ENSAIO 1 Quem Eram Os Escravos Africanos

Embed Size (px)

Citation preview

  • 7/27/2019 ENSAIO 1 Quem Eram Os Escravos Africanos

    1/6

    UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

    MUSEOLOGIA

    SANDRA MARIA SALDANHA KROETZ

    Ensaio acadmico apresentado para obteno de avaliao

    parcial para a disciplina Antropologia do Negro no Brasil,

    do curso de Museologia da Universidade Federal da

    Bahia.

    Orientador: Prof. Joclio Teles dos Santos

    Salvador2011

  • 7/27/2019 ENSAIO 1 Quem Eram Os Escravos Africanos

    2/6

    INTRODUO

    Sandra Maria Saldanha Kroetz1

    Os escravos africanos trazidos da frica para o outro lado do Atlntico eram reunidosde acordo com sua procedncia por traficantes europeus, americanos e africanos, entre outros,

    que, objetivando facilitar o trfico, eram renomeados quando do ato do batismo, de acordo

    com seu lugar de origem, que no revelavam as etnias a que eram vinculados antes de sua

    captura e convertidos em escravos. Eram na verdade, etnnimos2 que juntavam os nomes de

    portos de embarque, dos locais onde eram vendidos, alguns reinos e muito raro suas prprias

    origens tnicas.

    O agrupamento de grupos tnicos acabou sendo reconstruda e imposta pelos prpriosnegros escravizados, resultando numa identidade tnica que formatou os modos de

    organizao, a vida religiosa, os matrimnios, redefinindo a ligao entre escravos africanos

    oriundos de vrios grupos.

    Este ensaio objetiva demonstrar de maneira suscinta os temas apresentados por Maria

    Ins Corts Oliveira3 e Mariza Soares4 nos artigos Quem eram os Negros da Guin A

    origem dos Africanos na Bahia5 e Mina, Angola e Guin: Nomes d'Africa no Rio de Janeiro

    Setecentista6, respectivamente, os quais as autoras delimitaram o campo de estudo entre os

    sculos XVII e XVIII.

    Quem eram os Negros da Guin expe um panorama sobre os nomes de Nao

    atribudos aos primeiros africanos da Bahia e debate o significado tnico de alguns nomes de

    povos que no correspondem auto-adscrio africana.

    O texto de Mariza Soares debate a origem, procedncia e designao do trfico dos

    escravos, a distino entre nao e grupo tnico, alm da controvrsia sobre o uso da noo de

    identidade tnica africana.

    As autoras buscam compreender alguns aspectos do sistema escravista, contribuindo

    para elucidar questionamentos sobre a origem tnica e as influncias culturais dos escravos

    africanos, que passaram a compor o contingente populacional do Brasil escravocrata.

    1 Sandra Maria Saldanha Kroetz, graduanda do Curso de Museologia da UFBA, turma 2009/1.2 Etnnimo=Nome de povos, tribos, castas...., disponvel em www.aurelioonline.com, consultado em 05/09/2011.3 Maria Ins Crtes de Oliveira, professora de Mestrado em Histria da Faculdade de Filosofia e Cincias Humanas da

    UFBA.

    4 Mariza de Carvalho Soares professora do Departamento de Histria da Universidade Federal Fluminense e doutora peloPrograma de Ps-Graduao em Histria da mesma Universidade.

    5 Oliveira, Maria Ins Crtes. Quem eram os negros da Guin?Afro-sia. SP: 1997, n19-20, p.37-73.6 Soares, Mariza de C.Mina, Angola e Guin: nomes dfrica no Rio de Janeiro setecentista . Tempo, n.6. p.73-94.

    http://www.aurelioonline.com/http://www.aurelioonline.com/
  • 7/27/2019 ENSAIO 1 Quem Eram Os Escravos Africanos

    3/6

    QUEM ERAM OS NEGROS DA GUIN A Origem dos Africanos na Bahia7

    MINAS, ANGOLA E GUIN Nomes d'Africa no Rio de Janeiro Setecentista8

    Quando do inicio da escravido vieram para o Brasil negros das mais diversas naes

    africanas, uma vez que era prtica da poltica colonial portuguesa variar a combinao do

    negro africano traficado para dificultar sua unidade e mant-los submissos, o que resultou na

    criao de diferentes grupos tnicos, com uma grande variedade de lnguas.

