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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES FACULDADES INTEGRADAS AVM PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSO Jogos Do Teatro Do Oprimido- recurso alternativo na inclusão de aluno autista. Por: Sandra Rosa de Sousa Vieira Souto Orientadora: Solange Monteiro RIO DE JANEIRO 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

FACULDADES INTEGRADAS AVM

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSO

Jogos Do Teatro Do Oprimido- recurso alternativo na inclusão de

aluno autista.

Por: Sandra Rosa de Sousa Vieira Souto

Orientadora: Solange Monteiro

RIO DE JANEIRO

2015

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EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

FACULDADES INTEGRADAS AVM

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSO

Jogos Do Teatro Do Oprimido- recurso alternativo na inclusão de

aluno autista.

Esta publicação atende a complementação didático-pedagógico da disciplina de metodologia da pesquisa e a produção desenvolvimento monografia para os cursos de pós graduação lato e stricto senso.

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AGRADECIMENTOS

Meus pais, Francisca Castro de Sousa, Luiz Carlos de Sousa e irmã Ana Carla de

Sousa, os maiores responsáveis pelo que venho me tornando a cada dia e ao longo do

tempo que já foi, está sendo e virá. Juntos me ensinaram a odiar o mal, não me achar

pronta e me sentir bonita. Estou gostando muito de mim. Graças a vocês. Muito

obrigado. Amo vocês!

Meu amigo, esposo e amor de muitos anos Rodrigo Guimarães Vieira Souto,

menção honrosa, pela dedicação e apoio que contribuíram definitivamente para minha

formação e este trabalho.

Querida professora, Solange Monteiro, minha orientadora Amei nosso

relacionamento, mesmo por meios tecnológicos, estabelecemos um diálogo bastante

produtivo.

Querido mestre Paolo Vittoria, Mestre que veio da Itália para me proporcionar

tantas oportunidades, reflexões e mudanças na minha vida. Daqueles que transcendem

becas e titulações. Daqueles que transbordam as instituições. Coerentes com suas

proposições. A contradição opressor-oprimido está sendo superada. Para aqueles que

nos interessam a vitória já é nossa. Este trabalho, por exemplo. É vitória nossa!

Agradeço também a minha amiga Carolina Rossin, por ter me dado forças,

forneceu materiais de pesquisa e muitas vezes levantou a minha estima durante todo

esse tempo que estivemos juntas no processo de elaboração do trabalho.

Finalmente, agradeço a todos os companheiros e companheiras de lutas que

conheci dentro desta universidade e que compuseram minha rede de relacionamentos e

potencializaram minhas percepções no mundo.

A questão é não deixar que o medo nos convença de desistir de enfrentar situações, como, por exemplo, a aproximação com o conhecimento.

Paolo Vittoria

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DEDICATÓRIA

Compreendendo que o meu legado empírico é fruto de vivências possibilitadas pelos meios nos quais venho me experimentando, dedico este trabalho aos que correram e correrão os riscos desta interação. A minha linda família, avó Justina Pinto de Mesquita (in memória), mãe Francisca, pai Luiz Carlos, irmã Ana Carla, esposo Rodrigo Vieira Souto e minha sobrinha Giovanna.

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Resumo

O presente trabalho aborda de forma breve como podemos trabalhar jogos teatrais de

Augusto Boal como alternativas na escola inclusiva - no segundo segmento do Ensino

Fundamental. O problema parte de uma experiência pessoal que tenho desde 2014,

desde essa época me ficou uma inquietação de saber como os jogos do Teatro do

Oprimido poderiam mudar o comportamento, o desenvolvimento e a comunicação dos

estudantes incluídos. A metodologia utilizada constituiu-se em observação, registros no

caderno de campo e análise de três jogos do processo de trabalho com jogos a partir dos

registros. A conclusão da investigação nos mostra que os jogos têm muito a contribuir

com o processo de aproximação dos alunos que estão sendo inseridos na escola, não

somente em relação ao ensino-aprendizagem, mas também no respeito ao próximo, na

afetividade, na superação de medos e nas frustrações cotidianas. As experiências

fizeram com que todos os envolvidos nos jogos pensassem buscar a melhor forma de

conviver e vive.

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METODOLOGIA

A pesquisa de cunho qualitativo com estudo de caso visto que buscou explorar o

desenvolvimento do aluno e suas relação com jogos e exercícios teatrais e laços afetivos

desenvolvidos. Neste sentido, a metodologia utilizada constituiu-se em observação e

registros no caderno de campo e também análise em que tivemos em três períodos

diferentes das oficinas. É importante deixar que claro que o foco da análise contemplou

três aspectos: comportamento, desenvolvimento e comunicação dos participantes nos

períodos observados. Levamos em consideração as questões relatadas pela professora de

artes regente da turma e da escola, que se dispôs a oferecer uma hora da aula para o

desenvolvimento das atividades, pois a professora era a pessoa que além de participar

das oficinas, tem um ótimo relacionamento com a turma.

Os trechos de oficina foram escolhidos por meio de uma análise das Atas que

estão no caderno de campo, nos quais considerei mais clara a participação e que

ressaltassem uma mudança significativa de atitude do aluno com relação a turma e às

oficinas. O Caderno de Campo foi composto por Atas escrita de acordo com o

desenvolvimento da semana

Na primeira oficina foram relatados o primeiro contato com a turma, as várias

conversas com a turma para investigar as ideias e para que a mediadora multiplicadora

conseguisse através do diálogo iniciar um vinculo e conquistar a confiança da turma,

deixando claro que o objetivo das oficinas era incluir o aluno autista na turma de sétimo

ano. Além do momento de identificação das referências e afetividade com o aluno,

convidamos todos para assistir ao filme Teatro do Oprimido nas escolas.

Na Segunda oficina foi apresentado ao aluno o sistema de jogos e exercícios do

Teatro-Fórum, que se constitui, basicamente, no desenvolvimento e na participação das

oficinas, com muito diálogo após os jogos, buscando perceber como ele estava se

identificando e o que apresentavam de criticidade quanto aos temas abordados ou dos

jogos.

A Terceira oficina foi de elaboração de cenas do Teatro Fórum, com a ajuda de

dois alunos da turma, a qual ainda encontra-se em processo de construção durante a

escrita deste trabalho.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

O TEATRO DO OPRIMIDO E AS ALTERNATIVAS DE ATUAÇÃO 11

CAPÍTULO II

EDUCAÇÃO INCLUSIVA E OS TRANSTORNOS DO ESPECTRO DO AUTISMO: BREVE HISTÓRICO 17

CAPÍTULO III

O DESEJO DE UMA EDUCAÇÃO PARA TRANSFORMAR 23

CONCLUSÃO 34

BIBLIOGRAFIA CITADA 36

ÍNDICE 37

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INTRODUÇÃO

Este trabalho busca compreender como uma pedagogia que tenha como

metodologia formas alternativas de discutir a educação inclusiva e a política pela arte,

como vias de conscientização e através das diversas formas de expressão, pode

contribuir para o desenvolvimento, comunicação, comportamento e o processo de

ensino-aprendizagem de estudantes da Educação inclusiva, tomando como referência o

diálogo com os sujeitos que estão inseridos nos jogos.

O trabalho parte de uma experiência pessoal que iniciou no ano de 2014. O foco

principal são os jogos teatrais e como eles podem ser uma forma alternativa para

provocar a mudança nas atitudes dos alunos envolvidos nas atividades e a metodologia

fundamentada em Paulo Freire e Augusto Boal. Atualmente só tem um aluno envolvido.

