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360 EDIÇÃO 13 • SETEMBRO DE 2017 Álvaro Atallah afirma que não investir em ciência é burrice universal ANS anuncia mudanças no Fator de Qualidade Apesar de já ser uma realidade, medicina de precisão ainda é cara e pouco acessível Direto ao ponto

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360EDIÇÃO 13 • SETEMBRO DE 2017

Álvaro Atallah afirma que não investir em ciência é burrice universal

ANS anuncia mudanças no Fator de Qualidade

Apesar de já ser uma realidade, medicina de precisão ainda é cara e pouco acessível

Direto

ao ponto

EDITORIAL

Reagir de maneira negativa ou pessimista diante do que es-tamos vendo acontecer no país é o caminho natural. Deses-perançados, os brasileiros se entregam ao piloto automáti-co e seguem suas vidas. É preciso mesmo seguir em frente. Mas, sobretudo, é preciso caminhar adiante.

Enxergar e planejar o futuro em momentos anuviados é um grande desafio, porque significa ver o que não está ao nosso alcance. É preciso se desvencilhar do agora e vislum-brar o que pode ser feito amanhã.

Aqui, na Federação e nos sindicatos, pensar o futuro faz parte de nossa atividade diária. Permanentemente, de-bruçamo-nos sobre os problemas vividos pelo setor e pela sociedade – como reflexo – e buscamos saídas para as inú-meras crises que vivemos. De tanto exercitarmos esta prá-tica, aprendemos que não se faz nada sozinho. A união de esforços e o conjunto de ideias nos trazem a serenidade e a criatividade para encontrar soluções.

Um exemplo recente desse empenho é o trabalho que estamos desenvolvendo com a Rede Integra. O nome dela, emblemático, reporta-nos a dois valores fundamentais: a integração e a integridade. Nos baseamos nesses dois con-ceitos para montar uma rede de clínicas e serviços de saúde em geral, privados, na cidade de São Paulo, que descobri-ram algo em comum: possuíam agenda ociosa e uma ca-pacidade enorme de atender a uma demanda reprimida de consultas e exames.

A partir desse conhecimento, montamos uma associa-ção sem fins lucrativos, que reunisse todos esses estabele-

Mais saúde, mais ação

cimentos – hoje são mais de 50 – para que pudessem ofertar consultas e procedimentos médicos a uma população que busca atendimento ágil e acessível.

Em nossa visão, não faz o menor sentido mantermos a população refém de longas filas de espera para consultas, exames e cirurgias pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e, ao mesmo tempo, termos uma rede privada de serviços de saúde qualificada, equipada e ociosa. É preciso dar acesso à saúde, e isso pode significar acesso a um custo reduzido, com pagamentos facilitados, por exemplo.

A diferença da Rede Integra para os grupos de clínicas populares que se multiplicam pelo país é que ela nasceu diante de um conceito muito interessante, chamado coo-petição (competição+cooperação). Isto é, os serviços são competidores entre si, mas apostam no fair play. As regras do jogo são claras, as consultas terão preço único conforme suas especialidades e os integrantes poderão, ao longo do tempo, compartilhar clientes conforme cada um apresente sua demanda e sua necessidade.

Esse projeto, construído sob esse espírito, é o que que-remos para a saúde de São Paulo. Esperamos ainda que a Rede Integra cresça para todo o Estado e possa também atender, por meio de parcerias, a rede pública. Mais saúde para todos é a nossa missão.

Yussif Ali Mere JrPresidente

ÍNDICE A opinião de especialistas sobre a revista e o destaque do Portal FEHOESP 360

Confira a agenda de cursos do IEPAS para outubro

Os principais eventos do setor, na seção de Notas

Abertas as inscrições para o 2º Conecta Saúde

Prestadores buscam qualidade como diferencial de negociação

Álvaro Atallah fala como a medicina baseada em evidências é importante na formação médica, na qualidade e até na gestão

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Medicina de precisão já é uma realidade, mas precisa

se tornar mais acessível

CAPA 16

Liberação dos inibidores de apetite divide opiniões

Resenha: a realidade das mulheres encarceradas

Danilo Bernik comenta as dificuldades do processo negocial entre prestadores e operadoras

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PAINEL DO LEITOR ONLINE

Confira, na edição digital, os conteúdos exclusivos da

Revista FEHOESP 360 em seu smartphone,

tablet ou computador.

360

ENTREVISTAO médico Álvaro Atallah comenta

a importância da medicina baseada em evidências para a judicialização, slow medicine e

prontuários eletrônicos.

PREVENÇÃOOuça a opinião de

especialistas sobre a liberação das substâncias anorexígenas para o

combate da obesidade e o impacto da doença para o setor.

Moderna e atrativaGostaria de parabenizar a Revista FEHOESP 360, que vem tratando os diferentes temas da saúde com profissionais de alto nível e em formato moderno e atrativo.

O conhecimento é uma das formas, ou talvez a melhor delas, para en-frentarmos os desafios das diferentes vertentes da saúde. Sem dúvida, a publicação da FEHOESP tem contribuído com isso. Parabéns a todos.

RUY BAUMER, PRESIDENTE DO SINDICATO DA INDÚSTRIA DE ARTIGOS E EQUIPAMENTOS ODONTOLÓGICOS, MÉDICOS E

HOSPITALARES DO ESTADO DE SÃO PAULO (SINAEMO)

MARCELO CARNIELO, DIRETOR-TÉCNICO DA PLANISA

Combustível para o setor É louvável a iniciativa da FEHOESP de idealizar e colocar em circulação uma revista com matérias embasadas em temas de grande interesse para o setor da saúde.

O Sinaemo acredita que a Revista FEHOESP 360 é um importan-te canal para diálogos, alertas, atenção às demandas, necessidades e reinvindicações do nosso segmento, que poderão ser apresentados nas várias edições do veículo.

Ao folhearmos as páginas, nos deparamos com um informativo setorial dotado de agradabilíssima leitura e de vital importância para todos nós que atuamos diretamente em prol do desenvolvimento da saúde. Parabéns a todos e sucesso!

DESTAQUE DO PORTAL

A reportagem "Saiba o que muda com a reforma trabalhista", publicada no portal www.fehoesp360.org.br, em julho, foi a mais consultada no último mês. Sancionada no dia 14 de julho pelo presidente da Repú-blica Michel Temer, a lei 13.467/2017 faz uma profunda mudança na legislação trabalhista brasileira e entra em vigor em novembro.

No texto, está destacada uma das alterações mais marcantes: a pre-valência do negociado sobre o legislado. O que significa que a nego-ciação entre empresas e trabalhadores vai prevalecer sobre itens como parcelamento de férias, jornada de trabalho, banco de horas, trabalho remoto, intervalo entre jornadas, entre outros.

As negociações entre patrões e empregados não podem tratar de FGTS, 13º salário, seguro-desemprego, licença-maternidade de 120 dias, repouso semanal remunerado e aposentadoria, além de outros direitos. A matéria traz mais detalhes e disponibiliza, também, o link com o texto integral da lei, para consulta.

Segurança do paciente

30 de outubro 9h às 17hSorocaba

Liderança assertiva

22 de setembro9h às 17h

Mogi das Cruzes Como reduzir custos da instituição para

melhorar o resultado e aumentar a receita

26 de outubro 8h30 às 12h30

São Paulo Motivação: pedra preciosa

ou pedra no sapato?

2 de outubro 9h às 17hCampinas

Formação e aperfeiçoamento das

lideranças em gestão estratégica de operações de serviços

19 de outubro 9h às 17h

Santo André

A segurança do paciente na coleta de

sangue para fins diagnósticos

28 de setembro13h às 17h

Santos

Importância da gestão de equipamentos para o

sucesso do negócio

20 de outubro 16h30 às 20h30Ribeirão Preto

#AgendaCompletawww.iepas.org.br

*As datas podem estar sujeitas a alterações

Principais pontos da auditoria de contas

médicas para melhores resultados

27 de setembro 8h30 às 12h30

São José dos Campos

Controle de qualidade interno e externo na rotina do laboratório

4 de outubro 13h30 às 17h30

São Paulo

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CURSOS & EVENTOS

#iepas

Prepare seu RH para implementação

do eSocial

4 de outubro 8h30 às 17h30

Bauru

Evento discute parcelamento de dívidas paulistanasPara esclarecer a mudança na emissão de nota fiscal de serviços das sociedades uniprofissionais (SUP) e também abordar o Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) do município de São Paulo, o SINDHOSP e o Projeto IN$truir realizaram, em 8 de agosto, um workshop com o vereador Paulo Frange (PTB-SP), autor do Programa de Regularização de Débitos (PRD), destinado ao pagamento das dívidas rela-tivas ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), que faz parte do PPI.

Segundo Frange, o setor da saúde só pode ser contem-plado nos dois programas graças a esforços conjuntos entre a prefeitura, a FEHOESP e o Sindicato. “Tivemos a oportuni-dade de discutir as necessidades de cada prestador de ser-viço e tentar criar uma regulamentação benéfica a todos.”

“Esse projeto é uma dádiva para que os serviços possam ser regularizados. As SUP foram pegas de surpresa ao se-rem desenquadradas e taxadas de modo diferente”, afirmou Yussif Ali Mere Junior, presidente da Federação e do SINDHOSP.

