298
Maria Camila Loffredo DOttaviano Condomnios fechados na Regiªo Metropolitana de Sªo Paulo: fim do modelo centro rico versus periferia pobre? Tese apresentada Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Sªo Paulo, para a obtenªo do ttulo de Doutor em Arquitetura e Urbanismo `rea de Concentraªo: Habitat. Orientadora: Prof. Dra. Suzana Pasternak Sªo Paulo 2008

Dottaviano m c l Tese (1)

Embed Size (px)

DESCRIPTION

tese

Citation preview

  • Maria Camila Loffredo DOttaviano

    Condomnios fechados na

    Regio Metropolitana de So Paulo:

    fim do modelo centro rico versus periferia pobre?

    Tese apresentada Faculdade de

    Arquitetura e Urbanismo da Universidade

    de So Paulo, para a obteno do ttulo

    de Doutor em Arquitetura e Urbanismo

    rea de Concentrao: Habitat.

    Orientadora: Prof. Dra. Suzana Pasternak

    So Paulo

    2008

    id1056640 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • Autorizo a reproduo e divulgao total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrnico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

    E-mail: [email protected]

    DOttaviano, Maria Camila Loffredo D725c Condomnios fechados na Regio Metropolitana de So Paulo: fim do modelo rico versus periferia pobre? / Maria Camila Loffredo DOttaviano. --So Paulo, 2008. 290 p : il. Tese (Doutorado rea de Concentrao: Habitat) FAUUSP. Orientadora: Suzana Paternak

    1.Condomnios fechados So Paulo (SP) 2.reas metropolitanas 3.Loteamento 3.Segregao urbana I.Ttulo

    CDU 711.63:711.582(816.11)

    Capas: Fotomontagem com imagens do livro Astrix L Domaine des Dieux (Asterix e a Morada dos Deuses) de . Goscinny e A. Uderzo (Paris: Hachette, 2000). Arte: Fernando Atique

  • III

    para

    Joo Beatriz

    Anna Clara e Kiko

    que fazem a busca por uma cidade

    melhor e mais justa valer a pena

    e

    Rubens

    que sem saber, plantou a semente do amor pela cidade

    id1154796 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • IV

  • V

    AGRADECIMENTOS

    Em primeiro lugar, gostaria de agradecer minha companheira

    principal nestes anos de pesquisa, a professora Suzana Pasternak, que

    alm de orientadora foi quem me abriu as portas da pesquisa urbana

    contempornea, da demografia, da sociologia urbana e de tantas

    outras realizaes pessoais e profissionais ao longo dos ltimos anos.

    Ao lado de Suzana, gostaria de agradecer professora Lcia Bgus,

    que me acolheu entusiasticamente na equipe do Observatrio das

    Metrpoles de So Paulo e foi essencial para o entendimento de muitas

    questes relacionadas cidade contempornea e para a realizao

    desta Tese.

    Embraesp e ao engenheiro Luiz Paulo Pompia, seu diretor, mais que

    um agradecimento, uma dvida acadmica, pois sem o uso dos dados

    fornecidos pela Embraesp, esta Tese no existiria.

    Ao professor Emilio Haddad, que alm de ter sido o caminho de

    chegada at a Embraesp, foi um interlocutor importante para o

    desenvolvimento das questes discutidas na Tese.

  • VI

    Aos professores do Nepo-Unicamp, Jos Marcos Cunha, Coleta Oliveira

    e Roberto do Carmo, que me receberam com carinho num ambiente de

    trabalho e pesquisa que no era o meu, e, em especial, Rosana

    Baeninger que foi o caminho de chegada ao Nepo e Abep e tem sido

    uma companheira querida de tantas outras atividades tambm.

    A Construtora Beraldi, em especial ao engenheiro Guilherme Aranha

    Beraldi, pela ateno, pelos dados e materiais cedidos.

    Aos meus amigos queridssimos, que de uma forma ou de outra

    contriburam para a realizao deste projeto, seja com idias,

    conversas, dicas, apoio nas horas do aperto, enfim, essas coisas que

    os amigos fazem: Nelson, Marcelo, R, Raquel, Debi, Pedro, Mrcia,

    Dani, Mrcio, Edu, Luciana, Leandro e tantos outros. E, em especial,

    ngela e ao Fernando, sem os quais com certeza esta Tese no teria a

    mesma cara, e ao Renato, que tem sido o meu anjo da guarda ...

    A todos os meus colegas do Observatrio das Metrpoles, mas,

    sobretudo Eliane, pelos mapas, dados e pacincia, ao Rafael e Carol,

    pela ajuda com a burocracia e com a correria do dia a dia.

    Aos meus colegas da Universidade So Francisco, especialmente

    Glacir, que durante os ltimos quatro anos tem sido uma companheira

    imprescindvel, tanto na vida de professora quanto na vida de

    pesquisadora.

    minha ex-aluna e colega Renata Matsumoto, pela ajuda tecnolgica

    especializada.

  • VII

    tia Linda, pelo exemplo de fora e perseverana.

    Gabriela e ao Fabrcio, pelo apoio mtuo, conversas interminveis e

    sonhos em comum.

    Aos meus pais, Roberto e tala, sem os quais jamais chegaria at aqui,

    seja pela formao humanista, pelo apoio incondicional ou pelos dias e

    noites com os netos.

    E por ltimo, no sem querer, ao Marcelo, que tem sido o meu

    companheiro de sonhos, realizaes, angustias, alegrias e conquistas.

    Aproveite, pois esta Tese sua tambm!

    Campinas, janeiro de 2008.

  • VIII

  • IX

    RESUMO

    DOTTAVIANO, Maria Camila Loffredo. Condomnios Fechados na Regio

    Metropolitana de So Paulo: fim do modelo centro rico versus periferia

    pobre?. Tese de Doutorado. So Paulo: Programa de Ps-Graduao em

    Arquitetura e Urbanismo. rea de Concentrao em Habitat. Faculdade de

    Arquitetura e Urbanismo da Universidade de So Paulo, 2008.

    Os condomnios e loteamentos fechados constituem um fenmeno urbano que

    vem se espalhando por todas as metrpoles brasileiras. Desde o final dos

    anos 1980, podemos observar um grande aumento no nmero de

    condomnios fechados dentro da Regio Metropolitana de So Paulo (RMSP).

    Os condomnios e loteamentos fechados, antes destinados moradia da

    classe alta e localizados em grandes reas das zonas perifricas da RMSP,

    atualmente atendem outras classes sociais e possuem caractersticas bastante

    distintas (tamanho da gleba, unidade habitacional, servios coletivos). A

    preocupao com conforto foi suplantada pela necessidade de segurana e

    pelo status.

    A proliferao desses loteamentos e condomnios fechados nos ltimos quinze

    anos vem modificando a configurao espacial de algumas reas da Regio

    Metropolitana. Segundo alguns autores, o padro centro rico versus periferia

    pobre, que caracterizou os estudos sobre a RMSP, entre os anos 1940 e 1980,

    alterou-se na ltima dcada para um modelo fractal de segregao.

    Esta Tese pretende verificar a pertinncia do novo modelo fractal de

    segregao espacial, tomando como referncia os condomnios horizontais

    residenciais fechados, e mostrar, a partir de levantamento realizado na

    Regio Metropolitana de So Paulo, que parte das premissas relativas aos

    condomnios fechados no so absolutas.

    Palavras-chave: regio metropolitana, segregao espacial, condomnios

    fechados, expanso urbana, fractal.

  • X

    ABSTRACT

    DOTTAVIANO, Maria Camila Loffredo. So Paulo Metropolitan Area Gated

    Communities: the end of the rich center versus poor suburbia pattern?.

    Tese de Doutorado. So Paulo: Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e

    Urbanismo. rea de Concentrao em Habitat. Faculdade de Arquitetura e

    Urbanismo da Universidade de So Paulo, 2008.

    Gated communities constitute an urban phenomenon that is nowadays

    spreading all over the Brazilian metropolis. Since the 1980s, we can observe

    an increasing number of gated communities within the So Paulo Metropolitan

    Area (SPMA).

    The gated communities, initially located at suburban areas and used by upper

    classes, at the present time serve other social classes and have new and

    distinct characteristics (size and location, houses sizes, services at the

    collective areas, etc). The initial concerning to comfort was substituted by the

    need of security and possibly the search for status.

    This Thesis analyses if the new fractal pattern of spatial segregation has

    overlapped the rich center X poor suburbia pattern that characterized the

    SPMA between 1940 and 1980, using the gated communities as case studies.

    And also pretends to demonstrate that part of the premises about gated

    communities is not absolute.

    Key words: metropolitan region, spatial segregation, gated communities,

    urban sprawl, fractal.

