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PONTIF˝CIA UNIVERSIDADE CATLICA DO PARAN` CENTRO DE TEOLOGIA E CI˚NCIAS HUMANAS MESTRADO EM EDUCA˙ˆO CRISTINE ROBERTA PIASSETTA XAVIER A PR`TICA DA EDUCA˙ˆO MUSICAL NAS SRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CURITIBA CURITIBA 2009

Dissertacao Cristine Xavier 2009 oficial.doc - pdfMachine ......AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, pela vida, força e vontade de buscar o melhor!!! Aos Meus Pais, pela concepçªo,

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  • PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ

    CENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS

    MESTRADO EM EDUCAÇÃO

    CRISTINE ROBERTA PIASSETTA XAVIER

    A PRÁTICA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CURITIBA

    CURITIBA

    2009

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  • CRISTINE ROBERTA PIASSETTA XAVIER

    A PRÁTICA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CURITIBA

    Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Educação, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

    Orientadora: Profª. Drª. Joana Paulin Romanowski.

    CURITIBA

    2009

  • À minha família!!! Dela eu vim, por ela sou

    e com ela seguirei para um futuro melhor!

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeço a Deus, pela vida, força e vontade de buscar o melhor!!!

    Aos Meus Pais, pela concepção, incentivo, apoio, carinho, proteção, pelo eterno amor e espelho de como ser uma pessoa do bem!!!

    Ao Mauricio, meu marido, por vivenciar comigo a complexa arte de amar. Pelo aconchego, apoio, incentivo e compreensão!!!

    Aos meus filhos, Milena, Diogo e Leandro, que são a essência e força da minha vida! Por e para eles estou seguindo este caminho!!!

    Aos meus irmãos Cindy, Carine, Cid e Catherine, por serem o que são! Pelo amor, amizade, pela ajuda intensa, direta e indireta para a concretização deste trabalho e de outros que possam surgir!!!

    Aos Meus Sobrinhos, pela companhia e auxílio na arte da interação!!!

    À minha querida Orientadora Professora Joana, que com sua experiência e dedicação ajudou a desvelar a existência do caminho científico, sendo amiga e compreensiva em momentos tão essenciais da minha vida. Minha eterna gratidão!!!

    Ao Professor José Nunes, pela dedicação, amparo, companheirismo, profissionalismo e por ser um dos ícones na arte da educação musical, referência exemplar da área!!!

    À Professora Pura pela orientação, carinho, amizade e a forma comprometida que conduz seu olhar para a educação!!!

    Ao Professor Peri, amigo desde o primeiro momento em que tive contato, exemplo de profissional e, acima de tudo, de ser humano!!!

    À Professora Neuza pelo carinho e exemplo de profissional!!!

    Aos Professores Sergio e Rosa Lydia pelo impulso em buscar elementos históricos da arte de educar!!!

    À Professora Marilda, pelo afeto e conhecimento transmitidos em todos os momentos!!!

    Às Professoras Beatriz e Rosane, do departamento de música da UFPR, que sempre me receberam com muito carinho, pelo exemplo de

    profissionalismo e humanidade que possuem!!!

    À minha grande Amiga Simone, por mostrar infinitamente a união do amor, respeito e dedicação ao próximo e a profissão!!!

    Às minhas Amigas Ilze e Ana pela parceria, apoio e companheirismo!!!

    À minha Amiga Poliana, que desde a infância me acolhe, me ouve e mesmo na distância dos caminhos percorridos, continua sendo minha amiga do coração, incentivadora e companheira.

    À minha Amiga Gisele, exemplo de gestora da educação, que além de carinho e atenção, me incentivou e mostrou que é possível buscar sempre o melhor para os

    alunos, mesmo quando a probabilidade das coisas acontecerem parece ser ínfima!!!

  • À minha Amiga Mirian, companheira, acolhedora, surpreendente como profissional, que mostrou que o caráter é uma das dádivas divinas e que não é necessário corrompê-lo para obter sucesso!

    À minha Amiga Sonia, companheira, parceira e inesgotável fonte de inspiração! Obrigada por surgir em meus caminhos!!!

    Às minhas Amigas Professoras do Projeto Engenheiros da Cidadania, Márcia, Maria Júlia, Noely, Silvana, Val e Ivone, pelas habilidades artísticas, pela interação e pelo apoio!!!

    À Equipe Administrativa e Pedagógica da minha eterna escola CEI Eva da Silva, pelo trabalho dedicado e motivador que exercem!!!

    À Cleonice e à Teresa pela primorosa dedicação à Educação Musical do nosso Município e por serem as pessoas exemplares que são! Meu eterno respeito!!!

    Às minhas colegas de trabalho, Professoras Entrevistadas, que participaram deste estudo com muito respeito e que concederam um

    pouco da magnitude que possuem na arte de educar musicalmente!!!

    À Profª Ginilda, amiga e grande incentivadora no caminho da educação! Obrigada pelo carinho e pela confiança!!!

    Aos Professores que, de maneira muitas vezes difíceis, não desistem e ainda contribuem para os avanços da educação neste país!!!

    À Vanessa, que com carinho e fidelidade contribui para o zelo do meu lar!!!

    Ao Programa de Pós Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, pelo acolhimento, confiança e pela concessão da bolsa de estudos da CAPES!!!

    À Solange e a Francineide, Secretárias e corações do Programa de Pós Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, pela atenção, gentilezas e exemplo de profissionalismo!!!

    À Secretaria Municipal de Educação de Curitiba pelo apoio, concedendo uma bolsa de estudos, dando demonstração de respeito aos profissionais que possui, investindo na ampliação do conhecimento científico da educação do município!!!

    À Secretaria Municipal de Educação de Pinhais, por me impulsionar a cada dia no Aprofundamento sobre a educação, para evidenciar que novos caminhos são possíveis sim!!!

    Aos desafios que surgiram em minha vida, pois através deles é que conquistei o que sou e possuo! Desejo que continuem e muito, pois pretendo vencê-los sempre!!!

    Em especial aos Meus Eternos Alunos, independente da idade cronológica, pela dedicação, carinho e sapequice que possuem!!!

  • O petróleo é o combustível das máquinas.

    A música é o combustível da alma. (Villa-Lobos)

  • COMUNHÃO

    Sua barriga me deu a mãe O pai me deu o seu braço forte Os seios fartos me deu a mãe

    O alimento, a luz, o norte

    A vida é boa me diz o pai A mãe me ensina que ela é bela O mal não faço eu quero o bem

    Na minha casa não entra a solidão

    Todo o amor será comunhão A alegria de pão e o vinho

    Você bem pode me dar a mão Você bem pode me dar carinho

    Mulher e homem é o amor

    Mais parecido com primavera É dentro dele que mora a luz

    Vida futura no ponto de explodir

    Eu quero paz eu não quero guerra Quero fartura, eu não quero fome

    Quero justiça, não quero ódio Quero a casa de bom tijolo Quero a rua de gente boa

    Quero a chuva na minha roça Quero o sol na minha cabeça

    Quero a vida, não quero a morte não

    Quero o sonho, a fantasia Quero o amor, e a poesia

    Quero cantar, quero companhia Eu quero sempre a utopia

    O homem tem de ser comunhão A vida tem de ser comunhão

    O mundo tem de ser comunhão A alegria do vinho e o pão

    O pão e o vinho enfim repartidos

    Sua barriga te deu a mãe Eu pai te dou o meu amor e sorte

    Os seios fartos te deu a mãe O alimento, a luz, o norte

    A vida é boa te digo eu

    A mãe ensina que ela é sábia O mal não faço, eu quero o bem A nossa casa reflete comunhão

    (Milton Nascimento, 1982)

  • RESUMO

    A pesquisa realiza um estudo sobre a prática da educação musical nas séries iniciais do ensino fundamental da Rede Municipal de Ensino de Curitiba (RME). O problema da pesquisa que orienta a reflexão abordada é: como a educação musical é realizada nas séries iniciais do ensino fundamental nas escolas da RME? O objetivo geral tem por finalidade analisar a prática da Educação Musical nas séries iniciais do ensino fundamental da RME. Os objetivos decorrentes são: identificar as práticas pedagógicas de educação musical realizadas nas séries iniciais do ensino fundamental das escolas da RME, indicando as condições em que se move esta prática; averiguar quais as dificuldades encontradas para o desenvolvimento das práticas musicais na escola; verificar a formação dos professores de educação musical, a formação continuada ofertada pela RME e como os conhecimentos adquiridos se relacionam com a prática. A pesquisa se desenvolve numa abordagem qualitativa, na modalidade estudo de caso, utilizando como instrumento de coleta de dados a entrevista semi-estruturada e análise documental. As entrevistas foram realizadas com professores da RME que atuam na área da educação musical. Os referenciais de análise de estudo são Araújo (2001), Bellochio (2003), Del Ben (2003), Fernandes (1999, 2001, 2006, 2007), Gainza (1988), Grossi (2003), Hentschke (2000, 2002), Horta (1994), Joly (2003), Oliveira (1999, 2003), Penna (2007), Souza (1989, 2003) e Zagonel (2008). A análise dos dados revela que: a prática da educação musical acontece nas escolas que as professoras entrevistadas estão inseridas e o coral predomina entre as modalidades desenvolvidas; através dos cursos de formação continuada ofertados pela RME de maneira crescente e intensa há e haverá um reflexo na prática musical do cotidiano escolar; o desenvolvimento de atividades musicais contribui para o conhecimento musical e interferem na aprendizagem e o apoio administrativo para as práticas musicais é condição básica para seu desenvolvimento. Palavras-chave: Educação musical. Prática pedagógica musical. Formação musical.

