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EDUCAÇÃO E SEGURANÇA PÚBLICA: A SOCIEDADE, VÍTIMA DA SÍNDROME DE RILEY-DAY (artigo originalmente publicado no Jornal O POPULAR, Seção OPINIÃO, de 31 de maio 2007; ABDIR - Academia Brasileira de Direito; NETLEGIS, em 03/05/2007). Fabiano da Silva Faria e Reinaldo Szydloski Os discursos, muitas vezes repetitivos, sobre a segurança pública não levam em consideração uma análise multidisciplinar do problema, que deveria envolver as demandas de educação e os problemas sócio-econômicos, entre outros. Mas tão influente no problema da criminalidade quanto à ação policial preventivo-ostensiva, somente a educação e a formação do indivíduo, como cidadão. Tem-se, por característica nacional, deixar que nossos filhos sejam educados nas escolas, por mestres e professores dedicados à função. Mas este raciocínio é, de certa forma, equivocado: a escola deve ensinar e formar o cidadão; a família educa o indivíduo como ser humano, e lhe dá um caráter primário, fundamental para o desenvolvimento de sua personalidade social. Devemos desonerar as instituições de ensino desta responsabilidade, tentando evitar a quase falência da entidade familiar. A educação formal (proporcionada pela formação escolar, pelos condicionantes sociais e pelas regras de convivência em comunidade) não sobrepõe à importância da educação doméstica, que induz a uma formação de personalidade e caráter, que deverão guiar o indivíduo em suas escolhas futuras, na maioria das vezes. Ainda prospera, no pensamento de alguns do povo, que a estrutura penitenciária recupera o indivíduo recluso, o que é um equívoco. Ademais, já está repetitivo indicar que, para os crimes de pequena relevância social e sem violência contra o indivíduo, as medidas sócio-educativas devem passar, prioritariamente, por restrição de direitos e pelo encaminhamento do transgressor aos serviços sociais, onde o mesmo receberia orientação profissional e educacional. Todavia, àqueles que vierem a receber essa pequena punição e resolverem delinqüir novamente ou mesmo violar as restrições impostas, as medidas de reclusão e segregação deverão ser aplicadas, pois estes cidadãos apenados não levaram e consideração a segunda chance que a eles foi oferecida pela sociedade. Somos sofredores da síndrome de Riley-Day, quando, perante a (in)segurança pública e aos problemas de formação dos nossos jovens, cumprimos alguns requisitos da doença em tela: as vítimas dessa síndrome não sentem dores e, por isso, se sujeitam mais a padecer das conseqüências de suas ações; o organismo pára de registrar qualquer sinal de dano a si mesmo, por mais grave que seja. Sem o aviso de perigo que a dor proporciona, os sintomáticos da síndrome de Riley-Day tendem a morrer jovens, pelos ferimentos causados. Correlacionando essa doença com a nossa sociedade, tendo a sociedade como um organismo, as dores não sentidas como a criminalidade latente, e nossos jovens como as vítimas, não se vê uma fácil simetria? Não somos seguidores de Hans Kelsen, mas consideramos necessário um aviso de caráter geral: devemos começar a obedecer às normas de conduta, que em nosso país são representadas comumente pelas leis. Se não acreditamos nelas, ou as mesmas não atendem mais (ou nunca atenderam) a sociedade, existem meios corretos de discuti-las, visando sua

ESCOLA. SOCIOEDUCATIVO. Educação e Segurança Pública. FARIA, Fabiano Da Silva; SZYDLOSKI, Reinaldo

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EDUCAÇÃO E SEGURANÇA PÚBLICA: A SOCIEDADE, VÍTIMA DA SÍNDROME DE RILEY-DAY

(artigo originalmente publicado no Jornal O POPULAR, Seção OPINIÃO, de 31 de maio 2007; ABDIR -

Academia Brasileira de Direito; NETLEGIS, em 03/05/2007).

