48
UNIVERSIDADE C Â NDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO A VEZ DO MESTRE EM BUSCA DE UMA NOVA HIST ÓRIA Lauanne Macedo Fagundes Rio de Janeiro 2006

EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA

Lauanne Macedo Fagundes

Rio de Janeiro

2006

Page 2: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

2

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA

Monografia apresentada ao Instituto A

Vez do Mestre da Universidade Cãndido

Mendes como requisito à conclusão do

curso de pós-graduação em

Psicopedagogia por Lauanne Macedo

Fagundes.

Orientador: Vilson Sérgio de Carvalho

Page 3: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

3

AGRADECIMENTOS

Inicialmente, gostaria de agradecer aos meus queridos colegas de turma e

professores do Instituto A Vez do Mestre, em especial ao orientador Vilson Sérgio

de Carvalho.

Agradeço ao Centro de Educação e Cultura Alpha – CeEduca - pelas

oportunidades e pelo incentivo à realização deste curso.

À minha mãe, Valéria Macedo Fagundes, agradeço pelo seu amor, que me

tornou a pessoa que sou. Ao meu pai, Wanderley Fagundes, agradeço pelo

carinho e incentivo. Aos meus sogros, Adilson Teixeira Jorge e Selma Amaral

Jorge, agradeço por toda a atenção e acolhida.

Ao meu amado esposo, Leandro Amaral Jorge, agradeço por tudo que

vivemos juntos, pelo seu amor e por compreender a perda das tardes de sábado

durante este curso...

E, acima de tudo, agradeço a Deus...

... “porque desde a Antigüidade não se ouviu, nem com ouvidos se

percebeu, nem com olhos se viu Deus além de ti, que trabalha para aquele que

nele espera” (Isaías 64:4).

Page 4: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

4

RESUMO

O presente trabalho constitui-se em uma reflexão sobre os limites e as

possibilidades acerca do ensino de História no Brasil. Percorrendo a trajetória da

História em meio acadêmico e escolar, buscamos analisar como esta disciplina foi

construída por historiadores e professores, ambos perpassados pelas questões de

seu tempo, até chegar às atuais propostas curriculares, que abrem novas

possibilidades de reflexão e ação da prática pedagógica. Estas possibilidades, no

entanto, foram abordadas à luz da Psicopedagogia, no sentido da promoção de

um ensino e, certamente, de uma aprendizagem significativa do conhecimento

histórico, buscando a transformação do ensino através do privilégio de uma

reflexão e de uma ação dialética e dialógica, na qual professor e aluno são vistos

como protagonistas deste ato.

Page 5: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

5

METODOLOGIA

A metodologia de pesquisa utilizada consiste em levantamento bibliográfico

acerca do ensino de História e das dificuldades de aprendizagem, utilizando-se de

livros, artigos e documentos oficiais, de forma a permitir o resgate da trajetória

desta disciplina em meio acadêmico e escolar, a análise crítica e contextualizada

das possibilidades que se abrem ao trabalho do professor diante das atuais

propostas curriculares e a identificação das possíveis intervenções

psicopedagógicas, buscando uma melhora no processo de ensino-aprendizagem

do conhecimento histórico.

Page 6: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

6

SUMÁRIO

Introdução ............................................................................................................... 7

Capítulo I

Pelos caminhos da História .................................................................................... 9

1.1 – Um novo caminho: a revolução da historiografia .......................................... 9

1.2 – O caminho percorrido: a trajetória da História como disciplina escolar ....... 12

Capítulo II

O ensino de História: a construção e seus construtores ...................................... 19

2.1 – A construção de uma nova possibilidade .................................................... 19

2.2 – Reflexão e ação: o “fazer-se” pedagógico ................................................... 26

Capítulo III

A Psicopedagogia e a busca de uma nova História.............................................. 31

3.1 – A Psicopedagogia entra em cena ................................................................ 31

3.2 – “Como meu aluno aprende?” ....................................................................... 35

3.3 – O papel do professor na construção do conhecimento histórico ................. 37

3.4 – Intervenção psicopedagógica: educação dialética e dialógica .................... 41

Considerações Finais ........................................................................................... 44

Referências Bibliográficas .................................................................................... 46

Page 7: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

7

INTRODUÇÃO

A escola pode ser o lugar de muitos encontros e desencontros, à medida

que tanto pode possibilitar ao aluno um contato com um vasto mundo de idéias e

conhecimentos, como também pode tornar o desconhecido algo que o aluno não

deseja explorar.

O professor de História, em sua aula de “Introdução aos estudos históricos”,

inicia com a afirmação de que esta disciplina é “a ciência social que objetiva

estudar o passado, para compreender o presente e melhorar o futuro”, colocando

nesta definição a importância do seu estudo. Será que isto atinge o interesse dos

alunos? Sabemos que, atualmente, o professor precisa disputar o interesse do

corpo discente com muitos outros recursos e, diante disso, surge a seguinte

pergunta: como se fazer interessante e fazer com que o outro se interesse?

A Psicopedagogia trabalha as dificuldades de aprendizagem, mas estas

dificuldades devem ser pensadas não só na perspectiva do “aluno

desinteressado”, mas, antes disso, na perspectiva da avaliação da prática

pedagógica do docente, refletindo como este pretende atuar para alcançar cada

um de seus alunos.

O presente trabalho – Em busca de uma nova História - tem por objetivo

abordar as questões apresentadas acima, buscando analisar a História em três

instâncias, que nortearão a divisão dos capítulos da seguinte forma:

- Capítulo I – Pelos caminhos da História: Procuramos apresentar uma reflexão

sobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar.

Percorrendo o caminho de historiadores e professores na construção desta

disciplina, analisamos como as questões temporais influenciam tanto na escrita da

História quanto em seu ensino.

Page 8: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

8

- Capítulo II – O ensino de História: a construção e seus construtores – Buscamos,

neste capítulo, uma abordagem sobre as possibilidades que se abrem ao ensino

de História, considerando, em virtude das novas propostas curriculares, a

transformação que pode ocorrer na reflexão e na ação do professor e,

conseqüentemente, do aluno.

- Capítulo III – A Psicopedagogia e a busca de uma nova História – Por último,

após analisarmos a construção e o ensino do conhecimento histórico em sua

trajetória e na atualidade, procuramos lançar um olhar sobre o trabalho do

psicopedagogo, no sentido de intervir e melhorar a prática pedagógica do

professor de História.

Este trabalho pretende, portanto, promover uma reflexão e uma ação sobre

o processo de ensino-aprendizagem de História, tendo em vista que, ao analisar a

prática pedagógica dos docentes desta disciplina, temos por finalidade a

elaboração de uma proposta de intervenção que busque melhorar as condições de

aprendizagem de nossos alunos.

Page 9: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

9

CAPÍTULO I

PELOS CAMINHOS DA HISTÓRIA

Este presente capítulo tem como objetivo promover uma discussão sobre a

construção do conhecimento histórico, ao longo do tempo, enquanto disciplina

acadêmica e disciplina escolar, percebendo, neste processo, as múltiplas

influências das relações sociais e de poder e analisando como estas influências

marcam tanto o trabalho da escrita da História pelos historiadores quanto a prática

pedagógica dos professores de História.

1.1 - UM NOVO CAMINHO:

A REVOLUÇÃO DA HISTORIOGRAFIA

A História surgiu como disciplina no século XIX, inserida em um contexto

em que, finalmente, houve a reflexão de que a palavra ciência apresentava um

sentido bem mais amplo em relação àquele que até então lhe era conferido e, por

isso, deveria ser dividida em ciências naturais e ciências sociais. Foi dentro deste

contexto que teve início a possibilidade de se pensar o homem não somente em

sua dimensão biológica, mas também em sua dimensão social, estudando sobre a

sua trajetória, suas vivências e convivências ao longo do tempo e do espaço.

Entretanto, da mesma forma que podemos dizer que somos “frutos do

nosso tempo”, a História, apesar de ter recebido o status de disciplina, também

esteve, em seus primeiros passos, fadada a ser “fruto do seu tempo” e, diante

disso, as pesquisas históricas seguiam a linha de pensamento da corrente

predominante no século XIX: o positivismo ou historicismo.

Obviamente, não podemos negar as contribuições dos positivistas, dentre

os quais se destaca Augusto Comte, ao progresso da ciência; contudo, analisando

a escrita da História dentro da perspectiva do positivismo, podemos dizer que o

conhecimento histórico se reduzia a um conjunto de fatos/eventos históricos que

Page 10: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

10

deveriam ser escritos “da forma como ocorreram”. É a chamada História Factual

ou Narrativa que, quando traduzida para o ensino tradicional, deveria ser exposta

pelos professores e assimilada/decorada pelos alunos; afinal, a História era

ensinada da maneira como era vista e escrita pelos historiadores.

Para Circe Bittencourt (2004), dentro desta perspectiva da História como

narrativa, a sua definição estava ligada ao conhecimento do passado e, aos

historiadores, cabia a tarefa de recolher, através dos documentos, os fatos mais

importantes e narrá-los, respeitando-se a ordem cronológica.

