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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
Cérebro Religioso e Aprendizagem
Por: Marco Antonio Teles da Costa
Orientadora
Ms Marta Pires Relvas
Rio de Janeiro
2014
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
Cérebro Religioso e Aprendizagem
Apresentação de monografia à AVM
Faculdade Integrada como requisito
parcial para obtenção do grau de
especialista em Neurociência
Pedagógica.
Por: . Marco Antonio Teles da Costa
AGRADECIMENTOS
A Deus, família e amigos.
DEDICATÓRIA
Para meu pai Ewalnir
RESUMO
O homem é um ser bio-psico-social, cerebral e religioso. A religião é
um fenômeno universal de humanidade alcançando a teoria da mente,
memória e consciência o que a vincula a aprendizagem como conhecimento do
mundo. O ensino religioso confessional atende a necessidade fenomenológica
da experiência religiosa que forma conhecimento com sentido pela dialética do
sagrado e a noção de sentido último. Um ensino religioso fenomenológico
promove a autonomia e identidade do individuo como ser complexo. Sendo a
religiosidade e a biologia condições humanas cabe à educação estudar o
equilíbrio da aplicação fenomenológica da dialética do sagrado para construção
do conhecimento para um melhor desenvolvimento do aprendente na
construção da cidadania e autonomia pelo vinculo do ensino religioso.
Palavras Chave: religião, dialética do sagrado, sentido último,
neurociência
METODOLOGIA
A Pesquisa foi realizada pela leitura sintópica de bibliografia
cientificamente relevante e referente ao tema publicada nos últimos anos ou de
caráter clássico e citada em trabalhos acadêmicos sobre o tema. A pesquisa
adotou o caráter de estudo hipertextual para conectar os temas dentro de seus
pontos de contato.
O trabalho inventariou e descreveu as ideias em suas divergências e
convergências sob um ponto de vista argumentativo religionista quanto ao
ensino religioso.
Tendo esse caráter argumentativo a pesquisa focou-se nas
potencialidades das informações coletadas sugerindo novas intercessões
possíveis onde os desdobramentos da pesquisa ultrapassam o escopo da
monografia. Observou-se a construção lógica do argumento a partir da
estrutura do silogismo visando maior objetividade à redação. Sugestões e
críticas são embasadas em potencialidades presentes no material estudado e
em visão critica quanto aos argumentos, dados e metodologia das pesquisas
estudadas.
Adotou-se também a visão de uma unidade entre educação
progressista e clássica admitindo a coesistência de ambas na prática
pedagógica.
Os principais autores que influenciaram este trabalho foram Marta Pires
Relvas em sua produção literária e nas aulas ministradas na especialização,
Raul Marino Jr, Roberto Lent e Elkhonon Goldberg no campo das
neurociências; Paul Tillich, Mircea Eliade e Victor Emil Frankl quanto a história
das religiões e sentido para a vida; foram tomados como pressupostos teóricos
as teorias de Vygotsky, Wallon e Piaget na argumentação sobre aprendizagem
que se estende sobre um ponto de vista crítico quanto aos dados da
neurociência e as teorias de aprendizagem em aplicação as diferentes formas
de ação pedagógica entendidas como coexistentes e não auto excludentes.
Outros autores ainda foram referenciados de forma hipertextual direta ou
indireta sendo referenciados na pesquisa.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I 11
CÉREBRO RELIGIOSO E BIOLOGIA 11
1.1 - a causa necessária do cérebro religioso – a complexidade universal da humanidade 12
1.3 - A causa formal do cérebro religioso – funções 17
1.4 - Uma causa final para o cérebro religioso – a interface religião, biologia, aprendizagem 19
CAPÍTULO 2 22
ENSINO RELIGIOSO E CONHECIMENTO 22
2.1 - A antirreligiosidade como ideologia 23
2.2 - A fenomenologia da religião e o ensino religioso confessional 26
2.3 - A dialética do sagrado e o sentido último na formação cognitiva e cidadã 28
CAPÍTULO 3 33
RELIGIOSIDADE E APRENDIZAGEM 33
3.1 - Estrutura biológica da aprendizagem e da fé. 33
3.2 - Aprendizagem e religião na construção conhecimento, comportamento e autonomia 38
3.3 - Emoção, memória, razão e a construção social do aprendizado 39
CONCLUSÃO 42
BIBLIOGRAFIA 44
9
INTRODUÇÃO
Este trabalho versa sobre a educação do homem complexo e integral
considerando o cérebro religioso sob abordagem neuropedagogica como parte
dessa unidade. A neurociência pedagógica poderia esclarecer cientificamente
conceitos educacionais quanto ao ensino religioso e a formação de “sentido
último para a vida” como motivação para a aprendizagem.
O trabalho trata da aprendizagem e do cérebro religioso e sua relação
com a educação do sujeito integral considerando as conexões biológicas que
permitem ao individuo a percepção da realidade e a própria construção
individual.
O trabalho ainda discute convergências e divergências entre religião e
aprendizagem apontando a importância do papel social da religião como rede
neural autotranscendente de significado nos grupos humanos e entre grupos
humanos.
Esta pesquisa também se dedica a pontuar possíveis vínculos de
estimulação do cérebro religioso que motivem a aprendizagem visto que a
religião conecta-se a estruturas cerebrais responsáveis pelo prazer e também
pelo julgamento e adequação dos objetivos de vida.
Dentre os autores lidos destacam-se Marta Pires Relvas pela influencia
pessoal e acadêmica na formação do autor, Elkonon Goldberg e Victor Emil
Frankl por serem uma conexão entre o sentido último para a vida e a
neurociência em suas próprias experiências de vida. Sendo Goldberg um
neurocientista dissidente soviético e Fankl psicanalista que encontrou no
sentido de responsabilidade forças para sobreviver aos campos de
concentração nazista. Destaca-se ainda Mircea Eliade pelo conceito de
dialética do sagrado que apresenta uma grande aplicação no campo do ensino
10
religioso e da própria percepção da solução das tensões de conhecimento nos
períodos de crise de paradigmas.
A realização da pesquisa foi de grande valor na formação acadêmica
do autor por permitir a reflexão sobre diferentes intercessões entre a
especialização que se conclui e aprendizagens anteriores seguindo um
crescente em conteúdo e essência de conhecimento.
11
CAPÍTULO I
CÉREBRO RELIGIOSO E BIOLOGIA
Este capítulo trata do cérebro religioso em sua complexidade biológica
e mental. Mente e cérebro são uma unidade e não uma dicotomia. Sob o ponto
de vista de Damásio (apud Goldberg:2001) a divisão cartesiana entre mente e
cérebro é uma abstração, pois a neurociência tem demonstrado a unidade
entre o biológico e o mental.
Os próximo parágrafos exploram as causas fundamentais a unidade
bio-psico-social do homem individual que se estende ao conjunto da espécie
como considera Goldberg (2001). A pesquisa utilizará uma classificação
aristotélica da teoria das quatro causas. A partir de analogias entre o sistema
nervoso central, a vida social e a religião em seu papel moderador do cérebro
executivo Goldberg (2001) enfatiza a unidade complexa que requer uma
multiplicidade de especialidades no entendimento do fenômeno cerebral,
inclusive religioso.
A religião em sua significância para a vida é um objeto de estudo
pedagógico a priori, pois conforme Relvas (2012) o ensino precisa ter
correlação com a vida. Se a religião é parte importante da vida é pelo menos
indicado o ensino religioso como algo além do currículo, como uma disciplina
de sentido para a vida como discorreremos adiante.
Aristóteles é um dos filósofos mais influentes na história ocidental. Boa
parte dos métodos de classificação científica são devidos ao trabalho
sistemático de Aristóteles. Dentre as contribuições de Aristóteles destaca-se a
teoria das quatro causas universais.
A teoria das quatro causas tem caráter explicativo, não em si como
uma produção, mas como uma verificação da formalidade do raciocínio
12
humano para compreensão dos seres. Entendendo ser como tudo aquilo que
existe (Matheus, 2006-2011).
Intuição é a verificação da verdade auto evidente, entretanto,
Aristóteles entendia que para algumas verdades intuidas não era possível
conhecer algumas de suas causas. Dentre as causas passiveis de
conhecimento estão a causa formal e a causa material que são percebidas
pelos sentidos. Entre as causas que requerem um grau de abstração que pode
transcender o empírico estão a causa necessária e a causa final. (Matheus,
2006-2011)
É possível exemplificar com a comparação entre as quatro causas e a
narrativa da criação do homem no livro bíblico de Gênesis. Deus seria a causa
necessária, o antropomorfismo a causa formal, o barro a causa material
enquanto matéria em si, cuidar da criação seria a causa final do homem nesta
narrativa.
