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1 Silvia Regina Segato ENCONTROS COM A LEITURA - PARA UM NOVO OLHAR SOBRE A POESIA - UNISAL AMERICANA 2007

ENCONTROS COM A LEITURAlivros01.livrosgratis.com.br/cp037909.pdf · linguagem da vida, luz da minha alma”. ... Querido pai, Santo Segatto, "Que a estrada se abra à sua frente,

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1

Silvia Regina Segato

ENCONTROS COM A LEITURA - PARA UM NOVO OLHAR SOBRE A POESIA -

UNISAL AMERICANA

2007

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Silvia Regina Segato

ENCONTROS COM A LEITURA - PARA UM NOVO OLHAR SOBRE A POESIA -

Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do Grau de Mestre em Educação Sócio-comunitária à comissão Julgadora do Centro Universitá-rio Salesiano de São Paulo, sob a Orientação do Profes-sor Severino Antônio Moreira Barbosa.

UNISAL AMERICANA

2007

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Folha de aprovação

Comissão julgadora

Profª. Drª. Regina Célia Sarmento Membro Externo - UNICAMP

__________________________

Profº. Drº. Luís Antônio Groppo Membro interno

__________________________

Profº. Drº Severino Antônio Moreira Barbosa Professor Orientador

___________________________

4

Os poemas

Os poemas são pássaros que chegam

não se sabe de onde e pousam

no livro que lês.

Quando fechas o livro,

eles alçam vôo

como de um alçapão.

Eles não têm pouso

nem porto

alimentam-se um instante

em cada par de mãos

e partem.

E olhas, então, essas tuas mãos vazias,

no maravilhoso espanto de saberes

que o alimento deles já estava em ti...

Mário Quintana

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Amado filho, Pedro Augusto. “Guarda teu coração, última cidadela do amor, nos ásperos dias de tua juventude, para que esta não se acabe nunca. Que não te importem os caminhos es-curos, nem as seduções coloridas”.

Thiago de Mello

“ Fruto sagradoessência poética,

imagem da perfeição,transcendência,

obra Divina, linguagem da vida, luz da minha alma”.

Silvia

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Dedicatória especial

Querido pai, Santo Segatto,

"Que a estrada se abra à sua frente, que o vento sopre le-vemente às suas costas que o sol brilhe morno e suave em sua face, que a chuva caia de mansinho em seus campos... E, até que nos encontremos de novo, que Deus lhe guarde na palma de Suas mãos. "

Prece Irlandesa

Eterno avô, Pedro de Alcântara.

“A terra mãe das árvores e das flores receberá teu corpo. Teu cérebro não será cinza, será luz. Teu coração não será pó, será árvore que agasalha. Viverás nas folhas e nas flo-res. Não morre quem nos outros vive, não morre quem nos vivos vive”.

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Agradecimentos

Ao pai Celestial, e aos meus pais Maria do Carmo e Santo Segatto.

A todos os professores (as) que contribuíram para meu enriqueci-mento cultural ao longo desses anos: Professor Dr. Augusto Novaski, Professora Dra. Sueli, Professor Dr. Paulo de Tarso Gomes, Professor Dr. José A. Sigrist, Professor Dr. João Ribeiro, Professor Dr. P. Manuel Isaú.

Ao Professor Luís Antônio Groppo, por toda dedicação, paciência, compreensão e principalmente por ter dado a Inspiração sobre: um novo olhar. A Graziela Fernanda Carvalho, amiga e companheira nas horas difíceis.

Em especial aos participantes do grupo de leitura (Meu Jardim),

dos Bairros: Jardim Thelja e Jardim Alvorada.

“ O prazer dos grandes homens consiste em tornar os outros mais felizes.”

Pascal

Homenagem Póstuma

P. Manuel Isaú

“O filósofo é aquele que sabe realizar a plena coerência ou sintonia entre doutrina e

vida, ou melhor, entre teoria de viver e morrer”.

Citação dele/2006.

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Agradecimentos especiais

A todos os familiares e amigos que contribuíram, apoiaram e acre-ditaram na realização desse trabalho.

“Desde que a poesia se libertou dos lábios, exalando a paz,

e o nosso canto, alegrou o coração dos homens. Cantores do povo,

gostamos de estar entre os viventes. Onde muitos se reúnem,

alegres amigos de cada um, abertos a cada um,

assim também o nosso avô, o deus sol”.

Hölderlin

Em especial a meu Orientador Professor Severino Antônio pelo

apoio, dedicação, compreensão, sabedoria. Depois de tantos encontros e desencontros, impulsos afetivos da minha parte, reconheço que ele é a pessoa mais sensível e paciente do mundo. E acima de tudo: um grande amigo e poeta.

“Dissipa o dia, Mostra aos homens as leves imagens da aparência, Retira aos homens a possibilidade de se distraírem

O que foi compreendido já não existe, A ave confundiu-se com o vento,

O céu com a sua verdade, O homem com a sua realidade”.

Paul Éluard

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UNIDADE DOS CONTRÁRIOS

I as palavras partejam

longamente.

os poemas nascem

de luz súbita

e sem idade.

o claro e o escuros não se recusam

em sua carne.

II os poemas trazem

a aurora das coisas,

ao entardecer.

III nos limites do calar-se,

os poemas carregam

o som que os corpos amam

e o sentido

que move as formas.

IV cada poema escuta

o silêncio das origens,

a música no vazio,

as palavras que poderiam ter amado,

os sinais da vida futura.

SEVERINO ANTÔNIO

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RESUMO

Essas páginas têm como tema: “Encontros com a leitura – Para um novo olhar

sobre a poesia”. Um novo olhar sobre a poesia é também um novo olhar sobre

o mundo em que está inserida a leitura, assim como a educação. A opção de

trabalhar poeticamente propõe o desafio de se ter novos olhares sobre a poe-

sia e, com isso ter também um novo olhar sobre a vida. Assim, foi desenvolvida

uma proposta de intervenção educativa “ Encontros com a Leitura”, predomi-

nantemente para pessoas que moram nas periferias, comunidades em situação

de risco, que tinham dificuldades de acesso a livros, com o objetivo de motivá-

las na fruição, interpretação, compreensão de leituras poéticas. Leituras que

podem levar o leitor a uma vida de inclusão nos campos sócio-político-

econômico, mas também, no cultural e educativo. Esta dissertação se constitui

de pesquisa bibliográfica e de pesquisa-ação, a primeira supervisionada pelo

professor orientador, para a realização de leituras específicas sobre o tema

que estruturam os capítulos, I, “ Poesia e Linguagem”, e II, “Leitura e Educa-

ção”. No capítulo III, “Poesia e Leitura como Encontro”, apresentamos a pes-

quisa-ação, através de um trabalho de leituras educativas sócio-comunitárias

com crianças, adolescentes e adultos do Jardim Thelja e Jardim Alvorada (A-

mericana/SP), com a poesia.

Palavras-chave Educação, poesia, linguagem, leitura, olhar, comunidade.

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ABSTRACT

These pages contain the following theme: “Moment of Reading – To a new view

about poetry”. A new view about poetry is also a new view about the world in

which is inserted reading and education. The option to work poetically is more

than a mere challenge. I thought to carry an assignment out so that people are

able to have a new view about poetry as a result of having a new view of life.

For that reason, it was developed an intervention educative proposal “Moment

of Reading”, predominantly for people who live on the outskirts, communities in

poor situation that had difficulties in reading books, libraries or other ways which

involve the act of reading with the objective of motivating the interpretation,

comprehension of poetic readings. These several ways of reading could bring

the reader to a life of inclusion in the social – political - economic aspect as well

as the cultural and educative areas. This assignment constitutes of bibliographi-

cal and research-action, the first was supervised by the Professor Tutor for the

fulfillment of specific readings about the theme which contains the chapters I,

“Poetry and Language” and II, “Reading and Education”. The second structure

contains chapter III, “Poetry and Reading as a meeting” which was done a re-

search-action through an assignment of educative and social aspects in the

community together with children, teenagers and adults from Jardim Thelja and

Jardim Alvorada (Americana/SP), through poetry.

Key-words

Education, poetry, language, reading, view, community

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................14

CAPÍTULO I – POESIA E LINGUAGEM...............................................................19

1.1 - Poesia e essência poética..................................................................21

1.2 – A linguagem dos poemas ..................................................................30

1.3 – Ritmo e imagem ................................................................................40

1.4 – Palavra poética..................................................................................48

1.5 – Poesia e arte .....................................................................................55

1.6 - Poesia do olhar ..................................................................................60

CAPÍTULO II – LEITURA E EDUCAÇÃO .............................................................64

2.1 – Educação: leitura, diálogo, encontro..................................................66

2.2 – O ato de ler........................................................................................73

2.3 – Leitura: muitas formas de linguagem.................................................79

2.4 - Leitura poética para pequenos leitores ..............................................85

2.5 - Leitura do olhar .................................................................................94

CAPÍTULO III – POESIA E LEITURA COMO ENCONTRO..................................99

3.1 – Pesquisa-ação...................................................................................101

3.2 – Vozes polissêmicas dentro da noite ..................................................109

3.3 – Os Haicais e as vozes entrelaçadas..................................................116

3.4 – Novas Vozes e o ritmo das flores .....................................................125

3.5 – Encontros do olhar ...........................................................................135

13

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................143

BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................148

APÊNDICE ...........................................................................................................154

I. Projeto Enviado à APAM ........................................................................155

II. Oficina Realizada na Escola de Educação Infantil Mª. Fumaça .............159

III.Fotos da Oficina realizada com o Grupo Jds. Thelja e Alvorada .............160

IV.Fotos do Senhor Lázaro Ramos ..............................................................161

V.Fotos das “ Jovens Flores do grupo Jds Thelja e Alvorada ....................162

ANEXOS...............................................................................................................163

Anexo I – Mapa de Americana ................................................................... 164

Anexo II - Mapa dos Jardins Thelja e Alvorada .......................................... 165

Anexo III – Homenagem a Mulher de Pedra – “M” ..................................... 166

Anexo IV – Certificado da Palestra Poesia e Poema no CEESA ................ 167

Anexo V – Fragmento de Jornal sobre Feira do livro na FAEC....................168

POSFÁCIO ..........................................................................................................169

Homenagem a meus pais e familiares ..........................................................169

Homenagem ao orientador Profº. Dr. Severino Antônio................................170

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INTRODUÇÃO

“Viver a poesia é muito mais necessário é importante do que escrevê-la”.

Murilo Mendes

“A palavra poética tem uma função sagrada, capaz de traduzir a totalidade do mundo”.

Mallarmé

“O sonho é ver as fibras invisíveis da dis-tância imprecisa e, com sensíveis movi-mentos da esperança e da vontade, bus-car na linha fria do horizonte a árvore, a

praia, a flor, a ave, a fonte os beijos mere-cidos da verdade”.

Fernando Pessoa

Essas páginas têm como tema: “Encontros com a leitura – Para um

novo olhar sobre a poesia”. Um novo olhar sobre a poesia é também um novo

olhar sobre o mundo em que está inserida a leitura e a educação.

Um novo olhar pode tornar possível nossa relação poética de identi-

dade com o mundo e com o outro e com esse, olhar a linguagem poética passa

a ser um ato de compreensão do mundo do outro e de nós, pois, quando olha-

mos para a poesia, passamos a nos ver no próximo e flui um sentimento de

identidade que rompe as barreiras que ocultam nossos universos pessoais.

Nos encontros com a leitura pude observar a poesia através de outros olhares,

assim como outras pessoas passaram a enxergar a poesia através do meu o-

lhar.

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A linguagem do olhar também faz ouvir o som interior de outras pa-

lavras que desvelam os sentimentos. Com isso é possível recriar o mundo sob

uma nova ótica, pois o “ver” é a percepção da ação, o encontro dos sentimen-

tos que dão sentido à existência.

É aquilo que nos torna mais sensíveis e capazes para decifrar, sob

um novo olhar, as palavras e suas significações, formando um elo de caráter

transformador, emancipatório, de identidade entre o eu, o outro e o mundo.

Faço, portanto, nesta introdução um breve histórico da minha experi-

ência poética e os motivos que me levaram a desenvolver esta dissertação.

Após o Lançamento do livro de poemas, “Vertente de Corpo e Alma”,

Editora Compacta, (2001), realizei várias oficinas, seminários e palestras, nas

escolas de Americana e de Santa Bárbara d Oeste, com a finalidade de divul-

gar a poesia. Ao final de cada trabalho, por mais gratificante que fosse uma

questão incomodava: bastaria um encontro para que os alunos tivessem co-

nhecimentos de leitura no sentido polissêmico? Bastaria um encontro para fa-

zê-los amar a poesia como eu amo, ou, pelo menos para tentar conscientizá-

los da importância e da riqueza que contém a linguagem poética, que ela é car-

regada de significados? Será que os aprendizes conseguiam ver na poesia

uma linguagem rica em arte literária?

Meus objetivos mudaram com minhas inquietações e questionamen-

tos. Existiam muitas perguntas sem respostas: o que as pessoas pensavam

sobre a poesia? Elas sentiam interesse por esse gênero? Se não sentiam, o

que é que faltava? Seria falta de interesse ou de conhecimento da leitura poéti-

ca?Parecia haver uma grande resistência por parte dos leitores em relação a

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poesia, mas se eu perguntava-lhes sobre alguma obra, nunca haviam lido.

Como poderiam gostar de algo que não conheciam?

Encontro pessoas que dizem que não gostam desse gênero literário

sem sequer ter lido um livro, ou um poema. O contato com a leitura é que faz

amar os poemas tão profundos. Se muitos desconhecem o gênero, como terão

paixão pela leitura poética? Como formar o leitor poético?

Depois de muitos encontros, em diferentes lugares, cheguei à conclusão

que somente um estudo mais aprofundado com um grupo poderia provocar

reflexões de novos olhares sobre a poesia. Se as pessoas não conseguiam

enxergar a poesia que há na vida; então talvez fosse necessário levar a poesia

até elas e com isso motivá-las a sentir que ela existe e se faz presente em mui-

tos lugares.

A opção de trabalhar poeticamente vai além de um mero desafio.

“Sem a poesia, muitos continentes de vida e de linguagem permanecem ape-

nas latentes.” (SEVERINO ANTÔNIO, 2002, p. 13).

Assim, foi desenvolvida uma proposta de intervenção educativa “En-

contros com a Leitura”, predominantemente para pessoas que moram nas peri-

ferias, comunidades em situação de risco, que tinham dificuldades de acesso a

livros, bibliotecas ou outras formas que envolvem o ato de ler, com o objetivo

de motivá-las na interpretação, compreensão e fruição de poemas ou leituras

poéticas. Com essas inúmeras formas de leitura que poderiam levar o leitor a

uma vida de inclusão nos campos sócio-político-econômico, mas também, no

cultural e educativo.

A dissertação foi realizada com pesquisa bibliográfica, supervisionada

pelo professor orientador, para a realização de leituras específicas sobre o te-

17

ma, a respeito de questões como: a humanidade da linguagem, poesia e poe-

ma, a linguagem como chave para uma antropologia do humano, os símbolos,

a definição do homem nos termos da cultura humana, a construção do pensa-

mento e da linguagem, a interação verbal, filosofia da linguagem, língua, fala e

enunciação. Entre essas leituras, destaco: Paz (1982); Morin (2001); Bosi

(1983); Kramer (1993); Vigotski (2001); Benjamin (1985); Bakhtin (1986);

Pound (1983); Severino Antônio (2002) e Freire (1982).

Foi realizada a pesquisa-ação, ou seja, através de um trabalho de leitu-

ras educativas sócio-comunitárias com crianças, adolescentes e adultos do

Jardim Thelja e Jardim Alvorada (Americana/SP), através da poesia.

Na obra “Os Signos em rotação”, (1982), Octávio Paz faz a seguinte

pergunta: “Será uma quimera pensar numa sociedade que reconcilie o poema

e o ato, que seja palavra vivida, criação da comunidade e comunidade e criado-

ra?” Em seguida ele afirma que não há como responder a essa pergunta. (PAZ,

1982, p 309). Em outro momento, Paz ressalta que “uma sociedade sem poe-

sia careceria de linguagem. Uma poesia sem sociedade seria um poema sem

autor, sem leitor, e a rigor, sem palavras”. (PAZ, 1982, p. 310).

As leituras trabalham com o idioma de uma comunidade, portanto têm

papel fundamental em qualquer sociedade. Muitas pessoas necessitam da

descoberta da leitura, de uma sociedade leitora mais democrática, porque o ser

humano é um ser de palavras. Precisamos levar a poesia para os lares e tirar

as crianças da rua. Precisamos levar a leitura para as escolas e comunidades,

principalmente àquelas em situação de risco.

A leitura é uma maneira de interagir com o mundo e de transitar com a

linguagem, vai muito além de um mero instrumento de informação.

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Com esses pressupostos, esse trabalho foi estruturado da seguinte

forma:

Iniciamos o primeiro capítulo, “Poesia e Linguagem”, discorrendo

sobre a poesia, sua essência, alguns conceitos, gêneros de poemas, o ritmo

das palavras, poesia e arte e a poesia do olhar. Contextualizando a poesia

como forma especial da linguagem: o ritmo, movimento, imagem, que expres-

sam a presença da poesia em nossas vidas de forma simbólica, metafórica,

verbal e não verbal.

No segundo capítulo, “Leitura e Educação”, abordamos o ato de ler,

as inúmeras formas de leitura que existem dentro da linguagem, assim como a

abordagem individual de cada leitor, além de reflexões e questionamentos so-

bre a formação do leitor poético, de como incentivar os sujeitos sociais para

uma educação que busque desenvolver o domínio da leitura e escrita em um

nível razoável. Enfim, o repensar da leitura e da linguagem como chave para

uma educação mais humana e democrática.

No terceiro capítulo, a apresentação da “Pesquisa-ação” embasada na

investigação que busca promover a participação social, sugerindo alternativas

que pudessem contribuir com os sujeitos-cidadãos dentro da comunidade dos

Jardins Thelja e Alvorada, através do trabalho de leituras educativas sócio-

comunitárias com crianças, adolescentes e adultos, realizadas com poesia, no

sentido de letramento polissêmico.

O Brasil é um país de poucos leitores, embora possua em seu acervo

uma vasta criação literária. A literária não foi criada para uma minoria, ela exis-

te para todos, por isso, precisamos de renascimentos: o renascimento da leitu-

ra e da poesia sob um novo olhar.

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Capítulo I

POESIA E LINGUAGEM

“O espaço através do qual se lançam as aves não é o espaço íntimo que te realça a figura... O espaço ultrapassa-nos e traduz as coisas: para que o ser de uma árvore te seja êxito, lança em torno dela o espaço interior, desse espaço que se anuncia em ti. Cerca-o de moderação. Ela não sabe limitar-se. Só quando adquire forma em tua renúncia é que se torna realmente árvore”.

Rilke

“A poesia é uma forma especial da linguagem.

Quando o coração sente a si mesmo... Nasce a poesia...”.

Octávio Paz

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Além da Terra, além do Céu.

Além da Terra, além do Céu,

no trampolim do sem-fim das estrelas,

no rastro dos astros,

na magnólia das nebulosas.

Além, muito além do sistema solar,

até onde alcançam o pensamento e o coração,

vamos!

Vamos conjugar

o verbo fundamental essencial,

o verbo transcendente,

acima das gramáticas

e do medo e da moeda e da política,

o verbo sempreamar,

o verbo pluriamar,

razão de ser e de viver.

Carlos Drummond de Andrade

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1.1 POESIA E ESSÊNCIA POÉTICA

“Poesia é tempo, ritmo, perpetuamente criador. Ela não

nos dá á vida eterna, mas nos faz vislumbrar a vivacidade

da vida. A experiência poética é abrir a fontes do ser.

A poesia não é uma opinião, nem interpretação da exis-

tência humana; é uma revelação de nossa condição origi-

nal, da nossa condição humana e não encarnará na pala-

vra e sim na vida. A palavra poética jamais é completa-

mente desse mundo: sempre nos leva mais além: a outros

mundos, céus, terras e verdades. A poesia vive nas cama-

das mais profundas do ser”.

Octávio Paz

Neste primeiro capítulo discorro sobre a poesia e sua essência, alguns

conceitos, gêneros de poemas, o ritmo das palavras, poesia e arte e a poesia do

olhar. Um novo olhar sobre a poesia é um novo olhar sobre a leitura do mundo,

porque além da leitura dos livros há muitos mundos para serem lidos e descober-

tos.

Poesia é uma arte que precisa ser vista, sentida, percebida. A beleza da

poesia de nada adiantará se nossos olhos permanecerem fechados. Não tenho

a pretensão de dizer que uma vida com poesia é necessariamente melhor para

os seres humanos. Mas com essa escrita pretendo enfatizar que com ela cer-

tamente teremos outro olhar em todos os sentidos: para a leitura dos poemas,

para nosso poder criativo e para nossas palavras.

Quando o espaço do olhar é limitado, perdemos a beleza da poesia e da

vida que nos rodeia. Quando existe poesia em nossos olhos, passamos a con-

tar coisas diferentes: sentimentos através de canções. O pensamento torna-se

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mais poético, o olhar contemplativo; é possível sentir na poesia um lugar segu-

ro.

Poesia é ritmo, expressão lingüística, modo de força, onda que se divi-

de. Entendo que para se ter um novo olhar sobre a poesia é preciso também

conceituá-la.

Poesia, do grego, poíésis: significa criação, fabricação, confecção, obra

poética.

Poesia é a arte de compor ou escrever versos; composição em ver-

sos livres ou providos de rima, cujo conteúdo apresenta uma visão

emocional e ou conceitual na abordagem de idéias; estados de al-

ma; sentimentos, impressões subjetivas, etc.; o que desperta o sen-

timento do belo; poder criativo, inspiração; aquilo que há de mais e-

levado e comovente nas pessoais ou nas coisas. (HOUAIS, 1999, p.

236).

Outro conceito, pela Enciclopédia Delta Universal, define a poesia

como:

Forma de expressão literária que surgiu simultaneamente com a

Música, a Dança e o Teatro, em época que remonta à Antiguidade

histórica. Na própria fala fruto da necessidade de comunicação en-

tre elementos de uma comunidade primitiva estão às raízes poéti-

cas. Sabe-se que a comunicação imediata entre duas pessoas se

dá pela palavra e pelo gesto, que estão tanto mais intimamente li-

gados quanto mais primitivo for o grupo. O gesto complementa

sempre a fala, na proporção em que esta é limitada em sua inteligi-

bilidade. Assim é que os gestos foram marcando o tom e o ritmo

das palavras, até a caracterização individual dos primeiros contado-

res de seus feitos (caçadas) e dos feitos de sua tribo (guerras). A

saliência cada vez maior do indivíduo que contava sobre a comuni-

dade que o ouvia, acarretou a procura de fins artísticos em relação

narrativa. O primeiro valor artístico destacável das narrativas primiti-

vas foi o ritmo, a música da palavra já cantada ou simplesmente ar-

23

ticulada. E até nas revoluções mais radicais das formas poéticas o

ritmo continua a ser o elemento-chave da expressão.

(Enciclopédia Delta Universal, 2000, p. 6005).

A motivação rítmica varia entre o passado e o presente, como também

sua perspectiva imediata: a fonética. Com o desenvolvimento cultural, os as-

pectos primários do ritmo e do som começaram a adquirir cores intelectuais,

por indivíduos que pensavam não mais em função estrita dos problemas da

comunidade. Novas sugestões rítmicas foram aparecendo e permitindo à narra-

tiva constituir-se em formas fixas.

Ensaístas e filósofos se preocupavam com a essência da poesia, numa

tentativa de desligá-la da matriz em que fermentara com outras expressões,

que também foram conquistando autonomia e passando, por características

afins, à qualidade de gêneros. Entretanto, a essência da poesia é algo que fre-

qüentemente escapa a todas as tentativas de definição ou compreensão. Ape-

sar da natureza “etérea” da essência poética, há incontáveis perspectivas reve-

ladoras sob as quais se pode observá-la. Uma dessas perspectivas, particu-

larmente interessante, é a dos artistas. O olhar que artistas de diversos gêne-

ros lançam sobre a poesia; e a forma como eles e elas sentem a poesia e a

expressam através de sua arte. “A poesia, ligada à estrutura da narrativa, é a

expressão artística que mais discussões têm suscitado em relação à sua es-

sência”. (Enciclopédia Delta Universal, 2000, p. 6502).