No decorrer do século XX, novas ciências sociais se constituíam na busca

da compreensão da sociedade, como a Antropologia, a Sociologia e a Economia,

passando a disputar espaço com a produção historiográfica. Foi diante desta

disputa que ocorreu uma renovação na produção historiográfica, através da busca

de novos paradigmas que visavam ultrapassar o historicismo. O historiador Ciro

Flamarion Cardoso (1997), procurando resgatar as tendências deste percurso

historiográfico, identifica duas filiações básicas: a Escola dos Annales e o

Marxismo.

A transformação do ensino da História, certamente, foi e ainda é possível,

graças a esta revolução na historiografia (escrita da História), ocorrida no início do

século XX. A Escola dos Annales, uma revista francesa fundada por Lucien

Febvre e Marc Bloch, passou a combater a escrita da História dentro da lógica

positivista, inaugurando a chamada “História-problema”, alterando a mentalidade

e, conseqüentemente, o olhar dos historiadores sobre os documentos,

possibilitando-lhes escrever e construir uma nova História (BURKE, 1997). O

paradigma marxista propõe, por sua vez, uma vinculação epistemológica dialética

entre o presente e o passado, conduzindo à percepção de fatores formados no

passado cujo conhecimento é útil para a atuação na realidade.

Page 11: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

11

Apesar destas diferenças que apontamos entre os dois grupos, Ciro

Flamarion (1997) identifica aproximações entre os adeptos dos Annales e os

marxistas. Dentre os principais pontos, destacam-se o abandono da história

centrada em fatos isolados e a tendência para a análise de fatos coletivos e

sociais, a ambição em formular uma síntese histórica global do social, a história

entendida como “ciência do passado” e “ciência do presente” simultaneamente, a

consciência da pluralidade da temporalidade – tempo do acontecimento, da

conjuntura e da longa duração ou da estrutura.

De acordo com Circe Bittencourt (2004), paralelamente a essas duas

correntes, entra em cena também, ao longo dos anos de 1980, a chamada História

Cultural. Dentro deste contexto, muitos historiadores aproximaram-se dos sujeitos

e dos objetos de investigação da Antropologia, o que foi de significativa

importância para a compreensão da própria noção de História, cuja existência, até

então, se iniciava apenas após o advento da escrita. Com isso, os povos sem

escrita, deixados de lado pela “história da civilização”, como os indígenas e

africanos, foram incorporados à historiografia, ocorrendo a introdução de novos

métodos de investigação histórica, lançando um olhar para a memória oral,

lendas, mitos, objetos materiais, construções, entre outras.

Neste caminho de transformação da historiografia, pode-se perceber

também a influência das idéias do filósofo francês Michel Foucault, no que se

refere à preocupação com os micropoderes e as diversas estratégias de

dominação, desde a organização familiar, aos presídios, escolas, hospitais, etc.

Em seu artigo “Caminhos e Descaminhos da história”, o historiador Ronaldo

Vainfas (1997), realizando um inventário da produção histórica recente, observa a

existência de compatibilidade entre a micro-história (análises microscópicas) e a

macro-história (abordagens globalizantes).

Toda esta discussão sobre a historiografia faz-se necessária à medida que

entendemos que “ponto básico para o estabelecimento de um critério para a

Page 12: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

12

seleção de conteúdos é a concepção de história” (BITTENCOURT, 2004, p. 139).

Como exemplo temos a concepção de articulação entre a micro e a macro-

história, que se constitui em um desafio para o ensino de História, já que

fundamentam algumas das propostas curriculares e dela depende a seleção dos

conteúdos históricos escolares.

Vale ressaltar que estamos conjugando a transformação do ensino da

História e a transformação historiográfica como uma possibilidade, e não como

uma realidade propriamente dita. Atualmente, ainda há muito que refletir e

transformar – daí o sentido de estarmos pesquisando sobre este assunto.

1.2 – O CAMINHO PERCORRIDO:

A TRAJETÓRIA DA HISTÓRIA COMO DISCIPLINA ESCOLAR

Educar é ação, é prática social e, como toda prática social, encontra-se

perpassada pelas relações de poder da época na qual está inserida. Entendemos,

de maneira geral, que compreender a trajetória do ensino no Brasil significa

mergulhar nos distintos desenvolvimentos das práticas educativas e de suas

relações com o seu tempo.

Diante disso, podemos dizer que as tendências pedagógicas, que

caracterizam as maneiras de desenvolver a prática educativa, têm forte influência

sobre a elaboração de currículos e, conseqüentemente, sobre a prática do

docente. De acordo com Libâneo (1986), podem ser destacadas as seguintes

tendências pedagógicas:

- Pedagogia tradicional: tem a tendência de perpetuar o que já existe, transmitindo

os conteúdos para que os alunos possam apropriá-los e reproduzi-los;

- Pedagogia renovadora progressista: os alunos devem “aprender a aprender”,

estando sempre prontos para o aprendizado do novo, sem estarem presos aos

conteúdos;

Page 13: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

13

- Pedagogia tecnicista: procura desenvolver uma série de técnicas em busca de

uma ação eficaz. As questões de múltipla-escolha são um exemplo disso, pois não

dão a possibilidade de elaborar uma resposta;

- Progressista libertadora: Paulo Freire propõe uma educação problematizadora e

um trabalho interdisciplinar;

- Libertária: constitui-se no trabalho de grupos que buscam alternativas bem

próximas àquelas propostas pela pedagogia progressista libertadora;

- Crítico-social dos conteúdos: Propõe o regate do trabalho de Paulo Freire, mas

enfatiza os conteúdos, afirmando que é preciso que se ensine.

A elaboração do planejamento de ensino também está dividida levando-se

em conta dois significados, limites, possibilidades:

- Racionalidade técnica: a visão mais clássica é a de que se prepara antes para

agir depois, havendo um controle da ação e dos resultados. O professor, nesta

perspectiva, é um técnico, ele não produz conhecimento, apenas transmite e

reproduz.

- Didática fundamental: a escola é entendida como um espaço de produção de

saberes, saberes escolares, para os quais o professor é o autor que, ao planejar,

considera os aspectos sociais, políticos e culturais, levando em conta os marcos

referenciais sobre a situação do ensino, dos alunos, da comunidade e dos demais

professores.

Os currículos escolares, elaborados também de acordo com as relações

sociais e de poder da sua época - tendo em vista que são reflexos de como os

seus elaboradores lidam com as tendências pedagógicas de seu tempo -

influenciam substancialmente o trabalho do profissional da área de educação, no

que se refere tanto em sua reflexão (pesquisa e planejamento) quanto em sua

ação, podendo facilmente levá-los a adotar uma postura autoritária de “donos do

conhecimento” ou, como mencionamos acima, “detentores do saber”, que se

colocam em contraposição ao aluno, representante do “não-saber”.

Page 14: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

14

Não só as tendências pedagógicas, os currículos e os planejamentos são

influenciados pelas relações sociais, a própria profissão “professor” é vista de

acordo com o seu tempo. O caminho percorrido por este profissional pode ser

delimitado da seguinte forma:

- “professor sacerdote”: identificado com a noção de chamado, doação;

- “professor técnico”: domina técnicas de transmissão para realizar o seu trabalho,

havendo mínimo envolvimento. Esta idéia é muito predominante no século XIX,

onde, como vimos, a ciência entra como forma de explicação, e não de

questionamento;

- “professor instrutor ou monitor”: reprodutor de conteúdos;

- “professor pesquisador de sua prática” e “professor como prática reflexiva”:

aquele que reflete e planeja antes, durante e depois da ação.

A prática de ensino de História esteve e está, certamente, relacionada às

tendências pedagógicas, aos significados atribuídos ao planejamento e às

próprias formas de se conceber o professor. Segundo Circe Bittencourt (2004),

desde o século XIX, a História, enquanto disciplina escolar, tem aparecido nos

currículos dos diferentes níveis do ensino, integrando o conjunto de disciplinas que

são consideradas como saberes fundamentais no processo da escolarização

brasileira e passando por significativas mudanças – uma trajetória permeada de

conflitos e controvérsias - no que concerne aos métodos, conteúdos e finalidades,

até chegar à configuração das propostas curriculares atuais.

Analisando a trajetória percorrida pelo ensino da História, desde o século

XIX, podemos dizer que ele esteve identificado, já a partir da escola primária,

como instrumento pedagógico significativo para a constituição de uma identidade

nacional, para o ensino da leitura, para o reforço da moral cívica e religiosa e para

a construção das noções de nação e de cidadania.

