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Página 1 de 38 EVOLUÇÃO CULTURAL AO LONGO DO SÉCULO XX AS MUDANÇAS COMPORTAMENTAIS E NO PENSAMENTO CIENTÍFICO NAS PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉCULO XX As transformações da vida urbana O século XX foi o século das grandes cidades. Nas vésperas da Primeira Guerra Mundial, contavam- se, na Europa, 180 aglomerados urbanos com mais de 100.000 habitantes, e alguns, como Londres, Paris, Moscovo ou Berlim, atingiam já uma escala gigantesca, congregando vários milhões de almas. Pela primeira vez na História, no mundo industrializado, a população urbana superou a das zonas rurais. Esta urbanização maciça, que não parou de se acentuar, operou transformações profundas na vida e nos valores da civilização ocidental. Desenvolve-se uma nova sociabilidade. Na grande cidade, o indivíduo perde-se no meio da multidão. A vida despersonaliza-se e, tal como os produtos da indústria, segue um modelo estandardizado: os citadinos dirigem-se para o trabalho à mesma hora, partilham os mesmos transportes, consomem os mesmos produtos, habitam casas semelhantes e mesmo os lazeres tendem para a massificação. Nos tempos livres, são muitos os que convergem para os lugares públicos, invadindo os cafés, as esplanadas, os cinemas, os salões de baile, os recintos de espetáculos desportivos. O crescimento da classe média e, sobretudo, a melhoria do nível de vida proporcionam uma nova cultura do ócio, que a cidade fomenta, oferecendo inúmeras distrações. A anterior ênfase no trabalho vê- se, pouco a pouco, substituída pelo prazer do consumo e pela ânsia de divertimento. A convivência entre os sexos, outrora contida por rígidas convenções sociais, torna-se mais livre e ousada. Sobretudo após o primeiro conflito mundial, a mulher adquire visibilidade: sai para ir às compras nos grandes armazéns, para tomar chá e refrescos, para ir à praia, para dançar num clube noturno. O advento do automóvel alarga estes espaços de lazer e incute o gosto pela velocidade. Quem pode desloca-se com frequência, de carro ou de comboio, quer para um dia passado nos arredores, quer para uma viagem entre as grandes cidades da Europa ou da América. Este gosto pelo movimento, pela “ação”; fomenta a prática desportiva que, pela primeira vez, entra nos hábitos quotidianos. O ritmo de vida, outrora lento e pacato, acelera-se e, nos anos 20, torna-se quase frenético. Embora esta nova sociabilidade se confine, em Mulheres na esplanada de um café de Paris, em 1920 Carros vencedores de um rali em França, em 1913

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EVOLUÇÃO CULTURAL AO LONGO DO SÉCULO XX

AS MUDANÇAS COMPORTAMENTAIS E NO PENSAMENTO CIENTÍFICO NAS PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉCULO XX

As transformações da vida urbana

O século XX foi o século das grandes cidades. Nas vésperas da Primeira Guerra Mundial, contavam-

se, na Europa, 180 aglomerados urbanos com mais de 100.000 habitantes, e alguns, como Londres,

Paris, Moscovo ou Berlim, atingiam já uma escala gigantesca, congregando vários milhões de almas.

Pela primeira vez na História, no mundo industrializado, a população urbana superou a das zonas

rurais.

Esta urbanização maciça, que não parou de se acentuar, operou transformações profundas na vida e

nos valores da civilização ocidental.

Desenvolve-se uma nova sociabilidade. Na grande cidade, o indivíduo perde-se no meio da multidão.

A vida despersonaliza-se e, tal como os produtos da indústria, segue um modelo estandardizado: os

citadinos dirigem-se para o trabalho à mesma hora, partilham os mesmos transportes, consomem os

mesmos produtos, habitam casas semelhantes e mesmo os lazeres tendem para a massificação. Nos

tempos livres, são muitos os que convergem para os lugares públicos, invadindo os cafés, as esplanadas,

os cinemas, os salões de baile, os recintos de

espetáculos desportivos.

O crescimento da classe média e, sobretudo, a

melhoria do nível de vida proporcionam uma nova

cultura do ócio, que a cidade fomenta, oferecendo

inúmeras distrações. A anterior ênfase no trabalho vê-

se, pouco a pouco, substituída pelo prazer do consumo e

pela ânsia de divertimento.

A convivência entre os sexos, outrora contida por

rígidas convenções sociais, torna-se mais livre e ousada.

Sobretudo após o primeiro conflito mundial, a mulher

adquire visibilidade: sai para ir às compras nos grandes armazéns, para tomar chá e refrescos, para ir à

praia, para dançar num clube noturno.

O advento do automóvel alarga estes espaços de lazer e incute o gosto pela velocidade. Quem pode

desloca-se com frequência, de carro ou de comboio,

quer para um dia passado nos arredores, quer para

uma viagem entre as grandes cidades da Europa ou

da América.

Este gosto pelo movimento, pela “ação”; fomenta

a prática desportiva que, pela primeira vez, entra nos

hábitos quotidianos. O ritmo de vida, outrora lento e

pacato, acelera-se e, nos anos 20, torna-se quase

frenético.

Embora esta nova sociabilidade se confine, em

Mulheres na esplanada de um café de Paris, em 1920

Carros vencedores de um rali em França, em 1913

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muitos aspetos, às classes médias e abastadas, é ela que imprime uma marca de modernidade às

primeiras décadas do século, evidenciando a rutura com os valores e as convenções da rígida moral

oitocentista.

À entrada do século XX, os valores da sociedade burguesa sofriam as primeiras investidas. Os valores

tradicionais vão entrar em crise. Os sinais de que se avizinhava uma alteração profunda eram já

claramente visíveis mas a maioria desprezava-os, considerando-os extravagâncias sem futuro. A confiança

na superioridade da civilização ocidental dava aos Europeus e

Americanos uma sensação de otimismo, de viverem numa época

extraordinária que, apoiada em valores sólidos e grandes

realizações tecnológicas, caminhava firmemente na senda do

progresso.

Subitamente, entre 1914 e 1918, as certezas e esperanças

desmoronaram-se. A brutalidade da Primeira Guerra Mundial

pôs em causa as instituições, os valores espirituais e morais, todo

o edifício social que tinha sustentado a ordem burguesa do

século XIX.

Quando o conflito terminou, tinham morrido nove milhões de

homens e um exército de estropiados lembrava, a cada instante, a

carnificina e a barbárie. A miséria tomara conta das ruas das

grandes cidades europeias, outrora prósperas e ativas.

O impacto da destruição gerou um sentimento de descrença e

pessimismo, que afetou tanto os intelectuais como a gente comum. É então que o filósofo alemão Oswald

Spengler (1880-1936) publica A Decadência do Ocidente, obra de grande impacto em que vaticinava o fim

próximo e inexorável da civilização europeia.

Do choque da guerra e da deceção por ela provocada nasceu, pois, a convicção de que o mundo não

mais voltaria a ser o que era. Uma vaga de

contestação a todos os níveis abalou a sociedade

que, mergulhada numa profunda "crise de

consciência”; se viu sem referentes sólidos. A

família, a indissolubilidade do casamento, a moral

sexual, o papel da mulher, os preceitos religiosos,

as regras de conduta social deixaram de ter um

padrão rígido e foram aberta e sistematicamente

subvertidas. Instalou-se, pois, um clima de

anomia, isto é, de ausência de normas morais e

sociais que, com clareza, distinguissem o certo e o

errado.

Este relativismo de valores, que tudo punha em questão, acelerou as mudanças já em curso que,

num turbilhão, invadiram o dia a dia das grandes cidades. De todas elas, a emancipação feminina foi,

certamente, a que mais perturbou os contemporâneos.

A imagem da rapariga estouvada que, de saia curta e cabelo arrapazado, desafia todas as convenções

marcou, sem dúvida, a década de 20, durante a qual a mulher deu grandes passos no caminho da sua

Soldados nas trincheira, 1.ª Guerra Mundial

Passagem de modelos em 1920

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emancipação. No entanto, ela é apenas o lado mais escandaloso e fútil do longo e difícil percurso que

conduziu à emancipação feminina.

O movimento feminista organizado remonta

ao século XIX. Por volta de 1850, as

reivindicações centravam-se no direito das

mulheres casadas à propriedade dos seus bens

(nem mesmo lhes era reconhecida a liberdade

de dispor do seu salário), à tutela dos filhos (em

caso de viuvez, o poder paternal era exercido

por um parente masculino), ao acesso à

educação e a um trabalho socialmente

valorizado. Em suma, as primeiras feministas

lutaram por alterações jurídicas que

terminassem com o estatuto de eterna menori-

dade que a sociedade burguesa oitocentista

reservava à mulher.

Cerca de 1900, o direito de participação na vida política (direito ao voto) passou a assumir um papel

preponderante nas reivindicações femininas. Organizaram-se então numerosas associações de

sufragistas que, com um enorme espírito de militância, desencadearam uma luta tenaz pelo voto

feminino.

Na Europa, destacaram-se as sufragistas britânicas lideradas pela célebre Emmeline Pankhurst (1858-

1928) que, pela sua combatividade, viria a marcar o feminismo do princípio do século. Indignadas com a

oposição que se lhes deparava, as sufragistas inglesas procuraram atrair a atenção pública recorrendo a

meios extremos que incluíam longas e ruidosas marchas públicas, piquetes, apedrejamentos de polícias e

montras, irrupções intempestivas no Parlamento, greves de fome.

Em Portugal fundou-se, em 1909, a Liga

Republicana das Mulheres Portuguesas e,

mais tarde, a Associação de Propaganda

Feminista (1911), que perseguiram objetivos

idênticos aos das suas congéneres europeias

e contaram com a dedicação e o esforço de

mulheres prestigiadas como Ana de Castro

Osório (1872-1935), Carolina Beatriz Ângelo

(1878-1911), Adelaide Cabete (1867-1935),

Maria Veleda (1871-1955), entre outras.

Com exceção de um pequeno punhado de

países como a Austrália ou a Finlândia, as

pretensões políticas femininas chocaram, até

à Primeira Guerra Mundial, com uma forte

oposição, sendo alvo da censura e do escárnio dos poderes políticos e da própria sociedade,

maioritariamente conservadora.

As convulsões da guerra vieram alterar este estado de espírito. Com os homens nas trincheiras, as

mulheres viram-se libertas das suas tradicionais limitações como donas de casa, assumindo a

autoridade do lar e o sustento da família. Podiam ser vistas a trabalhar nas fábricas de armamento, a

Sufragistas inglesas manifestam-se pelo direito ao voto em 1913

Mulheres trabalhadoras numa fábrica de munições de Londres, 1917

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conduzirem carrinhas e autocarros, a fazerem reparações elétricas, a carregarem materiais pesados. No

campo, realizavam também o trabalho masculino e mesmo na frente de batalha se tornaram

imprescindíveis, assegurando os cuidados de enfermagem, com risco da própria vida. Como reconheceu

um comunicado do Ministério da Guerra britânico, "as mulheres tinham-se revelado capazes de

substituir o sexo forte em praticamente todas as tarefas”:

Este esforço reforçou a autoconfiança feminina e granjeou-lhe a valorização social que até aí lhe

faltava. Nas décadas subsequentes ao final do conflito, em grande parte dos países ocidentais as

mulheres adquiriram o direito de intervenção política, consolidaram a sua posição jurídica na família e

viram aberto o acesso a carreiras profissionais prestigiadas.

Embora a efetiva igualdade entre os dois sexos tenha demorado a concretizar-se e se depare, ainda

hoje, com algumas resistências, o movimento feminista do início do século derrubou as principais

barreiras e abriu à mulher uma nova etapa da sua história.

A descrença no pensamento positivista e as novas conceções científicas

Por meados do século XIX, o positivismo estabelecera uma confiança absoluta no poder do

raciocínio e da ciência, que considerava capazes de desvendar todos os mistérios do Universo.

Acreditava-se então num mundo perfeitamente ordenado, regido por leis claras e objetivas.

No início do século XX, o pensamento ocidental rebela-se contra este quadro de estreita

racionalidade, valorizando outras dimensões do conhecimento.

Na Filosofia, Henri Bergson (1859-1941) defende haver realidades (como a atividade psíquica, por

exemplo) que escapam às leis da Física e da Matemática e só podem ser compreendidas através de uma

outra via, a que chama intuição.

A intuição é, para Henri Bergson, de natureza muito diferente da inteligência, algo comparável ao

instinto e ao sentimento artístico que nos permite compreender a essência das coisas. Deste modo, o

pensamento filosófico revaloriza o transcendente e, com ele, a imagem de Deus.

O intuicionismo de Henri Bergson teve grande impacto na comunidade intelectual, que viu nele uma

libertação das normas rígidas do racionalismo. Mas, paradoxalmente, foi a própria ciência, com as suas

desconcertantes descobertas, que mais contribuiu para a ruína do pensamento positivista.

