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Universidade Federal da Bahia Instituto de Física Curso de Física Metodologia e Prática de Ensino de Física II - EDC 206 Docente: Maria Cristina Martins Katemari Rosa Trabalho de Final de Curso Entropia: Uma proposta para o ensino não universitário. Gustavo Fernando França Menezes Julho de 2005

Entropia - Uma proposta para o ensino não universitário

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Universidade Federal da Bahia

Instituto de Física Curso de Física

Metodologia e Prática de Ensino de Física II - EDC 206 Docente: Maria Cristina Martins

Katemari Rosa

Trabalho de Final de Curso

Entropia: Uma proposta para o ensino não universitário.

Gustavo Fernando França Menezes

Julho de 2005

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Entropia: Uma proposta para o ensino não universitário

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Introdução

Como trabalhar o conceito de entropia no ensino não universitário? Este trabalho nós vamos

abordar uma linguagem mais geral sobre a Entropia, a ser ministrada nas turmas de Ensino Médio. A

Entropia, nos dias de hoje, nos permite fazer diversos uso dela, podendo ser utilizadas diferentes

definições de acordo com o sistema estudado, mas a sua "essência" permanece, a de indicar o sentido

natural da evolução espontânea de um sistema dinâmico. Termodinâmica, Química, Biofísica, Sistemas

de Informação, Sistemas Sociais,…, são alguns exemplos de áreas do conhecimento que podem fazer

uso da Entropia nos seus estudos.

Aqui apresento a minha proposta de texto para se trabalhar o conceito de entropia, no ensino

não universitário. As Leis da Termodinâmica são apresentadas como uma breve revisão e/ou

familiarização com o tipo da abordagem, e podem fazer parte das aulas quando os alunos forem

introduzidos ao assunto.

Através de uma revisão teórica, poder relacionar diferentes definições da entropia, desde a sua

origem com Clausius, passando por uma roupagem estatística de Boltzmann-Gibbs e até uma

generalização do uso da teoria da informação (teoria matemática da informação de Shannon),

relacionando sistemas biológicos e a sua entropia e informação.

Uma discussão sobre a Entropia nos sistemas biológicos, bem como a interação do sistema

com o ambiente, o sistema mais o ambiente temos o Universo. Abordando conceitos termodinâmicos

como 1ª e 2ª Leis da Termodinâmica e suas implicações. Energia Livre e Entropia de um sistema e

suas implicações. Transformações de Energia. E relação entre Ordem Desordem de um sistema com a

Organização e Informação e Entropia de um sistema.

Os sistemas a serem abordados, serão exemplificados de forma mais ampla, ampla no sentido

de abranger mais ramos do conhecimento, e não somente máquinas térmicas como é comumente

abordado nos textos para ensino médio.

Mostraremos também como a entropia é discutida em alguns livros didáticos para o nível

médio, e uma sugestão de texto para se trabalhar o conceito de entropia no ensino não universitário.

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Entropia: Uma proposta para o ensino não universitário

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Motivação

"Como podem eventos no espaço e no tempo, que ocorrem dentro dos limites espaciais de um

organismo vivo, ser abordados pela física e pela química?". Questão posta por Erwin Schrödinger no

seu livro "O que é Vida?", em 1943.

Ao longo da trajetória do homem na Terra, ficou marcada a sua incontrolável busca na

compreensão do mundo que está a sua volta. Dentre outras coisas, a aplicação de teorias da física

clássica ou moderna no mundo, é afirmação desta marca.

Aspectos físicos e descrições sobre a vida (biológica) que estão presentes nos estudos de

Schrödinger. Que aborda com detalhes, a sua estrutura e comportamento, servindo de base e

inspiração para diversos estudos, como, por exemplo, o mapeamento do código genético (DNA), como

foi previsto por ele. Schrödinger chama de “substância hereditária”.

Ver que na maioria dos livros textos nível médio, a entropia como um ente restrito aos ramos

da física, em geral máquinas térmicas e cinéticas dos gases, deixando de abranger novas visões sobre

o tema. Suas aplicações são diversas, Física, Química, Teoria da Informação, Eng. Elétrica, Biologia,

Economia,... .