O ensino da História, mais do que das outras disciplinas escolares,

desenvolveu-se, a longo tempo, de acordo com a idéia do saber “pronto, fechado

Page 15: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

15

e acabado”, constituindo-se, muitas vezes, em repetições, memorizações e

monólogos do professor, que acabava se colocando como detentor do saber,

afirmando que os fatos históricos são indiscutíveis e assumindo, assim, como foi

dito anteriormente, uma postura marcada pelos referenciais do positivismo. Para

Popkewitz

“o principal objetivo do historicismo foi o de objetivar toda a vida

social, a realidade era explicada ‘tal como aconteceu’, através da

ordenação de eventos ou dos pensamentos singulares dos

indivíduos. Os eventos e atores eram reunidos através de uma

ordenação cronológica das práticas concretas no tempo. Tendo

os fatos como a força orientadora, o historiador devia interferir tão

pouco quanto possível ao escrever os ‘fatos’ da história”

(POPKEWITZ, 1994, p.182).

Ao nos remetermos à questão do saber “pronto fechado e acabado”, logo

fazemos conexões com o chamado ensino tradicional, associado ao uso de

determinado material pedagógico ou às aulas expositivas, diante dos quais o

aluno recebe, de forma passiva, uma carga de informações, que passam a ser

repetidas mecanicamente de maneira oral ou por escrito, com base no que foi

copiado no caderno ou nos exercícios propostos pelos livros.

Conforme Circe Bittencourt (2004), os anos 80 do século XX foram palco de

intensas discussões sobre a renovação do ensino de História, ocorrendo

questionamentos acerca do método de ensino, principalmente diante da

característica de uma disciplina que, até então, exigia do aluno apenas o “saber de

cor”. Diante destes debates, Jaime Cordeiro (2000), em seu livro A História no

centro do debate: as propostas de renovação do ensino de História nas décadas

de setenta e oitenta, observou a difusão da idéia de uma crise da disciplina e da

construção de slogans contra o “ensino tradicional”, caracterizado pela ligação

Page 16: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

16

entre conteúdo e método, associados a uma relação autoritária entre professor e

aluno e entre a hierarquia de saberes. Para Cordeiro, o método tradicional

“é fundado numa relação professor-aluno autoritária, que por sua

vez está inserida numa hierarquia de saber mais ampla, que vai

desde a Universidade (local por excelência da produção do

conhecimento), passando pelo livro didático e pelo professor, até

chegar ao aluno, mero receptor de um conhecimento que

aparece para ele já pronto e acabado” (CORDEIRO, 2000, p.60).

A partir dos anos de 1980, quando tiveram início as elaborações das

reformulações curriculares, as críticas ao ensino de História estiveram duramente

voltadas contra uma “História tradicional”, podendo-se constatar a renovação de

conteúdos e métodos por parte de professores, que se defrontavam com uma sala

de aula repleta de uma multiplicidade de realidades sociais e culturais.

Diante deste novo contexto, fazia-se necessária uma mudança geral e

profunda no ensino de História. Entretanto, toda transformação deve ser refletida,

dialogada... Não basta mudar o método, mas deve-se pensar sobre a concepção

de saber histórico, de aluno e de aprendizado. Para Circe Bittencourt

“as mudanças de métodos e conteúdos precisam ser entendidas

à luz da concepção de 'tradição escolar', sendo necessário

perceber, por intermédio desse conceito, dois aspectos

fundamentais. O primeiro opõe-se à idéia de que, em educação,

seja preciso sempre “inventar a roda”, bastando verificar que

muito do que se pensa ser novo já foi experimentado muitas

outras vezes. Outro aspecto a ser levado em conta no processo

de renovação é o entendimento de que muito do tradicional deve

ser mantido, porque a prática escolar já comprovou que muitos

conteúdos e métodos escolares tradicionais são importantes para

Page 17: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

17

a formação dos alunos e não convém serem abolidos ou

descartados em nome do “novo”. Assim, há que haver cuidado na

relação entre permanência e mudança no processo de renovação

escolar” (BITTENCOURT, 2004, p.229).

Estes debates contribuíram para as transformações do ensino de História,

que podem ser observadas através de um olhar sobre as propostas curriculares

formuladas pelos estados e municípios e pelos Parâmetros Curriculares

Nacionais. É possível observar o surgimento de propostas que almejam um ensino

de História mais significativo para alcançar a geração do mundo tecnológico. Mas,

isto é assunto para o Capítulo II.

Ao analisarmos a trajetória percorrida pela História tanto como disciplina

acadêmica quanto como disciplina escolar, objetivamos promover uma reflexão

sobre tudo o que já foi repensado, revisto e transformado e, sobretudo, uma

reflexão sobre o papel do professor para realizar estas transformações no seu

“fazer-se”, na sua prática pedagógica.

É preciso transformar aquele pesado estudo do passado, repleto de datas e

nomes a serem decorados, em algo que o professor possa dizer ao aluno: aqui

estão as ferramentas, temos as fontes históricas para construir a História do que

iremos estudar na aula de hoje... É a construção e os seus construtores...

“Os educadores, vinculando-se à prática da educação, pondo-se

à escuta dessa prática podem recriar a teoria, questionar suas

análises e rever a sua própria prática. O confronto pedagógico se

dá na prática onde um educador é um teórico, um intelectual que

articula dialeticamente o crescimento do grupo que dirige: seu

referencial teórico confronta-se com a capacidade do educando

que elabora a teoria em confronto com a prática do educador. O

educando não é um ser sem teoria e o educador, um teórico. São

Page 18: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

18

ambos intelectuais. Trazer para o educando a análise pronta,

acabada, constitui-se numa verdadeira fraude. É levar ao

educando uma visão livresca do processo. Pelo contrário, o ato

educativo exige que essa visão global do processo seja

elaborada conjuntamente” (GADOTTI, 1991, pp.79-80).

Page 19: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

19

CAPÍTULO II

O ENSINO DE HISTÓRIA:

A CONSTRUÇÃO E SEUS CONSTRUTORES

Após apresentarmos a trajetória da constituição da História como disciplina

em meio acadêmico e escolar, observando que o ensino também é perpassado

pelas questões de seu tempo, refletiremos neste capítulo sobre as atuais

possibilidades, apesar dos limites, que se abrem para o ensino da História,

analisando como o professor pode alcançar o interesse do aluno quando privilegia

a relação dialética da educação tanto em sua reflexão quanto em sua ação.

2.1 – A CONSTRUÇÃO DE UMA NOVA POSSIBILIDADE

Como vimos no Capítulo I, após os intensos debates sobre o ensino

promovidos ao longo da década de 1980, tiveram início as transformações no

ensino de História, baseadas em novas propostas curriculares. Para Circe

Bittencourt, “o momento atual tem propiciado a introdução de algumas reflexões

sobre a necessidade urgente do ofício do historiador e do professor de História no

sentido de evitar a amnésia da sociedade atual, marcada por incertezas e

perspectivas indefinidas” (BITTENCOURT, 2005, p.14).

Ao analisarmos as reformulações curriculares, iniciadas durante o processo

de redemocratização da década de 1980, observamos que elas estavam pautadas

no atendimento às camadas populares, enfocando uma formação política que

pressupunha o fortalecimento da participação de todos os setores sociais neste

processo. Com tal projeto, foram introduzidos, nas várias propostas que estavam

sendo elaboradas, os projetos vinculados aos das políticas liberais, levando-se em

conta os interesses internacionais. Sendo assim, diante da política do governo

federal, alinhado ao modelo liberal, o Ministério da Educação (MEC) se

comprometeu a realizar a reformulação curricular em todos os níveis de

escolarização, desde o infantil até o superior.

Page 20: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

20

Dentro deste contexto, foram criados os chamados Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCN), com o objetivo de reformular os currículos dos ensinos

fundamental e médio. Circe Bittencourt (2004) aponta que os PCN foram

elaborados de acordo com os pressupostos da psicologia da aprendizagem

piagetiana, ressaltando que esta tendência não é nova, mas que foi

redimensionada sob novas perspectivas, prevalecendo as interpretações de

alguns educadores, especialmente a do espanhol César Coll, do que se denomina

de construtivismo.

Comparando a visão de ensino apresentada no Capítulo I e as propostas

curriculares mais recentes, notamos um avanço considerável, já que as últimas

encontram-se centradas na relação entre ensino e aprendizagem, deixando de

lado o enfoque exclusivo ao ensino. Para Bittencourt,

“vários estudos assinalam as diferentes formas de produzir os

currículos e os diferentes sujeitos que executam essa tarefa,

sendo possível distinguir o conjunto complexo de elementos que

deles participam e os integram desde a sua elaboração, enquanto

documento oficial, até a sua efetivação por professores e alunos

na sala de aula” (Idem, pp. 103-104).

Atualmente, ao pensarmos sobre a idéia de currículo, devemos concebe-la

em todas as suas dimensões, distinguindo-se o currículo formal (ou pré-ativo ou

ainda normativo), criado pelo poder estatal, o currículo real (ou interativo),

correspondente ao que realmente é realizado na sala de aula por professores e

alunos, e o currículo oculto, constituído por ações que impõem normas e

comportamentos vividos na escola, mas sem registros oficiais. Em oposição a esta

linha conteudista, os defensores da educação popular, baseados em Paulo Freire,

entendem que a escola não pode ser apenas o lugar de transmissão de conteúdos

valorizados pela classe dominante, mas que esta deveria se ater aos conteúdos

Page 21: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

21

significativos, que são aqueles cujo enfoque proporciona uma leitura do mundo

social.

