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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais, realizada sob a orientação científica da Mestre Ana Isabel dos Santos Figueiredo Pinto e coorientação do Doutor Daniel Marcos

Dissertação - run.unl.pt‡ÃO MM 29SE… · Mas não podemos deixar de agradecer, desde logo, aos nossos orientadores. À professora Ana Pinto pelas aulas de Metodologias de Investigação

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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção 

do grau de Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais, realizada sob a 

orientação científica da Mestre Ana Isabel dos Santos Figueiredo Pinto e 

coorientação do Doutor Daniel Marcos 

   

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À memória do meu pai, Henrique Martins  A quem devo o gosto pelo estudo 

 

 

   

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“Where you sit really does influence what you see” 

Christopher Hill, The Changing Politics of Foreign Policy 

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AGRADECIMENTOS 

Nunca estamos  verdadeiramente  sós quando empreendemos um novo passo 

na vida. Temos os que nos inspiram, os que nos incentivam e aqueles que nos apoiam. 

Todos eles são importantes, cada um à sua maneira, cada um no seu momento. Foi o 

caso na elaboração desta tese, objetivo há muito desejado. 

Os que nos  inspiram com o  seu exemplo deixam  sementes. A nossa primeira 

inspiração  esteve  na  casa  dos  pais,  em  que  se  cultivava  o  gosto  pelo  estudo.  Em 

particular, o pai, a quem dedicamos a nossa dissertação. Nem  todas as horas  foram 

agradáveis,  houve  algumas mais  complicadas mas  o  balanço  final  deste  trabalho  é 

muito gratificante.  

Mas não podemos deixar de agradecer, desde logo, aos nossos orientadores. À 

professora  Ana  Pinto  pelas  aulas  de Metodologias  de  Investigação  que  semearam 

tanta  interrogação no nosso espírito. Dúvidas que vieram a, afinal, a ser um precioso 

auxílio  quando  das  dúvidas  surgiram  algumas  respostas,  ao  passar  da  teoria  à 

realização. E  todo o apoio ao  longo da  redação do  texto com  importantes sugestões 

que orientaram e reorientaram a nossa caminhada. Mas, também pela compreensão 

num momento mais  complicado.  Ao  professor  Daniel Marcos,  pela  disponibilidade 

para  nos  apoiar  nos  primeiros  passos  desta  “caminhada”  e  depois  em  muitos 

momentos‐chave,  inclusive  com  indicações  bibliográficas  e  alguns  incentivos  ao 

trabalho feito que nos deram entusiasmo para continuar. 

Finalmente,  o  reconhecimento  ao  universo  dos meus  afetos.  Os  amigos.  Os 

amigos que são, também, família. O apoio da família e a alegria de ter partilhado com 

o meu filho Luís, ao longo deste ano, a condição de estudante. E os amigos de coração. 

Todos  os  que  me  incentivaram  a  prosseguir,  em  particular  a  Célia  Chamiça  que 

prescindiu de parte do  seu  tempo  livre, oferecendo‐se para  rever o  texto em vários 

momentos e procurando ser tão rigorosa quanto é possível.    

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EUROPEIZAÇÃO DA POLÍTICA EXTERNA PORTUGUESA?  – O CASO DA RELAÇÃO COM CABO VERDE 

 

MARIA MADALENA DE CARVALHO ZOIO MARTINS TEIXEIRA FRANCO 

 

RESUMO 

Foi a Política Externa Portuguesa Europeizada?  

A  presente  dissertação  visa  compreender  o  impacto  do  processo  de  integração europeia na Política Externa Portuguesa.  

Procura‐se  identificar  e  compreender  os  efeitos  da  Europeização  na  elaboração, definição e implementação da Política Externa Portuguesa relativamente aos Países de Língua Oficial Portuguesa, elegendo Cabo Verde como estudo de caso.  

Num  primeiro  capítulo,  de  enquadramento  conceptual,  revisitamos  os  conceitos  de política externa e de Europeização, bem como as principais teorias neste domínio.  

Em seguida, sistematizamos as grandes prioridades da Política Externa Portuguesa no período democrático pós‐Revolução de 1974 até à atualidade, com enfoque nos Países Áfricanos de Língua Oficial Portuguesa, em particular Cabo Verde. 

Identificamos  igualmente os principais  traços da atuação externa da União Europeia (UE) e a sua ação na África subsaariana, destacando, naturalmente, a Parceria Especial UE‐Cabo Verde.  

As relações entre Portugal e Cabo Verde merecem natural destaque, dado o enfoque específico da presente dissertação, constituindo o objeto do quarto capítulo.  

Depois de cruzar os dados e aplicando indicadores de Europeização desenvolvidos em modelos  disponíveis  na  literatura  (Capítulo  V),  concluímos  que  existe  uma Europeização  na  elaboração,  definição  e  implementação  da  Política  Externa Portuguesa.  

O processo europeu influenciou os atores e o enquadramento, mas também alargou a zona  de  influência  da  Política  Externa  Portuguesa.  Na  relação  com  Cabo  Verde, aumentou  as  possibilidades  e  os  recursos  disponíveis  e,  dessa  forma,  influenciou  o relacionamento entre os dois países. 

 

 

PALAVRAS‐CHAVE:  Europeização,  Cabo  Verde,  Política  Externa,  Portugal,  União 

Europeia. 

 

   

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ABSTRACT 

 

Was the Portuguese Foreign Policy Europeanized?  

This thesis aims to understand the  impact of the European  integration process  in the Portuguese Foreign Policy. 

 It  seeks  to  identify  and  understand  the  effects  of  Europeanization  in  the  design, definition  and  implementing  Portuguese  Foreign  Policy  towards  the  Portuguese Speaking Áfrican Countries, choosing Cape Verde as a case study. 

In the first chapter, dedicated to the conceptual framework, we revisit the concepts of foreign policy and europeanization and the major theories in this field.  

Then we  systematize  the main  priorities  of  the  Portuguese  Foreign  Policy  since  the Democratic period after the Revolution of 1974 until today focusing on the Portuguese Speaking Áfrican Countries, in particular Cape Verde.  

We also identify the main features of the external action of the European Union and its action  in  Sub‐Saharan África, highlighting,  the European Union  ‐ Cape Verde  Special Partnership. 

Relations  between  Portugal  and Cape Verde  deserve  particular  attention,  being  the object of the fourth chapter.  

After  crossing  data  and  applying  Europeanization  indicators  developed  in  models available  in  the  literature  (chapter  V)  we  conclude  that  it  really  exists  an europeanization within  the making, definition  and  implementing Portuguese  foreign policy. 

The  European  process  affected  the  players  and  framework  but  also  increased  the 

influence zone of the Portuguese foreign policy. Regarding Cape Verde it has improved 

the  possibilities  and  resources  available  and  so  the  relations  between  the  two 

countries. 

 

KEYWORDS: European Union, Europeanization, Cape Verde, Foreign Policy, Portugal  

   

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ÍNDICE  

 

Introdução…………………………………………………………………………………………………………………….1 

Capítulo I: Enquadramento Conceptual………………………………………………………………………...8 

I. 1.    Política Externa ……………………………………………………………………………………………..8 

  I.1.1 – Conceito, níveis de análise e principais teorias…………………………………...8 

  I.1.2 – Os pequenos países têm mesmo política externa?.....………………….…….14 

I. 2.    Europeização…………………………………………………………………………………………………16 

  I.2.1 – Teorias da integração e Governação multisistémica..…………………………16 

  I.2.1 – Europeização ‐ de que falamos?………………………………………………………..19 

  I.2.3 –A  Europeização das políticas externas……………..………………………………..21 

Capítulo II: A Política Externa Portuguesa……………………………………………………………………..25 

II. 1   Principais eixos – uma breve leitura da história recente.……..……..………………….25 

II.2    Contornos da dimensão Áfricana. ..……………………..……………………………….……….33 

II.2. 1 – A relação com os  PALOP ……………………………………………………….………..33 

II.2.2 – Trazer África para a Europa…………………………………………………….………..41 

Capítulo III – A Ação Externa da União Europeia (UE)……..……………………….………………….. 46 

III. 1    Evolução histórica, natureza e prioridades geográficas…………………................ 46 

III.2     África na agenda europeia……….…………………………………..………………................ 50 

III.2.1 ‐ Da Declaração Schuman à Declaração da IV Cimeira UE‐África…........ 50 

III.2 .2 – A cooperação europeia com os PALOP – o caso de Cabo Verde…..... 56 

Capítulo IV: As relações Portugal‐Cabo Verde……………………………………………………………… 62 

IV. 1   Alguns dados sobre Cabo Verde …………………………………………………….….……..   62 

IV.2    A Cooperação portuguesa em Cabo Verde………………………………………..….………67 

   

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Capítulo V‐  Sinais de Europeização na relação com Cabo Verde…..…………………….........76 

V. 1   Contornos do processo de Europeização……………….……………………………….…...76 

V.2    Europeização top‐down.....................................................................................77 

V.2.1 – A socialização das elites.......................................................................77 

V.2.2 – Reorganização burocrática...................................................................79 

V.2.3 – Alterações constitucionais....................................................................85 

V.2.4 – Opinião pública.....................................................................................86 

V.2 5 – Adaptação e convergência política……………………………………………..87 

V.3 –Europeização bottom‐up.....................................................................................89 

Conclusões………………………………………………………………………………………………………………….92 

Fontes e Bibliografia          .............................………………………………………………………………..99 

Lista de Figuras ………………………………………………………………………………………………………….111 

   

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LISTA DE ABREVIATURAS 

 

ACP – África, Caraíbas e Pacífico 

AR – Assembleia da República 

ASEAN ‐ Associação de Nações do Sudeste Asiático 

CAD/OCDE – Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE 

CEDEAO ‐ Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental 

CEDN – Conceito Estratégico de Defesa Nacional 

COAFR – Grupo Trabalho África 

CPE – Cooperação Política Europeia 

CPLP – Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa 

DGPDN – Direção Geral de Política de Defesa Nacional 

EUA – Estados Unidos de América 

FED – Fundo Europeu para o Desenvolvimento 

FRONTEX ‐ Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras 

 Externas dos Estados‐Membros da União Europeia 

IILP – Instituto Internacional da Língua Portuguesa 

JOUE – Jornal Oficial da União Europeia 

MERCOSUL – Mercado Comum do Sul 

MNE – Ministério dos Negócios Estrangeiros 

NEPAD ‐ Nova Parceria para o Desenvolvimento da África 

OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico 

OIM – Organização Internacional para as Migrações 

OSCE – Organização para a Segurança e Cooperação Europeia 

OMC – Organização Mundial do Comércio 

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OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte 

PAC – Programas Anuais de Cooperação 

PAICV – Partido Áfricano de Independência de Cabo Verde 

PAIGC – Partido Áfricano de Independência da Guiné e Cabo Verde 

PALOP – Países Áfricanos de Língua Oficial Portuguesa 

PCC – Política Comercial Comum 

PCSD – Política Comum de Segurança e Defesa 

PE – Parlamento Europeu 

PESC ‐ Política Externa e de Segurança Comum 

PEV – Política Europeia de Vizinhança 

PIC – Programa Indicativo de Cooperação 

PIR – Programa Indicativo Regional (de Cooperação) 

PVD –Países em Vias de Desenvolvimento 

RUP – Regiões Ultraperiféricas 

SEAE – Serviço Europeu de Ação Externa 

TFUE – Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia 

TUE – Tratado da União Europeia 

UE – União Europeia 

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INTRODUÇÃO 

 

A  proliferação  dos  atores  intervenientes,  em  particular  das  organizações 

internacionais, alterou as dinâmicas das relações internacionais.  

Os Estados  já não  são os únicos  atores  a definir  as dinâmicas  internacionais. 

Continuam,  todavia,  a  ter  um  papel  de  relevo  por  toda  uma  série  de  razões  e  até 

porque são os próprios Estados que estão, na grande maioria dos casos, na génese das 

organizações internacionais. Definem os seus fins últimos, os seus meios de atuação e 

as suas limitações.  

Mas as organizações  internacionais ganham  também vida própria que  resulta 

do  equilíbrio  entre  os  interesses  dos  vários  países  membros,  quase  sempre  com 

influência  notória  dos  seus  fundadores.  Num  processo  que  consideramos  ser  de 

influência  recíproca,  também  os  Estados  ganham  contornos  específicos  quando 

participam  numa  ou  outra  organização  internacional.  No  período  de  guerra  fria,  a 

participação de um país na OTAN ou no Pacto de Varsóvia, por exemplo, não era isenta 

de significado e consequências na inserção desse país no sistema internacional. 

Na constelação das organizações  internacionais, a União Europeia  (UE) ocupa 

um  espaço  ímpar,  sendo  uma  experiência  única  no  domínio  dos  processos  de 

integração  regional1 em  função do seu carácter distintivo no  tipo e aprofundamento 

das relações de interdependência estebelecidas. E, nesse sentido, não é comparável a 

participação  na  UE  ou  numa  outra  qualquer  organização  internacional,  como  por 

exemplo  a Organização  de  Cooperação  e Desenvolvimento  Económico  (OCDE)  ou  o 

Conselho  da  Europa.  Ao  carácter  claramente  intergovernamental  destas  últimas, 

sobrepõe‐se a natureza híbrida da UE. 

Ora,  se  a  inserção  nas  organizações  internacionais  intergovernamentais  já 

acarreta  efeitos  nos  países  participantes,  um  processo  de  integração  regional,  e 

                                                            1 Lembre‐se, a  título de exemplo, o caso do MERCOSUL  (Mercado Comum do Sul) o caso da CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) ou o caso da ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático). 

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sobretudo com as características do que se tem vindo a desenvolver no quadro da UE, 

não pode deixar de ter efeitos nos seus Estados‐membros, não só nas políticas internas 

como também no domínio externo.  

Os efeitos da adesão ao projeto europeu2 são mais nítidos quando falamos de 

políticas  comuns  nas  quais  existe,  por  exemplo,  a  transposição  de  diretivas  para  a 

ordem  jurídica  interna dos Estados‐membros.  São,  todavia, menos  claros e  também 

menos  lineares  quando  se  trata  de outros  domínios  de  cooperação.  Em  todos  eles, 

estamos  convictos,  o  impacto  é  diverso  do  que  prevalece  nas  organizações 

internacionais ditas clássicas. 

A Europeização  tem  suscitado muitos estudos, pese embora a dificuldade de 

encontrar uma definição unanimemente aceite do conceito. Trata‐se de um processo 

que, na nossa visão, traduz uma dinâmica de dois sentidos, na qual a UE tem impacto 

nos  Estados‐membros,  sendo  igualmente  influenciada  por  estes,  já  que  definem  e 

conduzem o projeto comum de integração.  

Os  efeitos  da  Europeização  na  política  externa  dos  Estados‐membros  são 

eventualmente dos mais difíceis de autonomizar, compreender e medir. Em primeiro 

lugar pela própria natureza da política externa, em segundo lugar porque o seu efeito 

coexiste  com  vários  outros.  De  facto,  num  ambiente  internacional  de  globalização 

crescente,  em  que  as  fronteiras  de  um  Estado  são  cada  vez mais  porosas,  é muito 

difícil  autonomizar  os  efeitos  dos  vários  fatores  que  concorrem  para  a  elaboração, 

definição  e  implementação  da  política  externa  do  Estado.  Acresce  a  este  cenário  o 

papel  dos  fatores  domésticos  (nacionais),  eles  próprios  com  ramificações 

internacionais. 

A presente dissertação visa compreender o impacto do processo de integração 

europeia na Política Externa Portuguesa.  

Procura‐se identificar e compreender os efeitos da Europeização na elaboração, 

definição e implementação da Política Externa Portuguesa relativamente aos Países de 

Língua  Oficial  Portuguesa  (PALOP),  elegendo  Cabo  Verde  como  estudo  de  caso.  A 

                                                            2 Adotamos a expressão projeto europeu para nos referirmos à UE,  incluindo  igualmente todas as suas configurações  anteriores  (Comunidade  Económica  Europeia/Comunidade  Europeia  do  Carvão  e  do Aço/Comunidade Europeia de Energia Atómica  e Comunidade Europeia). 

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análise é, pois, desenvolvida com enfoque geográfico numa região do planeta em que 

o nosso país tem vindo a procurar marcar presença após o período de descolonização. 

Esperamos que esta  reflexão possa acrescentar valor ao atual estado da arte 

neste  domínio.  Existe,  ainda,  um  “número  reduzido  de  trabalhos  que  analisam  a 

participação portuguesa nas organizações multilaterais”  (Mendes, 2012:1), apesar da 

crescente importância que estas vêm ganhando.  

Aliás,  em  geral,  a  análise  de  política  externa  parece  ter  ainda  pouco 

desenvolvimento  em  Portugal,  existindo  poucos  estudos  sobre  Política  Externa 

Portuguesa contemporânea. 

Contudo,  existem  alguns  estudos  no  universo  da  história  diplomática  e  do 

relacionamento externo do país em geral que não podemos deixar de referir, como é o 

caso (e não sendo exaustivo) dos estudos de Nuno Severiano Teixeira (Teixeira, 2005, 

2010), de José Medeiros Ferreira (Ferreira, 2010), de António José Telo (Telo, 2008) ou 

de Calvet Magalhães (Magalhães, 2002). Ou de outros que se dedicaram já à temática 

da relação de Portugal com espaços geográficos específicos: a relação com a Europa, 

por exemplo, nas obras de José Magone (Magone,2006) ou a relação com África e as 

questões coloniais, como é o caso de Daniel Marcos (Marcos,2010).  

Consideramos o papel que os PALOP (com enfoque no caso de Cabo Verde) têm 

vindo  a  assumir  na  constelação  das  prioridades  da  Política  Externa  Portuguesa 

constantes  nos  Programas  dos  Governos  Constitucionais  do  período  pós  ‐

revolucionário.  

O  peso  dos  PALOP  na  Política  Externa  Portuguesa  está,  pois,  subjacente  à 

escolha  do  nosso  universo  de  estudo.  Dentro  dos  PALOP,  a  identificação  de  Cabo 

Verde surge por um conjunto de fatores. Consideramos que Cabo Verde pode ser um 

bom estudo de caso. Trata‐se de um eixo prioritário da Política Externa Portuguesa e, 

simultaneamente,  um  caso  bem‐sucedido,  existindo  desde  muito  cedo,  após  a 

independência de Cabo Verde, um bom  relacionamento entre os dois  Estados. Mas 

também porque se trata de um Estado que mantém um relacionamento especial com 

a  UE.  Finalmente  existe  (como  sempre  existe)  uma  motivação  que  ultrapassa  a 

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racionalidade  e  que  corresponde  ao  interesse  pessoal  no  relacionamento  entre 

Portugal e Cabo Verde. 

Elegemos,  assim,  a  Política  Externa  Portuguesa  como  tema  central  da  nossa 

dissertação.  

Abordamos o tema enquanto tópico de Relações  Internacionais no quadro da 

análise  do  sistema  internacional  e  do  comportamento  dos  seus  atores  numa 

perspetiva  multidisciplinar.  Tratamos  da  relação  entre  o  ator‐Estado  (o  Estado 

Português) com outros atores estatais (os PALOP em geral, o Estado de Cabo Verde em 

particular), sob a influência de um enquadramento institucional, a UE.  

Não  dispomos,  ainda,  do  ponto  de  vista  conceptual,  de  ferramentas  já 

consensualizadas.  De  facto,  muitos  conceitos  que  iremos  utilizar  não  são  (ainda) 

conceitos incontestados e consensuais na literatura científica. É o caso do conceito de 

Política Externa mas também, e sobretudo, do conceito de Europeização. 

A  análise  de  política  externa  é  uma  área  relativamente  recente  (data 

sensivelmente  do  pós‐segunda  Guerra mundial)  e  complexa  porque  envolve  vários 

atores e várias dimensões de análise. Adotamos uma conceção abrangente de política 

externa: 

“(…)  o  conjunto  de  objetivos,  estratégias  e  instrumentos  que  decisores 

dotados de autoridade (por regra os Estados acrescentamos nós) escolhem 

e  aplicam  a  entidades  externas  à  sua  jurisdição  política  bem  como  os 

resultados não intencionais dessas decisões” (Freire,2011:18).  

Coexistem  atualmente  vários modelos  teóricos  de  análise  dos  processos  de 

formulação  e  decisão  em  política  externa  (com  claro  predomínio  da  abordagem 

clássica do ator racional), cada um dos quais com vantagens e limitações. Procuramos, 

assim, uma análise multinível e multifacetada da Política Externa, uma política que é 

definida  e  implementada  em  vários  ambientes  (doméstico  e  internacional)  e  que 

muitas vezes funciona como plataforma de ligação entre os vários tabuleiros em que a 

política  do  Estado  se  joga.  Sendo  certo  que  atualmente  a  política  externa  não  se 

restringe ao ator‐Estado, é a dimensão do Estado que nos vai nortear.  

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A  Europeização  da  política  externa  dos  Estados‐membros  da  UE  decorre  da 

natureza  desta  política,  o  que  introduz maior  complexidade  a  uma  temática  ainda 

muito pouco consensual. Apesar de não ser aceite de forma unânime, juntamo‐nos aos 

que  defendem  a  Europeização  como  um  processo  de  duas  vias  que  interagem:  a 

influência da UE na política dos Estados‐membros, a qual é  (ou  foi em determinado 

momento)  igualmente  influenciada pelos próprios Estados‐membros. De  facto,  trata‐

se de “um processo de mudança contínuo, interativo e mutuamente constitutivo onde 

as respostas dos Estados‐membros ao processo de integração europeia alimentam de 

volta  as  instituições  da  UE  e  seus  processos  políticos  e  vice‐versa”  (Radaelli,2000; 

Jeffrey,2003; Boerzel,2003 cit. por Major,2005:177). 

Todavia,  e  embora  convictos  de  que  este  é  um  processo  dinâmico  e  sem 

fronteiras nítidas entre os dois  fluxos de  influência, previlegiamos na nossa análise a 

dimensão top‐down de influência do projeto europeu na Política Externa Portuguesa. 

É nesta lógica que se enquadra a nossa questão de partida:  

Foi a Política Externa Portuguesa Europeizada?  

E também as questões subsequentes e dela decorrentes3: 

Qual foi o  impacto da adesão à UE e aos seus mecanismos de coordenação 

na dimensão externa4 na Política Externa Portuguesa?  

Como  é  que  a  participação  nas  estruturas  e  práticas  de  coordenação  da 

política  externa  da  UE  influenciou  a  Política  Externa  Portuguesa  para  os 

PALOP, em particular para Cabo Verde  (país eleito como estudo de caso)? 

Houve lugar a uma adaptação nacional?  

Houve  uma  projeção  da  Política  Externa  Portuguesa  para  Cabo Verde  em 

virtude da adesão de Portugal à União Europeia? 

 

                                                            3 Para a formulação destas dúvidas iniciais, recebemos inspiração junto de autores que já procederam à analise da política externa de um Estado à  luz do enquadramento europeu, designadamente Wong, R The The Europeanization of French Foreign Policy ‐ France and the EU in East Asia. 

4  Da Cooperação Política Europeia à atual Política Externa e de Segurança Comum. 

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A presente dissertação está, assim, organizada, em torno de duas hipóteses de 

trabalho,  sendo  a  primeira  a  de  que  houve  lugar  a  uma  Europeização  da  Política 

Externa  Portuguesa.  A  segunda  respeita  aos  efeitos  da  Europeização.  Identificamos 

dois tipos principais de efeitos. Ao nível dos processos e dos atores (quem faz e como é 

feita a definição e implementação da Política Externa). E, depois, ao nível dos objetivos 

prosseguidos, isto é, a acumulação (que argumentamos que existe) de novos objetivos 

em função da integração na UE e por efeito da influência entre pares, designadamente 

a nível da áreas geográficas de intervenção prioritária da Política Externa Portugesa.   

O  período  analisado  nesta  dissertação  inicia‐se  com  a  fase  das  negociações 

para a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia e estende‐se até à 

atualidade,  ou  seja,  sensivelmente  entre  1977  e  2013,  procurando  o  comparativo 

entre o momento de partida e o momento de chegada.  

Apesar desta delimitação temporal, existe um pequeno recuo no tempo até ao 

ano de 1975, enquanto marco da Política Externa Portuguesa em  virtude do  fim da 

Ditadura. Procedemos  igualmente a uma breve  incursão histórica nas  relações entre 

Portugal e Cabo Verde  imediatamente depois do processo de  independência daquele 

país. 

Apesar  de  haver  uma  parte  eminentemente  explicativa  neste  trabalho, 

adotamos  igualmente  um  modelo  de  análise  compreensivo  já  que  procuramos 

interpretar o  impacto da participação de Portugal no projeto europeu na sua política 

externa para os PALOP e em especial para Cabo Verde. 

A bibliografia utilizada baseou‐se em fontes primárias e secundárias bem, como 

em  bibliografia  crítica.  A  análise  dos  Programas  de  Governo,  dos  discursos  dos 

decisores  políticos  em momentos‐chave,  bem  como  a  documentação  oficial  da  UE 

auxiliaram, em muito, o trabalho realizado. 

A  presente  dissertação  foi  escrita  ao  abrigo  do  Acordo  Ortográfico  e  está 

estruturada em cinco partes. 

Um  primeiro  capítulo  respeita  ao  enquadramento  conceptual  e  às  principais 

teorias em  jogo. Este primeiro capítulo divide‐se em dois blocos. Um primeiro bloco 

em torno do conceito de política externa, um segundo sobre a Europeização, incluindo 

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a  Europeização  da  política  externa  dos  Estados‐membros.  Resumimos  as  principais 

teorias em confronto, assumindo a nossa perspetiva em  torno das grandes questões 

que se perfilam neste horizonte. 

O  segundo  capítulo  tem  uma  natureza  histórica,  descritiva,  de  carácter 

instrumental  para  a  nossa  reflexão.  Procuramos  traçar  as  grandes  linhas  da  Política 

Externa Portuguesa. 

No terceiro capítulo identificamos os principais vetores da ação externa da UE, 

muito em particular, em razão do nosso objeto, os principais  interesses e atuação da 

UE na África Subsaariana, incluindo o relacionamento com Cabo Verde. Neste capítulo 

analisamos a Parceria Especial UE‐Cabo Verde. 

O quarto capítulo é dedicado às relações entre Portugal e Cabo Verde.  

No quinto e último capítulo procedemos ao cruzamento e análise dos dados, 

procurando  sinais  de  Europeização  na  Política  Externa  Portuguesa  em  geral  e  em 

particular na relação com Cabo Verde. 

Utilizamos,  para  o  efeito,  vários  indicadores,  trabalhando  os  contributos  já 

desenvolvidos  na  literatura. Desde  logo,  o modelo  desenvolvido  por Michael  Smith 

(2000) que analisa os efeitos da Europeização na política externa dos Estados com base 

em quatro indicadores: a socialização das elites políticas, a reorganização burocrática, 

a  reforma constitucional e a adesão da sociedade à cooperação política europeia no 

domínio da política externa. Consideraremos  igualmente os  indicadores que apontam 

Wong  e  Hill  (2011)  relativamente  à  adaptação  e  convergência  política,  muito  em 

particular  a  crescente  importância  da  agenda  europeia  e  da  adesão  aos  objetivos 

comuns. A  aplicação  destes  indicadores  visa  validar  as  hipóteses  de  trabalho  acima 

identificadas  e  cujos  resultados  são  trabalhados  nas  Conclusões  da  presente 

dissertação. 

 

   

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CAPÍTULO I: ENQUADRAMENTO CONCEPTUAL 

O  presente  capítulo  visa  enquadrar  o  objeto  da  presente  dissertação  nas 

principais teorias das relações internacionais, nas teorias de análise de política externa 

e nas teorias de integração europeia e estabelecer os conceitos e abordagens que são 

adotados neste contexto. 

I. 1.    Política Externa  

  I.1.1 – Conceito, níveis de análise e principais teorias 

Em primeiro lugar é necessário explorar o conceito de política externa.  

A  literatura oferece um vasto  leque de definições para o conceito de política 

externa,  o  que,  numa  primeira  abordagem,  parece  confundir  o  que  julgamos,  à 

partida, evidente. Todavia ao olhar para as  várias definições, podemos  verificar que 

não  são  (por  regra),  incompatíveis,  partilhando  mesmo  nalguns  casos,  elementos 

importantes.  

Acresce que o processo de globalização complicou, de alguma forma, a situação 

ao tornar cada vez mais porosas as fronteiras entre os domínios interno e externo e ao 

transformar a própria noção de Estado e do seu papel no sistema internacional. Muitas 

das grandes questões que hoje fazem parte da chamada agenda global (como, a título 

de  exemplo,  as  questões  ambientais)  reclamam  a  definição  de  soluções  partilhadas 

entre as esferas nacional e  internacional, numa  lógica que ultrapassa o nível  interno 

dos Estados. 

Para  alguns  autores  (é  o  caso  de  Hermann,  cit.  por  Neack,  2008:9)  quando 

falamos  de  política  externa  falamos  do  comportamento  dos  Estados;  para  outros, 

existe  uma  abordagem  mais  abrangente  que  considera  as  fases  anteriores  e 

posteriores  ao  comportamento,  à  ação.  Estes  incluem,  assim,  as  intenções,  as 

declarações, as ações, mas também as reações do outro (é o caso de Gerner, cit. por 

Neack, 2008:9). 

Uma segunda questão é a de saber se restringimos o conceito ao ator‐Estado 

ou se consideramos que a política externa pode corresponder a uma outra qualquer 

entidade.  Esta  questão  deriva  naturalmente  da  abordagem  que  se  adota  mas 

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arriscamos considerar que  já existe algum consenso sobre a coexistência de diversos 

atores na esfera internacional (independentemente do peso que a cada um se atribui). 

E o conceito adotado tem consequências para o tipo de análise que se procura 

fazer. 

