16

Esacto ediçao 21

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Esacto ediçao 21

Citation preview

Page 1: Esacto ediçao 21
Page 2: Esacto ediçao 21

Na edição nº 20, o ESACto atribuiu a autoria do artigo "Amnistia na ESA", erradamente, a Beatriz Canteiro. À sua verdadeira autora, Rosária Rego, e aos nossos leitores ,aqui fica o pedido de desculpas.

Page 3: Esacto ediçao 21

“Voa quanto queiraTão alto até que eu já não te possa ver.”E eu voei,Mas nunca me disseste, Que tu não virias.Então parti as minhas asas.E fiquei contigoE disseste-me:“Parva, porque partiste as tuas belas asas?”Eu respondi-te:“Tu é que és mais parvo Por teres abdicado a tua felicidadePela minha liberdade.”

Avó de nome, assim sempre foi,Alegria inesgotável e Puro Amor sem fim,Preocupada e incentivada, claro,Todas as avós são assim!

Mas igual a minha não é, não...Quer dizer, tudo o que eu disse é verdade,Mas a minha avó faz com que os netosSe encaminhem pela vaidade...

É sim senhora assim como disse!E posso não ter sido muito profundo...Mas como poderia eu não me envaidecer,Se a minha avó é a melhor no Mundo?

Já nem a voz ouvir consigo,O teu olhar, perdi-o,E num caminho esguioO pensamento perde-se comigo...

Ao longe bate a vontadeDe reviver o passado,E como se estivesse destinado,Chama por mim a realidade...

Um amor que viveMas que não respira entretantoN'alma sôfrega de outrém.

Uma lembrança que tive,Um momento que vai distanteMas que no coração se mantém...

Ai! Que não aguentoTão demorosa Infinidade,Se não me ajuda o tempoA matar esta SAUDADE.

Page 4: Esacto ediçao 21

Escrevo no final de ano. Sobre o quê?

Afinal, quem lê o ESACTO? Raros são os leitores que o compram, mais raros os que o ostentam, raríssimos os que o comentam, menos raros, porém, os que dele dizem mal. Mas alguém especial insistiu, cá vai. Deixo algumas notas, ao jeito de músi-ca lenta:

Li no último número do Expresso uma pequena rubrica com o título “Isto anda tudo ligado”. Era sobre educação, na es-cola, os meninos, o país, enfim. E sobre vídeos e violência na escola, e juízes e prisão preventiva… mas também sobre pais que se alheiam e deixam os filhos entregues a si próprios.

1. Na semana passada, tive uma experi-ência única: quatro queridos com ar an-gelical viam, no nosso CEESA, a risos despregados, o tal vídeo, a correr no YouTube: condena-se as escolas, os pais, mas o filme passa sem regra ou pu-nição; e os jovens vêem-no, com som, sem nenhuma restrição. Só eu reagi; os tais sorriam a olhar para o meu despropósito. Só quando me ofe-reci, provocatoriamente, para arrancar uns cabelos (gesto simbólico, deus nos

livre de um professor pôr a mão no ca-belo de um aluno!...), é que o jovem rea-giu e se pôs sério. De mais a mais, quem era eu, que ele nem conhecia, pa-ra me insurgir contra a sua liberdade?2. Nesta semana, alguns alunos acha-vam que Isabel da Nóbrega (sim, a escri-tora, a voz de “O prazer de ler” na Antena 1, há anos (!) e de muita coisa bonita em língua portuguesa) não tem o jeito adequado para cativar a atenção au-ditiva de um jovem, em aula ou em ca-sa; eles enfadam-se, a senhora talvez devesse tentar outras coisas mais anima-das.

“Não, eu não vou por aí!”