O conhecimento de que o átomo não era a unidade mais pequena da Natureza abriu à Física um

campo de estudos até então desconhecido, o da microfísica, área em que o alemão Max Planck (1848-

1957) desempenhou um papel pioneiro. Max Planck demonstrou

que, ao contrário do que era tido como certo, as trocas de energia

não se fazem num fluxo suave e uniforme mas em pequeníssimas

unidades separadas (a que chamou quantum - porção) que se

movimentam a velocidades inimagináveis, em saltos bruscos e

descontínuos.

A teoria quântica veio a ter profundas repercussões no avanço

da microfísica pois permitiu explicar o comportamento dos

átomos e das suas partes constituintes. Revelou-se assim um

mundo onde, como mais tarde ficou demonstrado por cientistas

como Niels Bohr (1885-1962) e Werner Heisemberg, (1901-1972) não existem regras fixas, sendo

impossível determinar, com rigor, o que está a acontecer e prever o que acontecerá.

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Foi, no entanto, Albert Einstein (1879-1955) e a sua Teoria da Relatividade quem protagonizou a

revolução científica do início do século. Einstein destruiu as mais sólidas bases da Física ao negar o

caráter absoluto do espaço e do tempo. Ninguém poderia imaginar que o tempo fosse uma variável e

decorresse mais depressa ou mais devagar consoante a velocidade dos corpos!

As teorias de Max Plancke Albert Einstein provocaram um profundo choque na comunidade científica

que se viu obrigada a reconhecer que o Universo era mais instável do que até aí se pensava e a verdade

científica menos universal do que se tinha acreditado.

Abriu-se assim uma nova conceção filosófica – o relativismo – que aceita a subjetividade do

conhecimento, o mistério e a desordem, como partes integrantes do Universo, rejeitando o

pensamento positivista fundado na clareza, na ordem, na explicabilidade de todos os fenómenos. Em-

bora tal mudança tenha representado, de facto, um avanço, o certo é que contribuiu para abalar a fé na

ciência e na sua capacidade para compreender e controlar a Natureza.

A ideia de que o Homem possui uma mente estritamente racional ficou também seriamente

comprometida pelos estudos do médico austríaco Sigmund Freud (1856-1939). Freud interessou-se

pelos trabalhos dos conhecidos neurologistas Jean Charcot (francês, 1825-1933) e Josef Breuer (vienense,

1842-1925). Os dois terapeutas tinham em comum a particularidade de

recorrerem à hipnose como processo de cura dos sintomas

neurasténicos.

Freud depressa compreendeu que, sob o estado hipnótico, os

pacientes se recordavam de pensamentos, factos e desejos que

aparentemente haviam esquecido. Esta constatação revelou a existência

de uma zona obscura, irracional, na mente humana, que o indivíduo não

controla e da qual não tem consciência, mas que se manifesta,

permanentemente, no comportamento - o inconsciente. Foi com base

nesta descoberta que Freud elaborou, a partir de 1897, os princípios do

que veio a chamar psicologia analítica ou psicanálise.

Segundo a psicanálise, o psiquismo humano estrutura-se em três níveis distintos: o consciente, o

subconsciente e o inconsciente.

O consciente representa apenas uma pequena parte da mente, semelhante à "extremidade visível de

um icebergue”; por oposição ao inconsciente, camada profunda, rica e significativa mas dificilmente

penetrável. Entre estas duas zonas situa-se o subconsciente, constituído por uma constelação de

elementos psíquicos que, com alguma facilidade, podem passar ao consciente.

Por influência das normas morais, o indivíduo tem tendência para bloquear desejos ou factos

indecorosos e culpabilizantes, remetendo-os para o inconsciente onde ficam aprisionados, num aparente

esquecimento. No entanto, os impulsos e sentimentos assim recalcados persistem em afluir à consciência,

materializando-se em lapsos (troca de palavras), esquecimentos súbitos, pequenos gestos de que não nos

damos conta ou, de forma mais grave, em distúrbios psíquicos a que Freud chama neuroses.

Para além de uma teoria revolucionária sobre o psiquismo, a psicanálise engloba ainda um método

de tratamento das neuroses que, basicamente, consiste em fazer emergir o recalcamento (trauma) que

lhes deu origem e racionalizá-lo. Esta terapêutica baseia-se em grande parte na "livre associação'; em

que, sob a orientação do médico, o paciente deixa fluir, livremente, as ideias que lhe vêm à mente, e na

análise dos sonhos, considerados por Freud a "via régia de acesso ao inconsciente".

Sigmund Freud

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Nas primeiras décadas do século XX, as conceções psicanalíticas chegaram ao conhecimento do

grande público que as recebeu entusiasticamente. A revelação do lado irracional da natureza humana

afetou os comportamentos, favorecendo a quebra das convenções sociais que marcou os anos 20.

O impacto da psicanálise estendeu-se também ao mundo da arte, dando origem ao movimento

surrealista, que teve uma forte expressão no panorama cultural da primeira metade do século.

AS VANGUARDAS CULTURAIS DO INÍCIO DO SÉCULO XX: RUTURAS COM OS CÂNONES TRADICIONAIS

Introdução

A produção cultural do final do século XIX e início do XX foi particularmente brilhante pelas suas

inovações em quase todos os domínios. De uma maneira mais ou menos inconsciente, os artistas

estavam à procura de um novo estilo, contra o enquadramento do academicismo. Surge, então, um

novo mundo com expressões originais e de certa forma caótico. A arquitetura, tendo à sua disposição

meios até então desconhecidos, procurava novas formas. Nascia o Jazz, o cinema adquiria vida e

amplitude, apareciam os primeiros edifícios altos na paisagem. A produção musical da Europa brilhava de

maneira fulgurante. Na escultura temos Auguste Rodin (1840-1910), com a conhecida obra O Pensador.

Na música vamos encontrar na Alemanha Franz Liszt (1811-1886) e Richard Wagner (1813-1883); na Itália

de Giuseppe Verdi (1813-1901) e Giacomo Puccini (1858-1924); na França de Gabriel Fauré (1855-1924) e

Claude Debussy (1862-191); na Rússia de

Rimsky-Korsakov (1844-1909) e Ilitch

Tchaikovsky (1840-1893); na Áustria de

Schonberg (1874-1951); na América surge a

nostalgia e a musicalidade do Jazz.

O cinema ganha vida em 1912 com o

aparecimento da sincronização entre a película e

o fonógrafo. Vemos aparecer David Griffith

(1875-1948), surge a "fábrica de sonhos" que é

Hollywood, e com ela artistas de enorme

popularidade como: Mary Pickford (1892-1979),

Theda Bara (1885-1955), Charles Chaplin (1889-1977), Rodolfo Valentino (1895-1926), de entre outros.

As primeiras décadas do século XX foram marcadas pela crise do capitalismo e pelo nascimento das

democracias. O homem viveu a guerra e começou a questionar os valores do seu tempo. Com a Primeira

Guerra Mundial (de 1914 a 1918) vem a instabilidade no sistema político, social e filosófico. Em 1917, a

Revolução Russa trouxe a classe operária ao poder pela primeira vez. O capitalismo sentiu-se ameaçado

pelo comunismo e pelas ideias de Karl Marx. Em 1929, o crash da Bolsa de Nova Iorque foi um dos

prenúncios da Segunda Grande Mundial (1939 a 1945). O curto período entre as duas guerras ficou

conhecido como "anos loucos", no qual se percebe um estilo frenético de vida provocado pela incerteza

de paz gerada pela Primeira Guerra. Tudo isso mudou radicalmente a forma de ver e analisar a realidade e

o modo de a representar artisticamente.

As correntes de vanguarda, como o próprio nome indica, anteciparam os acontecimentos captando

e antecipando o futuro. Daí serem muitas vezes incompreendidas e suscitaram enormes polémicas.

Trabalhadores americanos desempregados após a crise de 1929

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Fauvismo, Expressionismo, Cubismo, Abstracionismo, Dadaísmo, Futurismo e Surrealismo terão sido as

mais representativas e inovadoras correntes artísticas do início do século XX, tendo influenciado

artistas em todo mundo. Todos estes movimentos tinham em comum: a proposta de desorganizar a

cultura, em especial a arte produzida até então; a integração entre as diversas artes, como a escultura,

pintura, música, arquitetura e literatura; a deformação intencional e sistemática da realidade. A

proposta era radical, pretendia-se criar uma arte totalmente nova, mas nem por isso os vanguardistas

deixaram de se inspirar em estilos anteriores. 1)

O início do século XX assistiu pois a uma

autêntica explosão de experiências inovadoras

no domínio da cultura e das artes. Dando

continuidade ao caminho já aberto no final do

século anterior, escritores e artistas, derrubando

a estética tradicional, criaram uma estética

inteiramente nova que ficou conhecida como

modernismo, movimento cultural que, irradiando

de Paris, na altura o centro artístico da Europa,

revolucionou as artes plásticas, a arquitetura, a

literatura, a música, estendeu-se às restantes

manifestações culturais. Desenvolve-se assim

um movimento inovador, de vanguarda, em

todas as dimensões da área cultural,

designadamente nono campo artístico e

literário que rejeita os modelos estabelecidos e

antecipa tendências posteriores.

Nesse período, as artes podem ser consideradas únicas e revolucionárias. Os artistas procuram

inovar radicalmente os conceitos da estética vigente. Num contexto social e ideológico de profunda

rebeldia e de grandes inquietações, assiste-se, talvez, à maior revolução artística dos últimos séculos,

rompendo-se definitivamente com as regras e os modelos artísticos da Idade Média e do

Renascimento.

O aparecimento da fotografia no século XIX havia aberto um leque de novas possibilidades aos artistas

do século XX que abandonando o realismo/naturalismo, a perspetiva e o modelado, passam a explorar

outras dimensões de si próprio: a sua criatividade, as suas emoções, o seu pensamento (consciente e

inconsciente). Procuram ser originais, fazendo obras únicas, explorando as cores e as formas de maneiras

inovadoras. Produzem obras de arte que suscitam múltiplas interpretações por parte de quem as vê,

colocando desafios intelectuais e levando cada espetador a procurar os seus possíveis sentidos e a

questionar-se sobre eles.

Artistas e homens das letras, agrupados de acordo com os seus interesses, criaram numerosas

correntes estéticas, integradas no movimento modernista que revolucionaram a cultura do século XX.

Na última década do século XIX, no campo da pintura, já haviam começado a aparecer os primeiros

sinais de mudança com o surgimento do Expressionismo e das características precursoras do cubismo na

obra de Paule Cézanne (1839-1806). Entrados no século XX, vão aparecer os novos movimentos estéticos

que irão romper com os anteriores, não deixando contudo de coexistir, de se influenciar mutuamente e

de dialogar entre si.

O início do século XX foi pois marcado pelo questionamento dos valores autoritários, na política pelo

colapso dos governos oligárquicos e na organização da sociedade pela difusão de ideias democráticas de

cidadania e de liberdade.

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Nas artes o questionamento deu-se pelo repúdio da descrição impressionista em detrimento da

liberdade de experimentação. O avanço científico também alterou as condutas sociais e interferiu na

noção de tempo, fragmentando-o: nas artes, os estilos que se caracterizam por amplas categorias de

definição deram lugar à ideia de movimentos, mais transitórios.

Essa nova maneira de ver o mundo mudou também a maneira de se expressar: na pintura os rígidos

métodos de representação natural do impressionismo já não correspondiam à necessidade de liberdade

de expressão dos artistas, exigida pela transformação do mundo.

AS VANGUARDAS ARTÍSTICAS DO INÍCIO DO SÉCULO XX

FAUVISMO

O primeiro movimento de vanguarda de características modernas foi o Fauvismo, corrente

vanguardista, marcadamente francesa, iniciada em 1905 e liderada pelo pintor Henri Matisse (1859-

1954). Defende o primado da cor na pintura e utiliza-se com total liberdade, em tons fortes e

agressivos, negligenciando a precisão e a representação. As pinturas fauvistas apresentavam um

colorido muito intenso, aplicado de forma aparentemente arbitrária, tornando-

as, à primeira vista, obras estranhas, quase selvagens.

Os fauvistas reivindicam o primado da cor sob a forma e é na cor que

encontram a sua forma de expressão artística. Elevada ao papel de

protagonista, a cor desenvolve-se em grandes planos, desempenhando o papel

do desenho na perspetiva ou da sombra na modelação do volume. O colorido

fauvista autonomiza-se completamente do realidade, isto é, não procurar

concordar com as cores do objeto representado, mas refletir a sua essência, tal

como se revela aos olhos do pintor.

O fauvismo valorizava mais a liberdade do artista em criar um novo mundo

nos limites estruturais do quadro do que a rigidez na representação da imagem do modelo. Para os

fauvistas, a pintura não tem que representar a realidade, mas apenas o mundo apreendido pelos sentidos

do autor, sendo esta a tese que vai caracterizar toda a arte moderna. Embora já presente nos trabalhos

de outros pintores como Paul Gaugin (1848-1903) ou Vincent Van Gogh (1853-1890) , de alguma forma

precursores do novo movimento, será com os fauvistas que essa tese será formulada de forma clara. O

fauvismo, movimento marcadamente francês, distingue-se

essencialmente do expressionismo por recusar qualquer

sentimento de angústia ou de crítica social.