Passa-se a analisar o cérebro religioso pela teoria das quatro causas
como objeto de pesquisa. A primeira causa a será a causa necessária da
religião como objeto de pesquisa das neurociências.
1.1 - a causa necessária do cérebro religioso – a
complexidade universal da humanidade
Para conhecer a causa necessária para o estudo da religião pelas
neurociências, precisamos fazer referências entre a neurociência e as ciências
das Religiões.
Para a neurociência, conhecer o funcionamento da mente está
relacionado com sua preservação pelo conhecimento das relações cerebrais
envolvidas (Relvas, 2012; Goldberg, 2001). A Religião é uma das
manifestações universais da mente na espécie humana e como fenômeno é
incontestável e consequentemente objeto de pesquisa (Lent, 2011).
A ciência não é capaz de verificar ou negar a existência de Deus. O
próprio método ciêntífico ao definir a ciência a torna incapaz dessa
13
investigação por seu carater reducionista. O método ciêntífico não pode
formalmente e empiricamente alcançar o transcendente. Portanto, referir-se a
ciência como comprovadora da religião é atribuir-lhe função ulterior ao seu
escopo objetivo.
Entretanto, a partir dos sentidos, a ciência pode estudar a religião em
sua manifestação imanente que são os fenômenos religiosos. Dentre estas
manifestações imanentes encontra-se a manifestação biológica da religião.
Sendo imanente as manifestações biológicas podem ser submetidas ao
empirismo científico. Essa percepção, por ser parcial, corrobora mas não
esgota a possibilidade da compreensão da unidade lógica do mundo conforme
a percepção humana da realidade representada na mente e no cérebro (Marino
Jr., 2005) A neurociência é aliada na compreensão das dinâmicas do
conhecimento (Relvas, 2012), inclusive o conhecimento religioso.
Tanto a psique quanto o sentimento religioso e a razão passam pelo
sistema nervoso como uma conexão entre a sensibilidade do mundo natural e
sobrenatural. Nessa sensibilidade tanto a biologia não é capaz de provar a
existência de Deus quanto a razão é incapaz de provar sua inexistência. A
razão e a lógica são expressas na religião através de sensações e sentimentos
que são sintetizados pela fé que serve de instrumento de conhecimento pela
auto transcendência do sentimento de finitude humana (Marino Jr., 2005;
Rodrigues, 2011) Ao definir que não existe aprendizagem sem mudança de
comportamento Relvas (2012) nos remete também a essa dinâmica religiosa
em nossas transformações internas quanto a existência própria.
A religião se conecta com a ciência através da relação entre a
experiência empírica, a contemplação espiritual e a percepção sensória
mediadas pela razão e lógica. (Marino Jr., 2005) Essas caracteristicas não se
opõem, mas se completam na fenomenologia da religião enquanto experiência
sensória, cognitiva, significativa e transcendente (Rodrigues, 2011). Para
Relvas(2012) desafiar o cérebro é estimular aprendizagem. Não existe desafio
mais instigante para a mente humana que desvendar o infinito e o
transcendente representado no fenômeno religioso.
14
O fenômeno neurocientifica da autotranscendência também justifica
como causa necessária o estudo da religião pela neurociência. Existiriam três
tipos de personalidade que são orientadas à “busca do novo”, a “evitação de
danos” ou a “dependência de recompensa”. Cada pessoa seria um misto único
dessas características. O homem busca uma conexão entre personalidades e
individuos diferentes pela autotranscendência. Melhor explicando,
autotranscendência é o aspecto da personalidade que busca sempre pelo mais
elevado na ética, arte, cultura ou religião com sentimentos arrebatadores (Lent,
2011).
“A autotranscendência seria a tendência mental
de superar os limites do próprio corpo e elevar-se a
estados de consciência que nos absorvem
completamente, fazendo-nos esquecer do mundo e dos
outros (...) religiosos de vários cultos, expressam a
autotranscendência pela oração e variados rituais” (Lent,
2011: p. 146)
Como exemplo da autotranscendencia podemos citar estudo
controlado pela Universidade de Udine, Itália, onde pacientes com câncer
cerebral foram submetidos a cirurgia de retirada de tumores. Foram feitas
entrevistas com os pacientes antes e depois das cirurgias para medir seu grau
de espiritualidade. Após as cirurgia que tinham em comum a remoção de
pequena área do córtex no lobo parietal posterior identificou-se um maior grau
de autotranscendência nos pacientes demonstrando que esta área do cérebro
funciona como um inibidor da autotranscendência (Clonninger apud Lent,
2011)
Portanto, sob um ponto de vista da causa necessária o estudo
neurocientífico da religião se justifica como fenômeno humano intrinseco.
Sendo a religião um fenomeno intrinseco ao homem, uma ciência que se ocupe
do estudo do homem não pode necessariamente ignorar a religião como
fenômeno e suas implicações na vida.
15
1.2 - A causa material do cérebro religioso – anatomia e
bioquímica
Sendo a causa material tangente a situação no mundo material do
objeto de estudo, a anatomia do cérebro e sua bioquímica é por dedução a
causa material que deve ser abordada no estudo do cérebro religioso.
Desde Galeno, médico de gladiadores romanos, e Hipócrates já se
considera o cérebro como centro da vontade, embora a teoria cardiocêntrica
prevalecesse até o inicio da modernidade. Para Galeno, o espirito humano não
encontrava-se no coração, mas nos ventrículos encefálicos para os quais o
parênquima cerebral servia apenas de suporte. Para Aristóteles, que era
cardiocentrista, o coração bombeava a alma pelo cérebro que resfriava as
paixões. Posteriormente René Descartes teoriza a dualidade entre alma e
espírito situando a alma na glandula pineal por ser o único elemento unitário e
localizado no centro do cérebro. Ao se desacreditar cientificamente essas
teorias ocorre uma consequente separação entre as noções de alma e espírito
na ciência moderna (Marino Jr., 2005)
O cérebro é formado, sob um ponto de vista evolucionista, de camadas
de desenvolvimento que iniciam no tronco encefálico até o neocórtex. O tronco
encefálico é responsável pela auto preservação e preservação da espécie
atuando como força motora inconsciente e como receptor das informações que
são passadas ao hipotálamo para distribuição na estrutura neural (Marino Jr.,
2005)
Além dos sistema reptiliano, como camada mais primitiva, o cérebro
possui uma camada intermediária conhecida como sistema límbico (por
circundar o encéfalo como um anel ou limbo), também chamado de
paleomamífero. O sistema limbico está entre os dois hemisférios cerebrais na
região das conexões efetuadas pelo corpo caloso e é responsável pelas
respostas mais sentimentais às informações aferentes dos sentidos conduzidas
desde o tronco encefálico.
16
Não existe para a neurociência a dicotomia cartesiana entre mente e
cérebro. O cérebro, como elemento anatômico do homem, concentra a
essência do individuo. Mesmo sendo importantes as regiões funcionais
posteriores do cérebro, a perda de suas funções não implica em perda da
personalidade, entretanto, lesões no lobo frontal descaracterizam o individuo
em si. Isso comprova que a biologia está ligada a mente tanto anatômica
quanto bioquimicamente (Goldberg, 2001)
De um ponto de vista favorável à religião pode-se perceber a
incongruencia do erro de Descartes quando comparamos o funcionamento do
cérebro em um relação sexual e em uma experiência com o transcendente. Do
ponto de vista cerebral a religião ou a experiência com transcendental também
está relacionada ao extase e a sexualidade. São ativadas as mesmas
estruturas tanto em uma quanto em outra situação.
Entretanto, mesmo tendo semelhanças fisiológicas, não podemos
reduzir sexualidade a religião pois são experiências de cunho diferente. O
cérebro é mais focado na estimulação física centrada na distribuição de
sensações pelo hipotálamo, ao passo que a experiência com o transcendente
relaciona-se a estruturas de cognição mais elevadas nos lobos frontais e
temporais. O sexo é baseadao em extimulação fisica a religião em estimulação
mental como os sentimentos de arrebatamento, exaltação e união com o
sublime (Marino Jr., 2005)
O cérebro é o alicerce biológico do comportamento, sentimento,
pensamento e emoção. Pelos lóbulos frontais somos capazes de abstração
lógica e simbólica de sentido que proporcionou conquistas humanas como os
sistemas filosóficos, científicos e religiosos. Os lobos frontais nos tornam
humanos na medida em que nos capacitam para escolhas intencionais de livre
arbítrio (Marino Jr., 2005).
