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Perspectivas e reflexões acerca das práticas da Lei de 9394/96 que inclui o artigo A6.
Gedalva Neres da Paz Mestra em Desenho, Cultura e Interatividade
Aluna especial da disciplina Africanidade, corpo,Doutorando em Educação
Universidade Federal da Bahia / FACEDe-mail: [email protected]/
“Todos nós estamos desafiados a pensar diferentes maneiras de trabalhar com a questão racial na escola. Será que estamos dispostos? Podemos, enquanto educadores /as comprometidos/as com a democracia e com a luta pela garantia dos direitos sociais, recusar essa tarefa? A nossa meta final como educadores/as deve ser a igualdade dos direitos sociais a todos os cidadãos e cidadãs. Não faz sentido que a escola, uma instituição que trabalha com os delicados processos da formação humana, dentre os quais se insere a diversidade étnico-racial, continue dando uma ênfase desproporcional à aquisição dos saberes e conteúdos escolares e se esquecendo de que o humano não se constitui apenas de intelecto, mas também de diferenças, identidades, emoções, representações, valores, títulos... Dessa forma, entendo o processo educacional de uma maneira mais ampla e profunda. Poderemos avançar no nosso papel como educadores/as e realizar um trabalho competente em relação à diversidade étnico-racial” (GOMES, 2005, p.154).
RESUMO
O presente artigo pretende argumentar acerca da Lei nº10639/03, as dúvidas sobre a
implementação e a responsabilidade de execução tanto na Educação Básica como no Ensino
Superior. Qual é o entendimento a respeito da Lei nas diversas instituições de ensino, de que
forma essas podem auxiliar para efetivar na prática o que está preconizado no Parecer
CNE/CP 003/2004, nas Diretrizes Curriculares Nacional para Educação Étnico-Racial, e no
Pano de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação das Relações
Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana – Lei
10.639/2003. Assim como fazer reflexões críticas sobre a atuação prática da Lei na escola e
na formação dos profissionais das diversas áreas e institutos educacionais.
RESUMEM
Este artículo tiene la intención de discutir sobre las Leyes de nº10639 / 03 dudas acerca de la
aplicación y la responsabilidad de dirigir tanto en la educación básica y en la educación
superior. A medida que la comprensión de la Ley de diversas instituciones educativas , y
cómo estos pueden ayudar a llevar a la práctica lo que se llama en el Dictamen CNE / CP
003/2004 , las Directrices Curriculares Nacionales para la Educación étnico-raciales , y
Transposición de las Directivas del paño nacional de Educación programa de estudios de
relaciones étnico- racial y la enseñanza de la cultura afro-brasileña y africana - Ley 10.639 /
2003 . Así como hacer reflexiones críticas sobre la práctica del funcionamiento de la escuela
de derecho y la formación de profesionales de diferentes áreas e institutos educativos.
Palavras chaves: Lei 10.639/0, prática pedagógica, responsabilidade.
A Lei 10.639/03 alterou a Lei 9.394 de dezembro de 1996, que estabelecem diretrizes e bases
da educação nacional, incluindo no currículo oficial das Redes de Ensino a obrigatoriedade da
temática História, Cultura Africana e Afro-Brasileira nas instituições públicas e privadas de
ensino, principalmente para os/as professores/as de Educação Artística, História e Língua
Portuguesa e para a Educação Básica do Ensino Fundamental, isso proposta inicial da lei.
No entanto a Lei 9394/96 por meio do Parecer homologado publicado no Diário Oficial da
União de 19/5/2004. Resolução Nº 1, de 17 de junho de 2004. Ministério da Educação
Conselho Nacional de Educação prescreve a Inclusão de discussão da questão racial como
parte integrante da matriz curricular, tanto dos cursos de licenciatura para Educação Infantil,
anos iniciais e finais da Educação Fundamental, Educação Média, Educação de Jovens e
Adultos, como de processos de formação continuada de professores/as, inclusive de docentes
do Ensino Superior. (PARECER 003/2004, p. 13).
Desta forma, o Parecer 003/2004 esclarece que a execução da Lei 10.639/03 não é apenas de
obrigação da Educação Básica, mais também do Ensino Superior, tanto na inclusão dos
currículos dos diversos cursos ministrados no ensino superior, como no investimento dos
conteúdos previsto na Lei, na Formação inicial e continuada de professores/as que atuam nas
Universidades e dos profissionais que são preparados pelas mesmas para atuarem nas demais
etapas de ensino, conforme está previsto no Parecer.