Como  já  se  referiu  na  Introdução,  adotamos  um  conceito  abrangente  que 

considera a ação e a reação e que abre espaço a outras entidades que não apenas o 

Estado, até porque analisamos a política de um Estado  (Portugal) e não poderemos, 

portanto, fugir a uma visão minimamente estatocêntrica, mas vamos fazê‐lo num olhar 

cruzado com o efeito da atuação externa de um ator não estatal (a UE). Assim, Política 

Externa no âmbito desta dissertação é concebida como: 

“(…)  o  conjunto  de  objetivos,  estratégias  e  instrumentos  que  decisores 

dotados de autoridade (por regra os Estados,acrescentamos nós) escolhem 

e  aplicam  a  entidades  externas  à  sua  jurisdição  política  bem  como  os 

resultados não intencionais dessas decisões” (Freire,2011:18)”.  

A  política  externa  é  um  dos  temas  de  estudo  das  relações  internacionais.  É 

nesse âmbito que vamos trabalhar. De facto, nesta reflexão vamos proceder à análise 

da política externa no quadro das relações  internacionais, dando assim primazia (mas 

não  exclusividade)  à  dialética  das  relações  entre  os  diversos  atores,  neste  caso 

Portugal, Cabo Verde e UE.  

As  questões  de  análise  da  política  externa  são  tributárias  das  teorias  das 

relações  internacionais.  A  distinção  entre  as  teorias  sistémicas  das  relações 

internacionais  e  a  teoria  de  política  externa  é,  para  alguns,  pouco  nítida.  James D. 

Fearon defende que “o tema das teorias sistêmicas no seu domínio original é e deve 

ser a política externa dos Estados e suas consequências” (Fearon, 1998:297). 

A análise do sistema internacional, enquanto estudo autónomo é relativamente 

recente e revela uma grande primazia anglo‐saxónica, o que não é inconsequente.  

De  fato,  desde  a  instituição  da  primeira  cátedra  na  Universidade  de 

Abertytwyth5,  no Reino Unido,  nos  anos  vinte  do  século  passado  até  hoje,  diversas 

                                                            5 Cátedra Woodrow Wilson, na Universidade de Aberystwyth, no País de Gales, no Reino Unido, em 1919, de acordo com Ken Booth e Steve Smith na obra  International Relations Theory Today de 1995. 

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tendências  se  foram  definindo,  em  muito  influenciadas  pelo  decurso  da  História 

(sobretudo pelo decurso das guerras) e até pelas histórias de vida e pelos percursos 

pessoais dos seus defensores.  

As teorias que se foram desenvolvendo nas Relações  Internacionais são gerais 

(as  grandes  teorias)  ou  parciais,  quando  apenas  se  dedicam  a  estudar  uma  parte 

específica da realidade, por exemplo o efeito do meio geográfico.  

Apesar  de  existirem muitas  outras,  duas  grandes  teorias  têm  dominado  as 

relações  internacionais:  o  realismo  e  liberalismo. Mas,  do  ponto  de  vista  do  nosso 

objeto,  também o Construtivismo  tem  interesse na medida em que nele assenta um 

dos conceitos que vamos trabalhar: o da Europeização.  

Sem prejuízo da evolução e das variações, uma premissa básica tem perpassado 

o pensamento e as ideias defendidas pelos pensadores realistas, isto é, a ideia de que 

no sistema internacional, o Estado é o ator principal. 

Os realistas analisaram a forma como as características do Estado influenciam a 

sua  política  externa.  E  este  Estado  corresponde  a  uma  entidade  soberana,  tem  o 

monopólio  da  utilização  legítima  da  força,  autonomia  para  decisão  política  e 

económica,  tem  uma  população  e  um  território.  É  perspetivado  “como  uma  forma 

unitária e tende a maximizar o seu  interesse através de escolhas de política (externa) 

racionais e amorais” (Fernandes, 2011, 52). Na natureza do Estado está a prossecução 

do seu interesse próprio, isto é, a procura do poder. Preocupados com a sua segurança 

e  o  seu  poder,  os  Estados  estão,  naturalmente,  predispostos  para  o  conflito  e 

competição.  Nesta  ótica,  tal  como  defende  Hans  Morgenthau,  “Toda  a  História 

comprova que na política  internacional as nações estão continuamente a preparar‐se 

para se envolver ativamente ou para recuperar da violência organizada, sob a  forma 

da guerra” (cit. in Keohane e Nye, 1977). Prevalece, assim, uma visão negativa (ou no 

mínimo pessimista) da natureza humana e, em consequência, da natureza dos Estados 

que são norteados pela busca de segurança num ambiente internacional anárquico.  

                                                                                                                                                                              Note‐se  que,  para  os  Norte‐americanos,  o  início  de  tudo  estará,  pelo  contrário,  na  obra  de  Hans Morgenthau Politics Among Nations ‐ the struggle for Power and Peace de 1948. 

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Sendo  os  Estados  os  principais  atores,  as  organizações  internacionais,  nesta 

ordem  de  ideias,  não  fazem  mais  do  que  refletir  a  distribuição  do  poder  e  em 

particular o  interesse das  grandes potências. De  acordo  com esta  lógica,  a UE  seria 

sobretudo o reflexo dos  interesses do eixo Berlim‐Paris e também do Reino Unido ou 

em  geral,  o  domínio  dos  grandes  Estados‐membros  (uma  ideia  que  tende  a  ganhar 

mais adeptos em períodos de crise do projeto europeu). 

Nesta equação “causa‐efeito”, os neorrealistas (na esteira das ideias avançadas 

por  Kenneth Waltz)  apenas mudam  a  variável  “causa”,  continuando  a  acreditar  no 

mesmo efeito. Os Estados são centrais, procuram o poder mas atuam, assim, não em 

função  de  um  imperativo  natural  (por  ser  da  sua  essência),  mas  em  virtude  da 

natureza do sistema  internacional. A anarquia do sistema  internacional (em oposição 

ao  universo  nacional)  cria  a  necessidade  estatal  de  promover  a  sua  segurança 

(Dougherty e Pfaltzgraff, 2003).  

O Realismo neoclássico promove algum regresso às origens ao considerar que 

para além das causas sistémicas, existem também variáveis nacionais que explicam o 

comportamento  agressivo  dos  Estados  e  defende  que  “a  política  externa  é  ainda 

afetada por escolhas fundadas em perceções, valores e outros fatores pertencentes ao 

nível doméstico” (Dougherty,2003: 113). 

Esta  dicotomia  entre  a  influência  dos  fatores  externos  e  internos  tem‐se 

mantido  como  um  importante  tema  de  discussão  entre  os  pensadores  que  se 

interessam por esta temática. Trata‐se de saber qual dos dois fatores tem impacto na 

definição da política externa de um Estado e, sobretudo, saber qual o peso relativo de 

cada um. 

A teoria realista tem vindo a evoluir, coexistindo hoje vários realismos. E, como 

aliás,  sublinham  Dougherty  e  Pfaltzgraff  (2003:118),  “(…)  aquilo  a  que  se  chama 

realismo  contingente  deixa  aberta  a  questão  do  papel  que  as  instituições 

desempenham na facilitação da cooperação internacional”. 

O  Liberalismo,  por  sua  vez,  é  pluralista  no  sentido  em  que  considera  a 

existência de múltiplos atores (que não exclusivamente os Estados) e defende que as 

relações  entre  os  Estados  podem  ser  norteadas  pela  cooperação,  em  virtude, 

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designadamente,  da  interdependência  económica  existente.  Esta  visão  tem  o  seu 

corolário na teoria económica liberal que defende o livre comércio, o qual pode evitar 

o conflito. Os Estados acabam por reconhecer que uma estratégia de cooperação pode 

ser mais  válida  do  que  a  própria  guerra. O  Direito  Internacional  e  as  organizações 

internacionais ganham, assim, relevo.  

No contexto da teoria das Relações  Internacionais, os neoliberais focam a sua 

atenção  na  forma  como  as  instituições  podem  influenciar  o  comportamento  dos 

Estados através dos valores ou da criação de regras de comportamento. 

Enquanto  os  realistas  perspetivam  as  organizações  internacionais  como  uma 

forma  de  os  Estados  projetarem  o  seu  poder,  os  institucionalistas  neoliberais 

defendem  que  as  organizações  internacionais  podem  contribuir  para  a  paz  ao 

fomentar a cooperação entre os Estados. De acordo com esta visão, muito embora as 

instituições  (as  organizações  internacionais)  possam  resultar  da  necessidade  de 

satisfazer  os  interesses  (egoístas)  dos  Estados  num  ambiente  internacional  que  é 

anárquico por natureza, têm como objetivo gerar interdependência entre os atores, o 

que, no final, acaba por gerar uma maior cooperação entre eles. Nesta visão, as ideias 

e  crenças  assumem  também  um  papel  no  ambiente  internacional  porque  este,  em 

última instância, se baseia nas pessoas (Dougherty e Pfaltzgraff, 2003). 

É  neste  sentido  que  abordamos  a  questão.  A  UE  resulta  do  interesse  dos 

Estados  e  baseia‐se  na  procura  da  paz, mas  gera  interdependência  entre  os  seus 

membros e  fomenta a cooperação na gestão dos  interesses comuns. Parece aliás ter 

sido  essa  a  ideia,  verdadeiramente  inspirada,  de  Jean  Monnet  que  defendeu  a 

necessidade de evitar novo conflito no palco europeu, colocando acima das fronteiras 

a  gestão do  carvão e do  aço que eram,  à data,  “a  chave do poder económico e do 

arsenal onde se forjavam as armas da guerra “ (Monnet, 1986:260). 

Por outro  lado,  a  análise da política externa pode  ser  feita  a  vários níveis:  a 

nível  individual  (pensamos  sobretudo  nos  decisores  políticos),  a  nível  do  Estado  (a 

política  interna, o  impacto da opinião pública, dos meios de comunicação social ou o 

papel das elites) e a nível do sistema internacional propriamente dito (Neack,2008). É 

neste  último  nível  que  nos  vamos  situar  por  excelência, mas  não  abandonando  em 

absoluto algumas contribuições dos outros níveis.  

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E,  como  refere  Hudson  e  Vore  (1995:212)  e  Freire  (2011:  14),  a  análise  da 

política  externa  enquanto  abordagem  teórica  autónoma  teve  na  sua  génese  três 

estudos  inovadores que vieram a  influenciar o desenvolvimento deste ramo do saber 

em três vias. É o caso de J. Rosenau, que verificou a existência de uma permeabilidade 

entre  o  meio  interno  e  externo  com  a  sua  “Teoria  da  ligação”  (Rosenau,  1966), 

defendendo  a necessidade de uma  análise multinível e que  conduziu  a uma  análise 

comparativa.  A  obra  de  Richard  C.  Snyder,  H.W.  Bruck  e  Burton  Sapin  dedicada  à 

análise do processo de decisão, explorou os efeitos do processo e estrutura dos grupos 

nas  decisões  em  política  externa  (Snyder,  Bruck  e  Sapin,1954).  Harold  e Margaret 

Sprout procuraram a forma como as crenças do decisor pesam na política externa de 

um Estado (Sprout e Sprout, 1956).  

Estes  trabalhos  pioneiros  marcaram  os  estudos  posteriores  criando 

pressupostos  teóricos  relevantes  para  a  análise  de  política  externa,  tais  como  a 

importância  de  considerar  as  características  dos  decisores  para  compreender  o 

processo de decisão, a necessidade de considerar múltiplos níveis e o interesse de, em 

paralelo com os resultados das decisões em si mesmos, procurar compreender a fase 

da formulação da política externa. 

Hoje,  coexistem,  assim,  vários  modelos  de  análise  da  decisão  em  política 

externa  desde  o  processo  da  decisão  racional  à  teoria  sobre  o  papel  dos  líderes, 

passando pela teoria relativa às organizações burocráticas e pequenos grupos. 

No primeiro caso, com estreita relação com a  lógica realista “(…) o modelo de 

racionalidade  implica  que  o  Estado  aja  intencionalmente,  motivado  por  objetivos 

claramente  definidos,  demonstrando  capacidade  para  ordenar  as  suas  opções  e 

preferências  e  maximizar  a  utilidade  da  sua  escolha”  (Mintz  e  Derouen  Jr.,cit.por 

Freire,2011:21).  Outros  estudam  em  particular  o  papel  que  as  organizações 

burocráticas acabam por assumir,  já que a complexidade da realidade atual  torna os 

decisores  de  alguma  forma  reféns  de  organizações  especializadas  pela  recolha  e 

tratamento  da  informação.  Uma  outra  abordagem  foca‐se  no  papel‐chave,  que 

acreditam, podem os líderes e o tipo de liderança assumir nas decisões em matéria de 

política externa. 

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A  aplicação  de  uma  ou  outra  abordagem  tenderá  a  produzir  uma  leitura 

diferente de uma mesma ocorrência. Em todo o caso, mais do que concorrentes, estes 

modelos devem ser perspetivados como complementares. 

Neste  trabalho procuramos uma análise multinível e multifacetada, aplicando 

todavia, uma abordagem perto do institucionalismo neoliberal, pois estamos convictos 

de que sendo o Estado  (ainda) o principal ator das  relações  internacionais, os novos 

atores não estatais – como é o caso da UE – podem  influenciar a política externa do 

Estado. Com efeito, os institucionalistas neoliberais, embora partilhando pressupostos 

com  os  Neorrealistas  (a  anarquia  do  sistema  internacional  e  a  natureza  racional  e 

unitária do ator‐Estado), admitem e consideram a cooperação entre os Estados com 

potencialidade  de  gerar  ganhos  conjuntos.  E,  nesse  contexto,  as  instituições 

internacionais podem desempenhar um papel relevante (Mendes e Lima, 2005:72). 

Mas  consideramos  igualmente  a  visão  construtivista.  Esta  visão  coloca  o 

enfoque  na  construção  social  da  política  internacional  e  inclui  uma  abordagem 

interessante do processo de construção europeia no contexto da nossa reflexão. “(…)

O  construtivismo é uma  conceção  teórica que enfatiza a  importância das estruturas 

normativas e materiais, na  construção da  identidade e do papel que esta exerce na 

definição da ação política. (Adler, 1999). Pressupõe que o mundo é permanentemente 

construído através da  interação dos atores. E neste sentido a UE, enquanto realidade 

dinâmica,  em  permanente  evolução,  corresponde  a  uma  estrutura  que  exerce 

influência nos Estados‐membros, sendo, em simultâneo, moldada por estes. Ficamos, 

assim, perto da ideia de Europeização como um processo de duas vias. 

  I.1.2 – Os pequenos Estados têm mesmo política externa? 

Na verdade, a grande maioria dos estudos que se têm vindo a desenvolver no 

domínio da política externa tem‐se focado na política externa das grandes potências, 

no  relacionamento  externo  dos  que  têm,  de  uma  forma muito  visível,  impacto  no 

equilíbrio de forças internacional. É o caso paradigmático das várias leituras da Política 

Externa dos EUA (país onde, aliás, se iniciaram os trabalhos pioneiros neste domínio), 

mas também um importante volume de trabalhos sobre a política externa da ex‐União 

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Soviética, por exemplo. Os realistas, em geral, não veem grande  interesse no estudo 

da realidade dos pequenos países. 

A política externa das pequenas potências tem sido analisada ‐ por pensadores 

liberais ou marxistas – mas quase sempre no sentido, como assinala Neack (2008:164) 

de procurar averiguar “(…) se e como podem os pequenos poderes encontrar forma de 

desenvolver uma política externa independente”6. 

A questão é relevante no contexto do nosso objeto de estudo. 

É difícil generalizar, até porque não é evidente o agrupamento das potências 

em  pequenas,  médias  ou  grandes,  existindo  diversos  critérios  possíveis.  O  dilema 

inicia‐se, uma vez mais, em  torno do conceito. O que é um pequeno Estado? É uma 

noção absoluta ou será sempre relativa? Em regra, recorre‐se a critérios quantitativos 

relacionados com a dimensão do território, mas também com a sua capacidade militar 

ou económica, mas existem zonas de alguma indefinição. 

Acresce  que  dos  cerca  de  duzentos  Estados  atualmente  reconhecidos  no 

mundo,  a  grande maioria  são  de  pequena  dimensão  e  não  parece muito  rigoroso 

aplicar uma regra geral a todos eles.  

Em  todo o caso, a História  (que é, neste domínio, um poderoso auxiliar)  tem 

vindo a demonstrar que alguns Estados conseguem, mercê de  fatores diversos, criar 

oportunidades não só de independência na definição, elaboração e implementação da 

sua  política  externa,  como  também  na  obtenção  de  algum  poder  na  cena 

internacional. Vários fatores podem contribuir para tal, tangíveis ou não. 

É nesse sentido que Adriano Moreira chama a atenção para o que definiu como 

poder funcional que corresponde a uma influência externa que não é proporcional, no 

contexto  internacional,  à  dimensão  e  poder  do  Estado.  Resulta,  em  determinado 

momento  histórico,  duma  situação  geográfica  estratégica  do  ponto  de  vista  da 

segurança internacional ou da posse recursos económicos escassos que são objeto de 

grande procura no mercado internacional (Moreira, 2002). 

                                                            6 Tradução livre, da nossa autoria 

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O caso de Portugal pode servir de exemplo. A posição geográfica do nosso país 

contribuiu muito para o benefício de um poder funcional neste sentido e durante um 

determinado período histórico, como se sabe. 

Outros autores portugueses também se debruçaram sobre o poder do pequeno 

Estado como Políbio de Almeida, de acordo com o qual a diplomacia é a melhor opção 

de um pequeno Estado, como Portugal (Almeida, 1990). E o contexto multilateral pode 

contribuir para amplificar a sua voz, auxiliando a sua projeção de poder.  Existem  já 

vários estudos  sobre a problemática dos pequenos países no  seio da UE. De acordo 

com Tonra (2011:269), os líderes dos Estados pequenos encaram a participação do seu 

país na política externa da UE como fator de reforço da sua política externa nacional. 

I. 2.    Europeização 

  I.2.1 – As Teorias da integração e a Governação multisistémica  

Sendo  o  conceito  de  Europeização  central  no  nosso  estudo,  é  importante 

compreender, antes de mais o enquadramento conceptual do fenómeno de integração 

em  geral  e  a  sua  aplicação  ao  projeto  europeu  em  particular.  Ou  seja,  há  que 

considerar  as  várias  leituras  do  processo  de  integração  no  sentido  de  ponderar  a 

interpretação da  influência da natureza e tipo de funcionamento do projeto europeu 

nas políticas nacionais, no nosso caso da política externa. 

O projeto europeu é um processo ímpar que desafia os conceitos estabilizados. 

Não é um Estado, não é uma Federação de Estados, mas também é muito mais do que 

uma  organização  internacional  clássica,  de  natureza  puramente  intergovernamental 

(será eventualmente um pouco de várias daquelas realidades). Acresce que, para além 

de ser um processo dinâmico por natureza, não tem evoluído nem no mesmo sentido 

nem ao mesmo ritmo em todas as áreas da Governação.  

A  procura  de  um  modelo  que  sirva  esta  realidade  híbrida  nas  Relações 

Internacionais  tem  animado  os  debates  e  alimentado  a  literatura.  A  matéria  é 

relevante para o nosso objeto de estudo já que para compreender os efeitos da UE na 

Política Externa Portuguesa, interessa, antes de mais, identificar a natureza e modo de 

funcionamento da UE. 

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Numa primeira fase, a integração europeia é objeto de três modelos teóricos: O 

Federalismo, o Funcionalismo e o Intergovernamentalismo.  

O Federalismo, de inspiração norte‐americana, esteve presente em momentos‐ 

‐chave da história da Europa no século XX7 e está subjacente ao desenvolvimento do 

projeto europeu que  tem  como  fim último  a  criação de Uma união  cada  vez maior 

entre  os  povos  da  Europa.  Depois  do  êxito  dos  Tratados  de  Roma,  a  ideia  federal 

esteve  na  base  da  proposta  para  a  criação  da  fracassada  Comunidade  Europeia  da 

Defesa  e,  bastante  mais  tarde,  e  de  forma  bem  evidente  na  procura  de  uma 

Constituição para a Europa. 

Mas  dois  paradigmas  clássicos  têm  dominado  o  debate  sobre  a  integração 

europeia  (Lobo‐Fernandes,  2006:147):  o  Supranacionalismo  apoiado  na  corrente 

Neofuncionalista  da  integração  regional  e  o  Intergovernamentalismo  com  base  na 

teoria realista da Relações Internacionais.  

Na  visão  supranacional  apoiada  na  lógica  neofuncionalista,  a  integração 

económica liderada por instituições centrais poderá conduzir, a prazo, à união política. 

Com  efeito,  a  coordenação  da  cooperação  torna‐se  cada  vez mais  necessária  num 

efeito de  spill over em que a  integração económica num  sector conduz à  integração 

noutros sectores tornando a integração política necessária. Esta teoria, note‐se, esteve 

na base da solução defendida por Jean Monet e apresentada por Robert Schuman de 

uma integração passo a passo, sector a sector. 

  A  história  do  processo  de  integração  europeia  (designadamente  a  crise  da 

cadeira vazia8) veio evidenciar os  limites daquele modelo teórico, demonstrando que 

não  está  assegurado  o  automatismo  e  que  o poder  dos  Estados  não  está,  de  todo, 

esgotado. 

                                                            7 Veja‐se o caso do Manifesto de Viena de 1927 promovido pelo Conde Coudenhouve‐Kalergie e, mais tarde, do Manifesto para uma Europa unida e  livre  (Manifesto de Ventotene) de Altiero  Spinelli, em 1941 

8   Em 1965, naquela que  ficaria conhecida na história do processo europeu como a “crise da cadeira vazia”, a França manteve‐se ausente das reuniões em sinal de protesto contra a falta de financiamento da Política Agrícola Comum bloqueando, assim, a decisão no seio da Comunidade. 

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Para  o  Intergovernamentalismo,  desenvolvido  em  primeira mão  por  Stanley 

Hoffman o processo de  integração é explicado  com base numa escolha  racional dos 

Estados  que  procuram  através  da  integração  maximizar  os  seus  ganhos.  Andrew 

Moravcisk  desenvolveu  o  Intergovernamentalismo  liberal  que  considera  três 

elementos  para  a  compreensão  do  processo  europeu,  as  preferências  nacionais,  a 

negociação e a coordenação política entre os Estados.   

“Para  o  intergovernamentalismo  liberal,  os  desenvolvimentos  da  integração 

europeia  têm  sido  conduzidos  por  um  processo  gradual  de  convergência  de 

preferências  entre  os  estados‐membros  mais  poderosos,  no  termo  de  um 

processo  negocial  onde  o  poder  relativo  dos  estados‐membros  é  a  bitola, 

estabelecendo  compensações  aos  Estados  afetados  e  uma  delegação 

minimalista  de  poderes  às  instituições  supranacionais  com  o  intuito  de 

assegurar a exequibilidade dos compromissos” (Torres,2013,106). 

E  “(…)  qualquer  que  seja  a  dimensão  dos    poderes  atribuídos  às  instituições 

comunitárias,  a  autoridade  máxima  permanecerá  nos  Estados‐membros”  (Lobo‐

Fernandes,  2006:152)  até  porque  “Para  os  realistas,  a  delegação  de  autoridade  por 

parte  dos  Estados  é  revogável  a  qualquer momento”(  Lobo‐Fernandes,  2006:152). 

Também este modelo tem sido ultrapassado, pelo menos em parte, pela realidade, já 

que as formas de atuação dos Estados e algumas das suas políticas públicas têm sido 

objeto de alteração por um efeito de  convergência que não  tem apenas na escolha 

racional e no interesse nacional a sua origem.  

No domínio da Política Externa (um dos domínios mais caros aos Estados), este 

debate é, pois, muito relevante. Trata‐se de um domínio em que os Estados‐membros 

têm  procurado  resistir.  Mas  a  evolução  do  processo,  mesmo  que  lenta,  tem 

contrariado esse desiderato, sendo interessante notar que em nenhuma área a UE tem 

evoluído  tanto  nos  últimos  anos  como  no  domínio  da  sua  atuação  externa.  A 

Europeização  também parece atingir esta área, mesmo que mais  tarde em  relação a 

muitas outras e através de fórmulas diversas (menos evidentes, mas, talvez não menos 

importantes) como procuraremos demonstrar. 

Apesar  de,  na  nossa  opinião,  este  debate  estar  longe  de  estar  esgotado, 

atualmente verifica‐se uma  tendência para alterar o  foco da  investigação das  teorias 

da  integração para o  estudo da  governação  europeia  em que  se destaca uma nova 

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corrente de pensadores que concebem a UE como uma comunidade política multinível 

com  uma  governação multisistémica.  Nesta  abordagem  a  UE  “  (...)  emerge,  assim, 

como  uma  entidade  política  onde  a  autoridade  está  dispersa  entre  diferentes 

patamares  de  governação  e,  onde  existem  significativas  variações  sectoriais  nas 

dinâmicas de governação”  (Rosamond, 200:110,  cit. por  Lobo‐Fernandes, 2006:155). 

As  decisões  são  tomadas  em  vários  níveis  (nacional,  subnacional  ou  supranacional) 

numa geografia variável em função das áreas de cooperação. E, acrescentamos nós, o 

nível dominante numa área pode não o ser numa outra.  

  I.2.2 – Europeização ‐ de que falamos? 

Parece  incontestável que a adesão de um Estado à UE não é comparável, do 

ponto  de  vista  dos  efeitos,  com  a  participação  em  qualquer  outra  organização 

internacional. Mas esta quase evidência esconde muitas dificuldades e outros  tantos 

desacordos quando se procura definir o conceito de Europeização. 

O termo não é, desde logo, muito rigoroso pois não identifica de forma clara o 

ator  não‐estatal  europeu  a  que  se  refere,  sendo  utilizado  para  definir  uma 

multiplicidade de fenómenos e pelo menos em duas perspetivas diferentes. 

Com  efeito,  inicialmente,  a  investigação  adotou  uma  abordagem  bottom‐up, 

com  o  enfoque  na  influência  dos  Estados‐membros  na  construção  europeia;  num 

segundo momento procurou‐se a perspetiva  inversa e, assim, numa  lógica top‐down, 

os estudos concentraram‐se no  impacto do processo europeu nos Estados‐membros. 

Atualmente,  alguns  autores  consideram  que  o  processo  de  Europeização  é  um 

processo de dois sentidos, mas esta não é uma conceção unanimemente aceite. Para 

alguns (Major, 2005, Bulmer e Radaelli, 2004) esta dualidade pode até representar, do 

ponto de vista metodológico, um risco, já que não permite distinguir com clareza causa 

e efeitos. 

Entendemos, todavia, que uma não  faz sentido sem a outra e não podem ser 

vistas de  forma  totalmente autónoma. Com efeito, dificilmente  se pode definir uma 

fronteira nítida e rígida entre as duas dimensões da Europeização uma vez que se trata 

de “um processo de mudança contínuo, interativo e mutuamente constitutivo onde as 

respostas  dos  Estados‐Membros  ao  processo  de  integração  europeia  alimentam  de 

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volta  as  instituições  da UE  e  seus  processos  políticos  e  vice‐versa”  (Radaelli,  2000; 

Jeffery, 2003; Boerzel, 2003 cit. por Major,2005: 177).  

Assim, os efeitos que o processo europeu  tem na Política Externa Portuguesa 

não podem, na nossa  visão,  ser desligados da projeção para o quadro europeu que 

Portugal tenta fazer dos seus interesses em África, como se as duas realidades fossem 

totalmente independentes. 

Acresce  ainda  que,  em  último  caso,  existe  uma  ‘nacionalização’  da 

Europeização  já  que  o  impacto  da  UE  não  é  igual  em  todos  os  Estados‐membros. 

Depende de uma série de variáveis com raiz histórica, tais como, por exemplo a cultura 

organizacional  e  a  estrutura  e  organização  administrativa  do  Estado.  Os  Estados‐

membros  não  são  agentes  totalmente  passivos  no  processo.  Com  alguma  razão  se 

pode  pensar  que  “a  Europeização  (…)  será  sempre  o  produto  entre  a  capacidade 

europeia  de  impor  e  a  capacidade  interna  de  absorver,  adaptar  e  implementar” 

(Paulo,2006:4). 

Estamos, na nossa reflexão, perto da definição do conceito de Europeização de 

Cláudio Radaelli entendida como um 

  “processo de construção, difusão e institucionalização de regras formais e 

informais, procedimentos, políticas, estilos, modos de atuação e interesses 

e normas partilhados que são em primeiro lugar definidos e consolidados a 

nível  das  estruturas  da  UE  e  depois  incorporados  na  lógica  do  discurso 

doméstico (…) nas estruturas políticas e nas políticas públicas dos Estados‐

membros” (Radaelli,2003:30, cit por Abreu, 2006).  

A noção de Europeização implica assim, como muitos autores já salientaram, um 

desalinhamento  entre o nível  europeu  e o nível nacional    já que,  se o nível  europeu 

alinhar totalmente com o modus operandi doméstico  “(…) não é necessária mudança ao 

nível nacional” (Borzel e Risse, 2003:61). 

Podem existir vários níveis ou tipos de mudança.  

   

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Radaelli identifica quatro: 

A inércia, quando se verifica ausência da mudança; 

A absorção, que se traduz em adaptação; 

A transformação, como um mudança pragmática; 

A  oposição,  que  corresponde  a  uma  reação  e  pode  resultar  em  “menos 

Europa”. 

A  análise  dos  efeitos  é,  contudo,  diferente  consoante  o  domínio  em  que  nos 

situamos. Neste contexto  interessa‐nos apenas um: o da Política Externa dos Estados‐

membros. 

  I.2.3 –A Europeização das políticas externas 

A maioria dos estudos sobre os efeitos da UE nas políticas domésticas tem‐se 

concentrado  nas  áreas  socioeconómicas.  Foi  nestas  áreas  que  a  UE  avançou mais 

rapidamente. No domínio das políticas  comuns, por exemplo, a produção  legislativa 

que  é  necessário  transpor  para  a  ordem  jurídica  interna,  tornou  evidente  a 

comunitarização das políticas nacionais. 

No caso da política externa, os efeitos não são tão evidentes.  

Em  primeiro  lugar,  porque  a  atuação  externa  da  UE  foi,  e  ainda  hoje  se 

mantém,  pelo  menos  em  parte,  reservada  a  uma  cuidadosa  dimensão 

intergovernamental.  

O impacto na esfera nacional foi sendo feito de uma forma progressiva e numa 

base  voluntária,  em  grande  parte,  através  de  uma  lógica  de  convergência  que  nem 

sempre é muito nítida.  