O Fauvismo teve em Matisse o seu expoente máximo. Uma

das obras mais significativas deste autor é a Mesa Posta

(Harmonia em Vermelho), de 1908. Nela, Matisse expressa a sua

influencia não europeia. Devido às suas constantes viagens à

Argélia, colónia francesa no norte da África, Matisse começa a

pintar painéis decorativos, influenciado pelas tapeçarias

africanas.

Henri Matisse

Henri Matisse (1869-1954), Mesa Posta

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Nesses quadros fica evidente a constante representação de elementos da cultura árabe, como os arabescos.

Podemos perceber esse olhar de Matisse para o oriente na própria imagem da sua mulher, que foi representada

com um penteado oriental. Pode-se perceber que o cenário tem papel de destaque na conceção do quadro,

adquirindo grande importância nos trabalhos inovadores de Matisse, dando a mesma a importância a todos os

elementos do cenário, contrária à ideia tradicional da valorização do objeto central. Apesar da influência estampada

dos tapetes, os painéis decorativos de Matisse utilizam de linhas de fuga que causam a ilusão da perspetiva: essa é

retratada através das linhas dos móveis e da moldura da janela, além dos líquidos nos arabescos sobre a mesa. O

quadro valoriza as cores primárias, sendo o amarelo e azul utilizados para representar formas e conteúdos e o

vermelho para dar harmonia ao quadro, unindo a parede e a mesa num mesmo plano. E mais uma vez o verde, em

oposição ao vermelho, produz a ideia de profundidade

Outro dos quadros mais conhecidos de Matisse é Madame Matisse,

que representa a sua mulher. Símbolo máximo do Fauvismo, caracteriza-se

pela exclusiva preocupação em demonstrar a técnica de representar

vivências e sensações por meio da força cromática e dos contrastes. Utiliza a

formação das cores à luz para produzir noções de espaço/profundidade.

Para isso, as cores do preenchimento do rosto da Senhora Matisse são em

pinceladas soltas que expressam uma certa desordem contrastando com as

cores chapadas das áreas planas que completam o fundo do quadro. No

fundo, o verde, cor intermediaria, em contraste com os tons quentes do

vermelho e do laranja, produz a ideia de profundidade, ressaltando o rosto

da figura. Este é dividido ao meio por uma linha verde que também

expressa a parte central do espaço físico do quadro.

Análise de uma pintura Fauvista

A pintura é figurativa, o artista retrata um restaurante em Marly-le-Roy, representando um espaço ao ar livre.

A obra não é realista nem naturalista, pois as cores usadas não correspondem à realidade observada: as cores são alegres, vivas e contrastantes, justapondo-se em grandes manchas de tinta na tela.

Não há a preocupação de retratar o pormenor e os sombreados.

EXPRESSIONISMO O expressionismo surgiu tal como o fauvismo em 1905, mas simultaneamente em diversas cidades

alemãs, com o objetivo de abalar o conservadorismo da arte oficial germânica, mas também da própria

sociedade alemã excessivamente moralista e hierarquizada. Os criadores do expressionismo, reunidos

no grupo artístico a que chamar Die Brucke (A Ponte), defendiam uma arte impulsiva, fortemente

Henri Matisse (1869-1954),

Madame Matisse

Maurice de Vlaminck, O restaurante em Marly-le-Roy, 1905

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individual, produto do impulso artístico do autor. O movimento expressionista não foi homogéneo. Teve

diferentes formulações, diferentes estilos, dispersos por diversos polos geográficos,

em diferentes países, não deixando de ser essencialmente alemão.

Os expressionistas recorriam à utilização de grandes manchas de cor, intensas e

contrastantes, aplicadas livremente, tal como o fauvistas. Mas, ao contrário

destes, os expressionistas desenvolviam uma temática pesada, que privilegiava a

angústia, o desespero, a morte, o sexo, a miséria social. Visavam provocar a moral

burguesa e abalar as suas estruturas. A estética expressionista traduzia-se em

formas primitivas e simples, onde a distorção e o desenho caricatural serviam para

reforçar a expressividade. Desta forma, obtinham uma forte tensão emocional,

obtida por formas distorcidas e cores intensas que transmitiam ao espetador sensações de desconforto,

de repulsa e mesmo de angústia.

Edvard Munch (1863-1944), um dos mais conhecidos pintores do movimento expressionista, nasceu

na Noruega, em 1863, mas está intrinsecamente ligado ao expressionismo alemão, sendo a sua obra O

Grito, realizada quando tinha trinta anos, uma das mais conhecidas. Faleceu em 1944. A sua obra retrata

as suas obsessões com temos como a morte, a angústia, a solidão, a melancolia, o terror das forças da

natureza.

Análise de uma pintura expressionista

• A pintura é figurativa, o artista retrata a

crucificação de Cristo no monte Gólgota.

• A obra não é realista nem naturalista,

pois as cores usadas não correspondem à

realidade observada: as cores são escuras e

carregadas e as faces das pessoas distorcidas mas

expressivas.

• Não se encontram definidos os

pormenores dos rostos (são uma massa anónima

que o pintor desconhece) mas realçam-se os seus

sentimentos relativamente à crucificação de

Cristo: alguns mostram-se alegres, outros tristes.

• A perspetiva e o modelado são pouco

significativos.

CUBISMO

O Cubismo foi um movimento fortemente influenciado pelo geometrismo de Paule Cézanne (1839-

1806) e pela estilização volumétrica da arte africana, que teve em Pablo Picasso (1881-1973) o seu

fundador ao pintar, em 1907, o quadro a óleo Les Demoiselles d´Avignon. Podemos pois definir o

Cubismo como o movimento artístico iniciado por Picasso e George Braque (1882-1963), por volta de

1907, que rejeita a representação do objeto em função da perceção ótica e a substituiu por uma visão

intelectualizada globalizante de tipo geométrico. Podemos distinguir no cubismo duas correntes

estéticas: a do cubismo analítico e a do cubismo sintética.

Edvard Munch (1863-.1944), Gólgota, 1900.

Edvard Munch

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O Cubismo Analítico presente nas pinturas de paisagens elaboradas por Picasso e Braque em 1908,

caracteriza-se pela destruição completa das leis da perspetiva, que continuava a dominar a pintura da

altura. Picasso entendia que a pintura tradicional era redutora e mentirosa pois apenas mostrava parte da

realidade, aquela que percebemos de um

ponto de vista fixo, num determinado

momento. O cubismo analítico procura

representar os objetos de forma total e não

parcelar, montando-nos simultaneamente

de frente, de lado, por cima, por baixo...

estilhaçando o volume em vários planos que

se justapõem. Se o pintor tradicional pinta o

que vê, o cubista pinta o que sabe existir,

mas que só pode ser visto em momentos

sucessivos. As cores, a pouco e pouco,

restringem-se a uma palete quase

monocromática de azuis, cinzentos e

castanhos, de forma a não perturbar o rigor

geométrico da representação.

O Cubismo Sintético surge após Picasso e Braque terem levado o Cubismo aos limites, com a

desmantelação do objeto numa miríade de facetas, decompondo-o minuciosamente em planos

geométricos que se intercetam e sucedem, tornando-se para o observador, irreconhecível. O cubismo

havia entrado numa fase de pura abstração.

Os cubistas sentiram a necessidade de adotarem um processo de reconstrução/recriação,

reagrupando os elementos fundamentais que resultavam da desmantelação geomética dos objetos, de

uma maneira mais coerente e mais lógica, mais de acordo com as leis da perceção. Aproveitaram para

eliminar neste processo de síntese todo o pormenor, fazendo regressar a cor às telas. Por outro lado,

juntam à pintura outros materiais antes impensáveis como papeis, cartão, madeira, corda, etc., objetos

comuns. Um dos exemplos desta fase é a Natureza Morta com Cadeira Empalhada, de 1912.

Para além de Georges Braque (1882-1963) e de Picasso outros nomes adotaram a estética cubista:

Albert Gleizes (1881-1953), Jean Metzinger (1883-1956), Fernand Leger (1881-1954), Robert Delaunay

(1885-1941), entre outros. O Cubismo teve o seu apogeu até à 1.ª Guerra Mundial, altura em que deixou

de apresentar novos contributos para a arte moderna.

Em síntese, podemos considerar que o Cubismo revolucionou a arte:

Destruindo as leis tradicionais da perspetiva e da representação, que

embora abaladas pelos movimentos anteriores, se mantinham, no geral

válidas. Abriu, deste modo, caminho para a arte abstrata, verdadeiro

emblema da arte dói século XX.

Alargando os horizontes plásticos introduzindo neles materiais comuns, de usos quotidiano, até

então completamente alheios ao mundo da arte. Esta inovação está na origem dos ready-made

com que alguns anos mais tarde, Marcel Duchamp (1887-1968) chocou o mundo, bem como de

várias técnicas modernas como, por exemplo, a colagem, a fotomontagem e o Assemblage.

Pablo Picasso (1881-.1973), Natureza-Morta com Cadeira

Empalhada, 1912, 1907

Pablo Picasso

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Proporcionou meios de expressão a outras correntes, nomeadamente ao futurismo (a

representação de visões simultâneas, por exemplo).

O precursor e representante máximo do cubismo

como se referiu anteriormente, foi o pintor Pablo Ruiz

Picasso. Nasceu em 25 de outubro de 1881 na cidade

espanhola de Málaga. Desde cedo já pintava motivos

pictóricos, como pombas, por orientação de seu pai. A

sua obra é definida como revolucionária, genial,

vanguardista e visionária. Foi um artista ativo e

observador da evolução da pintura e criador de um estilo

inconfundível.

Picasso não se limitou à pintura académica, buscava

algo novo na arte. As suas mulheres e os seus dramas

pessoais (como o suicídio do pintor e amigo Casagenas,

em 1901, que o levou à fase azul) são elementos

transformadores nessa busca pictórica. Morreu em 8 de

abril de 1973.

Análise de uma pintura cubista

A Dança é uma das mais célebres das pinturas

cubistas de

Picasso. A inspiração inicial para o trabalho foram os ensaios do

ballet russo. A Dança é um quadro marcado pelas

metamorfoses da anatomia humana, que é apresentada ao

espetador violentada e com deformações grotescas e

monstruosas. Mas também expressa ambiguidade, dor e

prazer causados pela mistura da alegria da dança e com o

tratamento individualizado e introspetivo das personagens.

Outras das obras mais conhecidas de Picasso é o quadro Les

Demoiselles d'Avignon (As senhoritas de Avignon) de 1907.

Influenciado por Matisse e André Derain (1880-1954), Picasso

começou a elaboração desse trabalho, inspirando-se num

bordel de Barcelona. Demorou nove meses até ficar pronto,

depois de 809 estudos prévios. Revolucionou a história da arte

com suas anatomias humanas geométricas e deformadas. Ao

centro o espetador pode observar duas mulheres a olharem

para ele, como que se oferecendo. Em primeiro plano podemos observar um prato com frutas. A mulher

mais à esquerda parece inspirada na arte egípcia; as duas do meio, na inexpressão da arte ibérica; e as

duas da direita ficam por conta da revolução das formas, com os seus semblantes e corpos deformados. A

que se encontra curvada parece estar com o corpo invertido e apresentar as mãos deformadas. Julga-se

que ambas estejam a usar máscaras africanas.

Pablo Picasso (1881-.1973), Les

Demoselles d´Avignon, 1907

Pablo Picasso (1881-1973), A Dança

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Guernica, obra monumental, de 3m e 51 cm de cm de comprimento por 7m e 82 cm de altura, é uma das

mais conhecidas pinturas de Picasso. Foi criada a pedido do governo republicano espanhol para um mural

no pavilhão da Espanha na Exposição Internacional de Paris. A inspiração partiu do ataque da Legião

Condor da Alemanha de Hitler à cidade de Guernica em 26 de abril de 1937. O bombardeamento resultou

em 1660 mortos e 890 feridos. O mural pode ser considerado um grito contra os horrores da guerra. As

cores usadas são o preto e branco com toques de cinza e azul que transmite como na fase azul, tristeza,

melancolia e sensação de angustia. Pode-se perceber um

triangulo no centro da tela, partindo dos dois vértices

inferiores até o ponto mais alto da obra.

As figuras são muito representativas: o touro pode ser

percebido como a brutalidade, as trevas; o cavalo é a

representação da dor; o lustre ao meio assemelhar-se-á

representação do olho divino; o candeeiro mantém a chama

da esperança acesa; a mãe com o filho no colo "A piedade

dolorosa", demonstra a aguda dor maternal; e o incêndio

representado no canto direito da tela foi diretamente

influenciado pelas fotografias que Picasso recebeu do

bombardeamento.

A pintura é figurativa, identificamos as ervilhas e

certos aspetos do pombo, mas já perfeitamente

desconstruídos; o fundo confunde-se com os objetos e com

as figuras retratadas: caminhamos a passos largos para o

abstracionismo.

O realismo, o naturalismo, a perspetiva e o modelado são abandonados. O artista privilegia duas cores:

o cinzento e o amarelo-torrado.

As figuras e os objetos são geometrizados (cubos, cones, cilindros, etc.) e decompostos em partes, que

se sobrepõem no mesmo plano.