Este documento também esclarece as responsabilidades das Universidades e demais
instituição de ensino:
Mapeamento e divulgação de experiências pedagógicas de escolas, estabelecimentos de ensino superior, secretarias de educação, assim como levantamento das principais dúvidas e dificuldades dos professores em relação ao trabalho com a questão racial na escola e encaminhamento de medidas para resolvê-las, feitos pela administração dos sistemas de ensino e por Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros. Articulação entre os sistemas de ensino, estabelecimentos de ensino superior, centros de pesquisa, Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, escolas, comunidade e movimentos sociais, visando à formação de professores para a diversidade étnico-racial. - Instalação, nos diferentes sistemas de ensino, de grupo de trabalho para discutir e coordenar planejamento e execução da formação de professores para atender ao disposto neste parecer quanto à Educação das Relações Étnico-Raciais e ao determinado nos Art. 26 e 26A da Lei 9394/1996, com o apoio do Sistema Nacional de Formação Continuada e Certificação de Professores do MEC (PARECER003/2004, p.13).
Mesmo assim, algumas instituições de ensino superior insistem em não cumprir a lei por
desconhecimentos e ou por alegar que não tem obrigação em fazê-lo. O Parecer n.º: CNE/CP
003/2004 Colegiado: Aprovado em: 10/3/2004 esclarece essa dúvida e várias outras que são
postas na prática através dos encontros nas escolas e nos grupos militantes que executam e
fazem cumprir a Lei de Diretrizes e Bases nas Escolas, Faculdades, Universidades, ONGS,
Associações educativas, etc..
O posicionamento de muitas Universidades de ignorar a Lei 10.639/03 ou de fazer ações
isoladas e compartimentalizadas é uma atitude assumida por vários intelectuais que fazem
parte dessas instituições que centralizam o conhecimento hegemônico e eurocêntrico
limitando os projetos que discutem as questões afrobrasileiras e afrodescendentes.
[...] gerar uma discussão pública sobre a função social da universidade pública, seu papel social ficou restrito apenas à formação da elite política e econômica do país, para mim, seria o exemplo típico dessa universidade que se orgulha de ser completamente branca completamente eurocêntrica até hoje e completamente reacionária á discussão das cotas raciais. Isso não é uma crítica às pessoas, mas à maneira como a instituição se constituiu e se definiu como uma pessoa abstrata na qual as pessoas concretas se espelham (CARVALHO, 2005, p. 24).
Assim, por meio de alguns programas e ações que não são assumidas por todos/as os/as
professores/as das Universidades, disfarça-se o racismo institucional, silenciando práticas
preconceituosas que são amenizadas por políticas de ação afirmativas, estas de extrema
importância, mas, não é o suficiente para garantir aos jovens negros a permanência bem-
sucedida no ensino superior. Sem contar com a dificuldade que esse segmento de ensino tem
para incluir os saberes culturais, as questões étnico-raciais e socioeconômicas que esta
população negra trás para o seio desse espaço de educação.
A Lei 10.639/03 é Federal e a escola, as intuições, as ONGS, e os diversos grupos que se
propõem trabalhar com crianças adolescentes, jovens e adultos, formação de professores/as e
até mesmos os governos estaduais e municipais precisam entender o peso que compete a essa
lei de cunho obrigatório para que de fato a mesma seja cumprida. Estes órgãos e instituições
devem pensar quais são os trabalhos que podem acontecer e devem ser realizados com
efetividade e responsabilidade para o cumprimento da Lei e a superação dos obstáculos que
são encontrados na execução da mesma.
Nesta perspectiva as Diretrizes Curriculares nacionais preconizam que:
A Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, na medida em que procedem de ditames constitucionais e de marcos legais nacionais, na medida em que se referem ao resgate de uma comunidade que povoou e construiu nação brasileira, atingem o âmago do pacto federativo. Nessa medida, cabe aos conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios aclimatar tais diretrizes, dentro do regime de colaboração e da autonomia de entes federativos, a seus respectivos sistemas, dando ênfase à importância de os planejamentos valorizarem, sem omitir outras regiões, a participação dos afrodescendentes, do período escravista aos nossos dias, na sociedade, economia, política, cultura da região e da localidade; definindo medidas urgentes para formação de professores; incentivando o desenvolvimento de pesquisas bem como envolvimento comunitário. A esses órgãos normativos cabe, pois, a tarefa de adequar o proposto neste parecer à realidade de cada sistema de ensino. E, a partir daí, deverá ser competência dos órgãos executores - administrações de cada sistema de ensino, das escolas - definir estratégias que, quando postas em ação, viabilizarão o cumprimento efetivo da Lei de Diretrizes e Bases que estabelece a formação básica comum, o respeito aos valores culturais, como princípios constitucionais da educação tanto quanto da dignidade da pessoa humana (inciso III do art. 1), garantindo-se a promoção do bem de todos, sem preconceitos (inciso IV do Art. 3) a prevalência dos direitos humanos (inciso II do art. 4°) e repúdio ao racismo (inciso VIII do art. 4°), (PARECER003/2004, p. 16).