Líderes da saúde e representantes das entidades do setor participaram de um encontro, em 3 de agosto, na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), com o depu-tado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), para falar sobre reforma tributária e seus impactos. O parlamentar, que é o

Reforma tributária prevê isenção para medicamentos

Frange finalizou dizendo que o PRD, reaberto em 16 de agosto, é uma vitória para o setor e que, com isso, “as uni-profissionais vão continuar existindo em São Paulo”.

relator da proposta de emenda constitucional (PEC) na Câ-mara dos Deputados, explicou o conceito das medidas que estão sendo discutidas para reformular a tributação no país e informou que, de imediato, a reforma pretende eliminar a cobrança de impostos sobre remédios e alimentos. Tam-bém devem ser zeradas as contribuições sobre máquinas, equipamentos (ativo fixo) e exportações.

Hauly lembrou que a saúde custa cerca de R$ 500 bi-lhões/ano no Brasil, custeada pelo SUS e pelo setor priva-do. “Desse total, R$ 80 bilhões referem-se a medicamentos. Com a reforma, a desoneração reduziria o custo em aproxi-madamente R$ 26 bilhões.”

Pela PEC, um novo tributo, o Imposto sobre Valor Agre-gado (IVA), eliminaria ICMS, IPI, PIS/Cofins e salário educa-ção. Haveria duas modalidades, uma clássica e uma seletiva monofásica de destino federal sobre energia elétrica, com-bustíveis, comunicação, bebidas e outros. Seria mantido o Supersimples para micro e pequenas empresas.

O deputado chamou de reconstrução a mudança na tri-butação do país. “Nosso objetivo é usar o sistema tributário para gerar emprego e renda. Burocracia, corrupção, incenti-vos e sonegação prejudicam a economia.”

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#iepas NOTAS

O encontro também debateu o impacto da reforma tributária para a saúde

Paulo Frange e Yussif

arquitetura catastrófica da assistência à saúde no Bra-sil é responsável pelos resultados desanimadores vividos na última década: falta de dinheiro, alta sinistralidade, dificul-dades de acesso, indicadores ruins sobre a saúde das pes-soas. E pouco importa se a esfera é pública ou privada, as projeções pessimistas são as mesmas.

Pode parecer clichê, mas uma das soluções para mudar este cenário é recuperar a relação médico-paciente, que anda perdida. Há muita tecnologia e pouca anamnese. Esse é o pensamento essencial do médico italiano Marco Bobbio, que estará no Brasil para participar do painel “Slow medicine – Um resgate à essência da arte de cuidar”, durante a segunda edi-ção do Conecta Saúde – Criando Valor, em 17 e 18 de outubro.

Bobbio, que é secretário-geral da Associação Italiana de Slow Medicine e autor do consagrado livro “O Doente Imagi-nado”, vem atuando há anos na luta por uma medicina sem pressa, em que médicos e pacientes conectem-se mais. E de-fende: “Devemos evitar qualquer tipo de excesso. Não creio que se deva levar uma vida extremamente moderada, se re-nunciar a tudo. Aos meus pacientes, por exemplo, não digo para excluírem de suas dietas o sal e os queijos. Digo para reduzirem o máximo possível de sal e para não comerem um grande pedaço de queijo que custa pouco, mas para compra-rem um queijo muito especial e comerem pedacinho a peda-cinho, uma ou duas vezes por semana”, exemplifica.

Esse conceito mais amplo, de saborear a vida com prazer e sem afobação, tem sido levado para a medicina de uma maneira inovadora. Em sua apresentação no Brasil, Marco Bobbio irá mostrar como, na prática, tal filosofia tem modi-ficado a gestão dos hospitais na Itália. É daquele país que vêm as raízes do slow medicine, derivado do movimento slow food, fundado por Carlo Petrini, em 1986, em Piemonte.

Para José Carlos Aquino de Campos Velho, médico ge-riatra e fundador da iniciativa no Brasil, por aqui o conceito está começando a ser disseminado. “Estamos engatinhan-do. Posso dizer que aplico a medicina sem pressa no meu consultório, mas ainda não temos uma rede de serviços que atue baseada no conceito”, afirma. Aquino estará no Conecta

A para falar sobre a experiência brasileira. Atrelado a isso, o médico Lucas Zambon apresentará o movimento Choosing Wisely. Criado pela American Board of Internal Medicine (Abim) Foundation, em 2012, o conceito significa algo como “escolher sabiamente” e está relacionado a redução de cus-tos. Mas, sobretudo, a melhores práticas médicas e a medi-das que sejam seguras para o paciente. Uma das atuações mais contundentes da Abim Foundation é ter conseguido que mais de 70 sociedades médicas tenham revisado 400 recomendações de exames ou tratamentos que devem ser rediscutidos quanto a sua eficácia clínica.

Um talk show após as palestras, mediado pelo professor Dario Birolini, colocará Marco Bobbio, José Carlos de Aquino e Lucas Zambon diante da plateia, para um debate instigante.

No painel “Iniciativas para um novo modelo”, o Conecta Saúde levará ao público o Computerized Physician Order En-try, um sistema de prescrição eletrônica que vem impactan-do os hospitais. Dados internacionais revelam que a maioria dos erros médicos está relacionada ao momento da prescri-ção. O uso de ferramenta, segundo Carlos Eli Ribeiro, CEO da Sollis Soluções Integradas, tem diminuído os índices de eventos adversos e de mortalidade de maneira drástica.

O Hospital Alemão Oswaldo Cruz será o convidado para falar sobre sua unidade Vergueiro, recém-inaugurada e que traz ao mercado um sistema de remuneração no qual o risco é compartilhado entre hospital, operadora de plano de saú-de e fornecedores. Na sequência, Marcos Boscolo, líder de Healthcare da KPMG, falará sobre regras que evitam desvio de conduta e garantem mais ética e transparência nas rela-ções com o mercado.

Reforma trabalhistaNo segundo dia, o Conecta aposta no formato de perguntas e respostas para abordar um tema que tem tomado muito tempo das organizações: a reforma trabalhista. Aprovada em julho deste ano, a lei passará a valer a partir de 10 de novem-bro, e promove uma série de mudanças na relação entre pa-

EVENTO

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tem inscrições abertas2ª edição terá convidado internacional e conceitos disruptivos

PROGRAMA PRELIMINAR

18 DE OUTUBRO

PROGRAMA PRELIMINAR

17 DE OUTUBRO

trões e empregados. “As dúvidas entre os líderes de Gestão de Pessoas são inúmeras. Queremos promover um debate amplo, acompanhado de uma palestra magna com o pro-fessor José Pastore, a fim de mostrar aos executivos o cami-nho das pedras para que as mudanças sejam boas para as empresas e para os colaboradores”, afirma Marizilda Angioni, gerente de Gestão de Pessoas e do Instituto de Ensino e Pes-quisa na Área da Saúde (IEPAS), o organizador do evento.

O Conecta Saúde é uma realização da FEHOESP e de seus sindicatos filiados, e tem apoio institucional de KPMG, CBEXs, Hospitalar Feira + Fórum, Coalizão Saúde, ComSaúde da Fiesp, FBAH, Abimed e Abimo.

Inscrições no site www.fehoesp360.org.br/iepas/congres-sos. (Por Aline Moura)

PAINEL: INICIATIVAS PARA UM NOVO MODELO

Moderador: CBEXs

Computerized Physician Order Entry – CPOE Como o modelo de prescrição eletrônica impacta a saúde pública e suplementar

Palestrante: Carlos Eli Ribeiro – CEO – Sollis Soluções Integradas – SP

O novo modelo de negócios do Hospital Alemão Oswaldo Cruz – Unidade Vergueiro

Palestrante: representante do Hospital Alemão Oswaldo Cruz – SP

Como seguir programas de compliance e um raio-X da transparência em saúde no Brasil

Palestrante: Marcos Boscolo – líder de Healthcare – KPMG

Interação com a plateia

14h

ENCERRAMENTO16h30

TALK SHOW: AS NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO NA SAÚDE SOB A ÓTICA DA REFORMA TRABALHISTA Na prática: o que muda na gestão dos recursos humanos da saúde com a nova legislação

Palestrante: José Pastore

Debate

Grupo FleuryLuiza Dal Ben – sócia-diretora – Dal Ben Home Care – SP Eriete Teixeira – superintendente jurídica – FEHOESP e SINDHOSP – SP

Interação com a plateia

9h

CREDENCIAMENTO – WELCOME COFFEE 8h

ENCERRAMENTO / ALMOÇO12h

ABERTURA

Yussif Ali Mere Junior – presidente – FEHOESP e SINDHOSP

José Carlos Barbério – presidente – IEPAS

9h

CREDENCIAMENTO – WELCOME COFFEE8h

PALESTRA DE ABERTURA: EXPERIÊNCIA PRÁTICA E RESULTADOS DA REDE DE HOSPITAIS SLOW MEDICINE NA ITÁLIA

Palestrante: Marco Bobbio – secretário-geral – Associação Italiana de Slow Medicine – Itália

9h20

PAINEL: SLOW MEDICINE – UM RESGASTE À ESSÊNCIA DA ARTE DE CUIDAR

Moderador: Dario Birolini – Instituto de Cirurgia Dario Birolini e Hospital Sírio-Libanês – SP

Desafios da implantação do slow medicine no Brasil Palestrante: José Carlos Aquino de Campos Velho

Choosing Wisely – Escolhendo com sabedoriaPalestrante: Lucas Zambon – diretor e fundador – Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente – SP

Interação com a plateia

10h

CONECTA SAÚDE 2017 17 E 18 DE OUTUBRO DE 2017

LOCAL: HOTEL INTERCONTINENTAL SÃO PAULO

TEMA CENTRAL:

MODELOS DISRUPTIVOS QUE TRANSFORMAM OS RESULTADOS NA SAÚDE

*Programação sujeita a alterações

ALMOÇO12h

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QUALIDADE

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Acreditação em foco

Desde o início do ano, a Agência Nacional de Saúde Su-plementar (ANS) realiza reuniões para definir os indicadores do Fator de Qualidade 2018, que será aplicado no reajuste dos contratos entre os prestadores de serviços e as operado-ras de planos de saúde. Todas as sugestões são discutidas pelo Comitê Técnico de Avaliação da Qualidade Setorial (Co-taq) – grupo formado por membros da ANS e representantes do setor, incluindo a FEHOESP, que faz parte desde 2015.

