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 ESTUDO CORRELACIONAL DO PÉ GERIÁTRICO COM REQUISITOS CINÉTICO-FUNCIONAIS título C o r r el at i onal study be t w e e n g e ri at ricf o ot and k i ne t i c - f unc t ional r equir e m e nts  A driana C o r re i a A i k a w a [a] , Sergio Márcio Pacheco Paschoal [b] , Fátima Aparecida Caromano [c] , Carolina Fu [d ] , Clarice Tanaka [e] , Maiza Ritomy Ide [f] [ a ] Mestre em Gerontologia, Serviço de Fisioterapia do Instituto Central do Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), São Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected]. [b ] Doutor em Medicina (Medicina Preventiva) - Serviço de Geriatria do Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), São Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected] [ c] Doutora em Psicologia (Psicologia Experim ental) - Depa rtamento de Fisiotera pia, Fonoa udiologia e Tera pia Ocupa cional, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), São Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected] [d ] Doutora em Psicologia (Psicologia Experime ntal) - Depa rta me nto de Fisiotera pia, Fonoau diologia e Tera pia Ocupa cional, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), São Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected] [ e ] DoutoraemC iênciasM orfofuncionais,Serviço deFisiotera piadoI nstituto Centr aldo Hospital da sClínicaseDepar tam ento de Fisi ot era pia, Fonoaudiologia e Tera pia Ocupacional Faculdade de Me dicina da Uni versidade de o Pau lo (FMUSP), São Pau lo, SP - Bra sil, e-ma il: cltana ka @usp.br [f] Doutora do em Me dicina (Reumatologia ) - Universida de Estad ua l do Oestedo Paraná(UNIOESTE), Casca vel, PR - Bras il, e-ma il: ma izaide@hotma il.com Resumo INTRODUÇÃO : O pé é uma unidade funcional importante no controle da postura, manutenção do equ il íbri o enae xecu çãodos movimentos.Essa sfunçõesdependem daintegridad eana micaef uncionalde suas estrut uras que,comf requê nci a,sã oalt era dascom oenvelheci mento. OBJETIVOS : Identi ficaraltera ções dos pés; verificar requisitos cinético-funcionais (equilíbrio, mobilidade, flexibilidade do tornozelo, força muscular), queda no últ imo anoeacorrelaçãoentreelesecomainci dênciadeque das. MÉTODO :Trata- seum estudo transversal, na qu al partici para m 2 5 indivíduo s (70,68± 4,7 a nos) do Grupo de At endimento Multidisciplinar ao Idoso Ambulatorial do Serviço de Geriatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. Fora mu ti li zados:(i )questionário para identi f icara saltera çõesdospése oco rrência dequ eda s,(ii) f lexí me tro para a flexibilidade do tornozelo, (iii) alcance funcional ântero-posterior e o “Timed get-up and go” para o equ il íbri o,e( iv) testedelevan tar-sentardaca deirapa ram edidaindiretadaforçadosme mbrosinferiores .Foi rea li zadaa náliseestatísticadescriti vadasvariáveiseacorrelaçã o dePea rsonparaverif icaracorrelaçã o entre osdados(p<0,05 ). RESULTADOS :Asalteraç õesma isfrequ entesdospésfo ram :calosi dade snosdedos (80%),rachadurasno scalcanhare s(80%) ,unhasquebradiças,encravada secompri das(76%;32%e28%, respectivamente) e def or midades nos dedos (24%). Unha e ncravada , def or midades no s dedos e unhas que bra diçasa pres enta ra mcorrela ção signif icativ acomafl exibil idadedoto rnozelo direito (r=0,497e p= 0,01parafl exãoer=0,435ep=0,03para extensão) ,t estelev antar- sentar(r=0,451ep=0 ,02) eque das (r=0,459ep=0 ,02), respectivamente. CONCLUSÕES :Háumacorrelaçãoentreasalteraçõesdos pés com os requisitos cinético-funcionais e com a incidência de queda do idoso. A maioria das alterações identi f icadasé pot encialme ntemodificávelatravés dapre vençã o,t rata me nto cura tiv oereabil it açã o. Palavras-chave :Idoso.Pé.Equ il íbrio corporal.Fl exibilida de. Forç am usc ular. ISS N 0103 -515 0 Fisioter. Mov., Curitiba, v. 22, n. 3, p. 39 5-405, jul./ set. 20 09 Licenciado sob uma Licença Creative Commons Fisioter Mov. 20 09 jul/ set;22 (3):395 -40 5

