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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito
José Francisco Lemos
EXTRAFISCALIDADE, COMPETÊNCIA REGULADORA E TRIBUTÁRIA:
possibilidade e desafios ao emprego da norma tributária indutora pelos
estados federados
Belo Horizonte
2018.
José Francisco Lemos
EXTRAFISCALIDADE, COMPETÊNCIA REGULADORA E TRIBUTÁRIA:
possibilidade e desafios ao emprego da norma tributária indutora pelos
estados federados
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito. Orientador: Prof. Dr. Flávio Couto Bernardes Área de Concentração: Direito Público
Belo Horizonte
2018
FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Lemos, José Francisco
L557e Extrafiscalidade, competência reguladora e tributária: possibilidade e
desafios ao emprego da norma tributária indutora pelos Estados Federados /
José Francisco Lemos. Belo Horizonte, 2018.
152 f.
Orientador: Flávio Couto Bernardes
Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
1. Direito tributário. 2. Fiscalização tributária - Aspectos sociais. 3. Tributos -
- Finalidades e objetivos. 4. Política tributária - Legislação. 5. Federalismo -
Brasil. I. Bernardes, Flávio Couto. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. III. Título.
CDU: 336.2.01
Ficha catalográfica elaborada por Roziane do Amparo Araújo Michielini – CRB 6/2563
José Francisco Lemos
EXTRAFISCALIDADE, COMPETÊNCIA REGULADORA E TRIBUTÁRIA:
possibilidade e desafios ao emprego da norma tributária indutora pelos
estados federados
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação stricto sensu em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito. Orientador: Prof. Dr. Flávio Couto Bernardes Área de Concentração: Direito Público
________________________________________________________________
Prof. Dr. Flávio Couto Bernardes – PUC Minas (Orientador)
________________________________________________________________
Profa. Dra. Betina Treiger Grupenmacher (Banca Examinadora)
________________________________________________________________
Prof. Dr. Marciano Seabra de Godoi (Banca Examinadora)
Belo Horizonte, 08 de Março de 2018.
RESUMO
O objetivo desse trabalho consiste em investigar as potencialidades e limites ao uso
da extrafiscalidade pelos estados federados. A extrafiscalidade enquanto instituto
oriundo da ciência das finanças passou a ser debatida na seara jurídica como
ferramenta de indução de comportamentos com o objetivo de intervenção sobre o
Domínio Econômico, ficando conhecida como norma tributária indutora. Para a sua
perfeita identificação, há que se conjugar a finalidade da norma com a função por ela
desempenhada, entendendo-se por finalidade o aspecto relacionado à causa que
justifica a cobrança do tributo e por função a capacidade de influir na conduta dos
indivíduos através do agravamento do ônus fiscal. Outra questão fundamental para a
instituição da norma com intento extrafiscal reside na necessária cumulação de
competências constitucionais, tanto em matéria tributária como reguladora. Ao se
analisar a legislação do Estado de Minas Gerais sob a ótica de tais pressupostos
teóricos, e aplicando-se o método dedutivo de conhecimento, concluiu-se que o ente
possui importantes iniciativas em torno da utilização do tributo com função indutora ou
extrafiscal. Assim é que foram identificadas ações como a redução da base de cálculo
do IPVA para veículos movidos a álcool etílico hidrato combustível, ou a possibilidade
de dedução dos recursos aplicados em projetos culturais da base de cálculo do ICMS.
Destaca-se ainda a alíquota mais gravosa de ICMS (25%) para cigarros e a maior
parte das bebidas alcóolicas, além de armas e munições. Em relação ao ITCMD, tem-
se a isenção concedida à doação de bem imóvel pelo poder público com o fim de atrair
empresas industriais e comerciais para determinado Município, ou ainda da isenção
para doações vinculadas a programa de incentivo ao esporte ou à cultura. No que se
refere às taxas, identificou-se que a base da TFAMG e da TFRM, não guarda
necessária correspondência (ainda que relativa) com o custo da atuação estatal,
podendo ser dito que estariam a tornar mais ou menos onerosas determinadas
situações, o que resulta em potencial intervenção estatal no domínio econômico. Em
contraposição, considerou-se que as iniciativas até então adotadas terminam por se
revelar circunstanciais, isoladas e, por vezes, em aparenta contradição com outras
normas da legislação estadual.
Palavras-chave: Ciência jurídica. Direito Tributário. Extrafiscalidade. Competência
tributária e reguladora. Estados federados.
ABSTRACT
The purpose of this paper is to investigate extrafiscality in the Brazilian federal states.
Extrafiscality as an institute from the science of finance began to be debated in the
legal field as a tool to induce behavior with the objective of intervention on the
economic domain, being classified as tax inductive norm. For its perfect identification,
it is necessary to combine the purpose of the norm with the function it performs. That
said, by purpose is well known the aspect related to the cause that justifies the
collection of the tax and by function the ability to influence the conduct of individuals
through the escalation of the tax burden. Another fundamental request for the
institution of the norm with extrafiscal intent resides in the necessary cumulation of
constitutional competences, in both tax and regulatory matters. When analyzing the
situation of the State of Minas Gerais through such theoretical assumptions, and
applying the deductive method of knowledge, it was concluded that the entity has
important initiatives envolving the use of tax with an inductive or extra-fiscal function.
Thus, it was identified in the state legislation the reduction of the calculation basis of
the IPVA for vehicles powered by ethyl alcohol hydrate fuel, or the possibility of
deduction of the resources applied in cultural projects of the State Sales Tax (ICMS)
calculation base. The most elevated ICMS tax rate (25%) is also applied for cigarettes
and most alcoholic beverages, as well as weapons and ammunition. In relation to the
donation and succession tax (ITCMD), there is the exemption granted to the donation
of real state property by the public power with the purpose of attracting industrial and
commercial enterprises for a given municipality, or exemption for donations linked to a
program to encourage sports or culture iniciatives. Regarding rates or fees, it was
identified that the basis of the TFAMG and the TFRM, does not have necessary
correspondence with the cost of state action, and it could be said that they would make
certain situations more or less costly, which results in potential state intervention in the
economic domain. In contrast, it was considered that the initiatives still end up proving
to be circumstantial and sometimes in apparent contradiction with other norms of the
state legislation.