Um dos critérios que garantem a correção é a certificação dos estabelecimentos de saúde e, pensando na representa-tividade de hospitais, clínicas e laboratórios, o departamen-to de Saúde Suplementar (DAS) da Federação convocou ges-tores, administradores e profissionais do setor acreditados pelo Projeto Bússola para um brainstorming sobre o tema. O encontro objetivou a definição dos indicadores mais im-portantes a serem inseridos no Fator do ano que vem e que podem estabelecer reajustes a partir do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

O termo é aplicado apenas nas situações em que há no contrato a previsão de livre negociação, sem índice predefi-nido no documento e quando não houver acordo entre as partes após os primeiros 90 dias do ano, conforme explicou Katia Kaiser, analista em Saúde Suplementar da FEHOESP.

“De acordo com a proposta, o Fator de Qualidade para 2018 contemplará reajustes de 105% do IPCA aos prestadores de serviços elegíveis contratualmente que possuem selos de acreditação e/ou certificação e 100% do índice para os que ainda não possuem qualificação atestada por alguma insti-tuição acreditadora.”

Em agosto, a gerente-executiva de Estímulo à Inovação e Avaliação da Qualidade Setorial (GEEIQ) da Diretoria de De-senvolvimento Setorial (Dides) da ANS, Ana Paula Cavalcante, informou que a agência decidiu rever as propostas. Segundo ela, o índice que previa reajuste de apenas 85% do IPCA será extinto, permanecendo os percentuais de 100% e 105%.

Desde 2014, quando a ANS editou a lei 13.003 – que trata da contratualização –, e suas resoluções normativas nº 364 e 391 e a instrução normativa nº 61, a Federação, por meio do DAS, afirma que praticar um reajuste de 85% do IPCA significa aplicar deflação nos contratos. De acordo com o presidente da FEHOESP, Yussif Ali Mere Junior, a entidade apoia iniciativas de incentivo à qualidade, mas não pode compactuar com uma medida que prejudique o equilíbrio financeiro – já combalido – de seus representados. "Como se estimula um estabelecimento de saúde que não possui cer-tificação a implantar medidas de melhoria? Certamente não

Prestadores buscam qualidade como diferencial de negociação

POR REBECA SALGADO

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é pagando menos. O re-conhecimento dos que

possuem mais qualidade não pode ser em detrimen-

to daqueles que ainda estão no processo dessa busca", garante.

Certificação

Para atender à necessidade desse mercado e auxiliar os ser-viços de saúde a obter certificados de qualidade, a Federa-ção e o SINDHOSP idealizaram, com o desenvolvimento do IEPAS, o Projeto Bússola. Em parceria com a Organização Nacional de Acreditação (ONA), a primeira edição do progra-ma, realizado em 2014, teve a participação de oito clínicas. Dessas, seis já foram acreditadas.

A acreditação é um método voluntário, periódico e reser-vado, que busca promover a qualidade da assistência por meio de padrões previamente definidos, constituindo-se es-sencialmente em um programa de educação e de cultura da melhoria contínua.

Em seu terceiro ano de realização, o programa faz, nos meses de setembro e outubro, os seminários de sensibiliza-ção para clínicas de especialidades, diagnósticos por ima-gem e home care em todo o Estado de São Paulo.

Para conseguir a certificação, os estabelecimentos têm que adotar uma série de protocolos de gestão de qualidade. “As nossas instituições estão voltadas exclusivamente para melhorar o setor e a qualidade assistencial. Acreditamos que isso pode ser a solução para os inúmeros desafios da saúde hoje. A qualidade é o caminho para a sustentabilida-de”, afirma Yussif.

Após os seminários, os interessados em participar do projeto preenchem um formulário que é avaliado pela ONA para a seleção das instituições que estão aptas ao Bússola. Os estabelecimentos selecionados recebem a visita de diag-nóstico organizacional, realizada pelo Instituto Brasileiro para Excelência em Saúde (Ibes), acreditadora credenciada (IAC) parceira do projeto. A partir desse resultado são defini-dos os temas que serão abordados na fase de capacitação. A última etapa é a visita de acreditação, que deve ser solicita-da em até um ano após o término da capacitação.

Experiências

A evolução na qualidade de atendimento ao beneficiário é um dos pontos de destaque, segundo os participantes das edições anteriores do Bússola. Para João Antonio Sardelli Neto, diretor de Controladoria da Clínica Infantil Itaquera, o programa foi um processo de crescimento e reflexão em áreas ainda não exploradas pelos gestores. “Foi um grande aprendizado e toda equipe evoluiu. Identificamos funcioná-rios comprometidos com a mudança, o que foi fundamental nesse processo. Sabemos que qualidade é uma melhoria contínua e o nosso foco é a qualidade para o paciente.”

Juliana Ribas Leite da Silva e Rita de Cássia Catini, adminis-tradoras das clínicas Ecocenter e Pró Gastro, respectivamen-te, apontam a evolução em seus processos gerenciais como pontos positivos da acreditação, mas criticam a falta de reco-nhecimento das certificações por parte das operadoras.

“Foi uma experiência muito gratificante. Melhoramos no padrão de atendimento e otimizamos processos, mas ainda temos dificuldades com as operadoras de saúde na hora da remuneração. Espero que com o Fator de Qualidade possa-mos ser contemplados como merecemos”, diz Catini.

Essa também é a opinião de Juliana Silva. “Sem dúvida, o Bússola foi um divisor de águas na empresa. Os ganhos foram incomparáveis, mas nessa briga com os planos de saúde ainda saímos perdendo, pois ou acabamos descre-denciados por eles, ou ficamos sem poder de negociação. É bom contar com entidades como a FEHOESP, que nos aju-dam nesse processo.”

Para o CEO da Federação, Marcelo Gratão, o investi-mento na qualidade dos serviços prestados não é só uma tendência do mercado. “É uma necessidade para os esta-belecimentos de saúde e uma exigência dos usuários, que buscam, cada vez mais, segurança no atendimento. Por isso, vamos desenvolver o Bússola novamente e continuaremos participando ativamente nas negociações que beneficiam nossos associados mediante à ANS.”

Para mais informações sobre o Projeto Bússola e como participar, acesse www.iepas.org.br.

João Sardelli Neto, diretor da Clínica Infantil Itaquera

Para Yussif, "a qualidadeé o caminho para a sustentabilidade"

Rita Catini, administradora da Clínica Pró Gastro

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Estudioso da medicina baseada em evidências

há 30 anos, Álvaro Atallah afirma que é possível

melhorar a saúde valorizando a pesquisa

POR ALINE MOURA E ELENI TRINDADE

nefrologista e clínico Álvaro Na-gib Atallah acredita que quanto mais os médicos basearem-se em estudos de qualidade e mais a sociedade sou-ber exigir um atendimento comprova-do por pesquisas, mais a saúde e o país tendem a avançar. E ele sabe o que diz, pois há mais de 30 anos é estudioso da medicina baseada em evidências (MBE) – prática médica norteada por provas científicas rigorosas para guiar as decisões de cuidados da saúde.

Baseado em resultados práticos que vivenciou e influenciou, o profes-sor-titular de MBE e de medicina de ur-

gência da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) defende que essa forma de agir e de pensar permeie várias áreas do conhecimento e seja ensinada nas escolas. “Seríamos uma outra nação”, afirma.

Fundador e diretor do Centro Co-chrane do Brasil e diretor da Associa-ção Paulista de Medicina (APM), Atallah explica na entrevista a seguir como a ciência é fundamental para o trabalho dos médicos, para a qualidade de vida dos pacientes e para o uso racional de recursos na gestão de saúde. Confira:

Revista FEHOESP 360: Como o senhor avalia a pesquisa médica no Brasil? Álvaro Atallah: Existem áreas mais básicas de pesquisa de ponta muito boas, mas que acabam gerando pou-cas patentes por falta de investimento público. Mas temos uma pesquisa clí-nica baseada em evidências de ponta, com um grande número de gente trei-nada. Nós já formamos 270 mestres e doutores em MBE só na Escola Paulista de Medicina da Unifesp, em cursos a distância, e cerca de 30 mil profissio-nais do Sistema Único de Saúde (SUS). Também treinamos praticamente to-

O

ENTREVISTA

Não investir em ciência é uma

burrice universal

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dos os órgãos estratégicos do país, como Agência Nacional de Vigilân-cia Sanitária (Anvisa), Comissão Na-cional de Incorporação de Tecnolo-gias no SUS (Conitec) e Ministério da Saúde (MS).

