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Editora Brazil Publishing

Conselho Editorial

Presidente:Rodrigo Horochovski (UFPR - Brasil)

Membros do Conselho:Anita Leocadia Prestes (Instituto Luiz Carlos Prestes - Brasil)

Claudia Maria Elisa Romero Vivas (Universidad Del Norte - Colômbia)José Antonio González Lavaut (Universidad de La Habana - Cuba)

Ingo Wolfgang Sarlet (PUCRS - Brasil)Milton Luiz Horn Vieira (UFSC - Brasil)

Marilia Murata (UFPR - Brasil)Hsin-Ying Li (National Taiwan University - China)

Ruben Sílvio Varela Santos Martins (Universidade de Évora - Portugal)Fabiana Queiroz (UFLA - Brasil)

© Editora Brazil PublishingPresidente Executiva: Sandra Heck

Rua Padre Germano Mayer, 407 Cristo Rei ‒ Curitiba PR ‒ 80050-270

+55 (41) 3022-6005

www.aeditora.com.br

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PRÁTICAS INOVADORAS DE GOVERNANÇA NA CONSTELAÇÃO

LOCAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS EM CASCAVEL - PR

Aline Dario Silveira

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CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO - EDITORA BRAZIL PUBLISHING

S587p Silveira, Aline Dario

Práticas inovadoras de governança na constelação local de resíduos sólidos em Cascavel - PR / Aline Dario Silveira; Curitiba, PR: Brazil Publishing, 2019. 396p.; 16x23 cm.

ISBN 978-85-68419-74-8 E-book

1. Administração. 2. Crise Ambiental. 3. Resíduos Sólidos. 4. Sustentabilidade. 5. Prática Social. I. Título. II. Silveira, Aline Dario.

CDD 353.9 CDU 352

Comitê Científico da área Ciências Humanas

Presidente: Professor Doutor Fabrício R. L. Tomio (UFPR – Sociologia)Professor Doutor Nilo Ribeiro Júnior (FAJE – Filosofia)

Professor Doutor Renee Volpato Viaro (PUC – Psicologia)Professor Doutor Daniel Delgado Queissada (UniAGES – Serviço Social)

Professor Doutor Jorge Luiz Bezerra Nóvoa (UFBA – Sociologia)Professora Doutora Marlene Tamanini (UFPR – Sociologia)

Professora Doutora Luciana Ferreira (UFPR – Geografia)Professora Doutora Marlucy Alves Paraíso (UFMG – Educação)

Professor Doutor Cezar Honorato (UFF – História)Professor Doutor Clóvis Ecco (PUC-GO – Ciências da Religião)

Professor Doutor Fauston Negreiros (UFC – Educação)Professor Doutor Luiz Antônio Bogo Chies (UFRS – Sociologia)Professor Doutor Mario Jorge da Motta Bastos (UFF – História)

Diagramação e Projeto Gráfico: Brenner SilvaElementos da Capa: FreepikRevisão de Texto: A autoraRevisão Editorial: Editora Brazil PublishingDOI: 10.31012/praticasinovadorasdegovernança

Curitiba / Brasil2019

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SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO ................................................................ 17

CAPÍTULO 2 – TEORIAS DA PRÁTICA ................................................... 35

CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA ............................................................ 73

CAPÍTULO 4 – FEIXES DE PRÁTICAS DE RESÍDUOS SÓLIDOS .......116

CAPÍTULO 5 – FEIXE DE PRÁTICAS DE LOGÍSTICA REVERSA .......229

CAPÍTULO 6 – VERSÕES DA ESTRUTURA DE GOVERNANÇA DA PRÁTICA ...................................................................................................304

CAPÍTULO 7 – RELAÇÕES ENTRE PRÁTICAS E FEIXES NA CONSTELAÇÃO LOCAL .........................................................................323

CAPÍTULO 8 – PRÁTICAS INOVADORAS DE GOVERNANÇA ...........329

CAPÍTULO 9 – CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................338

REFERÊNCIAS .........................................................................................360

ANEXO A – PANFLETO DE DIVULGAÇÃO DE DESTINAÇÃO ADEQUADA POR TIPO DE RESÍDUO ...................................................373

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Eu não sou ateniense, sou cidadão do mundo.Sócrates

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AGRADECIMENTOS

À Universidade do Oeste do Paraná (Unioeste) e ao Colegiado de Administração, pela oportunidade de crescimento pessoal e profissional.

À Universidade Positivo (UP), pelos conhecimentos compar-tilhados.

À Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Cascavel e às empresas que participaram dessa pesquisa.

À Capes e à Fundação Araucária, pelo financiamento parcial a esta pesquisa, concretizado pela Bolsa de Estudos da Chamada Pública n. 13/2014 por meio do Acordo Capes/FA.

Aos professores e colegas de turma, pelos conhecimentos e amizade compartilhados, especialmente à Andriele de Prá Carvalho e à Fabiana Biscoli, companheiras de trabalho e de pesquisas, e por torna-rem ainda mais especial esse tempo.

Ao amigo Prof. Dr. Ivano Ribeiro pelas trocas de ideias.À Profª Drª Sieglinde Kindl da Cunha, pela confiança, pela

orientação e pela amizade.Aos Professores da Banca Examinadora, pela participação, pe-

las contribuições relevantes a esta pesquisa e, principalmente, pela doa-ção do seu tempo e da sua atenção.

Aos meus amigos e parentes, pelas ausências sentidas. À minha Mãe, pela dedicação, amor e compreensão. Ao Mestre Incomparável, pelas bênçãos recebidas.

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PREFÁCIO

Aplicar um olhar diferenciado e compreensivo sobre o fenô-meno social da governança de resíduos sólidos condiz com esta obra realizada pela autora Aline, que sempre demonstrou sua paixão pela Ciência da Administração e em especial por pesquisas que pudessem contribuir com uma análise profunda, visto seu grande potencial em re-lacionar temáticas e conceitos para a construção de conhecimento. Essa sua visão de pesquisadora é o que pode ser esperado no decorrer desta obra, que é resultado de sua tese de doutorado em Administração reali-zado na Universidade Positivo, em Curitiba-PR.

A obra Práticas Inovadoras de Governança na Constelação lo-cal de Resíduos Sólidos em Cascavel apresenta um contexto direciona-do a investigação de práticas inovadoras que buscam maneiras eficien-tes de gestão ambiental de resíduos sólidos. Contribui para entender a relação entre a sociedade, o poder público e o meio ambiente na gestão compartilhada sobre as possibilidades para a governança desses resídu-os. Nesse sentido, o contexto de governança abrange os diversos atores desta ação coletiva e torna a obra completa sob o ponto de vista das dife-rentes formas de interação voltadas para o objetivo comum do problema ambiental em foco.

O olhar teórico apresentado na obra traz contribuições signi-ficativas ao aplicar a teoria da Prática Social de Schatzki ao processo investigativo na análise do campo empírico relacionando seus achados com Política Nacional dos Resíduos Sólidos. O conceito de governança presente tanto da Teoria da Prática Social quanto da Política Nacional de Resíduos Sólidos traz inerentemente a dimensão do compartilha-mento social de decisões, ações e responsabilidade. Esta visão amplia o entendimento na importante discussão sobre a transição de paradigma para o caminho da sustentabilidade, isso porque a sensibilidade do olhar da prática, com base em Schatzki, aprofunda a concepção do comparti-lhamento de atividades humanas, regras e estruturas teleoafetivas.

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Em seus oito capítulos, a leitura desta obra é um convite ao di-álogo entre uma perspectiva teórica e o fenômeno social da governança de resíduos sólidos, fundamentada em uma pesquisa com bases ontoló-gicas e epistemológicas subjacentes à pesquisa interpretativa, na qual a percepção e a compreensão humana ressalta seu aspecto qualitativo. O caráter social da prática entrelaçado a arranjos materiais permite perce-ber as práticas inovadoras de governança na constelação local de resídu-os sólidos de Cascavel em uma abordagem única, que leva ao direcio-namento de contribuições teóricas relevantes para a Teoria da Prática.

Andriele de Prá CarvalhoDoutora em Administração, professora da Universidade Tecnológica

Federal do Paraná (UTFPR), campus Francisco Beltrão. Pesquisadora nas áreas de inovação, sustentabilidade e

Transition Management

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ABSTRACT

The Social Practice Theory supports that the place of human co-existence is a space of being and of intelligibility and happens in meshes of practices and material arrangements that differ between them in spa-ce-time extension or in scale of its practices-arrangements sharing the horizontality of the social life. This theoretical proposal was embraced by the present thesis, whose general objective was to understand how the innovative practices of governance in the local solid waste cons-tellation are developed in the municipality of Cascavel, state of Paraná. The adopted methodology is configured by the qualitative approach and case study, with theoretical sampling and gradual selection of the sample. The multi-actor and multi-local aspects were explored during the data collection, which used resources such as observation and in-terview (with the double and in depth) as main research instruments. The temporal perspective was transactional (May/November 2016). The unit of analysis was the practice and the analysis level was the local solid waste constellation. In the circular movement between data collection and analysis, the entwinement between practices emerged as well as the junction in bundles and these configuring the local constellation. The direction of this view was supported by the National Policy on Solid Waste. The thesis of this study was established in the following terms: The National Solid Waste Policy (PNRS in Portuguese), promulgated by Law 12.305/2010, as a constituent rule of municipal solid waste practice and intervention policy provides a favourable context for chan-ges in bundles of practices and solid waste arrangements, especially in innovative actions related to governance present both in the practices themselves and in specialized governance bundles. Field research ena-bled the recognition of the main activities constituent of practices and practice bundles, as well as the governance initiatives that promoted changes in practices and arrangements, creation of new practices and other actions considered innovative in their contexts. The results poin-

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ted to the formation of four bundles with spatial extent limited to the local constellation of waste solid and eight bundles that extrapolate the-se borders. The predominant relationships in the local constellation of solid waste (i) between practice and arrangement was constitutive; (ii) between practices and between arrangements was the sharing of activity space and the chain of action; (iii) in the chain of action the predomi-nance was governance and monitoring; and (iv) in the local constella-tion, the concepts prevailing in bundles dynamics were interweaving, bifurcation and stability. New concept was proposed to characterize the bundles dynamics: polyplasis, meaning that the social phenomenon is characterized by several points of formation, acting autonomously and performing peripheral actions in a decentralized governance model.

Keywords: Governance. Practices. Solid Waste. Brazilian National Policy on Solid Waste. Social Practice Theory.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

SIGLAS DESCRIÇÃOABDI Agência Brasileira de Desenvolvimento IndustrialABIHPEC Associação Brasileira de Produtos de Higiene PessoaisAbinee Associação Brasileira da Indústria Elétrica EletrônicaAbipla Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e AfinsACIC Associação Comercial e Industrial de CascavelAddav Associação dos Distribuidores de Defensivos Agrícolas e Veterinários do OesteAEN Agência Estadual de Notícias do Estado do ParanáAguasParaná Instituto das Águas do ParanáAmop Associação dos Municípios do Oeste do ParanáAnip Associação Nacional da Indústria de PneumáticoANTT Agência Nacional de Transporte TerrestreCBO Classificação Brasileira de OcupaçõesCMTE Cadastro Municipal de Transporte e EntulhoConama Conselho Nacional de Meio AmbienteCootacar Cooperativa dos Trabalhadores de Material Reciclável

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CPTMR Centro de Processamento, Tratamento e Transferência de Materiais RecicláveisCTF Cadastro Técnico FederalDNR Departamento Nacional de RodagemDOU Diário Oficial da UniãoFAG Centro Universitário Fundação Assis GurgaczFecomércio/SP Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São PauloFiep Federação das Indústrias do Estado do ParanáFundetec Fundação para o Desenvolvimento Científico e TecnológicoIAP Instituto Ambiental do ParanáIbama Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais RenováveisInpev Instituto Nacional de Processamento de Embalagens VaziasIpardes Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e SocialIPS Indústria Petroquímica do SulIsam Instituto de Saneamento AmbientalkVA Quilovoltampere é uma unidade de medida equivalente a 1000 voltamperesLR Logística reversaMP Ministério PúblicoPEA Programa de Educação AmbientalPers Plano Estadual de Resíduos SólidosPGIRS Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos

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PGRS Plano de Gerenciamento de Resíduos SólidosPGRCC Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção CivilPIC Penitenciária Industrial de CascavelPNRS Política Nacional de Resíduos SólidosProvopar Programa de Voluntariado ParanaensePUC-PR Pontifícia Universidade Católica do ParanáRDC Resolução da Diretoria ColegiadaRSS Resíduos de Serviços de SaúdeSeab Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do ParanáSema Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Recursos HídricosSema/PR Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos HídricosSenai Serviço Nacional de Aprendizagem IndustrialSeplan Secretaria Municipal de PlanejamentoSicoob Sistemas de Cooperativas de Crédito do BrasilSicredi Sistema de Crédito CooperativoSindicom Sindicato das Empresas Distribuidoras de CombustíveisSinduscon Sindicado da Indústria da Construção CivilSindusfarma Sindicato da Indústria de Produtos FarmacêuticosSinqfar Sindicato das Indústrias Químicas e Farmacêuticas do Estado do Paraná

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Sipat Semana Interna de Prevenção de Acidente do TrabalhoSisnama Sistema Nacional de Meio AmbienteSNVS Sistema Nacional de Vigilância SanitáriaSuasa Sistema Unificado de Atenção à Sanidade AgropecuáriaSinir Sistema Nacional de Informações so-bre a Gestão dos Resíduos SólidosSnis Sistema Nacional de Informação sobre SaneamentoSinima Sistema Nacional de Informação sobre Meio AmbienteSinmetro Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade IndustrialUBS Unidades Básicas de SaúdeUDC Centro Universitário Dinâmica das CataratasUFM Unidade Fiscal do MunicípioUnila Universidade Federal da Integração Latino-AmericanaUnioeste Universidade do Oeste do ParanáUSF Unidades da Saúde da FamíliaUTFPR Universidade Tecnológica Federal

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CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO

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O tema central deste livro pode ser apontado, genericamente, como a governança de resíduos sólidos. O resíduo sólido produzido pela sociedade no desenvolvimento de suas atividades tem sido compreendi-do como um problema ambiental, sociocultural, espacial e econômico já há algumas décadas, contudo, os esforços para uma solução efetiva ainda não se mostraram amplamente evidentes.

Os resíduos sólidos se inserem na problemática ambiental não somente pela possibilidade de poluição (contaminação de solos e água e emanações aéreas produzidas) e degradação ambiental, mas porque também representam um paradigma social, econômico e produtivo para o qual a natureza, vista como coisa, é um instrumento a serviço da humanidade, paradigma este respaldado na ideia dicotômica entre mente e corpo da doutrina racionalista cartesiana e nas diretrizes ca-pitalista de lucratividade, de expansão operacional e de racionalidade instrumental. Esse paradigma conduziu a sociedade a uma crise am-biental, merecendo um olhar mais atento sobre ela.

Leff (2001, p. 191) afirma que “a crise ambiental é a crise de nosso tempo”. Estamos vivendo nos últimos anos, nitidamente de forma mais expressiva, alterações climáticas em todo o globo, afe-tando todas as sociedades. Destruição de ecossistemas, perda de di-versidade, esgotamento de recursos naturais, desmatamentos, secas, enchentes, tempestades, derretimento de geleiras, enfim, problemas diversos cujas causas são multidimensionais e multifacetadas e apre-sentam comportamento interdependente.

Esta crise é ambiental pela saturação da capacidade de recupe-ração do meio ambiente, é ecológica porque afeta a destruição da base de recursos naturais, é social porque afeta em maior ou menor escala todas as sociedades do globo terrestre, é política por relacionar-se com sistemas políticos, institucionais e de poder (BARBIERI, 1996), é também uma crise energética porque afeta o sistema produtivo e como consequência, uma crise econômica por afetar o sistema econômico (TIEZZI, 1988).

Há, pelo menos, dois conceitos que são importantes destacar para compreender melhor a natureza dessa crise: a Lei da Entropia (GEORGESCU-ROEGEN, 2012) e a consideração de que os tempos

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biológicos são diferentes dos tempos históricos (TIEZZI, 1988). Estes dois conceitos estão, de certa forma, relacionados.

A Lei da entropia assevera que “o calor só pode ser passado por si mesmo do corpo mais quente para o mais frio, nunca em sentido inverso” (GEORGESCU-ROEGEN, 2012, p. 81). A entropia pode ser entendida como o grau de desorganização de um sistema, sendo que este grau equivale a uma mudança qualitativa e não quantitativa no sistema; representa para os seres vivos a própria degradação, pois estes buscam captar fontes de energia com baixa entropia, facilmente assi-miladas comparadas com as de alta entropia, que apresentam alto grau de desordem. Os processos de produção procuram também fontes de energia ou matéria com baixa energia para seus processos de entrada (inputs) ao mesmo tempo em que suas saídas (outputs) são resíduos sem valor, de alto grau entrópico.

Algumas consequências dessa lei podem ser apontadas como a poluição térmica gerada pela intensiva atividade produtiva que não pode ser revertida em resfriamento, a reciclagem de resíduos pode de-mandar mais recursos de baixa entropia do que seria esperado, assim como a produção de alguns produtos como proteínas (pecuária e avi-cultura, por exemplo) consomem mais baixa entropia no próprio pro-cesso do que aquela apresentada no resultado (produto final). Essas consequências têm implicações não somente ambiental, mas econômi-cas, especialmente quanto à viabilidade dos custos.

Os tempos históricos são os tempos produzidos pela huma-nidade por meio de sua ação cultural, política, econômica, tecnológica e produtiva; têm o seu próprio ritmo, acentuado pela celeridade em contraposição ao tempo biológico, este caracterizado pela cronologia da vida – tempo de nascimento, crescimento, maturamento e morte daquilo que é vivo. A diacronia e não a sincronia é o que difere os tempos históricos dos biológicos. Logo, só pelo ritmo intensivo de produção e consequente uso de recursos naturais fica claro que o meio ambiente em toda a sua complexidade não tem a seu dispor tempo suficiente para regenerar-se, para recompor-se dos efeitos antrópicos sobre a natureza.

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Estão imbricados nesta crise os sistemas natural, produtivo, tecnológico, econômico, sociocultural e político de tal modo que a complexidade da questão é um dos temas da atualidade mais discuti-dos nos meios social, produtivo, econômico, político e acadêmico.

Há um entendimento consensual emergente por parte dos atores envolvidos nessa discussão de que essa crise exige uma transição de paradigma em direção a um novo modo de viver, de produzir e de relacionar-se: o caminho da sustentabilidade. Nesse sentido, os enten-dimentos sobre resíduos sólidos se ampliam e revelam outra dimensão além daquela considerada como poluição: a da reciclagem, e com ela, mais dois conceitos que ficaram conhecidos como a política dos 3R’s: reduzir (a quantidade de resíduo produzido, consumindo o necessário e diminuindo o desperdício), reutilizar (dar um novo uso ao produto e/ou embalagem, e reparar para voltar a ser útil na mesma função ou função correlata) e reciclar (transformação de resíduos em novos produtos ou matérias primas para processos produtivos) (AGENDA 21, 1992).

1.1 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA

No Brasil, a questão dos resíduos sólidos passou a ser alvo de uma política nacional a partir da promulgação da Lei 12.305 de 2010. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) é uma política pública de Estado e de Governo.

É uma política pública por traçar diretrizes sobre como de-terminados assuntos devem ser tratados visando a garantia dos direitos fundamentais por meio da intervenção no domínio social. É uma polí-tica de Estado uma vez que visa a estruturação da temática por meio do processo legislativo ao aprovar a PNRS. E é uma política de Governo conquanto possui objetivos específicos direcionados ao incremento da eficácia e a proteção dos direitos constitucionalmente garantidos, quan-do desenvolve campanhas de educação ambiental e de conscientiza-ção pública nacional com o intuito de promover ações de preservação ambiental, como a separação seletiva do lixo, por exemplo (KUNTZ; VOLPATO, 2015).

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Versões desta lei tramitaram durante 21 anos no Congresso Nacional e o resultado é uma lei com uma sólida base constitucional e uma das mais modernas nesse campo. Firmemente estabelece a diretriz para a não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequa-da dos rejeitos (BRASIL, 2010). De fato, a PNRS é uma lei que vem ao encontro dos anseios da melhoria da qualidade de vida nos espaços urbanos, do cuidado e respeito ao meio ambiente e que promove o re-conhecimento do valor econômico do ‘lixo’ abrindo espaço para novos negócios e inclusão social através do trabalho.

“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equili-brado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, é o que estabelece o Art. 225 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), e o que a Política Nacional do Resíduo Sólido (PNRS) incorpora por meio da correspon-sabilidade e gestão compartilhada entre o poder público e a sociedade (YOSHIDA, 2012), uma articulação a ser construída entre a sociedade civil, o poder público, o setor econômico-empresarial e a figura dos ca-tadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, inseridos nesse sistema por meio de cooperativas e associações (YOSHIDA, 2012; JURAS; ARAÚJO, 2012).

É nesse contexto de corresponsabilidade e gestão compartilha-da entre o poder público e a sociedade que desponta novas possibilida-des para a governança desses resíduos. A governança está relacionada com a coordenação de ações coletivas de diversos atores, que pode tomar diferentes formas de interação, em diferentes contextos com o objetivo de resolver problemas comuns.

O olhar teórico a conduzir o processo investigativo sobre a go-vernança de resíduos sólidos será o da Teoria da Prática. Mais precisa-mente, o da Teoria da Prática Social que tem no filósofo Theodore R. Schatzki seu maior expoente.

A prática é concebida por Schatzki (2001, 2002, 2003, 2005 2006a, 2006b, 2010, 2012) como um conjunto de atividades humanas

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abertas, espaço-temporalmente dispersas, organizadas por um composto articulado de fazeres e dizeres incorporados, entendimentos práticos e gerais, regras e estruturas teleoafetivas entrelaçados a arranjos materiais. O compartilhamento de atividades humanas, por diferentes pessoas em diferentes lugares, é o que expressa o caráter social da prática.

A Teoria da Prática Social respalda-se em uma ontologia de-nominada site ontology ou ontologia local ou ainda ontologia do lugar, para a qual a vida social ou coexistência humana é inerentemente ligada ao tipo de contexto no qual ela ocorre. A ideia basilar desta ontologia está ancorada no conceito heideggeriano being-in-the-world (ser-no--mundo), significando que o mundo é tudo o que nos circunda, é o aqui e agora e que ser no mundo é estar imerso, inserido, ligado lite-ralmente ao mundo físico e tangível do dia a dia: é a vida experenciada; é estar sempre inter-relacionado e entrelaçado com diferentes pessoas e coisas, ambas engajadas em práticas materiais específicas. E é esse entre-laçamento com outras pessoas e coisas materiais que revela a forma mais básica do ser e a lógica da prática (HORNSBY, [s.d.]; SCHATZKI, 1988, 2010; SANDBERG; TSOUKAS, 2011).

O site ontology é uma ontologia contextual que têm como pre-missa a indissociabilidade entre o ser e o mundo e, nesse sentido, os fenômenos sociais só podem ser analisados através da análise dos lo-cais nos quais a convivência humana seja evidente. Por isso, o lugar da existência social pode ser compreendido como uma malha ou feixe de práticas e arranjos materiais (SCHATZKI, 2003, 2005).

Considerando que uma constelação é formada por feixes de prática-arranjos conectados a outros feixes diferentes de prática-arran-jos (SCHATZKI, 2011, 2015a) e que todo fenômeno social tem seu espaço objetivo (extensão espacial), o que difere os espaços ocupados por fenômenos amplos para os espaços ocupados por fenômenos pequenos é que os primeiros são modelados de forma distinta e mais distribuídos espacialmente que os segundos (SCHATZKI, 2015b).

Uma constelação local observa-se pelas ligações entre (i) fei-xes de práticas e arranjos materiais semelhantes ou não, (ii) entre prá-ticas e (iii) entre arranjos materiais configurados em formatos diversos,

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distribuídos espacialmente de formas diferentes, entretanto, delimitada por uma área geográfica onde se torna mais evidente o entrelaçamento da coexistência humana em um dado contexto. Nesta obra, o local como endereço geográfico da constelação refere-se ao espaço urbano e rural do município de Cascavel-PR.

Constelações conectadas a outras constelações formam um plenário de práticas (SCHATZKI, 2015a). A concentração de conexões, se mais densa ou mais distinta é o que caracteriza a existência de feixes de práticas e arranjos no plenário de práticas, assim como as conexões entre práticas, entre arranjos e entre práticas-arranjos podem ser carac-terizadas como um labirinto que forma uma ordem, uma matriz, que pode ser esparsa ou densa, mais compacta ou espalhada, contínua ou fugaz, e padronizada ou dispersa (SCHATZKI, 2016a).

Todas essas malhas, feixes, redes e constelações configuram ex-pressivas transformações na teia de práticas e ordens, cujo alcance mais amplo é coextensivo às dimensões espaço-temporal e socio-histórica, formando um nexo global, de imensa complexidade de práticas sobre-postas, que se interpenetram em um labirinto de forma assistemática e contingente (SCHATZKI, 2003, 2005).

Por ser a prática constituída por um conjunto de atividades humanas abertas, no sentido de serem várias atividades em execução ligadas por elementos comuns, orquestradas por entendimentos, regras e teleologias normativas e entrelaçadas a arranjos materiais, e por serem espaço-temporalmente dispersas imprime à prática uma impermanên-cia e lhe confere uma dinamicidade em resposta a eventos contingentes, o que a conecta com a inovação, seja ela relativa a “um produto [...], ou um processo, ou um novo método de marketing, ou um novo método organizacional nas práticas de negócio, na organização do local de tra-balho ou nas relações externas” (OCDE, 1997, p. 55).

A tecnologia representa a incorporação da materialidade da natureza na prática humana: objetos tecnológicos são também alte-rações das coisas naturais assim como as transformações de coisas naturais em artefatos, ou a reelaboração de artefatos já derivados da natureza (SCHATZKI, 2010).

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Essa impermanência da prática está estreitamente relacionada com a ideia heideggeriana do ser no mundo, do ser sempre em construção, sempre uma projeção do vir a ser e que afeta o espaço-tempo teleológi-co da atividade humana. O espaço teleológico é a arena ou contexto nos quais a convivência humana se realiza. O tempo teleológico é aquele no qual o passado, o presente e o futuro ocorrem juntos: a atividade humana é um agir em direção a um fim a partir de algo motivador, por isso seu caráter indeterminado, impermanente e a abertura para o novo, para o fazer diferente mais que para a reprodução da prática. “Até que a ação seja executada, nada pode garantir o que a determinou” (SCHATZKI, 2006, p. 161).

Esta obra apresenta a concepção seminal de governança sob a perspectiva da Teoria da Prática Social, revelando ser este um conceito plurilocal, ou seja, pode ser encontrado em vários lugares, como (i) na junção de vidas humanas e como se relacionam entre si, como (ii) em um fenômeno de feixes e constelações, assim como constituindo (iii) o plenário de práticas, do qual o fenômeno governado também é parte e, como (iv) feixes especializados em governança, que são aqueles que sugerem ou impõem orientações sobre atividades a serem executadas pelos participantes dos feixes de práticas, ou como (iv) uma habilida-de de governança que determinados feixes alcançam, podendo tornar--se ou ligar-se a outros feixes para formar constelação de governança (SCHATZKI, 2015a).

Nesse contexto teórico, este livro emerge do entrelaçamen-to (Figura 1) entre a Teoria da Prática Social, a Sustentabilidade, a Governança e a Inovação para responder a seguinte pergunta de Pesquisa: Como se desenvolvem as práticas inovadoras de governan-ça na constelação local de resíduos sólidos no âmbito do município de Cascavel, Estado do Paraná?

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FIGURA 1 - ENTRELAÇAMENTO TEÓRICO DA OBRA

Fonte: Elaborado pela Autora (2016)

Importante ressaltar que a Teoria da Prática Social não é uma teoria acabada, ao contrário, é uma teoria em construção procurando contribuir com outras teorias sobre como a Teoria da Prática Social entende determinados aspectos, estabelecendo aproximações com, por exemplo, (i) o mundo das artes, ao mostrar a arte como uma constelação de feixes de práticas-arranjos materiais e contextualizando conceitos te-óricos à temática (SCHATZKI, 2014a); (ii) com o campo dos negócios e das organizações (ORR et al., 2016); com (iii) o campo de estudos do consumo sustentável, abordando a emergência, persistência e dis-solução de práticas em direção a adoção de práticas mais sustentáveis (SCHATZKI, 2013); e com aproximações com o campo da (iv) sus-tentabilidade(SCHATZKI, 2015a) e, principalmente, para esta obra, com a (v) governança (SCHATZKI, 2015a).

Considerando essas especificidades da Teoria da Prática Social a escolha metodológica por uma abordagem qualitativa do problema se apresentou como uma alternativa evidente.

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O Objetivo geral da pesquisa é compreender como se desen-volvem as práticas- arranjos e os feixes relativos à gestão de resíduos sólidos no município de Cascavel, centralizando o olhar para as práti-cas inovadoras de governança. O conhecimento empírico é fundamen-tal para identificar as práticas e seus respectivos feixes e para compre-ender, por meio da análise das relações entre práticas (acionadas pelos atores envolvidos) e das versões da estrutura de governança da prática, como a governança de resíduos sólidos se configura, destacando suas ações inovadoras.

Os objetivos da pesquisa, o geral e os específicos, em sua inte-gralidade, são apresentados no Capítulo 3, Metodologia.

1.2 JUSTIFICATIVA TEÓRICA E PRÁTICA

A justificativa teórica principal deste livro se fundamenta pela inclusão da perspectiva da Teoria da Prática Social ao estudar o fenô-meno social escolhido: governança de resíduos sólidos. Tanto a Teoria da Prática Social quando a governança são temas pouco explorados pela academia, e quando associados não foram encontradas evidências de estudos publicados.

A Teoria da Prática Social, que tem em Schatzki seu autor semi-nal, ainda está em construção, entretanto apresenta uma base ontológica que respalda teoricamente os conceitos que orientam a investigação do fenômeno social eleito. A governança é um conceito que têm emergido nas últimas duas décadas distanciando-se da conotação governamental para incluir a participação de diversos atores em direção à solução de problemas comuns, movimento este em sintonia com outras mudanças sociais ao redor do mundo, que abraça a participação, a responsabilidade e a construção coletiva.

O entendimento ontológico do ser como constituindo o mun-do entrelaçado com a materialidade, por meio da experiência vivida sen-do parte indissociável das práticas que realiza na convivência humana e, portanto, responsável pelo que faz, torna-se um ponto de ligação com o paradigma da sustentabilidade para o qual a ação coletiva é tão impor-

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tante quanto a individual e para o qual as responsabilidades são indivi-duais e são compartilhadas coletivamente, como é o caso da gestão e da governança dos resíduos sólidos.

Pesquisa realizada em outubro de 2015 e janeiro de 2016 no acervo de bases do sítio de Periódicos da Capes envolvendo as bases1 Sage Journals, Science Direct, Scopus, Taylor & Francis Online, Web of Science e Wiley Online Library, adotando como critérios de busca (i) os artigos científicos publicados entre 2010 e 2015 e (ii) as palavras governance, solid e waste como parte do título, resultou em 08 (oito) pu-blicações, muitos deles presentes em mais de uma base, como demonstra o Quadro 1.

Quadro 1 - Publicações sobre Governança de Resíduos Sólidos

ArtigosSage

JournalsScience Direct

ScopusTaylor & Francis Online

Web of Science

Wiley online-Library

1. ADAMA, O. Urban gover-nance and spatial inequality in service delivery: a case study of solid waste management in Abuja, Nigeria, Waste Management & Research, v. 30, n. 9. p. 991-998, Sep. 2012. doi: 10.1177/0734242X 12454694.

X X

2. BHUIYAN, S. H. A cri-sis in governance: Urban solid waste management in Bangladesh, Habitat International, v. 34, n. 1, p. 125-133,Jan.2010. d o i : 1 0 . 1 0 1 6 / j . h a b i t a -tint.2009.08.002

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1 Nas bases ProQuest e Emerald Insight nenhum registro foi encontrado.

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ArtigosSage

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3. BJERKLI, C. L. Go-vernance on the Ground: A Study of Solid Was-te Management in Addis Ababa, Ethiopia, Interna-tional Journal of Urban And Regional Research, v. 37, n. 4, p. 1273-1287, Jul. 2013. Doi: 10.1111/j.1468-2427.2013.01214.x

X X X

4. LINDQVIST, K. Hybrid Governance: The Case of Household Solid Waste Management in Sweden, Public Organization Re-view, v. 13, I. 2, p. 143-154, 2013. Doi: 10.1007/s11115-013-0229-8

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5. BJERKLI, C. L. Urban Services and Governance: The Case of Solid Was-te Management in Addis Ababa, Ethiopia, Norsk Geografisk Tidsskrift- Norwegian Journal of Ge-ography, v. 68, n. 3, p. 195-196, May 2014.

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6. NZEADIBE, T. C.; AYADIUNO, R. U.; AKUKWE, T. I. Solid waste governance in Owerri urban area, Nigeria: problems and prospects, Waste Manage-ment, v. 30, n. 2, p. 355-357, Feb.2010. Doi: 10.1016/j.wasman.2009.11.009

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ArtigosSage

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7. NZEADIBE, T. C.; ANYADIKE, R. N. C. Solid Waste Governance Innovations: An Appraisal of Recent Developments in the Informal Sector Niche in Urban Nigeria, Geography Compass, v. 4, I. 9, p. 1284–1296, Sep. 2010. Doi: 10.1111/j.1749- 8198.2010.00385.x

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8. ZABALETA, I.; RO-DIC, L. Recovery of essen-tial nutrients from munici-pal solid waste - Impact of waste management infras-tructure and governance as-pects, Waste Management, v. 44, p. 178-187, 2015.

X X

Fonte: Elaborado pela autora (2016).

Adama (2012) estudou como as práticas de governança rela-cionadas a privatização e o papel regulatório do estado reforça as de-sigualdades espaciais na entrega dos serviços de resíduos sólidos em Abuja, Nigéria, sob a perspectiva de recuperação de custos. Bhuiyan (2010) revê o papel da governança de resíduos sólidos como é admi-nistrado pelos governos municipais de Bangladesh, diante do problema da descontinuidade da prestação desses serviços e aponta para o cresci-mento de iniciativas de base comunitária, privadas e organizações não governamentais que atuam para conservar esse serviço.

Bjerkli (2013) examina o gerenciamento de resíduos sólidos no período de 2004 a 2011, em Adis Abeba, na Etiópia, descrevendo a evolução do gerenciamento desses resíduos e mudança no relaciona-mento entre o setor informal e a autoridade local. Bjerkli (2014) objeti-va entender as razões da pobreza do gerenciamento de resíduos sólidos

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em Adis Abeba, Etiópia. Adota como fundamento teórico conceitos de governança e da política ecológica urbana e desenvolve um estudo etnográfico para investigar a percepção dos atores envolvidos no geren-ciamento de resíduos sólidos.

Lindqvist (2013) analisa a governança de resíduo sólido do-méstico na perspectiva da governança híbrida, que envolve diversas for-mas organizacionais, domínios jurisdicionais e stakeholders que nos âm-bitos público e privado, na cidade de Helsingborg, na Suécia. Zabaleta e Rodic (2015) procuram entender a relação entre o sistema municipal de gerenciamento de resíduos sólidos e componentes físicos e aspectos de governança em Vitória-Gasteiz, Espanha.

Nzeadibe, Ayadiuno e Akukwe (2010) examinam o estado do sistema de gerenciamento de resíduos sólidos dentro do sistema de go-vernança da cidade de Owerri, Nigéria. Nzeadibe e Anyadike (2010) abordam iniciativas de inovação social na governança de resíduos sóli-dos na Nigéria.

Nos 08 (oito) estudos mencionados acima, quatro deles se re-ferem a estudos desenvolvidos na África, dois na Europa e um na Ásia; seis deles focalizam o gerenciamento de resíduos sólidos em municípios e dois deles abordam nacionalmente o tema. Nenhum deles adota da te-oria da prática como referencial teórico. O artigo que mais se aproxima com o objetivo deste estudo é o de Bjerkli (2014).

Os mesmos critérios de período de publicação (2010-2015) e presença de palavras escolhidas no título foram utilizados na pesquisa no banco de teses e dissertação da Capes. Não há registro para as entra-das das seguintes palavras presentes no título: prática, governança, re-síduos, sólidos. Foi realizada pesquisa com vários arranjos de palavras a constarem no título, sendo que os resultados apontaram para: 01 traba-lho com prática de governança, mas relacionada à governança corpora-tiva; 01 para governança de resíduos sólidos, voltados para a governança socioambiental nos municípios da região da foz do rio Itajaí; 01 geren-ciamento de resíduo sólido em Sorocaba; 06 sobre gestão integrada de resíduos sólidos; 08 sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Ao total, foram 16 trabalhos, entre teses e dissertações que abordaram o tema dos resíduos sólidos nos últimos 6 anos. Resultados

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que mostram a ausência da abordagem das Teorias da Prática para in-vestigação desse fenômeno social ao mesmo tempo que indica a impor-tância da temática para a sociedade, sendo objeto de investigação no meio acadêmico.

Macrorie, Foulds e Hargreaves (2015) sugerem estudos na perspectiva da prática orientados para políticas de intervenção de modo de reconhecer a importância de oportunidades para criação e manuten-ção de práticas modificadas ao longo do tempo abordando como inter-venções geram reações, interações e resistência através do sistema de práticas, bem como priorizar o entendimento de fluxos e relações dentro e entre práticas em estudo. Recomendam também estudos que explo-rem alternativas internacionais e contextos culturais abordando assuntos como água, alimentos e resíduos.

Do ponto de vista prático, a relevância está no fato de que a gestão de resíduos sólidos é discutida por décadas. Entretanto, no Brasil, somente com a aprovação da Lei n. 12.305, de 2 de agosto de 2010, esta questão tornou-se relevante para política nacional do Meio Ambiente, estabelecendo, entre outros requisitos, que todos os municípios do país deveriam ter seus resíduos sólidos dispostos em aterros sanitários e um plano de gestão para estes resíduos.

No Paraná, em agosto de 2014, data final estabelecida em lei, somente 181 dos 399 municípios, ou seja, 45,36% cumpriram a meta de dispor os resíduos sólidos em aterros sanitários. Contudo, cabe ressaltar que a gestão de resíduos sólidos não se restringe a disposição em ater-ros sanitários. Ela tem início na educação ambiental para gerar mudan-ça de atitude e comportamento dos munícipes a fim de que o objetivo de dispor no aterro sanitário somente rejeitos seja alcançado. Além do mais, o compromisso de todos com a separação correta dos resíduos, sua disposição temporária até que a coleta seletiva seja realizada é funda-mental para os estes resíduos possam ser devidamente tratamos e pos-teriormente encaminhados para venda, para a logística reversa, para o reaproveitamento e outras destinações.

Tratar o lixo que não é lixo pode ser vantajoso economicamen-te e ter impacto social expressivo, pela possibilidade de inclusão social,

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empregando pessoas e gerando renda, abrindo novas possibilidades de negócios pela adoção de ecotécnicas, desenvolvimento de novas tecno-logias ambientais e de gestão que podem contribuir para que soluções a esse problema ambiental possam tornar-se relevantes nos âmbitos am-biental, econômico e social.

1.3 ESTRUTURA DO LIVRO

Este livro, além do Capítulo introdutório, é composto por mais oito Capítulos. A aproximação com a temática dos resíduos só-lidos impele à busca de seus pontos basilares, por isso emerge a dis-cussão sobre a crise ambiental ser também uma crise econômica, pro-dutiva e social, crise essa respaldada em um paradigma que coisifica o mundo e as pessoas, que dissocia os tempos históricos dos biológicos. Um novo paradigma enraizado na sustentabilidade apresenta-se como um caminho para olhar a questão de resíduos sólidos como prudência ecológica e eficiência econômica, pela economia dos recursos naturais, energéticos e produtivo. A seção seguinte contextualiza a Formulação do Problema de pesquisa tecendo considerações essenciais para a com-preensão dos assuntos associados à problemática, como governança, prática, inovação e constelação local. O Capítulo finaliza com a justifi-cativa teórica e prática da pesquisa.

O Capítulo 2 aborda os fundamentos teóricos do tema. Após breve contextualização sobre as abordagens teóricas da prática, este Capítulo é dedicado a Teoria da Prática Social, de Schatzki, iniciando com a discussão dos pressupostos ontológicos e seu posicionamento en-tre as ontologias contextuais. Na sequência, articula-se a ontologia e os elementos constitutivos da Teoria da Prática Social de modo a entender como as atividades humanas acontecem na prática. As duas seções finais abordam como a Teoria da Prática Social concebe a questão de amplos fenômenos sociais e governança, respectivamente.

A metodologia para o desenvolvimento da pesquisa é indicada no Capítulo 3, incluindo considerações sobre a atividade científica rela-

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cionada ao campo teórico da prática social, apresentamos na sequência, o problema, a tese provisória e as perguntas de pesquisa e os objetivos assim como as categorias analíticas e outros termos relevantes para esta obra. As escolhas metodológicas pertinentes a essa proposta de pesqui-sa são expostas subsequentemente incluindo a delimitação, o design da pesquisa e os procedimentos de coleta, tratamento e análise de dados. O Capítulo encerra com as considerações sobre ética na pesquisa científica e limitações da pesquisa.

Na seção subsequente, no Capítulo 4, os mais diversos Feixes de Práticas de Resíduos Sólidos na constelação local de Cascavel são descritos e analisados embasados nas categorias analíticas, estabelecidas no Capítulo 3, Metodologia.

O Capítulo 5 traz a narrativa sobre a emergência e constituição das logísticas reversas encontradas na constelação local de Cascavel como Pilhas e Baterias de Uso Domiciliar, de Medicamentos, de Agrotóxicos, de Pneus, de Baterias Automotivas e de Embalagens de Lubrificantes. Antes, porém, são tecidas algumas considerações iniciais sobre os requi-sitos legais e modos de organização de sistemas de logística reversa com a finalidade de propiciar melhor entendimento sobre esses feixes.

A análise sobre as versões da estrutura de governança da práti-ca são descritas no Capítulo 6, considerando os dizeres dos entrevista-dos sobre os entendimentos práticos, as regras, a estrutura teleoafetiva e os entendimentos gerais que são elementos constituintes da estrutura de governança.

O foco do Capítulo 7 recai sobre as relações entre práticas-ar-ranjos, feixes e constelação. Diversos tipos de relações são analisados, in-cluindo as relações entre práticas e entre arranjos, as relações com outras práticas, as características das cadeias de ação e a dinâmica dos feixes na constelação local de resíduos sólidos em Cascavel finaliza o Capítulo.

No Capítulo 8, o relato é sobre as mudanças propiciadas pela go-vernança da prática consideradas inovadoras, que são aquelas evidenciadas por dizeres e fazeres que modificam, alteram ou criam práticas e arranjos ou alteram um ou mais de seus elementos constitutivos. São relatadas as inovações identificadas no período 2010 a 2016.

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Nas Considerações Finais, Capítulo 9, a primeira seção é dedi-cada à apreciação da temática. Na sequência, os objetivos e as pergun-tas de pesquisa são retomados no intuito de demonstrar o alcance dos objetivos específicos e geral e propor respostas às perguntas realizadas. O Capítulo se encerra com as considerações sobre as contribuições teó-ricas, metodológicas e práticas desta obra e com as recomendações para pesquisas futuras.

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CAPÍTULO 2 TEORIAS DA PRÁTICA

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A Practice Turn ou a virada das práticas vislumbra uma li-gação com a vida cotidiana (everday life) e com o mundo da vida (life-world)2, lidando com estas questões sob a perspectiva quali-tativa, influenciadas por teoria sociais culturais ou interpretativas e com base filosófica de referência em Wittgenstein e Heidegger3

(RECWITZ, 2002).Abordagens da prática examinam as coisas e os fazeres coti-

dianos das pessoas engajados ativamente dentro de um contexto situa-do espaço-temporalmente (SANDBERG; DALL’ALBA, 2009). Como coloca Gherardi (2009b, p. 536), “as práticas não são somente padrões de ação, mas também padrões recorrentes de ação sustentados socialmente (produção e reprodução)”, ou seja, as pessoas (re) produzem em suas prá-ticas situadas, tanto o trabalho quanto a própria sociedade. Contudo, as Teorias da Prática não repousam sobre o empirismo ingênuo de observa-ção e descrição do que as pessoas fazem; elas formam identidades, cons-troem significados, produzem e ordenam atividades; oferecem um novo olhar sobre o mundo social por meio de uma perspectiva performativa (NICOLINI, 2012).

Para Schatzki (2001), a virada da prática é um movimento das teorias sociais que, desde 1970, apadrinha uma ontologia social que abarca a corporeidade, a materialidade (componentes pós-humanos como artefatos e objetos não humanos) e suas interseções com as prá-ticas organizadas em torno de conhecimentos compartilhados, de ma-neira muito distinta de outras teorias sociais. Nicolini (2012) aponta o interesse crescente pela virada da prática por sua capacidade de sintoni-zar com o mundo contemporâneo de fronteiras tênues entre entidades, de fluxo intenso e cada vez mais interligado.

Nesse sentido, Sandberg e Dall’Alba (2009), Miettinen, Samra-Fredericks e Yanow (2009) e Nicolini (2012) destacam a adoção da perspectiva da prática por outros campos do conhecimento como estudos organizacionais, sociologia, antropologia, psicologia, educação, estudos de gênero, filosofia, ciências políticas, linguagem, cultura, consu-

2 Schatzki baseia-se no conceito heideggeriano ser-no-mundo (being-in-the-world) ao invés de mundo da vida (life-world), conceito husserliano. Ver Sandberg e Dall’Alba (2009).3 Refere-se às ideias iniciais de Wittgenstein e as mais recentes de Heidegger.

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mo, aprendizagem organizacional, gestão do conhecimento, marketing, estratégia, ciência e estudos tecnológicos como forma de entender a or-dem social, o fenômeno social e a ação humana de vários tipos.

A teoria da prática enquanto paradigma teórico apresenta um panorama com múltiplas origens e influências de forma que não há uma abordagem unificada, amplamente aceita pela maioria dos es-tudiosos (SCHATZKI, 2001; RECKWITZ, 2002; POSTILL, 2010; FELDMAN; ORLIKOWSKI, 2011; NICOLINI, 2012). Embora compartilhem semelhanças, as diferentes histórias, vocabulários e supo-sições básicas desfavorecem o surgimento de uma teoria da prática com-pleta, integral, marcando essa abordagem como uma complicada rede de similaridades e dissimiliaridades (NICOLINI, 2012). Reckwitz (2002) enfatiza a necessidade de uma elaboração mais sistematizada das teorias para que possa tornar-se uma alternativa às teorias sociais existentes.

Alguns conceitos básicos são congruentes, contudo divergin-do sobre as bases ou forma de entendimento desses conceitos, carac-terizando o campo como especialmente polissêmico (GHERARDI, 2009b). Por exemplo, a maioria dos teóricos concorda sobre o conceito de prática como arranjos de atividades, entretanto, conceitos sobre o que é atividade e o que as conectam variam; reconhece a dependência do conceito da atividade estabelecida sobre habilidades compartilhadas (conhecimentos profissionais, experiência) ou entendimentos incorpo-rados, contudo discorda sobre a necessidade de inserir outro conceito além dos entendimentos compartilhados para explicar a prática; assume a inclusão de atores não humanos nas atividades que se conectam dentro de uma prática, todavia a forma de apreensão desses arranjos materiais é entendida de diversas maneiras (SCHATZKI, 2001).

A convergência principal entre os teóricos da prática respalda sobre o conceito de práticas como atividades humanas incorporadas, mediadas4

por arranjos materiais e organizadas em torno de entendimentos práti-

4 Em sua Teoria da Prática Social, Schatzki (1988, 2001, 2003, 2005, 2006, 2010, 2011, 2015b) não usa o conceito de mediação no sentido de que a ação humana é mediada por arranjos ma-teriais. Para ele, a ação humana e arranjos materiais são sobrepostos, entrelaçados. A mediação se dá entre elementos materiais (artefatos, organismos, natureza, arranjos) e tecnologia (ver SCHATZKI, 2010). Para Schatzki, a ação humana é incorporada e direta no mundo, constra-tando com outras teorias da prática que legitimam o conceito mediação, como a encontrada em

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cos. Destaca-se nesse conceito a ênfase no entrelaçamento da atividade com o corpo humano, de modo a entender que corpos e atividades são constituídos dentro das práticas (SCHATZKI, 2001). Esse conceito também expressa uma distinta ontologia social, localizada nas práticas, diferindo de outras abordagens da teoria social centradas em textos e símbolos (RECWITZ, 2002), indivíduos, interações, linguagem, siste-mas de significados, mundos de vida5, instituições/papéis, estruturas ou sistemas para definir o que é o social (SCHATZKI, 2001).

O campo de práticas (field of practices) é a totalidade de ligações de práticas humanas interconectadas. Sua demarcação alcança todas as análises que desenvolvem uma descrição ou explicação de práticas (ou de algum de seus subdomínios) ou trata o campo de práticas como o lugar de estudar a natureza e transformação do assunto em questão. A teoria da prática tem como unidade de análise a prática (SCHATZKI, 2001).

Todo campo do conhecimento científico estabelece conceitos associados ao objeto de estudo com a finalidade de estabelecer um foco, ressaltando que os conceitos não podem ser entendidos de forma iso-lada. Alguns dos conceitos e vocábulos adotados pela Teoria da Prática Social6, além da própria prática, são: atividade humana, ação, fenômeno social, agência, ator, corpo, praticante, entidade, convivência humana, co-existência humana, dizeres e fazeres incorporado/corporificado, enten-dimentos práticos, entendimentos gerais, conhecimento, regras, normas, ordem, performance, desempenho, execução, artefatos, arranjos materiais, materiais, tecnologia, estrutura teleoafetiva, significado, emoção, inte-gibilidade, integibilidade prática, orquestração, governança, estrutura da prática, espaço, espaço sóciotemporal, local, lugar, layout, configura-ção, malha, feixe, rede, nexo, constelação, ligação, conexão, sobreposição, trançado, entrelaçado, mudança, ciência, poder, linguagem, instituições, contexto histórico, contexto situado, transformações histórias.

Vygostki, fundada no entendimento de que a relação entre o indivíduo e o mundo é uma relação indireta, mediada por instrumentos e signos, sendo que estes é que permitem a transformação do objeto (ZDEPSKI; BULGACOV, 2014). Para Caldwell (2012), Schatzki apresenta “um profundo ceticismo sobre todas as categorias de mediação relacional e interacional”.5 Schatzki rejeita o conceito de mundo de vida (life-world), cuja base é fenomenológica, na Teoria das Práticas Sociais por contrariar os fundamentos ontológicos que adota.6 Conceitos e vocábulos baseado em Schatzki.

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A institucionalização do campo por meio de divulgação con-centra-se no meio acadêmico, com publicação de estudos teóricos e pesquisas empíricas em eventos e revistas científicas e conferem à abor-dagem da prática visibilidade, legitimidade e oportunidade de sedimen-tar-se como campo científico do conhecimento.

Entre os expoentes da Teoria da Prática estão Pierre Bourdieu, Anthony Giddens, Hubert Dreyfus, Charles Taylor, Michel Foucault, Harold Garfinkel, Judith Butler, Bruno Latour, Jean-François Loytard, Andreas Reckwitz, Elizabeth Shove, Stephen Kemmis e Theodore Schatzki (SCHATZKI, 2001; RECKWITZ, 2002).

Postill (2010) vislumbra duas gerações de teóricos da práti-ca. Os da primeira geração estabeleceram os fundamentos da Teoria da Prática, considerando o corpo humano enquanto ligação do engajamen-to prático das pessoas com o mundo. São representantes desta geração Bourdieu (1977), Foucault (1979), Giddens (1979, 1984), e Certeau (1984). Os da segunda geração continuaram a enfatizar o corpo huma-no para a prática, incluindo também aspectos culturais e históricos, além de desenvolver novos conceitos e aplicando conceitos da prática em no-vas áreas, como estudos sobre consumo, teoria organizacional, cultura material da família, ou neurociência. Esta geração tem como represen-tantes Ortner (1984), Reckwitz (2002), Warde (2005), Schatzki (1996) e Schatzki, Knorr Cetina e von Savigny (2001). Postill (2010) sugere Schatzki como a figura mais relevante dessa segunda fase dos teóricos da prática, ainda que sua teoria não esteja finalizada, como considera Nicolini (2012).

Orlikowski (2010) e Feldman e Orlikowski (2011) posicionam as teorias da prática como uma abordagem específica para o entendi-mento do mundo, situando três formas de conduzir os estudos da prá-tica, como (i) fenômeno ou estudos empíricos, como (ii) perspectiva ou foco teórico e como (iii) filosofia, comentadas a seguir.

Como fenômeno ou estudo empírico preocupa-se com o coti-diano da vida organizacional, com o que acontece na prática em oposi-ção ao que é esperado em relação à teoria. Enfoca como as pessoas agem no contexto organizacional, incluindo as rotinas e formas improvisadas

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de ação, destacando a contingência, a complexidade, a interdependên-cia e a emergência presentes na realidade organizacional. Estudos desse tipo requer um engajamento do pesquisador em campo, utilizando mé-todos como observação, participante ou não, pesquisa-ação, etnografia e etnometodologia. Contudo, a pesquisa empírica não precisa necessaria-mente estar vinculada a alguma teoria da prática ou com sua ontologia.

Como perspectiva ou foco teórico, o estudo da prática é traça-do mediante uma opção teórica envolvendo algum fenômeno sem, con-tudo, estar vinculado necessariamente a alguma escolha ontológica da prática. A dinâmica da atividade cotidiana, como é gerada e executada em diferentes contextos e tempos é articulada com conceitos fundamen-tados na teoria da prática escolhida, como ação incorporada, mediação material, ação de estruturas sociais, entre outros. A prática é a unidade central de análise para entender a organização, examinando os recor-rentes fazeres e dizeres dos atores, como moldam e são modelados pe-las condições estruturais e suas consequências. Escolhas metodológicas sobre a delimitação do estudo devem ser feitas sobre atores, objetivos, atividades, estruturas políticas, culturais e institucionais, entre outros.

Como filosofia, centra-se no papel constitutivo da prática em produzir a realidade social, focaliza o social como um campo de práticas incorporadas e materialmente entrelaçadas. Nesse sentido, a vida social é constituída nas atividades da vida cotidiana, na prática. A filosofia da prática social traz implicações epistemológicas para as ciências sociais, principalmente, ao questionar a epistemologia representacional, a qual acredita na ontológica distinção entre representação e o que se professa representar. Já a epistemologia performativa, afinada com a ontologia da prática, professa que o conhecimento advém de um direto engajamento material com o mundo, o que implica atuar diretamente sobre ele, ou seja, produzir realidade.

Essas escolhas de abordagem da prática não são mutuamente exclusivas, mas podem ser entendidas como formas diferentes da prá-tica apresentar o mundo. Neste estudo, a postura filosófica é diretriz na condução da pesquisa empírica.

Esta obra adota primordialmente a Teoria da Prática Social e o site ontologia como foram articulados e desenvolvidos por Schatzki,

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escolha esta que encontra respaldo nos divergentes fundamentos onto-lógicos que sustentam as diversas teorias da prática. As bases filosóficas mais expressivas na Teoria da Prática Social de Schatzki são encontra-das em Heidegger e Wittgenstein.

Após esta breve contextualização sobre as abordagens teóri-cas da prática, este Capítulo é dedicado a Teoria da Prática Social, de Schatzki, iniciando com a discussão dos pressupostos ontológicos e seu posicionamento entre as ontologias contextuais. Na sequência, articula--se a ontologia e os elementos constitutivos da Teoria da Prática Social de modo a entender como as atividades humanas acontecem na prática. Equivocadamente a teoria da prática tem sido percebida como aplicável a fenômenos localmente situados, de pequena amplitude, no entanto, essa visão é elucidada na seção Teoria da Prática Social e Fenômenos Sociais amplos. Finalizando, aborda-se um tema emergente na teoria da prática: a governança.

2.1 PRESSUPOSTOS ONTOLÓGICOS

A ontologia, palavra de origem latina, significa estudo do ser. Tem como objeto de estudo a natureza do ser, da realidade, da existência dos entes e das relações do ser enquanto ser, ou seja, trata das concep-ções da realidade, caracterizando-a por meio de categorias essenciais e estabelecendo as relações que estas mantêm entre si. Em seu significado geral refere-se à maneira como o mundo é e a forma como as coisas são, enfim, como percebemos o mundo e seus fenômenos (CILLIERS, 2007; JAPIASSÚ, 2008; SACCOL, 2009; SIGNIFICADOS, 2015).

Questões ontológicas sobre a existência de um mundo inde-pendente das percepções e construções mentais, ou se o mundo existe a partir da percepção que dele temos, ou se o mundo é percebido como resultado do compartilhamento de significados criados em instância co-letiva, caracterizam, respectivamente, uma ontologia realista, subjetiva e intersubjetiva (SACCOL, 2009).

Em ciências sociais pode-se adotar qualquer uma das ontolo-gias citadas, embora não se restrinjam a estes três tipos. Uma ontologia

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social tem como foco a compreensão da natureza do social ou carac-terísticas básicas, questionando o que é sociabilidade, em que e de que consiste o social e quais as estruturas ou componentes de fenômenos sociais (SCHATZKI, 2003, 2010). Schatzki é explícito ao declarar que, de acordo com sua visão ontológica, a natureza da “realidade social é o concreto, a realidade empírica da vida social” (SCHATZKI, 1988, p. 242), é “a experiência vivida no mundo” (SANDBERG, 2005).

Esta realidade social baseada no conceito being-in-the-world, de Heidegger, é entendida como a inter-relação de diferentes pessoas existindo em mundos interconectados, ou para dizer de outra forma, são vidas inter-relacionadas em curso (SCHATZKI, 1988). O mundo, para Heidegger, é aqui, agora e tudo o que nos circunda, e ser-no-mundo é estar ligado, inserido e imerso, literalmente, no mundo físico e tangível do dia a dia (HORNSBY, [s.d.]). A materialidade (propriedades físicas de artefatos, humanos e organismos) é parte da sociedade assim como a natureza (SCHATZKI, 2010), de modo que sujeito e objeto existem dentro de cenário social e histórico e são indissociáveis (NICOLINI; GHERARDI; YANOW, 2003).

Esse entendimento de ser-no-mundo estabelece que a forma mais básica do ser é o entrelaçamento (entwinement), significando que nunca estamos separados, mas sempre já entrelaçados com outras pessoas e coisas em mundos de prática sociomaterial específicos (SANDBERG; TSOUKAS, 2011).

“Para ser-no-mundo é realizar continuamente ações em ambien-tes interligados e conectados com o que faz sentido fazê-lo” (SCHATZKI, 1988, p. 244). Para Heidegger, ser- no-mundo é agir e quando uma pessoa age, ela já está situada em circunstâncias mundanas particulares do mun-do, no contexto do qual ela procede (SCHATZKI, 2006b).

Nesse sentido, Heidegger revela que a maneira mais fundamen-tal de se relacionar com o mundo é a de existir, é ser-no-mundo; é o ser ontologicamente enraizado no mundo, contrapondo outras ontologias que assumem a desconexão entre os seres sencientes e o mundo, ao qual logo após se tornam conectados de maneira contingente. Um dos filósofos que influenciou essa visão foi Descartes (2000) ao dicotomizar mente e

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corpo, enfatizando a identidade do ser na mente e não em seu organismo total (corpóreo), desloca o ser do seu logos material e como consequência seu entrelaçamento com o mundo. Ele passa a ser considerado algo a ser manipulado, submetido aos interesses da mente racional.

O entrelaçamento de nós mesmos com os outros e com as coi-sas do mundo é que dão sentido ao dizer que já estamos engajados em específicas práticas materiais e revela que o entrelaçamento constitui a lógica da prática. Assim como revela que nosso entrelaçamento com o mundo é antecedente à relação epistemológica entre sujeito e objeto (SANDBERG; TSOUKAS, 2011).

Ontologias7 sociais podem ser divididas em dois campos: in-dividualistas e não individualistas. As ontologias individualistas consi-deram que os fenômenos sociais são uma amálgama de construções de ações, estados mentais (algumas abrangem relações) de pessoas indivi-duais contextualizadas dentro de outras vidas formando um tecido cir-cundante de indivíduos inter-relacionados, configurando um contexto que é dependente dos recursos disponibilizados por esses atores, nesse sentido, os fenômenos sociais podem ser decompostos em e explicado por propriedades de pessoas individuais.

Assim, o contexto que os individualistas reconhecem não são os locais: as pessoas não fazem parte deles. Nesse sentido, enquadra--se como uma ontologia individualista: o construcionismo social, para os quais os fenômenos sociais consistem de indivíduos e suas relações; o institucionalismo, o qual baseado no compartilhamento intersubje-tivo de significados, de crenças e de atitudes possibilita o surgimento de fenômenos sociais objetivados, permitindo uma construção social da realidade; a teoria escolha racional na teoria organizacional (Herbert Simon); o interacionismo (Barry Barnes) (SCHATZKI, 2001, 2003, 2005; GERGEN; GERGEN, 2010; BERGER; LUCKMANN, 2012).

As ontologias sociais não individualistas, por sua vez, consi-deram que algo a mais abarca os fenômenos sociais e estes não podem ser reduzidos a uma análise individualista. Este algo a mais são compo-

7 Schatzki (2003, 2005) não faz distinção conceitual entre ontologia e epistemolo gia em seus tex-tos; pronuncia a ontologia da Teoria da Prática Social e mantém-se mudo quanto à epistemologia.

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nentes e dimensões da vida social, que determinam, às vezes, de forma causal ou capacitacional ou constrangededora, ações e estados mentais de indivíduos, qualificando de certa forma o contexto de vida dos indi-víduos, de forma que os fenômenos sociais não podem ser decompostos em recursos individuais, porém podem ser adequadamente analisados e explicados somente com referência a fatos e características relativas a um conjunto de pessoas como grupos, por exemplo, em oposição a pes-soas individuais. Entre estas ontologias estão aquelas que enfatizam a totalidade (holismo), fatos sociais (sociologia de Durkheim8), estruturas abstratas (estruturalismo de Lévi-Strauss), modos de produção (Marx), sociedades inteiras (Malinowski), discursos (Foucault) (SCHATZKI, 2002, 2003, 2005).

Entretanto, as ontologias contextuais têm como ponto de en-contro com ontologias não individualistas (i) a dimensão do social como o local no qual os indivíduos agem e se relacionam, e (ii) em discor-dar do individualismo quando este contextualiza ações, estados mentais e relações dos indivíduos dentro de um cenário social mais amplo. E compartilha com ontologias individualistas o entendimento de que (i) a vida social expressa pelo inter-relacionamento humano é semelhante ao conceito de convivência humana e de que (ii) a ação particular dos indivíduos (isolados ou combinados) é a principal força causal em ação importante socialmente. De forma que as ontologias contextuais alegam que a convivência humana se revela como parte de um contexto mais amplo e que não podem ser tratada apenas como características de indi-víduos inter-relacionados (SCHATZKl, 2003).

Site ontology ou ontologia do lugar, também denominada de ontologia local, é uma abordagem de ontologia social não individualista que sustenta que a vida social ou coexistência humana é inerentemente ligada ao tipo de contexto no qual ela ocorre, o que a designa como uma ontologia contextual. As ontologias contextuais têm como premissa a indissociabilidade entre o ser e o mundo. Parte do pressuposto que a

8 Em Schatzki (2003) a sociologia de Durkheim (fato social) é considerada não individualista; em Schatzki (2005), o fato social, em última análise, é visto como consistindo em uma explica-ção sobre as pessoas (individual ou em grupo).

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vida social existe e acontece inserida em um dado contexto, de modo que a vida social e o contexto sejam imbricados, entrelaçados, sobre-postos, de forma a entender que as características individuais são onto-logicamente contínuas às características do contexto social no qual elas existem. Nesse sentido, os fenômenos sociais só podem ser analisados através da análise dos locais nos quais a convivência humana seja evi-dente (SCHATZKl, 2003, 2005).

O termo ‘local’ não se refere somente à dimensão espaço-tem-poral, ou seja, à referência espacial, geográfica onde fenômenos e acon-tecimentos existem ou ocorrem, ou à sua localização temporal, onde o fenômeno se realiza no tempo do relógio, nos eventos do cotidiano, mas também incluem (i) o espaço-tempo teleológico da atividade humana relacionados a uma hierarquia de fins e de objetivos, e (ii) as configu-rações de lugares, arranjos físicos e caminhos nos quais ela se realiza (SCHATZKI, 2002, 2003, 2005, 2006b).

O tempo teleológico da atividade humana não é o tempo que ordena eventos. É o tempo em que passado, presente e futuro ocorrem juntos. Schatzki (2006b), inspirado no conceito de Heidegger sobre o ser no mundo, considera que o ser humano está sempre em construção, é sempre uma projeção do que pode vir a ser, de forma que sempre está agindo em direção a um objetivo, a um fim, e esta é a dimensão futura da atividade. Entretanto, este agir parte de algo dado que é considerado interessante e importante para a pessoa, é o que o motiva a agir, sendo esta, então, a dimensão passada da atividade. A dimensão presente da atividade é a atividade por si mesma. Portanto, o tempo da atividade é um agir em direção a um fim a partir de algo motivador. Nesse sentido, a atividade humana é um fenômeno teleológico.

O espaço teleológico é o lugar onde as atividades humanas ocorrem; é a arena, o contexto, ou conjuntos mais amplos de fenômenos como parte do que qualquer coisa existe ou ocorre. Por contexto pode ser entendido entidades humanas e não humanas, eventos, atividades, ações, significados, conhecimento, entre outros (SCHATZKI, 2002, 2003, 2005).

A ideia basilar do local como constituição do social decorre do pensamento de Heidegger que considera espaços como especialmen-

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te talhados para ser onde, e como partes do qual, entidades existem e eventos ocorrem. Esses espaços são espaços de ser e de integibilidade, nos quais as coisas são cheias de significado, são onde as pessoas são e agem; são onde os seres humanos vivem suas vidas, onde as ativida-des humanas se desenrolam, sendo estas partes intrínsecas das práticas sociais, não sendo necessário que este local ou contexto seja espacial (SCHATZKl, 2002, 2003, 2005).

O espaço ou lugar do social é conceituado como nexos de práticas que transportam espaços de integibilidade, considerando o social como arenas sociais de ação que são infiltrados por um espaço de significado em cujos termos as pessoas vivem, interagem e coexiste intelegivelmente. Portanto, não é possível considerar que este espaço de compreensão seja entendido como uma propriedade ou conjunto de propriedades de pessoas individuais (SCHATZKI, 2002, 2003, 2005).

Muitos autores compartilham essa visão heideggeriana das on-tologias contextuais, considerando práticas como arenas coletivas (en-volvem diversas pessoas) e sociais (comuns a essas pessoas) de ação, que são permeadas por um espaço de significado no qual as pessoas vivem, interagem e convivem de forma inteligível, como: Taylor (1971), com o conceito de espaços semânticos; Bourdieu (1990), com campos de ati-vidade; Giddens (1984), com a teoria da estruturação; Laclau Mouffe (1985), com campos discursivos; Spinosa, Flores e Dreyfus (1997), com mundos de práticas; Collins e Kusch (1998), fundamentados em Wittgenstein, com formas de vida. Inclui também práticas sociais de Schatzki (SCHATZKI, 2003, 2005).

O lugar da existência social pode ser compreendido como uma malha9 de práticas e arranjos materiais (SCHATZKI, 2003). A base on-tológica desta obra é a ontologia da prática social (SHATZKI, 2001, 2002, 2003, 2005).

9 O vocábulo malha (mesh) é encontrado em Schatzki (2003, 2005). Em trabalhos posteriores, predomina a aplicação do vocábulo feixes (bundles) (SCHATZKI, 2005, 2011, 2012, 2014b, 2015b). Em Schatzki (2005) os dois vocábulos podem ser encontrados.

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2.2 TEORIA DA PRÁTICA SOCIAL

“A realidade é constituída em organização de atividades e de integibilidade denominadas práticas” (SCHATZKI, 2002, p. 58). Todos os aspectos da prática realizam-se dentro de um nexo sobreposto e hie-rarquizado de conexões de campos sociais, de forma que a ordem social compõe um contexto no qual as práticas se tornam evidente. Cabe des-tacar que práticas e ordens10 não são ontologicamente distintas, elas são cocontextuais (SCHATZKI, 2002, 2005).

Schatzki (2003, 2005) articula a ontologia das práticas11 sociais partir do pressuposto de que a convivência humana se desenrola e acon-tece em um contexto social constituído por uma malha articulada de práticas e arranjos materiais.

Esse contexto social não se refere a propriedades espaciais, como uma localização particular em um espaço objetivo, geográfico, nas quais as ações constituintes da prática ocorrem. Pode ser amplamente entendido como uma arena ou conjunto de fenômenos que circunda ou absorve algo e que tem poderes de determinação com respeito a esse algo. Entretanto, as ações ocorrem em contexto espacial, e esse espaço objetivo da ação ajuda a determinar como e quais ações são executadas. As ações também apresentam uma dimensão temporal: elas ocorrem em contextos históricos, dependentes de tempos, lugares, tradições e even-tos contemporâneos (SCHATZI, 2005).

O site do social é uma malha ou feixe de práticas e arranjos ma-teriais. É nessa malha articulada, entrelaçada de práticas-arranjos mate-riais que entidades (humanas e/ou não humanas) agem, relacionam-se, posicionam-se, capacitam e constrangem umas em relação às outras e ganham significado e identidade (SCHATZKI, 2002, 2003).

A primeira dimensão do site do social é a prática. Por Práticas entendem-se as diversas ações estruturadas espaço-temporalmente (SCHATZKI, 2006) ou como atividades humanas organizadas re-

10 Ordem não deve ser entendida como regularidade, mas como arranjo de pessoas, artefatos e coisas (SCHATZKI, 2001, 2005).11 Schatzki (2010, p. 125) afirma que “ontologias são um tipo de teoria”.

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conhecidas, como práticas políticas, práticas econômicas, práticas de cozinhar, práticas educacionais, práticas de gerenciamento, práticas, práticas de venda de flores, práticas religiosas, práticas de governança (SCHATZKI, 2003, 2005, 2015a).

Cada prática, sendo uma rede de atividade organizada ou um conjunto de ações, exibe duas dimensões ou componentes: atividade e organização (SCHATZKI, 2005) ou ações e estrutura (SCHATZKI, 2006). Importante ressaltar que as atividades humanas que compõem as práticas não são um conjunto de ações regulares, ou seja, não formam regularidades, mas um campo de várias atividades em desenvolvimento ligadas por elementos comuns e orquestradas por entendimentos, regras e teleologias normativas (SCHATZKI, 2010). Esta concepção da im-permanência das atividades humanas sob o ponto de vista da Teoria da Prática Social evidencia a discrepância em relação a outras teorias que concebem prática como rotina ou padrão recorrente de ação.

De acordo com Schatzki (2002), práticas são feixes de ativi-dades hierarquicamente organizadas por um composto articulado de fazeres, dizeres, tarefas e projetos que constituem o fenômeno social. Outro conceito de prática é entendê-la como um encadeamento de fa-zeres e dizeres incorporados (ou ações que estes fazeres e dizeres cons-tituem), disperso espaço- temporalmente, e aberto. Aberto no sentido de que não é composto por um determinado número de atividades; disperso no espaço porque cada atividade acontece em um espaço ob-jetivo, e no tempo porque leva um tempo para ser realizada e pode ser encontrada dentro de uma dada sequência de ações (SCHATZKI, 2001, 2002, 2006).

O significado de fazer para Schatzki é o fazer humano incor-porado, corporificado. A materialidade, pelas propriedades físicas12 do corpo, como mãos, braços e olhos, é que permitem mediar práticas e outros materiais, organismos e natureza (SCHATZKI, 2010). Fazeres incorporados significa ações que pessoas desempenham diretamente como o corpo, incluindo próteses e com extensões (por exemplo, óculos,

12 A materialidade não se refere somente as propriedades físicas, mas também as químicas e biológicas de artefatos, natureza e humanos (SCHATZKI, 2010).

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bengala, salto alto) do corpo, e não se refere, portanto, a uma maneira de se fazer algo. Fazeres também é um subconjunto da categoria genérica ‘eventos’. Eventos são ocorrências inesperadas enquanto fazeres são per-formativos, executados, desempenhados. Fazeres implica que entidades (humanas, não humanas, organismos, artefatos, e coisas, individuais ou coletivamente) executem algo, dando início ou continuidade a uma ca-deia de ocorrências particulares (SCHATZKI, 2001, 2002).

Já dizeres se referem a o quê as pessoas dizem sobre alguma coisa, não se restringindo a linguagem (SCHATZKI, 2001, 2002). As práticas discursivas são entendidas, como formas de intervir e agir sobre o mundo, como outra forma de atividade social e material, de modo que a Teoria da Prática Social descentraliza a ênfase do textualis-mo em representar o mundo por meio de textos, sinais e comunicação (NICOLINI, 2012).

Schatzki (2002) esclarece a questão da agência humana, que pode ser entendida como algo contido nas práticas: os atos dos fazeres e dizeres constituem as ações que, por sua vez, compõem as práticas. O homo practicus é concebido, então, como portador de práticas, um corpo/mente que carrega e também realiza práticas sociais, diferentemente dos conceitos de homo economicus, concebido como um tomador racional de decisões, e de homo sociologicus, compreendido como um indivíduo segui-dor de normas e que desempenha um papel individual (RECKWITZ, 2002; NICOLINI 2012).

Os diferentes tipos de agência são os diferentes tipos de fazeres que as entidades apresentam. Os mais importantes para a vida social são o tipo causal e o tipo performativo. Fazer algo com causalidade é fazer acon-tecer ou dirigir algum aspecto de ordens e/ou práticas. Fazer algo performa-tivo é um agir situado por meio de dizeres e fazeres incorporados e também é uma execução da prática da qual faz parte (SCHATZKI, 2002).

Importa destacar que a ação humana também é social, visto que “as atividades (ou ações) e corpos são constituídos dentro da prática, o agir incorporado é onde a atividade e mente se encontram assim como o indivíduo e a sociedade, de forma que só podemos entender as ações dentro do contexto específico dessa prática” (SCHATZKI, 2001, p. 3).

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A prática sendo um conjunto de ações (fazeres e dizeres) é or-ganizada por uma união de quatro fenômenos: (i) entendimentos práti-cos, (ii) regras, (iii) estruturas teleoafetivas e (iv) entendimentos gerais13. É o que pode ser chamada de organização mental da prática ou sua estrutura de governança (SCHATZKI, 2001, 2002, 2003, 2005, 2006).

Os entendimentos práticos de ações constituintes de uma prática se referem aos conhecimentos conceituais e técnicos sobre as ações ou ati-vidades, às habilidades e às competências, ao know-how e demais conhe-cimentos inerentes a essas ações, enfim, envolve vários saberes. Envolve também não só o saber fazer e entender o que se pode fazer em uma dada circunstância, o que especificamente faz sentido fazer, mas também entender as ações dos outros, o que ajuda a determinar como responder ao outro. Importa ressaltar que os entendimentos são inerentes à prática e carregam a noção de ubiquidade: estão em toda parte, acessível a todas as pessoas e disponíveis em um espaço público (SCHATZKI, 2001, 2002, 2003, 2005, 2006a; SANTOS; SILVEIRA, 2015).

As regras dizem respeito a diretrizes explícitas (princípios, preceitos e instruções na forma de leis, normas, regulamentos, proce-dimentos, critérios de decisão, incluindo também censura, repreensão, conselho) que prescrevem, regulam, exigem, instruem ou organizam as atividades (o que deve ser feito, dito ou em que circunstância), enfim, instruções que os praticantes na prática observam ou negligenciam. Assim, as ações que compõem uma prática estão ligadas através do con-junto de regras a serem consideradas ou não, mais precisamente, pela compreensão destas regras que as ações expressam (SCHATZKI, 2001, 2005, 2006a; SANTOS; SILVEIRA, 2015).

Práticas ancoram um conjunto de regras que se presume que os praticantes atenderão. Entretanto, essas regras somente esporadicamen-te e nunca incondicionalmente determinam especificamente o que as pessoas fazem. Quem desempenha esse papel é a integibilidade prática.

“A integibilidade prática é determinada teleologicamente e afetivamente” (SCHATZKl, 2001, p. 60). A teleologia é orientada aos

13 Em Schatzki, 2006a.

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fins enquanto a afetividade é orientada pela significância e importância das coisas. Por exemplo, a maneira como uma pessoa procede motivada por determinados fins está atada por suas crenças, esperanças e expec-tativas. Ou seja, as pessoas não agem desconectadas de suas emoções e de seus objetivos. “A integibilidade prática é o que faz sentido para um ator fazer [...] é determinada por um conjunto de fatores determinantes de integibilidade como: finalidade, ideias (incluindo conceitos e pensa-mentos), importância, conhecimento, tarefas e projetos, regras, paradig-mas, costumes e cenários” (SCHATZKI, 1988, p. 244-245).

Nesse sentido, a integibilidade prática governa as ações (os fa-zeres e os dizeres incorporados) de uma dada prática, porém ela é deter-minada em função das estruturas teleoafetivas da própria prática e dos diferentes arranjos materiais (SCHATZKI, 2002).

A estrutura teleoafetiva constitui uma gama normativa, hierar-quicamente ordenada de fins, projetos, ações, tarefas, talvez emoções, e uso (de coisas) aceitáveis ou corretos aliada à também aceitáveis e cor-retas crenças de que tais tarefas específicas são adequadas para alcançar tais objetivos, incluindo até mesmo emoções aceitáveis ou corretas para desempenhá-las (SCHATZI, 2001, 2002, 2003, 2005, 2006a).

Para Schatzki (2012) o componente afetivo de uma estrutura teleafetiva abrange as emoções e os humores das pessoas que exercem uma prática devem ou podem expressar de forma aceitável. As práticas variam quanto à robustez ou intensidade de sua organização afetiva.

Os entendimentos gerais referem-se a entendimentos abstra-tos e valorativos em relação às coisas, compreensão que se tem sobre o trabalho, sobre a adequação das interações sociais, ou sobre o comparti-lhamento do acaso (SCHATZKI, 2006a).