De acordo com os currículos mais recentes, podemos dizer que os

conteúdos escolares correspondem à integração de vários conhecimentos

adquiridos na escola, tanto no que se refere aos conteúdos explícitos de cada

disciplina quanto no que concerne à aquisição de valores, habilidades e

competências que fazem parte das práticas escolares e que são de suma

importância para o convívio social.

Com isso, entende-se a escola não apenas como o lugar de alfabetização e

de obtenção sistematizada de informações através das disciplinas escolares, mas

como uma instituição em que se aprendem conteúdos sociais e culturais

associados a comportamentos, valores e ideários políticos. E, são também esses

conteúdos, que devem ser integrados nos programas e planos escolares.

Outra preocupação presente nos atuais currículos é a de renovação dos

métodos de ensino. Assim, são apontados dois pressupostos fundamentais: a

articulação entre método e conteúdo e a articulação da escola às novas

tecnologias.

Estas questões apontadas acima, de maneira geral, são extremamente

importantes para a compreensão da criação, também a partir da década de 80 do

século XX, de várias propostas curriculares de História, como as que circulam

pelos estados e municípios e, obviamente, os PCN. De acordo com Bittencourt

(Ibid), estas propostas têm algumas características em comum, tais como:

- a preocupação de sua legitimidade junto aos professores;

- a redefinição do papel do professor, concedendo-lhe maior autonomia no

trabalho pedagógico;

- a apresentação mais detalhada dos pressupostos teórico-metodológicos do

conhecimento histórico;

Page 22: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

22

- a fundamentação pedagógica baseada no construtivismo, tendo como princípio o

fato de que o aluno é sujeito ativo, e não passivo, no processo de aprendizagem;

- a aceitação de que o aluno possui um conhecimento prévio sobre os objetos de

estudos históricos, tendo em vista que pode adquiri-los através de sua história de

vida e pelos meios de comunicação;

- a introdução dos estudos históricos a partir das séries iniciais do ensino

fundamental.

O ensino de História está, portanto, presente em todos os níveis de ensino

e, juntamente com o ensino da Geografia, constitui uma das bases essenciais

para o conhecimento das ciências humanas. Entretanto, é importante

observarmos as diferenças entre as propostas curriculares para cada nível de

ensino.

O ensino de História para alunos de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental

está relacionado à preocupação de introduzir conceitos e noções históricas, como

por exemplo, a questão da noção do tempo. No ensino de 5ª a 8ª séries, os

conceitos também são considerados como a base para o conhecimento histórico,

havendo a busca pela coerência entre os objetivos da disciplina e os fundamentos

historiográficos e pedagógicos:

“Com isso, o aluno estará construindo um instrumental conceitual

que permitirá a identificação das diferenças e de suas formas

próprias de realização na História; estará também superando o

egocentrismo e o individualismo na compreensão do caráter

social da experiência humana” (RIO DE JANEIRO, SEE, 1994,

p.77).

Ainda no ensino de 5ª a 8ª séries, podemos observar uma opção pela

história sociocultural, trabalhando conceitos fundamentais como os de cultura,

Page 23: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

23

trabalho, organização social, relações de poder e representações. A importância

da História cultural é justificada da seguinte forma:

“... essa história cultural tem por objetivo possibilitar aos alunos

compreender que os homens, para sobreviver, se relacionam

com a natureza e entre si, e que nesse processo produzem

cultura, que abrange, portanto, todas as manifestações históricas

dos grupos humanos” (Idem, p.76).

Já nos PCN, encontramos o seguinte:

“O aprofundamento de estudos culturais, principalmente no

diálogo da História com a Antropologia, tem contribuído, ainda,

para um debate sobre os conceitos de cultura e de civilização.

Alguns historiadores rejeitam o conceito de civilização por

considerá-lo impregnado de uma perspectiva evolucionista e

otimista face aos avanços e domínios tecnológicos, isto é, com

uma culminância de etapas sucessivas em direção a uma cultura

superior antecedida por períodos de selvageria e barbárie. Nessa

linha, os historiadores valorizam a idéia de diversidade cultural e

multiplicam as concepções de tempo” (BRASIL, MEC, 1998,

p.32).

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9394/96), o

objetivo central do Ensino Médio deve ser o preparo do aluno para exercer a

cidadania. De acordo com esta perspectiva, os PCN de História procuram articular

o domínio das informações e conceitos históricos básicos por parte dos alunos à

formação da cidadania. Uma pesquisa sobre os PCN do Ensino Médio aponta o

seguinte:

Page 24: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

24

“A ênfase dos textos dos PCN reside na articulação entre os

conteúdos expressos em informações e conceitos e de como

proceder para compreendê-los e analisá-los, dimensionando o

saber escolar com o saber fazer, ao mesmo tempo em que

admite e inclui como pressuposto a ser explicitado que este saber

não é neutro. Desta forma, é intrínseco do conteúdo programático

de cada disciplina a inclusão de atitudes, valores e habilidades a

serem trabalhados na prática escolar. Nessa perspectiva, para

cada disciplina é necessário estabelecer as relações entre os

conteúdos explícitos e conceitos básicos com as formas pelas

quais os alunos adquirem e se apropriam desses conteúdos”

(MELLO, 2000, p.141).

Como colocamos no início deste presente trabalho, existe, por parte dos

professores de História, uma preocupação em responder à seguinte pergunta:

“Professor, por que estudar História?” Esta preocupação também vem sendo

abarcada pelas propostas curriculares, que não limitam as finalidades do ensino

de História apenas à “compreensão do passado para criar projetos para o futuro”.

Devemos compreender que as finalidades do ensino de História são mais

complexas, passando principalmente pela questão de constituição de identidades,

pela formação da cidadania, associada à formação do cidadão político e pela

construção de um cidadão crítico. De acordo com o historiador André Segal, a

História escolar

“forma cidadãos comuns, indivíduos que vivem um presente

contraditório, de violência, desemprego, greves,

congestionamentos, que recebe informações simultâneas sobre

acontecimentos internacionais, como as guerras, que deve

escolher seus representantes para ocupar cargos políticos

institucionais. [Através do ensino de História o indivíduo deve] ter

condições de refletir sobre tais acontecimentos, localizá-los em

Page 25: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

25

um tempo conjuntural e estrutural, estabelecer relações entre os

diversos fatos de ordem política, econômica e cultural, de

maneira que fique preservado das reações primárias: a cólera

impotente e confusa contra os patrões, estrangeiros, sindicatos

ou o abandono fatalista da força do destino” (SEGAL Apud

BITTENCOURT, 2004, pp.121-122).

Concluindo as nossas colocações sobre o objetivo do estudo da História,

podemos dizer que há uma proposta humanística nos PCN:

“Uma formação humanística e moderna abrange reflexões e

estudos sobre as atuais condições humanas, mas que se

fundamenta nas singularidades e no respeito pelas diferenças

étnicas, religiosas, sexuais das diversas sociedades (...). A

perspectiva histórica permite uma visão não apenas abrangente

para estabelecer relações entre passado-presente na busca de

explicações do atual estágio da humanidade, como permite

identificar as semelhanças e diferenças que têm marcado a

trajetória dos homens no planeta Terra, (...) significa rever as

relações entre homem e natureza e também situar, no tempo, as

permanências de conflitos geradores de violências de diferentes

níveis e em diferentes locais, dentro das casas, das favelas, nos

grandes centros urbanos, nas áreas rurais ou em campos de

batalha” (BRASIL, MEC, 2002, p.51).

Refletindo, portanto, sobre as atuais propostas para o ensino de História,

podemos afirmar que estas exigem um intenso trabalho do professor, que deve se

ver como um intelectual que, trabalhando conjuntamente com seus alunos, deve

estudar, pesquisar, realizar a organização e a sistematização dos materiais

didáticos apropriados, criando uma prática pedagógica baseada na troca dialética

durante o “fazer-se”. E, é sobre este tema que discutiremos a seguir.

Page 26: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

26

2.2 – REFLEXÃO E AÇÃO: O “FAZER-SE” PEDAGÓGICO

Pensar sobre a prática pedagógica é uma via de mão-dupla. Não há como

separar a reflexão da ação, já que uma gera a outra e vice-versa. É através da

reflexão antes da ação que o professor planeja a sua prática, mas é também

através da reflexão durante ou após a ação que o educador está constantemente

se avaliando, com o objetivo de melhorar a sua ação.

Planejar significa agir para um determinado fim, ou seja, significa explicitar

intenções para definir ações. Através do planejamento de ensino (seja ele de

curso, de bimestre, de unidade ou de aula), o professor define com mais clareza o

que e como ensinar.

O professor, na tarefa de definição, não está sozinho, afinal, deve levar em

conta, a priori, o projeto político-pedagógico da escola, no qual são consideradas

as características sociais, políticas e culturais dos atores envolvidos nesta

instituição, tais como as famílias, os alunos e os professores. É a partir desta

reflexão diagnóstica inicial (“quem somos nós?”), considerada como marco

referencial, que o professor define os temas, as atividades a serem realizadas, os

objetivos a serem atingidos e a sua abordagem.