360: Mas de que maneira é possível avançar mais nesse sentido, para que a ciência cresça no país? AA: É um desafio grande porque não se faz mudanças substanciais, mesmo na ciência básica, se não tiver apoio político. No caso do Centro Cochrane do Brasil, fomos aos poucos construin-do esse apoio político nas sociedades médicas, na APM, em hospitais, como o Sírio-Libanês e o Albert Einstein, e em universidades, como a Unesp, Unicamp e USP. É uma história cons-truída em mais de 30 anos. O impor-tante é a sociedade brasileira tomar consciência da importância da ciência para o desenvolvimento tecnológico, o bem-estar das pessoas e até para a preservação do meio ambiente. Esse é o caminho. Cingapura é uma nação menor que São Paulo, mas que inves-te em pesquisa científica e tecnologia de três a cinco vezes mais que o Brasil, um país de fartura mantido pela agro-pecuária, um setor forte porque tem uma Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) para ampliar a eficiência da produção.

360: Com a crise atual do Brasil, o se-nhor vê prejuízo para o incentivo à pes-quisa e à tecnologia? AA: Está se reduzindo a prioridade e o investimento porque há problemas políticos urgentes, e está se perdendo o foco. E isso não podemos perder. É o mesmo que uma pessoa em dificul-dade tirar o filho da escola para reduzir despesas. Se fizer isso, vai perpetuar a pobreza e a crise na sua família. Redu-zir o investimento na criação de novas tecnologias e na busca do conheci-mento é uma burrice universal.

360: Pode dar um exemplo em que a re-visão científica com base em evidências acarretou economia para a gestão em saúde? AA: Uma década atrás me pediram para fazer a revisão de um tratamento muito caro: a degeneração da vascula-rização ocular, que causa cegueira. O tratamento com Visudyne (verteporfi-na) e laser custava, na época, entre R$ 20 mil e R$ 30 mil e, às vezes, a pessoa tinha que fazer o procedimento três ve-zes em um ano. Com milhões de casos anuais multiplicados por R$ 30 mil, iria

consumir o orçamento do SUS intei-ro. Um tratamento para alguns, mas inacessível para a maioria. Durante um congresso da Academia Brasilei-ra de Medicina, um médico mostrou que injetava um miligrama de beva-cizumabe (Avastin) – medicamento para câncer – nos olhos dos pacien-tes com o problema. O tratamento custava R$ 10 porque ele usava a cada aplicação um miligrama de um frasco de 400 mg, que custava R$ 5 mil. Propus fazer a revisão de vários ensaios clínicos que já exis-tiam e verificamos que esse método não era só funcional como era 30% mais efetivo que o anterior, com um custo que caiu de R$ 30 mil para R$ 30 por paciente. A coordenadoria de Avaliação Tecnológica do Ministério

da Saúde fez uma tese mostrando que economizava R$ 6 bilhões só com esse tratamento.

Analisamos mais de 300 casos, não com esse impacto, mas que funcionam e só não são colocados em prática por-que não há estímulo econômico. Um exemplo é outra revisão que fizemos e diz respeito ao cálcio para a gestante evitar a eclâmpsia, um procedimento que é divulgado sem parar pela Orga-nização Mundial de Saúde (OMS) há 18 anos. Mas só 6% das mulheres brasilei-ras atendidas durante o pré-natal e em hospitais recebem o cálcio. Por quê? Porque é muito barato. Se fosse mais caro e atendesse a interesses econô-micos, era capaz de existirem até con-gressos mundiais sobre a importância do cálcio na gravidez.

360: Quando um tratamento inovador, mas sem evidências científicas, é válido? AA: Depois de décadas estudando, descobrimos que não temos certe-zas, mas redução das incertezas. To-mamos decisões e escolhemos as alternativas com maior chance de dar certo. É preciso ser honesto e confes-

A sociedade precisa

ter consciência da

importância da

ciência para o

desenvolvimento,

o bem-estar e até

para a preservação

do meio ambiente"

ENTREVISTA

Mas mesmo assim é um marco civili-zatório da nossa sociedade, porque a comissão procura estudar e consultar pessoas preparadas e não misturar a atuação com política.

360: O que senhor achou da lei que aprovou a liberação dos medicamen-tos anorexígenos, a contragosto da Anvisa? AA: Achei triste. Menosprezar a me-dicina moderna, que é baseada em ciência, é voltar à idade das caver-nas. Se outros países baniram, tem um motivo. Tem quem seja favorá-vel, mas é porque existem poucos médicos hoje bem treinados cientifi-camente. Isso tudo devido, segundo

estudos científicos, ao fato de a MBE ser ensinada ou constar ape-nas no currículo de 20% das esco-las de medicina. Se são 200 insti-tuições, 160 delas não têm MBE. São cerca de 16 mil médicos sem esse conhecimento.

360: Uma disciplina como esta, que traz benefícios para médicos e pa-cientes e é importante até para a ges-tão, não é obrigatória no ensino da medicina? AA: A medicina baseada em evidên-cias está nas diretrizes do Ministério da Educação. Nos EUA, Inglaterra, Canadá, Austrália e França isso nem se discute. Fico imaginando como alguém pode fazer gestão de um

hospital sem ter noções fundamentais do que seja MBE científica. A pessoa precisa saber se aquele tipo de exame realmente vai resolver, se é bom com-prar aquele equipamento ou aquele sistema de cirurgia robótica. O sujeito tem de estar preparado ou ter uma ex-celente assessoria, mas é fundamental ter essa cultura e investir naquilo que pode trazer benefícios razoáveis para o sistema de saúde, porque, às vezes, pode trazer malefícios.

360: Falando em malefício, o ser hu-mano é corruptível e o médico também pode ser cooptado pela indústria. Como combater isso?

AA: Existe uma grande defesa para esse tipo de situação. Exigir evidências imparciais de qualidade para imple-mentar aquilo na prática. Lembro que quando começamos a fazer todo esse trabalho, o dr. Adauto Castelo atendeu um garoto de 12 anos de idade que chegou ao consultório com o pai. Eles conversaram e, depois de uma pres-crição, o menino perguntou se aquilo era baseado em evidências. Uma cena que eu queria ter assistido! Essa é a de-fesa que a sociedade brasileira pode ter. Aprender a perguntar se as coisas são baseadas em evidências. Não é preciso saber medicina, mas exigir o direito de participar da decisão e pedir informações com base em dados de qualidade existentes. Isso é bom para todo mundo.

360: Em relação à gestão da saúde, o SUS é, no papel, o modelo ideal porque tem hierarquização de atendimento,

sar isso ao paciente. Poderia ser válido para um doente desenganado, como se diz, mas desde que ocorresse den-tro do contexto da pesquisa. Teria de ser preparado um projeto de pesquisa para ser submetido a um comitê de ética para aprovação com a concor-dância do paciente para, daí, aplicar na pessoa. Sem esquecer de docu-mentar tudo e explicar se funcionou ou não. É necessário haver um espírito científico por trás disso para checar os resultados. Hoje, há condições, por exemplo, para que todo paciente que recebeu uma simples aspirina possa ser seguido durante anos para saber como é que ele evoluiu, se houve efei-tos colaterais.

360: Há muitas críticas em relação à velocidade com que a Conitec incorpo-ra tecnologias e medicamentos. Como o senhor avalia a atuação da comissão? AA: É um progresso a existência da Conitec e grande parte dos integran-tes dela foram treinados nos nossos cursos. Nesses 15 anos de atuação, há algumas limitações. Centenas de pedidos vão chegando e, pela lei, eles têm de ser respondidos em seis meses, por isso, eles foram terceirizando isso.

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Fico imaginando

como alguém pode

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Não é preciso saber

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mas com problemas no acesso. Já a saúde suplementar não tem essa orga-nização. Como melhorar esse quadro? Existem exemplos estrangeiros que po-deriam ser citados? AA: O modelo inglês é o mais próximo do ideal. É socializado e universal, com médico generalista que tria os pacien-tes e só quando necessário encaminha para especialistas. Um médico bem preparado resolve 80% dos problemas até mesmo por telefone. Na hora da di-ficuldade, ele pede ajuda e encaminha o paciente. Isso funciona porque se o indivíduo for direto ao especialista, ele pode não perceber aspectos gerais dos pacientes. Na realidade, é preciso co-meçar do início, com vacinação, edu-cação desde a mais tenra idade, higie-ne e segurança alimentar. Isso é o que eu chamo de integralidade em saúde. Os ensinamentos da MBE abriram o le-que para o direito, psicologia, psicote-rapia, odontologia e muitos outros. Se isso fosse ensinado nas escolas, tería-mos outra nação, porque se começaria a raciocinar, pensar nas probabilida-des, evitaríamos curas milagrosas.

O que se vê na área da saúde é que à medida que vão surgindo novidades tecnológicas, vão sendo incorporados muitos exames e tratamentos sem avaliar cientificamente. Veja o caso do AVC: existem uns 50 tratamentos e uns 40 tipos de exame, e o médico acha que se pedir um número elevado deles o paciente vai ter mais chances de se curar. Isso tem uma lógica, mas, ao mapear esse assunto, vimos que havia três ou quatro exames necessá-rios e essa mesma quantidade de tra-tamentos úteis. Veja quanta coisa foi jogada fora. O pior é que em 90% das vezes os pacientes estão em altíssimo risco. Acompanhei casos de grupos de pacientes a longo prazo e vi que um exame fundamental é a tomografia computadorizada nas primeiras quatro horas. Mas analisan-

do 156 casos, descobri que nenhum teve o exame lido nas primeiras ho-ras. Alguns poucos foram realizados e a maior parte só foi lida 24 horas depois. Esse tipo de situação mostra que o paciente que tem risco, como o hipertenso, o renal crônico, o dia-bético, entre outros, assim como o familiar, o chofer da ambulância, enfim, todos os envolvidos têm de ser avisados. Se resolver em quatro horas, fizer o exame e desbloquear a artéria cerebral média, as chances são muito maiores. O medicamento custa US$ 1 mil, mas é muito menos do que a fisioterapia, o tratamento da pneumonia que ele pode vir a desenvolver numa UTI, a deficiência física etc. Por isso, a saída é o conhe-cimento, o estudo e a informação.

