É Preciso Algo Mais (Elisa Masselli)

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PRECISO ALGO MAISElisa Masselli

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Sinopse:O que leva um jovem de boa famlia, classe mdia, a ingressar no triste caminho das drogas? Mesmo sabendo que um passaporte para a dependncia fsica, para o crime, para a infelicidade, muitos so os que mergulham nessa aventura. Imaturidade? Curiosidade? Vontade de desafiar a prpria fora? Meio de vencer a timidez e se auto-afirmar? Os estudiosos procuram descobrir a cura e so unnimes em afirmar que para vencer essa dependncia indispensvel querer. A tora de vontade fundamental, mas no suficiente. Os que saram vencedores no mundo dos vcios reconhecem que precisaram dos recursos infinitos de foras espirituais invisveis. Essa ajuda est sempre presente, seja qual for o problema, mas s pode agir quando o interessado sustenta com a sua prpria f. por isso que afirmamos sem medo de errar, que no basta s querer, PRECISO ALGO MAIS... S Deus faz o impossvel.

ZIBIA GASPARETTO

NDICE:

Prefcio ....................................................................... 11 Um Rapaz Normal........................................................ 13 Momento de Deciso.................................................... 25 Primeiros Sintomas...................................................... 33 Mudana de Humor ..................................................... 45 Humilhaes e Mentiras .............................................. 63 Pedindo Ajuda ............................................................. 81 Traindo uma Amizade .................................................. 93 No Mundo do Crime..................................................... 119 Primeira Ajuda do Cu................................................. 131 Servindo de Instrumento.............................................. 139 Sentimento de Culpa ................................................... 151 Momento de Escolha.................................................... 159 Desespero e Procura .................................................... 169 Reparando uma Injustia............................................. 183 Momento de Despertar................................................. 193 O Cu Continua Ajudando. .......................................... 203 Caindo Sempre Mais.................................................... 209 Impotncia Diante da Realidade ................................... 227 Procurando Rodrigo ..................................................... 233 Na Espiritualidade ....................................................... 247 Durante o Sono ........................................................... 263 O Passado..................................................................... 271 Insegurana ................................................................ 291 A Descoberta ............................................................... 301 Marilu Planeja ............................................................. 313 Na Sala de Andr ......................................................... 325 A Fora da Droga ......................................................... 335 Ajuste de Contas ......................................................... 351 Plano de Vida .............................................................. 361 Eplogo ........................................................................ 369

Ofereo este livro para: Olvia, minha me, Que foi o meu incio; Olvia, minha neta, Que minha continuao.

Prefcio PRECISO ALGO MAIS - ELISA MASSELLI

A violncia est espalhada por todo o mundo. Na maioria das vezes est ligada droga, seja ela qual for. Os motivos sociais que levam muitas pessoas para a droga todos conhecemos. Mas eu no estava satisfeita. Aprendi com a espiritualidade que tudo est sempre certo e que a lei justa. Talvez por isso muitas vezes me perguntasse o porqu das drogas existirem. Por que Deus permite? Em uma manh, ao acordar, estava novamente no incio de um novo livro. Como das outras vezes, no sabia nada sobre a histria, somente o incio. Sabia apenas que era a histria de um rapaz envolvido com drogas. Fiquei entusiasmada, pois sabia que finalmente teria a resposta do mundo espiritual, aquela que eu tanto ansiava. Comecei a escrever. Como os outros livros, este tambm teve suas paradas, s vezes de dias. Fui conhecendo a histria de Artur, me apaixonando por ela, mas esperava o momento em que minhas dvidas seriam esclarecidas. At que um dia, finalmente, a resposta chegou. Uma resposta dita de um modo simples, como s o no plano espiritual. Quando terminei de ler, estava encantada, e pensei: "At pode ser verdade". Recebi a resposta de que realmente tudo est certo e que a lei mesmo justa. Desejo que a histria de Artur sirva como consolo para todos aqueles que direta ou indiretamente esteja envolvido com drogas, sejam quais forem, e que pensem que em algum lugar, algum pode estar dizendo: "Estou esperando por voc".

UM RAPAZ NORMAL PRECISO ALGO MAIS _ ELISA MASSELLI

Como em todas as manhs, Artur acordou com sua me colocando a mo em seu ombro e dizendo baixinho: Artur, acorde, j est na hora! Seu pai est terminando de tomar banho e logo estar tomando caf. Hoje voc no vai sair novamente sem se alimentar. Ele abriu os olhos, queria se virar na cama e continuar dormindo, mas ela voltou a dizer: No adianta se virar, sabe que est na hora! J vou, mame! J vou! Est bem, vou descer. No se esquea que precisa se levantar! Pode ir tranqila, j estou me levantando. Ele disse isso, mas voltou a se virar. Ela colocou novamente a mo em seu ombro: Vamos, Artur, no volte a dormir! Ele abriu os olhos e, sentando-se na cama, disse: Pronto, j acordei. Ela sorriu: Olhe l, estou descendo. Ela saiu do quarto. Artur olhou a sua volta. Seu quarto era grande e arejado. Dormia em uma cama confortvel, tinha seu prprio armrio, onde guardava suas roupas. Havia tambm uma estante para guardar livros. Ao lado de sua cama seu irmo Leandro dormia tranquilamente. Em um dos cantos havia uma

escrivaninha, e sobre ela um computador. Artur olhou para ele, pensando: "Voc minha maior alegria. Fiquei ontem at muito tarde tentando executar aquele programa! Vou aprender tudo sobre voc e os programas, e em pouco tempo dominarei todos os seus segredos. Minha av teve uma tima idia quando, no meu aniversrio, me deu voc de presente. De todos os presentes que ganhei at hoje, e foram muitos, voc foi o que mais gostei. Faltam s dois anos para eu terminar o segundo grau. Mesmo

contrariando a vontade do meu pai, no vou fazer Direito, vou fazer Cincias da Computao. Quero aprender tudo a seu respeito.... Levantou-se e foi para o banheiro tomar seu banho. Enquanto se banhava, ia pensando: "O dia do meu aniversrio esta chegando. Vou fazer dezesseis anos. Papai quer me dar uma festa em famlia, mas eu no quero hoje no se usa mais isso. Os jovens comemoram o aniversrio em barzinhos e danceterias. Vou ter que convenc-lo. No vai ser fcil, mas tenho que tentar." Olhou para um relgio que havia no banheiro. Sua me o colocara ali exatamente para que ele no perdesse a hora. Estou atrasado! Preciso me vestir depressa! Foi para o quarto, mas antes se olhou no espelho: Essas espinhas! Meu rosto est todo tomado por elas! Como Mariana vai me notar? Vestiu a roupa depressa e foi para a sala de refeies. Seu pai estava terminando de tomar o caf. Disse: Atrasado, como sempre! Novamente no vai tomar caf! No posso esperar. Vou lhe dar dinheiro, com ele poder tomar um lanche na cantina. Vamos embora?

Vamos, sim! Tchau, mame! Tchau, meu filho, vo com Deus... L fora, entrou no carro e seu pai saiu dirigindo. Artur j estava acostumado, todas as manhs eram a mesma coisa. Assim que o carro saiu, ele olhou para o rdio no mesmo instante em que seu pai o ligou e sintonizou em uma estao que transmitia notcias. O pai continuava dirigindo, comentando as notcias que ia ouvindo. Artur sempre respondia, mas naquele dia em especial estava com seus pensamentos voltados para Mariana. "S a conheci h alguns meses. Ela veio transferida de outra escola. No existe menina mais bonita. At agora, nunca havia me interessado por menina alguma, sempre s me preocupei com meus estudos." O pai interrompeu seus pensamentos, dizendo: Em que est pensando? Estou pensando no meu aniversrio. E, esta chegando. Continua ainda com aquela idia de no comemor-lo em famlia? Estava pensando justamente nisso. No acho uma boa idia. Voc ainda muito criana. Ora, papai! No sou mais criana! Vou fazer dezesseis anos, j estou quase terminando o primeiro ano do Ensino Mdio. Logo farei o cursinho para entrar na faculdade! Tem razo, no mais uma criana. Vou pensar sobre o assunto. Parou de falar, pois uma notcia no rdio chamou sua ateno. Artur voltou seu pensamento para Mariana. "E, nunca me preocupei com garotas, mas desde que a vi, senti algo diferente. Ela mesmo muito bonita, mas nunca ir me

notar. No enquanto eu tiver essas espinhas. Sei que, embora no seja feio, tambm no sou bonito." Em seu rosto um sorriso se formou: "Est resolvido! Vou convid-la para minha festa, quem sabe conseguirei falar com ela.... Chegaram em frente escola. Ele deu um beijo no pai e desceu de um lado da rua; teria que atravess-la. Seu pai sorriu, dizendo: No se esquea, estarei aqui ao meio-dia em ponto. No me esquecerei! Fique tranqilo, O pai foi embora e ele ficou olhando o trnsito. Precisava esperar paia poder atravessar. Estava ali olhando de um lado para o outro quando viu do outro lado da rua uma aglomerao. Atravessou correndo e foi para l; como os outros, queria saber o que estava acontecendo. Assim que chegou perto, perguntou a um amigo: O que esta acontecendo? Esse rapaz foi pego roubando aquele carro! Ele olhou para onde o amigo apontava e viu um rapaz, que devia ter a mesma idade que ele. O rapaz estava de cabea baixa, muito sujo e algemado. Ao seu lado, um policial e um homem, que muito nervoso, gesticulava e dizia: Esse marginal estava roubando o rdio do meu carro! O policial tentava acalm-lo: Fique calmo, ele agora est preso e ser encaminhado. Espero que seja mesmo, e que fique preso por muito tempo! Artur no entendia por que, mas sentia muita pena dele. O rapaz estava assustado e com os olhos muito vermelhos; chorava. Artur olhava para ele sem parar, no conseguia desviar o

olhar. O rapaz, parecendo perceber sua insistncia, por um segundo levantou a cabea e seus olhos se cruzaram. Artur sentiu uma emoo estranha. Em seguida, o rapaz voltou a baixar a cabea. Artur continuou ali olhando para ele, quando ouviu uma voz atrs de si, dizendo: Que pas este que no cuida de seus jovens! Artur voltou-se e viu que era o professor de Cincias que estava falando. Por que o senhor est dizendo isso? Porque o que est vendo aqui fruto de uma sociedade injusta! De um mau governo! Antes que Artur dissesse qualquer coisa, o policial colocou o rapaz dentro do carro e, juntamente com a vtima, se afastaram. A aglomerao foi se desfazendo e calmamente Artur se dirigiu para a escola. Todos iam comentando sobre o acontecido. Artur ouvia as pessoas conversando, mas no conseguia esquecer o rosto do rapaz, nem aquele olhar. A primeira aula foi de Portugus. A segunda seria de Cincias. O professor entrou. Estava com um semblante multo srio. Sentou-se em sua cadeira e olhou para a classe,

perguntando: Quem viu o que aconteceu h pouco l fora? Quase todos levantaram a mo. Ele continuou: Algum pode me dizer o que significou aquilo? Alguns responderam, mas Artur ficou calado, s via na sua frente o rosto assustado do rapaz. Ele no entendia e se perguntava:

