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a cabra JornAL UnIversITárIo de coImbrA Mais informação em acabra. net @ Do que é feito o vigor que sai dos ginásios Os ginásios são cada vez mais fre- quentados por homens. Com efeito, é o poder da aparência, tutor desta sociedade, que neles é cultivado. Numa abordagem aos efeitos fisio- lógicos e sociológicos desta prática, debatem-se experiências e conse- lhos de quem sabe os limites do exercício físico, falando, por vezes, quem já os passou. E tenta-se per- ceber o fenómeno dos músculos pelas costuras sociais. Dos ginásios, saem esqueletos bem protegidos por armaduras. E voltam sempre, para as aumentar. Precariedade Recibos verdes lutam pela legalidade Em Portugal, infringe-se a lei do trabalho com a criação dos falsos re- cibos verdes. Caracterizados por serem trabalhadores independentes na condição de contribuintes, mas de- pendentes face a uma “camuflagem do contrato” laboral, enfrentam um dos maiores obstáculos à continui- dade da sua atividade – a ilegalidade. Está, portanto, em causa o cumpri- mento de um direito fundamental do homem consagrado na declaração universal dos direitos do homem: o direito ao trabalho e a uma proteção contra o desemprego. Aqueles que vivem nesta situação revelam em jeito de testemunho os obstáculos por que passam para ter uma vida condigna. Pág. 16 Pág. 14 Musculação A urgência de reabilitar os centros urbanos hAbITAção Pág. 12 e 13 rAfAelA cArvAlho inês AmAdo dA silvA 22 de novembro de 2011 Ano XXI n.º 237 QUInZenAL GrATUITo dIreTor cAmILo soLdAdo • edITores-eXecUTIvos Inês AmAdo dA sILvA e João GAspAr A uma semana da escolha da nova DG/AAC Pág. 2 a 7 Restless Pobres meninos ricos AnA pAtríciA Abreu Pág. 18 Vendedores da Praça do Comércio reclamam novas licensas de venda Pág.10

Edição 237

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Jornal Universitário de Coimbra A CABRA

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acabraJornAL UnIversITárIo de coImbrA

Mais informação em

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Do que é feito o vigorque sai dos ginásios

Os ginásios são cada vez mais fre-

quentados por homens. Com efeito,

é o poder da aparência, tutor desta

sociedade, que neles é cultivado.

Numa abordagem aos efeitos fisio-

lógicos e sociológicos desta prática,

debatem-se experiências e conse-

lhos de quem sabe os limites do

exercício físico, falando, por vezes,

quem já os passou. E tenta-se per-

ceber o fenómeno dos músculos

pelas costuras sociais. Dos ginásios,

saem esqueletos bem protegidos

por armaduras. E voltam sempre,

para as aumentar.

Precariedade

Recibos verdeslutam pela legalidade

Em Portugal, infringe-se a lei do

trabalho com a criação dos falsos re-

cibos verdes. Caracterizados por

serem trabalhadores independentes

na condição de contribuintes, mas de-

pendentes face a uma “camuflagem

do contrato” laboral, enfrentam um

dos maiores obstáculos à continui-

dade da sua atividade – a ilegalidade.

Está, portanto, em causa o cumpri-

mento de um direito fundamental do

homem consagrado na declaração

universal dos direitos do homem: o

direito ao trabalho e a uma proteção

contra o desemprego. Aqueles que

vivem nesta situação revelam em jeito

de testemunho os obstáculos por que

passam para ter uma vida condigna.

Pág. 16

Pág. 14

Musculação

A urgênciade reabilitaros centrosurbanos

hAbITAção

Pág. 12 e 13

rAfAelA cArvAlho

inês AmAdo dA silvA

22 de novembro de 2011 • Ano XXI • n.º 237 • QUInZenAL GrATUITodIreTor cAmILo soLdAdo • edITores-eXecUTIvos Inês AmAdo dA sILvA e João GAspAr

A uma semana da escolhada nova DG/AACPág. 2 a 7

RestlessPobres meninos ricos

AnA pAtríciA Abreu

Pág. 18

Vendedores daPraça do Comércioreclamam novas licensas de vendaPág.10

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2 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | terça-feira

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os próximos dias 28 e29, os estudantes daUniversidade de Coim-

bra vão ter a oportunidade de es-colher os corpos gerentes daAssociação Académica de Coim-bra (AAC) para o ano de 2012.Este ano são cinco as listas candi-datas à direção-geral da AAC(DG/AAC) e à mesa da Assem-bleia Magna (AM), mais duas lis-tas que no ano passado. Casonenhuma das listas obtenha maio-ria na primeira volta, a segundavolta, entre as duas listas mais vo-tadas, vai ter lugar a cinco e seisde dezembro.

“Desperta a AAC” é o lema dalista C, liderada por André Costa,finalista de Direito. A lista I, “In-digna-te”, é representada por Re-nata Cambra, estudante dePortuguês. Ricardo Morgado,aluno de mestrado de EngenhariaBiomédica, é o rosto da lista L,“Liga-te à Academia”. Por sua vez,a lista M, com o mote “Mexe-tepela AAC”, é encabeçada pelo es-tudante de mestrado em Sociolo-gia, Fabian Figueiredo. A lista T,“A Alternativa És Tu”, apresentacomo candidato André Martelo,também estudante de Sociologia.

O período de campanha eleito-ral começou no passado sábado eestende-se até dia 27. Contraria-mente a anos anteriores, este anonão há lugar a dia de reflexão,uma decisão que ficou vinculada

na última AM.

Dez listas para o fiscalPara o conselho fiscal (CF), órgãode fiscalização e jurisdição da aca-demia, concorrem este ano dez lis-tas. Cinco das listas quecompetem pela presidência daDG/AAC e mesa da AM concor-rem também para o CF. A lista Capresenta como candidato RuiCarvalho, estudante de Ciências

Farmacêuticas. André Rodrigues,de História, é o candidato pelalista I. Pela lista L o escolhido foiFrancisco Guerra, de EngenhariaCivil. O candidato pela lista M éDiogo Barbosa, de História, e Ca-tarina Ângelo, estudante de Di-reito, é a representante da lista T.

As outras cinco apresentamcandidatura exclusivamente a esteórgão da AAC. A lista A, “ParaísoFiscal”, apresenta como candidatoo estudante de Gestão, DiogoAlves. Nuno Santos, de Engenha-ria Mecânica, é o rosto da lista D,“Até a dormir lá vamos”. Pela listaO, “Oligopólio”, concorre João

Abrantes, de Economia. Tambémde Economia compete Hugo Paisda lista P, “Pedrulha pra DG”.Joana Abreu, estudante de Medi-cina, apresenta-se pela lista Z,“Tudo em ordem”.

Desde 2008 que o CF conta comsete lugares, em vez dos cincocomportados até então. Esta alte-ração teve como objetivo aumen-tar a representatividade dosestudantes no órgão.

Tal como a eleição para o Con-selho Geral da Universidade deCoimbra, também a eleição para oCF se faz pelo método de Hondt,sendo os sete lugares disponíveisatribuídos de forma proporcionalaos primeiros números de cadalista, dependendo do número devotos conseguidos, sendo quepara o CF não há lugar a uma se-gunda volta.

Trabalho da ComissãoEleitoral dificultado O presidente da Comissão Eleito-ral (CE), Pedro Fialho revela queeste ano o trabalho está a ser difi-cultado pelo elevado número delistas candidatas ao CF. “No iníciocomeçou a especular-se que pode-ria haver mais listas, as chamadaslistas fantasma, mas percebeu-senas reuniões de comissão que esseproblema não se constituía por-que todos apareceram com dele-gados na CE” explica PedroFialho. O presidente da comissão

aponta como explicação para onúmero pouco habitual de listas ofacto de existirem “grupos de co-legas de determinadas faculdadesque se tentam juntar, com aspira-ções a um lugar no CF”.

Para a campanha eleitoral, aslistas concorrentes aos órgãos vãoter disponível, na totalidade, ummontante de 3500 euros, mais500 que no ano passado. PedroFialho adianta que o plafond dis-

ponível para a campanha das lis-tas já foi atribuído. “São 500euros em papelaria para as listasda DG/AAC e 100 euros para ascandidatas ao CF”, releva. O pre-sidente explica ainda que o baixomontante facultado às listas do CFfoi debatido em comissão. “Pena-lizou-se um pouco as listas, quepodem não ser fantasma, mas adecisão foi tomada com o intuitode penalizar as hipotéticas listasfantasma”, afirma Pedro Fialho.

“O cacique é uma coisa complicada” Nos atos eleitorais é habitual-

mente levantada a questão do ca-ciquismo, que se refere ao ato deexercer influência política sobreos estudantes para votarem emdeterminada lista. O presidenteda CE revela que esta equipa temde ser “uma equipa grande parahaver um bom controlo”, porque“uma coisa é certa: o cacique éuma coisa complicada”. PedroFialho adianta que a nível de re-cursos lhe é impossível “ter umdelegado em cada ponto das fa-culdades”, mas “vai estar pelomenos um delegado nas redonde-zas de cada urna”. “De certeza queesse controlo vai ser feito”, ga-rante.

Pedro Fialho revela ainda que,ao contrário de anos anteriores,optou por uma “solução radical”,em relação às tentativas de de-fraude nas urnas: a partir do mo-mento em que se fecha uma urnapor algum motivo as 23 restantesfecham também, aclara. O presi-dente explica que tomou esta me-dida para explicar “às pessoas queestão encarregues que, se tenta-rem defraudar uma urna, a delesfecha também”.

No início da próxima semana, os estudantes da Universidade de Coimbra vão serchamados às urnas para escolherem os seus representantes académicos para o ano de2012. Cinco são as listas que concorrem à cadeira da direção-geral. O conselho fiscalconta com dez listas candidatas. Por Inês Balreira

Os Cinco na corrida à DG/AAC

rafaela carvalho

Contrariamente a anos

anteriores este ano

ficou decidido em

AM que não há dia de

reflexão de reflexão

Este ano o plafon

disponibilizado

para a campanha

eleitoral é de três

mil e 500 euros

N

Noite eleitoral em

cabra net@

Entrevistas na íntegra em

cabra net@

Page 3: Edição 237

22 de novembro de 2011 | terça-feira | a cabra | 3

destaque

“Não adianta continuar a recusar Bolonha”André Costa, natural doPorto e finalista de Direito, éo líder e rosto da lista C –“Desperta a Academia”. Com23 anos e sem filiação parti-dária, tem como experiênciano associativismo o cargo decoordenador-geral da polí-tica educativa, em 2008, e apresidência do núcleo de es-tudantes de Direito em2009. Foi ainda membro dacomissão de revisão dos es-tatutos da Associação Acadé-mica de Coimbra (AAC).Atualmente ocupa o cargo desenador de Direito. Comoprincipal bandeira defendeum planeamento da AAC amédio longo prazo.

O que te levou a candidatar?

Acima de tudo foi o sentimento deque nós enquanto AAC podíamosfazer mais e melhor, ou seja, não es-távamos a corresponder àquilo queseria a necessidade do nosso papel.Tanto no âmbito local, na cidade e nauniversidade como no âmbito regio-nal, e mesmo até no âmbito nacional.

O cargo de presidente da dire-

ção geral da AAC (DG/AAC) é

compatível com o cargo de se-

nador?

Incompatibilidade formal e jurídicanão há nenhuma, porque é um órgãoda universidade e é um órgão daAAC. A verdade é que eu ainda nãodediquei muito tempo a pensar sobreisso.

Quais são as principais bandei-

ras do vosso projeto?

Há uma antes de todas as outras: teruma AAC ao nível do que ela pode,precisa e deve ser, no plano da uni-versidade, da cidade , da região cen-

tro e do país. Isto traduziu-se em vá-rias outras metas mais específicas emcada um dos pelouros. Na adminis-tração queremos apostar na eficiên-cia energética. Gostávamos tambémde fazer uma espécie de manual daAAC, com todas as suas condições lo-gísticas. No desporto queremos apos-tar no desporto adaptado. Naintervenção cívica gostaríamos defazer uma gala social mas tambémlançar um debate que nós apelidamosde “Pensar Coimbra”, em que nóspensássemos em conjunto os aspetosda reabilitação urbana. Na políticaeducativa a meta é pensar o ensinosuperior (ES). Queremos lançar umgrande congresso em Coimbra sobreo ES. Nas saídas profissionais temosuma iniciativa que passa por utilizaro nónio para colocá-lo ao serviço dasempresas para terem acesso aos cur-rículos e ao percurso dos estudantes.

Quanto à ação social temos duasideias: uma é a constituição de umfundo de apoio social da AAC.

De que forma é feito o financia-

mento da campanha?

Não temos apoios partidários, nemde nenhum grande lobby económico.O nosso financiamento vem de nós.Das nossas contribuições e do queangariamos com as iniciativas que fi-zemos, mas também do que conse-guimos mobilizar da comunidade quenos envolve.

Uma das palavras mais utiliza-

das por ti é meritocracia. O que

entendes por meritocracia?

Meritocracia são as pessoas que têmmais competência, mais qualidade eque tiveram maior trabalho desem-penhem os cargos que a AAC tem. Anossa ideia de meritocracia foi quecada uma das pessoas que viesse paraeste projeto trabalhar, se demons-trasse competências, este trabalholhe seria reconhecido de forma de-mocrática.

Consideras que os incidentes

envolvendo extintores passados

no Fórum AAC 2009 e conse-

quente processo movido pelo

Conselho Fiscal da AAC podem

condicionar a tua eleição?

Esse é um processo concluído, teve assuas consequências, mas é passado.Não acho que condicione em nenhumaspeto aquilo que é a nossa candida-tura. É um episódio da minha vidapessoal e não vou sobre ele fazerqualquer tipo de comentários.

Os anos de 2010 e 2011 ficaram

marcados por grandes altera-

ções na ação social escolar. Qual

é a análise que fazes?

Quando fomos confrontados comesta situação de crise internacional,que depois se refletiu em Portugalnuma crise muito específica, houveuma tentativa de reduzir custos. Essatentativa por parte do governo aca-bou por ser cega. Não se pode cortarsó por cortar e daí a implosão dasbolsas e da ação social no DL70/2010 ter-se repercutido numasérie de consequências que foraminadmissíveis. Estamos um poucomelhor este ano, ou seja, o que haviaanteriormente era pior do que temosagora mas acho que estamos longeainda do que seria necessário.

A DG/AAC vai associar-se à

greve geral no dia 24. Como vês

esta tomada de posição?

Não temos nada contra as manifesta-ções de rua, mas achamos que são o

último recurso e devem ser pondera-das no sentido de aconteceremquando as restantes vias estão esgo-tadas.

Achas que ultimamente se tem

ido para a rua só para cumprir

calendário?

Acho que a importância da ação sim-bólica está diretamente relacionadacom aquilo que é a sua preparação.Não posso entender que o façamos sóporque queremos fazer uma açãosimbólica.

Bolonha e o Regime Jurídico

das Instituições do ES (RJIES)

foram lutas dos estudantes du-

rante anos. Ambos os sistemas

estão implementados. Ainda faz

sentido lutar contra eles?

O RJIES não tem concordância daminha parte. Até determinado pontoé bom que haja uma grande ligaçãoda Universidade de Coimbra (UC) aomeio que a rodeia e que a participa-ção do tecido empresarial tenhamais-valias. A questão é a que custo éque essas mais-valias foram conquis-tadas: à custa de uma grande dimi-nuição da representação estudantil.O RJIES foi também olhado de ladodurante muito tempo devido à priva-tização do ES que poderia trazer, no-meadamente pelo regimefundacional. Neste momento esserisco desapareceu. Quanto a Bolonha,o processo não está concretizado por-que aquilo que se pretendia com Bo-lonha não se atingiu com a suaaplicação. Ter Bolonha mas não ter oregime que Bolonha pressupõe, ouseja, a participação dos estudantes,um regime tutorial, avaliação contí-nua e não ter as condições para issoser realizado ao nível estrutural e docorpo docente implica ter uma Bolo-nha amputada. Contudo, não adiantacontinuar a recusá-lo, mas sim con-tinuar a pugnar para que a sua apli-cação seja mais completa.

Qual é a vossa posição face às

propinas?

Por princípio a AAC é contra as pro-pinas. Uma posição deste género vin-cula todos os sócios da AAC. Não nosresta muito mais do que ser contra aspropinas. O que entendemos nesteespecífico contexto que envolve anossa candidatura é que em 2012 nãovale a pena estar a reivindicar paraque as propinas acabem. Nem seriaentendido sequer pela sociedadecivil.

E quanto à sua aplicação?

A UC era a única universidade quereinvestia parte da sua propina namelhoria da qualidade do ensinoatravés de um fundo de investimentoque depois se desmultiplicava em vá-rias iniciativas. A questão é que em2012 a UC, mobilizando todas as re-ceitas ao seu dispor, não consegue co-brir quase as despesas defuncionamento.

Esperas fazer alguma reestru-

turação a nível dos pelouros?

Acabámos com o pelouro do desportouniversitário, que achamos que se en-contra dentro do desporto. Nãotemos também o pelouro da ligaçãoaos órgãos, temos uma assessoria deligação aos órgãos.

Para cessar, o contrato do bar

da AAC tem que ser renunciado

até 31 de agosto de 2012. Se

fores eleito pensas fazê-lo?

Se houver condições para o fazer. Ese houver algum incumprimentocontratual.

O que é para ti um bom resul-

tado eleitoral?

Eu digo sempre que o nosso objetivoé sermos uma opção válida e sólida e,portanto, vencer as eleições, sem dú-vida, é o que nós queremos. Se nãovencermos as eleições, o facto de ter-mos existido já foi bom.

LISTA C • “deSperTA A ACAdemIA” • André CoSTA

“O que entendemos

é que em 2012 não

vale a pena reivindicar

para que as propinas

acabem“

rafaela carvalho

Inês Balreira

Camilo Soldado

Page 4: Edição 237

4 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | Terça-feira

LISTA I • “IndIgnA-Te!” • RenATA cAmbRA

DESTAQUE

“A luta de gabinete provou ser insuficiente”Renata Cambra é o rosto dalista I, “Indigna-te”. Com 20anos e natural de S. João daMadeira, a estudante de Por-tuguês é militante do Blocode Esquerda e integra aFrente de Ação Estudantil(FAE). Atualmente é mem-bro do conselho pedagógicoda Faculdade de Letras daUniversidade de Coimbra(UC). Fez ainda parte do nú-cleo de estudantes de Letrase da assembleia de revisãodos estatutos da AssociaçãoAcadémica de Coimbra(AAC).

O que te levou a candidatar?Existe uma indignação bastante fortedos estudantes em geral e essa indig-nação tem de ter voz. A nossa indig-nação é dupla. Por um lado, a atualsituação do ensino superior (ES) e aconjuntura nacional, por outro, a in-dignação com as sucessivas DGs, quenão cumprem o papel de defesa dosdireitos dos estudantes.

Quais é que são as principaisbandeiras do vosso projeto?Uma das nossas principais bandeirasé a luta pelos direitos dos estudantes,por isso estamos desde já a fazercampanha para a greve geral. Nãopartilhamos a visão da direção-geralda AAC (DG/AAC), que adere à grevegeral, mas não mobiliza para ela eque assim se vai escusar de fazer umamanifestação nacional de estudantes.Em termos de ação social, defende-mos que o cálculo da bolsa seja maisjusto: um cálculo linear, sem escalo-namentos e que os bolseiros estejamisentos do valor da propina.

De que forma é que o financia-mento da vossa campanha está

a ser feito?Fazemos coletas nas reuniões e esta-mos a contar com o orçamento paraas eleições da DG/AAC.

Têm apoios partidários?Não.

A vossa lista saiu de uma divi-são da lista R do ano passado.Porque é que isso aconteceu?Essa divisão aconteceu sobretudo porintransigência de ambas as partes.

Consideras que a divisão podeenfraquecer os movimentos?Claro. A divisão quer entre a FAE e aAAcção, quer entre a Alternativa ouentre os três enfraquece, como éóbvio. Fazemos a leitura de que real-mente somos projetos que têm bas-tante semelhança nas suas ideias enaquilo que defendem, daí termos in-sistido bastante na questão da união.

Já vieste a público dizer quetentaste chegar a acordo com osoutros movimentos – AAcção eA Alternativa És Tu. Qual é quefoi a resposta que tiveste?Por parte da Alternativa És Tu rece-bemos um não. Do coletivo AAcção,não recebemos qualquer resposta.

