Upload
eynnad07
View
12
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
0I
UFRN
Dissertao de Mestrado
A PRODUO DO MOBILIRIO URBANO EM ESPAOS PBLICOS
O Desenho do Mobilirio Urbano nos Projetos de Reordenamento das Orlas do Rio Grande do Norte
________________________
Glielson Nepomuceno Montenegro
PPGAU
Natal, RN, Brasil
2005
A PRODUO DO MOBILIRIO URBANO EM ESPAOS PBLICOS
O Desenho do Mobilirio Urbano nos Projetos de Reordenamento das Orlas do Rio Grande do Norte
______________________ por
Glielson Nepomuceno Montenegro
Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e
Urbanismo, rea de Concentrao em Urbanizao Projetos e Polticas Fsico-Territoriais, da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN, RN), como requisito para obteno do grau de Mestre em
Arquitetura e Urbanismo.
PPGAU
Natal, RN, Brasil
2005
2
Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Tecnologia
Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo
A Comisso Examinadora, abaixo assinada, aprova Dissertao de Mestrado
A PRODUO DO MOBILIRIO URBANO EM ESPAOS PBLICOS
O Desenho do Mobilirio Urbano nos Projetos de Reordenamento das Orlas do Rio Grande do Norte
elaborada por
Glielson Nepomuceno Montenegro
Como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo
COMISSO EXAMINADORA:
Marcelo Bezerra de Melo Tinoco (Presidente/Orientador)
Andr Menezes Marques das Neves
Maria Dulce Pican Bentes Sobrinha
Natal, 07 de Desembro de 2005
3
2005 Todos os direitos autorais reservados a Glielson Nepomuceno Montenegro. A reproduo de partes ou do todo deste trabalho s poder ser feita com autorizao por escrito do autor. Endereo: Rua Joo da Mata, 723, no 723, Centro, Campina gRande, PB, 58100-630 Fone (0xx) 83 33214174; End. Eletr: [email protected]
4
DEDICATRIA
Dedico este trabalho ao meu amigo de todas as horas, companheiro para somar e dividir e parceiro na alegria e na tristeza, na sade e na doena, no estresse e na paz, Heraldo do Nascimento Melo
5
AGRADECIMENTOS
Sinceros agradecimentos , Andr Neves Arruda Sales Carla Melo Carla Patrcia - Cludio Barros Dulce Bentes Franoise Valery Francisco Lemos Grace Sampaio Helena Guedes Inalza Almeida Joca Guedes Lenilda Melo Levi Galdino - Luiz Vidal Gomes Marconi Frana Marcelo Tinoco Maria Lcia Janurio Nat Morais Newton Stamford Pedro de Lima Srgio Oliveira - Snia Marques Shirley Leite Tnia Lcia Montenegro Thayza Stamford Thatiana Stamford Vilma Victor Zez Gomes Zezita Melo
6
SUMRIO
RESUMO ................................................................................................... XVI
ABSTRACT ............................................................................................... XVII
INTRODUO ......................................................................................... 18
Definio do Tema Problema investigado ............................................. 18
Objetivos ................................................................................................... 24
Hiptese ..................................................................................................... 26
1 CAPTULO 1 Consideraes Tericas .............................................. 29
Desenho Industrial ..................................................................................... 29
Mobilirio Urbano ..................................................................................... 30
Espaos Urbanos Pblicos ........................................................................ 51
Imagem Urbana e Percepo Ambiental ................................................... 56
2 CAPTULO 2 Orlas Martimas no Brasil: Ocupao e
Interveno Urbanstica .........................................................................
72
O Projeto Orla do Governo Federal .......................................................... 77
O Rio Grande do Norte e os Planos Tursticos: A Ao Zona Costeira e
Plo das Dunas ..........................................................................................
79
3 CAPTULO 3 Definio dos Procedimentos e Tcnicas para
Coleta de Dados .......................................................................................
85
Compreenso e Identificao do Contexto Analisado ............................. 85
Procedimentos Anlise do Ambiente Urbano e Definio da rea de
Estudo ........................................................................................................
85
Abordagem dos Locais a serem Revitalizados .......................................... 86
Anlise do Mobilirio Urbano nas Orlas Martimas ................................ 87
Classificao do Mobilirio Urbano de acordo com sua Definio de
Funcionalidade ..........................................................................................
88
Anlise do Mobilirio Urbano proposto para o Projeto de
Reordenamento das Orlas Martimas do Rio Grande do Norte ................
91
Delimitao do Mobilirio Urbano para Anlise ...................................... 92
7
Categorias para anlise da Paisagem Urbana das Orlas ............................ 92
Critrios para anlise do Mobilirio Urbano ............................................. 93
4 CAPTULO 4 Anlise das Orlas do Rio Grande do Norte e dos
Processos de Interveno ........................................................................
95
Praia de Ponta Negra Aspectos Gerais ...................................................
Praia da Redinha Aspectos Gerais .........................................................
95
126
Praias de Cotovelo e Pirangi do Norte Aspectos Gerais ........................ 140
Barra de Cunha Aspectos Gerais .......................................................... 156
Concluso das Anlises ............................................................................. 174
5 CONSIDERAES FINAIS ................................................................. 178
Das Contribuies do Desenho Industrial ................................................ 183
6 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ................................................. 186
8
LISTA DE FIGURAS FIGURA 01 - A e B - mesmo elemento o caju utilizado para identificar cidades e contextos bem distintos, o que demonstra o carter emprico deste tipo de projeto de criao ..........................................................................................047
FIGURA 02 - homogenizao e padronizao dos costumes e das construes, independentemente das caractersticas e do contexto local como clima, entorno, hbitos, smbolos e cultura ..................................................................................058
FIGURA 03 - cabine telefnica ...........................................................................066
FIGURA 04 - poste com iluminao direcional .................................................066
FIGURA 05 - nesta estao foram usados ladrilhos para o revestimento, uma vez que este o material de construo predominante naquela rea .........................070
FIGURA 06 - lminas de basalto com incrustaes de vidro gravado com fragmentos da obra de Kurt Schwitters Z A de 1922, em homenagem a contribuio do autor a uma editora das cercanias, formam a estrutura deste abrigo....................................................................................................................070
FIGURA 07 - o sistema de transporte pblico de Curitiba/PR e o cone da cidade: os modernos tubos transparentes e funcionais ....................................................071
FIGURA 08 - mapa dos municpios tursticos do Eixo Costeiro do Rio Grande do Norte (s/escala), destacando-se os municpios e a localizao das orlas analisadas neste trabalho ......................................................................................................084
FIGURA 09 - mapa de localizao do bairro de Ponta Negra em relao aos demais bairros da cidade de Natal (s/escala) .......................................................096
FIGURA 10 - localizao da Praia de Ponta Negra (linha cheia em vermelho) (s/escala)...............................................................................................................096
FIGURA 11 - A - desorganizao e favelizao da praia; B a falta de espao para os banhistas .................................................................................................099
9
FIGURA 12 - A barreiras circulao dos banhistas; B orla de Ponta Negra aps a remoo das barracas ...............................................................................099
FIGURA 13 - A - a cara nova de Ponta Negra aps a interveno; B - nova infra-estrutura voltada para o turismo e o lazer ..................................................100
FIGURA 14 - proposta para a Av. Erivan Frana ...............................................106
FIGURA 15 - solues para os postes de iluminao pblica e lixeira ..............107
FIGURA 16 - proposta para barracas na faixa de areia ......................................107
FIGURA 17 - mapa de Interveno da Orla de Ponta Negra ..............................109
FIGURA 18 - A cadeiras, mesas e outros apetrechos amontoam-se pela areia e pelo calado de Ponta Negra; B apropriao das estruturas pblicas do local para comercializao de produtos diversos .........................................................110 FIGURA 19 - A quiosque do calado: falta de espao e planejamento; B degradao da infra-estrutura da orla ...............................................................................111 FIGURA 20 - mudanas estruturais e morfolgicas alteram a silhueta da orla e do bairro de Ponta Negra ..........................................................................................112 FIGURA 21 - varal improvisado para venda de biquines ...................................113
FIGURA 22 - massagistas em ao na orla de ponta Negra contribuindo ainda mais para a desorganizao e o caos instalado na faixa de areia ........................113 FIGURA 23 - coletores de resduos slidos instalados - posicionamento e usos inadequados .........................................................................................................115
FIGURA 24 - A - sanitrios instalados no calado da orla de Ponta Negra; B chuveiro improvisado em barraca na praia para atender os clientes ...................116 FIGURA 25 - assentos em Ponta Negra - apropriao indbita do bem pblico .............................................................................................................................117
10
FIGURA 26 - A: orelho instalado no Calado: equvoco formal, conceitual e de uso; B: interferncia visual na paisagem da orla e repetitividade; C: rudos visuais e inadequao de estruturas comunicacionais na orla ............................................118
FIGURA 27 - mapa de localizao do bairro da Redinha em relao aos demais bairros da cidade de Natal (s/escala) ...................................................................127 FIGURA 28 - A tradicional Clube da Redinha; B antiga Capelinha freqentada pelos pescadores; C Igreja Nossa Senhora dos Navegantes .........130 FIGURA 29 - orla da Redinha - novos equipamentos e novo leiaute melhoraram as condies da praia ...........................................................................................130 FIGURA 30 mapa de Interveno da Orla da Redinha ....................................132 FIGURA 31 - imagem buclica do local criando uma paisagem peculiar ..........133
