ESTADO_ARTE_EJA_1986_1998[1]

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SRIE ESTADO DO CONHECIMENTO NO 8

Educao de Jovens e Adultos no Brasil (1986-1998)Srgio Haddad (Coordenador) Antonio Carlos de Souza Marcos Jos Pereira da Silva Maria Clara Di Pierro Maria Margarida Machado Miro Nalles Monica M. de O. Braga Cukierkorn(ANPEd)

Braslia-DF MEC/Inep/Comped 2002

COORDENAO-GERAL DE LINHA EDITORIAL E PUBLICAES Antonio Danilo Morais Barbosa COORDENAO DE PRODUO EDITORIAL Rosa dos Anjos Oliveira COORDENAO DE PROGRAMAO VISUAL F. Secchin EDITOR Jair Santana Moraes ORGANIZAO DOS ORIGINAIS E REVISO Antonio Bezerra Filho NORMALIZAO BIBLIOGRFICA Antonio Bezerra Filho Maria ngela Torres Costa e Silva PROJETO GRFICO E CAPA F. Secchin ARTE-FINAL Rodrigo Godinho Aparecido da Silva TIRAGEM 2.000 exemplares EDITORIA Inep/MEC Esplanada dos Ministrios, Bloco L, Anexo I, 4 Andar, Sala 418 CEP 70047-900 Braslia-DF Brasil Fones: (61) 224-7092 (61) 410-8438 Fax: (61) 224-4167 E-mail: [email protected] DISTRIBUIO Cibec/Inep Esplanada dos Ministrios, Bloco L, Trreo CEP 70047-900 Braslia-DF Brasil Fones: (61) 224-9052 (61) 323-3500 Fax: (61) 223-5137 E-mail: [email protected] http://www.inep.gov.br

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Educao de jovens e adultos no Brasil (1986-1998) / Srgio Haddad (Coord.). Braslia: MEC/Inep/ Comped, 2002. 140 p. : il. (Srie Estado do Conhecimento, ISSN 1676-0565, n. 8) 1. Educao de jovens e adultos. 2. Produo tcnico-cientfica. I. Haddad, Srgio. II. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. III. Comit dos Produtores da Informao Educacional. IV. Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao. CDU 374

Sumrio

EQUIPE RESPONSVEL PELO PROJETO .................................................................................... 7 INTRODUO ............................................................................................................................... 9 Srgio Haddad Objetivos e delimitao do campo de estudo .............................................................................. 9 A distribuio da produo acadmica discente no tempo ....................................................... 10 A participao do tema no total da produo acadmica discente .......................................... 11 A distribuio geogrfica da produo acadmica discente ..................................................... 11 A distribuio da produo entre instituies pblicas e privadas ............................................ 12 Os principais centros de produo acadmica .......................................................................... 13 Metodologia e procedimentos da pesquisa ............................................................................... 13 Algumas concluses produzidas pelo levantamento ................................................................. 14 Anexo 1 Indexao de dados bibliogrficos ............................................................................ 21 Anexo 2 Anlise de contedo ................................................................................................... 23 Tema I O PROFESSOR ........................................................................................................................... 25 Maria Margarida Machado Subtema I.1 Relaes professor/aluno e vises sobre EJA .................................................... 25 Principais problemas abordados ........................................................................................ 25 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 26 Subtema I.2 Professor: sua prtica e sua formao ................................................................ 27 Principais problemas abordados ........................................................................................ 27 Referencial terico ............................................................................................................... 29 Metodologias de pesquisa .................................................................................................. 31 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 32 Consideraes finais ................................................................................................................... 37 Quanto EJA ....................................................................................................................... 37 Quanto pesquisa em EJA ................................................................................................. 38 Anexo 1 Produo sobre o subtema I.1 ................................................................................... 41 Anexo 2 Produo sobre o subtema I.2 ................................................................................... 43

Tema II O ALUNO ..................................................................................................................................... 47 Maria Margarida Machado Subtema II.1 Perfil dos alunos .................................................................................................. 47 Principais problemas abordados ........................................................................................ 47 Referencial terico ............................................................................................................... 48 Metodologias de pesquisa .................................................................................................. 48 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 49 Subtema II.2 Viso do aluno ..................................................................................................... 51 Principais problemas abordados ........................................................................................ 51 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 51 Consideraes finais ................................................................................................................... 53 Quanto EJA ....................................................................................................................... 53 Quanto pesquisa em EJA ................................................................................................. 54 Anexo 1 Produo sobre o subtema II.1 .................................................................................. 55 Anexo 2 Produo sobre o subtema II.2 .................................................................................. 59 Tema III CONCEPES E PRTICAS PEDAGGICAS ........................................................................... 65 Monica M. de O. Braga Cukierkorn Subtema III.1 Fundamentos tericos ....................................................................................... 65 Principais problemas abordados e concluses .................................................................. 65 Subtema III.2 Propostas e prticas pedaggicas .................................................................... 67 Principais problemas abordados e concluses .................................................................. 67 Subtema III.3 Processos de ensino-aprendizagem dos contedos curriculares .................... 69 Aprendizagem da leitura e escrita ...................................................................................... 69 Matemtica .......................................................................................................................... 72 Outras reas ........................................................................................................................ 74 Consideraes finais ................................................................................................................... 75 Quanto s fundamentaes tericas .................................................................................. 75 Quanto s propostas e prticas pedaggicas ................................................................... 75 Quanto aos processos de ensino-aprendizagem dos contedos curriculares ................. 75 Currculo .............................................................................................................................. 76 Anexo 1 Produo sobre o subtema III.1 ................................................................................. 77 Anexo 2 Produo sobre o subtema III.2 ................................................................................. 79 Anexo 3 Produo sobre o subtema III.3 ................................................................................. 81 Tema IV POLTICAS PBLICAS DE EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS ............................................ 85 Antonio Carlos de Souza Subtema IV.1 Histria da educao de jovens e adultos ........................................................ 86 Principais problemas abordados ........................................................................................ 86 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 86

Subtema IV.2 Polticas pblicas recentes de educao de jovens e adultos ......................... 87 Objetivos .............................................................................................................................. 87 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 88 Outras consideraes ......................................................................................................... 90 Subtema IV.3 Alfabetizao ...................................................................................................... 91 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 91 Subtema IV.4 Centros de Estudos Supletivos (CES) ............................................................... 92 Objetivos .............................................................................................................................. 92 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 92 Subtema IV.5 Ensino regular noturno ....................................................................................... 94 Principais problemas abordados ........................................................................................ 94 Referencial terico ............................................................................................................... 95 Metodologias de pesquisa .................................................................................................. 95 Principais concluses presentes nas pesquisas ................................................................ 96 Outras consideraes ......................................................................................................... 98 Subtema IV.6 Polticas municipais e educao popular .......................................................... 98 Principais problemas abordados ........................................................................................ 98 Referencial terico ............................................................................................................... 99 Metodologias de pesquisa ................................................................................................ 100 Principais concluses presentes nas pesquisas .............................................................. 100 Anexo 1 Produo sobre o subtema IV.1 ............................................................................... 103 Anexo 2 Produo sobre o subtema IV.2 ............................................................................... 105 Anexo 3 Produo sobre o subtema IV.3 ............................................................................... 107 Anexo 4 Produo sobre o subtema IV.4 ............................................................................... 109 Anexo 5 Produo sobre o subtema IV.5 ............................................................................... 111 Tema V EDUCAO POPULAR ............................................................................................................. 113 Marcos Jos Pereira da Silva Subtema V.1 Participao dos movimentos sociais em EJA ................................................ 114 Principais problemas abordados ...................................................................................... 114 Principais concluses presentes nas pesquisas .............................................................. 115 Subtema V.2 Educao para a cidadania .............................................................................. 117 Principais problemas abordados ...................................................................................... 117 Principais concluses presentes nas pesquisas .............................................................. 117 Subtema V.3 Educao popular na Primeira Repblica ........................................................ 119 Principais problemas abordados ...................................................................................... 119 Principais concluses presentes nas pesquisas .............................................................. 119 Consideraes finais em relao ao tema ............................................................................... 120 Anexo 1 Produo sobre o subtema V.1 ................................................................................ 121 Anexo 2 Produo sobre o subtema V.2 ................................................................................ 123 Anexo 3 Produo sobre o subtema V.3 ................................................................................ 125 BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................... 127

Equipe responsvel pelo projeto

Srgio Haddad Coordenador Doutor em Educao pela Universidade de So Paulo Maria Clara Di Pierro Pesquisadora Assistente Doutora em Educao pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo Maria Margarida Machado Pesquisadora responsvel pelos Temas I e II Mestre em Educao pela Universidade Federal de Gois e Doutoranda em Educao na Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo Monica M. de O. Braga Cukierkorn Pesquisadora responsvel pelo Tema III Mestre em Educao pela Universidade de So Paulo Antonio Carlos de Souza Pesquisador responsvel pelo Tema IV Mestre em Educao pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo Marcos Jos Pereira da Silva Pesquisador responsvel pelo Tema V Mestre em Educao pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo Miro Nalles Responsvel pela documentao Virginia Castilho Assistente de documentao

BOLSISTAS Ceclia Nascimento Martins Claudia da Mota Dars Eike Frehse Isabel Mattos Porto Pato Juliana Yuni Kaneto Mrcia Cristina de Oliveira Maria Lcia Simes Valentim

IntroduoSrgio Haddad *

OBJETIVOS E DELIMITAO DO CAMPO DE ESTUDO Os estudos de tipo estado da arte permitem, num recorte temporal definido, sistematizar um determinado campo de conhecimento, reconhecer os principais resultados da investigao, identificar temticas e abordagens dominantes e emergentes, bem como lacunas e campos inexplorados abertos pesquisa futura. O objetivo do presente trabalho detectar e discutir os temas emergentes da pesquisa em Educao de Jovens e Adultos no Brasil, atualizando para o perodo 1986-1998 as indicaes do conjunto de estudos que compuseram um estado da arte nesta rea para o perodo 1975-1985 (Haddad, 1987; Haddad, Freitas, 1988; Haddad, Siqueira, 1986, 1988; Haddad, Siqueira, Freitas, 1987, 1989a, 1989b; Ribeiro, V. M. M., 1992). Da mesma forma que o estudo concludo em 1988, este estado do conhecimento se refere produo acadmica discente dos programas nacionais de ps-graduao stricto sensu em Educao, expressa em teses de doutoramento e dissertaes de mestrado. O levantamento e a anlise no compreenderam, portanto, a produo dos docentes pesquisadores ou aquela realizada em outras instituies que no as universitrias. A pesquisa s foi sistemtica e exaustiva nos programas de ps-graduao em Educao, ainda que tenha capturado incidentalmente teses e dissertaes elaboradas em outros programas, como os de Lingstica, Psicologia, Servio Social ou Sociologia. O levantamento, inicialmente, foi extensivo, compreendendo no s a produo acadmica stricto sensu, mas toda sorte de publicaes, inclusive documentos de rgos pblicos de Educao e de organizaes no-governamentais.1 Entre diversas outras fontes, foram consultados os catlogos de teses em Educao de 1985 a 1994 e o CD-ROM ANPEd (1999) produzidos pela Associao Nacional de Pesquisa em Educao (ANPEd) que trazem a produo de teses e dissertaes de 34 instituies que mantm programas de ps-graduao em Educao -, 98 colees de peridicos nacionais e os anais dos trs principais eventos da rea.2 Mediante esses procedimentos, apuraram-se mais de 1.300 ttulos produzidos no perodo de 1986 a 1998. Verifica-se que quase 33% da produo de conhecimento se expressam em artigos de peridicos e nmeros especiais de peridicos, enquanto as teses e dissertaes representam aproximadamente 9,5% da produo total. Os livros ou publicaes seriadas do perodo representam apenas 7,93% da produo, o que revela o escasso desenvolvimento editorial da rea temtica.

