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FOLHA DE ROSTO
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
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A RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE ERRO MÉDICO EM CIRURGIAS PLÁSTICAS
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Por: Emanuelly Chrystina Mendonça Assumpção
Orientador:
Prof. Carlos Leocadio
Rio de Janeiro
2009
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
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A RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE ERRO MÉDICO EM CIRURGIAS PLÁSTICAS
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Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”
em Responsabilidade Civil.
Por: Emanuelly Chrystina Mendonça Assumpção
3
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, por ter me dado a
família que tenho, aos meus pais e meu
irmão, pelo apoio, ao prezado Prof. e
orientador Dr. Carlos Leocadio, bem como
ao também prezado Prof. Dr. Diogo de
Souza e Mello, pelas inúmeras e valiosas
lições, pelo carisma e amizade, ao
ilustríssimo Prof. Dr. Álvaro Teixeira e aos
demais professores pelo incentivo e por
terem sido exemplos de sabedoria que
guardarei e certamente seguirei por toda
a vida, aos meus estimados colegas de
turma e aos que se tornaram amigos
obrigada.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a toda minha família,
formadora do meu caráter, aos meus pais,
por terem me educado, dando-me base
familiar, ensinando-me sempre o melhor
caminho a seguir para que possa lograr
êxito em todas as áreas de minha vida,
poupando-me assim de aprender com
erros que por mim possivelmente seriam
cometidos, a minha amada mãe, exemplo
de mulher sábia e de princípios que
pretendo seguir, ao meu querido irmão,
amigo amado e inseparável.
5
RESUMO
A presente pesquisa aborda a Responsabilidade Civil dos profissionais
de saúde, tendo como foco principal o erro médico. A escolha deste tema para
a monografia justifica-se pela necessidade em esclarecer que a
Responsabilidade Civil por erro médico decorrente de cirurgias plásticas visa
tutelar direitos que possuem aqueles que lesados foram pela má conduta de
alguns profissionais do ramo que, sem possuírem a devida especialização, não
tendo, portanto, capacitação para exercer tais intervenções cirúrgicas, o fazem.
Abordar-se-á ainda a questão da Responsabilidade Obrigacional que possui o
cirurgião plástico nas intervenções cujo caráter é meramente estético que
coaduna-se com o entendimento majoritário atual de que em tal situação a
obrigação do mesmo é de resultado, posto que é dever deste alertar o paciente
quanto ao resultado que pode-se chegar a atingir ou não, assim como dos
riscos que os procedimentos a serem realizados envolvem, podendo ainda, de
acordo com o livre arbítrio, optar pela não realização deste se entender ser a
decisão mais acertada. Por fim, tratar-se-á ainda da discussão no tangente ao
seguro para o médico e sua aceitação e também da existência da possibilidade
de cumulação de pedidos de indenização por dano estético com o dano moral.
6
METODOLOGIA
O estudo monográfico apresentado foi desenvolvido através da
seguinte metodologia: revisões bibliográficas referentes ao tema consoante
com a doutrina para determinar a evolução histórica da Responsabilidade Civil,
explicando dentro dos capítulos pontos importantes no que tange ao assunto
em questão, bem como pesquisa de artigos publicados a respeito do mesmo,
jurisprudências e entrevistas com profissionais de Medicina e do ramo do
Direito, buscando aspectos de ordem jurídica e também social que fomentam e
norteiam a discussão em tela.
7
SUMÁRIO
INTRODUCÃO................................................................................................09
1 – CAPÍTULO I – DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO..............12
1.1 – Evolução Histórica...............................................................................12
1.2 – Desenvolvimento da Responsabilidade Civil....................................14
2 - CAPÍTULO II – CONCEITO, ESPÉCIES E TEORIAS DA
RESPONSABILIDADE CIVIL....................................................................17
2.1 – Conceito de Responsabilidade Civil...................................................17
2.2 – Da Responsabilidade Penal.................................................................20
2.3 – Responsabilidade Contratual e Extracontratual (Negocial e
extranegocial)...........................................................................................20
2.4 – Responsabilidade Subjetiva (Teoria da Culpa)..................................21
2.5 – Responsabilidade Objetiva (Teoria do Risco)....................................23
2.6 – Teoria da Culpa no tangente ao erro médico.....................................24
2.6.1 – Imperícia...............................................................................................30
2.6.2 – Imprudência..........................................................................................32
2.6.3 – Negligência...........................................................................................32
3 – CAPÍTULO III – A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS MÉDICOS............35
3.1 – A culpa na Responsabilidade Civil dos médicos................................35
3.2 – Dos danos ocasionados pelos facultativos.........................................37
3.3 – Do dano estético.....................................................................................38
3.3.1 – Do dano estético contratual ou delitual.................................................38
83.3.2 – Do aleijão (deformidade física permanente).......................................39
3.3.3 – Do dano estético como lesão corporal grave permanente.................41
3.4 – Do direito a personalidade e a integridade física.............................42
3.5 – Dano moral...........................................................................................43
4 – CAPÍTULO IV – DA NATUREZA CONTRATUAL, EXTRACONTRATUAL E
A OBRIGACÃO DE RESULTADO NAS CIRURGIAS ESTÉTICAS.............44
4.1 – Das cirurgias estéticas.......................................................................44
4.2 – Relação médico – paciente e sua natureza contratual....................48
4.3 – Relação médico – paciente e sua natureza extracontratual...........51
4.4 – Da obrigação de meio e da obrigação de resultado........................52
4.5 – Da cirurgia plástica reparadora X embelezadora.............................54
5 – CAPÍTULO V – DA INDENIZACÃO, LIQUIDACÃO DA OBRIGACÃO DE
INDENIZAR O DANO MORAL E O DANO ESTÉTICO................................56
5.1 – Reparação do dano estético..............................................................56
5.2 – Liquidação da obrigação de indenizar..............................................58
5.3 – Cumulação do dano estético com o dano moral.............................60
5.4 – Contrato de seguro dos médicos......................................................64
5.5 – Consórcio para plástica.....................................................................64
CONCLUSÃO................................................................................................66
BIBLIOGRAFIA.............................................................................................68
ÍNDICE...........................................................................................................71
ANEXOS........................................................................................................74
9
INTRODUÇÃO
De grandiosa importância apresenta-se o estudo da Responsabilidade
Civil, objeto de consoante preocupação dos juristas de todo o mundo, pois,
indubitavelmente, de acordo com o que afirma José de Aguiar Dias (1983, p.1)
“toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da
responsabilidade”. A atividade do facultativo, médico, tem por objeto a saúde,
cuja aspiração em consegui-la ou ainda em mantê-la foi elevada juridicamente
à condição de Direito Fundamental na segunda metade do século XX.
(PASCUAL SALA SÁNCHEZ, 1994, p. 181).
Assim, destaca-se, por conseguinte, o Direito da Saúde que, segundo
define de modo preciso Sérvulo Correia (1991, p. 41) apresenta-se como sendo
“o sistema de normas jurídicas que disciplinam as situações que têm a saúde
por objeto imediato ou mediato e regulam a organização e o funcionamento das
instituições destinadas à promoção e defesa da saúde”.
Ainda segundo o entendimento de Sérvulo Correia (1994, p. 14) certo é
que ainda não é possível falar em autonominação científica do Direito de
Saúde, ou Direito Médico, visto que a saúde faz parte de uma extensa lista de
bens simultaneamente passíveis de disciplina tanto no quadro do Direito
Público, quanto no Privado, impedindo que haja uma sistematização assente
nessa clássica bipartição do ordenamento jurídico, o que em absoluto não
exclui a necessidade e a importância de seu estudo notadamente ante ao
crescente número de ações de indenização decorrentes da responsabilidade
médica e hospitalar. Ações essas que antes eram raras em nossa justiça e que
estão se tornando cada vez mais frequentes.
Muitas são as causas de tal fenômeno e como uma das causas desta
litigiosidade tem-se a má qualidade do ensino de um modo geral e dos
péssimos serviços prestados, assim como o aumento da demanda na procura
de tais serviços e, também, por ter hoje o cidadão uma maior consciência dos
seus direitos e por encontrar este mais facilidade no acesso à justiça (SÉRGIO
CAVALIERI FILHO, 1998, p.87).
10 José Conde, igualmente lembrando que a busca de uma indenização,
ante o dano experimentado, apresenta-se como último valor de uma sociedade
de consumo, aponta como causas da litigiosidade no âmbito do direito da
saúde, os progressos realizados pela medicina, o novo enfoque que é dado ao
paciente quanto ao relacionamento travado entre ele e o profissional de saúde,
considerando a imperiosa necessidade de seu consentimento para a realização
do tratamento, bem como a própria modificação da mentalidade da sociedade
que, antes resignada, passou atualmente a ser mais hedonista e reivindicativa,
razão pela qual, com maior frequência, busca obter uma indenização em caso
de dano à saúde decorrente da atividade médico-hospitalar.
Como já dito anteriormente, é inegável que a cada dia tem aumentado o
número de mulheres, assim como de homens que visam o corpo cujas formas
são tidas como perfeitas, o que ocasiona como consequência o aumento do
número de cirurgias plásticas tidas como “embelezadoras”, que se dá, também,
pela popularização das mesmas, uma vez que nos dias atuais há ofertas
absurdas de preços infinitamente inferiores daqueles cobrados por profissionais
de fato credenciados para realização de tal procedimento, o que resulta no
aumento do número de erros médicos.
Vê-se, pois, o quão importante se apresenta o estudo do Direito da
Saúde, notadamente sob o prisma do Direito Privado, onde exsurge a
problemática pertinente à Responsabilidade Civil Médica e neste contexto,
quando da solução das controvérsias decorrentes da relação paciente-médico,
deve o intérprete aplicador do Direito ficar atento, não só à mudança da
mentalidade da sociedade, como também à própria modificação do pensar
jurídico no que se refere à Responsabilidade Civil, não podendo os juristas
ignorarem que, neste final de milênio, passa a Responsabilidade Civil por uma
verdadeira revolução, visto que as concepções elaboradas no século XIX já
não mais atendem às necessidades sociais. Frente a essa nova realidade a
Responsabilidade Civil deixou de ter uma função exclusivamente reparatória,
ressarcitória ou indenizatória, em que pesa o fato de ser ainda a função
primacial, para também desempenhar outras importantes funções, como a
sancionatória e a preventiva.
11 Portanto, a monografia em tela busca mostrar tanto os cuidados que
devem de ser tomados em casos de realizações de intervenções cirúrgicas
embelezadoras, como também os direitos que os pacientes possuem ao
apresentar a estrutura da relação médico-paciente e a responsabilidade do
profissional que realiza tal intervenção da qual advém dano.
Tratando-se da legislação empregada, esta é a que é utilizada em casos
de Responsabilidade Civil em geral, visto que inexiste em nosso Código um
ordenamento preciso que trate especificamente da Responsabilidade Civil por
erro médico. Já no que tange a doutrina, cabível é mencionar que, num
primeiro momento, a abordagem do assunto deu-se por autores médicos mais
do que por juristas, o que vem mudando, uma vez que passou a haver extrema
necessidade de posicionamentos jurídicos, visto o vultoso número de ações
demandadas pela incidência de danos estéticos. Quanto a jurisprudência, as
decisões judiciais vêm se pacificando a cada dia.
Sendo assim, importante se faz apresentar a estrutura da presente
monografia que abordará a Responsabilidade Civil no Brasil, objetivando definir
cada um dos conceitos necessários para a sistematização da doutrina
conforme legislação existente, bem como apresentação de jurisprudência tida
como majoritária para então explanar especificamente o tema escolhido, sendo
este a Responsabilidade Civil no erro médico, analisando os aspectos
peculiares da culpa do profissional, a natureza contratual e a extracontratual,
assim como as obrigações decorrentes do contrato, a natureza jurídica das
obrigações, a caracterização do erro médico, a liquidação do dano ocorrido e a
possibilidade da cumulação do dano estético com o dano moral.
12
CAPÍTULO I
DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
1.1 - Evolução Histórica Sabe-se que no começo dos tempos as doenças e as dores surgiram
com o homem e num primeiro momento de racionalidade este tratou de buscar
meios para combater os males que lhe afligiam fisicamente, direcionando-se
não somente ao estudo das patologias, mas também ao estudo de sua cura,
sendo predominante durante milênios as experiências realizadas por curiosos
de modo exclusivo que por ajudarem na cura de muitos eram tidos como
sabedores, “taumaturgos”, isto é, aqueles que faziam milagres. Na antiguidade,
não era o médico considerado um especialista em determinada matéria, mas
sim um “sacerdote” dotado de poderes sobrenaturais que resultavam em cura.
Crença que derivava da total ignorância no que tange as doenças e também da
inconsciência quanto a reação do corpo humano em relação aos processos de
cura. No entanto, se por alguma circunstância a cura não ocorria, recaia a
culpa sobre o mesmo juntamente com a acusação de imperícia, incapacidade.
De acordo com Nélson Hungria, na Idade Média, penas severas eram
aplicadas aos médicos que ocasionavam eventos letais e não raras vezes
imputava-se como culpa o que era apenas atestado de precariedade da arte de
curar. Foi Montesquieu quem iniciou uma nova corrente de idéias no sentido de
afastar de sobre a cabeça dos médicos a espada de Dâmocles da sanção
penal, reconhecendo-se então a necessidade de tolerância para com os erros
devidos à própria imperfeição hipocrática. Inobstante isso, quanto mais a
medicina tornava-se ciência, maior foi se tornando o rigor científico na
avaliação dos erros decorrentes da profissão, não havendo apenas a
vinculação ao singelo fato do insucesso como se dava na fase anteriormente
analisada.
Em realidade, pode-se afirmar que desde os primórdios existiam
sanções previstas para os facultativos, ainda que não tivesse na antiguidade
13relação com o Direito, uma vez que havia predominância da “vingança privada”,
forma primitiva da reação espontânea e natural contra o dano sofrido; solução
comum a todos os povos nas suas origens, para reparação do mal pelo mal
(ANTONIO ELIAS DE QUEIROGA, 2003, p. 5).
Cabível é ressaltar que o Código de Hamurabi (1770-1790 a.C), foi o
primeiro documento histórico a disciplinar a respeito de erro médico e contém
interessantes normas referentes a medicina em geral. Alguns artigos desta Lei
(art. 215 e seguintes) estabeleciam para as operações tidas como difíceis uma
compensação pela prática que cabia ao facultativo. Imputava-se então ao
cirurgião o máximo de zelo e perícia no exercício de sua profissão, pois caso
contrário, severas penas eram aplicadas sempre que ocorria morte ou lesão ao
paciente por imperícia ou má prática do exercício da função. Sanções estas
físicas, onde eram amputadas as mãos do médico por não ter tido ele a
capacidade de curar. Além disso, ainda era previsto o ressarcimento do dano
quando mal curado fosse um escravo ou ainda um animal (o que caracterizava
desde então a existência do dano emergente – o que efetivamente a vítima
perdeu; e do lucro cessante – o que razoavelmente deixou de ganhar – artigo
402 C.C).
Possível é, portanto, observar que a mais de mil e quinhentos anos já
se cogitava a respeito da imperícia dos profissionais de saúde, visto que os
mesmos eram tidos como responsáveis desde então pelos danos decorrentes
de sua falta de conhecimento ou ainda de habilidade técnica.
No início do século XIX, a responsabilidade jurídica dos médicos quase
veio a desaparecer através de uma decisão da Academia de Medicina de Paris,
em 1829, na qual proclamava-se a exclusiva responsabilidade dos profissionais
da “arte de curar “(MIGUEL KFOURI NETO, 2001, p. 43). Tal decisão pretendia
consagrar uma determinada imunidade como situação especial. Assim sendo,
para que houvesse responsabilidade médica necessário seria provar ter havido
falta grave, imprudência, sendo esta clara, bem como manifesta imperícia. A
discussão à época, por haver uma pluralidade de critérios nas questões
médicas, se dava porque tudo mostrava-se muitíssimo vago, uma vez que
tratava-se apenas de suposições. Dessa forma, somente seria possível
14responsabilizar um médico por negligência por parte deste ou ainda por torpeza
que pudesse vir a ser cometida por qualquer homem, ou seja, aquela que
pudesse incorrer apenas e exclusivamente através do servidor da medicina
encontrava-se excluída.
Contudo, deveria ser a culpa médica grave, inescusável, advinda de
erro grosseiro elementar, cabendo ao paciente o ônus da prova. Por fim, os
pareceres dos peritos médicos deveriam ser de cunho decisivo, posto que
somente eles, possuidores de conhecimento científico na área médica,
poderiam vir a emitir uma opinião específica. Assim, após análise do que fora
explanado, pode-se dizer que tal imunidade gerava impunidade, tendo em vista
que em tais tempos a produção de prova que visasse constatar a ocorrência de
erro médico era praticamente impossível, visto os moldes que pela Academia
de Medicina de Paris foram consagrados.
Felizmente, em se tratando da atualidade, no Brasil novos conceitos
vêm se erigindo, pois a doutrina, assim como a jurisprudência tem admitido
que, para que se configure a denominada culpa aquiliana, faz-se
obrigatoriamente indispensável a presença do nexo causal entre a conduta do
agente e o dano, cuja vinculação estabelece o elo da responsabilidade que se
perde se, e somente se, a vítima ocasionou o evento danoso, sendo a culpa
exclusivamente desta ou ainda em havendo caso fortuito ou força maior,
porém, desde que devidamente comprovadas tais excludentes de ilicitude.
1.2 - Desenvolvimento da Responsabilidade Civil
Como consequência da conjugação entre ciência e tecnologia, de
pronto se constata a extraordinária evolução experimentada pelas atividades
médicas nos últimos tempos. Evolução essa que, a toda evidência, não pode o
Direito ignorar, principalmente porque em razão do desenvolvimento científico-
tecnológico, riscos novos vêm se introduzindo na atividade médico-hospitalar, o
que enseja no aumento da possibilidade de ocorrência de erro médico que
origina a responsabilização do facultativo.
15 “O desenvolvimento da Responsabilidade Civil, nos leva ao sentimento
mais elevado de justiça e a evolução do direito” (JOSÉ DE AGUIAR DIAS,
1954, p. 17). Tal desenvolvimento vem estabelecer normas de prudência
extrema limitando a atividade humana ao impor ao profissional a
responsabilidade pelo infortúnio. Assim, compete aos nossos Tribunais extrair
dos preceitos fundamentais o pronunciamento que seja, no momento, o mais
apto a realizar o fim do direito. Sobremais, atualmente o sentimento de justiça
é, por certo, muito mais refinado do que outrora, motivo pelo qual cada vez
mais há uma concepção social em vez de um caráter de individualização, pois
ainda de acordo com José de Aguiar Dias (1954, p. 18), o aumento dos erros
médicos, derivado da vida atual, induz, com efeito, o mais egoísta a pensar que
no futuro poderá ocorrer seu dia de infortúnio, razão utilitária, decerto, mas nem
por isso menos eficiente, para que então aceite a necessidade de reparação
com mais frequência do que em outros tempos.
Outrossim, a medida que evolui a sociedade, a relação entre os
homens torna-se ainda mais complexa, sendo, contudo, inevitável em tais
condições o atrito de interesses que se dá de modo cada vez mais intenso,
originando problemas de Responsabilidade Civil, o que faz com que esta
invada todos os ramos do Direito, conquistando um lugar privilegiado. Tal
importância crescente deste instituto deve de ser encarada como sinal do
desenvolvimento das indústrias, assim como das ampliações da ciência que
tem se dado de modo desenfreado, exigindo dos juristas a adaptação das
normas do Direito, conscientizando assim a sociedade para que esta venha a
ter ciência de seus direitos. Desse modo, a pobreza técnica, fruto do
desenvolvimento tardio de normas de fato eficientes, exige uma readaptação
das normas jurídicas às situações novas decorrentes da grandiosa evolução da
sociedade, pois de acordo com o que observa Fernando Noronha, “a sociedade
humana passa por transformações nunca antes experimentadas, que
progressivamente fazem anacrônico o regime jurídico instituído em 1916”, não
modificado pelo atual Código Civil. Contudo, a Responsabilidade Civil ganha
novos contornos e propósitos, tudo com escopo de se adequar às reais e
atuais necessidades do homem que, nas sociedades de massa, “se vê sob a
16iminência do risco a todo o momento, apenas por nela viver, seja pelo consumo
de bens, de produção alimentar e outros, quer por efeito das atividades e
serviços prestados em larga escala (produção industrial, energia, transportes,
etc.), sem cogitar-se da preservação dos direitos inerentes à sua condição
existencial, Física e Espiritual (ofensas ao direito da personalidade)” (LUIZ
ROLDÃO DE FREITAS GOMES, 2000, p.3).
Importante se faz mencionar que, filosoficamente impossível é
conceber Responsabilidade Civil sem existência de culpa, visto que a
obrigação civil que decorre de Responsabilidade Civil somente pode ser
atendida se consequente de dois elementos, quais sejam, imputabilidade mais
capacidade.
Vale lembrar que as sanções aos médicos aplicadas não devem ser
apenas de ordem civil visando a reparação de danos, mas também de ordem
penal e administrativa. Devendo responder na esfera penal pelo crime de lesão
corporal, podendo ser a mesma leve ou grave, enquanto que na administrativa
deverá ter o profissional suspenso ou caçado o seu registro por ter este
cometido uma infração ética.
Nesse contexto, é de extrema relevância que seja estabelecido um
diálogo interdisciplinar entre as ciências médicas e jurídicas, de modo que os
profissionais que atuam na área de saúde tenham pleno conhecimento do
sistema de responsabilização que lhes é imposto por nosso ordenamento
jurídico, o que faria com que fosse minorado o aumento progressivo de ações
indenizatórias em face dos mesmos.
17
CAPÍTULO II
CONCEITO, ELEMENTOS ESTRUTURAIS, ESPÉCIES E TEORIAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
2.1 – Conceito de Responsabilidade Civil
Inicialmente, cabível se faz salientar a definição de responsabilidade no
Brasil. Como regra, estabelece-se que aquele que vier a causar dano a outrem
deve ressarci-lo pelos prejuízos, isto é, terá a obrigação de responder pelos
danos a que deu causa.
De acordo com o que afirma o Professor Silvio Rodrigues (2002, p. 06)
é a Responsabilidade Civil a obrigação que pode incumbir uma pessoa a
reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou
coisas que dela dependam.
O principal objetivo do instituto da Responsabilidade Civil, segundo
ensinamentos de Cavalieri Filho, é manter a ordem jurídica protegendo-a do
ilícito e reprimindo-o, ou seja, simultaneamente visa proteger a atividade do
homem que se comporta de acordo com o Direito, reprimindo a conduta
daquele que o ignora contrariando-o. Desse modo, para se chegar a tal
preceito, estabelece a ordem jurídica deveres que, de acordo com a natureza
do direito a que correspondem, podem ser positivos, de dar ou de fazer, como
também negativos, de não fazer ou de tolerar algo.
Ademais, é a Responsabilidade Civil a obrigação de reparar o dano
causado a alguém ou de ressarci-lo, tendo sido o mesmo acarretado por força
de uma relação contratual na qual uma das partes deixou de cumprir com o
que fora anteriormente pactuado (Princípio do pacta sun servanda), ou ainda
por força de relação extracontratual, agindo uma das partes com culpa ou dolo,
causando então prejuízos a outra parte, vítima, a quem cabe provar o nexo
18causal entre o fato a que deu causa o agente e o dano sofrido, estando o
elemento referencial entre a conduta e o resultado.
É inegável, portanto, que na Responsabilidade Civil, a relação entre
direito e obrigação encontra-se ligada àquele que por sua conduta, tendo agido
com culpa ou não, causa o dano e consequentemente tem o dever de repará-
lo, sendo assim a vítima protegida do dano por ela sofrido por ter direito a uma
justa indenização.