ESTUDO CORRELACIONAL DO PÉ GERIÁTRICO COM REQUISITOS CINETICOS FUNCIONAIS

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ISSN 0103-5150 Fisioter. Mov., Curitiba, v. 22, n. 3, p. 395-405, jul./set. 2009 Licenciado sob uma Licena Creative Commons

ESTUDO CORRELACIONAL DO P GERITRICO COM REQUISITOS CINTICO-FUNCIONAIS ttulo Correlational study between geriatric foot and kinetic-functional requirementsAdriana Correia Aikawa[a], Sergio Mrcio Pacheco Paschoal[b], Ftima Aparecida Caromano[c], Carolina Fu[d], Clarice Tanaka[e], Maiza Ritomy Ide[f]Mestre em Gerontologia, Servio de Fisioterapia do Instituto Central do Hospital das Clnicas, Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP), So Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected]. [b] Doutor em Medicina (Medicina Preventiva) - Servio de Geriatria do Hospital das Clnicas, Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP), So Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected] [c] Doutora em Psicologia (Psicologia Experimental) - Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional, Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP), So Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected] [d] Doutora em Psicologia (Psicologia Experimental) - Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional, Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP), So Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected] [e] Doutora em Cincias Morfofuncionais, Servio de Fisioterapia do Instituto Central do Hospital das Clnicas e Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP), So Paulo, SP - Brasil, e-mail: [email protected] [f] Doutorado em Medicina (Reumatologia) - Universidade Estadual do Oeste do Paran (UNIOESTE), Cascavel, PR - Brasil, e-mail: [email protected][a]

ResumoINTRODUO: O p uma unidade funcional importante no controle da postura, manuteno do equilbrio e na execuo dos movimentos. Essas funes dependem da integridade anatmica e funcional de suas estruturas que, com frequncia, so alteradas com o envelhecimento. OBJETIVOS: Identificar alteraes dos ps; verificar requisitos cintico-funcionais (equilbrio, mobilidade, flexibilidade do tornozelo, fora muscular), queda no ltimo ano e a correlao entre eles e com a incidncia de quedas. MTODO: Tratase um estudo transversal, na qual participaram 25 indivduos (70,684,7 anos) do Grupo de Atendimento Multidisciplinar ao Idoso Ambulatorial do Servio de Geriatria do Hospital das Clnicas de So Paulo. Foram utilizados: (i) questionrio para identificar as alteraes dos ps e ocorrncia de quedas, (ii) flexmetro para a flexibilidade do tornozelo, (iii) alcance funcional ntero-posterior e o Timed get-up and go para o equilbrio, e (iv) teste de levantar-sentar da cadeira para medida indireta da fora dos membros inferiores. Foi realizada anlise estatstica descritiva das variveis e a correlao de Pearson para verificar a correlao entre os dados (p < 0,05). RESULTADOS: As alteraes mais frequentes dos ps foram: calosidades nos dedos (80%), rachaduras nos calcanhares (80%), unhas quebradias, encravadas e compridas (76%; 32% e 28%, respectivamente) e deformidades nos dedos (24%). Unha encravada, deformidades nos dedos e unhas quebradias apresentaram correlao significativa com a flexibilidade do tornozelo direito (r = 0,497 e p = 0,01 para flexo e r = 0,435 e p = 0,03 para extenso), teste levantar-sentar (r = 0,451 e p =0,02) e quedas (r = 0,459 e p = 0,02), respectivamente. CONCLUSES: H uma correlao entre as alteraes dos ps com os requisitos cintico-funcionais e com a incidncia de queda do idoso. A maioria das alteraes identificadas potencialmente modificvel atravs da preveno, tratamento curativo e reabilitao. Palavras-chave: Idoso. P. Equilbrio corporal. Flexibilidade. Fora muscular.Fisioter Mov. 2009 jul/set;22(3):395-405