* Coordenador Doutor em Educao pela Universidade de So Paulo. 1 Esse levantamento corresponde primeira etapa de um dos subprojetos integrados pesquisa Juventude e escolarizao: uma anlise da produo de conhecimentos, coordenada pelos Profs. Drs.. Marlia Pontes Sposito e Srgio Haddad, envolvendo a Faculdade de Educao da Universidade de So Paulo (FEUSP), a Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP) e a Ao Educativa - Assessoria, Pesquisa e Informao , com o apoio do CNPq e da Fapesp. 2 Foram pesquisados os anais das Reunies Anuais da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Cincia), da ANPEd (Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao) e das CBEs (Conferncias Brasileiras de Educao) realizadas no perodo.

Educao de Jovens e Adultos no Brasil 9

Todo esse material foi processado por bolsistas de iniciao e aperfeioamento cientfico (sob orientao e superviso do Servio de Informao e Documentao da Ao Educativa) em uma base de dados desenvolvida com o software MicroIsis. Esta base de dados contm as referncias bibliogrficas, um extenso conjunto de descritores consolidados em um tesauro especfico da rea - desenvolvido pelo Servio de Informao e Documentao da Ao Educativa - e os resumos dos documentos, que podem ser consultados atravs da base de dados disponvel no site . O presente relatrio no incide sobre a produo de conhecimentos total processada embora o levantamento e a base de dados bibliogrficos permitam esse nvel de anlise , tarefa esta pendente para que se possa realizar um balano mais abrangente do conhecimento acumulado com relao Educao de Jovens e Adultos no Brasil em perodo recente. O campo terico e prtico da educao de jovens e adultos vasto e mantm numerosas interfaces com temas correlatos. Para efeito do levantamento, foram considerados os estudos relativos educao formal ou informal, escolar e extra-escolar, o que nos levou a contemplar no s os textos que tratam dos processos de escolarizao bsica (a includos os subtemas da alfabetizao, ensino supletivo, ensino noturno e teleducao), como o tema conexo da educao popular, incluindo diversos de seus componentes (educao poltica, sindical, comunitria, etc.). A pesquisa compreendeu trabalhos que abordam as concepes, metodologias e prticas de educao de pessoas jovens e adultas, envolvendo questes relativas Psicologia da Educao, formao dos educadores, ao currculo e ao ensino e aprendizagem das disciplinas que o compem. J que a educao de jovens e adultos freqentemente reconhece o educando como trabalhador e remete s relaes com o mundo do trabalho, foram considerados tambm estudos relacionados a essa temtica.

A DISTRIBUIO DA PRODUO ACADMICA DISCENTE NO TEMPO Entre 1986 e 1998, foram defendidas 222 teses e dissertaes acadmicas. H claro predomnio das dissertaes de mestrado, que constituem 91% da produo, enquanto as teses de doutoramento representam apenas 9% do total (Tabela 1). Tabela 1 Distribuio da produo acadmica na srie histrica 1986-1998DISSERTAES N 7 18 13 13 19 17 19 14 21 14 20 11 16 202 % SRIE 3,15 8,11 5,86 5,86 8,56 7,66 8,56 6,31 9,46 6,31 9,00 4,95 7,21 91,00 N 1 0 0 2 0 2 2 1 2 7 0 0 3 20 TESES % SRIE 0,45 0,00 0,00 0,90 0,00 0,90 0,90 0,45 0,90 3,15 0,00 0,00 1,35 9,00 N 8 18 13 15 19 19 21 15 23 21 20 11 19 222 TOTAL % SRIE 3,60 8,11 5,86 6,76 8,56 8,56 9,46 6,76 10,36 9,46 9,00 4,95 8,56 100,00

ANOS 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 TOTAL

10 Srie Estado do Conhecimento

A distribuio dessa produo indica uma mdia anual de pouco mais de 17 teses ou dissertaes. A produo acadmica mais numerosa em 1994 (10,36% do total) e menos numerosa em 1986 (3,60%) e 1997 (4,95%). Os anos de 1995 e 1998 foram os mais fecundos para o doutoramento, anos em que foram computados, respectivamente, 35% e 15% das teses defendidas na dcada.

A PARTICIPAO DO TEMA NO TOTAL DA PRODUO ACADMICA DISCENTE Segundo o CD-ROM ANPEd (1999) , a produo discente do perodo de 1986 a 1998 somou 7.568 estudos, sendo 6.449 dissertaes e 1.119 teses (s quais podem somar-se quatro teses de livre-docncia). Os 222 produtos relacionados ao tema Educao de Jovens e Adultos neste perodo representariam, diante deste parmetro, 3% da produo discente nacional, sendo 1,8% das teses de doutoramento e 3,1% das dissertaes de mestrado. Estudos mais detalhados da produo discente nacional foram realizados por Warde (1993) para o perodo 1982-1991, permitindo uma comparao parcial com nossa srie histrica. Em mdia, a produo acadmica discente nas temticas relacionadas Educao de Jovens e Adultos apurada em nosso estudo representa 4,12% da produo nacional total no perodo 1986-1991, mantendo aproximadamente esta mesma proporo para teses e dissertaes (Tabela 2). Esse resultado consistente com o balano realizado por Warde para o perodo 1982-1991, segundo o qual a soma dos temas Educao Popular (englobando Educao de Jovens e Adultos, Ensino Supletivo, Ensino Noturno e Educao Comunitria) e Educao e Trabalho (conceituado de modo mais abrangente que em nosso estudo) responderam por 6,12% da produo total nacional no perodo (Cf. Warde, 1993, Tabelas 18.1 e 18.5). Tabela 2 Produo acadmica em Educao de Jovens e Adultos 1986-1991PRODUO ACADMICA NACIONAL NA REA DE EDUCAO A DIS. 1986 1987 1988 1989 1990 1991 TOTAL 211 243 338 393 415 404 2.004 B TESE 16 26 31 58 40 57 228 C TOTAL 227 269 369 451 455 461 2.232 PRODUO ACADMICA DISCENTE EM EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS D DIS. 7 18 13 13 19 17 87 D/A % 3,32 7,41 3,85 3,31 4,58 4,21 4,34 E TESE 1 0 0 2 0 2 5 E/B % 6,25 0,00 0,00 3,45 0,00 3,51 2,20 F TOTAL 8 18 13 15 19 19 92 F/C % 3,52 6,69 3,52 3,33 4,18 4,12 4,12

ANOS

* Fonte: CD-ROM ANPEd. So Paulo: ANPEd, Ao Educativa, 1996.

A DISTRIBUIO GEOGRFICA DA PRODUO ACADMICA DISCENTE A produo acadmica em Educao de Jovens e Adultos e temas correlatos expressa em nmero de teses e dissertaes defendidas apenas para o perodo 1986-1998 est concentrada no centro-sul do Pas, particularmente na Regio Sudeste, com destaque para os Estados de So Paulo e Rio de Janeiro, que, juntos, respondem por 59% do total nacional, conforme a Tabela 3.

Educao de Jovens e Adultos no Brasil 11

O Estado de So Paulo responde isoladamente por 41,44% da produo acadmica nacional em Educao de Jovens e Adultos. As universidades localizadas na capital paulista (USP e PUC-SP) produziram 58,57% das teses e dissertaes defendidas no estado, enquanto que as universidades localizadas no interior (Unicamp, UFSCar, Unimep e Unesp) foram responsveis por 41,43% da produo estadual. Comparando-se a produo discente relativa ao tema no perodo 1986-1998 com a produo nacional total levantada no CD-ROM ANPEd no mesmo perodo, observa-se uma vantagem em favor da Regio Nordeste, devido contribuio do Estado da Paraba, bem como uma desvantagem para a Regio Sudeste, devido ao pouco interesse de algumas instituies do Estado de So Paulo pela temtica em questo.

A DISTRIBUIO DA PRODUO ENTRE INSTITUIES PBLICAS E PRIVADAS Das 34 instituies universitrias que constam do CD-ROM ANPEd como produtoras de dissertaes e teses na rea de Educao, 79,4% so pblicas e 20,6%, privadas. Das instituies pblicas, cerca de 81,5% so mantidas pelo governo federal e aproximadamente 18,5%, por governos estaduais. Tabela 3 Distribuio geogrfica da produo acadmica discente, por Regio e UFA EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS 1986-1998 DIS. Norte AM PA Nordeste BA CE MA PB PE PI RN SE Centro Oeste DF GO MT MS Sudeste ES MG RJ SP Sul PR RS SC TOTAL 0 0 0 37 5 8 0 16 6 0 1 1 9 4 2 1 2 128 4 10 36 78 28 2 25 1 202 TESE 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 17 0 0 3 14 3 0 3 0 20 TOTAL 0 0 0 37 5 8 0 16 6 0 1 1 9 4 2 1 2 145 4 10 39 92 31 2 28 1 222 % REGIO 0,00 0,00 0,00 100,00 13,51 21,62 0,00 43,24 16,22 0,00 2,70 2,70 100,00 44,44 22,22 11,11 22,22 100,00 2,76 6,90 26,90 63,45 100,00 6,45 90,32 3,23 -A % TOTAL 0,00 0,00 0,00 16,67 2,25 3,60 0,00 7,21 2,70 0,00 0,45 0,45 4,05 1,80 0,90 0,45 0,90 65,31 1,80 4,50 17,57 41,44 13,96 0,90 12,61 0,45 100,00

B EDUCAO 1986-1998* TESES E DIS. 42 33 9 699 162 177 12 115 80 34 91 28 453 149 98 132 74 5196 124 305 1366 3401 1178 213 840 125 7568 B % TOTAL 0,55 0,44 0,12 9,24 2,14 2,34 0,16 1,52 1,06 0,45 1,20 0,37 5,99 1,97 1,29 1,74 0,98 68,66 1,64 4,03 18,05 44,94 15,56 2,81 11,10 1,65 100,00 AB 0,55 0,44 0,12 +7,43 +0,11 +1,26 0,16 +5,69 +1,64 0,45 0,75 +0,08 1,94 0,17 0,39 1,29 0,08 3,35 +0,16 +0,47 0,48 3,50 1,60 1,91 +1,51 1,20 0,00

REGIES/ ESTADOS

* Dados coletados do CD-ROM ANPEd, 3. ed. So Paulo: ANPEd: Ao Educativa, 1999.

