16
INTRODUÇÃO Em decorrência do Cerrado Piauiense se encontrar localizado sobre solos sedimentares, pode- se inferir que o mesmo é passível de grande risco de degradação devido ao desmatamento para fins de exploração agrícola. O predomínio do interesse econômico sobre a conservação do meio ambiente provoca como conseqüência imediata a degradação ambiental, através da perda da camada de solo agrícola e a redução da população de diversas espécies de plantas e de animais, além dos efeitos indiretos sobre o clima e a população humana. Com base nessa realidade, surgiu o interesse em estudar o impacto da exploração agrícola do Cerrado Piauiense, onde a atividade utiliza moderna tecnologia, com a predominância de mecanização e o uso de insumos, tais como a aplicação de corretivos do solo, fertilizantes químicos, defensivos e sementes selecionadas de cultivares indicadas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Logo, esta investigação centra-se na análise dos impactos ambientais que a ocupação, alicerçada na exploração agrícola moderna, provoca no solo e na biodiversidade dos referidos municípios, haja vista o debate no Estado alertar para a não-existência de uma racionalidade nos procedimentos de ocupação e uso do solo, o que coloca a agricultura como uma das atividades de maior responsabilidade pela degradação do meio ambiente, uma vez que o desmatamento e o uso intensivo de fertilizantes, de agrotóxicos e de mecanização com o objetivo de aumentar a produtividade e a produção provocam efeitos negativos diversos sobre mananciais de 1 - Este trabalho é parte da Dissertaçãode Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente, intitulada A agricultura comerci al e suas conseqüências sobre o ambi ente nos Municípios de Pal mei ra do Piauí e Currais .

ðº ðð - CEPRO · de exploração agrícola. O predomínio do interesse ... tecnologia, com a predominância de mecanização e ousodeinsumos,taiscomoa aplicaçãodecorretivos

  • Upload
    votu

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

INTRODUÇÃO

Em decorrência do Cerrado Piauiense seencontrar localizado sobre solos sedimentares, pode-se inferir que o mesmo é passível de grande riscode degradação devido ao desmatamento para finsde exploração agrícola. O predomínio do interesseeconômico sobre a conservação do meio ambienteprovoca como conseqüência imediata a degradaçãoambiental, através da perda da camada de soloagrícola e a redução da população de diversasespécies de plantas e de animais, além dos efeitosindiretos sobre o clima e a população humana.

Com base nessa realidade, surgiu o interesseem estudar o impacto da exploração agrícola doCerrado Piauiense, onde a atividade utiliza modernatecnologia, com a predominância de mecanização e

o uso de insumos, tais como a aplicação de corretivosdo solo, fertilizantes químicos, defensivos e sementesselecionadas de cultivares indicadas pela EmpresaBrasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).

Logo, esta investigação centra-se na análisedos impactos ambientais que a ocupação, alicerçadana exploração agrícola moderna, provoca no solo ena biodiversidade dos referidos municípios, haja vistao debate no Estado alertar para a não-existência deuma racionalidade nos procedimentos de ocupaçãoe uso do solo, o que coloca a agricultura como umadas atividades de maior responsabilidade peladegradação do meio ambiente, uma vez que odesmatamento e o uso intensivo de fertilizantes, deagrotóxicos e de mecanização – com o objetivo deaumentar a produtividade e a produção – provocamefeitos negativos diversos sobre mananciais de

1 - Este trabalho é parte da Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente, intitulada A agricultura comercial e suasconseqüências sobre o ambiente nos Municípios de Palmeira do Piauí e Currais .

v.23, n. 1, 2005

águas superficiais e subterrâneas, sobre os solos, abiodiversidade e sobre a saúde humana.

A escolha do tema alicerçou-se na importânciae no potencial produtivo da região do Cerrado paraa economia piauiense e no risco que esteecossistema encontra-se submetido quando umaagricultura tecnificada vem sendo implantada emritmo acelerado, sem que medidas de conservaçãodo ambiente e políticas públicas adequadas venhamsendo adotadas, a exemplo do que ocorreu noCerrado do Brasil Central, onde houve umadegradação ambiental de proporções alarmantes,cujos resultados danosos atingiram níveis totalmenteirreversíveis.

Os Municípios de Palmeira do Piauí e Curraisforam selecionados como área do estudo devido àuniformidade de suas condições edafoclimáticas epor consistirem em pólos de atração no último decêniopara implantação de projetos agrícolas, os quais estãosituados no platô da serra do Uruçuí. A instalaçãodesses projetos visando a produção de grãos (soja,arroz de sequeiro de terras altas e milho), iniciadana década de 1990 em Currais e na de 2000 emPalmeira do Piauí, vem se expandindo emdecorrência da alta rentabilidade, cuja produtividadeatinge valores economicamente compensadores, pormeio da presença de empresários e produtoresoriginários, principalmente, dos Estados do Paraná,São Paulo, Santa Catarina, Rio de Janeiro e RioGrande do Sul.

Neste artigo analisam-se os dados e asinformações coletados em pesquisa de camporealizada no ano de 2003, nos Municípios de Palmeirado Piauí e Currais. Em termos de procedimentometodológico, a pesquisa foi realizada medianteaplicação de dois questionários. Um dosquestionários foi direcionado aos proprietários ouadministradores dos projetos agrícolas financiadospela rede bancária oficial e por agências privadasde financiamento. O segundo questionário tevecomo objeto de pesquisa os técnicos que trabalhamdireta ou indiretamente na região do Cerrado, asautoridades locais, os dirigentes sindicais, os gerentesdos bancos oficiais, os funcionários de instituições

públicas ligadas ao setor agrícola e os representantesde entidades do setor privado com atuação tambémna região do Cerrado. A referida pesquisa foidividida em três etapas. A primeira objetivou oreconhecimento da região e envolveu, inclusive,municípios além da área selecionada para o estudo.Na segunda etapa realizou-se o teste-piloto paraadequação dos questionários com dois proprietáriosdo Município de Currais, onde ocorre maior númerode projetos, e um aplicado no Município de Palmeirado Piauí, além de entrevistas com três técnicos quetrabalham diretamente nos projetos em toda a regiãodo Cerrado. Após os ajustes necessários nos doisquestionários, realizou-se a terceira etapa medianteaplicação definitiva de todos os questionários.

O universo da pesquisa constituiu-se de doisprodutores do Município de Palmeira do Piauí e oitoprodutores do Município de Currais, além de 10técnicos, autoridadese representantes de entidadescivis organizadas, entre os quais, seis engenheirosagrônomos, um biólogo, um gerente de banco, umpresidente de sindicato de trabalhadores rurais e umprefeito municipal.

Com vistas à exposição dessa problemática,estruturou-se esse artigo nos seguintes itens:Cerrado Brasileiro: caracterização, ocupaçãoe uso, em que se faz uma retrospectiva dacaracterização e do processo de ocupação e usodo Cerrado Brasileiro; Cerrado Piauiense:caracterização, ocupação e uso , descrevendosuas características e a maneira como se realizoua ocupação e utilização dos espaços; ImpactosAmbientais, no qual se abordam o conceito, ascausas principais e as conseqüências dosimpactos ambientais para o meio ambiente;Pesquisa de campo, parte em que se discutemas informações coletadas junto aos produtores decada um dos municípios selecionados, os dadosfornecidos por técnicos, autoridades erepresentantes de entidades civis organizadasligados ao processo produtivo na região doCerrado, com o objetivo de demonstrar osimpactos sobre o solo e a biodiversidade no platôda serra do Uruçuí, nos Municípios de Palmeira

v.23, n. 1, 2005

do Piauí e Currais, em conseqüência da exploraçãoagrícola comercial para produção de grãos; eConclusão, quando se relatam os resultados dapesquisa nos dois municípios e os efeitos para o meioambiente, particularmente para o solo e abiodiversidade, além de formular propostas de políticasque venham a evitar o avanço do processo dedegradação ambiental e, ao mesmo tempo, viabilizaro aproveitamento do potencial produtivo da região emharmonia com o meio ambiente, na medida em que aconservação ambiental não deve ser vista comorestrição ao desenvolvimento, mas como oportunidadede negócios sustentáveis que combinam ocrescimento econômico, a geração de emprego erenda e a proteção dos recursos naturais.