Keywords: Legal science. Tax Law. Extrafiscality. Tax inducing norm. Brazilian federal
states.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CNI – Confederação Nacional da Indústria
CTN - Código Tributário Nacional
Embratur – Empresa Brasileira de Turismo
FEMA – Fundação Estadual do Meio Ambiente
GATT – Acordo Geral de Tarifas e Comércio
GEE – Gases do Efeito Estufa
ICMS – Imposto sobre operações relativas à Circulação de Mercadorias e prestações
de Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação
ICM – Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias
IEF – Instituto Estadual de Florestas
IEPHA-MG – Fundação Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas
Gerais
IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados
IPTU – Imposto sobre Transmissão, e aos Municípios o Imposto sobre a Propriedade
Predial e Territorial Urbana
IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores
IOF – Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou
valores mobiliários
ISSQN – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza
ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação
PAC – Plano de Aceleração do Crescimento
POF – Pesquisa de Orçamentos Familiares
RICMS - Regulamento do ICMS
TCFA – Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental
TFRM – Taxa de controle, monitoramento e Fiscalização das atividades de pesquisa,
lavra, exploração e aproveitamento de Recursos Minerários
TFAS – Taxa de Fiscalização sobre serviços públicos de Abastecimento de água e
Saneamento
TFAMG – Taxa de controle e Fiscalização Ambiental do estado de Minas Gerais
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15 2 DIREITO E EXTRAFISCALIDADE ........................................................................ 21 2.1 Panorama da extrafiscalidade no ordenamento jurídico brasileiro .............. 21 2.2 Pressupostos para que a extrafiscalidade possa se tornar uma política fiscal efetiva e em conformidade com o Direito positivo ............................................... 31 2.3 Análise jurídica da extrafiscalidade enquanto instituto de direito tributário .................................................................................................................................. 35 2.4 Critérios de identificação da norma tributária indutora ................................. 37
2.5 Norma tributária indutora enquanto ente lógico-jurídico .............................. 46 2.5.1 Definição da norma jurídica segundo a teoria da norma jurídica proposta por Hans Kelsen .............................................................................................................. 46 2.5.2 Classificação da norma tributária indutora como espécie de norma jurídica .... 48 2.5.3 Identificação das normas tributárias indutoras a partir do seu fundamento de validade ..................................................................................................................... 53
3 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E REGULADORA APLICADAS À EXTRAFISCALIDADE .............................................................................................. 61 3.1 Competência tributária para edição de normas tributárias indutoras .......... 61 3.1.1 Impostos ........................................................................................................... 65
3.1.2 Taxas................................................................................................................ 68 3.1.3 Contribuições de Melhoria ................................................................................ 73
3.2 Relação da competência reguladora com a capacidade para instituir tributos com efeito indutor ................................................................................................... 75 4 EXTRAFISCALIDADE NO ÂMBITO DOS ESTADOS FEDERADOS ................... 81 4.1 Contextualização da extrafiscalidade aplicável aos estados federados ...... 81 4.2 Esferas de regulação e atuação dos Estados com possibilidade de introdução da norma tributária indutora ............................................................... 89 4.2.1 Aspectos gerais ................................................................................................ 89 4.2.2 Proteção ao meio ambiente e controle da poluição .......................................... 90 4.2.3 Produção e Consumo ..................................................................................... 101
4.2.4 Proteção e defesa da saúde ........................................................................... 105
4.2.5 Outros ramos de regulação e atuação dos Estados ....................................... 114
4.3 Investigação da norma tributária indutora no Estado de Minas Gerais ..... 115 4.3.1 Pressupostos teóricos de investigação .......................................................... 115 4.3.2 Extrafiscalidade quanto aos Impostos Estaduais ........................................... 116 4.3.3 Extrafiscalidade quanto às Taxas ................................................................... 122
4.3.4 Resultados encontrados a partir da análise desenvolvida.............................. 129
5 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 133
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................... 141
15
1 INTRODUÇÃO
Ao Direito enquanto técnica de controle social tem sido atribuída nova função
distinta daquela tradicionalmente conhecida, que o considerava estritamente do ponto
de vista repressivo1. Trata-se de papel que acompanha a passagem do Estado liberal
para o social2, marcada pela introdução de modernas ferramentas de controle social
com intuito de que fossem perseguidos novos fins propostos à ação estatal. Seriam
as ‘técnicas de encorajamento’ citadas por Bobbio (2007, p. 2), que passam a ser
difundidas em acréscimo, ou mesmo em substituição, aos tradicionais instrumentos
de desencorajamento3. Afirma o autor se tratar de técnica que reflete verdadeira
transformação na função do sistema normativo e no modo de realizar o controle social.
Marca a passagem de um controle passivo, mais preocupado em desfavorecer ações
nocivas, para um controle ativo, voltado para favorecer ações vantajosas. Neste
contexto, distingue a existência de um ordenamento protetivo-repressivo – ao qual
interessa, sobretudo, os comportamentos não desejados e cujo fim seria impedir a
sua prática – de um promocional, em que os comportamentos socialmente desejáveis
ganham relevância e que se busca sejam realizados até mesmo pelos recalcitrantes.
As medidas de encorajamento, próprias desse segundo caso, teriam por objetivo a
mudança, diferentemente daquelas de desencorajamento, em que se busca a
conservação social.
Com base na concepção apresentada por Bobbio (2007), identifica-se o
ordenamento pátrio como tendo encampado a ideologia de Estado social, conferindo
ao Direito caráter promocional. Ao figurar como precursora desta tendência, a
Constituição de 1988 integra em seu texto um conteúdo intensamente programático4.
1 Ou, como assinala Bobbio, fala-se tradicionalmente em função protetora e repressiva, isto é, de
proteção em relação a atos lícitos mediante a repressão daqueles que sejam ilícitos (BOBBIO, 2007, p. 2).
2 Segundo Schoueri, a ideologia que predominou até o início do último século preconizava a atuação do Estado como mero vigilante de uma economia que se autorregulava. Esta visão foi superada por um modelo a partir do qual o Estado passou a desempenhar um papel ativo e permanente nas realizações inseridas no campo econômico, assumindo atribuições para a condução e funcionamento das forças econômicas (SCHOUERI, 2005, p. 1).
3 No seu entender, para garantir a paz, bastaria a existência de normas que impeçam os diversos membros da sociedade de fazer mal uns aos autos, e que se inspira no ideal do Estado liberal clássico, entendido como simples guardião da ordem pública. Neste contexto, o direito se resumiria, pouco a pouco, ao direito penal, composto, em sua maioria, por normas ou comandos negativos (proibições).
4 A utilização do termo “programático” ou “norma constitucional programática” está sendo empregada na acepção revelada por José Afonso da Silva (2005), ao identificar cinco elementos na estrutura
16
Isso se explica, em parte, pelo que afirma Schoueri, no sentido de que o constituinte
se mostrou inconformado com a ordem econômica e social então vigente,
estabelecendo uma série de valores a serem concretizados pelo Estado e conferindo
ferramentas hábeis a alcançar a ordem desejada (SCHOUERI, 2005, p. 2).
Dentre os instrumentos alinhados com esse objetivo, destaca-se o tributo como
relevante mecanismo de transformação social. A sua atribuição, que antes era
concebida como neutra ou limitada a fins arrecadatórios, volta-se com a nova ordem
jurídica a ser idealizada para a prática da intervenção sobre o meio econômico e
social, almejando a concretização de novos valores prestigiados pela Constituição. A
manipulação do tributo com esse objetivo se faz através das conhecidas implicações
que a sua incidência tem sobre o comportamento social, ora induzindo a adoção de
condutas socialmente desejáveis e ora inibindo a prática daquelas que sejam
contrários ao interesse público. Longe de se tratar de mera faculdade conferida ao
legislador, o ordenamento impôs que fosse levado em conta o caráter indutor das
normas tributárias.
A indução é feita pelo caminho do incentivo financeiro ou prêmio, ponto em que
se revela como nítida técnica de encorajamento. A se adotar a conduta desejada pelo
legislador, ainda que consistente em uma omissão ou inércia do indivíduo, ter-se-á o
surgimento de consequência que implica em vantagem fiscal. Sobre essa particular
utilização do tributo com efeito indutor, tem se referido ao seu uso extrafiscal - ou
simplesmente extrafiscalidade -, que escapa da noção tradicionalmente construída de
que essa figura se limitaria à arrecadação de recursos aos cofres públicos, entendida
simplesmente como função fiscal - ou fiscalidade.