12 Srie Estado do Conhecimento

As instituies pblicas federais e estaduais responderam por quase 71% da produo acadmica relativa Educao de Jovens e Adultos e temas correlatos no perodo, enquanto as instituies privadas produziram pouco mais de 29% das teses e dissertaes acadmicas. importante salientar que esses valores no podem ser interpretados em termos de alta produtividade da rede publica e baixa produtividade da rede particular, uma vez que esses dois conjuntos no possuem um nmero proporcional de instituies. Dado que 79,41% da amostra so compostos por instituies pblicas e 20,59% por instituies particulares, possvel inferir que a rede pblica apresenta uma maior produo de trabalhos, porm ela no , obrigatoriamente, a mais produtiva na rea temtica aqui abordada.

OS PRINCIPAIS CENTROS DE PRODUO ACADMICA Considerada a totalidade das 222 teses e dissertaes aprovadas no perodo 19861998, foi possvel organizar um ranking da produtividade acadmica (mensurada em termos estritamente quantitativos) relativo ao tema Educao de Jovens e Adultos. O ranking confere destaque a dois tipos de instituies universitrias: aquelas de grande porte, que j acumularam larga experincia cientfica nos diversos campos de conhecimento, e aquelas que possuem reas de concentrao, linhas de pesquisa ou cursos de especializao no campo da Educao de Jovens e Adultos e temas correlatos. Na primeira categoria, merecem ser destacadas a PUC-SP , a USP a Unicamp, a UFRJ e a PUC-RJ; na segunda categoria, merecem destaque a UFPB, o , Iesae/FGV, a PUC-RS e a UFCE. Trs instituies universitrias a UFRGS, a UFMG e a UFSCar combinam a caracterstica de centros com tradio em pesquisa educacional, ao mesmo tempo em que sustentam linhas de pesquisa e projetos de extenso universitria com temticas relacionadas Educao de Jovens e Adultos.

METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA A primeira etapa da pesquisa consistiu na identificao, dentro do levantamento realizado, das dissertaes de mestrado e teses de doutorado em Educao de Jovens e Adultos. A identificao dos trabalhos pertinentes ao campo foi realizada mediante a pesquisa com base nas palavras-chave e contedos dos resumos das obras, elaborados pelos prprios autores. Identificados os trabalhos pertinentes ao estado do conhecimento, a equipe do Servio de Informao e Documentao de Ao Educativa (SID) empenhou-se na recuperao de cpias dos volumes das obras junto aos programas de ps-graduao, mediante intensa comunicao a distncia e emprego do sistema de comutao bibliogrfica. medida que os volumes iam sendo incorporados ao acervo do SID, tinha incio o processamento das obras realizado pelos auxiliares de pesquisa e sob a superviso dos documentalistas. Preliminarmente, as dissertaes e teses eram indexadas na base de dados bibliogrficos, com as referncias bibliogrficas, palavras-chave e resumos indicativos do contedo (Cf. modelo no Anexo 1); posteriormente, eram processadas em maior profundidade pelas bolsistas de iniciao e/ ou aperfeioamento cientfico, que, sob a orientao do coordenador e dos pesquisadores, preenchiam uma ficha complementar de anlise do contedo das obras, compreendendo a identificao do objetivo, do problema de pesquisa, da abordagem terica, tipo e metodologia da pesquisa e suas concluses, terminando com uma apreciao crtica do leitor (Cf. modelo no Anexo 2). Concluda essa etapa, as fichas de indexao e anlise elaboradas pelos auxiliares passaram s mos dos pesquisadores, que, com elas, produziram estatsticas e elaboraram mais de uma possibilidade de classificao dos estudos em campos subtemticos. A anlise mais detida das

Educao de Jovens e Adultos no Brasil 13

obras revelou que algumas delas no eram pertinentes aos recortes temporal e temtico do estado do conhecimento, conduzindo a equipe a excluir da pesquisa alguns textos, reduzindo o total de documentos a serem analisados para 183, distribudos em temas e respectivos subtemas, conforme mostra a Tabela 4. Tabela 4 Temas e subtemas

Cada pesquisador assumiu a responsabilidade de analisar um dos subtemas, redigindo um paper que caracteriza o campo emprico compreendido pelos estudos, verificando as abordagens tericas e metodolgicas dominantes, bem como sistematizando as principais concluses. O pesquisador responsvel se encarregou das orientaes necessrias a uma estrutura comum, reviu os originais e produziu a sntese final. Ao longo do desenvolvimento dos trabalhos, orientaes individuais e seminrios conjuntos foram realizados. Esses textos vm na seqncia desta primeira parte.

ALGUMAS CONCLUSES PRODUZIDAS PELO LEVANTAMENTO 1. Num perodo relativamente longo, de 12 anos, encontramos apenas trs estudos de natureza terico-filosfica que abordaram a Educao de Jovens e Adultos (EJA) desde um marco conceitual mais amplo (Silva Filho, Trein, Silva). O interessante que cada um deles caminha em uma direo diversa (andragogia, educao popular, anlise crtica da educao permanente). Ainda que a eles somemos outros estudos sobre fundamentos terico da EJA que discutem

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criticamente o pensamento freireano (Cruz, Bortolozo) ou que procuram integrar a pedagogia de Freire a outras corrente tericas (Faria, Moura), verificamos que a produo acadmica de corte filosfico ou epistemolgico muito reduzida. Isso pode ser interpretado como sintoma de um campo de conhecimento ainda em constituio, mas reflete, tambm, o baixo grau de interlocuo com as produes de conhecimento latino-americana e internacional, que so mais fecundas nos campos terico e conceitual. 2. As abordagens tericas dominantes nos estudos situam-se nos campos da Sociologia, da Poltica e da Filosofia da Educao, disciplinas que, juntas, oferecem os fundamentos para mais da metade das teses e dissertaes apuradas. Uma quarta parte dos estudos desenvolvem-se nos terrenos terico-prticos da Pedagogia (a includa a Didtica) e da Psicologia da Educao. 3. Os trabalhos, na maioria, so estudos de caso, relatos analticos ou sistematizaes de experincias/prticas/projetos de escopo reduzido, referidos a uma ou poucas unidades escolares ou salas de aula ou, quando muito, a um programa de mbito municipal ou estadual. Pela prpria natureza desses objetos de estudo, prevalecem pesquisas de tipo qualitativo, que recorrem a mtodos etnogrficos. So estudos cujas concluses tm baixo grau de generalizao; muitos deles chegam a concluses contraditrias entre si (devido diversidade do referencial terico dos autores), e os dados empricos so to pouco expressivos que no nos permitem aferir a validade desta ou daquela concluso. Esse limite faz com que o estado do conhecimento no indique concluses claramente convergentes ou consistentes. 4. A localizao dos centros de ps-graduao acaba por atrair pesquisadores da prpria regio, influindo na escolha dos objetos de estudo. Assim, preponderam as pesquisas sobre prticas de Educao de Jovens e Adultos desenvolvidas naqueles estados em que se localizam as universidades (SP RJ. RS, MG, PB). Pesquisas que abordam a realidade nacional no , representam sequer 10% do total. Esse perfil de estudos reflete as prprias condies em que se realizam as pesquisas de ps-graduao: financiamento escasso, limites de tempo, ausncia de projetos integrados, grupos de pesquisa ou de lderes de grupos de pesquisa (no perodo anterior, localizamos os grupos do Jacques Velloso e de Cludio Moura Castro, que j no aparecem). Fica evidente que a pesquisa nessa rea temtica carece de meios adequados para realizar estudos de maior flego, como os de avaliao de polticas e programas ou sobre analfabetismo/alfabetismo, por exemplo. 5. H um desafio crescente para as universidades no sentido de garantir/ampliar os espaos de discusso da EJA nos cursos de graduao, ps-graduao e extenso, sendo fundamental considerar nestes espaos a produo j existente em Educao de Jovens e Adultos. 6. Embora o levantamento tenha procurado compreender estudos relativos educao formal ou informal, escolar e extra-escolar, contemplando no s os textos que tratam dos processos de escolarizao bsica (a includos os subtemas da alfabetizao, ensino supletivo ou ensino noturno nos nveis fundamental e mdio, bem como teleducao), mas o tema conexo da educao popular, h um claro predomnio de estudos que tratam de processos de escolarizao, sendo francamente minoritria (inferior a 20% do total) a produo acadmica relativa a prticas de educao poltica, sindical ou comunitria. Mesmo quando os agentes so movimentos sociais ou organismos da sociedade civil, as prticas focalizadas so, em sua maioria, de alfabetizao ou elevao de escolaridade. Podemos construir trs hipteses com relao a isso: ou as prticas escolares so, de fato, majoritrias em comparao com as demais; ou o predomnio da concepo compensatria da EJA no favorea a sensibilidade para outras modalidades de formao de adultos; ou os estudos sobre as prticas noescolares so feitos em outros programas de ps-graduao (Cincias Sociais, Antropologia, Servio