1 CERRADO BRASILEIRO:CARACTERIZAÇÃO, OCUPAÇÃO E USO

De acordo com Rocha (1997), o Cerrado Bra-sileiro é a segunda maior formação vegetal (2 mi-lhões de km2), ocupando cerca de 20% do territórionacional, estendendo-se por todo o Distrito Federale os Estados de Goiás e Tocantins; a maior parte deMato Grosso e Mato Grosso do Sul; áreas de SãoPaulo, Minas Gerais, Bahia, Piauí, Maranhão,Rondônia, Roraima e Amapá.

Segundo Buschbacher (2000), a ocupação doCerrado teve início no século XVIII com a minera-ção que utilizou um ciclo de exploração intensivaaté o quase esgotamento das jazidas, o que resul-tou na decadência da atividade. A região passoupor um período de estagnação até o início do sécu-lo XX. Na década de 30, com a construção de fer-rovias, apresentou um novo impulso nas atividadeseconômicas, possibilitando o comércio entre as re-giões mais urbanizadas do País. Na década de 40,políticas públicas direcionadas para a ocupação doEstado de Goiás culminaram com a criação daColônia Agrícola de Goiás, considerada o primeiropasso na “marcha para o oeste” no território brasi-leiro. Assim, a marcha se consolidou com a cons-trução da Capital Federal, no centro do Cerrado,na década de 50.

O modelo de ocupação agropecuária, nas ter-ras do Cerrado, caracteriza-se principalmente peloaumento da produção obtido através da incorpora-ção de novas terras, e por meio de ganhos em pro-dutividade, em razão do trabalho desenvolvido pelapesquisa da EMBRAPA, não só na introdução denovas cultivares adaptadas às condições de clima esolo, como também no desenvolvimento de novastécnicas agrícolas e de modernos equipamentos.

Caruso (1997) afirma que a vegetação do Cer-rado Brasileiro corresponde às savanas de outrasregiões tropicais do planeta, apresentando cober-tura vegetal intermediária entre o aberto e o fe-chado, classificando-se em quatro categorias, deacordo com a ordem crescente de biomassa: cam-po sujo (vegetação rasteira, formada por ervas egramíneas); campo cerrado (vegetação rasteiracom raros arbustos); cerrado (arbustos, árvores evegetação rasteira); e cerradão (árvores de portemais elevado bem próximas umas das outras).

Santos e Câmara (2002) caracterizam o Cer-rado como um mosaico de tipos vegetacionais, in-cluindo as formações abertas do Brasil Central (cam-po limpo, campo sujo, campo cerrado e camporupestre) e as formações florestais características(vereda, mata de galeria, cerradão e mata mesofílica).A vegetação herbácea coexiste com mais de 420espécies de árvores e arbustos esparsos.

Para Giordano (1999), o tipo principal de vege-tação evidencia-se por savanas estacionais, compresença de matas de galeria perenes ao longo dosrios. Ocorrem, ainda, com menor freqüência, as ve-redas e os campos rupestres. As árvores se apre-sentam de modo geral baixas e retorcidas, com umsistema radicular profundo, tendendo a ser maior quea sua parte aérea, justamente com a finalidade deprover reservas durante os períodos longos de estia-gem e ausência de trocas com o meio via raízes.

Percebe-se que os três autores apresentamidéias similares sobre a vegetação do Cerrado Bra-sileiro, incorporando, assim, todas as suas ocorrên-cias e variações. Entretanto, observam-se porme-nores entre os mesmos, sendo que a visão de Santose Câmara é mais específica, enquanto a de Giordanoé mais genérica. Caruso, em seus estudos, reconhe-

ce os tipos de vegetações ocorrentes classificadas,segundo sua ordem crescente de biomassa, o quepermite ter-se um esclarecimento exato de sua con-figuração.

Nesse sentido, considera-se que a flora doCerrado é a mais rica dentre as savanas do mundo.Muitas espécies são utilizadas localmente na alimen-tação (condimentares, aromatizantes e corantes),medicina, produção de cortiça, fibras, mel, óleos,gorduras, tanino, artesanato e decoração.

O clima do Cerrado é diversificado, entretanto,predomina o tropical com duas estações do ano bemdefinidas, uma seca e outra úmida. O solo é antigo eprofundo, de baixa fertilidade, baixa capacidade deretenção de águas, ácido e com elevado nível deferro e alumínio, associado a baixos níveis de fósfo-ro, cálcio e magnésio. Para viabilizar sua explora-ção com agricultura exige uma adubação fosfatadae a prévia correção da acidez nociva do solo, ele-vando o pH para valores entre 5,5 e 6,0. Os solosmais representativos são os latossolos vermelhoamarelo, os plintossolos, os planossolos e os neossolosquartzarênicos.

Com relação à fauna e aos microorganismosdo Cerrado, Alho e Martins (1995) enfatizam ariqueza da fauna de vertebrados, apesar de haverum baixo endemismo de espécies. O sinvertebrados são menos conhecidos, mas sabe-se que o endemismo é bastante grande, e a rique-za elevada, especialmente de insetos. Em geral,não se discute a importância dos microorganis-mos nas questões ligadas à biodiversidade, talvezpela falta de dados referentes ao grupo como umtodo. O nível de desconhecimento nesse campo étão grande que cerca de 157.000 novas espéciesde microorganismos são descritas anualmente,sendo que, aproximadamente, metade destes sãofungos. A importância dos microorganismos éfreqüentemente subestimada. Na manutenção dabiodiversidade, os microorganismos são importan-

tes, pois proporcionam a base alimentar para to-das as cadeias tróficas.2 Sem microorganismos, apirâmide trófica não existiria.

Devido a essa riqueza, Giordano (1999) atri-bui quatro funções básicas ao Cerrado Nordestino:pólo produtor de grãos para a moderna pecuária(avicultura, suinocultura industrial e bovinoculturaleiteira), cujo consumo de milho e soja exerce fortepressão sobre a oferta desses insumos; pólo pro-dutor de grãos para consumo humano e industrial,considerando que a região é deficitária de algunsprodutos básicos como feijão, arroz e milho, alémde matérias-primas importantes como o algodão;pólo auxiliar de sojicultura de exportação, conside-rando que a produção do Cerrado tende a ser maisregular, menos vulnerável a flutuações climáticase 3.000 km mais próximo de Roterdã do que osportos do sul; pólo agroindustrial processador dasmatérias-primas regionais, especialmente nas áre-as dos complexos soja, carne e lácteos.

2 CERRADO PIAUIENSE:CARACTERIZAÇÃO, OCUPAÇÃO E USO

O Estado do Piauí, com uma área de 252.378Km2, ocupa 16,20% da região Nordeste e 2,95% doterritório nacional. É o terceiro maior estado do Nor-deste, sendo menor que a Bahia e o Maranhão.

De acordo com Lima (1987, p. 64-65), a regiãodo Cerrado, inserida nos Chapadões do Alto-MédioParnaíba, apresenta-se como sendo “o conjunto deextensos planaltos ao sul do Piauí, dentro da grandeunidade estrutural da bacia sedimentar doMaranhão–Piauí”.

Segundo EMBRAPA (2002), o Piauí possuiaproximadamente 11,5 milhões de hectares de Cer-rado, tendo como área de domínio cerca de 70% ede transição em torno de 30%, o que o leva a ocuparo quarto lugar do País e o primeiro do Nordeste,

2 - Cadeia trófica ou cadeia alimentar é a transferência de energia alimentar, desde a fonte nos autótrofos (plantas), através de uma sériede organismos de uma comunidade, que consomem e são consumidos.

v.23, n. 1, 2005

apresentando, portanto, grande potencial a ser ex-plorado. Sua área de abrangência espacial ocupatoda a região sudoeste e parte do extremo-sul piau-iense, como área de domínio, além de manchas detransição ao norte e centro-leste do Estado.

Em conformidade com EMBRAPA (1999) eGoedert (1987), os solos que apresentam maior ex-pressão geográfica na região do Cerrado Piauiensesão os latossolos vermelho amarelo e os plintossolos.Ocorrem também, em menor percentual, osplanossolos e os neossolos quartzarênicos.

