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ESTADO DE MATO GROSSO GABINETE DO DEFENSOR PÚBLICO-GERAL Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. 1 DA IMPOSSIBILIDADE DA LEITURA DAS PROVAS EXCLUSIVAMENTE EXTRAJUDICIAIS NO PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI CARLOS EDUARDO FREITAS DE SOUZA, Defensor Público das comarcas de Alto Alto Araguaia/MT e Alto Garças/MT, Pós-Graduado em Direito Penal pela Universidade Federal de Goiás e Ex-Professor de Processo Penal na UNIC, campus Primavera do Leste. Guilherme Sant’Ana Canhetti, ex-estagiário da Defensoria Pública, núcleo de Primavera do Leste e, atualmente, estagiário do Ministério Público Estadual na comarca de Primavera do Leste e estudante da UNIC, campus de Primavera do Leste. 1 INTRODUÇÃO No dia 10 de junho de 2008, foi publicada a Lei 11.690 que alterou fortemente o cenário do processo penal brasileiro, a ponto de poder ser chamada de norma revolucionadora da ordem jurídica precedente, com o fim propício, talvez não aquele que seria alcançado, de adequar as normas legais aos ditames constitucionais e entendimentos jurisprudenciais modernos.

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GABINETE DO DEFENSOR PÚBLICO-GERAL Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada

na ética e na moralidade.

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DA IMPOSSIBILIDADE DA LEITURA DAS PROVAS EXCLUSIVAMENTE

EXTRAJUDICIAIS NO PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI

CARLOS EDUARDO FREITAS DE SOUZA, Defensor Público das comarcas de Alto

Alto Araguaia/MT e Alto Garças/MT, Pós-Graduado em Direito Penal pela

Universidade Federal de Goiás e Ex-Professor de Processo Penal na UNIC, campus

Primavera do Leste.

Guilherme Sant’Ana Canhetti, ex-estagiário da Defensoria Pública, núcleo de

Primavera do Leste e, atualmente, estagiário do Ministério Público Estadual na

comarca de Primavera do Leste e estudante da UNIC, campus de Primavera do

Leste.

1 INTRODUÇÃO

No dia 10 de junho de 2008, foi publicada a Lei 11.690

que alterou fortemente o cenário do processo penal brasileiro, a ponto de poder ser

chamada de norma revolucionadora da ordem jurídica precedente, com o fim

propício, talvez não aquele que seria alcançado, de adequar as normas legais aos

ditames constitucionais e entendimentos jurisprudenciais modernos.

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A referida Lei Federal tornou-se, ainda, mais uma de

inúmeras alterações pelas quais o antigo estatuto processual se submeteu desde o

seu decreto naquela época, em 1941, vale notar, sob o Estado Novo, que era

presidido por Getúlio Vargas.

A revolução, assim especificada por sua amplitude e

significado, não ocorreu sob o signo de uma só lei, pois se consumou juntamente

com a Lei 11.689/08, que alterou os procedimentos referentes ao Tribunal do Júri.

Ademais, vale ressaltar que a própria instituição do

Tribunal do Júri já é considerada arcaica, não se amoldando perfeitamente com a

nova ordem constitucional de 1988.

Entendia-se a instituição do Júri, baseando que se

originou em uma remota e distante época, onde as garantias do indivíduo eram

preteridas. Vale notar a tremenda modificação do entendimento doutrinário a

respeito dos meios de valoração das provas dos autos. Partimos de um extremo,

notadamente inquisitorial, e com muita dificuldade caminhamos em direção ao

equilíbrio, onde as garantias individuais conviveram harmoniosamente com as

instituições também preservadas pela ordem constitucional.

Exatamente isso que houve com o antigo Tribunal do Júri,

composto por cidadãos comuns, demonstração de cidadania na determinação do

veredicto aos réus acusados de terem cometido o crime de maior gravidade na

ordem jurídica atual: o crime contra a vida humana.

No entanto, apesar de preservado pela ordem

constitucional, não se pode olvidar que a Constituição nunca de contradiz, mas entre

seus pontos contraditórios reina a necessidade da ponderação. Um caso específico

em que há necessidade de ponderar interesses aparentemente opostos e

contraditórios surge do cotidiano forense e se resume na questão da valoração que

as provas inquisitoriais devem receber do jurados, constitucionalmente soberanos.