Depois,  é evidente que se torna muito difícil isolar os efeitos da Europeização 

dos  efeitos  de  outros  fatores, muito  em  especial  dos  efeitos  da  globalização, mas 

também dos efeitos de fatores domésticos diversos. 

Nicole  Alecu  de  Flers  (2011:22)  identifica  as  dimensões,  mecanismos  e 

respetivos  resultados da Europeização da Política externa dos Estados‐membros que 

apresenta num quadro‐síntese. 

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22 

Fig. 1 – Dimensões, mecanismos e resultados da Europeização da Política Externa 

Dimensões  Mecanismos  Resultados/Indicadores 

Uploading/Bottom‐up Estados‐membros procuram influenciar a política externa da UE  e  as  políticas  externas  dos outros Estados‐membros 

 

Socialização /Aprendizagem 

Projeção da política Projeção  das  preferências  da política nacional e dos modelos e  ideias  nacionais  para  o  nível europeu 

 Downloading/Top‐down Os  Estados‐membros  são sujeitos a influência e estímulo  por  parte  da  UE  e  dos  outros Estados‐membros 

 Socialização/ Aprendizagem 

Adaptação política Mudanças  nas  instituições, processos, preferências, ideias e políticas  em  virtude  das práticas,  regras,  objetivos  e normas  adotadas  ou  prescritas ao nível europeu 

FONTE: Alecu de Flers e Muller, 2012:22 (tradução da nossa autoria) 

 

Os  mecanismos  de  Europeização  são,  no  entender  daquela  autora,  a 

socialização  e  aprendizagem,  uma  e  outra  variando  em  função  da  periodicidade  e 

duração do contacto, bem como do grau de autonomia dos atores envolvidos. 

Assim,  e  sendo  certo  que  existe  também  Europeização  ao  nível  da  Política 

Externa,  a dificuldade  centra‐se, pois, na  sua  aferição, pelo que  se  torna necessário 

utilizar indicadores que nos auxiliem na análise. 

Michael Smith sugere no seu artigo (2000) um quadro de referência com quatro 

indicadores: a socialização das elites políticas, a reorganização burocrática, a reforma 

constitucional  e  a  alteração  da  perceção  da  opinião  pública  relativamente  à 

cooperação europeia neste domínio, concedendo, todavia, primazia aos três primeiros.  

Também  Wong  e  Hill  (2011)  coligiram  um  conjunto  de  indicadores9 

relativamente  às  três  dimensões  da  Europeização  da  política  externa  (adaptação  e 

convergência política/projeção nacional/reconstrução da identidade). Relativamente à 

dimensão top‐down, identificam cinco indicadores: a crescente importância da agenda 

política europeia, a adesão aos objetivos comuns, as obrigações que se sobrepõem aos 

“domínios  reservados” do Estado, a  internalização do estatuto de Estado‐membro e 

                                                            9    Estes  indicadores  foram  aplicados  a  um  conjunto  de  dez  Estados‐membros  e  apresentados  na publicação  R.  Wong.  and  C.J.  Hill,  eds  (2011),  National  and  European  Foreign  Policy:  Towards Europeanization, Routledge 

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(tal  como  Smith)  as  alterações  na  estrutura  e  nos  procedimentos  da  burocracia 

nacional. 

Na  Europeização  da  política  externa  devem,  pois,  ser  consideradas  duas 

vertentes.  

Uma primeira, mais imediata e visível, ligada à importação de procedimentos (o 

como  fazer) e às alterações orgânicas  (quem  faz) decorrentes da participação na UE, 

relativamente  à  qual  a  aplicação  de  indicadores  simples  nos  pode  fornecer  dados 

fidedignos. 

Uma  segunda  vertente, mais mediata  e menos  visível,  é  a  que  resulta  dos 

efeitos nos  interesses e objetivos da política externa nacional. Já não se trata aqui do 

como,  nem  do  quem, mas  sim  do  quê  e  para  quê.  Falamos,  pois  de  um  impacto 

substantivo  quando  se  trata  de  acrescentar  os  interesses  e  objetivos  da  UE  aos 

interesses  nacionais  por  pressão  da  UE,  mas  também  por  pressão  dos  pares.  O 

processo de  integração faz surgir novos  interesses e valores comuns. Resta saber até 

que ponto os Estados‐membros se apropriam totalmente deles. É aí que que reside a 

parte mais difícil, mas também mais interessante. 

A  análise  torna‐se  ainda mais  complexa  já  que  a  atuação  externa  da  UE  se 

estende hoje a vários domínios e com vários níveis e tipos de Governação. 

Com efeito, do ponto de vista formal, a atuação externa da UE, após a entrada 

em  vigor  do  Tratado  de  Lisboa,  apresenta  uma  dualidade  de  regimes  jurídicos  e 

métodos  –  “  a  vertente  da  PESC,  incluindo  a  PCSD  prevista  no  TUE  e  as  vertentes 

previstas no  TFUE  “  (Mesquita,  2011:102). Do ponto de  vista material,  como  refere 

aquela  autora,  a  atuação  externa  inclui  a  Ação  externa10,  outras  políticas  e  ações 

internas  com  dimensões  externas11  e  demais  domínios  de  ação  que  podem  incluir 

atuação externa12.  

                                                            10  A  Ação  Externa  propriamente  dita  integra  a  Política  Externa  e  de  Segurança  Comum,  incluindo  a Política Comum de Segurança e Defesa, a Política Comercial Comum, a Cooperação com países terceiros e a Ajuda humanitária  (nesta última a cooperação para o desenvolvimento, a cooperação económica, financeira e técnica com países terceiros e a ajuda humanitária) 

11 É o caso de algumas matérias do Espaço de Liberdade, Segurança e  Justiça, as questões  relativas à Imigração e Asilo, mas  também a política monetária, o desporto, a  formação profissional, a cultura, a 

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Naturalmente  não  poderemos  do  ponto  de  vista  substantivo  contemplar  no 

nosso trabalho todas estas áreas, tanto mais que o nosso foco é claramente geográfico 

e  será  essa  a  orientação  a  seguir  para  procurar  compreender  da  existência  da 

Europeização da Política Externa Portuguesa na sua relação com Cabo Verde. Acresce 

que  se  trata de matéria  complementar –  com efeito, o objeto do nosso estudo é  a 

Política Externa Portuguesa e não a Política Externa da UE. 

                                                                                                                                                                              saúde pública, as redes transeuropeias, a  investigação e desenvolvimento tecnológico, o ambiente e a proteção civil. 

12 É o caso da Política de vizinhança e dos Direitos Fundamentais 

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CAPÍTULO II: A POLÍTICA EXTERNA PORTUGUESA 

II. 1 Principais eixos – uma breve leitura da história recente 

Considerando  o  objetivo  da  nossa  dissertação,  procuraremos,  de  forma 

necessariamente  breve,  identificar  os  grandes  eixos  da  Política  Externa  Portuguesa 

desde  a  fase  das  negociações  para  a  adesão  de  Portugal  à  então  Comunidade 

Económica  Europeia  até  à  atualidade.  Para  compreender  as  grandes  opções  feitas 

neste  período  há  que  recuar  a  1974,  enquanto marco  fundamental  nas  condições 

internas subjacentes ao posicionamento externo do Estado Português. 

Com efeito, a Revolução do 25 de Abril de 1974 marca, na história recente do 

país, o momento em que deixamos de estar “orgulhosamente  sós”13 e  se  iniciam os 

processos de descolonização,  alterando  assim e de  forma profunda o paradigma da 

inserção internacional de Portugal. 

Como bem assinalam António Costa Pinto e Nuno Severiano Teixeira (2005:34), 

os primeiros grandes desafios da Política Externa Portuguesa no período pós  fim da 

ditadura foi o fim do ciclo do Império e a abertura ao mundo com o restabelecimento 

de relações diplomáticas alargadas. 

A Revolução altera, pois, o paradigma de  inserção  internacional do país a dois 

níveis.  Por  efeito  de  um  fator  exclusivamente  interno, mas  também  por  efeito  da 

conjugação de fatores internos e externos. 

O  ano  de  1974 marca,  efetivamente,  uma  verdadeira  rutura  na  definição  da 

Política Externa Portuguesa, que deixa de estar vocacionada para o Atlântico e para a 

manutenção  das  colónias  e  passa  fundamentalmente  a  estar  vocacionada  para  a 

Europa, para o Atlântico e para a reinvenção das relações pós‐coloniais. 

 

                                                            13 Célebre expressão utilizada por Oliveira Salazar, a 18 de fevereiro de 1965, relativamente às guerras coloniais, uma frase frequentemente utilizada para descrever o carácter isolacionista da Política Externa Portuguesa durante os  anos  sessenta do  século XX. Note‐se,  contudo que  alguns  autores,  como por exemplo António Telo,  consideram que este  isolamento é um dos mitos da história  recente do país, contrapondo que o regime tinha apoios externos relevantes (Telo, 1994, cit.por Rodrigues, 2004). 

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O fim do regime ditatorial do Estado Novo14, provoca uma abertura de Portugal 

ao  mundo.  Acresce  que  esta  abertura  é  feita  num  período  particular  em  que  se 

processa, em plena Guerra Fria, uma transformação do chamado Estado Soberano15.  

Esta  condicionante  (que  não  é  exclusiva  do  caso  português)  tem  também 

influência  em  Portugal  e  conduz  a  um movimento  tendente  à  inserção  em  grandes 

espaços.  Trata‐se,  aliás,  de  uma  necessidade  sentida  com  maior  acuidade  pelos 

Estados de média e pequena dimensão.  

É assim que Portugal, que  já pertencia à Organização do Tratado do Atlântico 

Norte (1949)16 , é membro fundador da OECE (1948), mais tarde OCDE (1960), adere à 

ONU (1955), é membro fundador da EFTA (1960)  adere ao Conselho da Europa (1976), 

pede  a  adesão  à  Comunidade  Económica  Europeia  (1977)  e  promove  o 

estabelecimento da CPLP.  

Este ciclo de adesão a organizações internacionais veio, aliás, a conduzir, como 

defende Adriano Moreira, a uma pluralidade de fronteiras não coincidentes: 

“(…) a  fronteira geográfica deixou de  coincidir  com a  fronteira de  segurança, 

que  é  a  da NATO,  que  a  fronteira  económica,  a  evoluir  para  política,  é  a  da 

União Europeia, diferente daquelas duas e que a fronteira cultural emergente, 

com apoio na língua, se diferencia de todas as outras (Moreira, 2000:319)17. 

O  multilateralismo  não  esgota,  todavia,  a  dinâmica  da  Política  Externa  de 

Portugal, que tem procurado promover relações bilaterais consideradas fundamentais. 

O caso dos EUA é paradigmático, mas outros se devem assinalar como a relação com a 

                                                            14 Estado Novo é a designação oficiosa do regime político que vigorou em Portugal desde a aprovação da Constituição de 1933 até à Revolução de 25 de Abril de 1974. 

15 Alguns autores consideram que, num período de  forte globalização em que as chamadas “questões globais” ultrapassam as fronteiras dos Estados, o chamado Estado soberano, na aceção que lhe é dada por Jean Bodin está hoje ultrapassado. No nosso entender, trata‐se de uma modificação e não  (talvez ainda) do seu fim já que, apesar de tudo, o Estado ainda permanece, dentro de certas condicionantes, um dos principais atores intervenientes na cena internacional. 

16  O estatuto de Portugal como país fundador da OTAN logo em 1949, em pleno regime de ditadura é a exceção num período de algum isolamento de Portugal na cena internacional e deve‐se, naturalmente, a fatores de natureza  geopolítica da  arquitetura do  sistema de  segurança ocidental  em que os Açores assumiam “valor estratégico acrescentado” (Teixeira, 1995:804). 

17 Mantemos o itálico do autor. 

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Espanha (a que o enquadramento na UE viria a dar novos contornos), a relação com a 

Alemanha  (muito  importante no processo de consolidação da democracia e  também 

no processo de adesão à CEE), com o Reino Unido e a França, mas também as relações 

bilaterais com os PALOP, cada vez mais com o Brasil, e ainda, em geral, com os países 

nos quais vivem alargadas comunidades portuguesas. 

A  inserção em organizações multilaterais e as  relações bilaterais privilegiadas 

que o país  tem promovido  ao  longo da  sua história  são, em parte  (mas  apenas em 

parte),18 o resultado da nossa  localização geográfica. País de reduzida dimensão com 

uma única  fronteira terrestre, Portugal tem, como vários autores defendem  (Pereira, 

2007; Teixeira, 2010) oscilado entre a dimensão marítima e a dimensão continental, 

com efeitos diretos nas suas opções de Política Externa.  

De  acordo  com  Teixeira  (2010)  Portugal  conheceu  três modelos  de  inserção 

internacional.  

Um  primeiro  modelo  corresponde  ao  período  medieval  e  gira, 

fundamentalmente, em torno das relações peninsulares.  

Do séc. XV ao séc. XX, o autor considera um segundo modelo que designa como 

“clássico”  e  define  com  base  em  três  ideias:  a  perceção  contraditória  entre  o 

continente  e  o  mar,  entre  a  Europa  e  o  Atlântico,  o  afastamento  estratégico  em 

relação  à  Europa  (percecionada  como  ameaça  espanhola),  a  afirmação  do  vetor 

marítimo/a opção atlântica e a diversificação das alianças extrapeninsulares. Na opção 

atlântica, em primeiro lugar as alianças com as potências marítimas (primeiro o Reino 

Unido,  depois  os  EUA),  por  outro  lado  o  projeto  dos Descobrimentos  e  do  Império 

além‐mar. 

A democratização  resultou num  terceiro modelo de  inserção  internacional, o 

atual.  Depois  de  um momento  de  clara  indefinição  no  período  revolucionário,  o  I 

Governo Constitucional  iniciou uma nova  fase em que a opção europeia se  identifica 

como a principal inovação em política externa.  

                                                            18  Estamos  convictos  que  a  geografia  explica  uma  parte,  mas  não  define  o  todo,  influencia  sem determinar. 

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Para a economia do presente estudo  interessa‐nos este último período ditado 

pelo  fim  do  ciclo  imperial,  pela  descolonização  (Portugal  “encolheu”)  e  pela  opção 

europeia (Portugal procura “crescer” de novo). 

Os  documentos  oficiais  (Programas  de  Governo,  discursos  dos  atores 

relevantes) permitem  uma  leitura histórica  da  Política  Externa  e  a  identificação  das 

principais tendências.  

Pavia  e Monteiro  (2013)  fizeram  este  exercício  e  com  base  na  análise  dos 

Programas dos Governos de 1974 a 2013  identificam quatro ciclos na política externa 

portuguesa  desde  1974:  o  ciclo  da  descolonização  (1974‐76),  o  ciclo  de  adesão  às 

Comunidades Europeias (1976‐1985), o ciclo da institucionalização da Comunidade dos 

Países de Língua Portuguesa (1985‐1996) e o ciclo da Diplomacia Económica (o atual). 

António Telo (2008:146)19, por sua vez, identifica igualmente quatro fases que, 

pelo menos parcialmente, são coincidentes com aqueles ciclos. 

Para este autor, a primeira fase corresponde ao período de abril a setembro de 

1974 e tem como eixo central as grandes opções de descolonização. Depois considera 

uma segunda fase em que a tónica fundamental é a do “ (…) envolvimento externo na 

luta  para  o  estabelecimento  de  uma  democracia  pluralista  em  Portugal  “  (Telo, 

2008:147) e que decorre até novembro de 1975. A terceira naturalmente traduz‐se no 

ciclo da adesão  (embora com algum desfasamento  temporal relativamente a Pavia e 

Monteiro). António Telo não divide contudo a fase posterior e considera que a fase de 

1986  à  atualidade  diz  respeito  à  procura  de  renovação  da  secular  disfunção 

internacional20 de Portugal. 

No  período  imediatamente  após  a  Revolução,  destaque‐se,  pela  sua 

centralidade no presente estudo, a independência de Cabo Verde (5 de Julho de 1975) 

e a assinatura, na mesma data, de um Acordo Geral de Cooperação e Amizade com 

                                                            19  Refere‐se este autor às relações externas de Portugal e não da Política Externa que considera apenas como uma das suas componentes. 

20  No  entender  de  António  Telo,  “os  múltiplos  mecanismos  edificados  ao  longo  dos  séculos  que potenciam  e  aumentam  a  força  e  capacidade  de manobra  nas  relações  internacionais”  de  Portugal, dando como exemplos as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, os  fluxos  financeiros do exterior ou a posição estratégica, por exemplo dos Açores.   

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Cabo Verde (entre outros assinados com outras ex‐ colónias portuguesas), iniciando‐se 

a  cooperação  com  os  PALOP,  enquanto  vertente  importante  do  relacionamento 

externo da democracia portuguesa. 

A  Constituição  da  República  Portuguesa,  aprovada  a  2  de  Abril  de  1976, 

estabelece  os  princípios  a  que  nas  relações  internacionais  o  Estado  português  se 

vincula  e  estabelece  no  nº  3  do  art.º  7  que  Portugal  manterá  laços  especiais  de 

amizade e cooperação com os países de língua portuguesa21. A relação com os PALOP 

será,  desde  então,  uma  variável  sempre  presente  nos  objetivos  de  política  externa 

assumidos nos Programas dos diversos Governos.  

Todavia,  é  claro  que  existe  um  cruzamento  desta  variável  com  a  opção 

europeia,  logo desde o  início. No nosso entendimento, apesar de muitas vezes estas 

duas dimensões surgirem como dimensões alternativas, uma leitura mais cuidada não 

pode  deixar  de  evidenciar,  que,  efetivamente,  estas  duas  variáveis  têm  sido 

complementares ao longo da nossa história recente. 

O  Programa  do  I  Governo  Constitucional  (1976‐1978)  que  consagra  “  (…)  a 

separação formal entre política externa e política ultramarina“ (Pavia, 2013:45) integra 

igualmente  a  decisão  estratégica  de  solicitar  a  adesão  à  Comunidade  Económica 

Europeia.  

De  interesse  registar que,  reconhecendo o movimento dos PALOP no  sentido 

da adesão à Convenção de Lomé22 este Programa de Governo defende o seguinte: 

Entronca  aqui  uma  das  razões  para  que  Portugal  venha  a  integrar‐se  no 

Mercado Comum, visto que até que tal aconteça, Portugal assumirá o papel de 

um  país  terceiro,  sendo  forçado  a  assistir  ao  estabelecimento  de  atos 

privilegiados  entre  os  novos  países  Áfricanos  de  expressão  portuguesa  e  a 

Comunidade Económica Europeia (CEE). 

                                                            21  Optamos,  ao  longo  do  nosso  trabalho,  pela  utilização  de  um  formato  itálico  para  a  citação  de documentos oficiais e de normativos.  

22 Acordo comercial assinado, em 1975, entre a CEE e os países de África, Caraíbas e Pacifico  (ACP), a que veio a suceder o atual Acordo de Cotonu, assinado em 23 de Junho de 2000. 

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30 

O  pedido  de  adesão  à  CEE  é  formalmente  apresentado  em  28  de março  de 

1977: 

“...)  Em  nome  da  República  Portuguesa  e  em  conformidade  com  a  posição 

tomada  pela  Assembleia  da  República  sobre  este  assunto,  tenho  a  honra  de 

informar Vossa Excelência, por este meio, do pedido de adesão de Portugal à 

Comunidade Económica Europeia, em conformidade com o disposto no artigo 

237.º do Tratado que institui a CEE (...)”23 

Como defende António Telo o pedido de adesão “(…) deve ser entendido como 

um corte com o passado (…) uma inversão drástica da grande estratégia para Portugal 

(…) um corte de grande envergadura” (2008:207). 

Não podemos deixar de notar que no Parecer da Comissão Europeia  sobre o 

pedido  de  adesão  de  Portugal  (19  Maio  de  1978),  apesar  de  se  referirem  as 

dificuldades económicas se salienta que “(…) a adesão de Portugal,  tendo em conta, 

nomeadamente a  sua política de abertura para o mundo exterior e as  suas  relações 

tradicionais com a América Latina, a África e o Extremo Oriente,  irá reforçar o papel 

desempenhado pela Comunidade ao nível mundial”  (Parlamento Europeu, 2001:199). 

Por  outro  lado,  o  Programa  do  Governo  identifica  ainda  a  “necessidade  de 

“intensificar  os  contactos,  quer  a  nível  político  quer  a  nível  militar,  com  vista  à 

execução  dos  compromissos  decorrentes  da  Aliança”  (a  OTAN),  e  nas  relações 

bilaterais  defende  (para  além  do  Reino  Unido,  da  Espanha,  da  França  e  da  RFA)  a 

tradicional  amizade  com  os  EUA.  A  opção  europeia  não  era,  pois,  entendida  como 

excluindo uma política atlântica que se assume dever prosseguir. 

Apesar de  reconhecer dificuldades  com Angola e Moçambique  (existia  já um 

bom entendimento com a Guiné, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe), o Programa do  I 

Governo Constitucional  reserva  igualmente espaço para a cooperação com os países 

de  expressão  portuguesa,  destacando,  no  continente  americano,  a  relação  com  o 

Brasil. 

                                                            23  In Carta dirigida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros português ao Presidente do Conselho da CEE em 28 de Março de 1977. 

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31 

De acordo com Teresa Gouveia (2013) “ A nova política externa da democracia 

portuguesa fica, no essencial, definida no Programa do I Governo Constitucional e não 

vai mudar  até  aos nossos dias  (…) uma hierarquia  flexível entre  três dimensões –  a 

dimensão europeia, a dimensão atlântica e a dimensão Áfricana”. 

No Programa do II Governo Constitucional (1978) a opção pela adesão é central 

nos  vários  objetivos  e  planeamento  de  toda  a  ação  governativa.  Três  questões  nos 

interessam salientar neste ponto.  

Em  primeiro  lugar,  a  motivação  não  só  de  política  externa,  mas  também 

económica  e  política  da  adesão.  De  fato,  a  opção  pela  adesão  traduziu,  naquele 

momento uma forma de ancorar a democracia portuguesa a um modelo político e de 

sociedade: 

“ (…) A opção europeia era não apenas uma opção de política externa, mas uma 

opção  de modelo  constitucional  e  de modelo  económico.  (…),  fundamental, 

não  só  em  termos  de  política  externa mas  também  em  termos  de  política 

interna” (Lamego in Ferreira, 2001:89). 

Em segundo lugar, e uma vez mais, a ligação entre a opção europeia e a opção 

Áfricana.  Nas  grandes  linhas  de  orientação  política  e  de  política  externa,  surge  a 

“Opção  europeia,  com  preservação  da  identidade  e  da  soberania  nacionais,  sem 

prejuízo da valorização, no plano  internacional, da nossa experiência Áfricana”24, mas 

também  Desenvolvimento  de  uma  política  externa  diversificada,  fiel  às  alianças 

tradicionais, e empenhamento na intensificação das relações de amizade e cooperação 

com os Estados de língua portuguesa” 25. 

Por  último,  e  não menos  importante  para  a  economia  desta  reflexão  (muito 

antes pelo contrário), a  ideia expressa no Programa de Governo de que a opção pela 

adesão  implica grandes transformações a nível nacional como forma de preparação e 

internalização  do  acervo  comunitário.  Trata‐se,  pois,  do  início  da  Europeização  no 

sentido  top‐down, ou  seja na aceção do  impacto do processo europeu nos Estados‐

membros/futuros Estados‐membros. 

                                                            24  In Diário da República, II série‐A, nº 34, Suplemento I, de 3 de Fevereiro de 1978, p. 4 

25 Ibidem. 

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32 

Efetivamente, a opção tomada e o pedido feito junto do Conselho da CEE está 

na base de muitas medidas previstas no Programa do  II Governo Constitucional que 

reconhece a necessidade de adaptação das estruturas produtivas, das instituições mas 

também, naturalmente ao nível legislativo. 

O  processo  de  adaptação  perpassa  este,  como  todos  os  Programas  dos 

Governos seguintes (incluindo o atual) como veremos, relativamente ao nosso objeto 

de estudo, no último Capítulo do nosso trabalho.  

O designado ciclo da adesão termina na vigência do IX Governo Constitucional 

(1983‐1985) no qual se assume como a primeira prioridade programática em termos 

de  política  externa  a  Aceleração  da  fase  final  do  processo  de  negociação  para  a 

entrada  nas  Comunidades  Europeias,  com  encerramento  dos  dossiers  em  aberto  e 

lançamento de ofensiva diplomática que conduza a uma tomada de decisão por parte 

dos governos e das instâncias comunitárias26.  

O  Tratado  de Adesão  é  assinado  já na  vigência do Governo  seguinte,  em  12 

Junho de 1985, e Portugal passa  ser membro efetivo da CEE no dia 1 de  Janeiro de 

1986.  

O  processo  de  integração  europeia  prossegue  como  central27  mas  surgem 

depois objetivos específicos nos ciclos seguintes, como salientam Pavia e Monteiro  já 

que depois da realização daquele objetivo (a adesão), “Portugal tinha agora condições 

para se envolver mais ativamente noutros palcos” (2013:103).  

Um destes objetivos corresponde ao reforço da cooperação com os PALOP e o 

estabelecimento da CPLP.  

O  Programa  do  XIII  Governo  Constitucional  (1995‐1999)  identificando  três 

dimensões  prioritárias  no  domínio  da  Política  Externa  (europeia,  transatlântica  e 

Áfricana),  daria  prioridade  à  institucionalização  da  CPLP,  como  veremos  no  ponto 

seguinte. 

                                                            26 In Diário da Assembleia da República, II Série‐A, nº 6 Suplemento, de 21 de Junho de 1983, pp 9‐10 

27 Depois da adesão vem o processo de integração propriamente dito e também o de aprofundamento. 

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33 

Em suma, e como muitos autores sublinham, existe uma grande continuidade 

nos principais eixos da Política Externa Portuguesa desde 1974 até à atualidade. 

Como  refere  Severiano  Teixeira,  a  opção  europeia,  o  vetor  atlântico,  o 

estabelecimento de  relações com os PALOP e a  renovação das  relações com o Brasil 

são as traves‐ mestras da política externa portuguesa do período democrático, às quais 

se  junta  a  partir  dos  anos  noventa  “(…)  a  participação  portuguesa  na  produção  de 

segurança  internacional, com a presença dos militares portugueses nas operações de 

paz  da NATO,  da União  Europeia  (…)  e  das Nações Unidas”  (2010:54).  Com  efeito, 

sensivelmente a partir dos anos noventa a participação portuguesa em missões de paz 

soba  égide  sobretudo  da ONU  e  da UE  em  várias  partes  do Globo  representa  uma 

importante  dimensão  da  Política  Externa  Portuguesa  que  não  pode  deixar  de  ser 

referenciada. 

Existe, todavia, uma prioridade de primeira linha para um conjunto de objetivos 

e relações privilegiadas no posicionamento externo de Portugal que se localizam “ (...) 

nos  quatro  lados  do  retângulo  atlântico:  a  Europa,  a  América  do Norte,  a  América 

Latina e a África” (Almeida, 2010:89). 

Numa outra visão,  como afirmou Medeiros Ferreira  (2010:43),  caso o estudo 

das negociações  financeiras  internacionais do Estado português nos séculos XIX e XX 

estivesse feito, poderíamos verificar que (…) a história da Política Externa Portuguesa 

é, em grande parte, a história da captação do capital no exterior para as necessidades 

da  economia  interna”.  Uma  diplomacia  económica  (expressamente  assumida  no 

Programa do atual Governo Constitucional) que parece estar, assim, subjacente e ser 

intemporal na Política Externa Portuguesa. 

II.2  Contornos da dimensão Áfricana 

II.2. 1 – A relação com os PALOP  

Com  uma  leitura  cuidada  dos  Programas  de  Governo  e  outros  documentos 

programáticos  

“(…)  facilmente  se  constata que  a  relação  com África e  em particular  com o 

conjunto de países de expressão portuguesa é um dado incontornável da ação 

externa  do  Estado  português.  Talvez mesmo  um  dos  que,  historicamente  se 

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compagina com os mais fortes e perduráveis traços de  identidade de Portugal 

na comunidade internacional” (MNE,1995:11). 

Assim, a presente análise não pode deixar de  lado uma referência particular à 

dimensão Áfricana. É, aliás, fundamental para o objeto do nosso estudo. 

Os  vários  processos  de  descolonização,  constituíram  uma  das  primeiras 

questões a que a Política Externa Portuguesa teve de dar resposta e a procura de uma 

relação privilegiada com aqueles países Áfricanos é questão central que, com maior ou 

menor acuidade, surge nos vários Programas de Governo desde o final da Ditadura. 

Com efeito, desde 1974, está subjacente em todos os Programas de Governo, 

uma clara preocupação em reinventar as relações com as antigas colónias, de forma a 

apagar as marcas deixadas pelas guerras coloniais e pelo processo de descolonização. 

Como refere João Cravinho, “(…) as elites portuguesas tentam (…) encontrar uma base 

nova e estável relativamente às relações de Portugal com África” (Cravinho, 2005:90). 