  • XI

    LISTA DE FIGURAS TESE

    Mapas

    MAPA 01 Municpios RMSP 69

    MAPA 02 Expanso da Mancha Urbana da RMSP - 1881/1995 74

    MAPA 03 Sistema Rodovirio RMSP 79

    MAPA 04 RMSP - Distribuio Famlias 1991 108

    MAPA 05 RMSP - Distribuio Famlias 2000 109

    MAPA 06 Lanamentos na RMSP por Ano 122

    MAPA 07 Lanamentos Horizontais na RMSP 1992-2005 129

    MAPA 08 Lanamentos na RMSP por nmero de banheiros 138

    MAPA 09 Lanamentos na RMSP por nmero de dormitrios 143

    MAPA 10 Lanamentos com Unidades de 2 Dormitrios e 1 Banheiro 146

    MAPA 11 Lanamentos com Unidades de 3 Dormitrios e 2 Banheiros 147

    MAPA 12 - Lanamentos com Unidades de 4 Dormitrios e 4 Banheiros 148

    MAPA 13 Lanamentos na RMSP por rea til 155

    Fotos

    FOTOS 1 e 2 Condomnio Grupo 1 no Butant 175

    FOTOS 3 e 4 Condomnios Grupo 1 em Ermelino Matarazzo 175

    FOTOS 5 e 6 Condomnio Grupo 2 no Butant 176

    FOTOS 7 e 8 Condomnio Grupo 3 em Vila Formosa 177

    FOTOS 9 e 10 Condomnio Grupo 4 na Vila Madalena 178

    FOTOS 11 a 16 - Condomnio Grupo 4 na Vila Carro 179-180

    FOTOS 17 a 20 Condomnio Solar de Munich Fotos do entorno 182

    FOTO 21 Condomnio Solar de Munich Vista do interior 197

    FOTOS 22 e 23 Condomnio Ermelino Matarazzo - Acesso e rea livre para

    estacionamento 204

  • XII

    Figuras

    FIGURA 01 Montagem imagens dos folhetos de vendas 183

    FIGURAS 02 e 03 Propaganda Condomnios Granja Viana publicada no jornal

    Folha de So Paulo 185

    FIGURA 04 Cond. na Granja Viana com dias mais verdes e seguros 186

    FIGURA 05 Condomnio que promete clima de casa de campo 187

    FIGURA 06 Destaque para as reas de lazer, com a promessa de diverso

    como em um clube 187

    FIGURA 07 Propaganda com condomnio de arquitetura exclusiva 188

    FIGURA 08 Vista area de lanamento prximo ao Parque do Carmo com

    financiamento pela Caixa Econmica Federal 189

    FIGURA 09 Folheto de propaganda com condomnio de casas amarelas

    geminadas na Granja Viana e que promete uma vida plena 191

    FIGURA 10 Solar da Paulicia - Planta do Conjunto 193

    FIGURA 11 Solar da Paulicia - Vista Geral do Conjunto 193

    FIGURA 12 Solar da Paulicia - Vista da rea de Lazer 194

    FIGURA 13 Solar da Paulicia - Planta da Unidade Residencial 194

    FIGURA 14 Solar de Munich - Planta do Conjunto 195

    FIGURA 15 Solar de Munich Planta da Unidade Residencial 196

    FIGURA 16 Solar de Munich - Vista Geral do Conjunto 196

    FIGURA 17 Solar de Munich - Vistas das reas de Lazer e Portaria 197

    FIGURA 18 Solar do Ablio Vista da Portaria 198

    FIGURA 19 Solar do Ablio - Planta do Conjunto 199

    FIGURA 20 Solar do Ablio - Planta da Unidade Residencial 199

    FIGURA 21 Solar do Ablio - Vista Geral do Conjunto 200

    FIGURA 22 Croqui planta sobrado com 4 dormitrios na Granja Viana 201 FIGURA 23 Croqui planta sobrado com 3 dormitrios na Granja Viana 201

  • XIII

    LISTA DE TABELAS

    Quadros

    QUADRO I Categorias Scio-Ocupacionais 102

    QUADRO II Perfil Famlias 1991-2000 105

    QUADRO III Base de Dados Embraesp 120

    QUADRO IV RMSP Legislao Condomnios Horizontais por Municpio 132

    Grficos

    GRFICO 01 Lanamentos por Ano 123

    GRFICO 02 Unidades por Ano 123

    GRFICO 03 Lanamentos - % Total Lanamentos por N de Banheiros 135

    GRFICO 04 Total de Lanamentos por N de Banheiros 136

    GRFICO 05 % Lanamentos por N de Dormitrios 140

    GRFICO 06 Total de Lanamentos por N de Dormitrios 141

    GRFICO 07 - % Lanamentos rea til por Ano 151

    GRFICO 08 - Lanamentos - rea til 152

    Tabelas

    TABELA 01 Municpios da Regio Metropolitana de So Paulo 69

    TABELA 02 - Populao e Taxas Anuais de Crescimento Geomtrico RMSP,

    Municpio de So e demais municpios 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991 e

    2000 70

    TABELA 03 Populao Municpios da RMSP 1970, 1980, 1991 e 2000 71

    TABELA 04.A - Taxas Anuais de Crescimento Geomtrico Municpios da

    RMSP 1970, 1980, 1991 e 2000 72

  • XIV

    TABELA 04.B - Taxas Anuais de Crescimento Geomtrico Municpios da

    RMSP 1970, 1980, 1991 e 2000 73

    TABELA 05 - Municpio de So Paulo. Taxas de crescimento populacional por

    anel, 1960-2000 75

    TABELA 06 - Populao ocupada em 1996 e 2001, por setor de atividade (o

    setor servios inclui servios financeiros) 77

    TABELA 07 Populao maior de 10 anos por Famlia 1991-2000 104

    TABELA 08 Diferenas por Famlia (pop > de 10 anos) 1991-2000 104

    TABELA 09 Lanamentos Condomnios Horizontais por Ano 121

    TABELA 10 Lanamentos Residenciais na RMSP por Tipo e por Ano 124

    TABELA 11 Mdia de Unidades por Empreendimento Horiz. e Vert. 125

    TABELA 12 Lanamentos Horizontais por Municpio 127

    TABELA 13 Lanamentos Verticais por Municpio 128

    TABELA 14 Lanamentos - N de Banheiros por Ano 134

    TABELA 15 Total de Unidades por N de Banheiros 137

    TABELA 16 Lanamentos - N de Dormitrios por Ano 139

    TABELA 17 Total de Unidades por N de Dormitrios 142

    TABELA 18 Lanamentos N de Dormitrios e N de Banheiros 144

    TABELA 19 Unidades N de Dormitrios e N de Banheiros 145

    TABELA 20 Lanamentos por rea til 149

    TABELA 21 - Lanamentos - rea til por Ano 151

    TABELA 22 Total de Unidades por rea til 154

    TABELA 23 - Lanamentos - rea til por Municpio 155

    TABELA 24 Lanamentos Total de Unidades 157

    TABELA 25 Lanamentos Tamanho da Gleba 158

    TABELA 26 RMSP Valores Mdios do M rea til em US$ 161

    TABELA 27 Municpio de SP Valores Mdios do M rea til em US$ 161

    TABELA 28 RMSP Valores Mdios (US$) por Nmero de Dormitrios 165

    TABELA 29 RMSP Valores Mdios (US$) por Nmero de Banheiros 165

    TABELA 30 RMSP Valores Mdios (US$) por Tipologia 166

  • XV

    LISTA DE FIGURAS ANEXO

    Mapas

    MAPA 1 Lanamentos Condomnios RMSP 1992 255

    MAPA 2 Lanamentos Condomnios RMSP 1993 256

    MAPA 3 Lanamentos Condomnios RMSP 1994 257

    MAPA 4 Lanamentos Condomnios RMSP 1995 258

    MAPA 5 Lanamentos Condomnios RMSP 1996 259

    MAPA 6 Lanamentos Condomnios RMSP 1997 260

    MAPA 7 Lanamentos Condomnios RMSP 1998 261

    MAPA 8 Lanamentos Condomnios RMSP 1999 262

    MAPA 9 Lanamentos Condomnios RMSP 2000 263

    MAPA 10 Lanamentos Condomnios RMSP 2001 264

    MAPA 11 Lanamentos Condomnios RMSP 2002 265

    MAPA 12 Lanamentos Condomnios RMSP 2003 266

    MAPA 13 Lanamentos Condomnios RMSP 2004 267

    MAPA 14 Lanamentos Condomnios RMSP 2005 268

    MAPA BASE - Sistema Virio Principal 269

    MAPA 15 Lanamentos RMSP com 1 Banheiro 270

    MAPA 16 Lanamentos RMSP com 2 Banheiros 271

    MAPA 17 Lanamentos RMSP com 3 Banheiros 272

    MAPA 18 Lanamentos RMSP com 4 Banheiros 273

    MAPA 19 Lanamentos RMSP com 5 Banheiros 274

    MAPA BASE - Sistema Virio Principal 275

    MAPA 20 Lanamentos RMSP com 1 Dormitrio 276

    MAPA 21 Lanamentos RMSP com 2 Dormitrios 277

    MAPA 22 Lanamentos RMSP com 3 Dormitrios 278

    MAPA 23 Lanamentos RMSP com 4 Dormitrios 279

    MAPA 24 Lanamentos RMSP com 5 Dormitrios 280

    MAPA BASE - Sistema Virio Principal 281

    MAPA 25 Lanamentos RMSP com at 75,00m de rea til 282

  • XVI

    MAPA 26 Lanamentos RMSP entre 75- 150,00 m de rea til 283

    MAPA 27 Lanamentos entre RMSP 150- 300,00 m de rea til 284

    MAPA 28 Lanamentos RMSP com mais de 300,00 m de rea til 285

    MAPA BASE - Sistema Virio Principal 286

    MAPA 29 Lanamentos RMSP com 2 Dormitrios e 1 Banheiro 287

    MAPA 30 Lanamentos RMSP com 3 Dormitrios e 2 Banheiros 288

    MAPA 31 Lanamentos RMSP com 4 Dormitrios e 4 Banheiros 289

    MAPA BASE - Sistema Virio Principal 290

  • XVII

    SUMRIO

    INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES 3

    MATERIAL E MTODOS 11

    CAPTULO 1

    SEGREGAO URBANA E OS CONDOMNIOS FECHADOS 17

    1.1. Os Conceitos de Segregao e a Cidade Global 22

    1.2. Cidades Divididas 28

    1.3. Os Subrbios Residenciais Norte-Americanos, a Bourgeois

    Utopia e as Gated Communities 35

    1.4. Os Condomnios Fechados como Paradigma de Segregao

    no Cone Sul Latino-Americano 52

  • XVIII

    CAPTULO 2

    A REGIO METROPOLITANA DE SO PAULO E OS CONDOMNIOS

    FECHADOS 65

    2.1. Condomnios X Loteamentos: Normatizao e Histrico 80

    2.2. Segregao Urbana na RMSP 87

    2.2.1. Segregao Fractal 87

    2.2.2. A Segregao Regionalizada 93

    2.2.3. A Anlise da Segregao Espacial a partir das

    Categorias Scio-Ocupacionais 99

    CAPTULO 3

    OS CONDOMNIOS NA RMSP: COMO, ONDE E DE QUE FORMA 117

    3.1. Localizao na RMSP 126

    3.2. Tipo de Unidade Dormitrios, banheiros e rea til 134

    3.3. Tipo de Empreendimento Total de unidades e tamanho

    da gleba 156

    3.4. Aspectos Financeiros Valor das Unidades 159

    3.5. Concluses Preliminares 168

  • XIX

    CAPTULO 4

    MORADORES E EMPREENDEDORES 171

    4.1. A Propaganda 183

    4.2. Os Projetos 192

    4.3. Os Moradores 202

    4.4. Os Empreendedores 206

    4.5. Novas (ou Velhas?) Tendncias 208

    CONSIDERAES FINAIS 211

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 229

    BIBLIOGRAFIA 233

  • Poderia falar de quantos degraus so feitas as ruas em

    forma de escada, da circunferncia dos arcos dos

    prticos, de quais lminas de zinco so recobertos os

    tetos: mas sei que seria o mesmo que no dizer nada.