Sabemos que uma das maiores dificuldades do professor de História está

em selecionar os conteúdos históricos apropriados para as diferentes situações

escolares. Encontra-se, aí, a importância da autonomia do profissional ao planejar,

tendo em vista que lhe possibilita escolher os conteúdos históricos, os métodos e

os recursos didáticos de acordo com as diferentes salas de aula, previamente

observadas e diagnosticadas, podendo selecionar os chamados conteúdos

significativos que, segundo Bittencourt (2004), estão baseados nas questões dos

próprios alunos, seja em sua condição cultural ou social.

Page 27: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

27

Ao selecionar os conceitos-chave a serem trabalhados em sala de aula, o

professor deve, novamente, se remeter à reflexão diagnóstica, para que possa

contextualizá-los e utilizá-los de forma mais inteligível para quem aprende. Existe,

assim, um desafio para o professor, que é o de saber introduzir e encaminhar as

tarefas da aprendizagem, levando em conta as realidades distintas encontradas

nas diferentes salas de aula.

Um planejamento para o ensino de História deve abordar as especificidades

dos conteúdos históricos trabalhados no processo de escolarização, cuja

conotação está relacionada à formação intelectual e valorativa, devendo haver o

cuidado do professor no sentido de evitar deformações ideológicas ou ainda

sedimentação de dogmas.

De acordo com os PCN (BRASIL, MEC, 1998), ao elaborar o seu

planejamento, o professor de História deve considerar que os conteúdos históricos

não se resumem ao estudo de acontecimentos e conceituações históricas,

havendo a necessidade de ensinar procedimentos e incentivar atitudes nos

alunos, que sejam coerentes com os objetivos da História. Diante disso, o

planejamento encontra-se dividido em três partes:

- conteúdos conceituais: representam a explicitação dos conteúdos históricos a

serem trabalhados;

- conteúdos atitudinais: representam a explicitação das atitudes que os alunos

deverão ser capazes de desenvolver através do estudo de História, tais como: a

iniciativa para realizar estudos, pesquisas e trabalhos, o interesse pelo estudo da

História, a valorização da diversidade cultural e do patrimônio sociocultural, a

crença no debate como forma de crescimento intelectual, a demonstração pelo

interesse de realizar pesquisas em diferentes fontes;

- conteúdos procedimentais: representam os procedimentos que os alunos podem

realizar para desenvolver seus estudos históricos, como aprender a coletar

informações em bibliografias e fontes documentais diversas.

Page 28: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

28

Como desenvolver nos alunos a capacidade de construção do

conhecimento histórico? Em outras palavras, como aproximar o ensino de História

e a historiografia? Para Maria Auxiliadora Schmidt (2005), ao pensarmos nas

relações entre o fazer histórico e o fazer pedagógico, nos remetemos à noção de

transposição ou de recomposição didática, que:

“designa o processo de transformação científica, didática social,

que afeta os objetos de conhecimento até a sua tradução no

campo escolar. Ele permite pensar a transformação de um saber

dito científico em um saber a ensinar, tal qual aparece nos

programas, manuais, nas palavras do professor, considerados

não somente científicos (...) Isto significa, então, um verdadeiro

processo de criação, e não somente de simplificação, de

redução” (INRP Apud SCHMIDT, 2005, p.58).

Diante disso, podemos afirmar que o professor deve privilegiar, em seu

planejamento, uma aula que permita a remontagem do próprio trabalho do

historiador, articulando elementos constitutivos tanto do fazer histórico quanto do

fazer pedagógico. O aluno, com isso, passa a ter em suas mãos as condições de

construção da História, compreendendo o processo de elaboração do

conhecimento.

Em sua reflexão e em sua ação, o professor deve privilegiar a

problematização, o ensino, a construção de conceitos, o contexto temporal, o

privilégio da exploração do documento histórico e o resgate dos conhecimentos

prévios dos alunos. O professor deve lançar mão destes “instrumentos” para que

haja a compreensão, por parte dos alunos, de que são numerosas as relações, de

pesos e características diferentes, que interferem na realização dos

acontecimentos históricos, como também na construção do conhecimento. “Ainda

mais, é preciso buscar a explicação na multiplicidade, na pluralidade e no

Page 29: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

29

encadeamento de causalidades, sem a preocupação com a determinação finalista

de causa-acontecimento-conseqüência” (SCHMIDT, 2005, p.60).

Como vimos no capítulo anterior e na primeira parte deste capítulo, as

renovações teórico-metodológicas e as novas concepções pedagógicas têm

permitido ao aluno construir o sentido da História, abrindo a possibilidade de

construção dos conteúdos através dos documentos, fazendo cair por terra

definitivamente (assim se espera) a idéia de que o conhecimento é fornecido

exclusivamente pelo professor. Para Schmidt,

“para que a prática de sala de aula adquira ‘o cheiro bom do

frescor’, é preciso que se assumam definitivamente os desafios

que a educação histórica enfrenta hoje em dia. Seria uma das

maneiras de se contribuir para que os educandos se tornassem

conhecedores da pluralidade de realidades presentes e

passadas, das questões do seu mundo individual e coletivo, dos

diferentes percursos e trajetórias históricas. Os educandos

poderiam adquirir a capacidade de realizar análises, inferências e

interpretações acerca da sociedade atual, além de olhar para si e

ao redor com olhos históricos, resgatando, sobretudo, o conjunto

de lutas, anseios, frustrações, sonhos e a vida cotidiana de cada

um, no presente e no passado” (Idem, p.65).

Para que isto se torne realidade, o ensino da História deve ser pensado,

elaborado e executado levando-se em conta o leque de possibilidades que ele

abre. Quando mencionamos, seja na Introdução deste trabalho ou na introdução

das aulas de História no início de um ano letivo, que o objetivo desta disciplina é

refletir sobre o passado para compreender o presente e melhorar o futuro,

devemos, primeiramente, analisar que este objetivo só será cumprido em cada

sala de aula se cada professor promover situações nas quais cada “eu” (aluno)

possa se ver como parte integrante do mundo.

Page 30: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

30

Em outras palavras, podemos dizer que o estudo do passado deve permitir

a todos (os) “nós” a interpretação do mundo em geral e a compreensão particular

do lugar do “eu” neste geral. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais

(BRASIL, MEC, 1998), o que se espera é que ocorra, através do ensino de

História, uma ampliação, por parte dos alunos, da sua realidade, sempre

relacionada a outras realidades históricas, o que lhes permitirá fazer escolhas e

estabelecer critérios.

Diante desta perspectiva, o aluno deve ser capaz não somente de se

perceber como parte integrante do mundo, mas como sujeito agente, reflexivo,

transformador e construtor da sua História e da História do seu tempo; afinal, deve

haver a compreensão de que as histórias individuais e coletivas se integram e

fazem parte da História.

Toda construção, para ser realizada, precisa de construtores. Assim é a

História: quando os historiadores a compreendem como um conhecimento

construído, entendem que, através dos artefatos históricos, podem construir o

caminho que os homens traçaram em diferentes tempos e espaços; por outro

lado, quando os professores a compreendem como um conhecimento construído,

entendem que o seu material didático é fruto de uma construção da historiografia,

e que o seu trabalho com o aluno é uma via de mão-dupla, que pode ser

enriquecida quando se abre espaço também para a construção do conhecimento.

Page 31: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

31

CAPÍTULO III

A PSICOPEDAGOGIA E A BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA

Apresentamos, nos capítulos anteriores, a trajetória percorrida pelo

conhecimento histórico em sua constituição enquanto disciplina acadêmica e

escolar; vimos os limites impostos ao “fazer-se” pedagógico desta disciplina, bem

como as possibilidades que se abrem diante das atuais propostas curriculares.

Entretanto, todo este enfoque sobre o ensino de História perde seu sentido

quando “o aluno não aprende”, afinal sem aprendizagem não há ensino.

O nosso olhar sobre este assunto torna-se mais complexo quando

consideramos a relação entre ensino e aprendizagem como interdependente,

compreendendo tanto o professor quanto o aluno como protagonistas deste ato.

Não há como separá-los, um não existe se o outro não existir... Mas, o que pode

acontecer quando esta relação não estiver gerando situações de ensino-

aprendizagem? Antes mesmo de o professor questionar “por que meu aluno não

aprende?”, deve refletir se a sua prática de ensino está gerando aprendizado. Aí

está o enfoque da nossa investigação psicopedagógica.

3.1 – A PSICOPEDAGOGIA ENTRA EM CENA

A Psicopedagogia nasceu diante da demanda das dificuldades de

aprendizagem. Tendo como seu objeto de estudo a aprendizagem humana, o

psicopedagogo busca sua atuação entre os limites da Psicologia e da Pedagogia.

