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ESTUDOS LITERÁRIOS 1 Secretaria de Cultura do Amazonas Biblioteca Virtual do Amazonas Autor da obra: Milton Hatoum Autor do Estudo: João Batista Gomes Dois irmãos NOTA BIOGRÁFICA Amazonense de Manaus Milton Hatoum nasceu em Manaus, em 1952. É professor de literatura na Universidade Federal do Amazonas. Primeira obra Milton estreou na literatura em 1989, com o romance Relato de um certo Oriente. O livro recebeu, da Academia Brasileira de Letras, o prêmio Jabuti de melhor romance e foi publicado nos Estados Unidos e em vários países da Europa. "Lecionei, escrevi e publiquei artigos e contos, dei várias conferências no Brasil e no exterior. Meu primeiro romance levou-me para muitos lugares. Foi o meu tapete mágico." Jabuti de 2000 Com o romance Dois irmãos, Milton ganhou o prêmio Jabuti de 2000, prova de que sua literatura tem o aval do público e da crítica. Influências do passado Vários escritores estimularam a literatura de Milton Hatoum. Entre eles, Jorge Luis Borges, William Faulkner, Flaubert, Conrad, Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, os relatos das Mil e uma Noites. "Leio os bons livros, os textos que podem enriquecer meu trabalho. Já não perco mais tempo com leituras amenas." Professor da Universidade do Amazonas Desde 1984, Milton Hatoum é professor de literatura da Universidade Federal do Amazonas. Há dois anos e meio (desde 1008), mora em S. Paulo, onde escreve uma tese de doutorado na USP. Além das aulas de literatura, ocupa o tempo escrevendo e publicando artigos, resenhas, ensaios.

Dois Irmaos

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  • ESTUDOS LITERRIOS

    1

    Secretaria de Cultura do Amazonas Biblioteca Virtual do Amazonas

    Autor da obra: Milton Hatoum Autor do Estudo: Joo Batista Gomes

    Dois irmos

    NOTA BIOGRFICA

    Amazonense de Manaus

    Milton Hatoum nasceu em Manaus, em 1952. professor de literatura na

    Universidade Federal do Amazonas.

    Primeira obra

    Milton estreou na literatura em 1989, com o romance Relato de um certo Oriente. O livro recebeu, da Academia Brasileira de Letras, o prmio Jabuti de melhor romance e foi publicado nos Estados Unidos e em vrios pases da Europa.

    "Lecionei, escrevi e publiquei artigos e contos, dei vrias conferncias no Brasil e no exterior. Meu primeiro romance levou-me para muitos lugares. Foi o meu tapete mgico."

    Jabuti de 2000

    Com o romance Dois irmos, Milton ganhou o prmio Jabuti de 2000, prova de que

    sua literatura tem o aval do pblico e da crtica.

    Influncias do passado

    Vrios escritores estimularam a literatura de Milton Hatoum. Entre eles, Jorge Luis Borges, William Faulkner, Flaubert, Conrad, Guimares Rosa, Graciliano Ramos, os relatos das Mil e uma Noites. "Leio os bons livros, os textos que podem enriquecer meu trabalho. J no perco mais tempo com leituras amenas."

    Professor da

    Universidade do Amazonas

    Desde 1984, Milton Hatoum professor de literatura da Universidade Federal do Amazonas. H dois anos e meio (desde 1008), mora em S. Paulo, onde escreve uma tese de doutorado na USP. Alm das aulas de literatura, ocupa o tempo escrevendo e publicando artigos, resenhas, ensaios.

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    2

    Relato de um certo Oriente: oito anos de maturao

    "Demorei muito para publicar meu primeiro romance. Entre escrever e publicar

    foram sete ou oito anos! Tive sorte, porque o texto da orelha do livro assinado por Davi Arrigucci Jr, um dos maiores crticos literrios do Pas. A editora ajudou muito, e os leitores e a crtica gostaram. Depois vieram o prmio Jabuti (melhor romance) e as tradues. Mas nada disso veio assim, de graa. Ainda me lembro das inmeras verses e correes que eu fazia, a em Manaus, onde morava no conjunto Castelo Branco, no Parque 10. Aquela trabalheira toda parecia no ter fim."

    Dois irmos:

    trabalho rduo com a linguagem

    "Quando escrevi o Dois irmos, foi a mesma coisa (muitos anos de trabalho). Para escrever um romance, preciso ter muita pacincia, e entregar-se a um trabalho rduo com a linguagem. Isso serve para qualquer arte, mas a literatura lida com a palavra, e, no caso do romance, com as tcnicas e estratgias narrativas.

    Dados Tcnicos de

    Dois irmos

    GNERO? ROMANCE DE COSTUMES Dois irmos um romance de costumes. Por

    causa do ambiente em que a histria se transcorre, pode tambm ser classificado de romance citadino ou urbano.

    TTULO GMEOS IDNTICOS O ttulo da obra faz referncia s duas personagens

    principais, Yaqub e Omar, irmos gmeos, idnticos no fsico, mas opostos nas atitudes e no carter. Movidos pela rivalidade, vo destruindo as relaes pessoais e familiares, semeando discrdia, inveja, vingana e dio.

    DIVISO DA OBRA DOZE CAPTULOS Dois irmos romance dividido em 12 captulos (sem

    ttulos), com um pequeno prembulo que, aguando a curiosidade do leitor, relata cenas do final da histria.

    ESCOLA LITERRIA LITERATURA CONTEMPORNEA Dois irmos foi publicado em 2000;

    pertence, pois, ao Modernismo brasileiro. obra da literatura contempornea, do Ps-Modernismo como querem alguns, seguindo a linha da literatura que valoriza a linguagem simples, mas com elevado grau de arte e de correo gramatical.

    CENRIO MANAUS O cenrio principal do livro a cidade de Manaus, valorizando o porto

    dos Remdios, o centro, os bairros e as praas mais antigos, com especial destaque para as atividades do comrcio.

    ESTUDOS LITERRIOS

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    Relato de um certo Oriente: oito anos de maturao

    "Demorei muito para publicar meu primeiro romance. Entre escrever e publicar

    foram sete ou oito anos! Tive sorte, porque o texto da orelha do livro assinado por Davi Arrigucci Jr, um dos maiores crticos literrios do Pas. A editora ajudou muito, e os leitores e a crtica gostaram. Depois vieram o prmio Jabuti (melhor romance) e as tradues. Mas nada disso veio assim, de graa. Ainda me lembro das inmeras verses e correes que eu fazia, a em Manaus, onde morava no conjunto Castelo Branco, no Parque 10. Aquela trabalheira toda parecia no ter fim."

    Dois irmos:

    trabalho rduo com a linguagem

    "Quando escrevi o Dois irmos, foi a mesma coisa (muitos anos de trabalho). Para escrever um romance, preciso ter muita pacincia, e entregar-se a um trabalho rduo com a linguagem. Isso serve para qualquer arte, mas a literatura lida com a palavra, e, no caso do romance, com as tcnicas e estratgias narrativas.

    Dados Tcnicos de

    Dois irmos

    GNERO? ROMANCE DE COSTUMES Dois irmos um romance de costumes. Por

    causa do ambiente em que a histria se transcorre, pode tambm ser classificado de romance citadino ou urbano.

    TTULO GMEOS IDNTICOS O ttulo da obra faz referncia s duas personagens

    principais, Yaqub e Omar, irmos gmeos, idnticos no fsico, mas opostos nas atitudes e no carter. Movidos pela rivalidade, vo destruindo as relaes pessoais e familiares, semeando discrdia, inveja, vingana e dio.

    DIVISO DA OBRA DOZE CAPTULOS Dois irmos romance dividido em 12 captulos (sem

    ttulos), com um pequeno prembulo que, aguando a curiosidade do leitor, relata cenas do final da histria.

    ESCOLA LITERRIA LITERATURA CONTEMPORNEA Dois irmos foi publicado em 2000;

    pertence, pois, ao Modernismo brasileiro. obra da literatura contempornea, do Ps-Modernismo como querem alguns, seguindo a linha da literatura que valoriza a linguagem simples, mas com elevado grau de arte e de correo gramatical.

    CENRIO MANAUS O cenrio principal do livro a cidade de Manaus, valorizando o porto

    dos Remdios, o centro, os bairros e as praas mais antigos, com especial destaque para as atividades do comrcio.

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    O autor faz referncia ao sul do Lbano, de onde provieram os chefes de famlia e para onde foi Yaqub contra sua vontade. A cidade de So Paulo tambm cenrio de referncia: l, Yakub formou-se em Engenharia, constituiu famlia e fixou residncia.

    TEMTICA CASA DEMOLIDA O tema principal do romance o drama familiar

    demolindo as vidas e, por conseqncia, o lar. O enredo centrado na histria de dois irmos gmeos Yaqub e Omar e suas relaes com a me, o pai e a irm. Moram na mesma casa Domingas, empregada da famlia, e o filho dela (que, mais tarde, se torna o narrador), um menino cuja infncia moldada justamente por esta condio: ser o filho da empregada.

    AMOR INCESTUOSO Apesar de no est escrito com todas as letras, deduz-se que o amor doentio da me (Zana) pelo filho mais novo (Omar) tem muito de incesto: ela o quer s para si, ignorando, a partir de certo momento, a relao com o prprio marido. Na mesma linha, classifica-se o amor de Rnia pelos irmos gmeos.

    FOCO NARRATIVO NARRADOR-PERSONAGEM A histria narrada na primeira pessoa, mas o

    narrador no o heri principal. Nael (o nome s revelado quase no fim da histria) valeu-se do que viu, do que ouviu e, principalmente, do que lhe contaram sobre a famlia de que fez parte. A funo do narrador olhar para o passado e tentar juntar pedaos do que lhe foram contando at formar a histria como um todo.

    LINGUAGEM FRASES CURTAS Milton Hatoum vale-se das frases curtas, ligeiras, com

    pouca fantasia ou adjetivao para narrar com clareza e sobriedade.

    CORREO GRAMATICAL No plano artstico, a linguagem de Milton Hatoum exibe simplicidade e correo gramatical, elevando o texto condio de obra de arte.

    TEMPO PRESENTE x PASSADO A narrativa comea na dcada de 1920 e, aos saltos,

    chega aos anos 60. A histria comea pelo fim: narra-se, antes do primeiro captulo, a morte de Zana, me dos gmeos. O narrador viveu, viu e ouviu todos os acontecimentos. Uns trinta anos depois, resolveu pr no papel os fragmentos que lhe vinham memria. A oscilao entre presente e passado recurso comum na narrativa.

    PERSONAGENS PLANAS, LINEARES As personagens criadas por Milton Hatoum, em Dois

    irmos, so todas planas, lineares ou estereotipadas, isto , no evoluem psicologicamente nem mudam de carter ou de personalidade.

    Vamos galeria de personagens do livro com suas respectivas caractersticas e/ou atuao:

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    O autor faz referncia ao sul do Lbano, de onde provieram os chefes de famlia e para onde foi Yaqub contra sua vontade. A cidade de So Paulo tambm cenrio de referncia: l, Yakub formou-se em Engenharia, constituiu famlia e fixou residncia.

    TEMTICA CASA DEMOLIDA O tema principal do romance o drama familiar

    demolindo as vidas e, por conseqncia, o lar. O enredo centrado na histria de dois irmos gmeos Yaqub e Omar e suas relaes com a me, o pai e a irm. Moram na mesma casa Domingas, empregada da famlia, e o filho dela (que, mais tarde, se torna o narrador), um menino cuja infncia moldada justamente por esta condio: ser o filho da empregada.

    AMOR INCESTUOSO Apesar de no est escrito com todas as letras, deduz-se que o amor doentio da me (Zana) pelo filho mais novo (Omar) tem muito de incesto: ela o quer s para si, ignorando, a partir de certo momento, a relao com o prprio marido. Na mesma linha, classifica-se o amor de Rnia pelos irmos gmeos.

    FOCO NARRATIVO NARRADOR-PERSONAGEM A histria narrada na primeira pessoa, mas o

    narrador no o heri principal. Nael (o nome s revelado quase no fim da histria) valeu-se do que viu, do que ouviu e, principalmente, do que lhe contaram sobre a famlia de que fez parte. A funo do narrador olhar para o passado e tentar juntar pedaos do que lhe foram contando at formar a histria como um todo.

    LINGUAGEM FRASES CURTAS Milton Hatoum vale-se das frases curtas, ligeiras, com

    pouca fantasia ou adjetivao para narrar com clareza e sobriedade.

