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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES – NITERÓI PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A LEI MARIA DA PENHA E A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER
FRANCINE CASCARDO DE LIMA MAIA QUEIROZ
ORIENTADOR PROF. JEAN ALVES
RIO DE JANEIRO
JULHO DE 2014
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A LEI MARIA DA PENHA E A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER
Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito Penal e Processo Penal . .
ORIENTADORA: Professor Jean Alves
RIO DE JANEIRO 2014
3
AGRADECIMENTO
Agradeço à Deus por tudo que Ele tem feito e por tudo que vai fazer em minha vida, a todos os professores de direito penal que tive até o presente momento que com carinho contribuíram para o crescimento do meu conhecimento, e a todos os meus amigos e parentes, por terem contribuído para a minha vitória.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho primeiramente à Deus que me deu forças para chegar ao final dessa jornada, à minha avó, minha mãe e meus irmãos que me amam muito e sempre estiveram do meu lado, me apoiando, e por fim ao meu esposo que com muito carinho me entendeu e me apoiou nesse momento tão importante em minha vida.
5
RESUMO
O presente trabalho tem por objeto a reflexão acerca da violência doméstica sofrida pelas mulheres, realizando um estudo acerca do conceito de violência, suas formas, causas e conseqüências, e seu âmbito de ocorrência. Por fim realiza-se um estudo sobre a Lei Maria da Penha, analisando sua criação, seu objetivo principal, e se o mesmo vem sendo alcançado. Os critérios metodológicos estabelecidos foram baseados em uma análise descritiva da Lei Maria da Penha, de seus dispositivos e de sua aplicabilidade nos dias atuais. Palavras Chaves: Violência doméstica contra a mulher – agressor - medidas protetivas de urgência – Lei Maria da Penha – eficácia.
7
METODOLOGIA
Os utilizados para analisar o problema em questão e obter a
resposta para a questão problema foram a leitura de livros, jornais, programas
de televisão, artigos jurídicos e textos da internet, obtendo a resposta, após
coleta de dados, pesquisa bibliográfica, as leituras de entrevistas e vídeos da
internet. Para realizar o presente estudo foi fundamental a leitura do livro A LEI
MARIA DA PENHA NA JUSTIÇA, da autora Maria Berenice Dias, o qual foi a
base dos estudos aqui realizados.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10 CAPÍTULO 1. VIOLENCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER ............................. 12 1.1 Breve histórico da violência contra a mulher ....................................................... 12 1.2 Conceito de violência .......................................................................................... 14 1.3 Formas de manifestação de violência contra a mulher ....................................... 17
1.4 Fatores que propiciam a violência doméstica ...................................................... 21 1.5 Conseqüências da violência doméstica .............................................................. 22 CAPÍTULO 2. A LEI MARIA DA PENHA ................................................................. 23 2.1 Origem da Lei ...................................................................................................... 23 2.2 Objetivo da Lei .................................................................................................... 25 2.3 Objeto tutelado pela Lei....................................................................................... 26 2.4 Sujeitos da Lei ..................................................................................................... 30 2.4.1 Vítimas ............................................................................................................. 30 2.4.2 Familiares ......................................................................................................... 33 2.4.3 Testemunhas .................................................................................................... 34 2.4.4 Agressor ........................................................................................................... 34 2.5 Inovações trazidas pela Lei Maria da Penha. ...................................................... 35 CAPÍTULO 3. EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA ...................................... 37 3.1 Constitucionalidade da Lei .................................................................................. 37 3.2. Atendimento pela autoridade policial – fase pré-processual .............................. 38 3.3. Rito processual ................................................................................................... 41 3.4 Criação dos Juizados de Violência Doméstica .................................................... 42 3.5 Exceções a Competência dos Juizados de Violência Doméstica ........................ 43 3.6 Medidas Protetivas de Urgência .......................................................................... 46 3.7. Atores da Lei ..................................................................................................... 49 3.7.1 Atuação do Ministério Público .......................................................................... 49 3.7.2 Assistência Judiciária Obrigatória .................................................................... 51 3.8 Representação e a possibilidade de retratação .................................................. 51 3.9 Vedações estabelecidas pela Lei ........................................................................ 53 CONCLUSÃO ........................................................................................................... 55 ANEXO A ..................................................................................................................57
9
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 68
10
INTRODUÇÃO
A violência contra a mulher é um assunto que vem sendo abordado com
muita ênfase nos tempos atuais, compreendendo todo ato praticado baseado no
gênero feminino, que cause algum tipo de sofrimento à mulher, podendo
corresponder a dano físico, sexual, psicológico, ou moral à mulher.
Esse tipo de violência sofrida pela mulher, não é um acontecimento novo,
pois sempre acontecera, desde a antiguidade, sendo nova a importância que tem
sido dado a esse tema.
Os traumas gerados pela violência dentro dos lares são inúmeros, tantos
para a mulher agredida, como para seus filhos e seus parentes. Marcas que nunca
se apagaram.
A mulher desde que se tem noção de sociedade nasce para obedecer aos
pais, e depois a seu marido, sem ter qualquer direito de opinião, exercendo suas
atividades sempre da mesma forma, lavando, passando, cozinhando, cuidando da
casa, dos filhos, do marido, como se fosse só isso o que a mulher sabe e presta pra
fazer, ficando sempre numa posição de submissão e desqualificação perante o
marido.
A violência doméstica contra a mulher representa, além dos aspectos
políticos, culturais e jurídicos, um problema de saúde pública, pois nota-se a
crescente constatação de que a violência doméstica está associada a traumas
físicos e mentais, o que leva muitas mulheres a procurar constantemente serviços
de saúde.
No Brasil, com a criação e implantação da Lei 11.340/06, mais conhecida
como Lei Maria da Penha, em vigor há oito anos, é que se vê uma tentativa de se
coibir este tipo de violência, tornando mais rápido ao acesso da mulher ao judiciário
e mais rigorosas as punições para os agressores.
Deste modo, no decorrer deste trabalho monográfico, procura-se chegar a
respostas, tais como: A Lei Maria da Penha desempenha o papel pelo qual foi
criada, cumprindo com seus objetivos? Ou quais as principais modificações
ocorridas na legislação brasileira com a implantação da Lei 11.340/06 no combate à
violência doméstica?
O objetivo geral deste trabalho é estudar a Lei Maria da Penha e sua
atuação no amparo as mulheres que sofrem com a violência doméstica.
11
Como objetivo específico procuraremos estudar o que é a lei Maria da
Penha e o que essa lei tutela, analisando como surgiu essa lei e o que motivou a
sua criação.
Também se buscará verificar as quais são as formas de violência
tuteladas pela lei e o que mudou no meio jurídico com a criação da Lei Maria da
Penha.
A metodologia utilizada na monografia será utilização do método
bibliográfico, pois será buscada a solução para o problema através da pesquisa de
referências ao assunto estudado em documentos, livros, e artigos publicados
anteriormente.
Também será realizado o método descritivo, pois após análise de
registros e fatos do cotidiano será possível definir os conhecimentos que abordam o
tema e suas características.
Ainda será feita uma pesquisa dogmática, onde será estudado ó
ordenamento jurídico passado e o atual que tenham relação com o tema, através da
análise e interpretação da legislação vigente.
No primeiro capítulo será analisado o conceito de violência contra a
mulher, sendo apresentado um breve histórico acerca desse tema, onde também
serão abordadas as formas de violência contra a mulher, os fatores que a propiciam
e suas conseqüências.
No segundo capítulo será demonstrada a importância da Lei 11.340/06
para a sociedade, sua origem, seus objetivos e objeto principal de tutela, abordando
seus sujeitos e notórias inovações trazidas com sua vigência.
No terceiro capítulo, a abordagem se dará em torno da eficácia da Lei
Maria da Penha e o seus dispositivos, sendo analisada sua constitucionalidade, o
rito processual estabelecido pela lei, bem como as garantias trazidas as mulheres
agredidas.
Por fim, este trabalho visa abordar o surgimento da Lei Maria da Penha,
como resposta a um clamor púbico por uma justiça mais eficaz no que tange à
violência doméstica e familiar contra a mulher, abordando os novos conceitos e
avanços trazidos por esta lei.
12
CAPÍTULO 1. VIOLENCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER
1.1 Breve histórico da violência contra a mulher
A violência doméstica é um assunto que está em evidência nos dias
atuais pois ao falar sobre tal assunto falamos de um problema que atinge mulheres,
crianças, adolescentes e idosos em todo o mundo. É fruto principalmente da
desigualdade existente nas relações de poder entre homens e mulheres, bem como
da discriminação de gênero ainda presente tanto na sociedade como no seio
familiar.
A mulher sempre foi discriminada, humilhada, tratada como coisa
pertencente ao seu marido, como objeto sem vontade própria, como um ser que não
tinha direitos.
Contudo, a violência doméstica nunca havia tido uma devida atenção da
sociedade, nem mesmo do poder Estatal, onde faltava legislação acerca do assunto
e pessoas que se importassem com a situação das mulheres violentadas.
A idéia incorruptível de família e a inviolabilidade domiciliar sempre foram
as justificativas mais usadas para impedir qualquer tentativa de se interferir no que
acontecia dentro das casas.
Nos dias atuais, a violência doméstica representa uma ameaça que
persegue milhares de mulheres de todas as idades, classes sócias, raças, grau de
instrução e orientação sexual, ao longo de suas vidas, sendo compreendida como
um fenômeno que prejudica a vida de pessoas em todo em mundo, não encontrando
barreiras geográficas, raciais, etárias ou mesmo entre classes sociais. Isso significa
que há casos de violência doméstica em qualquer lugar do mundo e em qualquer
tipo de meio social.
A classe social mais afetada são as mais baixas, pois as mulheres mais
pobres estão mais expostas à violência, ou talvez estas estejam mais evidentes já
as mulheres de classe alta não querem expor seus problemas, encobrindo a
violência sofrida objetivando resguardar o “nome da família”.1
1 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 66-68.
13
As mulheres, desde a antiguidade, vivem em situação de inferioridade
frente ao homem, onde eram até mesmo consideradas parte do patrimônio familiar,
sendo comparadas aos bens pertencentes a família como imóveis e escravos.
A mulher no Brasil colonial podia ser castigada por seu marido, havendo
até mesmo lei que o autorizava a puni-la fisicamente em caso de desobediência ou
quando a mulher merecesse. 2.
Até a década de 70, embora não houvesse previsão legal autorizando que
os maridos traídos ou supostamente traídos matassem as suas esposas, a
sociedade brasileira juntamente ao poder judiciário da época assistiam a cruéis
homicídios praticados contra as mulheres e a grande maioria dos homens alegavam
legítima defesa da honra , denegrindo a imagem de suas esposas e conseguindo ao
final uma absolvição.
Na década de 90, embora a Constituição Federal de 1988 assegurasse a
igualdade em seus arts. 5º e 226, §5º, que dizem:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; ”3 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.4
Impondo ao Estado o dever de assegurar assistência às famílias e criar
meios para reprimir a violência no âmbito familiar, o surgimento da Lei 9099/95 – Lei
dos Juizados Especiais significou um grande atraso no combate à violência
doméstica, pois reconheceu alguns crimes como de menor potencial ofensivo, que
2 RASPANTI, Márcia Pinna. Artigo publicado em 29 de maio de 2014 em http://historiahoje.com/?tag=castigos-fisicos. Retirado do site em 03 de junho de 2014 ás 12:00. 3 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa Brasileira, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.14. 4 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa Brasileira, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.114.
14
seriam julgados de maneira sumária pelos juizados especiais, e sendo permitido a
transação penal e a aplicação de medidas despenalizadoras.
Com a aplicação da Lei 9099/95 a grande maioria dos delitos cometidos
contra as mulheres vítimas de violência doméstica passaram a ser considerados de
menor potencial ofensivo, quais sejam a lesão corporal leve, ameaça, calúnia e
injúria e eram encaminhados aos Juizados Especiais Criminais, sendo os crimes
cometidos contra a integridade psíquica e física, bem como contra a dignidade da
mulher apreciados e julgados como brigas entre vizinhos ou ofensa entre desafetos,
ou seja, banalizados.
Porém, como uma forma de socorro às mulheres violentadas em seu lar,
que se viam totalmente desamparadas e banalizadas pela lei, entrou em vigor em 22
de setembro de 2006, a Lei 11340, de 07.08.2006, popularmente conhecida como
Lei Maria da Penha, que será objeto de estudo do presente trabalho em seus
próximos capítulos.5
1.2 Conceito de violência
Inicialmente, analisaremos o conceito de violência em seu sentido amplo,
para depois podermos diferenciar o que é violência doméstica e familiar de violência
doméstica contra a mulher, termos que são bastante confundidos pelas pessoas.