A metodologia utilizada consiste em revisão de literatura e análise de registros

do caderno de campo. Os autores de que nos valemos como referências principais são

Augusto Boal e Paulo Freire. Esses dois autores oportunizaram uma compreensão aguda

do processo de mudança crítica sobre os assuntos que fazem parte do cotidiano e trazem

a oportunidade de mudanças no pensamento fixo de estereótipos estruturados e

mantidos pelo sistema de ensino brasileiro, bem como dos que lideram e manipulam o

pensamento crítico. Augusto Boal nos fez compreender e pensar várias formas de

expressão e pensamentos que não priorizam somente o uso da palavra oral e escrita, mas

também potencializam o uso da palavra, do som e da imagem, criando poesias,

desenhos, pinturas, músicas, esculturas, danças e espetáculos, produzindo assim cenas

de Teatro Fórum1,ou seja, nas quais usa-se o corpo como forma de linguagem. Em

Paulo Freire (2012), por meio de sua pedagogia libertadora encontramos caminhos

pedagógicos para proporcionar a mudança aliados aos jogos teatrais, de Augusto Boal

(2009).

Tais autores nos deram a chave de compreensão dos elementos que podem

contribuir para alternativa encontrada pelo grupo de fazer interação das teorias teatrais

junto às práticas dentro do espaço escolar, não somente dentro da sala de aula, mas da

escola como um todo. Mas, vale perguntar, tendo em vista a busca de experiência 1 É o método teatral que se manifesta através da Estética do Oprimido, sistema com a mesma base filosófica, social e política, que engloba todas as artes que integram o teatro.

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pedagógica, o aprendizado e as mudanças na vida cotidiana com jogos Teatrais

utilizados no Teatro do Oprimido – TO. Como as oficinas que trabalham com exercícios

e jogos de T.O podem ajudar aos alunos no processo de construção de autonomia? De

que forma as atividades desenvolvidas na proposta do Teatro do Oprimido podem

interferir no cotidiano escolar e em seu sujeito? Essas são perguntas que, de acordo com

o trabalho desenvolvido por mim, merecem ser investigadas, mas que, em princípio,

podem não ser respondidas integralmente, haja vista a abrangências delas e o limite

deste trabalho, ainda que os trabalhos na Escola CER permaneçam em andamento.

Talvez em trabalhos posteriores possamos aprofundar tais questões ou possam ser

retomadas por outros pesquisadores que interesse em estudá-las.

O tema teve origem no trabalho com o Teatro do Oprimido na EJA através do

grupo de Extensão do qual participei na Escola Municipal X, em Duque de Caxias com

turmas de EJA. Fiz o Curso de formação de Multiplicadores de Teatro do Oprimido

(CTO), apresentamos comunicações sobre o tema na Jornada de iniciação científica em

palestras, reuniões e leituras, sempre dialogando e trocando as questões de opressão. Em

2014, iniciei o trabalho com o aluno Autista e me deparei com a possibilidade de fazer

um jogo teatral com ele no salão, que foi muito bem aceito por ele e executado com

prezes, logo, observei que os jogos poderiam trazer mudanças significativas para o seu

desenvolvimento, o que consolidou a minha escolha pelo tema.

Mas aos poucos fui descobrindo que o meu objetivo primordial não era o

trabalho que levasse só a construção dentro da escola de cenas de Teatro Fórum com os

alunos sobre as formas de opressões. Então julguei mais relevante abordar os jogos

como uma forma alternativa, onde o educador poderia utilizar para propiciar momentos

dialógicos dentro do âmbito escolar com o Aluno Autista através da expressão,

representação, arte e etc.

Um dos esforços cognitivos do estudo foi pensar no legado histórico que marca a

história da educação brasileira desde a década de 1960, momento marcado por um

intenso movimento o conceito de deficiência incluíam principalmente as causas

orgânicas, que se manifestavam ou se produziam no início do desenvolvimento na que

tangia a Educação Especial.

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O presente estudo está organizado em quatro partes. Esta introdução em que

apresentamos o estudo. O Capítulo I, O Teatro e a Pedagogia do Oprimido e a

alternativa de educação. Capítulo II, em que fazemos um breve histórico do Teatro do

Oprimido, da Pedagogia freireana e da Educação. O Capítulo III, os jogos utilizados

para uma de uma Educação Transformadora, no qual apresentamos a pesquisa e

analisamos três registros referentes ao desenvolvimento dos jogos teatrais, buscando

destacar se houve mudanças em relação ao aluno. Na terceira parte, apresentamos as

Considerações Finais, buscando evidenciar o que foi possível compreender quanto aos

objetivos e às questões do estudo.

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CAPÍTULO I

O TEATRO DO OPRIMIDO E AS ALTERNATIVAS DE ATUAÇÃO

Neste capítulo é necessário um resumo da história do Teatro do Oprimido,

para explicar de uma forma muito sucinta como é realizado e, o mais importante,

para tentar entender seus fundamentos e os relacionamentos entre as áreas artísticas,

políticas, sociais e estética. É possível levantar algumas informações sobre o que

isso representa no cenário teatral brasileiro e suas divisões.

O Teatro do Oprimido - TO têm raízes no antigo teatro de arena que teve um

papel fundamental para a dramaturgia brasileira com a fundação em 1953.

O TO é um conjunto de técnicas teatrais que se manifestam através da

Estética do Oprimido, práticas apoiadas em bases filosóficas, sociais e políticas, que

englobam todas as áreas que integram o teatro. Os métodos teatrais são praticados

em todo mundo e vêm sendo desenvolvidos em diversos continentes e por milhares

de pessoas, consideradas como multiplicadoras. São métodos que ajudam as pessoas

a se livrarem de certas opressões por serem pedagógicos, terapêuticos e estéticos.

Consistem na ideia de que todo mundo é teatral, mesmo quem não faz teatro devido

aos vários papeis que cada um representa em si e sob a própria direção, busca ser

um teatro transformador.

O TO tem como forma de representação uma árvore frutífera e bem

fundamentada filosoficamente em suas divisões. É uma Árvore Estética: tem raízes,

tronco, galhos e copas. As raízes da árvore trazem a solidariedade com ponto

fundamental para o desenvolvimento de um trabalho que visa à intervenção como

forma de propiciar a transformação.

Segundo Boal (2009), Ética e a Solidariedade, em forma estética, são a seiva

que alimenta a Grande Árvore do TO que viaja pelas axiais da palavra, da imagem e

do som, transitam pelos Jogos, metáfora da realidade,e iniciam o processo de nos

despirmos do lixo cultural que nos envolvem, estimulando a criatividade dos

participantes.

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Resumidamente, sinto a necessidade de explicar cada divisão da árvore e

seus aprofundamentos teóricos, para então deixar claro que a árvore do TO tem um

importante significado em seu desenvolvimento e subsidia sua teoria.

Ao longo de todos os anos de trabalho, desde a criação do Teatro Jornal, em

São Paulo no Teatro de Arena, em 1970, Augusto Boal foi descobrindo novas

técnicas e que foram sendo implementadas as anteriores, sem que nenhuma delas

fossem esquecidas. O Teatro invisível na Argentina, em seu exílio; o Teatro Fórum

e o Teatro imagem no Peru; o Arco-Íris do Desejo, na Europa; o Legislativo, durante

seu mandato de vereador no Rio de janeiro. Todas as técnicas desenvolvidas por

Boal tinham relação entre si, germinavam e se nutriam do solo fértil da Árvore do

Oprimido, com objetivo não só mostrar a realidade e sim transformá-la.

Conforme a distribuição física da árvore, os jogos e exercícios se dispõem

pelo tronco. Eles têm regras como tudo que se assemelham ao cotidiano das pessoas,

sendo que as regras são flexíveis, uma vez que a ética e a solidariedade se constroem

no e com o processo.

As copas das árvores compõem os cinco tipos de teatro: Teatro Fórum,

Teatro Legislativo, Teatro Invisível, Teatro Imagem, Teatro Fórum e ações sociais

concretas continuadas.