Referente ao ressarcimento do dano, o Desembargador fluminense
Luiz Roldão de Freitas Gomes, em seus estudos a respeito das perspectivas
na Responsabilidade Civil, esclarece: “não basta tão só reparar, mas, para a
segurança e tranqüilidade almejadas, importa mais prevenir. Sua função vai-se
deslocando, deste modo, da exclusiva função ressarcitória, em que o princípio
da equivalência, o mais das vezes predomina, para o de evitar o dano, atuando
como verdadeiro fator de precaução”. Esta atual função reparatória ganha
extrema importância quando se observa que ela tem por fim contribuir para
coibir a prática de outros atos danosos, tanto pela pessoa que o cometeu
quanto por quaisquer outros. E quando se fala numa função sancionatória, faz-
se evidente aproximação com a finalidade retributiva da responsabilidade
penal. Este, aliás, é o ensinamento de Fernando Noronha que, dissertando a
respeito, assevera que “a maior ou menor censurabilidade da conduta do
responsável tem alguns reflexos na obrigação de reparar os danos causados,
aproximando muitas vezes a “indenização” de uma “pena privada”. Algumas
vezes faz acrescer o montante a ser pago, que reveste em benefício do
ofendido, e outras vezes fá-lo reduzir, representando agora um menor sacrifício
para o lesante”.
Sob estas novas perspectivas é que se apresenta, hodiernamente, a
Responsabilidade Civil, não podendo ser tal fato, em absoluto, ignorado pelos
juristas que, igualmente, devem estar atentos para esta evolução, posto que as
soluções consagradas tradicionalmente estão sendo ultrapassadas por força de
textos legais subsequentes. É o caso, por exemplo, da Lei 8.078, de 11 de
setembro de 1990, conhecida como Código de Defesa do Consumidor (CDC),
posto que dispõe sob a proteção do consumidor e dá outras providências. De
19fato, referido diploma legal, que veio a lume para cumprir uma missão
constitucional, qual seja, a de promover a defesa do consumidor conforme
expressamente estabelecido no art. 5º, XXXII da CRFB/88, promoveu uma
verdadeira revolução em nosso direito obrigacional, principalmente na área da
Responsabilidade Civil.
Com efeito, como assegura Sérgio Cavalieri Filho, “não seria
exagerado dizer que depois do CDC podemos dividir a Responsabilidade Civil
em duas grandes áreas: a responsabilidade tradicional, fundada no art. 159 do
Código Civil (1916) e Leis Especiais, e a responsabilidade nas relações de
consumo, fundada no CDC. Além disso, tal Código estabeleceu
responsabilidade objetiva para todos os acidentes de consumo, quer
decorrentes do fato do produto, quer do fato do serviço. A responsabilidade
objetiva, antes circunscrita às hipóteses legais, depois do CDC passou a ter um
campo de incidências ainda maior que o da própria responsabilidade subjetiva”.
Outrossim, há que se considerar que, embora aparentemente setorial, o CDC,
em verdade, não o é, posto que é aplicável em todos os ramos do Direito, onde
ocorrem relações de consumo.
Como esclarece o renomado Desembargador do Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro anteriormente citado, o que o CDC “realmente fez foi criar uma
sobrestrutura jurídica multidisciplinar“, o que implica dizer que o seu campo de
incidência é extremamente abrangente, pois “sem retirar as relações de
consumo das áreas do direito onde normalmente ocorrem, sem afastá-las do
seu natural habitat, o CDC estendeu sobre todas a sua disciplina”.
Assim, faz-se correto afirmar que o instituto e os contratos continuam
sendo regidos pelas normas que lhes são peculiares, sendo certo, no entanto,
que, constatando-se a existência de uma relação jurídica de consumo, faz-se
presente também, a regular tais institutos e contratos, o CDC. Com efeito, é
através de uma análise quanto à existência ou não de uma relação de
consumo que se concluirá pela incidência ou não de tal dispositivo legal.
Deve-se mencionar que o mesmo não tratou de especificar os
contratos que regulamenta, competindo ao intérprete aplicador do Direito fazer
uma prévia análise da relação contratual com a qual se depara para saber se
20está diante de uma relação jurídica de consumo, para então fazer incidir as
regras estatuídas pelo CDC. Assim sendo, em sede de Responsabilidade Civil,
apresenta-se de suma importância esta análise prévia, posto que o CDC, como
visto, estatuiu como objetiva a responsabilidade decorrente do acidente de
consumo, seja pelo fato do produto, seja pelo fato do serviço, afastando assim
a tradicional regra da responsabilidade subjetiva e alargando o campo de
abrangência da responsabilidade objetiva.
2.2 – Da Responsabilidade Penal
Em se tratando da Responsabilidade Penal, esta se dá quando o
agente infringe a Lei Penal, norma de Direito Público que diz respeito ao direito
fundamental e social. Assim, a punição no âmbito da esfera criminal atinge os
ilícitos cometidos com uma maior gravidade objetiva (SERGIO CAVALIERI
FILHO, 2003, p. 25), buscando combater a prática de atos tidos como
criminosos que violam a ordem social.
O Estado, na prestação de um fato reputado como ofensivo da ordem
social, em sua unidade, decide soberanamente por um de seus órgãos
jurisdicionais que o fato configura crime, que seu autor é passível de pena e
assim sendo o condena a sofrer a sanção penal, castigo legal.
Cabe destacar que a jurisdição da Responsabilidade Penal é
independente da Civil, segundo dispõe a Lei 10.406/02 em seu artigo 935.
Valendo ressaltar que a absolvição criminal não obsta a ação civil, conforme
afirma o Código de Processo Penal em seu artigo 67 que reza que a sentença
absolutória que vier a julgar extinta a punibilidade não impedirá a propositura
da ação civil. Desse modo, em caso de ocorrência de homicídio, por exemplo,
haverá dupla penalidade por parte da ordem jurídica, ou seja, uma sanção
penal e o dever de indenizar – artigo 121 do Código Penal c/c artigo 948 do
Código Civil.
2.3 – Da Responsabilidade Contratual e Extracontratual (Negocial e extranegocial)
21 Trata a Responsabilidade Contratual, também denominada como ilícito
contratual ou relativo, da obrigação assumida entre as partes contratantes, em
virtude da qual estas se acham no dever de cumprir com o que por elas fora
convencionado. Dessa forma, tem-se caracterizada a Responsabilidade
Contratual da parte que não cumpriu com a obrigação por ela ajustada com
outrem, podendo ser compelida por este a o fazer, sob pena de responder
pelos danos causados de acordo com o disposto no artigo 389 da Lei
10.406/02, acrescidos de juros e correção monetária mais honorários do
advogado.
Isto posto, em havendo um vínculo obrigacional, é o dever de indenizar
consequência do inadimplemento, da inobservância contratual.
Já no que tange a Responsabilidade Extracontratual, também
denominada de aquiliana ou absoluta, que encontra-se regulada no artigo 927,
parágrafo único do Código Civil, dá-se quando o agente por ação ou ainda
omissão voluntária, negligência, imperícia ou imprudência, causar prejuízo a
outrem. Desse modo, terá o mesmo a obrigação de reparar o dano causado,
independentemente da existência de um vínculo contratual. É certo, em se
tratando de Responsabilidade aquiliana, afirmar que o dever de indenizar
advém de lesão ao direito subjetivo, posto que não há qualquer relação
contratual entre aquele que é o ofensor e a vítima.
Importante se faz também destacar que para o Direito, é a saúde,
objeto do contrato da relação médico-paciente, um bem jurídico, direito
fundamental, social e de personalidade (atributos da dignidade humana).
Enquanto que sob o ponto de vista médico esta é tanto corpo quanto mente sã.
Assim, violada, ofendida a saúde, o mesmo se dará com o direito de seu titular,
o que ensejará reparação através de indenização.
2.4 – Responsabilidade Subjetiva (Teoria da Culpa) De acordo com a teoria em questão, a Responsabilidade Civil encontra-
se embasada na existência de culpa por parte do agente do ato lesivo que deu
causa ao dano, daí denominar-se como subjetiva, visto estar caracterizada
num aspecto volitivo interno da pessoa, ou, pelo menos, por revelar, ainda que
22de modo sutil, uma conduta antijurídica contrária a Lei. Sabe-se que o agente
causador do prejuízo tanto quer o resultado danoso como assume o risco da
ocorrência deste, ou ainda atua com imprudência, negligência ou imperícia. Na
ocorrência da primeira hipótese tratar-se-ia de dolo, enquanto que na segunda
de culpa, porém, a legislação admite-os, na prática, como equivalentes com o
nome comum de culpa. Diante do exposto pode-se afirmar que a conduta do
agente responsável pelo dano está sempre viciada pela culpa, estando assim o
mesmo obrigado a ressarcir o prejuízo quando seus atos forem lesivos a um
direito ou interesse alheio, desde que o seu modo de agir seja considerado
comprovadamente culposo conforme dispõe o artigo 14, § 4°, CDC.
Cabível é salientar que a importância da culpa vem desde tempos
remotos, possuindo amparo na noção de que ninguém deve de ser punido se
não demonstrado que se quis o dano (dolo) ou que por sua ação comissiva ou
omissiva o ensejou (culpa).
Dessa feita, é a responsabilidade fundamentada pela Teoria Subjetiva.
Uma vez que provada a culpa ou ainda que presumida, haverá ensejo a
indenização, encontrando-se respaldo, especialmente, no Código Civil
Brasileiro em seu artigo 186. O dispositivo legal citado filiou-se a teoria em
análise, motivo pelo qual, a priori, a Responsabilidade Civil surgiu da
comprovação de culpa, incidindo em todos aqueles que de algum modo
encontravam-se ligados ao prejuízo ocasionado a outrem.
Assim, neste mesmo sentido, corrobora o Professor Silvio Rodrigues
ao afirmar que dentro desta concepção tradicional a responsabilidade do
agente causador do dano somente se configura se este agiu culposamente ou
dolosamente. De modo que a prova de culpa do agente causador do dano é
tida como indispensável para que surja o dever de indenizar (SILVIO
RODRIGUES, 2002, p.06).
Importante é destacar que a culpa, em determinados casos, poderá vir
a ser apenas do lesante, como tão somente do lesado ou ainda de ambos. Em
havendo uma parcela de culpa de cada um destes na ocorrência do prejuízo,
de acordo com o que afirma a teoria subjetiva, o ônus da recomposição deverá
23ser atribuído proporcionalmente, na medida exata no que tange a contribuição
de cada um no resultado danoso final.
A responsabilização do facultativo é ensejada pela sua culpa, daí o
porquê de se afirmar que, como regra geral, a sua responsabilidade é
subjetiva, pois há especificidades pelas quais o médico poderá responder
objetivamente se não alcançado o resultado prometido, ou seja,
independentemente da existência de culpa, como por exemplo, a cirurgia
plástica embelezadora.
2.5 – Responsabilidade Objetiva (Teoria do Risco)
Quanto a responsabilidade em questão, a existência fática do dano
sem haver indagação no que diz respeito e existência de culpa, como
ocorre na teoria subjetiva, é sua principal característica, visto que não é
necessária a presença de culpa para que seja estabelecido o nexo causal
entre a conduta do agente e o prejuízo que por ele fora causado, sendo a
atitude culposa do agente causador do dano sem importância, uma vez que
há relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato
praticado per este, surgindo então o dever de indenizar, ainda que tenha ele
agido ou não de maneira culposa.
Sendo assim, o indivíduo responsável pela prática de ato lesivo que
tenha posto em risco bem jurídico de outrem através de tal ato, será tido
como elemento gerador do dever de indenizar o dano que, porventura, vier
a causar ao lesado. Contudo, tão somente torna-se necessário o nexo
causal entre a conduta do agente e o dano causado ao que se viu lesado
em seu direito, pois tal teoria vincula-se a idéia do risco. Aquele que
provoca lesão ao valor alheio é, ipso facto, responsável pelo ressarcimento.
Tal obrigação que diz respeito a recomposição do prejuízo independerá da
comprovação de culpa existente na conduta do agente que ocasionou o
dano, uma vez que é a culpa presumida pela legislação ou dispensada
simplesmente a sua verificação por ser suficiente ter havido o dano e sua
associação à conduta que o deu causa para que haja a responsabilidade.
24 Isto posto, pode-se afirmar que a responsabilidade objetiva
caracteriza-se por ser independente da presença de culpa no agir daquele
que deu causa a lesão, não prescindindo da presença dos demais
elementos da Responsabilidade Civil. Entretanto, deve ser o nexo de
causalidade adequado entre a atividade daquele que deu origem ao dano e
a lesão (Teoria da Responsabilidade Civil sem culpa). Saliente-se que no
Código Civil Brasileiro a excepcionalidade da presença da teoria objetiva é
extremamente marcante e evidente, como por exemplo, a responsabilidade
dos pais para com seus filhos, dos patrões e comitentes para com seus
empregados e prepostos, segundo dispõe o dispositivo legal supracitado
em seu artigo 932.
Portanto, é de extrema importância destacar que a responsabilidade
objetiva convive com a subjetiva, e que, não obstante a responsabilidade
com culpa subsistir como regra geral, a responsabilidade objetiva vem
crescendo na sociedade moderna em vários países do mundo, sendo que
no ordenamento pátrio, encontra-se prevista em várias legislações
especiais.
É a Responsabilidade Objetiva também denominada de
Responsabilidade pelo Risco (Teoria do Risco), porém, alguns
doutrinadores preferem estabelecer uma distinção entre a Responsabilidade
Objetiva e a Responsabilidade pelo risco (responsabilidade sem culpa). Em
se tratando da Responsabilidade Objetiva o fundamento da indenização é
decorrente da existência de um ato lesivo ligado ao agente por um nexo de
causalidade, enquanto que a Responsabilidade pelo risco possui suporte
num risco específico, de perigo geral produzido pela atividade do agente, de
tal sorte que incidiriam em seu campo de ação tão somente os riscos
imprevisíveis ou excepcionais.
2.6 – Teoria da Culpa no tangente ao erro médico
Possível é afirmar após análise a respeito do conceito de
responsabilidade que a decorrente de erro médico segue os mesmos
25ditames gerais da Responsabilidade Civil genérica, o que importa dizer que
o responsabilizado por tal ato danoso será aquele que consciente e capaz
praticar uma conduta de maneira livre, com intenção de fazê-lo ou ainda
com simples culpa, ficando assim obrigado a ressarcir os prejuízos
decorrentes do ato por ele praticado. Dessa forma, pode-se constatar que
para que seja caracterizada a culpa não se faz necessária a intenção,
bastando, portanto, somente a voluntariedade da conduta, devendo esta ser
contrária a Lei imposta pela prudência e perícia comuns.
Todavia, em se tratando de Responsabilidade Civil por erro médico,
indispensável se faz uma prova inequívoca de que houve culpa no proceder
do facultativo, sendo de atribuição do paciente (vítima, autor) produzir prova
de que o profissional médico laborou com culpa, posto que o Código Civil
Brasileiro, em seus artigos 186 e 951, valoriza a teoria subjetiva na qual é
necessário a presença de culpa no agir do agente causador do dano, no
caso em tela o médico.
Saliente-se que a definição de erro como conduta profissional
inadequada supõe uma inobservância técnica caracterizada por
imprudência, negligência ou imperícia, capaz de produzir dano à vida ou
ainda à saúde de outrem (JULIO CESAR MEIRELLES GOMES E
GENIVAL VELOSE DE FRANÇA, 1999), bens jurídicos tutelados no
contrato existente na relação médico-paciente. Assim sendo, em havendo
imprudência, negligência ou imperícia em um ato médico do qual resultou
dano a um paciente, há culpa configurada, porém, esta deve de ser provada
pelo mesmo por ser dele o ônus da prova. Desse modo, incumbe à vítima e
somente a ela fazer prova do dolo ou da culpa stricto sensu do agente para
que então possa vir a obter a reparação do dano.
Vale mencionar que a consideração da natureza da
responsabilidade médica como contratual, segundo reza o artigo 951 do
Código Civil, não tem como efeito tornar presumível a culpa, cabendo ao
paciente ou aos seus familiares demonstrar a inexecução da obrigação por
parte do profissional. Dessa forma, tendo sido provada a culpa do
profissional com relação aos cuidados dispensados ao doente, será este
26constrangido a reparar o dano por ele causado. Tal culpa que emerge do
artigo 951 do Código Civil que adotou a teoria da culpa no que se refere à
atividade profissional, incluindo a dos profissionais de saúde, consiste numa
ação ou omissão consciente voltada a busca de um determinado resultado,
ou quando imprudência, negligência ou imperícia se encontrarem presentes
nos atos de tais profissionais. Atos estes que serão analisados
separadamente. Como por exemplo, no caso de omissão, pode-se
mencionar as obrigações decorrentes do contrato médico, quais sejam,
aconselhar pacientes; cuidar daquele que se encontra na condição de
enfermo com zelo, diligência, utilizando todos os recursos da medicina;
abster-se do abuso ou do desvio de poder, visto ser a relação médico-
paciente baseada na fidúcia; cumprir com o dever de informação, que
impõe ao médico advertir o paciente-cliente dos riscos do tratamento,
respeitando os Princípios da Autonomia da Vontade, da Beneficência e da
Razoabilidade; cumprir com o dever de documentação (prontuário, que é
obrigatório e deve ser completo, visto ser um documento do paciente que se
encontra nas mãos do médico e que por isso poderá ser exigida a qualquer
tempo uma cópia deste). Ressalte-se que as duas últimas obrigações
advêm do Direito norte-americano. Tais obrigações devem de ser
rigorosamente observadas, bem como respeitadas, pois a inobservância e
descumprimento de ao menos uma delas enseja responsabilização.
Tratando-se de erro profissional, sendo este interno às
insuficiências da profissão médica e às características do ser humano como
paciente, o erro possivelmente ocorrerá, não podendo, neste caso, ser a
culpa imputada ao facultativo, uma vez que sabe-se ser o erro invencível e,
portanto, desculpável.
Necessário, contudo, se faz frisar distinções existentes entre erro
resultante de algo imprevisível e erro culposo. O primeiro se dá ainda que
tenha o médico, completamente ciente de seus deveres, atuado com as
precauções devidas dentro do razoável no tangente as circunstâncias nas
quais se encontrava (erro honesto). Já o segundo, vem acompanhado da
culpa, ou seja, é um erro culposo que dá causa a lesão aos direitos do
27paciente e que poderiam ter sido evitados com uma atitude competente do
profissional. Desse modo, no tocante a verificação da existência de culpa,
esta compete ao juiz, não importando ser a mesma grave ou não, desde
que seja certa, visto que o agir culposo do médico necessita de nexo
causal, pois se ausente este, não há porque haver indenização. A teoria da
res ipsa loquitur, ou in re ipsa é aplicada quando ocorre prejuízo por fatos
que não ocasionariam dano, salvo se o agente lesante agir com culpa em
qualquer uma de suas formas. Assim, em tais casos, como por exemplo,
nos quais ocorre a amputação de um dos membros de um paciente ou
ainda a morte de um paciente doente, encontrando-se o juiz diante de
evidência de erro médico, poderá dispensar os peritos e concluir a culpa do
profissional como uma evidência circunstancial ao reconhecer que os fatos
não teriam se dado sem a culpa do médico. Portanto, há, assim, presunção
de culpa contra o médico, ainda que inexista obrigação de resultado.
Inegavelmente dessa hipótese aproxima-se a cirurgia denominada
funcional, devendo, portanto, ser responsabilizado o facultativo que, por
razões tidas como insuficientemente comprovadas, não só não obtêm êxito
como também termina por deixar o paciente em situação extremamente pior
do que a que este anteriormente se encontrava.
Deve-se ressaltar que a Teoria da perda de uma chance, que
também tem por objeto a avaliação da culpa e tem aplicação em nossos
Tribunais, admite que a culpa do médico tenha comprometido as
possibilidades de viver do paciente ou a sua integridade, como por exemplo,
o fato de abster-se o médico de informar ao seu paciente todos os recursos
da medicina que poderiam vir a ser utilizados em seu tratamento ainda que
o mesmo não possua condições de arcar com o custeio, pois poderia este
angariar o valor necessário se assim quisesse. Desse modo, não precisa o
juiz encontrar-se convencido de que a lesão ao paciente foi ocasionada por
culpa do médico, pois, de acordo com a teoria em análise, apenas se faz
necessário a dúvida de ter se dado o fato por culpa do facultativo,
presumindo-se a culpa deste. Aceitam os Tribunais o nexo causal existente
entre o dano e a culpa, visto que esta última constitui-se no fato de não ter o
28médico dado todas as chances das quais tinha direito o paciente, fazendo-
o, portanto, perder a oportunidade de ver-se recuperado.
Porém, cabível é mencionar que nem sempre é a Teoria da culpa
conveniente na abordagem do médico em sua atividade como profissional
liberal, não sendo a mesma adequada para se aplicar em todos os casos
que tratem de Responsabilidade Civil de ordem pessoal dos profissionais
liberais, o que ocorre nas obrigações de resultado e nas agressões aos
direitos dos consumidores perpetradas através de condutas e de práticas de
mercado, onde se revela além de inadequada, impertinente (OSCAR IVAN
PRUX, 1998) .
A Teoria da culpa foi mantida mesmo com a mudança do Código
Civil Brasileiro. Na Lei vigente, a Responsabilidade Civil no erro médico tem
seu regramento englobado na legislação geral da Responsabilidade Civil,
sendo os artigos que tratam de tal matéria os seguintes: artigo 927 a 943
(da obrigação de indenizar) e artigo 944 a 954 (da indenização nos casos
de Responsabilidade Civil).
Ocorre que houve a necessidade de se aumentar a amplitude do
conceito de dano, cujo vocábulo, etimologicamente, advém de demere (que
significa apoucar, tirar, diminuir), que desta forma passou a abranger o dano
material assim como o dano moral.
Desse modo, para que haja na responsabilização do profissional
médico a satisfação do dano na área civil, deve-se provar sua culpa,
havendo a necessidade de lesão decorrente de ato praticado por este a um
bem jurídico (nexo de causalidade), contrariando o princípio neminem
leadere. As provas têm a função de fazer emergir o liame, visto que deve de
haver relação de causa e efeito entre a ação do facultativo e o dano
verificado. Deve-se mencionar que pelo Código Civil pátrio, apenas os
danos diretos e efetivos são passíveis de ser ressarcidos por aquele que lhe
deu causa, sendo necessária uma conduta com culpa em sentido estrito e a
previsibilidade (evitabilidade do procedimento antijurídico), sendo com tal
proceder violada uma norma com um resultado lesivo consequente, o que
constitui culpa. Em não havendo damnum, não haverá configuração de
29delito, salvo se a conduta do médico, por si só, já é prevista como fato
punível. Caso contrário, para configurar-se o delito é necessário ocorrer
transgressão ao dever de evitar danos a bens e interesses alheios.
Necessário se faz destacar que o agir com imprudência,
negligência ou imperícia é a ação delituosa que a norma proíbe no caso de
erro médico.
Já no que tange ao ressarcimento, este se faz necessário em se
tratando de dano patrimonial e moral. O Código Civil vigente ao referir-se as
perdas e danos, trata dos prejuízos sofridos por pacientes decorrentes de
erro médico.
