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_____________________________________________________________________________ EXMO SR. DR. JUIZ VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE, DA 10ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO FÓRUM CENTRAL DA COMARCA DE SÃO PAULO. PROC. N. 1016019-17.2014.8.26.0053 ARTIGO 19 BRASIL , associação civil sem fins lucrativos, inscrita no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas/MF sob o nº 10.435.847/0001-52, com sede na Rua João Adolfo, 118 – conjunto 802 – CEP: 01050-020 – Centro – São Paulo – SP, vem por seu advogado e bastante procurador, apresentar parecer, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos: ARTIGO 19 – Rua João Adolfo, 118 – conjunto 802 – Centro – CEP: 01050-020 - São Paulo – SP www.artigo19.org – +55 11 3057 0042 +55 11 3057 0071 Página 1 de 45 Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1016019-17.2014.8.26.0053 e código 1139DE2. Este documento foi protocolado em 18/05/2015 às 17:48, é cópia do original assinado digitalmente por CAMILA MARQUES BARROSO. fls. 1313

EXMO SR. DR. JUIZ VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE, … a19 ACP.pdf · Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr5, corroborando com o entendimento da ... Vol. 4., Processo Coletivo, 9º

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EXMO SR. DR. JUIZ VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE, DA 10ª

VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO FÓRUM CENTRAL DA COMARCA DE

SÃO PAULO.

PROC. N. 1016019-17.2014.8.26.0053

ARTIGO 19 BRASIL, associação civil sem fins lucrativos, inscrita no

Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas/MF sob o nº 10.435.847/0001-52,

com sede na Rua João Adolfo, 118 – conjunto 802 – CEP: 01050-020 – Centro

– São Paulo – SP, vem por seu advogado e bastante procurador, apresentar

parecer, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos:

ARTIGO 19 – Rua João Adolfo, 118 – conjunto 802 – Centro – CEP: 01050-020 - São Paulo – SP www.artigo19.org – +55 11 3057 0042 +55 11 3057 0071

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Sumário

1) LEGITIMIDADE.........................................................................................3

2) AMICUS CURIAE......................................................................................6

3) INTRODUÇÃO...........................................................................................9

a) Objetivo..................................................................................................9

4) PADRÕES INTERNACIONAIS SOBRE O DIREITO AO PROTESTO......10

a) Restrições ao direito de manifestação e protesto no direito internacional.................................................................................................................. 13

5) PROTESTOS..........................................................................................16

a) Protestos Durante a Copa do Mundo Fifa..............................................17

6) VIOLAÇÕES............................................................................................22

i) Ausência do Uso de Tarjeta de Identificação..........................................22

ii) Uso de Armas Não Letais......................................................................24

iii) Defesa do Patrimônio e do Tráfego x Segurança das Manifestações....26

iv) Impedimento do Acompanhamento de Ações Policiais........................27

v) Jornalistas.............................................................................................28

vi) Monitoramento de Dados Pessoais e Privacidade................................32

7) CONCLUSÃO..........................................................................................39

8) PEDIDO...................................................................................................40

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1) LEGITIMIDADEA ARTIGO 19 é uma associação civil, sem fins lucrativos, fundada em

Londres no ano de 1986. Tem como principal objetivo proteger e promover o

direito à liberdade de expressão e acesso à informação, previstos pelo

ARTIGO 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, sendo este o

motivo para adoção do referido artigo como nome da organização.

O trabalho desenvolvido para a efetivação desses direitos humanos e a

importância do tema a nível internacional mostraram a necessidade de

expandir os escritórios da organização para outros países, como África,

México e Brasil, o que permitiu à entidade participar ativamente da vida

política da região em que está inserida. A experiência em variados países

gerou um maior conhecimento da realidade destes locais, suas práticas e

legislações, o que fez ao longo dos anos que a organização pudesse

contribuir com pesquisas, estudos e publicações, e a partir de 1991 passou

a ter ”status” consultivo junto a Organização das Nações Unidas – ONU.1

Desde a sua fundação, a ARTIGO 19 desenvolveu mais de 2000 trabalhos,

entre artigos, programas e campanhas voltados para a elaboração de

princípios e padrões consagradores da liberdade de expressão e do acesso à

informação. Atua em parceria com 22 organizações nacionais espalhadas

por mais de trinta países localizados na África, Ásia, Europa, América Latina

e Oriente Médio, sendo, inclusive, membro fundadora da organização

internacional Intercâmbio de Liberdade de Expressão (International Freedom

of Expression Exchange - IFEX), a qual, por meio de sua rede global,

congrega 72 organizações que atuam na defesa e promoção do direito à

liberdade de expressão.

Especificamente na América do Sul a ARTIGO 19 começou seu trabalho no

ano 2000, após uma intensa participação em eventos que discutiam a

liberdade de expressão na região. O fruto da participação efetiva nestes

1Cf. UNITED NATIONS ECONOMIC AND SOCIAL COUNCIL. NGO information. Disponível em: <http://esa.un.org/coordination/ngo/search/search.htm>.

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processos e o crescente envolvimento na promoção do acesso à informação

e da liberdade de expressão na região levaram ao estabelecimento de

representantes da entidade no Brasil e no México, entre 2006 e 2007.

A constante presença da ARTIGO 19 na América do Sul possibilitou a

consolidação de uma rede de contatos e parcerias com atores regionais,

tanto no setor privado quanto no setor público, como também com

organizações da sociedade civil, jornalistas, mídia e órgãos internacionais,

como a Relatoria para Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana

de Direitos Humanos, junto à Organização dos Estados Americanos (OEA).

No Brasil, a ARTIGO 19 desenvolve atividades desde 2008 e estabeleceu no

Estatuto Social (doc. X) as prioridades e objetivos de sua atuação voltada

para a América do Sul que são:

(...)

V) monitorar ações estatais que possam restringir o exercício dos direitos

protegidos pelo ARTIGO 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e

outros instrumentos jurídicos correlatos, considerando as restrições

admitidas pelo direito internacional;

VI) desenvolver campanhas para reduzir ao mínimo eventuais limitações

impostas pelo Estado às liberdades de opinião e de expressão e ao direito à

informação, incluindo a liberdade de buscar, receber e disseminar

informações e ideias por qualquer meio de comunicação,

independentemente de fronteiras;

VII) desenvolver campanhas para a supressão de leis, práticas e outros

mecanismos que estejam em aparente violação dos direitos protegidos pelo

ARTIGO 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e outros

instrumentos jurídicos correlatos.

A ARTIGO 19 trabalha em alguns eixos principais: internet, radiodifusão,

pluralismo e diversidade, acesso à informação, entre outros. Sobre internet,

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apresentou Amicus Curiae2 em ação que discute a questão da

responsabilidade de intermediários e acompanhou o projeto e aprovação do

Quadro de Direitos Civis da Internet no Brasil (o “Marco Civil da Internet”).

Contribuiu, bem como, com as consultas públicas sobre internet,

elaborando, inclusive, uma análise comparativa entre o Marco Civil e os

padrões internacionais, resultando em recomendações importantes, as

quais devem ser observadas e incorporadas à versão final da lei.

Sobre radiodifusão, entre outras ações, protocolou Amicus Curiae na ADPF

que contestava a constitucionalidade da Lei de Imprensa (Lei n°

5.250/1967) e outro Amicus Curiae3 em conjunto com Amarc Brasil –

Associação Mundial de Rádios Comunitárias, em ação que diz respeito à

cobrança de direitos autorais da rádio comunitária sobre as transmissões ao

público de composições musicais sem prévia autorização dos titulares dos

direitos autorais.

Ainda sobre o tema da radiodifusão, a ARTIGO 19 apresentou Amicus Curiae

na Ação Direita de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 10) que discute

a omissão do Congresso Nacional em regulamentar os artigos da

Constituição Federal sobre a comunicação social.4

Também protocolou Amicus Curiae na Ação Direita de Inconstitucionalidade

nº 4815, proposta pela Associação Nacional dos Editores de Livros – ANEL, a

fim de que seja declarada a inconstitucionalidade parcial, sem redução de

texto, dos artigos 20 e 21 do Código Civil para que, mediante interpretação

conforme a Constituição, seja afastada do ordenamento jurídico brasileiro a

necessidade do consentimento da pessoa biografada e, ainda, das pessoas

retratadas como coadjuvantes (ou de seus familiares, em caso de pessoas

2http://artigo19.org/centro/casos/detail/1

3http://artigo19.org/centro/casos/detail/8

4http://artigo19.org/centro/casos/detail/16

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falecidas) para a publicação ou veiculação de obras biográficas, literárias ou

audiovisuais.

Os objetivos da ARTIGO 19, acima citados, estão sendo plenamente

desenvolvidos pela Associação, especialmente, a partir do trabalho

realizado para a discussão e efetivação dos direitos à liberdade de

expressão e de informação, sendo assim a ARTIGO 19 preenche os

requisitos exigidos por este Egrégio Tribunal para o deferimento de sua

participação na qualidade de amicus curiae, pois atua na defesa de

questões globais envolvendo a luta pelas liberdades de expressão e de

opinião, bem como pelo direito de acesso à informação.

O amicus curiae pode ser entendido como a possibilidade de se apresentar

outros argumentos aos discutidos pelas partes em uma ação judicial,

através da intervenção de outros sujeitos, os quais trazem aos autos

opiniões difundidas na sociedade com o objetivo de que a decisão final da

ação esteja mais próxima possível da realidade social em que será inserida.

À exemplo, o Supremo Tribunal Federal tem manifestado em diversos

julgamentos uma preocupação quanto à adequação de suas decisões ao

contexto social, admitindo que terceiros apresentem subsídios técnicos e

informações que possam legitimar suas decisões, contribuindo para a

qualidade da prestação jurisdicional e o cumprimento do seu papel efetivo

de guardião da Constituição Federal.