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Social, Cincia Poltica, etc.) que no os de Educao. No entanto, a presena especfica de trabalhos denominados de Educao Popular vem reforar a interseco destas temticas. Mesmo a EJA estando cada vez mais prxima das instituies oficiais de ensino e das reflexes sobre escolarizao, isto no a isola ou no parece poder isola-la do debate mais amplo que ainda permanece vivo nos movimentos populares sobre a necessidade de se pensar numa educao que ultrapasse os objetivos utilitaristas de certificao e abra-se para uma perspectiva de conquista de direitos. 7. A ampla maioria dos estudos refere-se a prticas de alfabetizao e escolarizao de jovens e adultos, promovidas por organismos civis ou pelo setor pblico, no ensino supletivo ou regular noturno, nos nveis fundamental ou mdio. Somados os trabalhos que agrupamos nos temas Concepes e Prticas Pedaggicas, Aluno e Professor, teremos mais da metade (aproximadamente 55%) dos estudos analisados. Se comparado ao estado da arte anterior, houve uma inverso, pois naquele caso prevaleceram os estudos sobre histria, polticas, estrutura e funcionamento dos cursos, exames e teleducao, enquanto que neste perodo prevalecem as pesquisas sobre agentes, concepes, prticas e metodologias do ensino. Esse adensamento quantitativo, porm, ainda no produziu resultados consistentes com relao formulao de proposta para o desenvolvimento curricular ou de metodologias de ensino adequadas e eficazes. Embora ainda prevalea um olhar homogeneizador dos educandos, vistos genericamente como alunos ou trabalhadores, comeam a aparecer estudos que tratam da construo de identidades singulares (geracionais, de gnero, tnicas, culturais) ou que abordam a dimenso da subjetividade dos educandos. Neste conjunto, o subtema do ensino noturno (regular e, muitas vezes, de nvel mdio) um dos mais recorrentemente abordados no perodo, quase sempre como problema e associado ao fracasso/reprovao e evaso escolar. Freqentemente o ensino noturno pesquisado em conexo com a relao educao e trabalho, pois o seu alunado identificado com a categoria trabalhador. 8. No que concerne s concepes de EJA, o pensamento freireano continua a ser a referncia a partir da qual os pesquisadores aderem, tecem crticas ou incorporam novos aportes (seja Celestin Freinet, Emlia Ferreiro, Lev Vygotsky ou Luria). A matriz da alfabetizao conscientizadora/ educao transformadora de Freire o ponto de partida de uma srie de experincias curriculares, metodolgicas ou organizacionais. Sobre a matriz freireana, falta um balano geral da sua influncia na EJA, nos moldes deste estado do conhecimento. Nas questes relativas aos aportes tericos das pesquisas em EJA, percebe-se ainda uma grande disperso entre os autores utilizados, havendo alguma unidade nas referncias histricas da EJA (Celso Rui Beisiegel, Vanilda Paiva e Sergio Haddad). As demais reflexes encontram-se dispersas em diversos referencias. 9. Os estudos revelam tambm o pouco conhecimento (constatado nas indicaes bibliogrficas) do que j foi produzido sobre diversas temticas a eles relacionadas. Muitos trabalhos podero estar sendo enriquecidos quando puderem avanar ou contestar temas j abordados em outros trabalhos, com a divulgao dos dados levantados pelo estado do conhecimento. Neste sentido, seria interessante um trabalho que pudesse avaliar o quanto da produo discente foi publicado, ampliando o acesso para outros pesquisadores. 10. No que se refere s propostas e prticas pedaggicas, uma parcela importante dos estudos dedica-se aprendizagem da leitura, da escrita e da matemtica, problematizando, de

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um lado, as relaes entre alfabetizao e prticas sociais letradas (incluindo o debate sobre os conhecimentos prvios de jovens e adultos sobre o sistema de escrita e o clculo e sua assimilao aos processos de aprendizagem da linguagem e da matemtica escolar) e, de outro, as relaes entre alfabetismo, desenvolvimento e competncias cognitivas. 11. Aproximadamente 20% dos estudos abordam temas relativos s Polticas Pblicas de EJA (compreendendo os subtemas Histria da EJA, Polticas Pblicas Recentes, Alfabetizao, Centros de Estudos Supletivos, Ensino Regular Noturno e Polticas Municipais e Educao Popular). No perodo pesquisado continuaram a ser produzidos estudos relativos s campanhas dos anos 50 ou aos movimentos de educao e cultura popular dos anos 60 especialmente o MEB que dialogam com a literatura pr-existente sobre os temas (Paiva, Beisiegel, Wanderley, Fvero). Os estudos que abordam as polticas pblicas do perodo do regime militar (Mobral e o Ensino Supletivo) ou aquelas mais recentes discutem majoritariamente a funo cumprida pela EJA, ora vista, luz das teorias da reproduo, como instrumento de reiterao das desigualdades sociais, ora vista, luz do pensamento gramsciano, como elemento contraditrio de democratizao de oportunidades e reconhecimento de direitos educao. Evaso e repetncia so fenmenos generalizados, explicados, segundo os autores, pela inadequao das condies de estudo e dos modelos pedaggicos s necessidades educativas dos trabalhadores. As pesquisas analisadas ainda no revelam um vnculo de proximidade entre universidades e redes pblicas de ensino; as poucas experincias existentes so de trabalhos da universidade dentro dela mesma. Espera-se para os prximos anos, em funo do Programa Alfabetizao Solidria (PAS) e do Programa Nacional de Educao na Reforma Agrria (Pronera), um maior nmero de pesquisas que revelem esta relao das universidades com as redes de ensino e a contribuio destas para a EJA. Ningum estuda o tema do financiamento da EJA; no h um s estudo que o aborde durante o perodo. Embora a teleducao (em especial, o Telecurso 2000) tenha se expandido enormemente nesta dcada, h pouqussimos estudos sobre o tema. Os exames supletivos, que haviam sido objeto de um conjunto articulado e consistente de estudos liderados por Velloso e Castro, desaparecem como objeto de estudo; sobre eles, h apenas uma tese, a de Amaral, de 1987. 12. Entre as modalidades que ensejam uma produo crescente, destacam-se os Centros de Estudos Supletivos: foram identificados nove estudos, sendo trs sobre professores ou alunos (Lassalvia, 1992, sobre So Paulo; Miyahara, 1992, sobre Ribeiro Preto; Silva, 1987, sobre Vitria) e seis sobre polticas (Alves, 1991; Broggio, 1998; Feigel, 1991; Mattos, 1992; Torres, 1997; Pinheiro, 1988). As concluses no so convergentes: h estudos que aderem aos pressupostos pedaggicos dos CES e os avaliam positivamente, enquanto que outros autores criticam os pressupostos e os avaliam negativamente.

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13. Entre os temas emergentes (que quase no estavam presentes no estado da arte anterior e agora aparecem), pode-se mencionar a EJA no meio rural (quatro estudos: Talavera, 1994; Castro, 1990; Fagundes, 1990; Carneiro, 1986), educao de presos (dois estudos: Farias, sobre Santa Maria; Leite, sobre Marlia) e escolarizao de trabalhadores da construo civil (dois estudos: Rabelo, 1997; Durante, 1996). 14. Estudos relativos s polticas recentes informadas pelo iderio da Educao Popular, particularmente os Movimentos de Alfabetizao de Jovens e Adultos (Movas), apontam a participao popular em co-gesto com os rgos estatais como indcio de maior permeabilidade do poder local (Di Pierro) ou resultante da vontade poltica diferenciada das orientaes pedaggicas de partidos polticos e de seus aliados em governos democrticos (Machado, Camargo, Souza). O reconhecimento da vontade poltica como promotora de inovaes na educao de jovens e adultos remete-nos s concepes ideolgicas e metodolgicas componentes do acervo referente Educao Popular; nela, a ao educacional de qualidade passa pela ao educativa transformadora, adequada s necessidades da populao atendida, concebida como de essencial importncia para o avano da democratizao das oportunidades educacionais e da vida societria como um todo (Di Pierro, S, Camargo, Machado, Souza, Grangeiro). Assim, estabelecem-se relaes entre o fazer pedaggico e o fazer poltico, desnudando-se os mltiplos vnculos entre a educao e a organizao do poder na sociedade e no mbito dos aparatos do Estado (Di Pierro e Machado). As pesquisas aqui investigadas indicam a superao da concepo compensatria da educao de jovens e adultos e das possibilidades de uma Educao Popular no mbito do Estado que nos remete a considerar sobre a novidade ps-regime autoritrio de uma educao realizada entre parceiros Estado e sociedade civil. 15. Em algumas das pesquisas analisadas, aparece o destaque para a emergncia de mulheres e jovens, nos ltimos anos, em EJA. Este nos parece ser um fenmeno importante cujo estudo precisa ser mais aprofundado, principalmente no que se refere s suas relaes com os resultados do ensino fundamental e mdio do turno diurno, bem como com as mudanas no mundo do trabalho e no cotidiano das famlias, principalmente no meio urbano. 16. O conjunto das pesquisas que concentram suas discusses na relao escola/ trabalho sob a tica dos alunos revela muitas contradies sobre o papel da educao no mundo do trabalho. Este fato parece indicar a necessidade de aprofundamento maior dos princpios que norteiam ambas as prticas sociais a educao e o trabalho , a fim de compreender a interseco necessria de ambas nesta modalidade de ensino. Isto nos remete a uma aproximao maior entre EJA e as pesquisas sobre o ensino mdio e profissionalizante que vm sendo realizadas no Brasil. 17. As pesquisas sobre a temtica do professor de EJA reafirmam a existncia ainda hoje de um preconceito sobre esse campo de trabalho, considerado como de segunda linha. Esse estigma estaria presente entre professores, corpo tcnico das escolas e secretarias de educao e at mesmo entre os prprios alunos. Este um desafio que precisa ser enfrentado em qualquer proposta de EJA, sobretudo reconhecendo o direito especificidade prpria desta modalidade de ensino. Onde isto tem ocorrido, as experincias so exitosas e vm buscando sistematizar os ganhos evidenciados numa modalidade que vai se distanciando pouco a pouco do modelo padro da escola diurna, ao mesmo tempo em que aponta para referncias prprias em relao ao horrio de funcionamento das aulas, aos programas desenvolvidos nos diferentes nveis, s metodologias utilizadas no processo de aprendizagem e avaliao de alunos e professores, etc. Recomenda-se que a formao continuada de professores deva ser feita numa estreita relao com a prtica cotidiana, com acompanhamento sistemtico ao professor, para que se possa garantir algum retorno desta ao ao trabalho efetivo em sala de aula. Os treinamentos espordicos, os cursos aligeirados e os programas de