Para a ensaísta Susanne Langer há uma longa escala interpretativa: “A

poesia não é mais representativa, pois se desvinculou da preocupação de imi-

tar a natureza”. (READ, 2001, p. 227). O inglês Herbert Read chega a conclu-

sões semelhantes, quando estabelece a diferença entre poesia e prosa:

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Na prosa, as palavras implicam, geralmente, a análise de um es-

tado mental, ao passo que na poesia as palavras aparecem co-

mo coisas objetivas, que mantêm uma definida equivalência

com o estado de intensidade mental do poeta. (READ, 2001, p.

227).

O filósofo alemão Heidegger, ao procurar a essência da poesia em Hol-

derlin, não afastou a possibilidade de ser ela conceitual e, ao mesmo tempo,

lírica.

É de fato, constante a poética através dos tempos, os aspectos

líricos, presentes, inclusive, na obra dos grandes épicos, como

em Homero, nas cenas de amor de Circe, ou como em Camões,

nas cenas do Adamastor e de Inês de Castro (Os Lusíadas). Por

outro lado, Goethe sempre considerou a poesia como impossí-

vel de ser analisada. (HEIDEGGER, 2003, p. 89).

Na obra poética, “ O Arco e a Lira”, de Octávio Paz a poesia é conceitua-

da como:

Conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de

transformar o mundo. Convite à viagem; regresso à terra natal.

Inspiração, respiração. Súplica ao vazio, diálogo com ausência.

Oração, presença, conjura, magia. Experiência, sentimento, e-

moção. Arte de falar em forma superior. Loucura, êxtase, nos-

talgia, confissão, visão, música, símbolo. (PAZ, 1982, p. 15).

Na obra de Severino Antônio, em “Utopia da Palavra”:

A poesia é a utopia da palavra, a terra prometida da linguagem.

Horizonte de plenitude de expressão, em que se realizariam as

potencialidades multissêmicas dos símbolos. A palavra-coisa. A

25

palavra-corpo. A palavra-ser. O sonho dos signos. (SEVERINO

ANTÔNIO, 2002, p. 21).

Para o filósofo Edgar Morin a poesia não é apenas um modo de expres-

são literária, mas um estado segundo do ser que advém da participação, da

admiração, da comunhão, da embriaguês, da exaltação e do amor. “O sentido

do amor e da poesia é o sentido supremo da vida”. (MORIN, 2001, p. 10).

A poesia é liberada do mito e da razão, mas contém si uma uni-

ão. A poesia transcende loucura e sabedoria. É necessário aspi-

rar o viver o estado poético e assim evitar que o estado prosaico

engula nossas vidas, tecidas de prosa e de poesia. Amor e poe-

sia engendram-se mutuamente. Vivemos sempre a procurar um

sentido para nossas vidas, o sentido do amor e da poesia é o

sentido da vida. (MORIN, 2001, p. 10).

Para filósofos, ensaístas, poetas e pensadores a poesia é considerada

uma das sete artes tradicionais, através da qual a linguagem humana é utiliza-

da com fins estéticos. O sentido da mensagem poética também pode ser im-

portante, ainda que seja a forma estética a definir um texto como poético. “

Num contexto mais alargado, à poesia aparece também identificada com a

própria arte, o que tem razão de ser já que qualquer arte é, também, uma for-

ma de linguagem”. (ARGAN, 1992, p. 37).

Assis Brasil fala da poesia como uma manifestação cultural, criativa, ex-

pressiva do homem:

Não se trata de um estado emotivo, do deslumbre de um pôr-do-

sol é muito mais do que isso, é uma forma de conhecimento in-

tuitivo, nunca podendo ser confundido o termo poesia com outro

correlato: o poema. Daí fica claro que um é o objeto e, o outro, a

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manifestação. A poesia é algo de mais filosófico e mais sério do

que a história. (BRASIL, 1979, p. 39).

Ariano Suassuna considerou que a poesia, “seria o espírito criador que

se encontra por trás de todas as artes literárias, sejam estas realizadas através

da prosa ou do verso. Assim, poesia é o ritmo e a imagem, principalmente a

metáfora". (SUASSUNA, 1975, p. 53).

Para Maiakovski: a poesia começa onde existe uma tendência:

A poesia é uma indústria: das mais difíceis e das mais compli-

cadas, mas, apesar disso, uma indústria. Aprender o ofício de

poeta não é aprender o modo de preparar um tipo definido e li-

mitado de obras poéticas, mas sim, o estudo dos meios de todo

o trabalho poético, o estudo das práticas dessa indústria que a-

judam a criar outros. O trabalho do poeta deve ser quotidiano, a

fim de melhorar a técnica, e acumular reservas poéticas.

(MAIAKOVSKI, 1984, p. 45).

Eliot, por outro lado, defende que: A poesia pode ter um significado so-

cial deliberado e consciente e difere de qualquer outra arte por ter para o po-

vo da mesma raça e língua do poeta um valor que não tem para os outros.

Nenhuma arte é mais obstinadamente nacional do que a poesia.

A poesia que é o veículo do sentimento. A poesia é uma cons-

tante lembrança de todas as coisas que só podem ser ditas em

uma língua, e que são intraduzíveis. E como tarefa de poeta,

27

que primordialmente se leve a efeito uma revolução na lingua-

gem, articulada com musicalidade de imagens e de sons.

(ELIOT, 1972, p. 93).

A Poesia é ritmo, movimento, liberdade espiritual. E enquanto cria ima-

gens e símbolos, ela voa livre. A imagem no poema é uma palavra articulada. A

palavra é uma cadeia sonora, a matéria verbal se junta à matéria significada

por meios de articulações fônicas que constituem a linguagem. Essa imagem

pode ser retida e suscitada pela reminiscência ou pelo sonho. “A imagem resul-

ta de um complicado processo de organização perceptiva que se desenvolve

desde a primeira infância” (BOSI, 2002, p. 15).

O escritor que é poeta dá a língua em que se exprime um sen-

tido de dualidade que a torna apta para exprimir o pensamen-

to. O poeta é o criador da linguagem e das imagens poéticas

carregadas de sentido. A interpretação projeta luz para a

compreensão da poesia que pode ser aclarada à luz da Medi-

tação. (BOSI, 2002, p. 19).

Ao longo do tempo, os poetas e os filósofos preocuparam-se em concei-

tuar a poesia. Para o poeta espanhol García Lorca, “todas as coisas têm seu

mistério, e a poesia é o mistério que todas as coisas têm". O poeta francês Mal-

larmé, defendendo uma outra concepção, afirmou que "a poesia se faz com

palavras, e não com idéias". (Enciclopédia Britânica, 1993, p. 92).

28

Além de expressão da linguagem rica em matizes verbais, a poesia lan-

ça o homem na vertigem do impossível da transcendência. “O problema do ser

só toca a alma, quando é sentido”. (PIRES, 1975, p.20).

A poesia é uma forma especial de linguagem, mais dirigida à imaginação

e à sensibilidade. Em vez de comunicar principalmente informações, a poesia

transmite, sobretudo, emoções. É uma das mais antigas e importantes formas

literárias.

A permissão para extrapolar o uso da norma culta da língua, tomando a

liberdade necessária para recorrer a recursos como, desvios da norma ortográ-

fica que se aproximam mais da linguagem falada ou a utilização de figuras de

estilo, é conhecida como licença poética.

A matéria-prima do poeta é a palavra e o escritor tem toda a liberdade

para manipular as palavras, mesmo que isso implique em romper com as nor-

mas tradicionais da gramática. “Limitar a poética às tradições de uma língua é

não reconhecer, a volatilidade da fala”. (http. wikipedia.org/wiki/Poesia, 2006).

A poesia pode expressar sentimentos: vários poetas falam de amor. O

poema é o seu sentimento expressado em palavras que tocam a alma. “O Sen-

tido e a essência não se encontram em algum lugar atrás das coisas, senão em

seu interior, no íntimo de todas elas." (HESSE, 2000, p. 117).

A poesia exprime os sentidos em formas de paixão. A poesia, no seu

sentido mais restrito, parte da linguagem verbal e, através de uma atitude cria-

tiva, se torna um instante emocional, uma linguagem sem fronteiras, embaça-

mento semântico da imagem poética.

29

Embriaguem-se

É preciso estar sempre embriagado

Com quê? Com vinho, poesia ou virtude,

a escolher. Mas embriaguem-se.

E se, porventura, nos degraus de um palácio,

sobre a relva verde de um fosso,

na solidão morna do quarto,

a embriaguez diminuir ou desaparecer

quando você acordar,

pergunte ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro,

ao relógio, a tudo que flui, a tudo que geme,

a tudo que gira, a tudo que canta, a tudo que fala,

pergunte que horas são;

e o vento, a vaga, a estrela,

o pássaro, o relógio responderão:

"É hora de embriagar-se!”

Para não serem os escravos martirizados do tempo,

embriaguem-se; embriaguem-se sem descanso.

Com vinho, poesia ou virtude, a escolher”.

Charles Baudelaire

30

1.2 A LINGUAGEM DOS POEMAS

“O poema é um caracol onde

ressoa a música do mundo”.

Octávio Paz

“Eu escrevia silêncios, noites, anotava o

inexprimível. Fixava vertigens”.

Arthur Rimbaud

“A felicidade do escritor é o pensamento que consegue trans-

formar-se completamente em sentimento, é o sentimento que

consegue transformar-se completamente em pensamento”.

Thomas Mann

Para falar sobre os poemas, discorrerei, primeiramente, sobre alguns

conceitos, resultantes de algumas pesquisas. No dicionário Larousse da Língua

portuguesa, “poema é uma obra literária em versos, com sentido, estrutura e

estilo; é um nome dados por artistas e compositores a obras instrumentais as

quais se atribuem ressonâncias literárias”. (Larousse Cultural, 2000, p. 253).

Na obra de Octávio Paz, “O Arco e a Lira” o poema é um organismo ver-

bal que contem, suscita ou emite poesia, uma forma literária, ou artefato literá-

rio, com estrofes, metros e rimas. Objeto único criado pela “técnica poética”,

sem receitas. “O poema é um artefato literário, feito de palavras, e está além da

linguagem, mas só pode ser conseguido através da linguagem”. (PAZ, 1982, p.

16).

Severino Antônio em “Utopia da Palavra” refere-se ao poema como:

31

Energia rítmica, emocional, semântica que se manifesta na lin-

guagem, mas não é apenas verbal; é uma força mágica da lin-

guagem-criação. Natureza e cultura, revelação que se constrói;

parto e geometria. Vivência e arquitetação: unidade da diversi-

dade. (SEVERINO ANTÔNIO, 2002, p. 20).

Em recente pesquisa na Rede Mundial (Internet) obtive o seguinte con-

ceito para poema:

Obra literária apresentada geralmente em verso ainda que pos-

sa existir prosa poética, assim designada pelo uso de temas es-

pecíficos e de figuras de estilo próprias da poesia. Efetivamente,

existe uma diferença entre poesia e poema. Este último, segun-

do vários autores, é uma obra em verso com características

poéticas. Ou seja, enquanto o poema é um objeto literário com

existência material concreta, a poesia tem um caráter imaterial e

transcendente. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Poema, 2006).

Os poetas têm escrito poemas de vários gêneros. Dois deles, entretanto,

são considerados os principais: o lírico e o narrativo. Alguns críticos e ensaís-

tas acrescentam como um terceiro gênero, o dramático.

GÊNERO LÍRICO é geralmente curto. Muitos carregam grande musi-

calidade: ritmo e rima às vezes os fazem parecer canções. No poema lírico o

autor expressa sua reação pessoal ante as coisas que vê, ouve, pensa e sente.

(Enciclopédia Britânica, 1973, vol. 11, p. 94).

Boca

III

Boca viçosa, de perfume a lírio,

Da límpida frescura da nevada,

32

Boca de pompa grega, purpureada,

Da majestade de um damasco assírio.

Boca para deleites e delírio

Da volúpia carnal e alucinada,

Boca de Arcanjo, tentadora e arqueada,

Tentando Arranjos na amplidão do Empírio.

Boca de Ofélia morta sobre o lago,

Dentre a auréola de luz do sonho vago

E os faunos leves do luar inquietos...

Estranha boca virginal, cheirosa,

Boca de mirra e incensos, milagrosa

Nos filtros e nos tóxicos secretos...

Cruz e Souza

(Enciclopédia Britânica, 1973, p. 95).

GÊNERO NARRATIVO conta uma história e geralmente é mais ex-

tenso que os outros. O poeta apresenta os ambientes, os personagens e os

acontecimentos e lhes dá uma significação. Um exemplo de poema do gênero

narrativo é Os Lusíadas, de Luís de Camões. (Enciclopédia Britânica, 1973, p.

96).

CANTO I

Assunto do Poema

As armas e os barões assinalados,

Que da ocidental praia Lusitana,

Por mares nunca de antes navegados,

Passaram ainda além da Taprobana,

33

Em perigos e guerras esforçados,

Mais do que prometia a força humana,

E entre gente remota edificaram

Novo Reino, que tanto sublimaram.

Fragmento de Os Lusíadas, Camões.

(Enciclopédia Britânica, 1973, p. 97).

GÊNERO DRAMÁTICO assemelha-se ao gênero narrativo porque

também conta uma história e é relativamente longo. Mas, no poema dramático,

essa história é contada através das falas dos personagens. As peças de teatro

escritas em verso constituem forma de poesia dramática. (Enciclopédia Britâni-

ca, 1973, p. 98).

Em sentido amplo, também pode ser considerado um exemplo de gêne-

ro dramático, o poema: "Caso do Vestido", de Carlos Drumonnd de Andrade.

Através de uma suposta conversa entre mãe e filhas, o leitor acompanha uma

história de amor e traição e tem os elementos para reconstituir o caráter e os

sentimentos dos personagens principais.

O Caso do vestido

(Fragmento)

Nossa mãe, o que é aquele vestido, naquele prego?

Minhas filhas, é o vestido de uma dona que passou.

Passou quando, nossa mãe? Era nossa conhecida?

Minhas filhas, boca presa. Vosso pai vem chegando.

34

Nossa mãe, dizei depressa que vestido é esse vestido.

Minhas filhas, mas o corpo ficou frio e não o veste.

O vestido, nesse prego, está morto, sossegado.

Nossa mãe, esse vestido tanta renda, esse segredo!

Minhas filhas, escutai palavras de minha boca.

Era uma dona de longe, vosso pai enamorou-se.

de que tudo foi um sonho, vestido não há... nem nada”.

Carlos Drummond de Andrade.

(DRUMONND, 2001, p. 34).

Os poetas modernos usam tanto o verso metrificado quanto o verso livre.

O verso metrificado obedece a um esquema métrico, a uma espécie de com-

passo regular. É o gênero mais antigo e tradicional, como no exemplo abaixo:

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,

assim calmo, assim triste, assim magro,

nem estes olhos tão vazios,

nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,

tão paradas e frias e mortas;

35

eu não tinha este coração

que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,

tão simples, tão certa, tão fácil:

— Em que espelho ficou perdida

a minha face?”

Cecília Meirelles

(REBELO, in Antologia Poética Brasileira, 1977, p. 52).

Para identificar que tipo de verso o poeta usa: basta ler em voz alta al-

gumas linhas do poema. Se ele revela um ritmo constante, isso significa que

tem um esquema métrico e, portanto, está escrito em versos metrificados.

Assim que o leitor percebe o esquema métrico, o gênero de construção

do poema espera que ele continue regularmente até o fim. Mas a melodia de

um poema não reside propriamente em sua métrica. Ela resulta do uso que o

poeta faz do esquema escolhido, e da liberdade que ele se permitir.

O poeta encontra sua forma própria, mas não se torna escravo dela.

Quando ouvimos ou lemos um poema, espera-se que haja uma regularidade

na cadência. As vezes, entretanto, somos agradavelmente surpreendidos por

algumas variações. O poema, abaixo de João Cabral de Melo Neto, sugere o

que poderíamos chamar de versos livres.

A Educação pela pedra

Para aprender da pedra, freqüentá-la;

Captar sua voz inenfática, impessoal.

A lição de moral, sua resistência fria

36

Ao que flui e a fluir, a ser maleada;

A de poética, sua carnadura concreta;

A de economia, seu adensar-se compacta:

Lições da pedra (de fora para dentro,

Cartilha muda), para quem soletrá-la.

Outra educação pela pedra: no Sertão

(de dentro para fora, e pré-didática).

No Sertão a pedra não sabe lecionar,

E se lecionasse, não ensinaria nada;

Lá não se aprende a pedra: lá a pedra,

Uma pedra de nascença, entranha a alma.

João Cabral de Melo Neto

(Enciclopédia Britânica, 1973, p. 99 ).

A linguagem contida em um poema é uma forma de transcender os limi-

tes da própria linguagem, a transcendência de ir além, abrir horizontes simbóli-

cos, ampliar as possibilidades de comunicação, criando imagens poéticas.

Uma grande riqueza literária esta contida na linguagem dos poemas. A

poesia existe no poema e não pode se desprender de nossas vidas. “O poema

é uma tentativa de transcender o idioma, as expressões poéticas, é um recurso

do homem para ir mais além de si mesmo, ao encontro que é profundo e origi-

nal. (PAZ, 1982, p. 45).

Os estilos podem ter mudado, mas os poetas e os poemas, de certa

forma são eternos... Os poemas são feitos de inspiração com uma linguagem

especial, carregada de significados, o poeta busca a transcendência, ocupando

simultaneamente: passado, presente e futuro. O poeta habita a memória das

coisas, dos lugares e das pessoas, personagens de outra esfera. Isola as pala-

37

vras através de sua transubjetividade, e tenta compreendê-las através das su-

as próprias imagens, buscando, assim evocar e invocar a essência poética.

Habitar poeticamente – diz Heidegger – significa estar na pre-

sença dos deuses [que a poesia invocou] e ao mesmo tempo

ser tocado pela essência das coisas próximas. Que a existên-

cia humana é poética em seu fundamento significa – para a-

lém de qualquer esforço do homem que não chega à razão de

ser da existência humana – que sua instauração não é um mé-

rito, mas uma doação. A poesia não é um ornamento que a-

companha a existência humana, nem tão somente uma pas-

sageira exaltação, ou calor da hora, ou diversão. Ela é o fun-

damento que suporta a história, e por isso não é tampouco

uma manifestação da cultura, e menos ainda a mera “expres-

são”da “alma da cultura” A essência da poesia deve ser con-

cebida como essência da linguagem, ou melhor, a essência da

linguagem ( da linguagem primitiva de um povo histórico) é a

essência da poesia. Mas “ somente às vezes suporta o homem

a plenitude divina” e “deve partir a tempo aquele por quem fala

o espírito: a excessiva clareza afunda o poeta nas trevas.

(Apud, GMEINER, 1998, p.39).

Escrever poemas é mergulhar em busca da melhor semelhança entre

aquilo que é captado pelos sentidos e as palavras que melhor possam expres-

sá-los. Escrever poemas é demonstrar a habilidade em expor um estado subli-

me de entendimento.

E quanto mais elevada for a capacidade de combinar os sinais e seus

símbolos, através de uma linguagem acessível, mais apropriado será o traba-

lho poético e melhor será compreendida a intenção de seu autor, despertando

no leitor o encontro com a plenitude e porque não dizer...Com a própria identi-

dade. Heidegger em sua obra “Identidade e Diferença” ( 1971) diz que o pen-

38

samento da identidade põe o ser numa relação imediata com a consciência, a

linguagem apreende e nos fala da estrutura de ação enquanto ser no mundo.

“... Mais de dois mil anos precisou o pensamento para entender ver-

dadeiramente uma relação tão simples como a mediação no seio da

identidade. Podemos nós pensar que a penetração na origem essen-

cial da identidade pelo pensamento se deixa realiza num dia? preci-

samente, pelo fato de esta penetração exigir um salto, ela precisa de

seu tempo, o tempo do pensamento” “... O ser é determinado a partir

de uma identidade, como um traço desta identidade. “... O homem é

propriamente esta relação de correspondência, e é somente isso.

Somente não significa limitação, mas uma plenitude...” (HEIDEG-

GER, p.59., 1971).

Identidade poética é plenitude de ser único no universo, identificar-se

com os poemas tornando uma relação mais sensível e harmônica com o mun-

do interior e do outro, apreendendo novas linguagens e ouvindo o som das

palavras que consagram um instante.

O poema é uma forma de louvor à transcendência...

Instantes que refletem a sensibilidade criadora dos poetas.

Finitude, expressão, liberdade criadora, música essencial, transformado-

ra do mundo.

39

As palavras

São como um cristal,

as palavras.

Algumas, um punhal,

um incêndio.

Outras,

orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.

Inseguras navegam:

barcos ou beijos,

as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,

leves.

Tecidas são de luz

e são a noite.

E mesmo pálidas

verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem

as recolhe, assim,

cruéis, desfeitas,

nas suas conchas puras?

Eugênio de Andrade

40

1.3 RITMO E IMAGEM

“Cada palavra ou grupo de palavras é uma metáfora”.

Octávio Paz

“A poesia não voltará a ritmar a ação; ela passará a antecipá-la”.

Arthur Rimbaud

“As imagens seduzem, mas não são fenômenos de uma sedução”.

Gaston Bachelard

O idioma está sempre em movimento, a linguagem se produz através

dos signos e sons que se associam e transmitem um sentido. A linguagem em

movimento é um mundo de chamadas e respostas em que palavras se atraem

e outras repelem.

A linguagem humana é pensamento-som. Mas nem o som, nem o pen-

samento se comunicam por si mesmos: reunidos em articulações são chama-

dos de signos. O som em si e o pensamento transcendem a língua. A lingua-

gem em movimento é a expressão do ser humano em sua complexidade.

A poesia mítica recupera na figura e no som instantes de plenitude cor-

poral e espiritual. “Reinventar imagens da unidade perdida, eis o modo que a

poesia do mito e do sonho encontrou para resistir à dor das contradições que a

consciência não pôde deixar de ver”. (BOSI, 1983, p. 54).

Na Enciclopédia Britânica, volume 11, em Poetas eternos é feita a se-

guinte citação:

Assim como um compositor aproveita-se dos sons dos diferentes ins-

trumentos e do contraste entre notas graves e agudas, o poeta obtém

41

efeitos musicais e significativos utilizando os diversos sons de que se

compõem as palavras. É claro que o poeta não usa mecanicamente

esses recursos, como se fossem ingredientes de uma receita. O bom

resultado dependerá, em última análise, de sua sensibilidade. A utili-

zação dos efeitos sonoros das palavras é mais conhecida através da

rima e da aliteração. A rima, num paralelo com a música, já foi cha-

mada de harmonia do verso. Ela é agradável ao ouvido, isso, por si

só, já a justificaria. Mas, além desse aspecto, a rima pode ajudar a

constituir o ritmo do poema, sobretudo na poesia clássica, onde assi-

nala o final do verso. Aliás, as palavras: rima e verso, provêm do latim

rhytmus, originado do grego rhythmós, movimento regulado e com-

passado, ritmo. (Enciclopédia Britânica, 2000, p. 6503).

A excessiva preocupação com a rima, sobretudo no parnasianismo, le-

vou muitos poetas a forçarem sua expressão e caírem num formalismo de pou-

co significado. A aliteração é uma repetição de sons consonantais dentro do

verso, como neste exemplo se pode ver em "O Navio Negreiro", de Castro Al-

ves: A aliteração pode ser usada para gerar um efeito sonoro agradável ou pa-

ra imitir sons ou ruídos naturais.

Navio Negreiro

(Fragmento)

Estamos em pleno mar. Abrindo as velas

ao quente arfar das virações marinhas,

veleiro brigue corre à flor dos mares,

como roçam na vaga as andorinhas...

Donde vem? onde vai? Das naus errantes.

Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço?

Neste saara os corcéis o pó levantam,

galopam, voam, mas não deixam traço.