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AbstractINTRODUCTION: The foot is an important functional unit in the control of posture, balance and maintenance of execution of movements. These functions depend on the anatomical and functional integrity of their structures that often are altered with aging. OBJECTIVES: Identifying foot problems; verify functional requirements (balance, mobility, flexibility of the ankle, muscle strength), report of fall in the last year and the correlation between geriatric foot, kineticfunctional requirements and incidence of falls. METHOD: This is a cross-sectional study in which 25 subjects (70.68 4.7 years) assigned in the Group of Multidisciplinary Care for Elderly of Clinical Hospital participated in this study. To assess geriatric foot conditions and functional requirements it was used: (i) questionnaire to identify the changes of foot and occurrence of falls, (ii) fleximeter to evaluate the flexibility of the ankle, (iii) functional reach anteriorposterior and Timed get up and go to assess balance, and (iv) sit-to-stand test from chair for indirect measurement of strength the lower limbs. Descriptive analysis was performed of the variables and Pearson correlation to check the correlation between the data (p 45). Essa pontuao foi selecionada, pois estudo prvio mostra que o dficit na habilidade funcional apenas evidente em indivduos com grau grave de hlux valgo (10). 2. Requisitos cintico-funcionais Os requisitos cintico-funcionais foram avaliados atravs da aplicao de testes especficos para o equilbrio, mobilidade, flexibilidade do tornozelo e fora muscular pelo fisioterapeuta responsvel. 2.1 Equilbrio: Foi aplicado o teste de Alcance Funcional ntero-Posterior (12) que determina o quanto o indivduo capaz de se deslocar dentro dos limites de estabilidade anterior e posteriormente. Uma fita mtrica foi afixada parede, paralela ao cho, e posicionada na altura do acrmio do indivduo. Os voluntrios foram instrudos a ficar em p, de lado, prximo parede, com os ombros fletidos a 90 e os cotovelos estendidos, punhos posio neutra e os dedos estendidos. Foi solicitado aos indivduos inclinarem-se para a frente (alcance anterior) o mximo possvel, sem perder o equilbrio ou dar um passo. O deslocamento anterior foi verificado em centmetros sobre a fita mtrica. Similarmente, o procedimento foi repetido para avaliar o alcance posterior. 2.2 Mobilidade: Aplicou-se o teste Timed Get-Up and Go (13) que avalia a rapidez do indivduo durante a tarefa de levantar-se de uma cadeira, andar trs metros, retornar e sentar. A rapidez em que o indivduo executa o teste foi verificada atravs do cronmetro. O tempo gasto para realizar o teste est relacionado ao risco da queda: realizar em menos de 20 segundos indica que o paciente tem um risco pequeno de queda, entre 20 e 30 segundos um risco moderado, e mais de 30 segundos um grande risco de queda. 2.3 Flexibilidade do tornozelo: Foi utilizado o flexmetro, que um aparelho que mensura com preciso e praticidade os movimentos angulares de cada articulao. Para a realizao da avaliao da flexibilidade da flexo e extenso do tornozelo o indivduo permaneceu sentado, com os membros inferiores em suspenso, joelho em flexo de 90 graus. O flexmetro foi posicionado na face lateral do p (mdio p), com o mostrador voltado para o avaliador. Solicitou-se aos indivduos a execuo da mxima flexo e extenso do tornozelo verificando-se a angulao registrada no flexmetro. 2.4 Teste de Fora Muscular de Membros Inferiores: O teste Levantar e Sentar uma alternativa prtica para a medida indireta da fora dos membros inferiores, e parte integrante do questionrio Short Physical Performance Battery (14). O indivduo foi orientado a sentarem-se em cadeira, mantendo o tronco ereto, ps apoiados no cho e membros superiores cruzados sobre o peito. Em seguida, o voluntrio foi orientado a levantar-se da cadeira o mais rpido possvel. A tarefa foi repetida por cinco vezes. O tempo total gasto para realizao das cinco repeties do teste foi cronometrado e pontuado. Atribui-se escore 1 para maior que 16,7 seg.; 2 para tempo entre 13,7 a 16,6 seg.; escore 3 para tempo entre 11,2 a 13,6 e o escore mximo, 4 pontos, para tempo menor que 11,1 seg.Fisioter Mov. 2009 jul/set;22(3):395-405

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ANLISE ESTATSTICAPara a anlise estatstica utilizou-se o Software Minitab Statistical para ambiente Windows. Anlise descritiva e correlao de Pearson foram aplicadas s variveis a fim de se identificar as alteraes dos ps e sua correlao com os requisitos cintico-funcionais. O nvel de significncia adotado foi p < 0.05.

