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Antigo Testamento II Históricos e Poéticos 137 O LIVRO DE ESDRAS TÍTULO O livro recebe seu título de um de seus principais personagens, o sacerdote e escriba judeu Esdras, nome provavelmente derivado da palavra hebraica ʿēzer, que significa auxílio. Os massoretas trataram Esdras e Neemias como um único livro, com estatísticas de versículos dadas apenas no final de Neemias. Versões antigas tinham diferentes nomes para esses dois livros, perpetuando um enigma que as obras extra canônicas identificadas com Esdras ajudaram a agravar. DATA E AUTORIA Embora a autoria do livro não seja disputada, devido ao uso da primeira pessoa em partes da narrativa (7.279.15), seu conteúdo indica uma variedade de fontes que Esdras compilou e editou. Mesmo a narrativa em terceira pessoa pode apontar para o sacerdote- escriba, visto que o fenômeno é comum no Antigo Testamento. As principais fontes do livro foram memórias pessoais de Esdras (7.279.15), documentos oficiais, como o edito de restauração de Ciro, dado em aramaico, em 6.3-5 (com uma versão em hebraico em 1.2-4), a carta de Artaxerxes a Esdras (7.12-26), a correspondência entre Tatenai e Dario (5.7-17; 6.6-12), e a carta de Reum e Sinsai a Artaxerxes I (4.8-22). Pressupondo a contemporaneidade de Esdras e Neemias e a posição proeminente do último na corte persa, o acesso a tais documentos não seria um problema. Além destes, há uma gama de listas: os exilados que retornaram com Zorobabel (2.1- 70; também encontrada em Neemias 7.7-72), chefes de família que retornaram com Esdras (8.1-14), homens que haviam se casado com mulheres estrangeiras (10.18-44), e artefatos religiosos que Ciro devolveu a Sesbazar (1.9-11). Essas listas devem ter sido guardadas nos arquivos do Templo, ou talvez tenham sido preservados pelo governador, visto que muito da vida judaica era regulada pelos persas (cf. Ne 11.23; 12.22). A data de Esdras é motivo de debate com muitos estudiosos rejeitando a cronologia bíblica tradicional, alguns propõem a chegada de Esdras mais tarde, no ano 398 a.C., no sétimo ano do rei Artaxerxes II (Otto Eissfeldt, The Old Testament: An Introduction, p. 554). Outros mantêm os acontecimentos no reinado de Artaxerxes I, pedindo por uma emenda textual em Esdras 7.7, 8 para que diga trigésimo-sétimo ao invés de sétimo, assim situando a chegada de Esdras a Jerusalém em 428 a.C. (John Bright, Uma História de Israel, p. 545). A principal razão para rejeitar o ponto de vista tradicional relatado no texto bíblico é a aparente contradição entre a imagem de Esdras como um reformador bem-sucedido e a presença dos mesmos problemas no tempo de Neemias. As reações violentas de Neemias aos problemas de divórcio e do Sábado (capítulo 13) seriam supostamente injustificáveis se Esdras tivesse, 26 anos antes, firmemente resolvido o problema por meio de uma aliança (Ed 10.3) (sendo os anos 458 para as reformas de Esdras e 432 para as de Neemias). Ainda assim, tais obstáculos são em sua maioria artificiais. A natureza cíclica da lealdade espiritual de Israel é um fato bem estabelecido no Antigo Testamento e meramente manifestou-se novamente depois do exílio. Contudo, as reações de Neemias eram justificadas à luz da aliança renovada durante sua gestão (cf. Ne 10.30-39). Outros argumentos incluem: (a) suposta existência dos muros no tempo de Esdras, à luz de 9.9 (... nosso Deus [...] para nos dar um abrigo em Judá e em Jerusalém.). Isso,

ESD - O Livro de Esdras

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Introdução ao AT - H 5.

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  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 137

    O LIVRO DE ESDRAS

    TTULO

    O livro recebe seu ttulo de um de seus principais personagens, o sacerdote e escriba

    judeu Esdras, nome provavelmente derivado da palavra hebraica zer, que significa auxlio. Os massoretas trataram Esdras e Neemias como um nico livro, com estatsticas de

    versculos dadas apenas no final de Neemias. Verses antigas tinham diferentes nomes para

    esses dois livros, perpetuando um enigma que as obras extra cannicas identificadas com

    Esdras ajudaram a agravar.

    DATA E AUTORIA

    Embora a autoria do livro no seja disputada, devido ao uso da primeira pessoa em

    partes da narrativa (7.279.15), seu contedo indica uma variedade de fontes que Esdras compilou e editou. Mesmo a narrativa em terceira pessoa pode apontar para o sacerdote-

    escriba, visto que o fenmeno comum no Antigo Testamento.

    As principais fontes do livro foram memrias pessoais de Esdras (7.279.15), documentos oficiais, como o edito de restaurao de Ciro, dado em aramaico, em 6.3-5

    (com uma verso em hebraico em 1.2-4), a carta de Artaxerxes a Esdras (7.12-26), a

    correspondncia entre Tatenai e Dario (5.7-17; 6.6-12), e a carta de Reum e Sinsai a

    Artaxerxes I (4.8-22). Pressupondo a contemporaneidade de Esdras e Neemias e a posio

    proeminente do ltimo na corte persa, o acesso a tais documentos no seria um problema.