2010 e 2011 ficaram marcadospor grandes alterações na açãosocial escolar. Que análisefazes?As alterações a nível da ação socialsão o reflexo de que o ensino supe-rior (ES) está a ser estrangulado. Es-tamos a chegar a uma situação limite.Existem estudantes a abandonar oES porque não têm possibilidadeseconómicas, as bolsas são insuficien-tes e estão a ser cortadas. A previsãoé que isso continue. É preciso umaluta muito forte para que os estudan-tes não tenham de abandonar as uni-versidades, que possam concluir osseus estudos. Deve haver uma con-

certação muito grande para quepossa ser revertida esta situação.Sem vontade de nos mexermos nãovamos a lado nenhum.

E por que formas passa essaconcertação?Há a velha questão da luta de gabi-nete, que já provou ser insuficiente.Também há a questão das lutas frag-mentadas, ou seja, direções-geraisque têm visto a luta como um calen-dário que têm de cumprir. A nossavisão é que haja um plano de luta queseja pensado a nível estratégico.

A DG/AAC vai associar-se àgreve geral do dia 24. Como éque vês esta tomada de posição?Foi muito bom que a DG/AAC que-brasse este tabu de aderir à greve. Noentanto, não adianta de nada a retó-rica e irmos à Assembleia Magna(AM) apresentar propostas quandodepois não as fazemos descer à prá-tica e não as fazemos acontecer. Es-tamos a poucos dias da greve geral eainda não se viu mobilização efetivapor parte da DG/AAC.

O que é que faltou a estaDG/AAC?Vontade. Não me parece que sejauma questão de incompetência, éuma questão de falta de vontade eisso tem uma questão de fundo:como é que aqueles que estão ligadosàs juventudes dos partidos que estãoa fazer cortes no ES vão ser contraesses mesmos cortes? E também éisso que nós criticamos nas listas decontinuidade D e M, esse compro-metimento com o centrão que, ob-viamente, ata mãos, pés e braços.

Bolonha e o Regime Jurídicodas Instituições do ES (RJIES)foram lutas dos estudantes du-rante anos. Ambos os sistemasestão implementados. Ainda fazsentido lutar contra eles?

A FAE, que é o coletivo que dinamizaesta lista, surgiu sobretudo contraBolonha. Numa altura em que háquestões cada vez mais fraturantes,torna-se evidente que há sistemasque não funcionam, como Bolonha,que supostamente iria tornar o en-sino muito melhor. O RJIES retiroumuita representatividade aos estu-dantes. Também há uma questão pe-rigosa que não é falada em termosclaros. Uma situação em que o queestá a ser posto em cima da mesa émais autonomia da UC através deempresas, que atualmente já estão noconselho geral. Se existem empresasna UC é porque existe algum inte-resse: o sucesso das suas própriasempresas.

Qual é a vossa posição face àspropinas?Defendemos a redução imediata dapropina porque os estudantes têmcada vez menos possibilidades eco-nómicas para se manterem no ES.Defendemos também a isenção de

propina para os bolseiros como umamedida imediata de urgência para es-tancar a saída dos estudantes do ES.

Qual é a tua opinião sobre o re-gulamento de atribuição de bol-sas em vigor este ano?Não é que o regulamento seja mau detodo, mas não adianta de nada ter omelhor regulamento quando não hádinheiro para as bolsas.

Uma das bandeiras de todas asdireções gerais é a aproxima-

ção dos estudantes à academia.Isso não se tem vindo a verifi-car. A que se deve?Há uma falta de presença nas facul-dades, nos departamentos e tambémhá muita falta de tentativa de aproxi-mação. É importante tentar ao má-ximo o contacto e isso passa por ironde os estudantes estão. Muitasvezes a própria postura da DG/AACna AM é de quem não está a ouvir osestudantes.

Esperas fazer alguma reestru-turação a nível dos pelouros?Temos um pelouro que é da informa-ção, adequado ao de comunicação eimagem. Basicamente, asseguramosos pelouros que achamos essenciaise apostamos no de informação, que éum pelouro novo no que é realmentea nossa tradição para que possamostrabalhar a questão da proximidadecom os estudantes.

Qual a vossa posição face à con-cessão do bar da AAC?O bar não deve ser gerido por em-presas da noite. Não temos uma pro-posta fechada, isso deve ser discutidoem AM. O bar deve ser asseguradopelos estudantes e consideramos aproposta dos SASUC ficarem com aconcessão do bar, num misto dosdois verem uma forma de assegurar obar. Se formos eleitos não vamos re-novar o contrato com o InTocha, nemvamos fazer um contrato com o NB,que é outra das empresas que atual-mente está interessada. Vamos de-fender que os estudantes devemdecidir o que fazer com o bar.

O que será para ti um bom re-sultado eleitoral?É aquele que mostre que realmentehá uma quantidade considerável deestudantes que concorda com as nos-sas ideias e que percebe que as coisasnão estão bem e que é preciso inver-ter a situação atual.

“Estamos a poucos

dias da greve geral

e ainda não se viu

mobilização efectiva

por parte da DG”

rafaela carvalho

Inês Balreira

Inês Amado da Silva

Page 5: Edição 237

22 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 5

DESTAQUE

LISTA L • “LIgA-Te à AAc” • RIcARdo moRgAdo

“Não faz sentido acabar com as propinas”Estudante do segundo anode mestrado de EngenhariaBiomédica, Ricardo Mor-gado é natural de Gouveia.O candidato pela lista L,“Liga-te à Academia”, com22 anos, foi já coordena-dor-geral do pelouro da Pe-dagogia em 2010. É filiadona Juventude Social-Demo-crata, mas assume a suacandidatura como indepen-dente.

O que te levou a candidatar?A académica não chega de formaefetiva aos estudantes e o principalobjetivo deste projeto pelo qual mecandidato é efetivar essa união. Vaiser o ano mais difícil que a nossa ge-ração alguma vez enfrentou e paraisso precisamos de uma académicaforte, experiente, que consiga maisuma vez pautar-se pela defesa dosseus estudantes.

Estavas a dizer que queriasuma académica mais unida,achas que ela não tem estadounida o suficiente?Acho que não. Tem de se perceberque uma casa como Associação Aca-démica de Coimbra (AAC), comcerca de 80 organismos, está acimade qualquer individualidade e qual-quer organismo.

E a que é que achas que se deveessa desunião?Tem havido falta de vontade, sobre-tudo para criar laços de estreita-mento que criem a aproximaçãoentre a direção-geral da AAC(DG/AAC) e os restantes organis-mos. Depois acontecem coisas quenão favorecem a AAC.

Estás a referir-te às demis-

sões?A questão das demissões e os res-tantes casos foram um extravasardo que acontece cá dentro, e temosque perceber que se queremos mos-trar uma académica forte para fora,temos que ter uma académica fortepor dentro. Isso não aconteceu nemeste ano nem ao longo dos anos.

Quais é que são as principaisbandeiras do vosso projeto?A ação social e o financiamento doensino superior. Tivemos umagrande vitória relativamente ao DL

70/2010 mas temos um novo regu-lamento de atribuição de bolsas doqual já sabemos alguns resultados,e a verdade é que vai haver algunsestudantes que vão ficar sem bolsa.Entendemos que todos os preçossubiram, os salários foram cortadose os impostos subiram. Estes cortesvão fazer muita gente sair do ensinosuperior (ES), e para quem já estu-dou o novo regulamento de atribui-ção de bolsas, é possível melhorá-loe colmatar algumas injustiças.

Que injustiças?Um artigo prevê que consoante opatrimónio que o estudante tenhano banco ou dinheiro que tenha aprazo para poupar, leva uma dimi-nuição na sua bolsa. Esse é um casode injustiça que pode ser facilmentecolmatada. Tem de haver um limitepara que um estudante que tenhapouco dinheiro no banco não levelogo um corte de cinco por cento.

Que outras bandeiras são apre-sentadas pelo vosso projeto?Este vai ser um ano em que se vaidiscutir mais o financiamento doES. A Universidade de Coimbra(UC) levou um corte de 7,6 milhõesde euros, recebendo agora 80 mi-lhões para 2012, quando está pre-visto pagar apenas em salários 90milhões de euros. Se estes cortescontinuarem a única solução é queas propinas aumentem. Percebemosa difícil situação do país mas perce-bemos a difícil situação dos estu-dantes, e é do lado dos estudantesque temos de estar.

Já ocupaste um cargo naDG/AAC de 2010 que deu con-tinuidade à DG/AAC ainda emfunções. Há elementos da atualdireção-geral que fazem parteda tua lista. Pode afirmar-seque este é um projeto de conti-nuidade?Não é um projeto de continuidade.É verdade que tenho pessoas destaDG/AAC que vão integrar a minhaequipa, mas todo o conceito do pro-jeto é diferente do que o que se temlevado até agora.

Consideras que é um projetode rutura?Não é de rutura. Obviamente queconta muito o que foi feito neste anoe o que foi feito no anterior.

De que forma é feito o finan-ciamento da campanha?Digo já que não temos financiamen-tos partidários. O financiamento dacampanha tem sido feito sobretudopelos elementos que pertencem àlista.

Mas para quem passa a pontede Santa Clara, há um outdoordo projeto “Liga-te” numa pla-taforma que costumava serocupada pela JSD…

Mas lá está, costumava ser usadapela JSD, eu nem sequer sabia dissomas aquilo é um espaço onde é pos-sível colocar um outdoor.

A DG/AAC vai associar-se àgreve geral no dia 24. Como éque vês esta tomada de posi-ção?Esta tomada de posição talvez façasentido neste momento, apesar denão ser uma coisa virada para o ESdiretamente. A verdade é que temosque pensar que os nossos pais estãoa levar um grande corte nos seus sa-lários. Isso vai-nos afetar indireta-mente.

Bolonha e o regime jurídicodas instituições do ES (RJIES)foram a luta dos estudantesdurante anos e ambos os siste-mas estão implementados.Ainda faz sentido lutar contraeles? A autonomia das universidades foialgo que, em certa parte, foi reti-rado, sobretudo aos estudantes etambém à própria universidade e,infelizmente, foi daquelas lutas emque não tivemos resultados. Depoisdo RJIES, temos uma menor repre-sentação nos órgãos da universi-dade. Acho que não é das lutas maisprioritárias neste momento.

E quanto a Bolonha, qual é atua consideração? Eu acho que os objetivos de Bolonhaeram e continuam a ser grandes.Ainda não está tudo conseguido.Bolonha é uma realidade e é comessa realidade que devemos traba-lhar, é essa realidade que devemoscolocar. Acho que já não faz sentidolutar contra Bolonha. Bolonha éuma realidade com a qual nós temosque, neste momento, trabalhar efazer de tudo para que as coisas cor-ram bem. Já não é uma luta, paramim, que faz sentido.

E qual é a vossa posição face àspropinas? A AAC, nos seus estatutos, defendeum ensino gratuito. Eu, pessoal-mente, também defendo o ensinogratuito. Quando deixarmos de de-fender o não às propinas a acadé-mica está a abrir um pouco o flancoda luta. Mas a verdade é uma: narealidade socioeconómica em queestamos não faz sentido acabar comas propinas. Quando não, aí é que asuniversidades fechavam mesmo.

Quanto ao provedor do estu-dante qual é a vossa posição?O provedor do estudante faz todo osentido que exista na universidadee muitas vezes não tem o devido re-conhecimento. Falta alguma divul-gação relativamente à existência doprovedor do estudante. Ele é al-guém que está disposto a resolver osproblemas dos estudantes.

Qual a vossa posição face àconcessão do bar da AAC?Se ganharmos as eleições e a ante-rior DG/AAC ainda não tiver re-nunciado ao contrato,comprometo-me a renunciar aocontrato com o InTocha e levar aconcessão do bar a concurso pú-blico. Gostava muito de, quando seescrevesse o caderno de encargos,estivesse, para além da concessão, apassagem da sala de estudo para obar de baixo e o bar debaixo para asala de estudo.

O que é para ti um bom resul-tado eleitoral?Ganhar as eleições.

E ir a uma segunda volta?Sejamos francos, obviamente quehaverá uma segunda volta. A se-gunda volta será um bom resultado,mas se ganhássemos à primeira,isso sim, seria um extremamentebom resultado.

“Se estes cortes

continuarem a

única solução é

que as propinas

aumentem”

rafaela carvalho

Inês Balreira

Camilo Soldado

Page 6: Edição 237

DESTAQUE6 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | Terça-feira

LISTA M • “Mexe-Te peLA AAc” • fAbIAn fIgueIredo

“A ação social é a continuidade do desastre”Natural da Suíça, mas criadodesde pequeno em Coimbra,Fabian Figueiredo assume-se como o candidato pelalista M – “Mexe-te pelaAAC”. Com 22 anos, o estu-dante de mestrado em Socio-logia já fez parte de doisprojetos do núcleo de estu-dantes de Sociologia, no pe-louro da cultura e pedagogia.Conta ainda com dois anosde mandato na assembleiada Faculdade de Economiada Universidade de Coimbrae ainda no conselho pedagó-gico da mesma faculdade.Militante do Bloco de Es-querda, assume a sua candi-datura independente dopartido.

O vosso slogan é “e se este anonão mudássemos só as mos-cas”. O que querem dizer comisto?É um slogan provocatório, humorís-tico, é direto e acho que as pessoaspercebem o que quer dizer. Mas onosso slogan mesmo é “Mexe-te pelaAAC”. As discussões que têm havidoeste ano são completamente clarasquando há duas listas recheadas deinteresse. Uma vai pelo mérito, outrapelo compromisso, e diz que não é decontinuidade mas que também não éde rutura, e a diferença do ponto devista de ideias não existe. Não quere-mos que mudem só as moscas, que-remos que o conteúdo e as práticasmudem.

Quais são as principais bandei-ras do vosso projeto?Uma das coisas que nós já propuse-mos e deu algum alvoroço é algomuito simples: o bar da AAC. O con-trato vai ser renegociado. Nesse sen-

tido, e indo de acordo com o que é avontade do administrador dos Servi-ços de Ação Social da Universidadede Coimbra (SASUC), propomos algosimples: na próxima concessão osSASUC ficam com a exploração dobar e da esplanada. Isto resolveriauma data de problemas. De onde éque vem o dinheiro quando osSASUC levam um corte de 800 mileuros? O bar da AAC dá muito di-nheiro. Porque é que esse dinheironão há de ser aplicado no fundo deapoio social? Estamos em novembroe o Estado ainda não pagou as bolsasde estudo nem analisou grande partedos processos. Isto é surreal. Inter-namente, não se percebe, como é queos SASUC, numa conjuntura destas,feche as cantinas aos fins de semana.É urgente que a associação acadé-mica se posicione também sobre ocorte do passe social dos estudantesem transportes públicos. Outra pro-posta: como é que não há uma sala deestudo sem ser a da AAC e como éque a biblioteca geral fecha às 10 danoite e como é que as bibliotecas dasfaculdades fecham Às 10 da noite?Mais, nós somos contra as propinas.As propinas servem essencialmentepara pagar custos de funcionamentocorrente. Não é essa a nossa visão doensino superior.

De que forma é feito o financia-mento da vossa campanha?Podia dizer que alugava sedes decampanha e que tinha uma pré-cam-panha fortíssima. Não é isso que voudizer, porque não corresponde ànossa realidade. O grosso do finan-ciamento será aquele fixado pela co-missão eleitoral. Por outro ladotemo-nos financiado pelas pessoas dalista. Vamos também fazer um conví-vio e esperamos que abata as dívidas.

Têm apoios partidários?Não temos apoios partidários ne-nhuns.

Houve uma proposta de coliga-ção de outros movimentos?Houve uma conferência de imprensaem que se falou nisso. Quando sequer acima de tudo aglomerar temque se apostar muito na forma comose faz. A vontade da maioria fosse quenós apresentássemos o nosso projetoautonomamente e com as muitaspessoas que o compõem.

Na apresentação da campanhafalaste em segunda volta. É essaa meta a atingir?É uma meta a atingir. A meta mínimaera entregar a lista e entregámos.Chegarmos à segunda volta é um de-sejo que o projeto tem, mas acima detudo é uma necessidade democráticaque a AAC precisa. A AAC enfraquecesempre que os afilhados dos anterio-res ocupam os órgãos gerentes. Esteclima reprodutivo, de casta, de apa-drinhamento, enfraquece a AAC.

Os anos de 2010 e 2011 ficarammarcados por grandes altera-ções na ação social escolar. Qualé a análise que fazes?É a continuidade de um desastre. Noano passado cerca de 20 mil estu-dantes perderam a bolsa de estudo.

Dos dados que são públicos cerca de600 estudantes do ES abandonaramCoimbra. Este governo disse que iriaalterar de fundo o regulamento debolsas de estudo. Nós hoje sabemosque isso não é verdade. Se o ano pas-sado 20 mil bolseiros deixaram de oser, este ano serão 10 mil, sendo queestes 10 mil representam 30 por

cento. Se este ano estamos assim, e seno ano passado já era mau, para opróximo ainda será pior. Se começa-ram a cortar pelas bolsas de estudo edo que se pode ler no programa dogoverno avizinha-se uma motivaçãopara aumentar propinas. Outra ver-tente da acção social que não pode serdescurada é a caução que os estudan-tes das residências pagam aumentou,assim como o preço do prato social.

A direção-geral da AAC(DG/AAC) vai associar-se dia 24à greve geral. Como vês essa to-mada de posição?Vemos com bons olhos, apesar de terhavido uma tendência de alguns diri-gentes académicos de querer fazerilhas em torno dos estudantes e daAAC. Como nós sabemos os estudan-tes não são ilhas nem as suas famí-lias. O plano que está em cima damesa é demasiado malévolo para fi-carmos parados.

Bolonha e o Regime Jurídicodas Instituições do Ensino Su-perior (RJIES) foram lutas dosestudantes ao longo dos últimosanos, mas são sistemas já im-plementados. Ainda faz sentidolutar contra eles?Apesar de ser um dueto, a coisa vaiser um trio. Vem aí a passagem a fun-dação e sabemos que este reitor é umgrande adepto disso. Passagem a fun-dação significa carregar cada vezmais na lógica empresarial do ES. Bo-lonha e o RJIES não são uma inevi-tabilidade. Não deixa de ser curiosoque a própria Universidade de Bolo-nha discute a sua continuidade emBolonha. O propósito de Bolonha foi,acima de tudo, reduzir as valênciasacadémicas dos cursos. Por outrolado o RJIES foi um golpe de estadono ES, principalmente na democra-cia. Atualmente há banqueiros egrandes empresários a mandar maisno ES do que os estudantes. Qual é o

interesse de um banco, de uma em-presa de telecomunicações ou até deuma petrolífera estar num conselhogeral de uma universidade? Não épelo prestígio, porque há uma lógicade que quando for para partir o boloeles querem fazer parte dele.

Qual é a vossa política para comas secções culturais, desporti-vas e organismos autónomos?Quando se fala de secções desporti-vas é inevitável falar do Estádio Uni-versitário. É inaceitável ter que sepagar uma taxa para se utilizar o es-tádio. A nossa política para com assecções culturais é a de boa convi-vência entre elas, de trabalho con-junto com as suas necessidades erespeito da sua autonomia. Por outrolado, propusemos criar o dia das sec-ções. Um dia em que haja um com-promisso entre a AAC e as secçõesonde elas tomem o espaço público nacidade e das faculdades.

Uma das bandeiras de todas asdireções gerais é a aproximaçãodos estudantes à academia. Issonão se tem vindo a verificar. Aque se deve?Existe uma descrença por parte demuitos estudantes que não se reveemnas direções-gerais, nas suas tricas etêm desconfiança. Não falo só destemandato, mas de um avolumar demandatos. Em relação às AM’s, aca-bar tarde é uma razão de afasta-mento. Também a sua divulgação émuito deficitária. Porque é que não sefazem mais vezes ciclos de plenáriosde faculdade? Os núcleos são tam-bém setores privilegiados para essaaproximação. A culpa não é só daAAC. Muitas vezes é dos seus sóciosque fazem das AM’s guerras de pa-vões, de galos e lutas de egos. É umaestratégia política, mas que exclui aspessoas da discussão e que não pro-cura qualquer tipo de discussão paramelhorar os nossos problemas.