Os latossolos vermelho amarelo são solos bas-tante intemperizados, profundos, ácidos e de baixafertilidade, porém com boas condições físicas, con-dicionadas por teores de argila predominantementena faixa de 18% a 40% e estrutura em forma deblocos subangulares e granular. Embora apresentemgraves limitações quanto à fertilidade natural, tor-nam-se excepcionalmente produtivos quando utili-zados sob sistemas de manejo tecnificados, que in-cluam a correção da acidez, o aumento da fertilida-de e o controle da erosão. Ocorrem em relevo pla-no ou suave ondulado, o que os torna bastante apro-priados para atividades agrícolas intensivas.

Os plintossolos são profundos, associados aoslatossolos e com elevada concentração deconcreções lateríticas no perfil. Ocorrem mais nasbordas das chapadas ou em áreas de acumulação.Sua textura é argilo-arenosa ou franco-argilo-are-nosa na superfície, passando a argilosa nas cama-das subsuperficiais. São fortemente ácidos, de bai-xo teor de carbono nos horizontes superiores e apre-sentam carência generalizada de nutrientes.

Os planossolos são medianamente profundos,relacionados às condições de saturação periódica deágua que induz intensa redução dos óxidos de ferro,condicionando a formação de cores acinzentadas.Apresentam normalmente teores médios a elevadosde matéria orgânica, alta acidez e baixa disponibili-dade de nutrientes. Sua utilização intensiva dependeda implantação de sistemas de drenagem que per-mitem o controle do excesso de água.

Os neossolos são pouco desenvolvidos, bastan-te profundos, ácidos e de baixa disponibilidade de

nutrientes, que ocorrem em relevo plano ou suave-ondulado. Em função da fraca estrutura, esses solosapresentam grande suscetibilidade à erosão e gran-de permeabilidade. Os teores de argila são sempreinferiores a 15% e a estrutura fracamente desen-volvida, sendo excessivamente drenados e de baixadisponibilidade de água.

A vegetação da região em geral é pouco den-sa, apresentando espécies de porte atrofiado, comtroncos tortuosos de engalhamento baixo e retorci-do, folhas grandes e grossas, copa assimétrica eausência de espinhos.

A região em estudo possui, em quase toda asua área, um enorme potencial de águas subterrâ-neas, com bastantes águas artesianas, além de serrica em águas superficiais, sendo banhada, expres-sivamente, por vários rios perenes, dentre os quaisse destacam: Uruçuí Preto, Uruçuí Vermelho,Paraim, Gurguéia e o Parnaíba, onde está localizadaa barragem de Boa Esperança, mais precisamenteno Município de Guadalupe, com 5 bilhões de metroscúbicos de água.

Ainda de acordo com EMBRAPA (2002), oclima da região do Cerrado é caracterizado normal-mente por uma estação seca que pode perdurar dequatro a cinco meses, ocorrendo chuvas nos mesesrestantes, com valores pluviométricos anuais médi-os em torno de 1.100 milímetros. O clima predomi-nante na região é o tropical subúmido quente, inse-rindo-se também, em menor escala, o tipo tropicalsemi-árido quente. Já a temperatura média se situaentre 23º - 24º Centígrados.

Nesse sentido, as condições edafoclimáticasda região são fatores favoráveis para o plantio deculturas comerciais, pois permite a mecanizaçãodos solos. Existem os insumos básicos, motivadospelas jazidas de calcário e fosfato relativamenteabundantes no Cerrado, bem como o crédito rural,disponível por meio dos bancos oficiais (Banco doBrasil e Banco do Nordeste). Apesar dessas van-tagens, o Cerrado ainda apresenta uma infra-es-trutura de estradas, armazéns e eletrificação ruralinsuficientes, sendo um obstáculo para o pleno de-senvolvimento das atividades agropecuárias.

2.1 Município de Palmeira do PiauíLocaliza-se no centro-sul do Estado, na

Mesorregião Sudoeste Piauiense e na MicrorregiãoGeográfica do Alto Médio Gurguéia, entre 44º02’ e44º51’ de Longitude Oeste e 8º16’ e 8º50’ de Latitu-de Sul, distando da Capital, Teresina, 600 km por viarodoviária. Os dados do Censo Demográfico doIBGE (2000) indicam que o município apresenta umaárea territorial de 2.152 km2, uma população total de5.199 habitantes e densidade demográfica de 2,42hab./km2. A temperatura média anual é de 27,5ºCentígrados e a precipitação média anual de 776,7milímetros.

Situado na área conhecida pela denominaçãode Chapadas e Chapadões do Meio-Norte, seu rele-vo, modelado em rochas sedimentares antigas, seapresenta sob a forma de chapadas bastantedissecadas, com escarpas festonadas e topo plano,descambando o conjunto em direção noroeste.

Nos amplos vales dos rios Gurguéia e UruçuíPreto, a topografia é suavemente ondulada, com tes-temunhos tabulares. A altitude oscila entre 250 a 400metros. A rede hidrográfica é constituída pelos riosGurguéia, sendo seu principal afluente o riacho Bre-jo Novo, em cuja margem direita está localizada asede municipal, e Uruçuí Preto, cujo principal aflu-ente é o riacho dos Castros. Os rios principais des-crevem meandros em seus cursos.

Em relação à estrutura fundiária, segundo asEstatísticas Cadastrais do Instituto Nacional de Co-lonização e Reforma Agrária (INCRA), em 2001,as pequenas propriedades representaram 78,50%,as médias, 19,70% e as grandes, 1,80% dos imóveisrurais. Em relação à área dos imóveis, as pequenaspropriedades participaram com 18,60% da área dosimóveis, as médias, com 38,13% e as grandes com43,27%. Esses dados mostram uma elevada con-centração das terras no município, uma vez que43,27% da área total das terras concentram-se emapenas 1,80% do número de imóveis do município.

A base da estrutura produtiva do municípiocentra-se no comércio, na pecuária, na qual se des-tacam os rebanhos bovinos, suínos, ovinos e aves,explorados de forma extensiva e destinados ao con-sumo das famílias, bem como nas culturas agrícolasde arroz de sequeiro, milho, feijão caupi, mandioca ecana-de-açúcar, exploradas predominantemente porpequenos agricultores familiares, que utilizam as ter-ras baixas do município. A partir de 1998 inicia-se aexploração da soja, com possibilidades de ser a maisimportante cultura agrícola do município, haja vistaque cerca de 2/3 de sua área total estão situadosnas terras altas da serra do Uruçuí (chapadas), ondea topografia, o solo e o clima apresentam boas con-dições para a prática de agricultura mecanizada.

2.2 Município de CurraisFoi criado em 26 de janeiro de 1994, por força

da Lei Estadual nº 4.680, com terras desmembradasdo Município de Bom Jesus. Localiza-se no Centro-Sul do Estado, na Mesorregião Sudoeste Piauiensee na Microrregião Geográfica do Alto MédioGurguéia, entre 44º18’ e 45º05’ de Longitude Oestee entre 8º26’ e 9º02’ de Latitude Sul, distando daCapital, Teresina, 640 quilômetros por via rodoviá-ria. A temperatura média anual é de 29º Centígradose a precipitação média anual é de 944,4 milímetros.3

Apresenta área territorial de 3.063 km2, populaçãototal de 4.232 habitantes e densidade demográficade 1,38 hab./km2. (CENSO DEMOGRÁFICO DOIBGE, 2000).

Situado na área conhecida pela denominaçãode Chapadas e Chapadões do Meio-Norte, seu rele-vo corresponde a uma superfície modelada em ro-chas sedimentares antigas, bastante dissecada pe-las bacias dos rios Gurguéia e Uruçuí Preto. Ao lon-go dos vales desses rios existem grandes baixõescom uma topografia suavemente ondulada edissecada em formas tabulares. A altitude oscila de290 a 700 metros. (IBGE, 1984)

3 - Os dados de temperatura, precipitação e relevo são do Município de Bom Jesus, uma vez que não existem essas informações par a Currais, cujasede municipal situa-se cerca de 8 km de Bom Jesus.

v.23, n. 1, 2005

No que se refere à estrutura fundiária, segun-do as Estatísticas Cadastrais do Instituto Nacionalde Colonização e Reforma Agrária (INCRA), em2001, 81,62% dos imóveis rurais são pequenas pro-priedades, 15,44% são médias propriedades e 2,94%são grandes propriedades. Em relação à área dosimóveis, 21,07% pertencem ao estrato de pequenaspropriedades, 31,63% ao de médias propriedades e47,30% ao de grandes propriedades. A exemplo doque ocorre em Palmeira do Piauí, em Currais tam-bém se verifica uma elevada concentração das ter-ras, pois 47,30% da área total das terras concen-tram-se em apenas 2,94% do número de imóveis domunicípio.

