82
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E ENGENHARIA DE MATERIAIS DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Efeito do Tratamento Térmico do Titânio Sobre a Proliferação de Células Pré-Osteoblásticas HAROLDO REIS ALVES DE MACÊDO. ORIENTADOR: Prof. Dr. Clodomiro Alves Júnior. Natal, Agosto de 2008.

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Efeito do Tratamento Térmico … · cultura de célula foram comparados através de sobreposição para analisar a ... Figura 4.11 – Difratograma para

Embed Size (px)

Citation preview

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA

PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E

ENGENHARIA DE MATERIAIS

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Efeito do Tratamento Térmico do Titânio Sobre a

Proliferação de Células Pré-Osteoblásticas

HAROLDO REIS ALVES DE MACÊDO.

ORIENTADOR: Prof. Dr. Clodomiro Alves Júnior.

Natal, Agosto de 2008.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA

PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E ENGENHARIA DE

MATERIAIS

Efeito do Tratamento Térmico do Titânio Sobre a

Proliferação de Células Pré-Osteoblásticas

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa

de Pós-Graduação em Ciências e Engenharia de

Materiais do Centro de Ciência Exata e da Terra da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como

parte dos requisitos para obtenção do título de

Mestre em Ciências e Engenharia de Materiais.

Mestrando: Haroldo Reis Alves de Macêdo

Orientador: Prof. Dr. Clodomiro Alves Júnior.

Natal, Agosto de 2008

Divisão de Serviços Técnicos

Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Central Zila Mamede

Macedo, Haroldo Reis Alves de. Efeito do tratamento térmico do titânio sobre a proliferação de células pré-osteoblásticas / Haroldo Reis Alves de Macêdo. – Natal, RN, 2008. 80 f.

Orientador: Clodomiro Alves Júnior.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Tecnologia. Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Materiais.

1. Titânio – Dissertação. 2. Titânio – Microestrutura –

Dissertação. 3. Titânio – Resposta biológica – Dissertação. I. Alves Júnior, Clodomiro. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BCZM CDU 661.882(043.3)

Dedico este trabalho a minha família e à minha

esposa Marina pelo amor, compreensão, carinho e

incentivo nas dificuldades e a todos que direta ou

indiretamente contribuíram para sua concretização.

Agradecimentos

A Deus pela sabedoria, saúde e ....

A minha mãe Teresa Cristina Avelino de Macêdo e a meu pai Haroldo Alves

Macedo pelo amor, carinho e por ter sempre ficado do meu lado nas horas mais

difíceis de minha vida.

A minha esposa, Marina, por sempre ter me ajudado nas atividades

relacionadas a este trabalho, bem como as atividades do lar que sempre soube

fazer de modo a ajudar na conclusão deste trabalho e pelo seu amor, respeito e

sinceridade.

Ao professor Dr. Clodomiro Alves Júnior pela dedicação na orientação deste

trabalho, pelo incentivo, pela amizade e por sempre estar presente.

Ao professor Dr. Ayrton de Sá Brandim por ter acreditado no meu potencial e

me incentivado a cursar uma pós graduação e pela orientação durante a graduação.

A minha sogra Maria Dalva e a meu sogro Braz Cardoso por ter me recebido

como filho e apoiado nesta nova fase de minha vida.

Aos meus irmãos Moaaby, Tamyack, Núrya e Nayra por ter acreditado em

mim e ter me apoiado quando da minha saída de casa para estudar em Natal.

A todos os professores da Engenharia de Materiais pelo apoio e competência

em ministrar as disciplinas do curso.

Aos professores Dr. Hugo Alexandre e Dra. Silvia Batistuzzo e seus alunos

pela colaboração na parte da cultura de células.

A todos os colegas do LABPLASMA pela convivência fraterna e amiga

durante todo o trabalho.

Aos professores do CEFET-PI, os quais não cito nomes para não ser injusto,

pelo apoio, incentivo e pela oportunidade oferecida de cursar as disciplinas junto

com eles.

Ao CNPq pelo apoio financeiro.

Resumo

O titânio como biomaterial é amplamente utilizado em dispositivos biomédicos

(implantes, próteses, válvulas, stents entre outros). Diversos tratamentos térmicos

são usualmente utilizados na obtenção das propriedades necessárias para as

diferentes aplicações. Este trabalho estudou a influência desses tratamentos na

microestrutura do titânio comercialmente puro e suas conseqüências no

crescimento, forma e proliferação de células pré-osteoblástica. Para tanto foram

utilizados discos de titânio submetidos a diferentes tratamentos e caracterizados por

microscopia ótica, análise de imagens, molhabilidade, rugosidade, dureza e difração

de raios-X. Após os tratamentos térmicos foram verificado modificações significantes

nestas propriedades. Padrões de imagens de superfícies do titânio antes e após a

cultura de célula foram comparados através de sobreposição para analisar a

influência da microestrutura na resposta biológica, não sendo verificadas

correlações entre a microestrutura e as preferências orientacionais das células.

Entretanto de um modo geral verificou-se que os discos que apresentaram maior

estado de tensão residual apresentaram também maior número de células em sua

superfície.

Palavras-chaves: Titânio, microestrutura do titânio, resposta biológica do titânio.

Abstract

Titanium is a biomaterial widely employed in biomedical applications (implants,

prostheses, valves, stents). Several heat treatments are usually used in order to

obtain physical properties required to different applications. This work studied the

influence of the heat treatment on microstructure of commercial pure titanium, and

their consequences in growth and proliferation of MC3T3-E1 cells. Discs of titanium

were treated in different temperatures, and characterized by optical microscopy,

image analysis, wettabillity, roughness, hardness and X-ray diffraction. After the heat

treatment, significant modifications in these properties were observed. Pattern

images of titanium, before and after the cell culture, were compared by overlapping

to analyze the influence of microstructure in biological response. It was not found

correlations between the microstructure and preferences guidance cells. However, in

general, titanium discs that showed a higher residual strength also presented an

increase of cells numbers on surface.

Keywords: Titanium, microstructure of titanium, biological response of titanium.

Lista de Figuras

Figura 2.1 – Algumas propriedades dos materiais que estão relacionadas à

biocompatibilidade (adaptado de Spencer, 2007).............................. 18

Figura 2.2 – Parâmetros superficiais e biológicos envolvidos na interação

célula/biomaterial a curto e em longo prazo. Parâmetros superficiais:

rugosidade e formação de camada de óxido. Parâmetros biológicos:

expraiamento da célula, proliferação e diferenciação celular (Anselme,

2006).................................................................................................. 20

Figura 2.3 – Influência da energia superficial do implante sobre a resposta celular.

(1) camada superficial de óxido sobre o biomaterial; (2) Ligações

moleculares superficiais e (3) célula (Spencer, 2007)........................ 21

Figura 2.4 – Gota depositada sobre uma superfície sólida. Onde Ssv, Slv e Sls são as

tensões resultantes da interação entre os três meios sólido, líquido e

vapor (Kwok, 2000). ........................................................................... 22

Figura 2.5 – Comportamento de uma gota apresentando, (a) alta molhabilidade; (b)

molhabilidade média e (c) não molhabilidade (Ferreira, 2004). ......... 23

Figura 2.6 – Formato das células osteoblástica (a) totalmente arredondada; (b) e (c)

parcialmente espraiadas e (d) totalmente espraiadas (Zhu, 2004). ... 25

Figura 2.7 – Formato da célula MC3T3-E1 na superfície de discos de titânio após 3

dias de cultura; (a) no disco polido; (b) no disco rugoso (Eisenbarth,

2002).................................................................................................. 26

Figura 2.8 – Representação esquemática dos primeiros instantes da adesão em

ordem de ocorrência. (1) interação inicial da superfície com moléculas

de água; (2) interação das moléculas de água com as proteínas e (3)

interação das proteínas com as células (Kasemo, 2002)................... 27

Figura 2.9 – Concentrações máximas permitidas para as impurezas em Ti-cp e ligas

(% em peso) (ASTM, 2000) ............................................................... 28

Figura 2.10 – Propriedades do titânio puro (Liu, 2004) ............................................ 30

Figura 2.11 – Micrografias por microscopia ótica com: (A) 200x e (B) 500x mostram

a microestrutura do titânio comercialmente puro com grãos

hexagonais alfa (Trota Filho, 2007).................................................... 30

Figura 2.12 – Transformações alotrópicas do Ti-cp, a temperatura ambiente possui

estrutura HCP e acima de 882°C possui estrutura CCC (Donachie,

1982; Flower, 1990). .......................................................................... 31

Figura 2.13 – Diagrama de fase representativo do sistema Ti-Al. Há um aumento da

temperatura de estabilização da fase α-Ti (Murray, 1986, apud Mello,

2000).................................................................................................. 33

Figura 2.14 – Diagrama de fase representativo do sistema Ti-Nb. Há uma diminuição

da temperatura de estabilização da α-Ti (Murray, 1986, apud Mello,

2000).................................................................................................. 33

Figura 2.15 – Esquema para ligas ternárias de titânio contendo estabilizadores alfa e

beta (Mello, 2000). ............................................................................. 34

Figura 2.16 – Diagrama esquemático da formação da estrutura de Widmanstäntten

na liga Ti-6Al-4V (Brooks, 1982) ........................................................ 36

Figura 2.17 – Microestrutura do titânio temperado acima da temperatura β-transus.

Apresenta no interior dos grãos hexagonais uma estrutura acicular ou

lamelar, característicos do resfriamento rápido a partir da faixa de

temperatura citada. ............................................................................ 39

Figura 3.1 - Ilustração do equipamento utilizado para determinação do ângulo de

contato (Adaptado de Costa,2006). ................................................... 44

Figura 3.2 – (a) esquema da posição dos riscos de rugosidade e (b) esquema das

marcações de microdureza................................................................ 45

Figura 3.3 – Fotografia ilustrativa da placa de 24 poços utilizada na cultura de

células................................................................................................ 46

Figura 4.1 – Micrografia do disco ST. Os três pontos escuros em forma de “ ” no

centro do disco são as marcações do local de estudo....................... 49

Figura 4.2 – Micrografia do disco TSR. .................................................................... 50

Figura 4.3 – Micrografias dos discos revenidos. (a) TR200 (b) TR300 (c) TR500. .. 51

Figura 4.4 – Microestrutura da região central dos discos de Ti-cp tratamentos

térmicos. (a) TT300 (b) TT500. .......................................................... 52

Figura 4.5 – Visualização dos contornos de grão por micrografia, (a) microestrutura

correspondente à fase alfa – grãos hexagonais, discos TR300 e (b)

microestrutura correspondente à fase martensita – grãos hexagonais

com formações lamelares no interior, discos TSR............................. 52

Figura 4.6 – Resultado do ângulo de contato para água após 60 segundos de

acomodação da gota.......................................................................... 54

Figura 4.7 – Rugosidade superficial dos discos tratados e não tratados. ................ 55

Figura 4.8 – Gráfico da microdureza dos discos de Ti-cp. ....................................... 57

Figura 4.9 – Difratograma do disco sem tratamento (ST). Há somente a presença da

fase alfa. ............................................................................................ 58

Figura 4.10 – Difratogramas dos discos tratados com têmpera e têmpera seguida de

revenimento. Em todos os difratogramas há presença de duas fases:

a fase α e αm, exceto para o caso ST que apresenta somente fase

alfa. .................................................................................................... 58

Figura 4.11 – Difratograma para os discos de Ti-cp sem tratamento e tratados

termicamente à 300° e 500° respectivamente. Há a presença somente

da fase alfa. ....................................................................................... 60

Figura 4.12 – Micrografia (800X) dos discos tratados termicamente, onde se verifica

a presença de alguns grãos contento precipitados em forma de

lamelas. (a) ST; (b) TT300 e (c) TT500.............................................. 61

Figura 4.13 – Número de células na superfície dos discos de Ti-cp tratados e não

tratados. ............................................................................................. 62

Figura 4.14 - Sobreposição das imagens da microestrutura com a das células sobre

a superfície para o disco TSR............................................................ 62

Figura 4.15 – Imagens dos discos Ti-cp revenidos. Visualização das células

orientadas sobre superfície: (a) TR300 e (b) TR500.......................... 63

Figura 4.16 – Imagens da adesão celular na região central dos discos de Ti-cp (a)

TT300; (b) TT500; (c) ST. .................................................................. 64

Figura 4.17 – Porcentagem de células por diâmetro médio em micrometros........... 65

Figura 4.18 – Porcentagem de células por razão de aspecto. ................................. 66

Figura 4.19 - Correlação do crescimento celular com a microestrutura dos discos de

Ti-cp. (a) TR200; (b) TR300 e (c) TR500. .......................................... 69

Figura 4.20 – Correlação do crescimento celular com as microestruturas dos discos

de Ti-cp tratados termicamente e não tratados. (a) TT300; (b) TT500;

(c) ST. ................................................................................................ 70

Tabela 3.1 Composição química do titânio utilizado 41

Tabela 3.2 Condições de Tratamentos e simbologia 43

Tabela 4.1 Resultado da análise da adesão celular nos discos de Ti-cp

tratados e não tratados

67

Tabela 4.2 Resumo dos resultados da análise da adesão celular nos

discos tratados e não tratados

67

Titânio comercialmente puro

Média aritmética dos picos de rugosidades

Meio de Cultura celular

Sociedade Americana para análise e padronização de Materiais

Angstron

Hexagonal Compacto

Cúbico de Corpo Centrado

Fase alfa

Fase beta m Fase Martensita

Fase Omega

TSR Temperada sem Revenimento

TR200 Temperada e Revenida a 200°C

TR300 Temperada e Revenida a 300°C

TR500 Temperada e Revenida a 500°C

TT300 Tratada termicamente a 300°C

TT500 Tratada termicamente a 500°C

ST Sem Tratamento

DRX Difratometria de Raios-x

Ângulo de contato

HA Hidroxiapatita

Sumário

1. Introdução .............................................................................................................15

