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Estação Científica (UNIFAP) http://periodicos.unifap.br/index.php/estacao ISSN 2179-1902 Macapá, v. 5, n. 1, p. 05-06, jan.-jun. 2015

Estação Científica (UNIFAP), v 5, n 2, 2015

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Edição completa da revista Estação Científica (UNIFAP), ISSN 2179-1902, v.5, n.2, 2015

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Estação Científica (UNIFAP) http://periodicos.unifap.br/index.php/estacao ISSN 2179-1902 Macapá, v. 5, n. 1, p. 05-06, jan.-jun. 2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ

Reitora: Prof.ª Dr.ª Eliane Superti Vice-Reitora: Prof.ª Dr.ª Adelma das Neves Nunes Barros Mendes Pró-Reitor de Gestão de Pessoas: Dorivaldo Carvalho dos Santos Pró-Reitora de Administração: Esp. Wilma Gomes Silva Monteiro

Pró-Reitor de Planejamento: Prof. Msc. Allan Jasper Rocha Mendes Pró-Reitor de Extensão e Ações Comunitárias: Prof. Dr. Rafael Pontes Lima

Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Prof.ª Dr.ª Leila do Socorro Rodrigues Feio Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação: Prof.ª Dr.ª Helena Cristina Guimarães Queiroz Simões

Pró-Reitor de Cooperação e Relações Interinstitucionais: Prof. Dr. Paulo Gustavo Pelegrino Correa

Estação Científica (UNIFAP)

ISSN Eletrônico 2179-1902 Volume 5, Número 2, jul.-dez., 2015

EDITOR-CHEFE

Fernando Castro Amoras Universidade Federal do Amapá, Brasil

_____________________________________________________________

Estação Científica (UNIFAP) / Universidade Federal do Amapá, Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação, Departamento de Pesquisa. – V. 5, n. 2 (jul./dez. 2015). – Dados eletrônicos. – Macapá: Universidade Federal do Amapá, 2011- Semestral Descrição baseada em: v. 5, n. 2, 2015 e-ISSN 2179-1902 Modo de acesso: https://periodicos.unifap.br/index.php/estacao 1. Ciências. 2. Interdisciplinar. 3. Pesquisa. I. Universidade Federal do Amapá. II. Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação. III. Departamento de Pesquisa. IV. Título: Estação Científica (UNIFAP).

_____________________________________________________________ Esta revista não assume a responsabilidade das ideias emitidas nos diversos artigos, cabendo-as exclusivamente aos autores. / É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta revista desde que seja citada a fonte. Indexada em: AGRIS: International Information System for the Agricultural Science and Technology (EUA),

BASE: Bielefeld Academic Search Engine (Alemanha), Bibliothèque uOttawa Library (Canadá), CiteFactor (Estados Unidos), Copac (Inglaterra), Diadorim (Brasil), DOAJ (Suécia), European Reference Index for the Humanities and the Social Sciences (Noruega), EZB (Alemanha), Journals for Free (Canadá), Journal Index, Latindex (México), LivRe! (Brasil), OasisBr (Brasil), Open Science Directory (Estados Unidos), Periódicos Capes (Brasil), Rede Cariniana (Brasil), REDIB: Red Iberoamericana de Innovación y Conocimiento Científico (Espanha), ROAD (EUA), Qualis CAPES (Brasil), SEER (Brasil), Sherpa/Romeo (Inglaterra), Sudoc (França), Social Services Knowledge Scotland (Escócia), Sumários (Brasil), Western Theological Seminary (Estados Unidos), World Wide Science (Estados Unidos) e WorldCat (Estados Unidos).

Estação Científica (UNIFAP)

EDITOR-CHEFE

Fernando Castro Amoras

Universidade Federal do Amapá, Brasil

CONSELHO EDITORIAL

Alaan Ubaiara Brito, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Alan Cavalcanti da Cunha, Universidade Federal do Amapá, Brasil

André Luiz Ramalho Aguiar, Universidad Nacional de Asunción, Paraguai

Bárbara dos Santos Simões, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil

Cássia Hack, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Cezar Tadeu Bartholomeu, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil

Cristiana Nogueira Menezes Gomes, Universidade Federal do Amapá, Brasil

David Figueiredo de Almeida, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá, Brasil

Edinaldo Pinheiro Nunes Filho, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Elias Antonio Vieira, UNESP FRANCA, Brasil

Elinaldo Conceição Santos, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Elizabeth Viana Moraes Costa, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Fernando Castro Amoras, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Helenilza Ferreira Albuquerque Cunha, Universidade Federal do Amapá, Brasil

João Paulo da Conceição Alves, Universidade Federal do Pará (UFPa), Brasil

Mário Martins, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Valter Gama de Avelar, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Wanderley Pivatto Brum, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Brasil

Willen Ramos Santiago, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará, Brasil

Estação Científica (UNIFAP), ISSN 2179-1902, é um periódico de publicação semestral do Departamento de Pesquisa da Universidade Federal do Amapá, na área Interdisciplinar, ou seja, está aberta em todos os ramos do conhecimento, com o objetivo de divulgar a produção científica desenvolvida no âmbito das instituições de ensino e pesquisa. Publica artigos originais e inéditos nas seguintes seções: artigo original, artigo de revisão, ensaio, entrevista, experimentação, grupos de estudos e de pesquisa, ponto de vista, relato de experiência/caso, relatos de práticas pedagógicas e resenhas. Está aberta a colaborações do Brasil e do exterior. Os procedimentos de análise e apreciação dos artigos pelos pareceristas são realizados com o anonimato dos autores dos respectivos trabalhos e pareceristas, ou seja, por meio de avaliação cega. O prazo de recebimento das contribuições de artigos é com fluxo contínuo. Está indexada em diversas bases de dados nacionais e internacionais.

Estação Científica (UNIFAP)

PARECERISTAS

Alaan Ubaiara Brito, Universidade Federal do Amapá, Brasil Aldeci da Silva Dias, UNIFAP, Brasil Alexandre Adalberto Pereira, Universidade Federal do Amapá,

Brasil Alexandre Guandalini Bossa, Unespar - Campus Apucarana e Iap, Brasil Allan Rogério Veltrone, Universidade Federal de São Carlos, Brasil

Aluana Vilhena Amoras, Governo do Estado do Amapá, Brasil Amauri Bartoszeck, Universidade Federal do Paraná, Brasil Ana Paula Nunes Silva, Universidade do Estado do Amapá, Brasil Ana Rita Pinheiro Barcessat, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Andreine Lizandra dos Santos, Escola Técnica Estadual 31 de Janeiro, Brasil Antonio Carlos Estender, Universidade Guarulhos - SP, Brasil Argemiro Midonês Bastos, Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia do Amapá, Brasil Ariely Nunes Ferreira de Almeida, Universidade Federal do Amapá, Brasil Bárbara dos Santos Simões, Universidade Federal de Minas Gerais,

Brasil Breno Marques da Silva e Silva, SEMA - GEA, Brasil Bruno Inácio da Maia, UNISOCIESC, Brasil Bruno Rafael Silva Nogueira Barbosa, Universidade Federal da Paraíba - UFPB, Brasil

Bruno Sérgio Scarpa Monteiro Guedes, Cefet-RJ, Brasil Camila Alves Siqueira, IMMES, Brasil Carlos Henrique Lima de Matos, Instituto Federal de Roraima, Brasil

Cássia Hack, Universidade Federal do Amapá, Brasil Cássio Furtado Lima, Instituto Federal do Espírito Santo, Brasil Cesar Augusto Nagi Gradella, Instituto de Ensino Superior do Amapá, Brasil

Cleber Assis dos Santos, Universidade Federal do Pará, Brasil Cristiana Nogueira Menezes Gomes, Universidade Federal do Amapá, Brasil Daniela Silva Costa, Brasil

David Figueiredo de Almeida, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá, Brasil Edcarlos Vasconcelos da Silva, Unifap, Brasil Elias Antonio Vieira, UNESP FRANCA, Brasil Elinaldo Conceição Santos, UNIFAP, Brasil

Erivelton Santos Soares, Faculdade Sete de Setembro, Paulo Afonso-BA, Brasil Eudes Cristiano Vargas, Universidade Estadual de Maringá /Faculdade do Noroeste Paranaense / Centro Universitário de

Maringá - UNICESUMAR, Brasil Fabiana Pelinson, Brasil Fábio dos Santos Massena, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Brasil

Flávio Henrique Ferreira Barbosa, Universidade Federal de Sergipe, Brasil Heliadora Georgete Pereira da Costa, Agência de Pesca do Amapá, Brasil Isaac Nilton Fernandes Oliveira, Faculdade de Medicina de Juiz de

Fora, Universidade Presidente Antônio Carlos, Brasil Ivã Guidini Lopes, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil João Paulo da Conceição Alves, Universidade Federal do Pará

(UFPa), Brasil

Joaquim Onésimo Ferreira Barbosa, Faculdades Integradas do Tapajós - FIT, Brasil Jonise Nunes Santos, Secretaria Municipal de Educação, Brasil

José Nilson da Silva, UNIFAP, Brasil Juliana Martins Ribeiro, UFVJM, Brasil Laércio Gomes Rodrigues, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil

Layana Ribeiro Cardoso, UNIFAP, Brasil Leandro Freitas Pantoja, Governo do Estado do Amapá, Brasil Marcos Roberto Tovani Palone, Universidade de São Paulo, Brasil Marcos Torres Carneiro, IFRN, Brasil Mário Martins, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Melissa Probst, Universidade Tuiuti do Paraná, Brasil Miquéias Serrão Marques, Universidade Federal do Amapá, Brasil Nely Dayse Santos da Mata, Universidade do Estado do Amapá, Brasil

Niebla Bezerra de Melo, UEPB, Brasil Núbia do Socorro Pinto Breves, Secretaria Municipal de Educação de Manaus, Brasil Olavo Fagundes da Silva, UNIFAP/IESAP, Brasil

Rafael Bastos Ferreira, UNICAMP, Brasil Ramon Taniguchi Piretti Brandão, Universidade Federal de São Paulo, Brasil Richard Augusto Silva, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Brasil

Roberta Sá Leitão Barboza, Universidade Federal do Amapá, Brasil Robert Saraiva Matos, Universidade do Estado do Amapá, Brasil Robson Antonio Tavares Costa, Universidade Federal do Amapá, Brasil

Rodrigo Diaz de Vivar y Soler, Centro Universitário Estácio de Sá/SC, Brasil Rondinele Aparecido Ribeiro, UNIESP, Brasil Sheylla Susan Moreira da Silva de Almeida, Universidade Federal

do Amapá, Brasil Sybelle Lima Serrão, Brasil Telma Temoteo dos Santos, Fundação Oswaldo Cruz, Instituto Oswaldo Cruz, Laboratório em Inovações em Terapias, Ensino e

Bioprodutos (LITEB), Programa de Pós-Graduação em Ensino em Biociências e Saúde, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Thiago Soares de Oliveira, Instituto Federal Fluminense, Brasil Valter Gama Avelar, UNIFAP, Brasil Vinícius Ferreira Baptista, Universidade Federal Rural do Rio de

Janeiro, Brasil Wanderley Pivatto Brum, Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR/PR), Brasil Wellington Teixeira Lisboa, Universidade Estadual de Campinas,

Brasil Willen Ramos Santiago, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará, Brasil Willians Lopes Almeida, Instituto Federa do Amapá, Câmpus

Laranjal do Jari, Brasil Yvens Ely Martins Cordeiro, Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará, Brasil

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SUMÁRIO | CONTENTS

Editorial............................................................................................................ Editorial

Fernando Castro Amoras

07

Artigos de revisão de literatura

Alfabetização científica: reflexões sobre as possibilidades para o enfrentamento dos desastres naturais no município de Blumenau/SC............................................... SCIENTIFIC LITERACY: REFLECTIONS ON THE POSSIBILITIES FOR COPING OF NATURAL DISASTERS IN THE MUNICIPALITY OF BLUMENAU / SC

Raquellen Milbratz e Melissa Probst

09

A (não) utilização das Tecnologias da Informação e da Comunicação pelos professores............................................................................................................... A (NO) USE OF INFORMATION TECHNOLOGY AND COMMUNICATION BY TEACHERS

Jandira Dantas dos Santos

21

Henrique Gallucio: trajetória, agonia e morte do gênio construtor da Fortaleza de São José de Macapá.................................................................................................. HENRIQUE GALLUCIO: TRAJECTORY, AGONY AND DEATH OF THE GENIUS BUILDER OF THE FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ

Fernando Pimentel Canto

29

Pensamento freireano: bases para uma educação revolucionária.............................. THOUGHT FREIREAN: BASES FOR EDUCATION REVOLUTIONARY

Ana Claudia Reis da Silva, Eliana Alves dos Santos e Izabel Lucia dos Santos Oliveira

39

Projeto de arquitetura - proteção contra incêndio em elementos estruturais de aço. ARCHITECTURAL DESIGN - FIRE PROTECTION OF STRUCTURAL STEEL ELEMENTS

Cleide Cedeni Andrade e João Carlos Souza

49

Artigos originais

Inclusão digital de professores nas escolas públicas da região metropolitana de Belém........................................................................................................................ DIGITAL INCLUSION OF TEACHERS IN THE PUBLIC SCHOOLS OF THE METROPOLITAN REGION OF BELÉM

Dayvid Gomes Vital Fares

69

Produção científica brasileira sobre álcool e outras drogas: um estudo bibliomé-

trico.......................................................................................................................... BRAZILIAN SCIENTIFIC LITERATURE ON ALCOHOL AND OTHER DRUGS: A BIBLIOMETRIC STUDY

Gustavo Luís Caribé Cerqueira

83

6

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Ensaios

Leitura e escrita na sala de aula................................................................................. READING AND WRITING IN THE CLASSROOM

Rafaete de Araújo

95

Entrevista

O Programa de Leitorados do Ministério das Relações Exteriores do Brasil: o ex-leitor José Maria Rodrigues relata suas experiências durante os quatro anos de leitorado no território paraguaio............................................................................... THE LEITORADOS PROGRAM OF THE MINISTRY OF EXTERNAL RELATIONS OF BRAZIL: THE EX- LECTURE (READER) JOSÉ MARIA RODRIGUES RECOUNTS HIS EXPERIENCES DURING THE FOUR YEARS OF LECTURESHIP IN PARAGUAYAN TERRITORY

André Luiz Ramalho Aguiar

103

Resenha

A violência urbana (re)apresentada na obra A retomada do Complexo do Alemão.... THE URBAN VIOLENCE (RE) PRESENTED IN THE WORK A RETOMADA DO COMPLEXO DO ALEMÃO

Elaine Teixeira da Silva

111

Diretrizes para autores ..................................................................................... 117

Editorial 7

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ISSN 2179-1902 Macapá, v. 5, n. 2, p. 07-08, jul./dez. 2015

EDITORIAL

A revista Estação Científica (UNIFAP), ISSN 2179-1902, continua com sua ênfase na im-

plantação de aprimoramentos no processo editorial. O sistema de editoração eletrônico da

revista foi atualizado para a mais moderna versão, sendo, por conta disso, possível obser-

varmos alguns itens da mudança:

A) a forma de acessar os artigos das edições: há uma nova janela de acesso aos pdfs

das edições publicadas, com uma barra de navegação, que permite imprimir, baixar o pdf

por download, mudar para a tela cheia, navegar por páginas ou no sistema de rolagem,

girar o pdf, salvar.

B) A tela de acesso do usuário também está compartilhada, permitindo que a pessoa

logada tenha uma visão de todas as revistas e funções em que está cadastrado no Portal

de Periódicos da UNIFAP, o que é algo bom, haja vista que assim não se perde mais tempo

na navegação nem mesmo se esquece em quais revistas se está cadastrado, sendo que

inclusive este “esquecimento do usuário” é que tem gerado a eles a necessidade de faze-

rem outros e novos cadastrados, e assim esta tela compartilhada permite logo identificar

em quais revistas está-se registrado e quais funções possui-se.

O sistema de transmissão de e-mails dentro da revista apresentava um problema de

envio, mas esta falha foi resolvida pela equipe do Núcleo de Tecnologia da Informação da

Universidade Federal do Amapá, à qual apresentamos sinceros agradecimentos pelo em-

penho dos funcionários envolvidos nesta missão.

Mais para frente, durante o ano de 2016, intenciona-se incluir na revista um contador

individual público de acesso dos artigos publicados, para saber quantos acessos teve cada

artigo e a média mensal/semanal/diária de cada um. Cabe informar aqui uma curiosidade:

o artigo mais acessado da revista Estação Científica (UNIFAP) tem quase 16 mil acessos à

íntegra do pdf desde a publicação do mesmo.

Continuamos com nossas práticas editoriais sempre voltadas a bem atender a todos os

usuários da revista, como os leitores, os autores e os avaliadores.

Aos leitores é apresentado um serviço de livre acesso à revista em sua totalidade.

Aos autores, além de tentarmos diminuir o tempo médio de processamento de análise

dos manuscritos submetidos, passamos também a fazer a checagem da normatização do

conteúdo dos textos publicados, aprimorando a escrita padrão em língua portuguesa, co-

mo também a identificação de referências faltantes para que sejam complementadas pelos

autores ainda durante a edição ahead of print / pré-print. Paralelamente a isso, os proce-

dimentos de comunicação franca com todos os autores é mantida como princípio de elevar

os laços de bem servi-los.

8 Amoras

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ISSN 2179-1902 Macapá, v. 5, n. 2, p. 07-08, jul./dez. 2015

Os avaliadores convidados para proceder com as análises dos artigos, de forma cega,

recebem, ao final, como praxe editorial, um atestado certificando que integram o quadro

de pareceristas da revista, e desta forma eles podem comprovar suas participações efeti-

vas na revista e registrar no currículo Lattes. A lista completa está disponível em:

https://periodicos.unifap.br/index.php/estacao/about/editorialTeam.

Boa leitura a todos/as.

Atenciosamente,

Fernando Castro Amoras

Editor-chefe da revista Estação Científica (UNIFAP)

Artigo de revisão de literatura

Estação Científica (UNIFAP) https://periodicos.unifap.br/index.php/estacao

ISSN 2179-1902 Macapá, v. 5, n. 2, p. 09-20, jul./dez. 2015

Alfabetização científica: reflexões sobre as possibilidades para o enfrentamento dos desastres naturais no município de Blumenau/SC

Raquellen Milbratz 1 e Melissa Probst 2

1 Especialista em Alfabetização e Letramento (UNIASSELVI), Graduada em Serviço Social (FURB) e Graduada em Pedagogia (FA-ERPI), Brasil. E-mail: [email protected]

2 Doutoranda em Educação pela Universidade Tuiuti do Paraná, Mestre em Educação (FURB), Licenciada em Pedagogia (FURB) e Licenciada em História (UNIASSELVI), Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO: O presente artigo traz uma reflexão sobre a importância da temáti-ca “desastres naturais” e sua relação com o ensino de ciências. Com o propósi-to de aprofundar o tema, analisam-se as produções teóricas e os modos como estas conceituam a alfabetização científica buscando relacionar esses concei-tos com o exercício da prática docente, na rede municipal de ensino do muni-cípio de Blumenau/SC. O estudo caracteriza-se como qualitativo, sendo reali-zado a partir de revisão de literatura. Percebe-se, segundo Lenzi (2013), Olivei-ra (2012) e Faht (2011) que o tema desastres naturais nas escolas blumenau-enses do ensino fundamental é considerado um produto educacional. No en-tanto, a temática não está voltada à formação de indivíduos capazes de rei-vindicar mudanças à minimização dessa problemática. Tomando-se como premissa a pouca efetividade das ações governamentais, bem como a pouca efetividade do modo como os desastres naturais são tratados na escola, evi-dencia-se, nesse texto, a importância de um ensino de ciências voltado à alfa-betização científica como possibilidade para enfrentar as causas e consequên-cias dos desastres naturais frequentes no município. Palavras-chave: Alfabetização científica. Ensino de Ciências. Desastres naturais. Scientific literacy: reflections on the possibilities for coping of natural disas-ters in the municipality of Blumenau / SC ABSTRACT: This article presents a reflection on the importance of the theme "natural disasters" and its relation to the teaching of science. In order to ex-amine the subject, theoretical productions are analyzed and the ways they conceptualize scientific literacy trying to relate these concepts to the practice of teaching practice in municipal schools in the city of Blumenau / SC. The study is characterized as qualitative, being held from literature review. It can be seen, according Lenzi (2013), Oliveira (2012) and Faht (2011) that the topic natural disasters in blumenauenses elementary schools is considered an edu-cational product. However, the issue is not aimed at training individuals able to claim changes to minimize this problem. Taking as its premise the little ef-fectiveness of government actions, and the little effectiveness of how natural disasters are treated at school, it is evident in this text, the importance of sci-ence education focused on the scientific literacy as a possibility to face the causes and consequences of frequent natural disasters in the city. Keywords: Scientific Literacy. Science Teaching. Natural desasters.

10 Milbratz e Probst

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1 INTRODUÇÃO

Para que os cidadãos compreendam e questionem suas vidas em sociedade é im-prescindível uma formação plena, escolas atuantes e professores dispostos a sociali-zar o conhecimento científico voltado às problemáticas do cotidiano de seus edu-candos. Sobre isso, Lopes (1999, p. 137) nos diz que “O conhecimento cotidiano, como todos os demais saberes sociais, faz parte da cultura e é construído pelos homens das gerações adultas, que o transmitem às ge-rações sucessivas, sendo a escola um dos canais institucionais dessa transmissão.” No entanto, tem-se como premissa de que a escola não pode permanecer na transmis-são do conhecimento cotidiano, mas, ques-tioná-lo, refletir sobre ele, e possibilitar a compreensão dos conhecimentos científi-cos tendo por base esse conhecimento co-tidiano. Como argumenta Chassot (2006, p. 31), “a responsabilidade maior [do profes-sor] ao ensinar ciências é procurar que os alunos e alunas se transformem [...] em homens e mulheres mais críticos”. Para que isso aconteça, acredita-se que uma das pos-síveis estratégias seja a alfabetização cientí-fica voltada ao letramento 1, como forma de tornar o aluno mais politizado e consciente de suas ações na sociedade.

1 De acordo com Kleiman (2005), letramento é a imersão do sujeito em práticas sociais de leitura e de escrita que tenham sentido para o grupo ao qual pertence. Porém, não há consenso entre autores da educação científica quanto ao uso dos termos alfabetização e letramento. Como apontam Paula e Lima (2007), o termo letramento científico é considerado inapropriado “para designar todos os compromissos da Educação em Ciências” (PAULA; LIMA, 2007, p. 8). No entanto, o imprescindível neste trabalho de conclusão de curso não é discutir ter-mologias, mas olhar a educação científica na perspectiva do letramento, apesar da maioria dos autores da área utilizar o termo alfabetização científica para essa ação.

Por ter grande parte do relevo bastante acidentado e exposto a uma formação geo-lógica propícia a riscos socioambientais, Blumenau convive há muito tempo com chuvas intensas solos frágeis, inundações, e demais consequências do el niño. Além dis-so, fatores sociais, como os desmatamen-tos, as ocupação nas margens do Rio Itajaí Açu e das encostas dos morros estarrecem ainda mais a conjuntura social (SIEFERT, 2012, p. 10 apud MATTEDI, 2009). Neste sentido, conforme estudos realizados por Lenzi (2013), Oliveira (2012) e Faht (2011) a alfabetização voltada ao debate sobre estes desastres naturais que tanto assolam Blu-menau/SC, é, ainda, apresentada de forma frágil nas escolas de ensino fundamental do município, tornando-se, assim, incompatível com seu real propósito.

Diante desse cenário, Chassot (2004) questiona: “Por que as crianças, quando começam sua vida escolar, adoram ir à es-cola, para bem cedo, talvez antes de conclu-írem a primeira etapa do Ensino Fundamen-tal, a abominarem? A resposta talvez seja pelo quanto essa escola é castradora da criatividade dessas crianças” (CHASSOT, 2004, p. 83).

Partindo desse contexto, o presente es-tudo tem como objetivo discutir a impor-tância da temática “desastres naturais” no currículo das escolas do ensino fundamen-tal do município de Blumenau/SC, tendo como foco a alfabetização científica. Para isso delineiam-se ainda os seguintes objeti-vos específicos: 1 - perceber, com base em Lenzi (2013), Oliveira (2012) e Faht (2011) o debate sobre os desastres naturais nas es-colas da rede pública municipal do ensino fundamental de Blumenau; 2 - pontuar as principais ideias de Hazen e Trefil (2005), Hurd (1998 apud LENZI, 2013), Chassot

Alfabetização científica: possibilidades para o enfrentamento dos desastres naturais no município de Blumenau/SC 11

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(2006), Shen (1975 apud LORENZETTI; DELI-ZOICOV, 2001), Lorenzetti e Delizoicov (2001), Delizoicov e Slongo (2011) e Lopes e Macedo (2013) referente ao processo de alfabetização científica nas escolas; 3- iden-tificar, com base em levantamentos biblio-gráficos, estratégias didáticas para o ensino de ciências, especialmente a abordagem da temática “desastres naturais” no ensino fundamental.

2 ESCOLAS BLUMENAUENSES E O DESAFIO NO COMBATE AOS DESASTRES NATURAIS

Quando colocada em pauta a questão do

papel da escola e sua influência na vida so-cial, Vygotsky (1987) aponta que esse espa-ço é o lugar no qual a intervenção pedagó-gica desencadeia o processo ensino e a-prendizagem. Nesse contexto, considera-se que seja papel da escola e, especialmente, do professor, favorecer as aprendizagens dos estudantes, bem como criar espaços que propiciem o envolvimento ativo destes na sua comunidade. Assim, o objetivo esco-lar seria a formação do cidadão, de modo que este possa expressar, nas ações cotidi-anas o entendimento de novas informações e sua aplicação em sua comunidade, e quando necessário na sociedade.

No entanto, percebe-se em muitas situa-ções outra realidade. Chassot (2006) ao problematizar o cenário escolar em tempos de globalização desenfreada, percebe que a escola não é produtora de conhecimento e sim reprodutora ou apenas transmissora do saber.

Usualmente a escola costuma transmitir um saber que ela não produziu (e, às ve-zes, nem o entende), mas o corteja, prin-cipalmente, porque traz o rótulo de vali-

dação acadêmica. Por outro lado, tam-bém não entende - não sabe explicar - os saberes que são próprios da comunidade onde está inserida e por isso os rejeita, até porque estes não são reconhecidos pela Academia, pois estas, em muitas si-tuações, também não os sabem explicar. (CHASSOT, 2006, p. 208-209)

Essa questão extrapola iniciativas e o de-

senvolvimento de novas consciências e mostra a incapacidade da escola em desen-volver, muitas vezes, de forma plena as po-tencialidades da vida na sociedade e no ambiente. É privilegiado o modelo centrado na reprodução de conteúdos escolares que apenas precisam ser repetidos no âmbito da própria escola (MALDANER; ZANON, 2004). É nesta perspectiva que se evidencia que a questão dos desastres naturais nas escolas da rede pública municipal do ensino fundamental de Blumenau não é abordada como conteúdo curricular. Conforme apon-tam Lenzi (2013), Oliveira (2012) e Faht (2011) 2: a problemática é considerada um

2 Nosso estudo é bibliográfico e tem como base as pes-quisas realizadas por Oliveira (2012), Lenzi (2013) e Fath (2011). Oliveira (2012) realizou uma pesquisa explorató-ria, com análise dos livros didáticos utilizados na rede pública de Santa Catarina e do estudo do projeto de pesquisa e extensão da Universidade Regional de Blume-nau (FURB) titulado: “Biodiversidade Catarinense: poten-cialidades e ameaças”, que posteriormente foi publicado no formato de livro. Lenzi (2013) realizou pesquisas bi-bliográficas exploratória em materiais destinados ao ensino fundamental das escolas da rede municipal de Blumenau assim como deu destaque à temática alfabeti-zação científica e o processo social e natural que levam a ocorrência de desastres, com foco nos dois principais tipos que ocorrem em Santa Catarina: inundação e desli-zamento. O trabalho de Faht (2011) teve como base uma pesquisa qualitativa, na qual realizou uma série de entre-vistas com diretores e professores que realizam projetos didáticos voltados à questão ambiental de uma escola pública do município de São Paulo-SP, uma escola públi-ca de Taboão da Serra-SP e três escolas públicas de Blu-

12 Milbratz e Probst

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produto educacional, mas não voltada a formar cidadãos capazes de entender a rea-lidade do local onde vivem bem como ques-tionar e reivindicar mudanças para a mini-mização dos desastres naturais.

Blumenau é um município catarinense propício a inundações e deslizamentos de terra, devido ao seu relevo acidentado, i-números ribeirões e as comuns cheias do Rio Itajaí-Açu, maior afluente (rio que corta a cidade). Além da ocupação territorial ur-bana irregular, também se tem o agrava-mento da situação pelo desmatamento e da poluição na região, aspectos que acabam por deixar o solo mais suscetível à ocorrên-cia de desastres naturais (AUMOND et al., 2009).

Nas escolas de ensino fundamental da rede municipal de educação há espaços cur-riculares adequados para levar conscienti-zação e reflexão sobre essa questão. No entanto, a problemática muitas vezes é a-bordada de forma insegura e burocrática. O conteúdo sobre desastres naturais é men-cionado, em sua maioria, numa perspectiva tradicionalista, pois apesar de estar presen-te na grade curricular, valoriza mais o “transmitir conhecimento” (FAHT, 2011).

Tem-se a consciência, claro, de que o professor tem pouca, ou quase nenhuma participação na discussão ou em instâncias do planejamento e da implantação das polí-ticas públicas voltadas à educação, no en-tanto, esse mesmo professor convive com os desastres naturais ocorridos na região, tem conhecimento das suas consequências e ouve o que os alunos e comunidade esco-lar têm a dizer sobre o assunto. Nesse sen-tido, sabe-se que ao trabalhar conteúdos

menau-SC, não sendo identificados os nomes das institu-ições.

curriculares instituídos nas disciplinas obri-gatórias, este professor poderá criar elos entre o conteúdo exposto no livro didático e a realidade vivida pelos estudantes, ou seja, entre o conteúdo científico apresenta-do e o conhecimento cotidiano desses es-tudantes, afinal,

Considerar que a ciência rompe com o senso comum e elabora sua crítica, como faz Bachelard, não implica considerar a ciência como único conhecimento válido, nem tampouco desqualificar conheci-mentos não quantificáveis e oriundos da prática. As ciências, muito menos as ciên-cias físicas, não têm como dar conta de todo o universo de significados culturais. (LOPES, 1999, p. 149)

A partir de análises realizadas por Fourez

(2003) e Gouvêa (2006), Faht (2011) amplia a discussão trazendo outras questões que afligem o trabalho dos professores das es-colas do ensino fundamental de Blumenau:

A prática de Educação Ambiental nas es-colas da rede púbica municipal do ensino fundamental de Blumenau ocorre nor-malmente sob uma série de problemas, dentre deles a falta de preparo dos edu-cadores para ações interdisciplinares. Al-guns professores fazem o mero cruza-mento de disciplinas sem a devida refle-xão, pensando ser interdisciplinaridade (FAHT, 2011, p. 11). A extrema desvalori-zação faz com que o professor, pelos bai-xos salários, pelo descaso com sua forma-ção esteja muito mais preocupado em sobreviver do que transformar, o que re-flete na prática pedagógica. (GOUVÊA, 2006 apud FAHT, 2011, p. 11)

Da mesma maneira, Oliveira (2012) com

base em Maldaner et al. (2007), enfatiza

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que os programas de ensino, os livros didá-ticos, os materiais entre outros métodos pedagógicos utilizados nas escolas da rede púbica municipal de Blumenau apresenta-ram poucas mudanças ao longo dos últi-mos anos, não adequando-se à realidade local, provocando, assim, pouca reflexão sobre os desastres naturais ocorridos na região.

Apesar do foco e do ensino de ciências ser diferente do passado, [nos] currículos [...] ainda prevalecem roteiros tradicio-nais de ensino que se consolidam em li-vros didáticos que conservam, em essên-cia, as mesmas sequências de conteúdos lineares e fragmentados, somente enri-quecidas com novas ilustrações que lhes dão certo status de atualização. Os co-nhecimentos propostos são mais frag-mentados ainda, e a aprendizagem passa a ser vista como capacidade de resolver, repetidamente, os inúmeros exercícios propostos para os mesmos itens de con-teúdos (MALDANER et al., 2007 apud O-LIVEIRA, 2012, p. 19).

As questões apresentadas por Faht

(2011) e Oliveira (2012) refletem o que a Educação no Brasil vivencia: um sistema engessado que não está voltado à constru-ção do conhecimento crítico, que não traz reflexão do currículo e desvaloriza o docen-te.

Na mesma perspectiva, Lenzi (2013) re-conhece que enquanto os professores se-guem um currículo oficial obrigatório, com conteúdos padronizados e sem nexo com a realidade local, a transformação da educa-ção blumenauense estará dificultada. Lenzi (2013) salienta que em Santa Catarina, a tomar por base o que é abordado nos livros didáticos distribuídos pelo Ministério da

Educação para o ensino fundamental, pou-co ou nada se trata da questão dos desas-tres naturais, tão frequentes, causadores de perdas econômicas e sociais, além dos traumas que provocam.

Desta forma, o conhecimento científico não tem qualquer valor fora do contexto escolar [...] as aulas de ciências, da forma como são ministradas, com a inclusão de ensinamentos com conteúdos considera-dos irrelevantes pelos educandos tornam-se desinteressantes e desnecessários, pois estes não se sentem envolvidos por aqueles conteúdos descontextualizados e pela metodologia utilizada. (HODSON, 1998 apud LENZI, 2013, p. 21)

Ainda com base em Lenzi (2013) acredi-

ta-se que a alfabetização científica aponta-da nas escolas da rede pública municipal de Blumenau será democrática somente quan-do deixar de ser elitista, restritiva e afasta-da da vida experienciada no cotidiano dos educandos.

A partir do momento que for acessível a todos, interessante e excitante, real, rele-vante e útil, não sexista e multicultural, pessoalmente relevante e humanizada, portadora de valores e interessada, a al-fabetização científica [nas escolas de Blumenau] terá seus objetivos alcança-dos. (HODSON, 1998 apud LENZI, 2013, p. 18)

Essa realidade poderia, portando, mudar

se os docentes abrirem espaço para o co-nhecimento do cotidiano, trazendo para a sala de aula a discussão acerca dos desas-tres naturais numa perspectiva crítica, e a partir dessa perspectiva buscassem auxiliar os educandos no que concerne ao enten-

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dimento dessa situação, tornando-os capa-zes de agir para minimizá-la. Sabe-se, entre-tanto, que nem sempre o professor torna-se o responsável pelas poucas mudanças ocorridas nas discussões tradicionais do conteúdo curricular, pois, muitas vezes as suas iniciativas acabam por esbarrar em burocracias institucionais, em políticas pú-blicas que o deixam de mãos atadas.

No entanto, a mudança pode ocorrer, mesmo que apenas no âmbito da sala de aula. Entretanto, afirma Lenzi (2013, p. 13) que “isso requer professores capacitados e motivados para trabalhar os [temas sobre os desastres naturais]. Eles precisam ter informações científicas sobre os fenômenos naturais, as fragilidades físicas, ambientais e sociais e como as ações humanas os intensi-ficam”.

A partir dessas considerações, considera-se que seja importante analisar as possibili-dades existentes para tornar o educando mais politizado e consciente, possibilitando o entendimento sobre conceitos diversifi-cados a partir da alfabetização científica.

2.1 Mas afinal, o que é alfabetização cientí-fica?

Para Hazen e Trefil (2005, p. 12), a alfa-

betização científica é definida como “[...] ter o conhecimento necessário para entender os debates públicos sobre questões de ci-ências e tecnologia [...]”. Hurd (1998) apud Lenzi (2013, p. 17) refere-se à “capacidade [das pessoas] em utilizar as ciências no seu dia a dia, com o objetivo de provocar mu-danças com dimensões na democracia, no social e nas adaptações humanas”.

Nessa mesma perspectiva, Chassot (2006, p. 91) aponta que a alfabetização científica é o cidadão “saber ler a linguagem

em que está escrita a natureza. É um anal-fabeto científico aquele incapaz de uma leitura do universo”. Além disso, Chassot (2006) não acredita num ensino abstrato, superficial, mas um ensino que privilegie a realidade dos alunos.

Há aqueles que, quando se fala em pre-servação do meio ambiente, pensam no que se poderia fazer para evitar o aumen-to do buraco na camada de ozônio ou mi-nimizar a produção da chuva ácida. [...] Tudo isso é importante... mas nossa rela-ção com o ambiente é mais próximo. O riacho do nosso bairro, o lixão da vila, ou o esgoto sanitário da nossa rua são preo-cupações tão (ou mais) importantes que as campanhas pelo não uso de derivados de fluor-carbonetos. (CHASSOT, 2006, p. 136-137)

Uma pessoa alfabetizada cientificamente

toma decisões políticas e éticas sobre tudo que envolvem ciências e suas tecnologias. O ensino desvinculado da realidade torna-se dominador e demagógico, não reflete ne-nhuma mudança. Logo, Chassot (2006) chama a atenção ainda para a interconexão das ciências naturais com as ciências huma-nas, proposta que é observado também num dos temas transversais dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) em Ciências:

o meio ambiente traz a discussão a res-peito da relação entre os problemas am-bientais e fatores econômicos, políticos, sociais e históricos. São problemas que acarretam discussões sobre responsabili-dades humanas voltadas ao bem-estar comum e ao desenvolvimento sustenta-do, na perspectiva da reversão da crise socioambiental planetária. Por isso, sua discussão completa demanda fundamen-tação em diferentes campos de conheci-

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mento. (BRASIL, 1997, p. 35)

Desse modo, a alfabetização científica a-

lém de ter uma postura cívica e cultural, precisa também se importar com as neces-sidades básicas dos cidadãos, ser prática, objetiva e que contribua para a solução dos problemas que afetam a vida das pessoas para assim poder melhorar os padrões de vida das mesmas (SHEN, 1975 apud LOREN-ZETTI; DELIZOICOV, 2001).