42

Bem feliz quem ali pode nesta hora?

Sentir deste painel a majestade!

Embaixo — o mar em cima — o firmamento...

E no mar e no céu — a imensidade!

Esperai! Esperai! Deixai que eu beba.

Esta selvagem, livre poesia

Orquestra — é o mar, que ruge pela proa,

E o vento, que nas cordas assobia...

Castro Alves

(RABELO, in Antologia Escolar Brasileira, 1977, p. 83)

O poeta não se limita apenas com à melodia da língua, mas também lida

com as imagens e cenas que lança à mente do leitor, em que uma imagem

suscita a outra. Os ritmos são vibrações da matéria viva que forjam a corrente

vocal. Os ritmos poéticos nascem na linguagem do corpo, na dança, nos sons

e nas modulações da fala. “Os nomes são imagens, estas são ícones, objetos

sacralizados. A poesia corrente de alumbramento desloca-se de um fundo, sem

fundo da memória ou do inconsciente”. (BOSI, 1983, p. 61).

Às vezes o poeta lida com idéias e emoções complexas, mesmo através

de assuntos aparentemente simples. A "Morte do Leiteiro", de Carlos Drum-

mond de Andrade, fala de uma situação comum à entrega do leite em lingua-

gem bastante acessível. Mas, ao terminar a leitura, sentimos que o poeta deu a

essa situação um significado muito mais amplo.

Drummond transforma o que não passaria de uma cena policial confun-

dido com um ladrão, o leiteiro é morto. Num retrato das diferenças sociais en-

43

tre as pessoas, da violência da vida urbana e da insegurança das pessoas,

preocupadas apenas em defender suas propriedades.

A morte do leiteiro

À Cyro Novaes

Há pouco leite no país

é preciso entregá-lo cedo.

Há muita sede no país,

é preciso entregá-lo cedo.

Há no país uma legenda,

que ladrão se mata com tiro.

Então o moço que é leiteiro

de madrugada com sua lata

sai correndo e distribuindo

leite bom para gente ruim.

Sua lata, suas garrafas,

seus sapatos de borracha

vão dizendo aos homens no sono

que alguém acordou cedinho

e veio do último subúrbio

trazer o leite mais frio

e mais alvo da melhor vaca

para todos criarem força

na luta brava da cidade...

Mas o homem perdeu o sono

de todo, e foge pra rua.

Meu Deus, matei um inocente.

Bala que mata gatuno

também serve pra furtar

a vida de nosso irmão.

Quem quiser que chame médico,

44

polícia não bota a mão

neste filho de meu pai.

Está salva a propriedade.

A noite geral prossegue,

a manhã custa a chegar,

mas o leiteiro

estatelado, ao relento,

perdeu a pressa que tinha.

Da garrafa estilhaçada.

no ladrilho já sereno

escorre uma coisa espessa

que é leite, sangue... não sei

Por entre objetos confusos,

mal redimidos da noite,

duas cores se procuram,

suavemente se tocam,

amorosamente se enlaçam,

formando um terceiro tom

a que chamamos aurora.

Carlos Drummond de Andrade

(http.www.academiamineiradeletras.org. br/revista/2006)

O poeta não se limita às coisas que podem ser vistas. Muitas vezes,

para melhor comunicar o que pretende, ele sugere sons, movimentos, perfu-

mes, imagens através de analogias, metáforas, figuras de estilo. “O poeta goza

do privilégio de poder, a sua vontade, ser ele mesmo e outro”. (BAUDELAIRE,

1985, p. 335).

A imagem no poema é como um facho de luz que produz o conheci-

mento e ajuda o leitor a desenvolver a capacidade de coordenar conhecimen-

tos polissêmicos que um texto poético proporciona. A imagem final que se tem

45

do poema é uma conquista do discurso sobre a sua linearidade. Essa imagem

é figura, pois procede às operações mediadoras e temporais, um modelo de

realidade como nós a imaginamos. Pela analogia o discurso recupera no corpo

da fala a imagem. “Se no fim do trajeto a imagem parece ter ultrapassado o

discurso, a transcendência se fez em sentido contrário para levar a figura à

plenitude da palavra.” (BOSI, 2002, p. 39).

Para transmitir idéias e sensações o poema, não se apóia exclusivamente

no significado exato das palavras e em suas relações dentro da frase, mas

também nos valores sonoros e no poder sugestivo dessas mesmas palavras

combinadas entre si. Pensamentos e frases também são ritmos chamados e-

cos. “O diálogo é mais que um acordo _ é um acorde” (PAZ, 1982, p. 63)

O poeta encanta a linguagem através do ritmo. Assim a função do ritmo dis-

tingue o poema de outras formas literárias, tornando-o um conjunto de frases,

uma ordem verbal fundadas no ritmo. Do ponto de vista de sua forma, o poema

caracteriza-se pela existência de versos e linhas que o constituem. Quem lê

versos sente um ritmo mais ou menos regular. “O poema exerce a função de

suprir os intervalos que isola os seres... Traz sob as espécies de figura e do

som aquela realidade pela qual vale ou não a pena lutar...” (BOSI, 1983, p. 83).

Os versos podem ou não ser reunidos em estrofes, grupos de dois ou mais

versos. A rima que é a repetição de sons existentes no final dos versos é pró-

pria do poema, embora não indispensável. “ Quando se lida com o poema a

imagem impõe, se arrebata, frases são linhas, onde há ressonância e retorno”.

(BOSI, 1983, p. 85)

O poeta faz uso daquilo que as palavras podem sugerir ao leitor. Es-

se efeito sugestivo das palavras é obtido através dos sons que elas têm e, so-

46

bretudo, das diversas imagens, ou figuras de linguagem, que o autor for capaz

de criar.

A linguagem-som é um jogo de palavras, em que envolvem o movimento

e o sentido das expressões. O ritmo não é medida, é fonte de todas as cria-

ções, a própria historia da civilização é ritmada e implica na visão concreta do

mundo.

Poesia é som, palavra, ritmo, imagem.

As imagens poéticas bailam nas ondas sonoras das palavras.

Através do ritmo as palavras tornam-se linguagem-som.

Instantes de melodia e da cadência poética.

Imagem.

Ritmo.

Temporalidade.

47

As palavras

As palavras se movem,

a música se move

Apenas no tempo;

mas só o que vive

pode morrer.

As palavras, após a fala,

Alcançam o silêncio.

Apenas pelo modelo, pela forma,

As palavras ou a música podem alcançar

As palavras se distendem,

estalam e muita vez se quebram,

sob a carga, sob a tensão,

tropeçam, escorregam, perecem,

apodrecem com a imprecisão,

não querem manter-se no lugar,

Não querem ficar quietas.

T. S. Eliot

48

1.4 PALAVRA POÉTICA

SUMA DE TODAS AS LINGUAGENS

“ A linguagem foi criada e é utilizada para a comunicação, a li-

teratura não existe num vácuo. A poesia é a mais condensada

forma de expressão verbal ”.

Ezra Pound

“O homem habita a terra poeticamente.”

Holderlin

“A palavra poética é incondicionalmente tensa, enquanto pa-

lavra que oculta desoculta o ser que nela habita. Como pode-

ríamos definir esta tensão? Não podemos fazê-lo. Defini-la

não nos conduzirá a nada, se não nos decidirmos escutar a

poesia”.

Alejandra Pizarnik

A linguagem faz parte do nosso universo dando capacidade à ex-

pressão humana que consegue assim criar relações em um campo aberto às

transformações sociais. A criação poética se inicia com a linguagem, no desen-

raizamento das palavras. A palavra tem o dom de concentrar energias que

nossos sentidos não conseguem identificar. Através da palavra é possível

descobrir novos mundos que o imaginário propicia. O dinamismo da linguagem

leva o leitor a criar seu universo verbal.

49

A linguagem humana é seqüência, estrutura, movimento e for-

ma, curso e recorrência. A sua estratégia de ir e vir é mais lenta

que a percepção visual e o devaneio. Nessa complexidade esta

a força e a fraqueza do discurso, que tende a recuperar diante

da figura um jogo de idas e voltas. (BOSI, 2002, p. 34).

A linguagem é o principal meio da comunicação humana, uma soma

de comunicações que é veiculada através de diagramas, artes e formas pura-

mente musicais. “A soma de toda sabedoria humana não está contida em ne-

nhuma linguagem e nenhuma linguagem em particular é capaz de exprimir,

todas as formas e graus da compreensão humana”.(POUND, 1990, p. 45).

A poesia é a suma de todas as linguagens: não há um saber especí-

fico que decifre todas as nuances dessa linguagem repleta de imagens, metá-

foras e significações.

Em seu livro “ A Utopia da Palavra”, Severino Antônio nos diz :

[...] a poesia está nas ruas, em gestos involuntários. Entre frases

obscuras. Nos silêncios. A poesia está nos restos dos dias. Á-

gua vital das origens e das utopias, a poesia está em tudo. No

entanto em paradoxo: a poesia é raríssima. (SEVERINO AN-

TÔNIO, 2002, p. 39).

A poesia é inerente ao ser humano, mas é preciso trazer à tona, o

que há de mais poético: como enxergar o pôr-do-sol, a delicadeza das flores,

os cristais da manhã, o perfume da noite, os dias cinzentos e tudo o que há de

mais sublime. “A poesia é uma arte da linguagem; certas combinações de pa-

lavras podem produzir uma emoção que outras não produzem, e que denomi-

namos poética.” (VALÉRY, 1999, p. 216).

50

A poesia está nos vestígios da guerra, nos olhares das crianças, na

súplica dos gestos e das palavras. A poesia habita todos os lugares. “A poesia

converte a pedra, a cor, a palavra e o som em imagens”. (PAZ, 1982, p. 27).

O gesto, o olhar e a palavra são contíguos: ela aparece dentro de

nós em oposição a um mundo fora de nós. O homem é um ser de palavras. As

palavras nascem perdidas entre outras palavras à procura do essencial. Para

atingir esse estado poético é preciso atravessar as fronteiras do inconsciente. A

palavra se transforma pela pausa; o silêncio, a escuta, e a imanência do poema

culmina no ato da escrita poética. “Quando a palavra é um instrumento do pen-

samento abstrato elas são conduzidas como seres caprichosos e autônomos. A

palavra em si mesma é uma pluralidade de sentidos”. (PAZ, 1982, p. 58).

Para Morin, o amor precede a palavra, o amor encontra-se enraizado

em nosso mito que pressupõe a linguagem e nesse sentido pode-se dizer que

ele decorre da linguagem. “O amor procede da palavra e precede a palavra. É

pela palavra que se exprimem a verdade, a ilusão e a mentira que podem cir-

cundar ou construir o amor”. (MORIN, 2001, p. 17).

As palavras são pontes que revelam mesmo quando querem escon-

der no livro, “A morada do ser: uma abordagem filosófica da linguagem, na lei-

tura de Martin Heidegger”, Conceição Gmeiner faz a seguinte consideração

sobre palavra, linguagem e significado:

As coisas não são fundamentalmente coisas presentes no mun-

do exterior, mas na palavra que as nomeia originalmente e as

torna acessíveis, até mesmo na presença espaço-temporal. A fi-

gura etimológica, a escavação do significado a partir das raízes

verbais e da historia das palavras e, na sua mais plena acepção,

uma emergência, um desocultamento, um movimento para a luz.

51

Qualquer investigação séria sobre o ente deve adaptar, como

ponto de vista, as considerações lingüísticas, em virtude da lin-

guagem se apresentar como chave que abre a porta do desve-

lamento do ser, do homem e do mundo. A linguagem opera o

desvelamento das significações do Mundo, não havendo, por-

tanto, dois planos: o do percebido e o do conhecido; o do falado

e o do expresso. A palavra não introduz um sentido num conte-

údo. Pelo contrário, é o conteúdo que se revela significante na

linguagem. A linguagem é própria do homem, não apenas por-

que para além de todas as suas outras faculdades o homem

também tem a genial capacidade de falar, de comunicar inteligi-

velmente através das palavras, mas sobretudo porque apenas

por intermédio desta irredutível via, ele tem acesso privilegiado

ao Ser. A linguagem é um acontecimento que, ao manifestar-se,

produz a indicação e a língua. A palavra é a marca do aconteci-

mento interior à linguagem e a escrita o depósito da tradição do

Ser. Por isso, ao interrogar-se o Ser, a Linguagem arranca cons-

tantemente a palavra ao peso significativo da tradição e a escrita

aos limites do signo para a fazer regressar à presença originária

que permitiu a sua manifestação. Neste sentido, a Linguagem

reside na diferença interior à palavra do ser que se inscreve en-

tre o acontecimento o qual, ao mesmo tempo, desvela e oculta a

letra ou a palavra que morre no limiar da coisa. (GMEINER,

1998, p. 54).

A interpretação de um texto poético é complexa porque a linguagem

poética possui múltiplas significações e não pode ser entendida de forma lite-

ral.” Só a corrente da comunicação verbal fornece à palavra a luz da sua signi-

ficação”. (BAKHTIN, 1992, p. 58). Antigamente interpretava-se um texto do

ponto de vista analítico-sintático, mas, essa relação mudou. Hoje se busca o

significado nas palavras do leitor, que de certa forma é o co-criador da obra.

52

No caso de leituras poéticas as dificuldades dos sujeitos não decorrem

simplesmente do desconhecimento sobre o texto, mas também da falta de lei-

tura e do pouco contato que têm com a poesia. Confunde-se muito a poesia

com o poema. O poema, que fique bem claro, é um artefato literário. Já discorri

sobre isso nos itens anteriores.

O poder de nomear é fundamental para a linguagem e por extensão, pa-

ra o fundamento da poesia, porque sua forma lingüística é sempre flexível e

variável, com suas metáforas, analogias e demais figuras que enriquecem a

percepção.

Todos ignoram o projeto da linguagem: que somente se ocupa

de si mesma. Por isso é um fecundo e esplêndido mistério.

Quando alguém fala simplesmente por falar, então justamente é

quando diz o mais original e verdadeiro que se pode dizer. So-

mente aquele que tem o sentimento profundo da língua, que a

sente em sua aplicação, seu ritmo, seu espírito musical – so-

mente aquele que a entende na sua natureza interior e capta em

si seu movimento intimo e sutil… Sim, somente esse é profeta.

(Novalis, 1988, p. 57, fragmento 32).

A leitura poética é considerada a mais rica, pois é repleta de signifi-

cações, destacando, porém que é a mais condensada de todas as linguagens.

“A poesia não é uma opinião, nem interpretação da existência humana; é uma

revelação de nossa condição original, da nossa condição humana e não encar-

nará na palavra e sim na vida” (PAZ, 1982, p. 59).

Linguagem-comunicação.

Linguagem-palavra.

53

Linguagem-poema.

Poesia: suma de todas as linguagens.

54

Ponto e Linha sobre Plano

A obra reflete-se na superfície da consciência.

Ela encontra-se para lá de e,

quando a excitação cessa,

desaparece da superfície sem deixar rastro.

Existe aí também como que um vidro transparente,

mas duro e rígido que impede todo o contato direto e íntimo.

Ainda aí temos possibilidade de penetrar na obra,

de nos tornarmos ativos

e de viver a sua pulsação

através de todos os nossos sentidos.

Para além do seu valor científico,

que depende de um exame dos elementos particulares da arte,

a análise dos seus elementos constitui uma ponte em direção à

vida interior da obra.

Todos os procedimentos são sagrados quando necessários.

Wassili Kandinsky

55

1.5 POESIA E ARTE

“A satisfação proporcionada pela obra de arte àquele que a re-

vela é dolorosamente efêmera: relampeja fugaz, nos momentos

de febre inspiradora, quando ele tateia formas novas para exte-

riorização do seu magma íntimo, do seu mundo interior”.

Guimarães Rosa

“A arte é um instante de eternidade e perfeição".

V. Avelino

“A arte não reproduz o que vemos. Ela nos faz ver.”

Paul Klee

As artes poéticas atravessam espaços e fazem ascender o espírito no

processo de mutação da palavra em poesia. O presente e o futuro poético po-

dem ser ritualizados, pela escuta da palavra perdida e reencontrada num senti-

do de renovação interior: o deslumbramento perante a beleza, a procura de luz,

no quotidiano.

Não há nenhuma definição de arte que seja acabada ou definitiva. Isso

revela que a convivência com a criação e com o conhecimento artístico é uma

experiência sem fim. A literatura poética é a possibilidade de representar sim-

bolicamente a vida que realmente vivemos e tem uma extrema capacidade de

revelar a vida.

56

Alguns pensadores modernos relacionam a concepção poética de arte

às tendências lúdicas do homem. O conceito de arte como construção de um

novo ser que se acrescenta aos fenômenos da natureza conheceu vários mo-

mentos na cultura do Ocidente. “A natureza, obra de um jogo sobre-humano

transcende os limites da razão”. (BOSI, 1983, p. 15).

Ao artista é dado combinar sensações, imagens e representações. Co-

mo todo jogo, também na arte a liberdade de formar atenderia leis ao cumpri-

mento de um objeto universal. O poema cuja beleza nasce na unidade mais

profunda da representação, preexiste à arte na palavra, no espaço e no tempo.

Numa palavra, o espaço e o tempo, categorias universais que preexis-

tem a todas as artes e de todas são a matéria primeira, recebem de cada uma

delas em tratamento que jamais dispensa a medida.

Na vida simbólica de todos os povos formaram-se certos padrões estilís-

ticos. A criação de formas e a sua reiteração constituem provavelmente um

universal “técnico” do gênero humano. Cabe a ciência da interpretação, à her-

menêutica, decifrar, estilo por estilo, obra por obra, o significado dessas for-

mas.

A história da estética ensina, porém, a dialetizar o discurso for-

malista, mesmo porque a confiança absoluta nos recursos técni-

cos e na combinatória artesanal, enquanto reais produtores da

obra de arte está longe de ser partilhada por todos os teóricos, e

até mesmo, pelos artistas. (BOSI, 1983, p. 35).

Bosi em “Reflexões Sobre a Arte” menciona que, na obra Íon de Platão a

poesia, aparece como que habitada por seres divinos: essa é definição do ter-

mo entusiasmo com que os gregos nomeavam o estado da alma quando profe-

57

ria seus oráculos. “Entusiasta é aquele que recebeu um deus dentro de si”.

(BOSI, 1983, p. 19).

Alfredo Bosi considera inverossímil que uma grande obra literária possa

ser compreendida como um carrossel de gêneros, uma aglutinação de estilos.

“Só uma leitura neo-retórica pode confundir a potência criadora de um poeta,

ou a fantasia intelectual de um narrador, com o propósito deliberado de montar

uma máquina de citações, alusões e paródias” (BOSI, 1983, p. 21).

Uma das perspectivas, particularmente interessantes, é a dos artistas. O

olhar que artistas de diversos gêneros lançam sobre a poesia; e a forma como

sentem a poesia e a expressam através de sua arte.

O fenômeno da poesia se esclarece como um acontecimento nor-

mal do processo cognoscitivo, no qual ocorrem sentidos externos,

que se combinam com os internos: imaginação e memória. A obra

poética consiste em representar estes objetos estímulos, para que

as imagens se levantem para a superfície. O grande poeta não é

senão aquele que por palavras adequadas ou por figuras adequa-

das cria um enredo de imagens por meio de evocações. (Enciclopé-

dia Simpósio, 1997, p. 211).

A poesia é uma arte: ela está bem próxima de nós, mas nossos olhos

seletivos, muitas vezes focalizam somente o que queremos ver. Para Bosi, por

exemplo: “A arte é um fazer, um conhecer, um exprimir: operação construtiva,

ato de transformar os signos da natureza e cultura”. (BOSI, 2001, p. 89).

A poesia é arte: arte-construção; arte-expressão; arte-vida; arte-

sentimento; arte-poema. Ela se faz presente nas obras literárias, bem como,

nas pinturas, esculturas, também na música e na dança... Mas a poesia e a

arte também estão presentes na imaginação, nas palavras, nos gestos, nos

silêncios.

58

A poesia converte a pedra, a cor, a palavra e o som em ima-

gens. E segundo essa característica, o fato de serem imagens, e

o estranho poder de suscitarem no ouvinte ou no expectador

constelações de imagens, transforma em poemas todas as o-

bras de arte. (PAZ, 1982, p. 27).

Acontece a poesia em toda espécie de arte, na de formas, cores, sons

musicais e palavras. Poesia é arte. É pensar por imagens, tocar, ouvir, manu-

sear, sentir o aroma, fluir, transcender.

59

Arte e verdade

Duas vozes da mesma boca,

Duas expressões do mesmo olhar

o que deseja o coração,

o que quer a inteligência,

é uma coisa só:

luz e amor:

a verdade que se vê

e a verdade que se sente.

A inspiração e o pensamento

são dois eternos combatentes

diferentes são as armas:

mas no pendão de ambos

está gravada esta mesma legenda:

Verdade.

Antero de Quental

60

1.6 POESIA DO OLHAR

“Existe mais poesia no olhar de quem ama de que em mil poe-

mas que se escreva”...

Nuno Branco

“O olho é o mais espiritual dos sentidos”.

Santo Agostinho

“O mundo não cabe no relance do olhar, se aprofunda em nós

um sentido de totalidade”.

Paulo Venturelli

Poetas, filósofos, pensadores falam da magia, da amplitude e da com-

plexidade do olhar. A forma de olhar concretiza a representação imagética e

essa imagem é uma das formas de construção do conhecimento.

Os olhos trazem uma relação íntima de construção do autor e de si, em

que é permitido mergulhar na polissemia, alterações semânticas e recursos

literários. Ao ler um texto sentimos e identificamos o “eu”. Tal como a poesia o

olhar é carregado de significados. A significação do olhar consiste em enxergar

a poesia sob um novo prisma.

O corpo da palavra é uma marca que perde sua essência ao ser tolhida,

mas ganha essência ao ser compreendida. Assim como o olhar, a palavra é

identidade, essência, transcendência, sensibilidade, revelação e desvelamento.

Através do olhar ocorre o encontro entre a literatura e a arte.

61

Proust dizia que: “A verdadeira viagem de um descobrimento não é en-

contrar novas terras, mas ter um olhar novo”. (PROUST, 2000, p. 67).

O olhar poético é aquele que decifra nossas inquietações, aquele que

enxerga através de muros, portas, paredes, aquele que não se escraviza com

os grilhões de ferro que querem nos prender. E esse novo olhar implica em

muitas significações, o olhar da revelação: uma visão mais ampla sobre a cria-

ção poética.

A palavra poética transmite imagens e ao contemplá-las, reconstruímos

metáforas em sua origem etimológica. Com a perda da linguagem poética, es-

sas figuras, bem como as metáforas ficaram esquecidas pelo homem. “O olhar

etimológico representa nosso encontro com a aura da palavra”. (KRAUS, 1987,

p. 36).

Cada um de nós vê o mundo com os olhos que têm, e os olhos vêem o

que querem enxergar, ainda que seja uma fantasia. A poesia do olhar leva à

visão plena da razão e da sensibilidade, tornando visível algo que aparente-

mente permanecia oculto.

Um novo olhar sobre a poesia é um novo olhar sobre a vida. O olhar

busca a construção dos sentidos que reconhecem as significações como para-

digmas. Os sentidos podem ser apreendidos por meios de interpretações,

quando as imagens mentais se relacionam com a percepção e o conhecimento.

Sentimentos e atitudes podem ser expressos através do olhar poético:

uma reinvenção de si mesmo. Enxergar a poesia que há na vida é vê-la de fato

em seu caráter emancipatório. Poesia-ação: metáforas ocultas, metáforas reve-

ladas. “A metáfora é o fenômeno da alma poética”. (BACHELARD, 1988, p. 97).

Olhar da poesia: arte literária, artesanato, composição.

62

Poesia do olhar: estados da alma, sentimentos, poder criativo, inspiração

sublime, tudo o que há de transcendente.

Um novo olhar sobre a poesia, um novo conceito para a vida; uma nova

visão de mundo: lugar nenhum da linguagem; lugar todo da linguagem. Poética

do olhar: uma viagem imaginária, sem horário de saída ou chegada. O destino

vai até aonde a imaginação possa transportar: a descoberta de um mundo no-

vo, sem limites, sem fronteiras, nas fibras espessas da palavra.