    Segundo Maria Ins Oliveira, Negro da Guin e gentio da Guin foram as

    primeiras indicaes para registrar a origem dos escravos escravizados desembarcados na

    Bahia no sculo XVI, no significando um registro de procedncia, mas uma condio de

    escravo9.O que era a Guin, afinal, nos tempos de trfico de escravos? No incio, para os

    portugueses, era somente a Costa Ocidental Africana, subordinada ao Cabo Verde, mas com a

    expanso do comrcio portugus passou a designar outras partes do Litoral, como Costa do

    Marfim, Costa da Pimenta, Costa do Ouro e Costa dos Escravos, estendendo-se assim toda a

    frica Ocidental ao Norte do Equador, do Rio Senegal ao Gabo10.

    Os negros, que eram oriundos da Guin, de Angola, da Costa da Mina, do Congo, de

    Moambique ou de qualquer outra regio da frica, recebiam novos nomes quando de seusbatizados, sendo que as terminologias como mina, benguela e angolas referiam-se aos

    portos de embarque no continente africano e no a sua origem tnica. Esses escravos

    provavelmente originaram-se dos conflitos ocorridos no interior da regio dos portos do

    trfico de escravos das etnias iorub, ond, egb e ijex, todos utilizadores da lngua iorub e

    que na Bahia, foram indiscriminadamente denominadas nag11.

    Oliveira, apud Costa Lima12 narra que o termo nag teria se originado de um apelido

    pejorativo que os iorubas da fronteira do Daom receberam dos fons, cuja verso foi recolhidapor Costa Lima durante uma pesquisa no Benin em 1963, de que a palavra nag significaria

    sujo, piolhento, faminto, referindo-se de como os nags chegaram Daom fugindo das

    guerras tribais.13

    Outro termo utilizado na Bahia era jeje (gege), empregado na frica para os gun,

    7 OLIVEIRA, Maria Ins Crtes. Quem eram os negros da Guin?Afro-sia. SP: 1997, n19-20, p.37-73.8 SOARES ,Mariza de C. Mina, Angola e Guin: nomes dfrica no Rio de Janeiro setecentista . Tempo, n.6. pp.73-941.9 OLIVEIRA, op.cit., p.37.

    10 Ibid., p. 39.11 Ibid. p.74.12 Ibid. p.64.13 Iid. p. 64

  • 7/27/2019 ENSAIO 1 Quem Eram Os Escravos Africanos

    4/6

    tambm chamados djedji, do reino de Hogbonu, em Porto Novo. No Brasil, estendeu-se aos

    povos ajas-fons da regio do Dahom, Porto Novo e vizinhos.

    Oliveira no apresenta detalhes sobre o grupo hauss, outro grupo tnico presente na

    Bahia e identificado pela rede do trfico, por considerar j bem definido pela historiografia.

    O termo iorub, segundo Oliveira, enquanto etnnimo, de uso recente e pouco

    frequente, aparecendo algumas vezes, apesar disso, entre os registros de escravo, como se

    fosse uma subdiviso dos nags, sendo que era originalmente usado exclusivamente aos

    habitantes de Oy, atualmente Nigria Ocidental.14

    O resultado dessa pesquisa levou Maria Ins considerar ter ocorrido na Bahia uma

    forma reconstruda de identificao tnica, em torno do qual os diversos grupos africanos se

    organizaram para enfrentar de uma maneira muito peculiar as novas condies de vida que lheeram impostas o regime de escravido.15

    Mariza de Carvalho Soares, deixando de lado a questo da etnia, deteve-se na

    controvrsia sobre o uso da noo de identidade tnica, investigando para este fim, aos mais

    remotos livros de assento de batismo de escravos do Arquivo Metropolitano da Cria do Rio

    de Janeiro, relativos cidade do Rio de Janeiro, entre os anos de 1718 e 1760.