Recuso-me a fazer movimento de retro-cesso, de baixar o nível para os jovens não se sentirem desconfortáveis, para não perderem a motivação (a de fazer sempre o mesmo e se enfadarem por is-so mesmo).Que função tem um professor? Essa mesma: incomodar, fazer sair da zona de conforto da ignorância e da pre-guiça mental. Instruir é ensinar a questionar.Escrevemos já nestas páginas sobre a es-cola da Primeira República: os meninos há 100 anos vinham à escola para sair

da sua condição mais humilde, para me-lhorarem e para crescerem. Hoje muitos pedem à escola que não os tire da sua ignorância de adolescentes arrogantes (é que podem ficar despertos!...); pe-dem aos professores que os deixem ser o que são: relaxados, preguiçosos, com mentes lentas, a reproduzir cópias in-competentes da Internet, disfarçadas de “bons trabalhos” (como se os professo-res não percebessem…); pedem aos pro-fessores que não lhes tragam actividades para a aula, para depois se queixarem de aulas “sem fazer nada”. Ah! E o professor tem de ter piada fá-cil, ou o jovem pode ficar ofendido se a lição exigir esforço.Das ciências às línguas, muitos querem aulas a começar tarde, querem conver-sar para o tempo passar melhor, mas com pouca actividade; o resto é esperar para fazer algo mais útil, como acabar trabalhos (diga-se, as tais transcrições mal amanhadas da Internet, com a coni-vência de muitos, a começar pelos pais), estudar de véspera para os testes, ter uma notitas, isto é, ocupar o tempo na escola secundária, que a vida não es-tá para trabalhos!

Mas, afinal, o que faz mesmo um pro-fessor na escola?

Page 5: Esacto ediçao 21

Bom, …Faço os meus alunos trabalharem mais do alguma vez eles pensaram que poderiam fazer.Faço-os estar sentados 60 a 90 minu-tos durante a aula, quando os pais não o conseguem fazer por mais do que 5 minutos sem um iPod, PSP ou Nintendo.Faço-os admirar-se e maravilhar-se.Faço-os interrogar-se.Faço-os pedir desculpa com sentido.Faço-os respeitar e responsabilizar-se pelas suas acções.Ensino-os a escrever e depois faço-os escrever algo com sentido e valor.Faço-os ler e ler e ler. E ainda ler…Faço-os pensar, interrogar, questio-nar, duvidar do que lêem.Faço da minha sala de aula um lugar onde os meus alunos se sentem bem mas intranquilos pelo saber.Finalmente, faço-os entender que se usarem os talentos com que nasce-ram, trabalharem muito, e seguirem os seus corações, podem ser felizes na vida.

Que faço enquanto professora? Tento fazer a diferença…

Em inglês, circula pela net uma histó-ria de uma conversa entre um alto ad-ministrador de empresa, rico, e uma professora, menos afortunada.Ela inspira-me, hoje, como me inspira-ram as mulheres e os homens que me fizeram desejar ser mais. Esse mais en-contrei-o em muito lado na minha vida (sou uma felizarda), mas encontrei-o também, para começar, na escola. Ain-da hoje uma professora me inspira to-dos os dias da minha vida profissional.

E por isso alguns alunos também fa-zem a diferença na minha vida: os que interrogam, os que duvidam, e questio-nam, e não aceitam tudo o que digo co-mo garantido, a não ser que o compreendam; os que me exigem mais dedicação, mais pesquisa e inovação,

mais rigor comigo própria e com os instrumentos a que recorro. Os que me demandam que raramente me confor-me com os trabalhos do ano anterior e faça novos tanta vez. Os que me pe-dem ajuda para mudar, também, por-que vão construindo a consciência de que é o indivíduo que aprende, não o professor que ensina. Os que, lá bem no fundo me ensinam a aprender mais coisas para fazer no dia seguinte, por-que um deles precisa de mim. Os que me ajudam a nunca estar satisfeita co-migo e com o meu sucesso. Porque o meu sucesso não existe enquanto o de-les não está garantido.Os que me fazem merecer o nome de professora, no pleno sentido da palavra.Estou grata a esses. E aos outros tam-bém, porque me mostram o caminho...

Page 6: Esacto ediçao 21

Para o Conhecimento: rapidamente e em força!