Letras agrupadas formam palavras. Palavras em agrupamento criam fra-

ses. A beleza das palavras faz descobrir a poética do olhar como forma, conte-

údo e imagem. “A imagem revela o que é e não o que poderia ser. Por obra do

ritmo a imagem abre-se à participação”. (PAZ, 1982, p. 121).

Existe um significado mítico e místico nas palavras. “O valor das pala-

vras reside no sentido que ocultam”. (PAZ, 1982, p. 128). O olhar semiótico faz

a leitura do mundo: o encontro entre o autor e o leitor recria a obra. Ocorre um

encontro entre o criador da obra e o leitor, através de pensamentos, analogias,

metáforas.

A diferença entre o ver e o olhar é uma distinção semântica significativa

para os jogos de linguagem, quando somos tomados pela tarefa de compreen-

der a condição humana da recriação através de imagens e significados. Olhar

trata-se de uma experiência única, num exercício de compreensão dos senti-

dos. O sentido não só como fundamento, mas como apreensão e percepção.

A imagem na leitura exerce o encantamento, transforma a realidade em

representação e outras formas de expressão. Olhar é comunicar, expressar,

revelar. Os olhos transmitem atitudes e sentimentos que demarcam a persona-

lidade pela forma mais sutil da comunicação não verbal.

63

Leitura de mundo.

Leitura poética.

Leitura do olhar.

Para concluir esse capítulo cito um fragmento do poema de Li Tai Pó,

“Improviso” fazendo um paralelo com a poesia:

...se não posso

vê-la......... (a poesia)

nos píncaros

de jade

sob a lua

ei-la

no pavilhão

de jaspe.

(Apud, POUND, 1995, p. 45).

Neste primeiro capítulo discorri sobre alguns conceitos de poesia e lin-

guagem, bem como a arte que a poesia contém. Em se tratando do olhar é

preciso lutar com as palavras e enxergá-las. Abrir os horizontes e ampliá-los: a

poesia que renova os signos, as maneiras de sentir e exprimir a sensibilidade...

Como dizia Paz: “A poesia vive nas mais profundas camadas do ser”. (PAZ,

1982, p. 21). Precisamos mudar nossas mentes, precisamos mudar nossas

vidas, mais isso ocorrerá quanto tivermos: um novo olhar... Um novo olhar so-

bre a poesia.

64

Capitulo II

LEITURA E EDUCAÇÃO

“A leitura é um exercício de generosidade. E aquilo que o escritor

pede ao leitor não é aplicação de uma liberdade abstrata, mas a do-

ação de toda a sua pessoa com suas paixões, simpatias e escala de

valores”.

Sartre

“A poesia educa enquanto poesia. Para trazer vida e poesia pa-

ra a educação, é preciso trazer também a educação para a vida

e para a poesia”.

Severino Antônio

65

Canção Óbvia

Escolhi a sombra desta árvore para

repousar do muito que farei,

enquanto esperarei por ti.

Quem espera na pura espera

vive um tempo de espera vã.

Por isto, enquanto te espero

trabalharei os campos e

conversarei com os homens

Suarei meu corpo, que o sol queimará;

minhas mãos ficarão calejadas;

meus pés aprenderão o mistério dos caminhos;

meus ouvidos ouvirão mais,

meus olhos verão o que antes não viam,

enquanto esperarei por ti.

Estarei preparando a tua chegada

como o jardineiro prepara o jardim

para a rosa que se abrirá na primavera.

Paulo Freire

66

2.1 EDUCAÇÃO:

LEITURA, DIÁLOGO, ENCONTRO

“Se eu transmitir a paixão pelo saber, pelo ler, terei mais que

um aluno, um discípulo: a deslanchar sua capacidade criativa

e atingir o estágio real de ser humano”.

Paulo Venturelli

"A educação é o processo pelo qual o indivíduo desenvolve a

condição humana, com todos os seus poderes funcionando

com harmonia e completa em relação à natureza e à sociedade.

Implica tanto a evolução individual quanto a universal".

Friedrich Froebel

"Não se pode falar de educação sem amor".

Paulo Freire

Para educarmos pessoas é preciso a reunião dos saberes que cons-

truímos durante a vida. Espero que com esse trabalho de leitura e educação

possa contribuir com a formação e religação desses saberes. Após discorrer

sobre poesia e linguagem no primeiro capítulo, para fundamentar a pesquisa,

neste capítulo, faço algumas considerações sobre educação e práticas de lei-

tura no seu sentido polissêmico.

Faço uma ressalva aos leitores: após muitos anos trabalhando com

Educação de jovens e adultos, não poderia deixar de mencionar Paulo Freire,

67

que muito contribuiu para o crescimento da minha experiência e vivência como

educadora.

Para Paulo Freire, educar é construir, é libertar o homem do determi-

nismo, passando a reconhecer o papel da História, a questão da identidade

cultural, tanto em sua dimensão individual, como em relação à classe dos edu-

candos. Isso é essencial à prática pedagógica. Sem respeitar essa identidade,

sem autonomia, sem levar em conta as experiências vividas, não haverá signi-

ficação real no processo educativo.

A educação modela as almas e recria corações, ela é a chave das

mudanças sociais, é ideológica, mas dialogante, pois só assim pode se estabe-

lecer a verdadeira comunicação da aprendizagem.

Não há educação fora das sociedades humanas e não há ho-

mem no vazio. Existir humanamente é pronunciar o mundo e

modificá-lo através da palavra e da ação-reflexão. A palavra se

converte em ativismo. O diálogo é o encontro dos homens. O

diálogo se impõe e ganha significado. O diálogo verdadeiro é o

pensar verdadeiro. Sem diálogo não há educação. Pensar a

educação é pensar o homem, é concebê-lo em seus aspectos

biológicos mas também culturais. Pensar a educação do ho-

mem é não ignorar as circunstâncias do homem ao qual nos re-

ferimos. A educação é a própria existência humana em sua

busca de perpetuação ou de mudança. (FREIRE, 1980, p. 33).

Assim dizia Paulo Freire ao se referir à função libertadora do conheci-

mento e sua importância para a construção de novos olhares sobre a educa-

ção. A palavra, como pronúncia do mundo, não será um dizer no vazio.

Sendo um encontro, não há lugar para quem queira dizer a palavra sozi-

nho. O "dizer a palavra", em Freire, não é modalidade passiva, ela é a própria

68

existência que, sendo humana, não pode ser muda, nem desvinculada de uma

práxis. “Existir, humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo. O mundo

pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes,

a exigir deles novo pronunciar” (FREIRE, 1980, p. 92).

A educação assume o aspecto de encontro entre homens. Nela, a hierar-

quia de "um que sabe" frente ao "que não sabe" deixa de existir. Isso porque

numa educação que se incompatibiliza com os processos de dominação e de

alienação, o ato de conhecer não pode se reduzir ao depósito de idéias de uma

linguagem.

Através do diálogo, dá-se o encontro dos homens, desses que não

se esgotam na relação eu-tu, porque são expressão de uma realida-

de de mundo mais ampla. A conquista implícita no diálogo, é a do

mundo pelos sujeitos dialógicos, não a de um pelo outro. Conquista

do mundo para a libertação dos homens (FREIRE, 1980, p. 93).

A educação deixa de localizar-se num patamar acima da realidade hu-

mana, mas se reconhece como diálogo que se estabelece não somente entre

pessoas, mas também entre realidades locais, e as vinculações destas com

um universo mais global. A educação, tal como definida por Freire, por tudo

que a compõe, precisa ser estruturada na interdisciplinaridade. “Uma visão da

educação é na intimidade das consciências, movida pela bondade dos cora-

ções que o mundo refaz” (FREIRE, 1982, p. 97).

Pensando no homem como um ser social, de palavras, porém único, que

está vinculado a um universo global, me remeto aqui a considerações do filóso-

fo Edgar Morin:

69

Um dos principais objetivos da educação é ensinar valores. E es-

ses são incorporados pela criança desde muito cedo. É preciso

mostrar a ela como compreender a si mesma para que possa

compreender os outros e a humanidade em geral. Os jovens têm

de conhecer as particularidades do ser humano e o papel dele na

era planetária que vivemos. Por isso a educação ainda não está

fazendo sua parte. O sistema educativo não incorpora essas dis-

cussões e, pior, fragmenta a realidade, simplifica o complexo, se-

para o que é inseparável, ignora a multiplicidade e a diversidade.

As disciplinas como estão estruturadas só servem para isolar os

objetos do seu meio e isolar partes de um todo. Eliminam a de-

sordem e as contradições existentes, para dar uma falsa sensa-

ção de arrumação. A educação deveria romper com isso mos-

trando as correlações entre os saberes, a complexidade da vida e

dos problemas que hoje existem. Caso contrário, será sempre i-

neficiente e insuficiente para os cidadãos do futuro. É a investiga-

ção e a pluralidade de possíveis caminhos que tornam o assunto

interessante. Podemos ir pelo social — somos indivíduos, perten-

centes a determinadas famílias, que estão em uma certa socie-

dade, dentro de um mundo que tem passado, história. (MORIN,

2000, p. 94)

A educação, ponto de encontro de áreas do saber, deveria se aproximar

do homem para compreendê-lo melhor, pois além de estudá-lo, tem de lidar com

ele e ajudá-lo a realizar-se como ser humano.

O desejo de compreender a realidade com mais lucidez e com

mais sensibilidade revela-se, assim, como possibilidade de

escolher a vida a se fazer. Educar é muito mais do que transmis-

são de conhecimentos: educar é desenvolver possibilidades

humanas. (SEVERINO ANTÔNIO, 2002, p. 54)

70

Educar é humanizar, reconhecer o homem como um sujeito-cidadão,

que tem voz e identidade. Dentro de uma concepção educativa, podemos pen-

sar na leitura como conhecimento e atividade que potencializa as capacidades

humanas, mas necessita ser desenvolvida em cada ser. Por um lado, respeitá-

lo como um ser único, com autonomia e identidade; e, de outro, ter a compre-

ensão de que isso não ocorre fora de uma sociedade.

Morin considera que a literatura e as artes deveriam ter mais destaque

no ensino, que elas poderiam se constituir em eixos transdisciplinares. “Toda

grande obra de literatura tem a sua dimensão histórica, psicológica, social, filo-

sófica e cada um desses aspectos traz esclarecimentos e informações impor-

tantes para o leitor”. (MORIN, 2000, p. 92).

É importante ressaltar a necessidade de promover a expansão do saber

através da leitura, porém, é imprescindível que ocorra uma organização multi,

inter e transdiciplinar, mediada pela inteligência geral da mente. Fazer nascer a

sabedoria trazê-la à luz é um desafio aos educadores, em especial aos de lín-

guas e literatura, pois a globalização em seu aspecto criativo torna possível

uma biblioteca universal sem muros.

Freire fala da importância do diálogo, da leitura do mundo, antes da leitu-

ra da palavra, da educação como prática libertária, o respeito e a identidade,

além da autonomia dos sujeitos e da educação inexistente fora das socieda-

des. Morin fala sobre a religação dos saberes, de valores adquiridos antes da

educação formal, as particularidades do ser humano e o papel dele na socie-

dade.

A educação na leitura deve ir além e conseguir que os leitores fruam

contos, narrações, histórias, principalmente os poemas: ler é uma atividade

71

privilegiada, uma das atividades mais completas, formativas e prazerosas à

qual podemos dedicar nosso tempo. A leitura pode ampliar nossos conheci-

mentos, transportar-nos a outros mundos, conhecer outras pessoas e viver a-

venturas apaixonantes em diferentes situações. A leitura tem um enorme poder

de fascínio, é uma paixão solitária e solidária.

A leitura é uma forma de ampliar perspectivas, uma atividade que deve

ser cuidada e valorizada por todos. O contexto familiar parece ser o núcleo ini-

cial mais poderoso para esse desenvolvimento literário que deve se consolidar

como forma de educar, mas deve se apoiar no afeto, na empatia e na reflexão,

mas também imprescindível o convívio comunitário. Assim como a pesquisa-

ação desenvolvida dentro da comunidade dos bairros: Jardim Thelja e Jardim

Alvorada.

72

Ler é uma das experiências mais radiosas da vida, pois, como

leitores descobrimos nossos próprios pensamentos e nossa

própria fala graças ao pensamento e a fala de outro. Ler é sus-

pender a passagem do tempo: para o leitor, os escritores pas-

sados se tornam presentes, os escritores presentes dialogam

com o passado e anunciam o futuro. O livro abre novos mun-

dos, idéias e sentimentos novos, descoberta sobre nós mes-

mos, os outros e a realidade.

Marilena Chauí

Educar é um trabalho que consiste em trazer à tona a natureza

divina oculta no ser humano e acreditar firmemente na sua ca-

pacidade. A educação deve ter como base a fé no ser humano

e a postura mental de contemplar algo sublime, invisível aos

olhos físicos.

Seicho Taniguchi

73

2.2 - O ATO DE LER

“O ato de ler é um ato da sensibilidade e da inteligência, de

compreensão e de comunhão com o mundo”.

Eliana Yunes

“A construção de uma relação proveitosa e duradoura

com os livros começa antes da alfabetização e deve

incluir diversão e exemplos positivos”.

Paulo Hebmuller

“Sem a cultura, e a liberdade relativa que ela pressupõe,

a sociedade, por mais perfeita que seja, não passa de

uma selva. É por isso que toda a criação autêntica

é um dom para o futuro”.

Albert Camus

Ler é descortinar, ampliar horizontes, expressar o universo individual

em interação com os outros, é prática, fundamento da existência, vivenciar ou-

tros saberes, dissipar as trevas da mente, transmitir paixão através de novas

perspectivas, receber mensagens através da musicalidade, dos símbolos e dos

signos.

O que configura a humanidade é o fato de sermos sujeito-

sociais, cidadãos ativos na história, mergulhado de valores, de

desejos, de sonhos, possuidores e produtores de linguagem.

Construtor coletivo que produz a história como sujeito social

da linguagem. (KRAMER, 1993, p. 35).

O mundo em que vivemos é o mundo das leituras, das palavras,

do texto e do contexto, que aumentam a capacidade de percepção, compreen-

74

são e aprendizagem. A leitura do mundo é fundamental na rica experiência de

compreensão do mundo imediato. “Ao ser introduzido na leitura da palavra, à

decifração da mesma fluía naturalmente da leitura do meu mundo particular”.

(FREIRE, 1982, p. 11).

A compreensão crítica da importância do ato de ler, através da práti-

ca revela uma visão da palavra cuja visão precisa ser superada com urgência.

Paulo Freire considera que a leitura do mundo em particular é

absolutamente significativa, porque é recriar e reviver uma experiência vivida

no momento em que a pessoa ainda não podia ler a palavra. “É preciso ler o

mundo para ler a palavra.” (FREIRE, 1982, p. 23).

Ao realizarmos a leitura do mundo adquirimos subsídios para a leitu-

ra da palavra. Paulo Freire considera imprescindível que o mundo seja lido pa-

ra que se possa fazer a leitura da palavra. “A leitura do mundo me foi sempre

fundamental à importância ao ato de ler”. (FREIRE, 1982, p. 28).

A leitura é decorrente do conjunto de conhecimentos e informações a

qual constitui uma determinada forma de ver o mundo. Existem muitas concep-

ções de leitura cuja dinâmica envolve componentes sensoriais, emocionais e

racionais:

A leitura sensorial: é uma leitura inicial, quando o leitor despertará

com letras, cores, ilustrações, quando a história é contada (a ento-

nação de voz, a musicalidade) desperta a imaginação e o lúdico do

leitor, onde este cria suas fantasias.

A leitura emocional: o contato do leitor desse nível em contato

com a leitura é dominado por seus sentimentos. A emoção ressalta

a necessidade do ser humano de fugir da realidade em que vive

nesse nível a emoção é mais forte que a razão.

A leitura racional: Nessa leitura o que fala mais alto é o intelecto,

não separada, porém da leitura sensorial e emocional que farão

75

com que o leitor tenha uma visão mais ampla do conhecimento e já

é capaz de captar a essência do texto. (BRITO, 2004, p. 53-54).

A leitura não pode ser confundida com a reprodução de informações,

ao ato de ler devem ser atribuídos significados e, nesse sentido em contato

com o texto o leitor deixa aflorar seu conhecimento de mundo, interesses e o-

piniões.

A ativação do conhecimento prévio é então essencial à compre-

ensão, pois o conhecimento que o leitor tem sobre o assunto é

que lhe permite fazer inferências necessárias para relacionar dife-

rentes partes do texto num mundo coerente. Esse tipo de inferên-

cia, que se dá como decorrência do conhecimento de mundo e

que é motivado pelos itens lexicais no texto é um processo in-

consciente do leitor proficiente. (KLEIMAN, 1997, p. 37).

Ler é uma experiência individual, interpessoal e dialógica, individual

porque significa um processo particular de processamento de informações de

um texto. Mas os sentidos não se encontram no texto ou no leitor, exclusiva-

mente, mas sim, entre ambos, tornando assim a leitura dialógica.

Cada leitor aciona seu universo de conhecimentos no ato da leitura, o

que possibilita uma análise mais profunda dentro desse processo. Quando se

fala em leitura, o que vem à mente em primeiro lugar é a decodificação da lin-

guagem escrita, porém o conceito vai muito além dessa visão. “Aprender a ler

significa aprender a ler o mundo, dar sentido a ele e a nós próprios”. (MAR-

TINS, 1985, p. 22).

A leitura deve ir além de gostos e hábitos, pois através dela temos

uma melhor compressão de mundo e de nós mesmos. Através da leitura pode-

se alcançar esferas nunca experimentadas, abrem-se as portas do imaginário e

76

viaja-se para outras dimensões. As portas se abrem para explorar um universo

até então desconhecido, muito embora, como Paz ressalta em “O Arco e a Li-

ra”, o leitor é um co-criador da obra: “Cada leitor procura algo que já trazia

dentro de si. Quando alguém encontra sua palavra, reconhece-a: já estava ne-

le”. (PAZ, 1982, p. 19).

Ler é: interagir, interpretar, compreender. A leitura dá condições de optar

e decidir sobre o universo que nos toca. Ler é dar contexto a todos os textos.

Quem lê pensa, adquire forma própria de pensar e não aceita a interpretação

oficial de tudo. Quem lê desestrutura universos dos padrões convencionais e

reorganiza o mundo através da palavra. A leitura é para a vida uma maneira de

se encontrar e ampliar perspectivas, principalmente para aqueles que moram

longe do conhecimento.

A leitura não resolve os problemas sociais, mas transforma-se em

conhecimento: quem está informado faz melhor escolha. Leitura é fruição, tra-

balho, método, pesquisa, busca de informações: aprendizado. A leitura via-

ja sem desprender-se da raiz. O ato de ler acaba provocando a memória do

leitor e nela seus sonhos. “Lemos para compreender, ou para começar a com-

preender. Não podemos deixar de ler. Ler é quase como respirar”. (MANGUEL,

2000, p. 95). Se considerarmos que a leitura do mundo é necessária para ou-

tros processos do conhecimento, poderíamos afirmar que ler o mundo é prati-

camente respirar...

A experiência do ato de ler convoca ao exercício de pensar e neste

raciocínio de se encontrar. “É sempre ir além de si, para romper os muros tem-

porais para ser outro”. (PAZ, 1982, p. 30).

77

Quem lê tende a se expressar cada vez melhor e com mais identida-

de. Isso sem contar o papel emancipador da leitura, principalmente, para ca-

madas sociais historicamente privadas ou com poucas possibilidades de leitu-

ra.

A leitura é uma experiência de sentidos e significados: um jogo entre

o leitor e o texto. “A leitura acontece num cosmo impalpável, além da órbita

terrestre num não-lugar”. (PERROTTI, 2000, p. 37).

O leitor necessita de desafios, deve ler novidades e gêneros textuais

diversos; os livros devem ser inseridos conforme a progressão do seu contexto

de leitura. A paixão pelos livros transforma as palavras, tornando-as cheias de

significados.

A redescoberta dessa paixão traz o entendimento de que a vida pre-

cisa ser lida como um livro que se abre nos vários sentidos de suas páginas.

“As obras literárias convidam à liberdade de interpretação porque propõe um

discurso com muitos planos de leitura, defrontando-nos com a ambigüidade da

linguagem”. (ECO, 2001, p. 29).

Parafraseando Paulo Freire a leitura da palavra é precedida pela lei-

tura do mundo. Através da leitura do mundo é possível ter palavras para rees-

crevê-lo e transformá-lo.

78

O homem constrói casas porque está vivo, mas escreve livros porque é

mortal. Vive em sociedade porque é gregário, mas lê porque se sente só. A

leitura constitui para ele uma companhia que não ocupa lugar de nenhuma ou-

tra, mas que nenhuma outra poderia substituir. Não lhe oferece nenhuma expli-

cação definitiva acerca de seu destino, mas tece uma apertada rede de coni-

vências entre a vida e ele. Ínfimas e secretas conivências que falam da para-

doxal alegria de viver, mesmo quando referem o trágico absurdo da vida. Por

isso as razões que temos para ler são tão estranhas como as que temos para

viver.

Daniel Pennac

79

2.3 LEITURA: MUITAS FORMAS DE LINGUAGEM

“Ler é saber trocar, dialogar, exercitar o discernimento, ampliar

a percepção. Ler bons livros é capacitar-se para a vida”.

Rita Foelker.

“Os limites da minha linguagem denotam os limites do meu

mundo”.

Ludwig Wittgenstein “Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”.

Cora Coralina

A linguagem está sempre presente na vida do ser humano: verbal,

não verbal, através de símbolos, representações, seja no nosso mundo atual

ou em qualquer outro passado. “O homem é um ser que se criou ao criar uma

linguagem”. (PAZ, 1982, p. 43).

Vivemos em sociedade em que as trocas sociais e culturais ocorrem

rapidamente. A linguagem sempre presente em nossas vidas é uma ferramenta

utilizada para sobreviver. A linguagem não é um produto, é criação, constru-

ção ativa dos sujeitos. “Toda a recusa de uma linguagem é uma morte”. (BAR-

THES, 1989, p. 57).

Através da leitura testamos nossos próprios valores e experiências.

Os livros partilham sentimentos que nos ajudam a sonhar. A leitura desenvolve

nossa capacidade criadora e além de educativa é estimulante.

Várias perspectivas e áreas de investigação lingüística e literá-

ria apontam o estudo da formação do leitor como sendo uma

80

das experiências fundamentais para se compreender as rela-

ções do ser humano com seus pares e para se entender o

processo de inclusão do ser humano na sociedade. (YUNES,

2002, p. 63).

A leitura é um evento social que envolve o leitor, seus instintos e e-

moções. A diversidade e complexidade da leitura fazem dela uma atividade

rítmica e dinâmica. Existem muitas formas de leitura dentro da linguagem, pois

cada leitor tem a sua abordagem individual...Mas como formar leitores num

país de poucos leitores? Como incentivar os sujeitos-sociais para uma educa-

ção que busque incentivar o domínio da escrita e da leitura em um nível razoá-

vel? Essa é uma questão para repensar a leitura e a linguagem como chave

para uma educação mais democrática.

É uma questão que envolve a formação do ser humano como sujeito-

cidadão, sujeito-leitor e cidadão-social: o processo de formação do leitor dentro

de um contexto social, em que possa desenvolver além de habilidades lingüís-

ticas uma consciência literária. Sartre dizia que “estabelecer um pacto com o

leitor é uma forma de transformar o mundo à sua realidade. Uma tentativa de

recriar uma realidade que modifique as estruturas da nossa sociedade”. (SAR-

TRE, 1987, p. 123).

Valorizar a cultura a partir do estímulo à leitura é um instrumento fun-

damental para o desenvolvimento humano e pessoal. O prazer pela leitura vem

da liberdade que ela sugere. Ler é um processo cuja condição primordial é a

própria prática da leitura em que, é necessário ir e voltar no texto, interiorizá-los

para que a leitura realmente faça parte de nós.