    CORREO GRAMATICAL No plano artstico, a linguagem de Milton Hatoum exibe simplicidade e correo gramatical, elevando o texto condio de obra de arte.

    TEMPO PRESENTE x PASSADO A narrativa comea na dcada de 1920 e, aos saltos,

    chega aos anos 60. A histria comea pelo fim: narra-se, antes do primeiro captulo, a morte de Zana, me dos gmeos. O narrador viveu, viu e ouviu todos os acontecimentos. Uns trinta anos depois, resolveu pr no papel os fragmentos que lhe vinham memria. A oscilao entre presente e passado recurso comum na narrativa.

    PERSONAGENS PLANAS, LINEARES As personagens criadas por Milton Hatoum, em Dois

    irmos, so todas planas, lineares ou estereotipadas, isto , no evoluem psicologicamente nem mudam de carter ou de personalidade.

    Vamos galeria de personagens do livro com suas respectivas caractersticas e/ou atuao:

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    4

    Zana Me dos gmeos Yaqub e Omar; esposa de Halim. O romance comea com a

    descrio da morte de Zana. Era filha de Galib, dono do restaurante Biblos. medida que a histria evolui, ela vai-se mostrando dominadora, moldando o destino do marido e dos filhos.

    Halim Pai dos gmeos Yaqub e Omar; esposo de Zana. Quando jovem, era mascate nas

    ruas de Manaus. Melhorou de vida ao casar-se com Zana. Aos poucos, foi perdendo o amor da esposa para o Caula, o gmeo que nasceu logo depois de Yaqub.

    Yaqub um dos heris da histria. Rapaz vistoso e alto, rosto anguloso, olhos castanhos

    e grados, cabelo ondulado e preto. Aos treze anos, foi mandado para o sul do Lbano, tentativa dos pais de separ-lo de Omar, seu irmo gmeo. Tornou-se engenheiro e casou-se com Lvia.

    Omar O outro heri da histria. Tem os mesmos traos fsicos do irmo, mas carter e

    comportamento opostos. Desde criana, mostrava-se mais arrojado e corajoso. Com o excesso de proteo da me, tornou-se vadio e arqui-rival do pai e do irmo gmeo.

    Lvia Moa que provocou a primeira briga sria entre os gmeos. Por causa dela, Omar

    cortou a face de Yaqub com uma garrafa quebrada. Foi embora para So Paulo e, s escondidas, casou-se com Yaqub.

    Galib Pai de Zana. Tinha um restaurante no trreo da prpria casa. Quando a filha se

    casou com Halim, voltou para o Lbano e l morreu.

    Abbas Poeta bomio que ajudou Halim, por meio de versos, a conquistar Zana.

    Domingas rf que veio do interior trazida por uma freira. Enfrentou dois anos de orfanato.

    Depois, foi morar na casa de Halim e Zana, tornando-se empregada. Me de Nael, o narrador da histria. O prprio narrador diz que Domingas no teve a liberdade de escolher nada na vida.

    Irm Damasceno Alta, carrancuda, toda de preto, palmatria na mo, amedrontava a todos no

    orfanato. Foi quem doou Domingas a Halim e Zana.

    Estelita Estilista rica, vizinha de Salim, esposa de Abelardo. De vez em quando, batia no

    marido por causa da irm dela. Atazanava a vida do narrador, arranjando coisas para ele fazer, embora tivesse um batalho de serventes.

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    Zana Me dos gmeos Yaqub e Omar; esposa de Halim. O romance comea com a

    descrio da morte de Zana. Era filha de Galib, dono do restaurante Biblos. medida que a histria evolui, ela vai-se mostrando dominadora, moldando o destino do marido e dos filhos.

    Halim Pai dos gmeos Yaqub e Omar; esposo de Zana. Quando jovem, era mascate nas

    ruas de Manaus. Melhorou de vida ao casar-se com Zana. Aos poucos, foi perdendo o amor da esposa para o Caula, o gmeo que nasceu logo depois de Yaqub.

    Yaqub um dos heris da histria. Rapaz vistoso e alto, rosto anguloso, olhos castanhos

    e grados, cabelo ondulado e preto. Aos treze anos, foi mandado para o sul do Lbano, tentativa dos pais de separ-lo de Omar, seu irmo gmeo. Tornou-se engenheiro e casou-se com Lvia.

    Omar O outro heri da histria. Tem os mesmos traos fsicos do irmo, mas carter e

    comportamento opostos. Desde criana, mostrava-se mais arrojado e corajoso. Com o excesso de proteo da me, tornou-se vadio e arqui-rival do pai e do irmo gmeo.

    Lvia Moa que provocou a primeira briga sria entre os gmeos. Por causa dela, Omar

    cortou a face de Yaqub com uma garrafa quebrada. Foi embora para So Paulo e, s escondidas, casou-se com Yaqub.

    Galib Pai de Zana. Tinha um restaurante no trreo da prpria casa. Quando a filha se

    casou com Halim, voltou para o Lbano e l morreu.

    Abbas Poeta bomio que ajudou Halim, por meio de versos, a conquistar Zana.

    Domingas rf que veio do interior trazida por uma freira. Enfrentou dois anos de orfanato.

    Depois, foi morar na casa de Halim e Zana, tornando-se empregada. Me de Nael, o narrador da histria. O prprio narrador diz que Domingas no teve a liberdade de escolher nada na vida.

    Irm Damasceno Alta, carrancuda, toda de preto, palmatria na mo, amedrontava a todos no

    orfanato. Foi quem doou Domingas a Halim e Zana.

    Estelita Estilista rica, vizinha de Salim, esposa de Abelardo. De vez em quando, batia no

    marido por causa da irm dela. Atazanava a vida do narrador, arranjando coisas para ele fazer, embora tivesse um batalho de serventes.

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    5

    Abelardo Esposo de Estelita. Quando era castigado pela esposa, ficava no aposento dos

    macacos, fora de casa.

    Talib Vizinho e amigo de Halim e Zana. Tinha duas filhas muito bonitas: Zahia e

    Nahda. Quando era flagrado em cenas libidinosas com alguma caboclinha, apanhava das filhas.

    Dlia Danarina que conquistou o corao de Omar. Zana, por intermdio do narrador,

    fez que ela desaparecesse.

    Zanuri Ganhava dinheiro para vigiar e delatar casais apaixonados. Trabalhou para Zana,

    vigiando Omar.

    Adamor, o Perna-de-Sapo Tinha faro especial para encontrar coisas (e pessoas) perdidas. Foi quem localizou

    Omar quando este sumiu com a Pau-Mulato.

    Pau-Mulato Mulher alta, forte, bem escura, por quem Omar se apaixonou e com quem fugiu de

    casa. O romance foi desfeito por Zana, e o Caula voltou a ser mimado pela me e pela irm.

    Prof. Antenor Laval Professor de Francs no Liceu Rui Barbosa (Galinheiro dos Vndalos). Foi preso

    em praa pblica pelos soldados do Exrcito e morto dois dias depois. Alm de professor, era poeta e crtico ferrenho da poltica.

    Nael Narrador-personagem. Filho de Domingas, empregada da famlia. O nome

    aparece quase no final da histria. Ele prprio no tem certeza, mas tudo indica que o pai dele Yaqub.

    Bolislau Professor do colgio dos padres que Omar agrediu com um soco no queixo e um

    chute no saco.

    Resumo de todos os captulos de Dois irmos

    A MORTE DE ZANA O romance comea com algum descrevendo a morte de

    Zana. Antes de morrer, ela delirava pela casa, chegava a ver o marido e o pai andando pela casa: Eles andam por aqui, meu pai e Halim vieram me visitar... eles esto nesta casa. Acreditava tambm que o filho caula iria voltar: Sei que um dia ele vai voltar. O narrador no quis v-la morrer. Mas contaram-lhe que ela, antes da morte, ergueu a cabea e perguntou em rabe: Meus filhos j fizeram as pazes?

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    Abelardo Esposo de Estelita. Quando era castigado pela esposa, ficava no aposento dos

    macacos, fora de casa.

    Talib Vizinho e amigo de Halim e Zana. Tinha duas filhas muito bonitas: Zahia e

    Nahda. Quando era flagrado em cenas libidinosas com alguma caboclinha, apanhava das filhas.

    Dlia Danarina que conquistou o corao de Omar. Zana, por intermdio do narrador,

    fez que ela desaparecesse.

    Zanuri Ganhava dinheiro para vigiar e delatar casais apaixonados. Trabalhou para Zana,

    vigiando Omar.

    Adamor, o Perna-de-Sapo Tinha faro especial para encontrar coisas (e pessoas) perdidas. Foi quem localizou

    Omar quando este sumiu com a Pau-Mulato.

    Pau-Mulato Mulher alta, forte, bem escura, por quem Omar se apaixonou e com quem fugiu de

    casa. O romance foi desfeito por Zana, e o Caula voltou a ser mimado pela me e pela irm.

    Prof. Antenor Laval Professor de Francs no Liceu Rui Barbosa (Galinheiro dos Vndalos). Foi preso

    em praa pblica pelos soldados do Exrcito e morto dois dias depois. Alm de professor, era poeta e crtico ferrenho da poltica.

    Nael Narrador-personagem. Filho de Domingas, empregada da famlia. O nome

    aparece quase no final da histria. Ele prprio no tem certeza, mas tudo indica que o pai dele Yaqub.

    Bolislau Professor do colgio dos padres que Omar agrediu com um soco no queixo e um

    chute no saco.

    Resumo de todos os captulos de Dois irmos

    A MORTE DE ZANA O romance comea com algum descrevendo a morte de

    Zana. Antes de morrer, ela delirava pela casa, chegava a ver o marido e o pai andando pela casa: Eles andam por aqui, meu pai e Halim vieram me visitar... eles esto nesta casa. Acreditava tambm que o filho caula iria voltar: Sei que um dia ele vai voltar. O narrador no quis v-la morrer. Mas contaram-lhe que ela, antes da morte, ergueu a cabea e perguntou em rabe: Meus filhos j fizeram as pazes?

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    1 A VOLTA DE YAQUB Yaqub chegou do Lbano. O pai foi busc-lo no Rio de

    Janeiro. No era mais o menino, mas o rapaz que passara cinco dos seus dezoito anos no sul do Lbano.

    O encontro de pai e filho foi emocionante. O pai falou da penria em Manaus por causa da guerra. No farnel do filho, no havia roupa, nem presente.

    Em plena Cinelndia, Halim viu o filho virar-se para uma parede e mijar. O pai reclamou, mas Yaqub no entendeu, ou fingiu que no entendeu.

    A SEPARAO Yaqub e Omar eram gmeos idnticos. Omar nasceu um pouquinho depois. At treze anos, viveram na mesma casa. A idia de Halim era mandar os dois filhos para o sul do Lbano, mas a esposa, Zana, persuadiu o marido a mandar apenas Yaqub. Assim, durante anos, Omar foi tratado como filho nico.

    VIAGEM E SERMO Na viagem de volta a Manaus, Halim fez um longo sermo sobre educao domstica: que no se deve mijar na rua, nem comer como uma anta, nem cuspir no cho. O filho concordava, a cabea baixa, vomitando de vez em quando.

    REENCONTRO COM A ME No aeroporto de Manaus, o reencontro com a me chamou a ateno de todos. Era como se a me recuperasse uma parte da prpria vida: "o gmeo que se ausentara por capricho ou teimosia de Halim."

    LEMBRANAS DE YAQUB No caminho do aeroporto para casa, Yaqub dava asas s lembranas. "Ele e o irmo entravam correndo na casa, zigue-zagueavam pelo quintal, caavam calangos com uma baladeira. Quando chovia, os dois trepavam na seringueira do quintal da casa, e o Caula trepava mais alto, se arriscava, mangava do ir-mo, que se equilibrava no meio da rvore, escondido na folhagem, agarrado ao galho mais grosso, tremendo de medo, temendo perder o equilbrio."

    IGUAIS E DIFERENTES Yaqub vai relembrando a infncia. Ele e Omar, embora tivessem o mesmo fsico, eram bem diferentes. O caula era corajoso, brigo, audacioso. Corria descalo, sem medo de queimar os ps, saltava para pegar a linha ou a rabiola de um papagaio, soltando um grito de guerra e mostrando as mos estriadas. "Yaqub recuava ao ver as mos do irmo cheias de sangue, cortadas pelo vidro do cerol."