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Se a MBE fosse

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Na mirado cuidadoAbordagem de precisão traz

uma nova visão para a medicina, mas os desafios ainda são grandes

POR RICARDO BALEGO

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Enxergar a medicina sob a ótica do indivíduo, tra-tando cada paciente como único e utilizando novas formas de identificar e cuidar de doenças. Assim funciona a medicina de precisão, impul-sionada pela ideia de uma maior efetividade te-rapêutica e que ganha cada vez mais espaço na área da saúde.

Com uma abordagem personalizada, esse conceito representa para muitos o futuro da pró-pria medicina, seja utilizando soluções mais es-pecíficas quando o assunto é a busca pela cura de patologias, especialmente as complexas, seja com finalidades preditivas.

“A medicina de precisão parece uma evolução incontestável e começa com a observação de que a constituição genética das pessoas é bastante variável, e, como consequência, as doenças e repostas aos tratamentos também são bastante diferentes. Ela procura sempre descobrir o medi-camento certo, para o paciente certo, no momen-to certo”, afirma a médica geneticista Carolina Fischinger Moura de Souza, presidente da Socie-dade Brasileira de Genética Médica (SBGM).

Segundo Stephen Stefani, pesquisador e mé-dico oncologista do Hospital do Câncer Mãe de Deus, em Porto Alegre (RS), isso resulta em abor-dagens mais assertivas. “A ideia é evitar tratar pacientes que não vão ter resposta adequada, buscar tratamentos diferentes e melhores para

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eles, e, ao mesmo tempo, oferecer uma resposta mais efetiva”, diz. O especialista também lembra que esse conceito de cuidado não é novo. “Há décadas nós já temos algumas drogas que só po-dem ser usadas se o paciente tem determinado receptor. A diferença atual é que as drogas são baseadas em anticorpos e possuem um nível de efetividade muito maior, com menos toxicidade.”

Fora do Brasil, essa nova realidade vem sendo tratada com seriedade. Em 2015, por exemplo, o então presidente americano Barack Obama anunciou um plano para estimular a medicina de precisão nos EUA, orçado em US$ 215 milhões. O grande objetivo era criar um banco de dados clí-nicos e genéticos da população americana, para ser utilizado posteriormente na seleção de candi-datos a novas terapias.

Essa abordagem clínica, no entanto, ainda não é um consenso na área da saúde. “O concei-to, obviamente, tem seus adeptos entre os espe-cialistas clínicos. Mas para cada um deles há, em contrapartida, alguém que acredita que os esfor-ços para chegar à medicina de precisão são uma perda de tempo e de dinheiro”, pontua Fischinger.

Tal desconfiança talvez possa ser explicada pelo fato de que as novas soluções terapêuticas têm muito campo para desenvolvimento e ainda não contemplam grande parte dos problemas co-nhecidos, como explica o professor José Eduardo Krieger, diretor do Laboratório de Genética e Car-diologia Molecular do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medici-na da Universidade de São Paulo (FMUSP). “Isso veio para ficar, mas nós estamos ainda no início. Desde o sequenciamento do genoma e a entrada na era pós-genômica, nós achávamos que o cami-

nho ia ser mais fácil, principalmente com relação às chamadas doenças complexas, mas não tem sido exatamente assim”, pondera.

Se por um lado a medicina de precisão ainda divide opiniões, por outro em muitas áreas já é uma realidade como ramo de atuação médica. “Hoje, tratar uma pessoa com câncer de pulmão, de intestino ou de mama, por exemplo, sem ter esse nível de informação, é deixar de manejar o pa-ciente da maneira adequada”, exemplifica Stefani.

Evidências genômicasFoi graças ao sucesso no mapeamento do geno-ma humano, anunciado há quase uma década e meia, que se abriu caminho para as inovações que podemos ver hoje. Isto porque o conceito de precisão está intimamente associado aos avan-ços da genética médica.

Embora ainda estejamos longe de decifrar e correlacionar os perfis genéticos para a maioria dos males que existem, em muitos casos isso já é possível. Como exemplo prático, muitos tipos de câncer já podem ser melhor combatidos a partir da análise genética do material tumoral, identificando marcadores que sugerem o uso de drogas capazes de agir de forma específica naquele problema.

Em alguns casos, inclusive, esses me-dicamentos de última geração con-seguem substituir, com melhores resultados, a quimioterapia tradi-cional. Isso porque, ao invés de

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se atingir tanto células cancerosas como as sau-dáveis, é possível priorizar as que estão doentes, agindo com maior precisão. “Isso é fato, vários medicamentos são mais efetivos e menos tóxi-cos. Se o paciente tiver alguns biomarcadores, ele pode deixar de fazer quimioterapia e passar a usar drogas que oferecem melhor taxa de respos-ta, porque a toxicidade é menor”, explica Stefani. Já existem marcadores conhecidos para muta-ções em cânceres de pulmão, intestino e mama.

Com isso, uma nova geração de medicamentos tem surgido, com propriedades que conseguem maior efetividade e menos efeitos colaterais. É o caso do pembrolizumabe (que possui o nome comercial de Keytruda), aprovado recentemente pela Food and Drug Administration (FDA) e que age por meio de marcadores tumorais. A novida-de é que pela primeira vez a agência americana de controle aprovou uma droga para câncer baseada em uma característica genética, e não no local do corpo onde surgiu o tumor. O medicamento já era usado anteriormente, inclusive no Brasil, para ca-sos de câncer de pele (melanoma) e pulmão.

Uma outra e não menos importante faceta da medicina de precisão é sua possibilidade de abordagem preditiva. Com base nos mesmos re-cursos, amparados pela genética médica, alguns testes podem diagnosticar doenças genéticas de aparecimento tardio, mas que ainda estão em um período assintomático. Nesse caso, é necessário ter o conhecimento da doença e das alterações genéticas a serem investigadas, já manifestadas em familiares previamente afetados.

Os testes genéticos preditivos (TGP) estão disponíveis em alguns serviços privados e públi-cos, e recomenda-se que sejam realizados, assim como todo teste genético, em laboratórios espe-cializados em biologia molecular e com certifica-dos de qualidade específicos para esse tipo de análise. Também é necessário aconselhamento e acompanhamento adequados para os pacientes, já que muitas vezes são identificadas anomalias graves. “Hoje é consenso mundial que, para a realização de qualquer TGP, deve existir um pro-tocolo organizado e estruturado para aconselha-mento, avaliação e acompanhamento psicos-social pré e pós-teste, realizado por uma equipe multiprofissional, na qual se incluam preferen-cialmente um geneticista clínico e um psicólogo”, aponta Carolina Fischinger, que atua no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, e também atende pacientes no sistema público.

De acordo com a médica, uma série de medi-das devem ser tomadas visando minimizar pos-síveis reações negativas após o exame. No caso da suspeita de disfunções neurodegenerativas, por exemplo, recomenda-se que os testes sejam feitos apenas em adultos e naqueles que os pro-curem de forma espontânea, com a realização de avaliação psicológica e acompanhamento antes e após o exame, fornecendo todas as informa-ções e assegurando o completo sigilo médico e laboratorial. “Considerando a inexistência de me-didas terapêuticas e o peso imposto às famílias por essas doenças, fica evidente que há riscos de danos aos usuários se não houver um adequado

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Stephen Stefani, oncologista do Hospital do Câncer Mãe de Deus (RS)

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aconselhamento, bem como suporte médico e psicossocial”, justifica.

Medicina para poucosBase para a medicina de precisão, os exames genéticos possuem um custo que já foi bastante alto, mas que tendem a ser cada vez mais acessí-veis para a população. “Com a evolução das téc-nicas de biologia molecular, é possível, hoje, com uma gota de sangue ou mesmo com o uso da saliva fazer uma investigação bastante ampla da nossa constituição genética. Esse custo era exor-bitante anos atrás, contudo, atualmente é viável na prática clínica”, informa Fischinger.

Os painéis moleculares específicos para diag-nóstico de problemas genéticos já são realizados em diversos laboratórios privados no país. Além disso, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) contempla em seu rol de procedimentos a cobertura obrigatória de exames de alta comple-xidade para o rastreamento de 29 doenças genéti-cas – para planos de saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 ou adaptados à lei 9.656/98. Por outro lado, no setor público esses exames exis-tem somente no campo da pesquisa, já que não há cobertura do Sistema Único de Saúde (SUS).

Mas é na área dos medicamentos que se en-contra uma das maiores barreiras para o acesso aos cuidados, já que boa parte deles chega a ter valores impraticáveis para a maioria das pessoas e sequer são disponibilizados na rede pública. Portanto, os custos totais das novas terapias re-presentam um fator determinante para que a área de precisão ainda seja considerada uma medici-na para poucos.

E essas dificuldades de acesso têm preocupa-do os especialistas. O oncologista Stephen Stefa-ni é um dos autores de um artigo publicado em 2016 na revista “Lancet Oncology”, que tratou da medicina de precisão e seus desafios. “Nós abor-damos nesse estudo como é que isso pode se tor-nar realidade no nosso meio. Porque não adianta ter essa tecnologia se não existir um projeto de implementação, seja no mercado privado, seja no sistema público”, explica.