2. Aspectos Teóricos.................................................................................................18

2.1. Biomateriais .......................................................................................................18

2.1.1 Interação do biomaterial com o meio biológico. ...............................................19

2.1.1.1 - Energia de superfície ..................................................................................21

2.1.1.2 – Textura da superfície .................................................................................23

2.1.1.3 – Osteoblastos ..............................................................................................25

2.1.1.4 – Interação com a água ................................................................................26

2.2. Titânio ................................................................................................................28

2.2.1. Propriedades do titânio ...................................................................................29

2.2.2. Tratamentos térmicos no titânio ......................................................................31

2.2.2.1. – Têmpera e Revenimento...........................................................................36

3. Metodologia experimental .....................................................................................41

3.1. Material utilizado ................................................................................................41

3.2. Tratamentos térmicos ........................................................................................41

3.3. Preparação metalográfica ..................................................................................42

3.4. Caracterização...................................................................................................43

3.4.1. Molhabilidade..................................................................................................43

2.4.2. Rugosidade.....................................................................................................44

3.4.3. Dureza ............................................................................................................44

3.4.3.1 Impressões....................................................................................................45

3.4.4. DRX ................................................................................................................45

3.4.5. Cultura Celular ................................................................................................45

3.4.6. Microscopia Ótica e Análise de Imagens ........................................................46

3.4.7. Análise Estatística...........................................................................................47

4. Resultados e discussão.........................................................................................49

4.1. Tratamentos Térmicos........................................................................................49

4.2. Caracterização ...................................................................................................53

4.2.1. Molhabilidade e ângulo de contato..................................................................53

4.2.2 Ensaio de Rugosidade................................................................................54

4.2.3. Dureza ............................................................................................................56

4.2.3 DRX ............................................................................................................57

4.3 Cultura de células ...........................................................................................61

4.4 Correlação microestrutura x proliferação celular.................................................67

5. Considerações finais .............................................................................................73

Referências Bibliográficas .........................................................................................75

Capítulo 1

Introdução

Introdução

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

15

1. Introdução

Os biomateriais estão cada vez mais presentes em nossa vida. Dentre os

diversos materiais utilizados com finalidades biomédicas, destaca-se atualmente o

titânio e suas ligas, os mesmos têm tido aplicações crescentes e é objeto de estudo

de muitos grupos acadêmicos no Brasil e no mundo.

A reputação do titânio como material biocompatível foi baseada

principalmente em dois fatores: em sua excelente resistência à corrosão, que limita a

quantidade de íons titânio liberados nos tecidos na maioria das circunstâncias, e na

sua inatividade biológica, algumas vezes denominada “indiferença biológica”, onde

sinais da presença do metal parecem não influenciar os tecidos (Williams, 1994).

O uso de biomateriais como o titânio em aplicações biomédicas necessitam

ter suas características superficiais de tal modo que possibilitem uma maior e mais

rápida resposta biológica. No caso de implantes há a necessidade de se definir uma

superfície compatível com uma boa resposta biológica, isto é imperativo na pesquisa

básica de implantes (Amarante, 2001).

Qualquer implante, uma vez em contato com o meio biológico, é caracterizado

por mudanças dinâmicas em suas propriedades superficiais envolvendo uma

cascata de reações que ocorre entre o meio biológico e o biomaterial formando um

“filme de condicionamento” que modula as respostas celulares (Puleo, 1999).

Segundo Schneider (1994) e Macdolnad (2002) a molhabilidade e a energia

superficial exercem um importante papel na adsorção de proteínas, aumentando a

formação de adesões de osteoblastos na superfície do implante. A rugosidade e a

molhabilidade interferem nos processos de adsorção de proteínas, com isso é

possível que células sejam fortemente influenciadas por ambas, se chegarem à

superfície do implante (Rupp, 2004).

Tem sido observado que uma maior velocidade de crescimento de células

osteoblásticas pode ser alcançada pela texturização da superfície do implante

(Brunette, 1998; Sykaras, 2000). Com base no mecanismo de osseointegração

proposto por Kasemo em 2002, o real precursor do crescimento osteoblásticos é a

molhabilidade da superfície pelo líquido biológico e não a rugosidade, como se

imaginava anteriormente (Brunette, 1998). As primeiras moléculas a chegarem à

superfície do titânio são as de água. A molhabilidade superficial influencia proteínas,

Introdução

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

16

moléculas e células que chegam um pouco mais tarde (Brunette, 1998; Sykaras,

2000).

Na busca por superfícies que supram a necessidade de obter uma resposta

biológica mais rápida, várias pesquisas têm sido desenvolvidas, modificando as

propriedades de superfície pelos mais variados processos (Silva, 2005) dentre os

quais se destaca os métodos mecânicos, químicos e físicos de tratamento de

superfície, que permitem obter os mais variados graus de texturas (Xuanyong,

2004).

Os tratamentos utilizados neste trabalho foram os tratamentos térmicos em

forno resistivo por ser um dos tratamentos mais utilizados pelas indústrias. E pelas

excelentes propriedades mecânicas, estabilidade química e biocompatibilidade que

podem ser obtidas. Os tratamentos térmicos geram modificações microestruturais

que por sua vez geram modificações das propriedades mecânicas, físicas e

biológicas.

Os tratamentos realizados foram: têmpera a 1100°C; revenimento a 200°C,

300°C e 500°C e tratamento térmico a 300°C e 500°C, durante uma hora cada,

obtendo-se mudanças na fase cristalina, que foram observadas por meio de

microscopia ótica e por DRX. Essas mudanças na cristalinidade do material

proporcionaram alterações em algumas propriedades, tais como: dureza, rugosidade

e molhabilidade que foram características juntamente com as fases superficiais e

proliferação celular.

O presente trabalho teve como objetivo geral o estudo da influência da

microestrutura produzida por diferentes tratamentos térmicos na resposta à

proliferação de células osteoblásticas, tendo para isso os seguintes objetivos

específicos:

1. Estudo das propriedades do Ti-cp modificadas termicamente, tais como: fases

presentes, dureza, rugosidade, molhabilidade;

2. Estudo da resposta de células osteoblástica nessas superfícies modificadas

por tratamento térmico. Os parâmetros analisados foram: quantidade,

tamanho e forma das células, bem como se existe organização e/ou

localização preferencial das células.

Capítulo 2

Aspectos Teóricos

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

18

2. Aspectos Teóricos

2.1. Biomateriais

Os biomateriais são usados como dispositivos médicos, sobretudo naqueles

que são temporários ou permanentemente implantados no corpo humano. O termo

biomaterial foi definido na Conferência do Instituto Nacional de Desenvolvimento de

Consenso em Saúde, em 1982 como:

“ Qualquer substância (outra que não droga) ou combinação de substâncias,

sintética ou natural em origem, que possa ser usada por um período de tempo,

completa ou parcialmente como parte de um sistema que trate, aumente ou

substitua qualquer tecido, órgão ou função do corpo” (Helmus, 1995).

A seleção do material a ser utilizado deve levar em consideração as

propriedades físicas, químicas e biológicas deste. As principais propriedades que

devem ser levadas em conta estão na figura 2.1 (Spencer, 2007).

Figura 2.1 – Algumas propriedades dos materiais que estão relacionadas à

biocompatibilidade (adaptado de Spencer, 2007).

Existem várias classificações para os materiais quanto à resposta biológica.

Considerando os materiais de maneira genérica, estes podem ser classificados em

tóxicos e não tóxicos. Quando se considera apenas os biomateriais, estes podem

ser classificados em materiais bioinertes, bioativos e biodegradáveis (Sykaras, 2000;

Silva, 2005; Santos, 2007).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

19

Os materiais bioinertes são os materiais menos suscetíveis a causar uma

reação biológica adversa devido a sua estabilidade química em comparação com

outros materiais. Como exemplo pode-se citar: carbono, alumina e zircônia (Kohn,

1992). Os materiais bioativos são assim definidos por apresentarem propriedades

formadoras de tecido sobre a superfície e por estabelecer uma interface capaz de

suportar cargas funcionais (Kohn, 1992). O termo biodegradável é geralmente

utilizado para polímeros devido à dispersão in vivo que sofrem durante a degradação

macromolecular (Santos, 2007).

Os biomateriais metálicos podem ser divididos em três tipos quanto à sua

função: i) que apresentam resposta adversa do tecido ósseo – Cu, Ag; ii) os que

apresentam função questionável em longo prazo – CoCrMo, INOX 316L, Ti6Al4V e

iii) os que são de excelente função em longo prazo Nb, e Ti pois interagem

positivamente com o tecido ósseo (Hobkirk, 1995).

2.1.1 Interação do biomaterial com o meio biológico.

No caso de implantes ósseos integráveis, para que ocorra a formação de

tecido ósseo sobre o biomaterial é necessário que as células precursoras de

osteoblástos se diferenciem em osteoblastos e se proliferem produzindo uma matriz

extracelular não mineralizada, que será subseqüentemente calcificada (Schwartz,

1994). Estes eventos são bastante influenciados por algumas propriedades da

superfície dos biomateriais, tais como: a composição química; energia de superfície

e a textura da superfície; uma combinação entre topografia e rugosidade (Schwartz,

1994).

A figura 2.2 apresenta algumas propriedades de superfície e parâmetros

biológicos envolvidos em interações célula/biomaterial. No lado do biomaterial, a

química e rugosidade da superfície têm influência junto ao comportamento das

células. Do lado biológico, as diferentes fases podem ser distinguidas de acordo com

o tempo em cultura na resposta de células frente o material. A primeira é a fase da

adesão inicial da célula, que envolve forças eletrostáticas não específicas (por

exemplo, Van Der Waals) e formação passiva de laços de ligante-receptor. A

segunda fase concerne à proliferação e a diferenciação. A quantificação da adesão

em curto prazo, da adesão em longo prazo e da proliferação celular permitiram

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

20

estabelecer relações entre propriedades indutoras da adesão celular (por exemplo

poder de adesão) e as propriedades de superfície (Anselme, 2006).

Figura 2.2 – Parâmetros superficiais e biológicos envolvidos na interação

célula/biomaterial a curto e em longo prazo. Parâmetros superficiais: rugosidade e formação de camada de óxido. Parâmetros biológicos: expraiamento da célula,

proliferação e diferenciação celular (Anselme, 2006).

Taborelli et al. (1997) apresentaram um estudo físico-químico das

propriedades do Ti-cp submetido a vários tratamentos para otimizar sua topografia

para aplicação em implantologia osseointegrável. A rugosidade, composição química

da superfície e molhabilidade foram analisados em amostras de Ti preparados por

polimento mecânico, ataque ácido (HCl / H2SO4), jateamento de areia e plasma

spray.

Os tratamentos realizados nos estudos de Taborelli (1997) influenciaram

essencialmente a rugosidade de superfície preservando a composição química e as

propriedades de molhabilidade da camada superficial de óxido de Ti.

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

21

2.1.1.1 - Energia de superfície

Segundo Den Braber et al. (1995), vários estudos têm sido realizados para se

tentar explicar a influência da energia de superfície de um material implantável sobre

o comportamento celular (figura 2.3). Uma teoria amplamente aceita é a de que esta

propriedade tem um efeito seletivo sobre a configuração e conformação das

proteínas que são adsorvidas sobre um substrato (Baier, 1988; Uitto, 1992). Estas

proteínas desenvolvem uma importante função durante a adesão celular (Den

Braber, 1995).

Figura 2.3 – Influência da energia superficial do implante sobre a resposta celular.

(1) camada superficial de óxido sobre o biomaterial; (2) Ligações moleculares superficiais e (3) célula (Spencer, 2007).

As características das superfícies dos implantes, assim como propriedades

específicas de proteínas do meio intercelular, contribuem para a organização da

camada de proteínas adsorvidas, e a natureza desta determina a resposta celular

aos implantes (Lampin, 1997).

Neste contexto, também se observa que a energia de superfície de um

biomaterial é primariamente determinada pela natureza da camada mais externa de

átomos do material, sendo independente da natureza química ou do arranjo de

átomos e moléculas interiores (Phillips, 1991).

A energia de superfície está diretamente relacionada ao grau de

molhabilidade da superfície, pois quanto mais alto for à energia de superfície

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

22

maiores são as ocorrências de ligações moleculares superficiais. Assim a

molhabilidade é um indicativo do quanto a superfície pode interagir em termos

moleculares com o meio no qual esta sendo inserido. A medida do grau de

molhabilidade é um dos parâmetros de avaliação de biocompatibilidade de um

material (Lampin, 1997). Tal medida pode ser expressa pelo ângulo de contato que

um líquido (geralmente água) forma sobre a superfície do material (Keller, 1994;

Lampin, 1997).

O ângulo de contato de uma superfície líquida depende apenas das

propriedades físicas dos três meios de contato (sólido, líquido e vapor). A figura 2.4

ilustra uma gota de um fluido em contato com o sólido e num meio vapor (Kwok,

2000). A linha pela qual as três fases se encontram é denominada “linha de contato”.

