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CENTRO DE ESTUDOS
SISTEMA BRASILEIRO DE SEMENTES
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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O SISTEMA BRASILEIRO DE SEMENTES SOB A ÉGIDE DA
LEI DA PROPRIEDADE INTELECTUAL E DA LEI DE PROTEÇÃO DE
CULTIVARES
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Bom-dia a
todos. Vamos dar início ao nosso evento do Centro de Estudos, que faz parte
do Projeto Debates Sobre Temas Polêmicos.
O Centro de Estudos tem algumas linhas de apresentações,
na forma de painéis e de palestras, dos objetos das suas pesquisas.
Normalmente os eventos são apresentados no Projeto
Horizontes do Conhecimento; também temos o Projeto Juízes do Mundo, no
qual apresentamos as pesquisas de Direito Comparado, e o Projeto Debates
Sobre Temas Polêmicos, que me parece ter sido o adequado para o assunto
do nosso estudo na manhã de hoje, que é uma questão de tema polêmico.
Como os senhores terão a oportunidade de observar e de
perceber nas exposições, existe um aparente conflito entre dois sistemas
legislativos de proteção de direitos, que são a Lei de Cultivares e a Lei da
Propriedade Industrial.
O título do painel é o seguinte: O Sistema Brasileiro de
Sementes sob a Égide da Lei da Propriedade Industrial e da Lei de Proteção
de Cultivares. Estamos com dois especialistas, os quais em seguida
apresentarei. Vamos ver se este é um tema polêmico, ou não. Mas sendo, ou
não, polêmico, é um tema muito judicializado. Há muitas ações na Justiça,
tanto ações individuais como ações coletivas, que discutem essas questões,
por isso é importante que o Centro de Estudos do Tribunal de Justiça se
ocupe com o fomento, com o debate e com reflexões sobre essa matéria.
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Inicialmente, eu gostaria de saudar os senhores que
compareceram para assistir a este tema, que não é um tema geral do assunto
do Direito - é um tema muito focado, muito específico de um segmento do
Direito -, mas que mesmo assim despertou o interesse dos senhores, a quem
saúdo e cumprimento.
Quero destacar a presença de alguns Colegas, Des. Luiz
Augusto Coelho Braga, Des. Rinez da Trindade e Des. Breno Vasconcellos.
Peço desculpas por talvez não ter localizado outros Colegas para saudar, mas
agradeço pelo comparecimento dos demais magistrados, advogados,
professores e funcionários do Poder Judiciário.
Apresentarei os nossos convidados, a quem agradeço por
aceitarem o convite e também pelo comparecimento.
Falará primeiro o Dr. Silmar Teichert Peske, graduado em
Engenharia Agronômica pela Universidade Federal de Pelotas, Doutor em
Agronomia, Tecnologia de Sementes, pela Mississippi State University,
Professor, por 40 anos, da Universidade Federal de Pelotas.
A seguir, o Dr. Marcelo Gravina de Moraes, graduado em
Engenharia Agronômica e Mestre em Microbiologia Agrícola e do Ambiente
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Doutor em Fitopatologia pela
University of Wisconsin, Madison, Estados Unidos, Professor Adjunto II da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Quero saudar também a presença da Dra. Adriana Brandani,
responsável direta pela realização deste evento. Com a missão, com a tarefa
de poder produzir este evento, procurei me assessorar e me orientar com
organizações não governamentais que pudessem fazer a indicação de
especialistas no assunto. Então, através das minhas pesquisas, localizei o
Conselho de Informações sobre Biotecnologia, www.cib.org.br.
O Conselho de Informações sobre Biotecnologia é uma
organização não governamental e uma associação civil sem fins lucrativos,
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sem nenhuma conotação político-partidária ou ideológica. Seu objetivo básico
é divulgar informações técnico-científicas sobre a Biotecnologia e sobre os
seus benefícios, aumentando a familiaridade de todos os setores da
sociedade sobre o tema.
Procurei a Diretora desse Conselho de Informações sobre
Biotecnologia, a Dra. Adriana Brandani, que gentilmente colaborou, fez essa
interlocução com o Poder Judiciário e fez a indicação dos nossos palestrantes,
que, sem ônus para o Poder Judiciário, aqui compareceram para dar a sua
contribuição, prestar informações que poderão fomentar o debate e a reflexão,
e contribuir, até para um melhor entendimento dessas questões.
Finalizando a minha fala de abertura, quero prestar um
esclarecimento no sentido de que os Juízes precisam se abeberar também
dos conhecimentos interdisciplinares para melhor entenderem as questões
que são levadas a julgamento.
O Centro de Estudos, nesses dois anos em que estou
coordenando as tarefas, trouxe médicos, economistas e administradores, e
não somente pessoas do Direito para fazer palestras; trouxe também pessoas
de outros segmentos do conhecimento. Muitas vezes temos que conhecer
questões de outras áreas do saber, da Administração, da Economia, da
Medicina, da Psicologia e assim por diante, que são questões
interdisciplinares que repercutem nos nossos julgamentos.
Pareceu-me adequado aqui termos o conhecimento de dois
engenheiros da área da Botânica, da Biologia e da Biotecnologia, que, tenho
certeza, prestarão informações relevantes e de repercussão também no
mundo do Direito, porque o Direito não é um fim em si mesmo, mas regula as
relações sociais. Desse modo, o conhecimento da sociedade é um
pressuposto.
Com esses esclarecimentos iniciais, vou passar primeiro a
palavra ao Dr. Silmar, depois ao Dr. Marcelo e, finalmente, vamos colocar a
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palavra à disposição para as contribuições do auditório, para perguntas e
comentários.
Passo a palavra ao Dr. Silmar.
DR. SILMAR TEICHERT PESKE – Bom-dia. É uma grande
satisfação estar aqui com vocês, tratando de um tema de suma importância
para o País, para a nossa região e para o nosso Estado.
Preparei a minha parte, os aspectos agronômicos, vou
abordar aspectos relacionados à Lei de Proteção de Cultivares, e o colega
Marcelo dará continuidade a seguir.
Coloquei alguns slides para visualizar melhor o que estou
falando. O título parece que está um pouquinho diferente do que está
colocado, porque eu coloquei As Proteções Legais, uma vez que existem
outros tipos de proteções também.
Dentro das espécies que o Brasil cultiva, temos dois carros-
chefes que realmente sustentam a nossa economia hoje, 2015, que são a
soja, que estou colocando aqui para vocês, e o milho.
A soja, com mais de 31 milhões de hectares cultivados no
País, sendo que o Rio Grande do Sul tem quatro milhões de hectares de soja
e 15 milhões de hectares de milho. Essas duas espécies realmente estão
carregando a parte econômica do País. As outras também fazem parte,
entretanto essas se sobressaem.
Em relação à parte legal, devo começar dizendo que o País,
na década de 70, teve algumas políticas públicas relacionadas à semente. Até
a década de 70, por exemplo, a semente não precisava ter germinação para
ser comercializada, não tinha semente para os agricultores, praticamente tudo
era público, havia problemas de capacitação e de pesquisa.
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Então o governo teve uma política pública nos anos 70 e
elaborou um grande projeto de 40 milhões de dólares, dos quais ele conseguiu
oito milhões no BID, e implementou o Plano Nacional de Sementes.
Hoje estamos, em 2015, com muito sucesso nessa área de
sementes, diga-se de passagem. Então, as coisas que foram estabelecidas há
quase 50 anos atualmente representam uma realidade.
O sistema em si envolve vários atores. Temos a pesquisa, que
é a criação de novas variedades de soja, de milho, de arroz; tudo é dado pela
pesquisa. Nós temos que pesquisar e, depois de pesquisar, conseguir um ou
dois quilos de sementes. Essas sementes devem ser multiplicadas - semente
básica, semente comercial – e depois têm que ser comercializadas. E aí entra
o agricultor que vai utilizar essa inovação desenvolvida pela pesquisa, cujas
sementes são produzidas pelos produtores de sementes. Para isso chegar ao
agricultor, tem que ter uma qualidade, e aqui, em geral, entra o Estado, com o
controle externo de qualidade.
É evidente que o agricultor é quem utiliza as inovações
tecnológicas, mas o grande benefício vai para a sociedade, porque, quanto
mais se produz soja, quanto mais se produz arroz, quanto mais se produz
milho, menor será o preço para chegar à sociedade. Ou seja, dando um
exemplo bem simples: o frango consome é milho; se o quilo do milho for caro,
o frango vai ser caro; se o milho for barato, se produzirmos bastante, o milho
ficará mais barato e mais barato será para a sociedade. E assim acontece
com o ovo, com a carne de porco e assim por diante. Quanto mais eficiente
formos, mais a sociedade vai ser beneficiada.
Em termos de grandeza desse sistema, temos mais de 7.500
agrônomos atuando no Sistema Brasileiro de Sementes. Isso é bastante. A
UFRGS, aqui em Porto Alegre, forma ao redor de 50 a 60 agrônomos por ano;
Pelotas, de onde venho, forma mais 80. Então há mais de 7.500 agrônomos
que atuam no Sistema Brasileiro de Sementes.
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Produtores de sementes são aqueles que produzem as
sementes para o agricultor utilizar, e são 4.000, quer dizer, tem bastante.
E temos os obtentores, que são aquelas empresas que criam
e que desenvolvem as novas variedades de arroz, de soja, de milho, de
algodão e de trigo. São em número de 48 e envolvem o setor público e o setor
privado. Aqui no nosso Estado estão o IRGA e a FEPAGRO; em termos
nacionais, temos a EMPRAPA, a COODETEC e assim por diante. São 48.
Laboratórios de sementes - semente é um organismo vivo, e
temos de saber se a semente está viva e se está forte - são 288. Em termos
de grandeza, quanto à produção de sementes, cultivam-se 1.8 milhões de
hectares.
O sistema envolve a pesquisa, a produção de sementes, o
comércio e o agricultor. Isso envolve dinheiro, porque movimenta a
infraestrutura e tudo o mais, um dinheiro forte. A semente tem que ser limpa e
beneficiada, então envolve várias tecnologias, e isso tem que ser promovido.
Não adianta produzir, o agricultor tem que conhecer os benefícios de uma
nova variedade, os benefícios de uma semente de alta qualidade. E aqui entra
a capacitação, da qual faço parte, e o Marcelo também. A capacitação faz
parte do contexto, com vários cursos de especialização, mestrado e doutorado
em sementes.
Nesse contexto da proteção de cultivares e da Lei de
Patentes: para criarmos qualquer cultivar, seja de arroz, seja de soja, seja de
milho, qualquer uma delas, dizemos que começa com a hibridação, ou seja, o
cruzamento de uma flor, a parte feminina de uma flor com a parte masculina
de outra flor. O que vocês estão vendo é um processo de castração em arroz,
em que está sendo retirada a parte masculina. É hibridação. Corta-se aqui,
tiram-se as anteras e se poliniza com o pólen de outra planta. Chama-se isso
de hibridação. Depois de 10 anos, vamos ter uma nova variedade, com
sementes em abundância.
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Depois que houve a hibridação, que cruzaram duas
variedades, temos que multiplicar isso no campo e em Casas de Vegetação.
Essas plaquinhas que vocês estão vendo são o resultado de cada cruzamento
que ocorreu. No primeiro ano, sai tudo igualzinho. No segundo ano, tem alto,
baixo, panícula grande, panícula pequena, semente grande, semente
pequena, semente com pilosidade, semente sem pilosidade, há inúmeras
coisas. E isso tem que ser multiplicado por seis anos para tudo ficar puro e
podermos oferecer ao agricultor. É um trabalho exaustivo, e quem se dedica a
isso é o pessoal do fitomelhoramento. Além dos conhecimentos que eles têm
que ter de Genética e de Agronomia, tem que ter um pouquinho de sorte,
porque cruzar 10 mil caracteres de um com 10 mil caracteres do outro e
acertar a combinação é difícil. É a mesma coisa se num jogo de poker
fizermos um royalty. É complicado, mas com o conhecimento se torna mais
fácil.