2.2 Alfabetização científica no ensino de ciências: caminho para cidadania

Ao refletir os motivos econômicos, soci-

ais, culturais, cívicos e práticos das decisões a serem tomados no cotidiano, surge a ne-cessidade de se repensar o planejamento do ensino de ciências para o ensino funda-mental.

[...] mostrar a ciência como um conheci-mento que colabora para a compreensão do mundo e suas transformações, [e] re-conhece o homem como parte do univer-so e como indivíduo. [...] A apropriação de seus conceitos e procedimentos pode contribuir para o questionamento do que se vê e ouve, para a ampliação das expli-cações acerca dos fenômenos da nature-za, para a compreensão e valorização dos modos de intervir na natureza e de utili-zar seus recursos, para a compreensão dos recursos tecnológicos que realizam essas mediações, para a reflexão sobre questões éticas implícitas nas relações entre Ciências, Sociedade e Tecnologia. (BRASIL, 2000, p. 24)

Dadas estas oportunidades inovadoras

de ensino, clama-se, portanto, por um cur-rículo de ciências voltado ao diálogo e que

valorize a participação na prática social. Neste sentido, Bybee e Deboer (1994) apud Sasseron e Carvalho (2011, p. 65) em seus estudos, chamam a atenção à relação Ciên-cia-Tecnologia-Sociedade (CTS) dando im-portância a um currículo que seja voltado à formação pessoal e que acompanhe as mu-danças históricas da sociedade:

O currículo de ciências deve ser relevante para a vida de todos os estudantes, e não só para aqueles que pretendem seguir carreiras científicas. [Além disso,] os mé-todos de instrução devem demonstrar cuidados para a diversidade de habilida-des e interesses dos estudantes. (BYBEE; DEBOER, 1994, p. 376 apud SASSERON; CARVALHO, 2011, p. 65)

Todavia, é possível considerar que essas

concepções se originaram das vertentes progressistas 3 no início da década de 80, e trouxeram a importância de uma proposta curricular que abrangeu conceitos como inteligências e mudanças nas abordagens didáticas. O foco do currículo escolar tor-nou-se, então, a experiência direta do aluno como forma de superar o distanciamento que há entre a escola e seus interesses. Neste sentido, “o progressivismo se consti-tui como uma teoria curricular única que encara a aprendizagem como um progresso contínuo e não somente como uma prepa-ração para a vida adulta” (LOPES; MACEDO, 2013, s/p). Isto é, essa concepção aponta para a necessidade de novas e diferencia-das atitudes, ideias e posicionamentos da escola com a intenção de formar indivíduos

³ Conforme Libâneo (1993), as vertentes progressistas estão agrupadas nas seguintes tendências pedagógicas: Pedagogia Libertadora, Pedagogia Libertária e Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos, sendo este último foco das discussões realizadas neste trabalho.

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preocupados com o futuro da sociedade. O foco central do currículo para os progressis-tas

está na resolução de problemas sociais. O ambiente escolar é organizado de modo que a criança se depare com uma série de problemas, também presentes na socie-dade, criando oportunidade para ela agir de forma democrática e cooperativa. As atividades curriculares e os problemas são apresentados às crianças para que e-las, em um mesmo processo, adquiram habilidade e estimulem sua criatividade. O currículo compreende três núcleos: as ocupações sociais, os estudos naturais e a língua. Os conteúdos - assuntos que se re-lacionam a problemas de saúde, cidada-nia e meios de comunicação - deixam de ser o foco da formulação curricular, tor-nando-se uma fonte através da qual os alunos podem resolver os problemas que o social lhes coloca. (LOPES; MACEDO, 2013, s/p)

Chassot (2004, p. 85), por sua vez, apon-

ta que se o currículo é a oportunidade para escola alcançar a democracia e a coopera-ção, precisa atentar-se mais no que diz res-peito à vida política e às dimensões éticas. Neste sentido, Chassot (2004) diz que con-teúdos importantes são esquecidos muitas vezes pelos profissionais dessa área:

precisamos questionar não apenas a res-peito da utilidade dos conteúdos ensina-dos, mas, e principalmente, dos conteú-dos ausentes. Há, aqui, uma nova ordem de preocupações: por que não se ensi-nam determinados conteúdos. Há uma continuada preocupação de nos darmos conta de que não educamos só para o tempo presente. [...] Precisamos conhe-cer o real sob ou que outros aspectos e

inseri-los na ordem da vida para a comu-nicação e para a satisfação das pessoas. (CHASSOT, 2004, p. 85, grifos do autor)

Nesta direção, Lorenzetti e Delizoicov

(2001) apostam num ensino de ciências de acordo com a alfabetização científica o qual forneça propostas para que os alunos sejam capazes de compreenderem e discutirem significados dos assuntos científicos:

a alfabetização científica no ensino de ci-ências naturais é aqui compreendida co-mo o processo pelo qual a linguagem das ciências naturais adquire significados, constituindo um meio para o indivíduo ampliar o seu universo de conhecimento, a sua cultura, como cidadão inserido na sociedade. (LORENZETTI; DELIZOICOV, 2001, p. 8-9)

Pensando em formas de iniciar o proces-

so de alfabetização científica nos primeiros anos do ensino fundamental, Lorenzetti e Delizoicov (2001) pontuam ainda atividades didáticas que os professores podem utilizar. Entre tais proposições para desenvolver a alfabetização cientifica, Lorenzetti e Delizoi-cov (2001) indicam o uso sistemático da literatura, da música, do teatro, da internet, vídeos educativos, a exploração de artigos e revistas científicas, saídas a campo como visitas a museus, zoológicos, estações de tratamento da água, entre outras atividades que estimulem a criatividade e o interesse pela ciência. Portanto, aos professores cabe o papel de ser um formador de opiniões, um agente transformador e que se envolva na comunidade, desenvolva a crítica e a curiosidade nos alunos.

Além disso, conforme explicitam Delizoi-cov e Slongo (2011), as mídias em geral (re-des sociais, televisão, rádio, etc.) apontam

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cotidianamente aos estudantes inúmeras informações, as quais nem sempre estão adequadas do ponto de vista científico. Por isso a responsabilidade do ensino de ciên-cias no meio escolar.

É cobrado deste ensino contemplar con-teúdos que tenham ressonância no coti-diano dos alunos auxiliando-os, não ape-nas a melhor compreender o mundo físi-co a sua volta, mas também a reconhece-rem-se como sujeitos ativos na tomada de decisões individuais e coletivas, inter-vindo em sua realidade a partir de um o-lhar científico e superar o senso comum. Por isso, as mídias ajudam, mas não é a solução para a educação científica na so-ciedade moderna. (DELIZOICOV; SLONGO, 2011, p. 208)

A partir destas considerações, com rela-

ção ao enfrentamento dos desastres natu-rais e sua minimização em escolas blume-nauenses, este somente será possíveis por meio de um processo curricular que pro-porcione reflexões, com iniciativas de “se-dimentação da cultura local de preservação do meio ambiente” (LENZI, 2013, p. 72). Para isso, cabe ao meio escolar proporcio-nar atividades pedagógicas que auxiliam esta ação, como promover discussões sobre situações de emergências, reciclagem do lixo, desenvolver projetos de plantio de mudas nas encostas dos ribeirões e do rio Itajaí-Açu. A escola pode ainda resgatar as histórias dos principais desastres naturais ocorridos na cidade, entre outras ações, os quais levam os alunos a fazerem conexões críticas entre o conhecimento sistematizado pela escola com as suas vivências.

Para tanto, de acordo com Mattedi (2009) essa é uma questão a ser indagada também pelos gestores tanto das políticas

ambientais, sanitárias, do planejamento urbano e da educação de SC. Ou seja, não se pode perder em vista o papel do poder público frente ao combate dos desastres naturais que deveria ser segundo Vedovello e Macedo (2007, p. 84): “o de evitar o apa-recimento de áreas e situações de risco; identificar e caracterizar as áreas e situa-ções de risco já existentes; e solucionar ou minimizar os riscos existentes”.

No entanto, o que se evidencia por parte da gestão pública é o desenvolvimento de programas inadequados para a prevenção e minimização dos desastres naturais na regi-ão, programas sociais pouco eficientes as-sim como poucos recursos e financiamentos supérfluos à política da educação para tra-balhar esta questão nas escolas. Conforme elucida Lenzi (2013) até existem projetos interessantes que aparecem rapidamente para solucionar reivindicações imediatas da população, mas é preciso desconfiar, pois “não se cria da noite para o dia uma estru-tura capaz de desenvolver ações que pos-sam ter resultados eficientes e, portanto, confiáveis” (LENZI, 2013, p. 38). Assim,

as ações devem ser encaradas como polí-tica de Estado e não como política de go-verno, pois terá de haver a participação direta da União, dos Estados e dos Muni-cípios e não apenas por um tempo especí-fico, e sim, sempre que se fizer necessário a adoção das ações. É claro que para isto, se requer vontade política, pois terá de haver investimentos a curto e longo prazo e uma conscientização de que só será possível ter os resultados que se almejam quando não mais houver a política opor-tunista de tapar o sol com a peneira, para se obter os lucros eleitoreiros. (LENZI, 2013, p. 38)

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Apesar de a ação governamental ser de grande importância para a solução dos pro-blemas ambientais e sanitários da região, embora muitas vezes ineficaz, às escolas é imprescindível o papel da conscientização: o de educar seus alunos para que possam ter uma ação proativa visando à redução da vulnerabilidade frente aos deslizamentos. Um trabalho cooperativo e solidário que está presente também nas ações das Dire-trizes Curriculares Nacionais (DCN) da Edu-cação Básica: “o pleno desenvolvimento de seus sujeitos, nas dimensões individuais e sociais de cidadãos conscientes de seus di-reitos e deveres, compromissados com a transformação social” (BRASIL, 2013 p. 16).

Pode-se elucidar, portanto, que é neces-sário a sociedade civil e gestores da educa-ção de Blumenau-SC se atentem à proble-mática e invistam na qualificação dos pro-fessores para que possam instruir seus alu-nos sobre o combate e minimização das enchentes, inundações, enxurradas e desli-zamentos nos locais em que vivem, tornan-do-os capazes de agir para minimizar as causas e consequências que esses desastres naturais ocasionam na cidade.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Contribuir para a prevenção e a minimi-

zação dos desastres naturais são condições fundamentais para os cidadãos no municí-pio de Blumenau-SC. Este é também papel da escola em conjunto com a comunidade. Entretanto, apesar de cumprirem os objeti-vos curriculares incluindo no currículo a dis-cussão sobre os desastres naturais, confor-me estudos realizados por Lenzi (2013), Oli-veira (2012) e Faht (2011), a maioria das escolas da rede pública municipal do ensino fundamental do município de Blumenau

(SC) retrata o tema de forma desinteressan-te e com pouca efetividade na vida de seus educandos.

“Não é possível acabar com os fenôme-nos naturais, mas sim prevê-los, diminuindo os riscos e danos que eles causam criando uma cultura de prevenção” (BRASIL, 2015, s/p). Por isso, cabe salientar a importância do ensino de ciências nas escolas do ensino fundamental voltado à alfabetização cientí-fica como proposta para o enfrentamento dos desastres naturais ocorridos na cidade. Como sugestão de atividades que podem ser desenvolvidas pela escola no sentido de aproximar os conteúdos científicos e curri-culares ao conhecimento cotidiano dos e-ducandos, podemos citar a promoção de eventos como feiras científicas, memoriais, gincanas, jogos, debates em sala de aula e fora dela, viagens de estudos, dinâmica com as famílias, entre outros trabalhos são e-xemplos que podem estimular o desenvol-vimento do hábito para tornarem-se cienti-ficamente instruídos ao longo da vida. Nes-se sentido, se deslumbra um dos principais propósitos da alfabetização científica: unir o conhecimento e as habilidades adquiridas na escola com o mundo fora da sala de au-la, e assim fazer com que o aluno entenda que ciências é o que se vive no dia a dia.

Para tanto, os agentes das políticas edu-cacionais de Blumenau-SC (professores, gestores, alunos, diretores escolares, go-verno, entre outros) precisam rever as dire-trizes curriculares do município, analisando-as a partir de uma perspectiva crítica que privilegie o questionamento dos problemas causados pelos desastres naturais na regi-ão. De certo modo, diretrizes que possibili-tem principalmente a formação continuada dos professores para que estes contribuam com aulas e atividades condizentes para o

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enfrentamento dessa realidade. Assim, os estudantes terão a capacidade de discutir a temática, como estarão também aptos para refletir sobre os desastres naturais, bem como de, por meio de pequenas ações coti-dianas, preveni-los e combatê-los.

Sabe-se que enfrentar o desafio de for-mar professores e investir na melhoria do ensino de ciências no ensino fundamental em Blumenau não é tarefa simples. É preci-so investir em programas inovadores de ensino, em trabalhos colaborativos com universidades e investimentos financeiros do poder público. Além disso, cabe também aos cidadãos, especialmente aos professo-res desenvolverem a capacidade de análise e o pensamento reflexivo nas pessoas para que estejam cientes sobre as situações de emergências e combate aos desastres natu-rais. REFERÊNCIAS AUMOND, J. et al. Condições naturais que tornam o vale do Itajaí sujeito aos desas-tres. In: FRANK, B.; SEVEGNANI, L. Desastre de 2008 no vale do Itajaí: água, gente e política. Blumenau: Agência de Água do Va-le do Itajaí, 2009. BRASIL. Ministério da Educação. Enchen-tes: educar para prevenir. Disponível em: <http://webeduc.mec.gov.br/enchentes/>. Acesso em: 14 fev. 2015. BRASIL. Parâmetro Curricular Nacional em Ciências. Secretaria de Educação Funda-mental. Brasília: MEC/SEF, 1997. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ciências Naturais. Secretaria de Educação Fundamental. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.

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Artigo recebido em 08 de dezembro de 2015. Avaliado em 23 de fevereiro de 2016. Aceito em 29 de fevereiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): MILBRATZ, Raquellen; PROBST, Melissa. Alfabetização científica: reflexões sobre as possibilidades para o enfrentamento dos desastres naturais no município de Blume-nau/SC. Estação Científica (UNIFAP), Maca-pá, v. 5, n. 2, p. 09-20, jul./dez. 2015.

Artigo de revisão de literatura

Estação Científica (UNIFAP) https://periodicos.unifap.br/index.php/estacao ISSN 2179-1902 Macapá, v. 5, n. 2, p. 21-28, jul./dez. 2015

A (não) utilização das Tecnologias da Informação e da Comunicação pelos professores

Jandira Dantas dos Santos 1

1 Mestra em Tecnologias Aplicáveis à Bioenergia, Especialista em Tecnologias em Educação, Especialista em Educação Inclusiva, Especialista em Formação Socioeconômica, Pedagoga, Psicóloga e Licenciada em História. Coordenadora do Curso de Psicologia da UNIRB/FARAL e Professora da Secretaria de Educação do Estado da Bahia, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO: O presente artigo traz uma reflexão sobre a formação de profes-sores em tecnologias da informação e comunicação como parâmetro in-centivador da investigação em educação, percorrendo vários conceitos, le-vantamentos e abordagens, a fim de promover o entendimento e a consci-entização para uma prática pedagógica voltada para o uso das tecnologias. A metodologia utilizada neste estudo é a pesquisa bibliográfica. Nos resul-tados encontramos autores clássicos que trazem um aprofundamento teó-rico sobre a necessidade da utilização das Tecnologias da Informação e Comunicação nas escolas detectando os possíveis entraves para o uso das mesmas nestes espaços, bem como a falta de capacitação dos docentes para a utilização das tecnologias o que suscita a busca iminente de uma pessoa que seja intermediária entre o docente, o aluno e a tecnologia. Palavras-chave: Tecnologias. Educação. Professores. A (no) use of information technology and communication by teachers ABSTRACT: This article presents a reflection on teacher training in infor-mation and communication technologies as research incentive parameter in education, covering various concepts, surveys and approaches in order to promote understanding and awareness for a pedagogical practice for use technology. The methodology used in this study is the literature. The results found classical authors that bring a theoretical study on the necessi-ty of the use of information and communication technologies in schools detecting possible obstacles to using them in these spaces as well as the lack of training of teachers for the use of technologies which raises the im-pending search for a person who is an intermediary between the teacher, the student and technology. Keywords: Technology. Teacher. Education

1 INTRODUÇÃO

Num mundo cada vez mais competitivo e

complexo é perceptível a exigência de com-petências mais aprimoradas. Na escola atu-al, não cabe mais a educação bancária tão

combatida por Paulo Freire, isto é, a escola enclausurada na repetição, centrada na ora-tória do docente e em grade (horários) de cinquenta minutos. A escola necessita de profissionais mais criativos, empreendedo-res, melhor remunerados e conscientes de

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seus limites e possibilidades educacionais. Precisamos de ingredientes inovadores

na educação pautados no socioconstruti-vismo que oferece suporte à compreensão dos processos cognitivos. Profissionais ca-pazes de “estimular o aluno para a auto-nomia, despertar seu espírito inventivo, auxiliar no desenvolvimento da capacidade de refletir e criticar a realidade” (RICARDO, 2013, p. 26). Nesta situação, podemos e-xemplificar com as comunidades virtuais de aprendizagem que são um espaço privilegi-ado à adoção de uma perspectiva pedagó-gica que suplanta as características bancá-rias da educação tradicional.

Os motivos que impulsionaram a elabo-ração deste artigo relacionam-se à linha de pesquisa Formação do Educador, Currículo e Tecnologias Intelectuais, e perpassam pe-la dificuldade que os docentes têm de se aperceberem entre a díade tecnologia/edu-cação. Conforme Morin (2003), este é o ponto principal de resistência à utilização das Tecnologias da Informação e da Comu-nicação (TIC’s) na escola. Ou seja, os profis-sionais em educação, em sua grande maio-ria, ainda insistem em modelos ultrapassa-dos em uma sociedade em constante trans-formação.

Acredito que a escola pode transformar-se em um conjunto de espaços ricos de a-prendizagens significativas, presenciais e digitais, que motivem os alunos a aprender ativamente, pesquisar o tempo todo, a se-rem pró-ativos, além de tomar iniciativas e interagir na perspectiva da construção do conhecimento. Estes motivos impulsiona-ram a escrita sobre este tema.

Infelizmente, os cursos de formação de professores, em geral, não colaboram para que os docentes quebrem as amarras de modelos educacionais ultrapassados, por

exemplo, o uso tão somente do livro e do quadro negro e giz, de transmissão de in-formação, que em nada motivam a aprendi-zagem. Precisamos acabar com o resgate de uma escola velha num mundo globalizado. Por isso, o objetivo deste trabalho é refletir sobre a utilização das Tecnologias da Infor-mação e Comunicação na prática docente.

As tecnologias desencadeiam mudanças profundas e evoluem mais rapidamente do que a cultura de um povo. É preciso ter cui-dado para que as tecnologias não apenas reforcem o ensino tradicional, em que se percebe que em uma teleaula via satélite que o professor continua empoderado pela informação. Ou seja, não podemos utilizar a tecnologia como um instrumento que ape-nas reproduza os conteúdos, mas como um mecanismo capaz de problematizar todo o processo de ensino e aprendizagem.

A metodologia utilizada neste estudo é a pesquisa bibliográfica, pois a mesma ofere-ce meios que auxiliam na definição e reso-lução dos problemas já conhecidos, além de permitir que um tema seja analisado sob novo enfoque ou abordagem, produzindo novas conclusões. A escolha desta metodo-logia, para este caso específico, deve-se ao fato de o material disponível pesquisado estar estruturado para situações e reflexões acerca do tema abordado. Por meio da pes-quisa bibliográfica, tornou-se possível o e-xame da problemática da formação de pro-fessores em tecnologias sob uma nova a-bordagem.

O período norteador da análise literária sobre o tema foi o ano de 2005, em que as discussões e debates sobre as TIC’s ficaram mais evidentes no cotidiano escolar. Desta forma, utiliza-se como embasamento deste trabalho: Belloni (2009) por trabalhar com o conceito de mídias (jornal, livro, televisão,

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rádio) que vai além do uso das TIC’s o que torna esclarecedor para o docente; Cox (2008) que trata da necessidade da (re)construção contínua das ações e fazeres humanos tendo em vista o aprimoramento constante; Kenski (2003) contribui quando afirma que as TIC’s além de serem conside-radas suportes, interferem em nosso modo de ser; Freire (1996), notável por sua refle-xão sobre a autonomia no processo educa-tivo; Levy (1993) reflete sobre técnicas da inteligência na práxis educativa através das tecnologias; Moran (2000) que trata das novas TIC’s e o processo de mediação esta-belecido entre o docente e o discente; e finalmente, Fava (2013) que traz uma refle-xão sobre as questões culturais apontando que cada sujeito tem uma forma de com-preender o processo de inserção das tecno-logias no cotidiano.

Os autores acima mencionados e identi-ficados em suas ideias acerca do tema em questão, em muito contribuíram para a ela-boração deste artigo devido a conexão dos mesmos com a pesquisa e a similaridade de pensamento.

2 A UTILIZAÇÃO PEDAGÓGICA DAS TECNO-LOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICA-ÇÃO

Na utilização das Tecnologias da Infor-

mação e Comunicação como recurso peda-gógico, devem-se privilegiar as bases das teorias construtivistas para uma aprendiza-gem significativa. Para que isto ocorra, compete ao professor selecionar as tecno-logias que instiguem o aluno à busca, à ex-ploração e à sistematização de seus sabe-res. Visto que, a tecnologia em si não muda a educação, a escola sozinha não transfor-ma os paradigmas da educação tradicional,

mas, as práticas docentes, muitas vezes iso-ladas, podem intervir na formação do cida-dão (LEVY, 1993).

Segundo Belloni (2009), o mundo con-temporâneo exige um sujeito completo que tenha capacidade de adequação ao meio ambiente, com habilidade ao trabalho em equipe e capaz de aprender. Para sobrevi-ver no mundo contemporâneo, o sujeito precisa desenvolver novas capacidades que levem à imediatização das relações sociais.

Na estrutura educacional, possuímos vá-rios desafios que vão desde a reformulação curricular até à formação do espírito cientí-fico decorrente de demandas crescentes de formação.

Ao refletir sobre o papel desempenhado pela universidade no processo de forma-ção e no desenvolvimento de uma cultura de rede pelos professores, preliminar-mente é possível intuirmos que a existên-cia de programas complementares de ca-pacitação e formação docente na área se-ja alternativa para suprir uma carência e-xistente, decorrência de um processo de formação que não tem levado em consi-deração as mudanças ocorridas na socie-dade (TEIXEIRA, 2010, p. 66).

Com isto, a formação inicial deve con-

templar o fomento dos saberes ligados a ênfase da aquisição de habilidades de a-prendizagem e a interdisciplinaridade. “Neste contexto, deve-se oportunizar aos estudantes da formação inicial uma política de formação continuada que promova a criação de estruturas de formação continu-ada mais ligada ao ambiente de trabalho” (BELLONI, 2009, p. 23).

Segundo Cox (2008), diante de mudan-ças, a primeira palavra de ordem do ser humano em geral é resistência. Por isso que

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se torna necessário esclarecer os agentes escolares quanto à viabilidade do repensar a tríade: sociedade/ciência/educação, tão presente e necessária na vida moderna. É necessário perceber o professor como mo-la-mestra na estrutura de transformação da escola desencadeada pelos questionamen-tos levantados pelo uso das tecnologias, em virtude do seu papel mediador entre alunos e administradores.

Para fomentar as mudanças na escola, o professor deve rever suas posturas, reavali-ar seus propósitos, remodelar as ferramen-tas educativas, enfim, ele precisa reestrutu-rar-se e isto requer estudo, análise e esfor-ço. Resumindo, o professor precisa de pre-paração para adentrar ao mundo das tecno-logias de forma segura e eficaz. Posto que, segundo Cox (2008), não há um manual de passo-a-passo de práticas educacionais es-colares com exploração dos recursos da informática que garantam sucesso indubi-tável. A única certeza é da necessidade da (re)construção contínua das ações e fazeres humanos tendo em vista o aprimoramento constante.

As novas tecnologias da informação e comunicação, caracterizadas como midiáti-cas, segundo Kenski (2003), além de serem consideradas suportes, interferem em nos-so modo de pensar, sentir, agir, de nos rela-cionarmos socialmente e adquirirmos co-nhecimentos. Isto é, criam uma nova cultu-ra e um novo modelo de sociedade caracte-rizada pela personalização das interações com a informação e as ações comunicativas.

Na era da informação, comportamentos, práticas, informações e saberes se alteram com extrema velocidade e refletem sobre as tradicionais formas de pensar e fazer e-ducação. Desta forma, compreender a atua-lidade tecnológica resultante de mudanças

estruturais é um grande desafio a ser assu-mido por toda a sociedade e pelo professor para que possa atuar criticamente sobre as tecnologias que lhe aparecem no processo educativo ou são sugeridas pelas mídias:

O domínio das novas tecnologias educati-vas pelos professores pode lhes garantir a segurança para, com conhecimento de causa, sobreporem-se às imposições de programas e projetos tecnológicos que não tenham a necessária qualidade edu-cativa. Criticamente, os professores vão poder aceitá-las ou rejeitá-las em suas práticas docentes, tirando o melhor pro-veito dessas ferramentas para auxiliar o ensino no momento adequado (KENSKI, 2003, p. 50).

Para que a inserção das tecnologias seja

produtiva, é necessário que o professor ori-ente o processo e estimule o grupo escolar possibilitando uma abordagem cooperativa de ensino em que o aluno obterá autono-mia e maior grau de responsabilidade. Po-demos criar um ambiente digital como ex-tensão das atividades realizadas em sala de aula, quando é impossível a discussão com todos os alunos, em decorrência do elevado número de estudantes e do exíguo tempo de aula, por exemplo: blogs, skype, bate-papo nas redes sociais etc.

As atividades colaborativas de ensino o-rientam-se pelos princípios da inteligência coletiva, proposta por Pierre Levy (1993), e correspondem a uma reunião em sinergia dos saberes, das imaginações, das energias espirituais de um grupo humano constituí-do como comunidade virtual (KENSKI, 2003). Em suma, o ensino colaborativo, de-sencadeado nos ambientes virtuais apre-senta novas possibilidades para professores e alunos, o que facilita a proposta de uma

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educação inclusiva que valoriza as diversi-dades culturais. Na educação, a cultura da convergência traz conteúdos e informações por meio de plataformas diversas, fazendo com que alunos migrem em busca das ex-periências de aprendizagem que desejam (FAVA, 2013).

A escola na contemporaneidade deve ser um espaço de inclusão, democrática, de construção/socialização de saberes e for-mação para a cidadania. Portanto, trata-se de um local adequado para o preparo de-mocrático das pessoas das várias classes sociais sobre o tratamento do consumo dos produtos ofertados pelas mídias.

A escola deve integrar as tecnologias da informação e comunicação porque elas já estão presentes e influentes em todas as esferas da vida social, cabendo a escola, especialmente a escola pública, atuar no sentido de compensar as terríveis desi-gualdades sociais e regionais que o aces-so desigual a estas máquinas está geran-do (BELLONI, 2009, p. 10).

As Novas Tecnologias da Informação e da

Comunicação, em conjunto com as mídias (rádio, jornal, vídeo, etc.) ainda existentes de forma sutil na educação, invadem o es-paço escolar com aplicações pedagógicas. Isto tende a desencadear um novo processo pedagógico dentro e fora das salas de aula, se as mesmas forem usadas como ferra-mentas que possibilitem mudanças no pro-cesso de ensino-aprendizagem e de acesso e democratização da educação. Como sujei-tos ativos, e a partir da mediação do docen-te, os alunos poderão desenvolver a apren-dizagem com o auxílio das TIC’s num pres-suposto empreendedor e libertador.

O interesse pela inserção das Tecnologias da Informação e da Comunicação no ambi-ente escolar é para desvirtuar o foco da es-cola, que sempre foi transmitir informa-ções, para a orientação de processos de aprendizagem. A rotatividade das tecnolo-gias é incessante e perpassa do tão conhe-cido livro didático ao ambiente moodle, ferramentas colaborativas web 2.0 (blog) que possibilitam interagir de forma fácil e sem custo com um grupo de estudo.

Para atuar em novos ambientes equipa-dos com TIC’s, o profissional em educação deverá ter acesso à capacitação permanen-te para manusear os equipamentos e usu-fruir das informações e saberes, transfor-mando-os em novos conhecimentos.

Um dos mecanismos que pode auxiliar na formação de professores agentes e estra-tégicos durante as suas aprendizagens, em diferentes tarefas acadêmicas, ofere-cidas nas disciplinas que compõem os cursos de licenciatura é o desenvolvimen-to dos processos de autorregulação da aprendizagem (AVILA; FRISON, 2016, p. 274).

A autorregulação de aprendizagem per-

mitirá que o estudante perceba a importân-cia de lidar com a organização do tempo e regule a própria aprendizagem. Desta for-ma, terá capacidade de ser responsável pela própria escolarização pelo fato de incluir formas sociais de educação em que a parti-cipação dos pares e professores é importan-te para o entendimento do processo educa-tivo.

Com base nas ideias de Belloni (2009), podemos afirmar que as culturas que domi-nam a informação detêm os mais altos de-graus de acesso ao desenvolvimento em

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que as novas tecnologias e as mídias de consumo influenciam no comportamento das pessoas alterando o modo de vida das mesmas.

Diante da incapacidade do sistema edu-cativo tradicional de responder às inquieta-ções decorrentes da evolução da sociedade e dos processos de comunicação, a educa-ção mediada por tecnologias surge como possibilidade de difusão e democratização do conhecimento (POLAK, 2006) e de orga-nização de novos espaços de construção do conhecimento.

O autor Pierre Levy (1993) discute a inte-ração tecnológica e as mudanças significati-vas que elas promovem na sociedade, in-formando que os sujeitos só podem sobre-viver e prosperar no ciberespaço, contexto em que se dará a organização da inteligên-cia coletiva. Portanto, a educação mediada por tecnologias é o instrumento que possi-bilita a formação de ciberespaços, sendo este o universo das redes digitais que pro-porcionam a difusão do conhecimento.

O processo mediado pelo docente que se utiliza das Tecnologias da Informação e da Comunicação propicia o desenvolvimento da autonomia do sujeito do conhecimento (MORAN, 2000), neste caso, o educando. Desta forma, sendo a escola equipada ou não pelas tecnologias, o docente deve en-tender a forte presença das mídias no coti-diano do discente. Esta bagagem individual em muito oportunizará novos moldes de aprendizagem na escola, e, com certeza, a popularidade das TIC’s no cotidiano em muito aproxima os conteúdos trabalhados na escola dos saberes tecnológicos.

Sob essa ótica, urge a formação de pro-fessores e, especialmente, a formação continuada voltada a auxiliar os docentes

a apropriarem-se desse saber tecnológico e o colocar em prática. O que não se pode fazer, obviamente, é meramente criticá-los por não saberem. Sabemos que, em meio a essa revolução tecnológica, mui-tos cidadãos ficam ainda à margem, inclu-sive profissionais da área da educação (KURTZ; THIEL, 2010, p. 123).

Na educação, a inserção do conhecimen-

to tecnológico sempre foi lenta, devido à insegurança dos docentes em utilizá-lo. Mas hoje, frente a globalização, ele tem aden-trado os ambientes de aprendizagem e pro-vocado mudanças significativas na organi-zação e no fazer pedagógico escolar, exigin-do dos profissionais em educação um novo posicionamento quanto ao uso e dissemi-nação dele. Nesse contexto se faz necessá-rio entender as transformações e interfe-rências que as Tecnologias da Informação e da Comunicação impuseram às organiza-ções sociais e educativas, transformando-as em novos espaços colaborativos de cons-trução do conhecimento.

Ao discutir as novas formas de trabalho no contexto da sociedade tecnológica e in-formacional Polak (2006) explicita que o contexto da pós-modernidade exige mão-de-obra cada vez mais qualificada, com competências para o processamento de informação necessitando, por isso, de alto nível de instrução.

Nessa perspectiva, há necessidade, vee-mente, de formação de indivíduos autôno-mos que além de dominar conhecimentos, sejam capazes de manejar instrumentos tecnológicos, os quais exigem ações/toma-das de decisões constantes para responder/ resolver novas problemáticas que se colo-cam no contexto da sociedade globalizada.

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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS A escola deve integrar as TIC’s ao ensino,

porque elas já estão presentes e influentes em todas as esferas da vida social. A escola pública, em especial, deve atuar no sentido de compensar as graves desigualdades so-ciais e regionais que o acesso desigual aos equipamentos tecnológicos está gerando. A implantação de laboratórios de informática veio para diminuir a distância entre os alu-nos da escola pública e a tecnologia.

A partir do que foi mencionado no estu-do realizado, podemos perceber que existe um interesse pontual na utilização das TIC's em sala de aula. Contudo, percebemos nas entrelinhas uma má utilização dos recursos, posto que grande parte dos professores demonstra inabilidade no manuseio.

Acreditamos que um Coordenador/a de Tecnologias presente nas Unidades Escola-res facilitaria a capacitação de professores, pois percebemos na literatura analisada que os professores reclamam de não ter tempo para produzir as mídias. Portanto, um Coordenador de Tecnologias, que neste momento intitulamos de Coordenador Téc-nico Pedagógico, além de ter formação em Pedagogia e Especialização em Tecnologias, deverá produzir as mídias juntamente com o professor das disciplinas durante o horá-rio de Atividade Complementar – AC e, quando for possível, capacitá-los para a uti-lização das TIC’s, configurando uma Forma-ção Continuada em Serviço.

A mudança do sistema educacional, nos dias atuais, em decorrência da utilização das TIC's, tem proposto uma pedagogia que fortaleça o indivíduo e que promova sua autonomia perante suas tarefas educativas. Assim, devemos instrumentalizá-lo numa perspectiva inovadora que contemple o de-

senvolvimento de suas competências e ha-bilidades para o enfrentamento das dificul-dades do seu contexto sócio-histórico, em que as diferentes formas de midiatização do ensino precisam promover uma educação pautada na autoaprendizagem, consideran-do o educando como um sujeito aprenden-te e capaz de gerir sua própria aprendiza-gem (BELLONI, 2009).

A utilização das TIC's dinamiza o processo de ensino-aprendizagem a partir de virtua-lidades técnicas, possibilitando ao adulto, que vivencia o processo, evoluir no campo do conhecimento científico. Não cabe, nes-te momento, ser travada uma brincadeira de cabo de força em que os professores elegem uma posição entre os a favor e os contra a utilização das novas tecnologias argumentando que as mesmas irão roboti-zar o ser humano. Na verdade, precisamos retirar a “omissão do humanismo frente ao pensamento tecnicista” (BLANDINI, 1990, p. 73), visto que a utilização das TIC's é medi-ada primeiramente pelo elemento humano. Portanto, seja o uso das mídias tradicionais e das novas tecnologias, numa situação de aprendizagem, precisamos nos dar conta de que todas elas fazem parte do dia a dia dos nossos educandos favorecendo a aprendi-zagem autônoma.

Assim, as novas Tecnologias da Informa-ção e da Comunicação, existentes de forma sutil na educação, invadem o espaço escolar com aplicações pedagógicas inovadoras. Essa conjugação de fatores tende a desen-cadear um novo processo pedagógico den-tro e fora das salas de aula, se as TIC’s fo-rem usadas como ferramentas que possibi-litem mudanças no processo ensino-apren-dizagem e de acesso e democratização da educação.

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REFERÊNCIAS AVILA, L. T.; FRISON, L. M. B. A autorregula-ção da aprendizagem e a formação de pro-fessoras do campo na modalidade do ensi-no a distância. Revista Iberoamericana de Educación a Distancia-RIED, v. 19, n. 1, p. 271-286, 2016. BELLONI, M. L. O que é mídia e educação? São Paulo: Autores Associados, 2009. BLANDINI, B. Formateurs et formation multimédia. Paris: Les Editions d' Organisa-tion, 1990. COX, K. K. Informática na educação escolar. Campinas-SP: Autores Associados, 2008. FAVA, R. Educação 3.0. São Paulo: Saraiva, 2013. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996. KENSKI, V. M. Tecnologias e ensino presen-cial e a distância. Campinas-SP: Papirus, 2003. KURTZ, F. D.; THIEL, K. C. N. TIC e ensino de línguas: o que dizem professores e alunos. In: MACHADO, G. J. C. Educação e Ciberes-paço: estudos, propostas e desafios. Araca-ju: Virtus, 2010. LEVY, P. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: Editora 34, 1993. MORAN, J. M. Novas tecnologias e media-ção pedagógica. Campinas, São Paulo: Papi-rus, 2000. MORIN, E. Educar na era planetária. São Paulo: Cortez, 2003. POLAK, Y. N. de S. Conceitos e pressupostos da técnica e tecnologia. 2006. Disponível em: <http:///www12.unopar.br/unopar/sta tic/mestradoead/turma1/aula_ymiracy/aula01/default. htm>. Acesso em: 19 set. 2008. RICARDO, E. J. Educação à distância: pro-fessores-autores em tempos de cibercultu-ra. São Paulo: Atlas, 2013.

TEIXEIRA, A. C. Inclusão digital: novas pers-pectivas para a informática educativa. Ijuí: Ed. Unijuí, 2010.

License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, provi-ded the original work is properly cited.

Artigo recebido em 24 de agosto de 2014. Avaliado em 15 de dezembro de 2015. Aceito em 16 de janeiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): SANTOS, Jandira Dantas dos. A (não) utiliza-ção das Tecnologias da Informação e da Comunicação pelos professores. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 21-28, jul./dez. 2015.