"Como uma pessoa pode chegar a uma situao como aquela? Que ser que lhe aconteceu?" O professor continuava falando: O que viram l fora o produto da misria que existe neste pas! E o fruto do mau governo que aqui existe! Governo que no se preocupa com o bem-estar do povo! A misria est tomando conta de tudo e de quase todos, no h ningum para mudar esse estado de coisas. Todos olhavam para ele sem entender muito bem o que diria. Ele continuou: Vocs todos aqui no imaginam o que seja a pobreza! Todos so bem-nascidos, podem freqentar uma escola cara como esta, mas a maioria do povo brasileiro no tem o que comer, e muito menos escola! Os alunos comearam a discutir sobre o assunto. Artur ouvia uns e outros, mas no esquecia o rosto do rapaz... O professor continuou falando: Os nossos governantes no se preocupam com o bemestar do povo. S esto preocupados com seus prprios interesses, ou em um modo de conseguirem ganhar mais dinheiro! Ficou falando por muito tempo. Naquele dia praticamente no deu aula, s falou sobre esse assunto. A aula terminou, outros professores chegaram, mas nenhum deles tocou no assunto. Artur prestou ateno s aulas. Tinha isso por norma, achava que se prestasse ateno quando o professor ensinava, teria mais facilidade para aprender. Quando as aulas terminaram, foi para o lugar do encontro com o pai. Em seguida ele chegou. Sorrindo, abriu a

poria. Artur entrou. O pai, embora estivesse dirigindo, notou que ele estava muito calado: Aconteceu alguma coisa? Tenho a impresso que tem alguma preocupao. Aconteceu algo pela manh que me impressionou muito. O professor de Cincias comentou na aula. Que foi que aconteceu? Artur contou todo o acontecido. O pai ouvia em silncio. Quando Artur terminou de falar, ele estava furioso: Esse professor um idiota! Vou talar com a diretoria da escola! Que fruto de pobreza nada! So pessoas que nascem marginais! Nada, alm disso! Voc no tem que ficar preocupado dessa maneira. E um menino estudioso, que sempre se esforou para aprender. Eu fui um menino pobre, e nem por isso me tornei um bandido. Estudei, e hoje sou um advogado bem-sucedido. Se voc tem tudo, se pode estudar em uma escola como a sua, porque tambm estudei muito e posso dar a voc e a seu irmo o melhor! Chegaram em casa. Entraram. Artur continuava calado. Foi para o seu quarto, olhou sua volta, ouvia a voz do professor dizendo: " Enquanto vocs tm tudo, outros, e so muitos, no tem nem o que comer!" Trocava de roupas e pensava: "O professor tem razo, realmente tenho tudo. Aquele rapaz deve ser muito pobre, por isso estava roubando, devia estar com fome." Aps terminar de se vestir foi para a sala almoar. Seu irmo, Leandro, quatro anos mais novo que ele, estava sentado diante de um prato com batatas frita. Odete, a me, fazia isso para evitar que eles roubassem batatas um do outro, mas no

adiantava, eles continuavam. A uma pequena distrao, l se iam s batatas. Artur sentou, mas para surpresa do irmo, no tentou roubar suas batatas. Permaneceu calado. Sua me estranhou: Artur, o que voc tem? No tenho nada, s estou pensando em algumas coisas. Nesse exato momento, lvaro, o pai, entrava na sala: Ele est preocupado porque presenciou uma cena que o impressionou. O que foi? Artur contou. Quando terminou, ela perguntou: O que esta pensando a respeito? No rosto daquele rapaz, que parecia to assustado, e em tudo aquilo que o professor disse. Ser que existe mesmo toda essa pobreza? Ser que as pessoas roubam por no terem o que comer? lvaro, interrompendo a conversa, respondeu: J disse vrias vezes que a pobreza no tem nada a ver com a marginalidade! Voc no tem que ter sentimento de culpa por ter comida e boa escola. Trabalho muito para isso. O que tem que fazer estudar o mximo que puder para que amanh seus filhos possam ter uma vida igual, ou melhor, que a sua! Espere lvaro! Sabe que dou aula na periferia e vejo muitas crianas com fome, e s vezes sem um agasalho. A pobreza existe, sim! No estou negando isso, s estou dizendo que ela no a causa da marginalidade. Quer ver uma coisa? Iracema, voc mora na favela, no ? Iracema era a empregada da casa. J estava com eles havia muito tempo, desde que Artur tinha seis anos e Leandro dois. Ela ficava ali durante a semana e ia para sua casa na sexta-feira

tarde. Voltava no domingo tarde, pois morava longe e precisava tomar duas condues. Assustada com a pergunta de lvaro, respondeu: Moro l sim sinh. Todos l so bandidos? No, dot! Tem muita famlia boa que mora l. Eu mesma vim do interior com meu marido porque l no tinha trabaio. Assim que nis cheg, ele morreu, fiquei com cinco filhos. Nenhum deles, graas Deus, bandido, no! Esto vendo? Imaginem se todos os pobres fossem bandidos! O que seria do mundo? Existem pessoas que j nascem com o instinto da maldade. Mas voc no pode negar que se todos tivessem as mesmas oportunidades, poderia ser diferente... Oportunidades existem aos montes, temos que procurlas. Quando jovem, com catorze anos, por necessidade de ajudar minha me, que era viva, comecei a trabalhar como faxineiro em um escritrio de advocacia. E hoje, alm de ser um bom advogado, tenho o meu prprio escritrio. Voc teve sorte que o seu patro se interessou por sua educao. Ele gostou de voc e o encaminhou. Sorte? No foi sorte! Desde o primeiro dia em que cheguei ao escritrio sempre me interessei em aprender tudo. Ficava vendo os advogados discutindo algum caso. Prestava ateno e ia encontrando as solues. Lia muito os cdigos. Sempre fui e sou at hoje muito interessado. Dot! O sinh me d licena! J que o dot ta dizendo isso, quero aproveit esse momento pra pedir uma coisa, posso? Claro que pode o que ?

O dot j me ouviu falar sobre o meu filho Jarbas, num j? Sim, me parece que ia prestar o vestibular para Direito, no isso? Isso mesmo, ele passou no vestibul, s que agora no tem dinheiro para paga a faculdade. Queria v se o dot no arranjava um emprego pra ele l no seu escritrio. Pra ele pod continua estudando Quantos anos ele tem? Vai faz vinte e quatro anos em dezembro. S agora prestou o vestibular? L onde a gente morava era muito pobre, num tinha escola. Tambm ele o maior dos meus filho, precisava ajud o pai no trabaio. Quando chegamo aqui, ele tinha doze anos. Coloquei ele na escola pra pod aprend a leitura. Ele no fez o primrio? No, foi por isso que meu marido quis vim pra c, pra que os minino pudesse estud. Quando o pai morreu, ele teve que para de estuda e come trabai pra me ajuda cria os otro. Depois de um tempo, eu e otro filho menor que ele comeamo trabai tambm, a ele foi estud di noite. No paro mais. Diz sempre que vai s adevogado. Parece ser um rapaz com muita boa vontade. Mande-o L ao escritrio, conversarei com ele. Est vendo, filho? Esse moo pobre, mas se for honesto e interessado, ter toda a minha assistncia. No gosto de marginal! Tanto que no meu escritrio tramito por todas as varas, menos a criminal. Nunca vou defender um bandido! Brigada, dot!

Que isso? Voc j est h tanto tempo conosco que j a considero parte da famlia! Em tudo o que puder ajudar seu filho, ajudarei. Iracema foi para a cozinha sorrindo intimamente. Sabia que seu filho nunca a decepcionaria: "O meu filho vai s um dot! Ele sempre estudo muito!" Terminaram de almoar. Odete e Leandro foram para a escola. Ela dava aula tarde em uma escola na periferia, e antes de ir para sua escola deixava Leandro na dele. lvaro foi para o escritrio. Artur ficou um pouco na sala assistindo televiso, depois foi para o seu quarto. Estava estudando um programa novo de computador. Com esse programa poderia fazer qualquer tipo de trabalho relativo a nmeros. Sentou-se em frente ao computador e comeou a estudar. De repente, a imagem de Mariana surgiu sua frente: Ela to bonita, parece ser muito meiga, mas nunca me notar. Ao menos enquanto eu tiver todas essas espinhas em meu rosto... Com esta voz que no nem grossa nem fina... Quem sabe na festa eu consigo me aproximar. Ser que ela vai comparecer minha festa? Tomara que sim. Levantou, olhou pela janela. O dia estava lindo. Olhando para a rua, voltou a se lembrar do rapaz. Por que ser que chegou quele ponto? Ser que mesmo muito pobre? Por que ser que existem pobres no mundo? Voltou para o computador, continuou estudando aquele programa. No dia seguinte, na hora do almoo, lvaro, ao chegar em casa, disse: Iracema, seu filho esteve hoje no escritrio. Conversei muito com ele e gostei. Percebi que ele tem muita vontade de

estudar, e pela sua perspiccia, ser um bom advogado. Ele vai comear a trabalhar no escritrio. A princpio, ajudar na limpeza e ir ao frum para levar e trazer papis. Disse a ele que vou test-lo por um ms. Se ele mostrar interesse pelo trabalho, pagarei sua faculdade e darei mais algum dinheiro para que se mantenha. Ele ser um timo advogado! Vou fazer por ele o mesmo que um dia algum fez por mim. Muito obrigada, dot! Tenho certeza que o dot no vai se arrepend. No vou, no! Tenho certeza! Os dias se passaram. Faltavam poucos dias para a festa. Artur estava ansioso para que a hora chegasse, mas por outro lado, seus pais no se conformavam com aquele negcio de festa s para amigos em uma danceteria. Artur tentava convenc-los: Papai, mame, hoje as coisas mudaram, todos os meus amigos esto fazendo assim, no posso ser diferente! Odete abraou seu filho: Sei que voc est certo, mas no pode impedir que estranhemos. Gostaria de uma festa aqui em casa para toda a famlia, como fazamos quando voc era criana. Nessa sua festa, como voc disse, ns no poderemos comparecer Tem que aceitar que fiquemos descontentes. Artur beijou sua me, dizendo: Dona Odete... Dona Odete. Seu filho cresceu, no mais uma criana. J sou quase um homem completo, olhe a minha voz! Ela o beijou novamente:

Tem razo, meu filho, preciso me acostumar. Mas para os pais um filho sempre ser uma criana. Estou muito orgulhosa do filho que tenho! Precisamos saber o que vai querer de presente. Artur ficou pensando por um breve instante, depois disse pausadamente: Presente? Presente... Eu queria um tnis importado. lvaro os interrompeu: Por que importado? Os nacionais so muito bons. E iguais a qualquer outro! Ora, papai! Todos os meus amigos esto usando tnis importados! Est bem, quanto custa? Mais ou menos oitenta dlares... Oitenta dlares?! E muito dinheiro! Sei que , mas tenho tanta vontade de ter um... Ora, lvaro, no to caro assim, se vai fazer o nosso filho feliz! Ele merece. E um bom aluno, no nos d trabalho algum... Est bem, vamos tarde comprar, mas use o tnis s de vez em quando. Ele ter que durar muito! Prometo que vai durar muito. Eu adoro os dois! Ns tambm o adoramos, meu filho. Seu pai, embora parea um duro, na realidade no passa de um meloso e muito orgulhoso do filho! Quem disse que sou duro! Estou, sim, muito orgulhoso de voc, meu filho. Feliz aniversrio! Obrigado, papai. Tenho tambm muito orgulho do senhor. o melhor pai do mundo! lvaro passou a mo nos cabelos de Artur num gesto carinhoso. Depois de muito pensar, disse:

Est bem, meu filho. J que tudo est mudando, preciso aceitar essas mudanas. Pode fazer sua festa onde quiser. Artur levantou-se e abraou o pai: Obrigado, papai. No se preocupe, no vai acontecer nada demais. S vou reunir meus amigos. Est bem, acredito nisso. Naquela mesma tarde saram para comprar o tnis. Artur escolheu e comprou aquele que mais gostou. Depois foram tomar um lanche. Daquele dia em diante, Artur se dedicou preparao da sua festa. Fez contrato com a danceteria, marcou o dia, enviou convites para seus primos, primas, colegas da escola de natao e do curso de computao. Estava ansioso, pois teria a

oportunidade de ficar ao lado de Mariana. Talvez tivesse coragem de se aproximar e conversar com ela.

MOMENTO DE DECISO PRECISO ALGO MAIS _ ELISA MASSELLI

Finalmente o dia da festa chegou. Pela manh, ao acordar e descer para o caf, Artur teve uma surpresa. Em cima da mesa havia um bolo com dezesseis velinhas. Sua me disse: Sei que no quer nossa presena na sua festa, mas no pode nos impedir de cantar os parabns.