Propiciar ao aluno discussões/debates em sala respeito da entropia, incentivo à pesquisas e

seminários, podendo abranger temas relacionados à Meio Ambiente, Doenças, dentre outros.

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PARTE I – Revisão Teórica

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I - Entropia

Cunhado por Rudolf Clausius, o termo entropia foi originado do grego, em + trope (em

transformação). Na tentativa de quantificar as transformações energéticas que ocorrem num sistema

sob a ação de processos termodinâmicos.

Deste modo a 2ª Lei da Termodinâmica pode ser enunciada de forma quantitativa. A 1ª Lei

garante a conservação da energia e a 2ª Lei afirma que é impossível transformar toda a energia

fornecida ao sistema em trabalho, sem que ajam perdas. Estas perdas estão associadas ao aumento

da Entropia.

A entropia está relacionada com a direção, em que os eventos aconteçam espontaneamente,

ou seja, a direção dos processos naturais. Como na "primeira" versão do enunciado da 2ª Lei da

Termodinâmica: A produção de trabalho, à custa de uma máquina térmica, deve ser sempre

acompanhada de fluxo de calor de um corpo a uma temperatura mais alta para um outro a uma

temperatura mais baixa.

Clausius, em seus estudos sobre as transformações calor-trabalho, como transformações

energéticas, tentou encontrar uma função que satisfizesse aos seguintes requisitos:

1. A função deveria relacionar os vários tipos de transformações de energia possíveis, isto

é, transformações de calor de uma temperatura mais alta para uma mais baixa, e

transformações de energia mecânica em calor a uma determinada temperatura;

2. A função deveria ser função termodinâmica própria, ou seja, deveria caracterizar o

estado termodinâmico, independente do caminho percorrido para o atingir.

A função que satisfazia os requisitos, Clausius chamou de entropia. E pode ser definida na

forma diferencial, para um processo reversível infinitesimal, seguindo a seguinte relação:

dS = dQT

Eq. 1

Num processo reversível finito em que o sistema passa do estado A para o estado B a variação

de entropia ∆S é dada pela integra:

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PARTE I – Revisão Teórica

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∆S = Sb - Sa = ⌡⌠

a

bdQT

Eq. 2

Note que só foi definida a variação de entropia e não o seu valor absoluto. O calculo da

entropia absoluta só é possível através da 3ª Lei da Termodinâmica, que atribui o valor nulo à entropia

no zero absoluto.

A 2ª Lei da Termodinâmica pode ser reformulada de acordo com uma linguagem matemática e

em termo de entropia, através da integral cíclico.

⌡⌠

dQT <0

Eq. 3

Para qualquer ciclo reversível verifica-se que o resultado da eq.3 é igual à zero, em qualquer

ciclo irreversível o resultado da eq.3 menor que zero. Sendo ciclos que gerem resultados para eq.3

maiores que zero são impossíveis. Esta desigualdade, também conhecida como desigualdade de

Clausius, expressa o mesmo principio contido na formulação anterior, a impossibilidade do calor passar

espontaneamente de um corpo frio para um corpo quente, que é a impossibilidade de uma conversão

completa do calor em trabalho. A eq.3 podemos reescrever na forma,

⌡⌠

a

bdQT -

⌡⌠

b

adQT <0 è Sb - Sa >

⌡⌠

a

bdQT

Eq. 4

Deste modo, se tratando de um processo espontâneo num sistema isolado, logo não há

absorção de calor no processo. Dai temos que Sb – Sa > 0, ou Sb > Sa, a entropia do sistema

aumentou. Com isso temos uma diminuição da energia útil para a realização de trabalho.

Um sistema isolado não é "realimentado", com isso ele tende a esgotar a energia útil para a

manutenção do sistema, para realização de trabalho. Sempre existirá uma parcela da energia que será

perdida na forma de calor, som ou luz. A natureza mostra ter uma tendência para a degradação de

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PARTE I – Revisão Teórica

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energia, converter energia útil em energia inútil. Quanto mais próximo da entropia máxima o sistema

estiver, mais degradada é a sua energia.