O termo violência deriva do latim violentia, e para o dicionário Aurélio
significa:
Qualidade ou caráter de violento. Ação violenta: cometer violências. Ato ou efeito de violentar. Opressão, tirania: regime de violência. Direito Constrangimento físico ou moral exercido sobre alguém.6
Ou seja, violência define-se como sendo qualquer comportamento ou
conjunto de comportamentos que causem danos a outras pessoas, seres vivos ou
objetos, sendo exercido constrangimento físico ou moral. 5 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.26-30. 6 DICIONÁRIO AURÉLIO ON LINE. http://www.dicionariodoaurelio.com/, pesquisa realizada em 03 de maio de 2014 ás 13:30.
15
A autora Maria da Graça Blaya Almeida expõe suas considerações acerca
do assunto em seu livro A Violência na Sociedade Contemporânea:
A violência não é um estigma da sociedade contemporânea. Ela acompanha o homem desde tempos imemoriais, mas, a cada tempo, ela se manifesta de formas e em circunstâncias diferentes. Não há quem não identifique uma ação ou situação violenta, porém conceituar violência é muito difícil visto que a ação geradora ou sentimento relativo à violência pode ter significados múltiplos e diferentes dependentes da cultura, momento e condições nas quais elas ocorrem. Na Idade Média, por exemplo, certos procedimentos violentos eram formas de demonstração de amor a Deus. Nessa mesma época, havia a prova do ordálio, que consistia em submeter o suspeito de crime ou de falso amor a Deus a ter que segurar uma barra de ferro em brasa para provar sua inocência. Caso não se queimasse, seria absolvido como prova da verdade e do amor divino. Porém, atitudes como essa e o autoflagelo são inadmissíveis nos dias atuais para o bom senso do cidadão comum e dentro da nossa cultura. O melhor conceito de violência que encontrei foi o utilizado por Rocha (1996)1 : A violência, sob todas as formas de suas inúmeras manifestações, pode ser considerada como uma vis, vale dizer, como uma força que transgride os limites dos seres humanos, tanto na sua realidade física e psíquica, quanto no campo de suas realizações sociais, éticas, estéticas, políticas e religiosas. Em outras palavras, a violência, sob todas as suas formas, desrespeita os direitos fundamentais do ser humano, sem os quais o homem deixa de ser considerado como sujeito de direitos e de deveres, e passa a ser olhado como um puro e simples objeto.7
A violência doméstica familiar seria todo e qualquer tipo de violência
cometida dentro da unidade doméstica contra as figuras determinadas no art. 129,
§9º do Código Penal Brasileiro, quais sejam:
art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. [...] §9º. Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade:
7ALMEIDA, Maria da Graça Blaya . A violência na sociedade contemporânea [recurso eletrônico] – Dados eletrônicos. Porto Alegre : EDIPUCRS, 2010. Retirado do site http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/violencia.pdf em 03 de maio de 2014 ás 13:40.
16
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.8
Sobre o assunto, Rogério Greco em seu livro Curso de Direito Penal parte
especial, cita palavras do ilustre doutrinador Damásio de Jesus:
Em primeiro lugar, o tipo menciona as figuras do ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro. Cremos que não é imprescindível a coabitação entre o autor e a vítima, i.e, basta existir relação doméstica, familiar, para incidir o tipo. Exemplo: por ocasião de uma visita, um irmão agride o outro, ferindo-o, apesar de morarem em cidades diferentes. É também sujeito passivo a pessoa ‘com quem’ o agente ‘conviva ou tenha convivido’. Não se pode restringir sua aplicação ao regime de união estável. De ver-se que o tipo fala expressamente em ‘companheiro’. Por isso, a convivência, desde que seja doméstica, faz incidir o tipo. Exemplo: moradores de um aposento de república de estudantes. Se a convivência é passada (tenha convivido) acreditamos que a lesão corporal tenha sido provocada em razão da vivência anterior ocorrida entre autor e vítima.9
Já a violência contra a mulher segundo a Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção
de Belém do Pará seria:
Para os efeitos desta Convenção, entender-se-á por violência contra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada.10
Fazendo uma simples leitura do art 5º da Lei 11.340/06, temos o conceito
de violência doméstica e familiar contra a mulher, segundo a legislação brasileira
vigente:
8 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Código Penal Brasileiro, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.258. 9 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial, volume II : introdução à teoria geral da parte especial: crimes contra a pessoa - 7. ed. Niterói, RJ : Impetus, 2010. 10 CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, PUNIR E ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER – “CONVENÇÃO DE BELÉM DO PARÁ” de 9 de junho de 1994. Capítulo I, artigo1.
17
Art. 5º Para os efeitos dessa Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive esporadicamente agregadas; II – no âmbito da família compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III – em qualquer ralação intima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.11
A violência não é a melhor forma de se resolver um conflito, na verdade,
não se deve usar a violência de forma alguma, pois representa um ato de abuso de
poder, onde o mais forte prevalece sobre o mais fraco, restando como conseqüência
a sensação de insegurança e revolta. A mulher agredida passa a viver sob a égide
do medo, buscando na grande maioria das vezes, o isolamento, apresentando a
queda de sua auto-estima, podendo gerar para ela vários tipos de distúrbios e
doenças psicológicas, tais como a depressão e a síndrome do medo.
Tudo isso, é fruto de uma cultura machista, que foi implantada ao longo
dos anos, onde a mulher é vista como um ser inferior, que deve se subordinar ao
homem, aceitando ser vítima de discriminação e violência por parte do mesmo.
1.3 Formas de manifestação de violência contra a mulher
De acordo com a Legislação brasileira, são 5 as formas de violência
contra a mulher que estão expressamente escritas no art. 7 da lei 11.340/2006,
sendo a violência física, a psicológica, a sexual, a patrimonial e a moral, porém esse
rol é considerado meramente exemplificativo já que o caput utiliza a expressão
“entre outras”.
11 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.911.
18
Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.12
A violência física corresponde ao tipo de violência mais empregado contra
as mulheres no Brasil. Como conceito, temos que tal violência seria todo tipo de
ofensa à integridade física e corporal, praticada através do uso de força,
podendo abranger “socos, tapas, pontapés, empurrões, arremesso de objetos, queimaduras, etc., visando, desse modo, ofender a integridade ou a saúde corporal da vítima, deixando ou não marcas aparentes, naquilo que se denomina, tradicionalmente via corporalis.13
12 Idem 13 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 44.
19
Segundo a autora Alice Bianchini,
nos registros de recepções da Central de Atendimento á Mulher - Ligue 180 - do ano de 2011, dentre os 58.512 relatos de violência, a agressão física ficou em primeiro lugar (61,33%), seguida da psicológica (23,95%) e da moral (10,88%) [...] cerca de 40 % dos casos de violência doméstica redundam em lesões corporais graves, como deformidade permanente e perda de membro; [...] as pesquisas com mulheres violentadas apontam a prevalência de lesões na região da cabeça e do pescoço, sobre tudo no rosto; [...] a maioria das mulheres portadoras das seqüelas deformantes não podem pagar por cirurgias plásticas reparadoras nem consegue a realização desse procedimento nos serviços públicos de saúde14
A violência psicológica também chamada de agressão emocional é tão
grave quanto à violência física, pois deixa marcas invisíveis, podendo comprometer
o bem estar emocional da mulher, causando danos irreparáveis. Muita das vezes
não é reconhecida pela vítima como algo ilícito.
A Autora Alice Bianchini, enumera sete condutas que propiciam a
violência psicológica :
conduta que cause dano emocional e diminuição da auto-estima; conduta que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento; conduta que vise degradar suas ações; conduta que vise controlar sua ações; conduta que vise controlar seus comportamentos; conduta que vise controlar sua crenças; conduta que vise controlar suas decisões; Todas elas precisam ser praticadas por um dos seguintes meios: ameaça; constrangimento; humilhação; manipulação; isolamento; vigilância constante; perseguição contumaz; insulto; chantagem; ridicularização; exploração; limitação do direito de ir e vir; qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à a autodeterminação.15
Violência sexual seria uma conduta praticada visando constranger a
vítima com o propósito de limitar ou anular o exercício de direitos sexuais (opção
sexual, podendo a pessoa escolher seu(s) parceiro(s) e praticar atos sexuais sem o
objetivo de se reproduzir) e reprodutivos (número de filhos que deseja ter
14 Idem 15 Idem
20
independentemente de casamento) da mesma, podendo ocorrer mediante violência
física ou de violência psicológica (grave ameaça).
Alice Bianchini defende que as formas de violência sexual são “bastante
abrangentes” e que devemos considerar como sendo qualquer conduta que se
pratique “mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força, constrangendo a
mulher a presenciar relação sexual não desejada; manter relação sexual não
desejada; participar de relação sexual não desejada.”16
Também devemos, segundo a mesma, considerar violência sexual como
sendo qualquer conduta que seja praticada “mediante coação, chantagem, suborno
ou manipulação que a induza a comercializar, de qualquer modo, a sua sexualidade;
induza a utilizar, de qualquer modo sua sexualidade; impeça de usar qualquer
método contraceptivo; force ao matrimônio; force à gravidez; force ao aborto; force à
prostituição.”17
A violência patrimonial ocorre quando a conduta do agressor configurar
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de
trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos,
incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades. Este último encontra
respaldo no artigo 5º da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar
a Violência contra a Mulher, que diz
Artigo 5.Toda a mulher poderá exercer livre e plenamente seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais e contará com a total proteção desses direitos consagrados nos instrumentos regionais e internacionais sobre direitos humanos. Os Estados-Partes reconhecem que a violência contra a mulher impede e anula os exercícios desses direitos. 18
Por fim, temos a violência moral reproduz os conceitos de calúnia,
difamação e injúria, onde a primeira corresponde a imputação falsa de fato
16 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 46. 17 Idem 18 CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, PUNIR E ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER – “CONVENÇÃO DE BELÉM DO PARÁ” de 9 de junho de 1994. Capítulo I, artigo 5.
21
criminoso, a segunda imputação de fato desonroso e a terceira seria a ofensa
através de qualidades negativas.19
Constata-se que a violência contra a mulher ocorre das mais variadas
formas e deixa sempre seqüelas irreparáveis. A cada dia esse tipo de problema
cresce mais e mais em nosso país e em todo o mundo, apresentando números
alarmantes que precisam ser diminuídos. As vítimas, prisioneiras do medo
encontram barreiras na hora de procurar ajuda, o que gera a cada dia o aumento do
índice de impunidade.
1.4 fatores que propiciam a violência doméstica
Sabemos que as causas geradoras e difusoras da violência são diversas,
incluindo drogas, genética, meio social em que se está inserido, filmes, programas
de tv, jogos de vídeo game, entre outras.
É preciso que selecionemos o que é bom para nossas vidas como se
tivéssemos um filtro interno, pois principalmente a mídia nos fornece todo tipo de
informação.
A televisão é vista como a maior vilã e principal instigadora de violência
por isso deve-se selecionar o que pode ou não ser visto nas residências. O ser
humano absorve através da visão muitas informações, e com tantos relatos de
violência nos programas televisivos começa a achar normal, o que era pra no
mínimo deixá-lo indignado. Com isso começa a agir do mesmo modo que lhe fora
“ensinado” na tv.
Temos ainda, como fator que impulsiona a violência, o desrespeito, a
prepotência, crises de raiva causadas por fracassos e frustrações, crises mentais,
como loucura consequente de anomalias patológicas.
Os conflitos presentes nos relacionamentos são o fator mais relevante
para o início da violência doméstica, pois o casal em uma discussão, primeiramente
usam da agressão verbal, o que com o tempo passa a não “adiantar” mais e daí que
surge a agressão física que muitas das vezes inicia-se com pequenos empurrões, e
19 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 50.
22
com o aumento do nível de estresse entre o casal e o desgaste no relacionamento,
leva a agressões físicas de maior potencial lesivo.20
1.5 Conseqüências da violência doméstica
As mulheres que sofrem algum tipo de violência doméstica costumam ser
de fácil identificação, pois vivem em situação de sofrimento crônico e de eterna
agonia.
Os filhos que costumam presenciar brigas entre os pais caracterizam-se
como crianças que são ou extremamente pacatas ou extremamente agressivas, ou
seja, ou apanham sempre dos coleguinhas e não fazem nada ou vivem batendo e
caçoando das outras crianças.
Para a mulher que é violentada, muitas das vezes as conseqüências
físicas são trágicas, como lesões de natureza grave, mutilações, cicatrizes
horrorosas, fraturas pelo corpo, problemas ginecológicos como lacerações vaginais,
feridas no colo do útero, abortos contínuos e até esterilidade. Psicologicamente as
mulheres também sofrem com conseqüências drásticas tais como, depressão,
ansiedade, isolamento, baixíssima auto-estima (muitas vezes nem há), problemas
sexuais, pânico, desordem alimentar, problemas com o sono e comportamentos
anormais. 21
A violência contra a mulher, nos dias atuais tem sido tema de grandes
debates governamentais, de propagandas mil e de projetos feitos por empresas e
Ong’s, buscando diminuir a incidência de tal problema. A Lei Maria da Penha surge
como uma pequena resposta ao clamor público, visando combater a impunidade.