Resta evidente a legitimidade da ARTIGO 19 para tratar dos temas

abordados pela presente ação, pois advém do intenso conhecimento,

experiência acumulada ao longo de tantos anos de atuação para a

consolidação da liberdade de expressão e de manifestação do pensamento,

no Brasil, América do Sul e em diversas partes do mundo, em interação com

outras organizações da sociedade civil, devendo ser reconhecido à

requerente interesse institucional para pleitear sua intervenção na

qualidade de amicus curiae na presente Ação Civil Pública.

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2) AMICUS CURIAE Cuida-se de Ação Civil Pública proposta pela Defensoria Pública do Estado

de São Paulo para resguardar os direitos de liberdade de reunião, liberdade

de expressão e liberdade de reunião, direitos coletivos quem vem sendo

sistematicamente tolhidos pelo Estado de São Paulo em virtude da ação

violenta e repressiva de sua Polícia Militar.

Trata-se, portanto, de litígio de eminente caráter coletivo e de crucial

interesse público, uma vez que diz respeito a direitos e garantias

fundamentais da coletividade da população do Estado de São Paulo e que

possuem relação direta com o exercício da cidadania e com o respeito ao

Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, dada a relevância para a coletividade do tema aqui debatido,

a participação de entidades e instituições que efetivamente representem os

interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores essenciais e

relevantes da sociedade, abrem a possibilidade de intervenção do amicus

curiae como justificativa de aprimoramento da tutela jurisdicional coletiva.

Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr5, corroborando com o entendimento da

doutrina de Cássio Scarpinella Bueno, defendem a intervenção de amicus

curiae em qualquer ação coletiva, desde que se respeitem algumas

condições:

“Há uma tendência doutrinária e jurisprudencial, porém, de

admitir-se a intervenção de amicus curiae em qualquer

ação coletiva, desde que a causa tenha relevância (que,

em se tratando de ação coletiva, está quase sempre in re

ipsa), e o possível amicus curiae tenha condições de

auxiliar o trabalho do magistrado, contribuindo com

informações e análises para o melhor julgamento da demanda.

Seria uma intervenção atípica de amicus curiae, ideia que nos

5Curso de Direito Processual Civil. Vol. 4., Processo Coletivo, 9º edição, 2014, Ed. Jus Podium, p.231.

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parece louvável, tendo em vista a finalidade da participação deste

especial auxiliar do juízo: legitimar ainda mais a decisão do

órgão jurisdicional, em um processo de evidente interesse

público.”

Assim, conforme já dito, a presente Ação Civil Pública possui indiscutível

relevância para a coletividade. Evidente o interesse público contido na

demanda, a ensejar a participação da ARTIGO 19, organização que defende

e promove a liberdade de expressão, como já mencionado acima, como

amicus curiae.

Nesta senda, ao julgar os embargos infringentes nº 9092747-

45.2002.8.26.0000, a Terceira Câmara de Direito Público do Tribunal de

Justiça do Estado de São Paulo, deixou claro que mesmo que não haja

previsão expressa de intervenção de amicus curiae na ação civil pública, ela

deve ser aceita como medida a auxiliar no julgamento quando a demanda

tiver relevância social inquestionável. Veja-se trecho do v. acórdão:

“De outro lado, era perfeitamente possível aintervenção da “Conectas Direitos Humanos”, naqualidade de “amicus curiae”.

Ensina Cássio Scarpinella Bueno, que ao contrário dolargamente ministrado, a figura do “amicus curiae”, ou o“amigo da Cúria”, surgiu no século XVI na Inglaterra, e delá seguiu para os Estados Unidos da América, mas deforma diversa, adaptando-se às regras utilizadas pela“Common Law” (“O Amicus Curiae” nos TribunaisBrasileiros – palestra proferida na Escola Paulista deMagistratura em 13.09.2011).

Esta figura tinha por missão o auxílio dos sacerdotes nasolução de lides que a eles eram trazidas, em um épocahistórica em que as decisões judicias eram primeiramenteproferidas pelo clero, e após, referendadas pela nobrezagovernante.

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Embora não haja lei que defina expressamente o “amicuscuriae”, há uma série de diplomas legislativos que trazem,indiretamente, essa figura. Entre elas podemos citar:

- Art. 31 da Lei nº 6.386/76 – Mercado de Capitais;- Art. 89 da Lei nº 8.884/94 – lei antitruste;- Art. 49 da Lei nº 8.906/94 – Estatuto da Ordem dosAdvogados do Brasil;- Art. 5º da Lei nº 9.469/97 – que estabelece prerrogativasda faz. Pública;- Art. 97 da Constituição Federal Incidente deInconstitucionalidade.

Há, também, leis mais recentes que chama o “amicuscuriae” de “terceiros”:

- Lei nº 9.868/99 – Lei da ADIn e ADc. Neste caso, háprevisão expressa da intervenção de terceiros.- Lei nº 9.882/99 – Lei da ADPF – também, da mesmaforma.- Lei nº 11.418/06 – Lei de Repercussão Geral.

Assim, diante da legislação pátria, a função atual do“amicus curiae” é de ajudar o juiz a proferir uma decisão,quando por dois motivos: a decisão afetara outras pessoase aquela pessoa que na sua imparcialidade traz provas aojuiz para auxiliar o juiz.

Portanto, mesmo sem lei é possível e necessário,generalizar o “amicus curiae”, quando houver umprocesso paradigmático ou em não sendo deva terum conteúdo valorativo muito forte.

Dessa forma, era possível considerar a utilidade dasargumentações trazidas pela Conectas, que serviriampara corroborar a decisão ora proferida.”

Assim, fica demonstrada a possibilidade jurídica da manifestação da

requerente como amicus curiae na presente ação civil pública.

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3) INTRODUÇÃOTrata-se de Ação Civil Pública com pedido de antecipação dos efeitos da

tutela proposta pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em face do

Estado de São Paulo em virtude do desrespeito e violações aos direitos de

liberdade de expressão e liberdade de reunião, direitos fundamentais

garantidos pela Constituição Federal e pelos principais tratados e

convenções internacionais das quais o Brasil é signatário.

O objeto da Ação Civil Pública é especificamente a atuação violenta e

repressiva da Polícia Militar do Estado de São Paulo diante do exercício

destes direitos pelos cidadãos do Estado de São Paulo, seja em

manifestações políticas, seja em festas e eventos culturais e esportivos, seja

em reunião cotidiana nas periferias.

Neste sentido, e considerando a atuação da ARTIGO 19 em defesa dos

direitos humanos, com foco na defesa da liberdade de expressão e de

informação, tendo atuado e monitorado os protestos que se intensificaram

em São Paulo e no Brasil a partir das manifestações de junho de 2013, é que

se apresenta este Amicus Curiae, com o objetivo de fornecer subsídios ao

DD. Juízo para melhor julgamento da presente Ação Civil Pública.

a) ObjetivoTendo esta situação em vista e considerando que o objetivo da ARTIGO 19 é

defender e promover a liberdade de expressão e o acesso à informação,

apresentamos o presente AMICUS CURIAE no qual iremos demonstrar que

a presente Ação Civil Pública deve ser acolhida pois a atuação do Réu,

Estado de São Paulo, repressiva e violenta durante as manifestações viola

gravemente direitos humanos e fundamentais tais como à liberdade de

expressão e a liberdade de reunião, isto porque, de acordo com os padrões

internacionais de liberdade de expressão:

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a) a liberdade de expressão é um dos direitos fundamentais

para o sistema democrático;

b) o direito de protesto no direito internacional é garantido pela

inter-relação dos direitos de liberdade de expressão, direito

de reunião e direito de livre associação;

c) o direito ao protesto é um componente essencial da

democracia e indispensável ao pleno exercício dos direitos

humanos, devendo ser garantido pelo Estado;

d) as restrições à esses direitos devem seguir estritamente os

padrões internacionais; e ainda

e) os objetivos e pedidos da presente Ação Civil Pública visam a

uma mudança na atuação da Polícia Militar do Estado de São

Paulo ante manifestações públicas políticas, culturais,

artísticas e cotidianas, para garantir o respeito aos princípios

constitucionais de liberdade de expressão e liberdade de

reunião.

4) PADRÕES INTERNACIONAIS SOBRE O DIREITO AO PROTESTOA fim de evitar a repetição de padrões internacionais já apresentados pela

Defensoria Pública do Estado de São Paulo na inicial e pela organização

Conectas Direitos Humanos em Amicus Curiae, a ARTIGO 19 apresentará

padrões e declarações complementares, deixando claro desde já que

endossa todos os padrões até o momento apresentados.

A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, garante o

direito de reunião no artigo XXI, que determina que “Toda pessoa tem o

direito de se reunir pacificamente com outras, em manifestação pública, ou

em assembleia transitória, em relação com seus interesses comuns, de

qualquer natureza que sejam”.

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É importante ressaltar que tanto a Corte Interamericana de Direitos

Humanos quanto a Comissão Interamericana de Direitos Humanos afirmam

que embora tenha sido adotada como declaração, e não tratado, a

Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem constitui fonte

internacional de obrigações para os Estados Membros da Organização dos

Estados Americanos.