Pablo Picasso (1881-.1973), Guernica,

Pablo Picasso (1881-1973), O pombo e as

ervilhas, 1911

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ABSTRACIONISMO

A Arte abstrata procura eliminar qualquer relação entre a realidade e a obra, entre as linhas e os

planos, as cores e as ideias que se fazem destes elementos, assim como aquelas que eles sugerem ao

espírito. Quando a compreensão de um quadro depende essencialmente das reações às cores e às

formas, quando o pintor quebra as conexões entre a sua obra e a realidade, ela passa a ser abstrata.

O abstracionismo foi um movimento artístico que rejeita o tema ligado à realidade concreta, à

descrição do visível. A obra de arte abstrata procura uma linguagem universal capaz de superar as

diferenças intelectuais e culturais dos espetadores. Decomposição da figura e a simplificação da forma,

novos usos das cores, abandono da perspetiva e das técnicas de modelagem e rejeição dos jogos

convencionais de luz e sombra são os traços essenciais do Abstracionismo.

A ideia de descolar a pintura da representação do real terá sido

concretizada, pela primeira vez, em 1910, pelo pintor russo Vassily Kandinshky

(1866-1944) ao pintar a aguarela Sem Título. Outros pintores seguiram as suas

pegadas, enveredando contudo por caminhos diversificados, às vezes opostos.

De entre esses caminhos destacam-se o abstracionismo sensível e o

abstracionismo geométrico.

O abstracionismo sensível ou lírico - O Abstracionismo Sensível dava o

primado aos sentimentos e às emoções na produção da obra. As cores e as

formas são criadas livremente e a forma abstrata ao dirigir-se à perceção

sensorial, comum à espécie humana, é, tal como a música, uma linguagem

universal. Por outras palavras, as abstrações de forma e de cor, tal como a música, atuam diretamente na

lama.

Kandinsky pode ser considerado o principal representante do abstracionismo sensível. A

expressividade das suas obras fazia-se através da cor e das formas. Fruto das suas pesquisas cromáticas,

passou a utilizar nas suas pinturas diferentes tonalidades e matizes que resultaram em variações espaciais

e formais. A sua obra caracteriza-se por um expressionismo abstrato, sensível e emotivo.

Kandinsky é considerado o pai da arte abstrata. Ele acreditava na existência de uma relação entre as

cores e os sons. Música e Pintura encantavam-no de tal maneira, que passaram a ser a chave mestra da

sua inspiração artística e a origem de todas as suas

criações.

Durante sua vida Kandinsky entrou em

contacto com diversos estilos artísticos que

passam a influenciar suas obras: o Fauvismo, o

Expressionismo e o Surrealismo são apenas alguns

deles. A sua obra foi considerada a mais

consistente e lógica na busca de uma forma de

expressão não figurativa.

Análise de pinturas do abstracionismo sensível

A tela Sem Título (primeira aquarela abstrata)

produzida entre 1910 e 1913 marca a iniciação de

Kadinsky na arte abstrata. Os elementos nela representados não guardam qualquer relação com objetos reais. No

Vassily Kandinshky

Vassily Kandinshky, Sem Título, 1910-1913

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espaço imaginário branco, formas indefinidas flutuam constituídas apenas por pinceladas de cores vermelha, azul,

amarela, verde e preta.

Kandinsky mostra nesta obra o dinamismo das formas e das cores. Utilizando uma composição em espiral e

dispondo as pinceladas vermelhas e azuis de forma circular, o artista cria um movimento centrífugo iniciado no

canto inferior esquerdo da tela.

Podemos ver na manifestação das pinceladas vermelhas, amarelas, azuis e verdes a tentativa expressarao

máximoestas cores, traduzindo sons, apenaslimitadas pelas

linhas negras existentes no quadro. Desta forma, podemos

presenciar a relação que Kandinsky tenta estabelecer entre

cores e sons.

Em Sobre o Branco II, de 1923, somos remetidos

novamente para a relação entre cor e som tão cara a

Kandinsky. Há quem considere esta tela a obra-prima de

Kandinsky. Formas geométricas e linhas dispõem-se de forma

livre evocando sensações diversas. No conjunto, na

extremidade esquerda percebe-se o sol, representado por

um pequeno círculo alaranjado, com os seus raios

representados pelo triângulo amarelo banhando a tela, enquanto o vento a contorna em forma de brisa

representada pelas linhas pretas curvas. Alguns dos elementos que constituem esta tela parecem visões estilizadas

de alguns dos motivos mais habituais encontrados nas obras de Kandinsky. Um exemplo são as duas diagonais

cruzadas que reproduzem estilisticamente São Jorge no cavalo.

A pintura é abstrata pois retrata uma composição de pontos,

linhas e figuras geométricas – triângulos, círculos, quadrados.

Kandinsky compara a sua obra à música: a composição de linhas,

pontos e cores, combinados numa determinada dinâmica, está

para o pintor como uma composição de notas musicais

sequenciadas numa determinada tonalidade e seguindo certas

dinâmicas e ritmos está para o músico. Não traduz uma realidade

existente, antes transmite um estado de alma do artista e

constitui um processo criativo, o qual exprime pensamentos e

emoções pessoais, influenciados pelo ambiente circundante.

Abandona-se o realismo/naturalismo, o modelado e a perspetiva.

O abstracionismo geométrico – Esta corrente do

abstracionismo procurou fazer da pintura um meio de expressar a verdade essencial e inalterável das

coisas. O seu máximo representante foi Piet Mondrian (1872-1944), pintor holandês, que procurou dar ao

seu trabalho para além da dimensão estética, uma função social, impressionado que ficou com a violência

e o sofrimento causados pela 1.ª Guerra Mundial. Recusando o individualismo reinante, procurou as

verdades universais, os valores últimos, essenciais e permanentes da vida e da realidade. Tal implicava,

segundo ele, a supressão, na obra de arte, de toda a emotividade pessoal e também de tudo o que é

efémero e acessório. A pintura deveria ser depurada, liberta de tudo o que não é essencial, circunscrita

aos elementos básicos: a linha, a cor, a composição e o espaço bidimensional. O desenvolvimento desta

Wassily Kandinsky, Composição VIII, 1923.

Vassily Kandinshky, Sobre o Branco II, 1923

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opção levará o pintor à mais matemática das artes, feita de linhas retas e figuras geométricas

elementares preenchidas por manchas de cores. Organizadas de forma rigorosa, estas formas exprimiriam

a “realidade pura” que Mondrian tanto procurava.

Análise de pintura do abstracionismo geométrico

• A pintura de Piet Mondrian é abstrata, pois retrata uma

composição de linhas verticais e horizontais, e usa cores primárias:

vermelho, amarelo e azul, bem como o preto (ausência de cor e luz) e o

branco (todas as cores do arco-íris).

• Mondrian procura captar a essência da realidade visual – tudo

aquilo que observamos é composto por essas linhas e cores, tal como

os átomos constituem o elemento indivisível e essencial de toda a

matéria existente no Universo. A obra traduz, pois, a conceção do

mundo e da arte do pintor, marcada pelos avanços da ciência física.

• Abandona-se o realismo/naturalismo, o modelado e a

perspetiva.

FUTURISMO O Futurismo, contemporâneo do cubismo, surge em Itália, em 1909, proclamado por Fillipo Marinetti

(1876-1944) no seu Manifesto Futurista, verdadeiro hino à vida moderna, rejeitando o passado,

glorificando o futuro, que se acredita prodigioso, graças ao progresso da técnica. A máquina e a

velocidade assumem um lugar central no discurso futurista.

Os artistas futuristas desligam-se do passado centrando a sua estética na representação do mundo

industrial cheio de máquinas, velocidade, ruído, aceleração e dinamismo universal. A obra de arte não

pode ser encarada como algo de estático, mas em permanente transformação. Por isso a estética

futurista adota a diluição das formas, a justaposição de imagens fugazes, a decomposição da realidade em

segmentos representando ponto de vista simultâneos que se interpenetram, numa mistura de

movimento, som, cintilação e de luz. Deste modo, aproximam-se da estética cubista, com quem partilham

o simultaneísmo e a decomposição fragmentada, sem contudo conseguirem dialogar.

Análise de pintura futurista

A pintura é figurativa, identificamos um cão e os pés de

alguém que o passeia.

O pintor procura retratar as figuras e os objetos em

movimento, sobrepondo na tela várias imagens do cão e dos pés,

em momentos diferentes.

O realismo, o naturalismo, a perspetiva e o modelado vão

sendo progressivamente abandonados.

Piet Mondrian, Composição em

vermelho, amarelo e azul, 1921.

Giacomo Balla, Dinamismo de um cão

na coleira, 1912.

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O futurismo glorificava pois o progresso, a máquina, a velocidade e mesmo a guerra, a glória dos

vencedores construtores de um mundo novo. Estendeu-se às diferentes formas de expressão artística:

escultura, arquitetura, literatura, música, fotografia, teatro... Tornou-se uma moda, uma maneira de

estar, usando cartazes, panfletos, como meio de divulgação. Contudo, morreu cedo, com o eclodir da 1.ª

Guerra Mundial, que ironicamente vitimou Marinetti. Dos escombros da Guerra surgiu um novo

movimento vocacionado para a intervenção social, apostado em proclamar a destruição da própria arte, o

Dadaísmo.

DADAÍSMO

O Dadaísmo, movimento de contestação artística que recusa todos os modelos plásticos e a própria

arte, nasceu na Suíça, em 1916, mas quase simultaneamente desenvolveu-se noutros polos,

nomeadamente em Nova Iorque, Paris e Berlim. O movimento assumia o seu desprezo pelo mundo

violento sacudido pela guerra, pela sociedade e pelas suas regras, um desprezo pela própria arte que é

sempre o reflexo dos homens e do mundo.

Unidos pela fome do absurdo, pela necessidade compulsiva de destruir os fundamentos da arte, os

dadaístas exprimiram-se das formas mais díspares: as assemblages de Kurt Schwitters (1887-1948), as

composições ao acaso de Max Ernst (1891-1976) e Hans Arp (1866-1976), os ready-made de Marcel

Duchamp (1987-1968), tudo servia para negar a arte e o seu valor. O seu desprezo pela arte levaram-nos

a insultar o próprio público, a publicar panfletos obscenos, a realizar espetáculos públicos ininteligíveis.

Como movimento de subversão intelectual e artística,

procurou contrariar frontalmente a via reflexiva e

metódica aberta pelo cubismo, seguindo a via do

inconsciente, do ilógico, do absurdo, enfim do irreal. Os

dadaístas acabaram por se negar a si próprios, tendo parte

deles enveredado pelo surrealismo.

Análise de pintura dadaísta

• A pintura é figurativa, embora com características evidentes da

arte abstrata; identificamos com bastante dificuldade o

movimento de uma mulher a descer uma escada.

• O pintor procura retratar a mulher em movimento, sobrepondo

na tela várias imagens da mesma, em momentos diferentes.

• O realismo, o naturalismo, a perspetiva e o modelado são

abandonados, caminhando-se para o abstracionismo.

Esta obra apresenta características comuns ao Cubismo e ao

Futurismo.

Marcel Duchamp, Nu descendo uma

escada, 1912.

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SURREALISMO Nas primeiras décadas do século XX, os estudos psicanalíticos de Sigmund Freud (1856-1939) e as

incertezas políticas criaram um clima favorável para o desenvolvimento de uma arte

que criticava a cultura europeia e a frágil condição humana diante de um mundo

cada vez mais complexo. Surgem movimentos estéticos que interferem de maneira

fantasiosa na realidade.

O surrealismo foi por excelência a corrente artística moderna da representação

do irracional e do subconsciente. Surgiu como resposta ao esgotamento do

dadaísmo esgotado e cada vez mais extremo, pela mão de André Breton (1896-

1966), ex-dadaísta, que além de poeta, era médico e pertencia à geração à qual

foram revelados os mistérios do inconsciente. Publicado em 1924, o manifesto do

surrealismo, marca o nascimento oficial do surrealismo. A ele aderiram escritores

como Louis Aragon (1897-1992)e Paul Éluard (1895-1952) e artistas como André

Masson (1896-1987), Hans Arp (1886-1966), Joan Miró (1893-1983), Max Ernest

(1891-1976), René Magrit (1898-1967), Salvador Dali (1904-1989)e cineastas

como Luis Buñuel (1900-1983).

O surrealismo que pretende negar a estética e os valores estabelecidos de

uma sociedade burguesa e burocrática. Os artistas surrealistas deixam o

mundo real para penetrarem no irreal, em direção a novas formas de pensar a

sociedade moderna pós-industrial.

O Surrealismo apresenta relações com o Futurismo e o Dadaísmo. No

entanto, se os dadaístas propunham apenas a destruição, os surrealistas

pregavam a destruição da sociedade em que viviam e a criação de uma nova, a ser

organizada noutras bases. Os surrealistas pretendiam, dessa forma, atingir outra realidade, situada no

plano do subconsciente e do inconsciente. A fantasia, os estados de tristeza e melancolia exerceram

grande atração sobre os surrealistas, influenciando-os nas mais variadas produções, fossem elas literárias,

plásticas, esculpidas, filmadas cinematograficamente, questionando os limites da reprodução artística.