A palavra dano possui significado amplo, visto que abrange tanto
danos materiais que tratam de lesão a direitos pessoais e reais, quanto os
morais que tratam de direitos da personalidade e da família, estando nestes
incluídos os danos estéticos como espécie. Assim, se, por erro médico,
qualquer desses danos vier a ocorrer, haverá a necessidade de se
averiguar qual a repercussão econômica negativa que foi causada ao
paciente, vítima do erro. Sendo o dano material, será indenizável de acordo
com o valor patrimonial atingido do paciente (incluindo dano emergente e
lucros cessantes). Já sendo o dano moral, será o valor da indenização
determinado em juízo, segundo a CRFB/88, que o admitiu de forma
explícita em seu artigo 5°, inciso X. É sabido que “o dano moral é o efeito
não patrimonial da lesão de direito e não a própria lesão, abstratamente
considerada” (JOSÉ DE AGUIAR DIAS, 1954). Cabe salientar que o dano
moral puro, à luz dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, que não
distinguem direitos patrimoniais e não patrimoniais, gera a obrigação de
reparação do dano.
No que tange as excludentes da responsabilidade atribuída ao
médico por ter este praticado ato lesivo ao seu paciente, são estas: caso
fortuito e força maior, a interferência de terceiros não subordinados ao
médico agindo com dolo ou culpa e a conduta do paciente com culpa, visto
que em havendo culpa exclusiva do paciente, extingue-se a
responsabilidade do facultativo, uma vez que altera-se a relação de
30causalidade existente, o que já não se dá em caso de culpa concorrente
deste com o médico, respondendo cada um deles pelo que lhes couber,
sendo, portanto, a responsabilidade bipartida, podendo o dever de indenizar
por parte do médico diminuir se o paciente de fato contribuiu com o evento
danoso ocorrido. Sabe-se que o concurso de culpas caracteriza uma
concorrência de responsabilidades que justificam uma diminuição do valor
da indenização. O princípio da indenização proporcional nos casos de
responsabilidade concorrente que se encontra previsto no artigo 945 do
Código Civil dispõe que se a vítima tiver concorrido culposamente para o
evento danoso, a sua indenização será fixada, tendo-se em conta a
gravidade de sua culpa em confronto com a dor do autor do dano. Tal
princípio explica-se pela análise da Teoria da Causalidade Adequada que
considera o grau de causalidade bilateral, ou seja, cada um responsabiliza-
se apenas pela parcela do dano a que deu causa, sendo a conduta do
paciente considerada na avaliação da culpa.
Quanto ao caso fortuito ou força maior, também exoneram o
médico da Responsabilidade Civil em caso de dano ao paciente como visto
anteriormente, pois ambos causam a ação de liberar o médico do
cumprimento da obrigação contratual. Considera-se força maior como um
fato natural, superior as forças humanas, não sendo possível ao ser
humano evitar, impedir a sua ação e consequências, apesar de identificado
e previsível (SERGIO CAVALIERI FILHO, 2003, p. 85). Contudo, ainda
que se queira não se é possível resistir a força maior, uma vez que esta é
um evento externo a relação médico-paciente. Já o caso fortuito, cuja
característica é a ocorrência de um acontecimento inerente à pessoa
humana, não pode ser previsto nem evitado por não depender a sua
ocorrência do médico nem do paciente por se tratar de algo não esperado
na conjuntura do que está ocorrendo no momento da atuação do facultativo
– artigo 393, C.C.
2.6.1 – Imperícia
31 Na definição de Delton Croce e Delton Croce Junior, imperícia, do
latim, imperitia (de imperitus), designa o inábil ou a falta de aptidão técnica,
teórica ou prática no que se refere ao desempenho de uma determinada
atividade profissional. Consiste a imperícia, portanto, na falta cabedal
normalmente indispensável ao exercício de profissão ou arte (DELTON
CROCE E OUTRO, 1997, p.24).
O Código de Ética Médica preocupou-se com a imperícia em se
tratando de situação em que o médico proporciona a pessoas não
habilitadas o exercício da medicina. No caso apresentado, analisando o
Código em questão, é vedado ao médico “delegar a outros profissionais
atos ou atribuições exclusivos da profissão médica” (artigo 30 do Código de
Ética Médica), e acumpliciar-se com os que exercem ilegalmente a
Medicina, ou com profissionais ou instituições médicas que pratiquem atos
ilícitos” (artigo 38 do Código de Ética Médica).
Também trata o Código em análise da imperícia decorrente das
ações ou omissões do próprio médico.
Destaque-se que por muitas vezes difícil é distinguir a imperícia
da imprudência, visto que pode-se atribuir imperícia a um profissional
médico, ainda que diplomado devidamente, segundo uma visão jurídica.
Enquanto que em se tratando do ponto de vista ético, aparentemente
despreza-se a distinção existente entre o profissional diplomado e o
qualificado, pois é sabido que habilidades e conhecimento são algo
dinâmico, isto é, há a constante necessidade de revitalização, sendo tal
posicionamento adotado sabiamente pelo Código de Ética Médica em seu
artigo 5° que dispõe que o médico deve aprimorar continuamente seus
conhecimentos para então fazer uso do melhor do progresso científico em
benefício daquele que se encontra em posição de paciente. Sendo assim,
razoável é exigir de um médico habilidade e experiência comumente
possuída. Quanto aqueles que são especialistas devem estes também
possuir os padrões técnicos inerentes a sua especialidade. Pois, se
ausente, pelo menos, o nível de competência, tem-se caracterizada a
imperícia.
32
2.6.2 – Imprudência
Ainda de acordo com Delton Croce e Delton Croce Junior,
“imprudência, do latim imprudentia, é o modo como denomina-se a ocorrência
de falta de atenção, o descuido ou ainda a imprevidência no exercício de uma
ação tida como perigosa, caracterizando-se, necessariamente, por uma
conduta comissiva” (DELTON CROCE E OUTRO, 1997, p. 25). Vale ressaltar
que muitas das situações que acarretam danos a terceiros e que, portanto, se
encontram previstas no Código de Ética, são fruto de erro médico provocado
por imprudência, situações nas quais o médico age sem a devida cautela,
expondo assim o paciente a riscos desnecessários e expondo-se a riscos de
ordem jurídica, uma vez que em ocorrendo dano, este poderá vir a ser
processado criminal e/ou civilmente.
Trata o Código de Ética Médica de imprudência em seu artigo 39
quanto ao médico que receita ou atesta de forma secreta ou ainda ilegível, bem
como assina em folhas de receituário, laudos, atestados ou quaisquer outros
documentos que se encontrem em branco. De mesma forma trata o citado
dispositivo a respeito do assunto em questão ao vedar em seu artigo 62,
prescrição de tratamento ou de outros procedimentos sem que se tenha feito, a
priori, exame direto no paciente, salvo em casos de extrema urgência e de
impossibilidade comprovada de realização do mesmo, devendo-se, nessa
hipótese, fazê-lo de modo imediato quando cessado o impedimento.
Importante salientar também outras ações de médicos previstas pelo
Código de Ética Médica tidas como imprudentes, quais sejam, as mencionadas
nos artigos 46, 56, 64, 72 e 73.
2.6.3 – Negligência
De acordo com o que ensina Fábio Ulhoa, a negligência ou
imperícia por pressupor uma habilidade especial, formação superior ou
mesmo conhecimento técnico específico do agente culpado, caracterizam-
se pela inação, indolência, inércia, passividade, sendo a falta de
33observação aos deveres que as circunstâncias exigem. É, portanto, um ato
omissivo, deixar de fazer (FÁBIO ULHOA COELHO, 2004, p. 309). Os
casos de negligência que originam danos a pacientes podem ser
decorrentes de problemas pessoais dos médicos, como por exemplo,
extrema fadiga que pode advir de sobrecarga de serviço.
Mencione-se que são tidas como formas de negligência mais graves
encontradas no Código de Ética Médica a omissão de tratamento do qual
necessita o paciente e o abandono deste. Em análise do Código de Ética
Médica, pode-se constatar que possui o facultativo o direito de escolher
seus pacientes, não sendo então obrigado a atender qualquer um
indiscriminadamente, devendo exercer sua profissão com ampla autonomia,
segundo reza o artigo 7° do dispositivo supra mencionado. Entretanto, este
direito não é absoluto, visto que há limitações encontradas na segunda
parte do artigo supracitado, onde afirma-se que, em havendo ausência de
outro médico, em casos de urgência, ou quando sua negativa possa trazer
danos irreversíveis ao paciente, impedido se encontra o facultativo de poder
fazer valer tal direito. O Código de Ética Médica também trata do assunto
em tela em seu artigo 58, reiterando a posição por ele adotada ao afirmar
no mesmo que veda-se ao médico deixar de atender paciente que procure
seus cuidados profissionais em caso de urgência, quando não haja outro
facultativo ou serviço médico em condições de fazê-lo. Dessa feita, agindo o
médico de modo oposto ao que determinam os últimos dois artigos do
Código de Ética Médica observados, isto é, agindo com omissão ou inércia,
responsabilizar-se-á por negligência que constitui erro culposo. Postura que
é reforçada no artigo 35 do mesmo diploma legal, visto ser vedado ao
médico deixar de atender em setores de urgência e emergência, quando for
de sua obrigação fazê-lo, colocando em risco a vida de pacientes, ainda
que com respaldo por decisão da categoria tida como majoritária. O artigo
citado trata do caso de omissão de socorro, mas também existem os que
tratam da negligência como erro culposo, como os artigos 37 e 57, cujas
afirmações seguem abaixo respectivamente.
Ipsis verbis:
34 Artigo 37: “deixar o médico de comparecer a plantão em horário
preestabelecido, salvo por motivo de força maior”;
Artigo 57: “deixar o médico de utilizar todos os meios disponíveis de
diagnóstico e tratamento a seu alcance em favor do paciente”.
Existem ainda outros artigos que, semelhantemente, tratam de
negligência, sendo estes os artigos 59, 83 e 84. Todos do Código de Ética
Médica.
35
CAPÍTULO III
A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS MÉDICOS
3.1 – A culpa na Responsabilidade Civil dos médicos
Sabe-se que “a culpabilidade somente pode ser presumida quando
ocorre um erro grosseiro, de negligência, de imperícia ou de imprudência,
devendo ser demonstrado, e a este se acrescenta à culpa. O médico que viola
o seu dever pratica uma ação que surge como o primeiro pressuposto da
responsabilidade civil” (RUI ROSADO DE AGUIAR JÚNIOR, 1995, p. 37).
Obviamente no ramo da medicina é sempre possível a ocorrência de
um erro de diagnóstico que pode vir a acarretar consequências graves ou não
tão graves decorrentes de erro escusável, uma vez que tenha o erro sido
originado por consequência do emprego correto e oportuno dos conhecimentos
e regras da ciência pelo profissional de medicina aplicadas, da qual obteve
conclusão falsa, surgindo um resultado de dano ou de perigo, não se tratando
então de imperícia.
Isto posto, pode-se dizer que a apuração da culpa dos médicos
obedece aos mesmos procedimentos utilizados para a apuração da culpa tida
como comum. Assim sendo, cabe ao julgador, após análise das circunstâncias
a ele apresentadas, estabelecer os cuidados possíveis que deviam ter sido
utilizados pelo médico segundo os padrões determinados para o uso da
ciência, confrontando a norma concreta que fora por ele fixada para o caso,
com o comportamento adotado efetivamente pelo profissional. Dessa forma, se
constatado que o mesmo não observou tais cuidados tidos como essenciais,
comprova-se que agiu com culpa, devendo ser esta certa e não
necessariamente grave. Neste sentido, alguns doutrinadores têm sustentado
que a culpa médica é apreciada como qualquer outra, e desse modo, “caso o
magistrado entender que um médico prudente ter-se-ia comportado, nas
mesmas circunstâncias, diversamente do acusado, deve condená-lo a
36reparação. Contudo, é possível estabelecer a proporcionalidade da indenização
em função da gradação da culpa” (YUSSEF SAID CAHALI, 1999, p. 124).
Com relação a determinação da culpa, necessário se faz considerar,
como exemplo, algumas situações especiais, quais sejam:
a) Do especialista: deve exigir-se muito mais do que daquele que é médico
geral;
b) Do cirurgião estético: deve exigir-se rigoroso cumprimento do dever de
informação, bem como do cuidado na execução de seu trabalho. Cabendo
mencionar que de modo majoritário sua obrigação é de resultado, podendo
este, em caso de inobservância de suas obrigações, caso venha a ser
comprovada a sua culpa, ser responsabilizado civilmente conforme previsto
no artigo 951 do Código Civil, posto que, embora se refira a obrigação de
meio que consiste na obrigação do médico em empregar todo o zelo e
conhecimentos profissionais necessários, em se tratando de cirurgias
estéticas será sempre a obrigação tida como de resultado. Pois, não
obstante isso, além de possuir o médico a obrigação de empregar todo o
seu conhecimento científico, assim como os cuidados com o seu paciente,
deverá, também, que chegar ao resultado não pretendido por este, mas sim
prometido pelo próprio facultativo.
A Lei 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo
14, § 4°, dispõe que: “a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais
será apurada mediante a verificação da culpa.” Esse ônus existente na
relação contratual, em se tratando de obrigação de meio, existe também na
obrigação extracontratual, cabendo aquele que se encontra na condição de
lesado a prova da qual tratam os artigos 186 e 927, ambos do Código Civil,
no que tange às modalidades de negligência, imprudência ou imperícia.
Em se tratando de cirurgia estética, na qual a obrigação é de
resultado e se tem um paciente saudável que visa apenas o
embelezamento, pode o dano consistir no fato de não vir o facultativo a
37alcançar o resultado pretendido e por ele prometido ao paciente, frustrando-
o assim em suas expectativas ou ainda em sua auto-estima ao piorar a
aparência deste, o que desencadeará a responsabilidade culposa do
médico cirurgião por negligência, imprudência ou imperícia. Contudo,
restará ao paciente-cliente, ou aos seus sucessores, comprovar a culpa do
profissional que ocasionou o dano de acordo com os termos do artigo 186
do Código Civil, tendo-se em vista que na obrigação de resultado cabe
aquele que se encontra no polo ativo da ação demonstrar o
descumprimento do que fora pactuado com o prestador dos serviços
médicos.
3.2 – Dos danos ocasionados por médicos
Segundo o Professor De Plácido e Silva, tem-se como dano “o
prejuízo causado, em virtude de ato de outrem, que vem causar diminuição
patrimonial” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1999), podendo ser este prejuízo
decorrente de culpa ou ainda de dolo, regido pelo Princípio sine qua non.
O dano pelo qual responde o médico é aquele originado
diretamente de sua ação, podendo ser agravado pelas condições pessoais nas
quais se encontra o paciente.
Os danos físicos são os que ocasionam dano corporal que se
compõem de elementos variáveis, indenizáveis separadamente. No caso de
uma cirurgia de cunho estético, verificar-se-á se o resultado pretendido fora
atingido, visto que o resultado poderá ensejar uma deformidade estética
deixando assim configurado o dano físico.
Tratando-se de danos materiais, também denominados de
patrimoniais, de acordo com Miguel Kfouri Neto, em sua grande maioria se dão
por consequência dos danos físicos: lucros cessantes, despesas médico-
hospitalares, medicamentos, contratação de enfermeiros, acompanhantes e até
mesmo de viagens com a finalidade de tratamento (MIGUEL KFOURI NETO,
2001, p. 100).
38 Já quanto aos danos morais, estes incluem os danos estéticos, a
dor sofrida, o profundo mal-estar advindo de danos causados à esfera das
relações sexuais, a frustração pela abrupta cessação de uma atividade
profissional de um (a) modelo fotográfico, por exemplo, estão sempre ligados à
personalidade da pessoa, ou seja, sua aparência (MIGUEL KFOURI NETO,
2001, p. 100).
3.3 – Do dano estético
Conforme afirma a doutrinadora Teresa Ancona Lopez de Magalhães,
“o dano estético não é apenas o aleijão, mas também as deformidades ou
deformações outras, as marcas e os defeitos ainda que mínimos que podem
implicar, sob qualquer aspecto, num “afeamento” da vítima ou que pudessem
vir a se constituir para ela numa simples lesão “desgostante” ou em
permanente motivo de exposição ao ridículo ou de inferiorizantes complexos.”
(TERESA ANCONA LOPEZ DE MAGALHÃES, 1980, pp. 17-18).
A Responsabilidade Civil trata o dano estético como sendo uma
transformação sofrida na aparência física de uma pessoa. Lesão esta
duradoura ou permanente que cause a quem a sofreu o sentimento de
desgosto, de humilhação, originando, portanto, uma dor moral.
Cabível se faz mencionar que o dano estético passageiro, por ser
facilmente indenizável e superável, não poderá ser visto como dano estético
propriamente dito, mas como atentado reparável à integridade da lesão estética
passageira, que se resolve em perdas e danos.
3.3.1 – Do dano estético contratual ou delitual
Segundo Tereza Ancona Lopez de Magalhães, “os danos estéticos à
pessoa podem ser originados não só nos delitos ou quase delitos, isto é,
quando não há vínculo anterior entre as partes, mas também nos contratos
39onde uma convenção já existia entre a vítima e o ofensor” (TERESA ANCONA
LOPEZ DE MAGALHÃES, 1980, pp. 29).
Deve-se destacar que a obrigação de reparação do dano sempre
existe, independentemente de ter havido contrato ou não entre as partes
envolvidas, todavia, o modo da responsabilidade pode vir a ser distinto, uma
vez que o Código Civil, assim como outras Leis separou os dois tipos de
responsabilidade, a contratual e a extracontratual.
A Responsabilidade Civil Contratual se dá quando há violação de uma
obrigação em sentido estrito. Tal responsabilidade advém de um contrato e
está vinculada às cláusulas contidas no mesmo. Esta encontra-se definida e
limitada em cláusulas do contrato, podendo até conter cláusulas que visam
excluir a obrigação em casos de culpa leve ou ainda de culpa delitual. Já
quanto a Responsabilidade Civil Extracontratual, trata de violação a um dever
genérico, geralmente consistente em um dever geral de abstenção que visa
não causar dano à pessoa, sendo, portanto, um dever negativo. Nesta, a
obrigação de indenizar, como regra, advém da violação de uma disposição
legal ou de um direito absoluto que é inteiramente distinto dela.
A principal diferença técnica existente entre os dois institutos
analisados em supra baseia-se na presunção de culpa na Responsabilidade
Contratual, o que acarreta na reversão do ônus da prova, motivo pelo qual a
vítima do dano obtém mais facilmente a indenização. No entanto, em se
tratando de matéria delitual, a culpa do autor do dano deve de ser comprovada
pela vítima, devendo esta provar a existência do vínculo obrigacional, cabendo
ao ofensor provar não ter tido culpa, ou ainda a ocorrência de caso fortuito ou
força maior desde que comprovada a imprevisibilidade, bem como a
inevitabilidade destes.
3.3.2 – Do aleijão (deformidade física permanente)
Primeiramente deve-se destacar o que vem a ser deformidade física,
mutilação dos membros superiores ou inferiores da pessoa, ou seja, lesões
causadas pelos facultativos no corpo de um paciente como consequência do
40fato de não terem tomado os devidos cuidados na prática dos procedimentos
realizados ou ainda pelo fato de não possuírem especialização em cirurgia
plástica.
A relação existente entre aleijão-deformidade permanente-dano
estético tem sido causa de decisões contraditórias no que se refere à
reparação do dano moral resultante dos mesmos e a possibilidade de sua
cumulação ou não com outras formas de indenização.
O artigo 949 do Código Civil reconhece que os dois gravames que
envolvem a deformidade tida como permanente e o dano estético conservam a
sua individualidade como lesão objetiva e subjetiva da pessoa humana. De
acordo com o que afirma Yussef Said Cahali (2000, p.192), toda deformidade
permanente é o que induz a existência de um dano estético ou ainda que com
este se identifique ou se confunda conceitualmente. Cabe destacar que a
deformidade permanente quando atrelada à existência do dano estético,
encontra-se tipificada no Código Penal em razão da qualificadora do artigo 129,
§ 2°, IV, o que é aceitável na concepção restritiva da tipologia delituosa, uma
vez que encontra-se em pauta a liberdade individual do ofensor. Entretanto,
cuida-se da Responsabilidade Civil daquele que deu causa ao dano sendo este
uma lesão grave sofrida pela vítima, deformidade, aleijão ou até mesmo uma
incapacidade permanente, seja de modo doloso ou culposo, visto que pode
levar a provocação de um dano subjetivo à pessoa, que é indenizável como o
dano moral.
Quanto a simples deformação, deve-se esclarecer que é considerada
como sendo uma forma distinta de deformidade que pode representar uma
sequela que cause dor extrema a vítima, frustrando-a no tocante a sua
expectativa de vida, pois ainda que este tipo de lesão não acarrete
deformidade física, mexe com o estado psicológico daquele que a
experimentou uma vez que considere ter sido sua beleza afetada.
Determina a Lei em casos de deformidade ou aleijão que, a
importância correspondente a multa criminal (inexistente) deve ser paga em
dobro, agravada quando contemplada a hipótese de ferimentos que deixaram
41marcas, devendo ser o intérprete conduzido a um estado de justificável
perplexidade. Tal questão tratará de indenização por ofensa à saúde.
3.3.3 – Do dano estético como lesão corporal grave permanente
De acordo com o Professor de Direito Penal Júlio Fabbrini Mirabete,
pode o delito de lesão corporal ser conceituado como a ofensa à integridade
corporal ou à saúde, ou seja, como o dano ocasionado à normalidade funcional
do corpo humano, quer do ponto de vista anatômico, quer do ponto de vista
fisiológico ou mental. Tal ofensa encontra-se tipificada no artigo 129 do Código
Penal Brasileiro.
O Código Civil, em seu artigo 949 prevê a deformidade permanente e o
dano estético, afirmando ter a vítima o direito de ressarcimento do dano
material, assim como do dano moral por ela sofrido. Em se tratando de
deformidade permanente como, por exemplo, o aleijão, deformação ou lesão
incapacitante, podem advir danos de natureza patrimonial, tendo em vista que
resulta em inibições que impedem muitas das vezes a vítima de desempenhar
de forma plena suas relações pessoais, enfim, gera dor psíquica.
Já no tangente à lesão corporal de natureza gravíssima, isto é,
deformidade permanente, que se encontra tipificada no artigo 129, inciso IV e §
2° do Código Penal, pode-se dizer que há uma previsão de que a vítima pode
não vir a se restabelecer, sendo, portanto, o dano ocasionado perpétuo. Assim,
comprovando-se a não possibilidade de restabelecimento, é a deformidade
permanente, sob o aspecto médico-legal e jurídico, um prejuízo estético
adquirido, sendo ainda visível, indelével, proveniente da deformação de um
corpo, devendo ser esta além de permanente, perceptível e capaz de causar
impressão de desagrado e situação vexatória para a vítima.
Isto posto, possível é afirmar do que fora exposto que o conceito de
deformidade permanente jurídico penal não é objetivo puramente, tendo-se em
vista que deve ser analisado em um só momento sob os aspectos subjetivo e
objetivo. Uma lesão corporal tida como simples por não ter esta resultado
alteração da forma física da pessoa não alterando a sua aparência, exclui a
42figura da deformidade, embora eventualmente possa vir a determinar uma
responsabilidade de cunho indenizatório por danos morais em razão do motivo
ou ainda da natureza injuriosa posta como sendo causa da agressão pela
vítima sofrida.
Ao ser detectada a incapacidade permanente, o que se levará em
conta será qual foi o órgão ou a função afetada, não havendo necessariamente
a ocorrência de uma lesão da qual resulte deformidade. Contudo, a visibilidade,
a aparência, induzem a configuração do dano estético.
