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EFEITOS DA IRRADIAÇÃO E REFRIGERAÇÃO NA QUALIDADE E NO VALOR NUTRITIVO DA TILÁPIA ( Oreochromis niloticus) ALESSANDRA APARECIDA ZILIO COZZO DE SIQUEIRA Dissertação apresentada à Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, para obtenção do título de Mestre em Ciências, Área de concentração: Ciência e Tecnologia de Alimentos. PIRACICABA Estado de São Paulo – Brasil Outubro – 2001

EFEITOS DA IRRADIAÇÃO E REFRIGERAÇÃO NA … · 3 Postas de peixe armazenadas em recipiente tipo “placas de Petri” para posterior ... resultados mostraram tendência ao aumento

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  • EFEITOS DA IRRADIAO E REFRIGERAO NA QUALIDADE

    E NO VALOR NUTRITIVO DA TILPIA (Oreochromis niloticus)

    ALESSANDRA APARECIDA ZILIO COZZO DE SIQUEIRA

    Dissertao apresentada Escola Superior deAgricultura Luiz de Queiroz, Universidadede So Paulo, para obteno do ttulo deMestre em Cincias, rea de concentrao:Cincia e Tecnologia de Alimentos.

    PIRACICABA

    Estado de So Paulo Brasil

    Outubro 2001

  • EFEITOS DA IRRADIAO E REFRIGERAO NA QUALIDADE

    E NO VALOR NUTRITIVO DA TILPIA (Oreochromis niloticus)

    ALESSANDRA APARECIDA ZILIO COZZO DE SIQUEIRA

    Nutricionista

    Orientadora: Prof. Dr.a MARLIA OETTERER

    Dissertao apresentada Escola Superior deAgricultura Luiz de Queiroz, Universidadede So Paulo, para obteno do ttulo deMestre em Cincias, rea de concentrao:Cincia e Tecnologia de Alimentos.

    PIRACICABA

    Estado de So Paulo Brasil

    Outubro 2001

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)DIVISO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAO - ESALQ/USP

    Siqueira, Alessandra Aparecida Zilio Cozzo deEfeitos da irradiao e refrigerao na qualidade e no valor nutritivo da Tilpia

    (Oreochromis niloticus) / Alessandra Aparecida Zilio Cozzo de Siqueira. - -Piracicaba, 2001.

    137 p. : il.

    Dissertao (mestrado) - - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz,2001.

    Bibliografia.

    1. Alimento processado 2. Conservao de alimento por irradiao 3.Conservao alimento processado 4. Tecnologia de alimento 5. Tilpia 6. Valornutritivo I. Ttulo

    CDD 664.94

    Permitida a cpia total ou parcial deste documento, desde que citada a fonte O autor

  • Dedico ao meu marido,pelo incentivo, compreenso e carinho.

    A minha famlia,pelo apoio, auxlio espiritual e entendimento.

    E a DeusPela vida e oportunidade de crescer.

  • AGRADECIMENTOS

    minha famlia e, principalmente ao meu marido Rogrio Durvalino de Siqueira

    pelo apoio e compreenso;

    Aos meus pais Antonio Joo Cozzo e Marlene Apparecida Zilio Cozzo, e tambm

    ao meu irmo Alexandre Antonio Zilio Cozzo pelo incentivo, apoio emocional e auxlio

    espiritual;

    minha orientadora Dra. Marlia Oetterer, pelo incentivo emocional, amizade e

    dedicao durante toda a realizao do curso de mestrado e elaborao do trabalho da

    dissertao;

    Escola Supeiror de Agricultura Luiz de Queiroz- Universidade de So

    Paulo Departamento de Agroindstria, Alimentos e Nutrio pela disponibilidade dos

    laboratrios para o desenvolvimento das pesquisas;

    Fundao de Apoio Pesquisa do Estado de So Paulo (FAPESP) pela bolsa

    de mestrado e financiamento da pesquisa;

    Ao Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA) pela permisso de uso da

    fonte de Cobalto GammaBean para irradiao das amostras;

    Dra. Rachel E. Domarco pela colaborao na conduo da irradiao das

    amostras;

  • iv

    Ao Instituto de Tecnologia de Alimentos (ITAL) Campinas, pelas anlises

    realizadas;

    Ao Prof. Dr. Cludio Rosa Gallo pela colaborao e auxlio na elaborao da

    anlise microbiolgica;

    Dra. Marta Helena Fillet Spoto pela colaborao, amizade e auxlio na

    elaborao da anlise sensorial;

    Profa. Dra. Marisa A.B. Regitano dArce pelo incentivo, amizade e sugestes;

    Aos funcionrios do Departamento de Agroindstria, Alimentos e Nutrio

    especialmente s tcnicas do Setor de Processamento de Alimentos - Laboratrio de

    Pescado, Ivani Marchetto Moreno, Roberta Rizzo Benato e Juliana Antunes Galvo;

    s bibliotecrias Beatriz Helena Giongo e Midiam Gustinelli pela correo das

    referncias bibliogrficas;

    A todos os participantes da anlise sensorial;

    E a todos que contriburam direta ou indiretamente para a execuo deste

    trabalho.

  • SUMRIO

    Pgina

    LISTA DE FIGURAS......................................................................................... viii

    LISTA DE TABELAS........................................................................................ x

    RESUMO............................................................................................................ xii

    SUMMARY xiv

    1 INTRODUO .......................................................................................... 1

    2 REVISO DE LITERATURA ....................................................................... 7

    2.1 Produo e consumo de pescado................................................................. 7

    2.2 Pescado como matria prima...................................................................... 12

    2.3 Processamento do pescado refrigerado....................................................... 20

    2.4 Composio e valor nutritivo do pescado................................................... 22

    2.4.1 cidos graxos insaturados ..................................................................... 28

    2.5 Contaminao microbiolgica do pescado.................................................. 32

    2.6 Efeito das radiaes ionizantes nos alimentos............................................. 34

    2.6.1 Efeito das radiaes sobre os microrganismos........................................... 41

    2.6.2 Aplicaes das irradiaes em alimentos.................................................... 48

    2.7 Propriedades sensoriais dos alimentos......................................................... 51

  • vi

    3 MATERIAL E MTODOS ............................................................................. 54

    3.1 Pescado........................................................................................................ 54

    3.2 Beneficiamento da matria-prima................................................................. 54

    3.3 Irradiao do pescado.................................................................................. 56

    3.4 Refrigerao do pescado.............................................................................. 58

    3.5 Anlises microbiolgicas.............................................................................. 59

    3.6 Anlises fsico-qumicas e nutricionais ........................................................ 60

    3.7 Anlise sensorial .......................................................................................... 60

    3.8 Delineamento experimental ........................................................................ 62

    4 RESULTADOS E DISCUSSO .................................................................. 64

    4.1 Composio centesimal ................................................................................ 64

    4.2 Bases nitrogenadas volteis totais ............................................................... 67

    4.3 Nitrognio no-protico .............................................................................. 72

    4.4 pH ............................................................................................................... 74

    4.5 Anlises microbiolgicas ............................................................................. 78

    4.6 Substncias reativas ao cido tiobarbitrico (TBARS) ................................ 83

    4.7 Anlises nutricionais .................................................................................... 88

    4.7.1Aminocidos ........................................................................................... 88

    4.7.2 cidos graxos ......................................................................................... 93

    4.7.3 Vitamina B1 (tiamina) e vitamina A ............................................................... 96

    4.8 Anlise sensorial ......................................................................................... 98

  • vii

    5 CONCLUSES ............................................................................................ 104

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................ 106

    APNDICE...................................................................................................... 134

  • LISTA DE FIGURAS

    Pgina

    1 Smbolo Radura ................................................................................................... 38

    2 Limpeza e manipulao do peixe ........................................................................ 55

    3 Postas de peixe armazenadas em recipiente tipo placas de Petri para posterior

    irradiao e armazenamento refrigerado ............................................................. 55

    4 Fils de tilpia dispostos em bandejas de isopor para posterior irradiao e

    armazenamento refrigerado .............................................................................. 56

    5 Fonte de cobalto-60, modelo Gammabean 650 da Nordion, Otawa/Canad, utilizada

    para a irradiao das amostras de pescado............................................................ 57

    6 Armazenamento refrigerado ................................................................................ 58

    7 Laboratrio de Anlise Sensorial ...................................................................... 61

    8 Bases nitrogenadas volteis totais, em matria mida, do pescado no irradiado e

    irradiado, segundo o tempo de armazenamento ................................................... 68

    9 Nitrognio no protico do pescado no irradiado e irradiado em matria seca,

    segundo o tempo de armazenamento ................................................................... 73

    10 Valores de pH do pescado no irradiado e irradiado, segundo o tempo de

    armazenamento ..................................................................................................... 75

  • ix

    11 Valores de TBARS do pescado no irradiado e irradiado em matria mida, segundo

    o tempo de armazenamento ................................................................................. 84

  • LISTA DE TABELAS

    Pginas

    1 Componentes nitrogenados em msculo de peixes brasileiros de gua doce........ 19

    2 Necessidades dirias de aminocidos essenciais e contedo destes no

    pescado.................................................................................................................. 23

    3 cidos graxos (g/100g) constituintes de partes comestveis de peixes

    comerciais............................................................................................................. 31

    4 Composio centesimal (g/100g de matria seca) do peixe no irradiado e irradiado,

    segundo o tempo de armazenamento .................................................................... 64

    5 Coliformes totais em pescado no irradiado e irradiado, segundo os perodos de

    armazenamento sob refrigerao .......................................................................... 79

    6 E. coli em pescado no irradiado e irradiado, segundo os perodos de armazenamento

    sob refrigerao ..................................................................................................... 79

    7 Microrganismos psicrotrfilos nas amostras de pescado no irradiado e irradiado,

    segundo os perodos de armazenamento sob refrigerao .................................... 80

    8 Aminocidos (mg/100g em matria seca) do peixe no irradiado e irradiado, segundo

    o tempo de armazenamento (inicial e 20 dias)....................................................... 89

  • xi

    9 cidos graxos do pescado no irradiado e irradiados armazenados sob refrigerao

    por at 20 dias ..................................................................................................... 94

    10 Vitamina B1 (em mg/100g), retinol (em mcg/100g) e vitamina A (em UI/100g) no

    pescado no irradiado e irradiado armazenados sob refrigerao por 20

    dias........................................................................................................................ 97

    11 Mdias de doses para o teste hednico de aparncia e aroma do pescado no irradiado

    e irradiado armazenado sob refrigerao................................................................ 99

  • EFEITOS DA IRRADIAO E REFRIGERAO NA QUALIDADE E NO

    VALOR NUTRITIVO DA TILPIA (Oreochromis niloticus)

    Autora: ALESSANDRA APARECIDA ZILIO COZZO DE SIQUEIRA

    Orientadora: Prof. Dr. MARLIA OETTERER

    RESUMO

    Esta pesquisa teve por objetivo prolongar o tempo de vida comercial do pescado

    beneficiado, atravs da utilizao das radiaes ionizantes, associadas s tcnicas

    complementares de refrigerao, sob a tica do alimento minimamente processado.