O ângulo de contato θ é determinado a partir de um balanço de forças devido às

tensões superficiais ao longo da linha de contato e é definido por:

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛ −= −

lv

slsv

σσσθ 1cos

Onde: lvslsv e σσσ , são as tensões resultantes das interações entre os três

meios sólido, líquido e vapor (Kwok, 2000).

Figura 2.4 – Gota depositada sobre uma superfície sólida. Onde Ssv, Slv e Sls são as tensões resultantes da interação entre os três meios sólido, líquido e vapor (Kwok,

2000).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

23

A figura 2.5 ilustra o comportamento de uma gota sobre uma superfície que

apresenta alta molhabilidade ( )0=θ , molhabilidade média ( )πθ <<0 e sem

molhabilidade ( )πθ = (Ferreira, 2004).

Figura 2.5 – Comportamento de uma gota apresentando, (a) alta molhabilidade; (b)

molhabilidade média e (c) não molhabilidade (Ferreira, 2004). As superfícies hidrofílicas apresentam, de maneira geral, uma melhor

afinidade por células e menor afinidade por proteínas do que superfícies hidrofóbicas

(Lampin, 1997, apud Xavier, 2002), e este aumento no grau de molhabilidade

melhora a interação entre a superfície do implante e o meio biológico (Baier, 1984,

apud Xavier, 2002).

2.1.1.2 – Textura da superfície

A textura superficial de um biomaterial, incluindo a microtopografia e

rugosidade, tem sido relatada por influenciar com sucesso a resposta dos implantes

osseointegráveis (Rich, 1981; Thomas, 1985). Segundo Albrektsson (1998),

diferentes pesquisadores podem apresentar opiniões contrastantes a respeito do

que seria uma superfície lisa ou rugosa.

Alguns pesquisadores defendem que a rugosidade da superfície oferece uma

melhor adesão para a rede de fibrina, por onde migram os osteoblastos para as

proximidades da superfície do implante a fim de secretar matriz óssea, dando início

à formação da interface osseointegrada (Davies, 1998; Carvalho, 2001).

Embora a microrugosidade mostre ser uma importante característica para a

resposta aos biomateriais, também há observações que indicam uma resposta

biológica às irregularidades em dimensões nanométricas (Ellingsen, 1998). A

influência da configuração microgeométrica e textura de superfície final sobre a

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

24

resposta óssea ainda não é completamente compreendida (Kieswetter, 1996;

Cooper, 1998; Castellani, 1999; Park, 2000; Park, 2001), uma vez que existem

vários parâmetros para a medida da rugosidade superficial, no entanto o mais

utilizado é a rugosidade média (Ra). Esse parâmetro indica apenas o valor médio

aritmético e não tem nenhuma relação com a textura, assim podem existir texturas

distintas com o mesmo valor Ra.

Segundo Black (1992), as células tendem a responder mais fortemente aos

padrões de textura de superfície com dimensões aproximadas da ordem do tamanho

de uma célula, o que corresponde em geral em alguns micrômetros. Estudos in vitro

têm demonstrado que células de linhagem osteoblástica exibem características

fenotípicas de tamanho e morfologia, por exemplo, dependentes da rugosidade,

sendo que estas parecem se aderir mais rapidamente sobre superfícies com uma

microtopografia mais rugosa (Michaels, 1989, apud Xavier, 2002 e Bowers, 1992,

apud Xavier, 2002).

Ong et al. (1996) observaram que em discos de Ti-cp imersos em meio de

cultura ALFA-MEM a cultura de células osteoblásticas mostrou que a orientação

celular é dependente da topografia, sendo que as células aderidas sobre o Ti mais

liso eram mais arredondadas, enquanto as localizadas sobre a superfície mais

rugosa tinham um formato mais alongado indicando uma maior adaptação e

seguiam a orientação dos sulcos da superfície. As diferenças na orientação celular

observadas no trabalho de Ong (1996) são similares àquelas observadas em outros

estudos in vitro que utilizaram cultura de células de ratos (Inuoe, 1987, apud Xavier,

2002 e Gitto, 1994, apud Xavier, 2002).

Anselme et al. (2000) avaliaram quantitativamente a adesão de osteoblastos

humanos sobre substratos metálicos (Ti6Al4V) com várias rugosidades de superfície

obtidas a partir de tratamentos de polimento e jateamento com areia, a análise da

adesão foi feita em diferentes períodos para estudo da correlação das rugosidades

com mudanças qualitativas na expressão de proteínas de adesão.

As células se orientavam de maneira paralela nas superfícies polidas. Nas

superfícies jateadas as células não chegaram à confluência e tinham um formato

estrelado, e a camada celular não apresentava organização. A orientação da matriz

extracelular e proteínas do citoesqueleto refletiam a orientação da camada de

células. Os autores observaram uma menor adesão e proliferação celular nas

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

25

superfícies mais rugosas e menos organizadas (jateadas). Tais resultados seriam

explicados pela formação de número e tamanho reduzidos das placas de adesão

sobre as superfícies mais caóticas (Anselme, 2000).

São células mononucleadas, completamente diferenciadas, de origem

mesenquimal responsáveis pela síntese tanto do colágeno tipo I quanto de proteínas

não colagenosas (proteoglicanos e glicoproteínas adeseivas) da matriz orgânica do

osso. São responsáveis pela mineralização, e considera-se que sejam oriundos de

células mesenquimatosas pluripotentes ou, de uma forma alternativa perisvascular.

Durante a diferenciação o osteoblasto sofre mudanças morfológicas e funcionais

(Polland, 2006).

Zhu et al. (2004) avaliaram por meio de microscopia ótica células fixadas em

discos de titânio, em seus trabalhos observaram que todas as células fixas estavam

divididas em (a) não espraiadas ou arredondadas: células ainda tinham aparências

esféricas, ainda não tendo sido produzidos protrusões ou lamelopóides; (b) e (c)

parcialmente espraiadas: nesta fase, células começaram a se espraiar lateralmente

a um ou mais lados, mas as extensões de membrana plasmática não eram

completamente confluentes; (d) completamente espraiada: extensão de membrana

plasmática para todos os lados, combinou com área de superfície distintamente

maior que nos estágios de (a) para (c) e aplainamento óbvio da célula, como

mostrado na figura 2.6 (Zhu, 2004).

Figura 2.6 – Formato das células osteoblástica (a) totalmente arredondada; (b) e (c) parcialmente espraiadas e (d) totalmente espraiadas (Zhu, 2004).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

26

Eisenbarth (2002) cultivou células osteoblásticas MC3T3-E1 em discos

rugosos e polidos. Após 3 dias de cultura verificou que as células se apresentam

mais espalhadas nos discos polidos (a) e que as células apresentam-se orientadas

segundo a rugosidade do disco (b), conforme a figura 2.7.

(a) (b) Figura 2.7 – Formato da célula MC3T3-E1 na superfície de discos de titânio após 3

dias de cultura; (a) no disco polido; (b) no disco rugoso (Eisenbarth, 2002)

Segundo Kasemo (2002), quando uma superfície é implantada no organismo

a primeira interação que ocorre é com as moléculas de água numa escala de poucos

nano segundos. A água é conhecida por interagir e ligar superfícies muito diferentes

dependendo das propriedades superficiais. As propriedades superficiais da água são

fatores importantes que influenciam as proteínas e outras moléculas que chegam

pouco depois. Estas biomoléculas em soluções aquosas também têm camadas de

hidratação (água) e a interação entre a camada de água da superfície com as

camadas de água biomolecular influência os processos cinéticos fundamentais e as

interfaces.

Quando as células chegam à superfície “elas vêem” a superfície coberta de

proteínas, cuja camada tem propriedades que foram determinadas inicialmente pela

pré formação da camada de água. Assim, quando se fala sobre as interações da

superfície com as células, esta está até à ultima instância inter-relacionada com as

camada inicial de água e de proteínas (Kasemo, 2002), Figura 2.8.

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

27

Figura 2.8 – Representação esquemática dos primeiros instantes da adesão em

ordem de ocorrência. (1) interação inicial da superfície com moléculas de água; (2) interação das moléculas de água com as proteínas e (3) interação das proteínas

com as células (Kasemo, 2002).

Estudos demonstram que os materiais investigados, independentemente das

rugosidades superficiais, permitiram a adesão e proliferação celular assim como a

diferenciação dos osteoblastos. Os resultados foram capazes de identificar

comportamentos semelhantes em relação à morfologia da célula que parece não

sofrer influência direta da superfície embora tenha seu crescimento orientado pela

topografia além de confirmar a biocompatibilidade favorável do titânio como material

para uso biomédico (Rosa, 2003).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

28

O titânio comercialmente puro (Ti-cp) tornou-se conhecido como o metal não

nobre mais resistente à corrosão, esta propriedade se deve a formação espontânea

de uma camada de óxido sobre sua superfície. Quando exposto ao ar, o titânio

reage formando imediatamente (10-9 segundos) uma camada de óxido de titânio

que alcança a espessura de 2nm a 10nm (Einsenbarth, 2002). É esta camada

superficial de óxido que fornece a base de sua resistência à corrosão excepcional e

conseqüentemente da sua biocompatibilidade (Einsenbarth, 2002).

A produção comercial do titânio é rigidamente controlada pela Sociedade

Americana para Análise e Padronização de Materiais (ASTM), que estabelece

normas específicas para os graus de contaminação do titânio e para suas ligas,

utilizada na fabricação de implante. A figura 2.9 apresenta as diferentes

concentrações dos elementos nitrogênio, carbono, hidrogênio, ferro, oxigênio e

titânio, admitidos para os diferentes graus do Ti-cp (ASTM, 2000).

Ti grau I 0,03 0,10 0,015 0,02 0,18 Balanço

Ti grau II 0,03 0,10 0,015 0,03 0,25 Balanço

Ti grau III 0,05 0,10 0,015 0,03 0,35 Balanço

Ti grau IV 0,05 0,10 0,015 0,05 0,40 Balanço

Figura 2.9 – Concentrações máximas permitidas para as impurezas em Ti-cp e ligas (% em peso) (ASTM, 2000)

Quando usinado, o Ti-cp está sendo exposto de forma repentina a uma

atmosfera constituída de ar e substâncias lubrificantes e resfriadoras, ficando o

mesmo susceptível à dissociação das moléculas de oxigênio no ar, resultando numa

formação extremamente rápida de óxido na superfície (Kasemo, 1987).

Primeiramente, ocorre uma adsorção de moléculas de oxigênio que se dissociam

imediatamente para átomos. Após 10 nano segundos, forma-se a primeira camada

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

29

monoatômica de oxigênio e dentro de aproximadamente 1 minuto, a espessura de

óxido é na ordem de 50 a 100 Å.

O titânio e suas ligas apresentam propriedades interessantes que permitem

seu uso nas mais diversas áreas, desde aeroespacial até a biomédica, dentre as

quais se destacam: i) baixa densidade (massa específica da ordem de 4,5 g/cm3); ii)

boa resistência mecânica à tração (entre 200 e 1370 MPa; iii) excelente resistência à

corrosão (garantida pela formação de uma camada passivada de TiO2) e iv) relativa

abundância na natureza (é o nono metal mais abundante), geralmente sob a forma

de minerais oxidados (Liu, 2004).

À temperatura ambiente o Ti apresenta um reticulado hexagonal compacto

(HCP, razão c/a = 1,587, parâmetro de rede = 3,3065 Å) e quando puro, acima de

882 °C transforma-se num reticulado cúbico de corpo centrado (CCC) (Liu, 2004). O

titânio puro tem ponto de fusão em 1724 °C, condutividade térmica é baixa, bem

como apresenta baixo coeficiente de expansão térmicas linear, do mesmo modo, o

titânio não é um bom condutor de energia elétrica (Liu, 2004).

O titânio é levemente paramagnético, assim como outros metais de transição,

ou seja, não é ferromagnético como o ferro-alfa (cúbico de corpo centrado). Do

ponto de vista de valência eletrônica, o titânio pode ser bi, tri ou tetravalente, ou

seja, podem ser formados íons Ti+2, Ti+3 e Ti+4. O titânio apresenta elevada

afinidade pelo oxigênio, com o qual reage em condições normais de temperatura e

pressão para formar uma série de óxidos com diferentes composições

estequiométricas desde TiO até Ti7O12, embora seja comumente encontrado sob a

forma de dióxido de titânio (TiO2). Também pode reagir com o hidrogênio para

formar hidretos do tipo TiH2. A figura 2.10 resume estas propriedades.

As propriedades de uma superfície são de fundamental relevância para a

tendência da mesma adsorver átomos ou moléculas estranhas. Diferentes

superfícies têm diferentes propriedades de adsorção, e estas diferenças estão

intimamente relacionadas com aspectos químicos de biocompatibilidade (Meachim,

1993).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

30

A figura 2.11 apresenta a microestrutura do titânio comercialmente puro

reveladas pelo ataque preferencial aos contornos dos grãos por uma solução

metalográfica composta de ácido fluorídrico e nítrico (HF:HNO3 – 1:3). Esta

microestrutura consiste em grãos hexagonais de fase alfa - α (Trota Filho 2007).