Ele se emocionou. Os pais, Leandro e Iracema o estavam esperando. Cantaram os parabns, comeram o bolo e em seguida entregaram os presentes. Iracema costumava ir para sua casa s sextas-feiras, mas naquela sexta no foi. Levantou-se muito cedo no sbado, queria dar os parabns para Artur. Estava feliz por ver seu menino completar dezesseis anos. Aproximou-se: Muitas felicidades. Sei que vai te na vida tudo que deseja, um bom minino e merece s feliz. Obrigado, Iracema, sei que est sendo sincera. Craro que to! Te conheci quando era ainda um menininho, e hoje j t um moo qui d gosto! Em seguida ela saiu. Odete quis passear e almoar fora, queria comemorar o aniversrio do filho. Passearam, almoaram em um restaurante e voltaram para casa. Artur foi para o quarto se preparar para a festa. Viu no armrio seu tnis novo. Pensou: "Esse meu pai vale ouro! Vou guardar este tnis e s us-lo em momentos especiais." Terminou de se vestir e desceu: Nossa, meu filho! Como voc est bonito! J est quase um homem mesmo! Obrigado, mame, mas estou atrasado. Papai, o senhor me leva at l? Claro que sim, vamos indo. lvaro, acompanhado por Odete e Leandro, levou Artur at a entrada da danceteria. Artur no cabia em si de tanta felicidade. Quando estava saindo do carro, lvaro perguntou: A que horas quer que venha busc-lo? No precisa papai, no sei a que horas vai terminar. Voltarei para casa com algum amigo, pode descansar sossegado.

Acredita mesmo que vou ficar descansado at que volte para casa? Claro que sim! No se preocupe, vou ficar muito bem, aqui tenho muitos amigos. Est bem, vou tentar no me preocupar. Enquanto Artur entrava, os pais voltavam para casa. Dentro do carro, Leandro, acostumado a dormir cedo, adormeceu. lvaro e Odete iam conversando: Sabe Odete, nem acredito que os nossos filhos j estejam criados. Artur est fazendo hoje dezesseis anos, e Leandro j est com doze. Estamos ficando velhos! Eles esto crescidos, no criados! So duas prolas que Deus nos mandou! lvaro sorriu, e seguiram para casa. Enquanto isso, Artur entrava na danceteria. Ficou encantado com toda aquela iluminao. Ainda no havia chegado ningum. Ele, sendo o aniversariante, precisou chegar primeiro para receber os demais. Ficou ali olhando tudo. Estava

emocionado, pois era a primeira vez que seu aniversrio seria comemorado longe dos seus familiares. Precisava que fosse assim, pois aquilo j havia se tornado normal. J havia participado de muitos outros aniversrios de colegas, por isso sabia que eles iriam. Mas, mesmo assim, estava ansioso, e no fundo sentia medo que no aparecessem. Aos poucos foram chegando. Alguns em turmas, outros sozinhos. Logo o ambiente estava todo tomado de muita alegria. Artur no cabia em si de felicidade. Os amigos chegavam e o cumprimentavam. Ele olhava a todo instante para a porta de entrada, esperando ver Mariana entrar por ela. De todos ali, quem mais ele queria ver era ela.

Finalmente ela chegou, acompanhada por mais duas garotas. Aproximou-se dele e deu-lhe um beijo no rosto enquanto dizia: Feliz aniversrio, espero que esteja e seja muito feliz! Obrigado por ter vindo. Ela sorriu as amigas tambm o cumprimentaram.

Afastaram-se, foram se encontrar com outras garotas. Ele ficou ali, olhando-a afastar-se. Estava tremendo, sentia ainda os lbios dela em seu rosto. Estava assim quando se aproximou um rapaz dizendo: Ol, Artur, feliz aniversrio! Esta olhando para Mariana? Ela mesmo muito bonita! Artur voltou-se. Sorriu, respondendo: Ol, Rodrigo! Obrigado por ter vindo. Estou olhando mesmo, mas do que adianta? Ela nunca vai me notar, a no ser como amigo! Que isso, amigo? Voc at que um cara legal e bem apanhado. S tem que chegar at ela e dizer o que est sentindo! Nunca vou ter coragem para isso! Se quiser, posso ajudar! Como? Tenho aqui um cigarro. Se voc fumar, vai se sentir bem. Cigarro? No bem um cigarro, mas sei que vai lhe fazer muito bem. maconha. Maconha! Est louco? Nem pensar! Eu nem sequer fumo cigarro comum! Deixe de ser careta! A maconha no to ruim assim! S se vicia quem quer! Mas em horas como esta, em que est se

sentindo

inseguro,

nada

como

uma

"puxada"

pra

ajudar.

Experimente! Vai ver como vai se sentir outro! Nem pensar! No quero entrar nessa! Voc quem sabe. Estarei aqui noite toda. Se quiser, basta pedir. Sei que no vai se arrepender! Artur se despediu e foi conversar com outras pessoas. Rodrigo ficou olhando de longe. Enquanto todos danavam, Artur, que no sabia danar, ficava andando de um lado para o outro. Mariana parecia feliz, ria muito, conversava com um pequeno grupo. Artur a observava enquanto pensava: "Preciso me aproximar dela, mas como fazer isso? Ela to linda! No vai nem querer me olhar!" Queria, mas no conseguia, sentia-se muito alto e magro. Aquele rosto cheio de espinhas o incomodava. No tinha coragem de se aproximar. Continuou assim, andando de um lado para o outro, conversando, mas seus olhos no se afastavam dela. Estava no balco tomando um refrigerante quando Rodrigo se aproximou: Ento, Artur! Conseguiu falar com Mariana? No! Ainda no, mas at o final da noite vou conseguir. Vai nada! Voc no tem coragem! J disse que uma "puxada" vai ajudar voc! Ver que assim tudo ficar mais fcil! Est maluco? E se eu me viciar? Viciar? Que nada! S se vicia quem quer! Voc s vai ter coragem para falar com Mariana, nada mais que isso! Amanh no vai nem se lembrar! Tem certeza? Acredita que eu teria coragem para falar com ela?

Claro que sim! Tente! Uma vez s no tem problema algum! O que no pode ficar fumando sempre. Mas uma vez s no vai acontecer nada! Artur afastou-se, foi para a sacada, precisava respirar. Sentia-se agoniado: "Ser que vou conseguir falar com ela? Danar, ser agradvel? Fazer com que ela me note. Voltou para dentro. Mariana permanecia junto a um grupo. Ria e falava muito. Artur tentou se aproximar, mas no conseguiu. Olhou para o outro lado. Rodrigo estava olhando para ele e sorrindo. Artur no pensou mais, aproximou-se do amigo: Rodrigo, voc tem mesmo "aquilo" a? Tenho! Resolveu tentar? Garanto que no vai se arrepender.. Artur olhou mais uma vez para Mariana, percebeu que ela at ento no o havia notado. Decidido, disse: Est bem, vou tentar! Como vamos fazer? Muito bem, ver como vai se sair bem! Vamos l para fora, daremos uma volta pelo quarteiro. Quando voltar ser uma outra pessoa. Saram. J na rua, Rodrigo acendeu um cigarro para si e outro para Artur. Com muita pacincia, ensinou como o amigo deveria fazer para "puxar". Artur, a princpio, estava um pouco receoso. Levou um tempo para aprender como fumar. Tossiu um pouco, mas percebeu que estava se sentindo muito bem. Os dois, fumando, deram uma volta no quarteiro. Assim que terminaram os cigarros, voltaram para dentro da danceteria. Artur sentia-se estranho, parecia que levitava. L dentro viu Mariana, que ao

longe continuava conversando e se divertindo muito. Ele se aproximou: Mariana! J que sou o aniversariante, voc me deve uma dana, pode ser? Ela e os amigos com quem estava conversando

estranharam aquela atitude de Artur, pois todos o conheciam como um grande tmido. Mais por surpresa do que por vontade, ela aceitou. Saram danando, e para surpresa dela, percebeu que ele danava muito bem:

Pensei que voc no soubesse danar. Ele, rindo muito, respondeu: Tambm pensei! Acredito que eu s tinha medo! Como esse medo terminou! No sei, mas agora me sinto mais seguro. Danaram muito. Ele, falante, chamou a ateno dela. Por ter sido sempre um bom estudante, ele tinha muitos assuntos, falava sobre tudo. Ela ficou encantada: Sabe Artur, nunca pensei que voc fosse to agradvel assim, estou surpresa! Voc muito inteligente! Conversaram, danaram e se divertiram o resto da noite. Artur no cabia em si de tanta felicidade. Em dado momento, enquanto danavam, seus lbios se encontraram, e trocaram um beijo. Para ele, aquilo foi suprema felicidade. Finalmente ele conseguira aquilo com que sonhara desde que a vira pela primeira vez. A noite passou, o pai de Mariana foi busc-la. Despediram-se com mais um beijo. Aos poucos, todos foram

embora. Artur ficou com Rodrigo e mais alguns colegas. Saram juntos. Um deles possua carro. Entraram todos. Dentro do carro, mais cigarros foram acesos. Em determinado ponto, o motorista parou o carro e todos desceram. Haviam parado junto a um telefone publico, e rindo muito, destruram-no. Artur, at a, j havia fumado dois cigarros, mas estava muito bem, nunca se sentira solto daquela maneira. O carro parou em frente a sua casa. Ele desceu e entrou. Os outros continuaram sua jornada. J em casa, encontrou seu pai, que estava na sala assistindo televiso. Ao ver o pai, ele ficou um pouco assustado, com medo que percebesse que estava diferente. Disse: Boa noite papai, ainda no foi dormir? No, estava esperando voc chegar. Tentei, mas no consegui dormir. Estava preocupado. No precisava ficar preocupado, estou muito bem, s um pouco cansado. Vamos dormir? O pai sorriu, beijou sua testa e os dois subiram para seus quartos. Ao entrar em seu quarto, Artur sorriu ao ver seu irmo dormindo ali. Levantou o cobertor e cobriu-o enquanto pensava: "No adianta, ele definitivamente nunca vai dormir em seu quarto." Ainda sorrindo, deitou-se. Lembrou-se da noite que passara e da felicidade que sentira por ter finalmente tido coragem de falar com Mariana. Lembrou-se tambm do beijo. Suspirou profundamente: Quando acordou j era mais de meio-dia. Abriu os olhos, olhou a sua volta. A cama de Leandro estava vazia: "Que horas sero? Leandro no est mais dormindo. Ah, Leandro! No tem jeito, nunca vai dormir sozinho. Mame; fez para ele um lindo quarto, mas no adianta, ele quer dormir

comigo. Eu no ligo gosto muito dele e no me atrapalha em nada." Suspirou fundo enquanto pensava: "Que noite maravilhosa eu passei! Aquele cigarro que Rodrigo me deu foi a melhor coisa que poderia ter-me acontecido. Com ele, consegui me aproximar de Mariana. Como ela linda.... Sentou-se na cama, mas voltou a se deitar: "Estou com dor de cabea e de estmago. Deve ser fome, vou me levantar". Foi o que fez. Levantou-se, foi para o banheiro, tomou um banho, vestiu a roupa e desceu. Seu pai estava na sala lendo o jornal, Leandro assistia televiso, sua me devia estar na cozinha, pois aos domingos Iracema no ia trabalhar. Ele entrou na sala dizendo: Bom dia, papai! Dormi muito, no foi? Foi, sim, mas precisava. Parece que teve uma noite muito agitada! Artur lembrou-se do telefone quebrado. Receoso, disse: Por que o senhor est dizendo isso? Porque sempre que vai a essas festas chega cedo. Mas ontem foi diferente, quando chegou j estava quase amanhecendo. Parece que a festa foi muito boa. Aconteceu alguma coisa? No! Nada especial. S que a festa estava boa mesmo. Leandro disse: Papai, ele deve ter arrumado uma namorada! Artur, ao ouvir aquilo, aliviado e rindo, jogou uma almofada na cabea do irmo, que ria sem parar: No foi nada disso, mas, e se tivesse sido? O que tem a ver com isso?