O termo deformidade, segundo a acepção jurídico-penal, é a quebra da
estética individual na forma normal e própria da pessoa. Assim, de acordo com
o que afirma o Professor Nelson Hungria (apud CAHALI, Yussef Said. Dano
Moral, 2000, p. 198), “a deformidade deve ser de tal monta que causa uma
impressão, se não de repugnância ou de mal estar, pelo menos de desgosto,
de desagrado. É a cicatriz que acarreta chocante assimetria, é a desfiguração
notável”. Desse modo pode-se definir como deformidade, por exemplo, uma
lesão sofrida por uma pessoa na localização do rosto, sendo esta, além de
visível à distância e notável à primeira vista, irreparável em condições normais,
motivo pelo qual é tida a mesma como permanente, o que configura o dano
estético.
3.4 – Do direito a personalidade e a integridade física
Possível é afirmar que é o dano estético uma ofensa ao Direito da
Personalidade em se tratando do direito à integridade física externa, uma vez
que tais direitos são as prerrogativas do sujeito em relação às diversas
dimensões de sua própria pessoa, à sua dimensão física, no tocante a vida, ao
corpo vivo ou morto ou ainda sobre partes apartadas deste.
Sendo assim, a reparação de uma ofensa à integridade física de um
indivíduo, de acordo com o instituto da Responsabilidade Civil, deverá ser
integral de modo que tal ofensa venha a ser reprimida. Portanto, não
retornando a vítima ao seu estado quo ante, terá sido, ao menos, seu
padecimento minorado pela satisfação ou compensação.
43
3.5 – Do Dano moral
Trata o dano moral da ofensa ou violação que fere os bens de ordem
moral da pessoa, os que se referem à liberdade, à honra, à própria pessoa ou à
sua família, não ferindo, portanto, os bens patrimoniais propriamente ditos. E
de acordo com o que afirma o Professor Silvio de Salvo Venosa (2003, p.33), é
o dano moral o prejuízo que afeta o ânimo psíquico, moral e intelectual da
vítima, prejuízos sentidos advindos de dor moral, que não implicam em perda
pecuniária (dano extrapatrimonial), como por exemplo, dano por ricochete que
se dá em caso de falecimento.
Posto isto, analisando os conceitos em supra, pode-se dizer que não é
possível a quantificação do dano extrapatrimonial diretamente em pecúnia, pois
todo e qualquer valor que vier a ser estabelecido visando minorar a dor sofrida
será tido como insuficiente.
44
CAPÍTULO IV
DA NATUREZA CONTRATUAL, EXTRACONTRATUAL E A
OBRIGAÇÃO DE RESULTADO NAS CIRURGIAS ESTÉTICAS
4.1 – Das cirurgias estéticas
É sabido e certo que está superada a discussão travada em torno da
licitude da cirurgia plástica, importando no presente momento apenas distinguir
a cirurgia estética da corretiva.
Segundo o Professor Sérgio Cavalieri Filho (2003, p. 377 – 378), há
duas formas distintas de cirurgia plástica, a corretiva ou reparadora e a
embelezadora, existindo, portanto, como consequência disto, dois tipos
diferentes de responsabilidade. A primeira tem por finalidade corrigir
determinada deformidade física, sendo esta congênita ou ainda traumática. Em
tais casos, de acordo com o que afirma Sérgio Cavalieri Filho (2003, p. 377 –
378) o médico, por mais competente que seja, nem sempre pode garantir, nem
pretender, eliminar completamente o defeito. Sua obrigação, por conseguinte,
continua sendo obrigação de meio. Já na segunda, em se tratando das
operações plásticas cosmetodológicas ou estéticas, cuja finalidade é o
embelezamento, o rejuvenescimento estético através de modificação ou de
reconstrução de parte externa do corpo, a obrigação passa a ser de resultado.
Portanto, para que o facultativo seja responsabilizado, basta saber se o
resultado prometido foi ou não alcançado. Isto por se tratar de um ramo da
medicina tido como empresarial por objetivar apenas o lucro, uma vez que visa
não a saúde, mas sim a beleza. Motivo pelo qual se aplica a Teoria do risco,
pois houve modificação, desnaturação do objeto do contrato médico que deixou
de ser a saúde para ser a beleza, sendo o procedimento cirúrgico
desnecessário.
Assim, no tocante a cirurgia plástica denominada estética cabe
salientar que, embora não possua urgência, visto que “o paciente não corre
risco algum, no caso de livremente decidir a ela não se submeter, abstendo-se
45de expor a perigo a sua vida, integridade física e saúde orgânica” (MIGUEL
KFOURI NETO, 2001, p. 172), esta apresenta as mesmas características das
demais no que tange as reações do organismo humano, pois são imprevisíveis.
Quanto ao profissional que se propõe a realizar a cirurgia, este assumirá o
compromisso de que não resultará da mesma nenhuma espécie de dano
estético ao paciente, devendo ainda avaliar o risco, bem como informá-lo. Caso
o oposto ocorra, responderá o facultativo pelos danos decorrentes da cirurgia,
salvo se estes forem ocasionados por culpa do paciente ou de intervenção de
fato tido como imprevisível. Contudo, cabível é ao médico agir de modo mais
cauteloso possível, devendo prestar todas as informações por escrito e de
modo claro no que tange aos riscos pelos quais passará o paciente ao se
submeter a tal intervenção. Assim, sendo os riscos da operação maiores do
que as vantagens proporcionadas por ela é dever do médico negar-se a
realizá-la, não importando haver o consentimento do paciente, posto que trata-
se do Princípio da integridade do corpo humano, norma de ordem pública,
motivo pelo qual a máxima volente non fit injuria não se aplica.
De extrema importância também se faz destacar que deve ainda o
médico se preocupar em preparar o estado psicológico do paciente, uma vez
que a aparência deste será modificada. Por este motivo, atualmente, em muitos
consultórios os médicos já fazem uso de um determinado programa de
computador que os permite demonstrar ao seu paciente o resultado final da
operação através da imagem deste já modificada de acordo com as
informações passadas por ele ao facultativo ao expor o que pretende obter
como resultado final da intervenção. Assim, sendo pelo médico verificado que é
impossível chegar ao resultado pretendido pelo paciente, deverá este negar-se
a realizar a cirurgia, pois se o fizer e não o alcançar de modo satisfatório e
almejado pelo cliente, este poderá responder pelos danos causados.
Importante mencionar que como em qualquer outra cirurgia, nas cirurgias
plásticas estéticas também existem riscos que podem ser inerentes à própria
natureza da intervenção ou ainda de imperícia médica.
De acordo com o Dr. Luiz Carlos Martins, membro da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Plástica (Revista dos Tribunais, novembro de 2000, vol.
46781, p. 142) pode-se citar como riscos decorrentes das espécies de cirurgias
plásticas abaixo:
a) Lipoaspiração:
Resultado inerente à intervenção: leve assimetria, inchaço prolongado.
Imperícia médica: eliminação de grandes quantidades de gordura em
mulheres ou em homens com acentuada flacidez de pele, o que acaba
fazendo com que surjam dobras que apenas podem ser retiradas com
cirurgia; formação de túneis decorrentes de uso de cânulas muito grossas, o
que atualmente raramente se verifica, visto que as cânulas têm afinado;
ondulações por causa da eliminação excessiva de gordura; perfuração de
órgãos vizinhos.
O paciente deve ser alertado pelo médico de que a lipo, como
qualquer outra cirurgia, apresenta muitos riscos. Pode ocorrer uma embolia
pulmonar, complicações com a anestesia e infecções, entre outros
problemas segundo afirma o médico Jorge Menezes, presidente da
Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica – Regional Minas Gerais (Revista
Cláudia, Junho de 2009, p. 142). Este afirma ainda que para evitar a
embolia, conta pontos a habilidade do cirurgião, pois se a cânula machucar
o vaso, soltam-se partículas de gordura que trafegam pelo organismo e
chegam ao pulmão, entupindo artérias e levando à falência do órgão.
Contudo, explica Jorge Menezes que, antes da cirurgia é necessário que o
paciente passe por uma bateria de exames de hemograma a
eletrocardiograma, para minimizar as intercorrências. Já o cirurgião Alan
Landecker afirma que além de todos estes exames os médicos devem
verificar se a paciente possui histórico de problemas vasculares na família,
pedindo a mesma que pare de tomar pílula de duas a quatro semanas antes
da cirurgia, pois explica que o anticoncepcional contém substâncias com
poder para aumentar o risco de formação de coágulos, que, em geral,
interferem na circulação sanguínea, levando à trombose. Uma outra medida
é o uso de meias de compressão pneumáticas, acionadas por um aparelho
durante a cirurgia, para evitar a soltura de trombos.
47 Deve-se ainda destacar o alto índice de mortalidade decorrente de
lipo, motivo pelo qual é esta a campeã em processos estético-profissionais
entre os procedimentos médicos que correm no Cremesp. Em segundo
lugar encontra-se o silicone. Dos 289 médicos investigados, 38% são
reincidentes. Do total, 97% são ortopedistas, ginecologistas, enfim, não
possuem título de especialistas em cirurgia plástica.
Para que a cirurgia seja segura é necessário que anestesista e
médico tomem algumas medidas, como por exemplo, na realização de uma
lipoaspiração úmida (a mais utilizada pelos especialistas porque diminui a
perda de sangue, causa menos hematomas e dores), o anestesista deve
conversar com o paciente, checar os exames por este feitos em momento
anterior a data da cirurgia e aplicar no mesmo um pré-anestésico para que
este relaxe em momento anterior aos procedimentos. Posteriormente o
médico marcará as áreas a serem aspiradas com caneta especial e os
aparelhos de monitoramento serão colocados para que depois o anestesista
faça um acesso venoso para administrar medicamentos. A anestesia
poderá ser local (se em se tratando de áreas pequenas), peridural
(tratando-se da mama para baixo) ou geral (tratando-se de cirurgias
maiores). Deve ser feito um corte pequeno, de 0,5 centímetros para inserir
uma cânula de infiltração que injetará uma solução contendo soro
fisiológico, anestésico e adrenalina no tecido gorduroso. Após uns 15
minutos devem ser introduzidas cânulas ligadas a aparelhos de sucção de
gordura e ao final o médico deverá suturar as incisões, fazer curativo,
enfaixar e colocar uma cinta de sustentação.
Importante ressaltar que de acordo com decisão do CRM, é
permitido eliminar até 7% do peso corpóreo, uma vez que mais do que isso
pode levar a problemas como anemia e desidratação pela perda de sangue.
b) Aumento dos seios:
Resultados inerentes à intervenção: encapsulamento da prótese de silicone,
sendo atualmente tal problema mais raro, tendo-se em vista o uso
crescente de próteses rugosas; leve assimetria entre os seios.
48Imperícia médica: próteses em diferentes alturas (assimetria acentuada);
cicatrizes assimétricas.
c) Suspensão ou redução dos seios:
Resultado inerente à intervenção: leve assimetria entre os seios.
Imperícia médica: assimetrias acentuadas; mamilos com alturas muito
distintas; perda parcial ou ainda total da auréola por necrose do tecido.
d) Plástica de nariz:
Resultado inerente à intervenção: o fato da pele não assentar direito à nova
estrutura, dando a impressão de que pouca coisa foi modificada.
Imperícia médica: fraturas mal feitas; eliminação excessiva de cartilagem ou
de outras estruturas de sustentação do nariz, o que faz com que o mesmo
fique torto ou totalmente assimétrico.
4.2 – Relação médico – paciente e sua natureza contratual
Sabe-se que entre o médico e seu paciente se estabelece um
contrato, cujo conteúdo dispõe a respeito da responsabilidade de um para com
o outro, tratando-se, portanto, de uma relação contratual.
Saliente-se que embora o Código Civil Brasileiro coloque a
responsabilidade médica entre os atos ilícitos, não mais gera controvérsias se
caracterizar a responsabilidade médica como sendo “ex contractu”, impondo-se
que seja a responsabilidade civil do médico uma responsabilidade contratual,
devendo, contudo, haver uma relação estabelecida entre o médico e seu
paciente com cláusulas obrigacionais, restando apenas saber de que tipo de
contrato se trata, sendo encontrados no mesmo como características o fato de
ser intuitu personae, bilateral, oneroso ou gratuito, comutativo, aleatório e de
caráter civil, evidenciando-se por se tratar de um contrato principal, tendo na
sua constituição contratos acessórios.
49 No entanto, tal relação contratual não encontra um espaço particular na
legislação nacional que a ela tenha sido dedicado, sendo então tida como uma
figura atípica, inominada, mas que nem por esse motivo possui uma menor
tutela jurídica. Assim, para que vigore não se faz necessária forma especial,
nem definição exata quanto àquele que é seu objeto em suas minúncias,
tampouco preço e condições de pagamento, visto que a forma como este é
analisado é absolutamente livre, sendo suficiente que se prove a existência do
liame das partes entre si, o que originará os direitos, bem como as obrigações
pertinentes. Contudo, deve-se entender como objeto do contrato a atividade
médica globalmente considerada, ou seja, a aplicação zelosa de todos os
meios que se fizerem necessários e estiverem disponíveis de modo razoável.
No que tange ao objeto da obrigação, sendo este a prestação dos
serviços médicos, não deve de ser confundido com a finalidade da obrigação,
visto que o fim é a obtenção de um resultado esperado, correto, enquanto a
não obtenção do resultado esperado não se confunde com a violação da
obrigação em se tratando de obrigação de meio.
Já em se tratando de obrigação de resultado, fica o profissional médico
obrigado a alcançar o resultado pretendido, objetivo certo, fim específico a que
se propôs, uma vez que o importante é o resultado de sua atuação, pois
apenas terá adimplido com a obrigação assumida se o fizer.
Quanto as especialidades que tem por finalidade a cura do paciente de
modo direto, o especialista possui obrigação de meio, comprometendo-se com
esta. Sendo assim, por conseguinte, restringe-se a sua responsabilidade à
execução do ato médico. Contudo, predominante é na doutrina e na
jurisprudência o entendimento de que ao executar cirurgias plásticas estéticas
e embelezadoras, assume o médico a obrigação de resultado. De modo
indiscutível, em se tratando de cirurgia plástica estética, verifica-se uma
aceitação de forma generalizada pela não-efetivação do resultado, presumindo-
se a culpa do médico, o que a difere da cirurgia geral, visto que nesta é pacífico
o entendimento de que tal obrigação é de meio, tendo-se em vista ser o objeto
do contrato a saúde, a vida e não apenas a beleza. Cabe mencionar que na
doutrina e na jurisprudência predomina, também, o entendimento de que em
50caso de execução defeituosa de cirurgia estética, isto é, frustração do
resultado, haverá inexecução total da obrigação de fazer por parte do cirurgião
plástico.
Portanto, é o erro médico tido como um inadimplemento contratual por
ter havido falha na prestação do serviço médico, enquadrando-se na
abrangência do campo da responsabilidade contratual quando acompanhada
de culpa, o que gera obrigação de indenizar o que lesado fora ao ter seu direito
violado ao experimentar o dano, cabendo, para que haja a comprovação do
erro médico, todos os meios probatórios admitidos em direito, como por
exemplo, a prova pericial, o termo de consentimento. De suma importância se
faz destacar que tratando-se de obrigação de meio, deve o paciente produzir
provas que demonstrem não ter agido o médico com a devida diligência. O que
fica patente à luz do Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 14, § 4°,
ao tratar expressamente da Responsabilidade Subjetiva, observada em
obrigação de meio, em face de uma avaliação de erro médico. Já em obrigação
de resultado, onde há presunção de culpa do profissional, cumpre ao médico
produzir prova, podendo vir a ser elidida a culpa no caso de haver
comprovação de causa diversa que tenha originado o resultado, que não o seu
ato médico (artigo 6°, inciso VIII do CDC – Da inversão do ônus da prova),
podendo o mesmo arguir defesas previstas no artigo 14, § 3° da Lei 8.079/90 -
CDC.
A respeito do assunto em tela, afirma Fabrício Zamprogna Matielo: “A
prática da medicina é incluída, modernamente, no rol daquelas que se prestam
à incidência da Lei n° 8.078/90, porque os profissionais liberais em geral são
realmente prestadores de serviços, independentemente da área de atuação
escolhida. Já no artigo 2° da mencionada Lei tem-se a seguinte definição:
“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou
serviço como destinatário final”. O art. 3°, § 2°, afirma: “Serviço é qualquer
atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração (...)”. Ora,
despiciendo arvorar-se em maiores elucubrações para concluir pelo
enquadramento da atividade objeto do contrato médico como prestação de
serviços sujeita, no que autorizado, aos ditames contidos no estatuto protetivo.
51De outra parte, igualmente inequívoca a condição de consumidor assumida
pelo paciente a partir do advento da normatização ora em estudo.” (FABRÍCIO
ZAMPROGNA MATIELO, 1998, p.65).
Segundo o entendimento do Professor Silvio Venossa (2003, p. 104)
presente a responsabilidade objetiva, ao tutor da conduta cabe unicamente
isentar-se da indenização, se provar que a diligencia foi empregada, não
existindo direito na prestação do serviço, ou culpa exclusiva da vítima ou de
terceiro.
Ressalte-se que o artigo 14 do CDC, em seu parágrafo 4°, exige a
verificação da culpa do profissional de medicina, uma vez que este é um
profissional liberal. Assim, em caso de ocorrência de dano a um paciente
originado por sua atividade profissional, de acordo com alguns doutrinadores,
“importa aclarar que tal excepcionalidade não vem para introduzir em nosso
sistema a irresponsabilidade do profissional liberal nem excluí-lo da vigência de
nosso Código”. O que somente se dá em face da natureza personalíssima dos
seus serviços ou da livre escolha do consumidor pelo profissional em que tenha
maior ou menor confiança. Isto significa dizer que para contratar ou constituir
serviços de um profissional liberal deve se embasar na confiabilidade, fidúcia e
prestígio dispensados pelo consumidor contratante ao profissional contratado.
Desse modo, por ser o profissional liberal escolhido pelo cliente, este somente
se responsabilizará por danos em havendo culpa sua.
Destaque-se que o contrato de prestação de serviço médico não
possui regulamentação legal própria, motivo pelo qual aplícam-se as regras de
proteção aos consumidores, visto que tais contratos possuem como
característica o fato de ser sempre contrato civil, intuitu personae, de consumo.
4.3 – Da natureza extracontratual da relação médico-paciente
É a responsabilidade civil extracontratual regulada em nosso
ordenamento jurídico pelo Código Civil em seus artigos 186 e 188, bem como
nos artigos 927 a 943.
52 Em regra geral, a relação jurídica existente entre médico e paciente é
de natureza contratual, entretanto, existem situações nas quais se dará
extracontratualmente.
Deve-se destacar, portanto, que podem ocorrer casos de
Responsabilidade Civil decorrente de erro médico cuja origem seja
extracontratual, aquiliana, segundo o que afirma Vera Fradera (1992, p. 116):
“Em certas circunstâncias, contudo, e, tendo em vista algumas especialidades,
a responsabilidade médica poderá ser de natureza extracontratual ou aquiliana,
quando da ausência de contrato, aja o médico com negligência ou imperícia no
tratamento, ou o recuse à pessoa em situação de perigo iminente ou, ainda, em
se tratando de menor, responsáveis não tenham se manifestado a respeito do
tratamento ou dado consentimento para determinado ato cirúrgico”.
4.4- Da obrigação de meio e obrigação de resultado no tocante
à responsabilidade profissional do médico
Sabe-se que houve uma discussão no que tange a natureza teórica
das obrigações de meio e de resultado em se tratando da responsabilidade
profissional do médico.
Segundo o entendimento de Demogue, a obrigação pode ser tanto de
meio quanto de resultado, sendo este último o prometido pelo facultativo e não
o almejado pelo paciente.
De acordo com o que afirma o Professor Orlando Soares, as
obrigações, no tocante ao fim, podem ser classificadas em obrigações de meio
ou de resultado (Traité des Oligations em General, Vol. V, n° 1.237).
Nas obrigações de meio, apenas se obriga o devedor a diligenciar
honestamente a realização de um fim, com os meios de que dispõe, ou seja, é
esta a obrigação pela qual o devedor se obriga a fazer tudo o que está em seu
alcance para obter o resultado desejado pelo credor sem, no entanto, se
comprometer com o mesmo. Como por exemplo, um médico que através de
seus serviços profissionais se obriga a utilizar de todos os meios
indispensáveis para alcançar a cura do doente, porém sem jamais assegurar-
53lhe o resultado. O mesmo ocorre com os advogados, uma vez que, assim como
os médicos, os mesmos não podem prometer lograr êxito no resultado final de
suas obrigações ainda que lhes pareça certo conseguir o fazer.
Desse modo, em se tratando dos profissionais de medicina, aplicados
tais princípios à atividade médica, não sendo o resultado final a cura, não
poderá o médico sofrer sanção, salvo se tiver cometido negligência,
imprudência ou imperícia.
Tal espécie de obrigação aparece na maior parte dos contratos de
prestação de serviço dos médicos, sendo a própria atividade do devedor o
objeto do contrato. Atividade esta que deve de ser desempenhada da melhor
maneira possível, buscando sempre o melhor resultado, mesmo que não seja
ao final conseguido.
Em contraponto, nas obrigações de resultado, obriga-se o devedor a
realizar determinado fim, independentemente da cogitação dos meios. (R.
Limongi França, pp. 291-292), isto é, a obrigação de resultado é aquela pela
qual o devedor se obriga a um determinado resultado, comprometendo-se com
o mesmo. Como por exemplo, um contrato de transporte que deve respeitar a
cláusula de incolumidade independentemente de culpa.
Em tal espécie de obrigação, o credor tem o direito de exigir do devedor a
produção de um resultado, uma vez que sem o mesmo tem-se caracterizado o
inadimplemento da relação obrigacional. Assim sendo, tem-se o resultado em
si mesmo, de tal sorte que a obrigação somente se considerará adimplida com
a efetiva produção do resultado colimado. Pode-se citar como exemplo no
âmbito da medicina as cirurgias estéticas ou ainda as de vasectomia.
Em suma, quando se tratar de culpa cuja natureza seja extracontratual,
somente será possível à existência de obrigação de resultado.
Desse modo, pode-se afirmar após observância dos conceitos
analisados que tais obrigações se diferem. A primeira, por estar sempre
vinculada a conduta do devedor (se prudente ou imprudente, perita ou imperita,
diligente ou negligente), trata de Responsabilidade Subjetiva, enquanto que a
segunda de Responsabilidade Objetiva.
54 Portanto, pode-se concluir que a Responsabilidade Civil dos médicos,
em regra, é subjetiva, pois deve-se analisar se o facultativo atuou com ou sem
culpa. Entretanto, em se tratando de casos de cirurgia plástica de natureza
puramente estética, embelezadora, é a responsabilidade objetiva (há obrigação
de resultado) não importando a análise da conduta, haja vista que basta saber
se o resultado prometido foi ou não alcançado. O que se dá por ser este um
ramo da medicina tido como empresarial que visa não a saúde, mas sim a
beleza, motivo pelo qual é a cirurgia que possui tal intuito tida como
desnecessária, posto que o médico, para grande parte da doutrina e
jurisprudência é um empresário que objetiva apenas o lucro. Daí a razão em
ser aplicada a Teoria do Risco, visto ter sido o objeto do contrato médico, qual
seja a saúde, modificado, o que implica dizer que este veio a se desnaturar.
Destaque-se que quando o facultativo avoca para si obrigação de
resultado que anteriormente não possuía, responde pelo resultado prometido e
não alcançado de acordo com a Responsabilidade Objetiva.
4.5 - Da Cirurgia Plástica Reparadora X Embelezadora
Sabe-se que a cirurgia estética encontra-se autorizada no artigo 51 do
Código de Ética, que dispõe que são lícitas as intervenções cirúrgicas que
possuam a finalidade estética, desde que necessárias ou quando o defeito a
ser removido ou atenuado seja fator de desajuste psíquico.
A cirurgia plástica tem por objetivo a reconstituição de uma parte do
corpo humano por razões médicas ou estéticas e se desenvolve sob duas
facetas: a cirurgia plástica estética e a cirurgia plástica reparadora.