“A AAC enfraquece

sempre que os

afilhados anteriores

ocupam os órgãos

gerentes”

rafaela carvalho

Inês Balreira

João Gaspar

Page 7: Edição 237

22 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 7

LISTA T • “A ALTernATIvA éS Tu” • André MArTeLo

DESTAQUE

“A ação social escolar não é uma caridade”André Martelo, 20 anos, é ocandidato à presidência daDG/AAC pela lista T, “A Al-ternativa És Tu”. Nasceu emCoimbra, mas foi na Mar-gem Sul que cresceu. Comfiliação no Partido Comu-nista Português, o estudantede Sociologia assume nãoter experiência no associati-vismo ao nível do ensino su-perior. Contudo, integrou aassociação de estudantes dasua escola secundária.

O que te levou a candidatar?Eu não decidi candidatar-me sozi-nho. Faço parte de um movimentoque surgiu na Universidade deCoimbra há alguns anos e, no seiodesse movimento, houve uma deci-são de concorrer a estas eleiçõespara aos órgãos gerentes da Associa-ção Académica de Coimbra (AAC).

De que forma é feito o financia-mento da campanha?A nossa campanha, além de se ba-sear fortemente naquilo que é o pla-fond disponibilizado pela AAC, temtambém um contributo generosodos membros do movimento.

Têm apoios partidários?Não. É uma lista que tem gente devárias correntes partidárias, com vá-rias ideologias e com várias perspe-tivas do mundo.

Houve uma proposta de coliga-ção de outros movimentos queconstituem agora listas para aseleições da AAC?Houve um convite para conversar-mos e construirmos um projeto elei-toral para os orgãos da AAC.Recebemos o contacto e ouvimos oque tinham a dizer. No seio do mo-

vimento, com as perspetivas que játínhamos avançadas, discutimos oque tínhamos a fazer e a decisão foide continuar com o nosso trabalho.

Quais são as principais bandei-ras do vosso projeto?O nosso projeto assenta naquilo queé o nosso lema, sobre uma ligaçãomuito próxima às principais aspira-ções dos estudantes e às suas preo-cupações. A luta intransigente nadefesa dos estudantes não tem es-tado à altura daquilo que deveria serseguido pela AAC. Este eixo funda-mental de luta na forma como o en-sino superior (ES) está a ser atacadoé um ponto de partida daquilo quedeve ser a AAC, tendo também anoção da vastidão e diversidade defrentes de trabalho e questões que secolocam a uma AAC com esta di-mensão.

Os anos de 2010 e 2011 ficarammarcados por grandes altera-ções na ação social escolar(ASE). Qual é a análise quefazes?As alterações da ASE, tanto no planodireto como indireto, tiveram o anopassado uma implicação brutal. Nosnúmeros avançados pelo ministérioforam 10 mil bolsas retiradas e 11 milbolsas diminuídas. Na altura, os par-tidos que estavam na oposição con-testaram a situação. Curiosamente,são esses partidos que estão hoje nogoverno e fizeram a mesma coisa oupior. Os números que se avançampor vários serviços da ASE do país éuma retirada de mais 10 mil bolsas,ou seja, num quadro de dois anos,20 mil bolsas foram retiradas e 11mil diminuídas. A ASE não é umacaridade ou uma ajuda que o go-verno dá aos estudantes mais caren-ciados. A ASE é o apoio social que,no caso dos estudantes, garante queeles tenham condições económicaspara estudar.

Qual é a tua opinião sobre o re-gulamento de atribuição debolsas em vigor este ano?A opção política que o governo faz éa mesma que o ano passado: a pre-texto de uma crise, que não foram osestudantes que criaram, a solução écortar. Estas regras não servem equeremos outras. Queremos bolsasque vejam a ASE como um apoio so-cial para a frequência no ES, numaperspetiva de um maior alargamentodo número de estudantes abrangi-dos e no valor das bolsas.

A DG/AAC vai associar-se àgreve geral no dia 24. Como vêsesta tomada de posição?Na assembleia magna (AM) tivemosuma posição simples: a greve geralfoi convocada pelas centrais sindi-cais para os trabalhadores. Os estu-dantes não fazem greve. A própriaCGTP teve a iniciativa de, numalinha inovadora, ter por todo o paísconcentrações, ações e manifesta-ções de rua para dar espaço aos re-formados, desempregados,trabalhadores por conta própriapara exprimirem o seu descontenta-mento face à situação política. Nanossa opinião, a haver uma demons-tração de solidariedade por partedos estudantes é em Coimbra, nuncaaquilo que foi feito, que é aderir auma manifestação nacional que nãoexiste. Mas acresce outra coisa quetem gravidade e as pessoas queapoiaram esta decisão não percebe-ram: os trabalhadores que vão con-duzir os autocarros para Lisboa vãopicar o ponto e furar a greve.

Bolonha e o regime jurídico dasinstituições do ES (RJIES)foram lutas dos estudantes du-rante anos. Ambos os sistemasestão implementados. Aindafaz sentido lutar contra eles?A história da AAC prova que nada éimpossível mudar. Com o RJIES e o

processo de Bolonha aplicados ésimples, desaplicam-se. As coisasnão são impossíveis de mudar. ORJIES trouxe a antidemocracia paradentro das nossas instituições e es-cancarou as portas do ES à entradadas entidades privadas. O processode Bolonha é maior que o RJIES,mas também não é impossível de re-tirar. As compartimentações peda-gógicas que foram colocadas porBolonha são erradas e a divisão emtrês ciclos é um argumento basilardaquilo que é a etilização do ensino.

Com o termo do processo deBolonha, qual seria a estruturados cursos? O modelo de anti-gamente ou o de Bolonha ade-quado?O sistema antigo. Um sistema na-cional de ES sem Bolonha. Mas, ob-viamente, vai ter de haver umprocesso transitório e discussõesprofundas.

Qual é a vossa posição em rela-ção às propinas? É a posição da AAC, o fim das propi-nas. O ensino gratuito é um princí-pio constitucionalmente garantido.Em 20 anos houve um aumento de15 mil por cento. E não deixa de sercurioso que as maiores movimenta-ções de massas aconteceram quandoelas eram de seis euros e meio e nãode quando eram de mil.

Qual é a vossa posição face àsprescrições?O sistema de prescrições é injustoporque, em vez de criar condições nosistema do ES para que não haja umarrastar de matrículas sem fazer ca-deiras, acaba por criar um entraveeconómico. Quem tem condições fi-nanceiras pode comprar as cadeiras.Quem não pode, acaba por abando-nar o ensino.

Pensas fazer alguma reestru-

turação ao nível dos pelouros?O pelouro da política educativa nanossa opinião não deve existir. Estepelouro não discute mais políticaeducativa do que discute o pelouroda cultura, ou pelouro do desporto,ou da intervenção científica. Discutira construção da faculdade de des-porto é discutir política educativa.Na nossa opinião o pelouro de polí-

tica educativa é um pelouro que ficatransversal aos restantes.

Qual é a vossa opinião quanto àconcessão do bar?O bar é de estudantes e deve ser ge-rido por estudantes.

Se forem eleitos pretendem re-nunciar o contrato em vigor?Vamos acabar com o contrato o maisrapidamente possível e tentar en-contrar uma forma de gestão estu-dantil. Não vamos acabar com osfinos e com os cafés, mas pôr o barao serviço dos estudantes, commuito maior envolvimento das sec-ções culturais, dos organismos autó-nomos e das secções desportivas.

O que seria para ti um bom re-sultado eleitoral?O melhor possível seria ganhar como máximo de votos possível, se fossecem por cento era o ideal. Realisti-camente isso não acontecerá.

E quanto ao conselho fiscal?Eleger é o melhor resultado, sem dú-vida.

“A divisão do ensino

em três ciclos é um

argumento basilar

daquilo que é a

etilização do ensino”

rafaela carvalho

Inês Balreira

Ana Morais

Page 8: Edição 237

EnsinO suPEriOr8 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | Terça-feira

Portugal longe das metas da Europa 2020

Os objetivos delineados

pela estratégia parecem

não estar ao alcance de

Portugal até ao fim da

década mas Durão

Barroso acredita que

metas são realistas

Europa 2020 é o nome dado à

estratégia de crescimento adotada

pela União Europeia (UE) na pró-

xima década. Como tal, o plano

define metas e números a atingir

até 2020 em cinco áreas: emprego,

inovação e investigação, política

ambiental e energia, educação e

combate à exclusão social.

Quanto à educação, há metas

específicas para cada país, estipu-

ladas pela UE, ao nível do ensino

superior (ES). Na conferência “En-

sino Superior no quadro da estra-

tégia Europa 2020”, que decorreu

na Faculdade de Direito da Uni-

versidade de Lisboa (UL) nos pas-

sados dias 10 e 11 de novembro, a

coordenadora do setor para a polí-

tica do Ensino Superior na Direção

Geral para a Educação e Cultura

da Comissão Europeia, Sophia

Eriksson salientou a necessidade

de a Europa sair da crise através

do investimento no ES. Segundo

as metas estabelecidas na estraté-

gia Europa 2020, está previsto

que, até esse ano, Portugal passe

de uma percentagem de 23,5 por

cento da população de diplomados

entre os 30 e os 34 anos de idade,

para 40 por cento.

Para a pró reitora da Universi-

dade de Lisboa (UL), Luísa Cer-

deira, esse número “dificilmente”

será alcançado, “dados os condi-

cionalismos orçamentais que o

país está a viver e os cortes que

foram feitos no orçamento das ins-

tituições do ensino superior pú-

blico”.

Apesar disso, na conferência na

Faculdade de Direito da UL, o pre-

sidente da Comissão Europeia,

Durão Barroso, considera que as

metas da estratégia da UE 2020

“são ambiciosas mas realistas” e

que a sua implementação com su-

cesso “depende dos estados mem-

bros”.

Durão Barroso anunciou mais

financiamento para o ES a nível

europeu. “Haverá um investi-

mento de 15,2 mil milhões na edu-

cação e formação profissional, o

que constitui um aumento de 68

por cento neste tipo de despesa”,

afirmou. O presidente da comissão

europeia considera que o investi-

mento em capital intelectual é o

melhor que a Europa pode fazer

para o seu futuro e, por isso, "não

é inteligente cortar na educação e

na ciência".

Não obstante, está previsto, para

o Orçamento do Estado de 2012,

um corte de 100 milhões na verba

destinada às instituições de ensino

superior (IES), o que faz com que

o compromisso assumido por

estas instituições, aquando da as-

sinatura do contrato de confiança

em 2010, se torne mais difícil

cumprir, pondo ainda mais em

risco os objetivos europeus. Luísa

Cerdeira lembra que, para além de

faltarem poucos anos para as

metas estipuladas pela UE, o fi-

nanciamento, ao invés do desejá-

vel, decresceu. “Não só não se deu

esse reforço como, mais grave, vai

haver um corte”, lamenta a pró rei-

tora da UL mas garante que, ape-

sar disso, a instituição tem estado

a aumentar o número de alunos

conforme o acordado no contrato

de confiança. “Desde 2010 temos

estado a aumentar cerca de 600

alunos ao ano e gostaríamos de

continuar a poder fazer esse es-

forço”, afirma Luísa Cerdeira.

Menor taxa de diplomados

em relação à média da UE

Segundo dados do Eurostat relati-

vos ao ano de 2010, Portugal, com

23,5 por cento da população dos

30 aos 34 anos diplomados, está

ainda longe da taxa de diplomados

relativamente à média da União

Europeia, com esta a situar-se

atualmente nos 33,6 por cento.

Ainda assim, Portugal não tem

das piores percentagens da EU

quando comparado com Itália

(19,8 por cento), Malta (18,6 por

cento) ou República Checa (20,4

por cento), estando, no entanto,

ainda longe dos países no topo da

tabela como Bélgica (44,4 por

cento), Dinamarca (47 por cento)

ou Irlanda (49,9 por cento).

O ciclo de estudos que demora

menos tempo a ser concluído é o

segundo ciclo, pois tem dois anos

de duração e seria por aí que a pró

reitora da UL veria com maior fa-

cilidade um incremento de diplo-

mados. “Se houvesse um grande

número de estudantes a procurar

os cursos de mestrado” haveria

esse aumento, sendo que este ciclo

de estudos pode ser frequentado

por “ex-alunos que queiram com-

plementar a sua formação”, ad-

mite Luísa Cerdeira. Todavia, a

mesma antevê que, “nesta conjun-

tura, muitas pessoas que estariam

interessadas em aumentar a sua

formação não têm as condições

para poder pagar as propinas

dessa formação”.

Outro dos objetivos prioritários

relativos à educação é baixar a taxa

de abandono escolar para um nível

inferior a 10 por cento.

Já começou a

sensibilização para a

manifestação da greve

geral. Contudo, uma boa

resposta à greve por parte

dos transportes pode difi-

cultar ida a Lisboa

As ações de sensibilização à mobi-

lização para a greve geral por parte da

direção-geral da Associação Acadé-

mica de Coimbra (DG/AAC) já come-

çaram. Após conselho internúcleos,

realizado a 16, ficou decidido que se-

riam os núcleos de estudantes a rea-

lizar grande parte da divulgação e

sensibilização à participação da AAC

na greve geral de dia 24. Flyers, car-

tazes e postais foram distribuídos por

todos os núcleos, sendo que nesta se-

mana vão ser realizadas, pelos mes-

mos e pela DG/AAC, sessões de

esclarecimento em aulas.

Segundo o coordenador-geral do

pelouro da Política Educativa da

DG/AAC, Samuel Vilela, a inscrição

para a manifestação deve decorrer

também junto dos núcleos. Samuel

Vilela não espera a mesma intensi-

dade nem mobilização nesta partici-

pação como aconteceu nas últimas

manifestações de estudantes no 17 de

novembro: “esperamos entre 300 a

500 pessoas”.

A DG/AAC ainda não confirmou

transporte para Lisboa para o dia 24,

sendo que o presidente da DG/AAC,

Eduardo Melo, admite que “feliz-

mente há muitos trabalhadores do

setor que estão a aderir à greve”, es-

tando de momento à procura de al-

ternativas como o comboio. Contudo,

certezas ainda não há, e a DG/AAC

vai esperar até ter uma noção mais

concreta das alternativas que se po-

derão apresentar para o transporte.

“Pretendemos que os transportes

não funcionem “, afirma o membro

da CGTP de Coimbra, António Mo-

reia, comentando que “qualquer des-

locação para o Porto ou para Lisboa

não faz sentido”. O dirigente sindical,

apesar de congratular a decisão apro-

vada em Magna, apela ainda à

DG/AAC e aos estudantes para que

“se juntem às centrais sindicais em

Coimbra, que possam participar aqui

e que se juntem neste grito de alerta

e protesto”, assevera. O membro da

comissão executiva da CGTP, Armé-

nio Carlos, vinca a descentralização

da manifestação e da greve geral,

considerando que “a concentração

em Coimbra é um espaço onde os es-

tudantes podem participar de forma

mais significativa”.

Eduardo Melo defende a presença

da AAC em Lisboa por considerar que

“numa ação local não haveria uma

mensagem política clara e assim faz

mais sentido a deslocação a Lisboa,

que é onde está o poder de decisão

político”.

com Daniel Silva

Mobilização para a greve sem certeza no transporte

Inês BaLrEIra

O presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, participou no último dia da conferência que trouxe especialistas do ensino superior a nível europeu a Lisboa

Camilo Soldado

João Gaspar

Page 9: Edição 237

cultura22 de novembro de 2011 | terça-feira | a cabra | 9

das treze propostas apresentadas, foi a de rodrigo Santos que venceu o concurso de encenação do citac, que decorreu de 21 de setembro a 30 de outubro

Partindo das ambições, das preo-cupações, das ansiedades e das pul-sões do grupo de atores, o projetovencedor visa “criar textos origi-nais”, conta Rodrigo Santos, natu-ral de Palmilha Dentada, Porto, evencedor do Concurso de Encena-

ção do Círculo de Iniciação Teatralda Academia de Coimbra (CITAC).A proposta de encenação foi sobre-tudo “apontar ao intérprete en-quanto criador”. O conceito passa,assim, pela construção por parte dopróprio corpo de atores do CITAC,sendo esta uma “proposta maissensitiva que propriamente de his-tória ou de teatro convencional”.

Segundo Margarida Cabral,membro integrante do CITAC, Ro-drigo foi escolhido visto que o seuprojeto procurava criar uma perso-nagem do nada para depois a ex-plorar. Margarida refere ainda queo CITAC tem preferência por ence-nadores que tenham alguma expe-riência, “porque queremos arriscar,mas também não podemos arriscartudo”. Seduzidos por outras pro-postas também bastante arrojadase aliciantes, conseguiram realizar a

difícil tarefa de escolher um projetocom o qual trabalhar. No entanto,não deixaram completamente departe algumas das restantes ideiasque poderão vir a ser abordadaspelas direções vindouras.

Tendo já sido realizado nos anossetenta, oitenta e, mais recente-mente, em 2008, o lançamentodeste concurso tem surgido quandoo grupo sente necessidade de reali-zar novas experiências no âmbitoda expressão corporal e criativa. Ahipótese de participar nesta inicia-tiva foi aberta a “toda a gente quetenha ligação ao teatro e que sejaencenador”, inclusive estrangeiros.Desta vez, a adesão surpreendeupela positiva, pois já tinha aconte-cido noutros anos não existiremmais que duas candidaturas.

Após realizar um ‘workshop’ deinterpretação com esta equipa tea-

tral académica, Rodrigo Santos teveconhecimento deste concurso atra-vés de um colega pertencente aocírculo. Premiado com 1500 euros,estada e alimentação, o encenadorcomeçou no dia 7 deste mês a tra-balhar com o CITAC, mais especifi-camente com o grupo que foiselecionado no ano passado,aquando do curso bienal de inicia-ção ao teatro. Em termos de expe-tativas, esperava apenas “virtrabalhar com gente que quisessetrabalhar, que me desse liberdadepara executar as minhas propos-tas”. Consciente de que não encon-traria uma estrutura profissional ecom intenção de dotar os atores deferramentas criativas, está “con-tente com a experiência”. A apre-sentação deste projeto fora docomum está prevista para fevereirodo próximo ano.

Da matemática para o palco

iência no teatro. No iní-cio, parece um daquelescasos de amor impossí-

vel, que nada têm em comum. Masalguém disse que “o teatro é algoque humaniza e, desse modo, po-demos usá-lo para qualquer as-sunto”. Carl Djerassi foi essealguém. Químico, romancista edramaturgo, Djerassi conta comuma vasta carreira: no seu currí-culo, encontram-se vários roman-ces, peças de teatro e inúmeroscontributos no campo da química,nomeadamente na área da conce-ção -“Pai da pílula” não será umanomenclatura que vem ao acaso.

Mas como pôr Isaac Newton eGottfried Leibniz, importantes vul-tos da ciência, num palco? Pri-meiro, é preciso fazer umaretrospetiva histórica: os dois cien-tistas que afirmam ser os invento-res do cálculo entraram emconflito, pois ambos defendiam seros verdadeiros criadores da fór-mula e reclamavam a descobertapara o seu país. A discussão reque-reu uma reunião dos elementos daRoyal Society de Londres – da qualNewton era presidente. Leibniznada podia fazer contra isso emuito menos contra o seu carátermanipulador e vil.

Djerassi escolheu escrever sobreesta controvérsia, não por ser sobrefactos científicos reais, mas simporque, para além de abordar umafamosa invenção que revolucionouo mundo da ciência, “queria mesmoescrever sobre Newton” e sobre “aspessoas que se deixaram manipularpor ele”. É aqui que entra a huma-nização da ciência pelo teatro, re-tratada na peça “Cálculo”.

Tudo começa em Londres, noano de 1795. Dois amigos e aficio-

nados do teatro, Vanbrugh (FilipeEusébio) e Cibber (Gil MAC), dis-cutem uma nova dramatização aapresentar em Inglaterra. Van-brugh coloca as cartas na mesa epropõe uma peça sobre uma situa-ção real, que envolvia dois grandesnomes da ciência daquela altura.Cibber, qual ator atrevido e ambi-cioso, entusiasma-se com o texto.Os dois começam a representar, emjeito de experimentação. E chega-mos ao conceito principal da peçade Carl Djerassi: “uma peça dentrode uma peça”.

À medida que Vanbrugh e Cibbervão representando e dialogandosobre o texto, outras personagenssurgem – as verdadeiras persona-gens de “Cálculo”: Isaac Newton(Filipe Eusébio), Gottfried Leibniz

(Gil MAC), Lady Brasenose (An-dreia Damas), Dr. Arbuthot (RuiGuerreiro) e sua esposa, Sra. Ar-buthnot (Helena Freitas). A histó-ria central gira à volta da reuniãodo comité da Royal Society, ondeum simples matemático, Moivre(Filipe Eusébio) e um diplomata(Gil MAC) se juntam, para decidiro veredito: mas afinal, quem foi oinventor?