Para Nádia Bossa,

“do seu parentesco com a Pedagogia, a Psicopedagogia traz as

indefinições e as contradições de uma ciência cujos limites são

os da própria vida humana. Envolve simultaneamente, a meu

juízo, o social, o individual em processos tanto transformadores

quanto reprodutores. Da Psicologia, a Psicopedagogia herda o

Page 32: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

32

velho problema do paralelismo psicofísico, um dualismo que ora

privilegia o físico (o observável) ora o psíquico (a consciência)”

(BOSSA, 2000, p.23).

Diante desta característica multifacetada, o psicopedagogo constitui-se

como um profissional capaz de realizar, através da sua investigação, um trabalho

preventivo ou terapêutico no processo de aprendizagem. Esta investigação deve

estar acompanhada de uma visão global deste profissional diante do foco da

aprendizagem: “como o aluno aprende?”

Buscando respostas a esta pergunta, a investigação do psicopedagogo se

dá em diferentes níveis, atuando não só com alunos, mas também com

educadores. Assim, a escola também se constitui como um campo para a atuação

psicopedagógica, já que está diretamente relacionada ao foco da questão.

“É a escola, indubitavelmente, a principal responsável pelo

grande número de crianças encaminhadas ao consultório por

problemas de aprendizagem. Assim, é extremamente importante

que a Psicopedagogia dê a sua contribuição à escola, seja no

sentido de promover a aprendizagem ou mesmo tratar de

distúrbios nesse processo” (Idem, p. 89).

Iniciamos este presente trabalho dizendo que a escola pode ser o lugar de

muitos encontros e desencontros... É dentro da instituição escolar que ocorre

grande parte da aprendizagem, tanto no que se refere aos conteúdos quanto no

que se refere à vida em sociedade, afinal a escola é a mediadora no processo de

inserção do indivíduo no mundo. Nesse sentido, o psicopedagogo, ao atuar nas

dificuldades presentes no processo de aprendizagem, pode melhorar a função de

socialização da escola.

Page 33: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

33

Para Olívia Porto (2005), tem-se, assim, a constituição de um trabalho

psicopedagógico na área preventiva, através da orientação do processo ensino-

aprendizagem, com o objetivo de favorecer a apropriação do conhecimento pelo

ser humano. Diante disso, podemos dizer que

“o trabalho psicopedagógico pode, certamente, ter um caráter

assistencial. Isso acontece quando, por exemplo, o

psicopedagogo participa de equipes responsáveis pela

elaboração, direção e evolução de planos, programas e projetos

no setor de educação e saúde, integrando diferentes campos do

conhecimento. A psicopedagogia ocupa-se, assim, de todo o

contexto da aprendizagem, seja na área clínica, preventiva,

assistencial, envolvendo elaboração teórica no sentido de

relacionar os fatores envolvidos nesse ponto de convergência em

que opera” (BOSSA, 2000, p.30).

Para Porto,

“o trabalho preventivo pretende 'evitar' os problemas de

aprendizagem, utilizando-se da investigação da instituição

escolar, de seus processos didáticos e metodológicos etc. Enfim,

analisa a dinâmica institucional com todos os profissionais nela

inseridos, detectando os possíveis problemas e intervindo para

que a instituição se reestruture” (PORTO, 2005, p.91).

Delimitando a aprendizagem como o campo de atuação da Psicopedagogia,

temos que o papel do psicopedagogo é detectar os possíveis problemas que

possam estar ocorrendo no processo de ensino-aprendizagem; para tal, este

profissional pode atuar participando da dinâmica das relações de uma comunidade

educativa, realizando orientações metodológicas, analisando as características do

Page 34: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

34

indivíduo no grupo e colocando em prática processos de orientação educacional e

vocacional, seja em grupo ou individual.

A investigação psicopedagógica tem como objetivo alcançar um diagnóstico

que sirva como ponto de partida para a atuação em determinada dificuldade de

aprendizagem. Dentro deste contexto, esta presente pesquisa pretende lançar um

olhar para as possibilidades de atuação psicopedagógica dentro da instituição

escolar, principalmente no que concerne ao processo de ensino-aprendizagem de

História.

Bossa considera que “pensar a escola, à luz da Psicopedagogia, significa

analisar um processo que inclui questões metodológicas, relacionais e

socioculturais, englobando o ponto de vista de quem ensina e de quem aprende,

abrangendo a participação da família e da sociedade” (BOSSA, 2000, p.91). Ainda

sobre o enfoque psicopedagógico na instituição escolar, vejamos o que Weiss

afirma:

“Existem diferentes enfoques em relação ao que se entende por

Psicopedagogia na escola. Adotarei a posição de considerá-la

como um trabalho em que se busca a melhoria das relações com

a aprendizagem, assim como a melhor qualidade na construção

da própria aprendizagem de alunos e educadores. É dar-se ao

professor e ao aluno um nível de autonomia na busca do

conhecimento e, ao mesmo tempo, possibilitar-se uma postura

crítica em relação à estrutura da escola e da sociedade que ela

representa. Para isto, é necessário um posicionamento sobre o

que a escola produz” (WEISS Apud BOSSA, 2000, p.91).

No processo de ensino-aprendizagem, professor e aluno devem ser

encarados, igualmente, como protagonistas. Mas, é preciso dizer que eles não

estão sozinhos, já que se pode observar a interferência da família e de outros

Page 35: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

35

membros da comunidade neste processo. Assim, temos que a escola também é

produto da sociedade, e a sua atuação está em inserir o indivíduo na mesma. Por

outro lado, devemos identificar que a aprendizagem acontece no sujeito tanto

dentro quanto fora da instituição escolar e, por este motivo, entendemos que o

aluno vai aprender justamente aquilo que tiver significado em seu universo

simbólico.

Diante desta perspectiva, a Psicopedagogia deve contribuir para a

(re)construção de uma instituição escolar que preze por uma educação

libertadora, na qual o professor se vê e é visto como acompanhante do “outro”, do

aluno. “Quando o professor faz o aluno refletir, criticar e, de algum modo, permite

o extravasamento de raivas contidas, ele se torna o primeiro alvo do exercício de

liberdade do aluno” (Idem, p.93).

3.2 – “COMO MEU ALUNO APRENDE?”

Ao lançarmos nosso olhar sobre o processo de ensino-aprendizagem de

História, buscando observar as possíveis intervenções psicopedagógicas,

devemos refletir sobre a pergunta “como meu aluno aprende?”. Esta reflexão do

“outro” leva o educador a refletir também sobre a sua prática, à medida que, se

precisa atuar de forma a permitir a aprendizagem, precisa conhecer como esta

acontece.

Sobre a aprendizagem, Porto considera que

“o núcleo específico de todo aprendizado refere-se ao

‘conhecimento’ adquirido como o resultado da busca pelo

entendimento de ‘algo desconhecido’. Logo verificamos que, em

todo conhecimento, está implicada uma relação entre sujeito (S)

e objeto (O), sendo que a ‘revelação’ de algo (O) como uma

‘verdade’ só se realiza devido à presença de um sujeito (S), que

Page 36: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

36

se define como sujeito cognoscente. Dentro deste enfoque,

começamos a verificar que a aprendizagem entendida como

aquisição de conhecimento ou cognição é um aspecto

psicológico, entendido como pensamento, juízo ou raciocínio”

(PORTO, 2005, p.11).

O ato de pensar propriamente dito pode ser entendido como um “livre jogo

de idéias”, que deve ocorrer sem a presença de pressões, já que estas prejudicam

a elaboração dos pensamentos. No processo de ensino-aprendizagem deve ser

privilegiado que a informação recebida seja transformada pelo sujeito em

conhecimento construído.

“Somos como pescadores e nossas teorias são como redes. E

não deixamos de lado de bom grado as redes com as quais

algumas vezes pescamos pelo mero fato de que não servem para

certos peixes ou determinados mares, mas continuamente

inventamos e tecemos novas redes e distintas e as lançamos à

água, para ver o que pescamos com elas. Não desprezamos rede

alguma e em nenhuma confiamos excessivamente, ainda que

prefiramos carregar o barco com as redes mais eficazes e deixar

no porto as de menos uso. E assim vamos navegando,

renovando continuamente nosso arsenal de redes em função das

características da pesca” (MOSTERIN Apud PORTO, 2005,

p.13).

Ao permitir uma educação libertadora, sem a presença de pressões, o

professor caminha para o estabelecimento do chamado vínculo afetivo. “Afeto e

cognição se constituem em aspectos inseparáveis, estando presentes em

qualquer atividade a ser desenvolvida, variando apenas as suas proporções

(LAJONQUIERE, 1998). O afeto e a inteligência se estruturam nas ações e pelas

ações dos indivíduos” (PORTO, 2005, pp.13-14). Podemos dizer que a construção

Page 37: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

37

e a consolidação de vínculos afetivos atuam positivamente no processo de ensino-

aprendizagem.