Esta é uma matéria central logo no Programa do I Governo Constitucional como 

vimos, mas mesmo no período em que o  investimento se concentrou no objetivo de 

adesão  à  CEE,  a  cooperação  com  os  Estados  de  língua  portuguesa  foi  sempre 

identificada  como  uma  das  opções  estratégicas. Nesse  sentido,  defende  ainda  João 

Cravinho que: 

“(…) mesmo  que  o  futuro  de  Portugal  seja  entendido  como  pertencendo  à 

Europa, permanece o  sentimento de que as  relações privilegiadas com África 

podem  contribuir  para  ultrapassar  as  limitações  intrínsecas  de  um  país, 

simultaneamente, periférico do ponto de vista geográfico e fraco do ponto de 

vista económico, num contexto de expansão europeia” (Cravinho, 2005:92).28 

Esta procura de uma  recuperação da  ligação  com as ex‐colónias é visível nos 

documentos programáticos ao longo dos anos. Vejamos: 

O relacionamento e cooperação com os novos Estados Áfricanos de expressão 

portuguesa ocupará lugar específico e de particular relevo no âmbito da nossa 

política externa (Programa do II Governo Constitucional, 1978); 

                                                            28 Tradução da nossa autoria. 

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A  Comunidade  de  língua  é  afinal,  o  expoente  e  o  símbolo  da  existência  de 

vínculos e afinidades históricas fundamentais cujas potencialidades (…) – desde 

a  materialidade  das  trocas  comerciais  até  à  solidariedade  humana  que  as 

correntes migratórias criam, ‐ terão de constituir uma das grandes prioridades 

da  ação  do  Governo  na  ordem  externa.  No  elenco  de  Ações  prioritárias,  a 

identificação  da  Implementação  dos  Acordos  de  Cooperação  com  Angola, 

Moçambique, Guiné‐Bissau, Cabo Verde e S.Tomé e Príncipe  (Programa do  III 

Governo Constitucional, 1978); 

Especial  atenção  será  dada  às  relações  de  Portugal  com  os  Estados  do 

continente Áfricano  (…)  serão envidados esforços para  incrementar, alargar e 

solidificar  uma  política  de  cooperação  global  com  os  novos  Estados  de 

expressão portuguesa, na base de  interesse mútuo e do estrito  respeito pelas 

soberanias nacionais (Programa do IV Governo Constitucional, 1978‐1979); 

Entende o Governo que a revitalização das relações com os países ex‐colónias 

portuguesas, é um dos objetivos  fundamentais deste período  (Programa do V 

Governo Constitucional, 1979‐1980); 

De  acordo  com  José Carlos Venâncio  (citado por Pavia  e Monteiro,  2013:77) 

“(…) o VI Governo Constitucional ( 1980‐1981) colocou maior empenho na cooperação 

com os PALOP  (…) uma política de  relacionamento diplomático e de  cooperação de 

Estado  a  Estado”.  O  Governo  seguinte,  com  a  mesma  base  política,  viria  a  dar 

seguimento a esta política. 

A partir dos finais dos anos oitenta e depois de cumprido o objetivo de adesão 

à  CEE  (como  já  referimos),  o  investimento  viria  a  ser  feito  na  instituição  da 

Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), o que é expressamente assumido 

no  Programa  do  XIII  Governo  Constitucional  (1995‐1999)  como  uma  prioridade  – 

procurando com todo o empenho, constituir, com os Países Áfricanos de Língua Oficial 

Portuguesa e com o Brasil, uma Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. 

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No Programa daquele Governo pode  ler‐se que O Governo ativará a vertente 

Áfricana  da  sua  política  externa  (…)  Portugal  deve,  de  forma  particular,  reforçar  as 

suas relações com a África Austral.29. 

A  CPLP  tem  na  sua  base  uma  partilha  histórico‐cultural  que  se  traduz  numa 

língua comum. E, é assim, que os primeiros passos tendentes ao seu estabelecimento 

são dados com a criação do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), criado 

em Novembro de 1989, no 1º Encontro dos Chefes de Estado e de Governo dos países 

de Língua Portuguesa (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique, Portugal 

e S. Tomé) realizado no Brasil.  

Fig. 2 – Mapa dos países da CPLP 

FONTE: CPLP, em http://www.cplp.org/id‐22.aspx 

Estabelecida em 17 de Julho de 1996, a CPLP tem três objetivos gerais30: 

A  concertação  político‐diplomática  entre  seus  Estados‐membros, 

nomeadamente para o reforço da sua presença no cenário internacional; 

A  cooperação  em  todos  os  domínios,  inclusive  os  da  educação,  saúde, 

ciência  e  tecnologia,  defesa,  agricultura,  administração  pública, 

comunicações, justiça, segurança pública, cultura, desporto e comunicação 

social; 

                                                            29 É nesta zona de África que se situam os dois maiores PALOP  (Angola e Moçambique) e existe uma importante comunidade portuguesa na África do sul. 

30  De acordo com o nº 4 dos seus Estatutos, disponíveis em: http://www.cplp.org/Files/Filer/cplp/CCEG/IX_CCEG/Estatutos‐CPLP.pdf 

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A materialização de projetos de promoção e difusão da língua portuguesa. 

Para além dos PALOP e Brasil e, a partir de 2002, Timor Leste, a X Conferência 

de  Chefes  de  Estado  e  de  Governo  da  CPLP  (Dili,  23  de  julho  de  2014)  aprovou  a 

adesão  da Guiné  Equatorial  como  Estado membro e aprovaou  a  Resolução  sobre  a 

concessão da  categoria de Observador Associado da CPLP à Geórgia, à República da 

Namíbia, à República da Turquia e ao Japão que assim se juntam, neste estatuto à  Ilha 

Maurícia e ao Senegal.  

Nos  Programas  de Governo  seguintes  a  relação  com  os  PALOP  e  o  papel  da 

CPLP foram sendo, sempre, destacados no quadro das prioridades da Política Externa 

Portuguesa. 

O  atual Governo  (XIX Governo  Constitucional),  no  seu  Programa,  estabelece 

como  nova  prioridade  a  definição  de  uma  fortíssima  diplomacia  económica  numa 

política externa assente em três opções: europeia, atlântica e lusófona e a título desta 

última  define,  como  um  dos  objetivos  estratégicos  Redobrar  a  importância  do 

relacionamento  com  os  países  de  expressão  portuguesa,  tendo  sempre  presente  a 

relevância  da  língua  que  nos  une,  que  no  quadro  da  CPLP  se  revela  estratégica  e 

economicamente relevante31. 

A dimensão da  cooperação não pode, neste âmbito  ser esquecida  já que, na 

relação com os PALOP, a cooperação para o desenvolvimento é vetor estruturante da 

Política Externa Portuguesa. 

A este título, três documentos são de salientar no período em análise. 

Em 1999, procurando uma abordagem coerente e sistemática, o XIII Governo 

Constitucional  aprovou  em  Conselho  de  Ministros  um  documento  de  orientação 

estratégica “A Cooperação Portuguesa no Limiar do Século XXI” no qual se lê que:  

O importante desafio que se coloca a Portugal é o de saber articular, nos planos político,  económico  e  cultural, a dinâmica da  sua  integração  europeia  com a dinâmica de constituição de uma comunidade, estruturada nas relações com os países e as comunidades de língua portuguesa no mundo, e de reaproximação a outros  povos  e  regiões.  (…)  Torna‐se  assim  necessário  dotar  a  política  de cooperação de mais rigor e coerência estratégica, de um comando político mais 

                                                            31 Diário da Assembleia da República, II Série‐A,nº4. de 28 de Junho de 2011, p.101 

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eficaz, de uma organização mais  racional  e de um  sistema de  financiamento adequado.”(Resolução do Conselho de Ministros nº 43/99, de 18 de Maio). 

  

Procurava‐se,  à  data,  ultrapassar  um modelo  descentralizado  que,  com  uma 

grande  dispersão  de  meios  pelos  vários  Ministérios,  não  permitia  uma  política 

verdadeiramente coerente. Foram então definidos cinco objetivos específicos de curto 

prazo:  reforçar  a  democracia  e  o  Estado  de  direito,  reduzir  a  pobreza,  estimular  o 

crescimento económico, promover o diálogo e a integração regionais e promover uma 

parceria europeia para o desenvolvimento humano. Depois de duas décadas de ajuda 

portuguesa ao desenvolvimento às suas antigas colónias, a visão daquele documento 

estratégico mantém  a  concentração  dos  esforços  na  ajuda  ao  desenvolvimento  dos 

PALOP, não só em função das dificuldades que vivem, mas também tendo em conta o 

objetivo estratégico de consolidar e reforçar a Comunidade dos Países de Língua Oficial 

Portuguesa  e  a  sua  afirmação  no  sistema  internacional.  Ao  nível  sectorial,  as 

prioridades centram‐se na formação, educação, cultura e património; saúde; atividade 

produtiva e infraestruturas; sociedade e suas instituições e segurança.  

Esta abordagem  seria  reiterada no documento “Uma visão estratégica para a 

cooperação portuguesa”, aprovada em 200532 no qual se mantêm os países de língua e 

expressão  portuguesa,  sobretudo  os  PALOP  e  Timor‐Leste,  como  espaços  de 

intervenção prioritária da Cooperação Portuguesa. 

Um terceiro documento é digno de nota. Em  fevereiro de 2014  foi adotado o 

“Novo Conceito Estratégico da Cooperação Portuguesa 2014‐2020”33 que se baseia em  

quatro princípios:  

A coerência/coordenação entre parceiros;  

A concentração geográfica e setorial, apostando em projetos com dimensão 

e natureza estruturante; 

A  apropriação,  com  enfoque  no  desenvolvimento  de  capacidades  e  na sustentabilidade;  

                                                            32  Resolução  do  Conselho  de Ministros  nº  196/2005,  de  24  de  novembro,  publicada  no  Diário  da República, I série B nº 244 de 22 de dezembro de 2005. 

33 Resolução do Conselho de Ministros nº 17/2014 de 27 de fevereiro de 2014, publicada no D.R. nº 47, 1ª Série, de 07 de março de 2014 

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39 

 

A parceria, através da partilha de capacidades e  recursos,  incluindo  fontes de financiamento.  

 

O Conceito Estratégico  tem  como prioridades  geográficas os PALOP e  Timor‐

Leste e define que, para além de prosseguir o  investimento nos sectores tradicionais 

(educação e ciência, saúde, capacitação, proteção social e emprego e segurança), deve 

ser  feita  uma  aposta  em  novos  domínios  como  o  crescimento  verde,  a  energia,  o 

sector privado e o desenvolvimento  rural e do mar. Claramente assumida  como um 

pilar da Política Externa Portuguesa, a Política da Cooperação Portuguesa deve ter, nos 

termos deste Novo Conceito, uma abordagem integrada, coordenada e supervisionada 

pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. 

Fig. 3 – Síntese dos Objetivos, Princípios e Prioridades da Cooperação Portuguesa 

 

  

 FONTE: DR, 1ª série, nº 47 – 7 de março de 2014 

Coerência/Coordenação 

Parceria  Apropriação Concentração

Governação, Estado de direito  

Desenvolvimento Humano e Bens Públicos Globais 

Educação e Ciência  Saúde  Ambiente, Crescimento verde e Energia 

Desenvolvimento rural e mar 

Proteção e inclusão social e emprego 

Capacitação institucional  Segurança e Desenvolvimento 

Atores  MNE ‐ Camões, I.P

Ministérios  Setor Privado 

ONGDFundações 

 

Municípios  Universidades 

Tipos de ajuda

Intervenção 

tipo projeto 

Contribuições 

gerais 

ApoioOrçamental 

Bolsas  Peritos e 

Assistência 

Objetivos 

Erradicação da pobreza e desenvolvimento sustentável dos países terceiros 

Prioridades Geográficas e sectoriais

PAÍSES ÁFRICANOS DE LÍNGUA OFICIAL PORTUGUESA E TIMOR LESTE 

Igualdade de género e direitos da criança

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40 

A Cooperação atua a três níveis: cooperação para o desenvolvimento, educação 

para o desenvolvimento e ajuda humanitária e de emergência.

Num momento de crise financeira, o novo conceito introduz  

 “  (…)  novos  modelos  de  financiamento,  apostando  na  diversificação  e 

alavancagem  de  fontes  bilaterais  e  multilaterais,  combinando  a  tradicional 

ajuda  pública  ao  desenvolvimento  com  outros  fluxos  de  investimento  e 

comércio internacional”34.  

Este  documento  procura  dar  resposta  aos  novos  desafios  e  realidades 

internacionais, estando aliás alinhado com o novo Quadro Financeiro Plurianual da UE 

para 2014‐2020, no qual estão previstos cerca de mil milhões de euros para os PALOP 

e Timor‐Leste – um apoio  financeiro que deverá apoiar o  investimento dos Estados‐

membros neste domínio. 

Finalmente,  não  se  pode  deixar  de  fazer  uma  referência  muito  especial  à 

cooperação técnico‐militar que Portugal tem vindo a desenvolver com e nos PALOP. 

O vetor militar tem‐se vindo a assumir, nos últimos anos, como um instrumento 

cada vez mais relevante da Política Externa Portuguesa. Esta matéria ganha relevo nas 

nossas relações com os PALOP. É assim que o Conceito Estratégico de Defesa Nacional 

(CEDN) no  quadro  do  objetivo  de  Afirmar  Portugal  como  coprodutor  de  segurança 

internacional,  define  que  compete  ao  Estado  português  “Estabelecer  parcerias 

estratégicas  de  segurança  com  os  países  da  CPLP,  abertas  a  iniciativas  conjuntas  no 

domínio  da  segurança  e  da  defesa  e  Incrementar  o  esforço  que  vem  sendo 

desenvolvido na área da cooperação técnico‐militar” (CEDN,2013:35). 

A  Cooperação  Técnico‐Militar  (CTM)  é  desenvolvida  com  os  PALOP  desde  a 

década de oitenta do século passado, embora se tenha iniciado com ajudas de caráter 

pontual, logo após as independências daqueles países. Pretende afirmar a presença de 

Portugal no mundo, contribuir para o apoio ao desenvolvimento, para o estreitamento 

da  cooperação  na  CPLP  e  para  a  estabilidade  dos  PALOP  e  de  Timor  Leste.  É 

                                                            34  Luís Campos  Ferreira,  Secretário de Estado dos Negócios  Estrangeiros  e da Cooperação ‐ Opinião, Jornal  Público  de  25.03.2014,  disponível  em  http://www.publico.pt/política/noticia/o‐novo‐conceito‐estrategico‐da‐cooperacao‐portuguesa‐20142020‐1629575 

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41 

operacionalizada através de projetos  inscritos nos Programas‐Quadro da Cooperação 

Portuguesa  e  centra‐se  fundamentalmente  na  capacitação  institucional,  formação 

militar e serviços (fardamento e equipamento). De 1993 a 2011, “(…) participaram em 

ações  de  CTM  3  775 militares  das  Forças  Armadas  Portuguesas”  (DGPDN,  cit.  em 

Figueiredo, 2011: 6). 

Fig. 4 – Cooperação Técnico‐militar com os PALOP 

 

FONTE: Ministério da Defesa, http://www.emgfa.pt/ 

 

II.2.2 – Trazer África para a Europa 

No  contexto  europeu,  Portugal  tem  promovido,  em  muito,  as  questões 

Áfricanas  junto  dos  seus  parceiros  europeus.  ‐  “(…)  temos  no  âmbito  da  União 

Europeia (…) desenvolvido uma atividade consistente e permanente (…) no sentido de 

reforçar  o  diálogo  euro‐Áfricano,  como  prioridade  no  topo  da  agenda  externa 

(Antunes, 2007:12). 

O  exercício  da  Presidência  rotativa  do  Conselho  da  União  Europeia 

representou,  naturalmente,  um  momento  de  particular  relevo  e  utilidade  nesse 

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42 

sentido35. A 3ª Presidência Portuguesa, no segundo semestre de 2007, foi, a este título, 

emblemática, mas não exclusiva. 

A vertente externa foi sempre considerada uma prioridade nos Programas das 

várias Presidências Portuguesas do Conselho da UE. 

A Presidência Portuguesa do Conselho da UE no primeiro  semestre de 1992, 

estabeleceu  três  prioridades:  consolidar  o  Tratado  da  União  Europeia  (Tratado  de 

Maastricht), reforçar as relações com o resto do mundo36 e perspetivar o alargamento. 

O Tratado de Maastricht representou um importante avanço na política de cooperação 

para o desenvolvimento37, questão  importante nas relações da Europa com África. O 

Ponto  13  das  Conclusões  do  Conselho  Europeu  de  junho  de  199238  é  dedicado  às 

Relações  entre  a  Comunidade  Europeia  e  seus  Estados‐membros  e  os  países  em 

desenvolvimento  e  o  ponto  16  refere‐se  às  questões  da  África  Austral  (situação  na 

África do Sul e também de Moçambique).  

No Relatório para o Conselho Europeu de Lisboa sobre a evolução provável da 

Política  Externa  e  de  Segurança  Comum  (PESC)  com  vista  à  identificação  de  áreas 

passíveis de ações comuns em relação a determinados países ou grupos de países que 

constitui  o  Anexo  I  daquelas  Conclusões,  o  Conselho  Europeu  defende  a  particular 

importância das relações Norte‐Sul e refere que a União poderá desenvolver as suas 

atividades em  relação aos países de África  (e  também América Latina, Caraíbas e da 

Ásia)  em  todas  as  vertentes  das  suas  relações  (por  exemplo,  políticas  externa,  de 

segurança,  económica  e  de  desenvolvimento),  de  maneira  a  contribuir  para  o 

desenvolvimento dessas regiões (ponto 17 do Relatório). 

                                                            35  Afloramos  aqui  de  alguma  forma  a  Europeização  no  sentido  bottom‐up  que, muito  embora  não corresponda  ao  nosso  objeto  de  estudo,  é  consequente  para  a  nossa  análise,  como  referimos  no Capítulo I. 

36 Recorde‐se a assinatura do Acordo‐Quadro de Cooperação entre a Comunidade Económica Europeia e a República Federativa do Brasil, em Brasília, em 29 de junho. 

37 Com este Tratado, a Política de desenvolvimento é formalmente assumida, com  objetivos  definidos no artigo 130 U do Tratado. 

38  Conclusões  da  Presidência,  Conselho  Europeu  de  Lisboa,  26/27  de  junho  de  1992,  disponível  em: http://www.european‐council.europa.eu/media/848538/1992_junho_‐_lisboa__p_.pdf 

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43 

Note‐se, finalmente, que data de 1992 o Primeiro Programa Indicativo Regional 

de  Cooperação  da  Comunidade  Europeia  com  os  PALOP  (PIR  PALOP)  no  âmbito  da 

Convenção  de  Lomé  IV.  O  PIR  tinha  como  objetivos  específicos  a  promoção  dos 

sistemas  de  educação,  a  formação  no  domínio  da  saúde,  o  reforço/capacitação 

institucional e a cooperação cultural39. 

Nas  vésperas  da  segunda  Presidência  Portuguesa  do  Conselho  da  UE,  o 

Programa do XIII Governo Constitucional  (1995‐1999) definia  já que “(…) Ao nível da 

União  Europeia,  Portugal  deverá  atuar  como  um  agente  de  sensibilização  para  os 

problemas  do  continente  Áfricano  e  assumir  uma  postura  político‐diplomática  de 

promoção e aprofundamento do diálogo euro‐Áfricano” (Paiva,2013:131). 

De facto, a segunda Presidência Portuguesa que decorreu de 1 de Janeiro a 30 

de  junho de 200040  ficaria marcada pela  realização da 1ª Cimeira África‐Europa, que 

decorreu sob a égide da Organização da Unidade Áfricana (OUA) e da UE, no Cairo, a 3 

e  4  de  abril,  que  adotou  o  Plano  de  Ação  do  Cairo.  Esta  Cimeira  é  um  marco 

fundamental  nas  relações  entre  os  dois  continentes  e,  certamente,  um  ponto  de 

viragem na abordagem da UE.  

Mas foram várias as iniciativas promovidas por esta Presidência Portuguesa: 

“Logo em  janeiro de 2000, a Presidência organizou um Conselho  Informal dos Ministros do Desenvolvimento que inaugurou o debate sobre as condições para uma «Nova Parceria entre a União Europeia e África» e foi dado um importante impulso para a aprovação de uma nova convenção entre a UE e os países do Grupo ACP  (África, Caraíbas  e Pacífico) mediante  a  revisão da Convenção de Lomé”. (Ferreira‐Pereira,2008:139). 

 

O Conselho Europeu de Santa Maria da Feira, de 19 e 20 de junho, (Conclusões 

da Presidência), reiterou os compromissos assumidos no Cairo, congratulou‐se com a 

disponibilidade manifestada por Portugal de acolher a próxima Cimeira Europa‐África 

em Lisboa, em 2003, (o que acabaria por ser adiado) e reiterou a sua disponibilidade 

                                                            39  Os  projetos  incluíam  formação  em  Portugal,  promoção  da  língua  portuguesa  e  cooperação  com Portugal em geral. 

40 Período no qual Portugal assumiu igualmente a Presidência da União da Europa Ocidental (UEO). 

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44 

para continuar a apoiar medidas que visem um  rápido crescimento económico e um 

desenvolvimento sustentável em África.  

Mas  a Presidência  foi,  ainda, marcada pela  assinatura do Acordo de Parceria 

entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP) e a Comunidade Europeia e 

os seus Estados‐Membros, em Cotonu, a 23 de Junho (Acordo de Cotonu)41. 

O  Programa42  da  terceira  Presidência  Portuguesa  do  Conselho  da  UE,  que 

decorreu de 1 de  julho a 31 de dezembro de 2007, reflete, no domínio externo43 um  

dos eixos da Política Externa Portuguesa, as relações com África:  

África e a Europa têm uma história recente de oportunidades perdidas. Chegou o momento de acordarem numa Estratégia Conjunta. Temos de agir  juntos e sermos  vistos  a  agir  em  concerto. A  ênfase  que  colocamos  na  realização  em Lisboa  da  Cimeira  entre  a  UE  e  África  resulta  desta  perceção  (Programa  da Presidência Portuguesa de 2007). 

 

Como  refere  Lobo  Antunes  (2007:11),  um  dos  pontos  centrais  da  Política 

Externa  para  África  foi,  nas  vésperas  da  terceira  Presidência  Portuguesa,  uma 

aproximação efetiva à União Áfricana44, mas  também às organizações  sub‐regionais, 

em  particular  a  Comunidade  de  Desenvolvimento  da  África  Austral  (SADC)  e  a 

Comunidade Económica dos Estados da África Austral (CEDEAO). 

Como se pode ler no Balanço da Presidência Portuguesa de 200745,  

                                                            41 O Acordo foi assinado entre os países ACP e os então 15 Estados‐membros da UE, no dia 23 de junho de 2000, na cidade de Cotonu, no Benim. 

 42 Portugal  integrou o trio de Presidências (Alemanha, Portugal, Eslovénia) que elaborou um Programa do Trio para os dezoito meses, a partir do qual cada uma das Presidências apresentou o Programa para o  seu  semestre.  Prioridades  da  Presidência  Portuguesa  disponíveis  em https://infoeuropa.eurocid.pt/registo/000038660/documento/0001/ 

43 Não podemos esquecer que a Presidência Portuguesa  ficou marcada pela adoção da Estratégia de Lisboa, um marco  fundamental no processo de  integração europeia, mas o enfoque do nosso estudo reside na dimensão externa na qual Portugal obteve também resultados, naturalmente, no quadro da atuação de todas as instituições comunitárias e dos parceiros europeus. 

44 Nesse sentido Portugal nomeou um Embaixador em Addis Abeba , na Etiópia. 

45 Balanço do Ministério dos Negócios Estrangeiros disponível em https://infoeuropa.eurocid.pt/registo/000040070/documento/0001/ 

 

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45 

Portugal continuou a desenvolver e a reforçar uma persistente ação diplomática 

em  diversas  instâncias  incluindo  junto  da  União  Áfricana,  tendo  em  vista  o 

reforço  do  diálogo  euro‐Áfricano,  a  finalização  dos  documentos  a  serem 

apresentados na 2ª Cimeira e a efetiva realização e sucesso deste encontro. 

Esta Presidência ficaria, pois, marcada pela realização da 2ª Cimeira UE‐África, 

em Lisboa, a 8 e 9 de dezembro, na qual foi adotada a Estratégia Conjunta UE‐África 

que  estabelece,  na  relação  entre  os  dois  continentes,  um  novo  paradigma  de 

verdadeira parceria entre iguais.

A  Estratégia  Conjunta  constitui  e  estabelece  os  princípios,  objetivos, 

metodologia  e  grandes  áreas  de  interesse  comum,  cujas  medidas  são  depois 

desenvolvidas no Plano de Ação. A Declaração de  Lisboa,  igualmente adotada nesta 

Cimeira, destaca a alteração estratégica no relacionamento entre os dois continentes, 

bem como os mecanismos de seguimento da Cimeira. 

No  decorrer  desta  Presidência  Portuguesa  foram  igualmente  assinados  dois 

documentos relevantes: o Memorando de Entendimento entre a Comissão Europeia os 

PALOP e Timor‐Leste  (que deu  continuidade ao PIR PALOP), no quadro do 10º  Fundo 

Europeu de Desenvolvimento (FED) e o Memorando de Entendimento entre a Comissão 

Europeia e o Secretariado Executivo da CPLP, com o objetivo de reforçar a concertação, a 

cooperação e a coordenação no sentido de promover a eficácia dos projetos conjuntos. 

Digno de nota muito em particular, é a assinatura da Parceria Especial entre a 

União Europeia e Cabo Verde, a primeira que a União estabeleceu com um país ACP, 

que veremos com maior detalhe nos capítulos seguintes, dada a sua centralidade no 

presente estudo. 

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46 

CAPÍTULO III – A AÇÃO EXTERNA DA UE 

III.1 – Evolução histórica, natureza e prioridades geográficas 

Tendo em mente o objetivo da nossa reflexão é  importante considerar a Ação 

Externa da UE.  

Referimos,  de  forma  consciente,  Ação  Externa  e  não  Política  Externa. 

Pretendemos, desta  forma,  acautelar  as diferenças entre a Política Externa do  ator‐

Estado e a ação no domínio externo de uma  realidade híbrida que  (pelo menos por 

ora) não é assimilável ao ator‐Estado. Fazemos, simultaneamente, remissão à própria 

terminologia  do  Tratado  de  Lisboa46,  mas  consideramos  igualmente  a  dimensão 

externa das políticas  internas, de peso cada vez maior  (veja‐se, por exemplo, o peso 

das questões migratórias na dimensão da segurança). 

Apesar  de  tudo,  muito  se  tem  evoluído  (embora  de  forma  algo  lenta)  na 

dimensão externa da UE quer do ponto de vista do direito internacional quer do ponto 

de vista das relações internacionais. 

Como refere Severiano Teixeira, “A construção europeia tem, inequivocamente, 

uma  dimensão  internacional  (…)  sendo  hoje,  um  dos  atores  centrais  da  cena 

internacional contemporânea” (Teixeira, 1998:121). 

A dimensão  internacional  iniciou‐se no domínio da Política Comercial Comum. 

Nas décadas de cinquenta e sessenta do século passado,  

“  (…) a Comunidade desenvolveu e assegurou uma presença  internacional de 

algum  relevo  através  das  suas  relações  económicas  internacionais,  que  se 

materializavam  numa  poderosa  e  complexa  rede  de  acordos  comerciais  “ 

(Teixeira,1998:123). 

Depois  do  fracasso  da  Comunidade  Europeia  de  Defesa,  o  mecanismo  de 

coordenação das políticas externas nacionais (Cooperação Política Europeia  ‐ CPE) de 

natureza puramente intergovernamental, criado por força das circunstâncias, evoluiu e 

                                                            46 Sob esta designação o Tratado inclui os domínios materiais enquadrados formalmente nesta categoria e as  respetivos  regras e procedimentos, deixando, contudo, de  fora a dimensão externa das políticas internas que serão igualmente consideradas nesta reflexão. 

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47 

veio  a  ser  institucionalizado  através  do  Ato  Único  Europeu  que  procedeu  à 

consagração de uma prática pré‐existente.  

A sua substituição foi operada pelo Tratado de Maastricht, em 1992, através do 

segundo pilar da União Europeia, com a Política Externa e de Segurança Comum (PESC) 

que alargou os objetivos da CPE. Pouco depois, o Tratado de Amesterdão, em 1997, 

introduzia duas alterações  importantes: a criação do Alto Representante para a PESC 

(um  rosto  para  a  Ação  Externa  da  UE)  e  as  “missões  de  Petersberg”  (missões 

humanitárias e de evacuação, missões de manutenção da paz e missões de forças de 

combate para a gestão de crises, incluindo missões de restabelecimento da paz). 

O Tratado de Lisboa “(…)  reconfigurou a atuação externa da União Europeia” 

(Mesquita,  2011:  15).  Com  efeito,  o  Tratado,  que  elimina  a  estrutura  de  pilares, 

procede a algumas  inovações/alterações  significativas: a atribuição de personalidade 

jurídica  à  UE,  a  organização  de  uma  série  de  domínios  sob  o  chapéu  das  relações 

externas, bem como diversas alterações orgânicas. São criados o cargo do Presidente 

do  Conselho  Europeu,  de  Alto  Representante  para  os  Negócios  Estrangeiros  e 

estabelecido um  Serviço  Europeu de Ação  Externa  (SEAE).  Todavia,  tudo  continua  a 

depender, em última instância, dos Estados‐membros, não tendo efetivamente havido 

uma plena comunitarização da PESC. Como adianta Goucha Soares, 

 “(…) o Tratado de Lisboa permitiu a entrada em vigor de um conjunto de novos meios  de  natureza  política,  diplomática  e  militar  que,  se  devidamente implementados, consentirão à Europa aspirar a um nível de protagonismo na cena  internacional mais consentâneo com aquele que desempenha no quadro das relações econômicas externas. (…) A concretização de uma política externa europeia e de uma política de defesa dependerá, todavia, da vontade política dos Estados‐membros (Soares, 2011:102). 

Atualmente, os domínios  incluídos diretamente na Ação Externa da UE  são a 

Política Externa e de Segurança Comum, a Política Comercial Comum, a Cooperação 

com  países  terceiros  (cooperação  para  o  desenvolvimento,  cooperação  económica, 

financeira e técnica) e a Ajuda Humanitária. 

   

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48 

Sendo o maior bloco  comercial do mundo,  as  relações  comerciais da UE  são 

centrais  nas  relações  externas  da  União.  A  Política  Comercial  Comum  (PCC)  é 

efetivamente  uma  política  comum  na  qual  se  reflete  o  caráter  supranacional  do 

projeto europeu. Desde 1957, a PCC tem vindo a tornar‐se cada vez mais abrangente 

no sentido de dar resposta à evolução do comércio internacional.  

Igualmente  central  nas  relações  externas  é  a  política  de  cooperação  para  o 

desenvolvimento. Tal como se  lê na Comunicação da Comissão Europeia, Aumentar o 

impacto da política de desenvolvimento da UE: uma Agenda para a Mudança,  

“Nos  termos do Tratado de Lisboa, o apoio aos esforços empreendidos pelos 

países em desenvolvimento para erradicar a pobreza constitui uma prioridade 

da  ação  externa  da  UE  e  o  objectivo  primeiro  da  sua  política  de 

desenvolvimento.  Esta  política  contribui  igualmente  para  fazer  face  a  outros 

desafios  globais  e  ajuda  a  concretizar  a  Estratégia  Europa  2020”  (Comissão 

Europeia, 2011:3).  