Artigo de revisão de literatura

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Henrique Gallucio: trajetória, agonia e morte do gênio construtor da Fortaleza de São José de Macapá

Fernando Pimentel Canto 1

1 Doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará, Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Amapá e Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Pará. Sociólogo da Universidade Federal do Amapá, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO: O artigo aborda, em parte, o processo de construção da Fortale-za de Macapá que tem em Henrique Gallucio o seu principal ator social. Traz, no conceito de Elias (1995), uma sequência definida e ordenada na história da colonização amazônica. Para Elias trata-se de um processo es-truturado que vai numa certa direção e está intimamente ligado ao proces-so social geral. Gallucio viveu entre ser o que foi – um outsider – nas terras do Novo Mundo, lutando contra o poder do establishment e sofrendo do niilismo causado pelas condições ambientais, sociais e pela malária, doença que causou sua morte aos 41 anos de idade. Palavras-chave: Fortaleza de São José de Macapá. Identidade. Alteridade. Literatura e Gallucio. Henrique Gallucio: trajectory, agony and death of the genius builder of the Fortaleza de São José de Macapá ABSTRACT: This paper discusses the process of building the Fortaleza de São José de Macapá, that has in Henrique Gallucio its main social actor. Brings, in the concept of Elias (1995), a defined and ordered sequence in the history of Amazon colonization. For Elias it is a structured process that goes in the right direction and is closely linked to the general social pro-cess. Gallucio lived between being what it was - an outsider - the lands of the New World, fighting against the power of establishment and suffering of nihilism caused by environmental conditions, social and the malaria, a disease that caused his death at 41 years old. Keywords: Fortaleza de São José de Macapá. Identity. Otherness. Litera-ture and Gallucio.

1 INTRODUÇÃO

Neste trabalho, o tema não é a sociedade

de corte, muito menos o protagonista é um artista, na acepção usual da palavra. Tenta-se aqui referenciar a vida do construtor da Fortaleza de São José de Macapá, por meio dos elementos depoentes, como as cartas dos construtores dirigidas ao Governador

da Capitania do Grão-Pará no contexto his-tórico da construção da Fortaleza de São José de Macapá, de 1763 a 1782. Ela é con-siderada um marco da presença colonial portuguesa na Amazônia, gênese da ocupa-ção da cidade de Macapá e símbolo do Es-tado do Amapá, Brasil. Constitui-se uma representação simbólica em diversas áreas de atuação da sociedade, como a política, a

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religião, o comércio e os serviços de outras ordens, amplamente divulgadas pela mídia na contemporaneidade.

Ao lado dos propósitos para os quais foi feita, incluindo aí o de defender a entrada ao Rio Amazonas, a construção da Fortaleza de São José de Macapá se inicia num intrin-cado processo de relações socioculturais, que se deu com a presença do engenheiro e Sargento-Mor do Exército Português Henri-que Antonio Gallucio, encarregado das o-bras, que se encontrava no Brasil desde 1753, a convite do Capitão-General Francis-co Xavier de Mendonça Furtado, para traba-lhar na Comissão Demarcadora de Limites na região norte do Brasil. Pouco se conhece a respeito da vida de Gallucio antes de ele vir para o Brasil. Contudo, sabe-se que era italiano, nascido em Mântua (MARQUES, 2009), em 1728, e que

era um trabalhador da arte de cartografia e foi indicado por Carlos Martel, destaca-da autoridade de sua terra, para se apre-sentar ao governador da Província [do Grão Pará e Maranhão] Francisco Xavier de Mendonça Furtado, que precisava de um técnico para fazer “riscos” na Comis-são de Limites. (BARBOSA, 1997, p. 127)

Fontana (2009) diz que Gallucio, por or-

dem de Pombal, deveria aqui construir uma das maiores fortalezas do Brasil e da Améri-ca do Sul,

a de São José de Macapá na foz do Rio Amazonas, obra projetada e iniciada pelo engenheiro militar, ajudante e depois sargento-major de Infantaria Enrico An-tonio Galluzzi de Mantova (Lombardia) entre 1763 -1769 (quando aí morreu de malária), tendo sido requisitado pela cor-

te portuguesa ao Sereníssimo Duque de Gonzaga. (FONTANA, 2009, p. 40)

Fontana (2009) se refere ao engenheiro

Gallucio como protagonista central da cons-trução da Fortaleza de São José de Macapá, tendo “a confiança do Governador Furtado e do chefe da comissão técnica portuguesa Carlos Martel, encarregado da colonização amazônica” (FONTANA, 2009, p. 40). Fonta-na (2009) informa que em Mântua, Itália, existe a Fortaleza de Sabbioneta, projetada em 1588 por Giovan Battista Antonelli, composta de seis baluartes poligonais, que viria a inspirar Gallucio na projeção da de Macapá.

De fato, Henrique Gallucio já teria uma proposta “de fortificação com característi-cas básicas do que seria a de São José de Macapá: uma posição abaluartada de qua-tro faces. Mas esse desenho ainda não seria o final” (CASTRO, 1999, p. 176).

Pelo conteúdo da carta de Gallucio, de 08 de outubro de 1763, quando informou que teve “a honra de ser mandado pelo meu natural monarca a servir a tão Augusto So-berano já [há] mais de 13 anos” 1, deduz-se que o engenheiro já estava trabalhando para os portugueses desde 1750, provavel-mente em Lisboa, Portugal, à espera do embarque para o Brasil, o que ocorreu so-mente três anos depois devido ao adiamen-to causado pela morte do rei de Portugal. Os membros da Comissão só chegariam a Belém, Brasil, em 19 de julho de 1753.

Camilo (2009) cita, como fonte secundá-ria extraída da obra de José Roberto do Amaral Lapa, que por sua vez se municiou no códice 1204, de 16 de abril de 1767, do Arquivo Público do Pará, o seguinte:

1 Cód. 132. Doc. 90.

Henrique Gallucio: trajetória, agonia e morte do gênio construtor da Fortaleza de São José de Macapá 31

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Sobre Gallucio, é importante registrar que sua estadia na capitania do Grão-Pará, anunciada pela carta escrita em Lisboa pelo Padre José Moreira, em 14 de maio de 1753 (sic), teve momentos truculen-tos, pois não somente este engenheiro, mas todos os estrangeiros e a sociedade em geral estiveram sob os pesados olhos da Inquisição, instalada no Grão-Pará, em 1763. Gallucio, por exemplo, chamou a-tenção pelos seus poemas, que refletiam forte personalidade (grifos meus), en-quanto Gaspar João Geraldo Gronfeld, engenheiro alemão que concluiu as obras da fortaleza de Macapá, chegou a ser a-cusado de luterano pelo Santo Ofício. [grifos meus] (CAMILO, 2009, p. 171)

É dentro dos conteúdos epistolares de

Gallucio que se evidenciam traços de sua personalidade, apresentando como uma pessoa geniosa, de personalidade forte, vigorosa e corpulenta, que traz elementos de conduta diferenciados das demais pes-soas, tendo assim maneiras habituais de ser que o distinguem dos outros. Nesse contex-to personalístico, o engenheiro Gallucio en-carna uma figura dramática aos olhos das personagens do seu tempo, durante a cons-trução da fortificação. As narrativas missi-vistas do Comandante [da Praça de Maca-pá] Nuno de Athayde Varona, também de-tentor de uma personalidade diferenciada, vez por outra indicam choques de mando e expressões de vaidades de Gallucio contra ele, que sempre reclama de intrometimen-to nas suas atribuições de engenheiro mili-tar.

Talvez por ser estrangeiro, com alta pa-tente militar no exército português, Gallucio tenha despertado sentimentos espúrios dentro da corporação, visto os constantes

reclames dos seus subordinados e pela aus-tera condução do trabalho em um lugar insalubre como Macapá, Brasil. O engenhei-ro via alguns dos seus ajudantes como “preguiçosos”, indolentes no trabalho, reve-lando que mesmo os amando e querendo o melhor para eles, sente “na alma que em algum deles se tenha insinuada a serpente do Amor do descanço/ que poderá, como costuma suceder na gente moça/ ser cauza de sua ruína” (sic) 2 [grifos meus]. Por essas cartas também se pode notar que o Sargen-to-Mor Gallucio nem sempre podia com-preender a situação dos seus comandados. Era uma pessoa exigente e muito sensível nas suas relações.

Sobre seus valores e talentos literários ainda não foi possível encontrar nenhum verso de seus poemas que tenham chama-do a atenção do Santo Ofício. Sabe-se ape-nas das citações de versos do poeta italiano Virgílio - que escreveu um dos poemas épi-cos mais importantes da humanidade, a “Eneida”, em torno da figura de Enéias e a fundação de Roma – transcritos como epí-grafes de suas cartas.

2 O CENÁRIO, AS ALTERIDADES E A MORTE DE GALLUCIO

Na medida em que a obra da Fortaleza ia

sendo construída, ocorria uma cadeia de eventos que determinavam a agonia do en-genheiro Henrique Gallucio. A mudança da configuração da paisagem do lugar também é a paisagem da transformação cultural, ditada pela dinâmica das pessoas. Por isso cada olhar (implícito na narrativa das car-

2 Cód. 150. Doc. 114, de 24 de junho de 1765.

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tas) 3 pode ser uma visão de mundo, alteri-dades que vão mudando ao longo de uma trajetória que afeta o espaço e a vida social e cultural. É assim que, no decorrer da his-tória, o ser humano vai construindo rela-ções, desenvolvendo processos, às vezes contraditórios, que se superam no movi-mento do tempo e do espaço na sociedade e no lugar em que se encontra com os ou-tros. Nessas relações sociais dinâmicas se constrói a realidade que se vincula ao mo-vimento da própria história. Os olhares do estrangeiro, do militar colonizador, do es-cravo negro, do comerciante e do índio, são, sim, muito diversificados, mas que e-xistem como sujeitos que produzirão um trabalho determinado pela decisão política, em um espaço geográfico no qual reprodu-zirão a sua existência e os seus valores pe-rante a existência e os valores do outro. É, portanto, na diferença cultural que o jogo de ações (e tensões) se estabelece no con-texto da construção da obra.

O conteúdo das cartas dos construtores trazem evidências da realidade, das ações e das expressões de sentimentos de homens amargurados, mas rígidos dentro de seus códigos militares, desejosos de conforto, no entanto degredados dentro de si mesmo, desterrados e impotentes pela Ordem Real Portuguesa de plantarem uma Fortaleza que se tornaria um símbolo de conquista em terras do Novo Mundo.

As alteridades pareciam instigar as rela-ções sociais. E cada olhar era diferenciado porque “nenhuma cultura é jamais unitária 3 As cartas dos construtores são como crônicas literárias, pois não deixam de ser construções da realidade que registram/narram acontecimentos e fatos comuns do cotidiano da ereção da obra e de aspectos técnicos. Seus conteúdos dão a elas, in-dubitavelmente, teor científico eivados de certa lite-rariedade.

em si mesma, nem dualista na relação do eu com o outro” (BHABHA, 2007, p. 59). Em vista disso “as culturas são dinâmicas e se transformam no contato com outras cultu-ras” (BHABHA, 2007, p. 59). Além disso, mesmo que as culturas estivessem numa relação de interdependência, no contato direto, percebe-se nas cartas de Gallucio a sua erudição e o seu amor pelo trabalho, que parecia querer terminar com certa ur-gência para ir-se de vez de Macapá, Brasil, para encontrar sua família e traçar novos rumos à sua vida.

A construção da Fortaleza de São José de Macapá foi um processo marcado pela la-buta árdua, caracterizado por uma tecnolo-gia incipiente e dificultosa, com mão de o-bra escrava e por uma série de situações de relacionamentos sociais complexos. Nesses relacionamentos, o poder se imbricava em disputas nada salutares, em queixas, intri-gas e tensões explicitadas nas cartas, que refletiam o ambiente da época, mostrando as dificuldades e deixando transparecer uma subserviência impressionante aos mandatários – como era estilo do período, sobretudo por estarem as personagens li-gadas a uma hierarquia militar impositiva e implacável.

Os agentes da construção da Fortaleza de São José vieram para um ambiente violento, para um lugar caracterizado pela degrada-ção física e moral e pelas contingências am-bientais desfavoráveis, como a falta de a-bastecimento e com o risco de doenças tro-picais. Ao lado disso, africanos de diversas procedências viviam sob o regime de escra-vidão, bem como indígenas capturados para trabalhos de transporte, caça, pesca e ou-tras atividades laborais.

Inserem-se no cenário da construção as estratégias de que se valeram os portugue-

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ses para se fixarem no lugar, obviamente pela força militar que ostentavam, funda-mentada pelas ações expressas em seus códigos de guerra. Negros, índios, soldados desertores e cidadãos civis eram punidos de acordo com seus comportamentos.

Em seu trabalho, Santos (2009, p. 182) diz que “o segundo milênio foi o milênio das descobertas imperiais”. [...]. “o ‘Outro’ do Ocidente, o descoberto, assumiu três for-mas principais: o Oriente, o selvagem e a natureza”. O referido autor esclarece que

Se o Oriente é para o Ocidente o lugar da alteridade, o selvagem é o lugar da inferi-oridade. O selvagem é a diferença incapaz de se constituir em alteridade. Não é o outro porque não é sequer plenamente humano. A sua diferença é a medida da sua inferioridade. Por isso, longe de cons-tituir uma ameaça civilizacional, é tão só a ameaça do irracional. O seu valor é o va-lor da sua utilidade. Só merece apenas confrontá-lo na medida em que ele é um recurso ou via de acesso a um recurso. A incondicionalidade dos fins – a acumula-ção dos metais preciosos, a expansão da fé – justifica o total pragmatismo dos meios: escravatura, genocídio, apropria-ção, conversão, assimilação. (SANTOS, 2009, p. 185)

Essa afirmação remete ao conceito que

se tinha, no período da ereção da Fortaleza de São José de Macapá, sobre a natureza, posta conceitualmente por Santos como um lugar de exterioridade, mas também de in-ferioridade, pois “o selvagem e a natureza são, de fato, as duas faces do mesmo desíg-nio: domesticar a ‘natureza selvagem’, con-vertendo-a num recurso natural” (SANTOS, 2009, p. 188).

A Fortaleza de São José de Macapá foi construída sob a égide da imposição do branco colonizador por meio das chamadas “guerras justas”, concepção que segundo Santos (2009) está na teoria da escravatura natural de Aristóteles, a qual reza que “a natureza criou duas partes, uma superior, destinada a mandar, e outra, inferior, desti-nada a obedecer” (SANTOS, 2009, p. 186). Nesse panorama é que Henrique Gallucio, personagem principal da construção da For-taleza, indubitavelmente tinha seus concei-tos pessoais sobre o mundo que o cercava. Sua formação europeia permitiu que se de-dicasse ao estudo da Astronomia, munido de um telescópio que mandara buscar na Itália. Suas anotações eram mandadas para o Observatório de Lisboa, em Portugal, in-clusive as que informam que observou um eclipse do sol na tarde de 25 de agosto de 1767, e um da lua em 29 de julho de 1768 (BARBOSA, 1997).

Nas suas relações com os portugueses – o comandante da Praça de Macapá e seus engenheiros subordinados –, havia sempre uma rusga na qual o construtor mostrava características de sua personalidade. Trata-va-se de uma diferença cultural marcante, porque a identidade é fabricada por meio da marcação da diferença, que acontece por meio de sistemas simbólicos como também por meio de formas de exclusão social. Para Woodward (2008, p. 39-40), a

identidade, pois, não é o oposto da dife-rença: a identidade depende da diferen-ça. Nas relações sociais, essas formas de diferença – a simbólica e a social – são es-tabelecidas, ao menos em parte, por meio de sistemas classificatórios. Um sis-tema classificatório aplica um princípio de diferença a uma população de uma forma

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tal que seja capaz de dividi-la (e a todas as suas características) em ao menos dois grupos opostos – nós/eles; eu/outro [gri-fos da autora].

O Sargento-Mor e engenheiro Gallucio,

apesar das dificuldades enfrentadas no dia-a-dia, principalmente no trato de seus su-bordinados e nas relações com a outra au-toridade da vila, o Coronel-Comandante Nuno da Cunha Atahyde Varona, sabia do seu papel, da sua condição de europeu cul-to, mas essencialmente sabia o que signifi-cava para Portugal a sua presença naquele lugar ermo onde a doença e a saudade da família o fariam definhar até a morte.

O Comandante Marcos informa sobre os progressos da obra e que quase todos os prédios internos já se encontram prontos. É ele quem encaminha carta ao Governador, informando a morte do engenheiro Gallu-cio:

Pelas cinco horas e meia da manhã de ho-je entrou na Eternidade a Alma do Enge-nheiro Henrique Antonio Gallucio, e ainda que se haverá dez dias que se achava em princípio de segunda cura, purgando duas vezes, morreu quase repentinamente, e sendo sensível a sua falta, se faz mais las-timesa por morrer sem sacramentos, nem apertar a mão estando toda a noite com ele o Padre Vigário, dispondo-o para o cristão desengano e venturozo fim do ar-rependimento. Logo me veio falar o capitão Henrique Jo-ão Wilkens e certificar-me do mesmo que já me tinha dito: que ele da Fortificação nunca soubera nada porque o Defunto Gallucio fizera sempre mistério deste pro-jeto que nunca lhe quis revelar, e que isto mesmo tinha o ele capitão já representa-do a V. Exa: A vista do que fui logo à casa do Defunto fazer separar os papéis per-

tencentes ao serviço de Sua Majestade nesta Fortificação, para que o dito capi-tão, vendo o Risco, e o mais que nele está disposto poder inteiramente suceder no seu ministério e fazer executar todo o seu pensamento enquanto V. Exa. não resol-ver sobre este ponto o mais que for ser-vido. Macapá, 27 de outubro de 1769 4.

A morte do engenheiro Gallucio até hoje

causa especulações. O fato de guardar as plantas para si, sem mostrar a ninguém mais, pode revelar o traço da personalidade do engenheiro, que não queria ver seu tra-balho ser executado sem a sua presença. Mas, impossibilitado por causa da doença que lhe afligia, preferiu guardá-las em lugar seguro enquanto esperava ser curado.

A morte de Gallucio também põe fim ao embate causado entre ele e o comandante da Praça de Macapá, Nuno Athayde Varona, falecido cinco meses antes, e os engenhei-ros ajudantes Sambucetti e Wilkens, com quem vivia em permanente tensão. A Gallu-cio estava reservada uma morte descrita dessa maneira, pois o tempo, o ambiente e o espaço da construção iriam colaborar pa-ra a aceleração da doença, ainda que em suas epístolas não cansasse de suplicar sua transferência para a capital da Província em busca de cura e do carinho da família, da qual sofria a ausência.

Imprescindível para a obra, o sargento-mor Engenheiro vivia em Macapá, Brasil, como se cumprisse a pena de degredo, vi-gente à época para criminosos. E em Maca-pá encontrou o palco de sua agonia, na a-cepção total do termo, que é também um conjunto de fenômenos mórbidos que apa-recem na fase final de doenças agudas ou crônicas e que anunciam a morte.

4 Cód.200. Doc. 62

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A permanência da Fortaleza de São José de Macapá tem uma memória a ser restau-rada, não só pelas constantes transforma-ções que sofreu no decorrer de mais de dois séculos, mas porque suas mudanças, seus esquecimentos e suas rupturas fazem parte de um horizonte ideológico que lhe permi-tiu olhares diferenciados, que não foram contados nem pela historiografia oficial nem por uma literatura que resgatasse tal memória e acendesse os esquecimentos, ou que até mesmo abrisse mais os ouvidos pa-ra escutar a linguagem escrita nos docu-mentos dos homens que a construíram, que cimentaram nela pedras em cima de pe-dras.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dono de grandes conhecimentos, Gallu-

cio foi viajante na Amazônia, e é o vidente de um visível uniforme, quase homogêneo e cansativo ao olhar de um estrangeiro. Ele trouxe em suas cartas a essência de uma personagem que atuou diretamente no es-paço de um conflito (entre ele e aqueles que não gostavam de suas atitudes); de-sempenhou um grande número de ações para o êxito da construção, objetivo de sua missão como engenheiro e militar. Como diretor da obra, interviu diretamente na vida dos seus subordinados, obedecendo integralmente as ordens superiores dada a hierarquia militar. Sujeitou-se a ordens sem nada contestar, exaltando as qualidades de seus superiores e morreu como heroi real de um romance não escrito.

Parafraseando Norbert Elias (1995), falar de Gallucio como ser humano único e arqui-teto construtor único da Fortaleza de São José de Macapá, dependente das decisões

superiores, porque era militar (e estrangei-ro)

É difícil elucidar os problemas que os in-divíduos encontram em suas vidas, não importa quão incomparáveis sejam a per-sonalidade ou realizações individuais [...] E preciso ser capaz de traçar um quadro claro das pressões sociais que agem sobre o indivíduo. Tal estudo não é uma narra-tiva histórica, mas a elaboração de um modelo teórico da configuração que uma pessoa [...] formava, em sua interdepen-dência com outras figuras sociais da épo-ca. (ELIAS, 1995, p. 19)

As constantes litanias expressas nas car-

tas de Gallucio dão a ideia da total depen-dência às instâncias mais elevadas de po-der, que ali, naquele período, se concentra-va na capital da Província, cujos governan-tes não estavam muito interessados em tirá-lo de Macapá.

A doença crônica e agônica – malária – provocou no construtor o estacionamento no conformismo. Estivera, aos 41 anos de idade, pronto para morrer longe da família, crente que seus insufríveis martírios só aca-bariam com o seu próprio fim.

Gallucio foi aniquilado pela doença. An-tes, porém, sofreu o revés da vindita e as perseguições advindas de uma estrutura social de poder que o colocou não mais co-mo aquele que chegou para se estabelecer no local, cumprir sua tarefa militar e partir para novas missões profissionais, mas como um outsider reduzido pela competição permanente com o comandante Athayde Varona, da Praça de Macapá, e com os en-genheiros ajudantes que não lhes eram simpáticos. Sua relação com o poder, cons-truída por meio do seu currículo profissio-nal, da correspondência com o poder e

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também pelo respeito à sua patente militar, aparentemente lhe dava a condição de es-tabelecido, no entanto era tratado como outsider, que nesse caso individual “tem um certo significado paradigmático” (ELIAS, 1995, p. 38), pois sofria com as humilhações e reações hostis na disputa do poder hie-rarquizado, com o comandante, que inter-feria tecnicamente na construção da obra dando ordens aos trabalhadores sem o seu conhecimento .

Gallucio era um homem multifacetado pelas suas inquietações, como vimos acima. Era um estrangeiro experiente na sua pro-fissão, e, por isso, em parte desprezado pe-los seus pares. Talvez maníaco-depressivo e paranoico (foi posteriormente acusado de demente por ter escondido até à morte as plantas da construção), mas era orgulhoso de sua arte como engenheiro e tinha um dom especial, a genialidade, que se consti-tuiu num dos elementos determinantes do seu destino social, pois sua arte (a arquite-tura) estava plenamente conectada à sua existência social (ELIAS, 1995).

O processo de construção da Fortaleza de Macapá teve em Gallucio o seu principal ator social, e trouxemos no conceito de Eli-as uma sequência definida e ordenada na história da colonização amazônica, como “processo estruturado que vai numa certa direção e está intimamente ligado ao pro-cesso social geral” (ELIAS, 1995, p. 46). Gal-lucio viveu entre ser o que foi – um outsider – nas terras do Novo Mundo, lutando con-tra o poder do establishment e sofrendo do niilismo causado pelas condições ambien-tais, sociais e pela doença. Viveu confiante do seu legado, ainda que estivesse em es-tado permanente de desespero e como um degredado, impedido de ir em busca de cu-ra. Sua obra ficou para as gerações futuras

admirarem e sua vida é produto de ações dramáticas da sociedade do seu tempo. A Fortaleza de São José de Macapá é uma es-pécie de réquiem inacabado, composto por Gallucio até o último dia de sua morte.

REFERÊNCIAS BARBOSA, C. S. Personagens ilustres do Amapá. Macapá: Edição do Autor, 1997. BHABHA. H. K. O local da cultura. Belo Hori-zonte: UFMG, 2007. CAMILO, J. Homens e pedras no desenho das fronteiras – a construção da Fortaleza de São José de Macapá (1764/1782). Brasí-lia: Edições do Senado Federal, 2009. CASTRO, A. H. F. de. O fecho do império: história das fortificações do Cabo Norte ao Amapá de hoje. In: GOMES, F. (Org.). Nas terras do Cabo Norte: fronteiras, coloniza-ção e escravidão na Guiana Brasileira – sé-culos XVIII e XIX. Belém, Edufpa, 1999. ELIAS, N. Mozart, a sociologia de um gênio. Rio de Janeiro: Zahar, 1995. FONTANA, R. As obras dos engenheiros militares Galluzzi e Sambucetti e do arqui-teto Landi no Brasil colonial do séc. XVIII. Brasília: Edições do Senado Federal, v. 46, 2009. MARQUES, L. (Coord.). O Tempo do Renas-cimento 1 - 1260-1400 – Roma como Ideal. São Paulo: Duetto Editorial, 2009. SANTOS, B. de S. A gramática do tempo - para uma nova cultura política. São Paulo: Cortez, 2009. WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. Iden-tidade e diferença – A perspectiva dos es-tudos culturais. 8. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

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CÓDICES DO ARQUIVO PÚBLICO DO ESTA-DO DO PARÁ Cód. 132. Doc. 90 Cód. 150. Doc. 114 Cód. 200. Doc. 62

License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, pro-vided the original work is properly cited.

Artigo recebido em 04 de dezembro de 2015. Avaliado em 26 de janeiro de 2016. Aceito em 28 de janeiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): CANTO, Fernando Pimentel. Henrique Gal-lucio: trajetória, agonia e morte do gênio construtor da Fortaleza de São José de Ma-capá. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 29-37, jul./dez. 2015.

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Artigo de revisão de literatura

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Pensamento freireano: bases para uma educação revolucionária

Ana Claudia Reis da Silva 1, Eliana Alves dos Santos 2 e Izabel Lucia dos Santos Oliveira 3

1 Pós-graduada em Gestão e Docência do Ensino Superior pela Faculdade de Teologia e Ciências Humanas/FATECH/AP e Licencia-da em Pedagogia pela Universidade Vale do Acaraú, Brasil. E-mail: [email protected]

2 Pós-graduada em Gestão e Docência do Ensino Superior pela Faculdade de Teologia e Ciências Humanas/FATECH/AP e Licencia-da em Pedagogia pela Universidade Vale do Acaraú, Brasil. E-mail: [email protected]

3 Mestre em Ciência da Educação/UE/Évora, Especialista em Metodologia da Educação Especial/UEPA, graduada em Pedagogi-a/UFPA. Professora de Didática da Secretaria Estadual de Educação/SEED/AP e da Secretaria Municipal de Educação/SEMED/AP. Professora do Colegiado de Pós-Graduação da Faculdade de Teologia e Ciências Humanas/FATECH/AP, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO: Este artigo objetiva refletir sobre os conceitos que sustentam o pensamento de Freire e servem de base para construção de uma proposta de educação de caráter revolucionária. Para realizar-se este estudo optou-se pela pesquisa bibliográfica, mediante um levantamento sistematizado em obras de Freire (1983, 1996, 2011), Schwartz (2013), Moura (2002) e Tardif (2002). Destaca-se que os pensamentos de Freire inspiraram as prin-cipais propostas de alfabetização na década de 60, por conceber o proces-so de formação humana de forma contextualizada socialmente, cultural-mente e historicamente, sendo norteado pela realidade do aluno. Sendo uma educação libertadora, conscientizadora, dialógica, democrática, autô-noma e revolucionária, que possibilite a transformação social e a emanci-pação cultural, se distanciando da educação Bancária. Assim, o estudo re-velou que o pensamento freireano atende aos anseios de uma educação revolucionária comprometida com a mudança social, autonomia do indivi-duo, com a consciência reflexiva das diversas problemáticas sociais vigen-tes. Ressaltando que, o princípio para uma educação revolucionária esta na conduta ética dos atores que compõem o ensino-aprendizagem. Palavras-chave: Pensamento freireano. Revolução educacional. Transformação social. Thought freirean: bases for education revolutionary ABSTRACT: This article aims to reflect on the concepts that underpin the thought of Freire and serve as a basis for construction of a revolutionary character education proposal. To carry out this study we opted for biblio-graphical research, through a systematic survey in works of Freire (1983, 1996, 2011), Schwartz (2013), Moura (2002) and Tardif (2002). Highlights that the thoughts of Freire inspired the main proposals in the literacy of 60, by conceiving the human formation process of contextualized manner so-cial, cultural and historically, being guided by the reality of the student. Be-ing a liberating education, conscientizing, dialogical, democratic, autono-mous and revolutionary, enabling social transformation and cultural eman-cipation, moving away from education. Thus, the study revealed that the

40 Silva, Santos e Oliveira

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freirean thinking meets the yearnings of a revolutionary education commit-ted to social change, autonomy of the individual, with the reflective awareness of the various existing social problems. Noting that the principle to a revolutionary education is in the ethical conduct of actors that com-pose the teaching-learning process. Keywords: Thought Freirean. Educational Revolution. Social Transformati-on

1 INTRODUÇÃO

Este artigo analisa os aspectos relaciona-

dos ao pensamento do educador brasileiro Paulo Freire, especificamente no período de 1960, que corroborou com a construção de uma nova concepção de educação que sub-sidiou a educação brasileira contemporânea e repercutiu mundialmente. Assim, os pen-samentos de Freire inspiraram as principais propostas de alfabetização na década de 1960 no Brasil, onde a educação é a junção de vários conhecimentos, seja no âmbito cultural, político ou religioso, e que acabam por si indicando a instituição de uma forma contemporânea de ensino, norteada pela realidade do aluno, formando assim uma educação democrática, distanciando-se da concepção tradicional de educação.

Salienta-se que o eixo central do pensa-mento freireano pauta-se na ideia de uma educação transformadora como prática da liberdade, como diretriz para uma educação diferenciada e voltada para a autonomia, diálogo e conscientização do sujeito. Enten-dendo a construção do conhecimento a partir da leitura contextualizada do mundo, que possibilita construir uma identidade concreta e firme mediante a problematiza-ção, conscientização e intervenção da reali-dade social vigente, e, assim, ressignifican-do o conceito de educação e mostrando ser uma educação revolucionária, capaz de mi-nimizar as diversas problemáticas sociais.

Ressalta-se que este artigo aborda e re-flete sobre os conceitos fundamentais de Freire que subsidiam a base para uma edu-cação revolucionária no contexto brasileiro a partir das obras do próprio Paulo Freire. Com o intuito de realizar um estudo com o rigor científico da abordagem qualitativa, realizou-se pesquisa bibliográfica por esta permitir abarcar um conjunto de informa-ções do fenômeno estudado mediante le-vantamento sistematizado em obras de au-tores como Schwartz (2013), Pimenta (2012), Moura (2002), Tardif (2002) e ou-tros, tendo em vista um firme referencial teórico para subsidiar a produção textual (GIL, 2002).

Destaca-se que Paulo Freire é considera-do um dos maiores educadores do século XX, e vem marcando o pensamento educa-cional deste século, situando-se entre os pedagogos humanistas e críticos. Ele con-tribui decisivamente com “a teoria dialética do conhecimento, para a qual a melhor maneira de refletir é pensar a prática e re-tornar a ela para transformá-la” (GADOTTI, 1994, p. 254), porém situando-a num con-texto histórico – social - político e econômi-co.

Nesta perspectiva, o que se vislumbra, neste artigo, é analisar a construção das bases de uma educação revolucionária, pa-ra direcionar um modelo educacional com vista a transformação social, a partir das situações de conscientização, diálogo e li-

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bertação da pedagogia da autonomia, com-posto por competências que formularão uma identidade e saberes necessários à prática social docente e discente, firmada pelos direitos humanos e ética social.

2 A EDUCAÇÃO NA DÉCADA DE 1960 E O PENSAMENTO EDUCACIONAL FREIREANO

É mister salientar que a década de 60 foi

um período da história do Brasil marcado por profundas transformações sociais, eco-nômicas e em particular políticas, desta-cando-se a posse do Presidente Jânio Qua-dros e de seu vice João Goulart, em 31 de janeiro de 1961, sendo o povo brasileiro surpreendido em 25 de agosto do mesmo ano com o pedido de renúncia do presiden-te, sendo substituído por seu vice (ROMA-NELLI, 2007). Esse fato inesperado causou grandes conflitos entre as forças sociais po-líticas e econômicas, tendo por consequên-cia sua polarização, além de considerar-se como uma proposta de resolução parcial da problemática, por meio da adoção de um sistema parlamentarista de governo (ROMANELLI, 2007).

Assim, criou-se nesse período o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), o qual tinha como tarefa a elaboração de pla-nos viáveis ao desenvolvimento do país, por meio de uma ideologia nacional – desenvol-vimentista para “as camadas populares [que] deveriam ser conquistadas para o de-senvolvimento, conscientizando-as dos be-nefícios trazidos por este” (JAGUARIBE apud

XAVIER; RIBEIRO; NORONHA, 1994, p. 214) mediante a utilização “de propaganda ideo-lógica que mostrasse a dependência entre o processo de desenvolvimento econômico e a elevação do nível de vida” (JAGUARIBE

apud XAVIER; RIBEIRO; NORONHA, 1994, p. 214).

Percebe-se a crescente manipulação do povo em prol dos interesses do Estado, vi-sando uma hegemonia sobre o capital hu-mano que agora busca na educação uma forma de melhoria das condições de vida. Com o Golpe Militar de 1964, o ISEB foi ex-tinto. Nesse contexto, a educação seria pri-orizada como ponto-chave no projeto de desenvolvimento nacional, sendo voltada ao trabalho na indústria, instigando a parti-cipação do povo na contribuição para o progresso nacional (XAVIER; RIBEIRO; NO-RONHA, 1994).

Todavia, Romanelli (2007) afirma que a brusca mudança econômica deparou-se com uma legião de despreparados para o manuseio de equipamentos industriais, vin-dos em sua grande maioria do meio rural, o que levou a educação escolarizada a ade-quar-se às novas exigências da moderniza-ção econômica, suprindo contingencialmen-te de recursos humanos a industrialização vigente.

Surgem, então, os profissionais da edu-cação, que passaram a participar dos mo-vimentos como: Movimento de Cultura Po-pular (MCP); De Pé no Chão Também se Aprende a Ler; Movimento de Educação de Base (MEB) e o Centro Popular de Cultura da UNE, os quais são constituídos por seto-res progressistas da igreja Católica, intelec-tuais, estudantes e artistas. Nesse ínterim, os sindicatos rurais, as Ligas camponesas e os movimentos estudantis, passaram a rei-vindicar mudança e também a questionar o poder capitalista dominante (MOURA, 2002).

Moura (2002) salienta que a partir desse cenário, vários movimentos questionam as contradições do sistema de ensino implan-

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tado à população. E essas contestações põem o sistema educacional sob pressão, tendo de um lado a população carente, e exigente de um processo de democratiza-ção de ensino, e, de outro lado, a elite, que procurava de todas as formas o controle da massa e o status quo, limitando a distribui-ção de escolas e garantindo por meio lícitos a manutenção do nível elitista da educação.

É valido enfatizar que o nordeste brasilei-ro foi o principal núcleo das manifestações e protestos, caracterizados pelas Reformas de Base, que defendiam o nacionalismo, o patriotismo, a cultura brasileira e a valoriza-ção das políticas sociais, contrapondo-se aos interesses imperialistas (MOURA, 2002).

Destacou-se, nesse contexto, o educador e filósofo pernambucano Paulo Freire, o qual teve um importante papel na formula-ção de uma concepção de educação como prática da liberdade e conscientização soci-al, centralizando seu trabalho no campo da educação popular, voltado para educação e alfabetização de jovens e adultos. Assim, as ideias freireanas favoreceram a constituição do método de alfabetização dialético, utili-zando o diálogo, a conscientização e a in-tervenção social. Com isso, Freire influen-ciou positivamente na construção e imple-mentação da concepção pedagógica crítica da educação (MOURA, 2002).

O pensamento educacional freireano é revolucionário dentro do contexto político, econômico e social da década de 1960, ao qual se encontrava o Brasil, por Freire asse-gurar que “é pela educação que as consci-ências se tornam críticas da realidade. Ela deve ser pensada além da tutela do Estado, devendo estar sob a tutela do povo” (FREI-RE, 1983, p 38). Este pensar reflete saberes experienciados em contato com os mais pobres, o que lhe outorgou capacidade de

implantar e implementar respectivamente uma proposta de educação inovadora, re-fletindo em sua postura a dialogicidade, de forma histórica, objetiva, e de emancipa-ção cultural para o povo, se distanciando da educação bancária exercida na época.

Destaca-se que no Brasil, a Educação de Jovens e Adultos (EJA) ganhou inspiração nas ideias de Paulo Freire, por caracterizar o princípio do movimento de educação popu-lar, e por conceber o ensino como processo de formação humana, contextualizado soci-almente, culturalmente e historicamente (FREIRE, 1996). Sendo os educandos um dos principais atores do processo de ensino-aprendizagem e que tem consciência que o “mundo é algo em que o indivíduo está in-serido por circunstância, e que este indiví-duo precisa ter a capacidade de conhecê-lo e de dele participar conscientemente” (VASCONCELOS; BRITO, 2014, p. 62).

A tendência tradicional de educação é a mais privilegiada nas escolas brasileiras, e objetivava fazer com que o alfabetizando aprendesse a repetir palavras, sendo edu-cado para a servidão de um sistema exclu-dente, estabelecendo ao indivíduo sua im-portância de acordo com sua capacidade de ocupar essa ou aquela posição na divisão de trabalho (FREIRE, 1983).

Porém, Freire (2011, p. 38) ratifica que somente por meio de “uma pedagogia que elimina pela raiz as relações autoritárias, na qual não há escola nem professor, mas cír-culos de cultura e um coordenador cuja ta-refa essencial é o diálogo”, pode-se haver conscientização social mediante a realiza-ção de uma educação revolucionária, que levaria consequentemente à transformação do sistema social vigente.

Pondera-se que a concepção freireana reúne conhecimentos que propõem a cria-

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ção de um método inovador de alfabetiza-ção, o que atraiu a atenção de pedagogos, cientistas sociais, teólogos e militantes polí-ticos (quase sempre de esquerda), tornan-do-se uma forte influência para futuros pro-fessores na América Latina e na África, ele-vando Freire (1996) e suas concepções edu-cacionais e políticas, as quais eram voltadas ao benefício do esclarecimento do povo (MOURA, 2002), promovendo não somente a escolarização, mas também instigando a conscientização política do aluno e profes-sor. Ressalta-se que, o projeto de ensino empreendido por Freire, de início, associou-se à educação de jovens e adultos, porém, devido aos resultados positivos, poder-se-ia implementa-la aos demais níveis de ensino.