20 Fonte: PORTAL DA EDUCAÇÃO – http://www.portaleducacao.com.br/direito/artigos/24936/fatores-que-causam-violencia#ixzz33go17OWz em 04.05.2014 as 13:40. 21 PSICOLOGIA SOCIAL - COMPORTAMENTOS VIOLENTOS, VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. Artigo produzido por Ricardo da Palma - Mestrado Educação Social UAlg - ESEC, retirado do site http://pt.slideshare.net/RicardodaPalma/psicologia-social-comportamentos-violentos-violncia-domstica em 04.05.2014 as 14:50.
23
Capítulo 2. A Lei Maria da Penha 2.1 Origem da Lei
Há longos anos mulheres envolvidas com movimentos em prol dos
direitos femininos vêm lutando para que aqueles que agridem as mulheres
fossem punidos com mais severidade.
A lei 11.340/2006 foi criada como resposta a um clamor público que
já vinha ganhando força desde o início dos anos 2000. Essa lei, também
conhecida como Lei Maria da Penha representa um avanço cultural e jurídico
para nosso país, buscando acima de tudo, diminuir os casos de violência
doméstica contra as mulheres, de forma que a mulher violentada encontre uma
série de medidas que garantam proteção.
Maria da Penha Fernandes foi mais uma das inúmeras vítimas de
violência doméstica do Brasil, porém ela transformou todo seu medo e revolta
em força para lutar e tentar fazer com que os agressores pagassem pelo crime
cometido de forma efetiva.
Ela era casada com um professor universitário, morava em Fortaleza
– Ceará, e tinha 3 filhas . Em 29 de maio de 1983, seu marido tentou matá-la
pela primeira vez, com uma espingarda. Ele simulou um assalto para tal. Após
essa tentativa, Maria da Penha ficou paraplégica. Alguns dias depois, seu
marido tentou novamente matá-la, desta vez dando-lhe uma descarga elétrica
enquanto tomava banho. Porém essas tentativas não foram repentinas, e
descendem de uma série de agressões e coações que a mesma vinha
sofrendo e suportando durante o casamento.
Nunca havia reagido antes das tentativas de homicídio, pois tinha
medo que seu marido maltratasse suas filhas por conta da reação. Maria da
Penha, após quase ser assassinada por duas vezes, resolveu tomar
providências, denunciando as agressões que sofreu. Porém, nenhuma
providência fora tomada pela polícia e muito menos pela Justiça brasileira.
24
Várias vezes chegou a pensar que seu marido tinha razão em agredi-la já que
nada acontecia por parte das autoridades.1
Maria da Penha não se conformou com o descaso e escreveu um
livro contando a sua história, chamado “Sobrevivi, Posso Contar” e uniu-se a
militantes dos movimentos de mulheres, alcançando grande repercussão. Seu
marido foi processado, porém demorou 19 anos e seis meses para que fosse
preso.
O caso de Maria da Penha acabou chegando às esferas mais altas
da Justiça Internacional. O Centro pela Justiça e o Direito Internacional –
CEJIL, juntamente ao CLADEM – Comitê Latino Americano e do Caribe para a
Defesa dos Direitos da Mulher, fizeram denúncia perante à Comissão
Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos,
sendo a primeira vez que este órgão acatou uma denúncia de violência
doméstica. Ao final, o Brasil foi condenado a pagar o valor de 20 mil reais a
título de indenização a Maria da Penha, sendo responsabilizado por
negligência e omissão frente à violência doméstica. Foi recomendado que o
Brasil adotasse uma série de medidas para beneficiar as mulheres agredidas.
O Brasil deu cumprimento às convenções e tratados internacionais
ao qual é signatário. Um dos primeiros atos foi elaborar um projeto de lei no
ano de 2002 através de um consórcio entre 5 organizações não
governamentais. O projeto foi enviado ao Congresso Nacional em novembro de
2004 - Projeto de Lei nº 4.559/2004, cumprindo assim o que preceitua o
parágrafo 8º do Art. 226 da Constituição Federal de 1988:
Art. 226 A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] §8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência contra a mulher na forma da lei específica;2
1 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.15. 2 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa do Brasil, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.115.
25
Após algumas alterações feitas, a Lei nº 11.340/2006 foi sancionada
pelo Presidente da República em 07/08/06 e foi passou a vigorar a partir do dia
22/09/06.
Desde então a Justiça brasileira tem sido o principal responsável
pela eficácia da lei, produzindo inúmeras decisões que buscam pelo menos
reduzir em muito os casos de violência doméstica contra a mulher. 3
2.2. Objetivo da Lei
O objetivo principal da lei é reprimir e prevenir a violência de gênero
no âmbito doméstico, familiar ou de uma relação íntima de afeto.
Tal objetivo encontra-se explicitamente escrito nos artigos 1º e 5º da
lei 11.340/2006, como podemos observar abaixo:
Art. 1o Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.4
3 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.16 4 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.910-911.
26
2.3 Objeto tutelado pela Lei
O objeto da lei, ou seja, o que a lei tutela é a violência contra a
mulher baseada no gênero, praticada no âmbito doméstico, familiar ou em uma
relação íntima de afeto. Essa lei não trata de toda a violência praticada contra a
mulher, mas somente da daquela baseada no gênero, segundo o art. 5º, caput,
da lei Maria da Penha.
A violência de gênero refere-se a uma determinação social dos
papéis atribuídos ao homem e à mulher que são ditados pela sociedade com
importâncias diferenciadas, onde temos que os papéis femininos são super
inferiorizados em relação ao masculino.
O equilíbrio entre papéis é tão desproporcional que nos dá a
impressão de que há uma relação de hierarquia. Tal situação faz com que o
homem sinta-se legitimado a ser violento e nos faz compreender o porquê as
mulheres agredidas ficam inertes ou mesmo quando tomam alguma atitude,
voltam a trás e se reconciliam com o seu marido ou companheiro agressor,
mesmo tendo passado por vários episódios de violência .
As palavras de Maria Berenice Dias podem ilustrar com mais
detalhes o que realmente acontece dentro dos lares:
Antes mesmo de o relacionamento tornar-se
abusivo, há sinais indicativos de cuidado: apego rápido, ciúme
excessivo, controle do tempo, isolamento da família e dos
amigos, uso de linguagem derrogatória, culpabilização da
mulher e minimização dos abusos. A vulnerabilidade própria do
enamoramento e do apaixonamento converte-se em cegueira
[...] Primeiro vem o silêncio seguido da indiferença. Depois
surgem reclamações, reprimendas, reprovações. Em seguida
começam os castigos e as punições. A violência psicológica
transforma-se em violência física. Os gritos transformam-se em
empurrões, tapas, socos, pontapés, num crescer sem fim. As
agressões não se cingem a pessoa da vítima. O varão destrói
seus objetos de estimação, a humilha diante dos filhos. Sabe
que estes são seus pontos fracos e os usa como “massa de
27
manobra”, ameaçando maltratá-los. Facilmente a vítima
encontra explicações e justificativas para o comportamento do
parceiro. Acredita que é uma fase, que vai passar, que ele
anda estressado, trabalhando muito ou com pouco dinheiro.
Procura agradá-lo, ser mais compreensiva, boa parceira. Para
evitar problemas, afasta-se dos amigos, submete-se à vontade
do agressor: só usa as roupas que ele gosta, deixa de se
maquiar para não desagradá-lo. Está constantemente
assustada, pois não sabe quando será a próxima explosão, e
tenta não fazer nada errado. Torna-se insegura [...] Nesse
momento, a mulher vira um alvo fácil. Questiona o que fez de
errado e não se dá conta de que para o agressor não existe
nada certo [...] O homem não odeia a mulher, odeia a si
mesmo. [...] Críticas constantes levam a mulher a acreditar que
tudo o que faz é errado, que nada entende, não sabe se vestir
nem se comportar socialmente. É induzida a acreditar que não
tem capacidade para administrar a casa e em cuidar dos filhos.
A alegação de que ela não tem bom desempenho sexual
resulta no afastamento da intimidade e surge a ameaça de
abandono. Para dominara a vítima, o varão procura isolá-la do
mundo exterior, afastando-a da família. Proíbe amizades,
denigre sua imagem perante os amigos. Muitas vezes, a
impede de trabalhar, sob a justificativa de ter condições para
manter sozinho a família. Com isso, a mulher se distancia das
pessoas junto as quais poderia buscar apoio.[...] O homem
sempre atribui a culpa a mulher [...] O medo da solidão a faz
dependente, sua segurança resta abalada. Não resiste à
manipulação e se torna prisioneira da vontade do homem,
surgindo o abuso psicológico. Depois de um episódio de
violência , vem o arrependimento, pedidos de perdão, choro,
flores, promessas, etc. [...] O clima familiar melhora e o casal
vive uma nova lua de mel. Ela sente-se protegida, amada,
querida, e acredita que ele vai mudar. Tudo fica bom até a
próxima cobrança, ameaça, grito, tapa... 5
5 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.20-22.
28
Algumas das mais importantes características da violência de
gênero são o fato de ela decorrer de uma relação de poder e dominação do
homem e da aceitação e submissão da mulher; de esta relação de poder ser
resultado dos papéis impostos às mulheres e aos homens, reforçados pela
ideologia patriarcal, os quais estão baseados em uma hierarquia de poder
induzindo a relações de violência entre os sexos; a violência vai além das
relações entre homem e mulher, estando presente também nas instituições,
nas estruturas, nas práticas cotidianas, nos rituais, ou seja, está presente em
tudo que constitui as relações sociais; e a relação existente entre os casais, a
proximidade entre vítima e agressor (relação doméstica, familiar, ou íntima de
afeto) e a habitualidade com que ocorre os episódios de violência deixam as
mulheres ainda mais vulneráveis dentro do sistema de desigualdades de
gênero, quando comparado de desigualdade como o de classe e etnia, por
exemplo.6
A Lei Maria da Penha também baseia-se em um contexto que
está além da violência de gênero, sendo ele o contexto doméstico ou familiar
da ação ou a existência de uma relação de afeto.
Unidade doméstica, para a lei, representa o espaço de convívio
permanente de pessoas, ou seja, não se abrangendo a visitas (amigas, por
exemplo) ou entregadores de produtos, não exigindo vínculo familiar entre elas,
incluindo as pessoas eventualmente agregadas, como as mulheres tuteladas,
curateladas, enteadas, irmãs unilaterais e sobrinhas.
Há divergência doutrinária com a relação a possibilidade de se
incluir a empregada doméstica como tutelada pela lei, onde para a doutrina
majoritária a Lei Maria da Penha aplica-se sim as empregadas domésticas,
desde que as mesmas, não sejam diaristas (requer habitualidade) durmam no
emprego.
Já a corrente minoritária da doutrina como é o caso da autora Alice
Bianchini, defende que não se aplica a lei as empregadas domésticas pois a
Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT já faz esse amparo legal a elas. Nas
palavras da autora
6 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 31.
29
as relações laborativas domésticas não se encontram amparadas pela Lei Maria da Penha, sendo que os casos de violência doméstica contra a empregada doméstica devem ser resolvidos em sede de juízo criminal e/ou Trabalhista, já que as características que ensejam um especial tratamento do tema (por exemplo, relação de afeto, dependência emocional e /ou patrimonial, ciclo de violência, não se encontram presentes.7
O âmbito familiar corresponde à comunidade formada por indivíduos
que, de acordo com o art. 5º, II da Lei 11.340/06, “são ou se consideram
aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade
expressa”. Ou seja, é necessário que a mulher pertença a família, ostentando
estreita ligação com os demais membros da unidade doméstica.
Essa ligação entre os membros pode ser por afinidade ou por
vontade expressa, devendo sempre haver ligação entre o agressor e a
agredida. Havendo esse vínculo, não importa o local em que o crime fora
cometido, ou seja, não há necessidade de o crime ser cometido dentro de
casa, onde se uma mulher for agredida na rua ou em um estabelecimento
comercial, havendo vínculo entre agressor e agredida, incidirá com certeza a
Lei Maria da Penha.