FIGURA 32 - A - vista panormica de quem chega a Redinha pela balsa; B margem esquerda da chegada pela balsa .............................................................134 FIGURA 33 - A - mapa de localizao do municpio de Parnamirim (s/escala) B
Orla do Municpio de Parnamirim (s/escala) ......................................................143 FIGURA 34 assento improvisado em pedra beira-mar ................................ 145 FIGURA 35 - abrigo para usurios de transporte coletivo ..................................145
FIGURA 36 - orla de Pirangi do Norte ...............................................................147
FIGURA 37 - A - o trapiche d acesso aos barcos; B esgoto a cu aberto nas areias da praia de Pirangi ....................................................................................148 FIGURA 38 - barracas instaladas na praia ..........................................................149 FIGURA 39 - tonis de leo ao longo da faixa de areia .....................................149
11
FIGURA 40 mapa de Interveno da Orla de Cotovelo e Pirangi do Norte ..............................................................................................................................151 FIGURA 41 - A rea problemtica identificada no trecho: problemas de acesso praia devido aos desnveis do terreno, eroso, eixos virios em precrias condies e inexistncia de mobilirio urbano. B planta baixa B1 elevao/ilustrao; B solues propostas para o calado de Cotovelo no Trecho A (imagens s/escala) ...............................................................................152 FIGURA 42 - A situao problemtica identificada no trecho: ausncia de sinalizao para a rea, dificuldade de acesso pblico a praia, presena de obstculos locomoo (batentes, calhas de chuvas, desnveis), inexistncia de mobilirio urbano, faixa da rodovia utilizada como estacionamento, ausncia de equipamentos de apoio ao lazer e reas de sombra. B planta baixa; B1 elevao/ilustrao; B propostas para a rea pblica de Cotovelo (imagens s/ escala) ..................................................................................................................153 FIGURA 43 - A trecho problemtico em questo: inexistncia de mobilirio urbano, precariedade das reas de estacionamento, inadequao das vias para pedestre, ocupao ilegal de terras da marinha, conflitos entre barraqueiros e donos de residncias na praia. B planta baixa; B1 elevao/ilustrao; B solues propostas para o Calado de Pirangi do Norte (imagens s/ escala) ....153 FIGURA 44 - A trecho D e sua situao problemtica: ocupao irregular de terrenos da marinha por barraqueiros e proprietrios de residncias, inexistncia de mobilirio urbano B planta baixa; B1 elevao/ilustrao; B propostas de soluo para a rea pblica de Pirangi do Norte (imagens s/escala) ...................154 FIGURA 45 - mapas de localizao de Barra de Cunha no Municpio de Canguaretama (s/escala) ......................................................................................158 FIGURA 46 - paisagens de Barra de Cunha: A barcos coloridos atracados na enseada do rio e o trapiche; B pequenos catamars para a travessia de automveis e pessoas para a margem oposta do rio ............................................160 FIGURA 47 - passeio a beira do rio e enseada dos barcos; B: passeio pblico e imagem de Nossa Senhora dos Navegantes ........................................................161
12
FIGURA 48 - A inadequao e falta de planejamento na especificao e implantao de coletores na orla; B coletor padronizado implantado ao longo do passeio..................................................................................................................162 FIGURA 49 - A - assento em madeira implantado ao longo do passeio pblico; B assento em alvenaria e madeira: desproporcionalidade ...................................163 FIGURA 50 - contraste entre estruturas dos quiosques dispostas na orla de Cunha: falta de unidade e coerncia formal ......................................................164 FIGURA 51 - A barracas precrias existentes na praia; B os novos quiosques construdos em uma rea da orla ........................................................................165 FIGURA 52 - sinalizao precria e ineficiente, inadequada ao contexto local .165 FIGURA 53 mapa de Interveno no Trecho A da Orla de Barra de Cunha .167 FIGURA 54 - A- via beira-rio, eroso e pedras de conteno; B proposta para o passeio pblico e ciclovia ...................................................................................170 FIGURA 55 - A via beira-rio com o monumento a Nossa Senhora dos Navegantes; B proposta para um deque de contemplao da paisagem ......... 170 FIGURA 56 - A encosta prxima ao futuro Terminal Turstico; B proposta de mirante para o local para relaxamento e contemplao da paisagem .................170
13
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AM Amazonas Av. Avenida BNB Banco do Nordeste do Brasil CET Companhia de Engenharia de Trfego CIRM Comisso Interministerial para os Recursos do Mar DPU/RN Delegacia do Patrimnio da Unio do Rio Grande do Norte EMBRATUR Empresa Brasileira de Turismo ES Esprito Santo ESDI Escola Superior de Desenho Industrial EUA Estados Unidos da Amrica GEAU Grupo de Estudos em Arquitetura e Urbanismo GI-GERCO Grupo de Integrao do Gerenciamento Costeiro GRPU/RN Gerncia Regional do Patrimnio da Unio do Rio Grande do Norte IAB Instituto dos Arquitetos do Brasil IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renovveis IPLANAT Instituto de planejamento Urbano de Natal KM Kilometro MMA Ministrio do Meio Ambiente MP Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto PA Par PE Pernambuco PPGAU Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo PDN Plano Nacional de Desenvolvimento
14
PNGC Programa Nacional de Gerenciamento Costeiro PR Paran PRODETUR/NE Programa de Desenvolvimento Turstico do Nordeste RJ Rio de Janeiro RN Rio Grande do Norte SC Santa Catarina SE Sergipe SEMSUR Secretaria Municipal de Servios Urbanos SEMURB Secretaria do Meio Ambiente e Urbanismo SEPLAN Secretaria de Planejamento do Rio Grande do Norte SETUR Secretaria de Turismo do Estado do Rio Grande do Norte SPU Secretaria do Patrimnio da Unio UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFPE Universidade Federal de Pernambuco UNESCO Organizao das Naes Unidas para Educao, Cincia e Cultura UV Ultra-Violeta
15
RESUMO Dissertao de Mestrado
Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo Universidade Federal do Rio Grande do Norte
A PRODUO DO MOBILIRIO URBANO EM ESPAOS PBLICOS O Desenho do Mobilirio Urbano nos Projetos de Reordenamento das Orlas
do Rio Grande do Norte Autor: Glielson Nepomuceno Montenegro
Orientador: Marcelo Bezerra de Melo Tinoco
Data e Local da Defesa: Natal, 07 de Dezembro de 2005
Este trabalho analisa e avalia o Desenho de Mobilirio Urbano para os espaos
pblicos nos Projetos de Reordenamento da Orlas do Rio Grande do Norte,
estabelecendo relaes entre a paisagem urbana dos espaos pblicos revitalizados
sejam eles de interesse cultural, paisagstico e/ou turstico, e o processo de
interveno do Desenho na configurao do mobilirio urbano implantado
naqueles espaos observando as provveis conseqncias advindas desse processo
em um dado contexto urbano que alteram os usos, funes, as imagens culturais e
os valores sociais atribudos a cada lugar especfico. As percepes ambientais e a
legibilidade dos referenciais culturais dos lugares e sua representao nos
elementos do mobilirio urbano, influenciam positiva ou negativamente os
processos de cognio dos habitantes de um determinado espao revitalizado,
definindo novos usos e atribuies para esses espaos. Os projetos de interveno
urbanstica das orlas tendem padronizao excessiva dos meios tcnicos,
materiais e configuraes, criando espaos cenarizados que segregam os usurios,
impondo equipamentos e novos usos que, consequentemente, acabam criando os
chamados no-lugares e um regionalismo pitoresco. O trabalho est dividido em
6 captulos que tratam respectivamente de: conceituaes tericas (Desenho
Industrial; Mobilirio Urbano; Espaos Urbanos Pblicos; Imagem Urbana e
Percepo Ambiental; Ocupao e Interveno Urbanstica nas Orlas martimas);
dos Procedimentos e Tcnicas para Coleta de Dados; das Anlise das Orlas do Rio
Grande do Norte e dos Processos de Interveno; e das consideraes finais e das
contribuies do Desenho Industrial.
16
ABSTRACT
Dissertao de Mestrado Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
A PRODUO DO MOBILIRIO URBANO EM ESPAOS PBLICOS O Desenho do Mobilirio Urbano nos Projetos de Reordenamento das Orlas
do Rio Grande do Norte By Glielson Nepomuceno Montenegro
Natal, 07 de Dezembro de 2005
This work aims to analyze and evaluate the Urban furniture designed to public
areas according to the Revitalization planning for Rio Grande do Norte coastland,
defining visual relations among urban elements in the landscape of revitalized
public urban areas with cultural, paisagistic and touristic values and the design
process used for developing urban furniture to those areas, observing the
incoming consequences use to that process in a specific urban context which alters
use, functions, cultural images as well as social values attributed to each particular
place. Environmental perceptions, legibility of local cultural references and their
representation through the design of urban elements, act in a positive or negative
manner over the inhabitants cognition process of some particular revitalized area,
determining new use and attributions to those areas. Designs for coastal urban
interventions try excessively to standardize technical media, construction
materials and planning configurations, creating artificial sceneries that segregates
users, imposing new structures and usage, generating, consequently, the so called
non-places and burlesque regionalism. The research is divided into 4 chapters:
1) Theoretical support (Industrial design; Urban furniture; Public urban spaces;
Urban image and environmental perception; Urban occupation and interventions
in coastland areas); 2) Methodological procedures and data collection; 3) Analysis
of Rio Grande do Norte coastal areas and their urban interventions; 4) Final
considerations and Industrial Design contributions to the subject.
17
INTRODUO
Definio do tema Problema investigado
O fenmeno da globalizao com seu paradigma da
inexistncia de barreiras tecnolgicas, materiais, financeiras e sociais e da
internacionalizao da arquitetura o international style derivado do
movimento modernista, deram origem a um ecletismo tal que acabou por
inaugurar uma forma ps-moderna de pensamento, comportamento e urbanismo,
trazendo consigo uma homogeneidade e padronizao culturais: assistimos aos
mesmos filmes, ouvimos as mesmas msicas, almoamos sushi, jantamos no
McDonalds, fazemos compras nos shopping centers, trabalhamos em uma torre
envidraada e climatizada, seja em So Paulo, Nova York, Londres ou Natal.
Ao mesmo tempo em que a padronizao massificou os costumes, surgem
manifestaes contrrias ao processo de homogenizao como forma de resgatar
aquela identidade cultural presente nas diferentes sociedades urbanas atravs de
suas edifcaes, monumentos e no prprio espao pblico.