Já há algum tempo a extrafiscalidade vem sendo objeto de debate,
principalmente quanto à sua conformação jurídica, possibilidades, mecanismos de
controle ou limitações. Inclusive, inúmeros estudos tendem a analisar sua
aplicabilidade às medidas adotadas pela União Federal, principalmente em relação
aos tributos regulatórios, que são identificados como importantes mecanismos de
normativa constitucional, dentre eles os chamados “elementos sócio-ideológicos”, que seriam relevadores do caráter de compromisso das constituições modernas entre o Estado individualista e o Estado social intervencionista. Em outra obra do mesmo autor, Afonso da Silva (1968) desenvolve o conteúdo das chamadas “normas programáticas” como categoria normativa constitucional dos elementos sócio-ideológicos, concluindo que apontariam os valores sociais, especialmente o da justiça social, para cuja realização deve estar voltada toda a ordem jurídico política nacional, ou seja, normas que traçam fins sociais que devem ser cumpridas pelo Estado.
17
controle da economia. Pouco ou quase nada tem sido discutido a respeito do papel
dos Estados na instituição de tributos com pretensão extrafiscal.
Sabe-se que a Constituição tratou de repartir competências administrativas e
reguladoras comuns à União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Conquanto o
papel da primeira nessa função tem ganhando cada vez maior destaque, a dos demais
entes fica em segundo plano. No entanto, algumas justificativas têm sido levantadas
a esse respeito, como a aglutinação de competências, inclusive em matéria tributária,
em torno do Ente Central, o que termina por restringir a atuação dos demais entes
políticos. Também têm sido suscitadas preocupações em torno de um potencial
conflito entre Estados, tomando o imposto como instrumento para atrair investimentos
ao seu território, resultando em desestabilização da economia nacional.
Por outro lado, não se pode descuidar da circunstância de ter o ordenamento
imposto a utilização do tributo para que sejam alcançados fins outros distintos da mera
arrecadação, chegando até a preconizar o seu uso extrafiscal em determinadas casos.
Em sentido semelhante, não parece ter o constituinte excluído o papel dos Estados,
Distrito Federal e Municípios, nesta função, e sim pressupor a sua coparticipação.
O objetivo deste trabalho é, portanto, investigar a participação dos Estados na
instituição de normas tributárias com efeito indutor ou daquelas que tenham por
objetivo uma atuação extrafiscal. Para enriquecer a análise que se pretende
desenvolver, será analisada a situação do Estado de Minas Gerais, em especial de
quais medidas têm sido implantadas na legislação daquele ente e eventuais áreas em
que seja oportuna a utilização do tributo para alcançar fins constitucionalmente
relevantes. `
Por se tratar de projeto que envolve a (re)definição de conceitos abstratos do
Direito e a identificação no plano de legislação estadual da chamada norma tributária
indutora, a pesquisa utilizado foi do tipo teórica, sendo o procedimento para a coleta
de dados essencialmente oriundo da pesquisa bibliográfica, em que se apresentou
revisão ampla e sistemática da literatura especializada que trata do tema objeto de
estudo. Consequentemente, adotou-se a vertente jurídico-dogmática para resolução
do problema, tendo em vista que mostrou-se necessário confrontar a estrutura interna
18
do ordenamento jurídica e da relação entre as normas que autorizam a tributação
extrafiscal5.
Antes de enfrentar a problemática, porém, mostrou-se necessário entender
como a extrafiscalidade tem sido compreendida no contexto brasileiro, oportunidade
na qual foi demonstrando como parte da doutrina tem perfilhado um conceito extraído
da ciência das finanças para efeito de compreender um instituto que se diz jurídico. A
posição mais lógica parece ser aquela que identifica no fenômeno da extrafiscalidade
todos os casos em que o instrumento tributário estaria sendo utilizado para induzir o
comportamento dos indivíduos com o objetivo de buscar a intervenção sobre o meio
econômico e social. É o que Schoueri (2005) passa a designar por norma tributária
indutora.
Em seguida, foram apresentados alguns pressupostos para que se tornasse
viável a instituição da extrafiscalidade. Neste capítulo, o leitor irá notar que para a
introdução da norma tributária indutora é necessário que sejam perseguidos fins
constitucionalmente relevantes, que não se confundem com a mera arrecadação de
tributos. De toda sorte, há situações em que se mostra incabível a adoção da
extrafiscalidade, seja por uma imposição de que se adotem normas de direção ou
mandatórias como pelos impactos gerados que podem desvirtuar os propósitos
inicialmente estipulados.
Concluída essa etapa, foi desenvolvida análise quanto à feição jurídica da
extrafiscalidade, bem como dos critérios que permitam a sua identificação. Neste
tópico, restou demonstrado que a qualificação jurídica da extrafiscalidade depende de
que se identifique medida que tenha por objetivo induzir comportamentos em direção
à finalidade de relevância jurídica. Logo em seguida foram elencados os critérios
apontados pela doutrina para a identificação da norma tributária indutora. À vista do
insucesso das correntes que enxergam na finalidade a solução para o objetivo
proposto, recorrem alguns autores a uma visão pragmática do seu objeto. Esta,
contudo, deve necessariamente pressupor a conjugação dos aspectos normativos da
finalidade e função para dizer se há extrafiscalidade.
Não menos importante, ficou por saber se a norma tributária indutora se
qualifica como espécie normativa nova ou já existente. A esse respeito, não se 5 O modelo teórico de produção do conhecimento científico adotado foi do tipo ‘analítico’, pois que a
solução do tema-problema somente se mostra possível ante a investigação do caráter normativo da extrafiscalidade e a sua identificação no plano legislativo através destes mesmos critérios de identificação norma.
19
identificou espécie autônoma, mas mero desdobramento ou extensão da norma de
conduta que tem por objetivo a indução de comportamentos (função) em direção a
determinado objetivo jurídico (finalidade). Enfim, partiu-se do pressuposto de que é a
finalidade que legitima a norma tributária indutora, servindo ao lado da função como
critério para identificação da extrafiscalidade enquanto espécie.
Definidos os necessários pressupostos teóricos ao enfrentamento do tema,
buscou-se demonstrar que para que seja instituída a norma tributária indutora seria
necessária a cumulação das competências tributárias e reguladoras. Não obstante,
descartou-se as contribuições de melhoria por não serem compatíveis com o regime
da extrafiscalidade, isto é, não serem hábeis a provocar indução na conduta dos
indivíduos. Por outro lado, em relação à figura dos impostos e taxas, escolhidos para
análise por estarem inseridos na competência dos Estados, seria possível a
substituição da causa que justifica a sua cobrança por outra atinente à necessidade
de intervenção do Estado sobre o domínio econômico.
No último e derradeiro capítulo, cuidou-se de contextualizar a extrafiscalidade
à realidade dos Estados-membros, demonstrando a existência de impedimentos e
limitações à sua instituição. Em todo o caso, a utilização do tributo com viés indutor
se mostra factível e juridicamente possível, podendo ser aplicada em matéria de
impostos e taxas de competências estaduais para que seja atendida a atuação do
Estado em áreas que se inserem dentro da incumbência constitucional (proteção ao
meio ambiente e controle da poluição; produção e consumo; proteção e defesa da
saúde; dentre outros).
Especificamente quanto ao Estado de Minas Gerais, foram identificadas
importantes iniciativas em torno da utilização do tributo com função indutora ou
extrafiscal, principalmente em iniciativas como o incentivo ao consumo de
combustíveis e veículos menos poluentes, ou o apoio a projetos culturais, além do
desestímulo àqueles produtos nocivos à saúde (cigarro e bebidas alcóolicas).
Entretanto, em determinados áreas as medidas se revelam contraditórias e
aparentemente insuficientes para alcançar o objetivo proposto. Há ainda espaço para
que seja melhor desenvolvida uma política de tributação extrafiscal.