Qualquer frase, embora não seja um ser vivo (mas quantas têm vida própria!), tem sempre uma frase-mãe. Ora, a que inicia este parágrafo não é excepção. Esta frase-filha pode regozijar-se de ter uma mãe célebre: Para Angola: rapidamente e em força! Mas muito mais célebre é o seu autor-pai, que nunca tendo sido pai (tanto quanto se sabe), deveria ficar bastante contente de saber que 50 anos depois de ter nascido, a sua frase-filha ainda anda na boca do mundo, coisa que só admitia (andar na boca de alguém), por ser a sua frase-filha isso mesmo, uma frase. Ou não fosse ele um ditador às direitas! Mas e o pai, perguntam os mais atentos, quem é? Era: António de Oliveira Salazar,

responde o narrador contrito pelo esquecimento. Este nome-montra é bastante apelativo para uma entrada demorada na história-loja do estadista, mas a ponte-avenida é extensa, e ainda há muitas linhas-montras por ver e escrever, caros leitores. Retomemos a nossa viagem.Mesmo sem máquina do tempo é possível ir ao passado e lançar pontes para o futuro:Para Angola: rapidamente e em força! Para o Conhecimento: rapidamente e em força! Mãe. Filha. Passado. Presente. Duas metades unidas e eis a ponte construída. Não são duas metades iguais: uma é 1.246.700 km² de natureza imposta que muito superficialmente pode ser reconstruída pela gente que ela acolhe. A outra é uma entidade abstracta que só existe

no cerebral relevo orgânico da gente acolhida, e onde se acumula e transforma, infinitamente, dentro do paradoxo finito de dois hemisférios. Angola. Conhecimento. A primeira palavra, por designar um país, mensurável, portanto, tem direito a maiúscula (onde habitam as maiúsculas?). A segunda, por ser uma entidade metafísica (onde habitam as maiúsculas!), imensurável e pretensamente intangível, não tem. Mas foi o autor quem assim escreveu! Por que não o fez? Astuto leitor que habita as circunvalações da razão, bem-haja. Mas atente: as metáforas e quejandos recursos de estilo - meios poderosos à disposição de quem escreve - só existem se lhes criarem os espaços apropriados. Olhe, é como aqueles autarcas que vendem terrenos

Page 7: Esacto ediçao 21
Page 8: Esacto ediçao 21

públicos a 1 euro o m2 para atrair empresas para os concelhos que seguem os seus conselhos. Assim é quem escreve, um edil das palavras. Agradecido, o autor avança. Venha também, atento leitor.Voltemos à metafísica e, sem mais delongas, que comece a argumentação num terreno que não é caro. É inestimável! As linhas que tem vindo a ler são um intróito de defesa de uma entidade que, talvez por ser metafísica, tem vindo a ser negligenciada e injuriosamente instrumentalizada: o Conhecimento, com a simbólica maiúscula, como lhe é de direito. Todavia, não é negligente aquele que instrumentaliza o Conhecimento para criar mais experiências, mais projectos e mais ideias (eu próprio acabo de o fazer, reutilizando a histórica frase e adaptando-a em prol do meu objectivo, não injurioso), mas aquele que o faz sem reflectir sobre essa instrumentalização. Àqueles que criam e difundem Conhecimento, dedicarei os melhores elogios, “se a tanto me ajudar o engenho e a arte” dos meus Conhecimentos, noutra altura e noutras linhas. Fica, no entanto, a promessa que é, também, prova do meu não esquecimento e da minha admiração.

Antes de chegarmos à segunda metade da ponte-avenida que tentamos alcançar, é preciso percorrermos a sua primeira metade. Limitações físicas. Recorro ao meu Conhecimento – indirecto, porque releva da experiência própria de outros – para afirmar que nos tempos em que o autor desta meia ponte-avenida (Para Angola: rapidamente e em força) governava, mais depressa se investiria numa megalómana ponte até Angola, do que se abriria mais uma universidade, acção decerto mais exequível e sobejamente menos dispendiosa. Não quero com isto dizer que não houvesse universidades em Portugal ou que não houvesse quem tivesse acesso ao Conhecimento, mas antes que a universalização do Conhecimento, que