Este vínculo pode ter sido gerado por relações de parentesco
natural, como mãe, pai e filha; civil compreendendo marido, sogra, cunhada,
etc.; por afinidade, como primo, cunhado, tio; ou ainda por afetividade, como
amigos que dividem a mesma casa.8
Com relação ao fato de cunhado agredir a cunhada temos
como posicionamento do STJ, através do HC 172. 634-DF, que incide a Lei
Maria da Penha. Já com relação a irmão que agride irmã, o STJ reconheceu
que aplica-se também a Lei Maria da Penha, não sendo necessário a
coabitação entre eles.9
Por último, fala-se em qualquer relação íntima de afeto, onde temos
que a lei ampara qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva
ou tenha convivido com a agredida, independentemente de coabitação, ou 7 BIANCHINI, Alice.op. cit. p.35. 8 BIANCHINI, Alice.op. cit. p.36. 9 REsp 1.239.850-DF, Rel. Mi Laurita Vaz, julgado em 16-2-2012
30
seja, mesmo que não vivam sob o mesmo teto, sendo necessário apenas que
haja nexo entre a agressão e sua causa geradora, sendo a relação íntima de
afeto a causa para a violência.
Quanto a questão do namoro, vinha sendo defendido que não cabia
a aplicação da lei quando a agressão fosse entre ex-namorados, porém em
2011, o STJ passou a entender se cabível aplicação da lei com relação a
namoro, desde que se analise o caso em concreto e o nexo de causalidade
entre a conduta do agressor e a relação de intimidade entre ele e a vítima.10
A autora Alice Bianchini entende que em havendo uma relação de
namoro, ex-namorados ou amantes, mesmo sem que haja ou tenha havido
convivência entre eles, aplica-se a Lei Maria da Penha. 11
2.4 Sujeitos da Lei
O destinatário principal da Lei Maria da Penha é a mulher em
situação de violência doméstica e familiar. Porém a lei traz uma série de
dispositivos que dão assistência e/ou protegem os familiares, as vítimas, as
testemunhas e obrigam o agressor.
2.4.1. Vítimas
Mulher: mulher em situação de violência doméstica e familiar,
não porque ela seja mais frágil que o homem, mas porque ela encontra-se
em uma situação de vulnerabilidade.
Transexual: o art. 5º, parágrafo único, da Lei 11.340/06, diz que
a lei deve ser aplicada independentemente de orientação sexual, onde no
caso de relação entre mulheres hétero ou transexuais, onde tenha, por
exemplo, sexo biológico masculino, porém identidade de gênero feminina
deve haver aplicação da Lei Maria da Penha, já que a mesma baseia-se no
gênero que é diferente do sexo biológico. Para a autora Alice Bianchini, o
gênero é construído no decorrer da vida e refere-se ao estado psicológico,
10 HC 181.217-RS, julgado em 2011. 11 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 39.
31
de forma que os transexuais não devem ser confundidos com os
homossexuais, já que o segundo não nega seu sexo.12
Homossexual: O STJ através do REsp 1.183.378, entendeu
que levando-se em conta que o Estado protege a família através do
casamento, e que essa proteção se estende a todos independentemente de
orientação sexual, a mesma não pode ser fator determinante para a
concessão ou na de direitos civis. 13
Idosos, crianças e adolescentes: todos eles possuem proteção
constitucional e supra legal, onde temos para os idosos o art. 230 da CF/88
e a Lei 10.741/2003, e para as crianças e adolescentes, o art. 227 da CF/88
e a lei 8.079/90.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) § 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos: (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) I - aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil; II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) § 2º - A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.
12 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 54 13 Disponível em: http//www.stj.jus.br/portal_stj/publicação/engine.wsp?tmp.area=398 &tmp.texto=103683. Acesso em: 2-8-2012.
32
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos: I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII; II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; III - garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola; (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica; V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade; VI - estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado; VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) § 4º - A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente. § 5º - A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros. § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. § 7º - No atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se- á em consideração o disposto no art. 204. § 8º A lei estabelecerá: (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) I - o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens; (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) II - o plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas.14 Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. § 1º - Os programas de amparo aos idosos serão executados preferencialmente em seus lares. § 2º - Aos maiores de sessenta e cinco anos é garantida a gratuidade dos transportes coletivos urbanos.15
14 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa Brasileira, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.115. 15 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa Brasileira, op. cit. p. 116.
33
Porém a ilustre doutrinadora Alice Bianchini defende ser possível a
concessão das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da
Penha, por analogia, a crianças, adolescentes e idosos, mesmo que sejam do
sexo masculino, onde respalda seu entendimento dizendo que o mesmo
“decorre do mandamento constitucional, bem como da interpretação a ser dada
à nova redação do art. 313, inc. III, do CPP, o qual, após o advento da Lei n.
12.403/2011, prevê, expressamente, a possibilidade de decretação da prisão
preventiva (eu é uma medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da
Penha)”.16
Homem: A Lei Maria da Penha não se aplica aos casos em que
homem são agredidos por suas cônjuges ou companheiras, pois como já
dito, são as especificidades da violência de gênero que respaldam a
aplicação da lei, e estas não são vislumbradas quando o homem é a vítima.
2.4.2 Familiares
A Lei Maria da Penha em três artigos trata dos familiares da mulher
em situação de violência doméstica e familiar, dando a eles um grau de
importância considerável, já que os mesmos são muito afetados quando ocorre
episódios de violência, principalmente os filhos.
Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.[...] § 3o Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público. 17 Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:[...] III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
16 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 58. 17 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.914.
34
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;18
Art. 30. Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas, voltados para a ofendida, o agressor e os familiares, com especial atenção às crianças e aos adolescentes.19
No art. 19 §3º, temos que o juiz a requerimento da ofendida ou do
MP, pode conceder novas medidas protetivas ou rever as que já foram
concedidas, caso entenda necessário para proteção da família. Já o art. 22, III,
a e b, nos traz a medida protetiva que proíbe o agressor de se aproximar e
manter contato, estendendo-se aos familiares. E por fim, temos no art. 30, a
figura da equipe de atendimento multidisciplinar que tem a incumbência
desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras
medidas, voltadas para os familiares da mulher agredida.
2.4.3 Testemunhas
No art. 22, III, a e b da Lei 11.340/06, já acima exposto, encontramos
também a proteção a figura da testemunha, pois é muito difícil conseguirmos
provas acerca desse tema, sendo a testemunha uma prova muito valiosa.
2.4.4 Agressor
Para os agressores estão previstos na Lei Maria da Penha, Centros
de educação e reabilitação, porém ainda existem pouquíssimos no Brasil.
Esses centros fazem parte do grupo de programas de intervenção que
pretendem ressocializar o agressor, utilizando algumas técnicas psicosociais,
como psicoterapia.
18 Idem. 19 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, op. cit. p.915-916.
35
Sabe-se que muitos homens agressores também foram
agredidos ao longo de sua vida e tendem a reproduzir tal comportamento.
Esses centros são voltados para tentar impedir que isso continue.
Para que isso ocorra é necessário que o governo juntamente a
sociedade se esforcem e invistam em programas que ao invés de só reprimir,
também evitem que a violência aconteça.20
2.5 Inovações trazidas pela Lei Maria da Penha
A lei 11.340/06 como já dito anteriormente, foi produzida como
resposta a um clamor público para proporcionar maior efetividade na punição
de agressores de mulheres em âmbito familiar e doméstico. Para tal ela traz
em seu texto mecanismos que visam prevenir futuras agressões, dar
assistência as vítimas, instituir políticas públicas e aplicar punições mais
severaspara os agressores.
O art. 1º desta lei nos mostra expressamente para que ela foi criada :
Art. 1o Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.21
Observa-se que a lei tem como principal objetivo combater os atos
de violência doméstica e familiar contra a mulher, protegendo-a de agressões
que possam ser proferidas por homens ou mulheres ao qual tenham
atualmente ou tenham tido relação de afetividade, ou ainda que possam ser
20 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 63-66. 21 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, op. cit. p.910.
36
proferidas por qualquer pessoa com as quais conviva no âmbito doméstico e
familiar.
A lei em seus artigos é bastante inovadora trazendo formas de
reprimir a violência doméstica como assistência judiciária gratuita; o
atendimento em programas assistenciais do Governo federal, estadual e
municipal; proteção policial ou garantia de ser abrigada em local seguro
manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local
de trabalho, todos para a mulher agredida.
Também inovou ao criar os Juizados de Violência Doméstica contra
a Mulher e as Delegacias de Atendimento à mulher. Importante dizer que a Lei
9.099/95 não previa nenhuma medida de proteção à vítima, por isso foram
criados os Juizados Especiais Criminais. Também é muito importante lembrar
que nos casos de violência doméstica as penas aplicadas aos agressores pela
lei 9.099/95, tais como multas, prestação de serviços à comunidade e doação
de cestas básicas, representavam para as vítimas um ato de impunidade.
Vale ressaltar que o legislador, ao redigir o parágrafo único do artigo
5º, também amplia o concito de família, reconhecendo como tal as uniões
homoafetivas e considerando a realidade social em que vivemos, não deixando
desamparadas as vítimas oriundas de relações de mesmo sexo biológico.
Outra inovação importante trazida pela Lei Maria da Penha encontra-
se no artigo 7º da lei, que já foi tratado em capítulo anterior, o qual estabelece
e define as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher como a
física, a psicológica, a sexual, a patrimonial e a moral.
37
CAPÍTULO 3. EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA
3.1 Constitucionalidade da Lei
Com o surgimento da Lei Maria da Penha, um número pequeno de
doutrinadores e julgadores, começaram a discutir acerca da inconstitucionalidade ou
de alguns artigos, ou até mesmo de toda a lei, objetivando impedir sua vigência, ou
pelo menos restringir sua eficácia.
Eles alegavam que a Lei surgiu criando desigualdade na entidade familiar,
pois a lei fora direcionada exclusivamente à mulher, alegando afronta ao princípio da
igualdade.
Vale ressaltar que nenhum questionamento deste tipo fora suscitado
quando houve a criação do Estatuto do Idoso, da Infância e Adolescência ou da
Igualdade Racial, todos estes amparando seguimentos sociais determinados e
resguardando os direitos de quem se encontra em situação de vulnerabilidade.
As leis que são criadas para tutelar direitos de parte da população, que
precisa de especial atenção, não buscam gerar desigualdade, mas buscam igualar
quem é desigual. Este foi o objetivo da Lei Maria da Penha, criando mecanismos de
proteção e amparo baseando-se no gênero da vítima.43
Segundo o ilustre doutrinador Alexandre de Moraes “para as
diferenciações normativas serem consideradas não discriminatórias, é indispensável
que exista uma justificativa objetiva e razoável.”44 E é evidente que não faltam
justificativas para que as mulheres recebam um tratamento diferente, já que como
fora dito nos capítulos anteriores à mulher é colocada em situação de inferioridade
pela sociedade que ainda é bastante machista. Ainda que o homem possa, é claro,
ser vítima de violência doméstica, é um caso bastante raro, que não decorre de
fatores culturais. Por tal motivo, que se vê necessário a implementação de medidas
que possam compensar, mesmo que minimamente as desvantagens históricas
sofridas pela mulher, que carregam em si um passado discriminatório. 43 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.108 44 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 28ª edição, São Paulo. Editora Atlas. 2012, p.32.
38
Por esses motivos, a Lei Maria da Penha não fere de modo algum o
princípio da igualdade que está consagrado no artigo 5º da CF/88, pois a mesma
visa amparar e proteger as mulheres que são vítimas de violência em seus lares, o
que sempre aconteceu, porém na esmagadora maioria das vezes o agressor ficava
impune.
A Constituição Federal de 88 tutela a igualdade substancial, ou seja, de
fato, e não a igualdade em abstrato, logo a Lei Maria da Penha é constitucional, já
que o tratamento especial e favorável à mulher está legitimado e justificado por
critério valorativo, tentando equilibrar existencialmente e socialmente o gênero
feminino, e servindo em conseqüência à igualdade de fato, que é tutelada pela
Constituição Federal de 88.
As palavras de Marcelo Lessa Bastos afirma a constitucionalidade da Lei:
“[...]a Lei é o resultado de uma ação afirmativa em favor do mulher vítima de violência doméstica e familiar, cuja necessidade se evidenciava urgente. Só quem não quer, não enxerga a legitimidade de tal ação afirmativa que nada obstante formalmente aparentar ofensa ao princípio da igualdade de gênero, em essência, busca restabelecer a igualdade material entre esses gêneros, nada tendo, deste modo, de inconstitucional.”45
3.2 atendimento pela autoridade policial – fase pré-processual
Mais uma vez faz-se necessário dizer que a lei Maria da Penha foi criada
objetivando corrigir uma terrível realidade histórica. A Ausência de Lei própria que
amparasse as vítimas, as desestimulavam na hora de denunciar tornando os crimes
cometidos dentro dos lares quase inexistentes para o meio jurídico. Quando as
vítimas iam até uma delegacia para narrar o que sofria, muitas das vezes, era
ridicularizada, sendo até mesmo questionada sobre o que ela tinha feito para
merecer tal agressão, o que a fazia se sentir culpada pela agressão que sofrera.
Com a implantação da Lei Maria da Penha houve uma retomada dos
procedimentos de investigação pela polícia judiciária através da instauração de
45 BASTOS, Marcelo Lessa. Violência doméstica e familiar contra a mulher – Lei “Maria da Penha”: alguns comentários . ADV Advocacia Dinâmica, Seleções Jurídicas, nº 37p. 1-9, dez. 2006. p. 2.