Segundo o médico, o modelo regulatório no país ainda é lento e confuso, o que na prática sig-nifica que muitas vezes uma droga está disponível, mas não se tem o teste para avaliar se o paciente pode usá-la. Ou o contrário, com a disponibilida-de do teste, mas não da droga. “E o que é pior, eventualmente eu tenho a droga disponível, mas só para o paciente que tem um convênio, porque no sistema público não tem o medicamento. Isso gera um ambiente de inequidade que merece ser melhor tratado, tem que ser trabalhado de uma maneira muito mais receptiva”, aponta.

São desafios ainda o número pequeno de profissionais capazes de interpretar de maneira correta os dados dos exames genéticos – o país possui hoje apenas 241 especialistas médicos reconhecidos em Genética Médica, segundo a SBGM –, assim como a falta de padronização e adaptação. “Não basta ter o teste, ele tem que ter um processo de padronização e de validação muito adequado. Portanto, não é qualquer local que pode fazer, tem que ter labo-ratórios que sigam rigorosamente o mesmo protocolo mundial, para po-

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Em um exemplo do uso da me-dicina de precisão com enfoque preditivo para a saúde pública, o Laboratório de Genética e Car-diologia Molecular do Incor já

utiliza estratégias para implemen-tar isso na população em geral. O laboratório trabalha para identi-

ficar pacientes que apresentam doenças como a hipercolesterolemia familiar, que pro-

voca o aumento dos níveis de colesterol genetica-mente. Pessoas jovens, com colesterol elevado e que já tiveram um infarto, ao passar pelos ambu-latórios do hospital, podem indicar na triagem a possibilidade de ter a doença, que já possui iden-tificação genética de mutações feita pela institui-ção. “Estamos procurando fazer isso hoje, ainda em uma escala que não é nem pesquisa e nem sistema de saúde. Se eu tiver o diagnóstico mo-lecular para esse paciente, significa que eu tenho o diagnóstico para toda a família dele. Então, eu vou pegar seu irmão ou um filho que acabou de nascer e posso saber se ele é portador ou não da mutação, porque se for, esse indivíduo tem uma chance muito alta de manifestar a doença. Esse é um exemplo de como se usa essa informação”, explica o professor José Eduardo Krieger, diretor do serviço e pró-reitor de Pesquisa da USP.

A ideia é que, no futuro, isso possa ser usado já a partir da atenção primária. Toda vez que um exame simples, como o de sangue, apresentar valores muito altos, o teste genético pode ser solicitado por meio de informações de softwares do próprio sistema público, e o padrão genético eventualmente encontrado pode servir para toda a família do paciente. “Eu não vou nem perguntar mais se eles têm colesterol elevado ou não, por-que, agora, eu já tenho o diagnóstico molecular para aquela família. Podemos ir fazendo o teste em cascata, pois ao invés de esperar a pessoa ter um infarto para chegar ao hospital, já vou tratá-lo desde o início. E mais, os não afetados nem vão ser trazidos para o sistema de saúde, ainda que se tenha um pai ou um tio com o problema”, projeta o professor.

Por outro lado, Krieger lembra que esse tipo de iniciativa precisa se tornar viável também eco-nomicamente. “Alguns desses testes e novos procedimentos vão ser custo-efetivos, outros vão ser muito caros, e esse é o principal desa-fio da medicina, porque quando você fala em inovação, em qualquer área, significa um procedimento mais eficaz e mais barato. Isso não tem acontecido, e nós esta-mos muito interessados em come-çar a ter esse acesso, para que seu uso possa ser estendi-do para a população como um todo.”

der comparar dados e oferecer essa informação de uma forma padronizada.”

Para tentar diminuir algumas limitações de acesso a essas novas terapias, a Sociedade Bra-sileira de Genética Médica vem atuando junto ao Ministério da Saúde e sua Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), para o desenvolvimento de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (PCDTs) visando à incor-poração de medicamentos que já são judiciali-zados há mais de dez anos no Brasil. “O PCDT é uma forma de regulamentar alguns tratamentos, reduzir custos e melhorar o acesso, justamente

para os casos indicados de forma racional e com correta prescrição médica. Sabemos que sempre teremos novas tecnologias saindo no mercado e, por isso, é muito importante a constante atualiza-ção científica, pensando que o paciente é o foco e por ele é que devemos atuar”, afirma a presidente da SBMG.

“Entendemos que existe um aspecto econômi-co importantíssimo a ser considerado para viabili-zar o atendimento, mas o que não se aceita é não ter um plano de construção dessa solução. Não podemos sentar nessa inequidade e achar que isso é o melhor que podemos fazer”, conclui Stefani.

Saúde pública também pode ser preditivaJosé Eduardo Krieger, diretor do Incor e pró-reitor da USP

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Muito além do peso

Mais de 1,9 bilhão de adultos sofrem com o excesso de peso em todo o mundo, segundo dados da Organiza-ção Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde (MS), o cenário não é diferente: 53,8% da população tem o problema (aproximadamente 110,9 mi-lhões de pessoas) – desses, 18,9% são obesos (21 milhões de indivíduos).

Esses números fazem parte da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), realizada em todas as capitais brasileiras, entre fevereiro e dezembro de 2016, com 53.210 pessoas maiores de 18 anos.

O estudo ainda mostra que o índice de obesidade tem aumentado com o avanço da idade e é maior entre os que têm menor grau de escolaridade. Nas pessoas com 18 a 24 anos, por exemplo, o índice é de 30,3%. Entre os brasilei-ros de 35 a 44 anos, o percentual é de 61,1% e, nos de 55 a 64 anos, o número chega a 62,4%. Já na população com 65 anos ou mais, o índice é de 57,7%.

O sobrepeso, que cresceu 11,2% em dez anos, somado ao aumento da obesidade, também pode ter colaborado para a prevalência de diabetes e hipertensão, segundo o MS. As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) pioram a condição de vida e podem matar. De acordo com a pesquisa Vigitel, o diagnóstico médico de diabetes passou de 5,5%, em 2006, para 8,9%, em 2016. O de hipertensão, no mesmo período, saltou de 22,5% para 25,7%. Em ambos os casos, o diagnóstico é mais prevalente em mulheres. “Quando fa-lamos em obesidade estamos nos referindo a uma doença crônica que precisa ser identificada, tratada e prevenida”, alerta a endocrinologista Cintia Cercato, diretora do depar-tamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocri-nologia e Metabologia (SBEM).

A OMS aponta a doença como um dos maiores proble-mas de saúde pública no mundo. A projeção é que, em 2025, cerca de 2,3 bilhões de adultos estejam com mais peso do que deveriam (o que representa mais de 30% da população mundial). O número de crianças que apresentam

Em meio a epidemia de obesidade, o retorno dos inibidores de apetite divide opiniões

POR FABIANE DE SÁ

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essa condição no mundo poderá chegar a 75 milhões, caso nada seja feito.

Custos da doença

Nas últimas décadas, os gastos médicos aumentaram de maneira mais significativa do que em outros setores da eco-nomia mundial. O excesso de peso tem contribuído para isso. “As consequências econômicas da obesidade não se limitam aos elevados custos médicos, mas incluem também os gastos indiretos ou sociais, como diminuição da qualida-de de vida, problemas de ajustes sociais, perda de produtivi-dade, incapacidade com aposentadorias precoces e morte”, explica a presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), Maria Edna de Melo. Os indivíduos obesos gastam com serviços de saúde aproximadamente 42% a mais do que pessoas com peso normal, incluindo 105% a mais de prescrições de me-dicamentos (dados norte-americanos), além de significativa perda de produtividade.

Um estudo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) analisou os custos diretos associados aos pacientes ambulatoriais e hospitalizados com doenças relacionadas à obesidade e ao sobrepeso. Os riscos atribuíveis à doença e ao sobrepeso foram obtidos por meio de dados da literatura mundial e variaram muito, de 2% para o câncer de mama a 48,5% para diabetes. O custo anual com as doenças selecio-nadas foi de R$ 3,57 bilhões (ano 2010), R$ 1,15 bilhão para assistência ambulatorial e R$ 2,38 bilhões para a hospitalar.

Outro dado relevante é que a obesidade custa ao Brasil 2,4% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo um estudo internacional conduzido pelo McKinsey Global Institute, que mostra o aumento dos gastos no comba-te ao problema no mundo. O custo equivale a R$ 110 bilhões,

considerando o PIB bra-sileiro em 2013 (R$ 4,8 tri-lhões). No mundo, 2,8% de todas as riquezas são gastas no enfrentamento da obesida-de, o que representa cerca de R$ 5,2 trilhões.

O gasto mundial da obesidade é quase o mesmo de do-enças decorrentes do fumo ou perdas em consequência de conflitos armados – e tão relevante quanto o alcoolismo e as mudanças climáticas.

Divergência

O conhecimento sobre os custos é necessário para análises econômicas de intervenções preventivas e terapêuticas, tais como programas de educação ou novos tratamentos que possam ajudar a reduzir o crescimento da obesidade e dos gastos atribuídos à enfermidade no Brasil. “Esse cenário precisa ser modificado e buscar mais opções terapêuticas é uma necessidade no combate à doença”, afirma Melo.