De acordo com IBGE (1984), a rede hidrográficacompreende duas bacias: a do Gurguéia, onde estálocalizada a sede municipal, e a do Uruçuí Preto,ambas drenadas para o rio Parnaíba. O riacho da Emaé afluente do rio Gurguéia e os riachos Buritizinho edas Éguas são afluentes do rio Uruçuí Preto.

Com relação à estrutura produtiva, os bovinos,suínos, ovinos e aves, criados em regime extensivo,constituem os principais rebanhos do município. Eas principais culturas são as de arroz de sequeiro,milho, feijão caupi, cana-de-açúcar e mandioca, tra-balhadas pelas famílias de pequenos produtores nasáreas baixas e onduladas, no sistema tradicional nãomecanizado (plantio no toco) e cuja finalidade é asubsistência dessas famílias.

A exploração agrícola para produção de grãos(soja, arroz de sequeiro de terras altas e milho) estáconcentrada no platô da serra do Uruçuí, na parteoeste do município, sendo que grande parcela dosagricultores encontra-se organizada em quatro as-sociações de produtores e um condomínio (Associ-ação São José Operário, Condomínio Rural Agro-União Santa Rita, Associação Araras, Associaçãode Desenvolvimento Comunitário de MicroprodutoresRurais do Alto Alegre e Associação dos ProdutoresRurais de Currais) e três empresas rurais (FazendaAsorga, Fazenda Calibre, Fazenda Caus) e consti-tuídos por associados/proprietários oriundos das re-giões Sul e Sudeste do País, principalmente dos Es-tados de Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sule Rio de Janeiro.

Sendo assim, faz-se mister discutir os diferen-tes tipos de impactos ambientais sobre o solo e abiodiversidade, com a finalidade de subsidiar a aná-lise dos resultados obtidos pela pesquisa de campo.

3 IMPACTOS AMBIENTAIS

Por impacto ambiental considera-se qualqueralteração das propriedades físico-químicas e bioló-gicas do meio ambiente, causada por qualquer for-ma de matéria ou energia resultante das atividadeshumanas que, direta ou indiretamente, afetam a saú-de, a segurança e o bem-estar da população, as ati-vidades sociais e econômicas, a biota, as condiçõesestéticas e sanitárias do meio ambiente, enfim, aqualidade dos recursos ambientais.

Com efeito, o Cerrado Brasileiro tem sido con-siderado o celeiro do Brasil, dada a sua potencialidadeagrícola na produção de alimentos e matérias-pri-mas para a população. Convém questionar-se atéque ponto os usuários dessa base produtiva têm to-mado os necessários cuidados, tendo em vista man-ter sua conservação para as gerações futuras.

Campanhola, Luiz e Rodrigues (1997, p. 159),ao apontarem a agricultura como uma das principaisatividades produtivas responsáveis pela degradaçãodo meio ambiente, afirmam que,

Com a intensi ficação, a agricultura tornou-sedependente de insumos externos que consistem dautilização de sementes de variedades melhoradas,da mecanização, de fertilizantes e de agrotóxicos,com o objetivo de aumentar a produtividade. Osinsumos químicos e mecânicos têm causadoimpactos negativos nos diferentes compartimentosdos ecossistemas, representados por erosão ecompactação dos solos, contaminação de águassuperficiais e subterrâneas, resíduos químicos nossolos, efeitos nos organismos edáficos e aquáticos,danos à saúde humana, entre outros.

Nesse sentido, uma ação de impacto provoca,consideravelmente, a ruptura do equilíbrio existenteno meio ambiente, podendo comprometer todo umecossistema, ou seja, os processos de intervençãoantrópica sobre a natureza, em geral, são contínuos e

direcionados, impedindo qualquer forma de acomo-dação natural. Via de regra, os impactos ambientaisdesencadeiam os impactos sociais. Entretanto, qual-quer que seja a ação estranha sobre o ambiente, acar-retará, por conseguinte, custos socializados, repercu-tindo na qualidade de vida da população.

Nessa perspectiva, Santos e Câmara (2002, p.34), estudando as alterações sofridas pelo meio am-biente, creditam a perda acelerada de nossas rique-zas naturais “à exploração direta dos recursos natu-rais e à retirada da cobertura vegetal”. Como, tam-bém, reafirmam que

os impactos sobre os ecossistemas decorrem do proces-so de ocupação do território, feito com o uso de práticaseconômicas e sociais arcaicas, que são desenvolvidas acre-ditando-se na inesgotabilidade dos recursos naturais.

As causas, efeitos e alternativas de controledos impactos negativos sobre o solo consistem emgrande preocupação aos estudiosos e ambientalistas.Assim, Bertoni e Lombardi Neto (1999, p. 28-29)defendem que

as terras se estragam, tornando-se menos produtivas,por quatro razões principais: perda da estrutura do solo,perda da matéria orgânica, perda dos elementos nutriti-vos e perda do solo.

Esses prejuízos têm várias causas, entre as quaisa erosão, a drenagem imprópria, a irrigação malfei-ta, a alcalinidade, as enchentes e o mau uso do solo.

No entanto, o desgaste das camadas de terranão ocorre somente nas áreas exploradas com ativi-dades agropecuárias. A derrubada da mata, paraextração de madeiras, não só para exportação comopara construções e fabricação de móveis, lenha,carvão e celulose; as alterações dos terrenos, paraas explorações minerais e outras atividades industri-ais; e as queimadas constantes de vegetação sãopráticas que deixam os terrenos descobertos, facili-tando a ação da água da chuva e concorrendo aocarreamento do solo para diversos locais, provocan-do danos ao ambiente.

A gravidade dos problemas decorrentes daerosão está sendo mascarada porque tem ocorri-do, nos últimos anos e para a maioria das cultu-

ras, um aumento nas colheitas, influenciado pelosmelhoramentos da tecnologia, com cultivares maisprodutivas, a expansão das áreas exploradas, coma ocupação de novas fronteiras agrícolas e o em-prego de fertilizantes químicos, suprindo os nutri-entes carreados pelas enxurradas.

Segundo Corrêa (2002), os impactos negativossobre o solo provocados por meio do rápido processode ocupação do Cerrado, embora claramente percep-tíveis, são pouco conhecidos cientificamente, tornan-do-se profundamente preocupante, devido ao processode formação de um solo agrícola ser lento e a consti-tuição da camada agricultável demorar de cem a tre-zentos anos, em função das condições climáticas e darocha-matriz. Em determinadas situações de relevo,cobertura vegetal e intensidade de chuvas, um terre-no pode perder – com uma chuva intensa e em um sódia, pela enxurrada – uma camada de solo que a na-tureza necessitou de mais de 100 anos para formar.

Tal como o solo, a Biodiversidade também épassível de externalidades negativas, haja vista que,de acordo com Primack e Rodrigues (2001, p. 10), adefinição de diversidade biológica dada pelo FundoMundial para a Natureza (1989) consiste na

riqueza da vida na terra, os milhões de plantas, animais emicroorganismos, os genes que eles contêm e osintrincados ecossistemas que eles ajudam a construir nomeio ambiente,

Ou seja, é a manifestação de vida em todas assuas formas e dimensões. Ademais, a biodiversidadepode ser valorada em termos do seu potencial parafornecer futuros benefícios à sociedade humana, comonovos medicamentos, agentes de controle biológico eplantações.