  • ABSTRACT

    This research realizes a study about musical education practice inside primary education levels at Municipal Teaching Section in Curitiba (RME). The main goal for this research and that guides the reflective approach is: How the musical education is achieved inside primary education levels in schools of Municipal Teaching Section in Curitiba? The general goal aims to analyzing Musical Education practice inside primary education levels of (RME). As consequent goals: To identify pedagogical practices of Musical Education that have been achieved in primary education levels in schools of (RME), showing how is the development of this practice; to verify what difficulties can be found for the development, as well as the continuous development (RME) can offer to teachers and also how this knowledge is related to the practice. This researchs approach is qualitative and it was chosen case study as the modality, for collecting data, half-structured interviews and documental analysis were tools for this investigation. These interviews have been achieved with teachers who have been teaching to the Municipal Teaching Section. Some references for this study are: Araújo (2001), Bellochio (2003), Del Ben (2003), Fernandes (1999,2001,2006,2007), Gainza (1988), Grossi (2003), Hentschke (2000,2002), Horta (1994), Joly (2003), Oliveira (1999,2003), Penna (2007), Souza (1989,2003) e Zagonel (2008). Data analysis shows: There is musical education practice inside schools where those interviewed teachers belong to, and choral is the main modality developed. There is a great perspective for the everyday school development with musical practice, and through the continuous development (RME) which has been offered to the teachers, these musical activities can help developing some musical knowledge and also interfere into students learning. Staff support for this musical practice inside schools is essential for its development. Keywords: Musical education. Musical pedagogical practice. Musical development.

  • LISTA DE ILUSTRAÇÔES

    FIGURA 1 A Pesquisa em Educação Musical segundo as especialidades do CNPq

    nas dissertações de Mestrado dos Cursos de Pós-Graduação stricto sensu em

    Música/Educação Musical no Brasil........................................................................ 20

    FIGURA 2 Formação Inicial das Professoras Entrevistadas (porcentagem) ....... 96

    FIGURA 3 Formação Inicial na Área de Música.................................................. 97

    FIGURA 4 Formação Técnica (Instrumento) ....................................................... 98

    FIGURA 5 Formação Técnica (Instrumento) Acadêmica .................................... 101

    FIGURA 6 Formação Técnica (Instrumento) em Xilofone através da RME ........ 102

    FIGURA 7 Formação Técnica (Instrumento) em Flauta Doce através da RME .. 103

    FIGURA 8 Cursos de Extensão na Área de Música em outras Instituições....... . 103

    FIGURA 9 Perfil Ideal do professor para o ensino de música no ensino

    fundamental..............................................................................................................123

    QUADRO 1 Quadro demonstrativo da formação inicial das professoras

    entrevistadas neste estudo.........................................................................................47

    QUADRO 2 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em Música

    da UFRGS, relacionadas ao tema deste estudo......................................................135

    QUADRO 3 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em Música

    da UNIRIO, relacionadas ao tema deste estudo......................................................136

    QUADRO 4 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em Música

    da UFG, relacionadas ao tema deste estudo...........................................................137

    QUADRO 5 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em

    Educação da UFSCAR, relacionadas ao tema deste estudo...................................138

    QUADRO 6 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em

    Educação da UFMS, relacionadas ao tema deste estudo.......................................139

    QUADRO 7 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em

    Educação da UTP, relacionadas ao tema deste estudo..........................................140

    QUADRO 8 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em

    Educação da PUCPR, relacionadas ao tema deste estudo.....................................140

    QUADRO 9 Dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em

    Educação da UFPR, relacionadas ao tema deste estudo........................................141

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ABEM Associação Brasileira de Educação Musical

    ANPPOM Associação de Pesquisa e Pós-Graduação em Música

    CAC Centro de Artes Criadoras

    CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

    CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

    ISME International Society for Music Education

    LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

    PMC Prefeitura Municipal de Curitiba

    PUCPR Pontifícia Universidade Católica do Paraná

    RME Rede Municipal de Ensino de Curitiba

    SEMA Superintendência de Educação Musical e Artística

    UDESC Universidade do Estado de Santa Catarina

    UFBA Universidade Federal da Bahia

    UFG Universidade Federal de Goiás

    UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

    UFPB Universidade Federal da Paraíba

    UFPR Universidade Federal do Paraná

    UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul

    UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

    UFSC Universidade Federal de Santa Catarina

    UFSCAR Universidade Federal de São Carlos

    UFSM Universidade Federal de Santa Maria

    UNB Universidade de Brasília

    UNESP Universidade Estadual Paulista

    UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

    UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

    USP Universidade de São Paulo

    UTP Universidade Tuiuti do Paraná

    % porcentagem

    ª primeira

    h hora

    min minuto

    º primeiro

  • SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................14 2 HISTÓRIA DA PRÁTICA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL .....................27 2.1 OS PRIMEIROS REGISTROS DE EDUCAÇÃO MUSICAL ................................27

    2.2 A EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL DE 1930 A 1960.....................................29

    2.3 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO DE 1940 A 1960 ............................33

    2.4 A TENUIDADE DAS PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO MUSICAL NAS ESCOLAS, A

    PARTIR DE 1970 ......................................................................................................36

    2.5 A PRÁTICA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NA RME ..............................................40

    3 METODOLOGIA ....................................................................................................43 3.1 O CAMPO E OS SUJEITOS DA PESQUISA ......................................................46

    3.2 O PERCURSO METODOLÓGICO......................................................................48

    4 CORAÇÃO MUSICAL: O PULSAR .......................................................................52 4.1 A PRÁTICA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NA RME DE 1993 AOS TEMPOS

    ATUAIS .....................................................................................................................53

    4.2 A EDUCAÇÃO MUSICAL NA ORGANIZAÇÃO ESCOLAR ................................60

    4.2.1 Musicalização .................................................................................................67 4.2.2 Coral ................................................................................................................68 4.2.3 Flauta doce .....................................................................................................69 4.2.4 Xilofone ...........................................................................................................69 4.2.5 Violão...............................................................................................................71

    4.2.6 Fanfarra ...........................................................................................................72 4.3 A PRÁTICA DA MÚSICA NAS ESCOLAS DA RME ...........................................72

    4.3.1 Práticas musicais desenvolvidas pela professora Dó ................................77 4.3.2 Práticas musicais desenvolvidas pela professora Ré ................................81 4.3.3 Práticas musicais desenvolvidas pelas professoras Mi e Fá.....................84 4.3.4 Práticas musicais desenvolvidas pelas professoras Sol e Lá ...................87 4.4 NEM TUDO É UM MAR DE ROSAS.................................................................93

    4.5 FORMAÇÃO DO PROFESSOR: UMA FORMAÇÃO MUSICAL EM CONSTANTE

    FORMAÇÃO..............................................................................................................96

  • 4.6 AS CONQUISTAS ATRAVÉS DAS PRÁTICAS MUSICAIS DESENVOLVIDAS

    ................................................................................................................................105

    5 ENFIM, MEU OLHAR SOBRE O ESTUDO .........................................................111 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................120

    REFERÊNCIAS.......................................................................................................125 ANEXO A LEVANTAMENTO DE PESQUISAS NA ÁREA DE MÚSICA ...........132

    ANEXO B LISTA FORNECIDA PELA COORDENAÇÃO DE MÚSICA DA RME................................................................................................................................142

    APÊNDICE A ENTREVISTA LITERAL COM A PROFESSORA CLAVE DE FÁ................................................................................................................................147

  • 14

    1 INTRODUÇÃO

    [...] E jamais termina meu caminhar, só o amor me ensina onde vou chegar [...]

    ( Edmundo Souto; Danilo Caymmi; Paulinho Tapajós, 1974 )

    A música está presente em minha vida desde tenra idade. Para cada fase da

    vida, existe um repertório musical correspondente, sendo possível lembrar algumas

    cenas ao escutar determinadas músicas que fazem parte da minha história pessoal.

    Quando eu estava cursando as séries iniciais do ensino fundamental, na

    escola que estudava havia a disciplina de música e na 1ª série comecei a participar

    do coral da escola. Lembro-me de uma série de apresentações! Não saem da minha

    memória as aulas de música que a professora ministrava. Em alguns momentos ela

    tocava piano e as alunas da minha turma ficavam em torno do instrumento,

    disputavam um lugar mais próximo da professora, para escutar as músicas alegres

    que docemente ela cantava e tocava.

    O sonho da minha mãe era tocar piano! Uma das paixões do meu pai é a

    música! Cresci num ambiente de muitas amizades e muitas músicas que meu pai

    ouvia. Algumas eram insistentemente colocadas, como se ele quisesse transpor ao

    mundo o que sentia através da música.

    Com o estímulo dos meus pais, iniciei as aulas de piano. Um curso de piano

    clássico numa Academia de Música e Belas Artes. Adorava o instrumento, mas não

    gostava muito dos exercícios obrigatórios. Hoje entendo que estes exercícios eram

    para o aperfeiçoamento da técnica instrumental.

    No entanto, o melhor momento da aula de piano era quando a professora

    pedia para eu tocar as músicas que estudava, mas que não estavam no programa

    formal da Academia e, algumas vezes, nem condizentes à etapa que eu cursava.

    Eram músicas que eu ouvia, gostava e buscava o aprendizado, mesmo se fossem

    muito mais difíceis de executar com a técnica que eu tinha adquirido até aquele

    momento. Não importava o grau de dificuldade e sim, o prazer que eu tinha de tocar

    a música por cuja melodia havia me apaixonado!

  • 15

    Comecei a freqüentar as aulas de teoria musical da Academia de Música e o

    que era mais estimulante eram os momentos antes da aula, quando com outros

    alunos de diferentes instrumentos, produzíamos música coletivamente. Eram

    preciosos momentos de improvisação musical, distribuídos em instrumentos de

    percussão, de cordas e de sopro. Fazíamos música pelo prazer da música!

