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Coincidência de opostos: recurso vital e motivo de conflitos mortais; lugar de viagem esperançosa e cemitério vergonhoso de abandonados; ameaça natural ao homem e irremediavelmente ameaçada por ele; símbolo de vida e de morte; imagem do tempo que passa, escapando-nos, e da eterna fonte original, útero maternal… É sobre este estatuto paradoxal das águas que a exposição “Escutar as Águas” se debruça. Cruzam-se obras da Coleção François Schneider (França), que definiu a água como tema, com obras de artistas portugueses e com filmes, documentos, livros e objetos que nos permitem aproximar da complexidade do elemento e da atualidade do seu impacto político. Esta exposição é uma proposta a que não permaneçamos na margem, num alheamento falsamente seguro, mas que nos lancemos na corrente, conscientes de que estamos já embarcados. Há uma sabedoria e força plástica na água que é preciso escutar. Na água, ou melhor, nas águas: porque é na pluralidade de formas e estados que ela se manifesta – e essa é já uma lição. Museu do Dinheiro 1 Estamos já embarcados 2 Do naufrágio Torreão Nascente da Cordoaria Nacional 3 Da origem 4 Da plasticidade 5 Do tempo piso 0 piso 1 piso 0 piso 2 piso 1 Escutar as Águas Curador Paulo Pires do Vale Artistas Alberto Carneiro, Mathilde Lavenne, Vasco Araújo, Julie Chaffort, Zhang Kechun, Maria Helena Vieira da Silva, Manuel Rosa, José Leitão de Barros, Rashia Linendoll-Sawyer, João Pedro Vale, Laurence Demaison, Hélène Mugot, João César Monteiro, Michel Giacometti, Alex Seton, Gigi Cifali, Rui Sanches, Patrick Bailly-Maitre-Grand, Gaelle Callac, Francisco Tropa, Antoine Gonin, Carlos Nogueira, Ângelo de Sousa, Laurent Faulon, Benoît Billote, Etienne Cliquet, Akmar, Benoît Pype, Yves Chaudouët, Elizaveta Konovalova, Fernando Calhau, Gustavo Millon, Mehdi Meddaci. Museu do Dinheiro Largo de S. Julião (Baixa/Chiado), Lisboa | 4.ª a sáb. das 10h00 às 18h00 Visitas orientadas todos os sáb. até 8 set. às 16h30* (60 min.) *Exceto sáb. 30 jun. às 11h00 Visitas com os curadores 23 jun. às 16h30, 30 jun. às 11h00 e 1 set. às 16h30 (90 min.) Torreão Nascente da Cordoaria Nacional Avenida da Índia (Belém), Lisboa | 3. a a dom. das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 18h00 Visitas orientadas todos os sáb. até 8 set. às 11h00 (60 min.) Visitas com os curadores 7 jul. às 11h00, 21 jul. às 16h30 e 8 set. às 11h00 (90 min.) Informações e reservas Tel. 213 213 240 | [email protected] www.museudodinheiro.pt Colaboração Fernando Calhau, #71 (Time-Space) , 1976, Col. Fundação Serralves ESCUTAR AS ÁGUAS 16.06 a 08.09/2018 Exposição Coleção Schneider e artistas portugueses www.museudodinheiro.pt

ESCUTAR AS ÁGUAS - museudodinheiro.pt · maternal. Na mitologia grega, Afrodite – deusa do amor, da sexualidade, da beleza- nasceu quando Cronos cortou os órgãos genitais de

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Coincidência de opostos: recurso vital e motivo de conflitos mortais; lugar de viagem esperançosa e cemitério vergonhoso de abandonados; ameaça natural ao homem e irremediavelmente ameaçada por ele; símbolo de vida e de morte; imagem do tempo que passa, escapando-nos, e da eterna fonte original, útero maternal…

É sobre este estatuto paradoxal das águas que a exposição “Escutar as Águas” se debruça. Cruzam-se obras da Coleção François Schneider (França), que definiu a água como tema, com obras de artistas portugueses e com filmes, documentos, livros e objetos que nos permitem aproximar da complexidade do elemento e da atualidade do seu impacto político.

Esta exposição é uma proposta a que não permaneçamos na margem, num alheamento falsamente seguro, mas que nos lancemos na corrente, conscientes de que estamos já embarcados. Há uma sabedoria e força plástica na água que é preciso escutar. Na água, ou melhor, nas águas: porque é na pluralidade de formas e estados que ela se manifesta – e essa é já uma lição.

Museu do Dinheiro

1 Estamos já embarcados 2 Do naufrágio

Torreão Nascente da Cordoaria Nacional

3 Da origem 4 Da plasticidade 5 Do tempo

piso 0 piso 1

piso 0 piso 2piso 1

Escutar as Águas Curador Paulo Pires do Vale

Artistas Alberto Carneiro, Mathilde Lavenne, Vasco Araújo, Julie Chaffort, Zhang Kechun, Maria Helena Vieira da Silva, Manuel Rosa, José Leitão de Barros, Rashia Linendoll-Sawyer, João Pedro Vale, Laurence Demaison, Hélène Mugot, João César Monteiro, Michel Giacometti, Alex Seton, Gigi Cifali, Rui Sanches, Patrick Bailly-Maitre-Grand, Gaelle Callac, Francisco Tropa, Antoine Gonin, Carlos Nogueira, Ângelo de Sousa, Laurent Faulon, Benoît Billote, Etienne Cliquet, Akmar, Benoît Pype, Yves Chaudouët, Elizaveta Konovalova, Fernando Calhau, Gustavo Millon, Mehdi Meddaci.