Hodiernamente, as provas colhidas na fase da

investigação policial, encontram-se no início da maioria das Ações Penais, sendo

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que não estão submetidas aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla

defesa, advindos do processo penal.

Destarte, é de salutar importância a discussão jurídica a

respeito da possibilidade dos jurados ponderarem sobre tais provas, no momento

em que intimamente se convencem se devem ou não condenar aquele que estiver

sentado no banco dos réus.

Seria aplicável aos senhores jurados, da instituição do

Tribunal do Júri, a nova redação do art. 155 do Código de Processo Penal,

introduzida recentemente pela Lei 11.690/2008, que veda a apreciação exclusiva

das provas extrajudiciais? Se sim, quais seriam os meios de controle de valoração?

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2 DA PROVA EXTRAJUDICIAL

É possível afirmar que a Ação Penal não se inicia com o

simples recebimento da denúncia, como entende a maioria da doutrina e

jurisprudência. Ainda que juridicamente isso seja afirmado, a sustentação do

Processo Criminal encontra-se fora dos limites judiciais que as capas dos autos

indicam.

A ousada afirmação acima quer dizer que não é apenas

aquilo que se vê entre as capas dos autos, no foro onde tramitam, que de fato

ocorreu. Diversos outros acontecimentos, podendo ser até mesmo ilícitos, deram

causa para os fatos narrados na peça de denúncia do parquet ou para as palavras

das testemunhas que se apresentaram em juízo para depor.

No entanto, apesar de serem inúmeros fatores que

influenciaram para o acontecido, a autoridade policial, por meio de sua investigação,

apenas transcreveu aquilo que lhe era mais importante para a apuração da infração

e identificação de seu autor. Todo o mais, quer seja formado de atos meramente

corriqueiros, quer ilícitos e inaceitáveis, é deixado de fora.

O que temos no Inquérito Policial, então, são apenas

representações mitigadas da realidade e podem esconder um aspecto pouco

agradável de se abordar: o interesse da Autoridade Policial em encontrar um infrator

e contribuir para que ele seja punido.

Esse interesse já foi reconhecido por diversos

doutrinadores, que inclusive vieram a dissertar pela relativização das provas

exclusivamente policiais, mesmo que apresentadas em juízo, por esse motivo.

Acontece que, mesmo sendo autoridades públicas instituídas com a finalidade de

apurar os delitos cometidos, possui interesse na condenação dos indiciados, fato

este que não pode ser ignorado.

Assim sendo, o Professor Fernando Capez entende que:

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Por mais honesto e correto que seja o policial, se participou da diligência, servindo de testemunha, no fundo estará sempre procurando legitimar a sua própria conduta, o que juridicamente não é admissível. Necessário, portanto, que seus depoimentos sejam corroborados por testemunhas estranhas aos quadros policiais. Assim, em regra, trata-se de uma prova a ser recebida com reservas, ressalvando-se sempre a liberdade de o juiz, dependendo do caso concreto, conferir-lhe valor de acordo com sua liberdade de convicção.

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Além disso, as provas colhidas do inquérito policial podem

ser suscetíveis de erros e enganos, muitas vezes grosseiros, já que não são

acompanhadas e rebatidas pela defesa do acusado.

É nesse ponto que o papel da Constituição é exercido.

Como bem expressa o Professor Leo Van Holthe, na sua obra, dissertando acerca

dos direitos fundamentais de primeira dimensão, entre os quais se inclui a exigência

da confirmação das provas extrajudiciais por elementos probatórios judiciais:

[…] decorrem da ideologia do liberalismo e caracterizam-se pela exacerbação do direito de liberdade individual, pregando a não-intervenção do Estado nos negócios particulares. Nesse período, consagram-se as liberdade clássicas e os direitos civis e políticos.

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Nesse sentido, o ius puniendi estatal é limitado pelas

disposições garantistas esculpidas na Carta Magna, sendo que jamais poder-se-ia

ignorá-las sem estabelecer um desequilíbrio autoritarista e absolutista incompatível

com um Estado que se denomine Democrático (art. 1.º, caput, CF).