A partir dessa idia, tiveram incio processos de revitalizao dos centros
tradicionais em algumas capitais brasileiras entre as dcadas de 1970 e 1980,
como o Projeto Corredor Cultural no Rio de Janeiro (1979), o Plano de
Revitalizao do Centro em So Paulo (1976), o tombamento do Pelourinho em
Salvador pela UNESCO (1974), o Plano de Preservao dos Stios Histricos da
Regio Metropolitana do Recife (1976) e o Programa de Preservao e
Revitalizao do Centro Histrico de So Lus (1979). Contudo, somente nos
anos 80 que a grande maioria desses projetos e programas foi realmente
efetivada, tendo sua consolidao acontecida nos anos 90.
Outras capitais do nordeste brasileiro como Joo Pessoa, Natal e Fortaleza,
seguiram o exemplo passando tambm por um processo de revitalizao de suas
reas histricas centrais.
Todavia, o boom da revitalizao nas cidades brasileiras no restringiu-se
apenas aos seus centros histricos, estendendo-se tambm a outros espaos
18
urbanos como por exemplo a rea Porturia do Rio de Janeiro, a orla e
adjacncias de Ipanema e Leblon; Praia de Boa Viagem no Recife, Praia de
Iracema em Fortaleza; Cabedelo e Cabo Branco em Joo Pessoa; Ponta Negra,
Areia Preta, Praia dos Artistas, Praia do Meio e do Forte em Natal. As mudanas
ocorridas nesses espaos tiveram um carter eminentemente turstico na melhoria
das condies de infra-estrutura, segurana, servios e valorizao ambiental
daquelas reas.
O objetivo principal dessas aes o de atrair maiores investimentos por
parte do setor privado, sejam eles nacionais ou estrangeiros, atravs de
empreendimentos que venham gerar emprego, capital, desenvolvimento social e
turstico em algumas reas e, principalmente, lucro.
Nesse aspecto, o Rio Grande do Norte tem atrado ateno de investidores
que j se instalaram na regio, explorando a atividade hoteleira, a carcinocultura, a
fruticultura e a produo de sal. A cidade de Natal desponta no cenrio nacional
como uma das capitais do nordeste com grande potencial turstico devido aos seus
atributos paisagsticos em termos de praias, dunas e rios, alm do aspecto
urbanstico que lhe peculiar com largas avenidas que facilitam os acessos,
variados centros de compras, desenvolvimento do setor da construo civil e um
bom nvel de qualidade de vida.
No final de 1996, comeou-se a discutir as ocupaes irregulares das terras
pblicas da unio em algumas reas que evidenciavam problemas de degradao
ambiental, a exemplo de processos erosivos. Originou-se assim, o grupo Ao
Zona Costeira contando com a participao de rgos federais, municipais e
estaduais tendo como finalidade uma ao conjunta na Zona Costeira. 1
Tiveram incio aes preventivas e corretivas na zona costeira, sendo a
urbanizao de Ponta Negra o primeiro projeto implantando naqueles moldes.
Posteriormente, o Banco do Nordeste articulou reunindo prefeituras,
universidades, Secretaria de Turismo, a criao do plo de discusso do turismo
denominado Plo de Turismo Costa das Dunas, selecionando o litoral oriental do
Rio Grande do Norte para atuao, onde foram desenvolvidos alguns projetos de
urbanizao. 1 Dados obtidos na palestra do Secretario do Patrimnio Regional da Unio Sr. Carlos Jos, no dia 05/06/2003 na sala de aula do PPGAU/UFRN
19
O Plo de Turismo criou Grupos de trabalho: o Grupo de trabalho
Reordenamento da Orla Martima coordenado pelo GRPU, encaminhou projetos
de reordenamento da orla visando a regularizao das terras pblicas. Articulou
prefeituras, Banco do Nordeste, universidade e rgo Estadual do Meio
Ambiente. Em 1998 foi criado o Plano de Ao Federal da Zona Costeira
Brasileira incorporando-se a ele o Projeto Orla. Tiba do Sul foi um dos quatro
municpios brasileiros escolhidos como piloto para teste da metodologia do
Projeto Orla em 2001.
No mbito das aes do Plo, foram desenvolvidos os Projetos dos
municpios de Parnamirim, Canguaretama, Extremoz, Barra de Maxaranguape, a
partir de 2002. A UFRN, atravs do Departamento de Arquitetura
(GEAU/DARQ), participou desse trabalho desenvolvendo os projetos para as
orlas martimas daqueles municpios.
A revitalizao de espaos urbanos pblicos pode ser feita de vrias
maneiras considerando-se os setores envolvidos e tambm suas variveis; dentre
elas podemos citar o tratamento esttico e funcional das fachadas das edificaes,
o mobilirio urbano e tambm os elementos paisagsticos e publicitrios.
Entretanto, o que observamos muitas vezes, a falta de inter-relao entre o
mobilirio, o entorno, a identidade cultural e suas referncias urbanas.
O mobilirio urbano, sendo um conjunto de mveis e utenslios que
compem a paisagem urbana interferindo, participando, facilitando ou
dificultando o acesso e o trnsito das pessoas sendo parte das suas vidas, pode, de
um certo modo, caracterizar ou representar o esprito e/ou o estilo de vida das
cidades atravs de seus smbolos, como tambm pela explorao dos elementos
configuracionais.
Os elementos configuracionais tais como a cor, a textura, a forma e os
materiais, permitem intervenes que aproximem mais o objeto ao usurio,
definindo assim traos da identidade nacional, caractersticas referentes ao clima
local, aos comportamentos, paisagem urbana, enfim ao esprito da localidade,
sem, contudo, haver um comprometimento do planejamento arquitetnico como
acontece atualmente. Integrar o mobilirio urbano ao entorno, uma condio
para que o cidado se sinta valorizado.
20
O Desenho Urbano considera a interao destes fatores no seu processo de
elaborao como um conceito para criar e obter como resultado uma
requalificao do espao pblico oferecendo possibilidades para recriar o coletivo
atravs da incorporao de novos atratores ou ativadores programticos e
espaciais, destinados ao lazer, educao, equipamentos sociais e comrcio,
articulados com o mobilirio urbano e a vegetao paisagsticamente concebidos.
(JUREGUI, 2001, p. 02).
Os projetos de interveno urbanstica priorizam a organizao dos espaos,
seu uso racional, a uniformizao de estruturas, a valorizao da paisagem e o
apelo esttico de algumas reas ou edificaes. Alm disso, preciso analisar as
interaes entre os habitantes e seu ambiente, estabelecendo requisitos e
parmetros que estejam relacionados, direta ou indiretamente, com todo o
processo de revitalizao e desenvolvimento do mobilirio urbano para um
contexto especfico.
Os elementos do mobilirio urbano devem guardar na sua configurao certa
correspondncia, fazendo com que cada um deles seja entendido no apenas como
um objeto especfico, mas como pertencente a uma mesma famlia que contribui
para a sociabilizao do espao pblico e adequa-se as funes e ao contexto
local.
Apesar das intervenes urbansticas determinarem em seus projetos a
incorporao de um tipo especfico de mobilirio urbano, o critrio de seleo
utilizado prioriza muito mais o aspecto esttico do objeto do que qualquer outro.
Paradoxalmente, o Desenhador de mobilirio urbano no dispe de parmetros
metodolgicos claros que possam auxiliar no desenvolvimento desse mobilirio,
recorrendo muitas vezes a adaptaes de metodologias existentes com outra
finalidade distinta.
Este trabalho se prope a contribuir com estudo da configurao adequada
do mobilirio urbano a projetos de interveno urbanstica em espaos urbanos
pblicos dentro de um contexto local especfico, procurando estabelecer diretrizes
que facilitem o desenvolvimento de projetos de mobilirio urbano.
21
Definio do objeto de estudo
As orlas de Ponta Negra e Redinha foram submetidas a
processos de reordenamento e urbanizao de suas orlas, com projetos
especficos, mas que, paradoxalmente, apresentam uma configurao de
elementos urbanos e estruturas padronizadas para contextos diferentes que acabam
criando uma homogenidade visual e funcional, em detrimento das peculiaridades
do entorno e da paisagem.
Para Pirangi do Norte, Cotovelo e Barra de Cunha foram desenvolvidos
projetos que ainda no foram implantados. Os projetos foram desenvolvidos pelo
Grupo de Estudos em Arquitetura e Urbanismo/GEAU do Departamento de
Arquitetura da UFRN, o qual tambm definiu tambm o mobilirio urbano que
dever vir a ser instalado em cada uma das reas revitalizadas, constando de
assentos, coletores para lixo, quiosques, estruturas de iluminao pblica, suporte
para sinalizao vertical, superfcies horizontais para atividades diversas.
Dentre esses mobilirios selecionados, alguns deles foram concebidos por
profissionais, enquanto conceito e estrutura fsica, sendo outros tecnicamente
especificados atravs de catlogos de empresas fabricantes especializadas.
Desse modo, o Desenho do mobilirio urbano especificado nos projetos de
interveno urbanstica das orlas e sua adequao s condies fsico-geogrficas
e polisensoriais dos ambientes tratados, bem como sua validade enquanto objeto
de Desenho Industrial o foco central da anlise desenvolvida nesta pesquisa.
A abordagem deste trabalho ser direcionada a uma anlise das reas de
valor paisagstico e scio-econmico dos espaos pblicos revitalizados no Plano
de Interveno Urbanstica para Reordenamento das Orlas de Pirangi, Cotovelo,
Ponta Negra, Redinha e Barra de Cunha.
Justificativas - Interesse pelo Tema Verificamos a necessidade de uma anlise e avaliao
na concepo de elementos urbanos adequados s suas funes e especificidades
em projetos de interveno urbanstica, como um aspecto-chave na identificao
22
cultural em um determinado contexto social e paisagstico, para o qual o projetista
estabelecer relaes conceituais.
Verificamos que nos ltimos anos h um crescente processo de intervenes
urbansticas em reas centrais e histricas de algumas cidades brasileiras, como
tambm em suas orlas, de modo a funcionarem como novos atratores de recursos
financeiros para as cidades atravs de empreendimentos de grande porte. Alm
disso, esses processos procuram valorizar as caractersticas da paisagem e da
cultura local como forma de resgatar aquela identidade cultural presente nos
edifcios, monumentos e no prprio espao urbano pblico.
