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Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental ~ v.13, n.3, p.341-345, 2009 '.~~ Campina Grande, PB, UAEAlUFCG - http://www.agriambi.com.br íarnbl Protocolo 113.07 - 13/07/2007 • Aprovado em 12/11/2008 agnam I Avaliação de vidro reciclado granulado como meio filtrante de herbicidas em meio aquoso Odilio B. G. Assis' & Delia do C. Vieira' RESUMO Neste trabalho resultados e considerações sobre o uso de vidro reciclado na forma de material granulado, como poten- cial meio filtrante para remoção de agrotóxicos diluídos em água são apresentados. Para esta avaliação garrafas e vasi- Ihames de vidro transparente foram fragmentados e moídos até partículas com tamanhos inferiores a 1 mm e ensaios de filtração gravitacional realizados em colunas, em escala laboratorial. O herbicida atrazina foi escolhido como contami- nante em virtude de ser um composto altamente tóxico e amplamente empregado no Brasil. Análises por cromatografia gasosaindicam a retenção de agrotóxicos pelo meio poroso, em todo o intervalo de concentrações avaliadas (0,5; 1,0; 3,0; 10 e 15 mg L-')_O vidro apresentou-se corno material de fácil manuseio e potencialmente atraente para uso como meio coadjuvante em filtragem lenta. Palavras-chave: filtração, meio poroso, atrazina, remediação ambiental Evaluation of crushed recycled glass as a filtration médium of agrotoxic materiais in aqueous media ABSTRACT In this paper results and consideration about the use of recycled glass, as a granulated medium for filtration interaction with diluted agrotoxic materiais in water, are presented. For this purpose, transparent bottles and glass containers were first fragmented and than crushed into pieces with sizes < 1 mm. Gravitational filtration tests were carried out in columns, in laboratorial scale. The herbicide atrazine was chosen as a standard contaminant due to its high toxicity and intensive use in Brazil. The results, from gas chromatography analysis, showed that the contamination was retained by the porous medium over ali rangesof concentration (0.5, 1.0,3.0, 10 and 15 mg V'), which was dependent on the initial contamination degree. With regard to glass as a raw material, it showed itself to be a quite amenable material, potentially attractive for uses as a coadjutant medium in slow filtration. Key words: filtration, porous medium, atrazine, environmental remediation 1 Embrapa lnstrumentação Agropecuária. Rua XV de Novembro, 1452, CEP 13560-970, São CarJos, SP. Fone: (16) 2107-2800, Fax: (16) 2107-2902. E-mails:[email protected];[email protected]

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Revista Brasileira deEngenharia Agrícola e Ambiental

~ v.13, n.3, p.341-345, 2009'.~~ Campina Grande, PB, UAEAlUFCG - http://www.agriambi.com.br

íarnbl Protocolo 113.07 - 13/07/2007 • Aprovado em 12/11/2008agnam I

Avaliação de vidro reciclado granulado como meio filtrantede herbicidas em meio aquoso

Odilio B. G. Assis' & Delia do C. Vieira'

RESUMO

Neste trabalho resultados e considerações sobre o uso de vidro reciclado na forma de material granulado, como poten-cial meio filtrante para remoção de agrotóxicos diluídos em água são apresentados. Para esta avaliação garrafas e vasi-Ihames de vidro transparente foram fragmentados e moídos até partículas com tamanhos inferiores a 1 mm e ensaios defiltração gravitacional realizados em colunas, em escala laboratorial. O herbicida atrazina foi escolhido como contami-nante em virtude de ser um composto altamente tóxico e amplamente empregado no Brasil. Análises por cromatografiagasosa indicam a retenção de agrotóxicos pelo meio poroso, em todo o intervalo de concentrações avaliadas (0,5; 1,0;3,0; 10 e 15 mg L-')_O vidro apresentou-se corno material de fácil manuseio e potencialmente atraente para uso comomeio coadjuvante em filtragem lenta.