    Analisou-se os aspectos fsicos, qumicos, nutricionais e microbiolgicos de tilpias da

    espcie niltica (Oreochromis niloticus) evisceradas e em cortes comerciais, separadas

    em amostras irradiadas com 1; 2,2 e 5 kGy e no irradiadas, armazenadas sob

    refrigerao na faixa de 0,5 a -2C, durante 20 e 30 dias. Notou-se que a umidade nas

    amostras no irradiadas diminuiu, com conseqentes alteraes nos teores de protena e

    lipdeos, que aumentaram nos perodos de anlise; j as amostras irradiadas mantiveram-

    se estveis. O pH foi um indicativo importante para a determinao do frescor do peixe,

  • xiii

    associado ao ndice de bases nitrogenadas volteis totais (BNVT) e ao nitrognio no-

    protico (NNP) os quais, mostraram-se crescentes para as amostras no irradiadas;

    enquanto que para as irradiadas mantiveram-se estveis. O acompanhamento

    microbiolgico para coliformes totais e fecais durante o perodo de armazenamento,

    permitiu verificar a eficcia da irradiao, uma vez que, as amostras irradiadas

    apresentaram contagens microbiolgicas abaixo dos valores mnimos estabelecidos pela

    legislao para pescado, fato que no ocorreu para as amostras no irradiadas.

    Salmonella e Staphylococcus aureus no foram detectados.

    Analisaram-se os teores de aminocidos, em matria seca, e de cidos graxos dos

    lipdeos extrados das tilpias, notando-se estabilidade nas amostras irradiadas e

    decrscimo nos valores encontrados para as no irradiadas, nos perodos estudados.

    Determinaram-se tambm, substncias reativas ao cido tiobarbitrico (TBARS) e os

    resultados mostraram tendncia ao aumento conforme o aumento da dose de irradiao.

    A boa aceitao para aparncia, aroma, cor e textura obtida na anlise sensorial

    dos produtos armazenados por um perodo de 30 dias, mostrou a viabilidade do processo

    combinado de irradiao e refrigerao quanto inteno de estender a vida til das

    tilpias submetidas ao processamento mnimo.

    Palavras-chave: pescado cultivado, tilpia niltica, tilpia minimamente processada,

    irradiao, refrigerao, bases nitrogenadas volteis totais, nitrognio no protico.

  • EFFECTS OF IRRADIATION AND REFRIGERATION ON THE NUTRIENTS

    AND SHELF-LIFE OF TILAPIA (Oreochromis niloticus)

    Author: ALESSANDRA APARECIDA ZILIO COZZO DE SIQUEIRA

    Adviser: Prof. Dr. MARLIA OETTERER

    SUMMARY

    The objective of this study is to enhance the shelf-life of processed fish,

    combining ionizing radiation and refrigeration with minimal processing. The physical,

    chemical, nutritional and microbiological characteristics of the specie Tilapia nilotica

    (Oreochromis niloticus) were studied in eviscerated samples and in commercial cuts.

    The fish were separated into samples irradiated with 1.0, 2.2 and 5 kGy and non-

    irradiated samples. They were stored at temperatures ranging from 0.5C to -2C for 20

    and 30 days. During storage, the level of moisture in the non-irradiated samples

    decreased and the levels of protein and lipid increased while the irradiated samples

    remained stable.

  • xv

    The levels of pH, TVB-N and NPN increased in the non-irradiated samples but

    tended to remain stable in the irradiated fish samples. During storage, microbiological

    analyses for the presence of coliforms proved the efficiency of the irradiation process.

    The irradiated samples had a microbiological content below the levels established by the

    Brazilian seafood legislation, whereas the non-irradiated samples had a higher

    microbiological content and were not in conformity with the officially permitted levels.

    Salmonella spp. and Staphylococcus aureus were not detected. The levels of amino acids

    in muscles and fatty acids in oil remained stable in the irradiated fish stored samples but

    decreased in the non-irradiated ones. Lipid-oxidation, measured by the TBARS test,

    showed a tendency to increase when the dose of irradiation increased.

    The storage products after 30 days showed good acceptability for sensorial

    parameters, aparance, odour, color and texture, so it is possible to increase the shelf life

    of a minimally processed tilapia using combined irradiation and refrigeration.

    Key words: freshwater cultivated fish, fish shelf life, tilapia (Oreochromis niloticus),

    minimally processed tilapia, irradiation, refrigeration, total volatile basic nitrogen, non-

    protein nitrogen.

  • 1 INTRODUO

    As necessidades mundiais de alimentos foram aumentando e os problemas, advindos

    da demanda de estruturas adequadas de armazenamento e processamento, levaram busca de

    novos mtodos de preservao. Neste contexto, a irradiao utilizada como um mtodo de

    preservao dos alimentos, tanto in natura quanto como coadjuvante dos processados

    industriais (Villavicencio, 1998).

    O aumento na prtica da piscicultura para produo de pescado leva possibilidade

    de aplicao de mtodos mais eficientes e saudveis de comercializao, trazendo confiana

    ao consumidor. Todavia, com a expanso do comrcio internacional e inter-regional de

    gneros alimentcios, os riscos de contaminao podem aumentar, se transportados por longas

    distncias sem as devidas condies de armazenamento (Kferstein & Abdussalam, 1999).

    A produo mundial da aqicultura para pescado, moluscos, crustceos e algas

    marinhas, em 1985 foi de, aproximadamente, 11,7 milhes de toneladas. A piscicultura

    representou naquele ano 10% da produo mundial de pescado, sendo 44,5% de peixes

    (carpas, tilpias, salmondeos e catfishes), 26,5% de moluscos (ostras, mexilhes e mariscos),

    2,5% de crustceos (camares) e 26,5% de algas marinhas; deste total, 53%

  • 2

    foram obtidos em guas frias, 40% em gua salgda e 7% em gua saloba (Nash, 1988). Em

    1997, a aqicultura brasileira produziu 70.500 toneladas de pescado, o que corresponde a

    pouco mais de 0,2% das 36,5 milhes de toneladas mundiais produzidas, atualmente.

    necessrio, portanto, uma interferncia nesta produo com uma viso agronegocial, o que

    criar condies competitivas para o Brasil em nvel mundial (Madrid, 2000).

    O Brasil ainda importa parte do pescado que consome, apesar da produo

    proveniente da aqicultura nacional ter triplicado nos ltimos anos, passando de 26,8 mil

    toneladas em 1992, para cerca de 80 mil em 1999. Todavia, necessrio que o pas aprenda

    a vender melhor seu peixe, no sentido prprio da expresso, sendo preciso, uma melhor

    campanha promocional do pescado nacional, utilizando todos os meios de comunicao

    (Medeiros et al., 2000).

    Para tornar o Brasil um pas mais gil, o Governo brasileiro decidiu mudar a forma de

    planejar e executar as aes criando culturas gerenciais, com diretrizes estratgicas a fim de

    consolidar a estabilidade econmica com crescimento sustentvel; promover o

    desenvolvimento gerando empregos e oportunidades de renda, entre outras medidas. Foi

    criado, portanto, o programa Avana Brasil, um plano plurianual previsto para o perodo de

    2000 a 2003, do qual foram constitudos 365 programas prioritrios, entre os quais encontra-

    se o Desenvolvimento da Aqicultura que consta de recursos oramentrios da ordem de 50

    milhes de reais (Madrid, 2000).

    Enquanto a demanda de produtos de pescado vem aumentando em todo mundo, em

    vista da conscientizao do timo valor nutricional deste produto, a disponibilidade deste ao

  • 3

    consumidor no acompanha tal crescimento. necessrio, portanto, a implementao de

    prticas de conservao e preparo destes gneros, incluindo peixes de menor porte, o que

    promover a prtica da piscicultura; so prioritrios os esforos para melhorar a forma de

    abatimento, uma vez que, cerca de 25% do total de pescado capturado em todo mundo

    descartado devido ao manuseio inadequado (Venugopal et al., 1999; Villavicencio, 1992).

    A ateno dos consumidores est voltada aos alimentos de convenincia (inclusive

    embalagem e distribuio), aos atributos nutricionais, extenso da vida til e segurana.

    Para atender a estas exigncias, a agroindstria brasileira tem evoludo na base de assimilar os

    avanos conseguidos em sistemas agroindustriais mais desenvolvidos, via compra de patentes,

    por empresas nacionais ou na associao de empresas, via joint venture (Bliska, 1997).

    Como em outras reas produtivas novos materiais e tecnologias surgiram para

    propiciar o progresso tecnolgico agroindustrial. Com a globalizao, a conscientizao do

    consumidor est mais voltada para os alimentos mais saudveis, mais nutritivos e com

    aparncia mais prxima aos naturais, ou seja, tecnologias que minimizem os efeitos

    indesejveis das alteraes fsico-qumicas ou microbiolgicas nos alimentos e que garantam a

    segurana do alimento. necessrio, portanto, a utilizao de processos de durao curta, de

    tal forma, que se exponha o mnimo possvel o produto a condies adversas, como o caso

    dos produtos minimamente processados (Vitali, 1997).

    A irradiao de alimentos, uma tecnologia pioneira em alguns pases, pode ser uma

    sada para aliviar muitos dos problemas de perdas de alimentos no mundo. A irradiao como

    mtodo de conservao tem como objetivo reduzir as perdas devidas decomposio e

  • 4

    combater os microrganismos causadores de enfermidades provenientes do alimento

    (Loaharanu, 1994).

    A irradiao de alimentos no Brasil foi aprovada pelo Decreto n. 7218/1973, do

    Ministrio da Sade. Alimentos irradiados so comercializados em 23 pases em carter

    regular, junto com seus similares, e tm tido de modo geral, boa aceitao por parte do

    consumidor (Bruhn & Wood, 1996; Derr et al., 1995; Loaharanu, 1994; Urioste et al., 1990),

    sendo que nos ltimos anos foram realizados testes de aceitao na Argentina, Bangladesh,

    Chile, China, Estados Unidos, Filipinas, Frana, Hungria, Indonsia, Israel, Polnia, Tailndia

    e Alemanha, todos com resultados favorveis (Ehlermam et al., 1996; ICGFI/IAEA, 1991).

    A Comisso Nacional de Energia Nuclear (CNEN) conforme a resoluo 05/1980, aprovou

    as normas de irradiao de alimentos, posteriormente regulamentadas pela portaria n. 9 da

    Diviso Nacional de Vigilncia Sanitria de Alimentos (DINAL), de 8 de maro de 1985.

    Para produtos do pescado, as doses mdias recomendadas so as de 1,0 kGy para fil de

    peixe e 2,2 kGy para peixe salgado e defumado. Como tratamento prvio, conjunto ou

    posterior irradiao, a temperatura deve ser mantida a 30C, inclusive no armazenamento

    (IRRADIAO..., 1983). De maneira global, as finalidades especficas da irradiao em

    alimentos so: inibio de brotamento, desinfestao, radurizao (reduo de microrganismos

    formadores de esporos), radicidao (reduo da carga de microrganismos patognicos no

    formadores de esporos) e radapertizao ou esterilizao comercial (Bombo et al., 1996).