Ao contrário dos entendimentos práticos que são relaciona-dos à ação e aos fins almejados, os entendimentos gerais são percepções abstratas relativas à beleza, à natureza, à nobreza, ao mérito, ao valor, ao lugar das coisas, entre outros, que inspiram e são expressas nos dizeres e fazeres das pessoas (SCHATZKI, 2001, 2012).

A estrutura de governança da prática como ações, entendimen-tos, regras, desejos e emoções não são agregados das propriedades de in-

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divíduos específicos. Entretanto, são fenômenos mentais essenciais para a elaboração da ordem dentro das práticas.

As ações que compõem uma prática são, certamente, executadas por indivíduos específicos. Mas a organização de uma prática não é um conjunto de propriedades de indivíduos específicos. A prática é organizada por um conjunto de inteligibilidades, regras, fins, projetos e por coisas consi-deradas importantes. Estes elementos são incorporados de formas diferen-tes pelas mentes dos praticantes, no sentido de estarem contidos em estados mentais (condições de vida) das pessoas, como seus entendimentos, desejos, crenças e emoções (SCHATZKI, 2001, 2002, 2003, 2012).

Nesse sentido, pode-se dizer que a organização de uma prática pode ser retratada como uma mente objetiva, uma matriz normativa de estados mentais (ou estado de organização mental), não sendo, portanto, estados de indivíduos particulares. Esta mente objetiva é constituída por características da prática, expressa nas infinitas ações que compõem a prática. Os praticantes possuem versões dessa matriz, da qual, por meio de formação e de aprendizagem, podem chegar a ter versões aproxima-das, mas nem individualmente nem a totalidade das versões particulares alcança a diretriz normativa dessa matriz ou da mente objetiva da prá-tica (SCHATZKI, 2005).

De modo a dizer que ações particulares são ligadas por esses fenômenos é dizer que estas ações expressam os mesmos entendimentos, observam as mesmas regras, ou buscam objetivos e execução de projetos e que esses elementos são da mesma ordem normativa e teleológica/afe-tiva, consideradas aceitáveis ou prescritas para participantes da prática em questão (SCHATZKI, 2001, 2002, 2003, 2012).

Essa distinção entre a matriz organizativa da prática e as ver-sões que participantes dela têm reafirma que a organização da prática é “lá fora”, na prática, e que as diferentes versões de partes da prática são “aqui dentro”, nas mentes de diferentes indivíduos (SCHATZKI, 2003).

Os arranjos materiais são a segunda dimensão do site da vida so-cial, porque nela também se encontra a convivência humana (SCHATZKI, 2002, 2003, 2005). Qualquer entidade que é um elemento de arranjos como parte do qual a coexistência humana acontece é também uma enti-

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dade social, logo, a materialidade está entre os elementos constitutivos da coexistência e do fenômeno social (SCHATZKI, 2010).

Arranjos materiais é um conjunto interconectado de entidades ma-teriais (SCHATZKI, 2005, 2010), que podem ser “diferenciados em quatro tipos: humanos, artefatos, organismos e coisas da natureza” (SCHATZKI, 2010, p. 129). Constituem cenários nos quais as pessoas, artefatos, orga-nismos e coisas da natureza coexistem, se posicionam e se relacionam de maneira específica e ganham uma dada identidade (pessoas) e um dado significado (demais elementos). Exemplos de arranjos materiais são: layouts (arranjos físicos), networks e artefatos (SCHATZKI, 2005).

Todo fenômeno social demonstra uma intrincada rede de práti-ca, tecnologia e materialidade. Muitos fenômenos sociais evidenciam uma mediação mutualmente complexa e dependente entre práticas humanas, tecnologia e materialidade, incluindo a natureza (SCHATZKI, 2010).

Práticas e arranjos são interconectados. Enquanto as práticas executam, usam, reagem e dão significado as ações e são inseparáveis das entidades que a compõem, os arranjos induzem, pré-configuram e indicam previamente o caminho das ações (SCHATZKI, 2015a, 2016). Em uma malha de práticas-arranjos as práticas são realizadas em, e de-terminantes de, arranjos específicos. Além disso, as práticas também são dependentes de, e alteradas por, arranjos específicos. Nesse sentido, as práticas, os arranjos e a malha estão intrinsecamente entrelaçados (SCHATZKI, 2005), e co-constitutivos (SCHATZKI, 2010).

A tecnologia representa a incorporação da materialidade da natureza na prática humana: objetos tecnológicos são também altera-ções das coisas naturais, transformações de coisas naturais em artefa-tos, ou reelaboração de artefatos já derivados da natureza (SCHATZKI, 2010, p. 137-138). A tecnologia é essencial e intrinsecamente entranha-da em muitas práticas e pode mediar práticas humanas e materialidade, assim como práticas orquestram tecnologia e materialidade-natureza, e materialidade-natureza possibilita relações entre práticas humanas e tecnologia (SCHATZKI, 2010).

A materialidade, como parte da sociedade, advém de três for-mas: (i) em seu aspecto físicos, determina a localização dos elementos dos

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arranjos no espaço e tempo; (ii) quanto a composição física de seres hu-manos, artefatos, organismos, e coisas da natureza, estruturando ações que podem ser realizadas, quando, onde, e para quais fins, além de contribuir para a longevidade dos arranjos; e (iii) fluxos biológicos e físicos atraves-sam e são mediados por feixes de prática-arranjos (SCHATZKI, 2010).

Os arranjos não somente são estabelecidos dentro de práticas individuais, mas também atravessam ações e organizações de outras prá-ticas quando indivíduos que executam diferentes práticas interagem e formam um arranjo comum ou quando cadeias de ações atravessam di-ferentes práticas e ativam arranjos que abarcam outras cadeias conexas (SCHATZKI, 2005). Portanto, “práticas são inter-relacionadas e arran-jos são conectados” (SCHATZKI, 2006a, p. 1864). E práticas e arranjos são interconectados (SCHATZKI, 2016a).

Schatzki (2001, 2010, 2012) enfatiza que as práticas estabele-cem a ordem social, primeiro porque ajudam a moldar a integibilidade prática que governam as ações de seus praticantes e, segundo, porque ajudam a determinar quais arranjos as pessoas devem produzir. Como foi colocado anteriormente, a ordem social e o fenômeno social têm a mesma origem ontológica. Para Schatzki (2005), qualquer fenômeno social é consequentemente uma parte desta rede de prática-ordem que tudo abrange e no qual a coexistência humana realiza-se. Nesse sentido, Organizações são fenômenos sociais.

Uma Organização é entendida como um feixe de práticas-ar-ranjos, construída como (i) um produtos de ações executadas nas prá-ticas existentes, (ii) como uma malha que abarca práticas persistentes, variando o grau de alteração com possíveis adições de outras novas, e uma mistura de novos e velhos arranjo materiais, e (ii) que continua existindo por meio da perpetuação de suas práticas e da manutenção de seus arranjos, acomodando evolução e mudanças focalizadas na malha (SCHATZKI, 2005).

Dizer feixe de práticas-arranjos significa dizer que a prática afe-ta, usa e dá significado e são inseparáveis de arranjos, enquanto o caminho dos arranjos prefigura, facilita e é essencial para a prática. Mais especifi-camente, as práticas e arranjos, de acordo com Schatzki (2011), formam

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feixes através de cinco tipos de relações: causalidade, prefiguração, consti-tuição, intencionalidade e inteligibilidade, comentadas a seguir.

A Causalidade pode ser percebida quando as relações causais entre práticas e arranjos assumem duas formas proeminentes: (i) ativi-dades que alteram o mundo e (ii) entidades e acontecimentos que lhes sucedem, induzindo atividades.

A prefiguração, no entendimento de Schatzki (2011), refe-re-se ao atual estado das coisas qualificando a atividade futura, como, por exemplo, mais numerosa, mais fácil ou difícil, mais ou menos cara, mais básica ou mais complexa, mais rápida ou mais demorada, entre outros, de modo que os arranjos materiais prefiguram ou delineiam a perpetuação das práticas, ou seja, a repetição ou o redirecionamen-to dos atos e dizeres que compõem práticas particulares. Os arranjos também podem prefigurar mudanças em outras práticas e arranjos, do mesmo modo as infraestruturas materiais existentes, tais como as co-municações e os sistemas informatizados, prefiguram alterações nestas infraestruturas ou possibilitam a introdução de novas infraestruturas.

Com relação à constituição, os arranjos constituem práticas ou quando são essenciais para essas práticas ou quando estão envolvidos com as práticas em uma extensão espaço- tempo, por exemplo, como as salas de aulas são essenciais para as práticas de ensino. Também pode ocorrer o contrário: as práticas constituem arranjos quando dados arranjos não existiriam se não fossem as práticas específicas, como as práticas de ensino constituem os arranjos de sala de aula onde elas ocorrem. Entendem-se aqui os diversos arranjos possíveis em salas de aula pela aplicação de conhecimentos pedagógicos e didáticos e não às passarelas e caminhos físicos que alunos e professores fazem para chegar à sala de aula.

A intencionalidade ocorre quando as práticas são intencio-nalmente relacionadas com os arranjos e isso inclui pensamentos e imaginações que os participantes têm sobre os arranjos e as ações que os participantes realizam em relação aos arranjos, inclusive usá-los. Por exemplo, os professores pensam diferentes maneiras de usar qua-dros inteligentes, recursos tecnológicos, disposição de cadeiras e agem nesse sentido.

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A integibilidade refere-se à compreensão e aos significados que os participantes têm dos arranjos materiais, dos aspectos humanos e não humanos da materialidade ligados à prática em questão.

Os grumos formados pela junção dos cinco tipos de relações podem ser mais finos ou mais densos, mais compactos ou espalhados, contínuos ou passageiros, e assim por diante. As relações destes tipos em feixes de práticas e arranjos são tipicamente muito grossas; a concentra-ção de relações, sua densidade e sua continuidade que faz com que haja um feixe.

As relações de causalidade entre práticas e arranjos são mais es-pessas com aquela parte dos arranjos materiais que estão mais presentes, mais constantes e mais próximos na execução da prática. As relações de causalidade são mais finas e mais distantes com outros arranjos que não são muito acionados na execução da prática.

Os arranjos com os quais a prática mantém relações causais espessas tendem a ser as entidades com as quais mantêm relações cons-titucionais e cujos significados as práticas subentendem. É com as en-tidades de relações causais, constitucionais e de integibilidade que se forma um feixe de prática-arranjos. Importa ressaltar que os feixes de práticas e arranjos são centrais para a análise social.

Considerando que o site do social, da convivência humana, é uma malha de práticas e de arranjos sociais, Schatzki (2005, 2015a) aponta três formas de coexistência humana: (i) cadeia de ações, que é uma sequência de ações, na qual cada membro responde ao seu pre-decessor ou para as mudanças instigadas por ele; (ii) compartilhamento de atividades entre as pessoas, relacionados a seus fins, projetos e emo-ções; (iii) arranjos materiais, que abrangem conexões físicas, entidades específicas e layouts de configuração material.

As atividades humanas mantêm as práticas quando há a execução de dizeres e fazeres incorporados e quando expressam elementos existentes nas organizações de práticas (SCHATZKI, 2002). Contudo, para entender como uma organização de prática acontece não é suficiente saber o que acontece, mas também saber o que não acontece (SCHATZKI, 2006a).

A ocorrência de uma organização de práticas se realiza pelo cumprimento de suas ações constituintes e pela memória prática, que

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são estruturas persistentes da prática quando esta não acontece efetiva-mente. Isto é, a memória prática pode ser entendida como uma proprie-dade de uma prática ou organização que vem do passado para o presente, que repousa sobre a interconexão de ações, pensamentos, habilidades e aptidões, ou dito de outra forma, repousa sobre a estrutura de governan-ça da prática (entendimentos práticos, regras, estruturas teleoafetivas e entendimentos gerais) abarcando também um acervo de arranjos mate-riais. Importante ressaltar que a memória prática não é uma combinação de memórias individuais. Enfim, a memória prática pode ser entendida como uma linguagem específica ou conhecimento específico, relativo às práticas organizacionais, mantido de forma interacional ao longo do tempo (SCHATZKI, 2006b).

“Organizações de práticas não são estáticas” (SCHATZKI, 2002, p. 241). “Qualquer prática é uma míriade de ações organiza-das sujeitas a mudanças espaciais e temporais” (SCHATZKI, 2005, p. 471). Schatzki (2001, 2012) chama a atenção para a condição de mudança que as ações, por meio dos entendimentos, das regras e das estruturas teleoafetivas, estão sujeitas ao longo do tempo em resposta a eventos contingentes.

As atividades podem ser recompostas e reorganizadas. Os en-tendimentos, as regras e as estruturas teleoafetivas, que organizam in-tegrativamente as práticas, mudam frequentemente e como consequên-cia, mudam também os fazeres e dizeres que constituem essas práticas. A reorganização de regras e de estruturas teleoafetivas é um processo principalmente intencional e pouco ocasional. Por outro lado, a recom-posição e a mudança nos entendimentos práticos são contínuas e, prin-cipalmente, não intencionais (SCHATZKI, 2002).

As circunstâncias de mudança podem ser as mais diversas, como um problema emergente, rotatividade de pessoas, novas opor-tunidades e ideias que surgem. Essas mudanças podem ser: intencio-nais e não intencionais; de conhecimento ou não dos participantes. Geralmente as mudanças são graduais, e quando afetam algum com-ponente de um feixe é acompanhado pela continuidade (da mudança) em outros feixes. Entretanto mudanças substanciais ocorrem quando a intervenção, consciente e proveniente do interior ou do exterior da prática, tem como efeito alterações de objetivos, regras e redesenho de

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projetos. Este tipo de intervenção pode afetar também arranjos mate-riais e malhas prática-arranjos. (SCHATZKI, 2005).

Schatzki (2005) ressalta duas características importantes das práticas: a sobreposição e a conexão. A sobreposição de práticas ocor-re quando determinadas ações são parte de duas ou mais práticas ou quando práticas compartilham elementos organizacionais. As práticas se conectam quando, entre outras coisas, ações de diferentes práticas formam cadeias, quando ações de diferentes práticas ocorrem no mesmo arranjo e quando ações de uma prática são objetos de estados mentais (condições de vida) de participantes de outra prática. O fato das práticas se sobrepor e se ligarem não exclui a possibilidade de haver conflitos entre pessoas de uma mesma prática e entre práticas porque disputas podem vir à tona, entre outras coisas, como desempenhos individuais e padrões estabelecidos.

Os feixes ou malhas também se sobrepõem e interagem. Eles se sobrepõem quando elementos de uma prática e ordens aparecem em diferentes feixes ou malhas. Eles interagem de maneiras diversas e são mediadas especialmente por conexões tecnológicas. Eventuais conflitos podem ocorrer quando as interações entre feixes e malhas não são mu-tualmente sustentáveis (SCHATZKI, 2005).

Os feixes de prática arranjos podem se conectar a outros di-ferentes feixes e formarem uma constelação (SCHATZKI, 2011). “Constelações são grandes ligações de feixes de práticas e arranjos co-nectados, amplamente moldados ou configurados que aparecem no ple-nário total de práticas e arranjos. Um plenário é formado por feixes e constelações conectados, formando um imenso labirinto de práticas e arranjos interconectados” (SCHATZKI, 2015a, p. 4). A concentração de conexões, se mais densa ou mais distinta é o que define a existência de feixes de práticas e arranjos no plenário de práticas, assim como as co-nexões entre práticas, entre arranjos e entre práticas-arranjos podem ser caracterizadas como um labirinto que forma uma ordem, uma matriz, que pode ser esparsa ou densa, mais compacta ou espalhada, contínua ou fugaz, e padronizada ou dispersa (SCHATZKI, 2016a).

Todas essas malhas, feixes, redes, constelações configuram ex-pressivas transformações na teia de práticas e ordens, cujo alcance mais

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amplo é coextensivo às dimensões espaço-temporal e sóciohistórica, formando um nexo global, de imensa complexidade de práticas sobre-postas, que se interpenetram em um labirinto de forma assistemática e contingente (SCHATZKI, 2003, 2005).

De maneira geral, nessa seção, apresentamos conceitos essen-ciais da Teoria da Prática Social que são úteis para análise de fenômenos sociais situados localmente ou de pequena extensão espacial (micro). Entretanto, essa teoria não se restringe a esses tipos de fenômenos. Ela também pode ser útil para analisar fenômenos sociais amplos como eco-nomias, governos, ligas esportivas, federações internacionais, estabeleci-mentos educacionais e regimes sociotécnicos, assunto do qual tratará a próxima seção.

2.2.1 Fenômenos Sociais Amplos

A Teoria da Prática Social considera práticas como elemento chave para análise de fenômenos sociais (SCHATZKI, 2015b).

Todo fenômeno social é uma porção ou partes características de um plenário de práticas e arranjos, diferindo em continuidade, den-sidade e extensão espaço-temporal. Logo, todo fenômeno social tem a mesma constituição, os mesmos ingredientes básicos, não importando sua escala (SCHATZKI, 2015a, 2015b, 2016b).

Nesse sentido, depreende o que pode ser uma das caracterís-ticas mais importantes do fenômeno social na visão da teoria da práti-ca: a horizontalidade da vida social. Por ter a mesma constituição todo fenômeno social está no mesmo nível ou plano. Não há níveis na vida social. Nesse sentido, os fenômenos sociais diferem em extensão espaço--temporal ou em escala de suas práticas-arranjos, formas e relações que a compõem: do pequeno ao amplo, do micro ao macro, do local ao global (SCHATZKI, 2011, 2015a, 2015b). De acordo com Schatzki (2016), todos os teoristas da prática pensam práticas como situada em um só nível.

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Termos espaciais como pequeno, amplo, micro e macro, entre outros, são termos relativos. O que qualifica um espaço como micro ou macro depende da referência de comparação (SCHATZKI, 2011, 2015b). Como por exemplo, em nível macro temos governos nacionais, sistema de educação nacional e regimes sociotécnicos, e em nível micro temos, respectivamente, governos municipais, escolas e nichos.

Esses termos são associados, em outros assuntos da teoria social, ao pensamento convicto de que a sociedade ou a vida social é composta de níveis. Na filosofia da ciência, os níveis de realidade são concebidos como domínios de entidades ou realidades entre os quais existem relações de cau-salidade ou dependência, que atuam de forma sistemática. Os níveis mais comuns atribuídos a sociedade são (i) o nível micro, composto por indivídu-os, suas relações e interações e (ii) o nível macro que contém entidades como estruturas sociais, sistemas e instituições (SCHATZKI, 2015b).

Qualquer fenômeno social tem seu espaço objetivo e seu es-paço de atividade que são constituídos ou estabelecidos por feixes de práticas-arranjos, nesse sentido, esses espaços são vinculados às ativi-dades, à organização da prática, à regularidade da ação e aos arranjos envolvidos. O que difere os espaços dos fenômenos sociais amplos para os pequenos fenômenos sociais é que os primeiros são mais abrangentes (distribuídos espacialmente) e modelados de forma distinta dos segun-dos (SCHATZKI, 2015b).

Termos espaciais como pequeno, amplo, micro e macro, entre outros, são termos relativos. O que qualifica um espaço como micro ou macro depende da referência de comparação (SCHATZKI, 2011, 2015b). Como por exemplo, em nível macro temos governos nacionais, sistema de educação nacional e regimes sociotécnicos, e em nível micro temos, respectivamente, governos municipais, escolas e nichos.

Densidade e extensão (ou tamanho) são duas características do plenário de práticas e do fenômeno social. Densidade é o número de atividades, entidades, relações, feixes de práticas e constelações por uni-dade de espaço tridimensional. Volumosa densidade relacional marca a existência de feixes e constelações. Tamanho é o espectro entre o peque-no e grande, ou restrito e vasto relativo à extensão espacial e quanto mais

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denso de relações e/ou vasto (espalhado), mais complexa é a constelação (SCHATZI, 2016a).

Densidade, duração, forma, complexidade qualitativa14 14 e ex-tensão espacial são características do fenômeno social e do plenário de práticas (SCHATZKI, 2016a), entretanto queremos destacar a última delas. Ao contrariar esta ideia de níveis e trazer a horizontalidade ao en-tendimento do fenômeno social, reconhecendo que tanto macro e micro fenômenos são partes e aspectos específicos do plenário (ou da totali-dade) de ligações de práticas e arranjos, a Teoria da Prática Social não simplifica a realidade social, mas reconhece a complexidade das relações que ocorrem de múltiplas formas, variando a densidade ou a tenuidade delas, muitas vezes contingentes, assim como a objetividade e a circu-laridade presentes nas relações entre práticas e arranjos (SCHATZKI, 2015b, 2016a).

Por fenômenos sociais restritos, Schatzki (2016a) considera aqueles que são constituídos por poucas ligações entre ações, atividades coordenadas e interações face a face em ambientes adjacentes. Schatzki (2011, 2015b) denomina fenômenos sociais amplos (contrapondo os fe-nômenos sociais restritos) como aqueles que marcam extensão espacial significativa, considerando-os como constelações de feixes, ou seja, am-plos feixes de práticas-arranjos, no qual há ligações entre práticas e arran-jos, entre práticas e entre arranjos, que podem surgir em formatos dife-rentes e estarem distribuídos espacialmente de formas também diferentes.

Os tipos de relação que conectam práticas e arranjos a feixes são os mesmos que conectam feixes a constelações. As práticas são co-nectadas a outras práticas através de (i) poder comum (quando suas or-ganizações contêm os mesmos elementos – fins, regras, tarefas, emoções ou entendimentos), (ii) organização orquestrada (quando os fins são alcançados por meio de diferentes elementos de práticas diversas), (iii) espaço de atividade (quando arranjos físicos e caminhos usados por par-ticipantes em diferentes práticas são os mesmos ou orquestrados), (iv) atividades compartilhadas (inclui o estilo, o jeito de compartilhamento

14 Duração, forma e complexidade qualitativa são características dos fenômenos sociais não desen volvidos pelo autor nos artigos pesquisados; foram citados em Schatzki (2016).

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de atividades, assim como fazeres e dizeres compartilhados), (v) cadeias de ação (quando uma atividade precede e sucede outras), e (iv) inten-cionalidade (relacionada ao significado dos arranjos, dos recursos, enfim, das coisas para os praticantes) (SCHATZI, 2015b).

Tendo em vista que o fenômeno social se espalha em um plená-rio de práticas-arranjos, a mudança social consiste na mudança em feixes (em práticas, em arranjos e nas relações que as compõem). Nesse sentido, o surgimento, a manutenção e a dissolução de feixes são centrais para a dinâmica da vida social. Outro aspecto importante é o avanço irregular da mudança. Dado que a atividade humana é indeterminada, isto é, somente ao executar uma atividade ela se torna definitiva visto que a atividade atual é auto-organizada (ela mesma é responsável pelo que no passado a determina), tem-se como consequência que a cada atividade atual há possibilidade de um novo começo ou real mudança, embora a maioria das atividades perpetue o passado (SCHATZKI, 2011). Contudo, algo significante pode ocorrer a qualquer tempo, como novidades e inovação podem surgir e nova direção pode ser tomada. Não precisa necessaria-mente haver ruptura em rotina ou em fluxo para que a mudança comece (SCHATZI, 2015a).

O comportamento da mudança irregular que marca feixes e constelações ao longo do tempo, de acordo com Schatzki (2015a), é frequentemente gradual, até mesmo previsível ou precipitado e impre-visível. O fenômeno social envolve um misto de estabilidade e mudança, alguns permanecem, outros mudam. Mudanças locais sempre ocorrem, mas daí elas alcançarem grande extensão vai depender de como as pes-soas e práticas respondem a elas, já que cada atividade é potencialmente um começo. “A sociedade não é um fluxo, mas um mosaico que envolve continuidade e mudança” (SCHATZKI, 2015a, p. 7).

A teoria da prática propaga também a ideia de que cadeias de ação são inerentemente encaixadas em feixes e constelações de práticas (SCHATZI, 2014b).

Eventos e processos que ocorrem em feixes e em seus compo-nentes no plenário de práticas são os mais diversos, caracterizando, como resultado, mudanças em fenômenos sociais amplos. Schatzi (2016b), cita

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os seguintes conceitos15 que podem ser usados para explicar a dinâmica de fenômenos sociais amplos: (1) acumulação, associação e agregação; (2) dissociação e dissolução; (3) colonização e absorção; (4) difusão, cir-culação e propagação; (5) estabilidade, solidificação, persistência e evo-lução; (6) bifurcação, diferenciação, síntese e polypization; (7) entrelaça-mento; (8) convergência e fusão; e (9) divergência e separação.

A Teoria da Prática Social, até o momento, não tinha ainda conceitos desenvolvidos para prover uma visão geral de amplos fenôme-nos e dar explicações causais de formação, perpetuação e dissolução des-ses fenômenos. Somente dois conceitos apontam nessa direção: a noção de distanciação no espaço-tempo de Giddens e o conceito de circuito de reprodução e circulação de elementos de Shove et al., embora esses con-ceitos tenham sido primeiramente aplicados em fenômenos de pequena escala (SCHATZKI, 2014b).

De qualquer forma, Schatzki (2016a), reforça que as teorias da prática devem desenvolver conceitos úteis aos pesquisadores empíricos para conceituar, descrever e explicar os assuntos em pauta, de modo a capturar os processos dinâmicos que lhes digam respeito. Um dos cami-nhos indicados pelo autor é buscar argumentos gerais que se aplicam às práticas e amplos complexos de prática.

Schatzki (2016a, p. 28) apresenta alguns conceitos úteis para a formulação de visões gerais sobre cadeias de ação complexa, que formam a espinha dorsal do nexo causal responsável pela formação, persistência e dissolução de grandes fenômenos. São eles:

• Feedback (retroalimentação) é a reação de um ator da cadeia de ação sobre um evento ocorrido ao longo da cadeia;

• Domesticação é o confinamento de cadeias dentro de fei-xes específicos, demarcada por fronteiras espaciais, legais e sociais;

• Cascatas são rápidos fluxos de cadeias que perpassam feixes de modo a alterá-los;

• Bifurcação ou Aglutinação ocorre, respectivamente, quan-

15 O autor somente cita os conceitos, não os desenvolve.

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do uma ou mais cadeia se divide em uma ou mais cadeias ou quando há fusão de duas ou mais cadeias;

• Governança é uma maneira intencional de moldar a vida e as práticas que as pessoas levam e executam;

• Monitoramento inclui todo o tipo de atenção aos feixes e constelações, como escritórios do governo, sedes corporati-vas, salas de estar da família, bancos;

• Dispositivos de coordenação são dispositivos de ligação, de coordenação e sincronização de cadeias;

• Coordenação de discursos é um conjunto de dizeres a res-peito de um dado tópico suficientemente unificados para formar uma perspectiva distinta sobre o que pode impul-sionar e ligar o que acontece nos feixes;

• Infraestruturas materiais são constelações mais amplas de materialidade que abarca arranjos particulares, conec-ta arranjos e/ou supri necessidades materiais de feixes. Sustentam cadeias e nexos.

Esses conceitos designam formas importantes, determinantes e cenários de longas cadeias e conexões de feixes. Conceitos como esses po-dem ser usados para dar uma visão geral de vínculos causais (redes de ação, processos materiais e fluxos de desejos, crenças e emoções) envolvidos em pequenas ou amplas mudanças sociais. Ao usar esses conceitos pode-se abstrair os detalhes complexos relativos a constelações, ao mesmo tempo em que são compatíveis e aplicáveis a menores feixes de práticas.

Dentre esses conceitos para formular visões gerais sobre am-plos fenômenos sociais, destaca-se a governança por estar presente nas práticas-arranjos de qualquer amplitude espacial ou densidade, assunto este abordado na próxima seção.

2.2.2 Governança

A governança apresenta uma miríade de significados e ativida-des, como: normas e padrões, persuasão e retórica, leis, ordens e regu-

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lações, políticas, programas e iniciativas, exemplificando atividades ou feixes desejados, alterando arranjos, introduzindo novas materialidades, organizando espaços. Também inclui emoções como medo e ameaça, e ações como uso da força e violência (SCHATZKI, 2015a).

O conceito de governança tem sido discutido em torno de par-cerias ou conexões entre instituições, organizações e stakeholders. Para a Comissão sobre Governança Global (1996, p. 2), “Governança é a tota-lidade das diversas maneiras pelas quais os indivíduos e as instituições, públicas e privadas, administram seus problemas comuns”.

Governança, em um amplo sentido, é um assunto relacionado à coordenação e ao gerenciamento de ações coletivas de diversos atores, que pode tomar diferentes formas em diferentes contextos, envolvendo específica distribuição de relações de poder, como em uma governança hierárquica com grande centralização de controle ou em uma gover-nança descentralizada, na qual a liderança e poder são mais dispersos (MULDERRIG, 2011).

Nas últimas décadas, o foco está no deslocamento do conceito de governing para governance, implicando em outros modos de organizar, planejar e conduzir as questões de interesse. Governing (governo) envolve um esforço para administrar, guiar, controlar e ge-renciar setores ou partes da sociedade. Já Governance (governança) é uma maneira de agir por meio de interações como deliberação, nego-ciação, autorregulação ou escolha autoritária, e envolve a amplitude da tomada coletiva de decisão pelos atores envolvidos (KEMP; PARTO; GIBSON, 2005). Essa distinção conceitual emerge tanto no campo das políticas públicas quanto no gerenciamento privado, ganhando o signi-ficado de governança, em sentido amplo como aquele relacionado aos modos e maneiras de governar e, em sentido restrito significando um modelo particular de envolvimento mais horizontal de hierarquias, re-des e auto-organização (MULDERRIG, 2011).

Nesse sentido, o efetivo exercício do poder é através da rede interconectada de atores, visto que o poder advém de conhecimentos, de recursos e de direitos concedidos a eles. Esses direitos envolvem “a estru-tura e organização de processos, determinação de objetivos, influencia

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motivações, marca padrões, desempenha funções alocativas, monitora conformidade, impõe penalidades, inicia e/ou reduz conflitos e resolve disputa entre atores” (KEMP; PARTO; GIBSON, 2005, p. 17).

O termo governança, sob a ótica da dimensão política, preo-cupa-se com o relacionamento entre intervenção estatal e autonomia social. É comumentemente associado a uma mudança na natureza do estado, do modo tradicional de governar para outro, que envolve uma tomada de decisão coletiva, com a participação de uma diversidade de atores nos processos de formulação e implantação de políticas (TREIB; BÄHR; FALKNER, 2007).

Treig, Bähr e Falkner (2007) desenvolveram uma tipologia que caracterizam quatro modos de governança baseada em dois as-pectos principais: uso de instrumentos legais e forma de implementa-ção. Os instrumentos legais podem ser classificados como obrigatório/ compulsório, envolvendo atos legais como regulações, diretrizes e de-cisões, e instrumentos não obrigatório/compulsório, como recomen-dações, opiniões e declarações.

A forma de implementação refere-se a uma abordagem rígida ou flexível, sendo que a primeira estabelece padrões a serem adotados por todos, ao passo que a segunda, permite manobras para implantar aquilo que foi estabelecido de comum acordo. Dessa associação entre instrumentos legais e formas de implantação, surgem: a coerção, o vo-luntarismo, o direcionamento e o quadro regulatório. A coerção é ca-racterizada por instrumentos legais prescrevendo e fixando padrões que deixam pouco espaço de manobra para implantação; o voluntarismo define amplos objetivos que são especificados pelos atores envolvidos, se constituindo em um método aberto de coordenação, desprovido de regulação e, portanto, com baixo grau de intervenção.

No direcionamento não há uso de instrumentos regulativos, mas as recomendações são mais detalhadas e deixa menos espaço de manobras no estágio de implantação o que no voluntarismo. No quadro regulatório, como o próprio nome diz, há o uso de instrumentos legais que permitem, entretanto, mais manobra para implantação por parte dos atores, oferecendo, por exemplo, uma gama de objetivos amplos a

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serem especificados pelos atores, por apresentar opções de políticas a serem escolhidas pelos atores. Esta tipologia pode ser usada para mapear as mudanças nos modos de governança e abarca os principais aspectos que outras tipologias também abordam.

Uma teoria que tem se destacado dentro dos Estudos de Transição Sociotécnica é a Transition Management, definida como “um processo deliberativo para influenciar atividades de governan-ça de maneira a acelerar a mudança em direção à sustentabilidade” (LOORBACH; ROTMANS, 2010, p. 239).

Loorbach (2007, p. 23) coloca que a Transition Management tem como desafio “desenvolver uma forma genérica de governança ba-seada nos princípios da sustentabilidade que podem ser aplicados no contexto de todos os assuntos de longo prazo sem um conteúdo pres-critivo e dogmático”.

A Transition Management é uma meta-teoria de caráter mul-tinível, multifase e multiator que adota arenas de transição como es-paço participatório em direção a mudanças sustentáveis. A Transition Management “é uma forma de meta governança influenciando e geren-ciando atores e redes existentes” ( JESSOP, 2002 apud LOORBACH, 2007, p. 88). “Meta governança envolve a rearticulação e ajuste dos di-ferentes modos de governança [...] abarca a gestão da complexidade, pluralidade e hierarquias entrelaçadas encontradas nos modos de coor-denação vigente” ( JESSOP, 2002, p. 6).

No processo multiator da Transition Management participam indivíduos e representantes do governo, organizações sociais, de negócio, institutos de pesquisa e organizações intermediárias. O pressuposto cen-tral é que todos os atores de alguma forma influenciam a mudança social e que a governança destas atividades deve, necessariamente, ser participa-tória, e quando grupos de stakeholders (partes interessadas) são envolvidos de forma interativa nas definições políticas, estas são mais efetivas e am-plamente aceitas quando implementadas (LOORBACH, 2007).

Destaca-se que a Transition Management estimula a auto-or-ganização e direção entre os atores, sem controlar o processo de forma clássica de controle top-down; a autogovernança ou autocoordenação

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torna-se um mecanismo autônomo de interação e ajuste mútuo entre indivíduos ou grupos de atores e redes que permite a negociação, atra-vés do debate ou da ação, em busca da solução possível para problemas compartilhados (LOORBACH, 2007).

Para a Teoria da Prática Social, a governança não está somente nas instituições ou organizações que inerentemente têm a tarefa de exer-cer a governança, mas também pode ser encontrada em famílias, relações interpessoais, times esportivos, escritórios, atividades de lazer, no tráfego, enfim, na junção de vidas humanas e como se relacionam entre si.

De maneira geral a governança tem como características prin-cipais (i) o objetivo (agir para mudar), (ii) o alvo (o que é moldado ou dirigido), (iii) o caminho da intervenção (conexão por meio de feixes e arranjos como cadeias de ação, conexões físicas entre grupos), e (iv) a forma de atuação (maneira pela qual molda ou dirige). A escala (local, regional, nacional ou internacional, etc), ou alcance de um feixe de go-vernança também pode ser considerado (SCHATZKI, 2015a).

Na perspectiva de um olhar mais amplo enfocando a vida so-cial, Schatzki (2015a, p. 1) entende governança como “um plenário de práticas e materialidade inerentes que estabelece os termos relativos de como a sociedade pode ser induzida, por intermédio da governança, a desenvolver-se mais sustentavelmente”. Este conceito revela a centrali-dade da governança para a coexistência humana assim como seu modo de ação: forma intencional de direção, de influência e de intervenção. Ao olhar o fenômeno social, sob a perspectiva da prática, a governan-ça é conceituada como um fenômeno de feixes e constelações, assim como parte do plenário, do qual o fenômeno governado também é parte. Dizendo de outra forma, tanto o fenômeno em análise quanto o fenô-meno de feixes e constelações de governança fazem parte do plenário de práticas, sendo que ambos têm a mesma composição básica.

Nesse conceito, Schatzki (2015a) chama a atenção para a pos-sibilidade de a governança ser um dos caminhos para a sociedade de-senvolver-se de maneira sustentável. O desenvolvimento sustentável é definido abstratamente por Loorbach (2007) como um desenvolvimen-to de longo prazo em direção a um balanço entre bem-estar (econô-

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mico), bem-estar (sociocultural) e qualidade de vida (ambiental). Em geral, estas características da definição de desenvolvimento sustentável tornam-se um ponto inicial para pensar a governança de longo prazo, porque qualquer forma de orientação e gerenciamento tem intenção de promover soluções mais efetivas e eficientes ou desejadas socialmente (LOORBACH, 2007, p. 54).

O desenvolvimento sustentável tornou-se mais complexo quando se tentou operacionalizá-lo em termos de estratégias de go-vernança, que objetiva por meio da participação, de representantes de perspectivas distintas, estabelecer um campo no qual ocorra de forma contínua a discussão de valores e interesses, de maneira negociada e ponderada, em direção as mudanças desejadas, criando espaço para a experimentação, inovação e aprendizagem. Assim, a sustentabilidade é sempre resultado do debate pluriforme, de negociações, competição e experiência, e nunca é dada, ou seja, não é definida meramente por meio de objetivo pré-definidos e geridos por meio de estratégias de controle direto; “[...] a racionalidade por trás disso é que soluções para o de-senvolvimento sustentável podem somente ser chamadas de sustentável quando elas são codesenvolvidas, implantadas e sustentadas pelos atores sociais” (LOORBACH, 2007, p. 35).

Na perspectiva da Teoria da Prática Social, embora a gover-nança esteja distribuída por todo o plenário de práticas, há feixes espe-cializados em governança, como aqueles que sugerem ou impõem orien-tações sobre atividades a serem executadas pelos participantes dos feixes de práticas, ou como uma habilidade de governança que determinados feixes alcançam, podendo tornar-se ou ligar-se a outros feixes para for-mar constelação de governança. Exemplos desses feixes são agências go-vernamentais, escritórios de gerenciamento e administração, cadeias de comando, elaboração de políticas, como corpos legislativos e agências governamentais, organizações não governamentais e cidadãos. Ressalta-se que essas ligações não são em si mesmas produtos de governança (SCHATZKI, 2015a).

As práticas e feixes de governança estão sujeitos a pequenas e constantes alterações, a possíveis novos recomeços e dissoluções repen-

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tinas assim como a expansão ou ampliação do feixe ou transformação. Mudanças que podem ou não ocorrer. Schatzki (2015a) salienta que toda vida social é afetada por mudança desigual e indeterminada.

Schatzki (2015a) sugere que governantes, elaboradores de polí-ticas e planejadores pensem seus objetivos e suas próprias operações como características e partes de feixes e constelações. Este é um desafio não somente para gestores no âmbito público e privado, mas também para pesquisadores, diante de um campo de pesquisa ainda pouco explorado.

2.3 CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS

A Teoria da Prática Social posiciona-se como uma ontologia contextual para a qual a coexistência humana é inerentemente ligada ao tipo de contexto no qual ela ocorre. Nesse sentido, a indissociabilidade en-tre o ser e o mundo revela que a vida social e o contexto estão imbricados, sobrepostos e entrelaçados de maneira que para conhecer os fenômenos sociais implica em analisá-los através dos locais nos quais a convivência humana seja evidente, porque são espaços onde as atividades humanas se desenrolam, onde as pessoas vivem e interagem intelegivelmente. Para a Teoria da Prática Social o lugar da existência social é constituído por uma malha ou feixe articulado de práticas e arranjos materiais.

As práticas são atividades humanas organizadas por um com-posto articulado de fazeres e dizeres incorporados, disperso espaço-tem-poralmente, porém não constituem regularidades, mas um campo de várias atividades em desenvolvimento ligadas por elementos comuns. As práticas apresentam uma estrutura de governança (ou organização mental) que envolve entendimentos práticos, entendimentos gerais, re-gras e estrutura teleoafetiva. Os entendimentos práticos se referem às habilidades e competências, enfim, conhecimentos inerentes às ações desenvolvidas e carregam a noção de ubiquidade. As regras referem-se às diretrizes explícitas (princípios, leis, normas, procedimentos, critérios de decisão) que regulam, instruem ou organizam a prática. A estrutura teleoafetiva tem a finalidade de avaliar, de julgar, de apreciar os fins, pro-

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jetos, ações, tarefas, emoções e uso das coisas de maneira a considerar o que é ou não apropriado, aceitável e correto. Os entendimentos gerais são conhecimentos valorativos, conhecimentos que as pessoas carregam consigo e que os expressam em sua forma de falar e de fazer.

As práticas e arranjos materiais são interconectados. Em um feixe de práticas-arranjo as práticas são realizadas em e determinadas por arranjos específicos, são também dependentes e alteradas por ar-ranjos materiais, de modo que arranjos e práticas estão intrinsecamente entrelaçados, imbrincados e são co-constitutivos. As práticas inter-rela-cionam-se e os arranjos conectam-se formando arranjos comuns, novas práticas e cadeia de ação, entre outras possibilidades.

As práticas são fenômenos sociais que ocorrem no espectro espacial que vai do local ou global, sustentadas pela compreensão da horizontalidade da vida social. O que difere os espaços dos fenômenos sociais amplos para os pequenos é a sua abrangência e a sua modela-gem. As práticas se unem em feixes, estes em constelações e constela-ções em plenário de práticas, que representa a totalidade das práticas. Quanto mais vasta espacialmente, densa de relações, durável no tempo e qualitativamente complexa mais intrincada é a constelação. No en-tanto, fenômenos sociais restritos e amplos são partes e compartilham aspectos específicos do plenário de práticas e, portanto, os fenômenos que ocorrem em âmbito global ocorrem também no local. As relações que conectam práticas e arranjos a feixes são os mesmos que conectam feixes a constelações, e as mudanças que ocorrem em feixes provocam mudanças sociais. Por isso o surgimento, a manutenção e a dissolução dos feixes são centrais para a dinâmica da vida social.

A localização da mudança está na indeterminação da atividade humana, pois é somente ao executar uma atividade que ela se torna de-finitiva, porque ela é auto-organizada: ela mesma é responsável pelo que no passado a determina ao mesmo tempo carrega expectativas futuras que induzem a ação. É o passado e o futuro presentes no momento da ação. Isto posto, o comportamento irregular da mudança em feixes e constelações pode trazer alterações significativas ou não, pode ser ou não previsível, gradual ou rápida.

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Tomar decisões, dar direção, organizar esforços e recursos, e decidir como atuar são tarefas da governança, que para a Teoria da Prática Social pode ser encontrada em qualquer prática, sendo por ela considerada como um dos caminhos para a sociedade desenvolver-se de maneira mais sustentável.

No próximo Capítulo, Metodologia, antes que a configuração metodológica desta obra seja explicitada, abrangendo objetivos, pro-blema e perguntas de pesquisa, definição de categorias analíticas, deli-neamento da pesquisa, população e amostra, procedimentos de coleta, tratamento, análise dos dados, considerações sobre aspectos éticos en-volvidos na pesquisa e suas limitações, há uma breve exposição sobre al-gumas implicações metodológicas relacionadas ao desenvolvimento de pesquisas sobre a prática no campo dos estudos organizacionais.

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CAPÍTULO 3 METODOLOGIA

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Nicolini (2012) descreve o que pode ser chamado de forte (strong) ou fraco (weak) programa de pesquisa baseado na prática. O pro-grama fraco centra-se nas atividades materiais dos membros da organiza-ção, o que significa abraçar métodos que possibilitam realizar descrições detalhadas da vida no trabalho. Esta visão tem como pressuposto que as teorias da organização estão desaclopadas das atividades concretas.

Já o programa forte vai além da descrição de atividades cotidia-nas, procurando explicar questões organizacionais ao invés de somente descrevê-las. O foco então passa para a dinâmica da atividade cotidiana, como são gerados e como operam em diferentes contextos ao longo do tempo. Para tal, o comprometimento com a ontologia da prática, assumindo que as práticas são partes, aspectos ou componentes do fe-nômeno social, muda a maneira de olhar o que acontece na realidade organizacional e social, o que se reflete também na forma como a análise se desenvolve.

Os caminhos para a pesquisa e as implicações metodológicas para os estudos organizacionais provenientes da Teoria da Prática Social são colocados por Schatzki (2003, 2005) nos termos descritos a seguir.

A tarefa central para compreender uma organização é delimitar os episódios de qualquer atividade ou identificar as ações que compõe a prática e seus arranjos. As práticas são descobertas através da identifica-ção de fins, projetos, regras e ações que a compõe, enquanto arranjos são descobertos tanto por assistir às configurações onde ocorrem práticas específicas quanto por traçar conexões físicas a fim de promover outros enlaces entre práticas e arranjos.

A segunda tarefa chave é identificar os feixes de práticas-arran-jos dos quais as ações são partes, incluindo a rede de feixes, procurando descobrir se esses feixes são persistentes ou competitivos. Para realizar esta tarefa, o autor recomenda a observação participante (olhar as ativi-dades dos participantes, interagir com eles, dialogando, fazendo pergun-tas e tentar aprender suas práticas). Entretanto, a escolha metodológica foi pela observação não participante e pela entrevista em profundidade em função dos objetivos e da amplitude do campo de pesquisa.

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A interpretação hermenêutica tem um papel importante para os procedimentos metodológicos. Os nomes que os participantes dão as suas atividades são importantes para identificar práticas existentes e feixes, assim como considerações da teoria adotada.

A terceira tarefa é identificar outras redes de feixes de práticas--arranjos a que a prática estudada está mais conectada (intencionalmente ou não), o que inclui outras áreas organizacionais e administrativas, servi-ços de suprimento, procurando observar aspectos comuns e orquestrações em suas ações, arranjo teleológico e regras; cadeias de ação incluindo as interações entre áreas observando aspectos como harmonia e competiti-vidade; conexões materiais entre redes; e desejos, crenças e outras atitudes que os participantes de uma rede têm em relação a outras redes.

A ação humana é a primeira fonte de mudança em prática--arranjo, feixes e redes, por isso os investigadores em mudança devem atentar para as cadeias de ação que ligam e atravessam feixes e redes. As relações entre redes envolvidas, feixes e constelações são as estabe-lecidas entre a própria organização em si (empresa, corporação, etc), e entre formações semelhantes, como por exemplo: a legislação, governos locais, redes de associação, agências de crédito, indústrias, contratantes. Enfocando essa extensão de redes, os investigadores não precisam ras-trear e registrar o labirinto potencial de complexidade de feixes, redes de feixes e assim por diante. Em muitos casos, é desejável e praticável (possível) uma visão geral do fenômeno social e que seus trabalhos se-jam expressos em termos de referência e não em detalhes de feixes de prática-arranjo, mas uma visão completa de sua formação e suas rela-ções. Sob qualquer escala e aparato conceitual que os assuntos sociais são estudados, o fenômeno social, ontologicamente, são feixes ou redes de práticas-arranjos (SCHATZKI, 2005).

Portanto, considerar o fenômeno social como parte de feixes e constelações implica em investigá-lo a partir de feixes e constelações, utili-zando conceitos que revelam a captura dos aspectos estudados no plenário de práticas-arranjos, assumindo ontologicamente a prática (nas configu-rações de prática-arranjos, feixes e constelações) como unidade de análise ao invés de estruturas, instituições ou sistemas (SCHATZKI, 2015a).

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Para analisar amplos fenômenos sociais, por meio da explica-ção da situação de assuntos sociais ou mudanças sociais ou dinâmicas da vida social é necessário buscar o que ocasionou, gerou ou produziu even-tos ou estado das coisas. A teoria da prática defende que amplas mudan-ças sociais ou mudanças em amplos fenômenos sociais são (i) compostos de um conjunto de mudanças conectadas que acontecem às entidades que compõem esse amplo fenômeno ou (ii) a causa de qualquer grande mudança são as muitas causas de suas pequenas constituintes mudanças (SCHATZKI, 2016a).

Para estudos da prática focados em governança, Schatzki (2015a) sugere como tornar a governança mais efetiva estudando a identificação de componentes, relações e feixes que são centrais, ins-táveis, atrativos, mutáveis ou dissemináveis e descobrir o caminho para moldá-los. Indica também o estudo sobre a presença da materialida-de e natureza em feixes, como os contextos naturais municiam feixes e constelações. Outra possibilidade é um olhar para práticas organizacio-nais nas quais o entrelaçamento espaço-tempo é especial para entender como induzir pessoas e feixes a moverem-se em nova direção.

Explicações em mudança social são históricas, que envol-ve a descrição de um assunto direcionada para a mudança em ques-tão. Tais explicações são frequentemente feitas em forma de narrativa (SCHATZKI, 2016a). Para Schatzki (2010), escrever histórias e ana-lisar fenômenos contemporâneos com conceitos empíricos ressonantes resulta em um olhar menos sistemático ou ordenado e mais intrincado e contingente sobre a história e o mundo contemporâneo do que quando descritos e analisados por meio de arcabouços teóricos conceituais.

Após estas breves considerações sobre a atividade científica re-lacionadas ao campo teórico da Prática Social, apresentamos na sequên-cia a especificação do problema, abarcando, a temática, as perguntas de pesquisa, assim como as categorias analíticas e outros termos relevantes para esta obra. As escolhas metodológicas pertinentes a essa proposta de pesquisa são expostas na sequência, incluindo a delimitação e o de-sign da pesquisa, abrangendo a população e amostra, o delineamento e etapas da pesquisa assim como os procedimentos de coleta, tratamento

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e análise de dados. O Capítulo encerra com as considerações sobre ética na pesquisa científica.

3.1 DO PROBLEMA, DAS PERGUNTAS, DOS OBJETIVOS E DA TEMÁTICA DE PESQUISA

A Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos ficou conhe-cida amplamente pelos noticiários televisivos como a lei que extingue os lixões, que deveriam ser substituídos pela disposição final dos re-jeitos em aterro sanitário. Contudo, esta é uma pequena parte desta lei complexa, que ao conhecê-la despertou diversas indagações relativas à atuação as organizações (empresas geradoras de resíduos, empresas que atuam na área de resíduos sólidos, cooperativas de catadores de materiais recicláveis, secretarias municipais de meio ambiente, entre outras) neste contexto de mudança. Esta temática investigativa foi as-sociada a abordagem da Teoria da Prática Social enfocando as práticas de governança e as inovações introduzidas por ela no fazer cotidiano, nas atividades desenvo lvidas e na tomada de decisões.

Nesse contexto, o seguinte problema de pesquisa foi proposto:

Como se desenvolvem as práticas inovadoras de governan-ça na constelação local de resíduos sólidos no âmbito do município de Cascavel, estado do Paraná?

As perguntas que instigam esta pesquisa são:

1. Como a Política Nacional de Resíduos Sólidos estrutura, por meio de regras, a gestão de resíduos sólidos na conste-lação local de Cascavel?

2. As práticas de governança relacionadas aos resíduos sólidos têm sofrido mudanças? Como estas mudanças se configuram?

3. Como os diversos atores envolvidos nas ações de governan-

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ça da prática de resíduos sólidos têm entendido a Política Nacional de Resíduos Sólidos? E como têm convertido esse entendimento em ações inovadoras na prática de go-vernança de resíduos sólidos?

4. Quais são as relações que conectam práticas de governança a feixes e estes a constelações de resíduos sólidos e como elas se tipificam?

5. Como se caracteriza o envolvimento dos atores no feixe de prática-arranjos materiais de resíduos sólidos a partir da versão da estrutura de governança da prática?

O objetivo geral é compreender como se desenvolvem as prá-ticas inovadoras de governança na constelação local de resíduos sólidos no âmbito do município de Cascavel.

Os objetivos específicos abarcam as seguintes ações:

a) Investigar as principais atividades constituintes de feixes de práticas-arranjos na constelação local de resíduos sólidos;

b) Identificar as ações inovadoras de governança que fazem parte dessa constelação;

c) Analisar as formas de relações predominantes que conec-tam práticas de governança a feixes de mesma natureza, e estes a constelação local de resíduos sólidos;

d) Destacar os atores relevantes na governança dos resíduos sólidos;

e) Relacionar os achados empíricos com a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Em uma pesquisa é importante que os objetivos específicos es-tejam coerentes com as perguntas de pesquisa. A Figura 2 ilustra essas conexões neste estudo.

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FIGURA 2 – CONEXÕES ENTRE PERGUNTAS E OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Fonte: Elaborado pela autora, 2016.

As perguntas de pesquisa encaminham a investigação para ob-tenção de dados que perpassam vários objetivos estipulados, revelando também a não linearidade dessa investigação.

A Tese provisória desse estudo foi estabelecida nos seguintes termos:

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), promulgada pela Lei 12.305/2010, enquanto regra constituinte da prática de resí-duos sólidos municipais e política de intervenção propicia um contexto favorável para mudanças em feixes de práticas e arranjos de resíduos sólidos, especialmente em ações inovadoras relativas à governança, pre-sentes tanto nas próprias práticas quanto em feixes especializados em governança.

3.1.1 Categorias Analíticas

As categorias analíticas são aquelas fundamentais para orientar o estudo em termos de conhecimento para o entendimento do objeto de

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pesquisa em seus aspectos gerais (MINAYO, 2004). Por isso, essa defi-nição será aplicada neste estudo visto que se busca compreender as ca-tegorias elencadas por meio da identificação, descrição e conhecimento das relações entre as mesmas com o intuito de ampliar o entendimento sobre práticas de governança na constelação local de resíduos sólidos no município de Cascavel, Estado do Paraná.

As categorias analíticas que fazem parte do problema de pes-quisa são:

• Prática;• Arranjos Materiais;• Feixes de práticas-arranjos materiais• Governança;• Inovação; e• Constelação local.

A conceituação dessas categorias e formas de apreensão foram elaboradas pela autora com base em artigos de Theodore Schatzki (2001, 2002, 2003, 2005, 2006a, 2006b, 2010, 2012, 2015a, 2015b, 2016a].

Prática

• Conceituação:

A prática é um conjunto de atividades humanas abertas, espa-ço-temporalmente dispersas, organizadas por um composto articulado de fazeres e dizeres incorporados, entendimentos práticos e gerais, re-gras e estruturas teleoafetivas entrelaçados a arranjos materiais.

Conceito elaborado pela autora baseado em Schatzki (2001, 2002, 2003, 2005 2006a, 2006b, 2010, 2012) cuja referência também orientou a elaboração das formas de apreensão da prática, descritas a seguir.

• Formas de apreensão:

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Como a prática é constituída por ações incorporados articu-ladas a entendimentos práticos e gerais, regras e estrutura teleoafetivas, cabe ao pesquisador utilizar recursos metodológicos para coleta, trata-mento e análise dos dados de forma a identificar, registrar, estabelecer relações e interpretar os dados empíricos relacionados a/ao (s):

a) Ações - fazeres e dizeres incorporados executados pelos participantes da prática;

b) Entendimentos práticos relacionados aos conhecimentos necessários para execução das atividades e seu comparti-lhamento entre os executores da prática;

c) Regras relativas a orientações, instruções, normas, polí-ticas e demais instrumentos explícitos visando conduzir atividades constituintes da prática, que podem ou não ser seguidas e/ou aceitas;

d) Estrutura teleoafetiva relacionada à finalidade de atividades, tarefas, projetos envolvidos em uma prática assim como as atitudes (condutas), emoções, julgamento ético e estados de espírito (humores), que são consideráveis aceitáveis para a execução da prática e dos seus propósitos, enfim, do signifi-cado da prática, dos arranjos, dos recursos para os pratican-tes;

e) Entendimentos gerais, conhecimentos que fazem parte do indivíduo, amealhados pelo estudo e experiência na vida, se traduzem em entendimentos abstratos e valorativos em re-lação ao trabalho, à adequação das interações sociais, entre outras coisas.

Arranjos materiais

• Conceituação:

Arranjos materiais é expressão da materialidade do fenômeno

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social constituído por arranjos e conexões físicas, artefatos, tecnologia, seres humanos, organismos e natureza, constituindo cenários apoiadores e capacitadores das práticas, nos quais os elementos materiais coexistem, se posicionam e se relacionam de maneira específica. Os arranjos ma-teriais prefiguram, canalizam, facilitam e são essenciais para as práticas.

Conceito elaborado pela autora baseado em Schatzki (2005, 2010, 2015b).

• Formas de apreensão:

A partir das técnicas de observação e entrevista será possível registrar elementos materiais constitutivos da prática como: arranjos fí-sicos (layouts), estruturas físicas, artefatos, tecnologias, networks, orga-nismos, elementos da natureza, cadeias de ação, entre outros. Atenção especial deve ser dada para reconhecer o compartilhamento de arranjos materiais com outras práticas e/ou feixes.

Feixe de práticas-arranjos materiais

• Conceituação

Feixes se formam a partir da criação ou existência de uma ou mais atividades diversificadas que conjuntamente se tornam evidentes no meio de um arranjo particular ou conjunto de arranjos (SCHATZKI, 20111, p. 7). Feixe de práticas e arranjos materiais é o site (lugar/local) do social. É nesse feixe ou malha entrelaçada de práticas e arranjos materiais que entidades (humanas e/ou não humanas) agem, relacionam-se, posi-cionam-se, capacitam e constrangem umas em relação às outras e ganham significado (coisas) e identidade (pessoas) (SCHATZKl, 2002, 2003).

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• Formas de apreensão:

Os feixes serão formados pelo entrelaçamento entre práticas e pela formação da cadeia de ação. Os feixes serão analisados conside-rando (i) relações que conectam práticas a outras práticas e arranjos a outros arranjos, e (ii) os conceitos para formular a visão geral de cadeias de ações complexas, conforme Quadro 2. As relações que conectam prá-ticas a outras práticas e arranjos a outros arranjos, segundo Schatzki (2015b, 2011, p. 12) são:

I) Poder comum - quando suas organizações contêm os mes-mos elementos – fins, regras, tarefas, emoções ou entendi-mentos;

II) Organização orquestrada - quando os fins são alcançados por meio de diferentes elementos de práticas diversas;

III) Espaço de atividade - quando arranjos físicos e caminhos usados por participantes em diferentes práticas são os mes-mos ou orquestrados;

IV) Atividades compartilhadas - inclui o estilo, o jeito de com-partilhamento de atividades, assim como fazeres e dizeres compartilhados;

V) Cadeias de ação - quando uma atividade precede e sucede outras; e

VI) Intencionalidade - relacionada ao significado dos arranjos, dos recursos, enfim, das coisas para os praticantes.

QUADRO 2 – CONCEITOS PARA FORMULAR VISÃO GERAL SOBRE CADEIAS DE AÇÃO COMPLEXAS

Feedback(retroalimentação)

É a reação de um ator da cadeia de ação sobre um evento ocor-rido ao longo da cadeia. Também pode ser entendido como agir dentro de uma ação coordenada. É importante em situações de implantações de planos e intenções por meio de ações de outras pessoas assim como dar conhecimento dos resultados. Podem le-var a mudanças aceleradas.

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Domesticação É o confinamento de cadeias dentro de pacotes específicos, afeta-da pela demarcação de fronteiras espaciais, legais e sociais.

Cascatas

São rápidos fluxos de cadeias que passam por feixes de modo a alterar significamente ou não os feixes (como funcionamento do mercado de ações, viral de vídeos, pessoas em fuga diante de saqueadores invasores).

Bifurcação ou aglutinação

Ocorre, respectivamente, quando uma cadeia ou nexo de cadeias se dividem em uma ou mais cadeias ou quando duas ou mais cadeias ou nexo de cadeias se fundem em uma.

Governança

É uma maneira intencional de moldar a vida e as práticas que as pessoas levam e executam. A governança em si mesma é um tipo de cadeia. Assume a forma de extensos nexos de cadeia (como em uma coordenação policial).

Monitoramento

O âmbito do conceito inclui todo o tipo de atenção aos feixes e constelações, como escritórios do governo, sedes corporativas, salas de estar da família, bancos. O monitoramento é de suma importância para cadeias de ação e em conjunto com governança podem ser responsáveis por grandes nexos dela.

Dispositivos de coordenação

São dispositivos de ligação, de coordenação e sincronização de cadeias. Incluem relógios, telefones celulares, sinais de fumaça, mercado de ações, fitas, e monitores de negociação finanças in-ternacionais, entre outros.

Coordenação de discursos

É um conjunto de dizeres a respeito de um dado tópico suficien-temente unificados para formar uma perspectiva distinta sobre o que pode impulsionar e ligar o que acontece nos feixes. Essas perspectivas podem ser tênues como um conceito simples ou uma expressão disseminada entre dizeres em vários feixes sem que, contudo, forme uma perspectiva coerente; ou podem ser densas como uma doutrina mandatória que é espalhada entre feixes jun-tamente com a propagação de cópias de um documento ou livro.

Infraestruturas materiais

São materiais que sustentam cadeias e nexos. Infraestruturas são analiticamente diferentes de arranjos. Arranjos são constelações de materialidade se que entrelaça com feixes de práticas; as cadeias de ações se propagam em meio aos arranjos. Já as infraestruturas são constelações mais amplas de materialidade que abarca arranjos particulares, conecta arranjos e/ou supri necessidades materiais de feixes. Partes de infraestrutura são, frequentemente, arranjos.

Fonte: Baseado em Schatzki (2016a, p. 28).

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Governança

• Conceituação:

É uma forma intencional de direção, de influência e de inter-venção. A governança, na perspectiva da prática, é um termo plurilocal, ou seja, pode ser encontrada em vários lugares e/ou situações:

I) A governança está presente nas relações inerentes à coe-xistência humana, na maneira intencional de moldar a vida que as pessoas levam e as práticas que elas executam;

II) Toda prática-arranjo material traz em si atividades ineren-tes de governança;

III) Há feixes especializados em governança; é uma habilidade que determinados feixes alcançam; é em si mesmo um tipo de cadeia;

IV) Ligações entre feixes de governança formam uma constela-ção de governança, compondo, também, o plenário de práti-cas.

V) Governança como catalizadora de mudanças no plenário de práticas e materialidade de forma a estabelecer os ter-mos relativos de como a sociedade pode ser induzida a de-senvolver-se mais sustentavelmente.

Conceitos elaborados baseados em Schatzki (2015a).

• Formas de apreensão:

Como a prática é constituída por ações e arranjos materiais, a localização das práticas e ações de governança cabe ao pesquisador fazê-la a partir de entrevistas, da observação, do registro e da análise de fazeres e dizeres incorporados executados pelos responsáveis por essas ações, bem como pelos arranjos materiais entrelaçados à prática em es-

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tudo, procurando identificar as características do fênomeno social apli-cadas à governança:

a) Densidade (número de atividades, entidades, relações, fei-xes de práticas e constelações envolvidas pela governança por unidade no espaço tridimensional;

b) Duração (previsibilidade, continuidade, transitoriedade, mutabilidade);

c) Forma de atuação: maneira pela qual se molda ou dirige a ação (participativa/colaborativa, individual/autônoma, obri-gatória/mandatória, negociada/acordada), abrangendo enti-dades e relações estabelecidas entre elas, comportando tam-bém a materialidade (humanos, organismos, artefatos, tec-nologia) presente em arranjos materiais entrelaçados à ação;

d) Complexidade qualitativa (relativa ao contexto da prática, incluindo situações contingentes, interdependentes, emer-gentes, históricas e outros aspectos que singularizam o con-texto em estudo) e;

c) Extensão espacial: (i) alcance da ação realizada no contínuo entre restrito e amplo ou entre pequeno e grande espaço geográfico; (ii) escala geográfica de alcance da ação: feixe de governança local (considera as limitações geográficas do município), regional (área geográfica que envolve um gru-po de municípios), estadual, nacional, internacional etc).

Para elaborar a categoria operacional Governança a autora utilizou os conceitos relativos às características do fenômeno social, que são encontradas em Schatzki (2016a, p. 5), para adaptar estas caracterís-ticas à Governança como fenômeno social específico.

Schatzki (2016a) desenvolve conceitualmente somente as ca-racterísticas densidade e expansão espacial. Esta última, inclusive, teve seu conceito alterado pela inclusão de especificação sobre os tipos de delimitação espacial que podem ser considerados.

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A autora embasou-se no entendimento geral dos escritos de Schatzki (2005, 2006a, 2006b, 2010, 2016a, 2015a).

Inovação

• Conceituação:

O sentido da inovação nesta obra está relacionada com a ideia da indeterminação da ação articulado pela Teoria da Prática Social: a ação ou a atividade humana é um agir em direção a um fim a partir de algo motivador, por isso seu caráter indeterminado, impermanente e a abertura para o novo, para o dizer/fazer diferente mais que para a repro-dução da prática (SCHATZKI, 2006a; 2006b). Ademais, as atividades que compõem as práticas não são um conjunto de ações regulares pos-to que estão sujeitas a mudanças espaciais e temporais (SCHATZKI, 2005; 2010).

A inovação é o resultado da introdução de algo novo ou dife-rente na prática-arranjo resultante de dizeres (decisões) e fazeres (ações) (i) que modificam a prática-arranjo parcialmente ou integralmente, que (ii) alteram um ou mais de seus elementos constitutivos, que (iii) inse-rem novas atividades ou arranjos na prática, (iv) que estabelecem víncu-los com outras práticas, que (v) criam novas práticas.

• Formas de apreensão:

A localização da inovação pode ser percebida no dizer e no fazer diferente, em decisões que podem levar a alterações nas práticas, relacionadas (i) ao modo de fazer (método e processo), (ii) à organização do trabalho (pessoas, materiais, locais, etc), (iii) ao produto e/ou servi-ços, (iv) à inserção e utilização de tecnologia e recursos materiais, (v) aos objetivos e formas de relacionamentos com atores externos, (vi) aos planos (dizeres), (vii) entrelaçamento com outra prática-arranjo.

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Constelação local

• Conceituação:

Uma constelação local observa-se pelas ligações entre (i) feixes de práticas e arranjos materiais semelhantes ou não, (ii) entre práticas e (iii) entre arranjos materiais configurados em formatos diversos, distri-buídos espacialmente de formas diferentes, entretanto, delimitada por uma área geográfica onde se torna mais evidente o entrelaçamento da coexistência humana em um dado contexto. Neste livro, o local como endereço geográfico da constelação refere-se ao espaço urbano e rural do município.

Conceito desenvolvido pela autora baseado em Schatzki (2016a, 2015a, 2011).

• Formas de apreensão:

A partir das informações obtidas pelas entrevistas foi possível identificar na constelação local os feixes de práticas e de materialidade que se conectam, os que compartilham a materialidade em suas dimen-sões humanas e não humanas, utilizando como referência (i) tipos de relações que conectam feixes a constelações e (ii) a dinâmica da conste-lação local.

Os tipos de relações que conectam feixes a constelações, abor-dados por Schatzki (2011, p. 10-12), são:

a) Causalidade: quando as relações causais entre práticas e arranjos assumem duas formas proeminentes: (i) atividades que alteram o mundo e (ii) entidades e os acontecimentos que lhes sucedem, induzindo atividades;

b) Prefiguração: refere-se ao atual estado das coisas qualifi-cando a atividade futura, como, por exemplo, mais nume-rosa, mais fácil ou difícil, mais ou menos cara, mais básico

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ou mais complexo, mais rápido ou mais demorado, entre outros, de modo que os arranjos materiais prefiguram ou delineiam a perpetuação das práticas, ou seja, a repetição ou o redirecionamento dos atos e dizeres que compõem prá-ticas particulares. Os arranjos também podem prefigurar mudanças em outras práticas e arranjos, do mesmo modo as infraestruturas materiais existentes prefiguram altera-ções nestas infraestruturas ou possibilitam a introdução de novas infraestruturas;

c) Constituição: os arranjos constituem práticas ou quando são essenciais para essas práticas ou quando estão envolvidos com as práticas em uma extensão espaciotemporal. Também pode ocorrer o contrário: as práticas constituem arranjos quando dados arranjos não existiriam se não fossem as práticas especí-ficas;

d) Intencionalidade: ocorre quando as práticas são intencio-nalmente relacionadas com os arranjos e isso inclui pen-samentos e imaginações que os participantes têm sobre os arranjos e as ações que os participantes realizam em relação aos arranjos, inclusive usá-los;

c) Integibilidade: refere-se à compreensão e aos significados que os participantes têm dos arranjos materiais, dos aspec-tos humanos e não humanos da materialidade ligados à prática em questão.

A dinâmica da constelação local, considerando-a como fenômeno social amplo, pode ser explicada por eventos e processos que ocorrem em feixes e em seus componentes. Os conceitos que expressam as ocorrências em feixe, de acordo com Schatzki (2016) são: (1) acumulação, associação e agregação; (2) dissociação e dissolução; (3) colonização e absorção; (4) di-fusão, circulação e propagação; (5) estabilidade, solidificação, persistência e evolução; (6) bifurcação, diferenciação, síntese e polypization16; (7) entrela-çamento; (8) convergência e fusão; e (9) divergência e separação.

16 Polypization refere-se ao processo de formação de um pólipo. Informação concedida por Schatzki por e-mail [Schatzki, Theodore <[email protected]>] em 05 jan. 2017: “[...] It simply

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3.1.2. Definição de Outros Termos Relevantes

Outros termos relevantes para a pesquisa são: atores, feixes de práticas-arranjo, resíduos sólidos, gerenciamento de resíduos sólidos, gestão integrada de resíduos sólidos, conceituados a seguir.

Atores

• Conceituação:

Todas as partes envolvidas na gestão de resíduos sólidos in-dicadas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (BRASIL, 2010). Esses atores podem ser classificados nos seguintes grupos:

• Poder público envolve agentes públicos da administra-ção direta municipal, responsáveis pela Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (GIRS) e pelo Gerenciamento de Resíduos Sólidos (GRS), e os titulares dos serviços públi-cos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos; envolve também outras esferas públicas que regulam, diri-gem, coordenam e têm relação com a GIRS;

• Setor empresarial em geral, especialmente aqueles ligados às atividades relacionadas à gestão de resíduos sólidos;

• Fabricantes, fornecedores, comerciantes de embalagens;• Fabricantes, fornecedores, importadores, comerciantes de

produtos sujeitos à logística reversa, como: pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes (resíduos e embalagens), lâmpa-das fluorescentes, de vapor de sódio, mercúrio e de luz mis-ta, produtos eletrônicos e seus componentes, agrotóxicos (resíduos e embalagens).

means the process of the formation of a polyp. The idea is simply that from a certain distance certain social goings-on can look like the formation of a polyp and that a term that designates this can be used to help give an overview of social life”.

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• Sociedade civil17 - representada pelo conjunto de pes-soas físicas e jurídicas (entidades representativas de seg-mentos da sociedade civil – como Associação Comercial e Industrial de Cascavel (ACIC), Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Associação de Micro e Pequenas em-presas de Cascavel (AMIC), Sindicados Patronais de di-versos segmentos empresariais, entidades diversas como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e Organizações não Governamentais (ONG), alunos, síndicos de prédios, entre outros).

• Cooperativas e/ou associações de catadores, e catadores (pessoas físicas) de materiais reutilizáveis e recicláveis.

Resíduos Sólidos

Conceituação: Material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos esta-dos sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e lí-quidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnicas ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível (inciso XVI, Art. 3.o, Lei 12.305/10, BRASIL, 2010).

Gerenciamento de Resíduos Sólidos

Conceituação: Conjunto de ações exercidas, direta ou indire-tamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e des-tinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposi-ção final ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos ou com plano de ge-

17 Adaptação das entidades presentes no local da pesquisa, município de Cascavel.

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renciamento de resíduos sólidos, exigidos na forma desta Lei (inciso X, Art. 3.o, Lei 12.305/10, BRASIL, 2010).

Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (GIRS)

Conceituação: “Conjunto de ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável (inciso XI, Art. 3º, Lei 12.305/10, BRASIL, 2010).

Observa-se a Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (GIRS) pela presença de (Lei 12.305/10, BRASIL, 2010):

• Periodicidade de revisão: observado prioritariamente o pe-ríodo de vigência do plano plurianual municipal;

• Diagnóstico: contendo a origem, o volume, a caracterização dos resíduos e as formas de destinação e disposição finais ado-tadas;

• Metas de redução, reutilização, reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir a quantidade de resíduos e rejeitos encami-nhados para disposição final ambientalmente adequada;

• Identificação das possibilidades de implantação de solu-ções consorciadas ou compartilhadas com outros municí-pios, considerando, nos critérios de economia de escala, a proximidade dos locais estabelecidos e as formas de pre-venção dos riscos ambientais;

• Identificação de áreas favoráveis para disposição final am-bientalmente adequada de rejeitos, observado o plano dire-tor e o zoneamento ambiental, se houver;

• Identificação dos resíduos sólidos e dos geradores sujeitos ao plano de gerenciamento específico ou sistema de logísti-ca reversa, observado as normas e requisitos legais;

• Procedimentos operacionais e especificações mínimas a se-rem adotados nos serviços públicos de limpeza urbana e

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de manejo de resíduos sólidos, incluída a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e observada a Lei nº 11.445, de 2007;

• Indicadores de desempenho operacional e ambiental dos ser-viços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos só-lidos;

• Regras para o transporte e outras etapas do gerenciamen-to de resíduos sólidos, observadas as normas e disposições legais;

• Definição das responsabilidades quanto à implantação e operacionalização, incluídas as etapas do plano de geren-ciamento de resíduos sólidos a que se refere o Art. 20 a cargo do poder público;

• Programas e ações de capacitação técnica, voltadas para implantação e operacionalização;

• Programas e ações de educação ambiental que promovam a não geração, a redução, a reutilização e a reciclagem de resíduos sólidos;

• Programas e ações para a participação dos grupos interes-sados, em especial das cooperativas ou outras formas de as-sociação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, se houver;

• Mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda, mediante a valorização dos resíduos sólidos;

• Sistema de cálculo dos custos da prestação dos serviços pú-blicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, bem como a forma de cobrança desses serviços, observada a Lei nº 11.445, de 2007;

• Descrição das formas e dos limites da participação do po-der público local na coleta seletiva e na logística reversa, respeitado o disposto no Art. 33, e de outras ações relati-vas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.

• Meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito local, da implantação e operacionalização dos planos

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de gerenciamento de resíduos sólidos de que trata o Art. 20 e dos sistemas de logística reversa prevista no Art. 33.

• Ações preventivas e corretivas a serem praticadas, incluin-do programa de monitoramento;

• Identificação dos passivos ambientais relacionados aos re-síduos sólidos, incluindo áreas contaminadas, e respectivas medidas saneadoras.

3.2 DELIMITAÇÃO E DESIGN DA PESQUISA

Nesta seção é apresentado o desenho da pesquisa, consideran-do a definição da população e amostra, delineamento do estudo, etapas programadas para a pesquisa, perspectiva temporal, nível e unidade de análise, procedimentos de coleta e análise dos dados e aspectos éticos envolvidos na pesquisa qualitativa.

3.2.1 População e Amostra

A população da pesquisa envolve pessoas físicas e jurídicas es-tabelecidas no município de Cascavel, Estado do Paraná ou que nele desenvolve práticas (atividades) relacionadas aos resíduos sólidos. Mais precisamente, a população é composta por todas as partes envolvidas na gestão de resíduos sólidos indicadas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (LEI 12.305/10).

Essas partes envolvidas, denominadas genericamente de ato-res no decorrer deste estudo, foram classificadas em grupos na seção 3.2.3, Definição de Outros Termos Relevantes, deste Capítulo, de modo a tornar visível a dimensão da população envolvida no estudo. Resumidamente, os grupos de atores envolvidos na pesquisa são: (i) poder público; (ii) setor empresarial; (iii) fabricantes, fornecedores e co-merciantes de embalagens e de (iv) produtos sujeitos à logística reversa; (v) sociedade civil; (vi) associação e/ou, cooperativa de materiais reciclá-veis e catadores (pessoas físicas).

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Portanto, esta pesquisa caracteriza-se por ser multiator e mul-tilocal. Multiator porque envolve vários pesquisados que desenvolvem atividades distintas, contudo relacionadas a um mesmo assunto em co-mum: resíduos sólidos. E multilocal porque esses atores são pessoas e/ou organizações que detêm certa autonomia organizacional. Essa multilo-calidade destaca-se como um diferencial dessa pesquisa, porque embora exercendo práticas de resíduos sólidos singulares em seu domínio geo-gráfico, essas mesmas práticas se conectam a tantas outras e participam da constelação local de resíduos sólidos. Dizendo de outra forma, há uma integração intencional de diferentes ambientes locais (instituições) que este estudo procura conhecer.

A estratégia gradual de amostragem é a adotada para defini-ção e seleção da amostra, baseada na amostragem teórica18 , cuja lógica baseia-se na seleção gradual da amostra (pessoas, grupos, casos, ins-tituições e materiais) durante o processo de coleta e análise de dados (FLICK, 2009).

As seguintes condições do estudo para a escolha da amostra-gem teórica ressaltadas por Wiedemann (1995, p. 441 apud FLICK, 2009, p. 123) e que se aplicam a esta pesquisa são: (i) a extensão da população básica não é previamente conhecida; (ii) as características da população básica não são conhecidas antecipadamente; (iii) o tamanho da amostra não é definido previamente; (iv) a amostragem é concluída ao atingir-se a saturação teórica.

A amostragem teórica utiliza critérios relacionados ao conteú-do e escolhe as unidades amostrais consideradas promissoras e de rele-vância para o estudo e não por sua representatividade (FLICK, 2009). A unidade amostral é denominada caso, cuja definição é aquela que repre-senta um contexto de atividade interativamente realizado e realizável; tem como sinônimos ator(es) e local.

Esse princípio da seleção gradual da amostra é também com-partilhado pela pesquisa qualitativa no processo de coleta de dados (FLICK, 2009). A bola de neve (snowball) (WALLIMAN, 2006) foi

18 A amostragem teórica foi desenvolvida para ser aplicada em estudos de Grounded Theory, (Teoria Fundamentada), por Glaser e Strauss em 1967 (FLICK, 2009).

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utilizada para colher indicações de pesquisados sobre outros possíveis casos (atores/locais) incorporados na amostra, evidentemente mantendo o critério de relevância para o estudo.

O dilema da amostragem está em escolher a profundidade da análise ou alcançar o campo de forma ampla (FLICK, 2009).

O passo inicial para a escolha dos casos foi a partir da pesquisa documental na web, resultando em uma lista de locais a serem pesqui-sados. Durante as entrevistas, empresas foram citadas e ao final de cada entrevista foi solicitado indicação de empresas (snowball). Estas foram as principais estratégias para a escolha da amostra.

3.2.2 Delineamento e Etapas da Pesquisa

As bases ontológicas e epistemológicas subjacentes à pesquisa interpretativa repousam na ideia central de que a pessoa e o mundo estão intrinsecamente relacionados através da experiência vivida no mundo. O mundo humano nunca é um mundo em si mesmo, é sempre um mun-do experienciado, que sempre está relacionado com a consciência do sujeito. Essa base fenomenológica unifica os diferentes entendimentos que as diferentes abordagens interpretativas carregam. O pressuposto epistemológico da tradição interpretativa estipula que o conhecimento é constituído por meio da experiência vivida da realidade. Heidegger argumenta que a realidade é mediada através da experiência vivida, da cultura específica, do tempo histórico e linguagem na qual estamos situ-ados (SANDBERG, 2005).