Na sala Carlos Ribeiro, vive-seum verdadeiro ambiente aristocrá-tico, digno de um ido século XVIII.A música é uma constante ao longoda dramatização, marcando até vá-rios momentos de tensão entre osprotagonistas. José Valente, o mú-sico, foi o responsável por toda acriação musical, autêntico reviva-lismo da música clássica.

“Cálculo” e a marionetPelas mãos da companhia de Coim-bra, marionet, chega-nos “Cálculo”,estreada a 17 de novembro, noMuseu da Ciência da Universidadede Coimbra. A orientar esta intrigaencontra-se o encenador MárioMontenegro, que é simultanea-mente o tradutor da peça para por-tuguês. O elo entre a ciência e oteatro é visto como algo a explorare Mário afirma que “é algo [a ciên-cia] importante para as pessoas,por isso deve estar no teatro”. FilipeEusébio, um dos atores, confirma:“num mundo no qual, onde cadavez existem mais aspetos de multi-disciplinaridade, mal será se asartes e as ciências não se consegui-rem cruzar”. E em “Cálculo”, essecruzamento traduz-se num sucesso.

“Apontar ao intérprete enquanto criador”

foto cedida PoR MaRionet - fRanciSca MoReiRa

Parte da ação da peça decorre num ambiente que retrata a Royal Society de Londres

Joana Cabral

Inês Filipe

“o que é que a ciência pode fazer pelo teatro e vice-versa?” – esta é a questãoque o químico e escritor, carl djerassi coloca. a resposta surge-nos com “cálculo”,peça dramatizada pela marionet. por ana duarte e mariana Santos mendes

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olhar de carloS Gil”

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Page 10: Edição 237

CidAdE10 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | Terça-feira

Comerciantes da Praça do Comércioquerem expansão da sua atividade

O Empreendimento

Jardins do Mondego está

há 13 anos por concluir.

Ainda sem a legislação

completa, uma proposta

de demolição de um

lote da urbanização

foi aprovada

Com metade dos lotes completose a outra metade ainda em tijolo, aUrbanização Jardins do Mondegoapresenta-se como “o pior cartão-de-visita para a cidade”, expressãousada pelo arquiteto Rui Lobo, do-cente da Faculdade de Arquiteturada Universidade de Coimbra. Entreo sossego do Parque Verde e agita-ção da entrada da cidade, sobressaia estagnação daquele que poderia

ser um empreendimento de luxo ede maior atratividade para Coim-bra.

A proposta da demolição total dolote um foi feita pelo atual promo-tor da urbanização – a FundimoPromovest, sociedade anónima ges-tora de fundos de investimentoimobiliário. A alteração propostasugere também a cedência da cavedo lote 18 à CMC para a criação deum estacionamento público. O en-genheiro da divisão do Urbanismoda CMC, Rui Ernesto Figueiredo,assegura que este é “destinado aapoio ao Parque Verde do Mon-dego”.

Contra esta demolição está RuiLobo, que fez chegar à CMC umatomada de posição a contestar estademolição, que apelida como “umdisparate” e que corre o risco de “al-terar o equilíbrio do conjunto”.Para o docente, é possível “contor-nar-se” a situação, ao criar “um cor-redor de ligação entre o Botânico eo Parque Verde por outras vias”.

Rui Lobo acredita que o edifício“tem uma presença urbana muitoforte” e diz não entender como éque a questão da construção delotes em zona verde “não foi vistalogo à partida”.

O início da urbanização remontaa 1998, quando é aprovado na Câ-mara Municipal de Coimbra (CMC)o projeto para a construção de umempreendimento com vista privile-giada para o Rio Mondego. Mas, jádepois de começadas as obras é de-tetado um problema que impede oavanço do projecto inicial. O PlanoDiretor Municipal (PDM) não foicumprido, isto é, a construção foifeita parcialmente em zona verde.Segundo Rui Ernesto Figueiredo,foi considerado em sede judicialque “parte do primeiro e do décimooitavo lotes da urbanização colidemcom um corredor de zona verdeprevisto no PDM”. Neste momento,o representante do Urbanismo daCMC adianta que “está em cursoum pedido de alteração ao lotea-

mento, cujo desenho já foi apro-vado pela Câmara, e que prevê a de-molição do edifício do lote um.”Ainda assim, o técnico refere que“falta ainda a aprovação da comu-nicação prévia das obras”.

Com uma estagnação que durahá treze anos, quando se questionao seguimento na construção doslotes, a CMC justifica o facto de talainda não ter acontecido devido aoprocesso judicial subjacente. Se-gundo Rui Ernesto Figueiredo, oprocesso judicial em curso “é nestemomento o único impedimentopara se retomarem as obras”.Assim, como há um processo eminstâncias superiores, não é possí-vel a “concessão de autorizações deutilização dos imóveis ou das suasfracções”, como assevera o respon-sável do Urbanismo.

Até ao final da edição, a redaçãodo Jornal A Cabra tentou contactaro proprietário da urbanização, aFundimo Promovest, mas não ob-teve qualquer resposta.

Demolição em embargo nos Jardins do Mondego

ana patrícia abreu

Os comerciantes querem voltar à rua Ferreira borges, onde vendiam mais

Joana Guimarães

Margarida Pais

ana patrícia abreu

ana patrícia abreu.

Comerciantes de rua da

Praça do Comércio vivem

conjuntura difícil. Pedidos

para venda noutros locais

da cidade sem resposta

podem ser a causa do

número reduzido de

vendas

O comércio que há anos servia paraanimar as ruas da Baixa de Coimbravê-se agora perdido nas entrelinhasdas burocracias do poder local. Osraros transeuntes que cruzam a praçanotam-se alheios ao colorido das bar-racas destes artesãos. Não se vê nin-guém a parar, curioso para comprar.

Nos dias em que não chove, o arte-são Jorge Medina marca presença napraça com a sua banca de artigos ar-tesanais. Na posse da licença devenda, que faz questão de mostrar,sente-se no direito de protestar -“devia poder trabalhar em completa li-berdade nos roteiros turísticos”. O ar-tesão defende que este tipo decomércio devia ser feito também nos“locais históricos”. Jorge reivindicaque faz “parte dessa história”, e o ar-tesão queixa-se ainda dos parcosapoios dados pela Câmara Municipalde Coimbra (CMC), acusando os diri-gentes locais de não “dignificar e pro-mover o artesanato”.

Comerciantes preferem a Ferreira BorgesTambém a vendedora de bijutaria eartesanato, Maria Farag se queixa da

falta de apoio dado pela CMC. Mariaconta que há nove anos vendia as suaspeças na Rua Ferreira Borges, e équando recorda estes momentos queé visível a sua indignação - “lá aindase vendia, aqui na Praça quase nãopassa ninguém”. A artesã revela que jáse tentou, por diversas vezes, pedir àCMC para voltar à Ferreira Borges,mas o pedido foi recusado.

O pintor de retratos e aguarelas,Anildo Santana, revela que o objetivodos comerciantes “é voltar para a Fer-reira Borges, mas a CMC não nos dáautorização”. Quando questionadosobre a existência de diálogo com a câ-mara, Anildo confessa que “com aCMC não há conversação possível”.

Pelo contrário, a responsável peloGabinete de Relação do Munícipe dacâmara municipal, Ana Malho, de-clara que “não tem conhecimento denenhum pedido para venda noutroslocais”. Ainda assim, revela que estetipo de comércio deve ser regulamen-tado e faz referência ao Regulamentode Venda Ambulante do Município deCoimbra, que define os locais em quea realização do comércio de rua é, ounão, permitida. Contudo, a responsá-vel do gabinete concorda com a ex-pansão dos vendedores para outraspartes da cidade, o que permite “a di-namização de zonas não tão movi-mentadas”. Ana Malho adianta ainformação de que novos regulamen-tos serão estipulados para o próximoano, “por imposição da diretiva da co-munidade europeia”. De acordo coma postura da câmara está o presidenteda Agência para Promoção da Baixade Coimbra (APBC), Armindo Gaspar,que sublinha a necessidade de “havercritérios e regras” na venda ambulanteem Coimbra.

“Agora os chineses sãodonos de Coimbra”A forte concorrência por parte do co-mércio chinês também é uma questãoque preocupa os artífices - “agora oschineses é que são donos de Coimbra”,protesta Maria Farag. Jorge Medinarevela também que não tem condições“para competir com o material chinês”e faz questão de frisar que a qualidadedos materiais é diferente. “Preferiaquantas vezes estar na (rua) FerreiraBorges. Aqui o negócio é muito fraco,tenho dias em que não vendo”, expõeMaria Farag, que apela à CMC que re-veja a situação dos artesãos da Baixa.Jorge Medina atenta também paraoutro problema - “a câmara municipalmistura a venda ambulante com o ar-tesanato”, o que segundo o artesão sãocoisas “completamente diferentes ecom estatutos diferentes”. Recordaque deve “haver uma maior preocupa-ção do poder local em promover o tra-balho dos artesãos”.

Luís Fernandes, proprietário deuma loja de antiguidades na Baixa deCoimbra, manifesta a sua solidarie-dade com os artesãos e refere que é“urgente” resolver este problema. Luísafirma que a situação atual de “escon-der os comerciantes num só local, nãodignifica o espaço da cidade, nem aspessoas.”

Com reivindicações sem eco, éentão que ao anoitecer se arrumam asbancas repletas de artigos que maisuma vez sobreviveram o dia, miradospor apenas um ou dois visitantesapressados, que na sua rotina diáriaatravessam a vazia Praça do Comér-cio, deixando os comerciantes a con-tas com as parcas moedas que lhesaconchegam os bolsos.

com Ana Morais

Maria Rita Loio

Flávia Cid Nunes

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22 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 11

CidAdE

publiciDaDe

No Planalto há quem lute pelo seu bairroSem fazerem questão de apresentarem o Planalto como uma zona de risco e de insegurança, os moradores

falam dos seus bairros como um local de vivências partilhadas. Para essa partilha contribuiu a Planalto

Seguro, um conjunto de instituições que promovem “mais segurança e menos tráfico”. Por Ana Morais

peso da noite sente-se noBairro António Sérgio. Édomingo, dia de família,

de descanso. Mas por estes ladosisso não se sente. Para quem chega,a paz é enganadora, a hospitalidadede um conjunto de moradores dobairro contrasta com a realidade dequem já não suporta a vida semestar sob o efeito de estupefacientes.Vítor Oliveira, Joaquim Coelho eAntónio Rodrigues servem de anfi-triães desta crua visita: são morado-res do Bairro e não têm vontade deesconder a dura realidade. Pelo con-trário, pretendem denunciá-la paratornar o seu mundo, o seu bairro,num local melhor. Não queremmostrá-lo como um bairro de misé-ria, como um bairro de droga. Que-rem apenas mostrá-lo como a suacasa, onde vivem o seu dia-a-dia. Apostura de naturalidade contrastacom o vício de dois indivíduos quese escondem, mas que deixam notaraquilo que fazem. Enquanto um co-letivo assiste, alheio, a uma partidado Sporting na sede da associação demoradores, outros, ao lado, drogam-se.

Para mudar o estigma de zona pe-rigosa a esta região de Coimbra (In-gote, Rosa, António Sérgio eMonteformoso), juntaram-se asso-ciações de moradores e outras insti-tuições preocupadas em tornar estarealidade um pouco mais suavenuma parceria denominada PlanaltoSeguro. Planalto, nome pelo qual éconhecida aquela área e Seguro, por-que pretende promover a segurançae a melhoria de qualidade de vida deum conjunto de pessoas que por lávivem. Segundo o vereador Fran-cisco Queirós, responsável pela Pro-moção da Habitação do da CâmaraMunicipal de Coimbra (CMC), estaparceria, criada em 2008, tem comoprincipal missão “agir sobre proble-mas de ordem pública, o tráfico e oconsumo de estupefacientes”.

A equipa de rua do IDT tem um papel “fundamental”Vítor Oliveira, presidente da Asso-ciação de Moradores do Bairro An-tónio Sérgio (AMBAS), local em quetambém se localiza a sede da Pla-nalto Seguro, faz questão de subli-nhar, mais que uma vez, aimportância que assume a equipa deterreno do Instituto de Droga e To-

xicodependência (IDT) neste com-bate por “mais segurança e mais hi-giene”. Contudo, com o novoorçamento do estado para 2012, oIDT pode vir a ser extinto. JoaquimCoelho, morador do Bairro AntónioSérgio vê esta extinção como umahipótese certa, mas faz questão delamentar. Também Vítor Oliveiraencara o papel da equipa do IDTcomo “fundamental” e não imaginao bairro sem o trabalho que temvindo a ser realizado pelos técnicosdo instituto. O vereador FranciscoQueirós vai mais longe e confessa oreceio de se poder dar “um retro-cesso enorme” no seio desta comu-nidade.

Ainda assim, o responsável peladelegação do Centro do IDT, Joa-quim Borges, conta que este orga-nismo está a passar apenas por“uma reestruturação ainda por con-cluir”. Mas adianta que, “até marçode 2013, está garantido todo o tra-balho da Planalto Seguro”.

Polícia de proximidadeajuda a “mais segurança”Na equipa constituída para acompa-nhar diariamente a vida das cerca de800 famílias que vivem no Planalto,podem contar-se psicólogos, técni-cos de serviço social e sociólogos. Noentanto, é no trabalho da polícia deproximidade que os moradores re-conhecem maior mérito. “Os polí-cias conhecem o bairro de umaponta à outra e trabalham muitocom os outros parceiros”, conta omorador António Rodrigues. VítorPereira faz questão de, quando sefala nesta polícia que pretende aaproximação das entidades de segu-rança aos habitantes da zona, ho-menagear o inspetor Sineiro, oagente Lopes e o subcomissário Pra-tas. O presidente da AMBAS consi-dera que estes têm desenvolvido“um trabalho extraordinário”. Noentanto, quando se fala em segu-rança, os moradores não se inibem

– “a ação da polícia municipal é pra-ticamente nula”, protesta AntónioRodrigues.

A troca de seringas é também umadas iniciativas implementadas pelaPlanalto Seguro e que, segundo Joa-quim Coelho, se tem feito notar. Omorador reconhece que “há quatro,cinco anos, se viam mais vestígios”destas práticas. A zona verde, portrás da AMBAS, era “uma sala dechuto”, contam os moradores.Porém, agora, com o trabalho doIDT, já não são visíveis os sinais deum espaço que antes era repleto devícios.

As reuniões da Planalto Segurorealizam-se periodicamente, com re-presentantes de todas as institui-ções. O papel da Cáritas Diocesanatambém se revela de “forte impor-tância”, apesar de o seu trabalho sepautar por uma vertente mais social,com a distribuição regular de ali-mentos entre as famílias.

A escolha do local da sede da Pla-nalto também não é ao acaso, poisum certo secretismo e cautela sãotidos em conta. Vítor Pereira contaque os traficantes não têm acesso aeste local, o que permite às forças desegurança manterem o anonimato e“dar continuidade ao seu trabalho”.

Balanço “muito positivo”Quanto ao balanço feito dos trêsanos da parceria Planalto, todosconcordam que é “muito positivo”.O vereador Francisco Queirósafirma que se notou “consideravel-mente a melhoria da segurança dosbairros”. Esta ideia é apoiada porJosé Braga, da Associação de Mora-dores do Bairro da Rosa, quandoafirma que “é um trabalho que temsido muito bem feito” e acrescentaque “houve grande recetividade porparte dos moradores”.

O peso da noite ainda continua.Mas a regularidade destas lides edestas práticas não é importantepara quem habita estas ruas. Os mo-radores não se queixam de insegu-rança, nem de tráfico. Contam essashistórias, porque querem denunciare combater estas práticas, mas nãogostam que a zona onde crescerame vivem seja associada apenas adroga ou insegurança. “Esta zona écalma”, suspira Vítor. Ainda assim,queixa-se da falta de apoio da CMC,que “não tem investido aqui um cên-timo”.

O

a troca de seringas é uma das iniciativas implementadas pela planalto

Luta ao tráfico de droga

jOaquim cOelhO

A Planalto Seguro

pretende agir sobre

problemas de tráfico

e consumo de

estupefacientes

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CASAS DEgrADADAS12 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | Terça-feira

dECaEm

Casas sem pessoas, pessoas sem casa; casas p

assola a(s) cidade(s) e leva muitos dos seus int

problema moderno das cidades paira sobre Co

enilde Santos não diz aidade, mas diz que mora nacasa em que se encontra há

mais de 50 anos e que os seus filhosjá contam mais anos que a estadiana casa. Benilde tem até idade parajá ter morado no Arco da Traição, si-

tuado naquela memória a que agorase chama Velha Alta, onde, comodiz, tanto gostava de ver os estudan-tes. Sobre a demolição que sobre elase abateu, iniciada em 1940 para darlugar à cidade universitária, Benildenão consegue formar uma opinião.

Se, por um lado, gostava do sítio,aceita que tenha sido para benefíciodos estudantes.

Ainda mora na Alta da cidade -agora, na Rua das Flores. A sua casaseria mais uma das muitas que porlá se amontoam, não fosse um azu-

BSó na Baixa da cidade, são perto de oito mil os fogos vazios e cerca de 180 os prédios muito degradados

lejo que, alojado na cuidada fa-chada, exibe uma inscrição que adistingue: “Nesta casa, onde morouJosé Régio, nasceu em 10 de marçode 1927 a Revista Presença” - umahomenagem da Câmara Municipalde Coimbra (CMC), no mesmo diaem que eram passados 70 anos. Be-nilde não sabe o que aquilo signi-fica: “na altura, fizeram obras [nafachada] e ninguém me disse nada,até tive que andar a comer fora”.

Enquanto isto, algures na rua pa-ralela, umas mãos negras, comaliança, abanam numa janela. Podedizer-se que está ali um problemaentre mãos. É uma tira de persiana,solta, que alguém está a tentar de-sesperadamente reencaixar. E nemmesmo sobre todas as casas velhas,degradadas e que se mantêm ergui-das apenas por suportes de ferro,casas que moram bem perto da sua,Benilde consegue formular umaopinião. “Se as pessoas têm as casasfechadas, elas é que mandam”. Atéporque para tratar da sua casa,onde, por dentro, “estava tudomuito velho”, Benilde teve que pôrdo seu dinheiro. Ao fundo da rua,cai, por fim, de uma altura de doisandares, o pedaço de persiana queparece não encaixar em lado algum,afinal. E com ela cai também o cai-xilho que a albergava.

Um plano urbano incongruenteCom a demolição de parte da VelhaAlta, veio também um novo para-digma urbano para Coimbra.“Nessa altura davam casa emCelas”, lembra Benilde Santos, que,ainda assim, preferiu ficar pelamesma zona. O Bairro de Celas é só

uma das construções feitas, à época,para albergar aqueles habitantes,onde ainda permanece o “bair-rismo” que se levou da Alta.

Afirma o arquiteto José AntónioBandeirinha que “identificamos opatrimónio como aquilo que é a me-mória coletiva” - e talvez se justifi-que, assim, que aquele patrimónioseja já só uma memória. Hoje, osproblemas da Alta continuam a serpatrimoniais, mas de um outro tipo.A sobrevivência vai-se fazendo pelaproximidade à universidade e a Altavai bebendo da cultura dos estu-dantes, mas as ruas contam a histó-ria do abandono que as casas vãovendo perpetuar-se.

Já a Baixa da cidade vive uma si-tuação dramática, quase inversa.Desabitada e debilitada, ela é mo-tivo de preocupação por parte demuitos e é o exemplo da problema-tização moderna da urbe: o aban-dono dos centros históricos e a fugada população para as periferias,com todas as consequências que talfenómeno acarreta.