    Alm destes, h uma gama de listas: os exilados que retornaram com Zorobabel (2.1-

    70; tambm encontrada em Neemias 7.7-72), chefes de famlia que retornaram com Esdras

    (8.1-14), homens que haviam se casado com mulheres estrangeiras (10.18-44), e artefatos

    religiosos que Ciro devolveu a Sesbazar (1.9-11). Essas listas devem ter sido guardadas nos

    arquivos do Templo, ou talvez tenham sido preservados pelo governador, visto que muito da

    vida judaica era regulada pelos persas (cf. Ne 11.23; 12.22).

    A data de Esdras motivo de debate com muitos estudiosos rejeitando a cronologia

    bblica tradicional, alguns propem a chegada de Esdras mais tarde, no ano 398 a.C., no

    stimo ano do rei Artaxerxes II (Otto Eissfeldt, The Old Testament: An Introduction, p.

    554). Outros mantm os acontecimentos no reinado de Artaxerxes I, pedindo por uma

    emenda textual em Esdras 7.7, 8 para que diga trigsimo-stimo ao invs de stimo, assim

    situando a chegada de Esdras a Jerusalm em 428 a.C. (John Bright, Uma Histria de

    Israel, p. 545).

    A principal razo para rejeitar o ponto de vista tradicional relatado no texto bblico

    a aparente contradio entre a imagem de Esdras como um reformador bem-sucedido e a

    presena dos mesmos problemas no tempo de Neemias. As reaes violentas de Neemias

    aos problemas de divrcio e do Sbado (captulo 13) seriam supostamente injustificveis se

    Esdras tivesse, 26 anos antes, firmemente resolvido o problema por meio de uma aliana

    (Ed 10.3) (sendo os anos 458 para as reformas de Esdras e 432 para as de Neemias).

    Ainda assim, tais obstculos so em sua maioria artificiais. A natureza cclica da

    lealdade espiritual de Israel um fato bem estabelecido no Antigo Testamento e meramente

    manifestou-se novamente depois do exlio. Contudo, as reaes de Neemias eram

    justificadas luz da aliana renovada durante sua gesto (cf. Ne 10.30-39).

    Outros argumentos incluem: (a) suposta existncia dos muros no tempo de Esdras,

    luz de 9.9 (... nosso Deus [...] para nos dar um abrigo em Jud e em Jerusalm.). Isso,

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 138

    porm, mal chega a ser uma objeo, visto que a meno ao muro em Jud claramente

    indica que Esdras usava linguagem figurada. Alm do mais, a palavra usada por Esdras no

    a palavra normal para muro usada em Neemias; (b) Esdras era um contemporneo de

    Joan, filho de Eliasibe, que era o sumo sacerdote no tempo de Neemias (cf. Ne 12.10,11,

    22). Contudo, o Eliasibe mencionado em Esdras 10.6 no chamado de sacerdote, e a

    relao entre os dois diferente, filho em Esdras e neto em Neemias.

    FONTES

    Estes livros parecem ter sido compilados a partir de vrias fontes. H recordaes

    pessoais de Esdras e Neemias escritas na primeira pessoa do singular; incidentes acerca de

    Esdras, Neemias e outros, escritos na terceira pessoa; cartas, decretos, genealogias e outros

    documentos.

    Duas sees de Esdras (Ed 4.8-6.18 e Ed 7.12-26) vm escritas em aramaico, sendo

    quase inteiramente constitudas por cartas e decretos. O aramaico, uma lngua originalmente

    falada a leste e nordeste da Palestina (ver, por exemplo, Gn 31.47), veio a ser o idioma

    diplomtico do Prximo Oriente. Havia uma forma convencional desta lngua que se

    empregava nas comunicaes escritas. Existem todos os motivos para crer que o compilador

    destes livros, que contm quase tudo quanto se sabe acerca da histria dos judeus entre 538

    e cerca de 430 A.C., transcreveu neles as cartas originais.

    COMPARAO COM 1 ESDRAS

    Para estudar estes livros a srio, preciso compar-los, em certa medida, com 1

    Esdras, um livro integrado nos apcrifos. Trata-se de uma verso grega de parte de

    Crnicas, Esdras e Neemias, abrangendo de 2Cr 35.1 at ao fim de Esdras, e acrescentando

    Ne 8.1-12 at ao final. Alm das variantes secundrias em relao ao texto hebraico, h

    certos acrescentamentos substanciais. Nos captulos de abertura, a marcha dos

    acontecimentos reconstruda. Assim, Ciro permite o regresso sob o mando de Sesbazar,

    enquanto que Dario incumbe Zorobabel de ir construir o templo e a cidade. A ordem dada a

    Zorobabel segue-se famosa histria dos trs soldados que, um aps outro, dizem a Dario e

    sua corte o que julgam ser a coisa mais forte deste mundo. O primeiro diz que o vinho; o

    segundo que o rei, enquanto que o terceiro (Zorobabel) afirma que as mulheres so mais

    fortes do que ambas as coisas, mas que a verdade o que h de mais forte. Mas, embora 1

    Esdras situa o regresso de Zorobabel no reinado de Dario, inclui tambm a declarao de

    Esdras de que este esteve ativo em Jud "todo o tempo que Ciro viveu" (1Esdras 5.70-73).