O leitor vai em busca da criação com o objetivo de analisar os e-

nunciados da fala, contida na leitura, porque é nela que estão embutidas ex-

81

pressões verbais e extra-verbais. Já na atividade discursiva não se aprende

uma língua para dela se apropriar, mas para usá-la e em usando apreendê-la.

“O ser humano produz duas linguagens a partir de sua língua: uma racional,

empírica, pratica e técnica; outra simbólica, mítica, mágica”. (MORIN, 2001, p.

13).

Estudos indicam que o analfabetismo é um fenômeno que está

presente com maior predominância não só nas regiões mais po-

bres do país, como também na periferia dos grandes centros ur-

banos. Esses fatos apontam para a necessidade de as políticas

de combate ao analfabetismo levarem em conta os diferentes

perfis dos segmentos que se encontram nessa situação. Na a-

doção das diferentes concepções de linguagem e leitura, na prá-

tica o ensino formal obedece a uma seqüência de conteúdos a-

ditivos: ensina-se a juntar sílabas, letras, para formar as pala-

vras; juntar palavras para formar frases e juntar frases para for-

mar textos. (ALMEIDA, 2000, p. 34).

As crianças, ao adquirirem linguagem, se detêm no uso da sintaxe na

significação. A ênfase no ensino de vocábulos, assim como a simplificação e o

controle no uso das estruturas sintáticas, parece ter como objetivo facilitar a

aquisição da língua. Mas o ato de educar para a leitura é muito mais complexo,

se pensarmos na leitura integral com todas as significações.

O conhecimento tem um caráter dialógico. É acontecimento e

encontro. A centralidade está colocada, pois na linguagem, é

nela que se resolve a dicotomia entre sujeito e objeto. A lingua-

gem é mais que um processo de construção: a língua é material

e instrumento de si mesma. (BAKHTIN, 1992, p. 83).

82

Paulo Freire quando fala sobre a leitura de mundo, reconhece que

numa concepção discursiva a criança dispõe de um saber sobre a escrita antes

de entrar na escola. “Esse saber foi construído na sua particular leitura de

mundo associado a práticas sociais em que a escrita ganha sentido”. (FREIRE,

1988, p. 80). Nessa perspectiva a língua é concebida como um sistema históri-

co e social de signos que possibilitam o sujeito significar o mundo e a realida-

de. “Apreendê-la é aprender não só as palavras, mas também seus significa-

dos culturais”. (PCN, 1997, p. 18).

O caráter histórico da linguagem está firmado sobre uma infinidade

de significados. As línguas que se constituíram ao longo da história têm multi-

plicidade de significações. A leitura expressiva das palavras ressalta as cono-

tações que as penetram e chega-se por esta via ao limiar da expressão que

supõem movimentos. Inseparável do fluxo de comunicação verbal, a língua não

é transmitida, mas penetrada. “Só a corrente da comunicação verbal fornece à

palavra a luz da sua significação”. (BAKHTIN, 1992, p. 138).

Para a formação do leitor considerando que poderá adquirir habilida-

des no sentido de letramento polissêmico, pode-se dizer que a leitura, princi-

palmente a poética, que é rica em símbolos, estilística, figuras e analogias, po-

dem proporcionar ao leitor de forma lúdica, práticas do ato de ler.

Uma boa relação com os livros desenvolve a fluência e a rapidez, o

reconhecimento da leitura de mundo e a percepção de outras formas de lin-

guagem além de, ler e reconhecer as palavras globalmente.

Existem muitos caminhos sugeridos para formação do leitor. Ressal-

tando, porém que para se formar como leitor é preciso querer ser leitor. Não só

ter o hábito da leitura, mas gostar de ler. Aprende se a ler... Lendo, ouvindo,

83

prestando atenção nas expressões, verbais e não-verbais das leituras que o

mundo proporciona. Crianças que tiveram um bom letramento, ou referencial

de leitura durante a infância, desenvolveram–se melhor como leitoras. É impor-

tante valorizar a capacidade de ler por si mesmo, utilizar a leitura como desafio.

“Ler como jogo. Ler como travessia. Amorosamente e criadoramente”. (SEVE-

RINO ANTONIO, 2002, p. 45).

Daí a necessidade de construir um projeto de pesquisa-ação que ve-

nha atender às necessidades dos sujeitos-sociais para suprir carências em lei-

tura, com a perspectiva de construir uma educação para a cidadania. Lem-

brando que essa proposta não tem a pretensão de tornar os sujeitos em escri-

tores, poetas, ou críticos literários, mas se forem, tanto melhor.

O objetivo é levar principalmente para crianças, jovens e adolescen-

tes em comunidades em situações de risco, nossos futuros sujeitos-leitores, a

leitura dentro de uma prática consciente, porém lúdica. É uma proposta para

organizar as idéias e expressá-las através das várias leituras que fazem. Uma

literatura para expressar sentimentos e consequentemente educando-as para a

leitura, também educá-las para a vida.

84

Canção amiga

Eu preparo uma canção

em que minha mãe se reconheça,

todas as mães se reconheçam,

e que fale como dois olhos.

Caminho por uma rua

que passa em muitos países.

Se não me vêem, eu vejo

e saúdo velhos amigos.

Eu distribuo um segredo

como quem ama ou sorri.

No jeito mais natural

dois carinhos se procuram.

Minha vida, nossas vidas

formam um só diamante.

Aprendi novas palavras

e tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção

que faça acordar os homens

e adormecer as crianças.

Carlos Drummond de Andrade

85

2.4 LEITURA POÉTICA PARA PEQUENOS LEITORES

“A leitura para os pequenos leitores ocupa um lugar muito definido e ao mesmo tempo muito amplo”

Isabel Sole Gallart.

“A literatura é fundamental para a formação da criança”.

Ler é contar histórias é uma forma de desenvolver o

gosto pela fantasia, incentivando aspectos que dizem

respeito ao seu potencial criativo”.

Itália Maria Falceta da Silveira

O que existe no mundo da criança? Existe aquilo com que ela convi-

ve todos os dias e com isso faz a leitura do seu mundo particular. Cada criança

é um universo. Porém, tudo o que ela já fez, já descobriu, intuiu ou percebeu,

participa de seu modelo de ver o mundo e de aprender. Não saberemos que

conceitos e informações podem despertá-las totalmente, mas pode-se criar um

mundo propício com o melhor tipo de informação e também com os melhores

exemplos possíveis.

Quando nos voltamos para o mundo dos livros, é preciso observar

que a convivência com o ato de ler é que estimula os hábitos e os valores da

leitura. Surgindo com isso a magia de ler e conseqüentemente o conhecimento.

Conhecer para libertar-se das verdades absolutas e das regras do mundo adul-

to.

A comunicação verbal aparece desde o segundo ano de vida da cri-

ança, unida a uma série de condutas relacionadas com a função se-

86

miótica: a imitação, o jogo simbólico, o desenho. Nessa idade os lei-

tores apreciam histórias curtas, simples e claras, que tenham alguma

referência a seu cotidiano. (FRAGOSO, 1988, p. 44).

A atividade narrativa é a base primordial da animação e fruição da

leitura na primeira idade porque é o primeiro contato da criança com o feito lite-

rário. Sem esquecer que a linguagem natural da criança é uma linguagem total:

o afetivo e o cognitivo estão plenamente unidos. “Imaginar uma linguagem é

imaginar uma forma de vida”. Wittgenstein (Apud, NETO, 2003, p. 30).

O mundo dos livros é o mundo da comunicação e da linguagem em

seu sentido mais amplo, o prazer de ler estimula o prazer pela escrita. O amor

pelos livros pode acontecer desde a mais tenra infância em que é possível de-

senvolver uma relação prazerosa com a leitura.

A criança se familiariza com livro desde os primeiros meses de vida,

desde que possa ter esse contato. Mas há crianças que não têm sequer um

brinquedo, quanto mais um livro, e esse, é o caso de muitas crianças brasilei-

ras. Aí a importância de se pensar em encontros e espaços para que as crian-

ças cujas famílias são desprovidas de recursos possam ter a mesmas condi-

ções de leitura, que proporcione a possibilidade de ler e brincar e lendo, ter o

livro como seu brinquedo.

Para que a dinamização da leitura seja eficaz na formação de leito-

res é necessário que haja um ambiente, que de certa forma estimule os peque-

nos aprendizes. As bibliotecas e salas de leituras, por exemplo, têm uma fun-

ção sócio-educativa, e nesse ambiente a realidade pode tornar-se ficção e, a

ficção, realidade.

87

“Temos deixado de ver e ouvir para somente entender”. (PAZ, 1982,

p. 53). O que torna um conto ou um poema encantador é a paixão em todos os

leitores num mundo de sentimentos. Onde há sentimentos, não há preconceito.

Onde não há preconceito, não existe discriminação.

Um novo olhar sobre a poesia é um novo olhar sobre a leitura, sobre

o mundo, porque além da leitura dos livros há muitos mundos para serem lidos

e descobertos. Um novo olhar sobre a poética é um novo olhar sobre a vida... A

vida daquelas pessoas que não têm ou não tiveram a oportunidade de acesso

a livros ou práticas de leitura. Para se tornar um leitor poético é necessário atri-

buir sentido à leitura, trata-se, porém de um processo prolongado, mas é um

processo que se inicia em um momento que não terminará jamais.

A leitura não pode ser imposta, tem que ocorrer de forma natural e ao

mesmo tempo disciplinada. Tem que ser de acordo com o entendimento da

criança, envolvendo o mundo dela. Se a voz for acalentadora e a fala cheia de

ilustrações, uma vez contada a história pode-se reproduzi-la de mil maneiras

sem fugir do contexto original, fazendo usos de alegorias e novas expressões.

“A entoação desvela os movimentos da alma que estão trabalhando a frase a

procura de palavras. O ritmo e a entoação são formas de movimento acentual

ou ondulatório da fala”. (BOSI, 2002, p. 87).

Ler para os filhos antes de dormir estimula a curiosidade, solta a ima-

ginação e cria neles o hábito da leitura. Os ambientes escola e lar sem livros e

sem alguém como modelo de inspiração à leitura pode dificultar o ato de ler.

Aparentemente, os professores e os pais são as figuras que mais influenciam

no gosto pela leitura. As crianças que nunca viram seus pais com um livro,

falando sobre seus interesses literários são inibidas para tornarem-se bons

88

leitores. A presença de livros em casa ou o incentivo dos pais são fatores que

podem influenciar o desenvolvimento do gosto pela leitura. Em contraposição

há casos de pais que têm o hábito de ler e o mesmo não acontece com seus

filhos. “A leitura não só desperta na criança o gosto pelos bons livros e pelo ato

de ler, como, também, contribui para desenvolver suas potencialidades, ampliar

seus horizontes e progredir”. (FREITAS, 1986, p. 26).

Embora a família tenha um importante papel no estímulo a leitura, não se

pode desviar o foco da sala de aula que, através de práticas educativas, praze-

rosas e lúdicas colocam frente a frente o leitor e a leitura. É preciso considerar

que muitas comunidades e escolas são desprovidas de recursos porém, onde

não há provimentos, pode-se realizar de forma criadora uma ponte entre as

crianças e a leitura. Através de canções, narrações de histórias, declamações...

Mas os pais que têm condições de ter um livro deveriam reservar

todos os dias um tempo para ler com os filhos, porque além de prazeroso é

uma forma de aprender.

Acredito que a vida de um livro enquanto está nas mãos do autor

não é mais importante do que quando está nas mãos do leitor. O

leitor é quase sempre um autor ele próprio. É ele que dá signifi-

cado às palavras. Tudo o que um leitor leia num livro é legítimo

porque nessa fase o leitor é tudo, é ele que faz o livro. (PEIXO-

TO, 2003, p. 29).

Na minha experiência como mãe, meu filho de quatro anos pede que eu

leia para ele. Para ficar divertido, mudo a entonação da voz procurando não

utilizar palavras complexas, que ainda não fazem parte do vocabulário dele.

Percebo que ele gosta da musicalidade, da voz e das palavras.

89

É um exemplo de que o amor pelos livros pode ser desenvolvido

desde a mais tenra infância. Embora é preciso ressaltar que alguns teóricos da

literatura para os pequenos afirmam que deve-se ler para crianças não apenas

livros infantis. Os pequenos leitores podem ter acesso a muitas leituras.

Magda Soares menciona em sua obra:” Letramento: um tema em três

gêneros” que:

Ler é um conjunto de habilidades e comportamentos que se es-

tendem desde simplesmente decodificar sílabas ou palavras até

ler Grande Sertão Veredas de Guimarães Rosa... Uma pessoa

pode ser capaz de ler um bilhete, ou uma história em quadrinhos,

e não ser capaz de ler um romance, um editorial... (SOARES,

2003, p. 48).

Rubem Alves romanticamente menciona que: “as crianças têm olhos

encantados, os mundos das crianças são imensos! Sua sede não se mata be-

bendo a água de um mesmo ribeirão! Querem água de rios, lagos, lagoas, fon-

tes, minas, chuva”... (ALVES, 2001, p. 16).

Ou seja, diferentes gêneros podem ser utilizados no ato de ler, porém o pe-

queno leitor deve ser atendido de forma lúdica e afetiva. É preciso ler com pai-

xão, ensinar com paixão e impedir que o medo das alienações esmague o a-

mor pela leitura. Sem paixão nada se move, principalmente quando nos referi-

mos à leitura e à poética e aos pequenos leitores.

Não existe fórmula mágica para fazer uma criança apreciar a leitura, ser

um bom leitor e um bom ouvinte. A base da primeira infância é a família e dela

virá o primeiro referencial. Se uma criança convive num ambiente com livros, e

observa sempre que seus pais, irmãos e outras pessoas a seu redor convivem

com a leitura, ela certamente achará natural a convivência com os livros. Em

90

contraposição, existem crianças que não têm acesso a livros e crescem gos-

tando de ler. Isso é perfeitamente plausível. Tomo minha infância como exem-

plo: eu e meus irmãos tínhamos hábitos de ler histórias em quadrinhos já que

não tínhamos acesso a outras leituras.

Outro fato marcante, como referencial de leitura, na minha primeira

infância praticamente sem livros, foram as rodas de histórias. Meu avô sentava

conosco e fazia muitas narrativas. Lembro-me que era pequena, mas ficava

acordada até tarde para ouvir as histórias que ele contava, repletas de ilustra-

ções. As crianças são diferentes e têm especificidades não só por pertencerem

a determinadas classes sociais ou por estarem em momentos diversos em ter-

mos de desenvolvimento psicológico.

No campo da intuição alegórica existe um abismo permanente

que quebra o movimento dialético e torna imagem ambígua, po-

lissêmica, desprendida do todo, como um fragmento. Para a a-

legoria conhecer as coisas é preciso desmascará-las. (KRA-

MER, 1993, p. 26).

O adulto deve acompanhar a leitura da criança selecionando livros

em função de suas necessidades, perspectivas e afetividades. Aprende-se a ler

vendo outras pessoas lerem, ou contando histórias, aprende-se a ler... Lendo.

Um Contexto para o uso funcional da leitura implica em realizar

atividades que fomentem o prazer de ler - como ler para as cri-

anças e que permitam experimentar o poder da leitura para

transportar a outros mundos, reais ou imaginários. (GALLART,

2002, p. 35).

91

Mas para que haja incentivo de sua mente criadora, o exemplo é cer-

tamente a melhor forma de estimular, no sentido de orientá-la para ser uma

boa leitora. Atitudes simples tornam-se compromissos indispensáveis: estimu-

lar a curiosidade, brincar, fazer coisas do dia a dia juntos. Ensinar canções (a-

quelas canções antigas da nossa infância...), ou contar estórias... Aquelas que

nossos avôs contavam.

Muitas vezes faltam condições para que a criança produza e não a-

penas reproduza a escrita para ser autora. Sendo autora a criança interage

com a língua. Sendo ouvida pelos outros se identifica e cresce no seu aprendi-

zado. “É na atividade criativa que a criança constrói formas de ver o mundo”.

(www.crmariocovas.sp.gov.br/2007).

No mundo infantil a leitura poética é um jogo com muitos significados,

de recriação semântica e sonora. Para reconhecê-la e interpretá-la é necessá-

rio entrar em contato com a estilística. Na prática, como despertar na criança o

prazer pela leitura da poesia? Tanto o desenvolvimento da personalidade e da

sensibilidade quanto a expansão real pela poesia se dão por meio da fantasia e

de sua percepção particular com o mundo. “A literatura é um autêntico e com-

plexo exercício de vida que se realiza com e na linguagem”. (COELHO, 2000,

p. 35).

Abrir um livro de poemas e começar a ler com freqüência para a cri-

ança pode ser uma prazerosa forma de trabalhar a poesia tanto em casa como

em sala de aula. A porta talvez se abra para um caminho que leva a partilhar

da beleza poética. O prazer pela leitura, principalmente a poética faz viajar na

fantasia das imagens. A criança vive a poesia através das invenções, rimas e

brincadeiras. É preciso viver a poesia que existe no mundo. O mundo está den-

92

tro de cada ser, e cada ser possui dentro de si um mundo a ser despertado

pela poesia. Quando lemos dentro de nós, conseguimos realizar a leitura ex-

terna. Parafraseando Paulo Freire, primeiramente deve-se ler o mundo. Nosso

mundo interior.

93

O meu olhar é nítido como um girassol

O meu olhar é nítido como um girassol.

Tenho o costume de andar pelas estradas

Olhando para a direita e para a esquerda,

E de, vez em quando olhando para trás...

E o que vejo a cada momento

É aquilo que nunca antes eu tinha visto,

E eu sei dar por isso muito bem...

Sei ter o pasmo essencial

Que tem uma criança se, ao nascer,

Reparasse que nascera deveras...

Sinto-me nascido a cada momento

Para a eterna novidade do Mundo...

Alberto Caieiro (Fernando Pessoa)

94

2.5 - LEITURA DO OLHAR

“O olho é mais livre que os demais sentidos aos quais se atribui maior carga de passividade e sensualidade”.

Merleau- Ponty

“O olhar é feito de mediações próprias à temporalidade”.

Márcia Tiburi

“O que vimos com nossos olhos, o que temos contempla-do, e as nossas mãos tocaram da palavra da vida”.

Primeira Epístola de João – 1:01

“Não existe poesia sem olho, e olhar é antes de tudo uma

certa maneira de pensar e conhecer”.

Igor Fagundes

O olhar possibilita revelações e ocultamentos, o olhar pode visualizar in-

dignações e alumbramentos, é uma parte do objeto que está ligado à contem-

plação. A revelação do pensamento ocorre através da leitura do olhar. O objeto

visitado pelo olhar é revisitado pelo pensamento.

Ao olhar transformamos a realidade em efeitos da expressão poética. O

comportamento ocular é a forma mais sutil da linguagem física e também a

mais expressiva. Entre os sentidos a visão é a mais plena quando complemen-

tada pelo sentido interior da imaginação. “O olhar é ao mesmo tempo cognitivo,

e ao mesmo tempo passional”. (BOSI, 2002, p. 10).

A valorização do olhar como símbolo de reflexão representa um aspecto

fundamental para a fruição, na apreensão do leitor, sem culminar numa leitura

imediata. Com o amadurecimento dessa leitura é possível perceber, discernir e

interpretar. As reflexões feitas sob um novo olhar modificam a visão do mundo.

95

Quando se cria uma imagem do olhar, símbolo de forte polissemia, cuja ima-

gem suscita significados, é possível ampliar a leitura em espaços diversos.

A leitura do olhar faz o leitor recuperar a essência da palavra, chamada

desvelamento. Ler é desvendar o mundo onde há tanto para se descobrir e

encontrar. Não haverá nenhum sentido em realizar os encontros com a leitura,

se não ocorrer a leitura do olhar. Um olhar crítico sobre as palavras, um olhar

revelador da criação poética.

No olhar existem fronteiras difíceis de serem estabelecidas. O olhar as-

sim como as palavras expressa sentimentos. Daí a importância de apreender

as leituras que vêm do olhar, porque olhar é comunicar, todo esforço crítico se

vincula a razão.“ O mundo da leitura educa os sentidos, que recuperam a iden-

tidade perdida em que é necessário recriar uma relação sensível com o mundo

e descobrir novos continentes”. (SEVERINO ANTÔNIO, 2002, p. 14).

A leitura poética faz enxergar o ser humano sob um novo olhar: “As pa-

lavras possuem uma aura enlaçada com seu significado primeiro”. (BENJAMIN,

1980, p. 61).

A leitura poética faz enxergar o ser humano sob um novo olhar. As pala-

vras dentro da leitura poética têm muitos significados que falam nas entreli-

nhas, além de ser uma linguagem rica em metáforas, imagens e analogias.

Drummond dizia: “para que servem as palavras, a não ser para construir enga-

nos? www.academiamineiradeletras.org.br/revista/2006

A leitura é um ato da linguagem, de significar. A semiótica cujo pro-

cesso é o da significação, da representação e do conceito se organiza por

meio da construção, do discurso e da leitura. Os processos de significações da

leitura tentam compreender sua prática e as relações de sentido com o mundo.

96

Pensar na leitura como leitura do mundo é interagir com as imagens mentais

(projeção de uma imagem visual sobre a mente) que se relacionam, através

das trocas sociais da linguagem.

A leitura do olhar recria novas formas de sensibilidade do pensamen-

to. Ler é um conjunto de habilidades, comportamentos e conhecimentos que

compõem um longo processo. Quando o leitor desperta para a leitura, desperta

também para o imaginário e poético, viajando através das palavras, cria nela

sua própria identidade. Essa experiência pode ser chamada de comunhão ou

consagração do instante. “Por obra do ritmo, repetição criadora, a imagem a-

bre-se á participação e a participação é uma comunhão”.(PAZ, 1982, p. 141).

Dentro de uma concepção semântica ocorrem os inúmeros

raciocínios reflexivos e alegóricos. Essa interação é a recria-

ção ou interpretação: ao interpretar, revela-se, ao se revelar

rompe o medo e deixa fluir o interesse, em que ocorre o en-

contro em nível de leitura e em nível de arte literária. (SOA-

RES, 2000, p. 46).

Ao ler nas entrelinhas, o leitor desperta para a vida, recria o texto, deixa

de ser um leitor passivo da mensagem, constrói novos saberes essenciais e

suscita a existência de um novo universo através da transmutação daquilo que

lhe dá vida, que é a linguagem. Ao deixar fluir a leitura do olhar, o leitor revela o

outro, passa a fazer parte do ato da criação, integrante de um texto, ativo, inte-

rativo e co-criador.

As obras literárias transgridem o tempo, fazendo o leitor mergulhar na

polissemia, nascendo lentamente, e desvelando as palavras. A palavra e o con-

texto deixam de ser uma batalha e fazem o leitor sintonizar-se com a estrutura

da língua até chegar a uma ação criadora.

97

[...] o olho, fronteira móvel e aberta entre o mundo externo e o

sujeito, tanto recebe estímulos luminosos (logo, pode ver, a-

inda que involuntariamente) quanto se move à procura de al-

guma coisa, que o sujeito irá distinguir conhecer ou reconhe-

cer, recortar do contínuo das imagens, medir, definir, caracte-

rizar, interpretar, em suma, pensar. (BOSI, 2002, p. 86).

A leitura do olhar propicia ao leitor a busca da realidade com o desejo de

encarar os problemas, e desenvolver a capacidade criadora. Percebendo a his-

tória do mundo, desperta para a real função da linguagem. A leitura do olhar

também faz divagar. A leitura nas entrelinhas é a palavra madura: leitura con-

templativa e meditada. A leitura meditada contribui para a humanização do ho-

mem.

A leitura sob um novo olhar, faz transbordar a palavra, para enxergar o

seu potencial criador e emancipatório . É um meio apropriado de cultivar virtu-

des que transcendem a própria linguagem. A linguagem poética é arte sagrada,

com poder para suscitar, exprimir e habitar todos os lugares. É arte sagrada da

expressão, dos sentidos e da plenitude e do ser. A plenitude habita todas as

formas e imagens poéticas. “ O advento de uma sociedade fundamenta-se na

palavra poética. (PAZ, 1982, p. 288).

A leitura do olhar é uma linguagem.