A estética é aquela realizada pelo paciente com o objetivo de melhorar
sua aparência. A pessoa quando se submete a tal intervenção cirúrgica não a
faz com intenção ou propósito de obter alguma melhora em seu estado de
saúde, mas visa modificar algum aspecto físico que não lhe agrada. O que não
lhe causa prejuizo de ordem funcional. Já a reparadora tem como objetivo
corrigir lesões deformantes, defeitos congênitos ou adquiridos e é considerada
tão necessária quanto qualquer outra intervenção cirúrgica. O bem estar
55emocional, segundo o Dr. Ivo Hélcio Jardim de Campos Pitanguy, Cirurgião
Plástico brasileiro, é uma faceta da saúde, e, contudo, uma cirurgia reparadora
traz bem estar emocional para aquele que dela necessita, não sendo, portanto
considerada desnecessária, tendo-se em vista que resulta na melhora da
saúde que para o Direito é um bem jurídico, direito fundamental, social, da
personalidade a ser tutelado, o que tem sido afirmado por alguns juristas.
Assim sendo, como o objeto contratual não se desnatura, ou seja, continua a
ser a saúde e não a beleza, trata-se de obrigação de meio cuja
responsabilidade é subjetiva.
56
CAPÍTULO V
DA INDENIZAÇÃO, LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE
INDENIZAR O DANO MORAL E O DANO ESTÉTICO
5.1 – Reparação do dano estético
De acordo com São Tomás de Aquino, a essência da justiça “é dar a
outrem o que lhe é devido segundo uma igualdade”. Assim sendo, de acordo
com o que afirma Teresa Ancona Lopez, a reparação do dano estético visa dar
à pessoa que fora lesada o que a ela é devido, ou seja, visa ressarci-la ou
compensá-la pelo dano que injustamente veio a sofrer. Portanto, ofensas à
pessoa são tidas como muito mais graves do que aquelas cometidas contra o
patrimônio.
Tratando-se da parte histórica no tocante ao assunto ora abordado,
pode-se afirmar que antigamente, ao tratar-se de indenização de dano que não
patrimonial, havia certa dificuldade de aceitação, uma vez que alegava-se ser
imoral por haver degradação do sentimento daquele que fora lesado a
compensação da dor através de uma determinada quantia em dinheiro.
Dificuldade esta que, nos momentos atuais já se encontra superada.
Encontra-se a reparação do dano moral assegurada na CRFB/88 no
artigo 5°, incisos V e X (SILVIO RODRIGUES, 2002, p.229), possuindo ainda
apoio irrestrito tanto da doutrina quanto da jurisprudência.
Entretanto, no que tange a indenização de um dano estético, a
valoração é o maior problema, visto ser extremamente difícil avaliar os
sofrimentos psicológicos decorrentes da lesão, ter noção de sua estimativa
para posteriormente poder fixar o quantum devido.
Sabe-se que para transformar um dano em indenização, deve-se
verificar tanto o que é devido (an debeatur) quanto o que diz respeito ao
montante da indenização (quantum debeatur). Deve-se de mesmo modo, tendo
por finalidade a sanção imposta ao lesante, qual seja a de reparar
juridicamente o dano ocasionado, levar-se em conta que toda matéria deve ser
57regida pela regra geral de uma adequada equivalência entre a reparação e o
dano. No tocante aos danos materiais, devem de ser computadas as despesas
com a realização de tratamentos e ainda os lucros cessantes quanto aos danos
emergentes que dizem respeito à diminuição ou perda dos ganhos. Contudo,
não se quer valorar a dor daquele que se viu injustamente lesado por outrem,
mas sim compensá-la através de pecúnia.
Pode-se exemplificar o afirmado em supra utilizando-se o seguinte
caso: um (a) modelo que trabalha com a “perfeita” estética, visando aprimorá-
la, aperfeiçoando-a através de uma cirurgia reparadora, se vê lesado (a) ao
constatar que tal procedimento além de não ter chegado ao resultado
pretendido, ainda veio a deformá-lo (a), o que lhe ocasionou danos tanto
materiais quanto morais e/ou estéticos se a deformidade atender as
características de tal espécie de dano.
Também é de extrema valia destacar que nem sempre é possível se
chegar a uma equivalência no que tange ao dano material sofrido em se
tratando do dano e sua reparação, visto que em determinados casos o
restabelecimento do lesado ao seu estado normal, quo ante, é impossível, pois
na maioria das vezes o que existe é um sucedâneo do real prejuízo sofrido.
Dessa forma, o juiz convence-se de que realmente houve dano estético
indenizável determinando a extensão de tal dano estabelecendo uma
indenização proporcional seguindo obrigatoriamente bases que tem como
diretrizes que o farão chegar ao montante da indenização, dando-lhe o
conteúdo do pretium doloris.
O Código Civil em seu artigo 949 versa sobre a indenização decorrente
de dano estético e possui critérios básicos para que seja possível alcançar a
fixação do valor da indenização. O artigo em questão estabelece que
indenizará o ofensor aquele que por ele fora ofendido das despesas do
tratamento, bem como dos lucros cessantes até o fim de sua convalescença,
isso além de qualquer outro prejuízo que o ofendido venha a reclamar. Sendo
cabível mencionar que a extensão do dano dará a medida da indenização,
devendo a justiça chegar a um valor proporcional em cada caso, sempre
analisando a posição do lesante e do lesado.
58
5.2 – Liquidação da obrigação de indenizar
Sabe-se que o Direito Brasileiro admite a indenização tanto por
prejuízo material, em se tratando da reintegração pecuniária ou de
ressarcimento stricto sensu, quanto por reparação do dano moral, sanção civil
direta ao ofensor ou reparação da ofensa, motivo pelo qual a liquidação é feita
na proporção da lesão.
A liquidação do dano visa determinar o quantum que aquele que o
ocasionou deverá despender em prol do que fora lesado, sendo o mesmo em
pecúnia e é tida como mais uma fase ou etapa do processo de conhecimento.
Assim, em não havendo adimplemento da obrigação de modo espontâneo,
realizar-se-á a execução.
A recomposição do prejuízo correspondente aquilo que o paciente
efetivamente veio a perder em razão do ato médico (damnum emergens), diz
respeito ao prejuízo material ou perdas e danos. Porém, cabível se faz
ressaltar que não só o prejuízo é indenizável, mas de mesma forma também o
é o valor correspondente ao que, de modo razoável, se deixou de lucrar
(lucrum cessans). O Código Civil em seus artigos 949 e 950 trata da
indenização dos prejuízos, isto é, lucros cessantes e perdas, assim como a
reparação do dano moral. Devendo-se ainda mencionar orientação do STJ,
que tem afirmado que são sim cumuláveis as indenizações decorrentes de
dano material e dano moral oriundos do mesmo fato (SÚMULA 37, STJ).
Já no tocante a quantificação do dano material e do dano moral, será
possível através da realização de perícia judicial, visto que além do reembolso
das despesas médico-hospitalares deve-se incluir a incapacidade temporária
ou permanente inclusive laborativa, (dano material ou patrimonial), o quantum
doloris, o dano estético (dano moral ou extrapatrimonial).
Destaque-se que em se tratando da quantificação do dano patrimonial,
há parâmetros objetivos que a dimensionam pecuniariamente sem maiores
dificuldades, o que não ocorre com o dano extrapatrimonial, visto ser a
valoração pericial tipicamente ou duplamente subjetiva, pois além de ser o
59próprio dano intrinsecamente subjetivo, a apreciação pericial também possui
um subjetivismo onipresente.
Já no procedimento judicial de conhecimento, abrir-se-á fase probatória,
tendo a prova pericial, em se tratando de indenização decorrente de erro
médico, relevância inegável em face do objeto sobre o qual controverte-se.
Serão objetos da prova pericial os fatos alegados na inicial ou ainda na
contestação que careçam de perícia para sua demonstração, não tendo,
portanto, o condão de impor a necessidade de produção de prova a alegação
do fato surgido no decorrer do processo de modo fugaz e pouco consistente.
Neste caso, é o perito o auxiliar do Juízo no esclarecimento dos fatos
controvertidos. Destarte, “não está o juiz adstrito ao laudo pericial; mas, por
outro lado, nada o impede de tê-lo como fundamento de sua convicção” (STJ,
Ag. 39595, Rel. Min. Helio Mosimann, j. 10.09.1993, DJU de 17.09.1993,
página18978). Necessário se faz destacar que em tal fase procedimental deve-
se provar a injuridicidade da conduta do agente; a existência do dano material,
bem como do moral; o nexo de causalidade entre a conduta injurídica e os
prejuízos morais e materiais; a quantificação pecuniária da obrigação de
indenizar, incluindo no quantum reparatório os juros moratórios contados da
data da citação, os juros compensatórios e a correção monetária tendo como
“dies a quo” o momento da ofensa ao bem jurídico.
Se a sentença não determinar o valor devido, proceder-se-á a
liquidação dando a oportunidade de conferir à sentença judicial liquidez e
certeza, requisitos típicos das obrigações de pagar consubstanciadas em título
executivo de acordo com o que se encontra elencado no artigo 475 - A do
Código de Processo Civil.
No tangente aos danos emergentes, cuja liquidação encontra-se
prevista no artigo 949 do Código Civil, a comprovação matemática dos
prejuízos é de extremo e evidente valor no momento de sua averiguação,
quando da liquidação da sentença. Já quanto aos lucros cessantes, o que
razoavelmente se deixou de lucrar em virtude da lesão experimentada como
consequência do erro médico, a indenização deve abranger o período que
transcorreu entre o fato lesivo e o retorno daquele que se viu lesado quando
60recuperado as suas atividades habituais. Assim sendo, é necessário que haja
comprovação dos rendimentos auferidos pelo lesado na época em que sofreu o
evento danoso para que possa ser feito um cálculo correto do quantum
debeatur.
Importante também se faz mencionar o disposto no artigo 950 do
Código Civil que afirma que se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido
não possa vir a exercer o seu ofício ou profissão, ou que lhe diminua a
capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e
lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá uma pensão
correspondente à importância do trabalho, para que se inabilitou, ou da
depreciação do que ele sofreu. Em seu parágrafo único reza ainda que aquele
que se viu prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja
arbitrada e paga de uma só vez.
No tocante a indenização do dano moral no caso da Responsabilidade
Civil do médico, decorrendo este de mera conduta culposa, possui o dano
moral como objeto a dor física, assim como a emocional. Quanto a isso afirma
Teresa Ancona Lopes que não há equivalente da dor em dinheiro, não
havendo, portanto, o que se denomina de pecúnia doloris ou pretium doloris,
mas sim a compensação ou benefício de ordem material que permita aquele
que foi lesado obter prazeres e distrações que, de algum modo atenuem a sua
dor. Sendo dessa forma, ficará a verificação do quantum debeatur frente
aqueles casos em que, sendo levada em conta a natureza e o caráter
complexo das operações que serão realizadas para que seja efetivada a
liquidação da sentença, será utilizado o arbitramento conforme dispõe o Código
de Processo Civil em seu artigo 475-C, ou ainda a liquidação por artigos, de
acordo com o afirmado pelo artigo 475-E do mesmo dispositivo legal quando
necessário for alegar e provar um fato novo que na lide ainda não tenha sido
provado, visando valorar o quantum do ressarcimento determinado pela
decisão judicial.
5.3 – Cumulação do dano estético com o dano moral
61 Sabe-se que o Código Civil de 1916 disciplinava a lesão corporal de
natureza grave no parágrafo primeiro do art. 1.538, que se configurava em
caso de aleijão ou deformidade quando a lesão deixava marcas, dispondo que,
nesse caso, a soma seria duplicada. Saliente-se que para que se caracterize
deformidade é necessário que haja dano estético, que o ofendido cause
impressão penosa ou desagradável. Dessa forma, no parágrafo segundo,
dispunha o aludido dispositivo que, se o ofendido, aleijado ou deformado, fosse
mulher solteira ou viúva, ainda capaz de casar, a indenização consistiria em
dotá-la de acordo com as posses do ofensor, as circunstâncias do ofendido e a
gravidade do defeito, o que não mais subsiste.
Já o Código Civil em vigor não contém regras semelhantes, tratando
genericamente da lesão corporal em um único artigo, qual seja o art. 949 que
trata da lesão corporal de natureza leve e natureza grave, com previsão de
indenização das despesas do tratamento e dos lucros cessantes, além de
algum outro prejuízo que o ofendido tenha sofrido.
Foram eliminadas, assim, as extenuantes controvérsias sobre a
definição e a extensão do dote, sobre mulher em condição de casar, sobre a
natureza jurídica da indenização (moral ou material) e sobre o significado da
expressão “esta soma será duplicada”. Assim, em caso de lesão corporal, de
natureza leve ou grave, indenizam-se as despesas do tratamento e os lucros
cessantes até o fim da convalescença, fixando-se o dano moral em cada caso,
conforme as circunstâncias, segundo o prudente arbitramento judicial. Dessa
forma, a gravidade do dano que acarreta aleijão ou dano estético é fato a ser
considerado pelo magistrado na fixação do quantum indenizatório.
Destaque-se que a doutrina sempre se posicionou no sentido de que o
dano estético não se apresenta como uma terceira espécie de dano além do
dano material e moral, mas apenas um aspecto deste último. Motivo pelo qual
devia de ser avaliado de modo autônomo, visto que não se subsumia no dano
material, nem no dano moral tido como puro.
Afirmava-se que se tratava de dano moral objetivo, uma vez que agride
um dos direitos da personalidade, o direito à incolumidade física. Ressalte-se
que a jurisprudência, a princípio, se firmou no sentido de ser inadmissível a
62cumulação do dano estético com o moral, pois sendo aquele um aspecto deste,
a cumulação consistiria bis in idem. Operou-se, então, o entendimento de que o
dano estético subsume-se no dano moral. Neste sentido foi a conclusão
aprovada por unanimidade no IX Encontro dos Tribunais de Alçada do Brasil,
onde decidiu-se que o dano moral e dano estético não se cumulam, porque ou
o dano estético importa em dano material ou está compreendido no dano
moral.
De acordo com o Desembargador Carlos Gonçalves, as
jurisprudências majoritárias nos Tribunais de Justiça e nos Superiores
Tribunais de Justiça mencionam que a cumulação do dano estético com o dano
moral é sim cabível ao afirmarem que “a indenização deve abranger todos os
danos materiais acarretados ao paciente (despesas realizadas e as
decorrentes de nova cirurgia, com o próprio cirurgião ou com outro profissional,
de confiança daquele), como os danos morais decorrentes da frustração
provocada, e muitas vezes, do agravamento da situação. Como exemplo tem-
se decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, condenando o cirurgião a
pagar outra cirurgia à autora, facultando-lhe escolher o médico, dentre os
atuantes residentes no País, inserta na RJTJSP, 99315” (CARLOS
GONCALVES, p. 369).
Desse modo, evoluiu a jurisprudência, tendo o STJ já se posicionado no
sentido de que é possível a cumulação do dano moral com o dano estético,
quando possuem ambos fundamentos distintos, ainda que originários do
mesmo fato (AgRg no AgI 276.023-0/RJ, rel. Min. Paulo Gallotti).
Vem assim se posicionando a jurisprudência, sendo então editada a
Súmula 37. Portanto, atualmente entende-se o dano estético como uma
terceira espécie de dano, dano autônomo. É o damnum in re ipsa que
independe de comprovação. Destaque-se que em tal espécie de dano tanto a
dor quanto o sofrimento se integram, pois o dano social à imagem de uma
pessoa que como consequência dificulta o relacionamento desta com a
sociedade origina complexo de inferioridade, tendo visto que em havendo dano
estético, como já dito anteriormente, há agressão a incolumidade física onde a
aparência do lesado fora modificada para pior. Motivo que o faz sofrer
63duplamente, pela estética e pela moral. Daí, impõem-se uma indenização
também dupla, indenizando-se a título de dano estético a dor, a situação
vexatória, a humilhação decorrente da deformidade física, do aleijão. Faz-se
imprescindível o estudo das possibilidades de aplicação das verbas
indenizatórias, como sejam o dano moral e o dano estético, decorrentes do
dano lato sensu, sendo que sua reparação deve ser a mais ampla possível,
afim de que a parte prejudicada retorne a situação anterior ao fato danoso,
devendo a pessoa ser indenizada totalmente pelo prejuízo sofrido. Atentando-
se que, quanto aos danos morais deve-se buscar a compensação dos seus
efeitos, face á impossibilidade de retornar-se ao status quo ante.
No tangente ao momento tido com mais adequado para realizar-se a
avaliação de um dano estético, segundo o entendimento de Teresa Ancona
Lopes, no caso de tal dano pensa-se que a solução mais equitativa seria a
apreciação do mesmo o mais tarde possível e de preferência no momento do
julgamento, tendo ainda o juiz que considerar a possibilidade de mudanças
futuras, como por exemplo, o fato de serem atenuadas as lesões. Daí, a
mesma supõe em sua obra que uma determinada pessoa tenha sofrido uma
série de ferimentos no rosto em consequência de um tratamento de pele que
fizera. Se tal pessoa propuser uma ação de indenização de modo imediato,
alegando não só os danos morais por ela sofridos, mas também os estéticos,
poderá cometer uma injustiça com aquele que foi o autor do prejuízo, visto que
tais feridas podem cicatrizar perfeitamente, não deixando sinal algum. Assim,
caso já tenha recebido a indenização, terá tido um enriquecimento sem causa.
Porém, possível é requerer danos morais pelo padecimento que sofreu durante
o período em que as lesões perduraram. Contudo, se na época do julgamento
tivesse feito a vítima, por sua conta, tratamento ou cirurgia que lhe tivessem
melhorado a aparência, ou mesmo eliminado a lesão sofrida, o réu somente
deveria ser condenado a ressarcir os gastos que teve a pessoa lesada com a
cura e, caso houvesse restado alguma lesão permanente, deveria também o
réu ser condenado pelo ocorrido, além de eventual dano moral (TERESA
ANCONA LOPEZ, pp. 77 – 78).
64
5.4 – Contrato de seguro dos médicos
Entende-se por contrato de seguro, segundo o que afirma Orlando
Soares, aquele pelo qual uma das partes obriga-se para com a outra mediante
a paga de um prêmio a indenizá-lo em caso de prejuízo resultante de riscos
futuros, previstos no contrato. O Código Civil, em seus artigos 757 a 802 trata
da questão em análise.
Tal seguro pode ser individual; mútuo; profissional; de vida; sobre bens
(sendo estes móveis ou imóveis); marítimo e etc.
O seguro do qual tratamos possui natureza profissional visando
cobertura de riscos decorrentes da atividade médica no tangente à
Responsabilidade Civil, ressarcindo totalmente a vítima dos prejuízos causados
pelo ato ilícito do profissional de medicina ao favorecê-la.
Importante se faz destacar que o seguro feito pelo profissional de
medicina, poderá vir a reduzir, no mínimo, o risco que corre o causador do
dano de empobrecer e aumentar, ao máximo, as possibilidades de
ressarcimento da vítima no tocante ao prejuízo sofrido, restabelecendo o
equilíbrio alterado pelo evento danoso entre as partes da relação jurídica.
Em se tratando dos profissionais que atuam na área de saúde no Brasil,
estes fazem uso do “Termo de Consentimento Informado” como instrumento
que visa resguardá-los.
5.5 – Consórcio para plástica
Sabe-se, de acordo com informações cedidas pela Revista Cláudia de
Junho de 2009 que desde fevereiro vigora uma lei que permite que serviços
sejam oferecidos por meio de consórcios. As empresas da área, então, se
programaram para inclusão da cirurgia plástica nesse sistema. Assim, grupos
de interessados pagariam parcelas mensais e, a cada 30 dias, um paciente
seria sorteado e levaria a carta de crédito ao médico ou hospital. Tal novidade
tem sido motivo de muita polêmica, pois não responde muitas questões como,
por exemplo, quem ficaria responsável pelo pagamento da conta da UTI, visto
65que o consórcio apenas visa cobrir a cirurgia. De acordo com o posicionamento
de José Tariki, presidente da SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica),
os especialistas tendem a não aceitar a carta, uma vez que o Conselho Federal
de Medicina ainda não deu um parecer a respeito, pois encontra-se analisando
a lei para verificar se esta fere o Código Médico, segundo o qual não pode
haver intermediadores entre médico e paciente (Revista Cláudia, junho de
2009, p. 142).
66
CONCLUSÃO
Diante do que foi exposto pode-se salientar que nos tempos atuais,
diante do “culto ao belo”, um número crescente de pessoas passou a almejar a
possibilidade de realização de uma cirurgia plástica visando, na maioria das
vezes uma melhor aceitação pessoal, motivo pelo qual um erro médico e os
danos dele decorrentes causam aquele que se viu lesado graves sequelas.
Dessa forma, os operadores de Direito que se confrontam com um
dano surgido por consequência de um erro médico decorrente de uma cirurgia
plástica mal sucedida, devem levar em consideração as singularidades
referentes a matéria analisada em tela.
Cabível se faz salientar que a cada dia tem aumentado o número de
ações judiciais fundadas no assunto em questão que buscam lograr êxito na
reparação dos danos causados a pacientes por culpa dos profissionais de
medicina que, na maioria das vezes não possuem, sequer, qualificação para
fazê-lo.
Isto posto, tendo realizado breve análise a respeito do tema, pode-se
constatar que a Responsabilidade Civil decorrente de erro médico em cirurgias
plásticas possui as seguintes características, quais sejam, apresenta feição
peculiar em sua apreciação, tendo-se em vista o subjetivismo que cerca a
noção do que é belo; em se tratando de cirurgia plástica reparadora, não há de
se falar em Responsabilidade Objetiva, mas sim Subjetiva, pois o objeto
contratual, a saúde, é mantido, visto que tal cirurgia implica na melhora desta;
já sendo a cirurgia embelezadora, como o objeto contratual é modificado,
deixando de ser a saúde, a vida, para ser a beleza, o facultativo obriga-se com
o resultado e, portanto, tratar-se-á de Responsabilidade Objetiva caso tal
resultado não seja alcançado.
Importante destacar que segundo levantamento da SBCP (Sociedade
Brasileira de Cirurgia Plástica), 98% dos médicos ligados à entidade adotam as
medidas preventivas, por isso aquele que se encontra na condição de paciente
deve verificar se o profissional escolhido está incluso na lista da Sociedade.
67Podendo também pedir sugestão de nomes a médicos de confiança e ainda
dialogar com pessoas que já tenham sido operadas pelos profissionais
indicados. Além disso, deve o paciente recusar procedimento em consultório,
buscando sempre hospitais ou clínicas que possuam alvará de funcionamento
para procedimentos cirúrgicos emitidos pelos órgãos de vigilância sanitária.
Portanto, é dever daquele que pretende submeter-se a uma cirurgia
plástica informar-se a respeito do profissional com o qual pretende realizá-la,
posto que atualmente muitos são os que o fazem sem o mínimo de preparo,
sem especialização e sem nenhuma obrigação com a Ética Médica, podendo
causar como consequência danos irreversíveis ao paciente.