Explica José António Bandeiri-nha que esta tendência, “fortementeacentuada nos últimos anos”, paraalém de levar a que as populações sefixem em zonas periféricas, “malservidas pelas redes urbanas de mo-bilidade, esgotos, eletricidade ouenergia”, quebra com o “protocolourbano que é a urbanidade” e pro-move “o esvaziamento total dos cen-tros”. “A verdadeirasustentabilidade está na formacomo ocupamos os centros, naforma como nos aglomeramos,como gastamos menos dinheirocom densidade [populacional] ”, ga-rante. E mais afirma não acreditar

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CASAS DEgrADADAS22 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 13

E ninguémasa

as por requalificar e deixadas ao abandono de quem, um dia, já precisou delas. Toda uma lógica de abandono que

intervenientes consigo, numa espiral contrária ao desenvolvimento que urge ser invertida. O fantasma do

Coimbra. E mora nestas casas. Texto por Inês Amado da Silva. Fotografia por David Barata e Ana Filipa Silva

em quem hoje diz que a inversãodeste processo será “natural”.

Mais que para a Baixa ou para aAlta, os números do abandono sãoalarmantes para Coimbra. Apesarde os dados definitivos disponíveisserem ainda os do Censos 2001, overeador da habitação diz que noconcelho de Coimbra existiam,então, cerca de sete mil 668 fogosdevolutos – “creio que hoje serãomuitos mais. Além disso, é muitoprovável que um número conside-rável de fogos esteja em risco deruir”, assegura. “Há esta grande in-congruência de um país com muitascasas vazias: os proprietários nãocuidam dos seus bens”, lamentaFrancisco Queirós. Situação maisgrave verifica-se quando “algumasdestas casas até nem estão vazias,estão em péssimo estado e vive lágente”.

Prioridade: reabilitar os centros urbanosApesar de reconhecer que o pro-blema se espalha “um pouco portodo o lado”, José António Bandei-rinha é da opinião de que, em Coim-bra, “com especial cuidado, oproblema da habitação não está iso-lado do problema da cidade”. Os nú-meros falam por si: são quase trêsmil os edifícios construídos até 1919e quase quatro mil entre esse ano e1945. Só na Baixa da cidade, sãoperto de oito mil os fogos vazios ecerca de 180 os prédios muito de-gradados. “Quando estão em riscode ruir, a Câmara vai intervindo”,explica Francisco Queirós, uma vezque no domínio do parque habita-cional privado as competências daCMC ficam reduzidas, e “só quando

os inquilinos vêm queixar-se decondições de vida que não existem,e aí podemos obrigar a fazer obrascoercivas”.

Ironicamente, um dos mercadosdiretamente relacionados com estadecadência é o da construção, que“agora abrandou, porque está emcrise”, constata Francisco Queirós.Para o vereador, basta dar umavolta pela cidade para saber que,neste momento, “há muita casanova vazia - sendo que nos lotea-mentos mais caros, nem tanto”. “Éum pouco estranho este mercadoimobiliário”, analisa, porque “a ver-dade é que se continua a construir,sendo que também não se veemgrandes alterações a nível dos pre-ços”. O mesmo se verifica nas situa-ções de arrendamento: numa cidadeem que 12 776 fogos se encontramarrendados ou subarrendados,grande parte deles por populaçãoestudantil, continuam a verificar-se“as rendas mais caras, pelo menosno centro do país”, assevera o ve-reador” – “não é por acaso que a po-pulação de Coimbra, nestes Censos,poderá baixar ligeiramente”, ga-rante.

“A cidade está com problemasgravíssimos neste momento, porqueapesar de se falar muito em susten-tabilidade física dos edifícios, a ver-dadeira sustentabilidade vê-se namaneira como reabilitamos espaçose num plano territorial”, garanteBandeirinha. Assim, medidas polí-ticas acentuadas de negociação dascondições do mercado habitacionale de incentivo fiscal para quemqueira habitar os centros revelam-se, aos olhos do arquiteto, essenciaispara evitar um cenário de transfor-

mação, que parece aproximar-se:“será difícil que a cidade possaaguentar e manter-se como estru-tura urbana que é e que sempre foi,há mais de dois mil anos”.

Soluções modernas para a BaixaNa génese de uma possível soluçãoestá a Coimbra Viva – Sociedade deReabilitação Urbana (SRU), criadaem 2007 com o intuito de intervirprioritariamente na Baixa. O presi-dente do conselho de administraçãoda SRU, João Paulo Craveiro, de-clara que a prioridade é, neste mo-mento, a recolha de financiamentopara o Fundo de Investimento Imo-biliário e a adesão de novos pro-prietários dos edifícios. Oengenheiro explica que as alteraçõesna lei da reabilitação urbana obri-garam a “refazer todo um trabalho”,e que os projetos em curso para asáreas de reabilitação que vão agoraser definidas – “desde a Rua daSofia até ao rio e desde a Portagematé ao Arnado, grosso modo” – de-verão estar prontos nos meses de fe-vereiro ou março.

“Estamos a fazer o tipo de reabili-tação que vá chamar moradoresnovos para a Baixa”, afirma JoãoPaulo Craveiro. Além disso, como areabilitação da Baixa de Coimbranão pode dissociar-se de uma reno-vação do comércio, o engenheiroafirma “estar-se a falar com cadeiasinternacionais para que venham eestabeleçam os seus próprios pon-tos de venda, lojas novas nessaárea”, aplicando o conceito de “lojasâncora, que só por si garantam umafluxo de clientes muito grande paraas lojas à volta”.

Reabilitação comopotencialidade “Vivemos num país onde há muitascasas vazias e muita gente semcasa”, observa Francisco Queirós. Otambém responsável pela habitaçãosocial vê, na reabilitação da cidade,uma solução para o problema dafalta de habitações da CMC, salien-tando ainda que a reabilitação,“numa cidade que se está a candi-datar a património da humanidade,só faz sentido”, porque “a conseguirsê-lo, vai atrair muito mais turistas”.E ressalva ainda que “o patrimónionão é apenas os edifícios classifica-dos, ou os monumentos: é a cidadeem si que tem pessoas em prédios eem casas e tem cultura, e é precisocuidar de tudo isso”.

Entretanto, os inúmeros gatos va-dios, os ratos, os lixos, os vidros par-tidos, os escombros acumulados e aarte de rua continuam a ser rastosvisíveis de uma cidade cuja memó-ria e o que dela resta pedem maiscuidado. Benilde Santos, que é ori-ginalmente do Lorvão, confessasempre ter gostado da cidade e deter querido vir morar nela desdenova. Em frente da sua casa estáagora alojado um hostel, bom exem-plo dinamizador da zona. “Antes,moravam aqui estudantes, e junta-vam-se muitos num quarto porquea renda era de 20 escudos”. Benildeconhece os estudantes, tem estimapor muitos dos que são seus vizi-nhos. Conta que, quando a casa emfrente sofreu obras para se transfor-mar num hostel, um deles voltou àsua velha residência e pediu paraentrar. Quem estava nas obras teráquestionado a sua intenção. “Porqueeu devo o que sou a esta casa”.

“O património é a cidade em si,que tem pessoasem prédios e em casas, e quetem cultura.É preciso cuidar de tudo isso”, salvaguarda Francisco Queirós

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DESPOrTO14 | a cabra | 22 de novembro de 2010 | Terça-feira

õe mais cinco”, ouve-sejunto à estrutura metá-lica que serve para exer-citar os ombros. O

rapaz, que o diz ao colega, alterna o“puxa e relaxa” das manetas com sus-piros de esforço. Recusa, por en-quanto, falar. O objetivo primeiro é oconforto do espelho, quando este in-flama reflexos de músculos e egos.Nos tempos que correm, como dizTiago Gonçalves, instrutor no NelsonGym, em Coimbra, “a imagem é umamais-valia para tudo”. E, confes-sando-se praticante deste tipo deexercício, admite que, com o passardo tempo, se “torna num vício”.

Rui Faria, um dos fundadores dasecção de halterofilismo da Associa-ção Académica de Coimbra, autointi-tula-se, sem pejo, como “maluquinhodos pesos”. “Hei de vir de bengala”,diz, risonho, sobre o prazer queafirma ter quando faz musculação.

Olhar sociológicoA atração pelas barras de ferro, árvo-res carregadas de metal, também éestudada pela perspetiva sociológica.O professor catedrático na Faculdadede Ciências do Desporto e EducaçãoFísica da Universidade de Coimbra(FCDEF), Rui Adelino Gomes, temparticular interesse, não fosse estaárea objeto das suas investigações.

São “noções contraditórias”, ob-serva. A atividade física, que se supõeser típica das formas tradicionais delazer, acaba por se transformar, nãoraras vezes, em excessivas cargas depeso para o corpo, próximas do des-porto de alta competição. “Afastamo-nos, pois, de uma noção de bem-estare saúde”, explica o professor, “apro-ximando o sujeito de uma ascese, aoinvés de o aproximar do prazer”.

Praticante assíduo de musculação,Rui Faria diz ser “impensável” ir aoginásio apenas duas vezes por se-mana. Refletindo sobre o assunto,admite que deveria, a certa altura,enveredar por um “regime de manu-tenção”. Porém, não é essa a reali-dade espelhada nas suas palavras:“gosto de ir todos os dias e de carre-gar um pouco mais”.

As razões são compreensíveis parao mais incauto observador. Os valo-res das sociedades contemporâneaslegitimam, com normalidade, esta

conduta de atividade física. Vivemosnum tempo de “narcisismo social”,pelo que algum exagero “não podeser considerado como comporta-mento desviante”, afirma Rui Ade-lino Gomes. “O excesso de exercíciofísico – vigorexia – e a apatia peranteo mesmo são filhos da mesma cul-tura”, sintetiza o mesmo.

Falta de informaçãoVem de há muito, dos tempos daGrécia Antiga, o culto do corpo. E,com o avançar do tempo, avançam osmétodos. “Nós não descansamosantes de virmos treinar e, muitasvezes, nem temos a possibilidade decomer corretamente”, argumentaJoaquim Carvalho, trabalhador naindústria farmacêutica e praticantede musculação. Sobre as doses diá-rias de suplementos alimentares quefaz, esclarece que as “drogas ergogé-nicas que, ao contrário dos esteroi-des, não fazem mal, tomam-se antese depois do treino”.

O problema, muitas vezes, é a de-sinformação. Por ser muita, o sensocomum pode dar origem a sentençasde olhos vendados. Entre as proteí-nas e os esteroides anabolizantes, ocaminho pode parecer curto. Toda-via, diz quem sabe, são coisas dife-rentes, e as consequências distintas.Porque não apressar o alcance ao

corpo perfeito, se nisso não houverperigos?

Os riscos dos esteroidesA dependência do ginásio é assu-mida por Joaquim, para quem oamor pelo ferro tem uma vintena deanos. Rodado nestas andanças, oquadragenário não deixa de alertarpara os perigos de esteroides anabo-lizantes, que admite já ter ingerido:“podemos adquirir problemas aonível hepático, renal, testicular, cal-vície, etc”. Contudo, recorda: “tor-nou-se viciante porque o meu egoobrigou a isso”. No fundo, há uma es-pécie de troca de estabilidade emo-cional, que reconhece ficarmelindrada, por uma melhor apa-rência ou maior desempenho muscu-lar. É fácil cair na tentação doaumento do corpo.

No entanto, é necessário saber des-trinçar as coisas. Nem tudo o que pa-rece é, e vermos um indivíduorobusto e definido, na rua, não é sig-nifica passar por alguém sem cére-bro, por maiores que sejam osbraços. As proteínas, garante RuiFaria, “não fazem mal”, desde quebem ingeridas. Quanto à toma de es-teroides, prefere lembrar que “a úl-tima decisão é sempre da pessoa emcausa”. Joaquim é mais taxativo:“não os aconselho”.

Entre as pessoas que vão ao ginásio, cresce o número daqueles que querem crescer. E crescem-lhes músculos, braços, peito e pernas. Nestas coisas, há semprequem não se importe de dar a cara, não fosse esta uma questão de estética. Oferro a levantar auto-estimas. Por Fernando Sá Pessoa e Fábio Santos

No espelho do ginásio, reflexos de músculos e egos

AnA filipA silvA

Utente do ginásio da AAC executa exercícios lombares

Cultura do CorPo

“P

“O excesso de

exercício físico e a

apatia perante o

mesmo são filhos da

mesma cultura”

Prolongamento

HÓQUEI EM PATINS

Segue a difícilcaminhadada equipa dasecção de hó-quei da AAC

na segundadivisão sul do Campeonato Na-cional. À segunda jornada, osestudantes saíram do seu re-duto, no sábado passado, comum ponto a mais, após o em-pate por 2-2, frente ao CACampo Ourique. A briosaocupa o antepenúltimo lugar,imediatamente acima dos doislugares de despromoção, comdois pontos que, para já, vãosendo preciosos.

BASQUETEBOL

O efeito chi-cotada psi-c o l ó g i c afaz-se sentir.Nova vitória,

a segundaconsecutiva, após péssimo iní-cio de campeonato. Em jogopara a sexta jornada do cam-peonato, a equipa da secção debasquetebol da AAC venceu oVitória de Guimarães por 83-65. Um bom resultado, naqueleque foi o último teste antes dodesafio com o Benfica. Os estu-dantes seguem, ainda que pro-visoriamente, no 5º posto.

fUTEBOL

A equipa dasecção de fu-tebol da AACp r e c i s a v a ,após a com-

prometedoraderrota em Febres, de uma vi-tória caseira, frente ao Pene-lense. Porém, a Académica-SFsofreu mais um desaire, vendoo adversário colocar-se quatropontos à frente. Os estudantes,à procura de retomar os bonsresultados, têm na deslocação àVinha da Rainha, na próximasemana, a oportunidade. Ape-nas seis pontos os separam doseu sétimo lugar ao primeiro.

RUGBY

A secção derugby daAAC venceu,no passadosábado, o

Benfica, na-quele que foi o início de se-gunda volta da fase deapuramento do campeonatoSuper Bock. Após a vitóriafrente ao Técnico, os “Pretos”voltaram a dar conta do recado,desta feita, frente à equipa daluz. À oitava jornada, seguemnum prometedor segundolugar. As perspetivas são boas ea fase final está perto.

Fernando Sá Pessoa

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22 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 15

CIêNCIA & TECNOLOgIA

Ao final de 51 anos de carreira na química, o investigador recebe umprémio da Academia deCiências russa. “Tenhofeito o melhor possível”,garante

Nos 51 anos como professor e in-vestigador de química, Victor Loboconstruiu um nome de relevo na áreadas ciências, na Universidade deCoimbra. Como mais recente pre-miar do seu percurso, o investigadorrecebeu o prémio Nicolai M. Ema-nuel atribuído pela Academia deCiência Russa, pelo seu trabalho nasolução de um problema de difusãoem polímeros.

O professor catedrático da Facul-dade de Ciências e Tecnologia daUniversidade de Coimbra (FCTUC)viu despertar a vocação científicanuma cave, quando ainda andava noprimeiro ou segundo ano de liceu(atuais quinto e sexto anos), não tema certeza. Aos poucos, construía umpequeno laboratório improvisadocom o material que o tio trazia daunidade de apoio médico-cirúrgicoonde trabalhava.

Aos 16, vive a que acha ser a me-lhor experiência da sua vida: um anoa estudar nos Estados Unidos daAmérica, em 1956, integrado noAmerican Field Servive. Partiu emviagem da Bélgica, ainda de barco,rumo à primeira “vivência numa so-ciedade democrática” e “altamenteeficiente”, lembra Victor Lobo.

Prémios e publicaçõesNas largas décadas que dedica à quí-mica é possível enumerar outros tan-tos momentos marcantes, como odoutoramento pela Universidade deCambridge, em 1971; quando passaa professor catedrático em 1981; ou amedalha de ouro na 15ª Exibição deInvenções e Novas Técnicas de Ge-nebra, com uma célula desenvolvida

para medir a difusão de coeficientes;e ainda, a mais recente, a distinçãopela Academia Russa de Ciências,com a qual se “sente muito satis-feito”. Contudo, a Rússia não lhe éestranha, e o prémio vem de uma co-laboração protagonizada desde1980, quando o mesmo começou porresolver um problema de difusão depolímeros, em conjunto com ArthurValente. Este trabalho “resultou numprocesso de determinar Dodecil Sul-fato de Sódio em águas”, aplicávelem estações de tratamento de águasresiduais, para o controlo de polui-ção, explica o professor jubilado.

No trabalho para a sala de aula, oinvestigador recorda a tradução, em1977, de uma obra sobre termodinâ-mica química, algo que, “hoje emdia, não seria preciso”, aponta. Talaconteceu “para facilitar a vida aosalunos”, algo que se explica pelasmuitas dificuldades dos estudantes

com a língua estrangeira à época.Além da obra traduzida, o químico

publicou um trabalho dividido emdois volumes e de 2366 páginas:“Handbook of Electrolyte Solutions”.Começou, em 1975, a elencar o acu-mular de 20 anos de informação,numa altura de grande agitação po-lítica e social no pós-25 de abril quenão deixou de fora as universidadesportuguesas. O professor catedráticofoi impedido de prosseguir a investi-gação experimental: “até a água des-tilada me tiraram!”, confidencia.Como não é homem de estar parado,trabalhou “intensivamente”, durantetrês anos, a compilar todo o materialpara o seu livro.

Os artigos científicos com o cunhode Victor Lobo ascendem a quatrocentenas e é também nos jornais quelança o seu pensamento crítico emrelação ao estado do sistema de en-sino em Portugal – “o gravíssimo

problema dos estudantes não sabe-rem estudar”, sublinha.

Congressos de roulotteO investigador confessa “a sorte nosfilhos e esposa”, uma família muitounida que viajava “pelo mundo fora”.Levavam uma roulotte atrelada aocarro para acompanhar o pai peloscongressos na Europa. “Quando eramiúdo vivia numa aldeia onde nãohavia eletricidade, ao anoitecer tí-nhamos de estar todos à lareira: aminha mãe a cozinhar, o meu pai atratar de coisas e a conversar”, re-corda o investigador da FCTUC quecostuma dizer que “as viagens deroulotte foram o substituto da lareirada aldeia do meu tempo”.

Fora da ciência, Victor Lobo étambém um amante da música,amante esse que conduzia 300 qui-lómetros de Camberra, na Austrália,até Sidnei, apenas para ouvir ópera

com a mulher e regressar a casa aoamanhecer. O interesse pela fotogra-fia mantém-se, tanto nas recorda-ções da coleção de diapositivosantigos ou com os novos formatosdigitais meticulosamente organiza-dos. Aos domingos, entretém-se empequenas propriedades florestais,entre pinheiros e eucaliptos planta-dos.

Victor Lobo dispensa ser “juiz emcausa própria” e sublinha que tem“feito o melhor possível” no seu tra-balho científico - “por justiça pró-pria, tenho que dizer que emPortugal há pessoas com muitíssimomelhor serviço prestado à ciência”.Para melhor definir o seu contributoà investigação, utiliza uma expressãodo mundo do ciclismo: “consideroque vou no meio, nem serei dos quevão na cauda mas muito menos umfugitivo que deixou o pelotão”.

com Daniel Silva

Aplicação virtualdesenvolvida pelo DEI e IBILI pode permitir melhoria da interaçãosocial em crianças com autismo

“Foram encontrados estudos,numa pesquisa bibliográfica efe-tuada, que mostram que aplicaçõescomputorizadas para ensino de con-ceitos a crianças com autismo, fun-cionam melhor que sessõesterapêuticas”, refere um dos investi-gadores do Departamento de Enge-

nharia Informática (DEI) da Univer-sidade de Coimbra, Marco Simões.Tal perceção resultou no desenvolvi-mento de uma tecnologia virtual quepode permitir uma avaliação clínicae monitorização da reabilitação emcrianças autistas, a partir de casa esem a presença de um terapeuta.

Tudo começou com um “protótipoque estuda um conceito muito espe-cífico de atenção conjunta - duas pes-soas partilharem a atenção por umobjeto”, afirma Marco Simões, acres-centando que “o objetivo é simularesse conceito num ambiente virtual”.A aplicação recorre à monitorização,por eletroencefalograma (EEG), e“quando um objeto é ativado, conse-guimos identificar um padrão, umsinal neurológico, que é suposto

acontecer se a criança prestar aten-ção ao objeto correto”, explica aindaMarco Simões. “O algoritmo que estáa ser desenvolvido deteta o padrão econtabiliza o número de vezes queocorre nas circunstâncias certas, per-mitindo que a criança aceda a novosconteúdos, atingido o ‘score’ estabe-lecido”, esclarece Paulo Carvalho,outro dos responsáveis do projeto einvestigador e docente no DEI.