A UE é hoje, de acordo com os dados da OCDE, o maior doador de ajuda ao 

desenvolvimento. “A Ajuda Pública ao Desenvolvimento  (APD) concedida pela UE no 

seu  conjunto  (instituições  e  Estados‐Membros)  aumentou,  passando  de  55,3  mil 

milhões de euros em 2012 para 56,5 mil milhões em 2013” (Comissão Europeia, 2014). 

Também no domínio da Ajuda humanitária a UE ocupa lugar de destaque: 

“Atualmente,  a União disponibiliza, em média, mais de mil milhões de euros 

por  ano  para  apoiar  as  populações  mais  vulneráveis  no  mundo  inteiro.  Se 

juntarmos  a  este  montante  o  financiamento  concedido  pelos  Estados‐

Membros, a União Europeia é o principal doador de ajuda humanitária a nível 

mundial,  contribuindo  com  mais  de  metade  da  ajuda  humanitária  oficial” 

(Comissão Europeia, 2014:10). 

A  UE  mantem  relações  diplomáticas  com  praticamente  todos  os  países  do 

mundo e participa de forma ativa numa série de organizações internacionais, tomando 

inclusive  posições  concertadas,  em  determinados  domínios,  no  seio  das  Nações 

Unidas. Existem atualmente cento e trinta e nove delegações e escritórios da UE em 

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49 

todo o mundo. A União tem vindo a desenvolver relações privilegiadas com parceiros 

estratégicos 

“  (…) cujo apoio e cooperação é essencial para enfrentar os grandes desafios 

globais  em  termos  de  segurança,  desenvolvimento  sustentável  ou  na  luta 

contra as mudanças climáticas  (…) EUA, Canadá, México, Brasil, China, Rússia, 

India, África do Sul, Japão e Coreia do sul” ( Zacarias, 2013:19). 

 No domínio das relações externas regionais e na medida em que, por força do 

objeto  do  nosso  estudo,  as  relações  com  África  serão  objeto  de  um  sub‐capítulo 

especifico,  afigura‐se  importante  fazer  uma  referência  muito  particular  à  Política 

Europeia de Vizinhança  (PEV). Trata‐se, efetivamente, de matéria  relevante na Ação 

Externa da UE e que não é  inconsequente para a Política Externa Portuguesa, como 

veremos. 

A  PEV  foi  lançada  em  2003  com  base  na  consciência  de  que  “  (…)  a 

capacidade  de  a  União  garantir  a  segurança,  a  estabilidade  e  o  desenvolvimento 

sustentável aos seus cidadãos passará a ser indissociável do seu empenhamento numa 

cooperação estreita com os países vizinhos” (Comissão Europeia, 2003:1). Trata‐se da 

vizinhança a leste (Arménia, Azerbaijão, Bielorrússia, Geórgia, Moldávia e Ucrânia) e a 

sul  (Argélia, Autoridade Palestiniana, Egipto,  Israel,  Jordânia, Líbano, Líbia, Marrocos, 

Síria e Tunísia).  

Os  movimentos  gerados  pela  Primavera  Árabe  viriam  atribuir  enorme 

atualidade à PEV, motivando  igualmente a sua adaptação, na procura de uma maior 

coerência e eficiência. “Os movimentos de contestação, exigindo mudanças estruturais 

nos países da vizinhança sul motivaram, assim, o reajustamento de prioridades (…) do 

Leste para o Mediterrâneo” (Graça, 2013: 74).  

A região do Mediterrâneo reveste‐se de grande importância estratégica para 

a União em termos económicos (comércio, energia e migração) e no domínio político 

(segurança, estabilidade). 

Acresce que existe a perceção de que aqui  também se  joga o papel da UE 

como ator do sistema internacional e tem‐se assistido, por força de toda uma série de 

fatores, a uma maior convergência dos Estados‐membros relativamente aos países do 

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Magrebe. As questões de  segurança, energéticas ou das migrações  são algumas das 

grandes questões que impelem a UE a uma maior ação junto desta zona do globo.  

Numa recente Comunicação Conjunta da Alta Representante da UE para os Negócios 

Estrangeiros e a Política de Segurança, a UE reconhece a necessidade de apoiar “(…) 

uma  cooperação mais  estreita  entre  os  países  do Magrebe,  a  partir  da  sua  ampla 

experiência de integração e tendo em conta o seu interesse na região como vizinho e 

parceiro essencial dos cinco países em causa” (Comissão Europeia, 2012:2). 

Assim, e como vimos de forma necessariamente sucinta, a Ação Externa da UE tem 

vindo a evoluir,mas apresenta diversos contornos no quadro dos quais se pode inserir a 

relação com o continente Áfricano. Por outro lado, trata‐se de questão fundamental na 

compreensão do impato do processo europeu nas políticas externas nacionais, o que é 

relevante para o nosso estudo. 

III.2 – África na agenda europeia 

III.2.1 ‐ Da Declaração Schuman à Declaração da IV Cimeira UE‐África 

A Europa e a África  são  continentes  vizinhos  com  relações ancestrais. Para a 

economia  deste  estudo,  interessa‐nos  (tendo  em  vista  enquadrar  o  objeto  desta 

investigação) aflorar as  relações da UE com o continente Áfricano, com os PALOP e, 

muito em particular, com Cabo Verde. 

As  relações  da  Europa  com  o  continente  Áfricano  foram,  desde  o  início, 

inscritas  no  projeto  europeu  –  Como  escreve  Andreia  Henriques  (2009:6),  “A 

reestruturação das  relações da Europa com as colónias e ex‐colónias constituiu uma 

parte essencial da criação da então Comunidade Económica Europeia”. Nos seis países 

fundadores, encontravam‐se países com relações coloniais e a   França desempenhou, 

a este título, um papel relevante. 

Nos  termos  da  Declaração  Schuman,  de  9  de  maio  de  1950,  Com  meios 

acrescidos,  a  Europa  poderá  prosseguir  a  realização  de  uma  das  suas  funções 

essenciais: o desenvolvimento do continente Áfricano47. 

                                                            47  Disponível  em  http://europa.eu/about‐eu/basic‐information/symbols/europe‐day/schuman‐declaration/index_pt.htm 

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51 

O Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia48, no seu Preâmbulo 

estabelece que a Comunidade pretende confirmar a solidariedade que liga a Europa e 

os países ultramarinos, e deseja assegurar o desenvolvimento da prosperidade destes.  

Nesse sentido, a Parte  IV do Tratado de Roma é consagrada à associação dos 

países e territórios ultramarinos, estabelecendo que Os Estados‐membros acordam em 

associar  à  Comunidade  os  países  e  territórios  não  europeus  que mantêm  relações 

especiais  com  a  Bélgica,  a  França,  a  Itália  e  os  Países  Baixos  (…)  A  finalidade  da 

associação é promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e 

estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto 

(art.º 131, nº 1 e 2). A Convenção anexa ao Tratado fixa as modalidades e o processo 

desta associação. 

No  início,  as  relações  foram,  pois,  marcadas  pelo  paradigma  da  ajuda  ao 

desenvolvimento,  tendo  sido  criado,  para  esse  efeito,  o  Fundo  Europeu  para  o 

Desenvolvimento (FED). 

A restrição da cooperação aos territórios ultramarinos e associados, a evolução 

das perspetivas no domínio da  cooperação e as mudanças, entretanto, operadas no 

continente Áfricano, designadamente em  resultado dos processos de  independência 

nos  finais  dos  anos  cinquenta  estiveram  na  base  da  Convenção  de  Yaoundé,  em 

196349.  

A  Convenção  de  Yaoundé  incluía  dois  tipos  de  cooperação:  a  ajuda  ao 

desenvolvimento  e  a  promoção  de  relações  comerciais  com  acesso  privilegiado.  A 

Convenção Yaoundé  I  (1963‐69) e Yaoundé  II  (1969‐75)  financiadas,  respetivamente, 

pelo  FED  II  (1964‐1970)  e  FED  III  (1970‐1975)  previam,  em  grande  parte,  o  apoio  à 

África francófona, na sua fase de descolonização. 

                                                            48  Hoje  conhecido  por  “Tratado  de  Roma”  e  que  está  disponível  em: https://infoeuropa.eurocid.pt/opac/?func=service&doc_library=CIE01&doc_number=000037605&line_number=0001&func_code=WEB‐FULL&service_type=MEDIA 

49 Convenção assinada na capital da República dos Camarões, em 1963, entre os seis fundadores da CEE e dezoito Estados Áfricanos e Madagáscar.  

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52 

O  enquadramento  foi  alterado  na  década  de  setenta,  com  alteração  da 

abordagem europeia da política de cooperação (de tendência mais global) e com uma 

Comunidade agora alargada à Irlanda, Dinamarca e Reino Unido.  

No ano de 1975 foi assinado o Acordo de Georgetown50 que criou formalmente 

o Grupo ACP e a Convenção de Lomé que,  sujeita a várias  revisões e atualizações51, 

constituiu  o  enquadramento  das  relações  entre  a  CEE/UE‐Países  ACP  até  2000.  A 

entrada  do  Reino  Unido  na  CEE  e  a  necessidade  de  acomodar  os  países  da 

Commonwealth estiveram subjacentes a esta fase da cooperação europeia. 

Assim, o atual Acordo de Cotonou52, assinado em 2000, revisto em 2005 e 2010 

e em vigor até 2020, baseia‐se em várias décadas de cooperação entre os países ACP 

(um grupo que se foi alargando ao longo do tempo) e a União Europeia.  

Fig.5 – A cooperação europeia com os países ACP: de Yaoundé a Cotonu  

Tratado de Roma Convenção Yaoundé Convenção de Lomé Acordo de Cotonu

Yaoundé I  Yaoundé II  Lomé I  Lomé 

II 

Lomé 

III 

Lomé IV   

2000 

 

2005 

 

2010 

1957  1964  1969  1975  1980  1985  1990 

Regime de 

associação 

Cooperação financeira, técnica e comercial (acordos comerciais preferenciais) 

Ajuda ao desenvolvimento. Cooperação comercial. 

STABEX53.SYSMIN54. 

Direitos humanos 

 

Cooperação para o    Desenvolvimento  

Cooperação económica e comercial  

Dimensão política  

FED I 

FED II 

FEDIII 

FEDIV 

FEDV 

FED VI 

FEDVII+VIII 

FED  IX 

FEDX 

 UE 6  UE 6  UE 6 UE 9 UE 9 UE10 UE12 EU 15 

UE25  UE27

17 ACP  18 ACP  18 ACP 46 ACP 58 ACP 65 ACP 68 ACP 77 ACP 

77  ACP 

79ACP 

Fonte: Elaboração própria 

                                                            50 Disponível em: http://www.caricom.org/jsp/secretariat/legal_instruments/georgetownagreementonacp.jsp?menu=secretariat 51 Assinada entre a CEE e 46 países ACP, em 1975, prolongou a sua vigência até ao ano de 2000 :  Lomé I (o acordo inicial de 1975 a 1980), Lomé II (1980‐1985), Lomé III (1985‐1990) e Lomé IV  (1990‐2000). 

52  Acordo  2000/483/CE de  parceria  entre  os  Estados  de  África,  das  Caraíbas  e  do  Pacífico  e  a Comunidade  Europeia  e  os  seus  Estados‐Membros,  assinado  em  Cotonu,  em  23 de  Junho de  2000  ‐ JOUE nº L 317 de 15/12/2000 p. 0003 ‐ 0353 

53 Sistema de Estabilização das receitas de exportação no domínio agrícola 

54 Apoio à atividade mineira 

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53 

Ao diálogo  regional e à  cooperação  com países e  regiões Áfricanas acresce a 

dimensão do diálogo continental.  

Esta dimensão continental só surgiu com a realização da 1ª Cimeira UE‐África 

que teve  lugar no Cairo, Egipto, em abril de 2000. O Plano de Ação do Cairo55 definiu 

cinco  grandes  áreas  para  a  cooperação  entre  os  dois  continentes:  Questões 

económicas (cooperação e  integração económicas regionais em África),  integração de 

África na economia mundial56, direitos humanos, governação e Estado de direito, paz, 

prevenção, gestão e resolução de conflitos e questões de desenvolvimento. 

Este Plano previa  a  realização de uma nova Cimeira  três  anos depois, o que 

todavia, não veio a acontecer, em parte por força da problemática da participação do 

Zimbabué57,  embora  a  dinâmica  do  diálogo  tenha  progredido  através  de  reuniões 

ministeriais. 

Entretanto, a Estratégia da UE para África58, aprovada em 2005 sob Presidência 

Britânica, “constituiu um primeiro passo destinado a criar uma nova base nas relações 

entre os dois continentes deixando para trás o paradigma pós‐colonial e lançando um 

novo paradigma de diálogo estratégico que aborda questões globais”  (Eurodefense – 

Portugal,  2007:5).  Para  além  das  prioridades  identificadas  no  Cairo,  dois  tópicos 

assumem agora grande importância dada a sua atualidade: a luta contra o terrorismo e 

os  fluxos migratórios. Procurava‐se, em  simultâneo, promover uma maior  coerência 

entre  as  várias  políticas  consequentes  neste  domínio,  designadamente  a  ajuda  ao 

desenvolvimento, o comércio, a defesa, as migrações e a política agrícola.  

A  Europa  e  a  África  viriam  a  conhecer mudanças  que  estiveram  na  base  da 

evolução do relacionamento entre os dois continentes vizinhos. Destaque‐se, ao nível 

                                                            55 Disponível em http://www.summits.aip.pt/África/docs/The_Cairo_Action_Plan_EN.pdf 

56 Incluindo comércio, desenvolvimento do sector privado, investimento, desenvolvimento de recursos, infraestruturas industriais, tecnologia, dívida externa e cooperação em fora internacionais. 

57 O Zimbabué é país membro da UA. Todavia, a questão da participação do Presidente Robert Mugabe, alvo de sanções por parte da UE por violação dos direitos humanos e repressão da oposição, foi questão de sensibilidade política e diplomática acrescida no quadro da preparação da 2ª Cimeira. 

58  Comunicação  da  Comissão  ao  Conselho,  ao  Parlamento  Europeu  e  ao  Comité  Económico  e  Social Europeu  Estratégia  da  UE  para  África:  rumo  a  um  Pacto  Euro‐Áfricano  a  fim  de  acelerar  o desenvolvimento de África – COM (2005) 489 final, Bruxelas, 12.10.2005. 

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54 

europeu, o desenvolvimento da PESC e PCSD; ao nível Áfricano, a  transformação da 

Organização da Unidade Áfricana na União Áfricana e o  lançamento da Nova Parceria 

para o Desenvolvimento da África (NEPAD). 

A Estratégia Conjunta UE‐África adotada na 2ª Cimeira UE‐África, realizada em 

Lisboa,  em  2007,  foi mais  longe. Pela primeira  vez  estamos perante uma  Estratégia 

conjunta  e  um  Plano  de Ação  que  resultam  de  um  trabalho  conjugado  com  o  lado 

Áfricano,  envolvendo  também  atores  não‐estatais  e  as  sociedades  civis  Áfricana  e 

europeia. A cooperação articula‐se em torno de oito parcerias temáticas previstas no 

Plano de Acão e lideradas por copresidências Áfricanas e europeias (“chefs‐de‐file”): 

1ª Parceria:  Paz e Segurança;   2ª Parceria:  Governação Democrática e Direitos Humanos   3ª Parceria:  Comércio, Infraestruturas e Integração Regional;  4ª Parceria:  Objetivos de Desenvolvimento do Milénio;  5ª Parceria:  Energia;  6ª Parceria:  Alterações Climáticas;  7ª Parceria:  Migrações, Mobilidade e Emprego;  8ª Parceria:  Ciência, Sociedade de Informação e Espaço. 

 

A 3ª Cimeira UE‐África (Tripoli, Líbia, em 2010), adotou um novo Plano de Acão 

da  Estratégia Conjunta para o  triénio  2011‐2013 que procurou  aprofundar  as  ações 

conjuntas de cada uma das oito parcerias  temáticas,  reduzindo,  simultaneamente, o 

número de áreas prioritárias em cada parceria.  

Sob o  lema  Investir nas pessoas, na prosperidade e na paz, a 4ª Cimeira dos 

Chefes  de  Estado  e  de Governo,  reunidos  em Bruxelas,  em  3  e  4  de  abril  de  2014, 

reafirmou os princípios e objetivos da Estratégia Conjunta, reconheceu os progressos 

já alcançados e definiu cinco áreas prioritárias para o período de 2014 a 2017: Paz e 

Segurança;  Democracia,  Boa  Governação  e  Direitos  Humanos;  Desenvolvimento 

humano;  Desenvolvimento  e  Crescimento  Sustentável  e  Inclusivo  e  Integração 

Continental; Questões Globais e Emergentes. Tal como consta na Declaração  final da 

Cimeira, a UE compromete‐se a assegurar para 2014‐2020 mais de 28 mil milhões de 

euros para África, para além da cooperação bilateral dos seus Estados‐membros.  

Na  abertura  da  Cimeira,  o  Presidente  da  Comissão  defendeu  que  a  Parceria 

entre a Europa e África é  fundamental para os  interesses mútuos, afirmando que “a 

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vossa  paz  é  a  nossa  paz,  a  vossa  prosperidade,  o  bem‐estar  dos  vossos  povos  é 

também o bem‐estar dos nossos povos”. 

A questão da segurança é cada vez mais um dos desafios comuns. Recorde‐se a 

este  título  que  “Na  última  década  foram  enviadas  para  o  continente  Áfricano,  ao 

abrigo  da  Política  Comum  de  Segurança  e  Defesa,  16 missões  de  gestão  de  crises 

destinadas a manter a paz e a prevenir conflitos: sete missões militares59  (…) e nove 

missões civis60” (Conselho da UE, 2014).  

Várias questões criam hoje uma urgência no diálogo com África: a necessidade 

de combater o terrorismo e a criminalidade organizada (a dimensão da segurança cada 

vez mais presente); a necessidade de dar resposta às situações de desagregação e de 

guerra  civil  em muitos  Estados  Áfricanos; mas  também  as  questões  climáticas  e  os 

fluxos migratórios.  E,  por  último, mas  não menos  importantes,  a  afirmação  da  UE 

como ator global  junto de outras potências que competem em África pelos  recursos 

energéticos presentes no continente Áfricano.   

Kotsopoulos, Faria e Olsen,  três analistas citados por Maria da Costa Ferreira 

(2008:  52)  consideram  que,  de  alguma  forma,  o  continente  Áfricano  constitui 

“terreno”  para  ensaio  da  visão  integrada  nas  relações  externas  que  a  UE  tem 

procurado vir a desenvolver. 

A  política  da UE  para  o  continente  Áfricano  tem,  pois,  evoluído  nas  últimas 

décadas.  

Em  todo  o  caso,  é  importante  ter  em  consideração  que  na  UE,  atualmente 

composta  por  vinte  e  oito  Estados‐membros,  coexistem  diversas  perceções  neste 

domínio.  

Com  efeito,  dentro  da  UE,  alguns  Estados‐membros  mantêm  relações 

privilegiadas com os países Áfricanos ‐ é o caso de Portugal, mas também da França e 

do Reino Unido. Mas, por outro  lado, as questões Áfricanas não são prioritárias para 

                                                            59 ARTEMIS  e  EUFOR República Democrática  do Congo,  EUFOR  Chade/República Centro Áfricana, UE NAVFOR ATALANTA, EUTM Somália, EUTM Mali, EUFOR República Centro Áfricana. 

60  EUPOL, Quinxassa,  República  Democrática  do  Congo,  EUSEC  RDC,  Apoio  à  AMIS  II,  Sudão  Darfur, EUPOL RDC, EUSSR, Guiné‐Bissau, EUAVSEC, Sudão do Sul, EUCAP NESTOR, EUCAP Sael, Níger, EUBAM, Líbia. 

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outros Estados‐membros, designadamente para os mais recentes Estados‐membros da 

Europa mais a leste, os quais representam hoje uma parcela significativa da União. 

   III.2.2  – A cooperação europeia com os PALOP  ‐ o caso de Cabo Verde 

 

No quadro da sua política de cooperação para o desenvolvimento em geral e do 

seu  relacionamento  com  os  países  ACP,  a  UE,  desenvolve  relações  com  os  PALOP, 

através de Programas Regionais, tais como previstos logo no articulado da Convenção 

de Lomé.  

O primeiro PIR foi assinado em 1992 (PIR‐PALOP I) e contou com uma dotação 

global de 25 milhões de euros e o segundo em 1997 (PIR PALOP II) com um orçamento 

de  30  milhões  de  euros,  com  o  objetivo  de  promover  a  boa  governação  e  o 

desenvolvimento  económico  e  social  daqueles  países  e  incluindo  projetos  nos 

domínios da reforma da administração pública, da justiça, da educação, da cultura e da 

estatística.  

Já no quadro do Acordo de Cotonu,  foi assinado, em novembro de 2007 um 

Memorando  de  Entendimento  com  a  Comissão  Europeia61  que  tem  por  principal 

objetivo estabelecer orientações gerais para a cooperação entre a Comissão Europeia e 

o  grupo  dos  seis  países  ACP62  em  causa.  A  cooperação  no  domínio  da  governação 

democrática  tem  em  conta  quatro  dimensões:  a  governação  política,  eficácia  do 

Governo, governação económica e governação social. 

Dentro dos PALOP, a cooperação da UE com Cabo Verde merece uma particular 

atenção por dois motivos. A relação UE‐Cabo Verde reveste‐se de características muito 

específicas  no  universo  dos  países  ACP  e  dos  PALOP  e,  naturalmente,  trata‐se  de 

questão crucial para a nossa reflexão. 

                                                            61   Memorando de Entendimento  entre  a Comissão  Europeia, por um  lado,  e os Países Áfricanos de Língua  Oficial  Portuguesa  (PALOP)  e  Timor‐Leste  por  outro,  assinado  em  Lisboa  e  disponível  em https://infoeuropa.eurocid.pt/files/database/000040001‐000041000/000040062.pdf 

62 Angola, Cabo Verde, Guiné‐Bissau, Moçambique, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste. 

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Sendo certo que as  relações com a UE  remontam à  independência do país, o 

relacionamento  foi  institucionalizado em 1977 quando o país aderiu à Convenção de 

Lomé.  

A UE é hoje um dos principais parceiros de Cabo Verde, no quadro do  atual 

Acordo de Cotonu e da Parceria Especial, celebrada em 2007. 

Com efeito, na sequência da Comunicação da Comissão Europeia sobre o futuro 

das  relações  entre  a  União  Europeia  e  a  República  de  Cabo  Verde63,  e  das 

subsequentes  Conclusões  do  Conselho64  sobre  a  matéria,  foi  adotada  a  Parceria 

Especial UE‐Cabo Verde. 

Fig.6: Parceria Especial UE‐Cabo Verde 

 FONTE: Serviço Europeu de Ação Externa (http://eeas.europa.eu/delegations/cape_verde/documents/relacoes_entre_a_ue_e_cv_2012_pt.pdf) 

 

A Parceria Especial traduz uma abordagem política que pretende ultrapassar o 

paradigma  da  relação  dador‐beneficiário  e  dar  resposta  a  interesses  comuns. 

Desenvolve, sem contudo substituir, o Acordo de Cotonu.  

                                                            63 Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre o futuro das relações entre a União Europeia e a República de Cabo Verde, COM (2007) 641 final, Bruxelas, 24.10.2007 

64  Conclusões  do  Conselho  e  dos  representantes  dos  Governos  dos  Estados‐membros  reunidos  no Conselho relativas ao futuro das relações entre a União Europeia e a República de Cabo Verde adotadas no  Conselho  Assuntos  Gerais  e  Relações  Externas  de  19  de  Novembro  de  2007  –  Disponíveis  em: http://register.consilium.europa.eu/doc/srv?l=PT&f=ST%2015114%202007%20INIT 

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A abordagem é, assim, política, de complementaridade (para além do FED são 

utilizados outros instrumentos como o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional – 

FEDER),  progressiva  e  baseada  nos  princípios  de  boa  governação,  de  integração 

regional (promovendo a aproximação de Cabo Verde às Regiões Ultraperiféricas ‐RUP65 

66‐ e à África Ocidental, no âmbito da CEDEAO) e de convergência  (convergência em 

matéria de normas e padrões). 

Nos  termos do Quadro Orientador para a  implementação  (23 de outubro de 

2008)67, a Parceria assenta em seis pilares:  

i) Boa governação;  

ii) Segurança e estabilidade;  

iii) Integração regional; 

iv) Transformação e modernização;  

v) Sociedade do conhecimento e da informação;  

vi) Luta contra a pobreza e desenvolvimento.  

 

O apoio económico da UE a Cabo Verde é muito significativo. Com efeito, “ (…) 

o montante  financeiro  das  ajudas  da UE  a  Cabo  Verde  desde  1977,  ano  em  que  a 

República  de  Cabo  Verde  começou  a  beneficiar  de  fundos  no  âmbito  do  4º  FED, 

ultrapassa os 300 milhões de euros” (Pinto Teixeira,2012:5). 

A UE é o principal parceiro comercial de Cabo Verde. Acresce que Cabo Verde 

obteve em dezembro de 2011, um regime comercial especial, o designado Sistema de 

Preferências  Generalizadas  Plus  (SPG+)  através  do  qual  pode  exportar  parte 

significativa dos seus produtos com tarifa zero. 

                                                            65  São  regiões  ultraperiféricas  da  UE:  Guadalupe,  Guiana  Francesa,  Reunião, Martinica, Maiote,  São Martinho (França), Açores e Madeira (Portugal) e Ilhas Canárias (Espanha).  

66 A UE prevê medidas especiais para apoiar o desenvolvimento das regiões ultraperiféricas tendo em vista  atenuar  as  limitações  que  estas  regiões  conhecem  em  função  da  sua  localização  remota.  Esta situação  tem a  sua base  legal no artigo 349.º do Tratado  sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE). 

67 Documento disponível em http://www.governo.cv/documents/Parceria_especial_UE.pdf 

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59 

Por  outro  lado,  a  questão  da  segurança  revela‐se  um  tema  absolutamente 

crucial no relacionamento da UE com Cabo Verde. 

A  posição  geoestratégica  de  Cabo  Verde  e,  em  consequência,  a  dimensão 

securitária  (para  além  do  simbolismo  e  da  dimensão  económica)  é  um  elemento 

central na Parceria Especial.  

Nas suas Conclusões, o Conselho Assuntos Gerais e Relações Externas, de 19 de 

Novembro de 2007   

“(...)  acolhe  com  agrado  a  disponibilidade  do  Governo  de  Cabo  Verde  para 

promover a segurança coletiva através da cooperação estreita com a União Europeia 

em sectores como o controlo dos tráficos (droga, imigração ilegal, armamento, etc), a 

luta contra o terrorismo, etc, estes sectores são da maior importância tanto para Cabo 

Verde como para a União Europeia”. 

E foi, aliás, neste contexto que veio a ser assinada a Parceria para a Mobilidade 

UE‐Cabo Verde.  

Com efeito, no contexto da Parceria Especial UE‐Cabo Verde foi formalizada, no 

Luxemburgo,  à margem  do Conselho  Justiça  e Assuntos  Internos,  de  5  de  junho  de 

2008, uma Declaração Comum entre Cabo Verde, por um  lado, e Portugal, Espanha, 

França, Luxemburgo68  e a Comissão Europeia, por outro, instituindo uma Parceria para 

a Mobilidade com aquele país Áfricano. 

A  Parceria  para  a Mobilidade  constitui  um  quadro  político  para  o  diálogo  e 

cooperação  reforçados  com Cabo Verde no domínio da migração o qual prevê uma 

série  de  iniciativas  comunitárias  e  dos  Estados‐membros  participantes  em  três 

vertentes das migrações:  

Mobilidade, migração legal e integração;  

Migração e Desenvolvimento  

Gestão  de  fronteiras,  documentos  de  identidade  e  viagem,  luta  contra  a 

imigração ilegal e tráfico de seres humanos. 

                                                            68 A que os Países Baixos vieram posteriormente a aderir. 

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Assim, para além de uma Declaração Política, a Parceria  inclui em Anexo uma 

lista de áreas no quadro das quais têm vindo a ser desenvolvidos projetos69 .  

Entretanto, e  tal como previsto na Declaração Política,  foram celebrados dois 

acordos no âmbito da Parceria: um Acordo de Readmissão e um Acordo de Facilitação 

de Vistos de Curta Duração. O Acordo de Facilitação de Vistos  foi assinado em Cabo 

Verde  no  dia  24  de  Outubro  de  201270,  por  ocasião  do  5º  aniversário  da  Parceria 

Especial e o Acordo de Readmissão em 18 de Abril de 201371.  

O Acordo de Facilitação de Vistos com o objetivo de promover a mobilidade, 

visa facilitar,  numa  base  de  reciprocidade,  a  emissão  de  vistos  para  os  cidadãos  de 

Cabo Verde e da União relativos a estadas por um período máximo de 90 dias em cada 

período de 180 dias. 

O  Acordo  de  Readmissão  visa  estabelecer,  numa  base  de  reciprocidade, 

procedimentos rápidos e eficazes de  identificação e de repatriamento ordenado e em 

segurança  das  pessoas  em  situação  irregular  nos  territórios  de  Cabo  Verde  ou  de 

qualquer  dos  Estados‐Membros  da  União,  bem  como  facilitar  o  trânsito  dessas 

pessoas,  num  espírito  de  cooperação.  Note‐se  que  Cabo  Verde  é  o  primeiro  país 

Áfricano  a  aceitar  a  readmissão  de  nacionais  de  países  terceiros  no  quadro  de  um 

Acordo de Readmissão com a UE.  

Os  dois  acordos,  são,  aliás,  os  primeiros  acordos  desta  natureza  que  a  UE 

celebra com um país ACP.  