I.i – Probabilidade e Entropia

Na mecânica estatística, a entropia corresponde à desordem ou casualidade de um sistema

físico. Os diferentes macroestados distinguem-se pelo número de modos nos quais podem ser

compostos pelas partículas. Quanto maior for o número de arranjos que gerem um determinado

estado, maior será a probabilidade do sistema se encontrar neste estado. Imaginemos uma caixa,

onde nela existem várias cartas, que ao serem sorteadas indicaram a configuração para gerar o estado

"cor", sabe-se que o número de cartas vermelhas é superior às demais cartas. As configurações

contidas nas cartas são distintas, e levam ao estado "cor". O estado "vermelho" é o mais provável, por

possuir um maior número possibilidades de configurações possíveis. Na inexistência de um estado

mais provável, temos que os eventos são equiprováveis, ou seja, todos os estados são equiprováveis,

tem igual probabilidade da ocorrência. Assim, um sistema que se encontra num estado de entropia

superior, tem uma imprevisibilidade maior, devido ao numero maior de modos possíveis.

A entropia tem uma definição estatística apresentada por Boltzmann na forma,

S = K Σ log(w)

Eq. 5

Onde S representa a entropia de um sistema que se encontra num determinado estado

termodinâmico, w é o número de configurações possíveis, em que se pode encontrar, e K é a

constante de Boltzmann. A constante K estabelece a relação entre a teoria clássica e a teoria

estatística, onde K = R/N0, sendo R a constante do gases perfeitos e N0 é o número de Avogrado.

Agora, em vez de consideramos um sistema e calcularmos o número de arranjos possíveis,

supõe-se hipoteticamente, um conjunto de cópias do mesmo sistema. Cada sistema do conjunto

poderá ser um dos possíveis microestados, e o conjunto, como um todo, é definido quando for

conhecida qual a fração dos seus sistemas que se encontra em cada microestado. Tomando o i-ésimo

microestado com fração Pi dos sistemas, a entropia defini-se como.

S = -K Σ Pi log(Pi)

Eq. 6

No caso da eqüiprobabilidade, Pi=1/ω, e a eq.6 retorna à eq.5.

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PARTE I – Revisão Teórica

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II – Teoria da Informação

Claude E. Shannon (1916-2001) é conhecido como "o pai da teoria da informação". Sua teoria

foi a primeira a considerar comunicação como um problema matemático rigorosamente embasado na

estatística. A teoria da informação tem como objeto o estudo da transmissão de sinais ou mensagens

de um sistema para outro, inclusive humanos. O objetivo principal não é estudar o significado das

mensagens, e sim a sua estrutura estatística, com o objetivo de saber em que condições se poderiam

levar uma mensagem melhor ou mais eficiente, sendo ela definida em termos estatísticos formais e

não semânticos ou estéticos. Mas estrutura e significado não podem ser completamente

independentes.

A entropia como definida por Shannon está intimamente relacionada à entropia definida por

físicos. Boltzmann e Gibbs fizeram um trabalho considerável sobre mecânica estatística. Este trabalho

foi a inspiração para se adotar o termo entropia em teoria da informação. Há uma profunda relação

entre entropia nos sentidos termodinâmico e informacional. Por exemplo, o demônio de Maxwell

necessita de informações para reverter a entropia e a obtenção dessas informações equilibra

exatamente o ganho de informação (entropia negativa ou negentropia) que o demônio alcançaria de

outro modo.

A média da informação de M mensagens mk do conjunto Ωk = m0, m1,..., mM-1 é denominada

de entropia da variável aleatória X. Assim, a entropia H(X) da variável aleatória X, cujo espaço de

amostras é o conjunto Ωk de M mensagens é dada por

H(X) = -Σ Pk log2(Pk) [bits]

Eq. 7

De uma maneira mais geral podemos escrever na forma

S = -K Σ Pi log(Pi)

Eq. 8

Onde K é uma constante que determina a unidade da informação.