Conectando a causa material anatômica com a religião percebe-se que
elementos da cognição humana como a abstração, os sentimentos e emoções
são processados no suporte anatomico do cérebro. Sendo o cérebro o suporte
bioquimico e anatomico da pessoa e a pessoalidade um componente
17
importante na formação da identidade podemos entender que o estudo da
religião se justifica na neurociência como uma busca da compreensão da base
anatômica, ou causa material, do fenômeno religioso e as abstrações do
transcendente pela mediação do imanente biológico.
1.3 - A causa formal do cérebro religioso – funções
Os estudos sobre demência e memória na geração pós segunda
guerra mundial permitiu o incremento dos estudos do cérebro na década de 80
(Goldberg, 2001)
Os lobos frontais guardam as funções mais avançadas e complexas do
cérebro mais conhecidas como função executiva responsavel pelas ações
intencionais. Numa visão evolucionista a era dos lobos frontais é a era dos
órgãos humanos que permitem a civilização (Luria apud Goldberg, 2001)
Os lobos frontais são a central de comando das estruturas neurais de
ação . Qualquer dano aos lobos frontais produzirá apatia, inercia e indiferença .
conhecer o funcionamento dos lobos frontais nos propicia um reconhecimento
individual e da humanidade para dirigir nossos objetivos com capacidde
julgamento de ações individuais e alheias. (Goldberg, 2001).
Especialmente importantes para a observação biológica da religião são
os lobos temporais interligados ao sistema límbico e ao tronco encefálico. São
áreas cerebrais extremamente sensíveis e vulneráveis em comparação aos
outros mamíferos superiores que possuem esses lobos em parte superior do
cranio. As convulsões epiléticas são uma estimulação muito propagada que
sincroniza e amplia emoções complexas como o sentimento religioso, portanto,
pesquisas ciurgicas sobre epilepsia focaram os lobos temporais onde
estimulações diretas no cérebro durante entrevista com o paciente levaram a
compreensão de que o lobo temporal está conectado ao sentido de intuição
como percepção das verdades autoevidentes. Estimulação dos lobos temporais
por campos magnéticos transcranianos produziram relatos de experiências
transcendentes como uma sensação de unidade com o universo e de uma
“presença” invisível mesmo entre ateus (Marino Jr., 2005).
18
Seria possível perguntar sobre a importância da religião como
fenômeno humano no campo da biologia, entretanto, exames de tomografia e
estímulos específicos no córtex orbito frontal demonstram que uma noção de
presença é percebida mesmo por indivíduos ateus após estímulos controlados
(Marino Jr., 2005). Mesmo que o estudo da religião seja conduzido de forma
cética quanto à religião em si, este estudo não pode ser ignorado pois a religião
é inegavelmente um fenomeno humano observável biologicamente mesmo que
não possa ser controlado em laboratório (Lent, 2011)
A experiência com as freiras realizada pela Universidade de Montreal
em 2006 pode ser usada como exemplo de que a relação cérebro religião
transcende ao âmbito anatômico. Após anos de meditação e estudos religiosos
o cérebro de uma das pesquisadas foi examinado após a sua morte e
encontraram-se sinais de danos mentais que poderiam provocar demências,
entretanto, a religiosa apresentou lucidez mental até o fim de sua vida com
mais de cem anos de idade (Reimão, 2009; Goldberg, 2001).
Do ponto de vista das funções do cérebro a religião poderia ser um
potencializador da plasticidade cerebral, tomando como ponto de partida a
reconexão continua das redes neurais e o gradiente entre os limites de
localização das funções cerebrais no córtex (Goldberg, 2001).
Do ponto de vista deste trabalho é possível entender que a causa
formal do cérebro religioso é não só a localização das funções cerebrais, mas o
gradiente que intermeia essas funções e permite a neuroplasticidade. Como
elemento formador da civilização, a religião, poderia ter agido sobre o córtex
pré-frontal como transcendência do ser humano centrado em si para um ser
humano integrado com a natureza e com a sociedade a partir de uma dialética
do sagrado, de uma noção de finitude e de sentido último que trataremos em
capítulos em sequencia ao trabalho. Mesmo em sua subjetividade e
transcendência a religião tem uma interface anatômica, porém não reduz a
anatomia por sua intrínseca complexidade de transcendência.
Podemos dizer, portanto, que no modo aristotélico, as funções do
cérebro são a causa formal que nos motivam a estudar o cérebro religioso em
19
sua complexidade enquanto fenômeno localizado no encéfalo e disperso num
inconsciente coletivo, semelhante ao proposto por Jung (Rodrigues, 2011).
1.4 - Uma causa final para o cérebro religioso – a
interface religião, biologia, aprendizagem
Sob o ponto de vista religionista desta pesquisa não se pode ignorar a
causa final do cérebro religioso. A religião mostra-se como uma expansão da
consciência, em diferentes abordagens, e o cérebro é o centro da consciência,
portanto, o cérebro em seu declínio deve ser abordado num estudo
neurocientífica da religião. Podemos entender também que a causa final do
homem é de fundamental importância na educação na medida que
aprendemos com um objetivo de promoção pessoal. Esta promoção pode ser
pelo aprimoramento ou pela preservação que configura a conexão entre
cérebro religioso e educação no Ensino Religioso como veremos mais a frente
neste trabalho.
Tomando o homem como um ser consciênte e a consciência como
refletir sobre a própria existência e sua relação com outras coisas, podemos
conectar a consciência cognoscente aos lobos frontais do cérebro. Os lobos
frontais são responsaveis pelo processamento da cognição porém sofrem
declinio fisico com o envelhecimento ou com doenças como Alzheimer e outras
demências (Goldberg, 2001)
As doenças psiquiatricas também estão relacionadas à extrema
fragilidade dos lobos frontais. As desordens nos lobos frontais são
responsáveis pelos mais devastadores transtornos psiquiátricos como a
esquizofrenia (Goldberg, 2001)
O lobo frontal nos permite a liderança como um talento singular para o
mundo e para os outros, mas também é sujeito a falhas arrasadoras.
Inteligência e criatividade são inseparáveis, inteligência é a clareza de
pensamento e a criatividade é a habilidade de resolver novidades embaraçosas
(Goldberg, 2001)
20
As configurações estruturais das sociedades tem relação estreita com
o lobo frontal quanto à maturidade e responsabilidade social. Pode-se atribuir
isso a uma maturidade biológica dos lobos frontais que produzem o mundo
adulto como é apresentado, entretanto, a imaturidade biológica ou danos ao
cérebro produzem comportamentos socialmente constrangedores e
irresponsáveis como a criminalidade. (Goldberg, 2001)
A aprendizagem também é afetada pelos lobos frontais na manutenção
da motivação e atenção (Goldberg, 2001). Tanto a motivação, quanto a
atenção e a aprendizagem estão conectadas a sensações, percepções e
sentimentos moderados pelas emoções e tendências particulares dos
individuos (Marino Jr., 2005) A cadeia de sentimentos gerada no cérebro
paleomamífero pela percepção do mundo é capaz de gerar a motivação
necessária a atenção na aprendizagem além de fixar memórias com vinculos
emocionais. (Marino Jr., 2005)
O neo córtex é o responsável pela autonomia humana e pelo livre
arbítrio. O neocórtex é formado pelos lobos pré frontais, frontais, temporais,
parietais e occiptal cada qual com seus esquemas e padrões funcionais
próprios mas com interação dinâmica em toda dinâmica cerebral. O neocórtex
é o responsavel pelo pensamento associativo, analitico e pela cognição
atribuindo significado e razão às informações emocionais provenientes do
sistema límbico (Marino Jr., 2005).
Todo este processamento está conectado aos conceitos de dilética do
sagrado e de sentido último que se referem a religião em seu conceito
transcendente, socializante e propriamente fundante da sociedade.
Como elemento fundante e tradicional a religião serve como elemento
colaborador no equilíbrio social. Segundo Relvas (2012) vivemos uma era de
fornecimento e consumo rápido de informações que buscam satisfazer a área
de recompensa do cérebro. Partindo desse ponto de vista é possivel entender
que sendo a religião o elemento dialético de discurso oposto, o ensino religioso
não é apenas uma possibilidade de aprendizagem mas, na presente
21
globalização, é uma necessidade biológica de uma “humanidade orgânica” em
sua dialética entre o sagrado e o profano (Eliade, 2010; Goldberg, 2001).