Aqui está a parte final, depois de seis anos. Depois de seis
anos, vamos ter, daquele cruzamento que se fez de uma florzinha com a
outra, um cruzamento que resultou nisso aqui, outro cruzamento que deu isso
e o outro que deu algo diferente. Desses todos se seleciona o melhor e se
oferece para o agricultor. Qual será o melhor? Em geral, o melhor será aquele
que produz mais. Entretanto, às vezes o melhor será aquele que é resistente a
uma doença; às vezes também o melhor será aquele que dá um grão de arroz
inteiro, em maior percentagem. Então é isso que é oferecido ao agricultor. São
vários caracteres. Estou utilizando o arroz porque venho de uma região
orizícola, então minhas ilustrações vêm mais com o arroz do que com a soja.
A mesma plaquinha que tinha ali, que vocês viram, hoje está
aqui. Alguns são altos, outros são baixos. Alto não é muito bom porque (...),
então também não é bom, mas se produz muito e também se pode fazer.
Então, em geral, no fim do trabalho todo, temos uns 20 ou 30 materiais, e só
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se escolhe um; os outros se atiram fora. É um trabalho demorado, caro, mas
os benefícios são grandes, e a sociedade agradece.
Aqui mostro uma empresa de melhoramento de soja, vocês
podem ver todas as estufas, porque, como demora muito tempo, às vezes tem
que se cultivar no inverno também, aí envolve várias estruturas. E aqui estão
as parcelinhas, que vocês estão vendo, do melhoramento, em que o pessoal
analisa o que é bom, o que não é tão bom, o que pode ir para frente e o que
será colocado para outras utilidades.
Se desenvolvermos um material, por exemplo, aqui em Porto
Alegre, na estação do IRGA, em Cachoeirinha, esse material pode se dar
muito bem em Cachoeirinha, mas temos que levar para Pelotas, temos que
levar para Uruguaiana, temos que levar para Santa Maria, para ver se lá
também produzirá bem. Então, qualquer material, depois que estiver pronto,
tem que ser testado em pelo menos três locais por dois anos, mas nenhuma
empresa faz isso. São testados em vários locais por dois anos para se ter
certeza de que o material é superior. Isso envolve dinheiro, tempo e uma
logística grande para testar. O IRGA, por exemplo, testa pelo menos em 10
locais antes de lançar um material no mercado. O IRGA é o Instituto Rio-
Grandense do Arroz.
Aqui temos um dia de campo, depois que os materiais já estão
praticamente prontos para serem oferecidos ao agricultor. Isso é trigo, e vocês
podem ver que existem várias variedades; não há só uma variedade. Temos
aqui no Estado pelo menos umas 30 variedades para o agricultor utilizar.
Temos quatro empresas que se dedicam ao trigo aqui no Estado. Estão
localizadas em Passo Fundo e em Cruz Alta.
Na parte de Biotecnologia, na parte de transgênicos, o colega
Marcelo vai colocar para vocês o sistema como um todo e vai detalhar um
pouco mais.
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O sistema envolve a parte de Biotecnologia, que é a base dos
transgênicos. Envolve o melhoramento, que acabei de falar para vocês, em
que cruzamos a parte masculina de uma flor com a parte feminina de outra
flor, e, praticamente 10 anos depois, vamos ter sementes em quantidade para
oferecer ao agricultor. Isso é o melhoramento de um trabalho cujos
profissionais têm um conhecimento que na maioria das vezes não vem com
esse aqui. E os profissionais que atuam aqui são praticamente diferentes dos
que atuam ali.
Depois que temos a variedade, temos que ver como é que ela
se adapta. Depois que ela se adapta, vai para os produtores de sementes. Os
produtores de sementes é que vão multiplicar as variedades, que são em
torno de 4.000 no País inteiro, envolvendo todas as espécies: trigo, milho,
arroz, feijão, soja, azevém, tomate.
Eles vendem aos agricultores as sementes de uma variedade
superior, que foram criadas no melhoramento, e algumas delas também com
produtos transgênicos. Os mais comuns são, no Brasil, a soja, o milho e o
algodão.
Como falei para vocês, o melhoramento é um processo caro,
envolve muito pessoal altamente qualificado, é um processo que leva tempo,
dinheiro e, muitas vezes, até um pouco de sorte para termos o material. Às
vezes se trabalha por 10 anos e não se consegue nada.
Na política dos anos 70, a iniciativa privada também se
envolveu no melhoramento. Entretanto se viu que tem que haver um retorno
desse dinheiro. São 10 anos de trabalho, é preciso ter um ganho. Como é que
se vai recuperar o dinheiro investido? Então nós protegemos esses materiais.
Existe uma proteção biológica que não passa pela lei, que são
os híbridos, que é o híbrido de milho que temos no Brasil. O grande carro-
chefe dos híbridos é o milho, 85% de todo o milho é híbrido; o tomate também
é híbrido; do arroz, aqui no nosso Estado, 10% é híbrido. Esses têm uma
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proteção natural, que é o segredo. O híbrido tem uma proteção natural, e o
agricultor não guarda a semente. Ele até pode guardar, mas, se plantar um
material que é híbrido, no segundo ano ele vai ter plantas altas, plantas
baixas, um tomate grande, um tomate pequeno, um tomate verde, um tomate
vermelho, vai ter de tudo, e pouco do material que ele quer. Então, o híbrido o
pessoal não guarda, porque, na segunda geração, há uma segregação muito
grande, e o pessoal não utiliza. A perda de rendimento é astronômica. Então,
no híbrido há uma proteção já ao natural. Muitas espécies já estão sendo
comercializadas em forma de híbridos.
Há para outras uma proteção legal, que é o objetivo da nossa
presença hoje aqui, que é a Lei de Proteção de Cultivares (baseada na Ata da
UPOV, de 1978). Por que coloquei entre parênteses “baseada na Ata da
UPOV de 1978”? Hoje o comércio é internacional no mundo inteiro. E o Brasil,
dentro da Organização Mundial do Comércio, se comprometeu em ter uma Lei
de Proteção de Cultivares, e assim o fez, em 1997. O Brasil entrou na Ata de
1978. A UPOV é uma organização de governo, sob a tutela da ONU; tem a de
1978 e tem a de 1991.
A de 1978 protege as sementes das variedades melhoradas
até a semente, enquanto que a Ata da UPOV, de 1991, protege as sementes
das variedades melhoradas até o grão. Isso quer dizer o seguinte: se o
agricultor não quiser comprar semente, não precisa. Entretanto, se ele utilizar
semente, uma variedade melhorada e protegida, o direito do melhorista estará
assegurado, isso é de 1991. Ela é mais abrangente, é melhor, há uma
proteção mais robusta.
Esta UPOV é um acordo de governo. O governo brasileiro que
se comprometeu a utilizar isso. Hoje, em 2015, o Brasil está discutindo se
melhoramos a de 1978, porque ela realmente não propicia uma boa proteção
para quem cria e desenvolve uma nova variedade.
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Temos então a Lei de Patentes. A Lei de Proteção de
Cultivares é referente ao nosso Ministério da Agricultura, é ali que fazem tudo:
registram as variedades e protegem as variedades. Enquanto que a Lei de
Patentes, vocês como advogados sabem, está dentro do INPI. Há uma
proteção mais robusta. Nós pagamos, pagamos ou pagamos. Realmente há
um bom retorno para quem consegue patentear.
Antes que eu avance muito, quero colocar que, para
protegermos uma variedade superior, uma variedade que produz mais e é
melhor, temos que registrá-la e protegê-la, e aí se contam 15 anos de
proteção. Não há necessidade de tanto, mas são 15 anos, porque em geral
saem coisas novas quase todos os anos e a variedade fica obsoleta.
Para uma patente a proteção é de 20 anos, entretanto
efetivos são 10. Vou repetir: a proteção de patente é de 20 anos, entretanto,
no nosso caso dos transgênicos, é efetivamente explorada por 10. Por quê? A
patente entra desde o momento em que se entra no INPI. Começou a contar.
Depois que está no INPI, como são transgênicos, têm que passar pela
CTNBio e pelo Conselho de Biossegurança, e isso leva mais uns três anos.
Depois, isso tem que ser testado no País inteiro. Mais três
anos. Depois que foi testado no País inteiro, se funcionar, se não funcionar, se
for bom, ou se não for, teremos que produzir a semente por mais três anos.
Então efetivamente são 10 anos. Quem patenteou algo e tem algo superior
realmente não tem muito tempo para se ressarcir do investimento.
Exigências. Lei de Proteção de Cultivares. Como falei, é a
parte agronômica. Se olhar uma planta, se uma planta for diferente da outra,
pode-se proteger; se todas as plantas, num hectare, forem iguais,
homogêneas, pode-se proteger. E tem que ser estável, ou seja, a planta que
deu este ano, o ano que vem tem que dar de novo. Então tem que ser distinto,
homogêneo e estável. Por exemplo, um híbrido que não é estável não se
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patenteia; podem-se patentear os parentais; o híbrido em si, não,
normalmente.
Quanto à patente que estamos falando, novidade. Não tem
nada a ver com o distinto, isso aqui são aspectos agronômicos, o fenotípico de
uma planta. Aqui está o processo: novidade, atividade inventiva e se tem
utilidade. É bem diferente.
Alguns dados para vocês dos programas de melhoramento
que temos no nosso País. Algodão, por exemplo - eu coloquei de 1979 a
1997, porque em 1997 tivemos a Lei de Proteção de Cultivares, então
coloquei esse número –, arroz, milho, soja e trigo: os cinco carros-chefes que
temos. Aumento de produtividade: 95%, num período de 17 anos, o que
representa um aumento grande. Este aumento se deve, nessa época, de 1979
a 1997, a aspectos agronômicos. Por exemplo, aprendemos a adubar melhor
as plantas, aprendemos a fazer o cultivo mínimo, aprendemos a semear na
época certa. Então teve muito aumento de produtividade devido às práticas
agronômicas e, em menor escala, devido ao melhoramento. Isso nessa época.
O aumento é grande, invejável.
E de 1997 a 2015, tivemos, por exemplo, arroz, 44%. No Rio
Grande do Sul, o arroz irrigado, porque há regiões no Brasil que o pessoal não
irriga o arroz. Aqui no Sul irrigamos tudo. Então nosso arroz, em 1997, eram
cinco toneladas por hectare, hoje são mais de sete, um aumento de 44%.
Milho deu 100%, soja 31% e o trigo 68%.
Esse é o ganho de produtividade que foi dado pela Genética,
pela capacidade dos melhoristas em cruzar uma flor com a outra, que deu
ganho de produtividade, com um aumento de 80%. Esse momento deve-se à
Genética, ao germoplasma das espécies que o pessoal conseguiu fazer,
porque o cultivo mínimo, a adubação, essas práticas agronômicas já eram
dominadas e já tinham sido incorporadas.
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Este é um lindo campo de soja, com uma variedade superior,
que vocês podem olhar. Está limpa, verdejante, e o pessoal que trabalha em
economia diz: “Já pode vender a soja verde, porque usaram semente de alta
qualidade e de uma variedade melhorada”. Quer dizer, estão bem.
Estamos falando em sementes, em proteção de cultivares e
em patentes. Mas temos que produzir a semente, e essa semente também
envolve uma tecnologia forte. Isso aqui parece que está tudo verde, mas, se
não colhermos a soja verde assim, não vamos ter semente. Isso envolve
tecnologia.
Algumas coisas mais, equipamentos também. Está meio
longe, talvez vocês não vejam, mas aqui tem um 17.3, e isso quer dizer que é
a umidade da semente. Então temos que secar, inclusive temos que criar a
variedade, desenvolver uma variedade e produzir sementes de alta qualidade,
o que tem um custo e envolve também conhecimentos e tecnologia.
Vocês podem ver aqui um campo de produção cuja lavoura foi
afetada pela seca. Muitas vezes temos uma variedade superior, temos
sementes de alta qualidade, mas o clima não ajudou muito. Aqui no nosso
Estado a seca também não tem ajudado.
