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PSI – Rev. Psicol. Soc. Instit., Londrina, v. 4, n. 1, p. 1-24, 2007 1 EXPECTATIVAS SOBRE O PLANEJAMENTO DE CARREIRA: UMA EXPERIÊNCIA NA UNIVERSIDADE Maria Sara de Lima Dias 1 & Dulce Helena Penna Soares 2 RESUMO Este trabalho consiste em um relato de experiência, necessário para um debate sobre o planejamento de carreira como preparo dos formandos para o processo de transição entre a universidade e o mercado de trabalho. Enfoca o levantamento de expectativa dos universitários matriculados na disciplina de Orientação e Planejamento de Carreira (OPC) desenvolvida em uma universidade federal. A disciplina tem como objetivos identificar valores, interesses, habilidades e prioridades individuais; refletir sobre as transformações que estão ocorrendo no mundo do trabalho e as influências e exigências na vida pessoal e profissional do trabalhador; planejar e preparar meios de organização na busca de uma colocação no mercado de trabalho. Configura-se também como uma possibilidade de auxiliar os formando a enfrentarem a ansiedade e o medo frente à transição para este mercado altamente competitivo. A partir da análise da narrativa obtida através da realização do cartaz das expectativas, configuraram-se cinco categorias empíricas: expectativas quanto à disciplina e visões de futuro, preocupações com a formação profissional; oportunidades no mercado de trabalho e o primeiro emprego; reflexões sobre formatura e as preocupações com o tempo. Estas categorias são discutidas à luz do referencial teórico apresentado. Palavras-chave: carreira; sentidos do trabalho; formação profissional; função na universidade; transição universidade mundo do trabalho. EXPECTATIONS ON CAREER PLANNING: AN EXPERIMENT AT THE UNIVERSITY ABSTRACT This work consists of an experiment report, necessary for a debate on career planning as undergraduate students’ preparation for the process of transition from academic life to the work market. It focuses on surveying the college student expectation enrolled in the course of Career Planning and Guidance developed in a federal university. The course has the purpose of identifying individual values, interests, abilities and priorities; reflecting on the transformations occurring in the world of work and the influences and requirements in the personal and professional life of the worker; planning and preparing forms of organization in search of a placement in the work market. It also represents a possibility of assisting the graduating students whenever facing the anguish, anxiety and fear of transition to such highly competitive market. From the assessment of the narrative obtained through building an expectation chart, five empirical categories are outlined: expectations about discipline and views of the future, concerns around professional background, work market opportunities and first job; reflections on graduation and concerns with time. These categories are discussed in the light of the theoretical references presented. Key-words: career; meanings of work; professional background; function of the university; transition from university to world of work. 1 Doutoranda do Programa de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná. Psicóloga especialista em dinâmica de grupos e gestão de Recursos Humanos. Docente da disciplina de Planejamento de Carreira pela UFSC 2 Psicóloga, Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de Strasbourg na França. Docente do Curso de Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC. Pesquisadora Produtividade PQ CNPq, 2006/2009. Coordenadora do LIOP – Laboratório de Informação e Orientação Profissional. Conselheira da ABOP – Associação Brasileira de Orientadores Profissionais. Publicou vários livros e artigos científicos no campo da orientação profissional

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PSI – Rev. Psicol. Soc. Instit., Londrina, v. 4, n. 1, p. 1-24, 2007 1

EXPECTATIVAS SOBRE O PLANEJAMENTO DE CARREIRA: UMA EXPERIÊNCIA NA UNIVERSIDADE

Maria Sara de Lima Dias1 & Dulce Helena Penna Soares2

RESUMO Este trabalho consiste em um relato de experiência, necessário para um debate sobre o planejamento de carreira como preparo dos formandos para o processo de transição entre a universidade e o mercado de trabalho. Enfoca o levantamento de expectativa dos universitários matriculados na disciplina de Orientação e Planejamento de Carreira (OPC) desenvolvida em uma universidade federal. A disciplina tem como objetivos identificar valores, interesses, habilidades e prioridades individuais; refletir sobre as transformações que estão ocorrendo no mundo do trabalho e as influências e exigências na vida pessoal e profissional do trabalhador; planejar e preparar meios de organização na busca de uma colocação no mercado de trabalho. Configura-se também como uma possibilidade de auxiliar os formando a enfrentarem a ansiedade e o medo frente à transição para este mercado altamente competitivo. A partir da análise da narrativa obtida através da realização do cartaz das expectativas, configuraram-se cinco categorias empíricas: expectativas quanto à disciplina e visões de futuro, preocupações com a formação profissional; oportunidades no mercado de trabalho e o primeiro emprego; reflexões sobre formatura e as preocupações com o tempo. Estas categorias são discutidas à luz do referencial teórico apresentado.

Palavras-chave: carreira; sentidos do trabalho; formação profissional; função na universidade; transição universidade mundo do trabalho.

EXPECTATIONS ON CAREER PLANNING: AN EXPERIMENT AT THE UNIVERSITY

ABSTRACT This work consists of an experiment report, necessary for a debate on career planning as undergraduate students’ preparation for the process of transition from academic life to the work market. It focuses on surveying the college student expectation enrolled in the course of Career Planning and Guidance developed in a federal university. The course has the purpose of identifying individual values, interests, abilities and priorities; reflecting on the transformations occurring in the world of work and the influences and requirements in the personal and professional life of the worker; planning and preparing forms of organization in search of a placement in the work market. It also represents a possibility of assisting the graduating students whenever facing the anguish, anxiety and fear of transition to such highly competitive market. From the assessment of the narrative obtained through building an expectation chart, five empirical categories are outlined: expectations about discipline and views of the future, concerns around professional background, work market opportunities and first job; reflections on graduation and concerns with time. These categories are discussed in the light of the theoretical references presented.