    A cidade no feita disso, mas das relaes entre as

    medidas de seu espao e os acontecimentos do

    passado (...).

    A cidade se embebe como uma esponja dessa onda que

    reflui das recordaes e se dilata. Uma descrio de

    Zara como atualmente deveria conter todo o passado

    de Zara. Mas a cidade no conta seu passado, ela o

    contm como as linhas da mo, escrito nos ngulos das

    ruas, nas grades das janelas, nos corrimos das

    escadas, nas antenas dos pra-raios, nos mastros das

    bandeiras, cada segmento riscado por arranhes,

    serradelas, entalhes, esfoladuras.

    talo Calvino

    As Cidades InvisveisI

    id4686828 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • 1

    INTRODUO:

    OBJETIVOS E QUESTES

    id4741609 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES

    3

    O estudo da segregao espacial nas grandes cidades tem sido tema

    dos estudos urbanos desde o incio do sculo XX. Desde ento,

    urbanistas, planejadores, socilogos e gegrafos vm tentando

    entender o fenmeno e, tambm, identificar padres atravs dos quais

    a segregao se manifesta.

    Nas ltimas duas dcadas novos estudos1 apontam um novo padro de

    segregao espacial, sobretudo nas metrpoles globais: o padro

    fractal de segregao.

    Como um dos elementos estruturadores desse novo padro de

    segregao aparecem as reas residenciais auto-segregadas,

    separadas do entorno atravs de muros e aparatos de segurana: os

    condomnios fechados2.

    A terminologia pode variar de lugar para lugar - gated communities

    nos Estados Unidos, condominios no Chile, countries na Argentina ou

    condomnios fechados no Brasil porm, representa uma realidade

    que vem se espalhando nas grandes cidades ocidentais: so reas

    residenciais com acesso restrito, onde os espaos pblicos so

    normalmente privatizados (Blakely & Snyder 1995:04).

    1 Caldeira 2000, Kempen 1994/2002, Marcuse 1989/2002 e Marcuse & Kempen

    2000/2002, Mollenkopf & Castells 1991, Ribeiro 1997/2003, Sabatini 1998/2006,

    Sassen 1991, Svampa 2004. 2 Referem-se aos condomnios horizontais fechados, como explicado no Captulo 2.

    id5426031 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES

    4

    No caso das metrpoles brasileiras, os condomnios fechados

    representam um fenmeno urbano que vem se intensificando,

    sobretudo nos ltimos quinze anos. As caractersticas e proliferao

    desse modelo de moradia tm sido objeto de anlise cada vez mais

    freqente de estudiosos brasileiros e latino-americanos3.

    No contexto latino-americano, de pases em desenvolvimento, a

    segurana apontada como o principal motivo para a escolha da

    moradia em reas residenciais fechadas e providas de um vasto

    aparato de segurana. Poderamos, ento, supor que esse seria um

    padro residencial das classes altas em pases com grandes

    desigualdades sociais. No entanto, analisando a literatura

    contempornea sobre o assunto, podemos verificar que esta hiptese

    no se sustenta. Em Blakely & Snyder (1997) e Low (2003) podemos

    verificar que os condomnios fechados tm se tornado uma forma de

    morar cada vez mais presente mesmo em pases desenvolvidos (e, a

    princpio, com pouca desigualdade social).

    Os estudos apresentados por Caldeira (2000) trazem novas discusses

    para o entendimento dos enclaves fortificados que atualmente

    caracterizam vrias cidades brasileiras, especialmente na Regio

    Metropolitana de So Paulo. A partir de seu trabalho sobre a RMSP, a

    3 Caldeira 2000, Hidalgo 2004/2006, Lago 1998/2000, Ribeiro 1997, Sabatini

    1998/2000, Santos 2002, e Vidal-Koppman 2000/2001/2005/2006(1-2).

  • INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES

    5

    autora identifica trs diferentes momentos e expresses da segregao

    espacial no espao urbano da metrpole paulistana durante o sculo

    XX. O primeiro tipo de segregao compreendeu o perodo entre o final

    do sculo XIX e os anos 1940, quando tnhamos a cidade concentrada

    numa pequena mancha urbana, onde a segregao se resumia aos

    tipos de moradia. Dos anos 1940 at o final dos anos 1980, o modelo

    centro-periferia, ou centro rico versus periferia pobre, representou a

    segunda forma de segregao espacial metropolitana, quando as

    classes altas e mdias se concentravam nos bairros mais centrais,

    providos de maior infra-estrutura urbana, e as classes baixas foram

    expulsas para reas perifricas, precrias e distantes.4 O terceiro

    modelo vem surgindo nos ltimos quinze anos e representaria a

    superao do antigo modelo centro-periferia.

    Caldeira afirma que o padro centro rico versus periferia pobre

    (paradigma entre os anos 40 e 80) est sendo suplantado por um

    modelo fractal. Este padro vem gerando uma mudana nos padres

    de segregao residencial, de uma escala metropolitana para uma

    micro-escala (intra-urbana). Locais onde grupos sociais distintos esto

    fisicamente prximos, porm separados por muros e sistemas de

    segurana: Sobrepostas ao padro centro-periferia, as

    transformaes recentes esto gerando espaos nos quais os

    4 Ver Kowarick 1980/2000, Maricato 2001 e Rolnik 1990/1997.

  • INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES

    6

    diferentes grupos sociais esto muitas vezes prximos, mas esto

    separados por muros e tecnologias de segurana, e tendem a no

    circular ou interagir em reas comuns. O principal instrumento desse

    novo padro de segregao espacial o que chamo de enclaves

    fortificados, Trata-se de espaos privatizados, fechados e monitorados

    para residncia, consumo, lazer e trabalho. A sua principal justificao

    o medo do crime violento. Esses novos espaos atraem aqueles que

    esto abandonando a esfera pblica tradicional das ruas para os

    pobres, os marginalizados e os sem-teto. (Caldeira 2000:211).

    Nas ltimas dcadas, as diferenas histricas entre as reas centrais e

    perifricas da RMSP, em relao infra-estrutura instalada,

    diminuram de forma acentuada, com a difuso de alguns servios por

    todo o tecido metropolitano. Assim, se em 1980, 82% dos domiclios

    da metrpole estavam ligados rede pblica de gua, em 1991 esta

    percentual atingiu 95,42%, chegando a 96,32% em 2000. As ligaes

    rede pblica de esgotamento sanitrio passaram de 54,44% dos

    domiclios em 1980, para 82,18% em 1991 e para 86,73% em 2000. E

    o acesso energia eltrica tornou-se universal5. Assim, ao menos em

    princpio, a segregao centro-periferia perderia uma das suas

    razes, ou seja, o acesso diferencial aos servios urbanos.

    5 Fonte: IBGE - Censos Demogrficos de 1980, 1991 e 2000.

  • INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES

    7

    A proliferao dos loteamentos e condomnios fechados nos ltimos

    quinze anos, de fato, vem modificando a configurao espacial de

    algumas reas da Regio Metropolitana de So Paulo. Tericos

    estrangeiros tm defendido polticas de restrio ao uso de muros e

    grades (Marcuse 2004 e Sabatini 2004). Para a realidade brasileira

    esse ainda um desafio futuro. Neste momento, antes de discutir os

    malefcios ou formas de combater a segregao, devemos entender

    porque a moradia em condomnios fechados considerada pelo

    discurso da segurana a mais adequada.

    Muitos autores afirmam que o processo de globalizao6 aumentou as

    diferenas sociais nos pases em desenvolvimento e possivelmente tem

    contribudo para a expanso desse tipo de moradia. Entender a

    segregao espacial em determinada regio ou contexto scio-

    econmico pode ser um instrumento para o entendimento dos

    processos de estruturao urbana e social das cidades

    contemporneas, inclusive no que diz respeito aos mecanismos

    produtores de relaes de interao e sociabilidade entre grupos e

    classes sociais distintos (Bgus 2007).

    Apenas com o entendimento dos padres de segregao espacial

    existentes e suas manifestaes no contexto urbano/metropolitano

    podero ser desenvolvidas polticas pblicas que visem combater a 6 Friedmann 1996, Mollenkopf & Castells 1991, Ribeiro 1997/2003, Sassen 1991.

  • INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES

    8

    expanso desse fenmeno, tanto do ponto de vista espacial quanto

    social.

    O distrito de Vila Andrade, onde se encontra a favela Paraispolis, na

    cidade de So Paulo, um exemplo recorrente do padro fractal de

    segregao espacial. L, pode-se observar os barracos (que, alis,

    deixaram de ser barracos h bastante tempo) praticamente colados

    aos enormes muros dos grandes e luxuosos edifcios do Morumbi.

    Porm, ser que esse o modelo predominante nos diversos

    condomnios fechados construdos na regio nos ltimos quinze anos?

    Surgem algumas perguntas a serem respondidas nesta Tese:

    Os condomnios fechados da RMSP constituem, de fato, um

    exemplo de que a globalizao estaria efetivamente rompendo

    com o modelo de cidade que tnhamos at ento?

    Se a resposta questo anterior for afirmativa, a evidncia

    do modelo fractal (segmentao scioespacial em micro

    escala) dominante? Onde e por qu?

    Os condomnios fechados representam o fim do modelo

    centro rico versus periferia pobre, reforando a tese do modelo

    fractal?

  • INTRODUO: OBJETIVOS E QUESTES

    9

    O novo padro de desigualdade scio-espacial conduz a uma

    concentrao espacial das camadas mais poderosas e a uma

    diminuio dos espaos mais misturados?

    Se a infra-estrutura na metrpole de So Paulo no mais

    uma varivel determinante, quais seriam estas variveis e por

    qu?

    Os condomnios fechados, como resultado da dualidade social,

    so moradia exclusiva das classes ricas da metrpole?

    Este trabalho tem como hiptese que o modelo fractal de segregao

    espacial no o que melhor explica a realidade da segregao espacial

    na Regio Metropolitana de So Paulo.