se verifica hoje, não existia nem era fomentada, muito pelo contrário: “Tempo de solidão e de incerteza/Tempo de medo e tempo de traição/Tempo de injustiça e de vileza/Tempo de negação” (in Data, de Sophia de Mello Breyner Andersen)Contudo, puseram-se cravos nas espingardas e deram-se coronhadas nas portas do Conhecimento. Mas como ele jorrava demasiado rápido e a avidez era muita, criaram-se mais universidades, ou seja, mais barragens de Conhecimento, para que ninguém tivesse dificuldades em bebê-lo (ai estes lirismos!). Não sei, porque não vi, mas julgo que as coronhadas foram de tal maneira fortes que os cravos, que repousavam nos canos libertadores, saíram disparados e como ninguém os recolocou no seu devido sítio, ficaram esquecidos num chão letárgico. Até hoje…Não quer dizer que, entretanto, não se tenham construído mais universidades, porventura a mais, afirma-se hoje (pronuncie-se quem sobre isso já reflectiu). Quero dizer que a água que pressionava as barragens eutrofizou-se. Não porque o Conhecimento não fosse renovado, não! Não porque a avidez fosse menor, não! Mas antes porque não existia (existe) uma proporcionalidade entre o aumento de utentes das barragens e a avidez/motivação com que se as usam. As interjeições, ante mais e novo Conhecimento, deixaram de ser de curiosidade e espanto para passarem a ser de tédio e sono. Com o fim da

ditadura as universidades deixaram de ser um fim em si mesmo – a discussão/criação pró-activa para a mudança – para serem um meio para atingir, massivamente, prestígio e reconhecimento balofos. O diploma substituiu a atracção pelo Conhecimento e, mormente, a sua aplicação, inovadora e originalmente. E depois admiram-se (afinal sempre sabem o que são interjeições!) que com o canudo enrolado só avistem o seu umbigo ou o nada. Que é tudo, como o mito. O Conhecimento passou a ser um meio para atingir uma nota e satisfazer uma avaliação. As notas e as avaliações ficam. O Conhecimento nem sempre. As inferências atrás descritas (e como gostava que fossem um mito!) correspondem a gerações às quais não pertenci. Sou da geração de hoje. Mas fi-lo por extrapolação regressiva, sem máquina do tempo, partindo da geração à qual pertenço. Julgo que os jovens de hoje não são diferentes dos de outrora e nem as circunstâncias da vida universitária sofreram alterações assinaláveis. Infelizmente…O ónus da culpa por esta ausência de motivação é de ambas as partes: de quem transmite saber e avalia (a avaliação é indispensável, note-se) e de quem aprende. Se o ónus da culpa está equitativamente repartido, a responsabilidade de mudança deste estado cabe, em maior medida, aos actuais estudantes. A justificação oscila entre o egoísmo: é do maior interesse termos Conhecimentos efectivos e planos para a sua transformação em projectos, já que esse é o único caminho para consumar o sucesso num mundo assaz concorrencial; e o altruísmo: a missão das universidades é formar quadros técnicos de excelência e elites, sábias e pró-activas, que os liderem, de modo a conduzir a sociedade até ao bem-estar colectivo e ao progresso sustentado. Um lugar-comum é sempre bem-vindo até porque pode funcionar como um

Page 9: Esacto ediçao 21

argumento de autoridade: é no presente que se vive e se constrói o futuro e por isso, haja motivação, esforço, prazer e inteligência para que o futuro seja menos incerto e mais recompensador!É preciso que os estudantes, liderados, por exemplo, pelas associações académicas, direccionem esforços mais enérgicos, musculados e criativos na tentativa de reduzir o número sufocante de unidades curriculares por semestre e a proficuidade e o conteúdo curricular de algumas. É preciso que as associações académicas percebam a importância da interdisciplinaridade, incrementando, para isso, ligações informais entre faculdades de modo a criarem-se fluxos de saber dentro das academias. Mas há mais…Do lado de quem avalia e transmite