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Extraído de BOAL, Augusto – O Método – Metaxis: informativo do Centro do Teatro do Oprimido, CTO-Rio, n. 4, p. 72-75, Nov 2008 – ilustração de Helen Sarapeck.

1.1-TEATRO-JORNAL- PRIMEIRA COPA DA ÁRVORE

O Teatro-Jornal foi criado em 1970 por Boal, é uma técnica onde os atores

procuravam notícias no jornal matinal, ensaiavam e apresentavam à noite. As

apresentações sempre eram diferentes como forma de driblar a censura vivida naquele

momento da história.

O Teatro-Jornal foi a primeira tentativa teatral de fazer com que o espectador

atuasse na cena junto com os atores, dando o nome para o ato de “espect-atuação”. As

cenas são sempre de textos como matérias de jornal, bíblia, história,etc., que sejam em

cenas teatrais, uma técnica muita utilizada no Teatro Fórum.

1.2-ARCO-ÍRIS DO DESEJO

Iniciado em um Ateliê em Paris (1980). Segundo Boal (2009), nesta copa da

árvore estudam-se técnicas introspectivas, que trazem opressões que trazemos

integradas como se tivessem nascido em nossa mente; estudam-se as relações da

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sociedade com o indivíduo. Pode ser terapêutica, mas não é terapia. Boal quando pensa

nesta técnica se preocupa com outros tipos de opressão como solidão, vazio, angústia.

As oficinas funcionaram no período de dois anos e Boal sistematizou as técnicas

trabalhadas no livro Arco Iris do Desejo, para trabalhar as opressões que são de caráter

interior através de imagem e palavras.

1.3- TEATRO INVISÍVEL

Boal desenvolveu essa técnica quando andava por Buenos Aires em um período

nada fácil. Lá ele continuava trabalhando nas técnicas e trabalhava as oficinas que

tinham sido desenvolvidas e montadas pelos grupos de Teatro-Jornal. Segundo Boal

(2009), essa técnica tenta sensibilizar a cidadania para opressões despercebidas: é

preciso desfamiliarizar a opressão para que se possa vê-la e combatê-la. O teatro

invisível se caracterizou por ser um método teatral que os atores sabem que estão

atuando, mas a plateia não tem consciência do que está acontecendo.

1.4- TEATRO IMAGEM

Para Boal (2009), as formas de percepção não-verbal são estimuladas, sem

detrimento da palavra. Foi nesta técnica que Boal observou que o corpo precisava ser

mais expressivo:

A assim chamada de imagem de transição tinha por objetivo de ajudar os participantes a pensar com imagens, a debater um problema sem o uso da palavra, usando apenas seus próprios corpos (posições corporais, expressões fisionômicas, distância e proximidade etc.) e objeto (BOAL, 2009, p201).

1.5- TEATRO LEGISLATIVO

Segundo Boal (2009), foi desenvolvida com o Centro de Teatro do Oprimido -

CTO do Rio de janeiro, no seu mandato de Vereador, no período de 1993-1996.

Consiste na simulação, após o Fórum, de uma sessão normal de uma assembleia

legislativa. É realizada uma sessão solene com os mesmos rituais de uma assembleia

convencional. O CTO conseguiu com esse método teatral aprovação de quinze leis

municipais e estaduais.

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1.6- TEATRO FÓRUM

Para Boal (2009), o Teatro Fórum está no coração da árvore, os oprimidos

conscientes e os conscientizáveis expõem opiniões, necessidades e desejos; ensaiam

ações sociais concretas e continuadas, que é Copa Soberana, a meta maior do Teatro do

Oprimido.

É a técnica do Teatro Fórum mais utilizada pelo Teatro do Oprimido, também é

a mais popular no mundo, presente em mais de 70 países dos cinco continentes, levando

as pessoas a discutirem as suas opressões e as relações com a sociedade em que estão

inseridas. Para Boal:

A meta principal do TO é, através dos meios estéticos, descobrir e conhecer a sociedade em que vivemos e, sobretudo, transformá-la. Sempre. Em todas as intervenções que fazem, esse é o nosso desejo. Por essa razão dizemos que um espetáculo ou evento do TO quando acaba: Sempre procurar deixar raízes (BOAL, 2009, p. 215).

É uma representação teatral em que é mostrada uma situação de opressão; e ao

final da exposição da relação opressor-oprimido, quando o último tem o desejo

frustrado em função da intervenção do primeiro, é dado ao espectador o direito de

interferir na cena, mostrando ao oprimido as possibilidades possíveis que o espectador

tem de suas ações.

1.7- ALTERNATIVAS PARA LIBERTAÇÃO

Quando pensamos em Educação e Pedagogia, logo no remetemos as funções

semânticas destas palavras, que nos inclinam a situação temporal e de um espaço

especifico em qual ocorre à relação ensino-aprendizagem, ensino formal e informal.

As ações teatrais do teatro do Teatro do Oprimido propiciam a metodologia de

educação alternativa e através de ações educativas que ajudam a aproximação com os

problemas vividos. Essas ações desenvolvem a consciência crítica dos que participam

das atividades. A linguagem falada e representada teatralmente constitui em um

importante aliado no processo de ensino-aprendizagem e apresentam os aspectos

pedagógico, social, cultural, político e, algumas vezes, terapêutico.

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Como as técnicas de teatro do Oprimido não focam somente na preocupação

com natureza didática do trabalho do grupo, mas também com a humanização dos

problemas enfrentados pelas pessoas, mediadas e orientadas pelo grupo com atitudes

reflexivas e participativas, para ampliação das informações e conhecimentos, e

proporcionar momentos de críticas, desenvolvimento, que enriqueçam o pensamento

dos envolvidos.

As dramatizações possibilitam que o grupo viva os conflitos que estão inseridos

na sociedade, se liberte das tensões que o oprime e elabore novas formas de solucioná-

las e de aprender. As formas alternativas sugeridas através de T.O têm a finalidade de

educar e formar cidadãos mais críticos e com mais alternativas de vencer a opressão. O

trabalho com os jogos teatrais não têm como objetivo que o aluno chegue a um

determinado momento pronto para desenvolver uma cena teatral, mas será um primeiro

contato com a forma lúdica de comunicação e expressão que o teatro proporciona.

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CAPÍTULO II

EDUCAÇÃO INCLUSIVA E OS TRANSTORNOS DO ESPECTRO

DO AUTISMO: BREVE HISTÓRICO

A escolha do marco histórico na definição da Modalidade da Educação Especial

se deu através de uma percepção muito particular no que tange ao ambiente de

trabalhado e ao público que frequenta essa Modalidade de Ensino dentro da perspectiva

da educação Inclusiva.

Segundo Ventura (2009), define-se um novo cenário econômico e político no

Brasil. No âmbito econômico, observa-se o processo do desenvolvimento, como

substituição de importações, tida como base industrial no país. Diante desse processo

de crescimento do país foi necessário que crescessem as especializações para que o país

acompanhe o desenvolvimento mundial. Historicamente a Educação Especial passou

por um processo político como podemos observar na tabela seguinte:

1988- Constituição Federal. Com bases a Conferencia Mundial da criança.

1989- lei 7853/89 – lei da integração.

1990- Declaração Jontien- Conferência mundial sobre educação para todos na Tailândia.

1990- Estatuto da Criança e do Adolescente

1994- Declaração de Salamanca sobre os princípios, poítica e prática em Educação Especial (Educação Inclusiva)

1996- LDB- 9394/96

Analisando o período histórico da educação inclusiva no Brasil, é possível notar

que há teorias e práticas de discriminação, propiciando infinitas situações de exclusão.

Essa época foi caracterizada pela ignorância e rejeição do indivíduo especial portador de

necessidades específicas, a família, a escola e a sociedade em geral condenavam esse

público de uma forma extremamente preconceituosa, de modo a excluí-los.