De sementes, não queremos isso aqui. Essa semente é
diferente desta, esta é desta e esta é desta. Além de serem diferentes, temos
as invasoras, e isso também não queremos. Por isso que existem os
produtores de sementes, para oferecer aos agricultores sementes das
variedades melhoradas, puras, sem ervas daninhas.
Alguma coisa de grandeza de novo. Área cultivada para
algumas espécies, de 1979 a 2015. Foram os dados aos quais tive acesso.
Muitas vezes temos acesso a dados, mas os dados não são confiáveis. Em
termos de área cultivada, o dado que é confiável é o da CONAB, de 1979 para
cá. Somos um País jovem, então as nossas estatísticas não são tão grandes
assim.
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Voltando ao algodão, tínhamos, em 1979, três milhões de
hectares no País; hoje, temos um milhão. E o algodão, que era cultivado no
Estado do Paraná, hoje se cultiva na Bahia e no Mato Grosso. Mudou, mas a
área é menor e a produção é bem maior. (...) em 1979 se cultivavam 500 mil
hectares; hoje, mais de um milhão. Duplicamos a área.
Quanto ao milho, no País inteiro, havia 11 milhões, e hoje
temos 15 milhões de hectares. O milho está aumentado porque ao milho se
agrega valor. Vende-se pouco milho; o que se vende é carne de frango, e isso
agrega valor, isso é bom para o País.
Soja, esta sim, que conta: em 1979, eram oito milhões de
hectares. Uns 35 anos depois, 31 milhões de hectares. A soja, atualmente, em
2015, é que segura a nossa economia. Ela representa 14% das exportações,
é coisa grande.
E, do trigo, desde 1979, a área era de quase quatro milhões
de hectares, e hoje é de dois milhões e meio. Com o trigo, há alguma coisa no
comércio que não está bem. A parte de melhoramento está bem, se produz
mais por hectare, mas o agricultor ganha pouco. Quando ganha muito pouco,
ele deixa de cultivar.
Taxa de utilização de sementes. O que quero dizer com taxa
de utilização de sementes? Por exemplo, de soja, o Brasil cultiva 31 milhões
de hectares. Não quer dizer que todos os agricultores vão comprar semente
para plantar. Não. Na soja são 64%, ou seja, dos 31 milhões de hectares, 20
milhões de hectares são com semente que os agricultores compram, os outros
11 milhões não compram, guardam a semente em casa. Então isso é taxa de
utilização de sementes.
E coloquei, no último ponto, quanto é o negócio de sementes,
o dinheiro que envolve. Com algodão são 400 milhões de reais, é uma cultura
cara, e a semente custa, mais ou menos, 15% do valor.
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Arroz irrigado, 85 milhões de reais. O milho, como é híbrido,
custa um pouco mais, temos 15 milhões de hectares. A taxa de utilização do
milho: 90%. Noventa por cento compra semente de milho para plantar, isso dá
um negócio de mais de quatro bilhões de reais. É um bom dinheiro.
Soja é 64%, quer dizer, 36% não compram semente, e são 2.8
bilhões de reais. Então temos, com o negócio de semente de soja, 2.8 bilhões
de reais. É um bom dinheiro.
Dentro da Lei de Proteção de Cultivares há um fator que se
chama royalties. Eu desenvolvo a variedade, e o Marcelo produz a semente. O
Marcelo, que produz a semente da variedade que eu criei, vai me pagar, em
média, 10% para produzir a semente que eu criei. Muito bem, então coloquem
quanto é 10% sobre dois bilhões e 800 mil. Duzentos e oitenta milhões de
reais pagos em royalties para todos os programas de melhoramento. Não é
muito dinheiro. Não vou falar muito, mas não é muito dinheiro. Quanto aos
royalties, para o Marcelo produzir a semente que criei, 10%, não é um valor
significativo. Eu não vou ganhar muito dinheiro, vou penar. Se o meu (...) for
alto, provavelmente vou ter prejuízo.
Vamos adiante. Há mais alguns slides. Registro Nacional de
Proteção de Cultivares. Toda variedade que se cria tem que ser registrada, e
isso o Ministério da Agricultura tem feito muito bem. Então todo material, para
ser comercializado, deve ter um registro no Registro Nacional de Cultivares do
Ministério da Agricultura.
Depois, temos o Serviço Nacional de Proteção de Cultivares.
Para receber um retorno do investimento na criação e no desenvolvimento de
um cultivar, este deve estar registrado no Serviço Nacional de Proteção de
Cultivares. São dois passos: primeiro se registra e depois se protege. Todos
os programas de melhoramento protegem, sejam eles públicos ou privados.
Estão registrando e protegendo. Não precisa proteger se não quiser, mas,
para comercializar, tem que registrar.
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Aqui temos a CTNBio - Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança – e o CBS – Conselho de Biossegurança. (...). Aqui há um
Conselho de Ministros, aqui se analisa o material transgênico com bases
científicas. Analisa-se quanto à saúde, quanto ao ambiente e quanto a vários
aspectos. Depois de aprovado, vai para o Conselho de Ministros, que até hoje
aprovou tudo o que saiu da CTNBio, 100%. O Conselho de Ministros analisa
sobre a oportunidade e conveniência do material, aspectos políticos em si.
A nossa CTNBio é invejável. Os gringos, Estados Unidos e
também os argentinos, estão atrás, levam muito mais tempo. Nós, em três
anos, conseguimos liberar isso aí com exames profundos.
Lei de Proteção de Cultivares. Royalties. Royalty da
variedade, pago pelo produtor de sementes. Dentro da Lei de Proteção de
Cultivares, tenho uma empresa que cria e desenvolve uma nova variedade. E
o Marcelo, que é produtor de sementes, diz: “Silmar, eu quero produzir
semente da tua variedade, que é nota 10”. “Sim, podes produzir, entretanto
10% do valor da semente que tu venderes vem para mim.” “Certo, não há
problema nenhum.” Então ele paga para o produtor de sementes e só, é aí
que é pago o royalty, dentro da Lei de Proteção de Cultivares.
Patente. Royalty pelo processo, pago pelo produtor de
sementes ou por quem usa a semente, ou seja, pelo agricultor. Trocando em
miúdos, dentro da patente o royalty pode ser pago pelo produtor de sementes
ou pelo agricultor que não compra a semente, porque tem muita gente que
guarda a semente em casa. Este, dentro da Lei de Patentes, também paga o
royalty na hora em que ele for vender o grão.
Então, o royalty da patente pode ser pago em duas ocasiões:
dentro do sistema normal de sementes, ou seja, recolhido pelo produtor de
sementes, ou por aquele agricultor que não comprou semente, mas guardou a
semente em casa, conseguiu do vizinho ou de alguma forma.
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Isso, na hora de vender, vai ser verificado, e, se for
transgênico, o nosso caso, ele vai pagar o royalty, que é uma percentagem
sobre a produção. Ele paga isso aí. Há uma proteção mais robusta e diferente.
Isenção do melhorista. O melhorista é aquele que faz o
cruzamento entre uma flor na variedade A e uma flor na variedade B. Na Lei
de Proteção de Cultivares, lanço uma variedade no campo, e, no outro dia, a
minha concorrência já pode ir lá e pegar uma plantinha daquilo ali. Ou seja,
coloco uma variedade nova no campo, e, no outro dia, o melhorista de uma
empresa concorrente pode ir lá e pegar. Isso é isenção do melhorista.
Na patente não existe isenção do melhorista. De um evento
que é patenteado, que está no campo, o melhorista não pode pegar o material
e colocar no seu programa de melhoramento, usando o processo que foi
patenteado.
Temos aqui o resumo do que eu estava falando, a
sustentabilidade do sistema. Temos a pesquisa, que é a geração de um novo
e melhor cultivar, e, se licenciado para os produtores de sementes, esses
produtores de sementes vendem a semente para o agricultor, e, nesse
processo, o agricultor compra a semente, cujos royalties da variedade ou da
patente vão de volta para a pesquisa, e isso fica girando na parte de proteção
de cultivares.
Na parte de patente, a patente sai um pouquinho fora, porque
tem quem não compre sementes, então a patente também incide sobre o
grão.
Neste último slide, isso é um banco de germoplasma, que é o
local em que guardamos as amostras de sementes de todas as variedades de
soja, de milho, de arroz, de feijão, do que seja. No Brasil, temos o banco de
germoplasma do CENARGEN, em que temos, vamos dizer, a coleção de
feijão. O CENARGEN, que é em Brasília, tem uns oito mil tipos de feijão, e
está tudo guardado lá.
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Temos bancos de germoplasma em vários locais no mundo.
Por exemplo, o milho. Todo milho já foi coletado. Temos mais de 30 mil tipos
de milho, que são guardados em canequinhas de 1.000 sementes, mais ou
menos, nos bancos de germoplasma, com umidade baixa e temperatura bem
baixa para ficarem armazenadas de 50 a 100 anos.
Existem grandes bancos de germoplasmas na Colômbia, que
é o Centro Internacional de Agricultura Tropical, no México. No mundo inteiro
são 18.
Mas existe um Banco Internacional de Germoplasma com
capacidade para oito milhões de acessos, que são as coleções que temos dos
materiais crioulos. São acessos pequenos. O Brasil faz parte desse Banco
Internacional de Germoplasma, que se situa nas Ilhas Svalbard, praticamente
no Polo Norte. Fica a uma hora ao norte da Noruega, onde temos o sol da
meia-noite e a lua do meio-dia.
Então o germoplasma, do qual dependemos tanto para
aumentar o rendimento, praticamente está todo coletado, e parte já está lá;
outra já está em outros bancos.
Pessoal, o que eu me propus para falar para vocês foi isso.
Muito obrigado.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Agradeço
pela contribuição do Dr. Silmar.
Quero fazer um comentário, Dr. Silmar: num dos primeiros
slides que o senhor passou, parece que no Brasil há 7.500 engenheiros
agrônomos, trabalhando em sementes, e mais de 800.000 advogados. Esse
dado me chamou a atenção. Parece que no Brasil algumas áreas ficaram
infladas, e outras, como a área dos engenheiros, muito reduzidas.
Vou passar a palavra ao Dr. Marcelo Gravina de Moraes para
o prosseguimento.
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DR. MARCELO GRAVINA DE MORAES – Agradeço ao Des.
Ney, e, em seu nome, também agradeço aos demais magistrados, senhoras e
senhores aqui presentes, pela oportunidade de dividir com vocês esse
assunto, que é a Biotecnologia.
Minha proposta é trazer um pouco do conhecimento técnico,
da parte da pesquisa, como alguém que trabalha na área. Então me perdoem
se às vezes eu for excessivamente técnico. Vou tentar, com fotografias e com
ilustrações, amenizar um pouco o tema, que pode ser um pouco árduo em
razão da área de trabalho de vocês.
Este é o título: O Sistema Brasileiro de Sementes sob a Égide
da Lei da Propriedade Intelectual e da Lei de Proteção de Cultivares. Também
serão abordadas as inovações em geral no desenvolvimento das cultivares.
Sigo o que o Professor Silmar falou, fazendo uma abordagem
geral, principalmente sobre a questão da proteção de cultivares, que é uma
parte da questão. As outras questões envolvem as tecnologias mais recentes,
principalmente a Biotecnologia.
Para começar, mostro essa imagem de uma lavoura de milho,
uma lavoura bem estabelecida, bonita e interessante. Ela exige inovação,
exige tecnologia. Uma figura que muitos de vocês já viram é essa espiga
moderna de milho que está naquela lavoura, que foi desenvolvida com
inovação, a partir de uma espiga ancestral. Aqui entraram inovações que
surgiram dos povos originários da América, dos agricultores tradicionais, e,
mais recentemente, dos melhoristas, que foram citados pelo Professor Silmar.
E mais recentemente ainda pelos biotecnologistas, agregando outras
tecnologias que beneficiam hoje os agricultores.
A palavra é inovação, e a inovação encobre todo esse
processo, desde a questão original, passando pelo melhoramento tradicional e
chegando até às novas tecnologias, que incluem a Biotecnologia.