Atualmente, o desenvolvimento datecnologia passa por uma remodela-ção do material utilizado, “que en-globa um capacete de realidadevirtual, uma touca de EEG com fios,tudo demasiado intrusivo num es-tudo em crianças com autismo”, co-menta Mauro Simões, adiantandoque a equipa de investigação está “a

tentar adquirir material telemétrico,menos intrusivo”. Segue-se, então, avalidação clínica “onde se verá se istogeneraliza ou não. Contudo, o queestá para trás já é um grande avançoem termos científicos e tecnológicos,

uma descoberta per si”, conclui PauloCarvalho.

Um dos problemas que se pode le-vantar é o potencial custo do ‘hard-ware’ pelos pacientes, que PauloCarvalho considera “pertinente emtodos os sistemas de telemedicina,pelo que não há uma resposta paraessa questão, isto é, ainda não se en-controu, hoje em dia, um modelo denegócio adequado a este tipo de sis-temas”. Em Portugal, “o facto do Sis-tema Nacional de Saúde apostar maisnuma medicina curativa, ao invés deuma medicina preventiva, pode serum óbice”, continua o docente doDEI. Todavia, esta aplicação tem, naopinião de Marco Simões, “potencia-lidades globais, com o mundo comomercado possível.”

Tecnologia inovadora para autistas em desenvolvimento

AnA filipA silvA

Filipe Furtado

Paulo Sérgio Santos

Victor Lobo: da cave ao Laboratório

O Handbook of Electrolyte Solutions, dividido em dois volumes, começou a ser compilado em 1975

d.r.

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16 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | Terça-feira

país

TEsTEmuNhOs DE quEm É PrECáriO

“sou trabalhador estudante, jápassei por vários trabalhos comvínculos precários, já trabalheiem vários ‘call center’ e sempreatravés de empresas de trabalhotemporário. O que acontece éque em vínculos precários achantagem que é exercida sobreos trabalhadores é maior e, por-tanto, o poder reivindicativo esocial de um trabalhador precá-rio é muito reduzido devido aofacto dos vínculos serem instá-veis. De qualquer forma, achoque os trabalhadores precáriosterão que superar essa situação.Devem participar na greve geralpara conseguirem mais direitos equem sabe um contrato de tra-balho mais estável. Neste mo-mento, estou desempregadomas considero que o desem-prego é só uma face da preca-riedade”.

rafaEl rOsTOm

25 aNOs • lisBOa

“Eu não tenho contrato de trabalhonormal desde 1998. Vivo na instabi-lidade há mais de dez anos, e nãoentendo como é que essa situaçãodos recibos verdes ainda não che-gou ao ponto de ser colocada anível europeu, às mais altas instân-cias. É uma situação única nomundo, onde as pessoas são trata-das como empresários, quando deempresários não têm nada. Estaquestão deveria ser colocada ao tri-bunal europeu dos direitos huma-nos. Já começaram a fazer ameaçacoerciva, de prisão - uma coisa ab-solutamente escabrosa. a minha ge-ração foi totalmente induzida acomprar apartamentos e a endivi-dar-se. E, neste momento, somosameaçados de prisão porque tive-mos de escolher entre pagar a se-gurança social ou a casa e dar decomer aos filhos. É óbvio que vamosescolher comer”.

“se o estado das coisas não dáuma estabilidade ao professorpara se manter com os seus alu-nos, é óbvio que a nossa vida con-tinua, e o senhor que está na caixado supermercado não quer saberse eu sou paga a recibos verdes ese é natal e eu recebo metade, ouse eu fiquei doente e faltei umasemana. as pessoas continuam àprocura de um emprego, de umacoisa melhor do que as atividadesextracurriculares podem dar. Nãoposso pagar metade das contas,não estamos a brincar. Conheçopessoas, e é o meu caso também,que estão nesta faixa etária dos 30e que continuam a ter de recorreraos pais para poderem em algunsmeses pagar contas, ou a amigos,ou a quem isto dos recibos verdesnão tenha afetado. Estar a traba-lhar parece que não vale denada”.

D.r.

myriam Zaluar

45 aNOs • lisBOa

marGariDa BaraTa

33 aNOs • lisBOa

Na realidade laboral portuguesa o desempregosobe, há falta de condições de trabalho e osrecibos verdes lutam pelalegalidade do seu trabalho

“Toda a pessoa tem direito ao tra-balho, a livre escolha do trabalho, acondições equitativas e satisfatóriase a proteção contra o desemprego”.Preconizado no artigo 23 da Declara-ção Universal dos Direitos doHomem, o direito ao trabalho é con-dição premente do ser humano paraconseguir sustentar a sua vida. Mas, alabuta tem ganhado contornos cadavez menos condignos e dá lugar a umparadigma laboral cada vez mais re-conhecido como precário – os recibosverdes e os falsos recibos verdes. “Sãotrabalhadores dependentes, aos quaisnão foi feito um contrato de trabalhopela entidade patronal”, define RuiMaia do movimento contra a preca-riedade Fartos destes Recibos Verdes(FERVE). No entanto, o acordo labo-ral não constitui o maior obstáculoaos trabalhadores. A instabilidadeimpulsionada pela falta de contratoleva ao exercer de “uma chantagem eisolamento pela falta de capacidadese direitos do trabalhador”, esclareceo mesmo.

Ter um vínculo de trabalho contraa lei. Os que são ilegais ganham o epí-teto de falsos, e são-no “porque o có-digo de trabalho prevê váriospressupostos para a utilização docontrato de trabalho e não do reciboverde”, aclara Marco Marques do mo-

vimento Precários Inflexíveis. Este la-menta que, na verdade, o que se dá éuma “camuflagem do contrato” deforma a “deitar os descontos paracima do trabalhador”, que para o Es-tado se encontra como independente,contudo, na realidade, “não o é”. Talobriga o trabalhador dado como in-dependente a arcar com os descontosna totalidade para a Segurança Socialque correspondem nos dias de hoje a30% do total do seu salário. Ser-seum falso recibo verde transfere deigual modo constrangimentos para avida pessoal de quem labora: “a pre-cariedade laboral não tem apenasconsequências nesse âmbito, tem-nassobre todos os aspetos da vida”, es-clarece o sociólogo José Soeiro. Parao sociólogo e também defensor dos

direitos dos precários, a “incapaci-dade em fazer planos a médio e longoprazo” está em causa “porque nuncase sabe como vão estar amanhã”.

Denúncia do direito retiradoRestringindo-se à ilegalidade dos fal-sos recibos em Portugal, Soeiroacrescenta que “estes são uma espé-cie de offshore laboral” e “à luz da leiassim permanecem”. O mesmo asse-gura que a causa da perpetuação des-tes se deve “à inexistência demecanismos de fiscalização eficazes”,e dá como exemplo o próprio Estadocentral que “se serve deles nos seusserviços”.

Segundo os últimos dados relativosao desemprego, os jovens represen-

tam cerca de 30% da população ina-tiva, a associação Interjovem, inse-rida na intersindical nacional daCGTP, defende “a participação naluta, a sindicalização e a denúncia”dos problemas dentro das empresas,refere a responsável Anabela Laran-jeiro. Alega até que “mais de noventapor cento da precariedade e dos con-tratos das empresas são ilegais”, e re-força o apelo a “uma resistênciadentro destas, junto dos agentes detrabalho” e a dar conhecimento doabuso deste tipo de vínculos “por viada ação sindical, onde já consegui-mos resolver determinadas situa-ções”.

Medidas de intervençãoPara passar à ação, os movimentos

de precariedade vão levar uma pro-posta de lei à Assembleia da Repú-blica. A iniciativa “Lei contra aprecariedade” pretende, segundo omembro do FERVE, Rui Maia, inci-dir sobre três vetores “da precarie-dade e exploração laboral legal emPortugal”. São eles os falsos recibosverdes, o trabalho temporário parafunções efetivas e o trabalho a termotambém “utilizado para funções efe-tivas”. A constituição do recibo verdecomo crime; a mudança de políticaeconómica deficitária na criação deemprego; e a segurança de que a leise reporta ao lado do “mais fraco – otrabalhador”, segundo José Soeirosão as medidas ideais para dar fim aeste problema do panorama laboralportuguês.

D.r.

Todos têm direito ao trabalho, masnem todos o têm de forma condigna

Liliana Cunha

Os recibos verdes são o novo paradigma da realidade laboral portuguesa

JuliETa GuimarãEs

29 aNOs • POrTO

“Tenho uma companhia teatro circoque se chama Erva Daninha, traba-lho para a operação Nariz Vermelhoe para o festival internacional deteatro de expressão ibérica. Vivo emrealidades muito diferentes, onde hámuito dinheiro, onde não há quasenenhum, e tenho muita dificuldadeem viver estas diferenças de choqueque existem, quase de estatuto. Pen-sar que a arte em 99 por cento é pa-trocinada pelos contribuintes, custadepois saber que este dinheiro é tãomal gerido. Os modelos de gestãona secretaria da cultura são absur-dos. Os jovens saem da universi-dade e não têm trabalho, não têmpossibilidade porque o mercadoestá esgotado. O que está a aconte-cer às artes performativas é que asjovens companhias não conseguemter financiamento e apoio. Tens deandar a ser pago por um lado e de-pois trabalhar por gosto noutro”.

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MuNdo

questão 'indígena'possui um lugar cen-tral nos debates po-líticos que

estruturaram (e continuam a es-truturar) as lutas pela emancipa-ção, pelo direito a ter direitos,combinando a diversidade com aigualdade”: é assim que a coorde-nadora do Núcleo de Estudossobre Democracia, Cidadania e Di-reito (DECIDe) do Centro de Es-tudos Sociais de Coimbra (CES),Maria Paula Meneses, contextua-liza a situação atual destes povos.

A ação do mundo ocidentalsobre as minorias indígenas pa-rece ter o seu legado na questãocolonialista, “uma história de sé-culos, que passou por atitudesmuito distintas”, afirma um doscoordenadores do Núcleo de Estu-dos para a Paz (NHUMEP) deCoimbra, José Manuel Pureza.Como uma das problemáticas quevem sendo problematizada peloDECIDe, Maria Paula Menesesfala da “persistência da relação co-lonial nos tempos atuais”, vendo-acomo “parte do sistema capitalistaque identificamos metaforica-

mente como o norte global” e queresulta nas pretensões dos gover-nos face aos territórios ocupadospor estas minorias. Uma ação para“mais facilmente exercer o domí-nio colonial”, acabou, no entanto,por “comportar também atitudesde solidariedade e de defesa”, sal-vaguarda Pureza.

Questionada sobre a legitimi-dade do argumento utilizado pelosideais colonialistas de educação,saúde e religião, Paula Menesesanula qualquer tipo de legitimi-dade: “é a imposição colonial, dei-xemo-nos de eufemismos”. Para ainvestigadora, a saúde e a educa-ção têm sido “mecanismos usadospara promover a ação interventivado saber do norte global sobre oresto do mundo”. O professor as-sociado de Antropologia da Uni-versidade da Beira Interior etambém professor-colaborador naUniversidade de Columbia (EUA),Donizete Rodrigues, assegura que“é possível e necessário desenvol-ver um sistema de ensino oficial,respeitando a cultura, a religião e alíngua dos povos nativos. É obri-gação dos estados promover cui-

dados de saúde para garantir a so-brevivência física”, defende.

O também coordenador doNHUMEP, António Sousa Ribeiro,compreende uma “ecologia dos sa-beres,” que “percebe que a ciênciaocidental não é a única forma deconhecimento no Mundo”. O coor-denador aclama que tal passa por“perceber que o outro é outro, queé diferente de mim, que tem umsaber diferente, uma cultura dife-rente, e respeitá-lo nessa dife-rença, não querendoocidentalizá-lo”. Como confirmaDonizete Rodrigues, “a imposiçãode uma cultura, modo de vida, re-ligião, é sempre uma violação dosdireitos humanos”.

Uma questão de “lógica capitalista” O mundo ocidental “está, na suageneralidade, dominado pela ló-gica capitalista, assente na buscadesenfreada de fontes energéticasnão renováveis, minérios e maté-rias-primas para a produção in-dustrial”, afirma ainda o professorde Antropologia. Neste contexto,alerta que “não é difícil perceber

quem fica a perder nesta disputade interesses”. Também a indús-tria médica e farmacêutica temdestaque na exploração destes ter-ritórios, aproveitando-se dos sa-beres indígenas. “Na área dasmedicinas, técnicas de cura, estascomunidades conhecem substân-cias que estão, hoje em dia, cadavez mais a ser exploradas pela in-dústria farmacêutica”, confirmaAntónio Sousa Ribeiro. “São de-positadas patentes sobre os sabe-res indígenas” e esta é uma “formade esbulho colonial, de expropria-ção”, assevera.

Face à imposição do mundo oci-dental, Sousa Ribeiro compreendeque as minorias têm “meios paraassegurar a sua resistência no seumodo de vida originário”. MariaPaula Meneses ratifica: “a luta nãoé contra o mundo ocidental, mascontra a opressão e exploração” aeste associado. Por sua vez, Doni-zete Rodrigues acredita na “boapreparação e consciencializaçãopolítica na defesa dos interesses”dos povos indígenas para a sua au-todeterminação. Ainda assim, nãodescura que estes “são o elo polí-tico-económico mais fraco nestaluta”.

A intervenção internacional No que diz respeito à intervençãodas organizações internacionaisna defesa das comunidades indí-genas, Donizete Rodrigues consi-dera “necessária” a ajuda destasestruturas desde que “defendamos interesses dos povos”, o que, nasua opinião, “nem sempre acon-tece”.

Segundo José Manuel Pureza,distinguem-se duas formas de in-tervenção: “as que têm como obje-tivo evitar apenas

comportamentos extremos, man-tendo, no entanto, uma relação dedependência” e “outras mais cora-josas, que põem em causa a pró-pria relação desigual e a imposiçãode soluções que são sempre desfa-voráveis aos grupos indígenas”.Pureza lembra que a atuação des-tes grupos também difere no sen-tido de se exercer individualmenteou sobre comunidades.

Comissão Pró-Índio de São Paulo Nascida em 1978, a Comissão Pró-Índio de São Paulo pretendia “de-fender os direitos dos povosindígenas frente às crescentesameaças do regime ditatorial vi-gente naquela época”, conta umdos membros da organização, Ra-fael Carvalho da Cunha. Ainda noativo, abrangendo comunidadesindígenas como por exemplo asGuarani e as Quilombolas, a orga-nização propõe-se agir no sentidode “garantir os direitos territoriaisdos povos, fortalecimento de ín-dios e o combate à discriminaçãoracial e étnica”.

Rafael Carvalho da Cunha en-tende como “principal reivindica-ção das comunidades indígenas aregularização das terras que ocu-pam”. O facto de “não as teremainda identificadas e demarcadas”faz com que a manutenção “física ecultural dessas comunidades sejadiretamente afetada, violando osseus direitos básicos”. Em “muitoscasos, os indígenas acabam porabandonar as suas terras, mi-grando para algum centro urbanodo Brasil, onde os seus direitostambém não são reconhecidos demaneira adequada, sendo a suapresença estigmatizada e vendoperpetuada a discriminação e opreconceito”.

“A

“O outro é outro, é diferente de mim”

“A imposição de uma cultura, modo de vida, religião, é sempre uma violação dos direitos humanos”, confirma Donizete Rodrigues

O dOmíniO dO mundO Ocidental sObre as minOrias indígenas

ao longo da história, as minorias indígenas foram sendo dominadas pelo ocidente, sob o pretexto de uma vida melhor.porém, o capitalismo esconde-se por detrás desta máscara. por Carolina Caetano, Maria Garrido e Cláudia Carvalho silva

IvOne bezerra D.r.

IvOne bezerraIvOne bezerra

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ARtes18 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | terça-feira

avia curiosidade em per-ceber qual o ângulo quea câmara de Gus van

sant escolheria depois do passadorecente, com a adolescência ro-manceada de “Paranoid Park”, etendo na memória o desvio ao per-curso autoral em “milk”. este úl-timo título que, como era esperado,o avalizou perante as massas, aonormalizar a sua identidade atra-vés do género inevitável, o filmebiográfico (e de convulsão social epolítica).

eis-nos, então, “inquietos” pe-rante uma nova estreia. enoch(henry hopper, filho do dennis dequem o cinema não recuperará tãocedo) é um rapaz traumatizadocom a recente morte dos pais, me-mória que faz por combater nacompanhia de hiroshi - o fantasmade um kamikaze japonês da 2ªGuerra mundial - e frequentandofunerais de desconhecidos. É nestecontexto que conhece Annabel(mia Wasikowska, a Alice de Bur-ton e filha de duas mães em “os

miúdos estão bem”) e os dois seapaixonam. Pouco tempo depoisvem a saber que a ela restam trêsmeses de vida. o amor é fodido, jádizia alguém.

A partir daqui assiste-se a umtrânsito de corações em sentidosopostos: ela procura viver o mo-mento, ele sofre por antecipação.

o amor, em especial o trágico, étema para o qual haverá semprelugar no mundo - durante e após oenterro anunciado da economiaglobal.

Pena é que aqui tudo seja dema-siado poético e intencional para sertriste, e haja utopia em excessopara um realizador com mais deuma dezena de longas-metragensnas costas.

É, assim, impossível dissociar asensibilidade evidenciada neste deVan sant da que sustenta “o bomrebelde”. os dois filmes partilhamtambém a sua Portland de adopçãoe a paleta cromática em tons pas-tel, retida na estação que 2011 nosroubou. Não há, contudo, a genui-

nidade que encontramos na cró-nica da vida de Will hunting, nemos planos respiram como na at-mosfera de “elephant”. existeainda uma atenção ao guarda-roupa e penteados ao nível dumacolecção outono-inverno de umamarca de cachecóis em xadrez-in-glês.

longe de ser secundária, abanda-sonora preenche qualquerrecanto por onde pudesse espreitaro silêncio, de acordo com a cartilhasentimental de sufjan stevens(que, com a contribuição para“Uma família à beira de um ataquede nervos”, e mais ainda agora,está convidado para todos os casa-mentos, baptizados - e funerais -indie). o mundo ocidental, cauca-siano e de classe média continuamvivos no amor de Annabel e enoch.“Não podes fazer isso (suicidar-te)!Assim ofuscas a minha morte!” ex-clama ela, depois de uma simula-ção cúmplice do epílogo de romeue Julieta.

Pobres meninos ricos.

Inquietos

(“Restless”)

Cin

em

a

90 dias no Outono

CRítiCa De joão teRênCio

De

Gus vAn sAnt

Com

2011

oão Botelho não tinhamissão fácil. Pegar no“livro do desassossego”

de Bernardo soares, heterónimode Fernando Pessoa, e transpô-lopara a película é, seguramente,mais que um desafio, uma em-presa de contornos homéricos.Perscrutar numa alma inquieta e,ao mesmo tempo, tão segura desi, uma consciência da frágil na-tureza humana como a de Ber-nardo soares, adivinhava-secomo um caminho cheio de per-calços e armadilhas. Botelho jáhavia penetrado nos meandros daadaptação e reescrita literáriacom “A Corte do Norte” (2008),baseada no romance homónimode Agustina Bessa luís, com re-sultados aceitáveis.

o “Filme do desassossego”, di-ferentemente, “não pretende ser

o ‘livro do desassossego’”, naspalavras do realizador. É legítimo.mas esta nota de intenções não ésuficiente para a pobreza do filmede João Botelho. Ao longo de duasmaçadoras horas, o espectador éacossado por diversas persona-gens que habitam uma lisboa doséculo XXi que se limitam a reci-tar a obra. Umas vezes num puroentoar poético, outras acompa-nhadas de guitarra, havendo atémesmo uma versão hip-hop deum dos trechos. É manifesta-mente pouco para o que se espe-raria.

salvam-se as belas paisagensda lisboa pessoana, que nuncafartam, e a excelente filmagem,que é dos poucos elementos (ti-rando o texto, obviamente) queprendem o espectador, com close-ups na altura certa e movimentos

de câmara que depreendem umaintenção simbólica que não devepassar despercebida. os cenáriosconstituem, de igual modo, ummagnífico acrescento ao texto,caindo por vezes, no entanto,num rebuscado ornamento artís-tico que poderia ser evitado.

Com um dos textos mais ge-niais e profundos da língua por-tuguesa em mãos e um lequeinvejável de bons actores, o quefaltou então ao “Filme do desas-sossego”? Não querendo fazerdesmerecer o trabalho de JoãoBotelho, cuja coragem é louvávele, acima de tudo, por trazer, quaseum século depois, uma obraímpar da literatura à ribalta, aresposta julgo ser simples: há pa-lavras que funcionam no papel, eno papel deverão ficar.