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alfabetizao sem continuidade garantida so avaliados nas pesquisas como instrumentos de desservio EJA, pois criam expectativas que no sero correspondidas, frustram alunos e professores e reforam a concepo negativa de que no h o que fazer nesta modalidade de ensino. As pesquisas comprovam a aproximao das realidades vivenciadas por professores que atuam no ensino regular noturno com as do supletivo, as das classes de alfabetizao e de outras experincias em EJA. Ao mesmo tempo, estas pesquisas reforam a premissa de que o professor do noturno precisa encarar as especificidades deste turno, defendendo-as e buscando se qualificar como um profissional que atua numa modalidade diferenciada. O ensino noturno precisa deixar de ser um bico. Esta mesma observao cabe aos coordenadores pedaggicos e aos tcnicos das secretarias, pois, como vimos em algumas pesquisas, estes agentes so importantssimos na consolidao de projetos diferenciados dentro da escola, precisando, ento, de formao adequada. Outro aspecto que aparece em destaque nas vises de alunos e professores a necessidade de aproximar a escolarizao da realidade concreta do mundo do trabalho, no no sentido de antecipar propostas profissionalizantes, mas no de contemplar no currculo o cotidiano das prticas de trabalho e emprego a que submetida maioria dos alunos que freqentam classes de EJA. 18. As concluses apresentadas nas pesquisas relativas ao aluno reafirmam um dilema que a Educao de Jovens e Adultos carrega consigo: o de pretender dar garantias de um direito que foi negado a seus alunos a escolarizao bsica , mas, ao mesmo tempo, levantar neles uma grande expectativa quanto s mudanas que esperam no seu cotidiano, principalmente na sua realidade profissional, quando isto no depende apenas da escola. H ganhos para quem est vivenciando a experincia de voltar para a escola depois de adulto, mas h tambm decepes por esta escola no corresponder a tudo o que se espera dela. Em relao escola, os estudantes a consideram importante para que ascendam social e economicamente, entretanto deixam transparecer um certo desencanto quando se expressam sobre o cotidiano escolar. Atribuem escola o papel de transmitir o conhecimento e, ao defini-la, no conseguem ultrapassar os princpios que hoje a orientam (Escario, 1996; Portaluppi, 1996). Nos estudos sobre a representao que o aluno faz da escola, ela vai se transformando com o passar do tempo (Souza, 1994). Nessa trajetria, passam primeiro por um momento de expectativa antes do ingresso na escola, depois, por um momento de decepo, de desnimo, culminando com a desistncia. No entanto, o valor que os alunos do a escola no decresce (vai se fortalecendo no perodo em que ficam fora dela). Permanece em alguns alunos a avaliao de que a escola do perodo diurno sempre melhor do que a escola do noturno (Galindo, 1995). Os altos ndices de evaso e repetncia observados na pesquisa reafirmam a escola como obstculo para o aluno trabalhador. Ao mesmo tempo, este aluno v a escola como uma oportunidade de conquistar o direito cidadania e de inserir-se no mercado de trabalho formal (Oliveira, 1991). So ainda destacados entre as dificuldades enfrentadas o autoritarismo dos professores (Souza, 1993) e o medo do fracasso e do isolamento dos alunos em relao aos colegas na escola (Giglio, 1998).

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Anexo 1INDEXAO DE DADOS BIBLIOGRFICOS 007864 DATA DE ENTRADA: 24/04/00 TIPO DE MATERIAL: DISSERTAO ACERVO(S): Ao Educativa CDIGO: 05.04.02.01 Que mot QUEIROZ, Norma Lucia Neris de. Motivaes para a alfabetizao entre jovens e adultos: estudo de caso em trs experincias de alfabetizao no Distrito Federal. Braslia, 1993. 257 p. Dissertao (Mestrado em Educao) Universidade de Braslia. ORIENTADOR: BELLONI, Isaura. AUTOR(ES) SECUNDRIO(S): UnB RESUMO: Desenvolve, a partir da tica dos alfabetizados, as motivaes que levaram jovens e adultos a ingressar e permanecer nos programas de alfabetizao do Distrito Federal. A referida pesquisa foi realizada com alfabetizandos inseridos em trs experincias: alfabetizao do Parano, organizado e gerido pela prpria comunidade; alfabetizao do Seconci, organizado e realizado pelo Servio Social da Indstria da Construo Civil, com os trabalhadores da construo civil nos canteiros de obras do Distrito Federal, ambas organizadas numa perspectiva de educao popular; programa de ensino supletivo da FEDF (Fundao Educacional do Distrito Federal), realizado com verbas pblicas de educao e atendendo a perspectiva educacional de adultos. Com esse programa, trabalhou-se com jovens e adultos de uma classe de Ceilndia-DF. Concluiu-se que as motivaes para a alfabetizao entre jovens e adultos entrevistados so, entre outras, a manuteno do emprego e a melhor integrao social na cidade. IDIOMA: PORTUGUS REGIO: DF ALFABETIZAO DE JOVENS E ADULTOS; MOTIVAO; ENSINO SUPLETIVO; EDUCAO POPULAR.

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Anexo 2ANLISE DE CONTEDO TIPO DE MATERIAL: DISSERTAO

ACERVO(S): Ao Educativa CDIGO: 05.04.02.01 Que mot QUEIROZ, Norma Lucia Neris de. Motivaes para a alfabetizao entre jovens e adultos: estudo de caso em trs experincias de alfabetizao no Distrito Federal. Braslia, 1993. 257 p. Dissertao (Mestrado em Educao) Universidade de Braslia. ORIENTADOR: BELLONI, Isaura. AUTOR(ES) SECUNDRIO(S): UnB RESUMO: Desenvolve, a partir da tica dos alfabetizados, as motivaes que levaram jovens e adultos a ingressar e permanecer nos programas de alfabetizao do Distrito Federal. A referida pesquisa foi realizada com alfabetizandos inseridos em trs experincias: alfabetizao do Parano, organizado e gerido pela prpria comunidade; alfabetizao do Seconci, organizado e realizado pelo Servio Social da Indstria da Construo Civil, com os trabalhadores da construo civil nos canteiros de obras do Distrito Federal, ambas organizadas numa perspectiva de educao popular; programa de ensino supletivo da FEDF (Fundao Educacional do Distrito Federal), realizado com verbas pblicas de educao e atendendo a perspectiva educacional de adultos. Com esse programa, trabalhou-se com jovens e adultos de uma classe de Ceilndia-DF. Concluiu-se que as motivaes para a alfabetizao entre jovens e adultos entrevistados so, entre outras, a manuteno do emprego e a melhor integrao social na cidade. IDIOMA: PORTUGUS REGIO: DF ALFABETIZAO DE JOVENS E ADULTOS; MOTIVAO; ENSINO SUPLETIVO; EDUCAO POPULAR. OBJETIVOS/COLOCAO DO PROBLEMA: Analisar e compreender as motivaes que levam jovens e adultos a ingressar e a permanecer nas experincias de alfabetizao e suas inter-relaes com o contexto socioeconmico, poltico e cultural do Distrito Federal, a partir da tica dos alfabetizandos inseridos em trs experincias de alfabetizao. Busca contribuir para ampliar a reflexo sobre o significado e o alcance da alfabetizao de

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jovens e adultos, visando possibilitar aes educativas mais compatveis com os interesses dessa parcela da populao. HIPTESES: Esta compreenso acerca dos fatores ligados permanncia dos indivduos nos programas de educao dos adultos deve permitir adotar estratgias para reduzir as altas taxas de evaso que vm caracterizando essas atividades. TEXTO (Referencial terico): O referencial deste estudo divide-se em duas partes. A primeira discute a concepo dialtica da educao, a partir de conceitos bsicos elaborados por Antonio Gramsci. Na segunda parte encontram-se arrolados alguns estudos sobre a motivao para a alfabetizao, visando compreender a valorizao atribuda educao, mais especificamente, das classes populares. Foram usados como referncia, entre outros, Sylvia Schmelkes, M. I. Infante e M. Gajardo. TEXTO (Metodologia da pesquisa): Estudo de caso de carter exploratrio que se desenvolve com base na anlise de contedo das entrevistas semi-estruturadas, das observaes diretas em sala de aula e da anlise de documentos. Como autores de referncia, podem ser citados: Michel Thiollent e Spradley. CONCLUSES: Conclui-se que detectar os reais interesses dos alfabetizandos parece constituir a noo chave para instituies pblicas e entidades no-governamentais elaborarem propostas de alfabetizao de jovens e adultos mais adequadas realidade dessa parcela da populao. A anlise desenvolvida indica que as motivaes para alfabetizao predominantes nesse grupo so aquelas que visam a uma melhor integrao ao contexto social dominante. Por isso, a maioria desses sujeitos ingressa e permanece nas experincias de alfabetizao com expectativas de melhorar suas condies de vida e de trabalho. Considerar as motivaes para a alfabetizao de jovens e adultos na elaborao de programas e propostas educativas parece contribuir para a reduo da evaso entre essa parcela da populao. RECOMENDAES: Alguns passos podem ser indicados: considerar os reais interesses dos alfabetizandos; explorar os diversos tipos de motivaes, atravs da mdia, escolas (crianas aos pais), entidades comunitrias. Considerar os aspectos pedaggicos: nmero de horas-aula respeitando a capacidade de assimilao dos alunos; turmas pequenas para que o professor possa dar maior ateno; construir materiais didticos adequados realidade desses jovens e adultos. LEITOR: PN

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Tema I

O professorMaria Margarida Machado *

Entre as 183 dissertaes e teses analisadas neste estado do conhecimento sobre a Educao de Jovens e Adultos, defendidas no perodo de 1986 a 1998, convencionou-se classificar o conjunto daquelas que tratavam mais especificamente de assuntos relacionados ao professor como Tema I. O total de pesquisas classificadas neste tema foi de 32: quatro teses de doutorado e 28 dissertaes de mestrado. A classificao por temas foi uma opo dos pesquisadores para organizar, de forma mais objetiva, a produo analisada. Isto, porm, no retira destes trabalhos a riqueza da abrangncia ou a interseco de mais de um aspecto abordado nas pesquisas. Optou-se tambm por uma subtematizao, a fim de facilitar pesquisas posteriores, sendo este um dos objetivos de um estudo desta natureza. O Tema I, portanto, foi dividido em dois subtemas: o primeiro Relaes Professor/ Aluno e Vises sobre EJA abordou as relaes entre professores e alunos e as vises que tm de si e do processo de aprendizagem; o segundo Professor: sua Prtica e sua Formao tratou de pesquisas mais voltadas para o professor e sua prtica, juntamente com a questo da formao de professores para atuar em Educao de Jovens e Adultos. Vale destacar que, neste ltimo subtema, se encontram trs das quatro teses de doutoramento sobre esse tema. Nos Anexos 1 e 2, esto relacionadas, por subtema e segundo a ordem alfabtica dos autores, as pesquisas que compem o Tema I.

SUBTEMA I.1 RELAES PROFESSOR/ALUNO E VISES SOBRE EJA Este primeiro subtema dentro do Tema I est composto por uma tese e 111 dissertaes que tratam mais especificamente das questes em torno da relao professor/aluno na Educao de Jovens e Adultos, bem como da viso que ambos tm sobre si e sobre o ensino como um todo. So pesquisas que tratam, ao mesmo tempo, dos dois sujeitos da aprendizagem o professor e o aluno , o que as difere das pesquisas que sero apresentadas no Tema 2, onde o interesse-alvo se restringe ao aluno.

Principais Problemas Abordados Os objetivos dos trabalhos analisados apontam para uma preocupao central: conhecer a realidade da educao de jovens e adultos atravs dos seus sujeitos, quer em

* Mestre em Educao pela Universidade Federal de Gois e doutoranda em Educao pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo. 1 A dissertao de Beloni Ozelame s foi consultada no CD-ROM ANPEd, por falta de exemplar na Ao Educativa.

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experincias inovadoras ou em prticas j consolidadas. A busca deste conhecimento chega a apoiar-se em questes mais especficas, tais como os contedos trabalhados (De Camillis, 1988; Ozelame, 1998), o processo coletivo de transmisso de conhecimentos e atitudes (Ferraz, 1989; Junqueira, 1986), as caractersticas, valores e expectativas que marcam professor e aluno nesta relao de aprendizagem (Almeida, 1992; Caffer, 1990; Cianfa, 1996; Fernandes, 1990; Sachetti, 1992) e a relao da escola com o mundo do trabalho, seja ele urbano ou rural (Alvarim, 1992; Castro, 1990; Rombaldi, 1990).