Conhecimentos é preciso que a avaliação se centre na comprovação efectiva do Conhecimento e premeie aqueles o usam e difundam de forma inovadora. É preciso que o nevoeiro ignorante deixe de pairar em cada momento de avaliação com sucessiva

indiferença. É preciso que se tracem objectivos que transcendam os exames e os testes, porque há mais vida para além deles. Mas há mais…Transversalmente, é preciso que o Conhecimento se alargue, pela mão de professores e alunos, às escolas secundárias, básicas e primárias; aos lares, centros de dia e jardins de infância; a instituições públicas e privadas, por exemplo, dando primazia ao Conhecimento mais conveniente a cada grupo mas não descurando a interdisciplinaridade. Mas há mais… É preciso desencaixotar e desempoeirar o Conhecimento. Deixa-lo rolar pelo chão, sujar-se e adoecer para que ganhe defesas e seja maior! Há gente e Conhecimento, só falta que cada um lhe dê um pouco de vida e

Page 10: Esacto ediçao 21

força para que ele seja capaz de abrir livros e percorrer os meandros do mundo virtual. É preciso que quem já faz isto se mostre e divulgue o seu trabalho para que se perceba que é possível e importantíssimo. São precisos exemplos, pontos de partida para que se criem outros, melhores e geradores de mais Conhecimento. Porque o mundo não é somente aquilo que a razão alcança: é também aquilo em que ela o transforma!Embora já atrás mencionado, retomo a questão da interdisciplinaridade porque, creio, é o maior contributo-afirmação da actual geração. Justifico com duas analogias: se tomarmos cada disciplina do saber como um neurónio e os novos Conhecimentos como sinapses, conclui-se que, tal como

acontece no nosso cérebro, mais lig-ações entre neurónios resultam em mais sinapses. Ora, para estimular es-sas ligações é preciso que cada neurónio não só reflicta sobre a sua área de saber estritamente entre os seus pares, mas também com diferentes neurónios com o mesmo empenho e convicção. São as universidades quem deve tomar a dianteira nesta matéria e servir de catalisadores para que isso ocorra, da mesma forma que, nas reacções químicas é imprescindível que ocorram “choques eficazes” entre os reagentes de modo a formarem-se produtos. Mas nestas reacções o produto final é mais difícil de prever. Não obstante, os resultados dessa artic-ulação entre Conhecimentos de áreas diferentes podem ser tão sur-preendentes como um cadavre exquis

surrealista e tão gratificantes como um sincero e justificado elogio. É preciso que nos apercebamos que as armas que adquirimos ainda pouco tín-hamos avançado na idade – falo de ca-pacidades como ler e calcular, por exemplo – são a chave para nos tran-scendermos e destruirmos utopias im-postas em terras de aquém física e além metafísica. Para que tudo o que pensemos ou med-itemos não fique na metade! Fiquemos certos, no entanto, que o desejo de conhecer nunca será pó. Nunca será encontrado cadáver, em casa, abandonado pela vida (por nós), exasperada de esperar. Agoniza, con-tudo, no espírito de muitos jovens estudantes e de quem nos ensina a sê-lo.Hoje, o sistema de ensino, onde o

Page 11: Esacto ediçao 21

desejo de conhecer deveria ser um im-perativo, é um “cadáver adiado que pro-cria”, pela ausência desse imperativo:a) descrentes numa mudança (e que to-mavam as escolas e as faculdades como lugares inigualáveis onde o dog-matismo, o pedantismo e a jactância não tinham lugar) b) descontentes, porque foram iludidos com a ideia de que o Conhecimento é um bem mercantil, transaccionado a troco de notas de avaliação.Mas os descrentes, silenciosos, continuam a acolher o Conhecimento e a criar espaços para uma simbiose regeneradora. Mas não nos esqueçamos que silencioso não é sinónimo de conivente. E é por isso que oiço um silêncio inquietante. Talvez só o deixará de ser quando Pessoa, “O Binómio de Newton é tão