Numero Atômico 22 Peso Atâmico 47,90 Estrutura Cristaliona 1 α: hexagonal compacta (<882,5°C)

Estrutura Cristaliona 2 β: cúbica de corpo centrado (>882,5°C)

Cor Cinza Densidade 4,51g/cm3 Ponto de Fusão 1668±10°C Ponto de Ebulição 3260°C Dureza HBR 70 a 74 Módulo de cisalhamento 45Gpa Resistencia a Tração 520 Mpa Configuração Eletronica Externa 3d2 4s2 Coeficiente de Expanção Térmica 8064 x 10-6/°C Eletronegatividade 1,6 Resistencia Eletrica 47,8 W cm

Figura 2.10 – Propriedades do titânio puro (Liu, 2004)

Figura 2.11 – Micrografias por microscopia ótica com: (A) 200x e (B) 500x mostram a microestrutura do titânio comercialmente puro com grãos hexagonais alfa (Trota

Filho, 2007).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

31

As ligas à base de titânio possuem módulos de elasticidade baixos, da ordem

de 55 a 114GPa quando comparadas com o aço inoxidável (193GPa), porém

superior ao módulo de elasticidade do osso, obtidos por ensaio de tração, que se

encontra entre 17 e 35GPa. Por isso, os implantes de titânio apresentam vantagem

em relação aos seus concorrentes utilizados para a mesma função (RACK, 2006).

A resistência mecânica de um material está associada a características como

porosidade e microestrutura que, por sua vez, estão associadas ao tipo de

processamento utilizado na fabricação do produto. Ou seja, de acordo com o

processamento adotado, o produto final apresentará um conjunto diferente de

propriedades mecânicas.

Uma das características mais importantes do titânio é a transformação

alotrópica que ele sofre a 882°C, quando muda sua estrutura cristalina de hexagonal

compacta (HCP) chamada de fase α para uma estrutura cúbica de corpo centrado

(CCC) chamada de fase β. A figura 2.12 esquematiza as transformações alotrópicas

do titânio puro (Donachie, 1982; Flower, 1990).

Figura 2.12 – Transformações alotrópicas do Ti-cp, a temperatura ambiente possui estrutura HCP e acima de 882°C possui estrutura CCC (Donachie, 1982; Flower,

1990).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

32

A temperatura de transformação é fortemente influenciada por elementos

intersticiais. Metais simples dos grupos IIIA e IVA, por exemplo, Al, Ga e Sn; e os

elementos intersticiais (B, C, O e N) são denominados elementos α-estabilizadores

(ou alfagênicos) e, quando adicionados ao titânio puro, promovem o aumento da

temperatura de transformação da fase α para a fase β. Já a adição de metais, tais

como: Mo, V, Mn, Fe, Cu, Cr, Nb e Ta diminuem a temperatura desta transformação

e estes elementos são denominados β-estabilizadores (ou betagênicos) (Mello,

2000). A influência da adição de elementos α e β-estabilizadores é exemplificada

nas figuras 2.13, 2.14, através dos sistemas Ti-Al e Ti-Nb, respectivamente.

O titânio forma soluções sólidas intersticiais com elementos que possuem raio

atômico pequeno, como por exemplo, carbono, nitrogênio, oxigênio e hidrogênio. O

espaço intersticial é de aproximadamente 26,5% do volume do reticulado cristalino

para o α-Ti (HCP) e de 32% para o β-Ti (CCC). A estrutura α possui 4 posições

intersticiais de raio 0,62 Å. Já a estrutura β possui 12 interstícios do tipo tetraédrico

com raio 0,44 Å e 6 do tipo octaédrico (Wasilewski, 1995, apud Bellinati, 1999).

Com exceção do hidrogênio os demais elementos intersticiais são

estabilizadores de fase α (Williams, 1981, apud Bellinati, 1999). A presença de

elementos intersticiais tende a aumentar a dureza, a resistência mecânica e diminuir

a ductilidade do material (ASM Committee, 1987, apud Bellinati, 1999). A maioria

dos produtos de titânio comercialmente puro contém traços alguns desses

elementos (ALBREKTSSON, 1983; FRAKER, 1987)..

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

33

Figura 2.13 – Diagrama de fase representativo do sistema Ti-Al. Há um aumento da

temperatura de estabilização da fase α-Ti (Murray, 1986, apud Mello, 2000).

Figura 2.14 – Diagrama de fase representativo do sistema Ti-Nb. Há uma diminuição

da temperatura de estabilização da α-Ti (Murray, 1986, apud Mello, 2000).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

34

As ligas são tratadas termicamente para aumentar sua resistência mecânica,

produzindo soluções sólidas contínuas. Os elementos incorporados atuam como

estabilizadores de fase (FRAKER, 1987). É basicamente na manutenção de uma ou

outra fase em equilíbrio termodinâmico que se baseia a adição de elementos de liga.

Através de tratamentos térmicos ou termomecânicos pode-se obter grandes

variações microestruturais e, conseqüentemente, alterar de maneira significativa

suas propriedades.

Durante o resfriamento a partir de temperaturas superiores a temperatura β-

transus (882°C) ocorre uma transformação alotrópica da estrutura CCC que é

característica da fase β-Ti para a estrutura HCP que é características da fase α-Ti no

titânio comercialmente puro. A adição de elementos de liga nesta temperatura

modifica o equilíbrio entre os campos α e β implicando no aparecimento da região α

+ β (Collings, 1984).

Uma classificação ampla para o titânio é feita com referencia às linhas de

transformação martensítica inicial (Mi) e final (Mf), que são, geralmente, muito

próximas ou quase coincidentes. Assim, de acordo com a figura 2.15 as ligas de

titânio podem ser divididas em cinco classes, sempre relacionadas com a retenção

de β à temperatura ambiente, que são: ligas-α, ligas α-próximo, ligas α + β, ligas β-

próximo e ligas-β (Mello, 2000).

Figura 2.15 – Esquema para ligas ternárias de titânio contendo estabilizadores alfa e

beta (Mello, 2000).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

35

Como as temperaturas de inicio e fim das transformações martensíticas são

muito próximas, só é possível obter estruturas contendo martensita juntamente com

a fase β para um intervalo muito pequeno de composição. A transformação

martensíticas é precedida por um regime de variações estruturais chamadas de fase

ω (Colllings, 1984). A fase ω é o resultado de um resfriamento muito rápido,

existindo como um precipitado cristalino dentro de uma faixa muita estreita de

composição, nos contornos da fase martensita. A martensita αm (α’ ou α’’) possui

energia livre menor que a fase ω. Assim durante a transformação, as agulhas de

martensita consomem todos os possíveis precipitados de fase ω existentes no seu

caminho.

Os resfriamentos submetidos a altas taxas promovem uma precipitação mais

fina da fase αm, resultando na estrutura Widmanstätten e, chegando estas taxas de

resfriamento a patamares mais elevados, a difusão atômica será inibida gerando

uma estrutura martensítica (Flower, 1990). A estrutura Widmanstätten (α + β) é

característica das ligas diluídas e se apresenta como um emaranhado de agulhas

paralelas em matriz de β (Brooks, 1982). A figura 2.16 mostra o diagrama

esquemático da formação da estrutura de Widmanstätten na liga Ti-6Al-4V.

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

36

Figura 2.16 – Diagrama esquemático da formação da estrutura de Widmanstäntten

na liga Ti-6Al-4V (Brooks, 1982)

A têmpera é o tratamento térmico que possui como objetivo otimizar a relação

entre microestrutura e dureza. Basicamente, a têmpera consiste em resfriar

rapidamente o material, após a temperatura de austenitização, a uma velocidade

superior à velocidade crítica (Vc), para obter uma estrutura denominada martensita.

Essa velocidade (Vc) significa uma taxa de resfriamento crítico correspondente à

menor taxa de resfriamento que pode ser utilizada para que toda a estrutura obtida

ainda seja martensítica (Moreira, 2008). A temperabilidade mede a habilidade de um

material sofrer um tratamento térmico que aumente a proporção de fase dura

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

37

(martensita). Normalmente, esse processo é complementado por outro tratamento

térmico, denominado revenimento.

Segundo Moreira e Lebrão (2008) os meios utilizados para o tratamento de

têmpera podem ser água, salmoura, óleo e ar, da seguinte forma:

i) têmpera em água – este pode ser conduzido de diversas maneiras: por meio de

imersão, jatos, imersão ou jatos com água aquecida, ou ainda, misturas de água

com aditivos poliméricos;

ii) têmpera em salmoura – o termo salmoura refere-se á uma solução aquosa

contendo diferentes quantidades de cloreto de sódio (NaCl) ou cloreto de cálcio

(CaCl). As taxas de resfriamento da salmoura são superiores às obtidas em água

pura;

iii) têmpera em óleo – todos os óleos de têmpera têm como base os óleos minerais,

geralmente óleos parafínicos e são classificados de acordo com a velocidade

desejada para a têmpera, da seguinte forma: óleos de velocidade normal- para

metais de alta temperabilidade; óleos de velocidade média - para metais de média

temperabilidade; óleos de alta velocidade - para metais de baixa temperabilidade;

óleos para martêmpera e óleos laváveis em água. A maior parte dos óleos de

têmpera apresenta taxas de resfriamento menores que as obtidas em água ou em

salmoura, entretanto, nestes meios o calor é removido de modo mais uniforme,

diminuindo as distorções dimensionais e a ocorrência de trincas;

iv) têmpera em ar – como a água, o ar é um meio de tempera antigo, comum e

barato. A aplicação do ar como meio de têmpera é mais comum em metais de alta

temperabilidade. Como qualquer outro meio de têmpera, suas taxas de transferência

de calor dependem da vazão. Este tipo de têmpera é bastante empregado no

resfriamento rápido de metais não-ferrosos.

O revenimento tem como principal objetivo controlar a relação dureza e

tenacidade obtida após o processo de têmpera, reduzindo as tensões produzidas

durante esse processo e aumentando a ductilidade e a tenacidade. O revenimento é

realizado em temperaturas inferiores à zona critica com tempos de duração e

velocidades de resfriamento controladas. A martensita é muito dura, porém, muito

quebradiça e frágil. Isso ocorre devido a vários fatores que incluem a distorção do

retículo cristalino causada pelo aprisionamento dos átomos durante a têmpera. O

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

38

revenimento é o tratamento térmico que permite redução do efeito quebradiço,

aumentando a ductilidade (Moreira, 2008).

As variáveis que afetam a microestrutura e propriedades mecânicas dos

metais temperados são: i) temperatura de revenimento; ii) tempo na temperatura de

revenimento; iii) velocidade de resfriamento após o revenimento e iv) composição do

metal, incluindo teor de C, elementos de liga e impurezas. Cada metal apresenta

uma correlação entre a temperatura de revenimento e as propriedades mecânicas.

As curvas de dureza versus temperatura de revenimento são normalmente

empregadas para a seleção da temperatura de revenimento de um metal. A difusão

de carbono e elementos de impureza durante o revenimento é dependente do

tempo. Verificam-se grandes alterações de dureza para diferentes tempos de

revenimento (Moreira, 2008).

A cinética de transformação da fase alfa para beta durante o resfriamento

influência as propriedades do Ti, podendo gerar fases metaestáveis que necessitam

de adição de determinados elementos em determinadas teores para estabilizar a

fase beta. O resfriamento rápido a partir do campo beta (1000 ºC, por exemplo) não

suprime a formação de fase alfa, mas forma contornos mais irregulares, resultando

em maior resistência mecânica.

A figura 2.17 apresenta a microestrutura do Ti temperado a uma temperatura

superior à temperatura β-transus (1175°C). Analisando esta figura, pode-se perceber

que devido a alta taxa de resfriamento há formações aciculares no interior dos grãos

alfa - α, são mais finas neste caso do que no caso de resfriamento lento (ASM

HANDBOOK pag 463).

Apectos Teóricos

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

39

Figura 2.17 – Microestrutura do titânio temperado acima da temperatura β-transus.

Apresenta no interior dos grãos hexagonais uma estrutura acicular ou lamelar, característicos do resfriamento rápido a partir da faixa de temperatura citada.

Metodologia Experimental

Haroldo Reis Alves de Macêdo,Agosto/2008

41

O presente trabalho foi dividido em duas partes. Na primeira parte foi

realizado os tratamentos térmicos e as caracterizações dos discos de Ti-cp

para análise comparativa entre os discos tratados e não tratados. Na segunda

parte foi realizada a cultura de células sobre a superfície e as análises

microscópicas referentes à caracterização destas células nas superfícies

tratadas e não tratadas.

Neste trabalho foram utilizados 21 discos de Ti-cp, com especificação

conforme certificado de qualidade fornecido pela empresa Realum Ind. Com.

de Metais Puros e Ligas LTDA. Os discos tinham 15mm x 1,5mm (diâmetro x

espessura) e composição química de acordo com a tabela 3.1.

Composição química do titânio utilizado segundo fornecedor. Discos de Ti ASTM F67 GR1Φ 15x1,50mm.

Elementos N C H Fe O Ti

% 0,011 0,011 0,004 0,04 0,085 Balanço

Os tratamentos térmicos foram realizados em forno resistivo, mantendo-

se o patamar de temperatura por uma hora seguida de resfriamento até

temperatura ambiente. Os discos foram divididos em sete grupos de acordo

com os tratamentos conforme a tabela 3.2.

Metodologia Experimental

Haroldo Reis Alves de Macêdo,Agosto/2008

42

Tabela 3.2 – Condições de tratamentos e simbologia.