Em uma contribuição conjunta para o Relatório de janeiro de 2013 do Alto

Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, os Relatores

Especiais para a liberdade de reunião pacífica e associação, para a liberdade

de expressão e opinião, e sobre a situação dos defensores dos direitos

humanos declararam que os Estados devem reconhecer o papel positivo de

protestos pacíficos, como forma de fortalecer os direitos humanos e a

democracia.6

O relatório reconhece que os protestos pacíficos são “um aspecto

fundamental de uma democracia vibrante” e que “os direitos à liberdade de

reunião pacífica e associação e liberdade de expressão e opinião, são

componentes essenciais à democracia e indispensáveis para o pleno

exercício dos direitos humanos e devem ser garantidos pelo Estado.” E

ainda ressalta que, em muitas instâncias, esses direitos têm sido

indevidamente restringidos ou negados na totalidade no contexto de

protestos pacíficos.

No Relatório de 2004 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos

sobre Manifestações Públicas como um Exercício da Liberdade de Expressão

e Liberdade de Reunião, enfatizou-se que os direitos à liberdade de

expressão e liberdade de reunião e associação pacíficas, assim como o

direito dos cidadãos de realizarem manifestações, são pressupostos para o

intercâmbio de ideias e demandas sociais como forma de expressão. Esses

6Relatório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos – “Medidas efetivas e melhores práticas para garantir a promoção e proteção dos direitos humanos no contexto de protestos pacíficos”. Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session22/A.HRC.22.28.pdf

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direitos “constituem elementos vitais necessários ao funcionamento

adequado de um sistema democrático que inclua todos os setores da

sociedade”.7

Nesse sentido, a Corte Interamericana de Direitos Humanos entende que a

“liberdade de expressão constitui um elemento primário e básico da ordem

pública de uma sociedade democrática, o que não é concebível sem o livre

debate e a possibilidade de vozes dissidentes serem plenamente ouvidas”.8

O Relator Especial para o direito à liberdade de reunião pacífica e

associação, Maina Kiai, em um relatório para a vigésima sessão do Comitê

de Direitos Humanos da ONU, expressou que os direitos à liberdade de

reunião pacífica e associação “servem como um veículo para o exercício de

muitos outros direitos civis, culturais, econômicos, políticos e sociais”. Para

o Relator, tal interdependência e inter-relacionamento com outros direitos os

transformam em um valioso indicador do respeito do Estado pelo exercício

de muitos outros direitos humanos.9

Em um recente Relatório, sobre esses direitos no contexto das eleições,

publicado em setembro de 2013, o Relator Maina Kiai afirmou ainda que os

direitos à liberdade de reunião pacífica e associação “são meios cruciais

para indivíduos e grupos de indivíduos participem dos assuntos públicos”. O

Relator também ressaltou que o exercício destes direitos “provê avenidas

através das quais as pessoas podem agregar e expressar suas

7Relatório disponível em: http://www.oas.org/en/iachr/expression/topics/social.asp

8See I/A Court H.R., Compulsory Membership in an Association Prescribed by Law for the Practice of Journalism, Advisory Opinion OC-5/85, Series A., No. 5, November 13, 1985, para. 69

9Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session20/A-HRC-20-27_en.pdf

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preocupações e interesses e empenhar-se para moldar uma governança

que atenda aos seus reclames”.10

a) Restrições ao direito de manifestação e protesto no direito internacionalO direito de manifestação e protesto, sendo considerado pelos padrões

internacionais de direitos humanos como um desdobramento dos direitos de

liberdade de expressão, liberdade de reunião pacífica e de associação, pode

estar sujeito a algumas restrições legítimas, conforme prevê a legislação

internacional.

Apesar de sua importância internacionalmente reconhecida, é certo que a

liberdade de expressão, e consequentemente o direito de manifestação e

protesto, não é absoluta. Em algumas situações, é justificável que se

interfira no exercício desta liberdade com o fim de proteger outros direitos

humanos, os direitos humanos de outrem ou a própria liberdade de

expressão em sua dimensão coletiva. A pergunta central, portanto, será

exatamente quando e sob quais circunstâncias o direito internacional

permite que as restrições sejam impostas.

A normativa internacional, por meio do artigo 19, parágrafo 3°, do Pacto

Internacional dos Direitos Civis e Políticos – PIDCP,11 é clara na resposta a

essas indagações e estabeleceu o chamado “teste de três fases”, com a

10Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session20/A-HRC-20-27_en.pdf

11Relatório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos – “Medidas efetivas e melhores práticas para garantir a promoção e proteção dos direitos humanos no contexto de protestos pacíficos”. Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session22/A.HRC.22.28.pdf

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finalidade de avaliar, caso a caso, se restrições à liberdade de expressão e

informação podem ser consideradas legítimas.

A “regra das três partes” determina que qualquer restrição à liberdade de

expressão deverá (i) estar prevista por lei e regulamento de forma clara e

objetiva, (ii) proteger um fim considerado legítimo perante o direito

internacional, são eles: respeito pelos direitos e reputações de outros, e a

proteção da segurança nacional, ordem, saúde e moral públicas. Os

governos nacionais não devem acrescentar outros objetivos a esses, e (iii) é

necessária para a proteção do propósito legítimo.

Além disso, o Relatório do Alto Comissário da ONU para Direitos Humanos

deixa expresso que “a liberdade de realizar e participar de protestos deve

ser considerada a regra e as limitações a isso consideradas uma exceção.

Nesse sentido, a proteção dos direitos e liberdades de outros não deve ser

usada como uma desculpa para limitar o exercício de protestos pacíficos.”12

Por esse motivo, os organismos internacionais de direitos humanos já

reconheceram que o fechamento de vias públicas durante manifestações,

por exemplo, não é um motivo legítimo para restringir o direito de protesto,

já que um dos objetivos dessa ação é justamente mobilizar e chamar a

atenção da população que circula diariamente pelas ruas da cidades.13

Da mesma forma, focos não generalizados de violência em uma

manifestação não devem ensejar a restrição da liberdade de expressão de

uma grande maioria que se manifesta pacificamente. O documento

elaborado pela Organização para a Segurança e Cooperação na Europa

(OSCE), intitulado Diretrizes sobre Liberdade de Reunião Pacífica, aponta

12Relatório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos – “Medidas efetivas e melhores práticas para garantir a promoção e proteção dos direitos humanos no contexto de protestos pacíficos”. Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session22/A.HRC.22.28.pdf

13Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session20/A-HRC-20-27_en.pdf

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que as manifestações podem se tornar não pacíficas, perdendo a proteção

garantida sob as leis de direitos humanos, devendo ser dispersadas de

maneira proporcional. No entanto, o documento ressalta que “o uso de

violência por um pequeno número de participantes em uma manifestação

(incluindo o uso de linguagem incitatória) não transforma automaticamente

uma manifestação pacífica em uma não-pacífica, e qualquer intervenção

deve objetivar lidar com os indivíduos envolvidos ao invés de dispersar o

evento todo.”14

Em muitos casos, a violência por parte dos manifestantes pode ser uma

resposta à violência de um Estado que reprime desnecessariamente e

desproporcionalmente o direito à manifestação. Nesse sentido, o Relator

Especial da ONU sobre Execuções Sumárias, Arbitrárias ou Extrajudiciais,

em seu relatório anual de 2011, atentou para o fato de que, em países onde

o direito à liberdade de reunião pacífica é suprimido, há maior probabilidade

de que as manifestações que ocorram se tornem violentas.15

Sabemos que, no entanto, casos de violências iniciados por parte dos

manifestantes não são a regra e que, na maioria das vezes, o foco de

violência pode ser facilmente localizado e sanado. Assim, o Relator Especial

da ONU, Maina Kiai, aponta que, de acordo com a Corte Europeia de Direitos

Humanos, “um indivíduo não deixa de usufruir o direito de liberdade de

reunião pacífica como resultado de violência esporádica ou outros atos

puníveis cometidos por outros no curso dos protestos se o indivíduo em

questão permanecer pacífico em suas intenções e comportamento”.16

O documento Diretrizes sobre Liberdade de Reunião Pacífica das OSCE ainda

enfatiza que, enquanto as manifestações se mantiverem pacíficas, elas não

14Disponível em: http://www.osce.org/odihr/73405?download=true

15A/HRC/17/28

16Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session20/A-HRC-20-27_en.pdf

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devem ser dispersas pelos agentes da lei e que a dispersão de

manifestações deve ser medida de último recurso, não devendo ser

utilizada, a menos que todas as medidas razoáveis para facilitar e proteger

os protestos já tenham sido utilizadas e somente se houver uma eminente

ameaça de violência. Quando for necessária, a dispersão deve ser

governada pelos princípios internacionais.17

Em seu Comentário Geral nº 34, de 2011, o Comitê de Direitos Humanos da

ONU declara que “quando um Estado membro impõe restrições ao exercício

da liberdade de expressão, isso não pode por em risco o direito em si. O

Comitê recorda que a relação entre direito e restrição e entre

norma e exceção não deve ser invertida”.18 (grifo nosso)

No Relatório sobre manifestações públicas e liberdade de expressão e

liberdade de reunião da OSCE, enfatizou-se a importância da participação

social, através de manifestações públicas, para a consolidação da vida

democrática das sociedades. Em geral, a liberdade de expressão e a

liberdade de reunião são de crucial interesse social, o que deixaria o Estado

com margens muito estreitas para justificar a restrição a esses direitos.

Nesse sentido, o propósito de estabelecer regulação quanto ao direito de

reunião não pode ser o de estabelecer bases para proibição de reuniões e

protestos.19

5) PROTESTOSDurante o ano de 2013, a ARTIGO 19 desenvolveu um estudo sobre os

protestos sociais que se intensificaram em todo o país a partir de junho20. O

estudo incluiu o monitoramento e análise de 696 protestos noticiados por

17Disponível em: http://www.osce.org/odihr/73405?download=true

18Disponível em: http://www2.ohchr.org/english/bodies/hrc/docs/gc34.pdf

19Disponível em: http://www.osce.org/odihr/73405?download=true

20http://www.artigo19.org/protestos/

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veículos da imprensa, análise de direito internacional e nacional, projetos de

lei e decisões judiciais.