Key-words: career; meanings of work; professional background; function of the university; transition from university to world of work.

1 Doutoranda do Programa de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná. Psicóloga especialista em dinâmica de grupos e gestão de Recursos Humanos. Docente da disciplina de Planejamento de Carreira pela UFSC 2 Psicóloga, Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de Strasbourg na França. Docente do Curso de Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC. Pesquisadora Produtividade PQ CNPq, 2006/2009. Coordenadora do LIOP – Laboratório de Informação e Orientação Profissional. Conselheira da ABOP – Associação Brasileira de Orientadores Profissionais. Publicou vários livros e artigos científicos no campo da orientação profissional

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EXPECTATIVAS SOBRE O PLANEJAMENTO DE CARREIRA: UMA EXPERIÊNCIA NA UNIVERSIDADE

Maria Sara de Lima Dias & Dulce Helena Penna Soares

Introdução

A sociedade organizada sob o regime capitalista apresenta uma grande

complexidade no que se refere ao processo de orientação do sujeito para o planejamento

de uma carreira profissional e de sua inserção produtiva neste coletivo. Diante de um

mercado de trabalho (MT) instável, muitas carreiras desaparecem, às vezes devido ao

desenvolvimento de novas tecnologias ou por mudanças em seu processo produtivo. O

estudante recém formando tem a expectativa de trabalhar na área na qual se formou, e,

muitas vezes, por diferentes impossibilidades, precisa buscar atuar em outra diferente da

sua formação original.

O sentido do trabalho tem adquirido novas configurações frente aos ditames do

mercado, deixando de se revelar como algo que dá sentido a uma vida futura, para

representar meramente uma forma de adquirir bens de consumo na sociedade. O

trabalhador torna-se cada vez mais uma mercadoria para produzir outras mercadorias. O

trabalho é percebido como uma forma de se obter dinheiro, portanto o seu sentido está

fortemente vinculado ao valor deste na sociedade de consumo.

É uma difícil decisão para o aluno escolher uma carreira futura na qual ele

encontre uma satisfação pessoal, desenvolvendo um trabalho com sentido e retorno

financeiro, compatível com seus esforços e qualificação profissional. Há pouco tempo

atrás, a decisão por um curso superior era apenas um ato do sujeito, com uma

expectativa em torno de uma carreira orientada por modelos de profissionais bem

sucedidos, e, portanto bem remunerados.

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O desenvolvimento da orientação profissional (OP) e do atendimento

psicológico neste processo de escolha tem demonstrado uma necessidade do sujeito em

relacionar seu curso superior com as ofertas de trabalho. Na escolha de uma profissão

de nível superior, é importante não só auxiliar o sujeito a identificar uma área que lhe

traga satisfação pessoal, como orientar para que esta profissão também lhe permita uma

inserção ocupacional com remuneração adequada para sua sobrevivência.

Pretendemos discutir o necessário resgate do papel da universidade na

intersecção entre o curso ofertado pela instituição e a sua real conexão com as ofertas e

demandas de trabalho real. É necessário atender aos jovens formandos, na sua fase de

enfrentamento com o futuro, bem como repensar a função da universidade, que entrega

para este mercado milhares de jovens anualmente.

Dentro das instituições de ensino superior é importante desmistificar a questão

do trabalho e da futura carreira como um profissional. Deve haver uma preocupação

com seus egressos e suas expectativas, pois muitos alunos, após a formatura, na busca

empregos, se percebem fora das qualificações e requisitos exigidos. Estar fora do perfil

solicitado pode significar não só um mal estar gerado com a perspectiva do desemprego,

mas também a possibilidade de aceitação do subemprego, da inserção sob condições

precárias ou de trabalhar na informalidade. É indispensável aos jovens universitários,

nesta fase de transição, pensar sobre o futuro e realizar um planejamento de carreira

torna-se cada vez mais necessário.

Revendo o tema de carreira, frequentemente debatido por autores como Chanlat

(1996), Sennet (1999) Martins (2001), Schein (1993), Dutra (1992) e Lisboa & Soares

(2000), pode-se afirmar que ao longo do tempo o conceito se modifica. Carreira é um

termo de origem inglesa que significa estrada para carruagens, aplicada ao trabalho é

entendido como um percurso das atividades econômicas desenvolvidas ao longo da vida

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do sujeito. Mesmo nas sociedades mais industrializadas a questão do emprego para os

jovens é inquietante, portanto o percurso profissional e a carreira dependerá das

possibilidades profissionais ofertadas em determinado contexto.

Parece um paradoxo pensar em carreira e OP considerando a falta de empregos,

o declínio da ética no trabalho e a probabilidade de um horizonte profissional cada vez

mais abreviado. Porém, ao apreciar os sistemas de formação acadêmica em crise e a alta

demanda de jovens dominados por preocupações quanto ao seu futuro nos parece

essencial que esta temática seja exposta ao debate.

Os pressupostos teóricos da OP trabalham com a concepção de sujeito, como

autor de sua própria vida, isto é, como ser capaz de realizar o seu projeto de vida, onde

o escolher está entre aceitar ou não uma escolha dada por uma diversidade de

circunstâncias. “O homem pode escolher dentro de um leque de opções oferecidas pelo

sistema econômico e delimitadas pela classe social a qual pertence e pelas influências

familiares. Portanto, neste espaço se insere a OP” (Soares, 2002:40). Escolha, neste

contexto, não se refere à negação das determinações objetivas da existência do sujeito

antes remete à possibilidade de superação dos condicionamentos sejam eles

econômicos, familiares, políticos ou sociais que são históricos e contextuais.