A Teoria da Prática Social baseada no site ontology compartilha desses mesmos fundamentos ontológicos e epistemológicos, sustenta-dos nas ideias heideggeriana do Dasein.

A abordagem qualitativa, inserida no paradigma interpretativo, caracteriza esta pesquisa. “O termo qualitativo implica uma partilha den-sa com pessoas, fatos e locais que constituem objetos de pesquisa, para extrair desse convívio os significados visíveis e latentes que somente são perceptíveis a uma atenção sensível [...]” (CHIZZOTTI, 2003, p. 221).

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A pesquisa qualitativa se baseia principalmente na percepção e compreensão humana. Pode ser entendida com um tipo de pesquisa que busca conhecer algo em profundidade, buscando uma visão holística do problema social, envolvendo a interpretação numa abordagem na-turalística do assunto (GODOY, 1995; DENZIN; LINCOLN, 2000; STAKE, 2011).

Essencial na pesquisa qualitativa é a compreensão dos fenôme-nos a partir da perspectiva dos participantes, as suas visões subjetivas, qual o significado que as pessoas dão as coisas, aos acontecimentos, a experiência vivida, porque considera que a ação humana é significati-va (SCHWANDT, 2006). Procura entender bem uma coisa, buscando captar as singularidades e o contexto. Busca, portanto, preocupar-se com “os aspectos da realidade que não podem ser quantificados, centran-do-se na compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais” (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p. 32).

Dentro do espectro das epistemologias qualitativas, a com-preensão pode ser considerada participativa, conversacional, dialógica e negociada (SCHWANDT, 2006). Importante ressaltar a diversidade de pontos de vista e os significados múltiplos que emergem do estudo dão o caráter interpretativo à pesquisa qualitativa (STAKE, 2011). Para Schwandt (2006), o pesquisador interpreta o que ouve, vê, e entende, logo, suas interpretações não podem ser separadas de sua experiência, história, contexto e entendimento. O que é importante é a reflexividade do investigador, ou seja, do processo de reflexão do pesquisador sobre seu papel enquanto investigador e do quanto da pessoa (eu) influencia na pesquisa. O autor ainda reforça que a ideia não é livrar-se de precon-ceitos, mas sim examiná-los e compreendê-los e esforçar-se por mudar aqueles que se constituem barreiras para compreender os outros e a nós mesmos. Para Geertz (2012, p. 11), “somente o “o nativo” faz a inter-pretação em primeira mão: é a sua cultura” [grifo do autor], os demais fazem interpretações de primeira e segunda mão, de forma que construir descrições é construir algo, algo modelado sem perder a veracidade e fatuidade. Nesse sentido, as considerações dos autores citados são per-tinentes para entender que a primeira fonte do pesquisador já carrega

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interpretação, e o que chega por sua lente deve passar pela ação reflexiva, devestindo ideias preconcebidas e estar aberto para compreender o ou-tro em seu contexto.

A pesquisa qualitativa é experiencial, ou seja, é empírica e está ligada ao campo. A abordagem naturalística refere-se ao ambiente na-tural como fonte de coleta de dados, pois os pesquisadores consideram que um fenômeno pode ser mais bem observado no contexto em que ocorre, no local onde os participantes vivem o assunto ou problema em estudo (STAKE, 2011).

Desta forma, o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente, conversando com os participantes, interagindo face a face, observando seus comportamentos e atos dentro de seu contexto, é uma das características marcantes da pesquisa qualitativa e faz como que o pesquisador seja considerado o instrumento fundamental na pes-quisa em todas as suas fases (observação, coleta, análise e interpretação dos dados) (CRESWELL, 2007).

A postura do investigador é não intervencionista e não mani-puladora de dados. Procura formas de verificação para as interpretações realizadas, sobre como utilizar diversas fontes de dados, escolhe perfis diferentes de participantes, utiliza técnicas como entrevistas, observa-ções, anotações de campo, documentos, fotos, imagens, entre outros. E realiza triangulação de dados obtidos de diversas fontes, consultando participantes sobre a interpretação obtida e confrontando sua percepção com a de outros pesquisadores (CRESWELL, 2007, 2014).

Um aspecto importante da pesquisa qualitativa é o fato de que o conhecimento advindo com sua prática pode ser considerado situacional, ou seja, é relativo a contextos específicos, únicos, espaço e temporalmente limitados. Os contextos são descritos em detalhes. Cada local possui características específicas que impedem a genera-lização para uma população mais ampla. A generalização que pode ocorrer é a analítica (STAKE, 2011).

O método de análise da pesquisa qualitativa é, predominante-mente, o indutivo. É no local onde ocorre o fenômeno que a pesquisa deve ser realizada, sendo que as etapas de coleta e análise de dados são recursivas

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e interativas. Há uma circularidade entre os temas e dados empíricos até que se estabeleça uma compreensão dos temas (DENZIN; LINCOLN, 2000). O pensamento dedutivo também é aplicado à medida que os temas são constantemente checados com os dados. O método indutivo e deduti-vo representa o uso de habilidades de raciocínio complexo pelo pesquisa-dor durante todo o processo de pesquisa (CRESWELL, 2014).

Os temas abordados podem ser escolhidos por iniciativa e in-teresse do pesquisador (etic) ou pelos interesses expressos pelos partici-pantes (emic), sendo que esta última forma apresenta uma tendência de tornar-se predominante (STAKE, 2011).

O desenho da pesquisa é mais emergente do que pré-confi-gurado, o que significa que o plano inicial deve ser flexível, com pos-sibilidades de alterar o que foi previamente estabelecido depois que o pesquisador tenha entrado em campo e avaliado a conveniência ou não da continuidade do que foi programado diante do contexto que encon-tra (CRESWELL, 2014).

Os relatos da pesquisa qualitativa são descritivos, com detalhes interconectados, explorando a complexidades e especificidade da situa-ção e contexto. Importante que o pesquisador faça uma descrição densa, conectando os assuntos tratados com as teorias escolhidas e conheci-mentos científicos, assim como proporcionar uma experiência indireta (vicária) aos leitores, para que estes também façam suas interpretações (STAKE, 2011). O relatório final inclui as vozes dos participantes e a reflexão do pesquisador (CRESWELL, 2007).

A pesquisa qualitativa demanda tempo e recurso. Entre as ra-zões de escolha por um estudo qualitativo estão aquelas cujo objetivo é compreender o contexto e o grupo de participantes em uma questão específica, quando o problema é pouco conhecido (pesquisa explora-tória) e quando se busca o entendimento de um fenômeno como um todo, de forma detalhada, ou compreensão de relações sociais e culturais (pesquisa descritiva).

A pesquisa qualitativa à medida que busca compreender pro-fundamente o fenômeno social em foco no contexto e situação de sua ocorrência no campo empírico, que considera o investigador como o

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principal canal para a coleta e análise dos dados, e que constrói uma descrição densa caracterizada pela polivocalidade, revela ser o tipo de pesquisa para tratar adequadamente o problema, as perguntas de pes-quisa e os objetivos definidos nesta obra. Há que se ter um olhar especial para identificar e entender as práticas de governança de resíduos sólidos que somente uma pesquisa qualitativa oferece.

O estudo de caso é o método de procedimento escolhido. Estudos de caso são ricas descrições empíricas de casos particulares de um fenômeno que são tipicamente baseadas em uma variedade de fon-tes de dados (EISENHARDT; GRAEBNER, 2007).

O que distingue um estudo de caso é o estudo de um fenôme-no contemporâneo no contexto da vida real, especialmente quando as fronteiras entre o fenômeno e o contexto não são claramente evidentes. O estudo de caso permite uma investigação para compreender fenôme-nos sociais complexos, por isso as questões principais que o dirige são o “Como?” e “Por quê?”. Estas perguntas permitem um aprofundamento sobre o assunto estudado (YIN, 2005).

Como uma estratégia de pesquisa, o estudo de caso é um mé-todo que apresenta uma lógica de planejamento e formas de coleta e análise de dados adequados ao método e a abordagem do problema de pesquisa, sendo sempre uma opção do pesquisador a avaliação da pro-priedade de se adotar esta ou aquela técnica de coleta e análise de dados. Cada caso tem características atípicas importantes, acontecimentos, re-lacionamentos e situações que o tornam singular, dessa forma, não há como estabelecer uma estrutura rígida para a formatação do estudo de caso (STAKE, 2005). Importante destacar que no estudo de caso deve haver um delineamento de quais dados e informações são significativas e que auxiliam a elucidar o problema de pesquisa a fim de obter catego-rias suficientes, para não correr o risco de levantar dados não significa-tivos (YIN, 1981).

A escolha da amostra de casos deve ter como critérios principais a variedade da amostra intencional e o reconhecimento de oportunidades para estudos intensivos, ao invés de outras considerações como restrição logística, recepção potencial, recursos, entre outros (STAKE, 2005).

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Entender um caso geralmente requer extenso exame de como as coisas são feitas, mas a primeira referência em estudo de caso é o caso. Este pode ser entendido como um sistema integrado, no qual se reconhece características instrínsecas ao sistema (coerência e sequência devem ser encontradas) e também aquelas fronteiriças ao caso e ao seu contexto exterior (STAKE, 2005).

Stake (2005) coloca que a busca pela particularidade concorre com a busca da generalização em um estudo de caso. Para o autor, até mesmo estudo de caso intrínseco pode ser visto como um pequeno pas-so para grande generalização, especialmente em um caso que contraria a regra. Mas generalização não deve ser enfatizada em todas as pesquisas. O perigo da generalização é o pesquisador concentrar-se na teorização e esforçar-se menos para a compreensão do caso em si. Stake é favorá-vel à generalização naturalística, na qual há uma associação feita pelos leitores da descrição do caso com a vida particular dos mesmos. Já Yin (apud ALVES; MAZZOTTI, 2006) defende que a lógica da genera-lização comparativa, efetuada a partir de estudos de casos múltiplos, é a da replicação: ou se espera encontrar resultados semelhantes (replica-ção) ou diferentes (replicação teórica) em razão de fatores previamente antecipados pelo pesquisador.

A perspectiva temporal foi transecional, ou seja, com dados co-letados entre maio a novembro de 2016, uma única vez, contudo sem negar o movimento circular entre coleta e análise dos dados, o que per-mitiu voltar ao campo para levantar mais dados com o intuito de escla-recer determinada situação ou questão, porém poucas vezes essa volta foi necessária.

A teoria da prática assume a horizontalidade da vida social e, portanto, do fenômeno social. Não há níveis (verticais) na ordem social, pois todo fenômeno social está no mesmo nível ou plano. Entretanto, os fenômenos sociais diferem em extensão espaço-temporal ou em escala de suas práticas-arranjos, formas e relações que a compõem: do pequeno ao amplo, do local ao global (SCHATZKI, 2011, 2015a, 2015b). Nesse sentido, considerando essa visão ontológica da Teoria da Prática Social, a constelação local (já definida na seção 3.3.3 deste Capítulo) pode ser indicada como o nível de análise do estudo.

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A unidade de análise é a prática de governança de resíduos sólidos municipais. Como coloca Schatzki (2015a), a prática é um fenô-meno social e se deve assumi-la ontologicamente nos estudos sobre prá-tica como unidade de análise seja em qualquer configuração que apareça (prática-arranjos, feixes e constelações).

O propóstico deste estudo é compreender como as ações de governança acontecem, se desenrolam, se realizam dentro da constela-ção local de resíduos sólidos, que é formado, em última análise, por prá-ticas relacionadas aos cuidados relativos aos resíduos sólidos abrangendo a gestão, a separação e a coleta, a reciclagem e o reaproveitamento, o manejo e o tratamento, o transporte, a disposição temporária ou final desses resíduos.

Foi um estudo (i) delimitado geograficamente ao município de Cascavel, Estado do Paraná, entretando algumas práticas romperam esta delimitação, (ii) por envolver vários sites ou lugares (organizações de toda ordem que desevolvem práticas de resíduos sólidos) e que deman-dou (iii) acesso a uma multiplicidade de atores (polivocalidade) cujos fazeres e dizeres incorporados foram essenciais a este estudo. Nesse sentido, considerando que (i) as práticas ao mesmo tempo em que são situadas espaço-temporalmente e são versões da matriz de práticas e que (ii) elas são partes constituintes da ordem social, os resultados foram apresentados em feixes de práticas considerando o contexto específico e a historicidade de cada uma delas.

Este estudo contou com as seguintes etapas:1ª Etapa: Pesquisa documental, em sítios oficiais da web, visando

conhecer a Política Nacional de Resíduos Sólidos como um todo e especi-ficamente as regras para a gestão de resíduos sólidos em municípios;

2ª Etapa: Pré-campo é a fase de planejamento na qual há re-conhecimento dos lugares e das pessoas responsáveis a fim de obter au-torização e estabelecer uma agenda para pesquisa, abrangente o sufi-ciente para iniciar a pesquisa de campo, que pelo próprio desenrolar da permanência em campo, pela própria característica da prática e pelas cadeias de ações que a perpassam indicaram outros locais e atores a se-rem pesquisados. É nessa fase que o pesquisador, ao saber do modo de

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acesso permitido ao campo, determinará seu papel de insider ou outsider influenciando também nas escolhas das técnicas a serem aplicadas em cada localidade/ator selecionada (o) (FLICK, 2009).

3ª Etapa: As fases de coleta, tratamento e análise de dados ca-racterizam-se pelo movimento iterativo e circular e não pela sequencia-lidade das fases: a análise começa ao mesmo tempo ou logo após a coleta de dados e a extrapola muitas vezes.

4ª Etapa: Elaboração do relatório final da pesquisa: nessa fase a releitura minuciosa, crítica e reflexiva da temática são essen-ciais. É o momento de elaborar análises mais profundas e fazer cone-xões entre os achados; foi, também, o momento de correções e outros procedimentos finalísticos.

3.2.3. Procedimentos de Coleta de Dados

As fontes primárias de informações foram obtidas por meio de entrevistas, observação não participante, fotos e diários de campo e as fon-tes secundárias foram obtidas por meio de pesquisa documental, princi-palmente regras (leis, decretos), textos jornalísticos comprobatórios, home-page, entre outros, disponibilizados pela rede mundial de computadores.

Na fase antecedente à coleta de dados, foi realizada pesqui-sa documental, em sítios oficiais da web, visando conhecer a Política Nacional de Resíduos Sólidos como um todo e especificamente as re-gras para a gestão de resíduos sólidos em municípios, associado à pes-quisa bibliográfica para respaldar a interpretação dos dispositivos legais;

Ainda na fase de planejamento da pesquisa de campo, foi rea-lizada uma segunda etapa da pesquisa documental na web para levantar os possíveis atores a serem selecionados na pesquisa, incluindo deno-minações oficiais, endereços e responsáveis. Essa fase incluiu também visita in loco para contato inicial e sondagem sobre permissão de acesso à pesquisa de campo; coleta de autorização e agendamento prévio de entrevistas foi realizado. Como esta foi uma fase de planejamento, tam-bém envolveu o desenvolvimento de protocolo de controle e registro de

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entrevista, de observação e modelo de diário de campo de forma a facili-tar a coleta, o tratamento e a análise dos dados. Este período iniciou um pouco anterior a fase da coleta de dados até sua conclusão.

As fases de coleta e análise de dados caracterizam-se pelo mo-vimento iterativo e circular e não pela sequencialidade das fases: a análi-se começa ao mesmo tempo ou logo após a coleta de dados e a extrapola muitas vezes.

A entrevista enquanto técnica de coleta de dados exibe di-versas possibilidades de aplicação. Entre aquelas que se aplicam a essa pesquisa estão a entrevista em profundidade, a conversa informal, a entrevista com o sósia.

A entrevista em profundidade (in-depth interviewing) procura aprofundar o conhecimento sobre um assunto, reconhecer e entender o contexto do que se está pesquisando, considerando que a perspectiva do pesquisado é valiosa por refletir a sua experiência e conhecimen-to sobre determinado fenômeno social vivenciado por ele. Essa forma de entrevista é desenvolvida em um movimento dialógico que per-mite interpretar e validar a interpretação nesse momento de conversa (DARLINGTON; SCOTT, 2002).

Há também a entrevista em roupagem de conversa informal realizada no decorrer da observação e visitas in loco, que por se dar em um contexto informal abre a possibilidade de que o pesquisado se sinta mais livre e confiante para dar informações, ao mesmo tempo exige do investigador pleno conhecimento do que se queira saber. Para maior confiabilidade dos dados coletados, essas entrevistas foram gravadas em áudio a fim de que o registro não dependesse somente da memória do investigador.

Bauer e Gaskell (2015) chamam a atenção sobre a importância de elaborar um tópico guia para a entrevista, tendo como referência os fins e objetivos da mesma. Esse protocolo é mais uma relação de as-suntos a serem abordados, construído sobre uma lógica progressiva de profundidade ou especificação de um tema. É também um lembrete ao pesquisador no caso de esquecimento de algum tópico e pode ser utili-zado para controlar o tempo da entrevista. Entretanto, esse recurso foi

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dispensado na segunda semana e posteriormente foi aplicado em mais duas entrevistas. Importante ressaltar que em cada entrevista foi consi-derado o processo histórico da prática de resíduos sólidos desenvolvido pelo ator/local como forma de obter dados para municiar a análise de transformações e mudanças ocorridas na própria prática assim como identificar atores importantes nesse processo.

A entrevista com o sósia, Interview To The Double (ITTD), re-quer que o entrevistado imagine que ele tem um sósia que irá tomar o seu lugar no trabalho no dia seguinte. Ele age como um instrutor dando ins-truções detalhadas para que seu sósia não seja desmascarado. Esta técnica é especialmente útil para capturar o funcionamento da organização que orienta a conduta de seus membros e as dimensões normativas e moral da prática (NICOLINI, 2009a). Nessa pesquisa esse recurso foi utilizado de forma moderada, inserida dentro do contexto da entrevista.

A estratégia para iniciar a fase de coleta de dados foi escolher atores (organizações) que desenvolvam práticas de resíduos sólidos em seu âmbito de atuação. Os tipos de entrevista (em profundidade, infor-mal e com o sósia) aplicados foram definidos no momento de sua apli-cação conforme o nível de autorização recebida para o desenvolvimento da pesquisa em cada ator/local. O fator disponibilidade do tempo do entrevistado também contribuiu para que algumas entrevistas fossem mais objetivas e focadas na gestão de resíduos.

O conhecimento do campo se deu de forma progressiva, faci-litada pela técnica da bola de neve, que indicou atores que se mostra-ram relevantes para essa pesquisa. O critério para avaliar a interrupção da amostragem de diferentes grupos foi a saturação teórica, quando fi-cou evidente que dados adicionais não estavam surgindo na pesquisa (FLICK, 2009).

Foram realizadas 48 entrevistas, tendo sido a maioria gravada em áudio, exceto quatro, que foram registradas por escrito, e uma rea-lizada por telefone, contando com 1 (uma) desistência. Posteriormente todas foram transcritas em forma de relato.

Destacou-se nessa pesquisa o uso associado das técnicas de observação não participante ao da entrevista aberta em situação e/ou

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local cujo acesso foi permitido, momento no qual foi aproveitado para registrar artefatos, tecnologias, arranjos físicos e outras materialidades por meio de fotografias e vídeos.

No projeto de pesquisa havia a proposta de realizar dois grupos fo-cais, um com síndicos de condomínio predial e outro voltado para estudan-tes em idade escolar do nível fundamental. Foram pesquisados na internet telefones de condomínios, solicitei indicação de síndicos para colegas, e que estes pedissem aos seus colegas nas redes sociais. Mas foi uma surpresa para mim a dificuldade em entrar em contato com os síndicos, as resistências de porteiros e funcionários de prédios em fornecer o telefone do síndico, em encontrar o síndico na hora indicada, as desculpas dadas e a falta de interes-se em participar. Nesse processo, o ciclo de entrevistas continuava e percebi que o campo de pesquisa era muito maior do que tinha imaginado e a partir de então outras fontes passaram a ser priorizadas.

Em relação ao grupo focal com estudantes, após ser definido o público alvo como sendo de estudantes a partir do 7° ano, iniciou-se a fase de convite, que foi muito desgastante sem apresentar um resultado que pudesse ser confiável para a realização do grupo focal. Consultando minha orientadora, ela anuiu à ideia de trocar o grupo focal por palestras realizadas nas turmas a partir do 7° ano.

Vários foram os colégios convidados, para os quais se obteve três aceites e quatro recusas. Devo assinalar os colégios que aceitaram participar da pesquisa aderiram de pronto, por sua vez, os colégios que não aceitaram participar da pesquisa demoraram de 10 a 20 dias para dar retorno, apesar de e-mails e ligações realizadas. Alguns chegaram a justificar a não adesão.

A escolha das turmas foi realizada pelas coordenadoras pe-dagógicas, considerando o assunto abordado, a disciplina que traba-lha a temática e a disponibilidade do professor (a). Foram escolhidas duas turmas do 7° ano e uma do 9° ano. O título da Palestra foi “A Política Nacional de Resíduo Sólido e o Princípio da Responsabilidade Compartilhada”, com duração de 1 hora.

O diário de campo é um recurso etnográfico que objetiva re-gistrar diariamente o que acontece no espaço investigado. Os dados obtidos e as percepções do pesquisador fazem parte da construção

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do diário de campo (CAVEDON, 2014). Inicialmente foi elaborado um modelo para registro do diário de campo (manual ou por digi-tal), modelo este que foi utilizado na semana inicial e substituído por gravações, em um software de celular, sobre minhas impressões. Esses registros de áudio armazenados possibilitaram a identificação da própria subjetividade ética, de pré-conceitos, do viés pessoal e o entendimento de emoções e sentimentos.

Por exemplo, houve um período no qual consegui agendar duas entrevistas diárias, principalmente nas quartas, quintas e sextas feiras, uma no período matutino e outra no vespertino. Após as entrevistas, nada mais conseguia fazer, causando um estranhamento que só foi com-preendido ao longo do tempo: foram os entrevistados que demonstra-ram comprometimento com a causa ambiental, com o fazer a coisa certa de maneira certa, cujo perfil assinala para a experiência profissional e formação de ensino superior em cursos relacionados à área ambiental, funcionários e donos/sócios do próprio negócio, na faixa etária de 25 a 45 anos. Enfim, pessoas que tiveram contato com o movimento ecoló-gico, de uma forma ou outra.

3.2.4 Procedimentos de Tratamento e Análise de Dados

Os procedimentos para análise de dados foram os caracterís-ticos do método do estudo de caso que inclui a descrição detalhada do caso e do contexto (CRESWELL, 2014).

Cada ator/local de coleta de dados foi codificado e teve seus re-gistros guardados individualmente em pastas do computador. Os dados obtidos por meio de entrevistas foram gravados e redigidos em forma de relatos, e os obtidos por meio da pesquisa documental e da observação registrados de forma descritiva. Alguns dados qualitativos foram apre-sentados em formas de diagramas, fluxos e gráficos de rede. Foi utiliza-do o software Ucinet usualmente utilizado para análise de redes sociais (BORGATTI, EVERETT; FREEMAN, 2002) e nesta pesquisa foi aplicado para elaborar gráficos de mapeamento de relações entre atores e práticas.

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A prática de resíduos sólidos e a prática de governança foram os condutores da análise dos dados, assim como a forma de apresen-tação que foi agrupada conforme o tipo de prática de resíduos sólidos, especialmente aquelas relacionadas à logística reversa, procurando as-sociação entre os achados empíricos e categorias analíticas, apontando práticas divergentes e convergentes. A nomenclatura das práticas e dos feixes foi escolhida de acordo com os critérios: o primeiro foi a adoção do nome da prática já estabelecido pelos praticantes, o segundo foi, na falta do primeiro, escolher um nome que represente a atividade ou fina-lidade principal.

Os dados levantados levaram ao desenho da cadeia de ação de resíduos sólidos assim como ao feixe de governança de resíduos sólidos. Nesse sentido, o recurso de análise zoom in e zoom out (NICOLINI, 2009b) foram adequados para entender: (i) como as práticas são esta-bilizadas ou alteradas, com um olhar focalizado nas atividades e estru-turas de governança; e (ii) como ocorre as interconexões no tempo e no espaço entre diferentes práticas em um movimento para distanciar o olhar, permitindo uma visão mais ampla do cenário/do contexto, como o movimento de zoom out que uma câmera fotográfica faz.

Para Schatzki (2016b) parte da explicação de qualquer fenô-meno social (grande ou pequeno) é um relato histórico de como surgiu e como se perpetua, abordando o dinamismo das ações que provocam e mantém esses fenômenos, dando visões gerais sobre os feixes de prática arranjos que os compõem e sobre nexos de cadeias de ação que a eles conduzem, enfim, é uma apresentação, sob a forma de narrativa, que expressa a essência e ao mesmo tempo especifica elementos-chave. A outra parte é ontológica à medida que conceitua o relacionamento entre constelações (ou conjunto de aspectos) de práticas e disposições vincu-ladas ao plenário de práticas.

A pesquisa qualitativa sempre apresenta uma descrição deta-lhada. Como os pesquisados foram codificados, o relato teve inserção de registros literais, porém foi priorizado, para preservar os entrevistados, o relato sobre achados coletivos e quando singulares quadros sobre histó-ria de vida foram elaborados.

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A triangulação como um processo que utiliza múltiplas percep-ções para clarificar o significado, verificar a repetitividade de uma obser-vação ou interpretação e justificar interpretações é um recurso para evi-tar problemas de validação do estudo (STAKE, 2011), sendo importante também para a confiabilidade da pesquisa (PAIVA JR.; LEÃO; MELLO, 2011). Além disso, este procedimento enriquece o estudo porque o pes-quisador qualitativo está interessado na diversidade de percepção e até mesmo de realidades entre as quais as pessoas vivem e a triangulação aju-da a identificar essas diferentes realidades (STAKE, 2005).

A triangulação nessa pesquisa foi realizada principalmente por meio de distintas fontes de informação, seja pela aplicação de várias técnicas (pesquisa documental, fontes secundárias retiradas da internet, entrevista e observação), seja por envolver vários pesquisados em cada caso estudado, ora confrontando dados informados na entrevista para serem confirmados por fontes secundárias retiradas da internet, ora con-frontando informações com outros pesquisados.

Sandberg (2005) apresenta a constelação de verdade como cri-térios de validade em pesquisa qualitativa, inspirado nos conceitos de (i) realização percebida desenvolvido por Husserl, (ii) de realização na prá-tica por Heidegger e (iii) de realização indeterminada por Derrida. Essa constelação é formada pela validade comunicativa, validade pragmática, validade transgressora e confiabilidade, comentadas na sequência.

A validade comunicativa está relacionada com o critério de verdade e pode apresentar várias facetas. Uma delas é a comunidade de interpretação.

A comunidade de interpretação envolve em primeiro plano os pesquisados. Nesse sentido, o investigador procura esclarecer, antes do processo efetivo de coleta de campo, os objetivos da pesquisa ao(s) pesquisado(s) e como o processo será conduzido. Lembra, também, no início de cada encontro (entrevista/conversa) entre pesquisador e pes-quisado esses mesmos objetivos e processo de pesquisa.

Outro ponto é elaborar questões que encorajam o pesquisado a identificar e descrever seu entendimento sobre a experiência vivida a respeito de determinado assunto, submetendo à apreciação dos pesqui-

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sados as interpretações do investigador, momento este para esclarecer aspectos que ficaram obscuros, explorar significados, enfim, refinar a in-terpretação com a participação do pesquisado.

Na fase de análise do material empírico, a validade comunicati-va pode ser alcançada buscando uma interpretação coerente, baseada na noção do círculo hermenêutico: a interpretação é constituída pela rela-ção circular entre partes e o todo, ou seja, o todo está inserido na parte e vice-versa. De forma prática, significa que o material empírico pode ser analisado individualmente em termos de coerência com seu contexto, comparado com as demais interpretações de transcrições de entrevistas, pode ser separado por entendimentos semelhantes e/ou divergentes, en-tre outros procedimentos possíveis.

Uma terceira maneira de estabelecer a validade comunicativa é discutir os achados com outros pesquisadores e especialistas na prá-tica investigativa porque, embora os pesquisadores sejam os principais afirmadores do conhecimento produzido, é a comunidade científica, por meio do julgamento intersubjetivo, que decide sobre a verdade (origina-lidade) desse conhecimento.

Atenção especial foi dada às ações para estabelecer a validade comunicativa como (i) informar no primeiro contato (telefônico) os ob-jetivos da pesquisa, (ii) esclarecer o papel do pesquisado, apresentando o Termo de Consentimento Informado e Autorização para Publicação e colhendo assinatura, (iii) fornecendo pequenos resumos durante a en-trevista para o entrevistado com o intuito confirmar o entendimento da pesquisadora, (iv) confrontando dados de outros entrevistados sobre o mesmo tema (v) assim como confrontando informações obtidas por meio de pesquisa documental com as obtidas por meio de entrevistas.

A validade pragmática envolve testar o conhecimento pro-duzido na ação porque se pressupõe que embora os pesquisados não distorçam sua experiência vivida, suas descrições são mediadas por im-pressões que têm do gerenciamento, ações políticas, códigos sociais, morais e contexto cultural que podem produzir discrepância entre a entrevista e a vida experenciada.

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Uma forma de reduzir essa discrepância é (i) procurar fazer perguntas que transportem o pesquisado para situações reais vivencia-das a fim de saber qual a atitude tomada diante de tal situação; é (ii) dar, deliberadamente, outro significado ou entendimento a determinada situação ou conceito, observando a reação do pesquisado, e ainda (iii) as observações de fazeres e dizeres podem ser comparados com os dados obtidos por meio de entrevistas.

Para assegurar a validade pragmática, as três estratégias acima foram adotadas, a segunda com menos frequência que as demais.

A validade transgressora pressupõe que o pesquisador deve esforçar-se para conseguir uma interpretação coerente. E para tal, deve procurar formas de ambiguidade, complexidade e multiplicidade nas in-vestigações realizadas. Uma dessas maneiras é usar ironia para prover ou-tras perspectivas interpretativas de forma a tornar-se ciente daquelas que apropriamos na investigação. Procurar por diferenças e contradições mais que por coerência é outra forma de ativar a validade transgressora. Uma terceira forma de obter este tipo de validade é procurar inserir a participa-ção da mulher entre os pesquisados a fim de conseguir captar o olhar fe-minino em um contexto cultural frequentemente moldado e estruturado dentro de um imaginário masculino, como é a cultura ocidental.

Efetivamente as informações coletadas no momento da en-trevista foram comparadas com informações levantadas em entrevistas realizadas anteriormente com outros entrevistados. É um processo cog-nitivo que gera uma dada avaliação possibilitando, quase de imediato, elaborar questões para dirimir dúvidas. Contradições e distorções na fala são percebidas pelo investigador senão no momento da coleta, é certo no momento da análise ao ouvir o áudio da entrevista e ao realizar a triangulação de dados.

Acreditando na retidão de intenções e que estas são percebidas pelo outro mantive meu posicionamento costumeiro de compromisso com a pesquisa e com o tema, procurando desenvolver um olhar para abarcar o todo e as especificidades, evitando usar a ironia como um ins-trumento da validade transgressora.

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Em geral os entrevistados desempenham papéis de direção, gerência e especialista. Este é o público alvo. Do total de 48 en-trevistados, 11 (23%) eram mulheres, inseridas naturalmente como participantes da pesquisa.

A confiabilidade na pesquisa qualitativa está relacionada aos pro-cedimentos adotados pelo investigador em relação à forma de seleção dos pesquisados, à condução da coleta, à verificação e ao controle das interpre-tações ao longo do processo de pesquisa assim como às decisões sobre como relatar os resultados. Nesse sentido, a confiabilidade está intrinsecamente atada à consciência interpretativa do investigador fundada no pressuposto de que o pesquisador não pode escapar de suas interpretações e, portanto, deve assumir esse fato e buscar caminhos para lidar claramente com a sub-jetividade inerente ao processo de pesquisa (SANDBERG, 2005).

Em relação a esses aspectos, destaco que a seleção das organi-zações pesquisadas teve influência da bola de neve, porém, a escolha se deu em função das atividades que desenvolve, e este fato está intrinseca-mente ligado à pessoa do participante da pesquisa e, consequentemente, ao cargo que ocupa, como comentado acima. Então, nesse aspecto não houve interferência da pesquisadora. A coleta foi realizada in loco, onde a prática se desenvolve (parcial ou integralmente), na maioria dos casos, possibilitando a observação desses espaços.

Na fase final, da elaboração do relatório final da pesquisa, não houve retorno ao campo, muitas lacunas foram preenchidas pela pesqui-sa na Web relacionada às regras, à checagem de informação, à coleta de registros históricos e informações sobre os diversos atores.

As escolhas metodológicas na pesquisa qualitativa assim como a condução da pesquisa no campo empírico estão diretamente relacio-nadas aos aspectos éticos que a envolve. A confiabilidade e a não mani-pulação dos dados são algumas das questões éticas abordadas na próxi-ma seção.

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3.3 ASPECTOS ÉTICOS ENVOLVIDOS NA CONDUÇÃO DA PESQUISA

Christians (2006) indica quatro diretrizes para condução éti-ca na pesquisa qualitativa: o consentimento informado, a privacidade e confidencialidade, a fraude e a precisão.

O consentimento informado respeita a autonomia individual do participante informando-os sobre a natureza, objetivos ou finalidades da pesquisa, os métodos da pesquisa, a duração prevista e as consequências advindas de sua participação. Os participantes têm que aderir voluntaria-mente à pesquisa, sem que haja qualquer tipo de coerção física e psicológica. Ademais, têm que concordar em dar informações completas e transparen-tes, (CHRISTIANS, 2006), e serem informados da possibilidade de se re-tirarem da pesquisa em qualquer tempo (DARLINGON; SCOTT, 2002).

Ao anuir à informação consentida os participantes autorizam também a divulgação da pesquisa. Quando a pesquisa envolve crianças é importante que uma terceira parte seja envolvida para a proteção delas, geralmente na figura dos pais que devem consentir por escrito, como em todo consentimento informado que é assinado pelo participante, após ter sido dado todos os esclarecimentos sobre os objetivos da pesquisa. O pesquisador deve avaliar a necessidade de realmente envolver as crianças na pesquisa (DARLINGON; SCOTT, 2002).

A privacidade e confidencialidade atendem ao princípio do res-guardo da identidade e da não causação de danos. A proteção da identi-dade de indivíduos e dos locais de pesquisa são medidas preventivas de se-gurança contra a exposição indesejada, pois ninguém deve ser prejudicado ou constrangido porque participou da pesquisa e de alguma forma sofreu alguma exposição que trouxe prejuízos a sua pessoa. Ainda assim há o risco do reconhecimento por parte dos pesquisados de situações, de locais e relatos inseridos nos relatórios de pesquisa mesmo tendo sido usados recursos de simulação e disfarces (CHRISTIANS, 2006).

Os métodos de observação podem ser muito intrusivos, prin-cipalmente se houver o uso de recursos de gravação e filmagem. Estes aparatos podem influenciar o comportamento dos entrevistados e tam-

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bém se referem ao aspecto ético e não somente metodológico. O ar-quivamento adequado, a acessibilidade desses dados e a garantia de não serem usados para outras finalidades é um dever do pesquisador (DARLINGON; SCOTT, 2002).

A fraude refere-se a distorções deliberadas realizadas pelo pes-quisador quanto às informações obtidas, manipulação de dados e plágio. A precisão envolve tanto uma descrição precisa quanto aos procedimentos da pesquisa quanto à atitude do pesquisador diante da veracidade dos dados e análises produzidas pela pesquisa, sem que mentiras, materiais fraudulentos, omissões e maquinações façam parte dela (CHRISTIANS, 2006).

Ao início de cada entrevista foi apresentado um Termo de Consentimento Informado e Autorização para Publicação. Todos con-cordaram com o Termo e assinaram duas vias, informando os dados para preenchimento dos campos de identificação. As entrevistas foram codificadas. O Termo de Consentimento foi elaborado com autorização para divulgação do nome da organização participante e do cargo do en-trevistado. O entrevistado [E01] autorizou expressamente a divulgação do seu nome. Apenas duas empresas [E04 e E34] solicitaram codinome para citação da organização, o que foi respeitado; um entrevistado [E34] não permitiu a gravação da entrevista em áudio e as informações foram registradas por escrito; e um entrevistado concedeu a entrevista por tele-fone [E41]. Os relatos das entrevistas foram encaminhados por e-mail, entretanto, o índice de retorno foi de 15%. Em relação às Palestras dadas nos colégios, somente um deles solicitou Termo de Autorização para ser enviado e aprovado para os pais.

Importante ressaltar o cuidado a pesquisadora ao emitir suas opiniões aos pesquisados durante a permanência em campo. O com-promisso com a verdade e a ética é um pressuposto essencial para o pesquisador.

3.4. LIMITAÇÕES DA PESQUISA

No projeto de tese tinha sido planejada a aplicação de focus group para síndicos de condomínios e para um grupo de estudante com

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a finalidade de buscar informação sobre a prática das famílias na se-paração e disposição de resíduos recicláveis. Entretanto, a pesquisa foi tomando outro caminho e diante de dificuldades apresentadas para re-crutamento e confirmação na participação nos dois grupos focais. Foi decidido realizar palestras em colégios públicos e particulares, tendo como alvo as séries 7°, 8°, e 9°. Vários foram os colégios convidados, não obstante somente 3 (três) deles deram seu aceite.

Uma das limitações encontradas na fase de coleta de dados re-fere-se aos entrevistados. Não foram com todos os entrevistados que conseguimos abordar a estrutura de governança da prática, seja pelo re-duzido tempo disponível para a entrevista, seja pela minha percepção de que não havia predisposição do entrevistado em aprofundar a entrevis-ta, seja porque não adiantava perguntar algo mais profundo diante da circularidade de ideias apresentadas pelo entrevistado. E, fato, alguns entrevistados não entendiam o que eu perguntava, por mais explicações que eu desse, comentando com exemplos ilustrativos, e fazendo formu-lações diferentes das questões usando palavras diferentes. Analisando o perfil dos entrevistados, aqueles que apresentaram maiores dificuldades foram aqueles que trabalhavam distantes da realidade cotidiana dos re-síduos sólidos, mostrando informação restrita a respeito da temática.

Outra limitação significativa encontrada foi a ausência de abertura para a observação participante em alguns locais pesquisados e esse foi um dos motivos para adotar a observação não participante como uma das estratégias de coleta de dados. Houve outras limitações, contudo elas não afetaram a condução da pesquisa.

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CAPÍTULO 4 FEIXES DE PRÁTICAS DE

RESÍDUOS SÓLIDOS

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Neste Capítulo são apresentadas as prática-arranjos pertinen-tes aos resíduos sólidos organizadas em seus Feixes de Práticas, como os Feixes: de Prática do Programa Coleta Legal, de Prática Gestão Cooperativa de Material Reciclável, de Prática de Limpeza Urbana, de Prática de Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares, de Prática de Gestão Integrada de Resíduos da Construção Civil, finalizando com o Feixe de Governança de Resíduos Sólidos.

Ao relato de cada feixe segue a análise fundamentada nas ca-tegorias analíticas propostas no Capítulo 3, Metodologia. A análise considera os aspectos da configuração da governança de cada feixe, das relações entre prática-arranjos, entre práticas diferentes, das caracterís-ticas presentes na cadeia de ação, e da dinâmica de fenômenos sociais aplicados à constelação local de resíduos sólidos.

Nesse Capítulo, o feixe que inicia a descrição é o do Programa Coleta Legal, o qual se caracteriza pela polivocalidade. O relato consi-dera contribuições dos Entrevistados [E25, E28, E33, E38, E39 e E40], porém sem individualizá-los, e da pesquisa documental, cuja fonte prin-cipal foi a rede mundial de computadores.

4.1 FEIXE DE PRÁTICA DO PROGRAMA COLETA LEGAL

A Lei Orgânica do Município de Cascavel, de 1990, no inciso XI do Art. 118 coloca, entre outros deveres municipais referentes ao meio ambiente, o incentivo a solução de problemas comuns relativos ao meio am-biente, mediante celebração de acordos, convênios e consórcios, em especial para a reciclagem de resíduos. Em 1993, a Lei Municipal 2.366 permite ao Poder Público Municipal patrocinar serviço de tratamento e reciclagem de lixo em Cascavel (CASCAVEL, 2016a; DUARTE et al., 2013).

No intuito de cumprir essa lei, em 1994 foi desenvolvido um estudo de viabilidade para implantação da coleta seletiva em Cascavel possibilitado por um acordo de cooperação técnica e científica em 1995, firmado entre a Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Fundetec), a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e o Instituto de Saneamento Ambiental (Isam), e em 1995

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foi elaborado um projeto piloto para coleta seletiva de resíduos sólidos urbanos em Cascavel desenvolvido pelas instituições citadas.

Em 1998, iniciou a construção do Centro de Processamento, Tratamento e Transferência de Materiais Recicláveis (CPTMR), uma estrutura física com espaço para a separação de materiais recicláveis, espaço para educação ambiental, área administrativa e refeição, apro-priada para receber caminhões de coleta e espaço para estacionamento de veículos pequenos. A Figura 3 registra os principais fatos históricos dessa prática.

FIGURA 3 – FATOS HISTÓRICOS DA PRÁTICA DE GOVERNANÇA DA COLETA SELETIVA EM CASCAVEL

Fonte: Elaborado pela autora, 2016.

Pensando em uma forma de integrar no programa de Coleta de Seletiva os catadores de materiais recicláveis de uma forma mais or-ganizada, a Secretaria Municipal de Ação Social, em 1999, implantou o projeto Agentes Ecológicos, no qual os antigos catadores recebiam uni-formes, crachás, uma cesta básica por mês e carrinhos padronizados para coletar materiais recicláveis. E em abril 2000 o programa Ecolixo foi oficialmente lançado (NAZZARI et al., 2009; DUARTE et al., 2013;). Ganhou o Prêmio Ambiental do Governo do Estado do Paraná (de eficiência) e o 8º Prêmio Expressão de Ecologia (de dimensionamento do programa), ambos em 2000 (NAZZARI et al., 2009).

Em 2002 o Ecolixo foi premiado pelo Programa Caixa Melhores Práticas em Gestão Local no ciclo 2001/2002, e premiado também pelo Best Practice and Local Leadership Programme do UM-HABIT como uma das boas práticas do ano 2002 no âmbito mundial (SALVIANI, 2012).

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Em 2003 o Programa de Coleta Seletiva para Reciclagem Ecolixo foi apresentado na sede da Associação dos Municípios do Oeste do Paraná (Amop) para prefeitos da região, além de secretários mu-nicipais, vereadores e técnicos do setor ambiental (SANEAMENTO BÁSICO, 2016). Nos anos vindouros o programa não apresentou avan-ços significativos.

Em julho de 2010 o programa foi revisto e passou a ser cha-mado de Programa Coleta Legal, o serviço de coleta seletiva porta a porta com o objetivo de conscientizar a população sobre a importân-cia da separação do lixo (O PARANÁ, 2015). Em agosto a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Sema) entregou ao Instituto Ambiental do Paraná (IAP) a proposta do Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (CASCAVEL, 2016b). O Ecolixo passou a designar o local para destinação de resíduos volumosos, eletroeletrônicos e a estrutura física para algumas áreas da Secretaria de Meio Ambiente, como a Educação Ambiental, Gestão de Resíduos Sólidos, entre outros.

Até 2010, somente 10 bairros estavam inclusos na coleta sele-tiva porta a porta, o que representava 10% do material reciclável gerado em Cascavel. Em 2011 houve uma mudança no modelo de gestão do resíduo reciclável, passando a ser uma gestão híbrida entre o governo Municipal, a prestadora do serviço de coleta (Ambiental Cascavel) e a Cootacar. O CPTMR continuou recebendo resíduos tanto de cata-dores quanto de doadores voluntários. O Programa Coleta Legal foi ampliado, com acréscimo de mais um caminhão baú para se juntar aos outros que faziam este serviço. Com o objetivo de manter o programa foi distribuído sacos de ráfia nos domicílios e iniciada ação de sensibili-zação ambiental realizado por educadores ambientais com a finalidade de orientar moradores sobre a importância da reciclagem para o meio ambiente (CASCAVEL, 2016c; 2016d).

O programa Coleta Legal atingiu 97% dos bairros de Cascavel em 2012, iniciando uma nova ação direcionada aos condomínios e prédios para participarem da Coleta Seletiva. Em 2015 apresentou novas mu-danças como disponibilizar na internet o Portal do Coleta Legal, http://www.cascavel.pr.gov.br/coletalegal/, onde consta mapa dos bairros, dias e períodos de coleta e outras informações relativas aos resíduos sólidos. Nesse ano, todos os resíduos sólidos recicláveis passaram a ser entregues diretamente nas cooperativas de materiais recicláveis conveniadas com

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o município e os resíduos volumosos (sofá, cama, colchão, móveis em geral) e eletrônicos passaram a ser entregues na instalação do Ecolixo, antigo Centro de Processamento e Tratamento de Materiais Recicláveis (CPTMR), funcionando como depósito e centro de triagem desses mate-riais, garantindo assim para que tenham destinação correta (CASCAVEL, 2016c; 2016d).

O Ministério Público (MP) abriu um inquérito para apurar se os trabalhos realizados pelo Programa de Coleta Seletiva em Cascavel estavam sendo realizado de forma adequada. Em setembro de 2016, o MP arquivou o processo declarando que a implantação da coleta seletiva estava em concordância com os moldes previstos pela PNRS, com a uti-lização de cooperativas e associações de catadores, emprego de metas e métodos de coleta adequados e, desenvolvimento de educação ambien-tal (CASCAVEL, 2016e).

A Prática de Governança da Coleta Seletiva de Materiais Recicláveis é realizada pela coordenação da Governança da Educação Ambiental. As principais práticas desenvolvidas pela Governança da Educação Ambiental podem ser observadas na Figura 4.

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FIGURA 4 – PRINCIPAIS PRÁTICAS COORDENADAS PELA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

A educação ambiental é um dos instrumentos da PNRS (inciso VIII, Art. 8º). A governança da Educação Ambiental cola-bora com todas as áreas da Secretaria de Meio Ambiente coordenan-do práticas de educação ambiental de caráter eventual ou continuado, como a prática de Inventário do Plano de Arborização, a prática do Disk Problema, Descarte de Volumosos, entre outros. Cabe à Educação Ambiental a governança do Programa Coleta Legal.

De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (BRASIL, 2010), o princípio da responsabilidade compartilhada signi-fica um conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabri-

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cantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos com a finalidade de mitigar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados e os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos.

Esse aspecto inovador do compartilhamento de responsabili-dade torna o cidadão também responsável por realizar a sua parte indi-vidual de atribuições que é segregar corretamente os resíduos recicláveis, disponibilizando-os para coleta seletiva ou depositar os resíduos nos co-letores disponíveis, dar destinação correta de embalagens e produtos ao final de seu ciclo de vida.

Em Cascavel, há dois tipos de segregação: resíduo orgânico e resíduo reciclável. Os cuidados que o cidadão deve ter com os resíduos recicláveis são fáceis, porém exige higiene:

cuidar não contaminá-los com resíduo orgânico; (ii) dispor esses resíduos limpos sem restos de conteúdo (garrafas pet, tetra pak, lati-nhas de metal, plásticos e potinhos de plásticos, embalagens de papel e metálica, isopor, entre outros) a fim de não gerar mal cheiro na residência e no armazenamento do condomínio até que seja descar-tado assim como evitar que bichos sejam atraídos pelos conteúdos residuais das embalagens; (iii) procurar identificar peças de vidro, principalmente se quebrado, colocando-o em caixa ou em embala-gem pet ou tetra pak (com a face superior da embalagem cortada), a fim de evitar acidentes com os coletores.

Importante ressaltar que esses materiais são encaminhados às Cooperativas onde os cooperados ou aparistas vão manipulá-los, valendo desta forma, a mesma regra quanto a limpeza, higiene e segu-rança desses materiais.

O programa Coleta Legal em Cascavel é executado no modelo porta a porta e atinge 97% dos bairros da cidade em 2016. Os bairros foram agrupados por setores e segue um cronograma padrão no qual os caminhões da Coleta Legal passam recolhendo os resíduos recicláveis uma vez por semana, de segunda a sábado, no período da manhã ou da

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tarde. Esse mapeamento pode ser consultado no Portal da Coleta Legal (CASCAVEL, 2016f ), conforme ilustra a Figura 5.

FIGURA 5 – MAPA DO PROGRAMA COLETA LEGAL NO MUNICÍPIO DE CASCAVEL

Fonte: Portal do Programa Coleta Legal (CASCAVEL, 2016f ).

Dentro do cronograma geral, o setor de Coleta Legal elabora a rota e as distribui aos motoristas e coletores, que passam a cada do-micílio, condomínio, prédio ou comércio recolhendo os sacos de ráfia e transferindo seu conteúdo aos caminhões, que vão compactando o ma-terial, e devolvendo a sacola de ráfia no quintal do domicílio.

Quando o caminhão está com carga completa é conduzido para entrega dos resíduos na Cooperativa indicada na rota. A rota exe-cutada pelo caminhão está sujeita a fiscalização randômica. Essa cadeia de ação pode ser observada na Figura 6.

A prática da Coleta Legal está entrelaçada com outras prá-ticas desenvolvidas seja na própria Secretaria de Meio Ambiente seja em outras secretarias ou organizações, conforme será explicado na seção seguinte. A prática de segregação, organização e destinação de resíduos

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recicláveis executados pelas Cooperativas será abordada em seção pos-terior em virtude das particularidades que apresenta.

O entrelaçamento entre a Prática da Coleta Legal com outras práticas revela a cadeia de ação, os atores envolvidos, o compartilha-mento de atividades e arranjos e a abrangência da prática, e se torna significativo para a compreensão do contexto. A continuação do relato aborda esse aspecto.

FIGURA 6 – PRÁTICA DE COLETA LEGAL PORTA A PORTA EM CASCAVEL

Fonte: Elaborado pela autora baseado em dados primários, 2016.

O programa Coleta Legal é coordenado pela Secretaria do Meio Ambiente, porém os recursos materiais que possibilitam o serviço, em sua grande maioria, são da Ambiental Cascavel, empresa contratada para os serviços de coleta de lixo e limpeza urbana. No total são 6 caminhões alocados para a coleta seletiva. A Ambiental disponibiliza equipe de cole-tores, 4 caminhões e 6 motoristas, porque 2 caminhões são da Sema.

A prática de fiscalização da Coleta Legal desse serviço é ran-dômica na maioria das vezes e intencional quando há reclamações ou problemas detectados em alguma rota. Um fiscal da Secretaria Municipal de Cascavel (Sema) realiza este trabalho, acompanhando o serviço dos

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caminhões de coleta seletiva. Uma vez identificado situações que pre-cisam de ajustes informa ao coordenador do programa. É também um contato de referência com as cooperativas de materiais recicláveis as-sim como procura identificar, juntamente com motoristas e coletores, bairros com baixo índice de segregação de resíduos recicláveis da coleta seletiva para desta forma acionar a equipe de Sensibilização Ambiental.

O setor de Coleta Legal mantém canal de comunicação aberto à população, chamado de Ouvidoria. O cidadão pode ligar para o te-lefone 3902-1392 para solicitar informações sobre dia e período que o caminhão passa em seu bairro, por exemplo. Reclamações também po-dem ser feitas por esse telefone e pelo Ouvindo Cidadão (telefone 156).

As principais reclamações se referem à desordem feita com o resíduo reciclável colocado nas sacolas de ráfia e o sumiço das saco-las de ráfia dos moradores. Os coletores de lixo reciclável são treina-dos para despejarem o conteúdo da sacola de reciclável no caminhão e, ato contínuo, devolverem à residência, jogando-o por cima do muro. Reclamações semelhantes acontecem em condomínios. O fato é que coletores autônomos de material reciclável remexem nas sacolas de rá-fias e muitas vezes levam com eles essas sacolas. Assim, o cidadão não tendo a sacola de ráfia para colocar seus materiais recicláveis, coloca-os em sacos comuns, o que muitas vezes leva os coletores do lixo domiciliar confundi-los com o lixo comum. Ou seja, não há eficácia na destinação dos resíduos recicláveis nesses casos.

Para repor a sacola de ráfia o cidadão pode ligar para os tele-fones disponibilizados pela Coleta Legal e solicitar nova sacola de ráfia. Na próxima coleta, o motorista a entrega na residência.

A prática de Sensibilização Ambiental é realizada porta a porta ou a domicílio em bairros diagnosticados com baixo percentual de separação por educadores ambientais, contratado como estagiários (inicialmente eram 19 e atualmente são 11), matriculados em cursos universitários que têm relação com a área ambiental. A coordenação do programa distribui a rota a ser feita e se deslocam com uma van para os bairros selecionados, geralmente essas visitas se estendem por mais de um dia (CATVE, 2016). A equipe leva mapas e sacos de ráfia com

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cartilhas informativas e abordam as pessoas em suas casas, orientando sobre a separação de resíduos recicláveis e informando dia e período que o caminhão da Coleta Legal passa naquele bairro e entregam os sacos de ráfia.

E quando não encontram as pessoas, colocam a cartilha e o saco de ráfia no quintal. Os sacos de ráfia são fornecidos mensalmente pela Ambiental Cascavel, empresa contratada para o serviço de coleta de lixo no município. Com as informações registradas pelos estagiários, há controle sobre domicílios visitados e sacos de ráfia entregues, data, lo-cal, entre outros dados. Embora a educação ambiental seja um processo lento e gradativo, a eficácia dessa prática já foi comprovada em períodos anteriores nos quais se observou uma elevação da quantidade de mate-rial reciclável segregado e disponibilizado para Coleta Legal em áreas que foram alcançadas por essa prática (CASCAVEL, 2016e).

A prática de Sensibilização Ambiental compartilha com a prática de Inventário do Plano de Arborização a equipe de estagiá-rios, van, motorista e a coordenação. Em semanas alternadas a equipe é dedicada a cada uma das práticas citadas. As atividades relacionadas à manutenção do plano de arborização se referem ao levantamento qua-litativo de dados in loco para cadastramento (inventário) ou atualização do cadastro das árvores urbanas localizadas nas vias públicas, canteiros centrais e praças da cidade.

A Secretaria de Planejamento (Seplan) que gerencia o sistema informatizado desenvolvido especificamente para esta finalidade, carre-ga os tablets com as áreas a serem cadastradas, onde serão coletados os atributos de cada árvore, no que se refere aos aspectos localização, carac-terísticas da árvore e características do meio onde a árvore se encontra (CASCAVEL, 2016g). Os tablets são encaminhados à coordenação da Coleta Legal para entregá-los aos estagiários, que analisam árvore por árvore, identificam as espécies, tiram fotos e procedem a verificação de 19 critérios que inserem diretamente no sistema informatizado. O Plano de Arborização Urbana de Cascavel foi uma exigência do Ministério Público respaldado pelo Estatuto da Cidade, Lei 10.257/2001.

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A prática de Sensibilização para Coleta Seletiva em Condomínio inicia com a ligação do síndico ou seu representante para os telefones do programa (3902-1392 ou 3902- 1389), solicitando o agendamento da visita técnica no condomínio. Nessa ligação é preen-chido o cadastro do condomínio. Na data agendada, a equipe formada por funcionários da secretaria (atualmente um fiscal e uma estagiária) se desloca para o condomínio e procede a verificação in loco sobre existên-cia de lixeiras externas ou não, quantidade de moradores, zeladores, por-teiros e entre outros itens, assim como orienta como fazer a separação dos diversos tipos de resíduos sólidos; informa sobre o dia da semana e período que o caminhão da coleta irá passar coletando os materiais recicláveis e entrega a bolsa de ráfia apropriada para condomínios e os sacos de ráfia para cada apartamento. Ao retornar para o Ecolixo, as informações são cadastradas (CASCAVEL, 2016h).

Essa prática compartilha recursos materiais (escritório), tecno-lógicos (computador) e humanos (estagiária) com o Disk Árvore, que é um programa lançado em janeiro de 2010 com a finalidade de ampliar a arborização do município. O telefone do Disk Árvore é 3902- 1383 e qualquer pessoa pode solicitar o plantio de árvores nos estabelecimen-tos comerciais, residências e em áreas de passeio público. Ao ligar o cidadão informa o endereço desejado para plantio e outras informações pertinentes; se o caso estiver dentro dos parâmetros estabelecidos é feito o agendamento para o plantio, caso contrário, os dados do pedido são repassados para análise dos técnicos que indicarão qual espécie é mais adequada para o local. A equipe de plantio se desloca até o local, realiza o plantio e orienta moradores sobre cuidados com planta. Este é um serviço gratuito e as mudas disponibilizadas para o plantio são aquelas contidas no Plano de Arborização Urbana de Cascavel e provêm do Viveiro Municipal (CASCAVEL, 2016i).

A Prática do Descarte de Resíduos Volumosos teve início em julho de 2015, juntamente com os Resíduos Eletroeletrônicos19 com a finalidade de evitar que esses resíduos sejam descartados em terrenos

19 Esta prática será abordada em detalhes em seção posterior.

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baldios. O local de descarte é o Ecolixo, localizado na Rua Manaus, 1524, que funciona como depósito e centro de triagem desses materiais, a fim de receber destinação correta. As pessoas podem descartar os resí-duos volumosos (sofá, cama, colchão, móveis em geral) e os eletrônicos no Ecolixo ou pode ser agendado o recolhimento dos volumosos pelo telefone 3902-1383 (CASCAVEL, 2016j).

Os atendentes desses telefonemas, da Ouvidoria da Coleta Legal, questionam sobre o estado dos volumosos. Caso estejam em bom estado são encaminhados à Defesa Civil para distribuição quando necessário, caso contrário, o destino deles é o Ecolixo. A Defesa Civil também recebe muitas ligações para doações; caso a doação seja classi-ficada como inservível orienta a entrega no Ecolixo e repassa o número do telefone para contato com a Ouvidoria da Coleta Legal para que o doador solicite o recolhimento da doação em sua casa. Eventualmente, se necessário, a Defesa Civil auxilia no processo cedendo o veículo (ca-minhão) para que se faça a coleta de resíduo volumoso.

Nas descrições das práticas ligadas ao Programa Coleta Legal fica explícito o compartilhamento não somente de recursos materiais e de pessoas, mas também informações que geram outras ações de melhoria da prática.

A Figura 7 ilustra o entrelaçamento da Prática da Coleta Legal com outras práticas, baseado na descrição acima.

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FIGURA 7 – ENTRELAÇAMENTO ENTRE COLETA LEGAL E OUTRAS PRÁTICAS E ARRANJOS MATERIAIS

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

A materialidade, na Teoria da Prática, relaciona-se a aspectos materiais, tecnológico e informacionais, estrutura física, arranjos mate-riais e elementos humanos. Na prática de Coleta Legal a materialidade pode ser observada (o):

• na partilha da estrutura física como escritório entre Disk Árvore, Fiscalização e ambos compartilham as atividades

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de Sensibilização da Coleta Legal em Condomínios;• na distribuição de recursos materiais como sacolas de ráfia

para residência/condomínios entre equipe de coleta porta a porta, de fiscalização e de Sensibilização Ambiental porta a porta;

• no compartilhamento (i) de veículos entre Fiscalização, Resíduos Volumosos e

• de caminhões entre a Ambiental Cascavel, o Programa de Coleta Legal e Cooperativas, e (iii) entre Resíduos Volumosos e Defesa Civil;

• no uso dos recursos tecnológicos e informacionais, como computadores e telefones para organização e contro-le de execução de várias práticas, como Disk Árvore, Sensibilização Ambiental em Condomínio, controle de distribuição de sacolas de ráfia; e

• na alocação dos funcionários da Sema ligados ao Programa Coleta Legal que executam várias práticas distribuídas pela coordenação do programa, que é a governança da prática de coleta seletiva, que permeia as outras práticas relacionadas.

Enfim, esses são alguns exemplos, que não se esgotam aqui, de compartilhamento de práticas e arranjos materiais envolvendo o feixe de práticas de governança de Coleta Seletiva em Cascavel.

O olhar da Teoria da Prática Social revela como essas prá-ticas-arranjos se conectam entre si (SCHATZKI, 2015b, 2011). Um olhar longitudinal sinaliza que a origem da prática da coleta seletiva em Cascavel foi a regra, isto é, um conjunto de leis que respaldaram o surgimento desta prática em âmbito local. Inicialmente, para que a prática da coleta seletiva pudesse ser implantada efetivamente houve a resolução pela construção do Centro de Processamento, Tratamento e Transferência de Materiais Recicláveis (CPTMR) em 1998.

À vista disso, podemos entender que a prática de coleta se-letiva de materiais recicláveis em Cascavel constituiu a materialidade CPTMR e ao longo do tempo o CPTMR/Ecolixo possibilitou altera-

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ções nesta prática. O espaço, que mais tarde passou a ser chamado de Ecolixo, acomodou várias mudanças dessa prática nessa interinidade. Atualmente, ele abriga a governança do Programa Coleta Legal, e ou-tras práticas a ela ligadas como as Práticas de Destinação de Resíduos Volumosos e de Óleos vegetais.

As conexões entre diversas práticas-arranjos no Feixe do Programa Coleta Legal e entre este e outras práticas (pontuadas acima) ocorrem de diversas formas, como o espaço de atividade no qual são re-alizadas várias práticas, como os escritórios; as atividades compartilha-das nas quais vários funcionários executam atividades, fazeres e dizeres pertencentes às várias práticas sob a coordenação do programa Coleta Legal; na organização orquestrada que o conjunto dessas práticas ma-nifesta ao envolver de forma colaborativa e partilhada diferentes ele-mentos (recursos, pessoas, espaços, atividades) para que os fins da coleta seletiva sejam alcançados. E, evidentemente, a cadeia de ação que ex-pressa o entrelaçamento das diversas atividades de uma mesma prática e os nexos que se estabelecem com outras práticas também, como é o caso, por exemplo, da prática da Coleta Legal porta a porta, da Fiscalização e da Sensibilização ambiental porta a porta.

Na cadeia de ação do feixe da prática da Coleta Legal o moni-toramento acontece pela supervisão cotidiana da governança dessa prá-tica, pela fiscalização randômica e intencional por meio da Ouvidoria e do Disk Problema. O mapa de coleta e o roteiro diário são dispositivos de coordenação das atividades da prática. O feedback fornecido pelos motoristas quanto ao aumento ou diminuição dos resíduos segregados pela população de determinado bairro auxilia no monitoramento e ser-ve como dispositivo de coordenação para indicar o acionamento ou não da prática de Sensibilização ambiental porta a porta.

Embora o feixe de prática da governança do Programa Coleta Legal esteja cerceado pela domesticação da cadeia de ação, isto é, por estar confinado ao espaço territorial do município de Cascavel e às suas atribuições legais em âmbito nacional, estadual e municipal, posto que cada município deve gerir sua produção de resíduos sólidos, salvo em si-tuações consorciadas, os feixes de práticas de resíduos recicláveis não es-

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tão. Isto porque a partir do descarregamento do caminhão do Programa Coleta Legal nas cooperativas de materiais recicláveis demarca a bifur-cação da cadeia de ação: cada cooperativa realiza tanto atividades co-muns na separação e organização dos materiais recicláveis, quanto ativi-dades específicas, especialmente aquelas relacionadas à comercialização, gerando mais ou menos entrelaçamentos com outras cadeias de ação. A extensão dessa cadeia de ação e o feixe de prática de Cooperativas de Material Reciclável serão abordados na seção subsequente.

Ao considerar eventos e processos que ocorrem em feixes e em seus componentes são os mesmos que ocorrem em constelações no ple-nário de práticas, podemos atinar como ocorre a dinâmica de fenômenos sociais amplos recorrendo a alguns conceitos, apresentados por Schatzki (2016, p. 19), que são úteis para caracterizar resumidamente uma profusão de mudanças que constituem alterações em fenômenos amplos.

No feixe de prática da Coleta Legal observamos a difusão, cir-culação e propagação dessa prática a partir de 2011, atingindo amplo alastramento em 2012 na constelação local de Cascavel. Desde 1998 essa prática vem marcando grandes transformações a ponto de, algu-mas vezes, sofrer dissociação e dissolução. Por exemplo, (i) a extinção da figura dos agentes ecológicos como coletores de resíduos recicláveis, situação que em 2010 já não mais existia, permanecendo, porém, a exis-tência de catadores autônomos; (ii) o uso do CPTMR como centro de separação de materiais recicláveis a partir de 2015.

O Programa de Coleta Seletiva apresenta, também, entrela-çamentos com várias outras práticas, como a Figura 7 bem demonstrou anteriormente. Notadamente, essa prática apresenta nítida evolução na organização de sua gestão e pelos múltiplos relacionamentos que estabe-lece com outras práticas organizacionais. A estabilidade, solidificação e persistência dessa prática são garantidas pelas regras, especialmente pela PNRS, Lei 12.305/2010.

Nesse sentido, a Prática de Governança da Coleta Seletiva as-sume também essa perspectiva de estabilidade, solidificação e persistên-cia, com possibilidade de mutação posto que haja alteração de comando em 2017 em função do pleito eleitoral no município, assim como a du-

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ração da prática do Programa Coleta Legal nessa nomenclatura poderá sofrer solução de continuidade.

A forma de atuação da governança é mandatória do ponto de vista do governo municipal e acordada do ponto de vista das coopera-tivas de materiais recicláveis, cuja atuação é embasada em acordos de cooperação. Do ponto de vista da empresa coletora de resíduos reci-cláveis é obrigatória, posto que embasada em contrato de concessão, e colaborativa do ponto de vista dos órgãos municipais envolvidos de uma forma ou outra com a prática da coleta seletiva.

A complexidade qualitativa da governança dessa prática se revela por trazer à experiência a aplicação da regra norteadora (PNRS), pela diversidade de atividades envolvidas e pelo entrelaçamento cola-borativo com várias práticas, o que lhe confere densidade pelas rela-ções estabelecidas com uma miríade de entidades e com feixes de outras práticas ligadas aos resíduos sólidos que ocorrem dentro da extensão espacial ocupada pela constelação local de resíduos sólidos em Cascavel.

O Feixe de Prática da Coleta Legal é estreitamente entrelaça-do com o Feixe de Prática Gestão Cooperativo de Material Reciclável porque é a partir dos materiais recicláveis entregues na cooperativa que se fará a segregação desses materiais e a sua comercialização, assunto tratado na próxima seção.

4.2 FEIXE DE PRÁTICA GESTÃO COOPERATIVA DE MATERIAL RECICLÁVEL

A Cooperativa dos Trabalhadores de Material Reciclável (Cootacar) iniciou as atividades em 2006, como um projeto piloto em parceria com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, contando com 20 catadores dentro do processo. Atualmente as operações da coopera-tiva ocupam um espaço de 5.000m2, com 72 cooperados fixos e de 5 a 7 em estágio de experiência, organizados em 5 grupos de trabalho, sendo 4 responsáveis pela separação dos materiais recicláveis e 1 responsável por organização dos materiais (ENTREVISTADO [E02]).

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A atividade do catador de material reciclável é reconhecida for-malmente como categoria profissional desde 2002 e está registrada na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) com o número 5192-05, cuja descrição sumária é catar, selecionar, prensar material, vender mate-riais recicláveis como papel, papelão e vidro, bem como materiais ferro-sos e não ferrosos e outros materiais reaproveitáveis (CBO MTE, 2016).

A cooperativa mantém uma parceria com a Prefeitura Municipal de Cascavel para receber materiais recicláveis provenientes da coleta seletiva municipal. A parceria é oficializada por meio de um Termo de Cooperação Técnica, no qual cabe à Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SEMA) o acompanhamento das atividades e arcar com as despesas do aluguel do espaço, de água e de energia elétrica.

A Cootacar recebe diariamente o material de 4 caminhões, dis-tribuídos 1 para cada grupo. Também dispõe de um caminhão pequeno para coletar, gratuitamente, materiais provenientes de outros convênios com órgãos públicos e condomínios, tendo em vista que estes são grandes geradores de resíduos e somente uma coleta seletiva semanal, realizada pelo Programa Coleta Legal, é insuficiente (ENTREVISTADO [E02]).

O processo de seleção de candidatos a cooperados é definido em estatuto da cooperativa. Os candidatos têm que ter o perfil, estar na área de recorte da assistência social, ter cadastro único e ser catador, de preferência. A fase de cadastramento ocorre toda segunda-feira no período da tarde. Uma vez cadastrado, os candidatos entram para uma fila de espera e uma vez selecionados eles entram no processo produtivo, ficando 30 dias em contrato de experiência para então tornarem-se co-operados (ENTREVISTADO [E02]).

Durante este período são designados para um grupo, onde per-manecem todo o período. São treinados pelo coordenador do grupo, aprendem a reconhecer e separar materiais; fazem rodízios de funções dentro do grupo como organização e prensagem do material, se fixando na função onde se adaptam melhor. Geralmente as mulheres, por serem mais rápidas, ficam nas mesas de trabalho onde ocorre a separação, e os homens realizam a prensagem e lidam com a organização interna do espaço e trabalham com o caminhão (ENTREVISTADO E 02]).

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Atualmente a procura para trabalhar na cooperativa está alta em virtude do desemprego gerado por empresas da região do bairro. Mas para que um cooperado seja aceito é necessário que haja aumento de volume de materiais, para os quais se têm registrado diminuição em virtude da crise econômica. Então, a alternativa desses desempregados é realizar coleta de materiais com carrinhos, o que diminui mais ainda o volume da cooperativa.

A cooperativa tem como uma de suas bandeiras trabalhar com a autogestão, baseada também na pedagogia da alternância, testando formas de gestão, embora seja um processo difícil. Os líderes dos grupos passam por um processo de formação, mas a gestão do grupo é compar-tilhada. Alguns cooperados têm a visão de que quanto mais se processa materiais mais ganha, outros têm a visão de que a cooperativa é um espaço de convívio familiar, “onde eu passo meu tempo” e desta forma o aspecto financeiro não é o que o movimenta a agir, mas “o fato de estar ali, de poder almoçar, tomar café”, enfim, de coexistir ([E02]). Então os resultados gerados pelos grupos são diferentes.

Uma das razões para as diferenças na produtividade apontadas pelo Diretor Técnico [E02] é o componente cultural. Há grupos nos quais predomina um comportamento para alto desempenho, em outros o convívio se torna mais importante. Também há aqueles que não con-seguem se integrar no grupo e pedem para serem transferidos para ou-tro grupo, depois que já passaram o tempo de experiência e de estarem inclusos no processo.

O pagamento aos cooperados é feito por rateio que depende da gestão do grupo e de seus resultados. Todos os grupos compartilham da mesma estrutura e recebem as mesmas condições de trabalho, explica o Entrevistado [E02]. Há grupos em que os integrantes recebem R$ 500,00 e em outros, grupos integrantes recebem R$ 1500,00. A média de retirada mensal é de R$ 1000,00.

Na Cootacar os materiais recicláveis chegam à cooperativa de duas maneiras: (i) por coleta realizada pela cooperativa, e (ii) por coleta realizada pelo programa Coleta Legal da (Sema). A Figura 8 mostra as atividades que compõem esta prática.

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FIGURA 8 – PRÁTICA DE COLETA E SEPARAÇÃO DE MATERIAIS RECICLÁVEIS EXECUTADOS PELA COOTACAR

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

A prática de coleta de materiais realizada pelo caminhão da cooperativa atende primeiramente a um roteiro de coleta previamen-te estabelecido, o que envolve atividades de planejamento, registro de informação e decisão. A atividade é realizada pelo motorista e por dois ajudantes utilizando 1 caminhão. São duas cargas diárias, uma matuti-na e outra vespertina, sendo que estes materiais são distribuídos para 4 grupos de trabalho. Já na separação de materiais provenientes da Coleta Legal (Figura 9), os cooperados recepcionam o material acondicionan-do-os em big bags e os distribuem para as mesas de trabalho.

FIGURA 9 – PRÁTICA DE COLETA E SEPARAÇÃO DE MATERIAIS RECICLÁVEIS RECEBIDOS DO PROGRAMA COLETA LEGAL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

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Há a separação de papéis, por tipos de plásticos, metais, etc. Depois de separados, estes materiais são acondicionados em bags de ma-teriais específicos, ficando na espera de serem prensados e acondicionados em fardos. Após o processo de venda, os valores obtidos são rateados.

Os materiais comercializados são: plásticos (PVC, UPS, PEAD, PEAD leitoso, PP, Pet, Cristal incolor e verde, balde/bacia); vidro caco e de todo tipo, exceto plaino e temperado; sucata metálica e alumínio; embalagens tetra pak; isopor; papel branco, papelão, papel misto e papel cimento. Estas classificações são comerciais e não técnicas.

O cobre não é comercializado. Os materiais que contém cobre são armazenados temporariamente até formar um volume expressivo. Os coordenadores dos grupos decidem o que fazer: se vão separar o co-bre ou se o material vai ser distribuído para os cooperados. Há um rateio dos recursos provenientes da venda do cobre, e os cooperados decidem como aplicá-los, geralmente compram alimentos ou dividem os valores, informa o Entrevistado [E02].

A cooperativa não recebe lâmpadas nem pilhas, segundo o Entrevistado [E02]. Quando as identifica no material reciclável no mo-mento da coleta, eles as retiram e orientam a devolução para o local de compra. As lâmpadas e pilhas que eventualmente chegam à cooperativa são encaminhadas para destinação correta, geralmente para a empre-sa Parana Ambiental, com ônus para a Cootacar.

Os volumosos como sofás e armários são recebidos pela coope-rativa, que aproveita os que estão em bom estado ou os revende; aqueles que estão inservíveis são repassados para o programa de Coleta Legal do município. Não é realizado nenhum trabalho de recuperação, mas é uma atividade a ser desenvolvida no futuro pela cooperativa. Materiais como geladeiras, fogões e afins são comercializados se estiverem em bom esta-do ou desmontados e os materiais componentes vendidos como sucatas para Ferro-velho. A Cootacar tem acompanhado o volume de material entregue e que não é reciclável ou que ainda não tem mercado para venda, que chega a ser 30% do total do material recebido. Esse material, então, é encaminhado para o Aterro Sanitário.

Os arranjos materiais compartilhados pelas práticas de coleta e de seleção de materiais recicláveis são: estrutura física e administrati-

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va, prensas, caminhões, bags de ráfia, recursos financeiros e os materiais recicláveis.

A comercialização dos materiais recicláveis é feita com várias empresas, entretanto a empresa mais frequente e que compra a maior parte do material é a Negócio Renovável20, localizada em Santa Tereza do Oeste, por ter um processo mais transparente na pesagem dos ma-teriais, emite corretamente a Nota Fiscal e deposita conforme o rateio informado pela Cootacar. Há também empresas de Céu Azul (indústria Eco Pet de reciclagem de plásticos), Francisco Beltrão (plástico), Foz do Iguaçu (isopor) e Maringá (vidros) (ENTREVISTADO [E02]).

Com a entrada em vigor da Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), comenta o entrevistado [E02] “houve um incremento da militância do Movimento Nacional dos Catadores em busca da legitimação desta lei, porém a base ainda não sentiu reflexo desta lei. O que se observa é uma organização maior em relação à polí-tica da logística reversa”.

Para a Cootacar, um resultado concreto foi o recebimento de um caminhão e um elevador de carga, em 2010, que por meio de uma par-ceria com o Governo do Estado do Paraná, mais especificamente como resultado do Grupo de Trabalho G22+1, da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sema), a cooperativa conseguiu esta do-ação do Projeto Dê a Mão para o Futuro desenvolvido pela Associação Brasileira de Produtos de Higiene Pessoais (Abihpec) e pela Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins (ABIPLA), além da doação às associações, essas entidades monitoraram as ativida-des da cooperativa durante um ano, prestando assessoria (CASCAVEL, 2016k; [E02]).

Contudo, para o Diretor Técnico [E02], esta lei (PNRS) não gerou impacto no mercado comprador de resíduos sólidos, nem em rela-ção à quantidade nem em relação a novos materiais recicláveis. O que foi sentido pela cooperativa foi a ação da SEMA/PR, por meio do Sistema de Logística Reversa firmando Termos de Compromisso com empresas e cadeias produtivas no sentido de se organizarem e criarem mecanismos

20 Codinome solicitado pela empresa.

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para atuação na logística reversa, como foi o caso da doação do caminhão citado acima.

Entretanto, faltam às cooperativas em geral estrutura física e operacional satisfatória assim como relações de mercado mais justa. Por exemplo, a coleta seletiva tem que estar muito bem estruturada e ter um bom desempenho para suprir as cooperativas com materiais em quanti-dade suficiente. A Cootacar apresenta 50% de ociosidade nas instalações físicas e capacidade de trabalho. Ou seja, ela teria como comportar o dobro do material que recebe hoje, sem ampliar o quadro de pessoal. Ela tem uma esteira que está parada porque não compensa usá-la tendo pouco material a separar.

O Diretor Técnico [E02] reforça que o movimento cooperati-vista é muito maior do que somente separar e vendar material reciclável. Há o componente técnico, de realizar de forma adequada a separação e destinação correta dos materiais assim como o componente assistencial, de auxílio às pessoas. A cooperativa tem que dar suporte a essas pessoas. “Como o catador se manterá no processo se ele não tem um grão de feijão para comer em casa, quando ele tem que esperar 30 dias para receber o rateio?” ([E02]).

Como exemplo de suporte material a cooperativa fornece es-trutura de cozinha para os 5 grupos de trabalho e um caixa mensal de R$ 1.000,00 para compra de alimentos. Essa foi a solução encontrada tendo em vista que anteriormente foi feito uma experiência de fazer a refeição para todos, entretanto o modelo gerou conflitos.

Na Cootacar podem ser encontrados cooperados fundadores, resultado do trabalho realizado sobre a integração cooperativista no qual o cooperado reconhece a importância de estar vinculado à cooperativa, que desta forma ele consegue estruturar também a sua vida, ou seja, ele não está vinculado somente por motivos econômicos, financeiros e materiais, mas por reconhecer que o trabalho agregou qualidade de vida, melhorou suas condições de vida, possibilitou ter uma casa, uma moto, escola para os filhos, enfim, condições mais dignas de vida.