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PARTE II – Os Livros Didáticos

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I – Alberto Gaspar

Ao que o livro propõe, dentro da sua abordagem e discussão, está bem esclarecido o conceito

de entropia. O conceito de entropia trabalho neste livro, é o definido por Clausius como na eq.1, claro

que não na sua forma diferencial infinitesimal, fazendo uso da variação de entropia ∆S=∆Q/T.

Trazendo exercícios para o treino no calculo do ∆S.

A discussão de entropia e desordem se limitou a física estatística da cinética dos gases e

mistura de gases, e discutiu sobre o sentido natural em que os fenômenos ocorrem. Trouxe também

uma discussão sobre O Demônio de Maxwell, breve notas históricas sobre físicos como Boltzmann,

Clausius e James Maxwell, e uma atividade prática simulando a agitação térmica com dois gases com

recipientes interligados, utilizando uma gaveta caixas de fósforos e feijões.

II – GREF

No projeto GREF, não houve uma abordagem mais profunda, nem no sentido matemático nem

em discussões que o tema traz consigo. A variação de entropia é abordada no final da discussão sobre

a 2ª Lei da Termodinâmica. Trazendo a seguinte frase "À irreversibilidade dos processos naturais é

associada uma grandeza denominada entropia, interpretada como "algo" que aumenta em um

processo irreversível e se mantém constante em um processo reversível.". Sem maiores discussões

sobre o tema.

III – Ramalho

Apesar de falar sobre rendimento e energia útil, o livro assinado pelo Ramalho, Nicolau e

Toledo (a edição que tenho em mãos é a 6ª), não traz uma formulação matemática referente a

entropia, traz dois textos, dentro capitulo "Leis da Termodinâmica". O primeiro texto fala sobre o

principio da degradação da energia, falando que a medida que o Universo evolui, há diminuição da

energia utilizável. O texto é breve, apesar de trazer uma idéia generalizada sobre a diminuição da

energia útil do Universo, poderia ter discutido mais sobre o tema. No segundo texto, que fala sobre

desordem e entropia, também breve, não deu exemplos fazendo uso do modelo cinético dos gases,

deu dois exemplos, um com bolas dentro de um recipiente de vidro e outro com cartas de baralho,

falou que em todos os fenômenos naturais, a tendência é uma evolução apara um estado de maior

desordem. Trouxe a variação de entropia como a medida da ineficiência da energia do sistema.

Observação: Neste tópico, não é objetivo um detalhamento mais profundo sobre o que cada autor traz no livro que assinam, e sim em relação às novas possibilidades de discussão sobre entropia no ensino não universitário.

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PARTE III - Proposta

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I – Leis da Termodinâmica

I.i - 1ª Lei da Termodinâmica

Comecemos então com o iniciado da 1ª Lei da Termodinâmica, que garante a conservação da

Energia:

"Energia não pode ser criada ou destruída,

mas somente convertida de uma forma em outra".

Como por exemplo, a energia potencial gravitacional da água no alto da cachoeira que é

transformada em diversos tipos de energia, (1) na que da d’água, energia potencial em energia

cinética e térmica, (2) no movimento do moinho, energia cinética em energia mecânica e térmica, (3)

na rotação da bobina, energia mecânica em energia elétrica e térmica, (4) na lâmpada ligada na rede

elétrica, energia elétrica em energia luminosa e térmica, (5) para um ventilador temos a energia

elétrica transformada em energia magnética, da magnética em mecânica e térmica. (6) e no caso de

um forno elétrico energia elétrica em térmica. A soma de todas as formas de energia é constante e

podemos perceber que toda transformação de energia está acompanhada de energia térmica.

Os seres vivos produzem calor em todo e qualquer processo biológico. Alguns perdem calor

gerado para o ambiente, e possuem a temperatura ambiental. Outros conservam parte desse calor, e

regulam sua temperatura.