Palavras-chave: filtração, meio poroso, atrazina, remediação ambiental

Evaluation of crushed recycled glass as a filtration médiumof agrotoxic materiais in aqueous media

ABSTRACT

In this paper results and consideration about the use of recycled glass, as a granulated medium for filtration interactionwith diluted agrotoxic materiais in water, are presented. For this purpose, transparent bottles and glass containers werefirst fragmented and than crushed into pieces with sizes < 1 mm. Gravitational filtration testswere carried out in columns,in laboratorial scale. The herbicide atrazine was chosen as a standard contaminant due to its high toxicity and intensiveuse in Brazil. The results, from gas chromatography analysis, showed that the contamination was retained by the porousmedium over ali rangesof concentration (0.5, 1.0,3.0, 10 and 15 mg V'), which was dependent on the initial contaminationdegree. With regard to glass as a raw material, it showed itself to be a quite amenable material, potentially attractive foruses as a coadjutant medium in slow filtration.

Key words: filtration, porous medium, atrazine, environmental remediation

1 Embrapa lnstrumentação Agropecuária. Rua XV de Novembro, 1452, CEP 13560-970, São CarJos, SP. Fone: (16) 2107-2800, Fax: (16) 2107-2902.E-mails:[email protected];[email protected]

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342 Odilio B. G. Assis & Oelia do C. Vieira

INTRODUÇÃO

Os agrotóxicos são determinantes para a boa produtivi-dade na atividade agrícola, seja para o controle de pragas,doenças, plantas daninhas ou para regular os processos fisi-ológicos das plantas; seu uso, contudo, tem sido muitas ve-zes, irracionalmente empregado na lavoura, em proporçõescomumente superiores às ideais, causando impactos e danosambientais de difícil remediação. Um dos principais malesdo uso incorreto desses insumos é, sem dúvida, a contami-nação do meio ambiente com sérias implicações à saúdehumana. Segundo Ueta et aI., (I999), calcula-se que só cer-ca de 0,1% dos agroquímicos atinja o alvo específico enquan-to os restantes 99,9% da aplicação têm potencial para semover em diferentes compartimentos ambientais, tais comosolo e águas subterrâneas. Os chamados POPs (PoluentesOrgânicos Persistentes, Persistent organic pollutants), con-sistem na classe de agrotóxicos que, por não se ligarem àspartículas de solo, apresentam a maior probabilidade de con-taminação. Vários POPs, notadamente alguns agrotóxicosorganoclorados, como o DDT e o HCH, têm sido completa-mente banidos do uso agrícola na maioria dos países desen-volvidos (Lisboa, 2002). Embora o Brasil figure entre os trêsmaiores consumidores mundiais de defensivos agrícolas, sórecentemente definiu uma legislação específica sobre o usoracional dos organoclorados (Cruz, 2007).

Uma das piores conseqüências do uso excessivo de agro-tóxicos decorre da lavoura irrigada cujas águas, contendo osresíduos químicos diluídos, infiltram com facilidade no soloatingindo lençóis que correm para mananciais superficiais,contaminando águas muitas vezes destinadas ao uso animale humano (Tomita & Beyruth, 2002).

A remoção de agrotóxicos do meio aquoso não consisteem processos triviais. As moléculas são diminutas e se asso-ciam facilmente à água, o que não permite uma remoção porfiltração lenta (Coelho, 2003). Sistemas mais eficazes, comoos de osmose reversa, filtros CAG adsorvedores ou disposi-tivos de biofiltragem, são consideravelmente mais dispendi-osos e complexos inviabilizando o uso em larga escala; nes-te sentido, o desenvolvimento de metodologias alternativas,de baixo custo, ainda que com eficiências inferiores torna-se, sem dúvida, de interesse e potencialmente estratégicascomo recurso coadjuvante.

Recentemente, vidros fragmentados, como o PGA tpulve-rized glass aggregate), têm sido satisfatoriamente avaliadosem sistemas de purificação em larga escala, como em leitode filtração lenta, como uso alternativo à areia (Piccirillo &Letterman, 1997; Rutledge & Gagnon, 2002). O vidro, alémde ser 20% mais leve que a areia, apresenta melhor empa-cotamento em função do formato angular de suas partícu-las, o que gera uma retenção mais eficiente sem perdas napermeabilidade (CWC Publication, 1997).

Uma característica fundamental dos materiais vítreos é queeles podem sofrer alterações das propriedades físico-quími-cas superficiais, como a modificação ou implante de gruposfuncionais, que alteram a hidrofilicidade ou mesmo promo-vam mudanças para um comportamento hidrofóbico, o queé conseguido por tratamentos químicos relativamente sim-

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pies (Chartier, 1997). Esses tratamentos intensificam as in-terações com compostos orgânicos, tomando o vidro defini-tivamente um material de interesse para a confecção de dis-positivos de adsorção e retenção superficial, como membranasou meios ativos para uso em microfiltração.