Embora haja cooperados fundadores, a Cootacar também apresenta uma rotatividade expressiva de 10%. A alta rotatividade é co-mum nesse tipo de atividade, porque os cooperados buscam trabalho formal: “quando a economia dá sinal de melhora eles buscam coloca-

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ção em outras empresas, como supermercados, por exemplo”, comenta o Entrevistado [E02].

A Cootacar desenvolve o princípio cooperativista da educação e informação, sempre realizando palestras sobre diversos assuntos. A Secretaria de Ação Social cedeu uma estagiária (com 30 horas semanais) para desenvolver atividades in loco como cadastro, acompanhamento das famílias, acompanhamento e monitoramento do processo de formação, entre outros.

No decorrer de 2016 os cooperados têm se envolvido com um curso ofertado por meio de Convênio com a empresa Tetra Pak com o intuito de alavancar a questão do cooperativismo, abrangendo assuntos como liderança, prestação de contas, como se faz um rateio, como agre-gar valor aos produtos reciclados pela cooperativa, entre outros. Junto com esse processo formativo, há um processo de acompanhamento e de repasse de equipamentos, comenta o Entrevistado [E02].

A Tetra Pak faz também um acompanhamento dos resíduos tetra pak comercializados (volume e faturamento) pela cooperativa as-sim como indica os melhores compradores do produto visto que moni-tora o mercado comprador de embalagens tetra pak. Cabe ressaltar que esta iniciativa da Tetra Pak está vinculada com o Termo de Ajuste de Conduta assinado com o Grupo de Trabalho G22+1, no qual a empresa comprometeu-se em realizar

um programa de Educação Ambiental em vários municípios, qualifi-cação e estruturação de cooperativas, fornecimento de bags para sepa-ração de resíduos. Além de visitas de orientações técnicas sobre me-lhores condições de triagem, armazenamento e venda dos produtos, agregando valor, obtendo assim melhores preços de comercialização (Sema, 2010).

Observa-se no incremento das atividades de separação de ma-teriais recicláveis e da logística reversa o componente de colaboração financeira e/ou cofinanciamento, para a cessão de estrutura física e equi-pamentos (máquinas e veículos).

A localização das mudanças nessa prática está relacionada às regras pois as alterações significativas ficam registradas no Estatuto e/ou Regimento Interno. De acordo com o Entrevistado [E02], sempre que

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se discute um problema e se chega a um consenso ou a uma resolução que modifica uma regra anterior relativa à gestão ou questões de base, é providenciada a alteração legal tanto no Estatuto quanto no Regimento, no que couber, geralmente ao final do ano. Fica evidente o uso de re-gras como norteador das atividades. Mas não só, observa-se que esses instrumentos que incorporam regras é também o local onde mudanças e inovações importantes em práticas de governança são incorporadas formalmente. A memória organizacional é mantida vívida de maneira verbal quando se recapitula fatos e decisões anteriores.

Cascavel tem 6 (seis) distritos municipais, são eles: Espigão Azul, Juvinópolis, Rio do Salto, São Salvador, Sede Alvorada e São João D’Oeste. Ao todo abrigam uma população de habitantes (IPARDES, 2017). Nesses distritos há coleta domiciliar uma vez por semana, mas o Programa Coleta Legal não alcança esses distritos. Todo resíduo re-colhido tem o Aterro Sanitário como destinação. Em São João, um distrito incluso na pesquisa, não há cooperativa de material reciclável. Entretanto, os resíduos recicláveis não deixam de ser recolhidos, segre-gados e comercializados. O Caso 1 (Quadro 4) ilustra a prática de coleta de material reciclável no distrito de São João D’Oeste.

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QUADRO 3 – CASO 1: DONA MARGARIDA, COLETORA DE MATERIAL RECICLÁVEL

Caso 1

A Dona Margarida mora em São João, distrito de Cascavel, e trabalha como coletora de mate-rial reciclável. É a atividade que escolheu fazer depois que saiu da empresa que trabalhava em função da demissão massiva, comum em tempos de crise econômica como agora. Ela foi estimulada pela vizinha, também coletora de material reciclável na comunidade, e foi com ela que aprendeu a co-nhecer e separar os materiais recicláveis.No distrito não há serviço de coleta seletiva, há somente o serviço de coleta domiciliar que pas-sa duas vezes por semana. A Dona Margarida tem fornecedores fixos, como escola, comércios e residências. Ela é considerada uma boa catadora pela empresa compradora de seus materiais, porque são separados e organizados adequadamente. Quando recolhe aparelhos e eletrodomésticos seu marido procurar recuperá-los e então os repassa para quem sabe que está precisando, assim como roupas. Muitos tecidos também são descartados pelas pessoas e com eles faz estopas para vender. Também faz compostagem de seus resíduos orgânicos.A Dona Margarida gosta de fazer esse serviço porque ela programa os dias e horários que sai para coletar os materiais, tem mais flexibilidade para cuidar das coisas da casa e prepa-rar as refeições. Entretanto, a renda que obtém com a comercialização dos resíduos recicláveis é pequena, não cobre todas as despesas, “[...] não dá para comprar umas coisinhas”.Um dos benefícios mencionados pela Dona Margarida, além de ficar em casa e fazer o próprio horário de trabalho, é ajudar a comunidade a dar destino correto aos materiais recicláveis, evitan-do que sejam descartados na natureza.Ela se sente mais feliz agora, porque ela sai, vê e conversa com pessoas [...] é como um vício, já se acostumou a tarefa. Antes, quando ela trabalhava na empresa, estava com problemas de pressão arterial, se estressava demais no serviço, estava sempre indo no Posto de saúde, sempre consultando, sempre tomando remédios. Agora está bem e não toma mais remédios nem vai ao Posto de Saúde.Atualmente, a Dona Margarida voltou a estudar. Está cursando o 5º. ano do ensino fun-damental junto com seu marido e está firme na resolução de continuar trabalhando com a coleta de material reciclável.

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Outra cooperativa de material reciclável também foi visita-da. A Coaparas foi fundada em 2013, contudo entrou em operação somente em 2015. São 52 cooperados, porém 16 cooperados estão trabalhando ativamente, porque não há espaço físico suficiente nem material para reciclar.

A cooperativa mantém um convênio com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, através de um Termo de Compromisso, no qual se responsabiliza pelo pagamento do aluguel do Barracão, ou

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seja, da estrutura física. Esta estrutura abrange uma área construída em alvenaria, de 70m2, onde fica o escritório, a cozinha e o banheiro. A cozinha é compartilhada por todos: há aqueles que fazem comida lá, outros trazem marmita, “cada um se vira como pode”, comenta o Entrevistado [E03].

Na parte externa, no pátio há uma área grande coberta com fo-lhas de eternit onde se localizam as mesas com os bags, a área de prensa e de armazenamento temporário dos materiais a serem reciclados e os já enfardados, como pode ser observado na Figura 10.

FIGURA 10 – FOTO DO ESPAÇO DE ATIVIDADE DA COAPARAS

Fonte: Dados primários, 2016.

Há 3 (três) mesas de trabalho para separar materiais, porém somente 2 estão em atividade atualmente. Cada mesa é de responsabili-dade de uma equipe. Cada tipo de material é colocado em sacos de ráfias ou de outro material e acondicionado temporariamente até que haja volume suficiente (de 6 a 7 bags) para serem prensados e enfardados. Os próprios cooperados (cada grupo) controlam o espaço e a quantidade de material enfardado. O modelo de gestão do trabalho é por produção. Primeiramente, as despesas são pagas e o restante é rateado conforme

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a produtividade de cada grupo, que então faz o rateio entre seus inte-grantes. Atualmente, a retirada mensal está por volta de R$ 800,00 a R$900,00.

Embora a procura para se tornar cooperado seja grande, há alta rotatividade. O Administrador [E02] comenta que no processo de admissão, a cooperativa trabalha com um período de 90 dias de experi-ências, mas é difícil chegarem a esse prazo. A alta flutuação de pessoas também prejudica o processo produtivo e a produtividade. Segundo o Administrador [E02], uma das razões é que a atividade do catador é

mal vista, certo?!, então tem ainda discriminação [...] as pessoas falam: Ah! Ele trabalha com lixo, as pessoas não falam: trabalham com reciclável. Falam: trabalha com lixo. Quando uma pessoa vem procurar trabalho na cooperativa, ela já passou por várias empresas entregando currículo, e se ela é aceita lá, elas saem da cooperativa [...] é um serviço com mais status.

A existência da discriminação da atividade de catador também foi reforçada por alguns cooperados, afirmando que não são somente as pessoas de fora que discriminam, mas também muitas que trabalham com isso, os que são catadores. “Eles mesmos discriminam [...] acham que é um trabalho sem valor [...] têm vergonha de dizer que são catado-res de material reciclável”, comenta um cooperado.

O material a ser separado provém do Programa da Coleta Legal. São dois caminhões por dia: um na parte da manhã e outro na parte da tarde. O Administrador da Cooperativa reforça que com a crise econômica aumentou a quantidade de pessoas coletando diretamente nas ruas (residências e empresas) materiais recicláveis, o que diminui a coleta pelo programa Coleta Legal.

Os materiais reciclados e comercializados são os plásticos (di-versos tipos), vidros, papelão, papel, metais, entre outros; não separam isopor. Quando há volume grande de isopor, a cooperativa encaminha para a Cootacar. Porque a produção ainda é pequena eles vendem so-mente para um comprador, para a Negócio Renovável. O pagamento é por fardo, independente do material reciclado ou carga cheia (do cami-nhão), exceto o vidro, que vendem para uma empresa de Maringá, que recolhe o material diretamente na cooperativa.

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O Entrevistado [E03] avalia que “economicamente o traba-lho da cooperativa não compensa, mas é um dos mais importantes para a cidade porque você está tirando lixo da rua” e acha que esse trabalho “deveria ser mais bem visto pelo menos pela Prefeitura [....] é mais difícil a pessoa olhar para esse tipo de pessoa [...] então aqui a gente tem esse problema porque o pessoal que trabalha aqui é tudo pessoal que trabalha de dia para comer de noite. Essa é a verdade” ([E02]).

Há vários pontos em comum entre as duas cooperativas e po-demos relacionar as seguintes:

• recebimento de material já coletado pelo programa coleta legal;• parte das despesas é paga pela prefeitura;• há demanda para mais postos de trabalho;• rotatividade alta dos cooperados;• queda do volume dos materiais reciclados;• negociam com a mesma empresa, de Santa Tereza.

Associada a prática de venda de materiais recicláveis está a prá-tica de compra de materiais recicláveis.

A Prática de Compra de Materiais Recicláveis das duas co-operativas apresentadas é executada pela Negócio Renovável, uma em-presa com sede em Santa Tereza, fundada em 2008. Os sócios já tinham experiência no ramo em Curitiba e vieram para o oeste do Paraná para ficar mais próximos dos familiares.

A empresa comercializa três tipos de materiais recicláveis: plás-tico (todas as classificações), papelão (engloba todo os tipos e papéis) e sucata mista (todos os ferros de construção e outros materiais ferrosos).

Os fornecedores principais são as cooperativas de catadores de material reciclável (80% das compras) e sucateiros autônomos (20% restantes). A origem das cooperativas é de Cascavel e da região, em um raio de 120 km. O transporte do material até a empresa é de responsa-bilidade da empresa.

A comercialização e a destinação dos materiais vendidos depen-dem do tipo de material. O papelão em sua maioria é comercializado com indústrias paranaense de papel toalha e papel higiênico, outra parte vai

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para grandes indústrias de Santa Catarina que fazem o mesmo tipo de produto. A destinação do plástico é mais difusa, cada tipo de plástico vai para um lugar porque seu reaproveitamento depende de tecnologias dis-tintas. Uma parte fica no Paraná outra vai para São Paulo. A sucata é di-recionada para siderúrgicas, em São Paulo e no Rio Grande do Sul [E04].

As relações com outras organizações se enquadram nos pa-râmetros de um bom relacionamento comercial. Como a Negócio Renovável tem um relacionamento longínquo com muitas cooperativas e empresas de material reciclável possibilitou observar mudanças nas práticas de separação de materiais, como a que entrega produtos mais bem selecionados, tornando seus produtos com mais qualidade e atra-tivos para o mercado comprador. O gestor [E04] comenta que é con-sequência de treinamento e reuniões que as cooperativas realizam com seus cooperados. Há 8 (oito) anos a separação era avaliada como ruim, hoje está muito boa.

Mesmo assim, a Negócio Renovável reprocessa os materiais, principalmente os de papel e alguns plásticos, onde há separação por ti-pos, alguns são picados de acordo com a demanda de mercado e também como uma forma de agregar valor aos produtos. Quando há material su-ficiente para fechar uma carga, o processo de venda é iniciado, sendo que o custo do transporte depende da negociação em cada venda, explica o Entrevistado [E04].

Na prática de gestão de materiais recicláveis, desenvolvida pela Negócio Renovável, há as atividades de compra, transporte, separa-ção, classificação, prensa, enfardamento, venda assim como o transpor-te e a execução procedimentos para o pagamento e o recebimento. A instalação física é grande, com área administrativa, área para separação, prensa, armazenamento temporário, e na área externa, um pátio para estacionamento de veículos particulares e área específica para os cami-nhões da empresa.

Na análise da dinâmica do Feixe de Gestão Cooperativa de Material Reciclável encontramos presença dos conceitos (i) acumulação, associação e agregação, (ii) bifurcação, entrelaçamento e de (iv) estabilidade.

O conceito de acumulação, associação e agregação está vin-culado à aliança entre o Programa Coleta Legal, da Secretaria de Meio Ambiente, e as Cooperativas, deixando que estas realizem a separação de resíduos sólidos e efetuam a sua comercialização.

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A Cootacar, no entanto, mantém também a sua prática de cole-ta de materiais recicláveis, o que caracteriza uma bifurcação, uma rami-ficação de sua atividade principal, que é a separação de resíduos.

O entrelaçamento com práticas e arranjos de práticas externas, como o estabelecido com a própria Coleta Legal e com outras coope-rativas, com a Negócio Renovável e com outras empresas comercializa-doras e/ou clientes e/ou de destinação final conferem certa estabilidade e solidificação ao feixe, embora seja possível uma mudança no mode-lo de gestão em virtude de que esse modelo está firmado por Termo de Compromisso entre as Cooperativas e a Administração Municipal, com possibilidade de alteração a cada ciclo eleitoral, como é o caso de Cascavel, em 2017.

Na constelação local de Cascavel a ligação que se sobressai en-tre os feixes de prática- arranjos materiais do programa da Coleta Legal e da Gestão Cooperativa de materiais reciclável é a ligação constitutiva na qual os arranjos (caminhos, pessoas, caminhão, materiais recicláveis, etc) do programa Coleta Legal possibilitam o exercício da prática da Gestão Cooperativa, porque são essenciais a ela e também pelo envol-vimento espaciotemporal com a prática, afinal, é uma relação que se mantém desde a constituição tanto da Cootacar em 2006, quanto da Coaparas em 2015. Portanto, se não fossem os arranjos configurando a prática de coleta materiais recicláveis, ela teria que se desenvolver de outra maneira.

A integibilidade é outro tipo de ligação que está presente entre a materialidade humana: as pessoas que executam a prática de separação de materiais recicláveis na organização cooperativa compreendem o que fazem, como fazem e porque fazem o que fazem, em sua dimensão am-biental e laboral, entretanto, a aceitação da dimensão social em sua to-talidade apresenta barreiras, como indica a rotatividade da atividade e a busca por outras colocações no mercado de trabalho quando encontram oportunidade, ambas situações foram comentadas pelos entrevistados [E02 e E03].

O feixe da prática de gestão cooperativa de material reciclá-vel da Cootacar e da Coaparas está ligado pelo compartilhamento do espaço de atividade porque os arranjos físicos e caminhos são os mes-

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mos: são aqueles que o Programa da Coleta Legal possibilita para a prática de ambas cooperativas.

A Cootacar e a Coaparas se assemelham pelo poder comum presente em suas práticas posto que têm as mesmas tarefas, as mesmas regras, os mesmos entendimento e finalidades. Quando essas práticas se juntam as práticas do Programa da Coleta Legal e da comercializa-ção dos materiais recicláveis sinaliza a existência de uma organização orquestrada visto que a finalidade, que é a destinação adequada dos re-síduos recicláveis, é alcançada por meio de diferentes elementos de cada prática, bem como a existência da cadeia de ação, pelo sequenciamento das atividades.

Na cadeia de ação do feixe de prática de gestão cooperativa de materiais recicláveis a presença da infraestrutura material representa-da pelas instalações físicas é fundamental para que a prática seja possi-bilitada, porque o volume de materiais exige um ambiente amplo que o comporte. Ambas Cooperativas utilizam bags e fardos como dispositivos de coordenação da produção e da comercialização. O roteiro de coleta da Cootacar é um exemplo desse tipo de dispositivo.

A Cootacar apresenta também uma bifurcação em sua cadeia, uma ramificação originada pela prática de coleta de material reciclável que realiza com seus próprios veículos nos locais e datas indicados por seus clientes.

E, por fim, a governança da prática, singular em cada coopera-tiva, entretanto aqui abordaremos aspectos gerais para ilustrar a gover-nança do feixe. A forma de atuação da governança é negociada/acorda-da, pois ambas têm sua origem vinculada ao suporte das atividades de coleta seletiva municipal, não exerceram a prática de coleta e seleção de materiais recicláveis de forma autônoma ainda.

A Cootacar e a Coaparas são representantes deste segmento de atividade na constelação local de resíduos sólidos em Cascavel nesta pesquisa, e não reflete a densidade dessa prática, nem de práticas corre-latas, nem dos atores envolvidos.

A complexidade qualitativa relativa ao contexto da prática se torna mais evidente por duas situações contingentes: (i) a crise econô-mica influenciando no nível de atividade e nas relações de produção com os cooperados e (ii) os projetos e os programas de logística reversa

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que têm surgido em âmbito nacional e estadual incitam também ques-tionamentos de transitoriedade e mutabilidade da prática. Esse contexto impreciso e indefinido exige atenção da governança da prática.

Notadamente a extensão espacial da realização das atividades de coleta e separação de materiais recicláveis estão restritas à constela-ção local de resíduos sólidos de Cascavel, porém as atividades de comer-cialização extrapolam essa fronteira.

Dentre diversos resíduos sólidos são gerados em um município estão aqueles provenientes da limpeza urbana, próximo feixe a ser relatado.

4.3 FEIXE DE PRÁTICA DE LIMPEZA URBANA

O feixe de prática de Limpeza Urbana apresenta uma go-vernança compartilhada entre a Ambiental Cascavel e a Secretaria do Meio Ambiente (Sema) nos trabalhos cotidianos. Algumas práticas são diretamente dirigidas pela Ambiental Cascavel e outras pela SEMA, conforme indicação no Quadro 5. As principais fontes de informação foram os Entrevistados [E25 e E29].

QUADRO 4 – FEIXE DE PRÁTICA DE LIMPEZA URBANA E SUA GOVERNANÇA

Práticas Governança

Varrição de logradouros públicos Ambiental Cascavel

Roçada e Poda de ÁrvoresSEMA – Dpto. de Conservação e Fiscaliza-ção/Div.Gestão e Manutenção de Parques e Praças

Retirada de árvoreSEMA – Dpto. de Conservação e Fiscaliza-ção/Div.Gestão e Manutenção de Parques e Praças

Coleta de Entulhos SEMA – Dpto. de Conservação e Fiscaliza-ção

Serviço de Vistoria de Cortes deÁrvores Isoladas

SEMA – Dpto. de Licenciamento Ambien-tal/Div. DeLicenciamento de Atividade Florestal

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Práticas Governança

Serviços diferenciados Ambiental Cascavel

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

A Ambiental Cascavel disponibiliza os profissionais (motoris-tas e funcionários) e fornece os recursos materiais (veículos, equipamen-tos) necessários a operacionalização das práticas dirigidas pela SEMA, que designa um encarregado responsável para cada prática.

“Diariamente, a equipe [exceto da Varrição] sai da sede da Ambiental Cascavel e vai até a sede do Ecolixo com o ônibus da empre-sa. Ali a programação do dia é distribuída pelos encarregados de equipe, que são funcionários da SEMA”, explica o Entrevistado [E25].

A prática da Varrição de logradouros públicos é desenvolvida por duas equipes: a varrição manual e a mecânica. A varrição manual é concentrada no centro da cidade e áreas circunvizinhas. Nesta prática destaca-se uma inovação introduzida pela governança que foi a trans-ferência do serviço da varrição urbana da sede da empresa para local alugado nas proximidades de operação da prática. Pela manhã todos os funcionários alocados nessa prática vão direto para esse local e batem o ponto lá. Isso economiza tempo, quase 1 hora por colaborador/dia, au-mentando o tempo útil no trabalho, logo, mais áreas são varridas.

A Varrição mecânica nas vias principais da cidade é feita por um caminhão especial equipado com vassouras mecânicas, equipamen-to de sucção e compartimento para armazenamento de resíduos. Esse equipamento foi introduzido em julho de 2012 (ENTREVISTADO [E25]; CASCAVEL, 2016l).

A Prática da Roçada executa a limpeza e o corte de gra-ma em avenidas, terrenos da prefeitura, em nascentes, e em terrenos solicitados pelo Departamento de Licenciamento, seguindo o cro-nograma de trabalho. O trator de roçada é um dos equipamentos fundamentais utilizados pela equipe, que é integralmente composta pelos funcionários da Ambiental Cascavel. Os resíduos são levados para a compostagem na Agregare.

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A equipe de Poda de Árvores executa as podas de acordo com o cronograma de trabalho, faz o triturado no local e encaminha os re-síduos vegetais para a compostagem feita na empresa Agregare. A cada dez cargas que leva, recebe uma de adubo, utilizado nos canteiros de flores, plantios de árvores e no viveiro municipal.

A prática da Retirada de Árvores pode ser acionada por so-licitação do cidadão, por análise da equipe da Sema, como o Dpto. de Conservação e Fiscalização e o Depto. de Licenciamento, e por eventos climáticos adversos. O encadeamento das principais atividades pode ser observado na Figura 11.

FIGURA 11 – PRÁTICA DE RETIRADA DE ÁRVORES

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Os procedimentos iniciam com (i) o proprietário do imóvel entra com pedido no setor de Protocolo da Prefeitura, anexando com-provante de residência, documentos do terreno, registro do imóvel e do-cumentos pessoais; (ii) a solicitação é enviada à área de Fiscalização da Sema, que realiza vistoria e emite laudo; (iii) se a retirada for aprovada e a pessoa for aposentada, a taxa deste serviço é isenta; caso contrário a taxa de retirada de árvore é emitida e o solicitante é contatado; (iv) a solicitação entra na grade de programação existente por bairros, na ordem dos mais antigos para os mais novos. Os pedidos de retirada de árvores levam em média de 90 dias para serem atendidos na região central, e nos bairros a média é de 60 dias. Exceção é feita em situação de risco de queda de árvore, cabendo ao encarregado decidir quando o

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atendimento será feito; (v) no momento aprazado, a equipe se desloca ao local e realiza o corte e a limpeza do local. Quando as árvores estão abaixo da linha de transmissão da Copel a equipe consegue realizar o serviço, porém, quando as árvores estão interferindo na rede, a Copel é acionada para resolver a situação, então é agendada uma data o quanto antes possível. É uma parceria de longa data “[...] do operacional nosso com o deles [...] quando eles precisam de nós, a gente também atende”, esclarece do Entrevistado [E30]. Essa parceria também acontece com os Bombeiros “[...] quando há uma árvore de 30 metros, precisamos da ajuda deles. Mandamos o ofício e agendamos o serviço e eles mandam uma equipe para ajudar a gente” (ENTREVISTADO [E30]).

Os resíduos vegetais verdes (folhas e galhos) são entregues na Agregare e vão para a usina de compostagem e os resíduos lenhosos, per-tencentes ao Provopar, são entregues na Biosfera, empresa autorizada atu-almente pelo Provopar para fazer a destinação adequada desses resíduos.

A equipe é composta por funcionários da Ambiental Cascavel, sob a responsabilidade de um encarregado funcionário da Sema. Os re-cursos materiais disponíveis para essa prática são três caminhões, sendo um deles com cesto aéreo de 19 metros de altura, um caminhão caçamba para lenha e um com triturador.

“Quando há eventos climáticos perturbadores como temporais, principalmente à noite, a gente sai para a rua para fazer levantamento de árvores caídas e fazer a retirada delas assim como desobestrução de estradas e vias”, explica o Entrevistado [E30]. A área atendida é a cidade e o interior do município (distritos municipais).

“Durante o dia, o pessoal da Ambiental Cascavel vem dar apoio. Há uma parceira entre a Defesa Civil Municipal e a Defesa Civil do Estado (Bombeiros) nessas situações e juntos definem os locais e as equipes nessa fase de emergência”, continua o Entrevistado [E30]. Eventualmente forças do exército, da Penitenciária Industrial de Cascavel (PIC) e do Departamento de Estradas e Rodagem do Paraná (DER-PR) reforçam as equipes de atendimento, como foi o caso em 2010 quando houve um grande temporal.

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A prática de Serviço de Vistoria de Cortes de Árvores Isoladas tem como finalidade avaliar a possibilidade ou não da reti-rada de árvore constante nos processos em trâmite no Departamento de Licenciamento Ambiental. A vistoria é realizada pelo Engenheiro Florestal em conjunto com a Defesa Civil. Há a emissão de laudo e, se for o caso, autoriza a retirada da árvore.

O Engenheiro Florestal [E29] atua no Departamento de Conservação e Fiscalização e presta serviço ao Departamento de Licenciamento, no qual, além do serviço de vistoria de Corte de Árvores Isoladas, atua nos processos referentes (i) ao licenciamento de lotea-mento, ao licenciamento de pequena cascalheira e (iii) à vistoria de ser-viço de terraplanagem de lote ou retirada de terra do lote.

A prática da Coleta de Entulho tem por objetivo recolher en-tulhos da construção civil, materiais volumosos e resíduos domiciliares deixados em fundos de vale e em outros locais impróprios. A equipe é acionada por meio do Ouvindo Cidadão (Disk Problema 156) ou de-núncia diretamente feita à Sema. Se o que foi recolhido for aproveitável, o material é encaminhado para empresa de reciclagem de resíduos da construção civil (Future), caso contrário, a destinação final é o Aterro Sanitário. Os resíduos perigosos são encaminhados à Paraná Ambiental. Caso seja identificada empresa ou pessoa responsável pelo entulho, o Setor de Fiscalização da Sema faz a autuação e estabelece prazo de 3 (três) dias para regularizar a situação.

A prática dos Serviços Diferenciados é nova, informa o Entrevistado [E25], e consiste em realizar limpeza de lotes vazios e logra-douros públicos. Para tanto, foi necessária a disponibilização de 1 (uma) pá carregadora, 1 (uma) retroescavadeira e 2 (dois) caminhões caçambas.

A materialidade que sustentam essas práticas provém em grande parte da Ambiental Cascavel, pois em contrato de licitação está definido quais e quantos veículos, máquinas, equipamentos e respectivos operado-res/motoristas devem estar disponíveis para o uso da Sema. A empresa também é responsável pela manutenção desses equipamentos. Alguns dos recursos materiais são: caminhão pipa, rebaixador de toco, pá carregadeira, retroescavadeira, trator, caminhões, carrinhos, pás, vassouras.

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Quando necessário, os recursos materiais deste feixe são com-partilhados com feixes de práticas organizadas por secretarias e autar-quias, como retroescavadeira, caminhão pipa, trator, entre outros. Os pe-didos de empréstimo chegam por meio de ofício, que são analisados e despachados pelo secretário da pasta e encaminhados ao Departamento de Conservação e Fiscalização para elaboração de cronograma e execução.

Os recursos materiais disponíveis pela Sema para a operacio-nalização dessas práticas são veículos próprios da secretaria utilizados pelos fiscais e pelos encarregados além de quatro caminhões. Todos utilizam a Central de Veículos (Secretaria de Administração) para providenciar a manutenção.

Na sequência serão apresentadas outras práticas que dão con-tinuidade a cadeia de ação das práticas de Roçada e Poda de Árvores, Retirada de Árvore e Coleta de Entulho.

A Prática de Compostagem de Resíduos Orgânicos é rea-lizada pela empresa Agregare Soluções Ambientais, fundada em 2008 com o objetivo de fornecer soluções ambientais corretas e ecologica-mente viáveis, porém 2011 foi o ano inicial de suas operações, quando todas as licenças e documentações foram concedidas.

A Agregare posiciona-se como uma parceira para a des-tinação de resíduos orgânicos e passivos ambientais na região de Cascavel e arredores.

A empresa é detentora do direito de uso de uma biotecnologia para aplicação no processo de compostagem de forma a evitar que re-síduos orgânicos contaminem solo e água. Essa biotecnologia acelera o processo de compostagem por meio de um pull de bactérias resultando em adubo orgânico (ENTREVISTADO [E24]).

O processo que normalmente levaria 12 meses, neste leva de 3 a 6 meses (dependendo de temperatura, chuvas, etc). Essa tecnologia foi desenvolvida no Japão e trazida ao Brasil por meio de sistemas de fran-quias. Contudo a Franqueadora não teve resultados esperados e dissol-veu o sistema. Então os sócios da Agregare compraram a biotecnologia para ser utilizada nesta nova empresa (ENTREVISTADO [E24]).

A Agregare recebe os resíduos de vegetais gerados pela roçada e poda de árvores gratuitamente. Como foi abordado anteriormente, a

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cada dez cargas de resíduos, devolve uma carga de adubo orgânico para a Sema aplicar nas áreas verdes, jardins, hortas nas escolas, viveiro mu-nicipal, entre outros.

Segundo o Gerente Operacional, [E24], até o momento não há restrição para retirada de adubo pela Sema, por exemplo, em agosto 150 toneladas do produto foram retiradas pela secretaria. Sobras de pro-dução são doadas para escolas, pequenos agricultores, sem terra e para a própria Sema usar nos espaços públicos com jardinagem. As atividades que compõem a prática de compostagem realizadas pela Agregare po-dem ser observadas na Figura 12.

FIGURA 12 – ATIVIDADES DA PRÁTICA DE COMPOSTAGEM DA AGREGARE

Fonte: Agregare (2016).

Alguns dos resíduos recebidos pela empresa são originários de: abatedouros de frango (como penas de frango e frangos mortos), abatedouros de leitão, incubatórios de pintainhos, resíduos de fábrica de ração, cinza de caldeiras, resíduo de lodo proveniente de lagoas de tratamento de esgoto e de efluentes (desde que não tenha contami-nantes) e de resíduos vegetais, provenientes de podas e/ou retiradas de árvores que a SEMA realiza na cidade de Cascavel. Os clientes forne-cedores são de Ubiratã, Cafelândia e de outras empresas de Cascavel (ENTREVISTADO [E24]).

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O resíduo é entregue e deposto na parte do terreno indicada pelo operador da Agregare. Todo dia se recebe carga (de 7 a 8 ca-minhões por dia), aproximadamente 2500 toneladas/mês. O operador aleira o terreno, ou seja, divide o terreno em porções, sendo que a cada uma delas receberá o material em alguma fase do tratamento. Nas fases iniciais do tratamento há grande odor de amônia (cheiro forte e desa-gradável), resultado do próprio processo de transformação. Durante o tempo de compostagem são realizados vários testes para medir a presen-ça de substâncias como ferro, nitrogênio, carbono, entre outros.

O produto resultante é um composto orgânico, inodoro, que pode ser classificado em adubo orgânico, condicionador de solo ou resí-duo orgânico. Essas classificações são feitas através de análises laborato-riais e verificada conforme parâmetros estabelecidos. Ao final do proces-so de tratamento, em que não há nenhum resquício de DNA, a Agregare retira 3 (três) amostras de cada lote produzido, encaminhando uma para análise laboratorial em laboratórios credenciados pelo Ministério da Agricultura, outra amostra vai para armazenamento com identificação adequada, e outra fica à disposição do Ministério da Agricultura.

A venda do produto se dá de acordo com a classificação obtida na análise: se é adubo orgânico, condicionador ou resíduo orgânico. A venda é a granel, medida em toneladas. Os clientes para venda são de Cascavel (50%), Itaipulândia (30%), Santa Terezinha do Itaipu e Toledo (20%) e geralmente retiram no local de produção da Agregare e espalha em sua área. A Agregare também tem caminhões para fazer a entrega e o espalhamento do produto na propriedade do cliente. Os caminhões têm tecnologia para calcular a área a ser espalhada e a quantidade de produto a ser espalhado e libera automaticamente o produto (caminhões para espalhamento de calcário). Quem opera essa tecnologia é também motorista do caminhão, que recebe treinamento específico.

Para o Gerente Operacional [E24] a Agregare se preocupa em “evitar que material contaminante seja despejado no meio ambiente, dar um tratamento tal que ele retorne para o ambiente com uma finalidade mais nobre: de enriquecer a qualidade da terra, recompondo a matéria orgânica do solo. É um ciclo virtuoso”.

A localização de mudanças e inovações na governança da prá-tica de Compostagem da Agregare tem dois destaques: um está relacio-

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nado ao produto e o outro à pesquisa. A inovação referente ao produto é ensacá-lo, apresentando-o ao consumidor em embalagens de diversos tamanhos posto que até agora o produto é vendido a granel. O processo do registro da embalagem no Ministério da Agricultura está em anda-mento porque ele estabelece um procedimento para registro de produtos a granel (registro já obtido) e outro para produtos embalados. Em relação à produção, estão em fase de teste do processo de ensacamento, para es-tabelecer o tempo, os tamanhos de embalagens, a produtividade e outros parâmetros. Estão desenvolvendo também um produto especial de 0,5 kg para vender em supermercados, floriculturas e outros estabelecimentos comerciais afins.

Outra inovação é a realização de pesquisa experimental, já em andamento: uma área de terra preparada para receber a plantação de soja, com todo manejo orgânico, e alocação de todos os custos e recei-tas. Os dados a produção convencional de soja eles já têm. O objetivo é fazer um comparativo dos custos/receitas do produto orgânico e com o convencional. Desta forma terão resultados práticos e matemáticos para subsidiar os argumentos de vendas. A Agregare tem resultados de outras pesquisas, como ilustra a Figura 13.

FIGURA 13 – TRIGO ALCOVER: COMPARAÇÃO ENTRE OS MANEJOS QUÍMICOS E ORGÂNICOS

Fonte: Agregare, 2016.

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O trigo alcover, à esquerda, teve manejo químico e o da direita teve manejo orgânico. Este apresenta tamanho e raízes maiores que o do manejo químico, significando que a planta com adubação orgânica absorveu mais nutrientes que a outra, no mesmo período de tempo.

O impacto dessa prática está além do resgate de passivo am-biental; ela está conectada com a sustentabilidade ambiental, com o fa-zer sustentável. Não poderia deixar de destacar igualmente nessa prática a presença da materialidade, na forma de organismos vivos (bactérias), desempenhando uma atividade pertencente à prática. Como coloca Schatzki (2010), muitos fenômenos sociais evidenciam uma mediação mutuamente complexa e dependente entre práticas humanas, tecnologia e materialidade, incluindo a natureza.

A Prática de Destinação de Resíduos Lenhosos da maneira que ocorre atualmente é relativamente nova. Foi estabelecida em 2015 pelo artigo 32 da Lei Municipal 6.482/15 estabelece que “toda lenha proveniente da retirada de árvores pela Sema pertence ao Município de Cascavel e deverá ser encaminhada ao Programa de Voluntariado Paranaense – Provopar, que realizará sua comercialização visando a gera-ção de recursos para os seus fins institucionais” (CASCAVEL, 2016m).

Para o cumprimento do referido artigo, o Provopar divulgou no site da Prefeitura um convite aberto às empresas interessadas na aqui-sição desses resíduos lenhosos, sendo que a melhor proposta fecharia contrato com a entidade. Uma vez definido pela empresa Biosfera, o Provopar comunicou a diretoria da Sema.

A Biosfera Ambiental é uma empresa que iniciou as atividades em 2006 e atualmente os principais processos englobam o ciclo inicial de gestão de projetos até o gerenciamento de serviços ambientais, o que inclui o tratamento e a destinação adequada de resíduos recicláveis (pa-pel, plástico, isopor, sucata, gesso, entulho, folhas e galhos de árvores, resíduo de madeira de construção e da poda urbana), a poda e extra-ção de árvore, locação e transporte de caçambas, consultoria ambien-tal, licenciamento ambiental e elaboração de projetos relativos ao meio ambiente como plano de gerenciamento de resíduos sólidos, plano de gerenciamento de resíduos da construção, plano de controle ambiental e plano de isolamento acústico (ENTREVISTADO [E09]).

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A prática-arranjo dos resíduos de retirada de árvores é com-posta por atividades encadeadas. Sempre que há retirada de árvore, os resíduos lenhosos são levados pela Equipe de Retirada de Árvore da SEMA, com o caminhão da secretaria, diretamente para a Biosfera, onde a quantidade entregue é medida e registrada.

A Biosfera realiza o processamento do resíduo (trituração) e comercializa-o como combustível de biomassa, cuja destinação é Cafelândia/PR. Ao final do mês, um relatório é emitido e o valor res-pectivo é pago ao Provopar. Este encadeamento de ações pode ser ob-servado na Figura 14.

A prática-arranjo de resíduos de madeira de construção é o mesmo, porém o material passa por uma máquina de trituração que separa corpos metálicos dos lenhosos.

FIGURA 14 – PRÁTICA-ARRANJO DOS RESÍDUOS DA RETIRADA DE ÁRVORES

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Os resíduos orgânicos não aproveitados como folhas e asse-melhados assim como o gesso proveniente de obras de construção civil são encaminhados para a empresa Agregare, cuja atividade principal é a compostagem de resíduos orgânicos. O gesso entra no processo de com-postagem como calcário para neutralizar o ph do produto. Resíduos de isopor são encaminhados para indústria localizada em Santa Catarina.

Nessa prática observamos a tríplice dimensão da sustentabili-dade: ambiental, econômica e social. O aproveitamento de lenha para geração de energia fornece recursos financeiros para o Provopar, que os aplica, de maneira randômica, em diversas ações sociais por ela desen-volvidas, conforme ilustra a Figura 15.

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FIGURA 15 – AÇÕES SOCIAIS MANTIDAS PELO PROVOPAR DE CASCAVEL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Como o objetivo do Provopar é o combate à fome, esses recur-sos são destinados para a alimentação de pessoas socialmente em risco, na forma de oferta de refeições. Para tanto, o Provopar mantém uma Cozinha Comunitária, construída no Bairro Interlagos com recursos pró-prios, e tem como equipe a coordenadora do programa, uma nutricionista e cozinheiras.

As despesas com a Cozinha Comunitária não se restringem a compra de alimentos. “Tudo que é feito é feito com qualidade. A nutri-cionista elabora o cardápio, acompanha a elaboração das trezentas refei-ções diárias”, comenta a Coordenadora do Provopar [E08].

Muitos de nós ainda temos aquela cultura de que para pobre qual-quer coisa serve. Hoje as leis avançaram e a pessoa com perfil de pobreza é um sujeito de direitos. Por isso, nossa oferta de refeições obedece às normas estabelecidas pela segurança alimentar e nutri-cional, pois somente ofertamos alimentos frescos, saudáveis e nutri-tivos, e nossa Cozinha encontra-se dentro dos padrões de higiene e limpeza, acondicionamento e segurança pessoal ([E08]).

Os recursos financeiros necessários para manter os progra-mas sociais provêm, principalmente, de duas fontes: a) promoções re-

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alizadas pela Entidade; b) repasse de recursos pelo Fundo Municipal de Assistência Social. As promoções, em sua maioria, são a realização de Bazares com produtos apreendidos pela Receita Federal e doados à Entidade. “São com estes recursos que conseguimos construir e equipar materialmente nossos projetos e ampliar nossa oferta de serviços aos usuários da assistência”. Contudo, já faz dois anos que a entidade não recebe doações de mercadorias da Receita Federal, porém, outras insti-tuições menores realizam doações periodicamente ([E08]).

Junto com a estrutura da Cozinha Comunitária foi criado um espaço com todos os equipamentos e recursos materiais necessá-rios para a oferta de cursos, inaugurado em maio de 2015 e denomi-nado de Oficina do Pão, uma estrutura física de 50m2, equipada com recursos materiais (dois fornos semi-industriais, uma geladeira, uma pia, dois armários e mesas de inox e mármore) com a finalidade de capa-citar visando à geração de renda familiar (ENTREVISTADO [E08]; CASCAVEL, 2015).

O curso é ministrado por uma Oficineira e supervisionado pela Coordenadora do Projeto, tem duração de 7 (sete) semanas, uma vez por semana, onde os aprendizes aprendem a fazer quatro tipos de pães casei-ros, cuca, broa de milho e pão doce. Intencionalmente não são utilizados cilindros elétricos, somente recursos que os aprendizes têm em suas ca-sas para que possam realmente aplicar os conhecimentos adquiridos. A produção do dia de aprendizado é levada pelos alunos para suas casas (ENTREVISTADO [E08]).

A Cozinha Comunitária e o Curso de Pães se tornam um es-paço de convivência, de conhecimento da realidade pessoal e familiar dos frequentadores que, em grande maioria, são moradores do bairro, e do próprio conhecimento da comunidade em si pelos moradores porque sentam lado a lado para fazer refeições; também é um braço do Provopar no auxílio social de quem mais precisa.

Na Cozinha Comunitária servimos 300 refeições por dia, gratuita-mente. O público alvo é composto por pessoas que se encontram em insegurança alimentar, preferencialmente crianças, gestantes, defi-

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cientes físicos, idosos, assim como pessoas com deficiência intelec-tual, que varia entre a grave e a moderada. Consideramos que não se trata apenas de um lugar para se alimentar. Trata-se de um espaço de convivência, onde os usuários costumam se encontrar todos os dias, conversam, cumprimentam-se, fazem amizade. A coordenadora, por sua vez, acompanha diariamente o desenrolar de suas dificuldades e conquistas, assim como auxilia no encaminhamento para os demais serviços públicos necessários ([E08]).

O Provopar recebe periodicamente, dos órgãos governamen-tais e demais empresas, objetos considerados inservíveis, como material de informática obsoleto, móveis, armários, eletrodomésticos, que podem ser vendidos ou utilizados nos projetos, ou, ainda, doados aos usuários da assistência. O material de informática, por ser de difícil comerciali-zação, é levado ao Ecolixo. A Entidade não realiza o trabalho de recupe-ração desses materiais porque não tem estrutura para tal.

Outra ação de combate à fome é a distribuição de cestas bási-cas para socorrer famílias em situação crítica. Quando ocorrem eventos climáticos que afetam as casas das pessoas, a Defesa Civil faz o atendi-mento, e sempre que possível o Provopar ajuda com alimentos.

Outro serviço que o Provopar disponibiliza é o Brechó, onde são ofertadas roupas, agasalhos, calçados, cobertores, lençóis, entre outros, tudo gratuitamente às famílias cadastradas e que têm perfil de pobreza.

Vale ressaltar que o inverno é bastante rigoroso em nossa cidade, che-gando a temperaturas abaixo de zero grau. Ainda prestamos socorro às famílias que têm suas casas atingidas por tempestades, com doações de colchões, camas, fogões e tudo o que tivermos disponível, incluindo cestas de alimentos. Estes serviços que ofertamos têm custo mínimo, porquanto as mercadorias oferecidas são produto de campanhas rea-lizadas pela sociedade, empresas, pessoas, que, diariamente, trazem ao Provopar esses objetos, vestimentas e até alimentos ([E08]).

O destaque para essas informações a respeito da origem da Prática de Destinação de Resíduos Lenhosos e para as áreas de atuação do Provopar tem o intuito de revelar, na prática da convivência humana,

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lembrando Sandberg e Tsoukas (2011), que o entrelaçamento é a forma mais básica de ser, que nunca estamos separados, mas sempre entrela-çados com outras pessoas e coisas em mundos de práticas sociomaterial específicos.

O entrelaçamento entre práticas e arranjos configuram os ca-minhos pelos quais a convivência humana acontece e revela a ordem social na qual entidades humanas e não humanas relacionam-se, agem, ganham significado e identidade (SCHATZKI, 2002, 2003).

A Figura 16 evidencia a configuração das relações entre os ato-res, o entrelaçamento entre práticas e a destinação dos resíduos produ-zidos no Feixe de Prática da Limpeza Urbana.

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O feixe de prática da Limpeza Urbana apresenta uma dinâmi-ca acentuada pelo entrelaçamento entre práticas ao longo da cadeia de ação no âmbito interno e externo à Secretaria de Meio Ambiente (Sema), conforme discorremos anteriormente. Ademais, exibe bifurcação na prá-tica de Varrição de logradouros públicos (varrição manual e mecânica), no sentido de apartação momentânea, pois que ambas as práticas têm a mesma continuidade: a destinação dos resíduos ao Aterro Sanitário.

O tipo de relação prevalecente entre prática e arranjo que se estabelece no feixe de prática da Limpeza urbana é constitutiva, em um movimento no qual a prática a ser desenvolvida ativa a constituição dos arranjos necessários para a prática. No caso da prática de Varrição, ma-nual e mecânica, os arranjos prefiguram a prática, isto é, delineiam a forma de fazer e a sua perpetuação. Por exemplo, no caso da varrição mecânica, ela só pode ser feita em vias nas quais não há estacionamen-to central, por isso ela se concentra em avenidas; no caso da varrição manual, o arranjo material (locais e vias) onde se desenvolve a prática não pode ser alterado, porém a maneira de fazer sim. Na prática da Compostagem de Resíduos Orgânicos há uma relação causal entre a prática de Roçada e Poda de Árvore e o arranjo material escolhido como forma de destinação dos resíduos vegetais gerados.

Já as práticas-arranjo são conectadas a outras práticas-arran-jo pela organização orquestrada, na qual vários elementos das práticas diferentes contribuem para o objetivo comum, que é encaminhar cada resíduo a uma destinação adequada, segura. O espaço de atividade per-cebido como arranjos físicos (equipamentos, caminhos e até pessoas) são comuns a diversas práticas. A amarração que se estabelece entre as práticas, os pontos nodais, é percebida claramente na cadeia de ação.

A cadeia de ação é caracterizada pela domesticação como as demais práticas desenvolvidas pela Secretaria do Meio Ambiente, por-que estão confinadas em pacotes específicos e restritas, principalmente, em suas fronteiras espaciais e legais. Entretanto, a maioria delas é mo-nitorada de uma forma ou outra. A varrição de logradouros públicos é monitorada pela fiscalização randômica e pela frequência na prestação de serviço por parte da Sema, e de forma indireta pelos resíduos que encaminham ao aterro sanitário; a Roçada e Poda de Árvores pela quan-

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tidade de cargas que entregam na Agregare; a Retirada de Árvores pela medição e registro do material lenhoso entregue à Biosfera; o serviço de vistoria de corte de árvores isoladas pelo registro de vistoria realizados; e os serviços diferenciados pelas solicitações que são atendidas. Não foi possível identificar se há ou não monitoramento da Coleta de entulhos.

Outro aspecto interessante dessa cadeia de ação é a Governança, que em alguns nexos das diversas práticas deste feixe são compartilhadas. Destacam-se a governança da Ambiental Cascavel e da Sema nas práti-cas de Roçada e Poda de Árvores, da Retirada de Árvores, de Coleta de Entulhos e de Serviços Diferenciados em que a primeira é responsável pela materialidade humana e não humana e a segunda pelo comando operacional das atividades, atuando de forma colaborativa entre si.

O entrelaçamento das diversas práticas de Limpeza Urbana, que extrapola os limites do serviço público, traz uma densidade e com-plexidade qualitativa razoável pelo volume e diversidade de atividades e entidades envolvidas nesse feixe, cuja extensão espacial limita-se a cons-telação local de resíduos sólidos em Cascavel. O próximo feixe aborda a prática da coleta e destinação de resíduos domiciliares.

4.4 FEIXE DE PRÁTICA DA COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS DOMICILIARES

A coleta de resíduo domiciliar e a coleta seletiva em Cascavel é realizada pela Ambiental Cascavel21, empresa que vem atuando na cole-ta de resíduos sólidos e limpeza pública sob contrato mediante processo licitatório e que novamente venceu o certame em dezembro de 2016, ga-rantindo a continuação da prestação de serviço para os próximos 5 (cinco) anos (PORTAL DA CIDADE CASCAVEL, 2016). As principais fon-tes de informação deste feixe foram os Entrevistados [E25 e E28].

De acordo com informação do Entrevistado [E25], o planeja-mento da coleta domiciliar e critérios como local, equipes e frequência da coleta são definidos em contrato, porém há liberdade para alterar os dias

21 Razão Social é OT Ambiental.

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da coleta, mas não há possibilidade de alterar a frequência porque ela é a base para a cobrança da taxa de lixo que os munícipes têm que pagar.

Na prática da coleta de resíduo domiciliar, a organização do trabalho está distribuída em 2 (dois) turnos de trabalho (manhã e noite), com 13 equipes de coleta para cada turno. A coleta noturna no centro e em bairros próximos é realizada diariamente à noite.

A coleta diurna foi setorizada por região. Na região sul, a co-leta é realizada nas segundas, quartas e sextas-feiras, e na região norte, nas terças-feiras, quintas-feiras e no sábado pela manhã. Nos principais distritos de Cascavel (Sede Alvorada, Rio da Paz, São João e Espigão Azul) o caminhão passa 2 vezes por semana, nas segundas e sextas-fei-ras. Todos os resíduos são encaminhados ao Aterro Sanitário.

A materialidade envolvida nessa prática consiste em 15 ca-minhões disponíveis, 408 funcionários e maquinário alocado no ater-ro sanitário. A empresa também é a responsável técnica pelo Aterro Sanitário, esclarece o Entrevistado [E25].

Em relação às reclamações e solicitações dos cidadãos referen-tes ao processo de coleta domiciliar, o Setor Ouvindo Cidadão (Disk Problema – 156) encaminha diretamente para a empresa realizar as tra-tativas, para após retornar com as informações de resolução. Além do mais essa prática é “fiscalizada informalmente pela população porque se o caminhão não passar conforme o agendamento, o cidadão liga na Ouvidoria”, esclarece o Entrevistado [E25]. A empresa também realiza pesquisa de satisfação com munícipes há 3 anos. Na última pesquisa foi detectado um índice de satisfação de 90% com os serviços de coleta domiciliar (ENTREVISTADO [E25]).

O principal problema no manuseio dos resíduos durante a co-leta é o acondicionamento incorreto, principalmente de cacos de vidro, o que gera acidentes de trabalho A forma correta é cortar embalagem pet ou tetra pak para colocar o vidro, identificando na sacola que se trata de vidro e colocar esses resíduos próximos aos resíduos recicláveis e não nas lixeiras da coleta domiciliar.

Esse foi um dos temas do programa de educação ambiental de-senvolvido, anos atrás, em parceria com a Tarobá (rede de televisão) e de uma ação externa do Evento Semana Interna de Prevenção de Acidente do Trabalho (Sipat) da Ambiental Cascavel, com colocação de faixas instrutivas nos terminais de ônibus. Como resultado, constatou-se uma

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melhora perceptível dos índices de acidentes de trabalho por causa dos vidros, embora o índice no total não tenha melhorado. Atualmente, a orientação da Sema é encaminhar os resíduos de vidros para as coope-rativas, informa o Entrevistado [E25].

A Ambiental Cascavel também está envolvida em outras práti-cas de gestão de resíduos, como: (i) a Coleta porta a porta do Programa Coleta Legal, para a qual empresa cede caminhões e coletores para a Secretaria do Meio Ambiente (Sema), órgão que coordena essa ativi-dade; (ii) Limpeza urbana, que envolve a limpeza de logradouros pú-blicos, equipes de varrição manual e mecânica; (iii) equipes de roçada (corte de grama), de poda de árvores e de coleta de entulhos, que são coordenadas pela Sema, porém a Ambiental Cascavel cede funcionários e recursos materiais como caminhões e diversos equipamentos para a execução das atividades; e (iv) e fiscalização efetuadas por funcionários da Ambiental Cascavel que acompanham essas práticas, mas eles res-pondem funcionalmente aos coordenadores dessas práticas na SEMA (ENTREVISTADO [E25]).

Cascavel iniciou a Prática da Disposição Final de Resíduos Sólidos em Aterro Sanitário em 1995. Vale lembrar que a Lei 12.305/2010, a PNRS, ficou conhecida como a lei que proíbe os lixões a céu aberto e obriga a disposição do lixo em Aterro Sanitário. Portanto, Cascavel já atende esta exigência legal.

Em 2003 foi desapropriada uma área limítrofe à área inicial para dar lugar ao novo aterro sanitário, fechado em 2009. Em 2004 o Aterro Sanitário de Cascavel foi considerado modelo pelo Ministério das Cidades, atendendo a todos os requisitos exigidos pelo Diagnóstico da Gestão e Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos. O Aterro Sanitário de Cascavel compôs o grupo de 22 dentre os 121 municípios que repas-saram informações ao Governo Federal (CASCAVEL, 2016n).

Em 2010, outra área foi desapropriada e toda a infraestru-tura para o Aterro Sanitário foi feita nesta nova área, na localidade do distrito de Espigão Azul, distante cerca de 25 km de Cascavel. A vida útil restante do aterro sanitário atual é de 5 a 7 anos, informa o Entrevistado [E28].

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O Aterro Sanitário atende aos padrões da legislação ambien-tal, segue as recomendações do IAP, possui impermeabilização de base (geomembrana Pead), compactação dos resíduos, cobertura diária dos resíduos, sistema de drenagem de gases e de percolado, sistema de rea-proveitamento de gases e sistema e tratamento de percolado (chorume), explica o Entrevistado [E28]. No aterro sanitário também há uma cor-tina vegetal proveniente da plantação de 3 (três) mil mudas de eucalipto com o intuito de promover o isolamento da área (CASCAVEL, 2016o).

A prática da Operação do Aterro Sanitário (AS) envolve várias atividades, como demonstra a Figura 17.

“Todo caminhão que chega ao Aterro Sanitário passa pela ba-lança e tem o peso anotado. O material que chega ao aterro sanitário tem uma média de 7800 toneladas/mês, valor extrapolado ao final do ano”, comenta o Entrevistado [E28]. Após a balança, o caminhão descarrega a carga de resíduos na célula em operação, que são compactados com trator--esteira. Esse processo se repete com cada carga entregue. Periodicamente o operador do Aterro Sanitário confere os sistemas em funcionamento e relata a situação para o responsável técnico do Aterro Sanitário.

FIGURA 17 – PRÁTICA DE OPERAÇÃO DO ATERRO SANITÁRIO DE CASCAVEL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

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A última análise gravimétrica realizada em 2014 no aterro sa-nitário indicou que mais de 50% dos resíduos recicláveis eram enca-minhados ao aterro, mesmo com a coleta seletiva passando nas casas das pessoas. “Mesmo assim houve melhora de 20% na gravimetria dos resíduos recicláveis presentes nos resíduos domiciliares. Há 12 anos esse índice era de 70%”, informa o Entrevistado [E25]. Já nos cálculos do Entrevistado [E28], “37% de material reciclável que vai para o Aterro Sanitário”, resultando em média 43,5% de materiais recicláveis desper-diçados no aterro sanitário.

A Prática de Produção de Biogás se desenvolve no Aterro Sanitário de Cascavel. Desde 2008 a energia produzida no Aterro Sanitário é utilizada internamente para atender a demanda de energia do local. Toda a energia necessária para a operacionalização, incluindo a iluminação, é proveniente do acionamento de um grupo gerador de 36 kVA22 (moto bomba, um conjunto gerador de 180 kVA dedicado a geração distribuída). O Entrevistado [E28] explica que é uma energia mais segura e contínua que a própria energia da Copel porque a loca-lidade de instalação do Aterro Sanitário fica no finalzinho de linha de distribuição da Copel, fazendo com que qualquer tempo ruim e ameaça de chuva possa vir a interromper a transmissão de energia.

“Toda a parte de testes já foi realizada e os planos de manuten-ção já estão prontos. A energia gerada começou a ser transferida para a rede da Copel em 2016 e deve render R$ 40.000,00/mês23 de crédito junto a Copel. Cascavel deve ser o primeiro empreendimento de micro geração a produzir energia distribuída pela Copel sob a nova resolução da Aneel”, salienta o Entrevistado [E28].

Este projeto foi experimental, desenvolvido pela própria equipe da Prefeitura, reunindo 5 (cinco) profissionais de várias secretarias, sob a coordenação da SEMA. O custo total do projeto do biogás em Cascavel não chega a R$ 400.000,00. Tem a concepção de adotar um mecanismo mais simples, e por isso mais fácil de operar, de man-ter e de repor peças, assim como mais barato. Contudo, transplantar do projeto para a execução é diferente [...] aparecem problemas não

22 kVA - Quilovoltampere é uma unidade de medida equivalente a 1000 voltamperes.23 Na data da entrevista, 29 de junho 2016, ainda não tinha sido efetivado o encontro de contas entre a Prefeitura de Cascavel e a Copel, de modo que não foi possível especificar o valor em real.

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previstos [...] surgem questões que só podem ser resolvidas coletiva-mente. O conhecimento é construído na prática e de forma compar-tilhada (ENTREVISTADO [E28]).

As relações entre os atores e o entrelaçamento entre práticas e a destinação dos resíduos produzidos no Feixe de Prática da Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares podem ser observadas na Figura 18.

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A governança da prática da Coleta Porta a Porta e Destinação de Resíduos Domiciliares é executada pela Ambiental Cascavel e fis-calizada pela Secretaria do Meio Ambiente (Sema) por meio do seu Departamento Técnico Ambiental e de seu respectivo órgão subordina-do, Divisão de Resíduos Sólidos e Recursos Hídricos. Há um entrelaça-mento entre essas e outras práticas em vários pontos da cadeia de ação.

O relacionamento entre a Ambiental Cascavel e a Sema ofi-cialmente é baseado em regras (contrato sob licitação), portanto, de caráter obrigatório, porém cotidianamente é colaborativo e amistoso. De maneira geral, as relações entre as organizações são bastante infor-mais. As formas de contato são as mais diversas (pessoalmente, tele-fones, e-mail, recados, etc), e as reuniões sobre assuntos pontuais com a Secretaria são comuns. Contudo, quando há uma questão urgente, a Ambiental Cascavel geralmente emite um Ofício à Sema. Estas formas de contato é o que Schatzki (2016) denomina de cadeia de interação, que geralmente está entrelaçada com a cadeia de ação da prática.

A operação do Aterro Sanitário cabe à Ambiental Cascavel, sendo também seu responsável técnico. Contudo, a parte da infraestru-tura do Aterro, o projeto e a implantação da produção de bioenergia, até o momento, cabe à Sema.

A Ambiental Cascavel também é responsável pelo fornecimen-to de recursos materiais e humanos para a execução da Coleta Legal, no modelo porta a porta, e de outras práticas relativas à manutenção de espaços urbanos, como coleta de entulhos, roçada dos espaços verdes e retirada de árvores, todos estes coordenados pela Sema. Os serviços de varrição urbana e espaços públicos são diretamente coordenados pela Ambiental. Somadas a essas práticas, está a prática da Coleta Seletiva porta a porta (Programa Coleta Legal), que pode ser entendida, em sua origem, como uma bifurcação da prática de coleta domiciliar.

Decisões de governança conduzem à melhoria da eficiência, a alterações nas práticas e em inovações. Destacam-se o papel da materia-lidade e à atenção aos eventos circunvizinhos às práticas já estabelecidas, como são os casos (i) da geração de energia pelo biogás, (ii) do aumen-to expressivo na capacidade de compactação dos resíduos pelo uso de equipamentos mais eficientes, apropriados para esse fim, implicando no aumento da vida útil do aterro, (iii) da disponibilização de trator de re-

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serva para não interromper os trabalhos no aterro sanitário em situação de quebra da máquina, (iv) da substituição de caminhões de coletas mais modernos tecnologicamente com maior capacidade de compactação (3 vezes mais), gerando economia de custos e de tempo, e (v) inserção de novas práticas como a coleta de animais mortos de pequeno porte deixados em via pública.

A prática de recolhimento de animais existia anteriormente somente para animais de grande porte, sendo os casos atendidos pela Sema, explica o Entrevistado [E25]. Cada caso é analisado pela equi-pe da Sema, por exemplo, se a morte é recente, o corpo do animal é examinado para ver a possibilidade de encaminhar parte da carne ao Zoológico Municipal. Caso contrário, é providenciado o aterramento do corpo. Entretanto, para animais de pequeno porte não havia desti-nação adequada. Ao observar essa lacuna, a Ambiental Cascavel tomou a iniciativa de estabelecer a Prática da coleta de animais mortos de pe-queno porte. O procedimento é simples: basta o cidadão ligar para a empresa e informar o local e dispor o corpo na via pública.

Nesse cenário evidencia-se tanto a complexidade qualitativa trazida pelo entrelaçamento de diversas práticas que no cotidiano estão sujeitas a situações emergentes, contingentes e interdependentes, quan-to a densidade das relações entre práticas, entidades e atividades envol-vidas pela governança nesta constelação local.

A extensão espacial ocupada por essas práticas limita-se a constelação local de resíduos sólidos de Cascavel e a continuidade da governança pela Ambiental Cascavel está garantida pelos próximos 5 (cinco) anos, tendo em vista que ganhou o certame licitatório para essa prestação de serviço. A prática em si, da coleta de resíduos domiciliares, tem duração garantida pela regra (PNRS).

O tipo de relação prevalecente entre prática e arranjo que se estabelece no feixe de prática da Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares é constitutiva, isto é, para que a prática ocorra são neces-sários arranjos materiais que a possibilitem como pessoas e caminhões para coleta de lixo e local adequado para sua disposição.

Embora a regra PNRS torne obrigatória, a partir de 2018 (o prazo inicial era em 2014), a disposição de resíduos sólidos em Aterro Sanitário não se pode considerar uma relação de causalidade entre essa

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prática e arranjo na constelação local de Cascavel, visto que a essa prá-tica acontece desde 1995.

As relações que mais se destacam entre o feixe de prática-ar-ranjo da Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares com outras prá-ticas-arranjo são o espaço de atividade, a organização orquestrada e a cadeia de ação. Os caminhos são compartilhados entre as práticas de coleta domiciliar, coleta legal e coleta de animais, sendo o aterro sani-tário compartilhado por essas práticas como também pela prática da geração de energia, caracterizando dessa forma a partilha do espaço de atividades. Todas essas práticas desenvolvem atividades diferentes bus-cando o mesmo fim: a gestão adequada dos resíduos sólidos, portanto, operam de forma orquestrada.

Tanto a prática de coleta domiciliar, a de coleta seletiva ou co-leta legal, quanto a do aterro sanitário fazem parte da cadeia de ação da geração de resíduos sólidos e de sua destinação adequada. Podemos considerá-la como relativamente complexa e que apresenta característi-cas como: domesticação, bifurcação, monitoramento e governança, esta última já abordada anteriormente.

A domesticação é o confinamento da cadeia dentro de pa-râmetros estabelecidos e este conceito é inteiramente aplicável para as práticas de coleta domiciliar, colega legal e do aterro sanitário posto que a organização dessas práticas estão balizadas por regras (contratos de prestação de serviço, política nacional de resíduos sólidos e outras exigências normativas) ao mesmo tempo também estão restritas à cons-telação local de resíduos sólidos em Cascavel.

O conceito de bifurcação pode ser aplicado em situações nas quais uma cadeia ou nexo se divide e esse fenômeno é evidente no caso da coleta domiciliar, na qual houve uma fragmentação de parte do resí-duo sólido gerado que começou a ser segregado de forma diferenciada, em resíduo sólido reciclável e outros tipos de resíduos possibilitando, assim, a coleta em separado bem como a sua destinação.

O monitoramento da prática da coleta domiciliar é realizado diariamente no Aterro Sanitário, sendo registrado o peso e tipo de re-síduo de cada caminhão que chega ao local. Há também o acompanha-mento que pela Secretaria do Meio Ambiente realiza, seja por meio da fiscalização, seja por meio de reuniões e comunicações informais.

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A prática da geração e destinação de resíduos sólidos também é monitorada pelo (i) Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir), que é um instrumento da Política Nacional de Resíduos Sólidos, estabelecido pela Lei 12.305/2010, e é coordena-do pelo Ministério do Meio Ambiente e (ii) pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), coordenado pelo Ministério das Cidades. Estes sistemas solicitam uma gama de informações so-bre a gestão de resíduos sólidos que devem ser fornecidas anualmente pela Sema. Esses dados são consolidados e disponíveis para acesso do cidadão no portal do Sinir e do SNIS, compondo vários documentos por eles produzidos, como o Inventário de Resíduos e o Diagnóstico de Resíduos Sólidos.

A dinâmica do feixe de prática da coleta e destinação de resí-duos domiciliares é demarcada por conceitos como bifurcação, acumu-lação, entrelaçamento e estabilidade. A bifurcação é o mesmo conceito presente na cadeia de ação, aqui agora com o olhar sobre o feixe da práti-ca. Ainda assim é o mesmo fenômeno da fragmentação de parte do feixe de prática da coleta domiciliar em coleta seletiva de resíduos recicláveis, evento anterior ao Programa Coleta Legal. A acumulação, associação e agregação no sentido de ampliação do feixe pela criação de novas práticas, como é o caso da coleta de animais mortos de pequeno porte.

Ficou evidente o entrelaçamento da prática da coleta domi-ciliar porta a porta com outras práticas, compartilhando a materialida-de humana e não humana (equipamentos, veículos, arranjos, pessoas) com outras práticas (coleta seletiva, aterro sanitário, limpeza urbana, coleta de animais mortos).

A estabilidade do feixe, como foi apontada anteriormente, de-pende de situações contingenciais e do contexto. Um processo licitatório pode ser revertido se houver irregularidades constatadas. Neste caso, a continuidade do serviço de coleta domiciliar estaria temporariamente em jogo porque a Secretaria de Meio Ambiente não tem condições ma-teriais e pessoais para realizar este serviço de pronto. No entanto, a co-leta de resíduo é legalmente de responsabilidade municipal e, portanto, o risco de sua dissolução é nulo. Apenas a maneira como é executada é que pode mudar.

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Na próxima seção é descrito o feixe responsável pela gestão dos resíduos de construção civil.

4.5 FEIXE DE PRÁTICA DE GESTÃO INTEGRADA DE RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL

A Prática da Gestão Integrada de Resíduos da Construção Civil surgiu como uma forma de resolução de uma das maiores preocu-pações do Secretário de Meio Ambiente que era “dar destinação correta de todos os resíduos gerados no município de Cascavel, especialmente os resíduos Classe A, relativos à construção civil”, considera o Entrevistado [E32], porque o volume e peso diário gerado desse tipo de resíduo é o mesmo volume e peso diário coletado do resíduo domiciliar (8 ton/dia), portanto, um resíduo importante para ser monitorado, embora seja um resíduo inerte.

A Classificação dos Resíduos da Construção Civil no Brasil se dá através da Resolução de 307 e 469 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA, 2002, 2015) conforme explicita o Quadro 5.

QUADRO 5 – CLASSIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL

Resolução CONAMA 307/2002 e469/2015*

Classificação dos Resíduos da Construção Civil

I – Classe A

São os resíduos reutilizáveis ou recicláveis como agregados, tais como:de construção, demolição, reformas e reparos de pavimentação e de outras obras de infraestrutura, inclusive solos provenientes de terra-planagem; de construção, demolição, reformas e reparos de edificações: componentes cerâmicos (tijolos, blocos, telhas, placas de revestimento etc.), argamassa e concreto; de processo de fabricação e/ou demolição de peças pré-moldadas em concreto (blocos, tubos, meios-fios etc.) produzidas nos canteiros de obras.

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Resolução CONAMA 307/2002 e469/2015*

Classificação dos Resíduos da Construção Civil

II – Classe B

São os resíduos recicláveis para outras destinações, tais como: plásticos, papel, papelão, metais, vidros, madeiras e gesso;§ 1º No âmbito dessa resolução consideram-se embalagens vazias de tintas imobiliárias, aquelas cujo recipiente apresenta apenas filme seco de tinta em seu revestimento interno, sem acúmulo de resíduo de tinta líquida.§ 2º As embalagens de tintas usadas na construção civil serão sub-metidas a sistema de logística reversa, conforme requisito da Lei nº 12.305/2010, que contemple a destinação ambientalmente adequada dos resíduos de tintas nas embalagens”.

III – Classe CSão os resíduos para os quais não foram desenvolvidas tecnologias ou aplicações economicamente viáveis que permitam a sua reciclagem ou recuperação.

IV – Classe D

São resíduos perigosos oriundos do processo de construção, tais como tintas, solventes, óleos e outros ou aqueles contaminados ou prejudi-ciais à saúde oriundos de demolições, reformas e reparos de clínicas radiológicas, instalações industriais e outros bem como telhas e demais objetos e materiais que contenham amianto ou outros produtos noci-vos à saúde.

*Altera o Artigo 3º da Resolução 307/2002 do CONAMA.

Fonte: CONAMA 2012, p. 805; 2016.

Em 2014, a Sema comunicou, por meio de sua página na in-ternet, que a partir do mês de junho de 2014, os resíduos Classe B, recicláveis, deveriam ser encaminhados diretamente às Cooperativas de Catadores de Cascavel com o intuito de gerar emprego e renda aos ca-tadores de Cascavel (CASCAVEL, 2016q). Os resíduos Classe C e D têm como destino adequado o Aterro Industrial.

Os principais atores desse feixe são o poder público municipal representado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, o Ministério Público, e empresas de construção civil, de terraplanagem, empresas de coleta e transporte de resíduos de construção civil, empresas recicladoras e de destinação final desses resíduos.

A prática da gestão integrada dos resíduos sólidos da constru-ção civil em Cascavel nasceu do Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PGIRS) do Município de Cascavel, o qual foi submetido à

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apreciação do Ministério Público. Dentre as 17 ações previstas no cro-nograma estavam as obrigações do município relacionadas à gestão dos resíduos da construção civil. Foi uma iniciativa da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Sema) com acompanhamento do Ministério Público, informa o Entrevistado [E28].

Desde 2011 a Sema tem procurado organizar as atividades en-volvidas com resíduos da construção civil. As leis, decretos e demais documentos que regulamentam os resíduos da construção civil são:

• Lei nº 5.789/2011, que regulamenta a coleta, o transporte e a destinação final de Resíduos da construção civil e dá outras providências;

• Decreto nº 9.775/2011, que institui o Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil (PGRCC);

• Cartilha Informativa para Geradores de Resíduos da Construção Civil e Usuários de Caçambas de Transporte de Entulho;

• Lei nº 6.603/2016, que altera a redação [de alguns artigos] da lei nº 5.789/ 2011 e dá outras providências.

Até alcançar a etapa de formalização dessas regras, houve várias reuniões, palestras e audiências públicas com a participação da Secretaria de Meio Ambiente, Sinduscon (Comitê de Meio Ambiente), de empresários do setor da construção civil, da coleta e transporte de resíduos e de empresas que fazem a destinação final, algumas contan-do também com a presença do Ministério Público para apresentar as regras, discutir procedimentos, enfim, delineando as mudanças nessa prática. Entretanto, essa situação gerou muitos conflitos entre algumas empresas de transporte dos resíduos da construção civil e a Secretaria do Meio Ambiente por causa da regulamentação (PNRS) que passou a exigir mudanças em procedimentos e controles de gestão que antes não existia [E32, E22]. “O apoio do Ministério Público (9ª Promotoria) foi fundamental para assegurar as medidas tomadas pela SEMA”, explica

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o Entrevistado [E32], respaldado também pelo Entrevistado [E33]. O entrevistado [E22] comentou que o “Secretário teve que manter uma postura firme apesar das pancadas”.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos já está em vigor há alguns anos, e Cascavel foi um dos primeiros municípios no Brasil a exigir o Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil (PGRCC). Em projetos de obras acima de 600m2 de área constru-ída (construções, reformas e reparos) e de área de demolição (ou ater-ro) acima de 100m2 têm que constar este plano porque é pré-requisito para a liberação do habite-se ou do licenciamento de operação. “Sem esse documento nenhuma obra pode ser regularizada. Isto é um avan-ço e já se pode sentir a diferença”, avalia o Entrevistado [E21]. Para o Entrevistado [28], “[...] o município tem criado mecanismos de fiscali-zação e qualquer obra tem que ter o plano de gerenciamento de resíduos da construção civil”.

Desde 2002 esse tipo de resíduo era levado ao Aterro de Inertes, localizado na pedreira municipal. “Em 2005, no antigo aterro, se recebia 150 caçambas desse resíduo da construção civil por dia” [E22]. “[...] em 2011 o Ministério Público se manifestou dizendo que a Prefeitura não tinha a obrigação de receber este tipo de resíduos” [E28].

A governança da Sema decidiu pelo fechamento da Pedreira Municipal, local onde eram depositados os inertes, entulhos de cons-trução, etc, e que funcionou durante anos. Diante da necessidade de dar destinação e disposição apropriada aos resíduos, fazia-se necessário esta decisão. Entretanto, esta decisão mobilizou empresas do setor em um movimento para criação de uma associação para que defendesse a manutenção da Pedreira como local de recebimento de inertes. Foram realizadas várias reuniões, mas nunca se chegava a um consenso e essa ideia foi abortada porque muitas empresas transportadoras de entulhos estavam resistentes, não queriam mudar a forma de trabalhar e atender aos requisitos legais. Inclusive ameaças anônimas foram direcionadas ao Secretário Municipal. Não havia o entendimento que era obrigatória a tomada de decisão para atender a lei, caso contrário, estaria correndo o risco de ser preso, comenta o Entrevistado [E09]. A Prefeitura fechou definidamente este local em 2015 [E28].

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No segmento de transporte e destinação de resíduos sólidos a distribuição de poder é irregular. Sob o ponto de vista do mercado, as empresas que trabalham com a destinação final do produto, seja reali-zando tratamento transformativo, seja fazendo a disposição adequada, são as que mais têm poder porque precificam seus serviços e produtos em um ambiente no qual a concorrência é fraca. Sob o ponto de vis-ta permissão para atuar e de regulação das atividades o poder concen-tra-se no poder executivo por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e do Ministério Público.

O Art. 20 da PNRS indica como o maior responsável pelo pla-no de gerenciamento de resíduo sólido o gerador do mesmo, ou seja, a adesão às exigências legais e as alterações em práticas devem caber ao gerador. Como consequência, muitas empresas fecharam e outras estão à venda no segmento de transporte de caçambas e algumas estão em processo de cassação, comenta o Entrevistado [E09].

Nesse interim, foram abertas duas empresas recicladoras, li-cenciadas e já em operação, dedicadas à destinação final desses resíduos. “Cascavel é a única cidade do Paraná que tem duas empresas que fazem reciclagem de resíduos da construção. Hoje essas recicladoras recebem 40% a 50% do que é gerado” [E28]. Para o entrevistado [E21],

hoje em dia está sendo pouca a procura de resíduos recicláveis da construção civil para ser reutilizado em obra. As duas empresas em Cascavel que atuam no segmento estão ainda em fase de testes, para saber em quais etapas da obra que é possível utilizar esses resíduos. Por enquanto esses resíduos estão sendo utilizados para fazer aterros, bases de piso e itens não estruturais.

O entrevistado [E28] também é de opinião que ainda os pro-dutos não são bem aceitos no mercado.

Aqueles que não dão destinamento correto aos resíduos identifi-cam no mapa as áreas pertencentes ao município para lá descarregar esses resíduos e geralmente essas áreas estão em fundos de vale. “Neste ano fo-ram encaminhadas ao Ministério Público a cassação de quatro empresas por crimes ambientais. É um fato que não me deixa feliz” [E32].

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Muito dessa resistência em adequar-se às exigências legais se deve ao fato de impactar os custos da atividade porque há um custo para depositar esses resíduos em local adequado e esse custo pode ser absorvi-do pela empresa ou transferido aos preços, entretanto, essa última opção impacta na competitividade da empresa, comenta o Entrevistado [E32].

A Secretaria de Meio Ambiente (Sema) tem o controle dessa atividade através de leis e não dos serviços. A lei é base para que a fis-calização se manifeste com relação aos crimes, aos erros e à omissão dos empresários dessa atividade.

As Leis 5.789/11 e 6.603/15 regulamentam a coleta, o trans-porte e a destinação final de resíduos da construção civil. E estabelece critérios para emissão do Alvará de Licença por meio do Cadastramento na Sema. A Prática do Alvará de Licença e Cadastramento de empresas segue os procedimentos a seguir:

1. Empresas de coleta e transporte de resíduos, e empresas de terraplanagem e transporte de terra devem realizar licen-ciamento ambiental junto ao município ou estado;

2. Caso essas empresas possuam caçambas estacionárias, ca-minhões basculantes, com carrocerias e poli guindastes (únicos autorizados a transportar caçambas) devem efetu-ar o cadastramento no Cadastro Municipal de Transporte e Entulho (CMTE) de responsabilidade da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, para obtenção de Alvará de Licença, pela primeira vez ou em sua renovação ou quando houve alterações nas informações cadastrais;

3. Para realizar o cadastramento no CTME é necessário: • Formulário preenchido fornecido pela Sema; • Juntada de documentos da empresa e do veículo; • Fotos coloridas 10 x 15 cm de caminhões e caçambas; • Vistoria do caminhão e caçamba, realizada pela Sema; • Que o rastreador instalado no caminhão (obrigatório

para a empresa) esteja funcionando.4. Fornecido o número do CTME, ele deve ser colocado na

parte traseira e lateral do veículo e/ou caçamba em tama-

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nho visível a, no mínimo, 20 m de distância. • Se algum veículo ou caçamba for flagrado pela fiscalização sem o número do CTME, multa de 50 UFMs será aplicada com apreensão de veículo e caçamba até a efetiva regulariza-ção.

• Veículos de placa de fora do município não poderão ope-rar em o número do CTME.

5. Se algum veículo for flagrado despejando entulho em local inadequado as sanções são:

• pela 1ª vez, multa de 20 UFMs; • pela 2ª vez, valor da multa dobrada – 40 UFMs; • pela 3ª vez, cassação do CMTE.

A empresa que transporta o resíduo tem que estar licenciada pelo município, cadastrada e emitir manifesto de transporte dizendo de onde saiu a carga e para onde está sendo levada. Ressalta o entrevistado [E28] que “na obra deve ficar um manifesto igual de mesmo número. Ainda esse setor está se ajustando. A logística reversa da construção civil não é obrigatória pela Política (PNRS)”.