Bem se sabe que a Constituição é formada por princípios

e regras, que estruturam sua força normativa. No entanto, não há princípio absoluto,

como acertadamente declara Canotilho ao explicar o princípio da concordância

prática,

1 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 16. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009. p. 378-379. 2 HOLTHE, Leo Van. Direito Constitucional. Editora JusPodivm. 2. ed. revista, ampliada e atualizada até a EC 52/06. 2006. p. 245.

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[…] o campo de eleição do princípio da concordância prática tem sido até agora o dos direitos fundamentais (colisão entre direitos fundamentais ou entre direitos fundamentais e bens jurídicos constitucionalmente protegidos). Subjacente a este princípio está a idéia do igual valor dos bens constitucionais (e não uma diferença de hierarquia) que impede, como solução o sacrifício de uns em relação aos outros, e impõe o estabelecimento de limites e condicionamentos recíprocos de forma a conseguir uma harmonização ou concordância prática entre estes bens.

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Assim, todos os princípios devem se harmonizar. Quando

algum deles aparenta se confrontar diretamente com outro, nenhum deles se anula,

apenas se relativizam mutuamente, isto é, são aplicados ponderadamente. Pode-se

afirmar com isso que, toda e qualquer previsão constitucional deve se harmonizar

com os princípios e diretrizes que estatui. A esse respeito, a doutrina estatui que:

[...] a colisão de princípios se resolve de maneira completamente distinta. Quando dois princípios colidem, um dos princípios deve ceder ao outro. Não se trata porém da inclusão de uma cláusula de exceção ou então da invalidação de um princípio pelo outro. Cuida-se de precedência de acordo com as circunstâncias. Sobre determinada circunstância precederá este ou aquele princípio. Inobstante tal prevalência sob a tal circunstância, o princípio não prevalente pode ser utilizado em outro caso, com solução diversa.

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No caso em comento, mais viável é afirmar que os

princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa prevalecem sobre o

princípio da soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, em virtude das

circunstâncias a seguir explicitadas. Não que um princípio seja mais ou menos

importante que outro, mas, convém ressaltar que, diante de garantias processuais

tão evidentes, as decisões do respeitável Conselho de Sentença não podem

3 CANOTILHO, J. J, Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993. p. 227 4 THEODORO, Marcelo Antonio. A constituição como um sistema de princípios de normas. Revista de Direito Constitucional e Internacional. Vol. 65. Editora Revista dos Tribunais, 2008

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contrariar-lhes, para evitar a ocorrência da absurda hipótese de um princípio

constitucional anulando completamente a outro.

Por todo o exposto, correto seria concluir que, na fase

extrajudicial de apuração da materialidade e autoria dos crimes, a diretriz

orientadora é de buscar provas para a condenação dos acusados, enquanto que,

após o recebimento da exordial, perante a autoridade judiciária e amparado por um

defensor, o viés torna-se eminentemente defensivo, propiciando aos denunciados

amplas possibilidades de defesa e de contraditar as provas produzidas.

Em virtude do acima exposto, a tendência acusatória do

órgão policial pode afigurar-se nas páginas do inquérito por meio de destaques à

empreitada criminosa do indiciado e ocultação de certos elementos excludentes de

ilicitude ou do dolo ou da culpabilidade. Isso tudo porque a finalidade principal da

prova inquisitorial é fornecer subsídios para a instauração da Ação Penal, para que,

então, seja a situação processada sob o crivo da ampla defesa e do contraditório.

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3 VEDAÇÃO DA UTILIZAÇÃO DA PROVA EXCLUSIVAMENTE EXTRAJUDICIAL

PARA CONDENAR

Por outro lado, é bem sabido que a Constituição Federal

assegura aos litigantes, em seu art. 5º, inciso LV, em processo judicial ou

administrativo, o contraditório e a ampla defesa, todavia, por questões estruturais, a

grande maioria das provas produzidas inquisitorialmente não possuem o

acompanhamento do defensor do acusado. Por esses e por outros fatores que ainda

poderiam ser citados, o inquérito policial possui caráter eminentemente acusatório.

Acerca disso, o insigne Professor Alexandre de Moraes disserta:

O contraditório nos procedimentos penais não se aplica dos inquéritos policiais, pois a fase investigatória é preparatória da acusação, inexistindo, ainda, acusado, constituindo, pois, mero procedimento administrativo, de caráter investigatório, destinado a subsidiar a atuação do titular da ação penal, o Ministério Público.