Entretanto, observa-se que o sistema de mobilirio urbano destinado e
implantado apresentam-se como soluo pontual que nem sempre atendem s
necessidades dos usurios daqueles locais, apesar de ser um fator importante para
dinamizao dessas reas urbanizadas, j que funcionam como elementos de
sensibilizao e usos dos espaos urbanos.
Na maioria das vezes isto acontece devido a falta de informaes,
conhecimentos no apenas de base tcnica mas tambm scio-cultural, histrico,
urbano e cognitivo e suas inter-relaes com o ambiente e a paisagem, por queles
que projetam esses sistemas de mobilirio urbano devido escassez de material
sobre o tema.
Academicamente, observa-se que os futuros Desenhadores se interessam por
esta rea do conhecimento profissional em vista dos processos de interveno
urbansticas que acontecem atualmente, desenvolvendo projetos de concluso de
curso que versam sobre o assunto e que necessitam de orientao especfica que
lhes fornea a base de conhecimento necessrio para atuarem com profissionais
neste campo.
A padronizao de sistemas de objetos e ambientes urbanos visam
organizao e esttica, trazendo consigo o perigo da homogeneidade cultural, ou
seja, alguns elementos do mobilirio urbano instalados em Ponta Negra, Redinha
e Praia dos Artistas, passam a ser os mesmos tendo uma linguagem nica e
universal que no caracteriza cultura alguma em local algum.
Planejar e desenvolver o Desenho do mobilirio urbano mais adequado a um
determinado contexto enfatizando suas caractersticas nicas, justifica-se como
23
uma maneira para se criar uma identificao do usurio com o objeto, e
conseqentemente uma valorizao cultural mais forte e nica.
Portanto, a coerncia, contemporaneidade e abordagem desse trabalho
relacionado ao estudo e anlise das interaes entre o Desenho do mobilirio
urbano, os usurios e o entorno, poder contribuir academicamente para a
compreenso e desenvolvimento de projetos de mobilirio urbano mais adequados
aos usos e funes em orlas reurbanizadas.
.
Contribuio da pesquisa O pouco material bibliogrfico disponvel sobre
diretrizes metodolgicas e de planejamento especficos para o desenvolvimento de
mobilirio urbano torna ainda mais difcil os projetos desses produtos, conduzindo
a resultados equivocados comprometidos apenas com o aspecto esttico-
decorativo do resultado final.
A definio de diretrizes bsicas que possam auxiliar no desenvolvimento de
projetos mais adequados s necessidades de um dado contexto social e
paisagstico, demonstra a importncia desse estudo na definio de conceitos que
possibilitem a tomada de decises na criao, desenvolvimento e implantao do
mobilirio urbano segundo projetos de interveno especficos.
Objetivos
Objetivo Geral Com este trabalho objetivamos analisar os aspectos
configuracionais do Desenho do mobilirio urbano especificado para as reas
revitalizadas do plano de reordenamento da orla do Rio Grande do Norte e sua
adequao aos locais onde sero instalados, as relaes scios-culturais existentes,
usos e funes, paisagem, percepo ambiental e imagens urbanas associadas ao
contexto e seus habitantes.
Facilitar o desenvolvimento e a compreenso dos assuntos aqui tratados
relacionados aos processos de interveno urbanstica contemporneos, espaos
urbanos pblicos, Desenho de mobilirio urbano e referncias culturais,
procurando-se estabelecer as complexas relaes existentes entre estas
24
conceituaes e os fatores de ordem scio-econmicos, culturais, histricos,
arquitetnicos, paisagsticos e humanos, envolvidos em tais processos.
Assim so discutidas as temticas que tratam das conceituaes tericas
concernentes a mobilirio urbano, aspectos culturais e simblicos no uso e nos
comportamentos sociais relativos aos processos de reordenamento e urbanizao
de orlas, bem como sua relao com os espaos urbanos e seus usurios.
Objetivos Secundrios
Analisar as propostas de reordenamento desenvolvidas para o Projeto Orla Cotovelo, Pirangi, Ponta Negra, Redinha e Barra de Cunha no que se
refere ao Desenho do mobilirio urbano proposto para essas reas;
Analisar os aspectos envolvidos ao planejamento e determinao de caractersticas urbanas relacionadas ao desenvolvimento de mobilirio
urbano em consonncia ao projeto arquitetnico de revitalizao de
espaos pblicos que derivam das contribuies do Desenho Industrial;
Levantar conceitos atravs de informaes visuais leitura urbana que possam conduzir a uma caracterizao simblica dos elementos urbanos
que fazem parte do contexto da cultura local das reas revitalizadas,
relacionando aqueles conceitos aos princpios do Desenho Industrial;
Estabelecer relaes metodolgicas entre o processo do Desenho de produtos e o processo de desenvolvimento de projetos de revitalizao de
espaos urbanos pblicos, procurando determinar pontos convergentes que
conduzam ao estabelecimento de parmetros projetuais;
Aprofundar os conhecimentos relativos ao planejamento e desenvolvimento de mobilirio urbano mais adequado aos usos, funes e
necessidades em projetos de revitalizao de espaos urbanos pblicos;
Estabelecer uma interface de interao entre os processos projetuais aplicados ao Desenho e as intervenes urbansticas, contribuindo para a
realizao de estudos mais aprofundados neste campo de atuao de
Desenhadores e arquitetos-urbanistas.
25
Hiptese Partindo-se da hiptese principal de que o Desenho de
mobilirio urbano padronizado e implantado em reas de orlas que possuem
caractersticas ambientais, paisagsticas, scio-culturais e econmicas
diferentes, acaba gerando uma descaracterizao e mau uso dos espaos
revitalizados, j que no conseguem estabelecer uma interface entre o
produto, as necessidades dos usurios e as caractersticas do local, em vista
da configurao inadequada do elemento urbano no contexto onde est
inserido.
Questiona-se, portanto, como fatores de ordem scio-cultural, paisagstica e
histrico-arquitetnica influenciam nos processos de revitalizao de
determinados espaos urbanos - sejam eles stios histricos ou no -, que so tidos
como reas de interesse pblico que promovem o desenvolvimento econmico-
financeiro e urbano em um dado local, e qual o papel do Desenho Industrial em
meio a essas relaes?
Deste modo, faz-se necessria a definio de trs conceitos fundamentais
para o entendimento e desenvolvimento deste estudo, levantando questionamentos
a respeito dos processos de revitalizao de espaos livres pblicos, desenho de
mobilirio urbano e percepo ambiental. Entende-se, contudo, que os inter-
relacionamentos entre estes conceitos e suas ramificaes apresentam-se como um
processo complexo, que impe ateno e aprofundamento.
Neste trabalho so abordadas as conceituaes tericas referentes aos
processos de interveno urbanstica em espaos urbanos pblicos, o Desenho de
mobilirio urbano, mais especificamente relacionados aos projetos de
reordenamento e urbanizao das orlas do Rio Grande do Norte, como tambm as
percepes ambientais e imagens urbanas, baseados nos escritos de estudiosos e
pesquisadores das reas de urbanismo, sociologia, teoria do Desenho Industrial,
histria do urbanismo e da arquitetura, teoria da arquitetura, que englobam os
campos de estudo relativos anlise ambiental, legibilidade, imagens culturais,
desenho urbano e configurao de produtos industriais.
A primeira parte da pesquisa estabelece as teorias de referncia sobre as
quais o trabalho se apia, enunciando os atributos essenciais que sero utilizados
26
sob a luz de estudiosos e pesquisadores dos temas abordados, que tratam das
teorias da conceituao do Desenho Industrial, do Mobilirio Urbano, dos
Espaos Urbanos Pblicos, os processos de ocupao e desenvolvimento das
Orlas no Brasil e os conseqentes processos de interveno ocorridos nas orlas,
dentro de uma perspectiva econmica-social voltada para o turismo e o lazer.
O Captulo 1 trata das Consideraes Tericas sobre a definio dos termos
abordados na pesquisa, relativos ao Desenho Industrial, a origem do termo,
implicaes scio-culturais e tecnolgicas na utilizao de diferentes
terminologias e estrangeirismos voltados atuao profissional; ao Mobilirio
Urbano, suas terminologias, caractersticas funcionais e culturais dentro da
sociedade urbana, sua relao com os espaos da cidade, os usurios e o Desenho
Industrial; aos espaos urbanos pblicos, conceituao, caractersticas funcionais
e culturais, aspectos sociais dos espaos urbanos e seu desenvolvimento.
As teorias referentes a Percepo Ambiental, Imagens Urbanas e
Referenciais Culturais Urbanos so ainda tratados neste captulo, analisando-se os
trabalhos desenvolvidos por Ferrara (1999/2000), Lynch (1997), Pallamin (2000),
Cullen (1983) e Lerner (2003), como tambm a teoria do Regionalismo Crtico de
Frampton (1997) e suas inter-relaes com o Desenho de mobilirio urbano e os
processos de interveno urbanstica.
Na segunda parte do trabalho realizou-se um levantamento das orlas
reordenadas e reurbanizadas das praias de Ponta Negra, Redinha, Pirangi do
Norte, Cotovelo e Barra de Cunha e dos projetos do mobilirio urbano definidos
e implantados naqueles locais especficos.
Os processos de ocupao e interveno urbanstica das orlas no Brasil,
especificamente no Rio Grande do Norte, so tratados no Captulo 2, buscando-se
informaes que conduzam a compreenso do desenvolvimento das orlas e suas
conseqncias nos dias atuais em relao aos usos e funes destinadas quelas
reas de interesse turstico.
Os procedimentos metodolgicos e as tcnicas utilizadas para o
desenvolvimento da pesquisa de campo, para a anlise das orlas estudadas, dos
projetos de reordenamento e desenvolvimento das propostas de mobilirio urbano,
baseados nos trabalhos de Ferrara (1999), Mourth (1998), Serra (2000), Lynch
27
(1997), Tinco (2003), no Manual para implantao de mobilirio urbano na
cidade do Rio de Janeiro (1996) e no Roteiro metodolgico para classificao da
orla do MMA (2001), encontram-se definidos no Captulo 3.