Durante o monitoramento destes protestos a ARTIGO 19 identificou 13

principais violações cometidas pelo Estado, entre elas (i) ausência do uso de

identificação por parte dos policiais, (ii) vigilância dos manifestantes por

parte da polícia, (iii) monitoramento de dados pessoais e privacidade, (iv)

uso de armas menos letais e letais, (v) desproporcionalidade do efetivo e

das ações policiais, (vi) detenções arbitrárias, (vii) criminalização da

liberdade de expressão (através de dispositivos penais aplicáveis aos

manifestantes), (viii) censura prévia (através de decisões judiciais restritivas

do direto de manifestação), (ix) policiais infiltrados, (x) sequestros e

ameaças, (xi) defesa do patrimônio e do tráfego acima da segurança da

manifestação e dos manifestantes, (xii) impedimento do acompanhamento

das ações policiais (como revistas) e (xiii) mortes.

Dos 696 protestos analisados, em pelo menos 112 deles houve uso de

armas menos letais, ao menos 837 pessoas foram feridas e 2608 pessoas

detidas. Ainda, o estudo apontou 117 jornalistas agredidos e/ou feridos e ao

menos 10 jornalistas detidos.

Apesar de o Relatório abranger todo o Brasil, tais violações são também

cometidas pelo Estado de São Paulo, sobretudo através de usa Polícia

Militar. A Polícia Militar do Estado de São Paulo contribuiu e muito para os

números acima levantados.

Tal situação se deve, sobretudo, ante a ausência de protocolos de atuação

da Polícia Militar do Estado de São Paulo que respeitem os direitos humanos

e os direitos fundamentais constitucionalmente garantidos durante as

manifestações.

Desta forma, fica mais que flagrante a necessidade de acolhimento na

integralidade dos pedidos formulados na presente Ação Civil Pública pela

Defensoria Pública do Estado de São Paulo, uma vez que visam justamente

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a fornecer estes protocolos de atuação do Estado ante o direito de

manifestação.

Enquanto tais pedidos não forem acolhidos por este juízo e devidamente

implementados pelo Estado de São Paulo, as violações apuradas pela

ARTIGO 19 durante os protestos no ano de 2013 continuaram ocorrendo,

aumentando os preocupantes números aqui apresentados.

É justamente o que vem ocorrendo.

a) Protestos Durante a Copa do Mundo FifaA ARTIGO 19 durante os meses de Junho e Julho de 2014 acompanhou os

protestos que aconteceram durante a Copa do Mundo FIFA nas principais

capitais que sediaram os jogos. Foram analisados os protestos que se tem

notícia nestas cidades, independentemente de sua relação direta ou indireta

com o evento da Copa do Mundo.

A metodologia utilizada foi o acompanhamento dos principais veículos de

mídia do Estado e cidade sede e veículos de abrangência nacional, além de

veículos de mídia alternativos, páginas oficiais de movimentos sociais,

coletivos e ativistas, páginas dos eventos agendados pelo facebook, além

de contato com coletivos e ativistas que acompanham as manifestações.

Na cidade de São Paulo, ocorreram 23 manifestações durante o período da

Copa do Mundo, sendo que em pelo menos 4 delas, registrou-se algum tipo

de violência ou ilegalidade perpetrada pela polícia contra manifestantes e

jornalistas.

No dia 12 de Junho de 2014, dia da abertura da Copa do Mundo, foi

realizada uma manifestação nomeada “Grande Ato 12 de Junho Não Vai Ter

Copa”. Cerca de 150 policiais da Tropa de Choque, segundo notícias,

cercaram as ruas próximas ao Metrô Carrão, onde os manifestantes se

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reuniram, para impedir que a manifestação seguisse sentido estádio do

Itaquerão, onde iria acontecer a abertura da Copa.21

A Polícia Militar utilizou bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha,

bombas de efeito moral e spray de pimenta contra manifestantes e

jornalistas. Segundo relato dos Observadores Legais, ao menos 37 pessoas

foram socorridas pelo GAPP (Grupo de Apoio ao Protesto Popular, grupo

presta auxílios médicos e primeiros socorros aos feridos em manifestações),

com ferimentos decorrentes de estilhaços de bombas, balas de borracha,

asfixia por gás lacrimogêneo e mecânica decorrentes de esganadura, bem

como de golpes de cacetetes.22

21fontes: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/06/1469366-apos-confrontos-radial-leste-e-estacoes-do-metro-sao-liberadas-em-sp.shtml http://espn.uol.com.br/noticia/417502_policia-atira-bombas-e-balas-de-borracha-em-manifestantes-anti-copa

https://www.facebook.com/GappBrasil?ref=stream

http://advogadosativistas.com/advogados-ativistas-e-observadores-legais-registram-o-primeiro-dia-da-copa-do-caos/

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/06/1469230-pm-diz-que-cem-black-blocs-forcaram-confronto-nas-ruas-da-zona-leste.shtml

http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,confrontos-antes-de-jogo-em-sp-deixam-15-feridos-31-sao-presos,1510951

https://www.facebook.com/events/613104985455451/

https://www.facebook.com/maes.demaio/posts/473993422736363?comment_id=473996622736043&ref=notif&notif_t=comment_mention

http://esportes.terra.com.br/futebol/copa-2014/videos/manifestante-e-contido-com-gas-de-pimenta-e-preso-veja,7483135.html&novo_portal=1

http://esportes.terra.com.br/futebol/copa-2014/videos/veja-momento-em-que-reporter-da-cnn-e-atingida-em-protesto,7483030.html&novo_portal=1

https://www.youtube.com/watch?v=5_rsIYFVkZs

https://www.youtube.com/watch?v=Oo9_CZhG0_g

22Relato dos Observadores Legais - http://advogadosativistas.com/advogados-ativistas-e-observadores-legais-registram-o-primeiro-dia-da-copa-do-caos/

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Os Observadores Legais também registraram revistas pessoais realizadas

em transeuntes, sem justificativa legal, policiais sem tarjeta de

identificação, impedimento da atuação de advogados durante o

acompanhamento de revistas pessoais, violência deliberada contra

jornalistas, utilização de bombas e armas de fogo em um posto de gasolina,

utilização de bombas com data de vencimento raspada, agressão à

advogado, agressão à equipe de socorristas, entre outros abusos. Os

próprios Observadores Legais foram intimidados e relatam tentativa por

parte da Polícia Militar em apreender o material com as informações

colhidas ao longo dia (relatórios e câmeras).

No dia 23 de Junho de 2014 uma manifestação na Avenida Paulista

denominada “11º Ato Se Não Tiver Direitos Não Vai Ter Copa” também foi

palco de ilegalidades e abusos cometidos pela Policia Militar do Estado de

São Paulo.23

Segundo relatos do Advogados Ativistas e Observadores Legais, policiais da

“tropa do braço” formaram um cordão de isolamento e passaram a revistar

qualquer cidadão que desejasse adentrar na avenida paulista.

Um vídeo feito pelos Observadores Legais mostra policiais sem

identificação. Durante a filmagem, policiais militares abordam os

Observadores Legais e questionam o motivo da gravação, um policial tenta

retirar o celular que está sendo utilizado para fazer a filmagem.24

23Fontes: https://www.facebook.com/events/314226452067197/?fref=ts http://spressosp.com.br/2014/06/24/para-advogado-manifestacao-em-sp-e-encarada-como-crime-organizado/

http://advogadosativistas.com/enquanto-o-brasil-joga-e-a-democracia-que-esta-em-jogo-estado-de-excecao-na-copa/

24http://www.youtube.com/watch?v=Cym7FUpmbQ8

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Segundo relatos, um Advogado Ativista foi revistado e outro impedido de

acompanhar a ação da polícia, sob empurrões e agressões verbais.

Durante este mesmo Ato, os manifestantes Rafael Marques Lusvarghi e

Fabio Hideki Harano, foram detidos sob a alegação de estarem portando

material explosivo, além de associação criminosa e incitação à violência.25

A prisão dos dois manifestantes deu origem ao “Ato Libertem Nossos Presos

Políticos”, realizada no dia 26 de junho de 2014, também na avenida

paulista. Já antes do inicio da manifestação a Polícia Militar abordava

pessoas aleatoriamente no vão do MASP, lugar marcado para a

concentração dos manifestantes.26

A Polícia Militar tentou impedir que os manifestantes saíssem do vão do

MASP, mas os manifestantes interditaram uma via da paulista a partir das

19h. Segundo o Jornal a Folha de S. Paulo, o tenente-coronel Marcelo

Pignatari chegou a exigir que uma liderança se apresentasse, caso contrário

a Polícia Militar não deixaria a manifestação prosseguir, exigência essa que

não encontra qualquer respaldo na legislação pátria ou internacional.

Em 01 de Julho de 2014 outro ato foi reprimido pela Polícia Militar do Estado

de São Paulo. O “Ato Democrático pela Libertação dos Presos Políticos -

25Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/06/1475354-manifestantes-detidos-sao-transferidos-para-a-cadeia-em-sao-paulo.shtml

26Fontes: https://www.facebook.com/maes.demaio/posts/479171352218570?comment_id=479179925551046&ref=notif&notif_t=comment_mention http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/06/1476972-grupo-fecha-pista-da-av-paulista-em-ato-contra-prisao-de-manifestantes.shtml

https://www.facebook.com/Filhosdaluta/photos/a.392434774189977.1073741828.392430847523703/508133679286752/?type=1&relevant_count=1

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=479188025550236&set=a.174007019401673.38528.173936532742055&type=1

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Trabalhadores da USP e Território Livre” foi cercado pela Polícia Militar na

Praça Roosevelt antes mesmo de seu início27.