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Apesar de ser do conhecimento jurídico de todos o caráter

inquisitorial da fase policial, tal peça pré-processual vinha sendo considerada de

valor probante determinante por diversos juristas por todo o Brasil. Tinha-se por

premissa e entendimento jurisprudencial que uma vez não corroborada pelas provas

judiciais, as informações contidas no inquérito poderiam ser fundamento, ainda que

único, da condenação do acusado.

Eminentemente tal assertiva contrariava frontalmente a

ordem constitucional, pois, muitas vezes, por despreparo estatal, muitas

testemunhas, por exemplo, não eram localizadas, já que havia passado diversos

anos de sua oitiva policial. Sendo assim, suas declarações perante a autoridade

policial eram dotadas de uma relevância tal que serviriam para a condenação.

5 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 58.

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Depois de muitos anos, todavia, buscando conciliar a

arcaica legislação à nova ordem constitucional, a Lei 11.690/2008 vedou a

condenação fulcrada exclusivamente em provas extrajudiciais. Ressalte-se,

portanto, que a mens leges foi de constitucionalizar certas normas processuais. Eis,

portanto, o teor do artigo 155, do Código de Processo Penal:

O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

No entanto, sua redação não foi clara e continua a induzir

dúvidas. Como bem demonstra Aury Lopes Júnior:

O art. 155 não teve coragem para romper com a tradição brasileira de confundir atos de prova com atos de investigação(1), com graves reflexos na eficácia probatória deles. A redação vai muito bem, até o ponto em que inseriram a palavra errada, no lugar errado. E uma palavra, faz muita diferença... Bastou incluir o “exclusivamente” para sepultar qualquer esperança de que os juízes parassem de condenar os réus com base nos atos do famigerado, inquisitório e superado inquérito policial. Seguiremos assistindo a sentenças que, negando a garantia de ser julgado a partir de atos de prova (realizados em pleno contraditório, por elementar), buscarão no inquérito policial (meros atos de investigação e sem legitimidade para tanto) os elementos (inquisitórios) necessários para a condenação. Significa dizer que nada muda, pois seguirão as sentenças “fazendo de conta que....” o réu está sendo julgado com base nas provas colhidas no processo, quando na verdade, os juízes continuarão utilizando as clássicas viradas lingüísticas do “cotejando a prova judicializada com os elementos do inquérito...” ou “a prova judicializada é corroborada pelos atos do inquérito....”. Quando um juiz faz isso na sentença, está dizendo (discurso não revelado) que condenou com base naquilo produzido no inquérito policial (meros atos de investigação), negando o contraditório, o direito de defesa, a garantia da jurisdição etc., pois no processo não existem provas suficientes. Quem precisa “cotejar” e invocar o inquérito policial,

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quando a prova judicializada é suficiente? Aqui, a vedação de utilização dos atos de investigação (excetuando, é elementar, as provas técnicas irrepetíveis e aquelas produzidas no incidente judicializado de produção antecipada) já seria pouco.... O ideal seria ter coragem para romper, buscando a exclusão física dos autos do inquérito(2). Isso sim seria dar ao inquérito o seu devido valor e garantir o julgamento com base na máxima originalidade da prova (colhida no processo e em contraditório).

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Outrossim, no plenário do júri, vigora o princípio in dubio

pro reo, ou seja, na dúvida acerca da ocorrência de um crime, absolvição é de rigor.

Seguindo esse raciocínio, diante da ausência de provas judiciais aptas a ensejar a

condenação do acusado, a absolvição seria o caminho correto, ou seja, a existência

de provas exclusivamente extrajudiciais seria equivalente a inexistência de

elementos probatórios.

6 LOPES JÚNIOR, Aury. Bom para que(m)? Boletim IBCCRIM, São Paulo, ano 16, n. 188, p. 9-10, jul. 2008

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4 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO MEIO INTERPRETATIVO DE

SOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA

Tal conclusão é extraída pelo confronto aparente de dois

princípios constitucionais: soberania dos veredictos e exigência de judicialização da

prova.

Daí, quando há uma colisão entre os dois princípios

elencados, deve-se utilizar o princípio da proporcionalidade para haverá a correta

interpretação.