Como professoras de uma universidade pública e gratuita, ao trabalhar com

jovens em final de curso, de diferentes graduações, constatamos um sentimento da

angustia frente à formatura e a transição para o mundo do trabalho. Para os formandos,

é uma época de reflexões sobre o que fazer, a partir do agora: se entrar no mundo do

trabalho ou seguir se profissionalizando através de novos cursos de pós-graduação. Se

for procurar um emprego aparecem dúvidas: como montar seu currículo, como se

apresentar a uma entrevista de emprego, onde procurar uma vaga. Se o sonho era de ser

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um profissional, este está começando a se realizar, no entanto para isso é preciso sair em

busca de oportunidades e estratégias de ação que os auxiliem nesta fase de transição.

Os valores que inspiraram os primeiros grandes planos de carreira, há mais de 50

anos, já foram em muito ultrapassados. São menos enfáticas as idéias de contribuir para

o progresso da empresa e da nação e de sentir-se socialmente mais responsável e útil.

Hoje, as expectativas de preservar a individualidade, obter satisfação no trabalho, se

diferenciar de outros pelos bens materiais, tendem a prevalecer quando o tema é

carreira. Portanto “não é fácil resgatar o sentido de pertencimento de classe, que o

capital e suas formas de dominação (inclusive a decisiva esfera da cultura) procuram

mascarar e nublar” (Antunes, 2005: 205).

Preocupados em romper a barreira entre universidade e o MT, permeiam o

universo do jovem, questões de identidade, frente à necessidade de responder ao “quem

é você?” A real oportunidade de poder responder dizendo o que faz da vida, sendo um

profissional e atuando em sua área de formação impõe um desafio para o jovem.

Movidas pela experiência de acompanhar a ansiedade destes jovens propomos o

levantamento de expectativas dos universitários que buscam a disciplina Orientação e

Planejamento de Carreira (OPC). Pretendemos compreender este momento de vida dos

formandos em sua inserção no mundo do trabalho, e poder auxiliá-los nas possíveis

decisões desta fase transições.

A proposta da disciplina de Orientação e Planejamento de Carreira (OPC)

Num mundo com uma economia em crescente globalização, com alterações

profundas nos sistemas de valores individuais, familiares e sociais, as carreiras tendem a

caracterizar-se pela incerteza, imprevisibilidade e insegurança. As novas dinâmicas do

MT ditam as regras da profissionalização, e novos cursos são criados nas universidades,

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representando novas áreas de conhecimento e possibilidades de atuação. Para auxiliar a

pensar estratégias possíveis de inserção profissional, foi criada a disciplina OPC.

Considerada como inovadora no contexto universitário, a disciplina “Temas de

Psicologia: Orientação e Planejamento de Carreira” foi criada no Departamento de

Psicologia pelo LIOP – Laboratório de Informação e Orientação Profissional em

parceria com a Central de Estágio de uma universidade pública e gratuita, com o

objetivo de melhor preparar os alunos de graduação para a entrada no MT.

Originou-se de um antigo projeto denominado PAF - Programa de Apoio ao

Formando, quando foi constatada a demanda dos alunos, dos mais variados cursos que

buscavam informações sobre como se apresentar a uma entrevista de estágio, elaborar

um currículo, e iniciar a sua trajetória profissional. A disciplina tem sido ofertada em

nossa instituição desde o ano de 2003.

A disciplina apresenta dois créditos semanais, é optativa para todas as

graduações, tendo como requisito de freqüência às aulas os alunos estarem cursando

pelo menos a metade do curso escolhido, a fim de já estarem vivenciando este processo

de transição. Em sua maioria já estão na busca de estágios e na preparação para a

formatura.

Tem como objetivos refletir sobre as transformações do mundo do trabalho, as

influências e exigências na vida pessoal e profissional do trabalhador, identificar

valores, interesses, habilidades e prioridades individuais, desenvolver metas

profissionais a partir do conhecimento de sua realidade; planejar um esquema integrado

de ações e providências para atingir o futuro almejado.

O conteúdo programático divide-se em quatro eixos temáticos, a saber:

Informação Profissional, Autoconhecimento, Auto-Avaliação e Planejamento

Profissional. Caracteriza-se como um processo teórico e vivencial, onde cada aluno é

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estimulado à reflexão, ao autoconhecimento e à busca de respostas próprias às suas

questões profissionais. Ao final é solicitado um Planejamento de Carreira escrito e

individual que deve conter: missão e metas profissionais de curto, médio e longos

prazos, determinando as etapas das ações, os meios para alcançá-los e desenvolvendo

um cronograma do processo.

Assim a disciplina OPC abordando temas como a relação entre trabalho e

emprego, o currículo profissional, processos de recrutamento e seleção de pessoal, se

compromete com os egressos em explicitar e debater novas formas de trabalho e gestão

de seu planejamento de carreira. A disciplina tem muitas atividades grupais, e funciona

como uma oficina, ministrada nas salas de Dinâmica de Grupo do curso de psicologia.

Neste artigo, apresentaremos um levantamento sobre qual a expectativa dos estudantes

que se matriculam na mesma.

Conhecendo qual a expectativa dos alunos

O presente levantamento realizado não direciona a disciplina, mas traz

elementos para uma melhor compreensão das expectativas dos alunos e na medida do

possível estas vão sendo atendidas nas atividades e conteúdos desenvolvidos no

decorrer do semestre.