    CARNAVAL E TRAGDIA Veio lembrana de Yaqub o baile de Carnaval no casaro de Sultana Benemou. "Seria a primeira noite de Lvia na festa dos adultos, a primeira noite que ele, Yaqub, viu-a com os lbios pintados". Yaqub tinha treze anos. Lvia, da mesma idade, j parecia adulta. Quando ia aproximar-se dela, Zana ordenou: Leva tua irm para casa. Podes voltar depois. Ele obedeceu. Quando Znia dormiu, "voltou correndo ao casaro dos Benemou." A cena que viu deixou-o trmulo: Lvia e Omar danavam num canto da sala. "Danavam quietos, enroscados, movidos por um ritmo s deles, que no era carnavalesco." Dois meses depois, ele e o irmo estavam separados. Nunca entendeu "por que ele, e no o irmo, viajou para o Lbano dois meses depois."

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    1 A VOLTA DE YAQUB Yaqub chegou do Lbano. O pai foi busc-lo no Rio de

    Janeiro. No era mais o menino, mas o rapaz que passara cinco dos seus dezoito anos no sul do Lbano.

    O encontro de pai e filho foi emocionante. O pai falou da penria em Manaus por causa da guerra. No farnel do filho, no havia roupa, nem presente.

    Em plena Cinelndia, Halim viu o filho virar-se para uma parede e mijar. O pai reclamou, mas Yaqub no entendeu, ou fingiu que no entendeu.

    A SEPARAO Yaqub e Omar eram gmeos idnticos. Omar nasceu um pouquinho depois. At treze anos, viveram na mesma casa. A idia de Halim era mandar os dois filhos para o sul do Lbano, mas a esposa, Zana, persuadiu o marido a mandar apenas Yaqub. Assim, durante anos, Omar foi tratado como filho nico.

    VIAGEM E SERMO Na viagem de volta a Manaus, Halim fez um longo sermo sobre educao domstica: que no se deve mijar na rua, nem comer como uma anta, nem cuspir no cho. O filho concordava, a cabea baixa, vomitando de vez em quando.

    REENCONTRO COM A ME No aeroporto de Manaus, o reencontro com a me chamou a ateno de todos. Era como se a me recuperasse uma parte da prpria vida: "o gmeo que se ausentara por capricho ou teimosia de Halim."

    LEMBRANAS DE YAQUB No caminho do aeroporto para casa, Yaqub dava asas s lembranas. "Ele e o irmo entravam correndo na casa, zigue-zagueavam pelo quintal, caavam calangos com uma baladeira. Quando chovia, os dois trepavam na seringueira do quintal da casa, e o Caula trepava mais alto, se arriscava, mangava do ir-mo, que se equilibrava no meio da rvore, escondido na folhagem, agarrado ao galho mais grosso, tremendo de medo, temendo perder o equilbrio."

    IGUAIS E DIFERENTES Yaqub vai relembrando a infncia. Ele e Omar, embora tivessem o mesmo fsico, eram bem diferentes. O caula era corajoso, brigo, audacioso. Corria descalo, sem medo de queimar os ps, saltava para pegar a linha ou a rabiola de um papagaio, soltando um grito de guerra e mostrando as mos estriadas. "Yaqub recuava ao ver as mos do irmo cheias de sangue, cortadas pelo vidro do cerol."

    CARNAVAL E TRAGDIA Veio lembrana de Yaqub o baile de Carnaval no casaro de Sultana Benemou. "Seria a primeira noite de Lvia na festa dos adultos, a primeira noite que ele, Yaqub, viu-a com os lbios pintados". Yaqub tinha treze anos. Lvia, da mesma idade, j parecia adulta. Quando ia aproximar-se dela, Zana ordenou: Leva tua irm para casa. Podes voltar depois. Ele obedeceu. Quando Znia dormiu, "voltou correndo ao casaro dos Benemou." A cena que viu deixou-o trmulo: Lvia e Omar danavam num canto da sala. "Danavam quietos, enroscados, movidos por um ritmo s deles, que no era carnavalesco." Dois meses depois, ele e o irmo estavam separados. Nunca entendeu "por que ele, e no o irmo, viajou para o Lbano dois meses depois."

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    CHEGADA AO LAR J em casa, Yaqub abraou longamente a irm, agora moa completa, e dedicou uma ateno especial a Domingas. "Ele observou os desenhos de sua infncia colados na parede: as casas, os edifcios e as pontes coloridas, e viu o lpis de sua primeira caligrafia e o caderno amarelado que Domingas guardara e agora lhe entregava como se ela fosse sua me e no a empregada."

    FACE A FACE COM O IRMO A recepo entre os gmeos foi fria. Omar chegou quase meia-noite. Apesar do incentivo, os dois trocaram apenas um tmido aperto de mos.

    A HISTRIA DA CICATRIZ Um narrador ainda no identificado fala da cicatriz no rosto de Yaqub. "Foi Domingas quem me contou a histria da cicatriz". Depois do Carnaval, os gmeos foram com Domingas casa dos Reinoso: iam passar a tarde l, atrados pela notcia de um cinematgrafo ambulante. Lvia dava confiana aos dois, e Omar ficou enciumado. Depois do baile de Carnaval, o Caula achava que Lvia estava comprometida com ele. Quando o filme ia comear, Yaqub reservou uma cadeira para Lvia. Omar desaprovou o gesto polido com o olhar. A sala ficou escura, e as cenas em preto-e-branco surgiram da escurido. Uns vinte minutos depois, a projeo foi interrompida. Quando algum abriu uma janela, "a platia viu os lbios de Lvia grudados no rosto de Yaqub. Depois, o barulho de cadeiras atiradas no cho e o estouro de uma garrafa estilhaada, e a estocada certeira, rpida e furiosa do Caula. O silncio durou uns segundos. E ento o grito de pnico de Lvia ao olhar o rosto rasgado de Yaqub. O Caula, apoiado na parede branca, ofegava, o caco de vidro escuro na mo direita, o olhar aceso no rosto ensangentado do irmo." Vieram, depois, os apelidos: Cara de lacrau, bochecha de foice. Yaqub engolia os insultos, no reagia. "Ento Halim decidiu: a viagem, a separao. A distncia que promete apagar o dio, o cime e o ato que os engendrou."

    ADAPTAO Depois de voltar do Lbano, Yaqub tentou recuperar o tempo perdido. Era tmido, tinha vergonha de falar (trocava o p pelo b), era alvo de chacota dos colegas e de certos mestres que o tinham como um rapaz rude, esquisito: vaso mal moldado.

    OLHAR SEDUTOR Yaqub despertava desejo nas mulheres. Tinha olhar de conquistador. Domingas tambm se deixava encantar por aquele olhar. Dizia: Esse gmeo tem olho de boto; se deixar, ele leva todo mundo para o fundo do rio.

    UM MATEMTICO Na escola, Yaqub sobressaa-se em Matemtica. "O que lhe faltava no manejo do idioma sobrava-lhe no poder de abstrair, calcular, operar com nmeros." Logo ganhou gosto pelo jogo de xadrez.

    JUVENTUDE ESQUISITA Yaqub passava "dias e noites no quarto, em total isolamento. A me e o pai no entendiam por que ele renunciava juventude, ao barulho festivo e s serenatas que povoavam de sons as noites de Manaus.

    ATITUDES OPOSTAS Enquanto Yaqub ganhava fama de estudioso e esquisito, Omar "gazeava lies de latim, subornava porteiros sisudos do colgio dos padres e saa para a noite, fardado, transgressor dos ps ao gog, rondando os sales da Maloca dos Bars, do Acapulco, do Cheik Clube, do Shangri-L."

    ESTUDOS LITERRIOS

    7

    CHEGADA AO LAR J em casa, Yaqub abraou longamente a irm, agora moa completa, e dedicou uma ateno especial a Domingas. "Ele observou os desenhos de sua infncia colados na parede: as casas, os edifcios e as pontes coloridas, e viu o lpis de sua primeira caligrafia e o caderno amarelado que Domingas guardara e agora lhe entregava como se ela fosse sua me e no a empregada."

    FACE A FACE COM O IRMO A recepo entre os gmeos foi fria. Omar chegou quase meia-noite. Apesar do incentivo, os dois trocaram apenas um tmido aperto de mos.

    A HISTRIA DA CICATRIZ Um narrador ainda no identificado fala da cicatriz no rosto de Yaqub. "Foi Domingas quem me contou a histria da cicatriz". Depois do Carnaval, os gmeos foram com Domingas casa dos Reinoso: iam passar a tarde l, atrados pela notcia de um cinematgrafo ambulante. Lvia dava confiana aos dois, e Omar ficou enciumado. Depois do baile de Carnaval, o Caula achava que Lvia estava comprometida com ele. Quando o filme ia comear, Yaqub reservou uma cadeira para Lvia. Omar desaprovou o gesto polido com o olhar. A sala ficou escura, e as cenas em preto-e-branco surgiram da escurido. Uns vinte minutos depois, a projeo foi interrompida. Quando algum abriu uma janela, "a platia viu os lbios de Lvia grudados no rosto de Yaqub. Depois, o barulho de cadeiras atiradas no cho e o estouro de uma garrafa estilhaada, e a estocada certeira, rpida e furiosa do Caula. O silncio durou uns segundos. E ento o grito de pnico de Lvia ao olhar o rosto rasgado de Yaqub. O Caula, apoiado na parede branca, ofegava, o caco de vidro escuro na mo direita, o olhar aceso no rosto ensangentado do irmo." Vieram, depois, os apelidos: Cara de lacrau, bochecha de foice. Yaqub engolia os insultos, no reagia. "Ento Halim decidiu: a viagem, a separao. A distncia que promete apagar o dio, o cime e o ato que os engendrou."

    ADAPTAO Depois de voltar do Lbano, Yaqub tentou recuperar o tempo perdido. Era tmido, tinha vergonha de falar (trocava o p pelo b), era alvo de chacota dos colegas e de certos mestres que o tinham como um rapaz rude, esquisito: vaso mal moldado.

    OLHAR SEDUTOR Yaqub despertava desejo nas mulheres. Tinha olhar de conquistador. Domingas tambm se deixava encantar por aquele olhar. Dizia: Esse gmeo tem olho de boto; se deixar, ele leva todo mundo para o fundo do rio.

    UM MATEMTICO Na escola, Yaqub sobressaa-se em Matemtica. "O que lhe faltava no manejo do idioma sobrava-lhe no poder de abstrair, calcular, operar com nmeros." Logo ganhou gosto pelo jogo de xadrez.

    JUVENTUDE ESQUISITA Yaqub passava "dias e noites no quarto, em total isolamento. A me e o pai no entendiam por que ele renunciava juventude, ao barulho festivo e s serenatas que povoavam de sons as noites de Manaus.

    ATITUDES OPOSTAS Enquanto Yaqub ganhava fama de estudioso e esquisito, Omar "gazeava lies de latim, subornava porteiros sisudos do colgio dos padres e saa para a noite, fardado, transgressor dos ps ao gog, rondando os sales da Maloca dos Bars, do Acapulco, do Cheik Clube, do Shangri-L."

  • ESTUDOS LITERRIOS

    8

    LUTA V O pai no sabia o que fazer diante de um filho que chegava, todas as noites, brio. Ameaa castigo, dava o exemplo do outro filho, mas nada adiantava. Omar foi reprovado dois anos seguidos no colgio dos padres.

    EXPULSO DO COLGIO No dia em que foi expulso, Omar "gritou vrias vezes na presena do pai, desafiando-o, rasgando a farda azul, a voz impertinente dizendo: Acertei em cheio o professor de matemtica, o mestre do teu filho querido, o que s tem cabea.

    GALINHEIRO DOS VNDALOS "O Caula, expulso pelos padres, s encontrou abrigo numa escola de Manaus onde eu estudaria anos depois. O nome do colgio era pomposo Liceu Rui Barbosa, o guia de Haia , mas o apelido era bem menos edificante: Galinheiro dos Vndalos."

    SOCO NO QUEIXO E CHUTE NO SACO No Galinheiro dos Vndalos, "o Caula no escondia de ningum a verso verdadeira: o padre polons que o humilhou s podia tomar sopa, nunca mais ia mastigar comida." Chamava-se Bolislau, gigante de tez vermelha, carnadura atltica, olhos de castigador que procura cobaia. Fez uma pergunta dificlima para Omar, e em resposta ao silncio do aluno, zombou. "O Caula se levantou, caminhou para o quadro-negro, parou cabisbaixo diante do gigante Bolislau, deu-lhe um soco no queixo e um chute no saco".