A este cenário se soma que cerca de 7,5% em peso dototal de lixo doméstico gerado no mundo correspondem avidros descartados (garrafas, vasilhames diversos, vidrosplanos da construção civil etc.) Para se ter uma idéia nu-mérica dessa quantidade, os EUA consomem, em média, umvolume de embalagens de vidro superior a 30 kg hab! ano-I(Malisch et aI., 1975) e no Brasil esses valores são estima-dos em algo como 6 kg per capita por ano (Rodrigues &Peitl, 1999) o que, de forma geral, traduz em milhares detoneladas de resíduos vítreos diariamente rejeitados e acu-mulados como lixo, ou seja, consiste de um material abun-dante e praticamente gratuito.

A unidade da Embrapa Instrumentação Agropecuária emSão Carlos, SP, já há algum tempo, tem avaliado potenciaisusos para o vidro reciclado, sobretudo na confecção de dis-positivos de pequeno porte para filtração de água, de baixocusto e de fácil confecção, para uso geral e em particular nazona rural (Divino et aI., 1998; Assis et aI., 2001; Assis,2006). O propósito do presente estudo é avaliar pós de vi-dro, produzidos a partir de material reciclado, como meioalternativo de interação e filtração de herbicida diluído emágua potável.

MATERIAL E MÉTODOS

Produção dos pós de vidroA matéria prima constituiu-se de garrafas transparentes,

de mesma origem, cuja composição química média, expres-sa em massa, é: Si02 (72,8%); Na20 (13,2%); CaO (11,2%);MgO (0,16%); AI203 (2,13%); FeOIFe203 (0,039%); K20(0,09%), segundo determinação da Saint-Gobain (CentroTécnico de Elaboração do Vidro). As garrafas foram previa-mente lavadas, secadas em estufa e manualmente fragmen-tadas em partículas da ordem de 1,5 cm; este material foi,em seguida, .reduzido a pó em moinho de bolas de alumina,em rotação de 36 RPM por I h. A morfologia e a dimensãoaproximada dos grãos foram avaliadas por microscopia ele-trônica de varredura (Philips XL 30).

As superfícies vítreas sofreram tratamento químico como objetivo de limpar e elevar reatividade da superfície. Se-guiu-se a seqüência proposta por Kern (1993), conhecidacomo técnica "piranha", que consiste na imersão dos pós emuma solução de H2S04/H202 (7:3 v/v). O sistema é entãoaquecido até início de fervura e depois de resfriado condu-zido para limpeza no ultra-sorn, durante 40 min; após esteperíodo o material é exaustivamente lavado com água pura,seguido de imersão em solução de H20INH40HlH202 (5:1:1v/v/v) e novamente limpos com água.

Ensaios de filtragem e análiseOs ensaios de adsorção foram realizados por fittragem

gravitacional de soluções aquosas contaminadas por

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passagem em colunas com o material fragmentado. Ele-geu-se o agrotóxico atrazina como contaminante padrão,já que se trata de um herbicida amplamente empregadono Brasil, no controle geral de ervas daninhas, em parti-cular na plantação de cana-de-açúcar e milho, sendo umcomposto de alta mobilidade e persistência, danoso à saúdehumana e facilmente lixiviado para a água.

Frações próximas a 70 g de vidro moído foram acondi-cionadas em colunas de I polegada de diâmetro interno. Sé-ries de quatro colunas foram preparadas para cada ensaioobjetivando-se a coleta de dados estatísticos. Soluções aquo-sas de atrazina, a partir de produto de origem comercial(Ciba-Geyg, com o nome fantasia Gesaprim 500), forampreparadas nas concentrações de 0,5; 1,0; 3,0; 10 e15 mg VI a partir de solução estoque, em pH próximo a 3,5;a vazão foi de aproximadamente 35 mL min+, para um aflu-ente total de 300 mL.