Atualmente são 50 empresas cadastradas na Sema para exercer atividades de transporte relacionadas aos resíduos sólidos, contudo ape-nas 15 delas estão com a documentação adequada e, portanto, autoriza-das a fazer o transporte desse tipo de resíduo (Classe A). As empresas de transportes também são responsáveis pela destinação correta do resíduo, por isso uma forma de controle foi o estabelecimento do manifesto de transporte, onde consta a origem e o destino final do resíduo. Esse docu-mento fica de posse da empresa contratante e da contratada, disponível para verificação dos órgãos ambientais [E32].

Uma das inovações que as Leis Municipais 5.789/2011 e 6.603/2016 trouxeram foi a exigência de equipar os caminhões, que fa-zem o transporte de resíduos de construção civil, com rastreadores, a expensas dos empresários, e que contenha relatório de eventos com sis-tema de armazenagem de informações constando data, horário e loca-lização do veículo, incluindo o endereço eletrônico e a respectiva senha

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para o monitoramento e fiscalização pela Sema. Essa regra permitirá que se crie uma cerca eletrônica nas áreas ambientais: quando um ca-minhão rastreado ultrapassar a cerca um alarme será disparado. O que também exigirá uma prontidão do corpo de fiscais para se deslocarem ao local no momento da ocorrência. Essa nova prática está sendo orga-nizada no momento [E32].

A previsão da colocação de rastreadores já era prevista na Lei 5.789/2011, porém constava que os custos seriam da prefeitura. Essa exigência nunca foi amplamente colocada em prática. Como informa o Entrevistado [E22]:

Essa lei caiu em desuso, nunca foi revogada, simplesmente parou de se cobrar isso. O fornecimento dos rastreadores era de responsa-bilidade do município. Porém a lei previa a instalação, mas não a manutenção dos rastreadores e assim se eles quebrassem ou se desse defeito, não haveria nada a se fazer. Coincidentemente todos quei-maram ou deram defeitos. Então, como não se pode ter dois pesos e duas medidas, as empresas que estavam trabalhando corretamente fizeram pressão para que a SEMA também exigissem das demais empresas do setor. O caminho foi editar uma nova lei, agora com a previsão de que os rastreadores seriam de responsabilidade das em-presas, obrigando que elas fornecessem a senha, mantivessem dados nos servidores da SEMA, e se responsabilizassem pela manutenção do equipamento.

Uma prática comum, mas não correta, realizada por empresas do setor da construção civil é coletar o resíduo no ponto A e descar-regá-lo no ponto B, seja o ponto B um destino inadequado para este resíduo. É muito comum que este resíduo seja encontrado em fundos de vale, áreas de vegetação, impedindo o crescimento de mesma, fe-chando nascentes, comprometendo de alguma forma o ecossistema do lugar aliado ao fato de que os resíduos inertes levam mais de 400 anos para degradar-se. Não é incomum também que as caçambas contenham lixo domiciliar misturado aos resíduos de construção civil, uma prática vedada em lei. Isso seria outro potencial fator de contaminação dessas áreas [E32].

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Locais de disposição inadequada desses resíduos foram mape-ados pela Sema e entram sempre na rota da fiscalização, além de outros novos locais que vão aparecendo [E32]. “Estamos trabalhando para que 100% desses resíduos tenham destinação correta, tomando providência para inibir o despejo ilegal desse material na área do município” [E28].

O § 1º do Art. 2º da Lei 6.603/2016 prevê a possibilidade de cassação do alvará de funcionamento de empresas transportadoras ou transportadores autônomos cadastrados que forem apanhados pela fiscalização despejando entulho sem o devido aparelho rastreador ou em locais inapropriados.

Dar destinação correta aos resíduos da construção civil foi uma meta de gestão e agora estamos bem próximos a 100%. Falta muito pouco para que este setor seja controlado definitivamente pelo poder pú-blico, se assim persistir futuramente. Cascavel está bem nesse quesito comparada a outras cidades do mesmo porte que têm tido dificulda-de de controlar esse tipo de resíduo (construção civil) [E32].

O Sinduscon, entidade representativa da indústria da Construção Civil, insere-se neste feixe com a Prática de Apoio do Comitê do Meio Ambiente do Sinduscon aos seus associados, incluin-do as regras nacionais, estaduais e municipais.

Para o Entrevistado [E21], atualmente grande parte das cons-trutoras tem feito a segregação do material ainda na obra e a destinação correta, enviando para as duas recicladoras que existem em Cascavel hoje e que são licenciadas. Mas ainda existem obras de pequeno porte (reforma) que ainda não aderiram à nova regulamentação e continuam fazendo descarte irregular.

Nos últimos anos ocorreram diversas mudanças em legislações, especialmente as municipais e as empresas que não estão cumprindo a lei estão sendo autuadas. Para auxiliar as empresas de construção civil e associados, o Sinduscon Oeste do Paraná, de Cascavel implantou o Comitê do Meio Ambiente em 2014, espelhado em iniciativas seme-lhantes de cidades paranaenses.

A finalidade do Comitê é promover a discussão sobre a sustenta-bilidade ambiental relacionada ao setor, e oferecer um apoio mais abran-

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gente aos profissionais das empresas do setor (empreendedores e constru-toras) sobre a segregação e destinação adequada aos resíduos da constru-ção civil bem como divulgar e orientar sobre a legislação ambiental.

Poucas construtoras têm conhecimento pleno de como lidar com resíduos de classe a, b e c, como fazer as destinações corretas e o reaproveitamento dos materiais, assim como conhecimento sobre a legislação específica para o setor como o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos da Construção Civil (PGRCC) [E21].

A Prática de Apoio do Comitê do Meio Ambiente do Sinduscon compreende reuniões bimestrais no Sinduscon, com convo-cação formal aos associados, na qual há uma pauta previamente discuti-da. Os participantes contribuem com sugestões e dúvidas. É costume ter convidados especiais abordando assuntos de interesse como especialistas da Sema, pessoal de cooperativas de material reciclável e discussões so-bre certificações ambientais.

Para subsidiar os assuntos sobre os quais há interesse em apro-fundar conhecimentos é realizada uma pesquisa por e-mail. Esses even-tos acontecem a cada 2 ou 3 meses, dentro do próprio Sinduscon, na forma de workshops e palestras.

“No início do trabalho de coordenação do comitê, as reuniões eram extremamente profissionais, mas com o passar do tempo a pro-ximidade foi ficando maior e agora o relacionamento com os associa-dos Sinduscon é mais informal”, comenta o Entrevistado [E21]. Trocas de ideias sempre acontecem em eventos sociais ou encontros fortuitos, que ocorrem no dia a dia, no horário de trabalho, nos finais de semana. Os meios mais comuns para estabelecer relações com parceiros são os encontros pessoais, visitas, telefone, WhatsApp, reuniões, e-mail, workshops, eventos, entre outros.

O entrevistado representa o Sinduscon Oeste de Cascavel no Grupo de Trabalho “Plano de Logística Reversa dos Resíduos da Construção Civil no Estado do Paraná” formado por profissionais de Curitiba, Londrina, Maringá. É uma iniciativa da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema/PR), Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) (gestor do grupo), Serviço Nacional de Aprendizagem

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Industrial (Senai) e todos os Sindicatos da Indústria da Construção Civil do Paraná (Sinduscon-PR).

O Termo de Compromisso para execução do plano de logística reversa e responsabilidade pós-consumo de resíduos do setor industrial da construção civil no estado do Paraná foi assinado em dezembro de 2014 pela Sema/PR e pelos Sindicatos representativos do setor (Oeste, Noroeste, Norte e Paraná). O plano foi elaborado pelo Senai em 2014 e aprovado pelo Grupo Técnico instituído pela Resolução Sema/PR 49/2014 (PARANÁ, 2014).

Este grupo tem se encontrado há 18 meses, em reuniões. Estão na fase do desenvolvimento do planejamento estratégico. A intenção é envolver os participantes da cadeia produtiva da construção civil, como fabricantes de cimento, tijolos, tintas, vidros, gesso. Para o Entrevistado [E21], “O Paraná está sendo precursor nesta iniciativa para o setor da Construção Civil. O desafio é desenvolver uma forma em que os custos sejam divididos entre os atores da cadeia produtiva”.

Destaca-se, portanto, nesta prática como ações de inovação da governança as atividades de discussão e divulgação de conhecimentos (teórico-práticos) com a finalidade ampliar conhecimentos sobre a sus-tentabilidade aplicada à construção civil, regras que ordenam a atividade, sustentados na “ideia de fazer diferente, fazer melhor”, como pontuou o Entrevistado [E21].

A Prática de Reciclagem de Resíduos da Construção Civil em Cascavel tem na Future uma de suas praticantes, a outra é a Lapa Caçambas.

A ideia do negócio da Future surgiu há cinco anos, com os gestores entusiasmados com os resíduos de obras. Paralelo a essa ideia, a Política Nacional de Resíduos Sólidos entrou em vigor. O sócio proprietário, o Entrevistado [E22] comenta que “Então juntou as duas coisas: a parte comercial de um produto que você pode recolocar no mercado com boas propriedades para trabalhar e a legislação fun-cionando, então a gente deslumbrou uma oportunidade de lucro em cima disso”.

Há cerca de três anos e meio atrás foi iniciado o processo de licenciamento da empresa, há dois anos o de instalação, e a licença de

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operação já tem 18 meses. Foi um processo demorado, avaliado pelo Entrevistado [E22], e não obstante o atendimento tenha sido bastan-te eficiente e educado em todos os órgãos envolvidos no processo, não houve qualquer incentivo municipal ou estadual; não puderam operar experimentalmente. Tiveram que aguardar a liberação das licenças e im-plantar todos os processos organizacionais.

“Nesse tempo de operação, a prefeitura fechou o aterro de iner-tes (ex-pedreira), que foi pensado para durar dois anos e durou 12, sem controle do que e quanto era aterrado. A única certeza que se tinha era que era aterrado naquele local” [E22]. E desde então a Future recebe re-síduos da construção civil fazendo a reciclagem correta desses materiais.

“Diria que Cascavel é o município mais avançado da região em relação à gestão de resíduos sólidos [...] as mudanças ocorreram em 2010 e 2011 [...] governos anteriores anteciparam algumas ações até mesmo em relação a Política Nacional de Resíduos”.

A prática da reciclagem de resíduos sólidos envolve também a prática de locação e de transporte de caçambas. A empresa executa o ci-clo completo: desde a retirada dos resíduos na obra até a devolução des-se resíduo como material reciclável. É uma prática do berço ao berço.

Há um cuidado especial na prática de gestão de locação de ca-çambas. Cada caçamba tem um contrato específico, informando o ma-nejo dos resíduos na caçamba, o que pode e o que não pode ser deposita-do (como proibição de colocar fogo na caçamba, por exemplo), a forma de medição, para que as responsabilidades das partes fiquem claras.

A Future faz um trabalho de instrução junto aos clientes ex-plicando como a separação dos materiais deve ocorrer. Para aqueles que alugam a caçamba, entrega um saco de ráfia para separação de outros materiais recicláveis que não seja proveniente de obras. Antes de coletar a caçamba com resíduos é verificada a presença de materiais irregulares e estes são retirados e deixados na obra. A empresa mantém registro de todas as caçambas das empresas que entregam os produtos na Future. Registra o número, o conteúdo da caçamba e volume (m3).

A prática de separação dos resíduos quando chegam na Future inicia com a triagem e classificação dos materiais provenientes de ca-çambas (próprias ou de terceiros) ou caminhões, isso é necessário por-

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que a mistura de materiais dentro da caçamba é um problema recorrente na caçamba de outras empresas.

De todo o setor, há umas 17 empresas que só trabalham com caçam-bas, os caçambeiros. Destes, três ou quatro não entregam na Future, entregam na Lapa. Então, há aquelas empresas que entregam fre-quentemente na Future, aquelas que entregam semanalmente e es-poradicamente ([E22]).

Materiais como papel, plástico, isopor ou metal são armazenados provisoriamente no pátio para venda posterior. As recicladoras são con-tatas por telefones e vêm retirar o material na Future. Os parceiros são: Ferro-velho, empresas de material reciclável de papel e plástico, empresa de isopor. Resíduos contaminantes são devolvidos para o gerador para destinar corretamente o resíduo, ou a Future faz a destinação correta com a anuência do gerador e à custa dele. Esses materiais têm que ir para um aterro industrial e, geralmente, são encaminhados à Paraná Ambiental. Os resíduos orgânicos são mandados para a Agregare para fazer a composta-gem. As madeiras utilizadas nas obras são encaminhadas a Biosfera, onde madeira é triturada e vira cavaco (combustível de caldeira).

Vários produtos podem ser feitos com os resíduos da constru-ção civil como: paver, manilha, concreto, piso, caixa, pavimento, reapro-veitamento de areia e brita, entre outros.

O processo para se chegar aos diversos tipos de agregado reci-clado, segundo o Entrevistado [E22], foi construído no modelo tentati-va e erro porque, embora os sócios tivessem conhecimento teórico sobre como fazer, não conheciam profundamente do que cada coisa era feita, que recursos auxiliares utilizar, como transportar, que características e aplicações teriam cada produto, enfim, “[..] Então com esse material vamos fazer assim [...] mas não deu certo; tenta de outro jeito”.

Os resíduos da construção civil são separados por tipo. Cada monte de materiais que pode ser observado na Figura 19 é um tipo de material gerado, um tipo de agregado reciclado com características específicas.

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FIGURA 19 – FOTO DO ESPAÇO DE ATIVIDADE DA FUTURE

Fonte: Dados primários, 2016.

O único impedimento de uso dos produtos provenientes da reciclagem é o uso em estrutura (para fazer concreto estrutural), não porque seja fraco, mas porque pode haver presença de cal e gesso no produto reciclado e isso pode corroer o aço envolvido na estrutura. “É uma cadeia gigantesca de produtos que podem ser feitos e assim como suas aplicações. Vai chegar um tempo que os produtos falta-rão, há os limites da natureza. Como vai plantar areia?”, comenta o Entrevistado [E22].

O tempo de processamento dos resíduos, atualmente, é míni-mo: se o resíduo chega de manhã, na parte da tarde está pronto para a comercialização. Entretanto, condições meteorológicas, clima e tempo podem atrasar assim como se o volume desse material estiver além da capacidade produtiva, esclarece o Entrevistado [E22].

O processo produtivo da Future não gera resíduos. Os resíduos entregues na Future geram receita e entram como insumos (sem custos) no ciclo produtivo para gerar diversos produtos (que serão vendidos). Atualmente recebe de 55 a 60% dos resíduos de construção civil produ-zidos no município. Em 2011, quando iniciou a cobrança de disposição adequada desses resíduos, as 150 caçambas geradas passaram a ser 50 por dia. Isso veio crescendo e em 2016, na empresa Future a média di-ária de recebimento é de 30 caçambas. Muito abaixo do cenário de 11

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anos atrás, sem considerar os níveis de crescimento de Cascavel, que é um dos maiores do estado do Paraná, informa o Entrevistado [E22].

“O agregado reciclado (denominação dos produtos produzi-dos) é novo na região. As usinas mais próximas ficam de Londrina em diante. São Paulo já difunde o uso há 15 ou 20 anos”, informa o Sócio proprietário [E22].

De acordo com o Entrevistado [E22], o desbravamento do mercado exigiu informações, orientações e explicações para o mercado comprador sobre as aplicações e benefícios dos produtos, tecnicamente, economicamente e ambientalmente, por isso a Future realiza um acom-panhamento durante o processo de construção da obra.

As inovações que marcam esta governança se referem a par-cerias para inovação em produtos. A Future firmou convênios com Unioeste, FAG, UTFPR Toledo, UTFPR Medianeira, Unila, UDC Foz e muitos alunos de cursos de graduação e pós-graduação já estão usando o material da Future seja para produção de concreto, argamassa ou bloco. A ideia é utilizar esse material para fins mais nobres do que usar para pavimentação.

Na Unila são três projetos diferentes em pesquisa e desenvol-vimento: desenvolvimento de paver, desenvolvimento de concretos, e caracterização do material (especificações técnicas). Está em fase de tes-te, na Unila em Foz do Iguaçu, a produção de paver e a produção de concretos não estruturais.

Dentre as mudanças percebidas pelo Entrevistado [E22] rela-tivas à prática de resíduos da construção civil destacam-se as reuniões promovidas pela governança da Sema com Caçambeiros, as Audiências Públicas para a gestão de resíduos, a cobrança da licença ambiental para as empresas que realizam transporte de resíduos da construção civil, a ação do Comitê de Meio Ambiente do Sinduscon que teve a partici-pação da Future como palestrante em um dos eventos, e a iniciativa da SEMA em estabelecer mecanismos de controle dos caminhões para monitorar a disposição final dos resíduos da construção civil. Inclusive o Entrevistado [E22] aventou a possibilidade da Sema adquirir uma cerca virtual, que seria disparada quando se ultrapassasse os limites es-tabelecidos, assim se teria a informação da hora, local, placa do veículo e a rota traçada.

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A Future desenvolve outras práticas ligadas à prática à constru-ção civil como a elaboração e implantação de planos de gerenciamento de resíduos da construção civil e locação de máquinas para execução de obras. O propósito da Future, além da lucratividade inerente a qualquer empresa, é trabalhar com o meio ambiente e fazer isso da forma cor-reta. Retirar o material da obra, fazer o mínimo processamento (eco-nomia de energia) e retornar esse material para ser utilizado, salienta o Entrevistado [E22].

A Prática de Disposição Final de Resíduos em Aterro Industrial em Cascavel tem sua governança sob o comando da Paraná Ambiental, desde 2012 quando iniciou suas atividades após a concessão de todas as licenças e liberação para operar, embora tenha sido fundada em 2006. A ideia do negócio surgiu pela análise do mercado da região que indicou a necessidade de uma empresa de tratamento e destinação final aos materiais contaminantes, perigosos, entre outros. Os sócios conheciam uma empresa que já operava em Chapecó/SC nesse ramo e que tinha em Cascavel uma estação de transbordo (ENTREVISTADO [E23]).

A área de atuação da empresa compreende a coleta, o trans-porte, o tratamento e a destinação final do resíduo, atividades para as quais é licenciada. Portanto, são duas práticas principais realizadas pela empresa: a de coleta e transporte de resíduos e a de tratamento e desti-nação final dos resíduos.

Tem como foco principal os resíduos perigosos e contaminan-tes (resíduo classe I), porém recebe os resíduos classe II, que não contém componentes contaminantes e/ou perigosos, como vidros automotivos, parachoque e paralama, resíduos contaminados e resíduos da constru-ção civil. Cada tipo de resíduo tem um manejo diferente. Por exemplo, o lodo proveniente da estação de tratamento tem que ser solidificado antes de ser disposto no aterro. Os resíduos classe I não podem ter ne-nhum contato com o meio externo e sua disposição final deve ser cober-ta (Figura 20).

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FIGURA 20 – CÉLULA DE DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUOS CLASSE I E CAMADAS DE PROTEÇÃO DA CÉLULA

Fonte: Paraná Ambiental (2016).

Os resíduos dispostos nessa vala são acondicionados sobre um siste-ma de impermeabilização com argila e dupla camada de geomem-brana PEAD, totalmente coberta por estrutura metálica impedindo a incidência de chuva na área de operação. É o sistema mais seguro e eficaz, projetado com a aplicação de técnicas de engenharia de pro-teção ao meio ambiente [E23].

Quando essa célula for toda preenchida, ela será fechada com a geomembrana e as laterais são lacradas e a estrutura metálica é retirada para ser aproveitada em outra célula.

Uma empresa para transportar o resíduo classe I tem que ter autorização especial como licença ambiental de operação, cadastro no Ibama, cadastro na Polícia Federal Rodoviária, que exige o cadastra-mento para o transporte de alguns resíduos perigosos, e atendimento da NBR 7.500, que se refere a identificação e demais regras para operação do veículo de transporte.

Os resíduos classe II A são resíduos que podem sofrer a ação do meio ambiente, como a biodegradação, resultando no chorume e por isso a célula deve ter preparação adequada antes de receber este tipo de material. O preparo específico, além do sistema de captação de líquidos, com sistema de espinha de peixe, utilizado em aterros classe II e sistema de captação e queima de gases, envolve a impermeabilização, a coloca-ção de geomembrana, argila, areia compacta, entre outros, a fim de que o lençol freático fique protegido de possíveis contaminações.

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Os resíduos classe II B são inertes e não sofrem a ação do meio ambiente e são dispostos na vala de resíduos classe II, pois mui-tas vezes ainda vem misturados. Somente resíduos de saúde e radioati-vos não entram no rol de materiais que a empresa pode receber, tratar e dar destinação final. Se o resíduo de saúde já tiver sido tratado, a empresa pode dar destinação final. As principais atividades da Prática da Disposição Final de Resíduo Classe I em Aterro Industrial podem ser observadas na Figura 21.

FIGURA 21 - PRÁTICA DA DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUO CLASSE I EM ATERRO INDUSTRIAL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Quando o cliente liga e faz a solicitação para a coleta de resídu-os também informa os tipos de resíduos (Classe I e/ou II) e a quantidade aproximada. A Paraná Ambiental emite Manifesto de Transporte (que deveria ser feito pelo gerador do resíduo, mas a empresa internalizou esta prática), e entrega vias ao Motorista, eventualmente acompanhado de auxiliar dependendo da carga a ser coletada.

No local da coleta do resíduo, o Motorista verifica a conformi-dade dos resíduos com o Manifesto. Caso haja divergência, ele anota no manifesto. Destaca uma via do Manisfesto de transporte e entrega para o cliente. Carrega o resíduo no veículo.

Ao chegar na Paraná Ambiental, o resíduo é descarregado, confrontado com o Manisfesto de Carga e pesado (kg e m3). Caso haja

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alguma informação errada, quantidade do resíduo, tipo do resíduo, vo-lume, ou até resíduo que não tenha constado do Manifesto, o agente da Paraná Ambiental emite um relatório de não conformidade. A Paraná Ambiental recebe também resíduos transportados por outras empresas.

Os resíduos classe I líquidos são enviados para o Armazenamento temporário para passarem pelo processo de solidificação. Os demais resíduos têm o tratamento e a destinação adequado. A disposição dos resíduos classe I (contaminantes) é em célula coberta, cujo espaço físico interior é divido em colunas e linhas imaginárias criando um sistema de coordenadas para que identifique a localização exata da disposição final do resíduo, possibilitando um sistema de rastreabilidade (essa é uma técnica de gestão de materiais). Essa informação deve constar no documento Certificado de Destinação Final, documento comprobatório que o resíduo classe I teve destinação final adequada e é o documento a ser entregue aos órgãos fiscalizadores, se necessário.

O relatório de não conformidade é encaminhado para as áre-as administrativas e financeiras para emitir Nota Fiscal e fatura de co-brança a serem enviadas ao cliente. Os documentos Nota Fiscal, Fatura, Relatórios e Certificados de Destinação Final são entregues pessoalmente aos clientes de Cascavel e aos demais clientes são enviados via correio

Os clientes da Paraná Ambiental são cooperativas da região, fabricantes de baterias, empresas multinacionais, companhias de com-bustíveis, metalúrgicas, concessionárias de veículos, empresas de manu-tenção e reparação mecânicas, e demais empresas de Cascavel e região geradoras de resíduos perigosos.

A localização de inovações na governança dessa prática refere-se ao (i) fornecimento de recipiente adequado ao tipo de resíduo para seus clientes com a finalidade de facilitar a segregação do resíduo, (ii) à substituição do sistema informatizado integran-do as áreas operacionais e (ii) a emissão digital do Certificado de Destinação Final de Resíduos.

Uma nova prática, associada a essa principal, foi implantada e refere-se à Prática de Serviço de Palestra e Treinamentos, que foi cria-da com objetivo de orientar os clientes sobre a correta segregação dos

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resíduos e organização desse sistema internamente. Alguns resultados dessa nova prática já foram percebidos, como (i) o gerador diminuiu a produção de resíduos; (ii) o gerador se tornou mais cuidadoso na segre-gação de resíduos; e (iii) o gerador procura dar destinação adequada aos outros tipos de resíduos.

Duas práticas organizacionais foram implantadas nos últimos anos: a prática de atendimento emergencial a acidentes, com enfoque nos acidentes que ocorrem em rodovias envolvendo produtos ou resí-duos perigosos, e a prática de operação do serviço de coleta de resíduos sólidos do município de Cafelândia.

As relações entre atores, os pontos nodais de práticas entrelaça-das no Feixe de Prática de Gestão Integrada de Resíduos da Construção Civil são representadas na Figura 22.

FIGURA 22 – ENTRELAÇAMENTO ENTRE PRÁTICAS E RELAÇÃO ENTRE ATORES NA PRÁTICA DE RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Notadamente o feixe de Prática de Resíduos da Construção Civil deve a sua organização, em grande parte, às regras que a norteiam e à Política Nacional de Resíduos Sólidos que as fundamentam. O ano de 2011 foi marcado pelas mudanças nas práticas de destinação de resíduos

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da construção civil, consequência da entrada em vigor da lei e do decreto municipal que regulam o assunto, ressaltando o papel da governança desta prática pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente.

As práticas associadas a esse feixe acima descritas surgiram em um contexto legal favorável para sua implantação, embora contasse com a resistência de potenciais adotantes, como empresas dos setores da construção civil e de coleta e transporte de resíduos, que estavam acos-tumadas a depositar esses resíduos no Aterro de Inertes da Prefeitura, com custo mínimo (R$ 8,5 m3) (CASCAVEL, 2016p). A operação do Aterro Industrial em 2012 e da Future, empresa recicladora, em 2014 propiciaram alternativas para disposição adequada desses resíduos. As ações do Comitê de Meio Ambiente do Sinduscon, as ações de fiscali-zação, a exigência do Cadastro Municipal de Transporte de Entulho em 2011 e de licenciamento para a atividade em 2016, entre outros eventos, marcam a dinâmica desta prática.

Considerando esse contexto ao analisar, na perspectiva da Teoria da Prática Social, esse feixe de prática identifica-se alguns con-ceitos que podem explicar a dinâmica dessa prática na constelação local de Cascavel.

O conceito de dissociação e dissolução de prática pode ser re-lacionado à prática de descarte de resíduos da construção civil no Aterro de Inertes, antiga pedreira municipal, que teve encerramento de suas atividades em 04 julho de 2015 (CASCAVEL, 2016p).

As ações desenvolvidas pelo Comitê de Meio Ambiente do Sinduscon para seus associados mostram aderência ao conceito de di-fusão, circulação e propagação na medida em que essas ações visam divulgar o aparato legal e normalizações relativas aos resíduos da cons-trução civil assim como os esforços para disseminar o conceito teóri-co e prático da sustentabilidade no setor da construção civil. Reuniões com empresários e profissionais do setor coordenada pela Sema assim como a elaboração e divulgação da Cartilha pela Sema (SINDUSCON OESTE-PR, [201-]) somam-se a esse conceito.

A Prática de Resíduos da Construção Civil é uma prática local limitada à constelação local de Cascavel, com regras próprias. Como

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visto anteriormente, desde 2014 o Termo de Compromisso para opera-cionalização da logística reversa do setor da construção civil no Paraná já foi assinado, entretanto ainda não está em execução. Há também o fato de que haverá mudança do gestor municipal, o que traz sempre uma incógnita. Diante desses fatos, a estabilidade e solidificação da prática analisada não podem ser afirmadas. Contudo pode-se afirmar que esta prática sofreu evolução, modificações e correções (Lei 6.603/2016) com o intuito de adequar os objetivos da prática (destinação correta desses resíduos) aos acontecimentos cotidianos.

O entrelaçamento entre as práticas dentro e fora do feixe analisado, como a prática da Coleta de Entulho do Feixe da Limpeza Urbana, descrita anteriormente e a destinação de resíduos recicláveis para Cooperativas de Catadores, expressam a complementariedade entre práticas, embora muitas práticas existentes dentro do feixe não tenham sido abordadas.

As ligações entre práticas e arranjos na constelação local de resíduos sólidos em Cascavel acontecem, tanto pela prática constituir os arranjos como vice-versa. No primeiro caso as práticas são definidas pela governança, primeiramente, para então os arranjos serem providencia-dos para possibilitar a operacionalização da prática. Esse entendimento aplica-se às práticas estabelecidas pelas regras municipais, pelas práticas desenvolvidas pelo Comitê de Meio Ambiente do Sinduscon Oeste-PR e pela Paraná Industrial, que tem todos os procedimentos formalizados.

No segundo caso, o modo de fazer os produtos agregados da Future utilizando os arranjos (recursos auxiliares, equipamentos, ma-teriais, métodos) aplicados no modelo tentativa e erro indica que foi por meio do arranjo que a prática se delineou, se constituiu. Da mesma forma aconteceu com a Prática de Serviço de Palestra e Treinamento desenvolvida pela Paraná Ambiental, porque foi observando e manipu-lando os resíduos recebidos que chegaram ao entendimento que havia desconhecimento por parte dos clientes e seus respectivos funcionários de como os resíduos deveriam ser segregados e como fazer destinação de cada um deles. Portanto, a partir da materialidade se constituiu a prática de Palestra e Treinamento aos clientes.

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As práticas-arranjo são conectadas a outras práticas-arranjo de dentro ou fora do feixe especialmente pelo espaço de atividade por meio do compartilhamento de arranjos físicos e caminhos usados por diferentes práticas, e pela cadeia de ação, quando uma atividade sucede a outra.

Uma visão geral da cadeia de ação que esse feixe envolve indica claramente que é uma cadeia de ação domesticada, isto é, está restrita pela demarcação de fronteiras espaciais e legais, entretanto, caso seja implantado a logística reversa de resíduos da construção civil cujo plano foi aprovado pelo Termo de Compromisso, essa ca-racterística pode ser anulada.

O feedback é a reação de um ator da cadeia de ação sobre um evento ocorrido ao longo dela. Dois eventos relacionados puderam ser observados. O primeiro se refere à colocação dos rastreadores nos ca-minhões a expensas da Prefeitura, conforme a Lei 5.789/2011, quan-do atores do feixe começaram reivindicar que todos fossem sujeitos ao mesmo procedimento, levando à revisão da lei, à supressão do artigo e a alteração da lei (Lei 6.603/2016) considerando a responsabilidade pela colocação e manutenção pelos proprietários dos caminhões. O segundo se refere ao papel da área de Fiscalização da Sema, como receptora e emissora de feedbacks dentro da cadeia de ação.

Uma das ações de monitoramento da cadeia de ação que a Sema emprega é o acompanhamento e controle do Cadastro Municipal de Transporte de Entulhos e da licença de operação (Alvará) das em-presas do setor.

Também podemos notar pela fala de diversos entrevistados (internos e externos à SEMA) a coordenação de discursos se referindo como uma prioridade da governança da Sema a destinação correta dos resíduos da construção civil.

A governança da cadeia de ação é marcada pela centralidade da governança da Sema posto que estabelece as regras e atua de forma obrigatória (regida por leis e decretos), sem contudo diminuir a impor-tância da governança de outras práticas deste feixe, como a da Future, do Sinduscon e do Aterro Industrial, aqui representantes dos muitos atores

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que compreende este feixe, o que evoca a densidade (entidades, relações e atividades envolvidas) da governança e a complexidade qualitativa por apresentar um contexto da prática complexo, envolvendo interesses, pontos de vista e atividades diferentes exercidas pelos diversos atores.

Essa prática está inserida em um contexto atual de mudança. Há ainda um espaço de indeterminação, contudo, é possível a mudan-ça na governança desta prática pela posse de novo prefeito e nomeação de novo secretário, como registrado anteriormente, portanto, a conti-nuidade da Prática de Resíduos da Construção Civil fica em suspenso, permanecendo sua extensão espacial restrita à constelação local de resíduos sólidos em Cascavel.

4.6 FEIXE DE GOVERNANÇA DE RESÍDUOS SÓLIDOS

A Governança é uma forma intencional de direção, de influên-cia e de intervenção e está presente nas relações inerentes à coexistência humana, na maneira intencional de moldar a vida que as pessoas levam e as práticas que elas executam.

Cada prática-arranjo material traz em si atividades inerentes de governança, podendo ocorrer também feixes especializados em go-vernança que se ligam formando uma constelação. Na perspectiva da Teoria da Prática Social a governança pode ser encontrada em vários locais e situações, por isso a governança é um termo plurilocal.

Na composição desse feixe de governança participam aquelas práticas que têm a finalidade de contribuir para que a questões dos re-síduos sólidos percorram o caminho da sustentabilidade, utilizando os mecanismos de que dispõem.

Compõem este feixe os feixes de Governança de Questões Ambientais do Ministério Público, sendo o Entrevistado [E10] o res-ponsável pela maior parte das informações, o feixe de Governança de Resíduos Sólidos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, com des-taque para a contribuição de informações dos Entrevistados [E28, E32, E33]. No Feixe de Governança da Associação Comercial e Industrial

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de Cascavel as informações foram coletadas em entrevista com o Entrevistado [E26], na Prática de Reciclagem de Vidros da Tolevidros foi com o Entrevistado [E01] e no Feixe de Governança do Núcleo CPCE-ODS foi o Entrevistado [E19] e na Prática de Recebimento, Recuperação e Reaproveitamento de Materiais Eletroeletrônico do Colégio Pe. Carmelo as entrevistas foram feitas com o Entrevistado [E17] e um professor(a) do noturno comentou sobre os projetos relata-dos no Caso 3.

A Prática de Governança de Questões Ambientais do Ministério Público tem como objetivo fiscalizar a execução e atuar às vezes como elemento catalizador para encontrar soluções negociadas dentro da dinâmica da política de resíduos sólidos.

Desde 2010 quando foi aprovada a Lei da Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS) o Ministério Público (MP) instalou inquéritos civis para apurar os planos municipais de resíduos sólidos nos três municípios da Comarca de Cascavel (Cascavel, Santa Tereza, Lindoeste).

Uma vez apresentados os planos em 2012/2013 foram analisa-das as ações propostas para as disposições finais, aterros sanitários, sepa-ração de resíduos para a reciclagem e os destinos dados para as diversas categorias de resíduos como os industriais, orgânicos, do consumo do-méstico, embalagens, pneus, entulho da construção civil.

Para cada um desses foi aberto uma investigação civil, que em sua maioria foram finalizados com Termos de Ajustamento de Conduta junto aos Municípios, estando esses termos em fase de cumprimento.

Os municípios têm a responsabilidade de prever dentro do próprio plano de gerenciamento de resíduos os indicadores, formas de mensuração e acompanhamento do desempenho dos mesmos para comparação com os requisitos estabelecidos legalmente.

Esse processo de reconhecimento das práticas existentes culmi-na em termos de ajustamento que envolve não somente o poder executivo, mas também o controle social, que acaba indicando, dentro de sua própria composição multifacetária, representantes de segmentos. A Promotoria não lida diretamente com empresas envolvidas na atividade econômica, mas com entidades e instituições que representam os segmentos.

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A Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos é uma lei que define regras, diretrizes e princípios. As políticas públicas se diferenciam das outras leis comuns porque elas não fecham o assunto. Criam-se me-tas e determinações que devem ser seguidas.

Assim, os planos de gerenciamento de resíduos têm uma mar-gem de liberdade muito grande decorrente da realidade local: como as metas serão fixadas, como será o controle delas, o modo de execução e como será o manejo local. O que não pode é esse modus operandi vir a violar aqueles princípios e regras da política pública. Por exemplo, não pode o município limitar-se a fazer a coleta de resíduo sem que haja a preocupação de segregar os resíduos na origem, já que a segregação no destino final é tecnicamente inviável. Isso foi um dos pontos de debate com os municípios da Comarca, já que um dos objetivos da PNRS é que o mínimo de resíduos (os rejeitos) seja encaminhado aos aterros sanitá-rios, dando-lhes sobrevida.

O relacionamento com outros atores envolvidos no segmento dos resíduos sólidos é altamente formal. O Ministério Público não é uma instituição que atue informalmente, portanto, nós seguimos aquelas condutas que são preconizadas seja pela norma da política seja pe-las normas que regem a atuação do Ministério Público. Portanto, o que nós fazemos dentro dos inquéritos civis, inclusive o Termo de Ajustamento de Conduta, são atos formais que estão preconizados nas diversas leis que regulamentam a atuação do MP (Lei Orgânica do Ministério Público, Lei de Ação Civil Pública e normas internas que regem nossas atuações) (ENTREVISTADO [E10]).

A par dessa formalidade, os debates que surgem nesse contex-to são mesclados com debates técnicos, que fogem da questão jurídica. Então há debates que envolvem a área da biologia, da engenharia, das políticas públicas sociais, da educação porque o assunto é multifacetado, não é exclusivamente jurídico, salienta do Entrevistado [E10].

A política pública e todas as normas que regem a atuação dos órgãos do Legislativo, do Executivo, do Judiciário, do Ministério Público e aqueles não judiciais, como os órgãos de fiscalização (IAP, Ibama, Sema) e as ONGs, que atuam diretamente sobre a matéria, e

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os Conselhos com o controle social são pautados por regras que tam-bém não são jurídicas, com regras que definem regulamentos e que mensuram modos e níveis de objetivos que estão em uma dimensão técnica [E10].

O enfrentamento processual é uma forma de enfrentamento da questão e segue fórmulas, e essas são jurídicas. Mas há pouco enfrenta-mento processual nessa temática. Foram propostas ações civis públicas no início porque os municípios não estavam apresentando os planos de gerenciamento. “Uma vez que apresentaram os planos de gerenciamento, e apresentado por conta das ações públicas propostas, aí começamos a dis-cutir fora das ações civis públicas essas temáticas”, comenta o Entrevistado [E10].

A discussão dentro de um processo judicial é muito enges-sada e muito limitada ao objeto do pedido da causa. Por força disso, a discussão que melhor gera resultado no cotidiano e na progressão [do entendimento da temática] é essa discussão formada no consenso político social (não partidário).

Pontos nodais que se destacam na PNRS e que afetam todo o território nacional, segundo o Entrevistado [E10]: (i) o Aterro Sanitário, que deve ser implantado em todo território nacional em substituição aos aterros controlados e lixões, e Cascavel já conta com o Aterro Sanitário há mais de 10 anos; (ii) destinação massiva de pneus, que em Cascavel foi solucionado porque houve um sistema de logística reversa implanta-do em âmbito nacional; (iii) a política de resíduos inertes, proveniente da construção civil que, em Cascavel, embora documentalmente esteja pronto (documentos assinados, leis municipais elaborados e em vigor), a execução desses termos constitui outro passo muito mais complexo.

O trato dos resíduos inertes da construção civil passa por uma ques-tão de ordem socioeconômica que move mais de um segmento pro-dutor, cujos interesses são conflitantes e, portanto, isso não é uma coisa simples de se tratar. E temos enfrentado [esse problema] com ações penais, ações civis públicas, enfrentado com a repressão dos órgãos administrativos, multas e embargos. Mas ainda, evidente-mente, longe de resolver. Em que pese que a estrutura sócio admi-nistrativa esteja pronta (sabemos o que deve ser feito, como deve

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ser feito, de termos os locais para levar e regulamentações pertinen-tes), há ainda um número grande de empresas que optam por dar a esses rejeitos um tratamento tradicional, que é a disposição em aterros informais, [situação] que deve levar um tempo para resolver (ENTREVISTADO E[10]).

Os (iv) resíduos provenientes da indústria, resíduos produzidos regularmente e acidentalmente já são contemplados em Cascavel com destinação adequada; (v) resíduos dos serviços de saúde, também há em Cascavel o fluxo, o modus operandi e o local de disposição estabelecido.

O entrevistado [E10] comenta que em Cascavel a questão dos resíduos está bem parametrada. “Ter parâmetros não significa que ela esteja sendo cumprida [...] o cumprimento é um conflito que transcende [...] vai para o cotidiano e é permanente à fiscalização”.

O trato dos resíduos sólidos, associado ao saneamento, é um dos elementos incorporados na avaliação do (IDH) Índice de Desenvolvimento Humano das Cidades. Cascavel24 é a 4ª. Cidade em IDH no Paraná; está entre as 50 ou 30 cidades do Brasil que mais crescem. [Então, pode-se dizer que] Cascavel está em um bom caminho, talvez não no estágio que se esperaria nem no nível que se desejaria, mas está num caminho adequado para evolução [...] está em condições razoáveis, bem próximas daquelas cidades mais des-tacadas do estado de São Paulo e Santa Catarina, que são as cidades que têm os melhores IDHs”, avalia o Entrevistado [E10].

O Feixe de Governança de Resíduos Sólidos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente aglutina várias práticas auxiliares na gestão da governança e no desenvolvimento de projetos ou ações es-pecíficas, também apresenta entrelaçamento com outras práticas, o que será demonstrado no decorrer do relato, que abrange o período de 2009 a 2016.

24 O Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) - Cascavel é 0,782, em 2010, o que situa esse município na faixa de Desenvolvimento Humano Alto (IDHM entre 0,700 e 0,799). A dimensão que mais contribui para o IDHM do município é Longevidade, com índice de 0,846, seguida de Renda, com índice de 0,776, e de Educação, com índice de 0,728 (ATLAS BRASIL, 2016).

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A forma de atuação da governança, enquanto tomada de decisão e articulação com atores envolvidos, uma vez que preserva a aplicação das regras em situações de infrações ambientais, o caminho é o equilíbrio en-tre as faces do poder legalmente constituído, do poder discricionário e do poder de influenciação que se dá pelo diálogo e pelo uso do consenso até um determinado limite porque “as coisas têm que acontecer, de maneira consensual ou mandatória”, considera o Entrevistado [E33].

A governança da prática é compartilhada por vários profissio-nais. O trabalho em equipe é muito valorizado e a capacitação da equipe é primorosa. Todos têm cursos de formação e/ou especialização/mestra-do nas áreas de gestão e de gestão ambiental, com várias denominações.

Então, os problemas, as situações contingentes e decisões que impactam o futuro são muito discutidos; vários pontos de vistas são co-locados para se chegar a um consenso sobre a melhor decisão.

Nesse sentido, a dimensão temporal em suas perspectivas sin-crônica e diacrônica está presente: procuram resolver situações atuais, mas “sempre tendo em vista um panorama de 40, 50 [...] 70, 80 anos, pensando nas próximas gerações”, comenta o Entrevistado [E32].

Como é o caso da delimitação de áreas urbanas com restrições para áreas de fundos de reserva ou de preservação ambiental, direcio-nando o crescimento geográfico para áreas onde não há recursos natu-rais. O fundamento está no fato que Cascavel tem 1200 nascentes no perímetro urbano. Todas elas deságuam em algum rio corrente (Quati, Chico, etc) e todas vão para captação de abastecimento. Áreas com essa fonte aquífera não pode ficar em mãos particulares. Deve servir a todos, portanto, deve-se preservá-las agora e para evitar situações no futuro em que possam ser usadas para interesses privados. Este é um proce-dimento interno, uma regra interna que ainda não se converteu em lei. Esta situação configura a aplicação do princípio da precaução, explica o Entrevistado [E32].

As metas de gestão estipuladas para a governança de resíduos sólidos, nos últimos 4 (quatro) anos foram, segundo os Entrevistados [E28, E32 e E33]:

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• Atuar para que Cascavel tenha destinação correta para to-dos os tipos de resíduos;

• Ampliar o serviço de coleta seletiva porta a porta, especial-mente focando um trabalho de inclusão de condomínios residenciais;

• Regulamentar, implantar e fiscalizar a gestão dos resíduos da construção civil;

• Limpeza e conversação dos 14 rios urbanos de Cascavel.

Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) é avaliada como excelente, pelo Entrevistado [E33], porque aglutinou em um do-cumento as leis de vários estados e partir dela foi iniciado um trabalho para evitar que se jogassem resíduos em fundos de vale. Esta política também proporcionou que fosse elaborado o Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos em 2010, que foi atualizado/revisto em 2015.

A PNRS determina que o município seja responsável pelo des-tino do resíduo domiciliar e que detenha controle dos resíduos gerados no município. O município tem que ser parceiro da iniciativa privada na questão da destinação de resíduos sólidos.

E a PNRS possibilitou que se resolvessem vários problemas com resíduos. Por exemplo, a Logística Reversa de Pneu, que antes não existia. O entrevistado [E28] relata que em uma visita de trabalho com a Sema de Cascavel, o Coordenador de Resíduos da Sema/PR questio-nou porque o município tinha grande quantidade de pneus e porquê a Reciclanip não vinha coletar. Então, em reunião com a Promotoria e a Prefeitura de Cascavel resolveram fazer uma audiência pública para dis-cutir o problema. Convidaram todos os geradores, inclusive a Reciclanip, e a partir dali foi decidido que a empresa Pietta iria ficar responsável por gerenciar a logística reversa de pneus, o que acontece desde 2010.

Todos os geradores são informados que devem entregar nesta empresa. Há um termo de convênio assinado, no qual o município fica responsável pela fiscalização. A logística de transporte e os custos são de responsabilidade da Reciclanip. Com esse sistema 95% dos problemas relativos aos pneus foram solucionados. Os 5% restantes se referem a pessoas físicas que descartam em espaços urbanos e se recusam pagar 1 ou 2 reais para destinar corretamente, informou o Entrevistado [E28].

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A Sema é responsável por recolher esse material descartados em terrenos, fundos de vales e outros locais onde sejam encontrados, e encaminhar a Pietta. Multa quando se certifica do autor do delito. Anteriormente a esse sistema, o município de Cascavel tinha um passi-vo ambiental de 30.000 pneus que estavam no aterro e em outras áreas. Esse material também foi removido pela Pietta/Reciclanip [E28].

Com relação aos diversos tipos de resíduos recicláveis foram feitos estudos e levantamentos das empresas que atuam no setor e que estavam devidamente licenciadas. Então foi realizado um mapeamento do tipo de resíduo, da empresa que realiza o serviço com informações de localização e contato. O resultado foi explicitado na forma de um panfleto de divulgação (ANEXO A).

No Paraná somente Cascavel e Curitiba tem destinação correta para todos os tipos de resíduos. Mas ainda, a população precisa se en-gajar mais na prática da segregação do material reciclável para encami-nhá-lo à coleta seletiva, precisa desenvolver uma consciência ambiental para que comportamentos, como jogar resíduos em lotes baldios ou a quantidade de lixo jogado no chão em dia de domingo no lago, uma área que tem mais de 30 lixeiras, por exemplo, não aconteçam ou sejam mi-tigados. De acordo com o Entrevistado [E33], para mudar essa situação e desenvolver a consciência ambiental na população o instrumento é a educação ambiental, e isso só se consegue educando as crianças.

Em 2010 houve um aumento significativo do volume de ma-teriais recicláveis coletados em Cascavel devido a inclusão da Coleta Seletiva porta a porta no contrato de prestação de serviço da coleta de lixo do município.

A terceirização do serviço de separação de materiais reciclá-veis que vinha sendo executado no EcoLixo foi cancelado e todo ma-terial reciclável coletado pelo Programa Coleta Legal foi destinado a Cooperativas de Materiais Recicláveis. Atualmente cerca de 97% do perímetro urbano recebe a Coleta Seletiva porta a porta pelo menos uma vez na semana, exceto bairros criados recentemente e que não têm ocupação expressiva.

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Também houve uma ação de educação ambiental conjugada com esta iniciativa, cujos resultados apontaram que para a cada 10 casas sensibilizadas, 5 separavam os resíduos recicláveis. Hoje, está 2 para cada 10 casas que separam o resíduo reciclável, embora se conti-nue fazendo a sensibilização.

Esta situação reforça o entendimento de que há falta de cons-ciência ambiental da população. O fato é que se a população ajudasse, aumentando o volume de material reciclável destinado a Coleta Legal seria possível criar mais duas cooperativas de material reciclável em Cascavel, segundo estimativa do Entrevistado [E33]. Há um levan-tamento realizado em Cascavel indicando a existência de 65 famílias morando em fundos de vales e que armazenam material reciclável para venda posterior.

Hoje nós podemos dizer que temos uma coleta seletiva e temos pessoas que processam e vendem estes materiais, recebendo todo um apoio estrutural da SEMA como maquinário (prensa e manu-tenção), combustível, aluguel de estrutura física, pagamento de luz, água e telefone, enfim, tudo que a lei nos faculta fazer e que está explicitado no convênio de parceria estabelecido com as cooperati-vas de materiais recicláveis.

Atualmente o pessoal da Sema está trabalhando na organi-zação da Prática da Logística Reversa de Volumosos (não é a Prática de Coleta de Volumosos). De acordo com o Entrevistado [E28], o Promotor já pediu um levantamento de todos os geradores de resí-duos de grande volume como sofás, máquina de lavar e geladeiras. Foi levantada toda a cadeia, desde a indústria de móveis até revenda de linha branca (eletrodomésticos). Logo deve haver uma ação si-milar como houve do Pneu para estabelecer responsabilidade pela logística reversa desses resíduos, fazendo com que a responsabilidade para manutenção de estrutura física e armazenamento seja transferi-da para os fabricantes, importadores, comerciantes.

Essa iniciativa de fragmentar por tipo de produtos a destinação final adequada, e estabelecer os sistemas de logística reversa para deter-minados produtos foi a parte mais importante do trabalho realizado,

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com o apoio e a fiscalização do Ministério Público. Então o sistema de logística reversa de resíduos considerados importantes (como resíduos da construção civil e volumosos) em Cascavel está sendo delineado para que sua gestão fique sob responsabilidade da cadeia produtiva, formali-zado em acordo setorial local.

Outra decisão inovadora da governança em setembro de 2015 foi criar o Departamento de Licenciamento Ambiental, que ficou res-ponsável por 70% dos processos de licenciamentos iniciados no IAP referentes ao município de Cascavel [E31]. A legislação federal (Lei Complementar 140/2011) permitiu que os municípios ficassem respon-sáveis por alguns processos de licenciamento ambiental e o município de Cascavel aderiu no intuito de agilizar os processos locais.

Para formar a equipe houve a designação de 5 agentes admi-nistrativos, que tem formação na área ambiental, para a função de fiscal da Sema para atuar no departamento. A importância dessa iniciativa é que “a PNRS requisita que os empreendimentos façam um plano de gerenciamento de resíduos e este plano é parte componente do processo de Licenciamento”, esclarece o Entrevistado [E31].

A Prática da Taxa de Coleta de Lixo: determinação e co-brança é de responsabilidade dos municípios uma vez que tem a obri-gação de prestar esse serviço à população. Portanto, o município tem a permissão legal para a cobrança da taxa de lixo que corresponda aos serviços de coleta domiciliar e comercial assim como os custos da des-tinação final (aterro sanitário).

Segundo o Entrevistado [E27], no período de 2000/2001 ini-ciou-se um trabalho de avaliação de geração de lixo por contribuinte, especialmente de grandes geradores, como os supermercados. Desse es-tudo prático, foram feitas várias medições nos resíduos coletados, cul-minando com uma legislação alterando a taxa de cobrança de lixo que anteriormente era uniforme para todos, passando a ser proporcional ao lixo gerado. Grandes geradores foram identificados e passou a vigorar essa nova forma de cobrança. A lei estipulava faixas de geração de resí-duos e valores a serem aplicados e continua sendo assim, só atualizando valores, como consta na lei municipal 5.319/2009.

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É uma atribuição da Sema, sendo responsável pelos estudos, o reenquadramento de áreas geográficas, lançamentos de taxas no sistema informatizado e revisões e correções necessárias. Esse ano, em virtude da inflação e do aumento do custo dos serviços, a taxa teve um aumento de 18% a 20%; também 3 a 4 bairros tiveram a taxa majorada em virtude do reenquadramento do volume de lixo gerado.

O Entrevistado [E33] ressalta que na taxa de lixo do municí-pio de Cascavel não são cobrados todos os custos de todos os serviços relacionados com coleta de lixo porta a porta, limpeza e conservação de áreas públicas (como varrição, poda de árvores, retirada de árvores, manutenção de canteiros etc.) e outros serviços relacionado aos resíduos sólidos que compete à Sema realizar a gestão.

Os carnês são impressos pela Secretaria de Administração e enviados por correio e também disponibilizados no site da prefeitura para emissão. Há descontos para pagamentos antecipados e alterna-tivas para parcelamentos. De toda maneira, o custo da taxa de lixo é subsidiado. O que é cobrado do cidadão não paga o custo total do município com esse serviço.

Importante destacar que a cobrança de taxa de lixo em Cascavel é efetuada pela Secretaria de Finanças, e é cobrada em carnê individu-al dissociada do cômputo do valor do IPTU desde o ano 2000, apro-ximadamente. Devido a dificuldades na entrega, em 2016 houve uma mudança na prática de cobrança: os boletos para pagamento da Taxa de Lixo e IPTU continuam sendo impressos individualmente, contudo ambos compõem um mesmo carnê, compartilham a capa que envolve estes tributos com a finalidade de diminuir extravios, inadimplência por esquecimento de um dos carnês, entre outras ocorrências. O não pa-gamento da taxa de lixo em um ano possibilita a inserção da dívida na Dívida Ativa do Município.

A governança da Sema criou a Prática de recolhimento de lixo por mutirão. Eventualmente a Sema organiza ações de recolhimen-to de lixo em locais estratégicos com parceiros diversos (escolas, univer-sidades, ONG’s, empresas). Neste ano de 2016, esse mutirão ocorreu em março onde foram coletadas mais de 2000 toneladas de resíduos.

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Entretanto essas ações são eventuais porque quebra o ritmo de trabalho da secretaria.

A Prática Lixo no Lixo foi criada em função de lei 6.599/16. É uma nova prática de Fiscalização cujo Art. 1º da lei citada permite multar pessoa física e jurídica que for flagrado, ou que tiver comprovado contra si, jogando qualquer tipo de lixo fora dos compartimentos des-tinados a este fim, nos logradouros públicos ou privados. Vale destacar que há um estudo desenvolvido pela Secretaria de Planejamento deter-minando a distribuição e colocação de lixeiras em espaços públicos onde há transeuntes, ação esta já posta em prática pela Prefeitura de Cascavel. Conforme o Gerente de Fiscalização, o problema está no comporta-mento das pessoas que não usam as lixeiras.

A atuação dos fiscais até esse momento são ações de educação e informação, abordam a pessoa, entregam panfleto informativo, escla-recem e solicitam que a pessoa recolha o lixo no chão e o coloque em lixeira adequada. Atualmente, a varrição na área central da cidade é ida e volta, ou seja, é varrida duas vezes ao dia, ou seja, há muito lixo nas ruas e calçadas.

Em um próximo momento, a programação é atuar por meio de diligências e arrastões no centro da cidade e em pontos estratégi-cos. O registro da multa deve conter o CPF da pessoa física ou CNPJ da pessoa jurídica.

A Prática de Monitoramento de Nascentes nasceu em 2001. A Sema monitora rotineiramente 28 nascentes de água no perímetro urbano a cada 20 dias e realiza análise da qualidade da água. Estas nas-centes são disponibilizadas para que a população possa coletar e levar para casa assim como consumir esta água no local da nascente. Esta prática aparentemente não está relacionada resíduos sólidos, mas tem ligação direta com a presença de agentes poluidores nos corpos d’águas e com a limpeza do local, portanto, tem haver com a gestão de resíduos sólidos. Um dado correlacionado é o saneamento no município e a rede de coleta de esgoto.

Em 2008 eram 43% da rede de saneamento com ligações de esgoto, e em 2016 chegou a 93% da rede com serviço de tratamento de es-

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goto. Cascavel somente fica atrás de Maringá no Paraná. A cada R$ 1000,00 que se investe em saneamento, está se investindo R$ 34,00 em saúde (ENTREVISTADO [E33]).

Os canais formais de inserção da sociedade civil para a cola-boração na governança do meio ambiente em Cascavel são o Conselho de Meio Ambiente Municipal (Comam) e a Conferência Municipal de Meio Ambiente, instituídos pela Lei nº 3.238/2001.

O Comam é um parceiro da Sema e tem caráter deliberativo, consultivo e opinativo, além de ser um instrumento da PNRS (inciso XIII do Art. 8.). Seus membros foram escolhidos ao longo do tempo no intuito de fazer com que a representatividade de diversos órgãos seja importante no sentido do crescimento da busca da sustentabilidade.

As grandes discussões são em torno de problemas ambientais enfrentados, sugestões de soluções e desempenham o trabalho de fiscali-zadores das ações da Sema. É um órgão que tem sua independência para dizer e fazer, como recentemente membros do Comam foram ao Aterro Sanitário verificar as condições de operações e as mudanças implantadas.

A Sema tem a prática costumeira de apresentar o planejamen-to plurianual e o Orçamento para o ano seguinte incluindo os valores do Fundo Municipal de Meio Ambiente para o Comam. Neste ano de 2016 a reunião com o Conam, com esta finalidade, ocorreu em julho.

O objetivo da Conferência Municipal de Meio Ambiente é propor as diretrizes gerais da política municipal de meio ambiente. Ela é composta por delegados representantes das instituições ambientais, das organizações comunitárias, sindicais e profissionais do Município de Cascavel e dos Poderes Executivo e Legislativo Municipal.

A responsabilidade pela organização da Conferência é do Comam, apoiado pela Sema. Na opinião do Entrevistado [E33], “a lei é de 15 anos atrás e não evoluiu, não saiu do papel. Foi realizada somente uma Conferência de 2012, com adesão de participantes e realização de palestras. Foi uma boa experiência”. Ainda destaca que “a mobilização da sociedade civil organizada, instituições públicas e privadas, ONG’s, entre outras representatividades está engatinhando. À medida que te-

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mos uma crise econômica, a preocupação com as questões ambientais vai para o finalzinho da fila”.

Na avaliação do Entrevistado [E32] “a continuidade da Conferência do Meio Ambiente foi prejudicada pela indisponibilidade das empresas, sociedade civil e ONG’s em participar e colaborar efetiva-mente com as discussões pautadas”.

Foram identificados outros Feixes de Governança que se entre-laça ao Feixe de Governança de Resíduos Sólidos. São feixes governa-dos pela Associação Comercial e Industrial de Cascavel (ACIC) e pelo Núcleo CPCE/ODS.

O Feixe de Governança da Associação Comercial e Industrial de Cascavel (ACIC) tem a gestão ambiental como bandeira desde 2010, quando da implantação da ISO 14.001. E tomou cuidado ao construir a nova sede incorporando alguns conceitos importantes da bandeira ambiental. Iniciativas como redução do fluxo de água em tor-neiras, escolha por lâmpadas de led, espaços internos mais abertos, entre outras providências para que a manutenção seja mais sustentável, infor-ma o Entrevistado [E26].

Hoje desenvolve várias ações: separa o resíduo reciclável, reco-lhe e estimula associados a recolherem lâmpadas, pilhas e baterias dando destinação correta. Preocupa-se com a questão da água e energia. Várias ações são desenvolvidas no dia da Árvore.

A Política Nacional dos Resíduos Sólidos trouxe o princípio da responsabilidade compartilhada, sendo o sistema de logística reversa um dos seus mecanismos.

O papel da Acic é prezar pela competitividade de nossos associados e que o ambiente de negócios em que elas estão inseridas seja o mais próspero possível para que se desenvolvam e a questão am-biental impacta diretamente os negócios [...] A sustentabilidade está tomando mais corpo a cada dia que passa [...] há dois, três anos atrás nem se falava disso [...] a sustentabilidade aflorou muito[...] puxado muito pelo nosso Conselho.

Esse feixe teve um papel importante em uma ação desenvolvi-da há alguns anos. O Núcleo de Materiais Elétricos da Acic, que reúne

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7 empresas do setor, estava com problemas em dar adequada destinação em milhares de lâmpadas.

A Dínamo Eletricidade e Comércio Ltda participava do Núcleo Setorial da Acic em 2007 quando foi aprovada uma lei muni-cipal para obrigar comerciantes a receber pilhas, lâmpadas em outros resíduos recicláveis, gratuitamente, nos mesmos moldes de uma lei fe-deral sobre a matéria, comenta o Entrevistado [E37]. “Foi uma lei de iniciativa de um vereador, que não desenvolveu um trabalho de consulta ou discussão com as empresas do setor, a maioria vinculada ao núcleo de materiais elétricos da Acic”, explica o Entrevistado [E45].

O reaproveitamento e a reciclagem de materiais é a lógica natural das coisas; tem que ser assim. O que faltou foi obrigar em primeira mão os fabricantes e importadores a formatar um sistema de logís-tica reversa e não os comerciantes, como aconteceu em Cascavel. Políticas públicas mais eficientes talvez seria aceitas de maneira mais fácil [...] não tenho dúvidas que estamos no caminho certo, vamos deixar esse Brasil melhor (ENTREVISTADO [E37]).

Em 2015 o Núcleo Setorial de Material da Acic se reuniu para pensar como fazer a destinação correta de lâmpadas. Cogitou-se com-prar máquina para reciclar lâmpadas entre outras estratégias, as quais nenhuma foi levada a cabo. Enfim, buscou-se várias alternativas para resolver o problema, contudo os custos eram muito altos. Foram várias tratativas antes de selar um acordo com a Tolevidros, tendo a Acic inter-mediado esse contato e cedido inclusive o espaço para reuniões.

Alguns representantes da Associação Comercial e Industrial de Cascavel (ACIC) foram a Toledo e procurou a Tolevidros em março de 2015, para realizar a reciclagem de lâmpadas. Fizeram uma reunião na qual ficou acordado que seria necessário fazer um levantamento da quantidade de lâmpadas a serem recicladas antes de decidir como fazer esta operação.

O levantamento apontou para 90.000 lâmpadas (de produção nacional e internacional, fluorescentes, led e comuns) que estavam esto-cadas nas sete empresas participantes do Núcleo Setorial de Materiais Elétricos da ACIC, em Cascavel.

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Legalmente não se pode fazer a transferência intermunicipal desse tipo de resíduo da forma como estava (lâmpada inteira) pelo risco de acidente por conter um contaminante químico, o mercúrio, que em con-tato com o oxigênio toma a forma líquida, sendo facilmente disperso por meio do ar ou água e difícil de ser recuperado e altamente contaminante.

A solução encontrada foi levar as máquinas da Tolevidros (Usina Móvel e funcionários) para Cascavel, tendo em vista que esses equipamentos são transportáveis, e realizar a trituração e a desconta-minação em cada local. A lâmpada entra inteira na máquina que tem a capacidade de realizar a separação dos elementos. O resultado foi uma redução de 70% no volume dos materiais. Na sequência esse material, já descontaminado, foi transferido para a usina de reciclagem de vidros em Toledo.

Ainda hoje a Logística Reversa de Lâmpadas não aconteceu em Cascavel. O Acordo Setorial foi assinado em 27/11/2014 tendo sido elaborado um plano de implantação, com duração de 5 anos, para todo o território nacional. Nesse plano, consta para o Ano 3, ou seja, 2017, o início das operações em Cascavel, com 3 pontos de recebimento e 7 recipientes estimados para a cidade.

A Prática de Reciclagem de Vidros da Tolevidros inclui vários tipos de vidros, além de lâmpadas, informa o Entrevistado [E01] entre eles estão: (i) vidros de vidraçaria, classificados como planos e limpos, são guardados em tambores de 200 kg. A Tolevidros distribui os tonéis na fonte geradora de resíduos e quando atinge a capacidade máxima eles são substituídos por tonéis vazios; (ii) vidros de garrafas, também cha-mado de ocos, são encaminhados pelas prefeituras da região, incluindo a de Toledo, para a Tolevidros, onde são separados por cor e assim proces-sados na máquina para moer, triturar e fazer a classificação, por que cada cor tem o seu valor comercial; (iii) para-brisas, que são encaminhados pelas empresas da região; (iv) vidros de remédio.

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QUADRO 6 – CASO 2: ELTON BAUMGARTEN E A RECICLAGEM DE LÂMPADAS

Caso 2

Em 2003, Elton Baumgarten, aos 43 anos, sofreu um acidente no qual foi contaminado pelos vapores de mercúrio de uma lâmpada fluorescente em Chapecó, Santa Catarina, na sua empresa de injeção de plásticos (Bumerangue). O mercúrio foi direto para o sangue. Teve que fazer um tratamento sério, ficando mais de 60 dias na UTI para fazer a descontaminação, primeiramente com troca da água do corpo para então fazer a troca de sangue. Praticamente todo o organismo foi descontaminado.A partir dali, ainda internado, mas já consciente tomou a decisão de que se recuperasse fisica-mente e mentalmente ele abraçaria uma causa: “fazer o possível e o impossível para eliminar e tirar as lâmpadas fluorescentes do Brasil”, talvez por meio de campanhas ou montar uma indústria de reciclagem dessas lâmpadas.O acidente ocorreu em Dezembro de 2003, e em Fevereiro de 2006 desenvolveu a primeira máquina para descontaminação.Então, quando recuperou também a saúde financeira, montou uma mini usina em Santa Cataria, em 2006, e depois uma usina maior em Toledo, em 2013, no Paraná. Viajou por vários países (Alemanha, Itália, Portugal, Espanha e Estados Unidos e outros países, no total 26) procurando por equipamentos que fizessem essa função, porém não encontrou nenhum que fosse viável im-plantar no Brasil por causas dos altos custos.Então, ele começou a questionar-se: “Por que ele mesmo não desenvolvia uma máquina com essa finalidade já que era projetista industrial?”. Considerando este desafio começou a desenvolver vários equipamentos e máquinas que logo se tornaram procurados no mercado. Empresários de São Paulo que trabalham com a reciclagem de vidros em nível industrial vieram visitar a empresa, conhecer os equipamentos e garantiram que nem na Alemanha nem na China existiam equipamentos semelhantes em funcionalidade com esses resultados.No decorrer do tempo, mais precisamente em 2014, a Tolevidros foi desenvolvendo máqui-nas apropriadas para cada tipo de vidro, máquinas que realizam um processo específico de separação de materiais e trituração. Desta forma, há uma máquina específica para reciclagem de lâmpadas, que incluem as fluorescentes, de led e as comuns, reciclagem de vidros planos, ocos, e de remédio, triturador de entulhos, triturador de para-brisas, triturador de carcaças, todas elas patenteadas.A fabricação dessas máquinas inicialmente tinha o objetivo de suprir o processo produtivo da própria empresa, porém detectando a demanda do mercado nacional passou a produ-zi-las para revenda.A venda de seus equipamentos e máquinas alcançou, além do Estado do Paraná, nas cidades de Foz do Iguaçu, Curitiba e Ibaiti, também os estados de Mato Grosso do Sul (Campo Grande), Santa Catarina (Chapecó) e São Paulo ( Jaú).

Fonte: Elaborado pela Autora, baseada em entrevista pessoal concedida por Elton Baumgarten25 2016.

25 Autorizou a exposição do caso e de sua identidade.

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A reciclagem de lâmpadas gera subprodutos, explica o Entrevistado [E01], como: (i) mercúrio (1 a 2 gramas) em forma ga-sosa, que é absorvido por um filtro de carvão ativado, quando este filtro atinge a capacidade máxima (200.000 lâmpadas) a máquina contém um dispositivo que bloqueia nova operação e avisa a necessidade de troca do filtro. Esses filtros ficam em armazenagem temporária até que seja feita sua destinação apropriada para uma empresa do Rio de Janeiro, que realiza a coleta na própria Tolevidros. Essa empresa reutiliza esse material visto que é 100% reciclável: é como o vidro, não perde nenhu-ma de suas propriedades físico-químicas; (ii) fósforo; (iii) alumínio, que são formados lingotes; (iv) vidro, reciclado em forma de pó de vidro ou triturado em várias granulometrias e embalados em pacotes plásticos de 25 kg; (v) plástico; (vi) placa eletrônica destinada a uma empresa de São Paulo que envia para reciclagem na China, onde é extraído ouro branco, mercúrio e cádmio.

Os vidros planos depois de processados são acondicionados em embalagem de 25 kg. A Tolevidros tem como clientes: o DNR e empre-sas que atuam com pavers, manilhas e meio-fio; empresas de granalha de aço do Paraná e Santa Catarina, que estão substituindo por granalha de vidro para polimento e jateamento de peças; e para empresas do es-tado de São Paulo para produção de cola e tinta texturizada. Esse tipo de empresa também adquire os subprodutos dos para-brisas e vidros temperados, comenta o Entrevistado [E01].

A Tolevidros desenvolveu também uma máquina que separa os resíduos líquidos e sólidos dos frascos de remédios de modo a ser uma solução para a proibição, em Toledo, de destinar qualquer tipo de vidro para o aterro sanitário. A reciclagem dos vidros de remédio foi inserida a partir de uma ação da Tolevidros com a Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Toledo e com participação das farmácias do município, para coleta de frascos de remédios. Em um sábado, das 8h00 às 12h00 foram recolhidos 1.600 kg de vidros oriundos de frascos de remédios e outros vidros.

O Feixe de Governança do Núcleo CPCE/ODS. O Conselho Paranaense de Cidadania Empresarial e o Núcleo ‘Objetivos

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de Desenvolvimento Sustentável’, mais conhecido como Núcleo CPCE/ODS, têm como objetivo o desenvolvimento de ações e projetos sociais, culturais, ambientais e de voluntariado, disseminando a cons-ciência social e ambiental no meio empresarial e sociedade paranaen-se, tendo como desafio contribuir na disseminação de informações às questões sociais e também trabalhando em prol da plataforma mundial para o desenvolvimento denominada os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

O Conselho Paranaense de Cidadania Empresarial (CPCE), é um órgão consultivo vinculado ao Sistema FIEP, da Federação da Indústria do Estado do Paraná. É um Conselho Temático que tem como missão articular as competências de Responsabilidade Socioambiental Corporativa das empresas e dos diferentes setores da sociedade para estimular o desenvolvimento sustentável do Paraná.

Entre os objetivos estratégicos do CPCE estão: (i) promover a transferência e incorporação de conceitos relacionados à responsabi-lidade socioambiental corporativa; (ii) apoiar mecanismos inovadores de governança que criem valor de cidadania empresarial nas indústrias do Estado do Paraná, dando prioridade à educação, direitos humanos, meio ambiente, saúde e segurança; (iii) influenciar políticas públicas que promovam o desenvolvimento sustentável, entre outros.

Atualmente o Núcleo em Cascavel é composto por 47 insti-tuições dos 3 setores: público, privado e terceiro setor e que em comum tem o interesse em trabalhar com as questões da sustentabilidade pau-tadas na plataforma de desenvolvimento sustentável da ONU, considera o Entrevistado [E19].

No ano 2000, 193 países em reunião na cúpula da ONU criaram um documento que ficou conhecido como Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e que tinha o objetivo de nortear os tra-balhos principalmente com relação a redução da pobreza extrema. Essa plataforma trazia 8 objetivos para serem trabalhados pelos países sig-natários até 2015. Em 2015 houve a transição dessa plataforma para os ODS com 17 objetivos, com um alcance e um enfoque maior nas questões ambientais. Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável são

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divididos em 5 eixos, conhecidos como 5 P’s: Pessoas, Parcerias, Paz, Prosperidade e Planeta, comenta o Entrevistado [E19].

Desde 2007 o SESI abraçou a causa dos ODM/ODS e vem trabalhando nos municípios do Paraná, articulando e promovendo pro-jetos e ações em parceria corroborando para o desenvolvimento local. Em Cascavel o Núcleo está estabelecido há 5 anos e foi mais fortaleci-do há 3 anos quando ocorreu a junção das instituições integrantes do CPCE e ODM/ODS tendo em vista que ambas têm como base pro-mover a sustentabilidade, explica o Entrevistado [E19].

O trabalho do Núcleo CPCE/ODS em Cascavel, segundo o Entrevistado [E19] é organizado todo ano a partir do planejamento estratégico e as ações são pautadas nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, baseadas também em pesquisas e dados sobre as demandas locais, assim como nos indicadores no município, para elencar as priori-dades a serem trabalhadas buscando impactar positivamente a sociedade.

Em 2016, a definição de se trabalhar a questão da logística reversa foi respaldada pela aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) em 2010, que preconiza que os setores produtivos fa-çam os acordos setoriais para os quais as empresas e indústrias têm que se adequar e preparar o plano de logística reversa. A Logística Reversa é um dos assuntos pertinentes ao Objetivo 12 do ODS - Assegurar pa-drões de consumo e produção sustentáveis (FIEP, 2016).

Tudo pode ser aproveitado, reutilizado. Todos os materiais fa-zem parte do ciclo da logística reversa, mas precisamos colocar isso para a sociedade: que a coleta seletiva funciona e é preciso separar lixo eletrônico porque a gente vive uma realidade de problemas com lixões. O Brasil recicla somente 3% dos resíduos sólidos, considera o Entrevistado [E19].

Como é um tema que está em voga, explica o Entrevistado [E19], mas falta informação e grande parte das pessoas desconhece essa lei, surgiu a ideia de trabalhar primeiramente como um Fórum (trazer palestrantes renomados) e, concomitante a essa ação, realizar coleta de resíduo eletroeletrônico.

O Núcleo CPCE/ODS criou um cartaz informativo com lo-cais de descarte para medicamentos, chapas de raios-x, plástico, papel,

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resíduos volumosos, etc. Esse material foi distribuído em vários pontos de Cascavel.

Então, duas ações foram realizadas com o objetivo de disseminar conhecimentos e promover debates sobre a destinação correta dos resí-duos sólidos por meio do Sistema de Logística Reversa, que tem como responsáveis os fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes e o cidadão:

(I) Fórum “Os Avanços e os desafios da Logística Reversa”, realizado nas dependências da ACIC em 21 de julho de 2016; entrada gratuita.

(II) Recolhimento de material eletroeletrônico, entre os dias 20 e 24 de julho. Foram escolhidos e estabelecidos 3 pontos de coleta desses materiais: Univel, Lions Clube de Cascavel e Centro da Juventude, que ficaram a semana inteira aberta para receber esses materiais. Foram destacadas 10 pessoas para organizar e receber esses materiais (4 leões e 6 alunos do Colégio Estadual Padre Carmelo).

O resultado desta ação foi 3,5 toneladas de material eletroele-trônico recolhidos, contabilizando 508 aparelhos provenientes de 35 pes-soas. O grupo procurou empresas/locais que pudessem receber esse ma-terial e que dessem destino adequado a eles. A empresa Nova = Cascavel Reciclagem se disponibilizou a realizar a coleta dos resíduos nos pontos de descarte sem custos para os promotores do evento (ENTREVISTADO [E14]).

Na empresa Nova Cascavel Reciclagem, os produtos eletro-eletrônicos são separados por tipo de material (plásticos, alumínio, me-tais, ou computadores, impressoras, entre outros) e colocados em bags. Quando houver quantidade suficiente para fechar uma carga de cami-nhão, eles são transportados para a matriz da empresa em Curitiba/PR, que é a responsável pela destinação final adequada. Eles emitem certifi-cados sobre a destinação adequada dos resíduos entregues. Os materiais eletroeletrônicos foram coletados pela empresa (ENTREVISTADO [E15]).

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O Lions Club Cascavel foi um parceiro nesse projeto. E em outubro de 2016, a entidade decidiu promover uma campanha perma-nente de logística reversa para: óleo de cozinha, lixo eletrônico, garrafas pets e tampas plásticas. Toda 1.ª quarta feira de cada mês, das 9h00 às 17h00 na sede da entidade terá uma equipe para receber esses materiais recicláveis (ENTREVISTADO [E14]).

O Colégio Estadual Padre Carmelo Perroni também participou da ação cuidando de um dos pontos de coleta. Este colégio mantém um centro de recebimento de material eletroeletrônico durante o ano inteiro, e realiza um trabalho de recuperação e reaproveitamento desses materiais.

A Prática de Recebimento, Recuperação e Reaproveitamento de Materiais Eletroeletrônico do Colégio Pe. Carmelo surgiu quan-do os Cursos de Informática (ensino médio e pós-médio) foram im-plantados no colégio em 2010 e os laboratórios de informática não ti-nham recebidos os recursos e materiais para instalação no prazo previsto (ENTREVISTADO [E17]).

O colégio divulgou que estavam recebendo descarte de lixo eletrônico como computador e qualquer objeto eletrônico. Os equi-pamentos recebidos foram testados, novas configurações foram feitas e formaram o primeiro laboratório de informática para desenvolver as práticas das disciplinas. Essa prática de divulgação sempre é acionada em eventos escolares, no início de períodos letivos ou de cursos.

Desde então o colégio tem sido reconhecido por receber ma-teriais e equipamentos eletroeletrônicos de forma contínua. Recebem também pilha, lâmpada, qualquer equipamento ou aparelho que coloque na tomada (micro-ondas, televisão, vídeo cassete, DVD, ar condicio-nado). Todos os materiais são separados, reaproveitados, reciclados ou encaminhados para destinação adequada. Muitos equipamentos recu-perados são enviados a outras escolas comenta o Entrevistado [E17].

Quem coordena o projeto é um dos professores de Informática. As práticas de reaproveitamento e reciclagem de equi-pamentos de informática ocorrem em disciplinas, nos laboratórios de informática e em projetos de contraturno, como projeto de mídias, que são espaços nos quais os alunos acompanham a coleta e recepção

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de materiais, participam de campanhas de coleta (como foi o evento do CPCE/ODS e Lions Club de Cascavel), ajudam a separar, testar, reaproveitar e reciclar materiais.

De forma integrada com o conteúdo curricular, o professor conduz o aprendizado dos alunos sobre tipos de equipamentos como: características de materiais e equipamentos, testagem de equipamentos e peças, montagem e desmontagem, manutenção, substituição de pe-ças, instalação e formatação, enfim, conhecimentos que possibilitam aos alunos o aprendizado na prática em testar equipamentos, montar confi-gurações de computadores e avaliar a eficiência do equipamento. Essas aulas ocorrem em Laboratórios de Informática, como o da Figura 23.

FIGURA 23 – LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA DO COL. PE. CARMELO

Fonte: Dados primários, 2016.

Esses equipamentos e peças testadas formam um estoque (di-vidindo espaço com um dos laboratórios de informática da escola) para serem usados na substituição de peças defeituosas ou até mesmo de

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equipamentos da área administrativa da escola que estejam com pro-blema. Um dos pontos positivos para a aprendizagem é a diversidade dos materiais que recebem. Como eles têm especificações, tecnologias e aplicações diferentes os alunos estão sempre atualizados sobre evolução tecnológica e dos produtos disponíveis no mercado.