    Savitci et al. (1997) estudaram a viabilidade e a importncia da instalao de uma

    unidade de irradiao comercial de alimentos no Estado de So Paulo, e afirmam que se trata

  • 5

    de uma tecnologia com caracterstica fundamental de ser de multi-uso, desde que sejam

    seguidas as especificaes de uso, e de doses a serem empregadas, para cada tipo de produto

    alimentcio. Vale ressaltar que a operacionalidade da tecnologia utilizada exigir inclusive uma

    conscientizao, junto aos consumidores dos produtos irradiados sobre as vantagens da

    irradiao, principalmente para a manuteno da qualidade do produto.

    Para o pescado, o uso da irradiao ou pasteurizao a frio deve permitir que se

    obtenha um produto minimamente processado, aumentando a vida til sob refrigerao, o que

    se constitui em um meio para se levar ao consumidor o pescado no estado de fresco, sem

    necessariamente sofrer processos tecnolgicos radicais, a no ser a filetagem ou o corte em

    postas.

    O objetivo desta pesquisa foi obter um produto, tipo alimento de convenincia, de

    tilpia minimamente processada, estendendo sua vida til, em refrigerao combinando com

    irradiao. O acompanhamento da qualidade do produto armazenado foi feita pela anlise dos

    componentes fsico-qumicos e avaliao sensorial, microbiolgica e nutricional. Estes

    produtos, pela sua alta qualidade, podero, eventualmente ser exportados com mercado

    garantido no exterior, que j consome grande volume de produtos irradiados; como

    conseqncia, o piscicultor ter sua receita aumentada. Quanto a utilizao de peixes

    cultivados e em condies controladas, haver possibilidade de uma programao do abate,

    constituindo-se em uma vantagem em relao pesca extrativa, alm da despesca organizada,

    possibilitando a captura de peixes sem traumas fsicos e com baixo nvel de estresse.

  • 6

    Por se tratar de processos combinados, o valor nutritivo do pescado e a qualidade

    higinica devem ser mantidos, diferente do que ocorre em outros processamentos tradicionais,

    ou mesmo quando o pescado comercializado no estado de fresco, sob a ao do gelo.

  • 2 REVISO DE LITERATURA

    2.1 Produo e consumo de pescado

    Grande parte da populao padece, em sua alimentao, de carncia aguda ou crnica

    de protenas de origem animal. A populao brasileira encontra-se dentro deste quadro, uma

    vez que, na dcada de 80, o consumo mdio de carne ao ano era de 25 kg, correspondente

    metade do recomendado pela Organizao Mundial da Sade. Este fato tem se agravado

    pelas elevadas taxas de crescimento populacional, o que tem levado procura de novas

    formas de produo de alimentos. A piscicultura pode constituir uma fonte alternativa de

    produo de protena animal, em larga escala e a baixo custo, pois o Brasil apresenta

    excelentes condies para aumentar a produo de pescado, o que contribuiria para a soluo

    do problema de desnutrio. No entanto, os sistemas de cultivo, captura, manuseio,

    processamento e comercializao apresentam-se deficientes, o que contribui para o baixo

    consumo do pescado (Bard, 1980; Nagel, 1979).

    Segundo Oetterer (1991) o baixo consumo ou o pequeno hbito do brasileiro em

    consumir pescado, est ligado comercializao mal feita que j vem sendo praticada h

    vrios anos. O produtor no tem incentivo para colocar no mercado um produto de

  • 8

    melhor qualidade que ser mais oneroso, e que precisar de propaganda para sua divulgao.

    O consumidor, por sua vez, no se empenha em exigir melhores condies de um produto j

    desacreditado no mercado.

    Segundo Nicoluzzi (1993) o sul-americano tem pouco hbito de consumir peixes. Sua

    dieta baseia-se em produtos crneos bovinos e no frango. Isto se deve s oportunidades

    comerciais brasileiras que esto ligadas diretamente qualidade, padronizao, entrega e

    preos; tais caracteres relacionam-se a qualidade do produto que chega ao mercado.

    necessrio, portanto estudar os mecanismos de alteraes do peixe aps a captura,

    determinar a influncia das condies de manuseio e conservao, na qualidade e estabilidade

    do peixe congelado e obter mtodos analticos objetivos de avaliao do frescor, que tenham

    estreita relao com a anlise sensorial, a fim de garantir a qualidade dos produtos oferecidos

    populao (Mujica,1988).

    O potencial pesqueiro do Brasil, estimado pela FAO, considerando a extensa costa

    martima, os rios navegveis, as represas hidreltricas e os 20% do total de gua mundial

    concentrados na regio amaznica; est em torno de 4 milhes de toneladas. Com 7.367km, a

    costa brasileira apesar de extensa em termos absolutos, pequena quando comparada rea

    total do pas. Em relao pesca, sua explorao restrita, realizada de forma inadequada e

    explorativa. Segundo pesquisadores da Universidade do Rio Grande do Sul, a pesca

    excessiva vai, em poucos anos, levar extino espcies como a corvina e o camaro. O

    maior problema encontra-se na pesca descontrolada por parte das indstrias da pesca

    realizada mesmo em pocas imprprias (Montenegro, 1998).

  • 9

    O Brasil tem um dos maiores espelhos dgua do mundo, com 550 mil hectares de

    reservatrios e 407 km de canais de irrigao, somente no Nordeste; com clima favorvel,

    insumos disponveis e grandes extenses de terras alagadas subaproveitadas (mais de 2

    milhes de hectares), alm de possuir um dos melhores ambientes para o desenvolvimento da

    aqicultura no mundo. Entretanto, a participao da aqicultura brasileira na produo mundial

    de pescado modesta apesar de seu rpido crescimento (25% em 1997, contra 10% em

    nvel mundial) (Madrid, 2000; Montenegro, 1998).

    A produo de pescado no Brasil vem crescendo sob o influxo da expanso da

    piscicultura de gua doce e com o grande potencial de guas interiores; pode-se pensar no

    pescado no s como excelente fonte alimentar, mas tambm, como fonte de divisas para o

    pas atravs da exportao (Oetterer, 1991).

    A piscicultura pode ser definida como o cultivo racional de peixes que permite a

    produo de alimento de alto valor nutritivo a baixo custo, compreendendo particularmente, o

    controle do crescimento e da reproduo; altamente rentvel ao pequeno produtor rural,

    com resultados melhores do que a maioria das culturas tradicionais, o que leva os produtores a

    abandonar a lavoura para investir nesta prtica. Assim, podem ser cultivadas vrias espcies,

    que devem apresentar como caractersticas, condies de reproduo em cativeiro e aceitar

    alimentao artificial. O cultivo racional de peixes, comparativamente ao de outras espcies

    animais, apresenta diversos aspectos mais vantajosos, dentre os quais: o peixe produz mais

    protena por quilo de alimento consumido, isto , apresenta excelente converso alimentar,

    como tambm alta produtividade, pois, peixes cultivados em sistemas adequados de produo

  • 10

    ganham, aproximadamente, 0,75 g de peso por grama de alimento consumido, enquanto o

    frango converte cerca de 0,45 g de peso por grama de alimento consumido. Os peixes utilizam

    alimentos que outros animais no aproveitam de forma to eficiente, como resduos de origem

    animal ou vegetal, plncton, dejetos de animais, estes de modo direto ou indireto. O cultivo de

    peixes pode utilizar economicamente recursos que a agricultura no aproveita, como as reas

    estuarinas e regies alagadias portanto, atravs da policultura, todos os nveis da cadeia

    alimentar so preenchidos, em razo da consorciao de espcies de hbitos alimentares

    complementares no concorrentes (Marchi, 1997; Medeiros et al., 2000).

    Medeiros et al. (2000) afirmam que na piscicultura, em uma rea de baixa

    produtividade possvel obter 4 toneladas de peixe por hectare, e consequente renda de mais

    ou menos R$ 4 mil. J em uma rea de boa produtividade obtm-se at 10 toneladas, ou R$

    10 mil, em mdia.

    Segundo informaes pessoais do Dr. Jos Eurico Cyrino (ESALQ/USP), a tilpia-

    do-Nilo (Oreochromis niloticus) com aproximadamente 57% de poro comestvel,

    atualmente, a espcie de maior volume de produo da piscicultura, com produo estvel e

    aceitao por parte do consumidor, inclusive vem sendo comercializada nos Estados Unidos

    na forma de fils resfriados e congelados com preo de mercado competitivo. um peixe de

    guas paradas, bastante rstico, apresenta alta taxa de prolificidade, tipicamente herbvoro e

    sua carne de sabor agradvel, apresenta pouca susceptibilidade a doenas parasitrias, alto

    teor de domesticidade, resistncia a baixas concentraes de oxignio e grande precocidade.

    Sua introduo na aqicultura nacional apresenta-se bastante promissora, alm de ser a

  • 11

    espcie mais difundida e recomendada para a criao intensiva em tanques e audes (Bard,

    1980; Castagnolli, 1992; Vaz & Parreira, s.d.). Segundo Madrid (2000) pelo Programa

    Avana Brasil de desenvolvimento e incentivo aqicultura, em 1999 a produo nacional de

    tilpia apresentou-se em torno de 42.918 toneladas e a meta para 2003, de 86.416

    toneladas. Porm, por no ser espcie considerada nobre, deve receber tratamentos para se

    tornar mais conveniente e atrativa ao consumo.

    A produo mundial da tilpia niltica, em 1994, foi de 426.776 toneladas,

    contribuindo com cerca de 20% da produo de peixes oriundos da aqicultura, sendo o

    continente asitico o maior produtor mundial. A produo brasileira, em 1993, foi de 26.700

    toneladas com tendncia de grande crescimento para os prximos anos (FAO, 1996).

    Atualmente, algumas regies do Brasil vm apresentando grande desenvolvimento no cultivo

    desta espcie, uma vez que, tem-se a possibilidade de manejo para o aproveitamento de

    resduos da filetagem para a fabricao de silagem, que serve para o enriquecimento de raes

    animais. Na regio oeste do Estado do Paran, a rea em lmina de gua aproxima-se de

    2.000 ha, com cerca de 5.000 produtores envolvidos economicamente na piscicultura, sendo

    que a estimativa de produtividade de 3.000 kg/ha, ressaltando que em sistemas semi -

    intensivos e intensivos consegue-se produtividade de 8.000 a 16.000 kg/ha por safra, cujo

    peso comercial de 400 g atingido em um perodo de quatro a oito meses, dependendo do

    sistema de cultivo adotado e da poca do ano (Marchi, 1997; Pinto, 2000; Visentainer et al.,

    2000).

  • 12

    A atividade pesqueira deve ter um conhecimento exato sobre o que, onde, quando,

    quanto e como pescar, alm de como aproveitar melhor os recursos disponveis (Faulhaber,

    1988). O estresse e as alteraes mecnicas causadas durante a captura, bem como, na

    estrutura e composio de pescado, mudanas durante o perodo ps-mortem, declnio do

    pH e o tempo que o pescado permanece no gelo antes do desembarque (ou no permanece)

    podem induzir rapidamente o desenvolvimento microbiolgico (Church, 1998).