    Em vista desta confuso, melhor aceitar a ordem apresentada no livro de Esdras da nossa

    Bblia.

    No se deve confundir 1 Esdras com a outra verso grega que segue de perto o texto

    hebraico e que geralmente considerada a verso da Septuaginta de Esdras e Neemias,

    embora C. C. Torrey veja nesta verso a traduo de Theodotion do segundo sculo da

    nossa era e em 1 Esdras a traduo original da Septuaginta.

    A forma como se faz referncia a estas diferentes verses confusa, mas pode ser

    explicada como se segue:

    1 Esdras dos nossos Apcrifos vem na Bblia grega sob a designao de Esdras, e na

    Vulgata sob a designao de 3 Esdras. Na Vulgata, o nosso Esdras 1 Esdras, e o nosso

    Neemias 2 Esdras. Na Bblia grega, o nosso Esdras-Neemias aparece sob a designao de

    Esdras.

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 139

    CONTEXTO HISTRICO

    Esdras contm a continuao de Reis (e Crnicas), luz da promessa de restaurao

    anunciada pelos profetas (cf. especialmente Jeremias 25.11,12, onde 70 anos de cativeiro

    so mencionados). A captura de Babilnia por um monarca iluminado e magnnimo

    desencadeou a srie de eventos que culminaria com a consagrao do segundo templo, 70

    anos e alguns dias depois da destruio de Jerusalm por Nabucodonozor.

    PANORAMA HISTRICO DO PERODO PS-EXLICO

    A situao em Jud permanecera instvel por vrias razes. No s eram os judeus

    incapazes (ou no estavam dispostos a) promover uma total restaurao, que exigia pureza

    espiritual e compromisso com Deus evidenciados pela construo do templo, mas tambm

    as naes vizinhas os pressionavam a manter seu estado de negligncia pactual.

    Alm disso, na metade do sculo 5, o desassossego poltico cobriu a regio com a

    revolta do general Megabizus. O retorno de Esdras foi politicamente til para Artaxerxes,

    pois ajudaria a aliviar algumas das tenses na regio. O captulo 7 indica que Esdras

    apresentara um pedido formal ao rei, cuja resposta a carta encontrada em 7.11-26. Mais

    uma vez, como era muitas vezes o caso, a mo de Deus se movia na luva da Histria para

    cumprir o Seu soberano propsito.

    OBJEES CRTICAS HISTORICIDADE DE ESDRAS

    Dvidas so levantadas sobre a identidade de Sesbazar, que aparece para liderar o

    retorno no captulo 1, apenas para desaparecer a partir do captulo 2. Alguns estudiosos

    identificaram Sesbazar com Zorobabel, visto que ambos agem como um governador (cf.

    5.16; Ag 1.14) e diz-se que ambos lanaram os alicerces do templo (cf. 5.16 e 3.10). Mesmo

    assim, visto que Sesbazar identificado, em 1 Crnicas 3.18, como o filho de Jeoiaquim

    (supondo que este e Senazar sejam a mesma pessoa), e Zorobabel mencionado no

    versculo 19 como o neto de Jeoiaquim por intermdio de Sealtiel. Zorobabel deve ter sido

    sobrinho de Sesbazar, e provavelmente o prximo na fila da linhagem davdica. Zorobabel

    nunca chamado de o prncipe de Jud como era o caso com Sesbazar, o que d maior

    apoio ao ponto de vista de que eles so dois lderes distintos do Jud ps-exlico.

    O ttulo de Ciro, em Esdras 1.1, indicado como anacronismo. No obstante isso,

    nada menos do que dezoito autores diferentes em dezenove documentos diferentes com referncia a seis monarcas persas (Archer, Merece Confiana o Antigo Testamento?, p. 471) usam o ttulo rei da Prsia. Semelhantemente, o ttulo rei da Assria (6.22)

    apresentado como evidncia da impreciso histrica do autor. A razo para esse ttulo

    surpreendente, quase cem anos depois da queda do Imprio Assrio, jaz nas conotaes

    emocionais e espirituais que ele traz cerimnia que, de certo modo, marcou o fim do exlio

    de Israel.

    O argumento mais complexo contra a historicidade de Esdras centrado em torno do

    captulo 4, que supostamente mistura os reis da Prsia at a Histria perder o sentido.