21
2 DIREITO E EXTRAFISCALIDADE
2.1 Panorama da extrafiscalidade no ordenamento jurídico brasileiro
Não se sabe precisar o momento exato em que a expressão “extrafiscal”
começou a ser utilizada pelos estudiosos e operadores do Direito, com intuito de dar
nome ao fenômeno observado na utilização do tributo com fins outros que não o de
prover o Estado com recursos para fazer frente às despesas públicas.
Sabe-se, contudo, que se trata de tarefa a ser logo superada, dada a urgência
em que se encarem novos desafios relacionados ao estudo da extrafiscalidade, dentre
eles a definição dos seus limites, aplicabilidade, mecanismos de controle e até da sua
própria análise enquanto ente lógico6.
Não há, por certo, congruência quanto aos critérios que permitam identificar a
existência de tributação extrafiscal. Alguns falam em divisão da extrafiscalidade
enquanto gênero e espécie, outros em própria e imprópria, estando presente nas
classificações propostas a evidência de que a expressão parece alcançar um extenso
universo de situações distintas entre si e que não cabem ser analisadas sob um único
conceito. A evolução do instituto deixa claro que já não basta definir o que seja
‘extrafiscal(idade)’, mas antes reconhecer que há distintas manifestações do
fenômeno, o que justifica que a Ciência do Direito se encarregue da tarefa de lhe
conferir caráter sistêmico.
A começar pelo objeto da Ciência das Finanças, Baleeiro (2004, p. 9) a
interpreta como o estudo da atividade fiscal, isto é, aquela desempenhada pelo poder
público com o propósito de obter e aplicar recursos para o custeio da rede de serviços
públicos. Enquanto a Ciência das Finanças é revestida de neutralidade, limitando-se
a descrever o seu objeto (ou certas ‘verdades’ como diz o autor), a Política Financeira
se utiliza desses mesmos pressupostos para definir diretrizes e indicar quais seriam
as medidas aptas à realização de certos fins. A Política Fiscal, como parte da Política
Financeira, inspira-se na manipulação dos tributos ou da série de medidas que o
tomem por instrumento de ação. Atualmente, porém, a Política Fiscal vem sendo
concebida como a aplicação de instrumentos financeiros para fins ‘extrafiscais’,
6 Isto é, no plano da norma jurídica.
22
abandonando-se a orientação clássica em torno das “finanças neutras”7 para a das
“finanças funcionais”, cujo sentido é influir sobre a conjuntura econômica, corrigindo
as depressões econômicas e processos inflacionários existentes, além da modificação
das estruturas subdesenvolvidas através de políticas anticíclicas8.
De fato, o crescente abandono do liberalismo pelo intervencionismo9 provocou
profundas mudanças no campo financeiro. Descreve Corrêa que a partir dessa
mudança passou a se perceber que medidas financeiras poderiam valer como
instrumento de intervenção no campo econômico e social, independentemente dos
gastos públicos. Ou seja, o gasto deixou de ser o único parâmetro para a modificação
da realidade social, passando os instrumentos de cunho financeiro a desempenharem
igualmente esse papel10 (CORRÊA, 1975, p. 1). Outras alterações também foram
sentidas:
No setor do orçamento, por exemplo, o princípio do equilíbrio orçamentário deixou de possuir a importância que os clássicos lhe davam, visto que os especialistas em finanças públicas procuraram não mais o equilíbrio contábil e ânuo de orçamento do estado, mas sim, o equilíbrio geral da vida econômica e social da nação, nascendo daí a idéia de orçamento cáclico. (CORRÊA, 1975, p. 1).
Por isso, o estudo da teoria financeira já não se faz de forma neutra em relação
à economia, quer sob o aspecto axiológico como técnico, não podendo se descuidar
7 “A finalidade das instituições deveria ser puramente fiscal, isto é, arrecadar fundos para o Tesouro,
abstendo-se de reger ou alterar a estrutura econômica ou política da sociedade. Essa concepção tradicional é designada como a das ‘finanças neutras’. Não é menos política por isso: deixando a sociedade como estava, a atividade financeira obedecia a uma política eminentemente conservadora.” (BALEEIRO, 2004, p. 26).
8 Ao estudar as medidas anticíclicas adotadas no Governo do Presidente Luna, Lukic (2015) identifica que em 2007 foi proposto o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) que estipulava ações para estimular o investimento público e privado, dentre elas desonerações tributárias para incrementar o investimento privado e aumentar o consumo. Com a crise internacional de 2008, estas medidas tidas como extrafiscais continuaram a ser adotadas, inclusive através de provimentos de emergência (isenções temporárias de impostos para estimular a produção, o comércio e o consumo). Uma das medidas de destaque foi a redução do Imposto sobre produtos industrializados (IPI) sobre automóveis.
9 Como assinala Corrêa, o Estado deixou de ser mero espectador das atividades econômicas, passando a agir como regente da economia, preocupado com o crescimento do produto nacional bruto e da distribuição da riqueza, além do bem estar e desenvolvimento urbano (CORRÊA, 1975, p. 2).
10 Nogueira reconhece que é no campo das receitas que o Estado transforma e moderniza seus métodos de ingerência, deixando o imposto de ser concebida como instrumento destinado exclusivamente a cobrir as necessidades financeiras do Poder Público (NOGUEIRA, 1971, p. 148-149).
23
do que Baleeiro (2004) passou a denominar de ‘finanças extrafiscais’11. A atuação da
Política Fiscal - que no campo econômico era conhecida pelo viés protecionista e
limitado à instituição de impostos alfandegários - vem sendo cada vez mais
redirecionada para fins “sócio-políticos”, de modificação da conjuntura e da estrutura
sócio-econômica.
Dentre os meios empregados para alcançar tais objetivos, utiliza-se o Poder
Público do tributo enquanto instrumento de intervenção e direção da economia,
desvinculado da preocupação de servir como meio prioritário de cobrir as despesas
públicas12. Daí que se passou a referir no campo da tributação à extrafiscalidade, não
mais restrita ao campo da Ciência das Finanças, mas agora de interesse do Direito.
Justamente pelo seu marcante viés financeiro, a extrafiscalidade foi identificada
pela doutrina, em um primeiro momento, como toda forma de tributação que não
estivesse relacionada ao objetivo precípuo do Estado em carrear recursos aos cofres
públicos13.
Spagnol (1993) assevera que a tributação não está mais adstrita ao orçamento
fiscal, não podendo ser concebida como simples meio de obter recursos para o
Estado. Ao tratar da ‘tributação extrafiscal’, reconhece a sua existência como sendo a
própria utilização do instrumental tributário com finalidade não fiscal. Prossegue para
criticar a posição daqueles que consideram que a perseguição de fins extrafiscais
merece ser regulada por princípios distintos e muitas das vezes contraditórios àqueles
aplicáveis na tributação fiscal. No seu entender, trata-se de uma “visão viciada de todo
o sistema arrecadatório fiscal”, tendo em vista que “não obstante determinados
tributos possam cumprir finalidades extrafiscais, implicam também arrecadação de
numerário” (SPAGNOL, 1993, p. 32-33).
11 Quer-se demonstrar que a atividade tributária longe de ser compreendida como um fim em si mesma,
é analisada segundo a sua influência em termos econômicos. Quando se fala em “finanças extrafiscais”, coloca-se em evidência a atividade financeira do Estado que é utilizada com viés de intervenção na economia.