Têmpera TSR 1100°C Ar Têmpera e

revenimento a 200°C

TR200 Tempera 1100°C e revenimento 200°C

Tempera – Ar Revenimento -

forno Têmpera e

revenimento a 300°C

TR300 Tempera 1100°C e revenimento 300°C

Tempera – Ar Revenimento -

forno Têmpera e

revenimento a 500°C

TR500 Tempera 1100°C e revenimento 500°C

Tempera – Ar Revenimento -

forno Tratamento térmico

a 300°C TT300 Tratada termicamente a 300°C Forno

Tratamento térmico a 500°C TT500 Tratada termicamente a

500°C Forno

Comercial (recozida) ST Sem tratamento -

Após os tratamentos térmicos, os discos passaram por uma preparação

metalográfica de embutimento em resina poliéster, lixamento e polimento

(politriz AROTEC, modelo APL-2) com uma solução de 40% de sílica coloidal

com 60% de peróxido de hidrogênio (30%). Em seguida, os discos foram

desembutidos, marcados com três impressões de microdureza em forma de “L”

para garantir que a análise de imagens fosse feita exatamente na mesma

posição e local.

Terminada as marcações, os discos foram submetidos a um rígido

protocolo de limpeza para remoção de gorduras, sendo limpas em banho de

ultra-som por 30 minutos. Esta limpeza foi dividida em três partes de 10

minutos cada, sendo a primeira feita com detergente enzimático (EndoZime

AW plus), a segunda com álcool absoluto e finalmente com água destilada. As

amostras foram secas com secador e acondicionadas em embalagens

apropriadas para uso posterior.

Metodologia Experimental

Haroldo Reis Alves de Macêdo,Agosto/2008

43

O ataque químico utilizado para revelar os contornos de grão foi uma

solução de 10ml de ácido fluorídrico (HF), 5ml de ácido nítrico (HNO3) e 85ml

de água destilada com a qual embebeu-se o algodão e este foi posto sobre o

disco por 10 segundos (HF=0,7mol/L; HNO3=0,17mol/L).

A técnica utilizada foi a determinação do ângulo de contato estático ou

técnica da gota séssil. O aparato utilizado para tal determinação foi

desenvolvido no Laboratório de Processamento de Materiais por Plasma da

UFRN e está esquematizado na figura 3.1. Este aparato é composto por uma

base plana móvel, com movimentos no sentido vertical, uma micro-câmera,

uma pipeta de volume regulável, e uma fonte de luz difusa.

As amostras foram colocadas sobre a base plana e em seguida foi

depositado uma gota de 10μl de água sobre as superfícies dos discos. De

forma a padronizar o teste e por serem gotas muito pequenas, foram feitos

videos de acompanhamento da deposição da gota na supefície do disco, sendo

medido o ângulo de contato após completar 60 segundos de acomodação. O

software utilizado para isolar as imagens a partir do vídeo no instante 60

segundo foi o Pinnacle Studio QuickStart versão 8 e o software utilizado para

calcular o ângulo de contato foi o “surftens”, com este fez-se três marcações

para medida de cada ângulo e obtido uma média de cinco medições para a

determinação do valor de cada ângulo.

Metodologia Experimental

Haroldo Reis Alves de Macêdo,Agosto/2008

44

Figura 3.1 - Ilustração do equipamento utilizado para determinação do ângulo

de contato (Adaptado de Costa,2006).

Para análise da rugosidade foi mensurado o parâmetro Ra, utilizando um

rugosímetro modelo Surtronic 25 da marca Taylor Hobson Precision com cut-off

igual a 0.25, do laboratório de caracterização de materiais da UFRN . Foram

obtidas dez medidas em cada disco. Distribuídas ao longo de toda a área

superficial dos mesmos, conforme a figura 3.2 (a).

O ensaio de microdureza teve finalidade obter os valores de dureza

Vickers (HV) no centro e na bordas dos discos a fim de verificar se havia

alguma diferença entre tais valores. O ensaio de microdureza foi feito utilizando

um microdurômetro digital HVS 1000 PANAMBRA com carga de 200g, tempo

de aplicação de carga de 15 segundos e distância entre impressões de 150μm.

Foram feitas seis medições em cada disco sendo três na borda e três no

centro, conforme a figura 3.2 (b).

Metodologia Experimental

Haroldo Reis Alves de Macêdo,Agosto/2008

45

As impressões de microdureza realizadas nos discos tiveram como

segundo objetivo marcar local e posição nos discos para posterior análise de

imagens.

(a) (b) Figura 3.2 – (a) esquema da posição dos riscos de rugosidade e (b) esquema

das marcações de microdureza.

Para análise das fases foi utilizado um difratômetro de raios-X,

Shimadzu modelo XRD-6000 do Núcleo de Ensino e Pesquisa de Petróleo e

Gás Natural da UFRN. As amostras foram analisadas com ângulos de

varredura θ~2θ entre 30° e 80° numa velocidade de 2°/min.

Após a limpeza, os discos de titânio foram autoclavadas a 120°C por 30

minutos, secos e reservados para uso posterior. As etapas posteriores aqui

descritas foram realizadas em ambiente estéril numa câmara de fluxo laminar.

O experimento iniciou quando colocou-se os disco autoclavados numa placa de

cultura de células de 24 poços (poços de 16mm de diâmetro), na proporção de

um disco por poço. Adicionou-se em seguida 1 mL do meio de cultura celular

(ALFA-MEM) e posteriormente as células pré-osteoblásticas da linhagem

MC373-E1 (40.000 células por poço). As placas ficaram em condições de

Metodologia Experimental

Haroldo Reis Alves de Macêdo,Agosto/2008

46

cultura celular (5% de CO2, 37 °C) conforme a figura 3.3. Após 24 h, as células

foram fixadas nos discos com o uso de solução de Karnovsky. O material

permaneceu nessa solução a 4°C até a desidratação para visualização em

microscopia. O procedimento de desidratação foi realizado pondo-se os disco

com as células em álcool 70% a temperatura ambiente, depois de 10 minutos o

álcool 70% foi substituído por álcool a 80%, e assim por diante até álcool

absoluto. Este procedimento foi realizado no laboratório de cultura celular do

departamento de bioquímica da UFRN.

Figura 3.3 – Fotografia ilustrativa da placa de 24 poços utilizada na cultura de

células.

Foi utilizado o microscópio Olympus BX 60M com uma câmera digital

acoplada e o software Image Pro Plus que foi utilizado na aquisição e análise

de imagens. Para tal, foram obtidas fotomicrografias da superfície dos discos,

nas regiões previamente marcadas com as impressões de microdureza, em

três momentos distintos, a saber: superfície polida, superfície com as células

aderidas e finalmente da superfície atacada quimicamente – microestrutura.

O software Image Pro Plus foi utilizado na aquisição e principalmente na

contagem e caracterização de tamanho e forma das células aderidas à

superfície dos discos. Foram analisadas as imagens das superfícies que

tinham células aderidas e as microestruturas correspondentes.

Metodologia Experimental

Haroldo Reis Alves de Macêdo,Agosto/2008

47

Para a contagem das células foram fotografadas três regiões próximas à

marcação central a fim de obter uma visão geral da quantidade média de

células no disco. As regiões analisadas correspondem aos campos de visão

obtidos com aumento de 500 vezes, esse aumento foi utilizado com o intuito

minimizar o erro do operador, uma vez que com um menor aumento a

visualização do limite entre uma célula e outra é dificultada. No entanto, tem-se

imagens com os aumento menores que permitem uma visão geral da

quantidade de células nas regiões predeterminadas e nas regiões vizinhas.

Para análise estatística foi utilizado o software InStat versão 3. Para tal,

utilizou-se o teste da ANOVA que mede a variabilidade entre os valores e em

seguida fez-se o teste t-student para avaliar o nível de significância estatística.

Capítulo 4

Resultados e Discussão

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

49

Os discos sem tratamento (ST) apresentaram a microestrutura mostrada

na figura 4.1. Esta é compatível com a microestrutura apresentada na literatura

para o Ti-cp, conforme pode ser verificado na figura 2.9 (literatura).

Figura 4.1 – Micrografia do disco ST. Os três pontos escuros em forma de “ ”

no centro do disco são as marcações do local de estudo. Analisando a micrografia da figura 4.1 observou-se, que alguns grãos

apresentaram no seu interior regiões mais escuras e em formato de agulhas ou

lamelas como pode ser verificado observando a região 2 e grãos sem essas

estruturas e em formatos hexagonais na região 1. A diferença entre as regiões

1 e 2 desta figura podem ser atribuídas à presença de impurezas durante o

processo de fabricação dos discos.

1

2

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

50

Os discos temperados (TSR) apresentam uma microestrutura

caracterizada por uma estrutura acicular, ou seja, por lamelas, que neste caso

apresentaram-se grandes, bem definidas e orientadas (figura 4.2.). Estas

indicam a presença de uma nova fase, a fase martensita conforme a figura

representativa desta fase que foi mostrada na figura 2.17.

Figura 4.2 – Micrografia do disco TSR.

Os resultados microestruturais obtidos com o revenimento estão

apresentados na figura 4.3. Nesta figura foi verificado que o revenimento

aliviou as tensões provocadas pela têmpera de modo que os grãos se

reorganizaram, eliminando a estrutura lamelar e dando inicio a recristalização.

Verificou-se também que os discos revenidos apresentaram diferenças

microestruturais no tamanho e forma dos grãos, que podem ser atribuídas à

diferença microestrutural inicial apresentada na figura 4.1. Estas diferenças

provocam respostas diferentes para os tratamentos térmicos.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

51

(a) (b)

(c)

Figura 4.3 – Micrografias dos discos revenidos. (a) TR200 (b) TR300 (c) TR500.

A figura 4.4 apresenta os resultados para os discos tratados

termicamente. Estes apresentaram microestrutura semelhante à microestrutura

dos discos não tratados mostrados na figura 4.1, com grãos pequenos e em

forma de hexágonos, bem como, apresentam grãos mais escuros com

estrutura lamelar no interior. A presença desta estrutura no interior dos grãos

pode ser atribuída à precipitação de elementos de impurezas durante o

tratamento térmico, bem como à formação de uma solução sólida pelos

elementos de impurezas presentes nos materiais e mostrados na tabela 3.1.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

52

(a) (b)

Figura 4.4 – Microestrutura da região central dos discos de Ti-cp tratamentos térmicos. (a) TT300 (b) TT500.

Padronizou-se neste trabalho a utilização de micrografias obtidas com

aumento de 500x. No entanto, também foram obtidas fotomicrografias dos

discos com aumento de 200x para uma melhor visualização dos contornos de

grão das duas fases presentes nos discos temperados e revenidos. Com estas

micrografias confirmou-se o formato de grãos citados na literatura e mostrados

nas figuras 2.9 e 2.17, para ambas as fases, como podem ser visto nas figuras

4.5 (a) e (b).

(a) (b)

Figura 4.5 – Visualização dos contornos de grão por micrografia, (a) microestrutura correspondente à fase alfa – grãos hexagonais, discos TR300 e (b) microestrutura correspondente à fase martensita – grãos hexagonais com

formações lamelares no interior, discos TSR.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

53

Os tratamentos térmicos utilizados neste trabalho permitiram a obtenção

de microestruturas diferenciadas em tamanho e forma de grãos. Percebe-se

que a têmpera provocou uma mudança na cristalinidade do material, gerando

uma estrutura acicular ou lamelar dentro da estrutura hexagonal alfa, ou seja,

gerando a estrutura correspondente a fase αm (martensita), como pôde ser

visto na figura 4.2. Enquanto que o revenimento fez com que houvesse um

retorno da estrutura da fase αm para a estrutura da fase α (Figura 4.3).

Um maior ângulo significa uma menor área de contato do liquido com a

superfície do biomaterial enquanto que o menor ângulo significa uma maior

área de contato, ou seja, que o liquido está mais espalhado na superfície do

biomaterial, ou ainda, que o biomaterial é mais molhável.

Constatou-se que os discos temperados (TSR) foram os que

apresentaram o maior ângulo de contato, ou seja, a menor molhabilidade.

Verificou-se também que entre os discos revenidos a menor ângulo de contato

se deu para os discos TR300 e o maior para os discos TR200 apresentando

uma diferença significativa, entorno de 22%. Sendo que os discos TR500

apresentaram valores intermediários entre os demais revenidos conforme pode

ser visto na figura 4.6.

Nos discos tratados termicamente a diferença também foi significativa

entorno de 25%. Sendo que os discos TT300 foram dos que apresentaram

menor ângulo de contato, ou seja, estes se apresentaram mais molháveis que

os discos TT500. Entretanto, dentre todos os 21 discos estudados a melhor

molhabilidade se deu para os discos não tratados (ST) com uma diferença de

cerca de 60% para os discos menos molháveis os TSR (figura 4.6). Observa-se

que os discos TT300 e TR300 apresentaram semelhança nos valores da

molhabilidade após os 60 segundo de acomodação do líquido.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

54

0102030405060708090

TSR TR200 TR300 TR500 TT300 TT500 ST

Figura 4.6 – Resultado do ângulo de contato para água após 60 segundos de

acomodação da gota. De acordo com Baier (1984) e Lampin (1997) de maneira geral as

células apresentam melhor afinidade por superfícies hidrofílicas melhorando

assim a interação destas superfícies com o meio biológico. Assim os discos

que se destacam por apresentarem melhor molhabilidade são os discos

TR300, TT300 e ST. O ângulo de contato indica o grau de molhabilidade dos

materiais e esta é um fator indicativo da boa resposta biológica. Portanto,

deveriam os discos anteriormente citados apresentar maior quantidade, bem

como uma melhor acomodação das células.