    Como estudo de caso especfico, ser analisada a expanso dos

    condomnios horizontais fechados na Regio Metropolitana de So

    Paulo nos ltimos 30 anos, com suas especificidades e caractersticas

    principais, buscando entender de que forma a proliferao desse tipo

    de moradia, caracterizado pela negao do outro e do diverso, tem

    influenciado ou no o padro de segregao espacial metropolitano.

  • Marco Plo descreve uma ponte, pedra por pedra.

    - Mas qual a pedra que sustenta a ponte? Pergunta

    Kublai Khan.

    - A ponte no sustentada por esta ou aquela pedra

    responde Marco -, mas pela curva do arco que estas

    formam.

    Kublai Khan permanece em silncio, refletindo. Depois

    acrescenta:

    - Por que falar das pedras? S o arco me interessa.

    Plo responde:

    - Sem pedras o arco no existe.

    talo Calvino

    As Cidades InvisveisII

    id5539562 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • 11

    MATERIAIS E MTODOS

    id5589828 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • MATERIAIS E MTODOS

    13

    O estudo dos condomnios horizontais fechados, como um dos

    elementos estruturadores do padro de segregao espacial na Regio

    Metropolitana de So Paulo, foi dividido em duas etapas distintas de

    trabalho: uma de pesquisa terica e outra de anlise dos dados

    empricos.

    A pesquisa terica foi subdividida a partir de trs objetos especficos de

    anlise:

    I. As noes e conceitos relacionados ao estudo da segregao

    espacial e residencial;

    II. O estudo da ocorrncia de condomnios fechados em outros

    contextos urbanos que no o brasileiro;

    III. A anlise da produo terica relativa segregao

    espacial na Regio Metropolitana de So Paulo.

    O estudo dos conceitos relacionados segregao essencial, como

    base terica para a discusso do padro de segregao espacial

    existente na RMSP. Noes como cidades divididas, cidades

    fragmentadas ou cidade global so fundamentais para a discusso da

    segregao na cidade contempornea.

    Num segundo momento foi feita uma pesquisa bibliogrfica sobre os

    condomnios fechados em outros locais do Brasil e no exterior. Foi

    id5640187 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • MATERIAIS E MTODOS

    14

    encontrada uma vasta bibliografia, inclusive com trabalhos cientficos

    apresentados em congressos especficos sobre condomnios1. Aps

    uma pesquisa mais geral, a anlise foi focada em duas questes

    principais:

    . O estudo da consolidao do padro de segregao

    residencial suburbano das cidades inglesas e norte-americanas,

    como precursora dos condomnios fechados;

    . A realidade da segregao espacial em outras metrpoles

    latino-americanas, em especial na Argentina (Buenos Aires) e

    no Chile (Santiago), como forma de entender os padres de

    segregao urbana em outras metrpoles de pases em

    desenvolvimento, que historicamente concentram grande parte

    da atividade econmica do pas, como a RMSP.

    A ltima etapa da pesquisa terica foi delimitar as questes atuais

    relativas discusso da segregao espacial na RMSP como forma de

    inserir o objeto de estudo emprico, os condomnios fechados, no

    contexto dessa discusso.

    A segunda parte deste trabalho foi justamente a anlise dos dados

    empricos referentes aos condomnios fechados na RMSP. Para essa

    anlise, foram usadas trs fontes de dados: a base de dados da

    1 Cinar et al. 2006, Oskan & Kozaman 2006, Robert 2006 e Rodriguez 2006.

  • MATERIAIS E MTODOS

    15

    Empresa Brasileira de Estudos de Patrimnio (Embraesp), relativa aos

    lanamentos residenciais na regio metropolitana; levantamento de

    campo sobre os condomnios fechados; e entrevistas com moradores e

    empreendedores.

    A Embraesp mantm uma base de dados com todos os lanamentos

    imobilirios na RMSP desde 1985. A partir dessa base de dados foi

    feita uma anlise sobre a tipologia dos condomnios e de suas unidades

    residenciais (tamanho da gleba, tamanho das unidades, quantidade de

    unidades, nmero de quartos e de banheiros, etc).

    Numa segunda fase, esses dados foram georeferenciados. Dessa

    forma, essa etapa foi justamente a elaborao de mapas temticos

    com a espacializao dos lanamentos na metrpole, com o intuito de

    instrumentalizar a anlise da segregao espacial metropolitana.

    Foi possvel, ento, elaborar um diagnstico dos condomnios na RMSP

    em funo de suas caractersticas especficas, que serviu de base para

    o levantamento de campo. Foram selecionados alguns condomnios

    com caractersticas diferenciadas (nmero de quartos, dimenso das

    unidades residenciais, etc) nas vrias regies da metrpole (norte, sul,

    leste e oeste) para o levantamento.

    Com o levantamento de campo foram recolhidas informaes

    adicionais sobre cada um dos condomnios: caractersticas das reas

  • MATERIAIS E MTODOS

    16

    de lazer, tipo de sistema de segurana instalado, configurao dos

    espaos coletivos de uso comum.

    A terceira e ltima etapa consistiu na realizao de entrevistas com

    moradores e empreendedores. Nessa etapa, optou-se por centralizar a

    pesquisa na zona leste da cidade de So Paulo, devido s

    caractersticas peculiares dos condomnios ali instalados. Tambm

    foram realizadas algumas entrevistas com moradores de condomnios

    da regio sudoeste da capital, porm em menor quantidade.

    Por ltimo foram realizadas entrevistas com construtores e arquitetos

    responsveis por alguns dos projetos de condomnios horizontais

    estudados, como forma de identificar a lgica da demanda por esse

    tipo de projeto.

  • Before I built a wall Id ask to know

    what I was walling in or walling out

    And whom I was like to give offense

    Robert Lee FrostIII

    id5691828 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • 17

    CAPTULO 1 Segregao Urbana

    e os Condomnios Fechados

    id5748812 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    19

    Autor: Angeli Folha de So Paulo 08.janeiro.2008

    A expresso segregao urbana parece muitas vezes prescindir de

    explicao. A separao de grupos sociais no espao urbano uma

    realidade histrica j bastante estudada.

    Marcuse (2002) afirma que os bairros residenciais segregados e

    fechados no constituem uma configurao urbana recente. Cidades

    partidas, divididas, dualizadas, polarizadas ou fragmentadas no

    id5801406 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    20

    representam um fenmeno historicamente novo, resultante da

    globalizao ou da economia ps-fordista. Ao longo da histria, as

    cidades sempre foram divididas. Essas divises, em geral, refletiam as

    caractersticas de cada momento histrico e de sua formao social

    especfica.

    O modelo urbano proposto por Hippodamo de Mileto, no sculo V aC.,

    j pressupunha uma cidade dividida social e espacialmente. Segundo

    Aristteles, Hippodamo imaginou uma cidade de dez mil habitantes,

    divididas em trs classes, uma composta de artesos, outra de

    agricultores, a terceira de guerreiros; o territrio deveria ser

    igualmente dividido em trs partes, uma consagrada aos deuses, uma

    pblica e uma reservada s propriedades individuais. E inventou a

    diviso regular das cidades. (Poltica, II, 1267b apud Benevolo 1993)

    Durante a Idade Mdia, as muralhas eram no s uma barreira fsica e

    militar, mas tinham tambm um valor simblico, de unidade e

    segurana para a populao. Contra os ataques sbitos, uma muralha

    de guarda durante todas as horas, era mais til que qualquer

    quantidade de coragem militar. (Munford 1982:274)

    O modelo da muralha como forma de proteo da sociedade urbana foi

    usado pela primeira vez para segregar espacialmente uma comunidade

    especfica em Veneza, com o gueto judeu, no sculo XVI.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    21

    No plano delineado em 1915, por Zacaria Dolfin, os judeus ficariam

    fechados dentro de um espao urbano semelhante a um castelo,

    separados dos demais cidados venezianos: Enviar todos eles para

    viver no Gueto Novo, que como um castelo, e construir uma ponte

    levadia, encerrando-o com um muro; um nico porto dar acesso ao

    exterior; o Conselho do Dez manter dois barcos para garantir sua

    segurana. Mas eles tero que pagar por este servio. (apud Sennett

    1997:195) A garantia de segurana era dada aos venezianos,

    enquanto os judeus estivessem encerrados no castelo.

    Era o momento em Veneza perdia seu monoplio comercial com o

    oriente, e os judeus eram vistos como uma ameaa sociedade crist

    consolidada. Conforme aponta Sennett, fechando os judeus no gueto,

    os venezianos acreditavam estar isolando o mal que infectara a

    comunidade crist (...) a segregao dos diferentes, que no mais

    poderiam ser tocados nem precisavam ser vistos, traria a paz e a

    dignidade de volta. (1997:182-183). Os judeus foram confinados em

    uma ilha ao norte da cidade. Os edifcios eram construdos voltados

    para um espao central aberto. No final da tarde os judeus que por

    ventura tivessem passado o dia na cidade deveriam voltar a suas

    casas. As duas nicas pontes que ligavam a ilha malha urbana eram

    fechadas, as janelas viradas para o exterior eram igualmente fechadas

    e os balces retirados. Do lado de fora, o gueto se assemelhava s

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    22

    muralhas de um castelo, com os canais circundantes, que faziam o

    papel de fosso medieval, vigiados durante toda a noite.

    A segregao espacial, no entanto, s contribuiu para aumentar a

    estranheza do cotidiano judeu, fazendo com que as vidas no crists

    fossem cada vez mais enigmticas para os poderes dominantes.

    (Sennett 1997:184)

    As abordagens e anlises sobre segregao espacial so bastante

    variadas. Como forma de sistematizao da discusso, acredito ser

    importante a discusso de diferentes abordagens da questo: as

    abordagens tericas de anlise da segregao, especialmente em

    relao ao papel da globalizao e seu reflexo na estrutura espacial

    das cidades contemporneas; a evoluo histrica das cidades

    divididas, chegando at a noo de cidade fragmentada desenvolvida

    por Marcuse (1989); e, por ltimo, apesar de cronologicamente

    deslocada, a anlise da consolidao do padro de expanso

    suburbano das cidades inglesas e norte-americanas, como precursor

    dos condomnios fechados.