Observemos agora a cadeia alimentar, desde o principio, da obtenção, transformação e

transmissão da energia – a luz Solar, os vegetais e os animais – e, com isso, podemos notar que,

existe uma transmissão de energia no decorrer da cadeia, desde a sua origem (luz Solar) até os seres

vivos.

A radiação solar é a fonte primeira que permite a produção de nutrientes orgânicos pelos

organismos; é a fonte de energia para a criação de ordem. A produção, por parte de organismos

fotossintéticos, de novas moléculas fornece os nutrientes para outras formas de vida, baseadas em

outras fontes de energia, possam surgir no ambiente terrestre, dando início a uma cadeia de eventos.

I.i.1 – Exemplos de Transformação da Energia nos Organismos Vivos

A transformação de energia livre em trabalho é realizada através de mecanismos como a

contração muscular (mecânico), secreção, absorção e função renal (osmótico), reações sintéticas

anabólicas (químico) e impulsos nervosos (elétrico). Que por sua vez também são realizados com

desperdício de energia.

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PARTE III - Proposta

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Vejamos alguns exemplos de transformação de energia.

Transformação Órgão transformador

Energia química em elétrica Cérebro, nervos, nariz, língua

Energia química em mecânica Músculo

Energia química em osmótica Rins e todas as membranas celulares

Energia química em radiante Órgão luminescente do vaga-lume

Energia luminosa em química Cloroplasto

Energia luminosa em elétrica Olhos

Energia hidrostática em elétrica Ouvido interno

Som em energia elétrica Ouvido

Tabela 1 : Transformações Energéticas nos organismos vivos

Então já sabemos como é dado o mecanismo, de obtenção de energia e transformação de

energia em trabalho. De posse disto, podemos ir a busca de mais detalhes na descrição dos

fenômenos desta ordem.

I.ii - 2ª Lei da Termodinâmica

Vamos falar agora da transferência da Energia.

"A Energia, espontaneamente, sempre se desloca

de níveis mais altos para níveis mais baixos"

Como o calor vai do corpo mais quente para o mais frio, a luz é mais intensa perto da

lâmpada, o som é mais intenso próximo da fonte emissora, os corpos caem do local mais alto para o

mais baixo.

De acordo com a 1ª Lei, a energia está em constante movimento, se transformando,

realizando trabalho, e de acordo com a 2ª Lei, a energia somente vai de níveis mais altos de energia

para níveis mais baixos de energia. Em outras palavras podemos dizer que, todo sistema que realiza

trabalho tem a sua energia diminuída.

Então, pela 1ª Lei a quantidade de energia é constante, se conserva, e pela 2ª Lei, após cada

mudança, a qualidade da energia diminui. A cada mudança aparece uma energia degradada, incapaz

de realizar trabalho. Esse tipo especial de energia é chamado de Entropia. Que nos leva a outro

enunciado para a 2ª Lei.

"A Entropia do Universo tende para o máximo"

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PARTE III - Proposta

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II - Entropia

Entropia vem do grego em (em) + trope (transformação), e foi primeiramente formulada pelo

físico alemão Rudolf Clausius. Estudando as idéias de Carnot, Clausius, tentou encontrar uma função

que satisfizesse aos seguintes requisitos:

1. A função deveria relacionar os vários tipos de transformações de energia possíveis, isto

é, transformações de calor de uma temperatura mais alta para uma mais baixa, e

transformações de energia mecânica em calor a uma determinada temperatura;

2. A função deveria ser função termodinâmica própria, ou seja, deveria caracterizar o

estado termodinâmico, independente do caminho percorrido para o atingir.

A função que satisfazia os requisitos, Clausius chamou de entropia, seguindo a seguinte

relação:

∆S = ∆QT è T∆S = ∆Q

Eq. 9 Eq. 10

A variação de energia ∆Q, pode ser dada pela diferença entre a energia total, ∆H, e a energia

utilizada, que é a energia livre, ∆H. sendo assim, ∆Q = ∆H - ∆G, resultando na relação,

∆G = ∆H - T∆S Eq. 11

A Entropia pode ser chamada de uma energia incapaz de realizar trabalho, e está presente em

todos os processos, no sentido do aumento global da Entropia. A perda de energia em cada processo

da sua transformação, está relacionada com o aumento da Entropia. A energia é perdida, dissipada, e

não temos como reaproveitá-la.