    Argumentando a partir da ordem em que os reis so mencionados no captulo, os crticos

    afirmam que Esdras (ou o verdadeiro autor) tinha Ciro (539-530) seguido por Xerxes (485-

    465) e este por Artaxerxes (465-424), e este ltimo por Dario , cujo reinado foi de 522-485

    a.C. Essa objeo no considera a meno de Dario, em 4.5, quando o assunto ainda a

    reconstruo do templo, e o fato de que 4.6-23 lida topicamente, no cronologicamente,

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 140

    com a oposio, que encontrou seu pice nas tentativas dos judeus para reconstruir os muros

    de Jerusalm. O versculo 4.24 comea o assunto do relato de Esdras, a reconstruo do

    templo, que o fundamento de seu ministrio.

    A TEOLOGIA DE ESDRAS E NEEMIAS

    Antes de iniciar a considerao da teologia de Esdras e Neemias, relevante notar

    que o pargrafo inicial do livro uma repetio literal da concluso de 2 Crnicas.

    Sem entrar na discusso da identidade do autor (ou autores) dessas obras, esse fato

    singelo sugere que h uma continuidade temtica entre as duas obras, alm da bvia

    continuidade histrica. H tambm uma preocupao com a viso que os exilados que

    voltaram a Jud para reconstruir a comunidade da aliana tinham de seu Deus e do processo

    histrico em que estavam envolvidos.

    As obras (Crnicas, Esdras e Neemias) procuram inculcar esperana, alertando para

    seu custo, que era a restaurao do culto e da adorao em um templo reconstrudo, operado

    por meio de um sacerdcio puro em uma cidade restaurada como comunidade de

    adoradores.

    A PESSOA E O CARTER DE DEUS

    Yahweh um Deus universal

    A destruio de Jerusalm fora um rude golpe para as convices israelitas na

    grandeza peculiar de Yahweh. Como poderia ter sido Ele derrotado pelos deuses da

    Babilnia? Os profetas e os historiadores de Israel se encarregaram de demonstrar que no

    era assim. Esdras e Neemias contribuem para isso ressaltando que Yahweh no era um Deus

    localizado e limitado s fronteiras de Jud ou Israel.

    Ele freqentemente chamado de o Deus do cu (Ed 6.9-10; Ne 2.4) o que aponta

    tanto para Sua transcendncia quanto para Sua presena com Seu povo, mesmo quando este

    se encontrava espalhado por todas as naes debaixo do cu.

    Ele , alm disso, o Deus cujo louvor excede a capacidade humana de exaltao. Ele

    o criador do prprio cu e o exrcito dos cus (uma aluso velada s divindades astrais dos

    povos circunvizinhos) se prostra diante de Sua grandeza (Ne 9.6).

    Yahweh soberano

    Quase que um corolrio da caracterstica acima mencionado, esse atributo fica

    evidente na maneira em que tanto Esdras quanto Neemias atribuem seus triunfos em todas

    as esferas interveno de um Deus que tem poder acima de reis e tiranos terrenos.

    Ele quem estabelece o reinado de Ciro e move o corao de Ciro para que este

    autorize o retorno dos israelitas exilados a sua terra natal (Ed 1.2-4). ainda Ele quem

    interfere junto aos reis da Prsia para permitir e financiar a reconstruo do templo (Ed 6.8-

    12; 7.27,28) e dos muros de Jerusalm (Ne 2.4, 20).

    V-se ainda a soberania no direcionamento que Yahweh oferece ao povo, sua atitude

    para com a terra dos antepassados e o que constitua o ressurgir da comunidade da aliana.

    Ele, em Esdras 1.5, move o esprito do povo, ajuda pessoalmente Esdras e os que com ele

    voltaram (Ed 7.6; 8.18) e Neemias (2.8). Conforme Esdras (5.5) e Neemias (4.14)

    testemunham, nem mesmo os inimigos mais declarados dos israelitas escapam soberana

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 141

    mo de Yahweh. Ele, em sua soberania, se mostrava grande e terrvel (Ne 9.32), um Deus a

    ser levado a srio por um povo que raramente o fazia.

    Yahweh fiel s alianas

    Esdras e Neemias, ainda que vivessem em meio a um povo volvel, que prontamente

    esquecia de seus compromissos assumidos diante de Deus, testemunharam a fidelidade de

    Deus.

    Em Esdras 7, a conscincia da fidelidade de Yahweh s promessas (bnos e

    maldies) da aliana leva o escriba angstia diante da maneira leviana de Israel tratar as

    estipulaes pactuais em relao ao casamento misto. Esdras, quando afirma: Senhor

    Deus de Israel, justo s! (9.15), tem em mente a maneira fiel com que Deus cumpriu as

    ameaas de castigo contra Israel, e tambm a preservao de um remanescente que

    retornasse a Jud (9.13).

    Neemias 9, que contm uma tocante recapitulao da histria israelita, relembra a

    fidelidade na conquista e ocupao da terra (9.19-25) e na repetida restaurao de Israel em

    seus muitos episdios de arrependimento efmero (9.26,27).

    Yahweh gracioso

    A melanclica situao do povo de Jud depois da volta do exlio o pano de fundo

    adequado para uma considerao realista da graa de Yahweh. Esdras e Neemias, ainda que

    as gloriosas expectativas profticas aguardassem sem cumprimento maior, viam a simples

    presena de um remanescente em Jerusalm como o penhor de algo ainda maior. Em suas

    oraes intercessrias (Ed 9 e Ne 9), encontramos as expresses mais claras dessa

    convico.