12 O fenômeno chegou a ser identificado por Canto, que observou a existência de certos impostos que visavam fins outros que não a obtenção de meios econômicos e que, inclusive, comprometiam essa concepção. Segundo o autor, tais impostos seriam exceções dentro de um sistema impositivo, existindo aqueles que contestem o seu caráter tributário para considerar que seriam manifestação do exercício do poder de polícia. O autor advogada, porém, que as tendências mais modernas classificam a atuação do Estado, referida a estes meios, como tipo distinto da atividade financeira (CANTO, 19--, p. 23).
13 Buscou-se, com isso, recorrer a conceito que vinha sendo construído por outra área do saber para dar sentido a acontecimento que vinha sendo observado na seara jurídica.
24
Para Nabais (2005), a disciplina jurídica da extrafiscalidade reúne um conjunto
de normas que tem por finalidade principal a consecução de determinados resultados
econômicos ou sociais e não a obtenção de receitas para fazer frente às despesas
públicas.
Em sentido semelhante, Gouvêa (2006) considera que o Estado tributa para
auferir receitas, concretizando a supremacia do interesse público sobre o particular
através do princípio da fiscalidade14. Quando busca objetivos distintos, afastando-se
da mera arrecadação, pratica a extrafiscalidade. De toda forma, adverte que
fiscalidade e extrafiscalidade, estão sempre e necessariamente juntas, por ser
inconcebível que normas tributárias sejam avessas à arrecadação15.
Fiscalidade e extrafiscalidade, advirta-se, estão sempre e necessariamente juntas. Separam-se, apenas, hipoteticamente, para maior clareza de exposição. Eventualmente, na experiência jurídica, verifica-se a preponderância de um dos princípios, porém não supressão de um em prol da existência de outro. (GOUVEA, 2006, p. 47)16.
Tanto a fiscalidade como a extrafiscalidade, não teriam existência isolada,
porém conjunta, levando em conta que a tributação conta com dupla finalidade, ora
auferir recursos para que o Estado subsista e ora para garantir a realização dos
direitos fundamentais do cidadão ou de valores que excedem à mera arrecadação de
tributos17; embora sempre em consonância com o objetivo arrecadatório.
Em apertada síntese, pela fiscalidade, o Estado seria impelido à tributação com
o objetivo de garantir os meios necessários ao financiamento das suas finalidades
14 Para esclarecer o que se entende por fiscal ou fiscalidade, opta-se por nos filiar à posição de Gouvea
(2006) que identifica no instituto a noção de que o Estado tributa para auferir receitas com o objetivo de financiar suas atividades decorrentes da realização de suas atribuições constitucionais. Trata-se de tributação desvinculada de valores, afeita, apenas, a receita e despesas.
15 Em posição mais arrojada, Deodato sustenta que todos os impostos, em maior ou menor grau, seriam dotados de função extrafiscal. O doutrinador parte da suposição de que o tributo, em especial os impostos, seriam mecanismos cuja atuação prioritária seria no meio social, econômico e político, podendo, além dessas funções, possuir finalidade fiscal. De fato, todo o tributo é dotado de alguma finalidade, podendo ela ser do tipo fiscal (clássica) ou mais abrangente, envolvendo a atuação do Estado no meio social e econômico. O melhor, contudo, seria compreender que o tributo pode desempenhar diferentes funções, seja de forma concomitante como exclusiva. Nesse sentido, torna-se irrelevante investigar qual função precede a outra, uma vez que, na maioria dos casos, não há como fazer essa divisão (DEODATO, 1949, pp. 66-67).
16 Na acepção proposta, a extrafiscalidade restaria configurada como verdadeiro “princípio de legitimação da incidência tributária” (GOUVEA, 2006, p. 42).
17 Acrescenta Regina Helena Costa que se trata do emprego de instrumentos tributários para o “atingimento de finalidades não arrecadatórias, mas sim, incentivadoras ou inibitórias de comportamentos, com vistas à realização de outros valores constitucionalmente consagrados” (COSTA, 2005, p. 321).
25
constitucionalmente estabelecidas, e, através da extrafiscalidade, seria afastado –
desde que necessário e apenas em parte – do objetivo arrecadatório, para atingir
essas mesmas finalidades constitucionais18.
Também Grupenmacher se filia a corrente semelhante ao identificar que os
tributos extrafiscais ou regulatórios, assim como aqueles instituídos para financiar os
objetivos institucionais do Estado (tributos fiscais), também são cobrados para
abastecer os cofres públicos, com a única diferença que buscam precipuamente atuar
regulando alguma situação social, econômica ou política (GRUPENMACHER, 2017).
É o que defende Ávila, ao asseverar que as normas com finalidades fiscal
seriam entendidas como aquelas que visam primariamente carrear receitas para o
Estado, repartindo os encargos com base em elementos como a capacidade
econômica dos contribuintes. Já as normas com finalidade extrafiscal, são assim
consideradas como aquelas que visam a atingir algum fim público autônomo, tal como
a proteção do meio ambiente ou o desenvolvimento regional, distribuindo as
obrigações com base em elementos extrínsecos aos contribuintes (potencial poluidor
ou subdesenvolvimento regional) (ÁVILA, 2009, p. 65).
José Marcos de Oliveira cita como exemplo dos fins que orientam a tributação
extrafiscal a redistribuição da renda e da terra, a defesa da indústria nacional, a
orientação dos investimentos para setores produtivos - ou mais adequados ao
interesse público -, e a promoção do desenvolvimento regional ou por setor
(OLIVEIRA, 1999, p. 37).
Com o objetivo de precisar o conceito da extrafiscalidade, Ataliba propõe uma
definição mais detalhada do instituto como sendo o emprego dos instrumentos
tributários com objetivos não fiscais, mas regulatórios de comportamentos sociais, em
matéria econômica, social e política (ATALIBA, 1968, p. 150). Também Baleeiro adota
concepção próxima ao identificar na extrafiscalidade a utilização do instrumental
financeiro para provocação deliberada de resultados econômicos e políticos, listando
como exemplos a repressão da inflação e do desemprego, a restauração da
propriedade, a proteção da indústria nacional, a promoção do desenvolvimento
econômico ou o nivelamento das fortunas (BALEEIRO, 2004, p. 9).
18 Em outras palavras, como afirmam Jeronimo e Freitas, os tributos extrafiscais, quanto à sua
extrafiscalidade, são utilizados para orientar a atuação dos contribuintes nos setores mais produtivos, adequando-os ao interesse público (JERONIMO; FREITAS, 2013, p. 68).
26
Explicita Derzi que se trata de tributação que não almeja, prioritariamente,
prover o Estado dos meios financeiros a seu custeio, mas antes ordenar a propriedade
segundo sua função social19 ou a intervir em dados conjunturais ou estruturais da
economia (DERZI, 2004, p. 113).
[...] Para isso, o ordenamento jurídico, a doutrina e a jurisprudência tem reconhecido ao legislador tributário a faculdade de estimular ou desestimular comportamentos, de acordo com os interesses prevalentes da coletividade, por meio de uma tributação progressiva ou regressiva, ou da concessão de benefícios e incentivos fiscais. (DERZI, 2004, p. 113).
Ainda em Derzi é possível encontrar o entendimento de que não é fácil distinguir
os fins fiscais daqueles extrafiscais. A par da imprecisão e fluidez dos contornos entre
um e outro, não raro o ente tributante seria tentado a usar a extafiscalidade como
desculpa ou pretexto para estabelecer maior pressão fiscal (DERZI, 2004, p. 115).