De modo geral a o fator entrópico aumenta com a elevação da temperatura, pois de acordo

com a Eq.15, temos que a quantidade Entropia é dada por T∆S. Como por exemplo à febre, a

hipertermia corporal, traz um aumento na Entropia dos processos biológicos. Com isso um

decrescimento na Energia Livre.

"Energia é necessária para repor não apenas a energia mecânica de nossos esforços corporais,

mas também o calor que liberamos continuamente no ambiente. E que liberamos calor não é acidental,

mas essencial, pois é precisamente esta a maneira através da qual nos livramos do excedente de

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PARTE III - Proposta

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Entropia que produzimos continuamente em nosso processo de vida física.". (Erwin Schrödinger, "O

que é Vida?", pág.86).

III - Energia Livre

As células não usam Energia Mecânica ou Energia Térmica para produzir trabalho, utilizam a

Energia Livre (∆G), que é um tipo de energia elétrica, que produz trabalho em condições, isobárica,

isocórica e podendo ser também isotérmica.

Essa energia não está armazenada nas ligações químicas, como se pensam. Dizem que o ATP

tem ligações de alta energia que é liberada na hidrolise da molécula. Na verdade a energia aparece

como diferença entre o conteúdo de energia dos produtos menos a energia dos reagentes.

∆G( )reação = ∆G( )produtos - ∆G( )reagentes Eq. 12

A energia livre a que me refiro é a energia livre de Gibbs (G), que está relacionada à Entalpia

(H) e a Entropia (S), a uma temperatura (T).

G = H - TS Eq. 13

Para uma temperatura constante, a energia livre pode ser obtida tanto em termos de Entalpia

e Entropia.

∆G = ∆H - T∆S Eq. 14

Onde ∆H é o calor da reação, dada por,

∆H = ΣH( )produtos - ΣH( )reagentes

Eq. 15

Num sistema biológico, existe sempre troca de calor e matéria com o meio externo, e gasto de

energia com a manutenção da vida. A interação entre a matéria-prima usada pelo organismo como

fonte energética e como unidades para estruturação de seus tecidos (carboidratos, lipídios e proteínas)

e a maquinaria catalítica para a degradação dessas substâncias (mecanismos enzimáticos e oxidações

metabólicas), produz a energia livre durante a degradação dos alimentos. E como sempre há perdas

em todo processo em que não se encontra num meio conservativo, parte da energia é usada na

realização de trabalho (processos metabólicos) e uma outra parte é perdida para o meio (troca de

calor e matéria).

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PARTE III - Proposta

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III.i - Reversibilidade e Irreversibilidade

A termodinâmica interpreta a entropia como uma medida da irreversibilidade dos fenômenos

físicos. Tomando um sistema, que troca matéria e energia com o ambiente, realizando trabalho para

sair do seu estado inicial S para ir a um estado final S'. Se este processo for reversível, poderá ser

operado de forma inversa, saindo do estado S' retornando ao estado inicial S, as quantidades de

matéria, energia e trabalho serão as mesmas. Já um fenômeno irreversível ou não poderá ser operado

de modo inverso ou, se puder, as quantidades de energia, matéria e trabalho não serão as mesmas,

uma parte da energia na forma de trabalho é transformada em calor, uma perda definitiva, ou seja,

irreversível. A geração de calor é associada a um aumento de entropia.

Nos fenômenos reversíveis, é possível ocorre aumento ou diminuição da entropia, desde que

ocorra também no ambiente uma diminuição ou aumento exatamente igual, satisfazendo a condição

de que a sua variação total, sistema+ambiente, seja nula. Funcionando como um ciclo, S à S' à S.