Como causa final do homem que justifica o estudo neurocientífico da
religião, destaca-se a intuição no sentido de “verdade auto evidente”. A intuição
religiosa se liga a necessidade de sobrevivência da espécie na elaboração do
conflito dialético entre o sagrado, como a segurança necessária, e o profano,
como a ameaça do mundo natural, numa síntese dialética necessária ao
equilíbrio da cosmologia de uma civilização e dos individuos. (Marino Jr., 2005;
Eliade, 2010)
Este capítulo conclui que as quatro causas aristotélicas de explicação a
partir de uma causalidade se coadunam como justificativa para o estudo da
neurociência na religiosidade podendo ser aplicadas a pedagogia. Se tais
causas forem consideradas de um ponto de vista pedagógico é possivel que a
neurociência e o ensino religioso ajudem não só a resgatar valores
pedagógicos como a valorização da memória, por exemplo.
Tal resgate situaria mais o individuo em um ambiente urbano e global
onde a dialética do sagrado alcança novo destaque e revigora a importância do
discurso religioso na educação a partir da necessidade de adequação dos
indivíduos a uma nova situação social. A percepção do papel da neurociencia
nessa mudança de paradigma pode ganhar grande importância com o aporte
da religiosidade em seu papel aglutinador da sociedade. Essa temática será
aprimorada nos próximos capítulos.
22
CAPÍTULO 2
ENSINO RELIGIOSO E CONHECIMENTO
O ensino religioso é submetido a um embate democrático sobre o
papel da religião na educação. O ensino religioso pode ter configurações
diferentes conforme a localidade. Em alguns casos o ensino religioso é voltado
para um ensino ético, em outros para um estudo comparativo da história das
religiões. Existe ainda o ensino religioso confessional que segue as orientações
e conformações sociais e religiosas de cada localidade.
A própria disputa sobre a presença ou ausência do ensino religioso na
educação básica já reforça sua importância cidadã, pois tal debate transcende
o meio acadêmico e alcança viés político partidário. Ocorre uma confusão entre
laicismo e laicidade no tratamento da religião que este capítulo procurará
esclarecer.
Abordando ainda o ensino religioso do ponto de vista religionista, nos
ateremos ao modelo adotado pelo Município do Rio de Janeiro que é
confessional e do ponto de vista dessa pesquisa mais coerente com um
formação integral do ser humano por ser uma abordagem mais fenomenológica
do que meramente teórica.
Outro ponto a ser tratado nesse capítulo é a importância do sentido
último e da dialética do sagrado na relação do ensino religioso na formação do
conhecimento que se vincula a neurociência a partir do cérebro límbico e do
córtex pré frontal. Comparativamente, para Goldberg, a religião tem um papel
biológico de córtex pré frontal social cuja supressão leva a diversas questões
de cunho cidadão.
A partir dessa correlação de ideias a pesquisa buscará mostrar a
utilidade cidadã de um ensino religioso confessional com base na neurociência.
No capítulo anterior vimos pela teoria da causalidade de Aristóteles que o
ensino religioso na escola não pode ser desprezado como objeto de pesquisa,
neste capítulo, situaremos a discussão em linhas gerais seguindo para uma
23
abordagem mais qualitativa da experiência com o transcendente que intercepta
com dados biológicos da neurociência.
2.1 - A antirreligiosidade como ideologia
O laicismo é confundido com laicidade a partir de um discurso político
ideológico. O mesmo discurso ideológico não diferencia fundamentalismo de
fanatismo quase que tornando-os sinônimos mesmo nos meios acadêmicos.
Partindo do mais simples para o mais complexo, podemos afirmar que
fundamentalismo é um fenômeno religioso e fanatismo um fenômeno político
partidário. Um religioso fundamentalista tem tanto risco de se tornar um
fanático quanto um laicista militante.
O fundamentalismo surge com as novas configurações sociais da
Revolução Industrial. Nesse novo paradigma, como é comum nas crises de
paradigma, ocorre um rompimento de formas de ação política, religiosa e
econômica. Cada uma dessas atividades humanas tende a se reorganizar para
enfrentar o processo dialético resultante. A religião, dentre outras formas,
aderiu ao fundamentalismo como valorização dos valores e crenças
transmitidos. Ao valorizar suas crenças “como está escrito” religiosos
impuseram uma barreira a uma avalanche de novas ideias religiosas.
O fundamentalismo tem seu papel não somente de freio mas de
moderador, pois após um diálogo menos acalorado e mais reflexivo algumas
inovações que não destroem a estrutura da religião são aceitas de forma
adequada a nova conjuntura social. Observa-se, portanto, que o
fundamentalismo é valorização do que é fundamental em sentido numa crença
religiosa e não está atrelado necessariamente à intolerância.
Fanatismo é a tendência de um grupo social associar-se
irracionalmente a um partido. Esse partido pode inclusive ser religioso e
fundamentalista, como pode ser qualquer outro tipo de agremiação como uma
torcida de futebol. Um exemplo de fanatismo político foi o nazismo atrelado a
admiração partidária de um líder carismático, Hitler. Esse mesmo fanatismo
24
pode ser verificado em torcidas organizadas violentas que também não são
grupos religiosos.
Atribuir a todo fanatismo uma origem fundamentalista é afirmação
temerária, especialmente no que se refere ao racismo nazista que tomaremos
como referência. O racismo surge como forma de afirmação dos impérios sobre
os dominados. Com a queda da Alemanha na 1ª Guerra a noção de
superioridade alemã foi abalada, com isso o racismo como exacerbação do
nacionalismo é usado como trunfo político (Albright & Woodward, 2012).
Na região da Tchecoslováquia, alemães, tchecos, eslavos e judeus
tinham se miscigenado não sendo possível identificar um individuo de raça
“pura”. Entretanto, uma minoria alemã conhecida como sudetos por viverem na
fronteira sul entre a Alemanha e a Tchecoeslovaquia, aceitou o partidarismo do
racismo nazista exatamente com o objetivo de alcançar novo status social e
não de preservar valores de seu país ou de sua religião. (Albright & Woodward,
2012)
O racismo nesse caso foi uma decisão partidária mesmo que
posteriormente tenha se extendido ao âmbito outras associações seculares ou
religiosas pelo mundo. Um erro social generalizado não pode ser creditado por
significação imprópria a uma única instituição social, no caso de nosso estudo,
a religião. Observe-se que sendo um erro da sociedade as igrejas amplamente
acusadas de omissão podiam apenas pregar sermões, pois o fato era político e
não religioso em si.
Se fanatismo e fundamentalismo não são sinônimos atribuir sinonímia
a dois termos diversos já é um ato político e publicitário que requer crítica
atenta. Goebels soube usar a propaganda partidária para incutir o fanatismo na
Alemanha nazista e ganhar a simpatia dos aliados (Albright & Woodward,
2012). O ensino religioso, por analogia, arrisca-se pela intolerância a ser
atacado com argumentos que não se justificam em seus próprios termos,
portanto, faz-se necessário trazer os termos corretos ao debate democrático
como antídoto à intolerância religiosa.
25
Recorrendo a um exemplo. Uma religião pode ser fundamentalista e
pacífica. Entre religiões fundamentalistas temos a Assembleia de Deus cujo
cunho pacífico é notório. Por discordar das opiniões políticas de determinados
grupos uma religião não pode ser depreciada de forma indevida especialmente
dando conotação errônea e política a uma característica teológica.
Tendo verificado que fundamentalismo e fanatismo não são sinônimos
passa-se a verificar o significado de laicismo e laicidade no debate democrático
acerca da religião.
Secularização são conceitos heterogêneos e geralmente confundidos
nas ciências sociais. Secularização refere-se ao processo da história moderna
de redução da influencia das religiões nas decisões do Estado. Adotando a
ciência como base de conhecimento a secularização promove perda de
autoridade religiosa sobre a vida privada (Ranquetat Jr, 2008).
Etimologicamente, laico tem um sentido de "povo" tendo por oposição o
clerical. A imposição da laicidade é um ato político do Estado em busca de
soberania do povo no Estado democrático pela neutralidade e não pela
oposição quanto à religião. Embora a laicidade também promova a liberdade,
ela não é pré-requisito para a liberdade religiosa, pruralismo e tolerância.