Ele no tem nado mesmo, mas eu tenho. Voc ainda muito jovem, por enquanto deve se preocupar s com os estudos. Sei disso, no precisa se preocupar, vou ser o rei do computador! Preferia mesmo que fosse o rei dos advogados, mas se isso que deseja que seja. Parece que os meus trs homens esto muito bem hoje! Era Odete, que entrava na sala e sorria. Artur levantou-se e foi at a me. Abraou-se a ela, dizendo: Estamos, sim, nossa famlia uma beleza. Tambm, com uma me to bonita assim, como no seria? Est bem, j conheo voc muito bem. O almoo j est pronto. Com esse papo no vai se livrar de arrumar a mesa. Ela, rindo, saiu da sala. Artur e Leandro levantaram-se e foram para a sala de Jantar. Arrumaram a mesa com esmero, como a me os havia ensinado.

PRIMEIROS SINTOMAS PRECISO ALGO MAIS _ ELISA MASSELLI

Almoaram tranqilos. Artur estava com muita fome, tanta que sua me se surpreendeu: Nossa, Artur, parece que faz um ano que no come! O que est acontecendo?

No est acontecendo nada! S estou com fome! No entendo, a senhora vive brigando porque no como, e agora est brigando porque estou comendo! Os trs olharam para ele, intrigados pelo tom de voz que usara: No, meu filho, no estou brigando, estou at feliz! Por que est to nervoso assim? No estou nervoso, mas no quero comer mais! Vou para o meu quarto! Levantou-se e ia saindo da mesa quando lvaro, com voz firme, disse: Mocinho! Pode pedir desculpas a sua me e voltar a se sentar. Ainda no terminamos o almoo! S ento Artur se deu conta de que havia sido maleducado coma me: Desculpe mame, no sei o que me deu... Acredito que foi por estar cansado. No estou acostumado a dormir to tarde! No se preocupe, volte a se sentar e termine seu almoo. Ele voltou a se sentar. Continuou comendo, mas sentiu uma espcie de enjo. No disse nada, mas aps o almoo pediu licena e foi para o seu quarto. L chegando, deitou-se na cama e comeou a relembrar a noite anterior: "O que ser que tem naquele cigarro? S sei que por causa dele consegui me aproximar de Mariana. Ela tambm parece que gostou da minha companhia. Amanh na escola vou falar com ela novamente. Ser que ela vai querer falar comigo?" Levantou e olhou-se no espelho. Seu rosto ainda

continuava cheio de espinhas. Sentiu uma cerca insegurana:

"O que ela viu em mim para que eu a agradasse! Ser que ela no quis s ser educada? No sou bonito como o Csar.... Csar era um rapaz muito bem apessoado. Tinha dezoito anos. Era atleta, tinha um corpo perfeito. Todas as meninas da escola dariam tudo para que ele as olhasse. Artur, embora no fosse feio, estava comeando a tomar corpo. Sentia que Mariana preferia que fosse Csar quem se interessasse por ela. Ficou no quarto dormindo quase a tarde toda. Artur, acorde! Mame est chamando, est na hora de irmos para o restaurante. Ele abriu os olhos. Leandro o estava chamando. Com muito custo, conseguiu ficar com os olhos abertos. Lembrou-se que em quase todos os domingos iam jantar fora. Disse: J vou me levantar. Logo estarei l embaixo. Leandro no disse nada. Saiu. Artur ficou mais um pouco de tempo deitado, depois se levantou. Sua cabea doa. "Deve ser porque no estou acostumado a dormir tarde. Ou por ter passado quase a noite toda acordado." Relembrou mais uma vez de tudo o que havia acontecido na noite anterior: "Estava muito legal, mas como ajudei a quebrar aquele telefone pblico? Ser que foi o efeito do cigarro? Talvez tenha sido por isso melhor que eu no volte a fumar." noite saram, foram jantar. Voltaram, ele foi para o seu quarto, ligou o computador e ficou estudando a lio que havia aprendido na ltima aula. Seus planos eram: assim que terminasse o ensino mdio, prestaria vestibular para a Faculdade de Cincias da Computao. Queria essa profisso. Sabia que com

ela teria seu futuro garantido, j eram quase onze horas quando resolveu dormir. No dia seguinte foi mesma rotina. Acordou atrasado, o pai lhe deu dinheiro para o lanche. Quando chegou escola viu Mariana conversando com outras meninas. Estremeceu, no sabia o que fazer ou como encar-la. Viu tambm Rodrigo, que se aproximava: Bom dia, Artur! Tudo bem com voc? Bom dia, est tudo bem. Vi que estava olhando para Mariana. Estava sim, ela mesmo muito bonita. Agora j sabe que pode falar com ela e, quem sabe, comear um namoro. Namorar! No, ela muito bonita! No vai querer namorar algum como eu! Que bobagem voc est dizendo! Ela pareceu estar muito feliz ao seu lado. Parece que gosta de voc... Artur olhou novamente para Mariana que, distrada, conversando, no viu quando ele chegou. Disse: No sei, no, acho que voc est delirando. Ela nunca vai me querer. Rodrigo no disse nada, apenas sorriu. Todos entraram para a sala de aula. Mariana passou por Artur e sorriu. Durante a primeira aula, ele arriscou olhar para ela, mas assim que percebia que ela tambm o estava olhando, tremia e desviava o olhar. Na hora do lanche ela continuou com as amigas. Artur estava comendo quando Rodrigo se aproximou: Ento, Artur, j resolveu conversar com Mariana? Percebi que ela est lhe dando uma bola danada!

Voc est louco! Ela nem sabe que existo. Por que no vai falar com ela? No posso! Nem sei como me aproximar... Tenho a soluo, E s querer. Outro cigarro? No, no posso! Voc quem sabe. J viu que no fez mal algum. Artur falou nervoso: No, no quero isso muito perigoso! Perigoso por qu: Fosso me viciar, e j ouvi muitas histrias... Disse bem, muitas histrias. Ningum se vicia. S continua nas drogas quem quer. Isso de vcio mentira. Tem certeza? Claro que tenho. Eu mesmo s uso quando quero, quando estou a fim. Se quisesse, hoje mesmo pararia. Tem certeza disso? Estou dizendo! J uso h algum tempo, mas s quando quero. No sei, no. Tenho medo. Por isso que no consegue se aproximar dela. Tem medo de tudo! Artur olhou novamente para o lado em que Mariana se encontrava. Ela continuava conversando com as colegas.

Arriscava um olhar para ele, que assim que percebia, desviava o seu. Voltaram para a aula. Ele, como sempre, prestou ateno na aula e entendeu o que os professores ensinavam. Durante alguns dias foi assim. Ele olhava para Mariana, mas no tinha coragem de se aproximar. Rodrigo estava sempre por perto.

Fazia j quinze dias desde aquela noite. Artur, em casa, fazia planos de como faria para falar com Mariana, mas sempre que ela se aproximava, ele no conseguia dizer o que havia planejado. Em uma manh, quando estava tomando lanche,

Mariana se aproximou: Ol, Artur. Por que voc no me procurou mais desde aquela noite? Ele comeou a tremer, no sabia o que dizer. Ela continuou: Pensei que havia gostado da minha companhia! Ele disse com a voz baixa: Claro que gostei s que estou estudando muito nos ltimos tempos. Ela apenas sorriu: Eu tambm estou estudando, mas nem por isso preciso me isolar das pessoas. Ele no sabia o que dizer. Queria continuar conversando, mas no tinha assunto. Sorrindo, afastou-se. Agradeceu

intimamente quando ouviu o sinal para que os alunos voltassem para a classe. Mais trs dias se passou. Em casa, ele imaginava, mas na presena da Mariana, sua voz sumia. Naquela manh, enquanto ouvia as explicaes do professor de Portugus, arriscava olhar para ela, mas assim que a percebia olhando, rpido disfarava, fingia que estava olhando para o outro lado. Em uma dessas vezes, seu olhar cruzou-se com o de Rodrigo, que prestava ateno nele. Um pouco sem graa, desviou o olhar. Sem perceber, comeou a se lembrar daquela noite em que beijara Mariana:

"Naquela noite foi tudo to fcil... eu sabia o que fazer ou falar... por que no consigo hoje? Ser que Rodrigo tem razo? Ser que se eu fumar mais uma vez conseguirei talar com Mariana. No, perigoso, meus pais sempre me alertaram contra isso." Mais um dia se passou. noite, sozinho em seu quarto, voltou a se lembrar de Mariana e de como ela era bonita. Antes de dormir, resolveu: "Amanh vou falar com ela de qualquer maneira. Nem que seja preciso fumar novamente aquele cigarro. Vai ser s mais um." Na manh seguinte, assim que chegou escola, olhou para Mariana, tentou se aproximar, mas mais uma vez comeou a tremer. Desviou o olhar e entrou na sala de aula. Durante o tempo todo tentou olhar para ela, mas no conseguia. O sinal tocou, era hora de todos irem para a cantina. Enquanto saam, Rodrigo se aproximou: Ento, Artur, como est? Estou bem, mas preciso falar com voc. Que aconteceu? Quero falar com Mariana, mas no estou conseguindo. Ser que voc no poderia me arrumar outro cigarro daqueles? Rodrigo comeou a rir: Quer mesmo? Disse que tinha medo, que no queria... Tenho medo, pois sempre fui muito alertado, mas j faz algum tempo que fumei e no senti falta. Por isso sei que posso fumar s quando quiser. Vou fumar s mais um, falarei com Mariana e no vou precisar mais. Voc quem sabe. Tenho um aqui, se quiser, pra j... Aqui na escola?

Claro que no. Vamos sair, e na rua usaremos. Fao companhia pra voc. Como sair? No nos deixaro passar pelo porto! No tem ningum no porto, sempre saio. Vamos! Ele acompanhou Rodrigo e estranhou que na portaria da escola no havia mesmo ningum. Logo os dois estavam em uma pracinha que havia ali perto. Sentaram-se. Rodrigo tirou do bolso dois cigarros. Acendeu um e deu para Artur. Este olhou para o cigarro e para Rodrigo. Pensou um pouco, em seguida deu a primeira tragada. Essa foi a mais difcil, as outras foram mais rpidas e fceis. Assim que terminaram o cigarro, voltaram para a escola. Ele no estava sentindo nada. J na sala de aula arriscou novamente olhar para Mariana, justamente no momento em que ela estava olhando. Ele sorriu. Ela, admirada, sorriu tambm. Aps o termino da aula, no corredor, ele se aproximou: Mariana, preciso falar com voc. Ela estranhou aquela atitude. Um pouco desajeitada, disse: Que bom, pensei que este dia nunca fosse chegar! Voc est diferente! O que aconteceu? Ele, rindo muito, respondeu: Diferente como? S estou feliz por estar conversando com voc. E s isso mesmo? Claro que ! No quer conversar comigo! Que idia! Estou feliz por isso. S que no pode ser agora, minha me j deve estar l fora me esperando. S ento ele se lembrou do pai. Descontente, disse: Meu pai tambm deve estar a fora, ou quase chegando. Quando poderemos nos ver com mais calma?

Hoje tarde no vai dar, pois vou aula de bale, mas amanh, se quiser, pode ir tomar um lanche l em casa. Voc quer! Claro que sim. Amanh l pelas quatro vou at sua casa. Chegaram ao porto, Mariana viu a me, que a estava esperando. Acenou para Artur se dirigiu a ela. Artur ficou olhando-a se afastar. Percebeu que o pai ainda no o estava esperando. Foi para o ponto de encontro. No conseguia ficar parado, andava de um lado para o outro. Nunca seu pai demorara tanto para chegar. Finalmente o pai chegou. Artur entrou no carro e seguiram para casa. Durante o caminho seguia calado. Embora sentado, no conseguia ficar parado. Movia-se muito, lvaro estranhou: Artur! O que voc tem? No pode ficar parado? Artur demorou um pouco para responder: No tenho nada. S estou com fome. Tenha um pouco de pacincia. Estamos chegando em casa. Sabe que o almoo est pronto. Artur no respondeu. Voltou seu rosto para a janela e ficou olhando o caminho. No sabia o que dizer. No havia notado que estava se metendo canto. Tentou se controlar. Finalmente chegaram. Ele desceu quase correndo. Entrou em casa, subiu as escadas e foi para o seu quarto. Iracema estava preparando a mesa para o almoo. Viu Artur entrando calado e correndo. Admirou-se, pois sempre que ele chegava da escola brincava com ela ou dizia algo, mas nesse dia no fez nada. Admirou-se, mas no disse nada. Em seu quarto, Artur se jogou na cama. Preocupado, pensava: "No entendo o que est acontecendo. Por que este malestar? Por que esta vontade de chorar? Este vazio?"