A linguagem ganha significados para transformar o mundo.

O mundo da leitura faz descobrir a aura das palavras.

Palavras poéticas são capturadas através do olhar.

O olhar é a revelação da subjetividade e da poesia.

A poesia sob um novo olhar, leva ao ato de educar.

98

Educar é habitar continentes humanos.

Os continentes humanos são nossos sentidos.

Os sentidos e as imagens são as leituras do olhar.

Neste segundo capítulo, foram feitas considerações sobre Leitura e

Educação dentro da concepção poética. As inúmeras formas de leitura, a

formação do leitor poético e do pequeno leitor. Também a leitura como mui-

tas formas de linguagem.

99

CAPÍTULO III

POESIA E LEITURA COMO ENCONTRO

“O que eu pediria à escola, se não me faltassem luzes pedagógi-

cas, era considerar a poesia como primeira visão direta das coi-

sas, e depois como veículo de informação pratica e teórica, pre-

servando em cada aluno o fundo mágico, lúdico, intuitivo e cria-

tivo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética”.

Carlos Drummond de Andrade

“Se reconhece um poeta quando ele se transforma em leitor

inspirado; aquele que lê oferece ao criador dos poemas os mé-

ritos transcendentes das forças e das graças que se desenvol-

ve no primeiro. Ele procura e encontra a causa admirável de

sua admiração”.

Paul Valéry

100

As dunas

ao longo do lago

há dunas

que se deslocam

com os olhares

de quem faz muito

vive algures,

num transitório

perímetro,

desativando

gramáticas,

curtos-circuitos

que cavam

depósitos de coisas

na hesitação

entre uma língua e outra

Prisca Agustoni

101

3.1- PESQUISA-AÇÃO

“O relato começa com a própria historia da humanidade; não

há nem houve jamais, em parte alguma, povos sem relatos; to-

das as classes todos os grupos humanos têm seus relatos, que

frequentemente são saboreados em comum por homens de cul-

tura, diversa e oposta: o relato esta aí como a vida”.

Roland Barthes

Esse trabalho foi desenvolvido na perspectiva de uma pesquisa-

ação: a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa participante engajada, em oposi-

ção à pesquisa tradicional, que é considerada como “independente”,“não-

reativa” e “objetiva”. A pesquisa-ação procura unir a pesquisa à ação ou práti-

ca, isto é, desenvolver o conhecimento e a compreensão como parte da práti-

ca.

A pesquisa-ação surgiu da necessidade de superar a lacuna entre

teoria e prática. Uma das características deste tipo de pesquisa é que através

dela se procura intervir na prática de modo inovador já no decorrer do próprio

processo de pesquisa e não apenas como possível conseqüência de uma re-

comendação na etapa final de um projeto. Pesquisa-ação e pesquisa-

participante podem ser entendidas como similares na caracterização das pes-

quisas deste estudo. Sobre isso, porém, Thiollent, considera que:

Nessa direção, pesquisa-ação e pesquisa participante não se con-

fundem, ainda que alguns autores considerem pesquisa-participante

concepções de pesquisa-ação. Para o autor a pesquisa-ação é aque-

102

la que não limita a participação dos pesquisadores no meio pesqui-

sado, como meros observadores participantes.

A participação dos pesquisadores é explicitada dentro da situação de

investigação, com os devidos cuidados para que haja reciprocidade

entre as pessoas e grupos pesquisados. Neste contexto, a pesquisa-

ação é o instrumento ideal para uma pesquisa relacionada à prática.

Além da área educacional, a pesquisa-ação pode ser aplicada em

qualquer ambiente de interação social que se caracterize por um pro-

blema, no qual estão envolvidos pessoas, tarefas e procedimentos. O

processo de pesquisa deve tornar-se um processo de aprendizagem

para todos os participantes e a separação entre sujeito e objeto de

pesquisa deve ser superada. Como critério de validade dos resulta-

dos da pesquisa-ação sugere se a utilidade dos dados para os clien-

tes: as estratégias e produtos serão úteis para os envolvidos se forem

capazes de apreender sua situação e de modificá-la. (THIOLLENT,

1988, p. 16).

Além disso, a participação dos pesquisadores não deve substituir a

atividade própria dos atores sociais dos grupos e suas iniciativas. “Pesquisa-

ação não se limita a uma forma de ação: pretende-se aumentar o conhecimen-

to dos pesquisadores e o conhecimento ou o “nível de consciência” das pes-

soas e grupos considerados”. (THIOLLENT, 1988, p. 16).

A pesquisa-ação é um método de pesquisa que agrega diversas téc-

nicas de pesquisa social, com as quais se estabelece uma estrutura coletiva,

participativa e ativa no nível da captação da informação, requer, portanto, a

participação das pessoas envolvidas no problema investigado.

Em síntese, como propõe esse autor, a pesquisa-ação é uma estra-

tégia metodológica da pesquisa social, na qual existe ampla e explícita intera -

ção entre o pesquisador e as pessoas envolvidas na situação investigada; des-

sa interação resulta a priorização dos problemas a serem pesquisados e das

103

soluções a serem encaminhadas em ações concretas; o objeto de investigação

não se constitui em pessoas, mas sim em situações sociais e seus problemas;

o objetivo da pesquisa-ação é resolver ou esclarecer os problemas identifica-

dos na situação observada.

A pesquisa não se limita à ação, pressupõe um aumento do conhe-

cimento e do “nível de consciência” das pessoas ligadas à situação

e do próprio pesquisador. De acordo com os princípios da pesqui-

sa-ação, os aspectos práticos de concepção e organização do tra-

balho apresentam fases que não são rigorosamente seqüenciais,

sendo seu planejamento é flexível e passível de adequação às ne-

cessidades do pesquisador e dos participantes (THIOLLENT,

1986, p. 28).

Na introdução desta dissertação relatei um breve histórico das ações

que me levaram a escrever essas primeiras páginas. Quando cheguei a con-

clusão de que não bastaria uma série de encontros com pessoas diferentes,

mas uma série de encontros com as mesmas pessoas para que pudéssemos

refletir a respeito de novos olhares sobre a poesia.

Sou moradora do Jardim Thelja, um bairro isolado geograficamente. No

Jardim Thelja propriamente dito não há nada que se possa caracterizar como

estruturado, porém é conurbado ao Jardim alvorada (vide mapas em anexo).

Os dois bairros têm um total de mil e seiscentos habitantes, uma Escola de En-

sino: fundamental e Médio, um posto médico, uma EMEI, não há creche manti-

da pela Prefeitura, porém, existe a APAM que é a Associação de Promoção ao

Menor de Americana. A APAM além de creche, todos os dias promove em dife-

rentes horários atividades para moradores da comunidade.

Sabendo que não existe uma biblioteca ou sala de leitura dentro da

APAM, no início do ano de 2002 montei um projeto literário e encaminhei à

104

Administradora da APAM. Minha proposta era realizar atividades literárias com

crianças e jovens, bem como às pessoas mais idosas, que muitas vezes não

têm acesso a uma leitura, ou espaço mais reservado para ler. Solicitei no proje-

to uma entrevista mas não obtive nenhuma resposta.

Com o nascimento do meu filho, tentei esquecer por um tempo

minhas inquietações literárias e continuei com o meu trabalho na Escola em

que atuo como Diretora Pedagógica. Dentro dessa Escola cujo ensino é profis-

sionalizante, convivo com pessoas cujas mentes são voltadas principalmente

para a tecnologia e para o raciocínio lógico.

Certo dia observei um monitor da escola se comunicando com outro

usuário, através de um programa on-line. Mas não entendi nada do que ele

escrevia. E ele disse que entendia tudo e que aquela era uma linguagem bem

direcionada à Internet. Em outra ocasião solicitei ao mesmo monitor, que es-

crevesse um bilhete para um professor. Ele ficou bastante constrangido, ale-

gando timidez, mas depois acabou confessando que sequer sabia escrever um

bilhete. Disse também que sentia dificuldades para se expressar tanto através

da fala como da escrita.

Achei estranho, pois ele se comunicava via internet com pessoas

que mal conhecia dos mais diversos locais, mas quando se tratava de um bi-

lhete ou comunicado sentia dificuldades para se expressar. Ele disse que “nun-

ca lia um livro, um jornal, um artigo sequer, que suas buscas eram todas feitas

na internet, simplesmente copiava e colava”. Outras observações não passa-

ram despercebidas: comecei a observar que mesmo os alunos considerados

exemplares e estudiosos tinham uma clara dificuldade de se expressarem atra-

vés da escrita, principalmente se necessário utilizar uma linguagem mais culta,

105

quando necessária. Outras formas de comunicação como falar ao telefone com

as pessoas, pelo o que pude observar era motivo de constante aborrecimento

para o monitor acima mencionado.

Quero deixar bem claro que não estou fazendo uma crítica à comuni-

cação que se movimenta através da Rede mundial. Sou uma usuária da Rede,

mas confesso que me intrigava bastante observar as dificuldades de comuni-

cação e expressão, bem como, a ausência da leitura.

Muitas vezes necessitei de uma declaração do próprio punho do a-

luno, para tornar legítimo um documento e o aluno não conseguia escrever. O

curso era profissionalizante, mas aqueles alunos estavam se preparando para

ingressar no mercado de trabalho. Passariam na prova técnica, mas seriam

reprovados numa entrevista, porque não estavam preparados para a leitura e a

comunicação, não estavam preparados para a vida. Não havia comunicação...

A linguagem é um dos instrumentos básicos para introduzir a e-

ducação e conseqüentemente o pensar. Os dois papéis básicos

da linguagem são: construir a reflexão, e modelar a nossa identi-

dade. Que precisamos aprender a ler. Leitura tem um significado

bastante amplo: “é efetuada toda vez que lemos um significado

em algum acontecimento, alguma atitude, algum texto escrito,

comportamento”. Podemos chamar isso de leitura do mundo. Pa-

ra isso, é preciso saber observá-lo, utilizando todos os sentidos, e

assim, recolher as informações dos mais variados tipos. (ARA-

NHA, 1996, p. 84).

Minha memória voltou-se para o porão onde eu havia guardado o projeto

de leitura. Pensei na ausência da comunicação, na perda da linguagem... Den-

tro de um processo educativo, como utilizar uma forma de linguagem cheia de

significados, cujo propósito era resgatar a fala e a escrita em nível razoável?

106

Pensei nas crianças e jovens do Jardim Thelja e do Jardim Alvorada:

carentes de bibliotecas, livros e leitura. Vi a necessidade e ao mesmo tempo

uma oportunidade de amadurecer e desenvolver um projeto para que fosse

criada uma sala de Leitura. Mas como colocá-la em prática? Como resgatar

alguns valores de comunicação, da linguagem?

Elaborei um novo Projeto de leitura (vide apêndice) e encaminhei nova-

mente para a APAM. E dessa vez não era um pré-projeto, era uma proposta

bem clara de trabalhar a leitura polissêmica, com a finalidade de montar uma

sala de leitura, naquela Instituição. Após alguns contatos com a administração

da APAM a responsável informou que, naquele momento a APAM devido a

problemas de espaço físico não teria condições de manter uma sala de leitura.

Como moradora do Jardim Thelja e tendo lecionado na Escola “Maestro

Germano Benencase”, do Jardim Alvorada, durante alguns anos, tenho conhe-

cidos, ex-alunos, pessoas que sabem que sou escritora. Falei a uma conheci-

da do bairro,(ao falar sobre ela, chamarei-a de “ M”. Reportei a “M” sobre a

proposta frustrada de montar uma sala de leitura. Ela tem filhos que estudam

na escola local, e conhece também muitas pessoas, pois mora lá há vinte e

cinco anos.

Relatei a intenção de montar um ambiente em que encontros para leitura

pudessem ser realizados, após pensar um momento ela questionou se esses

encontros com a leitura poderiam ser realizados em qualquer espaço. Eu disse

que sim, então ela ofereceu o quintal, da residência dela, ou seja, uma grande

varanda murada e toda coberta, com espaço suficiente para abrigar aproxima-

damente vinte pessoas.

107

Agora com o espaço já determinado, a divulgação boca a boca ocorreu e

se espalhou rapidamente. Mas apenas algumas pessoas ficaram interessadas.

Porém era vital estabelecer um critério para dar início as atividades, então ficou

acertado que se alguém quisesse participar das atividades literárias poderia

freqüentar o espaço, da casa de “M”, toda quinta-feira a partir das 19h.

108

Se eu pudesse desfolhar

Eu pronuncio teu nome

nas noites escuras,

quando vêm os astros

beber na lua

e dormem nas ramagens

das frondes ocultas.

E eu me sinto oco

de paixão e de música.

Louco relógio que canta

mortas horas antigas.

Eu pronuncio teu nome,

nesta noite escura,

e teu nome me soa

mais distante que nunca.

Mais distante que todas as estrelas

e mais dolente que a mansa chuva.

Amar-te-ei como então

alguma vez? Que culpa

tem meu coração?

Se a névoa se esfuma,

que outra paixão me espera?

Será tranqüila e pura?

Se meus dedos pudessem

desfolhar a lua!!

Federico Garcia Lorca

109

3.2 - Vozes polissêmicas dentro da noite

“A orientação para a mensagem como tal, a mensagem pela

mensagem é a função poética da linguagem”.

Roman Jakobson

“Vozes, vozes. Escuta, coração como outrora somente

os santos escutavam: até que o gigantesco apelo

levantava-os do chão; mas eles continuavam

ajoelhados inabaláveis, sem desviarem a atenção:

eles assim escutavam. Não que tu pudesses suportar

a voz de Deus, de modo algum. Mas escuta o sopro,

a incessante mensagem que nasce do silêncio”.

Rainer Maria Rilke

Para iniciarmos nosso primeiro encontro, muitas explicações eram

necessárias. Explicar o motivo dos encontros, que fariam parte de uma pesqui-

sa para o Mestrado em Educação Sócio-Comunitária, que o caráter era educa-

tivo-sócio cultural-comunitário... Considerei que seria de bom tom deixar os

participantes à vontade e principalmente bem informados, com relação a minha

pesquisa.

É necessário que o cientista e sua ciência sejam primeiro, um

momento de compromisso e participação com o trabalho históri-

co e os projetos de luta do outro, a quem, mais do que conhecer

para explicar, a pesquisa pretende compreender para servir. O

reconhecimento da pesquisa como uma proposta que vai além

110

dos muros da academia e da sofisticação instrumental está se

fazendo de maneira cada vez mais clara na literatura brasileira.

Nestas últimas décadas, vem sendo consolidada uma valoriza-

ção da pesquisa e de estímulo ao seu desenvolvimento junto às

atividades. (BRANDÃO, 1984, p. 12).

Não tinha como prever exatamente o que aconteceria. Fui com uma

proposta. Não estava ali só para dar conceitos, pelos menos não naquele pri-

meiro momento, mas sim para partilhar da leitura e da poesia como um encon-

tro. Para descobrir a realidade, é preciso questionar. No entanto, as respostas

encontradas nem sempre representam resultados definitivos, mas é nesse diá-

logo com a realidade que se busca compreender e enfrentar de modo crítico e

criativo as situações desafiadoras do cotidiano de cada um.

Como já foi escrito, a pesquisa-ação para Thiollent:

[...] é um tipo de pesquisa social com base empírica, que é con-

cebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com

a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores

e os participantes representativos da situação ou do problema es-

tão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.

(THIOLLENT, 1986, p. 19).

Por meio deste procedimento, busquei estabelecer os primeiros con-

tatos entre os pesquisados, bem como, estreitar os laços entre essas duas es-

feras constitutivas do processo de investigação.

Éramos, então ao todo, sete no primeiro encontro: três mulheres, du-

as crianças e dois adolescentes. Como já nos conhecíamos, depois das expli-

cações, deixei o espaço aberto para perguntas, mas ninguém se pronunciou.

111

“M” disse que se tivessem dúvidas perguntariam. “A palavra para ser libertado-

ra e transformadora deve ser de todos. É um instrumento que permitirá ser:

livre, autônomo e capaz”.( FREIRE, 1986, p. 37).

Fiz uma pergunta genérica e bem simples, disse que eu seria a pri-

meira a responder e gostaria de ouvir a resposta de todos logo em seguida:

Para você o que é leitura, o que é ler?

Respondi que ler é mudar de horizontes, descortinar...

Parei e sinalizei para que cada participante pudesse dar a sua res-

posta pessoal. Primeiramente, vou enumerá-los nesse relato. Posteriormente

os números serão substituídos por nomes...

1 - ler é vencer dificuldades

2 - disciplina e aprendizado

3 – prática

4 – investimento

5 – encanto

6 – paixão

Pela primeira vez pude sentir aquelas vozes de extrema sinceridade,

vozes polissêmicas a aquecer a noite fria. Senti um perfume no ar. Perguntei o

que poderia ser e de onde estava vindo, e disseram que era a “Dama da noite”

ou flor de laranjeira. O céu estava claro, lua cheia, fomos verificar e do outro

lado da rua havia uma árvore “ A dama da noite”, florescendo...

Então pensando na pesquisa, na poesia e na leitura, nas vozes, na

lua esplendorosa, no perfume da noite... Compreendi que não poderia ser ex-

cessivamente formal. A leitura ali se tratava de muitas leituras, de envolvimen-

112

tos mais sensíveis, se nos tratássemos com nome de flores, seria uma forma

mais poética de nos preservarmos. Quando me referir aos participantes os no-

mes serão substituídos por flores que eles escolheram. Pode parecer estranho

nesse momento, mas com o desenvolvimento da pesquisa, cada nome, para o

leitor, terá um sentido.

Ficamos assim:

1 – Margarida

2 – Orquídea

3 – Violeta

4 – Cravo

5 – Narciso

6 – Rosa silvestre

Demos gostosas risadas pelas flores escolhidas. Então perguntaram

se eu gostava de alguma flor específica. Eu disse que gostava de muitas flores,

mas que a que mais me cativava era o Alecrim. Então eu também fui nomeada,

Alecrim.

7 - Alecrim

O interessante é que talvez a leitura e a poesia começaram aí...talvez

antes, quando sentimos o perfume da noite. A variedade de flores ali unidas,

cada qual da sua espécie, ocorreu um momento de comunhão entre nós que

como dizia Paz, ”Jamais se repetiria”. (PAZ, 1982, p. 24).

A doce Violeta perguntou o porquê de gostar tanto de alecrim...

Pensei no meu pé de alecrim e há quantos anos essa planta tem me

acompanhado. Pensei na história, nas lendas, nos mitos, mas não poderia falar

sobre tudo aquilo. No momento, o importante ali era realizar uma relação mais

113

sensível, mais emocional e mais poética com aquele público, que não me era

estranho, mas que não poderia ser amedrontado e ameaçado pelo excesso de

informações.

A inteligência humana para ser desenvolvida em sua potenciali-

dade tem que ser provocada por meio da troca com o outro, do

contato pela alimentação constante do imaginário. O principal ins-

tante para interação de pessoas na troca de informações aconte-

ce pela palavra que ganha força, multiplica-se e perpetua-se.

(SERRA, 1998, p. 93)

Contei para eles que minha relação com o alecrim sempre foi muito ínti-

ma, e que considerava a planta do amor e da saúde. A verdade é que o alecrim

também é muito sensível, não pode ter seus galhos cortados ou arrancados, e,

se a pessoa que o plantou não está bem, ele murcha, pode até morrer.

Meus colegas leitores ficaram admirados com a minha relação com o

alecrim e o tempo estava passando, não tínhamos um horário específico, mas

eu precisava prosseguir com o trabalho.

Perguntei para Margarida o porquê da escolha: ela também contou uma

história poética e encantadora. Disse que não sabia quando começou a amar

as margaridas, mas o fato é que ao casar usou uma coroa de margaridas, e o

buquê também era delas, mas não sabia o significado da escolha. Contou que

leu sobre elas uma vez e a margarida é uma flor de duas faces, pois vem do

latim (bélis). Na mitologia romana, a ninfa Bélides transformou-se nesta flor

para escapar do assédio do deus da vegetação das árvores frutíferas. Conta

uma lenda inglesa que uma fada alimentava um príncipe com comidas prepa-

radas com esta flor para que ele nunca crescesse e nem perdesse a inocência

infantil. E, no entanto, Bélis é proveniente de belo e ao mesmo tempo de bélico,

levando a sutileza da margarida a compor duas faces.

114

Margarida também nos contou que em dada fase de sua vida sofreu

muito por estar com uma profunda depressão e quando isso ocorreu fez um

canteiro de margaridas. Conforme ia convalescendo, as flores iam ficando cada

vez mais vistosas. Mas ao fazer uma oferenda das flores, o copo se esvaziara

e as margaridas murcharam.

Cada leitor nessa hora queria falar ou saber o significado da sua flor. Foi

muito interessante, porque já era tarde da noite, estávamos cansados, mas não

queríamos parar, pedi a todos que se quisessem poderíamos ler sobre a ori-

gem de cada flor. Todos concordaram, principalmente Narciso, que ficou entu-

siasmado, quando eu disse que o nome dele tinha uma linda estória...

No nosso primeiro encontro não houve uma leitura mais formal. Algumas

leituras foram feitas, uma delas a estória de Margarida, as flores escolhidas

pelos participantes, aparentemente sem significado, foram fluindo ao longo dos

nossos encontros, como um signo.

Nos próximos encontros, leituras mais formais e específicas viriam inevi-

tavelmente. Trocamos apenas idéias, mas essa troca era uma forma de ler e

ampliar perspectivas para a vida. “A expressão do nosso universo individual em

interação com os outros.” (VENTURELLI, 1995, p. 44).

115

Improviso

Nuvens são cambraias

Pétalas

tuas faces

Brisa que farfalha

nas varandas altas

Cristaliza

orvalho

diamantes de água

Se não posso vê-la

nos píncaros de jade

Sob a lua ei-la

no pavilhão de jaspe

Li Tai Pó

Tradução de Haroldo de Campos

116

3.3 - Os Haicais e as vozes entrelaçadas

“Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil

faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pe-

la resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: Trouxeste a cha-

ve”?

Carlos Drummond de Andrade

Quem, se eu gritasse me ouviria entre as hierarquias dos anjos?

E mesmo supondo que um deles subitamente me apertasse

contra o peito: eu morreria devido à sua existência mais forte."

Rainer Maria Rilke

O primeiro encontro foi imprescindível para dar seguimento aos próxi-

mos que vieram. Um senhor, morador do Jardim Thelja, com 92 anos, mora

sozinho, e parece ser um apreciador de leituras, é simpático e entusiasmado.

Informei a ele que estávamos realizando um trabalho de leitura na casa de “M”

e convidei-o a participar. Ele disse que era só um velho e que ninguém ligaria

para ele. Eu respondi que temos a idade de nossa mente. Ele não deu certeza,

mas disse que talvez passasse por lá.

O fato é que ele passava muito tempo livre. E a leitura seria uma boa

companhia para ele e para nossa alegria o Sr. Lazinho passou a freqüentar

nossos encontros. Ele é um senhor bem frágil e idoso que se tornou mais uma

flor para o nosso jardim - o jasmim. Eu disse a ele que existem muitas espé-

117

cies de jasmim, mas que em casa eu tinha o Jasmim-do-poeta, ele sorriu e as-

sentiu com a cabeça.

É perceptível aos leitores que não há um critério rigoroso estabelecido

em relação ao relato dos nossos encontros. Como disse no início, não fui a es-

criba. Achei que se começasse a anotar o que eles diziam poderia tirar-lhes a

autenticidade e intimidá-los. Posso falar das contribuições e tentarei ser mais

fiel possível aos acontecimentos e as falas.

Durante o tempo que estive com o grupo tentei trabalhar a leitura como

conteúdo de aprendizagem, um processo nos quais os significados são cons-

truídos. Expliquei que ler constitui uma prática social em que se constrói o co-

nhecimento. Mas só com o tempo pude perceber que, mesmo dentro de um

contexto informal, os participantes do grupo passaram a freqüentar os encon-

tros como uma responsabilidade necessária, o que me fez inspirá-los a um

processo de apropriação da leitura, relacionada à prática, sempre procurando

ouvir seus sentimentos, suas expressões e leituras, da forma mais singela pos-

sível.