A quantificação da atrazina, tanto inicial quanto após apassagem pelas colunas, foi estabelecida por cromatogra-fia gasosa pela extração em fase sólida (cartuchos C-18 pre-viamente ativados com acetato de etila); as análises por cro-matografia foram realizadas nas seguintes condições: i)detector fósforo/nitrogênio; ii) coluna capilar de metil-si-loxano; iii) injetor e detecto r operados a 300°C; iv) colu-na com programação de temperatura: inicialmente a 100°Cpor 2 min, seguido de aquecimento até 300°C com umataxa de aquecimento de 10°C rnirr ', permanecendo 10 minnessas condições; v) volume injetado de 2 mL e vi) gás dearraste: hidrogênio sob um fluxo 1,0 mL mirr ' Empregou-se equipamento Hewlwtt Packard 5890, série lI.

As concentrações das amostras foram estabelecidas a par-tir da curva de calibração ajustada à equação: 5,812 x 10-5x [Ap] com um coeficiente de correlação r = 0,9985 e a per-centagem removida estabelecida pela diferença entre a con-centração da solução controle (Apo) e a concentração da so-lução após a filtragem (Apr).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Figura I apresenta o aspecto dos pós, em amostra mo-ída, sob microscopia eletrônica de varredura, sendo possí-vel visualizar a distribuição de formatos e tamanhos gera-dos no período de moagem. De modo geral, os pós de vidrofragmentados e moídos não seguem um padrão definido deformato e apresentam dimensões variadas e em média in-feriores a 100 mm, ou seja, se constituem de partículas con-sideravelmente finas. Embora segundo Driscoll (1986), paraa formação adequada de um leito é desejável certo grau deuniformidade das partículas para que seja minimizada asegregação de material durante o fluxo sob pressão, varia-ções de formatos, por sua vez, garantem um empacotamentomais denso, configurando um meio com maior área de in-teração. Tipicamente, partículas em formatos regulares emais arredondadas configuram um meio com porosidademais uniforme porém com menor tortuosidade que as ob-servadas para empacotamento com materiais com caracte-rísticas angulares (Thovert et aI., 1993). Um percurso maior

do fluido durante o processo de filtração pode elevar a ca-pacidade de retenção, sobretudo quando o principal meca-nismo de remoção se dá por interações superficiais (Assis& Claro, 1999).

A Figura 2 ilustra um crornatograma típico referente àatrazina em solução, na concentração de 1mg L-I de herbi-cida, com um único sinal em 13,56 min, correspondendo aotempo de retenção da amostra no sistema e tomado comopadrão para as análises. Na Figura 3 estão organizados osresultados de retenção medidos.

De modo geral, há boa reprodutibi\idade entre as diver-sas colunas experimentadas indicando que, quanto maior acontaminação inicial menor é a proporção relativa de agro-tóxico retido o que, de certa forma, é evidente, pois há satu-ração da capacidade de adsorção superficial, que é o princi-pal mecanismo de filtragem neste caso, sendo que o volumede material particulado foi o mesmo para todas as colunas.

A atrazina (6-cloro-N-etil-N' -(1-metiletil)-1 ,3,5-triazina-2,4 diamina), de fórmula química CgHI4CINs, pertencente àfamília das s-triazinas (estrutura de anel simétrica), é carac-terizada por um aromático heterocíc\ico clorado e N-alqui-lado, compostos receptores de prótons e se tornam carregados

40

30

> 20E

10

8 16 1810 12 14Tempo(min)

Figura 2. Cromatograma padrão obtido para a atrazina em solução

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16

14

12~~ 10'"".~ 8•..o.'"o- 6'"•..u,

4

2

OO 1682 4 6 10 12 14

Concentração Inicial - Afluente (mg L')

Figura 3. Frações retidas de herbicida em função da concentração inicialpor filtração em coluna com material vítreo granulado

positivamente quando colocados em meio aquoso (Ahlrichset aI., 1974; Khan, 1980), principalmente próximo do seupKa (1,70). Segundo Dombek et aI. (2001), dependendo dapureza do herbicida, de 5 a 30% das moléculas de atrazinapodem estar no estado protonado em pHs entre 2 e 3, ou seja,há forte possibilidade de ocorrência de interação com os de-mais compostos ionizados ou grupos superficiais devido àpresença de cargas; entretanto, interações hidrofóbicas, as-sim como as ligações de hidrogênio e formação de comple-xos, evidentemente devem ser consideradas; a superficie dovidro é composta de ligações siloxanas (Si-O-Si) e sobretu-do por grupos silanóis (SiOH); os grupos silanóis se distri-buem aleatoriamente na superficie e são por demais polares,embora na presença de água se possam dissociar gerandoestruturas com cargas superficiais, segundo uma reação sim-ples do tipo (Sinton & Lacourse, 2001):