    IDENTIDADE DO NARRADOR Aqui, o narrador comea a aparecer mais nitidamente. "Quando ele (Yaqub) viajou para So Paulo, eu tinha uns quatro anos de idade, mas a roupa dele me esperou crescer e foi se ajustando ao meu corpo; as calas, frouxas, pareciam sacos; e os sapatos, que mais tarde ficaram um pouco apertados, entravam meio na marra nos ps: em parte por teimosia, e muito por necessidade."

    PARTIDA PARA SO PAULO Terminados os estudos no colgio dos padres, Yaqub decidiu: ia embora para So Paulo, seguir sua vocao para os nmeros. O colgio preparou-lhe homenagens.

    LVIA REAPARECE No dia da partida, Lvia reapareceu. Arrastou Yaqub para o quintal, depois os dois sumiram no mato. Como demorassem, Domingas foi atrs. "Estavam espichados no mato, e Yaqub acariciava o ventre e os seios da mulher, adiando a despedida."

    MARCAS DO AMOR Depois do encontro com Lvia, "Yaqub entrou sozinho na sala, o pescoo com arranhes e marcas de mordidas, a expresso ainda incendiada. Viajou assim mesmo: a roupa amarrotada, o rosto mido, o cabelo aninhando talos, folhinhas e fios de cabelo amarelados. Viajou calado. Deixou na casa a lembrana forte de duas cenas ousadas: o desfile com farda de gala e o encontro com a mulher que ele amava."

    2

    HALIM E GALIB O pai de Zana, Galib, inaugurou o restaurante Biblos no

    trreo da prpria casa. O prprio Galib, ajudado pela filha, levava comida mesa dos fregueses: mascateiros, comandantes de embarcao, regates, trabalhadores do Manaus

    ESTUDOS LITERRIOS

    8

    LUTA V O pai no sabia o que fazer diante de um filho que chegava, todas as noites, brio. Ameaa castigo, dava o exemplo do outro filho, mas nada adiantava. Omar foi reprovado dois anos seguidos no colgio dos padres.

    EXPULSO DO COLGIO No dia em que foi expulso, Omar "gritou vrias vezes na presena do pai, desafiando-o, rasgando a farda azul, a voz impertinente dizendo: Acertei em cheio o professor de matemtica, o mestre do teu filho querido, o que s tem cabea.

    GALINHEIRO DOS VNDALOS "O Caula, expulso pelos padres, s encontrou abrigo numa escola de Manaus onde eu estudaria anos depois. O nome do colgio era pomposo Liceu Rui Barbosa, o guia de Haia , mas o apelido era bem menos edificante: Galinheiro dos Vndalos."

    SOCO NO QUEIXO E CHUTE NO SACO No Galinheiro dos Vndalos, "o Caula no escondia de ningum a verso verdadeira: o padre polons que o humilhou s podia tomar sopa, nunca mais ia mastigar comida." Chamava-se Bolislau, gigante de tez vermelha, carnadura atltica, olhos de castigador que procura cobaia. Fez uma pergunta dificlima para Omar, e em resposta ao silncio do aluno, zombou. "O Caula se levantou, caminhou para o quadro-negro, parou cabisbaixo diante do gigante Bolislau, deu-lhe um soco no queixo e um chute no saco".

    IDENTIDADE DO NARRADOR Aqui, o narrador comea a aparecer mais nitidamente. "Quando ele (Yaqub) viajou para So Paulo, eu tinha uns quatro anos de idade, mas a roupa dele me esperou crescer e foi se ajustando ao meu corpo; as calas, frouxas, pareciam sacos; e os sapatos, que mais tarde ficaram um pouco apertados, entravam meio na marra nos ps: em parte por teimosia, e muito por necessidade."

    PARTIDA PARA SO PAULO Terminados os estudos no colgio dos padres, Yaqub decidiu: ia embora para So Paulo, seguir sua vocao para os nmeros. O colgio preparou-lhe homenagens.

    LVIA REAPARECE No dia da partida, Lvia reapareceu. Arrastou Yaqub para o quintal, depois os dois sumiram no mato. Como demorassem, Domingas foi atrs. "Estavam espichados no mato, e Yaqub acariciava o ventre e os seios da mulher, adiando a despedida."

    MARCAS DO AMOR Depois do encontro com Lvia, "Yaqub entrou sozinho na sala, o pescoo com arranhes e marcas de mordidas, a expresso ainda incendiada. Viajou assim mesmo: a roupa amarrotada, o rosto mido, o cabelo aninhando talos, folhinhas e fios de cabelo amarelados. Viajou calado. Deixou na casa a lembrana forte de duas cenas ousadas: o desfile com farda de gala e o encontro com a mulher que ele amava."

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    HALIM E GALIB O pai de Zana, Galib, inaugurou o restaurante Biblos no

    trreo da prpria casa. O prprio Galib, ajudado pela filha, levava comida mesa dos fregueses: mascateiros, comandantes de embarcao, regates, trabalhadores do Manaus

  • ESTUDOS LITERRIOS

    9

    Harbour; imigrantes libaneses, srios e judeus marroquinos que moravam na praa Nossa Senhora dos Remdios e nos quarteires que a rodeavam. Halim comeou a freqentar o restaurante menos pela comida e mais para apreciar a beleza de Zana. "Passou meses assim: sozinho num canto da sala, agitado ao ver a filha de Galib, acompanhando com o olhar os passos da gazela."

    O EFEITO DOS GAZAIS Halim estava apaixonado por Zana, mas era tmido, no tinha coragem de lhe fazer uma declarao de amor. Pediu ajuda a Abbas, um poeta bomio. Nasceu, ento, a idia de conquist-la com um poema. Abbas comps um gazal, espcie de poema amoroso, e Halim, encharcado de vinho, recitou-o a Zana dentro do restaurante cheio de gente. Dois meses depois, estavam casados. Tudo isso Halim contou ao narrador.

    INTRIGAS Houve muitas intrigas para atrapalhar o namoro de Zana e Halim. Galib no se intrometia, e Zana ganhava liberdade para decidir sozinha. Terminaram casando-se na Igreja dos Remdios.

    SOB O COMANDO DE ZANA Depois de casados, Zana dava as ordens, tomava as decises. Halim vivia para satisfaz-la, para ador-la, para faz-la feliz. Ele parecia passivo, "mas era um demnio na cama e na rede. Ele me contou cenas de amor com a maior naturalidade, a voz pastosa, pausada, a expresso libidinosa no rosto estriado, molhado de suor".

    A MORTE DE GALIB Logo depois de casados, Zana sugeriu ao pai "que viajasse para o Lbano, revisse os parentes, a terra, tudo. Era o que Galib queria ouvir. E partiu, a bordo do Hildebrand, um colosso de navio que tantos imigrantes trouxe para a Amaznia." Em Biblos, dormindo na casa perto do mar, Galib morreu. Quando Zana soube, trancou-se no quarto do pai. Depois balbuciou para o esposo: Agora sou rf de pai e me. Quero filhos, pelo menos trs.

    3

    CARTA DE YAQUB No fim de cada ms, Halim e Zana recebiam uma carta de

    Yaqub. Para espantar a tristeza, "Halim convidava os vizinhos e a leitura era pretexto para um jantar festivo. Sem festa, Zana ficaria deprimida, pensando no frio que o filho sentia".

    YAQUB PROFESSOR Seis meses depois, Yaqub tornou-se professor de Matemtica em So Paulo. Tempos depois, informou seu ingresso na Universidade de So Paulo: ia ser engenheiro. "Os pais mandaram-lhe dinheiro e um telegrama; ele agradeceu as belas palavras e devolveu o dinheiro. Entenderam que o filho nunca mais precisaria de um vintm. Mesmo se precisasse, no lhes pediria."

    YAQUB OFICIAL DO EXRCITO "Cresci vendo as fotos de Yaqub e ouvindo a me dele ler suas cartas. Numa das fotos, posou com a farda do Exrcito; outra vez uma espada, s que agora a arma de dois gumes dava mais poder ao corpo do oficial da reserva. Durante anos, essa imagem do gal fardado me impressionou. Um oficial do Exrcito, e futuro engenheiro da Escola Politcnica..."

    ESTUDOS LITERRIOS

    9

    Harbour; imigrantes libaneses, srios e judeus marroquinos que moravam na praa Nossa Senhora dos Remdios e nos quarteires que a rodeavam. Halim comeou a freqentar o restaurante menos pela comida e mais para apreciar a beleza de Zana. "Passou meses assim: sozinho num canto da sala, agitado ao ver a filha de Galib, acompanhando com o olhar os passos da gazela."

    O EFEITO DOS GAZAIS Halim estava apaixonado por Zana, mas era tmido, no tinha coragem de lhe fazer uma declarao de amor. Pediu ajuda a Abbas, um poeta bomio. Nasceu, ento, a idia de conquist-la com um poema. Abbas comps um gazal, espcie de poema amoroso, e Halim, encharcado de vinho, recitou-o a Zana dentro do restaurante cheio de gente. Dois meses depois, estavam casados. Tudo isso Halim contou ao narrador.

    INTRIGAS Houve muitas intrigas para atrapalhar o namoro de Zana e Halim. Galib no se intrometia, e Zana ganhava liberdade para decidir sozinha. Terminaram casando-se na Igreja dos Remdios.

    SOB O COMANDO DE ZANA Depois de casados, Zana dava as ordens, tomava as decises. Halim vivia para satisfaz-la, para ador-la, para faz-la feliz. Ele parecia passivo, "mas era um demnio na cama e na rede. Ele me contou cenas de amor com a maior naturalidade, a voz pastosa, pausada, a expresso libidinosa no rosto estriado, molhado de suor".

    A MORTE DE GALIB Logo depois de casados, Zana sugeriu ao pai "que viajasse para o Lbano, revisse os parentes, a terra, tudo. Era o que Galib queria ouvir. E partiu, a bordo do Hildebrand, um colosso de navio que tantos imigrantes trouxe para a Amaznia." Em Biblos, dormindo na casa perto do mar, Galib morreu. Quando Zana soube, trancou-se no quarto do pai. Depois balbuciou para o esposo: Agora sou rf de pai e me. Quero filhos, pelo menos trs.

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    CARTA DE YAQUB No fim de cada ms, Halim e Zana recebiam uma carta de

    Yaqub. Para espantar a tristeza, "Halim convidava os vizinhos e a leitura era pretexto para um jantar festivo. Sem festa, Zana ficaria deprimida, pensando no frio que o filho sentia".

    YAQUB PROFESSOR Seis meses depois, Yaqub tornou-se professor de Matemtica em So Paulo. Tempos depois, informou seu ingresso na Universidade de So Paulo: ia ser engenheiro. "Os pais mandaram-lhe dinheiro e um telegrama; ele agradeceu as belas palavras e devolveu o dinheiro. Entenderam que o filho nunca mais precisaria de um vintm. Mesmo se precisasse, no lhes pediria."

    YAQUB OFICIAL DO EXRCITO "Cresci vendo as fotos de Yaqub e ouvindo a me dele ler suas cartas. Numa das fotos, posou com a farda do Exrcito; outra vez uma espada, s que agora a arma de dois gumes dava mais poder ao corpo do oficial da reserva. Durante anos, essa imagem do gal fardado me impressionou. Um oficial do Exrcito, e futuro engenheiro da Escola Politcnica..."

  • ESTUDOS LITERRIOS

    10

    A SITUAO DE OMAR Omar levava a vida "entre a inrcia da ressaca e a euforia da farra noturna." No participava da leitura das cartas mandadas pelo irmo, ignorava o oficial da reserva e futuro politcnico.

    COMO SURGIU DOMINGAS Antes dos filhos, Halim e Zana receberam de uma freira uma indiazinha. Parecia uma menina de boas maneiras e bom humor: nem melanclica, nem apresentada. Durante um tempinho, ela nos deu um trabalho danado, mas Zana gostou dela. As duas rezavam juntas as oraes que uma aprendeu em Biblos e a outra no orfanato das freiras, aqui em Manaus.

    O NASCIMENTO DOS GMEOS Halim no queria filhos. Temia que eles atrapalhassem a tara que sentia por Zana. "Yaqub e Omar nasceram dois anos depois da chegada de Domingas casa." Da em diante, acabou-se o sossego de Halim: medida que os meninos cresciam, ia perdendo terreno no corao da esposa.

    O NASCIMENTO DE RNIA Quando Rnia nasceu, Halim j se tinha conformado com a intromisso dos filhos na sua vida ntima. Fez o papel de pai: brincou com eles, levou-os para passeios. Mas nunca aprovou o excesso de mimo que Zana dispensava ao caula.