Precisava descer para o almoo, mas no sentia fome alguma. Aps alguns minutos, trocou de roupa e desceu. Almoou em silencio, Leandro tentou falar com ele, mas no obteve resposta. Todos estranharam. Odete disse: Artur, o que voc tem? Ele tambm no entendia aquilo que sentia. Achou que aquele era o momento de contar o que estava passando. Sabia que algo no estava bem, mas.. Respondeu: No tenho nada! S estou um pouco nervoso! Nervoso por qu? Ele no sabia o que responder, tambm no sabia o motivo. Alguns minutos depois, disse: Estou com problemas. Que problemas? Ia contar o que estava acontecendo, mas lembrou-se de tudo que j ouvira falar sobre as drogas. Tinha medo de como seus pais reagiriam se maconha. Inseguro, respondeu Com a aula de Portugus, no estou conseguindo entender. Ora, meu filho, no precisa ficar nervoso. Basta me dizer, qual a sua duvida? Posso ajud-lo. No precisa mame, vou estudar mais um pouco, farei alguns exerccios, sei que vou entender. Est bem. Mas, se precisar, basta me dizer. Agora almoce. Sua comida vai esfriar. Ele comeou a comer, mas na realidade no sentia nenhuma vontade. contasse que tinha experimentado

Aps o almoo, como todos os dias, todos saram. Ele subiu para o seu quarto. Deitou-se na cama, tentou dormir, mas no conseguiu. Mariana surgiu em seu pensamento: ''Hoje consegui falar com ela. No foi to difcil como eu imaginava. Parece que ela tambm est interessada em mim. Ser que est mesmo ou s est sendo educada? Amanh irei ate sua casa. Teremos mais tempo para conversar. Vou dizer que quero namor-la. Ser que vai me aceitar?" Assim pensando, adormeceu. Acordou algumas horas depois. Estava muito suado, sentia calor. Levantou-se, foi ao banheiro e tomou um banho frio. Sentia que seu corpo estremecia. No entendia o que estava acontecendo. "Devo estar com um incio de resfriado. Vou pedir algum remdio para Iracema." Vestiu a roupa, desceu. Iracema estava na cozinha. Ele se aproximou: Iracema, voc tem algum comprimido para gripe? Pur qu? T sentindo arguma coisa? Acho que estou com febre, estou muito quente. Ela, com olhar preocupado, aproximou-se, colocou a mo em sua testa. Sorriu enquanto dizia: No ta cum febre. T morna. Irritado, ele disse: Como pode saber? Voc no colocou o termmetro! Ela estranhou seu tom de voz: No preciso disso a. O cal da febre diferente. Tive muitos filhu, cunheo a diferena. Num ta cum febre. Mesmo assim, quero um remdio. No podi toma remdio sem precis.

Muito nervoso, ele saiu da cozinha dizendo em voz baixa: Estou com febre! Sei o que estou sentindo. Ela no sabe nada. Saiu de casa, comeou a andar sem destino. Sentia necessidade de andar, no podia ficar parado. Andou a tarde toda. Eram quase seis horas quando retornou. Entrou em casa, no estava bem, isso ele sabia. A casa estava vazia, seus pais e Leandro ainda no haviam retornado. Ouvia um barulho que vinha da cozinha. Era Iracema que preparava o jantar. Foi para o seu quarto. J l dentro, olhou para o computador. Sabia que precisava estudar. Sentou-se e ligou o computador. Ficou alguns minutos estudando. Levantou-se, no conseguia se concentrar. Desceu, foi para a sala. Ligou o televisor. Assistiu um pouco, mas tambm no conseguia se concentrar na programao, Voltou para o quarto, ficou l por alguns minutos, retornou para a sala. Fez isso vrias vezes, at que sua me chegou acompanhada por Leandro: Ol, Artur, tudo bem? Ele, com a voz muito baixa, respondeu: Tudo bem, a senhora demorou muito... Odete aproximou-se e beijou-o, enquanto dizia: No demorei! Chego todos os dias a esta hora! No est bem? Est doente? No tenho nada, s senti sua falta... Ela percebeu que ele no estava bem. Olhou em seus olhos, perguntando: O que est acontecendo! Est triste! Ele sentiu que aquele era o momento. Sentia-se mal, estava deprimido, o pior era que no sabia o motivo. Ia contar, quando a porta se abriu e por ela entrou lvaro, sorrindo:

Boa noite, famlia! Os trs olharam para ele, que se aproximou e beijou a todos. Aps beijar o pai, Artur se afastou, foi para o seu quarto. Odete o acompanhou com os olhos enquanto ele subia

vagarosamente a escada. "Meu estmago est doendo. Por que ser? Ser por causa daquele cigarro que fumei? Rodrigo garantiu que no ia me acontecer nada!" Ficou em seu quarto, no sentia vontade de conversar. A dor e a ansiedade foram aumentado, ele escava muito triste e sentia vontade de chorar. "Por que estou me sentindo assim? Por que esta vontade de chorar? Por que esta tristeza? Isso no normal!" Enquanto isso, na sala, Odete e lvaro conversavam: lvaro, no sei o que est acontecendo com Artur. Ele parece muito nervoso. Isso no nada, como ele mesmo disse, est com problemas com Portugus. Tomara que seja s isso mesmo. Estou preocupada, e se ele estiver doente? S est cansado, mas se estiver doente, bastar lev-lo ao mdico. Artur continuava se sentindo mal. Aquele vazio e a ansiedade. Tentou mexer no computador, mas no conseguiu: "No estou conseguindo fazer nada. Que ser que est acontecendo comigo? Vou ligar para Rodrigo, talvez ele tenha uma explicao para isso. Foi exatamente o que fez. Pegou o telefone e ligou: Oi, Rodrigo, sou eu, Artur!

Oi, Artur! Estou estranhando voc me ligar, aconteceu alguma coisa? Acredito que possa me responder: o que est

acontecendo? Estou com uma sensao estranha! Estou sentindo um enorme vazio, mas no sei por qu. E tambm estou muito ansioso, no consigo ficar parado! Isso no nada! s vezes a "erva" tem essa reao, mas vai passar. Se quiser, venha at aqui e lhe dou um remdio. No posso sair agora, hora do jantar! Meus pais no me deixaro sair! Ento, no posso fazer nada. Isso vai passar? Como posso saber? Voc deve ter comido alguma coisa que lhe fez mal... No comi nada. Quando quiser, venha, estarei aqui. Est bem. Irei assim que for possvel, no saia de casa. No sairei, estarei esperando. Artur desligou o telefone e sentou-se em frente ao computador.

MUDANA DE HUMOR PRECISO ALGO MAIS _ ELISA MASSELLI

Estava ali tentando entender um programa, mas percebeu que j no tinha a mesma facilidade que antes. S pensava em uma maneira de sair de casa e encontrar Rodrigo. Leandro entrou:

Artur, o que est acontecendo? Ele, nervoso, respondeu: No est acontecendo nada! Por que todos esto perguntando isso? Porque voc est diferente. No estou diferente! Sou o mesmo! No no! Est sempre calado, no brinca como antes! No est nem roubando as minhas batatas! Artur sorriu: Talvez voc tenha razo, estou um pouco preocupado, s isso. Preocupado com o qu? Com as aulas de Portugus, mas logo vai passar. Sei que voc me acha uma criana, mas gosto muito de voc. meu irmo, e se achar que posso ajudar, basta pedir, farei tudo por voc. Artur pensou: "Talvez eu devesse contar a ele, ele falaria com meus pais. Eu no tenho coragem." Voltou o olhar para o irmo. Ia falar, quando Leandro disse: Sabe que voc meu heri! Quando crescer, vou ser igual a voc! Irritado, Artur gritou: No diga isso! Voc no vai ser igual a mim! Vai ser diferente! Leandro se assustou com aquela reao: Por que est dizendo isso? Por que est to nervoso? No estou nervoso! Est sim! Esta gritando!

Artur voltou a si. Notou que, sem perceber, estava mesmo gritando. Deitou-se na cama, dizendo: Desculpe, estou mesmo muito nervoso. Agora, por favor, saia, preciso estudar um pouco. Preocupado, Leandro saiu do quarto. No estava

reconhecendo o irmo. Na sala, sentou-se em frente ao televisor. Seu pai estava no banho, sua me na cozinha conversando com Iracema. Artur continuou no quarto at a hora do jantar. Desceu e, calado, jantou. Respondeu a algumas perguntas de seus pais. Aps terminar o jantar, deu boa noite e voltou para o quarto. Estava triste, s tinha vontade de chorar. Estava deprimido. Naquela noite dormiu muito bem. Acordou, lembrou-se que era o dia de ir casa de Mariana. No sentia nada, todo aquele mal-estar terminara. Olhando no espelho, sorriu enquanto pensava: "Hoje estou bem, assustei-me toa. Devo mesmo ter comido algo que me fez mal. Fiquei preocupado sem razo. Imaginei muitas coisas. Fiquei com medo de estar viciado, mas como Rodrigo disse que s vou me viciar se quiser. Nunca mais vou fumar. Tudo passou." Tomou banho, desceu. Sua me havia ido ao

supermercado. Seu pai, junto com Leandro, sorriu ao v-lo entrar na sala. Leandro disse: Estamos esperando voc para irmos ao clube. No posso ir. Por qu? Vou at a casa de uma amiga da escola. Leandro, com olhar maroto, disse: Papai, no disse que ele tinha arrumado uma namorada?

lvaro olhou paca Artur, que respondeu irritado: No nada disso! E s uma amiga! Ns vamos estudar! lvaro disse: E s isso mesmo que deve fazer. Sabe que no quero que namore, ainda muito cedo. Tem que estudar. Sei disso, no se preocupe, no estou namorando. E s uma amiga. Est bem. No quer mesmo ir ao clube? No. Ento, at logo. Vamos, Leandro. Vamos aproveitar o sol. Quando estavam saindo, Artur disse: Esperem s um pouco, s irei casa de Mariana tarde, tenho tempo para ir com vocs at o clube. lvaro sorriu: Est bem, mas apresse-se. Artur subiu correndo para o quarto, pegou sua roupa de banho e desceu. Os trs saram alegres em direo ao clube. L, enquanto lvaro jogava tnis, Artur e Leandro, alegres, nadavam. Artur estava feliz, sentia que tudo estava bem, voltara a ser como antes. Leandro tambm estava feliz. Disse: Artur, hoje voc est bem, voltou a ser o meu irmo de antes. Artur sorriu: Nunca deixei de ser seu irmo. Tambm no sei por que est dizendo isso. Era quase meio-dia quando Odete chegou. Foi em direo piscina. Viu seus filhos nadando e brincando. Sabia que lvaro estava na quadra de tnis. Ficou olhando um pouco, depois chamou os dois:

Artur! Leandro! Eles olharam para ela e, juntos, saram da piscina. Assim que chegaram perto, ela disse: Esta na hora do almoo, vamos at a quadra esperar o pai de vocs terminar de jogar. Sob protestos, os dois a acompanharam. lvaro terminou de jogar. Despediu-se dos amigos e foi para junto da famlia: Perdi a partida, mas no faz mal, ao menos fiz exerccio fsico. Todos riram, pois sabiam que ele ficava muito bravo quando perdia no tnis. Almoaram. Artur comeu muito bem. Aps o almoo voltaram para casa, Artur estava ansioso, hora de ir para a casa de Mariana estava chegando. Vestiu-se, colocou seu tnis. Olhouse varias vezes no espelho. Queria mostrar boa aparncia. Havia pensado muitas vezes no que diria a ela. "Vou pedir para namor-la. Ela vai aceitar, s tenho que deixar bem claro que preciso estudar. Mas poderemos nos ver na escola ou na sua casa. Depois a convidarei para que venha at aqui." Aps julgar que estava pronto, deu uma ltima olhada no espelho e desceu. N a sala de televiso, seus pais conversavam; olhou para eles, dizendo. Papai, mame, estou saindo. Voltarei antes do jantar. Odete aproximou-se e beijou o rosto do filho. Est bem, divirta-se. Artur saiu. Mariana morava a quatro quadras de sua casa. Decidido, caminhou. Parou em frente ao porto da casa dela.