O modelo de arte surrealista é procurado já não na realidade exterior, mas na realidade interior, na

mente do artista. Deste modo, o surrealismo não se prende em questões formais, aceita que o artista se

exprima do modo que achar melhor para transmitir o que lhe vai na mente, no seu psiquismo, no seu

inconsciente. Daí a diversidade de estilos surrealistas, desde o surrealismo de traço rigoroso e académico

às colagens à expressão abstrata.

O surrealismo enquanto movimento de vanguarda fecundo desenvolveu-se até à 2.ª Guerra Mundial,

embora alguns autores continuassem a cultivá-lo até ao fim dos seus dias, como Miró e Dali. Em Portugal

somente após o citado conflito teve alguma expressão. Podemos afirmar que com o surrealismo se

encerra o ciclo das primeiras vanguardas que revolucionaram a arte europeia.

O nome mais representativo do surrealismo é sem dúvida Salvador Dali.

Talvez não haja adjetivos para definir um dos pintores mais populares e

controversos do Século XX. Nasceu em 1904, e desde pequeno demonstrou

aptidão para o desenho e pintura. Dali considerava-se um pintor

impressionista ao ingressar na Escola Especial de Pintura Escultura da Real

Academia de Belas-Artes de San Fernando, em Madrid, estabelecendo

contacto com diversas ideias e alunos como Frederico Garcia Lorca (1988-

1936) e Luís Buñuel. Porém, em 1923, é expulso da Academia.

Em meados de 1926, já em Paris, conhece Picasso e realiza experiências com o cubismo. Nessa fase,

aprofundou a sua relação estética com cubismo e o surrealismo, em torno de temáticas sexuais, oníricas e

Salvador Dali

Segismundo Freud

Joan Miró

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escatológicas que garantiram identidade à sua obra, aproximando-o dos cérebros do movimento

surrealista, que reconhecem nas representações do quadro "O jogo lúgubre" as suas ideias.

À partir de 1936 os seus quadros foram expostos nos EUA, onde é acolhido na sequência da Guerra

Civil Espanhola (1936-1939) criando grandes laços com a elite americana. O seu vasto trabalho elevou-o à

categoria de uma das figuras mais notáveis do Século XX, ligado à estética surrealista estando a suas obras

intimamente associadas à descoberta do inconsciente de Freud, às manifestações dos sonhos e à

imaginação como matéria-prima, em busca incessante para descobrir o ser humano e as suas maneiras de

se representar.

Análise de pinturas surrealistas

Com o título sugerido pelo poeta Paul Éluard, em O Jogo

Lúgubre, Salvador Dali destaca a sua obsessão pela castração,

pela masturbação e pelas reações provocadas por elas. O quadro

apresenta uma figura central com cores vivas onde se nota o

perfil de Dali com olhos fechados, o desmantelamento do ser nas

suas intenções, logo acima da sua cabeça, a descoberta do

inconsciente e a explicitação do ser completo na sua

obscuridade.

Construção mole com

feijões cozidos

(premonição da Guerra

Civil), é uma das poucas

obras de Dali

relacionadas com

conflitos bélicos ou

políticos, no caso a

Guerra Civil Espanhola

(1936-1939) que o fez

abandonar a Espanha. O

quadro chama atenção

pela obscuridade e desolação da paisagem, representação que

se referia auto-aniquilamento pelo qual passava a Espanha.

A pintura é figurativa, o artista retrata, aspetos da realidade

visual – uma mulher, uma romã, um peixe, dois tigres… – enquadrada num ambiente fantasista, fruto da imaginação do artista – um elefante com umas patas muito estranhas, a sombra da maçã representada em forma de coração… Há uma relação ilógica e irracional entre os elementos retratados: um peixe a sair de dentro de uma romã e um tigre a aparecer de dentro da boca do peixe…

O artista recorre ao naturalismo, ao modelado e à

perspetiva, mas num contexto de fantasia e imaginário, próximo do mundo do inconsciente e dos sonhos.

Salvador Dalí, Sonho provocado pelo voo de uma abelha

em torno de uma romã um segundo antes do acordar,

1944.

Salvador Dali, O Jogo lúgrebe, 1929

Salvador Dalí, Construção mole com

feijões cozidos, 1936.

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Outro nome grande do Surrealismo foi René

Magritte. Nasceu na Bélgica em 1998 e faleceu

em 1967. • A pintura (Golconda) é figurativa. Nela o

artista retrata aspetos da realidade visual – uma

chuva de homens – enquadrada num ambiente

fantasista, fruto da imaginação do artista. Há uma

relação ilógica e irracional entre os elementos

retratados…

• O artista recorre ao naturalismo, ao

modelado e à perspetiva, mas num contexto de

fantasia e imaginário, próximo do mundo do

inconsciente e dos sonhos.

Em síntese...

Até ao século XX, a pintura permaneceu fiel ao “princípio da realidade”, representando um mundo de

aparência lógica e objetos reconhecíveis. As vanguardas vieram romper com este universo plástico,

destruindo, um a um, os seus fundamentos. Assim:

Libertaram a figuração da sujeição a modelo, distorcendo as formas e utilizando arbitrariamente

as cores, sem atender à sua fidelidade ao mundo real. Assumida por fauves (feras), e

expressionistas, esta liberdade tornou-se comum a todas as correntes.

Desconstruíram o espaço pictórico que, desde o Renascimento, se organizava segundo as leis da

perspetiva. Os esbatimentos dos volumes e da profundidade presentes nas telas fauvistas e

expressionistas anunciam o regresso da pintura à sua natureza bidimensional. Coube porém ao

cubismo a desarticulação completa das regras da figuração, ao substituir a perspetiva pela visão

plena e simultânea do objeto.

Adotaram novos modelos temáticos de índole abstrata (as emoções puras de Kadinsky, as ideias

essenciais de Mondrian...) ou projetadas pelo inconsciente humano. Pela primeira vez, a pintura

desliga totalmente os seus temas da realidade sensível.

Alargam o universo da pintura ao introduzirem aspetos que desde sempre lhe tinham sido

alheios, como o movimento e o tempo (4.º dimensão), esboçados pelo cubismo e plenamente

desenvolvidos pelo futurismo.

Introduziram um conjunto vasto de novos materiais artísticos, aumentando significativamente o

potencial plástico e expressivo da pintura. Iniciada pelo cubismo, esta vertente vai ser também

adotada pelos movimentos posteriores.

René Magritte, Golconda, 1953.

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A escultura O modernismo na arquitetura e no design

Depois de um grande desenvolvimento da arquitetura ao longo do século XIX, fruto dos progressos

técnicos e das condições sociais resultantes da Revolução Industrial, em que se utilizou preferentemente

o ferro e o vidro, a arquitetura vai procurar novas soluções estéticas agora possíveis devido à utilização do

betão.

É na transição do século XIX

para o século XX que na Europa

ganha expressão uma nova

forma de construir e de decorar

os edifícios, a Arte Nova, que

valoriza a natureza a fauna e a

flora. Um dos mais

representativos arquitetos deste

movimento foi o espanhol

Antoni Gaudi (1852-1926). As

suas primeiras obras revelam

um certo ecletismo tradicional,

com predominância de

elementos góticos, mas acabou

por evoluir na direção da Arte

Nova evidenciando uma grande

originalidade bem patente nas suas obras mais representativas: o Parque Guell e o templo da Sagrada

Família, ambas em Barcelona.

Na América, a Escola de Chicago foi responsável pela rutura com os modelos tradicionais de influência

europeia, povoando as cidades americanas de

arranhas-céus cada vez mais altos. Entre os arquitetos

mais representativos sobressai o de Frank Lloyd Wrigt

(1867-1959), responsável pela revolução no modo de

construir habitações e que falaremos mais adiante,

quando abordarmos o Funcionalismo Orgânica.

Em Portugal, o início do século XX não foi propício a

uma renovação artística que corresse paralelamente à

que então se processava no resto da Europa. O clima

de instabilidades social e política, subsequente à

instauração da República, a que se seguiu a 1.ª Guerra

Mundial, não permitiu grandes inovações na

arquitetura portuguesa, que vai continuar a seguir os

modelos desenvolvidos ao longo do século XIX. Só com

uma nova geração de arquitetos, enquadrados pelos

Estado Nova, a arquitetura Portuguesa trilhou

caminhos de características modernas sobre as quais nos debruçaremos mais adiante.

Antoni Gaudí, Templo Expiatório da Sagrada Família, Barcelona, 1882-1936

Louis Sullivan, Armazéns Carson, Chicago, (1899-1904)

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As vanguardas na literatura do início do século XX

À semelhança do que aconteceu nas artes plásticas e basicamente pelos mesmos motivos, o início

do século XX correspondeu, no campo das letras, a uma verdadeira revolução que pôs em causa, por

vezes de forma radical, os valores e as tradições literárias.

No mundo das letras, a vastidão de temas e de estilos assemelha-se ou ultrapassa até a

complexidade do mundo das artes. Por isso fiquemos pela ideia de que a literatura percorreu, nessa

época, todas as vias que a expressão escrita permite percorrer.

Nas primeiras décadas de novecentos, os esforços

concentravam-se sobretudo, na libertação da obra literária face

à realidade concreta. Tal como na pintura, foi abandonada a

descrição ordenada e realista da

sociedade e dos acontecimentos. As

obras voltam-se para a vida

psicológica e interior das personagens

mas do que para a narrativa de uma

ação. Marcel Proust (1871-1922) e o

seu vasto conjunto romanceado Em

Buscado Tempo Perdido (sete volumes)

cujo primeiro saiu em 1913, podem ser

considerados como um bom exemplo

desta corrente profundamente psicológica da literatura.

Numa linha complementar, autores como André Gide

(1869-1961) proclamam a liberdade total do ser humano, o seu

direito a tudo usar (desde que o faça por convicção), assim rejeitando as regras da oral, da família e da

sociedade.

Se a modernidade das obras referidas se situa ao nível do tema e da sua

abordagem, outras há que se destacam pela introdução de novas formas de

expressão, ao nível da linguagem e da construção frásica. Como exemplos

extremos podemos citar os poemas caligrafados de

Guilhaume Apolinaire (1980-1918), que funde a

palavra e a forma, os dadaístas, como Hugo Ball

(1986-1927), que transformam o nonsense em poesia,

ou os escritos automáticos de Paul Éluard (1895-

1952) e André Breton (1896-1966).

Estas correntes, se bem que efémeras e pouco produtivas em termos de

qualidade literária, romperam convenções e abriram as portas a obras de

grande valor, verdadeiramente inovadoras. Entre todas, pela sua envergadura

e pioneirismo, destaca-se Ulisses do escritor irlandês James Joyce (1882-1941),

publicada em 1922. O romance, que não tem fio condutor, desenvolve-se num

persistente diálogo interior em que passado e presente se intercetam,

quebrando a lógica narrativa tradicional.

Por todos os aspetos que reúne, quer ao nível temático, quer ao nível formal, Ulisses é, ainda hoje,

unanimemente considerada a melhor súmula da revolução que o século XX soube introduzir, também na

narrativa literária.

Apollinaire, Reconhece-te, poema

caligrafado, 1915

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A ARTE E A CULTURA EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Tendências culturais: entre o naturalismo e as vanguardas

Enquanto, na Europa das primeiras décadas do século XX, as vanguardas artísticas anunciavam

novas e radicais soluções estéticas, em Portugal a corrente naturalista reunia as preferências do

público, das instituições oficiais e da crítica. A arte académica e, nomeadamente, a pintura conti-

nuavam a explorar cenas da vida popular, que pareciam satisfazer uma burguesia nostálgica das

vivências tradicionais.

Embora os políticos republicanos se revelassem

culturalmente conservadores, a República acabou

por propiciar os primeiros sinais de mudança nos

gostos e padrões estéticos. A agitação política, em

que foi fértil, fomentou o debate ideológico, o livre

exame e a crítica. Foi assim que um conjunto de

jovens artistas e escritores se propôs, desde os

anos 10 do século XX, agitar a cena cultural

nacional com a originalidade, a ousadia e o

cosmopolitismo das suas propostas estéticas.

Conhecidas por modernismo, nelas se mesclavam

as vanguardas europeias como o cubismo, o futurismo, o expressionismo, o abstracionismo.

Distinguem-se duas gerações de modernistas. Ambas nasceram nas últimas décadas do século XIX

mas, enquanto a primeira se afirmou entre 1911 e 1920, a segunda geração deu-se a conhecer depois

dos anos 20.

O primeiro modernismo (1911-1918)

Na pintura, o primeiro modernismo ficou ligado a um conjunto de exposições (livres, independentes e

de humoristas) realizadas com regularidade desde 1911, em Lisboa e no Porto. Nelas encontramos

artistas como Manuel Bentes (1885-1965), Emmérico Nunes (1888-1966), Almada Negreiros (1893-1970),

Cristiano Cruz (1892-1951), Stuart Carvalhais (1987-1961), Jorge Barradas (1894-1971), António Soares

(1894-1978), Mily Possoz (1988-1966), entre outros.