    Esdras 9.8,9 menciona no apenas a preservao do remanescente, mas o favor que

    este encontrara aos olhos dos reis da Prsia. Ali, Yahweh identificado como um Deus

    misericordioso (o hebraico usa o substantivo teinn, derivado do verbo nan, (na maioria de seus usos, indica splica por favor divino e assim pode apontar aqui no apenas a graa de Deus mas a graa como resposta orao. Cf. DITAT, p. 497) e bondoso (o hebraico usa

    a expresso wayya aln ese) cuja conotao especfica a lealdade pactual de Deus ao responder aos pedidos de alvio de uma comunidade que se v ainda como escrava dos

    gentios, mas tem um p fincado na fidelidade de Deus ao amor eletivo que separou Israel

    como povo escolhido.

    Em Neemias 9, a graa de Deus se revela uma vez mais no atendimento aos rogos

    dos israelitas sob a disciplina da aliana (9.27,28). Neemias emprega a palavra ramm, termo mais antropomrfico, que indica as entranhas de uma pessoa e est associado a

    respostas benevolentes motivadas por emoo (Cf. DITAT, s.v. p. 1419).

    No versculo 31, Neemias combina os adjetivos rm e nn, que formavam a confisso de f bsica de Israel, desde o Sinai (cf. x 34.6, em que a ordem inversa), e que

    combinados falam da graa misericordiosa, condescendente e paciente de Yahweh,

    incansvel em Sua benevolncia para com Seu povo pactual. O contexto dessa passagem

    uma renovao da aliana, o que deveria levar-nos a considerar a expresso fiel Tua

    aliana e misericordioso (heb. shmr ber wehaese, em Neemias 9.32, como uma hendade, que poderia ser traduzida que guardas com amor leal aliana, apontando, mais uma vez, para as contnuas manifestaes da graa de Yahweh para com Israel.

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 142

    A ADMINISTRAO DOS PROPSITOS DE DEUS

    As quatro linhas de ao de Deus, na Histria, por meio das quais Ele opera para

    restabelecer Sua soberania mediada sobre o universo, esto claramente presentes em Esdras

    e Neemias.

    A permisso do mal

    Ambos os autores ressaltam que o mal que sobreveio ao povo de Israel fora predito e

    permitido por Deus. Na verdade, em uma tpica expresso da cosmoviso judaica, o castigo

    que sobreveio nao foi atribudo diretamente a Deus (Ne 9.27; Ed 5.12), ainda que

    agentes humanos o tivessem executado. A tolerncia divina para com o pecado em Seu

    povo (Ne 9.16-18, 26) nunca poderia ser interpretada como indiferena ou ignorncia.

    O decreto de punir o mal

    As duas grandes oraes intercessrias de Esdras e Neemias ressaltam que Yahweh

    ativamente se envolveu na punio s diversas quebras de lealdade pactual do povo de

    Israel, desde o bezerro de ouro (Ne 9.18) at os dias sombrios, quando profetas eram

    mortos, e a idolatria grassava no final da histria de Jud (Ne 9.26).

    Esdras via a punio do mal em Israel como um continuum que vinha desde os

    antepassados e era, na verdade, a marca registrada da nao (Ed 9.7), pois o alvio era

    temporrio (9.8) e a punio menor que a merecida (9.13).

    O decreto de libertar os eleitos

    Novamente, uma profunda conscincia da interveno libertadora de Yahweh

    perpassa as duas obras. Desde o decreto de Ciro (Ed 1) at superao das estratgias e

    intrigas dos samaritanos e outros vizinhos (Ed 4; Ne 4; 6) a percepo era a de que Yahweh

    agia para devolver ao Seu povo uma medida de liberdade, que lhe permitisse experimentar a

    bno divina na terra da aliana.

    Pode parecer, pelo palavreado da orao de Esdras, que o escriba-sacerdote tinha

    uma viso negativa da situao em que Israel se encontrava em sua poca, mas palavras

    como um pequeno alvio em nossa escravido (Ed 9.8) e somos escravos (9.9) devem ser entendidas no contexto maior das promessas pactuais a Abrao e Davi.

    Esdras reconhecia que a interveno era divina, e que era apenas o prenncio de

    coisas maiores. A prpria continuao do versculo indica que ele via a volta da comunidade

    ps-exlica e seu estabelecimento em Jerusalm e arredores como um renascer. Alm do

    mais, as intervenes soberanas de Deus na histria persa recente (cf. Ed 5.5) demonstravam

    que Seu povo podia continuar contando com Sua graa libertadora em seu favor.