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Os deficientes mentais eram internados em orfanatos, manicômios, prisões

dentre outros tipos de instituições que os tratavam como doentes anormais, “[...] na

antiguidade as pessoas com deficiência mental, física e sensorial eram apresentadas

como aleijadas, mal constituídas, débeis, anormais ou deformadas” (Brasil, 2001, p.25).

De acordo com decorrer da história da humanidade, observa-se que as

concepções sobre as deficiências foram evoluindo “conforme as crenças, valores

culturais, concepção de homem e transformações sociais que ocorreram nos diferentes

momentos históricos” (Brasil, 2001, p.25).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9.394/96) estabelece o direito de

todos a educação, sendo o dever do Estado e da família promove-la, conforme enfatiza

o Art. 2º sobre os princípios da educação nacional:

Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Entretanto, o referido artigo rege a educação de todos, sem exceção e com igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.

Os principais documentos legais, relacionados aos direitos das pessoas com

NEE, tais como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e a

Declaração de Salamanca (1994) abordam algumas particularidades referentes à

inclusão social e escolar desse público. Segundo determina a LDB 9.394/96:

Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial.

§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular.

§ 3º A oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil.

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Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais:

I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades;

II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;

III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ARTIGO 7 ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;

V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público. Parágrafo único. O Poder Público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste artigo.

Observa-se por meio desse breve levantamento histórico que a organização

histórica da educação inclusiva no cenário educacional passou valer a partir do

ARTIGO 9 da Declaração de Salamanca. Observou-se ainda a necessidade de análise da

capacitação e ensino-aprendizagem da educação inclusiva oferecida aos alunos com

NEE, para que se obtenham agentes transformadores na sociedade brasileira.

O foco do trabalho será realizado com o aluno diagnosticado com o Transtorno

Espectro Autismo (TEA). O breve apanhado histórico abrange alguns aspectos

diagnósticos relacionados ao TEA, possibilitando melhor compreensão o indivíduo

estudado.

É um transtorno que causa atraso no desenvolvimento da criança, e compromete

principalmente sua comunicação, socialização, iniciativa, imaginação e criatividade. A

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maioria dessas crianças nasce aparentemente sem nenhuma disfunção, algumas se

comportam e choram na maternidade como todos os bebês, mas, já nos primeiros meses

de vida, às vezes, até os cinco anos, começam a surgir os sintomas configurando uma

situação dolorosa para os pais: são estranhos comportamentos de crianças que não

falam, são incapazes de olhar as pessoas e isolam-se cada vez mais num mundo

misterioso e impenetrável

O TEA normalmente é diagnosticado por médico neuropediatra, por psicólogo

ou por psiquiatra especializado em autismo (os critérios de diagnósticos utilizados são

avaliações completas com base na DSM.IV ou, no Brasil, o CID, porém ao receber um

paciente ainda sem diagnóstico no consultório psicopedagógico, o profissional precisa

ter conhecimento suficiente para reconhecer o transtorno e fazer a intervenção e o

encaminhamento corretos.

Esse Transtorno do autismo pode ser encontrado em todo o mundo e em

famílias de qualquer. Não tem nenhuma comprovação psicológica, ou no meio ambiente

destas pessoas que possa causar o transtorno. Os sintomas, causados por disfunções

físicas do cérebro, podem ser verificados pela anamnese ou presentes no exame ou

entrevista com o indivíduo, estas características são: relacionamento social,

comunicação e cognitivo; Reações anormais às sensações, alterações na visão, audição,

tato, dor, equilíbrio, olfato, gustação e maneira de manter o corpo; Fala ou linguagem

ausente ou atrasada e certas áreas específicas do pensar, presentes ou não.

Desde o início do trabalho na escola embora o foco seja realizado com o aluno

autista, foi bem surpreendente observar a quantidade de alunos jovens necessitando de

atendimento especializado, olhamos todos não com um olhar de julgamento e sim com

um olhar sem dúvidas muito pulsante para tentarmos entender a complexidade do

ambiente escola, necessidades e os movimentos que seriam necessários para propiciar a

mudança no pensamento e comportamento de pessoas tão diferentes, cheios de

manifestações culturais e religiosas, aspectos trabalhados por Boal (2011) Ver o que

olham e não apenas sobrevoar a realidade sem senti-las.

Ainda que as escolas tentem acolher todos os alunos da educação básica com

objetivo de propiciar a alfabetização e levar a leitura e escrita de forma efetiva, no

entanto, observa-se que a qualidade de ensino ainda é muito desigual. Essas reflexões

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nos remetem às questões educacionais aos quais o profissional têm acesso, as propostas

educacionais declaradas pelo governo não valorizam nem colocam os alunos especiais,

pobres como prioridades, conforme afirma Boal:

Sempre lamentamos que os países pobres, e entre os pobres dos países ricos, seja tão elevado o número de pré-cidadãos fragilizados por não ler e nem escrever; o analfabetismo é usado pelas classes, clãs e castas dominantes como severa arma de isolamento, repressão, opressão e exploração (BOAL, 2009.p. 15).

Os alunos especiais carregam de uma forma geral a marca da incapacidade que é

uma característica muito importante para que possamos compreender os motivos que os

fazem “se isolar” da escola.

2.1- EDUCAÇÃO E O TEATRO DO OPRIMIDO

A partir desse momento farei uma breve aproximação das ideias do Pedagogo

Paulo Freire com as do Dramaturgo Augusto Boal, para deixar claro em que momento

um interfere no trabalho do outro, sempre lembrando que o foco principal são as

oficinas com jogos teatrais e as mudanças no comportamento e na realidade do aluno

autista.

Para Paulo Freire (2011), a alfabetização não pode se fazer de cima para baixo,

nem de fora para dentro, como uma doação ou uma exposição, mas de dentro para fora

pelo próprio analfabeto, somente ajustado pelo educador. Desse modo, pode-se afirmar

que a educação acontece de dentro para fora e não é impossível que ocorra educação

quando o educador e educando se colocam como um numa parte dos extremos e sim

processo dialógico de trocas, um ensinando e aprendendo com o outro.

Neste sentido, Boal busca se aproximar da Pedagogia de Paulo Freire quando

propõe um Teatro-Fórum, onde o ator dialoga com o espectador. Não os colocando nem

num extremo e nem em outro e sim rompendo a distância entre o palco e plateia. O

Teatro como forma de ação para que os participantes aprendam a reconhecer e lutar

contras as opressões. Os atores e espectadores atuam e dialogam juntos. Segundo Boal

(2009), a mídia e os patrocinadores tornam o artista um ser inalcançável, com dom e

divino; a vida real prova o contrário: somos todos artistas.

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Boal busca o diálogo trabalhando com jogos teatrais que se relacionam

diretamente com os diálogos corporais e que propiciam a interação entre a Palavra, o

Som e a Imagem. Os jogos são exercícios que têm como objetivo fazer com que os

participantes oprimidos aprimorem a capacidade de se perceber no mundo e de se

conhecer. De acordo com Boal (2009) a palavra evoca ideias, emoção e desejos. As

Imagens são trabalhadas nos jogos como uma forma de reinventar o mundo onde

estamos inseridos. Para Boal (2009), ao escolherem objetos existentes para inventar

uma imagem, os participantes são estimulados a ver o que olham, e não somente a

sobrevoar realidades sem senti-las. Durantes os jogos os participantes se desvinculam

das imagens que já tem empiricamente e exploram o abstrato sem a utilização de

símbolos, criam sua imagem através de desenhos, suas músicas com os instrumentos

que a escola disponibiliza, surgem vários sons, muitos tentando imitar músicas

existentes e outras das suas recordações. Para Boal:

A música é uma forma pela qual o ser humano organiza sua relação sonora com o lugar em que vive e com o universo, seus ritmos, melodias e sons harmônicos, ruídos, rumores, estrépitos, alaridos e barulhos; é como se relaciona consigo mesmo, com seus ritmos cardíacos, respiratórios, cardíacos (o sono e da fome, p.ex.) e a melodia do sangue nas veias (BOAL, 2009, p.203).