A Psicopedagogia deve atuar na escola em busca da criação de um

ambiente seguro e estável, facilitador da atividade intelectual. Cabe ao professor,

dentro da sala de aula, estabelecer uma relação de afetividade tanto com o grupo

quanto com cada um - já que cada um tem a sua própria forma de aprender. Desta

forma, o professor deve ser orientado para que esteja atento às descobertas dos

alunos, encorajando-os à construção contínua de conhecimentos, relacionando

cognição e afetividade de forma dinâmica.

Outra importante característica que o professor deve ser orientado a

privilegiar, no sentido de caminhar em direção a uma aprendizagem mais

significativa e eficaz, é a promoção do resgate e da problematização dos

conhecimentos prévios dos alunos. Para isso, é necessário conhecer o aluno,

permitindo-lhe a construção de seus próprios significados, em vez de lhes fornecer

as 'respostas certas' de um saber pronto, fechado e acabado”.

Avaliando as características do processo de ensino-aprendizagem,

podemos concluir que o professor deve ser o acompanhante do aluno, aquele que,

por ser mais experiente, orienta a construção do conhecimento, mas de forma a

permitir que o aluno seja, junto com ele, o construtor.

3.3 – O PAPEL DO PROFESSOR

NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO

Conforme Bittencourt (2004), o ensino e a aprendizagem de História são,

comumente, relacionados não apenas aos nomes de pessoas ou aos fatos que

ocorreram em determinado tempo e espaço, que podem ser comprovados pelos

documentos. O ensino e a aprendizagem de História, mais que isso, acontecem

Page 38: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

38

por intermédio do domínio de conceitos e noções que organizam os fatos,

tornando-os inteligíveis.

Para o historiador Marrou (MARROU Apud BITTENCOURT, 2004),

conhecer historicamente é substituir um dado bruto por um sistema de conceitos

“elaborados pelo espírito”. Assim sendo, podemos dizer que é inviável o ensino de

História sem o domínio conceitual. Contudo, refletindo sobre o ensino desta

disciplina, devemos nos questionar se há condições de uma abstração suficiente

para o domínio destes conceitos por parte dos nossos alunos. Buscando formular

respostas para este questionamento, devemos nos remeter às teorias propostas

por Piaget e Vygotsky, pesquisadores que se dedicaram à análise do

desenvolvimento cognitivo e à questão da formação de conceitos.

O ponto central dos estudos do professor suíço Jean Piaget é a construção

do conhecimento pelo sujeito, partindo da origem do pensamento racional. As

estruturas cognitivas dos indivíduos são adquiridas, ao longo da vida, em estágios

delimitados pela maturidade biológica e, em face do meio, assimilam os “objetos”

de acordo com as estruturas internas orgânicas. Diante de um objeto, cada

indivíduo acomoda-o a determinados esquemas, incorporando-o de acordo com

as condições disponíveis e organizando o pensamento para a assimilação. A

capacidade cognitiva cresce por meio do funcionamento constante dos processos

de assimilação e acomodação: os desequilíbrios criados pelos problemas

enfrentados promovem um desenvolvimento intelectual e uma maturação física do

sistema nervoso do sujeito em busca do reequilíbrio.

Segundo Porto, Piaget considera o desenvolvimento psíquico como

semelhante ao desenvolvimento orgânico, cuja direção é sempre o equilíbrio

progressivo. “Em sua ótica, a inteligência é uma adaptação na busca do meio-

termo entre o organismo e o ambiente. Ela é construída através do contato com o

meio e as experiências vividas” (PORTO, 2005, pp.21-22).

Page 39: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

39

Piaget considera o homem como um sistema aberto; sua visão teórica é

interacionista, sendo o homem o produto de uma bagagem genética que se

desenvolve no meio social. Nesse sentido,

“o papel do mestre deve ser aquele de incitar a pesquisa, de

fazer tomar consciência dos problemas e não aquele de ditar a

verdade. Não podemos nos esquecer que uma verdade imposta

não é mais uma verdade: compreender é inventar, reinventar e

dar uma lição prematuramente é impedir a criança de inventar e

redescobrir as soluções por si mesmas” (PIAGET Apud PORTO,

2005, p.18).

De acordo com Bittencourt (2004), a teoria piagetiana do desenvolvimento

cognitivo, ao associar as chamadas fases operatórias de desenvolvimento aos

condicionantes biológicos, serviu para justificar a impossibilidade de alunos dos

primeiros anos da escolarização dominarem os conceitos abstratos necessários à

construção do conhecimento histórico.

Analisando a formulação epistemológica de Vygotsky, observamos uma

maior ênfase na aquisição social dos conceitos, e não apenas na maturidade

biológica, sendo consideradas fundamentais, nas apreensões conceituais, as

dimensões historicamente criadas e culturalmente elaboradas pelo indivíduo. Para

este pesquisador russo, a abstração e a generalização são consideradas como

processos básicos da constituição dos conceitos, que correspondem à ampliação

do significado das palavras. Neste processo de significação das palavras, ocorre a

interferência de outras funções intelectuais: atenção deliberada, memória lógica,

abstração, capacidade para comparar e diferenciar.

Diante da proposta deste presente trabalho, buscando relacionar a

Psicopedagogia às dificuldades de ensino de História, entendemos que a

formulação epistemológica de Vygotsky constitui-se como um importante caminho

Page 40: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

40

para pensarmos sobre este processo de ensino-aprendizagem, em virtude da

maior responsabilidade que ele confere ao professor. Ao estabelecer três zonas

cognitivas de desenvolvimento (potencial, proximal e real), Vygotsky considera

que todo indivíduo tem potencial para aprender e, ao interagir com o “outro mais

experiente”, continua caminhando cada vez mais próximo de conquistar a sua

autonomia.

Para Vygotsky (1989), o papel da escola é fundamental no processo de

elaboração de conceitos, tendo em vista que esta capacidade só é adquirida

através de uma aprendizagem organizada e sistematizada. Contrapondo-se às

proposições de Piaget, Vygotsky relaciona a possibilidade de ensino não à faixa

etária, mas ao fato de educador e educando falarem a mesma linguagem.

Conferindo, portanto, uma maior responsabilidade ao professor, que é o “outro

mais experiente”, Vygotsky considera que as falhas do processo de ensino-

aprendizagem comprometem o desenvolvimento, tendo em vista que este é

gerado pela aprendizagem.

Voltando à pergunta “como meu aluno aprende?”, podemos colocar que, na

construção do conhecimento histórico, cabe ao professor, após a reflexão

diagnóstica, utilizar-se de ferramentas (como organização, significação das

palavras, estabelecimento do vínculo afetivo, resgate dos conhecimentos prévios

dos alunos, problematização, associação e contextualização) que permitam ao

aluno, acompanhado por este “outro mais experiente”, chegar à zona de

desenvolvimento real. È neste ponto que se encontra a nossa proposta de

abordagem psicopedagógica, no sentido de ir além dos problemas de

aprendizagem, lançando um olhar para o que ocorre antes disso, ou seja, sobre o

ensino.

Page 41: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

41

3.4 – INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA:

EDUCAÇÃO DIALÉTICA E DIALÓGICA

O professor escolheu como tarefa ensinar, compartilhando o que sabe.

Como colocamos anteriormente, o ensino, para assumir a sua significação,

precisa estar acompanhado de aprendizagem. Quando isto não ocorre, faz-se

necessária uma intervenção neste processo. O psicopedagogo, por sua vez,

escolheu como tarefa trabalhar com as dificuldades de aprendizagem, buscando,

através da sua investigação, um diagnóstico e uma intervenção que possam gerar

uma melhora positiva da aprendizagem.

A presente pesquisa se constitui em uma indagação sobre a atuação do

professor de História no processo de construção do conhecimento histórico com

seus alunos. Sustentamos a hipótese de que as dificuldades de aprendizagem

devem ser investigadas, em primeira instância, a partir do que está sendo

produzido pela instituição escolar. Desta maneira, a investigação psicopedagógica

deve se debruçar inicialmente sobre a prática pedagógica do professor.

Atuando na instituição escolar, a intervenção psicopedagógica se dá

através da participação do psicopedagogo na elaboração dos planos e projetos da

escola, orientando o grupo, de maneira geral, e cada professor, de acordo com as

suas especificidades disciplinares e individuais, objetivando, com isso, a proposta

de uma aprendizagem significativa.

Uma questão importante que deve ser levantada é a intervenção

psicopedagógica no sentido da promoção de uma educação dialética. Bittencourt

(2004) coloca que o método dialético corresponde a um esforço para o progresso

do conhecimento, através do confronto de duas teses opostas: o pró e o contra, o

sim e o não, a afirmação e a negação. Este confronto possibilita a formação da

crítica. Para o filósofo francês Henri Lefebvre, “o pensamento humano que não

consegue apreender num relance as coisas reais vê-se obrigado a tatear e a

Page 42: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

42

caminhar através das suas próprias dificuldades e contradições, a fim de atingir

realidades móveis e as contradições reais” (LEFEBVRE, 1979, p.25).