Fabiano da Silva Faria e Reinaldo Szydloski

Os discursos, muitas vezes repetitivos, sobre a segurança pública não levam em consideração uma análise multidisciplinar do problema, que deveria envolver as demandas de educação e os problemas sócio-econômicos, entre outros. Mas tão influente no problema da criminalidade quanto à ação policial preventivo-ostensiva, somente a educação e a formação do indivíduo, como cidadão. Tem-se, por característica nacional, deixar que nossos filhos sejam educados nas escolas, por mestres e professores dedicados à função. Mas este raciocínio é, de certa forma, equivocado: a escola deve ensinar e formar o cidadão; a família educa o indivíduo como ser humano, e lhe dá um caráter primário, fundamental para o desenvolvimento de sua personalidade social. Devemos desonerar as instituições de ensino desta responsabilidade, tentando evitar a quase falência da entidade familiar. A educação formal (proporcionada pela formação escolar, pelos condicionantes sociais e pelas regras de convivência em comunidade) não sobrepõe à importância da educação doméstica, que induz a uma formação de personalidade e caráter, que deverão guiar o indivíduo em suas escolhas futuras, na maioria das vezes. Ainda prospera, no pensamento de alguns do povo, que a estrutura penitenciária recupera o indivíduo recluso, o que é um equívoco. Ademais, já está repetitivo indicar que, para os crimes de pequena relevância social e sem violência contra o indivíduo, as medidas sócio-educativas devem passar, prioritariamente, por restrição de direitos e pelo encaminhamento do transgressor aos serviços sociais, onde o mesmo receberia orientação profissional e educacional. Todavia, àqueles que vierem a receber essa pequena punição e resolverem delinqüir novamente ou mesmo violar as restrições impostas, as medidas de reclusão e segregação deverão ser aplicadas, pois estes cidadãos apenados não levaram e consideração a segunda chance que a eles foi oferecida pela sociedade. Somos sofredores da síndrome de Riley-Day, quando, perante a (in)segurança pública e aos problemas de formação dos nossos jovens, cumprimos alguns requisitos da doença em tela: as vítimas dessa síndrome não sentem dores e, por isso, se sujeitam mais a padecer das conseqüências de suas ações; o organismo pára de registrar qualquer sinal de dano a si mesmo, por mais grave que seja. Sem o aviso de perigo que a dor proporciona, os sintomáticos da síndrome de Riley-Day tendem a morrer jovens, pelos ferimentos causados. Correlacionando essa doença com a nossa sociedade, tendo a sociedade como um organismo, as dores não sentidas como a criminalidade latente, e nossos jovens como as vítimas, não se vê uma fácil simetria?

Não somos seguidores de Hans Kelsen, mas consideramos necessário um aviso de caráter geral: devemos começar a obedecer às normas de conduta, que em nosso país são representadas comumente pelas leis. Se não acreditamos nelas, ou as mesmas não atendem mais (ou nunca atenderam) a sociedade, existem meios corretos de discuti-las, visando sua

modificação ou mesmo a sua extinção. Mas nunca, nunca mesmo, devemos ignorá-las, ou demonstrar desprezo irracional – principalmente, perante as crianças. Como exigir o cumprimento de algumas normas familiares básicas, se eles estão atentos ao fato que não obedecemos normais gerais de conduta, tal como as regras de trânsito, por exemplo? Qual será a respeitabilidade de um pai, quando exige um bom comportamento de sua prole? Muito reclamam, com toda a razão, da violência e da segurança pública, mas não atuam como cidadãos exigentes e corretos, ou preenchem esses requisitos somente quando lhes interessam ou quando não a lei não altera suas vontades, de alguma forma. FABIANO DA SILVA FARIA é policial rodoviário federal na 1ª SRPRF em Goiás e multiplicador da filosofia de Polícia Comunitária. Especialista em Criminologia, Gerenciamento em Segurança Pública e fez o Curso Superior de Polícia, na Polícia Militar do Estado de Goiás. [email protected] REINALDO SZYDLOSKI, PRF inativo, ex-Coordenador de Controle Operacional e ex-Coordenador-Geral de Operações do Departamento de Polícia Rodoviária Federal, Advogado, pós-graduado em educação para o trânsito, pela FIJO/PUC-RS; colaborador técnico da CPI da Pirataria e colaborador Técnico da CPMI do Banestado.