    O decreto de abenoar os eleitos

    Tanto Esdras quanto Neemias entenderam que a continuidade da bno para o

    remanescente dependia de uma resposta de f manifesta em obedincia. Como uma

    comunidade de adoradores, centrada no templo e no em um trono davdico, Israel s

    garantiria sua bno guardando-se puro. Por isso, tanto o sacerdote quanto o governador se

    empenharam muito em preservar a pureza racial no por mera xenofobia, mas pelo receio da

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 143

    xenolatria do efeito corruptor dos casamentos na adorao da comunidade. O exemplo de

    Salomo, por cuja idolatria Israel fora privado das bnos no passado, deveria falar alto aos

    ouvidos da comunidade ps-exlica (Ed 9.10-14; Ne 13.23-27). A disposio benevolente de

    Yahweh deveria ser correspondida com amor no dividido e com repugnncia evidente

    pelos deuses dos vizinhos pagos.

    PROPSITO E DESENVOLVIMENTO

    Todos os livros histricos do perodo ps-exlico partilham o propsito de

    demonstrar como Israel fez a transio de uma entidade poltica, onde a teocracia era

    mediada atravs da linhagem davdica, para uma comunidade adoradora que, embora

    permanecesse como povo de Deus, no era mais o canal mediador do reinado Dele na terra.

    Esdras compartilha desse propsito descrevendo o restabelecimento de Israel como uma

    comunidade adoradora na Terra Prometida e como isso exigia um reavivamento da

    verdadeira religio da aliana.

    Esse propsito aparece nas duas grandes divises do livro. A primeira parte (Ed 1.16.22) mostra os esforos da nao para reconstruir um templo e uma cidade das cinzas da

    destruio de Nabucodonozor. Embora a primeira parte desse plano tenha sido realizada

    depois de muita oposio e atraso, duas coisas no se realizaram. A cidade no foi

    construda e a nao no retornou plenitude de seu relacionamento com o Deus da aliana.

    Esdras 7.110.44 traz o relato da tentativa de um homem para restaurar a verdadeira identidade religiosa de Israel por meio da renovao da aliana e excluso de influncias

    estrangeiras. Neemias lida com a reconstruo da cidade e com o dej vu, a necessidade de

    verdadeira lealdade a Yahweh e Sua aliana.

    O livro inicia-se com o decreto de Ciro que permitiu que os judeus voltassem a

    Jerusalm e reconstrussem o templo. Esdras tem o cuidado de indicar que tal decreto est

    de acordo com o plano soberano de Yahweh anunciado por Jeremias (cf. 1.1; Jr 25.11,12).

    Os judeus reagem com entusiasmo ao decreto, embora apenas 49.897 acabem atendendo ao

    chamado para retornar a Jerusalm. Esses, porm, o fizeram motivados por Yahweh (1.5). A

    ajuda financeira dos judeus, na Babilnia, foi generosa e Ciro revelou, mais uma vez, a

    verdade das profecias de Isaas sobre ele (Is 41.1-4; 44.24-28) ao devolver os utenslios do

    templo (1.7-11). O captulo 2 contm o registro dos exilados que voltaram. A lista aparece

    com algumas mudanas em Neemias 7.6-73. Mudanas nos nomes podem ser explicadas

    por variaes na ortografia ou dois nomes para a mesma pessoa. Diferenas nos nmeros

    somam cerca de 20% do total, mas essas podem ser atribudas a um diferente sistema de

    anotao numrica empregado pelos judeus por volta do sculo 5 a.C. (como demonstrado

    nos papiros de Elefantina) que teria aumentado a possibilidade de erros de cpia. Um artigo

    interessante sobre esse assunto foi escrito por H. L. Allrik, The Lists Of Zerubbabel and the Hebrew Numerical Notation [As listas de Zorobabel e a notao numrica hebraica],

    BASOR 136 (dez. 1954):21-7. A lista de localidades indica quo fortemente os judeus se

    apegavam a suas ligaes familiares e tribais.

    O captulo 3 descreve os esforos iniciais para restabelecer a vida religiosa de Israel,

    comeando com o erguer do altar (3.1-3) e a celebrao da Festa dos Tabernculos (3.4),

    que olhava para trs, para a proviso de Deus, e para a frente, para a plenitude de Seu

    governo teocrtico sobre Israel. Os versculos 5 e 6 indicam que a normalizao da vida

    religiosa da nao dependia da construo do templo e que os atos religiosos realizados

    durante os primeiros dias do retorno, embora aceitveis pelo Senhor, eram de natureza

    provisria. O restante do captulo 3 concentra-se no lanamento dos alicerces do templo, em

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 144

    relao aos recursos disponveis (3.7), s pessoas envolvidas (3.8,9), e s diferentes

    respostas emocionais ao novo projeto (3.10-13).