RESULTADOSA Tabela 1 apresenta a frequncia e a descrio das variveis coletadas para a caracterizao dos 25 indivduos (70,684,7 anos) avaliados. Os dados referentes s alteraes dos ps encontramse na Figura 1. Todos os indivduos apresentaram grau predominantemente moderado de hlux valgo, similar nos dois antmeros, 60% e 64% respectivamente direita e esquerda e nenhum com grau grave. Cerca de 40% relataram ter cado pelo menos uma vez no ltimo ano. Dos idosos avaliados, 40% referiram ter dor nos ps, principalmente quando usam calados fechados; 24% tm dificuldades para lavar os ps e 84% adotam algum cuidado com estes, como cortar as unhas (56%), hidratar (40%), ir ao podlogo (12%) e tratar da onicomicose (4%).TABELA 1 - Caracterizao da amostra (n=25)Variveis Sexo Cor Feminino Masculino Branco Negro Mulato Casado Vivo Divorciado Nunca foi casado n 16 9 21 1 3 17 5 2 1 % 64 36 84 4 12 68 20 8 4

Estado Civil

FIGURA 1 - Frequencia das alteraes dos ps geritricos (n=25)

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A Tabela 2 apresenta a mdia e desvio-padro das variveis referentes aos requisitos cintico-funcionais avaliados.TABELA 2 - Mdia e desvio-padro dos requisitos cintico-funcionais avaliadosVarivel (unidade de medida) Direito Flexo do Tornozelo (graus) Extenso do Tornozelo (graus) TUG* (seg.) Fora Muscular (seg.) Alcance Funcional Anterior (cm) Alcance Funcional Posterior (cm)* TUG= Timed Get Up and Go

Mdia e Desvio-Padro Esquerdo 21,528,73 15,528,41 9,551,11 11,183,37 15,967,18 11,044,74

18,68,31 18,247,26

As Figuras 2 a,b e c referem-se s correlaes encontradas entre alteraes dos ps e requisitos cintico-funcionais. Verificou-se tambm correlao significativa entre a ocorrncia de quedas com a presena de unha quebradia (r = 0,459 e p =0,02).

FIGURA 2 - BoxPlot entre o movimento de extenso do tornozelo direito com presena de unha encravada (r= 0,497 e p=0,01); b) BoxPlot entre o movimento de flexo do tornozelo direito com presena de unha encravada (r= 0,435 e p=0,03); c) BoxPlot entre o teste de levantar-sentar e deformidades nos dedos (r= 0,451 e p=0,02)

DISCUSSOA primeira proposta deste estudo foi identificar as alteraes dos ps. As alteraes dermatolgicas e deformidades do p geritrico podem advir de problemas decorrentes de doenas sistmicas, de negligncia no cuidado com os ps ou mesmo por causa da marcha inadequada, traumatismos ou calados desconfortveis (2, 3, 7). A prevalncia de problemas nos ps aumenta com o avano da idade: 3% dos idosos entre 65 e 69 anos contra 13% dos com mais de 85 anos de idade (15), entretanto, no h um consenso na frequncia das alteraes reportadas nos ps. A falta de uniformidade dos instrumentos utilizados e a diversidade regional da populao estudada possivelmente expliquem a disparidade. A Tabela 3 demonstra as frequncias comparativas entre os vrios estudos e o presente.