Outra grandeza importante a ser analisada numa superfície para fins de

utilização como biomaterial é a rugosidade. Como comentado anteriormente

verificou-se que os tratamentos térmicos produziram modificações

microestruturais gerando uma estrutura lamelar martensita. Essa estrutura por

sua vez é mais resistente ao desgaste. Assim o processo de metalografia fez

com que os discos que apresentaram essas estruturas lamelares

apresentassem por conseqüência uma maior rugosidade.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

55

Os discos temperados (TSR) e os discos revenidos (TR200, TR300 e

TR500) apresentaram maior valor de rugosidade Ra. Entre eles os discos TSR

e TR200 se destacaram por apresentarem os maiores valores, enquanto que

os discos revenidos (TR300 e TR500). Os tratados termicamente (TT300 e

TT500) foram os que apresentaram os menores valores para a rugosidade,

bem como apresentam uma semelhança entre estes valores, como pode ser

visto na figura 4.7.

0

0,02

0,04

0,06

0,08

0,1

TSR TR200 TR300 TR500 TT300 TT500 ST

Figura 4.7 – Rugosidade superficial dos discos tratados e não tratados.

Existe uma divergência de opiniões entre alguns pesquisadores quanto

ao valor da rugosidade (Albrektsson, 1998). Sabe-se, no entanto que os

eventos biológicos iniciais são bastante influenciados por algumas

propriedades da superfície, dentre as quais destaca-se a rugosidade

(Schwartz, 1994). Sabe-se também que os valores de rugosidade encontrados

neste trabalho estão dentro de uma faixa de valores utilizados na literatura

pelos diversos autores dentre os quais cita-se Zhu et al (2004) que utilizaram

valores para a rugosidade na faixa de 0,19 a 0,42 μm e Xavier (2003) que

utilizou valores entre 1,79 e 1,92 para a rugosidade dos discos e que obtiveram

excelentes respostas biológicas para os discos utilizados. Kasemo (2002)

relata que ainda não há uma definição quanto ao valor da rugosidade

superficial para uma melhor resposta biológica

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

56

Comparando os resultados da molhabilidade com os da rugosidade,

tem-se a tendência de relacionar estas duas propriedades, pois se percebe

para quase todos os discos que, quanto mais rugosos menor será

molhabilidade, e quanto menos rugoso maior a molhabilidade, exceto para os

discos TT500 e ST em que esta relação não é válida, pois ocorre justamente o

inverso do comentado anteriormente. Portanto não se pode concluir nada a

cerca desta relação. Embora outros trabalhos (Rupp, 2004; Alves Jr, 2005)

tenham mostrado que essa concordância possa existir.

Um fato que deve ser levado em consideração quanto ao valor da

rugosidade Ra é que este valor pode ser o mesmo para diferentes graus de

textura superficial, ou seja, é necessário um parâmetro de rugosidade que

forneça ao mesmo tempo informação sobre a rugosidade média e a textura da

superfície. Assim de acordo com os resultados obtidos neste trabalho pode-se

afirmar que ainda serão necessários mais estudos para a definição da

rugosidade ideal para uma boa resposta biológica.

A dureza é um importante indicativo do estado de tensão residual de um

material uma vez que a tensão residual esta associada a uma instabilidade na

rede cristalina e esta instabilidade faz com que o material tenha uma maior

resistência à deformação e conseqüentemente uma maior dureza (Callister,

2002). O ensaio de microdureza mostrou que os discos somente temperados

(TSR), apresentaram maior dureza entre todos os demais discos. Esta

diferença pode ser atribuída à presença da fase martensita em todo o disco

TSR, e ao fato do revenimento ter propiciado uma diminuição da fase

martensita, bem como a não existência desta fase nos discos tratados

termicamente e nos não tratados.

Os discos revenidos apresentaram uma variação na dureza com uma

diferença considerável da ordem de 9%, sendo que entre estes os discos que

apresentaram maior dureza foram os discos TR300 enquanto que os discos

TR200 e TR500 não apresentaram diferença considerável entre si (figura 4.8).

Quanto aos valores da dureza Vickers estão de acordo com os valores

encontrados na literatura para o titânio martensítico (Santos, 2006).

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

57

Os discos tratados termicamente também apresentaram valores de

dureza com diferença considerável da ordem de 12%, no entanto se

assemelhando muito à dureza dos discos não tratados que apresentam valores

na ordem de 150+/-30HV segundo Santos (2006), conforme pode ser

observado na figura 4.8.

0,0050,00

100,00150,00200,00250,00300,00350,00400,00450,00

TRS TR200 TR300 TR500 TT300 TT500 ST

Figura 4.8 – Gráfico da microdureza dos discos de Ti-cp.

A têmpera promove um desarranjo na orientação dos planos

cristalográficos, com isso dificulta o deslizamento destes planos e aumenta a

resistência a deformação e conseqüentemente a dureza. Já o revenimento

promove uma organização dos planos cristalográficos e com isso há uma

facilitação quanto ao deslizamento desses planos, diminuindo assim a

resistência à deformação e conseqüentemente a dureza do material. Assim

pode-se dizer que quanto maior for o grau de desarranjo dos planos

cristalográficos, ou seja, o estado de tensão do material, maior será o valor da

dureza do mesmo.

Na figura 4.9 é apresentado o difratograma obtido para os discos Ti-cp

sem tratamento. Verifica-se que a única fase presente é a fase α-Ti. Isto está

de acordo com a literatura que diz que o Ti-cp apresenta somente a fase alfa

até a temperatura de 882°C (Donachie, 1982; Flower, 1990).

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

58

30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80-200

0

200

400

600

800

1000

1200

1400

1600

Inte

nsid

ade

Ti - αm

Figura 4.9 – Difratograma do disco sem tratamento (ST). Há somente a

presença da fase alfa. A têmpera foi realizada a 1100°C, ou seja, a uma temperatura superior a

β transus. A fase martensítica αm surge durante o resfriamento rápido quando a

tendência do Ti-cp é retornar a fase α. O aparecimento de picos nas posições

62,75° e 70,2° caracterizam o surgimento da fase αm no titânio segundo

difratograma apresentado por Pinto (2005). Na figura 4.10 são apresentados os

difratogramas dos discos de titânio temperados e revenidos.

30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80

0

1000

2000

3000

4000

5000

6000

7000

8000

9000

10000

11000

12000

13000

Inte

nsid

ade

ST

TSR

TR200

TR300

TR500

Ti - αTi - αμ

Figura 4.10 – Difratogramas dos discos tratados com têmpera e têmpera

seguida de revenimento. Em todos os difratogramas há presença de duas fases: a fase α e αm, exceto para o caso ST que apresenta somente fase alfa.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

59

Observando o difratograma da figura 4.10, percebe-se que para os

discos TSR há picos referentes à fase alfa nas posições 35,02° e 52,84° e dois

picos referentes à fase martensítica na posição 62,75° e 70,2°.

No disco TR200 há um grande aumento na intensidade do pico na

posição 62,75° referente à fase αm e o reaparecimento do pico na posição

40,1° referente à fase α. Com isso pode-se sugerir que houve um inicio do

processo de recristalização. Nos discos TR300 e TR500 verifica-se que o pico

na posição 62,75° decresce enquanto que o pico na posição 40,1° aumenta,

como observado na figura 4.10. Isso sugere que com o aumento da

temperatura houve uma maior recristalização do material fazendo com que

houvesse uma diminuição da fase αm e aumento da fase α.

Ainda analisando o difratograma da figura 4.10 verifica-se que houve um

pequeno deslocamento de aproximadamente 0,3° para as amostras revenidas,

sugerindo o aumento das distâncias interplanares da fase α. Esse aumento

pode ter ocorrido pela inserção de átomos intersticiais na rede dessa fase.

Observa-se que embora a temperatura de tratamento seja suficiente

para que o titânio transforme-se completamente em Ti-β, ou seja, superior a β-

transus, os difratogramas apresentam somente fase alfa e alfa martensita (α e

αm), isso se deve ao fato da fase beta não ser uma fase de fácil estabilização,

sem a adição de elementos betagênicos ou facilitadores de estabilização da

fase beta, em baixas temperaturas. Entretanto, apenas com as duas fases

presentes foi possível a obtenção de microestruturas variadas.

Na figura 4.11 pode-se verificar que o tratamento térmico a 300°C fez

com que houvesse um aumento na intensidade de todos os picos, ou seja, que

houvesse uma recristalização do material em relação ao disco não tratado. Já

o tratamento térmico a 500°C pouco influenciou na cristalinidade do material

em relação ao tratamento térmico a 300°C uma vez que a intensidade dos

picos quase não se alteraram, ou seja, em termos de reordenamento

cristalográfico verifica-se que quase não houve diferença entre o tratamento

térmico a 300°C e a 500°C.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

60

30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80

0

1000

2000

3000

4000

5000

6000 Ti - α

TT500

TT300

ST

Inte

nsid

ade

Figura 4.11 – Difratograma para os discos de Ti-cp sem tratamento e tratados termicamente à 300° e 500° respectivamente. Há a presença somente da fase

alfa. Embora o DRX mostre semelhança entre os discos tratados

termicamente a 300° e 500° foi possível perceber diferenças na rugosidade,

molhabilidade e principalmente na dureza desses dois discos.

Observando as micrografias da figura 4.12, verifica-se que alguns grãos

apresentam precipitados em forma de lamelas. Para amostras tratadas a

500°C a densidade de precipitados foi superior às amostras tratadas a 300°C.

As amostras recozidas (ST) apresentam apenas discretamente esses

precipitados. No entanto não foi possível a identificação desta fase através do DRX.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

61

(a) (b)

(c)

Figura 4.12 – Micrografia (800X) dos discos tratados termicamente, onde se verifica a presença de alguns grãos contento precipitados em forma de

lamelas. (a) ST; (b) TT300 e (c) TT500.

Verificou-se que os discos que apresentaram maior quantidade de

células foram os discos TSR conforme é mostrado na figura 4.13. De um modo

geral, verifica-se que para discos com maior temperatura de revenimento o

número de células é menor. Essa tendência pode ser um indicativo de que a

tensão residual no material induz a uma maior proliferação celular.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

62

0,020,040,060,080,0

100,0120,0140,0160,0

TSR TR200 TR300 TR500 TT300 TT500 ST

Figura 4.13 – Número de células na superfície dos discos de Ti-cp tratados e

não tratados.

Tentando-se então associar o efeito anteriormente citado com a

microestrutura exibida por esses discos fez-se a sobreposição das imagens da

cultura de células com a micrografia (figura 4.14). Caso positivo, ou seja, caso

a células sejam influenciadas pelas microestruturas, grãos martensíticos

apresentariam mais células que aqueles recristalizados. Também poderia se

observar um crescimento preferencial de células obedecendo a alinhamentos

desses precipitados. Nesse caso não é o que se observa na figura 4.14.

Verifica-se que em grãos com lamelas alinhadas numa única direção, há

crescimento celular aleatório, não obedecendo qualquer ordem.

Figura 4.14 - Sobreposição das imagens da microestrutura com a das células

sobre a superfície para o disco TSR

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

63

Embora não verificando nenhuma relação da influência microestrutural

sobre o crescimento preferencial das células, foi observado que a proliferação

celular segue um ordenamento, cuja causa ainda é desconhecida. A figura 4.15

mostra alguns exemplos desses alinhamentos.

(a) (b)

Figura 4.15 – Imagens dos discos Ti-cp revenidos. Visualização das células orientadas sobre superfície: (a) TR300 e (b) TR500.

A análise estatística, por meio de ANOVA e t-Student, dos resultados da

quantidade de células sobre a superfície dos discos mostrou-se que houve

diferença estatística significante entre os discos tratados termicamente e os

revenidos, bem como entre os discos ST e os revenidos. Já os TSR se

destacaram em termos de significância entre todos os demais discos.

Quanto aos discos revenidos (TR200, TR300 e TR500), estes

mostraram diferença na quantidade de células, de modo que os discos

revenidos a uma maior temperatura apresentaram menor número de células.

No entanto a diferença verificada não foi de significância estatística. Da

mesma maneira, os discos tratados termicamente (TT300 e TT500). Esses

ainda, não apresentaram diferença estatística significante entre eles e em

comparação com o disco ST. No entanto, a diferença encontrada neste

trabalho para os discos pertencentes aos grupos dos revenidos e dos tratados

termicamente fornece uma visão geral da resposta biológica para os diferentes

tratamentos térmicos.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

64

Analisando a figura 4.13 e as imagens da figura 4.16 percebe-se que os

discos tratados termicamente e os não tratados apresentaram uma

semelhança na quantidade de células. Sendo que para os discos TT300 e os

discos ST a quantidade de células é semelhante e que os discos TT500

apresentam maior quantidade de células. Como comentado anteriormente esta

diferença não apresenta significância estatística, no entanto mostra que

mesmo em níveis menores o tratamento térmico a temperaturas baixas

influência na resposta biológico do biomaterial.

(a) (b)

(c)

Figura 4.16 – Imagens da adesão celular na região central dos discos de Ti-cp (a) TT300; (b) TT500; (c) ST.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

65

Fez-se a medida do tamanho médio das células nas três regiões

utilizadas para o cálculo da quantidade. Em seguida foi estabelecido duas

faixas de tamanho segundo o diâmetro médio, a primeira faixa de tamanho

abrange o tamanho médio das células osteoblásticas, ou seja, de 10μm a

20μm e a segunda faixa abrange as células que têm tamanho superior a 20μm.