Passou a mo pelo cabelo, respirou fundo. Ia apertar o boto da campainha, mas estremeceu. "No posso fazer isso. No sei o que dizer. No vou ter assunto. Vou parecer um bobo. No, no posso entrar." Afastou-se dali quase correndo. Chegou praa que existia l perto. Sentou-se em um banco. Tremia muito, estava nervoso. "Por que essa insegurana voltou? Sei que ela gosta da minha companhia. No, ela gosta daquele Artur alegre e falante. Que conversa sobre todos os assuntos. No deste que est aqui. No saberei falar com ela... a no ser que fume um daqueles cigarros... isso mesmo. Preciso de um cigarro... vou ate a casa de Rodrigo, ele deve ter um." Saiu correndo. Assim que chegou, tocou repetidas vezes a campainha, mas ningum atendeu. Estava nervoso. Trmulo, tocou, tocou, mas nada. Teve que aceitar, Rodrigo no estava em casa. Saiu dali. "No posso voltar para casa. Todos vo querer saber por que voltei cedo. Vou tentar novamente. Vou at a casa de Mariana." Fez isso, mas, como da primeira vez, no conseguiu apertar a campainha. "No posso... no posso." Ficou andando o resto da tarde. Estava novamente triste e com aquele ardor no estmago. s seis horas da tarde voltou para casa. Ali tudo continuava como sempre. Entrou, cumprimentou a todas, foi para o seu quarto. Quando estava subindo a escada, ouviu a voz de Leandro: Ento, Artur, namorou muito?

Nervoso, ele respondeu: J disse que no estou namorando! Pare de falar assim! lvaro disse: Espere ai, mocinho, seu irmo est apenas brincando, no precisa ser malcriado. Desculpe papai; desculpe Leandro. S no quero que digam que estou fazendo algo que na realidade no estou. Terminou de subir a escada, entrou no quarto. Era o nico lugar onde se sentia bem. Mais tarde desceu para o jantar. Continuava nervoso e tremendo. Conversou um pouco, voltou para o quarto. Estava novamente com aquela tristeza da qual no sabia o motivo. No conseguia ficar parado, andava de um lado para o outro. Deitava, levantava, ia ao banheiro. Isso durou a noite toda. Dormia, acordava, levantava e deitava novamente. J eram onze horas da manha. Artur dormia

profundamente quando Leandro entrou. Aproximou-se da cama e suavemente chamou: Artur, acorde... Artur abriu os olhos. Ao ver Leandro ficou furioso. Sentou-se na cama e disse, gritando: O que voc quer? Ser que no posso dormir? Assustado, Leandro respondeu: Mame pediu que eu viesse chamar voc. J tarde... Artur olhou para o relgio. Ao ver a hora, percebeu que realmente era tarde. Olhou para Leandro, notou que ele estava assustado: Desculpe, Est bem, pode descer, j vou me levantar. Leandro saiu do quarto quase correndo.

Artur permaneceu sentado na cama, sentiu que o tremor e a ansiedade continuavam. Percebeu que precisava de um remdio, sabia que s Rodrigo poderia ajud-lo, ou pelo menos dizer por que estava sentido aquilo. Pegou o telefone, discou. O telefone chamou varias vezes, at que algum atendeu: Al, quem ? Oi, Rodrigo, sou eu, Artur. Preciso de sua ajuda! No estou me sentindo bem... O que est sentindo? Estou nervoso, com aquela sensao estranha... Venha at aqui, vou lhe dar o remdio. Irei, mas, por favor, no saia de casa... No vou sair, hoje domingo, minha me est em casa. Est bem, logo mais estarei a. Desligou o telefone, foi at o banheiro, olhou-se no espelho. Estava com olheiras profundas: "Vou, sim! No estou agentando mais!" Aliviado, pois sabia que logo ficaria bem, ensaiou um sorriso e desceu. Aps o almoo, disse: Papai, mame, vou at a casa de Rodrigo. Vamos ter uma prova, e ele est com um pouco de dificuldade. Ligou pedindo para que eu v at sua casa. Odete admirou-se: Mas, meu filho, hoje domingo! Sei mame, mas a nossa prova amanh! Ora, Odete, deixe o menino ir. Isso um sinal de que ele no est doente! Est bem, meu filho, mas no volte muito tarde.

Artur, aliviado, beijou o pai e a me e saiu. A ansiedade era intensa, seu corpo continuava tremendo. Chegou ao porto da casa de Rodrigo, que ficava duas ruas atrs da sua. Rodrigo morava em um sobrado junto com a me. O nvel de vida dele era bem diferente do de Artur. Sua me separara-se de seu pai j havia algum tempo. Ela trabalhava muito para poder manter a casa e seu filho em uma boa escola. Por trabalhar muito, quase nunca estava em casa. Rodrigo vivia praticamente sozinho. Artur tocou a campainha. A me de Rodrigo abriu: Ol, Artur, como vai? Ol, dona Glria, estou muito bem. Vim aqui falar com Rodrigo. Que bom, pode entrar. Ele est em seu quarto, vou cham-lo. Artur entrou, sentou-se em um sof enquanto dona Glria subia uma escada que levava ao andar superior. Ele ficou olhando tudo a sua volta. Aquela sala era bem diferente da sua, embora estivesse bem mobiliada. Era pequena e apertada. Os mveis tambm no eram da mesma qualidade dos seus. Enquanto Artur observava, Rodrigo chegou com a me: Ol, Artur, pensei que fosse demorar! Preciso tirar algumas dvidas de Portugus. Dona Glria admirou-se: Voc acha que Rodrigo vai tirar essas dvidas? Ele est indo to mal na escola! Estou indo mal, mas em Portugus sou bom, no , Artur? Artur no estava acostumado a mentir. Alis, nunca mentira, por isso no estava muito vontade quando respondeu:

E isso mesmo! Em Portugus ele muito bom... Rodrigo sorriu maroto: Venha, Artur, vamos para o meu quarto. Artur, um pouco sem graa, seguiu Rodrigo. J no quarto, disse nervoso: Rodrigo, no estou me sentindo bem! Estou com uma sensao estranha! Estou ansioso e tambm tremendo muito... Sabe me dizer o que ? Isso no nada! Vou lhe dar aquele remdio, vai ver como ficar bom... No h outra maneira? Estou ficando com medo! No estou mais agentando, precisei mentir para os meus pais, no gosto disso! No se preocupe, vai ficar bem. Tambm, uma

mentirinha no faz mal algum! Onde est o remdio? No podemos usar aqui, minha me est em casa, precisamos sair. Vamos? Claro que vamos, preciso me livrar deste mal-estar! Desceram. A me de Rodrigo estava na sala assistindo televiso. Ele se aproximou, dizendo: Me, eu e Artur vamos dar umas voltas por a! Sem tirar os olhos do televisor, disse: No vo estudar? Primeiro vamos casa de um amigo pegar um livro. Esta bem, meu filho, mas no demore. No se esquea que estou aqui sozinha... No me esquecerei, sabe que adoro ficar em sua companhia. Saram para a rua. Artur estava sentindo-se cada vez pior:

Rodrigo, d-me o remdio, no estou me sentindo bem... Ele no respondeu, apenas sorriu. Chegaram a uma praa. Rodrigo disse: Vamos nos sentar aqui. Sentar! No quero sentar! Preciso do remdio! Rodrigo falou devagar: Fique tranqilo, aqui est o seu remdio. Vai ver como ficar bem... Artur pegou em suas mos o cigarro que Rodrigo lhe oferecia. Pensou um pouco. Devolvendo o cigano, disse: No! No quero! Tem que haver outro remdio! Estou achando que esse mal-estar que estou sentindo por causa dos cigarros que fumei! No quero! Voc quem sabe... O nico remdio que conheo este... Voc me garantiu que eu no me viciaria! No est viciado. Isso acontece com todos nas primeiras vezes, mas logo vai passar e no sentir mais isso... Tem certeza do que est me dizendo? Claro que tenho... Fume este que estou lhe dando e ver como vai ficar bem... Artur ainda pensou em no aceitar, mas estava mesmo sentindo-se muito mal. Pegou o cigarro que Rodrigo lhe oferecia: Vou tentar, preciso fazer qualquer coisa para ficar bem. Tenho que estudar, vamos realmente ter provas esta semana! Rodrigo acendeu o cigarro, deu uma tragada e entregou para Artur, que tambm fumou do modo como ele havia lhe ensinado. Aps ter dado trs tragadas, percebeu que aquele malestar estava passando. Rodrigo! A ansiedade e o mal-estar esto passando!

No disse que ia ficar bem? E assim mesmo... Continuou fumando. A cada tragada parecia que sua cabea flutuava e sentia ser outra pessoa, diferente daquela que havia chegado casa de Rodrigo. No estava mais nervoso, sentia que estava flutuando. Rapidamente comeou a rir e querer sair correndo. Rodrigo ficou olhando para ele sem dizer uma palavra, apenas observando. Logo Artur estava muito bem. Ficou mais um tempo por ali, olhando as rvores e vendo os pssaros, que para ele possuam cores deslumbrantes. Comeou a escurecer, lembrou-se que precisava voltar para casa. Rindo muito, falou: Preciso voltar para casa, meus pais no gostam que eu fique na rua durante a noite. Vamos voltar agora voc est bem. No diga nunca que no o ajudei. Foi at a casa de Mariana? Fui, mas no consegui tocar a campainha. Agora acredita que conseguiria? Rindo muito, respondeu: Acredito que sim! Estou muito bem. For que no vai ate l? Agora no posso, preciso voltar para casa. Amanh vai conseguir. Acho que sim. Voc mesmo um amigo! Pode ter certeza que sou... Despediram-se, e Artur voltou para casa. Sentia que estava tudo bem, todo aquele mal-estar havia passado e ele estava at muito feliz.

Entrou em casa. Seu pai lia um jornal, sua me preparava o jantar e Leandro jogava vdeo game. Foi at a cozinha: Mame, estou com muita fome, o que temos para comer? Sabe que no gosto de anunciar a comida antes da hora, mas vai gostar muito do que estou preparando. Volte para a sala, logo mais estar pronto! Em seu quarto, ligou o computador e comeou a mexer, precisava fazer um trabalho que seu professor de computao havia pedido. Pensava: "Sei que vou trabalhar toda a minha vida com

computadores. Vou aprender cada vez mais. Quero dominar tudo muito bem. O que mais desejo aprender a fazer programas". Ficou ali por um bom tempo, at que Leandro entrou sem bater. Artur, mame est chamando, o jantar est pronto! Ele olhou para o irmo, levantou-se e mexeu nos cabelos dele da maneira que sabia que o deixava irritado. Leandro pegou uma almofada que estava em cima de um sof, atirou nele e, rindo, saiu correndo. Artur, rindo tambm, correu atrs dele. Chegaram correndo na sala. Odete tambm sorriu ao ver os dois brincando, mas fingindo estar brava, disse: Vocs dois, querem parar com essa briga! Vamos jantar! No estamos brigando, s que Artur mexeu nos meus cabelos, e eu no gosto! Ele me jogou uma almofada! Est bem, mas agora chega! Todos se sentaram. Artur sentia muita fome. Ele mesmo estranhou, pois no era de comer muito. Sua me tambm percebeu que estava comendo mais do que o normal, mas lembrando do que havia acontecido no outro dia, no disse nada.