Os desenhos apresentados, muitos deles caricaturas,

perseguiam objetivos de sátira política, social e até

anticlerical. Entre enquadramentos boémios e urbanos, ora

avultavam as cenas elegantes de café, ora as cenas populares

com as suas figuras típicas. Praticava-se a estilização formal

dos motivos, esbatia-se a perspetiva, usavam-se cores claras e

contrastantes.

Este primeiro modernismo sofreu um impulso notável com

a eclosão da Primeira Guerra Mundial, principalmente

quando, ao nosso país, regressaram Amadeo de Souza-

Cardoso (1887-1918), Guilherme Santa-Rita (1889-1918),

Eduardo Viana (1881-1967), José Pacheco (1985-1934), em

suma, o núcleo mais talentoso dos pintores portugueses que Retrato de Fernando Pessoa, Almada

Negreiro, 1954

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estudavam em Paris. Com eles veio também o casal Robert Delauny (1885-1941) e Sonia Delaunay (1885-

1979), destacadas personalidades do meio artístico parisiense.

Destes regressos

resultou a formação de

dois polos ativos e

inovadores: um em

Lisboa, liderado por

Almada Negreiros

(1893-1970) e Santa-

Rita (1889-1918) que,

numa das conjugações

mais felizes da história

das nossa artes, se

juntaram a Fernando

Pessoa (1988-1935) e a

Mário de Sá-Carneiro

(1890-1916), fazendo nascer a revista Orpheu; outro polo radicou-se

no Norte em torno do casal Delaunay, de Eduardo Viana e de

Amadeo.

Com a publicação de Orpheu, revista de que

apenas saíram dois números em 1915, o

modernismo português revelou a sua faceta

mais inovadora, polémica e emblemática: a do

futurismo. A revista, que "fez o encontro das

letras e da pintura”; contou com a colaboração

de Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), Fernando

Pessoa (1988-1935), Raul Leal (1886-1964), Luís de

Montalvão, Ângelo de Lima (18872-1921), Almada

Negreiros (1893-1970), Santa-Rita (1889-1918), José

Pacheco (1985-1934).

Arrebatados pelo mundo da técnica do seu tempo,

excêntricos e provocadores, os jovens de Orpheu

deixaram o país escandalizado. Nas suas dissertações

agressivas, repudiavam o homem contemplativo e

exaltavam o homem de ação. Propunham-se a um corte

radical com o passado, denunciando a morbidez

saudosista dos Portugueses e incitando a "raça latina"

ao orgulho, à ação, à aventura e à glória. Assim se exprimiu, em Portugal, o dinamismo moderno, que o

futurista Fillipo Marinetti (1876-1944) preconizara em 1909.

“Fac-simile” das capas da Revista Orpheu, números 1 e 2, alías

únicos, pois o 3.º não chegou a ser publicado

A Cabeça, atribuído a Santa-Rita

Pintor, 1912

Amadeu de Sousa-Cardoso, Parto da Viola, 1916

Fernando Pessoa

Nasceu em Lisboa em 1988 e faleceu em

1935. De temperamento enigmático,

desdobrou-se em diferentes

personalidades, os heterónimos: Alberto

Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos,

entre muitos outros. É considerado o

maior poeta português do Século XX. As

suas poesias estão dispersas por

diferentes obras: Poemas de Alberto

Caeiro, Odes de Ricardos Reis, Poesias de

Álvaro de Campos, Poesias, Poemas

Dramáticos, Poesias Inéditas e Mensagem

do ortónimo Fernando Pessoa.

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Face às críticas indignadas do escritor e académico Júlio Dantas (1872-1966), os futuristas explodiram

de raiva. O Manifesto Anti-Dantas, qual resposta pronta, atacou violentamente o escritor, associando-o a

uma cultura retrógrada que urgia abater.

Influenciado pelo futurismo declarou-se, igualmente, Amadeo

de Souza-Cardoso (1887-1918). Duas exposições individuais,

realizadas em 1916, não colheram o apoio da crítica nem do

público (no Porto, Amadeo de Souza-Cardoso até agredido foi),

mas favoreceram a aproximação ao grupo de Orpheu. Almada

desdobrou-se em elogios ao pintor, que o país não compreendia

e não merecia. Um terceiro número de Orpheu, que não chegou

a publicar-se, deveria incluir reproduções de obras de Amadeo de

Souza-Cardoso (1887-1918). A agitação futurista culminou, em 1917, com a apresentação espalhafatosa do Ultimatum futurista às

gerações portuguesas do século XX, no Teatro República, em Lisboa, feita por Almada Negreiros (1893-

1970). Logo a seguir, saiu o número único da revista Portugal Futurista. Nela apareceram trabalhos de

Santa-Rita (1889-1918), Almada Negreiros (1893-1970), Amadeo de Souza-Cardoso (1887-1918), Pessoa,

Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), entretanto falecido, além de escritos de Fillipo Marinetti (1876-1944),

Guillhaume Apollinaire (1880-1918), Blaise Cendrars (1887-1961). Considerada hoje a "peça fundamental

do movimento futurista português”; a revista conheceu a apreensão pela polícia no momento de saída da

tipografia. Atacado nos gostos e opções culturais, o regime republicano não ousava desvincular-se dos

cânones académicos e defendia-se. Pouco animadoras se mostraram por isso as possibilidades de

sobrevivência do modernismo futurista. Até do ponto de vista político as opções dos primeiros

modernistas chocavam os republicanos.

Dois nomes sobressaem pois no panorama do primeiro modernismo português, ambos ligados à

publicação da revista Orpheu: Fernando Pessoa e Almada Negreiros, artistas multifacetados que tão

bem ligaram a literatura e a pintura. Para conhecer um pouco melhor a obra de Fernando Pessoa e de

outros grandes vultos da literatura portuguesa poderá aceder ao documento “Literatura portuguesa do

início do século XX à atualidade”.

Almada Negreiros (1893-1970), artista múltiplo, com

uma atividade que se prolongou durante grande parte do

século XX, deixou-nos monumentais frescos nas gares de

Alcântara e Rocha Conde de Óbidos, integrados em

projetos arquitetónicos do arquiteto Pardal Monteiro. A

composição Os

Emigrantes, presente

na gare de Rocha

Conde de Óbidos,

segue a inspiração

cubista europeia, bem

presente nas cores vivas e intensas usadas pelo pintor.

Reagindo à apropriação do modernismo pelo Estado Novo, o

jovem artista António Pedro (1909-1966) organizou, em 1936, a

exposição dos Artistas Modernos Independentes, onde se

homenageou a originalidade dos primeiros modernistas, que se

considerava perdida. A António Pedro (1909-1966) coube, nos anos

40, a dinamização do surrealismo, numa clara oposição à "arte oficial" do Estado Novo.

Almada Negreiros, fresco Os Emigrantes, Gare de

rocha Conde de Óbidos, 1946-1949

A Ilha do Cão, António Pedro, 1841,

1934

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Impacto do modernismo na escultura e na arquitetura Escultura

À semelhança do ocorrido na pintura, também a escultura da primeira década do século XX ficou

marcada pela hegemonia do gosto naturalista. Mestre António Teixeira Lopes (1866-1942), o grande

cultor desta corrente, continuou a reunir as preferências do público.

Tal não impediu a manifestação, se bem que tímida, de

características modernistas nos anos 20, em escultores como Francisco

Franco (1885-1955), Diogo de Macedo (1889-1959) e Canto da Maia

(1890-1981) que, em Paris, haviam tomado contacto com as

vanguardas artísticas. O modernismo das suas obras ora se expressou

na simplificação geométrica das formas e volumes, ora na busca da

essencialidade plástica, ora na facetação das superfícies.

À semelhança da pintura, a modernidade escultórica acabou

condicionada nos anos 30 e 40 pelas encomendas oficiais. Aos valores

heroicos e à estética monumental do Estado Novo - patrocinador das

grandes obras submeteram-se muitos dos escultores.

Arquitetura

Os primeiros sinais de uma nova linguagem arquitetónica datam dos anos 20. Cristino da Silva (1896-

1976), Carlos Ramos (1897-1969), Pardal Monteiro (1897-1957), Cottinelli Telmo (1897-1948) e Cassiano

Branco (1879-1970) contam-se entre os primeiros autores de projetos arquitetónicos modernistas. A

modernidade das suas obras manifestou-se no uso do betão armado, no predomínio da linha reta sobre a

curva, no despojamento decorativo das paredes, na utilização de

grandes superfícies de vidro, nos terraços e coberturas planos. Estes

arquitetos adaptar o modernismo europeu dando-lhe um cunho

nacional.

Nos anos

30 e 40, as

experiências

modernistas

consolidaram-

se graças ao

apoio recebido

pela política

de obras

públicas do

Estado Novo,

com cujo programa e valores tiveram,

naturalmente, de se conciliar. É no quadro da renovação dos edifícios públicos e da expansão urbana de

Lisboa que a ação dos novos arquitetos modernistas se vai fazer sentir e que ganhar toda a sua expressão

com a construção efémera de edifícios no âmbito da exposição do Mundo Português, em 1940.

Adão e Eva, Canto da Maia, 1929

Pardal Monteiro, Igreja de Nossa

Senhora de Fátima, Lisboa, 1924-38,

Cristino da Silva, Parça do Areeiro, Lisboa, 1938-1943

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A DIMENSÃO SOCIAL E POLÍTICA DA CULTURA A PARTIR DOS ANOS 20

A cultura de massas

É nos meios urbanos que, no princípio do século XX, emerge a cultura de massas, mas que se afirma

sobretudo após a 1.ª Guerra Mundial. Como o nome indica, trata-se de uma cultura comum à maioria

da população, cujos gostos se uniformizam, orientando para o consumo maciço dos mesmos bens

culturas. Dois fatores contribuíram decisivamente para esta homogeneização cultural: a generalização

do ensino e o extraordinário desenvolvimento dos meios de

comunicação de massas – os media – que, transformados numa

poderosa indústria, “moldaram” a acultura do século XX.

A imprensa, a rádio e o cinema foram os mais importantes

meios de comunicação da primeira metade do século XX. Em

conjunto, proporcionaram ao cidadão comum a evasão da rotina

diária, transpirando-o para o mundo de sonho e irrealidade.

Transmitiram, também, valores e modos de estar que, ligados à

miragem de uma vida melhor, se impuseram como padrões

culturais.

A imprensa

de massas

utiliza um

vocabulário

simples e

atrativo, feito

de frases

curtas e

diálogos vivos

e informais.

O livro, antes

apanágio de

uma elite, tornou-se um produto de consumo corrente popular.

Apoiados nesta linguagem acessível, desenvolveram-se novos géneros

literários: o romance cor-de-rosa, feito de empolgantes histórias de amor com um

final sempre feliz; a banda desenhada, cujos heróis

vivem épicas aventuras em defesa dos oprimidos e dos

valores do mundo ocidental; o romance policial, em

que argutos detetives solucionam os mais

inexplicáveis crimes. Este último género, que

conheceu uns períodos de ouro entre 1930 e 1949,

mereceu a preferência do público. Agatha Christie

(1890-1976), a criadora do célebre inspetor Poirot, foi

a autora mais vendida do século XX.

O Jornal “A Capital”, edição de 5 de

outubro de 1910.

Orson Wells, através da rádio, em 30 de outubro de 1938, assustou a América

com uma invasão marciana. No dia seguinte os jornais davam conta do pânico

instalado.

Friedrich Wilhelm Murnau

(1888-1931) foi um dos mais

importantes realizadores do

cinema mudo

Agatha Christie

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Para além destes novos géneros literários, o século XX inaugura

também o jornal de grande tiragem. Alguns

chegam a vender mais de um milhão de

cópias por dia, em cidades como Paris, Nova

Iorque, Berlim ou Londres. Para atrair o

leitor, os jornais recheiam-se de histórias de

guerra e de crime, socorrem-se de títulos

bombásticos, ilustram-se com uma profusão

de fotografias. A edição completa-se,

frequentemente, com secções desportivas,

páginas femininas e crónicas avulsas, cujo

objetivo é mais entreter que informar. Em

breve estes artigos ganham destaque e enchem as páginas de domingo.

A par dos jornais proliferam as revistas, cujas temáticas são as mais diversas. Sobre política, eventos

sociais, desporto, moda ou cinema, enchem periodicamente os escaparates dos quiosques e instalam-

se a rotina dos leitores da classe média.

A rádio, depois do aperfeiçoamento da telegrafia se fios por Marconi, em 1896, torna-se entre as

duas guerras mundiais, o mais popular dos

meio de comunicação.

Em 1937, menos de duas décadas volvidas

sobre o início das emissões regulares, contam-

se já 36 mil emissoras e 70 milhões de ouvintes

em todo o mundo. Acessível a todos, mesmos

aos analfabetos, a rádio tornou-se um

importante meio de difusão cultural: transmite

notícias, música, novelas radiofónicas, anúncios

publicitários. Transforma a sala dos ouvintes

em auditórios onde se realiza colóquios e

debates, se analisam as obras literárias, se ouve

música sinfónica e música ligeira. Em suma, estimula gostos e consumos, contribuindo também para

esbater as diferenças de pronuncia e vocabulário entre

regiões e classes sociais. Esta abrangência da rádio

transformou-a num veículo

privilegiado de propaganda

política, que os governos

usaram largamente.