    No captulo 4 encontra-se o primeiro relato de como a oposio ao projeto

    divinamente prometido, e apoiado pelo rei, surgiu cedo no perodo ps-exlico e se susteve

    por todo o sculo, comeando com a chegada dos exilados em Jerusalm. Os samaritanos

    buscaram se juntar aos judeus na reconstruo, com a explicao de que eles tambm eram

    adoradores de Yahweh (4.1,2). A resposta dos judeus pode parecer muito bitolada, mas, na

    verdade, refletia um zelo pela pureza que logo se perderia (cf. Ed 9 e 10) em detrimento da

    f e da bno de Israel. A total rejeio em 4.3 trouxe o assdio tenaz em 4.4,5 (mais 4.246.12), que s seria vencido 20 anos depois, quando o templo finalmente foi terminado (6.13-

    18). O restante do captulo 4 (v. 6-23) uma sntese da oposio que o programa de Deus

    para a restaurao de Israel enfrentou das naes vizinhas e dos ingnuos oficiais persas na

    satrapia de Abar-Nahara (ou Trans-Eufrates). Os detalhes lidam com a tentativa dos judeus

    de reconstruir Jerusalm, que foi frustrada por intrigas samaritanas e tambm pela explosiva

    situao poltica, por volta de 450 a.C. Esse incidente torna, ainda mais notvel, a petio de

    Neemias ao rei, visto que ele teve a audcia de pedir que Artaxerxes revertesse um decreto

    anterior (cf. 4.17-23).

    O captulo 5 d o contraponto a essa oposio humana, introduzindo o ministrio dos

    profetas de Deus, Ageu e Zacarias, que despertaram o esprito do povo e seus lderes a fim

    de reconstruir o templo (5.1,2) aps 15 anos de inrcia espiritual e inanio civil (cf. Ag 1).

    A oposio, dessa vez, veio de outros lugares, os oficiais persas da provncia de Abar-

    Nahara, cujo tratamento das evidncias muito mais honesto do que o dos samaritanos (4.7-

    16). Esdras tem muito cuidado ao indicar como a soberania de Yahweh preservou o mpeto

    construtor, enquanto a oposio perdia sua fora devido ao atraso em levar e trazer a

    correspondncia para a Prsia (5.5b) e na verificao, por Dario, do decreto de Ciro e sua

    deciso de apoi-lo plenamente. Assim, Esdras conclui a descrio desse perodo crucial

    com os dois decretos reais que fizeram valer na terra o que Deus j decretara no cu, a

    restaurao de Seu povo como Sua comunidade adoradora, em Jerusalm.

    A cobertura de Esdras do primeiro retorno e suas repercusses termina em tom

    festivo com a narrativa do trmino e da consagrao do templo (6.13-18), com o

    restabelecimento completo do culto e a celebrao da Pscoa e dos pes zimos (6.19-22). A

    meno a essas duas festas importante, pois liga essas circunstncias ao xodo, tanto no

    aspecto libertador quanto no purificador. A referncia ao monarca persa, como rei da

    Assria, tambm pode ser um jeito deliberado de indicar que agora o cativeiro de Israel

    terminara (esse escritor prefere o intervalo entre 586 e 515 como os 70 anos preditos por

    Jeremias), visto que os assrios o tinham iniciado em 732 a.C., quando as tribos do Norte

    foram levadas cativas por Tiglate-Pileser III.

    A segunda poro do livro (7.110.44) fala de um segundo retorno, liderado por Esdras, um sacerdote zadoquita e escriba (7.1-5), cujo corao fora preparado por Deus para

    estudar, praticar e ensinar a Lei de Deus, em Israel (7.10). O captulo deixa implcito o

    pedido de Esdras a Artaxerxes por autorizao para voltar Judia e ministrar a lei de Deus

    ao seu povo. A resposta do rei, contudo, amplia a misso de Esdras consideravelmente, de

    renovar o culto (7.14-20) para a designao de magistrados e juzes (7.25) e o reforar a lei

    com todas as despesas pagas pela tesouraria persa (7.21,22).

    bem possvel que uma das razes predominantes para Artaxerxes mandar Esdras de

    volta com tais poderes era aumentar seu controle sobre uma situao politicamente voltil.

    A abrangncia da misso de Esdras pode explicar o aparente atraso em sua exposio da Lei

    de Deus ao povo, registrado apenas em Neemias 8, uns treze ou catorze anos depois de sua

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 145

    chegada em Jerusalm. A reao de Esdras ao decreto de Artaxerxes de alegria e louvor

    fervorosos (7.27,28a). O sucesso na corte o motivou a buscar apoio para seu plano entre

    seus compatriotas (7.28b).

    A necessidade de revitalizar o culto na ptria deve ter sido relatada a Esdras, na

    Babilnia, assim como a necessidade de reparar os muros foi relatada a Neemias (Ne 1.2,3).

    Seu relato do retorno inclui uma lista dos que retornaram (8.1-14), seu recrutamento de

    levitas e servos do templo (8.15-20; o pequeno nmero de levitas pode ser devido s

    melhores chances de ganhar a vida na Babilnia, onde eles no estariam confinados a

    trabalhos religiosos banais), a orao de Esdras por proteo durante a longa e perigosa

    jornada, especialmente luz da grande quantidade de prata e ouro que estariam carregando

    de volta Palestina (8.24-30). A viagem e os eventos da chegada de Esdras a Jerusalm

    perfazem o restante do captulo 8 (v. 31-36).