    Para Soares, no existe homogeneidade nos nomes das procedncias do escravos, uma

    vez que vo desde nome de Vilas, Portos de embarques, reinos, entre outros. Ela afirma queos registros das naes tendem a reagrupar pequenos grupos tnicos sob identidades maiores,

    como Congo ou Mina ou ainda como de nao , denotando identidades construdas do lado

    de c do Atlntico, servindo esta travessia como ruptura e redefinio das identidades

    tnicas.16

    A leitura dos livros de assento de batismo pesquisados por Soares a fizeram perceber

    que a distribuio dos escravos era efetuada em dois grupos: os nascidos no mbito da

    sociedade colonial, que eram organizados com base nos critrios de cor (pretos e pardos) e osnascidos fora do mbito da sociedade colonial, organizados pela procedncia (gentil/nao,

    angola, mina, etc), uma vez que os eclesisticos sentiram que essa exigncia no eram

    somente observaes formais, mas essenciais para identificao dos escravos.

    Soares observou a diferenciao no modo de identificao da procedncia dos

    africanos, com a indicao no nome do escravo, de gentio ou nao a que pertencem,

    citando que a palavra gentio est associada s gentes, enquanto a palavra nao diz respeito

    gente de um pas ou regio, que tem lngua, leis e governo a parte. Observa ainda a autora,

    14 OLIVEIRA, ibidem., p. 7415 OLIVEIRA, op.cit, p. 6716 SOARES ,Mariza de C. Mina, Angola e Guin: nomes dfrica no Rio de Janeiro setecentista . Tempo, n.6. pp.73-941.

  • 7/27/2019 ENSAIO 1 Quem Eram Os Escravos Africanos

    5/6

    que, diferente de Angola e Mina, que podem ser gentios ou naes, guin sempre um gentio.

    Assim como Maria Ins Cortes Oliveira, Mariza de Carvalho Soares acredita que

    houve uma reconstruo da identidade tnica dos grupos africanos, ao tempo em que utiliza

    um dos conceitos antropolgicos de apropriao, onde cultura vista como sujeita a

    constantes apropriaes, privilegiando as formas de organizao dos indivduos em novos

    grupos, embora no eliminando a importncia da organizao social e da cultura das

    populaes escravizadas. Utiliza como exemplo o caso de um grupo de procedncia denominado

    mina no Rio de Janeiro, que pode ser diferente daquele designado mina na Bahia, em

    Pernambuco ou no Maranho

    CONCLUSOVrios estudiosos tm conseguido reconstituir alguns caminhos percorridos pelos

    africanos e seus descendentes nas Amricas, sempre levando em conta as relaes sociais e

    culturais entre os diferentes grupos nos dois lados do Atlntico.

    Estas leituras so uma alavanca para se repensar a origem, os conceitos e as

    caractersticas culturais de alguns povos africanos traficados, matria j amplamente

    transmitida e por todos assimilada, muitas vezes de forma equivocada, uma vez que

    determinados termos que foram usados para identificar as procedncias dos escravos eramtermos utilizados tantos pelos europeus quanto pela populao das colnias para designar os

    indivduos pertencentes a grupos que lhe eram conhecidos.

    Alm disso, a assimilao de forma equivocada, gera ideias no verdadeiras como por

    exemplo na superioridade dos povos "sudaneses" em relao aos "bantos" e da classificao

    da lngua falada pelos jejes como pertencente ao grupo ew.

    Maria Ins Cortes Oliveira e Mariza de Carvalho Soares buscaram entender em seus

    estudos, o processo pelo qual pessoas de vrias origens, lnguas e religies se integraram,

    entre eles e com os que j habitavam a colnia. Trata-se de valiosa contribuio que procura

    resgatar a multiplicidade das culturas que contriburam para a formao da populao e da

    prpria cultura brasileira.

  • 7/27/2019 ENSAIO 1 Quem Eram Os Escravos Africanos

    6/6

    BIBLIOGRAFIA

    OLIVEIRA, Maria Ins Cortes de "Quem Eram os Negros da Guin? A Origem dosAfricanos na Bahia". Afro-sia, n 19-20, pp. 37-74.

    SOARES, Mariza de Carvalho - Mina, Angola e Guin: nomes d'frica no Rio de janeiroSetecentista. Tempo, 6 (1998): 73-93, disponvel em