    2.2 Pescado como matria prima

    Nos dias atuais, a indstria de pesca tem crescido consideravelmente, tanto pelo

    aumento da demanda do consumidor, como pelas inovaes tecnolgicas pelas quais a

    indstria est passando, porm necessrio acompanhar estas inovaes com a melhoria nos

    programas de inspeo de qualidade e de processamento. O pescado por apresentar algumas

    caractersticas peculiares inerentes ao modo de captura, sua biologia e tipos de

    processamento, torna-se diferente de outros alimentos de origem animal, requerendo para isto,

    um processamento apropriado (Dams et al., 1994). Segundo Leito (1977), o pescado tido

    como mais susceptvel ao processo de deteriorao do que outros produtos crneos, por ter

    rpida ao destrutiva de suas enzimas, caracterstica menos cida da carne e facilidade de

    oxidao dos lipdeos presentes. Portanto, segundo a FAO (1968) a utilizao do peixe em

    larga escala tornou-se possvel somente depois que o efeito preservativo do gelo e/ou do uso

    da refrigerao tornaram-se uma prtica comercial.

  • 13

    importante destacar que, em tecnologia de alimentos, no se pode obter um produto

    final de alta qualidade a partir de matria prima inferior ou mesmo razovel. Dentre os

    principais fatores que influem decisivamente na qualidade do pescado processado, destacam-

    se a composio do produto, a manipulao e o tratamento anterior ao processamento

    (Ferreira, 1987).

    O mercado consumidor do exterior mantm inspetores em tempo integral junto aos

    produtores ou exige laudos tcnicos de empresas especializadas, a fim de verificar e controlar

    a qualidade do produto que chega, via importao. A inspeo sanitria permite a liberao

    do pescado para o comrcio varejista ou indstria alimentcia, somente do produto em boas

    condies higinico-sanitrias. No entanto, assim que o pescado liberado, forma-se uma

    extensa cadeia de comercializao que propicia o desenvolvimento de contaminaes

    microbiolgicas. Em adio, vrios esporos de bactrias podem reduzir o tempo de vida do

    produto, alterando o odor, cor e viscosidade, alm de levarem a outros problemas, como a

    ao enzimtica que pode interagir com a microbiolgica (Germano et al., 1998). A

    deteriorao do pescado se instala logo aps a morte e avana com o tempo, sendo que a

    velocidade de decomposio depende dos fatores exgenos (peixe passa a um meio adverso

    ao seu habitat) e endgenos (se constitui em excelente substrato para o desenvolvimento

    microbiano) (Oetterer, 1998).

    Segundo Leito (1994) o pescado est sujeito a processos de deteriorao que

    envolvem a atividade enzimtica, a rancificao de gorduras e principalmente a atividade de

    microrganismos presentes em sua superfcie, guelras e trato intestinal. Embora a predominncia

  • 14

    de um ou outro destes fatores de deteriorao mude, em funo da composio do pescado,

    condies de captura e estocagem, intensidade de manuseio, entre outros, sabe-se que a

    participao microbiana um dos principais fatores determinantes da vida til deste alimento.

    Em pescado proveniente de guas temperadas analisam-se como caractersticas,

    predominncia de espcies psicrotrficas, predominncia de espcies com metabolismo pouco

    ativo na utilizao de carboidratos, mas com atividades proteolticas e lipolticas e

    microrganismos aerbios. J o estudo da microbiota do pescado fluvial, considera que em

    pescado de guas temperadas/frias, tem-se a predominncia de espcies Gram - sobre os

    Gram +; em pescado fluvial capturado em regies tropicais, ainda se observa a predominncia

    de Gram -.

    Segundo Oetterer (1999) as espcies de pescado cultivado podem ou no apresentar

    caractersticas adquiridas de sabor na carne devido ao tipo de alimentao recebida, de

    qualquer forma recomenda-se no Brasil, a depurao dos peixes, mantendo-os pelo menos 24

    horas sem alimentao antes do abate, sendo que tal gua deve ser isenta de resduos da

    rao, bem como no apresentar contaminantes.

    A aplicao dos princpios do Programa de Anlise de Perigos e Pontos Crticos de

    Controle, internacionalmente conhecido como HACCP (Hazard Analysis Control Critical

    Point) no processamento de pescado oferece um programa de inspeo melhorado e

    modernizado, identificando os pontos crticos nas operaes de processamento do pescado,

    determinando seu controle e desenvolvendo um esquema de inspeo que satisfaa as

  • 15

    regulamentaes estabelecidas, atravs do monitoramento de manuteno dos registros

    permanentes (Dams et al., 1994).

    A contaminao biolgica no preparo de alimentos tem um importante papel na

    transmisso de doenas para seres humanos. Cerca de 70% das doenas transmitidas pelos

    alimentos, no mundo, desenvolvem-se em crianas menores de 5 anos, segundo dados da

    Organizao Mundial da Sade, sendo causadas por contaminaes microbiolgicas em

    alimentos, incluindo pases em desenvolvimento, em particular quando h carncia alimentar e

    as prticas de higiene so inadequadas. O processamento de alimentos com radiao

    ionizante, ao lado de outras metodologias, pode ajudar a superar estes riscos (Mayer-

    Miebach, 1993).

    Sob este ponto de vista, a gua o primeiro ponto crtico que deve ser observado; se

    os peixes provierem de tanques com cho de terra pode haver estruturao de cepas no

    proteolticas de Clostridium botulinum (anaerbico e resistente a baixas temperaturas) e

    chegar a um nvel indesejvel de contaminao; alm, do tanque de recepo estar em fluxo

    contnuo ou com agitadores, pois no pode haver gua parada. De acordo com Bligh (1971)

    em contraste com a pesca marinha, o ambiente no qual o pescado de gua doce capturado

    pode variar de guas claras e geladas a quentes, turvas e contaminadas. Esta diferena,

    relacionada qualidade da gua, tem influncia sobre a preservao da qualidade do pescado

    de gua doce. Contudo, apesar deste fato, a deteriorao do pescado de gua doce no

    difere, basicamente, em muito daquela do pescado marinho, no que for decorrncia da ao

    bacteriana e autlise.

  • 16

    Quanto ao abate, Oetterer (1999) recomenda que este seja feito imediatamente aps a

    captura, evitando que os peixes sofram fadiga e percam as reservas energticas, importantes

    para mant-los mais tempo na fase pr rigor-mortis, sendo que o abate por choque trmico

    mais efetivo, pois se feito por aumento do CO2 na gua, pode levar ao aparecimento do rigor

    mais cedo, e o pescado ir para o processamento j passvel de sofrer a ao de

    microrganismos da flora intestinal e enzimas viscerais.

    Os peixes ao serem retirados da gua, morrem por asfixia, causada pela interrupo

    do fornecimento de oxignio. O excessivo acmulo de produtos metablicos no oxidados no

    sangue e nos msculos paralisa o sistema nervoso e a partir da, ocorrem a hiperemia e a

    liberao de muco, caracterizados assim como pr-rigor, com perodo que varia de 1 a 2

    horas. Nesta fase o glicognio utilizado como fonte de energia e o ATP (trifosfato de

    adenosina) combinado com a miosina impede a formao do complexo actomiosina,

    mantendo a carne macia e o pH em torno de 7,0. O ATP desfosforilado e passa a ADP

    (difosfato de adenosina) liberando energia, e ressintetizado enquanto houver glicognio. O

    ADP com uma nova desfosforilao passa a AMP (monofosfato de adenosina) que desamina

    a IMP. Esgotado o contedo de glicognio, a miosina combinada com o ATP liberada,

    ocorre a formao de cido lctico a partir da degradao do glicognio, distinguindo-se a a

    passagem do pr-rigor para o rigor-mortis, que pode durar de 2 a 18 horas com um pico

    aps 6 horas. O estresse elevado do peixe ocasiona um consumo elevado de glicognio,

    restando pouca quantidade para ser utilizado como fonte de energia nesta fase (Ogawa &

    Maia, 1999). Portanto, o rigor-mortis definido como a perda da elasticidade e

  • 17

    extensibilidade dos msculos, como resultado da alterao dos ciclos de contrao e

    relaxamento (Contreras-Gusman, 1994).

    Aps a morte do peixe ocorrem alteraes fsicas, qumicas e biolgicas em seu corpo

    que, se no forem interrompidas, levam o produto a um estado de deteriorao que inclui a

    liberao de muco, o rigor-mortis, a autlise e a decomposio bacteriana. Tal processo

    permanece ativo, uma vez que os sistemas enzimticos permanecem ativos aps a morte e, se

    houver substratos e cofatores suficientes, continuaro a produzir metablitos que se

    acumularo no decorrer da armazenagem (Ferreira, 1987). A velocidade destas reaes pode

    ser diminuda grandemente com a refrigerao, ou detida por longos perodos pelo

    congelamento. As reaes post-mortem podem ser classificadas, de acordo com os efeitos

    que causam, como: modificaes das propriedades fsicas dos msculos, degradao dos

    carboidratos (evoluo do glicognio), degradao dos nucleotdeos (evoluo do ATP) e

    alterao das protenas (desnaturao e autlises) (Contreras-Gusman, 1994).

    Segundo Botelho (1970) citado por Sales et al. (1988), dentre os alimentos crneos, o

    pescado o que se decompe mais rapidamente devido a sua constituio pobre em tecido

    conjuntivo, como tambm a caracterstica especial do tecido muscular, que tem o pH

    aumentado aps a morte.

    Dois processos contribuem para a putrefao precoce do pescado sendo o primeiro

    de natureza bioqumica, conhecido por autlise ou autodigesto, que ocasionada pela ao

    das enzimas sobre o prprio msculo. O segundo e principal agente causador da putrefao

  • 18

    so as bactrias que se encontram no muco exterior, nas brnquias e no intestino, em

    quantidade considervel (Sales et al., 1988).

    Segundo Ogawa & Maia (1999) o pescado vivo utiliza o oxignio para o metabolismo

    orgnico, realizando reaes de decomposio e biossntese. Entretanto, aps a morte, em

    condies anaerbias, as reaes de decomposio passam a prevalecer.

    As bases nitrogenadas volteis totais (BNVT) compreendem compostos como

    amnia, trimetilamina e dimetilamina. No incio do processo degradativo, a base voltil mais

    representativa a amnia, originria dos produtos da desaminao dos derivados do ATP.

    Posteriormente, a amnia proveniente da degradao de outros compostos nitrogenados, a

    exemplo de aminocidos, juntamente com a trimetilamina formada a partir do xido de

    trimetilamina, passam a se fazer presentes (Molteno et al., 1968; Ogawa & Maia, 1999).