Para conhecer a expectativa dos alunos optou-se por desenvolver a técnica

“Cartaz das Expectativas”, descrita em Soares (1993:42). Esta técnica se insere na

metodologia qualitativa e incorpora a questão do significado e da intencionalidade como

inerentes aos atos, às relações e às estruturas sociais. O estudo qualitativo pretende

apreender a totalidade coletada visando conhecer a demanda dos formandos que buscam

a disciplina.

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Desta forma, questionamos as preocupações dos jovens sobre o planejamento de

suas carreiras. Que sentidos estes dão a esta fase de transição entre a universidade e o

MT. Para atingir este objetivo, não houve seleção prévia dos participantes, todos os

alunos matriculados na disciplina foram convidados a colaborarem com este

levantamento.

O perfil dos participantes é composto por alunos dos cursos de: enfermagem,

jornalismo, educação física, psicologia, farmácia, nutrição, engenharia civil, mecânica,

química, sanitária, alimentos, elétrica, arquitetura, pedagogia, contábeis, administração,

automação, economia e serviço social, perfazendo um total de cento e vinte alunos

distribuídos em seis turmas.

O procedimento de coleta das informações foi realizado no primeiro dia de aula,

com cada uma das seis turmas da disciplina. Solicitou-se que, em grupos de quatro a

seis alunos, produzissem um cartaz onde representassem através de figuras e palavras

recortadas de revistas, quais as suas expectativas em relação à disciplina OPC,

totalizando vinte e quatro cartazes.

A proposta de um ambiente receptivo e de uma técnica de grupo, além do fato

dos alunos serem de vários cursos diferentes e se encontrarem para partilham seus

interesses, medos e expectativas em relação ao futuro, permitiu manter o foco da

pesquisa. Conforme Schütze (apud Bauer & Gaskel, 2002), a produção das narrativas,

pretende criar uma situação que encoraje e estimule o jovem falar sobre sua vivência

enquanto formando de um curso superior, e foi isto que aconteceu.

Neste estudo analisaremos somente as palavras e frases nomeadas nos cartazes,

consideradas como narrativas. Não utilizaremos as figuras, embora também trouxessem

uma riqueza de imagens, pois não foi possível anotar todos os significados mencionados

pelo grupo relativos à produção das mesmas.

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Na análise das informações, foram desenvolvidos os seguintes passos: leitura

inicial do material coletado, classificação das frases relativas às expectativas dos

formandos, releitura do material coletado até a emergência de categorias empíricas,

análise do material partindo da leitura do núcleo de significados mais recorrentes e

análise "final", resultado de reflexões, articulando o trabalho empírico com algumas

inferências teórico-conceituais.

Considerando a opção teórico-metodológica adotada, apresentamos a seguir a

conceituação das cinco categorias empíricas eleitas para este estudo: expectativas

quanto à disciplina e visões de futuro, preocupações com a formação profissional;

oportunidades no MT e o primeiro emprego; reflexões sobre a formatura e as

preocupações com o tempo. Ressaltamos o esforço de integrar essas categorias para

apreender a totalidade sócio-histórica do sujeito.

Dimensões de analise e discussão

A narrativa do jovem sobre sua vivência na transição entre a universidade e o

mundo do trabalho fez emergir dimensões nas quais esses atores se integram a um

contexto micro e macrossocial, e determinam o seu modo de pensar, sentir e agir na e

para a vida. Na realidade estar conectado a um grupo de alunos com objetivo

semelhantes, possibilita estabelecer novas trocas afetivas com colegas de outros cursos

pertencentes ao mesmo contexto universitário.

Igual importância foi dada às categorias institucionais, determinando as

"posições objetivas" (escolares, profissionais...), e às categorias de linguagem utilizadas

pelos sujeitos, para tomar a sério falas sobre si mesmo vindo de um sujeito incitado "a

se narrar" e entrando num diálogo particular, verdadeiro "exercício espiritual" segundo

Dubar (1998). Esta narrativa nos permitiu compreender como um momento de

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reprodução e ao mesmo tempo de transformação da realidade social na qual ele constrói

o seu fazer cotidiano.

1) Expectativas quanto à disciplina e visões de futuro

Representam preocupações e expectativas, o que leva os jovens a buscarem a

disciplina. Demonstrando os tipos de discursos construídos no contexto universitário e

as visões do futuro originadas dos cursos diferentes cursos de graduação.

Partindo da produção textual dos alunos, percebemos que os processos

identitários de acordo com Dubar (1998), ou posições de sujeito podem ser apreendidos

a partir de suas escritas, nas quais os formandos se justificam e se posicionam em

relação em relação as suas expectativas, tal como expresso nas falas: a posição que você

alcança no mercado, tem muito a ver com a energia que te impulsiona. Esta narrativa

nos remete a uma valorização do empenho individual, a energia que te impulsiona, para

atingir seus objetivos e metas profissionais independente do contexto macro-social. O

sucesso é atingido pelo empenho e dedicação do sujeito, único responsável por seu

sucesso ou fracasso profissional.

Então, a expectativa de ter sucesso faz com que o aluno se interesse em buscar a

disciplina OPC, como expresso nestas narrativas: orientados para o futuro. É o maior

projeto do Brasil. Percebe-se uma preocupação crescente quanto ao futuro profissional,

sendo este um dos fatores que motivam os alunos a buscarem orientação, e a construção

de um projeto de futuro voltado para obtenção do sucesso.

Suas narrativas também revelam medo: não tenho o direito de errar. A gente

acha que chegou à hora de decidirmos nosso futuro. Manual de sobrevivência. A

disciplina OPC é vista pelos alunos como uma orientação que lhes permita tomar

decisões sem medo, ou pelo menos com menor grau de ansiedade. Se a carreira era vista

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no início do século como um caminho a trilhar e a seguir, hoje quando chega à hora de

decidir seu futuro profissional, o jovem precisa de um verdadeiro manual de

sobrevivência. Seu interesse é que o curso lhe permita atingir este objetivo.