O cinema, nascido em

França pela mão dos irmãos

Lumiére, rapidamente se

universaliza, encontrando

excelentes cultores na

Europa, na América na Ásia.

O nascimento do cinema sonoro, em 1927, com Jazz Singer abre à

ABC, Revista portuguesa.

Edição de 1920

Família ouvindo radio à volta de 1920

Cartaz de apresentação do The Jazz Singer,

primeiro filme sonoro, 1927

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Sétima Arte novas perspetivas. O cinema adquire uma dimensão muito próxima da realidade e cultiva

outros géneros, com destaque para o musical. Poucos anos depois (1932), o technicolor aumenta, com o

brilho da cor, o encanto do cinema.

Qualquer que fosse o seu género – amor, comédia, guerra, suspense, western, musical –, o filme

conduzia o espetador a uma outra dimensão. Na obscuridade da sala de cinema, sozinho no meios da

multidão, o homem vulgar era transportado a um mundo de sonho e de quimeras em que, identificados

com as personagens, ria, chorava, amava ou vivia as maiores aventuras. Por momentos, evadia-se da sua

própria vida para viver as vidas que se projetavam

no ecrã. Nesta possibilidade de evasão residia, (e

reside ainda hoje) a magia do cinema.

De todos os mas media, o cinema foi também

o que mais contribuiu para a difusão dos

modelos socioculturais e a consequente

estandardização de comportamentos. A forma de

vestir, de estar, a vida privada das estrelas

cinematográficas tornou-se num modelo a seguir,

que influenciou modas, atitudes e valores.

A rápida difusão dos mass media fez do mundo

uma gigantesca sala de espetáculos, transformando o cinema e a música ligeira em entretimentos

coletivos que não conhecem fronteiras. Foi também sobre o impulso dos media que o desporto se

internacionalizou e se transformou num fenómeno de massas capaz de arrebata multidões.

Enquanto modalidades como o ténis e o golfe permaneceram ligados às classes privilegiadas e

conhece uma difusão restrita, outras, como o

futebol, o boxe ou o ciclismo, adquirem grande

popularidade, atraindo milhares de aficionados.

Aí, identificados com os atletas em competição,

os espetadores aplaudem, rejubilam e sofrem,

descarregando nesses momentos de

empolgamento as tensões e as frustrações

acumuladas a vida quotidiana.

Para além da emoção do espetáculo, os

ídolos desportivos proporcionavam ainda o

sonho da ascensão social. Oriundos muitas

vezes dos bairros pobres, servem de modelos aos

mais desfavorecidos, que assim ligam o desporto à obtenção da fama e da riqueza, o que aumenta, em

muto, o seu fascínio.

AS PREOCUPAÇÕES SOCIAIS NA LITERATURA E NA ARTE

Em meados dos anos 20, já se fazia sentir um certo cansaço relativamente às audácias da arte da

literatura modernas. Acusavam-nas de uma ânsia de originalidade a qualquer preço, de se lançarem em

pesquisas excessivamente especializadas, de se tornarem incompreensíveis para o grande público, não

contribuindo, por isso, para a ávida da coletividade.

Primeira Volta a Portugal em ciclismo, 1927

Jogo do 1.º Campeonato Mundial de futebol, 1930

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A Literatura

Numa Europa marcada ainda pelas dificuldades do pós-guerra e com os olhos postos na Revolução

Soviética, cresceu o sentimento de que a literatura e a arte não possuíam um

valor puramente estético mas tinham também

uma missão social a cumprir. A profunda crise

económica desencadeada em 1929 veio

avolumar este sentimento.

Entre as duas guerras, a literatura tomou

uma feição combativa e socialmente

empenhada. Critica-se a sociedade que

produziu a carnificina e que, no entanto, lhe

sobreviveu: os seus vícios, a sua podridão

moral, a sua hipocrisia. Os protagonistas deixam de ser personagens

singulares e tornam-se tipos sociais. No romance, na poesia ou no teatro, este tipo de literatura ganhou

um lugar cimeiro. Entre os seus muitos e excelentes cultores podemos destacar o alemão Bertolt Brecht

(1899-1956), o inglês Aldous Huxley (1894-1963) e o francês André Malraux

(1901-1976).

Poeta e um dos maiores dramaturgos do seu tempo, Bertolt Brechttem como

fim primeiro provocar o leitor e forçá-lo a participar criticamente na obra.

Segundo Bertolt Brecht, o teatro tradicional (bem como a literatura em geral)

deixava o público à mercê da ação dramática, forçando-o a uma identificação

com as personagens que o fazia viver as suas

desgraças, paixões e triunfos. Ao contrário, Bertolt

Brecht propõe-se despertar no público a surpresa e a

perplexidade para que este se sinta compelido a

debater e a questionar o sentido da peça literária.

Erich Maria Remark (1898-1970) publica, em 1929, A Oeste Nada de Novo

que tem como pano de fundo a 1.ª Guerra Mundial, sendo o livro de sempre

mais vendido na Alemanha.

Aldous Huxley publica, em 1932, a mais célebre

das suas obras - Admirável Mundo Novo -, na qual,

sob a forma de ficção científica, denuncia a

civilização industrial, mecanizada, onde se perderam os valores humanos

fundamentais.

A literatura de contestação social identificou-se, muitas vezes, com os

ideais marxistas, dando origem a obras de acentuado cariz sociopolítico. É o

caso de A Condição Humana de André Malraux (1933), cuja ação decorre na

China e relata a repressão brutal de uma insurreição comunista. Esta literatura

ideologicamente empenhada, que foi comum a uma geração de escritores

como André Breton (1896-1966), André Gide (1869-1951) ou Paul Éluard

(1895-1952), mereceu ainda a André Malraux obras como O Tempo do

Desprezo (1935), onde, em traços apocalípticos, descreve as prisões hitlerianas e A Esperança (1937),

dedica da à luta antifranquista, na Guerra Civil de Espanha.

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O retorno da literatura a fórmulas neorrealistas teve também grande expressão nos Estados Unidos,

onde a miséria resultante da Grande Depressão sensibilizou os escritores para as questões sociais. Ernest

Hemingwai (1899-1961), John dos Passos (1896-1970) e John Steinbeck (1902-1968), entre outros,

retratam o mundo desencantado do capitalismo, que acusam de fomentar a guerra, a desumanização e as

injustiças sociais.

Portugal: o 2.º modernismo na literatura e na pintura

Com as mortes prematuras de Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), Santa-Rita (1889-1918) e Amadeo

de Souza-Cardoso (1887-1918), o regresso dos Delaunay a França (1917) e a partida de Almada

Negreiros para Paris (1919), encerrou-se o primeiro modernismo português.

Nos anos 20 e 30, decorreu um novo ciclo no movimento modernista, que continuou a conciliar

as letras com as artes plásticas. Distinguiram-se escritores como José Régio (1901-1966), João Gaspar

Simões (1903-1987) e Adolfo Casais Monteiro (1908-1972), e pintores como Dordio Gomes (1890-1976),

Mário Eloy (1900-1951), Sarah Afonso (1899-1993), Carlos Botelho (1899-1992), Abel Manta (1888-1992),

Bernardo Marques (1898-1962), Júlio (Reis Pereira) (1982-1983), Vieira da

Silva (Maria Helena) (1908-1992). Almada Negreiros (1893-1970) regressou

ao país e, tal como Eduardo Viana (1881-1967), protagonizou uma

consistente carreira.

Mais uma vez as revistas assumiram a dinamização literária e artística,

sendo de destacar a Contemporônea (1922-26) e a Presença (1927-40). Mais

uma vez, também, os artistas continuaram a deparar-se com a rejeição pelos

organismos oficiais, pelo que as exposições independentes que realizavam

(coletivas ou individuais), os cafés e clubes que decoravam e os periódicos

que ilustravam vieram a ser os seus grandes espaços de afirmação.

Como era de esperar, a decoração modernista de A Brasileira do Chiado e

logo a do Bristol Club, realizadas em 1925-26, causaram polémica. No dizer de José Augusto França,

aqueles espaços converteram-se no museu de arte contemporânea que Lisboa, de facto, não tinha.

Entre as revistas que empregaram artistas modernistas, salienta-se a Ilustração Portuguesa (de onde

se viram afastados ao fim de um ano de colaboração), a Domingo Ilustrado, a

ABC a lIustração, a Sempre Fixe. Nelas se distinguiram com as suas figuras

estilizadas, em enquadramentos de moda, de música e de desporto.

Em 1933, António Ferro (1895-1956) que, além de

destacado jornalista era simpatizante dos modernistas,

assumiu a direção do Secretariado da Propaganda

Nacional. A partir de então, a quase totalidade dos

artistas modernos foi utilizada na construção da imagem

de "novidade" que o Estado Novo pretendia criar. Ferro

convenceu Salazar que "a arte, a literatura e a ciência

constituem a grande fachada duma nacionalidade, aquilo

que se vê lá fora”.

Para saber mais sobre os movimentos literários e autores mais representativos durante o Estado Novo

consultar “Literatura portuguesa do início do século XX à atualidade”

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A pintura

Interrompidas pela violência da Primeira Guerra Mundial, as vanguardas artísticas esmoreceram.

Numa Europa reduzida a escombros, o sentido da obra de arte procurou-se na intervenção social e esta,

porque dirigida ao grande público, requeria uma linguagem simples e clara.

É assim que, depois de todas as desconstruções vanguardistas, se assiste, na Europa e no mundo, a

um "regresso à ordem”, isto é à arte figurativa.

Este novo realismo, que se fez sentir por toda a Europa, revelou-se cedo na Alemanha, especialmente

atingida pela trágica derrota na Primeira Guerra Mundial. Aí, o testemunho do primeiro expressionismo

passa para pintores como Max Beckmann (1880-1950), Otto Dix (1891-1961) ou George Grosz (1893-

1959), que nas suas obras nos deixam um retrato amargo da

sociedade do pós-guerra, marcada pelos contrastes sociais e pela

agitação política.

Nos Estados Unidos, a tendência figurativa assumiu uma

expressão particularmente forte. Conhecido como American Scene,

um movimento artístico de grande amplitude reuniu, nos anos 30,

artistas como Edward Hooper (1982-1967) ou Grant Wood (1891-

1942), que, numa

linguagem realista,

intensa e eficaz,

retrataram os mais

diversos aspetos

da América "da

Grande De-

pressão".

A convicção de que o artista deve contribuir para a

coletividade suscitou, neste período, o ressurgimento da

pintura mural. Preterindo a arte de cavalete, os pintores

interessam-se

pela

ornamentação

dos edifícios

públicos, onde a

sua obra é mais facilmente visível.

Muito utilizado como elemento da propaganda dos regimes

totalitários europeus, o mural teve também, por influência de

Diego Rivera (1886-1957) e outros artistas mexicanos, grande

difusão nos Estados Unidos. O programa de construções do New

Deal incluiu mais de 2000 encomendas de pinturas murais para os

novos edifícios públicos, que difundiram pelos recantos de uma

América abatida pela crise mensagens de alento e episódios da

gloriosa história do país. No México Frida Kahlo (1907-1954), é

também um nome a registar, pela singularidade da sua pintura

ligada a temas de costumes e das tradições.

Grant Wood, American Gothic, 1930

Diego de Rivera, A Nova Liberdade, 1933

Frida Kalo, Coluna Partida, 1944

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A arquitetura, arte da coletividade A consciência coletivista que marcou a cultura entre as duas guerras manifestou-se também na

arquitetura. Numa Europa destruída, os governos viram-se na necessidade de reerguer numerosos

edifícios e de realojar os seus cidadãos. Impunha-se uma construção simples, barata, mas digna. Havia

muito que a insalubridade dos bairros operários era alvo de denúncia social, acicatada pela difusão das

ideias socialistas que, na Rússia, acabavam de obter a sua primeira vitória. Tudo se conjugava, pois,

para que os arquitetos orientassem as suas pesquisas para as

necessidades da comunidade.

Nascido sob o signo da eficiência e do baixo custo, o novo

estilo arquitetónico tomou o nome de funcionalismo e

rapidamente começou a marcar, com as suas construções

despojadas, os bairros das cidades europeias.

O que primeiro chama a atenção na arquitetura

funcionalista é a simplificação dos volumes exteriores. Linhas

predominantemente retas delimitam volumes básicos, sólidos

geométricos regulares como o cubo e o paralelepípedo, que dão forma à maioria das construções. Os

telhados praticamente desaparecem, substituídos por coberturas planas que, transformadas em terraço,

prolongam o espaço da casa para o exterior.

Recobrindo estas formas, as paredes pr imam

pela ausência de elementos decorativos. Nelas,

muitas vezes formando uma linha contínua, rasgam-

se grandes janelas que deixam entrar o ar e a luz. Os

edifícios abrem-se e o vidro toma neles um lugar de

destaque.