39
inquérito policial, o que para vítima é muito importante já que o seu caso não pode
mais ser deixado de canto, nem muito menos ser menosprezado.
Todo o procedimento policial foi alterado. Atualmente a vítima
comparecendo a delegacia e registrando a ocorrência, deve receber proteção
policial, e quando for necessário, deverá ser encaminhada para receber atendimento
médico, podendo ser acompanhada até sua casa com o objetivo de recolher seus
pertences e ainda poderá receber transporte para abrigo seguro, em caso de risco
de morte. Logo, percebe-se que permanece com a polícia a responsabilidade de
investigar e proteger a vítima através de varias medidas.
Nos artigos 11 e 12 da Lei 11340/06 encontramos as providências a
serem tomadas pela policia imediatamente após o registro de ocorrência:
Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências: I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário; II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal; III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida; IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar; V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis. Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal: I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada; II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias; III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência; IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários; V - ouvir o agressor e as testemunhas; VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele;46
46 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.912-913.
40
Vale ressaltar que no artigo 11 encontram-se as medidas de proteção e
assistenciais que no artigo 12 temos os procedimentos que a polícia deve adotar
após o registro de ocorrência, destinados à formação do inquérito policial.
Com isso temos que ao receber a notícia de um crime de violência
cometido no âmbito doméstico, a autoridade deve lavrar o boletim de ocorrência;
tomar a termo a representação da vítima, que será a peça inicial do inquérito e
tomara a termo o pedido de medidas protetivas formulado pela vítima. Esse último,
segundo Fredie Didier, poderá ser feito, pois a vítima é dotada de capacidade
postulatória para pedir a concessão de medida protetiva não sendo necessário estar
acompanhada de advogado ou defensor público.47
Após realizar as diligências, a autoridade policial deve remeter no prazo
de 48 (quarenta e oito) horas, expediente ao Juiz com o pedido das medidas
protetivas que foram requeridas pela ofendida, para que as medidas emergenciais
sejam efetivadas pelo Juiz competente.
Contudo, esta medida não obsta a instauração do inquérito policial, que
deve seguir seu rito normal, tendo o delegado o prazo conclusivo de 30 dias se o
indiciado estiver solto e 10 dias nos casos em que o indiciado estiver preso.
Ao elaborar o pedido de medidas protetivas de urgência da ofendida, a
autoridade policial deve mencionar alguns requisitos obrigatórios, como nome
completo e qualificação da requerente e do agressor; nome e idade dos
dependentes da vítima (caso haja); descrição sumária dos fatos, para fins de
tipificação penal e enquadramento da hipótese fática concreta nas modalidades de
violência relacionadas nos artigos 5º e 7º da Lei 11.340/06 e relação das medidas
pretendidas pela vítima dentre as previstas nos artigos 22 a 24 da Lei Maria da
Penha.
Além de tudo que foi dito acima, a autoridade policial pode ainda, de
ofício, representar pela prisão preventiva do agressor, devendo encaminhar sua
47 DIDIER JÚNIOR, Fredie; OLIVEIRA, Rafael. Aspectos processuais Civil na Lei Maria da Penha (Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher). In: PEREIRA, Rodrigo Cunha (cord.) Família e Responsabilidade: Teoria e prática do direito de família. Porto Alegre, ed. Magister/IBDFAM, 2010. p 318.
41
representação para o juiz o mais breve possível, de acordo com o que diz no artigo
20 da Lei 11340/06. 48
Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.49
3.3 Rito processual
O artigo 13 da Lei Maria da Penha determina que seja aplicado o Código
de Processo Penal de forma subsidiária, sendo necessário para tal, a análise do
coso concreto para se definir qual o procedimento será.
Art.13 Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com o estabelecido nesta Lei.50
Como a Lei prevê no artigo 41 que “ao crimes praticados com violência
doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se
aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995”51, que é o conhecido como
procedimento sumaríssimo, restam apenas a aplicação do procedimento comum e
do especial, este último previsto no art. 394 do CPP.
Segundo o parágrafo primeiro do artigo 394 do CPP, o procedimento
ordinário será aplicado quando a sanção máxima cominada ao crime for igual ou
superior a 4 anos de pena privativa de liberdade. Já para o procedimento especial,
os crimes de violência doméstica cometidos nesta circunstância devem observar as
48 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p.189-193. 49 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.914. 50CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, op. cit. p.913. 51 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, op. cit. p. 916.
42
regras especiais previstas no CPP, como é o caso da Calúnia, Injúria e Difamação,
com procedimento especial previsto nos art. 519 e seguinte do CPP.
Quanto ao fato de haver o cometimento de contravenções penais com
violência doméstica e familiar contra a mulher, temos uma divergência de
entendimentos não pacificados onde temos doutrinadores que defendem ser
possível a aplicação da Lei Maria da Penha nesses casos, como o Lênio Luis Streck,
alegando que “ao definir violência e familiar contra a mulher, a Lei Maria da Penha
optou por abranger “qualquer ação ou omissão” que cause violência domestica e
familiar contra a mulher, dando, portanto, um sentido muito abrangente para o termo
violência, o que poderia, perfeitamente, abarcar contravenções penais”52 , e temos
quem defenda não ser cabível, como a autora Alice Bianchini, que alega que “o fato
é que se está diante de uma norma processual penal com implicações diretas e
marcantes para o réu, já que a opção pelo afastamento da Lei 9.099/95 implica a
impossibilidade de se cogitar sobre a aplicação de benefícios que lhe são muito
favoráveis: transação penal e suspensão condicional do processo [...] não se
admitindo, portanto, a interpretação extensiva”.53
3.4 Criação dos Juizados de Violência Doméstica
A maior inovação trazida pela Lei Maria da Penha foi a criação dos
Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM), como já fora
dito em capítulos anteriores, que tem competência cível e criminal, conforme
previsão do artigo 14 da própria lei.
Por meio dos juizados criados, foi possível haver a centralização em um
único processo judicial de todos os meios de garantia dos direitos das mulheres em
situação de violência doméstica e familiar, sendo permitido pelo mesmo juiz,
preservando a conexão entre litígios cíveis e criminais, fossem julgados o pedido de
divórcio e ação de alimentos, levando em consideração os fatos envolvidos nestas
ações no momento em que for apreciar ações que decorrem das práticas de
violência relacionadas a estes conflitos familiares.
52 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p.195 53 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: op. cit. p.197
43
Antes de serem criados os Juizados de Violência Doméstica, a mulher
precisava buscar seus direitos em diferentes órgãos do poder Judiciário, o que lhe
dificultava o acesso à justiça, já que envolvia diversos custos e demora na prestação
jurisdicional, o que desmotivava ainda mais a mulher violentada.
Porém, mesmo com a previsão legal para criação dos Juizados de
Violência Doméstica, vemos que ainda há um número reduzido dos mesmos no
Brasil. Também observamos que muitas das vezes a dupla competência não está
sendo observada em muitos casos. Não basta somente a lei prever, é necessário
que haja movimentos que incentivem e fiscalizem.
A Lei também inovou quanto ao horário para serem realizados os atos
processuais desses juizados, onde segundo o art. 14, parágrafo único “os atos
processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem as
normas de organização judiciária”. Esse fato dá-se pela necessidade de que
providências como a imposição de medidas protetivas de urgência sejam tomadas
em um período do dia que o acesso às autoridades seja mais dificultoso, em que
muitas repartições públicas estão fechadas, qual seja, a noite. 54
3.5 Exceções a Competência dos Juizados de Violência Doméstica
A competência para processar e julgar os crimes cometidos com violência
doméstica e familiar contra a mulher é da Justiça Comum, entretanto, há exceções
previstas constitucionalmente, como os crimes de competência da Justiça Federal
ou Militar e os crimes de competência do Tribunal do Júri.
Quanto aos crimes de competência da Justiça Federal ou militar, temos
que estes serão processados e julgados pela Justiça Federal, onde temos por
exemplo, um caso de violência do marido contra a mulher praticada dentro de um
navio, respaldado pelo art. 109 da CF/88.
Embora a lei não faça expressa previsão da criação dos Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher no âmbito da Justiça Federal,
usamos a ampla aplicação do art. 4 da Lei 11340/06, onde prevê que na 54 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p.202.
44
interpretação da Lei Maria da Penha devem “ser considerados os fins sociais a que
ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação
de violência doméstica e familiar”.55 Logo não há dúvidas que as medidas protetivas
de urgência podem ser aplicadas no âmbito federal.
Já quanto aos crimes de competência do Tribunal do Júri temos
correntes que divergem entre si. Como aos processos de competência do Júri é
aplicado um procedimento divido em duas fases, qual seja a judicium accusationis e
a judicium causae , temos a primeira que corrente que defende que a primeira fase
do júri, em processos que envolvam violência doméstica, deve ocorrer nos Juizados
de Violência Doméstica e não no Tribunal do Júri, devendo apenas a segunda fase
deve ocorrer no mesmo, temos a segunda corrente que defende que todas as duas
fases devem ocorrer no Tribunal do Júri e temos a terceira corrente que defende que
todo o processamento deve-se dar perante os Juizados de Violência Doméstica.
A primeira corrente, onde a ela filia-se o STJ, na decisão do HC 73.161, e
a autora Maria Berenice Dias, defende que a fase de judicium accusationis deve
ocorrer perante os Juizados e que a fase de judicium causae deve ocorrer perante o
Tribunal do Júri, devendo o juiz presidente do Tribunal do Júri proferir a pronúncia.
Nas palavras de Maria Berenice Dias,
“Os crimes dolosos contra a vida são julgados pelo Tribunal do Júri. Porém, sendo a vítima mulher e tendo o fato acontecido em decorrência de Vínculo doméstico, a instrução do processo deve ocorrer nas varas especializadas de combate a violência doméstica, sob pena de a vítima de tentativa de homicídio, ficar privada dos benefícios da Lei Maria da Penha. No fim da primeira fase, antes da pronunciado réu, é que o processo deve ser encaminhado à Vara do Júri para o julgamento em plenário. Ainda que o processo deva tramitar no JDFM, a sentença de pronúncia cabe ao presidente do Tribunal do Júri (CPP, art. 407). Assim, o deslocamento da ação ocorrerá após a inquirição das testemunhas e do oferecimento das alegações finais.”56
55 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.911. 56 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.142.
45
Dentro dessa corrente temos uma outra sub-corrente onde que entende
que assim como Maria Berenice Dias, entende que a fase de judicium accusationis
deve ocorrer perante os Juizados e que a fase de judicium causae deve ocorrer
perante o Tribunal do Júri, porém o juiz quem deve proferir a pronúncia é o Juiz do
Juizado de Violência Doméstica. A essa corrente filia-se a autora Alice Bianchini.
A segunda corrente utiliza como argumento a análise do artigo 5º, XXXVIII
da CF/88 para defender que as duas fases devem ocorrer perante o Tribunal do Júri,
já que a competência dos crimes dolosos contra a vida é do mesmo.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:[...] XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;57
A terceira corrente utiliza uma reflexão acerca do art. 14 da Lei 11340/06,
que determina que os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
“poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos
Estados, para o processo, julgamento e a execução das causas decorrentes da
prática de violência doméstica e familiar contra a mulher”58. Defendem que o
dispositivo diz que todo o processamento deve ocorrer perante os Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. 59
57 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa do Brasil, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.16. 58 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.913. 59 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p.202-205.
46
3.6 Medidas Protetivas de Urgência
A Lei Maria da Penha traz em seus artigos um rol de medidas que visam
proporcionar a efetividade de seu objetivo, ou seja, garantir a mulher o direito de
viver uma vida sem violência. Para tal, é necessário que o juiz, o Ministério Público e
autoridade policial trabalhem em conjunto, agindo de modo efetivo.
A vítima, em sede policial, faz o requerimento das medidas protetivas, que
ao serem enviadas ao juiz devem ser determinadas, caso o juiz encontre respaldo
para tal, podendo o mesmo requisitar o auxilio da força policial para garantir o
cumprimento da medida.
As medidas protetivas visam proteger direitos fundamentais, buscando o
fim da violência e das situações que a tornam possível. Elas não servem como
preparo processual, não se vinculam a processos principais nem são acessórias dos
mesmos, mas sim visam proteger a pessoa da mulher ofendida, cumprindo o
disposto no art. 226, §8º da CF/88, seu fundamento, que diz que “O Estado
assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram,
criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.60
As palavras da ilustre doutrinadora Maria Berenice Dias servem como
uma melhor explicação para este instituto:
As tutelas inibitórias e reintegratórias que cabem ser asseguradas como medidas protetivas de urgência são espécies de tutela específica: modalidade de tutela jurisdicional em que se busca viabilizar à parte um resultado específico. Têm por finalidade impedir atos ilícitos, o que justifica a possibilidade de o juiz impor ao agressor deveres de fazer, não fazer ou de entregar coisa, no intuito de tutelar especificamente o resultado almejado pela ofendida. 61
60 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa do Brasil, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.115. 61 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.149.