Durante um dos encontros, percebi que Orquídea estava apreensiva.

Perguntei o que estava acontecendo e ela disse que estava preocupada com

Narciso, seu filho, pois achava a letra dele “ruim, difícil de entender”. Disse a

ela que a leitura poética ajudaria a repertoriar a criança na aprendizagem da

linguagem e que possibilitaria produzir melhores textos orais e escritos, mas

que ele precisaria se empenhar e ela, ajudá-lo durante esse processo. Expli-

quei que tanto os conhecimentos lingüísticos, como saberes e crenças, sobre o

mundo do texto dos contextos intervém na compreensão a partir do uso de

estratégias de leituras.

118

Orquídea quis saber sobre as estratégias de leitura.

Embora tenha dito que não abordaria conceitos, pude perceber que essa

questão teria que ficar clara. Expliquei da maneira mais natural possível que

estratégias de leitura são as formas que esperamos alcançar para atingir nos-

sos objetivos; no ato de ler, por exemplo, poderíamos trabalhar a leitura e al-

cançá-la, através de declamações, leitura silenciosa, leitura individual, troca de

opiniões, trocas de descobertas, sempre contextualizando uma situação. Em

suma, informei que para nos aproximarmos dos nossos objetivos teríamos que

ser espontâneos para expressar sentimentos, buscando sempre uma leitura

que, de certa forma, nos completasse como leitores.

Violeta havia encontrado um livro na casa da avó, trouxe para que lês-

semos juntos e ao ver o que era tive uma grande surpresa. Era um livro só de

Haicais. Pronunciei a palavra Haicai e rapidamente todos queriam saber o que

era Haicai. Fiz uma interpretação bastante sucinta e pessoal desta classe de

poemas. Informei que Raiku ou Haicai é uma forma poética de origem japonesa

em que se busca dizer o máximo com o mínimo.

Como assim? Perguntaram eles... Não entrei nas questões mais apro-

fundadas do esquema métrico de 5,7,5 das três linhas, ou das 17 sílabas mé-

tricas do Haicai, mas informei que ele é divido em três versos. Porém para nos-

sos leitores, dando maiores explicações, o Haicai ou Haiku em inglês é um

poema de origem japonesa, que chegou ao Brasil no início do século XX e hoje

conta com muitos praticantes e estudiosos brasileiros. No Japão, e na maioria

dos países do mundo, é conhecido como haiku.

Inspirada nas palavras de Goga em “Haicai no Brasil”, pode-se dizer que

o haicai clássico japonês obedece a quatro regras:

119

1) O Haicai é poema conciso, formado de 17 sílabas, ou melhor, sons,

distribuídas em três versos (5-7-5), sem rima nem título.

2) O haicai é poema que expressa fielmente a sensibilidade do autor.

Por isso, respeita a simplicidade, captando o instante em seu núcleo

de eternidade.

3) A métrica ideal do haicai é a seguinte: 5 sílabas no primeiro verso, 7

no segundo e 5 no terceiro; mas não há exigência rigorosa, obedecida a

regra de não ultrapassar 17 sílabas ao todo. E a contagem das sílabas

termina sempre na sílaba tônica da última palavra de cada verso.

4) O haicai é considerado um poemeto popular; por isso usa-se palavras

quotidianas e de fácil compreensão. O dono do haicai é o próprio autor.

O haicai é considerado como uma espécie de diálogo entre au-

tor e apreciador; por isso, não se deve explicar tudo por tudo. A

emoção ou a sensação sentida pelo autor deve apenas sugeri-

da, a fim de permitir ao leitor o re-acontecer dessa emoção, para

que ele possa concluir, à sua maneira, o poema assim apresen-

tado. Em outras palavras, o haicai não deve ser um poema dis-

cursivo e acabado. O haicai é um produto de imaginação ema-

nada da sensibilidade do haicaísta; por isso, deve-se evitar ex-

pressões de causalidade, sentimentalismo vazio. (CAMPOS,

1975, p. 27).

Exemplo:

Nesta catedral,

quando arde o sol, toda tarde,

sangra este vitral.

120

Jorge Fonseca Junior

O haicai sempre exprime um momento vivenciado no presente.

Sendo baseado na natureza, obrigatoriamente fala de coisas con-

cretas, com existência física. E ao falar do presente através de

coisas concretas, necessariamente alude à temporalidade, ao

provisório e ao efêmero, marcas do mundo terreno. Em outras pa-

lavras, o haicai é um veículo para a expressão da transitoriedade,

e esta é evidenciada através do uso dos termos-de-estação ou

kigos. Signos de um mundo em constante mutação, os kigos se

sucedem ao longo do ciclo anual, representando a própria ima-

gem da transitoriedade.

Ao exprimir um momento do presente, baseado na realidade físi-

ca, o haicai se aproxima da fotografia. Sempre que olhamos para

uma foto, aquela impressão visual se reaviva e se torna presente

para nós. O haicai faz o mesmo, através da descrição objetiva de

uma sensação física, que além de visual, pode ser também audi-

tiva, tátil, olfativa ou de paladar. Esta sensação pode disparar

uma lembrança ou um sentimento, o que pode ser expresso no

poema. O contrário não é permitido. A sensação psicológica

sempre nasce depois da sensação física.

( http://www.kakinet.com.)

Dizemos que o haicai pode ser comparado a uma fotografia, que é com-

pletamente diferente de um filme. O minúsculo tamanho do haicai não compor-

ta cenários dramáticos, amplos movimentos ou planos em seqüência. Também

não se trata de suprimir todos os elementos sintáticos como num telegrama,

visando comprimir o máximo de palavras dentro de 17 sílabas. A descrição

simples e sem artifícios estilísticos de uma sensação, deixando grande espaço

para a sugestão, é a regra a ser seguida. Haicai não é síntese, no sentido de

121

dizer o máximo com o mínimo de palavras. “É antes a arte de, com o mínimo,

obter o suficiente”. (FRANCHETTI, 1996, p. 112).

Sempre trabalhei com o grupo com a finalidade de inspirá-los e motivá-

los a ler. O fato é que a leitura também precisa ser inspirada e inspiradora. No

início desta dissertação falei sobre conceitos poéticos, mas quero deixar bem

claro que em uma comunidade, não poderia trabalhar só conceitos, era preciso

exemplificá-los. A poesia e a leitura existem para serem sentidas. O fato de

trabalhar de forma mais informal e afetiva foi uma estratégia de aproximação.

Os poemas são linguagens da alma, do coração. Depois de sentidos e perpe-

tuados, podemos buscar mais. E, além dos conceitos, conhecer autores, falar

de gêneros, estilos e épocas.

Retomando o nosso encontro, Violeta estava aguardando ansiosa para

ler os Haicais e então pedi a ela que lesse:

Já é primavera

Uma colina sem nome

Sob a névoa da manhã

Bashô

Narciso leu outro:

Em qualquer lugar

Onde se deixem as coisas,

As sombras do outono.

Kyoshi

122

Houve um entrelaçamento de vozes e palavras, as faces da felicidade

que só a poesia consegue capturar... O livro passou de mão em mão, cada lei-

tor declamando um haicai.

o céu se aproxima.

com vertigens invertidas,

caio pra cima.

Manoel Jacinto

E naquele ressoar de vozes entrelaçadas e poéticas eu tinha olhos só

para Violeta, que se sentou silenciosa, mas estava atenta às leituras. Também

me silenciei, a observar a inocente Violeta de apenas nove anos. Era uma a-

preciadora de poemas, de haicais, não havia encontrado o livro em vão. Como

diz Octávio Paz em “ O Arco e a Lira “ A expressão do poema, sua recriação

ocorre através da leitura ou recitação. Há uma característica comum a todos os

poemas: a participação”. (PAZ, 1982, p. 28).

Após a leitura todos foram convidados a se expressarem, o que haviam

compreendido e sentido. Não me lembro de todas as vozes... Mas quis saber a

opinião de Violeta cujos olhos brilhavam, ela disse pouco e esse pouco me im-

pressionou: ‘”Não foi sem querer que disse que leitura é uma paixão”...

Margarida disse que “ o Haicai era um poeminha profundo”.

Narciso disse: “aprendi a recitar um poema em japonês”.

Outras vozes sussurraram, porém como já relatei, não tenho a pretensão

de resgatar todos os diálogos e atividades desenvolvidas, dado as limitações

123

de não termos um(a) escriba me citarei com fidedignidade os exemplos que

lembrar.

Como proposta para os próximos encontros sugeri que trabalhássemos

de forma mais sistematizada, ou seja, poderíamos nos embasar em algum refe-

rencial, mas dada às limitações e compromissos dos presentes, fiquei encarre-

gada de providenciar o material a ser lido. Somente o Senhor Jasmim, com-

prometeu-se a tentar uma composição poética.

Fiquei pensando em fundamentos e acontecimentos... Algo estava acon-

tecendo... A doce Violeta apreciando as leituras e um ancião inspirado era mais

do que eu poderia esperar... Aguardei ansiosamente novas emoções para os

próximos encontros que certamente viriam.

124

A valsa

Tu, ontem,

Na dança

Que cansa,

Voavas

Co'as faces

Em rosas

Formosas

De vivo,

Lascivo

Carmim;

Na valsa

Tão falsa,

Corrias,

Fugias,

Ardente,

Contente,

Tranqüila,

Serena,

Sem pena

De mim!

Quem dera

Que sintas

As dores

De amores

Que louco

Senti!

Quem dera

Que sintas!...

— Não negues,

Não mintas...

— Eu vi!...

Casimiro de Abreu

125

NOVAS VOZES E O RITMO DAS FLORES

“O poeta fala no limiar do ser.”

Gaston Bachelard

“A disciplina do ritmo é aprendida até ficar sendo uma parte da

alma: o verso que a emoção produz nasce já subordinado a es-

sa disciplina. Uma emoção naturalmente harmônica é uma e-

moção naturalmente ordenada; uma emoção naturalmente or-

denada é uma emoção naturalmente traduzida num ritmo orde-

nado, pois a emoção dá o ritmo e a ordem que há nela, a ordem

que no ritmo há”.

Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)

As reuniões continuaram ocorrendo na casa de “M” sempre as quintas

feiras. Algumas estudantes ficaram sabendo sobre os encontros com a leitura,

e apareceram no final de novembro de 2006. Dirigiram-se a mim dizendo que

gostariam muito de participar dos encontros, mas só poderiam fazê-lo nas fé-

rias porque estudavam no período noturno.

Pelo histórico do bairro, não havia muitas opções, as pessoas costu-

mam participar de novidades que possam propiciar alguma forma de lazer. Ex-

pliquei que o os encontros tinham uma caráter lúdico e educativo e era também

um espaço aberto a toda a comunidade.

126

Segundo Chizzotti, o pesquisador participa da vida social e, por isso, é

impossível olhá-la de fora.

Algumas revelações são produzidas através do progresso do

conhecimento humano. A pesquisa não pode ser o produto de

um observador postado fora das significações que os indivíduos

atribuem aos seus atos; deve, pelo contrário, ser o desvelamen-

to do sentido social que os indivíduos constroem em suas inte-

rações cotidianas. (CHIZZOTTI, 1991, p. 80).

Com isso, conhecemos novas pessoas, na verdade novas flores que

foram chegando como camélias, tulipas, crisântemos e outras, das mais varia-

das espécies... Eu sabia que os encontros com as jovens flores não duraria

muito, pois, precisariam voltar para a escola no início do próximo ano, elas fo-

ram até a casa de M. voluntariamente, mas com alguma expectativa. Os inte-

grantes do grupo já haviam feito alguns avanços, estavam realizando leituras

de poemas, não só durante os encontros.

Naquela noite, com a chegada das nove garotas, foi necessário tomar

algumas decisões de que, enquanto freqüentassem o grupo teríamos que en-

trar em uma nova dinâmica, dada as necessidades de fazê-las apreender a

poesia. Como poderia fazê-lo? Eram jovens, radiantes, cheias de expectativas,

não era viável realizar apenas um discurso era necessário algo mais. Mas em

função da variedade das faixas etárias que compunham o grupo e em respeito

às expectativas dos demais integrantes não poderia ser nada esdrúxulo.

Aceitei a presença das mesmas como mais um desafio dentro de um

jogo lúdico-educativo. Uma das maiores descobertas que vivenciei durante o

mestrado e a dissertação foi o encontro da poesia sob um novo olhar, era exa-

127

tamente essa imagem que eu pretendia transmitir, de forma educativa, praze-

rosa e lúdica.

Fiquei por um minuto pensando e ao mesmo tempo observando o entu-

siasmo das jovens flores. Pensei na poesia e arte. Ritmo... Precisávamos de

ritmo, poesia é ritmo, movimento, arte. Aquelas jovens eram ritmos, entusias-

mo, suas vozes e risos demonstravam movimentos.

No sub item 1.1 “Poesia e essência poética”, dessa dissertação, inspira-

da nas palavras de Bosi, “O Ser e o Tempo na Poesia” (Bosi, 1983). Faço as

seguintes considerações: a Poesia é ritmo, movimento, liberdade espiritual,

enquanto, cria imagens e símbolos, ela voa livre. A imagem no poema é uma

palavra articulada. A palavra é uma cadeia sonora, a matéria verbal se junta à

matéria significada por meios de articulações fônicas que constituem a lingua-

gem.

Cada sorriso radiante e entusiasmado lembrava gestos, ritmo e movi-

mento. Naquela noite após uma breve e informal apresentação das novas par-

ticipantes que ao todo eram nove percebi que com as novas flores o grupo es-

tava bastante animado era um momento propício para falar sobre poesia, ritmo

e arte.

Fiz algumas considerações sobre poesia e arte: informando que poesia

é arte-construção; arte-expressão; arte-vida; arte-sentimento; arte-poema, que

se faz presente nas obras literárias, bem como, nas pinturas, esculturas, tam-

bém na música e na dança... A poesia e a arte estão presentes na imaginação,

nas palavras, nos gestos...

Pensei na cadência poética, tinha comigo um poema da Cecília Meirel-

les, solicitei a Tulipa que lesse em voz alta o poema abaixo:

128

Motivo

Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa.

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,

não sinto gozo nem tormento.

Atravesso noites e dias

no vento.

Se desmorono ou se edifico,

se permaneço ou me desfaço,

- não sei, não sei. Não sei se fico

ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.

Tem sangue eterno a asa ritmada.

E um dia sei que estarei mudo:

- mais nada.

Cecília Meireles

http://www.algumapoesia.com.br/poesia2/poesianet140.htm. 2006

129

Perguntei aos integrantes se haviam percebido o ritmo. Ninguém res-

pondeu, considerei que não havíamos chegado a uma compreensão, falei que

nesse poema em particular havia rimas como: tudo e mudo; fugidias e dias.

Propus uma nova leitura do poema. Eu mesma li a primeira estrofe, informei ao

grupo que estrofe é um agrupamento rítmico formado por dois ou mais versos

que, em geral, se combinam pela rima. Fiz a leitura, tentando trazer o ritmo à

presença dos ouvintes:

Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa.

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.

Cecília Meireles (Grifos, meus).

http://www.algumapoesia.com.br/poesia2/poesianet140.htm. 2006

Solicitei aos participantes que contribuíssem com um verso, no final do

poema havia um coro... Vozes que criaram um ritmo. Pedi que repetíssemos o

poema. O ritmo mais parecia uma música, gesticulei para que todos se levan-

tassem então as jovens passaram a levantar os braços, batendo palmas como

num clamor rítmico.

Uma das entradas que caracteriza o modo de ser da linguagem

é o estudo dos seus ritmos. O ritmo é como um imã - convoca

as palavras. No fundo de todo fenômeno verbal há um ritmo. As

palavras se juntam e se separam atendendo a certos princípios

rítmicos. Se a linguagem é um vaivém de frases e associações

130

verbais regidos por um ritmo secreto a reprodução desse ritmo

nos dará poder sobre as palavras. (PAZ, 1982, p. 64).

O poema foi declamado várias vezes, para que pudessem assimilar e

sentir o ritmo... Fiquei petrificada com aquele momento mágico, muitas ima-

gens passaram pela minha mente, estava ali para falar de arte, do ritmo e a

poesia se fez presente. “Com a explosão de uma imagem, o passado longín-

quo ressoa ecos e já não vemos em que profundeza esses ecos vão repercutir

e morrer”. (BACHELARD, 2005, p. 2). Pelo entusiasmo principalmente para as

jovens flores, percebi que era um instante poético único que jamais se repetiria.

“A imagem poética tem um ser próprio e um dinamismo próprio”. (BACHE-

LARD, 2005, p. 2).

Com o silenciar das vozes observei cada rosto, neste deslumbre que ca-

da flor poderia se revelar através do olhar e das palavras, bem como, através

do silêncio. Considerei que era um momento bastante propício e perguntei o

que haviam achado do ritmo e como sempre fazíamos nos encontros anterio-

res, fui sinalizando para que cada pessoa se reportasse.

Lembro de ter ouvido os seguintes comentários:

“Não queria ficar parada”

“Queria levantar e gesticular”

“Gostei do som das vozes”

“Parecia um jogral”

“Não, parecia um coral!”

Tulipa não se conteve, levantou e perguntou se era possível encontrar

poesia na música.

131

Respondi que sim, pois a poesia é uma arte, e sendo arte habita todos

os lugares, inclusive a música. Esclareci que a poesia não está presente ape-

nas nos poemas, mas deixei bem claro que nosso trabalho tinha um tempo limi-

tado, talvez não fosse possível falar sobre música e poesia. Tulipa insistiu per-

guntando que poderiam arrumar um tempo nos fins de semana para realizar

ensaios. Eu quis saber de que ensaio Tulipa estava falando. Ela disse que “as

flores” tinham conhecimento sobre o meu trabalho e poderiam ensaiar algo que

pudessem apresentar.

Não respondi imediatamente, pois precisava assimilar aquele momento.

Durante muito tempo busquei na poesia uma forma de representar, e porque

não representá-la através, da dança e dos gestos, lembrei-me de uma canção

que fala de alecrim, uma canção que inicia lenta e vai ritmando cada vez mais

até chegar numa salva de palmas, como as jovens haviam feito ali com o poe-

ma da Cecília Meirelles. A música em questão é a música “Tanto Mar”, 1978,

de Chico Buarque de Holanda:

Tanto Mar

Foi bonita a festa, pá

Fiquei contente

Ainda guardo renitente um velho cravo para mim

Já murcharam tua festa, pá

Mas certamente

Esqueceram uma semente nalgum canto do jardim

Sei que há léguas a nos separar

Tanto mar, tanto mar

Sei, também, quanto é preciso, pá

Navegar, navegar

132

Canta primavera, pá

Cá estou carente

Manda novamente algum cheirinho de alecrim.

(BUARQUE, Cara nova Editora Musical, 1978).

Há uma salva de palmas no final da música que termina abruptamente.

As garotas e o grupo estavam olhando, aguardando uma resposta, pensei que

a representação poderia ser gratificante para todos (as) nós. Seria uma evolu-

ção para o grupo e um grande presente para os professores.

Pensei no Projeto Generosidade: Ritmo, voz e flores em que o antropó-

logo Tião Rocha e a diretora teatral Regina Bertola uniram arte, educação, soli-

dariedade e investiram tempo e trabalho na formação de um coral de crianças

carentes, nascidas na cidade de Araçuaí, no centro do Vale do Jequitinhonha

em Minas Gerais.

Tião Rocha e Regina Bertola são parceiros na prática e nas i-

déias: trabalham com as crianças dando oportunidades para que

escolham seus caminhos. Há criança, pobreza, música, isola-

mento geográfico, dança e solidariedade. Ensina dignidade, res-

gata auto-estima e se baseia no educar com esperança. - Proje-

to Generosidade - Ritmo, voz e flores: Com arte, dois mineiros

resgatam dignidade de crianças no Vale do Jequitinhonha. (Re-

vista Crescer, Edição 155, 2006).

Porém deixei claro que deveríamos ter muita responsabilidade se assu-

míssemos tal tarefa, pois tudo seria registrado e iria para a dissertação, além

disso, elas teriam que encontrar dentro da música e da representação a pre-

133

sença da poesia e depois disso relatar fielmente ao grupo. Tulipa, respondeu

que se responsabilizaria pelos ensaios e que seriam feitos em dias e horários

diferentes dos encontros, mas deu a palavra que todas, sem exceção continua-

riam a participar dos encontros na casa de “M” inclusive, para relatar sobre a

poesia e a evolução dos ensaios.

De comum acordo as jovens flores agendaram os ensaios da perfor-

mance para todos os sábados as 16h00mim. Na residência de Tulipa. No de-

correr de todos os ensaios pude acompanhar a evolução das mesmas, o esfor-

ço e o trabalho que trariam uma linda colheita, bem próxima do outono.

134

Estalactite

Localizar na frágil espessura

do tempo, que a linguagem

pôs em vibração

o ponto morto onde a velocidade

se fratura e aí

determinar com exatidão

o foco do silêncio.

Algures o poema sonha

o arquétipo do vôo

inutilmente porque repete

apenas o signo, o desenho

do Outono aéreo

onde se perde a asa quando vier

o instante de voar

Caem do céu calcário, acordam flores

milênios depois, rolam de verso

em verso fechadas

como gotas, e ouve-se

ao fim da página um murmúrio

orvalhado.

Carlos Oliveira

135

ENCONTROS DO OLHAR

“Com um novo olhar a poesia foi o toque mágico que me

acordou de uma morte profunda que jazia em meus olhos”.

“M” Cleide Carvalho

“Eu amo seus olhos tão negros, tão puros,

que falam de amores com tanta poesia”.

Gonçalves Dias

“Em toda percepção, tem-se o paradoxo

da imanência e da transcendência”.

Merleau-Ponty,

Merleau-Ponty, em sua Obra o “Olho e o Espírito”, (1989) diz que “O o-

lho é mais livre que os demais sentidos aos quais se atribui maior carga de

passividade e sensualidade”. Em todos os momentos dos encontros na casa

de “M” tentei observar cada fato, cada gesto, cada palavra, cada sentimento...

Não é fácil, mas se existe algo que não dá para enganar é o olhar.

O olhar revela naquilo que diz e também no que não diz, pois propicia

revelações e ocultamentos. Mas na “não-revelação”, no silêncio do olhar é pos-

sível realizar uma leitura. Através de um olhar sabemos se a pessoa está triste,

preocupada, feliz, indignada. O importante é sentir o que diz cada olhar, porém

essa percepção requer grande sensibilidade, que só a poesia revela através de

uma profunda observação.

136

Naquela noite, logo no início do encontro informei ao grupo que eu seria

a escriba, mas não deveriam se sentir constrangidos ou intimidados. Naquele

encontro em questão gostaria de melhor observar e apreender a emoção poéti-

ca dos mesmos. Por isso solicitei que cada integrante, relatasse verbalmente

ou por escrito sobre o que sentiu durante os encontros com a poesia.

Segundo Thiollent, a pesquisa-ação é caracterizada como uma ação

planejada, de caráter educacional e técnico com base empírica.

Visa adquirir experiência numa questão previamente planejada e di-

vulgar os resultados posteriormente. Nessa perspectiva, a pesquisa-

ação, é um tipo de pesquisa social com base empírica, que é conce-

bida e realizada em estreita associação com uma ação na qual os

pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do

problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.

(Thiollent, 1985, p. 12).

Foi “M” quem começou a dizer o que pensava sobre os encontros e o

que havia sentido e iniciou com o seguinte relato: disse que para ela eu lem-

brava um beija-flor, pela agitação, pela fisionomia delicada, parecia querer su-

gar a essência da vida. Disse também que quando eu declamava, os poemas

se rendiam, com movimentos suaves... Como nuvens tocadas pela brisa... Ale-

crim deixa perfume no ar... Ela disse que foi através do olhar poético que se viu

em outros papéis, papéis os quais nunca imaginou. Ela disse que atualmente

uma simples fotografia passou a ser uma obra de arte e que seus olhos passa-

ram a ser extratores da beleza que outrora não poderia ser vista imediatamen-

te. Enfim, concluiu: com um novo olhar todos os sentimentos tinham sido apre-

137

endidos e que a poesia foi o toque mágico que a acordou de uma morte pro-

funda que jazia em seus olhos.