No entendimento de Corrêa (2003), os efeitosnegativos sobre a diversidade biológica decorrentesdo uso da terra para fins de exploração agropecuáriasão classificados como sendo diretos e indiretos. Osdiretos são a redução ou até a eliminação de espéci-es de plantas e animais, enquanto os indiretos po-dem resultar na degradação dos solos, na reduçãoda infiltração da água que abastece o lençol freáticoe os mananciais de superfície, ou influenciar omicroclima e até o clima da região.

v.23, n. 1, 2005

De acordo ainda com o autor, o termo biodi-versidade, de maneira geral, refere-se a três níveisde diversidade biológica: genética, de espécies, e deecossistemas. A diversidade genética refere-se àinformação genética contida nos genes dos indivídu-os (plantas, animais e microorganismos) de umadada região. A diversidade de espécies é constituídapela variedade de tipos de organismos vivos. Atual-mente, cerca de 1,7 milhão de espécies já foramcatalogadas e descritas cientificamente. Estima-se,no entanto, que esse total represente uma pequenaparte da diversidade de espécies existentes, que podechegar a 12,5 milhões de espécies. A diversidade deecossistemas inclui a variabilidade de habitats, co-munidades bióticas e processos ecológicos intrínse-cos a cada ecossistema como, por exemplo, aciclagem de nutrientes, água, oxigênio e outros ele-mentos vitais à manutenção da integridade dosecossistemas. A biodiversidade, portanto, manifes-ta-se na forma de genes, espécies e ecossistemasque têm, ou podem vir a ter, valor à sociedade. Ovalor econômico da biodiversidade tem sido o fatorde maior relevância utilizado para justificar o méritodas ações conservacionistas, em seu âmbito legal.

Sem dúvida, a biodiversidade tem enorme ape-lo econômico e sua exploração produtiva provoca asubstituição da vegetação original, com várias plan-tas, por uma única cultura (monocultura) o que difi-culta a sobrevivência de alguns animais e tambémempobrece a terra, impedindo a reciclagem naturaldos nutrientes. Quando se destrói o Cerrado paraproduzir soja, os animais têm dificuldade para se ali-mentar, não encontram abrigo e não conseguem sereproduzir.

Logo, Primack e Rodrigues (2001, p. 133) de-monstram estatisticamente o perigo por que passa abiodiversidade do Cerrado, quando o homem passaa usá-lo em nome do desenvolvimento,

A ação do homem tem levado muitas espécies à extinção.Desde 1600, cerca de 2,1% de todos os mamíferos domundo e 1,3% das espécies de pássaros já se extinguiram.A taxa de extinção está se acelerando, e muitas espéciesestão à beira da extinção. Mais de 99% das extinções daera moderna são atribuídas à ação humana.

Tradicionalmente a exploração agrícola é rea-lizada, aparentemente da maneira mais econômica,através da queimada da vegetação, ocasionandodanos aos recursos naturais. No caso do CerradoPiauiense e, particularmente, da área de chapadados Municípios de Palmeira do Piauí e Currais, asqueimadas de áreas naturais possuem origens diver-sas, identificadas durante a pesquisa de campo e notranscorrer das Conferências dos “Cenários Regio-nais do Piauí”, promovidas pelo Governo do Estado:

a)queimadas naturais– surgem como fatocomum e sazonal, havendo estudos queatribuem à presença do fogo a existência dasdiversas fisionomias de Cerrado (do campolimpo ao cerradão). É como dizer que, comooutros ecossistemas savânicos, o Cerradoevoluiu com o fogo;b)queimadas culturais– relacionadas com aspráticas tecnológicas adotadas nos sistemasprodutivos (abertura de novas áreasagropastoris, estimulação ao rebrote degramíneas na renovação das pastagens e nomanejo de pragas e doenças). Para essas érecomendável, por meio da extensão rural eassistência técnica aos produtores, odesenvolvimento de tecnologias menosimpactantes;c)queimadas acidentais– casos como omotorista fumante que atira a ponta de cigarrodurante a viagem, ou o “meleiro” (coletor demel de abelha) que acende uma fogueira paraespantar as abelhas etc. São atitudes que,embora não tenham a pretensão de causardanos, resultam em acidentes ambientais.Nesses casos, somente a educação ambientale a sensibilização da sociedade podem agir deforma preventiva;d)queimadas criminosas – estes são ca-sos das mais diversas motivações: incêndi-os causados por caçadores, para acuar apresa, ou para destruir refúgios naturais;manifestações de revolta contra áreas depreservação, onde em geral não é concedi-da pelo proprietário a autorização para aber-tura de áreas de roça, por meeiros ou ar-

rendatários. Para esses casos existe a apli-cação das penalidades legais.

Para encontrar um novo equilíbrio ecológico elutar contra os animais e plantas prejudiciais (ervasdaninhas), os produtores utilizam certos produtosquímicos cujo número e eficácia não pára deaumentar. Entre esses produtos destacam-se osagrotóxicos ou pesticidas (fungicidas, acaricidas,inseticidas, herbicidas etc.), que são produtosquímicos não-biodegradáveis, usados para aumentara produtividade e evitar predadores nas lavouras,mas que matam insetos, aves e os microorganismosdecompositores que interferem na construção dosolo, impedindo, deste modo, a sua regeneração. Osprodutos tóxicos, acumulando-se nos solos, podempermanecer ativos durante longos anos. As plantascultivadas nestes terrenos infectados podemabsorvê-los ainda mesmo quando estes não foramutilizados para o seu próprio tratamento. Assim seexplica a existência de pesticidas nos nossosalimentos principais, como o leite e a carne, acabandoa sua acumulação por se dar fundamentalmente nohomem, que se encontra no fim das cadeiasalimentares.

As pragas agrícolas são as que mais causamdanos, pois seu combate pode ser contraproducente.A utilização de uma imensa variedade de agrotóxicosafeta mais as espécies de insetos e aves predadorese os benéficos à agricultura do que as própriaspragas. Os agrotóxicos também podem ter efeitosmuito graves para a saúde dos agricultoresencarregados de aplicá-los e para a população emgeral que irá consumir os produtos que receberamaplicação de pesticidas.

As monoculturas aumentam muito a oferta dealimentos para os insetos, beneficiando certasespécies que acabam sendo consideradas pragas aserem combatidas. Em condições naturais, todos osinsetos possuem algum tipo de controle biológico.Todavia, devido ao aumento dessas pragas, torna-se impossível que seus inimigos naturais consigamnovamente trazer a população em níveis aceitáveis,exigindo o uso de controles artificiais, químicos oubiológicos. O uso continuado de defensivos pode

ocasionar uma resistência cada vez maior dos insetos,resultando na necessidade do uso a cada ano deprodutos mais fortes e em doses maiores,encarecendo ainda mais os custos para o agricultore aumentando o risco de contaminação do meioambiente.

Por outra parte, as indústrias que produzem osagrotóxicos e fertilizantes, na ânsia de aumentar suasvendas e lucros, utilizando-se de programasagressivos de marketing, procuram demonstrar queuma agricultura moderna de alta produtividade sefaz com a aplicação massiva desses produtos,criando uma dependência para a viabilidadeeconômica da atividade agrícola. A aquisição e ouso de agrotóxicos, em alguns casos, sem oreceituário agronômico concorrem para aumentar orisco de contaminação ambiental.

Nessa perspectiva, Alves Filho (1987) explicitaque o uso continuado de agrotóxicos torna a terrainaproveitada, sendo este um dos fatores de reduçãode sua capacidade produtiva, além disso os pesticidascomprometem a saúde humana, contaminam a água,agridem os ecossistemas e deixam as pragas maisresistentes. Isto aliado à erosão, à salinização, àdesertificação e ao esgotamento dos nutrientestornaram-se os maiores problemas da agricultura.

4 PESQUISA DE CAMPO

A pesquisa consistiu em instrumento deinvestigação sobre as condições da exploraçãoagrícola para produção de grãos desenvolvida noCerrado dos Municípios de Palmeira do Piauí eCurrais, com o objetivo de demonstrar os impactossobre o solo e a biodiversidade. Para tanto, partiu-se da hipótese de que a exploração agrícolacomercial, estimulada por meio de políticas públicas,vem promovendo agressões ao meio ambiente,colocando em risco a integridade físico-química dosolo e a biodiversidade.