Destarte, a regra da soberania dos vereditos não é

absoluta, uma vez que deve ser controlada pelo princípio da judicialização da prova,

ou seja, o promotor de justiça, ao explanar a prova em plenário, tem a obrigação de

demonstrar para os jurados elementos probatórios judicias, não podendo

fundamentar sua acusação em simples elementos inquisitoriais.

É até corriqueiro nos Tribunais do Júri desse país a leitura

por parte do Ministério Público de provas exclusivamente extrajudiciais para ensejar

a condenação de um acusado. Porém, tal prática deve ser totalmente rechaçada,

tendo em vista que a existência de prova exclusivamente extrajudiciais equivale a

não existência de provas para condenar o réu.

Dessa maneira, proponho a seguinte solução: quando

houver tão-somente provas inquisitoriais no processo do júri, deve o juiz presidente

do Tribunal do Júri proibir a utilização da leitura das mencionadas provas pelo

membro do Ministério Público, sob pena de tornar nulo o julgamento e,

conseqüentemente, atrasar a finalização do trâmite processual.

Isso se justifica porque, em nome do princípio da íntima

convicção, os jurados não necessitam de fundamentar o seu voto, mas, na hipótese

acima levantada, não há como ser outra conclusão, em caso de condenação, a não

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ser a utilização da prova unicamente extrajudicial por parte dos jurados para

condenar o acusado, violando frontalmente o que está escrito no artigo 155, do

Código de Processo Penal, além também, por óbvio, de violar o artigo 5o, LIV, da

Constituição Federal.

Confirmando o que foi dito, trago à baila os recentes

julgados do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, segundo os quais a

utilização de prova exclusivamente extrajudicial torna nulo o julgamento pelo

Tribunal do Júri:

PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO. TRIBUNAL DO JÚRI. CONDENAÇÃO DOS ACUSADOS. ALEGAÇÃO DE DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. DECISÃO QUE SE FUNDOU EM PROVA EXCLUSIVAMENTE EXTRAJUDICIAL. APELO DO ACUSADO EDSON GONZAGA IMPROVIDO. APELO DOS DEMAIS RÉUS PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. 1. Quanto ao acusado Edson Gonzaga, não há que se falar em qualquer pecha no julgamento a implicar novo julgamento pelo Tribunal do Júri, seja pelo não acolhimento da tese de legítima defesa e acolhimento da qualificadora, seja pelo não reconhecimento de homicídio privilegiado. 2. A pretensão de rever a decisão do Tribunal do Júri violaria o preceito constitucional da soberania dos veredictos. 3. No que se refere aos acusados Sebastião Manoel da Silva e Nilson José do Nascimento, verifica-se que a versão acolhida pelo Conselho de Sentença, apresentada pela acusação, está fundada unicamente em confissão realizada em inquérito policial. 4. Relativamente à possibilidade de que a condenação se fulcre em prova colhida em inquérito policial, observo que a jurisprudência majoritária já entendia ser necessário que em sede judicial fosse a referida prova confirmada pelos demais meios probatórios, encontrando, assim, respaldo no conjunto probatório produzido com a observância do contraditório e da ampla defesa. A contrario sensu, uma vez contrariada pelas provas colhidas em juízo ou não confirmada por estas, inviável seja a prova extrajudicial o único elemento para a condenação. 5. Nova redação ao art. 155 do CPP, acolhendo os argumentos antes adotados pela jurisprudência. 6. A decisão do júri foi eminentemente contrária à prova dos autos, vez