68
BIBLIOGRAFIA
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71
ÍNDICE FOLHA DE ROSTO........................................................................................02 AGRADECIMENTO........................................................................................03 DEDICATÓRIA...............................................................................................04 RESUMO........................................................................................................05 METODOLOGIA.............................................................................................06 SUMÁRIO.......................................................................................................07 INTRODUÇÃO................................................................................................09
1 – CAPÍTULO I – DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO..............12
1.1– Evolução Histórica................................................................................12
1.2 – Desenvolvimento da Responsabilidade Civil....................................14
2 - CAPÍTULO II – CONCEITO, ESPÉCIES E TEORIAS DA
RESPONSABILIDADE CIVIL....................................................................17
2.1 – Conceito de Responsabilidade Civil...................................................17
2.2 – Da Responsabilidade Penal.................................................................20
2.3 – Responsabilidade Contratual e Extracontratual (Negocial e
extranegocial)...........................................................................................20
2.4 – Responsabilidade Subjetiva (Teoria da Culpa)..................................21
2.5 – Responsabilidade Objetiva (Teoria do Risco)....................................23
722.6 – Teoria da Culpa no tangente ao erro médico.....................................24
2.6.1 – Imperícia...............................................................................................30
2.6.2 – Imprudência..........................................................................................32
2.6.3 – Negligência...........................................................................................32
3 – CAPÍTULO III – A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS MÉDICOS............35
3.1 – A culpa na Responsabilidade Civil dos médicos................................35
3.2 – Dos danos ocasionados pelos facultativos.........................................37
3.3 – Do dano estético.....................................................................................38
3.3.1 – Do dano estético contratual ou delitual..................................................38
3.3.2 – Do aleijão (deformidade física permanente)..........................................39
3.3.3 – Do dano estético como lesão corporal grave permanente....................41
3.4 – Do direito a personalidade e a integridade física................................42
3.5 – Dano moral..............................................................................................43
4 – CAPÍTULO IV – DA NATUREZA CONTRATUAL, EXTRACONTRATUAL E
A OBRIGAÇÃO DE RESULTADO NAS CIRURGIAS ESTÉTICAS................44
4.1 – Das cirurgias estéticas..........................................................................44
4.2 – Relação médico – paciente e sua natureza contratual.......................48
4.3 – Relação médico – paciente e sua natureza extracontratual..............51
4.4 – Da obrigação de meio e da obrigação de resultado...........................52
4.5 – Da cirurgia plástica reparadora X embelezadora................................54
5 – CAPÍTULO V – DA INDENIZAÇÃO, LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE
INDENIZAR O DANO MORAL E O DANO ESTÉTICO...................................56
5.1 – Reparação do dano estético.................................................................56
5.2 – Liquidação da obrigação de indenizar.................................................58
735.3 – Cumulação do dano estético com o dano moral................................60
5.4 – Contrato de seguro dos médicos.........................................................64
5.5 – Consórcio para plástica........................................................................64
CONCLUSÃO..................................................................................................66
BIBLIOGRAFIA...............................................................................................68
ANEXOS.........................................................................................................74
ANEXO I -
Jurisprudências...............................................................................................75
ANEXO II -
Matérias..........................................................................................................78
ANEXO III –
Entrevista......................................................................................................107
FOLHA DE AVALIAÇÃO..............................................................................109
74
ANEXOS
75ANEXO I
JURISPRUDÊNCIAS
2008.002.28536 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 2ª Ementa DES. ADEMIR PIMENTEL - Julgamento: 17/12/2008 – DECIMA TERCEIRA CAMARA
CIVEL
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA.
ENTIDADE FILANTRÓPICA. SITUAÇÃO PATRIMONIAL QUE NÃO DEMONSTRA
SUA HIPOSSUFICIÊNCIA. GRATUIDADE NEGADA. PRECEDENTES DOS
COLENDOS TRIBUNAIS SUPERIORES. ERRO MÉDICO. IMPOSSIBILIDADE DE
DENUNCIAÇÃO DA LIDE AO MÉDICO QUE REALIZOU A CIRURGIA. RELAÇÃO
DE CONSUMO RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL. RECURSO AO
QUAL SE NEGOU SEGUIMENTO COM BASE NO ART. 557 DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. IMPROVIMENTO. I - Mesmo em se
tratando de entidade filantrópica a gratuidade de justiça pode ser indeferida pelo juiz
se este constatar diante dos documentos constantes dos autos que a situação social,
profissional ou patrimonial do requerente é incompatível com o benefício pleiteado; II -
Embora a associação, ora agravante seja uma entidade beneficente a situação
patrimonial demonstrada pela declaração de rendimentos acostada aos autos não lhe
permite auferir os benefícios da Lei 1.060/50; III - Impossível a denunciação da lide ao
médico que realizou a cirurgia na ação em que se pleiteia indenização por suposto
erro médico. A responsabilidade do profissional depende da demonstração de
culpa, o que não ocorre na relação paciente-hospital, na qual a
responsabilidade é objetiva, com base no CDC; IV - Recurso ao qual se negou
seguimento com amparo no art. 557, do Código de Processo Civil, decisão que se
confirma.
2005.001.01734 – APELAÇAO – 2ª Ementa
DES. OTAVIO RODRIGUES - Julgamento: 03/12/2008 - DECIMA PRIMEIRA
CAMARA CIVEL
76
Ação de Responsabilidade Civil c/c Dano Moral e Material pelo procedimento comum
ordinário. Pedido de indenização por danos morais. Erro médico, agravando o
quadro e levando paciente a óbito. Sentença julgando improcedente o pedido.
Recursos de Apelação Cível. R E F O R M A P A R C I A L, pois a prova pericial
médica determinada pela Câmara apontou a falha no atendimento. Dano Moral
fixado em R$ 100.000,00. P R O V I M E N T O P A R C I A L D O R E C U R S O.
2008.001.56224 – APELACAO – 1ª Ementa
JDS. DES. MYRIAM MEDEIROS - Julgamento: 18/11/2008 - PRIMEIRA CAMARA
CIVEL
DIREITO DO CONSUMIDOR. CIRURGIA PLÁSTICA. ERRO MÉDICO. INCIDÊNCIA
DO DIPSOSTO NOS ARTIGOS 14, § 4º C/C 6º, VI E VIII DO CODECON.
OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. DANOS MATERIAIS INCOMPROVADOS. DANOS
MORAIS QUE SE RECONHECE ANTE A SUBMISSÃO DA PACIENTE A CINCO
CIRURGIAS COM A FINALIDADE DE ASSEGURAR A FUNCIONALIDADE DO
NARIZ, SENDO QUE O RESULTADO FINAL, NÃO ATINGIU A HARMONIA QUE,
NO CASO, ERA RAZOÁVEL ESPERAR. O RESULTADO QUE SE BUSCA NA
CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA, ALÉM DO EMBELEZAMENTO QUE SE ATINGE
PELO EMPREGO DA BOA TECNICA À HARMONIZAÇÃO DAS FEIÇOES OU
CONTORNO CORPORAL, DEVE ATENDER IGUALMENTE Á PRESERVAÇÃO DA
FUNCIONALIDADE. SUCUMBÊNCIA RECIPROCA REGULADA PELO ARTIGO 21
DO CPC. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
2007.001.67829 – APELACAO – 1ª Ementa
DES. JOSE C. FIGUEIREDO - Julgamento: 30/01/2008 - DECIMA PRIMEIRA
CAMARA CIVEL
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MATERIAL, MORAL E
ESTÉTICO. CIRURGIA PLÁSTICA. ALEGAÇÃO DE ERRO MÉDICO. SENTENÇA
DE IMPROCEDÊNCIA. Consumidora que realiza cirurgia, mediante procedimento de
77
abdominoplastia, restando insatisfeita com o resultado. Como sabido e consabido, a
cirurgia plástica é obrigação de resultado. Todavia, o procedimento em foco pode
apresentar certas variações, ou seja, resultados variados de um paciente para outro.
Inexistência de prova da inadequação do serviço que, inclusive, foi realizado dentro
da melhor técnica disponível. O resultado que veio a decepcionar à Autora
decorreu de sua própria conduta, ou seja, do seu ganho de peso em momento
pós-cirúrgico. RECURSO IMPROVIDO
78
ANEXO II
MATÉRIAS
Neri Tadeu Camara Souza Advogado e Médico Autor do livro: Responsabilidade civil e penal do médico– 2003 – LZN Editora – Campinas – SP. Inserido em 20/12/2005 Parte integrante da Edição no 157 Código da publicação: 983
Indenização por erro em cirurgia plástica Texto extraído do Jus Navigandihttp://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=51
Trata-se de ação por danos morais proposta em face de cirurgião plástico que sequer possuía habilitação para o procedimento,ocasionando, portanto, sérios danos à paciente.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA _ VARA CÍVEL DA COMARCA DE CURITIBA/PARANÁ
"Para que tenha origem a responsabilidade médico-hospitalar – enfatiza
Costales – deve existir um dano ao paciente, de qualquer tipo ou espécie: lesão a um direito (à vida, à integridade física, à saúde), lesão de um interesse
legítimo, danos patrimoniais ou danos morais." (Miguel Kfouri Neto – Resp. Civil do Médico, pg. 92 Edit. Revista dos Tribunais).
XXXXXXXXXXXXX, ...., neste ato representada por seu procurador adiante assinado, Dr......................................., vem respeitosamente perante Vossa excelência propor a presente
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
em face dos direitos materiais violados por F.A., brasileiro, médico
inscrito no CRM/PR sob o nº ..., estabelecido à rua ..., pelas razões de fato e direito a seguir expostas:
79
I –––– DESCRIÇÃO FÁTICA
A autora é pessoa de idade levemente avançada e em virtude disso fora adquirindo algumas rugas em sua face e leve flacidez cervical, as quais lhe causavam grande incômodo, na medida em que prejudicavam sua aparência.
Como o ser humano é muito vaidoso, e a mulher mais ainda, a autora sempre visou de corrigir tais defeitos através de cirurgia plástica reparadora, porém jamais lhe fora economicamente possível realizar o tão desejado sonho, pois uma cirurgia desta natureza tem um custo bastante elevado, tornando-se difícil para uma viúva desempregada que vive de uma insignificante pensão de seu ex-marido, conforme se evidencia com os comprovantes anexos.
Porém, no início do ano de 1999 recebeu uma pequena ajuda de alguns familiares, decidindo que aplicaria aquele valor numa cirurgia reparadora. Procurou então algumas clínicas de tratamento e encontrou o consultório do réu através de divulgações do mesmo. Deslocou-se até lá e foi informada que o réu era especialista em cirurgia plástica e que todo o tratamento, desde a cirurgia até a recuperação, seria muito rápido e simples.
A clínica denomina-se "...".
Após realizar uma consulta para orçamento, resolveu realizar o tão esperado tratamento. O valor acordado para a cirurgia e acompanhamento até recuperação total fora de R$1.200,00, mais medicamentos, os quais não deveriam ultrapassar a cifra de R$200,00.
Apreensiva com o resultado, agendou imediatamente a cirurgia, quando submetida ao procedimento denominado "Minilifting", em data de 10.03.99 sob a administração de anestesia local no próprio consultório do réu.
Realizada a cirurgia, deslocou-se até sua residência a fim de recuperar-se, tomando todos os medicamentos que lhe foram receitados, além de atender a todas as orientações médicas quanto ao repouso, temendo qualquer complicação. Já no dia seguinte retornou ao consultório a fim de realizar os curativos de rotina, questionando seu médico acerca das fortes dores que vinha sentindo. O réu então, esclareceu que tais sintomas nada mais eram do que normais para o quadro da paciente.
Retornou à sua casa, porém começou a ficar preocupada pois, além das dores terem aumentado, passou a sentir insuportável mal cheiro, apesar de todos os remédios que vinha tomando. Como é leiga no assunto e não possui qualquer conhecimento em medicina, julgou por bem aguardar o final do tratamento, continuando com os remédios indicados e adquirindo outros que eram receitados, seguindo à risca todas as orientações daquele profissional da medicina, pois, apesar de tudo, confiava nos serviços do médico contratado,
80uma vez que o mesmo se denominava ESPECIALISTA.
Infelizmente as dores não pararam e o mal cheiro aumentou gradativamente. Deslocava-se diariamente ao consultório do seu médico, onde permaneceu em tratamento por mais de 15 dias, como pode ser verificado na cópia de relatório fornecido pelo réu após solicitação perante o Conselho
Regional de Medicina. Após o 03º/04º dia de tratamento, já não podia mais ir de ônibus até a clínica, sendo compelida a tomar táxi todas as vezes devido ao desagradável mal cheiro que a acompanhava, aparentando aspecto de apodrecimento da pele. Além disso, a cada curativo a dor era intensa pois a anestesia não fazia qualquer resultado em virtude da putrefação já existente do tecido cabeludo.
Foi informada então que havia adquirido uma infecção. Em suas anotações o médico coloca a seguinte informação: "...questionada paciente relatou que não usou Amoxil, achou que não precisava...". O profissional passou a relatar tais fatos quando percebeu que havia cometido sério erro no tratamento de sua paciente e, sabendo que seria responsabilizado, direcionou seus argumentos no sentido de voltar para a autora a responsabilidade pelo fracasso na cirurgia. Por tal motivo, referidas anotações merecem total impugnação uma vez que a paciente usou todos os medicamentos receitados, mesmo os mais caros, pois sempre visou melhorar sua aparência.
Não bastasse, relatou ainda na anotação de 31.03.99 que "...novamente perguntado do uso do antibiótico, usou uma caixa achou o suficiente paciente advertida da necessidade do uso do antibiótico..." novamente no intuito de repassar à paciente toda a responsabilidade do tratamento. Porém, por infelicidade do réu, tais fatos jamais ocorreram. A autora adquiriu e usou todos os medicamentos, sem exceção, pois sempre esteve ciente das suas responsabilidades para o bom resultado do tratamento.
No último dia em que esteve no consultório do réu (quarenta dias após a realização da cirurgia), nervosa, insatisfeita e desanimada com o tratamento, exigiu que o requerido lhe devolvesse tudo o que fora pago até então, inclusive as despesas com medicamentos.
O réu, ciente que havia cometido um grande equivoco na cirurgia da autora, diante de sua negligência e também por temer que houvesse qualquer representação perante o órgão de classe questionando sua especialidade, assumiu o erro e reembolsou todas as despesas à paciente, sendo aproximadamente R$750,00 com medicamentos e R$1.200,00 com a cirurgia propriamente dita, quando devolveu todos os cheques pré-datados antecipadamente fornecidos ao profissional.
O próprio médico reconhece tais fatos quando traça os seguintes comentários em suas anotações na data de 20.04.1999: "Curativo. Tem que refazer o corte do dia 19.04.99 acertamos a devolução do dinheiro que
81pagou a cirurgia mais o que gastou com medicação, etc..." (grifo nosso).
No mesmo dia a autora procurou outro profissional, desta vez a Dra. Sandra M. P. Pianowski, a qual interviu rapidamente no sentido de evitar que o quadro da paciente se agravasse, quando então encontrou "...ferida com bastante secreção purulenta, tecidos desvitalizados, tábua óssea exposta na região temporal direita.", iniciando "...antibioticoterapia adequada e debridamento cirúrgico sob anestesia."(1). Após, e SOMENTE após isso, é que a autora iniciou processo de cicatrização aparentando melhora em seu quadro. Porém, devido ao estado em que se encontrava, permaneceu com cicatrizes na região, desconfigurando totalmente sua aparência. Tais cicatrizes, infelizmente, permanecem até a presente data.
Como bem relata seu procedimento, a Dra. Sandra resume em sua conclusão que a paciente “...ficou com uma seqüela de uma cicatriz inestetica e alopecia na região."
II - DOS DIREITOS DA AUTORA
Para que ocorra a responsabilidade médica, segundo Hélio Gomes, fazem-se necessários alguns elementos. Mais especificamente 05 elementos a saber: O AGENTE (que é o médico); O ATO PROFISSIONAL (ocorrido no exercício da profissão); A CULPA (imperícia, imprudência ou negligência); O DANO (que pode abranger desde o agravamento da doença, uma lesão ou até a morte) e; NEXO CAUSAL (ação ou omissão do médico que causou o dano).
Todos esses elementos se fazem presentes na cirurgia realizada pelo réu e que veio a trazer enormes prejuízos à autora, principalmente de ordem moral. Antigamente ela sofria com a existência de rugas em sua pele, as quais lhe causavam algum desconforto; atualmente, sofre com as cicatrizes aparentes e irreversíveis que a constrangem a ponto de evitar sair de casa ou aparecer em público.
III - DA QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO RÉU
Ocorre que o réu é formado em medicina e possui habilitação para realização de cirurgia geral, não possuindo qualquer autorização do Conselho Regional de Medicina, conforme documentação anexa, nem mesmo qualquer outra credencial da Associação Brasileira de Cirurgia Plástica, que o autorize a adentrar na especialidade de Cirurgião Plástico.
Não obstante, realiza freqüentemente cirurgias semelhantes à realizada na autora, uma vez que a área é bastante promissora. Além do mais, intitula-se médico especializado em COSMIATRIA, ou seja, especialidade médica que
82cuida da parte estética, sendo que até seu consultório chama-se CONSULTÓRIO DE MEDICINA ESTÉTICA DO PARANÁ.
A tendência atual é de que aumentará muito a procura por cirurgias plásticas, principalmente em mulheres, as quais se sobressaem aos homens quando se trata de cuidados com o corpo, o que trará significativo retorno pecuniário ao profissional da área. E foi este retorno financeiro que estimulou o réu a trabalhar na área, mesmo sem habilitação, julgando-se conhecedor de toda a ciência médica que envolve esta especialidade. No entanto, sem a devida especialização o profissional corre o inevitável risco de adotar práticas inadequadas com o tratamento, prejudicando os seus pacientes, como ocorreu no caso em tela.
Desta forma, justifica-se os motivos dos erros cometidos na paciente em comento, pois o réu sequer possui habilitação para as práticas que vem desempenhando em seus pacientes, não apresentando qualquer registro de que tenha feito especialização ou pós-graduação na área.
Assim sendo, seus pacientes correm o sério risco de serem verdadeiras COBAIAS HUMANAS, quando por ocasião das cirurgias realizadas ficam à mercê de um profissional sem qualquer habilitação que talvez as esteja usando para aperfeiçoar-se e desenvolver seus conhecimentos, além da busca desenfreada por retorno financeiro.
A ilustre doutrinadora Hildegard Taggesell Giostri (2) teceu o seguinte
comentário ao transcrever a apelação cível de nº 110.111-3 da 04ª C.C. cujo relator fora o Juiz Mercêdo Moreira, do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, inRT 629 p. 149-51:
"Errou o médico quando adentrou em área que não era sua, pois não era portador de certificado que o habilitasse a trabalhar em cirurgia plástica, especialidade que demanda longo curso de pós-graduação, sem o que não estará o profissional habilitado a exercê-la. Nítido caso de imperícia: exercício daquilo para o qual não está habilitado. Serviu-se de técnica inadequada e ultrapassada, segundo o perito, razão do resultado negativo."
(grifo difere do original)
Um, médico especialista em cirurgia Plástica e membro do Colégio Brasileiro dos Cirurgiões, faz os seguintes esclarecimentos sobre a especialidade em comento, alertando os pacientes, em matéria veiculada pelo jornal Indústria & Comércio, encarte "Saúde", número 03 de 23 de fevereiro de 2000, conforme abaixo:
"O cirurgião plástico deve ter alguns requisitos básicos de formação: formação acadêmica de medicina; registro da especialidade no CRM do Estado em que está atuando; residência médica de cirurgia geral (mínimo de três anos); residência médica em cirurgia plástica (mínimo de três anos); título de
83especialista pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica; cursos de atualização e participações em eventos científicos.(...)" (grifo nosso)
Esclareça-se a este D. Juízo que o réu não possui especialização em cirurgia plástica perante o CRM, senão vejamos relatório de especialistas adquirido via "internet" através do "site" do CRM-PR (www.crmpr.org.br), não realizou residência médica na especialidade em que exerce suas atividades profissionais, nem mesmo possui registros perante a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
O princípio Constitucional do livre exercício profissional não contempla a liberdade absoluta, nem é uma garantia para que qualquer pessoa possa entregar-se livremente a sua atividade, mas o direito de exercê-la desde que legalmente habilitado, observando as prerrogativas e limites. Exige de quem a exerce, autorização do poder público, idoneidade e competência, sujeito a fiscalização do Estado, pois mesmo em caráter privado, há interesses individuais indisponíveis e coletivos que necessitam amparo e proteção.
Toda lei na criação de requisitos para o exercício da profissão há de se ater exclusivamente às qualificações profissionais. A lide em sua essência trata-se, portanto, de um problema de capacitação técnica, científica e moral que o médico deve possuir para prestar seus serviços e promover seus anúncios publicitários investidos de legalidade.
A medicina por ser uma profissão que, de maneira alguma, pode ser exercida sem o cumprimento das exigências legais e regulamentares, constitui-se em prática criminosa o exercício sem preencher as condições a que por lei está subordinado seu ofício.
Cabe salientar Excelência, que para configurar-se o crime, basta apenas o perigo, não exigindo a lei que venham a consumar-se quaisquer lesão ou malefício, sendo necessária unicamente a possibilidade de dano.
Colaciona o mestre Damásio E. de Jesus, em sua obra "Direito Penal", que:
"Não basta ao médico, dentista ou farmacêutico a habilitação profissional, sendo necessário registro do título, diploma ou licença, ou seja, a
habilitação legal."(JESUS, Damásio Evangelista, "Direito Penal", vol. 3 – Parte Especial, 5a ed., Ed. Saraiva, 1988, São Paulo)
Conforme os fatos narrados, o requerido ao praticar irregularmente a medicina excede os limites do exercício da profissão, objetivando na maioria dos casos o lucro, configurando um crime próprio de perigo, tipificado no Código Penal Brasileiro, artigo 282, segunda parte e parágrafo único.
"A antijuridicidade, em relação ao crime do art. 282 do CP – exercício
84
ilegal da medicina – caracteriza-se quando o agente transpõe os limites da profissão médica para qual está habilitado, isto é, quando transgride os limites estabelecidos na lei, nas normas regulamentares e na utilização de métodos e
práticas não condenadas "(TACRIM-SP – RO 493.581-1 – Rel. Celso Limongi –RT 628/333 e RJDTACRIM 4/204)
Por todos estes motivos, evidente a culpa do réu quando desempenha uma função para a qual não possui habilitação ou autorização dos órgãos fiscalizadores competentes.
Todavia, mesmo que possuísse todos os requisitos para desempenhar adequadamente suas atividades, agiu com culpa quando, negligentemente, deixou de adotar os cuidados necessários para o tratamento da paciente, sobrevindo-lhe as amargas consequências e as tão dolorosas e irreversíveis seqüelas, presentes até hoje.
IV - Da Ética Médica
Por ser uma profissão a serviço da saúde humana e da coletividade, a medicina está revestida de normas éticas que devem ser seguidas pelos médicos no exercício de suas funções, independente de suas especialidades ou o cargo que ocupe, com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade.
Todo médico deve ter por objetivo guardar absoluto respeito pela vida, atuando sempre em benefício do paciente, considerando-se inadmissível a conduta do requerido ao utilizar de seus conhecimentos para causar o sofrimento moral e físico, não controlando os riscos inerentes de suas atividades, atribuindo seu insucesso a terceiros e a circunstâncias ocasionais.
Institui o Código de Ética Médica, em seu artigo 14 que:
"o médico deve empenhar-se para melhorar as condições de saúde e os padrões dos serviços médicos e assumir sua parcela de responsabilidade em relação à saúde pública, à educação sanitária e à legislação referente à saúde."
V - Da Responsabilidade Civil
"Domina, na esfera doutrinária, a tese de que o profissional liberal é aquele que exerce seu ofício com independência, sem qualquer vinculação hierárquica, caracterizando-se seu trabalho por sua natureza preponderantemente intelectual ou técnica."(SAAD, Eduardo Gabriel, "Comentários ao Código de Defesa do Consumidor", 3a ed., Editora LTr, São
85Paulo, 1998)
Na condição de profissional liberal, o requerido no exercício de suas atividades buscou somente obter vantagens pecuniárias, colocando em detrimento o bem estar de sua paciente, que movida pela boa-fé contratou seus serviços.