    Esdras, 4 meses depois de sua chegada (por volta de dezembro de 458 a.C.), percebe

    quo profunda a necessidade de reformas religiosas em Israel. A descrio do problema de

    casamentos mistos (9.1,2) intencionalmente expressa para trazer memria as antigas

    associaes pecaminosas de Israel com os antigos habitantes de Cana (a continuidade do

    tema est presente em Esdras e em Neemias tambm).

    A reao de Esdras (9.3,4) expressou profunda angstia e choque com o estado

    espiritual de sua nao. Essa forma especfica de pecado consistentemente seduzia os judeus

    do perodo ps-exlico e seus efeitos devastadores podem ser vistos na corrupo espiritual

    (por meio de sincretismo idlatra) e degenerao social da colnia judaica em Elefantina, no

    Egito. Essa tentativa sutil de diluir a identidade nacional israelita ainda outro contraponto

    no complexo processo do restabelecimento de Israel como comunidade adoradora de

    Yahweh.

    A reao de Esdras, porm, vai alm do lamento pessoal pblico (a meno do

    sacrifcio vespertino sugere que tenha acontecido no templo, cf. 9.5 e 10.1, onde o templo

    mencionado). A orao de confisso de Esdras (9.6-15) enfatiza a mesmice bsica do estilo

    de vida pecaminoso dos israelitas quando comparada s geraes anteriores (9.6,7), a

    bondade de Yahweh apesar da culpa deles (9.8,9) e o assumir a culpa de sua gerao que

    repete os pecados antigos com total cincia da condenao de Deus sobre tais prticas (9.10-

    15; cf. Dt 11.8,9).

    To profunda tristeza teve seu contgio espiritual, como evidente na reao do povo

    que assistiu cena e ouviu sua orao. A proposta de romper casamentos racialmente mistos

    veio do prprio povo, assim como a sugesto de que Esdras deveria coordenar um esforo

    nacional para corrigir esse erro (10.1-4). Esdras, mesmo mantendo o luto, obteve a lealdade

    dos lderes religiosos e de todo o Israel (mais provavelmente atravs de lderes

    representantes) para a aliana proposta por Secanias. Ele, enquanto isso, permaneceu em

    jejum secreto e em orao pela triste situao (10.5,6).

    Medidas eficazes para lidar com o problema incluam uma convocao geral sob

    penalidade de perda de propriedade e excomunho da comunidade religiosa (9.7,8). A

    assemblia se reuniu sob o inclemente clima de dezembro e votam, com dissenso mnima,

    dissociou-se da influncia estrangeira criada por seus casamentos racialmente mistos (10.9-

    16). Procedimentos adequados foram estabelecidos e com a chegada do ano 457 a.C. os

    tribunais matrimoniais comearam a investigar cada caso. Os processos legais se

    completaram em 4 meses (10.16b,17).

    O livro termina com a lista de ofensores no escndalo dos casamentos mistos (10.18-

    44), comeando com a equipe religiosa (10.18-24) at a plebe de Israel (10.25-44). Um total

    de 111 nomes so dados, o que no indica um problema social traumtico com milhares de

  • Antigo Testamento II Histricos e Poticos 146

    rfos vagando pelo campo, como querem insinuar alguns que, s vezes, acusam Esdras (e

    Neemias) de xenofobia e racismo excessivos. As provveis centenas de crianas foram

    entregues a suas mes e, muito provavelmente, retornaram com elas para suas terras de

    origem, as naes vizinhas. Isso estaria de acordo com relatos bblicos (Gn 21.14) e extra-

    bblicos de padres do Oriente Mdio (cf. cdigo de Hamurbi).

    A reforma estava encaminhada e, por enquanto, a identidade nacional fora

    preservada. Duas observaes vm a calhar nesse ponto. Primeiro, o que se encontra em

    Esdras e Neemias no tem nada a ver com o exclusivismo judeu posterior, que negava aos

    gentios os privilgios que os judeus deveriam tornar disponveis para o mundo. Essas

    mulheres gentias expulsas foram mandadas embora com base em sua recusa de, como Rute

    ou Raabe o fizeram, reconhecer Yahweh como seu nico e suficiente Deus. Segundo, esse

    retrato de uma expulso voluntria de esposas estrangeiras oferece mais evidncias de que

    Esdras precedeu Neemias, pois mais provvel que tal problema ressurgisse depois de 27

    anos (457 430 a.C.), do que aps somente 5 anos (430 425 a.C.), de acordo com a data proposta por Bright para Esdras (o 37 ano de Artaxerxes).

    ESBOO

    I. O primeiro retorno sob Zorobabel (538-516 a.C.) (1.16,22). A. O Decreto de Ciro (1.1-4).

    B. Descrio geral do Retorno (1.52.67). C. Comea o trabalho de Restaurao do Templo (2.683,13). D. A Reconstruo interrompida pelos Adversrios (4.1-24).

    E. A Reconstruo do Templo concluda (520 a.C.) (5.16.22). II. O retorno sob a liderana de Esdras (7.110.44) A. Esdras enviado para ajudar na Restaurao (7.18,36) B. As Reformas de Esdras (9.110.44)