    4

    ANGSTIAS DO NARRADOR Neste captulo, o narrador questiona o seu

    prprio passado. Fica-se sabendo que ele filho de Domingas. E o pai? "Anos depois, desconfiei: um dos gmeos era meu pai. Domingas disfarava quando eu tocava no assunto; deixava-me cheio de dvida, talvez pensando que um dia eu pudesse descobrir a verdade. Eu sofria com o silncio dela".

    ORIGENS DE DOMINGAS Domingas era rf. Por isso, foi trazida do interior por uma freira para um orfanato de Manaus. Ali aprendeu a rezar e a escrever, experimentando a palmatria da irm Damasceno. Saiu do internato para viver na casa de Zana e Halim. "Viu os gmeos nascerem, cuidou do Yaqub, brincaram juntinhos...

    VIAGEM A ACAJATUBA O narrador e Domingas fizeram uma nica viagem de barco juntos: foram a Acajatuba, vila natal de Domingas. Na volta, um temporal provocou pnico e vmitos, aumentando a tristeza dela. Por alguma razo, ela no falava nos gmeos, muito menos em Yaqub. E isso aumentava as desconfianas do narrador.

    MENINO DE RECADOS O narrador tinha total liberdade na casa de Halim e Zana. Dificilmente se sentava mesa com os donos da casa, mas alimentava-se da mesma comida, andava por todos os ambientes, eles no se importavam. Os vizinhos, por meio de Zana, pediam-lhe favores: que fosse ali, acol, ele ia. s vezes, nem agradeciam nem davam dinheiro para o transporte.

    A PIOR VIZINHA A pior vizinha do narrador era Estelita Reinoso. Vivia pedindo a Zana que mandasse o filho da Domingas fazer isso ou aquilo. Demorou, mas um dia o narrador deu o seu grito de independncia: no serviria mais de mensageiro para Estelita. Halim concordou com ele.

    ESTUDOS LITERRIOS

    10

    A SITUAO DE OMAR Omar levava a vida "entre a inrcia da ressaca e a euforia da farra noturna." No participava da leitura das cartas mandadas pelo irmo, ignorava o oficial da reserva e futuro politcnico.

    COMO SURGIU DOMINGAS Antes dos filhos, Halim e Zana receberam de uma freira uma indiazinha. Parecia uma menina de boas maneiras e bom humor: nem melanclica, nem apresentada. Durante um tempinho, ela nos deu um trabalho danado, mas Zana gostou dela. As duas rezavam juntas as oraes que uma aprendeu em Biblos e a outra no orfanato das freiras, aqui em Manaus.

    O NASCIMENTO DOS GMEOS Halim no queria filhos. Temia que eles atrapalhassem a tara que sentia por Zana. "Yaqub e Omar nasceram dois anos depois da chegada de Domingas casa." Da em diante, acabou-se o sossego de Halim: medida que os meninos cresciam, ia perdendo terreno no corao da esposa.

    O NASCIMENTO DE RNIA Quando Rnia nasceu, Halim j se tinha conformado com a intromisso dos filhos na sua vida ntima. Fez o papel de pai: brincou com eles, levou-os para passeios. Mas nunca aprovou o excesso de mimo que Zana dispensava ao caula.

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    ANGSTIAS DO NARRADOR Neste captulo, o narrador questiona o seu

    prprio passado. Fica-se sabendo que ele filho de Domingas. E o pai? "Anos depois, desconfiei: um dos gmeos era meu pai. Domingas disfarava quando eu tocava no assunto; deixava-me cheio de dvida, talvez pensando que um dia eu pudesse descobrir a verdade. Eu sofria com o silncio dela".

    ORIGENS DE DOMINGAS Domingas era rf. Por isso, foi trazida do interior por uma freira para um orfanato de Manaus. Ali aprendeu a rezar e a escrever, experimentando a palmatria da irm Damasceno. Saiu do internato para viver na casa de Zana e Halim. "Viu os gmeos nascerem, cuidou do Yaqub, brincaram juntinhos...

    VIAGEM A ACAJATUBA O narrador e Domingas fizeram uma nica viagem de barco juntos: foram a Acajatuba, vila natal de Domingas. Na volta, um temporal provocou pnico e vmitos, aumentando a tristeza dela. Por alguma razo, ela no falava nos gmeos, muito menos em Yaqub. E isso aumentava as desconfianas do narrador.

    MENINO DE RECADOS O narrador tinha total liberdade na casa de Halim e Zana. Dificilmente se sentava mesa com os donos da casa, mas alimentava-se da mesma comida, andava por todos os ambientes, eles no se importavam. Os vizinhos, por meio de Zana, pediam-lhe favores: que fosse ali, acol, ele ia. s vezes, nem agradeciam nem davam dinheiro para o transporte.

    A PIOR VIZINHA A pior vizinha do narrador era Estelita Reinoso. Vivia pedindo a Zana que mandasse o filho da Domingas fazer isso ou aquilo. Demorou, mas um dia o narrador deu o seu grito de independncia: no serviria mais de mensageiro para Estelita. Halim concordou com ele.

  • ESTUDOS LITERRIOS

    11

    AS FILHAS DE TALIB Eram duas, cada uma mais bonita que a outra: Zahia e

    Nahda, a primeira mais assanhada que a segunda. O narrador, quando ia casa de Talib, faltava engolir Zahia com os olhos. "Talib me tacava uma cacholeta: Queres engolir minha filha, seu safado? Eu ficava acabrunhado, Zahia dava uma risada. No perdia uma noite em que elas danavam em casa, onde eram rivais de Rnia e rebolavam como nunca."

    SURRA NO PAI Certa vez, as filhas de Talib flagraram-no com uma cunh atrs do balco da Taberna Flores do Minho. Ele no esperava por isso, no acreditava que as filhas voltariam mais cedo da escola. "Deram uma sova no pai, ns ouvamos os urros do vivo ecoando no quarteiro, e quando me aproximei da casa eu o vi deitado na sala, escorjado sob os braos rolios e rijos das filhas, a voz de splica repetindo: S estava me divertindo um pouquinho, filhas....

    ATRITOS COM OMAR Omar discriminava o narrador. "Um dia, eu estava almoando quando ele se aproximou e deu a ordem: que eu sasse, fosse comer na cozinha. Halim estava por perto, me disse: No, come a mesmo, essa mesa de todos ns. O Caula bufava, depois se vingava de mim.

    VONTADE DE FUGIR As presses sobre o narrador eram muitas. Omar, quando chegava bbado, desrespeitava Domingas. O narrador pulava sobre ele e levava safanes e pesadas. Halim defendia-o, mas Zana ficava do lado do filho e contra o filho da empregada. A idia de fugir no lhe saa da cabea.

    ALM DOS LIMITES Omar chegava bbado todas as noites e dava trabalho para a me e para Domingas. Certa noite entrou em casa com uma moa do cortio da rua dos fundos, irm do Calisto. Fizeram uma festinha a dois. De manhzinha, Halim viu o filho e a moa, nus, dormindo no sof cinzento. Depois que a moa se vestiu e saiu, ele "se aproximou do filho, que fingia dormir, ergueu-o pelo cabelo, arrastou-o at a borda da mesa e ento eu vi o Omar , j homem feito, levar uma bofetada, uma s, a mozona do pai girando e caindo pesada como um remo no rosto do filho."

    YAQUB CASADO Yaqub, quando foi casar-se, noticiou o evento apenas com um telegrama. No revelou o nome da mulher. "Zana mordeu os lbios. Para ela, um filho casado era um filho perdido ou seqestrado. Fingiu-se desinteressada do nome da nora e cercou ainda mais o Caula, que ela atraa para si como um imenso m atrai limalhas."

    RNIA Rnia, aos poucos, tornou-se arredia, retrada, enclausurada. Depois das oito horas da noite, resguardava-se do mundo. No saa: no ia ao cinema, s praas, s casas vizinhas. Ningum sabia por qu. Com o tempo, tornou-se tima negociante, uma vendedora arguta. Rasgava as cartasa de todos os pretendentes. S se mostrava numa nica noite do ano: no aniversrio da me.

    OMAR E DLIA Tudo aconteceu no aniversrio de Zana. Omar apareceu com uma mulher nunca vista por ali. Chamava-se Dlia e tinha uma beleza incomum. To logo a viram, me, filha e as duas Talib ficaram enciumadas. Rnia, humilhada, nem esperou o momento do parabns: retirou-se para o quarto sem os costumeiros elogios de outros anos. As Talib danaram, mas tiveram os movimentos sensuais obscurecidos pela dana

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    AS FILHAS DE TALIB Eram duas, cada uma mais bonita que a outra: Zahia e

    Nahda, a primeira mais assanhada que a segunda. O narrador, quando ia casa de Talib, faltava engolir Zahia com os olhos. "Talib me tacava uma cacholeta: Queres engolir minha filha, seu safado? Eu ficava acabrunhado, Zahia dava uma risada. No perdia uma noite em que elas danavam em casa, onde eram rivais de Rnia e rebolavam como nunca."

    SURRA NO PAI Certa vez, as filhas de Talib flagraram-no com uma cunh atrs do balco da Taberna Flores do Minho. Ele no esperava por isso, no acreditava que as filhas voltariam mais cedo da escola. "Deram uma sova no pai, ns ouvamos os urros do vivo ecoando no quarteiro, e quando me aproximei da casa eu o vi deitado na sala, escorjado sob os braos rolios e rijos das filhas, a voz de splica repetindo: S estava me divertindo um pouquinho, filhas....

    ATRITOS COM OMAR Omar discriminava o narrador. "Um dia, eu estava almoando quando ele se aproximou e deu a ordem: que eu sasse, fosse comer na cozinha. Halim estava por perto, me disse: No, come a mesmo, essa mesa de todos ns. O Caula bufava, depois se vingava de mim.

    VONTADE DE FUGIR As presses sobre o narrador eram muitas. Omar, quando chegava bbado, desrespeitava Domingas. O narrador pulava sobre ele e levava safanes e pesadas. Halim defendia-o, mas Zana ficava do lado do filho e contra o filho da empregada. A idia de fugir no lhe saa da cabea.

    ALM DOS LIMITES Omar chegava bbado todas as noites e dava trabalho para a me e para Domingas. Certa noite entrou em casa com uma moa do cortio da rua dos fundos, irm do Calisto. Fizeram uma festinha a dois. De manhzinha, Halim viu o filho e a moa, nus, dormindo no sof cinzento. Depois que a moa se vestiu e saiu, ele "se aproximou do filho, que fingia dormir, ergueu-o pelo cabelo, arrastou-o at a borda da mesa e ento eu vi o Omar , j homem feito, levar uma bofetada, uma s, a mozona do pai girando e caindo pesada como um remo no rosto do filho."

    YAQUB CASADO Yaqub, quando foi casar-se, noticiou o evento apenas com um telegrama. No revelou o nome da mulher. "Zana mordeu os lbios. Para ela, um filho casado era um filho perdido ou seqestrado. Fingiu-se desinteressada do nome da nora e cercou ainda mais o Caula, que ela atraa para si como um imenso m atrai limalhas."

    RNIA Rnia, aos poucos, tornou-se arredia, retrada, enclausurada. Depois das oito horas da noite, resguardava-se do mundo. No saa: no ia ao cinema, s praas, s casas vizinhas. Ningum sabia por qu. Com o tempo, tornou-se tima negociante, uma vendedora arguta. Rasgava as cartasa de todos os pretendentes. S se mostrava numa nica noite do ano: no aniversrio da me.

    OMAR E DLIA Tudo aconteceu no aniversrio de Zana. Omar apareceu com uma mulher nunca vista por ali. Chamava-se Dlia e tinha uma beleza incomum. To logo a viram, me, filha e as duas Talib ficaram enciumadas. Rnia, humilhada, nem esperou o momento do parabns: retirou-se para o quarto sem os costumeiros elogios de outros anos. As Talib danaram, mas tiveram os movimentos sensuais obscurecidos pela dana

  • ESTUDOS LITERRIOS

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    inesperada de Dlia, com direito a beijo teatral de Omar no final. Zana no quis parabns, no se importou com o bolo. Todos se retiraram, e as duas rivais comearam a recolher as coisas da mesa. Omar estava deitado na rede, l fora. De repente, Zana cochichou alguma coisa no ouvido de Dlia. Foi a gota d'gua. Ela se retirou batendo a porta, e Omar foi atrs dela.