Países de orientação confessional, como Brasil Imperial (1824), Grã Bretanha e
países escandinavos já garantiam a liberdade religiosa. (Ranquetat Jr, 2008).
Entretanto, historicamente a laicização inicialmente neutra ganha
caráter ideológico como uma crença própria a partir de uma oposição a
reações católicas à secularização e ao racionalismo.
O conceito de laicidade evoluiu de uma coabitação tolerante com as
religiões para uma laicidade de combate como o laicismo dos regimes
comunistas (PEISER, 1995; BRÉCHON, 1995; ARROYO, 2005 apud
Ranquetat Jr).
Sob este olhar que difere laicidade de laicismo percebe-se o caráter
antirreligioso do laicismo e o caráter de convívio da laicidade. Usando o
exemplos de Estados podemos dizer que o Estado soviético adotava o laicismo
26
como controle ideológico, por conhecer o poder da religião na formação
humana. Sendo assim em sua faceta mais extrema o laicismo serve de
justificativa a mecanismos de repressão ao passo que a laicidade produz
tolerância entre religiosos e não religiosos.
Desta forma, o discurso sobre o ensino religioso não pode pairar sobre
um ponto de vista que instrumente a repressão, e nem mesmo a religião pode
ser opressora. Entretanto, um ponto de vista da laicidade e não do laicismo é
necessário para reconhecer a importância de não limitar a autotranscedência
humana seja pela religião ou por outras formas de sentido para a vida
escolhida pelo individuo.
A autotranscedência é um fenômeno estudado pela neurociência onde
o individuo busca o justo, o belo, o bom em sua essência (Lent, 2011). Negar
essa autotranscedência pela via religiosa é limitar um dos instrumentos de
liberdade que estão no interior de cada pessoa.
Cabe a escola, como formadora de cidadãos, não se tornar um
instrumento de um laicismo que negue em nome de uma ideologia a identidade
humana para além de nós mesmos.
Transcender é o principal movimento para a cidadania. As
neurociências podem ajudar a compreender essa transcendência a partir da
biologia cerebral, porém, uma neurociência que abrace o laicismo e não a
laicidade perderia a neutralidade necessária a um estudo tão importante.
Portanto, conforme a abordagem dada à religião, neutra ou opositora, a
neurociência pode servir tanto como promotora da humanidade quanto como
instrumento ideológico. Tal assunto pontua a neuroética na pedagogia e, essa
indicação, para fins desse trabalho, já é suficiente.
2.2 - A fenomenologia da religião e o ensino religioso
confessional
Para estudar cientificamente a religião é necessário um locus objetivo
de observação. Sendo a religião uma afirmação de identidade do ser a partir de
27
algo maior que ele mesmos é necessário buscar no ser a fonte objetiva de
estudo da religião.
O ser é tudo aquilo que existe. Na teoria das quatro causas de
Aristóteles podemos conhecer pelos sentidos a causa material e a causa formal
dos seres. Sentimos a materialidade do ser e sua conformação no espaço. É
impossível saber com exatidão a causa primeira do ser e sua causa última. A
causa primeira em toda a causalidade e a causa última estão fora do escopo
de estudo da ciência. São causas metafísicas, isto é, estão além da física.
A religião se ocupa das causas metafísicas, mas se demonstra na
forma e na materialidade humana. Essa expressão material e formal está
conectada às causas metafísicas em coerência. São a parte visível das causas
do ser, os fenômenos. Se a ciência não pode se ocupar da metafísica religiosa,
ela pode se ocupar dos fenômenos religiosos. Ao ocupar-se dos fenômenos
religiosos a ciência das religiões encontra um ponto de contato objetivo onde
ancorar os estudos sobre a religião.
Um exemplo desse estudo fenomenológico seria analisar, por exemplo,
o dom de línguas ou glossolalia praticado em igrejas pentecostais. A glossolalia
é envolta em dificuldades não só práticas como também teológicas. Alguns
interpretam a glossolalia como a capacidade espiritual de falar em idiomas
desconhecidos para pregar o evangelho, um milagre raro e muito especial.
Outros interpretam que a glossolalia é falar a língua dos anjos de forma que os
homens não entendam.
Ambas as interpretações se baseiam no livro de Atos e na Epístola aos
Coríntios. Comparando as considerações teológicas ambas as interpretações
são possíveis dependendo do ponto de partida. Teólogos tradicionais
interpretam com análise textual, sistemática, gramatical, histórica e cultural.
Teólogos renovados admitem maior subjetividade em suas interpretações.
A ciência não pode estar sujeita a essa dinâmica religiosa, portanto, a
fenomenologia é o conceito objetivo que permite o estudo da religião como
fenômeno observável. Para a neurociência a religião pode ser observada por
28
exames cerebrais que localizam a relação das funções e estruturas cerebrais
na experiência religiosa.
Dentro do contexto escolar de ensino religioso confessional o
fenômeno religioso pode ser experimentado por orações e meditações em
textos sagrados. A partir das contribuições das neurociências sobre os
benefícios da experiência religiosa pode-se ampliar a discussão sobre o ensino
religioso.
Essa ampliação não pode criar uma neuroteologia para o ensino
religioso, pois seria disciplina artificial ao fenômeno em si, mas pode ajudar a
compreender o papel da religião na formação do cérebro aprendente para
ampliar as discussões de conteúdo cidadão nos estudos pedagógicos.
2.3 - A dialética do sagrado e o sentido último na
formação cognitiva e cidadã
Dialética do sagrado e sentido último são elementos complementares
para o entendimento do valor social e humano do fenômeno religioso.
A dialética do sagrado é conceito proposto pelo historiador da religião
Mircea Eliade. Esta dialética está ligada ao fenômeno quando parte de uma
dialética entre o mundo natural visível e mundo sobrenatural invisível. A
natureza seria um ambiente repleto de ameaças, o profano, e o ponto onde se
rompe essa tensão ameaçadora é o sagrado.
Nos centros sagrados a tensão gerada pelas ameaças do mundo
natural são rompidas e equilibradas pela ação do sagrado. Embute-se nessa
relação a ideia de finitude humana que ao defrontar-se com o tremendum , com
o inexplicável, encontra o fascínio do sobrenatural e entende o transcendente
em sua experiência particular e coletiva do grupo religioso.
A possibilidade de se entender finito em conexão com o eterno conduz
o homem ao conceito de sentido último. Quando o homem encontra algo maior
do que si próprio ao qual decide dedicar sua vida ou até arriscar sua vida ele
29
encontra o sentido último para ele. Sentido último é o compromisso com aquilo
pelo que vale a pena viver.
Conhecer o sentido último nos leva a reconhecer a vida do ponto de
vista da responsabilidade. Ter responsabilidade em profundidade com algo
transcendente, ou com outro ser humano é o que permite o homem
transpassar sua finitude e gerar sentido para a vida.
Do ponto de vista prático o sentido último se conecta a ideia de suicídio
com seu oposto. Se o suicídio é ausência de sentido para a vida a religião é
atribuição metafísica de sentido para a vida que ultrapassa a capacidade do
próprio de individuo de entendimento. Essa transcendência impulsiona para
diferentes conquistas nas resoluções das tensões de conhecimento pela
dialética do sagrado.
Ao dialetizar com o profano e buscar o sagrado como sentido último
para a vida o homem reestrutura seu conhecimento do mundo em síntese
criativa no sentido de solução útil para os problemas da vida.
O assunto é extenso e ultrapassa o escopo desse trabalho, mas
podemos citar como exemplo as crises de paradigma. As crises de paradigma
tem em comum mudanças de cunho religioso, político, cognitivo e econômico.
Na antiguidade grega com as navegações comerciais e descoberta de
novas realidades culturais foram o componente econômico e cognitivo, a
democracia o componente político e a mitologia grega arcaica o componente
religioso. Na busca da resolução dessa tensão de conhecimento na crise de
paradigmas os gregos resolvem primorosamente com o surgimento da filosofia
a partir de uma dialética do sagrado em busca de sentido último para a vida.
Com o surgimento do cristianismo ocorre uma nova crise de
paradigmas da sociedade romana que se torna um império escravocrata em
contradição com sua origem e valores republicanos. Em uma crise politica pelo
governo do Império, Constantino marcha contra Germânico com um exercito
formado por muitos cristãos. Sob um novo padrão moral que coincidia com
valores dos filósofos epicuristas, Constantino restabelece o equilíbrio e unidade
30
do império pelo apoio ao cristianismo em sua avassaladora força como sentido
último capaz de resistir por séculos os boicotes e perseguições romanas.