Ao propormos a introdução do método dialético no ensino, consideramos

que o professor deve colocar como ponto inicial a identificação do objeto de

estudo para os alunos e situá-lo como um problema (com prós e contras) a ser

desvendado com a utilização da análise (decomposição dos elementos), para

posteriormente esse objeto voltar a ser entendido como um todo.

Para Bachelard, tem-se, com isso, a introdução do aluno na cultura

científica, que parte do princípio de que para conhecer todo e qualquer objeto é

preciso formular um problema sobre ele.

“Em primeiro lugar, é preciso formular problemas. E, digam o que

disserem, na vida científica os problemas não se formulam de

modo espontâneo. É justamente esse sentido do problema que

caracteriza o verdadeiro espírito científico. Para o espírito

científico, todo o conhecimento é resposta a uma pergunta. Se

não há pergunta, não pode haver conhecimento científico. Nada é

evidente. Nada é gratuito. Tudo é construído” (BACHELARD,

1996, p.18).

O educador Paulo Freire (1986), por sua vez, defende o processo

pedagógico pelo dialogismo, ou método dialógico, colocando o diálogo entre

professor e aluno como algo bem mais complexo, constituindo o fundamento de

uma postura específica ante o conhecimento por estabelecer o princípio da

comunicação social. Assim, ainda que tenha dimensões individuais, conhecer é

um evento social.

Através do método dialógico, tem-se como princípio básico que o

conhecimento não pode ser posse exclusiva do professor, embora este tenha um

Page 43: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

43

conhecimento prévio sobre o objeto de estudo, bem como a responsabilidade de

apresentá-lo para a discussão em classe. Dentro desta perspectiva, o professor

conhece mais sobre o objeto de estudo quando o curso começa, contudo o

reaprende mediante o diálogo constituído com os alunos durante o processo de

estudo. Assim, Freire coloca que

“o diálogo é a confirmação conjunta do professor e dos alunos no

ato comum de conhecer e re-conhecer o objeto de estudo. Então,

em vez de transferir o conhecimento estaticamente, como se

fosse uma posse fixa do professor, o diálogo requer uma

aproximação dinâmica na direção do objeto” (FREIRE, 1986,

p.124).

Defendemos, portanto, a introdução e a integração entre o método dialético

e dialógico na prática reflexiva e ativa dos professores, com o intuito de promover

uma verdadeira aprendizagem, que seja realmente significativa para os alunos.

Ainda sobre esta questão, Bossa (2000) coloca que ensinar não pode ser um

processo solitário e, por isso, o professor deve ser o mediador no processo de

construção do conhecimento. “É preciso que o professor não tenha medo de

perder o seu lugar social, o lugar do único que sabe” (BLEGER Apud BOSSA,

2000, p.93).

Enfim, podemos dizer que esta nossa proposta de intervenção constitui-se

numa reflexão sobre a prática de ensino em busca de uma nova História. Desta

forma, o nosso olhar psicopedagógico encontrou-se voltado para o levantamento

de instrumentos que auxiliem o professor no planejamento e na realização de

aulas que não somente conquistem o interesse do aluno, mas de aulas nas quais

a presença do aluno seja condição fundamental para a existência daquele “fazer-

se”. Afinal, o professor não existe sem o aluno.

Page 44: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

44

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Refletir sobre o ensino de História no Brasil nos remete, em primeira

instância, à trajetória da construção desta disciplina em campo acadêmico e

escolar, observando as múltiplas influências das relações sociais e de poder sobre

a escrita e o ensino de História.

Atualmente, diante das novas propostas curriculares, despontam novas

possibilidades para o ensino desta disciplina, à medida que professor e aluno

passam a ser encarados como construtores do conhecimento histórico, devendo

este permitir, por meio da mediação e orientação do professor, o desenvolvimento

de competências e habilidades que serão úteis não somente “dentro dos muros”

da instituição escolar, mas, principalmente, para a vida.

Para que o conhecimento histórico não seja um mero conjunto de fatos,

nomes e datas, apenas memorizados e logo esquecidos pelos alunos, é

necessário que o professor permita e possibilite que estes se percebam tanto

como parte integrante da História quanto como construtores do conhecimento.

Sendo assim, o professor desce do seu lugar de destaque e passa a privilegiar

uma relação dialética entre educador, educando e conhecimento.

O psicopedagogo, tendo como objetivo a investigação, o diagnóstico e a

intervenção sobre as dificuldades de aprendizagem, pode lançar um olhar sobre a

prática de ensino de História, buscando propostas que levem a uma melhora

significativa deste processo. Assim sendo, devemos colocar que a

Psicopedagogia, ao trabalhar as dificuldades de aprendizagem, não se limita

somente a investigar as características de alunos que não aprendem, mas

também a investigar se a prática de ensino está gerando aprendizagem.

Page 45: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

45

Uma intervenção psicopedagógica na prática de ensino de História se faz

necessária no sentido de contribuir para transformá-lo em algo prazeroso e

interessante para os alunos, através da troca e do diálogo entre educador e

educando, ambos intelectuais no processo de construção do conhecimento.

O professor deve se ver e ser visto como um ser plenamente consciente da

sua responsabilidade, afinal, juntamente com outros setores sociais, educa para a

vida. Diante disso, o ensino não pode se limitar aos conteúdos conceituais, mas

deve ser significativo no sentido da transformação do indivíduo em busca da

construção de valores, autonomia e cidadania.

Educar é, portanto, compartilhar conhecimentos e experiências no caminho

que leva à libertação do indivíduo para a vida em sociedade. A escola deve,

assim, ser um lugar que conceda esta possibilidade ao aluno, um ambiente

propício às várias aprendizagens. É preciso estar consciente do papel que se tem

nas mãos, amando o que se faz e a quem se faz, em busca de uma nova História.

Page 46: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

46

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANTUNES, Celso. Como desenvolver as competências em sala de aula.

Petrópolis: Vozes, 2001.

BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico. Rio de Janeiro:

Contraponto, 1996.

BITTENCOURT, Circe. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo:

Cortez, 2004.

_____ “Capitalismo e cidadania nas atuais propostas curriculares de História”. IN:

BITTENCOURT, Circe (Org.). O saber histórico na sala de aula. São Paulo:

Contexto, 10ª ed., 2005.

BOSSA, Nádia. A Psicopedagogia no Brasil: Contribuições a partir da prática. 2ª

ed. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Parâmetros Curriculares Nacionais:

História (ensino fundamental – 1ª a 4ª séries). Brasília: MEC/SEF, 1997.

_____. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Fundamental.

Parâmetros Curriculares Nacionais: História. Brasília: MEC / SEF, 1998.

_____. História e Geografia, ciências humanas e suas tecnologias: livro do

professor (ensino fundamental e médio). Brasília: MEC/Inep, 2002.

BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989): A Revolução Francesa da

Historiografia. São Paulo: Unesp, 1997.

Page 47: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

47

CORDEIRO, Jaime. A História no centro do debate: as propostas de renovação do

ensino de História ns décadas de setenta e oitenta. Araraquara: FCL/Laboratório

Editorial/Unesp; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2000.

FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Rio de

Janeiro: Paz e Terra, 1986.

GADOTTI, Moacir. Educação e Poder: Introdução à Pedagogia do Conflito. São

Paulo: Cortez, 1991.

LEFEBVRE, Henri. Lógica formal, lógica dialética. Tradução de Carlos Nelson

Coutinho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1975.

_____. O marxismo. Tradução de J. Ginsburg. São Paulo: Difel, 1979.

LIBÂNEO, J.C. Democratização da escola pública. São Paulo: Ed. Loyola, 4ª ed,

1986.

MELLO, Paulo Eduardo Dias de. Vestibular e currículo: o saber histórico escolar e

os exames vestibulares da Fuvest. Dissertação de Mestrado – FE/USP, São

Paulo, 2000.

POPKEWITZ, Thomas. “História do currículo, regulação social e poder”. IN:

SILVA, T.T. (org.). O sujeito da educação: estudos foucaultianos. Petrópolis:

Vozes, 1994.

PORTO, Olívia. Bases da Psicopedagogia. Diagnóstico e intervenção nos

problemas de aprendizagem. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2005.

RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Educação. Plano básico de

estudos: anos iniciais da escola básica. Rio de Janeiro: COGP/Coeb, 1994.

Page 48: EM BUSCA DE UMA NOVA HISTÓRIA Lauanne … MACEDO FAGUNDES.pdfsobre a constituição da História enquanto disciplina acadêmica e escolar. Percorrendo o caminho de historiadores e

48

SCHMIDT, Maria Auxiliadora. “A formação do professor de História e o cotidiano

da sala de aula”. IN: BITTENCOURT, Circe (Org.). O saber histórico na sala de

aula. São Paulo: Contexto, 10ª ed., 2005.

VAINFAS, R. “Caminhos e Descaminhos da História”. IN: CARDOSO, C.F.;

VAINFAS, R. (Org.). Domínios da História: ensaios de teoria e metodologia. Rio de

Janeiro: Campus, 1997.

VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. Tradução de Jéferson Camargo. São

Paulo: Martins Fontes, 1989.