Existe um acompanhamento da aplicação do Plano de Ação da Parceria sob a 

forma  de  reuniões  a  nível  político,  O  acompanhamento  operacional  da  Parceria  é 

assegurado  pelo  “Grupo  Local  de  Seguimento”,  estabelecido  no  quadro  da  Parceria 

Especial, e por reuniões dos Estados‐membros participantes em Bruxelas.  

A Parceria para  a Mobilidade entre  a UE e Cabo Verde  tem  sido  avaliada de 

forma muito positiva por ambas as Partes, designadamente nos encontros ministeriais.                                                             69 Os projetos portugueses serão objeto de referência no capítulo seguinte do presente trabalho. 

70 Acordo entre a União Europeia e a República de Cabo Verde sobre a facilitação da emissão de vistos de curta duração para os cidadãos da República de Cabo Verde e da União Europeia, publicado no JOUE, série L, n.º 282, de 24/10/2013. 71 Acordo entre a União Europeia e a República de Cabo Verde relativo à readmissão de pessoas que residem sem autorização, publicado no JOUE, série L, n.º 282, de 24/10/2013. 

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Trata‐se  de  uma  Parceria  pioneira72  que  demonstrou  a  validade  e  interesse  deste 

instrumento da Abordagem Global das Migrações e Mobilidade73 que tem entretanto 

vindo a ser aperfeiçoado. 

   

                                                            72 Cabo Verde e a Moldávia (2008) foram as primeiras Parcerias assinadas. Entretanto, a UE já celebrou Parcerias para a Mobilidade  com a Geórgia  (2009), a Arménia  (2011), Marrocos  (2013), o Azerbaijão (2013) e a Tunísia (2014). 73 A Abordagem Global para a Migração e a Mobilidade (AGMM) é, desde 2005, um quadro abrangente da política externa da UE relativa à migração e asilo com base no qual a UE desenvolve o diálogo político e  a  cooperação  operacional  com  países  e  regiões  terceiros.  Veja‐se  sobre  esta  matéria  a  recente Comunicação da Comissão Europeia sobre a implementação da AGMM em 2012‐2013 – COM (2014) 96 final de 21.2.2014, disponível em  file:///C:/Documents%20and%20Settings/madalena.martins/Os%20meus%20documentos/Downloads/1_PT_ACT_part1_v2.pdf  

 

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CAPÍTULO IV: AS RELAÇÕES ENTRE PORTUGAL E CABO VERDE 

  IV.1 – Alguns dados sobre Cabo Verde 

Apesar da partilharem um passado e uma  língua comum, os PALOP possuem 

muitas  diferenças  “(…)  em  termos  de  localização  geográfica,  dimensão  e  perfis 

socioeconómicos (Chabal, 2002). Os dois maiores (Angola e Moçambique) localizam‐se 

na África Austral, os restantes ‐ Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe e a Guiné Bissau ‐ na 

África Ocidental. O número de habitantes, o nível de formação ou o PIB são igualmente 

fatores que os diferenciam.  

Cabo Verde apresenta características únicas.  

É um  arquipélago de dez  ilhas  e oito  ilhéus,  localizado na África Ocidental  a 

aproximadamente  500km  a  oeste  do  Senegal. De  reduzida  dimensão74,  Cabo Verde 

ocupa,  todavia,  uma  posição  estratégica75  de  ligação  entre  os  três  continentes, 

Áfricano, europeu e americano. 

O  arquipélago,  descoberto  pelos  portugueses  no  ano  de  1460,  foi  uma  das 

colónias  portuguesas  até  1975.  Como  colónia  teve,  apesar  de  tudo,  um  estatuto 

específico que se traduziu, designadamente, na atribuição de algumas regalias sociais 

com consequências, por exemplo, no nível de formação da população cabo‐verdiana. 

Pelo menos  formalmente,  aos  habitantes  dos  arquipélagos  de  Cabo  Verde  não  se 

aplicou o estatuto do indigenato76.

O país obteve a  independência em 5 de Julho de 1975 e como refere António 

Telo, “Cabo Verde  foi a mais exemplar das descolonizações, com um acordo onde se 

                                                            74 Cabo Verde ocupa a posição 176ª  (em 252 países  listados) no  ranking  relativo ao  território do CIA World  Factbook:  https://www.cia.gov/library/publications/the‐world‐factbook/rankorder/2147rank.html?countryname=Cabo%20Verde&countrycode=cv&regionCode=afr&rank=176#cv 

75 Muitos eventos históricos traduzem a relevância da posição geográfica do país. Esta posição fez com que Cabo Verde fosse utilizado, no período colonial como entreposto comercial e de aprovisionamento. Foi  também em grande parte devido à sua  localização que a primeira missão da OTAN no continente Áfricano teve lugar precisamente em Cabo Verde em 2006 ("Steadfast Jaguar 06") tendo em vista testar a operacionalidade da Força de Reação Rápida. 

76 O Estatuto dos Indígenas Portugueses das Províncias da Guiné, Angola e Moçambique (Decreto‐lei n.º 39  666,  de  20  de Março  de  1954)  não  se  aplicou  em  Cabo  Verde muito  embora  outros  diplomas aplicassem lógica semelhante, designadamente ao nível da legislação do trabalho indígena. 

 

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previa a  formação de órgãos provisórios  (…) encarregados de preparar uma consulta 

popular  para  eleição  da  Assembleia  Constituinte”.  Adianta  ainda  o  historiador  que 

“Cabo Verde acedeu à  independência como o caso mais próximo de uma democracia 

que saiu da descolonização portuguesa” (2008:183). 

Depois de um período de unidade política com a Guiné Bissau (1975‐1981) e de 

manter, ainda após esse período, um  sistema de partido único  (PAICV), Cabo Verde 

viria a ter as primeiras eleições multipartidárias em 1991. 

É  hoje  considerado  como  uma  das  democracias mais  estáveis  do  continente 

Áfricano,  obtendo  bons  resultados  em  indicadores  internacionalmente  consagrados 

relativamente à democracia, às  liberdades civis ou à boa governação. Estas condições 

têm  permitido  o  crédito  do  país  junto  de  Governos,  empresas  e  organizações 

financeiras internacionais. 

Sendo um país de poucos  recursos77 e ecologicamente  frágil, a  sua economia 

depende,  em  muito,  do  exterior  seja  sob  a  forma  das  receitas  do  turismo,  do 

investimento  direto  estrangeiro,  seja  da  ajuda  bilateral  ou  das  remessas  de 

emigrantes.  

É  nessas  condições  que  “  (…)  a  sua  política  externa  tem  sido  subsidiária  do 

desenvolvimento”  (Cardoso,  2008:195),  procurando,  assim  e  de  uma  forma 

pragmática,  relações  externas diversificadas  e  consequentes.  Esta orientação  é  aliás 

assumida  e  expressa  no  atual  Programa  do  Governo78  na  seção  “Afirmar  a  Nação 

Global e desenvolver parcerias para a competitividade” de acordo com a qual,  

“ (…) são cruciais as parcerias que teremos de consolidar e criar para garantir o 

acesso ao financiamento – seja sob forma de ajuda oficial ao desenvolvimento, 

de  financiamento  concessional  ou  de  investimento  directo  externo  –  e,  bem  

assim,  o  cada  vez  mais  importante  acesso  aos  mercados.  Continuaremos  a 

consolidar antigas alianças e parcerias, enquanto procuraremos construir novas 

                                                            77 De acordo com o Banco Mundial, apenas cerca de 10% do seu território está classificado como terra arável  e  com  limitados  recursos  minerais.  Informação  disponível  em: http://www.worldbank.org/pt/country/caboverde/overview#1 

78 Programa do Governo – VIII Legislatura 2011‐2016, disponível em http://www.governo.cv/index.php/programa‐do‐governo 

 

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pontes  de  cooperação  na  procura  de  benefícios  mútuos.  Igualmente, 

continuaremos  a  aprofundar  a  participação  do  país  e  o  envolvimento  em 

organizações regionais e  internacionais, tais como a CEDEAO, a CPLP, a União 

Áfricana,  a Macaronésia,  os  ACP  e  a  Francofonia.  Continuaremos  as  nossas 

parcerias especiais com a União Europeia, com a RUP e com a Macaronésia e 

reforçaremos a participação de Cabo Verde nas Nações Unidas” (Programa do 

Governo, Cabo Verde, pág.55). 

 

Recorde‐se, a este título, que, em 2007, o país saiu da  lista dos Países Menos 

Desenvolvidos (PMA) das Nações Unidas, passando, desde então, a  integrar a  lista do 

Países de Desenvolvimento Médio (PDM). 

“Boa governação, sólida gestão macroeconómica, abertura ao comércio e uma 

maior integração na economia global, para além da adoção de políticas eficazes 

de  desenvolvimento  social,  têm  produzido  resultados  notáveis  em  todo  o 

arquipélago. O  crescimento do produto  interno bruto  (PIB) per  capita atingiu 

7,1% no período 2005‐08, bem acima da média para a África Subsariana e para 

pequenos estados ilhas” (Banco Mundial). 

Igualmente  digno  de  nota  é  a  o  facto  de  se  prever  que  Cabo  Verde  possa 

alcançar  a maioria  dos  Objetivos  do Milénio  (ODM)79  até  2015,  tendo  já  atingido, 

designadamente os objetivos relativos à educação primária, à  igualdade de género, à 

mortalidade infantil e à saúde materna. 

Cabo  Verde  é,  por  tradição,  um  país  de  emigração.  Nos  termos  do  Perfil 

Migratório80,  “Está profundamente enraizada na  sociedade  cabo‐verdiana a  ideia de 

                                                            79 Os ODM são objetivos de desenvolvimento acordados internacionalmente com base na Declaração do Milénio assinada em 2000 e com metas até 2015. São oito os ODM: Reduzir a pobreza extrema e a fome (Objetivo 1); Alcançar o ensino primário universal  (Objetivo 2); Promover  a  igualdade de género e o empoderamento  das mulheres  (Objetivo  3);  Reduzir  a mortalidade  infantil  (Objetivo  4); Melhorar  a saúde materna (Objetivo 5); Combater o VIH/SIDA, a malária e outras doenças (Objetivo 6); Garantir a sustentabilidade ambiental (Objetivo 7); Criar uma parceria mundial para o desenvolvimento (Objetivo 8). 80 O Perfil migratório de Cabo Verde de 2009 foi elaborado no quadro da Parceria para a Mobilidade UE‐Cabo Verde e está disponível em http://www.un.cv/files/Cape_Verde_Profile_2009.pdf. O conceito de Perfil  migratório  foi  inicialmente  proposto  pela  Comissão  Europeia  como  um  relatório  estatístico (Comunicação sobre Migração e Desenvolvimento de 2005) mas veio a evoluir no sentido de funcionar como um instrumento tendente a facilitar o desenvolvimento de políticas por parte do Governo do país objeto da análise.  

 

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emigrar,  como  estratégia  de  alcançar  sucesso  pessoal,  familiar  e  social”  (OIM, 

2010,17).  Portugal  é  um  dos  principais  destinos  da  emigração  cabo‐verdiana  –  de 

acordo com o citado Perfil Migratório, no período entre 1995 e 2000, Portugal recebeu 

54% dos  emigrantes  cabo‐verdianos  (seguido dos  EUA  com  19%,  França,  8%, Países 

Baixos, 5%). Digna de uma nota muito particular é a situação dos estudantes: 

“No  período  entre  1997/98  e  2002/2003,  saíram  ao  todo  5.382  estudantes 

bolseiros e não bolseiros, para  receberem  formação  superior no estrangeiro. 

Destes, cerca de 77% não terão regressado (OIM, 2009:53). 

 

Dados mais atualizados reforçam estas tendências. 

O Módulo Estatísticas das Migrações  (2008‐2013) do  Inquérito Multi‐objetivo 

Contínuo (IMC) recentemente apresentado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) 

de Cabo Verde81, revela um total de 11903 emigrantes dos quais a maioria com destino 

a Portugal (56.4%), num fluxo maioritariamente associado ao estudo (36%): 

 

Fig. 7 Emigrantes de Cabo Verde por país de destino (2008‐2013 ‐ dados ponderados) 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

FONTE: INE Cabo Verde 

 

 

 

                                                            81 Disponível em http://www.ine.cv/actualise/destaques/files/94456152942014APRESENTA%C3%87%C3%83O%20MIGRA%C3%87%C3%83O‐%20FINAL.pdf 

 

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Fig. 8 Emigrantes de Cabo Verde segundo motivo de emigração, por sexo (%) (2008‐2013 ‐ dados 

ponderados) 

FONTE: INE Cabo Verde 

 

Em  resultado  desta  situação  existe  uma  grande  comunidade  cabo‐verdiana 

espalhada pelo mundo. A dimensão da diáspora é tão significativa que vários autores 

referem ser o número de cabo‐verdianos no estrangeiro maior do que os que residem 

no território nacional.  

Na  seção Afirmar a Nação Global, o Programa do atual Governo de Cabo Verde 

defende que “ os emigrantes na Diáspora  foram e continuam sendo uma  importante 

alavanca  para  o  desenvolvimento  das  ilhas.  Serão  sempre  considerados  parte 

integrante  da  Nação  cabo‐verdiana  e  estarão  no  centro  das  políticas  internas  e 

externas da governação”. É objetivo do Governo, no quadro da agenda “Nação  sem 

fronteiras”,  promover  o  aprofundamento  dos  laços  das  segundas  e  posteriores 

gerações da diáspora com a Nação cabo‐verdiana. Defendendo que “(…) neste sentido 

(…)  trabalharemos para a  implementação dos acordos  recentes,  tal  como a Parceria 

para a Mobilidade com a União Europeia, para facilitar vistos e assistência àqueles que 

queiram regressar.” 

 

A  imigração  para  Cabo  Verde  é  igualmente  relevante  e  tem  registado  um 

aumento. De acordo com o Perfil Migratório, os dados do Centro de Pesquisa para o 

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Desenvolvimento  sobre Migrações, Globalização e Pobreza apontavam para que, em 

2007,  “a maioria dos  imigrantes em Cabo Verde  (82%)  fosse proveniente dos Países 

Áfricanos de Língua Oficial Portuguesa e de Portugal (16%).  

Existe assim um importante fluxo de pessoas entre Cabo Verde e Portugal que 

deve ser considerado na análise da relação entre estes dois países. 

 

  IV.2 –  A Cooperação Portuguesa em Cabo Verde 

Cabo Verde é, no quadro da política externa portuguesa, um país prioritário a 

nível do diálogo político e da cooperação. As questões do desenvolvimento económico 

mas também as questões de segurança e as migrações fazem hoje parte da agenda da 

relação bilateral entre os dois países. 

E, de todas as ex‐colónias, Cabo Verde foi o país com o qual mais rapidamente 

Portugal definiu boas relações. Esta situação está expressa nos Programas de Governo 

como  já  se  referiu no Capítulo  II. Aliás,  logo em 1975,  foi assinado entre Portugal e 

Cabo Verde o Acordo Geral de Cooperação e Amizade, de acordo com o qual As Partes 

Contratantes reconhecem a existência de especiais laços de amizade e de solidariedade 

entre os respetivos povos e prosseguirão uma política comum de cooperação com vista 

a reforçar esses laços (artigo 1). 

Como assinala António Telo, 

“A  cooperação  com  as  ex‐colónias  deu  os  primeiros  passos  em  Cabo  Verde, 

logo  em  1975.  Este  arquipélago  foi  o  primeiro  a  beneficiar  de  subsídios  ao 

desenvolvimento  a  fundo  perdido  (…).  Portugal  aceitou  igualmente  a 

responsabilidade de concluir as principais obras em curso de execução no Plano 

de Fomento de Cabo Verde e assinou acordos de cooperação na área da saúde 

e educação” (Telo, 2008:217). 

Portugal e Cabo Verde, têm, assim, desde então, mantido boas relações, sendo 

Portugal  um  dos  principais  parceiros  daquele  país.  à  data  da  presente  dissertação, 

Portugal  tem cerca de cem  instrumentos  internacionais82 com Cabo Verde dos quais 

cerca de oitenta em vigor e os restantes recentemente assinados . 

                                                            82  Considerando,  para  este  efeito,  Tratados,  Protocolos,  Acordos  ou Memorandos  de  Entendimento entre os dois Estados mas também entre departamentos das respetivas administrações públicas. 

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68 

Destes acordos, é digno de uma  referência especial o Acordo de Cooperação 

Cambial,  assinado  em  13  de Março  de  1998,  entre  a  República  de  Cabo Verde  e  a 

República Portuguesa83 que visa “(…) garantir a estabilidade nominal de Cabo Verde, 

aprofundar  os  laços  da  economia  cabo‐verdiana  a  Portugal  e  à  Europa  e  sustentar 

reformas  conducentes  à  abertura  e modernização  da  economia”  (CEMPRE,2008:vi). 

Este Acordo  tem sido  identificado como  fator de promoção do bom desempenho da 

economia cabo‐verdiana. 

Nos  últimos  anos,  a  cooperação  portuguesa  com  Cabo  Verde  tem  sido 

desenvolvida84 ao nível bilateral e ao nível multilateral. 

A nível bilateral, a cooperação articula‐se em torno dos Programas  Indicativos 

de Cooperação (PIC) que definem os principais eixos estratégicos para períodos de três 

anos  e  que  se  materializam  em  Planos  Anuais  de  Cooperação  (PAC).  Ao  nível 

multilateral,  Portugal  enquadra‐se  nos  programas  das  organizações  internacionais 

ativas na cooperação com Cabo Verde (em especial a UE mas também as Agências das 

Nações Unidas e a CPLP) ou desenvolve projetos em parceria com outros doadores85.  

Os  PIC  têm  como  áreas  prioritárias  a  valorização  dos  recursos  humanos  e  a 

capacitação institucional tirando partido da vantagem relativa de Portugal (uma língua 

comum,  laços  culturais  e  sistemas  jurídicos  semelhantes)  e  tendo  sempre  como 

objetivo último contribuir para a redução da pobreza.  

“ A programação é feita (…) com base nas Estratégias de Redução da Pobreza 

ou  em  documentos  similares  dos  parceiros,  atentas  as  prioridades  e 

necessidades  aí  definidas,  de  modo  a  garantir  a  complementaridade  de 

esforços” (IPAD,2005:27).  

                                                            83 Após  janeiro de 1999, o Acordo envolve uma paridade fixa do Escudo cabo‐verdiano ao Euro.  Inclui ainda uma facilidade de crédito de Portugal a Cabo Verde, mas também a adoção por parte deste país dos critérios macroeconómicos de referência dos Estados‐membros da UE. 

84 MNE (1995) Dez anos de Política de Cooperação, Lisboa. 

85  Portugal  integra  a  comunidade  doadora  internacional  e  participa,  como  tal,  em  diversos  fora internacionais,  em  particular  a  UE,  a  OCDE  e  a  ONU,  nos  quais  tem  subscrito  compromissos internacionais em matéria de coerência das políticas para o desenvolvimento. Sobre esta matéria veja‐se  a  Estratégia  Portuguesa  para  a  cooperação  multilateral,  disponível  em  https://www.instituto‐camoes.pt/images/cooperacao/estrategia_multilateral.pdf  e  bem  assim  a  Resolução  do  Conselho  de Ministros n.º 82/2010 (21/10/2010).  

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69 

Os  instrumentos  da  cooperação  são  essencialmente  a  cooperação  técnica  e 

ações de alívio da dívida mas também o apoio direto ao orçamento. Esta matriz geral 

da Cooperação Portuguesa aplica‐se ao caso de Cabo Verde. 

O PIC relativo ao triénio 2002‐2004, com um orçamento  indicativo de 50 milhões 

de euros:  

“(…)  identificou os seguintes eixos de concentração das  intervenções: reforço da 

estabilidade macroeconómica, apoio à  consolidação das  instituições,  valorização 

dos recursos humanos, desenvolvimento de infraestruturas, alargamento da base 

produtiva e melhoria da  competitividade do  sector empresarial  cabo‐verdiano e 

valorização da cultura e preservação do património histórico”. (IPAD,2005:61).  

No  quadro  da  Visão  Estratégica  para  a  Cooperação  Portuguesa  e  das 

prioridades  da  Estratégia  de  Crescimento  e  Redução  da  Pobreza  (ERCP)86  de  Cabo 

Verde foi assinado, em novembro de 2004, o PIC 2005‐2007 com um envelope de 55 

milhões  de  euros.  Este  novo  PIC  procurou  tirar  partido  da  experiência  passada 

(tentando,  em  particular,  ultrapassar  alguma  dispersão  e  pequenas  ações  com 

reduzido impacto e visibilidade) e concentrou a Ajuda em três eixos: 

Valorização dos recursos humanos e capacitação técnica 

Apoio à criação de infraestruturas básicas, ordenamento do território e 

recuperação do património 

Apoio à estabilidade macroeconómica 

A  inserção  de  Cabo  Verde  no  sistema  e  mercado  internacionais  sofreu, 

entretanto, algumas alterações. Destaca‐se, em particular, em 2008, a graduação de 

Cabo Verde do Grupo dos Países Menos Avançados, a celebração da Parceria Especial 

com a UE  (que  inaugura um novo  tipo de relacionamento) e a adesão à Organização 

Mundial de Comércio (OMC). 

É neste contexto que o PIC 2008‐2011 se baseia numa abordagem renovada e 

inaugura  uma  nova  modalidade  de  ajuda,  a  ajuda  orçamental.  Este  PIC  tem 

subjacentes alguns princípios fundamentais, a saber: 

                                                            86    Em  2004  Cabo Verde  adotou  o Documento  de  Estratégia  de  Crescimento  e  Redução  da  Pobreza (ECRP)  2004‐2005/2007  com  base  nas  Grandes  Opções  do  Plano  e  no  Plano  Nacional  de Desenvolvimento 2002‐2005. O documento define a centralidade da redução da pobreza nas políticas públicas  e  identifica  cinco  eixos  (boa  governação,  competitividade,  capital  humano,  infraestruturas básicas, proteção social). 

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Concentração da cooperação em eixos Estratégicos; 

Descentralização geográfica; 

Aprofundamento da abordagem bi‐multi na concretização de projetos de 

cooperação (identificação de projetos para  implementar em parceria com 

agências multilaterais (sobretudo UE e o Sistema das Nações Unidas); 

Aprofundamento da coordenação com outros doadores bilaterais; 

 Maior participação da sociedade civil e do sector privado; 

Introdução de questões  transversais como o género, a boa governação e 

sustentabilidade ambiental. 

Com  um  orçamento  indicativo  de  70  milhões  de  euros,  as  prioridades  de 

cooperação  centraram‐se  “  (…)  na  Boa  governação,  participação  e  democracia,  no 

Desenvolvimento  Sustentável  e  Luta  contra  a  Pobreza  (o  eixo  que  recebeu  a maior 

fatia de orçamento) e na concretização de um Cluster de Cooperação” (IPAD, 2008:49). 

Entretanto, em 9 de Junho de 2010, teve lugar em Lisboa a I Cimeira Luso‐Cabo‐

verdiana87 que 

“  (…)  confirmou  a  assinalável  densidade  do  relacionamento  existente  entre 

Portugal e Cabo Verde, assente não só em fortes laços históricos como também no 

desejo de os projetar de  forma privilegiada no  futuro,  através de uma parceria 

estratégica e dinâmica” (in Declaração Conjunta). 

 

Por  ocasião  desta Cimeira,  foi  assinado  o  Tratado  de Amizade  e Cooperação 

entre a República Portuguesa e a República de Cabo Verde88 que define os principios 

que  regem  as  relações  entre  os  dois  países.  O  Tratado  prevê  um  mecanismo  de 

                                                            87 A realização de Cimeiras entre os dois países de dois em dois anos visa institucionalizar, ao mais alto nível,  as  relações  de  cooperação  e  foi  decidida  na  sequência da  visita  de  uma  delegação ministerial (incluindo o Primeiro Ministro) e de empresários portugueses à Cidade da Praia, em Cabo Verde, em Março de 2009.  

88  Tratado  de  Amizade  e  Cooperação  entre  a  República  Portuguesa  e  a  República  de  Cabo  Verde, assinado em Lisboa em 9 de junho de 2010 e publicado no Diário da República, 1.ª série, nº 58 de 21 de março de 2012. 

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consultas  políticas,  nomeadamente  através  da  Comissão  Permanente  Luso‐Cabo‐

verdiana, criada pelo respetivo artigo nº12.  

A  Declaração  Conjunta  da  I  Cimeira  refere,  ainda,  os  vários  dominios  da 

cooperação bilateral  (defesa nacional, finanças, ciência, tecnologia e ensino superior, 

cultura, economia e modernização administrativa) e  também a  concertação político‐

diplomática nas organizações  internacionais, como a ONU e a CPLP  (defesa da  língua 

portuguesa) e na UE (com referência específica à Parceria Especial UE‐Cabo Verde e à 

Parceria para a Mobilidade UE‐Cabo Verde). 

Dois  anos  depois,  na  II  Cimeira  (Mindelo,  2012),  os  Chefes  de  Estado 

salientaram, uma vez mais, a vontade de ampliar e melhorar a cooperação centrando‐

a na economia e nas empresas. Note‐se que nesta reunião foi  igualmente debatida a 

futura Escola Portuguesa em Cabo Verde89.  

O  PIC  2012‐2015,  numa  linha  de  continuidade  face  aos  anteriores,  resultou 

igualmente dos compromissos internacionais a que os dois Estados se vinculam90 e dos 

documentos programáticos de Portugal91 e de Cabo Verde92. 

Com um orçamento  indicativo de 56 milhões de euros, aposta, para além das 

áres tradicionais (formação de recursos humanos e assitência técnica) em duas novas 

áreas:  capacitação  cientifica  e  tecnológica  e  empreendedorismo  e  desenvolvimento 

empresarial. 

   

                                                            89 À semelhança das Escolas Portuguesas de Angola, Moçambique, Macau e Timor Leste. 

90 Designadamente ODM, Declaração de Paris e (2005), Agenda de Ação de Acra (2008) e Declaração de Busan (2011). 

91  Estratégias  sectoriais,  Estratégia  de  Cooperação  multilateral,  Recomendações  do  CAD/OCDE, Avaliação do PIC 2008‐2011, entre outros. 

92 Dos quais se destacam a ECRP III (2012‐2016) e o Programa de Governo 2011‐2016. 

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Fig 9 – PIC 2011‐2015: Eixos Estratégicos e áreas de intervenção 

Eixo  % do Orçamento 

Eixo estratégico I  Boa governação, Participação e Democracia   

Área de intervenção I  Capacitação Institucional – Governo e sociedade civil  6% 

Área de intervenção II  Segurança e Desenvolvimento 

Eixo estratégico I  Desenvolvimento sustentável e luta contra a pobreza   

Área de intervenção I  Educação e Serviços Sociais básicos   

94% Área de intervenção II  Capacitação Cientifica e tecnológica 

Área de intervenção III  Empreendedorismo e Desenvolvimento Empresarial 

Área de intervenção IV  Programa Geral de Assistência/Ajuda sob a forma de 

Produtos 

FONTE: CAMÕES, Instituto da Cooperação e da Língua, I.P 

 

Por outro  lado, é  introduzida a filosofia dos Projetos‐bandeira,  isto é, projetos 

de maior dimensão que possam ter um maior impato, numa lógica de custo‐benefício. 

São identificados dois projetos‐bandeira: 

Programa  de  Cooperação  técnico‐policial  que  visa  “Desenvolver  as 

competências técnicas e operacionais das Forças e Serviços de Segurança cabo‐

verdianas,  incrementar  a  assessoria  técnica  em  áreas  organizacionais  e 

funcionais, fortalecendo os princípios emergentes dos Acordos de Cooperação 

assinados entre os dois países” (CAMÕES, 2008:15)93.

Apoio  ao  sector  da  educação  combinando  várias modalidades  e  formas  de 

cooperação  para  os  diferentes  níveis  de  ensino  (Ensino  Secundário,  Ensino 

Técnico‐Profissional, Ensino Superior e Bolsas de Estudo). 

Refira‐se finalmente que  

                                                            93 O Programa de Cooperação Técnico – Policial com Cabo Verde tem vindo a ser implementado desde 2007,  procurando  promover  níveis  de  segurança  que  permitam  consolidar  o  Estado  de  direito  e promover  a  Boa  Governação  (http://www.instituto‐camoes.pt/cabo‐verde/root/cooperacao/cooperacao‐bilateral/cabo‐verde#programa‐de‐cooperação‐técnico‐policial) 

 

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“(…)  os  diferentes  programas  sectoriais  do  PIC  serão  enquadrados  de  forma 

coerente  numa  política  de  cooperação  estrategicamente  orientada,  com 

objetivos partilhados e atividades complementares, quer nas ações bilaterais, 

quer nas ações ao nível multilateral, numa abordagem “whole‐of‐government”  

(CAMÕES, 2008:10). 

No  relacionamento  com  Cabo  Verde  não  se  pode  deixar  ainda  de  referir  a 

temática  das  migrações,  uma  agenda  em  muito  enquadrada  pela  Parceria  para  a 

Mobilidade UE‐Cabo Verde. 

Tal  como  já  referido,  é  muito  significativa  a  mobilidade  de  pessoas  entre 

Portugal  e  Cabo  Verde.  A  cooperação  no  domínio  das migrações  tem  vindo  a  ser 

desenvolvida quer ao nível bilateral  (foi mesmo criada uma  subcomissão Luso‐Cabo‐

verdiana  para  as migrações)  quer  ao  nível multilateral  no  âmbito  da  Parceria  para 

Mobilidade UE‐Cabo Verde. 

Alguns projetos da cooperação portuguesa  são, a este  título, emblemáticos e 

não podem deixar de ser referenciados. 

É  o  caso  do  CAMPO, Centro  de  Apoio  ao Migrante  no  País  de  Origem,  um 

projeto bilateral,  financiado pela Cooperação Portuguesa com o objectivo de prestar 

informações  a  potenciais  emigrantes  sobre  possibilidades  de  trabalho  e  estudo  em 

Portugal. Com base numa  avaliação muito positiva,  as  atividades do projecto  foram 

prolongadas e alargadas através de um projeto conjunto entre a Comissão Europeia, 

Portugal e a Espanha  intitulado “Reforço das Capacidades de Cabo Verde no domínio 

da gestão da migração laboral e do retorno”, integrado na Parceria para a Mobilidade. 