O Captulo 4 trata das Anlises Gerais sobre as orlas estudadas, suas
caractersticas, aspectos paisagsticos, usos, mobilirio urbano, conflitos sociais e
ambientais, desenvolvimento turstico e os projetos de reordenamento executados
e propostos para queles espaos urbanos, bem como os elementos de mobilirio
urbano definido para cada rea urbanizada e suas implicaes projetuais,
paisagsticas, scio-culturais e funcionais sob a luz do Desenho Industrial.
O ltimo Captulo trata das Consideraes Finais e das contribuies do
Desenho Industrial no apenas aos processos de interveno urbana, mas para a
sociedade como um todo.
28
CAPTULO 1
Consideraes Tericas
Desenho Industrial Para o desenvolvimento deste estudo adotaremos o
conceito de Desenho Industrial/Desenho, para a ao de projetar, desenhando
produtos industriais, e Desenhista para o ator, o sujeito das aes intelecto-
criativas expressionais/projetuais, no apenas operacionais, apesar de estas serem
de fundamental importncia para a realizao, produo e fabricao da obra do
desenhador.
A adoo desse tipo de conceituao procura seguir a idia elaborada por
Gomes (1996), uma vez que acreditamos ser a terminologia adequada para definir
a atividade profissional responsvel pela concepo, desenvolvimento,
detalhamento e otimizao de produtos industriais para a cultura material da
sociedade ps-industrial.
O termo Desenho pode ser inserido em diversas reas da atuao
profissional, vindo a expresso geralmente acompanhada de outro termo para
designar mais especificamente a qual rea do conhecimento estamos nos
referenciando. Portanto, podemos ter o Desenho de vesturio, Desenho de
calados, Desenho de jias, Desenho de eletro-eletrnicos, Desenho grfico,
Desenho de embalagens, entre tantos outros.
Utilizaremos o termo Desenho de Mobilirio Urbano, sempre que
necessrio, para nos referir quela rea de estudo responsvel pela concepo e
desenvolvimento de artefatos direcionados a oferecer comodidade e conforto aos
cidados da urbe, prioritariamente os pedestres, e que compem o ambiente
construdo onde se acham inseridos, sendo parte do desenho urbano das cidades,
interagindo com seus usurios e com o contexto scio-cultural e ambiental.
Apesar das vrias conotaes atribudas ao Desenho nos ltimos anos tais
como linguagem, inovao, qualidade, configurao, e at atitude,
compreendemos que ele pode englobar tais classificaes dependendo das
29
diversas situaes onde utilizado, contudo sua denotao permanece a mesma ao
longo do tempo, adequando-se quela ou esta contextura.
Mobilirio Urbano Mobilirio urbano ou Elementos urbanos? No
Dicionrio de Urbanismo, Ferrari (2004: 240), levanta os seguintes aspectos:
Mobilirio urbano (urban furniture, mobilier urbain, mobilaje urbana). Conjunto de elemento materiais localizados em logradouros pblicos ou em locais visveis desses logradouros e que complementam as funes urbanas de habitar, trabalhar, recrear e circular: cabinas telefnicas, anncios, idealizaes horizontal, vertical e area; postes, torres, hidrantes, abrigos e pontos de parada de nibus, bebedouros, sanitrios pblicos, monumentos, chafarizes, fontes luminosas etc
A definio nos leva a um nvel mais compreensvel daquilo que seria o
mobilirio urbano, apesar de no deixar claro o que viria a ser idealizaes
horizontais, verticais e areas assim com tambm torres.
Segundo o Manual para Implantao de Mobilirio Urbano na cidade do
Rio de Janeiro (1996: 11), mobilirio urbano a coleo de artefatos
implantados no espao pblico da cidade, de natureza utilitria ou de interesse
urbanstico, paisagstico, simblico ou cultural.
Entretanto, essa conceituao ainda no define exatamente o termo
mobilirio, considerando mais o valor utilitrio dos objetos do que propriamente
suas funes intrnsecas de uso, esttica e simblica, dando margens a
interpretaes superficiais sobre o papel desempenhado por estes objetos e sua
importncia para a urbe.
De acordo com o Manual de Procedimentos para Interveno em Praas
(2002: 55), da Prefeitura Municipal do Recife,
A expresso mobilirio designa, de modo anlogo ao conjunto de mveis utilizados no interior de um edifcio, os objetos que, no espao pblico, se destinam a oferecer comodidade e conforto aos
30
habitantes, notadamente o pedestre, complementando desse modo, o ambiente construdo no qual esto inseridos.
Esta definio apresenta alguns conceitos que parecem agravar ainda mais a
compreenso das funes e atribuies daqueles objetos urbanos, associando-os
ao mobilirio domstico como sofs, mesas e cadeiras, que oferecem conforto e
comodidade queles que os utilizam.
Diferentemente do mobilirio domstico, o mobilirio urbano no
adquirido pelo cidado, ele apenas faz uso deste, sendo necessrio que se
estabelea uma compreenso do que seja o objeto urbano em questo, j que esse
entendimento ajudar o cidado a utiliza-lo de modo mais adequado, tirando
proveito das suas funes.
Todavia, o prprio manual lista uma srie de objetos que prioritariamente
no so utilizados em espaos interiores, como por exemplos postes, telefones
pblicos, brinquedos para parques e praas, e vasos de grandes dimenses.
Outro aspecto do mobilirio urbano diz respeito comodidade e ao conforto
dos usurios. Porm nem sempre tais objetos so utilizavis pelos habitantes das
cidades como o caso das esculturas, postes, placas de sinalizao de
logradouros, guarda-corpo e floreiras, j que estes objetos urbanos possuem
funes especficas intangveis que vo da esttica simblica satisfazendo os
desejos e aspiraes dos cidados relacionados contemplao do belo, como as
esculturas e as floreiras; e necessidades funcionais de localizao e segurana
como as placas de sinalizao e guarda-corpo.
O fato de considerar esses produtos como um complemento do ambiente
construdo, contraria sua origem, uma vez que foram concebidos a partir das
necessidades decorrentes dos processos de urbanizao que requeriam, por sua
vez, a implantao de novos servios pblicos que atendessem as demandas dos
habitantes das crescentes cidades nos finais do sculo XIX e incio do XX, como
iluminao pblica, servio de limpeza urbana, transporte pblico coletivo etc.
O desenvolvimento desses objetos urbanos adquire um grau de importncia
dentro dos projetos de interveno urbanstica dos espaos urbanos pblicos na
31
medida em que representam um fator de valorizao no uso do espao pblico,
atravs da prestao de servios, atendimento de necessidades e desempenho de
funes especficas.
Creus em Serra (2000: 06) argumenta que,
(...)Aunque el trmino mobilirio urbano es el ms extendido y usado, nunca me ha parecido muy correcto. Se h traducido de uma forma demasiado literal del francs Mobilier urbain o del ingls urban furniture, aunque no se ha cado em la tentacin de traducir del italiano arredo urbano (arredare=decorar). Es precisamente la idea de amueblar o decorar la ciudad la que considero errnea y que creo lleva a confusin. Son ideas de antao cuando el amueblamiento urbano de um urbanismo clasista y, por lo tnato, la ornamentacin de la ciudad estaba muy ligada a la urbanizacin siendo los muebles la respuesta a unas necessidades urbanas muy elementales. Hoy em dia las ciudades son otras, el urbanismo es uma ciencia pluridisciplinar y el hecho urbano es de uma mayor complejidad. No parece lgico pensar que cada vez que colocamos un banco o una farola, estamos decorando la ciudad. Si en cambio es lgico y adecuado adornar la ciudad para festejar um acontecimiento cvico o social o para celebrar unas fiestas, pero son ocasiones especiales, temporales, extraordinarias.
Me gustara poder contribuir a arraigar de forma ms universal y comprensible el trmino Elementos urbanos. Son objetos que se utilizan y se integran en el paisaje urbano, y deben ser comprensibles para el ciudadano. Uso, integracin y comprensin son pues conceptos bsicos para la valoracin de todo el conjunto de objetos que encontramos em los espacios pblicos de la ciudad.
A definio de Elementos urbanos oferecida por Creus (2000) engloba
uma conceituao mais ampla, fazendo referncia ao uso e a integrao daqueles
objetos com a paisagem urbana. Levanta tambm a questo do ponto de vista do
cidado sobre compreenso desses artefatos, j que a partir da descoberta das
funes desempenhadas pelos elementos2 urbanos nos espaos pblicos, que
ocorre uma valorizao no uso do conjunto desses objetos em um dado contexto
urbano.
2 O termo elemento refere-se, neste trabalho, a uma pea especfica que faz parte do conjunto de mobilirio urbano como, por exemplo, o elemento assento que poder ser um banco ou uma cadeira. N.A.
32
Por conseguinte, o elemento urbano seria parte integrante de algo maior
chamado cidade, j que h muito faz parte da sua estrutura e vem acompanhando
sua evoluo no desenvolvimento urbano, seja atravs da adequao de seus usos,
seja na insero de novas funes, seja na alterao da sua configurao, estrutura
ou no emprego de materiais e tecnologias inovadoras na sua fabricao.
O autor explica ainda que a idia de mobiliar a urbe no aplicvel per si
s, pois a complexidade urbana das cidades com suas variadas nuances de
habitantes e demandas por servios, lazer, trabalho entre outras atividades,
adquiriu uma perspectiva muito diferente daquela das cidades de fins do sculo
XIX e incio dos XX.
Tinco (2003: 43-46), explica que mesmo em documentos oficiais, como as
vrias legislaes vigentes no Municpio de So Paulo3, as definies e
classificaes transformam, Equipamentos Urbanos em Mobilirio Urbano,
fazendo uso indiscriminado dos termos. Tambm possvel encontrar bibliografia
especializada livros, catlogos, peridicos -, que comumente utilizam os termos
citados, independentemente de sua funo, configurao ou contexto onde se
encontra inserido.