Resíduos sólidos como pilhas, lâmpadas e baterias recebidas são acondicionados em bags separados e armazenados temporariamente e de-pois encaminhados para a LF Falque e Cia Ltda. e para Nova Cascavel Reciclagem (empresas de reciclagem) que dão destinação a esses mate-riais. O Colégio faz a ligação solicitando o recolhimento e as empresas o fazem sem custos para o Colégio, explica o Entrevistado [E17].

O Colégio Pe. Carmelo participa de um programa com a Furukawa Eletric Group, denominado de Green IT, comenta o Entrevistado [E17]. O programa Green IT procura racionalizar a utiliza-ção de recursos não renováveis tratando e reciclando resíduos provenien-tes de descarte de produtos de cabeamento estruturado, transformando--os em matéria prima para outras indústrias (FURUKAWA, 2016).

O programa repassa ao colégio algumas bolsas coletoras de ma-teriais. Como o colégio recebe muito material como cabos e fiação, eles (professores e alunos) cortam os terminais dos fios de cobre e os fios em tamanhos específicos. A cada duas bolsas de material cortado a empresa repassa ao Colégio uma caixa de cabo de rede, que foram utilizados para fazer o cabeamento de internet no colégio inteiro.

O colégio mantém um museu de informática, um dos poucos do interior do estado. O acervo foi formado de material doado porque alguns eram muito antigos. Então resolveram formar um museu.

Pode-se dizer que a comunidade escolar já criou uma cultu-ra da reciclagem e uma consciência de que esse material deve ser des-cartado adequadamente. Por isso trazem materiais de suas casas ou de conhecidos para serem reciclados. Funcionários e professores também levam esse tipo de material para o colégio para serem reaproveitados ou descartados. Várias empresas conhecendo essa prática desenvolvida pelo Colégio Pe. Carmelo encaminham equipamentos de informática ao co-légio sempre que há descarte em função de novas aquisições, como é o caso da Eucatur, Universidades e escolas da rede estadual.

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QUADRO 7 – CASO 3: FEIRA DO ESCAMBO E PROJETO GELOTECA

O Colégio Pe. Carmelo instituiu, há alguns anos, a Feira do Escambo que tem por objetivo a troca. O público alvo são a comunidade estu-dantil e a comunidade do bairro.Os alunos trazem coisas que não usam mais em casa, que estejam em bom estado, para trocar. Os objetos são distribuídos em me-sas por categorias como calçados, roupas, objetos inusitados, móveis, utensílios, ele-trônicos, livros, entre outros. Já apareceu até fogão e violão para a troca.Para a Coordenadora, “os alunos do notur-no são os mais engajados e fazem questão de trazer objetos. Já os alunos do diurno têm mais receio de participar, são mais re-traídos, acham que se expõem mais [...] têm mais vergonha”.O Projeto Geloteca surgiu da ideia de reapro-veitar duas geladeiras que foram doadas para o Colégio, porém elas não tinham condições de recuperação para reaproveitamento.A iniciativa foi de alunos e professores para pintar, divulgar e solicitar doação de livros para serem colocados na Geloteca.As Gelotecas ficam em um pátio interno coberto, espaço de circulação e de recreio. As regras são simples: a pessoa escolher o livro que quiser, levar para casa, ler e devol-ver. Não há controle de entrega ou devo-lução. Da mesma forma, quem quiser doar um livro é só colocar na Geloteca.

Fonte: Elaborado pela Autora baseado em depoimento de um Professor do período noturno.

Nesta seção apresentamos quatro feixes especializados em governança: a do Ministério Público (MP), a da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Sema), a da Associação Comercial e Industrial

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de Cascavel (ACIC) e a do Núcleo CPCE-ODS. Abordamos algu-mas práticas desenvolvidas por esses feixes relativos aos resíduos sóli-dos. Respeitando as diferenças inerentes a suas atividades e responsa-bilidades, notamos que essas governanças atuam como catalizadora de mudanças no plenário de práticas em direção a transformação de uma sociedade mais sustentável.

A forma de atuação dessas governanças é diferente, guardando semelhança quanto a decisão consensual sempre que possível. A forma de atuação do Ministério Público é o enfrentamento jurídico que tem as suas próprias fórmulas de resolução e sempre que possível promove a discussão formada no consenso político social, pois esta gera resultados positivo.

A forma de autuação da Sema se caracteriza por ser mais man-datória, ou seja, procura recomendar como fazer corretamente, e obri-gatória, porque tem leis a zelar e a fiscalizar, mas estão presentes na tomada de decisões a participação da equipe de trabalho e a busca pelo consenso. Vale ressaltar que decisões do Ministério Público influenciam as decisões da Sema, como foi o caso da ampliação da Coleta Seletiva porta a porta.

Já a Acic e o Núcleo CPCE-ODS caracterizam-se pela par-ticipação e colaboração dos seus associados (praticantes). Vale destacar que há governanças de outras práticas que têm ascendência sobre prá-ticas do mesmo feixe assim como mostram influência em feixes com os quais estão entrelaçadas.

A densidade de cada feixe de governança se diferencia em fun-ção da diversidade de atividades, entidades envolvidas, relações entre atores e entrelaçamentos que mantêm com outras práticas, muitas das quais não foram relatadas. Da mesma forma que todas apresentam con-dições de continuidade. Há trocas planejadas de liderança da governan-ça nos feixes da Sema e ACIC, conforme regras.

A complexidade qualitativa desses feixes é distinta em função do contexto da prática (aspectos legais, administrativos, econômicos e culturais), da natureza da relação entre atores (obrigatória ou volun-tária), da forma de identificação e resolução de problemas e do tempo disponível para realizar os objetivos e dos recursos disponíveis.

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Todos os feixes de governança acima, exceto o Ministério Público, restringem o alcance de suas ações na constelação local de Cascavel, embora mantenham relações com atores de outras constela-ções. A restrição da Sema à constelação local é legalmente estipulada. O Ministério Público estende suas ações até Santa Tereza e Lindoeste.

Considerando os Feixes de Governança da Acic na prática relacionada as lâmpadas e do Núcleo CPCE-ODS, relativa à coleta e destinação de materiais eletroeletrônico, podemos notar em ambas as práticas que elas se conectaram com outras práticas-arranjo por meio da organização orquestrada, quando fins são alcançados por elementos diversos de práticas diferentes.

Na Governança do feixe de prática do Ministério Público so-bressai a cadeia de ação como elemento conector entre práticas. Para o feixe de governança da Sema há o destaque para a organização orques-trada, o compartilhamento do espaço de atividade, os dizeres e fazeres da atividade compartilhada e a cadeia de ação.

A relação percebida nas práticas-arranjo dos feixes de gover-nança, de forma geral foi a integibilidade, referente ao significado e compreensão da prática e da materialidade ligada a ela.

Na Figura 24 pode ser observado o entrelaçamento e relações de atores no Feixe de Governança de Resíduos Sólidos.

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A conexão entre feixes de governança na constelação local se estabelece pela indução de atividades que o encontro de acontecimentos e entidades propicia (causalidade) e pela integibilidade, ou seja, a com-preensão e os significados que os atores têm em relação à problemática dos resíduos sólidos.

As cadeias de ação da governança de resíduos sólidos da Sema da Acic e do Núcleo CPCE-ODS apresentam características seme-lhantes como a bifurcação e a coordenação de discursos. A Sema tam-bém está sujeita ao monitoramento do Sistema Nacional de Informação sobre a Gestão de Resíduos Sólidos (Sinir) porque anualmente insere informações no Sistema Informatizado do Sinir.

A dinâmica dos feixes na constelação local se caracteriza por diferentes formatos. No feixe do Ministério Público desponta o entrelaçamento entre feixes, nos feixes de governança da Acic e do Núcleo CPCE-OBS apresentam a associação como dinâmica carac-terística, similaridade em função do próprio modelo de gestão, da natureza de suas finalidades.

Já o feixe de governança da Sema apresenta uma dinâmica maior porque traz em seu histórico a dissolução de práticas (extinção do aterro de inertes e do ecolixo como local de separação de resíduos recicláveis), o entrelaçamento entre práticas diversas (limpeza urbana, coleta porta a porta, coleta legal, coleta de entulhos e volumosos etc.), a difusão de prá-ticas (sensibilização ambiental, distribuição de bags para a população, panfleto de destinação correta de resíduos sólidos), pela fusão (integrou práticas na Gestão Integrada de Resíduos da Construção Civil), bifur-cação (Sensibilização Ambiental e Sensibilização em Condomínios). Esses são alguns dos fenômenos encontrados nesse feixe.

Na próxima seção serão apresentados os feixes de governança de logística reversa de vários resíduos sólidos.

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CAPÍTULO 5 FEIXE DE PRÁTICAS DE

LOGÍSTICA REVERSA

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Alguns resíduos sólidos têm feixes de práticas especialmente dedicados a dar destino ambientalmente adequado, seja por meio do reaproveitamento, da reciclagem ou do tratamento adequado para a dis-posição final. Esses feixes estão organizados em sistemas de logística reversa, assunto desse Capítulo. Antes, porém, algumas informações são elucidativas sobre as regras para formação de sistema de logística reversa no Brasil.

A logística reversa é considerada pelo inciso XII do Art. 3º da Lei 12.305/10 como um instrumento de desenvolvimento econômico e social constituído por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou ou-tra destinação final ambientalmente adequada (BRASIL, 2010a).

A Política Nacional de Resíduos Sólidos explicitamente obriga a estruturação e implementação de sistemas de logística reversa pelos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: (i) agrotóxi-cos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja emba-lagem, após o uso, constitua resíduo perigoso; (ii) pilhas e baterias; (iii) pneus; (iv) óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; (v) lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; (vi) produtos eletroeletrônicos e seus componentes (BRASIL, 2010a).

Entretanto, o § 1° do mesmo artigo estende os sistemas de logística reversa, devidamente estabelecidos em regulamentos, acordos setoriais e termos de compromisso com o setor empresarial, para os pro-dutos com potencial de impacto negativo (em grau e em extensão) ao meio ambiente e à saúde pública assim como àqueles comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro. Essa possibilidade de ampliação de sistemas de logística reversa também consta no Art. 17 do Decreto 7404/10 (BRASIL, 2010a, 2010b). Esta regra revela a po-tencialidade desses sistemas serem, efetivamente, além de uma medida protetiva ao meio ambiente, instrumentos de desenvolvimento econô-mico e social.

A logística reversa pode ser implantada por três tipos de instrumentos: (i) acordos setoriais, (ii) regulamentos expedidos pelo

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Poder Público, como decretos e leis e (iii) por termos de compromisso (BRASIL, 2010b).

Tanto o Poder Público quanto os fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes dos produtos e embalagens sujeitos à logística reversa podem iniciar os procedimentos para implantação do sistema de logística reversa por meio de acordo setorial.

Quando iniciado pelo Poder Público, este deve emitir edital de chamamento, previamente aprovado pelo Comitê Orientador; quando iniciado pelos segmentos produtivos, estes devem apresentar uma pro-posta formal ao Ministério do Meio Ambiente (MMA, 2016). O Decreto 7404/10 especifica o conteúdo mínimo que devem conter tanto a proposta iniciada pelo Poder Público, quanto pelo segmento produtivo (BRASIL, 2010b).

Além de representantes do Poder Público e de representantes do segmento produtivo, outros atores podem participar da elaboração dos acordos setoriais como entidades representativas de cooperativas ou outras formas de associações de catadores de materiais recicláveis ou reutilizáveis, entidades e indústrias dedicadas ao tratamento, à reutiliza-ção e à reciclagem de resíduos sólidos bom como entidades representan-tes dos consumidores, entre outros

A logística reversa pode ser implantada por regulamento por meio de Decretos editados pelo Poder Executivo. Nesse caso, o Comitê Orientador deverá analisar previamente a viabilidade técnica e econô-mica da logística reversa, assim como submeter o sistema proposto a consulta pública antes da edição do decreto, de acordo com os Artigos 30 e 31 do Decreto 7404/10 (BRASIL, 2010b).

Os Termos de Compromisso são celebrados entre órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e fabricantes, importa-dores, distribuidores ou comerciantes para o estabelecimento da logísti-ca reversa quando não houver acordo setorial ou regulamento específico para a mesma área de abrangência ou quando se pretender a fixação de compromissos e metas mais exigentes que o previsto em acordo setorial ou regulamento (BRASIL, 2010b).

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A relação que se estabelece entre os agentes públicos e os seg-mentos produtivos, visando a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto, por meio de sistemas de logística reversa, são sempre contratual representado pelo Acordo Setorial e Termo de Compromisso, que podem ter abrangência nacional, regional, estadual ou municipal. O que tem prevalecido em âmbito nacional são os acordos setoriais e em âmbito estadual os Termos de Compromisso. Já os regulamentos têm caráter obrigatório (BRASIL, 2010b).

Um ponto relevante é a hierarquia de prioridade dos contratos estabelecidos pelos agentes públicos com os representantes dos segmen-tos produtivos da seguinte forma: os acordos setoriais firmados em âm-bito nacional têm prevalência sobre os firmados em âmbito regional e estes sobre os municipais. Os acordos firmados com menor abrangência geografia podem ser mais rigorosos nas medidas de proteção ambiental do que os de âmbito geográfico maior (BRASIL, 2010b).

O Decreto 7404/10 estabelece também que a responsabilidade pela realização da logística dos segmentos produtivos será limitada na proporção dos produtos que colocarem no mercado interno, conforme metas progressivas, intermediárias e finais, estabelecidas no instrumento que determinar a implementação da logística reversa.

De acordo com a PNRS, Lei 12.305/2010 (BRASIL, 2010), de forma geral, o sistema de logística reversa começa com os consu-midores devolvendo produtos e embalagens após uso aos comerciantes ou distribuidores e estes devem efetuar a devolução aos fabricantes e importadores, que devem dar destinação ambientalmente adequada aos produtos e embalagens assim como aos rejeitos.

Todos esses atores, exceto consumidores, deverão manter in-formações atualizadas disponíveis ao órgão municipal competente e a outras autoridades sobre a realização das ações sob sua responsabilidade.

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5.1 FEIXE DE PRÁTICA DE LOGÍSTICA REVERSA DE PILHAS E BATERIAS

Em 1999, o Conama lançou a Resolução 257 no intuito de disciplinar o descarte e o gerenciamento ambientalmente adequado de pilhas e baterias usadas, no que tange à coleta, reutilização, reciclagem, tratamento ou disposição final. Estabelecia que os usuários deveriam devolver esses produtos usados aos estabelecimentos que os comercia-lizavam ou à rede de assistência técnica autorizada pelas respectivas in-dústrias, para que estes repassassem aos fabricantes ou importadores. Estes por sua vez, deveriam adotar, diretamente ou por meio de tercei-ros, procedimentos de reutilização, reciclagem, tratamento ou disposi-ção final ambientalmente adequada (CONAMA, 2016).

A Resolução Conama 401/2008 foi emitida visando a necessi-dade de atualizar o disposto na Resolução Conama 257/99 em razão de maior conscientização pública e evolução das técnicas e processos mais limpos objetivando a mitigação dos impactos negativos no meio antró-pico e ecológico pelo descarte inadequado de pilhas e baterias de uso doméstico em especial daquelas que contêm chumbo, cádmio, mercúrio e seus compostos (CONAMA, 2008).

A resolução 401 estabelece em seu Artigo 3º a obrigatorie-dade de fabricantes de pilhas e baterias assim como importadores de produtos que incorporem pilhas e baterias de apresentar ao órgão am-biental competente o plano de gerenciamento de pilhas e baterias que contemple a destinação ambientalmente adequada bem como informar aos consumidores sobre como proceder quanto à remoção dessas pilhas e baterias após a sua utilização, possibilitando sua destinação separada-mente dos aparelhos. Ainda estipula que os estabelecimentos de venda de pilhas e baterias devem, obrigatoriamente, conter pontos de recolhi-mento adequados (CONAMA, 2008).

A Política Nacional de Resíduo Sólido, Lei 12.305/2010, veio consolidar o cuidado com o meio ambiente em relação aos resíduos sóli-dos, instituindo a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos entre fabricantes, importadores, distribuidores, revendedores e

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consumidores ao mesmo tempo deixando em aberto a forma de organi-zação de cada setor para instituírem um sistema de logística reversa para seus produtos, desde que atendendo aos requisitos legais. No Art. 33 da Lei 12.305/2010, há a instituição da obrigatoriedade do sistema de logís-tica reversa para vários produtos, entre elas pilhas e baterias (BRASIL, 2010).

Em 2012, a Instrução Normativa n. 8 do Ibama institui, para fabricantes nacionais e importadores, os procedimentos relativos ao controle do recebimento e da destinação final de pilhas e baterias ou de produtos que as incorporem (IBAMA, 2016).

Com o objetivo de atender a Resolução 401 do Conama e a Política Nacional de Resíduo Sólido, Lei 12.305/2010 entre outras regras, a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) desen-volveu o Programa inicialmente denominado Recebe Pilhas, que poste-riormente passou a ser denominado de Programa de Logística Reversa de Pilhas e Baterias de Uso Doméstico da Abinee (ABINEE, 2016a).

A Abinee congrega fabricantes e importadores de pilhas e bate-rias portáteis cujas marcas são: Alfacell, Attic, Bic, Carrefour, Comexport, Cyber, Duracell, Elgin, Energizer, Eveready, Johnson, Kodak, MaxPrint, Panasonic, Philips, Rayovac, Sony, entre outras (GMCLOG, 2016).

Esse programa começou a operar em 05 de novembro de 2010 com a finalidade de implantar um sistema de logística reversa e desti-nação final de pilhas e baterias portáteis (de suas marcas) e de informar aos consumidores os procedimentos que devem tomar para descartar adequadamente esses produtos, isto é, para entregarem aos estabeleci-mentos onde compraram, em assistências técnicas ou mesmo nos postos de recebimento (ABINEE, 2016a).

A GM&CLOG Logística e Transporte é a empresa certificada oficial do programa de logística reversa de Abinee para o transporte de pilhas e baterias de uso doméstico do sistema de logística reversa. Do total nacional de 1240 postos de recolhimento, 41 postos de recebi-mento de pilhas são paranaenses, sendo o Atacadão Cascavel o único posto indicado na cidade de Cascavel (GMCLOG, 2016). É preciso destacar que a GM&CLOG também recolhe pilhas de outras marcas,

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porém estas têm destino diferenciado: caso sejam marcas nacionais, a Abinee notifica a marca responsável para assumir o passivo ambien-tal, porém, caso sejam ilegais as autoridades (Ibama, Polícia e Receita Federal, Ministério do Meio Ambiente) são comunicadas para adotar medidas cabíveis.

As pilhas e baterias de uso doméstico coletadas nos postos de recolhimento têm sido encaminhadas à empresa Suzaquim Indústria Química, localizada na região metropolitana da Grande São Paulo. Todos os custos de transporte e da destinação final são de responsabi-lidades dos fabricantes e importadores participantes desse programa de logística reversa da Abinee (ABINEE, 2016b).

Em Cascavel o Grande Atacarejo Multinacional de Cascavel26 é um dos locais que recebe pilhas e baterias de uso domiciliar devolvidas por clientes e não clientes e essa prática é muito comum. Há um dis-play na entrada da loja para colocar a pilha e baterias usadas. O critério para dar sequência ao sistema de logística reversa é formar lote de 30 kg de pilhas usadas para acionar a empresa homologada pela área de Sustentabilidade do Atacarejo, que é uma empresa de São Paulo.

O gerente administrativo da empresa [E44] destaca que “hoje se fala muito em sustentabilidade na empresa no sentido de dar destinação correta aos resíduos. A empresa tem uma área central de Sustentabilidade na matriz que apoia as atividades nas filiais”. É fato que a “destinação correta traz economia e redução de custos e os funcio-nários procuram separar adequadamente os resíduos” de modo a validar essa iniciativa. Os recursos financeiros obtidos com a venda de resíduos são incorporados à receita da empresa.

São vários resíduos que têm um encaminhamento adequado para reaproveitamento, reciclagem ou destinação final. As lâmpadas usadas são acondicionadas temporariamente formando lotes de 300 lâmpadas, que é o mínimo para acionar a empresa homologada pela área de Sustentabilidade do Atacarejo para retirá-las e encaminhá-las para destinação adequada. O estabelecimento tem recebido poucas lâmpadas usadas de clientes para dar destinação correta.

26 Codinome.

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Os resíduos plásticos e de papelão são acondicionados tempo-rariamente e vendidos para Aparas Cascavel.

O óleo de cozinha, proveniente do refeitório da empresa, é des-tinado à empresa Ita Resíduos Coleta de Óleo de Cozinha, uma empre-sa de Campo Mourão/PR, que emite certificação de destinação correta. O resíduo orgânico proveniente de carnes é acondicionado tempora-riamente em dois containers. Quando está cheio, é ligado para a Paraná Ambiental, empresa de Cascavel, coletar o material.

Com relação ao resíduo orgânico de hortifrutigranjeiro, há uma parceira firmada entre o Sesc Mesa Brasil e a empresa, válida em todo território nacional, para que todo produto que não tenha aparência para a venda, mas que esteja próprio para o consumo seja colocado à dis-posição do Sesc Mesa Brasil para coleta desses produtos. O que o Mesa Brasil não leva é descartado como resíduo orgânico.

O Atacarejo de Cascavel é um endereço oficial para entrega de pilhas, baterias e lâmpadas usadas que a Secretaria Municipal de Cascavel relaciona no panfleto de divulgação dos destinos corretos para cada resíduo no município (ANEXO A).

Entretanto, desde 2007, Cascavel conta com uma regra que de-veria orientar os envolvidos com a compra, venda e consumo de pilhas e baterias de uso doméstico. A Lei 4.726/2007 ainda está em vigor e dis-põem sobre a coleta e o destino de pilhas e baterias de uso domiciliar, ba-terias de telefones celulares ou produtos eletroeletrônicos no Município de Cascavel, que inclui também no Art. 1º, lâmpadas fluorescentes e de qualquer espécie, obrigando os estabelecimentos que comercializam esses produtos a manterem recipientes para a coleta em locais visíveis nos pontos de venda para que os consumidores possam depositar esses produtos usados. Responsabiliza fabricantes, distribuidores, revendedo-res e assistência técnica a dar destinação final em conformidade com a Resolução 257/1999 do Conama (CASCAVEL, 2007).

Essa lei não restringe a disposição dos produtos usados nos es-tabelecimentos que os comercializam contra apresentação de nota fiscal nem restringe a entrega desses produtos às marcas vendidas pelo esta-belecimento. Prevê sim, sanções para os infratores da lei com notifica-ção oficial para adequação do estabelecimento e multa de 100 Unidades

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Fiscal do Município (UFM) na segunda infração e duplicação da multa em caso de reincidência (CASCAVEL, 2007).

Em relação às pilhas e baterias de uso domiciliar os Entrevistados [E06 e E07] que atuam no ramo de supermercados apresentam proce-dimentos diferentes para a coleta desses produtos usados. Quanto as pilhas, o Entrevistado [E6] recebe as pilhas das marcas que vende por-que o vendedor/representante das pilhas não aceita devolução de pilhas de outras marcas. Em ambos os estabelecimentos as pessoas, clientes ou não, não os procuram para entregar baterias e nem mantém vasilhame no estabelecimento para devolução de pilhas, baterias e lâmpadas. A ausência de recipientes para disposição desses resíduos é recorrente em estabelecimentos do ramo, um fato constatado por observação in loco.

Entretanto, displays colocados em estabelecimentos que não comercializam pilhas e baterias, chamaram a atenção como é o caso das agências do Sicoob e do Sicredi. A campanha Papa-Pilhas é uma iniciativa do Instituto Sicoob Paraná vinculada ao projeto Consumo Consciente do instituto desde 2013 e visa à coleta e destinação correta de pilhas e baterias, abrangendo o público interno e externo. Em Cascavel são 7 (sete) unidades de atendimento (SICOOB, 2016a). A Instituição, além de manter postos de coleta em suas unidades de aten-dimento, têm celebrado parcerias com cooperados, escolas e universida-des para que atuem também como pontos de coleta, fazendo com que esta campanha se expanda e tenha alcance nacional. As pilhas e baterias coletadas são recolhidas pela Associação Fukuoka Instituto, especiali-zada na área de tratamento e destinação correta desse tipo de resíduos (INSTITUTO SICOOB, 2016). Em 2015 foram 2.078 kg de pilhas e baterias recolhidos (SICOOB, 2016b).

O Sicredi Vanguarda, que envolve o estado do Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro, iniciou a coleta de pilhas e baterias usadas em 2014, com a disponibilização de displays de coleta Papa-Pilhas em suas agências (SICREDI, 2016a). Em Cascavel são 6 (seis) Unidades de Atendimento (UA). O Entrevistado [E42] afirmou que deposita pilhas usadas prove-niente de clientes e do próprio uso na agência Sicredi Carlos Gomes, que fica próximo ao seu estabelecimento (SICREDI, 2016b).

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Para as empresas de telefonia celular, o Termo de Compromisso entre a Secretaria de Meio Ambiente do Paraná (Sema), Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e a Abinee foi assinado em dezembro de 2012 para responsabilidade Pós-Consumo de Terminais Portáteis de Telefonia Móvel e Acessórios. As empresas decidiram implantar in-dividualmente o processo de logística reversa desses produtos pós-uso (ABINEE, 2016c).

A Vivo mantém o projeto Reciclar Transforma, no qual clien-tes e comunidade podem descartar aparelhos celulares, baterias e aces-sórios em desuso nas lojas da rede (VIVO, 2016). A Tim apresenta em seu Relatório de Sustentabilidade de 2014, no Capítulo Cuidar do Meio Ambiente, a seção Recuperação de Material na qual são descritas as ações de recolhimento de celulares, baterias e acessórios vinculando par-cerias com o Programa Papa Pilhas do Santander em 2014 e em 2015 com o Programa Recarregue o Planeta (TIM, 2016).

Já no site da Claro, na seção Institucional está relacionado o Programa Claro Recicla com informações sobre o funcionamento do programa, inclusive há uma cartilha eletrônica intitulada Cartilha Lixo Eletrônico - Qual é o melhor destino para ele?, disponível para download, explicando a forma correta de destinar aparelhos eletrônicos obsoletos ou fora de uso, abordando os riscos para o meio ambiente e para a saúde hu-mana e traz dicas para uma ação cidadã relacionada à temática (CLARO, 2016). No site da Oi, usando a ferramenta de busca com a palavra susten-tabilidade chega-se a uma página com link para a política de sustentabili-dade, que, por sua vez, é encaminhada a uma página na qual há mensagem de erro e não se tem acesso as informações (OI, 2016).

Paralelo ao Programa da Abinee para logística reversa de pilhas e baterias, a Philips mantém desde novembro de 2010 um programa de logística reversa de Pilhas e Baterias como parte de um programa mais amplo denominado Ciclo Sustentável Philips que envolve postos credenciados relativos às lojas próprias da Philips e à sua assistência técnica. No Paraná há somente dois postos credenciados e ambos se localizam em Curitiba (PHILIPS, 2016).

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Os feixes de prática-arranjo da logística reversa de pilhas e baterias de uso domiciliar na constelação local de resíduos sólidos de Cascavel são representados de forma sintética pela Figura 25 a partir do fluxo reverso iniciado pelo cidadão.

FIGURA 25 – FEIXES DE PRÁTICA DA LOGÍSTICA REVERSA DE PILHAS E BATERIAS NA CONSTELAÇÃO LOCAL DE CASCAVEL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Feixes de Prática da Logística Reversa de Pilhas e Baterias na Constelação Local de Cascavel.

No olhar da Teoria da Prática Social o tipo de relação entre práticas e arranjos que acarreta a formação do feixe de prática de go-vernança de logística reversa de Pilhas e Baterias de Uso Doméstico é a constitutiva porque os arranjos materiais aqui materializados como dis-plays, urnas ou outros recipientes, elaborados com materiais adequados para o acondicionamento e transporte seguros, dispostos em locais visí-veis para a devolução de pilhas e baterias são essenciais para a compo-sição da prática. Se não houver um local adequado, autorizando e indi-cando onde dispor esses resíduos recicláveis, aquele que deverá executar a parte inicial da prática trazendo esses resíduos e colocando-os nesses

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recipientes ficará impossibilitado de fazê-lo. Desse modo, disponibilizar recipiente adequado, identificado e visível é essencial para que a prática de logística reversa tenha início.

No Feixe de Prática de Governança da Logística Reversa de Pilhas e Baterias pode-se notar que há vários feixes de governança tra-balhando em prol do recolhimento de pilhas e baterias usadas a fim de dar destinação correta a esses resíduos.

Todos esses feixes de governança como Abinee/Atacadão, Sistemas Sicoob e Sicredi, Abinee/Empresas de Telefonia - Claro, Tim e Vivo, Sicoob e Sicredi - têm como forma de relação predominante entre feixes e constelações o poder comum porque têm os mesmos ob-jetivos, entendem que as razões práticas estão na proteção e preservação da saúde humana e ecológica, atendem as mesmas regras, principalmen-te a PNRS, e por isso desenvolvem tarefas similares.

Em uma visão geral sobre a cadeia de ação complexa dos feixes de governança envolvidos na Logística Reversa de Pilhas e Baterias de Uso Domiciliar destacam-se os conceitos de Bifurcação e/ou Aglutinação como conceitos estruturantes do nexo causal responsável pela formação, persistência e dissolução de grandes fenômenos porque nesse feixe há al-gumas peculiaridades como: (i) os feixes tiveram um marco regulatório em tempos diferentes: em 1999, em 2008 e em 2010; (ii) a ampliação da densidade dessa prática é expressiva a partir de 2010-2012; (iii) as regras tratam os produtos usados como sendo de mesma natureza, composto por elementos químicos contaminantes, contudo como o uso é diferenciado, apresentam feixes e cadeias de ação independentes como pilhas e baterias de uso doméstico daquelas relacionadas aos produtos de comunicação celular; (iv) apresenta iniciativas diversas oriundas de grupos de gover-nança diferentes, como fabricantes e importadores de pilhas reunidos sob a Abinee, como as iniciativas da governança das empresas de telecomuni-cações (Claro, Tim e Vivo), que resolveram formar individualmente seu feixe de governança, e iniciativas voluntárias e independentes de gover-nança como o Sicoob e o Sicredi.

Portanto, a bifurcação e a aglutinação são conceitos consisten-tes na formação da cadeia de ação complexa como a da Governança de

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Logística Reversa de Pilhas e Baterias (GLRPB) que avança além da constelação local resíduos sólidos de Cascavel, alcançando uma confi-guração nacional. Esta análise aponta para a existência sincrônica da bifurcação (Abinee-celulares) e da aglutinação (Abinee-pilhas) de fei-xes e constelações de uma mesma prática, embora enfocando diferentes produtos associados às pilhas e baterias. Vale destacar outro conceito presente nestas cadeias de ações de GLRPB que é o monitoramento. Todas as práticas de governança realizam o monitoramento do desem-penho de suas cadeias pelo menos no que se refere aos resultados porque todas fazem o controle dos materiais coletados e encaminhados para tratamento ou disposição final.

Analisando aspectos de fenômenos sociais e que também se re-ferem à governança da Logística Reversa de Pilhas e Baterias podemos considerar que a densidade desta prática é relevante principalmente pela presença de múltiplas entidades que fazem a governança da logística re-versa, envolvendo constelações como Abinee, Sicoob, Sicredi, Philips, companhias de telefonia celular (Vivo, Tim e Claro) que extrapolam a extensão espacial local e alcançam o âmbito nacional, algumas atuan-do de forma (i) mandatória e ainda assim de forma negociada/acordada pois que baseada em Acordo Setorial assinado com o Ministério do Meio Ambiente, (ii) outras de forma mandatória e autônoma como são os casos das empresas de telefonia celular e (iii) outras ainda de forma voluntária para participar da iniciativa com o objetivo de contribuir com a conservação do meio ambiente, como são os casos do Sicoob e Sicredi.

A durabilidade da iniciativa da Logística Reversa caracteriza--se pela continuidade no tempo principalmente para as constelações de governança de caráter mandatório, exceto aquelas de iniciativa partici-patória como Sicoob e Sicredi que podem ter uma condição de transi-toriedade mais expressiva, pois depende da resolução da própria gover-nança em dar continuidade ou não à prática.

O feixe de prática da logística reversa de pilhas e baterias de uso domiciliar é composto por várias prática-arranjo de logística rever-sa desenvolvidas por governanças diversas como Abinee, Claro, Tim, Vivo, Philips, Sicoob e Sicredi, que mesmo atendendo ao mesmo objeti-

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vo, as cadeias de ação são diferentes conferindo ao contexto desta prática complexidade qualitativa.

A prática de descarte correto de pilhas e baterias como uma das atividades ativadoras da logística reversa depende de maior par-ticipação do consumidor cidadão na consolidação desta prática e na ampliação de canais de divulgação no intuito de fomentá-la e torná--la mais visível e dinâmica no contexto local, de modo a ampliar sua complexidade qualitativa.

A prática-arranjo de descarte e destinação correta de pilhas e baterias é orientada por regras que estabelecem certos cuidados que devem ser tomadas como o acondicionamento adequado, condições se-guras para transporte e conhecimentos específicos aplicados em proces-sos de reaproveitamento, reciclagem e destinação final. Os responsáveis principais, fabricantes, importadores, diretamente ou indiretamente, por meio de entidades representativas, têm a tarefa de desenhar o modelo considerado adequado e esse modelo é submetido a uma ação contratu-al, representada pelo Acordo Setorial em âmbito nacional, e pelo Termo de Compromisso em âmbito estadual, em cumprimento a regra princi-pal que é a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Nesse sentido é que a governança estabelece a prática inova-dora: ao elaborar o modelo de gestão, ao determinar a cadeia de ação, as atividades relativas a essa prática, ao prover arranjos materiais inter-conectados à prática e ao escolher essa e aquela entidade governadora de outras práticas que podem se associar a prática em foco ou mesmo decidir participar desta prática. Portanto, a decisão de desenvolver, de implantar uma prática anteriormente inexistente já é uma inovação para a organização.

O feixe de prática da logística reversa de pilhas e baterias revela que há várias formas de se realizar essa prática, algumas têm conseguido obter o êxito esperado, e outras apresentam oportunidades de melhoria, como a expansão de pontos de coleta em estabelecimentos que comer-cializam esses produtos e a inclusão desses pontos de coleta no sistema formalizado da logística reversa especialmente os vinculados a Abinee para pilhas e baterias de uso doméstico. Ausência de campanhas escla-

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recimento do papel do cidadão nesse sistema e de divulgação do funcio-namento da logística reversa para pilhas e baterias foram detectadas na pesquisa de campo.

Embora a prática de governança da logística reversa de pi-lhas e baterias de uso doméstico esteja presente na constelação local de Cascavel e se faça presente em âmbito nacional, não se pode afirmar que a densidade de feixes de práticas, entidades e relações esteja em seu auge.

5.2 FEIXE DE PRÁTICAS DE LOGÍSTICA REVERSA DE MEDICAMENTOS

Os medicamentos não estão entre os produtos explicitamente citados na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) como obri-gatórios para implantação do sistema de logística reversa, contudo os medicamentos estão entre os produtos que podem causar impacto ne-gativo no meio ambiente e na saúde humana, conforme o §1º do Art. 33 da Lei 12.305/10. Nesse sentido, a PNRS determinou que o sistema fosse estabelecido por regulamento ou em acordos setoriais e termos de compromisso entre o poder público e as organizações do segmento (fa-bricantes, importadores, entidades representativas) (BRASIL, 2010).

Os remédios podem envolver a utilização de substâncias tóxi-cas o que confere periculosidade aos resíduos, também podem conta-minar a água, o solo, a flora e a fauna, ao mesmo tempo, medicamentos vencidos em casa são um risco à saúde humana pelo consumo acidental ou até intencional (ABDI, 2013).

A destinação ambientalmente adequada dos medicamentos não utilizados no ciclo pós-consumo domiciliar tem preocupado a Anvisa desde 2008 e tornou -se tema estratégico a partir da 2010 com a publicação da PNRS, tendo em vista que o gerenciamento dos Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) dentro dos estabelecimentos de saúde já é regulamentado pelas Resoluções RDC Anvisa 306/04 (atualmente em revisão para adequar-se à PNRS) e Conama 358/05 (ABDI, 2013).

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Em outubro de 2013, o Ministério do Meio Ambiente lançou edital de chamamento para implantação do sistema de logística reversa de medicamentos tendo como base a lei 12.305/2010 (DOU, 2013). Porém em fevereiro de 2014 o prazo para apresentação da proposta de logística reversa de medicamentos foi prorrogada para 06 de abril de 2014 (DOU, 2014).

O fato é que desde 2011 o governo federal tenta firmar um acordo entre indústria, distribuidores e farmácias, envolvendo tam-bém entidades representativas do segmento, para implantar a logística reversa de medicamentos de uso doméstico, contudo sem sucesso até novembro de 2016. A alocação dos custos de gerenciamento tem re-presentado um entrave na definição do modelo de gestão assim como a ausência de critérios de classificação dos resíduos de medicamen-tos em relação à periculosidade à saúde pública e ao meio ambiente (SENADO FEDERAL, 2016; MORETTO, 2014).

No estado do Paraná, o aparato legal sobre a responsabilidade da destinação do s medicamentos em desuso de origem domiciliar e seus procedimentos recai sobre a Lei 17.211 de 03 de julho de 2012 e sobre o Decreto 9213 de 23 de outubro de 2013, que a regulamenta, expressando claramente o alinhamento com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PARANÁ, 2012, 2013). Esta lei tem sido vista como modelo por repre-sentantes de entidades da área de saúde e meio ambiente, sendo utilizada como referência para outros estados (BATTISTELLI, 2014).

Uma das inovações na lei paranaense é incluir, além dos es-tabelecimentos que comercializam e distribuem medicamentos (como farmácias, farmácias de manipulação e drogarias), as farmácias veteri-nárias e lojas de produtos animais, serviços públicos de saúde, os hospi-tais, as clínicas e os consultórios médicos ou odontológicos, assim como os hospitais, clínicas e consultórios veterinários. Também incluem os laboratórios de exames clínicos e qualquer outro estabelecimento que comercialize ou distribua medicamentos, mesmo que de forma gratuita, como a distribuição de amostras grátis. Todos ficam obrigados a aceitar a devolução das unidades usadas, vencidas ou inservíveis, cujas caracte-rísticas sejam similares àquelas comercializadas ou distribuídas por estes

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estabelecimentos. Outra inovação é que esta lei especifica formas de destinação final proibidas, conforme consta no Art.10 da lei estadual e no Art. 19 do Decreto supracitados (PARANÁ, 2012, 2013).

A prática da logística reversa de medicamentos em desuso, regulamentada pelo Decreto 9213/13 inicia pela (i) entrega voluntária dos medicamentos em desuso pelo consumidor nos pontos de coletas. Essa ação voluntária deverá ser estimulada de modo permanente por processos de divulgação sobre os danos decorrentes do lançamento in-devido no meio ambiente sem tratamento desses resíduos e de orien-tação pós-consumo; (ii) os estabelecimentos que comercializam ou dis-tribuem medicamentos ao consumidor final devem instalar pontos de coleta no interior em local visível e identificado, e receber esses resíduos, acondicioná-los adequadamente temporariamente e realizar o registro do gerenciamento desses resíduos; (iii) os fabricantes, importadores e distribuidores e transportadores se responsabilizam pela coleta externa, o transporte, o tratamento e a destinação final (PARANA, 2013).

Essas responsabilidades podem ser delimitadas em Termos de Compromisso celebradas em âmbito estadual no intuito de gerenciarem suas responsabilidades de forma coletiva (PARANÁ, 2013).

Em novembro de 2012, o Sindicato das Indústrias Químicas e Farmacêuticas do Estado do Paraná (Sinqfar) assinou o Termo de Compromisso para a Logística Reversa nos Setores Químicos, Farmacêuticos e de Cosméticos do Paraná junto à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sema) e ao Instituto Ambiental do Paraná (IAP) (SINQFAR, [2016?]). Entretanto, a Agência Estadual de Notícia aponta dezembro de 2014 como a data da assinatura do Termo de Compromisso do Sinfar para a logística rever-sa de medicamentos e março de 2015 a sua implantação (AEN, 2014).

Já o Sindusfarma e outras entidades representativas do se-tor farmacêutico vêm trabalhando em 2016 para que o Termo de Compromisso seja celebrado com a Sema/PR e o IAP (CONSÓRCIO PARANÁ SAÚDE, 2016).

No município de Cascavel a Lei Municipal 5.935 de 2011 é a regra que estab eleceu a logística reversa de medicamentos. Esta regra

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disciplina o descarte, o recolhimento e a destinação de medicamentos vencidos e a vencer como proteção ao meio ambiente e a saúde pública.

Em seu artigo 1º. consta que o usuário deverá depositar todo medicamento vencido em recipientes instalados em farmácias e postos de saúde do município. Estes, por sua vez, deverão ser encaminhados à Vigilância Sanitária do município para que repasse aos fabricantes e aos distribuidores ou aos importadores a fim de que estes adotem os proce-dimentos ambientalmente adequados de destinação final, nos termos da Lei Estadual de 18 de dezembro de 2008 (CASCAVEL, 2011).

Contudo, não se pode afirmar que esta lei vigorou efetivamente ainda porque a Lei Estadual 17.211 data de julho de 2012, sendo regu-lamentada em 2013 por Decreto, é superior à Lei Municipal, ou seja, a lei de menor abrangência deve subordinar -se à lei de maior abrangên-cia. Em informações levantadas em campo consta que os procedimentos adotados para logística reversa têm em torno de 4 (quatro) anos, ao tempo da data do Decreto 9213/13 que regulamenta a Lei Estadual 17.211/12.

Declaração do Secretário de Meio Ambiente de Cascavel [E33] sustenta que todos os estabelecimentos de saúde têm que ter plano de gerenciamento de resíduos sólidos e a apresentação destes está vinculado à liberação do Alvará de Funcionamento. Desta forma todas as Unidades Básicas de Saúde (postos de saúde), Unidades de Saúde da Família e Farmácias do município têm o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos27.

Por telefone, houve a confirmação por parte da Secretaria de Saúde de que todas as Unidades Básicas de Saúde e outras unidades que realizam atendimentos têm Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos e que existe uma empresa contratada por meio de licitação para fazer o transporte e destinação final adequada dos medicamentos venci-dos e a vencer de uso domiciliar.

“Até 2007 usava-se vala como destino final desses resíduos. A partir de 2007 e 2008 todos os geradores foram obrigados a procurar

27 O Plano de Gerenciamento de Resíduos de Saúde envolve outros tipos de resíduos e é regu-lamentado pela Anvisa.

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uma empresa para fazer o tratamento e a disposição final. Então a pre-feitura deixou de se responsabilizar por esse resíduo” [E28].

O Entrevistado [43] afirma que “hoje o setor de farmácia está totalmente em conformidade com as exigências legais; o Alvará não é emitido sem [a apresentação do] projeto arquitetônico e o plano de ge-renciamento de resíduos”.

Na Masterfarma os medicamentos vencidos ou a vencer de clientes e não clientes são recebidos embora tenha baixa procura. O re-cipiente para depósito do medicamento está disposto na sala de injeção porque o espaço de atendimento é realmente diminuto e no local há ex-posição de outros produtos. Uma das razões por manter o recipiente na sala de injeção é a guarda segura do medicamento (para evitar acidentes e acesso indesejado a esses medicamentos). Também não há cartaz in-formativo visível indicando que a farmácia recebe medicamentos em desuso (ENTREVISTADO [E43]).

A prática da logística reversa de medicamentos que a Masterfarma desenvolve inclui as seguintes atividades:

• Recepção do usuário que vem entregar o medicamento vencido ou a vencer.

• O atendente separa a caixa e a bula colocando-os no reci-piente de resíduo reciclável.

• Registra este medicamento em uma ficha de controle;• Deposita o tablete ou similar contendo o medicamento

em recipiente adequado provisoriamente até o momento da coleta;

• A Farmácia entre em contato com a empresa contratada de Maringá, no Paraná, para fazer o transporte para o local de destinação final adequada;

• O coletor confere o controle, pesa os medicamentos, trans-fere-os para o recipiente da empresa coletora;

• O coletor emite certificado de coleta e destinação adequada dos medicamentos.

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A empresa contratada para a coleta de medicamentos do estoque vencidos da farmácia que são colocados na bombona (como eles chamam este recipiente) também é a mesma para coletar os resíduos perfurocortantes.

Os custos da contratação da empresa, ou seja, o transporte e destinação final adequada dos medicamentos correm por conta da própria farmácia.

Outros tipos de resíduos, como o lixo comum, são recolhidos pelo serviço de coleta porta a porta e o resíduo reciclável é coletado pelo programa Coleta Legal.

Em visita in loco no mês de setembro em uma das lojas da rede Droga Raia foi identificada uma caixa coletora de medicamentos para as pessoas depositarem seus medicamentos vencidos ou a vencer, separando caixas e bulas em um escaninho e o remédio em outra. De acordo com Sanofi [201-], no final de 2010 a Medley iniciou volunta-riamente um projeto de logística reversa de medicamentos vencidos em parceria com a rede de farmácias Droga Raia, abrangendo os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.

Visitei outras quatro farmácias como cliente e constatei que uma tinha como recipiente de descarte de medicamentos uma caixa de papelão, porém estava sem identificação, duas não tinham recipiente visíveis nem cartaz ou informativo na ár ea de circulação mas recebiam medicamentos vencidos e a vencer e somente uma disse que não tinha, “que há algum tempo atrás a matriz mandava recipiente adequado e depois parou, não sei o porquê mas a farmácia tal recebe, você pode entregar lá” [grifo nosso].

Tanto a Lei Estadual 17.211/12, no seu Art. 3º quanto o Decreto 9213/13, em seu Art. 13 fazem referência à necessidade de identificação clara da função do recipiente no qual os medicamentos em desuso serão descartados, como medicamentos em desuso ou recepção de medicamentos vencidos e em desuso nos espaços de comercialização ou recepção dos estabelecimentos. Nesse aspecto as farmácias precisam se organizar para encontrar uma forma de atender a esses requisitos legais, com atenção especial também às características do recipiente que podem ser usados para o descarte de medicamentos vencidos.

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Podemos destacar os seguintes feixes de práticas de governança de medicamentos de uso domiciliar presentes na constelação local de resíduos sólidos de Cascavel:

• Farmácias;• Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades da Saúde da

Família (USF);• Outros estabelecimentos que comercializam medicamentos;• Sinqfar.

Os feixes de prática de governança de Medicamentos de Uso Domiciliar apresentam características distintas uma das outras, porém partilham as mesmas regras no estado do Paraná porque ainda não há acordo setorial em âmbito nacional.

A forma de atuação da governança é obrigatória porque deve atender ao disposto nas regras (Lei Estadual 17.211/12 e Decreto Estadual 9213/13). Mas também se caracterizam por ser individual ou autônoma.

Para as farmácias, sendo elas individuais ou pertencentes a re-des, a governança é individual ou autônoma porque governam a prática sem interferência ou auxílio de outra entidade. Nas farmácias pesqui-sadas não foram encontrados indícios de que o Sinqfar esteja atuando efetivamente junto às farmácias ou redes de farmácia.

Outro aspecto que reforça a ação individual ou autônoma de far-mácias, e que também é uma prática realizada por UBS e USF entre outros estabelecimentos relacionados na lei estadual, é que o Art. 12 do Decreto 9213/13 exige que essas organizações comprovem a destinação dos me-dicamentos em desuso, registrando em seu Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS) a indicação da em presa contratada responsá-vel pelo recolhimento, transporte, tratamento se for o caso, e destinação adequada dos medicamentos vencidos ou a vencer de uso doméstico. O PGRS deve ser também apresentado à autoridade local responsável pela emissão do alvará de funcionamento quando se referir a novos estabele-cimentos.

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Nesse contexto, recaem sobre as farmácias todos os custos da logística reversa, sem participação de indústrias, importadores e distri-buidores. Assim como recai sobre a Prefeitura, através da Secretaria da Saúde, os custos da logística reversa de medicamentos em desuso de unidades de atendimento à saúde gestionada pelo município. Pode -se dizer então, que a responsabilidade compartilhada enquanto princípio da PNRS não está sendo efetivo no feixe de governança de logística reversa de medicamentos em desuso, pelo menos em relação a alguns atores envolvidos na constelação local de resíduos sólidos.

A prática de logística reversa de medicamentos acontece em Cascavel e seu início certamente foi impulsionada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos e disseminada após 2013. Por estar embasada em regra, a condição de continuidade é alta embora possa apresentar muta-bilidade caso haja alterações nos padrões de governança com a assunção de responsabilidade de indústrias, importadores e distribuidores tanto no âmbito nacional com o estabelecimento de Acordo Setorial quan-to em âmbito estadual, com assinatura de Termo de Compromisso ou mesmo com a efetivação do papel do Sinqar ou Sindusfarma ou outra entidade no sentido de compartilhar as responsabilidades e os custos com a logística reversa de medicamentos em desuso.

Tanto a questão da expansão espacial quanto a densidade enquanto características da governança apresentam um contexto ne-buloso, talvez porque os feixes de governança estejam dissociados uns dos outros, com poucos entrelaçamentos entre eles justificado pela ação autônoma de cada feixe. Entretanto, em algumas farmácias pesquisadas indicaram uma empresa de fora de Cascavel como coletora desses re-síduos. En tão, podemos dizer que este feixe vai além das fronteiras da Constelação Local.

As informações coletadas indicam uma complexidade qualita-tiva indefinida, que há espaço para organização das atividades inerentes à prática e da própria prática, assim como inserção de novas entidades e crescimento do número de relações entre as entidades envolvidas,

Para se compreender o contexto atual da cadeia de ação da logística reversa de medicamentos em desuso é preciso olhar para seu

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início, para o momento de formação dessa prática. As regras foram a solução encontrada, no estado do Paraná, para o impasse que se estabe-leceu na definição e assunção de responsabilidades dos atores principais (fabricantes, importadores, distribuidores) envolvidos no ciclo de vida dos produto s, em âmbito nacional e estadual, forçando a aplicação da regra em sua essência sem a preocupação efetiva da constituição de um sistema de logística reversa e, nesse sentido, contribuiu para que os fei-xes de práticas fossem marcados por diversos pontos de formação ou polyplasis28 em grego).

Outro aspecto, que podemos extrair do parágrafo anterior, que singulariza esses feixes de prática é a coordenação de discursos como ponto comum na formação dos diversos feixes de prática focada no argumento da destinação correta de resíduos potencialmente peri-gosos ao meio ambiente e à saúde humana.

Dentre os conceitos propostos pela Teoria da Prática Social para caracterizar mudanças em fenômenos sociais amplos nenhum de-les se aplica ao de feixe de prática da logística reversa de medicamentos em desuso. O conceito de ação periférica29 ou ações periféricas pare-ce ser o mais apropriado para definir esse feixe considerando uma de sua s singularidades, que é a ausência de centralidade na governança. Contextualizando para nosso assunto: os diversos feixes de práticas de governança da logística reversa de medicamentos em desuso ocupam um lugar periférico, circunvizinho ao que seria um modelo de gestão de governança norteadora ou centralizadora. A governança mostra-se descentralizada na constelação local de governança de resíduos sólidos, com feixes autônomos e com poucas conexões recíprocas.

Os tipos de relações entre práticas e arranjos que acarretam a formação do Feixe de Prática de Logística Reversa de Medicamentos Vencidos de Uso Domiciliar é constitutiva e intencional. Constitutiva porque as práticas estabelecem, organizam, montam os arranjos físicos (recipiente coletor, informação visual, escolha e contratação de trans-portador adequado para destinação final) necessários para sua execução

28 Conceito proposto pela autora. 29 Conceito proposto pela autora.

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de modo a, intencionalmente, incitar seu uso pelos participantes. Da mesma forma que ocorre no Feixe de prática da logística reversa de Pilhas e Baterias, se não houver local adequado, autorizando e indicando onde dispor esses resíduos recicláveis, o cidadão ficará impossibilitado de fazê-lo, exceto se perguntar ao atendente da farmácia se eles recebem medicamentos vencidos ou a vencer.

No Feixe de Prática da Logística Reversa de Medicamentos Vencidos de Uso Domiciliar a forma de relação predominante que co-necta práticas de governança a feixes de mesma natureza e estes a cons-telação local de resíduos sólidos é o poder comum porque as organi-zações das diversas prática-arranjos (Farmácias, UBS, Sinqfar) contém elementos comuns como (i) a mesma regra (Lei Estadual e Decreto) que orienta a organização das tarefas (ii) e a mesma finalidade. Entretanto não apresentam os mesmos entendimentos porque a execução da regra é diferenciada no que diz respeito a ativação de canais de divulgação e, de modo especial, à disponibilização, em lugar visível, de recipiente adequado para o descarte de medicamentos vencidos ou a vencer. A ausência dessas materialidades em alguns feixes de governança de logís-tica reversa de medicamentos compromete o exercício da prática porque mantém o consumidor desinformado sobro esse serviço e dificulta a en-trega dos medicamentos em desuso para descarte.

5.3 FEIXES DE PRÁTICA DE LOGÍSTICA REVERSA DE AGROTÓXICOS

O sistema de logística reversa de agrotóxico com tal deno-minação tornou-se obrigatório pela Lei 12.305/10 que dispõe sobre a Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS), em seu artigo 33. O decreto 7.404/10, que regulamenta a PNRS, estabelece, em seu Art. 14, que o sistema de logística reversa de agrotóxicos, seus resíduos e em-balagens, deve seguir o disposto na Lei no 7.802/198930 (que dispõe

30 Em todos os endereços pesquisados para a Lei 7.802/1989 aparecem as alterações posteriores que sofreu, incluindo a Lei Lei 9.974/2000.

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a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização [...] de agrotóxicos, seus componentes e afins) e no Decreto no 4.074/2002 que a regula-menta (BRASIL, 2010b).

Entretanto, nessa Lei (7.802/1989) não constavam regras so-bre embalagens vazias de agrotóxicos, o que gerou a necessidade de ou-tra lei para regulamentar a matéria, o que se deu com Lei 9.974/2000, que em seu §5º do Art. 6º, dispôs sobre a responsabilidade das empresas produtoras e comercializadoras de agrotóxicos e seus componentes pela destinação das embalagens vazias dos produtos por elas fabricadas e co-mercializados e devolvidas pelos usuários, discorrendo ao longo dos ar-tigos sobre as requisitos mínimos legais para organização de um sistema logístico de embalagens de agrotóxicos (BRASIL, 2010a; 2000).

Para atender a Lei 9974/2000 foi criado o Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inPEV), conforme informa-ção do Entrevistado [E20]. O inPev é uma organização sem fins lucrati-vos fundada oficialmente em 14 de dezembro de 2001 para ser uma en-tidade de integração dos elos da cadeia de agrotóxicos, como indústrias fabricantes e/ou registrantes de defensivos agrícolas, distribuidores, co-merciantes e consumidores com a missão de promover a correta destina-ção das embalagens vazias desses produtos por meio do gerenciamento do sistema de logística reversa de agrotóxicos, que o inPEV denomina de Sistema Campo Limpo (INPEV, 2016).

Atualmente o inPEV conta com a associação de mais de 100 (cem) empresas fabricantes de defensivos agrícolas do Brasil e 10 (dez) entidades representativas do setor, todas mantenedoras do Instituto, so-bre o qual recaem os principais custos, como os relativos à infraestrutura (unidades de recebimento), à logística e à destinação final das embalagens (INPEV, 2016).

Contudo os demais elos da cadeia produtiva agrícola, e conse-quentemente do sistema de logística reversa, também arcam com parte dos custos. Cabe ao agricultor levar as embalagens até a unidade ou ponto de devolução indicado na nota fiscal de venda, já os canais de dis-tribuição (revendedores e cooperativas) compartilham com os fabrican-tes a construção e administração das unidades de recebimento. Governo,

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fabricantes e comerciantes são responsáveis por ações educativas e de conscientização do agricultor (INPEV, 2016; E20).

Com criação do inPEV e a implantação do sistema de logística reversa em 2002, o princípio da responsabilidade compartilhada entre agricultores, indústria, canais de distribuição e poder público, expressa pela PNRS em 2010, passou a tornar-se observável em todas as regiões do país. Consolidada após 14 anos de atuação, a rede do inPEV abran-ge mais de 400 unidades de recebimento de embalagens vazias, em 25 estados brasileiros e no Distrito Federal, gerenciadas por cerca de 260 associações de revendedores, contando com mais de 5 mil pontos de revenda, entre distribuidores e cooperativas (INPEV, 2016).

O sistema de logística do inPEV abrange, além das unidades de recebimento, e parcerias com 9 empresas recicladoras localizadas em Mato Grosso, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná.

Em 2002 foram 3.768 toneladas de embalagens recebidas e recicladas; em 2016 projeta-se que sejam 44.500 toneladas. O Brasil é o país que se destaca na destinação correta de embalagens de agrotóxicos, com retorno de 94%, seguido pela França com 77% e Canadá com 73%. Estados Unidos dá destinação correta somente a 30% de todas as emba-lagens e componentes vendidos (INPEV, 2016).

A matriz do inPEV é em São Paulo, de onde todas as diretri-zes são emitidas de acordo com a lei. Essas diretrizes são direcionadas as Centrais de Recebimento Embalagens. No Brasil são 314 unidades de Centrais de Recebimento de Embalagens funcionando de igual ma-neira, seguindo os protocolos emitidos pelo inPEV. No Paraná, são 13 unidades de Centrais de Recebimento, todas com licença ambiental para funcionar e Cascavel é uma delas. Há uma coordenação estadual responsável pelas Centrais de Recebimento em cada estado, chamada de Coordenação Regional de Operação (CRO), explica o Entrevistado [E20]. Todos os recicladores, incineradores e centrais de recebimento têm que estar credenciados no inPEV.

A Associação dos Distribuidores de Defensivos Agrícolas e Veterinários do Oeste (Addav) é uma associação formada pelas reven-das da região oeste do Paraná e teve sua fundação em novembro de 2001. A atuação da Addav é em parceria com o inPEV, com convênio firmado, porém é a Addav que administra localmente a unidade. O pa-

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pel do inPEV é de coordenação tecnicamente das ações das Centrais de Recebimento, o que inclui a Addav, padronizando todas as diretrizes como procedimentos e estrutura física, e orientando ações, esclarece o Entrevistado [E20].

A prática da governança da logística reversa de embalagens de agrotóxicos é distribuída entre agricultores, indústria fabricantes, canais de distribuição/cooperativas, centrais de recebimento, empresas recicladoras e/ou incineradoras e poder público, conforme demonstra a Figura 26.

FIGURA 26 – ELOS DO SISTEMA DE LOGÍSTICA REVERSA DE EMBALAGENS DE AGROTÓXICOS

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

Os agricultores têm um ano para devolver as embalagens vazias dos produtos comprados, prazo contado a partir da data da compra. O agricultor pode armazenar as embalagens vazias no mesmo local onde existem embalagens cheias, seguindo as regras: coberto para ser abriga-do de chuva, fechado para impedir o acesso, ventilado porque sempre terá pessoas circulando, e piso para proteção do solo.

Todas as empresas de revenda de defensivos agrícolas têm que apresentar aos órgãos públicos uma carta de credenciamento à Addav ou

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provar que têm local para encaminhar embalagens vazias nos termos da lei. Esse credenciamento é uma das exigências para a abertura de empresa nesse ramo.

Ao realizar a venda, os revendedores devem emitir na Nota Fiscal o local de devolução de embalagens vazias, com o endereço e telefone da Addav.

A Addav conta com três 3 pontos de recebimento: (i) a pró-pria central, recebe mediante agendamento durante todo o ano, de 2.ª a 6.ª feira, exceto período de férias (Natal e Ano Novo); (ii) recebimen-to itinerante, há a programação de calendário sempre no ano anterior para divulgação às revendas, passando em todos os municípios da região, uma vez por ano; (iii) Posto de Recebimento, que fica na Campelínea, próximo a cidade de Corbélia, uma vez por mês, geralmente na primei-ra segunda-feira de cada mês, exceto dezembro e janeiro. Do Posto de Recebimento as embalagens são trazidas para a Central em Cascavel ([E20]).

A responsabilidade da Addav como Centro de Recebimento é receber as embalagens dos agricultores, das revendas e emitir docu-mentação quanto a isso. O agendamento para entrega das embalagens pelo agricultor pode ser feito eletronicamente direto no site do inPEV: (http://www.inpev.org.br/agendamento/Page/1_estado.aspx).

A emissão de documentação para o produtor compreende o comprovante de entrega de embalagens, e para revenda é emitido docu-mentação para os órgãos públicos informando que a revenda está auto-rizada a receber embalagens.

A Central de Recebimento também recebe embalagens vazias entregues nos Postos de Recebimento e, até que sejam recolhidas, cuida de sua armazenagem. As embalagens são de vários tipos de plásticos, metal, flexível, tratamento de sementes e são embalagens individuais e a granel. Na Central é realizado um processo de separação por tipos de materiais, e os plásticos por tipo de plásticos. Os materiais são prensados e formam fardos de forma a reduzir o volume para o transporte. Com a prensa, uma carga pode chegar a 14 ton. e, sem prensa a 1,5 ton., sempre respeitando o limite de carga do veículo, explica o Entrevistado [E20].

Estudos indicam que, no Paraná, há um retorno de 94% a 96% das embalagens vendidas no estado. Os dados de embalagens recebidas

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são coligidos pelas Centrais no Estado, e de embalagens vendidas são fornecidas pela Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Paraná (SEAB). Em Cascavel, em 2015 foram retornadas um pouco mais de 300 ton. e até julho 2016 já foram destinadas mais de 200 toneladas [E20].

A responsabilidade pelos custos das Centrais, neste caso, da Addav, cabe às empresas revendedoras associadas. Mensalmente é feito uma previsão orçamentária e esse valor é rateado entre os associados. A região oeste atende 30 municípios e tem 41 revendas. Ao todo são 3.000 agricultores atendidos, informa o Entrevistado [E20].

Compreende a destinação final adequada realizada pelo inPEV, a responsabilidade pelo transporte de embalagens vazias, o encaminha-mento de materiais que podem ser reciclados para as empresas recicla-doras homologadas, e para as incineradoras homologadas são encami-nhados os materiais que não receberam a tríplice lavagem e/ou materiais que não podem ser tríplice lavados, como papelão que foi contaminado por produtos de defensivo, saquinho de flexível e embalagens de trata-mento de sementes, salienta o Entrevistado [E20].

O inPEV opera com uma única empresa contratada para rea-lizar o transporte de produtos de defensivos agrícolas e de embalagens vazias em todo o território nacional, aplicando o conceito de aproveita-mento do frete de retorno. Assim, o mesmo veículo que entrega a emba-lagem cheia nos canais de distribuição, carrega o veículo, nas Centrais de Recolhimento, com embalagens vazias tendo como destino as reciclado-ras e/ou incineradoras. A Luft é a operadora logística do sistemo inPEV, tanto de embalagens cheias quanto vazias. (inPEV, 2016; [E20]).

Aqui nota-se um entrelaçamento maior entre as práticas de-senvolvidas pela Addav e pela Luft. A Luft opera um sistema informa-tizado online chamado Sistema Informatizado de Centrais (SIC). Toda embalagem recebida é cadastrada no sistema e fica visível para todos que têm acesso. A Central Addav tem a responsabilidade de inserir no SIC o volume a granel transformado em fardo, entre outros dados. A emissão de ordem de coleta é automática pelo sistema informatizado: quando atinge um volume relativo a uma carga é acionado automaticamente informativo para a transportadora e para a recicladora. A transporta-dora, então, agenda o recolhimento desses fardos. A transportadora faz

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a gestão dessa logística, sempre fazendo o aproveitamento do veículo: quando traz embalagens cheias para entregar os pedidos da revenda, volta levando os fardos. Os custos de transporte cabem ao Inpev.

O inpEV mantém parcerias com nove empresas recicladoras, estrategicamente localizadas em cinco Estados: Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e São Paulo. Essas empresas recebem e reciclam as embalagens vazias conforme todos os padrões preestabeleci-dos de segurança, qualidade e rastreabilidade, cumprindo as normas dos órgãos ambientais e as exigências legais (INPEV, 2016).

A área de Cascavel ainda não tem reciclador credenciado. Os materiais são encaminhados para recicladores fora da região. Os mais próximos são a Cimflex, de Maringá, que recicla materiais plásticos e a Pasa em Tamarana, que recicla papelão. A incineração das embalagens não recicláveis é realizada por cinco empresas, localizadas nos Estados de São Paulo (3), Rio de Janeiro (1) e Bahia (1).

Nas recicladoras, os fardos são abertos e limpos para retirar as impurezas (terra, folhas) em um processo de lavagem e depois passam por trituração, originando a resina pós consumo, denominado de produ-to RPC. Essa resina passa para outro processo até gerar outros produtos.

No início do Sistema Campo Limpo as embalagens eram en-caminhadas para incineração. Com o tempo percebeu-se que dava para reciclar o material. O primeiro produto foi o conduíte de plástico para passar fiação elétrica. Ao todo, as recicladoras produzem 17 diferentes artefatos, incluindo a própria embalagem de defensivo, todos orienta-dos e aprovados pelo inpEV, como pode ser observado na Figura 27 (INPEV, 2016, [E20])).

As inovações em produtos originados dos materiais reciclados são divulgadas na rede do inPEV. O último produto foi a própria em-balagem de defensivo. Há produtos que saíram de produção também, como uma corda plástica.

O inPEV conseguiu desenvolver um modelo de logística re-versa do berço ao berço, que foi sendo construído ao longo do tempo, apresentando resultados importantes.

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FIGURA 27 - PRODUTOS FABRICADOS A PARTIR DE EMBALAGENS VAZIAS DE DEFENSIVOS AGRÍCOLAS

Legenda:

1. Recipallet 2. Suporte parasinalização rodoviária 3. Cruzeta de poste 4. Caixa para

descarga

5. Caçamba plástica para carriola

6. Caixa para massa de cimento

7. Caixa de bateriaautomotiva

8. Roda plástica para carriola

9. Embalagem para óleo lubrificante

10. Ecoplástica Triex 11. Barrica plástica para incineração

12. Conduíte corrugado

13. Duto corrugado

14. Caixa de passagem para fios e cabos elétricos

15. Tubo para esgoto Tampa agro RecicapBarrica de papelão

Fonte: inPEV (2016).

Art. 19 da Lei 7.802/1989 compromete o Poder Executivo a desenvolver ações de instrução, divulgação e esclarecimento a fim de es-timular o uso seguro e eficaz de agrotóxicos e seus componentes visando

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a prevenção de acidentes e a mitigação de impactos negativos para a saúde humana e o meio ambiente ao mesmo tempo estabelece que as empresas produtoras e comercializadoras de agrotóxicos e seus com-ponentes deverão implementar programas educativos e mecanismos de controle e de estímulo à devolução das embalagens vazias por parte dos usuários (BRASIL, 1989). Antes dessa lei, no Brasil, cada elo da cadeia desenvolvia ações isoladas. Não havia protocolo [E20].

A cada ano as Centrais se reúnem com o Inpev, de duas a três vezes ao ano, com o objetivo de discutir e analisar vários pontos que podem ser melhorados. Um dos assuntos trabalhados foi a conscientiza-ção ambiental, procurando padronizar linguagem e estratégias utilizadas para torná-las mais eficientes [E20].

Várias são as ações desenvolvidas pelo inPEV e pelas Centrais de Recebimento. Em 2005 foi criado um dia para fazer a comemoração da Lei e reforçar a questão da educação ambiental. Esse evento está no calendário nacional, o dia 18 de agosto como o Dia Nacional do Campo Limpo. Nesse dia todas as unidades realizam um evento denominado Portas Abertas, convidam universidades, agricultores, colégios agrícolas para fazerem visitação e para saber como o processo funciona [E20].

Além da desse evento, há o Dia do Campo Limpo nas Escolas, onde se faz um trabalho com as crianças, preparam e plantam uma hor-ta e utilizam material educativo elaborado pelo inPEV com linguagem apropriada para crianças e com brincadeiras lúdicas, sendo que o conte-údo está voltado para a Política Nacional dos Resíduos Sólidos no geral. A Central oferece o material educativo, como cartilhas, pôsteres, gibi, jogo de tabuleiro, entre outros, mas quem conduz as atividades são os professores e a escola [E20].

Quando há solicitação, a Coordenadora da Central vai até a es-cola e faz palestras ou atividades lúdicas educativas. Todas as crianças do Ensino fundamental participam. As escolas têm o mês de agosto para desenvolver a atividade. Há também uma priorização em levar esse pro-grama para as escolas municipais e do interior dos municípios na área de abrangência da região de Cascavel. Anualmente de 9 a 10 escolas são convidadas para participar do Programa e todo evento tem que ser regis-trado [E20].

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Outra ação é o Programa de Educação Ambiental (PEA) rea-lizado no mês de agosto e voltado para crianças. Concurso de desenho é direcionado aos alunos do 4º. ano, e o de Redação para os alunos do 5º ano. Há duas etapas: 1.ª Etapa na região da Central, com premiação para os três primeiros colocados, tanto em desenho quanto em redação; e a 2.ª Etapa ocorre ao nível nacional com todos os primeiros colocados de cada concurso.

A produção dos concorrentes é enviada para São Paulo, onde é feita a escolha dos 3 primeiros lugares. A premiação é entregue aos ga-nhadores via Central. São contemplados os professores e a escola dos alu-nos ganhadores. Em Cascavel, em 2012, o Reassentamento São Francisco foi premiado nacionalmente na 1.ª Colocação do Concurso de Redação [E20].

O Dia Nacional do Campo Limpo direcionado às universida-des é ouro evento. De acordo com a solicitação de universidades é reali-zada palestra aos acadêmicos (futuros profissionais da área como enge-nheiros agrícolas, e outras formações) ministrada pela Coordenação da Central; uma visita técnica à Central também pode ocorrer [E20].

A Central também é aberta para receber visitas técnicas agen-dadas por grupos interessados, como os de acadêmicos por exemplo.

As relações entre atores, os pontos nodais de práticas entre-laçadas no Feixe de Prática de Governança da Logística Reversa de Agrotóxicos são representados na Figura 28.

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A prática de governança da LR Embalagens de Agrotóxicos embora constituída de forma mandatória conseguiu articular sua ope-racionalização de forma colaborativa com os elos responsáveis pela prá-tica, em um contexto relativamente estável visto que equilibrada com a regra norteadora da prática, o que propicia uma condição de continui-dade, sendo que sua ocupação espacial abarca toda a área da constela-ção local como também a do território nacional, no plenário de práticas da logística reversa.

As práticas inovadoras de governança geralmente têm impacto em toda a cadeia por se originar diretamente do Instituto inPEV e se estender às Coordenações Estaduais e às Centrais de Recebimento e se referem a ações programadas inclusas no calendário da logística reversa e nos protocolos (procedimentos). Há pouco espaço para a iniciativa e alterações em práticas por parte da Addav.

No processo de constituição de feixes e de materialidade os tipos de relações que se evidenciam são os de causalidade e de constitui-ção. A relação de causalidade entre prática e arranjo no caso da prática de logística reversa de agrotóxicos está em sua dimensão teleológica: evitar impactos negativos no meio ambiente e na saúde humana pro-venientes do manejo inadequado de embalagens vazias e de resíduos de defensivos agrícolas. Nesse sentido, estabelecer procedimento para que as embalagens vazias sejam recolhidas resultou em uma atividade que altera o mundo, no dizer de Schatzki (2011), mudando significati-vamente o modo como os agricultores, fabricantes, revendedores, entre outros, entendem e lidam com essas embalagens vazias. Os resultados de desempenho dessa prática amparam esse entendimento.

Outra relação observada entre práticas e arranjos é a constitui-ção porque a prática da logística reversa de embalagens vazias de agro-tóxicos exige arranjos específicos que só existem por causa dessa prática, como (i) os arranjos materiais para o armazenamento temporário das embalagens vazias tanto nas propriedades rurais quanto nos Centros de Recebimento, e como (ii) o arranjo informacional e a Nota Fiscal para indicação do local de devolução das embalagens vazias.

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Destaca-se nessa prática a organização orquestrada como um tipo de relação que se estabelece entre diferentes elementos de práticas di-versas no intuito de alcançar objetivos comuns, como é o caso (i) do trans-porte dos produtos de defensivos agrícolas, que no seu retorno transporta as embalagens vazias da localidade, (ii) dos revendedores que informam agricultores sobre a devolução das embalagens e indicam na Nota Fiscal o local, (iii) da prática da tríplice lavagem e devolução de embalagem va-zia feita pelo agricultor ao Posto de Recolhimento ou à (iv) Central de Recebimento, que por sua vez coordena a coleta das embalagens vazias e providencia seu transporte para (v) incineradoras e empresas recicla-doras, principalmente, que vão produzir novos produtos a partir des-sas embalagens, (vi) todas essas práticas coordenadas e monitoradas pela Coordenação Regional de Operação (CRO) de atuação estadual, sob (vii) a governança da prática da logística reversa de embalagens de agrotóxicos orquestrada pelo inPEV em âmbito nacional.

Diante da narrativa acima é possível depreender a cadeia de ação presente na prática da logística reversa de embalagens de agrotó-xicos, para a qual podemos apontar algumas de suas características. A que mais se sobressai é a domesticação, no sentido de reger e regular a cadeia dentro de feixes ou pacotes específicos demarcados por fronteiras legais, espaciais e sociais e para certificar-se que estes feixes corres-pondem ao que foi determinado, realiza o monitoramento em toda cadeia de ação.

A prática da logística reversa de embalagens de agrotóxicos di-ficilmente se sustentaria sem infraestrutura material, e não teria auto-rização para operação se ela não atendesse às exigências legais. São duas infraestruturas principais: o barracão para armazenamento temporário de embalagens devolutas e o abrigo destinado ao armazenamento das embalagens vazias, e que também serve para as que contêm produtos, nas propriedades rurais.

O uso de dispositivo de coordenação que é utilizado nessa prática tem a finalidade de sincronizar atividades na cadeia de ação, ca-pitaneado pela Luft, empresa de transporte, que por meio de seu Sistema Informatizado de Centrais, consegue programar a coleta de embalagens vazias com a entrega de produtos aos revendedores da localidade.

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A governança sendo ela mesma um tipo de cadeia, e que se apresenta intrinsecamente vinculada a uma prática, merece destaque nessa prática porque o inPEV consegue centralizar decisões e diretrizes e descentralizar o acompanhamento das operações e orientações aos elos da cadeia por meio da CRO, especialmente aqueles vinculados com as Centrais de Recebimentos, que também tem a sua governança local as-sim como os serviços de transporte e os de reciclagem. Entretanto, pai-rando sobre todos os elos e a todos influenciando localiza- se o inPEV.

Os conceitos que podem explicar a dinâmica do feixe de go-vernança da prática da logística reversa de embalagens de agrotóxicos, segundo Schatzki (2016), são (i) a acumulação, associação e agregação, (ii) difusão, circulação e propagação, e o de (iii) estabilidade, solidifica-ção, persistência e evolução.

O primeiro porque desde a sua constituição o inPEV teve como diretriz o envolvimento e a integração de todos os elos da cadeia produtiva agrícola, é mais do que um entrelaçamento entre os elos. O inPEV criou um sistema de logística reversa que expressa uma união entre as partes, uma verdadeira aliança entrelaçamento, entre os respon-sáveis e um compromisso para tornar a gestão do sistema mais sustentá-vel, materialmente expresso pelos resultados, como os índices de retorno de embalagens vazias e os produtos elaborados com materiais recicláveis destinados a diversas aplicações.

O segundo conceito a explicar a dinâmica ocorrida no feixe de prática de embalagens de agrotóxico é a difusão, circulação e propaga-ção tanto no que se refere ao conhecimento do agricultor e do resto da cadeia produtiva sobre a obrigatoriedade legal da devolução da embala-gem quanto pelo alastramento da execução da prática por todo territó-rio nacional, presente em 25 estados brasileiros. Constatação efetivada pela adesão dos agricultores à prática que se reflete no índice de retorno das embalagens de agrotóxicos alcançado.

O terceiro porque desde o início de sua operacionalização apresentou consistência, constância e continuidade em seu modelo de gestão, desenhando um sistema com responsabilidades definidas para todos os envolvidos, com procedimentos padronizados e com foco em resultados. O Entrevistado [E20] destacou que não houve mudanças

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expressivas na prática da LR de Embalagens de Agrotóxicos mas que sempre estão avaliando as práticas de forma coletiva nas reuniões com a Central Regional de Operações e realizando os ajustes necessários, aperfeiçoando a prática, configurando uma evolução gradativa da mes-ma por meio de inovações contínuas. Além disso, essa experiência revela a existência da memória prática mantida de forma interacional ao longo do tempo, ainda que se registrem nela alterações. De maneira que se percebe ao longo destes quase 15 anos uma estabilidade, persistência, solidificação e evolução do feixe de prática de logística reversa de emba-lagens de agrotóxicos.

O próximo feixe a ser descrito e analisado na seção subsequen-te é o da Logística Reversa de Pneus.

5.4 FEIXE DE PRÁTICA DE LOGÍSTICA REVERSA DE PNEUS

A prática da logística reversa de pneus inservíveis no Brasil já é uma realidade há 17 anos, com aperfeiçoamento da legislação que rege a matéria assim como os procedimentos adotados pelos responsáveis pela coleta e destinação final dos pneus. A Figura 29 pontua as principais datas históricas desta prática.

FIGURA 29 – MARCO HISTÓRICO DA PRÁTICA DA LOGÍSTICA REVERSA DE PNEUS

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados secundários, 2016.

O sistema de logística reversa de Pneus foi regulamentado pela Resolução Conama 416/2009, que dispõe sobre a prevenção e a degradação ambiental causada por pneus inservíveis e sua destinação

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ambientalmente adequada, portanto, anterior a Política Nacional de Resíduos Sólidos, em 2010.

Uma década antes, em 1999, o Conama lançou a Resolução 258 que determinava a obrigação de fabricantes e importadores de pneumá-ticos de realizar a coleta e a destinação final ambientalmente adequada aos pneus inservíveis (CONAMA, 1999). O setor produtivo foi se orga-nizando até que o Programa Nacional de Coleta e Destinação de Pneus Inservíveis fosse implantado nesse mesmo ano, em 1999, pela Associação Nacional da Indústria de Pneumático (Anip), entidade representativa dos fabricantes de pneus novos no Brasil (RECICLANIP, 2016).