    Segundo Contreras-Gusman (1994) durante a estocagem com gelo, as BNVT so

    produzidas com maior velocidade pelas bactrias aerbicas porm, em perodos prolongados,

    as anaerbicas facultativas assumem importncia. A necessidade de esquematizar e simplificar

    o estudo da composio muscular (carne), tem levado a dividir o nitrognio total em dois

    grupos: compostos nitrogenados proticos totais (NT) e no-proticos (NNP). A diferena

    entre NT e NNP, corresponde ao nitrognio protico que, multiplicado por 6,25, fica

    expressado como protena. Na Tabela 1 so apresentados os valores de nitrognio de vrias

    espcies brasileiras.

    O significado de qualidade amplo, diz respeito a todas as caractersticas que o

    consumidor, ou comprador de pescado, consciente ou inconsciente, estima que o produto

  • 19

    deva ter, ou seja, deve abordar sua composio intrnseca, valor nutritivo, grau de alterao,

    provvel alterao durante a elaborao, armazenamento, distribuio, venda, apresentao

    ao consumidor, consideraes estticas, rendimento e benefcios do produtor e intermedirio

    (Taha, 1988).

    Tabela 1- Componentes nitrogenados em msculo de peixes brasileiros de gua doce.

    Espcies N Total (NT)

    (mg/100g)

    NNP

    (mg/100g )

    NNP/Nt x 100 Protenas

    (g/100g)

    Mandi 2552 210 8,22 14,6

    Corimbat 2880 253 8,80 16,4

    Tilpia 3256 343 10,50 18,2

    Pacu 3052 327 10,70 17,0

    Carpa 2949 330 11,20 16,4

    Tambaqui 2923 332 11,30 16,2

    Fonte: Contreras-Gusman, 1994.

    A higiene e sanitizao so prerrogativas do servio de inspeo; assim, o controle da

    qualidade do pescado deve manter as condies higinico sanitrias do ambiente e dos

    equipamentos, estabelecendo os procedimentos de limpeza e periodicidade (Oetterer, 1999).

  • 20

    2.3 Processamento de pescado refrigerado

    O pescado refrigerado definido pelo Regulamento de Inspeo Industrial e Sanitria

    de Produtos de Origem Animal (RIISPOA) de 1962, no artigo 438 e pargrafo 2, como:

    Entende-se por resfriado, o pescado devidamente acondicionado em gelo e mantido em

    temperatura entre 0,5C e 2,0C. As normas no mencionam, porm os produtos

    refrigerados processados, como fils ou postas ou mesmo inteiros descamados, eviscerados e

    descabeados e embalados. No artigo 441 faculta ao critrio do Departamento de Inspeo

    de Produtos de Origem Animal (DIPOA), a obrigatoriedade da eviscerao para que possa

    ser apresentado ao consumo. No artigo 442 passa a estabelecer os padres organolpticos

    desejveis nos vrios tipos de pescado e no 445 mostra as caractersticas que definem o

    pescado como imprprio para o consumo (Brasil, 1976).

    Segundo Fennema (1985), a refrigerao definida como a estocagem a temperaturas

    acima de 0C e at 15C resulta na conservao do alimento, por retardar o crescimento

    microbiano e as atividades metablicas post-mortem dos tecidos animais, controlar as

    reaes qumicas deteriorativas, incluindo o escurecimento enzimtico oxidativo, a oxidao

    de lpides e alteraes qumicas associadas com a degradao de cor, alm de controlar a

    autlise do pescado e de evitar perda de umidade e de nutrientes de alimentos em geral. O

    resfriamento deve ser feito logo aps o abate, para manter a qualidade do msculo, como

    maciez, capacidade de reteno de gua e cor; o msculo deve estar frio quando o pH se

    estabilizar. interessante registrar que pequenas alteraes na temperatura podem ser efetivas

    no aumento da vida til, alm de evitar ou retardar as reaes qumico-enzimticas envolvidas

  • 21

    no processo de autlise como tambm, o desenvolvimento de microrganismos que contribuem

    para a deteriorao do alimento (Ogawa & Maia, 1999).

    A refrigerao mantm o valor nutritivo do pescado, se conduzida com tcnica,

    evitando o drip que certamente arrastaria nutrientes, componentes solveis do msculo, como

    alguns aminocidos e vitaminas hidrossolveis, e utilizando embalagens para proteo contra a

    desidratao na cmara fria, que poderia provocar a oxidao dos componentes lipdicos,

    como os cidos graxos e as vitaminas lipossolveis (Oetterer, 1998). Portanto, tanto a

    refrigerao quanto a manuteno do peixe sob gelo, so mtodos mais adequados para

    conserv-los aps a captura, sendo que a proporo adequada, de peixe/gelo, para se obter

    uma boa conservao deve ser de 2:1 (Eddie, 1983).

    Mujica (1988) ressalta que tilpias evisceradas e inteiras so consideradas

    inadequadas para o consumo, no perodo de nove horas temperatura ambiente e trs dias no

    gelo, uma vez que processos oxidativos interagem conforme a temperatura se altera.

    As bactrias do pescado de zonas tropicais so predominantemente mesoflicas e o

    resfriamento a tcnica mais usualmente aplicada aps a captura; esta diferena de

    temperatura afeta sobremaneira a microbiota que predominar no armazenamento resfriado. O

    pescado dever estar resfriado para 3C dentro de 1 hora aps a captura, com auxlio de gelo

    adicionado gua dos tanques; alertar para o fato do gelo ser suscetvel contaminao por

    microrganismos psicrotrpicos (Oetterer, 1999).

    Lima dos Santos (1981), apresenta extensa reviso sobre o tempo de estocagem de

    peixes mantidos em gelo; assim para espcies de gua doce tropical, devido microbiota

  • 22

    predominantemente mesoflica, h a possibilidade de estocagem por perodos de 12 a 36 dias,

    superiores s dos peixes de clima frio, cuja estocagem de 5 a 18 dias.

    Disney (1969) discute a utilizao de peixes tropicais, particularmente no Brasil, ndia

    e frica, como uma necessidade para incremento da oferta de pescado, alm dos tradicionais

    de guas frias de alto valor comercial. As tilpias, por exemplo, aps 20 horas de captura j

    podem apresentar 103 a 105 microrganismos/g de tecido, ao serem armazenados no gelo, aps

    19 dias chegam a ter a contagem de 108 bactrias/cm2 de pele, este fato sugere que, aps a

    estocagem sob gelo, as espcies tropicais apresentam baixo crescimento microbiano.

    2.4 Composio e valor nutritivo do pescado

    O consumo de pescado ainda pequeno, quando comparado ao das outras fontes de

    protena de origem animal, como a carne de aves e as carnes vermelhas, motivado pela falta

    de tradio (gostos e hbitos); pequena oferta do produto, devido a baixa produo brasileira;

    falha da indstria processadora em oferecer produtos de convenincia, de fcil preparo e

    diversificados; bem como em razo de um sistema de distribuio e comercializao ineficiente

    e oneroso. Atualmente, novos incentivos aqicultura esto surgindo, e entre as espcies de

    maior cultivo est a tilpia niltica que, em virtude de suas caractersticas zootcnicas e de

    processamento, vem despertando grande interesse dos criadores e processadores (Marchi,

    1997).

    Um maior interesse foi voltado ao pescado, aps a expanso da nutrio como rea de

    conhecimento, que apresentou as vantagens do pescado como alimento, devido ao seu valor

  • 23

    nutritivo, principalmente em relao aos altos teores das vitaminas A e D, da qualidade dos

    lipdeos do pescado marinho, bem como, a presena de protenas de alto valor biolgico, que

    podem ser utilizadas para o preparo de farinha enriquecida na alimentao infantil, alm de se

    constiturem em tima fonte de clcio e fsforo (Oetterer, 1991; Sikorski et al., 1994).

    Segundo Kraut (1957) citado por Sanchez (1989) o contedo protico das carnes de

    pescado varia de 15 a 24%, considerando a ingesto de 200g de carne de pescado, onde a

    qualidade e o teor de aminocidos presentes nas protenas, unidos sua digestibilidade,

    garantem um suprimento nutricional ao organismo considerado como excelente, como pode

    ser observado na Tabela 2.

    Tabela 2- Necessidades dirias de aminocidos essenciais e contedo destes no pescado.

    Aminocidos Necessidades dirias

    (mg)

    Contedo em 200 g de fil de pescado

    (mg)

    Valina 1,6 2,0

    Treonina 1,0 1,6

    Leucina 2,2 2,8

    Isoleucina 1,4 2,0

    Lisina 1,6 3,2

    Metionina 2,2 1,2

    Fenilalanina 2,2 1,4

    Triptofano 0,5 0,4

    Fonte: Kraut (1957).

  • 24

    A composio de aminocidos essenciais no pescado completa, balanceada e

    bastante semelhante entre as espcies dulccolas e marinhas. Quanto s protenas da carne, a

    miosina rica em cido glutmico (22,5%), cido asprtico, lisina, leucina e isoleucina, que

    juntos perfazem cerca de 55% dos aminocidos totais (Geiser & Borgstron, 1962), e pode

    variar em funo da espcie, tamanho, sexo e poca do ano, compreendendo, geralmente,

    cerca de 20% do total das protena (Ogawa & Maia, 1999).

    O msculo do pescado pode conter 60 a 85% de umidade, aproximadamente 20% de

    protena bruta, 1 a 2% de cinza, 0,3 a 1% de carboidrato e 0,6 a 36% de lipdeos, sendo que

    este ltimo componente apresenta esta variao em vista do tipo de msculo corporal

    analisado e espcie de peixe analisada (por exemplo, a carne dorsal apresenta menor

    quantidade lipdica do que a carne abdominal), sexo, idade, poca do ano, habitat e dieta. Os

    lipdeos exercem importante papel como fonte energtica, so constituintes de membranas

    celulares, nutrientes essenciais (cidos graxos essenciais e vitaminas lipossolveis), substncias

    controladoras de metabolismo, substncias isolantes de temperatura e protetores contra danos

    mecnicos externos (Dean, 1990; Ogawa & Maia, 1999).

    Para Sikorski (1990), o pescado magro apresenta um alto teor de umidade, podendo

    chegar at 83%; ao contrrio, o pescado gordo, pode atingir um mnimo de 58% de umidade,

    que se concentra nos msculos claros e na zona caudal do peixe.

    Para peixes de carne vermelha como arenque, sardinha e cavalinha que migram para

    desova, os lipdeos de depsito constituem uma importante fonte energtica e base para o

    desenvolvimento das gnadas. J para os peixes de carne branca como bacalhau e merluza, a

  • 25

    maioria dos lipdeos do msculo (80 a 90%) composta de fosfolipdeos e seu contedo

    quase no varia durante o ano, com exceo para o fgado, que rico em lipdeos neutros e

    que sofrem variaes de acordo com a estao do ano (Dean, 1990; Ogawa & Maia, 1999).

    Dentre os carboidratos do pescado esto o glicognio e mucopolissacardeos mas,

    tambm existem acares livres e fosfossacardeos. Seu contedo de 0,3 a 1%, mas, certos

    mariscos estocam parte da reserva energtica como glicognio, o qual contribui para o

    caracterstico sabor adocicado destes produtos (Ogawa & Maia, 1999).