    PLANO DE ZANA Para separa Omar de Dlia, Zana tentou convencer o filho doutor a hospedar o filho farrista. Ele quer se enganchar com uma sirigaita da Maloca, uma danarina que se exibiu na noite do meu aniversrio. Se ele no passar um tempo em So Paulo, vai abandonar tudo: os estudos, a casa, a famlia, escreveu ao engenheiro. Mas Yaqub negou abrigo ao irmo: no ia permitir que o irmo dormisse sob o seu teto. Que ele encontre o caminho dele, mas longe de mim, muito longe da minha seara.

    VINGANA DE ZANA Por intermdio do narrador, Zana ofertou dinheiro s tias de Dlia, e a moa desapareceu de Manaus. "Dlia sumiu da Maloca dos Bars, da casa na Vila Saturnino, da cidade. S assim o caula retornou ao lar: sem camisa e bbado.

    VIAGEM PARA SO PAULO Omar foi obrigado a viajar para So Paulo. "Ele viajou dando coices no ar, rebelde, enraivecido. Foram seis meses de quietude na casa, de alvio para Halim. Os livros do Caula, romances e poemas que ele lia na rede, caram nas minhas mos. Os livros, os cadernos, as canetas, tudo, menos o quarto, que era s dele, s para ele."

    DOMINGAS SAUDOSA Domingas, todos os dias, limpava os quartos vazios dos gmeos. Detinha-se em ambos, admirando o excesso de trastes de um e a falta de objetos suprfluos de outro. O narrador achava que a me admirava aquele contraste.

    O NARRADOR NO GALINHEIRO Graas ajuda de Halim, o narrador ingressou no Galinheiro dos Vndalos. "No liceu havia vestgios do Caula: ex-namoradas, histrias de algazarra, de cenas hericas, duelos, desafios. Nas paredes do banheiro havia inscries de sua autoria. Por onde passava, deixava um gesto ousado, de valentia, ou um epigrama qualquer, palavras de humor e ironia."

    OMAR SUMIU? Este captulo termina com o desaparecimento de Omar da penso onde morava, em So Paulo. Depois de comprovar que o irmo desaparecera misteriosamente, Yaqub decidiu no informar logo os familiares de Manaus. Havia a esperana de que ele reaparecesse de repente.

    5

    VISITA DE YAQUB Pela primeira vez, desde que se fora para So Paulo,

    Yaqub vinha visitar a famlia. Quando o narrador soube que ele ia chegar, sentiu uma coisa estranha. Se ele fosse seu pai, ento seria filho de um homem quase perfeito. Foram quatro dias de visita que aumentaram as dvidas do narrador. Ele e Yaqub passearam pela cidade, visitaram lugares que acendiam a memria do visitante, mas ele nada de substancial revelou sobre o ralacionamento com Domingas.

    ESTUDOS LITERRIOS

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    inesperada de Dlia, com direito a beijo teatral de Omar no final. Zana no quis parabns, no se importou com o bolo. Todos se retiraram, e as duas rivais comearam a recolher as coisas da mesa. Omar estava deitado na rede, l fora. De repente, Zana cochichou alguma coisa no ouvido de Dlia. Foi a gota d'gua. Ela se retirou batendo a porta, e Omar foi atrs dela.

    PLANO DE ZANA Para separa Omar de Dlia, Zana tentou convencer o filho doutor a hospedar o filho farrista. Ele quer se enganchar com uma sirigaita da Maloca, uma danarina que se exibiu na noite do meu aniversrio. Se ele no passar um tempo em So Paulo, vai abandonar tudo: os estudos, a casa, a famlia, escreveu ao engenheiro. Mas Yaqub negou abrigo ao irmo: no ia permitir que o irmo dormisse sob o seu teto. Que ele encontre o caminho dele, mas longe de mim, muito longe da minha seara.

    VINGANA DE ZANA Por intermdio do narrador, Zana ofertou dinheiro s tias de Dlia, e a moa desapareceu de Manaus. "Dlia sumiu da Maloca dos Bars, da casa na Vila Saturnino, da cidade. S assim o caula retornou ao lar: sem camisa e bbado.

    VIAGEM PARA SO PAULO Omar foi obrigado a viajar para So Paulo. "Ele viajou dando coices no ar, rebelde, enraivecido. Foram seis meses de quietude na casa, de alvio para Halim. Os livros do Caula, romances e poemas que ele lia na rede, caram nas minhas mos. Os livros, os cadernos, as canetas, tudo, menos o quarto, que era s dele, s para ele."

    DOMINGAS SAUDOSA Domingas, todos os dias, limpava os quartos vazios dos gmeos. Detinha-se em ambos, admirando o excesso de trastes de um e a falta de objetos suprfluos de outro. O narrador achava que a me admirava aquele contraste.

    O NARRADOR NO GALINHEIRO Graas ajuda de Halim, o narrador ingressou no Galinheiro dos Vndalos. "No liceu havia vestgios do Caula: ex-namoradas, histrias de algazarra, de cenas hericas, duelos, desafios. Nas paredes do banheiro havia inscries de sua autoria. Por onde passava, deixava um gesto ousado, de valentia, ou um epigrama qualquer, palavras de humor e ironia."

    OMAR SUMIU? Este captulo termina com o desaparecimento de Omar da penso onde morava, em So Paulo. Depois de comprovar que o irmo desaparecera misteriosamente, Yaqub decidiu no informar logo os familiares de Manaus. Havia a esperana de que ele reaparecesse de repente.

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    VISITA DE YAQUB Pela primeira vez, desde que se fora para So Paulo,

    Yaqub vinha visitar a famlia. Quando o narrador soube que ele ia chegar, sentiu uma coisa estranha. Se ele fosse seu pai, ento seria filho de um homem quase perfeito. Foram quatro dias de visita que aumentaram as dvidas do narrador. Ele e Yaqub passearam pela cidade, visitaram lugares que acendiam a memria do visitante, mas ele nada de substancial revelou sobre o ralacionamento com Domingas.

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    A VERDADE SOBRE OMAR Yaqub no contou a verdade para todos. Contou-a s para o pai, sentados mesa de um boteco. "O Caula enviou o primeiro carto-postal de Miami; depois enviou outros, de Tampa, Mobile e Nova Orleans, contando suas farras e peripcias em cada cidade. Yaqub rasgara todos os postais menos um, que entregou ao pai: Queridos mano e cunhada, Louisiana a Amrica em estado bruto e mesmo brutal, e o Mississipi o Amazonas desta paragem. Por que no do uma voltinha por aqui? Mesmo selvagem, Louisiana mais civilizada que vocs dois juntos. Se vierem, tratem de pintar o cabelo de loiro, assim vo ser superiores em tudo. Mano, a tua mulher, que j foi bonita, pode rejuvenescer com o cabelo dourado. E tu podes enriquecer muito, aqui na Amrica. Abraos do mano e cunhado Omar.

    FUGA ESPETACULAR Omar roubara o passaporte do irmo, roupas e algum dinheiro (oitocentos e vinte dlares) e partira para os Estados Unidos. Quem facilitou a entrada do irmo em casa foi a empregada. Mais ainda: Omar descobriu que a esposa secreta do irmo era Lvia, aquela que provocara a primeira briga sria entre os gmeos. Aproveitou a ausncia do irmo e desenhou obscenidades no lbum de casamento.

    A AJUDA DE YAQUB Em So Paulo, as coisas melhoraram muito para Yaqub. Ele mandou mveis novos para os pais e dinheiro para reformar a casa e a loja. O narrador e Rnia participaram ativamente das reformas, trabalhando de verdade. "Depois da reforma, Rnia tomou mais gosto pela loja. Mandava e desmandava, cuidava do caixa, do estoque e das dvidas dos caloteiros. Acabou de vez com a venda a fiado, uma filantropia que no combina com o comrcio.

    INDIFERENA DE OMAR Omar mostrava-se indiferente revoluo que o dinheiro do irmo vinha operando na casa e nos negcios dos pais. Continuava bomio e malandro, tendo a ajuda velada da me.

    MUDANA BRUSCA Omar, misteriosamente, mudou de vida: dormia regularmente, acordava cedo e ia trabalhar. Bem vestido, ganhou ares de executivo. A mudana provocou comentrios e desconfianas em casa e fora ela. Alguns apostavam em amor novo. A me dele no acreditava na hiptese. O Caula dizia que estava trabalhando num banco britnico.

    ME-DETETIVE Zana, desconfiada do comportamento de Omar, partiu para a pesquisa. O emprego no banco era uma farsa. O ingls com quem o filho andava, um contrabandista. E havia uma mulher. Com a ajuda de Zanuri, a me descobriu tudo. Ela tinha o apelido de Pau-Mulato porque era grande e escura.

    DESPEDIDA GROSSEIRA Omar preparou-se para deixar a casa dos pais e viver com a Pau-Mulato. A despedida foi agressiva: A senhora tem o outro filho, que s d gosto e tem bom posto. Agora a minha vez de viver... Eu e a minha mulher, longe da senhora... Ergueu a cabea e gritou para o pai: Longe do senhor tambm, longe dessa casa... de todos. No venham atrs de mim, no adianta....

    ESTUDOS LITERRIOS

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    A VERDADE SOBRE OMAR Yaqub no contou a verdade para todos. Contou-a s para o pai, sentados mesa de um boteco. "O Caula enviou o primeiro carto-postal de Miami; depois enviou outros, de Tampa, Mobile e Nova Orleans, contando suas farras e peripcias em cada cidade. Yaqub rasgara todos os postais menos um, que entregou ao pai: Queridos mano e cunhada, Louisiana a Amrica em estado bruto e mesmo brutal, e o Mississipi o Amazonas desta paragem. Por que no do uma voltinha por aqui? Mesmo selvagem, Louisiana mais civilizada que vocs dois juntos. Se vierem, tratem de pintar o cabelo de loiro, assim vo ser superiores em tudo. Mano, a tua mulher, que j foi bonita, pode rejuvenescer com o cabelo dourado. E tu podes enriquecer muito, aqui na Amrica. Abraos do mano e cunhado Omar.

    FUGA ESPETACULAR Omar roubara o passaporte do irmo, roupas e algum dinheiro (oitocentos e vinte dlares) e partira para os Estados Unidos. Quem facilitou a entrada do irmo em casa foi a empregada. Mais ainda: Omar descobriu que a esposa secreta do irmo era Lvia, aquela que provocara a primeira briga sria entre os gmeos. Aproveitou a ausncia do irmo e desenhou obscenidades no lbum de casamento.

    A AJUDA DE YAQUB Em So Paulo, as coisas melhoraram muito para Yaqub. Ele mandou mveis novos para os pais e dinheiro para reformar a casa e a loja. O narrador e Rnia participaram ativamente das reformas, trabalhando de verdade. "Depois da reforma, Rnia tomou mais gosto pela loja. Mandava e desmandava, cuidava do caixa, do estoque e das dvidas dos caloteiros. Acabou de vez com a venda a fiado, uma filantropia que no combina com o comrcio.

    INDIFERENA DE OMAR Omar mostrava-se indiferente revoluo que o dinheiro do irmo vinha operando na casa e nos negcios dos pais. Continuava bomio e malandro, tendo a ajuda velada da me.

    MUDANA BRUSCA Omar, misteriosamente, mudou de vida: dormia regularmente, acordava cedo e ia trabalhar. Bem vestido, ganhou ares de executivo. A mudana provocou comentrios e desconfianas em casa e fora ela. Alguns apostavam em amor novo. A me dele no acreditava na hiptese. O Caula dizia que estava trabalhando num banco britnico.

    ME-DETETIVE Zana, desconfiada do comportamento de Omar, partiu para a pesquisa. O emprego no banco era uma farsa. O ingls com quem o filho andava, um contrabandista. E havia uma mulher. Com a ajuda de Zanuri, a me descobriu tudo. Ela tinha o apelido de Pau-Mulato porque era grande e escura.

    DESPEDIDA GROSSEIRA Omar preparou-se para deixar a casa dos pais e viver com a Pau-Mulato. A despedida foi agressiva: A senhora tem o outro filho, que s d gosto e tem bom posto. Agora a minha vez de viver... Eu e a minha mulher, longe da senhora... Ergueu a cabea e gritou para o pai: Longe do senhor tambm, longe dessa casa... de todos. No venham atrs de mim, no adianta....