Segundo noticiado, a polícia atirou bombas de gás lacrimogêneo, disparou

balas de borracha, spray de pimenta contra os manifestantes, advogados,

jornalistas e transeuntes. O professor da Escola de Artes, Ciências e

Humanidades da USP, Pablo Ortellado, em relato à Carta Capital afirmou que

se tratava de um debate, e não de uma passeata, ainda sim a Polícia atuou

de forma repressiva, mais uma vez tolhendo o direito de liberdade de

expressão e de reunião de centenas de pessoas ali presentes. Abaixo trecho

do relato do professor:

“Apesar de ser apenas um debate, bem no meio da praça, a Polícia Militar

enviou centenas de policiais da Tropa de Choque e da cavalaria, prendeu

arbitrariamente e provocou os presentes o tempo todo. A sensação de todos

nós é que a comparação com a ditadura não é mais metafórica.

Simplesmente a liberdade de reunião e a liberdade de manifestação estão

suspensas. Também como nos anos de chumbo, quem está dentro da

ordem, apenas acompanhando e torcendo pelos jogos, nem percebe as

graves violações pelas quais o país está passando.”

Durante todo o ato pessoas que buscavam adentrar a Praça Roosevelt eram

revistadas. A Polícia Militar chegou a apreender a biografia “Marighella”, que

estava na mochila de um dos manifestantes.

Além disso, dois Advogados Ativistas, Daniel Biral e Silvia Daskal foram

presos pela polícia militar. Daniel Biral ainda foi agredido fisicamente e

colocado inconsciente dentro da viatura. Os advogados foram presos

27Fontes: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/07/1479482-pms-cercam-ato-que-pede-a-libertacao-de-manifestantes-presos-em-sp.shtml http://www.cartacapital.com.br/sociedade/direitos-suspensos-relato-de-um-debate-em-praca-publica-5640.html

http://blogdomariomagalhaes.blogosfera.uol.com.br/2014/07/02/pm-apreende-marighella-em-protesto-queimara-livros-como-os-nazistas/

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quando questionavam a ausência do uso de tarjeta de identificação por

parte de alguns policiais que realizavam uma revista em manifestante.28

Tais fatos recentes demonstram a urgência do pedido contido nesta Ação

Civil Pública. A Polícia Militar do Estado de São Paulo vem sistematicamente

desrespeitando e atacando os direitos à liberdade de expressão e de reunião

de manifestantes, jornalistas, advogados, midiativistas, e da população,

direitos estes garantidos pela Constituição Federal (art. 5º IV, IX e XVI) e por

tratados internacionais ratificados pelo Brasil como a Declaração Universal

dos Direitos Humanos (art. 19 e art. 20), o Pacto Internacional dos Direitos

Civis e Políticos (art. 19 e art. 21) e a Convenção Americana de Direitos

Humanos (art. 13 e art. 15), conforme amplamente demonstrado pela

Defensoria Pública do Estado de São Paulo nesta Ação Civil Pública.

Os abusos cometidos pela Réu ferem ainda diversos protocolos

internacionais para a atuação da polícia como o Código de Conduta para os

Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, de 1979 e o Princípios

Básicos Sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários

Responsáveis pela Aplicação da Lei, de 1990, como também já amplamente

demonstrado pela peticionaria e pela organização Conectas Direitos

Humanos em Amicus Curiae.

6) VIOLAÇÕESVisando a acrescentar informações sobre os abusos e ilegalidades

cometidas pela Polícia Militar do Estado de São Paulo serão comentadas

abaixo algumas das principais violações que vem sendo cometidas durante

protestos de rua. Tais violações foram retiradas do Relatório elaborado pela

ARTIGO 19 no ano de 2013, conforme acima citado.

28https://www.youtube.com/watch?v=l_vBy3aimjc&list=UUmYuiV9wAR3i8p19Ygc7izg&index=72

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i) Ausência do Uso de Tarjeta de IdentificaçãoUm dos graves problemas constatado nas manifestações e eventos

relacionados pela Defensoria Pública de São Paulo, além das manifestações

ocorridas a partir de junho de 2013 e as manifestações durante a Copa do

Mundo aqui mencionadas, foi o fato de que muitos policiais militares não

utilizavam a identificação contendo o nome e a graduação presa à farda,

durante o acompanhamento dos protestos.

É certo que o uso de tal identificação é requisito legal para o exercício da

atividade policial, conforme consta, por exemplo, no Regulamento de

Uniformes da Polícia Militar do Estado de São Paulo, aprovado pelo Decreto

Lei Nº 28.057 , de 29 de Dezembro de 1987:

“CAPÍTULO IX

Da Identificação Nominal

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Artigo 112 – É obrigatório o uso de identificação de posto e

nome ou graduação e nome, nos uniformes básicos ou

específicos abaixo discriminados29, sendo proibido nos

demais uniformes: [...]”

No entanto, constatamos que grande parte do efetivo policial que atua nos

protestos não utiliza a identificação obrigatória, e, inclusive, há casos em

que policiais se recusam a se identificar quando requisitados por

manifestantes e jornalistas. Durante os protestos do último ano, diversos

policiais foram ainda flagrados por manifestantes e jornalistas retirando a

referida identificação durante as ações policiais.

É muito grave que agentes do Estado, especialmente os policiais, cujo dever

é o de proteger e garantir a segurança dos cidadãos, bem como assegurar o

cumprimento da lei, retirem suas identificações durante a prestação de seus

serviços, agindo em desconformidade com o próprio regulamento de sua

corporação. A intenção repressora é transmitida pelo anonimato dos

agentes fardados e armados.

A ausência de identificação dificulta a apuração e a responsabilização dos

agentes policiais que extrapolem os limites de sua função e cometam

abusos durante os protestos, reforçando a tradição de impunidade para

violações aos direitos humanos, cometidas por agentes do Estado.

O Relator da ONU sobre o Direito à Liberdade de Reunião Pacífica e de

Associação, Maina Kiai, expressou a importância de agentes policiais

usarem identificação visível em seus uniformes, como parte de um contexto

em que o Estado tem a obrigação de estabelecer meios acessíveis e

efetivos para o recebimento de denúncias sobre violações de direitos

humanos ou abusos cometidos, de forma a responsabilizar os culpados.30

29Os uniformes básicos ou específicos “abaixo discriminados” são todos os uniformes constantes do Regulamento de Uniformes

30http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session20/A-HRC-20-27_en.pdf

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ii) Uso de Armas Não LetaisO uso pela Polícia Militar do Estado de São Paulo de armas consideradas

menos letais, como bombas de efeito moral e de gás lacrimogêneo, balas de

borracha, spray de pimenta e cassetetes, ainda é extremamente

desproporcional e abusivo, causando ferimentos graves e até mutilações,

como amplamente demonstrado pela Defensoria Pública.

Essas armas, longe de serem “não-letais”, como o termo propositadamente

empregado pela Polícia Militar sugere,31 causam sérios ferimentos,

mutilações e podem, sim, levar à morte.

Segundo a matéria publicada no site da Revista Galileu, uma lista do Centro

de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos constatou que, em

exposição prolongada ao gás lacrimogêneo, estimada em uma hora, os

efeitos podem levar a vítima a desenvolver lesões na córnea ou mesmo

cegueira, garganta e pulmões podem sofrer queimaduras avançadas e a

asfixia pode ser completa.32

O Relator Especial sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias

da ONU recorda que “o gás não faz discriminação entre manifestantes e

não-manifestantes, pessoas saudáveis e com problemas de saúde e

também alerta contra qualquer modificação na composição química do gás

com o propósito de infligir dor severa nos manifestantes e, indiretamente,

nos transeuntes espectadores” (A/HR/17/28).

As balas de borracha, por sua vez, podem também ser letais, dependendo

da distância do tiro e do local atingido na vítima, sendo que áreas como a

cabeça, a nuca, o peito e o rosto são as mais sensíveis a esse tipo de

munição. A orientação dada à polícia é para que se use esse armamento a

31http://menosletais.org/armas-menos-letais

32http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI339395-17770,00-COMO+FUNCIONAM+AS+BOMBAS+DE+GAS+LACRIMOGENEO.html

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pelo menos 20 metros de distância da vítima e em direção às pernas.33 No

entanto, não é o que ocorre na maioria das vezes e houve diversos casos de

pessoas atingidas no rosto por balas de borrachas, sendo que algumas

delas, atingidas no olho, perderam a visão, como o fotógrafo de São Paulo,

Sergio Silva, atingido por uma bala de borracha lançada pela Polícia Militar

enquanto cobria o protesto realizado no dia 13 de Junho de 2013.

Outra arma bastante utilizada nas manifestações que por seu uso

desproporcional e inadequado vitimou manifestantes foi a bomba de efeito

moral. O estudante de 19 anos, Vitor Araujo, estava na manifestação no dia

7 de setembro em São Paulo, na frente da Câmara Municipal quando um

policial atirou uma bomba de efeito moral em sua direção. Havia outros

manifestantes com Vitor, mas ele não conseguiu se proteger e a bomba

estourou ao seu lado. Os policiais militares tentaram resgatar Vitor, mas a

Tropa de Choque não deixou que passassem com o manifestante. O resgate

demorou mais de 50 minutos para chegar. Vitor perdeu a visão do olho

direito34.