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Estudo correlacional do p geritrico com requisitos cintico-funcionaisTABELA 3 - Comparao das frequncias das alteraes entre os vrios estudos e o presenteVariveis Dunn et al., 2004 (6) Rachaduras nos calcanhares Calosidades Unhas Quebradias Onicomicose P Plano Unhas Encravadas Unhas Compridas Deformidades nos dedos P Cncavo Frieira Bolhas nos dedos Halux Valgo Grau Leve Halux Valgo Grau Moderado Halux Valgo Grau Grave* NP no pesquisado

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% Menz et al., 2001 (10) NP 14 (dedos)31 (plantar) NP NP 2,23 NP NP 49 NP NP NP 52 37 17 Rocco, 2000 (3) NP 48 (ignorado) 53 NP NP NP 32 13 NP NP NP NP 31 NP Aikawa et al., 2008 (27) 80 80 (dedos) 76 68 52 32 28 24 20 16 NP 38 62 NP

14 58,2 (dedos) 65,2 22,4 19 7,4 40,4 60 5,2 14 37,1 NP NP NP

Calosidades so zonas de hiperqueratose reacional que ocorrem em local de proeminncia ssea depois de muito tempo de excesso de presso e atrito (2). Essa condio pode ocasionar dor e dificuldade para deambular, podendo ainda ulcerar e infectar-se. Transtornos trficos das unhas como unhas encravadas e quebradias so frequentes e muitas vezes esto associadas limitao para cuidar dos seus ps por dificuldade visual, diminuio da mobilidade articular e transtornos da coluna. Entretanto, muitos idosos desconhecem a importncia dos cuidados bsicos, como, por exemplo, cortar as unhas ou ir ao podlogo, e sofrem desnecessariamente, prejudicando o seu dia-a-dia. A unha encravada uma afeco em que os bordos da unha invaginam na pele adjacente e pode ser por uso do calado apertado e inadequado e ao hbito de cortar a unha em curva com bordos curtos (16). sabido que 36% dos idosos tm dificuldade de cortar as unhas dos ps e que aps a ocorrncia de queda este ndice aumenta para 49% (17). Unha quebradia, revelada em 76% dos idosos avaliados, uma condio pela qual a unha descama e se quebra com facilidade, tendo como causa a desidratao extrema da unha ou a onicomicose no tratada. importante ressaltar que a onicomicose frequente no idoso (18) e foi identificada em 68% dos idosos avaliados. Os fatores que podem contribuir para o aumento da prevalncia de onicomicose na populao mais idosa incluem a taxa reduzida de crescimento da unha e o aumento de trauma em relao ao grupo mais jovem, oferecendo ao organismo maior oportunidade de causar doena no leito ungueal e de invadir a lmina ungueal (19). As deformidades nos dedos so frequentes entre os idosos (20) e o hlux valgo a principal alterao. O hlux desempenha um papel essencial no desenvolvimento do passo. Indivduos com grau moderado a severo de hlux valgo apresentam uma reduo significativa da velocidade e do comprimento do passo durante a marcha em superfcies irregulares contribuindo para a instabilidade e risco de quedas na populao idosa (1). A segunda proposta deste estudo foi verificar requisitos cintico-funcionais como equilbrio, mobilidade, flexibilidade do tornozelo, fora muscular, queixa de dor e a frequncia de queda no ltimo ano.