O Som e a dança também fazem parte do processo de reinvenção, e todos os

participantes buscam criar e experimentar novos ritmos musicais.

Paulo Freire e Augusto Boal se aproximam quando os dois autores fundem seus

pensamentos no diálogo para a transformação e a libertação das opressões e dos medos

que norteiam a troca educador-educando e espectador- ator. Segundo Freire (2012), não

é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.

Portanto, é necessário que o grupo pratique com os alunos e experimentem as

possibilidades de transformação através dos jogos. E Boal (2009) se aproxima muito de

Freire quando diz que é o fazer que nos faz, na prática se observa e se percebe como e

quais são os jogos que propiciam a mudança e a partir das experimentações os alunos

descobrem que estão fazendo.

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CAPÍTULO III

O DESEJO DE UMA EDUCAÇÃO PARA TRANSFORMAR

A motivação para esta pesquisa está estreitamente ligada à minha formação,

experiência profissional, familiar e acadêmica no campo da Educação de Jovens e

Adultos e Educação Inclusiva, visto que sempre estive muito envolvida em trabalhos

com os alunos adultos e alunos especiais. O trabalho iniciou nos anos de 2012 e 2015,

com o nome Educação Popular no Luar (EPL), coordenado pelo professor Paolo

Vittoria e formados por sete alunos da graduação da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, alunos de cursos diversificados, dentre eles, Educação Física, Artes Cênica,

Artes Plásticas e Pedagogia. O trabalho tem como foco principal a Educação Popular e

a metodologia fundamentada em Paulo Freire e Augusto Boal.

O Campo de pesquisa inicial do grupo foi na comunidade Jardim Primavera-

Caxias, no qual o grupo EPL iniciou u trabalho social com um grupo de bailarina da

comunidade. Em 2012, mudou-se para a Penha onde iríamos desenvolver o projeto

EPL, junto à coordenação de um projeto de dança já era existente.

Em 2012, EPL começou com encontros para leituras coletivas, que tinha em sua

metodologia a formação de educadores na Experiência Dialógica, a Filosofia da Práxis,

Cultura Popular e Educação Popular. De acordo com as trocas e diálogos que eram

proporcionados, surgiram ideias de fazermos oficinas dentro do grupo, baseando-se nos

trechos ou fragmentos textuais que mais se aproximavam das escolhas e objetivos de

cada componente do grupo. Diante das experimentações, surgiu a possibilidade do

grupo participar do Curso de Formação em Teatro do Oprimido: Dramaturgia em Teatro

Fórum. O curso enriqueceu de forma extraordinária os círculos de cultura que fazíamos

semanalmente, quando começamos a articular as oficinas de Teatro do Oprimido com as

literaturas propostas.

O objetivo do diálogo era discutir a educação e a política pela arte como via de

conscientização e seu papel multiplicador através das diversas formas de expressão que

se unem construindo concepções e ações políticas. E mais, especificamente, dialogar

com todos os sujeitos que estão inseridos no projeto, exercitar a práxis e superar a

dicotomia pesquisa e experiência.

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Em novembro de ano de 2014, surgiu a proposta de iniciar um trabalho na

Escola CER, com a medição de dois alunos com TEA (Transtorno do espectro autista).

A escola já estava trabalhando com o projeto Filosofia, com as turmas orientadas pela

Professora. Iniciamos nossas atividades com oficinas de teatro do oprimido na quadra

esportiva e tivemos muitos sucessos, visto que muitos alunos se propuseram a participar

das oficinas.

Em fevereiro de 2015, iniciamos o ano e pensamos na possibilidade de darmos

continuidade ao trabalho que já havíamos começado, mas tendo em vista que o foco

principal do trabalho era inclusão do aluno autista e encontramos muitos alunos novos e

muitos que haviam participado das oficinas anteriores e já sabiam qual era o trabalho. A

proposta foi realizar oficinas com os alunos semanalmente e abrir para turma uma vez

por mês, círculo e debate com os professores e alunos, debates/oficinas abertas

periodicamente, apresentação de uma cena de Teatro Fórum - Cenas e Teatro

Fórum/Estética em Dezembro, sabendo que é uma proposta muito ousada e diferente

com o aluno autista. O que possibilitou observar e ficar livre para fazer avaliações

individuais, em relação aos trabalhos desenvolvidos, levando em consideração o

desenvolvimento humano.

3.1- O perfil do aluno acompanhado

Toma-se como base para elaboração desse perfil, informações de professores,

multiplicadora, familiares, amigos e médicos que acompanharam essa criança. São

relatos da convivência dentro e fora da escola.

A criança é um pré-adolescente de 13 anos de idade, Chama-se Dani. Ele é do

sétimo ano (antiga sexta série). Dani é um menino muito calmo, sempre muito

obediente, carinhoso e sorridente. Apresenta dificuldade de socialização, o que levamos

em consideração pelo seu quadro de autista moderado.

O aluno apresenta uma ótima interação sócio emocional, hora está sentado, hora

em pé, quieto em muitos momentos. Relaciona-se muito bem com os colegas da turma,

claramente dentro das suas limitações, muito querido e respeitado por todos.

Atualmente ficando em destaque pelos olhares femininos da sala que as acham um

“fofo” e o cobrem de carinhos, beijos no rosto e abraços sempre que surge uma

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oportunidade, existindo uma reciprocidade nessa relação. O que chama atenção é o

comportamento e as reações mediante a uma aluna em especial, pois se mostra bastante

nervoso, foge daquela situação, evita qualquer tipo de contato com essa aluna, mas

nunca agressivo.

Desenvolvimento entre ele a multiplicadora é todo baseado na afetividade,

cumplicidade, carinho, com limites e momentos bem estabelecidos. A entonação vocal e

expressão facial fazem a diferença para que o aluno perceba os momentos e para suas

ações.

Quando se fala dos aspectos psicomotores observa-se desenho pobre em

detalhes, sem discernir gêneros dos personagens que desenha, mas gosta de desenhar

objetos e desenhos abstratos. Coordenação motora fina e grossa muito bem trabalhada e

evoluída, pintura, recorte e colagem totalmente dentro do esperado para sua idade e

especificidade. Coordenação motora global muito bem trabalhada, tem muita noção do

espaço corporal e imagem corporal. A escrita tem traços firmes e desenhados. Noção

de espaço entre os limites, entre linhas, alto e baixo no que se refere ao material e

caderno.

3.2-Oficinas- Derrubando os Muros da escola

A escola onde foram iniciadas as oficinas fica localizada em um bairro do

município da Taquara. A escola atende no turno da manhã e tarde os alunos do

Ensino Fundamental.

As aulas têm início às 7h e término às 12h30. O trabalho é realizado com

uma turma de Ensino Fundamental. Os alunos são muito diferentes, sendo uma das

características do ano letivo. As oficinas de T.O tiveram início no final do ano de

2014, as atividades foram retomadas, mais precisamente, em Fevereiro de 2015.

As oficinas têm início no ultimo tempo da aula de arte, toda às quartas-feiras.

Com o desenvolvimento das atividades semanais com o Dani e somente duas vezes

por mês com a turma.

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3.2.1-Primeira Parte- O Medo do Novo

Nesta primeira parte, relato o primeiro contato com a turma mediante ao

primeiro contato com a multiplicadora e o Dani, à construção de confiança e à

oportunidade de diálogo, propiciados pelo grupo junto com a Professora da turma que

participa de todas as oficinas.