Posteriormente foi realizada a análise da quantidade de células por faixa de

tamanho, conforme pode ser visto na figura 4.17.

0102030405060708090

100

TSR TR200 TR300 TR500 TT300 TT500 ST

>10 e <20 μm >20 μm

Figura 4.17 – Porcentagem de células por diâmetro médio em micrometros.

Observando a figura 4.17 tem-se que, para todos os discos a grande

maioria das células tinha tamanho entre 10μm e 20μm exceto para os discos

TR500 que apresenta maior quantidade de células com tamanhos superiores a

20μm. Analisando em termos de porcentagem no geral verifica-se que os

discos apresentaram células com tamanho entre 10 e 20 μm. Quanto aos

discos temperados e revenidos após a têmpera pode-se perceber que nos

discos TSR e TR300 mais de 80% das células tinham diâmetro médio a entre

10 e 20μm, enquanto que para os discos TR200 esse percentual cai pra 70% e

nos discos TR500 para 45%.

Analisando os discos tratados termicamente e não tratados (figura 4.17)

observa-se que os disco TT300 têm aproximadamente 87%, enquanto que nos

discos TT500 esse valor diminui para aproximadamente 79% e os discos ST

foram aproximadamente 74% de células com tamanho entre 10 e 20 μm.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

66

Outra característica estudada foi o formato das células. Para o cálculo

do formato fez-se a razão entre os diâmetros máximos e mínimos (razão de

aspecto), assim quanto mais próximo de 1 mais arredondada seria a célula, o

resultado é apresentado na figura 4.18. Estabeleceu-se que para valores de

razão de aspecto entre 1 e 1,5 a célula seria considerada arredondada e para

valores superiores a 1,5 a célula seria espraiada (alongada), esse parâmetro

foi obtido a partir da medição da razão de aspecto das células da figura 2.4,

pois as mesmas segundo X. Zhu (2004) apresentam-se arredondadas e

espraiadas respectivamente.

0102030405060708090

100

TSR TR200 TR300 TR500 TT300 TT500 ST

>1 e <1,5 >1,5

Figura 4.18 – Porcentagem de células por razão de aspecto.

A figura 4.18 mostra que para os discos TSR, TR500 e TT500 há uma

predominância de células arredondas, com cerca de 57%, 52% e 58% das

células com este formato respectivamente. Ainda na figura 4.18 observa-se

que para os discos TR200, TT300 e ST esse perfil é semelhante, com cerca de

53%, 62% e 61% de células espraiadas respectivamente para cada tratamento.

Já para os discos TR300 houve uma semelhança na quantidade de células

arredondadas e espraiadas com cerca de 50% para cada formato.

A tabela 4.1 resume os resultados de molhabilidade, rugosidade, dureza

e fases. Já tabela 4.2 apresenta um resumo dos dados comentados

anteriormente sobre a quantidade, o formato e o tamanho das células aderidas

na superfície dos discos tratados e não tratados.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

67

Tabela 4.1 – Resumo dos resultados de molhabilidade, rugosidade, dureza e fases para os discos com diferentes tratamentos.

Ângulo de Contato Rugosidade Dureza Fases

80,2 0,088 390,4 αm + α 54,7 0,071 344,1 αm + α 42,6 0,055 362,5 αm + α 46,2 0,057 330,5 αm + α 41,1 0,053 165 α 55,2 0,047 191,2 α 31,3 0,059 159,1 α

Tabela 4.2 – Resumo dos resultados da análise da adesão celular nos discos tratados e não tratados

122 86,5 65 108 26 101,7 60,5 67 85 30 82,7 53 53 79 19 79 44,5 42 38 47 49 18 29 39 6

54,3 54,5 42,3 45 12 49,5 20 31 34 12

No inicio deste trabalho esperava-se que houvesse uma relação entre a

proliferação celular e a microestrutura do material em questão. Diante disso

tratou-se termicamente discos de Ti-cp e cultivou-se células em suas

superfícies. Como resultado obteve-se diversas microestruturas e respostas

celulares diferentes. Para análise da influência da microestrutura sobre a

proliferação fez-se a sobreposição das imagens da microestrutura (com ataque

químico) com as imagens das células aderidas, nos casos em que a

visualização simultânea de ambas as imagem foi possível e analisou-se

separadamente as imagens que a sobreposição não permitiu a visualização

simultânea de ambas as imagens.

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

68

A sobreposição para o disco TSR foi mostrada na figura 4.14, nela foi

verificado que as células não obedecem às direções das lamelas. Para os

discos revenidos a correlação da microestrutura com o crescimento celular não

pôde ser apresentado em forma de sobreposição porque os contornos de grão

para tais discos não se apresentaram suficientemente evidenciados para que a

sobreposição pudesse ser realizada. No entanto, a figura 4.19 apresenta

separadamente a imagem da microestrutura e das células aderidas. Para

análise destas imagens tomou-se por base as marcações na região central e

analisou-se a vizinhança, não encontrando nenhuma relação entre a

organização preferencial celular e a orientação dos grãos.

(a)

(b)

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

69

(c)

Figura 4.19 - Correlação do crescimento celular com a microestrutura dos discos de Ti-cp. (a) TR200; (b) TR300 e (c) TR500.

Analisando as imagens da sobreposição dos discos TT300, TT500 e ST

na figura 4.20 – percebe-se que assim como para os discos revenidos os

discos com tratamento térmico a 300°C e 500°C e os sem tratamento não

apresentam correlação entre a microestrutura e a proliferação celular, uma vez

que os grãos nestes discos apresentaram-se menores que as células e com

isso não interferiram na orientação e formato dessas células.

(a) (b)

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

70

(c)

Figura 4.20 – Correlação do crescimento celular com as microestruturas dos discos de Ti-cp tratados termicamente e não tratados. (a) TT300; (b) TT500; (c)

ST.

Com base nas observações realizadas nesse trabalho, pode-se inferir

que o estado de tensão do material seja o mais importante na influência da

proliferação celular. Verificou-se que para materiais com altos níveis de tensão

(material temperado) houve maior proliferação que nos materiais com níveis de

tensão inferiores (materiais revenidos).

A amostra ST foi a que apresentou maior molhabilidade (menor ângulo

de contato). Vários trabalhos na literatura (Kasemo, 1993; Kasemo2002)

relacionam uma maior molhabilidade de uma superfície com uma maior

proliferação celular, uma vez que superfícies com essas características

possuem um contato mais intimo com o liquido biológico, o que proporciona

uma maior interação com as proteínas e, conseqüentemente, com as células.

Esperava-se, portanto, que essa amostra apresentasse maior proliferação

celular indicando que outros fatores são mais influentes.

Quanto à rugosidade o disco que apresentou maior rugosidade foi o

TSR. Alguns autores defendem que esta propriedade é de forte influência na

proliferação de células ósseas (Davies, 1998; Anselme, 2000; Carvalho, 2001).

Outros trabalhos, no entanto, mostram que tanto a molhabidade quanto a

rugosidade influenciam diretamente na resposta à cultura de células

osteoblástica, uma vez que estas estão relacionadas (Rupp, 2004). Assim o

disco que deveria ter apresentado maior quantidade de células seria o disco o

Resultados e Discussão

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

71

ST, que apresenta maior rugosidade e molhabilidade, no entanto o número de

células foi o menor.

O disco que apresentou maior quantidade de células foi o disco TSR.

Este, porém, apresentou maior rugosidade e menor molhabilidade. De acordo

com o comentado anteriormente e com a literatura, este disco poderia até

apresentar maior proliferação celular, mas para isso ele deveria ter também

uma alta molhabilidade e rugosidade. Isso não foi verificado para este disco.

Comparando os resultados da microdureza com a quantidade de

células. Verificasse uma relação indireta entre estes, uma vez que o maior

número de células ocorreu para os discos de maior dureza. Sendo a dureza

uma medida indireta do grau de tensão residual do material confirma-se mais

uma vez que a tensão residual é fator influente na proliferação celular.

Para o material tratado termicamente não houve grandes variações nos

níveis de tensões, uma vez que o material recebido se encontrava no estado

recozido. Mais uma vez percebe-se a influência da tensão residual sobre a

proliferação celular, ao constatar que as três condições com baixos níveis de

tensão apresentaram valores baixos e próximos.

Considerações finais

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

73

Com base nas observações realizadas nesse trabalho, pode-se inferir

que o estado de tensão residual do material seja o mais importante fator a

influenciar a proliferação celular. Verificou-se que para materiais com altos

níveis de tensão (material temperado) houve maior proliferação que nos

materiais com níveis de tensão inferiores (materiais revenidos).

A amostra ST foi a que apresentou maior molhabilidade (menor ângulo

de contato). Vários trabalhos na literatura (Kasemo, 1993; Kasemo2002)

relacionam uma maior molhabilidade de uma superfície com uma maior

proliferação celular, uma vez que superfícies com essas características

possuem um contato mais intimo com o liquido biológico, o que proporciona

uma maior interação com as proteínas e, conseqüentemente, com as células.

Esperava-se, portanto, que essa amostra apresentasse maior proliferação

celular. Isso não foi verificado indicando que outros fatores são mais influentes.

Quanto à rugosidade o disco que apresentou maior rugosidade foi o

TSR. Alguns autores defendem que esta propriedade é de forte influência na

proliferação de células ósseas (Davies, 1998; Anselme, 2000; Carvalho, 2001).

Outros trabalhos, no entanto, mostram que tanto a molhabidade quanto a

rugosidade influenciam diretamente na resposta à cultura de células

osteoblásticas, uma vez que estas estão relacionadas (Rupp, 2004). Assim o

disco que deveria ter apresentado maior quantidade de células seria o disco o

ST, que apresenta alta rugosidade e alta molhabilidade, no entanto o número

de células foi o menor.

O disco que apresentou maior quantidade de células foi o disco TSR.

Este, porém, apresentou maior rugosidade e menor molhabilidade. De acordo

com o comentado anteriormente e com a literatura, este disco poderia até

apresentar maior proliferação celular, mas para isso ele deveria ter além de

uma alta rugosidade uma alta molhabilidade. Isso não foi verificado para este

disco.

Com isso reforça-se então o indicativo de que deve haver outro fator

além de molhabilidade e rugosidade a influenciar a resposta de células

osteoblásticas quando estas são cultivadas sobre a superfície de biomateriais,

no caso deste trabalho o titânio.

Considerações finais

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

74

Comparando os resultados da microdureza com o número de células.

Verifica-se uma relação indireta entre estes, uma vez que o maior número de

células ocorreu para os discos de maior dureza. Sendo a dureza uma medida

indireta do grau de tensão residual do material confirma-se mais uma vez que a

tensão residual é fator influente na proliferação celular, uma vez que para o

material tratado termicamente não houve grandes variações nos níveis de

tensões, pois, o material recebido se encontrava no estado recozido. Mais uma

vez percebe-se a influência da tensão residual sobre a proliferação celular, ao

constatar que as três condições com baixos níveis de tensão apresentaram

valores baixos e próximos.

Baseado no que foi proposto e realizado neste trabalho, bem como

através da avaliação dos resultados obtidos pode-se concluir que:

1. Os tratamentos térmicos realizados modificaram as propriedades de

molhabilidade, rugosidade e dureza, influenciando na proliferação

celular.

2. A proliferação celular foi maior nos discos temperados e nos revenidos

que nos disco apenas com tratamento térmico e não tratados, ou seja, a

proliferação celular foi maior nos discos que apresentaram maior estado

de tensão residual.

3. Não foi observado qualquer organização celular preferencial influenciada

pela microestrutura.

Referências Bibliográficas

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

75

Albrektsson, T. Surface roughness of intraoral dental implant fixtures.

Dent. Implantol. Update, v.9, n.10, p.73-77, 1998.

Alves JR, C.; Guerra Neto, C. L. B.; Morais, G. H. S.; Silva, C.F. ; Hajek, V.

Nitriding of titanium disks and industrial dental implants using hollow

cathode discharge. Surface and Coatings Technology, 194 (2) (2005) 196-202

Amarante, E. S.; Lima, l. A. de. Otimização das superfícies dosimplantes:

plasma de titânio e jateamento com areia condicionado por ácido – estado

atual. Pesqui Odonto Bras. 15 (2), p.166-173, 2001.

American Society for Testing and Materias. Standard recommended practice

for surface preparation and marking of metallic surgical implants.

Philadelphia, ASTM. 2000 (ASTM Standard F 67 - 95).

Anselme, K.; Bigerelle, M. Modelling approach in cell/material interactions

studies. Biomaterials. V.27, p.1187-1199, 2006.

Anselme, K.; Bigerelle, M.; Noel, B.; Dufresne, E.; Judas, D.; Iost, A.; Hardouin,

P. Qualitative and quantitative study of human osteoblast adhesion on

materials with various surface roughnesses. J. Biomed. Mat. Res., v.49, n.2,

p.155-166, 2000.

ASM Handbook. Metallography and Microstructures. V.9.

Baier R.E.; Meyer, A.E.; Implant surface preparation. Int. J. Maxillofac. Impl.,

v.3, n.1, p.9-20, 1988

Baier R.E.; Meyer, A.E.; Natiella, J.R.; Natiella, R.R.; Carter, J.M. Surface

properties determining bioahesive outcome: methods and results. J.