Em 2002, houve nova alteração da matéria realizada pelo com a entrada em vigor da Resolução do Conama 301/2002, que modificou alguns dispositivos da Resolução 258/1999.

As ações do Programa Nacional de Coleta e Destinação de Pneus Inservíveis foram se expandindo pelo território nacional até que em 2007 a Anip decidiu criar uma entidade voltada exclusivamente para coleta e des-tinação de pneus no Brasil, denominada de Reciclanip (RECICLANIP, 2016).

Em 2009, tanto a Resolução do Conama 258/1999 quanto a 301/2002 foram revogadas pela Resolução Conama 416/2009. Na Instrução Normativa (IN) 01/2010 do Conama o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) recebe a atribuição de gerir os procedimentos necessários ao cumprimento da Resolução Conama 416/2009, a ser res-peitado pelos fabricantes e importadores de pneus novos sobre a coleta e destinação final de pneus inservíveis.

Em 2010 entrou em vigor a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), estabelecendo em seu Art. 33 a obrigatoriedade de estruturar e implantar sistemas de logística reversa, independente do serviço público de limpeza urbana, para os fabricantes e comerciantes de pneus.

No Paraná, o Termo de Compromisso para responsabilidade de pós-consumo de pneus inservíveis foi assinado em 10 de dezembro de 2012 pela Reciclanip e Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sema), Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e o Instituto das Águas do Paraná (Aguasparaná) com o objetivo de forma-lizar e manter o Sistema de Responsabilidade Pós-consumo em funcio-

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namento, de maneira integrada e coordenada com o funcionamento e princípios do sistema nacional.

Portanto, o Sistema de Logística Reversa de Pneus está em funcionamento desde 1999, passando por adequações legais e procedi-mentais até chegar a PNRS e ao decreto que a regulamenta.

Atualmente, o sistema da Reciclanip se compara ao do inPEV (embalagens de agrotóxicos) e ao de latas de alumínio (RECICLANIP, 2016).

Para entender melhor a logística reversa de pneus é preciso des-tacar alguns aspectos legais importantes. Primeiramente, a IN 01/2010 do IBAMA define quais são os tipos de pneus que são obrigados à coleta e dado destinação adequada. Segundo o Art. 3° da Resolução Conama 416 ordena que a cada pneu fabricado ou importado destinado para comercialização no mercado de reposição31 deve ser dado destinação adequada a 1 (um) pneu inservível. Terceiro, a IN do Ibama, em seus Art. 4° e 5°, definem metas para fabricantes e importadores, exigindo a inserção de informações no ‘Relatório de Comprovação de Destinação de Pneus Inservíveis’ disponível no Cadastro Técnico Federal (CTF). Quarto, as empresas destinadoras deverão ser cadastradas no CTF, es-tarem devidamente licenciada por órgão ambiental e também declarar a destinação dos pneus inservíveis no mesmo sistema do Ibama. Diante desse contexto legal e procedimental podemos considerar, portanto, que o sistema de controle elaborado e aplicado pelo Ibama não deixa mar-gem para descuidos.

É um princípio da logística reversa que os fabricantes e im-portadores se responsabilizam por realizar a coleta e dar destinação adequada ao resíduo, neste caso, o pneu inservível, assim como cabe ao consumidor, ao revendedor, ao distribuidor, aos destinadores e ao poder público contribuir para implantar os procedimentos estabelecidos para o sistema.

A cadeia de ação da prática da logística reversa de pneus é de-monstrada na Figura 30.

31 Mercado de reposição é o resultante do total fabricado/importado, excluídos os pneus desti-nados aos carros novos e à importação.

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FIGURA 30 – PRÁTICA DE LOGÍSTICA REVERSA DE PNEUS INSERVÍVEIS EM CASCAVEL

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

O modelo de gestão adotado pela Reciclanip é organizar e ge-renciar uma rede de logística reversa arcando com todos os custos de coleta e destinação dos pneus inservíveis, como transporte, trituração e destinação. Até 2016, foram mais de R$ 898,8 milhões em investi-mentos para o funcionamento dessa cadeia de logística reversa e mais de mais de 4,1 milhões de toneladas de pneus recolhidos. A Reciclanip tinha, ao final de 2015, 1008 pontos de coleta de pneus espalhados por todo território nacional. No Paraná são 90 pontos e em Cascavel ape-nas 1 ponto (RECICLANIP, 2016). Vale ressaltar que os pontos de coleta da Reciclanip são oficializados por meio de Convênios com a Entidade. No site da Reciclanip há um formulário para ser preenchido pelas Prefeituras que queiram firmar convênio com a Entidade.

Em Cascavel, com a entrada em vigor da Resolução do Conama 416 em 2009, o Ministério Público embargou o local onde a Prefeitura de Cascavel depositava os pneumáticos inservíveis. Percebendo a opor-tunidade de atuar nessa área, logo a empresa Pietta contatou a Reciclanip com o objetivo de estabelecer parceria com a entidade. Essa nova ativi-dade exigiu algumas licenças ambientais e logo a Pietta se tornou um Ecoponto, ou seja, ponto de coleta de pneus assim como parceiro no transporte de pneus até a destinação adequada.

A Pietta foi fundada em 2001 e a partir de 2009 tem como uma de suas atividades principais a logística reversa de resíduos pneu-máticos. Essa mudança de atividade recebeu a influência da Resolução 416/2009 do Conama.

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Os materiais que recebe são os pneus de caminhões, de carros, e motos, câmeras de ar, pneus de carriola, resíduos de processo de recapea-mento de pneus e outros resíduos derivados de borracha. Alguns materiais são comprados pela empresa, outros são entregues como inservíveis. A origem desses materiais abrange Medianeira, municípios da regional de Cascavel, e do sudoeste do Paraná, como Francisco Beltrão [E05].

“Nessas cidades, a Prefeitura faz uma ação de recolhimen-to de pneus em parcerias com borracharias, empresas comercian-tes, enfim, providenciam o transporte para entregar no Eco Ponto de Cascavel. Muitas vezes os custos são compartilhados ou subsidiados por Prefeituras”, comenta o administrador e proprietário [E05]. De maneira geral, a Reciclanip orienta aos conveniados a solicitarem “a retirada do material quando atinge a quantidade de 2.000 pneus de passeio ou 300 pneus de caminhões” (RECICLANIP, 2016).

Os materiais recicláveis provenientes de pneus de carros de pas-seio passam pelo processo de trituração, separação, armazenamento tem-porário e comercialização. Exceto os pneus de caminhões, que são enca-minhados para o destino final da mesma forma que foram recebidos.

Os pneus de caminhões são todos direcionados a incineração em cimenteiras, na Votorantim, em Rio Branco no estado do Paraná. O controle da quantidade é registrado em planilhas e sua mensuração é feito em quilogramas. A média mensal da Pietta é de 7 a 8 cargas de caminhão, sendo cada carga de 10 toneladas [E05]. A Reciclanip paga as cimenteiras para usarem os pneus como combustível alternativo em seus fornos, tendo sido necessário fazer adequações sob a aquiescência do Ibama (RECICLANIP, 2016).

A Secretaria de Meio Ambiente de Cascavel é notificada a cada operação de transporte de pneus inteiros inservíveis, porque tam-bém ela realiza controle.

A Reciclanip considera que os pneus sejam um passivo ambien-tal, então não remunera por quilo ou peça, mas ajuda financeiramente nas despesas com a atividade da logística reversa que seus representantes de Eco Ponto têm, inclusive com funcionários. O Administrador [05] diz que para essa prática da logística reversa de pneus, a empresa não au-fere lucros; ele mantém a atividade porque os fornecedores desses pneus precisam dar destinação correta e também são fornecedores de outros

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produtos que interessam a ele, e se ele não fizer isso, não há quem faça. Outro motivo porque mantém essa prática é para ajudar a cuidar do meio ambiente, é uma ação social.

A atividade de transporte de pneus não é tão simples como se pode imaginar. Quando há material para fechar um carregamento, a Pietta informa à Reciclanip via e-mail, emite um documento informati-vo, um ofício de transporte da carga, providencia cópia para a Secretaria do Meio Ambiente e para a Reciclanip, em São Paulo. Neste ofício deve constar a assinatura da empresa (e do motorista do veículo dependendo do caso), do secretário da Sema Cascavel e da Reciclanip, sendo que as duas últimas assinaturas são recolhidas a posteriori. Uma via vai com o condutor do veículo para conhecimento da Polícia Rodoviária Federal e outra para entrega na empresa de destino do material. Esta prática é es-tabelecida pela Reciclanip e é padronizada em todo território nacional, com pequenas alterações, como acontece em Foz do Iguaçu onde há um coordenador que acompanha o carregamento do caminhão com pneus inservíveis, comenta o Entrevistado [E05].

Os demais materiais recicláveis são triturados, separados em aço, borracha e nylon. Os produtos gerados pelo processo produtivo são granulados de borracha, de nylon e pedaços de metal, entre outros. O aço é vendido para o ferro-velho; o nylon volta para ciclo produtivo de materiais como sola de sapato e tapete automotivo; a borracha também volta para o ciclo produtivo de calçados para fazer sola, tapete automo-tivo, pistas esportivas, quadras poliesportivas e asfalto.

A Pietta comercializa os granulados de borracha para aplicação em campo esportivo com empresas instaladas em Maringá, Londrina, Guarapuava, e asfalto para a Greca Asfalto, em Curitiba. Para São Paulo, Goiás, Santa Catarina, Rio Grande do Sul os granulados de borracha e nylon são comercializados como matéria prima para diversas cadeias pro-dutivas. O Administrador [E05] externou a preocupação em conhecer seus compradores, saber que tipo de material vai ser produzido, se é idô-neo, enfim, garantir de alguma forma que seu material seja bem aplicado. Entretanto, o relacionamento que mantém com fornecedores e comprado-res é o comercial, contatos realizados por e-mail e, no máximo, por telefone.

As principais mudanças ocorridas nas práticas, desde 2010, se referem à melhora do produto e do processo, como adequação de produto

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no quesito granulometria de acordo com as demandas de compradores, como medição precisa do material com aquisição de balança de precisão, adequação dos materiais para embalagem dos produtos e maior controle no carregamento de caminhões, respeitando a capacidade de carga, entre outros. Algumas dessas medidas estão relacionadas com a prática de lo-gística reversa.

Os resíduos contaminantes especialmente aqueles contendo gra-xa, óleo, como estopas e materiais de manutenção são descartados em aterro industrial da Paraná Ambiental.

Em visita a uma Borracharia de pequeno porte, o Entrevistado [E46] destacou que os pneus de carro e de moto assim como as câmeras de ar são recolhidos mensalmente pela Pietta, embora esta não dê com-provante de destinação correta. Outros materiais recicláveis são segre-gados nas bolsas de recicláveis e são colocados todo sábado pela manhã na calçada para recolhimento do caminhão do Programa Coleta Legal.

Em outra empresa visitada que presta serviços automotivos, a B&C Auto Center, o proprietário [E47] comentou sobre a geração e a prática da destinação dos resíduos sólidos produzidos na atividade.

O principal resíduo gerado é o de pneus automotivos médios em razão da venda de pneus novos. Os resíduos de pneumáticos são levados para a Pietta, que é a empresa autorizada para fazer a destinação correta. Quando o volume é muito grande eles ligam e a Pietta passa para recolher. A empresa paga uma taxa mensal (em torno de R$ 50,00) para dar a destinação correta, independente da quantidade de pneus.

Resíduos como filtros de óleo e estopas são armazenados tem-porariamente em tonel de plástico fornecido pela Paraná Ambiental, e quando está cheio, a B&C liga para vir recolher. Este serviço tem custo para a empresa.

Os resíduos de óleo lubrificante inservível são também arma-zenados em tonéis fornecidos pela Indústria Petroquímica do Sul (IPS) e seu recolhimento é o mesmo da Paraná Ambiental, exceto que é um serviço gratuito, e ainda pagam alguns centavos por litro.

As embalagens de lubrificante de qualquer tipo são recolhidas gratuitamente pelo Programa Jogue Limpo, que deixam 2 (dois) tonéis para armazenamento temporário e passam para recolher. Caso o tonel

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encha antes de passarem, a B&C liga para recolherem.“As baterias automotivas usadas são entregues para a

Distribuidora Ω no momento da compra de novas baterias ou dentro do prazo especificado pela Distribuidora, porque eles controlam a quan-tidade vendida e a quantidade devolvida de bateria usada”32 explica o Entrevistado [E47].

As lâmpadas inservíveis, provenientes da iluminação da em-presa, são entregues no local da compra. Ultimamente tem comprado na empresa Dínamo sem que haja algum problema nessa prática. Resíduos como papelão, papel e caixas são guardados e entregues para carrinhei-ros, ou, catadores autônomos que passam recolhendo esses resíduos.

Já os resíduos de metais são vendidos por quilo para ferro-velho de Cascavel. Quanto há uma quantia de resíduos considerável, a B&C liga para o ferro-velho vir coletar esse material. Os recursos financeiros vão para o caixinha dos funcionários (fica a critério dos funcionários como gastar esses recursos).

“Desde a implantação da gestão de resíduos, todos os funcio-nários se adequaram sem problemas porque a B&C é uma empresa su-per limpa, tudo tem o seu lugar [...] terminou de trabalhar no carro, os equipamentos, as ferramentas e os materiais têm seu lugar para ser guardado”, salienta o Entrevistado [E47].

A Teoria da Prática Social oferece várias possibilidades de olhar como a prática acontece, vendo-a como cadeia de ação, relações entre práticas e arranjos dentro de feixes, como feixes de práticas se ligam entre si, como se caracteriza a dinâmica de feixes em constelações e até mesmo como se configura a governança dessa prática, de modo que essas possibilidades são abarcadas na análise a seguir sobre a prática narrada acima.

As relações entre atores, os pontos nodais de práticas entrela-çadas no Feixe de Prática de Governança da Logística Reversa de Pneus são representados na Figura 31.

32 Embora o Entrevistado da Distribuidora Ω tenha dito que não faz esse tipo de controle, os Entrevistados [E47 e E11] falaram espontaneamente que há esse procedimento. O Entrevistado [E48] não fez comentário sobre esse aspecto.

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As características presentes na cadeia de ação de Logística Reversa de Pneus são a bifurcação, a governança, o monitoramento, os dispositivos de controle e as infraestruturas materiais.

A bifurcação está presente nessa cadeia porque compartilha a destinação do resíduo sólido com outras cadeias que formam o conjunto de segmento de negócios nos quais subprodutos do pneu inservível são inseridos em processos produtivos como matéria prima para outros pro-dutos. Este aspecto será abordado mais amplamente adiante.

A governança é em si mesma um tipo de cadeia que está intrinse-camente entrelaçada com a prática (SCHATZKI, 2015a), e evidentemen-te está presente na de logística reversa de pneus. A governança estabelece o modelo de gestão e configura a cadeia de ação ao planejar e coordenar sua execução, compreendendo questões referentes a estruturação da cadeia de coleta, que envolve revendedores, reformadores, prefeituras municipais, empresa, enfim, todos aqueles que são também responsáveis pela destina-ção adequada dos pneus, além de construir e manter relacionamento com empresas recicladoras, desenvolver ações de conscientização voltadas para o público em geral e apoiar a pesquisa e o desenvolvimento de novos pro-dutos e aplicações que os resíduos gerados pelos pneus inservíveis podem proporcionar.

Procedimentos ligados ao monitoramento da cadeia de ação que puderam ser observados foram: (i) o documento oficial emitido à SEMA de Cascavel e à Reciclanip pela Pietta (Ponto de Coleta) comu-nicando o transporte do pneu inservível, com dados a remessa (tipo de pneu, peso, unidades), do veículo e do local de destino; (ii) no site da Reciclanip na página inicial há a exposição sincronizada em números cumulativos do volume de pneus destinados (kg).

Os dispositivos de coordenação utilizados ao longo da ca-deia, de acordo com os entrevistados são, principalmente, o telefone e o e-mail.

A infraestrutura material refere-se aos materiais que susten-tam cadeias e conexões (SCHATZKI, 2016). Foram identificados nessa cadeia logística como infraestruturas materiais os locais de armazena-mento temporário dos pneus até que haja a coleta e destinação final e

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os fornos das cimenteiras. Geralmente os pneus permanecem armaze-nados em organizações do segundo elo da cadeia (empresas/prefeitu-ras) e pontos de coleta. A exigência é que o local atenda a normas de higiene e segurança, e que seja coberto de modo que os pneus fiquem abrigados. Já os fornos são estruturas utilizadas no coprocessamento da indústria cimenteira, parceira na cadeia da logística reversa de pneus (RECICLANIP; [E05]).

As relações que se estabelecem entre feixes de práticas e de materialidade e que também conectam feixes a constelações na logística reversa de pneus que são mais significativas são relações de constituição e de prefiguração. De constituição porque em seu iní-cio a prática da logística reversa com destinação final adequada tinha que ser operacionalizada e precisaria de determinadas configurações materiais e humanas para que pudesse ser levada a efeito. Logo, foi por causa da prática que os arranjos materiais foram fomentados, como sistemas de informação, documentos oficiais da prática, formas de comunicação, tipo e roteiro de transporte.

Uma das possibilidades de entendimento da prefiguração como conceito se refere ao modo como as infraestruturas materiais existentes prefiguram alterações em práticas e arranjos materiais e como essas mu-danças são qualificadas (SCHATZKI, 2011). O fato é que desde 2005 a atividade de destinação final de pneus da prática de logística reversa apresentou mais uma alternativa: a de incineração em fornos da indús-tria cimenteira, cuja participação nesta logística evidenciou crescimento sucessivo até 2013. Em 2014, 24% dos resíduos coprocessados pela in-dústria cimenteira eram de pneus (ABCP, 2015). Portanto, uma infra-estrutura já existente mudou parcialmente a forma como a prática era executada, por acrescentar mais uma opção de destinação final adequada do resíduo.

Há outras relações que conectam práticas a outras práticas e arranjos a outros arranjos. (SCHATZKI, 2015b, 2011). No feixe de prá-tica da logística reversa de pneus as relações que mais se destacam são o poder comum e o espaço de atividade. O poder comum é encontrado quando as práticas-arranjos contêm os mesmos elementos, como regras, tarefas, finalidades, entendimentos e emoções, como quando o consu-

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midor entrega o pneu para ser destinado adequadamente, quando todos os participantes de segundo elo encaminham os pneus para o Ponto de Coleta, também denominado de Eco ponto.

Na constelação local de Cascavel há destinação adequada pre-vista para muitos tipos de resíduos, principalmente para aqueles que po-dem prejudicar a saúde humana e ao meio ambiente. São vários tipos de organizações, aquelas de segundo elo, que tem pneus e outros resíduos como baterias automotivas, estopa contaminada com óleo, óleo lubri-ficante, embalagens de óleo lubrificante, peças automotivas, lâmpadas, entre outros. Cada tipo desses resíduos integra um feixe de prática de logística reversa e/ou de destinação adequada. Nesses locais esses feixes se encontram, compartilham pessoas que realizam a guarda temporária desses resíduos, os locais de armazenagem temporária, enfim, os mes-mos pontos de coleta. Por isso, podemos dizer que esses feixes de práti-cas compartilham os mesmos espaços de atividade.

Os conceitos que expressam a dinâmica dos Feixes de Governança da Prática de Logística Reversa de Pneus Inservíveis na constelação local de resíduos sólidos em Cascavel são (i) o entrelaça-mento, (ii) a acumulação, associação e agregação, (iii) a difusão, circula-ção e propagação, (iv) a estabilidade e (v) a bifurcação.

A dinâmica do feixe de governança da prática LR de Pneus é semelhante ao do Agrotóxico, exceto que aqui na constelação local de resíduos sólidos nota-se mais o entrelaçamento de outros feixes de go-vernança de resíduos sólidos, como baterias automotivas, óleos lubrifi-cantes e suas embalagens, lâmpadas, entre outros, com aquele relaciona-do ao segundo elo, o da empresa que recebe o pneu do consumidor final.

A acumulação, associação e agregação são observadas es-pecialmente na forma colaborativa que se estabelece entre o Ponto de Coleta (seja Prefeitura ou empresa conveniada) com as empresas que armazenam temporariamente o pneu, consideradas como o segundo elo da cadeia.

Em Cascavel, a ligação entre a Pietta e essas empresas parece natural porque os entrevistados [E46 e E47] comentaram que têm o hábito de ligar para a Pietta solicitando para recolher os pneus caso haja

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um volume maior do que o habitual sem a necessidade de esperar pela coleta regular realizada pela Pietta.

Já a associação entre a Reciclanip e os Pontos de Coleta é esta-belecida por parcerias formalizadas por convênio entre as partes e essa relação com a Pietta é duradoura (2009-2016) visto que estão associadas desde o início dessa prática em Cascavel.

O estabelecimento de vínculo entre a Reciclanip e as empresas transportadoras é baseado no cumprimento de alguns requisitos soli-citados pela entidade e na exigência de licenciamento ambiental para a atividade de transporte desse resíduo. A Pietta também tem esse li-cenciamento visto que atua como transportadora desses resíduos até o destino final.

O fato de o feixe de governança da LR de Pneus estar es-palhado por todo território nacional com seus 1008 pontos de coleta e aberto para formação de parcerias com Prefeituras e empresas do setor de pneumáticos (comércio, oficinas e serviços automotivos) si-naliza a disseminação dessa prática para além da constelação local de Cascavel. Além disso, nas entrevistas o nome da Pietta apareceu de forma espontânea indicando que ela é reconhecida como a repre-sentante das indústrias e importadoras responsáveis pela destinação correta de pneumáticos.

O modelo de governança da logística reversa da Reciclanip é resultado de pesquisas e observações de modelos de governança adota-dos por países europeus mesclado com o Programa Nacional de Coleta e Destinação de Pneus Inservíveis fundado pela Associação Nacional da Indústria de Pneumático (Anip) em 1999 e que a Reciclanip deu conti-nuidade (RECICLANIP, 2016).

A Reciclanip mantém parceria com a Pietta desde 2009. Considerando que houve poucas alterações na prática estabelecida pela Reciclanip, de acordo com o Entrevistado [E05] e que as mudanças ocorridas se referem a iniciativas tomadas no âmbito de governança da Pietta visando melhoria de suas práticas, podemos dizer que esse feixe de prática de logística reversa evidencia estabilidade e solidificação.

O pneu inservível enquanto resíduo é muito versátil, pode ser utilizado em várias aplicações, como fabricação de solados de sapatos,

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borrachas de vedação, dutos pluviais, quadras poliesportivas, tapetes de automóveis, com componentes de manta asfáltica e asfalto borra-cha, e como combustível para as indústrias de cimento, entre outras (ENTREVISTADO [E05]; RECICLANIP, 2016).

A prática adotada pela Reciclanip após a coleta do pneu inser-vível de caminhões é encaminhá-los para a incineração, e outros tipos de pneus para a trituração, e dali para outras empresas que absorverão o material transformado em matéria prima no seu ciclo produtivo.

A Pietta é uma empresa recicladora e também é um Ponto de Coleta e transportadora da Reciclanip. Ela transporta os pneus de cami-nhões até a destinação de incineração. Contudo, para os demais tipos de pneus ela aplica seu processo de reciclagem, de separação de materiais, de corte específico ou de granulometria específica conforme as solicitações dos clientes que reinserem esses materiais em seu ciclo produtivo. Nesse sentido detectamos a existência de segmento de negócios para esses resí-duos e constatamos a bifurcação da prática de LR de pneus inservíveis na constelação local de Cascavel, considerando-se que o caminho da logís-tica reversa não segue necessariamente a destinação final indicada e res-ponsabilizada pela Reciclanip, mas que não deixa de ser uma destinação adequada.

A governança dessa prática acontece em Cascavel, há uma densidade expressiva de atividades da própria prática, de entidades lo-cais (de segundo elo) e de relações com outros feixes de outras práticas de logística reversa de resíduos sólidos que se entrelaçam. A continuida-de da prática é garantida pela lei e pela declaração da Reciclanip como sendo uma entidade sem limite de duração (RECILANIP, 2016).

A forma de atuação dos outros atores com a Governança da Prática da logística reversa de pneus coordenada pela Reciclanip são as mais diversas. A atuação do Poder Público é mandatória, com relação ao consumidor final (primeiro elo da cadeia) e com relação às organizações de segundo elo da cadeia a atuação é participativa e colaborativa. No que se refere aos Pontos de Coleta, às empresas de transportes e às empresas recicladoras, transformadoras e de destinação final a relação é negociada e firmada por acordos.

A governança local dessa prática é desenvolvida pela Pietta e cumpre o duplo papel de Ponto de Coleta e agente reciclador indepen-

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dente do sistema de logística reversa da Reciclanip. É uma governança monitorada à distância pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Cascavel (Sema), e ocupa seu lugar na constelação local de resíduos sólidos de Cascavel, entretanto, não se restringe à localidade pois sua extensão espacial tem alcance nacional, tanto no que se refere como par-ticipante da cadeia de ação da Reciclanip quanto como participante da cadeia de reciclagem de pneus.

O contexto da prática, de acordo com o Entrevistado [E05], tem sido afetado pela crise econômica e financeira que o Brasil tem passado nos últimos anos, principalmente em relação ao mercado de borracha triturado cujo destino é industrial, provocando modificações na prática de governança e nas atividades constitutivas da prática e, nes-se sentido, procura alinhar as demandas de clientes aos processos orga-nizacionais, mudanças essas que podem ser denominadas de inovações incrementais.

A Prática da Logística Reversa de Baterias Automotiva é o assunto da próxima seção.

5.5 FEIXE DE PRÁTICA DE LOGÍSTICA REVERSA DE BATERIAS AUTOMOTIVAS

A Logística Reversa (LR) de Baterias Automotivas e Estacionárias33 foi implantada em 2008, e segue as instruções do Conama 401/2008 e demais instruções relativas à matéria. Portanto, anterior à pro-mulgação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, em 2010.

Não há acordo setorial em nível federal. O governo do Estado de São Paulo firmou Termo de Compromisso para a Logística Reversa de Baterias Automotivas de chumbo ácido em 20 de dezem-bro de 2012, sendo signatárias a Abinee e três indústrias de bate-rias automotivas (FECOMÉRCIO/SP, [s.d]). A Secretaria de Meio

33 Bateria Estacionária tem componentes semelhantes às Baterias Automotivas. T em como aplicação sistemas UPS (no break), centrais telefônicas, alarmes, sistemas de som, energia solar e eólica, iluminação de emergência, entre outros. A pesquisa de campo não identificou esse tipo de bateria (que é abarcada pela norma), porém ela foi identificada por meio de fontes secundárias em pesquisa na rede mundial de computadores.

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Ambiente e Recursos Hídricos do Paraná (Sema) não tem Termo de Compromisso assinado relativo à Logística Reversa de Baterias Automotivas (Sema, 2016).

A regra que rege a organização dessa prática é a Resolução 401/2008 do Conama, como indicado acima e é preciso conhecê-la em seus pontos principais para que possamos entendê-la.

Como princípio de todo sistema de logística reversa no Brasil, a responsabilidade compartilhada também aparece nessa prática. Os fabri-cantes e importadores são os responsáveis pela destinação final e devem adotar procedimentos de reutilização, reciclagem, tratamento e disposição final ambientalmente adequada, sendo necessário que (i) se cadastrem no sistema Cadastro Técnico Federal (CTF), realizando desta forma presta-ções de contas anualmente ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) das quantidades produzidas, ven-didas e que forem destinadas; e (ii) cada fabricante ou importador deve elaborar um plano de gerenciamento de baterias, que é um pré-requisito para concessão de licenças de funcionamento do Ibama.

O feixe de prática da logística reversa de baterias tem como regra geral a seguinte cadeia de ação: os usuários devem entregar as baterias (que contenham em suas composições chumbo, cádmio, mer-cúrios e seus compostos) aos estabelecimentos que as comercializem ou à rede de assistência técnica autorizada; os comerciantes de baterias au-tomotivas ou rede de assistência técnica (autorizada pelos fabricantes e importadores desses produtos) são obrigados a aceitar dos clientes a devolução das unidades usadas, que possuam características que sejam similares às comercializadas no início de suas vidas úteis assim como repassar as baterias usadas aos fabricantes ou importadores.

O transporte de baterias de chumbo ácido (novas ou usa-das) deve estar de acordo com a Resolução da Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) 420/2004, que trata do transporte rodo-viário de produtos perigosos. Comerciante e rede de assistência técnica autorizada podem ter incentivos do poder público e de fabricantes para realizar promoção de campanhas ambientais educativas com a finalida-de de coletar baterias usadas.

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Na constelação local de Cascavel aparece um ator importante que faz as conexões entre empresas prestadoras de serviços automotivos e de comércio de baterias com a indústria: a empresa distribuidora de baterias, como retrata a Figura 32.

FIGURA 32 – DIAGRAMA DO FEIXE DE PRÁTICA DA LR DE BATERIAS AUTOMOTIVAS E ESTACIONÁRIAS

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

A (1) Indústria produz baterias automotivas, vende-as para os centros distribuidores no regime à base de troca (baterias usadas), provi-dencia (2) o transporte para entrega e utiliza-o para devolução à indús-tria as baterias usadas (sucatas). Os (3) Centros Distribuidores vendem as baterias no regime à base de troca para empresas comercializadoras do produto; providencia (4) armazenamento temporário de baterias usadas a serem devolvidas para a indústria em uma próxima compra. As (5) Empresas Comercializadoras de baterias automotivas vende-as (6)

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ao consumidor no (7) regime à base de troca; caso o consumidor não tenha (ou não queira) bateria para trocar, é cobrado um valor a mais re-ferente ao custo da sucata para reposição do vendedor, elas também pro-videnciam (4) armazenamento temporário para baterias usadas a serem devolvidas aos centros distribuidores em uma próxima compra à base de troca. E é a indústria que providencia (8) a reciclagem do produto, realizando-a de forma direta ou indireta, parcialmente ou não.

A governança principal, identificada pela pesquisa, no feixe dessa prática na Constelação Local de Resíduos Sólidos de Cascavel é exercida pela Distribuidora Ω34 [E34]. Embora este seja um segmento competitivo em Cascavel, os entrevistados [E11, E47, E48] atuantes no setor indicaram a mesma empresa distribuidora citada, que é uma referência em bateria automotiva e uma empresa tradicional na cidade.

O Entrevistado [E34] da Distribuidora Ω relatou em quais condições funciona a prática de logística reversa das baterias, apresen-tadas a seguir:

I. a relação entre indústria e seus clientes é direta, não há a figura de entidade intermediadora no papel de governança, a exemplo de outros sistemas de logística reversa no Brasil;

II. a relação de compras entre indústrias e distribuidoras e entre comércio e consumidor é a base de troca, adotando como padrão de referência a mensuração por quilo; atualmente, há um desconto de R$ 41,00 no preço de compra da bateria à base de troca ao consumidor. Este, se não tiver bateria usada para devolver, paga a diferença e a empresa procura comprar sucata de bateria a fim de equilibrar a contagem de peso das baterias;

III. as indústrias só vendem baterias mediante entrega do mes-mo peso em baterias usadas (sucata). Alguma flexibilidade pode ser encontrada nessa regra, mas é uma decisão da in-dústria visto que tem que prestar contas relativas às suas metas ao IBAMA. No caso da Distribuidora Ω, ela utiliza

34 Codinome.

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um software para registro e controle de venda de baterias novas e entrega de baterias usadas feitas por compradores (os mais relevantes). O parâmetro utilizado é a quantidade vendida e recebida em quilo;

IV. não existe prazo para devolução de baterias usadas. As in-dústrias liberam compra mediante entrega do mesmo peso de compra em sucata. Algumas indústrias exigem a entrega antecipada. A distribuidora Ω mensalmente devolve aproxi-madamente 10 ton. de sucata (são em média de 4 ou 5 cargas a.m.);

V. o custo logístico do fluxo reverso é da indústria. Geralmente usam o mesmo canal de distribuição (logo após a descarga de produtos novos é carregada a carga de sucatas de bate-rias);

VI. há flexibilidade para negociação entre pagamento direto do frete pela indústria ou desconto na compra de produtos quando o pagamento do frete for do comprador.

A implantação da prática da Logística Reversa de Baterias Automotivas não gerou alteração no preço do produto, contudo gerou in-segurança para veículos devido ao aumento de roubo de baterias automo-tivas, principalmente de caminhões, segundo informação do Entrevistado [E34].

Distribuidores e consumidores aumentaram a procura por baterias usadas vendidas sem notas, começaram a visitar autoelétricas, concessionárias, autopeças, enfim, estabelecimentos que operam com baterias automotivas. Com isso, houve a retirada dessa sucata do meio ambiente pela precificação no início dessa prática, assim como a dimi-nuição do passivo ambiental que representava essas baterias dispostas inadequadamente no ambiente e nos estabelecimentos do setor auto-motivo ([E34]).

Os impactos financeiros foram expressivos para a empresa por-que foi investido capital de giro para compra de sucata de baterias e na construção de estrutura física específica para armazenamento temporá-rio de sucatas de baterias.

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Em relação ao mercado de trabalho, o Entrevistado [E34] ob-servou o aumento de profissionais autônomos que lidam com recolhi-mento de baterias usadas e as vendem para comerciantes e distribuidores de baterias.

Uma das empresas atuantes nesse segmento é a Auto Elétrica Toni, seu Administrador [E11] apontou como resíduos produzidos na atividade as baterias, os recicláveis (plástico, papel, metal), as estopas e lâmpadas automotivas.

O relato do Entrevistado sobre a prática da LR da bateria auto-motiva segue ao que já foi exposto acima. O Entrevisto [E11] destacou três pontos: (i) as sucatas de bateria ficam em local sinalizado na oficina, apoiadas sobre um estrado de madeira até que sejam devolvidas (esto-que de 15 a 20 unidades), esse transporte é realizado pela Distribuidora Ω; (ii) a Distribuidora Ω mantém um controle de baterias vendidas e sucatas de baterias entregues, mensuradas em quilos e concede crédito em unidades de baterias, o que permite novas compras até o limite esti-pulado. “A Auto Elétrica têm o prazo de 1 ano para devolver o total da compra em sucata, enquanto não devolve tem um limite de crédito, pode ir comprando [...]”. Essa prática se reproduz na empresa B&C, cujo proprietário declarou que “as baterias automotivas usadas são entregues para a Distribuidora Ω no momento da compra de novas baterias ou dentro do prazo especificado pela Distribuidora, porque eles controlam a quantidade vendida e a quantidade devolvida de bateria usada35” , ex-plica o Entrevistado [E47]; e (iii) a existência de um mercado paralelo para compra e venda de sucata de baterias. “Para as empresas que traba-lham de maneira formal, não compensa esse mercado [paralelo], porque têm que devolver a sucata para repor com bateria nova” [E11].

Os recicláveis são destinados à Coleta Legal; as estopas vão para a coleta normal cujo destino é o Aterro Sanitário. Até agora a pre-feitura não está exigindo licença ambiental, mas quando isso acontecer deverá dar destinação adequada a cada tipo de resíduo.

35 Embora o Entrevistado da Distribuidora Ω tenha dito que não faz esse tipo de controle, os Entrevistados [E47 e E11] falaram espontaneamente que há esse procedimento. O Entrevista-do [E48] não fez comentário sobre esse aspecto.

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As lâmpadas são descartadas em embalagens separadas e cole-tadas pelo programa Coleta Legal. O Entrevistado [E11] afirmou que a Fiscalização do Meio Ambiente é ativa.

A Auto Elétrica Curitiba [E48], outra empresa pesquisada, tem que entregar a sucata de bateria no ato da compra de baterias novas na Distribuidora Ω para receber desconto na nota fiscal. Por essa razão não há estoque de sucatas de bateria na empresa. Esse sistema funciona há 4 (quatro) anos.

Um resíduo gerado em quantidade na empresa e que não tem destinação final definida é a lâmpada de lanterna de carro. O Acordo Setorial de Lâmpadas não inclui esse tipo de lâmpada. O proprietário [E48] entrou em contato com indústrias e não tem previsão para inclu-são desse tipo de lâmpada na prática de logística reversa vigente. Diante disso, a empresa mantém estoque de lâmpadas queimadas armazenadas em sacos de lona até que ache “uma empresa que certifique a destinação correta do resíduo e que seja economicamente viável porque uma em-presa de Curitiba queria R$ 1,00 por lâmpada para fazer a destinação correta, enquanto o preço de compra foi de R$ 0,50”, o que inviabiliza a destinação [E48].

Resíduos como estopas e peças de metal eram descartados no lixo comum (coleta porta a porta). Algumas peças metálicas passaram a ser armazenadas temporariamente assim como os fios elétricos, que são separados, ensacados e armazenados O proprietário pretende comercia-lizar esses resíduos.

Durante o relato da prática foi possível entender que não há uma explicação clara ao cliente informando sobre a prática de logística reversa das baterias automotiva e o porquê ele tem que deixar a bateria na autoelétrica. Somente falam que se ele levar a sucata haverá um valor a mais de R$ 80,00 a ser pago: “[...] com casco é um preço, sem casco é outro” [E48].

Nas atividades cotidianas de separação dos resíduos o Entrevistado [E48] afirmou que todos os funcionários contribuem para organizar e limpar o ambiente, o que inclui descartar corretamente os resíduos gerados nos recipientes respectivos.

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As relações entre atores, os pontos nodais de práticas entrelaça-das no Feixe de Prática de Governança da Logística Reversa de Baterias Automotivas são representados na Figura 33.

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O conceito que representa a relação que se estabelece entre prática e arranjos materiais possibilitando conexões entre feixes e cons-telação é a constituição, principalmente. Práticas constituem arranjos porque sem a primeira, a segunda não existiria como é o caso da in-fraestrutura material exigida pela regra para a guarda temporária das sucatas baterias (distribuidores e eventualmente comerciantes de grande volume) até que sejam removidas para entrega à indústria no momento da compra de baterias novas ou para a destinação final indicada pela indústria. Essa infraestrutura material deve ser um espaço adequado não só pela proteção contra intempéries ambientais, mas proteção contra possíveis vazamentos e contaminação do local. Na constelação local de Cascavel foi observado que essa infraestrutura teve que ser providen-ciada pelo elo distribuidora de bateria. Sem ela a cadeia de ação dessa prática não seria possível.

Outras relações que conectam práticas de LR Baterias Automotivas e Estacionária com práticas de logística reversa de dife-rentes resíduos sólidos (coleta legal, óleo e embalagem de lubrificantes, metais etc. ) são o espaço de atividade e a cadeia de ação. Espaço de atividade inclui arranjos físicos compartilhados (como a área de arma-zenamento temporário) e participantes que executam diferentes ativi-dades de cada prática.

É nesse local que as cadeias de ação se entrelaçam, se cruzam e se efetivam ações possibilitadoras dos fins pretendidos. Todas as cadeias de ação das diversas indústrias de baterias são monitoradas porque todas têm o compromisso legal com o atingimento de metas, mensuradas em quilos de sucata recolhida, fazendo uso de dispositivos de coordenação dessa cadeia como documentos organizacionais (ordem de compra, nota fiscal) e tecnologia da informação (computador, e-mails, telefones, sis-temas de informação, entre outros) e elementos materiais (caminhões).

A governança do feixe de práticas de logística reversa de Baterias Automotivas e Estacionárias é caracterizada pela estabilidade e persis-tência desses feixes provida principalmente pelas indústrias que mantém ao longo do tempo as práticas estabelecidas no seu ponto inicial.

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Outra característica é a atuação periférica, fenômeno que pode ser explicado pela diversidade de pontos de origem ou formação (polyplasis) dessa prática. Isto significa dizer que os feixes dessa prática atuam de forma autônoma desde a sua criação, posto que cada indústria de baterias organiza sua prática, tendo como referência a regra maior, que é a Resolução 401/2008 do Conama. É como se os feixes constitu-ídos pelas indústrias existissem de forma paralela, cada qual com suas características singulares e especificidades, ou seja, diferentes entre si, contudo compartilhando praticantes (usuários, comerciantes e distri-buidores) e atividades delineadas pela regra.

Comparando com outras práticas de logística reversa, esta apresenta um deslocamento da centralidade da governança para um modelo de governança periférica. Na Prática da Logística Reversa de Medicamentos Vencidos de Uso Doméstico este fenômeno foi observa-do na constelação local de resíduos sólidos de Cascavel e aqui o mesmo fênomeno é identificado com extensão espacial no âmbito nacional.

Na cadeia de ação é perceptível o entrelaçamento das ativi-dades dessa prática entre o consumidor, empresas comercializadoras e prestadoras de serviço até as distribuidoras de baterias. A partir desse ponto, percebe-se a separação da prática evidenciando sua individu-ação em função dos diferentes critérios estabelecidos pelas indústrias. Portanto, podemos dizer que sob a ótica da indústria a governança da prática da logística reversa é autônoma, atuando perifericamente; sob a ótica dos praticantes a prática é unificada até que o destino da sucata de bateria seja retornado à indústria, momento no qual há a disjunção (bi-furcação) da prática. Na constelação de Cascavel, a disjunção ocorre no elo distribuidor. Esses movimentos expressam a dinâmica que ocorrem em feixes e em seus componentes no plenário de práticas.

Castro, Barros e Veiga (2013) identificaram os principais fa-bricantes de baterias automotivas e estacionárias instaladas no Brasil. A partir dessa informação foi realizado um levantamento nos sites dessas empresas com o intuito de identificar informações a respeito da prática da logística reversa. Algumas empresas apresentam como funciona essa prática de forma mais consistente (Newpower, Júpiter), outras indicam

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que têm política de logística reversa (Route/Enerbrax, Moura, Johnson Controls, Cral, Tudor, Baterax, Kania, Ranger) agregando a forma de con-tato, a Eletran postou somente a Resolução do Conama, a Pioneiro dispo-nibilizou somente a forma de contato, e em alguns sites nada consta sobre este assunto (GNB, Inbracell). O site da Camarotto não foi localizado.

Diante da restrição de informações disponibilizadas para acesso do consumidor e dos demais elos do feixe de prática de LR de Baterias Automotivas e Estacionárias, fica uma questão sem resposta nesse mo-mento: como efetivamente as indústrias de baterias automotivas e esta-cionárias organizam, cada qual, suas práticas no que se refere a cadeia de ação, o que inclui a responsabilidade pela reciclagem, a organização do transporte (especializado) e a tarefa de contribuir com a promoção de campanhas ambientais educativas com a finalidade de coletar baterias usadas? Esta é uma pergunta que está além do escopo dessa pesquisa.

A governança da prática de LR de Baterias Automotivas e Estacionárias na constelação local de resíduos sólidos em Cascavel, de forma geral, é fenômeno social de constituição mandatória, organiza-ção autônoma, cuja atuação é periférica em meio a um contexto com-partilhado com outras governanças da mesma prática, o que confere singularidade a essa prática e enseja uma complexidade qualitativa a esse ambiente. Exibe condições de continuidade, sem alterações signi-ficativas em suas atividades, portanto, oferece previsibilidade na sua exe-cução. A análise local da prática indicou que alguns pontos apresentam nexos mais densos que outros, como o elo distribuidor. É uma prática que ocupa amplamente o espaço do segmento automotivo e o espaço geográfico na constelação local de resíduos sólidos em Cascavel, e por ser uma prática legalmente constituída, estende seu alcance em todo território nacional.

5.6 FEIXE DE PRÁTICA DE LOGÍSTICA REVERSA DE EMBALAGENS DE LUBRIFICANTES

De acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (SINIR, 2016b), a entidade responsável

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pela gestão do sistema de logística reversa das embalagens de lubrificantes é o Programa Jogue Limpo, criado em 2005 pelo Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes (Sindicom), e transformado em Instituto Jogue Limpo em 2014 ( JOGUE LIMPO, 2016a). É regido pelas Resoluções 362/2005 e 450/2012 do CONAMA e pela Lei 12.305/2010 (PNRS).

Tem a responsabilidade de cumprir o Acordo Setorial com o Ministério do Meio Ambiente firmado em 2012 e os 11 Termos de Compromissos assinados com Estados e DF, além de promover ações voltadas ao cumprimento da Lei 1.2305 da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Desde 2005 são mais de 507 milhões de embalagens destinadas a reciclagem ( JOGUE LIMPO, 2016b).

A descrição do funcionamento do Sistema está formalizada pelo Termo de Compromisso para Responsabilidade Pós-Consumo de Embalagens Plásticas Usadas de Lubrificantes, acordada entre as partes Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMA), Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e diversas entidades representati-vas do segmento no âmbito do estado do Paraná, firmado em dezembro de 2012 ( JOGUE LIMPO, 2016b).

Os postos de combustíveis iniciam a Prática da Logística Reversa de Embalagens de Óleos Lubrificantes. Nessa pesquisa dois postos de combustíveis foram visitados ([E12] e [E42]) e como suas práticas são semelhantes, o relato abordará aspectos comuns a ambos, quando houver diferenças, estas serão referenciadas.

O contexto dessa prática é regulado por leis e por normas das empresas distribuidoras as quais os postos estão vinculados contratual-mente. Segundo o Entrevistado [E42], sua distribuidora é reconhecida pelo selo de Posto Totalmente Sustentável, então há um zelo quanto aos cuidados ambientais da atividade. Essas normas, informa o Entrevistado [E42], atendem a todas as exigências legais.

Ambos os Postos têm que ter licença para operação assim como o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos, que deve ser revisto sempre que houver renovação de contrato com a distribuidora.

Os resíduos sólidos produzidos no posto de combustível e sua destinação são:

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• embalagens recicláveis (papel e plástico) são armazenadas e entregues aos coletores de materiais recicláveis;

• embalagens de lubrificantes ficam em armazenamento tem-porário adequado e participam do Programa Jogue Limpo; a coleta é feita a cada 15 ou 20 dias pela Central da Celus em Cascavel, que pesa as embalagens e emite comprovante para o Posto. Este serviço é gratuito.

• lodo da caixa de separação oriunda da drenagem da água da pista é recolhido pela Paraná Ambiental;

• filtros, estopas e materiais contaminados com óleo são ar-mazenados em tonéis/tambor de 200 litros e recolhidos pela Paraná Ambiental;

• filtros de ar são recolhidos, armazenados temporariamen-te e entregues aos catadores de materiais recicláveis (Posto [E42]);

• lâmpadas são levadas na Comercial Elétrica DZ, local de compra do material;

• vidros são devolvidos à vidraçaria.• resíduos da embalagem de lubrificante e óleo lubrificante

contaminado usado (Oluc):• no posto do Entrevistado [E42] vai para o escorredor (tam-

bor subterrâneo adequado para receber restos de óleo), e é vendido à IPS;

• no posto do Entrevistado [E12] o material é armazenado temporariamente em tambor de 200 litros; a geração do OLUC é de um a dois tambores por mês e esse resíduo é coletado por 2 empresas, de forma aleatória: (1) Filtroville Ambiental (SC) - o serviço certificado é gratuito e a empre-sa paga centavos por litro de óleo; (2) Lwart Lubrificantes (Cascavel), com serviço certificado.

No Posto do Entrevistado [E42] há revenda de pilhas, porém raramente as pessoas procuram o posto para entregar pilhas usadas. Quando isso acontece, as pilhas são recebidas e depois levadas ao Banco

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Sicredi que fica na esquina e que tem display para depósito desse mate-rial. Nesse posto os resíduos sólidos recicláveis são separados nas lixeiras adequadas para cada tipo de lixo e são dispostos em um lugar específico do posto para os catadores de materiais pegarem.

Em ambos os postos não passam os caminhões do Programa Coleta Legal. Devido a isso, no Posto do Entrevistado [E12] os mate-riais recicláveis são dispostos para a Coleta Porta a Porta caso não tenha sido coletado por catadores de materiais recicláveis.

A prática de segregação e destinação adequada de resíduos só-lidos acima citados é feita desde 2008, segundo o Entrevistado [E12]. E não houve mudanças significativas em procedimentos em função da entrada em vigor da Lei da Política de Resíduos Sólidos em 2010.

De acordo com o Entrevistado [E42] antes de 2010, da Política Nacional de Resíduos Sólidos, havia a separação de resíduos, porém a frequência na coleta de resíduos era falha não havia periodicidade fixa, chegou a ser armazenados resíduos por 6 meses. Mas depois de 2010 as empresas passaram a fornecer vasilhames adequados para a separação dos resíduos recicláveis e a frequência passou a ter periodicidade mensal ou a cada 20 dias, dependendo do resíduo. O posto não precisou fazer adequações para a segregação dos resíduos, somente organizou o local anteriormente destinado ao armazenamento temporário com os reci-pientes adequados aos resíduos.

A Celus Ambiental (Coleta de Embalagens de Lubrificantes Usados) foi criada especialmente para atuar no sistema de logísti-ca reversa de embalagens de lubrificantes e é uma empresa do Grupo Taborda, no Paraná. A parceria da Celus Ambiental com a entidade responsável nacionalmente pela logística reversa de embalagens de lu-brificantes ocorreu em 2010, sendo que em 2012 ocorreu a assinatura do Acordo Setorial Nacional e Termo de Compromisso com o Estado do Paraná (SINIR, 2016a; JOGUE LIMPO, 2016c).

A entidade gestora do Sistema de Logística Reversa abriu li-citação nos estados brasileiros onde atua. A Celus Ambiental ganhou em 2010 a licitação para o Estado do Paraná e Santa Catarina para operação logística de recolhimento de embalagens de óleos lubrificantes provenientes de oficinas mecânicas, postos de combustíveis, concessio-

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nárias, atacadistas, e outros locais que realizam a troca de óleos lubrifi-cantes até a destinação para a reciclagem do resíduo sólido.

A Celus Ambiental como opera em todo o Paraná, tem sua licença de operação (transporte e operação) emitida pelo IAP. Tem 3 (três) Centros de Coleta, nos municípios de Fazenda Rio Grande (próximo de Curitiba), Cascavel e Paiçandu (próximo de Maringá) e atende os 399 municípios do estado. A filial de Cascavel é responsável pela coleta das embalagens de lubrificantes na região Oeste e Sudoeste do estado, desde Guaíra até Coronel Vivida, operando com 3 (três) caminhões cargos, atendendo 1800 pontos geradores de resíduos ca-dastrados [E35].

Os recursos materiais utilizados na operação do Centro de Coleta de Cascavel são de propriedade da Celus Ambiental, exceto o barracão que é alugado. O corpo funcional é constituído pelo Gerente de Administrativo, 3 Motoristas e 4 Auxiliares de Produção. A Figura 34 demonstra a rota da logística reversa de embalagens de lubrificantes.

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O Gerente Administrativo, o Entrevistado [E34] faz o relato das atividades da prática, iniciando pelo Centro de Coleta de Cascavel, onde o gerente administrativo faz um cronograma de rotas e pontos de coleta com duração de dois dias, repassa-os aos motoristas junto com o comprovante da destinação correta a ser entregue a cada cliente, que é a certificação contendo informações sobre coleta realizada e é um instru-mento comprobatório junto aos órgãos fiscalizadores.

Nos pontos de coleta, os motoristas pesam eletronicamente os sacos de embalagens plásticas de lubrificantes usadas. Esses dados são as-sociados ao CNPJ do ponto gerador e são transferidos eletronicamente para o Site Jogue Limpo, para cômputo nacional automático (veja no site www.joguelimpo.org.br o registro na front page da quantidade de embala-gens já encaminhadas para reciclagem). No ato da pesagem é emitido um comprovante de recebimento que poderá ser exigido pelo órgão ambiental por ocasião da renovação do licenciamento ou de inspeções. Os motoris-tas entregam aos clientes sacos plásticos para armazenamento temporário das embalagens até que seja feita a próxima coleta.

Nesses sacos plásticos as embalagens ficam misturadas. Quando chegam ao Centro de Coleta, as embalagens são separadas por cor e o óleo restante nos frascos é esgotado em tonel apropriado de 1000 litros. As embalagens são prensadas e reunidas em fardos por cor, pesando aproximadamente 45 kg.

As embalagens são recolhidas na Central, transportadas pela carreta da Taborda Ambiental Brasil, que atende a todas as centrais, e enviadas à Recicladora do grupo Celus Ambiental, a Cimflex, em Maringá. Normalmente, saem de Cascavel duas cargas de carreta men-sais para Maringá, equivalendo 18 a 20 tonelada/mês.

Na recicladora, o material é triturado e depois de submetido a um processo de descontaminação do óleo lubrificante residual, pas-sa pelo processo de extrusão para ser transformado em matéria prima de novos frascos de lubrificante, canos de esgoto, eletroduto corrugado e outros produtos plásticos, retornando à cadeia de produção, além de economizar o estoque natural de um recurso não renovável como o pe-tróleo, matéria prima do plástico.

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O resíduo do óleo lubrificante usado e/ou contaminado é cole-tado por um veículo apropriado, um caminhão tanque que suga somente óleo lubrificante; caso tenha algum outro líquido misturado, este não será aspirado.

A empresa que presta este serviço é uma filial de Cascavel de empresa do Rio Grande do Sul, Indústria Petroquímica do Sul (IPS), que atua nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná e que faz a destinação correta do resíduo encaminhando-o para o rerrefino. A Figura 35 apresenta o fluxo do sistema da Logística Reversa de Oluc.

O rerrefino é uma “categoria de processos industriais de re-moção de contaminantes, produtos de degradação e aditivos dos óleos lubrificantes usados ou contaminados” de forma a atender as mesmas especificações técnicas dos óleos básicos (SINDIREFINO, 2016).

No Brasil, são consumidos anualmente mais de 1,4 bilhões de litros de óleos lubrificantes. Do volume disponível para a coleta, apenas 37% são destinados para o rerrefino. Portanto, mais de 50% do óleo lubrificante usado ou contaminado ainda é descartado ilegalmente no meio ambiente provocando a contaminação da água, do solo e do ar (LWART, 2016).

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FIGURA 35 – FLUXO DO SISTEMA DA LOGÍSTICA REVERSA DE ÓLEOS CONTAMINANTES (OLUC)

Fonte: Sindirrefino, 2016.

Na Central há outros resíduos contaminados como estopas e serragem sujos de óleos e papéis de bala que vem junto com as em-balagens. Estes resíduos são recolhidos pela Taborda Ambiental Brasil, outra empresa do Grupo Taborda Ambiental [E34].

As principais mudanças ocorridas na Celus Ambiental de Cascavel foram devidas á expansão dos pontos de coleta de embalagens o que acarretou um aumento nos estoques temporários. Mudanças na estrutura física e na operação foram realizadas, algumas delas de inicia-tiva do gerente outras exigidas por órgãos ambientais, como alterações no layout do barracão e nas formas de segregar os resíduos, providências para isolamento de paredes e pisos com caneleta para escoamento de óleo em caso de acidente, caixa separadora de óleo e adequação dos caminhões cargos para evitar o derramamento de óleo, como canelas e vedações internas.

A autonomia do gerente sobre as operações da filial de Cascavel é total, seguindo as regras e procedimentos determinados pela matriz.

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O treinamento para os funcionários é feito pelo gerente, destacando o compromisso ambiental da empresa.

O programa tem poucos anos, mas ainda não está sendo va-lorizado em toda a sua dimensão por toda a cadeia de abastecimento; muitos empresários não dão a atenção e o cuidado que poderia dar ao cumprir a sua parte na responsabilidade compartilhada da gestão das embalagens de lubrificantes assim como não têm noção da dimensão desta logística reversa e os impactos positivos que ela traz ao meio am-biente, considera o Entrevistado [E35].

O Entrelaçamento entre práticas e as relações dos atores na Prática da Logística Reversa de Embalagens de Lubrificantes podem ser observadas na Figura 36.

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A cadeia de ação nesse feixe está restrita ao modelo de prática estabelecida pela governança geral do Instituto Jogue Limpo, portanto, caracteriza-se pela domesticação. Há também o monitoramento reali-zado pela governança local e estadual quanto aos planos e cronogramas de trabalho previamente estabelecidos. Destaque interessante é o dispo-sitivo de ligação e de sincronização de cadeias que é configurado pela medição das quantidades no posto de combustível cujos resultados ali-mentam registro das embalagens coletadas desde 2005 no site do Jogue Limpo, onde também é possível imprimir comprovantes de entrega/coleta de embalagens de lubrificantes.

A organização orquestrada e o espaço de atividade são relações presentes no entrelaçamento entre práticas-arranjos nesse feixe. Além de-las, se sobressai nesse feixe e que o conecta a outras práticas na constelação local é a prefiguração, isto é, os arranjos materiais prefiguram esta prática no local do elo gerador do resíduo (posto de combustível).

A dinâmica do feixe de logística reversa de embalagens lubri-ficantes na constelação local se caracteriza pelo entrelaçamento entre práticas, especialmente com o elo inicial, o gerador do resíduo (postos de combustíveis, oficinas e estabelecimentos afins).

A governança local apresenta densidade expressiva pela quantidade de relações que mantém, afinal são mais de 1800 pontos de coleta. Sua forma de atuação é por meio de negociação contratu-al, mas demonstra estabilidade e solidez. A governança local da Celus Ambiental é centralizada em Cascavel, porém extrapola essa fronteira, pois sua abrangência consiste na região Oeste e Sudoeste do estado, desde Guaíra até Coronel Vivida. Nessa prática o contexto se mostra estável, sem turbulências, o que diminui a complexidade qualitativa dessa prática.

A dinâmica desse feixe é marcada pela acumulação de práticas ao longo da cadeia de ação organizadas por uma governança central no estado do Paraná. O Grupo Taborda aglutina empresas responsáveis pe-las práticas da logística reversa de embalagens lubrificantes, de empresas de transporte e de reciclagem dessas embalagens.

Ao olhar a prática na perspectiva da governança do Instituto

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Jogue Limpo, a dinâmica do feixe se mostra estável e sólida, apresentando entrelaçamento com integrantes da cadeia de ação e bifurcação da go-vernança da prática nos estados, disseminada em todo território nacional.

O próximo Capítulo aborda as versões da estrutura de gover-nança da prática.

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CAPÍTULO 6 VERSÕES DA ESTRUTURA DE

GOVERNANÇA DA PRÁTICA

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A prática é organizada mentalmente por entendimentos práti-cos, regras, estrutura teleoafetiva e entendimentos gerais (SCHATZKI, 2001, 2002, 2003, 2006a, 2012).

Os entendimentos práticos envolvem o saber fazer, como co-nhecimentos conceituais, técnicos, habilidades, know-how, competên-cias e conhecimentos inerentes às ações que a compõem, isto é, saber realizar as ações desejadas por meio de dizeres e fazeres incorporados. Ademais inclui entender o que faz sentido fazer, entender o que o outro faz e o que se pode fazer e como fazer em determinada circunstância.

As regras orientam, prescrevem, instruem, organizam e regu-lam as atividades. Essas regras, em geral, são explícitas como princípios, preceitos, instruções na forma de normas, leis, regulamentos, procedi-mentos, critérios de decisão, incluindo censura, repreensão e conselho. Como as regras são constituintes da organização mental da prática, aqui não se refere a regras por si só, mas implica no entendimento que as pessoas têm sobre a sua pertinência, podendo aceitá-las ou não.

A estrutura teleoafetiva refere-se aos aspectos ligados aos fins (tele) e às emoções (afetividade) que uma prática carrega, ou seja, essa estrutura ordenada hierarquicamente é composta de fins, projetos, ações, emoções, humores e uso das coisas avaliadas como adequadas, aceitáveis ou corretas ao executar uma prática.

Essa definição também expressa que não há dissociação entre razão e emoção, mas o reconhecimento de que o ser humano não age dissociado do raciocínio e da emoção e, nesse sentido cada prática traz em si uma normativa indicativa do que é adequado, aceitável ou consi-derado correto para aquela prática. A referência à ordenação hierárquica significa realizar ações e projetos específicos para fins específicos.

Esse julgamento de adequação e aceitação está relacionado ao contexto social, daquilo (fins, projetos, ações, tarefas, emoções, uso das coisas) que é considerado apropriado e aceitável socialmente. Logo, a estrutura de governança de cada prática deve ser entendida como situa-da socialmente e em consonância com a concepção de prática enquanto fenômeno social.

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O último elemento da estrutura de governança são os enten-dimentos gerais, que também foi o último componente da estrutura de governança da prática adicionado por Schatzki (2006a).

[...] general understandings are abstract senses, for instance, of the beauty of an artisanal product or of the nobility of educating students. They are not ends for which people strive but senses of the worth, value, nature, or place of things, which infuse and are expressed in people’s doings and sayings (SCHATZKI, 2012, p. 3).

Esses entendimentos gerais trazem a dimensão axiológica e es-tética à prática à medida que são entendimentos abstratos e valorativos.

O valor dá significação a toda relação humana, com outras pes-soas, com a natureza, com as coisas, enfim, com o mundo. Serve de guia para o pensar e o agir do ser humano no mundo, logo, está presente nas atividades humanas. A determinação do valor é subjetiva, está associado ao sentimento e é social e culturalmente situado (MONDIN, 2015).

A estética está ligada à capacidade humana de perceber o mun-do [pelos sentidos, como o belo, o feio, o gosto] [...] assim como a gama de sentimentos que nos invadem quando exercemos tal capacidade diante de algo (ANDRADE, 2017).

Enfim, os entendimentos gerais são as percepções abstra-tas relativas ao mérito, ao valor, à nobreza, à natureza, à beleza, ao lugar das coisas, ao trabalho e às interações sociais entre as pesso-as, que inspiram e são expressas nos dizeres e fazeres das pessoas (SCHATZKI, 2006a, 2012).

Isto posto, os feitos e as palavras pertencem a uma determi-nada prática quando expressam alguns dos entendimentos, compo-nentes teleoafetivos e regras que compõem a organização dessa prática (SCHATZKI, 2012). Contudo a estrutura de governança não é está-tica. Schatzki (2005) afirma que mudanças ocorrem nesses elementos constitutivos da estrutura de governança em função do contexto e da dimensão espaciotemporal.

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Entretanto, é a integibilidade prática que governa as ações, os dizeres e fazeres incorporados porque ela é que traz o sentido do dizer/fazer baseada na estrutura teleoafetiva da própria prática. No dizer de Schatzki (2005), o que as pessoas fazem quase sempre é regido por aqui-lo que faz sentido para elas.

Esta organização da prática não é um conjunto de propriedade de indivíduos específicos, mas sim uma matriz normativa de estados mentais da qual os praticantes possuem versões dessa matriz, expressan-do os mesmos entendimentos, observado as mesmas regras, objetivos e projetos e que estes elementos são da mesma ordem normativa e teleo-lógica/afetiva da matriz (SCHATZKI, 2001, 2002, 2003, 2005).

No decorrer da pesquisa de campo, a cada entrevista realizada procuramos identificar alguns aspectos da estrutura de governança da prática, a versão que as pessoas têm dessa matriz. Entretanto, isso não foi possível com todos entrevistados, seja pelo reduzido tempo disponí-vel para a entrevista, seja pela percepção de que não havia predisposição do entrevistado em aprofundar a entrevista, seja porque não adiantava perguntar algo mais profundo diante da circularidade de ideias do en-trevistado, nem das limitações de entendimento das questões formula-das acompanhadas de exemplos ilustrativos e reformulações diferentes. Apesar dessas limitações, alguns depoimentos se destacaram e serão co-mentados aqui. Vale ressaltar que cada entrevistado está ligado a uma prática específica ainda que pertencendo ao mesmo feixe.

No Feixe de Governança de Resíduos Sólidos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente os entendimentos práticos são cons-truídos pelo conhecimento formal, especializado na área, pela experi-ência cotidiana individual e grupal, e pelo compartilhamento de co-nhecimentos e informações gerais e legais da área. De acordo com o Entrevistado [E33], “Temos uma equipe altamente capacitada e estamos em constante comunicação, compartilhando informações e conhecimentos, trocando opiniões de maneira a construir uma vi-são ampla da situação e dos problemas ambientais atuais e futuros de Cascavel”. Aqui observamos aspecto da estrutura de teleoafetiva: a recomendação para o trabalho e equipe.

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As regras são as diretrizes da ação, norteiam a direção das de-cisões e ordenam as operações da Secretaria. Os entendimentos gerais principalmente estão vinculados aos conhecimentos relativos à área ambiental que proporcionam uma nova maneira de olhar o mundo e compreendê-lo, permite a construção de uma visão de mundo realista, sistêmica e diacrônica. O conceito da sustentabilidade ocupa a centrali-dade do pensar e do fazer.

Na estrutura teleoafetiva, a sustentabilidade enquanto finali-dade da prática ocupa um lugar de destaque, pois, para o Entrevistado [E33], o significado da prática de resíduos sólidos “é atingir a sustenta-bilidade, é reciclar todo e qualquer tipo de material e somente mandar para o aterro sanitário os rejeitos. Essa é a base para tudo que fazemos aqui: destinar corretamente para que tenhamos sustentabilidade, essa é a nossa missão na Secretaria”.

O sentimento de saudade foi uma das expressões destacadas pelo Entrevistado [E33]: “Você nunca quer sair de um lugar em se sen-te maravilhosamente bem, no qual você tem disposição em trabalhar e muitas ideias para colocar em prática”. Esse depoimento expressa o comprometimento com a tarefa, o envolvimento afetivo com ela.

No Feixe de Prática de Embalagens de Agrotóxicos, o enten-dimento prático das atividades desenvolvidas pelo Entrevistado [E20] se refere aos procedimentos operacionais, àqueles advindos da forma-ção acadêmica e conhecimentos técnicos da área. No entanto, quan-do questionado quais seriam esses entendimentos o entrevistado [E20] respondeu “ética para com o meio ambiente, entender a magnitude e a importância desse trabalho. A atividade em si é simples: receber, classi-ficar, separar, prensar, enfardar, destinar. As formas ou maneiras de fazer esse processo, inicialmente simples, exigem muita responsabilidade [...] Por isso a ética para com o meio ambiente”. Essa resposta indica o quão presente estão os entendimentos valorativos no cotidiano do trabalho, e a compreensão que se tem das coisas, e tanto um como o outro são expressões dos entendimentos gerais.

Na sequência, o Entrevistado [E20] acrescenta aos conhe-cimentos práticos: atender com qualidade os agricultores, entender a

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situação deles, ter habilidades de comunicação, flexibilidade, empatia, visão ampla (sistêmica, dos impactos que uma ação pode causar), visão responsável e comprometimento com o bom funcionamento do sistema. Nesse comentário podemos perceber também como a estrutura teleo-afetiva está enraizada em nossos dizeres e fazeres, orientando nossas atitudes e a maneira de conduzirmos as situações.

Esses dois exemplos acima não se tratam de incompreensão das questões, ao contrário, expressam o que a pessoa vive no dia a dia, como e pelo qual motivo sua ação é orientada. Questionado sobre quais emoções e sentimentos tem ao fazer o que faz, o Entrevistado comenta que é um

sentimento gratificante por ver toda a magnitude que é o sistema; por ver que ele está sendo realizado, principalmente na nossa cidade, porque ele poderia estar em qualquer outra cidade da região [...] hoje a gente não consegue fazer nada sem considerar o meio ambiente [...] nosso público não são somente os agricultores, é todo o mundo, até o peixe que está lá no rio quando se evita a poluição da água [...] então a sensação é de gratificação por estar fazendo um trabalho de extrema importância [E20].

Quando o Entrevistado comenta que o seu público “[..] é todo mundo, inclusive o peixe [...]” está expressando os entendimentos valo-rativos e estéticos que delineiam suas convicções.

As regras comandam as atividades cotidianas porque embasa-das em lei (de 2000) e protocolos e procedimentos definidos baseados na lei e no funcionamento do sistema de logística reversa coordenada pelo inPEV, responsável nacional pela atividade. As regras estabelecidas permitem um ajustamento às condições locais e eventos contingentes inesperados, desde que diretrizes gerais sejam cumpridas.

Na Prática da Logística Reversa de Embalagens Lubrificantes, os entendimentos práticos que sustentam o fazer coti-diano são respaldados na formação acadêmica, nos procedimentos orga-nizacionais, na pesquisa na internet que informa, instrui e atualiza, e na experiência cotidiana do aprender fazendo.

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Para o Entrevistado [E35] os entendimentos gerais que em-basam e contribuem para o entendimento prático e o fazer cotidiano são os conhecimentos relativos às questões ambientais que têm uma dimensão maior: são conhecimentos que auxiliam a compreensão e o significado da tarefa desenvolvida e que sustentam o modelo de gestão da empresa que é a atuação do respeito ambiental como exemplo seja para pessoas, seja para organizações.

As regras direcionam as ações da empresa. “Teoricamente [as regas] são a vida da empresa, são muito importantes [...] voltadas para a segurança humana e ambiental” [E35].

Na estrutura teleoafetiva o que predomina é o modelo do trabalho em equipe, o respeito e a colaboração e o gostar do que faz. Mesmo considerando as diferenças culturais, as diferenças experienciais e os possíveis conflitos advindos com a situação, o trabalho em equipe se constitui em diferencial para a organização.

Na Prática de Retirada de Árvore, o Entrevistado [E30] apon-ta como entendimentos práticos aqueles relativos como fazer o tombo da árvore, identificar a posição de vento, onde pode passar o caminhão onde não pode e como operar motosserra. No início não sabia nada: “Eu cheguei cru no município”. Seu aprendizado foi no dia a dia e já tem 17 anos de experiência.

As regras que norteiam as atividades são os procedimentos estabelecidos pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Sema). “A gente procura fazer o trabalho o melhor possível, para não causar danos ao proprietário, ninguém se machucar, nunca houve acidente grave [...] a equipe é muito integrada, faz tempo que trabalha jun-to, sempre um dando apoio para os outros”, comenta o Entrevistado [E30]. Nessa fala podemos notar uma amálgama de elementos da es-trutura teleoafetivas e entendimentos gerais. A esse último remete a valorização do trabalho bem feito, a interação e apoio mútuo da equipe de trabalho, e à conduta segura na forma de agir a fim de evitar impac-tos negativos materiais e pessoais. Embora pareça ser uma atividade simples, não é isenta de riscos.

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Na análise da estrutura de governança da Prática de Logística Reversa de Pneus, os entendimentos práticos foram construídos no di-zer, no fazer e no conhecer. O Entrevistado [E05] antes de iniciar sua atividade empresarial com os pneus foi procurar quem já trabalhava com isso. Em 2001 não se tinha a facilidade possibilitada hoje pela internet por isso ele viajou para vários lugares, conhecendo várias empresas a fim de estruturar sua.

Atualmente vê com preocupação a instabilidade e a incerteza advinda com a crise econômica que atinge a todos os setores, inclusive o dele. Um dos problemas que enfrenta é a seleção das empresas para as quais vende seus produtos no que se refere à capacidade de pagamento. Para lidar com uma situação como essa o indivíduo acessa conhecimen-tos amealhados ao longo das experiências, sendo que esses conhecimen-tos não se expressam de forma objetiva, é um conhecimento tácito, de difícil comunicação e compartilhamento, mas constituem entendimen-tos sobre os acontecimentos, as pessoas, as coisas, enfim, conhecimentos esses ligados aos aspectos estéticos dos entendimentos gerais.

“Você tem que amar o que faz, porque o tanto que você se in-comoda, o tanto de lixo que vê [...] você tem que amar o que faz” [E05], essa declaração do entrevistado expressa o componente afetivo da es-trutura teleafetiva, a ligação entre a prática e o praticante e ao mesmo tempo a crença na finalidade da prática, que suas ações são importantes senão não continuaria a fazê-las.

Em relação às regras, o entrevistado [E05] citou leis ambien-tais como a PNRS e a norma da ABNT/CB-045 – Pneus e Aros e disse serem essenciais para o negócio, “[...] porque sem elas não haveria negócio [...] se não fosse a lei, ninguém traria o pneu aqui” [E05]. Esse dizer manifesta o poder da regra Política Nacional de Resíduos Sólidos e leis afins não somente para o entrevistado, mas para uma gama de praticantes vinculados de uma forma e outra com a prática. Seja no pa-pel de cidadão, trabalhador ou empresário, todos são responsáveis pela destinação adequada dos resíduos sólidos fazendo valer o princípio da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.

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Na Prática de Disposição Final de Resíduos em Aterro Industrial, na versão da estrutura de governança do Entrevistado [E23], os entendimentos práticos referem-se ao conhecimento prévio na área de resíduos (legislação), acompanhamento das mudanças regulatórias do setor, operação de softwares e a experiência prática.

Nessa prática as regras aparecem como elemento estruturante uma vez considerando que todas as atividades da empresa estão fun-damentadas em normas, regras e leis. A empresa tem todas as licen-ças necessárias, atende as normas ABNT direcionadas aos veículos de transportes, segue todas as exigências legais, desde a infraestrutura do empreendimento até a operação (ENTREVISTADO [E23]).

Em relação à estrutura teleoafetiva, o Entrevistado [E23] des-tacou os fins da Prática de Serviço de Palestra e Treinamentos:

uma das razões de fazermos a transferência de conhecimento para o cliente por meio de Palestras e Treinamento é que assim estamos aumentando a vida útil do aterro, diminuindo custos dos clientes, destinando corretamente os materiais que podem ser reaproveitados e reciclados, voltando à cadeia produtiva, embora com reflexos nega-tivos no faturamento.

Notamos nessa fala que os entendimentos gerais valorativos re-lativos à questão ambiental aparecem oferecendo sustentação à prática e à sua finalidade à medida que esta ação contraria os interesses lucrativos do empreendimento.

Na Prática da Limpeza Urbana e de Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares, o Entrevistado [E25] relacionou como enten-dimentos práticos os conhecimentos técnicos específicos, conhecimen-tos e habilidades de gestão, relacionamento interpessoal. Em relação aos entendimentos gerais os cuidados com o meio ambiente e gestão ambiental “têm que estar bem vivo no dia a dia”, levando a compre-ensão de que há mais do que o conhecimento técnico ambiental que as práticas exigem no cotidiano. De fato, a questão ecológica-ambiental está carregada de valores, dentre eles o respeito à natureza, às pessoas, às coisas e as relações éticas que se estabelecem entre esses elementos.

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Em relação às regras, além das obrigações legais, há obrigações voluntárias com as quais a empresa se comprometeu como na política da qualidade e nos procedimentos internos. O Entrevistado [E25] afirma que “todo fiscal tem uma pasta que leva ao campo contendo os procedi-mentos da empresa”. Para ele a Política Nacional de Resíduos Sólidos in-fluenciou na adição de novo serviço na empresa, como a Coleta Seletiva. Aqui o papel das regras é de diretriz até porque como a empresa presta serviço público ela tem que atender a requisitos contratuais.

Dentre os componentes constituintes da estrutura teleoafetiva têm destaque os projetos e os fins relacionados às práticas desenvolvidas tanto pela empresa como pelo profissional. Como empresa, espera man-ter um padrão de excelência nos serviços e buscar esse nível de aceitação nos demais serviços assim como obter a certificação ISO 14.001. “Como profissional espero que o Aterro Sanitário continue sendo referência, já que sou responsável técnico por ele. Gosto do que faço (quase 15 anos tralhando com resíduos sólidos, destes 12 anos na empresa). Então, eu realmente gosto do que faço”, expressa o Entrevistado [E25].

Na Prática Gestão Cooperativa de Material Reciclável, o Entrevistado [E02] destaca entre os entendimentos práticos a habilida-de administrativa e a habilidade social, esta estando ligada aos entendi-mentos gerais, como pode ser observado no depoimento a seguir:

Se você não tiver essa articulação interna, esse olhar em observar o outro em relação ao processo, você não consegue desenvolver (re-lações interpessoais significativas) [...] não somente desenvolver o trabalho administrativo, mas ter habilidades para desenvolver o tra-balho social: como vai se pautar isso ou aquilo, como a equipe vai se posicionar em relação ao trabalho dos catadores, se ela reconhece esse catador enquanto indivíduo e ser social, tem que ter uma visão mais apurada, e conhecer as leis regem a questão dos catadores, do processo histórico, do movimento (cooperativista).

Entre os componentes mais importantes das regras estão a Assembleia, o Estatuto e o Regimento Interno. Sempre que se discute um problema e se chega a um consenso ou a uma resolução que modi-

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fica uma regra anterior relativa à gestão ou questões de base é providen-ciada a alteração legal tanto no Estatuto quanto no Regimento, no que couber, geralmente ao final do ano.

É um documento que usamos à risca assim como guia norteador. Por exemplo, um catador furtou quando estava no espaço interno da cooperativa: como é feita a punição desse catador? Como se faz o rateio? Tem fundo, o que se faz como ele? Como são feitos os pagamentos? Quem autoriza os pagamentos? [...] assim como a ne-cessidade de adequação do Estatuto e/ou Regimento Interno às leis externas [E02].

Em relação à estrutura teleoafetiva, o Entrevistado [E02] bus-ca a preservação e aplicação dos princípios cooperativistas e o compro-misso com a construção social do indivíduo porque, segundo ele,

quando a Cootacar buscou o reconhecimento de utilidade públi-ca fundamentado na geração de trabalho e renda, ela também se comprometeu com a construção do indivíduo enquanto ser social para participar e permanecer nesse processo, enfim, de realizar um trabalho de regaste, de mudança cultural, esclarecendo sobre a vali-dade e os benefícios da atividade cooperativista em contraposição com a sua realidade de vida, muitas delas vividas na rua em busca da subsistência diária

Essa postura normativa é a mesma que rege a Prática Gestão Cooperativa de Material Reciclável; percebe-se a congruência entre a estrutura teleoafetiva da prática com a do praticante e há uma justifi-cativa para isso: o praticante está há 18 anos envolvido com a prática cooperativista.

Na Prática de Licenciamento Ambiental, o Entrevistado [E31] aponta como entendimentos práticos o somatório de conheci-mentos técnicos, conhecimento legais que regem o fazer profissional, treinamentos, especializações, conhecimentos compartilhados, conheci-mentos adquirido, sobretudo, no cotidiano da atividade. Considerar caso a caso, suas especificidades e respectivo enquadramento legal.

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As regras são compreendidas como diretrizes para o trabalho cotidiano porque utiliza a Legislação Federal, Estadual e Municipal re-ferente ao Licenciamento e os resíduos sólidos, seu uso e destinação estão incluídos nas leis. De acordo com o Entrevistado [E31] para cada tipo de atividade há uma regra. Existe utilização de matérias primas di-ferenciadas e a geração de resíduos é em conformidade com o processo industrial gerando resíduos diferentes que devem ter destinação espe-cífica, seja no reaproveitamento de processo produtivo seja a disposição final adequada.