É muito importante mencionar que as circunstâncias que permitem a

utilização de armas de baixa letalidade devem estar previstas

taxativamente em lei e que quando permitidas, o uso deve seguir uma série

de protocolos alinhados com os padrões internacionais. Houve diversos

registros de utilização desse tipo de armamento em manifestações que

seguiam pacíficas e o seu uso seria apenas para dispersar os

manifestantes.35 O levantamento feito pela ARTIGO 19 mostra que houve

33http://menosletais.org/bala-de-borracha/

34Veja depoimento de Vitor: depoimento de Vitor: https://www.facebook.com/photo.php?v=10151904430881613

35http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-06-07/grupo-faz-novo-protesto-contra-o-aumento-da-passagem-de-onibus-em-sao-paulo.html

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uso de armas não-letais em pelo menos 101 manifestações de Junho a

Dezembro de 2013.36

iii) Defesa do Patrimônio e do Tráfego x Segurança das ManifestaçõesEmbora seja função da policia militar a preservação da ordem pública, o que

inclui a preservação do patrimônio e a garantia da circulação do trânsito, os

protestos revelam que a ação militar visa desproporcionalmente esses

objetivos, através da repressão e da truculência, ao invés de uma ação

equilibrada que vise a garantia de que os protestos sociais ocorram da

melhor maneira possível.

A preservação do fluxo normal do trânsito e a liberação das vias têm sido

utilizadas como justificativa para a ação violenta da polícia durante os

protestos, mesmo quando os manifestantes bloqueiam as vias de forma

totalmente pacífica.

Além disso, quando há dano ao patrimônio público, mesmo que os efeitos

sejam irrisórios, perto daqueles que podem vir a ocorrer em caso de

confronto, a polícia militar e as tropas de choque se utilizam de força

desproporcional para garantir a preservação desse patrimônio.

Ainda que o patrimônio público e privado deva ser preservado, não é

legitimo e razoável que a polícia recorra à violência e ao emprego de armas

de baixa letalidade, que ferem gravemente muitos manifestantes, podendo

causar lesões irreversíveis e até a morte, para proteger muros e janelas de

eventuais depredações que possam ocorrer.

Além do mais, como ficou demonstrado durante as manifestações ocorridas

a partir de junho de 2013, a ação truculenta e repressiva da polícia tende a

36Relatório feito pela ARTIGO 19 sobre os Protestos a partir de Junho de 2013. Disponível em: http://www.artigo19.org/protestos/

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tornar os protestos ainda mais violentos e a gerar custos muito maiores

para a recuperação do patrimônio, além dos custos sociais, do que os

possíveis danos causados em uma manifestação, na qual a polícia aja

visando garantir a segurança e o fluxo pacífico dos manifestantes.

O Relator Especial para o direito à liberdade de reunião pacífica e

associação, Maina Kiai, endossando a afirmação do painel de experts do

Escritório para Instituições Democráticas e Direitos Humanos (ODIHR/OSCE),

declarou que “o fluxo livre do tráfego não deve automaticamente ter

precedência sobre a liberdade de reunião pacífica”.37

Ainda a este respeito, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos

também indicou que “as instituições competentes do Estado têm o dever de

desenvolver planos de operação e procedimentos que irão facilitar o

exercício do direito de reunião... [incluindo] redirecionar o tráfego de

pedestres e veículos em certas áreas”. O Relator Especial também aponta

uma decisão da Corte Constitucional Espanhola em que se estabeleceu que

“em uma sociedade democrática o espaço urbano não é somente uma área

para circulação, mas também para participação”.38

iv) Impedimento do Acompanhamento de Ações PoliciaisOutra situação que vem sendo denunciada por manifestantes e

comunicadores é o fato de policiais intimidarem e coagirem pessoas para

impedir que elas acompanhassem as abordagens e as ações policiais

durante os protestos. Vários relatos, como o dos Observadores Legais acima

mencionado, e vídeos demonstram que a agentes da Polícia Militar buscam

de forma sistemática, através do uso da violência e intimidação, impedir

que pessoas acompanhem as ações policiais como revistas e detenções, ou

registrem as ilegalidades por eles cometidas.

37http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session20/A-HRC-20-27_en.pdf

38http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session20/A-HRC-20-27_en.pdf

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Um vídeo gravado em 13 de Junho de 2013 mostra policiais da Tropa de

Choque xingando e ofendendo um cidadão que fazia gravações da ação

policial. O policial da Tropa de Choque ameaça agredi-lo se não parar a

filmagem e chega a tentar derrubar a câmera.39

No mesmo 13 de Junho de 2013 até mesmo um grupo de pessoas que

estava filmando a manifestação de um prédio foi atacado por uma bomba

de gás dentro do apartamento.40

Essa situação é extremamente preocupante, pois sabe-se que quanto mais

pessoas estiverem acompanhando as ações policiais, inclusive jornalistas,

menor é a chance de que se ocorram ilegalidades durante as abordagens e

maior a chance de que irregularidades sejam denunciadas, comprovadas,

apuradas e punidas.

A captura de imagens da ação policial durante os protestos deve ser

protegida, como uso legítimo do direito de liberdade de expressão e acesso

à informação de extrema importância para denunciar os abusos e identificar

as autoridades que cometem esse tipo de ilegalidade.

v) JornalistasConforme o gráfico abaixo41,é possível observar que existe uma correlação

entre o total de manifestantes feridos e detidos e os comunicadores que

passaram pela mesma situação. Com muita frequência, nos dias em que

aumentou ou diminuiu a violência contra os manifestantes, o mesmo

39https://www.youtube.com/watch?v=EDL1Ul79UgI#t=23

40http://mais.uol.com.br/view/zwuxgmhe6kop/manifestacao-sp--alvejados-pela-policia-dentro-de-casa-04024D1C3170C8A94326?types=A&

41O gráfico faz parte do levantamento feito pela ARTIGO 19 em 2013 e tomou como base somente os protestos em que houve dois ou mais jornalistas agredidos, feridos ou detidos. A escala usada para comunicadores é de 1-18 e para manifestantes é de 1-400. Mais informações e relatório completo disponível em: http://www.artigo19.org/protestos/

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ocorreu com os comunicadores. Ou seja, os protestos com maior violência

contra manifestantes tenderam a ser mais violentos contra os jornalistas

também.

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Jornalistas agredidos/feridos/ detidos Número total de detidos/feridos

Não apenas táticas para impedir indiretamente o registro das ações policiais

durantes os protestos foram relatadas pelos profissionais que cobriam as

manifestações, muitos jornalistas e comunicadores foram intencionalmente

atingidos pela polícia, na tentativa de impossibilitar que a cobertura e o

registro da violência policial continuassem. Diversos depoimentos vídeos 42

apontam que, mesmo depois de se identificarem como profissionais e

42Vídeo mostra a PM atacando a imprensa mesmo após haverem se identificado: http://www.youtube.com/watch?v=TvtmaL3rSLIJornalista é perseguido e espancado por diversos policiais: http://www.youtube.com/watch?v=043RmwFwero

Repórter da folha atingida no olho por bala de borracha: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/06/o-depoimento-de-giuliana-vallone-jornalista-atingida-no-olho-pela-pm.html

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afirmarem que estavam cobrindo as manifestações, jornalistas continuaram

a ser ameaçados, agredidos e até mesmo detidos.

Essas ações são claramente uma forma de bloqueio para o debate público,

já que tentavam impedir que informações sobre a atuação policial ou

mesmo sobre a dinâmica dos protestos chegassem à população através dos

veículos de comunicação. O relator da ONU para o direito e a liberdade de

expressão e opinião, Frank La Rue, emitiu um comunicado em conjunto com

a relatora para liberdade de expressão da comissão interamericana de

direitos humanos da OEA43, em setembro de 2013, condenando a violência a

jornalistas e pessoas em geral que buscavam registrar os protestos. Frank

La Rue observa que “no contexto de manifestações e situações de conflito

social, o trabalho de jornalistas e comunicadores e o livre fluxo de

informações através dos meios de comunicação alternativos como as redes

sociais digitais, é fundamental para manter a população informada sobre os

acontecimentos, pois cumpre um papel importante de reportar a atuação do

Estado e da Força Pública ante as manifestações, prevenindo o uso

desproporcional da força e o abuso de autoridade”. (tradução livre)

O acesso a dados concretos – por meio de entrevistas com manifestantes,

agentes do Estado, fotos e vídeos – é importante para a formação de

opinião da população, que, uma vez bem informada, pode tomar inúmeras

decisões, como a de aderir ao protesto por se identificar com as

reivindicações. A presença dos jornalistas no meio das manifestações para

cobrir com precisão e detalhe o que estava a acontecendo ali é muito

importante para uma análise mais plural e sólida sobre o contexto social do

país.

43Comunicado emitido em conjunto com a relatora para liberdade de expressão da comissãointeramericana de direitos humanos da OEA. Link para o texto na íntegra: http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=931&lID=2

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A Relatora Especial para Liberdade de Expressão da Comissão

Interamericana de Direitos Humanos, Catalina Botero Marino, já asseverou

que “os atos de violência cometidos contra jornalistas ou pessoas que

trabalham em meios de comunicação e que estão vinculados com sua

atividade profissional violam o direito destas pessoas de expressar e

compartilhar ideias, opiniões e informação e ainda atentam contra os

direitos dos cidadãos e das sociedades em geral de buscar e receber

informações e ideias de qualquer tipo”.44

O termo comunicadores é entendido pela Relatoria a partir de uma

perspectiva funcional, como sendo aqueles indivíduos que descrevem,

documentam e analisam acontecimentos declarações, políticas e qualquer

proposta que possa afetar a sociedade, com o propósito de sistematizar

essa informação e reunir fatos, analises e opiniões para informar a setores

da sociedade ou a toda sociedade. Esta definição inclui também os que

trabalham em meios de comunicação comunitários, “cidadãos jornalistas” e

outras pessoas que empreguem novos meios de comunicação como

instrumento para alcançar o público.