O  Projeto94,  com  a  duração  de  36 meses  (2009  –2011)  teve  como  objetivo 

promover  a  mobilidade  legal  entre  Cabo  Verde  e  a  UE  e  incluiu  três  dimensões 

complementares: migração  laboral  para  a UE;  retorno  da  “diáspora”  cabo‐verdiana 

(em particular a sua  reintegração no mercado  laboral de Cabo Verde); promoção do 

investimento  e  empreendedorismo migrante. O  principal  resultado  do  projeto  foi  a  

criação  de  um  centro  de  atendimento  aos migrantes  (os  que  pretendem  sair, mas 

                                                            94 Foi mantida a designação de “CAMPO” no sentido de aproveitar a respetiva “imagem de marca”  

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também os que pretendem regressar) 95. Houve uma apropriação do Centro por parte 

das Autoridades cabo‐verdianas que reconheceram a sua mais‐valia e, assim, no final 

do Projeto foi feita a sua transferência para a Administração Pública cabo‐verdiana96. 

Um  segundo  projeto  digno  de  nota  é  o  Projeto  DIASpora  para  o 

desenvolvimento de Cabo Verde  (DIAS de Cabo Verde), um projeto do  Instituto das 

Comunidades de Cabo Verde co‐financiado pela Comissão Europeia e por Portugal e 

implementado pela Organização Internacional para as Migrações (OIM). Concluído em 

2011,  este  Projeto  visava  promover  o  contributo  da  diáspora  caboverdiana  em 

Portugal,  Itália e Holanda  como agentes de desenvolvimento do  seu país de origem 

através da aplicação das suas competências e conhecimentos profissionais no reforço 

do  capital  humano  de  Cabo  Verde  em  quatro  sectores  funadamentais:  a  Saúde,  a 

Educação,as Infra‐estruturas e o Turismo. 

Sem  prejuizo  de  vários  outros  projetos  em  desenvolvimento,  merece 

igualmente referência o Centro Comum de Vistos  inaugurado em  2010 e que: 

“(…) actualmente, processa pedidos de visto Schengen97 para Portugal, Bélgica 

e  Luxemburgo,  bem  como  para  os  seguintes  Estados‐Membros  da  União 

Europeia representados: Alemanha, Áustria, Eslovénia, Finlândia, França, Itália, 

Países  Baixos,  República  Checa  e  Suécia”  (CCV,  em 

http://www.eurovisaccv.com/web/guest/home). 

 

Uma última nota para a cooperação Técnico‐Militar com Cabo Verde que tem a 

sua origem num acordo bilateral assinado em 1988. No âmbito do PIC 2012‐2015, a 

cooperação  técnico  militar  visa  apoiar  a  Estrutura  Superior  das  Forças  Armadas 

caboverdianas,  apoiar  a  organização  e  funcionamento  da  Escola  Militar,  apoiar  a 

organização  e  criação  de  Unidades  de  Polícia  Militar,  apoiar  a  consolidação  da 

estrutura  organizacional,  formativa  e  operativa  da Guarda Costeira  e dos  Fuzileiros, 

                                                            95 Para mais informações consulte‐se https://www.instituto‐camoes.pt/cabo‐verde/root/cooperacao/cooperacao‐bilateral/cabo‐verde#campo‐–‐centro‐de‐apoio‐ao‐migrante‐no‐país‐de‐origem 

96 O CAMPO está disponível em http://www.campo.com.cv/ 

97 O Visto  Schengen  é  uma  autorização  emitida  por  um  Estado Membro  com  a  finalidade  de  escala aeroportuária,  trânsito ou  intenção de estadia de curta duração no  território de um ou mais Estados‐membros, permitindo que o seu portador se apresente na fronteira externa, não garantindo, contudo, a respetiva entrada, que será decidida pelas autoridades fronteiriças à sua chegada. 

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apoiar  o  Centro  de  Instrução  Militar  Conjunto  do  Morro  Branco  e  disponibilizar 

formação em Portugal. 

  Portugal mantém, pois, boas relações com Cabo Verde sendo atualmente um 

dos principais parceiros daquele país. As questões económicas, a segurança e as 

migrações são temas centrais nesta relação. 

   

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CAPÍTULO V – SINAIS DE EUROPEIZAÇÃO NA RELAÇÃO COM CABO VERDE 

V.1 – Contornos do processo de Europeização 

O processo de Europeização, é, no nosso entendimento, um processo dinâmico, 

de duas vias. E  reflecte‐se nas políticas nacionais dos Estados‐membros, de diversas 

formas  incluindo  através  de  produção  legislativa  que  ganha  vida  no  ordenamento 

nacional. 

Assim  acontece,  também,  embora  de  forma  menos  perceptível,  com  a 

elaboração, definição e implementação da política externa. Não existe, neste domínio, 

uma  aplicação  direta  ou  uma  transposição  de  legislação  da UE, mas  a  inserção  no 

projeto europeu de integração influencia as formas, os atores e os objetivos da política 

externa.  É  sempre  necessário  procurar  distinguir  (tarefa  nem  sempre  fácil)  o  fator 

Europeização  de  muitos  outros  fatores  que,  num  mundo  globalizado,  vêm  a  ter 

influência na política externa dos Estados‐membros. 

E, por outro lado, os Estados‐membros procuram influenciar a posição comum 

a nível da UE e marcar a agenda de acordo, designadamente, com os seus  interesses 

geográficos  em  zonas  particulares  do  globo.  Trata‐se  de  um  processo  que, muitas 

vezes,  inclui  a  influência  junto  de  um  ou  mais  Estados‐membros  com  idênticas 

preocupações e objetivos. 

Como  registamos no Capítulo  I, diversos  autores procuraram  já  identificar  as 

dimensões,  os mecanismos  e  os  efeitos  da  Europeização  nas  políticas  externas  do 

Estados‐membros.   

Nicole  Alecu  Flers  (2011:22)  identificou  duas  dimensões:  a  dimensão  de 

Downloading/Top‐down  em  que  os  Estados‐membros  são  sujeitos  a  influência  e 

estímulo  por  parte  da  UE  e  dos  outros  Estados‐membros  e  a  dimensão 

Uploading/Bottom‐up  através  da  qual  os  Estados‐membros  procuram  influenciar  a 

política externa da UE e as políticas externas dos outros Estados‐membros.  

Michael  Smith  sugeriu  num  seu  artigo  (2000)  um  quadro  de  referência  com 

quatro  indicadores: a  socialização das elites políticas, a  reorganização burocrática, a 

reforma  constitucional  e  alteração  da  perceção  da  opinião  pública  relativamente  à 

cooperação europeia neste domínio, concedendo, todavia, primazia aos três primeiros.  

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Reuben  Wong  (2008)  isolou  três  dimensões  da  Europeização  da  política 

externa:  adaptação  e  convergência  política,  projeção  nacional  e  reconstrução  da 

identidade.  

Procuramos agora analisar a Política Externa Portuguesa em geral e a  relação 

particular  com  Cabo  Verde,  à  luz  das  duas  dimensões  que  nos  surgem  como 

fundamentais: top‐down e bottom‐up. 

V.2 –Europeização top‐down 

Numa primeira  fase,  isto é, no período que  antecede  a  adesão e no qual  se 

prepara  o  cumprimento  das  condições  para  aderir  ao  “clube”,  estamos,  por  regra, 

perante uma Europeização de uma só via na qual os Estados candidatos, e mais tarde 

membros,  procuram  aceitar  e  implementar  o  acervo  comunitário.  Este  tipo  de 

Europeização,  note‐se,  prossegue  depois,  mas  já  não  como  um  processo 

exclusivamente top‐down. 

  V.2.1  A socialização das elites 

Tal  como  Smith  assinala,  “A  resolução  dos  problemas  depende 

fundamentalmente  do  grau  de  socialização  dos  decisores  com  o  sistema”  (Smith, 

2000:617)98.  

Ora, este é um fenómeno muito evidente na esfera da União, não só entre os 

representantes  governamentais  mas,  sobretudo,  entre  a  elite  diplomática  e  os 

representantes e  técnicos da Administração Pública. Nestes últimos, ao contrário do 

que  acontece  com  os  primeiros,  existe  o  efeito  da  continuidade.  São  eles  que,  em 

última  instância, preparam os dossiês e o processo de decisão política e, por  regra, 

permanecem,  apesar  das  alterações  governamentais  resultantes  dos  processos 

eleitorais. 

Esta  socialização  opera‐se  na  intensa  rede  de  contactos  entre  os 

representantes nacionais, designadamente, através das reuniões dos diversos comités 

e  instâncias  preparatórias  das  reuniões  ministeriais  e  de  Chefes  de  Estado,  na 

preparação das declarações conjuntas, nos exercícios de elaboração de relatórios em 

                                                            98 Tradução da nossa autoria 

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conjunto. Opera‐se,  igualmente, através da  informação COREU99, “uma  rede que em 

2010 distribuiu  cerca de 8500 mensagens no domínio da política externa da UE aos 

vinte e  sete  Estados‐membros,  ao  Secretariado‐Geral do Conselho,  ao Conselho e  à 

Comissão Europeia” ( Bicchi e Carta, 2012)100. 

A alteração de atitude é percetível, como defende Smith (2000:619) através de 

dois  indicadores:  as  elites  familiarizam‐se  com  a  posição  dos  outros  em  termos  de 

política  externa  e,  por  outro  lado,  valorizam  a  cooperação  política.  Criam‐se  assim, 

como adianta o autor, novas formas “de fazer” e uma identidade comum. 

No  caso  português,  a  socialização  começou  ainda  antes  da  adesão, 

fundamentalmente quando a adesão se tornou o principal objetivo da Política Externa 

Portuguesa. “ A socialização das elites portuguesas  inicou‐se muito cedo com o “Tour 

europeu “ de Mário Soares em 1977 (..) Reino Unido, Irlanda, Dinamarca e Itália, mais 

tarde França, Alemanha, Países Baixos, Luxemburgo e Belgica” e “ os contactos no seio 

do  movimento  socialista  europeu  aceleraram  o  seu  processo  de  socialização  “ 

(Chrobot, 2012: 89)101. A missão  junto da CEE aumentou substancialmente e os seus 

conselheiros monitorizaram  de  perto  o  policy making  das  Comunidades”  (Ferreira, 

2001, cit por Chrobot, 2012).  

A Europeização da política inicia‐se assim pela própria Europeização das elites, 

dos agentes que decidem em Política Externa. 

Note‐se,  todavia,  que  no  processo  de  adesão  houve  alguma  prudência 

relativmente à  

“participação nacional num processo de coordenação de políticas externas que 

representava uma  inovação de fundo e que podia, além disso, conduzir a uma 

secundarização  dos  interesses  portugueses  face  às  opções  estratégicas  de 

potências  com maior  peso  no  contexto  internacional  ou mais  influentes  no 

processo europeu de decisão” (Correia,2006:63). 

                                                            99  A  COREU  (CORrespondência  EUropeia)  é  uma  rede  de  comunicação  da  União  Europeia  entre  os Estados‐Membros e a Comissão, tendo em vista a cooperação no âmbito da política externa. A COREU facilita  uma  tomada  de  decisão  rápida  em  caso  de  crise  (in  Glossário  ‐ http://europa.eu/legislation_summaries/glossary/coreu_pt.htm) 100 Tradução da nossa autoria 

101 Tradução da nossa autoria 

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Mas a situação evoluiu e  foi‐se progressivamente consolidando a participação 

do país na Cooperação Política Europeia, tendo como um primeiro marco importante o 

exercício da Presidência do Conselho no primeiro semestre do ano de 1992. 

A  socialização  é  um  processo  contínuo  e  vai muito  além  do  processo  incial, 

prosseguindo  até  hoje.  Atua  sobre  os  decisores  políticos,  sobre  os  diplomatas mas 

também  sobre  os  técnicos  e  decisores  da  Administração  Pública  Portuguesa  que 

acompanham os dossiês relativos à Ação Externa da UE e ainda os relativos à dimensão 

externa das políticas internas. 

Este  processo  de  tendência  geral  tem  igualmente  relevância  na  relação  com 

Cabo Verde tanto mais que este país integra um dos eixos principais da Política Externa 

Portuguesa contemporânea e possui uma relação especial com a União Europeia.  

A  socialização  entre  pares  é  também  feita  de  forma  específica  nos  grupos  e 

instâncias que trabalham as questões africanas, designadamente no âmbito do Grupo 

de Trabalho África (COAFR)102 e do Grupo de Trabalho ACP103. 

  V.2.2  Reorganização burocrática 

Esta  é  a  área  mais  facilmente  identificável  do  processo.  Com  efeito,  a 

preparação da adesão, a adesão e a participação na construção europeia têm efeitos 

diretos,  visíveis  e mensuráveis  na  burocracia  dos  Estados‐membros,  provocando  a 

alteração das estruturas existentes e a criação de novas estruturas. 

Como  define  Smith  (2000:619),  a  organização  da  estrutura  de  elaboração, 

definição e implementação da política externa é afetada pela participação na UE e na 

PESC em particular.Estes efeitos são muito claros, por exemplo, quando se prepara e 

exerce  a presidência  rotativa do Conselho da UE  (questão que  já não  se  coloca, no 

domínio  da  PESC  após  o  Tratado  de  Lisboa). O  autor  identifica,  em  particular,  três 

alterações:  o  estabelecimento  de  novos  técnicos/representantes,  a 

                                                            102 O COAFR visa garantir uma política coordenada e coerente da União em relação aos países da África Subsariana (incluindo questões relacionadas com a prevenção e gestão de conflitos) sendo responsável pelas relações com organizações regionais tais como a União Africana. 

103 Grupo de Trabalho responsável pelas relações com os países de Africa, Caraíbas e Pacífico no quadro do estbelecido no Acordo de Cotonu. 

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expansão/reogranização das redes diplomáticas (apesar de estas terem sofrido cortes 

em  função  da  crise  financeira  e  económica)  e  a  reorganização  das  estruturas  da 

Administração Pública.  

No  primeiro  caso,  a  questão  resulta,  não  só  da  necessidade  de  assegurar  a 

participação  nas  reuniões  regulares, mas,  também  a  designação  de  representantes 

para cargos específicos criados no domínio da CPE e mais tarde da PESC. Veja‐se o caso 

dos correspondentes europeus “(…) de  ligação entre as capitais e grupos de trabalho 

que efetuavam análises geográficas ou temáticas para a CPE” (Teles, 2006), no quadro 

da obrigação de consulta entre os Estados em todas as questões de política externa. 

A  reorganização  da  rede  diplomática  foi mais  evidente  nuns  países  do  que 

noutros.  Smith  refere  que,  entre  1972  e  1978,  sete  dos  nove  Estados‐membros 

aumentaram o número das missões em países terceiros (Smith,2000:621). Houve, por 

outro  lado,  uma  reorganização  dos  serviços  internos,  isto  é,  dos  Ministérios  dos 

Negócios  Estrangeiros  –  número  de  efetivos  e  orçamento  –  e  a  criação  de  novas 

estruturas nos Ministérios setoriais. 

Vejamos o caso português.  

No  quadro  das  negociações  para  a  adesão  houve  lugar  a  uma  série  de 

alterações nas instituições portuguesas.  

Desde logo, na Assembleia da República (AR), no seio da qual foi instituida, em 

1979,  uma  delegação  para  o  estabelecimento  de  informações  com  delegação 

correspondente do Parlamento Europeu  (PE). No ano seguinte era criada a Comissão 

Parlamentar de  Integração Europeia, vocacionada para acompanhar a negociação da 

adesão e dialogar com o PE, os seus congéneres e a sociedade civil. Em 1987 mudaria o 

nome para Comissão para os Assuntos das Comunidades Europeias e, no ano seguinte, 

adotava a atual designação de Comissão de Assuntos Europeus104. É esta Comissão que 

é responsável  pela “(…)  apreciação parlamentar global dos assuntos europeus e a que 

representa  a  AR  na  COSAC  –  Conferência  dos  Órgãos  Especializados  em  Assuntos 

Comunitários.  “  (Paulo, 2006). É  também  logo nos primeiros anos de  adesão  (1987) 

                                                            104   No entretanto esta Comissão  foi  fundida com a Comissão dos Negócios Estrangeiros durante a  IX Legislatura: 2002‐2004). 

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que é publicada a primeira lei portuguesa sobre o acompanhamento parlamentar dos 

assuntos europeus105.  

Mas no sistema político português o poder de direção e condução da Política 

Externa está atribuída ao Governo e, portanto,  interessa antes de mais  identificar as 

alterações provocadas pela adesão e participação no projeto europeu em geral e na 

CPE e PESC em particular nas estruturas da orgânica do Governo  ‐ no Ministério dos 

Negócios Estrangeiros (MNE) mas também nos Ministérios sectoriais. 

Na  fase  de  preparação  da  adesão  e  quando  foi  formalmente  assumido  este 

objetivo “(…) o processo foi transferido para o topo do executivo” ( Correia, 2006:39), 

tendo sido criada a Comissão para a  Integração Europeia à qual competia preparar e 

dirigir as negociações com vista à adesão, sob a orientação do Governo.  

O MNE  não  teve  assim  no  início  um  papel  central  neste  processo.  Como  se 

pode ler no Preâmbulo do normativo que cria a Comissão,  

“Em virtude de o processo de negociações envolver aspetos políticos, técnicos e 

económicos que  caberiam normalmente no âmbito da  competência de  vários 

Ministérios,  optou‐se  por  fazer  depender  as  novas  estruturas  diretamente  da 

Presidência  do  Conselho  de  Ministros,  a  fim  de  facilitar  a  indispensável 

coordenação  e  de  assegurar  uma  visão  integradora  da  economia  global  das 

negociações” (Decreto‐Lei nº 306/77 de 3 de Agosto) 

Para  o  apoio  técnico  e  administrativo  da  Comissão  foi  criado  o  Secretariado 

para a Integração Europeia ao qual competia (artigo 6º): 

Realizar  estudos  especializados  indispensáveis  à  preparação  das negociações com a CEE; 

Colaborar  com  os  serviços  envolvidos  nos  trabalhos  de  preparação  das negociações; 

Acompanhar a execução dos acordos celebrados com a CEE, por  forma a garantir  o  seu  eficaz  funcionamento  e  o  melhor  aproveitamento  das potencialidades respetivas. 

 

                                                            105 Lei n.º 28/87, de 29 de Junho publicada no DR, I série, nº146, de 29.06.1987 sobre a Participação da Assembleia  da  República  na  definição  das  políticas  comunitárias,  disponível  em http://www.dre.pt/pdf1s/1987/06/14600/24942495.pdf 

 

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Esta estrutura veio a sofrer diversas alterações desde então. 

Em 1979 foi  instituido o Conselho de Ministros para a Integração Europeia e a 

Comissão passou a depender do Vice‐Primeiro‐Ministro para os Assuntos Económicos 

e  Integração  Europeia.  O MNE  continuava  a  ter  um  papel  algo marginal  –  tinha  a 

prerrogativa de ser  informado das atividades desenvolvidas e promovia no âmbito de 

ação  da  sua  competência  prórpia,  as  iniciativas  que,  no  processo  das  negociações, 

assumem  expressão  política,  e  que  não  poderão  ser  consideradas  isoladamente  da 

política externa no seu conjunto (Decreto‐Lei nº185/79 de 20 de junho). 

Acresce  que  este  diploma  de  1979,  prevê  a  criação  de  Gabinetes  para  a 

Integração  Europeia  nos  Ministérios  sectoriais  mais  diretamente  envolvidos 

(Administração Interna, Educação e Investigação Científica, Habitação e Obras Públicas 

Transportes e Comunicações, Comunicação  Social). Esta é uma questão  relevante  já 

que  se  relaciona  com  uma  das  consequências  da  integração.  Efetivamente  são 

introduzidos  novos  atores  na  implementação  da  Política  Externa  ao  envolver  o 

trabalho  dos  Ministérios  sectoriais  em  políticas  que  têm  uma  dimensão  externa 

assinalável  –  veja‐se  o  caso,  a  título  de  exemplo,  da  dimensão  das migrações  e  da 

segurança no domínio da admnistração interna. 

Numa  fase  mais  adiantada  da  negociação,  foi  criado,  na  orgânica  do  VII 

Governo,  um  Ministério  da  Integração  Europeia  com  um  Secretário  de  Estado  da 

Integração Europeia,  solução que  foi  abandonada  logo no Governo  seguinte, o qual 

veio a colocar o Secretário de Estado na dependência do Ministério das Finanças e do 

Plano, um cargo que viria a ser extinto no IX Governo Constitucional. Na fase final das 

negociações o processo foi, de alguma forma, centralizado no Presidente da Comissão 

de Integração Europeia, sob dependência direta do Ministro das Finanças e do Plano. 

Mas,  como  refere  José  de  Matos  Correia  “A  integração  plena  na  Europa 

Comunitária, ocorrida em 1986, veio alterar sensivelmente o quadro descrito e fazê‐lo 

em  benefício  do  ‘Palácio  das  Necessidades’  (Correia,  2006:44)  –  na  orgânica  do  X 

Governo Constitucional, o Secretário de Estado, a Comissão e o Secretariado para a 

Integração Europeia transitam para o MNE, numa lógica que apesar de toda uma série 

de modificações, permance até hoje. 

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O  reforço do papel do MNE deve‐se, como assinala  José de Matos Correia, a 

quatro motivos  fundamentais: as questões europeias são centrais na Política Externa 

Portuguesa, a valoração decisiva para a definição da posição nacional é de natureza 

política, o projeto europeu envolve negociações com países terceiros ou organizações 

internacionais o que  implica envolvimento do Estado  ao nível da  sua  representação 

externa,  e  alguns  temas mais  delicados  do  processo  europeu  são  eminentemente 

políticos (Correia, 2006: 59).  

Mas,  como  salienta  igualmente  aquele  autor,  as questões europeias  são, em 

regra,  de  carácter  técnico,  muito  para  além  da  vocação  política  e  generalista  do 

pessoal  diplomático.  Para  dar  resposta  a  esta  exigência,  a  Direção  Geral  das 

Comunidades  Europeias  (sucessora  do  Secretariado  para  a  Integração  Europeia)  foi 

concebida como um serviço “(…) de interface eficaz quer das instituições comunitárias 

quer da administração pública nacional (…) e  criada recorrendo ao recrutamento  (…) 

de pessoal técnico exterior à carreira diplomática” (Correia, 2006:60). Naturalmente os 

progressos no processo de  integração que  se  traduz num  carácter muito  técnico do 

acompanhamento  de  alguns  dossiês  permanece  como  um  desafio  ao  papel 

coordenador  do  MNE,  sobretudo  porque  algumas  políticas  internas  têm,  na 

atualidade, um forte componente de relacionamento externo com países terceiros. 

Neste esforço de adequação das estruturas nacionais é também digna de nota 

uma  menção  à  Comissão  Interministerial  para  as  Comunidades  Europeias  (atual 

Comissão Interministerial para os Assuntos Europeus), uma estrutura de coordenação 

horizontal  concebida  para  assegurar  a  coordenação  entre  os  diversos  ministérios, 

regiões autónomas e serviços do Estado com vista à definição das posições a assumir 

pelo  Governo  Português  nas  diferentes  instituições  das  comunidades  europeias 

(Decreto‐Lei nº527/85 de 31 de Dezembro).  

E, para além desta,  interessa no âmbito da nossa  reflexão,  referir  também a 

Comissão  Interministerial  para  a  Cooperação106  criada  em  1985  como    órgão  de 

consulta e articulação das atividades desenvolvidas na área da cooperação. 

                                                            106 Originalmente criada pelo Decreto‐Lei n.º 175/85, de 22 de maio, e  funciona atualmente  junto do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, I.P.  

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A  participação  na  CPE/PESC  muito  em  particular  traduziu‐se,  em  termos 

formais, em duas  alterações/adaptações  concretas:  a  instalação da  rede COREU e  a 

criação do serviço Correspondente Europeu inicialmente numa base informal e depois 

formalizada na Lei orgânica do MNE, de dezembro de 1985. 

Nas  novas  estruturas  criadas  em  geral,  não  se  pode  deixar  de  referir  a 

Representação Permanente em Bruxelas (REPER)107 criada com a missão de assegurar 

a  defesa  dos  interesses  do  Estado  Português  junto  de  todas  as  instituições 

comunitárias. A missão  tem  desenvolvido  um  papel  importante  designadamente  na 

CPE  e  PESC,  sendo,  “(…)  porventura  a  missão  diplomática  portuguesa  de  maior 

relevância”  (Correia,2006:61). Reflete as novas  formas de assegurar a  representação 

externa  do  Estado.  Com  efeito  a  REPER  é  liderada  por  um  Embaixador,  são‐lhe 

aplicáveis  as  disposições  legais  que  regulam  o  funcionamento  das  missões 

diplomáticas portuguesas no estrangeiro,  integra  funcionários do quadro diplomático 

do MNE mas  inclui  também  funcionários  dos  diferentes Ministérios  e  do  Banco  de 

Portugal.  Aliás  a  revisão  da  orgânica  desta  estrutura  operada  em  2006  foi  feita  no 

sentido  de  reforçar  a  componente  dos  conselheiros  técnicos  em  áreas  económicas 

consideradas fundamentais. 

A nível das Embaixadas e Consulados, também a participação na CPE/PESC veio 

a ter efeitos já que, como assinala José de Matos Correia,  

“ o caráter permanente da negociação comunitária multiplicou a necessidade 

de contatos diretos aos mais diversos níveis entre  responsáveis políticos e de 

reuniões entre os altos funcionários, diplomáticos ou não que, em cada capital, 

gerem os distintos dossiês europeus (…)” (Correia,2006:68). 

 

Com o evoluir da Ação Externa da UE, as Embaixadas portuguesas deixaram de 

ser  apenas  as  Embaixadas  de  Portugal,  para  serem  igualmente  Embaixadas  de  um 

Estado‐membro  da  UE  com  tudo  o  que  este  novo  estatuto  acarreta.  O  mesmo 

acontece  com  os  Consulados  –  neste  caso  a  sua  atividade  registou  alterações 

significativas  em  resultado  do  princípio  da  proteção  diplomática  dos  cidadãos 

                                                            107  Criada  pelo  Decreto‐Lei  nº459/85,  de  4  de  novembro  (a  que  foi  dada  nova  redação  através  do Decreto‐Lei 97/2006 de 5 de junho).  

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comunitários  introduzido pelo Tratado de Maatricht e das  consequências do Espaço 

Schengen.  De  fato,  em  1992,  o  Tratado  de  Maastricht,  ao  instituir  a  cidadania 

europeia,  estabelece  que,  na  ausência  de  proteção  nacional  num  país  terceiro,  o 

cidadão  tem  direito  a  beneficiar  da  proteção  de  outro  Estado‐Membro  da  UE  nas 

mesmas condições de que beneficiam os nacionais desse Estado. O Espaço Schengen 

com  origem  num  Acordo  assinado  em  1985,  estabelece  a  supressão  gradual  dos 

controlos nas  fronteiras  comuns  e  inclui, designadamente procedimentos uniformes 

para a emissão de vistos. 

Neste domínio é digno de nota o referido Centro Comum de Vistos na Praia, em 

Cabo Verde. Trata‐se de projeto europeu  liderado por Portugal    (em parceria com a 

Bélgica e o Luxemburgo), que recebe pedidos de visto Schengen para Portugal, Bélgica 

e  Luxemburgo, bem  como para a Alemanha, Áustria, Eslovénia, Eslováquia,Finlândia, 

França,  Itália, Países Baixos, República Checa e Suécia. Existe pois aqui uma evidente 

Europeização no domínio dos instrumentos diplomáticos. 

V.2.3  Alterações constitucionais 

Como assinala Michael E. Smith (2000), o processo de  integração europeia em 

geral e a CPE/PESC, em particular  também  resultaram em debates  constitucionais e 

mesmo  na  revisão  das  Constituições  dos  Estados‐membros,  correspondendo  a mais 

um indicador do impacto da construção europeia na esfera nacional. 

Assim aconteceu em Portugal.  

Como  refere  Maria  Teresa  Paulo  “Todas  as  revisões  da  Constituição  da 

República  Portuguesa  desde  1976  introduziram  ou  alteraram  disposições  relativas  à 

participação de Portugal na União”  (Paulo, 2006). Assinala  a  autora que existe uma 

lógica de causa/efeito nas revisões constitucionais: 

“(…) 1982  (como preparação da  adesão), 1989  (no  seguimento do Ato Único 

Europeu), 1992  (durante  a Presidência Portuguesa do Conselho da UE,  como 

resposta às disposições do Tratado de Maastricht e na sequência de um novo 

ambiente político europeu, resultante da queda do Muro de Berlim e do fim da 

URSS), 1997  (depois do Tratado de Amesterdão), 2001  (depois da Presidência 

Portuguesa do Conselho da UE e como resposta ao Tratado de Nice), 2004 (no 

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ambiente  pós  Convenção)  e  2005  (na  sequência  da  assinatura  do  Tratado 

Constitucional)” (Paulo, 2006). 

Tratou‐se  de  acompanhar  o  processo  de  evolução  da  própria  integração 

europeia – como foi o caso da terceira revisão que resultou do Tratado de Maastricht ‐ 

mas  também  de  afastar  normas  e  principíos  constitucionais  que  podiam  constituir 

obstáculos  à  integração do país no bloco  europeu  – o  caso da primeira  revisão  em 

1982.  

Com efeito, “”(…) as mutações  induzidas pelo processo de  integração geraram 

pressões  (..)  que  determinaram  a  necessidade  de  alterar  o  texto  constitucional  de 

forma a poder  corrigir o desfasamento  (…)”  ( Guedes e Coutinho, 2006:99). E nesta 

base  geraram‐se  alterações  designadamente  no  princípio  de  separação  de  poderes 

(com  o  Governo  a  ganhar  terreno  na  arquitetura  comunitária  e  a  Assembleia  da 

República a perdê‐lo) e, naturalmente, as questões relativas à organização económica 

da Constituição. 

 

V.2.4  Opinião pública 

Para Michael Smith, o indicador relativo à crescente adesão da opinião pública 

à CPE é dos quatro o menos forte mas, deve, em todo o caso, ser considerado.  