    O pescado boa fonte de vitaminas, no entanto, na prtica, nos processos de

    conservao, como durante a coco, podem ocorrer perdas devido lixiviao pelo calor,

    luz, oxignio e enzimas. Dentre as vitaminas encontradas esto vitamina A, D e E, como

    lipossolveis, e tiamina, riboflavina, piridoxina, cido nicotnico, cido pantotnico, cido flico

    e vitamina C, entre outras hidrossolveis. Com relao aos minerais, encontram-se no msculo

    dos peixes sdio, potssio, clcio, magnsio, fsforo, cloro, enxofre, ferro, iodo, cobre, zinco,

    selnio, cromo e nquel, entre outros (Ogawa & Maia, 1999).

    Segundo Ferreira (1987) os peixes podem ser considerados como fontes das

    vitaminas A e D, sendo que alguns concentram at 50.000 UI de vitamina A e 45.000 UI de

    vitamina D por grama de fgado. Os peixes magros so mais pobres em vitamina A e os

    elasmobrnquios, ou peixes cartilaginosos, apresentam apenas traos de vitamina D.

    Um consumo mais acentuado de pescado se iniciou quando sua qualidade nutricional

    foi destacada, uma vez que apresenta um balano protico, de vitaminas e minerais

  • 26

    (especialmente clcio, fsforo e ferro) associado a um baixo valor calrico, superior ao da

    carne vermelha (Venugopal et al., 1999).

    As vitaminas hidrossolveis (principalmente as do complexo B) esto presentes no

    tecido muscular de pescado, enquanto as lipossolveis (vitamina A, D, E, K) esto

    distribudas por todo o organismo do pescado. As vitaminas hidrossolveis so relativamente

    perdidas em processos de coco seguidos de estocagem. Durante a irradiao do pescado,

    perdas de vitaminas so similares s ocorridas com processamentos que envolvem altas

    temperaturas. Niacina a vitamina mais resistente e perdas de tiamina podem ser minimizadas

    sob condies de refrigerao (Pigott & Tucker, 1990).

    Certas vitaminas podem ser destrudas durante o processamento por irradiao de um

    alimento, sendo que estas perdas so decorrentes de alguns fatores, como a dose empregada,

    o meio em que foi irradiado o alimento, alm das condies de armazenamento. Portanto, as

    perdas de vitaminas que ocorrem durante a irradiao de um alimento so similares s de um

    processamento trmico, ou seja, geralmente a perda pequena (FAO/IOEA/OMS, 1966).

    A frao cinza de peixes de gua doce apresenta variaes em quantidades que vo

    desde 0,90 a 3,39%. Com relao aos minerais, a carne de pescado considerada uma fonte

    valiosa de clcio e fsforo em particular, apresentando quantidades razoveis de sdio,

    potssio, mangans, cobre, cobalto, zinco, ferro e iodo (Contreras-Gusman, 1994).

    De um modo geral, os peixes tm mais tecido muscular que outros animais criados

    para consumo humano, como os frangos, porm assemelham-se a outros animais consumidos

    em termos de protena, cerca de 15 a 22%. Sua porcentagem comestvel varia de 47 a 60%,

  • 27

    conforme a espcie, estgio de desenvolvimento e tipo de processamento (Machado, 1994;

    Prado, 1984).

    Com relao ao contedo de lipdeos, os peixes dividem-se em dois grupos: peixes

    magros e peixes gordos conforme a idade, estado biolgico, tipo de alimentao e do estado

    de nutrio do peixe, como tambm, da temperatura da gua (Sanchez, 1989). Uma

    caracterstica da frao lipdica de peixes o seu alto teor em cidos graxos insaturados, que

    embora seja uma caracterstica nutricionalmente positiva, preocupante industrialmente, pois

    quanto mais insaturado o lipdeo maior a possibilidade de desenvolvimento do rano (Prado,

    1984). A oxidao ou autoxidao consiste em uma srie de reaes em cadeia, resultando

    em inmeros compostos tais como lcoois, cetonas, hidrocarbonetos, cidos, entre outros, os

    quais conferem sabores e odores de rano, sendo muitas vezes, fator de rejeio do produto

    (Khayat & Schwall, 1983). O processo chamado de autoxidao, pois uma vez iniciado

    torna-se difcil control-lo, devido intensa formao de molculas altamente reativas

    conhecidas como radicais livres, que atacam em cadeia os lipdeos do pescado. O processo

    oxidativo inicia-se logo aps a morte do pescado, podendo ser favorecido pela exposio ao

    ar atmosfrico, temperatura elevada, desidratao e presena de agentes pr-oxidantes; as

    protenas do sangue e msculo (hemopigmentos) so agentes catalisadores destas reaes

    (Machado, 1994).

  • 28

    2.4.1 cidos graxos insaturados

    A revalorizao dos leos marinhos veio a ser conseqncia da campanha pela

    reduo do colesterol diettico, que estimulou o consumo de leos polinsaturados de origem

    vegetal. Os polinsaturados de origem marinha foram aceitos inicialmente com reticncia porm,

    aps os anos 60, as evidncias de que as populaes cuja alimentao era baseada em

    produtos marinhos tinham menor incidncia de doenas isqumicas do corao, incentivaram

    as pesquisas em nvel nutricional e clnico (Contreras-Gusman, 1994).

    Segundo Oetterer (1991) as doenas vasculares, como a aterosclerose, podem ser

    minimizadas com a ingesto de pescado, uma vez que estes apresentam cidos graxos com

    ligaes do tipo mega-3, que so mais geis para abaixar o colesterol sangneo.

    Fisiologicamente, os cidos polinsaturados do tipo mega-3 dificultam a formao das placas

    ateromatosas. As lipoprotenas do sangue ficam menos densas, mais fludas e portanto, pouco

    capazes de transportar o colesterol e os triglicrides para os tecidos do corpo. Todavia, os

    leos de peixe no fazem parte do hbito alimentar dos consumidores brasileiros, alm de

    terem tendncia oxidao, pela presena dos cidos graxos polinsaturados.

    O elemento chave da sade dos esquims foi descoberto por mdicos dinamarqueses,

    que ao estudarem a alimentao dos esquims, que basicamente composta por peixes e suas

    gorduras, perceberam a presena de lipdeos com cadeias carbnicas entre 20 e 22 tomos.

    Dentre estes, encontravam-se os cidos graxos mega-3: eicosapentaenico (20:5 -3; EPA)

    e o docosahexaenico (22:6 -3; DHA). Existem distines bioqumicas e principalmente,

    funcionais entre eles; o EPA age mais diretamente no sistema vascular, enquanto o DHA

  • 29

    modifica as propriedades coagulantes das plaquetas sangneas (Ackman, 1994; Contreras-

    Gusman, 1994).

    Pigott & Tucker (1990) destacam que os ergosterides e 7-dehidrocolesterois (esterol

    animal) so as duas pr-formas de vitamina D. Alimentos de origem vegetal apresentam altos

    ndices de cidos graxos polinsaturados (PUFAs), todavia alguns destes, contm somente

    duas ligaes insaturadas. J os leos animais apresentam quatro duplas ligaes, porm um

    alto ndice de cidos graxos saturados. Somente os leos de pescado apresentam longas

    cadeias de cidos graxos com cinco ou seis duplas ligaes, contendo, em mdia, 50% de

    cidos graxos polinsaturados.

    A maioria dos cidos graxos existentes no pescado contm 14 a 22 tomos de

    carbono, podendo ser saturados ou insaturados, mononicos ou polinicos. A composio em

    cidos graxos varia de acordo com a espcie do animal, hbito alimentar, estao do ano,

    temperatura da gua, dieta, habitat e estgio de maturao. Dentre os cidos graxos

    insaturados mais comuns no pescado esto, principalmente o cido mononico (18:2 9),

    dinico (18:26), trinico (18:3 3) e tetranico ou araquidnico (20:4 6). Como cido

    pentaenico, o principal o cido eicosapentaenico (EPA) ou 20:5 3, e como hexaenico,

    o cido docosahexaenico (DHA) ou 22:6 3 (Ogawa & Maia, 1999).

    A poro lipdica dos alimentos pode estar associada, positiva ou negativamente, s

    diversas propriedades dos alimentos como sabor, estabilidade da cor, caractersticas

    emulsificantes e contedo calrico. A diferena entre espcies, em relao composio de

    cidos graxos, representa uma das variveis mais significativas que determinam as

  • 30

    caractersticas de processamento, palatabilidade e armazenamento de peixes, carnes bovinas e

    de aves, entre outros alimentos. Os cidos graxos insaturados, especialmente os

    polinsaturados, so lbeis oxidao, problema srio no processamento e armazenamento

    destes alimentos (Maia & Rodriguez-Amaya, 1993).

    Os alimentos com elevados teores de lipdeos possuem cidos graxos que diferem nas

    suas propriedades qumicas e fsicas, como tambm, na suscetibilidade oxidao, bem como,

    apresentam outros componentes no-lipdicos que podem co-oxidar e/ou interagir com os

    lipdeos oxidados e seus produtos de oxidao. Desma maneira, alguns fatores podem estar

    presentes durante o processo oxidativo interagindo na reao, dentre eles esto, a composio

    de cidos graxos, presena do oxignio, temperatura, umidade, presena de pr-oxidantes, luz

    visvel, energia radiante, entre outros (Bombo, 1998).

    O tipo de cidos graxos das gorduras dos peixes de gua doce resultam da

    combinao dos cidos graxos ingeridos na dieta e das modificaes para funes fisiolgicas,

    que so realizadas nos tecidos especficos. A armazenagem da gordura para energia ocorre de

    maneira quase semelhante aos peixes marinhos: h um acmulo nas paredes da cavidade

    abdominal como depsitos semi-slidos, sob a pele, no fgado, nos tecidos mesentricos e nos

    msculos. Exceto nestes ltimos, os outros tecidos refletem, de maneira muito prxima, os

    cidos graxos da dieta. Nos peixes tropicais de gua doce, freqente encontrar peixes semi-

    magros, porm com grandes depsitos localizados na cavidade abdominal (tambaqui,

    matrinx, curimbat) (Contreras-Gusman, 1994).

  • 31

    Estudos mostram que a administrao de cidos graxos mega-3 reduz as chances de

    mortalidade por doenas cardiovasculares. As tendncias dietticas atuais promovem a

    utilizao de leos vegetais como fonte lipdica da dieta, os quais so ricos em cido

    araquidnico (20:4 -6), como pode ser observado na Tabela 3 (Ackman, 1994).

    Tabela 3- cidos graxos (g/100 g) constituintes de partes comestveis de peixes comerciais.

    cidos

    graxos

    Bacalhau

    (Gadus

    morhua)

    Arinca

    (Melanogramms

    aeglefinus)

    Solha

    (Pleuronects

    virens)

    Alabote

    (Hipoglossus)

    Salmo

    (Salmo

    solar)

    14:0 Traos Traos 0,05 0,05 0,56

    16:0 0,14 0,11 0,25 0,17 2,20

    16:1 0,01 0,02 0,23 0,14 0,70

    20:1 0,01 0,01 0,06 0,10 0,98

    18:2-6 Traos 0,01 Traos 0,04 0,16

    20:4-6 0,02 0,02 0,04 0,24 0,06

    20:5-3 0,11 0,07 0,17 0,29 0,96

    22:6-3 0,21 0,14 0,14 0,41 1,29

    Fonte: Ackman, 1994.