Nesse ínterim o Governo de João Goulart criou e instalou Conselho Federal de Educa-ção (CFE) em 12 de fevereiro de 1962, e aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE) em setembro do mesmo ano. O obje-tivo seria eliminar o analfabetismo por meio do atendimento às exigências do trabalho da Aliança para o Progresso, acordo assina-do pelo Presidente Goulart em Punta del Este (Uruguai) em 1961 (XAVIER; RIBEIRO; NORONHA, 1994).

É válido salientar a criação da Comissão Nacional de Alfabetização, em Brasília, com o propósito de elaborar o Plano Nacional de Alfabetização (PNA). Propôs-se ainda a Co-missão de Cultura Popular, com o objetivo de implantar o PNA, além da implantação e disseminação do método de alfabetização de Paulo Freire por todo o país, a fim de que seus benefícios escolares chegassem a milhares de pessoas (XAVIER; RIBEIRO; NO-RONHA, 1994).

Todas essas propostas foram substituídas quando o golpe Militar implantou-se no Brasil. Freire (1996) foi submetido às san-

ções impostas pelo Estado, e isto resultou consequentemente em seu exílio. O PNA e o sistema de ensino freireano são desfeitos e em seus lugares foram implantados a Cru-zada de Ação Básica Cristã (Cruzada ABC) com o intuito de neutralizar as Ligas Cam-ponesas e, posteriormente, nos anos de 1970, o Movimento Brasileiro de Alfabeti-zação (MOBRAL) como instrumento de con-trole político das massas (XAVIER; RIBEIRO; NORONHA, 1994).

Tais projetos educacionais implantados pelo Regime Militar destoavam da realidade da população brasileira, o que ocasionou defasagem e problemática escolar, contra-riando assim o almejado interesse do Esta-do em universalizar o ensino básico. Em contrapartida, ressalta-se que houve êxito em neutralizar as forças populares. De-monstrando dessa forma que o jogo de in-teresses políticos partidários está acima dos interesses civis (XAVIER; RIBEIRO; NORO-NHA, 1994).

Todavia, a história revela que a proposta educacional implantada pelo regime ditato-rial nesse período, conduziu a nação brasi-leira a sérios problemas sociais e a proble-máticas educacionais crescentes, que se ampliaram ainda mais ao longo do tempo. Certificando assim o erro cometido pelo Estado ao repudiar a implantação do siste-ma de ensino freireano. É valido comentar que, com as ideias freireanas, ocorreu a democratização da educação das classes populares e serviram para aproximar as ne-cessidades educativas dos alunos desesco-larizados e trabalhadores às realidades so-cioculturais e econômicas (FREIRE, 1983). Mas, por outro lado, configurou-se como um processo de aceleração de estudos dos alunos com baixo desempenho na escola regular.

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É possível afirmar que a educação brasi-leira sofre modificações em seus objetivos e metas de acordo com o contexto histórico, político, econômico e social vigente, e que cada “sujeito competentemente alfabetiza-do está habilitado a produzir, ler e compre-ender diferentes tipos de ensino” (SCHARTZ, 2013, p. 27), já que a educação é um processo dinâmico e inacabado.

3 FREIRE E UMA EDUCAÇÃO COMO PRÁTI-CA DA LIBERDADE

Destaca-se que o educador pernambu-

cano Paulo Freire teve um grandioso papel ao elaborar uma concepção de educação pautada nos princípios da prática da liber-dade. Por isso seu pensamento educacional é considerado revolucionário dentro do contexto político-econômico ao qual se en-contrava o Brasil, nos anos de 1960 do perí-odo da Ditadura Militar.

Um dos fundamentos principais do pen-samento freireano pauta-se na afirmação que “é pela educação que as consciências se tornam críticas da realidade. Ela deve ser pensada além da tutela do Estado, devendo estar sob a tutela do povo” (FREIRE, 1983, p 38). Assim, esta forma de pensar a educa-ção reflete os saberes vivenciados por Frei-re em contato com as classes mais pobres da sociedade, e este cabedal de experiência lhe propiciou a habilidade de implantar e implementar uma proposta de educação inovadora, pautada na dialogicidade, de forma histórica, objetiva, e de emancipa-ção cultural para o povo.

Assim, em sua obra Educação como Prá-tica da Liberdade, Freire (2011) apresenta os pressupostos básicos de sua teoria, con-siderando enfaticamente o processo dialéti-co tendo a “compreensão ética – crítico -

político da educação” (FREIRE, 1996, p. 21) e a conscientização pelo diálogo, na busca de uma sociedade mais justa, democrática e igualitária. Na pedagogia dialética, segundo Pimenta (2012, p. 88), “o homem é um ser que se constitui como síntese de múltiplas determinações, como um conjunto de rela-ções sociais” relacionadas entre si. Partindo desse pressuposto, entende-se o homem como ser histórico, atuante nas relações no e com o mundo, não determinado, não de-finido e acabado, e sim, em constante di-namicidade e construção a partir do conta-to direto com o mundo social, histórico-cultural, político e ético.

Em Pedagogia do Oprimido, Freire (1983) explana sobre o uso consciente da palavra como método potencializador de seu pró-prio conhecimento, a se reconhecer como autor de sua própria história e não a deixar-se subjugar por ideologias impostas. O Mé-todo Paulo Freire de Ensino compõem-se de uma série de palavras geradoras, escolhidas por meio do levantamento do universo vo-cabular da população a ser alfabetizada. O método inicia-se por encontros informais com os alunos do grupo de alfabetização, a fim de arrecadar maior número de informa-ções a serem inseridas nos vocábulos sobre a vida e linguagem cotidiana do grupo, a fim de garantir palavras conhecidas para me-lhor fundamentar o ensino (MOURA, 2002).

Desta forma, a proposta da teoria educa-cional de Freire pauta-se na realidade do educando do qual são extraídos os temas geradores, escolhidos por meio do levan-tamento do universo vocabular, para pro-blematização da vida dos educandos e para definição dos conteúdos de ensino, median-te a uma metodologia dialógica. Para Freire, os educandos envolvidos na ação pedagógi-ca possuem, em si próprios, os conteúdos

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necessários, que irão gerar uma nova figu-ração de interação com a experiência vivida (MOURA, 2002).

Entende-se que tal preocupação possibi-lita um melhor entendimento pelo educan-do, já que as palavras geradoras refletem “situações, objetos, emoções, familiariza-dos por estes, que dão concretude ao a-prendizado, tendo sempre o apoio do coor-denador-mediador” (SCHWARTZ, 2013, p. 43). Além de encaminhar perspectivas para análise de “problemas nacionais e regionais, que podem apenas referir-se a um contexto único da vida do individuo ou do coletivo” (SCHWARTZ, 2013, p. 42). Sendo os educa-dores conscientizados e preparados para conduzir a reflexão e o pensar do educan-do, a construir seu universo literário com propriedade. Assim, qualquer transmissão de conteúdos que esteja fora do contexto social do educando é entendido “como uma invasão cultural ou depósito de informa-ções porque não emerge do saber popular” (SCHWARTZ, 2013, p. 45).

Freire (1983) enfatiza que, para que o processo educacional ocorra eficazmente, deve ser primeiramente de forma conscien-tizadora a fim de não se tornar mecanizada e memorizada, assumindo os princípios da educação bancária, em que o saber do pro-fessor é depositado educando, sendo uma prática domesticadora; mas sim uma edu-cação integral politizada, sendo uma ação educativa de recriação, de (re) significação de significados, tendo como “fio condutor a alfabetização visando à libertação” (SCHWARTZ, 2013, p. 44), que ocorre no campo cognitivo, e principalmente no cam-po social e político, sendo caracterizada como um ato educativo politizado, pois não existe educação neutra.

Ressalta-se que o caráter da politicidade do ato educativo é um dos fundamentais princípios do método de Freire, seguido do princípio da dialogicidade do ato educativo, pois a relação pedagógica necessita ser, acima de tudo, uma relação dialógica. Se-gundo Paulo Freire (1983), o alargamento da visão de mundo do educando só é possí-vel mediatizada pelo diálogo, já que a “ati-tude dialógica é, antes de tudo, uma atitude de amor, humildade e fé, é acreditar no po-der de fazer e de refazer, de criar e de re-criar” (FREIRE, 1983, p. 32), de forma cons-ciente e politizada para poder intervir na sociedade e construir um futuro melhor.

Outro princípio essencial e inovador no Método Paulo Freire diz respeito à indisso-ciação da aprendizagem no momento da leitura e da escrita do processo de politiza-ção (FREIRE, 1983), já que neste momento o educando é desafiado “a refletir sobre seu papel na sociedade enquanto aprende a escrever a palavra sociedade; é desafiado a repensar a sua história enquanto aprende a decodificar o valor sonoro de cada sílaba que compõe a palavra história” (FREIRE, 1983, p. 32). Neste processo o educando aprende a ler as letras e consequentemente o mundo que o cerca. É o momento de re-flexão no qual o educando busca superar a consciência ingênua e construir sua consci-ência crítica frente à realidade social con-textualizada, para mudar sua própria histó-ria de vida.

4 PEDAGOGIA DA AUTONOMIA: IDENTI-DADE E SABERES NECESSÁRIOS A PRÁTICA DOCENTE

É válido salientar que Paulo Freire (1996)

considerava-se um homem do povo, conhe-cedor das necessidades, anseios e realidade

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da população carente e oprimida. Assim, Freire acreditava que somente pela educa-ção e principalmente pela figura do profes-sor, poder-se-ia causar mudanças positivas na vida social e pessoal de milhares de pes-soas que compõem a classe oprimida (FREIRE, 1983).

Na obra Pedagogia da Autonomia, Freire (1996) expõe os ensinamentos que propici-am ao educador estimular o aprender de forma consciente, crítica e virtuosa, tendo nos princípios da autonomia a fundamenta-ção necessária para a prática docente, no que concerne ao ensinar e aprender da es-sência desta profissão que é humanizadora e ética (FREIRE, 1996).

Dessa forma, a prática docente deve ser uma ação reflexiva e autônoma buscando a qualidade do de ensino e aprendizagem do aluno. Essa prática deve ser fundamentada nos vários saberes essenciais à docência para aplicabilidade com responsabilidade ética, já que “a prática educativa tem de ser, em si, um testemunho rigoroso de de-cência e de pureza” (FREIRE, 1996, p. 33).

Assim, ao discutir a prática docente em conformidade com princípios éticos, o saber científico e da profissão, as competências e habilidades, a diversidade, a humildade, deve-se considerar que o grande problema que o educador de opção democrática tem “é como trabalhar no sentido de fazer pos-sível que a necessidade do limite seja assu-mida eticamente pela liberdade. Quanto mais criticamente a liberdade assuma o li-mite necessário tanto mais autoridade tem ela” (FREIRE, 1996 , p. 10). Sendo prática docente, o princípio freireano serve de base para uma ação educativa democrática e transformadora, impulsionada pelo desejo de justiça, contra a deslealdade, a explora-ção e a violência. O que caracteriza uma

ação educativa crítica que “implica no pen-sar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer” (FREIRE, 1996, p. 38), que torna o docente sujeito da produção de saberes em um processo de ensino e aprendizagem mú-tuo entre professor e aluno, já que “não há docência sem discência” (FREIRE, 1996, p. 22), considerando que “ensinar não é trans-ferir conhecimento e ensinar é uma especi-ficidade humana” (FREIRE, 1996, p. 22).

Sob esse prisma, o docente assume o pa-pel de mediador neste processo e busca superar a dicotomia entre o que é ensinado na academia e o que realmente será viven-ciado na prática escolar. Esse diferencial, na postura docente concebida por Freire, bus-ca conscientemente assumir suas respon-sabilidades e o uso do diálogo, da comuni-cação, que se faz tão somente no interesse da ajuda, tanto de si próprio quanto do ou-tro, em constante desafio as contradições de nosso sistema de ensino (FREIRE, 1996).

Considerando tal realidade e mensuran-do que a profissão docente pautada na di-mensão crítica é acompanhada das mudan-ças sociais e suas implicações, e requer uma intervenção no mundo, desmascarando a ideologia dominante subjacente aos conte-údos ensinados, com a certeza de que “nos tornamos seres capazes de observar, de comparar, de avaliar, de escolher, de deci-dir, de inventar, de romper, de optar, nos fizemos seres éticos e se abriu para nós a probabilidade de transgredir a ética, jamais poderia aceitar a transgressão como um direito mais como uma possibilidade” (FREIRE, 1996 , p. 100).

Trata-se de compreender que a ação e-ducativa engloba não só o contexto curricu-lar das disciplinas conteudistas, mas um entendimento da problemática social de

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forma crítica, atuante, a fim de que sua formação docente não fique estagnada em saberes fixos, desqualificando seu trabalho e sua identidade como profissional.

Neste contexto, destaca-se as considera-ções de Tardif (2002) no que se refere aos saberes os quais chama de saberes docen-tes, classificando-os em saberes da forma-ção profissional, saberes pedagógicos, sabe-res disciplinares, saberes curriculares e sa-beres experienciais. É necessário enfatizar que esses saberes encontram-se interagin-do uns com os outros em uma verdadeira sintonia que constituem os saberes da do-cência. Pensa-se então, que os saberes es-tão presentes na prática docente, os quais são manipulados por meio das disciplinas curriculares e que são transmitidos median-te a formação do professor, garantido uma prática pedagógica com sucesso em sala de aula (TARDIF, 2002).

É valido considerar que os saberes am-plamente discutidos e ressignificados na prática pedagógica dão ênfase ao conheci-mento e ao aprendizado do professor que se efetiva em sala de aula a partir da reali-dade escolar, colaborando para a ação e a reflexão docente e oportunizando uma a-prendizagem significativa e crítica ao edu-cando, resultante de uma pedagogia da au-tonomia, de uma educação revolucionária.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando as informações obtidas por

meio da pesquisa bibliográfica em obras de Freire (1983, 1996, 2011), e dos autores Sch-wartz (2013), Moura (2002) e Tardif (2002) que seguem as ideias freireanas, que inspi-raram as propostas educacionais contem-porâneas subsidiadas na formação contex-tualizada socialmente, culturalmente e his-

toricamente, tendo como eixo norteador a realidade do aluno.

Nesta perspectiva, o pensamento educa-cional de Freire oferece subsídios para efe-tivação de uma proposta educacional de caráter revolucionário partindo da contex-tualização dos aspectos políticos, econômi-cos e sociais, assegurando a tomada de conscientização, dialógica, libertadora, de-mocrática, autônoma e crítica da realidade, que possibilite a transformação social e a emancipação cultural, se distanciando da educação bancária. É como afirma Freire (1983) na sua obra Pedagogia do Oprimido, a educação com vista a revolução social e cultural deve ser idealizada além da tutela do Estado, devendo estar sob o comando unicamente do povo e para o povo.

Assim, o pensamento freireano atende os anseios de uma educação revolucionária comprometida com a mudança social, au-tonomia do indivíduo, com a consciência reflexiva das diversas problemáticas sociais vigentes. Ressalta-se que o princípio para uma educação revolucionária está na con-duta ética dos atores que compõem o ensi-no-aprendizagem. Fica seu legado como semente para um pensar em educação mais humanizado, cujo foco é o sujeito, princípio transformador de toda conjuntura social. REFERÊNCIAS FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: sabe-res necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura). ______. Pedagogia do oprimido. 13. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. ______. Educação como prática da liberda-de. 14. ed. ver. atual. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

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GADOTTI, M. História das ideias pedagógi-cas. 2. ed. São Paulo: Ática, 1994. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pes-quisa. São Paulo: Atlas, 2002. MOURA, M. da G. C. Educação de jovens e adultos: um olhar sobre sua trajetória his-tórica. São Paulo: Educarte, 2002. PIMENTA, S. G. Saberes pedagógicos e ati-vidade docente (org.). 8. ed. São Paulo: Cortez, 2012. ROMANELLI, O. de O. História da educação no Brasil: (1930/1973). 31. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. SCHWARTZ, S. Alfabetização de jovens e adultos: teoria e prática. 3. ed. Petrópolis-Sp: Vozes, 2013. TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2002. VASCONCELOS, C. S. Construção do conhe-cimento em sala de aula. 16. ed. São Paulo: Libertad, 2005. VASCONCELOS, M. L. M. C.; BRITO, R. H. P. de. Conceitos de educação em Paulo Frei-re/Glossário. 6. ed. Petropólis-RJ, 2014. XAVIER, M. E. S. P.; RIBEIRO, M. L. S.; NO-RONHA, M. O. História da educação: a es-cola no Brasil. São Paulo: 1994. (Coleção Aprender & ensinar).

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Artigo recebido em 03 de março de 2015. Avaliado em 30 de novembro de 2015. Aceito em 22 de janeiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): SILVA, Ana Claudia Reis da; SANTOS, Eliana Alves dos; OLIVEIRA, Izabel Lucia dos San-tos. Pensamento freireano: bases para uma educação revolucionária. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 39-48, jul./dez. 2015.

Artigo de revisão de literatura

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Projeto de arquitetura - proteção contra incêndio em elementos estruturais de aço

Cleide Cedeni Andrade 1 e João Carlos Souza 2

1 Mestre em Arquitetura e Urbanismo - Pós-Arq – UFSC, Arquiteto e Urbanista, Engenheiro de Segurança. Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina - IFSC, Brasil. E-mail: [email protected]

2 Doutor, Professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo – UFSC, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO: O desenvolvimento da humanidade, desde os mais remotos tempos, foi e continua sendo submetido a constantes desafios, testando sua capacidade de sobrevivência. Acontecimentos desastrosos causados por incêndios ao longo da história propiciaram a criação de mecanismos le-gais, impulsionados pela necessidade de construir ambientes seguros. Mostrou-se, a importância do arquiteto, profissional responsável pelo pro-jeto de arquitetura e pelo gerenciamento dos projetos complementares, conheça os sistemas de revestimento contra incêndio a fim de evitar inter-venções inadequadas, que não seja conveniente com o projeto idealizado. O objetivo deste trabalho é analisar os processos e materiais para revesti-mento contra incêndio em edificações com estruturas metálicas de aço e o seu grau de influência no projeto de arquitetura. A partir da pesquisa veri-ficou-se que os diversos processos construtivos interagem com a arquitetu-ra, dependendo da opção dos materiais e dos processos de execução. Veri-ficou-se que os diversos sistemas de proteção contra incêndio incorpora-dos à edificação por meio de revestimentos, interagem com projeto de ar-quitetura, e que por solicitação normativa, deve ser prevista a proteção dos elementos estruturais, a fim de evitar a instabilidade estrutural. Con-cluiu-se, que os diversos processos construtivos de revestimentos de pro-teções contra incêndio, não for repassado em sua vivência acadêmica, ha-verá dificuldades de se elaborar um projeto de edificações segura e mini-mizar as intervenções no projeto de arquitetura. Palavras-chave: Incêndio, Proteção contra incêndio, Arquitetura. Architectural design - fire protection of structural steel elements ABSTRACT: The development of mankind, since ancient times, was and remains subjected to constant challenges, testing their capability to sur-vive. Disastrous events caused by fire throughout history led to the crea-tion of legal mechanisms, driven by the need to build secure environments. It has been shown the importance for the architect, professional responsi-ble for the architectural design and the management of complementary projects, to learn about fire coating systems in order to prevent inappro-priate interventions, which is inconvenient for the idealized design. The ob-jective of this study is to analyze the processes and materials for fire coat-ing in buildings with metal structures of steel and their degree of influence

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on architectural design. The research found that the various construction processes interact with the architecture, depending on the choice of mate-rials and execution processes. It was found that the various fire protection systems incorporated into the building through coatings interact with ar-chitectural design, and that by a legal request, must foresee the protection of structural elements in order to avoid structural instability. It was con-cluded that if the different construction processes involving the use of coating protections against fire is not worked in their academic experience, there will be difficulties to create a safe building design and minimize the interventions in architectural design. Keywords: Fire, Fire protection, Architectural Project

1 INTRODUÇÃO

A prevenção contra incêndio em edifica-

ções evoluiu a partir de acontecimentos desastrosos causados por incêndios ao lon-go da história. A avaliação destes desastres levou a criação de mecanismos legais, im-pulsionados pela necessidade de construir ambientes seguros.

Segundo Ono (2007), a importância do conhecimento mais amplo de uma edifica-ção segura contra incêndio pode resultar em alternativa viável, que traduza os con-ceitos mínimos necessários em uma obra funcional, estética e segura, sem que a cria-tividade possa ser afetada e comprometida.

A grande dificuldade da elaboração de um projeto de edificação que contemple exigências da segurança contra incêndio está na formação acadêmica dos profissio-nais. Segundo Seito et al. (2008), os currícu-los dos cursos de arquitetura e engenharia têm um conteúdo extenso e apertado, não possibilitando transmitir outros conheci-mentos. Assim, é necessária uma profunda reformulação para que o conteúdo de segu-rança contra incêndio (SCI) seja absorvido.

A presente pesquisa tem como foco prin-cipal o revestimento contra incêndio em elementos estruturais em aço (vigas, lajes e pilares) sujeitos às altas temperaturas em

situação de incêndio e a sua interação com o projeto de edificação, sendo que as pro-teções contra o fogo dos elementos cons-trutivos em concreto e madeira, assim co-mo, o risco de incêndio não foram tratadas no presente artigo.

A análise financeira detalhada dos custos de aplicações e manutenções das proteções contra o fogo também não foi objeto desta pesquisa, e sim informações pertinentes, associadas aos tipos de opções de menores custos.

2 SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO NO ENSINO DE ARQUITETURA E URBANISMO 2.1 Educação e a Segurança Contra Incêndio

Em países desenvolvidos, a preocupação

na SCI já vem sendo observada desde muito tempo. No Brasil, somente, após os aconte-cimentos desastrosos, principalmente, com os incêndios nos edifícios Andraus, em 1972, e Joelma, em 1974, a comunidade acadêmica foi alertada para essa necessida-de, obrigando o desenvolvimento de pes-quisas, criando uma nova mentalidade de se pensar e agir na prevenção e combate contra incêndio.

Rosso (1975 apud ONO, 2007), após o si-nistro do Edifício Joelma, comenta:

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Torna-se iminente a necessidade de fusão en-tre medidas normativas e o processo de con-cepção do projeto de edificações, de maneira a potencializar o fator de segurança nas edifi-cações no que tange à proteção estrutural e de bens, assim como na salvaguarda de vidas, aliados aos aspectos de habitabilidade (ROSSO, 1975 apud ONO, 2007).

De acordo com Ono (2007), o trabalho de

Rosso resultou numa apostila intitulada “In-cêndio e Arquitetura”, que serviu de base para a formação de duas gerações de pes-quisadores na área de segurança contra incêndio. A mesma autora defende a ideia de que as regulamentações existem para garantir que o nível mínimo de segurança seja exigido e atendido. Por outro lado, sem a compreensão conceitual das exigências, o arquiteto também não possui ferramentas para propor soluções alternativas de proje-to que resultem numa edificação igualmen-te, ou até mais segura e estética/funcional-mente satisfatória, tolhendo, assim, a liber-dade criativa. Conclui que é importante lembrar que não há, no Brasil, informações técnicas voltadas ao tema e dirigidas aos arquitetos e estudantes de arquitetura, cri-ando, assim, uma lacuna a preencher, tanto com a sistematização das informações dis-poníveis no Brasil e no exterior, como com a discussão de sua adequabilidade e impor-tância.

Nesse cenário, verifica-se que a forma-ção de arquitetos e de engenheiros tem dado pouca ênfase para a SCI nas edifica-ções; isso tem levado às práticas com baixa exigência em relação ao controle do risco de incêndio.

Seito et al. (2008) comentam:

Caso se decidisse implantar cursos de SCI em todos os cursos de arquitetura e engenharia,

seria um desastre, pois não existem quadros de professores suficientes para ministrar tais cursos. Existem apenas alguns professores o-rientando alunos de pós-graduação nessa á-rea de conhecimento (SEITO et al. 2008, p. 10).

Normalmente, o arquiteto tem obrigação

de definir as medidas de proteção passiva 1 e também deve ter noções básicas dos prin-cípios da proteção ativa 2, pois, somente assim, pode garantir que os sistemas não sejam instalados de forma inadequada, pre-judicando o projeto de edificações como um todo.

2.2 Formação do arquiteto e o projeto em estrutura metálica

Percebe-se que há grandes dificuldades

de se projetar uma edificação que contem-ple os requisitos de segurança contra in-cêndio em estruturas de concreto armado, usualmente conhecida no meio acadêmico, nos cursos de arquitetura. Nas estruturas metálicas, acrescentam-se outros fatores, que tornam os projetos de edificações com diferentes formas de interpelações, às ve-zes de difícil compreensão, para os que não estão familiarizados com esse sistema. Um importante fator a ser considerado nesse processo refere-se à formação específica de

1 Conjunto de medidas incorporado ao sistema construti-vo do edifício, sendo funcional durante o uso normal da edificação e que reage passivamente ao desenvolvimen-to do incêndio, não estabelecendo condições propícias ao seu crescimento e propagação, garantindo a resistên-cia ao fogo, facilitando a fuga dos usuários, a aproxima-ção e o ingresso no edifício para o desenvolvimento das ações de combate (NBR 14432:2001). 2 Tipo de proteção contra incêndio que é ativada manual ou automaticamente em resposta aos estímulos provo-cados pelo fogo, composta basicamente das instalações prediais de proteção contra incêndio (NBR 14432:2000).

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profissionais da construção civil, na área de segurança contra incêndio.

Zanettini (2007) indica que “na arquite-tura do mundo inteiro, não há nada mais significativo do que o aço. É uma solução tecnológica avançada, limpa e que pressu-põe os mais variados desenhos para aero-portos, galpões, arenas, entre outros espa-ços”.

O sistema de construção em aço tem a sua forma lógica de trabalhar para a condi-ção arquitetônica e especial mais correta, envolvendo diversos detalhamentos cons-trutivos, dentre os quais, a revestimento contra incêndio, que desempenha um papel importante nesse sistema. A busca insisten-te para compor uma solução harmoniosa de fácil execução, menor interferência no pro-jeto de edificações e com custo comparati-vamente baixo, deve ser motivo de atenção dos arquitetos.

2.3 Estrutura curricular dos cursos de ar-quitetura e urbanismo e a segurança con-tra incêndio

As estruturas curriculares dos cursos de

arquitetura, de forma geral, apresentam lacunas consideráveis, quando o assunto é segurança contra incêndio, principalmente, ao tratar-se de estruturas metálicas. A defi-ciência com que o tema é tratado, não so-mente em estruturas de aço, mas também, em estruturas de concreto, impossibilitam ao arquiteto conceber projetos de edifica-ções, que atendam às necessidades de uma obra segura, quando submetida a incêndio.

Carvalho (2010) 3, em entrevista ao Por-tal da Arquitetura, Engenharia e Construção

3 Professora livre-docente, Mônica Junqueira de Carva-lho, leciona a disciplina História da Arquitetura Contem-

– E-construmarket - AECweb, tratando do tema “Arquitetura brasileira: um triste ce-nário”, ao ser indagada sobre a perda de espaço do arquiteto no mercado imobiliá-rio, e como isso se revela, responde:

Essa perda de espaço pode ser constatada na defasagem que existe entre o que se discute nos meios acadêmicos e o que se faz no mer-cado imobiliário. De um modo geral, essa ar-quitetura é criticada nos meios acadêmicos que não reconhecem o que é construído co-mo boa arquitetura. Algumas questões se co-locam: nós estamos ensinando para quem? As pessoas saem da faculdade e estão indo trabalhar aonde? Considero que existe um divórcio entre o que se faz lá fora e o que se fala na academia. (CARVALHO, 2010).

Constata-se essa separação, mais acen-

tuadamente do que expõe Carvalho (2010), quando o assunto tratado é SCI nos cursos de Arquitetura e Urbanismo.

3 MATERIAIS USADOS PARA REVESTIMEN-TO CONTRA INCÊNDIO

Os materiais de revestimento contra in-

cêndio, como, projetados, gesso acartonado resistente ao fogo - GARF, tintas intumes-centes, alvenarias de blocos de concreto ou cerâmico, entre outros, são importantes na proteção estruturas metálicas submetidas às altas temperaturas, minimizando o fluxo de calor para determinado tempo requerido de resistência ao fogo - TRRF.

3.1 Materiais rígidos ou semirrígidos

Os materiais rígidos são geralmente ele-

mentos pré-fabricados fixados à estrutura

porânea na faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.

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na maior parte por meio de pinos de aço. Os semirrígidos são feitos com materiais fibrosos como lã de rocha, em geral, aglo-merado com resinas, com propriedades térmicas bastante semelhantes ao das man-tas (Quadro 1). Quadro 1: Materiais rígidos ou semirrígidos produzidos e em-pregados no mercado brasileiro. Frame 1: Rigid or semi rigid materials produced and used in the brazilian market.

PRODUTO FABRICANTE MATERIAL

PEM Thermax Rockfibras Lã de rocha basáltica

Firemaster Morganite do Brasil Fibra cerâmica

Firewrap B6 Morganite do Brasil Fibra cerâmica

Placo Placo do Brasil Gesso acartonado

Knauf Knauf do Brasil Gesso acartonado

Gypsum Lafarge Gesso acartonado

Fonte: Seito et al. (2008, p.156). Conforme Pannoni (2009), os materiais

rígidos ou semirrígidos podem ser aplicados a seco, tanto na forma de “caixas“ quanto de “envolventes“.

3.2 Materiais projetados

Revestimentos projetados contra fogo

são os mais empregados na construção civil brasileira, e apresentam excelentes desem-penhos como revestimento contra incêndio, sendo resistentes a chamas e às altas tem-peraturas e atendem aos TRRF superiores com o que determina a NBR 14432/2001.

De acordo com Seito et al. (2008), esses materiais são conduzidos, dentro do equi-pamento de aplicação, na condição seca (fibras projetadas) ou úmida (materiais de base gesso contendo vermiculita) como po-de ser observado no Quadro 2.

Quadro 2: Materiais projetados empregados no mercado brasi-leiro. Frame 2: Designed materials used in the brazilian market.

PRODUTO FABRICANTE REPRESENTANTE NO BRASIL

Blaze Shield II Isolatek internacional Morganite do Brasil

Cafco 300 Isolatek internacional Morganite do Brasil

Fendolite Isolatek International Morganite do Brasil

Pyrolite 15 HY Carboline Unifrax Brasil

Pyrolite 22 Carboline Unifrax Brasil

Pyrolite 40 Carboline Unifrax Brasil

Termosist Grupo Sistema Produzido no Brasil

Isobrax Magnesita Produzido no Brasil

Isopiro Eucatex Produzido no Brasil

Isopiro LV Eucatex Produzido no Brasil

Monokote MK6 Grace Grece do Brasil

Fonte: Seito et al. (2008, p. 56). Esse bom desempenho contra incêndio

associado a um custo atrativo, tem possibi-litado a uma utilização em escala maior se for comparada a outros revestimentos, mesmo não apresentando uma boa aparên-cia onde se busca uma estética aprimorada.

3.3 Tintas intumescentes

Um sistema intumescente possui, de

modo geral, três componentes: um primer, a tinta intumescente (a fase que reage) e um selante (a pintura de acabamento). Em algumas situações, o primer ou o acaba-mento podem não ser necessários.

Segundo Seito et al. (2008), os revesti-mentos intumescentes mais empregados na construção de edifícios podem ser tanto de base solvente quanto base de água, e tipi-camente possuem uma espessura de pelícu-la seca menor do que 3mm.

4 REVESTIMENTO CONTRA FOGO EM ELE-MENTOS ESTRUTURAIS DE AÇO E A INTE-RAÇÃO COM O PROJETO DE ARQUITETU-RA DE EDIFICAÇÕES

O revestimento contra fogo dos compo-

nentes de aço de uma estrutura apresenta uma variedade de arranjos e soluções, atre-lados aos valores estéticos, resistência, cus-

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to, entre outros, que o arquiteto deve co-nhecer quando da elaboração do projeto de edificações.

4.1 Revestimento contra fogo em elemen-tos estruturais

Em pilares e vigas, deve-se concentrar maior atenção quando da necessidade de protegê-los contra as chamas e altas tem-peraturas, em situação de incêndio, devido aos esforços a que estarão sujeitos. Igual-mente, não de se devem desprezar as lajes quanto às solicitações a que estarão subme-tidas.

4.1.1 Pilares

Quanto à forma de aplicação de revesti-

mento contra fogo em pilares, ela pode a-presentar características inerentes ao am-biente e à aparência (conforme Figura 1).

Figura 1: Forma de aplicação de revestimento contra incêndio em pilares. Figure 1: Application method for fire coating on pillar.

Fonte: Pannoni (2009, p. 26) Os perfis mais comuns utilizados em pila-

res nas estruturas de aço são os perfis H e os tubulares. O primeiro apresenta a vanta-gem de ser aberto, facilitando a ligação com as vigas e sua manutenção. Os segundos apresentam a vantagem de grande rigidez, mas têm contra si a maior dificuldade na concepção das ligações e o problema da

deterioração ocorrer de dentro para fora, dificultando o aspecto da manutenção.

A seguir serão apresentadas as alternati-vas de revestimento contra fogo em pilares:

A) Pilares protegidos por paredes de blo-cos

a1) Pilares integrados com paredes de blocos (interno/externo)

Elementos de aço podem ser parcialmen-te integrados (conforme Figura 2), ou com o mínimo de exposição do perfil, (conforme Figura 3), entretanto, uma solução inter-mediária pode ser utilizada, quando o perfil apresentar uma área maior de exposição às chamas e ao calor que as demais soluções (Figura 4).

Na interação com o projeto de edifica-ções, as soluções apresentadas, nas Figuras 2 e 3, pouco interferem em acréscimo di-mensional, principalmente quando o perfil utilizado apresenta dimensões que possibi-litem uma aproximação com espessuras das paredes. Ao integrá-los na alvenaria, conse-gue-se uma diminuição da área exposta ao fogo, resultando economia com material de revestimento contra fogo ou até eliminan-do-os.

Figura 2: Pilar parcialmente integrado à parede de blocos. Figure 2: Pillar partially integrated into a wall of blocks.

Fonte: Vargas et al. (2010, p. 47).

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Figura 3: Pilar interno incorporado às paredes. Figure 3: Internal Pillar incorporated into walls.

Fonte: Andrade (2010, p. 116) O aspecto de acabamento (aparência),

principalmente, como ilustrado na Figura 4, dependerá da criatividade do arquiteto, em situação em que, complementos de acaba-mento (revestimento) ou mesmo uso da estrutura aparente, podem ser soluções viáveis.

Figura 4: Pilar parcialmente incorporado às paredes. Figure 4: Pillar partially incorporated into the walls.

Fonte: Coelho (2007, p. 31)

a2) Pilares periféricos (externo) integra-dos com paredes de blocos

Vários são os arranjos que podem fazer parte de detalhamento de projeto de edifi-cações em estrutura metálica. Assim, desta-cam-se, dentre elas, algumas que mais in-terferem em acréscimo dimensional, (Figura 5a), e acabamento (estética) (Figura 5b).

Figura 5: Pilares de fachada, interfaces com alvenaria. Figure 5: Front Pillars, interfaces with masonry.

(5a - Linha) (5b - Canto) (5a - Line) ( 5b - Corner) Fonte: Vargas e Silva (2003, p. 63).

O posicionamento dos pilares em relação

à alvenaria é necessário ser bem estudado, pois, simples arranjo da posição relativa entre pilares e alvenaria pode proporcionar economia significativa de revestimento con-tra fogo e altas temperaturas.

B) Pilares mistos (aço/concreto), protegi-

dos por concreto Seito et al. (2008) defendem a ideia de

que as estruturas mistas de aço e de con-creto são aquelas em que ambos os materi-ais trabalham de forma solidária para resis-tir aos esforços externos. Em situação de incêndio, há transferência de calor entre os elementos estruturais.

Há três tipos de pilares mistos: totalmen-te revestidos por concreto (enclausurados), parcialmente revestidos por concreto, e tubulares preenchidos com concreto, que pouco interfere em acréscimo dimensional

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e possibilitam um bom acabamento (estéti-ca), (Figura 6).

Figura 6: Tipos de seções transversais de pilares mistos. Figure 6: Types of cross sections of mixed pillars. a) Perfil I ou H totalmente b) Perfil I ou H parcialmente revestido com concreto revestido com concreto a) I or H shape, totally lined b) I or H shape, partially with concrete lined with concrete

c) Perfil tubular retangular d) Perfil tubular circular pre- preenchido com concreto enchido com concreto c) Rectangular tubular shape, d) Circular tubular shape, lined with concrete lined with concrete

Fonte: ABNT (2013, p. 34). Algumas desvantagens da proteção com

concreto são o custo (é uma das mais caras formas de proteção), a velocidade (conso-me tempo na obra), o peso (a edificação ficará muito mais pesada) e a redução de espaço ao redor das colunas.

b1) Pilares totalmente envolvidos por concreto (enclausurados)

O cobrimento mínimo de concreto (c) (Figura 7), com função apenas de isolamen-to térmico apresenta valores variáveis con-forme o TRRF. A variação do cobrimento de concreto (c) para as condições em que os pilares estão dimensionados como elemen-

tos mistos, também desempenham funções estruturais.

Figura 7: Seções transversais de pilares mistos – Cobrimento “c”. Figure 7: Types of cross sections of mixed pillars – ”c” cover-ings.

Fonte: Andrade (2010, p. 120). A principal vantagem na utilização do

concreto como material de revestimento contra incêndio diz respeito à durabilidade, mesmo considerando seu custo elevado. O enclausuramento tende a ser utilizado quando o componente em aço está sujeito ao risco por impacto, abrasão ou exposição ao intemperismo, (conforme Figura 8), ca-racterístico de estacionamentos.

Figura 8: Pilares mistos – Execução do revestimento contra incêndio. Figure 8: Mixed pillars - Implementation of fire coating.