    Fiz o curso de piano até a época em que iniciei o cursinho pré-vestibular, no

    período que estava terminando o curso de magistério. Após, iniciei minha carreira

    como professora regente de turma, lecionando todas as disciplinas da série do

    ensino fundamental. Ao tomar conhecimento de que eu tinha uma formação como

    instrumentista musical, a diretora da escola pediu para que eu desenvolvesse um

    trabalho de educação musical com todas as turmas. Por ter experiência musical com

    o instrumento piano, cuja execução é individual, não assumi por não me considerar

    apta o suficiente para ensinar música numa turma do ensino regular, em que a aula

    seria coletiva.

    Diante desta situação desafiadora, após cinco anos de experiência como

    professora, fui buscar uma formação acadêmica para dar o suporte tanto na questão

    didática, como na condução de um trabalho musical coletivo, cujo processo criativo

    fosse significativo aos alunos. Esta formação acadêmica foi o curso de Licenciatura

    em Educação Artística com Habilitação em Música.

    Durante o curso, conforme o histórico escolar da Faculdade de Artes do

    Paraná (FAP), tive disciplinas específicas de música, disciplinas reflexivas e

    disciplinas didáticas do ensino da música, que proporcionaram uma formação

    profissional com possibilidades de concretizar o que antes estava insegura de

    realizar, um trabalho significativo e coletivo musicalmente.

    Dentre as disciplinas cursadas, as denominadas específicas foram: técnicas

    de expressão vocal I e II; técnicas de musicalização I e II; linguagem e estruturação

    musical I, II, III e IV; formas de expressão e comunicação artística; canto coral I, II e

    III; prática instrumental I, II e III; instrumentação e orquestração I e II; regência I e II e

    oficina de música experimental.

    As disciplinas cursadas denominadas reflexivas foram: introdução a filosofia;

    métodos e técnicas de pesquisa; antropologia; estética I e II; história da arte I e II;

    folclore brasileiro I e II e evolução da música.

    Já as disciplinas didáticas cursadas foram: psicologia da educação I e II;

    fundamentos da expressão e comunicação humanas I e II; fundamentos da arte-

  • 16

    educação I e II; didática I e II; prática de ensino I e II e estrutura e funcionamento de

    ensino.

    Assim, passei a lecionar como professora do ensino da Arte, atuando com os

    quatro eixos da arte: artes visuais, dança, música e teatro, norteadores do trabalho

    artístico. Mesmo com um conhecimento musical cultivado ao longo dos anos e

    formação superior na área, senti muitas dificuldades em ensinar música

    coletivamente, pois a diversidade cultural e de interesses dos alunos exigem do

    professor uma prática flexível, articulada e criativa.

    Neste contexto, percebi que esta prática necessita, não só a experiência

    profissional no segmento educacional como professora regente, mas também um

    conhecimento articulado com questões teóricas, ou seja, a prática docente articulada

    com os conhecimentos teóricos adquiridos na formação técnica, na licenciatura em

    música e na formação continuada. No entanto, percebi que a licenciatura é um

    começo e que no decorrer da prática pedagógica há um amadurecimento

    profissional e aprofundamento teórico.

    Ao constatar estas questões expostas, fiquei intrigada em pesquisar se outros

    profissionais que atuam na área da Educação Musical possuem uma formação

    específica e/ou se tiveram contato com a prática musical apenas em sua vivência

    escolar. Em reuniões com professores nas redes de ensino que atuo, verifiquei que

    alguns docentes que trabalhavam com o ensino da Arte nas séries iniciais do ensino

    fundamental, não possuíam formação específica, licenciatura na área de artes, para

    atuarem com esta área do conhecimento. Dentro deste contexto, desta formação ou

    não-formação, ampliam-se os questionamentos e preocupações sobre como

    acontecem as práticas de educação musical nas escolas, direcionando esta

    pesquisa. De acordo com Bellochio (2003, p. 138):

    O professor precisa refletir constantemente sobre as práticas que realiza, individual e compartilhadamente. Precisa acreditar que os saberes da experiência são fundamentais na construção de sua tarefa profissional e requerem sustentação sólida. Não basta fazer por fazer. É necessário pensar criticamente na elaboração dos planejamentos e na sua realização. Essa é uma das possibilidades de gerar mudanças no espaço escolar. No caso específico da aula de música, é preciso que o professor tenha conhecimentos pedagógicos e musicais, teóricos e práticos, que subsidiem a planejar e tomar decisões no contexto da sala de aula.

    Deste modo, o objeto deste estudo é a prática da educação musical nas

    séries iniciais do ensino fundamental da Rede Municipal de Ensino de Curitiba

  • 17

    (RME). A questão da prática do ensino de música circunscreve-se na linha de

    pesquisa de teoria e prática de ensino e algumas questões são orientadoras da

    investigação: O ensino de música acontece nas séries iniciais do ensino

    fundamental das escolas da RME? Como são realizadas as práticas musicais nas

    séries iniciais do ensino fundamental das escolas da RME? As práticas pedagógicas

    de educação musical aplicadas nas séries iniciais do ensino fundamental das

    escolas da RME são realizadas com um embasamento teórico? Se ocorrem as

    práticas musicais, quais são as dificuldades encontradas para o seu

    desenvolvimento? E destas perguntas que permeiam esta pesquisa surgiu o

    questionamento central: como a educação musical é realizada nas séries iniciais do

    ensino fundamental nas escolas da RME?

    Assim, o objetivo geral é analisar a prática da Educação Musical nas séries

    iniciais do ensino fundamental da Rede Municipal de Curitiba. Os objetivos

    específicos são: apontar como se constitui essa prática da educação musical nas

    séries iniciais do ensino fundamental nas escolas da RME; identificar as práticas

    pedagógicas de educação musical aplicadas nas séries iniciais do ensino

    fundamental das escolas da RME; averiguar quais as dificuldades encontradas para

    o desenvolvimento das práticas musicais nas escolas; verificar a formação dos

    professores de educação musical, a formação continuada ofertada pela RME e

    como os conhecimentos adquiridos se relacionam com a prática.

    Ao falar da importância e no papel da música na escola, Joly (2003, p. 118)

    afirma:

    A música é um elemento importante na rotina diária de uma sala de aula. O contato com ela pode enriquecer a experiência da criança de inúmeras formas. Se o professor tocar ou cantar diversas músicas em diferentes situações durante todo o dia escolar, a criança assimila outras situações de aprendizagem, tais como habilidades sociais e estruturas de linguagem. As crianças são sempre aprendizes por inteiro, elas aprendem um pouco de cada coisa cada vez que têm oportunidade. Assim como assimilam os sons oriundos do processo de aprendizagem da linguagem, elas também aprendem os sons musicais experimentando-os como parte do ambiente onde estão.

    No contexto deste estudo se destaca que o ensino da música nas escolas,

    está incluído na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n. 9394

    (BRASIL, 1996), cujo art. 26, parágrafo 2º, estabelece: O ensino da arte constituirá

    componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma

  • 18

    a promover o desenvolvimento cultural dos alunos. E nos Parâmetros Curriculares

    Nacionais, o documento n. 6 expressa que o ensino da arte para o primeiro e

    segundo ciclos no ensino fundamental, será trabalhado na escola a partir das áreas

    de artes visuais, dança, música e teatro. Esta orientação indica a obrigatoriedade do

    ensino da música e na formação profissional de professores para assumirem tais

    campos do conhecimento.

    Sobre a formação profissional do educador musical destaca-se o trabalho

    discutido por Souza (2003), Oliveira (2003) e Penna (2007). E na reflexão sobre

    atuação profissional e mercado de trabalho na perspectiva da formação do educador

    musical, encontra-se escritos de Grossi (2003). Igualmente, foram consultadas como

    fontes bibliográficas as revistas da Associação Brasileira de Educação Musical

    (ABEM), os Cadernos Debates da Universidade Federal do Estado do Rio de

    Janeiro (UNIRIO), a Série Estudos nº. 6 da Universidade Federal do Rio Grande do

    Sul (UFRGS) e a revista Música em Pauta, que apresentam temas relacionados a

    esta pesquisa, orientando no foco da educação musical.

    Os principais autores utilizados para o embasamento da análise da prática

    pedagógica musical foram: Bellochio (2003), Fernandes (1999, 2001), Hentschke

    (2000), Joly (2003), Swanwick (2003) e Zagonel (2008).

    Enfatiza-se que as questões legais da Educação Musical, da música presente

    na escola, do acesso a todos, constituem busca constante, principalmente dos

    profissionais da área. Gainza (1988, p. 98) afirma:

    [...] a música se converte em mito naqueles ambientes onde indivíduos ouviram afirmar reiteradamente que a música é patrimônio de uns poucos eleitos. Somos nós, os educadores musicais, que devemos lutar para inculcar nas pessoas que a música não é um mito, mas sim uma realidade ao alcance de todo o ser humano.

    1.1 CONTEXTO DO TEMA DA PESQUISA

    Neste estudo tive a preocupação de investigar as pesquisas que já foram

    realizadas na área de educação musical no Brasil, investigando pesquisas na área

    de música, na área da educação envolvendo a educação musical, observando

    também os trabalhos que tiveram como campo a música na rede pública de Curitiba.

  • 19

    As fontes averiguadas foram: o site da Associação de Pesquisa e Pós-

    Graduação em Música (ANPPOM); o banco de dissertações e teses da

    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); o banco

    de dissertações dos programas de pós-graduação em música existentes no Brasil e

    o banco de dissertações de alguns programas de educação, observando os que

    apresentam linhas que convergem à educação musical.

    Nos estudos realizados por Fernandes (1999), foram apontadas as

    instituições que desenvolvem programas de pós-graduação, incluindo as áreas da

    música em que ocorrem as pesquisas. Este estudo aponta as áreas da educação

    musical estudadas (Figura 1), bem como a carência de estudos em alguns campos

    desta área do conhecimento. Esta sistematização foi elaborada com base nas

    pesquisas realizadas até 1997.