As escolas, as Universidades e ou as Faculdades são os principais veículos articulador do
racismo institucional em suas práticas cotidianas e nos currículos escolares, por muitas vezes,
ainda tem ignorado a execução e implementação da Lei, através de atitudes que são
fortalecidas por uma sociedade eurocêntrica e escravocrata. As quais impõem crenças a
respeito dos lugares destinados ao povo negro, o lugar de subalterno, do corpo sem expressão,
de identidade marcada eternamente pela dor e pela submissão, crenças perpetuadas por meio
dos currículos escolares, dos programas de ensino e seleção de conteúdo. Considerando ainda,
os dizeres e as atitudes que inferiorizam e subestima os negros/as. Os mesmos dificilmente
são incluídos em posições de destaque e sua história ancestral, política, social e cultural ainda
são negadas.
Como, então esse quadro preconceituoso que prejudica a formação do verdadeiro cidadão e a educação de todos os alunos, em especial os membros dos grupos étnicos, vítimas do preconceito e da discriminação racial?(...) No entanto, cremos que a educação é capaz de oferecer a possibilidade de questionar e desconstruir os mitos de superioridade e inferioridade entre grupos humanos que foram introjetados neles pela cultura racista na qual foram socializados (MUNANGA, 2005, p. 17).
Sendo assim, a Lei propõe o resgate do legado histórico que por muitos séculos não foi
trabalhado nos currículos e nos livros didáticos, esta retomada tem como finalidade fortalecer
toda a contribuição cultural, ancestral, pertencimento étnico, autoestima da população
afrodescendente e afrobrasileira. Além da implementação de políticas de ações afirmativas.
Sabendo-se que a Lei meramente por si só não dará conta de uma tarefa tão grandiosa que
fora deixada por século desprestigiada, será necessária a mudança de postura, de
comportamento habitual, de compreensão da construção histórica que é formada pelas
múltiplas matrizes das populações brasileiras.
A Lei é de suma importância para a sociedade Brasileira, no que concerne a todas as pessoas
de pele negra e não negra, para todos os institutos de ensino e aprendizagem. Os assuntos que
são citados na Lei que se refere a Historia, Cultura da África e Afrobrasileira de raízes
ancestrais que por muito tempo foi invisibilizada e silenciada é de extrema relevância para o
resgate da memória coletiva e da reconstrução positiva da memória individual de cada pessoa
negra e não negra. Como bem afirma Nascimento (1992): “Resgatar a nossa memória
significa resgatarmos a nós mesmos da armadilha da negação e do esquecimento, significa
estarmos reafirmando a nossa presença ativa na história pan-africana e na realidade universal
dos seres humanos. ”
Esse silêncio mantido pelas instituições de educação sobre as questões étnico-raciais e a
ausência de discussão acerca das mais diversas culturas intrínsecas ao povo negro brasileiro,
reforçaram práticas racistas, discriminatória e preconceituosa que consequentemente
mantiveram histórias de escravizados, de acorrentado e de negro submisso.
O racismo que permeia as escolas não é só praticado pelos/as alunos/as mas também pelos/as
professores/as e pela comunidade interna e externa. A chegada da Lei não sana essa realidade
sem um trabalho efetivo no autoconhecimento, no reconhecimento étnico de cada membro
envolvido no processo educativo e responsável pela implementação da lei, todos nós.
Desta forma, pensamos em um cuidado especifico de quem tem a responsabilidade para
trabalhar com a Lei 10.639/03. Como essas pessoas se sentem? E de que forma se assumiram
ou se assumem negra ou não negra? Ao entender isso, como esse processo aconteceu? Quais
as memórias positivas ou negativas desse processo? Antes dessa imposição da obrigatoriedade
da Lei em que momento membros das escolas, comunidades e Universidades discutiam sobre
ser ou não ser negro? O que conhecem sobre os legados Africanos? As contribuições
antropológicas sociais, históricas, tradições e falares Africanos e Afrobrasileiro? O que
realmente sabem sobe o continente africano? Quais as formações que já fizeram sobre os
assuntos étnicos racial?