A sanção do projeto de lei (PL) 2.431/11, que deu origem à lei 13.454/17, de 26 de junho último, pelo presidente da Re-pública em exercício à época, Rodrigo Maia (DEM-RJ), autori-za a produção, a comercialização e o consumo, sob prescri-ção médica, dos anorexígenos sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol, e dá a especialistas mais possibi-lidade para o tratamento do excesso de peso. No entanto, o uso das substâncias ainda é permeado por polêmicas.

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Cintia Cercato, diretora da SBEM

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Feitos à base de anfetaminas, os emagrecedores anfepra-mona, femproporex e mazindol viraram tema de intenso de-bate após a liberação das substâncias pelo Congresso, sob o apoio das sociedades médicas. No entanto, a Agência Na-cional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é contra e afirma que os riscos à saúde são maiores que os benefícios.

Os medicamentos, conhecidos como anorexígenos, atu-am no sistema nervoso central para gerar aversão a comida e inibir o apetite e, por isso, são utilizados em tratamentos para perda de peso. Em 2011, eles foram vetados após aná-lise da Anvisa. Somente a sibutramina seguiu com suas pro-dução e comercialização autorizadas pelo órgão regulador.

Em nota, a assessoria de Comunicação da agência infor-ma que esses inibidores de apetite trazem riscos a pessoas com predisposições a doenças cardíacas e psiquiátricas, e seus benefícios contra a obesidade são limitados. Pelos mesmos motivos, as substâncias também foram proibidas nos Estados Unidos e na Europa, com exceção da anfepra-mona (dietilpropiona), comercializada no mercado ameri-cano. “Essa lei, além de inconstitucional, pode representar grave risco à saúde da população. Legalmente, cabe à Anvi-sa a regulação sobre o registro sanitário dessas substâncias após rigorosa análise técnica sobre sua qualidade, seguran-ça e eficácia. Assim ocorre em países desenvolvidos e signi-fica uma garantia à saúde da população. O Congresso não fez, até porque não é seu papel e nem dispõe de capacidade para tal, nenhuma análise técnica sobre esses requisitos que universalmente são requeridos para autorizar a comerciali-zação de um medicamento.”

Mas entidades como o Conselho Federal de Medicina (CFM), a SBEM e a Abeso comemoram o retorno dos medi-camentos ao país. "Se há grupo de remédios com consenso

sobre seu uso entre as sociedades médicas e liberado em outros países, acreditamos que é direito do médico e do paciente obeso ter essa opção como tratamento contra a obesidade, mesmo com as limitações dessas substâncias", defende Cercato.

Para o conselheiro e o coordenador da Câmara Técnica de Psiquiatria do Conselho Federal de Medicina (CFM), Sa-lomão Rodrigues Filho, a permissão da produção e comer-cialização dos derivados dos anorexígenos é um fator a ser comemorado dentro do atual contexto do país. “Nenhum tratamento para obesidade é uma coisa definitiva. Estamos falando de uma doença crônica, grave, recorrente, de trata-mento complexo e multifatorial, onde as medidas de estilo de vida são muito importantes. Mas poder lançar mão de medicamentos que, prescritos de forma adequada, são fun-damentais para o controle dessa doença, é uma forma de enfrentar essa grave realidade”, explica.

Outro público-alvo desses medicamentos são pessoas com sobrepeso e sob risco por terem doenças graves. "É importante que o paciente com excesso de peso volte a ter a opção dos inibidores de apetite como tratamento", avalia Rodrigues Filho, que lamenta a decisão da Anvisa de proi-bir as substâncias. Para a agência, apesar da lei que libera o uso dos anorexígenos, a importação desses produtos para a venda no Brasil continuará vetada. Como a norma fala ape-nas em autorizar "produção, comercialização e consumo", sem citar a importação, o órgão regulador já anunciou que deve vetar tentativas de empresas em trazer a anfepramona, femproporex e mazindol do exterior.

A ação tem base nas atuais regras brasileiras, que impe-dem a importação de produtos sem registro na Anvisa para serem vendidos no país. Será preciso que os fabricantes in-

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teressados apresentem estudos indicando a eficácia e segu-rança dos remédios.

Cintia Cercato, que participou, em 2009, de um estudo do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), que avaliou a eficácia da dietilpropiona a longo prazo, com ênfase em doenças cardiovasculares e psiquiátricas, acredi-ta que é pouco provável que haja interesse da indústria em fabricar esses medicamentos. “Estudos clínicos mais apro-fundados e realizados com um maior número de pessoas, feitos quando da liberação dessas substâncias há décadas, para comprovar a eficácia, o que não era exigido antigamen-te, são de alto custo. Não compensa ao fabricante investir tanto em um remédio que já tem a patente liberada há mais de 20 anos.”

Segundo o presidente do Sindicato da Indústria de Pro-dutos Farmacêuticos do Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini, que critica a liberação das substâncias pelo Congresso, as farmácias de manipulação devem sair na frente porque podem importar as substâncias para ven-dê-las em dosagens preparadas individualmente para cada paciente. Ele apoia a decisão da Anvisa de negar o registro dos anorexígenos. “A questão que interessa à indústria far-macêutica é a segurança dos pacientes e a eficácia compro-vada de seus medicamentos. Sendo assim, o setor defende o posicionamento da agência.”

A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), em nota enviada à imprensa, repudiaram a decisão do governo – considerando os riscos e os prejuízos à saúde pública – que liberou a comercialização e o consumo dos anorexígenos. As entidades informam que estão estudando as medidas ju-diciais cabíveis para questionar a constitucionalidade da lei.

Opções de tratamento

Para médicos que atuam na área, o retorno dos inibidores de apetite aumentam as possibilidades de tratamento. Hoje, o país tem quatro opções de medicamentos para o controle da doença: sibutramina, orlistat (Xenical), liraglutida (Saxen-da) e cloridrato de lorcasserina (Belviq).

Segundo Maria Edna de Melo, o problema é que nem to-dos os pacientes respondem a eles ou têm como custeá-los – o Saxenda custa em torno de R$ 800/mês. "Por serem mais baratos, os inibidores de apetite seriam uma opção para a população de baixa renda, na qual a doença predomina."

Para ela, há uma estigmatização do tratamento, e nem todos os pacientes conseguem emagrecer com exercícios físicos e dieta, por exemplo. “Todo mundo fala: é só fechar a boca. Não é. Se fosse só isso, não teríamos essa epidemia mundial de obesidade.”

Já para o pesquisador e professor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Francisco Paumgarten, a libera-ção dessas substâncias por meio do Congresso é “lamen-tável e fere a autonomia da Anvisa”. Segundo ele, a eficácia desses medicamentos é “questionável”. “Muitos pacientes não respondem a esses remédios. E mesmo os que perdem peso, quando suspendem o uso, ganham de novo.”

Paumgarten cita um estudo com a sibutramina feito com dez mil pacientes que detectou um aumento do risco de in-farto entre aqueles que utilizavam a substância. "Os riscos são maiores do que os benefícios.”

O fato de inibidores de apetite provenientes das anfeta-minas, de acordo com Cintia Cercato, terem ficado disponí-veis no mercado por décadas mostra que eles são seguros. "Os problemas foram a má prática e o abuso das prescri-ções, com doses elevadas", diz ela, para quem casos como esses podem ser evitados com maior fiscalização da Anvisa e dos conselhos de medicina.

Francisco Paumgarten, pesquisador da Fiocruz

Salomão Rodrigues Filho, conselheiro do CFM

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egundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o sistema prisional brasileiro conta atualmente com mais de 700 mil encarcerados no país, número que aumentou mais de 400% nos últimos 20 anos. Hoje, a média de encarceramen-to é de 300 presos para cada 100 mil habitantes, o que coloca o Brasil na terceira posição do ranking mundial, perdendo apenas para Estados Unidos e China.

Se sobe o número de presos também sobe o déficit de vagas nas penitenciárias. Hoje, faltam mais de 350 mil vagas e, se fossem considerados os mandados de prisão em aberto, cerca de 370 mil, a população carcerária saltaria para mais de um milhão de pessoas, com o Brasil liderando o ranking mundial.

Em 2015, a Anistia Internacional divulgou um relatório com dados ainda mais alarmantes: o Brasil está no topo dos países mais violentos do mundo, com uma taxa de ao menos 100 homicí-dios por dia, sendo a impunidade um dos fatores incentivadores, já que 85% dos crimes acabam sem solução. O índice de reincidência e as con-dições desumanas das unidades prisionais são também fatores preocupantes.

A realidade das mulheres na Penitenciária Feminina da Capital

RESENHA

Entre a razão e

a emoção

S Esse é o universo apresentado pelo médico Drauzio Varella em sua trilogia de livros sobre a carceragem no Brasil. Primeiro “Estação Carandi-ru” (1999) conta a história da extinta Casa de De-tenção de São Paulo; em seguida, “Carcereiros” (2014) mostra a rotina de trabalho dos funcioná-rios públicos nas penitenciárias. Agora, “Prisionei-ras” (2017) apresenta um universo pouco conhe-cido: a vida das mulheres na prisão. Do total de encarcerados, elas representam um percentual de 3,97%, ou seja, cerca de 100 mil mulheres es-tão detidas no Brasil.

Trabalhando há 11 anos como médico volun-tário da Penitenciária Feminina da Capital, em São Paulo, Varella conta, de modo literário, sobre as consultas e as amizades que fez com as mais de duas mil detentas que pertencem à casa. Em seu livro, elas se tornam protagonistas de roteiros dignos de Hollywood.