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que não está embasada em elemento probatório válido suficiente, o que autoriza a sua reforma, com a devolução dos autos para que sejam os réus Sebastião Manoel da Silva e Nilson José do Nascimento submetidos a novo julgamento perante o Tribunal do Júri. 7. Em face do julgamento do HC 82959, de relatoria do Min. Marco Aurélio, que declarou a inconstitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei de Crimes Hediondos, e da redação do referido dispositivo legal conferida pela Lei nº 11.464/2007, o cumprimento da pena dos crimes hediondos deve ser realizado sob o regime inicialmente fechado, razão pela qual deve ser a sentença reformada neste aspecto quanto ao acusado E.G. 8. À unanimidade, negou-se provimento ao apelo do acusado E.G., modificando-se de ofício o regime de cumprimento da pena para o inicialmente fechado. Deu-se provimento ao recurso de S.M.S. e N.J.N., a fim de que sejam submetidos a novo julgamento (TJPE; ACr 0156863-8; Flores; Segunda Câmara Criminal; Rel. Des. Mauro Alencar de Barros; Julg. 01/07/2009; DOEPE 31/07/2009). PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO. TRIBUNAL DO JÚRI. ABSOLVIÇÃO DE UM DOS CO-RÉUS E CONDENAÇÃO DO DEMAIS ACUSADO. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DA DEFESA. ALEGAÇÃO DE DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. DECISÃO QUE SE FUNDOU EM PROVA EXCLUSIVAMENTE EXTRAJUDICIAL. APELO DO MP IMPROVIDO. APELO DO RÉU EZEQUIEL JACINTO DE ALCÂNTARA PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. 1. Relativamente à possibilidade de que a condenação se fulcre em prova colhida em inquérito policial, observo que a jurisprudência majoritária já entendia ser necessário que em sede judicial fosse a referida prova confirmada pelos demais meios probatórios, encontrando, assim, respaldo no conjunto probatório produzido com a observância do contraditório e da ampla defesa. A contrario sensu, uma vez contrariada pelas provas colhidas em juízo ou não confirmada por estas, inviável seja a prova extrajudicial o único elemento para a condenação. 2. Nova redação ao art. 155 do CPP, acolhendo os argumentos antes adotados pela jurisprudência. 3. Verifica-se da análise dos autos que a condenação baseou-se apenas na confissão extrajudicial dos acusados, a qual não teve a

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necessária confirmação nas evidências judiciais, razão pela qual não é suficiente para embasar a condenação. Provimento do recurso do réu Ezequiel Jacinto de Alcântara, para que este seja submetido a novo julgamento perante o Tribunal do Júri. 4. Se consignado acima não haver prova suficiente para a condenação dos acusados, vez que a condenação se lastreou apenas em confissão extrajudicial que não foi ratificada pelas demais provas produzidas em juízo, não há como se ter como eminentemente contrária à prova dos autos decisão dos jurados que absolveu o co-réu Aluízio Aleixo da Silva Filho. Recurso do Ministério Público improvido. 5. À unanimidade, negou-se provimento ao apelo do Ministério Público e deu-se provimento ao recurso de Ezequiel Jacinto de Alcântara (TJPE; ACr 0149598-5; São Lourenço da Mata; Segunda Câmara Criminal; Rel. Des. Mauro Alencar de Barros; Julg. 10/06/2009; DOEPE 18/07/2009).

Além desses, pode-se citar um louvável julgado proferido

pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, por meio do qual se determinou

a anulação de uma decisão do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri com base

nos argumentos anteriormente expostos:

APELAÇÃO CRIMINAL. JÚRI. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. CONDENAÇÃO. IRRESIGNAÇÃO. DECISÃO MANIFESTAMENTE À PROVA DOS AUTOS. FUNDADA EXCLUSIVAMENTE PRODUZIDAS DURANTE INQUÉRITO POLICIAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO CONTRADITÓRIO. NOVO JULGAMENTO DETERMINADO. RECURSO PROVIDO. A decisão do Júri respaldada exclusivamente nas declarações prestadas pela vítima durante o inquérito policial, sem qualquer amparo em provas produzidas sob o crivo do contraditório, se mostra manifestamente contrária à prova impondo, assim, a realização de novo julgamento nos termos do artigo 593, inciso III, alínea "d", da Lei Instrumental Penal. (TJMT; RACr 62590/2006; Rondonópolis; Primeira Câmara Criminal; Rel. Des. Rui Ramos Ribeiro; Julg. 10/10/2006)

No corpo do julgado resumido na ementa anterior, tem-se

ainda a seguinte transcrição, obtida da exposição do eminente Ministro Felix Fischer,

em julgamento no STJ, do REsp 257083-DF, em 07/11/2002:

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O Júri Popular, com toda a amplitude de apreciação que se queira destacar, não pode ultrapassar princípios basilares de valoração da sistemática processual e nem ferir frontalmente regras de experiência cotidiana de julgamento de processos criminais. Neste particular a lição genérica extraída do v. julgado na Ap. Criminal nº 40.662-2 (do e. Tribunal de Alçada do Estado do Paraná), in verbis: 'Tampouco procede invocar a sentença como base Nessa esteira, o termo juiz previsto no artigo 155, do Código de Processo Penal, refere-se, numa interpretação ampliativa, também aos jurados, não podendo estes condenar quando houver tão-somente provas extrajudiciais para condenação, conforme entendimentos doutrinários e jurisprudenciais colacionados.