Com a queda do império romano o cristianismo se mantém como
unidade cultural. Os reis carolíngios percebendo isso aliam-se à igreja, guardiã
do conhecimento de então, resolvendo mais uma crise da paradigmas.
No período renascentista a Reforma Protestante, aliada a mercadores,
permite a mudança da sociedade para um novo padrão de conhecimento. Na
Revolução Industrial, o sociólogo Max Weber atribui à ética protestante o
espírito que alavancou o capitalismo e consequentemente a Revolução
Industrial.
Outra dialética do sagrado ocorre na crise de paradigmas e tensão de
conhecimentos na presente política de globalização aliada a uma visão a
tecnologia da informação como instrumento de autotranscendência humana.
Quanto a isso, Goldberg (2001) faz uma alusão neurocientífica de cunho
importante para a consideração da importância do ensino religioso nas escolas.
As sociedades humanas funcionariam conforme sua estrutura mental biológica
que comunicam entre si como organismos. Sendo assim, cada grupo de uma
sociedade exerceria papel fundamental na organização social. Por exemplo, os
artistas seriam responsáveis pela catarse das emoções em analogia ao
sistema límbico; os intelectuais seriam a memória da sociedade em analogia ao
processo de memorização em que atua o hipocampo com emoção e razão;
Enfim os lideres políticos seriam teriam a função executiva como o lobo pré-
frontal.
Estendendo ainda considerações tecnológicas pode-se dizer que a
fonte biológica e mental de autotranscendência seria originalmente a religião
vinculando a sociedade em objetivos comuns. Com o advento da internet a
autotranscendencia ganha contornos virtuais permitindo ainda uma aldeia
global. Isso permitiria um governo global onde cada grupo social teria seu
papel. Ao contrário da religião que não pode ser controlada mesmo em regimes
autoritários, a tecnologia pode, em tese, ser facilmente controlada. Se
aplicarmos a ideia de funções sociais em rede digital deduz-se que alguém
31
deveria ser o lobo pré-frontal. Como a religião é aspecto da consciência e não
pode ser controlada existem várias sociedades que se mantém unidas a partir
de um individuo ou individuos que agem como função executiva da sociedade.
Tal possibilidade manté a unidade do organismo social que é necessária a sua
própria sobrevivência (Goldberg, 2001).
Entretanto, sendo o organismo social de âmbito global e unido por
vinculos digitais a unidade de um organismo social desse tamanho só seria
possível por controle extremamente centralizado. Implica tal argumento que
uma pequena elite teria que se tornar o lobo pré-frontal de uma sociedade
globalizada através de um controle dos meios virtuais e padrões mentais dos
indivíduos. Tal possibilidade levaria ao totalitarismo global (Goldberg, 2001).
Sob este argumento de Goldberg (2001) o ensino religioso torna-se
ainda mais necessário à formação cidadã como elemento de união até mesmo
global, mas que é extremamente localizado nas pertenças e identidades de
cada grupo. O ensino religioso sob este aspecto não é só uma questão de
diversidade mas de garantia da liberdade de consciência e também política.
Poderia se perguntar ainda sobre este aspecto até que ponto é
desejável que o Estado regule o ensino religioso ou os cursos de teologia, mas
esta digressão ultrapassa o âmbito deste estudo, mas cabe a provocação para
a discussão cidadã.
É possível citar inúmeras crises de paradigma com tensões de
conhecimento onde os conceitos de sentido último e dialética do sagrado
estiveram em ação na história da humanidade. Cabe, acima de tudo, destacar
a atual crise de paradigmas requer um elemento de forte coesão para sua
resolução. A dialética do sagrado e o sentido último podem encontrar em
colaboração com a neurociência uma resolução paradigmática que a história
indica que o papel da religião é fundamental, portanto, o ensino religioso
justifica-se por necessidade prática para a vida individual e cidadania.
32
No próximo capítulo as características citadas até aqui sobre religião e
cérebro serão alinhavadas em relação à aprendizagem com foco no ensino
religioso.
33
CAPÍTULO 3
RELIGIOSIDADE E APRENDIZAGEM
3.1 - Estrutura biológica da aprendizagem e da fé.
Biologicamente a aprendizagem e a fé podem ser compreendidas
como partes de um processo integral do cérebro. Além do córtex pré frontal
que foi o responsável pela formação da civilização nas palavras de
Goldberg(2010), funções cerebrais importantes estão envolvidas tanto na
aprendizagem quanto na fé. Tanto para Raul Marino (2005) quanto para Lent (
2011) a neurociência não se ocupa do transcendente, mas pode ocupar-se da
fé como um fenômeno humano observável com as novas tecnologias de
exames por imagem.
Entretanto, é possível considerar que religião e aprendizagem se
relacionem no conceito de fé como algo que em algum momento é necessário
a um start de conhecimento. Se a confiança é sinônimo de fé, pois a própria
fidelidade é confiança, é possível conjecturar que mesmo uma criança
estabelece uma relação de fé não transcendente ao confiar nos seus
cuidadores.
Para Marino Jr (2005), um religioso pode ser mais inteligente que a
média no sentido em que possui um aparato biológico cerebral para a fé e que
desenvolve esse aparato cerebral, potencializando seus níveis de consciência.
Existem três níveis de consciência que são a vigília, o sono e o sonho,
entretanto, pesquisas mais recentes definem como níveis de consciência a
meditação, a oração e a contemplação que são elementos característicos da
religião.
Através de estímulos cerebrais eletromagnéticos foi possível estimular
regiões do cérebro envolvidas no processo de experiência com o
transcendente e também verificar o comportamento do cérebro de freiras e
34
monges budistas em processos de meditação religiosa. Cabe observar que tais
exames foram feitos no contexto do cérebro individual, cabendo ainda
investigações do funcionamento do cérebro sócio-religioso, pois o elemento
social é importantíssimo na formação e manutenção da fé (Marino Jr, 2005).
Na experiência transcendente o córtex pré frontal e frontal entram em
atividade irradiando no conjunto cerebral a troca de informações neuronais que
vão se concentrar no que é conhecido como “ponto de Deus” na parte anterior
do lobo temporal direito. Ao se observar essa reação cerebral detecta-se
fisiológica e funcionalmente a existência da fé como fenômeno humano
inquestionável, mesmo que a neurociência não se ocupe do transcendente
(Marino Jr, 2005).
Em pesquisas realizas por neuroestimulação dessas áreas cerebrais
tanto crentes quanto ateus tiveram experiências que poderiam ser
consideradas místicas como a percepção de uma presença ou de uma unidade
com o universo. O que se observa é que alguns indivíduos tem maior
desenvolvimento dessa sensibilidade religiosa do que outros, entretanto, tal
sensibilidade não pode ser atribuída unicamente ao componente cultural, mas
é, inclusive biológica (Marino Jr, 2005).
Ainda tomando a religião como uma experiência que envolve
aprendizagem e a aprendizagem como tomada de consciência do mundo,
podemos vincular para o raciocínio deste trabalho o processo de aprendizagem
que ocorre no cérebro com o processo de experiência religiosa. A primeira
instituição formadora do homem, juntamente com a família, é a religião. Como
formadora do homem a religião ocupou-se da aprendizagem inclusive
propondo métodos de aprendizagem baseados na experiência religiosa. É de
citação notória a importância do culto à deusa Mnemosine na produção de
técnicas de memorização entre os gregos. No campo do monoteísmo as
Escrituras judaico-cristãs chegaram até a atualidade com um número
reduzidíssimo de erros de grafia devido à dedicação dos rabinos e copistas à
memorização dos textos sagrados. Um escriba judeu para memorizar um texto
deveria repeti-lo cerca de 400 vezes para a proficiência requerida, cada linha
35
tinha um número definido formando tantas páginas. Após a Escritura ocorria
ainda a conferência do próprio texto escrito além do número de letras que
compunham o manuscrito. Não é sem propósito que Jesus afirma:
“Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim
abrogar, mas cumprir. Porque em verdade vos digo que,
até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til
jamais passará da lei, sem que tudo seja cumprido.