Schoueri, em posição inovadora, defende o duplo sentido do termo
extrafiscalidade, sustentando que a expressão tanto pode se referir a um gênero como
a uma espécie. Para o autor, “o gênero da ‘extrafiscalidade’ inclui todos os casos não
vinculados nem à distribuição equitativa da carga tributária, nem à simplificação do
sistema tributário” (SCHOUERI, 2005, p. 32). Nesse ponto parece se aproximar da
definição pressuposta pela maior parte da doutrina, ao reconhecer que a
extrafiscalidade estaria vinculada a razões não fiscais e substancialmente distintas da
mera fiscalidade. Deles se distancia ao identificar no uso corriqueiro do termo
extrafiscalidade de uma acepção em sentido estrito para contemplar a universalidade
de casos em que o instrumento tributário estaria sendo utilizado para regular,
modificar, direcionar, desestimular o comportamento dos cidadãos com o firme
propósito de buscar a intervenção sobre o domínio econômico.
A extrafiscalidade enquanto espécie não incluiria as normas que, apesar de
serem movidas por razões não fiscais, estariam desvinculadas do impulsionamento
econômico por parte do Estado. Pretende com isso subdividir o papel desempenhado
pelas chamadas normas tributárias indutoras daquelas atinentes às políticas sociais,
bem como das normas que não se incluem na fiscalidade e cuja disciplina por vezes
escapa do regime tributário. Portanto, o autor se utiliza da expressão ‘normas
19 É o que identifica Greco, que em análise da progressividade aplicada ao IPTU, sustenta a existência
de uma corrente que defende o viés de natureza fiscale (arrecadatória), relacionada ao princípio da capacidade contributiva, e outra também chamada de progressividade urbanística (ordenatória), ligada à função social da propriedade (GRECO, 1990, p. 110).
27
tributárias indutoras’ para deixar à evidência de que o regime jurídico (princípios e
regras) aplicável é o tributário.
A expressão “normas tributárias indutoras”, por outro lado, tem o firme propósito de não deixar escapar a evidência de, conquanto se tratando de instrumentos a serviço do Estado na intervenção por indução, não perdem tais normas a característica de serem elas, ao mesmo tempo, relativas a tributos e portanto sujeitas a princípios e regras próprias do campo tributário. (SCHOUERI, 2005, p. 34).
Comungando do entendimento proposto, Leão reconhece que “as normas
tributárias indutoras não exaurem a temática da extrafiscalidade”. Ao interpretar a
posição adotada por Schoueri, sustenta que a extrafiscalidade em sentido estrito faria
referência a todas as normas com “consciente estímulo ao comportamento das
pessoas, sem revelar como fundamento precípuo arrecadar recursos pecuniários”
(LEÃO, 2015, p. 46). Ainda que reconheça a dificuldade e artificialidade na distinção
entre normas tributárias indutoras e arrecadatórias, acredita na possibilidade de que
se identifique normas cuja função principal não seja arrecadatória, mas sim indutora.
Aliás, considera imprescindível que se encare o desafio por acreditar na diferença de
tratamento entre contribuintes sujeitos ao comando de normas de natureza diversa e
também nos diferentes tipos de controle a serem exercidos sobre cada uma dessas
espécies normativas.
Ao mesmo tempo em que a autora se resigne ante o fato de que no âmbito da
norma tributária possam coexistir funções arrecadatórias e regulatórias, defende que
referidas finalidades são exercidas com intensidades distintas20. Com isso, pretende
que seja buscada uma norma tributária cujas características indiquem de forma
premeditada e intencional a indução sobre o comportamento dos contribuintes, e que
se distancia daquelas espécies em que esse efeito seja secundário se comparado aos
fins arrecadatórios.
Por essa razão, mesmo que se reconheça que as normas tributárias indutoras serão, em alguma medida, também arrecadatórias, podemos identifica-las como aquelas em que este objetivo é minimizado diante da intenção de realizar outras finalidades estatais que não a arrecadação dos recursos necessários à manutenção do Estado. (LEÃO, 2015, p. 50).
20 Embora reconheça que também os impostos regulatórios - ou extrafiscais na acepção aqui proposta
-, tenham função de gerar receita, Vogel afirma que o contraste que permite distinguir os objetivos das leis tributárias estaria na função distributiva da carga tributária e na função regulatória por elas exercida (VOGEL, 1984, p. 548).
28
Enfim, ao delimitar o seu objeto de pesquisa, Leão (2015), em posição
semelhante à encontrada em Schoueri (2005), assinala que as normas tributárias
indutoras seriam aquelas cuja função principal consistiria na utilização do tributo como
mecanismo de intervenção sobre o domínio econômico, valendo-se como instrumento
para contribuir com a concretização da ordem social e econômica preconizada pela
Constituição de 1988.
Conquanto seja por nós aceita como correta a tese segundo a qual a
extrafiscalidade no campo tributário representa relevante mecanismo de intervenção
estatal sobre o domínio econômico21, até por ser notória a influência do tributo sobre
as relações de natureza econômica22 – especialmente na esfera de liberdade
concedida aos agentes econômicos23 -, não pretendemos com isso limitar seu escopo
de abrangência para dele excluir a atuação mais abrangente do Estado sobre a ordem
econômica e social, modificando-a segundo fins constitucionalmente relevantes24.
Nesse sentido, considera-se que a invocação de uma suposta ‘norma tributária
indutora’ como mecanismo puramente de intervenção sobre o domínio econômico25,
poderá enfraquecer a compreensão do fenômeno jurídico da extrafiscalidade, que se
estende igualmente aos campos político e social.
Ainda que assim o aparenta ser, revela-se igualmente correto reconhecer que
a extrafiscalidade enquanto espécie é empregada prioritariamente como instrumento
de intervenção estatal no campo econômico. Já sustentava Becker que cada vez mais
a principal finalidade de muitos tributos deixa de ser a de instrumento de arrecadação
de recursos para o custeio das despesas públicas, passando a operar como
21 Segundo ensinamento de Schoueri que ora passa-se a adotar, “domínio econômico há de ser
compreendido como aquela parcela da atividade econômica em que atuam agentes do setor privado, sujeita a normas e regulação do setor público, com funções de fiscalização, incentivo e planejamento, admitindo-se, excepcionalmente a atuação direta do setor público, desde que garantida a ausência de privilégios” (SCHOUERI, 2005, p. 43).
22 Já alertava Ataliba que a tributação exerce “influências instigantes” na economia em geral, não existindo as sonhadas finanças neutras (ATALIBA, 1966, p. 150).
23 Vogel ensina que todo ‘imposto’ regulatório ao intervir na propriedade e obrigar o pagamento em dinheiro, funcionaria como gatilho ou alavanca provocando a adoção de conduta pelo contribuinte em determinado sentido desejado pelo legislador (VOGEL, 1984, p. 551).
24 O que, inclusive, é reafirmado por Schoueri (2005, p. 3) na introdução de sua obra. 25 A definição de domínio econômico pode ser encontrada em Schoueri: “[...] o Domínio Econômico há
de ser compreendido como aquela parcela da atividade econômica em que atuam agentes do setor privado, sujeita a normas e regulação do setor público, com funções de fiscalização, incentivo e planejamento, admitindo-se, excepcionalmente a atuação direta do setor pública, desde que garantida a ausência de privilégios” (SCHOUERI, 2005, p. 43).