Assim sendo, foram utilizados dois questioná-rios, sendo um direcionado aos proprietários ou ad-ministradores dos projetos agrícolas financiados pela

v.23, n. 1, 2005

rede bancária oficial e por agências privadas de fi-nanciamento, enquanto o outro foi aplicado junto atécnicos que trabalham direta ou indiretamente naregião do Cerrado, autoridades locais, dirigentes sin-dicais, gerentes dos bancos oficiais, funcionários deinstituições públicas ligadas ao setor agrícola e re-presentantes de entidades do setor privado com atu-ação também na região do Cerrado. O universo dapesquisa constituiu-se de dois produtores do Muni-cípio de Palmeira do Piauí e oito produtores do Mu-nicípio de Currais, além de 10 técnicos, autoridadese representantes de entidades civis organizadas, entreos quais, seis engenheiros agrônomos, um biólogo,um gerente de banco, um presidente de sindicato detrabalhadores rurais e um prefeito municipal.

A área objeto do estudo está situada no platô daserra do Uruçuí, a oeste das duas sedes municipais,onde se desenvolve uma agricultura moderna paraprodução de grãos (arroz de sequeiro de terras altas,soja, milho e feijão), realizada por agricultores oriundosdas regiões Sul e Sudeste do País.

As informações aqui apresentadas são parao conjunto dos dois municípios que serviram debase para investigação. Foram constatados sinaisclaros de impactos negativos sobre o solo nasáreas dos projetos e nas vias de acesso,manifestados pela ocorrência de erosão laminar.Nos estágios iniciais, o processo de erosão nemsempre é visível, porém um solo desprovido daproteção da cobertura vegetal está sujeito aosefeitos da gota de chuva que quebra a estruturada camada superior do solo em partículas menores,as quais são transportadas pela água deescorrimento superficial e depositadas nas áreasbaixas do terreno. O resultado é um progressivoempobrecimento do solo agrícola pela perda departe de sua matéria orgânica e de substânciasquímicas essenciais para a nutrição das plantas.Nas áreas cultivadas, a utilização de máquinas eequipamentos pesados nos trabalhos de gradagem,plantio e de tratos culturais quebra a estrutura dosolo nos primeiros 30 centímetros, deixando asuperfície exposta à ação das águas da chuva,

causando a lixiviação dos nutrientes e erosão dedifícil controle. Nas vias de acesso aos projetos(estradas) a circulação de veículos, máquinas eequipamentos promove a compactação do solo,dificultando a infiltração das águas da chuva ecriando condições para o escorrimento superficialdas águas, formando verdadeiros riachos em algunscasos, levando o material sólido para as partes maisbaixas do terreno, onde se acumulam os bancos deareia já muito comuns na área estudada.

Verificou-se, também, pouca utilização depráticas conservacionistas nas áreas cultivadas,atitude justificada pelos produtores pela topografiaquase plana de suas terras, embora já exista umaconsciência dos produtores com relação ànecessidade da utilização de práticas deconservação, particularmente o plantio direto e acobertura com palhada na entressafra da culturaprincipal.

Embora não se tenha comprovação materialda contaminação do solo e da água por agrotóxicosnas diversas fases das culturas, sabe-se que oprocesso ocorre sempre que esses produtos químicossão utilizados visando combater as pragas (lagartada soja, percevejo da soja e lagarta elasmo), asdoenças (ferrugem) e as ervas daninhas. Asconseqüências são a contaminação do solo, da água,dos alimentos produzidos e dos trabalhadores quemanuseiam os agrotóxicos.

Sobre a biodiversidade, ao mesmo tempo emque se observou a redução do número de animaissilvestres como a anta (Tapirus terrestris), a onça-pintada (Phantera onça), a onça-sussuarana (Felisconcolor ), o lobo-guará (C hr ys ocy onbrachyurus), a cutia (Dasyprocta agouti), o veado-mateiro (Mazama americana), o veado-catingueiro(Mazama gouazoubira ), o veado-campeiro(Ozotoceros bezoarticus ), o sagüi (Callithrixpenicillata), o macaco-prego (Cebus apella), omacaco-guariba (Allaouatta belzebul ), a paca(Agouti paca), o caititu (Tayassu tajacu), otamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) eo tamanduá-mirim (Tamanduá tetracactyla),

também se verificou o aumento de outros, entre osquais a ema (Rhea americana), a perdiz (Tinamussolitarius), o gavião-caboclo ( Heterospiziasmeridionalis), o gavião-relógio ( Micrastissemitorguatus), o carcará (Polyborus plancus),a pomba-verdadeira ou carijó (Columba picazuro),o periquito-rei (Aratinga áurea), a juriti (Leptotilarufaxilla) e os pássaros em geral.4

Esse desequilíbrio no meio ambiente expressopelo aumento/redução na quantidade de animais seestende também à estrutura do solo e sua capacidadede absorção de água, à quantidade de matériaorgânica e até mesmo às condições do microclimalocal (temperatura do ar e do solo, umidade relativado ar). As causas principais são, por um lado, odesmatamento que reduz as áreas de refúgio dosanimais e, por outro lado, a ação dos caçadores que,embora proibidos de caçar nas propriedades,continuam matando os animais silvestres. Para tanto,utilizam o fogo como forma de espantar os animaispara locais que facilitem o abate. A caça de animaissilvestres é praticada por amadores, por moradoresda zona rural e pessoas das sedes municipais. Natotalidade dos projetos estudados a caça de animaissilvestres é proibida e o controle se dá mediantevigilância constante, vistoria da propriedade,colocação de placas, divulgação oral e não abrindoestradas de acesso à reserva legal. No entanto, essasformas de controle não são suficientes, pois oscaçadores continuam agindo na região.

Por outro lado, nas áreas destinadas às culturas,em cinco projetos houve desmatamento de áreasalém daquelas planejadas para implantação deculturas, o que se constitui em prática negativa, poisa retirada da cobertura vegetal elimina espécimesde plantas protegidas por Lei. Para compensar aperda dessas árvores, os proprietários tiveram queaumentar de 20,0% para 30,0% suas áreas dereserva legal.

Constatou-se, ainda, o surgimento de plantasinvasoras, como a erva-de-touro, o carrapicho

(timbete), o caruru, o picão, o leiteiro, a marmelada,a guachuma, a beldruega e a vassourinha de botão.O surgimento dessas invasoras é motivo de grandepreocupação para os produtores locais, pois asmesmas são de difícil controle e quebram o equilíbriodo ambiente onde são introduzidas, aumentam ocusto de produção e podem reduzir a produtividadedas culturas, caso não sejam combatidasadequadamente.

Também se verificou o surgimento de novaspragas nas culturas, como a lagarta-da-soja(Anticarsia gemmatalis Hübner), o percevejo-da-soja (Euschistus heros Fabr. e Nezara viridulaL.) e a lagarta elasmo (Elasmopalpus lignosellusZeller). Não se observou a existência de animaisque danificam as culturas, à exceção do veado quese alimenta de soja logo após sua germinação, porémsem causar prejuízos para a produção que justifiquemmedidas de controle. Ressalta-se, ainda, que asmaiores dificuldades enfrentadas pelos produtorespara implantação de projetos agrícolas no Cerradodos municípios estudados são a falta de infra-estrutura básica (estrada e energia), de mão-de-obraqualificada, de assistência técnica para máquinas eequipamentos, de água e de incentivos dos Governos,além de tributos elevados, pouca disponibilidade derecursos para financiamento, distância dos projetospara os centros urbanos e a criação de uma taxasobre a importação de máquinas, equipamentos efertilizantes. Todas essas dificuldades resultam emelevação dos custos do produto final e redução damargem de lucro da atividade.

Nessa perspectiva, os produtores propuseramas seguintes políticas de apoio e estímulo àsatividades agrícolas na região que o Governo deveriaadotar: incentivos fiscais e financeiros; estímulo àaquisição de máquinas com o crédito do ICMS, àprodução de calcário e fósforo natural, à perfuraçãode poços artesianos; assistência técnica; criação denovos mercados externos e construção de infra-estrutura (energia, estrada, comunicações). Além

4 - Os nomes científicos das espécies animais foram fornecidos pelo técnico do IBAMA, médico veterinário José Lacerda da Luz.

v.23, n. 1, 2005

disso, sinalizaram que o Governo deveria melhorara capacitação para gestão dos recursos parafinanciamento, eliminação da cobrança da sobretaxade importação de máquinas, equipamentos e insumos,dinamizar a atuação do EMATER-PI e incentivar aimplantação de novas empresas para melhorar ofornecimento de bens e serviços.