Ao concluir suas palavras “M” estava com os olhos lacrimejantes e nós

estávamos mudos e emocionados.” M” me abraçou e agradeceu. Sua voz ain-

da ressoava quando despertei para a continuidade do encontro. Não era uma

despedida apenas uma pré-conclusão.

Orquídea se voluntariou em ser a próxima a falar. Começou dizendo que

nunca havia se interessado por literatura, mas a partir dos encontros, conse-

guiu expressar seus sentimentos e entender melhor os poemas. Disse que as

leituras realizadas ajudaram-na a se identificar com coisas da vida. Orquídea

relatou que o filho Narciso havia mudado o comportamento dele na escola e

passou a gostar mais de língua portuguesa e finalizou o diálogo fazendo um

apelo, dizendo que outros escritores e professores deveriam trabalhar com

poesia em grupos, nas periferias, principalmente com crianças.

Lírio-do-vale foi o próximo a dar seu testemunho. Disse que quando ti-

nha aulas de literatura na escola achava a poesia fútil e supérflua. E era muito

revoltado com as aulas de língua portuguesa. Disse que antes vivia isolado do

mundo, pois era muito rebelde. De tanto a mãe insistir passou a freqüentar os

encontros. Foi só para esmiuçar e “desmoralizar”. Entretanto ao verificar a

tranqüilidade das pessoas se expressando através dos poemas, de forma sin-

gela, sua visão foi mudando gradativamente. Relatou que hoje já faz as pró-

prias leituras poéticas, espontaneamente e quer fazer Universidade na área de

Humanas. Agradeceu pelos os encontros dizendo que o tornaram mais huma-

no, e acredita que a poesia poderá contribuir para o renascimento de outras

pessoas.

138

O senhor Jasmim disse que sempre gostou de ler, informou que com os

encontros passou inclusive a desenhar, imaginando o que seriam as “cores

poéticas”. Ele comprou um caderno em que escreve seus feitos literários e de-

clamou o seguinte poema para melhor se expressar:

SILVIA

Sempre arrojada

Inteligente e destemida

Lançando sabedoria

Vivacidade e alegria

Irradiando sua alma

Amor por todo saber.

Sempre aprendendo e ensinando

Embelezando a vida dos outros

Ganhando assim a simpatia

Alcançando o direito de ser

Trazendo e levando ensinamentos

Toda matéria possível

Onde tudo parece impossível

Mulher, música e luz.

Carinho, meiguice, fulgor.

Perfume, doçura, aroma.

139

Encanto, ternura, amor.

Lázaro Ramos de Moraes

(Senhor “Lazinho” – Jasmim do poeta).

O senhor Jasmim, estava meio trêmulo para continuar falando, mas to-

dos o aplaudiram, recebeu elogios do grupo e ficou encabulado. O fato é que o

senhor Lazinho tem “arriscado” como ele diz, a escrever poemas e crônicas,

desde que passou a freqüentar o grupo. Sempre diz que sou a musa inspira-

dora dele, tem sido um grande exemplo para todos nós porque com seus no-

venta e dois anos mostra claramente a alegria de viver estampada no rosto,

marcado pelas areias do tempo. A verdade é que a poesia o conquistou.

Violeta disse que a vida é feita de poesia. Ela relatou que ganhou um li-

vro de poemas da Cecília Meirelles e é uma apaixonada por haicais, disse que

gosta de rimas, se sente feliz com os encontros e enquanto puder participará

de todas as atividades da escola, principalmente as literárias.

Faço aqui uma breve observação sobre a jovem Violeta, depois que

passou a freqüentar o grupo ganhou um prêmio na Escola “Maestro Germano

Benencase” de melhor leitora.

Naquela noite devido aos compromissos escolares as jovens flores não

estavam presentes, excetuando Tulipa, que fez o relato em nome das demais.

Ela disse primeiramente que se sente realmente uma “flor com aroma da noite”

e durante o tempo que estiveram com o grupo foi muito promissor, pois perce-

beu um comprometimento dos participantes com o aprendizado. Tudo o que

vivenciaram contribuiu para ajudá-las na escola.

140

Em particular relatou que já consegue “ver a poesia”: nos olhares das

pessoas, nas noites escuras e frias, na chuva, nas flores e, principalmente na

vida. Todos os depoimentos foram emocionantes demais para palavras. Só

tenho a dizer que a poesia deve continuar e essa é também a intenção do gru-

po. Os participantes perguntaram o que eu senti com os encontros. Expliquei

que, quando se trata de poesia não sou tão coerente.

Eles sabem que a poesia é minha vida, pois faz parte dela. Nada para

mim teria sentido se não fosse vivenciado com poesia. Eu aprendi muitas coi-

sas novas ao ler e estudar a poesia. As leituras que me foram sugeridas pelo

professor orientador Dr. Severino Antônio, a quem atribuo muitas descobertas,

foi sábio o bastante para me fazer enxergar outras faces da poesia. No início

eu fui bastante resistente, pois achava que sabia muito e na verdade, posso

falar por mim, descobri que sei pouco e não posso deixar de buscar a poesia.

Porém num contexto não muito objetivo, pelas leituras que fiz, e também

pelo que sinto, posso dizer que a poesia habita todos os lugares, é uma arte e

muito preciosa, é a essência da vida, tem ritmo criador, a poesia dentro do

poema cria mundos revela e desvela sentimentos, abre novos horizontes, rom-

pe as barreiras da linguagem e da imaginação. A poesia não nos limita, porém

nos completa, o leitor poético, consegue identificar figuras de linguagem, ana-

logias, metáforas, enriquece seu vocabulário pelo fato de a poesia ser a mais

complexa e a mais condensada de todas as linguagens.

Para fechar nosso encontro, solicitei a cada integrante que dissesse uma

frase ou palavra conceituando a poesia. E como escriba do grupo, naquele en-

contro, relato cada frase ou palavra que foi dita:

Margarida – Linguagem da alma

141

Orquídea – Descoberta e encontro

Violeta – Lindos sonhos

Cravo – Conhecimento

Narciso – Alegria

Jasmim – Cores que tingem a vida

Lírio do Vale – Humanização

Tulipa – Alegria rítmica

Rosa Silvestre – Luz radiante

Alecrim – Razão de viver

O que mais posso dizer? Durante o período da dissertação fui em busca

de encontros de outras pessoas com novos olhares sobre a poesia, mas des-

cobri que também me encontrei. Quem encontra a poesia, encontra consigo

mesmo e passa a ter um novo olhar para toda vida. Eu também tenho um novo

olhar sobre a poesia.

Com essas palavras finalizo o relato dessa pesquisa, porém que fique

bem certo. Declaro em nome do grupo “Meu Jardim”, que nossos encontros...

Continuam ocorrendo toda quinta-feira as 19h00min na casa de “M”.

142

POÉTICA

Mas o que vou dizer da poesia? O que vou dizer dessas nuvens no céu?

Olhar, olhar, olhá-las, olhá-lo, e nada mais. Compreenderás que um poeta não

pode dizer nada da Poesia. Isso fica para os críticos e professores. Mas nem

tu, nem eu, nem poeta algum sabemos o que é Poesia.

Aqui está; olha. Tenho o fogo em minhas mãos. E o entendo e trabalho

com ele perfeitamente, mas não posso falar dele sem literatura. Compreendo

todas as poéticas; poderia falar delas se não mudasse de opinião a cada cinco

minutos. Não sei.. Pode ser que um dia eu goste muito da má poesia, como

gosto (gostamos) hoje, com loucura, da música má. Queimarei o Paternão du-

rante a noite, para começar a erguê-lo pela manhã e não terminá-lo nunca.

Em minhas conferências tenho falado às vezes da Poesia, mas a única

coisa de que eu não posso falar é da minha poesia. E não porque seja um in-

consciente do que faço. Ao contrário, se é verdade que sou poeta pela graça

de Deus – ou do demônio -, também é verdade que o sou pela graça da técnica

e do esforço, e da minha percepção absoluta do que é um poema.

Federico Garcia Lorca

143

CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Poesia é a criação rítmica da beleza”.

Mallarmé

“A Poesia é a palavra mais humana da existência”.

Maiakovski

“Poesia é representar o belo por meio da palavra rítmica”.

Auguste Magne

“A Língua vive como uma grande árvore cujas raízes atin-

gem o mais fundo da vida social e cerebral, cuja copa res-

plandece no céu das idéias dos mitos, cujas folhas farfa-

lham em miríades de conversas”.

Edgar Morin

A primeira consideração a ser feita nesse trabalho foi, a minha própria

redescoberta da poesia com novos olhares. Um encontro comigo mesma na

perspectiva de uma nova visão poética. Um trabalho envolvente que conseguiu

me direcionar através de um caminho que eu já percorria, mas não tinha a níti-

da consciência disso.

Tenho buscado a poesia desde bem jovem, mas nesses dois anos tive o

prazer de encontrá-la por completo e a maior felicidade é saber que ela faz par-

te da minha vida de uma maneira tão sublime e ao mesmo tempo tão profun-

damente enraizada, que é algo que não quero mais me desprender.

144

O essencial muitas vezes nos escapa e acabamos por conhecer muito

da superfície das coisas e pouco da profundidade, do que realmente

fundamenta tudo. Descobri que há muitos caminhos para percorrer, mas

infelizmente o tempo é implacável. Então nesse pouco tempo que resta peço a

Deus que me faça viver o bastante para ter a humildade de multiplicar e

partilhar conhecimentos que aprendi e que possa continuar aprendendo.

No sentido de suscitar respostas que sejam conclusivas sobre a poesia,

gostaria de dizer que ela é extensa, bela e inquietante. É desconstrução e re-

construção da linguagem ao mesmo tempo. É uma arte literária e, como arte,

cria e recria a realidade. Poetizar é expressar-se de forma a combinar palavras,

mexer com o seu significado, utilizando metáforas e imagens. A poesia sempre

se encontra dentro de um contexto cultural e histórico.

É difícil precisar um conceito de poesia. A poesia é criação humana que

espelha a pluralidade de sentidos. Não pode ser medida como: imaterial, com-

plexa ou abstrata. Poesia é uma criação que vem da sensibilidade e da técnica.

A leitura poética é um jogo, com muitos significados de recriação semântica e

sonora. A linguagem poética possibilita a troca de experiências entre as pesso-

as de um grupo social, pois é capacidade que um indivíduo tem de se comuni-

car através dos significados e dos signos que a compõe.

Educar poeticamente é habitar os continentes humanos, educar é vida, é

humanizar, é dialogar com o semelhante através das várias leituras que o

mundo proporciona. O sujeito tem voz e tem história e para reconhecê-lo como

um sujeito-cidadão, que tem voz, deve ser dialógico, inserido em uma socieda-

de que constrói a história.

145

A autonomia do indivíduo humano se funda na qualidade de

sujeito que se auto-afirma ocupando o centro do seu mundo,

mas que comporta um nós (família, espécie, sociedade), uma

inscrição comunitária (família, pátria), hereditária, histórica e

cultural. (MORIN, 2002, p. 19).

Quando realizei a pesquisa-ação nos Bairros Jardim Thelja e Jardim Al-

vorada, percebi que os pesquisados não tinham uma consciência totalmente

clara da própria identidade. No decorrer dos encontros passaram a perceber

que tinham um “signo” e começaram a se identificar com coisas do dia a dia,

aparentemente óbvias que antes não percebiam em busca de uma identidade

cultural. De acordo com a visão heideggeriana “... todo ser se faz presente na

medida em que seu modo de ser possui essencialmente o caráter da presen-

ça...” (HEIDEGGER, p.54, 1971).

Observei que cada detalhe, aparentemente prosaico, passou a ser vivi-

do mais intensamente pelos integrantes, transformando-se em poesia, dando

novos sentidos às experiências. A poesia na vida dos aprendizes passou a ser

manifestação e expressão da existência. Foi um trabalho que levou a muitas

reflexões poéticas, abrindo espaços para que as pessoas pudessem se ex-

pressar com opiniões sob diferentes olhares.

Octávio Paz, em suas concepções faz a seguinte citação sobre poesia,

linguagem e sociedade fazendo a seguinte citação:

Uma sociedade sem poesia careceria de linguagem. Uma poe-

sia sem sociedade seria um poema sem autor, sem leitor, e a ri-

gor, sem palavras. A poesia não é algo que possa ingressar no

intercambio de bens mercantis, não realmente um valor. E se

não é um valor não tem existência real dentro do nosso mundo.

O poeta já tem um “lugar” na sociedade e a poesia tem? O po-

146

ema se nutre da linguagem viva de uma comunidade, de seus

mitos, seus sonhos e suas paixões. (Paz, 1982 p 310).

O principal objetivo com o grupo foi tentar, através da poesia, despertar

a imaginação para a construção de conhecimentos polissêmicos e a formação

do leitor poético. Como também, conscientizá-los sobre a importância do diálo-

go, sempre a procura de respostas, de apreender valores na sociedade atual e

compreender como esses valores assumem papéis na configuração das identi-

dades. E como autores da palavra, jogar com a linguagem, que é criação. Em

cada novo encontro, retomávamos que havia sido apreendido no encontro an-

terior para partilhar opiniões, emoções, principalmente aprendizado.

A poesia se faz urgente. Muitos tornar-se-iam melhores se a conhe-

cessem. No entanto, permanecem apenas, latentes... Pound dizia que “a poe-

sia é linguagem condensada e carregada de significados”; Paz fala da “sacrali-

dade da poesia” e Morin, de sua “complexidade”; Murilo Mendes diz que ”viver

a poesia é mais importante que escrevê-la “; Severino Antonio, nos diz que “A

poesia educa enquanto poesia”. Holderlin nos fala que “ o homem habita a terra

poeticamente” e Bachelard diz que a “poesia vive no limiar do ser”... A poesia,

sempre bela e essencial em seu sentimento de mundo, torna-se cada vez mais

necessária.

As pessoas continuarão resistindo a poesia? Penso que sim, mas a poe-

sia passou por milênios e se mantém majestosa. Penso que num futuro bem

próximo a sociedade terá que repensar valores, principalmente os de comuni-

cação e expressão para que exista uma sociedade mais dialógica e humana.

A poesia restaura e recoloca, nas mãos dos homens, o sentido da

sua própria humanidade. É do homem, pelo homem e para o homem que a

147

poesia existe. Para falarmos de uma sociedade mais humana será preciso ha-

bitá-la poeticamente. “O ser humano é acima de tudo um ser de linguagem,

essa linguagem exprime seu desejo de encontrar o outro e estabelecer uma

comunicação” (Dolto, 1999, p. 64).

A palavra poética não ficará no deserto da abstração. Discutir conheci-

mentos polissêmicos é discutir a especificidade da linguagem da poesia e sua

relação com o sujeito e o mundo.

Conhecimento e criação poética são indissociáveis, pois, quando algo

que não existia passa a estar presente, essa presença nos convoca a partici-

par de sua existência, modificando o nosso modo de estar no mundo. Portanto,

a participação significa transformar a poesia em plenitude, alumbramento e

contemplação. E nos convoca ao encontro dialógico e poético, sob um novo

olhar.

148

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154

APÊNDICES

155

Apêndice – I - Projeto enviado à APAM

JUSTIFICATIVA

A leitura é uma maneira de interagir com o mundo e de transitar com a

linguagem, vai muito além de um mero instrumento de informação. As leituras

trabalham com o idioma de uma comunidade, portanto têm papel fundamental

em qualquer sociedade. Muitas pessoas necessitam da descoberta da leitura,

de uma sociedade leitora mais democrática, porque o ser humano é um ser de

palavras.

O texto literário constitui-se em espaço privilegiado de interação entre

disciplinas uma vez que nele a linguagem é repleta de inferências, transversal

por excelência... A leitura e a interpretação de textos diversos como notícias,

propagandas, panfletos, letras de canções, histórias em quadrinhos, mapas

históricos e geográficos, possibilitam ao leitor obter informações e conhecimen-

to de mundo e desenvolver habilidades e competências em leitura e em produ-

ção de textos.

O interessante ao desenvolver uma consciência lingüística nas pessoas

é mostrar que uma educação boa não serve para salvar ninguém, que não ma-

ta fome de ninguém, não diretamente. Alguém que domine vários tipos de lin-

guagem tem mais chances de se adaptar ao mundo, em diversas esferas, seja

em trabalho, em convivência, em realização pessoal. A linguagem é como uma

roupa: vivemos em sociedade e os costumes coletivos ditam que em certo am-

biente deve ser usada determinada gama de roupas, e algumas podem ser a-

dequadas para vários ambientes e muitíssimo inadequada para outros, entra

aqui um fator de estética dentro da convenção social. Assim cada tipo de lin-

guagem também tem o momento de ser usada.

Daí a necessidade e a importância de se construir um projeto que venha

atender às expectativas dos sujeitos para suprir carências (em leitura, interpre-

156

tação de textos, expressão oral, visual e escrita) e que se constituísse em

perspectiva de uma Educação para a Cidadania.

PROBLEMATIZAÇÃO

A linguagem está presente desde muito cedo na vida do ser humano é

uma ferramenta usada para sobreviver, seja no nosso mundo atual ou em

qualquer outro passado. Não devemos tratar a educação como uma forma de

‘salvar’ as pessoas, mas sim como uma forma de libertar, ou melhor, de dar

liberdade.

Pode-se dizer que o fato de alfabetizar uma pessoa, que talvez não o

queira ser, seja um tolher da liberdade individual. Mas levando em conta só as

pessoas que estão no processo de letramento (elas já estão sofrendo o pro-

cesso, por diferentes razões), devemos fazer com que isso ocorra da melhor

forma possível, que ganhem a liberdade de escolher no futuro, se já não pude-

ram escolher ser ou não letradas.

Estudos indicam que o analfabetismo é um fenômeno que está presente

com maior predominância não só nas regiões mais pobres do país, como tam-

bém na periferia dos grandes centros urbanos. Esses fatos apontam para a

necessidade de as políticas de combate ao analfabetismo levarem em conta os

diferentes perfis dos segmentos que se encontram nessa situação.

O Brasil é um país de poucos leitores, embora possua em seu acervo

uma vasta criação literária. A literária não foi criada para uma minoria, ela exis-

te para todos, por isso, precisamos de renascimentos: o renascimento da leitu-

ra e da poesia sob um novo olhar.

OBJETIVO

Montar uma sala de leitura dentro da Entidade APAM – Associação de Promo-

ção ao menor de Americana.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

157

Por objetivo específico desenvolver um trabalho de leituras para:

� estimular o gosto pela leitura poética;

� trabalhar na formação do leitor poético;

� despertar a criatividade;

� conscientizar o sujeito de que a leitura é algo que quando

conquistada lhe dará autonomia para expressar-se plena-

mente através da linguagem falada ou escrita;

� exercitar a linguagem , através de uma relação dialógica

em que estejam presentes a análise, a interpretação e a

aplicação de recursos expressivos relacionando os textos

com seus contextos;

� demonstrar o contato com diferentes tipos de linguagem

(verbal/não verbal);

METODOLOGIA

Os encontros deverão ser realizados semanalmente com duração de 60

minutos. Nesses encontros haverá oportunidade para realização de leituras,

discussão, questionamentos, estudos de autores e trabalhos específicos sobre

literatura.

DESENVOLVIMENTO E CRONOGRAMA

Início das atividades: 15/08/2005.

Sugestão – Fazer da Sala de leitura um espaço aberto à toda Comuni-

dade, independente da faixa etária, nos dias e horários em que a APAM estiver

em funcionamento.

158

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tária.

www.icpg.com.br/artigos. Proposta Curricular.

159

Apêndice II Oficina realizada na Escola de Educação infantil Maria-fumaça em 30/08/2006, com poesia.

160

Apêndice III

Oficina Realizada com o Grupo no Jardim Thelja Jardim Alvo-rada em março de 2007.

161

Apêndice - IV – Sr Lázaro Ramos - Jasmim do poeta

“A leitura inspirou-me a escrever e desenhar. Não signifi-

camos nada nesse universo tão imenso. Nunca imaginei

que chegaria a essa idade, muito menos que escreveria...

Acredito que a leitura e a escrita é uma forma de contribu-

ir para um mundo melhor”. Como diz Fernando Pessoa:

“[ tudo vale a pena se a alma não é pequena]”.

Lázaro Ramos – 92 anos

Palavras do Senhor Lázaro Ramos citando, no final: Fernando Pessoa.

Produção realizada por Silvia Regina Segato

162

Apêndice – V – As Jovens flores

163

ANEXOS

164

Anexo I – Mapa de Americana

http://www.guiaamericana.com.br/2005/mapageral.htm

165

Anexo II – Mapa dos Jardins: Thelja e Alvorada

http://www.guiaamericana.com.br/2005/mapabairros.htm

166

Anexo III - Homenagem à Mulher de Pedra – “M”

...os poemas são cheios de palavras por dentro

e as palavras que há nas pedras perduram ao vigor dos cinzéis

são como casas construídas sobre rochedos

falam de nós se na infância as levávamos nos bolsos

falam de nós como se fossem poemas

e nós escutamos a sua voz

porque expomos as nossas mãos ao silêncio

as pedras estão cheias de silêncio por dentro

como se fossem poemas

as palavras habitam o coração do silêncio

e se eu não sei contar as palavras que há dentro dos teus poemas

como posso saber quantas habitam o coração do teu silêncio.

José Rui Teixeira

167

Anexo - IV – Certificado da Palestra Poema e poesia no CEESA

168

Anexo – V – Fragmento de Jornal sobre Feira do livro na FAEC

169

Posfácio

Homenagem a meu paiHomenagem a meu paiHomenagem a meu paiHomenagem a meu pai

Hoje é dia dos pais. Eu e o Pedro

fizemos uma visita Abracei-o e vi

Que seus olhos azuis brilhavam muito...

Beijei sua testa e percebi que as bochechas

estavam rosadas... As mãos cheias de rugas

apertaram as minhas num sinal de assentimento.

Ao abraçar meu filho Como sempre...sorriu...feliz

E ele nunca esteve tão frágil e suscetível!

Ele também nunca esteve tão translúcido e lindo...

Uma homenagem de Silvia Segatto para seu Pai Santo Segatto

Americana, dia dos pais, agosto de 2006.

Meus paisMeus paisMeus paisMeus pais contribuíram para a minha formação por toda a contribuíram para a minha formação por toda a contribuíram para a minha formação por toda a contribuíram para a minha formação por toda a vida e me ensinvida e me ensinvida e me ensinvida e me ensinaaaaram a ter ram a ter ram a ter ram a ter ética e valores, pai estás representando ética e valores, pai estás representando ética e valores, pai estás representando ética e valores, pai estás representando a família Segatto,a família Segatto,a família Segatto,a família Segatto, e e e e e e e esssstttta homea homea homea homenagem se estenagem se estenagem se estenagem se esten-n-n-n-de de de de a minhaa minhaa minhaa minha amada mãe amada mãe amada mãe amada mãe Maria do CarmoMaria do CarmoMaria do CarmoMaria do Carmo e meus irmãos: Célia, José Carlos, Ant e meus irmãos: Célia, José Carlos, Ant e meus irmãos: Célia, José Carlos, Ant e meus irmãos: Célia, José Carlos, Antôôôônio nio nio nio Carlos, Sandra e SelmaCarlos, Sandra e SelmaCarlos, Sandra e SelmaCarlos, Sandra e Selma....

170

“Sobreviver a dor da perda é uma ato de coragem;

transpor obstáculos é o grande jogo da vida;

Deus é a maior prova de toda inspiração poética”.

A outra margem

Você chegou

através do silêncio.

Revelando: a saudade, a distância,

a paixão e a morte...

Provei do cálice

da imortalidade do amor,

mas, perdi no pântano

a essência da vida...

A poesia é a única companheira

testemunha da dor

aprisionada no sótão

de todos esses anos...

Caminhando às cegas

em meio a névoa

te esperarei

na outra __ margem.

Obrigada, por me orientar e acima de tudo por me compreender e amar a

poesia tanto quanto eu.

Silvia Segatto

Homenagem a meu Professor orientador Drº. Severino Antônio

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