Biomed. Mater. Res., v.18, n.4, p. 337-355, 1984

Black, J. Biological Performance of Materials. Fundamentals of

Biocompatibility, 2ed., Maecel Dekker, New York, 1992

Bowers, K.T.; Keller, J.C.; Randolph, B.A.; Wick, D.G.; Michaels, C.M.

Optimization of surface micromorphology for enhanced osteoblast

responses in vitro. Int. J. Oral Maxillofac. Implants, v.7, n.3, p.302-310, 1992.

Brooks, C. R., Heat treatment, Structure and properties of Nonferrours

alloys, ASM, 1982.

Brunnete, D. M. effects of implants surface topography on the

behavior of cells. Int J Oral Maxillofacial and Implants. V.3, p.231-246,1988.

Referências Bibliográficas

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

76

Carvalho, P.S.P.; Paleckis, L.G.P.; Mendes, V.C.; Bassi, A.P.F. Fundamentos

da implantodontia – Basis of implantology. 3i Innovations Journal, v.5, n.2,

p.06-13, 2001.

Callister, Jr. W. D. Ciência e Engenharia de Materiais: Uma Introdução.

Tradução Soares, S. M. S., 2002. Rio de Janeiro.

Castellani, R.; de Ruijter, J.E.; Renggli, H.; Jansen, J.A. Response of rat bone

marrow cells to differently roughened titanium discs. Clin. Oral Impl. Res.,

v.10, n.5, p.369-378, 1999.

Collings, E. W.. The Physical Metallurgy of titanium Alloys. Ohio: American

Society for Metals. Metals Park,. p.261, 1984.

Cooper, L.F.; Masuda ,T.; Yliheikkila, P.K.; Felton, D.A. Generalizations

regarding the process and phenomenon of osseointegration. Part II. In

vitro studies. Int. J. Oral Maxillofac. Implants, v.13, n.2, p.163-174, 1998.

Costa, T.H.C., Feitor, M.C., Alves JR., C., Freire, P.B., Bezerra, C.M., “Effects

of gás composition during plasma modification of polyester fabrics”.

Journal of Materials Processing Technology, v. 173, pp. 40–43, 2006.

Davies, J.E. Mechanisms of endosseous integration. Int. J. Prosthodont.,

v.11, n.5, 1998.

Den Braber, E.T.; De Ruijter, J.E.; Smits, H.T.J., Ginsel, L.A.; Von Recum, A.F.;

Jansen, J.A. Effect of parallel surface microgooves and surface energy on

cell growth. J. Biomed. Mater. Res., v.29, n.4, p.511-518, 1995.

Donachie, M. J. Titanium and Titanium alloys. 1st Edition. Ohio: Source Book

ASM Metals Park, 1982. Section 1: Overview. p.3–15 editor. Biocompatibility of

clinical implant materials, vol. I. Boca

Eisenbarth, E.; Linez, P.; Biehl, V.; Velten, D.; Breme, J.; Hildebrand, H. F. Cell

orientacion and cytoskeleton organization on ground titanium surface.

Biomaterials Engineering, v. 19, p.233-237, 2002.

Eisenbarth, E.; Velten, D.; Meuser, K. S.; Linez, P.; Biehl, V.; Duschner, H.;

Breme, J.; Hildebrand, H. Interactions between cells and titanium surfaces.

Biomolecular Engineering, v.19, p. 243-249, 2002.

Ellingsen, J.E. Surface configurations of dental implants. Periodontol. 2000,

v.17, p.36-46, 1998.

Ferreira, J. P. M. Tensão Superficial sua Natureza e Efeitos, Quimica-

Boletim da SPQ, v.93, p. 43-48, 2004.

Referências Bibliográficas

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

77

Flower, H. M.. Microstructural Development in Ralation to Hot Working of

Titanium Alloys. Materials Science and Techonology, London, v. 6; n 11, p.

1082 – 1092, Nov. 1990.

Gitto, C.A.; Plata, W.G.; Schaaf, N.G. Evaluation of the peri-implant

epithelial tissue of percutaneous implant abutments supporting

maxillofacial prostheses. Int. J. Oral Maxillofac. Implants, v.9, n.2, p.197-206,

1994.

Helmus, M.N; Tweden, K.S; Harasaki, H.; Jones, M.; Blevitt, J.M.; Craig, W.S.;

Pierschbacher, M.: Accelerated healing of cardiovasculas textiles promoted

by na RGD peptide, J Heart Valve Dis, 90-97, 1995.

Hobkirk, J.A.; Watson, R.M. Color Atlas and Texto f Dental and MAxillofacial

Implantology. St. Louis, Mosby, 1995, 204 pages. ISBN, ilustrated in color.

Inoue, T.; Cox, J.E.; Pilliar, R.M., Melcher, A.H. Effect of the surface

geometry of smooth and porous coated titanium alloy on the orientation

of fibroblasts in vitro. J. Biomed. Mater. Res., v.21, n.1, p.107-126, 1987.;

B. Kasemo, J. Lausmaa, Osseointegration in Oral Rehabilitation, 1993.

Kasemo, B. Biological surface science. Surface Science, Volume 500, Issues

1-3, 10 March 2002, Pages 656-677

Keller, J.C.; Stanford, C.M.; Wightman, J.P.; Draughn, R.A.; Zaharias, R.

Characterization of titanium implant surfaces. III. J. Biomed. Mater. Res.,

v.28, n.8, p.939-946, 1994.

Kieswetter, K.; Schwartz, Z.; Dean, D.D.; Boyan, B.D. The role of implant

surface characteristics in the healing of bone. Crit. Rev. Oral Biol. Med., v.7,

n.4, p.329-345, 1996.

Kohn, H. D. & Ducheyne, P. Medical and Dental Materials. In: Williams D.R

Eds., VCH, Weinheim., v. 14, p. 30-109,1992.

Kwok, D. Y.; Neumann, A. W.; Contate Angle interpretation in terms of solid

surface tension. Colloids and Surface A: Physicochemical and Engineering

Aspects, v.161, p. 31-48, 2000.

Lampin, M.; Warocquier-Clerout, R.; Legris, C.; Degrange, M.; Sigot-Luizard,

M.F. Correlation between substratum roughness and wettability, cell

adhesion and cell migration. J. Biomed. Mater. Res., v.36, n.1, p.99-108,

1997.

Referências Bibliográficas

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

78

Liu, X., Chu, P., Ding, C. Surface modification of titanium alloys, and

related materials for biomedical apllications, Materials Science and

Engineering, v.47, pp. 49-121, 2004.

Macdonald, D. E.; Deo, N.; Markovic, B.; Stranick, M.; Somasundaran, P.

Adsorption and dissolution behavior of human plasma bronectin on

thermally and chemically modi.ed titanium dioxide particles. Biomaterials

2002;23:1269–79.

Mello, G. M. R. Transformação de fases e caracteristicas microestruturais

de ligas Ti-Al e Ti-Nb. 2002, 136f Dissertação (Mestrado em Engenharia

Mecânica) Programa de Pós Graduação em Engenharia Mecânica,

Universidade Estadual de Campinas. Campinas.

Michaels, C.M.; Keller, J.C.; Stanford, C.M.; Solursh, M. In vitro cell

attachment of osteoblast-like cells to titanium. J. Dent. Res., v.68, p.276,

1989.

Moreira, M. F.; Lebrão, S. M. G. Tratamentos térmicos dos aços. Disponivel

em: http://www.dalmolim.com.br/educaçãomateriais/biblimat/tratterm2.

Acessado em 19/03/2008.

Murray, J. L., Bennet, L. H., Baker, H. Binary Alloy Phase Diagrams.

American Society for Metals. Metals Park, Ohio, v. 1, p.173 – 176, 1986.

Murray, J. L., Bennet, L. H., Baker, H. Binary Alloy Phase Diagrams.

American Society for Metals. Metals Park, Ohio, v. 2, p.1699 – 1703,1986.

Nicholas D. Spencer, Marcus Textor. Surface Modification, Suface Analysis

and Biomaterials. Disponivel em:

http://www.textorgroup.ch/pdf/publications/journals/22/Spencer_MatDay_1998.p

df. Acessado em 07/12/2006.

Ong, J.L.; Prince, C.W.; Raikar, G.N.; Lucas, L.C. Effect of surface

topography of titanium on surface chemistry and cellular response. Impl.

Dent., v.5, n.2, p.83-88, 1996.

Park, J.Y.; Davies, J.E. Red blood cell and platelet interactions with

titanium implant surfaces. Clin. Oral Implants Res., v.11, n.6, p.530-539,

2000.

Park, J.Y.; Gemmell, C.H.; Davies, J.E. Platelet interactions with titanium:

modulation of platelet activity by surface topography. Biomaterials, v.22,

n.19, p.2671-2682, 2001.

Referências Bibliográficas

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

79

Phillips, R.W. Skinner’s Science of Dental Materials, WB Saunders,

Phladelphia, 1991.

Pinto, G. R. R. Caracterização de ligas à base de titânio com adição de Nb, Zr,

Pd para finalidades biomédicas. 2005, 81f Dissertação (Mestrado em Ciências

e Engenharia Metalúrgica e de Materiais) Programa de Pós Graduação em

Engenharia, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro.

Puleo, D. A.; Nanci, A. Understanding and controlling the bone–implant

interface. Biomaterials 20, 2311–2321, 1999.

Rack, H. J.; Qazi, J. I., Titanium alloys for biomedical applications,

Materials Science & Engineering, v. 26, p.1269-1277, 2006.

Rich, A.; Harris, A.K. Anomalous preferences of cultured macrophages for

hydrophobic and roughned substrata. J. Cell. Sci., v.50, p.1-7, 1981.;

Rosa A. L.; Beloti, M. M. Effect of cp Ti surface roughness on human bone

marrow cell attachment, proliferation, and differentiation. Braz Dent J.14,

v.1, p.16-21, 2003.

Rupp, F.; Scheideler, L.; Rehbein, D. et al. Roughness induced dynamic

changes of wettability of acid etched titanium implant modifications.

Biomaterials. 25, 1429-38, 2004.

Santos Jr., A. R; Wada, M. L. F. Polímeros biorreabsorvíveis como

substrato para cultura de células e engenharia tecidual. Polímeros: Ciência

e tecnologia, v. 17, n° 4, p. 308-317, 2007.

Santos, L. C. O.; Matlakhova; Matlakhov, A.N.; Toledo, R. 17º CBECIMat -

Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais, 15 a 19 de

Novembro de 2006, Foz do Iguaçu, PR, Brasil.

Schneider, G.; Burridge, K. Formation of focal adhesions by osteoblasts

adhering to different substrata. Exp Cell Res. 214, 264–269, 1994.

Schwartz, Z. & Boyan, B.D. Underlying mechanisms at the bone-biomaterial

interface. J. Cell Biochem., v.56, n.3, p.340-347, 1994.

Silva, M. A. M.; Martinelli, A. E.; Alves JR, C.; Nascimento, R. M.; Távora, M. P.;

VILAR, C. D.. Surface modification of Ti implants by plasma oxidation in

hollow cathode discharge Surface & Coatings Technology 20, 612 – 620,

2005.

Sykaras, N.; Iacopino, A.M.; Marker, V.A.; Triplett, R.G.; Woody, R.D. Implant

materials, designs, and surface topographies: Their effect on

Referências Bibliográficas

Haroldo Reis Alves de Macêdo, Agosto/2008

80

osseointegration. A literature review. Int. J. Oral Maxillofac. Implants, v.15,

n.5, p.675-690, 2000.

Taborelli, M.; Jobin, M.; Francois, P.; Vaudaux, P.; Tonetti, M.; Szmukler-

Moncler, S.; Simpson, J.P.; Descouts, P. Influence of surface treatments

developed for oral implants on the physical and biological properties of

titanium. (I) surface characterization. Clin. Oral Implants Res., v.8, n.3, p.208-

216, 1997.

Thomas, K.A.; Cook, S.D. An evaluation of variables influencing implant

fixation by direct bone apposition. J. Biomed. Mater. Res., v.19, n.8, p.875-

901, 1985.

Trota Filho, J. Modificação superficial de titânio para produção de

implantes. 2007, 120f Dissertação (Mestrado em Ciência e Engenharia de

Materiais) Programa de Pós Graduação em Engenharia, Universidade Federal

do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro.

Uitto, V.J.; Larjava, H.; Peltonen, J.; Brunette, D.M. Expression of fibronectin

and integrins in cultured periodontal ligament epithelial cells. J. Dent.

Res., v.71, n.5, p.1203-1211, 1992.

Williams JL, Iannotti JP, Ham A, Bleuit J, Chen JH. Efects of fluid shear

stress on bone cells. Biorheology; 31:163,70, 1994.

Xavier SP, Carvalho PSP, Beloti MM, Rosa AL. Response of rat bone marrow

cells to commercially pure titanium submitted to different surface

treatments. J Dent, v. 31, p.173–80, 2003.

Xuanyong L.; Paul K. C.; Chuanxian D. Surface modification of titanium,

titanium alloys, and related materials for biomedical applications. Materials

Science and Engineering. 47, 49–121, 2004.

Zhu, X.; Chen, J.; Sheneideler, L.; Reichl, R.; Gerstorfer, J. G. Effects of

topography and composition of titanium surface oxides on osteoblast

responses. Biomaterials. V.25, p.4087-4103, 2004.