    Fernandes (1999) buscou sistematizar o conjunto de dissertações

    organizadas nas pesquisas de Ulhôa (1997 apud FERNANDES, 1999) e Oliveira &

    Souza (1997 apud FERNANDES, 1999) e verificar como está o campo da pesquisa

    em Música / Educação Musical nas teses e dissertações nos programas de pós-

    graduação. Adotou como padrão de cálculo da freqüência dos tópicos da "Estrutura

    da Área da Música", presentes no Relatório do CNPq de Ilza Nogueira (1997 apud

    Fernandes, 1999), que contém as subáreas e as especialidades de cada subárea.

    As especialidades da subárea Educação Musical são: (1) Filosofia e Fundamentos

    da Educação Musical, (2) Processos Formais e Não-formais da Educação Musical (I,

    II e III Graus), (3) Processos Cognitivos na Educação Musical, (4) Administração,

    Currículos e Programas em Educação Musical, (5) Educação Musical Instrumental

    (Banda, Orquestra), (6) Educação Musical Coral, (7) Educação Musical Especial.

    De acordo com Fernandes (1999, p. 4):

    Como podemos observar na Figura 1, a maioria dos trabalhos de Educação Musical está na especialidade (2) Processos Formais e Não-formais da Educação Musical (54%). Existe um sério "desequilíbrio" entre os índices, devido, talvez, aos interesses dos pesquisadores. Os baixos índices em relação às especialidades (4), (5) e (6) também devem ser levados em conta. Acreditamos que o interesse que, possivelmente, regula a produção possa também estar ligado a uma pequena quantidade de estudos teóricos e práticos existentes e à falta de prática dos pesquisadores nesses campos. Na especialidade (7), Educação Musical Especial, não existe qualquer trabalho feito, sendo, portanto, a especialidade mais carente.

  • 20

    Figura 1. A Pesquisa em Educação Musical segundo as especialidades do CNPq nas dissertações

    de Mestrado dos Cursos de Pós-Graduação stricto sensu em Música/Educação Musical no Brasil.

    Fonte: figura elaborada por Fernandes (1999),com base em Ulhôa (1997) e Oliveira & Souza (1997).

    Esta figura indica um enfoque nas pesquisas da educação musical formal e

    informal realizadas nos programas de pós-graduação e a carência de estudos na

    área da educação musical especial.

    Em outros estudos realizados por Fernandes (2006, p. 12) que abrangem as

    pesquisas referentes aos anos anteriores a 1998 e de 1998 a 2001, ele aponta um

    aumento no número de cursos de pós-graduação em música, gerando assim um

    aumento no número de trabalhos produzidos por alunos de pós-graduação em

    música. O autor complementa que

    Torna-se relevante apontar aqui que existe uma grande produção de trabalhos em outros cursos que não são de música. Daí ser fundamental para os alunos e pesquisadores conhecerem a situação do campo, não só para contextualizarem seus objetos de estudo, conhecendo seus antecedentes, mas para produzir conhecimento novo (2006, p. 14).

    Em 2007 Fernandes publicou novo estudo elaborado com base nas pesquisas

    realizadas de 2002 a 2005, em que consta também o aumento de cursos de pós-

    graduação em música, bem como o aumento da produção discente nesta área.

    Ressalta que houve um aumento da produção de pesquisas em educação musical

    em outros cursos, diferentes da área de música, artes e educação, e afirma que isso

  • 21

    gera pesquisas com os mais diversificados fundamentos teóricos e abordagens

    metodológicas (2007, p. 98).

    O autor salienta que a maioria dos trabalhos é sobre processos formais e não-

    formais da educação musical, que o menor índice de estudos continua na área da

    educação musical especial. Complementa dizendo acreditar que com a inclusão de

    pessoas com necessidades especiais na escola regular o número de pesquisas

    nessa especialidade cresça (2007, p. 98).

    Fernandes sugere aos programas de pós-graduação em música a criação ou

    ênfase em linhas de pesquisa que estejam ligadas às especialidades mais carentes

    apontados neste e nos levantamentos anteriores (2007, p. 98).

    Com base nas pesquisas de Fernandes, observei a necessidade de

    especificar os estudos já realizados e pesquisados até o presente momento, mas

    citando cada instituição e suas pesquisas1.

    Através do site da ANPPOM, foram constatados programas de pós-graduação

    em música nas seguintes instituições: Universidade Federal da Bahia (UFBA),

    Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Federal de Minas Gerais

    (UFMG), Universidade Federal da Paraíba (UFPB), UFRGS, Universidade Federal

    do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade de Brasília (UNB), Universidade Estadual

    Paulista (UNESP), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Universidade

    Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Universidade de São Paulo (USP).

    Nestes programas de pós-graduação stricto sensu em música, as linhas de

    pesquisas permeiam a musicologia, os processos de criação musical, execução

    musical, etnomusicologia, música e tecnologia e somente alguns deles apresentam

    a linha de pesquisa em educação musical.

    Os programas de pós-graduação stricto sensu em música que apresentam a

    linha de educação musical, música e educação ou práticas musicais são: UFG,

    UFRGS, UFBA, UNIRIO, UFMG. Os programas stricto sensu em música mais

    recentes são da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Universidade do

    Estado de Santa Catarina (UDESC), criados em 2006. Sendo que o da UFPR

    apresenta uma linha de cognição e filosofia, que poderá absorver pesquisas que

    envolvam a educação musical e o da UDESC, com a linha de pesquisa em

    1 Em anexo a instituição, o autor, a data e as pesquisas realizadas na área da música, convergentes a este estudo.

  • 22

    educação musical. Estes programas ainda não possuem o banco de dissertações

    por estarem em início de funcionamento.

    Entre os estudos realizados nas instituições que apresentam a linha de

    pesquisa em educação musical, foram selecionados os que abordam sobre a

    educação musical nas escolas, a prática da educação musical, os saberes musicais

    e as pesquisas realizadas em Curitiba na área de música.

    As pesquisas foram selecionadas também por temas que permeiam o objeto

    deste estudo: educação infantil; séries iniciais do ensino fundamental; séries finais

    do ensino fundamental; ensino médio; para adultos; contexto escolar; através do

    canto coral; processo de desenvolvimento através da educação musical; referente

    ao material didático; currículo; referente à prática pedagógica do professor de

    música; regulamentação; e à educação musical na visão de Villa-Lobos.

    São apontadas as pesquisas de cada instituição consultada, citando a

    instituição, o número de pesquisas e o número de pesquisas em cada categoria.

    Na instituição UFRGS, no programa de pós-graduação stricto sensu em música, de 1990 a 2007, foram encontradas 111 dissertações e dentre elas 22 estão

    de acordo com a temática deste estudo e de temas correlatos.

    Das 22 pesquisas selecionadas que envolvem a educação musical, 1 é

    referente à educação infantil; 1 às séries iniciais do ensino fundamental; 2 às séries

    finais do ensino fundamental; 1 através da mídia; 3 são no contexto escolar; 3

    focalizam a educação através do canto coral; 3 sobre o processo de

    desenvolvimento através da educação musical; 2 são referentes ao material didático;

    4 referem-se à prática pedagógica do professor de música; 1 versa sobre currículo e

    1 sobre a educação musical na visão de Villa-Lobos.

    Na instituição UNIRIO, no programa de pós-graduação stricto sensu em música, de 1995 a 2006, foram encontradas 129 pesquisas e dentre elas 9

    relacionam-se de acordo com a temática deste estudo. As pesquisas selecionadas

    foram: 1 sobre educação musical; 1 sobre a prática pedagógica do professor de

    música; 1 sobre currículo e 6 sobre a educação musical através do coral.

    No site da UFG foram encontradas 66 pesquisas realizadas de 2000 a 2005 e dentre elas 8 envolvem a temática deste estudo, sendo: 1 sobre a educação musical

    infantil; 1 sobre a educação musical escolar; 3 sobre o processo de desenvolvimento

    musical; 1 sobre a educação musical de adultos; 1 sobre a educação musical no

    ensino médio e 1 sobre regulamentação da educação musical.

  • 23

    Nos sites da UFBA e da UFMG, durante a realização desta pesquisa, não estavam disponíveis as dissertações já defendidas no programa. Os sites da UFPB, da UNB e da UFRJ não estavam disponíveis durante a realização desta pesquisa.

    Na UFSC, no programa de pós-graduação stricto sensu em engenharia de

    produção, foi encontrada uma dissertação de educação musical e que teve como

    campo de pesquisa a Rede Municipal de Curitiba intitulada A produção musical na

    educação infantil: um desafio da escola do futuro.

    Já os programas de pós-graduação stricto sensu em educação que tiveram

    pesquisas sobre música e/ou educação musical encontradas foram: Universidade

    Federal de São Carlos (UFSCAR), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM),

    Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), Pontifícia Universidade Católica do Paraná

    (PUCPR) e UFPR.

    No programa de pós-graduação stricto sensu em educação da UFSCAR, na área de metodologia de ensino, entre 364 pesquisas realizadas (mestrado e

    doutorado), foram encontradas 10 pesquisas voltadas para a temática deste estudo:

    1 sobre as séries iniciais do ensino fundamental; 1 sobre educação musical escolar;

    1 sobre processo de desenvolvimento da educação musical; 1 sobre educação

    musical através do coral e 6 sobre a prática pedagógica do professor de música.

    Através do banco de dissertações e teses no programa de pós-graduação

    stricto sensu em educação da UFSM, na linha de pesquisa educação e arte, das 10 pesquisas encontradas, 9 envolvem a temática deste estudo. As pesquisas

    selecionadas são: 1 em educação infantil; 1 voltada para as séries iniciais do ensino

    fundamental; 1 sobre o processo de desenvolvimento musical; 3 sobre a educação

    musical escolar e 3 sobre a prática pedagógica do professor de música.

    Para estabelecer uma relação entre as pesquisas que já analisaram a

    educação musical em Curitiba, examinei as dissertações dos programas de pós-

    graduação existentes nesta cidade que abordaram o tema.