Por fim, a pesquisa expressou a necessidadede se tratar com maior seriedade as questõesrelativas ao licenciamento, ao monitoramento dasreservas de vegetação, às águas, ao uso, manuseioe destino das embalagens de agrotóxicos. Faz-senecessária também a realização de campanhas,cursos, palestras e outros eventos educativos eformativos de opinião junto às comunidades, apresença do Governo como fator inibidor de açõesdegradantes do ambiente e a atenção para aconservação das matas ciliares, que são poucofiscalizadas e não conservadas por muitosproprietários de terras. Observa-se, ainda, apremência das instituições bancárias exigirem tantoas licenças ambientais quanto um certoconhecimento/noção sobre conservação do meioambiente, antes de concederem financiamento aosprojetos que alteram o meio ambiente.

Os dados fornecidos pela pesquisa permitemconcluir que o solo do Cerrado dos Municípios dePalmeira do Piauí e Currais está sofrendo impactosnegativos que se manifestam pela erosão laminarnas áreas cultivadas, com perdas de nutrientes e departe da camada superficial do solo. Nas estradasde acesso aos projetos, a movimentação de veículos,máquinas e equipamentos promove a compactaçãodo solo, dificultando a infiltração da água da chuvaque, ao escorrer na superfície do solo, leva o materialsólido para as partes baixas onde vai formar bancosde areia. De outro lado, a utilização de inseticidas,fungicidas e herbicidas para o combate de pragas,doenças e ervas daninhas está causando acontaminação do solo, da água e dos alimentosproduzidos, bem como matando os predadoresnaturais das pragas.

Além disso, o processo de exploração agrícolaestá causando o desequilíbrio ambiental que se

expressa pelo aumento/redução na população deanimais silvestres, pela destruição de espécimes deplantas, pelo surgimento de novas plantas invasorase novas pragas e doenças nas culturas.

Não obstante as externalidades negativasidentificadas pela pesquisa de campo, tem-se queressaltar a importância da exploração agrícola dasterras da chapada dos Municípios de Palmeira doPiauí e Currais, especialmente para produção desoja, produto cuja demanda nos mercados interno eexterno tem perspectivas incomensuráveis. Éinteressante frisar que, além da soja, as culturas dearroz, milho e feijão vêm apresentando boasprodutividades na chapada, tornando a atividadenessa área muito atrativa para os empreendedoresagrícolas oriundos do Sul e Sudeste do País. Nessesentido, faz-se necessário frisar a importância quea exploração do Cerrado dos dois municípios tempara a economia regional e do Estado, porém nãose deve descuidar para que a ocupação e o uso dasterras sejam conduzidos com responsabilidade,embasada no tripé da sustentabilidade, onde as açõessejam implementadas de forma economicamenteviáveis, socialmente justas e ecologicamentecorretas.

CONCLUSÃO

Apesar de a agricultura para produção degrãos praticada pelos produtores dos Municípios dePalmeira do Piauí e Currais ser realizada por meioda mecanização agrícola em todas as etapas decultivo e com aplicação de insumos modernos(sementes selecionadas, corretivos, fertilizantes,inoculantes e defensivos), observaram-sedeficiências que se expressam por meio da falta deassistência técnica especializada, do uso excessivode máquinas pesadas que movimentam intensamenteo solo, quebrando a sua estrutura física e provocandoa sua compactação, e pouca utilização de práticasconservacionistas nas áreas cultivadas.

Também se verificaram sinais claros de erosãodo solo, tanto nas estradas de acesso quanto nas

áreas cultivadas, comprovados pela formação debancos de areia que dificultam a passagem deveículos leves sem tração nas quatro rodas. A erosãolaminar é a principal forma de degradação do soloconstatada nos Municípios de Palmeira do Piauí eCurrais e já existe uma consciência dos produtorescom relação à necessidade da utilização de práticasde conservação, particularmente o plantio direto e acobertura com palhada na entressafra da culturaprincipal.

O desmatamento para implantação daagricultura eliminou vários espécimes de plantasprotegidas por Lei, porém torna-se difícil evitar essefato, uma vez que a permanência de árvores nasáreas cultivadas dificultaria sobremaneira as tarefasmecanizadas.

Constatou-se o rompimento do equilíbriobiológico do ecossistema, mediante a redução dapopulação de algumas espécies animais (anta, onça,lobo-guará, veado, cutia, sagüi, macaco, paca, porco-do-mato e tamanduá) e o aumento da população deoutras (ema, perdiz, gavião, carcará, pomba carijó,periquito, juriti e pássaros), o surgimento de novasplantas invasoras, pragas e doenças nas plantascultivadas, a prática da caça de animais silvestres eo desmatamento de áreas além daquelas planejadaspara implantação de culturas.

Além disso, a aplicação de agrotóxicos(inseticidas, fungicidas, herbicidas) para o combateàs pragas, às doenças e às ervas daninhas nasculturas acaba por prejudicar também os predadoresdessas pragas e os trabalhadores que manuseiamtais produtos, além de deixar resíduos que vãocontaminar o solo, a água e os alimentos produzidos.

Nesta perspectiva, infere-se que a exploraçãoagrícola do Cerrado nos Municípios de Palmeirado Piauí e Currais pode ser analisada sob doisprismas. Positivamente, quando aumenta a produçãode grãos, o nível de emprego dos trabalhadores, aarrecadação de tributos, o movimento comercial(insumos, máquinas, equipamentos e serviços) ebancário (crédito de investimento e custeio).Negativamente, mediante o desmatamento, quereduz o patrimônio genético (de plantas e animais,

inclusive os microorganismos) e expõe o solo aosefeitos da erosão e da contaminação, inclusive daágua, por resíduos químicos dos agrotóxicos efertilizantes utilizados intensivamente naagricultura.

A investigação realizada no Cerrado dosMunicípios de Palmeira do Piauí e Currais permitemque se formulem propostas de políticas que venhama evitar o avanço do processo de degradaçãoambiental e, ao mesmo tempo, viabilizar oaproveitamento do potencial produtivo da região emharmonia com o meio ambiente, na medida em quea conservação do meio ambiente não deve ser vistacomo restrição ao desenvolvimento, mas comooportunidade de negócios sustentáveis quecombinam o crescimento econômico, a geração deemprego e renda e a conservação dos recursosnaturais.

Políticas públicas. Elaborar políticas adequa-das para alcançar pontos de equilíbrio entre cresci-mento econômico e tecnológico, desenvolvimentolocal, organização e participação social e conserva-ção ambiental pode representar uma estratégia go-vernamental para o desenvolvimento sustentável doCerrado Piauiense, em médio e longo prazos. Paratanto, propõem-se as seguintes recomendações:apoio financeiro e suporte técnico para criação deConselhos Municipais de Conservação do MeioAmbiente (solo, água, biodiversidade); formação deum Consórcio de Municípios da Região do CerradoPiauiense para defesa do meio ambiente e execu-ção da política de educação ambiental e de desen-volvimento sustentável do ecossistema; criação deSecretarias Municipais de Meio Ambiente; institui-ção do ICMS Verde ou ICMS Ecológico, mediantecriação de Lei Estadual, destinando 5% do ICMSarrecadado para conservação dos recursos naturais;política de incentivos visando a preservação dos re-manescentes de vegetação natural, em todas as suasformas, através de descontos e/ou isenção de im-postos como Imposto Territorial Rural (ITR) e faci-lidades de créditos agrícolas para proprietários quepreservem os remanescentes.

v.23, n. 1, 2005

Métodos de manejo e conservação. Odesenvolvimento sustentável tem como requisitobásico a harmonia entre a exploração e aconservação dos recursos naturais. Para tanto, faz-se necessária a utilização de métodos adequados demanejo e conservação dos solos, tais como, mantero solo sob cobertura vegetal, incorporar matériaorgânica (esterco animal, adubo verde, restos deculturas), reduzir ao máximo o tráfego de máquinaspesadas no terreno, promover o controle biológicode pragas e doenças, além do uso do Sistema dePlantio Direto (SPD).