Museu do Dinheiro Largo de S. Julião (Baixa/Chiado), Lisboa | 4.ª a sáb. das 10h00 às 18h00 Visitas orientadas todos os sáb. até 8 set. às 16h30* (60 min.) *Exceto sáb. 30 jun. às 11h00 Visitas com os curadores 23 jun. às 16h30, 30 jun. às 11h00 e 1 set. às 16h30 (90 min.)

Torreão Nascente da Cordoaria Nacional Avenida da Índia (Belém), Lisboa | 3.a a dom. das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 18h00 Visitas orientadas todos os sáb. até 8 set. às 11h00 (60 min.) Visitas com os curadores 7 jul. às 11h00, 21 jul. às 16h30 e 8 set. às 11h00 (90 min.)

Informações e reservas Tel. 213 213 240 | [email protected] www.museudodinheiro.pt

Colaboração

Fernando Calhau, #71 (Time-Space), 1976, Col. Fundação Serralves

ESCUTAR AS ÁGUAS16.06 a 08.09/2018

Exposição Coleção Schneider e artistas portugueses

www.museudodinheiro.pt

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Francisco Tropa, Dânae, 2016, Col. do artista

2 Do naufrágio Depois de ter sobrevivido a um naufrágio, Aristipo (séc. V-IV a.C.) es-creveu aos seus concidadãos atenienses: “Deve-se deixar às crianças apenas os bens que, no curso da vida, podem ser salvos em caso de naufrágio, pois só aquilo que as inclemências do destino, a revolução ou a guerra não podem prejudicar, é importante para a vida”.

Educar para o naufrágio é aprofundar a certeza de que nem a nossa vida é propriamente nossa. E como fechar os olhos aos milhares de migrantes mortos no mar Mediterrâneo, uma estrada de esperança transformada num imenso cemitério, sem portos seguros?

4 Da plasticidadeA rigidez e a inflexibilidade são o oposto da vida – que exige a plasticidade, o incessante movimento.

A água molda o mundo, e é moldada por ele. É essa dupla aceção de plasticidade, a capacidade de moldar e de ser moldado, que encontramos nestes núcleos, e que a água nos ensina – se a soubermos escutar. A água vai formando, com paciência e persistência, o território, alterando os leitos, as margens e a forma da costa marítima – água mole em pedra dura…

A água é informe. Flui: separa-se, irradia, bifurca, abre caminhos onde antes não existiam, forma imagens, cria desenhos e apaga outros. Dá origem a formas de vida inesperadas. É a potência, a vida que se dispersa e reúne e adapta, em perpétuo movimento.

A água sabe dançar.

1 Estamos já embarcados A metáfora da viagem é uma das mais poderosas para figurar e com-preender a existência humana.

Nesta antiga Igreja, não podemos esquecer viagens míticas e poéticas como a do astucioso Ulisses, a barca dos mortos ou o simbolismo reli-gioso da água: símbolo de morte e renascimento, de purificação e vida nova.

No centro da nave, corre agora um rio. E corremos nós no centro dele. Olhamo-nos nessas águas e compreendemo-nos aí como água – e por isso, a escassez e a sua falta nos colocam em causa.

3 Da origemNos mitos fundadores de várias civilizações, a água surge como a origem da vida: como a causa ou o lugar do seu aparecimento, como sémen ou útero maternal.

Na mitologia grega, Afrodite – deusa do amor, da sexualidade, da beleza- nasceu quando Cronos cortou os órgãos genitais de Urano e arremessou-os no mar; da espuma (aphros) ergueu-se Afrodite.

Noutro mito, conta-se que Dânae foi enclausurada pelo pai num lugar escondido do mundo, para que não se cumprisse a profecia do oráculo que lhe revelou que ele seria morto pelo seu neto. Dânae, mesmo presa e solitária, será fecundada pela chuva dourada enviada por Zeus, que se apaixonou por ela.

Estes mitos revelam a relação ancestral entre a sexualidade, a fecundidade e a água: ela é fonte, o líquido amniótico, a origem do mundo.

Museu do Dinheiro

Torreão Nascente da Cordoaria Nacional

Vieira da Silva, História Trágico-Marítima, 1944, Col. Fundação C. Gulbenkian

Alberto Carneiro, Metáforas da água, 1993-94, Col. particular

5 Do tempo“Ladrão cristalino” foi uma expressão usada na época barroca para definir o tempo, e compará-lo ao rio que corre, à vida que passa e nos é roubada.

Se o tempo é como o movimento permanente das ondas do mar, a suspensão desse movimento assume uma estranheza próxima daquilo que definimos como eternidade. Sem princípio nem fim.

Nestes núcleos, as obras permitem perceber o tempo de várias formas: o tempo como movimento universal, repetição e alteração; o tempo suspenso, que se assemelha à eternidade; e o tempo como viagem em direção ao futuro – futuro que é o tempo primordial, a partir do qual os outros, passado e presente, são compreendidos.

Estamos já embarcados!