belo como a Vénus de Milo. O que há é pouca gente que dê por isso ”, deixar de ter razão. Inaugurámos a ponte-aveninda que temos vindo a percorrer logo que começámos a ler as primeiras linhas, mas falta-nos dar-lhe um nome: Prefiro o MIT ao FMI, sugiro. Porquê? Porque acredito que serão instituições como o MIT e as pessoas que lhes dão vida, que nos libertarão da austeridade, da pequenez dos problemas imediatos e da volatilidade angustiante que muitas outras, como o FMI, submetem, intransigentemente, às sociedades-prisioneiras. É por isto que prefiro o Conhecimento, e o projecto para o futuro. E é por sermos o futuro, jovens estudantes, que é chegada a hora de sermos Conhecimento. É urgente que se animem e

substanciem, com fulgor, moderação e sapiência, as alegorias do presente que precedem, espero, mudanças. É-lo, porque hoje o Conhecimento mede forças com a apatia!

Page 12: Esacto ediçao 21

Elogio da Leitura

L ER é uma actividade estimulante, embora pareça aborrecida. O acto de escrever e ler é criar

um universo paralelo que se alimenta dos materiais vividos no nosso mundo quotidiano, penetrando-os com uma nova luz (leia-se, a este propósito, o Pêndulo de Foucault, de Umberto Eco , no qual o autor interpreta os acontecimentos históricos que marcaram a Europa nos últimos dois mil anos, como o resultado de uma

conspiração urdida por uma sociedade secreta) .Recordo-me de, quando jovem, viver numa aldeia pobre em estímulos, onde nada acontecia, e de ter tido necessidade de mergulhar, através da leitura, na imensa constelação da cultura, na literatura, religião, filosofia e ciência. Sentia-me interiormente rico e exteriormente pobre, rodeado de formas e personagens mais interessantes do que aquilo que a experiência quotidiana me oferecia; a volúpia da vida vinha até mim, conquistada com o meu esforço de querer compreender tudo o que existia e, por isso, era mais saborosa

(um prazer construído é superior a um prazer imediato oferecido pela natureza). Não esqueço, para provar que o acto de ler proporciona sensações intensas, o meu assombro e deslumbramento, quando, na cena final das Vinhas da Ira, de John Steinbeck, uma mulher, mãe havia poucos dias, saciava ao seu peito, num celeiro abandonado, um trabalhador faminto; o inesperado e a grandeza moral da situação arrebatou de tal modo o meu espírito que, por uma espécie de graça, senti-me a sobrevoar o meu próprio corpo, compreendendo que os velhos sábios tinham razão quando diziam que

Page 13: Esacto ediçao 21

Elogio da Leituraa alma podia retirar-se do corpo e a ele voltar. Também muitas vezes senti gotas de suor espessas a descer pelo meu rosto, quando lia avidamente, pela madrugada fora, as Histórias extraordinárias, de Edgar Allan Poe, A porta das sete chaves, de Edgar Wallace, ou As aventuras de Sherlock Holmes, de Conan Doyle, e o desenlace final se aproximava (a literatura policial é, geralmente, menosprezada como um género menor, e, contudo, os seus autores manipulam a seu bel prazer as emoções e pensamentos dos crédulos leitores – exploram o medo e fascínio que

experimentamos perante o espectáculo do mal - como foi evidenciado, em relação ao modo como encurtam ou dilatam o tempo da narrativa para fins digamos dramáticos, pelo genial escritor italiano Umberto Eco , na obra Seis passeios no bosque da ficção).Regressando ao início deste artigo: o acto de ler implica, num primeiro instante, um distanciamento do leitor, um pôr entre parêntesis os seres e acontecimentos com os quais se relaciona na existência dita real. Leva à criação de um outro universo, no qual, especialmente na literatura de ficção, os sentidos enquanto faculdade de

apropriação do real vulgarmente usada na vida corrente, cedem a primazia à imaginação (faculdade criadora de novas formas) e ao pensamento já liberto das exigências de obedecer às leis da lógica (ao que a literatura filosófica e cientifica estão obrigadas) e ao veredicto dos factos (que é a fronteira da especulação cientifica). Contudo, num segundo momento, e ao transformar os modos de pensar e sentir do leitor, reconcilia-nos com a realidade, mesmo com os seus aspectos terríveis e absurdos (como bem o mostra Nietzsche, na sua obra A Origem da Tragédia).