Fonte: Pannoni (2009, p. 44).

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Essa interação não pode ser desprezada na verificação final do projeto de edifica-ções (acréscimo da seção devido ao cobri-mento c), mesmo sabendo que esse tipo de solução, aliando resistência às altas tempe-raturas e esforços mecânicos, ainda incor-pora o revestimento contra fogo na con-cepção final do projeto estrutural. O aca-bamento segue o convencional em revesti-mentos adequados ao ambiente.

b2) Pilares parcialmente envolvidos por concreto

O concreto envolvido no perfil fica parci-almente enclausurado entre a alma e a me-sa e, além da função de revestimento parci-al contra incêndio, desempenha função de suporte de cargas (Figura 9).

Figura 9: Seção transversal de pilar misto parcialmente envolvido por concreto. Figure 9: Cross section of a mixed pillar partially surrounded by concrete.

Fonte: ABNT (2013, p. 37)

Os aspectos de acabamento podem ser

tratados da mesma forma que as estruturas metálicas, em que a criatividade do arquite-to pode gerar elementos visualmente agra-dáveis (conforme Figura 10).

Figura 10: Pilar misto parcialmente envolvido por concreto. Figure 10: Mixed pillar partially surrounded by concrete.

Fonte: Pannoni (2003, p. 10). A utilização dessa solução não adiciona

valores dimensionais que possam interferir, além do perfil metálico.

b3) Pilares tubulares preenchidos com concreto

De acordo com Jacinto et al. (2009), o aço e o concreto têm bom comportamento em termos de capacidade resistente, tanto em temperatura ambiente, quanto em altas temperaturas, principalmente na forma de tubos preenchidos com concreto, porque o concreto retarda a velocidade de aumento da temperatura no aço e aumenta a rigidez do elemento estruturas, ao retardar a flam-bagem local do tubo. Espessura da parede do tubo, resistência do concreto, diâmetros das barras de aço, entre outras, são impor-tantes na adoção desse sistema (Figura 11).

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Figura 11: Seções transversais de pilares mistos preenchidos por concreto. Figure 11: Cross sections of mixed pillars filled with concrete.

Fonte: ABNT (2013, p. 38). As formas desses perfis apresentam as

mesmas condições que os perfis parcial-mente envolvidos com concreto, relativos a acréscimos de área, tal qual, estrutura con-vencional em aço, onde o acabamento se-gue os mesmos padrões de revestimento (pintura).

C) Pilares protegidos com concreto celu-

lar autoclavado - CCA A principal característica do CCA, refe-

rente à sua baixa condutividade térmica, é o fato de possibilitar sua utilização como pro-teção de perfis metálicos em situação de incêndio (pilares internos) (Figuras 12 e 13).

Figura 12: Pilar em perfil H protegido com blocos. Figure 12: Pillar in H shape protected with blocks.

Fonte: Britsh Steel (1998 apud VARGAS; SILVA, 2003, p. 33).

A solução adotada na Figura 12, o reves-timento contra fogo do elemento estrutural (pilar) não apresenta acréscimo dimensio-nal no perímetro resultante e possibilita boas condições de um acabamento, con-forme Figura 13.

Figura 13: Pilar em perfil H protegido com blocos, acabamento final. Figure 13: Pillar in H shape protected with blocks, finished design.

Fonte: Pannoni (2009, p. 44) Nessa condição, a utilização de revesti-

mento com blocos CCA entre as mesas do perfil, a função é restrita de revestimento contra fogo.

Pilares em fachada podem ser protegidos por blocos ou painéis de CCA, associados a outros materiais, apresentando as mesmas condições de acabamentos que os pilares internos, porém, com características especí-ficas de cada projeto de edificação (con-forme Figura 14).

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Figura 14: Pilar parcialmente protegido por blocos de concreto celular. Figure 14: Partially protected pillar of cellular concrete blocks.

Fonte: Vargas et al. (2010, p. 46). D) Pilares protegidos por pré-moldados

de concreto Soluções construtivas em pré-moldados

leves de concreto oferecem uma solução esteticamente adequada a um grande nú-mero de situações e a um custo relativa-mente baixo (Figuras 15 e 16).

Figura 15: Detalhe do componente confeccionado em pré-moldado leve. Figure 15: Detail of the lightweight precast component.

Fonte: Seito et al. (2008, p. 155).

Figura 16: Pilares de aço protegidos com pré-moldados de concreto. Figure 16: Steel pillars protected with precast concrete.

Fonte: Seito et al. (2008, p. 155). A resistência ao fogo deste tipo de com-

ponente é de, no mínimo, 60 minutos e po-de proteger elementos internos e externos à edificação.

A interação com o projeto de edificação apresenta acréscimo dimensional, porém, se comparados com os blocos de concreto, não se torna tão significante. Esse tipo de material possibilita uma variedade de re-vestimentos normalmente utilizados como acabamento, em obras de edificações.

E) Pilares protegidos por paredes de ges-so acartonado resistente ao fogo - GARF

A utilização de placas de GARF, aplicadas em componentes internos, tipo caixa, pos-sui características específicas para proteção contra fogo e altas temperaturas (Figura 17), que as torna diferente de placas dry

wall (parede seca) de uso geral, utilizadas para vedações.

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Figura 17: Pilar interno enclausurado às redes de GARF. Figure 17: Internal pillar enclosed to GARF networks.

Fonte: Coelho (2007, p. 24). Os aspectos relativos aos acréscimos di-

mensionais, em planta, são pequenos (Figuras 18a e 18b). Tudo dependerá das adaptações, de acordo com a necessidade; entretanto, o acabamento segue os padrões normais, alvenaria, concreto, aço, entre outros.

Figura 18: Pilares internos, (a) enclausuramento com suporte, (b) enclausuramento sem suporte - GARF. Figure 18: Internal pillars, (a) enclosure with support, (b) enclo-sure unsupported - GARF

(a) (b) Fonte: Gerken (2007, p. 107).

Em pilares isolados protegidos por GARF, utilizados em ambientes interno, necessi-tam de atenção especial, principalmente quando posicionados em locais onde pos-sam ocorrer impactos ou presença de umi-dade. Quanto ao projeto de edificações, a interferência é a menor possível.

F) Pilares protegidos por placas, painéis e

mantas de fibras minerais. f1) Placas de lã de rocha. Os painéis de lã de rocha podem ser utili-

zados em proteção de pilares de aço, po-rém, não apresentam um bom acabamento e não oferecem resistência a impactos, sendo necessário utilizar revestimento adi-cional resistente e que apresente um bom acabamento Entretanto, a alternativa de instalar um material que apresente bom desempenho à resistência mecânica e pos-sibilite um bom acabamento, vai resultar num acréscimo de área, além do que o re-vestimento contra incêndio no perfil de aço originalmente apresentava.

f2) Placas de vermiculita. São placas isolantes extremamente leves,

prensadas, quimicamente ligadas à base de vermiculita expandida e ligantes inorgâni-cos, apresentando boa resistência mecâni-ca. É um produto inodoro, imputrescível, não deteriorável e incombustível. A interfe-rência no projeto de edificações apresenta características semelhantes ao sistema de GARF.

f3) Painéis de silicato de cálcio autocla-vado

São placas rígidas de grande resistência a impactos e à abrasão. Os painéis são insta-lados de forma limpa, mesmo em edifica-ções já em funcionamento, por meio de travamentos por parafusos ou grampos, sem a necessidade de soldagem na estrutu-

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ra. Este material possui acabamento similar a placas GARF, podendo receber massas e pinturas de acabamento, posteriormente a sua aplicação.

f4) Mantas de fibras minerais As mantas de lã de rocha e de fibra ce-

râmica são de baixa densidade e apresen-tam boa flexibilidade. Aplicadas de modo a envolver o perfil metálico, são fixadas com pinos de aço à estrutura. Não são indicadas para ambientes abertos, onde há possibili-dade de o intemperismo provocar a ocor-rência de desprendimento das fibras. Em ambientes onde há possibilidade de impac-tos ou exigências de acabamentos mais a-primorados, outros revestimentos para pro-teger o isolante térmico devem ser provi-denciados, porém, ocorrerá um acréscimo da área do pilar, adicionada à área do re-vestimento contra incêndio, semelhante ao resultado de acabamento das placas de lã de rocha.

G) Pilar protegido por argamassas proje-

tadas Argamassas projetadas são os materiais

mais utilizados em todo o mundo para o revestimento contra incêndio de estruturas metálicas, pois, reúnem as maiores vanta-gens técnicas e os menores custos para to-das as situações, principalmente onde as estruturas não estejam aparentes, como vigamentos ocultos sobre forros. Pilares podem receber acabamentos (gesso acar-tonado, concreto, entre outros), sendo mui-tas vezes utilizado o concreto como prote-ção contra impactos, conforme Figura 19.

Figura 19: Central dos Correios Santo Amaro - São Paulo, prote-gido com Argamassa projetada. Figure 19: Central Post Office Santo Amaro - São Paulo, pro-tected with designed mortar.

Fonte: Refrasol (2015). A superfície rugosa da argamassa proje-

tada não apresenta um bom acabamento, a não ser quando alisada, por isso, são mais adequadas para ambientes menos exigen-tes. O acréscimo dimensional no elemento estrutural é insignificante, quando apresen-ta proteção contra incêndio.

I) Pilar protegido por tintas intumescen-

tes Conforme Engterm (2015), a pintura in-

tumescente é uma película fina, que au-menta o volume em até 40 vezes a sua es-pessura original aplicada e quando sujeita à ação do calor forma uma camada de reves-timento contra fogo por até 2 horas, de-pendendo da espessura final aplicada. É adequada para ambientes internos e exter-nos, destacando-se a facilidade de aplica-ção, limpeza e aspecto harmonioso, porém, possui uma aplicação lenta e de preço ele-vado, se comparado aos demais sistemas.

Segundo Refrasol (2015), as tintas intu-mescentes são os produtos de melhor aca-bamento visual para a proteção de estrutu-ras metálicas, todavia são materiais caros,

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que devem ser utilizados com cautela para se garantir a viabilidade econômica de qualquer empreendimento.

Não interferem no projeto de edifica-ções, com os acréscimos de área dos com-ponentes metálicos e apresentam um bom acabamento.

4.1.2 Vigas

Vigas são elementos estruturais respon-

sáveis principalmente por sustentar as car-gas provenientes das lajes e paredes e transmiti-las aos pilares. Em estruturas me-tálicas, o perfil mais utilizado é o tipo I, (Figura 20). Figura 20: Forma de aplicação do revestimento contra incêndio em vigas. Figure 20: Application method of fire coating in beams.

Fonte: Pannoni (2009, p. 26). Quanto à forma de aplicação de revesti-

mento contra fogo em vigas, pode apresen-tar características inerentes ao ambiente e ao requinte estético.

A) Proteção de viga com concreto As vigas de aço que utilizam concreto

como revestimento contra incêndio e tam-bém para a absorção de esforços, auxilian-do o conjunto estrutural (aço/concreto) são menos usadas, se comparadas aos demais

sistemas. As etapas executivas são mais va-garosas (Figura 21) e necessitam de um tempo maior para dar acabamento quando necessário, principalmente se ficar aparen-te e seguir com revestimento convencional de tintas, pouco interferindo no projeto de edificações.

Figura 21: Viga com revestimento contra incêndio de concreto. Figure 21: Beam with concrete fire coating.

Fonte: Pannoni (2009, p. 41). B) Proteção de viga com placas e painéis

de fibras minerais b1) Placas de GARF A utilização de placas de GARF segue as

mesmas características quando aplicadas em pilares. Esse tipo de revestimento con-siste numa proteção tipo caixa e exige cui-dados especiais nas uniões entre as placas ao elemento a revestir, para impedir a pas-sagem de gases quentes pelas juntas, prin-cipalmente por ser um elemento que está localizado na parte superior do ambiente, (Figura 22).

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Figura 22: Viga / pilar protegido com placa de GARF. Figure 22: Beam/Pillar protected with GARF board.

Fonte: KNAUF DO BRASIL (2015). Sua execução exige pinos de fixação nas

superfícies. b2) Placas de lã de rocha São boas alternativas para a proteção de

estruturas de edificações já em funciona-mento, uma vez que esses sistemas geram menos sujeira que materiais projetados (Fi-gura 23). Tais sistemas são fixados em pinos previamente soldados à estrutura e possu-em acabamento rústico, devendo ficar ocul-tos sobre forros ou envolvidos por materiais específicos de acabamento, aumentando o perímetro do elemento a ser protegido, com atenção especial ao pé direito que, em ambiente de altura limitada. Previsão de forro falso poderá ficar comprometida.

Figura 23: Placas de lã de rocha. Figure 23: Mineral wool boards.

Fonte: Pannoni (2009, p. 33).

Esse tipo de proteção não necessita de preparo da superfície da estrutura de aço; no entanto, sua fixação é lenta, principal-mente ao redor de detalhes complexos e pode ter o custo elevado.

b3) Placas de vermiculita e painéis de si-licato autoclavado

Esses dois sistemas apresentam caracte-rísticas semelhantes ao GARF, e as conside-rações relativas a resistências e acabamen-to seguem as mesmas das proteções em pilares de aço.

C) Proteção de viga com mantas de fibras

minerais c1) Mantas de lã de rocha e fibra cerâmi-

ca A lã de rocha é obtida da fusão da rocha

de origem basáltica, é fornecida na densi-dade 96 kg/m3 na proteção tipo contorno (Figura 24) e densidade 144 kg/m3 para pro-teção tipo de caixa (Figura 25), dos perfis metálicos. As mantas de fibra cerâmica propiciam os mesmos acabamentos que a lã de rocha.

Figura 24: Fixação de lã de rocha – Tipo contorno. Figure 24: Mineral wool fixation – contour type.

Fonte: Martins (2000, p. 33).

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Figura 25: Mantas de fibra cerâmica. Figure 25: Ceramic fiberbBlankets.

Fonte: Vargas e Silva (2003, p. 45). Esses sistemas podem ficar aparentes

quando usados em ambientes menos exi-gente, entretanto, se for discriminado um acabamento final refinado, será necessário encobrir o revestimento contra incêndio das vigas. O forro falso pode ser uma boa solução, contudo, o pé direito pode sofrer redução.

D) Argamassas projetadas e fibras proje-

tadas Esses sistemas apresentam as mesmas

características das aplicações em pilares, porém, as interferências no projeto de edi-ficações seguem as mesmas das fibras mi-nerais. Nas argamassas projetadas, quando o acabamento for alisado (conforme as Fi-guras 26a e 26b) e receber pinturas, possi-bilitará um bom acabamento, sem a neces-sidade de colocação de forro falso.

Figura 26: Argamassa projetada, alisada (a) e pintada, (b) - Itambé Adm. Condomínios – SP. Figure 26: Designed mortar, smoothed (a) and painted, (b) - Itambé Adm. Condomínios - SP

(a) (b) Fonte: REFRASOL (2010).

E) Tintas intumescentes São utilizadas principalmente em estru-

turas aparentes, onde o requisito é um aca-bamento de elevado requinte estético (Figura 27). A aplicação de tinta intumes-cente em vigas segue as especificações em pilares, não acrescentando aspectos dimen-sionais no elemento estrutural, e nem influ-enciando no acabamento, possibilitando ao arquiteto, discriminações de uma gama de cores que o sistema convencional de pintu-ra apresenta e permitindo uma proteção adicional à pintura intumescente.

Figura 27: Pintura intumescente. Figure 27: Intumescent paint.

Fonte: TERMOCOM (2015).

4.1.3 Lajes Por apresentarem uma grande superfície

exposta às chamas e às altas temperaturas, posicionada na situação mais severa nas condições de incêndio. A estanqueidade é

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de fundamental importância para evitar a passagem de gases quentes e fumaça para o pavimento que fica acima.

A) Laje mista (aço/concreto) Lajes de concreto com forma de aço in-

corporada (steel deck), sem material de re-vestimento contra fogo em situação de in-cêndio, calculadas a temperatura ambiente, seguindo os princípios normativos, devem apresentar uma resistência ao fogo de, no mínimo, 30 minutos, verificados os critérios de isolamento térmico, adotando a espes-sura efetiva mínima de concreto (hef), de acordo com o TRRF solicitado, (Quadro 3).

Quadro 3: Espessura efetiva mínima da laje em função do TRRF. Frame 3: Minimum effective thickness of the slab due to the TRRF.

Fonte: ABNT (2013, p. 47). Conforme a Figura 28, a espessura de

concreto (hef) influenciará em uma altura diferenciada, conforme o TRRF solicitado, o que resultará em elevação do pé direito do pavimento.

Figura 28: Dimensão da seção transversal da laje. Figure 28: Cross-section dimension of the slab.

Fonte: ABNT (2013, p. 48). As lajes de concreto com forma de aço

incorporada (steel deck), sem revestimento contra incêndio (Figura 29) além da condi-

ção de estanqueidade, podem ser mais ba-ratas se comparadas com o custo do reves-timento contra incêndio com materiais pro-jetados, caso a espessura de concreto espe-cificado apresentar compatibilidade com as exigências da NBR 14323/2013 (hef).

Figura 29: Laje de concreto com forma de aço incorporada (steel deck). Figure 29: Concrete slab with embedded steel shape (steel deck).

Fonte: Pannoni (2004, p. 29) As lajes mistas que não apresentarem

espessuras de concreto (hef) suficientes pa-ra atender aos critérios de isolamento con-tra incêndio deve utilizar revestimento con-tra incêndio (Figura 30).

Figura 30: Argamassa projetada - revestimento contra incêndio em laje de concreto com forma de aço incorporada (steel

deck). Figure 30: Designed mortar – fire coating in concrete slab with incorporated steel shape (steel deck).

Fonte: Vargas et al. (2010, p. 57).

TRRF (minutos) Espessura efetiva mínima hef (mm)

30 60 60 80

90 100

120 120

180 150

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Os materiais projetados pode ser uma boa solução, porém, não apresentam um bom acabamento; entretanto, em ambien-tes requintados, a utilização de elementos complementares (forro falso), pode ser uma boa solução.

5 CONCLUSÕES

No desenvolvimento deste trabalho fo-

ram abordados os vários tipos de proteções contra incêndio em elementos estruturais em aço e suas interações com o projeto de edificações.

Verificou-se, ainda, a importância SCI nos projetos de edificações, que deve ser solu-cionada na fase dos estudos preliminares evoluindo para o anteprojeto, em que o arquiteto normalmente deve considerar as exigências de proteção passiva e as interfa-ces com os dispositivos de proteção ativa e passiva. Importante destacar-se que é nessa fase, da definição das soluções de compati-bilidade entre estruturas e demais elemen-tos construtivos que se define o custo da segurança estrutural em situação de incên-dio, e que, a conciliação da técnica e da arte pode levar a uma arquitetura atraente e segura.

A partir da pesquisa, verificou-se a ne-cessidade de compreender o risco de in-cêndio a que uma edificação poderá estar exposta, quando a estrutura de aço não for protegida por barreira contra o fogo e as altas temperaturas, que deverá ser ideali-zada para atender às exigências das normas técnicas, a fim de evitar a instabilidade es-trutural.

Constatou-se, também, que os diversos sistemas incorporados à edificação por meio de revestimento contra fogo, intera-gem no projeto de arquitetura, quando a

opção for estrutura metálica em aço em que, por solicitação normativa, deve ser prevista a proteção dos elementos estrutu-rais.

Outra constatação do presente trabalho foi a verificação de que a escolha do reves-timento contra fogo, além do custo, facili-dade de aplicação e da forma como é pro-tegido o elemento estrutural em aço, refle-te no projeto de edificações em soluções que podem levar acréscimos dimensionais em área e pé direito. Entretanto, quando a solução adotada for mista (aço/concreto) as dimensões finais desses elementos estrutu-rais, será de responsabilidade do projetista de estruturas.

Mostrou-se, finalmente, que o arquiteto é o profissional responsável pelo projeto de arquitetura e pelo gerenciamento dos pro-jetos complementares, por isso, é impor-tante o conhecimento dos sistemas de re-vestimento contra fogo, e quais os materi-ais que a compõem, a fim de evitar inter-venções inadequadas, que não revelem o que foi idealizado. Entretanto, se esse co-nhecimento não foi repassado na sua vivên-cia acadêmica, maior será a dificuldade de se elaborar um projeto de edificações que possa minimizar essas intervenções.

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produtos-spi/estruturas-metali cas>. Acesso em: 20 abr. 2015.

License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, pro-vided the original work is properly cited. Artigo recebido em 16 de maio de 2015. Avaliado em 08 de janeiro de 2016. Aceito em 22 de janeiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): ANDRADE, Cleide Cedeni; SOUZA, João Car-los. Projeto de arquitetura - proteção con-tra incêndio em elementos estruturais de aço. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 49-68, jul./dez. 2015.

Artigo original

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Inclusão digital de professores nas escolas públicas da região metropolitana de Belém

Dayvid Gomes Vital Fares 1

1 Mestrado em Ciências da Educação pela Escola Superior de Educação Almeida Garret, Lisboa. Especialização em Supervisão e Formação de Professores pela Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Marabá. Especialização em Rede de Computadores pela Universidade Federal do Pará. Graduação em Tecnologia em Processamento de Dados pelo Centro Universitário do Estado do Pará. Graduação em História pela Universidade Federal do Pará. Professor de Tecnologia da Informação/Rede de Computadores da Fa-culdade Pan-Amazônica, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO: Este artigo traz algumas contribuições, de cunho teórico, a res-peito da inclusão digital de docentes nas escolas de Belém, e as dificulda-des que os mesmo encontram para utilizar a tecnologia da informação e comunicação no ambiente estudantil. Aborda sobre a infraestrutura com-putacional adquirida por projetos governamentais e faz uma alusão a difi-culdade dos professores em relação a formação relacionada ao uso das tecnologias. Palavras-chave: Inclusão digital, Tecnologia da informação, formação de professores. Digital inclusion of teachers in the public schools of the metropolitan re-gion of Belém ABSTRACT: This article brings some contributions of theoretical, regarding the digital inclusion of teachers and administrators in schools in Bethle-hem, and the difficulties that are to use information technology and com-munication in the student environment. Discusses about the computing in-frastructure acquired by government projects and makes an allusion to the difficulty of teachers in relation to training related to the use of technology Keywords: Digital inclusion, Information technology, Formation of teachers

1 INTRODUÇÃO

A chegada mais intensa das tecnologias

de informação e comunicação (TIC) nas es-colas nos últimos 10 anos, evidencia desafi-os e problemas relacionados aos espaços e aos tempos que o uso das tecnologias novas e convencionais provocam nas práticas que ocorrem no cotidiano dessas escolas. Para entendê-los e superá-los, é fundamental reconhecer as potencialidades das tecnolo-gias disponíveis e a realidade em que as escolas se encontram inseridas, identifican-

do as características do trabalho pedagógi-co que nela se realizam, seu corpo docente e discente, e sua comunidade interna e ex-terna.

No processo de incorporação das tecno-logias na escola, aprende-se a lidar com a diversidade, a abrangência e a rapidez de acesso às informações, bem como com no-vas possibilidades de comunicação e intera-ção, o que propicia novas formas de apren-der, ensinar e produzir conhecimento, que se sabe incompleto, provisório e complexo.

O fato de equipar a escola com computa-

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tadores não é garantia de que este recurso será utilizado para a melhoria do processo de aprendizagem e de que ele, por si só, vá resolver os problemas da educação e prin-cipalmente incluir digitalmente seus mem-bros. É preciso ensinar professores e alunos a utilizar as tecnologias para o bem coletivo e para o desenvolvimento de práticas peda-gógicas que incluam a informática no seio escolar.

No Brasil, inclusão digital está sendo li-gada a alfabetização digital, a qual consiste em ter competências básicas para o uso de tecnologias numa perspectiva de usuário-consumidor. A escola é chamada a atuar na preparação da população. No entanto, para a maioria dos professores não é oferecida sequer uma capacitação rápida, o que os mantêm fora do processo. Aliás, essa é a situação que mais temos presenciado nas escolas brasileiras: os professores sentindo-se excluídos, com medo da tecnologia, fora de qualquer programa de formação ou par-ticipando de uma formação que não lhes dá condições para utilizar as tecnologias em sua prática pedagógica.

Existem inúmeros projetos governamen-tais estaduais e federais, tais como Projeto Um computador por aluno, Programa Na-cional de Tecnologia Educacional (Proinfo), Projeto de inclusão digital do Estado do Pa-rá (Navegapará), Projeto de Inclusão Digital de Âmbito Nacional (GESAC) que tentam mudar esse quadro. Contudo, esses proje-tos geralmente são focados nas tecnologias de informação e comunicação (TICs), mas não são acompanhados de desenvolvimen-to de material adequado e de capacitação de docentes e de alunos. Sem o desenvol-vimento de capacitação, cursos, material didático adequado e palestras de informáti-ca, focado nas necessidades do público-

alvo, não haverá êxito no desenvolvimento dos conhecimentos e saberes dos docentes e, consequentemente, na inclusão digital da comunidade. Tem que haver um trabalho colaborativo entre os gestores e professo-res, para que o material e os assuntos dos cursos sejam de interesse deles e que sejam úteis para o âmbito escolar.

Muitas escolas hoje, no Brasil, possuem laboratórios equipados com computadores, e com conexão à Internet, datashow, mas quem normalmente os utiliza é um profes-sor específico da área de tecnologia, ou às vezes nem são usados pelos professores, e alunos, por não terem conhecimento da utilização do computador e seus softwares. Essa possível falta de conhecimento tecno-lógico dos professores das escolas, a priori, é o problema central que este artigo vai tentar discutir em relação às escolas públi-cas no Estado do Pará. Escolas estas com toda uma infraestrutura montada, através do Programa Navegapará, do Governo Es-tadual, mas que não consegue incluir digi-talmente a população por falta de uma me-lhor instrução, formação, principalmente dos professores.

O programa Navegapará possui o objeti-vo de ofertar conectividade de alta veloci-dade (internet) nos polos do Estado, em especial as escolas da capital e do interior, promovendo educação de qualidade. Para isso, o programa vale-se dos mais recentes avanços tecnológicos para suplantar as e-normes distâncias e as enormes dificulda-des de acesso, características de muitas re-giões do território paraense. Dentre os be-nefícios para a população e profissionais de educação destacam-se a inclusão digital e social, formação à distância dos profissio-nais de educação, etc. Infelizmente, o pro-grama acaba somente instalando o equi-

Inclusão digital de professores nas escolas públicas da região metropolitana de Belém 71

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pamento nas escolas e não dando o suporte teórico e prático para sua devida utilização, principalmente nas escolas dos interiores paraenses, que já carecem de bons profes-sores e de boas instalações para funciona-rem com excelência.

De acordo com Prado (2011), não existe sentido em se inserir o computador na es-cola se a mesma estiver orientada por um paradigma tradicional, pois isso somente traria a ilusão de um processo de transfor-mação, não provocando as reflexões neces-sárias acerca do processo de ensino e de aprendizagem, exigidas para uma utilização de abordagem construcionista. Para a auto-ra, o papel do professor nesse cenário é fundamental, sendo a partir dele que as ações construcionistas ou tradicionais se materializam, revestindo de extrema impor-tância a sua formação.

O objetivo deste artigo é trazer algumas contribuições, de cunho teórico, a respeito da inclusão digital de docentes nas escolas de Belém, e as dificuldades que os mesmo encontram para utilizar a tecnologia da in-formação e comunicação no ambiente es-tudantil. Faz também uma abordagem so-bre a infraestrutura computacional adquiri-da por projetos governamentais e também uma alusão às dificuldades dos professores em relação à formação relacionada ao uso das TICs.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A inclusão digital representa um dos

grandes desafios globais para o século XXI, principalmente nos países emergentes co-mo o Brasil, e a Educação, por sua vez, se apresentam como uma das principais for-mas de massificar o acesso às novas tecno-logias em comunidades de baixa renda.

Em muitos países, especialmente no nos-so país, a inclusão digital está sendo vista como a capacidade da população inserir-se no contexto das tecnologias de informação e comunicação como consumidora de bens, serviços e informações, o que demanda a oferta de treinamento para a aquisição de competências básicas para o manuseio des-sas tecnologias.

Considerando o aspecto social, podemos estabelecer que inclusão digital significa, antes de tudo, melhorar as condições de vida de uma determinada região ou comu-nidade com ajuda da tecnologia. Em termos concretos, incluir digitalmente não é apenas alfabetizar a pessoa em informática, mas também melhorar os quadros sociais a par-tir do manuseio dos computadores, con-forme Rêbelo (2005).

No Estado do Pará, a disponibilização de computadores nas escolas já teve início com o programa Navegapará (do Governo Estadual) e o GESAC (programa de inclusão digital do Governo Federal), que disponibili-za máquinas dispostas em um laboratório de informática, com acesso a internet em alta velocidade de forma gratuita. Porém, ainda falta uma política para melhor utiliza-ção desses equipamentos, pois na maioria dos casos, estes são instalados, mas não há nenhum treinamento, capacitação para os professores, e alunos sobre como utilizá-los, o que acaba deixando aquela infraes-trutura paralisada por falta de uso e conhe-cimento.

Inserir-se na sociedade da informação não quer dizer apenas ter acesso à tecno-logia de informação e comunicação (TIC), mas principalmente saber utilizar essa tecnologia para a busca e a seleção de in-formações que permitam a cada pessoa

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resolver os problemas do cotidiano, com-preender o mundo e atuar na transfor-mação de sua realidade e contexto em que se encontra (ALMEIDA, 2003, p. 23).

O fato de equipar a escola com compu-

tadores não é garantia de que este recurso será utilizado para a melhoria do processo de aprendizagem e de que ele por si só, vá resolver os problemas da educação. O pro-fessor tem papel fundamental neste pro-cesso de inclusão.

Os profissionais da educação defrontam-se hoje com exigências de ordens diversas no sentido de incorporarem à sua prática em sala de aula as tecnologias de informa-ção e comunicação (TICs). Em uma socieda-de cada vez mais complexa, rica em infor-mação e fundamentada em conhecimentos, o professor deve usar as tecnologias de forma eficaz, pois em um espaço qualifica-do, a tecnologia pode atender os alunos para que se tornem usuários cada vez mais qualificados.

Por intermédio do uso da tecnologia no processo de escolarização, os alunos têm a chance de adquirir complexas capacidades tecnológicas sob a orientação do professor. Em sala de aula ele é responsável por esta-belecer um ambiente e preparar as oportu-nidades de aprendizagem que facilite o uso da tecnologia sob a orientação do principal agente que é o professor. Assim, o docente deve estar respaldado com esses conheci-mentos tecnológicos para que o espaço di-gital seja só mais uma ferramenta de a-prendizagem de conhecimento ao aluno.

Partindo da premissa que a informática aplicada à educação ainda é um mistério para alguns professores e também é uma ferramenta recente no cenário educacional, Valente (2003) afirma que o nó da questão

está na formação docente:

muitos educadores ainda não sabem o que fazer com os recursos que a informá-tica oferece. E, nesse sentido, a chave do problema é a questão da formação, da preparação dos educadores para saberem como utilizar esta ferramenta como parte das atividades que realizam na escola. (VALENTE, 2003, p. 12).

A formação do professor deve prover

condições para que ele construa conheci-mento sobre as técnicas computacionais, entenda por que e como integrar o compu-tador na sua prática pedagógica e seja ca-paz de superar barreiras de ordem adminis-trativa e pedagógica. Essa prática possibilita a transição de um sistema fragmentado de ensino para uma abordagem integradora de conteúdo e voltada para a resolução de problemas específicos do interesse de cada aluno.

É preciso também uniformizar a utiliza-ção dos computadores nas escolas e para isso, é necessário habilitar os professores a trabalhar nos laboratórios de informática. Para isso acontecer de forma eficaz, medi-das voltadas para a capacitação profissional se tornam necessária, para que haja uma aceitação de que o mundo informatizado gera novas possibilidades de aprendizado e que atualmente a tecnologia está presente em todo o cotidiano da população. Isso faz com que seja uma necessidade, ensinar aos futuros cidadãos como lhe dar com o mun-do virtual.

Para Valente (2003, p. 8) usar a informá-tica na educação é mais do que desenvolver atividades mecânicas, requer “implementar mudanças profundas, mudanças em proce-dimentos que são centenários” e para tanto

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é necessário que se invista na formação não só do professor, mas, também, da equipe administrativa e pedagógica.

De acordo com Perrenoud (2000), para se construir competências, visando à utili-zação das tecnologias, o professor não pre-cisa ser especialista em informática ou pro-gramação. Ele deve, porém, “ser um usuá-rio alerta, crítico, seletivo do que propõem os especialistas educativos e ser um conhe-cedor dos softwares que facilitam o traba-lho intelectual, em geral, e uma disciplina, em particular” (PERRENOUD, 2000, p. 134). O autor em tela sugere ainda que o profes-sor tenha uma cultura informática básica, que o prepare para a utilização das tecnolo-gias digitais e ressalta que hoje os professo-res podem escolher entre os softwares e-ducativos disponíveis, o que melhor se a-dapta à sua disciplina.

Entretanto, a formação inicial do profes-sor, muitas vezes, não os prepara para a utilização da informática, cabe, então, aos dirigentes educacionais propiciar capacita-ções que levem a reflexão sobre o impacto da entrada dos computadores nas escolas.

É preciso que aqueles que administram o sistema educacional formulem estraté-gias que garantam ao professor capacitar-se para desempenhar novas funções, numa sociedade (e esperamos em uma escola) que assume novas funções, mar-cada pelo domínio da informação e pelos recursos computacionais. (OLIVEIRA, 1997, p. 92)

Não podemos esquecer que na formação

inicial, continuada ou na capacitação, é im-portante refletir sobre o que se faz nas prá-ticas educacionais, para que se possam rea-limentar estas práticas, buscando o cons-

tante aperfeiçoamento do fazer docente. Segundo Freire (1996, p. 39), “na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou ontem que se pode melhorar a próxima prática”. A formação de professo-res na tendência reflexiva se configura co-mo uma política de valorização do desen-volvimento pessoal-profissional dos profes-sores e das instituições escolares.

A capacitação do professor deve ter cará-ter crítico e reflexivo, para uma posterior análise de suas práticas no cotidiano esco-lar, visando melhorar o processo de ensino-aprendizagem e compartilhando experiên-cias entre capacitador e os capacitandos. Os saberes docentes vão se constituindo tam-bém a partir das trocas de experiências, pela história de vida de cada um, pelos ti-pos de formação dos professores, das insti-tuições de ensino pelas quais trabalharam ou trabalham e da reflexão sobre as práti-cas observadas.

Candau (2003) ressalta que na formação continuada desenvolvida no seu locus de trabalho, a troca dessas experiências pode-ria enriquecer os saberes docentes e propi-ciar uma prática profissional reflexiva, por meio da identificação dos problemas e das sugestões de como resolvê-los. É importan-te ressaltar, que no mundo da informática, a prática é fundamental para um bom de-senvolvimento do trabalho, pois a tecnolo-gia se atualiza constantemente, e o profes-sor, com a ajuda e contribuição dos outros docentes, tem que está sempre atualizado às novas tendências digitais.

Na formação de professores para utiliza-ção das tecnologias digitais na educação, não exige apenas o domínio dos recursos informacionais, mas uma prática reflexiva

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inserida no contexto de trabalho do profes-sor. Nessa perspectiva, Valente (2003) afir-ma que o uso de computadores por si só, não garante uma melhoria na qualidade do ensino e não é uma solução mágica para os problemas pedagógicos da sala de aula. O autor em questão ainda enfatiza a necessi-dade do professor da disciplina curricular ter conhecimento dos recursos educacio-nais que o computador oferece, e assim poder alternar atividades informatizadas e não informatizadas de ensino-aprendiza-gem nas suas atividades pedagógicas.

Almeida (2003) diz que, para utilizar a In-formática com uma abordagem crítica e reflexiva, é indispensável que o professor tome consciência de como se aprende e como se deve ensinar. Somente assim ele poderá compreender a sua própria prática, tendo o computador como aliado. Acredita-se que novos modos de formação são ne-cessários, incluindo a discussão sobre uma nova concepção de homem, de mundo e de sociedade, o que reformula o papel do pro-fessor, do aluno e do conhecimento. Além disso, o docente deve acompanhar as ativi-dades dos acadêmicos, incentivar a respon-sabilidade pela construção do conhecimen-to, e fomentar no aluno a visão de que ele deve possuir autonomia e um perfil investi-gativo.

Porém, ainda não se encontrou uma forma ideal de capacitar o professor para o uso das novas tecnologias, aqui incluída a informática. E não é só no Brasil. Valente (2003, p. 12) afirma que até os países mais desenvolvidos, tecnologicamente, têm o mesmo problema o que prova que “a ques-tão não é técnica, mas pedagógica e ne-nhum país tem a fórmula mágica de como implantar a informática na educação”.

Uma capacitação que leve a mudanças na prática pedagógica deve ir além da pas-sagem de informações de técnicas compu-tacionais, deve proporcionar ao professor “condições para entender o computador como uma nova maneira de representar o conhecimento”, Valente (2003, p. 2) e prin-cipalmente:

Prover condições para o professor cons-truir conhecimento sobre as técnicas computacionais, entender por que e co-mo integrar o computador em sua prática pedagógica e ser capaz de superar barrei-ras de ordem administrativa e pedagógi-ca. (VALENTE, 2003, p. 3)

O professor deve perceber, na capacita-

ção, como integrar a tecnologia da informá-tica a sua proposta pedagógica. Para Tajra (2001, p. 113) tal capacitação deve contem-plar “conhecimentos básicos de informáti-ca; conhecimento pedagógico; integração de tecnologia com as propostas pedagógi-cas; formas de gerenciamento da sala de aula com novos recursos”. Deve, também, levar o docente a compreender que o aluno tem um novo papel neste contexto.

Na sociedade atual nos deparamos com o desafio de lidar com o excesso de infor-mação, uma vez que as modernas tecnolo-gias nos fornecem a cada dia melhores con-dições de envio e recepção de mensagens, mas ainda não criaram condições de sepa-rá-las entre úteis, inúteis ou perigosas. Des-ta forma, temos a responsabilidade de sele-cionar, interpretar e separar o conhecimen-to e os saberes que conduzem ao aprendi-zado.