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    HALIM x AZAZ Azaz, um desocupado, andou espalhando calnias sobre Halim: que ele tinha filhos com as ndias, com a de casa (referia-se a Domingas) e com outras. Halim marcou um duelo em praa pblica era moda na poca. A luta foi sangrenta: Azaz com uma navalha, Halim com uma corrente. Os dois saram feridos, mas Halim venceu.

    BUSCA INCESSANTE Omar e a Pau-Mulato sumiram de vez. Primeiro, a procura da me; depois, de Halim. Todos os esforos fracassaram. O casal desapareceu. O faro do Perna-de-Sapo desfez o mistrio. Os dois moravam em um barquinho, no porto da Escadaria, viviam da pesca e dos donativos dos ribeirinhos. "Ela, a Pau-Mulato, dando uma de cartomante, lendo a mo calosa dos ribeirinhos, recebendo farinha e moedas em troca de destinos fantasiosos."

    FRIA DE OMAR Quando Omar descobriu que o pai, por meio do Perna-de-Sapo, conseguiu localiz-lo, ficou furioso. Com uma corrente nas mos, destruiu espelhos, quebrou mveis, rasgou fotografias. Acusava o pai e me de culpados. Halim no estava em casa. Omar xingou a me, a irm, o narrador (filho duma gua, interesseiro, puxa-saco de Halim). O narrador, j adulto, preparou-se para uma briga de vida ou morte, mas Omar foi amolecendo at ser totalmente dominado por Zana.

    DESABAFO DE HALIM Halim desabafou todas as mgoas ao narrador. Punha a culpa de tudo que aconteceu esposa. Zana, aos poucos, foi dominando Omar, sugando-lhe alma e corao, deixando-o dependente dela. At o amor pelo marido e os momentos de prazer foram substitudos por essa ateno doentia dedicada ao Caula. Omar tornara-se, com o passar do tempo, o arqui-rival de Halim.

    7

    PRISO E MORTE DE LAVAL O professor Laval (poeta cujos versos

    estavam espalhados pelas mos dos alunos do Liceu Rui Barbosa) foi preso por soldados do Exrcito em plena praa pblica. "Foi humilhado no centro da praa das Accias, esbofeteado como se fosse um co vadio merc da sanha de uma gangue feroz". Dois dias depois, o professor estava morto.

    O RETORNO INESPERADO DE YAQUB Sem prvio aviso, Yaqub retornou a Manaus. Domingas foi acolh-lo e, na viso do narrador, o abrao entre os dois foi o mais demorado daquela casa. Ele estava expansivo, cheio de intimidades com Domingas, e vrias vezes pronunciou o nome do narrador.

    DOIS DOENTES: ATENES DIVIDIDAS Omar e o narrador adoeceram a um s tempo por causa da morte do professor Laval. Zana dedicou atenes ao Caula; Domingas, Yaqub e Halim ficaram cabeceira do narrador que, naquela poca, alcanava a maioridade. Quando a doena cedeu, Yaqub j tinha viajado para So Paulo.

    RNIA E O NARRADOR Certo sbado, Rnia convocou o narrador para uma faxina geral no depsito da loja. Ele atendeu prontamente. Coisas velhas pertencentes ao

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    HALIM x AZAZ Azaz, um desocupado, andou espalhando calnias sobre Halim: que ele tinha filhos com as ndias, com a de casa (referia-se a Domingas) e com outras. Halim marcou um duelo em praa pblica era moda na poca. A luta foi sangrenta: Azaz com uma navalha, Halim com uma corrente. Os dois saram feridos, mas Halim venceu.

    BUSCA INCESSANTE Omar e a Pau-Mulato sumiram de vez. Primeiro, a procura da me; depois, de Halim. Todos os esforos fracassaram. O casal desapareceu. O faro do Perna-de-Sapo desfez o mistrio. Os dois moravam em um barquinho, no porto da Escadaria, viviam da pesca e dos donativos dos ribeirinhos. "Ela, a Pau-Mulato, dando uma de cartomante, lendo a mo calosa dos ribeirinhos, recebendo farinha e moedas em troca de destinos fantasiosos."

    FRIA DE OMAR Quando Omar descobriu que o pai, por meio do Perna-de-Sapo, conseguiu localiz-lo, ficou furioso. Com uma corrente nas mos, destruiu espelhos, quebrou mveis, rasgou fotografias. Acusava o pai e me de culpados. Halim no estava em casa. Omar xingou a me, a irm, o narrador (filho duma gua, interesseiro, puxa-saco de Halim). O narrador, j adulto, preparou-se para uma briga de vida ou morte, mas Omar foi amolecendo at ser totalmente dominado por Zana.

    DESABAFO DE HALIM Halim desabafou todas as mgoas ao narrador. Punha a culpa de tudo que aconteceu esposa. Zana, aos poucos, foi dominando Omar, sugando-lhe alma e corao, deixando-o dependente dela. At o amor pelo marido e os momentos de prazer foram substitudos por essa ateno doentia dedicada ao Caula. Omar tornara-se, com o passar do tempo, o arqui-rival de Halim.

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    PRISO E MORTE DE LAVAL O professor Laval (poeta cujos versos

    estavam espalhados pelas mos dos alunos do Liceu Rui Barbosa) foi preso por soldados do Exrcito em plena praa pblica. "Foi humilhado no centro da praa das Accias, esbofeteado como se fosse um co vadio merc da sanha de uma gangue feroz". Dois dias depois, o professor estava morto.

    O RETORNO INESPERADO DE YAQUB Sem prvio aviso, Yaqub retornou a Manaus. Domingas foi acolh-lo e, na viso do narrador, o abrao entre os dois foi o mais demorado daquela casa. Ele estava expansivo, cheio de intimidades com Domingas, e vrias vezes pronunciou o nome do narrador.

    DOIS DOENTES: ATENES DIVIDIDAS Omar e o narrador adoeceram a um s tempo por causa da morte do professor Laval. Zana dedicou atenes ao Caula; Domingas, Yaqub e Halim ficaram cabeceira do narrador que, naquela poca, alcanava a maioridade. Quando a doena cedeu, Yaqub j tinha viajado para So Paulo.

    RNIA E O NARRADOR Certo sbado, Rnia convocou o narrador para uma faxina geral no depsito da loja. Ele atendeu prontamente. Coisas velhas pertencentes ao

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    pai foram jogadas fora. "Ela agia com uma determinao feroz, consciente de que estava enterrando um passado." J era tarde da noite, e os dois continuavam trabalhando. "Quando Rnia se curvou para abrir uma caixa de lenis, vi os seios dela, morenos e suados, soltos na blusa branca sem mangas. Rnia demorou nessa posio, e eu fiquei paralisado ao v-Ia assim, recurvada, os ombros, os seios e os braos nus. Quando ela se ergueu, me olhou por uns segundos. Os lbios se moveram e a voz manhosa sussurrou, lentamente: Vamos parar?. Ela ofegava. E no se esquivou do meu corpo nem evitou meu abrao, meus afagos, os beijos que eu desejava fazia tanto tempo. Pediu que eu apagasse a luz, e passamos horas juntos naquele suadouro. Aquela noite foi uma das mais desejadas da minha vida."

    OMAR COM GONORRIA O caula agora demonstrava traos de sandice. Passava os dias no quintal, catando folhas e frutas podres, podando galhos de rvores, arrancando ervas-daninhas. Certa vez, quando foi urinar, soltou urros aterradores. Descobriram que estava com gonorria.

    OS PASSEIOS DE HALIM Halim saa por a, sem rumo certo, andando de rua em rua, de bar em bar, e o narrador tinha que lhe seguir os passos a pedido de Zana. Halim no se escondia: queria apenas andar. Quando voltava, contava histrias desencontradas: confundia quem se mudara com quem j morrera.

    A MORTE DE HALIM Os passeios eram rotineiros, mas Halim sempre voltava para casa. Numa noite de dezembro, vspera de Natal, ele sumiu de verdade. O narrador esgotou todas as opes para encontr-lo e voltou sozinho. Naquela noite, ningum dormiu, todos preocupados com o sumio de Halim. De manh cedo, ele estava no sof da sala, "calado, para sempre". A reao mais estranha diante do morto foi de Omar. Gritava com o pai, queria enfrent-lo, humilhava-o com palavras, o dedo em riste apontado para o rosto do morto. O narrador teve que arrastar o filho possesso para o quintal.

    8

    O APARECIMENTO DE ROCHIRAM Omar apareceu em casa com um

    indiano. Chamava-se Rochiram. Dizia-se construtor de hotis pelo mundo. Domingas antipatizou com ele primeira vista. Zana, aos poucos, foi ficando ntima do amigo do filho.

    CARTA PEDINDO PERDO Zana viu no indiano a oportunidade de aproximar os dois gmeos. Era o que ela mais queria na vida. Rochiram ia construir um hotel, Yaqub podia participar do projeto e Omar ajud-lo-ia. Por intermdio do narrador, fez uma carta para o filho de So Paulo: pedia-lhe perdo e compreenso. Queria que ele fizesse as pazes com Omar. A resposta veio, mas no deixou Zana animada. Yaqub interessou-se pela construo do hotel, mas no se mostrou interessado em fazer as pazes com Omar. Quando o caula soube do plano, ficou colrico.

    A AGRESSO DE OMAR Yaqub retornou a Manaus, mas ficou hospedado em um hotel. Certo dia, foi a casa rever Domingas e o narrador. Omar voltou de repente e, sem aviso, comeou a esmurrar o rosto de Yaqub e a dar-lhe chutes. O narrador interveio,

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    pai foram jogadas fora. "Ela agia com uma determinao feroz, consciente de que estava enterrando um passado." J era tarde da noite, e os dois continuavam trabalhando. "Quando Rnia se curvou para abrir uma caixa de lenis, vi os seios dela, morenos e suados, soltos na blusa branca sem mangas. Rnia demorou nessa posio, e eu fiquei paralisado ao v-Ia assim, recurvada, os ombros, os seios e os braos nus. Quando ela se ergueu, me olhou por uns segundos. Os lbios se moveram e a voz manhosa sussurrou, lentamente: Vamos parar?. Ela ofegava. E no se esquivou do meu corpo nem evitou meu abrao, meus afagos, os beijos que eu desejava fazia tanto tempo. Pediu que eu apagasse a luz, e passamos horas juntos naquele suadouro. Aquela noite foi uma das mais desejadas da minha vida."

    OMAR COM GONORRIA O caula agora demonstrava traos de sandice. Passava os dias no quintal, catando folhas e frutas podres, podando galhos de rvores, arrancando ervas-daninhas. Certa vez, quando foi urinar, soltou urros aterradores. Descobriram que estava com gonorria.

    OS PASSEIOS DE HALIM Halim saa por a, sem rumo certo, andando de rua em rua, de bar em bar, e o narrador tinha que lhe seguir os passos a pedido de Zana. Halim no se escondia: queria apenas andar. Quando voltava, contava histrias desencontradas: confundia quem se mudara com quem j morrera.

    A MORTE DE HALIM Os passeios eram rotineiros, mas Halim sempre voltava para casa. Numa noite de dezembro, vspera de Natal, ele sumiu de verdade. O narrador esgotou todas as opes para encontr-lo e voltou sozinho. Naquela noite, ningum dormiu, todos preocupados com o sumio de Halim. De manh cedo, ele estava no sof da sala, "calado, para sempre". A reao mais estranha diante do morto foi de Omar. Gritava com o pai, queria enfrent-lo, humilhava-o com palavras, o dedo em riste apontado para o rosto do morto. O narrador teve que arrastar o filho possesso para o quintal.

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    O APARECIMENTO DE ROCHIRAM Omar apareceu em casa com um

    indiano. Chamava-se Rochiram. Dizia-se construtor de hotis pelo mundo. Domingas antipatizou com ele primeira vista. Zana, aos poucos, foi ficando ntima do amigo do filho.

    CARTA PEDINDO PERDO Zana viu no indiano a oportunidade de aproximar os dois gmeos. Era o que ela mais queria na vida. Rochiram ia construir um hotel, Yaqub podia participar do projeto e Omar ajud-lo-ia. Por intermdio do narrador, fez uma carta para o filho de So Paulo: pedia-lhe perdo e compreenso. Queria que ele fizesse as pazes com Omar. A resposta veio, mas no deixou Zana animada. Yaqub interessou-se pela construo do hotel, mas no se mostrou interessado em fazer as pazes com Omar. Quando o caula soube do plano, ficou colrico.