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Vou tentar abordar, nos próximos minutos, um pouco das
cultivares, sobre o que o Professor Silmar brilhantemente já falou. Vou fazer
só uma contextualização novamente aqui e vou me estender mais sobre a
questão única das cultivares geneticamente modificadas, que, por economia
de tempo, vou chamar de GMs.
Por fim, vou dar uma ideia sobre as etapas do
desenvolvimento de cultivares GMs. O que diferencia essas cultivares GMs,
ou geneticamente modificadas, de cultivares em geral? As cultivares, como já
foi dito pelo Dr. Silmar, estão estabelecidas por essa lei de 1997. O que
diferencia as cultivares são todas aquelas séries de características – se são
homogêneas, estáveis e assim por diante – que levam à compreensão do que
é uma cultivar, que posteriormente pode ser comercializada na forma de
semente ou muda. Uma cultivar é um ser vivo, uma planta que é multiplicada
através dos seus propagos.
Essa lei que foi citada oferece o direito para quem produziu de
vender e propagar essa semente, com fins comerciais. É o que se conhece
como Lei de Proteção de Cultivares.
Eu trouxe essa figura muito bonita de variedades de batatas -
não são brasileiras, são andinas, da região do Peru - para vocês visualizarem
bem. Poderiam ser diferentes cultivares de batata, porque são claramente
diferentes entre si. Provavelmente o agricultor que plantar cada uma delas vai
ter plantas homogêneas e estáveis ao longo do tempo. Isso representa a
variedade de características agronômicas qualitativas, possivelmente de
gosto, de textura, de cor e assim por diante, dessas variedades de batata. São
as cultivares.
O benefício já foi explicado, mas vou colocar alguns dados.
Desculpem-me, está em inglês, eu deixei o original das apresentações. Esses
benefícios do melhoramento genético, através do desenvolvimento de
cultivares, são muito grandes em vários países. Aqui mostra o trigo no México,
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uma multiplicação por quatro, em termos de toneladas, por hectare, desde o
desenvolvimento das primeiras cultivares da era moderna, vamos chamar
assim. Na era moderna – meados dos anos 50 - houve um melhoramento
genético, com mais tecnologia genética.
A soja, nos Estados Unidos, desde 1925 - outros países têm
estatísticas um pouco mais longas -, mostra uma evolução, em quilos por
hectare, em torno de quatro ou mais vezes.
É um processo benéfico, em termos de produtividade, pois
permite ter mais renda e diminuição da área de cultivo. Logo, há um benefício
ambiental bem claro.
O mesmo acontece com o milho, de forma até mais dramática.
Temos uma série, também nos Estados Unidos, desde o século XIX, em 1865,
quando plantavam variedades de milho que inclusive fazem parte dos 10%
que ainda plantamos no Brasil. Há uma minoria que planta o milho em
variedades, com produtividades bem modestas. São os híbridos.
Posteriormente vou comentar a questão dos transgênicos, das
plantas geneticamente modificadas, com um óbvio aumento de produtividade,
passando de menos de dois mil quilos por hectare para basicamente 10 mil
quilos. E existe uma projeção de 20 mil quilos, em poucos anos, nas plantas
de milho.
Para chegar a isso, o melhoramento usa várias tecnologias: os
cruzamentos, que já foram citados, e outras tecnologias genéticas que
também aceleram o processo de obtenção daquelas características. Imaginem
aquelas cultivares de batata. Muitas vezes não existe essa variabilidade, a
qual é induzida através de processos químicos, ou de radiação ionizante, que
é um processo físico. Isso não é Biotecnologia; isso é considerado
melhoramento clássico, tradicional, e é utilizado em vários casos na
agricultura
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A novidade que agrega um pouco da discussão sobre a
questão de patentes é a entrada da Biotecnologia. No Brasil foi estabelecida a
Lei de Biossegurança, em 2005, que normatizou a pesquisa e o uso comercial
dos transgênicos.
Os transgênicos, organismos geneticamente modificados em
geral, envolvem a introdução de genes que dão características específicas, e
esses genes podem vir da mesma espécie ou de espécies diferentes. Entra
então um processo completamente diferente do anteriormente explicado,
através de cruzamentos, de radiações e assim por diante.
As cultivares geneticamente modificadas vão ter todo o
manejo convencional, que caracteriza qualquer cultivar, e a elas se agregam,
através da Biotecnologia, determinadas características, que vou exemplificar
ao longo da apresentação.
Voltando à produtividade, ela não tem um período muito
grande nesse dado que eu obtive, mas vocês podem ver que já há uma
inflexão na curva, que se deve exatamente ao período breve de introdução -
nos Estados Unidos, neste caso - das primeiras plantas de soja transgênica,
mostrando que essa tecnologia realmente é diferente. Isso é uma tendência
histórica. Se continuassem usando soja não transgênica, provavelmente
haveria um prolongamento nessa linha, mas aqui foi devido à introdução da
Biotecnologia. Com relação ao milho, acontece a mesma coisa.
Faltam dados do Brasil, mas talvez aqui a situação seja ainda
mais dramática, porque, além de termos os benefícios em relação à redução
de custo, também houve uma significativa melhoria nas condições de
produção dessas plantas, milho e soja, que são os exemplos aqui no campo.
O aspecto diferenciador das plantas geneticamente
modificadas é as composições que entram para produzi-las. Basicamente
entram sequências de nucleotídeos, que são o DNA - aqui temos DNA e RNA,
mas no geral são os DNAs -, os vetores plasmídeos, que são meios, são
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partes do processo que levam o DNA que quero introduzir para dentro da
planta, assim como os micro-organismos, que também são modificados para
fazer o processo funcionar. Depois vou mostrar, num diagrama, uma ideia, um
esboço do que é o processo.
O próprio processo de transformação é diferente, porque não
envolve o cruzamento, não envolve as mutações; envolve um processo
chamado de transformação genética. O conjunto dessas três partes é
normalmente objeto das proteções em patentes pela Lei da Propriedade
Industrial aqui no Brasil, ou equivalente em outros países, desde que tenham
os requisitos já citados pelo Professor Silmar.
Essas patentes são ligadas a uma determinada sequência
genética e têm que ter uma finalidade. Por exemplo, neste caso, uma bactéria
é isolada da natureza, possui um gene, que, como pesquisador, identifiquei:
“importante para produzir uma vitamina”. Aí usei, pelo processo de
transformação genética, as sequências isoladas, as quais modifiquei para
ficarem apropriadas para colocar numa planta e coloquei numa planta para
produzir a vitamina.
A foto que vocês estão vendo aqui é do arroz dourado, que já
foi desenvolvido. Não tem no Brasil, mas é um processo biotecnológico
bastante interessante, em que se introduziu a característica de produzir a
vitamina no grão do arroz. Por que isso é característico, bem visual, para
entendermos a patente? O arroz não produz absolutamente nada de
betacaroteno, que é a provitamina A. Ele só vai produzir se for feito o processo
através da Engenharia Genética ou, como se diz também, da Biotecnologia.
Não há na natureza essa possibilidade. Existe em outras plantas, em outros
grãos, mas não no arroz. Não vou entrar em detalhes dos benefícios de tudo
isso, porque não é objeto da apresentação, mas vocês podem ver aqui várias
gerações com grãos contendo a coloração indicadora do acúmulo do
betacaroteno.
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A invenção biotecnológica, que envolve as sequências, os
vetores e o processo, é estabelecida dentro de um laboratório, usando micro-
organismos – esta é uma agrobacterium -, usando vetores – este é um
plasmídeo – e usando os genes de interesse, que são manipulados, são
isolados da natureza, são colocados dentro desses vetores apropriados e
usados para transformar plantas. Todo esse processo, exceto as plantas em
si, é objeto das patentes. Voltando à questão das cultivares, a novidade, a
inovação biotecnológica está no processo e nas partes que compõem o
processo com uma determinada finalidade.
Comparando os dois sistemas, já fugindo um pouquinho da
questão técnica da Biotecnologia, aqui é mostrado um processo, já explicado
em outros casos pelo Dr. Silmar, de introdução de um determinado gene, por
exemplo, entre duas plantas, neste caso, tomate. Essa é a planta na qual
quero receber o gene, e essa é a doadora do gene. Eu cruzo e depois, por
várias gerações, tento incorporar esse gene na nova cultivar, exceto outras
características dessa planta doadora, que, por sinal, é pequena, não é
produtiva, etc. Esse é o melhoramento genético. Isso leva alguns anos e é um
processo que envolve uma mistura bastante complexa de genes. Isso é o
clássico, isso é o desenvolvimento de uma cultivar.
Esse processo pode ser feito também por uma invenção
biotecnológica, em que isolo determinado gene - casualmente esse gene
também é de uma planta de tomate, da mesma planta doadora anterior -,
trago ele para o laboratório e o coloco diretamente na minha nova planta
receptora, que seria a planta que vai originar a nova variedade.
Logicamente o processo não é tão simples e não é tão rápido.
Seria uma grande promessa fazer isso de forma tão rápida.
Por algumas razões, que vou explicar no final da
apresentação, esse processo acaba retardando; o benefício do tempo, que
seria um ótimo benefício, acaba sendo contraposto com outros problemas de
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desenvolvimento em termos do tempo que leva. Mas só quero mostrar para
vocês que é um processo diferente, que não tem as mesmas características
do desenvolvimento através do melhoramento convencional.
Em relação a tudo o que temos no Brasil em termos de
aprovações, seja em plantas ou em outros organismos, em Biotecnologia
usaram sistemas semelhantes de sequências, de plasmídeos, de micro-
organismos. E há processos de transformação que variam de um mosquito ou
de uma planta para um micro-organismo. Não serão totalmente diferentes; são
muito parecidos.
No caso da planta - eu trouxe um exemplo da agricultura -
resistente a insetos, existe, na natureza, um grande número de proteínas
conhecidas, que são tóxicas para insetos, são as chamadas Proteínas Cry,
também chamadas de Proteínas Bt. Essas proteínas foram trazidas para
laboratório, foi reconhecida sua toxicidade e a sua especificidade contra
insetos, foram estudadas profundamente na sua estrutura, modificadas,
inclusive, para se tornarem mais aptas a serem produzidas em plantas, porque
elas são de bactérias. Quando estão em plantas, funcionam como
bioinseticidas, matando as lagartas que comem as plantas. Esse é o método
de controle de plantas resistentes a insetos por Biotecnologia, pelo invento
biotecnológico.
Por melhoramento convencional, pelo desenvolvimento das
cultivares, é muito pouco provável conseguirmos obter uma planta resistente
às lagartas como aqui. E certamente não seria pelo mesmo método, porque
normalmente as plantas não adquirem genes de bactérias na natureza.
Existem casos em que podemos adquirir de outros organismos, mas não é
muito provável, e não é provável que funcione devido à baixa frequência de
ocorrência do evento.
Outros casos, como o das plantas tolerantes a herbicidas,
seguem o mesmo processo. Também são genes, a maioria provenientes de
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micro-organismos que foram introduzidos nas plantas. Não preciso repetir,
porque basicamente o exemplo é semelhante.
Somando essas duas tecnologias, atualmente o Brasil produz
uma área significativa de inventos biotecnológicos dentro das cultivares:
91,8% no caso da soja, 81,6% no caso do milho e 65% no caso do algodão.
São os três grandes cultivos que incorporaram essas invenções de
Biotecnologia no seu sistema de produção de sementes.
E muitos outros talvez cheguem a nós. Eu trouxe casos para
observarmos visualmente, questões interessantes que vão além do controle
de insetos ou da questão de tolerância a herbicidas. São os casos brasileiros,
os casos que já estamos vendo. Este é o caso de uma maçã que é resistente
à oxidação, tem uma vida útil mais interessante para o consumidor. O
processo de liberação, em outros países, já está bastante avançado. Há
tomates com altos teores de antocianinas. É óbvio que isso não é algo que se
encontre; foi desenvolvido através da Biotecnologia. Talvez ainda mais óbvio
seja o caso das flores azuis ou de diversas cores que normalmente não são
obtidas por cruzamentos, por métodos naturais, e que também não são
pintadas, obviamente. São geneticamente modificadas para produzir esse
pigmento diferenciado. Já existem e já são comercializadas.