Principais Concluses Presentes nas Pesquisas As pesquisas que tratam mais especificamente das questes que envolvem a relao professor/aluno apontam para problemas j evidenciados h muito na Educao de Jovens e Adultos: a) H, por parte de professores e alunos, preconceitos em relao a essa modalidade de escolarizao, difundindo-se uma concepo de que j tarde para se aprender algo. Contraditoriamente, projetos exitosos no noturno tm mostrado a importncia da garantia de uma educao de qualidade para jovens e adultos, apresentando, inclusive, mudanas nos relacionamentos interpessoais dos sujeitos envolvidos (Almeida). Exemplo disto se evidencia quando o professor comea a redesenhar o aluno-trabalhador como um sujeito com potencial para aprender, com capacidade de reflexo, com direitos e perspectivas de futuro (Ozelame). A reflexo conduz o professor a um reexame da realidade, e, por isso, preciso contribuir para que ele desenvolva um modo de agir e de pensar centrado nos interesses do aluno-trabalhador, alm de se perceber tambm como classe trabalhadora (Ferraz; Cianfa). b) A crise do ensino noturno passa pelo aluno que no consegue questionar os esquemas rgidos da escola regular e, por vezes, quer que lhe seja facilitada a concluso dos estudos; passa por professores que vem no turno uma continuidade das prticas com crianas (Fernandes); por coordenadores pedaggicos e diretores que julgam o turno noturno como uma perda de tempo, restringindo o acesso a materiais, equipamentos e espaos especficos da escola (Caffer). Onde h indicaes de processos de superao destas tendncias da crise, como em experincias exitosas de alfabetizao numa perspectiva crtica, refora-se a necessidade de construo participativa da escola noturna, para ser possibilitada a constituio de uma nova identidade dos sujeitos envolvidos (Junqueira). Superar o conceito de escola do silncio, da subservincia, hierarquizada, centralizadora, controlada (Sachetti; Alvarim). c) Professores e corpo tcnico esto distantes das condies concretas dos alunos trabalhadores que buscam o ensino noturno; no h formao especfica para atuar com estes alunos (De Camillis). Isto tem preocupado algumas instituies formadoras de profissionais da educao que apontam a necessidade de contemplar em seus currculos um espao especfico para discusses sobre EJA, enfatizando a questo do papel do educador como profissional, o que o distingue de um missionrio (Castro). d) necessrio compreender o limite do papel social da escola, para que se busquem mudanas, para alm de seus muros, que contribuam com o avano da EJA (Rombaldi).

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SUBTEMA I.2 PROFESSOR: SUA PRTICA E SUA FORMAO Da anlise realizada nas 32 pesquisas que tratam de temas ligados aos professores, foram encontradas nove que se referem mais especificamente prtica pedaggica dos professores que atuam na EJA, todas referentes a dissertaes de mestrado. As outras 11 trs teses e oito dissertaes2 enfocam como questo central a formao dos professores dessa modalidade de ensino. H uma quase unanimidade na constatao da necessidade de uma preparao especfica dos professores que atuam em EJA, balizada em exemplos de experincias pesquisadas ou na comprovao das precariedades dos trabalhos dos professores onde esta formao no ocorre. Dada a proximidade dos aspectos abordados neste subtema prtica e formao , optou-se por analisar as 20 pesquisas conjuntamente, mantendo, em alguns momentos, destaques que as diferenciam e parecem pontuar melhor uma ou outra questo.

Principais Problemas Abordados Existem dois eixos nos objetivos propostos pelas dissertaes que analisam as prticas dos professores, sendo que o primeiro e majoritrio enfoca experincias de escolarizao em classes de ensino regular ou supletivo: Abrantes (1991), Campos (1998), Coltro (1994), Cruz (1994), Guidelli (1996), Machado (1990) e Oliveira (1995). O segundo eixo, encontrado em duas dissertaes (Almeida, 1988; Talavera, 1994), busca conhecer a prtica de alfabetizadores populares e a prtica de agentes formadores de alfabetizadores populares. Os objetivos podem ser assim sintetizados: a) Conhecer o professor do perodo noturno e suas representaes, focalizando o seu percurso escolar, a sua atuao profissional, assim como suas concepes em relao ao ensino nesse perodo, buscando confrontar a funo que exerce com sua formao terico-prtica (Coltro; Cruz; Machado):Receber o trabalhador-estudante, atuar frente a altos ndices de evaso, desistncia e/ou reprovaes, enfrentar problemas relacionados infra-estrutura, assim como conhecer melhor o professor que atua neste perodo so aspectos que deveriam fazer parte das preocupaes daqueles que tm como objeto de estudo o ensino noturno. (Coltro, 1994, p. 2).

b) Trazer elementos para a discusso em torno da didtica da educao bsica de jovens e adultos, que tem como maior desafio garantir, no processo ensino-aprendizagem, as dimenses poltica, tcnica e humana (Abrantes; Guidelli):(...) o foco de anlise do fazer pedaggico do professor foi o da sua intencionalidade no processo ensino-aprendizagem (dimenso poltica), o da forma e contedo trabalhado nesse processo (dimenso tcnica) e o da relao professor e aluno (dimenso humana). (Abrantes, 1991, p. 6). Conhecer a prtica docente do professor que atua no campo especfico da educao de jovens e adultos torna-se necessrio tambm compreenso especfica deste tipo de ensino quanto possibilidade de intervenes que objetivem uma educao de qualidade (acesso, permanncia e aquisio de conhecimentos bsicos vida e ao trabalho). (Guidelli, 1996, p. 13).

c) Compreender as peculiaridades existentes no trabalho docente realizado por professores do EDA e por monitores do Mova-SP (Campos):(...) de um lado temos as/os monitoras/es do Mova-SP com uma histria marcada pelo engajamento nos Movimentos Populares e por isso tm um olhar diferente sobre a Educao2

A pesquisa de Tereza Cristina Loureiro s foi consultada no CD-ROM ANPEd, por ausncia de um exemplar nos arquivos da Ao Educativa. As outras 19 dissertaes e teses foram lidas na ntegra, para a elaborao deste texto.

Educao de Jovens e Adultos no Brasil 27

de Jovens e Adultos Trabalhadores, de outro lado temos as/os professoras/es que compem o quadro do Magistrio da Secretaria Municipal de Educao e que, neste perodo, puderam fazer uma opo dentro do quadro do Magistrio: a de trabalhar na Educao de Jovens e Adultos Trabalhadores como professoras/es da EDA da Secretaria Municipal de Educao. (Campos, 1998, p. 14-15).

d) Discutir as implicaes do Construtivismo Piagetiano e da Psicognese da Lngua Escrita na prtica pedaggica de alfabetizao de adultos (Oliveira). e) Discutir a questo pedaggica da educao popular a partir da anlise histrica da ao dos educadores populares nas dcadas de 60-80:A relao pedaggica enquanto igualdade entre sujeitos que ensinam e aprendem requer cuidados por parte do educador, no sentido de no interferir no processo pedaggico, transmitindo contedos que expressem juzos de valor do segmento social a que ele pertence (...) podendo, assim, dominar o processo de aprendizagem, o que implica desigualdade na interao dos educandos com os educadores. (Almeida, 1988, p. 54).

f) Fazer crtica prtica dos agentes de transformao na experincia educacional, desenvolvida num acampamento rural. No contexto desta pesquisa h uma discusso singular da educao popular:... a educao popular seria mais voltada para as prticas educacionais alternativas, ou seja, promovidas pelas prprias organizaes populares. Na outra viso, defendia-se a possibilidade de realiz-la no contexto da educao formal da populao em geral, promovida pelo Estado. (Talavera, 1994, p. 19).

Analisando-se os objetivos expressos nos trabalhos sobre formao de professores, podem ser identificadas duas tendncias: uma primeira que busca analisar experincias especficas de formao de professores, dando nfase participao dos professores e sua percepo dos objetivos da atuao em EJA (Telles, 1998),3 relao entre formao e o fracasso escolar (Menin, 1994), formao em servio (Prada, 1995;4 Souza, 1995; Christov, 1992; Toledo, 1998); uma segunda tendncia busca apontar caminhos para uma boa formao de professores que atuam em EJA superar a separao entre a teoria e a prtica (Piconez, 1995), combinar docncia com pesquisa (Piconez, 1995), identificar no adulto-educando suas caractersticas bio-psico-sociais (Giubilei, 1993),5 considerando que estas se constituem subsdios para o desenvolvimento de uma proposta de trabalho adequada sua natureza (Loureiro, 1996; Calvo Hernandez, 1991; Oliveira, 1994).

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A estrutura de formao permanente consistiu basicamente em: cursos de Formao Inicial, reunies pedaggicas dos supervisores populares com equipe tcnica da Secretaria (chamada de Superviso) e reunies pedaggicas dos supervisores populares com os monitores em suas entidades, reunies de superviso integrada (reunies pedaggicas entre monitores, supervisores populares e tcnicos da secretaria), cursos de formao complementar (cursos e/ou oficinas temticos), seminrios e encontros regionais. (Telles, 1998, p. 35). Esta pesquisa analisa principalmente a experincia de capacitao em servio de docentes da Colmbia no chamado Projeto do Noturno, cujos objetivos so: ... oferecer possibilidades de capacitao aos docentes e de integrar-se entre si mesmos, gerar reflexes pedaggicas sobre a cotidianidade do trabalho escolar, diagnosticar problemas pedaggicos na educao noturna, projetar aes de mudana no trabalho pedaggico, motivar os docentes s mudanas atravs da prpria participao no projeto, estruturar coletivamente uma proposta de ajuste curricular e administrativo para a educao noturna (p. 15). Mas h tambm uma anlise da experincia da PUC-Camp, do projeto supletivo, fazendo, inclusive, referncia pesquisa de Giubilei (1993). H neste trabalho, especificamente, uma preocupao com a teorizao da educao continuada e com o aprofundamento do referencial terico sobre o homem na vida adulta (Captulo IV).