Desta maneira, os meios de comunicação e as tecnologias de informação apresentam um desafio cultural para os professores,

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uma vez que os alunos estão a cada dia mais interessados em descobrir as possibili-dades que as inovações tecnológicas ofere-cem. Martín-Barbero (2003, p. 67) afirma que “comunicação e educação reduzidas ao uso instrumental dos meios na escola, fica de fora aquilo que seria estratégico pensar: a inserção da educação nos complexos pro-cessos de comunicação da sociedade atual”.

A comunicação mediada por computado-res, conforme Castells (1999, p. 382) “não é um meio de comunicação geral e nem será em um futuro próximo. Embora seu uso se expanda em ritmo fenomenal, ainda exclui-rá a maior parte da humanidade por um longo tempo, ao contrário da televisão”. Nesse sentido, Castells (1999, p. 383) res-salta ainda que, “o uso da comunicação mediada por computadores se expandirá principalmente via sistema educacional e alcançará proporções substanciais da popu-lação do mundo industrializado”. Assim, percebemos como é importante que sejam elaboradas políticas públicas voltadas para a formação de professores para a utilização da informática e a criação de laboratórios nas escolas públicas, disponibilizando o a-cesso às inovações tecnológicas para as ca-madas mais pobres.

Por outro lado, Belloni (2005, p. 7) afirma que a “penetração das máquinas inteligen-tes em todas as esferas da vida social é in-contestável: no trabalho e no lazer; nas es-feras públicas e privadas”, diante disso a-ponta como desafios que se colocam para o campo da educação visando à intervenção, “a implementação das políticas públicas” e na perspectiva da reflexão “construção de conhecimento apropriado à utilização da-quelas máquinas com fins educativos”. Ou seja, é necessário que se utilize a tecnologia e as mídias móveis, como celulares, Tablet

PC, IPad entre outros, a favor da educação e como meio de inserção digital de profissio-nais e alunos.

De nada adianta a capacitação do profes-sor ser um direito garantido por lei e ofere-cido pelos órgãos de educação se o profes-sor não tiver a vontade política de estar constantemente atualizado, seja ou não para o uso das novas tecnologias.

3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

As escolas investigadas para esta pesqui-sa foram três, que estão localizadas em três diferentes bairros da capital em termos so-cioeconômicos. Cada escola, escolhida por conveniência, devido à facilidade de acesso, está localizada em um bairro de alta, média e baixa classe. As mesmas pediram para que seus nomes não fossem colocados na pesquisa e por isso serão identificadas co-mo escolas A, B e C.

Foram realizadas entrevistas com 30% dos docentes de cada escola por meio de questionários escritos, com perguntas fe-chadas e abertas a respeito da temática inclusão digital. Utilizar-se-á a designação para professores como P1 para professor 1, P2 para professor 2 e assim sucessivamen-te.

Um dos principais aspectos que ficaram nítidos entre as três escolas foi a ausência de um profissional de tecnologia da infor-mação (TI) nas escolas A e C, o que causa um impacto negativo na manutenção e condução do laboratório de informática, que é o principal recurso tecnológico dessas instituições de ensino. A ausência de um profissional de TI torna-se ruim para o su-porte e auxílio nas dificuldades dos profes-sores em relação à informática e também diminui o tempo de vida das máquinas pela

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falta de um reparo mais especializado. Um ponto em comum entre todas as es-

colas foi em relação ao estado do ambiente informatizado, o laboratório, onde todas as escolas foram avaliadas como “Regular” pelos docentes das mesmas. A justificativa que mais apareceu nas três escolas foi “computadores não funcionam e internet com problemas”, que fez com que os pro-fessores relatassem a condição regular. Ou seja, é impossível trabalhar com tecnologia da informação se os recursos oferecidos não dão condições para isso. Esses recursos são hardware, software, redes e armaze-namento que são indispensáveis para boa utilização de TI, conforme o conceito de Turban, McLean e Whetherbe (2002), que afirmam que tecnologia da informação in-clui hardware, banco de dados, software, redes e outros dispositivos.

Dentre as escolas A, B e C num total de 46 entrevistados, 27 responderam não utili-zar o laboratório de informática em suas aulas, ou seja, mais da metade dos profes-sores não fazem uso deste recurso tecnoló-gico no seu cotidiano de aprendizagem, conforme Gráfico 1.

Gráfico 1 - Utilização do laboratório de informática pelos do-centes nas três escolas Graphic 1 - Using the computer lab by teachers in 3 schools

Fonte: Elaborado pelo autor.

O que se percebeu nas três escolas foi a justificativa “não possuo conhecimento su-ficiente” para relatar a não utilização do laboratório de informática, isto é, os pro-fessores estão com dificuldades de interagir com a tecnologia, pois é preciso ter um co-nhecimento de diversos recursos para saber utilizar a ferramenta tecnológica - compu-tadores, internet - de forma apropriada. Além do mais, a tecnologia não consiste somente no maquinário ou robótico, vai muito, além disso, como afirma Gebran (2009, p. 12), onde o mesmo fala que tec-nologia da informação está relacionada ao “planejamento de informática, a metodolo-gia de desenvolvimento de programas e sistemas, ao suporte de softwares, aos pro-cessos de produção e operação, ao suporte de hardware”.

Outra situação em comum, relatado nas três instituições, foi a condição ruim dos computadores que compunham o ambiente informatizado, fazendo com que os profes-sores não utilizassem as TIC no seu proces-so de ensino-aprendizagem. Ficava difícil reunir a turma no laboratório se os equi-pamentos apresentavam falhas físicas e de conectividade com a internet, fazendo com que o docente resolvesse questões técnicas na hora da aula.

Um ponto interessante entre as três es-colas é que a maioria dos docentes disse que não utilizam o laboratório de informáti-ca. Porém quando se falou em aptidão para usar, relacionar informática no processo de ensino-aprendizagem, as três escolas se mostraram equilibradas nas respostas dos seus professores, conforme Gráfico 2.

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Gráfico 2 - Aptidão de usar informática no processo de ensino-aprendizagem docente Graphic 2 - Ability to use information technology for teaching

teaching- learning process

Fonte: Elaborado pelo autor.

O que se notou é que existe uma boa

quantidade de docentes (22) que se dizem aptos a usar a tecnologia na escola, contras-tando com a falta de uso dos laboratórios de informática pelos mesmos (27). Ou seja, há profissionais da educação com aptidão, mas que não utilizam as ferramentas tecno-lógicas disponíveis na escola, no caso o la-boratório.

Outro dado comparativo interessante é que dentre os 22 docentes que se dizem aptos a utilizar a informática nas três esco-las, somente 19 realmente fazem jus dessa aptidão, utilizando o laboratório de infor-mática. O detalhe é que existem professo-res que se acham aptos somente por saber utilizar o computador de forma pessoal, o que não capacita àquele docente para le-cionar utilizando TIC, como afirma Gonçal-ves (2005, citado em OLIVEIRA, 2008, p. 170), “se a formação inicial e continuada não contemplar as TIC no contexto escolar, o conhecimento adquirido em ambientes extraescolar, em cursos, autodidatismo, não será suficiente para garantir o uso pedagó-gico desses instrumentos”.

Entretanto, os professores das três insti-tuições pesquisadas relataram a não apti-dão de usar a informática à falta ou ao pou-co conhecimento em tecnologia, deixando bem claro que é preciso qualificar o corpo docente das escolas para utilizar as TIC.

Analisou-se também que nas três esco-las, há um número alto de docentes que não possuem capacitação, curso em tecno-logia, 21 no total de 49 entrevistados, ou seja, é preciso qualificar tecnologicamente o profissional da educação que está traba-lhando no ensino fundamental e médio, pois somente a sua formação não supriu essa nova realidade da educação brasileira. Para corroborar com essa ideia disponibilizo a contribuição de Gonçalves (2005, apud em OLIVEIRA, 2008) a respeito das mudan-ças na educação, o qual advoga que as insti-tuições formadoras ainda desenvolvem cur-rículos muito formais, havendo um distan-ciamento entre a teoria e a prática nas ati-vidades desenvolvidas durante o curso de formação. Por isso, Oliveira (2008, p. 105) afirma que “deve-se introduzir essa tecno-logia nos cursos de licenciatura, a fim de que o profissional chegue ao mercado de trabalho com esse conhecimento específi-co”.

Isso fará com que haja uma diminuição dos docentes desqualificados tecnologica-mente, pois nas escolas há laboratório de informática, mas os mesmos não estão sen-do utilizados pelos professores.

Os motivos que foram citados nas três escolas para a não qualificação docente em TIC, foram “falta de dinheiro, tempo e inte-resse”. Daí nota-se como a nossa educação está defasada, pois os professores, mestres do ensino, não têm interesse em se qualifi-car para propor uma educação melhor, ba-seada também na baixa remuneração que o

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cargo proporciona o que não garante condi-ção financeira para arcar com curso. Além disso, para que este profissional ganhe um salário razoável ele tem que trabalhar um período integral em varias escolas, o que inviabilizar, por questão de tempo, realizar tais capacitações.

O que ficou bem evidente nas três esco-las pesquisadas foi que os docentes mostra-ram conhecimento sobre o que vem a ser inclusão digital, pois um dos conceitos mais mencionados nas três instituições foi o “uso da tecnologia” e o “uso do computador” dentro da escola. Além disso, os professo-res não se esqueceram de falar que inclusão digital não é somente tecnologia, isto é, ela é uma aliada para o desenvolvimento pro-fissional e social tanto dos alunos quanto professores, como afirma Rebêlo (2005) quando fala que em termos concretos, in-cluir digitalmente não é apenas 'alfabetizar' a pessoa em informática, mas também me-lhorar os quadros sociais a partir do manu-seio dos computadores.

Um fato curioso é que mesmo todos os professores das três escolas sabendo o que é inclusão digital, a maioria deles afirmaram que suas instituições não aplicam a inclusão de forma adequada, ou seja, a teoria se co-nhece, porém a dificuldade está em colocar em prática os conceitos apreendidos e sa-bido pelos professores sobre este tema. Para se ter uma noção de números, dentre os 49 docentes entrevistados das três esco-las, 39 acham que a escola não aplica a in-clusão de maneira adequada, contra so-mente 9 mestres que acham que há inclu-são digital correta.

Um dos principais motivos na escola A foi a falta de condições do laboratório, da es-cola B foi a falta de incentivo para usar o laboratório e falta de infraestrutura e na

escola C o principal motivo foi as máquinas e internet em condições ruins. Ou seja, num apanhado geral, as três escolas sofrem com carência na infraestrutura tecnológica para dar suporte aos professores desenvolverem atividades de inclusão para seus alunos.

No último quesito questionado, referen-te às dificuldades dos professores em usar o laboratório, uma resposta que permeou as três escolas foi a falta de capacitação em informática dos docentes, pois em todas as escolas houve situações de professores que reclamaram não saber usar os computado-res, o que seria um enorme entrave para as aulas de inclusão digital. Além disso, o me-do, a falta de interesse e tempo foram al-gumas questões abordadas como proble-matizadoras para utilizar a tecnologia. Seis professores da escola A, por exemplo, afir-maram ter medo de usar a tecnologia por acharem que os alunos sabem mais do que eles em relação à informática e por isso não se arriscariam em dar aula utilizando um recurso que não dominam.

Por fim, há uma falta de capacitação de professores em TIC e também uma carência em infraestrutura tecnológica no Estado do Pará, pois se percebe que existem laborató-rios disponíveis, mas na prática, muitos pro-fessores não os utilizam devido aos motivos citados acima, ou quando existem professo-res capacitados, as condições dos laborató-rios são decadentes, o que impossibilitar usar as ferramentas informatizadas para compor suas aulas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A finalidade deste trabalho teórico-

empírico foi identificar as dificuldades que impedem os professores de utilizar a tecno-logia da informação e comunicação em es-

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colas que possuem infraestrutura tecnoló-gica, no caso o laboratório de informática.

Para o embasamento teórico foi realiza-da uma revisão bibliográfica que ajudou a delinear a estrutura da pesquisa. Foi abor-dado conceito sobre a formação inicial e continuada de professores, inclusão digital e TIC, como forma de obter conhecimentos teóricos para analisar a prática docente em relação ao uso das tecnologias no ambiente escolar e assim entender a realidade que estes professores se encontram, em termos tecnológicos, nas instituições de ensino de caráter público.

Com a chamada era digital, a profissão de professor tem ficado mais complexa, pois novos conhecimentos precisam ser agregados em sua formação para que estes possam ser transmitidos, de maneira ade-quada, para os alunos. Um desses conheci-mentos é a informática, que atualmente é ferramenta indispensável para o desenvol-vimento do aluno, pois é considerada como grande ferramenta de estudo e trabalho. Cabe aos antigos e novos professores se capacitarem para o uso dessa nova tecnolo-gia, que está sendo inserido nas escolas e que são relevantes para a formação do alu-no. Para isso, é necessário que os docentes conheçam as TIC e como usá-las e conse-quentemente conceitos sobre a inclusão digital, que vai mostrar justamente a me-lhor forma de incluir digitalmente tanto professores como alunos.

Para o estudo empírico foi utilizada uma metodologia de estudo de caso múltiplo, onde foi utilizadas observações nas escolas como uma forma de coletar dados, questi-onários com perguntas abertas e fechadas e o desenvolvimento de matriz de análise de conteúdo, que serviu para tratar e enrique-

cer a leitura dos dados coletados nas entre-vistas.

Esta metodologia foi necessária, pois se podem obter respostas mais completas e autênticas dos entrevistados referentes aos objetivos traçados na pesquisa, que foi de identificar as dificuldades da não utilização do laboratório de informática pelos profes-sores na sua prática pedagógica.

Baseado nas pesquisas feitas nas três es-colas públicas da cidade de Belém do Pará, quando se fala da condição dos ambientes informatizados das escolas, foi constatado que o estado é regular, pois existem muitos computadores que não funcionam e a in-ternet apresenta defeitos. Isso é mais um entrave para a utilização da tecnologia pe-los docentes, já que o laboratório não dis-põe de condições para uma boa aula com recursos tecnológicos. Nesse quesito con-clui-se que há uma carência grande na in-fraestrutura tecnológica dos ambientes di-gitais dessas instituições.

Outro fator detectado que impede a uti-lização das TIC é a falta de conhecimento para usar a tecnologia, que foi a resposta de 27 do total de 46 professores dentre as três escolas pesquisadas. Percebe-se uma falta de qualificação por parte dos docentes em como utilizar a tecnologia no seu cotidiano escolar. Isso se confirmou com um número alto de docentes sem capacitação e qualifi-cação em informática e que consequente-mente se disseram não aptos para lecionar ou utilizar tecnologia em suas aulas. Dentre as três escolas, os motivos mais menciona-dos pelos professores que não tinham ca-pacitação em tecnologia foram: falta de interesse, dinheiro e tempo. Isto denota uma falta de comprometimento dos docen-tes com a educação e com o futuro dos seus alunos, já que não se comprometem em se

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atualizar, capacitar ou qualificar para minis-trar uma boa aula com uso da informática.

Porém um fato curioso se averiguou na pesquisa. Infelizmente se concluiu que há docentes aptos para lecionar ou utilizar in-formática ou o laboratório em suas aulas, pois estes possuem cursos e capacitação para isso, mas verificou-se que nem todos os que se diziam aptos utilizavam o ambien-te informatizado em suas aulas, pois alguns professores se achavam aptos apenas por saber mexer no seu próprio computador, o que não torna o profissional habilitado para utilizar tal recurso com propriedade, pois para Warschauer (2006) ter o acesso a TIC é muito mais do que oferecer o computador, é oferecer um acesso significativo as tecno-logias.

Autores como Pellanda e Schlünzen (2005) consideram a inclusão digital como o acesso à informação através do uso das TIC – Tecnologias da Informação e Comunica-ção - e a preparação do aluno para as exi-gências do mercado de trabalho. Porém, a prática observada na coleta dos dados das pesquisas nas três escolas, a maioria dos professores acharam que suas instituições não aplicam a inclusão digital de forma a-propriada ao do conceito citado acima, já que a escola às vezes oferece o recurso, mas não o preparo para manusear o mes-mo.

Entretanto, a grande questão é que exis-te uma falta de infraestrutura para poder oferecer estes recursos computacionais com melhor qualidade, pois quando há essa estrutura ela é deficitária e ultrapassada. Aliada a isso, concluiu-se também que os docentes sentem medo, insegurança, falta de interesse em utilizar as tecnologias exis-tentes em suas escolas. Há também falta de conhecimento dos mesmos para lhe dar

com as TIC, devido a ausência de cursos de capacitação e a própria desmotivação do professor em procurar se qualificar nesta área tecnológica.

Em resumo, a pesquisa observou que e-xistem professores capacitados nas escolas, porém somente esta minoria utiliza as TIC, o restante carece de formação e capacita-ção em tecnologia para poderem fazer uso dos recursos tecnológicos e assim se incluí-rem digitalmente. Alguns que possuem essa capacitação ou cursos apresentam medo, insegurança e resistência em utilizar a tec-nologia, por não saber como utilizar a mesma no seu cotidiano pedagógico, cau-sando um entrave para uso do mesmo.

Porém, o ponto mais questionado pelos docentes é a falta de melhor infraestrutura tecnológica nos ambientes escolares da ci-dade de Belém do Pará, o que faz com que seja alvo de muitas criticas e por conse-quência um fator que emperra o desenvol-vimento da inclusão digital docente no Es-tado.

Com isso, os objetivos da pesquisa foram alcançados com êxito, pois através dela se puderam obter dados que confirmaram o porquê da não utilização da tecnologia de informação e comunicação pelos docentes. Futuramente, seria interessante elaborar ou estudar soluções que viabilizem de forma mais efetiva a inclusão digital nas escolas pelos professores, a fim de que os mesmo se sintam mais seguros e capacitados para utilizarem as TIC nas suas aulas, sendo esta uma ferramenta importante para alavancar os conhecimentos dos alunos e professores.

REFERÊNCIAS ALMEIDA, F. J. Educação à distância: forma-ção de professores. 2003.

Inclusão digital de professores nas escolas públicas da região metropolitana de Belém 81

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Artigo recebido em 14 de junho de 2015. Avaliado em 21 de fevereiro de 2016. Aceito em 29 de fevereiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): FARES, Dayvid Gomes Vital. Inclusão digital de professores nas escolas públicas da regi-ão metropolitana de Belém. Estação Cientí-fica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 69-81, jul./dez. 2015.

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Artigo original

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Produção científica brasileira sobre álcool e outras drogas: um estudo bibliométrico

Gustavo Luís Caribé Cerqueira 1

1 Psicólogo especialista em Dependência Química e em Atenção Integral aos Usuários de Substâncias Psicoativas. Professor da Fa-culdade Maurício de Nassau nos cursos de Fisioterapia e Psicologia, além do Centro Regional de Referência do CETAD/UFBA, Bra-sil. E-mail: [email protected]

RESUMO: Trata-se de um estudo bibliométrico que visou quantificar e descrever as características da produção científica em álcool e outras drogas nas universida-des brasileiras no período de 2003 a 2012. O estudo compreendeu a busca de re-sumos de teses de doutorado e dissertações de mestrado depositadas no Banco de teses da Capes. Através da aplicação de métodos matemáticos e estatísticos sobre as fontes bibliográficas foram analisados um total de 350 resumos de teses e 739 resumos de dissertações. Todas as referências encontradas foram sistemati-zadas em planilha do software Statiscal Package Social Science, versão 15.0 de a-cordo com as seguintes variáveis: tipo de estudo (mestrado ou doutorado), ano de publicação, área de conhecimento, região geográfica e instituição de ensino superior. O presente estudo evidenciou que a maior parte da produção científica sobre a temática de álcool e outras drogas, desenvolvida no período investigado, se deu no formato de dissertações, com maior concentração de estudos na região sudeste, tradicional pólo de pesquisa científica em diversas áreas. Novas investi-gações são importantes no sentido de aprofundar a análise das produções aca-dêmicas coletadas para além dos resumos, contribuindo para uma verificação mais detalhada do perfil das pesquisas, em caráter de dissertação e tese, desen-volvidas no país. Palavras-chave: bibliometria; produções acadêmicas; álcool e outras drogas Brazilian scientific literature on alcohol and other drugs: a bibliometric study ABSTRACT: It is a bibliometric study that aimed to quantify and describe the char-acteristics of scientific literature on alcohol and other drugs in Brazilian universi-ties from 2003 to 2012. The study involved the pursuit of doctoral dissertation ab-stracts and master's theses deposited in the Bank CAPES theses. By applying mathematical and statistical methods on literature sources were analyzed a total of 350 abstracts of theses and dissertations of 739 abstracts. All references found were systematized in software spreadsheet Statiscal Package Social Science (SPSS) version 15.0 according to the following variables: type of study (Masters or PhD), publication year, area of expertise, geographic region and educational institution higher. This study showed that most of the scientific literature on the topic of al-cohol and other drugs developed in the investigated period occurred in the disser-tations format, with the highest concentration of studies in the Southeast, tradi-tional focal point of scientific research in various fields. Further investigations are important to deepen the analysis of academic productions collected in addition to the summaries, contributing to a more detailed verification of the research pro-file, dissertation and thesis character, developed in the country. Keywords: bibliometrics ; academic research; alcohol and other drugs

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1 INTRODUÇÃO

Discutir o fenômeno do abuso de álcool e outras drogas é algo complexo que exige a atenção das esferas socioculturais, farmaco-lógicas, psicológicas dentre outras. Neste sentido, a compreensão da ação da droga deve ultrapassar seus efeitos farmacológi-cos e estenderem-se às suas representa-ções sociais, psicológicos e na forma de co-mo se dá esse uso, o contexto envolvido e suas significações. Constata-se que apesar de uma política global de “guerra às dro-gas” que vem sendo implementada desde a segunda década do século XX, os problemas relacionados ao uso de psicoativos ilícitos só têm aumentado (MACRAE, 2001), refor-çando a necessidade de reflexão sobre te-ma tão complexo em seus aspectos socio-culturais, psicológicos, farmacológicos e ou-tros.

A problemática que remete ao uso de substâncias psicoativas está relacionada ao uso das substâncias ilegais e do abuso das substâncias lícitas. No entanto, pesquisado-res como Vargas (2006) e Macrae (1997), a-firmam que nem todo uso de álcool ou de outra droga constitui necessariamente um problema de saúde (VARGAS, 2006). Já o abuso caracteriza-se como um problema com o qual a sociedade ainda não sabe li-dar. Exemplo disso é o consumo de álcool quando associado à condução de veículos automotores resultando em acidentes de trânsito (OLIVEIRA; MELCOP, 2001) e o con-sumo do tabaco com danos já comprovados à saúde (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011), além dos altos custos ocasionados ao Sistema de Saúde (BRASIL, 2011).

No que se refere ao modo como, histori-camente, a sociedade vem se relacionando com estas substâncias observa-se uma ati-

tude repressiva que remonta a séculos pas-sados. Autores como Macrae (1997), Esco-hotado (1998), Carneiro (2005) e Valença (2010) apresentam diversos estudos que apontam que na Europa, no período dos sé-culos XIV à XVII, curadores tradicionais fo-ram perseguidos pelas Santas Inquisições, acusados de realizarem práticas profanas de cura utilizando psicoativos com proprie-dades alucinógenas. Apesar dos diferentes contextos, esse tipo de atitude adquiriu uma proporção mundial e ainda se manifes-ta no século XXI com a estigmatização do usuário e o preconceito, permeando um imaginário social pejorativo, tanto com a substância quanto com quem faz uso da mesma.

No âmbito das sociedades modernas me-didas repressivas são expressas através das políticas de repressão às drogas. Segundo Bastos (1993 apud MACHADO, 2006) a questão do uso abusivo de drogas foi pen-sada pelos formuladores de políticas sociais e de saúde em quase todas as sociedades, no imediatismo dos preconceitos, sem uma análise profunda do fenômeno.

Ao longo da última metade do século XX o debate sobre a temática das substâncias psicoativas vem ganhando maior repercus-são no mundo, principalmente em se tra-tando de drogas consideradas ilícitas.

Quando se discute a questão de drogas e os posicionamentos políticos para o enfren-tamento das questões relacionadas ao con-sumo e abuso destas substâncias sejam líci-tas ou ilícitas, estratégias como o proibicio-nismo (PEREIRA, 2009) e a abordagem de redução de danos são os principais meca-nismos utilizados para lidar com esta ques-tão (BERRIDGE, 1993; REALE, 1997; BASTOS, 1998; FONSECA, 2005). O Brasil adotou a estratégia de redução e danos desde as

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primeiras iniciativas, em 1989 na cidade de Santos (MESQUITA; RIBEIRO, 1998; BUENO, 1998 apud SANTOS; SOARES; CAMPOS, 2010), desde então tem implantado en-quanto política tais estratégias normatiza-das na portaria nº 1.059/GM de 4 de julho de 2005 (BRASIL, 2010). Enquanto as políti-cas proibicionistas estão voltadas para a re-dução da oferta e da demanda de drogas, com intervenções de repressão e criminali-zação da produção, tráfico, porte e consu-mo de drogas ilícitas, as políticas e progra-mas de redução de danos têm disseminado intervenções orientadas para a minimização dos danos à saúde, sociais e econômicos re-lacionados ao consumo de álcool e outras drogas sem necessariamente coibi-lo (OLI-VEIRA; PAIVA; VALENTE, 2006).

No Brasil, a política de drogas se confunde com a Lei nº 6.368/76, elaborada durante a ditadura militar de 1964. Tal política posta em prática naquele momento reverbera-se até os dias atuais onde há a individualização do problema – reconhecendo o usuário co-mo vilão – e desresponsabilizando o mode-lo socioeconômico pelos danos decorrentes das relações que a sociedade mantém com as drogas. Nesse contexto, buscou-se a convocação da sociedade na luta contra as drogas, compreendendo o usuário de dro-gas como doente e/ou como criminoso (FIORE, 2005 apud MACHADO, 2006).

As primeiras intervenções voltadas para o tratamento de usuários de substâncias psi-coativas surgiram no campo da justiça penal e não no âmbito da Saúde Pública (BOI-TEUX; RIBEIRO, 2010). A manutenção da or-dem social e a preservação das condições de saúde e de segurança da população bra-sileira serviram como justificativas para o estabelecimento de medidas de controle do uso de álcool e outras drogas (MACHADO,

2006). Através do discurso normativo da lei, a criação de serviços especializados para a atenção ao uso prejudicial e dependência de drogas se caracterizou por apresentar uma importância secundária às ações de saúde quando na verdade o real interesse era a repressão da oferta/demanda de dro-gas (MACHADO, 2006).

Na década de 1970 a concepção de com-bate às drogas passou a ser reformulada, já que esta se restringia ao campo da segu-rança pública, contrastando com a concep-ção do problema do uso abusivo de subs-tâncias psicoativas, que a situa no âmbito da saúde pública. Nesta última, tanto as drogas lícitas quanto às ilícitas são tidas como uma ameaça não à ordem social, mas sim à saúde da população no sentido am-plo, visando em particular os danos associ-ados ao uso de tais substâncias (BUCHER; OLIVEIRA, 1994). Analisando de outra forma o “fenômeno das drogas” tem oportunizado o questionamento das leis e a implementa-ção de políticas voltadas para a assistência, prevenção (BOITEUX et al, 2009).

Em 1980, foi criado o Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN), suas principais funções foram definidas no decreto 85.110, de 2 de setembro do referente ano (MACHADO; MIRANDA, 2007). Embora este tenha se detido as atividades de repressão à produção, tráfico e consumo de drogas, há relevância de algumas iniciativas do ór-gão para o desenvolvimento de práticas de atenção ao consumo de álcool e outras dro-gas no cenário brasileiro (OLIVEIRA, 2009). Ainda estes autores salientam a criação dos Centros de Referência na década de 1980, em sua grande maioria vinculados a univer-sidades públicas. Tais Centros voltavam-se não só para o desenvolvimento de ações de prevenção, assistência e redução de danos

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ao uso abusivo de álcool e outras drogas, como também para a formação de profis-sionais qualificados para a atenção ao usuá-rio de substâncias psicoativas e realização de estudos e pesquisas sobre a temática.

Os Centros de Referência surgiram em di-ferentes regiões do Brasil, no início da dé-cada de 1980 a exemplo do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (PROAD) do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP); o Centro de Orientação sobre Drogas e Atendimento a Toxicômanos (CORDATO) da Universidade de Brasília (UnB); o Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (NEPAD) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ); o Centro de Estudos e Tera-pia do Abuso de Drogas (CETAD) da Univer-sidade Federal da Bahia (UFBA); e o Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psi-cotrópicas (CEBRID) do Departamento de Psicobiologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNI-FESP) (MACHADO; MIRANDA, 2007).

Em 1998 ocorreu a extinção do CONFEN e consequentemente a sua transformação em Conselho Nacional Antidrogas (CONAD), Por meio do decreto 2.362, de 19 de junho de 1998 – substituído pelo decreto 3.696, de 21 de dezembro de 2000 – o presidente Fernando Henrique Cardoso instituiu o Sis-tema Nacional Antidrogas (SISNAD), com-posto pela Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) e pelo Conselho Nacional Antidro-gas (CONAD). Essa reformulação institucio-nal foi anunciada na Sessão Especial da As-sembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), dedicada ao enfrentamento do problema mundial das drogas, realizada em junho de 1998 (MACHADO; MIRANDA, 2007) tais mudanças possibilitaram o apro-

veitamento da estrutura organizacional da política de drogas resultando na criação, posteriormente, da Secretaria Nacional An-tidrogas (SENAD), que, a partir do Governo Lula, passou a se chamar Secretaria Nacio-nal de Política Pública Sobre Drogas, tendo como propósitos:

A realização de um diagnóstico situacio-nal, sobre o consumo de drogas, seu im-pacto nos diversos domínios da vida da população e as alternativas existentes. Es-te diagnóstico vem se consolidando, por meio de estudos e pesquisas de abran-gência nacional, na população geral e na-quelas específicas que vivem sob maior vulnerabilidade para o consumo e o tráfi-co de drogas. A capacitação dos atores sociais que trabalham diretamente com o tema drogas, e também de multiplicado-res de informações de prevenção, trata-mento e reinserção social. A implantação de projetos estratégicos de alcance na-cional que ampliam o acesso da popula-ção às informações, ao conhecimento e aos recursos existentes na comunidade. Também no cenário internacional, o Bra-sil além de participar dos principais fó-runs de discussão sobre o tema vem fo-mentando a cooperação por meio de a-cordos com organismos internacionais e com países das Américas, Europa e África. (BRASIL, 2013, p. 223)

No decorrer dos anos 2000, diversas ini-

ciativas se seguiram em direção à compre-ensão do fenômeno do uso/abuso de subs-tâncias psicoativas para além do caráter re-pressivo e punitivo e ao fortalecimento de políticas direcionadas às implicações desse uso na saúde da população dentre as quais destacam-se a Política Nacional de Saúde Mental (BRASIL, 2001), que estendeu os di-reitos das pessoas portadoras de transtor-

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nos mentais aos usuários de álcool e outras drogas; a Política do Ministério da Saúde para Atenção Integral a Usuários de Álcool e Outras Drogas; a Lei nº 10.216/2002 que es-tá em consonância com os pressupostos e propostas da Organização Mundial da Saú-de (SOUZA; KANTORSKI, 2007) e a nova Po-lítica Nacional sobre Drogas – PNAD (2005) que definiu como seus objetivos a busca in-cessante de atingir o ideal de construção de uma sociedade protegida do uso de drogas ilícitas e do uso indevido de drogas lícitas, reconhecendo as diferenças entre o usuá-rio, a pessoa em uso indevido, o dependen-te e o traficante de drogas, tratando-os de maneira diferenciada, de forma igualitária e sem discriminação.

Em seu estudo sobre o processo de cons-trução da política de saúde do Brasil para usuários de álcool e outras drogas, Macha-do (2006) aponta que a escassez de infor-mações a respeito dos problemas associa-dos ao consumo de álcool e outras drogas no Brasil dificultava uma avaliação sobre a necessidade de estabelecimento de medi-das de controle. Considerando a necessida-de de informações e evidências científicas para embasar a formulação e implementa-ção de Políticas sobre drogas no País, a Se-cretaria Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SENAD) desencadeou, a partir da década de 2000 uma série de incentivos à produção de trabalhos acadêmicos que in-vestigassem o consumo de substância psi-coativa e suas articulações com os aspectos de natureza psicossocial, financeira, jurídi-ca, biológica, entre outros. Tais incentivos eram disponíveis através de bolsas de pes-quisas, concursos de monografias sobre a temática além de concursos de fotografia, jingle e curtas-metragens (BRASIL, 2009).

Em 2006 a SENAD implementou o proje-to Rede de Pesquisa sobre Drogas, cujo ob-jetivo era o estabelecimento de um plano de formação de técnicos através da conces-são de bolsas de mestrado e doutorado pa-ra alunos que desenvolvessem projetos de interesse da Política Nacional sobre Drogas - PNAD sobre a temática “álcool e outras drogas”, tal iniciativa visava também fo-mentar a formação de recursos humanos em pesquisa na área de drogas (BRASIL, 2005).

Apesar das iniciativas desencadeadas, pouco ainda se sabe sobre a produção es-pecífica na temática de álcool e outras dro-gas no Brasil, tornando-se necessário o de-senvolvimento de investigações nessa pers-pectiva e entendendo que, estudos nessa direção podem contribuir para a caracteri-zação do estado da arte em relação à temá-tica bem como a identificação de lacu-nas/áreas que carecem de novas investiga-ções ou aprofundamento. Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivo ca-racterizar a produção científica brasileira sobre a temática de álcool e outras drogas no âmbito da pós-graduação Stricto sensu, no período de 2003 a 2012.

2 METODOLOGIA 2.1 Desenho de estudo

Trata-se de um estudo bibliométrico que

visa quantificar e descrever características da produção científica em uma determina-da área do conhecimento através da aplica-ção de métodos matemáticos e estatísticos sobre as fontes bibliográficas (CARVALHO, 2010, ARAÚJO; ALVARENGA, 2011). Para tanto foi realizado um levantamento da produção científica gerada em caráter de

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pós-graduação Stricto Sensu, investigando resumos de teses de doutoramento e dis-sertações de mestrado disponíveis no Ban-co de Teses da Coordenação de Aperfeiço-amento de Pessoal de Nível Superior (Ca-pes) e produzidas no período de 2003 a 2012.

2.2 Procedimentos de coleta de dados

O estudo compreendeu a busca de re-

sumos de teses de doutorado e disserta-ções de mestrado depositadas no Banco de teses da Capes, que foram publicados no período de 2003 a 2012. A escolha deste in-tervalo de tempo deu-se em função das presenças de políticas públicas (SENAD) in-dutoras da produção científica nessa área, desencadeadas a partir dos anos 2000, ca-racterizadas pelo investimento em progra-mas de incentivo para produção de teses e dissertações acerca do tema álcool e outras drogas.

O processo de busca ocorreu no período de maio a julho de 2013, sendo acessado o sítio virtual <http://www.capes.gov.br/servi cos/banco-de-teses> e consultado o DeCS – Descritores em Ciências da Saúde, para i-dentificar os descritores mais adequados a serem utilizados. Foram encontrados os se-guintes descritores: cannabis, marijuana, drogas, entorpecentes, cocaína, uso de ál-cool, uso de tabaco e crack.

Para selecionar as teses e dissertações que participaram do estudo, foram defini-dos os seguintes critérios: a) inclusão: estu-dos que problematizaram aspectos relacio-nados ao uso/abuso de substâncias psicoa-tivas em suas mais variadas esferas: jurídi-cas, sócio-históricas, econômicas, farmaco-lógicas, antropológicas, biológicas, psicoló-gicas e políticas; b) exclusão: em caso da re-

ferência se deter a drogas que não contem-plam a condição de psicoativos (psicotrópi-cos), além do período de defesa da tese e/ou dissertação.

2.5 Processamento e análise dos dados

A busca sistemática resultou em um total

de 350 resumos de teses e 739 resumos de dissertações. Todas as referências encon-tradas foram sistematizadas em planilha do software Statiscal Package Social Science (SPSS), versão 15.0 de acordo com as se-guintes variáveis: tipo de estudo (mestrado ou doutorado), ano de publicação, área de conhecimento, região geográfica, institui-ção de ensino superior.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

O Brasil, nos últimos nove anos, tem in-

vestido em pesquisas na área de álcool e outras drogas através de financiamentos de teses e dissertações, além, de projetos go-vernamentais de intervenção nesta área (BRASIL, 2009). Neste sentido, no período de 2003 a 2012 67,9% da produção acadê-mica nesta temática se deu sob o formato de dissertações e 32,1% de teses (Tabela 1) que, segundo Araújo e Alvarenga (2011) tem sido as principais modalidades de pro-duto de pesquisa nesta área no Brasil.

TABELA 1 - Categoria das produções acadêmicas de 2003 à 2012

Produção acadêmica N %

Dissertações 739 67,9 Teses 350 32,1

Total 1.089 100 Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

Numa análise temporal das produções acadêmicas (Tabela 2), observou-se cresci-mento do número de publicações durante a

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década de 2000. Alguns fatores podem ter contribuído para o interesse crescente no desenvolvimento de pesquisas em torno desta temática, sobretudo iniciativas que buscaram problematizar a questão do u-so/abuso de substâncias psicoativas sob uma perspectiva mais ampliada, seja no âmbito de eventos, seminários, conferên-cias, seja na esfera da formulação de políti-cas públicas, cuja implementação gerou um conjunto de experiências em serviços passí-veis de investigação científica.