"Há um salutar princípio jurídico geral que, objetivando resguardar os interesses, os direitos e as obrigações do homem no seio da sociedade, estabelece a todo indivíduo mentalmente sadio e capaz a obrigação de responder por prejuízos cometidos a outrem, por meio do dolo ou da atuação negligente, imperita ou imprudente, obrigação esta que será calculada, sob a perspectiva civilista, exclusivamente sobre a extensão do dano e não pelo grau de culpa, seja ela grave, seja leve ou mesmo levíssima." (CROCE, Delton e JÚNIOR, Delton Croce, "Erro Médico", 1a ed., Editora Oliveira Mendes, São Paulo, 1997)
Consoante o disposto do artigo 14, § 4o, do Código de Defesa de Consumidor, "a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa"
No que tange às cirurgias estéticas, a responsabilidade do médico depende apenas da demonstração de que ele não atingiu o resultado a que se propôs, ou além disso ainda deixou o cliente com um aspecto pior do que quando entrou para a sala de cirurgia.
Pelo Código Civil, artigos 1.518, e 1.538 a 1.545, a verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade, regulam-se nas seguintes condições:
"Art. 1518. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado, e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação.
Art. 1538. No caso de ferimento ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de lhe pagar a importância da multa no grau médio da pena criminal correspondente.
§ 1º. Esta soma será duplicada, se do ferimento resultar aleijão ou deformidade.
§ 2º. Se o ofendido, aleijado ou deformado, for mulher solteira ou viúva, ainda capaz de casar, a indenização consistirá em dotá-la, segundo as posses do ofensor, as circunstâncias do ofendido e a gravidade do defeito.
Art. 1545. Os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas são obrigados a satisfazer o dano, sempre que da imprudência, negligência, ou
86imperícia em atos profissionais, resultar morte, inabilitação de servir, ou ferimento.
Não sendo a obrigação do cirurgião plástico de meio, mas de resultado, nos moldes jurídicos tradicionais, é preciso reconhecer que o réu inadimpliu a avença, já que o pretendido embelezamento não foi alcançado, como provam as fotografias acostadas nos autos, não existindo caso extintivo da obrigação de resultado (caso fortuito ou força maior).
Ocorre que a técnica operatória utilizada pelo réu falhou, talvez pela falta de exames mais aprofundados no tecido epitelial de sua paciente e de suas possibilidades e grau de deformação, talvez pelo desconhecimento aprofundado da área, talvez pela utilização de métodos incorretos ou desaconselhados, os quais causaram todo o problema à autora.
"Além de corrigir os diversos graus de ptose e de hipertrofia, a conduta operatória deve também estar atenta para cicatrizes mínimas e discretas, resultados mais duráveis, adequação da forma às expectativas, mínimo de complicações e, enfim, preservação das funções de sensibilidade e de possível lactação futura."(CROCE, Delton e JÚNIOR, Delton Croce, "Erro Médico", 1a ed., Editora Oliveira Mendes, São Paulo, 1997)
Em suma, tendo a paciente se submetido a uma cirurgia plástica de obrigação de resultado, pode-se opinar pela responsabilidade objetiva do cirurgião, vez que as expectativas por ela almejada não foram alcançadas. Pior ainda, ficou ela com seqüelas desagradáveis, decorrentes da malsucedida operação, além de todo o constrangimento e a dor sofridas durante o tratamento. Nesse linha de raciocínio, cabe a indenização devida.
VI - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O réu presta serviço na área de saúde, restando perfeitamente incluído no rol dos prestadores de serviços do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a autora é a destinatária final dos serviços prestados. Mesmo porque veio atraída por divulgações diversas e anúncios chamativos. Desta forma, incide aqui o art. 14 da Lei 8.078/90 o qual contém o seguinte teor:
"O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos."
Além disso, prevê em seu art. 6º, VI o seguinte:
87
"Art. 6ºººº. São direitos básicos do consumidor:
(....);
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos".
VII - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA –––– Art. 6ºººº Lei 8.078/90 ––––Hipossuficiência da autora –––– Qualificação técnica dos réus.
Ocorre que a responsabilidade do cirurgião plástico é objetiva, senão vejamos que foi contratado com o fim exclusivo de melhorar a aparência da autora. Apesar dos contratos médicos atribuírem responsabilidade subjetiva a este profissional da medicina, no caso específico do cirurgião plástico, a responsabilidade é OBJETIVA, eis que é contratado para atingir um resultado previamente esperado. Não se trata neste caso de tentar obter a cura e sim, garantir a aparência esperada, pena de, assim não o fazendo, responder civilmente pelos danos causados, razão pela qual, há que se considerar obrigação de resultado.
Ao passo que na obrigação de meios do médico o objeto do contrato não é a cura, mas a prestação de serviços alicerçados em cuidados conscienciosos, de acordo com os avanços científicos e tecnológicos de sua profissão, onde o profissional não se obriga a restituir a saúde a um paciente, mas tão-somente a agir com toda a diligência para atingir, dentro das possibilidades existentes tal objetivo, na obrigação de resultado, o médico é contratado para um fim específico: embelezar o paciente (no caso do cirurgião plástico).
Cabível, desta forma, a inversão do ônus da prova, tendo em vista o conhecimento técnico científico do profissional bem como a garantia assegurada pela doutrina, a qual atribui ao médico, o ônus de produzir todas as provas necessárias processualmente, diante de sua responsabilidade objetiva, nos casos em que o contrato é de resultados, e não de meios.
Além do mais, o Código de Defesa do Consumidor assegura ao consumidor hipossuficiente a inversão do "onus probandi", como forma de evitar a vantagem que o fornecedor de produtos e serviços possui no mercado de consumo, senão vejamos:
"Art. 6ºººº - São direitos básicos do consumidor:
(...)
88
VIII –––– a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com ainversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação, ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias da experiência."(grifamos)
Vejamos a jurisprudência dominante acerca de matéria semelhante:
200938 –––– DIREITO CIVIL –––– RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO
MÉDICO –––– CIRURGIA PLÁSTICA DE NATUREZA ESTÉTICA –––– OBRIGAÇÃO
MÉDICA DE RESULTADO – A cirurgia plástica de natureza meramente estética objetiva embelezamento. Em tal hipótese o contrato médico-paciente é de resultado, não de meios. A prestação do serviço médico há que corresponder ao resultado buscado pelo paciente e assumido pelo profissional da medicina. Em sendo negativo esse resultado ocorre presunção de culpa do profissional. Presunção só afastada a prova inequívoca caso tenha agido observando estritamente os parâmetros científicos exigidos, decorrendo, o dano, de caso fortuito ou força maior, ou outra causa exonerativa o tenha causado, mesmo desvinculada possa ser à própria cirurgia ou posterior tratamento. Forma de indenização correta. Dano moral. Sua correta
mensuração. (TJRS – AC 595068842 – 6ª C. Cív. – Rel. Des. Osvaldo
Stefanello – J. 10.10.1995)(grifamos)
200945 –––– RESPONSABILIDADE CIVIL –––– CIRURGIA PLÁSTICA ––––ONUS PROBANDI –––– OBRIGAÇÃO DE RESULTADO –––– TABAGISMO PÓS
OPERATÓRIO –––– A cirurgia plástica, com fins exclusiva ou preponderantemente estéticos, é cirurgia embelezadora e, por isso, a obrigação não é de meio e sim de resultado. Na hipótese de o resultado ser negativo e oposto ao que foi convencionado, presume-se a culpa profissional do cirurgião, até que ele prove sua não-culpa ou qualquer outra causa exonerativa. Inobstante o fumar no período pós-operatório possa provocar os danos ocorridos, há necessidade do réu provar que o cliente fumou embora contra-indicação médica. Prova suficiente. Responsabilidade civil
reconhecida. (TJRS – AC 591.055.017 – 1ª C. – Rel. Des. Tupinambá M. C. do
Nascimento – J. 05.05.1992) (RJ 184/90)(grifo nosso difere do original)
205158 – RESPONSABILIDADE CIVIL – CIRURGIA PLÁSTICA –OBRIGAÇÃO DE RESULTADO – É de resultado, e não de meio, a obrigação do cirurgião plástico, que realiza mamoplastia da qual resulta flacidez e ptose. Falta de obtenção do resultado, e necessidade de corrigir o estado atual da paciente, através de outra cirurgia, apuradas pela perícia. Dano moral devido.
(TJRS – AC 597004902 – 5ª C. Cív. – Rel. Des. Araken de Assis – J.
8927.02.1997)
200953 – RESPONSABILIDADE CIVIL – Erro médico – Deformação de
seios, decorrente de mamoplastia – Culpa presumida do cirurgião – Cabimento
– Hipótese de cirurgia plástica estética e não reparadora. Obrigação de resultado. Negligência, imprudência e imperícia, ademais, caracterizadas.
(TJSP – AC 233.608-2 – 9ª C. – Rel. Des. Accioli Freire – J. 09. 06.94) (RJTJESP 157/105)
Diante de tais fatos, principalmente da hipossuficiência da autora, requer desde já seja declarada a inversão do ônus da prova, cabendo ao réu o ônus de produzir todas as provas atinentes ao presente processo, pena de vir a ser condenado com a procedência total da ação, na indenização pleiteada.
Isso porque, a verificação da culpa médica possui algumas peculiaridades até mesmo da própria profissão da medicina, as quais tornam difícil a comprovação da culpa, como por exemplo a natureza confidencial das relações médico-paciente, por ser a relação contratual geralmente realizada entre quatro paredes, nada possuindo a vítima que comprove tudo o que fora pactuado, informado, advertido, etc.
Além disso, geralmente existe um silêncio por parte daqueles que presenciaram ou que participaram do ato médico (como colegas de trabalho, funcionários, auxiliares, etc), por haver laços de hierarquia e amizade entre os integrantes de uma equipe que trata de determinado paciente. Quando o paciente tenta demonstrar seu descontentamento, dispõe apenas de algumas receitas na qual foram descritos alguns medicamentos, e ainda assim, com grafia ilegível, típica de médicos.
Não bastasse, existe o aspecto técnico da culpa médica, por se tratar de detalhes no tratamento, na intervenção cirúrgica e em outros procedimentos cujo conhecimento profundo somente os profissionais da área o possuem. Não raras as vezes, até os resultados das perícias técnicas são camuflados como forma de evitar que os julgadores venham a concluir de forma a desfavorecer qualquer profissional da área de saúde, pois nem mesmo o magistrado, com todo o seu conhecimento, consegue se aprofundar em aspectos peculiares da área médica.
Além do mais, nas relações médico/paciente, é normalmente o médico quem dispõe de maior número e de melhores dados sobre o fato, daí o seu dever processual de levá-los ao processo, fazendo a prova da correção do seu comportamento. Tocando ao médico o ônus de provar se agiu ou não com culpa, negligência, imprudência ou imperícia, não se lhe atribui a produção de prova negativa, apenas se exige dele a demonstração de como fez o diagnóstico, de haver empregado conhecimento e técnicas aceitáveis, haver ministrado ou receitado a medicação adequada, haver aplicado o procedimento
90cirúrgico que correspondia em forma adequada, haver controlado devidamente o paciente, etc.
Por tudo isso é que deve ser invertido o ônus da prova nos processos de responsabilidade médica, como forma de tornar a lide equilibrada e assegurar à vítima de erro profissional que realmente venha a ser ressarcida pelos danos sofridos.
VIII - DANOS MATERIAIS
Quanto aos danos materiais, estes em sua maior parte foram reembolsados pelo médico réu quando percebeu o erro que cometera na paciente, talvez até como uma tentativa de amenizar o sofrimento desta. Porém, tal atitude pouco auxiliou, uma vez que a autora teve que se submeter a nova cirurgia, sofrer aplicação de novos medicamentos, de anestesia, permanecer mais tempo em repouso, além de, finalmente, ter permanecido com a cicatriz da primeira cirurgia, eis que a mesma, pelo que se sabe, não poderá ser corrigida. Além disso perdeu muito tempo, gastou dinheiro com deslocamento especial, dentre outros gastos. Porém, uma vez ressarcidos os danos materiais, mesmo sem contra-recibo, não há motivo para sua cobrança.
IX - DANOS MORAIS DEMONSTRAÇÃO DOS DANOS
Já os danos morais, estes não foram nem jamais serão totalmente indenizados, mesmo com o recebimento da indenização ora pleiteada, pois somente a paciente sabe o que sofreu com o tratamento, sendo que esta marca jamais se apagará de sua memória. A dor, o sofrimento o mal cheiro e a ansiedade por uma cura que não vinha, causaram-lhe grande mal, a ponto de sofrer abalos psicológicos de sérios reflexos.
Além disso, já se sentia constrangida com as pequenas rugas que possuía em sua face, imagine agora Excelência, o constrangimento que vem sentindo com as enormes cicatrizes em seu couro cabeludo, cicatrizes estas que impedem inclusive que o cabelo cresça na região.
Por tudo isso, faz jus a autora a uma indenização a título de danos morais no importe de 700 (setecentos) salários mínimos, a fim de amenizar toda a dor resultante das manobras do réu.
Alternativamente, caso Vossa Excelência assim o entenda, requer seja arbitrado outro valor, desde que compatível com todos os danos sofridos pela autora, considerando-se o sério risco de vida que correu, bem como a gravidade da negligência e imprudência do réu, que lhe trouxeram inúmeros constrangimentos, além dos danos irreparáveis à sua aparência, cabendo
91ressaltar que: "Para atribuir quanto vale a integridade moral de outrem no caso de uma indenização, basta questionarmos quanto valeria a nossa integridade moral, caso fossemos a vítima!!!!!"
Assim entendeu o Min. Barros Monteiro no R.E. 8.768-SP, 4ª T.,
publicado no DJ de 06.04.92, nº 122:
"Sobrevindo, em razão de ato ilícito, perturbação nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentimentos e nos afetos de uma pessoa, configura-se o dano moral, passível de indenização."
X - JUSTIÇA GRATUITA
A peticionária é pessoa de baixa renda e, desta forma, não reúne condições de arcar com as despesas processuais da presente demanda sem o prejuízo em seu sustento e o de seus dois filhos. Por este motivo, requer sejam concedidos os benefícios da JUSTIÇA GRATUITA, na forma da lei, eis que a própria peticionária, em declaração, já postula tal benefício.
Assistência Judiciária Gratuita. Pedido. Requisito. Prazo.
"É suficiente a simples afirmação do estado de pobreza para obtenção do benefício da justiça gratuita. O pedido de assistência judiciária pode ser
formulado em qualquer fase do processo." (STJ – Rec. Esp. 174.538 – SP –Rel. Min. Garcia Vieira – J. em 08/09/98 – DJ de 26.10.98).
XI - REQUERIMENTO FINAL
Diante de todo o exposto, requer finalmente a Vossa Excelência:
a. Seja recebida a presente Ação de Indenização por Danos Morais, bem como todas as peças que a instruem;
b. A condenação do réu a indenizar a título de danos morais o importe de 700 (setecentos) salários mínimos. Caso não seja este o entendimento de V.Excia., requer seja arbitrado outro valor desde que compatível com todos os danos sofridos pela autora e a capacidade econômica do lesante, tudo conforme exposto em fundamentação;
c. A inversão do ônus da prova, na forma do art. 6º, VIII do CDC, ficando ao encargo do réu a produção de todas as provas que se fizerem necessárias ao andamento do feito;
d. Realização de perícia técnica para confirmar os fatos narrados na inicial e que ocorreram com a autora;
92e. Honorários advocatícios no importe de 20% sobre o total da
condenação; f. Sejam concedidos os benefícios da JUSTIÇA GRATUITA.
Finalmente, requer a citação do réu nos endereço informado, via oficial de justiça, para que no prazo legal conteste a presente ação de indenização, pena de revelia. Requer ainda seja a presente ação julgada procedente por sentença que condene o réu em face dos pedidos supra, mais despesas processuais e honorários advocatícios na base de 20% sobre o valor da condenação. Requer provar o alegado com documentos, depoimento pessoal do réu, pena de confesso, perícias e oitiva de testemunhas, cujo rol apresentará na forma do art. 407 do CPC.
Confere à causa o valor de R$105.700,00 (Cento e cinco mil e setecentos reais)
Nestes termos pede deferimento
NOTAS
1. Vide relatório médico fornecido pela Dra. Sandra M. P. Pianowski –PIANOWSKI CLÍNICA DE CIRURGIA PLÁSTICA E ONCOLOGIA.
2. Erro Médico à Luz da Jurisprudência Comentada, pg. 179
Sobre o texto: Texto inserido no Jus Navigandi nº 44 Elaborado em 04.2000.
Informações Bibliográficas: Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: Indenização por erro em cirurgia plástica. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=51>. Acesso em: 12 fev. 2009.
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Rio: família de vítima diz que houve erro médico
19 de fevereiro de 2008 • 02h31min. • atualizado às 02h31min.
Família da telefonista Ana Paula Ribeiro Silva, 31 anos, morta dia 14 após se submeter a uma cirurgia plástica na Santa Casa da Misericórdia, no centro do Rio, acredita que a paciente foi vítima de erro médico. Segundo sua mãe, a dona-de-casa Lorinete Ribeiro Silva, 52, Ana Paula deu entrada na unidade na quinta-feira pela manhã para fazer cirurgia de redução de mama, lipoaspiração na barriga e enxerto nas nádegas. À noite, Lorinete recebeu telefonema do médico George Luiz Mahfoud Filho, responsável pela cirurgia, comunicando que Ana Paula não resistira a duas paradas cardíacas.
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"Ele foi muito frio ao dar a notícia de que a minha filha estava morta. Primeiro, falou que deveria ter feito as três cirurgias, mas que teria feito apenas a lipoaspiração e interrompido o procedimento porque Ana Paula passou mal. Estou abalada e inconformada. Minha filha saiu linda e feliz de casa. Ainda deixou uma filha de 7 anos. Acredito que ela poderia ter sido salva se houvesse um CTI na Santa Casa", afirma Lorinete.
Segundo a família, Ana Paula decidiu fazer a cirurgia plástica em dezembro. Por recomendação de amiga, procurou o médico George Luiz, que tem consultório na Barra da Tijuca. Em pouco tempo, Ana Paula deu início aos exames pré-operatórios após acertar o pagamento de R$ 7.250. De acordo com Lorinete, Ana Paula teria pago R$ 3 mil em dinheiro na primeira consulta e acertou o pagamento de mais quatro cheques: três no valor de R$ 1 mil e um no de R$ 1.250. Segundo a família, que registrou queixa na 5ª DP (Gomes Freire), o médico devolveu os quatro cheques, mas não reembolsou o valor pago em dinheiro.
Ana Paula chegou na Santa Casa às 7h30 de quinta-feira. Por volta das 15h, uma amiga da família contou à mãe de Ana Paula que ouvira alguém na Santa Casa dizer que sua filha havia sofrido reação. "Quando ela disse isso, pensei logo que tivesse sido reação alérgica.
Não imaginei que pudesse ser algo tão grave. Mesmo assim, meu genro foi até lá para ver o que estava acontecendo. Lá, não o deixaram ver a minha filha, mas insistiram em dizer que ela estava bem", reclama Lorinete, que pretende entrar na Justiça contra o médico e a Santa Casa, cujo CTI está em obras.
A assessoria da Santa Casa informou que nem o médico George Mahfoud, que fez a cirurgia plástica, nem o médico João Maurício Barreto, responsável pela
9419ª Enfermaria, ontem estava a paciente, foram localizados para falar sobre o assunto.
Outra morte A morte de Ana Paula aconteceu no mesmo dia em que faleceu a funcionária pública Marilda Silva Pinto, 45. Como O Dia noticiou sábado, parentes dela acusam a Santa Casa, onde ela foi submetida a cirurgia plástica de redução de mama, de não tê-la transferido para o CTI de hospital particular a tempo de evitar seu óbito. Segundo a família, entre 9h e 17h, Marilda sofreu pelo menos 12 paradas cardíacas.
O Dia - © Copyright Editora O Dia S.A.
95
Edição 1 739 - 20 de fevereiro de 2002
Geral Medicina
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Índice Seções Brasil
Internacional Geral
A cara diversão de pilotar um carro de Fórmula 1 A roupa como
cultura numa exposição em Nova YorkAs mulheres
ganham mais e ficam com as novas vagasCrescimento
populacional e crime mudam Las VegasA busca por
provas da existência da rainha de SabáComo era a
vida na Europa 3 800 anos atrásMédico é preso
depois da quinta morte de paciente
O médico que matava
Cirurgião plástico é preso em Brasília depois da morte de sua quinta paciente
O médico Denísio Marcelo Caron tem 38 anos, é um homem bem-apessoado, veste ternos da moda, mora num apartamento confortável em Goiânia e ganha cerca de 12.000 reais por mês. Nos últimos dois anos, exerceu a profissão de cirurgião plástico em ritmo febril: fez cerca de 1.000 cirurgias. Na semana passada, em Brasília, Marcelo Caron foi preso por ordem da Justiça Federal. O motivo é assustador: doze horas antes de sua prisão, morrera mais uma de suas pacientes. A vítima foi a fisioterapeuta Grasiela Murta Oliveira, 26 anos. Uma semana depois de se submeter a uma lipoescultura com o doutor Caron, Grasiela foi internada com complicações pós-operatórias, que evoluíram para uma infecção generalizada. Em seguida, entrou em estado de coma e, na quinta-feira, morreu com falência múltipla dos órgãos. Pelo que se tem notícia até agora, Grasiela foi a quinta vítima fatal do bisturi do doutor nos últimos dois anos.
Formado pela Universidade Severino Sombra, no Rio de Janeiro, cujo curso de medicina recebeu notas D, C e C nos últimos Provões do Ministério da Educação, Caron começou a carreira em Campinas, no interior de São Paulo. Entre 1994 e 1996, fez um estágio em cirurgia plástica no Hospital Mário Gatti. Em 1997, tentou obter na Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica o título de especialista no ramo. "O pedido foi recusado por um motivo simples: ele não tinha feito residência médica em cirurgia plástica", lembra Farid Hakme, presidente da entidade na época. Em 2000, com a mudança da diretoria, Caron apresentou novo pedido. Outra vez sem sucesso. Ocorre que, nesse
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mesmo período, devido a um erro monumental, Caron obteve o registro de cirurgião plástico no Conselho Regional de Medicina de Goiás. De lá para cá, passou a atuar como tal em Goiânia. Anunciava seus serviços a preços populares num carro de som. Seu consultório
lotava – e as mortes começaram.
Em 23 de março de 2000, morreu Vera Lúcia Teodoro, 39 anos, depois de uma lipoaspiração no abdome.
Em 14 de janeiro de 2001, faleceu a advogada Janete Figueiredo, 42 anos, após uma lipoescultura.
Em 12 de março de 2001, a vítima foi a oficial de Justiça Flávia Rosa, 23 anos, que fez lipoaspiração.
Em dois anos, o médico realizou cerca de 1 000 cirurgias plásticas com fim estético. Janete, Flávia e Vera Lúcia (no sentido horário) morreram em Goiânia. Adcélia e Grasiela (foto maior) faleceram em Brasília
A sucessão de mortes, aliada às 35 denúncias por erro médico contra Caron, começou a chamar a atenção. E aí se descobriu o erro monumental. No início de 1999, Caron pediu ao CRM de Goiás o registro de cirurgião plástico dizendo que fizera estágio no Hospital Mário Gatti, de Campinas, entre 1994 e 1996. O conselho
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consultou a Comissão Nacional de Residência Médica, órgão vinculado ao Ministério da Educação, para saber se o hospital de Campinas era credenciado. Era. O órgão então deu o registro a Caron. Depois da notícia da terceira morte, o CRM voltou a consultar a Comissão de Residência Médica. Descobriu que, de fato, o hospital de Campinas era reconhecido, mas isso só acontecera em 1999. Ou seja: quando Caron fez o estágio, entre 1994 e 1996, o hospital não era credenciado e, portanto, não habilitara Caron a trabalhar como especialista em plásticas.