    No programa de pós-graduação stricto sensu em educação da UTP, foram encontradas 2 pesquisas relacionadas a temática deste estudo, sendo uma

    desenvolvida na Rede Municipal de Curitiba e outra na Rede Municipal de Ponta

    Grossa. Na pesquisa intitulada O ensino da música nas séries iniciais das escolas

    municipais de Curitiba, de acordo com Araújo (2001):

  • 24

    [...] Introduziram-se os dados atuais sobre esse ensino nas escolas municipais de Curitiba, por meio de sua apresentação e analise: a freqüência com que se realizam as atividades musicais; os tipos de atividades mais comuns nas aulas de música; a formação do professor que ministra tais aulas; e as principais dificuldades encontradas para a sua realização. Ao final, são analisadas as características desse ensino: a sua ausência em muitas escolas; a falta de regularidade do ensino da música em grande parte das escolas municipais de Curitiba; a predominância das atividades que envolvem o canto; e a falta de professores com formação na área específica de música para ministrar as aulas. Propõem-se, na conclusão, outras investigações para o aprofundamento de algumas questões levantadas neste trabalho.

    A pesquisa Educação musical: a atuação do professor na educação infantil e

    séries iniciais defendida na Universidade Estadual de Ponta Grossa e, conforme

    Tozetto (2003):

    Este trabalho tem por objetivos apontar os desafios enfrentados pelo professor de Educação Musical no mundo globalizado e propor um caminho alternativo no processo de sua formação. A escolha do tema foi motivada pela obrigatoriedade do ensino da Música no currículo da Educação Básica e, em especial, na Educação Infantil e Séries Iniciais, nas quais se inicia a musicalização das novas gerações, expressa nas prescrições legais regulamentadoras da educação escolar brasileira. Ao referirmo-nos à Educação Musical como uma das dimensões da Arte na escola, nosso objetivo foi compreender os posicionamentos assumidos pelo professor a partir das tendências que marcaram o percurso histórico do ensino da Arte no Brasil e, em especial, da Música, e discutir as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais-Arte e seu desenvolvimento diante da insuficiente formação de professores para a área.

    Através do banco de dissertações e teses da Capes foram encontradas no

    programa de pós-graduação stricto sensu em educação da PUCPR, pesquisas que

    envolvem a música, mas não estão diretamente relacionadas à temática deste

    estudo.

    Através do banco de dissertações e teses da Capes foram encontradas 33

    pesquisas desenvolvidas no programa de pós-graduação stricto sensu em educação

    da UFPR relacionadas ao ensino da música, dentre elas, 9 estão relacionadas à temática deste estudo. Na pesquisa de Fernandes (1999) foram apontadas 2

    pesquisas desenvolvidas no programa de pós-graduação stricto sensu em educação

    da UFPR, que não constam no banco de dissertações da Capes.

    As pesquisas selecionadas da UFPR foram: 2 sobre educação musical

    escolar; 1 sobre a educação musical no ensino médio; 1 sobre a prática pedagógica

    do professor de música; 3 sobre o processo de desenvolvimento musical e 2 sobre a

    educação musical através do coral.

  • 25

    Assim, constata-se que há vários estudos direcionados a temática focalizada

    nesta pesquisa, mas poucos que buscam relacionar a formação e a prática dos

    professores de música. A organização do estudo está delineada em seis capítulos que descrevem o

    caminho do surgimento do tema, a delineação histórica da prática da educação

    musical no Brasil e sua influência na realidade da RME, a metodologia utilizada, um

    panorama das professoras entrevistadas citando a formação, as ações pedagógicas

    musicais, as dificuldades e as conquistas. Acrescento a análise das práticas

    musicais desenvolvidas sob a luz de autores da área e sugestões de estudos

    futuros.

    Na introdução apresento minha história pessoal com o intuito de compartilhar

    o que já vivenciei na área de educação musical, como me apaixonei pela música, a

    formação que possuo e o porquê do meu interesse pelo tema pesquisado. Segue

    com o questionamento central deste estudo: como a educação musical é realizada

    nas séries iniciais do ensino fundamental das escolas da RME, tendo como objetivo

    analisar esta prática. Cito alguns dos autores que embasam a pesquisa e apresento

    o estudo que realizei para verificar as pesquisas existentes no Brasil sobre este

    tema.

    No segundo capítulo faço uma linha do tempo de como a prática da educação

    musical ocorreu historicamente, para ilustrar e evidenciar o contexto que influenciou

    a história da educação musical na Rede Municipal de Ensino de Curitiba. No que se

    refere à educação musical da RME nas décadas de 70 e 80, foram utilizados como

    referência os relatos da Professora Clave de Fá, um dos sujeitos entrevistados nesta

    pesquisa.

    No terceiro capítulo descrevo a metodologia que utilizei para desenvolver esta

    pesquisa, mencionando a abordagem, a modalidade e os instrumentos de coleta de

    dados utilizados. Apresento o campo, os sujeitos da pesquisa e o caminho

    percorrido para a realização da mesma.

    No quarto capítulo, coração musical: o pulsar está a essência deste estudo,

    constando a seguinte seqüência:

    a) A educação musical na RME desde 1993 sob a ótica da Coordenadora

    de música do município, suas reflexões e seus objetivos acerca da

    educação musical da RME;

  • 26

    b) A educação musical na organização escolar das escolas selecionadas

    para o estudo, quais as modalidades da educação musical presentes

    em cada unidade e os horários reservados para esta prática;

    c) Em que consiste a educação musical na RME, incluindo como esta

    área está contemplada no Currículo (CURITIBA, 1998) e nas Diretrizes

    Curriculares (CURITIBA, 2006) da RME, os conteúdos abordados e a

    descrição da intenção pedagógica de cada modalidade desenvolvida

    nas escolas que as professoras entrevistadas estão inseridas,

    articuladas com autores da área que embasam as práticas da

    educação musical;

    d) A prática da música nas escolas da RME, consta o relato das ações

    pedagógicas musicais de cada professora entrevistada;

    e) Nem tudo é um mar de rosas constam as dificuldades encontradas

    pelas professoras entrevistadas para o desenvolvimento das práticas

    musicais;

    f) Formação do professor: uma formação musical em constante

    formação, neste momento foi descrita a formação inicial de cada

    professora entrevistada e os cursos de formação continuada na área

    de educação musical que realizaram até o final de 2007;

    g) As conquistas através das práticas musicais desenvolvidas, neste

    tópico encontram-se as conquistas resultantes dos esforços das

    profissionais entrevistadas, das suas batalhas diárias, da dedicação e

    empenho que exercem no desenvolvimento das ações pedagógicas

    musicais.

    No quinto capítulo estão os achados da pesquisadora e as inferências

    possíveis embasadas em autores da área.

    Nas considerações finais são propostas sugestões para futuras pesquisas e

    aprofundamento do tema.

    Na abertura de cada capítulo e em alguns sub-títulos do texto foi colocado um

    trecho de músicas do meu gosto pessoal e que, de alguma maneira, me reportaram

    ao assunto tratado. Lanço ao leitor como uma forma de sintonia e harmonia com os

    meus pensamentos, no intuito de deixá-lo ouvindo a música internamente enquanto

    efetua a leitura e, se houver o interesse, de fazer a ligação do trecho selecionado

    com o tópico em questão.

  • 27

    2 HISTÓRIA DA PRÁTICA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL

    Isto aqui o ô, é um pouquinho de Brasil, ia iá Desse Brasil que canta e é feliz[...]

    (Ary Barroso, 1942)

    Este capítulo apresenta algumas considerações e delineia historicamente o

    cenário da educação musical no Brasil. Assim se estrutura levando em conta os

    tópicos a seguir: os jesuítas e a educação musical; a ênfase na atividade musical

    individual; a presença no currículo escolar a partir de 1879; a atividade musical

    coletiva, seu fortalecimento a partir de 1930, pois é neste período que tem início a

    expansão da música na escola primária; a educação musical inserida na disciplina

    de Educação Artística. Finalizo com o movimento crescente desta área do

    conhecimento dentro da Rede Municipal de Curitiba.

    Esta trajetória se faz necessária, pois é preciso compreender o cenário da

    prática da educação musical no contexto amplo do sistema educacional. As Leis que

    surgiram ora para o fortalecimento, ora para o enfraquecimento do ensino de

    música. Na RME analisam-se os reflexos da Lei n. 5.692 (BRASIL, 1971), para

    conseguir visualizar o fluxo da prática da educação musical, intensificado a partir dos

    anos de 1990.

    Para tanto, este estudo foi elaborado com base principalmente nos seguintes

    autores: Hentschke (2000), Cartolano (1968), Fernandes (1999), Goldemberg

    (2002), Ribeiro (1955) e Zagonel (2008).

    2.1 OS PRIMEIROS REGISTROS DE EDUCAÇÃO MUSICAL

    Conforme Rosa (1990, p. 13), a linguagem da música parece ter estado

    sempre presente na vida dos seres humanos e desde há muito faz parte da

    educação de crianças e adultos.

  • 28

    Encontra-se em diferentes registros históricos que a música esteve presente

    nos povos indígenas que já habitavam essas terras na época do descobrimento do

    Brasil. Segundo Vasconcelos (apud ELLMERICH, 1977, p. 156) [...] os índios são

    afeiçoadíssimos à música e os que são escolhidos para cantores [...], prezam-se

    muito do ofício, e gastam os dias e as noites em aprender, e ensinar outros.

    De acordo com Ellmerich, a música ocupava uma função importante entre os

    indígenas e foi fator de valorização do povo pelos jesuítas:

    Os jesuítas, logo após o descobrimento do Brasil, notaram a boa disposição dos índios para a música. Manuel da Nóbrega dizia com a música e a harmonia me arrisco a atrair todos os indígenas. Os primeiros historiadores do Brasil [...] são unânimes em apontar a atração que a música exercia sobre os índios. Alguns deles, de tribos ferozes, pouparam a vida de seus prisioneiros brancos devido a seus dotes de bons cantores (1977, p. 156).