    Especificamente, os lipdeos de pescado contm cidos graxos polinsaturados de

    cadeia longa da famlia 3 (AGPI 3), sendo que esta tendncia mais clara em peixes

    marinhos do que de gua doce. O contedo de AGPI 3 mais alto em fosfolipdeos do que

  • 32

    em lipdeos neutros. Por isso, observa-se que em espcies que contm menor teor de lipdeos,

    h uma tendncia de apresentarem maior proporo de AGPI 3 (Ogawa & Maia, 1999).

    Maia (1992) pesquisando peixes de gua doce como pacu, tilpia e corimbat,

    demonstrou que os cidos graxos polinsaturados dos fosfolipdeos correspondiam,

    principalmente, ao C20:4 6 e C22:6 3, cada um contribuindo, em mdia, com 10% dos

    cidos graxos, incluindo, ocasionalmente, C22:5 3 e C20:5 3 em nveis prximos a 5%.

    2.5 Contaminao microbiolgica do pescado

    Dos alimentos crneos, o pescado o que se decompe mais rapidamente; isto

    devido a sua constituio pobre em tecido conjuntivo, como tambm as suas caractersticas

    especiais do tecido muscular que tem o pH aumentado aps a morte (Sales et al., 1988). Por

    ser rico em nutrientes, principalmente protenas, muito susceptvel ao ataque e/ou

    desenvolvimento microbiano, alm de poder sofrer alteraes de natureza fsica ou qumica,

    que iro se refletir geralmente em sua cor, consistncia, odor e sabor, podendo alm de

    acarretar perdas do produto, ocasionar risco sade dos consumidores (Brasil, 1976).

    Microrganismos e enzimas iniciam os processos de decomposio protica, sendo que a

    maioria dos microrganismos presentes no pescado apresenta atividade proteoltica e lipoltica,

    contribuindo para a desintegrao dos tecidos e levando a uma srie de reaes bioqumicas

    indesejveis (Kai & Morais, 1988).

    A contaminao bacteriana da carne se origina basicamente nos intestinos, no limo

    superficial e nas guelras, sendo que a remoo das vsceras normalmente considerada

  • 33

    benfica preservao da qualidade. Todavia, quando o animal morre, as enzimas

    proteolticas existentes nas vsceras atacam os rgos e os tecidos adjacentes, degradando-os

    ou tornando-os to debilitados que mais leve frico ou presso se desprendem, alm do

    que as bactrias invadem os tecidos atravs das guelras, ao longo das artrias e veias,

    diretamente pela pele e peritnio (Amlacher, 1961; Andrade, 1975; Connell, 1988; Eiroa,

    1980; Shewan, 1961).

    Como a decomposio do pescado causada principalmente pelas bactrias, uma das

    maneiras de retardar essa decomposio diminuir a temperatura at um nvel em que as

    bactrias no cresam ou o faam muito lentamente (Tornes & George, 1976). Dentre as

    bactrias que concorrem para a putrefao do pescado temos: Pseudomonas, Micrococcus,

    Flavobacterium, Serratia e Bacillus entre outras (Sales et al., 1988), sendo os

    microrganimos principais os psicrfilos, que tambm so proteolticos, bem como, podem ser

    encontradas outras bactrias como os coliformes, clostrdios, Salmonella, Staphylococcus

    aureus e Vibrio, podendo os mesmos estar relacionados com a matria-prima, o ambiente ou

    ainda serem conseqncia de manuseio e/ou estocagem incorretos durante o processamento e

    a comercializao (Hoffmann et al., 1999).

    O crescimento microbiano foi estudado por Gram & Huss (1999), que demonstraram

    que inicialmente microrganismos aerbicos crescem na superfcie do peixe, e quando a

    superfcie comea a modificar-se e aumentar o muco residual, comea o desenvolvimento de

    bactrias anaerbicas.

  • 34

    Enquanto o peixe est vivo sua pele atua como uma barreira mecnica penetrao

    das bactrias, razo pela qual seu msculo, quando recentemente capturado, considerado

    estril. Logo aps a morte o peixe perde suas defesas tornando-se vulnervel ao ataque

    microbiano. O tipo de deteriorao observado pode ser em grande parte atribudo a

    alteraes nos tecidos dos peixes, causadas pelo ataque de tipos especficos de bactrias e

    dos produtos gerados por elas. A extenso da deteriorao determinada pela carga

    bacteriana inicial, pela temperatura do msculo do peixe, pelo tempo decorrido depois de sua

    morte e pelas prticas sanitrias adotadas (Leito et al., 1977).

    No Brasil, a Portaria n. 451 de 19/09/97 do Ministrio da Sade, SVS (1997), fixa

    os seguintes padres microbiolgicos para pescado in natura, fresco e refrigerado:

    - Salmonella: ausncia em 25g.

    - Coliformes fecais: mximo de 102/g.

    - Staphylococcus aureus: mximo de 103 /g.

    - Contagem padro em placas: mximo de 106 /g.

    As bactrias coliformes so importantes nas alteraes dos alimentos pela sua

    capacidade de crescer bem em inmeros substratos e por utilizar como fonte de energia um

    grande nmero de hidratos de carbono e alguns compostos nitrogenados como fonte de

    nitrognio, pela capacidade de sntese da maioria das vitaminas que necessitam, alm de

    produzirem, a partir dos acares, considerveis quantidades de cidos e gs, podendo

    ocasionar sabores anormais (Jay, 1970).

  • 35

    2.6 Efeito das radiaes ionizantes nos alimentos

    O uso de novas tecnologias permite que cada vez mais os produtos sejam

    diversificados, acompanhando as tendncias mundiais de alimentos prontos e de fcil preparo.

    Uma das vantagens em processar os alimentos, a de se poder apresent-lo de forma mais

    atraente que a tradicional, no exigindo o desgaste de limpar e eviscerar, no caso de pescado,

    alm de permitir estocagem por maior tempo, sem perda de seus atributos organolpticos

    (Beiro et al., 2000).

    Somente determinados tipos de radiaes ionizantes possuem propriedades

    adequadas para o tratamento de alimentos. So radiaes eletromagnticas, em forma de raios

    gama ou de raios X. Os raios gama so radiaes com comprimentos de onda que se originam

    na desintegrao espontnea do ncleo atmico de certos elementos; os raios X so de igual

    natureza, porm so produzidos por geradores. Tanto os raios gama como os raios X so

    muito penetrantes e efetivos (FAO/IOEA/OMS, 1966).

    Segundo Truswell (1987), baixas doses de radiaes ionizantes (abaixo de 1,0 kGy)

    so capazes de inibir o brotamento de batatas e cebolas; j doses entre 5 e 10 kGy,

    aumentam a vida til de alimentos, reduzindo a carga microbiana e eliminando microrganismos

    no-esporulados em condimentos, carne de aves e pescado.

    A irradiao de alimentos um tratamento que consiste em submeter os alimentos, j

    embalados ou a granel, a uma quantidade minuciosamente controlada de radiao ionizante,

    por um tempo prefixado e com objetivos bem determinados. O processo no aumenta o nvel

    de radioatividade normal dos alimentos e as radiaes ionizantes podero ser utilizadas nos

  • 36

    alimentos em geral, com energia inferior ao limiar das reaes nucleares, que poderiam induzir

    radioatividade no material irradiado. No caso de radiaes gama, que apresentam um elevado

    poder de penetrao nos tecidos de forma homognea, no existe aumento significativo de

    temperatura durante o processamento. A dose mdia global absorvida por um alimento

    submetido a um processo de irradiao no deve exceder 10 kGy, com a finalidade de

    assegurar a inocuidade do alimento irradiado, sob os pontos de vista toxicolgico, nutricional e

    microbiolgico, conforme especifica a legislao brasileira (Diehl, 1992; IAEA, 1989; Rela,

    2000).

    A radurizao (pasteurizao a frio) um processo de irradiao a ser utilizado para

    estender o frescor dos peixes mantidos no gelo ou sob refrigerao, reduzindo a incidncia da

    deteriorao causada por bactrias. Dois fatores so determinantes na escolha da dose de

    radurizao, a qualidade e quantidade de mudanas no crescimento microbiolgico e a

    manuteno dos atributos organolpticos deste alimento. Bactrias Gram negativas so radio-

    sensveis e grandemente responsveis pela deteriorao de produtos de pescado, sendo

    portanto, necessrio uma baixa dose de radiao para inativ-las. A radurizao suficiente

    na dose de 1 a 3 kGy para reduzir uma contagem inicial de organismos deterioradores de 1

    para 3 ciclos logaritmos (Poole et al., 1994; Ryder et al., 1983; Sikorski, 1990;).

    Segundo Rela (2000) nos ltimos 30 anos foram realizadas pesquisas cientficas

    utilizando tcnicas analticas, altamente precisas, com o objetivo de isolar e detectar produtos

    radiolticos formados durante o processo de irradiao, sendo que no foram detectadas

    substncias que sejam produzidas exclusivamente nos alimentos irradiados.

  • 37

    A irradiao de alimentos essencialmente um processo frio, porque este

    tratamento no causa um aumento da temperatura. Todavia, a temperatura do produto

    irradiado influencia na mudana de radiao-induzida, ou seja, reaes entre radicais livres

    aumentam com a temperatura, afetando a taxa total de radilises. Baixas temperaturas,

    reduzem a produo de compostos volteis em alimentos, os quais afetam a qualidade

    sensorial do alimento irradiado. Estas alteraes so minimizadas em produtos congelados

    (Merrit et al., 1985).

    De 1970 a 1982 estudos foram coordenados pelo International Project (IFIP) com

    sede em Karlsruhe, na Alemanha. O Joint Expert Committee constitudo pela World Health

    Oorganization das Naes Unidas, FAO Food and Agriculture Organization e IAEA

    International Atomic Energy Agency concluram, no ano de 1980, que a irradiao de

    qualquer alimento, at a dose de 10 kGy, no apresenta perigo toxicolgico nem tampouco

    alteraes nutricionais. Tal julgamento foi razo para a elaborao dos padres no Codex

    Alimentarius quanto segurana do alimento irradiado e medidas de controle e documentao

    deste procedimento; as normas de aplicao irradiao de alimentos, estipulam que os

    alimentos irradiados destinados exportao devem ser acompanhados de documentos de

    embarque, nos quais devem estar identificados o irradiador, o lote, a dose e outros detalhes

    do tratamento. Tais alimentos devem estar devidamente embalados e etiquetados para

    identificao, alm de ser utilizado o termo irradiado ou tratado por radiao ionizante,

    bem como estar presente o smbolo internacional para alimento irradiado conforme a Figura 1

    (Bruhn & Wood, 1996; ICGFI/IAEA, 1991; Lusk et al., 1999; Mayer-Miebach, 1993).