Ao iniciarmos o nosso trabalho com qualquer grupo social, temos que nos identificar e pedir que se identifiquem. Não podemos ignorar quem são os nossos parceiros, até mesmo para a escolha dos jogos e técnicas que devemos usar. Mas não podemos rotulá-los- este é o operário, aquele, classe média; este é o professor, aquele um usuário. Esse proceder criaria limitações na nossa própria capacidade de compreendê-los (BOAL, 2011, p.237).

No primeiro contato com os alunos foi observado que sentiam-se retraídos,

muito quietos e tinham um olhar muito desconfiado. O início de diálogo foi bastante

tranquilo, pois como ninguém falava nada a multiplicadora aproveitou para explicar

como funcionavam as oficinas e qual seria o objetivo da mediação e como a

multiplicação aconteceriam com a turma e suas experiências vividas no final do ano de

2014, ano que o grupo iniciou as atividades e estavam presentes alguns dos alunos que

estão nas oficinas desse ano.

Ainda neste primeiro encontro foi disponibilizado um tempo para que os alunos

se expressassem e falassem quais eram as dúvidas sobre a proposta do grupo, mas como

os alunos têm muitas dificuldades de comunicação verbal e muito medo do errar,

preferiram não comentar nada. De acordo com Vittoria (2011), sentiriam medo, um

profundo medo do desconhecido, medo da realidade, medo da liberdade.

O que mais chamou a atenção da multiplicadora foi a forma como a turma se

comportou, visto que foram muito tranquilos e harmoniosos e em todo tempo em que

houve encontro com eles, o silêncio sempre pairou dentro da sala e o Dani permanecia

em silêncio acompanhando o grupo. No momento aberto para diálogo, os alunos sempre

permaneciam muito calados, um olhando para o outro até que o silêncio começou a

incomodá-los e alguém chamou pelo nome do outro colega para que esse se colocasse.

Há dois alunos que mais se comunicam na sala ou em conversas paralelas e bem baixa

uns com os outros e os dois alunos que mais se aproximam do Dani. Segundo Vittoria

(2011), alguns falavam entre si, trocavam palavras, sussurravam palavras. Outros

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seguiam o caminho em silêncio. As vozes baixas e altas se confundiam no espaço

aberto. Palavras... silêncio... palavras.

Nos primeiros encontros realizamos alguns jogos e oficinas, sempre após os

jogos eram momentos de propormos o diálogo e a reflexão sobre o que foi trabalhado

com o corpo e as propostas do grupo. No decorrer dos jogos, percebeu-se que todos

faziam o que o que a multiplicadora pedia para fazer, sem objeções, são muito

comandados, do tipo eu mando e todos fazem, inclusive o Dani que demonstra

capacidade intelectual, porém necessita de estímulos diretivos que indiquem o que deve

fazer e como agir. Não consegue tomar decisões sem consentimento ou sem que se diga

se está certo ou errado. A princípio achavam interessante os jogos por parecerem com as

aulas de Educação Física. Logo, achavam legal o momento para esticar o corpo.

Nesta primeira parte, o desenvolvimento dos jogos era positivo no sentido de

realização, pois sempre conseguíamos realizar todos os jogos, nunca contestavam,

faziam, apesar de muito calados, e sobrava tempo até para propor outras atividades. A

preocupação da multiplicadora era saber se estava conseguindo propor um momento de

diálogo através dos jogos ou somente o fazer pelo fazer e perceberem a importância da

inclusão do Dani nas atividades e parceria dele com o grupo, superando as frustração e

reações. Segundo Vitória (2011) é nessa realidade fictícia que se inserem os

instrumentos de manipulação de poder programados pelos donos das palavras, das

imagens, dos sons, Naquele momento, para eles a multiplicadora era o dona do

conhecimento e a forma como a mesma comandava os jogos e as mediações nos

diálogos seriam a ponte na construção do pensamento dos alunos com o objetivo dos

jogos.

Para Freire (2011), uma educação sem esperança não é educação. Quem não tem

esperança na educação dos camponeses deverá procurar trabalho noutro lugar. A escola

tem uma participação muito marcante na realização do trabalho da multiplicadora, se

colocando muito solícita e esperançosa para que os alunos tenham e aproveitem a

oportunidade, sem ter medo da transformação que a multiplicadora tem como proposta

principal, disponibilizando materiais para que o trabalho fosse realizado da melhor

maneira, conforme Vittoria:

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Dessa forma, o medo de ler, o medo de escrever, o medo de aprender, o medo de abandonar suas crenças para encontrar outras é medo da mudança. As mudanças do conhecimento mudam, transformam. É medo da transformação. É medo de sair da caverna, mas também de voltar à caverna (VITTORIA, 2011, p.126).

Considero também importante a opinião da professora no processo inicial de

contato com os alunos. Segundo ela, os alunos ficaram tímidos porque ainda não

conheciam bem o trabalho da multiplicadora que até então, fazia-se presente na sala

como mediadora e já se tornava diferente, pois ainda não tinham presenciado o trabalho

da mediação. A professora contou que alguns ainda estão muito tímidos e por isso

desenvolvem as atividades de forma comandada e sem expressar opinião em quase

nada, por esses motivos. Na sala, havia muitos alunos novos que ainda não se

conheciam muito bem e pouco se falavam, por isso desenvolveram os jogos com muitas

dificuldades de tocar, abraçar e olhar o outro. A professora tentava o tempo todo

estimulá-los ou até mesmo nomear alguém para que eles se colocassem.

3.2.2- Segunda Parte- Experimentar para acreditar

Nesta segunda parte, foi apresentada e trabalhada com os alunos uma

sistematização de jogos e exercícios de Teatro do Oprimido. A partir desse momento,

começaram a aparecer as mudanças nos alunos. Segundo Vitória (2011) é uma prática

inquieta e criativa porque a crítica sem experiência pode se tornar simplesmente uma

atitude, um modo de ser, um pensamento abstrato, perdendo seu potencial para

mudança. Partindo desse pensamento passamos para um momento mais prático e com

intuito de propiciar mais conscientização como ato de transformação da realidade de

suas estruturas sociais, pois de acordo com Boal:

Nisto este trabalho não diferencia qualquer outra categoria de oprimido, já que a todos respeitamos como pessoas e como artistas. A escolha de jogos e técnicas será feita a partir das necessidades ditadas pela prática e não por colocarmos de cada um a palavra “usuário” (BOAL, 2011, p. 237).

O início de compreensão se sucedeu após o Filme Teatro do Oprimido nas

escolas, os alunos pareciam ter tido uma certa compreensão do que é Teatro Fórum, e

diante dessa compreensão percebiam coo poderiam incluir do Dani dos jogos teatrais e

até mesmo mostrar a de forma lúdica e concreta a participação dele nos momentos.

Além de perceber que os alunos estavam participando cada vez mais das oficinas, dos

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diálogos e compreendendo melhor, estavam mais conscientes do que é Teatro Fórum.

Os alunos estavam fazendo Teatro do Oprimido, logo, nos levavam a pensar que

estavam aprendendo a fazer.

No decorrer das oficinas, a multiplicadora teve a sensibilidade de perceber que

os alunos preferiam jogos que trabalhassem mais as imagens e eram os jogos que o Dani

mais gostava de participar, até mesmo pela dificuldade de se comunicar ele prefere os

gestos e mímicas. Partindo desta percepção, os jogos de imagens começaram a ser mais

frequentes nas oficinas e houve escolha criteriosa de todos os exercícios de imagem ou

até mesmo das adaptações. Segundo Boal (2011) os jogos, exercícios e técnicas,

normalmente se adaptam. Os alunos se comunicam mais e expressam muito através das

imagens, nem sempre fazem o uso da comunicação oral e sim de gestos e imagens, o

que deixava o Dani bem mais à vontade nas oficinas. Nas escolhas dos jogos muitas

vezes aconteciam de terem alunos que tinham algumas resistências ou limitações,

quando isso acontece ou eles não participam mesmo ou ficam sentados e participam

somente dos diálogos.