TABELA 2 - Número e proporção de teses e dissertações produ-zidos na área temática de álcool e outras drogas no período de 2003 a 2012

Ano de publicação Dissertação Tese

n % n %

2003 55 7,4 18 5,1 2004 53 7,1 33 10 2005 74 10 31 9 2006 72 9,7 42 12 2007 68 9,2 37 10 2008 71 9,6 40 11 2009 73 9,8 48 14 2010 104 14 36 10 2011 88 12 51 14 2012 81 11 14 4 Total 739 100 350 100

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

Assim, são exemplos de eventos que co-

locaram em pauta a discussão ampliada so-bre essa temática: a realização dos I e II Seminário Nacional Antidrogas, em 2000 e 2001 respectivamente e a III Conferência Nacional de Saúde Mental em 2001 na qual foram feitas recomendações para a elabo-ração de planos municipais de saúde que contemplassem propostas de atenção aos usuários de álcool e outra drogas, com a-ções intersetoriais (BRASIL, 2001). Conside-rando a formulação de políticas públicas voltadas para essa temática destacam-se: a Política do Ministério da Saúde para Aten-ção Integral a Usuários de Álcool e Outras Drogas (BRASIL, 2003) que criou dispositi-

vos para assegurar a assistência aos usuá-rios de álcool e outras drogas no âmbito do Sistema Único de Saúde e a nova Política Nacional sobre Drogas (BRASIL, 2003) na qual se reconhecem as diferenças entre o usuário, a pessoa em uso indevido, o de-pendente e o traficante de drogas, tratan-do-os de maneira diferenciada, de forma igualitária e sem discriminação.

É justamente nessa atmosfera que ocor-rem as grandes mudanças estruturais, principalmente no discurso, re-significado quanto a perspectiva do ideal de uma "sociedade livre de drogas" dando lugar ao ideal mais centrado e realista de uma sociedade protegida do uso de drogas ilí-citas e do uso indevido de drogas lícitas (OLIVEIRA; PAIVA; VALENTE, 2006, p. 476)

Como elemento indutor do crescimento

da produção acadêmica, sobretudo no perí-odo de 2006 a 2010, destaca-se o lança-mento em 2006 da Rede de Pesquisa sobre Drogas, uma iniciativa da Secretaria Nacio-nal de Políticas sobre Drogas (SENAD/MJ), com o objetivo de promover a formação de recursos humanos em pesquisa na área te-mática de álcool e outras drogas por meio de concessão de bolsas de mestrado e dou-torado para alunos de instituições de ensi-no superior reconhecidas pela CAPES oriun-das de todas as regiões do país (BRASIL, 2009).

No que diz respeito à produção acadêmi-ca por região geográfica (Tabela 3), obser-vou-se que as regiões brasileiras que mais produziram nos últimos dez anos foram a região Sudeste com 59,3% das teses e/ou dissertações, seguida da região Sul (15%) e da região Nordeste (11,5%).

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TABELA 3 - Número e proporção de teses e dissertações produ-zidas na área temática de álcool e outras drogas, segundo regi-ão geográfica, 2003 a 2012

Região Produção acadêmica n %

Sudeste 647 59,3 Sul 164 15 Nordeste 125 11,5

Centro-oeste 64 6 Norte 6 0,6 Não identificada 83 7,6

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

Com relação às Instituições de Ensino

Superior cadastradas na CAPES que mais produziram no período (Tabela 4), desta-cam-se a Universidade de São Paulo – USP (15,3%), seguida pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP (8%) e pela Univer-sidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho- UNESP (4,4%). Considerando também a produção das Universidades Federal e Es-tadual do Rio de Janeiro (4,3% e 4,0%), a Pontifícia Universidade Católica de São Pau-lo – PUCSP (3,8%) e a Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG (3,2%) observa-se que o principal pólo de produção acadêmi-ca nesta área é a região Sudeste. Dentre as Instituições de Ensino Superior fora da regi-ão Sudeste destaca-se a Universidade Fede-ral da Bahia (3,1%), com a maior produção da região Nordeste.

TABELA 4 - Número e proporção de teses e dissertações produ-zidos na área temática de álcool e outras drogas, segundo Ins-tituição de Ensino Superior (IES) de origem, 2003 a 2012

IES Produção acadêmica n %

USP 167 15,3 UNIFESP 87 8,0 UNESP 48 4,4 UERJ 47 4,3 UFRJ 44 4,0 PUC SP 41 3,8 UFMG 35 3,2 UFBA 34 3,1 PUC RS 34 3,1 UNICAMP 28 2,6 UnB 26 2,4 FIOCRUZ 25 2,3

UFC 24 2,2 UFCS e UFF 20 1,8 UFES 16 1,5 UFPE 15 1,4 UFPR e UEM 14 1,3 UFPB e UEL 11 1,0 UFSCAR e UMESP 10 0,9 UNISINOS , UFG e PUC RJ 09 0,8 Demais IES abaixo de nove produ-ções nos últimos 12 anos

387 35

Dado indisponível 01 0,1 Total 1089 100

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

No que diz respeito ao financiamento

(Tabela 5), observa-se que aproximadamen-te a metade do total de teses e dissertações produzidas no período (48%) foram financi-adas, evidenciando que ainda são necessá-rios investimentos para a produção de pes-quisa nesta área.

TABELA 5 - Número e proporção de teses e dissertações produ-zidos na área temática de álcool e outras drogas, segundo fi-nanciamento, 2003 a 2012

Categorias Produção acadêmica

n %

Pesquisas financiadas 523 48 Pesquisas não financiadas 566 52

Total 1089 100

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

Conforme evidenciado na Tabela 6, as

áreas de conhecimento que apresentaram maior número de teses e dissertações pro-duzidas nos últimos nove anos, foram as á-reas de Ciências Humanas (34,6%), Ciências da Saúde (33,4%) e Ciências Sociais Aplica-das (8,9%) Importante salientar que em 15% dos resumos esta informação não es-tava disponível.

TABELA 6 - Produção acadêmica na área temática de álcool e outras drogas por área de conhecimento, 2003 a 2012

Área de conhecimento n %

Química 07 0,7

Ciências biológicas 67 6,2 Ciências da saúde 357 32,7 Ciências agrárias 01 0,1 Ciências sociais aplicadas 97 8,9

Ciências humanas 373 34,5

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Linguística, letras e artes 05 0,5 Multidisciplinar 15 1,4 Dado indisponível 167 15

Total 1089 100

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

No âmbito das Ciências da Saúde (Tabela

7), a maior produção se destacou nas subá-reas de Saúde Coletiva, Medicina e Enfer-magem, respectivamente 35,6%, 24,6% e 23% do total de publicações. Na Saúde Co-letiva foram encontrados 127 estudos sen-do 17 em Epidemiologia, 29 em Saúde Pú-blica e 6 em Medicina Preventiva, conforme a classificação da CAPES. Em Enfermagem foram encontrados 82 estudos e em Medi-cina encontrou-se 88 estudos com destaque para a subárea de Psiquiatria, com 50 estu-dos.

Tabela 7 - Produção acadêmica na área temática de álcool e outras drogas por área de conhecimento, 2003 a 2012: Ciências da Saúde

n %

Ciências da saúde (sub-área não especifi-cada)

41 11,4

Medicina 88 24,6

Nutrição 2 0,5 Odontologia 7 1,9 Farmácia 5 1,5

Enfermagem 82 23 Saúde Coletiva 127 35,6

Fonoaudiologia 4 1,2

Fisioterapia e Terapia Ocupacional 1 0,3 Total 357 100

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

Com referência às Ciências Humanas, a

Psicologia apresentou maior produção com 219 estudos. Em seguida a Educação com 65 estudos e a Antropologia com 30 estu-dos encontrados. Na Psicologia destacaram-se as sub-áreas de Psicologia Social com 39 estudos encontrados e Tratamento e pre-venção psicológica com 27 estudos (Tabela 8). A Antropologia apresentou um número expressivo de estudos e tem sido conside-rada uma área de grande importância no

auxílio da compreensão do fenômeno no âmbito das diferentes culturas, diferentes tipos de uso, desmistificando e diminuindo preconceitos. Neste sentido, salienta Ma-crae (2001), atualmente é comum se dizer que uma abordagem exclusivamente far-macológica da questão da droga não é sufi-ciente, e que os efeitos tanto individuais e subjetivos, quanto os sociais do uso de substâncias psicoativas só podem ser en-tendidos a partir de uma perspectiva biop-sicossocial.

Tabela 8 - Produção acadêmica na área temática de álcool e outras drogas por área de conhecimento, 2003 a 2012: Ciências Humanas

n %

Ciências Humanas (sub-área não especificada)

8 2,2

Sociologia 22 5,9 Antropologia 30 8,0 História 8 2,2

Geografia 8 2,2 Psicologia 219 59 Educação 65 17 Ciência Política 13 3,5

Total 373 100

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

Nas Ciências Sociais Aplicadas a maior

quantidade de estudos encontrados foram referentes ao Direito com 35 estudos e Ser-viço Social com 31 produções acadêmicas identificadas (Tabela 9).

Tabela 9 - Produção acadêmica na área temática de álcool e outras drogas por área de conhecimento, 2003 a 2012: Ciências Sociais Aplicadas

n %

Ciências Sociais Aplicadas (subárea não especificada)

12 12,3

Direito 35 36 Economia 9 9,2 Planejamento Urbano e Regi-onal

2 2,0

Mortalidade 1 1,0 Comunicação 7 7,5 Serviço Social 31 32

Total 97 100

Fonte: Portal de periódicos CAPES, 2013.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo evidenciou que a

maior parte da produção científica sobre a temática de álcool e outras drogas desen-volvida no período investigado se deu no formato de dissertações, com maior con-centração de estudos na região sudeste, tradicional pólo de pesquisa científica em diversas áreas. O período de intensificação das pesquisas coincide com o aprofunda-mento das discussões sobre a temática e com o estabelecimento de articulações e parcerias interinstitucionais, sobretudo en-tre governo e Instituições de Ensino Superi-or no sentido de induzir pesquisas sobre as políticas e experiências implementadas. As áreas de Ciências Humanas e da Saúde lide-raram a produção nessa temática, com des-taque para os estudos antropológicos, epi-demiológicos, análise de políticas públicas, e estudos em psiquiatria. Observou-se tam-bém que ainda são necessários investimen-tos para a produção de pesquisa nesta área.

Novas investigações são importantes no sentido de aprofundar a análise das produ-ções acadêmicas coletadas para além dos resumos, contribuindo para uma verificação mais detalhada do perfil das pesquisas, em caráter de dissertação e tese, desenvolvias no país.

Recomenda-se desenvolvimento de no-vos estudos bibliométricos na área de álcool e outras drogas que permitam a análise das produções como um todo, e a seleção de maior número de variáveis a serem exami-nadas contribuindo para a verificação da qualidade das produções científicas na área de álcool e outras drogas e seus desdobra-mentos no Brasil.

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License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original work is properly cited. Artigo recebido em 11 de outubro de 2015. Avaliado em 08 de março de 2016. Aceito em 08 de março de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): CERQUEIRA, Gustavo Luís Caribé. Produção científica brasileira sobre álcool e outras drogas: um estudo bibliométrico. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 83-94, jul./dez. 2015.

Ensaio

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Leitura e escrita na sala de aula

Rafaete de Araújo 1

1 Graduada em Letras - Língua Portuguesa pela Universidade Estadual do Maranhão. Professora da rede municipal de Açailândia-MA, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO: A prática de ensino de escrita e leitura é muito discutida, princi-palmente, quando os resultados nacionais são apresentados, além do ensi-no distante da realidade dos falantes nativos, diante disso o estudo traz uma discussão sobre essa prática, envolvendo o texto como base no pro-cesso de aquisição das competências comunicativas, dando ênfase na competência textual, fazendo um panorama das formas do uso do texto na sala de aula, o momento de valorização do contexto como as inúmeras va-riedades existentes, sendo indispensável no processo de comunicação den-tro ou fora da sala de aula, o envolvimento com a língua em uso, atividade mutável e variável. Conclui-se, para um resultado eficaz é necessário o en-volvimento com a língua em uso e respeitando as inúmeras variedades e-xistentes, tendo como centro – o texto. Palavras-chaves: Texto. Ensino. Prática. Comunicação. Língua.

Reading and writing in the classroom ABSTRACT: The practice of teaching writing and reading is much debated, especially given the national results, but also far from the reality of teach-ing native speakers, the study presents a discussion of this practice, involv-ing the text as a basis in the acquisition of communicative competence with emphasis on textual competency, an overview of the ways of using the text in the classroom, the time to recovery of the context as the many existing varieties, being essential in the communication process inside or outside the classroom, involvement in the language in use, changeable and variable activity. Concludes that for an effective result it is necessary en-gagement with language use and respecting the many existing varieties, with the center - the text. Keywords: Text. Education. Practice. Communication. Language.

1 INTRODUÇÃO

Ao observamos as competências e habi-

lidades adquiridas pelos alunos dos mais diversos níveis educacionais, entendemos que a realidade é muito distante daquela exigida para os respectivos níveis escolares. São aulas e aulas tentando ensinar uma lín-gua que não é vivida diariamente por eles,

ocasionando insatisfação com a leitura e escrita, dificuldade nas habilidades funda-mentais para qualquer ciclo escolar, princi-palmente, nos anos finais do ensino funda-mental. A partir dessas considerações inici-ais, faz-se necessário asseverar que o pre-sente texto traz uma reflexão acerca da prá-tica de ensino-aprendizagem de leitura e escrita de forma contextualizada envolven-

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do o texto como mecanismo para uma boa interação sócio-educacional.

Neste primeiro momento, refletiremos sobre o texto e as variações textuais e o seu uso na sala de aula, como uma atividade concreta da língua em funcionamento, fa-zendo um retrocesso da análise transfrásti-ca, gramática textual à teoria do texto, en-fatizando a competência textual, como também a linguística textual na sala de aula na prática de ensino de leitura e escrita.

No segundo momento, desmistificamos o ensino homogêneo e imutável da língua, apresentando elementos que devem ser explorados e respeitados no ensino, presen-tes nos textos e em suas manifestações. Pensando na importância da leitura e escri-ta, como essenciais para definir os objetivos deste estudo, sendo realizado por meio de texto, o presente trabalho reflete-se tam-bém sobre as práticas isoladas e fracassos nas salas de aulas, em que o ensino de es-crita e oralidade é apenas pretexto para avaliar: a ortografia oficial, a gramática – momento de repassar regras e normas – e a leitura, espaço para averiguar as pronúncias e decodificação da escrita. Então, vê-se a necessidade do ensino contextualizado e uniforme. Ademais, para um resultado efi-caz a prática deve ocorre por meio de tex-tos, como na prática de leitura para familia-ridade com diferentes espaços e usos lin-guísticos dentro desse processo dinâmico e misto, respeitando as inúmeras variedades existentes, sendo indispensável o contexto social na sala de aula, interdisciplinaridade, intertextualidade, o envolvimento com a língua em uso, processo mutável e variável.

2 TEXTO: UNIDADE BÁSICA NA PRÁTICA DE LEITURA E ESCRITA NA SALA DE AULA

Diante de inúmeros estudos e debates, o

ensino de língua portuguesa concretizou-se no desenvolvimento da competência co-municativa, ou seja, na capacidade de com-preender textos nas diferentes manifesta-ções de interação que os falantes são en-volvidos nas situações de sócio-comunica-ção, já que, comunicamo-nos por meios de diversos textos e estruturas, produzimos uma atividade com uso da linguagem - o discurso, e temos uma atividade de falante para a criação de texto, seja de forma inte-rativa ou informativa. Temos o texto como produto concreto do uso da língua. Ao defi-nir texto, Koch e Travaglia (1989, p. 8-9) afirmam que:

É uma unidade linguística concreta, que é tomada pelos usuários da língua, em uma situação de interação comunicativa espe-cífica comunidade de sentido e como preenchendo uma função comunicativa reconhecível e reconhecida, independen-temente da sua extensão.

Essa unidade linguística concreta é algo

significativo de construção do mundo, re-presentada pelos discursos tanto na fala como na escrita, uma língua em funciona-mento, pensando assim, temos a Linguística Textual defendendo a ideia de que a língua não funciona de partes isoladas (as frases soltas), como o ensino tradicional previa, mas sim de unidades de sentido complexas (os textos). A partir dessa defesa, o texto passou a ser reconhecido em tipos e gêne-ros diversos, uma vez que, “todo texto se organiza dentro de determinado gênero em função das intenções comunicativas, como

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parte das condições de produção dos dis-cursos, as quais geram usos sociais que os determinam” (BRASIL, 1998, p. 21).

No entanto, houve muitas mudanças em relação à análise de textos para definir qual o objetivo de estudo dessa unidade. Bentes e Mussalim (2006) distinguem três momen-tos que abrangeram preocupações teóricas bastante distintas entre si, desde a análise transfrástica, passando pelas gramáticas textuais e finalmente à teoria do texto. Ca-da processo teve suas contribuições impor-tantes para o estudo da língua e principal-mente o uso do texto, que passou a ser bem mais explorado, e a construção de uma linguística do discurso, o distanciamento da linguística estrutural de Saussure.

A teoria da análise transfrástica era o percurso da frase ao texto, por tal razão o texto era definido como uma sequência co-erente de enunciados. Percebe-se que o processo estava focado na análise sintática e semântica da frase, podendo ser feito também de forma isolada. Mas com o tem-po, foi possível perceber que, para analisar determinados casos, só seria possível expli-car com referência de um contexto situa-cional, pois muitas vezes os elementos coe-sivos não se encontravam presentes dentro dos textos.

Os estudos da gramática textual traziam “um projeto de reconstrução do texto como um sistema uniforme, estável e abstrato” (BENTES; MUSSALIM, 2006). O texto passou a ser estudo da linguística. A partir desse momento, acontece um processo inverso, em que parte-se do texto, por segmentação significativa até chegar a unidade menor, em que acontecia a classificação, defen-dendo a ideia de que todos os falantes pos-suíam a competência textual, sendo capaz de identificar a unidade maior (o texto) de

meras frases desconexas. Karnopp (2006, p. 20) diferenciou da seguinte forma:

A diferença entre frase e texto não era somente quantitativa, mas qualitativa, [...] propondo que a partir do texto fos-sem analisadas e classificadas as unidades menores, desde que não se perdesse a função textual dos elementos isolados. Com esse objetivo, o texto constituiria ‘uma entidade do sistema linguístico, cu-jas estruturas possíveis em cada língua deveriam ser determinadas pelas regras da gramática textual.

O texto passou a ter um caráter linguísti-

co também. Sendo assim, os falantes possu-íam as habilidades de identificar aquele sis-tema como um texto estruturado, compre-ender e diferenciar os tipos de textos diver-sos. Sendo que o texto não era um sistema homogêneo não foi possível desenvolver uma gramática formal. Os estudos centra-vam-se “em descrever a competência tex-tual de falantes idealizados, investigar a constituição, o funcionamento, a produção e a compreensão dos textos em uso” (BENTES; MUSSALIM, 2006, p. 265), inicia-va-se a elaboração da teoria do texto.

A competência textual é a capacidade de produzir e compreender textos em situa-ções de interação comunicativas, como também modificar e identificar característi-cas próprias, além de adequação da lingua-gem nas situações sociocomunicativas. Es-sa competência não se resume em redações de textos mecânicos, mas produções e fa-miliaridade com a pluralidade do discurso, do enunciado e do texto.

No terceiro momento, o elemento de es-tudo passa a ser visto não apenas como um produto, mas como um processo, tendo mais um fator de análise, o pragmático. O

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texto parte agora para o contexto, “conjun-to de condições externas da produção, re-cepção e interpretação dos textos” (BENTES; MUSSALIM, 2006, p. 251). Nesse momento vê se a necessidade de entender o quê, como e por que foi produzido de-terminado texto, seja por influências inter-nas ou externas do processo em si, além das influências dos falantes. Como Bakhtin (1986, p. 113) resume o conceito de texto:

Poder-se-ia, assim, conceituar o texto, como uma manifestação verbal constituí-da de elementos linguísticos selecionados e ordenados pelos falantes durante a ati-vidade verbal, de modo a permitir aos parceiros, na interação, não apenas a de-preensão de conteúdos semânticos, em decorrência da ativação de processos e estratégias de ordem cognitiva, como também a interação (ou atuação) de a-cordo com práticas socioculturais.

O texto é uma reprodução que pode a-

contecer tanto na modalidade escrita como oral, em que o falante desenvolverá uma atividade comunicativa e com sentidos den-tro de um processo de interação. E será também por meio do texto que essa ativi-dade, denominada discurso será concreti-zada e compreendida. Apresentando rela-ções situacionais e contextuais, em que ele está ligado ao contexto de produção for-mado por vários outros textos além dessa relação, os elementos dos enunciados e os elementos extralinguísticos são importantes para compreensão de um texto.

2.1 A prática de leitura e escrita na sala de aula

Quando falamos de língua portuguesa,

mencionamos vários elementos que devem

ser vistos e analisados na atividade de ensi-no, principalmente, na sala de aula, como é o caso da leitura e da escrita – competên-cias necessárias para qualquer indivíduo que termine seu ciclo básico escolar. Esses elementos acabam sendo explorados super-ficialmente e de formas mecânicas, esque-cendo que possuem inúmeras formas de interação por meio de diversos contextos, seja na forma escrita ou oral.

O ensino da escrita na sala de aula, desde a alfabetização, vem sendo uma atividade mecânica, encontrada nos primeiros passos escolares com o objetivo da aquisição das habilidades motoras, e nos anos seguintes à representação gráfica da língua, além de encontrarmos em aulas práticas, enuncia-dos como: “marque os erros de português nas seguintes frases”, “forme frases com as palavras abaixo”, sendo muito comum tam-bém, como meio avaliador da caligrafia e ortografia dos alunos. Dessa forma, o ensi-no permanece centralizado em nomencla-turas gramaticais ou análise sintática, aban-donando-se as dimensões da linguagem, em que ela apresenta uma interação nas diversidades de seus usos, como diz Antu-nes (2003, p.45): “a atividade da escrita é, então, uma atividade interativa de expres-são, (ex, “para fora”), de manifestação ver-bal das ideias, informações, intenções, crenças ou dos sentimentos que queremos partilhar com alguém, para, de algum mo-do, interagir com ele”.

A importância da interação da língua leva os questionamentos das práticas de escrita mecânica, pois a funcionalidade da escrita está relacionada ao desenvolvimento de diferentes funções comunicativas e sociais. São objetivos da escrita: o registro das con-dições de produções e o domínio do código linguístico, com base no uso e na funciona-

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lidade da língua e linguagem ligada ao pro-cesso de comunicação. Não são apenas produções de textos sem relação com con-texto de ensino, apenas para correção da ortografia oficial da língua portuguesa, a prática de ensino de escrita deve estabele-cer vínculos comunicativos. Antunes (2003, p. 62) mostra que “a escrita escolar deve realizar-se também com o fim de, por ela, se estabelecerem vínculos comunicativos. Nessa dimensão, não pode deixar de ser, sempre, escrita de textos; de textos relacio-nados em que vivem os alunos”.

Um ensino contextualizado de escrita es-tá nos textos e suas manifestações. Os tex-tos estão sempre relacionados a um contex-to. O ensino também deve estar ligado a uma situação, podendo trabalhar as situa-ções linguísticas vivenciadas pelos alunos. Levando em consideração a forma, caracte-rísticas e funções dos gêneros textuais, a-lém dos elementos de composição nas pro-duções escritas, não seria uma atividade artificial, mas uma reflexão da língua e da linguagem no uso da escrita.

A reflexão do uso da escrita abrange a análise das condições de produção, méto-dos diferenciados para elaboração, caracte-rísticas discursivas, como também coerên-cia e coesão textual, e seus propósitos de escrita, e por fim os padrões de escrita. Como a oralidade, a escrita apresenta varia-ções, em que cada dialeto tem seus padrões em que o culto é apenas mais variação lin-guística, mesmo que ditada como única, a atividade de escrita só será eficiente quan-do planejada, escrita e avaliada para uma reescrita, nesse momento teremos a refle-xão do uso da língua e linguagem como fun-ção de interação, não apenas atividades mecânicas, como são realizadas nas salas de aulas.

A competência textual está associada às produções textuais, mas também considera os processos de leitura, não como atividade de decodificação de letras e palavras, mas um trabalho com a oralidade, em que as variações se fazem mais presentes, acredi-tando na valorização desse mecanismo, principalmente nas escolas. O contato com diversos textos possibilitará a familiaridade com situações diferentes de interação co-municativa, se cumprindo o objetivo da competência textual: produzir e compreen-der textos nas mais diversas situações de comunicação.

A leitura é a concretização da escrita, ou seja, aquilo que é escrito é para ser lido. Muitas crianças e adolescentes são capazes de decodificar a escrita, mas não conse-guem entrar na essência do texto. Isso não é leitura. Segundo Cagliari (1993, p.150), leitura é:

Uma decifração e uma decodificação. O leitor devera em primeiro lugar decifrar a escrita, depois entender a linguagem en-contrada, em seguida decodificar todas as implicações que o texto tem e, finalmen-te, refletir sobre isso e formar o próprio conhecimento e opinião a respeito do que leu.

A prática de leitura em muitas escolas

brasileiras está centralizada somente na decodificação dos signos linguísticos. Na verdade, é necessário mais do que isso: o aluno deve ser capaz, além de decodificar os símbolos escritos, como compreender o texto, saber qual o tema, se é uma narração ou descrição ou um texto injuntivo, qual seu objetivo e saber resumir isso em poucas palavras; após ser capaz de compreender, passe-se para interpretá-lo, encontrar e

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organizar as ideias presentes naquele enun-ciado e por fim reter as informações implíci-tas e relevantes por ele encontradas, assim terá base para uma reflexão e formar suas próprias opiniões.

Os exames nacionais, como a Prova Bra-sil, utilizam a leitura como ferramenta de avaliação, pois “requer a competência de apreender um texto como construção de conhecimentos em diferentes níveis de compreensão, análise interpretação” (BRASIL 2008, p. 21). A leitura é importante como qualquer outra atividade, sendo res-ponsável pela aquisição de conhecimento de outras áreas e do exercício da cidadania. Sendo que as dificuldades de domínio de leitura resultam, além das evasões e repe-tências escolares, a aversão pela disciplina, como também as dificuldades em participa-ção social como mostra Antunes (2003, p. 20):

Com enormes dificuldades de leitura, o aluno vê frustrado no seu esforço de es-tudar outras disciplinas e, quase sempre “deixa” a escola com a quase inabalável certeza de que é incapaz, de que é lin-guisticamente deficiente, inferior, não podendo, portanto, tomar a palavra ou ter voz para fazer valer seus direitos, para participar ativa e criticamente daquilo que acontece à sua volta.

Ensinar a desenvolver habilidades de lei-

tura nas aulas de português significa possi-bilitar leituras contextualizadas, ou seja, que possuam uma função comunicativa, uma interação, como também algo motiva-dor que desperte nos alunos o hábito de ler. A contextualização ocorre na apresen-tação de diversos gêneros textuais, que possuem suas funções comunicativas, des-

de a leitura e escrita ou a escuta de um tex-to de cordel a um conto, ou uma entrevista a uma reportagem, contemplado tanto a oralidade como a escrita, em que o plane-jamento de estratégias para a leitura é fun-damental na formação de um leitor compe-tente.

A leitura em sala de aula possibilita a fa-miliarização do aluno com a funcionalidade da linguagem, como a ampliação das infor-mações, novas ideias e opiniões. A reprodu-ção por meio da produção do texto é um caminho para identificar os avanços e as dificuldades dos alunos, tanto no domínio linguístico como na identificação dos ele-mentos bases da compreensão textual. A seleção do texto será pelas necessidades e possibilidades dos alunos, levando-se em consideração o contexto de produção. Esses dois critérios são vistos pelos PCN (BRASIL, 1998, p. 37) da seguinte forma:

As necessidades dos alunos definem-se a partir dos objetivos colocados para o en-sino. As possibilidades de aprendizagem, por sua vez, definem-se a partir do grau de complexidade do objeto e das exigên-cias da tarefa proposta. Ambas, necessi-dades e possibilidade - são determinadas pelos conhecimentos já construídos pelos alunos.

A exploração do uso da língua oral e es-

crita envolve a produção e a recepção do discurso, seja de forma oral, no diálogo, ou escrito, em um artigo de opinião. Assim sendo, entra nesse eixo explora a prática da escuta e leitura de textos e a produção de textos nas duas variáveis. A proposta é dis-por aos alunos um ensino que considere as especialidades de cada prática da lingua-gem, ou seja, uma articulação entre si.

Leitura e escrita na sala de aula 101

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3 CONCLUSÃO Diante da exploração da expressividade

das variedades linguísticas das situações sociais vivenciadas pelos alunos, entende-se que a prática de leitura e escrita na sala de-ve trazer características de uma língua viva e dinâmica, ligada ao dia a dia dos falantes, explorando as formas possíveis das mani-festações desse processo linguístico, sendo o texto esse elo.

O texto, fonte riquíssima de diversas formas de apresentação do uso da língua e da linguagem, seja formal ou informal, oral ou escrita, é usado para identificação de verbos, sujeitos, orações, vozes verbais, ou seja, a gramática normativa, quando não é uma forma de avaliar a habilidade de deco-dificação ou pronúncia das palavras. Possi-bilitando assim o ensino pautado no conhe-cimento linguístico e discursivo, que ainda não está completamente presente nas salas de aulas.

Uma vez que, a prática de leitura e escri-ta deveria estar pautada na aquisição das competências comunicativas, isto implica duas outras competências: linguística (gra-matical) e textual. Assim, os usuários seriam capazes de adequar a língua em diversas situações comunicativas, o uso da lingua-gem, como também construir frases e ora-ções aceitáveis, além de produzir e com-preender um texto dentro do discurso.

O texto é a materialização do discurso, que compete tanto a língua escrita como a falada. Dessa forma o discurso não é único, apresentando variações linguísticas e soci-ais, defendendo a ideia de reflexão linguís-tica no contexto escolar, em que as duas modalidades da língua apresentam caracte-rísticas comuns, como a dialogicidade, usos estratégicos, funções interacionistas, envol-

vimento, situacionalidade, coerência e di-namismo.

Portanto, na concepção de que a socie-dade não usa uma única forma para comu-nicar-se, cada situação passa por transfor-mações com base nas mudanças de lugares, idade, sexo, profissões e outros, acredita-se que se as escolas empregarem a prática de leitura e escrita a partir do texto como ele-mento fundamental, teríamos no futuro mais alunos capazes de usar a língua e a linguagem no seu real objetivo: a interação social, além de dominarem a escrita e a fa-la, e de fato, fortalecendo a ideia do saber língua portuguesa.

REFERÊNCIAS ANTUNES, I. Aula de Português: encontro e interação. 8. ed. São Paulo: Parábola Edito-rial, 2003. BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Lin-guagem. 3. ed. São Paulo: Hucitec, 1986. BENTES, A. C.; MUSSALIM, F. Linguística textual. Introdução à Linguística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2006. BRASIL. Secretaria da Educação Fundamen-tal. Parâmetros Curriculares Nacionais ter-ceiro e quarto ciclo do Ensino Fundamen-tal: Língua Portuguesa. Secretaria da Educa-ção Fundamental – Brasília: MEC/SEF, 1998. ______. Plano de Desenvolvimento da Edu-cação. Matrizes de referência, tópicos e descritores: Prova Brasil Ensino Fundamen-tal. Brasília: MEC/SEF, 2008. CAGLIARI, L. C. Alfabetização e linguística. São Paulo: Scipione, 1993. KARNOPP, L. B. Linguística Textual. In: FLO-RES, O. (Org.). Teorias do texto e do discur-so. Canoas: Ed. ULBRA, 2006. KOCH, I. G. V.; TRAVAGLIA, L. C. Texto e co-erência. São Paulo: Cortez Editora, 1989.

102 Araújo

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License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, pro-vided the original work is properly cited.

Artigo recebido em 25 de janeiro de 2015. Avaliado em 10 de dezembro de 2015. Aceito em 13 de janeiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): ARAÚJO, Rafaete de. Leitura e escrita na sala de aula. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 95-102, jul./dez. 2015.

Entrevista

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O Programa de Leitorados do Ministério das Relações Exteriores do Brasil: o ex-leitor José Maria Rodrigues relata suas experiências

durante os quatro anos de leitorado no território paraguaio

The Leitorados Program of the Ministry of External Relations of Brazil: the ex- lecture (reader) José Maria Rodrigues recounts his experiences during the four years of

lectureship in Paraguayan territory

André Luiz Ramalho Aguiar 1

1 Doutorando em Estudos da Tradução (PGET-UFSC) e Mestre em Letras (Université Paris 3/Sorbonne Nouvelle). É Professor Leitor da Universidade Nacional de Assunção (UNA), no Paraguai, atuando no âmbito do Programa de Leitorados do Ministério das Rela-ções Exteriores do Brasil. E-mail: [email protected]

José Maria Rodrigues (Figura 1) é forma-do em Português/Inglês pela Universidade Estadual de Londrina (1998), Especialista em Didática e Metodologia do Ensino pela Universidade do Norte do Paraná (1999), Mestre em Língua Espanhola (2003) e Dou-tor em Linguística Aplicada (2009), diplomas adquiridos pela Universidad de Valladolid

(2009), Espanha. Durante o período que esteve na Europa, atuou como pesquisador científico em vários projetos sobre linguísti-ca de corpus, espanhol e português como línguas estrangeiras e linguística computa-cional. Lá, lecionou em vários centros de ensino e universidades europeias, entre as quais se destacam: a Universidad de Valla-

dolid, onde desenvolveu um conjunto de ferramentas computadorizadas para a aná-lise empírica automática de corpora lingüís-ticos (Wanlex e AGN), a University of Wales-

Aberystwyth, onde desempenhou a função de professor de espanhol como língua es-trangeira, e a Sorbonne Paris III, instituição na qual deu um curso de capacitação sobre linguística de corpus.

Figura 1: Imagem do entrevistado: José Maria Ro-drigues Figure 1: Picture of the interviewed: José Maria Rodrigues

Ao retornar ao Brasil em 2007, J. M. Ro-

drigues candidatou-se ao Programa de Lei-torados do Ministério das Relações Exterio-

104 Aguiar

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res do Brasil (MRE-Capes) e foi selecionado para a função de Professor Leitor, lotado na Universidade Católica de Assunção (UCA), onde exerceu a função de 2008 a 2012. A partir deste momento, começa a saga desse pesquisador, professor universitário e em-presário no universo multilíngue e multicul-tural demarcado pelo território paraguaio.

Em 2009, foi idealizador e coordenador do I Seminário Internacional de Educação Intercultural Bilíngue e Educação Indígena: Educación en la diversidad: experiencias y

desafíos en la Educación Intercultural Bilin-

güe en Brasil y en Paraguay, Assunção. De-pois vieram o II Seminário Internacional de Educação Intercultural Bilíngue e Educação Indígena: Educación Lenguas y Culturas en

el MERCOSUR: pluralidad cultural e inclusi-

ón social en Brasil y en Paraguay (2010) e o III Seminário Internacional de Educação In-tercultural Bilíngue e Educação Intercultu-ral: Ciudadanía democrática y multilingüis-

mo: Los derechos de la infancia y la cons-

trucción de la Identidad lingüística y cultural

del Mercosur (2011). Os eventos contaram com o apoio da Embaixada do Brasil em Assunção, do Fundo das Nações Unidas pa-ra a Infância (UNICEF) e do Centro de Estu-dos Antropológicos da Universidade Católi-ca (CEADUC).

A experiência adquirida durante esses eventos lhe permitiu recompilar, organizar e publicar uma coleção de livros sobre Edu-cação Intercultural e Educação Indígena: Diversidad, Interculturalidad y educación en

Brasil y en Paraguay: problemas, experien-

cias y realidades (2010); Ciudadanía demo-

crática y multilingüismo: la construcción de

la identidad lingüística y cultural del Merco-

sur (2012) e Políticas lingüísticas para la

integración educativa y cultural en el Mer-

cosur: Legislación, Planificación Idiomática y

Glotopolítica (2013). Além de, publicar co-mo co-autor, o Diccionario Trilingüe del

Mercosur - Ñe'ê Mercosur Pegua Ryru: gua-

rani-español-portugués (2011), obra que tornou-se referência para a lexicografia do Cone Sul.

Atualmente, J. M. Rodrigues é pesquisa-dor científico (Nível I) do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia do Paraguai (CO-NACYT), professor catedrático na Universi-dade Nacional de Assunção, onde atua, par-ticularmente, na Licenciatura de Língua Por-tuguesa e presidente do Instituto para a Promoção e o Ensino da Língua, Literatura e Cultura Brasileiras (IPEBRAS), instituição privada, fundada em dezembro de 2014, por um grupo de ex-leitores brasileiros no Paraguai.

A proposta desta entrevista nasceu no momento em que assumi, em abril de 2014, uma vaga para o leitorado na Universidade Nacional de Assunção (UNA), onde fui lota-do na Licenciatura em Língua Portuguesa, curso oferecido pelo Instituto Superior de Línguas (ISL), vinculado à UNA e apoiada pelo governo brasileiro por meio da Embai-xada do Brasil em Assunção, Paraguai. Na-quele momento, a função de Professor Lei-tor era considerada por mim um novo desa-fio e algo pouco esclarecedor.

Na UNA, em 2014, eu voltei a comparti-lhar o espaço acadêmico com o professor J. M. Rodrigues. Havíamos nos conhecido du-rante o período de 2012-2013 na Universi-dade Federal da Integração Latino-America-na (UNILA), quando atuamos como profes-sores visitantes daquela instituição e regis-tramos momentos memoráveis em Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil. Neste contexto, eu e o professor J. M. Rodrigues tivemos inúme-ras conversas informais em torno do signifi-cado e das funções específicas do Professor

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Leitor nas universidades estrangeiras e, neste sentido, resolvemos registrar por meio de uma entrevista as experiências vi-vidas por ele, primeiro leitor brasileiro no Paraguai.

A entrevista foi concedida e gravada num famoso café no centro de Assunção, Para-guai, situado entre as ruas Mariscal Estigar-

ribia e Yegros, no dia 10 de dezembro de 2014, e os principais objetivos foram: (i) esclarecer o processo de seleção para o cargo de Professor Leitor; (ii) apresentar um panorama minucioso do campo de atuação deste profissional; (iii) explicar o vínculo do Professor Leitor com o Programa de Leito-rados do Ministério das Relações Exteriores do Brasil (MRE-Capes) e (iv) refletir como o Leitor pode dialogar com as universidades locais, as embaixadas brasileiras e as comu-nidades civis.