Qualquer, pois, que violar um destes mandamentos, por
menor que seja, e assim ensinar aos homens, será
chamado o menor no reino dos céus; aquele, porém, que
os cumprir e ensinar será chamado grande no reino dos
céus. Porque vos digo que, se a vossa justiça não
exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum
entrareis no reino dos céus” (Mateus 5.17-20)
Com esta passagem Jesus não condena o zelo farisaico na escritura
por memorização e verificação minuciosa, mas afirma que deve ser feito ainda
mais que isso para chegar ao transcendente. Ou seja, não ocorre uma
condenação do processo mental, ou mesmo da aprendizagem como pode
parecer aos desavisados, ao contrário, ocorre a valorização da aprendizagem
para a vida.
Outro exemplo importante do uso da religião na educação é o
islamismo. É comum a afirmação de que Maomé não pode ser considerado
autor do Corão por ter sido analfabeto, claro que considerações religiosas
quanto a revelações não cabem nesse trabalho, mas é importante notar que na
época do surgimento do islamismo, muito antes do advento da imprensa,
pouquíssimas pessoas eram leitores. Existia a profissão de escriba os quais
copiavam livros e seu trabalho era o mais caro e especializado da época
tornando os livros raros. Estes livros eram lidos para um grupo de pessoas que
tinham por praxe decorar os textos, especialmente se revestidos de sacralidade
ou de importância fundamental. O analfabetismo de Maomé não indicava
ignorância, mas o provável domínio da memorização. Na antiguidade não era
36
impossível a existência de homens muito sábios de cultura oral, mas não de
cultura letrada. Embora seja possível afirmar o analfabetismo em termos
letrados de Maomé, não é possível negar sua sabedoria a partir de
memorização. Até hoje existem entre muçulmanos a prática de memorização
do Corão com campeonatos e premiações internacionais.
Após estes exemplos, retomando, em coerência com os exemplos, a
vinculação da religião com aprendizagem no campo biológico, é possível
afirmar que em seu contexto holístico de operação o cérebro utiliza funções e
regiões relacionadas a aprendizagem no processo religioso, como a memória,
o que indica uma importância tanto biológica quanto histórica da religião no
processo ensino aprendizagem.
Descrevendo em resumo o processo de aprendizagem é possível dizer
que a aprendizagem é um processo onde o homem como ser biologicamente
capaz de produzir linguagem e tecnologia expandindo suas potencialidades,
ainda possui grande capacidade de memória que estabelece uma prontidão
para a elaboração do conhecimento por construção de sentidos e
procedimentos que promovem mudanças no cérebro através tanto da gravação
de informações na rede neural quanto pelo melhor desempenho do raciocínio
em relação com a inteligência emocional que Relvas destaca:
As duas formas de inteligência completam o ser
humano em sua essência; uma fornece a reação institiva
e rápida e a outra nos conduz a racionalização da solução
ou atitude diante de um problema ou situação, colocando-
a em sua real dimensão e concebendo a melhor solução
dentro do raciocínio lógico de nosso conhecimento
(Relvas, 2010).
Essa relação gerará a plasticidade cerebral que é a capacidade do
cérebro de se recompor e se modificar a partir da neurogênese, do processo de
desenvolvimento humano, da resposta a estímulos repetitivos e até mesmo de
restauração de lesões sofridas no córtex (Relvas, 2010).
37
Esse processo, assim resumido, pode ainda ser melhor entendido ao
abordar-se a importância do cérebro paleomamífero, repitiliano e do cerebelo
na aprendizagem compondo todo o encéfalo. O cérebro paleomamífero ou
emocional é responsável pelas ações de autopreservação pela sensação de
perigo ou adequação ao ambiente. Essas ações podem tanto envolver a fuga
quanto a agregação de indivíduos para o bem da espécie. Já o cérebro
repitiliano formado pelo tronco encefálico, bulbo raquidiano e telencefalo é
responsável pela prontidão e atenção bem como pelos processos mais
primitivos de manutenção da vida, como a respiração e os batimentos
cardíacos. O cérebro reptiliano tem importância na aprendizagem pois sua
correta posição, ao sentar para estudar por exemplo, pode favorecer a atenção
e conforto necessários para aprendizagem. Ainda quanto ao cerebelo que é
responsável pelos movimentos mais involuntários e automáticos, percebe-se
sua importância na aprendizagem pois sua especialização funcional permite a
liberação de recursos executivos para atividades mais complexas (Relvas,
2010).
Vinculando a anatomia e funcionamento do cérebro na religião e na
educação é sugestivo que as funções transcendentes do “ponto de Deus” são
pouco utilizadas na educação de forma intencional. Essa forma intencional não
se refere a modelagem de indivíduos mas de estimulação do cérebro religioso
o que propiciaria a formação de um individuo mais completo em termos de unir
o homem técnico, linguístico, emocional, racional como o homem que
experiência o transcendente. Se a educação visa a formação integral e
integrada do individuo, trabalhar diferentes áreas cerebrais é fundamental e as
funções religiosas são parte inequívoca da natureza do ser humano.
É importante notar a pertinência do ensino religioso no funcionamento
cerebral ao atender prerrogativas da educação conforme defendidas por Morin
que são os saberes necessários à educação que incluem eliminar a cegueira
do conhecimento no sentido em que um saber encobre a possibilidade de
conhecer de outra maneira por ilusão e erro; buscar um saber pertinente que
esteja atrelado a própria condição humana em sua constituição biológica,
social, e até mesmo religiosa, além da aprendizagem para enfrentamento das
38
incertezas, compreensão e uma busca pela ética do gênero humano (Morin,
1999)
Ainda que tais considerações de Morin sejam genéricas estes saberes
podem ser vinculados a religião como uma forma de superar a cegueira do
conhecimento, de superar as barreiras à pertinencia da condição humana, das
barreiras da incerteza, bem como do caráter ético da fé.
3.2 - Aprendizagem e religião na construção
conhecimento, comportamento e autonomia
A aprendizagem é mudança de comportamento e essa mudança de
comportamento deve ocorrer pela consciência de si mesmo e do mundo que
cerca o educando (Relvas, 2010). O conhecimento tem um caráter empírico e
também abstrato, todavia o ponto de partida é empírico. Desde o nascimento a
criança experimenta o mundo e os outros em todas as fases do
desenvolvimento. O conhecimento é a capacidade de avaliar os fenômenos
naturais e dar uma resposta ótima para eles ou mesmo fazer boas perguntas
sobre o mundo.
Na construção do comportamento é fundamental a interação social
como enfatizou Vygotsky. Essa interação social forma abstrações que são
internalizadas, mas tal internalização não é possível sem a participação de um
fenômeno social. A religião como fenômeno social é formadora de
comportamento (Upson, 2014), portanto, ainda que não se enfatize um
comportamento religioso específico é desejável que a aprendizagem ocorra
num ambiente escolar que não seja avesso à religiosidade, mas que incentive
os valores religiosos de construção de mutualidade. A negação ideológica da
religião é negação da natureza humana em sua biologia em sua complexidade
de sentido para a vida. Como vimos no capítulo 2 a noção de responsabilidade
dada por um sentido último para a vida faz da religião um elemento gerador de
comportamentos conscientes, mesmo que contrários a opiniões ideológicas.
Ainda que a escola não seja um templo, ela também não é uma prisão.
A proibição da religião em instituições de internação coletiva só ocorre em
39
regimes ideológicos de exceção. Num país democrático a educação deve “dar
asas” ao educando. Só é possível dar asas quando se educa a “voar” a partir
de si mesmo, a partir de sua finitude para o transcendente. A citação de Rubem
Alves é própicia a este raciocínio:
“Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros
desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são
pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode
levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre
têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a
essência dos pássaros é o vôo. Escolas que são asas não
amam pássaros engaiolados. O que elas amam são
pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros
coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem
fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo
não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado” (Alves).
Estudantes sem asas não possuem sentido para a vida. O sentido para
a vida é o conhecimento fundamental que move o homem e a religião é um dos
caminhos para encontrá-lo. Cabe portanto, um ensino religioso como
construção de uma conhecimento que potencialize um comportamento
autônomo e livre do educando.
3.3 - Emoção, memória, razão e a construção social do
aprendizado
Não existe aprendizado sem memória (Relvas, 2010). Temos
memórias de curto prazo, longo prazo e procedimental. Essas memória se
conectam em todo o cérebro e são filtradas pelo córtex pré frontal. Memórias
também são fruto de experiências somatossensórias, sociais, afetivas e
psicológicas. Essas memórias fazem parte da construção social do
aprendizado. Tal afirmação coincide com as teorias de Vygotsky, Piaget e
Wallon que tomaremos como pressuposto da pedagogia devido à extensão e
40
âmbito específico do trabalho. Nesse aprendizado complexo e singular do
individuo a religião não pode se ignorada, tanto pelos elementos anatômicos e
funcionais já citados quanto por sua importância na formação de sentido, de
significação e de pertencimento.