Observamos que os jogos teatrais estavam proporcionando uma mudança

significativa no comportamento dos alunos da turma que estávamos trabalhando, pois

quem antes não falava agora estava se colocando na sala e participava dos diálogos com

a turma. E Dani já conseguia se comunicar através do uso da palavra, agora se

expressava melhor, além de fazer uso do corpo como um movimento de expressão.

Temos o exemplo de uma aluna que não falava na sala por ter uma voz infantilizada e

atualmente através do convívio e trocas dos diálogos conseguiu superar alguns medos e

está se comunicando através da palavra e se expressando através da imagem.

Os jogos e atividades aconteciam de forma muito tranquila e dava tempo para

fazermos mais um jogo ou abrirmos mais tempo para o diálogo que se estendia pelo

horário do intervalo. Era sempre intensa a troca de experiência e foram esses momentos

que os alunos iniciaram que fortaleciam as amizades e os laços afetivos dentro da sala e

com a multiplicadora e professora. Os alunos estavam muito unidos e buscando com a

multiplicadora incluir de forma efetiva o Dani nas vida cotidiana deles, levando em

consideração que o Dani não participava da rotina de sala e nem no recreio, ficava

sempre sozinho e resumia no conformismo do seu estereótipo de autista, eles queriam

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mudar a realidade e iniciar a consciência critica e não discriminatória, pois conforme

Freire:

Não há educação sem amor. O amor luta contra o egoísmo. Quem não é capaz de amar os seres inacabados não pode educar. Não há educação imposta, como não há amor imposto. Quem não ama não compreende o próximo, não o respeita. Não há educação do medo. Nada se pode temer da educação quando se ama (FREIRE, 2001, p.36)

As mudanças ocorridas com os alunos também foram enfatizadas pela

professora da turma nesta parte de observação, visto que a mesma relata com satisfação

que os estudantes estavam mais participativos nas aulas, mais à vontade uns com os

outros para brincarem, compartilharem sentimentos, o corpo estava se expressando de

forma mais constante, assim como permitindo abraços e sorrisos, o que antes não

acontecia. Isto confirma que a mudança cognitiva e social através dos jogos teatrais é

uma alternativa para alcançar e vencer desafios que os alunos enfrentam no cotidiano. O

Teatro do Oprimido é linguagem para ser usada sempre, não excepcionalmente: é

linguagem diz Boal (2011). O teatro com suas múltiplas interpretações e formas para

conseguir o diálogo com os oprimidos.

A relação de amor e de esperança conquistada pela multiplicadora foi tão grande

que os alunos tornaram a reproduzir e comentar os jogos e exercícios com os

funcionários, com os alunos que participam do trabalho na escola e com aqueles que

participaram no final do ano de 2014. A professora relatou que os alunos ficavam muito

ansiosos para o próximo encontro das quartas-feiras. Este resultado do laço afetivo foi

conquistado pelo trabalho ao longo de muitos meses juntos e dialogando, de acordo com

Vitória:

O sentimento de amor atrai o gesto de solidariedade e compromisso do profissional da educação com a sociedade. Solidariedade não significa conceder ajuda mantendo a situação inalterada, mas exige interagir com quem está em dificuldade para transformar a sociedade nas suas contradições políticas: ouvir, falar, pensar, criticar politicamente (VITTORIA, 2011, p.130)

A comunidade escolar esteve disposta a ouvir a multiplicadora e os alunos de

acordo com as nossas necessidades, se mostrando atenta às mudanças acontecidas na

escola desde a entrada da mediação com aluno Dani e com os jogos teatrais que tem por

objetivo adapta-lo se que seja algo forçado e sem conscientização da comunidade

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escolar. Sempre que pôde a diretora participou das atividades com muita alegria e

confiança no trabalho que estava sendo proposto realizou.

3.2.3- Terceira Parte- Luz de Ideias

Esta terceira parte é repleta de sentimentos, ideias e envolvimentos com o

trabalho da multiplicadora. Os alunos com o passar do tempo acreditaram e confiaram

muito na multiplicadora, esse movimento de confiança e amizade, foi muito importante

no sentido de que o trabalho se fortalecia e trabalhava com muita esperança e amor,

tentativa de propiciar a mudança.

As atividades fluíram muito bem com essa turma que atualmente, está mais solta

e disposta a participar dos jogos. Daniel estava sempre querendo participar, mas sem

querer a comunicação verbal, mas através da mímica e gestos. No momento de diálogo,

colocam-se nas falas sem medo de errar ou de julgamentos, trocando ideias e

experiências de vida, de onde foi extraída a primeira cena de Teatro Fórum. O aluno

Cláudio que tem o diagnóstico de TDAH (transtorno déficit de atenção e

hiperatividade), estava totalmente à vontade e se comunicando , abraçando , manda

beijos e faz questão de brincar com a turma e multiplicadora é importante enfatizar que

Claudio não interagia com a turma, devido o seu comportamento tido como

“inadequado”. Como havia grande afinidade de todos da turma com a multiplicadora e

vice-versa, estávamos todos envolvidos na elaboração das cenas e nos jogos. É

importante relatar que alguns alunos que antes não queriam participar por algum

motivo, já que as oficinas de jogos e atividades não eram obrigatórias, começaram a se

aproximar da turma e participar das atividades.

Nesta parte podemos verificar o processo de construção das cenas de Teatro

Fórum, a escolha de jogos e atividades foram criteriosas e intencionais para a

estimulação da criatividade e que partissem deles as ideias teatrais e que o Dani pudesse

participar ou que ele tivesse sido o personagem principal. Um dos momentos marcantes

foi o dia em que a multiplicadora sugeriu que os alunos desenhassem o que seria

opressão para cada um, isso porque já havíamos dialogado sobre o tema com os alunos

antes. Surgiram diversos desenhos e o mais frequente eram desenhos que mostravam

opressões dentro da sala de aula, Dani desenhou sua casa vista de dentro da sala.

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Abrimos para o diálogo e começamos a trabalhar as cenas a partir desses movimentos.

Os jogos com imagens paradas e várias interpretações:

Este é o processo que devemos e temos usado: metaforizar em forma teatral a visão que o oprimido tem do mundo, fazê-lo vivenciar seu personagem e descobrir variantes para o seu comportamento, no fórum. Devemos ajudar o usuário a descobrir, teatralmente, que algumas de suas opressões não são produtos de alienação, mas existe na realidade da família, do trabalho e da sociedade (BOAL, 2011, p. 239)

Tentávamos fazer com que os alunos experimentassem os jogos e as atividades

de forma gradativa e prazerosa, para que o novo não o assustasse. Partindo desse

pensamento, fomos fazendo as oficinas e perguntávamos o que eles achavam e o que

gostariam de trabalhar, para usar suas ideias e torná-las mais próximas dos alunos. Até

chegarmos à construção das cenas de Teatro Fórum. Iniciávamos o trabalho para

escolher as histórias que fossem reais e que tivessem o oprimido e o opressor presentes.

Foi legal perceber que todos tinham histórias e que as histórias eram bem parecidas, um

dos motivos mais marcantes foram a evasão escolar para trabalhar e ajudar a família.

Segundo Boal (2011), tivemos que submeter as histórias contadas a um processo

investigativo antes de aceitá-las tal como são contadas, usando técnicas de Teatro

Fórum Imagem e Técnicas de ensaio. Fizemos um jogo em que pedíamos para formar

duplas e para que contassem uma história de opressão um para o outro e elegessem

uma, depois em quartetos e que trocassem suas histórias e elegessem uma, até que

tivesse um grupo de alunos grande e elegêssemos uma história para aquela turma e a

partir desse momento a história deixou de ser de um e passa ser de todos. O grupo

limitou a escolha do tema e não interferiu em momento algum. As histórias e ideias

surgiram da própria turma em que todos estavam envolvidos e participando do processo

de construção de Teatro Fórum. A história eleita foi uma situação que aconteceu com o

Dani na hora do recreio.