    1.1. Os conceitos de Segregao e a Cidade Global

    O uso do termo segregao, como conceito, implica no entendimento

    da viso terica utilizada como base de anlise. Kempen (2002) e

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    23

    Bgus (2008) indicam algumas vises tericas principais para

    abordarmos o conceito de segregao:

    1. A partir da anlise social do espao da Escola de Chicago,

    desenvolvida por Robert Park e Ernest Burgess, onde a ecologia

    humana explicaria a distribuio da populao nas cidades1, a

    segregao seria a localizao especfica de determinado grupo social a

    partir de afinidades raciais, tnicas ou de posio social, sendo gerada

    por escolhas individuais de gosto e convenincia.

    2. A Sociologia Urbana Marxista dos anos 1960 e 1970, encontrada,

    sobretudo nos textos de Castells (2000), Lojkine (1972) e Harvey

    (1980), enfatiza o papel do Estado como agente social da estruturao

    urbana. O Estado como representante dos interesses das classes

    dominantes possuiria um papel central na diviso social do espao da

    cidade2. Villaa afirma ainda que a segregao um processo

    1 [Park e Burgess] Partiram da idia de existncia de reas naturais, a partir das

    quais se constituam comunidades homogneas, com sistemas de valores prprios e

    relaes simblicas especficas. Segundo Park (1926) essas reas naturais eram

    encontradas em todas as cidades americanas de certo tamanho e o modelo da

    ecologia seria a principal caracterstica das cidades, organizadas por crculos

    concntricos, por onde se distribuam as atividades administrativas, comerciais,

    industriais e residenciais. A existncia de um modo de vida urbano (Wirth, 1928)

    seria decorrncia dessa morfologia espacial, que permitia identificar as comunidades

    que viviam nas cidades, constituindo unidades de vizinhana com suas redes de ajuda

    mtua e de relaes sociais fundadas na reciprocidade. (Bgus 2008:2) 2 De acordo com outra concepo, inspirada na Sociologia Marxista, a segregao a

    expresso das desigualdades sociais circunscritas ao territrio das cidades como

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    24

    necessrio dominao social, econmica e poltica por meio do

    espao (2001:150).

    3. Dentro da noo de Cidade Global3, caracterizada pela dualidade

    social e espacial (Sassen 1991, Mollenkopf & Castells 1991, Sabatini

    1998 e Ribeiro 2003), a segregao entendida como a expresso das

    desigualdades sociais urbanas a partir da apropriao desigual da

    terra, bens e servios pelas diversas classes sociais. Segundo Sassen

    (1991) a disperso espacial e a integrao global criaram um novo tipo

    de estratgia para as grandes cidades (major cities). Com a

    identificao de cidades chaves usadas pelo capital global como

    pontos base na organizao espacial e na articulao da produo e

    dos mercados (Friedmann 1986), foi organizado um novo arranjo entre

    essas cidades globais dentro de uma complexa hierarquia espacial,

    onde so elas os locais prioritrios para a concentrao e acumulao

    do capital internacional. Muitos estudiosos (Sassen 1991, Mollenkopf &

    Castells 1991 e Prteceille 1994) afirmam que a formao das cidades

    manifestao da apropriao desigual de terras, bens e servios pelas diferentes

    classes sociais. Nesse sentido, a segregao residencial assumiria caractersticas

    especficas nas sociedades capitalistas, sendo fruto da luta de classes, responsvel

    pela apropriao desigual do territrio, dos bens de consumo, da habitao em suas

    diferentes formas. (Bgus 2008:2) 3 Patrick Geddes foi o primeiro estudioso a empregar o conceito de cidade mundial, j

    em 1915 (1994 ano da edio brasileira), como cidade com grande concentrao de

    negcios importantes do ponto de vista mundial.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    25

    globais traz tona as principais contradies do capitalismo industrial,

    entre elas a polarizao espacial e de classes.

    A hiptese da cidade global considera que as transformaes na

    atividade econmica das cidades contemporneas, onde a importncia

    da produo industrial suplantada pela oferta de servios

    especializados, vem gerando uma estrutura social polarizada, tanto em

    relao estrutura de empregos como em relao renda. A oferta de

    empregos estaria dividida em vagas com alta remunerao para

    pessoal qualificado e empregos muito mal remunerados e de baixa

    qualificao. A essas mudanas na estrutura de emprego

    corresponderia uma nova ordem espacial, tambm dual (a Dual City

    de Mollenkopf e Castells 1991). Castells e Mollenkopf afirmam tambm

    que a fragmentao social leva fragmentao urbana.

    No modelo da Cidade Global, a estrutura scio-espacial tradicional da

    cidade industrial estaria sendo substituda pela polarizao entre

    segmentos pobres e ricos, com o desaparecimento da classe operria

    tradicional e a reconfigurao das classes mdias. Segundo Ribeiro

    (2000:16), o ovo substitudo pela ampulheta com metfora da nova

    estrutura social, o que se expressa na existncia de um grande

    contingente de trabalhadores dos servios de pouca qualificao e

    baixa remunerao e de desempregados vivendo de virao, e de um

    pequeno segmento constitudo pelos novos profissionais da economia

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    26

    de servios e financeira (corretores, advogados, analistas de sistemas,

    especialistas em marketing, etc), altamente qualificados e muito bem

    remunerados.

    Considerando-se a noo mais geral de Cidade Global, algumas

    generalizaes podem ser feitas em relao segregao espacial,

    porm importante destacar a necessidade de entendimento da

    matriz scio-histrica de cada pas para o entendimento da segregao

    scio-espacial local de forma aprofundada.

    A discusso atual sobre os novos padres de segregao nas principais

    cidades latino-americanas tem se baseado no conceito de cidade-

    global. Autores como Svampa/Argentina (2004), Ribeiro/Brasil (2006)

    e Hidalgo/Chile (2004 e 2006) apontam a globalizao econmica, a

    reestruturao das relaes sociais sobre novas bases, crise do Estado,

    desindustrializao e crescente inseguridade urbana com o

    conseqente aumento das desigualdades e da excluso social

    (aumento das distncias entre ricos e pobres) como causa da

    intensificao da segregao espacial urbana. Os autores tomam

    como base o modelo de Cidade Dual delineado por Castells e

    Mollenkopf (1991), onde a estrutura social aproxima-se do formato de

    uma ampulheta, com mais ricos e pobres e praticamente sem classe

    mdia.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    27

    Segundo Ribeiro, a segregao espacial pode ser entendida de duas

    formas, como a diferena de localizao de um grupo em relao aos

    outros grupos ou como a existncia de chances desiguais de acesso

    aos bens materiais e simblicos materializados na cidade. (2005:94)

    Para Prteceille (1994) a teorizao mais elaborada sobre as cidades

    globais tem como hiptese central a existncia de um vnculo

    estrutural entre as transformaes econmicas e a dualizao social e

    urbana. O autor no concorda com a generalizao do aumento do

    dualismo apontando que, apesar do aumento da desigualdade de

    renda na cidade, as atividades mais globalizadas representam uma

    pequena parte do emprego total e determinadas ocupaes mdias, na

    realidade, sofreram aumento nos anos 80. A introduo de novas

    tecnologias aumenta a demanda por qualificao superior, mas

    tambm por categorias mdias tcnicas e qualificadas, no gerando

    necessariamente o efeito ampulheta. No caso de Paris, os espaos

    mais polarizados (ricos e pobres) concentram 42% da populao,

    enquanto a maior parte da populao, quase 60%, vive em espaos

    mais complexos (mdios). A principal caracterstica da Cidade Global

    seria a visibilidade do contraste social, fonte de tenses sociais e

    aumento da violncia.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    28

    1.2. Cidades Divididas

    Para Marcuse (1989), a diviso da cidade, incluindo suas

    manifestaes espaciais, pode ser vista sob trs perspectivas

    histricas:

    1. A histria da sociedade organizada, com hierarquias

    especficas e seus espaos delimitados.

    2. Nas divises particulares da cidade capitalista criadas pela

    produo capitalista do espao.

    3. Ou a partir do processo de transio da cidade fordista para

    a cidade ps-fordista, com sua magnitude, intensidade e forma

    de diviso particulares.

    A partir da anlise histrica e de seus estudos sobre Nova York,

    Marcuse (1989,2000 e 2002) elabora classificaes importantes em

    relao aos tipos de diviso existentes historicamente nas cidades, s

    tipologias de segregao residencial e de produo econmica e aos

    diversos tipos de espaos segregados existentes nas cidades

    contemporneas.

    Marcuse identifica trs principais tipos de diviso urbana ao longo da

    histria:

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    29

    . Diviso Cultural diviso feita a partir de diferenas de

    lngua, de etnia, ou por pas ou nacionalidade, tribo de origem,

    parentesco, religio, crenas ou mesmo estilo de vida.

    . Diviso por Funo diviso como resultado da lgica

    econmica, fsica ou organizacional. Por exemplo, a diviso

    entre fazendas ou fbricas de reas residenciais. O zoneamento

    a aceitao legal desse tipo de diviso.

    . Diviso por Status diviso como reflexo e reafirmao das

    relaes de poder, de dominao, explorao ou autoridade do

    Estado. Podemos tomar como exemplo os enclaves imperiais

    nas cidades coloniais da frica do Sul.

    Desde a revoluo industrial, no entanto, as divises espaciais no

    contexto urbano ocidental so resultado de divises por classe ou etnia

    (com exceo das sociedades socialistas do sculo XX e XXI).

    As divises por classe e raa so, em geral, hierrquicas, involuntrias,

    socialmente determinadas, rgidas, de excluso e incompatveis com o

    modo de vida urbano democrtico, mesmo que muitas vezes

    legitimado como diviso cultural.

    J as divises por etnia tendem a ser culturais e voluntrias,

    determinadas individualmente, de no excluso, e coerentes com um

    modo de vida urbana democrtico.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    30

    A espacializao dos vrios tipos de diviso espacial se manifesta na

    cidade contempornea de duas formas principais:

    . Como Guetos - concentraes espaciais involuntrias

    daqueles no fundo da hierarquia de poder e bem-estar,

    usualmente confinados a partir de uma caracterstica como cor,

    raa ou classe social (exemplo: campos de refugiados).

    . E como Enclaves - clusters voluntrios usualmente baseados

    na etnia, ligados ao status onde a solidariedade prov fora e

    oportunidade para uma mobilidade social ascendente. Estilo de

    vida e renda tambm podem definir um enclave. Segundo

    Abrahamson we shall use enclave to refer to concentrations of

    residents who do not have the same ethnic or minority status

    in the conventional sense, but who share a significant

    commonality based on wealth, life-style, or a combination of

    these attributes.4 (1996:01).