As alterações no processo produtivo trouxeram conseqüências objetivas “ (...) o

processo produtivo trouxe o planejamento, a organização, o controle do trabalho, mas só

encontra a sua energia na geração incontrolável de mercadorias. O mundo se tornou o

mundo das mercadorias, onde todas as esferas da vida se vêem penetradas pelas

necessidades, “provenham elas do estômago ou da mente” (Cruz, 1999: 177).

A disciplina OPC aparece como uma possível solução para os problemas dos

jovens formandos, quase como uma garantia de seu futuro profissional: você pode:

garanta seu futuro. Programe a sua viagem. Passaporte. Tranqüilidade no lugar de

problemas. E difícil chegar lá sem determinação. Mas é impossível chegar lá sozinho.

Caminho para a vitória. É hora de dialogar. Ganhar equilíbrio. Expressões como

buscar tranqüilidade, equilíbrio e segurança são constantes, como alternativa para fugir

a sensação de insegurança ou desfiliação social, segundo Castel (1998). Uma sensação

de estar sozinho, ou isolado da sociedade como um todo, “um sentimento de ruptura das

redes de integração primárias dadas a partir de um desatrelamento com respeito às

regulações dadas a partir do encaixe na família, na linhagem, no sistema de

interdependências fundadas sobre o pertencimento comunitário” (Castel, 1998: 50).

Além deste medo de não integração do sujeito social, encontramos também um

sentimento místico e mágico em relação ao porvir, como se uma visão do destino

permeasse seus futuros profissionais, como um véu que encobre o amanhã: Mistério.

Inspiração oportuna. O futuro não lhe pertence, é mistério ou inspiração divina. Este

futuro também revela o medo de não conseguir colocação no mercado nacional, e

necessariamente precisar procurar emprego em outro país: nossos profissionais são

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como craques de futebol: fazem sucesso no Brasil depois vão para a Europa. Esta

narrativa reflete os efeitos da globalização sobre as práticas sociais dos formandos ao

buscarem inserção profissional. Ao se inscrever na sociedade é importante participar do

processo produtivo, é se inscrever como um trabalhador, retomando experiências dos

jogadores de futebol que fazem sucesso fora do país, muito jovens universitários

evidenciam a real possibilidade de seguir este modelo de trabalhador.

As expectativas explicitadas em suas narrativas apresentam-se permeadas pelos

efeitos da globalização e da política liberal. Refletem seus impactos sobre as oscilações

de oferta e procura por postos de trabalho, a busca de segurança para tomar decisões e

os limites de suas condições. O modo como os formandos percebem sua vida

profissional futura e a necessidade de ajuda, neste processo de transição, mostra uma

expectativa social de que não errem: eu não tenho o direito de errar.

2) Preocupações com a formação profissional

A opção pelo curso superior não resume a totalidade dos interesses dos jovens,

em sua maioria evidenciam a necessidade de ampliar seus conhecimentos e continuar

desenvolvendo sua formação acadêmica, condição fundamental para manter sua

perspectiva de emprego futuro. O seu fazer reflete o que pensam sobre a educação: a

educação é uma estrada. A educação é vista pelos alunos como uma possibilidade de

construção de uma trajetória profissional e muitas vezes, significa ascensão e

mobilidade social. Segundo valores constitutivos da classe-que-vive-do-trabalho,

conforme Antunes (2005) reporta que o compromisso com a educação é considerável,

visto como uma via que permite sua pensar uma carreira profissional.

Muitos estudantes buscam se identificar com personagens sociais, na produção

de seus cartazes, onde espelham seus projetos profissionais: é fácil reconhecer quem

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está no rumo certo. As imagens de pessoas bem sucedidas coladas nos cartazes

demonstram uma identificação com profissionais de sucesso a partir dos padrões de

vestimenta utilizados. Este reconhecer que está no rumo certo, em sua narrativa, nos

remete à aparência das pessoas de sucesso ou o status de cada profissão. “Para alguns,

os fatores sociais, a questão do status da profissão, as melhores possibilidades do

mercado de trabalho podem ser os verdadeiros determinantes naquele momento da

escolha” (Soares, 2002: 95).

A educação é um processo contínuo e necessário para se manter empregável na

constante busca de qualificação, o domínio de idiomas é essencial: Inglês. Sem um outro

idioma, não dá. Pesquise no mercado. O conhecimento assume o papel de principal

fator de produção na chamada “era da informação” assim a educação é vista como via

para o emprego, os cursos de pós-graduação são quase uma obrigação a ser cumprida.

Por outro lado os alunos demonstram uma grande necessidade de pesquisar o mercado,

de saber quais as exigências das carreiras para que consigam se adequar a elas.

Contudo a formação contínua significa também um investimento, nem sempre

acessível a todos. Assim, para muitos jovens, a preocupação com a formação

profissional se limita às suas possibilidades econômicas, posicionando o jovem dentro

de uma cultura do risco, analisam ser um risco pertencer a um grupo que sustente

apenas um diploma universitário. Apesar da intensificação da busca por uma maior

qualificação, esta se constitui como: uma imensidão de problemas. Investir e se

qualificar na ultima fase do curso, é assumir uma imensidão de problemas, mesmo para

os alunos mais privilegiados economicamente.