Espero que o registro dessas experiên-cias, tão instigantes e esclarecedoras, pos-sam elucidar dúvidas daqueles que preten-dem se candidatar ao cargo de professor Leitor e desejam investir nessa área de atu-ação, promovendo assim, a língua, a cultura e a literatura brasileiras no exterior.

ENTREVISTA:

André Luiz Ramalho Aguiar: Por quanto tempo atuou no Programa de Leitorado? José Maria Rodrigues: Durante quatro anos e meio.

André Luiz Ramalho Aguiar: Qual é o prin-cipal papel do Programa? José Maria Rodrigues: O Programa de Lei-torado financia professores brasileiros inte-ressados em divulgar a língua, a literatura e a cultura brasileiras em instituições univer-sitárias estrangeiras. São atribuições do

cargo de Leitor dedicar-se ao ensino siste-mático da língua portuguesa falada no Bra-sil, à difusão da literatura e da música popu-lar e erudita, à distribuição de materiais didáticos e informativos sobre o país, etc.; em suma, promover a cultura brasileira no exterior.

André Luiz Ramalho Aguiar: Como se dá a escolha ou classificação dos participantes do Programa? José Maria Rodrigues: Através de um pro-cesso seletivo simplificado que se divide em três fases: i) após a abertura do edital, os candidatos se inscrevem e enviam os currí-culos Lattes à Coordenação de Aperfeiçoa-mento de Pessoal de Nível Superior (CA-PES), encarregada de fazer uma pré-seleção baseada na consistência documental da candidatura e na análise dos méritos aca-dêmicos; ii) em seguida, a Divisão de Pro-moção da Língua Portuguesa – DPLP –, se-cretaria vinculada ao Departamento Cultu-ral (DC) do Ministério de Relações Exterio-res (MRE), encaminha os currículos reco-mendados para a Embaixada do Brasil loca-lizada no país de destino; iii) a última fase fica a cargo da universidade que solicitou o Leitor, a qual escolherá o profissional mais adequado às necessidades da instituição de ensino.

André Luiz Ramalho Aguiar: Qual institui-ção financia os participantes do programa? José Maria Rodrigues: Este Programa é fi-nanciado pelo governo brasileiro através de uma parceria da CAPES com o Ministério de Relações Exteriores, órgão que regulamenta a função desde 1999.

André Luiz Ramalho Aguiar: Em quais paí-ses já trabalhou?

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José Maria Rodrigues: Embora eu tenha trabalhado como docente em vários países – México, Estados Unidos, França, Espanha, País de Gales etc. –, o Paraguai foi o primei-ro país no qual eu exerci a função de Leitor de língua, literatura e cultura brasileiras.

André Luiz Ramalho Aguiar: Durante este período, quais trabalhos lhe deram satisfa-ção em realizar? Por quê? José Maria Rodrigues: Durante os quatro anos e meio nos quais exerci a função de Leitor tive a oportunidade, não só de execu-tar aqueles projetos de pesquisa e extensão que há muito tempo ‘dormiam’ nas minhas gavetas, mas também de testar metodolo-gias, métodos, materiais e abordagens de ensino/aprendizagem de Português Língua Estrangeira (PLE). Como todos sabemos, poucas vezes na vida um professor-pesqui-sador tem o privilégio de desenvolver e le-var a cabo um conjunto de ações educacio-nais de alcance nacional. E foi exatamente isso que ocorreu no Paraguai.

Dentre as diversas atividades realizadas – que haviam sido previamente esboçadas em meu ‘plano de atuação 2008-2013’ –, destaco, em primeiro lugar, a criação de um centro de pesquisas científicas na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Univer-sidade Católica de Assunção. Este núcleo constituiu-se, nos últimos cinco anos, em uma referência para o Paraguai nas áreas de linguística teórica e linguística de corpus – vide Projeto AVAKOTEPA –, congregando pesquisadores, profissionais e estudantes brasileiros, paraguaios e outros países do Mercosul que se dedicam à educação inter-cultural bilíngue, à linguística aplicada e às diversas áreas afins. Através desse projeto, pudemos criar ferramentas computacionais para a exploração e análise de dados lin-

guísticos (HANLEX e AGN) e publicar diver-sos materiais, como o DTM – Dicionário Tri-língue do Mercosul/ Mbohapy Ñe’ẽ Merco-sur Pegua Ryru –, que surgiu da necessidade de se registrar aspectos funcionais das prin-cipais línguas faladas na região. Com o obje-tivo de promover a integração linguística e cultural no âmbito do Mercosul, apostamos pelo processo de inclusão social onde a e-ducação tem um papel preponderante, ou seja, criamos uma obra simples que torna possível o diálogo entre as três línguas im-prescindíveis para a construção da identi-dade «mercosulista» e tentar facilitar o diá-logo e a concórdia entre as pessoas que vivem – ou transitam – na região da tríplice fronteira.

É importante ressaltar que alguns dos projetos científicos realizados, principal-mente os relacionados com as línguas ofici-ais do Paraguai – como o guarani –, foram de vital importância para a promoção da língua, literatura e cultura brasileiras nesse país, já que atingiram uma parcela qualita-tiva das populações locais, no âmbito das comunidades acadêmicas formadoras de opinião, as quais valorizaram positivamente a adoção de um modelo de fortalecimento da identidade regional favorável à integra-ção.

Salientamos, também, o trabalho reali-zado junto ao Centro de Estudos Brasileiros de Assunção, o qual consistiu na elabora-ção, implantação e monitoramento contí-nuo do Novo Plano Curricular e na capacita-ção do quadro docente da instituição. A primeira etapa do processo, concluída em 2011, incidiu sobre os seguintes eixos de intervenção: i) reestruturação da grade cur-ricular; ii) abertura de novas modalidades de cursos; iii) implementação de instrumen-tos de planejamento e avaliação de desem-

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penho – docente e institucional –; iv) cria-ção de sistema de avaliação de rendimento escolar; v) capacitação docente em novas tecnologias aplicadas ao ensino de PLE; vi) preparação de materiais didáticos específi-cos; vii) desenvolvimento e adoção de me-todologias adaptadas às peculiaridades lin-guísticas do Paraguai; etc. Foi extremamen-te gratificante poder criar e implementar uma matriz curricular dinâmica e flexível, que contempla, desde então, a programa-ção do setor cultural da Embaixada do Brasil em Assunção, oferecendo aos alunos – e docentes – a possibilidade de desfrutar, semanalmente, de espetáculos de música brasileira, obras de teatro, mostras de foto-grafia, exposições, etc.

Outra iniciativa que merece destaque é o Seminário Internacional de Educação Inter-cultural Bilíngue e Educação Indígena, cria-do como um projeto de extensão e que, por quatro anos consecutivos, contou com a participação de pesquisadores, docentes e discentes de vários países da América Latina e da Europa. Pode-se corroborar, com uma simples consulta à Internet, a repercussão que essas jornadas acadêmicas tiveram, tanto no Paraguai quanto no Brasil, e o im-pacto social que a publicação dos anais está promovendo no âmbito educacional do Mercosul.

Em conclusão, a maioria das ações reali-zadas no Paraguai, principalmente aquelas decorrentes de atividades não docentes, foram de vital importância para o estabele-cimento de relações dialógicas intercultu-rais que têm levado ao êxito do programa de leitorado nesse país. Apesar de todos os desafios enfrentados, é muito gratificante saber que pude contribuir – de algum modo – para o desenvolvimento de políticas edu-

cacionais pautadas no respeito à diversida-de cultural e linguística.

André Luiz Ramalho Aguiar: Quais são as principais dificuldades encontradas na reali-zação do Programa de Leitorados? José Maria Rodrigues: Não gostaria de vol-tar a discorrer sobre as dificuldades encon-tradas no exercício da função de Leitor por-que, de fato, apesar das particularidades de cada país, as adversidades encontradas cos-tumam ser similares às já relatadas por ou-tros ex-Leitores. Nessa linha, recomendo a leitura do excelente artigo do colega Serra-valle de Sá (2009).

Quanto à minha missão em território pa-raguaio, os aspectos positivos superaram – em muito – os negativos. Todavia, durante o período em que transitei pela Ponte da amizade, pude perceber o quão complexas são as relações entre as nossas respectivas culturas, as quais, na maioria dos casos, são influenciadas por fatores históricos e/ou de índole político-econômica. Por exemplo, muitas vezes o programa de leitorado foi visto como uma ferramenta usada pelo MRE para maximizar a hegemonia do Brasil na região, o que provocou certa resistência por parte de alguns docentes, que não viam com bons olhos a abertura de cursos de PLE nas instituições de ensino superior do país. Por outro lado, o fato de ter sido o primeiro Leitor enviado pelo MRE ao Paraguai, obri-gou-me a dedicar grande parte do meu tempo ao estabelecimento de diálogos com vários setores da sociedade paraguaia, in-clusive com o Ministério da Educação para, por um lado, apresentar o Programa de Lei-torado e, por outro, criar condições idôneas para a realização dos trabalhos acadêmicos.

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André Luiz Ramalho Aguiar: Eu perguntaria a você se, a partir destes exercícios dialógi-cos com setores da sociedade paraguaia, nasceu a proposta de criação de uma licen-ciatura em Língua Portuguesa no território paraguaio? Comente, por favor, a participa-ção dos Leitores neste projeto. José Maria Rodrigues: A licenciatura em língua portuguesa no Paraguai é um projeto muito antigo, iniciado, segundo algumas fontes, pelo Prof. José Carlos Paes de Al-meida Filho há mais de dez anos, e que so-mente em 2007 ressurgiu como uma pro-posta do MRE/Capes. De fato, quando eu assumi o posto de Leitor em Assunção, em fevereiro de 2008, ele estava sendo enca-beçado pela Prof. Terumi Koto Bonnet – in

memoriam –, autora da matriz curricular e uma das principais responsáveis pela apro-vação e implantação do curso no Instituto Superior de Línguas da Universidad Nacio-

nal de Asunción (UNA). Com a chegada de outros dois Leitores, Prof. Terezinha Juraci Machado da Silva e Prof. Luís Eduardo We-xell Machado, a licenciatura começou a to-mar forma e, a pedido da Embaixada do Brasil em Assunção, assumimos as princi-pais disciplinas –ad honorem – e realizamos todos os procedimentos necessários – cria-ção de ementas, programas, conteúdos programáticos, provas de vestibular, etc. – para abrir a primeira turma e dar andamen-to ao curso. A coordenação da carreira ficou a cargo do Ms. Luís Eduardo Wexell, quem, sem sombra de dúvida, foi a pessoa que mais se empenhou para que esse projeto se tornasse realidade. No final do ano letivo de 2014, o nosso quadro docente era compos-to por nove professores, quatro dos quais eram Leitores enviados pelo Governo brasi-leiro e se dedicam exclusivamente à licenci-atura de Língua Portuguesa. Em outras pa-

lavras, os três primeiros Leitores foram os pioneiros desse projeto que, pouco a pou-co, foi ganhando identidade, estabeleceu-se com credibilidade no Paraguai e no futuro talvez possa se tornar uma referência em PLE na região.

André Luiz Ramalho Aguiar: Segundo o ar-tigo publicado na Revista Vozes dos Vales (MACHADO, 2013) o português desponta como a terceira língua mais falada do Para-guai, principalmente nas regiões fronteiri-ças com o Brasil e na zona rural, onde en-contramos a presença de famílias brasilei-ras. Neste sentido, como promover a difu-são de língua, cultura e literatura brasileiras desde uma perspectiva mais uniforme e planejada no território paraguaio? José Maria Rodrigues: Segundo dados re-centes levantados pelo Itamaraty, o número de brasileiros residentes no Paraguai já su-pera os 400 mil, constituindo a segunda maior comunidade brasileira no exterior. Se levarmos em conta que a população atual do país é de 6,8 milhões de habitantes, es-tes dados já nos dão uma pista de como o português se tornou o terceiro idioma mais falado no Paraguai, sendo suplantado ape-nas pelas duas línguas oficiais do país: o guarani e o espanhol1. Eu costumo dizer que dar seguimento às ações da DPLP no Paraguai exige ‘cabelos brancos’, pois re-quer, por um lado, um conhecimento pro-fundo do caráter multilíngue e pluricultural de uma sociedade herdeira de uma língua autóctone majoritária, que é minorizada no

1 Dados oferecidos pela Dirección General de Estatísti-cas, Encuestas y Censos (DGEEC), concernente ao Censo Nacional de 2002, publicado em dezembro de 2002, As-sunção, Paraguai. Disponível em: <http://www.uff.br/ cadernosdeletrasuff/39/artigo1.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2015.

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país, e por outro lado, é necessário ter ma-turidade intelectual para entender quais os fatores que subjazem ao estabelecimento dessa complexa relação de amor e ódio que existe entre esses dois países. Ou seja, di-fundir a língua e a cultura brasileiras no Pa-raguai deveria ser uma tarefa para especia-listas com conhecimentos de antropologia, sociologia, história, direitos humanos, rela-ções internacionais... e um pouco de lin-guística (risos). Antes de vir morar aqui li uma tese de doutorado em sociologia inti-tulada ‘Fronteiras em movimento e identi-dades nacionais – a imigração brasileira no Paraguai’. Este trabalho me ajudou muito a criar um ‘plano de ação’ que contemplasse o ensino de PLE – português como língua estrangeira – e PLH – português como lín-gua de herança –, tendo por base a educa-ção intercultural e as concepções de língua, cultura e identidade no contexto de ensino-aprendizagem. Em resumo, conhecer a rea-lidade sociolinguística do país e tê-la como ponto de partida é o primeiro passo – e conditio sine qua non – para que se possa criar estratégias e políticas linguísticas que visem à difusão da língua, literatura e cultu-ra brasileiras desde uma perspectiva mais uniforme e planejada no território para-guaio.

André Luiz Ramalho Aguiar: Eu gostaria de agradecer muitíssimo pela entrevista con-cedida, que foi magnífica, uma honra para mim, e acho que só tenho que agradecer, não há palavras mais. José Maria Rodrigues: Eu é que lhe agrade-ço pela atenção dispensada e por me dar a oportunidade de falar um pouco sobre a política linguística do governo brasileiro à luz do programa de Leitorado no Paraguai. Espero que o meu relato inspire outros do-

centes interessados em divulgar a língua, literatura e a cultura brasileiras no exterior.

Como costumamos dizer aqui no Para-guai: Aguije ndéve, mbo’ehára André.

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Artigo recebido em 01 de setembro de 2015. Avaliado em 04 de dezembro de 2015. Aceito em 10 de janeiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): AGUIAR, André Luiz Ramalho. O Programa de Leitorados do Ministério das Relações Exteriores do Brasil: o ex-leitor José Maria

110 Aguiar

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Rodrigues relata suas experiências durante os quatro anos de leitorado no território paraguaio. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 103-110, jul./dez. 2015. Nota do Editor: O entrevistado José Maria Rodrigues gentilmente cedeu Termo de Autorização para publica-ção do conteúdo desta entrevista (de autoria de André Luiz Ramalho Aguiar), e da fotografia-imagem do mesmo, à revista Estação Científica (UNIFAP).

Resenha

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A violência urbana (re)apresentada na obra A retomada do Complexo do Alemão

The urban violence (re) presented in the work A retomada do Complexo do Alemão

Elaine Teixeira da Silva 1

1 Especialista em Ensino de Língua Espanhola pela Universidade Candido Mendes (UCAM), Especialista em Estudos de Língua Por-tuguesa e de Literatura Brasileira (UNIFSJ) e Licenciada em Letras/Espanhol (UNIFSJ). Professora da SEEDUC/RJ, Brasil. E-mail: [email protected]

Si vis pacem, para bellum. (Se queres a

paz, prepara-te para a guerra)

Força e honra

Caveira!

Estas são as primeiras palavras que o lei-

tor encontra ao deleitar-se com a obra A retomada do Complexo do Alemão sugerin-do o que ele encontrará nas páginas seguin-tes. A narrativa aborda o fato histórico o-corrido na cidade do Rio de Janeiro-RJ, Bra-sil, no ano de 2010, circunstância em que o Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE-RJ) foi acionado para retomar o complexo de favelas da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão, que estava sob o crescente domínio do tráfico de drogas e do crime organizado. A ação de retomada teve início com o apoio do BOPE-RJ aos “policiais militares do 16º Batalhão localizado em O-laria-RJ, que precisavam de auxílio, uma vez que se encontravam impossibilitados de sair da comunidade” (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 25). A missão dos policiais do BOPE-RJ era “entrar na comunidade, resgatar os policiais e gerenciar a crise” (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 29). Conseguidos os dois primeiros objetivos, restava apenas o último e que por ordem do então Subcomandante do BOPE-RJ Te-

nente Coronel René, os homens da tropa de elite1 da Polícia Militar deveriam continuar a missão e prender os traficantes que ge-renciavam o tráfico e o crime organizado do Complexo da Vila Cruzeiro. Conforme avan-çava a tropa do BOPE-RJ, com o auxílio da Polícia Civil e Federal do Estado do Rio de Janeiro e da Marinha do Brasil, já que os obstáculos deixados pelos traficantes ne-cessitavam que outros recursos fossem a-cionados, os traficantes iniciaram uma fuga em direção ao Complexo do Alemão, pois as duas comunidades, a do Alemão e a da Vila Cruzeiro, pertenciam à mesma facção cri-minosa, o Comando Vermelho. O avanço das forças militares culminou, portanto, com a retomada do Complexo do Alemão.

Escrito por três amigos que participaram do processo de retomada, André Monteiro, Policial Militar do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE-RJ), Eduardo Maia Betini, Policial Federal cursado pelo Curso de Operações Especiais Policiais (COEsp – BOPE-RJ) e Rogério Greco, Procurador Esta-dual da Justiça do Estado de Minas Gerais, que participou como observador a convite do BOPE-RJ. Cada um deles narra a seu mo-do alguns fatos que aconteceram no evento

1 Título dado aos homens que integram o BOPE.

112 Silva

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histórico do Complexo do Alemão. A obra é composta por 300 páginas, contendo textos e um acervo de imagens que ajudam o lei-tor a reconstituir e imaginar mais realisti-camente o que aconteceu em 2010 na cida-de do Rio de Janeiro-RJ, a qual serviu de palco para o desbravamento de uma guerra urbana até então não vista, pois

Todas as forças de segurança estaduais, isto é, as polícias militar e civil, bem como a Polícia Federal e, extraordinariamente, a Marinha do Brasil, estavam atuando juntas, nessa missão, naquela comunida-de que era considerada como o reduto principal da facção criminosa denominada de Comando Vermelho (GRECO; MON-TEIRO; BETINI, 2014, p. 94).

Segundo Greco, Monteiro e Betini

(2014), os locais estavam munidos de ar-madilhas com granadas, muros de conten-ção para dificultar o acesso ao local, além de bombas que eram arremessadas em di-reção às tropas militares. “Pelo menos po-demos afirmar que as armas que se encon-travam em poder dos traficantes eram as mesmas armas utilizadas na Primeira Guer-ra Mundial e na Segunda Guerra Mundial” (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 187).

Vale ressaltar que a “cidade maravilho-sa”2 é composta por várias comunidades – na atualidade optou-se em utilizar o termo comunidade para designar um grupo social apartado, conhecido como favelas – e que nelas vivem não somente membros do cri-me organizado como também famílias não envolvidas em atos ilícitos nem ilegais e no período da retomada de 2010, ou em ou-tros conflitos com as autoridades policiais,

2 Este epíteto refere-se à cidade do Rio de Janeiro-RJ, Brasil.

os criminosos tomam os moradores como escudo, servindo-se deles como reféns e objetos de negociação.

Figura 1: Capa do livro A retomada do Complexo do

Alemão Figure 1: Book cover A retomada do Complexo do

Alemão

Fonte: <http://www.rogeriogreco.com.br/?p=2388>

Temas como violência, guerra e conflitos

sociais são e estão presentes na literatura contemporânea, como um ponto de apro-ximação da vida cotidiana seja ela ficcionali-zada ou não, como é o caso da obra A re-

tomada do Complexo do Alemão, a qual aborda fatos reais de um momento vivido no Brasil. Como corrobora Schøllhammer (2013, p. 112), “a literatura, além de parti-cipar na simbolização da violência, procura nela um veículo para uma experiência cria-

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tiva que explora e transgride os limites ex-pressivos da escrita literária.”

Em vários trechos do livro de Greco, Monteiro e Betini (2014), é feito o uso do recurso da analepse

3, trazendo ao leitor informações novas que complementam a história narrada, como no trecho em que nos é apresentada a história do soldado do BOPE-RJ, Wilson Sant’anna, que “havia sido alvejado e morto pelos traficantes no Com-plexo da Vila Cruzeiro” (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 61), fato acontecido no ano de 2007, mas que para os integrantes mili-tares do BOPE-RJ era como se isto tivesse acabado de acontecer. Em outros momen-tos da obra também percebemos o uso do recurso da analepse, como, por exemplo, quando o policial Monteiro, autor da obra, menciona um momento de tensão de sua patrulha militar ao incursionar na comuni-dade e ser alvejado com intensa troca de iros o que lhe fez recordar de um fato:

Nesse momento, em frações de segun-dos, minha mente voltou ao passado. Lembrei-me do dia 9 de maio de 1998. Eu estava de plantão no Batalhão, quando um amigo querido de equipe, chamado Jessé, foi ao meu encontro, dizendo que havia esquecido de entregar ao oficial de operações daquele dia, Ten. Sarmento, um croqui em que se encontravam locali-zados alguns alvos que deveriam ser aba-tidos pela equipe que havia se dirigido ao morro do Turano (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 102).

A narrativa seguinte a este episódio re-

sultou no óbito do policial militar do BOPE-RJ, Jessé, quando ele e Monteiro após en- 3 Termo usado na Literatura para referir-se a eventos ocorridos anterior ao atual, é um recuo no tempo da narrativa.

tregarem o croqui e regressarem ao Bata-lhão foram submetidos a vários disparos por traficantes da comunidade do Fal-let/Fogueteiro. O fato narrado assemelhou-se ao evento atual da retomada, pois a ten-são em torno da incursão dos militares ao Complexo da Vila Cruzeiro, local em que os militares do BOPE-RJ estavam naquele mo-mento, era a mesma e toda cautela seria necessária para que a tropa dos militares saísse ilesa daquele lugar.

A narrativa traz informação sobre algo histórico e recente, pois são fatos carrega-dos de realidade. A obra informa ao leitor sobre a origem de uma das facções mais conhecida no Brasil, bem como também sobre o surgimento de outras. Greco, Mon-teiro e Betini (2014) nos contam quando e como surgiu o então Comando Vermelho:

Comando Vermelho - CV – foi criado no ano de 1979, no sistema prisional Cândi-do Mendes, localizado na Ilha Grande, em Angra dos Reis, no estado do Rio de Ja-neiro. Naquela oportunidade, presos co-muns, membros de uma conhecida orga-nização criminosa chamada de “Falange Vermelha”, tiveram contato com presos políticos. Esse caldo deu origem ao atual Comando Vermelho, cujo lema oficial era Paz, Justiça Social e Liberdade (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 94).

O lema deles contrasta com a realidade

atual, pois a cidade do Rio de Janeiro estava refém da criminalidade do Comando Ver-melho. Quem não se lembra dos constantes ataques a carros, ônibus, os famosos “bon-des”? Um dos fatos que mais chamou a atenção à época da retomada foi a morte do jornalista Tim Lopes que também é nar-rada no livro fazendo-nos relembrar um momento que chocou a todos em função de

114 Silva

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tamanha crueldade. “O repórter foi seques-trado, torturado, julgado e executado por traficantes liderados por Elias Pereira da Silva, vulgarmente conhecido como Elias Maluco” (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 21). A morte do jornalista foi chocante em função da modalidade criada pelos tra-ficantes para eliminarem suas vítimas de-pois de torturadas: o micro-ondas, o qual consistia em envolver os torturados em pneus de caminhão ateando fogo em segui-da com eles ainda vivos. “De acordo com a conclusão do inquérito policial que apurou a morte de Tim Lopes, através de exame de DNA, já que seu corpo estava irreconhecí-vel, permanecendo somente fragmentos de ossos misturados” (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 21).

Também o fato ocorrido no mesmo ano da morte de Tim Lopes, 2002, em que a im-prensa internacional desaconselhou o tu-rismo no Rio de Janeiro devido aos constan-tes ataques ao comércio da zona sul.

Era início do caos. Os criminosos já não se continham em suas comunidades e co-meçaram a espalhar o terror sobre toda a cidade. Pela primeira vez, a zona sul sen-tia na pele a violência do tráfico de dro-gas, que obrigou os comerciantes dos bairros de Ipanema e Leblon a fecharem as portas (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 23).

Uma das cenas que rodou o mundo foi a

fuga dos traficantes do Complexo da Vila Cruzeiro em direção ao Complexo do Ale-mão:

Estávamos nos aproximando de uma das cenas jamais vistas no Brasil, que ganhou, inclusive, destaque internacional. À me-dida que nossas forças de segurança iam

avançando e dominando completamente o terreno, os traficantes saiam se dirigin-do para aquele que seria o único caminho de possível fuga. Essa rota de fuga era o elo que unia a comunidade da Vila Cruzei-ro com a do Alemão, sem que fosse moni-torada pela polícia (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 169).

A obra também narra momentos de des-

contração entre os homens da Tropa do BOPE-RJ, como conta Betini (GRECO; MON-TEIRO; BETINI, 2014, p. 278): “Era impossí-vel não rir daquelas figuras. O Magalhães com as suas grandes bochechas e um olhar de quem está sempre de bem com a vida, quase rindo”. Este trecho é descrito após o episódio em que o policial Betini e alguns de sua equipe começam a revirar um monte de lixo a procura de armas escondidas e acabaram ficando enlameados pela sujeira do lixo.

A narrativa conta-nos de modo preciso cenas daquele dia e o desfecho da história, mas também nos põem em posição de co-bradores por parte do Governo, de atitudes a serem tomadas com relação à nossa segu-rança, não só para os que moram do Estado do Rio de Janeiro, mas também nas outras regiões do Brasil.

Os brasileiros contam com isso. O mo-mento é de união. Já chegou a hora, na verdade, já passou da hora da população se levantar contra esses exterminadores do bem público. Poucos são os que, efeti-vamente, representam a sociedade que os escolheu (GRECO; MONTEIRO; BETINI, 2014, p. 300).

Além de abordarem o tema da retomada

do Complexo do Alemão, Greco, Monteiro e Betini (2014, p. 300) chamam nossa atenção

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enquanto cidadãos, pois “enquanto houver essa gritante desigualdade social, ainda te-remos muito o que escrever.” A leitura da obra é imprescindível não somente para fruição, mas também para reconhecimento de um fato que faz parte da história de nos-so país, já que a guerra urbana cometida pelo crime organizado não é privilégio so-mente da cidade do Rio de Janeiro, como também de outras capitais do Brasil.

REFERÊNCIAS GRECO, R.; MONTEIRO, A.; BETINI, E. M. A retomada do Complexo do Alemão. Nite-rói, RJ: Impetus, 2014. SCHØLLHAMMER, K. E. Cena do crime: vio-lência e realismo no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: José Olympio, 2013.

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Artigo recebido em 04 de dezembro de 2015. Avaliado em 15 de dezembro de 2015. Aceito em 11 de janeiro de 2016. Publicado em 14 de março de 2016.

Como citar este artigo (ABNT): SILVA, Elaine Teixeira da. A violência urbana (re)apresentada na obra A retomada do

Complexo do Alemão. Estação Científica (UNIFAP), Macapá, v. 5, n. 2, p. 111-115, jul./dez. 2015.

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Os autores se obrigam a aceitar a Declaração de Direitos Autorais da revista.

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Abstract e Keywords). c) O Título, centralizado e negritado, com no máxi-mo vinte palavras, no idioma do artigo e também em inglês, deverá ser preciso. d) O Resumo, escrito em parágrafo único, não exce-dendo 200 palavras, deverá conter informações sucintas sobre o artigo. Devem constar no resumo o objetivo, a metodologia, resultados e conclusões do artigo. Até seis palavras-chave deverão ser acres-centadas ao final, que não estejam citadas no título, separadas entre si por ponto e finalizadas também por ponto. As mesmas instruções se aplicam para o Abstract e Keywords. e) Ao final do artigo deverão constar apenas as re-ferências bibliográficas dos trabalhos referidos no texto. Devem ser atualizadas, contendo, preferenci-almente, os trabalhos mais relevantes sobre o tema publicados nos últimos cinco anos. f) Agradecimentos poderão ser mencionados sob a forma de nota de rodapé. Também pode ser comu-nicado a existência de todo e qualquer auxílio fi-nanceiro recebido para a elaboração do trabalho, mencionando agência de fomento, também em nota de rodapé. g) Os artigos submetidos deverão ter entre 10 a 20 páginas digitadas (exceto resenhas e entrevistas, que deverão ter entre 05 a 10 páginas), incluindo figuras, tabelas e referências bibliográficas (listadas somente aquelas citadas no texto). Deverão ser escritos com espaçamento entre linhas de 1,5 e ter

suas páginas numeradas. Dever-se-á deixar uma linha em branco entre os títulos e subtítulos e os textos que os sucedem ou precedem. Nas citações diretas, deve haver uma linha em branco antes e depois dos textos que as precedem e sucedem. Nas ilustrações deve haver uma linha em branco entre elas e os textos que as precedem e sucedem. Não pode haver linhas em branco entre os parágrafos dos textos com o objetivo de aumentar a quantida-de de páginas. O trabalho deverá ser editado no MS-Word, ou compatível, utilizando fonte Times

New Roman, tamanho 12. h) No caso da seção de Entrevistas, deve ser envia-do fotografia recente e comprovante de autorização do entrevistado concordando com a publicação na revista. i) No caso da seção de Resenhas, é obrigatório que esteja inserido no desenvolvimento do texto uma imagem da capa do livro resenhado. j) O trabalho deverá ser formatado em A4, com margens superior e esquerda com 3,0 cm e a inferi-or e a direita deverão ter 2,0 cm. k) O arquivo contendo o trabalho que deverá ser anexado (transferido), durante a submissão, não poderá ultrapassar o tamanho de 2MB, bem como, não poderá conter qualquer tipo de identificação de autoria, inclusive na opção propriedades do Word. Caso haja problemas na transferência do manuscri-to, deve-se comunicar ao Suporte Técnico da revista para auxílio. l) Ilustrações: tabelas, figuras, gráficos, desenhos, esquemas, fluxogramas, fotografias, organogramas, mapas, plantas, quadros, retratos outras ilustrações deverão ter os títulos na parte superior, numerados sequencialmente conforme a categoria, escritos no idioma do artigo e também em inglês, caso não seja este o idioma principal do artigo. Embaixo das ilus-trações deverá constar a fonte e, se houver, no-tas. Deverão ser inseridas no texto, logo após a sua citação e o mais próximo possível do trecho a que se refere. m) As ilustrações (tabelas, figuras, gráficos, dese-nhos, esquemas, fluxogramas, fotografias, organo-gramas, mapas, plantas, quadros e retratos) deve-rão ter preferencialmente 7,5 cm de largura, e não deverão ultrapassar a altura máxima de 16 cm. n) As figuras digitalizadas deverão ter 300 dpi de resolução e preferencialmente gravadas no formato jpeg ou jpg.

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o) Abreviações podem ser utilizadas, devendo ser precedidas de seu significado por extenso na pri-meira menção. p) As citações deverão seguir os exemplos seguintes que se baseiam na ABNT, no sistema AUTOR-DATA. Nas citações diretas, é obrigatório informar o autor, ano e página: Câmara (2008, p. 31) ou (CÂMARA, 2008, p. 31). Para o caso de citações indiretas no texto, usar apenas o sobrenome e ano: Caporalini (2005) ou (CAPORALINI, 2005); para dois autores: Veiga e Santos (2008) ou (VEIGA; SANTOS, 2008); para três autores: Morelli, Souza e Cruz (2014) ou (MORELLI; SOUZA; CRUZ, 2014); mais de três auto-res, utilizar o primeiro e após et al.: Gheorghiu et al. (2008) ou (GHEORGHIU et al., 2008). MODELOS DE REFERÊNCIAS Deverão ser organizadas em ordem alfabética, justi-ficado, conforme os exemplos seguintes que se baseiam na ABNT. Listar todos os autores do traba-lho. Os títulos dos periódicos deverão ser completos e não abreviados. Livros com um autor: AUTOR. Título. Edição. Local: Editora, ano. Exemplo: NOGUEIRA, C. M. A feminização no mundo do tra-balho: entre a emancipação e a precarização. Cam-pinas: Autores Associados, 2003. Livros com dois autores: AUTORES separados por ponto e vírgula. Título. Edição. Local: Editor, ano. Exemplo: ACCIOLY, A. R.; MARINHO, I. P. História e organiza-ção da educação física e desportos. Rio de Janeiro: Universidade do Brasil, 1956. Livros com três autores: AUTORES separados por ponto e vírgula. Título. Edição. Local: Editor, ano. Exemplo: REZER, R.; CARMENI, B.; DORNELLES, P. O. O fenô-meno esportivo: ensaios crítico-reflexi-vos. 4. ed. São Paulo: Argos, 2005. Livros com mais de três autores: Entrada pelo pri-meiro autor, seguido da expressão et al. Título. Local: Editora, ano. Exemplo: TANI, G. et al. Educação física escolar: fundamentos de uma abordagem desenvolvimentista. São Paulo: EPU, 1988.

Livros com organizadores, coordenadores: OR-GANIZADOR ou COORDENADOR, etc. (Org. ou Co-ord. ou Ed.) Título. Local: Editora, ano. Exemplo: CRUZ, I. et al. (Org.). Deusas e guerreiras dos jogos olímpicos. 4. ed. São Paulo: Porto, 2006. 123 p. (Coleção Fio de Ariana). Partes de livros com autoria própria: AUTOR da parte referenciada. Título da parte referenciada. Referência da publicação no todo precedida de In: Localização da parte referenciada. Exemplo: GOELLNER, S. Mulher e Esporte no Brasil: fragmen-tos de uma história generificada. In: SIMÕES, A. C.; KNIJIK, J. D. O mundo psicossocial da mulher no esporte: comportamento, gênero, desempenho. São Paulo: Aleph, 2004. p. 359-374.

Dissertações, teses, trabalhos de conclusão de cur-so: AUTOR. Título. Ano. Paginação. Tipo do docu-mento (dissertação, tese, trabalho de conclusão de curso), grau entre parênteses (Mestrado, Doutora-do, Especialização em...) - vinculação acadêmica, o local e o ano da defesa. Exemplo:

SANTOS, F. B. Jogos intermunicipais do Rio Grande do Sul: uma análise do processo de mudanças ocor-ridas no período de 1999 a 2002. 2005. 400 f. Dis-sertação (Mestrado em Educação Física) - Curso de Educação Física, Departamento de Educação Física, UFRGS, Porto Alegre, 2005. Trabalhos de eventos: AUTOR. Título do trabalho apresentado no evento. Referência da publicação no todo precedida de In: nome do evento, numera-ção do evento (se houver), ano e local (cidade) de realização do evento. Título do documento (Anais, Livro de Resumo, Proceedings, tópico temático

etc.). Local, editora: ano de publicação. Página inici-al e página final da parte referenciada. Exemplo: VIOLATO, R. R.; WAISMAN, Jaime. O moto-táxi co-mo modo de transporte urbano de passageiros. In: Panamerican Conference On Traffic And Transpor-tation Engineering., 2004, Albany, NY. Conference Papers. Albany, NY: Rensselaer Polytechnic Institu-te, 2004. p. 1-9.

Artigos de revistas/periódicos: AUTOR do artigo. Título do artigo. Título da revista, local, v., n., pági-

nas, mês, ano. Exemplos: Um autor: ADELMAN, M. Mulheres no esporte: corporalidades e subjetividades. Movimento, Porto Alegre, v. 12, n. 1, p. 11-29, jan./abr., 2006. Dois autores: AMORAS, F. C.; RODRIGUES, L. G. A constituição dos programas de políticas públicas no

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Brasil. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, n. 173, p. 97-106, out. 2015. Três autores: CAVECHINI, C.; SOUZA, F. de; PAGA-NOTTI, I. Polêmica na garupa: uso de motos para transporte de passageiros: risco ou solução? Revista Problemas Brasileiros, São Paulo, n. 366, p. 32-35, nov.-dez. 2004. Mais de três autores: SOUSA, R. S. et al. Antropolo-gia das trocas econômicas informais e ilícitas.

PRACS: Revista Eletrônica de Humanidades do Curso de Ciências Sociais da UNIFAP, Macapá, n. 1, p. 01-10, dez. 2008. Artigos de jornais: AUTOR do artigo. Título do arti-go. Título do jornal, local, data (dia, mês e ano). Caderno, p. Exemplo: SILVEIRA, J. M. F. Sonho e conquista do Brasil nos jogos olímpicos do século XX. Correio do Povo, Por-to Alegre, 12 abr. 2003. p. 25-27. Leis, decretos, portarias, etc.: LOCAL (país, estado ou cidade). Título (especificação da legislação, nº e data). Indicação da publicação oficial. Exemplo: BRASIL. Decreto nº 60.450, de 14 de abril de 1972. Regula a prática de educação física em escolas de 1º grau. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, v. 126, n. 66, p. 6056, 13 abr. 1972. Seção 1, pt. 1. Documentos eletrônicos online em html ou htm: AUTOR. Título. Local, data. Disponível em: < >. A-cesso em: dd mm. aaaa. Deve-se informar o ende-reço online, exceto nos textos em pdf. Exemplo: PEPEU, S. R. F. O advento das mototáxis. Jus Navi-gandi, Teresina, ano 3, n. 27, dez. 1998. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id= 500>. Acesso em: 13 jul. 2009. BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil _03/LEIS/L8987compilada.htm>. Acesso em: 28 mar. 2010.

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Sim

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Elaborado por: Fernando Castro Amoras

Artigo rejeitado

Artigo aprovado

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