47
As medidas protetivas de urgência têm características próprias que estão
elencadas nos artigos da própria Lei 11340/06, sendo o caráter primordial de
urgência, previsto no art. 18, onde dita que o juiz deve, em um prazo de 48 horas,
decidir sobre o deferimento ou não da medida protetiva pleiteada; as medidas
podem ser requeridas pela própria ofendida, pelo delegado ou pelo Ministério
Público, podendo ser decretada de ofício pelo juiz, conforme os art. 19 e 20; podem
ser aplicadas isolada ou cumulativamente (art. 19, §2), não havendo necessidade de
audiência das partes, nem de manifestação prévia do Ministério Público, para a
concessão das medidas (art. 19, §1); pode ocorrer a substituição de uma medida
protetiva por outra a qualquer tempo, desde que necessário para a proteção da parte
e que sua eficácia esteja garantida (art. 19, §2); e por fim as medidas dividem-se em
duas espécies, que estão compreendidas nos arts. 22 e 23/24, sendo as que
obrigam ao agressor e as que são dirigidas à proteção da vítima e de seus
dependentes, respectivamente. 62
Das Medidas Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios. § 1o As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.
62 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 164-165.
48
§ 2o Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso. § 3o Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial. § 4o Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil). Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento; II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor; III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos; IV - determinar a separação de corpos. Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras: I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida; II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial; III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor; IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida. Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo. 63
As medidas que obrigam ao agressor, como já dito acima, que
compreendem o afastamento do lar; a proibição de aproximação; a proibição de
contato; a proibição de freqüentar determinados lugares; restrição ou suspensão de
visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar
ou serviço similar; e prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
63 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.914 – 915.
49
As medidas protetivas dirigidas à mulher correspondem a
encaminhamento a programa de proteção ou de atendimento; recondução ao
domicílio, após afastamento do agressor; afastamento da ofendida do lar; separação
de corpos; restituição de bens; proibição temporária para a celebração de atos e
contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum; suspensão de
procuração; e prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas
e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a
ofendida.64
3.7 Atores da Lei
Para lidar com a lei Maria da Penha e seus tutelados é necessário que
todos estejam capacitados especialmente para compreender a violência doméstica e
familiar baseada no gênero, suas causas e efeitos, seu histórico e contexto de
atuação. Para tal, vemos que deve haver uma sensibilização do problema, um
estudo do tratamento que deve-se dar as vítimas e a todos os envolvidos.
Os atuadores jurídicos, que compreendem os Defensores Públicos, o
Advogado, o Delegado de Polícia, o Magistrado e o Ministério Público devem de
acordo com o art. 8, VII da própria lei Maria da Penha, estar capacitados para que
sua atuação sirva como aliada da Lei.
As atuações, de todas as relatadas acima que merecem mais atenção é a
do Ministério Público como veremos a seguir.
3.7.1 Atuação do Ministério Público
Os artigos 25 e 26 da Lei Maria da Penha apresentam o rol de atividades
complementares do Ministério Público, no caso do Promotor de Justiça atuante no
Juizado de Violência Doméstica ou junto à Vara Criminal competente.
64 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p. 166-173.
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Art. 25. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher. Art. 26. Caberá ao Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário: I - requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de segurança, entre outros; II - fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas; III - cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.65
O Ministério Público tem o importante papel de defender os interesses
sociais e individuais indisponíveis, de acordo com o art. 127, caput da CF/88, que diz
que “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional
do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis”.66
Sua principal atuação é no âmbito judicial, onde o mesmo deve intervir
tanto em processo cíveis como criminais, pois a vítima encontra-se em situação de
vulnerabilidade e necessita de especial atenção do promotor de justiça.
O Ministério Público tem legitimidade para agir como parte, na condição
de substituto processual, de acordo com o disposto nos arts. 19, §3º c/c 37 da Lei
11340/06, e como fiscal da lei, ou custus legis, como é mais conhecido, onde a sua
não intervenção gera nulidade processual, de acordo com previsão dos arts. 25 c/
26, II ambos da Lei 11340/06 c/ 82, III, c/c 84, ambos do CPC.
O Ministério Público dentro de suas atribuições também pode requerer
medidas protetivas, não precisando aguardar o pedido da vítima. Também é
legitimado para requerer a prisão preventiva do agressor ou sua requerer sua prisão
temporária.67
65 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.915. 66 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Constituição da República Federativa do Brasil, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.75. 67 67 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.168-170.
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3.7.2 Assistência Judiciária Obrigatória
Os artigos 27 e 28 da Lei Maria da Penha rezam que em todas as fases
do procedimento deve a ofendida ter o acompanhamento de um advogado, e caso a
mesma não o tenha, deverá ser nomeado pelo juiz defensor público na Vara que
esteja em exercício na Vara Criminal competente ou no Juizado para acompanhá-la:
Art. 27. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei. Art. 28. É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado.68 .
3.8 Representação e a possibilidade de retratação
Com a implantação da Lei Maria da Penha surgiu à dúvida acerca dos
delitos de lesão corporal leve e lesão culposa, onde não se tinha certeza se a ação
penal, nesses casos, continuava sendo condicionada a representação ou se tornara-
se pública incondicionada, pois nesse caso não seria possível a retratação da
representação. O STF decidiu esta questão através do julgamento da Ação
Declaratória de Constitucionalidade 19 e da Ação Declaratória de
Inconstitucionalidade 4.424, ambas de relatoria do Ministro Marco Aurélio, julgadas
em 08 de fevereiro de 2012. 69
Ele decidiu que a lesão corporal leve é pública incondicionada e que por
isso não é cabível a retratação da representação, só sendo a mesma cabível aos
crimes que ainda estavam condicionados a representação da ofendida.
68 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.915. 69 STF, ADC 19-3/610 e ADI 4.424, j. 08.02.12, rel. Ministro Marco Aurélio.
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Sendo assim, o crime de ameaça, por exemplo, ainda depende de
representação devendo a mesma ser tomada pelo policial na hora em que está
sendo feito o registro de ocorrência, e a retratação desta representação só poderá
ser feita perante o juiz em audiência especialmente designada para isso, que
acontece antes do recebimento da denúncia e deve ser ouvido o Ministério Público,
conforme previsto nos arts. 12, I e 16 da Lei 11340/06.
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal: I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada; Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.70
Ao longo do tempo surgiram várias indagações acerca da expressão
utilizada pelo legislador “renúncia à representação”, o que gerou grande dúvida
sobre o real significado da palavra renúncia. A dúvida é se significa renúncia,
retratação ou desistência, e várias posições doutrinárias surgiram sobre esse tema.
Para a doutrinadora Maria Berenice Dias, é necessário, primeiramente
definir as três expressões, dizendo que desistência “é o gênero que compreende as
espécies renúncia e retratação”71. Para ela, “desistir é tanto se quedar inerte, deixar
escoar a possibilidade de manifestar a vontade como tem o sentido de renunciar,
abrir mão da manifestação já levada a efeito, voltar atrás do que foi dito. Na esfera
penal “renúncia” significa não exercer o direito, abdicar do direito de representar.
Trata-se de ato unilateral que ocorre antes do oferecimento da representação. Já a
retratação é ato posterior, é desistir da representação já manifestada. Retratação é o
70 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.913. 71 DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3ª edição. Setembro de 2012. Ed. Revista dos Tribunais. 2013. p.97.
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ato pelo qual alguém retira a sua concordância para a realização de determinado
ato, que dependia de sua autorização.”72
A autora Alice Bianchini, faz suas as palavras do doutrinador Pinto Cunha,
e diz que não há que se falar em renúncia como previsto na lei e sim e retratação da
representação, pois “importa ressaltar que o termo renúncia não poderia ser
aplicado a um direito que já se exerceu: trata-se antes de uma reconsideração a
respeito do pedido-autorização manifestado pela vítima, do qual poderá, no máximo,
retratar-se”.73
3.9 Vedações estabelecidas pela Lei
Como já fora dito anteriormente a lei Maria da Penha faz várias inovações no meio
jurídico. Dentre elas está a não aplicação da Lei 9.099/95, a Lei dos Juizados
Especiais e de nenhum de seus institutos. Além disso, a Lei 11340/06 trouxe em
seus artigos algumas vedações, importantes para o processo e para a ofendida.
Abaixo, seguem os artigos que trazem esses importantes tópicos:
Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa. Art. 21. A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público. Parágrafo único. A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor. Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995. Art. 42. O art. 313 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IV: IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.”
72 Idem. 73 BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: 11340/2006: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. Ed. Saraiva, 2013. p.213.
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Art. 43. A alínea f do inciso II do art. 61 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com a seguinte redação: f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; Art. 44. O art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com as seguintes alterações: § 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. § 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.” (NR) Art. 45. O art. 152 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a vigorar com a seguinte redação: Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.” 74
74 74 CÓDIGOS 3 EM 1 SARAIVA: Legislação Especial – Lei 11.340/2006, 9ª edição. Ed. Saraiva, 2013. p.914-916..
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CONCLUSÃO
O presente estudo procurou analisar a Lei 11.340/2006, também
conhecida como Lei Maria da Penha, realizando um estudo acerca de seu contexto
de criação, de seus objetivos e de sue principal objeto tutelado, a mulher vítima de
violência doméstica.
Concluiu-se que a referida Lei provocou uma verdadeira revolução, na
forma de se prevenir e erradicar a violência de gênero, trazendo novos conceitos e
procedimentos, muito importantes para todos os envolvidos na agressão.
Uma das grandes novidades dessa Lei, foi a criação dos Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher – JVDFM, com competência cível e
criminal, e como conseqüência a não aplicação da Lei 9.099/95, o que proporcionou
maior seriedade e celeridade aos casos de violência doméstica contra a mulher.
Verificou-se que a Lei, ao ser editada, procurou diminuir o numero de
casos de violência, pois veio para assegurar à mulher o direito à sua integridade
física, psíquica, sexual e moral.
Percebemos que seus efeitos são positivos, principalmente porque está
se tentando colocá-la em prática. As mulheres estão a cada dia mais buscando a
proteção da Lei, que aos poucos tem tirado muitas mulheres de situação de perigo.
Vale ressaltar que as medidas protetivas de urgência previstas na Lei em questão,
tem sido grandes aliadas das mulheres, que se sentem mais amparadas e não mais
sozinhas. Estas medidas visam dar uma maior proteção à mulher vítima de violência,
dentre elas temos o afastamento do lar, impedimento de aproximar-se da ofendida e
seus familiares, restrição ou suspensão de visitas a dependentes menores,
prestação de alimentos provisionais, podendo até mesmo levar o agressor à prisão,
caso descumpra as determinações contidas nas medidas protetivas.
Podemos concluir que o Brasil, com a criação da Lei Maria da Penha,
avançou bastante nos últimos anos, no combate a violência doméstica contra a
mulher.
No entanto, é necessário que se continue dando importância ao tema e
principalmente que se continue fazendo valer os dispositivos da Lei 11.340/06, para
que continue diminuindo o número de casos de crimes cometidos conra as mulheres
dentro de seus lares.
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Faz-se necessário que o Estado juntamente com a sociedade, busquem a
cada dia pôr em prática os mecanismos trazido pela lei, buscando assegurar os
direitos das mulheres, protegendo não só elas, como também seus filhos e
familiares das garras do agressor, dando eficácia a lei.
Por fim, conclui-se que a Lei Maria da Penha, trouxe muitas inovações ao
nosso ordenamento jurídico, inovações essas para melhorar a vida das mulheres,
buscando trazer justiça e igualdade a quem sempre foi tratada de modo degradante
e humilhante, como o pó da sociedade. Sendo posta em prática, acredita-se que a
lei possa promover uma adequação entre as punições e a gravidade dos crimes
cometidos, e que a triste realidade em que vivemos possa ser modificada a cada dia.