Há outros casos que vão beneficiar bastante o Brasil. Por
exemplo, a cana de açúcar com alto teor de sacarose, que produz etanol com
menor custo e assim por diante; canola com menos nitrogênio, menos
poluição, menos custo para produzir, além de outras culturas; tolerância à
seca, tolerância ao frio.
Enfim, há uma grande variedade de tecnologias que vão surgir
dessas invenções - e sempre ressalto -, que dificilmente seriam obtidas, por
não serem óbvias, através do processo tradicional. Foi essa inovação que
trouxe o benefício.
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A parte final eu vou focar no desenvolvimento em si, pois
penso que é importante e normalmente me perguntam sobre isso: como se
desenvolve, quanto tempo leva, quais são as etapas importantes para
desenvolver um cultivo transgênico, envolvendo a invenção biotecnológica até
a cultivar? Na verdade, o que vai se plantar vai ser a semente, e as duas
coisas vão coexistir num determinado período. Mas o que é diferente? Toda
essa etapa de laboratório é única para as invenções biotecnológicas.
Toda a etapa, no final, de biossegurança, só se exige para as
invenções biotecnológicas, pela lei brasileira. Podemos usar a mutagênese,
podemos usar a cultura de tecidos. Isso não é objeto da Lei de Biossegurança.
Isso é avaliado só para a Biotecnologia, e esse processo, como vocês vão ver
pela minha descrição, é o único também para a Biotecnologia. Existe a etapa
de laboratório, a etapa de ambiente protegido, que chamamos de Casa de
Vegetação, e a etapa de campo.
A descoberta, que é a etapa inicial, começa com uma série de
pesquisas. Hoje se faz muito em computador – in silico, como chamamos -,
mas também em bibliotecas gênicas, em coleções de genes, em várias
organizações e universidades. As universidades são muito ativas nesse
processo, inclusive a nossa, e faço também no meu laboratório, lá na UFRGS.
Este é o resultado de um trabalho publicado alguns anos
atrás. Eu trouxe os números: em média, de acordo com uma pesquisa feita,
cada evento transgênico parte de 6.200 eventos de pesquisa desde o início,
desde a descoberta. Esse é o funil daquela ideia que coloquei para vocês no
slide anterior. Deu-se num período que leva 26 meses. Não vou falar muito em
valores aqui, estão todos explicitados e são originados desse trabalho
publicado há uns dois anos.
Esta é a descoberta inicial: muitas sequências, muitas
bibliotecas, muitas pesquisas para encontrar os primeiros genes que quero
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testar, e provavelmente vão ser muitos. Como vocês estão vendo, 6.000
sequências.
Na fase de descoberta é preciso testar esses genes, é preciso
diminuir o número de candidatos, para não se tornar um processo
extremamente grande, caro ou de uma duração muito grande. Isso é feito com
o uso de plantas modelo, que chamamos de Prova de Conceito. São plantas
que consigo transformar, porque, com a Biotecnologia, haverá maior agilidade,
maior rapidez e maior eficiência.
A Prova de Conceito reduz o número de sementes, e, num
período de aproximadamente dois anos, consigo fazer. Esta é uma foto nossa,
é uma Prova de Conceito lá da UFRGS. Fizemos com essa planta modelo,
que não é uma planta cultivar. Aqui estou selecionando características das
plantas que vocês estão vendo. As verdes estão sobrevivendo; as outras
estão morrendo por causa do seletivo que estou usando, que, no caso, é um
patógeno.
Estou selecionando plantas resistentes ao patógeno, ao micro-
organismo que vai causar uma doença. Se eu fizesse com soja, não poderia
ter esses vasinhos aqui; teria que ter uma grande estufa, uma grande sala,
que provavelmente me impediria de continuar nas pesquisas. Esse é um
processo de descoberta.
A segunda parte trata da otimização da construção.
Construção é o termo que se usa para falar sobre a montagem nos vetores
dos genes de interesse, os vetores que são usados para transferir o DNA, por
exemplo, daquela bactéria para a planta. Só que nem sempre a otimização se
comporta como queremos. Queremos que tenha mais produção da nova
proteína no grão, na semente ou na parte verde da planta. Isso se chama
otimização, e é feita com um número relativamente grande, mas bem menor
do que o número inicial. Muitas sequências não passaram na Prova de
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Conceito, não passaram na otimização; foram reduzidas. Isso é feito em
laboratório, normalmente.
Partimos para a seleção e produção do evento comercial.
Agora já sei que existem candidatos fortes, que funcionam bem, que
produzem grande quantidade daquela proteína. Vou passar a usar as
construções, transformando as plantas de interesse: milho, soja, algodão e
assim por diante. O número de eventos é ainda relativamente grande, então
elimino desse processo algumas inserções, algumas transformações
indesejáveis, complexas, em que entraram muitos genes, e não exatamente
uma cópia, que normalmente é o que se quer.
Isso passa por uma avaliação na Casa de Vegetação, em
ambiente fechado. O ambiente fechado, no caso, é exigido até pelas questões
de biossegurança, porque ainda é uma pesquisa inicial; não sei que efeitos
têm esses genes. Então tenho que usar toda a precaução possível para não
colocar no ambiente. Logicamente vocês veem que, quanto mais precaução,
quanto mais contido o ambiente, maior o custo, menor o espaço. Vou levar
mais tempo para fazer, mas é uma exigência legal que os países normalmente
seguem. Aqui vou ter eventos com qualidade comercial na nova espécie para
a qual estou transferindo esse gene.
Mostro uma foto de uma empresa que faz esses testes em um
ambiente protegido. No caso, é uma Casa de Vegetação bastante tecnológica,
bastante grande, mas vocês vão ver variações do tema de acordo com o
tamanho das empresas que trabalham com essas plantas. Esses esquemas
podem ser extremamente robotizados e transformar o processo com grande
efetividade, sendo possível analisar um número grande de eventos, um
número grande de plantas.
Também nessa fase são feitas muitas análises, já no grão,
coletando o DNA, coletando o endosperma, no caso, do milho, para fazer as
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análises qualitativas, ou as próprias análises moleculares, para ver se aquilo
que coloquei está na quantidade, no número que quero.
Agora posso ir para o campo, e entramos na única etapa
desse funil em que os dois desenvolvimentos tecnológicos têm semelhança,
as cultivares convencionais e os eventos desenvolvidos pela Biotecnologia.
Nessa etapa o que vai ser feito exatamente é avaliar o desenvolvimento dessa
planta transgênica, em condições de campo, e as questões de produtividade,
de qualidade, de crescimento e de ciclo da planta, se ela se comporta de
acordo com o que é desejado para a nova cultivar. Normalmente o que se
quer é que o evento transgênico não altere nada, exceto que produza aquilo
que eu quis. Lembrem-se do exemplo do betacaroteno no grão de arroz: a
planta de arroz tem que produzir a mesma coisa, tem que crescer da mesma
forma, tem que ter o mesmo ciclo, mas vai ter um grão de uma qualidade
diferente, produzindo uma vitamina que não produzia.
No caso dos transgênicos é quase igual. No caso dos
transgênicos, todo esse processo é feito em um ambiente protegido. É em
campo, mas é protegido. O que significa protegido? É cercado, é monitorado,
é auditado pelo Ministério da Agricultura, pela CTNBio. E claramente não
posso depois permitir que alguma semente saia desse local até que a
pesquisa toda seja concluída e que o processo seja aprovado. É um processo
que também tem um custo, porque não se trata exatamente de lançar
sementes em qualquer lugar, no campo, com produtores, enfim, com um custo
menor. É uma pesquisa ainda em um ambiente de contenção, só que já numa
etapa de campo.
Vocês viram que houve uma diminuição muito grande no
número de eventos exatamente porque, nessas pesquisas - aqui normalmente
são dois eventos, no máximo –, já sei muito bem o que quero, o que está
funcionando, até porque esses experimentos podem levar três anos, ou mais,
como o Dr. Silmar falou. São custos muito grandes. Não são feitos só num
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local; são feitos em vários locais. O Brasil é um país grande, então, se for
comercializada uma planta de soja, vai ser útil para vários estados, para vários
ecossistemas diferentes. Isso requer a instalação em contenção em números
grandes em termos de locais. Várias questões de biossegurança são
avaliadas, além dos aspectos de produtividade, que já citei aqui.
Voltando àquilo que é inerente só ao processo da
Biotecnologia, que é a etapa de biossegurança, registro e regulamentação. Na
verdade, são coisas diferentes que coloquei aqui para não me alongar, mas é
bastante comentada a questão de biossegurança. Ela exige bastante em
termos de custo e de tempo. Durante todo o processo é feita a análise de
biossegurança, desde a origem do gene, desde o gene que quero colocar. Em
relação àquele gene que entrou no arroz, que veio de uma bactéria, por
exemplo, tem que ser provado que ele produz uma proteína segura na
bactéria de origem. Ou melhor, aquela toxina que foi colocada na soja, no
milho, estava presente numa bactéria que era totalmente imune, no caso
como patógeno, para animais, humanos ou outros organismos.
A biossegurança se dá desde a origem, desde o
desenvolvimento inicial. Mas nessa etapa do produto final os experimentos
mais avançados, em termos de biossegurança ao ambiente, a insetos, a
micro- organismos, a outras plantas e também à saúde - a composição dessas
novas plantas transgênicas e os produtos que elas produzem, os grãos, no
caso - têm que ser avaliados em grande escala, com rigor. Esse é um
processo que exige etapas muito especializadas de laboratório até o produto
ser considerado apto para o uso comercial. Essas avaliações fazem parte dos
dossiês necessários, que inclusive vão servir para registro em outros países.
Uma vez que isso seja resolvido, a etapa de registro e de
regulamentação é encaminhada para a aprovação, em uso comercial, da
semente. No caso do Brasil, no Ministério da Agricultura, e em cada país para
o qual o Brasil for exportar o grão, pode ser pedido todo esse processo e
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todos os dossiês envolvendo a biossegurança. É um processo longo e, neste
caso, é bastante diferenciado das cultivares tradicionais em função de ser um
produto de Biotecnologia.
Não estou entrando no mérito, se isso é certo, é errado ou se
é exagero. São questões que fogem da nossa discussão. Estou relatando
exatamente o que acontece. E vejam que esse é um processo que não leva
pouco tempo. Estima-se que a média desses processos todos seja de 12
anos, desde a descoberta até o lançamento. Pode ser mais, pode ser menos,
mas, em média, têm levado 12 anos, e os valores, somados, em torno de 136
milhões de dólares, conforme publicação do estudo, cobrindo todas as etapas
de laboratório, de Casa de Vegetação, de campo, de registro e da terra, até
entrar para a produção comercial. Aí chegamos à planta de milho, com toda
aquela tecnologia atualmente presente também na produção dos híbridos, que
é uma tecnologia tradicional, e com a Biotecnologia.
Encaminhando-me para o final, penso que foi comentada a
questão das leis. Diante dos aspectos técnicos que expus, a proteção de
cultivares e a propriedade industrial são complementares. Claramente conduzi
a minha apresentação para essa conclusão, para essa consideração. Elas não
seguem exatamente o mesmo caminho, ainda que entrem no mesmo ser vivo,
que são as plantas. A produção de cultivar está relacionada ao ser vivo, à
cultivar, à planta, à variedade, como queiram, e a propriedade industrial está
relacionada às construções, aos plasmídeos, às sequências, aos micro-
organismos usados e ao processo de transformação genética, que é
absolutamente único no caso da Biotecnologia.
Muito obrigado.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Agradeço
muito ao Dr. Marcelo e ao Dr. Silmar pelas suas apresentações, que foram
extremamente ricas e esclarecedoras. Não tenho dúvida de que nós todos
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conseguimos compreender bem a diferença entre uma cultivar e uma planta
geneticamente modificada.
O foco não se limitou especificamente a questões puramente
legais, até porque temos aqui engenheiros, e não juristas, Mas, como havia
falado na abertura, é um pressuposto para nós, juristas, partirmos dessa base
de conhecimento cultural, que extrapola a área do Direito, para podermos
saber a respeito do que estamos tratando.