    Mario de Andrade (1975, p. 21) comenta que os jesuítas tomaram a música

    como estratégia de aproximação dos indígenas [...] o ensino jesuítico musicalizando

    à européia a escravaria de Santa Cruz. [...] a música dos primeiros jesuítas foi

    necessária e social. O sentido de necessária seria em relação à crença em Deus,

    no ponto de vista espiritualista. E social, porque funcionaria como elemento de fusão

    defensiva e protetora da coletividade. A música servia de catequização e de

    disciplina aos indígenas.

    E por isso a música, ou mais exatamente, o canto místico dos jesuítas, funcionava também como elemento de religião, isto é, de religação, de força ligadora, unanimizadora, defensiva e protetora dos diversos indivíduos sociais que se juntavam sem lei nem rei no ambiente imediatamente post-cabralino: chefes nobres profanos, aventureiros voluntários, criminosos deportados, padres e selvagens escravos (ANDRADE, 1975, p. 21).

    Observa-se que a educação musical acontecia nos povos indígenas que

    viviam antes do descobrimento do Brasil e que, após o descobrimento, os jesuítas

    foram responsáveis em utilizar o ensino musical como forma de catequizar os índios,

    utilizando uma prática coletiva.

    Conforme Andrade (1975) cada povo que foi chegando ao Brasil, os

    portugueses e os escravos negros, juntamente com os indígenas que aqui já se

    encontravam, cada um em seu tempo, foram mostrando a sua música que, mais

    tarde passa a ter um caráter brasileiro.

  • 29

    A escassa documentação existente tende a provar que os negros faziam a sua música negra, os portugueses a sua música portuga, os índios a sua música ameríndia. É só no fim do século XVIII, já nas vésperas da Independência, que um povo nacional vai se delineando musicalmente, certas formas e constâncias brasileiras principiam se tradicionalizando na comunidade (1975, p. 31).

    No final do Império e no início da República a música cresce e se define

    rapidamente com a influência dos indígenas, dos negros e portugueses. É neste

    período que a educação musical começa a fazer parte do ensino nas escolas.

    De acordo com Tanuri (2000, p. 67) em 1879, através do Decreto n. 7.247, os

    currículos começaram a apresentar maior complexidade e entre várias matérias, a

    música vocal deveria ser contemplada no ensino para professores normalistas, cuja

    prática seria nas escolas primárias.

    A Primeira República não conseguiu abrir uma nova fase para a música

    brasileira, foi à Segunda República que coube os méritos dessa importante

    evolução. Conforme Fuks (1993 apud HENTSCHKE, 2000, p. 47) apesar do ensino

    de música nas escolas públicas do Brasil ter sido instituído como obrigatório desde o

    século XIX, foi a partir da década de 30 que este inicia uma etapa de maior

    destaque.

    Esse novo estado-de-consciência musical se afirmou não como experiência

    individual, mas como tendência coletiva e poucos anos depois de finda a guerra,

    Villa-Lobos tornou-se iniciador da fase nacionalista2, através do canto orfeônico

    (ANDRADE, 1975).

    2.2 A EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL DE 1930 A 1960

    A prática de educação musical adotada no Governo Vargas na década de 30,

    foi o Canto Orfeônico. De acordo com Cartolano (1968, p. 16) a palavra Orfeão vem

    do nome de Orfeu, figura da mitologia grega, deus da música e da poesia. O canto

    orfeônico diferencia-se de coral. Para o autor, coral é uma prática musical em

    conjunto que exige conhecimentos musicais e de técnicas vocais mais aprimorados.

    Já o canto orfeônico é a prática musical em conjunto cujos elementos estão sujeitos 2 Nacionalista no sentido de exaltar a cultura e o folclore do país.

  • 30

    a menores exigências. Esta diferenciação não impede a existência de conjuntos

    orfeônicos tão bons quanto alguns corais.

    A prática orfeônica é desenvolvida coletivamente, podendo ser realizada a

    capela3 ou com acompanhamento instrumental. Segundo Ribeiro (1955), o

    orfeonista convive com elementos de diversas classes sociais, recebe o exemplo e o

    incentivo de uns, animando e auxiliando outros. Adquire progressivamente o hábito

    da disciplina e da compreensão, sendo constantemente refreado para não se

    sobressair ao demais, evitando vaidades individuais. Mas sua aplicação pessoal

    colabora com o conjunto orfeônico.

    Quanto aos resultados pretendidos pelo canto orfeônico, Ribeiro (1955, p. 7)

    expõe:

    Tornar-se musicalmente bem educado e, na família como na sociedade, quando mais tarde tiver a oportunidade de criticar, de apreciar a boa música, sempre haverá de discernir o nobre do vulgar [...]. O orfeonista não irá sofrer esta vergonha. No decorrer da existência, já integrado em quefazeres dos mais variados, lembrar-se-á, saudoso, dos hinos, das canções, dos coros executados no tempo escolar. Quanta vez, não irá trautear estas saudosas canções, experimentando, então, nos momentos difíceis da vida, lenitivo para as mágoas, tônico para os nervos, paz para o espírito.

    A partir destes conceitos, observou-se que o canto orfeônico poderia

    colaborar com a difusão e reforço do processo de identidade patriótica, pela

    coletividade e ideais incutidos em seu repertório. Para desenvolver um projeto de

    educação musical nos moldes do ideário governamental, foi convidado Heitor Villa-

    Lobos. Este compositor de renome internacional estava em evidência devido as

    suas qualidades musicais, sendo oportuna sua participação para o governo no que

    se refere à música.

    Heitor Villa-Lobos (1887-1959) foi um dos principais compositores brasileiros.

    Nasceu no Rio de Janeiro, onde iniciou seu contato com a música e demonstrou

    suas aptidões musicais desde tenra idade. Em sua juventude viajou pelo país,

    passando por várias regiões brasileiras, onde auferiu os mais diversos motivos

    folclóricos, que lhe serviram de fontes de inspiração. Ao estudar fora do país, viajou

    pela Europa disseminando a música brasileira. Ao voltar para o Brasil, em 1932, foi

    designado pelo Presidente da República Getúlio Vargas, para Diretor da Educação

    Musical no Brasil. Seguindo seus ideais, Villa-Lobos aceita o convite de Getúlio 3 Cantar sem acompanhamento instrumental.

  • 31

    Vargas e se torna um mediador significativo entre a música, a educação musical e a

    ideologia autoritária do Governo. Durante dez anos ocupou o cargo, preocupando-se

    em evidenciar a educação musical através do canto orfeônico, multiplicando esta

    prática por todo o país (RIBEIRO, 1955).

    Conforme Goldemberg:

    Villa-Lobos era um tradicionalista e estava preocupado com a elevação artístico-musical do povo brasileiro. Ele acreditava que se todos estudassem música nas escolas estar-se-ia contribuindo para transformá-la numa vivência cotidiana e formando um público sensibilizado às manifestações artísticas. O compositor participou ativamente do projeto de desenvolvimento do canto orfeônico e tinha como objetivo primordial auxiliar o desenvolvimento artístico da criança e produzir adultos musicalmente alfabetizados (2002, p. 2).

    Com efeito, o ensino de música no Brasil desta época é marcado pela

    oficialização do canto orfeônico nas escolas, sob a responsabilidade de Heitor Villa-

    Lobos. Através da Superintendência de Educação Musical e Artística (SEMA), que

    foi criada por Anísio Teixeira no Departamento de Educação da Prefeitura do Distrito

    Federal, a ação de Villa-Lobos se intensifica. O primeiro curso de Pedagogia da

    Música e do Canto Orfeônico, organizado pela SEMA, ocorre em 1932. No decorrer

    das ações desenvolvidas por Villa-Lobos, ele ganha apoio institucional e adquire

    dimensão nacional (HORTA, 1994).

    Para a formação da consciência patriótica e da educação moral e cívica,

    utilizou-se como meio de promoção a prática do canto orfeônico. Em 1933, o

    Governo Federal observa as vantagens da prática coletiva do canto orfeônico, que

    poderia ser implantada em unidade nacional, com uma orientação didática uniforme,

    e impõe esta prática aos Interventores e aos Diretores de Instrução dos Estados.

    Através do canto ter-se-ia a oportunidade de apresentar ao público os ideais do

    governo, com a constituição de espetáculos de grande repercussão (HORTA, 1994).

    Em 1934, a obrigatoriedade do ensino do canto orfeônico estende-se a todos os estabelecimentos de ensino primário e secundário do país, de acordo com as normas a serem estabelecidas pelo Governo Federal. Como vimos, para justificar esta medida, apelar-se-á não apenas para a ′utilidade do canto e da música como fatores educativos′, mas também para o fato do ensino do canto orfeônico constituir ′uma das mais eficazes maneiras de desenvolver os sentimentos patrióticos do povo′ (HORTA, 1994, p. 183).

    Seguindo esta visão de ensino de música da época e o contexto de

    valorização do nacionalismo, no final de 1936 foi instituída a obrigatoriedade do

  • 32

    canto do Hino Nacional nos estabelecimentos de ensino primário, normal,

    secundário, técnico-profissional e em todas as associações com fins educacionais,

    tanto públicos quanto privados.

    Para Maia (2000, p. 47), Villa-Lobos já havia apresentado propostas ao

    governo anterior, constando de planos educacionais referentes à educação musical.

    Mas foi o Governo Vargas que possibilitou a execução de seus planos, mais

    especificamente, quando Gustavo Capanema assumiu o Ministério da Educação as

    idéias do compositor são consideradas e consagradas através do canto orfeônico

    em favor do governo. Para realizar este programa educacional, Villa-Lobos elaborou

    estratégias de difusão onde idealizou a formação de um grupo de professores para

    executar suas idéias, promovendo um curso de especialização de finalidade

    pedagógica, observando as possibilidades e recursos de cada integrante.