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Anexo A
REPORTAGEM: MARIA DA
PENHA A mulher que sobreviveu à tentativa de assassinato pelo marido e
virou nome de lei
Texto retirado do site: http://revistatpm.uol.com.br/revista/82/paginas-vermelhas/maria-da-penha.html
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TPM 82
PÁGINAS VERMELHAS tamanho da letra
MARIA DA PENHA A mulher que sobreviveu à tentativa de assassinato pelo marido e virou nome de lei 11.03.2009 | Texto: Décio Galina, de Fortaleza | Fotos: Arquivo Pessoal
Maria da Penha Maia Fernandes é uma sobrevivente. Seu marido tentou matá-la duas vezes. A primeira, com um tiro nas costas que a deixou paraplégica. A segunda,
eletrocutada no chuveiro. Ela foi à forra – além de prender o criminoso, batizou a lei que protege a mulher vítima da vio lência doméstica
Arquivo Pessoal
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Maria da Penha tem sono pesado. Capota e só acorda no dia seguinte. Na madrugada de 29 de maio de 1983, porém, teve seu repouso interrompido pelo pior pesadelo da vida. “Acordei de repente com um forte estampido dentro do quarto. Abri os olhos. Não vi ninguém. Tentei me mexer. Não consegui. Imediatamente fechei os olhos e um só pensamento me ocorreu: ‘Meu Deus, o Marco me matou com um tiro’. Um gosto estranho de metal se fez sentir forte na minha boca, enquanto um borbulhamento nas costas me deixou perplexa.” Entre desmaios e devaneios, a mulher, então com 38 anos, tinha momentos de consciência. Por mais que estivesse acostumada com os gritos, as explosões de fúria e os empurrões do marido, Penha custava a acreditar que fora alvejada por um tiro de espingarda disparado pelo homem que escolheu para ser pai de suas três filhas (na época com 6, 5 e 1 ano e 8 meses). Não concebia tamanha covardia. “Quando os vizinhos chegaram ao meu quarto, demoraram a perceber o ferimento, pois eu estava de costas, com o sangue escorrendo no colchão.” Para acobertar sua intenção diabólica de assassinar a própria mulher em pleno sono, Marco se fantasiou de vítima de um suposto assalto: rasgou o pijama, pôs uma corda no pescoço e disse para a polícia que havia sido atacado por uns bandidos. O teatro não funcionou. Mas a verdade demorou, demorou quase 20 anos a aparecer e levar o economista e professor universitário colombiano Marco Antonio Heredia Viveros para onde devia estar há tanto tempo: atrás das grades.
Os quatro meses seguintes após a tentativa de homicídio foram de cirurgias em hospitais de Fortaleza, onde Penha nasceu, e de Brasília. Maria da Penha Maia Fernandes, farmacêutica bioquímica formada pela Universidade Federal do Ceará e mestre em parasitologia pela USP, resistiu firme, mas sua vida não seria mais a mesma. “Após vários exames, chegou a hora da avaliação que diria se eu ia voltar a andar ou não. Como profissional da saúde, antevia o fatídico diagnóstico. Como paciente, ousava sonhar, pedir aos meus santos... Enfim, declararam: nunca mais andaria.” De volta para casa, na cadeira de rodas, Penha ainda teve que fazer força para escapar de outra atrocidade do marido: ele tentou eletrocutá-la embaixo do chuveiro. Marco, então, foi embora para ficar com uma amante no Rio Grande do Norte.
Ela mudou a história E Penha transformou sua existência na luta pelos direitos das mulheres que sofrem com a violência doméstica. Em 2001, conseguiu que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenasse o Brasil por negligência e omissão pela demora na punição do marido. Daí a semente para que, em 2006, o presidente Lula sancionasse a lei 11.340, a lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir a violência familiar contra a mulher e prevê que os agressores sejam presos em flagrante ou tenham prisão preventiva decretada. Além disso, aumenta a pena máxima de um para três anos de detenção e acaba com o pagamento de cestas básicas , como acontecia anteriormente com os agressores. Hoje, Penha é colaboradora de honra da Coordenadoria de Mulher da Prefeitura de Fortaleza, dá palestras em faculdades e recebe homenagens por todo o país. Ela acredita que o ex-marido viva no Rio Grande do Norte. Em um sábado de sol e calor (será que algum dia faz frio em Fortaleza?), Maria da Penha recebeu, em casa, a reportagem da Tpm para lembrar dos dias mais dramáticos e dos mais felizes de seus 63 anos. Tpm. Como foi a sua infância em Fortaleza? Maria da Penha. A minha mãe sempre procurou bons colégios. Ela primava em dar uma educação de valores, não só de instrução. Estudei em colégio dirigido por irmãs. Na hora de brincar, ia para a calçada, jogava bola, pulava corda. Dia de domingo a gente ia para a praia. Meu pai levava as amigas da gente junto numa caminhoneta. Ele gostava de pescar nas pedras. O primeiro namorado apareceu logo? Ah, sim, eu era garota precoce, quer dizer, sempre fui muito alta para a minha idade. Quando tinha 12 anos, meu corpo já era de gente grande. Namorei uma pessoa que morava perto daqui. Acharam um absurdo. Tão nova, namorando. Só podia na morar depois dos 15 anos... Praticava algum esporte? Sim, na escola jogava vôlei, era levantadora, e pingue-pongue. Cheguei a participar de campeonatos. Ano passado, ganhei medalhas em tênis de mesa para pessoas com deficiência.
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Maria da Penha, eleita a Rainha dos Calouros, ingressa no curso de farmácia e bioquímica, em 1962 Quando surgiu o desejo pela bioquímica? Queria uma área médica, mas não medicina, porque não iria conseguir enfrentar uma cirurgia. Minha avó sugeriu que fizesse farmácia. Fui para a área de análises clínicas. Sou da primeira turma da Faculdade de Farmácia e Bioquímica, de 1966, na Universidade Federal do Ceará. Nesse período você morava com os pais? Não, aos 19 anos eu casei, movida por uma paixão violenta. Depois de mais ou menos um ano o casamento não deu certo. Eu querendo avançar, progredir nos estudos, e ele, muito machista, não aceitava o estudo, não aceitava trabalhar fora. Daí separei, viajei para continuar os estudos na USP, onde concluí o mestrado na área de parasitologia. Fiquei no apartamento de uma amiga. A vida universitária foi muito agradável. Foi aí que você conheceu o seu segundo marido, o Marco Antonio? Foi. Ele era professor de economia. Chegou a São Paulo e foi morar no apartamento de um grupo que eu conhecia, estrangeiros da Colômbia, da Bolívia, da Venezuela, do Equador. O grupo era unido para passear, conversar, ir às festas. O que te chamou a atenção nele? Achei a conversa interessante. Até o dia em que ele me levou ao cinema. Não lembro se foi na avenida Paulista ou no Iguatemi. Depois passou a ir ao apartamento que eu dividia com mais mulheres. Comecei a gostar do jeito dele de ser prestativo. Se tivesse um chuveiro elétrico quebrado, ele já ia consertando. Isso aí chamou a atenção inclusive da mãe de uma colega da Paraíba que passava temporada em São Paulo. Ela dizia: “Ah, se a minha filha arranjasse um namorado igual ao seu...”. Depois de alguns meses resolvemos juntar os mulambos. Como eu era desquitada, casamos na embaixada da Bolívia, onde tínhamos uns conhecidos. Minha primeira filha nasceu em São Paulo. Você voltou antes para Fortaleza e ele veio te encontrar aqui alguns meses depois? Foi. Mas aí ele começou a mostrar um comportamento agressivo. Já estava grávida da segunda filha. Ele tinha um ciúme exagerado da minha família. Quando a segunda filha nasceu, os problemas aumentaram, a decepção também. Perto de a terceira filha nascer, ele começou a bater nas crianças. Já tinha perdido toda a esperança no relacionamento. Só me preocupava em evitar situações que pudessem incomodá-lo. Você começou a fazer manobras para preservar as filhas... Exato. Tentei convencê-lo de uma separação. Era a única coisa que eu podia fazer. Não existia lei pra me proteger ou alguma coisa pra me orientar. Você abria a sua situação para amigas? Pedia conselhos? Abria. Elas falavam que conheciam outros casos, que era assim mesmo. Diziam para eu começar a rezar. O que ele dizia quando você tocava no assunto da separação? Desconversava. “Que besteira é essa? Separar por quê?” Quando percebia que ele chegava irritado na hora do almoço, eu nem comia e saía com as crianças. Por que você acha que ele não aceitava a idéia da separação? Acho que ele já devia ter alguma premeditação. Um ou dois meses antes de ele me balear, pediu para eu assinar um seguro de vida para ele. Eu não aceitei. Você achava que ele podia te matar? Na época, achava que poderia acontecer algo de grave comigo, mas me recusava a acreditar no assassinato. Antes de ele te balear, houve alguma agressão física? Houve.
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No dia da formatura da faculdade, com os pais Que tipo? Jogar prato em mim. Mas eu me antecipava e não deixava ele me acertar. Não aconteceram outras coisas porque eu evitava. Não deixava chegar perto.
Por que ele te jogou um prato? Uma vez ele não gostou da comida, era uma feijoada, achou não-sei-quê, jogou o prato, que caiu no chão e cortou a perna da minha filha. A essa altura, você já devia estar perdida... Não sabia o que fazer. Estava realmente perdida. Qual era o direito que a mulher tinha?Solução não existia. Experimentei até encontro de casais. Armei toda a situação para uma amiga minha nos convidar. Socialmente ele era uma pessoa maravilhosa, nunca demonstrava para o público quem ele era na realidade. Tem gente que acha que violência doméstica está relacionada a classes sociais menos favorecidas. O seu caso e o de suas amigas comprovam o contrário, correto? Sim. As mulheres de uma classe social mais elevada estão conseguindo ser atendidas pela lei Maria da Penha, só que tudo de forma discreta. Não aparece na mídia. Elas só aparecem na estatística. Essas mulheres têm advogados que não permitem que os casos saiam nas manchetes. A lei Maria da Penha auxilia classes menos favorecidas também. O problema é que as pessoas de menor poder aquisitivo ficam na dependência de o processo andar pela via gratuita e daí demora mais. É terrível isso, mas quem tem amizades, conhece alguém no juizado, faz a coisa andar mais rápido. É possível traçar o perfil do agressor doméstico? Muitas vezes não é um bandido ou uma pessoa má. Ele tem aquele comportamento agressivo [o agressor mais leve] porque viveu numa família onde isso era normal. Ele acha que agredir é normal. É cultural. Por isso que, com a lei, há um sistema de atendimento ao agressor. Nós temos que desconstruir essa
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cultura com diversos mecanismos: o da educação; a pena, que tem que ser exemplar; e a questão do atendimento ao agressor. Mas tudo isso é disparado pela denúncia? Exatamente.Se a mulher não denuncia, como o homem que não a trata bem vai ser penalizado? O homem que agrediu uma mulher pela primeira vez tem salvação? Tem. Mas a mulher precisa procurar a delegacia e conscientizar o cara de que ela tem como recorrer, caso a agressão se repita. Se ele gostar mesmo dela, vai aprender a respeitá-la. Tenho referências de comunidades em que, quando prenderam o primeiro homem em flagrante, os outros homens pararam de bater nas mulheres. O que acontece mais: a mulher procurar a delegacia na primeira agressão ou apanhar muito até buscar ajuda? O segundo caso. A violência doméstica obedece a um ciclo com as seguintes etapas: violência, pedido de perdão do agressor, nova lua-de-mel e nova agressão, que aumenta a cada ciclo. Conheço muitas mulheres aceitas em casas de abrigo que não podem nem voltar pra casa por que correm o risco de serem mortas. Por que a mulher muitas vezes nem denuncia? Porque o marido é um bom pai. Ela pensa mais nos filhos. Muitas mulheres de classe mais alta deixam de se separar porque o marido diz: “Posso me separar, mas vou te dar somente o que você tem de direito”. Como é que essa mulher vai poder sustentar o filho no mesmo padrão? Então, ela se sujeita. Como foi a noite em que o Marco tentou te matar com um tiro de espingarda? Era um momento feliz porque ele havia conseguido um emprego de professor no Rio Grande do Norte, então passava semana sim semana não lá. No dia do crime, ele havia chegado de viagem. Fui buscá-lo no aeroporto, exigência dele para manter as aparências. À noite, fomos visitar uma amiga e fiz questão de levar as meninas. Ele fez um caminho por lugares ermos e o carro atolou. Hoje penso que, se esti vesse sozinha, teria morrido ali. Voltamos pra casa umas 11 da noite. Levei as crianças pra dormir. Tomei banho, troquei de roupa e ele ficou na sala, vendo TV. Dormi. Acordei com um tiro nas costas. A primeira idéia que me veio à cabeça foi que o Marco havia me matado. Aí , escutei o ferro e a tábua de engomar caírem na área de serviço. Pensei: “Puxa, fiz um mal juízo dele...”. Não me mexia. Tinha levado um tiro quase letal. Aí, não sei se desmaiei, acordei e vi um monte de gente perto de mim. Me disse ram que o Marco tinha sido encontrado com o pijama rasgado e uma corda no pescoço, que ele tinha lutado com uns assaltantes e que tentaram enforcá-lo. A história real: ele armou todo o circo.
Na feira do Embú das Artes, em São Paulo, na época em que fazia mestrado na USP Em que pensava na cama, quando sentiu que havia sido atingida? Naquele momento, só fiz rezar. Que minhas filhas não ficassem órfãs de mãe. Seja de que jeito for, mas eu não quero morrer. Pedi a Deus isso e ele me atendeu.