Esses questionamentos também podem auxiliar para a identificação de práticas e
comportamento racista que jamais foram refletidos e ou discutidos, que inclusive podem
ajudar para elucidar a resistência da implementação da Lei. Como professores/as racistas vão
legislar a favor da prática não racista no seio da escola? Quais as garantias efetivas do
trabalho transversalizados dos conteúdos da História, da Cultura Afro- Brasileira e da África?
Segundo Silva Monteiro, (2000, p.81)
“... como poderá alguém desabrochar seu corpo que é físico, que é inteligente, percepção, sentimento, emoção, com alegria e espontaneidade, sendo ele negro num mundo em que o feio, o negativo, errado, o mau é qualidade de negro? Refazendo sua história de dor e negação”.
Essas mesmas pessoas ficaram incumbidas de fazer o trabalho sistematizado para dirimir os
estereótipos, os preconceitos e práticas racistas que acontecem no chão da escola. As criticas
entorno de como trabalhar a lei na sala de aula, como sair conteúdos eurocêntricos e de livros
didáticos e paradidáticos com poucas referencias da África, da riqueza do continente e da
influência cultural do berço da civilização do mundo sem a devido conhecimento e formação.
Os profissionais de educação possuem demanda de ordem étnico racial dentro e fora do
ambiente escolar. Os corpos negros passam despercebidos neste lugar, a não ser que esse
conteúdo seja debatido, discutido, assumido e incorporado pelos pares aprendentes e
ensinantes. Assim com afirma Celano (1999, p.13) “A educação só é libertadora e capaz de
propiciar o surgimento de indivíduos despertos e sensíveis, se for orientada por pessoas que
vivenciem em si mesmas um processo de libertação e autodescobrimento”.
Dessa forma, pensamos qual será a relação corporal da/o professor/a negro/a a se ver
representada por seu aluno/a negro/a na sala de aula? O corpo se expressa pelos seus gestos, e
silhuetas, sons e trejeitos, histórias de aceitação, de autoconfiança e de negação de ser. Essas
expressões e sentimentos vão sendo ampliadas por meio do contato com outros corpos a
depender de como esse contato foi e é realizado. Como a professora lidou com sua cor de
pele, como começou a se assumir, como se deu o reconhecimento das suas características
negras, cabelos, lábios e nariz. Estar em contato é perceber o todo a nossa volta, a sociedade,
a comunidade, a sala de aula, também perceber os/as alunos/as que possuem características
étnico raciais análogas as das professores/as, como esses par educativo lida com esses
aspectos de etnicidade ?
Para Silva & Moreira (2010, p.12), o que:
Importa academicamente e culturalmente compreender a configuração da corporalidade brasileira e baiana na matriz cultural africana e desta forma, propiciar discussões mais aprofundadas sobre a ligação entre corpo, ancestralidade, educação e cultura. Importa também, num plano teórico-metodológico interdisciplinar fazer com que estas considerações repercutam de forma mais efetiva na escola. Justificamos este último desejo como uma sugestão para que o estudo da cultura corporal na escola básica e na formação de professores se torne significativo e contribua para fazer avançar a Lei nº 10.639/03.
Para além, dessa situação precisamos contar com o compromisso das instituições de ensino
para formar, estudar, refletir e questionar sobre os conteúdos expresso na Lei 10.639/03, e os
documentos que a subsidia: Parecer 003/04, Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro Brasileira e
Africana, Proposta de Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana, Práticas pedagógicas de trabalho com relações étnicoraciais na
escola na perspectiva da Lei nº 10.639/03.
Os trabalhos de pesquisa realizados pelas Universidades/Faculdades devem estar
disponibilizados e divulgados para que todos tenham acesso aos conhecimentos que estão
sendo sistematizados para ajudar as comunidades na implementação e debates que todos
entendam nas escolas públicas e particulares independente do seu público, pois ainda tem um
entendimento que a Lei e para negro e para lugares que existem negros a Lei 10.639/3 é para
toda sociedade brasileira.