O mobilirio urbano instalado nos espaos pblicos com o propsito de
oferecer servios especficos, possuindo usos e funes diferenciados que vo
surgindo paralelamente, de acordo com as novas necessidades de seus cidados
tais como o descanso, a comunicao, a limpeza, a limitao e ordenao dos
espaos para pedestres, entre outros.
Da mesma forma que outros produtos, o mobilirio urbano possui uma vida
til e precisa de manuteno. A verificao das condies de resistncia,
acabamento e qualidade dos elementos urbanos pelos usurios, podem determinar
o nvel de prestao de servios oferecidos pelo poder pblico bem como o tipo de
gesto pblica praticada para as cidades.
3 Leis n 9.413/12-1981 que dispe sobre o parcelamento do solo do Municpio; 9.803/12-1984 dispe sobre a obrigatoriedade do rebaixamento de guias, caladas e canteiros centrais; 10.305/04-1987 autoriza a Companhia de Engenharia de Trfego CET a promover a instalao de equipamentos urbanos; 10.135/04-1987 dispe sobre a limpeza pblica do Municpio; 12.849/05-1999 dispe sobre a instalao de mobilirio urbano no Municpio de So Paulo (TINOCO, 2003)
33
Portanto, levar em conta tais fatores na hora do Desenho desses produtos,
significa oferecer tambm uma boa prestao de servios, j que, prioritariamente,
so destinados aos cidados, que os utiliza para realizar algum tipo de atividade.
Os elementos urbanos apareceram nas ruas das nossas cidades por razes
que, de certo modo, encontravam-se atreladas aos fatores econmicos, sociais e
tambm estticos de um determinado conceito histrico-filosfico da sociedade. A
medida que as cidades mudavam, o mobilirio acompanhava tais mudanas tanto
em termos configuracionais, tecnolgicos, funcionais, qualitativos e quantitativos,
tornando-se parte indissolvel da urbe, influenciando, por sua vez, as atitudes dos
seus usurios.
A ecloso da Revoluo Industrial na Inglaterra no incio do sculo XVIII e
as inovaes tecnolgicas que atingiram sua indstria metalrgica, facilitaram a
produo de artefatos em ferro fundido como chapas, escadas e fachadas de lojas
e residncias, e tambm de elementos urbanos tais como coretos, estaturia, fontes
e postes de iluminao. Alguns desses elementos passaram a ser importados para
mobiliar algumas cidades no Brasil, em seus processos de urbanizao,
importando-se, posteriormente, as tcnicas e as tecnologias para a produo local
de ferro fundido, em meados do sculo XIX.
A partir das mudanas sociais, dos costumes e dos processos de modernizao das cidades, outras peas do mobilirio urbano passaram a ser introduzidas devido as emergentes necessidades sociais urbanas e tcnicas,
destacando-se a criao das praas pblicas que vieram representar um papel de
destaque para socializao urbana.
O desenvolvimento do mobilirio urbano encontra-se atrelado ao
desenvolvimento das cidades, incorporando alm da sua funo prtica
primordial, o carter esttico, atravs dos planos urbanos de embelezamento de
cidades como Paris, Londres, Buenos Aires e Rio de Janeiro.
Os fabricantes de artefatos em ferro fundido para o embelezamento das
cidades, como a Macfarlane & Cos uma das grandes fundies escocesas no
sculo XIX estabelecida em Glasgow, produziam postes, mictrios, fachadas para
escolas e orfanatos, coretos, entre tantos outros produtos, dos quais alguns
34
exemplares podem ainda ser encontrados em algumas cidades brasileiras como
Belm/PA, Manaus/AM e Olinda/PE, sendo instalados nas vias das cidades que
se modernizavam.
O mobilirio urbano passa a ser implantado em praas pblicas, principalmente naquelas onde havia uma grande concentrao de edificaes
pblicas monumentais, como o Teatro Santa Isabel em Recife, o Largo do Teatro
em Salvador, e a Avenida Central no Rio de Janeiro que recebiam iluminao
gs, coreto, fontes e estaturia, funcionando como atrativos para o passeio pblico
e sua contemplao.
Em um primeiro momento, as praas passam a ser sinnimo de lazer e
descanso onde possvel encontrar chafarizes, esttuas e marcos que caracterizam
alguns locais e tambm a cidade, sendo posteriormente instalados outros
elementos como bancos, iluminao e coretos. O mobilirio do sculo XIX
concebido em uma poca em que o tempo de observao e contemplao dos
monumentos pela populao ressaltava sua importncia como elementos de animao do espao pblico. (PREFEITURA MUNICIPAL DO RIO DE
JANEIRO, 1996: 68).
Com a chegada da Famlia Real em 1808, foram feitos investimentos
pblicos e o Rio passa por uma total transformao, ganhando melhoramentos
como calamento de ruas, pontes e chafarizes e desenvolvimento da iluminao
pblica feita com azeite de peixe.
Uma nova orientao na forma de concepo da arquitetura e do espao
urbano com relao ao saneamento das habitaes e das cidades, assim como os
princpios de isolao e aerao de seus cmodos, foi dada com a vinda da Misso
Artstica Francesa ao Brasil em 1816, composta por tcnicos e artistas que viriam
implantar a arte neoclssica oficial, dotando a cidade de ruas largas, praas e
edifcios monumentais.
A intensificao da urbanizao e a importao direta de costumes da Europa desenvolvida, contriburam substancialmente para alterar a vida brasileira, recm-egressa de uma realidade colonial, onde o
35
convvio social ocorria, somente, por ocasio de eventos de carter religioso. (SILVA, 1987: 103)
A partir de 1891 a rede de energia eltrica foi implantada nas principais ruas,
juntamente com a ferrovia e o bonde, contribuindo para a expanso da cidade
alm dos seus limites coloniais. As cidades iluminam-se noite, sendo
incorporados novos comportamentos.
O desenvolvimento tecnolgico do sistema de fornecimento de energia e os
melhoramentos das lmpadas, facilitaram e baratearam os custos de implantao
da iluminao pblica, e os postes passam a fazer parte da paisagem das grandes
cidades, sendo inclusive a primeira iniciativa de ordenar os elementos urbanos.
Diante de tantas modificaes scio-culturais, econmicas, tecnolgicas e
urbanas, e das crescentes necessidades da populao urbana, surgiram e se
multiplicaram os servios, aparecendo ento os passeios pblicos e as novas
praas que, alm de embelezar as cidades, eram a demonstrao das mudanas
essenciais que ocorriam na vida e costumes brasileiros.
Entretanto, o aumento da prestao dos servios pblicos que foram
instalados para atender s demandas sociais, exigiam equipamentos no
disponveis em quantidade suficiente no pas para suprir os anseios de
modernizao da sociedade de ento, pois a produo industrial quela poca
praticamente inexistia e toda a cultura local se fundamentava no trabalho manual.
Portanto, os produtos e componentes de ferro industrializados importados vieram
suprir essa deficincia, sendo utilizado na implantao do mobilirio urbano no
pas.
Dentro dessa nova estrutura urbana, alguns elementos tais como: coretos,
bancos de praa, postes de iluminao gs, portes, bebedouros, banheiros
pblicos, torres para relgios, gradis, passaram a ser instalados e a fazer parte do
cotidiano dos cidados da nova sociedade brasileira de costumes e hbitos europeus, incorporados s praas do sculo XIX, que serviam de elemento agregador de atividades diversas como o lazer, a contemplao, a conversa ou o
descanso.
36
O desenho de alguns equipamentos urbanos permaneceu quase que
inalterado durante as primeiras dcadas do sculo XX, tanto em termos materiais
quanto formais. Certamente a formao cultural dos paisagistas europeus que
vieram ao Brasil como planejadores e projetistas responsveis pelo
embelezamento de praas, ruas, avenidas e jardins, influenciou diretamente nas
formas e no uso do material tecnologicamente vivel e acessvel quele contexto
histrico para o mobilirio urbano: o ferro fundido.
Some-se a isso, o padro esttico-cultural vigente quela poca quando
imperava o estilo ecltico e o gosto ingls e francs. Alm disso, quase a
totalidade do mobilirio urbano que era implantado nas cidades brasileiras era
fabricado na Europa principalmente na Inglaterra e Frana sendo importado
por rgos pblicos do pas.
Como afirma Robba e Macdo (2003:55),
A dominao cultural e econmica da Frana e da Inglaterra nesse perodo notvel, e o desejo da nao brasileira de transformar-se em um pas imagem e semelhana de seus parceiros comerciais europeus faz com que a vinda desses paisagistas para executar jardins urbanos fosse urgente e bem aceita. A maioria das principais cidades brasileiras recebeu, na virada do sculo, projetos de praas ajardinadas, parques e jardins eclticos, concebidos por paisagistas europeus ou maneira dos jardins franceses e ingleses.
O mobilirio at ento produzido, possua um carter decorativo, detentor de
um apelo esttico elevado, j que se tratava de um objeto que deveria simbolizar a
modernidade daquele perodo decorando a cidade, embelezando-a e servindo aos
propsitos elitistas da classe dominante de ento.
Mas as cidades cresceram bastante devido as atividades fabris mecanizadas,
atraindo para si toda sorte de trabalhadores que viam nelas uma forma de melhorar
de vida. Enquanto as cidades cresciam, tambm cresciam os cortios e com eles, a
deteriorao da qualidade de vida nesses locais, tornando-se uma situao
insustentvel, que provocou reaes contra os horrores da cidade encortiada.
37
Assim, a suburbanizao passou a ser vista como uma soluo vivel ao problema do cortio. Novas casas, novas fbricas, foram construdas em sua periferia. Novas tecnologias do transporte o bonde eltrico, o trem eltrico de interligao com o centro, o metr, o nibus permitiram que esse processo de suburbanizao se concretizasse. (HALL, 1988: 57)
A popularizao dos automveis e o aparecimento dos subrbios, trouxe
consigo a implantao de malhas virias e rede de infra-estrutura para transporte
coletivo. O urbanismo e a arquitetura propuseram ento um novo modelo de
cidade privilegiando o transporte virio em detrimento dos pedestres, com seus
edifcios de linhas despojadas e arrojadas construdos com a tecnologia mais
avanada para a poca, dando incio, a era do modernismo.