Nos fenômenos irreversíveis, a variação de entropia é sempre não-nula positiva. Como afirma

a 2ª Lei da Termodinâmica. De maneira espontânea o fluxo de calor entre dois corpos, isolados, com

temperaturas diferentes, será no sentido que o corpo que estiver mais quente cederá energia na forma

de calor para o corpo de temperatura menor. Pensar no sentido contrário seria supor que o corpo que

foi aquecido devolvesse o calor absorvido ao corpo que lhe cedera, realizando o processo inverso e

retornando ao seu estão inicial.

III.ii - Entropia e Informação

Relacionando Entropia (Desordem) com a organização e informação (Ordem) de um sistema,

podemos dizer que quando a Entropia aumenta, a organização e informação diminuem. Ou seja, é uma

relação inversa. Aumenta a Entropia à Diminui a Ordem; Diminui a Entropia à Aumenta a Ordem.

Temos um exemplo clássico que relaciona Entropia e informação, ou seja, Desordem e Ordem,

respectivamente: Uma caixa que cabe perfeitamente dentro dela 125 blocos, inicialmente com os

blocos dentro da caixa de maneira organizada, a combinação de todos os blocos nos da uma

informação, uma imagem de um mapa, por exemplo, como num quebra-cabeça, bloco a bloco

formando uma imagem. Neste estado a sua Entropia é mínima e a sua Ordem é máxima. Se a caixa

cair, deixando cair todos os blocos para fora da caixa, e em seguida colocarmos os blocos de volta, nos

preocupando apenas com a posição dos blocos, de maneira que todos os blocos caibam dentro da

caixa de novo, teremos a mesma caixa com os mesmos 125 blocos dentro dela, mas não teremos a

informação que nela continha – o desenho do mapa – mudou a Ordem dos blocos, ou seja, a entropia

do sistema aumentou. Já se não nos preocuparmos com a posição que os blocos são colocados na

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PARTE III - Proposta

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caixa, teremos a mesma caixa, organização e informação, não caberá os 125, nem teremos a imagem

do mapa formada. Dizemos, assim, que a Entropia é máxima.

III.iii - Aumento de Entropia e o Meio

Essa relação entre Entropia e Ordem não se limita a aspectos físicos somente. Os seres vivos

procuram atingir o mais alto grau de organização, informação e eficiência de utilização de Energia,

justamente no processo de diminuir a Entropia. Um exemplo é a organização da molécula de

hemoglobina (Hb) esclarece este esforço biológico por uma baixa Entropia. Na passagem dos níveis

estruturais, a molécula de Hb vai do primário (seqüência linear de aminoácidos), secundário

(enrolamento em α-hélice, outras estruturas), terciário (a disposição espacial de cadeia polipeptídica) a

quaternário, a associação de cadeias entre si. A cada nível a Entropia diminui, a organização e

informação aumentam.

Esse processo é espontâneo, e, portanto, a sua Energia deveria decrescer e a Entropia

aumentar. A Energia realmente decresce, como esperado, pois o número de ligações aumentou, do

primário até o terciário. Mas a Entropia, como demonstra o processo, diminuiu. Parece violar a 2ª Lei

da Termodinâmica. Para que isso não ocorra, a Entropia deve estar aumentando em alguma parte do

Universo, e isto realmente ocorre no solvente do sistema. Enquanto a molécula se organiza, a água se

desorganiza e a Entropia Total do sistema aumenta, como esperado.

O mesmo ocorre na formação dos cristais. O cristal se forma no meio, num solvente, formando

uma estrutura altamente organizada. Já o meio em que ele está imerso fica caótico, o solvente tem a

sua Entropia aumentada. O cristal tirou Ordem do ambiente para se organizar, deixando, assim, o

ambiente desorganizado.

Lembrando que, a formação do cristal é um caso de cristais periódicos, a matéria orgânica,

como uma molécula do DNA, também é um cristal, só que aperiódico. Valendo perfeitamente a

analogia.