(Si-O-R),kIro + H,O ~ (Si-O-H),,,,,, + R+ + OI-r ~h,,1o

Em razão de sua inespecificidade, os radicais hidroxi-Ias (OH), presentes nos grupos silanóis, reagem com gran-de variedade de compostos, majoritariamente com compos-tos orgânicos presentes em meio aquoso (Czaplicka, 2006).De acordo com Cheney et aI. (1998), ao avaliarem a ad-sorção de atrazina dissolvida sobre superficies de óxido demanganês (Mn02), que possui estrutura similar ao vidro(Si02), os autores concluíram que as moléculas de atrazi-na apresentam forte tendência de transferência de prótonscom o nitrogênio do anel na posição três e com os gruposaminos; portanto, esses grupos podem unir o herbicida àsuperficie ácida dos óxidos metálicos, facilitando a trans-ferência de cargas. Em uma primeira etapa da reação dá-se a oxidação parcial da atrazina por troca de elétrons comos sítios na superfície reativa do óxido. Resultados simila-res foram observados para a interação da atrazina com óxi-dos presentes no solo (Kovaios et aI., 2006). Ringwald &Pemberton (2000), realizaram um estudo sobre a adsorçãode compostos aromáticos e heteroaromáticos com a super-ficie da sílica (Si02) hidratada e desidratada concluindo que

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interações do tipo ligação de hidrogênio predominam naadsorção de compostos aromáticos devido à protonação donitrogênio (N) do anel, que resulta em espécies tipo ácidode Bronste, ou seja, os resultados indicam que os grupossilanóis da superfície vítrea são os sítios responsáveis pelaadsorção desses compostos, podendo-se propor um mode-lo, como o apresentado na Figura 4.

~ ..-+- Silanois. Ividro

I

I

~ lC ~vidro

t,~ +- Silanois

IFigura 4. Representação esquemática da retenção do herbicida atrazinasobre superfícies vítreas, tendo por base as considerações de Ringwald &Pemberton (2000)

Para ser eficiente, em processo de filtragem requer a açãoconjunta de diversos mecanismos, principalmente o de ofe-recer uma barreira fisica a patógenos e impurezas dimensi-onais; neste aspecto e embora não avaliado neste estudo, umleito de vidro granulado deve apresentar certa eficiência de-vido à natureza angular de suas partículas; neste sentido, osgrãos de vidro apresentam maior área de filtragem, fato quepode ser explorado como capacidade de retenção, o que podeser superior aos silicatos arenosos convencionais. Outro as-pecto interessante no vidro é a possível redução do "biofou-Iing", isto é, do entupimento gerado pelo acúmulo de mate-rial biológico retido na superfície do meio. Avaliaçõesrealizadas pela Dryden Aqua na Grã-Bretanha, mostram quevidro particulado reduz significativamente o problema de bi-ofouling em leitos de filtração rápida em grande intervalo.de pressões (Dryden Aqua Ltd., 2004).

O que deve ser observado com certo critério, é o fato deque o vidro tem densidade menor que a areia o que pode,em movimentos circulatórios intensos, gerar movimentaçãoe reacornodação, alterando as características originais do

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leito; granulado de vidro, contudo, pode ser facilmente pro-cessado e classificado em diversas dimensões satisfazendodiversas aplicações em filtragens.

CONCLUSÕES

1. De modo geral se vê, em função das característicasexaminadas, que a aplicação de vidro moído pode vir a serpromissora não apenas do ponto de vista econômico mastambém como meio coadjuvante de filtragem, sobretudo naremediação de água industriais.

2. Avanços podem ser conseguidos alterando o tamanhode partículas (maior área superficial para interação), o quepode elevar a eficiência do processo.

3. O uso de pós de vidro reciclado pode ser particular-mente interessante na remoção de contaminantes em baixasconcentrações, conforme resultados obtidos.

AGRADECIMENTOS

Os autores são gratos à FAPESP e à EMBRAPA, pelosrecursos disponibilizados.

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