Contatamos, porém, no modo de vida dos formandos, que os investimentos em

educação, se concentram na busca por melhores resultados nos históricos escolares e se

relacionam sempre à perspectiva da competitividade. “A vida social é, então, pelo

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menos como tendência, assimilável a certo número de riscos (sociais). Estar coberto

contra o conjunto dos riscos seria estar em segurança total” (Castel, 1998:383) Como

enfrentar o risco? Para muitos, a preocupação com a formação profissional é a

possibilidade de fazer sozinho, de conseguir a almejada independência e autonomia,

sendo necessário todo o esforço para buscar alguma garantia de segurança, isto é, de

estar superqualificado.

O futuro profissional mais tranqüilo é visto pelos formandos através de uma

possibilidade se transformar de empregado em patrão: a sua empresa. Ser o dono de seu

negócio. O negócio é ser patrão. Ter a sua empresa é um fator de segurança contra o

desemprego ou um futuro incerto. Aqueles que já vivenciaram situações de desemprego

em suas famílias de origem ou através do discurso de outros colegas vêem a

possibilidade de serem donos de seus negócios futuros como uma forma de se colocar

ao abrigo das contingências do mercado.

Segundo Dubar (1998) qualquer trajetória dos sujeitos implica objetivamente em

uma seqüência de posições sociais e em uma história pessoal cujo relato atualiza visões

de si e do mundo. Como expresso neste trecho: Somos feitos de carne, mas temos que

viver como se fossemos feitos de ferro. Para sobreviver no mundo altamente

competitivo, percebem que devem se transformar em ferro, em ser superpoderosos. Na

elaboração dos cartazes, o grupo formula narrativas, expressando sentimentos presentes

na coletividade. Na esfera do trabalho futuro, é fundamental a luta por manter-se

empregável, e, cada vez mais consolidada, a visão do “homem de aço”, imbatível, e

capaz de viver no limite, para acompanhar a competitividade do mundo moderno.

Interessados em investir em sua formação profissional, a necessidade de auto-

estima é fundamental, para conseguir superar os obstáculos que se apresentam em sua

trajetória: sou o melhor. Tem que ser o primeiro em tudo na vida. Você é o que você faz.

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Segurança e vida melhor. Dúvidas não, sucesso. Ser o melhor, manter sua auto-estima

elevada, é evitar os acasos do futuro, os lances de sorte ou azar, é buscar a garantia de

segurança e de uma vida melhor.

A idéia de que a realização profissional só acontece com a satisfação pessoal é

expressa em suas narrativas: estou feliz, pois faço o que gosto. A vida é assim mesmo:

num dia a gente ganha, no outro a gente ganha de novo. O que constitui a centralidade

do discurso dos universitários é a necessidade de ser vitorioso, de ganhar sempre, de ser

o primeiro, deste modo, a visão de futuro é envolvida por uma “normalidade” no padrão

de competitividade assimilado pelos jovens.

A preocupação com a melhor formação possível, é uma busca de garantias para

o futuro profissional, onde só os alunos mais dedicados se encontram no caminho certo,

no caminho do ganha, ganha! O formando vive no terreno da instabilidade e da

insegurança em relação ao futuro, a única certeza preponderante é a da contínua

mudança e da necessidade de continuar estudando sempre para se manter empregável.

3) Oportunidades no mercado de trabalho e o primeiro emprego

As emoções que permeiam a visão do jovem sobre seu futuro na competição por

um mercado extremamente severo refletem imagens fortes: quando chegar a sua hora

vai ver um grande túnel. Missão quase impossível. Começou a disputa. Os formandos

têm consciência de que deverão enfrentar muitos obstáculos em sua trajetória

profissional. A começar pelas vivências dos processos seletivos, onde muitos candidatos

se debatem na seleção para as melhores oportunidades de estágio, e somente uns poucos

conseguem passar, vivenciando já na universidade a competitividade acirrada do MT.

Por outro lado, esta experiência muitas vezes pode desenvolver uma

insegurança: o que faremos de nossa vida profissional? Nós não vamos decidir. O

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desafio de ser o escolhido. Percebem que as tomadas de decisão sobre o primeiro

estágio ou emprego, sobre serem aprovados nos processos seletivos, não dependem

somente de seu empenho e dedicação. Outros fatores estão envolvidos: escolha o

melhor anúncio. Sobrevivência no Limite. Competitividade, isso vai pesar. Em pé de

guerra. Os conhecimentos técnicos adquiridos na universidade serão testados, e a

competitividade das disputas pelos melhores lugares afetam diretamente a subjetividade

dos indivíduos.

Consciente das transformações e solicitações do mercado, o jovem se sente

inseguro, principalmente sobre como se comportar nos processos seletivos, como fazer

para ser o escolhido ou o aceito. Buscam na disciplina OPC como uma forma de apoio e

orientação: estar com o jogo na mão. É difícil chegar lá sozinho.

Também apresentam a consciência da falta de estabilidade dos empregos atuais:

não adianta só conseguir o primeiro emprego, tem que ser bom o bastante para se

manter nele, mesmo diante da possibilidade e obter um emprego, é necessário

apresentar resultados para se manter nele. Assim o universo do jovem formando é

permeado por conflitos em relação ao seu futuro profissional, um misto entre fantasia e

realidade sobre o MT ainda desconhecido pelos jovens.

Esta consciência de que não se pode depender de seus empregos futuros, se

reflete em expressões como: mais cedo ou mais tarde vai surgir um executivo melhor

preparado que vai tentar tomar o seu lugar. Além da conquista do primeiro emprego, é

necessário todo um esforço para conseguir se manter diante desta instabilidade. Para

Dubar (1998) a categoria de "estabilização" é aplicada a todos os itinerários de inserção

de jovens, durante os três a sete primeiros anos após o fim de seus estudos.

Portanto as oportunidades de trabalho e as chances de obter um emprego ditam

normas de qualificação e disputa por perfis cada vez mais distantes de serem atingidos.