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Referencial Terico As pesquisas que tratam mais especificamente das prticas6 dos professores que atuam em EJA, assim como aquelas que trataram da sua formao,7 apontam, em sua maioria, como um dos suportes utilizados para seu referencial terico, um resgate do histrico da Educao Popular e da Educao de Jovens e Adultos no Brasil. Para este resgate, so mais destacados os autores Celso de Rui Beisiegel (Telles, 1998; Talavera, 1994; Coltro, 1994; Guidelli, 1996), Hugo Lovisolo (Giubilei, 1993), Vanilda Pereira Paiva (Calvo Hernandes, 1991; Giubilei, 1993; Almeida, 1994; Coltro, 1994; Cruz, 1994; Guidelli, 1996), Luis Eduardo Wanderlei (Almeida, 1988), Laurinda R. Almeida (Coltro, 1994), Jorge Nagle (Coltro, 1994), Marilia Sposito (Telles, 1998; Coltro, 1994), Pedro Demo (Machado, 1990), Celia Pezzolo Carvalho (Menin, 1994; Machado, 1990; Coltro, 1994), Sergio Fiker (Menin, 1994), Carlos Rodrigues Brando (Giubilei, 1993; Souza, 1995; Almeida, 1988; Talavera, 1994), Rosa Maria Torres (Christov, 1992; Guidelli, 1996), Sergio Haddad (Calvo Hernandes, 1991; Telles, 1998; Guidelli, 1996), Gaetana Maria Jovino Di Rocco (Cruz, 1994). As pesquisas, em geral, fazem referncias ao histrico da EJA, destacando os equvocos presentes nesta modalidade de ensino desde sua concepo original como educao compensatria, supletiva e de carter emergencial. Podem ser destacados alguns destes enfoques:A educao de adultos hoje oferecida no Brasil, embora pobremente, tem por funes no s a de complementar uma formao incompleta, insuficiente, recuperando o adulto marginalizado, como a de ensinar a ler e escrever aos deserdados sociais. Os planos governamentais, principalmente nas ltimas trs dcadas, apontam para o atendimento principalmente ltima destas funes; to-somente a alfabetizao. (Giubilei, 1993, p. 4). A educao de jovens e adultos foi vista no decorrer de sua histria como uma modalidade de ensino que no requer, de seus professores, estudo e nem especializao, como um campo eminentemente ligado boa vontade. Em razo disso, so raros os educadores capacitados na rea. Na verdade, parece que continua arraigada a idia de que qualquer pessoa que saiba ler e escrever pode ensinar jovens e adultos, pois ainda existem educadores leigos que trabalham nessa modalidade de ensino, assim como a idia de qualquer professor automaticamente um professor de jovens e adultos. Com esta falsa premissa, no tem se levado em conta que para se desenvolver um ensino adequado a esta clientela exige-se formao inicial especfica e geral consistente, assim como formao continuada. (Guidelli, 1996, p. 126). A maioria dos estudos sobre Educao de Adultos tem colocado, entre suas prioridades, a necessidade de formao de professores para educao to peculiar. A inexistncia de estudos sobre jovens e adultos nos cursos de formao de professores, seja em nvel de 2 ou 3 graus, tem sido colocada com freqncia. As prprias Faculdades de Educao comeam a se dar conta nos ltimos anos de que seus currculos no contemplam estudos sobre a problemtica do analfabetismo ou da educao de jovens e adultos, tratada, muitas vezes, como matria espria, com seu desenvolvimento caracterizado por descontinuidades ou como tarefa de perspectiva assistencialista e filantrpica, e no na perspectiva de um direito de cidadania. (Piconez, 1995, p. 37).

Foram identificados nos referenciais tericos tambm os autores marxistas nas anlises histricas de conjuntura e estrutura, sendo os mais destacados Karl Marx (Talavera, 1994; Machado, 1990), Friedrich Engels, Karel Kosik (Machado, 1990), Antonio Gramsci (Talavera, 1994) e Lev Semenovich Vygotsky, que tambm citado quando o estudo se prope um confronto com a teoria piagetiana.

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Uma exceo presena destes referenciais encontra-se no trabalho de Oliveira (1995), que tem como enfoque principal as teorias de Piaget e Vygotsky apropriadas pela Pedagogia. Uma exceo presena destes referenciais encontra-se no trabalho de Oliveira (1994), que, sendo produzido em um departamento de lingstica, utiliza-se de autores especificamente ligados a esta rea.

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Quando a nfase maior dada pratica do professor, so citados Paulo Freire (Christov, 1992; Calvo Hernandez, 1991; Menin, 1994; Prada, 1995; Telles, 1998; Talavera, 1994; Almeida, 1988; Abrantes, 1991; Cruz, 1994; Guidelli, 1996; Campos, 1998), Enrique Pichon-Riviere (Cruz, 1994), Acacia Kuenzer (Coltro, 1994), Carlos R. Brando (Menin, 1994; Prada, 1995; Talavera, 1994), Dermeval Saviani (Piconez, 1995; Talavera, 1994; Machado, 1990; Abrantes, 1991), Menga Ldke (Calvo Hernandez, 1991; Menin, 1994; Piconez, 1995), Marli Andr (Piconez, 1995) e Antonio Novoa (Campos, 1998).(...) a Didtica crtica busca superar o intelectualismo formal do enfoque tradicional, evitar o espontanesmo escolanovista, combater a orientao desmobilizadora do tecnicismo e recuperar as tarefas especificamente pedaggicas, desprestigiadas a partir do discurso reprodutivista. Procura, ainda, compreender e analisar a realidade social onde est inserida a escola. (Abrantes, 1991, p. 25).

Numa discusso mais especfica sobre a prtica do professor a partir da teoria psicogentica, alm de Jean Piaget, Ana Teberosky e Emlia Ferreiro (Calvo Hernandez, 1991; Oliveira, 1995), so utilizados, ainda, os autores Lev Semenovich Vygotsky (Oliveira, 1995), Alexander Romanovich Luria, Marta Kohl de Oliveira, Isilda Campaner Palangana e Vera Maria Masago Ribeiro (Oliveira, 1995).Para Piaget, o conhecimento no pode ser mecanicamente predeterminado pelas estruturas internas do indivduo (apriorismo, ou concepo que delega o conhecimento ao amadurecimento, em etapas organizadas e predeterminadas, de fatores inatos ou programados na bagagem hereditria do indivduo). No pode tambm ser determinado pelos caracteres preexistentes do objeto (empirismo, uma concepo psicolgica que entende a gnese do conhecimento do indivduo como obra da percepo, um carimbo do meio). Tais negativas se devem ao fato de que, para ele, o conhecimento resulta de uma construo efetiva e contnua do indivduo em sua relao com o mundo, e os objetos s podem ser apreendidos como tais pela mediao dessas estruturas. (Oliveira, 1995, p. 10). Segundo Ribeiro (1993), quando Emlia Ferreiro usa a concepo piagetiana de desenvolvimento, afirmando que o processo endgeno, descrito como linha evolutiva, dirige a construo do conhecimento do incio ao fim e que o processo cognitivo realiza-se mediante a experincia direta da criana com o objeto, relega a segundo plano a mediao do adulto ou dos colegas, atravs das informaes, modelos e conflitos proporcionados, restringindo-se a aspectos no essenciais do processo. (Oliveira, 1995, p. 36). atravs das relaes sociais, na interao com outros indivduos, que o homem interioriza as formas de funcionamento psicolgico estabelecidas culturalmente. A cultura, para Vygotsky, um palco de negociaes, onde todos os elementos so carregados de significao e os membros esto em constante recriao e reinterpretao de informaes, conceitos e significados. Portanto, as origens das funes psicolgicas superiores devem ser buscadas nas relaes sociais. (Oliveira, 1995, p. 44).

J os estudos que analisam a prtica a partir das representaes e do imaginrio dos docentes apontam como autores-chave R. Chartier, Gilbert Durand, Bronislaw Baczko, Castoriadis Corbnelius, Maryvonne Saison, Ren Barbier, Gaston Bachelar, Eliade Mircea, Jacques Le Goff, Pierre Bourdieu, mile Durkheim, Bader Buriham Sawaia, Serge Moscovici e D. Jodelet, entre outros.Chartier (1990) discute aspectos importantes sobre as diversificadas representaes das capacidades de ler e de escrever. Para ele, as representaes variam de acordo com as prticas culturais que so construdas histrica e socialmente. No caso da leitura, lembra que, frente ao texto escrito, os leitores no so apenas receptores passivos de informaes mas esto em permanente ao, produzindo uma leitura a partir de sua experincia de vida e das suas referncias culturais. (Souza, 1995, p. 55).

Especificamente sobre formao de professores, so tambm citados Luiz Carlos Freitas e Vera Maria Candau (Piconez, 1995; Abrantes, 1991), Maria das Graas F. Feldens (Menin, 1994),

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Guiomar Namo de Mello (Piconez, 1995; Abrantes, 1991), Antonio Joaquim Severino, Dermeval Saviani (Abrantes, 1991), Zaia Brando (Menin, 1994) e Antnio Nvoa (Piconez, 1995; Campos, 1998). Nesta temtica so includas tambm vrias referncias s discusses que estabelecem vnculo entre teoria e prtica: Selma G. Pimenta, Donald Schn, Leda M. F. Azevedo e Adolfo Sanchez Vazquez.(...) consideramos que as funes do estgio curricular, tais como vm sendo desenvolvidas, parecem refletir um dos sinais mais visveis da contradio que impera em nossa sociedade, o da dicotomia entre teoria e prtica. Os estgios dimensionam mais uma forma de ajuste utilizada para solucionar o problema da defasagem entre conhecimentos tericos e trabalho prtico. difcil encontrar projetos pedaggicos coletivos nos cursos que formam professores integrando uma teoria pedaggica luz de problemas significativos encontrados nas escolas, campos naturais de estgios. (Piconez, 1995, p. 13).

Relacionado especificamente ao fracasso escolar, so referidos os autores Maria Helena S. Patto (Crua, 1994) e Neubauer da Silva (Menin, 1994). No que se refere s reflexes sobre o cotidiano (Prada, 1995), so citados Agnes Heller, Peter Berger e Tomas Luckmann. Por este espectro geral dos referenciais tericos utilizados nestas 20 pesquisas em EJA, podemos constatar a variedade de interseces que so realizadas nesta rea temtica. Isto acaba por revelar uma riqueza em termos de aportes que so utilizados para buscar compreender as prticas e a formao dos professores que atuam em EJA, ao mesmo tempo em que aponta para algumas fragilidades em termos da consistncia e segurana na utilizao de um referencial mais homogneo.