    Antes de o menino, o jovem aluno, ser atrapalhado com regras, deve-se torná-lo familiar com sons. Deve-se ensiná-lo a conhecer os sons, a ouvi-los, a apreciar suas cores e individualidade. Eduque-lhe o ouvido a passar de um tom a outro. A esperar que certos sons sigam-se aos outros, a combinar sons em ritmos. Deixe-o aprender melodias, sentir harmonias, não por regras no papel, mas pelo som no próprio ouvido. Então mais tarde ensinam-lhe as regras (VILLA-LOBOS apud MAIA, 2000, p. 48).

    Foi concebido por Villa-Lobos um Guia Prático que serviria de apoio à

    proliferação de seus ideais, junto aos professores responsáveis pelo canto orfeônico

    nas escolas. Este guia reunia um repertório com temas já conhecidos pelo povo,

    facilitando a sua difusão. As apresentações desta prática musical chegaram a

    proporções de até 40 mil crianças e adolescentes cantores, já em meados de 1940

    (MAIA, 2000).

    Para Goldemberg (2002, p. 5), a formação de professores foi através:

    Do Curso de Orientação e Aperfeiçoamento do Ensino de Música e Canto Orfeônico. As atividades eram subdivididas em cursos de Declamação Rítmica e de Preparação ao ensino do Canto Orfeônico, destinados aos professores das escolas primarias; também foram criados o Curso Especializado de Música e Canto Orfeônico e de Prática de Canto Orfeônico, destinados à formação de professores especializados.

    Quanto aos objetivos do curso, Goldemberg acrescenta que:

    O Curso Especializado de Música e Canto Orfeônico tinha por objetivo estudar a música nos seus aspectos técnicos, sociais e artísticos, e tinha um currículo extenso: canto orfeônico, regência, orientação prática, análise harmônica, teoria aplicada, solfejo e ditado, ritmo, técnica vocal e fisiologia

  • 33

    da voz, disciplinas às quais foram incluídas história da música, estética musical, e, pela primeira vez no Brasil, etnografia e folclore (2002, p. 5).

    Aproveitando os conhecimentos e a prática musical desenvolvida com os

    professores, criou-se paralelamente

    [...] O famoso Orfeão dos Professores, com aproximadamente 250 vozes, que estimulou o processo educativo e ofereceu uma importante contribuição ao panorama cultural através de diversas apresentações altamente qualificadas (GOLDEMBERG, 2002, p. 6).

    Em 1942, Villa-Lobos assumiu a direção do Conservatório Nacional de Canto

    Orfeônico, administrando-o até a sua morte em 1959. Esta direção é alternada entre

    suas idas e vindas a turnês internacionais, perpetuando-se como personalidade

    musical brasileira.

    Para Hentschke (2000, p. 47):

    O grande objetivo político-ideológico da prática musical do canto orfeônico era o da congregação de massas, através da qual o sentido de coletividade, patriotismo e disciplina foram exaltados. Representante do regime Vargas e de uma abordagem tradicional do ensino de música, o canto orfeônico já estava no seu declínio nos anos cinqüenta.

    Hentschke (2000, p. 47) complementa que o canto orfeônico:

    Era um modelo tradicional, baseado em processos imitativos, direcionados aos objetivos e metas do programa determinado, e que explorava o aspecto funcional da música em direção à acomodação dos indivíduos ao sistema governamental vigente. [...] os professores de canto orfeônico ensinavam o repertório selecionado a todos os alunos das escolas que, em dias pré-determinados, se apresentavam em concerto coletivo, muitas vezes regido pelo próprio Villa-Lobos.

    2.3 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO DE 1940 A 1960

    Com o objetivo de fazer proliferar o ideário político vigente, houve uma certa

    preocupação com a formação do docente de educação musical da época. Em 1946,

    foi implantada a Lei Orgânica do Ensino de Canto Orfeônico, Decreto-Lei n. 9.494 (BRASIL, 1946), onde consta a organização do ensino do canto orfeônico. As

    questões que constam na Lei são: finalidade, cursos, estabelecimentos, disciplinas

  • 34

    com seriação, programas e conclusão de cursos, certificação dos participantes,

    divisão do ano escolar do canto orfeônico dos alunos, promoção e habilitação,

    organização escolar, inspeção federal do ensino do canto orfeônico, concurso ao

    magistério e disposições transitórias.

    Das questões expostas observa-se entre elas a finalidade da Lei, que seria

    formar professores para que, com sua prática na área da educação musical,

    pudessem proporcionar meios de aquisição musical e incentivar a mentalidade

    cívico-musical dos educadores.

    Com relação aos cursos, eles seriam de especialização, com duração de um

    ano, para a formação de professores que não tinham o curso completo da Escola

    Nacional de Música ou estabelecimento equiparado ou reconhecido e curso de

    aperfeiçoamento. Os alunos seriam aferidos em relação à participação, limitação e

    distribuição de tempo de trabalhos escolares, freqüência e avaliação de

    aproveitamento, atividades complementares e exames.

    No que se refere aos estabelecimentos, o Decreto-Lei n. 9.494 (BRASIL,

    1946) determinou que houvesse um único tipo de estabelecimento de ensino de

    canto orfeônico, o conservatório. O conservatório destinava-se à formação de

    professor de canto orfeônico das escolas pré-primárias, primárias e de grau

    secundário. Os estabelecimentos de ensino de canto orfeônico federais,

    equiparados ou reconhecidos, não poderiam adotar outra denominação que não a

    de conservatório.

    Com este Decreto-Lei n. 9.494 (BRASIL, 1946), houve uma organização da

    formação docente de canto orfeônico destinado às escolas, que hoje seriam as

    unidades escolares da educação básica, sob o controle do Governo Federal. Isto

    limitou a formação do professor em conservatórios institucionalizados destinados a

    determinar a conduta deste professor.

    Os Conservatórios de Música do país, alguns que já existiam desde o século

    anterior e outros que foram oficializados ao longo do período referenciado,

    conseguiram desenvolver programas próprios e alguns se transformaram em

    Faculdades.

    Um exemplo de transformação neste processo é a FAP (Faculdade de Artes

    do Paraná, 2007), que de Conservatório de Música do Paraná (1913) passou para

    Academia de Música do Paraná (1931). De Academia transformou-se em Faculdade

  • 35

    de Educação Musical do Paraná (1966). De Faculdade de Educação Musical,

    ampliou para Faculdade de Artes do Paraná em 1991.

    Ficou evidenciado que no período de 1930 a 1960 houve a aplicação do canto

    orfeônico em grandes proporções educacionais, devido aos recursos mais

    acessíveis que esta prática utiliza, possibilitando a expansão mais acelerada. Este

    tipo de canto utiliza como principal recurso a voz, um instrumento musical nato à

    maioria da população. Sua execução não exige virtuoses4, pode ser realizado com

    grandes grupos simultaneamente e seu repertório, que é repetido várias vezes para

    um melhor desempenho e apresentado para outras pessoas, serviu como

    propagador dos ideais políticos da época.

    A intenção de Villa-Lobos de uma educação musical popular no Brasil, sua

    performance musical em evidência, tanto no país quanto no exterior e a

    concomitância do Governo Federal convidá-lo a desenvolver este trabalho,

    demonstra a intencionalidade de aproveitar este talento em prol do próprio governo.

    Por sua vez, Villa-Lobos utiliza suas habilidades musicais, sua influência no

    meio musical, seu respeito profissional e seus ideais, para o programa que envolveu

    um país inteiro. Para conseguir atingir seus objetivos com maior brevidade, o

    compositor elaborou um programa de formação acelerada de professores, com a

    intenção de capacitar seus multiplicadores. Esta formação acelerada de professores

    e o conteúdo abordado, com base no Decreto-Lei n. 9.494 (BRASIL, 1946),

    ressaltou a ambigüidade das intenções governamentais e do próprio Heitor Villa-

    Lobos, reforçando a implantação da política autoritária do Governo Vargas.

    Observou-se que, como afirma Souza (1989, p. 29), [...] demonstra uma

    contribuição significativa da prática músico-pedagógica para a concretização dos

    objetivos sócio-políticos do regime Vargas.

    Ainda que tenha sido bem sucedido a princípio, o projeto de disseminação de uma cultura musical através do canto em nosso país estagnou e foi praticamente esquecido. [...] o canto orfeônico partiu dos mesmos princípios que regeram a implantação de métodos de ensino musical bem sucedidos em outros países, mas aconteceram algumas particularidades do sistema brasileiro que determinaram o seu fracasso. Dessa forma, os seguintes aspectos são discutidos: as conotações de caráter políticos; a falta de capacitação pedagógica adequada, a falta de uma metodologia de ensino suficientemente estruturada (GOLDEMBERG, 2002, p. 1).

    4 De acordo com o dicionário Luft: 1.Artista musical de grande talento. 2. Quem atinge um alto grau de perfeição técnica numa arte ou em outra atividade.

  • 36

    Quando aprovada a Lei n. 4.024 (BRASIL, 1961), 1ª Lei de Diretrizes e Bases

    da Educação Nacional, que, entre outras questões, estabeleceu:

    Será permitida a organização de cursos ou escolas experimentais, com currículos, métodos e períodos escolares próprios, dependendo o seu funcionamento para fins de validade legal da autorização do Conselho Estadual de Educação, quando se tratar de cursos primários e médios, e do Conselho Federal de Educação, quando se tratar de cursos superiores ou de estabelecimentos de ensino primário e médio sob a jurisdição do governo federal (BRASIL, 1961, Art. 104).

    Com esta Lei, que fomentava a autonomia das instituições, dos professores e

    dos alunos, em relação à qualidade do ensino em termos mais liberais que

    anteriormente, passam a existir alterações na formação do professor, neste caso,

    formação do professor da área de música.