Por todo o exposto, ainda que as provas extrajudiciais

sejam, sem dúvida, suficientes para o oferecimento da denúncia, ou alicerce

indiciário para a prolação da sentença de pronúncia, não podem jamais, por si só,

ensejar uma condenação, em consonância com a atual ordem constitucional, cujo

entendimento é refletido na jurisprudência e doutrina nacional.

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5 A LEITURA DAS PROVAS EXTRAJUDICIAIS E O SISTEMA DE VALORAÇÃO

DOS JURADOS

Até o presente ponto, afirmou-se que a nova ordem

constitucional, inaugurada em 1988, ressaltou como um de seus princípios primários

a necessidade de submissão de qualquer acusação à ampla defesa e ao

contraditório pelo acusado (art. 5.°, inciso LV), revogando todo o sistema arcaico de

acusação outrora existente no Brasil, de modo que o legislador teve de adequar as

normas infraconstitucionais a essa realidade.

Também foi ponderado que, embora a reforma no

Processo Penal em 2008 possua aspecto salutar, tais modificações se procederam

de forma tímida e, como afirmou o ilustre doutrinador Aury Lopes Júnior, ficaram

aquém daquilo que ainda se espera da interpretação da própria ordem

constitucional.

O que se quer dizer, então, é que a forma de acusação,

em que não se oportuniza o direito do acusado de contraditar a prova colhida, ou de

praticar todos os meios necessários para se defender de suas repercussões, deveria

ser terminantemente banida da realidade brasileira. Todavia, por questões

estruturais, os Inquéritos Policiais presentes no início da maioria das Ações Penais

são construídos sem essa observação, necessitando-se que, a posteriori, fossem

tomados os cuidados necessários para não embasarem uma condenação. Dessa

forma, afirma-se que a reforma do art. 155 do Código de Processo Penal foi

benéfica, mas insuficiente.

Por outro lado, o Conselho de Sentença do Tribunal do

Júri, que solenemente se reúne com a finalidade de julgar o pedido de condenação

de alguém pela prática de fatos tipificados em lei como criminosos, não necessita

fundamentar suas decisões, nem sequer tomá-las segundo os preceitos legais

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normalmente obedecidos pelo juiz singular. Destarte, o voto de um jurado quanto à

condenação do acusado poderá se basear em qualquer circunstância, plausível ou

não, objetiva ou subjetiva, sem que haja controle a esses fundamentos. Trata-se da

soberania dessa instituição, abarcada constitucionalmente no art. 5.°, inciso XXXVIII,

alínea “c”.

Não se busca aqui atacar, como outros autores já fizeram,

a constitucionalidade do sistema de valoração de provas denominado de “íntima

convicção”7, que é praticado excepcionalmente nessa situação. Pretende-se afirmar,

todavia, que a soberania outorgada constitucionalmente à instituição do júri não é

absoluta, assim como não há qualquer princípio absoluto em nossa ordem

constitucional. Há outros casos, em que o entendimento majoritário da jurisprudência

se posicionou no sentido de relativização dessa soberania, tais como no caso de

decisão manifestamente contrária à prova dos autos, ou no caso de rescisão da

condenação pelo Judiciário em sede de Revisão Criminal. Em caso de conjugação

dessa soberania com outros princípios constitucionais, como os princípios do

contraditório e da ampla defesa, deve-se destacar o princípio da proporcionalidade,

diante das peculiaridades do caso em questão, como se proporá a seguir.

O principal realce que se deve dar, nesse ponto, é ao fato

de o jurado, soberano e dotado da “íntima convicção” constitucional, poder se

embasar em valores que fogem de qualquer forma de controle de legalidade ou

constitucionalidade de suas motivações. A não ser que os jurados decidam de forma

manifestamente contrária à prova dos autos (art. 593, inciso III, alínea “d” do Código

de Processo Penal), apenas se houver nulidade ou erro ou ilegalidade por parte do

juiz presidente, um novo julgamento será determinado. Sendo assim, as decisões

desse Conselho de Sentença tornam-se essencialmente perigosas e capazes de

7 Sinteticamente, segundo o insigne doutrinador Fernando Capez, em sua obra “Curso de Processo

Penal, 2009”: “A lei concede ao juiz ilimitada liberdade para decidir como quiser, não fixando qualquer regra de valoração das provas. Sua convicção íntima, formada não importa por quais critérios, é o que basta, não havendo critérios balizadores para o julgamento. Esse sistema vigora entre nós, como exceção, nas decisões proferidas pelo júri popular, nas quais o jurado profere seu voto, sem necessidade de fundamentação.