Page 14: Esacto ediçao 21

O modelo da Escola Pública tem-se mantido mais ou menos nos mesmos moldes há

cerca de 200 anos. Se houvesse fotografias da época, dos alunos, sentados, e do professor, autoridade máxima, em pé, perante um grande quadro que cobriria, quase por completo, uma das paredes da sala, nós provavelmente confundiríamos esta imagem com aquela que nós possuímos da sala de aula, pelo conceito que nutrimos por ela, actualmente.O conceito da Educação Pública, nos termos em que o conhecemos, como investimento das receitas que o Estado obtém da taxação aos seus cidadãos, foi revolucionário: foi trazer cultura aos que não tinha acesso a ela, foi igualizar todas as pessoas através de um caminho, pelo qual nós nos tornamos educados e, portanto, habilitados a responder, qualificadamente, aos desafios da civilização. Como tal, para que a Educação ajude o cidadão a estar mais habilitado a responder a esses desafios, é importante que a Educação, ou pelo menos o modo de ensinar, evolua, e que acompanhe a necessidade própria do Homem de adquirir conhecimento, já que somos animais e racionais, lutamos não só pela necessidade de sobrevivência, mas também pela necessidade de evoluirmos racional e intelectualmente. Caso estagnemos na forma de ensinar, colocamos em risco a nossa capacidade de evoluir como seres humanos, livres e autónomos. Olhemos brevemente para estes 200 anos, o que aconteceu? A Revolução Liberal abriu asas ao Homem, dando combustível ao motor da potencialidade e da capacidade do Homem de se inventar a si próprio. Descobrimos o rádio, o raio-x, a penicilina, inventámos as máquinas, olhámos o espaço e pisámos a Lua. Nestes 200 anos, nós quebrámos não só barreiras tecnológicas, mas como também alguns dos nossos preconceitos sociais, e

ainda estamos numa era de mudança, quando, daqui a anos, olharem para atrás, verão que vivemos um mundo em viragem, vivemos um momento único. E em relação à escola? Será que apanhou este voo de mudança?Podemos ter passado da ardósia ao papel, dos quadros de giz aos interactivos, mas será que os paradigmas do ensino mudaram? Parece que perdemos o avião.A escola actualmente funciona como se duma fábrica se tratasse, a separação das matérias-primas, horários rígidos e sempre o mesmo modo de fabrico. Nestas fábricas, na maior parte delas, reina a monotonia e o desinteresse, o que se revela na qualidade dos produtos que fabricam. Qual será, então, a melhor forma de potenciar a qualidade dos produtos? A forma de produção... tal como nas fábricas que produzem menos do que podiam, a Educação precisa de alterar o seu esqueleto de ensinamento.Para tal, pensamos que é necessário descolar certos ossos neste esqueleto para que o organismo em si desencadeie as melhores respostas possíveis ao meio. Isto é, a meta suprema da escola será a de formar alunos com as capacidades desenvolvidas o mais próximo possível da plenitude.É necessário rever o sistema, e ter em mente uma ideia fundamental: o Futuro rege-se pela Educação. E é absolutamente necessário não o sacrificarmos em prol de prazer individual, ou simplesmente abstrações e problemas virtualmente inexistentes. O que é a crise? O que é a dívida? Um espectro, puro espectro existente nas nossas mentes. E cabe a nós construirmos o amanhã, sem estarmos presos às amarras do ontem. Que se solte o génio que há em cada um. Como? Aprendendo por prazer, não por compulsão, como, outra vez? Ora maneiras há de certeza, agora: Inventemos.