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As oportunidades que surgem são percebidas de uma maneira ou de outra como voláteis

ou com tendência a desaparecer, estas são condições que condicionam expectativas mais

ou menos otimistas de futuro profissional.

4)Reflexões sobre a formatura

Seus cartazes revelam os medos e expectativas dos jovens em relação à transição

e formatura deixa de ser um momento de celebração e comemoração por méritos

alcançados, para representar mais fortemente a ruptura entre o ambiente acadêmico e o

mercado profissional.

Este momento particular de suas vidas são expressos como metamorfoses e

transformações sociais, sentidas e sofridas: os últimos dias da lenta agonia. Mudança.

Caos. A vida em transformação. Mais perto do fim. Nas últimas fases de seus cursos de

graduação, a maioria dos alunos está envolta em trabalhos de conclusão de cursos, em

buscar estágios, ou conseguir um emprego. Para alguns, são tantas atividades

concomitantes envolvendo seu cotidiano no universo acadêmico, que simplesmente,

preferem focalizar sua atenção somente em passar de ano.

Somente vencer os obstáculos das notas e das disciplinas e conseguirem sua

formatura com o restante de sua turma, já é um grande objetivo a ser alcançado. Temem

seu futuro profissional, percebem que passaram a maior parte de seus anos de graduação

em atividades acadêmicas e desconhecem o MT, permanecem sem saber se possuem ou

não todas as qualificações exigidas.

Suas emoções são ambíguas, pois ao mesmo tempo em que sentem medo do

futuro, se orgulham da posição social ou status alcançado com a formatura: quem te viu

e quem te vê! Agora é só correr para o abraço. Opção pela qualidade. É hora de idéias.

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A vitória inacreditável. Vitória. Chance. A realidade. Este mês, seus desejos serão

realizados.

A imaginação do que é ser um profissional bem sucedido e feliz em sua

atividade parece depender unicamente da formatura. A carreira a ser trilhada se constitui

em uma outra etapa, quase que descolada de sua vivência no ambiente universitário.

Neste contexto, uma determinada posição social diferente do status de estudante é

esperada pelo formando, permeada de ansiedades. Sua rotina de sala de aula está para

terminar e ele deve necessariamente tomar decisões sobre o que fazer, onde estar, o que

escolher para sua trajetória profissional.

5) Preocupações com o tempo

Em seus cartazes, também revelam a compreensão da noção de tempo e espaço.

Para os formandos não existe tempo suficiente para pensar ou para tomar decisões,

mesmo assim devem fazê-lo. Estudando para provas, elaborando relatórios, o final do

curso é um tempo de escolhas: do estágio, trabalho ou do primeiro emprego. Todas estas

escolhas são necessárias e muitas vezes acabam por definir uma perspectiva de inserção

futura e, ao mesmo tempo, uma carreira profissional.

O seu discurso é permeado por sentimentos e emoções conflitantes: em busca do

tempo. Que horas são? “O tempo é minha matéria, o tempo presente os homens

presentes, a vida presente” (Carlos Drummond de Andrade em Mãos Dadas).

A pressa se faz presente no cotidiano dos formandos e devem estar sempre

atentos às oportunidades, para se inscreverem na sociedade como trabalhadores. Muitas

vezes estes jovens se sentem velhos, pelo que ainda não fizeram para se qualificar para

o trabalho: eu ainda não tenho o domínio de um idioma. Sou muito velho para ser

trainee em uma empresa. Conhecem alguns perfis das vagas e temem não terem

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conseguido construir uma qualificação adequada às demandas do mercado, durante o

período universitário.

Estão em busca de requisitos cada vez mais altos e a necessidade urgente de

tomadas de decisões: agora tenho que aprender mandarim, porque inglês todo mundo

já sabe. Seus projetos se alteram constantemente, mesmo sem terem um conhecimento

mais apurado de seu campo de atuação profissional. Na modernidade, com todas as

tecnologias desenvolvidas para facilitar a vida, há uma compressão do tempo e o

formando olha para seu futuro, sem tempo. Para enfrentar as necessidades presentes e

futuras de sua carreira, transforma sua vida diária em um constante desafio de superação

dos limites do tempo presente e do tempo futuro. Esta “correria” de final de curso leva a

perceber a carreira como um tempo que nunca chega.

Quanto ao futuro, os formandos de hoje, com cursos superiores, considerados

segundo (Antunes, 2005), no início do século XX como qualificados para o mercado,

não tem mais a segurança do diploma, e esta posição social já não é garantia de sucesso

pessoal ou profissional.

Considerações finais

Este relato pretendeu retratar a vivência das autoras na disciplina OPC como

uma forma de acolhimento aos estudantes em suas angústias e ansiedades sobre o

processo de transição entre a universidade e o MT. Direciona-se muito mais a revelar os

sentimentos e pensamentos da visão do sujeito sobre o seu futuro profissional, do que

em indicar propriamente um caminho a ser seguido.

Buscamos compreender as condições que influenciaram os alunos a se

matricularem na disciplina OPC. Nosso objetivo em sala de aula é constituir um espaço

para a expressão e reflexão de suas dificuldades, potencialidades, recursos e limitações,

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no enfrentamento desta fase de transição. Nesse sentido, através das vivências em grupo

e atividades realizadas, foi possível evidenciar as expectativas e visões sobre o futuro

dos jovens, revelando suas preocupações; oportunidades e temores diante deste

momento.