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Equilbrio: O teste de alcance funcional (AF), que mensura os limites de estabilidade em p, revelou em nosso estudo valores menores do que a reportada por Silveira et al. (21). Nossos resultados podem ter sido influenciados por fatores como o tipo de estratgia utilizada para a realizao do alcance (22) (tornozelo, quadril e misto), flexibilidade das articulaes do tornozelo e quadris, fora muscular de membros inferiores (21). Mobilidade: A mobilidade um requisito da funo fsica indispensvel para a deambulao, para a preservao da independncia e da capacidade funcional. Nosso estudo revelou mdia de 9,55 segundos para a realizao do TUG. Segundo Posiadlo & Richardson (13), tempos inferiores a 20 segundos indicam risco pequeno de queda. Flexibilidade de tornozelo: O movimento de flexo do tornozelo essencial nas atividades funcionais como o levantar-sentar de uma cadeira e subir-descer degrau (23). Estudo prvio revela que a idade teve um efeito significativo no movimento de flexo do tornozelo, ou seja, quanto mais velho o indivduo, menor a flexibilidade, alm de existir uma correlao inversa significativa entre o movimento de flexo com a incidncia de quedas. Idosos que relataram mais de duas quedas no ltimo ano apresentaram uma diferena de cerca de oito graus de flexibilidade a menos comparados com os no caidores (24). A integridade da flexibilidade do tornozelo e a manuteno da fora dos msculos flexores e extensores do tornozelo permitem a gerao de fora eficaz e execuo de estratgia de movimento corporal adequada para marcha, equilbrio e preveno de queda, bem como a marcha funcional (24). Fora muscular: Os idosos avaliados terminaram o teste de levantar e sentar da cadeira em 11,18 segundos, tempo este muito prximo ao correspondente ao escore mximo (escore 4, 11,1 segundos), indicando bom desempenho fsico. Os movimentos envolvidos nesta tarefa so movimentos incorporados no cotidiano e a independncia para sua realizao importante para a prtica de outras atividades do dia-a-dia (25). Dor: Dor nos ps foi relatada em 40% dos indivduos avaliados, principalmente quando usam sapatos fechados. Muitos idosos tendem a no identificar a dor nos ps como um problema a ser relatado e apenas um tero dos pacientes com dor recebem cuidados adequados, indicando a necessidade de enfocar um atendimento especfico aos ps para melhorar a dor nesta regio (26). Queda: 40% dos idosos relataram ter tido pelo menos uma queda no ltimo ano, em concordncia com os achados na literatura (27). A frequncia de quedas em pessoas idosas certamente mais alta do que reportada, uma vez que os idosos as entendem como um acontecimento inevitvel no processo de envelhecer e normalmente no as relatam, a menos que interrogados. A queda pode ser considerada um evento sentinela na vida de uma pessoa idosa, um marcador potencial do incio de um importante declnio da funo ou um sinal de uma nova enfermidade. A terceira proposta deste estudo foi verificar a correlao entre as alteraes dos ps, requisitos cintico-funcionais e a incidncia de quedas. Os resultados deste estudo demonstraram correlao significativa de unha encravada com flexibilidade do tornozelo direito, deformidades nos dedos com o teste levantar-sentar e unha quebradia com presena de queda no ltimo ano. Nosso estudo revelou que a presena de unha encravada se correlaciona com a diminuio da flexibilidade de tornozelo. Assintomticas no incio, com o decorrer do tempo podem causar dor, especialmente com o uso de calados inadequados. O uso de calados incorretos est fortemente associado com dor e patologias no ante-p (28). A cronicidade desta situao pode acarretar, no lado acometido pela unha encravada, alterao da marcha e diminuio da mobilidade do tornozelo, com prejuzo de sua flexibilidade flexo e extenso. Nossos resultados revelaram, ainda, que a presena de deformidades dos dedos se correlaciona com o aumento do tempo do teste de levantar-sentar; a falta de alinhamento dos dedos reduz a informao sensorial sobre a posio dos ps, podendo afetar o equilbrio corporal e ocasionar uma instabilidade mecnica durante a propulso (10). Durante a postura ereta, os indivduos idosos exercem uma maior presso nos seus dedos do que os indivduos jovens, possivelmente numa tentativa de intensificar as informaes sensoriais para a manuteno do equilbrio (29).Fisioter Mov. 2009 jul/set;22(3):395-405

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Nesta pesquisa, a presena de unha quebradia foi a nica varivel que teve correlao com o ndice de quedas. A onicomicose pode causar dor e desconforto tornando difcil permanecer em p ou caminhar. Indivduos com idade superior a 60 anos apresentam onicomicose devido baixa imunidade, associao de vrias doenas e ingesta de diversos medicamentos que debilitam o organismo (30). Sabe-se que o uso crnico e concomitante de vrios medicamentos um risco de queda muito relatado na literatura (31). Dollinis et al. (32) relataram tambm que a presena de calos e bolhas nos ps foi um fator independente para risco de queda, sugerindo que outras alteraes encontradas nos ps podem ser fatores de risco para queda. Nossos resultados permitem melhor conhecer as caractersticas do p geritrico e a importncia da avaliao detalhada dessas alteraes por causa de seu impacto funcional. A maioria das alteraes dos ps e dos requisitos cintico-funcionais avaliados potencialmente modificvel recomendando-se a incluso desses itens nos programas de preveno, tratamento e reabilitao de idosos. Aspectos de limitao deste estudo como a falta de padronizao do questionrio das alteraes dos ps e um nmero maior de participantes podem ser considerados para futuros estudos, possibilitando conhecimentos mais amplos sobre o p geritrico e sua influncia nas limitaes funcionais dos indivduos idosos.

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