Metodologias de Pesquisa As pesquisas, em sua maioria, se caracterizam como qualitativo-descritivas, tendo, algumas, a tentativa de intervir na realidade analisada, sejam elas desenvolvidas por secretarias de educao e universidades ou em movimentos sociais. Alguns autores classificam seus trabalhos como pesquisa etnogrfica (Oliveira, 1994; Abrantes, 1991), pesquisa participante8 (Prada, 1995), pesquisa-ao (Giubilei, 1993).Sendo o fenmeno educativo quem determina o procedimento metodolgico, a pesquisa qualitativa do tipo etnogrfico foi a mais indicada para essa pesquisa, porque os problemas so estudados no ambiente em que eles ocorrem naturalmente. (Abrantes, 1991, p. 8). Como a inteno desta pesquisa desvelar o fenmeno alfabetizao de adultos tal como ele ocorre, nada melhor que uma abordagem flexvel no seu delineamento, permitindo alteraes sempre que necessrio, da a escolha de uma abordagem qualitativa e com mtodo de coleta de dados centrado na anlise documental, chegando em alguns momentos ao registro de situaes no documentadas. (Calvo Hernandez, 1991, p. 83). Em lugar de acreditar na validade das concluses de pesquisa pela quantidade dos dados ou sujeitos (como tpico da tradio quantitativa positivista), a pesquisa de carter etnogrfico opta pela anlise de um pequeno cosmos, de caracterizao microestrutural, a fim de determinar quais sero as aes dos sujeitos (assumidos individualmente):o que os sujeitos fazem e como se percebem; qual o sentido, para eles, do lugar onde esto e sua funo naquele ambiente; qual o sentido dos papis sociais que ali esto em jogo, etc. (Oliveira, 1994, p. 47). Esta tese desenvolvida considerando enfoques qualitativos e especificamente participativos do pesquisar. Pesquisa entendida como um processo de construo de conhecimento a partir do

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Este trabalho no s utiliza a pesquisa participante como mtodo, mas tambm como objeto de sua anlise; portanto, existe uma vasta indicao de referenciais tericos que embasam a experincia da Colmbia: Paulo Freire, Carlos Rodrigues Brando, Ren Barbier, D. Juan E. Bordenave, Joo Bosco Pinto, Orlando Borba Fals, L. Salvador Moreno, Ivani Fazenda e Nelly Stromquist, entre outros.

Educao de Jovens e Adultos no Brasil 31

saber de experincias feito. Disso decorre que os participantes na pesquisa expressem seus conhecimentos, detectem suas necessidades e interesses como fundamento para contrastar tais conhecimentos com os universalmente sistematizados e comunicados atravs de publicaes bibliogrficas. (Prada, 1995, p. 11).

Os dados so obtidos mediante a observao direta e sistemtica das atividades de sala de aula, alm de entrevistas com professores, alunos, diretores e outros profissionais da escola, complementadas com a anlise dos documentos produzidos, planos de ao, relatrios, ofcios, palestras, programas de governo do Estado e das organizaes da sociedade civil, panfletos, atas e materiais didticos. Finalmente, busca-se a discusso e articulao das informaes coletadas com os respectivos referenciais tericos. Aparecem como autores que do suporte ao uso deste referencial metodolgico: Marli Andr, Menga Ldke, F. Erickson, Augusto Trivinos, Carlo Ginzburg, entre outros. As informaes relacionadas s concepes e prticas dos professores e sua formao so adquiridas por meio de produes escritas dos professores e alunos, relatrios, publicaes das secretarias e anotaes de experincias de formao, questionrios e entrevistas realizadas com tcnicos, coordenadores e professores. H utilizao de reviso bibliogrfica e de anlises de discusses realizadas em conferncias e seminrios. Principais Concluses Presentes nas Pesquisas Nas discusses relacionadas prtica dos educadores populares, retoma-se a necessidade da articulao entre o pedaggico e o poltico na ao educativa que aproxime da realidade da escola; que as teorias de uma atuao transformadora da realidade ultrapassem os discursos e se concretizem nas relaes pedaggicas de professores e alunos, mas, tambm, na atuao dos agentes formadores que procuram intervir nas experincias educativas. Neste sentido, as anlises feitas por Talavera (1994) e Almeida (1988) repem preocupaes significativas das prticas da educao popular que apontam tambm para questes fundamentais nas prticas em geral de todos os educadores de EJA:Na poca, no percebamos qualquer problema terico em nossas formulaes. Agora, porm, fazendo algumas consideraes sobre essas idias no confronto com a prpria orientao terica na qual buscvamos referncia (Paulo Freire), percebemos as contradies, os equvocos e desvios cometidos nessa experincia (Talavera, p. 111). (...) prope-se a retomada da questo pedaggica da educao popular incorporando-se o carter poltico que foi privilegiado na ao dos educadores populares nos anos setenta. justamente esse contedo poltico que permite superar a oposio entre educao popular e educao escolar, e a retomada do carter pedaggico da educao popular que proporciona a distino entre o pedaggico e o poltico. (Almeida, p. 130).

Nas anlises que partiram mais especificamente de experincias escolares, destacamse algumas concluses mais: a) A presena significativa de mulheres na docncia em EJA foi assunto destacado na pesquisa de Coltro.Nota-se maior proporo de mulheres (72%), podendo-se caracterizar o curso noturno (na cidade de Salto-SP) como uma atividade feminina. Isto pode estar relacionado ao fato da carreira do magistrio possibilitar uma maior flexibilidade de acomodao de horrios. (Coltro, 1994, p. 44).

b) A maioria dos professores trabalhou e estudou, mas isso no contribui para que eles se identifiquem com os alunos-trabalhadores do ensino noturno.Em relao ao nmero de professores que trabalharam durante sua formao educacional, importante salientar que 86% dos pesquisados vivenciaram experincias profissionais conjunta-

32 Srie Estado do Conhecimento

mente com os estudos (...). Embora tenham vivenciado a condio de trabalhador-estudante (...), para o professor, o aluno tem a principal parcela de responsabilidade pelo seu fracasso. (Coltro, p. 48, 102-103).

c) O docente ainda apresenta uma viso extremamente preconceituosa em relao ao aluno, pois acredita que ele e responsvel pelo seu fracasso e que somente freqenta a escola porque quer obter o diploma.O aluno trabalhador que freqenta as classes noturnas do supletivo normalmente j passou por vrias experincias escolares. Essas experincias geraram no aluno sentimentos de incapacidade e desvalorizao pessoal. Esses estigmas na escola autoritria so reforados em vrias situaes da prtica pedaggica do professor. (...) A baixa expectativa que o professor tem sobre o aluno tambm refora a sua autodesvalia: aligeirar o contedo, porque o futuro lhe reservou apenas essa chance de estudar; acreditar que esses alunos so menos inteligentes que os da escola particular; imaginar que jamais podero ascender profissionalmente face sua incapacidade intelectual. (Abrantes, 1991, p. 51-52).

d) O imaginrio de alguns educadores encerra uma dimenso imediatista, sendo a prxis funo de um assunto presente que precisa ser contornado. O professor vai experimentando com os alunos, e, nesta troca de experincias, vai, segundo ele, aprendendo a lidar com EJA.Tendo em vista sua formao acadmica bastante deficiente, corre o professor o risco de, nessa prtica, tornar-se razoavelmente capaz de exercer o magistrio de forma honesta e interessada, porm desempenhando o papel de reprodutor do sistema social vigente. (Cruz, 1994, p. 115).

e) A vida profissional do docente no possibilita seu aperfeioamento, seja atravs de estudos ou de cursos. Quando existe, a formao recebida pelos professores insuficiente e inadequada para atender as demandas do ensino noturno e, conseqentemente, da educao de jovens e adultos.(...) um profissional: desestimulado, professor de ensino de segunda classe, desesperado, encara sua tarefa no supletivo como um bico, cansado, sem preparo acadmico, desinteressado e abandonado. (Machado, 1990, p. 79). A opo poltica por trabalhar com estagirios, e no com professores formados, e por criar projetos informais de educao de adultos histrica, e revela mais uma vez o descaso com a educao e, mais especificamente, com a educao dessa parcela to estigmatizada da populao, que so os adultos analfabetos, alm de demonstrar a inexistncia de um projeto poltico consistente sobre a educao no Pas. (Oliveira, 1995, p. 92).

f) Aparece em outros estudos a afirmao de que os professores, apesar dos poucos recursos, mostram-se interessados, alguns se tornando autodidatas, porm sem um conhecimento mais reflexivo e sistematizado, tanto terico como da realidade da clientela e do prprio curso. Para que ocorram mudanas na prtica, deve-se partir dos dados concretos dessa prtica o professor precisa ser estimulado a investig-la e analis-la luz de uma teoria crtica, visando transformar suas concepes.Na perspectiva de se concretizar a vinculao da teoria com a prtica, aponta-se a necessidade de os processos de capacitao trabalharem com a descrio, pelos professores, das atividades que realizam e, aps, eles mesmos procurarem buscar elementos tericos que expliquem e possam permitir-lhes entender melhor as opes metodolgicas que fazem. As observaes que se vm fazendo sobre formas de capacitao podem mesmo nos fazer assegurar que o professor s muda sua prtica quando ele passa por esse processo: analisa a prtica, identifica e avalia a teoria que a sustenta. (Abrantes, 1991, p. 189).

Educao de Jovens e Adultos no Brasil 33

...sejam oriundos dos cursos normais ou de faculdades, os professores do ensino noturno no foram preparados para atuar junto clientela jovem e adulta. Adquirem experincia aprendendo na prtica diria de sala de aula, literalmente na base do ensaio e erro. (...) quando o professor atua nos dois segmentos noturno e diurno , a tendncia dele transportar para o segmento noturno tudo o que ele faz no diurno, como forma de facilitar o seu trabalho. Alguns inclusive defendem esta atitude, alegando elevar o nvel dos alunos, j que o diurno mais forte, e os alunos vo ter que enfrentar os concursos l fora. (Cruz, 1994, p. 38).

g) Em relao ao fazer pedaggico, o que caracteriza a prtica de um bom professor a articulao entre as dimenses poltica, tcnica e humana. Portanto, sua prtica no deve se restringir adoo incondicional de uma teoria (por exemplo, o Construtivismo, onde professores, por desconhecerem aprofundadamente esta teoria, caram ou na apatia do apriorismo ou no ativismo na sala de aula).Vimos nas falas dos professores, supervisores e coordenadores do PMEA a dificuldade de uma prtica pedaggica construtivista, expressa principalmente quando afirmam no saber o que fazer especificamente para ensinar a ler e escrever, que tipos de atividades utilizar, e solicitam do Construtivismo uma posio mais pragmtica. (...) um dos principais fatores causadores dessa dificuldade por parte do professorado a tentativa de traduo linear do Construtivismo para a Pedagogia, que se frustra diante da impossibilidade de se transformar o Construtivismo em mtodo. (Oliveira, 1995, p. 124).

h) Apostar apenas no aprendizado a partir da prtica tem se mostrado um caminho frgil para a construo de referenciais bsicos para EJA. Portanto, vrias pesquisas retomam a necessidade da relao teoria/prtica.Apesar de se reconhecer a riqueza profissional que o professor vai adquirindo na sua prtica em sala de aula, uma prtica pedaggica mais conseqente necessita do preenchimento de uma srie de lacunas na sua formao profissional. Estas lacunas, na verdade, no diferem muito daquelas que vm sendo apontadas pelas pesquisas e pelos educadores. Dentre elas o distanciamento da teoria em relao prtica, o conhecimento ministrado de forma fragmentada, a ausncia de um corpo terico sobre os fundamentos da ed