Assim que terminaram de jantar, ele voltou para o seu quarto. Estava na metade do trabalho, precisava terminar. Voltou a mexer no computador, mas logo comeou a sentir muito sono. Estranhou, porque no era de dormir cedo. Tentou continuar estudando, mas no conseguiu, o sono foi mais forte. Desligou o computador, deitou-se e dormiu imediatamente. Antes de deitar, Odete passou pelo quarto dele. Vinha acompanhada por Leandro. Os dois admiraram-se por ele j estar dormindo. Leandro se deitou, ela os cobriu e saiu. No meio da noite Artur acordou: "No, meu Deus! No pode ser! Aquela sensao est voltando!" Levantou-se. Com a mo sobre o estmago, foi at o banheiro. Olhou-se no espelho. Percebeu que ainda estava com grandes olheiras. Sua boca estava seca e o tremor voltava com mais intensidade: "E agora, o que vou fazer?" Resolveu tomar um banho para ver se melhorava. Ligou o chuveiro, entrou e ficou ali parado, apenas sentindo a gua cair por seu corpo. Ficou ali por quase meia hora. Saiu do chuveiro, estava um pouco aliviado, mas percebeu que o tremor estava intenso. Foi para a cama, deitou-se e ficou o resto da noite virando de um lado para o outro. Odete, como fazia todos os dias pela manh, abriu a porta. Estranhou ao ver Artur acordado olhando para o teto. O que aconteceu? J est acordado? Esta sentindo alguma coisa? Est com alguma dor? Ele sentiu vontade de contar o que estava acontecendo, mas no teve coragem. Sua me no entenderia e contaria para o seu pai, e isso ele no queria:

No estou sentindo nada, acordei porque ontem dormi cedo. Ainda bem. Levante-se, seu pai j est no banho. J que acordou cedo, podem tomar caf com ele. Vou fazer isso! S assim ele no vai brigar comigo por eu sair sem me alimentar. Ela saiu do quarto. Artur sentia aquela sensao ruim. Novamente foi para o chuveiro e tomou um banho rpido. Antes de sair, olhou para o espelho. Seu rosto continuava com muitas espinhas, mas aquilo no o preocupava mais. Havia conversado com Mariana e percebera que ela no se preocupava com elas. Sabia que as espinhas logo mais dariam lugar a uma bela barba. Apesar do mal-estar, sorriu e foi se vestir: Quando chegou sala de refeies seu pai j ali se encontrava junto com sua me, e ambos tomavam caf. Iracema os servia. Ele se sentou. Iracema, sorrindo, falou: Inda bem que o minino hoje vai toma caf! Vou, sim, mas no estou com muita vontade! lvaro tambm estava feliz por ver seu filho ali. Ficava sempre muito preocupado, pois ele quase todos os dias saa sem se alimentar. Ainda bem que hoje vai alimentado para a escola. Coma uma fruta. Est numa idade em que precisa de boa alimentao. Fica s comendo aquelas bobagens da cantina... Artur no respondeu, apenas comeu. O que queria era mesmo ir logo para a escola, precisava falar urgente com Rodrigo. Enquanto comia, ia pensando: "J sei que este mal-estar e o tremor s passaro com outro cigarro, mas Rodrigo garantiu que vai passar. Espero que sim, no quero me viciar....

Terminaram de tomar o caf. Deram um beijo em Odete e os dois saram. No carro, Artur no prestava muita ateno nas notcias que o radio ia dando. S queria chegar logo escola. lvaro comentava alguma notcia, ele respondia por monosslabos. Parecia que a escola estava muito distante, parecia que o trnsito estava parado. "No estou agentando tanta ansiedade. Tomara que Rodrigo j esteja l, e que tenha um cigarro daqueles. Sinto que, sem ele, no conseguirei assistir s aulas.... lvaro percebeu que ele estava muito calado: O que est acontecendo com voc? Artur assustou-se com aquela pergunta: Por que esta fazendo essa pergunta? Estou percebendo que voc est um pouco distante, nem parece o mesmo de todos os dias. Sempre me atrapalha com perguntas quando estou ouvindo uma notcia! Est doente? No, no estou doente, s que no dormi muito bem esta noite e agora estou com sono! No dormiu por qu? No sei, estava sentindo muito calor e acordei muitas vezes... Eu no senti calor, ao contrrio, senti at um pouco de frio. No sei o que me aconteceu. Finalmente chegaram em frente escola. Artur desceu apressado, esqueceu-se de dar o beijo que todos os dias dava no pai. Atravessou a rua correndo. lvaro, intrigado, olhou o filho se afastando: "Esse menino no est bem, ele est muito estranho. Ser que est apaixonado!

Sorriu, acelerou o carro e saiu pensando: "Embora no queira admitir, meu filho j est um homem, no posso me admirar de ele estar apaixonado. Na idade dele eu j namorava." Artur entrou quase correndo na escola. Olhou para o lado em que Rodrigo sempre ficava conversando com alguns amigos, sempre os mesmos. Naquela manh tambm, como sempre, estava ali. Artur se aproximou: Rodrigo, preciso falar com voc. Rodrigo sorriu, afastou-se dos outros levando com ele Artur: O que est acontecendo? Parece que est muito nervoso. Aquele mal-estar voltou e est intenso. Voc precisa me ajudar, seno no vou conseguir assistir s aulas. Est bem, no precisa ficar nervoso! Ainda cedo, teremos tempo de sair. Vamos sair da escola, e enquanto andamos pelo quarteiro, voc d uma puxada no bagulho. Vai ver como ficar bem. Saram da escola, e mais uma vez ningum percebeu. Assim que chegaram rua, Rodrigo deu a ele um cigarro. Artur pegou aquele cigarro e, nervoso, acendeu-o. Deu uma tragada depois da outra, quase sem intervalo. Aos poucos foi se sentindo melhor. Logo estava muito bem. Sentia que poderia assistir s aulas sem problema algum. Enquanto Artur fumava, Rodrigo, em silncio, observava. Voltaram para a escola, Artur notou que estava com muita energia, mas que suas mos estavam tremendo. Durante as aulas, percebeu que no conseguia, como antes, acompanhar as explicaes dos professores. Sentia certa dificuldade de assimilao. Queria sair dali, olhava a todo instante

para o relgio. Durante um dos intervalos, no se deu conta que Mariana se aproximara. Artur, por que no foi at minha casa? Fiquei esperando voc. Ele se voltou ao ouvir a voz dela, mas sua presena o incomodava, queria mesmo era sair dali. Respondeu seco: No pude ir, tive que sair com meus pais. Ela, nervosa, afastou-se. Finalmente a campainha tocou, dando por encerrada as aulas. Artur saiu correndo, no suportava ficar ali sentado. Queria correr sentir o ar fresco. J na rua, respirou fundo. Olhou para o caminho pelo qual seu pai costumava chegar. No conseguia ficar com o corpo parado. Ficou andando de um lado para o outro, at que finalmente seu pai chegou. Entrou rapidamente no carro. Novamente se esqueceu de beijar o pai. Ele notou, mas no disse nada. Acreditava que o filho estivesse apaixonado. Apenas sorriu, acelerou o carro e foram embora. Durante o caminho tentou conversar com Artur, mas ele estava distante. Como todos os dias, ligou o rdio e ficou ouvindo as notcias. Artur permanecia calado, parecia muito distante dali. Realmente, ele estava no s distante como tambm muito preocupado: "O que ser que est acontecendo comigo? Por que estou sentindo meu corpo to estranho? Ser que me viciei? No pode ser! Fumei s alguns cigarros! E pouco pra me viciar. Hoje tarde tenho aula de natao, vou nadar muito para tirar de mim toda essa droga." Chegaram em casa. Iracema j estava com a comida pronta para ser servida. Artur foi para o seu quarto, trocou de

roupa, lavou as mos e voltou para a sala de refeies. Sentou-se. Em silncio, comeou a comer. Iracema estava em p ao lado da mesa, terminando de servir. lvaro olhou para ela, dizendo: Iracema, estou muito contente com o trabalho do seu filho. Ele mesmo muito inteligente, aprende tudo rpido. Aquele menino vai longe. Disse a ele que, se continuar assim, pagarei sua faculdade com mais prazer. Muito obrigada, dot. Ele mermo um bom minino! muito bom filho e irmo tambm. O dot no vai se arrepender de ajud ele. O dot vai v! Tenho certeza disso. Ele muito esforado mesmo. Artur ouvia o que diziam, mas no conseguia

acompanhar a conversa. Estava muito preocupado consigo mesmo: "E se eu estiver mesmo viciado? Como vai ser? Meu pai espera muito de mim, nunca poderei chegar pra ele e contar o que est acontecendo. O que vou fazer?" Artur, por que est to calado? Ele ouviu o seu nome, mas no entendeu o que mais sua me perguntara: No entendi mame! O que perguntou? O que est acontecendo com voc? Parece que est muito distrado. Est acontecendo alguma coisa na escola? Ele olhou para a me e para o pai, sentiu vontade de contar. Estava apenas comeando, eles poderiam ajud-lo. Pensou um pouco e, nervoso, respondeu: No estou sentindo nada! Estou bem! Por que a senhora e o papai ficam fazendo essas perguntas? A me estranhou sua reao:

Estamos preocupados. Voc est diferente! Deve estar acontecendo alguma coisa. Precisamos saber o que para poder ajud-lo. No est acontecendo nada! J disse que s estou com alguns problemas em Portugus. Nada, alm disso. Sabe que sou professora e seu pai advogado. No acredita que possamos ajudar? Claro que podem, mas no acho justo, j gastam tanto com a minha educao... O mnimo que posso fazer aprender. No tem que ser assim. Gastamos, sim, com a sua educao, mas nunca nos arrependemos disso. Voc, alm de ser um bom filho, tambm um bom aluno. S precisa nos dizer qual a sua dvida. Desculpe mame, que estou muito nervoso. No estou acostumado a no entender as aulas. Vou agora para o meu quarto tentar entender. Se no conseguir, vou pedir sua ajuda. Faa isso, mas se no conseguir, estamos aqui eu e seu pai. Ns o amamos muito. Artur terminou de almoar e foi para o seu quarto. Assim que se viu sozinho, entregou-se ao desespero: "O que est acontecendo comigo? Por que toda essa irritao sem motivo? Ainda bem que no estou sentindo aquele mal-estar. Parece que passou mesmo! Tomara." Sentiu muita vontade de dormir, mas no podia,

precisava ir natao. Deitou-se s para descansar, mas, sem perceber, adormeceu. Odete, antes de sair para a escola, foi at o quarto de Artur para ver como estava. Estranhou ao ver que ele estava dormindo. Sorriu, fechou a porta e saiu. Foi falar com Iracema:

Artur est dormindo, no se esquea de acord-lo para que possa ir aula de natao. Pdi fica sussegada, eu acordo ele, sim. Odete foi embora. Iracema voltou para seus afazeres. Artur, que j dormia por mais de uma hora, acordou sentindo aquele vazio aquele mal-estar, sintomas que j conhecia. Sabia que em breve ficaria pior. Levantou-se e, apavorado, foi para o banheiro. Olhou-se no espelho. As espinhas j no o

incomodavam mais. Percebeu que seus olhos estavam vermelhos. Voltou para o quarto, olhou o relgio. "Est na hora de ir para a natao, mas como poderei nadar com este mal-estar? Vou me apressar, e antes de ir para a aula vou procurar Rodrigo. Ele vai me dar outro cigarro e tudo ficar bem." Fez exatamente isso. Vestiu-se, colocou o tnis, pegou a mochila e saiu rapidamente. Quando passava pela sala, Iracema disse: Pur que t cum tanta pressa? No vai toma um lanche antes de sa? No, estou atrasado, hoje preciso chegar mais cedo para a aula de natao! T bem, mas isso no t certo no. Ele no a ouviu, foi correndo em direo casa de Rodrigo. Enquanto corria, ia pensando: "Preciso me apressar, seno vou perder a aula. Mas se for at l sem fumar, no conseguirei nadar." Chegou finalmente em frente casa de Rodrigo.

Encostou-se ao porto e tocou a campainha. Rodrigo surgiu na janela: Ol, Artur! Quer falar comigo?