  • 38

    Figura 1-Smbolo Radura

    A aceitao depende da confiana sobre a qualidade e a segurana apresentada pelos

    alimentos irradiados juntamente com o custo, sendo que o sucesso da comercializao dos

    produtos irradiados no mercado interno, ocorrer se houver a aceitao destes, por parte do

    mercado externo, alm de se adaptarem facilmente atual tendncia a alimentos embalados e

    mecanizao da indstria alimentcia. Em 1997, aps trs anos de estudo, o FDA (Food &

    Drug Administration), aprovou o uso da irradiao em carne bovina, uma vez que esta

    preserva a qualidade dos alimentos sem alterar o sabor, a aparncia ou o aroma, alm do

    produto poder ser irradiado j embalado (Savitci et al., 1997).

    A irradiao pode ser utilizada juntamente com outros mtodos de conservao de

    alimentos como a refrigerao, tratamento trmico, cura e a adio de substncias qumicas, a

    fim de prolongar, consideravelmente a vida til de alguns alimentos durante o perodo de

    armazenamento, tanto refrigerado como no, sendo necessrio um envase perfeito que no

    permita uma nova contaminao, uma vez que o alimento estar isento de qualquer flora

    microbiolgica (FAO/IOEA/OMS, 1966).

  • 39

    Rela (2000) destaca que os macronutrientes como protenas, carboidratos e gorduras

    so estveis ao processo de irradiao. Os micronutrientes, especialmente as vitaminas,

    podem ser sensvies a qualquer mtodo de tratamento de alimento, incluindo a irradiao.

    Os alimentos em geral, contm componentes chave que, embora presentes em

    concentraes muito baixas, regulam o seu sabor, aspecto e o valor nutritivo (WHO, 1994).

    Esses componentes so muito sensveis irradiao e, se a dose de radiao for alta, pode

    causar transformaes prejudiciais no sabor, no odor e na cor desses alimentos (Singh et al.,

    1995). Em relao ao processo tecnolgico, as radiaes ionizantes podem agir

    negativamente sobre os lipdeos que rancificam devido oxidao (Hutzier, 1997). Todavia,

    Al-Kahtani et al. (1996) destacam que o efeito da irradiao nos lipdeos similar s

    mudanas resultantes do emprego do calor ou processos oxidativos, sendo que tal efeito

    minimizado na excluso do oxignio.

    Gruiz et al. (1987) analisaram as mudanas ocorridas na frao lipdica aps a

    irradiao de frangos e observaram que em doses altas (50 kGy) apareceram reaes de

    oxidao lipdica, enquanto em doses mais baixas (4 kGy) no ocorreram alteraes

    significativas.

    Doses maiores que 3 kGy desencadeiam processos de oxidao lipdica, uma vez que

    o pescado possui altas concentraes de cidos graxos polinsaturados na pele e nos tecidos

    musculares (Ghadi & Venugopal, 1991). A pele do pescado a regio onde a oxidao

    lipdica se apresenta mais marcante, devida a grande quantidade de fosfolipdios. Todavia,

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    quando utilizadas baixas doses, ou doses de radurizao, e com a ausncia do oxignio, os

    processos oxidativos so minimizados (Pigott & Tucker, 1990).

    Outra alterao importante a ser ressaltada diz respeito aos aminocidos, que podem

    sofrer pequenas quebras e liberao desagradvel de cheiro sulfuroso, porm deve-se lembrar

    que isto acontece em nveis bem baixos, no acarretando problemas no valor nutricional

    (Kilcast, 1994).

    Os radicais livres podem se formar no somente durante o processo de irradiao,

    mas tambm mediante vrios outros tratamentos convencionais de alimentos, tais como a

    liofilizao, torrefao, fervura, os processos normais de oxidao, entre outros (Diehl, 1992;

    Satin, 1996; Singh et al., 1995). Tal reao desenvolve-se quando a clula submetida s

    radiaes ionizantes, onde vrios dos seus componentes qumicos podem ser atingidos com a

    conseqente formao de produtos radiolticos quimicamente estveis, o que promove a

    estabilidade qumica das substncias presentes no alimento (Ray, 1996; Voisine et al., 1993;

    Wagner, 2000).

    Al-Kahtani et al. (1996) analisaram fils de tilpia do nilo (Oreochromis niloticus) e

    cavala-moira (Scomberomorus commersoni), irradiados com doses de 1,5 a 10 kGy,

    estocados por 20 dias temperatura de refrigerao e no-irradiados, sob os aspectos de

    bases nitrogenadas volteis totais (BNVT), cido tiobarbitrico (TBA), tiamina, riboflavina e

    tocoferis. Aps trs semanas de estocagem, os fils no-irradiados apresentaram um

    aumento para 60mg/ 100g de BNVT comparados aos 35 mg/ 100g dos fils irradiados.

    Quanto ao contedo de tiamina, este foi afetado com aplicao de doses maiores que 4,5

  • 41

    kGy, porm o teor de riboflavina no foi afetado. Para o tocoferol, houve uma maior reteno

    desta vitamina nos fils submetidos a doses de 3 kGy. Um aumento nos valores de TBA foi

    observado de acordo com o aumento da dose.

    Pesquisas demonstram que os macronutrientes tais como as protenas, carboidratos e

    as gorduras so relativamente estveis s doses at 10 kGy, e que os micronutrientes,

    principalmente as vitaminas, podem ser sensveis a qualquer mtodo de tratamento de

    alimentos (Diehl, 1992; Fox et al., 1989; Fox et al., 1992; Singh et al., 1995; WHO, 1994).

    Vitaminas hidrossolveis so particularmente sensveis a quaisquer mtodos de

    processamento, porm as lipossolveis so particularmente destrudas pela irradiao e os

    tocoferis so os mais sensveis nas doses de pasteurizao (Diehl, 1992; Fox et al., 1989;

    Kilcast, 1994; Nawar, 1983).

    2.6.1 Efeito das radiaes sobre os microrganismos

    Os problemas sanitrios que afetam os produtos da aqicultura, incluindo aqueles que

    interessam particularmente aos pases em desenvolvimento, esto associados com a

    contaminao biolgica e qumica que podem ocorrer durante o cultivo destes alimentos

    (Beiro et al., 2000).

    O pescado capturado carreia uma microbiota que reflete aquela do meio ambiente e

    normalmente no deve albergar microrganismos perigosos ao ser humano, porm h excees

    como os registros de cepas no proteolticas de Clostridium botulinum e vibries como o

    Vibrio parahaemolyticus (APPCC, 1988).

  • 42

    Os peixes so propensos a contaminao por uma variedade de microrganismos,

    dependendo do meio em que vivem e das condies de manuseio e da temperatura. A

    composio da microflora de diferentes espcies de peixes provenientes de guas frias aps

    sofrerem deteriorao, apresentam bactrias Gram negativas, enquanto espcies de peixes de

    guas tropicais, apresentam bactrias Gram positivas, alm de bactrias entricas, destacam

    Gram & Huss1 citados por Venugopal et al. (1999).

    Alm da gravidade da constatao de que um alimento est contaminado com

    microrganismos de origem fecal, a presena de E. coli pode ter um significado particularmente

    importante, uma vez que se constitui em linhagens enteropatognicas, causadoras de vrios

    surtos de gastroenterites, provocadas pela ingesto de gua e/ou alimentos contaminados

    (Franco et al., 1985).

    Segundo Figueiredo (1991) os coliformes fecais so destrudos por pasteurizao ou

    temperaturas normais de coco todavia, a sua resistncia ao congelamento depende do grupo

    e do substrato. Quanto sobrevivncia em alimentos desidratados, a ocorrncia de coliformes

    requer confirmao dos tipos encontrados. Se sua presena confirmada,significa

    contaminao fecal humana, atravs de manuseio durante o processamento e contaminao

    animal, atravs das prticas de manejo.

    Segundo a Legislao Brasileira, anexo II da portaria n 01/87 de 28 de Janeiro de

    1987, do Departamento de Inspeo Nacional de Alimentos (Brasil, 1976), classifica-se

    como produtos potencialmente capazes de causar toxinfeces alimentares os que

    1 GRAM, L.; HUSS, H.H. Microbiological spoilage of fish productos.

  • 43

    apresentam Staphylococcus aureus, Bacillus cereus, Clostridium perfringens e seus

    indicadores (clostrdios sulfito redutores, a 46C), em nmero superior a dez vezes os limites

    estabelecidos nos padres especficos, incluindo microrganismos como Salmonella, Yersinia

    enterocolitica, Brucella spp., Compylobacter jejuni e outros reconhecidos e caracterizados

    como agentes de infeces alimentares (Gonalvez, 1998; Silva et al., 1997).

    O indicador microbiolgico de poluio fecal mais empregado o grupo coliforme;

    bastonetes que fermentam a lactose com formao de gs a 35C, bactrias Gram negativas,

    facultativas anaerbicas, no esporuladas (Lima & Oliveira, 1992; Roitman et al., 1988). So

    microrganismos tpicos da microflora fecal, podendo ser encontrados em outras partes do

    corpo, como mos e ouvido. A espcie Escherichia coli considerada como sendo de

    origem unicamente fecal, pertence famlia Enterobacteriaceae e pode no possuir

    motilidade, ou pode possu-la atravs de flagelos peritrquios; sua temperatura tima de

    crescimento de 37C e o pH em torno de 7,0. Embora E.coli faa parte da flora normal do

    intestino grosso dos humanos e animais, a maioria das linhagens no patognica, alm de

    produzir infeces entricas e no trato urinrio, bem como, envenenamento alimentar. Pelo

    fato da pouca tolerabilidade dos coliformes gua do mar e a clorao, existem desvantagens

    apontadas de seu uso como indicadores de poluio fecal, todavia no existe outro mtodo de

    escolha para tal determinao (Roitman et al., 1988).

    A Salmonella constitui alto risco sade do consumidor por ser contaminante de

    alimentos manipulados sem os cuidados higinico-sanitrios, alm do armazenamento e

    transporte dos mesmos, ser feita de maneira inadequada. Alimentos in natura de origem

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    animal, so as maiores fontes de Salmonella, e o risco de se contrair uma salmonelose, tem

    incio quando esses alimentos j contaminados entram em contato direto com o manipulador

    que poder servir como agente disseminador desses microrganismos aos equipamentos,

    utenslios e alimentos j preparados (Roitman et al., 1988).

    No Brasil, vrios trabalhos demonstram a qualidade insatisfatria dos alimentos, em

    termos higinicos, principalmente em relao ao patgeno S. aureus, visto que o Comit

    Misto de Peritos da FAO/OMS, reunido em Genebra em 1980, determinou a necessidade de

    metodologias mais rigorosas a fim de minimizar tais riscos sade humana. O relatrio

    concluiu, portanto, que a utilizao de uma dose mxima de 10 kGy assegura a inocuidade dos

    alimentos sob os pontos de vista toxicolgico, microbiolgico e nutricional (OMS, 1984).

    A radiao ionizante age sobre as bactrias contaminantes atravs da leso de seus

    cidos nuclicos, especialmente do DNA, sendo sua eliminao relacionada intensidade da

    dose empregada (Hutzier, 1997)