O transporte coletivo passou a ter um papel fundamental nesse processo
sendo ento elaborados planos de expanso de linhas de bondes e ferrovias
subterrneas e elevadas.
A eletrificao dos bondes viabilizou a urbanizao de reas das cidades at
ento distantes, fazendo com que fossem construdas novas cidades-satlites ao
redor dessas linhas. O transporte pblico urbano em So Paulo na dcada de 1950
j era o meio mais utilizado pelos trabalhadores para seu deslocamento, e os
abrigos para os usurios protegerem-se do sol ou da chuva eram raros.
Grandes mudanas ocorreram na vida urbana com a consolidao do modo
de produo industrial no incio do sculo XX. A populao urbana aumentava
devido migrao do campo para as cidades e o desenvolvimento dos avanos
tecnolgicos afetaram as relaes sociais e econmicas. As cidades comeavam a
alterar sua estrutura e morfologia promovendo intervenes urbansticas que se
adaptassem as novas demandas que o crescimento urbano e os novos modelos de
produo industrial exigiam.
As teorias modernas de urbanismo tiveram como cerne a setorizao da cidade, isto , a cidade moderna deveria ser organizada em setores com usos especficos, que atendessem s suas necessidades funcionais. Segundo a Carta de Atenas (1933) um clssico manifesto urbanstico modernista -, a cidade ideal deveria atender a quatro funes bsicas e distintas: habitao, trabalho, circulao e lazer. (ROBBA e MACEDO, 2003: 95)
38
Esta nova postura urbanstica influenciou as idias de espaos urbanos
pblicos, alterando seu conceito de utilizao. Se nos sculos XVIII e XIX os
parques, praas e passeios representavam o local para a contemplao, o flerte, as
discusses polticas e as aparies sociais, nas dcadas iniciais do sculo XX eles
passam a ser a opo de lazer para a maioria dos habitantes urbanos, j que agora
se tornava mais difcil e longnquo o convvio com a natureza nos arrabaldes e nos
campos.
Na dcada de 1930 nas grandes cidades brasileiras, expressiva parcela dos
trabalhadores urbanos e suas famlias no tinham condies financeiras para
deixar a cidade em direo aos balnerios e associaes privadas, passando a
utilizar-se dos espaos livres pblicos para seu lazer em finais de semana. Desta
maneira, a prtica de esportes, principalmente os coletivos, e a recreao infantil,
vieram desempenhar um papel importante na convivncia social urbana, sendo os
espaos urbanos pblicos os locais ideais para a realizao de passeios e
piqueniques em praas, praias e parques.
Diante dessa nova percepo urbana de lazer e convivncia social, o
mobilirio urbano adquiriu outras caractersticas, incorporando novas funes e
tipologias, surgindo tambm outros equipamentos que at ento no existiam
por no haver uma demanda social e da prestao de servio urbano -, que
passaram a fazer parte do cotidiano dos habitantes da cidade, como as estaes
para transporte coletivo urbano, as cabines telefnicas individuais, os brinquedos
para recreao infantil e esportiva, os coletores de lixo, entre outros.
Diferentemente do ecletismo que promovia na praa o hbito de se flanar4,
as praas modernas tm como proposta fundamental o lazer ativo que objetivava a
permanncia dos freqentadores nos espaos que so criados para serem usados.
O mobilirio urbano assume outra caracterstica formal, buscando explorar as
linhas simplificadas e a pureza das formas geomtricas fazendo uso de outros
materiais que no apenas o ferro fundido na sua fabricao.
Somente a partir dos anos 30 com mudanas significativas na arquitetura o
modernismo e a simplificao formal das construes, os elementos urbanos
4 Flanar: (fr flaner) vint Passear ociosamente; vadiar (MICHAELIS, 1998: 966)
39
sofrem outras influncias e passam a adaptar-se ao novo estilo das edificaes,
incorporando tambm outro material na sua configurao: o concreto armado. Na
praa modernista, o mobilirio limitado a bancos de concreto, algumas vezes
moldados na prpria obra; ou de madeira, a partir de um projeto especfico; e aos
postes de iluminao.
Adquirindo um carter mais funcionalista do que propriamente esttico ou
decorativo, o mobilirio procura, desse modo, incorporar-se paisagem e
contexto modernos, como se fosse parte dele. Assim, o mobilirio urbano
implantado reduz-se a estruturas geomtricas sem adornos que acompanham o
traado da praa. O surgimento do consumismo, o desenvolvimento da
publicidade e do marketing levam esses equipamentos a assumirem uma nova
funo urbana, sendo vistos e utilizados como suportes para comunicao das
massas. As praas modernistas no pas adquiriram um carter tipicamente
brasileiro, especialmente devido obra do paisagista Burle Marx na utilizao de
espcies vegetais nacionais.
Aps a 2a. Guerra Mundial, com o aparecimento de novas tecnologias de
fabricao e novos materiais nos anos 50, o mobilirio urbano assumiu novas
configuraes, novos materiais e novas funes, que permitiram a fabricao e a
rpida difuso de produtos para o uso cotidiano.
A pesquisa tecnolgica e a utilizao dos metais leves, como as ligas de alumnio e magnsio, e dos polmeros saram da esfera blica e se integraram ao cotidiano, pois passaram a ser empregados nos produtos industriais. A matria plstica, devido sua capacidade de modelagem e facilidade de produo, tornou-se um dos mais importantes elementos na confeco de produtos de uso dirio, permitindo infinitas possibilidades de variao formal, de acabamento e de cor. (MORAES, 1997: 43)
Materiais como o alumnio, o ao e o plstico passam a ser usados na
produo do mobilirio urbano, adaptando-se tambm s formas retilneas das
novas edificaes e sua arquitetura modernista sem adornos.
O grande fluxo de automveis e a reduo das reas verdes para recreao,
como tambm a preocupao em manter as crianas fora dos perigos das ruas,
40
foram o principal motivo na criao de parques que pudessem proporcionar lazer,
diverso para elas e segurana para os pais. Os playgrounds5 surgiram no Brasil
nos anos de 1940 sendo encontrados em clubes, escolas e grmios, passando a ser
largamente implantados em espaos livres pblicos a partir da segunda metade do
sculo.
Com a metropolizao das cidades a partir dos anos 1960, as reas centrais
tornaram-se o ponto de circulao de pedestres e automveis, j que muitas
pessoas moravam e trabalhavam no centro, ou prximo a ele, e aqueles que
moravam em bairros afastados tinham que cruza-lo de um modo ou de outro; seja
para apanhar um transporte coletivo que os levasse a diferentes destinos, seja para
realizar alguma atividade.
O congestionamento das reas centrais e o alto fluxo de pedestres, levaram o
poder pblico a pensar em solues que pudessem preservar a integridade fsica
de seus habitantes, culminando no final dos anos de 1970 com a criao dos
famosos calades.
Os calades foram idealizados como um espao para a circulao e o lazer
dos pedestres, configurado pelas edificaes do entorno fazendo com que
houvesse uma revitalizao de algumas vias centrais, a valorizao do patrimnio
arquitetnico e da paisagem, como tambm o restabelecimento e crescimento
comercial em alguns setores.
Em um primeiro momento, o mobilirio urbano implantado naqueles locais
tais como bancos, jardineiras, telefones pblicos, floreiras, quiosques diversos e
luminrias, se tornaram um empecilho para o fluxo de pedestres, atrapalhando sua
circulao e deslocamento devido ao nmero excessivo de elementos nas vias.
A observao das atividades e dos usos dados a determinados calades,
assim como as crticas feitas aos projetos, levaram os projetistas a evitar a
implantao desses elementos em grande nmero, desobstruindo o trfego de
pedestres facilitando sua circulao, considerando de modo mais racional os
5 Playground estrangeirismo, palavra de origem inglesa que define um local ou rea especfica destinada a recreao infantil com aparelhos para brincadeiras, jogos e ginstica. N.A.
41
aspectos funcionais e estruturais do elemento proposto para o local, do que apenas
sua funo esttico-decorativo.
As ruas de pedestres foram um marco nas cidades brasileiras nos anos de 1970 e 1980, tornando-se um smbolo de progresso e modernidade. Tanto que vrias cidades de mdio e pequeno porte em todo o pas adotaram a idia, em alguns casos sem a real necessidade de um equipamento urbano desse gnero. (ROBBA e MACEDO, 2003: 136)
Se no incio e meados do sculo XX o espao livre pblico determinava a
atividade e o uso especfico do local e a partir da a implantao do seu
mobilirio, desempenhando o papel de suporte complementar para a
contemplao, o lazer, ou a atividade fsica e recreao; no espao urbano pblico
contemporneo encontramos, alm das funes listadas anteriormente, a atividade
comercial e da prestao de servios com o intuito de atrair o pblico para uma
determinada rea.
Os calades foram implantados em vrias reas centrais de cidades
brasileiras, estendendo-se a idia para outros locais como as orlas martimas, de
lagos e rios, ampliando-se deste modo, os usos e as funes daqueles espaos
pblicos, instalando-se o mobilirio especfico para cada stio de acordo com as
atividades ali realizadas. O mobilirio urbano volta-se ento ao servio da
populao no seu cotidiano, compondo os espaos urbanos nas cidades brasileiras.
Com o crescente desemprego nas grandes cidades, atividades informais
tornaram-se comuns levando a implantao de quiosques para a comercializao e
para a execuo de pequenos servios, voltando a ser uma proposta aceita em
muitos dos programas de planejamento urbano e revitalizao de determinadas
reas das cidades. Uma idia semelhante quela que acontece nos centros de
compras com suas praas de alimentao e servios.
Os programas de atividades dos espaos urbanos pblicos atuais variam de
acordo com cada cidade, cada rea especfica e com as demandas sociais da
populao. Deste modo, pode-se ento definir o tipo de mobilirio urbano a ser
projetado e implantado naqueles locais, levando em considerao aspectos
42
referentes ao entorno, ao tipo de atividade programada, ao clima, ao simbolismo
do local, enfim, aos parmetros scio-culturais e econmicos que envolvem tais
propostas.