A fria objectiva

substituiu a

caneta

Filme do Desassossego””

joão RibeiRo

“ h

J

ve

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Artigo disponível na:

filme

De

João Botelho

eDitora

Ar de Filmes

2010

Page 19: Edição 237

FeItAs22 de novembro de 2011 | terça-feira | a cabra | 19

através de Atlas soundque Bradford Cox, voca-lista dos imprescindíveis

deerhunter, canaliza toda a suanecessidade de se expor aomundo, de exorcizar o seu víciode fazer música, de escrever can-ções, de nos escrever canções.

desde a estreia a solo em2008, que Bradford se expõe, ese esconde ao mesmo tempo, en-quanto Atlas sound. As suas le-tras sempre foram bem claras esempre demonstraram o seu es-tado de espírito. No entanto,sempre procurou esconder-sedebaixo de ‘delays’ e reverbera-ções, quer na voz, quer na mú-sica, que acabavam sempre porsoar como se os sons viessem deum quarto escuro, fechado e frio,sem móveis, e por isso com umeco e uma dimensão fantasmagó-ricas. em Parallax, o terceirodisco como Atlas sound, a histó-ria é outra.

As influências de música am-biental continuam lá, como em Flagstaff, onde se resumemtodas as referências sonoras do projecto, ou na fantástica teAmo. No entanto, é logo no primeiro tema que percebemos oque mudou. the shakes soa a banda sem soar à sua banda. NelaBradford conta a história de alguém que apesar de ter vencidona vida não se sente realizado, alguém que dedicou tempo de-mais à coisa errada e que se sente arrependido. the shakeslança a temática de todo o álbum - é Bradford Cox no meio dosseus pesadelos, é Bradford escondido atrás do seu alter ego, aser o mais ele que consegue, e é Bradford a marcar pontos comoum dos melhores escritores de canções da década em que vive-mos. Parallax é escuro e no entanto tem mona lisa, que cita osrem e trilha caminho até à New Jersey dos real estate. É umdisco cru não deixando de ser complexo, há menos efeitos navoz e um arriscar assumido em tentar fazer algo diferente doque fez no passado.

os fantasmas estão lá e o quarto continua vazio, mas Brad-ford nunca foi tão claro a contar o que sente.

uas páginas, sete quadrosapenas, é tudo o que é precisopara surgir a primeira ana-lepse – nada de espantar,

tendo em conta os múltiplos saltos tem-porais que vão rompendo em catadupaao longo de toda a narração. Não fosse oenredo de “As extraordinárias Aventu-ras de dog mendonça e Pizzaboy ii –Apocalipse” declarada e promiscua-mente de inspiração cinematográfica(daquele cinema de série B, em que co-rante vermelho q.b. e uns tantos vampi-ros mal amanhados saltam para dentrode uma película que, de tão granulada,quase se torna imperceptível).

As honras do prefácio, a cargo deGeorge romero (o mesmo do “Night ofthe living dead” e “dawn of the dead),deixam adivinhar que só algo aparatosose pode passar nas páginas seguintes. eo que se passa nas páginas seguintes émuito mais do que uma simples sequela.

Não é novidade em Filipe melo estaideia de esgaivar qualquer resquício debom cliché cinematográfico – já nos de-monstrou isso em “mundo Catita” e “i’llsee You in my dreams”. esta mesmafalta de finura que preencheu todas aspranchas de “As incríveis Aventuras dedog mendonça e Pizzaboy”, onde umdetetive obscuro, um jovem entregadorde pizzas, uma cândida rapariguinhapossuída por um demónio com mais deseis mil anos e uma cabeça de gárgula lu-taram nos subterrâneos de lisboa con-

tra um exército de zombies nazis (e maisdiversas criaturas da mitologia do hor-ror).

Cinco anos volvidos da primeira aven-tura, um terceiro segredo de Fátima malcontado resulta numa aparatosa inau-guração do Armagedão, que (pasmem-se spielberg e michael Bay) tem comocenário, não Nova iorque ou tóquio,mas... lisboa.

A partir de aqui, borra-se o céu detodos os tons de encarnado possíveis,para a típica cena de terror, onde nem aáguia Vitória é poupada, e onde os maisdistintos demónios de uma bíblia infan-til vão dando o seu ar de graça ao dramada capital - até um príncipe das trevasque mais faz lembrar o Akira de Katsuirootomo.

Um desenrolar de cenas em que lis-boa é espantosamente construída (e des-montada) pela mão de Juan Cavia e docolorista santiago r. Villa, onde o cui-dado com os detalhes é mais que mani-festo. há mesmo pormenores queassumem uma precisão quase fílmica.

se argumentos faltam para ler “As ex-traordinárias Aventuras de dog men-donça e Pizzaboy ii – Apocalipse”,saiba-se que a primeira personagem aperecer ás mãos das bestas do juízo finalé um tuno. e se tal ultraje poderá ofen-der a alma do academista mais confesso,então o mesmo está trajado de calças deganga e sapatos sem atacas...

ara aliviar a espera dos fãspelo tão aguardado doom 4,a id software juntou-se àBethesda para produzir um

novo e supostamente revolucionário‘shooter’. e eis que chega rage, ofruto dessa relação.

em rage tomamos o lugar deum protagonista anónimo (e mudo,como dita a moda), que, depois deser seleccionado para um programaespecial e ser induzido num sonocriogénico, acorda num deserto pós-apocalíptico e é deixado à mercê doque resta da sociedade. e é basica-mente isto. Aliás, a história de rageé quase não existente, aproveitandoos clichés da indústria para justificara sucessão de missões. o que, consi-derando o mundo vibrante e coloridoem que o mundo nos põe, dá pena.embora existam alguns aspectos dahistória que são aprofundados nou-tros modos de jogo, a campanha emsi deixa a sensação irritante de que omundo de rage merecia melhor tes-temunho.

Ainda assim, é um dos shootersmais refinados e divertidos do mer-cado, afinal de contas estamos a falarda id software, produtora de lendascomo Quake e doom. A jogabilidadetem tudo a seu favor, desde mecâni-

cas exclusivas e altamente divertidascomo os “wingsticks” (pequenos bu-merangues ideais para decapitar mu-tantes), até ao combate de veículos,que é a estrela do modo online. A in-teligência artificial dos inimigos é so-berba, sendo impossível de prever oseu comportamento enquanto criamestratégias elaboradas para acabarcom a existência da nossa persona-gem.

Com uma componente gráficamaravilhosa e um universo inspiradonos filmes “mad max”, rage peca sómesmo pela falta de história, nos ha-bituais problemas de carregamentode texturas e no facto de não haverum modo competitivo online quenão envolva corridas de buggies,existindo apenas um modo coopera-tivo chamado “legends of the Was-tes” que é composto por, mais oumenos, uma dezena de missões quecomplementam certos aspectos dahistória, e que, no fundo, são bas-tante divertidas.

tudo isto faz de rage um shoo-ter sólido e uma mais que boa alter-nativa para quem esteja cansado dosshooters mais comerciais que por aíandam.

oUvir

De

FIlIPe MelO e JuAn CAvIA

eDitoRa

tIntA dA ChInA

2011

De

AtlAs sOund

eDitoRa

4Ad

2011

Parallax ”

lUís FiliPe lUzio

Artigos disponíveis na:

das extraordinárias aventuras de Dog mendonça e Pizzaboy ii – apocalipse”

RUi CRaVeiRinHa

joão miRanDa

Rage”

JoGar

“dias de Raiva”

GUerra DaS CaBraS

A evitar

Fraco

Podia ser pior

Vale a pena

A Cabra aconselha

A Cabra d’ouro

ler

Quarto escuro

P

Que não se

metam com os

portugueses

PlataFoRma

PC /Ps3/XbOX360

eDitoRa

bethesdA

2011

É

Page 20: Edição 237

soltAs20 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | terça-feira

uMA idEiA PArA o ENsiNo suPErior

Um desafio para o ensino sUperior: o ensino profissional

GoNçAlo XuFrE silvA • ProFEssor CoordENAdor do iNstituto suPErior dE ENGENhAriA dE lisboA

O Ensino Superior atra-vessa um período extre-mamente complicado.

Tendo sido um dos sectores quemais foi sacrificado nos últimosanos em termos de cortes finan-ceiros viu progressivamente asverbas do Orçamento de Estadoficarem insuficientes para cobriras despesas de funcionamento,nomeadamento o pagamento devencimentos a funcionários e do-centes. Sendo que estes constra-gimentos poderiam levar a que asInstituições procurassem criar di-nâmicas de obtenção de receitaspróprias para ultrapassar as difi-culdade que lhes estavam a ser co-locadas, também é verdade queessa mudança passa muito poruma mudança cultural em termosdos dirigentes das Instituições emais importante de uma pro-funda mudança na mentalidadedos docentes. Estes processosde mudança não são processosnada fáceis e a conjuntura eco-nómica aumenta de forma expo-nencial as dificuldades. AlgumasInstituições viram nos Cursos deEspecialização Tecnológica (CET)uma oferta alternativa com o ob-jectivo de obterem fontes de fi-nanciamento. PrincipalmenteInstitutos Politécnicos do inte-rior aderiram a esta ofertaformativa mas agrande maioria dasinstituições encara-ram este ensinocomo não presti-giante para o En-sino Superior e asua classificação

como ensino pós-secundário temlevado a que sejam essencial-mente escolas profissionais priva-das ou centros de formação adesenvolver estes cursos.. O Mi-nistro Nuno Crato já afirmou pordiversas vezes que o Ensino Pro-fissional tem de ser uma apostacoerente, de qualidade e valori-zada no nosso País. A formaçãopara o exercício de uma profissãoé um dos caminhos possíveis parasairmos do ciclo vicioso em queestamos colocados pela actualcrise. Descobrir as profissões emque o País deve apostar de modo adar resposta às necessidades pro-dutivas é um desafio de todos: go-

verno, indústrias,instituições

de en-sino ef o r -

mação e empresas. Contribuirpara uma formação profissionalde qualidade é um desafio queestou convencido cabe em grandeparte às Instituições de EnsinoSuperior. Os CET centram-se nacaracterística tecnológica do con-teúdo da formação sendo quemuitas áreas ficam ainda por co-brir em termos de formação pro-fissionalizante de nível superior.A criação de Cursos de Especiali-zação Superior (onde os CET se-riam uma parte) com oenquadramento claro de nível su-perior na qalificação escolar asso-ciada, abriria um campo de ofertaque estou convencido levaria asInstituições de Ensino Superior acrescerem em termos de alunos eo País a melhorar em termos dasua capacidade de preparação dosseus recursos humanos para daruma resposta forte aos desafioscolocados pela actual crise. Faltaao País uma aposta clara no En-sino Profissional que poderá co-meçar a seguir ao 9º ano deescolaridade, com uma formaçãode qualidade e exigente, num ca-minho valorizado e de possibili-dades de saída profissional emvários pontos, mas que permitachegar a uma formação profissio-nalizante de nível superior. Sem

deixar de investir na investi-gação e no ensino de carizmais académico as Insti-tuições de Ensino Supe-rior teriam aqui aoportunidade de maisuma vez contribuirempara o desenvolvimentode Portugal.

outoNo: ÉPoCA ProPíCiA às rEFEiçõEs FriAs!

Já dizia Sócrates: "não vivemos para comer, mas comemospara viver".De facto, em pleno outono (que diga-se de pas-sagem, tão rigoroso como o próprio inverno), espera-se queuma refeição servida a centenas de alunos e funcionários es-teja nos meandros da razoabilidade. Será difícil para todosaqueles - que no meio de panelas e tachos, salpicos de gor-dura e mistura de variáveis cheiros - produzirem uma sopacálida, um conjunto de batatas quentes e uma costeleta deporco que não cause efeitos, por sorte, reversíveis aos talhe-res?

Pois bem, estimulado pelo cheiro agradável que pairava nacantina dos grelhados, a minha entrada não podia ser maissatisfatória. Sorriso na cara e começava a maratona de com-pletar o tabuleiro que acabara de pegar.

Cinco passos à frente e havia chegado à zona das sopas. Seguiu-se oprato: tenaz na mão, um ligeiro gesto e a caça à costeleta havia termi-nado. Batatas, batatas, algumas em fase de transformação para puré,uma bola de arroz que deixava qualquer um com água na boca e umasfolhas de alface.

Finalizei a maratona com um copo de água cristalina e parti para arefeição propriamente dita. Como caraterizá-la? Breve. Uma colhe-rada da sopa, uma ida ao ginásio era descartável porque dominar umacosteleta de porco exigira muito. Satisfeito com as batatas e o maciodos grãos de arroz, um golo de água revitalizara o estômago que, des-contente, rosnava por mais e melhor.

Por Nelson Barbosa

toM

Ai E

Co

MEi

Inês BalReIRa

ArtE.PoNto

ente-se o frio, a chuva, o in-cómodo das gotículas deágua que circundam pelas

rédeas de uma viagem que temcomo destino um café intimista. É olocal onde, por excelência, os ena-morados pelas letras, música e equi-pamentos eletrónicos se juntam. Aguitarra portuguesa está na FNAC.E não vem sozinha, qual Carlos Pa-redes nos seus “verdes anos”, étempo de vestir a guitarra e o fadodoutra forma. Desta feita, uma maishipnotizante, acercada de pigmen-tos contemporâneos com o sinteti-zador e o toque das cordas de umcontrabaixo. Sem voz, Marco Mi-randa ou M-PEX dirige o trio. Umacasa de fado moderna. Sem cande-labros, nem fadista, mas com umatela refletora de imagens em ponti-nhos que deixam adivinhar as figu-ras parcas que por lá passavam. Orajardins, ora vegetação. A música e otranse é que interessavam. Sala bemcomposta por certo, olhava-se emredor e tinham-se todos os olhos fi-xados num dedilhar salteador de

um cistre embalado pelas suas seiscravelhas. Faltou algum sentimentonaquele semblante de quem ofereceacordes de destino.

No entanto, o contrabaixo pron-tificou-se a reverter a falta de ex-pressão facial. Pontos intersetadosnum soletrar de acordes, o homem“pizzicava” as cordas com uma levesacudidela de vibrações graves. Elesim contrabalançava-se e vibravacom o seu parceiro do sintetizador.De efeitos sonoros que funcionavamnuma taquicardia de batidas, o sin-tetizador aprimorava o dueto a seulado. Por altura da terceira músicado seu novo álbum chamado Iphado(o prefixo deve-se por ter sido total-mente gravado apenas com o gad-get Ipod), já alguns direcionavam oseu foco para o nada. Sim, para onada. Um pequeno nada que trans-parecia algo mais. Recordações. Apalavra correta a utilizar. Lacrimae,deste EP, foi por conseguinte a maiscalma e tensa de todas, nela se des-cobriu o porquê da guitarra. Nela foirainha, e fez evocar memórias lon-

gínquas, numa “guitarra com gentedentro”- nome de um dos álbuns deParedes.

Lá se assimilou. Não se soubebem o que se pedia. Apenas não sepensou. E essa falta de pensamentofez em “Fusões” reportar de novo aonada, porque em jeito de embalaresta música melancólica e ténue co-nheceu pelo sintetizador um efeitode quase chill-out. Para proceder auma terapia de sons onde o resul-tado era uma espécie de imobili-dade do sentir e do cogitar.Provavelmente Alberto Caeiro sen-tir-se-ia em pleno aqui. Breve, estaapresentação terminou na músicasexta e última do seu mais recenteálbum. “Neurointerface”, onde seefetivavam dois sistemas: o fado,propriamente dito entreviu-se eagora sim a saudade pôde por fimemergir. E o tango. Provindo deBuenos Aires veio colocar a paixão,a agressividade e interpor-se na tris-teza característica do “correr dofado”.

Por Liliana Cunha

Uma nova “gUitarra portUgUesa com gente dentro”

M-PEX • FNAC CoiMbrA • 18 dE NovEMbro

D.R.

S

d.r.

Page 21: Edição 237

Uma mesa. Um bar.Um homem. Uma mulher.Um espelho com empregado ao

fundo.A mulher é louca ao espelho:

prepara-se para a caçada:arranha cabelos, mascara cica-

trizes, borrifa de perfume os ló-bulos; descruza as pernas derenda; os lábios mudam de cor eidade.

A gordura é vício; a fealdade in-decisão.

São duas e meia da manhã.O gelo derrete nos copos.O homem suspende. Avalia o

redor.A linguagem é imprecisa.O vazio enche-se de copos.As almas de vodka.O homem cansado domestica o

bigode;sossega as sobrancelhas com

saliva.Esquadrinha um novo ângulo

numa das patilhas e diz:-Tenho sono.A mulher responde:-Ainda é cedo. Nenhum amor se

deita para dormir.Dentro do espelho, as bocas

mordem-se sem sinal de sangue.O homem levanta-se, sai.A mulher louca cruza nova-

mente as pernas.O empregado assiste a tudo,

impávido e transparente, en-quanto limpa com um pano obolor dos copos.

Os livros fazem fazer coisas.Divórcios, poemas.O amor também. Ele gosta de livros.Ela gosta dele. Oferece-lhe li-

vros.Ele lê os livros que ela lhe ofe-

rece deitado no lado esquerdo dacama.

Ela não lê, antes medita:Para que lado se deita o amor?

Por qual narina respira melhor?Ela levanta-se do lado direito da

cama e veste o robe de seda púr-pura.

Prepara-se para o afecto.Ele continua a ler: prefere a

carne e o odor forte de certas fra-ses.

Adormece com o livro aberto afazer o cume do coração.

Com a página 63.Ela destapa-lhe o coração, lê

uma frase aleatória.Rasga, amarfanha, mastiga, en-

gole. Despe o robe de seda púrpura e

veste o pijama com o cheiro a vés-peras.

Algodão impregnado de mono-tonia.

Os livros fazem fazer coisas.Divórcios, poemas.O amor também.

Não há como alterar a vida.À janela, o velho acende o ci-

garro.Puxa a morte para dentro dos

pulmões.O hábito manso.Bate o indicador na boca acesa

e a cinza cai sobre o canteiro derosas. Diz:

O meu cinzeiro é o mundo.

A noite cresce na cama zan-gada.

De costas voltadas. Ela, ele.Respiram a fingir: dormir é

aquilo.Olhos adúlteros interditos por

pálpebras.Corpos quietos que doem nos

lençóis.A noite como competição.Quem vence a maratona da in-

sónia?Ela finge melhor o sono. Engo-

liu a borboleta.Ele respira grilos nos pulmões.Ela move a tíbia esquerda. A

omoplata.Ele hesita no embate da pele.Corpo a perdoar?Ele roda a cabeça, tronco. Pro-

cura o hálito das abelhas.A sua mão tenaz descobre as

costelas dela.Ela não tem dúvidas.Os dedos dele: flores de penu-

gem que vão mutilá-la.

Vejam isto:A mulher magra, que habita no

quinto andar, um apartamento comescassa mobília, inicia um choro.

O espadarte ficou salgado?As unhas pintadas de azul não

combinam com os sapatos?Esqueceu-se de comprar o ama-

ciador para a roupa?O cão da vizinha perturbou-lhe o

sono?A mulher magra desconhece a

razão concreta.Sabe do que precisa.Era o que mais faltava.Esperar que os dias nos ofereçam

uma razão concreta para um acon-tecimento.

A mulher magra chora.Corridos cinco minutos o nível do

pranto já chega aos rodapés.10 centímetros.Se a mulher magra não encontrar

a razão concreta, dentro de meiahora a enchente alcançará as gave-tas.

76 centímetros.Depois os armários.Dentro de uma hora a sirene do

carro dos bombeiros ecoará portodo o bairro.

Uma inundação, alguém gritará,num rés-do-chão.

Mesmo aí, a mulher magra, nãocessará.

Arregaçará a saia, subirá aotampo da mesa.

Insistirá no choro.Era o que mais faltava.Esperar que os dias nos ofereçam

uma razão concreta para um acon-tecimento.

soltas22 de novembro de 2011 | terça-feira | a cabra | 21

lote 19por sandro William Junqueira MiCro-Conto

e és herdeiro político de umprojecto para a DG, apesar denunca teres feito grande coisa

pela academia, se és tacheiro dos nú-cleos e consegues alargar as tuas in-fluências com intervençõeseloquentes e inofensivas nos órgãos,se és um jovem militante com elevadograu de consciência ideológica, ou umex-academista aborrecido com a tuareforma e dificuldade em desligaremocionalmente de Coimbra, reúnesas condições necessárias para sercandidato aos corpos gerentes daAAC.