Estas mudanças complementaram-se com uma

nova conceção dos espaços. Não são necessários

grandes quartos com tetos demasiadamente altos e

portas por onde passam gigantes. O Homem será a

escala para a construção da casa e esta deve ter

sempre em conta a vida que se processa dentro dela. Tem de ser prática, racional, em suma funcional, de

acordo com os seguintes princípios enunciados por Le Corbusier (1887-1965):

1. Sentido prático dos espaços (“ter uma casa

prática como uma máquina de escrever”).

2. Volume simples da casa (o que pressupõe a

redução das construções a sólidos geométricos

como o cubo e o paralelepípedo, que dão forma à

maioria das construções).

3. Eliminação dos elementos puramente

decorativos (o branco, por exemplo, é a cor

dominante em paredes lisas).

4. Janelas rasgadas de grandes dimensões,

graças ao uso de betão armado (“janelas

semelhantes às das fábricas”). Le Corbusier, Edifício habitacional, Berlim, 1957

Le Corbusier, Chemin de Villier, 1929

Le Corbusier, Capela de Ronchamp, 1950

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5. Coberturas em terraço (“viver numa casa sem telhado pontiagudo”).

6. Colunas que parecem sustentarem o edifício (o que permite o aproveitamento do espaço sobre o

qual a casa parece suspensa).

7. Flexibilidade no uso dos espaços interiores.

A arquitetura funcionalista desenvolvendo-se em

vários polos simultaneamente, o funcionalismo

contou com homens notáveis que, em conjunto,

podem considerar-se os criadores da arquitetura

moderna. É o caso de Le Corbusier (1987-1965),

arquiteto francês de origem suíça que, para além de

uma notável obra construída, publicou numerosos

artigos, ensaios e livros, onde expõe os fundamentos

da nova arquitetura; é também o caso do alemão

Walter Gropius (1883-1969), pioneiro pelas suas

soluções arrojadas e fundador da Bauhaus, escola de artes que terá uma influência marcante no design e

na arquitetura do século XX.

No decurso da década de 30 do século XX, a arquitetura funcionalista sofreu uma crescente

contestação. Acusavam-na de excessiva rigidez, de traçar géIidos planos de casas despersonalizadas que,

invariavelmente, lembravam muros de cimento armado com uma fieira horizontal de janelas. Por esta

altura, o novo estilo tinha já perdido muito do seu caráter inovador e esgotava-se em repetições de

fórmulas preestabelecidas.

Uma nova geração de arquitetos enveredou então por um estilo mais humanizado que, sem negar as

linhas mestras do funcionalismo, se libertou dos seus dogmas, procurando, para cada caso, a melhor

solução: em zonas chuvosas, por que optar por coberturas planas que propiciam as infiltrações, em vez

dos velhos telhados de duas águas, mais eficazes? Porquê utilizar obsessivamente linhas retas se, por

vezes, a curva ondulante, orgânica, se adapta melhor à exposição solar e ao terreno? Por que destacar a

casa da paisagem, como um corpo estranho, se for possível fundi-la com o meio envolvente, integrando-a

na Natureza?

Conhecido como funcionalismo orgânico, esta nova vertente arquitetónica teve excelentes cultores,

como é o caso do arquiteto finlandês Alvar Aalto

(1898-1976)) ou do norte-americano Frank Lloyd

Wright (1867-1959), que vieram trazer um novo fôlego

à arquitetura do século XX.

As preocupações do funcionalismo estenderam-se,

naturalmente, à cidade que, vista como um todo,

deveria também ser repensada segundo critérios

racionais.

A importância do tema trouxe-o para o centro dos

debates sobre arquitetura, tornando-o objeto de

estudo das CIAM - Conferências Internacionais de

Arquitetura Moderna - iniciadas em 1928. Cada

conferência tomou como tema de trabalho um aspeto

Walter Gropius, Sede da Bauhaus, Berlim, 1925

Frank Lloyd Wrigt, Casa da Cascata, 1936 (ver vídeo)

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específico. Em 1930, por exemplo, debateu-se a habitação social e, em 1933, sob a orientação de Le

Corbusier (1887-1965), os trabalhos debruçaram-se sobre "A Cidade Funcionalista".

As conclusões da conferência foram publicadas na célebre Carta de Atenas, que se tornou numa

espécie de guia do urbanismo funcionalista.

Segundo a Carta, a cidade deve satisfazer quatro funções principais: habitar, trabalhar, recrear o corpo

e o espírito, e circular. Numa lógica estritamente funcionalista cada uma destas funções ocuparia uma

zona específica da cidade. As três zonas articular-se-iam por uma eficiente rede de vias de comunicação.

Embora estas propostas tenham sido, posteriormente, consideradas demasiado racionalistas e

redutoras, a Carta teve o mérito de colocar as questões sociais no centro.

A cultura e o desporto ao serviço dos estados

A dimensão social e política que marcou a cultura dos anos 30 do século XX fez-se sentir com particular

intensidade nos estados totalitários. De direita ou de esquerda, as ditaduras compartilharam o mesmo

objetivo de colocar a cultura ao serviço do poder, procurando assegurar que a criação intelectual

contribuísse eficazmente para a construção da "ordem nova" que defendiam.

Poder-se-ia pensar que, ao subverterem a

estrutura social, os comunistas soviéticos

pressionassem as artes a romperem, igualmente,

com o passado. Porém, os bolcheviques eram

revolucionários em nome da coletividade e bem

depressa começaram a encarar as pesquisas

estéticas como expressão do individualismo

burguês.

À arte, à literatura, ao cinema foi atribuída a

missão de exaltarem as conquistas do

proletariado e de contribuírem para a educação

das massas. O êxito de uma tal tarefa implicava

a utilização de uma linguagem básica, acessível até aos mais humildes. Como já vimos, essa Iinguagem

não poderia ser outra senão a do realismo.

Assim, o regresso à arte figurativa e ao

realismo Iiterário que se fez sentir um pouco por

toda a parte assume, na Rússia de Estaline, uma

vertente dominantemente política que o regime

batizou de realismo socialista. Aos poucos, o

vanguardismo russo, pujante nas primeiras décadas

do século, desvaneceu-se, abafado por um rígido

controlo estatal, que se oficializou em 1932. Em

abril desse ano, o Comité Central do Partido

Comunista obriga todos os "trabalhadores criativos

soviéticos" a agruparem-se em "uniões de

criadores”; de acordo com a sua atividade (União

Isaak Brodsky, Lenine discursando aos operários, 1917

Aleksandr Guerassimov, Stalin e Vorochillov no Kremlim,

1938

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dos Arquitetos, dos Escritores, das Artes Plásticas...). A ninguém é permitido exercer a sua atividade fora

destas associações que estabelecem os parâmetros a seguir.

O realismo socialista procura refletir a alegria e o otimismo da nova so-

ciedade, o seu vigor e a sua dinâmica revolucionária, a excelência dos seus

dirigentes. Nas artes plásticas, os temas ficam Iimitados à pintura histórica,

às cenas que evocam o mundo socialista ou ao retrato que exalta os líderes

do regime.

Este cariz propagandístico da cultura estruturou-se também, em

moldes semelhantes, no regime nazi. Pouco depois da subida de Hitler ao

poder, é criada a Câmara da Cultura do Reich que adota uma política

frontalmente antimodernista. Centenas de obras de vanguarda são

retiradas dos museus

e são destituídos do

seu cargo os

conservadores que se

identificam com as

novas correntes. Posta ao serviço do nacional-

socialismo, a criação artística empenha-se em

exaltar, dentro dos preceitos do academismo, o

valor da raça ariana, a força e a felicidade

protagonizados pelo novo regime. É no quadro

dessa exaltação que tem que ser analisada a ação

propagandística levada a cabo pelo regime nazi de

realização dos Jogos Olímpicos em 1936.

Mais moderado, o fascismo italiano limita-se

a proteger os artistas que Ihe são favoráveis.

Sem instituições oficiais de controlo, o poder

exige, apenas, que não sejam postos em causa

os pilares da ordem fascista. Ponto comum a

todos os regimes estatizados é também o

regresso a uma arquitetura de feição

neoclássica e de dimensões grandiosas. 2)

Estado Novo: o projeto cultural do regime

Bem cedo o Estado Novo compreendeu a necessidade de uma produção cultural submetida ao regime.

Por isso, artistas, escritores, jornalistas, cineastas, ensaístas sentiram as malhas apertadas da censura,

que, sob o pretexto da subversão, atingiram de forma discricionária pedaços da criação cultural

portuguesa. Mas o Estado Novo foi mais longe nos seus propósitos de controlo da produção cultural.

Concebeu um projeto totalizante que fez de artistas e escritores instrumentos privilegiados da

inculcação e da propaganda do seu ideário.

Arno Breker`s, O Guarda, 1930

(Arte ao serviço do estado nazi)

Leni Riefenstahl, a mais famosa

realizadora de cinema do período

nazi. O Triunfo da Vontade é o seu

filme mais conhecido

Estádio Olímpico de Berlim, construído para os Jogos Olímpicos de

1936

Hitler presidiu à abertura dos Jogos Olímpicos de 1936

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Esse projeto cultural, a que se chamou "política do espírito”; pois pretendia elevar a mente dos

portugueses e alimentar a sua alma, viria a ser implementado pelo Secretariado da Propaganda

Nacional (1933), que António Ferro dirigiu com devida mestria.

Jornalista afamado e cosmopolita, amigo

dos modernistas (editou a revista Orpheu,

em 1915), admirador convicto de Mussolini

e de Salazar, António Ferro (1895-1956)

convenceu o ditador português da

importância das manifestações culturais

para o regime se revelar às massas, as

impregnar e cultivar. Ferro costumava dizer

que "a arte, a literatura e as ciências consti-

tuem a grande fachada duma nacionalidade,

o que se vê lá de fora; pelo que ao Estado

competiria estimular a criação cultural.

Conhecedor do efeito da propaganda

fascista na Itália, Ferro servia-se, assim, da

"política do espírito" para mediatizar o

regime. Claro que A. Ferro e Salazar possuíam uma ideia muito precisa de cultura. Pretendiam-na

arredada de preocupações, decadentistas e dissolventes da unidade nacional. Pelo contrário, as artes e

as letras deveriam propiciar uma "atmosfera saudável”; inculcando no povo o amor da pátria, o culto

dos heróis, as virtudes familiares, a confiança no progresso, ou seja, o ideário do Estado Novo.

Mas essa cultura, que se queria portuguesa e nacionalista, teria, igualmente, que evidenciar uma

estética moderna e aberta ao seu tempo, aquilo que Ferro designava de "bom gosto': Simpatizante dos

modernistas, Ferro chamá-Ios-ia a colaborarem com o regime, promovendo uma controversa e

problemática união entre conservadorismo e vanguarda.

No domínio literário, a ação do Secretariado da Propaganda Nacional revelar-se-ia um fracasso. A

adesão dos escritores foi escassa e, dos que o regime premiou, poucos se vieram a destacar. Em 1947, o

SPN elaborou uma lista das obras "essenciais" da literatura, que se ficava pelo Romantismo.

“A Lição de Salazar”, cartaz editado em 1938 pelo Secretariado de

Propaganda Nacional, a fim de ser comentado elos professores

nas escolas primárias

Exposição do Mundo Português, 1940

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Já nas artes plásticas e decorativas, na arquitetura, no bailado, no cinema e até no teatro, a

colaboração mostrou-se mais fecunda.

Num país em que a burguesia não criara

um mercado cultural, o Estado assumia-se

como grande entidade empregadora.

Através de exposições nacionais e

internacionais, muitas de cariz histórico,

como a Exposição do Mundo Português,

realizada em 1940, das obras públicas do

regime, de festas populares, do teatro, do

cinema e da rádio, do bailado, do turismo

e de concursos (como os concursos de

montras e da "aldeia mais portuguesa"),

patrocinaram-se artistas e produções que

divulgassem, sobretudo, as tradições

nacionais e populares e que enaltecessem a grandeza histórica do país e a dimensão civilizadora dos

Portugueses.

Mas, ironia do destino, todo o investimento do Estado Novo e todo o empenho entusiástico de

António Ferro sofreriam um duro golpe com a derrota dos fascismos em 1945. Perante a dificuldade de

enquadrar as novas gerações de modernos na ideologia do regime e agastado com as críticas à sua ação

no SPN, Ferro abandonou aquele organismo em 1949. Para trás ficava o projeto grandioso de forjar um

português novo, o português "estado-novo”.

1) In Contemporâneos, Revista de Artes e Humanidades, nº 3. Henriques, Emílio Andrade e Rogério et outros2009 A Arte do

Século XX como a Exaltação de todos os Sentidos, Universidade Federal de Viçosa. 2009. [Consultado em 2015-04-23 21:22:00].

Disponível na Internet: http://www.revistacontemporaneos.com.br/n3/pdf/seculoxx.pdf, Adaptado

2) No essencial retirado de: Couto, Célia Pinto de; Antónia, Maria; Rosas, Monterroso. (2015) Um Novo Tempo da História.

Porto: Porto Editora. Adaptado.

Salazar faz-se esculpir por António Franco, sob o olhar atento de António

Ferro, 1934