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afrontar de maneira gritante a diversos princípios constitucionais, sem que se possa

fazer nada, em nome de sua soberania.

Outro realce importante, conforme exposto nos tópicos

anteriores, referente ao que a jurisprudência já tem afirmado, no sentido de vedar a

condenação de alguém feita exclusivamente com base em provas extrajudiciais,

quer pelo juiz singular, quer pelo Tribunal do Júri. Portanto, a interpretação que se

faz é de que a vedação do art. 155 do Código de Processo Penal também deve

plenamente incidir sobre os integrantes do Conselho de Sentença, de forma

limitadora de sua soberania.

Recapitulando-se as premissas, tem-se que:

a) o inquérito policial possui a finalidade de embasar a

denúncia, sendo que, por isso, não pode ser utilizado como fundamentação

exclusiva da condenação;

b) o Tribunal do Júri também está sujeito à vedação da

norma legal do art. 155, do Código de Processo Penal;

c) o sistema de valoração de provas por parte dos jurados

se faz por sua “íntima convicção”;

d) a soberania das decisões do Conselho de Sentença

não é absoluta, a ponto de poder ser controlada a fim de se evitar arbitrariedades

que afrontem as demais normas constitucionais.

Com base nessas premissas sintetizadas acima, de forma

específica em interpretação proporcional, é válido dizer que a simples leitura do

Inquérito Policial em uma sessão de julgamento do Tribunal do Júri deveria ser uma

prática vedada no Brasil, sob pena de tornar nulo o julgamento. Isso porque, como

não é possível atestar de que modo houve valoração das provas pelos jurados,

também não se pode assegurar se não levaram em conta apenas (e tão somente)

as provas extrajudiciais para embasar seu posicionamento a favor da acusação.

Portanto, é bastante razoável acreditar que, em nome da

aludida soberania dos veredictos, inúmeros acusados foram condenados pelo

Tribunal do Júri, o qual, por sua vez, atentou-se exclusivamente nas palavras lidas

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perante eles, juntadas aos autos quando da fase policial de investigação, cujas

provas não passaram pelo crivo do contraditório e da ampla defesa.

Admitir a leitura dessas provas, é permitir que a

condenação possa se fazer em detrimento de princípios constitucionais que

estruturam todo o sistema processual (tal como o do contraditório e da ampla

defesa), sob o argumento simplista de que os veredictos dos jurados são soberanos

(como se intocáveis ou incontroláveis).

Como se vê, trata-se de uma inconstitucionalidade de

prática disseminada e aceita sem a análise proporcional dos princípios em questão.

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6 CONCLUSÃO

Portanto, com a nova sistemática processual penal,

mormente com a reforma processual penal de 2008, mais especificamente com a lei

11690/08, não há como admitir a leitura de peças exclusivamente extrajudiciais no

plenário do júri, sob pena de ferir os princípios constitucionais da ampla defesa e do

contraditório, gerando a nulidade da decisão do júri, com supedâneo no art. 593,III,

d, do Código de Processo Penal.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CANOTILHO, J. J, Gomes. Direito constitucional e

teoria da constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993. p. 227.

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 16. ed.

São Paulo: Editora Saraiva, 2009. p. 378-379.

HOLTHE, Leo Van. Direito Constitucional. Editora

JusPodivm. 2. ed., revista, ampliada e atualizada até a EC 52/06. 2006. p. 245.

LOPES JÚNIOR, Aury. Bom para que(m)? Boletim

IBCCRIM, São Paulo, ano 16, n. 188, p. 9-10, jul. 2008.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23. ed.

São Paulo: Atlas, 2008. p. 58.

THEODORO, Marcelo Antonio. A constituição como um

sistema de princípios de normas. Revista de Direito Constitucional e Internacional.

Vol. 65. Editora Revista dos Tribunais, 2008