A falsa democracia racial que está instalada no imaginário social dos brasileiros também é um
obstáculo que impede a lei acontecer na prática. A discussão sobre os preconceitos que temos,
o racismo que praticamos, até porque o que conta no panorama social é que nos damos muito
bem e a diversidade tanto racial e como religiosa não é um problema no Brasil, logo há o
reforço da crença de que não há racismo, então não há motivos para professores/as,
comunidades escolar e famílias trabalhar com esses conceitos.
Assim como trás Munanga (2005, p.18):
A primeira atitude corajosa que devemos tomar é a confissão de que nossa sociedade, a despeito das diferenças com outras sociedades ideologicamente apontadas como a mais racistas (Estados Unidos e África do Sul), é também racista. Ou seja, despojarmo-nos do medo de sermos preconceituosos e racistas. Uma vez cumprida esta condição primordial, que no fundo exige uma transformação radical de nossa estrutura mental herdada do mito de democracia racial, mito segundo o qual no Brasil não existe preconceito étnico-racial e, consequentemente não existem barreiras sociais baseadas na existência da nossa diversidade étnica e racial, podemos então enfrentar o segundo desafio de como inventar as estratégias educativas e pedagógicas de combate ao racismo.
Esses conteúdos não foram contemplados nos livros didáticos, nos planejamentos e nas
formações de professores/as, enfim não estavam presentes na história dos currículos e nem
nas práticas cotidianas das escolas. Trazer a história das lutas do nosso povo, entender as
estruturas ou a falta dela, para a construção imagética de uma cultura contada pelo outro, tão
distante, que colonizou que negou e que subtraiu nossa tradição.
Nesta e na outra margem atlântica, em híbridas e renovadas encenações, africanas recortam,enfrentam, interromperam estruturas e poderes excludentes com ironia, astúcia e anuência de seus ancestrais. Revelando incoerências de discursos cronológicos, deixaram latências de historias e geografias esquecidas, como suportes de memorização em tempos trans-historias. (ANTONACCI, 2013, p. 15).
A história da África e afrobrasileiro, do movimento de resistência e religioso, a cultura, a
história, a geografia e a formação do povo brasileiro, não eram incluídos nos currículos.
Buscar o que verdadeiramente nos constituiu e nos constitui para nos dirimir dos traumas e
das dores para nos levar às nossas características e identidades afrodescendentes, sabendo de
todas as nossas riquezas conquistas e pertencimentos.
O desdobrar atenções a museus, galerias de arte e exposições, como à música e cinema negros, tem permitido outras aproximações a culturas africanas e da diáspora. Traços de seus horizontes delineiam-se em provérbios e expressões artísticas, extravasam em danças, ritmos e instrumentos musicais, não só na arte de fabricar artefatos sonoros com toques de suas línguas, como em habilidades de comunicação audiovisuais que desafiam leituras ocidentais (ANTONACCI, 2013, p.14).
As crianças, adolescentes, jovens e adultos, precisam saber do legado deixado por seus
ancestrais, heróis, informações sobre locais nos quais fizeram história no Brasil e nos
territórios quilombolas Urbanos e Rurais. A cosmologia, a estética e á ética das culturas
negras, a literatura, os intelectuais e cientistas, a arqueologia dos saberes orais, acervos
históricos, e patrimônios audiovisuais. Corpos individuais e corpos coletivos contando sua
própria história.
Experiências e vivências de corpos decolonizados ancoradas em memórias verdadeiras,
valorizadas e positivas que por muito tempo foram negadas. Descortinar nossas raízes não
mais com pobrezas e misérias, mas com riquezas imateriais e materiais, elencando nosso
capital intelectual, conquistas e lutas.
Nada muda com a retirada da obrigatoriedade da Lei, as questões éticas raciais são legitimas,
para qualquer militante ou mesmo para quem não o seja, com ou sem lei continuaremos
lutando e trabalhando, com o propósito do respeito e da inclusão das culturas negras nos
currículos brasileiros. Como sempre fizemos.
REFERÊNCIA
ANTONACCI, MARIA ANTONIETA. Memórias ancoradas em corpos negros. São Paulo:
EDUC, 2013.
BRASIL. Lei 10639, de 9 de janeiro de 2003.
BRASIL. LEI Nº 12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010. Institui o Estatuto da Igualdade Racial; Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, n. 138. 21 jul. 2010. Seção 1, p. 1-144. Disponível em: <http://www.in.gov.br/visualiza/index.jsp?data=21/07/2010&jornal=1&pagina=2&totalArquivos=144>. Acesso em: 01 mai. 2016.
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