Como se pode ler no Eurobarómetro108 “Os portugueses revelam, desde o início 

da  integração, atitudes afetivas positivas relativamente à pertença de Portugal à UE” 

(Eurobarómetro  64,  2005:  15).  Ao  longo  dos  primeiros  20  anos  de  adesão,  a 

percentagem de cidadãos nacionais que considera que a  integração europeia é “uma 

coisa boa” foi sempre superior a 50 por cento. Acresce que “Os portugueses são mais 

favoráveis  à  integração  política  da  Europa  do  que  a média  dos  cidadãos  europeus” 

(idem:44). Todavia,  

“os Portugueses arrancaram com crescente otimismo até ao início dos anos 90 

(…) Com  a  recessão do  início dos  anos  90,  esse  apoio diminuiu brevemente, 

mas voltou a recuperar na segunda metade da década. Desde então, contudo, a 

                                                            108 EUROBARÓMETRO 64 – Opinião Pública na União Europeia, Outono de 2005 ‐  http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/eb/eb64/eb64_pt_nat.pdf  

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estagnação  económica  portuguesa  e  o  acentuar  da  crise  a  partir  de  2009 

fizeram sentir os seus efeitos. Hoje, menos de metade dos Portugueses vêem a 

nossa pertença à UE positivamente”  (Fundação Manuel Francisco dos Santos, 

2013:49‐50). 

Mas os cidadãos portugueses , “são em geral favoráveis à Política Externa e de 

Segurança Comum  (…)”  (Eurobarómetro,  2004:47).  (…) muito  embora  pareça  existir 

uma  significativa  falta  de  informação  e  conhecimento,  como  se  pode  deduzir  do 

número elevado de respostas “Não sabe/Não responde”. 

V.2 5 – Adaptação e convergência política 

Reuben Wong  distingue,  ao  nível  da  adaptação  e  convergência  política,  três 

dimensões: a crescente importância da agenda política europeia, a adesão a objectivos 

comuns  e  a  prevalência  dos  objectivos  comuns  sobre  os  tradicionais  “domínios 

reservados”. 

Distinguimos  aqui  alguns  exemplos  de  adaptação  que  nos  parecem  poder 

ilustrar a situação relativamente ao caso português.  

Em primeiro lugar, o alargamento da Política Externa Portuguesa para além dos 

seus eixos/regiões tradicionais de atuação. 

De facto, a participação portuguesa na CPE/PESC não teve apenas impacto nos 

atores, nas estruturas e no enquadramento normativo da definição e elaboração da  

Política  Externa  Portuguesa.  Sem  “beliscar”  os  grandes  eixos  da  Política  Externa 

Portuguesa, a nossa participação na CPE/PESC alargou as zonas de atuação nacional. 

“(...)  a  nossa  qualidade  de  Estado‐membro  da  UE  permite  agora  ter  um  contacto 

directo e atuante com certos países ou regiões, e neles com um leque de questões das 

quais  tínhamos  estado  mais  afastados  pela  geografia  ou  pela  história“ 

(Pereira,2006:143). Novas áreas  como as questões  relativas ao  Leste, aos Balcãs, ao 

Mediterrâneo  passam,  contra  a  tradição  e  a  história,  a  interpelar  Portugal  (  Janus, 

2002). 

“A  política  externa  portuguesa  virá  a  sofrer  alterações  em  três  direcções 

essenciais  com  a  adesão  às  Comunidades  Europeias:  a  orientação 

predominantemente atlântica das relações externas do país será temperada pela 

componente  europeia  (...)  euro‐atlantismo;  a  extrema  cautela  no 

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relacionamento  com  a  Espanha  dará  lugar  a  uma  intensificação  das  consultas 

políticas intergovernamentais e a uma convergência de posições quanto às mais 

relevantes matérias de  interesse comunitário; o  relacionamento com o Brasil e 

em especial com os países Áfricanos de expressão portuguesa passará a ser feito 

com  base  numa  área  de  apoio  mais  significativa,  em  que  Portugal  surgirá 

simultaneamente como dinamizador europeu do espaço da  lusofonia e como a 

janela de acesso a uma Comunidade desenvolvida que aposta no diálogo Norte‐

Sul e na cooperação para o desenvolvimento. (Vicente,2011:387‐388)”. 

O  caso  do  Mediterrâneo  é  paradigmático.  Como  salienta  Chrobot,    “Foi  a 

Cooperação  Política  Europeia  que  aproximou  Portugal  do  Mediterrâneo” 

(Chrobot,2012: 110). Ou, pelo menos, reaproximou já que não se pode esquecer que o 

nosso país tem um passado comum com os países do Magrebe. Como escreve Pedro 

Esteves, de relações dispersas até à adesão, as relações de Portugal com estes países 

“ganharam  corpo  com  a  implementação  de  políticas  de  cooperação  europeias 

centradas  no  Mediterrâneo  e  com  a  participação  em  fora  internacionais  como  o 

chamado  “(Diálogo)  5+5”109  e  outras  iniciativas  na  área  da  Defesa  euro‐atlântica” 

(Esteves,  s.d:7).  Com  efeito,  a  Europa  rapidamente  percebeu  que  a  sua  segurança 

depende  da  estabilidade  no  Mediterrâneo  sul,  razão  pela  qual  tem  apostado  na 

relação com os  seus vizinhos do  sul e Portugal  tem vindo a participar do esforço de 

promoção desse diálogo.  

Mas  não  só.  As  posições  de  Portugal  sobre  determinadas  questões 

internacionais  têm  vindo  a  ser  alinhadas  com  a  CPE/PESC  –  por  exemplo, 

relativamente ao conflito israelo‐palestiano ou relativamente à invasão do Kuwait pelo 

Iraque em 1990, como assinala Chrobot (Chrobot, 2012:111). 

Finalmente, o  relacionamento de Portugal com o  seu vizinho  ibérico  também 

sofreu a influência da adesão – Portugal e Espanha passaram a ser membros da mesma 

aliança militar (OTAN) e da mesma organização de integração económica (CEE).  

“(…)  a  Espanha  passou  a  ser  matéria  de  primeira  linha  de  relevância  no 

posicionamento internacional de Portugal. Numa ótica de avaliação estratégica, 

                                                            109 O Processo de Cooperação no Mediterrâneo Ocidental ("Dialogo 5 + 5") é um fórum político informal, criado em 1990, entre 5 países europeus (Espanha, França, Itália, Malta e Portugal) e 5 países do Norte de África (Argélia, Líbia, Marrocos, Mauritânia e Tunísia) (www.dgai.mai.gov.pt) e que tem por objectivo principal  a  coesão  geográfica  através  da  cooperação  em  diversos  domínios,  como  a  energia,  as migrações ou a defesa. 

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pode dizer‐se que este foi um dos mais significativos elementos de alteração do 

enquadramento de Portugal, por efeito da adesão à CEE” (Lopes, 2001:40). 

 

Na relação previligiada com os PALOP,  incluindo com Cabo Verde, é notória a 

convergência. Com efeito, a UE assume grande  relevância na política da Cooperacao 

Portuguesa,  tanto em  termos politico‐institucionais, como ao nível das contribuições 

financeiras.  

“A politica portuguesa de  cooperação para o desenvolvimento está  cada  vez 

mais intimamente ligada à política da União Europeia (…). Os objectivos últimos 

são  os  mesmos:  lutar  contra  a  pobreza,  com  vista  a  sua  erradicação,  e 

contribuir não só para o desenvolvimento sustentável de todos os países como 

também para a sua integração na economia mundial” (IPAD,2011:229). 

 

V.3 – Europeização bottom‐up  

Sendo  a  Europeização  um  processo  de  duas  vias  que  são  comunicantes,  é 

necessário  perspectivar  igualmente  a  Europeização  da  Política  Externa  Portuguesa 

como um processo bottom‐up, já que a projeção nacional também constitui um factor 

de influência nessa política. 

Nesta dimensão, o Estado procura aumentar a  influência nacional no mundo, 

tenta influenciar as políticas externas dos seus parceiros europeus e procura utilizar a 

UE como cobertura/chapéu  (Wong, cit. por Abreu, 2006). Existe como que a procura 

de  um  efeito  catalizador,  ou  talvez  melhor,  da  economia  de  escala,  aberta  pela 

integração num espaço maior e, portanto, com mais possibilidades e peso no sistema 

internacional.  E,  no  caso  de  um  país  pequeno  como  Portugal,  esta  questão  ganha 

naturalmente relevância. 

Na sessão ministerial de abertura das negociações para a adesão de Portugal às 

Comunidades  Europeias,  em  17  de  outubro  de  1978,  o  Ministro  dos  Negócios 

Estrangeiros  português,  Correia  Gago  declarava  que  “  Portugal  não  deixará  de 

contribuir com as suas aptidões e a sua experiência de diálogo com os povos de outros 

continentes (...)” (AR, 2001). 

Com  efeito,  Portugal  procurou  introduzir  na  agenda  europeia  algumas  das 

principais preocupações e objectivos da sua Política Externa. Nalgumas situações com 

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relativo  sucesso  como  aconteceu  em  particular  quando  exerceu  a  presidência  do 

Conselho da UE (1992, 2000 e 2007). 

Foi o  caso, desde  logo, da  sua  relação previligiada  com os PALOP. Depois de 

alguma resistência à CPE, as Autoridades Nacionais rapidamente perceberam que, no 

quadro europeu, o país ganharia margem de manobra para enfrentar a concorrência 

de outros intevenientes em África, em particular a França e o Reino Unido. De fato, a 

integração  no  projeto  europeu  deu  a  Portugal  acesso  a  meios  financeiros  que 

permitiram  desenvolver  a  cooperação  com  os  PALOP,  desinadamente  com  Cabo 

Verde.  Portugal  procurou  reforçar  a  posição  de  África,  em  particular  da  África 

Subsaariana  na  agenda  da  UE.  A  realização  da  1ª  Cimeira  UE‐África  na  segunda 

Presidência Portuguesa do Conselho da UE, em 2000 e a realização da 2ª Cimeira UE‐

África  e  da  1ª  Cimeira  UE‐Brasil  no  decorrer  da  terceira  Presidência  Poruguesa  do 

Conselho  da  UE,  no  segundo  semestre  de  2007,  traduzem marcos  importantes  da 

estratégia  nacional  nesse  sentido. No  quadro  da UE,  o  país  tem‐se  vindo  a  assumir 

como ponte entre a Europa, África e a América Latina.  

De  fato, Portugal  tem‐se empenhado no processo de decisão das políticas da 

UE  na  área  da  cooperação  para  o  desenvolvimento mas  também  na  definição  de 

políticas  sectoriais  e  horizontais  (migrações,  segurança  ou  alterações  climáticas)  em 

diversas regiões do globo mas muito em particular no que diz respeiro ao continente 

africano.  

“Portugal  interage  na UE  procurando,  por  um  lado,  influenciar  as  políticas  e 

estratégias  que  são  adotadas  no  Conselho  e  a  sua  operacionalização  pela 

Comissão  Europeia  com  base  na  experiência  e  boas  práticas  da  cooperação 

bilateral  e,  por  outro  lado,  sendo  influenciado  pelas  decisões  comunitárias, 

traduzindo‐as para práticas de cooperação bilateral e para o estabelecimento 

de parcerias específicas com a Comissão Europeia” (IPAD,2011:229).  

 

Dois outros casos merecem uma referência: a questão dos direitos humanos e a 

situação de Timor Leste, mas também a relação com os EUA e sua inserção na OTAN. 

Timor  Leste  é  um  exemplo  de  como  a  participação  de  Portugal  na  PESC 

permitiu a mulltilateralização das relações e de dossiers políticos  importantes para a 

Política  Externa  Portuguesa.  Portugal  conseguiu,  por  exemplo,  levar  o  Conselho  a 

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adoptar, em 25 de Junho de 1996, uma posição comum relativa a Timor‐Leste, na qual 

a  UE  dá  o  seu  apoio  às  iniciativas  tomadas  no  âmbito  das  Nações  Unidas  para  a 

resolução da questão.  

Assim,   

“(...)  o  facto  de  Portugal  colocar  a  questão  timorense  no  plano  europeu  (da 

PESC)  permitiu  que  a  questão  de  Timor‐Leste  ganhasse  uma  relevância 

internacional, que dificilmente teria sido possível sem (...) levar a questão  

timorense para o plano da PESC, e de relacionar a questão  timorense com os 

direitos humanos” ( Hermenegildo, 2001:s.pag.).   

 

A PESC funcionou, assim, como um multiplicador de visibilidade, de poder, de 

contactos e de influência.  

Por outro  lado, Portugal procurou  igualmente preservar o  laço  transatlântico, 

promovendo o uploading dos  seus objetivos estratégicos. Neste caso, Portugal  tinha 

como objectivo manter o eixo atlântico da sua Política Externa sem colocar em causa 

os esforços europeus no domínio da defesa. Tratava‐se, assim, de equilibrar o binómio 

UE / NATO e, nesse sentido, Portugal defendeu que  

“ (...) o  desenvolvimento da então chamada “identidade europeia de segurança 

e  defesa”  pela  UE  não  conduziria  inevitavelmente  a  uma  incompatibilidade 

entre  esta  e  a  Aliança  Atlântica  desde  que  se  aceitassem  mecanismos  de 

coordenação e cooperação adequados” (Pereira, 2006:136). 

 

 

 

 

   

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CONCLUSÕES  

 

Com a presente dissertação procurou‐se compreender o  impacto do processo 

de  integração europeia na Política Externa Portuguesa, tentando  identificar os efeitos 

na sua elaboração, definição e  implementação,  relativamente aos PALOP e elegendo 

Cabo Verde como estudo de caso.   

Optámos  por  uma  análise  multinível  e  multifacetada  da  política  externa, 

apelando  a dois enquadramentos  teóricos. Uma  visão próxima dos  Institucionalistas 

Neoliberais  que  admitem  a  cooperação  entre  os  Estados  da  qual  podem  resultar 

ganhos mútuos numa visão na qual as instituições internacionais podem assumir papel 

relevante.  A  UE,  como  experiência  singular  no  universo  das  organizações 

internacionais, faz mesmo a diferença. E, tanto assim é, que considerando os ganhos 

conjuntos que podem obter  os Estados‐membros têm vindo a aprofundar o processo 

de  integração e tem, em paralelo, vindo a aumentar o número de Estados‐membros, 

existindo um poder de atração que se traduz na existência, em todos os momentos, de 

novos candidatos à adesão. 

Mas,  também  o  Construtivismo  que,  dá  enfâse  às  estruturas  normativas  na 

construção da  identidade e do  seu papel na definição da ação política, pressupondo 

que  o mundo  é  permanentemente  construído  através  da  interação  dos  atores  –  e, 

neste sentido, a Europeização é entendida como um processo dinâmico, de duas vias, 

de influência recíproca entre a UE e os Estados‐membros.  

No final da nossa investigação e subsequente reflexão regressamos ao ponto de 

partida: Foi a Política Externa Portuguesa Europeizada?  

Consideramos  igualmente  as  interrogações  resultantes  daquele  ponto  de 

partida.  Trata‐se  de  saber  qual  o  impacto  da  adesão  à  UE  na  Política  Externa 

Portuguesa, a forma como a participação nas estruturas e práticas de coordenação da 

política externa da UE  influenciou  a Política  Externa Portuguesa para os PALOP, em 

particular para Cabo Verde e averiguar se houve, afinal,  lugar a uma adaptação e/ou 

projeção nacional. 

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Concluímos  pela  confirmação  da  nossa  primeira  hipótese  de  trabalho  ‐  a 

Política  Externa  Portuguesa  foi  (e  continua  a  ser)  objeto  de  um  processo  de 

Europeização e exploramos os diversos sinais dessa Europeização que confirmam a sua 

existência. 

Analisámos as duas dimensões, a dimensão top‐down e a dimensão bottom‐up 

do processo de Europeização. Na primeira dimensão Portugal foi (e ainda é) sujeito à 

influência e estímulo por parte da UE e dos restantes Estados–membros na sua Política 

Externa. Na segunda, o país procurou  influenciar a Ação Externa da UE e as políticas 

externas dos seus parceiros europeus. Por uma e outra razão e, talvez, sobretudo pelas 

duas em  interação, a Política Externa Portugesa alterou‐se. Alterou‐se nos meios, nos 

atores e no alargamento dos objectivos. 

Por efeito da adesão portuguesa ao projeto europeu, produziram‐se uma série 

de alterações.  

Em  primeiro  lugar,  ocorreu  uma  socialização  das  elites  portuguesas  que  se 

iniciou,  como  vimos,  muito  cedo,  ainda  antes  da  adesão  propriamente  dita.  Esta 

socialização  prosseguiu  e  prossegue  sobretudo  junto  dos  decisores  políticos  que 

compreendem, aceitam e negoceiam as grandes linhas das posições comuns europeias 

sobre questões consequentes das relações internacionais. Esta socialização entre pares 

é igualmente muito evidente entre o corpo diplomático, os técnicos e funcionários de 

alto nível da Administração Pública portuguesa que trabalham ao nível europeu, entre 

pares, no seio dos diversos Comités e Grupos de Trabalho. Trata‐se, muitas vezes, de 

questões com incidência, direta ou indireta, no posicionamento externo de Portugal. 

Houve  igualmente  lugar  a  diversas  alterações  na  estrutura  da  burocracia 

nacional  com  uma  reformulação  do  MNE  para  dar  resposta  aos  requisitos  de 

participação  na  CPE/PESC  e  com  a  concomitante  criação  de Gabinetes  de  Relações 

Internacionais  nos  diversos Ministérios  Sectoriais. O  papel  que  as  Embaixadas  e  os 

Consulados  são  chamados  a  desempenhar  em  países  terceiros  foi  igualmente 

influenciado pelo processo europeu. 

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Os  efeitos  estenderam‐se,  como  referimos,  à  Constituição  da  República 

Portuguesa que foi diversas vezes objeto de alteração para evitar o desfasamento com 

o processo europeu e em função da própria evolução desse processo de integração. 

Finalmente houve um alargamento do universo da Política Externa Portuguesa. 

Com efeito, e  como  vimos, depois de uma  importante  rutura operada  com o 25 de 

Abril e o fim da Ditadura, a Política Externa Portuguesa tem estado articulada em torno 

de alguns eixos consideravelmente consensuais e estáveis ao longo dos últimos anos: a 

opção europeia, a  ligação atlântica, as  relações com os PALOP e uma  renovação das 

relações com o Brasil. Ora a participação na UE não modificando estes eixos, conduziu 

a ação externa de Portugal a outras zonas do globo, em particular através da Política 

Europeia de Vizinhança. As fronteiras da Política Externa Portuguesa em determinadas 

condições vão para além das fronteiras do território nacional, dilatando‐se aos vizinhos 

da  UE  a  leste mas  também  a  sul.  Por  efeito  desta  situação,  Portugal  tem  vindo  a 

assumir um papel  importante no relacionamento com os países do Mediterrêneo sul. 

Em  diversos  domínios.  É  a  este  título,  por  exemplo,  que  Portugal  é  dos  Estados‐

membros  signatários das Parcerias para  a Mobilidade,  recentemente  assinadas  com 

Marrocos e a Tunísia, e participa de forma ativa em diversas operações da FRONTEX no 

quadro do diálogo sobre mobilidade, migrações e segurança. 

Houve, pois uma  adaptação. Mas,  também uma projeção da Política  Externa 

portuguesa, particularmente evidente, naturalmente, no exercício da Presidência do 

Conselho da UE. E, neste âmbito, o pilar Áfricano da nossa Política Externa (e em geral 

as relações com as ex‐colónias) parece ter sido aquele em que esta projeção mais se 

sentiu  (embora,  como  vimos,  não  tenha  sido,  de  todo,  o  único).  Interessa‐nos  em 

particular porque representa o enquadramento do nosso estudo de caso. 

Com  efeito,  a  designada  dimensão  Áfricana  tem  sido  uma  constante  desde 

1974,  na  procura  de  um  novo  relacionamento  com  as  ex‐colónias. No  domínio  das 

relações  com  os  PALOP,  a  Cooperação  Portuguesa  tem  sido  um  dos  instrumentos 

fundamentais da Política Externa Portuguesa e o caso de Cabo Verde é, a este título, 

emblemático. 

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Portugal tem vindo a procurar, como referimos no Capítulo II, trazer África para 

a Europa, diligenciando no sentido de que o diálogo euro‐africano possa ser uma das 

prioridades da agenda  internacional da UE. Se olharmos para os  resultados das  três 

Presidências  Portuguesas  do  Conselho  da  União  Europeia,  não  podemos  deixar  de 

reconhecer algum sucesso nesse sentido. 

Em  1992,  obtiveram‐se  avanços  na  política  de  cooperação  para  o 

desenvolvimento  e  foi  assinado  o  primeiro  PIR  PALOP  no  quadro  da  Convenção  de 

Lomé IV. Em 2000 teve lugar a 1ª Cimeira UE‐África e foi assinado o Acordo de Cotonu, 

como  resultado  da  revisão  da  Convenção  de  Lomé  em  que  Portugal  foi 

particularmente ativo. Finalmente, na terceira Presidência, em 2007, Portugal colocou 

novamente na agenda europeia, ao mais alto nível, o reforço do diálogo euro‐Áfricano 

que se traduziu na realização da 2ª Cimeira UE‐África, em Lisboa no mês de dezembro. 

E,  finalmente,  de  grande  significado  para  a  nossa  reflexão,  a  assinatura  da  Parceria 

para  a Mobilidade UE‐Cabo Verde,  a primeira parceria desta natureza  com um país 

ACP  e  uma  das  duas  parcerias  pioneiras  da  UE  no  domínio  da  gestão  dos  fluxos 

migratórios.  

Houve,  pois,  uma  projeção  dos  interesses  estratégicos  de  Portugal.  Uma 

projeção  da  Política  Externa  Portuguesa  (Europeização  bottom‐up),  designadamente 

no plano do eixo Áfricano. 

E  desta  forma,  verifica‐se  um  processo  de  Europeização  da  Política  Externa 

Portuguesa, em geral e, em particular, para África, enquanto pilar dessa política.  

E, no quadro deste processo geral, houve lugar a uma Europeização da Política 

Externa para Cabo Verde. 

As  relações entre Portugal e Cabo Verde normalizaram‐se  logo desde o  início 

do período pós‐descolonização. Hoje, existem laços importantes entre os dois países a 

nível do diálogo político, materializado na  cooperação operacional –  cooperação  ao 

nível  económico,  educativo,  da  capacitação  institucional,  relativa  aos  fluxos 

migratórios, e ao nível da cooperação técnico‐policial e tecnico‐militar entre outros, tal 

como o testemunham os diversos PIC. A mobilidade de pessoas entre os dois Estados e 

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o peso da diáspora caboverdiana em Portugal são igualmente elementos estruturantes 

das relações lusocaboverdianas.  

A relação de Portugal com Cabo Verde foi influenciada pela adesão de Portugal 

à  UE,  não  só  por  todas  as  modificações  operadas  em  geral,  como  referimos  nos 

parágrafos anteriores,  como  também, e  sobretudo, em virtude de outras de  caráter 

mais específico. Estas resultam, também, do relacionamento muito especial deste país 

Áfricano com a UE que influencia a relação bilateral Portugal‐Cabo Verde. 

A  Cooperação  Portuguesa  teve  acesso  a meios,  designadamente  financeiros 

que  fortaleceram  a  presença  de  Portugal  em  Cabo  Verde  –  é  o  caso  dos  projetos 

educativos ou da cooperação técnico‐policial, mas também a cooperação no domínio 

das migrações sob o “chapéu” da Parceria para a Mobilidade UE‐Cabo Verde, na qual 

Portugal assume claramente um papel de liderança e de “ponte”. 

Com efeito, Portugal tem‐se assumido como uma “ponte” entre Cabo Verde e a 

UE. Três exemplos podem ser mencionados: o papel de Portugal na graduação de Cabo 

Verde, na celebração da Parceria Especial UE‐Cabo Verde e da subsequente Parceria 

para a Mobilidade.  

Em todos estes processos Portugal teve um papel ativo. Na graduação de Cabo 

Verde  para  o  grupo  de  Países  em Vias  de Desenvolvimento  (PVD)  Portugal  exerceu 

pressão  diplomática  no  quadro  da UE  (mas  também  das Nações Unidas)  tendo  em 

vista a consagração de um período transitório para Cabo Verde. Nos dois últimos casos 

propondo  e  diligenciando  para  a  assinatura  daquelas  parcerias  que  concedem  um 

estatuto especial a Cabo Verde no quadro europeu.  

Este relacionamento especial entre Cabo Verde e a UE tem efeitos positivos e 

mensuráveis  na  relação  bilateral  entre  Portugal  e  Cabo  Verde  como,  aliás,  as  duas 

partes reconhecem ao mais alto nível. 

Tal  como  se  pode  ler  na  Declaração  Final  da  I  Cimeira  Luso‐Caboverdiana, 

realizada em 2010, Portugal e Cabo Verde:  

 

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Saudaram  os  progressos  alcançados  na  implementação  da  Parceria  para  a Mobilidade entre a União Europeia e Cabo Verde, cuja consolidação se reflecte positivamente nas suas relações bilaterais, e comprometeram‐se a prosseguir a cooperação  para  dar  resposta  aos  desafios  e  oportunidades  desta  agenda comum. 

Na  Declaração  do  Mindelo  (II  Cimeira  Luso‐caboverdiana,  realizada  em 

dezembro  de  2012)  e  no  que  respeita  à  concertação  político‐diplomática,  as  duas 

partes saudaram o quinto aniversário da Parceria Especial entre a UE e Cabo Verde e 

Portugal  reafirmou a  sua disponibilidade para apoiar Cabo Verde no diálogo  com os 

demais Estados‐membros da UE e outras  instituições, bem como no aprofundamento 

da Parceria. 

Concluímos,  assim,  pela  validação  da  primeira  hipótese  de  trabalho  já  que 

houve  lugar  a  uma  Europeização  da  Política  Externa  Portuguesa.  E  identificamos  os 

efeitos  já que o processo e os atores da Política Externa  foram alvo do processo de 

Europeização  que  conduziu  a  alterações  na  burocracia  que  é  responsável  por  esta 

política,  mas  também  ao  nível  dos  objectivos  já  que  houve,  como  vimos  um 

alargamento do universo das relações que Portugal mantém com determinadas áreas 

do globo.  

Este movimento  global  é  igualmente  evidente  na  relação  com  África,  e  em 

particular, com Cabo Verde.  

No  caso  de  Cabo  Verde  não  houve  propriamente  alteração  substantiva  da 

Política Externa Portuguesa do ponto de vista dos objetivos mas houve, sem dúvida,no 

acesso  a  um  novo  enquadramento  e  sobretudo  no  acesso  a meios  financeiros  que 

potenciam a realização dos objetivos da Cooperação Portuguesa.  

De  uma  forma  geral,  a  relação  bilateral  está  agora  enquadrada  numa  relação 

multilateral que teve efeitos ao nível da cooperação portuguesa. Os projetos em Cabo 

Verde são, em muitos casos projetos da Cooperação Portuguesa mas beneficiam de um 

enquadramento diverso e do acesso a meios de financiamento que potenciam a nossa 

ação. É o caso dos projetos desenvolvidos ao abrigo da Parceria para a Mobilidade. 

   

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Por outro  lado, a projeção que Portugal tem promovido das questões Áfricanas 

na  agenda  europeia  tem  vindo  a  beneficiar  Cabo  Verde.  Portugal,  enquanto  Estado‐

membro da UE  foi particularmente ativo na promoção de um estatuto especial de Cabo 

Verde  junto da União Europeia, o que se  reflete de  forma positiva no  relacionamento 

com este país. 

   

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Verde, assinado em Lisboa em 9 de junho de 2010 e publicado no Diário da República, 

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União Europeia  

Acordo 2000/483/CE de parceria entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico 

e a Comunidade Europeia e os seus Estados‐Membros assinado em Cotonu, em 23 de 

Junho de 2000 ‐ Jornal Oficial nº L 317, de 15/12/2000 p. 0003 – 0353 

Acordo  entre  a União  Europeia  e  a República de Cabo Verde  sobre  a  facilitação  da 

emissão de vistos de curta duração para os cidadãos da República de Cabo Verde e da 

União Europeia, publicado no JOUE, série L, n.º 282, de 24/10/2013. 

Acordo entre a União Europeia e a República de Cabo Verde relativo à readmissão de 

pessoas  que  residem  sem  autorização,  publicado  no  JOUE,  série  L,  n.º  282,  de 

24/10/2013.  

Comissão  das  Comunidades  Europeias,  Comunicação  da  Comissão  ao  Conselho,  ao 

Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu Estratégia da UE para 

África: rumo a um Pacto Euro‐Áfricano a fim de acelerar o desenvolvimento de África – 

COM  (2005)  489  final,  Bruxelas,  12.10.2005  Disponível  em:  http://eur‐

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Comissão das Comunidades Europeias, Comunicação da Comissão  ao Conselho e  ao 

Parlamento Europeu sobre o futuro das relações entre a União Europeia e a República 

de Cabo Verde, COM (2007) 641 final, Bruxelas, 24.10.2007 Disponível em: http://eur‐

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Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu, Estratégia da UE para 

África: rumo a um Pacto Euro‐Áfricano a fim de acelerar o desenvolvimento de África, 

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LISTA DE FIGURAS OU ILUSTRAÇÕES 

 

Fig. 1: Dimensões, mecanismos e resultados da Europeização da Política Externa....  22

Fig. 2: Mapa dos países da CPLP……………………………………………………………………………….  36

Fig. 3: Síntese dos Objetivos, Princípios e Prioridades da Cooperação Portuguesa….  39

Fig.4: Cooperação técnico‐militar com os PALOP……………………………………………………..  41

Fig. 5: A cooperação europeia com os países ACP: de Yaoundé a Cotonu ………………  52

Fig.6: Parceria Especial UE‐Cabo Verde……………………………………………………………………  57

Fig.7: Emigrantes de Cabo Verde por país de destino (2008‐2013 …………………………..  65

Fig.8: Emigrantes de Cabo Verde segundo motivo de emigração, por sexo …………..           (2008‐2013) 

66

Fig.9: PIC 2011‐2015 – Eixos estratégicos e áreas de intervenção……………………………  72