Os entendimentos gerais envolvem experiência de vida, co-nhecimentos genéricos sobre questões ambientais e conhecimentos sobre as mudanças sociais, porque “a sociedade é muito dinâmica e o poder público tem dificuldade de acompanhá-las”, argumenta o Entrevistado [E31].

Na estrutura teleoafetiva chama à atenção a vinculação da fi-nalidade da prática com a emoção do praticante quando expressa o se-guinte:

Eu sinto prazer e satisfação quando se resolve um problema [...] a gente não é um Dom Quixote da vida, mas quando a pessoa chega com um problema e você ajuda a resolver, você vê que a pessoa ficou feliz e você também, por conseguir repassar uma informação, um conhecimento e resolver o problema.

Na estrutura de governança da Prática de Compra de Materiais Recicláveis um dos entendimentos práticos mais importan-tes é conhecer bem cada tipo de material, reconhecê-lo fisicamente e associá-lo as normas definidoras de classificação. Esse conhecimento tem reflexo direto no momento da compra quando há a verificação do material e o reconhecimento inicial da qualidade do material ofertado e como consequência reflete também no preço de compra. Outros co-nhecimentos importantes se referem à área administrativa, ao controle de custos e a fase de comercialização. Aqui nota-se também o aspecto normativo da estrutura teleoafetiva regendo a forma de se executar uma

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ação “([...] verificação [..] reconhecimento [...] preço de compra) porque uma ação específica está ligada a um fim específico (SCHATZI, 2012).

Quanto às regras, as normas da ABNT para classificação de materiais são destacadas pelo [E04], assim como as leis trabalhistas, e as normas relativas ao uso de equipamento de proteção coletiva e individu-al. A empresa atende as exigências ambientais e tem os licenciamentos necessários para atuar.

Na vivência do Entrevistado [E28], relacionada ao Feixe de Prática de Resíduos Sólidos (Coleta Domiciliar, Fiscalização, Aterro Sanitário, Limpeza Urbana, entre outros) os entendimentos práticos fo-ram obtidos no aprender fazendo, com a experiência.

Em sua opinião para “conhecer e saber fazer na prática exi-ge muita conversa com outras pessoas que compartilham da atividade (encarregado e o operador) [...] verificando se o serviço está sendo bem feito na prática”. Os conhecimentos técnicos que mais utiliza são os de gestão, com pouca aplicação do conhecimento em engenharia. O en-trevistado comenta que “Resíduo sólido virou assunto do momento nas graduações, mas na minha época nem se falava disso”.

As regras representam diretrizes para a ação, “A Política Nacional de Resíduos Sólidos veio como um guia, como uma ferramen-ta que dá suporte as demais decisões, como os acordos setoriais para lo-gística reversa”. Uma ferramenta de suporte à decisão é o caso do Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos dos Municípios. Em relação a este plano o Entrevistado [E28] explica que “Todo o processo de gestão de resíduos já tem plano elaborado e provavelmente vai ser seguido pela próxima gestão”.

O comentário do Entrevistado [E28] “O pessoal fala que o meu filho é o aterro sanitário [...] sou teimoso [...] quero ver isso aconte-cer [...] quem trabalha na administração pública sabe como é fazer algo [...] Eu gosto do que eu faço” refere-se à Prática da Produção de Biogás localizada no Aterro Sanitário e externaliza a determinação e o compro-metimento com o projeto e sua finalidade, assim como o envolvimento afetivo e emocional com a tarefa.

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Aos poucos vamos percebendo que a estrutura teleoafetiva, as-sim como os outros elementos constitutivos da governança da prática apresenta uma complexidade e dinamicidade difíceis de serem percebi-dos e verbalizados pelo próprio praticante assim como pelo pesquisador. Contudo, naquilo no qual os praticantes estão engajados, o cerne das suas preocupações se revela mais facilmente no seu dizer, como é o caso do comentário acima. Essa observação remete à compreensão da prá-tica enquanto ações espaço-temporalmente abertas, sempre se alteran-do porque projetos e finalidades mudam, outros se tornam prioridades, configurando a dinamicidade da prática e seus reflexos nas versões da estrutura de governança dos praticantes.

Os entendimentos práticos que envolvem a Prática de Apoio do Comitê do Meio Ambiente do Sinduscon são os conhecimentos técnicos relacionados à construção civil e aqueles relacionados com a sustentabilidade de forma geral e mais especificamente aqueles conhe-cimentos ligados ao setor, o que inclui as normas e legislação ambientais.

Para o Entrevistado [E21] as regras deveriam ser o mínimo que as empresas atendem, mas isso se torna difícil devido as muitas alterações que sofrem e são muitas regras que regem o setor. “A gente deveria fazer, no mínimo, o que a lei pede e não cumpri-las somente mediante fiscalização e autuações”.

Os entendimentos gerais valorativos se respaldam na ideia de uma sociedade mais sustentável, nas palavras do Entrevistado [E21]:

A gente tem que pensar fora da caixa, ter uma ideia diferente do que tem sido praticado nos últimos anos e tentar descobrir uma maneira, uma forma de se preocupar realmente com o meio ambiente, pensar no futuro do que vamos deixar para nossos netos mas de uma ma-neira que seja economicamente viável.

Na estrutura teleoafetiva a normatividade da conduta, da for-ma de fazer as coisas se vincula às finalidades da prática como observa-mos no depoimento do [E21], abaixo:

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o meu papel e o que eu quero deixar como legado é fazer alguma coisa diferente, trazer para o mundo real mostrando que o meio am-biente pode ser cuidado, pode ser preservado sendo sustentável eco-nomicamente também, que as empresas consigam trazer benefícios econômicos e ecológicos conjuntamente, porque se um não andar junto com o outro isso não vai acontecer, talvez essa seja a grande barreira para as coisas acontecerem, independente de legislações, isso pode ajudar as empresas a saírem da inércia, de iniciar o trabalho que pode ser feito.

Em relação à análise da estrutura de governança da Prática de Destinação de Resíduos Lenhosos, os entendimentos práticos são constituídos por conhecimentos amealhados nos tempos de formação universitária, na experiência profissional, no conhecimento de todo o ramo e segmento de atividade, no cotidiano das atividades e desafios que se apresentam, fundamentados também em entendimentos gerais, embasado na “cultura da sociedade em saber que tem que dar destinação adequada aos resíduos, que hoje poucas pessoas têm essa consciência” (ENTREVISTADO [E09]).

Nesse sentido, esses entendimentos têm que ser compartilha-dos com outros praticantes. “Se os funcionários não tiverem consciência, se eles não tiveram conhecimento do motivo de estarem fazendo isso, a importância que isso tem, também não vão estar desempenhando uma atividade muito legal porque antes de tudo a gente também é um educa-dor ambiental [...]”, comenta o Entrevistado [E09] sobre as finalidades das ações e projetos relativos à estrutura teleoafetiva.

As regras são consideradas diretrizes para o trabalho, não so-mente porque no serviço de consultoria ou no de desenvolvimento de projetos (outras práticas ligadas à prática da destinação de resíduos lenhosos) a regra é incorporada explicitamente, mas porque a empresa se preocupa em fazer o que é o correto fazer, e isso implica na incorpo-ração de conhecimentos técnicos específicos nas práticas de trabalho, independentemente de exigências legais que, no entanto, se torna uma regra interna.

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Na Prática de Reciclagem de Resíduos da Construção Civil os entendimentos práticos dizem respeito aos conhecimentos de en-genharia, de relacionamento humano e principalmente conhecimentos que foram aprendidos no dia a dia das atividades, como conhecimento do que cada coisa é feita, como reconhecer materiais, formas de trans-portar, descobrir recursos auxiliares, coisas que foram aprendidas na prá-tica, no modelo tentativa e erro.

O Entrevistado [E22] comenta que tiveram que aprender na prática o que fazer com os materiais “[...] Então com esse material va-mos fazer assim [...] mas não deu certo; tenta de outro jeito [...] Esse é o nosso dia a dia. A cada manhã a gente reaprende e reorganiza [...]”. Em consequência desse aprendizado construído na prática, também foi um desafio treinar e instruir os funcionários.

As regras são em grande parte responsáveis de como as coisas acontecem. “A espinha dorsal do nosso produto está bem clara e nós queremos dar um critério rigoroso para ela. Para o restante todo, eu preciso de uma regra, de uma lei para que isso funcione de uma forma correta” [E22]. Estas regras foram sendo incorporadas estudando leis e normas que regem a atividade econômica. “Estamos quase virando ad-vogado para conseguir fazer tudo isso funcionar [...]”.

A mudança pode acontecer sim, com pequenos atos gradativamen-te [...] eu acredito no cenário no qual as pessoas vão perceber que geram resíduos de qualquer forma, de qualquer tipo e que ela tem que fazer alguma coisa com isso [...] O grande x da questão é esse: a pessoa entender que ela produz um problema ambiental, ela é parte do problema e tem que ser parte da solução [E22].

Na fala acima percebemos a visão de mundo expressando o entendimento geral do problema e da solução, a compreensão das coisas, e essa crença molda também a normatividade da estrutura teleoafetiva, posto que o Entrevistado [E22] salienta que “Como objetivo mor de tudo isso aqui é mudar um pouco a consciência da população e fazer isso funcionar [...] acredito que isso vai demorar um pouco, mas que isso vai dar certo”.

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A estrutura teleoafetiva envolve emoções consideradas aceitá-veis, corretas ou adequadas e quando questionado sobre que emoções e sentimentos que o fazer dessa prática desperta, o Entrevistado [E22] deu o seguinte depoimento:

Eu sinto diversas coisas [...] a primeira é um grande orgulho de ver tudo funcionando, e ver o que era um grande problema está virando uma grande solução, está deixando de degradar o meio ambiente, transformando isso de novo em produto utilizável, tenho um orgu-lho imenso de fazer parte da empreitada, isso anima a gente a traba-lhar a cada dia mais, a enfrentar todos os problemas possíveis, então é gratificante ver as coisas funcionando, ver as pessoas que nunca ouviram falar do processo, elogiando [...] ‘puxa, que ideia bacana’ e quando vem aqui conhecer, e vê que a coisa não é uma brincadeira de criança, não é nenhuma maluquice, é sim algo palpável, é visual [...] você vê um caminhão com o problema entrando e você vê um caminhão saindo com a solução na mesma hora. Isso é incrível, é fantástico quando você vê o brilho nos olhos das pessoas quando ela enxerga que aquilo tem solução, que aquilo não é uma fantasia, não é pra inglês ver, aquilo funciona e está pertinho da casa dele.

Nesse depoimento sobressaem também os aspectos estéti-cos e valorativos ligados aos entendimentos gerais, na percepção do mundo e compreensão das coisas (problemas e soluções) e no meio ambiente equilibrado enquanto valor, tudo isso respaldando as ações e finalidades da prática.

Diante dos depoimentos que externalizam versões da estrutura de governança da prática, percebemos algumas similaridades recorrentes.

A primeira delas refere-se às regras entendidas como diretrizes da prática, sendo elas

(i) de iniciativa interna e voluntária, como o estabelecimen-to de procedimentos, protocolos, alterações estatutárias ou regimen-tais, ou (ii) de ordem externa, como normas, regulamentos, contratos e leis, principalmente.

Em algumas práticas as leis são vistas como elemento estrutu-rante da prática e essenciais para a existência e continuidade de negó-

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cios nos quais as práticas se desenvolvem. Dentre todos os depoimentos somente um deles referiu-se a regras com o significado de obrigação. Esses são os entendimentos que os praticantes têm das regras. E, de fato, o segmento de atividades relacionadas aos resíduos sólidos é regido por leis e controlados por diversos mecanismos legais.

Além dessa regência legal, a maioria dessas atividades exigem conhecimentos conceituais, técnicos específicos assim como os adminis-trativos e legais. Estes se inserem no contexto dos entendimentos práti-cos que, além desses, solicitam uma aproximação com o dizer e o fazer incorporados, aqueles aprendidos na lida cotidiana, na manipulação, no manejo, na organização e no compartilhamento desses conhecimentos, entre tantas ações possíveis que a experiência vivida proporciona. Esta é a segunda similaridade encontrada: o aprender fazendo.

As versões da estrutura teleoafetiva da prática apresentaram diversas relações recorrentes, não há exatamente uma prevalência dentre elas. Entre elas estão:

• os entendimentos gerais valorativos subsidiando a gama normativa da estrutura de governança;

• orientação de atitudes, de conduta, da forma de fazer as coisas e a maneira de conduzir situações;

• ligação entre os conhecimentos práticos e a finalidade da prática;

• relação entre projetos e fins;• associação da finalidade com a emoção no alcance dos ob-

jetivos;• elo afetivo entre praticante e prática;• aspectos normativos ligados à ação específica e aos fins es-

pecíficos;• a finalidade adequando ações e emoções; e• crença na finalidade da prática.

Os entendimentos gerais foram incorporados como dimensão da estrutura de governança da prática em Schatzki (2006a). Eles apa-

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recem associados à compreensão das coisas, do mundo, dos problemas e suas soluções, vinculados aos valores, à significação da tarefa, aos sen-timentos pela prática/trabalho. As relações entre entendimentos gerais com os demais elementos constitutivos da estrutura de governança da prática se referem ao elo basilar entre entendimentos práticos e enten-dimentos gerais valorativos, ao entendimento geral moldando e susten-tando a estrutura teleoafetiva e ao aceite de regras.

Essas vinculações vêm confirmar, neste estudo, que o dizer e o fazer incorporados é um fato na execução da prática porque o praticante está implicado com seus entendimentos e seus valores, com a compre-ensão das coisas, com emoções e sentimentos que carregam em relação à prática. Portanto, podemos dizer que, embora as versões dos praticantes da estrutura de governança da prática sempre carregam parte de subjeti-vidade e ligação com as condições de vida, há coerência entre as versões da estrutura de governança da prática com a sua matriz.

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CAPÍTULO 7 RELAÇÕES ENTRE PRÁTICAS E FEIXES NA CONSTELAÇÃO

LOCAL

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A Teoria da Prática Social elenca uma série de conceitos para caracterizar as relações existentes entre práticas e arranjos, entre prá-ticas-arranjos com outras práticas- arranjos e suas variantes (práti-ca-prática e arranjo-arranjo), as relações que tipificam as cadeias de ações bem como a dinâmica que ocorrem em feixes.

As relações que acontecem na Constelação Local de Resíduos Sólidos em Cascavel são as mais diversas dentro e entre os 12 feixes de governança de resíduos sólidos identificados pela pesquisa. A análise que se segue considera aqueles aspectos ou características que mais singularizam e que mais se evidenciam nos feixes. Isto quer dizer que se destacamos tal e tal característica, não quer dizer que outras não estejam presentes, mas apenas que elas não se sobressaíram nesse feixe em função dos dados e das informações coletadas.

Na Figura 37 os feixes e as relações entre atores na constela-ção local de Cascavel podem ser observadas.

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Os atores estão envolvidos entre si por práticas e por arranjos dentro de um mesmo feixe, de modo geral, e se caracterizam pelas rela-ções comentadas na sequência.

As relações que se estabelece dentro da prática-arranjo a que predomina é a relação de constituição (10 casos, exceto LR Embalagem de Lubrificantes e Governança de Resíduos Sólidos), ou seja, tanto a prática constitui o arranjo, como o arranjo constitui a prática. No pri-meiro caso significa que a prática para ser executada precisa da mate-rialidade ainda inexistente que o arranjo representa. No segundo caso, a existência ou presença do arranjo propicia que a prática seja executada.

A prefiguração diz respeito ao estado atual das coisas (arran-jos) qualificando uma prática ainda inexistente. Foram localizados 3 ca-sos: Limpeza Urbana, LR de Pneus e LR Embalagem de Lubrificantes. As relações causais entre práticas e arranjos estão presentes na LR do Agrotóxico e da Limpeza Urbana. A integibilidade é encontrada na Governança de Resíduos Sólidos e no feixe da Cooperativa de Materiais Recicláveis. A intencionalidade é encontrada na LR de Medicamentos.

As relações que caracterizam os vínculos entre práticas e arran-jos e suas variantes nos feixes estudados são: (i) os espaços de atividade, relativos ao compartilhamento de caminhos físicos e arranjos, com 9 casos identificados, exceto a LR de Pilhas e Baterias, Medicamentos e Agrotóxicos; (ii) a organização orquestrada, quando os fins são alcan-çados por meio de elementos diferentes de práticas diferentes, com 7 casos observados nos feixes da Coleta Legal, Cooperativas de Material Reciclável (MR), Limpeza Urbana, Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares, Governança de Resíduos Sólidos, LR de Agrotóxicos e LR de Embalagens e Lubrificantes. Isso significa que o entrelaçamento de práticas próximas contribui para que os objetivos comuns sejam al-cançados; (iii) o poder comum, representado pelas mesmas atividades, fins, regras e emoções é encontrado os feixes da Cooperativa de MR, na LR de Pilhas e Baterias e na LR de Embalagens de Lubrificantes e significa que as práticas têm semelhante organização (atividades e estrutura de governança); e (iv) as atividades compartilhadas são en-contradas na Coleta Legal e na Governança de Resíduos Sólidos. Tod os os feixes pesquisados estão vinculados à cadeia de ação, exceto o da LR de Medicamentos.

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As cadeias de ação apresentam Monitoramento em 10 feixes, exceto os feixes da Cooperativa de MR e o feixe de LR de Medicamentos. Os dispositivos de coordenação podem ser encontrados em 6 feixes: Coleta Legal, Cooperativa de MR, LR de Agrotóxicos, LR de Pneus, LR de Baterias Automotivas e LR de Embalagens de Lubrificante.

A domesticação, que é a confinação da cadeia em pacotes/feixes específicos, caracterizam 6 casos, como a Coleta Legal, a Limpeza Urbana, a Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares, a Governança de Resíduos sólidos, a LR de Agrotóxicos e a LR de Embalagens de Lubrificantes.

A bifurcação está presente em 5 feixes (Cooperativa de MR, Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares, LR de Pilhas e Baterias, LR de Pneu e Governança de Resíduos Sólidos). A Infraestrutura material distingue o feixe de Cooperativas de MR, o feixe de LR de Agrotóxicos, o feixe de LR de Pneus e o feixe de LR de Baterias Automotivas.

Por sua vez, o Feedback pode ser localizado na Coleta Legal, nos Resíduos da Construção Civil, e na LR de Pneus. A coordenação de discursos está presente no feixe de Resíduos da Construção Civil e na LR de Medicamentos. A governança está presente em todos, exceto na LR de Medicamentos.

As características dos feixes de governança em relação à forma de atuação são muito diversificadas entre os feixes. Há feixes que podem ser caracterizados por duas ou mais formas, ou seja, podem carregar du-pla ou tripla característica, como a da Governança de Resíduos Sólidos. Metade das governanças apresentam atuação mandatória (6 casos), 5 delas apresentam atuação acordada ou negociada. Em 4 casos a atuação é colaborativa, em 3 é autônoma e em outras 3 é obrigatória. Cinco feixes estão restritos à constelação local e oito exibem extensão que ul-trapassam as fronteiras locais da constelação.

A dinâmica dos feixes na constelação local caracteriza-se pelo entrelaçamento (9 casos), pela bifurcação e pela estabilidade (7 casos cada), pela difusão e acumulação (6 casos cada), pela dissolução, evolu-ção e polyplasis (2 casos cada) e pela fusão (1 caso). Os destaques são para a Coleta Legal e Resíduos da Construção Civil que apresentaram aspectos evolutivos, para a LR de Medicamentos e LR de Baterias auto-

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motivas pela configuração polyplasis da governança e para a Governança de Resíduos Sólidos por uma fusão. Na próxima seção as práticas inova-doras de governança é o assunto abordado.

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CAPÍTULO 8 PRÁTICAS INOVADORAS

DE GOVERNANÇA

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A inovação entendida como localização de mudanças é eviden-ciada por dizeres e fazeres que modificam a prática-arranjo parcialmen-te ou integralmente, ou alteram um ou mais de seus elementos constitu-tivos, ou insiram novas atividades ou arranjos na prática, ou estabeleçam vínculos com outras práticas, ou criem novas práticas. A inovação que consideramos nesta seção são aquelas ocorridas no espaço da constela-ção local de resíduos sólidos em Cascavel, no período de 2010 a 2016.

Na Prática de Reciclagem de Resíduos da Construção Civil desenvolvida pela Future se destaca o agregado de reciclado, que é um conjunto de produtos derivados da reciclagem de resíduos da constru-ção civil. Os materiais têm características físicas diferenciadas e servem para compor produtos e obras de construção civil de acordo com essas especificações. O processo de desenvolvimento desses produtos foi na prática, na experiência típica do método tentativa e erro. A inovação está no resultado desse processo, o agregado reciclado, tanto como produto para a empresa como para o mercado. Outra prática estabelecida pela governança desse feixe foi firmar parceira com Instituições do Ensino Superior (Unioeste, FAG, UTFPR Toledo, UTFPR Medianeira, Unila, UDC Foz) para desenvolvimento de pesquisa para novos produtos, es-pecificação do material produzido, e testagem do agregado reciclado produzido.

Na Paraná Ambiental a nova Prática de Serviço de Palestra e Treinamentos está associada à prática principal de segregação de re-síduos para destinação em aterro industrial. Surgiu da observação do cotidiano, do conteúdo trazido pelos clientes para terem destinação adequada. Observou-se mistura entre materiais, acondicionamento ina-dequado e contaminação indevida de outros resíduos, o que encarecia o serviço prestado para o cliente. Então foi planejada e implantada a essa prática com objetivo de orientar os clientes sobre a correta segrega-ção dos resíduos e organização desse sistema internamente na empresa cliente. Alguns resultados dessa nova prática já foram percebidos, como (i) o gerador diminuiu a produção de resíduos; (ii) o gerador se tornou mais cuidadoso na segregação de resíduos; e (iii) o gerador procura dar destinação adequada aos outros tipos de resíduos.

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Outras duas práticas organizacionais foram implantadas nos últimos anos: a prática de atendimento emergencial a acidentes, com enfoque nos acidentes que ocorrem em rodovias envolvendo produtos ou resíduos perigosos, e a prática de operação do serviço de coleta de resíduos sólidos do município de Cafelândia.

No feixe de Logística Reversa de Pilhas e Baterias a gover-nança estabelece a prática inovadora ao elaborar o modelo de gestão, ao determinar a cadeia de ação, as atividades relativas a essa prática, ao prover arranjos materiais interconectados à prática e ao escolher essa e aquela entidade governadora de outras práticas que podem se associar a prática em foco ou mesmo decidir participar desta prática. Portanto, a decisão de desenvolver, de implantar uma prática anteriormente inexis-tente já é uma inovação para a organização.

A Prática de Logística Reversa de Medicamentos em Desuso acontece em Cascavel desde 2013, estimulada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos. A introdução desta prática foi inovado-ra para farmácias, unidades básicas de saúde entre outros, mesmo sen-do uma prática obrigatória baseada em regras (Lei Estadual 17.211/12 e Decreto Estadual 9213/13).

As práticas inovadoras de governança no feixe de Logística Reversa de Embalagens de Agrotóxico geralmente têm impacto em toda a cadeia por se originar diretamente do Instituto inPEV e se es-tender às Coordenações Estaduais e às Centrais de Recebimento. Essas inovações referem-se principalmente a ações programadas inclusas no calendário da logística reversa e nos protocolos (procedimentos). Há pouco espaço para a iniciativa e alterações em práticas por parte da ADDAV. Então podemos dizer que em relação à esfera operacional/administrativa as inovações são incrementais.

Em relação à reciclagem das embalagens, foi desenvolvido um produto inovador: Ecoplástica Triex 20l, a primeira embalagem produzida a partir da reciclagem de embalagens de defensivos agrí-colas pós-consumo e também a primeira com certificação para trans-porte terrestre de produtos perigosos. A embalagem é destinada para o envase de defensivos agrícolas, óleo lubrificante, fertilizante foliar, além de outros produtos químicos. Foi produzido pela Campo Limpo

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Reciclagem e Transformação de Plásticos, pertencente ao Sistemo inPEV (SILVEIRA, 2017; CAMPO LIMPO, 2017).

No início do Sistema Campo Limpo as embalagens eram en-caminhadas para incineração, ao longo do tempo percebeu-se que com o plástico reciclado poderia ser produzido diversos produtos. Atualmente são 17 diferentes artefatos. As inovações em produtos originados dos materiais reciclados são divulgadas na rede do inPEV.

No feixe da Logística Reversa de Pneus as principais mudan-ças ocorridas nas práticas, desde 2010, se referem à governança da Pietta focalizando a melhoria das práticas de produção (produto e processo), como: (i) adequação de produto no quesito granulometria de acordo com as demandas de compradores, (ii) medição precisa do material com aquisição de balança de precisão, (iii) adequação dos materiais para em-balagem dos produtos e (iv) maior controle no carregamento de cami-nhões, respeitando a capacidade de carga, entre outros. Algumas dessas medidas estão relacionadas com a prática de logística reversa e se carac-terizam pela melhoria contínua ou inovações incrementais.

No feixe da Logística Reversa de Baterias Automotivas e Estacionárias a localização das mudanças mais expressivas foi identi-ficada no elo distribuidor da cadeia de ação. Para adequar-se as regras estabelecidas houve investimento no aumento do nível de estoque de sucatas de baterias e investimentos, em imobilizado, aplicados na cons-trução de um espaço adequadamente protegido contra intempéries am-bientais, contra possíveis vazamentos e contaminação do local.

No feixe de governança da Logística Reversa de Embalagens Lubrificantes foi tomada uma decisão inovadora em relação ao mode-lo de gestão do feixe, diferente dos outros modelos estabelecidos. Foi realizada uma concorrência promovida pelo Sindicato das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom) para encontrar uma gestora do programa de logística reversa de embalagens plásticas de lubrifican-tes em cada estado. No Paraná, o Grupo Taborda ganhou a concorrência e criou a Celus Ambiental para ser a gestora dessa logística, que atua na coleta das embalagens em todos os pontos de venda de óleos lubrifican-tes, no transporte, no armazenamento, na separação por cores e no envio para a reciclagem desses materiais (GRUPO TABORDA, 2017).

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Na localização das mudanças no Centro de Coleta da Celus Ambiental em Cascavel merecem destaques as modificações nos arran-jos no intuito de promover mais segurança da atividade: (i) as adapta-ções realizadas no piso e alterações no layout do barracão, o que inclui isolamento de paredes e pisos com caneleta para escoamento de óleo em caso de acidente, caixa separadora de óleo e (iii) adequação dos ca-minhões cargos para evitar o derramamento de óleo, como canelas e vedações internas. Essa iniciativa foi do gerente local. A combinação dos materiais utilizados e do método aplicado foi inovadora e tem sido reproduzida nos demais centros de coleta.

A localização de mudanças e inovações na governança da Prática de Compostagem de Resíduos Orgânicos geridas pela Agregare tem dois destaques: um está relacionado ao produto e o outro à pesquisa. A inovação referente ao produto é ensacá-lo, apresentando-o ao consumi-dor em embalagens de diversos tamanhos posto que até agora o produto é vendido à granel e, consequentemente, surge uma nova prática, que está em fase de teste do processo de ensacamento, para estabelecer o tempo, calibragem de equipamentos da produção, os tamanhos de embalagens, a produtividade, a determinação dos tempos de produção, entre outros parâmetros. O processo do registro da embalagem no Ministério da Agricultura está em andamento porque ele estabelece um procedimento para registro de produtos a granel (registro já obtido) e outro para produ-tos embalados.

Outra inovação é a realização de pesquisa experimental, já em andamento: uma área de terra preparada para receber a plantação de soja, com todo manejo orgânico, com controle da alocação de todos os custos e receitas. Os dados da produção convencional de soja eles já têm. O objetivo é fazer um comparativo dos custos/receitas do produto orgâ-nico e com os do convencional. Desta forma terão resultados práticos e matemáticos para subsidiar os argumentos de vendas.

A Prática de Destinação de Resíduos Lenhosos da maneira que ocorre atualmente é relativamente nova em Cascavel, esta prática foi estabelecida legalmente em 2015 reconhecendo a Provopar como legíti-ma comercializadora dos resíduos lenhosos provenientes de retirada de árvores pela SEMA com a finalidade de aplicação em suas práticas de atenção. A inovação está na mudança de destinação desses resíduos, ou

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seja, na atividade e finalidade da prática, que anteriormente era disposto no aterro de inertes passando a uma destinação mais sustentável: combus-tível de biomassa.

Dentre essas práticas de atenção da Provopar, foi implantada em maio de 2015 a Oficina do Pão e com ela a Prática Curso de Pães com a finalidade de capacitar as pessoas na arte de fazer pão, bolo, cucas e outras massas, aprendizado este visando a geração de renda familiar.

Na Prática de Gestão Cooperativa de Materiais Recicláveis da Cootacar a localização das mudanças está relacionada às regras, pois as alterações significativas ficam registradas no Estatuto e/ou Regimento Interno. Sempre que se discute um problema e se chega a um consenso ou a uma resolução que modifica uma regra anterior relativa à gestão ou questões de base, é providenciada a alteração legal tanto no Estatuto quanto no Regimento, o que couber, geralmente ao final do ano.

Fica evidente o uso de regras como norteador das atividades. Mas não só, observa-se que esses instrumentos que incorporam regras, como elemento constitutivo da estrutura de governança da prática, é também o local onde mudanças e inovações importantes em práticas de governança são incorporadas formalmente. A memória organizacional é mantida vívida de maneira verbal quando se recapitula fatos e decisões anteriores.

No feixe de prática de Limpeza Urbana a Prática dos Serviços Diferenciados é nova, consistindo em realizar limpeza de lotes vazios e logradouros públicos, tendo sido necessários arranjos materiais específicos (pá carregadora, retroescavadeira e caminhões caçambas) para sua execução.

Na Prática da Coleta e Destinação de Resíduos Domiciliares, decisões de governança da Ambiental Cascavel resultaram em melho-ria da eficiência da prática, alterações em práticas e em inovações, com destaque para papel da materialidade contribuindo para o aumento ex-pressivo na capacidade de compactação dos resíduos pelo uso de equi-pamentos mais eficientes, apropriados para esse fim, implicando no au-mento da vida útil do aterro, da disponibilização de trator de reserva para não interromper os trabalhos no aterro sanitário em situação de quebra da máquina, da substituição de caminhões de coletas mais mo-dernos tecnologicamente com maior capacidade de compactação, ge-

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rando economia de custos e de tempo, e inserção de novas práticas como a coleta de animais mortos de pequeno porte deixados em via pública.

A Prática de Apoio do Comitê do Meio Ambiente do Sinduscon é uma iniciativa inovadora da governança do Sinduscon Cascavel porque tem como foco principal na sustentabilidade. São de-senvolvidas, nesta prática, atividades de discussão e divulgação de co-nhecimentos (teórico-práticos e legais) com a finalidade ampliar co-nhecimentos sobre a sustentabilidade aplicada à construção civil, regras que ordenam a atividade, sustentados na “ideia de fazer diferente, fazer melhor”.

Quanto às práticas inovadoras de governança para o Núcleo CPCE-ODS e para o Núcleo Setorial de Materiais Elétricos da ACIC elas surgem da ação participativa dos seus agregados, em decisões consen-suais, entretanto, nos casos em que há descontinuidade da prática, como foi o evento de coleta de material eletroeletrônico, caso tenha nova edição não há garantia de acontecer nos mesmos moldes anteriores.

Com relação ao Ministério Público as práticas inovadoras surgem em função do aparato legal, ou seja, são procedimentos coloca-dos em execução no intuito do cumprimento do dever legal e tendem a se reproduzir.

A Sema apresenta maior diversidade de práticas inovadoras de-correntes das funções legalmente atribuídas, do poder discricionário, de influenciação e intervenção no âmbito administrativo e legal (por meio de projetos de leis apresentados e aprovados pelo Poder Legislativo).

As práticas, portanto, são criadas, alteradas, ramificadas, agre-gadas e extintas em virtude do cumprimento do dever legal e adminis-trativo. A maneira como a decisão é tomada depende do contexto, da urgência e da gravidade do assunto em pauta. Geralmente, as discus-sões são fomentadas entre a equipe de trabalho, pontos de vistas e argu-mentos expostos para avaliação do grupo e decisão final do responsável pela pasta. Há espaço para participação externa, sendo o Comam e a Conferência do Meio Ambiente um mecanismo legal de participação.

De modo geral, podemos dizer que novas práticas ao serem colocadas em ação tendem a se reproduzir e que as decisões sobre al-terações em práticas existentes registram mudanças incrementais. As inovações observadas neste estudo se referem à:

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• criação e implantação de novas práticas;• decisões (dizeres) que alteram e/ou extinguem práticas;• alteração em arranjos materiais pela introdução de no-

vas regras, de novos materiais e de instrumentos de gestão;• estabelecimento de novas regras que alteram práticas en-

trelaçadas;• estabelecimento de regras que criam novas práticas;• inclusão ou exclusão de atividades da prática.

As principais inovações da governança da SEMA em relação às práticas de resíduos sólidos, no período de 2009 a 2016, são elencadas no Quadro 9.

QUADRO 8 – PRÁTICAS INOVADORAS DE GOVERNANÇA DA SEMA

Práticas-arranjo Inovadoras de Governança da SEMA

Inovações associadas à Prática da Coleta Legal:Prática de Resíduos Volumosos;Prática de Resíduos Eletroeletrônicos;Prática de Sensibilização Ambiental;Prática de Sensibilização para a Coleta Legal em Condomínios;Mapa da Coleta Legal on line;Ampliação da Coleta Seletiva porta a porta;Extinção da terceirização do serviço de separação de material reciclável no Ecolixo;Fornecimento de sacolas de ráfia aos cidadãos para guarda de resíduos recicláveis.

Destinação correta para todos os tipos de resíduos e divulgação para a população por meio de panfletos informativos.

Regulamentação e implantação da Prática de Gestão de Resíduos da Construção Civil.

Desenvolvimento e implantação da Prática de Cadastro Municipal de Transporte e Entulho.

Produção de Biogás no Aterro Sanitário.

Elaboração e utilização do Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PGIRS) como agen-da de trabalho.

Acompanhamento da implantação de práticas de logística reversa, como o de pneus.

Desenvolvimento de estudos para elaboração de Práticas de Logística Reversa, como os Volumosos.

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Apoio material, logístico e financeiro à Cooperativas de Materiais Recicláveis.

Prática de Limpeza e Conservação de 14 rios urbanos.

Fechamento do Aterro de Inertes (ex pedreira municipal).

Criação de várias práticas: Licenciamento, Lixo no Lixo, Monitoramento de Nascentes, entre outras.

Sistematização de informações para suprir o SINIR.

Fonte: Elaborado pela autora baseada em dados primários, 2016.

A Prática da Gestão Integrada dos Resíduos da Construção Civil teve origem no Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PGIRS), foi concretizada por aparato legal que permite, por meio de regras, intervir em práticas entrelaçadas de resíduos da construção civil.

Além de a própria prática em si ser uma inovação (presente em poucas cidades do Paraná), ela estabelece arranjos materiais para as prá-ticas de transporte de resíduos da construção civil, que foi a instalação e manutenção de rastreador em caminhões utilizados para esse fim. Uma das atividades dessa prática é o monitoramento da localização desses veículos pela Sema.

Outra prática que merece destaque é a Prática da Produção do Biogás, que surgiu de um projeto inovador, desenvolvido por uma equipe de funcionários da Prefeitura de Cascavel, alocados em várias se-cretarias. O projeto utilizou recursos materiais disponíveis no mercado, o que reduziu o custo do projeto. A inovação está na produção do biogás e no compartilhamento da energia gerada com a rede de distribuição da Copel, resultando em créditos para o município.

Ao fim e ao cabo podemos dizer que na Constelação Local de Resíduos Sólidos de Cascavel que existem práticas inovadoras de governança e que elas se desenvolvem de diversas maneiras, como já ex-posto acima, com melhorias contínuas no cotidiano, por meio de ações planejadas, de pesquisas, de regras, pela aplicação de materialidade hu-mana e não humana (materiais, equipamentos, tecnologias, pessoas e organismos) e pelo compartilhamento de conhecimentos, entre outras formas. O que carregam em comum é a busca por um dizer e fazer mais sustentável.

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CAPÍTULO 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

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A Teoria da Prática Social sustenta que o lugar da coexistência humana é um espaço de ser e de integibilidade e acontece em malhas de práticas- arranjos materiais que se diferem entre si em extensão espaço--temporal ou em escala de suas práticas-arranjos compartilhando a ho-rizontalidade da vida social. Essa pesquisa abraçou essa proposta teórica para olhar a questão da governança dos resíduos sólidos em Cascavel, encontrando o entrelaçamento entre práticas, a junção em feixes e estes configurando uma constelação. A direção desse olhar foi sustentada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos.

O movimento iterativo e circular da coleta e análise de da-dos juntamente com a técnica bola de neve possibilitaram o reco-nhecimento de feixes, isto é, a partir da identificação das práticas no campo empírico, os feixes pesquisados foram se delineando, os entrelaçamentos foram sendo identificados assim como a localização das práticas inovadoras da governança.

A configuração das práticas-arranjos e sua junção em feixes ana-lisados por uma miríade de conceitos da Teoria da Prática Social per-mitiu oferecer um olhar diferenciado e compreensivo sobre o fenôme-no social em foco, e nesse sentido se constitui em um caminho para as Ciências Sociais Aplicadas e, especialmente para mim, para a Ciência da Administração.

Na continuidade das Considerações Finais, segue a discussão sobre a pesquisa, as contribuições teóricas, metodológicas e práticas des-te estudo, e seu desenlace com as recomendações para trabalhos futuros.

9.1 DISCUSSÃO SOBRE A TEMÁTICA

O assunto desse estudo foi estabelecido nos seguintes termos:A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), promulgada

pela Lei 12.305/2010, enquanto regra constituinte da prática de resí-duos sólidos municipais e política de intervenção propicia um contexto favorável para mudanças em feixes de práticas e arranjos de resíduos sólidos, especialmente em ações inovadoras relativas à governança pre-sentes tanto nas próprias práticas quanto em feixes especializados em governança.

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A seguir expomos argumentos que embasam a assertiva acima.A Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS) respaldou o

Ministério Público, em 2011, quando este dissolveu o processo licitató-rio para coleta de resíduo domiciliar sem previsão para o serviço de co-leta seletiva e ordenou que se elaborasse outro processo licitatório com previsão para esta atividade (ENTREVISTADO [E09]), posto que a coleta seletiva é dos instrumentos da PNRS (inciso III, do Art. 8º) e uma das responsabilidades do titular dos serviços públicos (inciso II do Art. 36). Esse fato alterou a forma como era feita a gestão de resíduos e principalmente a coleta seletiva. Hoje Cascavel atende 97% da popula-ção urbana com o Programa Coleta Legal.

Práticas inovadoras como a de Sensibilização Ambiental Porta a Porta e de Sensibilização Ambiental em Condomínios desenvolvidas pela SEMA são ações de educação ambiental que apresentaram resulta-dos significativos e são também um dos requisitos constantes no Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PGIRS) (inciso X do Art. 19).

Além delas, outras práticas relacionadas ao Programa Coleta Legal foram criadas como a prática de fornecimento de sacolas de rá-fia aos cidadãos para guarda de resíduos recicláveis e o mapa da co-leta legal que torna acessível ao cidadão informações sobre o roteiro da Coleta Legal. As Práticas de Resíduos Volumosos, de Resíduos Eletroeletrônicos e de Resíduos de Óleo Vegetais foram implantadas em meados de 2015.

Várias foram as mudanças ocorridas na coleta seletiva em Cascavel, entretanto, uma das mais significativas foi a extinção da prática da segregação do resíduo reciclável no Ecolixo (CPTMR). Em julho de 2015 os resíduos recicláveis coletados pelo Programa Coleta Legal passaram a ser entregues diretamente nas Cooperativas de Materiais Recicláveis.

O incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis é entendida como um instrumento da PNRS (inciso IV do Art. 8º). A Prefeitura de Cascavel estabeleceu o Termo de Cooperação Técnica e Financeira como formato para parcerias com cooperativas de materiais recicláveis, para as quais concede auxílio financeiro, nos ter-mos do inciso III do Art. 42 da PNRS.

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A Cootacar firmou convênio com fabricante da embalagem Tetra Pak para separação de embalagens tetra pak com a contrapartida de realização de cursos e assessoria à Cooperativa durante 1 ano, projeto este vinculado ao Termo de Ajuste de Conduta assinado com o Grupo de trabalho G22+1 da Sema-PR.

Em bases semelhantes, em dezembro de 2010 a Cootacar re-cebeu da Abihpec e Abipla doação de um elevador elétrico e caminhão para a coleta seletiva, além de capacitação e apoio à divulgação da coleta seletiva. A contrapartida foi a recuperação de embalagens pós consumo dos produtos das empresas associadas. Essas entidades e indústria colo-caram em ação a recomendação da PNRS (inciso III do §3º do Art. 33) de atuar em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.

O inciso V do Art. 42 da PNRS permite ao poder público instituir medidas indutoras para iniciativas de estruturação de logística reversa. Nesse sentido, a PNRS foi avaliada, pelo Entrevistado [E28] como guia ou ferramenta que dá suporte à tomada de decisões, a exem-plo dos acordos setoriais para logística reversa.

A constituição da Logística Reversa de Pneus em Cascavel é atribuída, pelo Entrevistado [E28], à Política Nacional de Resíduos Sólidos, tendo em vista que essa logística ainda não era realidade em Cascavel. Desse modo, o inciso III do Art. 33 da PNRS respaldou o Termo de Convênio que foi assinado entre as partes (Prefeitura de Cascavel e Reciclanip), ficando o município responsável pela fiscalização, e a logística de transporte e os custos sob a responsabilidade da Reciclanip.

A Pietta, empresa que opera como ponto de recolhimento de pneus para Cascavel e região apresenta inovações incrementais relaciona-das ao processo e produto, já que também é uma recicladora de resíduos pneumáticos. Inclusive seu gestor, o Entrevistado [E05] declarou que se não fossem as leis ambientais não haveria negócio porque ninguém levaria o pneu lá.

A prática de Logística Reversa de Medicamentos em Desuso em Cascavel é um fato devido à exigência da Lei Estadual 17.211/2012

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e do Decreto 9213/2013, claramente alinhados com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (§1º do inciso VI do Art. 33). No entanto, todo o ônus está recaindo sobre farmácias, unidades básicas de saúde e estabe-lecimentos que comercializam ou manuseiam esse tipo de produto, ten-do em vista que não há Acordo Setorial nem Termo de Compromisso em operação em Cascavel.

No feixe de governança da Logística Reversa de Embalagens Lubrificantes a parceria da Celus Ambiental (responsável estadual pela gestão) com o Instituto Jogue Limpo (responsável nacional) ocorreu em 2010, a abertura da empresa em Cascavel foi em 2011 e em 2012 ocor-reu a assinatura do Acordo Setorial Nacional e Termo de Compromisso com o Estado do Paraná, em atendimento ao inciso IV do Art. 33 da PNRS. Os custos de toda a operação recaem sobre a entidade gestora em âmbito nacional. Em Cascavel proporcionou o surgimento da em-presa Celus e novos postos de trabalho.

A logística reversa de Pilhas e Baterias de uso doméstico foi oficialmente implantada com Cascavel em 2015, a partir da inaugura-ção do Atacarejo, rede ligada à Abinee, que mantém Acordo Setorial em âmbito nacional firmado desde 2010 com o Ministério do Meio Ambiente se responsabilizando pela logística reversa desses produtos.

Existem também outros locais que fazem o recolhimento des-ses resíduos, com destaque para os Sistemas Sicoob e Sicredi, em suas unidades de atendimento. Essa iniciativa demonstra o engajamento de entidades com a prática da logística reversa mesmo não estando obri-gadas a elas.

Dispositivos de recolhimento de resíduos provenientes de ce-lulares e periféricos são disponibilizados pelas respectivas redes de tele-fonia celular. Disponibilizar postos de entrega de resíduos reutilizáveis e recicláveis é uma medida recomendada pelo inciso II, §3º do Art. 33 da PNRS como componente do modelo de sistemas de logística reversa.

O inPEV é a entidade gestora do sistema de logística reversa de agrotóxico deste 2001. Esse sistema não é resultado direto Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS), mas esta a tornou obrigatória em seu Art. 33, inciso I. O decreto 7.404/10, que regulamenta a PNRS,

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estabelece, em seu Art. 14, que o sistema de logística reversa de agro-tóxicos, seus resíduos e embalagens devem seguir o disposto na Lei no 7.802/198936 que é complementada pela Lei 9.974/2000.

Em Cascavel, a Addav é uma Central de Recebimento do sis-temo inPEV, gerida por distribuidores e comerciantes de defensivos agrícolas da região. Desde 2002 ocupa um espaço na região rural do mu-nicípio cedido pela Prefeitura de Cascavel, sem custos para a entidade, ação esta autorizada pela Lei Municipal 3.395/2002, e posteriormente respaldada pelo inciso III do Art. 42 e inciso I do Art. 44 da PNRS. A localização da mudança indica as melhorias incrementais, que são resul-tado da participação dos integrantes da rede inPEV e são formalizadas e compartilhados por meio de protocolos e agenda de trabalho, por exem-plo, com toda a rede, incluindo a Addav.

A Logística Reversa de Baterias Automotivas e Estacionárias é realizada individualmente pelas indústrias do setor, pois não há Acordo Setorial firmado em âmbito nacional nem estadual, por meio de Termo de Compromisso. As indústrias do setor operam seu próprio sistema de logística reversa seguindo as instruções do Conama 401/2008. Embora sendo uma prática estabelecida anteriormente à Política Nacional de Resíduos Sólidos (2010), sua obrigatoriedade é explícita no inciso II do Art. 33.

Nesta prática, a grande maioria das indústrias exige a entrega de sucata de bateria na mesma quantidade do pedido de compra, pois elas são responsáveis pela reciclagem e têm metas a serem cumpridas e apresentadas ao Ibama, órgão fiscalizador dessa logística. Se a entrega da sucata é simultânea ou não com a entrega do produto novo é uma definição que cabe às indústrias individualmente.

Porém, essa exigência desencadeou a valoração de sucata de baterias, permitido pelo inciso I do §3º do Art. 33 da PNRS, como uma estratégia para assegurar a devolução das sucatas de baterias pelo pri-meiro elo (consumidores) e segundo elo (oficinas, autoelétricas e demais prestadoras de serviço automotivo) da cadeia de ação. Hoje, com a prá-tica já estabilizada, não compensa financeiramente para o consumidor não aceitar esse sistema à base de troca.

36 Em todos os endereços pesquisados para a Lei 7.802/1989 aparecem as alterações posteriores que sofreu, incluindo a Lei Lei 9.974/2000.

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Sistemas de logística reversa de lâmpadas e de material eletro-eletrônico não existem formalmente em Cascavel, ainda. O que houve e há ainda são ações esporádicas, periféricas, que amenizam, mas não resolvem a situação desses resíduos, porque dependem de iniciativa vo-luntária de entidades e de empresas.

O Acordo Setorial para a Logística Reversa de Lâmpadas, atendendo ao disposto no inciso V do Art. 33 da PNRS, foi assinado em 2014, com cronograma de implantação para 5 (cinco) anos. Para Cascavel, 2017 é o ano de implantação, contando com 3 (três) pontos de recebimento e 7 (sete) recipientes. Até então, uma ação de coleta e reciclagem de lâmpadas ocorreu em 2015 com apoio da ACIC e de seu Núcleo de Material Elétrico, porém restrito ao estoque de resíduos dessas empresas.

Outra ação foi conduzida pelo Núcleo CPCE-ODS relacio-nada aos resíduos eletroeletrônicos (REE), contando com apoio de entidades, colégios, universidade e empresas, no formato de campanha para coleta desses resíduos. São eventos nos quais se recolhe volumes expressivos de resíduos embora sejam sazonais e demonstra a preocu-pação e a mobilização social em direção a um manejo mais sustentável desses resíduos.

Atualmente, a equipe da Sema de Cascavel está elaborando, com o apoio do Ministério Público, a prática da logística reversa deVo-lumosos (móveis e eletrodomésticos), em uma perspectiva de feixe e não somente prática, como se tem agora. Isso exige levantamento de mar-cas, fabricantes, distribuidores, enfim, um conjunto de informações que darão suporte às regras de funcionamento e ao estabelecimento de res-ponsabilidades pela logística reversa desses resíduos, fazendo com que a responsabilidade para manutenção de estrutura física e armazenamento seja transferida para os fabricantes, importadores e comerciantes.

A disposição final ambientalmente adequada em Aterro Sanitário, de resíduos e rejeitos oriundos dos serviços públicos de lim-peza urbana e de manejo de resíduos sólidos, é uma responsabilidade atribuída ao titular desses serviços públicos pela PNRS, no inciso VI do Art. 36.

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A lei também exigia que este requisito fosse cumprido em até quatro anos da data da publicação da lei, ou seja, 2014. Em primeiro de julho de 2015, essa data foi prorrogada para o período de 2018-2021 porque junto com esta alteração foi prevista a implantação esca-lonada, concedendo prazos diferenciados para cidades de tamanhos diferentes, sendo que as cidades menores terão um prazo maior para fazer a adequação.

Esse fato não teve nenhuma repercussão em Cascavel, pois a disposição final de resíduos e rejeitos sólidos em Aterro Sanitário é efe-tuada desde 1995. Desde então nova área foi providenciada, foi adquiri-da área anexa à instalação do Aterro Sanitário. Investimentos realizados em equipamentos mais eficientes, com maior poder de compactação, em anos recentes, contribuem para a sobrevida do aterro sanitário.

Em 2016 foi iniciada a Prática de Produção de Biogás com sis-tema de produção ligado ao sistema de distribuição da Copel, gerando energia e créditos financeiros ao município. O aterro sanitário já pro-duzia energia para sustentar suas atividades desde 2008. A elaboração do projeto e sua implantação foi conduzida por técnicos da SEMA e de outras secretarias da Prefeitura de Cascavel. A utilização de tecnologias visando à recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos é uma das diretrizes da PNRS (§1º Art. 9º).

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) propiciou que o município de Cascavel desenvolvesse uma estratégia para a ges-tão dos resíduos sólidos ao exigir legalmente a elaboração do Plano de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos (PGIRS) (inciso V, do Art. 14 da PNRS).

Esse plano foi apresentado à 9º Promotoria do Ministério Público em Cascavel e em 2012/2013 houve a análise das ações pro-postas para destinação de vários tipos de resíduos, destinações finais, aterro sanitário e separação de resíduos para reciclagem. Para cada um deles foi aberto uma investigação civil, sendo a maioria finalizada com Termos de Ajustamento de Conduta junto ao Município, ainda em fase de cumprimento (ENTREVISTADO [E10]).

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Atualmente esse plano é utilizado como um cronograma ou agenda de trabalho. Para o Entrevistado [E28] “a PNRS veio como um guia, como uma ferramenta que dá suporte as demais decisões”. E essa finalidade corresponde a intenção da PNRS em estabelecer os Planos de Resíduos Sólidos como um de seus instrumentos (inciso I, Art. 8º PNRS).

A próxima gestão pode dar continuidade às atividades planeja-das tendo em vista que foi revisto em 2016, pois a cada 5 anos deve ser reavaliado. O inciso XIX do Art. 19 da PNRS indica que a periodicidade da revisão deve coincidir com o período de vigência do plano plurianu-al municipal, prioritariamente. “A Política Nacional de Resíduos Sólidos teve influência proativa na gestão ambiental de Cascavel, que foi um mu-nicípio que despontou na região. Talvez pela magnitude, pela problemá-tica, a SEMA acabou inserindo e abraçando [a lei]” (ENTREVISTADO [E31]).

O Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil (PGRCC) foi instituída legalmente pela Lei 5.789/2011 e Decreto 9.775/2011 em resposta ao problema que repre-sentava este resíduo em Cascavel, em função do peso e volume diário ser o mesmo do resíduo domiciliar, e do fechamento do Aterro de Inertes da Prefeitura, que se efetivou somente em 2015.

Essa iniciativa da Sema, com apoio da 9º Promotoria do Ministério Público, atendeu também ao disposto nos incisos VII e XVIII do Art. 19 e inciso III do Art. 20 da PNRS, relativas, respecti-vamente, às regras de transporte de resíduos sólidos, à identificação de passivos ambientais e à exigência de elaboração de plano de gerencia-mento de resíduos sólidos.

Vislumbrando o aumento de demanda para processos de licen-ciamento ambiental, em setembro de 2015 foi criado o Departamento de Licenciamento Ambiental (Lei Municipal 6.507/2015) ligado à Secretaria Municipal de Meio Ambiente, posto que a Lei Complementar 140/2011 permitiu que os municípios ficassem responsáveis por alguns processos de licenciamento ambiental e o município de Cascavel aderiu a essa proposta no intuito de agilizar os processos locais. O departamen-

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to novato ficou responsável por 70% dos processos de licenciamentos iniciados no IAP relativos ao município de Cascavel.

A PNRS foi a causa geradora de mudança interna nas em-presas que atuam no segmento de resíduos sólidos pela exigência de licenciamento ambiental, pois este fato tem reflexo em alterações nos procedimentos internos, na elaboração de documentação e no proces-so decisorial (ENTREVISTADO [E09]). O licenciamento ambiental, além de ser um dos instrumentos da PNRS (alínea f, do inciso XVII do Art. 8°), tornou-se parte integrante do Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos, conforme o Art. 24 da PNRS.

“Cascavel é hoje uma das cidades mais bem organizadas na questão da destinação de vários resíduos [...] uma das melhores do Paraná” considera o Entrevistado [E29]. A busca pela destinação corre-ta para todos os resíduos sólidos foi uma meta de gestão cumprida pela Governança da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e ao mes-mo tempo atendeu ao inciso IV do Art. 19 da PNRS.

Para dar publicidade às informações, foi desenvolvido um pan-fleto para distribuição ao público constando o tipo de resíduo sólido e as empresas credenciadas para recebê-los de modo a possibilitar a des-tinação e/ou disposição adequada. Este panfleto pode ser observado no Anexo A.

A PNRS recomenda também que os municípios tenham um sistema de cálculo dos custos da prestação dos serviços públicos de lim-peza urbana e de manejo de resíduos sólidos bem como a forma de cobrança. Em Cascavel, todo o sistema foi revisto em 2000/2001, sendo anualmente reeditado com atualização de valores. Porém, o Entrevistado [E33] afirmou que a receita levantada não cobre a totalidade dos custos que a Prefeitura tem com essa atividade.

“Graças à Política Nacional de Resíduos Sólidos aprova-da em 2010 está existindo demanda para os serviços ambientais, porque se não fosse isso, a questão cultural não estaria mudando nada”, declara o Entrevistado [E09]. Em Cascavel, o segmento de resíduos sólidos apresentou várias mudanças, como o surgimento de novas empresas no mercado assim como novos serviços desen-volvidos por empresas já estabelecidas.

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A PNRS não foi a razão da abertura da Paraná Ambiental, mas encontra nela o sustentáculo para seus negócios, à imagem da Future. Na Paraná Ambiental práticas como Serviço de Palestra e Treinamento, Atendimento Emergencial de Acidentes e Operação de Resíduos Sólidos Municipais são exemplos de novas práticas agregadas à sua prá-tica principal, que é de aterramento industrial de resíduos classe I.

Na Future, as práticas produtivas e os tipos de produtos com-ponentes do agregado reciclado foram criados pelo modelo de aprendi-zado na prática embora fundamentado conceitualmente e tecnicamente. As práticas de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos prove-nientes do agregado reciclado, realizadas em parcerias com instituições de ensino superior, têm trazido resultados importantes para a empresa e expectativas promissoras para as pesquisas ainda em andamento. Vale ressaltar que o modelo de negócio tem dupla entrada de receita e não gera resíduo.

A Agregare, com a prática de compostagem de resíduos orgâ-nicos se revelou uma destinação adequada aos resíduos orgânicos prove-nientes das práticas de Roçada e de Poda de Árvores do feixe de Prática de Limpeza Urbana. Essa parceria é articulada em um modelo de ga-nha-ganha, sem ônus financeiro para as partes.

A Agregare, na dimensão econômica, com a atividade de pro-dução de composto orgânico, também tem encontrado formas diversifi-car o uso de seus produtos, originando novos produtos (em fase de teste) no mercado. Porém, é na dimensão ecológica-ambiental que sua impor-tância se revela: a transformação do passivo ambiental, que representam os resíduos orgânicos de origem animal, principalmente, tornando-o um recurso sustentável pela produção de adubo orgânico.

Para a prática de destinação de resíduos lenhosos são três des-taques a fazer. O primeiro é que é uma prática nova para a Biosfera, uma nova fonte de entrada de recursos financeiros para a empresa. O segundo está na destinação adequada do resíduo lenhoso como fonte de energia de biomassa, contribuindo para a sustentabilidade da ambiental, porque evita a extração de madeira. O terceiro é a geração de renda para o Provopar destinar às suas práticas de atenção social, como a Cozinha Comunitária, a Oficina de Pães e o Banco de Alimentos.

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A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) (i) oportu-nizou o surgimento de novos negócios e o desenvolvimento de novos produtos; (ii) despertou o olhar de cuidado de pessoas e empresas em relação ao meio ambiente; (iii) assegurou legalmente a criação de regras específicas para gestão de resíduos específicos; (iv) subsidiou o proces-so de tomada de decisão; (v) estimulou a criação de novas práticas, a modificação de práticas e alterações em arranjos. Enfim, propiciou um contexto favorável para que a governança de feixes e de práticas de re-síduos sólidos pudessem realizar ações inovadoras na constelação local de Cascavel.

Portanto, a PNRS propiciou um contexto favorável para mu-danças em feixes de práticas e arranjos de resíduos sólidos no município de Cascavel. Embora o município sempre tenha sido proativo no desen-volvimento das práticas, arranjos e feixes que a antecedem, ele também foi além da PNRS ao desenvolver práticas inovadoras de governança não previstas por ela.

Diante dos argumentos apresentados podemos afirmar que a tese para este estudo se confirma.

9.2 OBJETIVOS E PERGUNTAS DE PESQUISA

Esta obra teve como objetivo geral compreender o desenvol-vimento de práticas inovadoras de governança na constelação local de resíduos sólidos no âmbito do município de Cascavel.

Após os preparos teóricos e metodológicos, iniciou-se a busca para cumprir cada um dos objetivos específicos determinados. A inves-tigação em campo possibilitou o reconhecimento das principais ativida-des constituintes da prática e dos feixes de prática, assim como apontou as iniciativas de governança que promoveram modificações em práticas e arranjos, criação de novas práticas e demais ações consideradas inova-doras em seus contextos.

Os resultados foram apresentados em cinco Capítulos relacio-nados aos feixes de resíduos sólidos, aos feixes de logística reversa e so-bre versões sobre a estrutura de governança da prática, respectivamente

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Capítulos 4, 5 e 6. As relações predominantes na constelação local de re-síduos sólidos e o envolvimento de atores foram apreciados no Capítulo 7, sendo destacada a presença dos atores relevantes nas figuras de gráfico de redes no decorrer da descrição dos feixes de práticas de resíduos só-lidos e de logística reversa. As práticas inovadoras de governança foram indicadas e comentadas no Capítulo 8. Na seção anterior, Discussão sobre a Temática, as conexões entre dados empíricos e a PNRS foram evidenciados com maior detalhe.

Considerando que os objetivos e as perguntas de pesquisa estão vinculados entre si e que os resultados da pesquisa contribuem para o esclarecimento do problema inicialmente formulado (como se desen-volvem as práticas inovadoras de governança na constelação local de resíduos sólidos no âmbito do município de Cascavel?), tecemos as se-guintes considerações no intuito de prover uma resposta esclarecedora.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) é uma políti-ca pública que carrega um poder mandatório, isto é, é inevitável atender os requisitos legais, entretanto, há um grau de liberdade sobre a fixação de metas e os métodos adotados, como o modo de execução, de manejo e de controle, desde que não viole os princípios e regras da política pú-blica. A PNRS dispõe sobre os requisitos mínimos a serem atendidos, relaciona princípios, diretrizes e instrumentos, atribui responsabilidades e indica as proibições.

Para os municípios a PNRS estabelece o PGIRS como instru-mento de planejamento e gestão de resíduos sólidos, indicando o conte-údo mínimo. E a administração pública dentro da liberdade concedida pelo poder discricionário que detém, estabelece priorização de ações e cronograma de ações. Na governança de resíduos sólidos da Sema de Cascavel, a pesquisa de campo identificou que o PGIRS é utilizado como uma diretriz para o desenvolvimento de ações, como uma agenda de trabalho.

Observando o que acontece na constelação local e conside-rando os requisitos solicitados pela PNRS a governança dos resíduos sólidos da Sema tem promovido mudanças em suas práticas. Ela têm utilizado as regras como recurso para (i) implantar novas práticas, como

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o licenciamento ambiental, (ii) regular o modo de manejo de resíduos, como é o caso dos resíduos da construção civil, (iii) orientar decisões estratégicas, como são os casos do repasse dos resíduos recicláveis co-letados para as cooperativas de materiais recicláveis, das ações de edu-cação ambiental (práticas de sensibilização ambiental porta a porta e em condomínios) e da identificação de destinação adequada para todos os tipos de resíduos, provendo alternativas de destinação (por meio de novas práticas) para os resíduos que ainda não tinham destinação espe-cíficas (volumosos, eletroeletrônicos, óleo vegetal usado), entre outras mudanças e inovações relacionadas no Capítulo 8.

A PNRS estabelece o Plano de Gerenciamento de Resíduos para empresas geradoras que se enquadram no Art. 20, também relacio-nando requisitos mínimos para sua elaboração.

O princípio da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos compromete fabricantes, importadores, distribuido-res, comerciantes e consumidores a uma destinação adequada dos re-síduos sólidos. Dispõe sobre regras a serem atendidas para a formação de sistemas de logística reversa. Porém, há liberdade para estruturação do modelo de governança.

Os editais para acordos setoriais (nacionais) e termos de com-promisso (estadual) são um convite para que as entidades representati-vas de um dado produto-resíduo apresentem proposta sobre a estrutura e o funcionamento do sistema, que são analisadas posteriormente para aprovação ou ajustes. Caso haja um entendimento da necessidade de se estabelecer legalmente um parâmetro de organização das práticas, regras (resoluções, instruções, leis, decretos, normativas, entre outras) são elaboradas e publicadas (seguindo o processo legal). Parte do que a PNRS dispõe depende dos corresponsáveis pelos resíduos, outra parte do poder público, seja pela via do Ministério Público, seja pela via do Executivo e de seus órgãos ambientais.

De maneira geral, as práticas de resíduos sólidos foram revistas, especialmente após a promulgação da PNRS, em agosto de 2010. Os feixes de Logística Reversa estabelecidos e operando em conformidade com outras regras, afinadas com a PNRS, não sofreram alterações sig-

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nificativas, como o feixe de LR de Agrotóxicos e o de LR de Baterias Automotivas e Estacionária. Para os demais, os reflexos da lei foram diferentes para cada um.

Para o feixe de LR de Pneus, houve o acordo entre as partes (Prefeitura e Reciclanip), definição do Centro de Recolhimento (Pietta). Para o feixe de LR de Embalagens de Lubrificante foi providenciado operadora estadual para a gestão da coleta, transporte e destinação final, com a fixação de Centro de Coleta em Cascavel, tornando também mais regular a prestação desse serviço.

No feixe de LR de Medicamentos de Uso Domiciliar (ven-cidos), uma lei estadual estabeleceu a prática obrigando os estabeleci-mentos comerciantes ou usuários desses medicamentos a providenciar a destinação adequada, a governança desse feixe é descentralizada e o ônus recai sobre esses estabelecimentos sem compartilhamento com fabricantes, importadores e revendedores. Há exceção como o caso da Droga Raia pertencente a uma rede que mantém seu próprio feixe de logística reversa.

No feixe de LR de Pilhas e Baterias, embora haja acordo seto-rial assinado, só há um ponto oficial da Abinee para entrega desses resí-duos. No caso dos celulares e dispositivos afins, cada operadora mantém seu feixe de LR. Há também iniciativas voluntárias que ofertam, aos cidadãos, alternativas para a entrega desses resíduos, como são os casos do Sicoob e do Sicredi.

As relações que acontecem na Constelação Local de Resíduos Sólidos em Cascavel são as mais diversas dentro e entre feixes de gover-nança.

As relações delineadas pela Teoria da Prática Social se referem a prática e arranjos, entre práticas e entre arranjos, cadeias de ação, go-vernança e dinâmica de feixes. Esses conceitos teóricos foram analisados frente às informações levantadas no plano empírico e as classificações apuradas se referem às características mais marcantes de cada feixe.

Nas relações entre prática-arranjo com outras práticas-arranjos as articulações que se sobressaem é a participação em cadeia de ação (ex-ceto o feixe de logística reversa de medicamentos), o compartilhamento

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do espaço de atividade e a presença da organização orquestrada.Analisando as características das cadeias de ações que cada fei-

xe participa, há a presença mecanismos para monitoramento da cadeia, dispositivos de coordenação, sendo que a metade dos feixes analisados está restrita a uma configuração domesticada, isto é, uma um modelo com caminhos e fluxos prefigurados. E todos exigem a presença da go-vernança, e novamente, a exceção vai para a logística reversa de medi-camentos.

Quanto à governança, a maioria apresenta vinculação com dois tipos de atuação, na configuração mandatória/acordada, obrigatória/colaborativa, mandatória/colaborativa, mandatória/autônoma, entre ou-tros modelos. Essa classificação diz respeito se a atuação de governança é estimulada pela obediência à lei, por estar obrigada a ela, se é colabo-rativa, negociada ou autônoma, considerando os atores nela envolvidos. Em relação à expansão espacial, 4 feixes se restringem à Constelação Local, e 8 a extrapolam, por razões diversas.

E agora, as relações que caracterizam a dinâmica dos feixes e por consequência a constelação local. O entrelaçamento entre prá-ticas dentro e entre feixes é o fenômeno que mais se repete nos feixes analisados, secundados pela bifurcação e estabilidade/solidificação. A acumulação e difusão também são encontradas em metade dos feixes. Tanto os conceitos de a evolução quanto de polyplasis e de dissolução são encontrados em dois feixes cada um. O fenômeno fusão foi encon-trado em um feixe.

Considerando a exigência do licenciamento ambiental como requisito fundamental para operação das atividades relacionadas ao ma-nejo dos resíduos sólidos, assim como a necessidade de as organizações elaborarem o plano de gerenciamento de resíduos e de indicarem res-ponsável técnico, sinaliza para a capacitação técnica das pessoas envolvi-das na governança dessas práticas. Como salienta o Entrevistado [E09], é exigido muito mais conhecimentos para quem lida com “lixo” do que para outros negócios normais. E isso foi efetivamente comprovado em observação e durante as entrevistas, quando solicitamos a fala sobre for-mação e experiência na área.

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Portanto, não é difícil compreender porque os atores envolvi-dos na governança da prática de resíduos entendem a Política Nacional de Resíduos Sólidos como necessária, aquela que vem indicar como é o fazer correto [para aqueles que não o fazem], aquela que vem legitimar e, ainda que indiretamente, impulsionar os negócios, aquela que vai com o tempo separar o joio do trigo.

Na análise das versões da estrutura de governança da prá-tica dois aspectos se sobressaíram: o uso das regras como dire-trizes para as ações, significando, portanto, aderência à PNRS, e o envolvimento emocional com a atividade, envolvimento este baseado em valores ecológicos.

Nesse sentido, a governança das diferentes práticas segue re-gras, faz com que novas práticas sejam introduzidas visando a ampliação de serviços e desenvolvimento de produtos, e que novos investimentos sejam realizados alterando arranjos para obter maior eficiência.

9.3 CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS, METODOLÓGICAS E PRÁTICAS

Foi desafiante aplicar os conceitos teóricos de forma apropria-da à descrição e à análise de práticas e de feixe de práticas, possibilitando uma compreensão concreta da Teoria, considerando também os funda-mentos da pesquisa qualitativa e os caminhos e implicações metodoló-gicas indicados por Schatzki (2005, 2008).

Uma contribuição teórica relevante desta pesquisa é a aplicação prática dos conceitos teóricos da Teoria da Prática Social, a validação de seus conceitos porque encontra aderência na vida social e também por-que não há divulgação de trabalhos acadêmicos com a mesma abordagem desse livro associando os assuntos resíduos sólidos, inovação e governança na perspectiva da Teoria da Prática Social no Brasil, segundo pesquisa realizada.

Entretanto, o trabalho que mais se aproxima à temática aqui estudada é uma produção do próprio Schatzki, publicada em 2015, in-

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titulada “Practices, governance and sustainability”, fato que indicou ter escolhido caminho interessante e inovador, ao mesmo tempo trouxe segurança porque nessa obra a própria Teoria da Prática Social revela algumas questões e respostas ao que antes era muda. Esses conceitos foram muito importantes para a elaboração das categorias analíticas, especialmente aquela relativa à governança.

Outro destaque é a elaboração de conceitos como o de conste-lação local e a de inovação. O conceito de constelação local foi necessi-dade nascida da própria elaboração do problema de pesquisa, uma vez que as práticas seriam apresentadas em feixes e o conjunto de feixes sen-do uma constelação, esta teria que ter alguma limitação espacial. A solu-ção foi dada pela própria teoria por meio de três ideias: (i) quando traz a ideia da horizontalidade da vida social (SCHATZKI, 2015a, 2015b) e de que (ii) os tipos de relação que conectam práticas e arranjos a fei-xes são os mesmos que conectam feixes a constelações (SCHATZKI, 2015b), e (iii) quando denomina fenômenos sociais amplos como aque-les que marcam extensão espacial significativa, considerando-os como constelações de feixes (SCHATZKI, 2011, 2015b).

O conceito de inovação foi construído alicerçado na ideia da indeterminação da ação: toda ação ou a atividade humana é um agir em direção a um fim a partir de algo motivador. Daí seu caráter im-permanente e abertura para o novo, para o dizer e o fazer diferente (SCHATZKI, 2006a; 2006b). As práticas inovadoras são aquelas que surgem de tomada de decisão realizada pela governança, que as alteram (em relação às atividades e arranjos), que as criam ou as tornam extintas, enfim, são práticas novas porquanto criadas ou modificadas.

Ao realizar a análise da dinâmica da constelação local utilizan-do como referência os conceitos propostos por Schatzki um fenômeno encontrado na realidade empírica se tornou evidente e sem aproximação com os conceitos teóricos pré-determinados. Desse modo o conceito de polyplasis foi elaborado. Polyplasis tem sua origem etimológica em gre-go (poly, significando muito; plasis, significando formação), e significa diversos pontos de formação ou origem, um tipo de fenômeno social que ocorre em práticas e que caracteriza o feixe de práticas pelo surgimento

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autônomo de práticas com mesma finalidade, porém dissociadas entre si, sem a presença de entrelaçamentos e, portanto, não compartilham da mesma cadeia de ação.

Essas práticas contêm as mesmas ações, respondem às mesmas regras, e apresentam as mesmas finalidades, contudo não apresentam entrelaçamento entre si. Essas práticas surgiram em locais diferentes dentro da mesma constelação local, por isso diversos pontos de forma-ção. Algumas desenvolveram feixes próprios. Após a constituição dessas práticas elas permanecem autônomas e como não há a presença de uma governança central, pode-se dizer que a governança é descentralizada com ação periférica. Esse fenômeno foi observado no Feixe de Prática de Logística Reversa de Medicamentos.

Esse fenômeno também foi identificado no Feixe de Governança da Logística Reversa de Baterias Automotivas. Embora essa matéria te-nha sido regulamentada pela Instrução do Conama 401/2008, não foi feito nenhum Acordo Setorial, pois as indústrias decidiram estabelecer seu próprio sistema de logística reversa. Então, esse feixe se caracteriza por não apresentar uma governança central que reúna as indústrias, mas sim uma atuação autônoma, ocupando um espaço periférico.

Desse modo podemos dizer que o fenômeno social polyplasis se caracteriza por diversos pontos de formação, atuando de forma au-tônoma e realizando ações periféricas em um modelo de governança descentralizado. Nesta pesquisa identificaram-se dois feixes com essas características: o Feixe de Medicamentos que tem sua extensão espacial limitada à constelação local de resíduos sólidos em Cascavel e o Feixe de Logística Reversa de Baterias Automotivas e Estacionárias, cuja ex-tensão espacial alcança o plenário dessa prática no território nacional. Este foi um conceito surgido da realidade empírica a serviço da Teoria da Prática Social que poderá vir a ser validado em outras pesquisas rela-cionadas a outros contextos sociais e ser, consequentemente, inserido no rol de conceitos pertencentes à Teoria da Prática Social.

As contribuições metodológicas desta obra são singelas. A pri-meira delas se refere a delimitação do estudo à constelação local de re-síduos sólidos, que se mostrou adequada ao escopo do estudo. O olhar

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da Teoria da Prática Social para fenômenos sociais locais em ligações de feixes e formação de constelação possibilita uma compreensão dos fenômenos que acontecem no local onde vivemos, nos municia de infor-mações para a tomada de decisão, e indica a possibilidade desses feixes locais estarem conectados a outros feixes de práticas- arranjo em uma extensão espacial mais ampla.

A segunda delas relaciona-se à decisão pela estratégia gradual da amostra, primeiro porque as condições do estudo preencheram os critérios indicados para a escolha desse tipo de amostragem, e segundo porque embora tenha centralizado entrevistas nas figuras das pessoas responsáveis pela governança ainda assim a saturação teórica se deu em ampla maioria dos casos.

A terceira delas é relativa à utilização do recurso metodológi-co de bola de neve para a seleção dos pesquisados, que apresentou um alto grau de eficiência. As indicações foram muito relevantes e inseridas logicamente na cadeia de ação, uma observação realizada durante a pes-quisa de campo.

A derradeira das contribuições metodológicas é a associação da pesquisa documental com os relatos de entrevistas. Além da oportu-nidade de triangulação dos dados, essas informações são mais precisas quanto ao registro dos acontecimentos na linha temporal. Muitos entre-vistados não conseguiram precisar a época dos acontecimentos, mesmo os mais recentes: “foi em torno de [...].”. Desse modo a pesquisa docu-mental reforçou a existência dos acontecimentos e deu maior precisão à narrativa.

Dentre as contribuições práticas que esta pesquisa pode levar ao campo empírico realçamos a ação de Sistematizar a organização das práticas de resíduos sólidos em feixes, de modo a torná-lo explícito, en-seja o conhecimento sobre quais são as práticas e os arranjos materiais envolvidos, como elas se desenvolvem e acontecem no cotidiano, como se conectam entre si, com outros atores, quais entrelaçamentos estabele-cem com outras práticas. Enfim, possibilita compreender a importância, a inter-relação e o alcance ambiental, econômico e social dessas ativi-dades.

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O olhar sobre as atividades humanas como feixes de práti-cas compartilhadas permite aos responsáveis pela governança planejar caminhos futuros e elaborar políticas públicas de modo a considerar a existência de feixes e não somente prática como atividades isoladas, tendo como ponto de referência as cadeias de ações que percorrem prá-ticas e feixes de práticas. A partir da visão das cadeias de ações que perpassam práticas e arranjos materiais identificam-se os nexos que de-mandam mais atenção, atividades e relações que podem ser alteradas e melhoradas.

A disseminação dos resultados da pesquisa para empreendedo-res pode inspirá-los ao desenvolvimento e/ou transformação de práticas neste setor de atividade. Novos negócios e empresas podem surgir, e como consequência, postos de trabalho.

Compartilhar experiências de várias empresas que se abriram para a pesquisa acadêmica pode contribuir para que empresários e ges-tores a visualizem como um serviço prestado pela academia à sociedade, que há utilidade prática na pesquisa acadêmica, e esse entendimento pode estreitar o caminho entre teoria e prática.

9.4 RECOMENDAÇÕES PARA TRABALHOS FUTUROS

Esta pesquisa pode ser utilizada como ponto referencial para estudos mais profundos sobre o mesmo fenômeno social ou fenômenos sociais adjacentes na mesma constelação local ou em outra constelação. Há ainda feixes de logística reversa que não foram abordados aqui ou mesmo que não foram identificados nesta constelação local ou ainda em fase de estudo, como o de material eletroeletrônico, óleos vegetais, filtros de óleo lubrificante, vidros, volumosos, metal mecânico, tintas, entre outros.

Esta obra também pode ser utilizada como referência para o entendimento de outra realidade local sobre a mesma temática. Uma abordagem complementar poderia ser desenvolvida focalizando a práti-ca de separação de resíduos sólidos (em domicílios, comércio, escolas) e

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suas versões de estrutura de governança.Sugere-se considerar a possibilidade de investigação futura que

enfoque as reflexões teórico-empíricas da matriz da estrutura de go-vernança da prática com suas versões a fim de confirmar as relações e aspectos revelados nesta pesquisa assim como descobrir outras relações.

Há muitos conceitos na Teoria da Prática Social a serem de-senvolvidos, especialmente aqueles relacionados aos fenômenos sociais amplos. Alguns deles são nominados por Schatzki, porém não conceitu-ados, desse modo, a identificação e a construção de conceitos a partir da pesquisa empírica contribuiria para a compreensão desses fenômenos.

Uma última recomendação de pesquisa, mas esta é para o pes-quisador: A Teoria da Prática Social não é somente uma construção de conceitos, antes, é uma forma de compreender o mundo.

À guisa de conclusão, a Política Nacional de Resíduos Sólidos tem como um dos objetivos destinar aos Aterros Sanitários a menor quantidade de rejeitos possível, e para isso conta com o reaproveitamen-to e a reciclagem de resíduos sólidos que além de aplicar o princípio da prudência ecológica, pela economia do estoque dos recursos naturais, busca também a aplicação do princípio da eficiência econômica, rein-troduzindo esses resíduos no sistema produtivo, seja ele o mesmo de origem ou não, proporcionando diversidade de usos e vida longa ao ma-terial. Ativa a economia pela geração de negócios que surgem e, como consequência, a geração de postos de trabalho e incentiva a inclusão social pelo trabalho digno garantidor de renda.

Em meio a tudo isso a governança e a inovação possibilitam que as práticas sejam alteradas e com ela o nosso espaço de convivência. Talvez, não de forma ideal, mas ainda inicial, a solidariedade sincrônica e diacrônica comece a ser uma realidade em nossas vidas humanas en-trelaçadas.

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ANEXO A PANFLETO DE DIVULGAÇÃO DE DESTINAÇÃO ADEQUADA POR

TIPO DE RESÍDUO

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