    Quanto a esta legislação, no discurso ela demonstrou uma abertura de

    possibilidades e algumas instituições conseguiram resultados efetivos de autonomia

    durante sua vigência. Como o exemplo citado da FAP (Faculdade de Artes do

    Paraná, 2007):

    Todo esse percurso demonstra o empenho e o comprometimento das personalidades que acompanharam a construção e o desenvolvimento da Instituição e que tornaram possível seu reconhecimento como produtora de saberes em arte e educação e como promotora da cultura no Paraná.

    É possível observar que, através de esforços internos, a FAP conquistou um

    espaço significativo para a formação de professores no Estado do Paraná e que

    outras instituições, inclusive de estruturas mais privilegiadas, também fazem parte

    desta significação da educação musical do nosso país.

    2.4 A TENUIDADE DAS PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO MUSICAL NAS ESCOLAS, A

    PARTIR DE 1970

    A educação musical presente nos currículos escolares desde o final do século

    XIX, sua expansão influenciada por Villa-Lobos, mesmo que a intenção central fosse

    a música como recurso para divulgar o ideário governamental vigente, ela acontecia

    como área do conhecimento. No entanto, o processo de enfraquecimento da

  • 37

    educação musical inicia-se no período da Ditadura Militar e isto fica oficializado na

    criação da Lei n. 5.692 (BRASIL, 1971), que inclui a educação musical na disciplina

    de Educação Artística e como conseqüência, ocorre à pulverização desta área.

    De acordo com Xavier; Cartaxo e Romanowski (2008, p. 12.409):

    No período da Ditadura Militar, de 1964 a 1985, a censura imperou e como afirma Oliveira (1999) estes regimes contribuíram para a desestruturação de muitas experiências educacionais interessantes, derivadas da Nova Pedagogia e do movimento Escola Nova Popular. A educação, nestes 21 anos, não foi muito positiva. Todos os ginásios pluricurriculares das décadas de 60/70 foram dificultados ou readaptados para a Pedagogia Tecnicista.

    Com este contexto histórico no país, a música, que está inserida no ensino de

    educação artística segue a Lei deste momento. Conforme Oliveira:

    Nesses anos [...] implanta-se a Lei 5.692/71, que institui a polivalência nas artes, através do ensino da educação artística, que, apesar de ter uma aparência de abertura e criatividade, possibilitou a formação de profissionais sem um embasamento adequado nas áreas específicas (1999, p. 22).

    Assim, a educação brasileira reformada na década de 70 e através da Lei n.

    5.692 (BRASIL, 1971), determinando a educação musical como parte da disciplina

    de Educação Artística.

    A Educação Artística, que englobava o ensino de música, artes visuais e teatro, implantada no Brasil através da Lei 5.692/71, visou desenvolver um atendimento artístico abrangente à população estudantil, incentivando a formação de professores polivalentes em artes. Esta, com sua atenção voltada principalmente ao processo e, em detrimento do produto, procurava atender às aptidões artísticas diversas dos alunos sem, contudo, abordar a formação de artistas (HENTSCHKE, 2000, p. 48).

    A educação musical era uma área do conhecimento específica, mas com a

    Lei n. 5.692 (BRASIL, 1971) passou a dividir seu espaço com outros campos de

    artes (artes pláticas, desenho e teatro) e resultou em uma prática cada vez mais

    escassa nas escolas. Conforme Zagonel (2008, p. 52) essa proposta de inter-

    relação das artes não se mostrou eficaz, principalmente devido à falta de uma

    formação especializada, tanto pedagógica quanto de conteúdo, do profissional

    dessas diversas áreas requisitadas.

    Com isso foi gerada uma situação de difícil solução, pois não havia professores capacitados para empreender esse ensino na escola de primeiro grau e, paradoxalmente, artistas e professores que haviam sido

  • 38

    formados pelas escolinhas de Arte, apesar de bem qualificados, não puderam ser absorvidos pela escola, uma vez que não possuíam o diploma de nível superior exigido. O governo foi então obrigado a resolver a situação de forma emergencial, criando os cursos de Licenciatura Curta em Educação Artística, com dois anos de duração, para atender o mais rapidamente possível à demanda das escolas (ZAGONEL, 2008, p. 53).

    No decorrer dos anos ocorreu o enfraquecimento da qualidade do ensino de

    Arte nas escolas de primeiro e segundo graus, mesmo com a implantação dos

    cursos de Licenciatura de longa duração (ZAGONEL, 2008).

    De acordo com Fernandes:

    Nas décadas de 60/70, ocorreu um processo de articulação entre as correntes escolanovista e tecnicista [...]. Na educação musical escolar, o processo escolar não ficava longe disso, pois as exigências da Lei 5.692/71 traziam para a escola um professor que tecnicamente deveria ser polivalente em várias linguagens artísticas: especializar-se em uma delas, dominar todo o aspecto didático geral e específico, ainda demonstrando qualidades através de planejamentos eficientes (2001, p. 51).

    Apesar do enfraquecimento do ensino de Arte, com a Lei n. 5.692 (BRASIL,

    (1971) ele passou a ser visto como um meio de educação e sua concepção foi

    ampliada, do aprendizado de técnicas específicas, passou à sensibilização feita por

    meio do ensino coletivo (ZAGONEL, 2008).

    De qualquer forma, foi um período importante para o ensino de Arte. Por um lado, houve uma tomada de consciência da importância do ensino de Arte e sua prática na escola, a ponto da Educação Artística, pensada como forma de integração das diferentes linguagens artísticas, ser inserida no currículo nacional. Por outro lado, as linhas pedagógicas para o ensino de Arte começaram a ser discutidas, visando-se um melhor desenvolvimento dos estudantes (ZAGONEL, 2008, p. 53).

    Após o término da ditadura militar, a música, embora valorizada pelo

    movimento dos professores pela democratização da escola básica, não logrou

    constituir-se disciplina específica. Algumas iniciativas foram tomadas pelas escolas e

    por professores com formação musical que receberam apoio nos sistemas de

    ensino. Com a aprovação da Lei n. 9.394 (BRASIL, 1996) a música aparece como

    um dos 4 eixos da Arte (artes visuais, dança, música e teatro), sendo obrigatória

    esta disciplina na abrangência dos seus eixos especificados nesta Lei.

    De acordo com o Grupo de Articulação Parlamentar Pró-Música (PRÓ-

    MÚSICA, 2006):

  • 39

    Em 2007 foi aprovado, no Senado, um projeto de lei que torna obrigatório o ensino de música nas escolas. Este ano, o projeto de lei será discutido na Câmara dos Deputados. A volta da educação musical nas escolas significará para milhões de crianças e jovens a construção de valores pessoais e sociais, além de um desenvolvimento maior cognitivo, psicomotor, emocional e afetivo5.

    Este projeto acrescido ao artigo n. 26 da Lei n. 9.394 (BRASIL, 1996),

    determina que a música deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo (sem

    excluir os outros eixos) do componente curricular; que o ensino da música será

    ministrado por professores com formação específica na área e que os sistemas de

    ensino terão três anos letivos para se adaptarem às exigências estabelecidas neste

    artigo.

    E aos dezoito dias do mês de agosto de 2008, o atual presidente da república

    sancionou a Lei n. 11.769 (BRASIL, 2008), dispondo sobre a obrigatoriedade do

    ensino de música na educação básica do país. Foi aprovada a Lei no que se refere à

    obrigatoriedade do ensino de música e ao período de três anos para os sistemas de

    ensino de adaptarem às novas exigências. Para a conquista dessa lei houve o

    envolvimento do Grupo de Articulação Parlamentar Pró-Música, da ANPPOM, da

    ISME e principalmente pelo engajamento da ABEM.

    Quanto à questão do profissional com formação específica na área de

    música, Art. 2º, não foi incluso na Lei, pois, segundo Fernando Haddad (2008):

    No tocante ao parágrafo único do art. 62, é necessário que se tenha muita clareza sobre o que significa formação específica na área. Vale ressaltar que a música é uma prática social e que no Brasil existem diversos profissionais atuantes nessa área sem formação acadêmica ou oficial em música e que são reconhecidos nacionalmente. Esses profissionais estariam impossibilitados de ministrar tal conteúdo na maneira em que este dispositivo está proposto.

    E Haddad complementa:

    Adicionalmente, esta exigência vai além da definição de uma diretriz curricular e estabelece, sem precedentes, uma formação específica para a transferência de um conteúdo. Note-se que não há qualquer exigência de formação específica para Matemática, Física, Biologia etc. Nem mesmo quando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional define conteúdos mais específicos como os relacionados a diferentes culturas e etnias (art. 26, § 4o) e de língua estrangeira (art. 26, § 5o), ela estabelece qual seria a formação mínima daqueles que passariam a ministrar esses conteúdos.

    5 Informações adquiridas no site www.queroeducacaomusicalnaescola.com

    http://www.queroeducacaomusicalnaescola.com

  • 40

    Com a aprovação desta Lei, a educação musical tornou-se obrigatória em

    todas as escolas da educação básica e houve uma determinação do prazo de

    adaptação para os sistemas de ensino. Com isso, espera-se haver uma abertura de

    campo de trabalho para profissionais com esta formação e que sejam contempladas

    nos editais de concursos, vagas para profissionais com formação específica na área.

    A questão do profissional com a formação específica em música não seria por

    considerar a música uma área que deva ser privilegiada, mas considerando que, na

    educação básica, as pessoas têm acesso as outras áreas do conhecimento como

    português, matemática, história, geografia, etc. Já na área de música, salvo as

    exceções, isto não ocorreu desde a implantação da Lei n. 5.692 (BRASIL, 1971).

    Consequentemente, as pessoas não apresentam um conhecimento prévio musical e

    muitos profissionais acabam atuando por gostar desta área, sem apresentar um

    conhecimento mínimo necessário para tornar-se um professor de educação musical

    apto a atuar com esta prática na educação básica.

    2.5 A PRÁTICA DA E