Page 15: Esacto ediçao 21

É com grande felicidade e entusiasmo que anunciamos o lançamento oficial da Esa Filosofia. Este projecto inicia-

se como uma aposta educativa entre alunos e professores da área de Filosofia. Com um estilo e personalidade que, na nossa opinião, se traduzem em simplicidade e acessabilidade, a nova Esa Filosofia foi cuidadosamente pensada por Daniel Pereira ( aluno de Filosofia), Paula Serôdio e Anabela Santos ( professoras na área de Filosofia).O projecto tem como objectivo oferecer a todos os internautas

interessados, muito daquilo que esteja directa ou indirectamente relacionado com Filosofia. O blog será actualizado comnovos conteúdos todas as semanas, bem como serão introduzidos Vídeos e Textos de Reflexão para esclarecimento da comunidade e dos internautas que tenham interesse em participar neste reino dos porquês, mas também para todos aqueles que esperam conseguir adquirir uma visão mais atenta de pequenos factos com que lidam diariamente e que tenham por ventura interesse em perceber o porquê daquilo ou qual a ideia mais correcta a ter sobre determinado assunto.

Page 16: Esacto ediçao 21

Professora Primária: "Porque o frango queria chegar ao outro lado da rua."Criança:"Porque sim."Platão:"Porque queria alcançar o Bem."Aristóteles:"Porque é da natureza do frango atravessar a rua."Descartes:"O frango pensou antes de atravessar a rua, logo, existe."Rousseau:"O frango por natureza é bom; a sociedade é que o corrompe e o leva atravessar a rua."Freud:"A preocupação com o facto de o frango ter atravessado a rua é um sintoma de insegurança sexual."Darwin:"Ao longo dos tempos, os frangos vêm sendo seleccionados de forma natural, de modo que, actualmente, a sua evolução genética fê-los dotados da capacidade de cruzar a rua."Einstein:"Se o frango atravessou a rua ou se a rua se moveu em direcção ao frango, depende do ponto de vista... Tudo é relativo."Martin Luther King:"Eu tive um sonho. Vi um mundo no qual todos os frangos livres podem cruzar a rua sem que sejam

questionados os seus motivos. O frango sonhou."George W. Bush:"Sabemos que o frango atravessou a rua para poder dispor do seu arsenal de armas de destruição maciça. Por isso tivemos de eliminar o frango."Cavaco Silva:"Porque é que atravessou a rua, não é importante. O que o país precisa de saber é que, comigo, o frango vai dispor de uma conjuntura favorável. Não colocarei entraves para o frango atravessar a rua."José Sócrates:"O meu governo foi o que construiu mais passadeiras para frangos. Quando for reeleito, vou construir galinheiros de cada lado da rua para os frangos não terem de a atravessar."Mário Soares:"Já disse ao frango para desistir de atravessar a rua! Eu é que vou atravessar! Não vou desistir porque sei que os portugueses querem que eu atravesse outra vez a rua!!!"Manuel Alegre:"O frango é livre, é lindo, uma coisa

assim... com penas! Ele atravessou, atravessa e atravessará a rua, porque o vento cala a desgraça, o vento nada lhe diz!"Jerónimo de Sousa:"A culpa é das elites dominantes, imperialistas e burguesas que pretendem dominar os frangos, usurpar os seus direitos e aniquilar a sua capacidade de atravessar a rua, na conquista de um mundo socialista melhor e mais justo!"

Francisco Louçã:"Porque é preciso dizer olhos nos olhos que só por uma questão racista o frango necessita de atravessar a rua para o outro lado. É uma mesquinhice obrigar o frango a atravessar a rua!"Valentim Loureiro:"Desafio alguém a provar que o frango atravessou a rua. É mentira...!!! É tudo mentira!!!"Paulo Bento:"O frango atravessou a rua tranquilamente... Era isso que esperávamos e foi isso que aconteceu, com muita naturalidade. O frango ainda é muito jovem e estas coisas pagam-se caro, com tranquilidade!!!"Zézé Camarinha:"Porque foi ao engate! É um verdadeiro macho, viu uma franga camone do outro lado da rua e não perdoou. Deu um créu nela!!!"E a Loira Lili Caneças..."Porque se queria juntar aos outros mamíferos."