Para isso deves seguir os ensina-mentos expressos nesta cartilha, comfascículos quinzenais aqui n’ A Cabra.

Para formar a tua lista vencedora,deves rodear-te de pessoas que des-creverei com o recurso a uma metá-fora lafonteniana: a colmeia.

A rainha, sem conotações homofó-bicas, serás tu. A tua função é basica-mente beber e dormir, e ser levado aocolo de um lado para o outro, até à vi-tória final.

As obreiras são os recém-chegadosque crêem piamente na sua capaci-

dade de influenciar o curso da histó-ria, que por inépcia ninguém levamuito a sério, mas que estarão con-tigo até ao fim. Capacidades espe-ciais: resistência, fidelidade, pôrfaixas, colar cartazes, distribuir coi-sas, financiar, passar noites na sede atrabalhar, passar dias nas bancas,inalar vapor de tinta, permanecer emmesas de voto isoladas.

Valem “à cabeça” o seu voto, econstituem o elemento mais nume-roso.

Caso a candidatura não se concre-tize, é de extrema importância mode-rar as expectativas das obreiras.Alguns, confrontados com a face pér-fida do desaire, nunca mais voltarão adesempenhar funções cívicas, vo-tando PAN nas próximas legislativas,do alto da sua superioridade moral.Os que sobreviverem serão os solda-dos mais leais, e poderão evoluir parase transformarem em “guerreiros” e“ideólogos”.

As guerreiras serão os caciques quete levarão à vitória. Combaterão naspraias, nos campos, nas colinas, nosátrios, nos bares e nas salas de aula.

Conhecerão todas as manhas, neces-sárias para influenciar o colegamenos consciente para votar no sen-tido que lhe convier, e neutralizar ou-tros caciques. Possuem exaustivaslistas de contactos, com números te-lefónicos de centenas de colegas, epontuam os caloiros de acordo com oseu potencial de futuro arregimenta-dor eleitoral.

No entanto, são os mais traiçoei-ros, que poderão virar-te Costas erumar à colmeia seguinte sem escrú-

pulo. Quanto maior a sua experiên-cia, mais difícil será satisfazê-los, eimpedir que queiram tomar o teulugar. O que lhes prometes para con-seguir a sua lealdade será proporcio-nal ao número de votos queamealham.

Valem de trinta votos para cima, eapenas existem dez a vinte exempla-res por faculdade.

Por fim, os ideólogos. O cérebro dacolmeia, para que tu não tenhas preo-cupações mundanas. Irão encontrar

o esquema para que, criando a ilusãode auto-financiamento, terceirosfaçam chegar o seu dinheiro, e osseus interesses, à sua candidatura.

São estes que ostentam o cartão demilitante, e não têm pejo em brandi-lo e exigir a disciplina de voto a algu-mas obreiras tresmalhadas.Identificam os melhores guerreiros, eé o seu ascendente intelectual quenuma primeira fase define para quelado caem.

A seu cargo estará o programa, quedeverá cumprir moderadamente osestatutos da AAC e as suas linhas po-líticas, que em breve ficará em sus-pensão na gaveta.

Decidem os mecanismos para in-fluenciar a Comissão Eleitoral, desdea sua estrutura ao número de listascandidatas. No seu reportório, estãoo recurso às votações nos átrios e asurnas com um ou duas pessoas, noscantos recônditos do pólo I, Desportoou Dentária.

Valem poucos, e em alguns casos,até fazem perder votos. São bichoraro.

Continua no próximo fascículo.

MonuMentais panados soCiaispor doutorando paulo Fernando • facebook.com/paulofernandophd

Sd.r.

Cadernos eleitorais – lição n.º1: o período pré-eleitoral

Sandro William junqueira nasceu na

rodésia, mas foi por entre as Caldas da

rainha, Setúbal e Portimão que cres-

ceu. Começa a escrever numa primeira

fase como resposta a problemas da

adolescência e mais tarde, a partir dos

24,25 anos, como algo mais sério.

Trabalhou como designer até 2006,

mas é como profissional de teatro que

vive atualmente. Para ele, “o teatro é

o espaço onde se chega mais fundo à

alma humana” assim como uma in-

fluência óbvia na sua escrita.

o facto de não ter conhecido o

local onde nasceu e as constantes mu-

danças de residência, tornaram impos-

sível para o escritor o contacto

continuado com amigos de infância:

“nunca me agarrei a um sítio devido a

várias circunstâncias, e isso influencia

muito a minha escrita.”

Considera os escritores peças fun-

damentais na sua vida e, quando ques-

tionado sobre o desejo de viver

futuramente da escrita, responde “sim

e não”. “Sim, porque gostava de ter

tempo só para a escrita. não, porque

acho que depois isso também tem um

lado perverso.”

em fevereiro de 2012 lança o seu

novo livro, “um piano para Cavalos

altos”, editado pela Caminho.

Raquel Mariz

Sandro William junqueira

(Cave) (Rés do Chão)

(1.º B)

(2.º A)

(5.º C)

Page 22: Edição 237

opinião22 | a cabra | 22 de novembro de 2011 | Terça-feira

Cartas ao diretorpodem ser

enviadas para

[email protected]

A Cena Lusófona tem em curso

um projecto de promoção da lei-

tura em parceria com a Escola Se-

cundária D. Dinis, em Coimbra. A

acção inclui visitas guiadas ao seu

Centro de Documentação e Infor-

mação (CDI), a disponibilização

de parte do seu acervo na biblio-

teca da escola e leituras de peças

de teatro por alunos e actores pro-

fissionais.

No passado dia 17 de Novembro

tiveram lugar as duas primeiras

visitas ao CDI, com quase uma

centena de alunos. Durante a vi-

sita e em declarações aos jornais,

vários deles destacaram a riqueza

do Centro (aberto ao público, com

atendimento especializado) e a

sua importância para o conheci-

mento da realidade social e cultu-

ral dos países de língua

portuguesa.

Este projecto acontece numa al-

tura em que está a decorrer, por

iniciativa da Câmara Municipal de

Coimbra, o concurso para a re-

qualificação da Ala Central do Co-

légio das Artes, no Pátio da

Inquisição, onde se prevê a insta-

lação da Cena Lusófona e do seu

CDI a partir de 2013. Sediada em

Coimbra desde 1996, a associação

passará assim a dispor de melho-

res condições para desenvolver o

seu trabalho, contribuindo para a

consolidação de um importante

polo cultural no centro da cidade,

junto ao Teatro da Cerca de São

Bernardo e ao Centro de Artes Vi-

suais.

O CDI é apenas uma das áreas

de intervenção da Cena Lusófona.

Dedicada ao intercâmbio teatral

entre os países de língua portu-

guesa, a associação trabalha nas

áreas da criação artística (promo-

vendo ou apoiando co-produções

internacionais), da formação (com

destaque para os três estágios in-

ternacionais de actores realiza-

dos), dos festivais (a “Estação” é o

primeiro festival rotativo na CPLP,

com edições realizadas em Mo-

çambique, Cabo Verde, São Tomé

e Príncipe, Brasil e Portugal) e das

edições (uma colecção de drama-

turgia, uma revista, um jornal, do-

cumentários), entre outras.

No final de 2010, a Cena Lusó-

fona deixou de ter financiamento

do governo português. Apesar dos

esforços para encontrar soluções

alternativas – candidaturas a pro-

jectos internacionais; o pedido à

autarquia para que comparticipe o

custo com as actuais instalações

até à conclusão das obras; apoios

pontuais como o da Fundação Ca-

louste Gulbenkian ao projecto

com a Escola D. Dinis –, este

recuo do governo português pode

destruir o trabalho feito ao longo

de 15 anos. Reconhecendo este

risco, mais de cem criadores, pro-

dutores, investigadores e repre-

sentantes de estruturas de criação

de todos os países lusófonos diri-

giram em Maio um apelo ao go-

verno português. Afirmando-se

como “testemunhas directas da

importância da acção levada a

cabo pela Cena Lusófona” e sen-

tindo-se “directamente lesados

com esta situação”, alertaram para

as consequências de um eventual

desaparecimento da Associação:

“significaria o desbaratar do in-

vestimento feito e do capital de

confiança gerado desde 1995, bem

como o desaproveitamento da

vasta rede de contactos e de cum-

plicidades artísticas e institucio-

nais que o projecto permitiu

desenvolver ao longo dos anos e

que tem sido base sólida de im-

portantes realizações e de múlti-

plas iniciativas de colaboração

entre os oitos países de língua por-

tuguesa”. Vários meses depois da

sua tomada de posse, o novo go-

verno continua sem dar resposta a

este apelo e a situação de asfixia fi-

nanceira da associação degrada-se

rapidamente.

O paradoxo é evidente. Ao fim

de 15 anos, o trabalho realizado é

reconhecido local e internacional-

mente, foram reunidos meios para

construir novas instalações, há

projectos e candidaturas em

curso. E tudo isto pode acabar, em

resultado de uma decisão cega de

quem não quis sequer dar-se ao

trabalho de conhecer o que está

feito.

Em altura de crise, parece-nos,

mais necessário é aproveitar os re-

cursos de que se dispõe. Partindo

do princípio de que Portugal quer

continuar a fomentar as relações

culturais com os países lusófonos,

desperdiçar a experiência adqui-

rida e o investimento público rea-

lizado nesta área é, no mínimo,

uma enorme irracionalidade.

*Associação Portuguesa para o In-

tercâmbio Teatral

Vários meses depois da sua tomadade posse, o novo governo continua semdar resposta ao nossoapelo e a situação deasfixia financeira da associação degrada-serapidamente

Cena Lusófona: paradoxos e irraCionaLidades

Cena Lusófona*

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Page 23: Edição 237

opinião22 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 23

Secção de Jornalismo,

Associação Académica de Coimbra,

Rua Padre António Vieira,

3000 - Coimbra

Tel. 239821554 Fax. 239821554

e-mail: [email protected]

Diretor Camilo Soldado Editores-Executivos Inês Amado da Silva, João Gaspar Editoras-Executivas MultimédiaAna Francisco, Catarina Gomes Editores Inês Balreira (Ensino Superior), Ana Duarte (Cultura), Fernando Sá Pessoa (De-sporto), Ana Morais (Cidade), Filipe Furtado (Ciência & Tecnologia), Liliana Cunha (País), Maria Garrido (Mundo) Secretáriade Redação Nicole Inácio Paginação Inês Amado da Silva, João Miranda, Rafaela Carvalho Redação Daniel Silva, DianaLima, Diana Teixeira, Fábio Santos, Félix Ribeiro, Joana de Castro, Paulo Sérgio Santos Fotografia Ana Patrícia Abreu, DavidBarata, Inês Amado da Silva, Inês Balreira, Ivone Bezerra, Joaquim Coelho, Rafaela Carvalho Ilustração Ana Granado, AnaBeatriz Marques, Tiago Dinis Colaborou nesta edição Carolina Caetano, Cláudia Carvalho Silva, David Barata, Flávia CidNunes, Inês Filipe, Joana Cabral, Joana Guimarães, Mariana Santos Mendes, Margarida Pais, Maria Rita Loio, Nelson Bar-bosa, Raquel Mariz Colaboradores Permanentes Carlos Braz, João Miranda, João Ribeiro, João Terêncio, João Valadão,José Afonso Biscaia, José Miguel Pereira, José Santiago, Lígia Anjos, Luís Luzio, Pedro Madureira, Pedro Nunes, Rafael Pinto,Rui Craveirinha Publicidade João Gaspar 239821554; 917011120 Impressão FIG – Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: [email protected] Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da AssociaçãoAcadémica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade deCoimbra, Gonçalo Xufre Silva, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra, Sandro William Junqueira

A história parece repetir-se. Há

um ano atrás eram os PEC, um

governo PS esgotado e um PM

sem credibilidade. Para trás fica-

vam os eternos problemas na

educação, os protestos dos pro-

fessores, o aumento das desi-

gualdades, as carreiras

congeladas, o crescimento do de-

semprego, a precariedade, o en-

dividamento crescente das

famílias, etc., etc. Motivos bas-

tantes para justificar uma greve

que foi considerada a maior de

sempre.

Se há um ano estávamos à

beira do abismo, hoje já estamos

em queda vertiginosa. Para além

das medidas violentas de auste-

ridade que estão longe de se pau-

tar pela equidade (como o

próprio PR já denunciou), põem

em risco o Estado social e atin-

gem em cheio a classe média,

empurrada para uma rápida pro-

letarização. Com o país interven-

cionado pela Toika, uma

soberania mitigada e um go-

verno de direita a querer repetir

o estatuto de “bom aluno” –

agora já não da Europa mas da

Sra. Angela Merkel –, incapaz de

admitir outro cenário que não a

austeridade pura e dura, uma po-

lítica duríssima e que recai exclu-

sivamente sobre a força de

trabalho e o funcionalismo pú-

blico em especial, mas poupa as

grandes fortunas, os lucros fabu-

losos e os interesses da banca e do

capital, oferece-nos um cenário

onde há todas as condições para

uma greve de amplitude e im-

pacto nacional, apesar dos custos

económicos para os trabalhado-

res.

Ao amplo leque de sectores pro-

fissionais, sindicatos e profissões

que representam o conjunto dos

trabalhadores (das diversas cor-

rentes sindicais) juntam-se os vá-

rios movimentos de precários e

grupos de jovens indignados, da

geração à rasca, associações de

estudantes, entre as quais a AAC

que foi a primeira a manifestar a

adesão ao protesto nacional de

dia 24. Um aspeto que poderá

fazer a diferença entre esta greve

e as anteriores é o facto de as di-

versas formas de contestação pro-

gramadas – a convocação

simultânea de uma greve geral e

de um conjunto de manifestações

é algo inédito ou pouco comum –

possam assumir-se como um

imenso caudal de insatisfação

capaz de reunir os grupos inorgâ-

nicos (os precários, os indignados

e em geral os movimentos ligados

ao ativismo virtual das redes so-

ciais) e os sectores mais organiza-

dos como é o movimento sindical.

Essa aliança pode não só afirmar

uma revolta geral contra tantas

medidas cegas, mas uma orienta-

ção política em defesa de con-

quistas sociais e valores

progressistas de que os cidadãos

não abdicam.

*Investigador do CES

GreVe GeraL: da

indiGnação à

poLitização

eLísio estanque*

Com o paísintervencionado pela troika, há todas as condições para umagreve de amplitude eimpacto nacional, apesar dos custoseconómicos para ostrabalhadores.

editoriaL

a reCapituLação do ato eLeitoraL

Chegados a novembro, o cenário é

semelhante todos os anos. Dá-se

pela presença de cartazes, flyers,

outdoors e dos mais variados tipos

de material de propaganda, sinal que

começou a corrida para os corpos ge-

rentes da Associação Académica de

Coimbra (AAC). Este ano, a disputa

para a direção-geral da AAC

(DG/AAC) conta com mais dois can-

didatos que no anterior, perfazendo

assim cinco listas.

Duas já se fizeram notar devido à

clara aposta na pré-campanha e à

envergadura da estrutura criada por

cada uma. O que não se percebe é

porque é que há três listas com

ideias bastante semelhantes em vez

de uma lista que as congregasse, já

que – defendendo os mesmo princí-

pios – estão a disputar o mesmo elei-

torado. Assim sendo, perdem

expressão eleitoral ao invés de cons-

tituírem uma alternativa de peso.

Para o Conselho Fiscal da AAC

(CF/AAC) há um incremento ainda

maior no número de listas: dez no

total. No entanto, será ainda cedo

para tecer quaisquer considerações

ou tirar conclusões sobre o verda-

deiro efeito eleitoral que tal quanti-

dade de listas a concorrer para o

CF/AAC poderá ter.

Apesar de tudo, as bandeiras apre-

goadas pelas diversas listas não são

novas. Infelizmente. O que só pode

querer dizer que há algo que tem fa-

lhado sucessivamente no trabalho

das equipas que passaram pela

DG/AAC até aqui. Por entre as prin-

cipais lacunas pode contar-se a apro-

ximação dos estudantes à academia.

Uma bandeira tão propalada em

tempos de campanha quanto falhada

quando muda a direção. O interesse

dos estudantes pela academia e pela

participação ativa no seu dia a dia

deveria ser algo espontâneo em vez

de uma luta que as candidaturas se

propõe a travar todos os anos.

Por acréscimo, podemos contar

com a oposição declarada ao atual

sistema de ação social escolar, tal

como ao modelo de financiamento

do ensino superior, indício que tam-

bém nestes campos os estudantes

têm feito importantes concessões à

tutela.

Constância tem sido a palavra que

poderia caracterizar este ciclo: na se-

mana que anima a academia tudo

muda, para daqui a um ano voltar ao

mesmo.

Camilo Soldado

a aproximação dos estudantes à ac-ademia é uma bandeira tão propal-

ada quanto falhada quando muda a direção “

Ao contrário do que tem vindo a acontecer em anos anteriores, o Jornal

Universitário de Coimbra – A Cabra, tal como a TV AAC, não vai participar

na organização e moderação do debate com os candidatos à DG/AAC. Esta

situação deve-se unicamente ao facto de a Rádio Universidade de Coimbra

(RUC), sem qualquer aviso e justificação prévia, ter avançado unilateral-

mente para a realização do debate. De salientar que o Jornal Universitário

– A Cabra sempre esteve disponível para iniciativas conjuntas com os di-

ferentes órgãos de comunicação da casa, vindo por este meio expressar a re-

provação que esta atitude nos merece. Apesar do sucedido, o Jornal A Cabra

entende que a cobertura do debate é do superior interesse dos estudantes

e, como tal, acompanhará essa atividade, tal como todas as restantes rela-

tivas às eleições para os corpos gerentes da AAC.

NOTA EDITORIAL

Page 24: Edição 237

acabra.netRedação:Secção de JornalismoAssociação Académica de CoimbraRua Padre António Vieira3000 CoimbraTelf: 239 82 15 54

Fax: 239 82 15 54e-mail: [email protected]

Conceção e Produção:Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra

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PersPetiva por DaviD Barata 200

x 100Um simples olhar faz desper-

tar um furacão de sensações emcada um de nós. E aí, baseadaem sentidos, a nossa mente de-senvolve algo que nos vai mar-car até um certo ponto.

Mas perante a vida, na minhaopinião, vão existir aqueles sim-ples momentos em que umolhar é algo que irá prevalecer,perante o tempo, na nossamente.

É algo próprio, é algo difícil dedescrever. Porque cada um denós, naquilo que vê pode imagi-nar tudo.

O tempo passa, os momentosficam….

Os falsos recibos verdes são umaafronta à legalidade da atividade la-boral portuguesa. Independentesno papel, mas limitados no que tocaao cumprimento dos seus direitos,vêm enfrentando nas últimas se-manas uma ameaça coerciva de pri-são por parte da segurança social.Prender quem não tem pago os seusdescontos parece mais fácil do quetomar uma atitude ágil e intimar asempresas que devem mais de 5 milmilhões de euros à instituição. Étempo de repensar a ética do mi-nistério da solidariedade e da segu-rança social. Estaremos peranteuma sobrevalorização do paga-mento da dívida? L.C.

Marionet MSSS Vítor Lobo

Numa época de crise cultural,ainda há instituições que mostram aqualidade do que se produz em Por-tugal. Exemplo disso é a companhiamarionet, que desde a sua criação,tem vindo a apresentar projetos ino-vadores na área da dramatização,com a aposta em raros conceitoscomo a ciência no teatro. “Cálculo” éa sua mais recente estreia, que se fezacompanhar de um grande sucesso edo total apoio do seu escritor, o quí-mico Carl Djerassi. Num mundocada vez mais polivalente, a misturade conceitos tão distintos como ciên-cia e a representação é necessária. E amarionet está de parabéns pela suaconcretização. A.D.

Numa altura em que a Universi-dade de Coimbra (UC) vai sofrerum corte de 20 milhões de euros,torna-se importante o exemplo deVictor Lobo, recentemente pre-miado pela Academia de CiênciasRussa. A longa colaboração com aacademia russa valeu ao investiga-dor químico da Faculdade de Ciên-cias e Tecnologia o prémio NicolaiM. Emanuel. A aplicação prática doseu trabalho permite desenvolverbaterias para automóveis elétricos,estudar a corrosão ou o tratamentode águas residuais. As cinco déca-das de contributo à ciência de Vic-tor Lobo mostram a qualidadeintelectual da UC. F.F

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