O mobilirio urbano vem adquirindo ao longo dos anos uma maior
importncia, pelo papel que desempenham no contexto das cidades modernas
tornando-se parte integrante da vida social cotidiana urbana, fazendo uso de
materiais e tecnologias diversas que influenciam no seu uso.
Como aglutinador de atividades sociais, os elementos urbanos facilitam a
convivncia social e o intercmbio de experincias individuais e coletivas atravs
de suas funes bsicas uso, esttica e simblica -, porm no o fator
determinante no uso de um espao pblico: as condies de manuteno do
mobilirio, a segurana do local, os usos definidos no programa de atividades para
uma determinada rea so tambm alguns fatores que, em conjunto ao mobilirio
urbano, podem revitalizar ou no um espao urbano pblico.
Como afirma Lerner (2003: 47), um terminal de transporte, por exemplo,
no precisa se assemelhar a uma estao rodoviria. Ele tambm pode ser um bom
ponto de encontro.
Observa-se que as mudanas ocorridas no perfil de consumo da populao e
os avanos tecnolgicos acontecidos desde o sculo XIX at os nossos dias,
refletem-se no uso e no desenho do mobilirio urbano atual. Como ele est
inserido em uma determinada contextura scio-cultural-espacial, encontra-se
tambm sujeito s alteraes ou mudanas que ocorram naquele contexto
especfico.
Assim sendo, se a rea onde estiver implantado o mobilirio sofrer
depredaes, abandono ou segregao, ele sofrer mais imediatamente suas
conseqncias devido a sua escala reduzida em relao aos edifcios e
monumentos, degradando-se mais rapidamente; ou seja, ele um dos indicadores
dos processos de gesto e apropriao dos espaos pelos usurios.
Ao longo dos anos, alguns elementos do mobilirio urbano passaram a ser
associados a uma cultura ou localidade especfica, identificando caractersticas
referenciais de um dado contexto dentro da sociedade culturalmente globalizada e
43
massificada, como as cabines telefnicas de Londres, os quiosques de
Montevdeo, as mquinas de venda de jornais de Nova Yorque ou os orelhes no
Brasil.
De acordo com Lima (2001: 01)
O mobilirio urbano seria o conjunto de todos os mveis e utenslios que compem, em conjunto, a paisagem urbana (mesmo que nem sempre to teis e nem sempre to em conjunto assim): latas de lixo, bancos de praa, pontos de nibus, placas de ruas, postes de luz. Coisas de presena mais sutil e mais intensa do que se pensa, porque, como as rvores, esto sempre ao redor, e estamos sempre procura delas. Muito do esprito de uma cidade pode ser entendido a partir de seu mobilirio urbano. Os bancos em pontos de nibus de Los Angeles tm formato meia-cana, para impedir os mendigos dormirem neles. Em San Francisco (sic) os assentos giram em torno de um pino quando no tem ningum sentado. Londres sempre foi lembrada pelas hermticas cabines de telefone vermelhas. Os orelhes do Rio, em Recife tm formato de coco ou berimbau.
Os telefones pblicos no Brasil s tiveram uma soluo efetiva em 1972
quando tcnicos da Companhia Telefnica Brasileira desenvolveram os chamados
orelhes sendo os primeiros instalados na cidade do Rio de Janeiro, tendo uma
boa aceitao por parte do pblico e com a configurao que permanece at os
dias de hoje.
Estes elementos passaram a fazer parte do cotidiano dos brasileiros,
possuindo uma caracterstica peculiar que equivaleria s cabines telefnicas
vermelhas da Inglaterra, assumindo o papel de referncia urbana nas cidades
brasileiras. Verifica-se que em alguns locais os orelhes adquiriram formatos
diferenciados variando de acordo com a representao simblica do lugar, como
por exemplo, forma de coco verde em Recife; caju em Natal; chapu de couro em
Fortaleza; balo de So Joo em Campina Grande; berimbau em Salvador.
Cada idia que se tem a respeito do esprito de uma cidade procura ser
representada nesses elementos evocando atrativos tursticos, festejos locais,
musicalidade ou regionalismo, estabelecendo-se uma associao direta entre
aqueles fatores e as formas relacionadas a eles, que poderiam simbolizar a cultura
local. Portanto, segundo Juregui (2001), essa busca para captar o esprito de cada
44
local atravs da configurao do seu mobilirio urbano, a procura pelo
zeitgeist6.
Segundo Brzek e Massimi (2002: 106),
Wolfgang Goethe poeta e pensador alemo definia Zeitgeist como um conjunto de opinies que dominam um momento especfico da histria e que, sem que ns nos apercebamos de modo inconsciente, determinam o pensamento de todos os que vivem num determinado contexto.
Menos poeticamente, utilizando-nos de uma terminologia prpria da antropologia, podemos falar em cultura contempornea ou cultura do nosso tempo. Tratam-se de conhecimentos, crenas, atitudes, de pessoas que vivem num tempo e num lugar especficos. (2002: 106)
Essa procura pelo zeitgeist urbano, pode ser observada no mobilirio criado
para o Projeto Rio Cidade, onde cada equipe de profissionais recebeu uma
determinada rea para interveno, desenvolvendo um repertrio formal,
definindo novos referenciais urbanos que promovessem uma identidade
paisagstica prpria ao local, buscando estar em sintonia com o bairro da sua
implantao.
A preocupao das equipes era no tentar reproduzir os velhos cones
convencionais e as influncias variavam desde obras modernistas at cones
barcelonenses. O mobilirio implantado em vrios bairros da cidade possui
caractersticas peculiares, apresentando configurao, estrutura, usos, funes e
tratamentos diferenciados para cada caso particular. Portanto, os equipamentos
neste caso especfico - assumem tambm o papel de referenciais urbanos ligados
diretamente paisagem e seu contexto local, sendo parte integrante dela.
Esse tipo de abordagem, relaciona-se quilo que Kenneth Frampton (1997)
denominou de Regionalismo Crtico, ou seja,
6 O Longman Dictionary of Contemporary English assim define o termo: the general spirit of a period in history, as shown in peoples ideas and beliefs (o esprito geral de um perodo na histria, como demonstrado nas idias e crenas das pessoas) Traduo nossa. (1986: 1279)
45
distancia-se da modernizao como um fim em si mesmo, sem deixar de valorizar aspectos progressistas do movimento moderno; coloca maior nfase no stio do que na obra arquitetnica como um fato isolado; valoriza fatores de condicionamento impostos pelo lugar, no como limites de finalizao, mas como de inicio de um espao a ser criado, delimitados por estes (luz topografia materiais clima); toma elementos vernculos e os interpreta como elementos separados dentro da totalidade; a criao de uma cultura universal baseada no regional. (ARTUSA, 1997: 04)
As referncias urbanas esto presentes no cotidiano das cidades, seja na
memria de seus habitantes, seja numa estrutura qualquer, seja nos costumes e
hbitos locais, mesmo quando ocorrem transformaes na paisagem, na
reorganizao dos vrios setores de atividade que compem a cidade como um
organismo vivo. Procurar fazer uma associao ou analogia direta entre
determinados elementos e o mobilirio urbano, criando um novo cone na cidade
seria uma tentativa positiva na busca pela captao de seu genius loci7.
Como afirma Lerner (2003: 83-84),
identidade, auto-estima, sentimento de pertencer, tudo tem a ver com os pontos de referncia que uma pessoa possui em relao sua cidade. (...) Tudo isso pode parecer nostlgico, mas no se apaga. E quando no existe? Fabrica-se? No, vai-se buscar. Alguma coisa que vai resgatar um momento e alavancar outros.
Outro aspecto que deve ser levado em considerao est associado a
superficialidade projetual com a qual tratado o Desenho de mobilirio urbano.
Essa superficialidade pode criar distores no entendimento do conceito de genius
loci, j que esse tipo de equipamento poderia ser instalado em qualquer cidade ou
paisagem, fazendo com que as referncias urbanas de um determinado contexto
sejam confundidas com as de outro.
Limita-se o desenvolvimento ou especificao do mobilirio urbano
associaes diretas com referncias artificiais criadas a partir de interesses
7 Genius loci esprito do lugar. Esta expresso est relacionada a Teoria do Regionalismo Crtico que baseia-se na busca de uma arquitetura ecologicamente e esteticamente bem projetadas, no aspecto crtico no uso dos materiais locais para a construo, na busca da identidade ou esprito do lugar, na crtica produo massificada e homogeneizao do capitalismo globalizante.
46
publicitrios ou de marketing cenarizao de lugares -, que no representam a
imagem scio-cultural e as vivncias de seus cidados em relao quele contexto
e local especfico.
A multiplicidade formal de uma mesma estrutura de mobilirio urbano
destinada a uma funo especfica, mais uma associao formal e decorativa do
que propriamente simblica. Alm disso, a funo esttica de alguns desses
produtos sobrepe-se aos aspectos funcionais e de uso comprometendo seu
desempenho, negligenciando-se parmetros relacionados ao clima, material,
manuteno, acstica, contexto paisagstico e cultural, entre outros.
Como exemplo ilustrativo deste tipo de abordagem, destacamos os orelhes
em formato de caju (fig. 01) que coincidentemente so encontrados tanto na
cidade de Natal quanto de Aracaju; ou os contentores plsticos para lixo que
podem ser encontrados em vrias cidades brasileiras, alterando-se apenas a
colorao deles de acordo com a cidade onde se encontram: azuis em Recife,
vermelhos em Salvador, verdes em Campina Grande, laranja em Natal.
A alterao da configurao de um orelho atribuindo-lhe o formato de um
caju pode no ser a proposta mais adequada para simbolizar o esprito de um dado
local, at porque os telefones pblicos podem ser instalados em stios onde no
exista relao direta ou indireta com o fruto.
A Caju/Barra de Cunha/RN B Caju/Aracuaj/SE
Fig. 01: A e B - mesmo elemento o caju utilizado para identificar cidades e contextos bem distintos, o que demonstra o carter emprico deste tipo de projeto de criao. Fonte: http://www.geocities.com/thetropics/cabana/2831/cur01.htm Fotos: Mitsuoki Suwabe
47