No estou bem, preciso de sua ajuda! Pode entrar no se preocupe, minha me est

trabalhando. Artur entrou apressado: Voc precisa me arrumar outro cigarro daqueles. Preciso ir aula de natao, mas no conseguirei nadar com isto que estou sentindo! Est bem, mas s tem um problema, eu no tenho mais bagulho. Dei vrios pra voc, mas agora terminaram todos os que eu tinha, precisamos buscar mais. Ento vamos rpido, no posso perder a aula! Voc tem dinheiro a? Dinheiro? No. No tenho. Por qu? Porque o bagulho custa dinheiro. Eu lhe dei os meus, mas agora vai ter que comprar para ns dois. Dinheiro!?! No tenho! Comovamos fazer? No sei, tambm estou precisando, tambm estou sentindo o mesmo que voc! Voc me garantiu que eu no ia me viciar, mas acredito j estar viciado. No quero isso! fcil. Basta voltar para sua casa e esquecer do bagulho. No posso voltar para casa! Preciso ir para a aula! Ento, meu amigo, no tem jeito, precisamos pegar mais bagulho. Como!?! No temos dinheiro! Eu no tenho mesmo, mas voc tem. Eu? No tenho dinheiro. Dinheiro no, mas tem um belo par de tnis nos ps. Ele vale muito, d pra comprar uma boa quantidade de bagulho.

Que est dizendo? Meu tnis!?! No posso! Que vou dizer para o meu pai? Seu tnis, sim! Vale muito dinheiro! importado. Sei que vale muito dinheiro, mas o que vou dizer para o meu pai? Diga que foi assaltado e que levaram seu tnis. Ele vai ficar contente por voc estar vivo no vai ligar para o tnis e at comprar outro. Hoje em dia normal o tnis importado ser roubado. Ele no vai desconfiar de nada. Artur estava tremendo, no sabia se era por aquela situao ou pelo mal-estar que sentia: No posso fazer isso. No saberei mentir. Nunca menti! Voc quem sabe. No tenho dinheiro e nem bagulho. Volte para sua casa ou v para a aula. Sem dinheiro, no posso fazer nada... Artur comeou a chorar. Sabia que estava perdido, pois a cada segundo sentia que precisava muito da droga. Pensou por algum tempo e disse: Est bem, como vamos fazer? Iremos at um lugar que conheo. L diremos que no temos dinheiro, mas que voc tem o tnis. Conseguiremos uma boa quantidade, que vai dar para ns dois consumirmos por um bom tempo. Artur, nervoso, concordou. Saram.

HUMILHAES E MENTIRAS PRECISO ALGO MAIS _ ELISA MASSELLI

Artur seguia Rodrigo como um rob. Entraram em uma favela. Enquanto caminhavam pelas vielas, Rodrigo andava e cumprimentava vrias pessoas. Pararam em frente a um barraco. L dentro estava outro rapaz de mais ou menos dezenove anos, que ao ver Rodrigo, disse: Rodrigo! Voc por aqui novamente? Veio buscar mais erva? Quem esse? Rodrigo, piscando um olho sem que Artur visse, respondeu: Vim buscar mais erva, sim. Este aqui Artur, ele tambm quer um pouco. Voc tem dinheiro? No, mas Artur tem esse tnis, que importado e vale muito. O rapaz olhou primeiro para Artur, depois para o tnis que estava em seus ps. O tnis bonito mesmo! Vale uma boa quantidade de erva. Voc vai querer mesmo trocar! Artur tambm olhou para o seu tnis. Aquele vazio aquela vontade cada vez mais forte... Sentiu que no poderia ficar sem a droga. Impotente, disse: Preciso fazer a troca, mas como vou andar sem tnis? Rodrigo respondeu:

O Jil aqui empresta um dos dele, mas quando chegar perto de sua casa, voc joga fora e entra em essa descalo, assim poder contar uma boa histria para os seus pais. Eles acreditaro, no se preocupe. J vimos muitas vezes isso acontecer. No , Jil? Artur se abaixou, tirou os tnis e entregou-os a Jil, que em troca lhe deu outro par velho e sujo. Ele o calou, sentindo um mal-estar profundo. Mas sabia que aquela era a nica soluo. Em seguida, Jil deu aos dois uma boa quantidade de um tipo de grama seca, que Artur at ento no havia visto, pois Rodrigo sempre lhe dera os cigarros j prontos. Ali mesmo Rodrigo preparou e acendeu um cigarro e deu outro para Artur, que tremendo muito, fumou. Aos poucos, ele foi se sentindo melhor. Seu corao batia forte, mas ele sabia que daquele dia em diante estaria nas mos daqueles dois. Sentiu um frio passar por sua espinha, quis sair dali rapidamente. Saiu correndo. Rodrigo o seguia de longe. J fora da favela, Artur chorava muito enquanto pensava: "O que vou fazer da minha vida? Como vou mentir para os meus pais? Rodrigo se aproximou: No fique assim, tudo vai dar certo. Nunca menti para os meus pais! No sei se vou conseguir! Vai sim. Tem sempre uma primeira vez. Esta vai ser a mais difcil, as outras sero fceis.

Nunca mais vou mentir! Ser s esta vez. Nunca mais! Vou me livrar de tudo isso. Vou pedir ajuda para os meus pais. Eles me ajudaro! Est bem. Eles ajudaro, provavelmente o internaro em uma clnica. Mas enquanto isso no acontece, vamos dividir o bagulho. Metade para mim e a outra metade para voc. Vou preparar, mas bom aprender como se faz. Artur ficou olhando Rodrigo preparar os cigarros. Ele tirou do bolso alguns pedaos de papel de seda. Disse que eram tirados dos maos de cigarro que eram jogados fora depois de usados. Preparou toda a parte de Artur. Em seguida entregou a ele. No posso levar isso para casa. No tenho onde guardar. Se eu fosse voc, arrumaria um lugar, porque talvez sinta necessidade durante a noite. No vou sentir. Vou me livrar dessa loucura. No posso levar para casa. No quero ser internado em clnica alguma! Voc quem sabe. Mas, mesmo assim, vou guardar a na sua mochila. Rodrigo abriu a mochila de Artur e colocou os cigarros. Artur saiu dali correndo, precisava chegar a tempo para a aula. Rodrigo o acompanhou at a sada da favela. Artur estava muito nervoso, queria sair dali o mais rpido possvel. J na rua, sem se despedir, saiu correndo. Assim que desapareceu, Rodrigo voltou novamente para o barraco de Jil, que o estava esperando: Rodrigo disse-lhe: Jil, como voc viu esse agora j nosso fregus. Cumpri a minha parte, trouxe mais um. Espero que no me deixe mais sem o bagulho. Jil, sorrindo, respondeu:

Trabalhou direitinho, por um bom tempo vai ter todo o bagulho que precisar. Mas bom ir procurando outro fregus. Artur chegou apressado ao clube, e s ento se lembrou que estava com um tnis muito sujo e rasgado. Pensou: "No posso entrar com este tnis. O que direi ao professor e aos meus colegas? Preciso ir para casa, mas como chegar l sem o meu tnis?" Sabia que no havia outra maneira, precisava ir para casa. Dirigiu-se para l. Quando faltava uma quadra para chegar, tirou o tnis velho dos ps e comeou a correr. Entrou em casa esbaforido e cansado. Iracema assustou-se por v-lo entrar daquela maneira e quela hora, pois deveria estar na aula de natao: Qui te aconteceu, minino? Fui assaltado por trs rapazes, eles levaram o meu tnis! Deus do cu! Fizeram mais arguma mardade com oc? No! S levaram o tnis! Inda bem! Vai tom um banho e fica carmo, vou telefon pr seu pai! No faa isso! J estou bem. S vai fazer com que fique assustado. noite falarei com ele. Vou para o meu quarto... Tem razo, o mei que agora oc t bem. Vai dscans... Artur foi rpido para o seu quarto, precisava ficar sozinho. Precisava pensar no que faria dali para frente. Sabia que estava se viciando, mas no encontrava um caminho para se afastar. J no quarto, tirou a mochila das costas. S ento se lembrou que Rodrigo havia colocado nela os cigarros restantes.

Abriu, tirou-os e segurou-os nas mos. Aquilo para ele era o incio de uma longa caminhada. "Meus pais falaram tanto a respeito de drogas! Como fui me deixar envolver? Preciso encontrar um lugar para esconder, mas onde?" Olhou para o alto de seu armrio, lembrou-se que ali estava guardado havia muito tempo o casaco que seu pai lhe comprara quando foram para os Estados Unidos. Subiu em uma cadeira, abriu o armrio e pegou o casaco. Ele estava dobrado do lado do avesso, pois desde que voltaram da viagem nunca mais fora usado: "Nunca consegui us-lo aqui. O nosso frio no permite. Vou esconder dentro do bolso. Ningum mexe nele mesmo.... Guardou todos os cigarros ali. Deitou-se na cama e ficou lembrando da viagem que fizeram. "Meu pai quis nos fazer uma surpresa, levou-nos at a Disneylndia. Foi uma viagem maravilhosa. Ficamos ali por quinze dias, depois fomos para Nova York. Ao chegarmos, sentimos muito frio. No conhecamos a neve, sempre ouvimos falar que era muito fria, mas nunca poderamos imaginar o quanto. Foi a que meus pais resolveram comprar casacos para todos." Sem dizendo: Artur, acorde! Cheguei agora do trabalho e Iracema me contou o que aconteceu! Como foi? Voc est bem? No machucaram voc? Ele, com muito custo, abriu os olhos. Ao ver a me, comeou a chorar. Queria contar tudo o que havia acontecido e pedir ajuda, mas no conseguia. Sentia vergonha da sua atual perceber, adormeceu. Acordou com sua me

situao. Eles esperavam tanto dele, como poderia dizer que era um viciado? Estou bem, mame, no me machucaram, s levaram o meu tnis... No chore meu filho. No se preocupe com o tnis. Compraremos outro! O importante que esteja bem... Estou bem, s um pouco assustado... Entendo. Seu pai j deve estar chegando, no falaremos nada antes do jantar. Aps o jantar contaremos juntos. Ele vai ficar muito nervoso, mas comprar outro tnis. Est bem, mas no quero outro tnis. Vou agora terminar o meu trabalho de Histria que preciso entregar amanh. Tudo bem, vou para o meu quarto, se precisar de alguma coisa, basta me chamar. Odete saiu do quarto. Artur comeou a chorar de forma violenta. "Como consegui mentir to friamente? No posso continuar assim, quando meu pai chegar vou criar coragem e contar tudo O que est acontecendo. Sei que ele vai me entender e ajudar. Vou dizer que menti a respeito do tnis." Ficou ali deitado, tinha realmente que terminar o trabalho de Histria para levar no dia seguinte, mas no sentia vontade de se levantar da cama. Adormeceu novamente. Leandro entrou no quarto, Artur dormia: Artur, acorde! Papai j chegou, o jantar est pronto! Artur abriu us olhos, olhou para o irmo. No sabia se era dia ou noite. Sua cabea e olhos pesavam muito. Sentou-se na cama ainda um pouco sonolento. Sentiu novamente aquele vazio, j sabia que logo mais se transformaria em ansiedade e naquela vontade imensa da droga. Seu irmo olhava para ele admirado:

Voc est doente? A mame me contou sobre o assalto! Machucaram voc? No estou doente, no! No! Eles no me machucaram. Pode descer que irei em seguida. Leandro, mais tranqilo por ver o irmo bem, saiu do quarto. Artur levantou-se e foi para o banheiro. Olhou-se no espelho, percebeu que estava com os olhos vermelhos e com olheiras profundas. Ficou apavorado, com medo que seus pais notassem a diferena. Nem por um instante se lembrou das espinhas que tanto o incomodavam. O vazio aumentava. Olhou para suas mos, elas tremiam. Tomou um banho, tentou se acalmar, sabia que a conversa com o pai seria difcil. "Ele no vai acreditar em assalto... seria melhor que eu contasse a verdade... ele ficar bravo, mas me ajudar." Saiu do banheiro. Voltou