É notório o papel da religião no processo de pertencimento de um
individuo e mesmo em seu processo de inclusão em um meio social. Nesses
processos há uma profusão de emoções e de memórias significativas que são
resignificadas por cada aprendente gerando novas plasticidades e novas
relações sociais, identitárias e afetivas. Essa característica da religião coincide
com propósitos educacionais defendidos por pensadores da educação como
Paulo Freire e Rubem Alves que viam no ser humano a potencialidade de “ser
mais”. Nenhuma capacidade mental permitiria ao homem “ser mais” do que a
capacidade que lhe permite a percepção de uma transcendência da própria
finitude, portanto a religião tem tanto um papel biológico quanto qualitativo na
formação humana.
Estudos estatísticos comprovam que além da associação entre religião
e bem estar o pertencimento a grupos religiosos gera maior tendência à
felicidade (Upson, 2014). Na verdade “a sensação de pertencimento pode ser
tão imprescindível como o alimento” (Leary apud Upson, 2014). A religião
apresenta um forte componente social o que já era esperado tendo em vista
seu papel aglutinante e regulador na formação da civilização. Isso corrobora
com a tese de Goldberg sobre o papel civilizatório dos lóbos pré frontais.
Esse forte pertencimento social pela religião como elemento
potencializador do “ser mais” ocorre mesmo em países mais secularizados
como Dinamarca e Suécia. Mesmo ocorrendo menor comprometimento
religioso e tendo uma religião estatal, batismos de bebês e impostos pagos
para sustentar a igreja representam “um senso de comunidade, base moral e
patrimônio nacional” (Upson, 2014). Essas caracteristicas conferem ao ensino
religioso, no campo da educação para o “ser mais” um elemento agregador que
ultrapassa a própria confessionalidade.
41
Cientistas descobriram que determinas personalidades combinam com
outrinas mais específicas o que, além de outros fatores, pode estar associado
ao caráter genético. O geneticista Dean Hamer estuda a possibilidade de um
gene particular ligado à religiosidade. Embora a pesquisa Hamer seja ainda
incipiente é reconhecido que os genes produzem proteinas que influenciama
nossa forma de agir, o que incluiria as crenças religiosas (Saraglou, 2014)
Pesqisas com 21 mil participantes indicam que pessoas religiosas
possuem alguns quesitos de personalidade mais pronunciados do que as que
não se declaram religiosas. Cinco fatores são apresentados para classificação
da personalidade por Lewis Goldberg, são eles, extroversão, neuroticismo,
afabilidade, consciência e abertura. Os religiosos pesquisados, segundo este
critério, apresentaram maior indice de afabilidade e consciência. O apoio a
estilos de vida saudáveis, autocontrole emocional e no consumo de drogas são
fatores importantes que são influenciados pela religião (Saraglou, 2014). Tais
caracteristicas sugerem que o ensino religioso, do ponto de vista cerebral e
social é uma necessidade educacional que atende à vocação humana de “ser
mais” através da manutenção do equilíbrio individual e social.
Estudos focados no evolucionismo apontam que a coesão social
proporcionada pela religião permitiu a união de grupos sociais e caracteristicas
como afabilidade e consciência, além da preocupação com o bem estar alheio
tendem a uma estabilidade social (Saraglou, 2014). Ainda que sob foco não
religionista o ensino religioso se justifica socialmente, entretanto, seu caráter
fenomenológico e de pertencimento ao grupo religioso torna fundamental que o
ensino religioso seja mais do que um apanhado ético ou de história das
religiões. Para a abordagem desse trabalho, as caracteristicas bio-psico-sociais
da religião potencializadas em sua fenomenologia indicam a importância de um
ensino religioso confessional, mais do que um ensino religioso “neutro”,
entretanto, a escola deve oferecer opções que atendam tanto grupos
majoritários quanto minoritários em matéria religiosa. Mesmo entre ateus
cresce a ideia de que a ligação a um grupo semelhante a um grupo religioso
seria relevante para o incremento da qualidade de vida dos individuos ateistas
(Upson, 2014).
42
CONCLUSÃO
O pressuposto hipotético da pesquisa visava abordar a importância do
ensino religioso especialmente em seu caráter confessional pela importância
fenomenológica da experiência religiosa na formação de sentido para a vida e
como construtora da sociedade. Ainda foi pressuposto que ao contrário do
senso comum antirreligioso, a religião é capaz de propor autonomia ao sujeito
tanto por ser uma característica intrínseca ao humano quanto por permitir uma
referencia dialética em suas relações entre o sagrado e o profano.
Durante toda a pesquisa foram pontuados elementos das
neurociências em diálogo com as Ciências da Religião e educação. O capítulo
1 tratou do cérebro religioso e sua constituição biológica sob um ponto de vista
da classificação aristotélica de causa e efeito. Observou-se no primeiro capítulo
que o estudo da religião no cérebro atende as quatro causas básicas da
epistemologia aristotélica no sentido de que cérebro e religião se relacionam de
forma necessária, formal, material e lógica.
Tendo estabelecido as causas como uma justificativa de base para o
estudo da religião do ponto de vista da neurociência pedagógica, adentra-se no
segundo capítulo as questões de sentido último para a vida e de dialética do
sagrado com referencias a um funcionamento dialético do cérebro em estimulo-
reação. Observa-se que ter um sentido de responsabilidade perante a vida em
momentos de tensão de conhecimento são elementos de crucial importância na
formação ética do individuo e que encontram respaldo na base neurológica do
sujeito aprendente.
No capítulo terceiro, aborda-se a aprendizagem e a fé. Descreve-se o
processo biológico de aquisição da aprendizagem e o papel da fé na formação
da civilização e do próprio sentimento de pertencimento do indivíduo ao seu
ambiente social. Com isso observa-se a ligação entre aprendizagem, religião e
biologia como uma rede intrincada e necessária de complexidade humana que
precisa ser atendida pela educação.
43
A partir da investigação a hipótese aventada se confirma pela pesquisa
bibliográfica, pois a religião em seu papel de pertença e experiência biológica e
social encontra sua conexão coma realidade do individuo no fenômeno
religioso em si que ultrapassa a mera teoria, mesmo que o fazer religioso seja
restrito à competência da escola. Observa-se também a necessidade do ensino
religioso na formação de um homem responsável e capaz de resolver tensões
de conhecimento, além de manter o próprio equilíbrio interno e social pela ação
religiosa. Por fim verifica-se a proximidade e complementaridade tanto
biológica quanto sócio afetiva da religião com a aprendizagem na busca
humana pela excelência.
A partir da pesquisa que não se pretende exaustiva, conclui-se que o
ensino religioso confessional pode ser valorizado para além de considerações
ideológicas ou preconceitos, pois a base biológica, psicológica, social e
identitária podem ser perfeitamente atendidas nessa modalidade de ensino
religioso.
44
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nº 257.
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INDICE
DEDICATÓRIA 4 RESUMO 5 METODOLOGIA 6 SUMÁRIO 8 INTRODUÇÃO 9 CAPÍTULO I 11 CÉREBRO RELIGIOSO E BIOLOGIA 11 1.1 - a causa necessária do cérebro religioso – a complexidade universal da humanidade 12 1.3 - A causa formal do cérebro religioso – funções 17 1.4 - Uma causa final para o cérebro religioso – a interface religião, biologia, aprendizagem 19 CAPÍTULO 2 22 ENSINO RELIGIOSO E CONHECIMENTO 22 2.1 - A antirreligiosidade como ideologia 23 2.2 - A fenomenologia da religião e o ensino religioso confessional 26 2.3 - A dialética do sagrado e o sentido último na formação cognitiva e cidadã 28 CAPÍTULO 3 33 RELIGIOSIDADE E APRENDIZAGEM 33 3.1 - Estrutura biológica da aprendizagem e da fé. 33 3.2 - Aprendizagem e religião na construção conhecimento, comportamento e autonomia 38 3.3 - Emoção, memória, razão e a construção social do aprendizado 39 CONCLUSÃO 42 BIBLIOGRAFIA 44 INDICE 46