No ano passado, já sob investigação, Caron assinou um compromisso com o CRM garantindo que não iria mais clinicar. Violando o acordo, mudou-se para Brasília e montou um consultório na cidade-satélite de Taguatinga. Foram mais duas mortes. Em 29 de janeiro passado, a secretária Adcélia de Souza, 38 anos, foi internada para fazer uma lipoescultura completa nos glúteos, barriga e culote, além de colocar próteses de silicone nos seios. Já nas primeiras intervenções na paciente, Caron fez perfurações profundas nas artérias, causando hemorragias internas. O mais grave é que perfurou a paciente logo abaixo da axila com a caneta da lipoaspiração. O médico atingiu a primeira vértebra de Adcélia e foi rasgando artérias que desembocam no coração. Dois litros de sangue escorreram direto para os pulmões da vítima. A equipe tentou reanimá-la por uma hora e 45 minutos. Adcélia já estava morta. "Mesmo assim levaram minha mulher para a UTI, de onde ela só saiu às 18h45. Segundo o laudo médico do IML, a morte aconteceu às 15h45", conta o companheiro de Adcélia, Marcelo Henrique Fernandez, um paramédico de 30 anos. "Caron fugiu imediatamente do hospital. Nem sequer deu uma satisfação à família", afirma. Na semana passada, foi a vez de a família de Grasiela enfrentar o martírio.
O currículo macabro do doutor Caron revela um pouco do que está acontecendo no campo da cirurgia plástica estética no Brasil, ramo em que o país é recordista mundial. Há 3.500 cirurgiões registrados na Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. O boom desse tipo de cirurgia fez com que muitos médicos se aventurassem pela área sem o título de especialista. Estima-se que cerca de 1.500 profissionais estejam fazendo cirurgias plásticas sem o devido preparo. Num contexto assim, erros são inevitáveis. Em números absolutos, a
98ginecologia e a obstetrícia lideram o ranking das denúncias de erro médico registradas no Conselho Federal de Medicina. Em seguida, vem a cirurgia plástica. "Como esses números são absolutos, certamente as cirurgias plásticas são campeãs de denúncias por erro médico", afirma a doutora Deíla Barbosa Maia, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Direito Médico. No ano passado, as queixas na área de ginecologia e obstetrícia somaram oitenta. Na de cirurgia plástica, 64. Tem-se de levar em conta, porém, que o número de ginecologistas e obstetras é muito
maior que o de cirurgiões plásticos – 22.000 contra 3.500. Ou seja, de cada 1.000 ginecologistas e obstetras, em média quatro foram vítimas de denúncia. Entre cirurgiões plásticos, a proporção é muito mais alta, dezoito por 1.000.
99Erro em cirurgia plástica leva médicos a tribunal. Pela primeira vez no DF, cirurgião e anestesista serão submetidos a júri popular, sob a acusação de provocar a morte de uma paciente. Diego Amorim - Do Correio Braziliense Comentários Publicação: 05/09/2008 08h25min. Atualização: 05/09/2008 08h32min.
A família de Sônia Isis de Andrade esperou 10 anos por esta notícia. Os médicos responsáveis pela cirurgia que matou a mulher de 47 anos em 1998 vão a Júri Popular, ainda sem data marcada. O anestesista e o cirurgião plástico são acusados de realizarem o lifting facial — técnica para rejuvenescimento da pele — sem as condições adequadas. A sentença, de 6 de agosto, é do juiz substituto da Vara do Tribunal do Júri de Brasília, Fábio Francisco Esteves. Será a primeira vez que médicos de Brasília responderão pela morte de paciente, de acordo com o Conselho Regional de Medicina (CRM). Os dois aguardarão o julgamento em liberdade. A tragédia ocorreu no sábado, 3 de janeiro de 1998, no Centro Médico Hospitalar de Brasília (Centromed), uma clínica particular, hoje desativada, no Guará. Sônia havia pago R$ 2 mil pelo serviço. Às 11h30, entrou na sala de cirurgia. Entre 12h e 15h, sofreu uma parada cardiorrespiratória: o anestésico aplicado na veia da paciente não interagiu bem com o medicamento que ela usava para combater a bronquite aguda. A mulher entrou em coma e, dois dias depois, morreu no Hospital Brasília, no Lago Sul, vítima de hipoxia cerebral (falta de oxigênio no cérebro). De acordo com a denúncia do Ministério Público, aceita pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, os médicos sabiam que Sônia tinha bronquite e fazia uso de xaropes. O promotor de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde Diaulas Costa Ribeiro relata que o Centromed não possuía Unidade de Terapia Intensiva (UTI) nem medicação apropriada para reanimar a paciente. Ainda segundo a denúncia, os eletrodos que poderiam ter identificado mais cedo a parada cardiorrespiratória não estavam ligados a Sônia porque o único monitor existente na clínica não funcionava. Quando uma equipe de UTI chegou ao local, já não havia muito o que fazer.
Sandra Andrade comenta a decisão da Justiça de mandar para Júri Popular o caso que resultou na morte de sua irmã Sônia Andrade em 1998. Em trecho da denúncia recebida pelo TJ em abril de 1999, o promotor sustenta que a cirurgia foi realizada “sem que estivessem asseguradas as condições
100mínimas para tanto”. Na sentença em que acata essa tese, o juiz Fábio Esteves diz que há no processo indícios de crime doloso na modalidade dolo eventual (quando não há intenção de matar, mas se assume o risco de fazê-lo). Em sintonia com o discurso do MP, o magistrado alega que os denunciados usaram a clínica no Guará “sem as condições adequadas para a realização da cirurgia”. Absolvição: O Conselho Regional de Medicina analisou o caso em fevereiro de 2002 e decidiu pela absolvição do cirurgião plástico. “Do ponto de vista ético, não ficou comprovado que ele cometeu infração”, justificou o segundo secretário do CRM, Luiz Fernando Salinas. O anestesista Orlando Souza, que na época da cirurgia era diretor técnico e clínico do Centromed, foi punido com uma suspensão de 30 dias. Não era a primeira vez que Orlando figurava como denunciado no CRM. Em 2001, ele havia tido o registro profissional cassado por comandar uma cirurgia como a de Sônia, também em 1998, em que a paciente saiu gravemente lesionada. A cassação só foi confirmada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em 2004. De 2001 a 2004, portanto, o médico exerceu a atividade livremente. Orlando não foi localizado ontem pela reportagem. O cirurgião, que continua a atuar em dois consultórios de Brasília, pediu que o Correio entrasse em contato com o advogado José Gomes, que cuida do caso. Para Gomes, não há no processo elementos que apontem a morte de Sônia como crime doloso. Por isso, ele recorreu da decisão na semana passada. O pedido ainda não foi analisado. “O juiz não leu o processo. Existe uma grande confusão entre as funções do médico anestesista e as do cirurgião plástico”, comentou o advogado.
Levantamento do CRM mostra que o número de sindicâncias instauradas envolvendo cirurgias plásticas tem aumentado nos últimos anos. Em 2004, foram 11. No ano passado, o número pulou para 19. A maioria dos pacientes procura o conselho para reclamar do resultado das intervenções. Dos 25 médicos envolvidos nas denúncias de 2007, 14 não eram especialistas. O problema não se restringe ao DF. Entre 2005 e 2007, o Conselho Federal de Medicina apreciou 24 casos de erros médicos em cirurgias plásticas. “As pessoas têm procurado as clínicas pelo preço e não vêem nem se o local é apropriado. O perigo é que tem muito médico fazendo cirurgia por aí sem conhecimento algum”, alertou o defensor público de Taguatinga André de Moura Soares. Só este ano ele cuidou de dois casos em que pacientes acabaram lesionados por cirurgias malsucedidas.
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Cirurgião plástico é condenado por erro médico
JB Online RIO - O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio, por maioria de votos, condenou, nesta segunda-feira, por erro médico o cirurgião plástico Altamiro da Rocha Oliveira, diretor presidente da Clínica Sant'Anna de Cirurgia Plástica. Ele terá que pagar indenização de R$ 50 mil, por danos morais, à sua ex-paciente Marília de Sá Marques Poliano, que teve a mama deformada após mal sucedida cirurgia plástica, de cunho estético, para esvaziamento da mama e colocação de prótese. O médico também foi condenado a pagar R$ 5 mil por outra operação a que a paciente teve que se submeter; R$ 2 mil pelo uso de motorista, uma vez que a vítima ficou impossibilitada de dirigir; e R$ 30 mil pelos lucros que ela deixou de ganhar, pois não pôde trabalhar durante 15 meses. O médico alegou que os problemas ocorreram porque havia nódulos malignos na mama da paciente, o que foi considerado estranho pela desembargadora Letícia Sardas, que votou favoravelmente à condenação do réu. Segundo ela, a cirurgia foi realizada sem a presença de um oncologista. “Ela foi submetida a cinco cirurgias, um absurdo. Não vai recompor a mama nunca mais”, afirmou a desembargadora, que teve acesso às fotos anexadas ao processo. Letícia Sardas disse também que laudos comprovaram a inexistência de nódulos malignos na mama da paciente em exames realizados em 1993, 1994 e 1995. “Houve negligência sim”, concluiu. Para o desembargador Sergio Cavalieri, também ficou demonstrado que houve erro médico. “Jamais foi ventilado que ela teria câncer, nódulo e, no entanto, houve uma tragédia, algo chocante”, afirmou. O desembargador destacou que se trata de uma relação de consumo e que o médico é um prestador de serviços. “O foco é este: saber se houve ou não defeito na prestação do serviço”, ressaltou o desembargador, lembrando que a defesa foi inábil por não alegar relação de consumo. [18h59min] - 03/11/2008 Outras notícias
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Ex-médico Marcelo Caron é condenado a 30 anos pelas mortes de duas brasilienses
Tribunal do Júri - Julgamentos 08/07/2009
O ex-médico Marcelo Caron foi julgado e condenado a 30 anos de prisão - 29 anos em regime
fechado e um ano em regime aberto - pelas mortes das brasilienses Graziela Murta Oliveira e
Adcélia Martins de Souza. A sentença, lida às 3h desta quarta-feira pelo juiz-substituto Germano
Oliveira Henrique de Holanda, do Tribunal do Júri de Taguatinga, condena Caron a 14 anos e seis
meses em cada uma das mortes.
No caso de Graziela Murta, os seis meses a mais na pena de 14 anos foram pelo agravante de
deixar uma família sem o convívio de uma pessoa ainda jovem. No caso de Adcélia Martins de
Souza, foram por ter deixado três crianças órfãs. O ano em regime aberto foi acrescido pela
prática do exercício ilegal da medicina.
Os advogados responsáveis pela defesa de Marcelo Caron garantem que vão recorrer da sentença.
O ex-médico vai responder ao processo em liberdade, por ter residência fixa e, segundo a Justiça.
não apresentar ameaça à sociedade. O juiz Germano Oliveira não fixou indenização para as
famílias das duas brasilienses, porque ambas já entraram com ações cíveis no Tribunal de Justiça
do DF contra Caron.
A defesa de Caron, durante o julgamento, insistiu que os dois casos não deveriam ser julgados no
mesmo dia e não concordavam com a classificação de homicídio com dolo eventual, que foi o que
prevaleceu. De acordo com a sentença, mesmo não tendo a intenção, "Caron sabia que era muito
provável de acontecer alguma coisa e, mesmo assim, assumiu a responsabilidade de realizar as
cirurgias, além do motivo torpe, que era para obter lucro, mesmo sem ter especialização".
Para o promotor Leonardo Jubé de Moura, "a pena não traz de volta os parentes que estas
pessoas perderam, mas resgata a dignidade das famílias, que esperam há sete anos pela decisão
da Justiça, por conta das manobras da defesa, que tentou adiar o máximo o julgamento". Marcelo
Caron, que saiu pelos fundos do Fórum de Taguatinga, não quis comentar a sentença, bem como
seus advogados.
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A sentença contra Caron foi comemorada pelas famílias das duas vítimas. Para Tereza Murta, mãe
de Graziela Murta, "esta foi apenas uma vitória". "Se fosse possível, queria uma pena maior, mas
só o fato de ser em regime fechado já é melhor e vamos continuar firmes para as próximas
batalhas", disse. Maria Martins de Oliveira, mãe de Adcélia Martins, se disse satisfeita com a pena.
"Mesmo ele tendo direito de recorrer, tenho a certeza de que a justiça divina será feita."
Mortes
Graziela Murta tinha 26 anos em fevereiro de 2002, quando morreu em decorrência de
complicações após uma lipoaspiração e Adcélia Martins de Souza, 39 anos em 29 de janeiro de
2002, quando seu coração parou na mesa de cirurgia, também durante um procedimento de
lipoaspiração. Caron veio para Brasília após se envolver na morte de três mulheres em Goiânia.
Outras 29 o processaram por causa de sequelas graves de operações como a lipoaspiração.
Durante todo o processo entre a acusação apresentada pelo Ministério Público do DF e o
julgamento, o ex-médico tentou de diversas formas adiar o encontro com o júri popular. A última
foi a troca dos seus três advogados, que foram substituído por Ricardo Silva Neves. Neves tentou
ainda hoje que o juiz responsável pelo júri fosse o mesmo da época da instrução do processo e
alegou que os dois casos deveriam ser julgados em separado. Mas nenhum dos pedidos foi aceito
pelo magistrado Germano Oliveira Holanda.
O ex-médico falou com a imprensa em um dos intervalos do julgamento. Negou as manobras para
atrasar a Justiça. "Mudei de advogado por questões financeiras. Não tenho mais condições de
arcar com os custos do processo. Estou acabado financeiramente", garantiu.
Nove testemunhas foram interrogadas durante todo o dia. Diante das perguntas do juiz, do
promotor e do advogado do réu, os fatos que levaram à morte de duas pacientes foram
apresentados aos jurados; quatro mulheres e três homens escolhidos por sorteio. Os primeiros
depoimentos foram os relacionados ao caso de Graziela Murta. "Ela veio para casa no dia seguinte
à operação sentindo muita dor, tendo febre, vomitando. A gente ligava para o médico e ele dizia
que era normal, que era manha dela e que não poderia vir de Goiânia porque estava cuidando do
aras, dos cavalos dele", contou emocionada a mãe da vítima, Teresa Murta.
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A anestesista da cirurgia, Olívia Mota, também depôs e disse que o procedimento ocorreu
normalmente. "A única coisa diferente foi que ele previu que tudo duraria 40 minutos, mas acabou
demorando quatro horas", disse.
O médico Nestor Junior foi o primeiro a falar sobre o caso da servidora da Terracap Adcélia
Martins. O médico disse que foi chamado para ajudar em uma reanimação, no dia em que Adcélia
fez a cirurgia de lipoaspiração e prótese nos seios. “A equipe estava trabalhando nisso há pelo
menos 40 minutos com poucos resultados. Eu coloquei um marca-passo temporário, mas o
sangue dela estava aquoso, não coagulava", contou o médico. O laudo cadavérico da vítima
apontou a perfuração de artérias por uma cânula usada na operação como causa da morte — por
hemorragia interna.
Durante sua defesa, o ex-médico contestou as provas e disse que nunca se recusaria a visitar uma
paciente, como o que foi dito com relação a Graziela. "Nem mandei suspender a medicação dela,
como alega a família. Isso seria uma irresponsabilidade. O caso dela era tão complexo que o
problema só foi descoberto depois de 26 dias de internação", afirmou. Caron disse ao júri que não
quer mais exercer a profissão de médico e que pretende concluir a faculdade de direito que
iniciou, mas interrompeu por falta de dinheiro.
No discurso de acusação, o promotor Leonardo Jubé de Moura, destacou a falta de registro no
prontuário médico dos procedimentos, como a inserção de uma cânula na axila esquerda de
Adcélia, que o médico só confessou que fez depois do depoimento de uma anestesista e que não
constava nos prontuários e também as duas inserções nas coxas de Graziela. A universitária
morreu por infecção decorrente da cirurgia, sendo que o médico foi condenado por omissão no
pós-operatório. A acusação destacou também o uso de documentação falsa pelo médico, para
conseguir o registro de cirurgião plástico.
Condenação
A última condenação de Caron ocorreu em abril deste ano. O Tribunal de Justiça de Goiás o
sentenciou a oito anos de prisão em regime semi-aberto pela morte de Janet Virgínia Novais
Falleiro, em 14 de janeiro de 2001. Também teve de pagar R$ 30 mil à família da vítima. A
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advogada não resistiu a complicações decorrentes de uma lipoescultura.
Caron recebeu condenação anterior na Justiça goiana. Em 2003, pagou R$ 88 mil a Marlene Maria
Alves, uma das 17 pacientes com graves sequelas após se submeter a cirurgia com o ex-médico.
Além das cinco mortes, ele responde a processos por estelionato, desvio de dinheiro público,
formação de quadrilha, furto, uso de documentos falsos e falsificação de documentos públicos e
particulares.
Fonte: Site Correioweb.com.br
Júri de Marcelo Caron entra na fase de debates
Tribunal do Júri - Julgamentos 07/07/2009
No início da noite desta terça-feira, o julgamento do ex-médico Denísio Marcelo Caron entrou na
fase de debates. Ao longo da tarde, o Tribunal do Júri de Taguatinga ouviu cinco testemunhas de
acusação e três de defesa. Em seguida, durante o interrogatório, que durou aproximadamente
duas horas e meia, o réu contestou a denúncia do Ministério Público. Com relação à paciente
Adcélia Martins de Souza, Caron alegou que “A necropsia do Instituto Médico Legal foi conduzida
de modo incorreto, e o laudo apresentou resultado inconclusivo”. O julgamento está previsto para
terminar por volta das três da manhã de quarta-feira.
Júri de Marcelo Caron começa em Taguatinga
Tribunal do Júri - Julgamentos 07/07/2009
Denísio Marcelo Caron começa a ser julgado, na manhã desta terça-feira, pelo Tribunal do Júri de
Taguatinga. O ex-médico foi denunciado pelo Ministério Público por homicídio qualificado, por
motivo torpe (duas vezes), omissão, e pelo exercício ilegal da medicina. O réu está sendo julgado
pela morte de Grasiela Murta Oliveira, 26 anos, e Adcélia Martins de Souza, 39 anos.
O juiz Germano Oliveira Henrique de Holanda sorteou os 7 jurados (4 mulheres e 3 homens). O
Promotor de Justiça, Leonardo Jubé de Moura, e o advogado de defesa do réu interrogam as
primeiras testemunhas de acusação. A previsão é que o julgamento se estenda até a madrugada
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de quarta-feira. Se condenado, Marcelo Caron pode pegar de 12 a 30 anos de prisão.
Tribunal do Júri de Taguatinga julga hoje Marcelo Caron
Tribunal do Júri - Julgamentos 07/07/2009
O Tribunal do Júri de Taguatinga julga hoje, a partir das 9 horas, o ex-médico Denísio Marcelo
Caron, acusado da morte de duas pacientes no Distrito Federal: a universitária Graziela Murta de
Oliveira e a funcionária da Terracap Adcélia Martins de Sousa. Caron ficou conhecido
nacionalmente por ser o responsável pela morte de cinco pacientes submetidas a cirurgias de
lipoaspiração em Goiânia e Brasília. Ele também é apontado como responsável pela deformação de
dezenas de mulheres, todas em consequência de falhas em procedimentos cirúrgicos. O ex-médico
usava diploma falso de especialização em cirurgia plástica.
Segundo o Promotor de Justiça da 2ª Promotoria de Justiça do Tribunal do Júri de Taguatinga,
Leonardo Jubé de Moura, responsável pelo caso, o processo foi marcado por manobras defensivas,
sendo as mais recentes na tentativa de adiar o julgamento. Ainda assim, a expectativa é de que o
acusado, enfim, após anos de espera, responda perante a sociedade pelos dois homicídios e pelo
exercício ilegal da medicina em Taguatinga.
Local: Fórum de Taguatinga - Tribunal do Júri de Taguatinga - Área Especial nº 23 - Setor C Norte
Data: 7 de julho de 2009
Horário: a partir das 9 horas.
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ANEXO III
ENTREVISTA
II – Dr. Teresa Cutrim
Médica – Clínica Geral.
As cirurgias reparadoras segundo o seu entendimento se diferem das
embelezadoras? Por quê?
Geralmente as cirurgias reparadoras ocorrem por um defeito congênito ou
mesmo por uma lesão causada por um motivo que pode ser acidente, como
queimaduras, lesões por traumas, ou devidas a outros procedimentos
anteriores, enfim o paciente já vem com alguma SEQUELA, seja congênita ou
adquirida. Nesses casos o profissional tentará REPARAR o problema e muitas
vezes pode não obter sucesso, dependendo do grau de lesão que o paciente
apresenta. Algumas cirurgias reparadoras têm técnicas bastante estudadas,
desenvolvidas e por isso raramente apresentam más consequencias (por
exemplo, o lábio leporino e/ou fenda palatina em crianças, cuja técnica é
universalmente adotada e bem sucedida pode-se dizer que em 100% dos
casos); outras cirurgias reparadoras, por exemplo, a de grandes queimaduras,
as vezes podem não apresentar resultados tão bons, e necessitam ser feitas
em vários tempos para se chegar a um
resultado satisfatório, e muitas vezes o profissional, por mais capacitado que
seja, pode não gostar do que obteve no final dos procedimentos. Junta-se a
isso nesses casos a idiossincrasia, que sempre devemos ter em mente quando
se fala de tratamentos e seus efeitos.Dificilmente um paciente submetido a
cirurgia reparadora irá se queixar do resultado, porque, por pior que ele seja,
ficará melhor do que a lesão congênita e/ou adquirida que ele já tem, salvo os
108casos de extrema inabilidade do cirurgião reparador, o que graças a Deus no
nosso meio é raro (eu mesma nunca vi uma cirurgia reparador que tenha ficado
pior do que a lesão pre-existente).
Diferente ocorre com a cirurgia estética, quando, movido ou pela vaidade,
ou por um desejo de melhorar sua aparência, geralmente ligada a questões
psíquicas relacionadas a auto estima, o paciente decide modificar algo ou
"melhorar" em seu corpo algo que o incomoda, e geralmente só a ele, pois as
vezes o suposto "defeito"é até imperceptível aos olhos dos outros. O grau de
expectativa de quem faz esse tipo de procedimento é muito grande, os padrões
de beleza difundidos pela mídia se confundem com o próprio desejo do
paciente, que interfere e quer "escolher" o tipo de intervenção a que quer se
submeter para atingir o seu objetivo. Muitas vezes o resultado não será o
esperado pelo paciente. Também é claro que isso se torna campo fértil para os
maus profissionais, que sempre irão existir, e deve-se julgar com bom senso
cada caso porque o resultado pode ter sido satisfatório a nível técnico, mas
para o paciente pode ter sido uma verdadeira decepção. Cabe ao médico
informar o que pode e o que não pode ser feito, e isso não é muito fácil numa
época em que o paciente vai pra internet e já chega ao consultório com uma
lista de coisas que ele quer fazer, exames, receitas e etc. como se o médico
estivesse ali para satisfazer todas as suas vontades em detrimento do bom
senso! E bom senso é artigo de luxo hoje em dia, principalmente em se
tratando de saúde!
Dr. Teresa Cutrim.
109
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes
Título da Monografia: A Responsabilidade Civil decorrente de erro médico
nas cirurgias plásticas
Autora: Emanuelly Chrystina Mendonça Assumpção
Data da entrega:
Avaliado por: Conceito:
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