A escola ficou surpresa e confiante com a interação dos alunos e da

multiplicadora, já que era essa intenção, de fazer com que os alunos tivessem o

momento de inclusão dos alunos especiais, comportamento e comunicação.

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O apoio da comunidade escolar foi fundamental para que esse trabalho

permanecesse presente na escola e elencando tantos elementos de estudo que possam

promover e ajudar o Dani no processo escolar.

Outro fator importante que não se pode deixar de citar é a visão da professora

que sempre nos acompanhou e esteve presente com alguns alunos na sala de aula. A

professora relatou que os alunos tiveram um avanço considerável nas trocas de

experiências, com relação aos conteúdos e a relação professor- alunos, aluno-aluno, eles

se respeitavam mais, se abraçavam, receberam e fizeram elogios e participaram de

forma geral sem medo de se arriscarem.

E agora que estamos com as cenas escolhidas e em processo, a professora

comenta que eles no intervalo das refeições estão sempre reunidos escolhendo o

figurino, comentando suas falas, o que ela avaliou como algo genial, pois pessoas que

não falavam agora estavam ensaiando cenas com fala, segundo Boal:

Cada grupo de TO deve colaborar em alguma ação coletiva na comunidade onde se apresenta. Após um evento artístico, não devemos abandonar o local como uma companhia itinerante que deixa saudades, em transito para outra cidade: temos que manter contatos, formando redes de apoio. Não podemos e nem devemos tomar o lugar do oprimido; ajudá-los, sim, sempre (BOAL, 2011, p. 213).

É muito emocionante e profundamente gratificante acreditar nas pessoas, mesmo

que no início o medo ou as dificuldades apareçam, mas assim permanecer e crer para

ver. A multipicadora e os alunos desconfiaram, enfrentaram muitas dificuldades, mas

permaneceram juntos e acreditando na transformação, na educação como forma de

mudança social e na inclusão dos alunos especiais.

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CONCLUSÃO

No início do trabalho buscava-se entender como os jogos Teatrais, como formas

de comunicação e expressão, poderiam propiciar mudanças na vida das pessoas

envolvidas na oficina e, se de fato, o envolvimento iria trazer alguma transformação

efetivamente no que tange ao comportamento, ao desenvolvimento e à comunição com

o outro e principalmente incluir o aluno especial no ambiente escolar, mas durante o

processo foi observado que todos os alunos eram especiais e cada um com uma

especificidade e muitos sem laudos.

Observando, participando das oficinas e considerando a análise das anotações de

caderno de campo, pode-se afirmar que os jogos têm muito a contribuir com o processo

de aproximação dos alunos da escola regular e os alunos especiais, não somente em

relação ao ensino-aprendizagem, mas também no respeito ao próximo, na afetividade,

nas superação de medos e nas frustrações cotidianas de ambos. Essas experiências

faziam com que pensassem e refletissem a melhor forma de conviver e viver.

Ao observar os alunos e a multiplicadora nas oficinas, os envolvidos nas oficinas

puderam ver suas ações e atitudes e puderam concluir que nem sempre suas atitudes e

opiniões são as mais corretas para sobreviver em uma sociedade tão excludente.

É muito interessante ver como os alunos do ensino fundamental, que no

momento mais forte da educação formal, muitas das vezes não conseguiam acompanhar

o raciocínio lógico que a aula exige , tinham que formular uma resposta para aqueles

exercícios e problemas vividos na vida, diante das dificuldades do Aluno especial e

quando o problema se transforma em cenas todos conseguem levantar sugestões para

transformar a realidade e construir sua autonomia na resolução de situações.

O medo de enfrentar situações e do novo foi um dos pontos mais latentes que o

grupo levou em consideração na elaboração das oficinas e somente com o tempo e se

acostumando com a nova situação dentro de sala de aula, os alunos perderam o medo de

falar, brincar, rir e se expressar através dos jogos corporais. A afetividade, o amor e a

esperança são capazes de transcender a diversidade e o desrespeito com o outro.

Desse modo, penso que nossas instituições escolares precisam se adaptar para

poder atender as especificidades desses alunos especiais, pois muito se fala em uma

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Educação para todos e pouco se faz para que essa Educação seja realmente para todos.

Uma das possibilidades é pensar formas alternativas que levem e propiciem esses meios

de comunicação e expressão através do corpo e jogos teatrais.

A meta principal do TO é, através dos meios estéticos, descobrir e conhecer a sociedade em que vivemos e, sobretudo, transformá-la. Sempre. Em todas as intervenções que fazemos, esse é o nosso desejo. Por essa razão, dizemos que um espetáculo ou evento do TO não termina quando acaba: sempre procura deixar raízes (BOAL, 2011, p.215).

Considero de muita valia como profissional da Educação a experiência vivida

com os alunos especiais. O trabalho de multiplicadora não termina por aqui, tendo como

objetivo principal levar essas mudanças para outras comunidades e instituições

escolares e não escolares.

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BIBLIOGRAFIA CITADA

BOAL, Augusto. A estética do oprimido. Rio de janeiro: Garamond, 2009.

____. Jogos para atores e não-atores, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

____. O Método – Metaxis: informativo do Centro do Teatro do Oprimido, CTO-Rio, n.

4, p. 72-75, Nov 2008 – ilustração de Helen Sarapeck.

BRASIL. Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica. MEC

SEESP, 2001.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de janeiro: Nova Fronteira, 2012.

__________ , Educação Como Prática da Liberdade. 31ª Ed. São Paulo: Paz e Terra,

2008.

___________, Educação e Mudança; Moacir Gadotti; tradução Lilian Lopes Martin.2º

Ed. Ver. E atual. São Paulo: paz e Terra, 2011.

TEIXEIRA, Gustavo. Manual do Transtornos escolares: entendendo os problemas da

criança e adolescentes na escola/ Gustavo Teixeira. 5 ª Ed. Rio de janeiro, 2014.

VITTORIA, Paolo. Narrando Paulo Freire: por uma pedagogia do diálogo./ Paolo

VITTORIA; tradução Marcia Wolf. - Rio de janeiro: Editora UFRJ, 2011.

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WEBGRAFIA

http://www.psiqweb.med.br/dsm/sexual5.html#identidade. Acesso em 27 de julho de

2015.

http://www.psiqweb.med.br/dsm/sexual5.html#identidade. Acesso em 01 de agosto de

2015.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm Acesso em 03 de agosto de 2015.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTOS 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

O TEATRO DO OPRIMIDO E AS ALTERNATIVAS DE ATUAÇÃO

1.1- Teatro do Jornal 13

1.2- Arco-íris do Desejo 13

1.3- Teatro Invisível 14

1.4- Teatro Imagem 14

1.5- Teatro Legislativo 14

1.6- Teatro Fórum 15

1.7- Alternativa para Libertação 16

CAPÍTULO II

EDUCAÇÃO INCLUSIVA E OS TRANSTORNOS DO ESPECTRO

DO AUTISMO: BREVE HISTÓRICO

2.1- Educação e o Teatro do Oprimido 21

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CAPÍTULO III

O DESEJO DE UMA EDUCAÇÃO PARA TRANSFORMAR

3.1- O perfil do aluno acompanhado 24

3.2- Oficinas – Derrubando os muros da escola 25

3.2.1- Primeira Parte 26

3.2.2- Segunda Parte 28

3.2.3- Terceira Parte 31

CONCLUSÃO 34

BIBLIOGRAFIA 36

WEBGRAFIA 37