Assistência técnica. Faz-se mister aorientação e acompanhamento técnico porprofissionais especializados na aplicação demodernas tecnologias de produção, desenvolvidasou adaptadas para a região do Cerrado, mediante aredução nas quantidades de fertilizantes químicosusados na agricultura, substituindo parte deles porprodutos naturais (pó de rocha) e por adubosorgânicos obtidos por meio da reciclagem de resíduosorgânicos (compostagem) contidos no lixo domiciliare nos restolhos das culturas, ou pela adubação verde.

Conservação dos recursos naturais. O totaldas áreas protegidas em cada bioma é insuficientepara a conservação da biodiversidade, e as áreas jáimplantadas ainda não atingiram os objetivos paraos quais foram criadas. Assim, propõe-se a criaçãode novas unidades de conservação municipais,estaduais e federais não fragmentadas por rodovias,cercas e outras atividades humanas, administradasmediante um plano de manejo adequado.

Plano Diretor do Cerrado. A conservação epreservação do meio ambiente tem como princípio oequilíbrio natural dos ecossistemas. Quando se reti-ram 70% a 80% da cobertura vegetal de umecossistema frágil como o Cerrado, isto significa orompimento do equilíbrio dessa área e a perda de igualpercentual em sua diversidade biológica. O PlanoDiretor do Cerrado poderia cobrir essa lacuna. Paratanto, o primeiro passo seria a realização de um diag-

nóstico participativo, seguido da implantação de umprograma de conscientização e educação ambiental,visando construir uma consciência dos danos causa-dos pela degradação do solo, da água e da floresta.

Educação ambiental. A falta de conscienti-zação acerca da necessidade de conservar os re-cursos naturais, associada às precárias condiçõesem que vivem as populações rurais são as princi-pais causas e conseqüências dos problemasambientais mais comuns no Cerrado, tais como adegradação do solo, a contaminação das águas (su-perficiais e subterrâneas), dos alimentos e do solopor resíduos químicos, as queimadas, a redução dapopulação de espécies da flora e da fauna. Daí anecessidade de implementação de um ProgramaEstadual de Educação Ambiental.

Pesquisas. Intensificar e diversificar as pes-quisas para o conhecimento da biodiversidade doCerrado Piauiense, realizar parcerias entre aSEMAR, EMBRAPA, ONGs ambientais, empre-sas privadas, universidades e agências financeiras(bancos) nacionais e internacionais, para execuçãode pesquisas de tecnologias alternativas que visemo uso sustentável dos recursos naturais.

Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE).Elaboração e execução do Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE), como importante instrumento bá-sico e referencial para o planejamento e gestão doprocesso de desenvolvimento, identificando aspotencialidades de cada região e orientando os in-vestimentos do Governo para que se façam de acor-do com a vocação natural de cada sub-região, e paraorganizar o processo de ocupação sócio-econômicado Estado, cujo objetivo principal é contribuir para aimplementação do Desenvolvimento Sustentável.

Diante das conclusões e das necessárias re-comendações, infere-se que o recente processo deocupação e uso do solo dos Municípios de Palmeirado Piauí e Currais para a produção granífera provo-cou impactos negativos sobre o solo e a biodiversi-dade local. No entanto, essa situação pode ser re-

vertida na medida em que a exploração das terrasseja conduzida com responsabilidade, embasada notripé da sustentabilidade, onde as ações sejamimplementadas de forma economicamente viáveis,socialmente justas e ecologicamente corretas, fun-damentadas na adoção de políticas que objetivem oalcance do equilíbrio entre o crescimento econômi-co e tecnológico, a justiça social e a conservaçãodos recursos naturais. Somente a implementação depolíticas públicas sérias para o meio ambiente é queserá possível permitir aos indivíduos iniciarem o pro-cesso de conservação ambiental que lhes possibiliteter uma perspectiva de melhoria da qualidade devida. Ressalte-se, ainda, a necessidade de inserir osprodutores e proprietários rurais, por meio de suasentidades representativas, nas decisões de quais aspolíticas devam ser implementadas para incentivaro Desenvolvimento Sustentável do Cerrado.

REFERÊNCIAS

ALHO, C. J.; MARTINS, E. S. De grão em grão, o cerradoperde espaço (Cerrado – impactos do processo de ocupação).Brasília, DF: WWF – Fundo Mundial para a Natureza, 1995.68p.

ALVES FILHO, A. P. Agrotóxicos: envenenando os alimentos

CARUSO, Rubens. Cerrado brasileiro: desenvolvimento,preservação e sustentabilidade. Campinas, SP: FundaçãoCargil, 1997. 112p.

CENSO DEMOGRÁFICO 2000: características da populaçãoe dos domicílios. Rio de Janeiro: IBGE, 2001.

CORRÊA, Altir. Coluna do prof. Altir Corrêa: prejuízos com asperdas de solo nas áreas agrícolas. Disponível em: <http://www.c n p s . e mb r ap a . b r / s e a rch /p l a n e t s / co l u n a1 4/coluna14.html>. Acesso em: 6 out. 2002.

______. Coluna do prof. Altir Corrêa: uso adequadod o s s o lo s a g r í co l a s . D i s p o n í v e l e m : <h t t p : / /www. c n p s . e m b r a p a . b r / s e a r c h / p l a n e t s / c o l u n a 1 6 /coluna16.html>. Acesso em 16 jan. 2003.

EMBRAPA. Sistema brasileiro de classificação de solos.Brasília – DF, 1999. 396p.

______. Cerrados do Piauí. Disponível em: <http:/ /www.cpamn.embrapa.br/cerrados. html>. Acesso em 16set. 2002.

GIORDANO, Samuel Ribeiro. Competitividade regional eglobalização. 1999. Tese (Doutorado em Geografia) – USP,São Paulo, 1999.

GOEDERT, W. J. Solos dos cerrados: tecnologias e estratégiasde manejo. São Paulo: Nobel; Brasília: EMBRAPA, 1987. 422p.

IBGE. Bom Jesus. Rio de Janeiro, 1984. (Coleções deMonografias Municipais, n. 93).

e poluindo o ambiente. Carta CEPRO, Teresina, v. 12, n. 2, p. Palmeira do Piauí. Rio de Janeiro, 1985. (Coleções43 - 53, ago./dez. 1987.

ANTÔNIO FILHO, Fadel David. Impactos ambientais e gestãoambiental: comentários para debate. Disponível em: <http://www.rc.unesp.br/igce/geografia/ CURSMS.html>. Acessoem 16 mar. 2003.

BERTONI, José.; LOMBARDI NETO, Francisco. Conservaçãodo solo. 4. ed. São Paulo: Ícone, 1999. 355p.

BUSCHBACHER, Robert (Coord.). Expansão agrícola e perdada biodiversidade no cerrado (Origens históricas e o papeldo comércio internacional). Brasília, DF: WWF – FundoMundial para a Natureza, 2000. 98p.

CAMPANHOLA, C.; LUIZ, A. J. B.; RODRIGUES, G. S.Agricultura e impacto ambiental. In: Simpósio sobre osCerrados do Meio-Norte, 1., 1997, Teresina. Anais... Teresina:EMBRAPA, CPAMN, 1997. p. 159 - 169.

de Monografias Municipais, n. 357).

INCRA. Estatísticas Cadastrais. 2001.

LIMA, I. M. de Moura Fé. Relevo piauiense: uma propostade classificação. Carta CEPRO, Teresina, v. 12, n. 2, p. 55-84, ago./dez. 1987.

PRIMACK, R. B.; RODRIGUES, E. Biologia da conservação.Londrina: Vida, 2001. 327p.

ROCHA, C. M. C. da. A região dos cerrados e as pesquisasdesenvolvidas pela EMBRAPA CERRADOS. In: Simpósiosobre os Cerrados do Meio Nor te, 1., 1997, Teresina. Anais...Teresina: EMBRAPA, CPAMN, 1997. p. 57-80.

SANTOS, Thereza Christina Carvalho.; CÂMARA, João BatistaDrummond (Orgs.). Geo Brasil – perspectivas do meioambiente no Brasil. Brasília, DF: IBAMA, 2002. 440p.

v.23, n. 1, 2005