    A moradia em determinado enclave pode ser vista como fator de

    identidade e status, servindo como um carto de visitas que

    4 Para todas as citaes em ingls, ser feita uma traduo livre do texto como nota:

    Podemos usar enclave para nos referirmos a concentraes de moradores que no

    possuam a mesma etnia ou status inferior, no sentido convencional, mas que

    compartilhem uma vida em comunidade baseada em riqueza, estilo de vida ou a

    combinao de ambos.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    31

    identifica seu morador. Abrahamson afirma que a excluso e a

    discriminao sociais so necessrias para a manuteno do padro e

    do status das elites dos enclaves residenciais.

    Com a anlise especfica da realidade urbana de Nova York, Marcuse

    (1989) desenvolve o conceito de cidade fragmentada (quartered

    cities), onde os espaos so divididos de acordo com o tipo de

    moradia:

    . Luxury housing spots (reas de moradias de luxo) - enclaves

    ou prdios isolados ocupados pelas camadas que detm o

    poder e a riqueza. No possuem uma nica rea especfica com

    limites definidos dentro da cidade. A cidade menos

    importante como local de residncia do que como local de

    poder e de benefcios (ganho).

    . Gentrified city (cidade gentrificada) - a cidade renovada e

    remodelada, dos yuppies (profissionais liberais, diretores,

    tcnicos, etc).

    . Suburban city (cidade dos subrbios) - a cidade tradicional,

    moradia das famlias em expanso, reduto tradicional das

    classes mdias, trabalhadores bem pagos, pequena burguesia,

    etc.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    32

    . Tenement city (cidade operria) - cidade dos cortios e

    pequenas unidades habitacionais de aluguel, locus de operrios

    mal pagos, empregos irregulares com poucos benefcios ou

    chance de melhora, e da habitao social.

    . Abandonned city (cidade abandonada) - local dos excludos,

    dos sem teto, desempregados, da pobreza mais aguda.

    Para cada tipologia residencial corresponde uma rea especifica

    de carter econmico nas cidades:

    . Controlling City (Cidade de Controle) - locais das grandes

    decises, inclui uma rede de escritrios de alto padro e

    antigas manses em reas privilegiadas e delimitadas dentro

    do tecido urbano. reas de maior segurana e controle.

    . City of advanced services (cidade dos servios avanados) -

    escritrios na rea central, localizados em torres de alto padro

    (skyscraper center), com grande aparato tecnolgico, em reas

    delimitadas da cidade.

    . City of direct production (cidade da produo direta), inclui

    fbricas e suportes de servios avanados, escritrios do

    governo, escritrios de apoio das principais empresas,

    localizados em diferentes reas da regio metropolitana.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    33

    Subrbio industrial. Importncia do valor da terra na

    localizao.

    . City of unskilled work and the informal economy (cidade do

    trabalho sem qualificao e da economia informal) -

    manufatura de pequena escala, produo informal domstica.

    Inclui pequenas empresas, atacadistas, servios de consumo

    tecnologicamente atrasados e indstrias de imigrantes,

    localizados prximos s cidades de produo e se espalha por

    toda urbe.

    . Residual city (cidade residual) - a cidade da economia

    informal ilegal (a cidade dos NIMBY: not in my back yard).

    Cidade sem oportunidade de emprego, ou sub-emprego.

    Cidade das atividades menos legais e menos valorizadas dentro

    da economia informal. Compatvel com a cidade residencial

    abandonada.

    No contexto atual da cidade global ps-fordista, novas formas

    espaciais se consolidaram e velhos padres de segregao se

    intensificaram:

    a) Crescimento da cidade gentrificada e encolhimento da

    outras reas.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    34

    b) Crescimento da cidade abandonada, com aumento dos

    guetos.

    c) Mudana na dinmica das divises dos bairros, numa relao

    de tenso entre eles.

    d) Importncia das identidades dos bairros expressa no uso

    defensivo do espao.

    e) Barreiras criadas entre bairros ou quarteires (muros,

    cercas, etc).

    f) Instncias governamentais promovendo a diviso da cidade

    segundo interesses privados.

    As diferenas espaciais, do ponto de vista residencial, se manifestam e

    reforam posies na hierarquia de poder e fortuna, definida por um

    grupo muito restrito. A localizao da residncia passa a indicar

    caractersticas scio-econmicas do morador (nvel de renda/social). A

    segregao espacial difere os grupos sociais "numa relao na qual o

    bem-estar e poder de alguns dependem da pobreza e subordinao de

    outros" (Marcuse 1989:706). Esta nova viso se relaciona com as

    divises globais de trabalho e com os movimentos do capital,

    tornando-se visveis hoje, numa escala sem precedentes. Estes

    modelos espaciais variam de cidade para cidade, de pas para pas,

    diferindo em intensidade e profundidade (Pasternak 2006).

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    35

    Marcuse, por exemplo, afirma que freqentemente as famlias de

    baixa renda esto concentradas nos centros urbanos, enquanto os

    ambientes suburbanos abrigam as famlias de rendimento mdio e

    superior (2004:30). Est uma afirmao vlida para o ambiente

    urbano norte-americano, porm no para as grandes cidades latino-

    americanas como So Paulo, Rio de Janeiro, Santiago ou Buenos Aires,

    como ser visto mais adiante.

    1.3. Os Subrbios Residenciais Norte-Americanos,

    a Bourgeois Utopia e as Gated Communities

    Como nem toda diviso social do espao caracteriza uma situao de

    segregao espacial, importante entender como essa segregao se

    espacializa nas grandes metrpoles contemporneas, especialmente no

    caso norte-americano (como referncia constante no mercado

    imobilirio atual) e nas metrpoles latinas do Cone Sul (So Paulo,

    Buenos Aires e Santiago do Chile).

    A anlise da segregao espacial em determinada regio pressupe o

    entendimento no apenas do conceito de segregao, que

    pretendemos analisar, mas tambm da configurao espacial

    resultante. O estudo dos condomnios fechados na Regio

    Metropolitana de So Paulo parte de uma tipologia espacial bastante

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    36

    definida: reas residenciais com casas semelhantes e espaos coletivos

    de lazer cercados por muros ou cercas. Coloca-se como uma questo

    importante entender de que forma esse modelo se imps como padro

    a ser seguido de forma abrangente.

    O padro de urbanizao das cidades brasileiras, como em Santiago e

    Buenos Aires, durante o sculo XIX e incio do XX, seguiu modelos

    europeus continentais, sobretudo franceses. A partir dos anos 1920,

    com o primeiro boom de disseminao dos automveis5 e,

    principalmente aps a Segunda Guerra Mundial, ocorre uma mudana

    para o modelo norte-americano, baseado no transporte por

    automveis e na expanso perifrica das grandes cidades.

    O entendimento do padro de expanso perifrico norte-americano,

    com seus subrbios residenciais e padres especficos de segregao,

    faz-se necessrio para procurarmos compreender de que forma esse

    modelo tem sido implementado nas cidades brasileiras e mais

    especificamente na RMSP.

    A anlise feita por Robert Fishman (2002) em Bourgeois Utopias:

    Visions of Suburbia6 explica no apenas o surgimento de uma

    5 Entre 1915 e 1927, apenas na cidade de So Paulo o nmero de automveis passa

    de 1.227 para 11.380, um aumento de 827% em 12 anos (DOttaviano 2001). 6 Para o entendimento da realidade norte-americana em relao especificamente

    expanso dos condomnios fechados, outras cinco obras so essenciais: Abrahamson

    (1996) Urban Enclaves. Identity and Place in America, Blakely & Snyder (1999) -

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    37

    tipologia de segregao tipicamente anglo-americana, chamada por ele

    de burguesa, mas tambm de que forma essa tipologia deu origem ao

    padro de segregao espacializado nos condomnios fechados da

    cidade global contempornea.

    Os primeiros subrbios destinados moradia de uma classe mdia

    burguesa emergente surgem na Inglaterra no final do sculo XVIII.

    Naquele momento, o surgimento do subrbio significou uma

    importante transformao dos valores urbanos vigentes: mudana das

    noes de centro e periferia, separao dos locais de trabalho e

    moradia, e a criao de novas formas de espao urbano com

    segregao de classes sociais e de funo (moradia, comrcio,

    indstria, etc).

    Os subrbios que antes eram a regio de moradia dos pobres, ladres

    e prostitutas7, passam a ser local de moradia da elite emergente. O

    modelo desses novos bairros residenciais teve origem no padro de

    moradia rural dos nobres, com seus castelos e vilas construdos em

    meio ao verde do campo. Baseou-se na primazia da casa unifamiliar

    Fortress America. Gated Communities in the United States; Jackson (1985) -

    Crabgrass Frontier: The Suburbanization of the United States; Low (2003) - Behind the

    Gates. Life, Security, and the Pursuit of Happiness in Fortress America; e McKenzie

    (1994) - Privatopia. Homeowner Associations and the Rise of Residential Private

    Government. 7 Nos sculos 17 e 18, em Londres uma prostituta era normalmente chamada de

    pecadora do subrbio (Fishman 2002:26)

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    38

    isolada construda em meio ao verde. Segundo Fishman, a partir do

    conceito ingls do pitoresco, o subrbio deveria possuir caractersticas

    construtivas e de desenho urbano que o diferenciassem tanto da

    cidade quanto do campo, numa esttica de casamento entre cidade e

    campo (2002:25).

    Porm, para entender a proliferao desse modelo, mais importante do

    que analisar o que continha identificar o que exclua: todas as

    atividades industriais, atividades comerciais de grande porte (apenas

    pequenos comrcios que servissem diretamente aos moradores seriam

    admitidos) e residncias para moradores de classe baixa.