29
instrumento de intervenção estatal no meio social e na economia privada. E que
“nenhuma das reivindicações pleiteadas hoje sob o título de direitos sociais poderá
alcançar seu objetivo sem uma intervenção do Estado na economia”26 (BECKER,
2007, p. 623). Logo, mesmo que se considere a esfera de atuação mais abrangente
da extrafiscalidade, sempre que analisada sob a ótica tributária, estaria relacionada
de forma mais imediata a mecanismo de intervenção no domínio econômico, a partir
do qual será possível levar a cabo os programas constitucionais atinentes à esfera
social, política, econômica e etc.
Sobre os mecanismos que o Estado se utiliza para praticar a intervenção27,
tem-se que a extrafiscalidade é forma de atuação por indução (daí porque oportuna a
referência à expressão ‘norma tributária indutora’). Segundo a classificação proposta
por Grau, a indução estaria relacionada a preceitos, que embora prescritivos, não são
dotados da mesma carga de cogência que afeta as normas de intervenção por
direção28. Trata-se, no seu dizer, de um convite oferecido ao destinatário da norma
para que manifeste adesão ao seu comando, caso em que resultará vinculado por
prescrição normativa correspondente a benefício(s) a ser(em) usufruído(s) (GRAU,
2000, p. 160). Entretanto, resta aberta a alternativa de não se deixar seduzir pelo
prêmio oferecido pela norma, deixando de aderir à prescrição nela veiculada29.
26 Ainda nas palavras de Becker, “é importante observar que a tributação extrafiscal tanto pode ser
utilizada como instrumento de reforma social, quanto instrumento para alcançar objetivo exatamente oposto: impedir a reforma social e conservar, ou melhor, salvar o regime capitalista liberal” (BECKER, 2007, p. 631).
27 Souza classifica a intervenção estatal quanto à sua efetivação entre ‘intervenção legislativa’ e ‘administrativa’, também chamada por ele de “intervenção executiva”, considerando-se a competência do Poder Executivo para efetivá-la (SOUZA, 1999, p. 351). Diferentemente de Grau (2000), portanto, sua teoria pretende subdividir o papel desempenhado pelos Poderes Legislativo e Executivo.
28 Para bem compreender a teoria de Grau (2000), há que se partir das diferentes formas de intervenção no campo da atividade econômica em sentido estrito, que tanto se pode ser feita por absorção ou participação, como por direção ou indução. No primeiro caso, o Estado atua como o próprio agente econômico, explorando determinada atividade econômica, ora por absorção, assumindo integralmente os meios de produção e/ou troca (regime de monopólio), e outrora como por participação, quando assume apenas parcela dos meios de produção e/ou troca (regime de competição com empresas privadas). Por outro lado, na intervenção por direção, o Estado atua no campo regulatório, estabelecendo mecanismos e normas de comportamentos compulsório para os sujeitos da atividade econômica em sentido estrito, diferentemente da modalidade por indução, em que manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados.
29 Como afirma Schoueri (2005), a norma de direção vincularia um único consequente a determinada hipótese, enquanto nas normas de intervenção por indução o destinatário está sujeito a estímulos e desestímulos, que o levam a decidir pelo caminho proposto pelo legislador, mas podendo adotar conduta diverso sem recair no ilícito. A distinção está no grau de liberdade concedido ao administrado.
30
Privilegia-se, nestes casos, o mercado como centro decisório (SCHOUERI,
2005, p. 44), dado que a não adoção da conduta proposta implicará em desvantagem
competitiva aos agentes econômicos não alcançados pela vantagem fiscal. De acordo
com Grau (2000), cuida-se de indução à adoção de determinado comportamento
através de ‘sedução extremamente vigorosa’; dada a implicação em vantagens
competitivas aos concorrentes que optarem pela adesão ao comando da norma, em
detrimento daqueles que se encontram em posição desprivilegiada nesses mercados
por terem optado pelo caminho inverso.
A indução, todavia, não se faz apenas pelo caminho da concessão de um
benefício (isenção ou redução de tributo, ou subsídio), também chamada de positiva,
mas também quando o Estado onera por meio de imposto o exercício de determinado
comportamento (GRAU, 2000, p. 161), hipótese em que será do tipo negativa30. O
exemplo citado por Grau (2000) é da importação de determinados bens, em que a
oneração é utilizada para desestimular a conduta, porém sem que ela seja taxada
como proibitiva.
Sobre o aspecto negativo da norma de indução, Becker assinala que
modernamente o Estado para intervir em determinado fato social como forma de
atingir o bem comum pode alcançar o mesmo resultado pretendido de diferentes
maneiras. Para impedir ou desestimular determinado comportamento social, poderá
optar por dois caminhos: (i) instituir regra jurídica que declare ilícita aquela conduta ou
(ii) através da criação de tributo extrafiscal “proibitivo”. Optando-se pela segunda
forma, tem-se que a pretensão do Estado não seria propriamente de recebimento do
valor do tributo – única exigência possível -, porém aquele específico reflexo
econômico-social que resultaria da circunstância de passarem os indivíduos a se
comportarem de modo a evitar a incidência da imposição fiscal (BECKER, 2007, p.
628).
Por outro lado, como afirma Marcos Oliveira, ao abordar o tema da utilização
do tributo para estimular condutas não poluidoras e desestimular as poluidoras, o
30 Derzi (2001, p. 577) aborda o tema da chamada ‘indução negativa’ na utilização do imposto territorial
rural (ITR) e imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU), com fins extrafiscais. Segundo a célebre autora, a Constituição Federal autorizaria que a Lei destes tributos possa perseguir objetivos distintos, desde suprir os cofres do Estado até estimular ou desestimular comportamentos na extrafiscalidade. Em face dessa previsão constitucional, haveria que consentir “na maior agressividade fiscal em uma tributação que, de fato, possa acarretar desvantagens econômicas àquele que, embora não pratique ato ilícito, persiste em atuar contrariamente aos interesses políticos, sociais ou econômicos superior da coletividade”.
31
Estado não procura apenas impor castigo ao recalcitrante (o que poderia ser
indevidamente traduzido pela expressão tributo “proibitivo”), mas reconhece o esforço
do cidadão em cumprir a lei. Com suporte no princípio retributivo e estribado na teoria
kelseniana, identifica na figura dos incentivos fiscais31 a forma geralmente utilizada
para conceder um prêmio a quem não polui ou polui relativamente pouco, tributando-
se menos o contribuinte (OLIVEIRA, 1999, p. 39).
É dizer, busca-se por meio da tributação o estímulo ou desestímulo a adoção
de comportamentos socialmente desejáveis, pressupondo as leis mercado, e atuando
segundo os conhecidos efeitos que o tributo possui sobre tais mecanismos (aumento
ou redução de custos e preços)32. Tanto poderá ser incentivado o consumo de
determinados bens através da concessão de incentivos – que não seriam obtidos em
situação de livre mercado -, como será possível ao legislador provocar um
desincentivo – que não seriam imputados em situação de livre mercado -, sem que a
conduta seja reprimida através da configuração do ilícito33.
A esse respeito acrescenta Coelho, que as isenções e outras técnicas de
incentivo fiscal enquanto mecanismo de desenvolvimento econômico, partem da ideia
de que os empreendedores são dotados de elevada capacidade econômica, o que faz
com que sejam atraídos a realizar investimentos na atividade empresarial em troca
dos ‘aliciantes fiscais’. Em sentido contrário, as técnicas inibitórias de extrafiscalidade
seriam instituídas através da exacerbação de encargos fiscais, tornando
‘hiperonerosas’ certas situações (COELHO, 2005, p. 57).