Se pudesse escolher outro título para seu tra-balho, certamente seria “Esquecidas”. A maior parte das presas acabou encarcerada por tentar ajudar seus parceiros já presos. Foram flagradas nas vistorias tentando levar drogas aos compa-nheiros nas penitenciárias masculinas em dias

PrisioneirasEditora Cia. das Letras296 páginasR$ 39,90

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de visita e acabaram detidas pelo artigo 12 do Có-digo Penal – tráfico de drogas. Depois disso, não são mais lembradas nem por familiares, nem pe-los maridos e namorados que tentaram favorecer.

Passando em frente a qualquer instituição de reclusão masculina aos fins de semana é possível ver filas, barracas, mulheres e crianças cheias de sacolas, os chamados "jumbos", que abastece-rão os filhos, netos e companheiros ao longo de sete dias. Já na porta da Penitenciária Feminina da Capital, a quantidade de visitas é pífia, assim como na maior parte das cadeias femininas do país. Em geral, as famílias conseguem tolerar um homem encarcerado, mas não uma mãe, irmã, filha ou esposa.

Nesse ambiente elas se veem não só aban-donadas, mas, também, sem rumo sobre qual direção tomar. Não incomum, acabam, como diz o próprio autor, “se convertendo à homossexuali-dade” não somente como modo de sobrevivência dentro da cadeia, mas como meio de suprir a ca-rência e a ausência deixadas por aqueles que de-veriam ajudá-las. E não é uma homossexualidade qualquer, ela é classificada, por elas mesmas, em níveis, grupos e subgrupos de relacionamentos, do saudável ao abusivo.

Engana-se quem pensa que é fácil a convivên-cia por ali. A obra mostra que existem regras, que são regidas pelas “irmãs” do Primeiro Comando da Capital (PCC), que também está presente no universo feminino e mostra sua força pelas mu-lheres que integram a facção. Há ordens como não trocar carícias de modo explícito, não haver brigas, discussões ou roubos, sob ameaça de julgamento do PCC.

A relação entre as mulheres que habi-tam as cadeias não é menos complexa que as dos homens, mas há particulari-dades, descritas com riqueza de detalhes pelo médico, que nos faz sentir na pele cada dúvida, cada sonho, cada angústia e cada alegria das presas em seus atendimen-tos. Ele relata o capricho das presas com suas celas, as quais chamam de casas. Há mulheres que ali se tornam verdadeiras donas de casa e o fazem como forma de ganhar a vida dentro das prisões. A moeda de troca válida, ao contrário do que se pode pensar, não é o dinheiro, mas maços de cigarro.

Sem papas na língua e com senso crítico, Va-rella aborda em sua narrativa problemas de um nicho da sociedade pouco observado. Lida com a saúde das detentas como questão de saúde pú-blica, pouco olhada, pouco cuidada, pouco am-parada pelo sistema. Mostra dificuldades, como a falta de suprimentos, a repetição de comida, os banhos de água fria, mas em momento algum co-loca as detentas na condição de vítimas. Em um trecho, deixa claro que “todas estão ali por terem cometido alguma infração”, mas evidencia em todos os momentos as melhorias que deveriam ser feitas pelo governo para que houvesse maior humanização nas penitenciárias, especialmente nas femininas.

Apesar do tema, inóspito para alguns, inte-ressante para outros, “Prisioneiras” é uma obra agradável de se ler, intensa e muito bem redigida. Rica em detalhes. Não há como chegar na última página do livro sem pensar em como se pode contribuir para uma vida melhor ao próximo, in-dependentemente da condição em que ele se en-contra: preso, solto, rico, pobre, branco, preto. Em um Brasil de oportunidades para poucos, o médi-co consegue envolver o leitor em uma profunda reflexão no futuro que está sendo construído.

Encerrando seu ciclo de narrativas, Varella mostra um talento excepcional não só para escri-ta, mas, também, para confrontar com coragem e sensibilidade as situações que viveu durante seu voluntariado. (Por Rebeca Salgado)

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adequação da rede”, baseado na resolução nor-mativa (RN) n° 35, de 11 de novembro de 2014, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que pode implicar em autorização para um des-credenciamento isolado ou de um grupo atingin-do uma especialidade ou conjunto delas.

Há também uma “negociação” na qual a ope-radora visa reduzir o número de credenciados em uma determinada especialidade e, com isso, há a promessa de aumentar o número de atendimen-tos ao prestador ou prestadores remanescentes. Porém, o valor atual dos procedimentos costuma ser renegociado para valores menores, sob o argu-mento de que a quantidade de usuários será am-pliada devido à nova redistribuição, o que resulta-ria em um faturamento final maior. É ver para crer.

Não podemos esquecer o mais importante desse relacionamento: os contratos que as ope-radoras enviaram à maioria dos seus credencia-

POR DANILO BERNIK

ARTIGO

a saúde suplementar, negociação é uma ferramenta que faz toda a diferença. É o meio pelo qual se busca o entendimento, o consenso e a solução dos conflitos de forma a atender os interesses de ambas as partes. É um instrumento de grande relevância que, infelizmente, tem sido desprezado e pouco utilizado como realmente deveria ser.

Os prestadores de serviços médico-hospita-lares sabem bem as dificuldades que enfrentam ao colocar em prática esse procedimento, que é normal no mundo de negócios e entre empresas com saudáveis parcerias, mas isso não ocorre neste segmento.

Serviços de saúde de médio e pequeno portes são, na imensa maioria dos casos, o lado fraco da relação comercial com as operadoras de planos de saúde, porque não possuem poder algum no processo negocial, e isso os impede de recom-por seus custos e reaver as perdas inflacionárias. Ressalta-se que em quaisquer dessas hipóteses trata-se de reajuste, o que seria justo e resultaria no aprimoramento da qualidade dos serviços, beneficiando diretamente o paciente tanto sob o prisma técnico quanto operacional.

Não bastasse a difícil relação comercial, os médios e os pequenos serviços de saúde passa-ram a conviver com o fantasma denominado “re-

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Negociação ou imposição?

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dos, pessoas físicas e jurídicas, principalmente para clínicas e serviços de apoio diagnóstico tera-pêutico (SADT), são geralmente unilaterais, com cláusulas que afrontam as regras inseridas nas RNs n° 363 e n° 364, emitidas pela ANS em 11 de dezembro de 2014.

Devemos também ficar atentos aos primeiros 90 dias de cada ano, contados a partir de 1º de janeiro, pois é o período de livre negociação em que devem ocorrer os reajustes a serem aplicados na data de aniversário do contrato.

Uma das cláusulas que gera mais dúvidas e problemas refere-se às formas de reajuste e seus respectivos índices, os quais, na maioria das ve-zes, são percentuais do INPC, IGP-M e IPCA, este último como referência pela ANS. Mas não pode-mos esquecer que o índice definido pela agência que deve ser aplicado pelas operadoras para rea-juste nos planos individuais/familiares em 2017 é de 13,55 %, que também pode ser utilizado como referência para a correção dos valores dos con-tratos. Nada mais correto do que usar a mesma referência que utilizou a operadora.

Vejamos um exemplo de uma negociação que consta na cláusula de reajustes de um contrato enviado ao prestador pela operadora: consultas, honorários e terapias = com reajuste de 100% do IPCA; SADT = com reajuste de 40% do IPCA; e taxas e pacotes = aplicando reajuste de 60% do IPCA. Dando continuidade ao que foi citado: “Os valo-res relacionados aos serviços contratados serão reajustados no percentual (índices variados ou cada operadora tem os seus, conforme a negocia-ção) correspondente ao acumulado dos 12 meses anteriores a contar da data-base, considerando a última competência publicada oficialmente pelo IBGE”. Agora, atenção ao que se segue: “Deduzi-do desse percentual de aumento, a variação do custo assistencial médio do período, calculado conforme cláusula (número próprio de cada tipo de contrato), o cálculo do custo assistencial médi-co dar-se-á pela soma do valor total pago ao cre-denciado pelos serviços prestados aos usuários, dividido pelo total de beneficiários que utilizaram esses serviços durante os 12 últimos meses ante-riores à data-base”.

Como podemos notar, são cláusulas que dei-xam ambíguas a interpretação, dificultando o en-tendimento do prestador de serviços.

As operadoras irão pressionar sempre pelo me-nor índice, cabe ao prestador optar ou não pelo que foi proposto. Se pudermos usar a mesma tática do nosso “parceiro” será ótimo. Se não for possível, resta-nos negociar, negociar e negociar.

Devemos estar atentos, também, ao teor do contrato, lê-lo detalhadamente e submetê-lo a um advogado de confiança, apesar de ser comum que o rodapé de cada página contenha a obser-vação: “Contrato previamente aprovado pela ge-rência jurídica de saúde. Dispensada a chancela do Jurídico”. Em caso de dúvida, a operadora deve ser questionada por escrito a fim de que se documente a dúvida suscitada.

Mas o que as operadoras pensariam se lhes fossem autorizado pela ANS repassar apenas 50% do índice fixado pela agência para a corre-ção dos contratos com os usuários dos serviços? Elas achariam justo? Afinal, não é esse o critério por muitas adotado? Diante desse panorama, re-almente há negociação ou trata-se de verdadeira imposição?

*Danilo Bernik é gerente de Assistência à Saúde da FEHOESP

As operadoras irão

pressionar sempre

pelo menor índice,

cabe ao prestador

optar ou não pelo

que foi proposto"

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A Revista FEHOESP 360 é uma publicação da FEHOESP, SINDHOSP,

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