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Você é religiosa? Não sou de botar joelho no chão e de ir todo dia à missa, mas gosto de assistir a uma missa quando o sermão é bem conduzido. Acho que tem coisas inexplicáveis regidas por uma força superior. Quando você começou a entender o que realmente aconteceu naquela noite de maio de 83? Quando uma amiga me visitou em Brasília. Ela disse: “Você está sabendo de um boato em Fortaleza que foi o Marco que atirou em ti?”. Eu não acreditei... Os boatos começaram a apontar para ele porque a história estava mal contada? Os vizinhos contribuíram muito para a verdade aparecer. Eles escutaram o tiro e correram pra rua, então não houve chance nem tempo de fugirem da minha casa sem alguém ver. O Marco disse ter sido ferido com um tiro, só que não foi. Ele mesmo se feriu, talvez com uma faca, no ombro, e a minha mãe quando fez o curativo achou estranho: “Marco, só esse machucado aqui e você diz que foi uma bala?”. Durante o tratamento você foi levada para Brasília? Fiquei dois meses hospitalizada aqui em Fortaleza e dois meses lá em Brasília. Ele te visitava no hospital? Sim, pra fazer raiva. Tinha medo porque, na primeira vez que ele chegou, foi muito arrogante quando não tinha ninguém no quarto. Minhas irmãs ficavam dentro do banheiro por segurança. Chegava brigando, reclamando das crianças. Por duas vezes, quando chegou ao quarto do hospital e eu estava cochilando, me acordou dando uns chutes na cama, dizendo: “Não quer falar comigo, não?”. O período de quatro meses longe das filhas foi o pior momento da sua vida, não? Foi muito doloroso. Foi o pior momento. Chorava muito lá em Brasília. Às vezes, à noite, ouvia uma criança chorar na enfermaria e pensava nelas na hora. Receber a notícia de que não andaria nunca mais também deve ter sido muito pesado. Do que sente mais saudades da época em que andava? Tenho saudades do forró. Adorava dançar. Também tenho saudades das ondas “lambendo” as pernas quando elas recuavam para o mar. Lembro da areia saindo de baixo dos pés. É verdade que, duas semanas após voltar para casa, ele tentou te eletrocutar no chuveiro? Alguns dias depois da minha chegada de Brasília, ele me perguntou se eu não queria tomar banho. Me conduziu, empurrando uma cadeira de banho, ao banheiro da suíte, abriu o chuveiro elétrico, eu apoiei na parede e fiz assim [estica o braço] só pra ver a temperatura da água. Senti uma corrente [elétrica] passar... Aí me empurrei e disse que estava dando choque. Ele disse: “Que besteira!”. A minha cadeira era toda de ferro... Fui pra trás e disse que não ia tomar banho, dei um grito e as meninas [babá e empregada], como sempre estavam por perto, apareceram logo e me ajudaram. Pouco tempo depois ele resolveu ir embora. Meu Deus, quando ele foi viajar ainda veio me dar um beijo! Na ausência dele, consegui dormir. Até então só dormia de dia, à noite tinha medo. Fui ao escritório, abri umas gavetas e descobri que ele tinha uma amante no Rio Grande do Norte. O dia em que ele viajou de vez foi o dia mais feliz da sua vida? Com certeza. Você sabe o que é dormir às oito horas da noite e acordar às dez horas da manhã? Recuperei as forças, cabeça serena. Esse dia, venci uma etapa. A partir daí, procurei a polícia para dar depoimento. Aí começou a luta de mais de 19 anos para você provar que foi vítima de uma tentativa de homicídio. Pensou que ia demorar todo esse tempo? Aí que fui conhecer o que é a Justiça. Aí que vi que a vítima e nada são a mesma coisa.
Quando o presidente Lula sancionou a lei Maria da Penha, em 7 de agosto de 2006, ao lado de Ellen Gracie, na época presidente do Supremo Tribunal Federal
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Demorou quanto para você desistir da Justiça brasileira e procurar entidades internacionais? Se eu tivesse conhecimento antes, já tinha chamado há mais tempo. Mas nem poderia, pois precisava esgotar os recursos internos do país. Mas quase que o crime prescreveu? Isso me deixava desesperada. No momento em que o Brasil foi condenado pela Organização dos Estados Americanos, relaxei. Na condenação, dizia que as leis do Brasil teriam que mudar, pois negligenciavam os casos de violência doméstica. Quando existe impunidade, o agressor acaba sendo estimulado. Como o seu caso foi reconhecido internacionalmente? O principal foi a publicação do meu livro de 150 páginas [Sobrevivi... Posso Contar], em 94. Repercussão muito grande. Foram mil exemplares, todos vendidos. Trabalho na publicação de uma segunda edição com atualizações de tudo o que aconteceu depois de 1994. Você ficou satisfeita com o período que ele ficou preso (Marco foi condenado a dez anos, mas cumpriu na prisão menos de um terço da pena)? A minha alegria foi o Brasil ter sido condenado internacionalmente. Acho que o tempo que ele ficou preso não interfere em nada. O importante é o que se conquistou, diversas mulheres já foram salvas pela lei. A decepção que você teve com o sistema judiciário brasileiro se compara com a decepção amorosa?Não, é bem maior a decepção que tive com a Justiça. A raiva é bem maior. Uma Justiça que você precisa de pistolão não é Justiça. É muito triste. Qual sua grande batalha hoje? Ampliar o número de delegacias da mulher e que todos os lugares tenham esse atendimento especializado com pessoas capacitadas. E você tem algum lazer? Domingo de manhã gosto de assistir a programas de debate na TV. Ler jornal, só de domingo e segunda. Estou sem tempo para nada. Tenho uma pilha de livros pra ler, estou doida pra terminar de escrever meu livro, dou palestras, recebo homenagens. Tem pesadelos com as coisas que te aconteceram? Não. Exorcizei tudo com o livro que escrevi. Foi a minha carta de alforria. Muita coisa deixei de contar, e tem coisas que esqueci mesmo. Faço questão de não lembrar. Às vezes, toca alguma música que me faz lembrar daquele tempo, quando as crianças eram pequenas... Qual música? “Ursinho Pimpão”. Não posso ouvir essa música. * * *
Tpm + Maria da Penha: uma entre muitas A lei que pune e coíbe a violência contra mulheres leva o nome da brasileira que lutou por quase 20 anos para ver seu agressor atrás das grades. Maria da Penha é um caso extremo do que acontece todos os dias com milhões de mulheres no Brasil e no mundo. Mas ainda hoje a violência contra mulheres atinge números assustadores. Os números abaixo são prova disso. Vale dar uma olhada. Dormir com o inimigo não é algo tão raro assim Por Paula Rothman - Segundo a OMS, 70% das mulheres assassinadas no mundo são vítimas de seus próprios companheiros.
- Um em cada cinco dias de falta ao trabalho no mundo é causado pela violência sofrida pelas mulheres dentro de suas casas.
- No Brasil, o Ibope mostra que 33% da população aponta a violência contra as mulheres como o problema que mais preocupa a brasileira na atualidade – mais do que o câncer de mama e o de útero (17%) e a Aids (10%).
- No Brasil, mais de 2 milhões de mulheres são espancadas a cada ano por maridos ou namorados atuais e antigos.
- Na mesma pesquisa, 14% dos entrevistados acreditam que a mulher deve agüentar agressões em nome da estabilidade familiar.
- 19% dos homens admitem que existem situações que permitem a agressão, assim como 13% das mulheres. 68% da população brasileira conhece a lei Maria da Penha e sabe da sua eficácia (83%).
- Em 2005, nos primeiros quatro meses de funcionamento do telefone nacional da Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180, houve 14.417 denúncias.
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- Depois da aprovação da lei Maria da Penha, em 2006, as denúncias deram um salto: de janeiro a junho de 2008, foram registrados 121.891 atendimentos, um número 107,9% maior que no mesmo período de 2007 (58.417).
- A busca por informações no Ligue 180 sobre a lei Maria da Penha no primeiro semestre de 2008 cresceu 346% – foram 49.025 este ano contra 11.020 no primeiro semestre de 2007.
- Em 61,5% das denúncias de violência registradas no Ligue 180, as usuárias do serviço declaram sofrer agressões diariamente.
- Em 63,9% dos casos, os agressores são os próprios companheiros.
Mais que um tapa Já aconteceu de o seu namorado surtar e te dar um empurrão, levantar a voz ou te dar um tapa? Ouviu a vizinha gritar e sacou que ela foi agredida? Não fique quieta. Saiba o que fazer se isso acontecer. A lei Maria da Penha está aí pra ajudar e, sobretudo, proteger Por Paula Rothman Por medo ou vergonha, muitas mulheres que sofrem algum tipo de violência, seja ela física, sexual ou psicológica, continuam caladas. Quando procuram ajuda, geralmente recorrem a uma amiga, colega de trabalho ou parente próxima. No entanto, a única forma de combater e diminuir esses números é denunciando.
Desde 2005, está disponível o telefone da Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180, criado pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM). O serviço funciona em todo o Brasil para orientar e auxiliar mulheres em situação de violência. A ligação é gratuita e atendentes capacitadas estão de plantão sete dias por semana, durante 24 horas.
Na hora de denunciar, procure a delegacia mais próxima. De preferência, uma Delegacia da Mulher ou Delegacia de Defesa da Mulher. O Instituto Patrícia Galvão, referência na defesa da mulher, tem uma página completa com endereços no Brasil: http://www.violenciamulher.org.br/apc-aa-patriciagalvao/home/guiadeservicos.shtml Com a lei Maria da Penha, as mulheres estão muito mais protegidas quando decidem fazer a denúncia. A lei assegura não só a integridade física, como estabelece medidas práticas para que, uma vez na delegacia, a justiça seja feita. Entre elas:
- ouvir a mulher, fazer o boletim de ocorrência e tomar as devidas medidas caso seja manifestado o interesse em processar criminalmente o acusado;
- colher todas as provas e ouvir o agressor e as testemunhas;
- determinar que seja feito o exame de corpo de delito e requisitar outros exames periciais necessários;
- encaminhar a mulher ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal. Os laudos ou prontuários médicos são admitidos como provas; remeter, no prazo de 48 horas, um expediente ao juiz com pedido de concessão de medidas protetivas de urgência;
- obrigação de garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;
- fornecer transporte para a mulher e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;
- se necessário, acompanhá-la para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar.
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Arquivo Pessoal Hoje, aos 63 anos, Maria da Penha vive em Fortaleza e dedica a maior parte de seu tempo à luta contra a violância doméstica
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REFERÊNCIAS
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO .................................................................................................. 02 AGRADECIMENTO .................................................................................................. 03 DEDICATÓRIA ......................................................................................................... 04 RESUMO................................................................................................................... 05 METODOLOGIA ....................................................................................................... 07 SUMÁRIO ................................................................................................................. 08 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10 CAPÍTULO 1. VIOLENCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER ............................. 12 1.1 Breve histórico da violência contra a mulher ....................................................... 12 1.2 Conceito de violência .......................................................................................... 14 1.3 Formas de manifestação de violência contra a mulher ....................................... 17
1.4 Fatores que propiciam a violência doméstica ...................................................... 21 1.5 Conseqüências da violência doméstica .............................................................. 22 CAPÍTULO 2. A LEI MARIA DA PENHA ................................................................. 23 2.1 Origem da Lei ...................................................................................................... 23 2.2 Objetivo da Lei .................................................................................................... 25 2.3 Objeto tutelado pela Lei....................................................................................... 26 2.4 Sujeitos da Lei ..................................................................................................... 30 2.4.1 Vítimas ............................................................................................................. 30 2.4.2 Familiares ......................................................................................................... 33 2.4.3 Testemunhas .................................................................................................... 34 2.4.4 Agressor ........................................................................................................... 34 2.5 Inovações trazidas pela Lei Maria da Penha. ...................................................... 35 CAPÍTULO 3. EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA ...................................... 37 3.1 Constitucionalidade da Lei .................................................................................. 37 3.2. Atendimento pela autoridade policial – fase pré-processual .............................. 38 3.3. Rito processual ................................................................................................... 41 3.4 Criação dos Juizados de Violência Doméstica .................................................... 42 3.5 Exceções a Competência dos Juizados de Violência Doméstica ........................ 43 3.6 Medidas Protetivas de Urgência .......................................................................... 46 3.7. Atores da Lei ..................................................................................................... 49 3.7.1 Atuação do Ministério Público .......................................................................... 49 3.7.2 Assistência Judiciária Obrigatória .................................................................... 51 3.8 Representação e a possibilidade de retratação .................................................. 51
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3.9 Vedações estabelecidas pela Lei ........................................................................ 53 CONCLUSÃO ........................................................................................................... 55 ANEXO A ..................................................................................................................57 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 68 ÍNDICE ...................................................................................................................... 69