    Suburbia represents a collective assertion of class wealth, and

    privilege as impressive as any medieval castle. Most importantly,

    suburbia embodies a new ideal of family life [grifo meu], an ideal

    so emotionally charged that it made the home more sacred to the

    bourgeoisie than any place of worship. () From its origins, the

    suburban world of leisure, family life, and union with nature was based

    on the principle of exclusion. Work was excluded from the family

    residence; middle-class villas were segregated from working-class

    housing; the greenery of suburbia stood in contrast to a gray, polluted

    urban environment. () It also reflects the alienation of the middle

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    39

    classes from the urban-industrial world they themselves were

    creating8. (2002:24)

    Os novos bairros foram construdos em grandes reas perifricas, de

    fcil acesso por carruagens privadas, porm com baixo valor de

    mercado. A expanso para os subrbios se deu com a transformao

    de grandes e baratas glebas agrcolas em reas urbanizadas com alto

    valor de mercado. O novo modelo de moradia propunha um novo estilo

    de vida, que valorizava sobretudo a estrutura familiar nucleada, mas

    tambm era um timo investimento para os banqueiros e

    comerciantes.

    There, within easy commuting distance to the city by private carriage,

    these merchants and bankers could construct their bourgeois

    utopia of leisure, neighborliness, prosperity, and family

    life.(grifo meu)

    8 Os subrbios representavam uma declarao coletiva de prosperidade de classe e

    privilgio, to impressionante quanto qualquer castelo medieval. O mais importante

    que o subrbio corporificava um novo ideal de vida familiar [grifo meu], um

    ideal to emocionalmente carregado que transformou o lar mais sagrado para a

    burguesia do que qualquer outro lugar de adorao. (). Desde sua origem, o mundo

    suburbano de lazer, vida familiar, e unio com a natureza foi baseado no princpio da

    excluso. Trabalho foi excludo da residncia famlia; casas de classe media eram

    segregadas das habitaes operarias; o verde do subrbio contrastava com o

    ambiente urbano poludo e cinza. () Isto tambm refletia a alienao das classes

    mdias em relao ao mundo urbano-industrial que elas mesmas estavam criando.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    40

    To this strong cultural impetus to suburbanization was soon added an

    equally strong economic motive. The suburban idea raised the

    possibility that land far beyond the previous range of metropolitan

    expansion could be transformed immediately from relatively cheap

    agricultural land to highly profitable building plots. This possibility

    provided the great engine that drove suburban expansion forward.

    Builders in both England and the United States adapted more easily to

    the needs of suburban development than they did to the more difficult

    challenge of creating middle-class districts within the city. Suburbia

    proved to be a good investment as well as a good home.9 (Fishman

    2002:28).

    J o modelo de segregao espacial adotado nas cidades europias

    continentais teve como paradigma a cidade de Paris. Na dcada de

    1840, foi implantado o primeiro bairro burgus segregado, porm

    ainda dentro da rea urbana. the Chausse dAntin embodied the

    9 Assim, com o trajeto por carruagem facilitado at a cidade, esses comerciantes e

    banqueiros podiam construir sua utopia burguesa de lazer, sociabilidade,

    prosperidade e vida familiar. [grifo meu].

    Para esse forte mpeto cultural de suburbanizao foi adicionada uma igualmente forte

    razo econmica. A idia do subrbio criou a possibilidade de terras agrcolas

    relativamente baratas, fora dos limites da expanso urbana de ento, serem

    transformadas imediatamente em reas construdas altamente rentveis. Essa

    possibilidade foi o grande motor de expanso do subrbio. Construtores, tanto na

    Inglaterra quanto nos Estados Unidos, se adaptaram mais facilmente as necessidades

    do desenvolvimento suburbano do que tinham feito com a tarefa mais difcil de criar

    bairros para a classe mdia nas reas j urbanizadas. Os subrbios provaram sem to

    bons investimentos quanto bons lares.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    41

    suburban principles of domesticity, privacy, and class segregation,

    but in an urban setting. The Chausse dAntin presented a solid front

    of luxurious structures that proclaimed their affiliation with the city and

    not the countryside.10 (Fishman 2002:38)

    Os edifcios foram construdos tendo por modelo as formas clssicas do

    Palais Royal e de outras manses urbanas da aristocracia do sculo

    XVIII. Os edifcios, de cinco ou seis andares, tinham ambientes amplos

    e apartamentos que ocupavam geralmente todo o andar.

    Com as reformas urbanas encabeadas por Haussmann, a partir da

    metade do sculo XIX, o modelo de Chausse dAntin foi usado na

    configurao dos novos e amplos bulevares. Not surprisingly, the

    Parisian middle class moved en masse to the apartments of the

    boulevards and the beaux quartiers; and their loyalty to the large

    apartment house was never wavered. The consequences of

    Haussmannization have further ensured that the suburban ideal would

    make few converts among the Parisian bourgeoisie.11 (Fishman

    2002:42)

    10 O Chauss DAntin corporificou os princpios suburbanos de domesticidade,

    privacidade e segregao de classes, porm em um ambiente urbano. O Chauss

    DAntin introduziu uma fachada compacta de estruturas luxuosas, evidenciando sua

    associao com a cidade e no com o campo. 11 Sem surpresa, a classe mdia parisiense se mudou em massa para os

    apartamentos dos bulevares e dos novos bairros, e sua lealdade s amplas moradias

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    42

    A populao pobre que antes morava nas reas centrais da cidade teve

    suas casas demolidas durante a reforma e foi forada a se mudar para

    reas perifricas da cidade, juntamente com as indstrias e seus

    operrios. Suburbanization in the French sense thus come to refer

    almost exclusively to a working-class or lower middle-class movement

    to the periphery.12 (Fishman 2002:42)

    A suburbanizao parisiense incorporou o sentido de periferia pobre e

    popular, onde se localizavam as moradias das classes populares e

    operrias e os usos menos nobres (como as indstrias).

    Mesmo as reas verdes e de lazer foram segregadas no contexto

    parisiense, com a criao de dois bosques distintos, um para a elite da

    rea central (Bois de Boulogne) e outro, mais popular, construdo no

    limite a leste da cidade (Bois de Vincennes).

    A partir dos anos 1850 e 1860, as cidades norte-americanas

    comearam a vivenciar um processo de intenso crescimento. Nesse

    momento a expanso suburbana, com bairros residenciais segregados,

    foi adotada de forma irrestrita, passando a caracterizar o modelo de

    expanso urbana norte-americano como um todo.

    em apartamentos nunca oscilou. As conseqncias da haussmanizao garantiram que

    o ideal suburbano fizesse poucas converses entre a burguesia parisiense. 12 Suburbanizao, no contexto francs, se refere, quase que exclusivamente, ao

    movimento das classes operrias e da classe mdia-baixa para a periferia.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    43

    Fishman afirma que a histria do subrbio , na verdade, a histria

    social e cultural da burguesia anglo-americana: middle-class

    suburbanization thus entered into the structural logic of the expanding

    Anglo-American city. () Suburbia might appear to be a flight from the

    city but, seen in larger, regional context, suburbanization was clearly

    the outer edge in the wide process of metropolitan growth and

    consolidation that was draining the rural areas and small towns of their

    population and concentrating people within what H. C. Wells called the

    whirlpool cities. (...) They [comerciantes e banqueiros] are the

    pioneers whose collective style and choices define the nature of

    suburbia for their era.13 (Fishman 2002:28 e 30).

    A moradia no subrbio passa a ser, ento, um modelo espacial ideal,

    que representa um novo estilo de vida das novas classes burguesas.

    In this Darwinian struggle for urban space, the bourgeoisie sought not

    only land for their commercial and industrial enterprises but also land

    13 A suburbanizao da classe media passou a fazer parte da lgica estrutural de

    expanso urbana das cidades anglo-americanas. () O subrbio podia aparentar ser

    um tipo de guerra contra a cidade, mas visto numa escala mais ampla, de carter

    regional, a suburbanizao foi claramente o limite exterior do amplo processo de

    crescimento metropolitano que inclua a incorporao de reas rurais e da populao

    de pequenos municpios, concentrando pessoas no que H. C. Wells chamou de cidades

    redemoinho. (...) Eles so os pioneiros [comerciantes e banqueiros] cujo estilo

    coletivo e escolhas definiram a natureza dos subrbios no seu tempo.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    44

    for their dreams: their visions of the ideal middle-class home.14

    (Fishman 2002:30).

    No contexto norte-americano a expanso dos subrbios tem uma

    caracterstica especial: o uso intensivo da propaganda. As casas no

    subrbio e seu novo estilo de vida so vendidos como o ideal norte-

    americano de habitao.

    Os subrbios passam ento a ser zonas residenciais valorizadas, onde

    pessoas com alto poder aquisitivo escolhem viver em bairros-jardim,

    caracterizados pela segregao de classes e de funes e por moradias

    unifamiliares isoladas.

    Com a disseminao desse tipo de moradia nos Estados Unidos, residir

    em um subrbio passa a ser acessvel a novos grupos sociais. No incio

    do sculo XX, mesmo a classe mdia operria comea a se mudar para

    casas suburbanas. Uma nova questo se coloca: se os subrbios

    passam a ser acessvel a novas classes sociais, como manter seu

    princpio bsico de excluso?

    Durante o sculo XX, novas formas de segregao so implementadas

    no contexto urbano norte-americano, como a criao de associaes

    14 Nessa briga darwiniana por espao urbano, a burguesia soube conquistar terreno

    no apenas para suas indstrias e negcios, mas tambm para a terra dos seus

    sonhos: suas vises do ideal do lar da classe mdia.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    45

    de moradores e o surgimento das gated communities (comunidades

    com barreira, na traduo literal), analisadas a seguir.

    Aps a disseminao da moradia em bairros suburbanos, com o intuito

    de manter a exclusividade de alguns desses bairros, na primeira

    metade do sculo XX, comeam a se consolidar as primeiras

    Associaes de Moradores Norte-Americanas. Essas associaes

    passam a regulamentar e normatizar o acesso e o uso desses bairros.

    As restries impostas pelas associaes de moradores pretendiam

    manter as caractersticas segregacionistas e de excluso, inclusive com

    o discurso de manuteno do valor das propriedades (McKenzie 1994).

    Em 1934, foi criada a Federal Housing Administration FHA

    (Administrao Federal de Habitao), como um instrumento para

    minimizar o desemprego na construo civil causado pela crise de

    1929. Rapidamente, no entanto, o rgo federal transformou-se num

    parceiro dos incorporadores imobilirios e da industria da construo

    civil.