A vida, portanto, parece ser um comportamento bem ordenado e regrado da matéria, não

exclusivamente baseado na tendência desta de passar da ordem para a desordem, mas baseado

parcialmente em uma ordem existente que é mantida.

Os seres vivos vivem enquanto lutam pela redução de sua Entropia. Isto resulta em aumento

da Entropia ambiental. Viver é retirar Ordem do ambiente, é estar em permanente não equilíbrio com

o meio. O equilíbrio é a morte do sistema biológico. Num ecossistema sem interferências estranhas, a

Entropia ambiental aumenta num ritmo natural. Só a espécie humana, com seus objetivos

desvairados, é capaz de acelerar o ritmo da Entropia ambiental. Para disfarça essa agressão ambiental,

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PARTE III - Proposta

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a Entropia foi apelidada eufemisticamente de Poluição. A diferença entre o estado hígido (saúde) e

estados patológicos (doença), é o grau de Entropia, o aumento dos estados patológicos.

Uma outra idéia da baixa Entropia dos seres vivos é dada pelo seguinte fato: nenhuma

estrutura não biológica, nenhum artefato aperfeiçoado pelo homem, possui, a 37°C, uma Entropia tão

baixa como uma celular viva. A noção de que os cristais possuem Entropia mínima é naturalmente

válida. Mas se considerarmos as funções desempenhadas por um cristal e por um protozoário conclui-

se facilmente que o cristal tem muito menos organização e informação que a celular viva.

III.iv - Patologia e Entropia

Perturbações entrópicas atingem desde a composição, estrutura, função até os finos

mecanismos de controle. Conforme tabela abaixo, alguns exemplos.

Estado Patológico Linguagem Biológica Linguagem Termodinâmica

Arteriosclerose

Depósito de gordura e cálcio nas artérias, com alterações estruturais, endurecimento da parede, hipertensão.

Aumento de Entropia na circulação devido à desorganização da fina estrutura das artérias; Distúrbios Energéticos da Hemodinâmica.

Cárie

Corrosão das camadas dentárias.

Aumento da Entropia por desaparecimento de estruturas dentárias.

Drepanocitose (Hemoglobinose S)

Presença de hemoglobina mutante, com anemia, afoiçamento e alterações graves circlatórias.

Aumento de Entropia na molécula de hemoglobina pela troca de um aminoácido β (glutâmico por valina). Distúrbios entrópicos da circulação.

Diabetes

Lesões nas células β do pâncreas, falta de insulina ou utilização defeituosa. Hiperglicemia, glicosuria, polidípsia, etc.

Aumento da Entropia na utilização de glicose, lipides e outros metabólicos, por perturbação no mecanismo de controle metabólica insulina-dependente.

Tabela 2 : Estados de Entropia Aumentada. Alterações Fisiopatológicas

Page 16: Entropia - Uma proposta para o ensino não universitário

PARTE IV – Considerações Finais

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Considerações

Abordagem de temas atuais, como surgimento de doenças, meio ambiente, recursos naturais,

abre muitas possibilidades de atividades a serem feitas em classe. A proposta aqui exposta visa

propiciar uma discussão em sala com/entre os alunos sobre temas que eles tenham mais afinidades, e

que consigam traze-lo para o campo da física e discuti-lo.

Certamente que este trabalho ainda não foi experimentado, com isso não podemos concluir a

sua eficácia na utilização destas temáticas no processo de ensino/aprendizado, do conceito de

entropia. Mas já é um passo em busca de explorar outras aplicações de conceitos físicos em sala de

aula.

O crescimento da ordem é fundamental para a existência da vida, como também é inevitável e

irreversível, assim como a Entropia. Este crescimento da ordem é uma resposta contra o crescimento

constante da Entropia, como um equilíbrio para a existência da vida, entre a ordem e a desordem, sem

a perda da informação. Perda de informação leva, gradativamente, ao estado de Entropia máxima, a

morte do sistema biológico.

Referências Bibliográficas

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Page 17: Entropia - Uma proposta para o ensino não universitário

PARTE IV – Considerações Finais

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