Quero aproveitar para saudar o Des. Jorge do Canto, a quem
não havia saudado anteriormente. Agradeço também pela sua presença neste
evento.
E faço uma pequena digressão: enquanto ouvia as
explicações sobre as cultivares e sobre os transgênicos, veio-me à mente
algumas questões da raça humana. Parece-me que o ser humano é como se
fosse uma cultivar, que, por sucessivos cruzamentos, vai ficando mais forte,
mais resistente, mais imune às doenças. Teve um filme da série Star Trek,
acho que o nome é A Ira de Khan – o último desta série que passou -, em que
Khan era geneticamente modificado, era imune a doenças, ele tinha
superforças. Era como se fosse um mutante, extremamente poderoso e forte.
Depois veio a explicação de que ele era geneticamente modificado.
Essas explicações que foram dadas, especialmente pelo Dr.
Marcelo, desmistificam um pouco esses preconceitos que muitas vezes temos
sobre a questão da transgenia. Muitos diziam que causava câncer, houve
movimentos de invasões, em que tocaram fogo e destruíram laboratórios de
pesquisa, como se isso fosse algo prejudicial à saúde. Então é muito
importante esse tipo de manifestação, de evento, para trazer mais
conhecimento e informação à sociedade em geral a respeito desses temas.
Temos ainda um tempo disponível para as contribuições dos
senhores. A Dra. Kelly já está inscrita e vai ser a primeira a se manifestar.
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DRA. KELLY – Quero fazer uma pergunta ao Professor
Marcelo, que às vezes mexe muito com o senso comum. Sei qual a resposta,
mas queria uma explicação científica sobre isso. Muita gente questiona: “Será
que esse gene que foi inserido na planta não vai migrar para o nosso corpo?”
Gostaria que fosse explicando tecnicamente como isso
funciona, se for possível, para desmistificar realmente essa questão.
Também gostaria que o senhor tratasse daquela questão que
envolveu uma pesquisa específica em que vários ratos foram tratados com
milho transgênico e, por acaso, todos eles desenvolveram câncer.
Obrigada.
DR. MARCELO GRAVINA DE MORAES – Essa é uma
pergunta que se faz normalmente: se animais, no caso, cobaias, absorvem
esse DNA. O que normalmente se explica é que o DNA é digerido, assim
como as proteínas. Estamos consumindo DNA a todo momento, por exemplo,
nos tomates. Qualquer vegetal ou animal tem DNA, e não nos tornamos nada
disso porque os comemos.
Surpreendentemente a resposta é que algumas vezes foram
encontrados, nos músculos de animais - de humanos não vi testes -,
fragmentos de genes: em vacas, suínos, aves. Há a seguinte condição: as
cópias desses genes têm que ser extremamente abundantes. Por exemplo, há
um gene que é envolvido na fotossíntese, chamado RuBisCO. No espinafre ou
em vários animais, é possível que exista uma pequena proporção que, se
ingerida, será absorvida no intestino, entrará nos músculos, depois vai
diluindo, enfim. Nada que permita que o animal que os comer tenha o gene
inteiro, porque são fragmentos.
Foram feitos os testes, isso que é interessante. E à sua
pergunta respondo que a ciência na questão de biossegurança praticamente
surgiu com os transgênicos. Hoje o conceito que temos de testes necessários
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para biossegurança, em que se usa na Biotecnologia, é fantástico. Por
exemplo, desenvolver um estudo com animais, dando determinada quantidade
de ração, para tentar, porque a frequência é muito baixa, detectar eventos
raríssimos de absorção do DNA. E assim por diante.
São essas as questões de biossegurança que nasceram.
Nunca se perguntou, por exemplo, se aquelas batatas nos fazem mal.
Sabemos que fazem, porque elas têm toxinas, mas somos habituados a
comê-las. E isso parece que só ocorre com os transgênicos, o que representa
um lado bom, porque nos ensinou várias coisas.
Quanto à pergunta sobre os ratos, esse foi um estudo muito
debatido e controverso, por fim retirado inclusive da revista por falta de rigor
do pesquisador. Ali havia problemas com as linhagens dos ratos, que tinham
uma propensão a produzir câncer, naturalmente muito elevada. Porque se
trabalhou com cobaias, havia problemas estatísticos entre outros. A respeito
desse trabalho não cabe muita discussão, a não ser que foi reprovado pela
própria revista para a qual o pesquisador encaminhou.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Passo a
palavra para o Dr. Milton.
DR. MILTON LEAL – Bom-dia. Em primeiro lugar, parabenizo
as palestras dos dois expositores. Tive a oportunidade de ler recentemente o
artigo do Dr. Marcelo que reproduz um pouco esse conhecimento que foi
publicado na Revista DTI; parabenizo a organização, o Des. Ney e todo o
comitê organizador do evento. Para nós é um prazer poder debater um
pouquinho mais, de forma técnica, esses aspectos envolvendo a propriedade
intelectual.
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Minha pergunta tem relação com o que foi colocado pelo
Professor Silmar e também, de certa forma, pelo Professor Marcelo, no que
diz respeito especificamente ao percentual de royalties.
Faço uma analogia com um caso que foi muito debatido na
área de autopeças e na área dos mercados primário e secundário, quanto à
proteção de veículos; quanto à proteção, por desenhos industriais, do farol, da
lanterna, etc., de um veículo produzido por uma GM, ou de outros carros, que,
no mercado primário, têm um valor agregado e são vendidos para o
consumidor final. Posteriormente, tem um mercado secundário, e, quando
esse carro bate, tem que se vender a autopeça. O uso da propriedade
intelectual, da patente ou do desenho industrial é relacionado a esses
mercados primário e secundário. Faço uma analogia com o setor de
sementes, que não é muito apropriada, ou seja, é uma analogia pobre, para
entender a pergunta.
A pergunta, na verdade, é a seguinte: existiria a possibilidade
de se ter uma aplicação específica de royalties - maior, no início, menor, no
fim -, diferida, dependendo do tipo de uso, do tempo que aquela semente já
foi, digamos assim, modificada - não na sua essência -, ou que tenha alguma
modificação com o uso reiterado das plantações? Perdoem-me pelo termo
técnico, pois não sou da área técnica. A minha pergunta é bem específica
quanto à quantificação dos royalties, já que foi mencionado um percentual,
que talvez fosse o ideal, ou não, e por quê.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) - Passo a
palavra ao Dr. Silmar, que acredito que se encontra apto para responder a
essa pergunta.
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DR. SILMAR TEICHERT PESKE – Muito bem, então vamos falar
do royalty no contexto da proteção de cultivares.
O obtentor, ou seja, a empresa que criou e desenvolveu a
cultivar, licencia para um produtor de sementes fazer a comercialização. E,
realmente, no primeiro ano que licencia, o royalty é mais elevado, em geral
12% ou 13%.
Com o passar dos anos, entram outras variedades melhores,
então os 12% ou 13% vêm para 10%, 8%, 6%, conforme os anos vão
passando, porque outras cultivares serão lançadas no mercado.
Em relação à patente, no caso da nossa soja - vamos colocar
a soja RR2BT, que é o grande exemplo -, o obtentor licencia para o produtor
de sementes um valor ao redor de 115 reais por hectare, e, como é nova, não
sei se isso vai baixar, ou não. Está há dois anos no mercado.
E, para aquele que não utiliza a semente via produtor de
sementes, ou seja, aquele que guarda sua própria semente, ou pegou do
vizinho ou o de quem quer que seja, paga um percentual sobre o grão que ele
está vendendo, e a proposta é de 7%. Era de 2% na patente anterior da soja
RR. Isso é fixo, porque são só durante 10 anos, mais ou menos, que eles
exploram. Terminados os 10 anos, é zero.
Ou seja, no primeiro caso é flexível; no segundo, não.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Há duas
inscrições no fundo.
- Especificamente quanto às questões da soja e do uso de
agrotóxicos ou inseticidas, o senso comum diz que o uso de inseticidas ou de
herbicidas, mas principalmente de inseticidas, continua o mesmo em relação
aos organismos ou às sementes que passaram por um processo de
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modificação. Pergunto se é observada uma diminuição do uso de inseticidas
nesse processo de GM. Como sou filho de agricultor, a minha família produz
soja, observo, por exemplo, que a lagarta continua existindo, mesmo com GM,
então há necessidade de inseticida. E novas doenças surgirão, que vão levar
à aplicação de novos inseticidas ou de venenos em geral, como a ferrugem,
que está muito em voga hoje.
Pergunto se é observada, nas GMs, uma diminuição do uso
desses agrotóxicos.
DR. MARCELO GRAVINA DE MORAES – Sim, tem que
haver.
Vamos separar os dois casos. No caso da planta (...) inseto, o
método de controle é para alguns insetos, não é para todos os insetos. É para
lagartas. Isso já diferencia dos inseticidas, que normalmente têm um espectro
bem amplo. Então já entendemos que isso tem o benefício da especificidade.
Estamos controlando as lagartas.
O princípio é esse: diminuir os inseticidas para o controle de
lagartas, e isso funciona. Ocorreu no Brasil, pelo uso contínuo da mesma
tecnologia do mesmo gene - considerando que o produtor tem a opção de
usar vários genes, mas, se ele usar o mesmo gene, a mesma variedade da
mesma empresa -, uma resistência dos insetos, como também ocorre dos
inseticidas. Então não é um problema da tecnologia; é um problema do
manejo.
Não estou dizendo que a culpa seja do agricultor. A culpa é de
o sistema não ter informado, ou de o produtor não ter executado aquilo que o
sistema informou para ele, a assistência técnica. Então é um problema de
manejo. Isso poderia acontecer, e acontece com o inseticida; pode acontecer
a mesma coisa com o transgênico. O processo é o mesmo, é controlar o
inseto.
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Existe tecnologia de manejo que resolve essa questão de a
lagarta continuar sobrevivendo, mas veja bem: existem lagartas que
caminhavam em cima - só para usar uma figura de linguagem - da planta do
milho e que, com inseticida, morriam, mesmo que elas não fossem pragas e
comessem a planta do milho. E, com o transgênico, ela só vai morrer se ela
comer a planta do milho. Então tem um benefício ambiental bem claro. Esta é
uma questão que temos que levar em consideração, entre outras. Não é o
objeto desta apresentação falarmos em biossegurança, mas estou
respondendo à sua questão.
Quanto aos herbicidas, houve um problema semelhante de
tolerância: uso contínuo do mesmo herbicida, da mesma soja transgênica. O
que aconteceu? Surgiram plantas daninhas, plantas invasoras, resistentes a
esse herbicida. Como se resolve a questão? Mudando a tecnologia, passando
a usar plantas não transgênicas - se tivessem a opção, tolerantes a outros
herbicidas - ou usar outros herbicidas. A mesma questão se resolve com
manejo. Aliás, os bons produtores estão resolvendo com manejo, fazendo a
rotação, fazendo aquilo que a assistência técnica recomenda.
O que lamentamos é que todo o sistema de biossegurança,
que considero bastante apropriado, bastante seguro no Brasil, em vários
casos é um pouco lento, então o produtor se viu sem opções de outras
tecnologias - seja para o controle de insetos ou para o controle de plantas
daninhas – pelas quais pudesse optar. Podemos perguntar por que ele não
volta para a planta não transgênica. Ele sabe o custo para produzir uma planta
não transgênica; ele não tem mais nem a máquina para fazer a capina, que
destrói o solo, que tem também problemas mais sérios.
A volta ao passado, às décadas de 70 ou de 80, é algo que
ele não visualiza. É difícil eu, como técnico, como agrônomo, convencer o
produtor: “Você tem que deixar de plantar o transgênico este ano, e plantar
outra cultivar normal, para não haver problema de seleção”. “Mas se eu não
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plantar o transgênico vou ter que ter um equipamento que não tinha, vou ter
que ter mão de obra, vai ficar mais caro e assim por diante.”