    A AGRESSO DE OMAR Yaqub retornou a Manaus, mas ficou hospedado em um hotel. Certo dia, foi a casa rever Domingas e o narrador. Omar voltou de repente e, sem aviso, comeou a esmurrar o rosto de Yaqub e a dar-lhe chutes. O narrador interveio,

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    mas no conseguiu evitar a agresso. Antes de sair, Omar rasgou o projeto que o irmo deixou sobre a mesa.

    O ESTRAGO DA AGRESSO Domingas acompanhou Yaqub at o hospital. "Disse que o estado de Yaqub no era grave: a mo esquerda, sim, em frangalhos, dois dedos fraturados. Ia perder uns trs dentes, o rosto estava irreconhecvel, ele sentia dores terrveis nas costas e nos ombros. Pedira a Domingas que calasse o bico, que inventasse, dissesse a Zana: O teu filho teve de viajar s pressas para So Paulo.

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    CENAS DO PASSADO Domingas resolve contar ao narrador detalhes do

    nascimento dele. Quando tu nasceste, ela disse, seu Halim me ajudou, no quis me tirar da casa... Me prometeu que ias estudar. Tu eras neto dele, no ia te deixar na rua. Ele foi ao teu batismo, s ele me acompanhou. E ainda me pediu para escolher teu nome. Nael, ele me disse, o nome do pai dele. Eu achava um nome estranho, mas ele queria muito, eu deixei..." Domingas revelou ao filho que, numa determinada noite, Omar chegara bbado, entrara no quarto dela e estuprara-a.

    A SEMIDEMNCIA DE ZANA Depois que Omar sumiu, Zana passou a confundir as coisas. Vivia uma semidemncia de dar tristeza. Desafiava os amigos, incitava-os a ir procurar o seu Caula.

    A MORTE DE DOMINGAS Certa vez, a me do narrador no estava no quarto. Ele foi encontr-la no quarto de Omar, embrulhada com a prpria rede. "Vi o corpo que oscilava lentamente, comecei a chorar. Sentei no cho ao lado dela e fiquei ali, aturdido, sufocado. Durante o tempo que a contemplei, no vaivm da rede, rememorei as noites que dormimos abraados no mesmo quartinho que fedia a barata." O corpo de Domingas foi enterrado ao lado do de Halim, no jazigo da famlia.

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    O AMOR PELA CASA Rnia comprou um bangal em um dos bairros ao

    norte de Manaus. Zana resistiu: "nunca sairia da casa dela, nem morta deixaria as plantas, a sala com o altar da santa, o passeio matutino pelo quintal. No queria abandonar o bairro, a rua, a paisagem que contemplava do balco do quarto. Quando Rnia chegava da loja, a me se precipitava em dizer: Podes ir para o teu bangal, eu no arredo p daqui.

    MUDANA DEFINITIVA Um dia, Rnia partiu, "deixou a casa e seu quarto. Toda manh, a caminho da rua dos Bars, visitava a me. Dizia-lhe: O bangal est um brinco, mama. O teu quarto o mais espaoso, tem um quintalzinho para os animais, as plantas, e uma varandinha para estender a rede....

    AS CONFISSES DE ZANA Agora, moravam no casaro apenas o narrador e Zana. Ela, aos poucos, foi-lhe confidenciando segredos que poucos sabiam. Antes de vir para o Brasil, o nome dela era Zeina. s vezes, delirava, falando do filho ausente: Por que essa demora, querido? Por qu? Os outros j foram embora, agora s estamos ns em casa, ns dois....

    ESTUDOS LITERRIOS

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    mas no conseguiu evitar a agresso. Antes de sair, Omar rasgou o projeto que o irmo deixou sobre a mesa.

    O ESTRAGO DA AGRESSO Domingas acompanhou Yaqub at o hospital. "Disse que o estado de Yaqub no era grave: a mo esquerda, sim, em frangalhos, dois dedos fraturados. Ia perder uns trs dentes, o rosto estava irreconhecvel, ele sentia dores terrveis nas costas e nos ombros. Pedira a Domingas que calasse o bico, que inventasse, dissesse a Zana: O teu filho teve de viajar s pressas para So Paulo.

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    CENAS DO PASSADO Domingas resolve contar ao narrador detalhes do

    nascimento dele. Quando tu nasceste, ela disse, seu Halim me ajudou, no quis me tirar da casa... Me prometeu que ias estudar. Tu eras neto dele, no ia te deixar na rua. Ele foi ao teu batismo, s ele me acompanhou. E ainda me pediu para escolher teu nome. Nael, ele me disse, o nome do pai dele. Eu achava um nome estranho, mas ele queria muito, eu deixei..." Domingas revelou ao filho que, numa determinada noite, Omar chegara bbado, entrara no quarto dela e estuprara-a.

    A SEMIDEMNCIA DE ZANA Depois que Omar sumiu, Zana passou a confundir as coisas. Vivia uma semidemncia de dar tristeza. Desafiava os amigos, incitava-os a ir procurar o seu Caula.

    A MORTE DE DOMINGAS Certa vez, a me do narrador no estava no quarto. Ele foi encontr-la no quarto de Omar, embrulhada com a prpria rede. "Vi o corpo que oscilava lentamente, comecei a chorar. Sentei no cho ao lado dela e fiquei ali, aturdido, sufocado. Durante o tempo que a contemplei, no vaivm da rede, rememorei as noites que dormimos abraados no mesmo quartinho que fedia a barata." O corpo de Domingas foi enterrado ao lado do de Halim, no jazigo da famlia.

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    O AMOR PELA CASA Rnia comprou um bangal em um dos bairros ao

    norte de Manaus. Zana resistiu: "nunca sairia da casa dela, nem morta deixaria as plantas, a sala com o altar da santa, o passeio matutino pelo quintal. No queria abandonar o bairro, a rua, a paisagem que contemplava do balco do quarto. Quando Rnia chegava da loja, a me se precipitava em dizer: Podes ir para o teu bangal, eu no arredo p daqui.

    MUDANA DEFINITIVA Um dia, Rnia partiu, "deixou a casa e seu quarto. Toda manh, a caminho da rua dos Bars, visitava a me. Dizia-lhe: O bangal est um brinco, mama. O teu quarto o mais espaoso, tem um quintalzinho para os animais, as plantas, e uma varandinha para estender a rede....

    AS CONFISSES DE ZANA Agora, moravam no casaro apenas o narrador e Zana. Ela, aos poucos, foi-lhe confidenciando segredos que poucos sabiam. Antes de vir para o Brasil, o nome dela era Zeina. s vezes, delirava, falando do filho ausente: Por que essa demora, querido? Por qu? Os outros j foram embora, agora s estamos ns em casa, ns dois....

  • ESTUDOS LITERRIOS

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    A PERDA DA CASA Rochiram reapareceu e fez a proposta final: "a dvida dos

    dois irmos em troca da casa de Zana. No entanto, surpreendeu-se quando ele acrescentou: Seu irmo, o engenheiro, est plenamente de acordo. As coisas foram tiradas, e a casa ficou vazia. Zana mudou-se para o bangal da filha, e o narrador ficou sozinho.

    ADEUS TRISTE Zana, brao engessado, voltou casa vazia onde restava apenas o narrador. A filha trouxe-a, pedindo a Nael que cuidasse dela na sua ausncia. Nael distraiu-se, e Zana sumiu. Encontraram-na deitada no galinheiro, o brao doente meio arroxeado. Foi uma luta para coloc-lo num carro: no queria abandonar a casa. "Ela chorou, como se sentisse uma dor terrvel. Nunca mais voltou. Deitou-se em outro quarto, longe do porto, no lar que no era para ela."

    MORTE DE ZANA "Depois eu soube da hemorragia interna, e ainda a visitei numa clnica no bairro de Rnia. Ela me reconheceu, ficou me olhando. Ento soprou nomes e palavras em rabe que eu conhecia: a vida, Halim, meus filhos, Omar. Notei no seu rosto o esforo, a fora para murmurar uma frase em portugus, como se a partir daquele momento apenas a lngua materna fosse sobreviver. Mas quando Zana procurou minhas mos, conseguiu balbuciar: Nael... querido..."

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    CASA ROCHIRAM O casaro foi reformado e descaracterizado. A noite de

    inaugurao da Casa Rochiram "foi uma festa de estrondo, e na rua uma fila de carros pretos despejava polticos e militares de alta patente. Diz que veio gente importante de Braslia e de outras cidades, ntimos de Rochiram."

    HERANA PARA NAEL "No projeto da reforma, o arquiteto deixou uma passagem lateral, um corredorzinho que conduz aos fundos da casa. A rea que me coube, pequena, colada ao cortio, este quadrado no quintal. 'Tua herana', murmurou Rnia."

    PERSEGUIO A OMAR "Rnia, aos poucos, foi descobrindo que o irmo distante havia calculado o momento adequado para agir. Yaqub esperou a me morrer. Ento, com truz de pantera, atacou." Omar tentava fugir ao cerco da justia e ia contraindo dvidas para a irm pagar. At que sumiu de vez.

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    REENCONTRO COM OMAR Depois de muitas buscas vs, Rnia avistou

    Omar na praa das Accias. "Ficou paralisada. Estava magro, meio amarelo, barba de uma semana, o cabelo crespo com jeito de juba. Os braos cheios de arranhes, a testa avolumada por calombos. Os olhos fundos e acesos davam a impresso de um ser deriva, mesmo sem ter perdido totalmente a vontade ou a fora de recuperar uma coisa perdida."

    PRISO VIOLENTA "Rnia no teve tempo de se aproximar dele." Ouviu estampidos, viu pessoas correrem: eram trs policiais, e logo cinco, muitos. Uma caada. Viu o Caula levar uma coronhada no rosto, cair de costas e ser arrastado at a viatura. "Rnia correu ao encontro do irmo, viu no rosto dele um fio vermelho e grosso que a gua

    ESTUDOS LITERRIOS

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    A PERDA DA CASA Rochiram reapareceu e fez a proposta final: "a dvida dos

    dois irmos em troca da casa de Zana. No entanto, surpreendeu-se quando ele acrescentou: Seu irmo, o engenheiro, est plenamente de acordo. As coisas foram tiradas, e a casa ficou vazia. Zana mudou-se para o bangal da filha, e o narrador ficou sozinho.

    ADEUS TRISTE Zana, brao engessado, voltou casa vazia onde restava apenas o narrador. A filha trouxe-a, pedindo a Nael que cuidasse dela na sua ausncia. Nael distraiu-se, e Zana sumiu. Encontraram-na deitada no galinheiro, o brao doente meio arroxeado. Foi uma luta para coloc-lo num carro: no queria abandonar a casa. "Ela chorou, como se sentisse uma dor terrvel. Nunca mais voltou. Deitou-se em outro quarto, longe do porto, no lar que no era para ela."

    MORTE DE ZANA "Depois eu soube da hemorragia interna, e ainda a visitei numa clnica no bairro de Rnia. Ela me reconheceu, ficou me olhando. Ento soprou nomes e palavras em rabe que eu conhecia: a vida, Halim, meus filhos, Omar. Notei no seu rosto o esforo, a fora para murmurar uma frase em portugus, como se a partir daquele momento apenas a lngua materna fosse sobreviver. Mas quando Zana procurou minhas mos, conseguiu balbuciar: Nael... querido..."

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    CASA ROCHIRAM O casaro foi reformado e descaracterizado. A noite de

    inaugurao da Casa Rochiram "foi uma festa de estrondo, e na rua uma fila de carros pretos despejava polticos e militares de alta patente. Diz que veio gente importante de Braslia e de outras cidades, ntimos de Rochiram."

    HERANA PARA NAEL "No projeto da reforma, o arquiteto deixou uma passagem lateral, um corredorzinho que conduz aos fundos da casa. A rea que me coube, pequena, colada ao cortio, este quadrado no quintal. 'Tua herana', murmurou Rnia."

    PERSEGUIO A OMAR "Rnia, aos poucos, foi descobrindo que o irmo distante havia calculado o momento adequado para agir. Yaqub esperou a me morrer. Ento, com truz de pantera, atacou." Omar tentava fugir ao cerco da justia e ia contraindo dvidas para a irm pagar. At que sumiu de vez.

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    REENCONTRO COM OMAR Depois de muitas buscas vs, Rnia avistou

    Omar na praa das Accias. "Ficou paralisada. Estava magro, meio amarelo, barba de uma semana, o cabelo crespo com jeito de juba. Os braos cheios de arranhes, a testa avolumada por calombos. Os olhos fundos e acesos davam a impresso de um ser deriva, mesmo sem ter perdido totalmente a vontade ou a fora de recu