No mesmo sentido, o Relator Especial da ONU para Liberdade de Expressão,

Frank La Rue, já afirmou que um ataque contra jornalistas é “um atentado

contra os princípios da transparência e responsabilidade, assim como contra

o direito de ter opiniões e participar de debates públicos, que são essenciais

em uma democracia”45

44CIDH. Relatoría Especial para la Libertad de Expresión. Comisión Interamericana de Derechos Humanos. “Violencia contra periodistas y trabajadores de medios: Estándares interamericanos y prácticas nacionales sobre prevención, protección y procuración de la justicia”. 2013. Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/expresion/docs/informes/iNFORME_VIOLENCIA_2013.pdf

45Naciones Unidas. Asamblea General. Informe del Relator especial sobre la promoción y protección del derecho a la libertad de opinión y expresión, Frank La Rue. A/HRC/20/17. 4 de junio de 2012. Párr. 54. Disponible para consulta en:

http://ap.ohchr.org/documents/dpage_s.aspx?m=85

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Para Relatoria para Liberdade de Expressão da CIDH “quando tais delitos

ficam impunes, isto fomenta a reiteração de atos violentos similares e pode

resultar no silenciamento e na autocensura dos comunicadores”46

É exatamente o que vem ocorrendo no Estado de São Paulo, até o presente

momento não há notícias de qualquer agente do Estado responsabilizado

pelos abusos e ilegalidades cometidos pela Polícia Militar do Estado de São

Paulo durante as manifestações que se intensificaram a partir de Junho de

2013.47

Nesse sentido a Relatoria para Liberdade de Expressão da CIDH afirma que

“se pode dizer que as pessoas que estão sujeitas à jurisdição de um Estado

podem ver afetados seus direitos fundamentais por conta de ações de

agentes estatais ou por condutas perpetradas por terceiros, as quais se não

são investigadas darão lugar a responsabilidade estatal pelo cumprimento

da obrigação de garantir a proteção judicial”48

Segundo a Relatora, os Estados Membros da OEA estão obrigados a

assegurar que seus agentes não interfiram nos direitos a vida e a

integridade pessoal, estando os Estados obrigados a abster-se de realizar

atos que possam vulnerar diretamente estes direitos, como cometer atos de

violência contra seus cidadãos.

467 CIDH. Relatoría Especial para la Libertad de Expresión. Estudio Especial sobre la Situación de las Investigaciones sobre el Asesinato de Periodistas por motivos que pudieran estar relacionados con la Actividad Periodística (período 1995-2005). OEA/Ser.L/V/II.131. Doc. 35. 8 de marzo de 2008. Párr. 129.

47http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,nenhum-pm-foi-punido-por-abuso-em-manifestacoes-imp-,1132200

48CIDH. Relatoría Especial para la Libertad de Expresión. Comisión Interamericana de Derechos Humanos. “Violencia contra periodistas y trabajadores de medios: Estándares interamericanos y prácticas nacionales sobre prevención, protección y procuración de la justicia”. 2013. Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/expresion/docs/informes/iNFORME_VIOLENCIA_2013.pdf

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Ainda assim, a relatora ressalta que atualmente muitos dos atos mais

graves de violência contra jornalistas nas Américas são cometidos por

atores estatais. A Polícia Militar do Estado de São Paulo, conforme

amplamente demonstrado pela Defensoria do Estado de São Paulo nesta

Ação Civil Pública enquadra-se neste cenário, como um dos atores que mais

comete violências contra jornalistas, sobretudo no contexto das

manifestações.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos por sua vez já destacou que “o

exercício do jornalismo só pode se dar livremente quando as pessoas que o

realizam não são vítimas de ameaças nem de agressões físicas, psíquicas

ou morais ou outros atos de assédio”49

O monitoramento feito pela ARTIGO 19 das manifestações ocorridas em São

Paulo durante a Copa do Mundo FIFA demonstra que as violências e abusos

contra jornalistas permanece uma constante na atuação da Polícia Militar do

Estado de São Paulo.

Em 12 de Junho de 2014, dia da abertura da Copa do Mundo, durante uma

manifestação denominada “Grande Ato 12 de Junho Não Vai Ter Copa” as

jornalistas da CNN Barbara Arvanitidis e Shasta Darlington, foram atingidas

por estilhaços de uma bomba efeito moral atirada para dispersar

manifestantes.50

Na mesma manifestação o assistente de câmera do SBT, Douglas Barbieri,

também foi atingido por estilhaços de bomba e teve o rosto ferido e o

jornalista argentino, Rodrigo Abd, da agência de notícias Associated Press,

49Corte IDH. Caso Vélez Restrepo y Familiares Vs. Colombia. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 3 de septiembre de 2012 Serie C No. 248. Párr. 209.

50http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/06/jornalista-da-cnn-e-ferida-em-protesto-contra-copa-em-sp.html e

http://copadomundo.uol.com.br/noticias/redacao/2014/06/12/jornalista-da-cnn-e-atingida-por-bomba-e-sofre-ferimentos-em-protesto.htm

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teve a perna machucada após sentir impacto enquanto corria durante a

confusão.

vi) Monitoramento de Dados Pessoais e PrivacidadeOutra prática que afeta não somente o direito de liberdade de expressão e

de reunião, como também a o direito a privacidade é o monitoramento por

parte da polícia e dos órgãos de inteligência, de redes sociais e dados

pessoais de manifestantes na internet.

O direito a privacidade é garantido pela Declaração Universal dos Direitos

Humanos em seu Artigo XII, que determina que “Ninguém será sujeito à

interferência em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua

correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação” e que “todo ser

humano tem direito a proteção da lei contra tais interferências ou ataques”.

Está garantido também pelo Pacto Internacional dos Direito Civis e Políticos,

em seu artigo 17, que adota semelhante redação à Declaração Universal

dos Direitos Humanos, e, ainda, garantido na Convenção Americana de

Direitos Humanos, em seu artigo 11.2, que prevê:

Art. 11

2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas

em sua vida privada, na de sua família, em seu domicílio ou em

sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra e

reputação.

3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais

ingerências ou ofensas.

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O Relator Especial da ONU para Liberdade de Expressão, Frank La Rue,

expressou em seu Relatório de 2013, em que aborda a relação da liberdade

de expressão, privacidade e vigilantismo, que o “direito à privacidade é

frequentemente entendido como um requisito essencial para a realização

da liberdade de expressão”. O Relator ressalta que qualquer “interferência

indevida sobre a privacidade de um indivíduo pode tanto direta quanto

indiretamente limitar o livre desenvolvimento e a troca de ideias”.51

Segundo o Relator a privacidade pode ser definida como a presunção de

que os indivíduos devem ter uma área autônoma de desenvolvimento,

interação e liberdade, uma ‘esfera privada’ com ou sem interação com

outros, livre da intervenção do Estado e de excessiva intervenção não

solicitada por indivíduos ‘não convidados’. O direito a privacidade é também

a habilidade dos indivíduos de determinar quem possui informação sobre

eles e para quê essa informação é usada.

Conforme definido na Assembleia Geral das Nações Unidas na resolução

“Direito à privacidade na era digital”, adotada por consenso, os Estados têm

a obrigação de respeitar e proteger o direito à privacidade em conformidade

com o Direito Internacional dos Direitos Humanos, incluindo aí o contexto

das comunicações digitais.52

Nesse sentido, a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da

Comissão Interamericana de Direitos Humanos asseverou que as

autoridades devem abster-se de fazer intromissões arbitrárias na órbita do

indivíduo, de suas informações pessoais e de suas comunicações.53

51Disponível em: http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/RegularSession/Session23/A.HRC.23.40_EN.pdf

52Nações Unidas. Assembleia Geral. Resolução aprovada pela Assembleia Geral em 18 de dezembro de 2013. 68/167. O direito à privacidade na era digital. A/RES/68/167. 21 de janeiro de 2014. § 4. Disponível em: http://www.un.org/Depts/dhl/resguide/r68_es.html; Assembleia Geral. Departamento de Informação Pública. Gerenal Assembly Adopts 68 Resolutions, 7 Decisions as It Takes Action on Reports of Its Third Committee.

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A internet, que se mostrou ferramenta essencial para que a sociedade civil

pudesse se organizar e movimentar os protestos ocorridos em 2013, tornou-

se também um ambiente monitorado pela polícia, órgãos de inteligência e

até mesmo o exército, interferindo gravemente na privacidade de usuários e

a autonomia nos processos de comunicação entre os manifestantes.

Denúncias e notícias em todo o Brasil dão conta de tais órgãos tem

monitorado redes sociais, como o facebook, e até aplicativos de conversas

privadas, como o whatsapp.54

No Estado de São Paulo, no final de 2013, o Departamento de Investigações

Criminais da Polícia Civil afirma ter, infiltrado investigadores em sites para

monitoramento e, a partir disso, convocado “lotes” de até 80 manifestantes

para prestar depoimento no mesmo horário e local.55

Acredita-se que o intuito desses monitoramentos pela internet seja a criação

de bancos de dados sobre os manifestantes, incluindo informações pessoais

encontradas nas redes, como manifestações que participaram, grupos e

páginas frequentadas pelos manifestantes, bem como seus

posicionamentos políticos e comentários e publicações por eles postadas.

53Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão. Liberdade de Expressão e Internet. OEA/Ser.L/V/II. CIDH/RELE/INF. 11/13. 31 de dezembro de 2013.

54Fontes: http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,abin-monta-rede-para-monitorar-internet,1044500,0.htm http://www.brasildefato.com.br/node/25773

http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/06/1299632-exercito-monitora-crise-por-meio-das-redes-sociais.shtml

http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,abin-monta-rede-para-monitorar-internet,1044500,0.htm

http://www.brasildefato.com.br/node/25773

55http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/12/1381005-policia-de-sao-paulo-indiciou-13-dos-detidos-durante-protestos.shtml

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A questão do monitoramento e do vigilantismo da internet por parte da

polícia e dos órgãos de inteligência brasileiros é especialmente problemática

porque o Brasil ainda não possui uma legislação para tratar de dados

pessoais e privacidade na internet.