Buscando apreender a totalidade sócio-histórica dos sujeitos quanto às

expectativas sobre a disciplina OPC, o primeiro aspecto a ser considerado é que o

planejamento de carreira apresenta-se aos olhos dos formandos como uma possibilidade

de pensar sobre o futuro pretendido. As expectativas, nem sempre realistas, são de que a

disciplina OPC fosse um manual de sobrevivência, ou a solução dos problemas na

decisão sobre o futuro: programe a sua viagem, pois a proposta de ensino contempla um

processo de ajudar a pensar, a elaborar o currículo e a preparar-se para uma entrevista

de seleção.

O espaço criado pela disciplina OPC revelou jovens de fato preocupados em

conseguir se inserir e sobreviver em um MT altamente competitivo. Nos remete a

pensá-los como sujeitos concretos, inseridos numa realidade social e histórica, que se

depara a todo momento com dilemas para realizarem suas escolhas profissionais. São os

profissionais do futuro e pode-se dizer que a maioria dos graduandos pretende se inserir

na sociedade com uma atividade produtiva.

Sobre a visão do futuro, num mundo do trabalho em constantes oscilações, os

empregos bem pagos e mais ou menos estáveis, se tornaram um bem raro ou estão

desaparecendo. São suficientes os dados do desemprego, para afirmar que poucos

empregos qualificados e intelectualizados estão sendo disponibilizando aos jovens.

Neste sentido, os formandos vivenciam uma cultura do risco e imaginam a possibilidade

de que seus projetos não se efetivem. Portanto vêem o MT como um grande fantasma,

que os assombra e impõe barreiras, pelas faltas das qualificações exigidas.

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As poucas oportunidades do mercado e a questão do primeiro emprego são

vivenciadas como uma preocupação constante com os critérios de seleção profissional.

Crêem que as melhores notas serão avaliadas nos processos seletivos e estabelecem uma

convivência de disputa com seus pares por oportunidades de estágios. As reflexões

sobre a formatura aparecem de forma contraditória, permeadas por sentimentos de

sucesso de uma etapa vencida na vida, e ao mesmo tempo de angústia, quanto ao que

fazer depois da graduação. Determinantes estruturais macro-econômicos e

acontecimentos experienciados de desemprego na família, ou entre amigos, se refletem

na inquietação sobre o que fazer após o período universitário.

Frente aos ditames do mercado, os formandos expressam suas preocupações com

o tempo. Todo o tempo deve ser dedicado à profissionalização e a qualificação.

Emergem em suas narrativas, num futuro muito próximo, jovens envelhecidos e sem

tempo para o preparo profissional, resultante da interação do sujeito e seus pares e com

os mais diversos quadros da realidade.

O histórico da criação da disciplina e a perspectiva de aumento significativo do

número de alunos no decorrer dos anos, justificam para as autoras a importância da

centralidade do trabalho na vida dos formandos. Também nos remetem à seriedade em

analisar que condições são estas na modernidade, que levam os sujeitos a sentimentos

de angústia e medo quanto aos seus futuros profissionais, mesmo no contexto de

elevada escolaridade. Dependendo do grau de insegurança e dos esforços despendidos

durante o período acadêmico, muitos alunos chegam a sofrer de depressão nos últimos

anos universitários.

Este movimento de busca pela disciplina OPC, no seio de uma universidade

pública e gratuita, nos leva como professoras a refletir sobre a necessidade do

autoconhecimento, da informação profissional e da escolha, para os jovens nesta fase de

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transição. A OP deve ser um processo de “facilitação da escolha” (Soares, 2002:121)

sendo vista como possibilidade de trabalho possível, auxiliar a pensar, conscientizar

sobre os fatores que interferem na escolha.

Visa auxiliar a superação das angústias referentes às suas escolhas profissionais

intercalando o conhecimento teórico sobre o mundo do trabalho, do emprego e das

profissões, ou seja, a carreira objetiva com práticas de dinâmicas de grupos em sala de

aula que permitem espaço para compartilhar carreiras subjetivamente interiorizadas

pelos estudantes.

A possibilidade de compartilhar e de se comunicar com o grupo, permite retomar

temas como o MT, o emprego, os processos seletivos, que na maioria das vezes não são

abordados durante todo o período de graduação. O espaço da disciplina permite ao

jovem expressar suas ansiedades e medos em relação ao seu futuro profissional e, ao

mesmo tempo, a criar novos sentidos para o trabalho e repensar alternativas e

possibilidades de carreiras profissionais. Por mais que o futuro tende a se caracterizar

pela incerteza, imprevisibilidade e insegurança o fato de planejar afeta diretamente a

vida dos graduandos e os coloca ao abrigo de algumas das contingências a serem

enfrentadas.

Pretende-se com este estudo revelar a importância da psicologia atender aos

dramas destes sujeitos, que muitas vezes parecem invisíveis em nossas práticas diárias,

e carecem de entendimento e atenção. Quando o sujeito desencadeia processos

reflexivos na disciplina e estabelece relações grupais com outras áreas de conhecimento,

amplia sua visão de possibilidades de escolhas profissionais. Sobre seu futuro abre-se

um leque de alternativas até então não pensadas. A universidade deve auxiliar os jovens

no encaminhamento de soluções para os problemas vividos em sua futura inserção na

realidade social.

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Seria, portanto uma das tarefas da universidade, num mundo com uma economia

em crescente globalização, orientar sobre as alterações profundas nas formas e

oportunidades de trabalho. A disciplina OPC visa desenvolver um planejamento de

carreira com mais autonomia e iniciativa, auxiliando a enfrentar esta fase de sua vida,

refletindo sobre sua ação e podendo promover possibilidades de mudanças. Tem-se

consciência dos limites deste estudo, situado em uma problemática mais ampla, da

relação entre a universidade e o MT. Porém, pensamos ter contribuído, com este relato

de experiência, para o debate sobre as carreiras profissionais.

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