Essa é a luta dos técnicos, tentar que exista uma
sustentabilidade no sistema. Mas as duas tecnologias visam à mesma coisa:
reduzir o uso de produtos químicos. E existem pesquisas que mostram que
reduz, e há casos de mau manejo que aumenta.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) - Dr. Marcelo,
só fazendo novamente uma analogia com os humanos, recentemente ficou
constatado que o uso exagerado de antibióticos pelos humanos fez com que
estes desenvolvessem resistência. Os antibióticos já não curavam as
doenças, surgiram superbactérias, então o Estado proibiu a venda de
antibióticos sem receita médica, porque as pessoas gostavam muito de se
automedicar e ficaram resistentes devido ao mau uso de antibióticos.
Passo a palavra para o Professor Raul Murad.
PROFESSOR RAUL MURAD – Bom-dia a todos. Meu nome é
Raul Murad, sou Professor de Direito Civil do Estado do Rio de Janeiro e
Professor de Propriedade Intelectual da PUC do Rio de Janeiro.
Peço autorização do Presidente da Mesa – sei que a palestra
não foi jurídica – para fazer um comentário provocativo jurídico. Não é bem
uma pergunta, mas, como pontos jurídicos foram tratados na palestra, gostaria
de fazer uma complementação.
Em relação à complementaridade técnica entre inventos
tecnológicos relativos a um processo de inserção dos genes e o cultivo da
cultivar, concordo plenamente com palestrantes no sentido de que existe uma
complementaridade mesmo. Muitas cultivares incorporam essa modificação
genética.
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Mas, em relação à eventual complementaridade dos sistemas
jurídicos, existe uma discussão relativamente substancial quanto a essa
questão. O Brasil, assim como muitos países desenvolvimento, adotou a ata
de 1978, da UPOV (União Internacional para Proteção das Obtenções
Vegetais), e essa ata, que foi diferente da Ata de 1991 - que foi internalizada
em nosso ordenamento -, vedava por completo a dupla proteção relativa a
variedades de cultivar, criando então uma proteção sui generis, como a
própria doutrina vem determinando.
No nosso ordenamento, na Lei de Proteção de Cultivares, o
art. 2º tem um dispositivo por meio do qual exclui outros sistemas jurídicos que
poderiam vir a obstar a utilização dos direitos que a Lei de Proteção de
Cultivar traz, como os direitos prescritos no art. 10, que tratam dos privilégios
do agricultor: que o agricultor pode reservar a semente, desde que para uso
próprio, pode cultivar a semente, desde que na comercialização como matéria-
prima ou como alimentos.
Realmente existe certo questionamento quanto a isso. Não há
uma definição muito clara, numa interpretação jurisprudencial, mas, numa
interpretação doutrinária, há vozes que defendem uma exclusão, e não uma
complementaridade entre esses dois sistemas, em que pese haja
efetivamente uma complementaridade técnica.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Tenho uma
anotação das questões mais polêmicas, sobre as quais os Juízes têm que
tomar uma posição. “Discute-se se é possível, ou não, a comercialização dos
frutos de sementes próprias obtidos no cultivo, bem como se a Lei de
Cultivares se aplica, ou não, se permite a comercialização dos frutos das
sementes próprias sem novo pagamento de propriedade intelectual, forte nos
arts. 2º e 10 da Lei de Cultivares. Da mesma forma, se a reserva de sementes
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próprias, sem condicionantes, seria, ou não, direito dos agricultores, que
poderiam comercializar os frutos dela gerados.”
A palestra do Dr. Silmar abordou essa questão: se paga no
momento em que compra semente, se paga quando entrega a safra. O Dr.
Silmar também comentou que pode se pegar uma cultivar e modificá-la
geneticamente. Em cima do benefício genético natural, pelos cruzamentos, se
faz uma transgenia. Se uma lei exclui a outra, se ambas convivem, essas são
as questões do Judiciário. Os Juízes têm que resolver esse imbróglio.
Parece que o Dr. Silmar tem uma contribuição a dar.
DR. SILMAR TEICHERT PESKE - Eu vou invocar uma outra
lei. Tem uma lei do comércio. Só pode comercializar sementes quem estiver
registrado no RENASEM (Registro Nacional de Sementes). Então o agricultor
que não estiver registrado não pode comercializar sementes.
Segundo, ele pode guardar as sementes se ele comprou a
primeira vez – assim reza o art. 10 - e se registrar no mapa, o que o pessoal
não faz. Se ele se registrar, se ele comprou uma vez, se ele tiver nota fiscal,
ele pode fazer; caso contrário, não. Em geral, o pessoal não faz, e ainda
vendem para os vizinhos. Aí infringem a Lei do Comércio de Sementes.
Eu teria um comentário a fazer em relação à primeira e à
segunda perguntas. Estamos em 2015. As discussões fortes mesmo foram no
final dos anos 90 e no início do ano 2000. Discussões fortes, pesadas, com
audiência pública e tudo, em que as questões versavam sobre a saúde e
sobre o ambiente. Hoje, em 2015, é raro ver perguntas similares a respeito de
doenças. É raríssimo. Qual a pergunta que se faz hoje? Quem detém a
tecnologia? Esta é a pergunta.
Então vou dar uma informação. Evidentemente que as
multinacionais que nós conhecemos, seis, mais a EMBRAPA, a nossa estrela
nacional, que detém a tecnologia, vide feijão dourado. Os brasileiros comem
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em média 16 quilos de feijão por ano. A EMBRAPA desenvolveu um feijão
transgênico e está em vias de desenvolver outros produtos transgênicos
também. A EMBRAPA contou com a colaboração da UFRGS e da
Universidade de São Paulo. Além da EMBRAPA, a Argentina, a África do Sul
e muitas universidades americanas também. Os chineses já têm arroz Bt e
têm um milho rico em fitase, uma enzima que desdobra o fósforo, muito
importante para a ração animal.
Atualmente a discussão é um pouco diferente, e, graças a
Deus, já dominamos isso através da EMBRAPA e das nossas universidades.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Passo a
palavra para o Des. Jorge Luiz Lopes do Canto.
DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO – Um bom-dia a
todos. Em primeiro lugar, gostaria de parabenizar o Des. Ney pelo evento e
parabenizar os palestrantes pela clareza, pela exposição, enfim, por todas as
contribuições para essa discussão.
Fiz uma brincadeira com o Dr. Silmar: “Que bom que vou
começar a entender isso um pouco melhor!” Realmente, essa questão técnica
é muito complicada. Num processo que julguei, vali-me dos senhores e da
Professora Maria Helena e do Professor Leandro Loguercio, que são
pesquisadores nessa área.
Até para desmistificar, conversando com esses dois
pesquisadores e ouvindo os senhores, a grande preocupação que todos os
pesquisadores têm é no sentido de que não se volte à era de caça às bruxas,
em que se realizavam queimadas. Enfim, que se identifiquem as questões de
biossegurança e dos transgênicos não como um mal. Não, é uma evolução da
tecnologia, do ser humano, é uma coisa útil. Foram provadas a produtividade
e a riqueza que isso envolve, com o trabalho de todos os senhores.
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Uma questão muito interessante, levantada pelo Dr. Marcelo,
é a de que não há volta ao passado. Ou seja: é transgênico ou transgênico. E,
nos números apresentados, de quase 100%, no caso da soja, 100% será
transgênico daqui para frente, porque o custo da inversão seria absolutamente
danoso.
Não sei se depreendi bem, Dr. Marcelo, mas penso que foi
isso que o senhor disse: “É 100% transgênico e será transgênico daqui para
frente. Não há como reverter essa expectativa”.
Conversei também com o Leandro e com a Maria Helena. A
Maria Helena disse que, dos 58.000 genes da soja, apenas um é modificado.
É uma modificação técnica importantíssima, fundamental, mas numa
proporção pequena. E todos sabem, e os senhores, como pesquisadores, que
é proibido patente de vida. Há várias teorias sobre a invenção dos seres vivos,
sejam elas à luz das crenças, sejam à luz da ciência, mas não podemos
patentear um ser vivo.
Essa questão é irreversível, e a soja é o nosso principal
produto de exportação. Isso se discute juridicamente, não quero concluir se
está certo, ou errado. Essas são avaliações judiciais que serão feitas, mas
uma das coisas que o Professor Leandro e a Professora Maria Helena
comentaram foi sobre a questão da contaminação.
Quanto à questão de contaminação no País, mesmo
reconhecendo que a semente de soja é específica, de difícil cruzamento, tem
que ter dois metros de distância de uma lavoura para outra, como a
Professora Maria Helena disse, uma colheitadeira é usada em 10 lavouras. Às
vezes é colheitadeira da cooperativa. O transporte por trem é feito em vagões;
do caminhão, a soja é tirada à pá. Então fiz uma consulta com ela: “Existe
uma fiscalização de contaminação, saindo do produtor até um navio,
absolutamente precisa, e que possa distinguir soja transgênica da soja não
transgênica? E como é que eu vou desigienizar isso?” Ela disse: “Olha, é um
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processo longo, complicado, cada caminhão teria que ser desigienizado,
assim como cada colheitadeira, antes de ser usada. Por exemplo se tenho 10
lavouras de soja não transgênica e usar uma de soja transgênica, como vou
desigienizar isso?”
Faço algumas perguntas ao Dr. Marcelo. Primeiro: é
irreversível, como o senhor falou? Será 100% soja transgênica daqui para
frente? Segundo: é um gene só, dos 58.000? Terceiro: como é que estão as
pesquisas e a segurança disso no País, em termos de contaminação?
DR. MARCELO GRAVINA DE MORAES – Des. Jorge, quanto
à questão dos genes, a mais simples, o que se coloca para desenvolver um
transgênico normalmente é um gene só. Existem razões técnicas, porque não
se quer criar complexidades depois da própria expressão, nem que esse gene
venha a produzir mais ou menos do que se quer da proteína. Então é um
gene. Em geral, as plantas têm de 30.000 a 40.000 genes. É essa a
proporção. Um pouquinho menor o número de genes, talvez, do que o senhor
falou, no caso da soja, mas não baixa muito disso.
Isso não isso não interfere com biossegurança, porque posso
ter um gene, e a proteína que ele produzir ser extremamente perigosa. As
questões de biossegurança se mantêm, sendo um ou 50.000. É um novo
produto, então tem que ser analisado. E aí que a lei brasileira entra na
questão de biossegurança alimentar.
A contaminação, que prefiro chamar de mistura de sementes,
já foi um caso mais conversado no Brasil quando existia a expectativa, por
uma questão de mercado, de se produzir transgênicos ou não transgênicos
para a exportação. E no Brasil a rotulagem exige alguma segregação. Com o
tempo, os próprios países que estão importando soja, por exemplo, não têm
mais preferência. A soja, sendo transgênica, ou não transgênica, basicamente
é a mesma coisa.
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Em outras palavras, o custo da segregação valeria a pena se
tivesse valor, em termos comerciais, vender soja não transgênica. É possível
que algum nicho, algum tipo de consumidor muito específico, em poucos
lugares, seja no Brasil ou em outros países, prefira e queira pagar por isso,
mas não me parece um mercado muito relevante, pelo que observo. A palavra
mistura é mais apropriada porque é uma questão comercial. A pessoa que não
quer plantar o transgênico tem o direito de que sua carga não seja misturada
com uma carga transgênica que venha a prejudicar o seu comércio, mas não
se confunde com questão de biossegurança, porque isso já foi resolvido antes.
O que se produz comercialmente no Brasil em matéria de transgênicos tem
que ser seguro.
Por exemplo, um produtor que queira voltar a produzir soja
não transgênica porque tem um problema de resistência de plantas daninhas.
É um caso bem real. Não há problema, e possivelmente a questão comercial
não vai interferir nisso. Vai ser uma questão só do produtor. Quando falamos
em transgênicos, parece que é uma coisa só, mas os transgênicos envolvidos
hoje no Brasil são só de interesse do produtor. Problemas de insetos e
problemas de plantas daninhas: para o consumidor que vai consumir isso,
tanto faz. Isso não tem interferência na saúde, é seguro, não modifica nada –
cor, sabor, tamanho -, absolutamente nada. É só uma questão de manejo, e
isso é comprovadamente seguro. Então a reversão para ele plantar não
transgênico é apenas um problema técnico dele.