    Os investimentos federais se concentraram na construo de novos

    empreendimentos residenciais suburbanos, com padro

    segregacionista, em detrimento de habitaes populares em zonas

    mais centrais.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    46

    O FHA adotou a idia de que contratos restritivos15, utilizados pelas

    associaes de moradores, era a maneira de preservar o valor das

    propriedades, baseado na idia de criao de bairros homogneos, que

    exclussem as minorias. Segundo seu manual16, de 1938, a Protection

    From Adverse Influences (proteo contra influncias adversas) era

    um dos fatores mais importantes na definio dos valores de locao

    de um imvel. Devemos entender essas influncias adversas como a

    presena de minorias raciais e tnicas.

    A defesa da homogeneidade social e racial era feita abertamente pela

    FHA: If a neighborhood is to retain stability, it is necessary that

    properties shall continue to be occupied by the same social and racial

    classes. A change in social or racial occupancy generally contributes to

    instability and a decline in values. 17 (McKenzie 1994:65)

    Em seu estudo sobre a expanso urbana norte-americana, Jackson

    (1985) afirma que o FHA helped to turn building industry against

    the minority and inner-city housing market, and its policies supported

    the income and racial segregation of suburbia. For perhaps the first

    15 Restrictive convenants no original. As restries ao tipo de comprador/morador

    eram colocadas j nos contratos de compra e venda e eram posteriormente reforadas

    pelas associaes de moradores. 16 Vrios manuais passaram a serem publicados, no s pela FHA, mas tambm pela

    NAREB National Association of Real Estate Boards. 17 Para a manuteno da estabilidade de um bairro, necessrio que as propriedades

    continuem a ser ocupadas pelas mesmas classes sociais e raciais. A mudana na

    ocupao social ou racial geralmente contribui para a instabilidade e queda de valor.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    47

    time, the federal government embraced the discriminatory attitudes of

    the marketplace. Previously, prejudices were personalized and

    individualized; FHA exhorted segregation and enshrined it as public

    policy.18 (apud McKenzie 1994:67)

    Num perodo de grande crescimento demogrfico e no momento de

    maior construo civil da histria norte-americana (ps-Segunda

    Guerra), a expanso urbana das cidades norte-americanas foi

    fortemente influenciada pelas polticas segregacionistas da NAREB

    (National Association of Real Estate Boards Associao Nacional dos

    Conselhos de Bens Imveis), dos incorporadores locais e do FHA. A

    criao de organizaes voluntrias (como as associaes de

    moradores), como forma de garantir a segregao residencial, era

    incentivada pelos representantes do mercado imobilirio.

    Em 1955, Charles Abrams, advogado da Califrnia Real Estate

    Association (Associao de Bens Imveis da Califrnia), defendeu o

    uso das associaes de moradores como um instrumento de controle

    da restrio de uso dos seus bairros:

    18 O FHA ajudou a direcionar a indstria da construo contra o Mercado de habitao

    das reas centrais, e suas polticas deram suporte para o crescimento da segregao

    racial e de renda dos subrbios. Talvez pela primeira vez, o governo federal adotou as

    atitudes discriminatrias do mercado imobilirio. Anteriormente, prejuzos eram

    personalizados e individualizados; FHA exortou a segregao e elevou-a a poltica

    pblica.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    48

    A homes association could be formed, the members of which are the

    owners of building sites within the residential tract, and prohibiting the

    occupancy except to those persons or families, who hold an occupancy

    permit issued by the homes association. The issuance of the permit is

    discretionary and without reference to race or color but based entirely

    upon personal qualification as a good neighbor or in other words,

    cultural status. This is an extension of the idea that any club may

    regulate admission to its membership. Many a country club restricts

    occupancy of home sites on its grounds members. Religious colonies

    have long been established upon same basis. This arrangement would

    likewise operate against undesirable Caucasians as prospective

    buyers.19 (apud McKenzie 1994:76)

    Outras instituies, como o Urban Land Institute (Instituto de Terra

    Urbana), passam a elogiar o papel das associaes de moradores na

    preservao do carter e da integridade das comunidades, como a

    manuteno de um alto grau de orgulho e sociabilidade dentro dessas

    19 Uma associao de casas poderia ser formada, cujos membros so os proprietrios

    de imveis dentro da rea residencial, e proibindo a ocupao exceto para aquelas

    pessoas ou famlias que possuam uma permisso de uso emitida pela associao. A

    emisso da permisso arbitrria e sem referncia a raa ou cor, mas sim baseada

    inteiramente na qualificao pessoal como bom vizinho, ou em outras palavras, status

    cultural. Essa uma extenso da idia de que qualquer clube pode regulamentar a

    admisso de novos scios. Muitos clubes de campo restringem a ocupao de seus

    lotes a associados. Colnias religiosas h muito tempo foram estabelecidas sobre os

    mesmos princpios. Esse arranjo pode operar contra caucasianos indesejveis como

    possveis compradores.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    49

    comunidades. Em 1989, Robert H. Nelson, economista do

    Departamento de Interior, chegou a firmar que as associaes de

    moradores poderiam substituir gradualmente os governos municipais.

    (McKenzie 1994)

    As gated communities se tornaram um modelo de parcelamento

    quando, nos anos 1960 e 1970, a partir de um plano geral de oferta de

    bairros especficos para lazer e veraneio, vrios condomnios fechados

    foram construdos. Os resorts e clubes de campo exclusivos foram os

    primeiros locais onde os norte-americanos puderam wall themselves

    off (criar espaos cercados).

    Os anos 1980 viram um boom de construo de bairros murados,

    cercados e protegidos. A proliferao das gated communities refletiu o

    medo crescente do crime. Segundo Blakely & Snyder (1997), esse

    medo crescente no se justificava pelo aumento da criminalidade. E os

    locais onde esses condomnios foram implantados no eram, em geral,

    regies com alta criminalidade. O nmero crescente de mtodos

    usados para o controle do meio fsico como forma de garantir

    segurana fsica e econmica de grupos especficos, tambm pode ser

    associado implementao dessa nova tipologia residencial.

    In the 1980s, upscale real estate speculation and the trend to

    conspicuous consumption saw the proliferation of gated communities

    around golf courses that were designed for exclusivity, prestige, and

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    50

    leisure. The decade also marked the emergence of gated communities

    built primarily out of fear, as the public became increasingly

    preoccupied with violent crime. Gates became available in

    developments of suburban single-family tracts and high-density urban

    apartment complexes. Since the late 1980s, gates become ubiquitous

    in many areas of the country; there are now entire incorporated cities

    that feature guarded entrances.20 (Blakely & Snyder 1997:4 e 5)

    Em 1997 cerca de 8,5 milhes de norte-americanos viviam em

    condomnios fechados e aproximadamente 40% das novas residncias

    na Califrnia eram construdas em condomnios fechados behind

    walls (atrs de muros). (Blakely & Snyder 1997)

    Blakely & Snyder afirmam que existem trs tipos principais de

    condomnios fechados nos EUA:

    1. Lifestyle Communities (comunidades de estilo de vida)

    condomnios formados por grupos de moradores com estilos

    20 Nos anos 1980, a especulao imobiliria em larga escala e a busca por um

    consumo diferenciado levou proliferao dos condomnios fechados ao redor dos

    campos de golfe, projetados como locais de exclusividade, prestigio e lazer. A dcada

    tambm foi marcada pelo surgimento dos condomnios fechados construdos

    inicialmente devido ao medo, uma vez que a populao se tornava cada vez mais

    preocupada com o crime violento. Portes se tornaram disponveis em

    empreendimentos suburbanos para residncias unifamiliares e em conjuntos de

    apartamentos de alta densidade em reas centrais. Desde o final dos anos 1980,

    portes se tornaram onipresentes em vrias reas do pas; existem agora cidades

    totalmente incorporadas cujo trao principal so suas entradas protegidas.

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    51

    de vida semelhantes, focados, sobretudo, nos equipamentos e

    reas comuns voltadas para a recreao (ex: campos de golfe).

    2. Prestige Communities (comunidades de prestgio)

    condomnios formados com o intuito de manuteno ou

    aumento dos valores de mercado dos imveis.

    3. Security Zones (reas de segurana) condomnios

    formados a partir da preocupao prioritria em relao ao

    incremento da segurana.

    Apesar do discurso do medo e da segurana (ver Low 2003, por

    exemplo), a anlise histrica dos bairros e subrbios segregados

    norte-americanos indica que a consolidao de bairros residenciais

    homogneos e segregacionistas nos Estados Unidos no esteve ligada

    questo de segurana, mas sim a uma cultura, desenvolvida ao

    longo do final do sculo XIX e durante todo o sculo XX, de que bairros

    etnicamente homogneos promoviam a valorizao imobiliria dos

    lotes e edificaes, alm de facilitarem e estimularem a vida em

    comunidade (entre iguais, claro).

    Assim, nas ltimas trs dcadas, foi incorporada ao modelo norte-

    americano, de grandes subrbios homogneos para a classe mdia, a

    construo de portes, de enormes muros e a presena e controle de

    guardas.

  • CAPTULO 1

    Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    52

    1.4. Os Condomnios Fechados como Paradigma de

    Segregao no Cone Sul Latino-Americano

    Na Amrica Latina as grandes concentraes urbanas so uma

    realidade recente. No incio dos anos 1950, apenas Argentina, Chile,

    Cuba e Uruguai tinham maioria de populao urbana. Desde ento tem

    ocorrido uma intensa urbanizao por todo o territrio. Em 1990, o

    grau de urbanizao alcanou 72%. A populao total pulou de 100

    milhes em 1930 para 425 milhes em 2000 (Pasternak 2006).

    Os principais trabalhos acadmicos sobre segregao espacial nos

    pases do Cone Sul Latino-Americano associam sua intensificao aos

    fenmenos econmicos e sociais ligados globalizao.

    Segundo RIBEIRO (2003) a difuso de idias liberais mudou modelos

    de polticas pblicas, privatizando servios e assim aumentando a

    desigualdade de acesso a equipamentos pblicos. Este mesmo iderio

    concorreu para uma liberalizao da interveno no mercado de terras

    e de moradia, reforando a desigualdade tambm na organizao do

    espao urbano. Alm disso, a globalizao tem contribudo para

    transformaes na base produtiva das cidades, com tendncias

    dualizao social, e aumento de distncia entre a renda mdia dos

    estratos superiores e a dos inferiores. Essa dualizao age como

  • CAPTULO 1 Segregao Urbana e os Condomnios Fechados

    53

    fac