Desta forma, não existem padrões e limitações legais em âmbito nacional

para que o eventual monitoramento, se estritamente necessário, ocorra em

respeito aos direitos fundamentais, sobretudo o direito à privacidade e à

liberdade de expressão.

A espionagem de conversas particulares, bem como o cruzamento de dados

pessoais disponíveis na rede provocam uma sensação de insegurança nas

pessoas que desejam participar dos protestos, além de servir como uma

forma de intimidação. A privacidade é um direito fundamental e

complementa o direito à liberdade de expressão, na medida em que um

ambiente privado proporciona maior liberdade e segurança ao indivíduo que

poderá formar suas opiniões e expressar-se sem interferências externas e

receio de ser vigiado pelo Estado.

A Assembleia Geral das Nações unidas já reconheceu que o respeito à

liberdade de expressão on-line pressupõe a privacidade das comunicações.

Tal direito não pode ser exercido de forma plena, ao menos que haja um

espaço privado, livre de ingerências arbitrárias pelo Estado ou por

particulares.56

A jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, por sua vez,

já reconheceu que o direito a privacidade contido no art. 11 da Convenção

Americana de Direitos Humanos visa a garantir que as pessoas gozem de

56Nações Unidas. Assembleia Geral. Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais na Luta contra o Terrorismo, Martin Scheinin. A/HRC/13/37. 28 de dezembro de 2009. § 33. Disponível em: http://www.ohchr.org/EN/Issues/Terrorism/Pages/Annual.aspx; Nações Unidas. Assembleia Geral Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Frank La Rue. A/HRC/23/40. 17 de abril de 2013. §24. Disponível em: http://ap.ohchr.org/documents/dpage_s.aspx?m=85.

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um âmbito reservado de sua vida imune à intervenção, ao conhecimento ou

à divulgação pelo Estado ou por terceiros.57

Nesse sentido a Comissão Interamericana aponta que o direito à privacidade

protege, ao menos, quatro bens jurídicos que têm uma relação estreita com

o exercício de outros direitos fundamentais, como a liberdade de

pensamento e expressão. São eles (i) o direito a contar com uma esfera de

cada indivíduo protegido contra ingerências arbitrárias pelo Estado ou por

terceiros; (ii) o direito a governar a si mesmo nesse espaço solitário, por

regras próprias definidas de forma autônoma de acordo com o projeto

individual de vida de cada um; (iii) o direito à vida privada protege o

segredo de todos os dados produzidos nesse espaço reservado, ou seja,

proíbe a divulgação ou circulação das informações coletadas, sem o

consentimento do titular; (iv) o direito à própria imagem, isto é, o direito de

que a imagem não seja utilizada sem o consentimento de seu/sua titular.58

A privacidade deve ser entendida em sentido amplo como “todo espaço de

intimidade e anonimato, livre de intimidações e represálias, necessária para

que um indivíduo possa formar livremente uma opinião e expressar suas

ideias, bem como buscar e receber informações, sem ser forçado a se

identificar ou a revelar as suas crenças e convicções ou as fontes que

consulta.”59

57Corte IDH. Caso Fontevecchia e D’Amico Vs. Argentina. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 29 de novembro de 2011. Série C, Nº 238. §48.

58CIDH. Relatório Nº 82/10. Caso Nº 12.524. Fontevecchia e D’Amico. Argentina. 13 de julho de 201. §91 e seguintes.

59Nações Unidas. Assembleia Geral. Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Frank La Rue. A/HRC/23/40. 17 de abril de 2013. § 47. Disponível para consulta em: http://ap.ohchr.org/documents/dpage_s.aspx?m=85; Nações Unidas. Assembleia Geral. Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Frank La Rue. A/HRC/17/27. 16 de maio de 2011. §§ 53, 82 e 84. Disponível para consulta em: http://ap.ohchr.org/documents/dpage_s.aspx?m=85.

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Conforme os padrões internacionais, duas políticas concretas são

necessárias para a garantia da privacidade e da liberdade de expressão e

pensamento na internet: a proteção do discurso anônimo e a proteção dos

dados pessoais.60

A proteção do discurso anônimo, conforme a Comissão Interamericana de

Direitos Humanos, favorece a participação das pessoas no debate público,

evitando que sejam vítimas de represálias injustas pelo exercício de um

direito fundamental. Isto não se limita à participação em fóruns de debate

mas também “pressupõe a possibilidade de divulgar mobilizações sociais,

de convocar outros cidadãos a se manifestar, de organizar-se politicamente

ou de questionar as autoridades, mesmo em situações de risco”.61

Além disso, a Comissão já asseverou que para garantir um espaço privado

propício para o exercício do direito à liberdade de expressão deve-se

garantir a confidencialidade dos dados pessoais on-line.

Como se sabe, o uso de comunicações via internet gera riscos para a

privacidade, uma vez que tudo o que circula pela rede deixa “rastros

digitais”, o que implica que enormes quantidades de informações sobre as

pessoas podem ser interceptadas, armazenadas e analisadas por terceiros.62

60Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão. Liberdade de Expressão e Internet. OEA/Ser.L/V/II. CIDH/RELE/INF. 11/13. 31 de dezembro de 2013.

61Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão. Liberdade de Expressão e Internet. OEA/Ser.L/V/II. CIDH/RELE/INF. 11/13. 31 de dezembro de 2013.

62Relator Especial das Nações Unidas (ONU) sobre a Proteção e Promoção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão e Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA. 21 de junho de 2013. Declaração Conjunta sobre programas de vigilância e seu impacto na liberdade de expressão. Ponto 4-6; Nações Unidas. Assembleia Geral. Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Frank La Rue. A/HRC/17/27. 16 de maio de 2011. § 56. Disponível em http://ap.ohchr.org/documents/dpage_s.aspx?m=85.

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O Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à

Liberdade de Opinião e Expressão já asseverou que a interceptação e

retenção de dados sobre comunicações privadas contêm tanto uma

restrição direta do direito à intimidade quando uma violação do direito à

liberdade de pensamento e expressão.63

Conforme aponta o Relator, a violação da privacidade pode regar uma

restrição direta à liberdade de expressão quando, por exemplo – o direito

não puder ser exercido de forma anônima como consequência da atividade

de vigilância, porém pode ainda causa uma restrição indireta, uma vez que

a mera existência de um programa de vigilância pode gerar um efeito

inibidor sobre o exercício da liberdade de expressão.64

Contudo, as violações aos dados pessoais e à privacidade perpetradas pelo

Estado não ocorrem somente no âmbito digital. Além da frequente prática

da polícia de capturar de imagens fotográficas e/ou aos registros

audiovisuais de manifestantes, há uma crescente iniciativa por parte da

polícia em coletar dados pessoais de manifestantes e advogados nas

próprias manifestações. Os dados que vêm sendo coletados vão muito além

daqueles meramente necessários para a identificação de suspeitos. Pede-se

a identificação de contas nas redes sociais, preferências políticas etc. de

manifestantes e advogados, em uma clara intenção de monitorá-los em sua

totalidade – e aqui inclui- se mesmo aqueles que não estão sub suspeita.

63Nações Unidas. Assembleia Geral. Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Frank La Rue. A/HRC/23/40. 17 de abril de 2013. § 81. Disponível para consulta em: http://ap.ohchr.org/documents/dpage_s.aspx?m=85;

64Nações Unidas. Assembleia Geral. Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Frank La Rue. A/HRC/17/27. 16 de maio de 2012. § 53 e 55. Disponível para consulta em: http://ap.ohchr.org/documents/dpage_s.aspx?m=85; Nações Unidas. Assembleia Geral. Relatório do Relator Especial sobre a Promoção e a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais na Luta contra o Terrorismo, Martin Scheinin. A/HRC/13/37. 28 de dezembro de 2009. § 33. Disponível em: http://www.ohchr.org/EN/Issues/Terrorism/Pages/Annual.aspx

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7) CONCLUSÃO

O direito de manifestação e protesto no direito brasileiro está garantido pela

Constituição Federal, em seu artigo 5º, nos direitos à livre manifestação do

pensamento (inciso IV), direito à reunião pacífica (inciso XVI) e no direito à

livre associação (XVII).

Seguindo os padrões do direito internacional, esses direitos fundamentais

devem ser analisados em conjunto no âmbito de manifestações e protestos

pacíficos e devem ser garantidos pelo Estado, com vistas à fortalecer e

preservar o pleno exercício da democracia pelos cidadãos.

Ao contrário, o Estado de São Paulo vem, através da atuação de sua da

Polícia Militar, sistematicamente e reiteradamente desrespeitando esses

direitos humanos e fundamentais, de forma repressiva e violenta, tolhendo

seus cidadãos do exercício destes direitos e ainda, ferindo princípios

basilares do Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, a ARTIGO 19 recomenda a este juízo o acolhimento na

integralidade de todos os pedidos formulados pela Defensoria Pública do

Estado de São Paulo nesta Ação Civil Pública.

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8) PEDIDO

Ante o exposto a ARTIGO 19 requer a sua admissão como amicus curiae na

presente ação civil pública.

Caso não seja admitida a presente manifestação na qualidade de amicus

curiae, requer-se seu recebimento como memoriais.

São Paulo, 18 de Maio de 2015.

Camila Marques

OAB/SP nº325.988

Karina Quintanilha

OAB/SP nº 316.200

Pedro Eurico de Souza Cruz Teixeira

Estagiário de Direito

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