Pode ser que, em casos futuros, daquele arroz dourado ou de
produtos bem diferenciados, em termos nutricionais, como alimentos, a
história possa ser diferente, mas não é um caso que se discute no Brasil.
Não sei se lhe respondi, mas, quanto ao início da sua
exposição, que diz que é irreversível por ter vantagens, eu concordo. É por
isso que 95%, ou mais, da soja produzida no Brasil é transgênica. O problema
da transgenia passou a ser, como o Dr. Silmar falou, um problema de quem
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está usando a tecnologia; antes era um problema de biossegurança. É uma
prova da vantagem. Alguns anos atrás, estávamos discutindo se deveríamos,
ou não, plantar, e se produzia esse ou aquele problema; hoje estamos
discutindo os direitos, quem paga, percentuais, quem tem direito à tecnologia.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) - Dr. Marcelo,
gostaria de reformular a pergunta do Des. Jorge, pois percebi uma outra
perspectiva: poderia um agricultor negar que tenha usado sementes
transgênicas, porque elas vieram voando, saltaram do vagão de um trem ou
de uma colheitadeira suja, e dizer: “Eu não plantei nada transgênico, eu não
vou pagar esse royalties. Isso foi o vento, uma ave que trouxe”? É alguma
coisa assim? Não sei se foi esse o sentido.
DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO – Quanto à questão
técnica, é exatamente o contrário. A formulação feita é sobre sistemas de
controle. Eu quero plantar, por exemplo, só soja natural. Quero vendê-la -
como existe a moda atual - como um produto orgânico e tal. E se, com esse
transporte, uma semente vier voando, o que é comum no campo?
Posso ter uma lavoura transgênica e 10 não transgênicas. A
própria Dra. Marilene falou que não tem uma higienização nessas
colheitadeiras. Os caminhões que transportam também não têm higienização,
os trens também não têm higienização, os navios não têm higienização, então,
quando esse sujeito disser que tem tudo aquilo puro, mas, como falou o Dr.
Marcelo, misturado no transporte, misturado no caminhão, na hora que disser
que o produto é orgânico, poderia aparecer alguma quantidade de
transgênicos ali.
DR. MARCELO GRAVINA DE MORAES - Eu poderia
responder, juntando as duas questões. Existem sistemas de segregação
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apropriados, uma cooperativa, um município ou um grupo que quer produzir
não transgênico. Isso existe no Paraná, existe em outros locais, para a
produção de grãos orgânicos, que, por determinação, não podem ter
transgênico. E como é atestado isso? Através da segregação, que é o
processo de produção, e da análise de detecção. A análise de detecção vai
dizer se tem 1%, 0,5%. O que obviamente é muito diferente do que se vier de
uma lavoura. Então dificilmente, já usando o seu comentário, um produtor vai
poder alegar que está plantando transgênico se 0,5% dos grãos são
transgênicos. Isso claramente é adventício, veio por uma mistura. E, no caso
da soja, não veio por pólen; veio por semente. No milho até poderia ser um
caso de mistura na lavoura.
Nesses casos, a técnica permite a detecção e assegura tanto
a segregação, se ela foi bem feita, quanto se ele está usando, ou não, a
tecnologia, que é o assunto das apresentações.
DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO – Mas esse sistema
de segurança, segundo me falou a Professora Marilene, é muito precário, e o
transporte permite essa mistura. Ela me falou que esse mecanismo de
controle no Brasil é insipiente.
DR. MARCELO GRAVINA DE MORAES - Eu vou dar um
exemplo: existe um produtor, no Mato Grosso, que é muito conhecido – não
vou citar o nome -, que é um grande produtor de soja, e que, por um bom
tempo, como questão de marketing, produziu soja não transgênica. Ele viu um
nicho de mercado, e ele tinha escoamentos, enfim, portos dedicados a
produzir o grão não transgênico. Não sei se ainda existe, mas existiu, no
Brasil, e coexistiu com uma produção de transgênicos em larga escala em
Mato Grosso, por outros produtores.
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DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO - Muito obrigado, Dr.
Marcelo.
DR. SILMAR TEICHERT PESKE – Gostaria de fazer um
comentário em cima disso. Nós temos três tipos de soja: a soja transgênica, a
soja convencional e a soja orgânica. A produção da soja orgânica tem uma
similitude com a produção de sementes. Na produção de sementes, isola-se o
campo, limpa-se a máquina, tem sacaria nova, tudo. Isso é 10, e o sujeito que
não faz isso está fora do sistema. O orgânico é mais ainda do que isso. Eu
diria que o Brasil tem tecnologia para isolar, para minimizar esses problemas.
Quanto à parte da adventícia, o sujeito que produz o grão de
soja convencional, esse sim talvez não siga todas as técnicas de um orgânico
e de um produtor de sementes. Então, esse que produz o convencional pode
ter algumas sementes transgênicas ou adventícias.
Entretanto, os testes adotados nas cooperativas, porque é ali
que se compra, ou nas tradings, têm uma tolerância, não sei se de 2%, 3%,
4% ou 5%. Quer dizer, até 5% não se cobra mais. Se tiver mais que 5%,
haverá problemas. Provavelmente terão que pagar o royalty de 7%. Se o
sujeito sabe que está produzindo um convencional, que tem o perigo de pagar
os 7%, então vai ter que cuidar um pouco.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) –
Encaminhando para encerramento, porque, pelo regulamento do
funcionamento do salão e pela necessidade de os funcionários retornarem aos
seus gabinetes, costumamos levar até meio-dia o nosso evento, passo a
palavra ao Dr. Nestor. Depois vamos encerrar.
DR. NESTOR – Des. Wiedemann, cumprimento-o por presidir
este trabalho; cumprimento os palestrantes, que nos brindaram com palestras
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esclarecedoras, e, na sua pessoa, cumprimento os demais Desembargadores,
colegas advogados e profissionais da área de Agronomia aqui presentes.
Como a FARSUL representa mais de 90% dos produtores de
soja - pessoas físicas e jurídicas que produzem neste Estado -,
acompanhamos a evolução da Biotecnologia no Rio Grande do Sul desde o
seu nascedouro com muita atenção, porque ela é muito importante para a
economia do Rio Grande do Sul.
A Biotecnologia foi introduzida aqui, como todos sabem,
através do chamado “comércio de fronteira”, em que há o contrabando.
Através da soja chamada “Maradona”, começaram as experimentações, até
que fizemos o marco legal referente à soja.
Dos 138 sindicatos que temos, 131 deles se manifestam
favoráveis a pagamentos pelo uso da tecnologia, e sete sindicatos entendem
de forma diversa; fazem inclusive parte dessa ação, que vai ser apreciada
pelo Tribunal, neste 2º Grau de jurisdição.
Os produtores rurais da FARSUL são pessoas normais,
querem produzir o máximo possível, pagando menor preço. Nenhum deles
tem apreço por algum tipo de multinacional ou coisa parecida. Ninguém ama
ninguém. Todos acham que as multinacionais ganham e lucram bastante.
Nossos fornecedores de máquinas agrícolas cobram muitas vezes valores
muito superiores ao custo da sua matéria-prima.
Mas, quanto à questão específica da introdução da
Biotecnologia, tanto a Bayer, que tentou introduzir aqui o arroz mutagênico, e
não foi bem sucedida, como outras empresas, como a Monsanto e outras, que
trouxeram a possibilidade de semente de soja geneticamente modificada, têm
tido um diálogo com a nossa categoria econômica que não temos com nossos
outros fornecedores.
Então nos reunimos em oito sub-regiões de soja, no Rio
Grande do Sul. Hoje a soja está disseminada inclusive na Região Sul do Rio
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Grande do Sul, que não era uma região sojicultora, e auscultamos os
produtores.
Esses preços pagos pelos royalties, se não são ajustados, são
debatidos pelo setor, o que não acontece com outros fornecedores nossos. No
caso específico do fornecimento de sementes de soja transgênica e de
pagamentos de royalties, há uma discussão prévia com o setor. O setor é
cientificado sobre o que está acontecendo em relação a esses valores. Essas
negociações nem sempre são como almejamos: pagar o menos possível para
obter esse tipo de insumo, que faz parte do nosso custo, mas temos tido uma
experiência satisfatória em relação a isso.
Queria contribuir dizendo que, como estamos começando a
introduzir a soja na Região Sul, que é uma região úmida, não há dúvida
alguma quanto ao menor uso de agrotóxicos. Nós fazíamos, em relação à
lagarta, por vezes até seis aplicações de agrotóxicos; hoje, fazemos duas. Por
vezes, dependendo da sazonalidade, fazemos uma.
Existem outras pragas, como foi dito anteriormente pelos
professores que estão aqui, que levam e demandam a aplicação de
agrotóxicos. A própria produção enorme de soja no Brasil e a sua
multiplicação nas últimas décadas fizeram com que haja realmente um
consumo de agrotóxicos, mas, sem dúvida alguma, diminuímos sua aplicação
nas nossas lavouras.
O que o setor da agricultura deseja é obter segurança jurídica.
Obviamente não queremos ser taxados de pessoas que se utilizam da
tecnologia, como foi explicado aqui. Gostaríamos que a Biotecnologia fosse
pública, que a EMBRAPA tivesse desenvolvido a transgenia. Seria ótimo, não
pagaríamos nada. Mas, por uma razão óbvia, a transgenia foi inventada em
laboratórios. Por exemplo, a Monsanto, nos Estados Unidos, em Saint Louis,
tem 60 laboratórios que custam 30 milhões de dólares cada um, que
reproduzem microclimas da África, da Ásia, da Austrália, da Nova Zelândia e
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do Brasil para colocar os seus experimentos. Nós imaginamos que deva haver
alguma compensação financeira para as empresas que colocam esse produto
e que facilitam a nossa vida.
Como dissemos, queremos o menos possível e batalhamos
por isso, mas queremos pagar; não queremos ser taxados de pessoas que
utilizam produtos e não querem pagar por isso. Resta aos produtores que
desejam voltar à soja convencional saberem que - o professor explicou muito
bem – ela leva mais veneno que a soja transgênica, porque necessita de mais
aplicações de veneno.
E não penso que a soja transgênica seja irreversível. Se
tivermos algum dia uma vantagem em voltar a uma soja tradicional, os bancos
genéticos estão aí, podemos até voltar. Mas tem que haver vantagem com
isso. Tem que haver consumidores que paguem o preço para que voltemos
àquele cultivo tradicional.
Só queria passar essa posição, obviamente sem o intuito de
convencer alguém, mas a fim de expressar o ponto de vista do nosso setor,
que é importante, em que o produtor está na ponta; ele é que recebe essa
tecnologia para ser aplicada, e imagino que ele tenha alguma importância
nesse ato nobre de decidir dos eminentes Desembargadores aqui do Tribunal.
Muito obrigado.
DES. NEY WIEDEMANN NETO (PRESIDENTE) – Realmente,
o Dr. Nestor fez uma contribuição, que não é propriamente uma pergunta e
não demanda comentários ou análises específicos.
Como já havia dito no início, fizemos uma abordagem
interdisciplinar. Houve até a contribuição de um professor do Rio de Janeiro, a
qual foi muito importante, embora não tenhamos aprofundado o debate e a
reflexão abordados. Isso tudo será amadurecido e frutificado, com sementes e
com frutos jurídicos que se sucederão a essas reflexões que o Centro de
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Estudos procura alcançar àqueles que depois vão se debruçar juridicamente
em acórdãos, que serão frutíferos, utilizando a linguagem da agricultura.
Mais uma vez agradeço ao Dr. Marcelo, ao Dr. Silmar, à Dra.
Adriana, que viabilizou, fez as indicações e compareceu ao evento; agradeço
pela presença de todos, dando assim por encerrada a sessão, pedindo uma
salva de palmas aos nossos palestrantes.
(DEGRAVADO PELO DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA E ESTENOTIPIA DO TJ/RS.)