Demonstrado que a extrafiscalidade equivale a intervenção por indução, resta
saber se ela seria aplicável a qualquer situação que envolve a atuação do Estado
sobre a economia.
2.2 Pressupostos para que a extrafiscalidade possa se tornar uma política
31 Também Bobbio lista a isenção fiscal como manifestação da técnica de encorajamento do
ordenamento promocional (BOBBIO, 2007, p. 18). 32 “Assim, quando se cogita, por exemplo, do instrumento tributário como meio de internalizar as
chamadas ‘externalidades’, o que se faz é transferir ao mercado, por meio do mecanismo de preço, aqueles custos, cabendo aos produtores e consumidores decidir, em última instância, sobre o sucesso ou fracasso de um produto. Do mesmo modo, o incremento da tributação de um produto poderá implicar em seu menor consumo, conforme esteja ou não o mercado disposto a assumir tais custos. No sentido inverso, isenções pontuais podem induzir os consumidores em direção a determinados produtos” (SCHOUERI, 2005, p. 44).
33 Registre-se que os estímulos ou desestímulos poderão ser analisados sob uma mesma ótica, já que toda conduta estimulada provoca em certa parte desestímulo ao comportamento que lhe é contrário, e vice-versa.
32
fiscal efetiva e em conformidade com o Direito positivo
Alguns pressupostos precisam ser levados em consideração para que a
extrafiscalidade venha a ser tornar uma medida legítima e efetiva de intervenção sobre
o domínio econômico.
Em primeiro lugar, não é qualquer comportamento ou conduta que poderá ser
incentivada, mas apenas aquela que corresponda à busca de um fim ou valor
consagrado pela Constituição. Gouvêa assenta que a extrafiscalidade cumpre com a
imposição tributária pelo Estado com o intuito de obter efeitos de ordem econômica,
política e social, porém sempre na busca de fins que são delineados pela Constituição.
Na lição do autor a norma extrafiscal busca a realização de valores constitucionais,
restando identificada “sempre que a norma tributária realizar desidérios
constitucionais, de realização dos direitos do cidadão” (GOUVEA, 2006, p. 47).
Portanto, para a configuração da norma tributária indutora é preciso que sejam
perseguidos fins (ou programas) prestigiados constitucionalmente, que não se
confundem com a mera arrecadação de recursos financeiros por parte do Estado para
fazer frente às despesas públicas34.
Em segundo lugar, cabe notar que em determinadas situações não é cabível a
criação de normas indutoras, seja pelo fato de que adoção de normas de direção é
mandatória (v.g. serviço militar) como por não estarem presentes as condições
necessárias para que esse instrumento possa alcançar seus objetivos. Esta
circunstância pode se dar tanto por uma condição de mercado, como sói ocorrer diante
da inelasticidade da oferta e demanda (que ocorre quando o aumento ou redução do
preço de certos bens não afeta o seu consumo), e também quanto ao potencial efeito
concorrencial das normas indutoras, que, por vezes, é desconsiderado quando da
implantação de uma política (extra)fiscal.
A questão relativa aos efeitos concorrenciais da norma tributária indutora fica
evidente tanto nas políticas de desincentivo como principalmente a de estímulo, dada
a sua capacidade de desestabilizar o equilíbrio de mercado. Qualquer avaliação
equivocada ou precipitada do cenário econômico, poderá ensejar distorções de
34 Essa posição é sustentada, inclusive, por Helena Costa, para quem a extrafiscalidade seria o
emprego de instrumentos de tributação com o objetivo de que sejam atingidas finalidades não arrecadatórias, mas incentivadoras ou inibitórias de comportamentos, porém sempre com vistas à realização de outros valores constitucionalmente consagrados distintos da arrecadação (COSTA, 2005, p. 321).
33
mercado, como o chamado ‘efeito carona’, a redistribuição da carga tributária para
outros segmentos da atividade econômica, o fortalecimento da posição concorrencial
de contribuintes que suportam o agravamento fiscal da sua conduta e a perda de
arrecadação de outros entes federados em decorrência da concessão de incentivo
fiscal.
O ‘efeito carona’ se dá quando os contribuintes terminam por auferir ganhos
extraordinários em razão dos incentivos fiscais concedidos no âmbito de uma política
extrafiscal, por algo que já fariam ainda que não gozassem dos benefícios35. Ainda na
linha dos incentivos de natureza fiscal, eles acarretam necessariamente o aumento
da pressão fiscal sobre o restante da sociedade, o que justifica que sejam objeto de
maior vigilância e controle36.
Ao debater a concessão de benefícios fiscais por nações soberanas com o
objetivo de atrair investidores não residentes aos seus mercados domésticos37,
Santos (2012, p. 234) adverte que os incentivos à atração do investimento externo
não podem ser feitos de forma indiscriminada, estando adstritos a limites. Dentre as
restrições impostas pelo ordenamento está a necessária constatação de que a baixa
ou inexistente tributação sobre a renda auferida pelos não residentes nos mercados
financeiros e de capitais, seria estritamente necessária para atingir o objetivo
extrafiscal de mobilização da poupança visando o desenvolvimento nacional. Em
último caso, os malefícios propiciados pela medida – que romperia com a igualdade
tributária e com a tributação conforme a capacidade contributiva - teria que ser
contrastada à luz da proporcionalidade com os benefícios resultantes para a
coletividade, como o crescimento econômico sustentado, gerando emprego e renda.
35 Segundo Schoueri, os benefícios ficais não implicariam, necessariamente, em mudança de
comportamento, tendo em vista que atingiriam “de igual modo aqueles que, mesmo sem sua concessão, já adotavam a prática objetivada pelo legislador, dando-se o ‘efeito carona’” (SCHOUERI, 2005, p. 51).
36 Derzi (2001, p. 529) salienta que os incentivos e estímulos fiscais, financeiros e creditícios, são compatíveis com as metas do pleno emprego dos fatores de produção e do desenvolvimento, o que seria feito através de uma distribuição de renda mais justa. Logo, depreende-se da premissa levantada que os incentivos fiscais somente podem ser concedidos se em consonância com o objetivo de promover a justiça distributiva. Não se admite que benefícios possam ser concedidos a classes dominantes com intuito de acentuar a diferença para o restante da sociedade ou para instituir privilégios em favor de determinados indivíduos. Também se nota a proximidade da extrafiscalidade com a justiça distributiva (progressividade), o que será melhor debatido em capítulo próprio.
37 O autor ainda cita a intensa competição internacional e a alta mobilidade dos fatores financeiros como causas que acarretam a adoção de medidas extrafiscais, dentre elas a concessão de incentivos fiscais, direcionadas à atração do investimento estrangeiro.
34
A premissa elencada se mostra especialmente verdadeira confrontada com
estudos que identificam que a política de isenção dos dividendos ou da dedução dos
juros sobre capital próprio carecem de resultados conclusivos que demonstrem o êxito
em ampliar os investimentos no país38. Como assinalam Gobetti e Orair (2015),
durante as décadas de 80 e 90, o governo brasileiro adotou uma série de medidas em
sintonia com a teoria novo clássica que pregava que a renda deveria ser tributada
linearmente e o capital desonerado para incentivar a atração de investimentos. Tais
políticas terminaram por reduzir a progressividade da tributação sobre a renda e
restringir o papal redistributivo do imposto. Ao analisar dados das declarações de
imposto das pessoas físicas, identificam os autores que o princípio da progressividade
tributária é violado no topo da distribuição de renda brasileira, pelo principal motivo de
que a renda dos mais ricos provém predominantemente de lucros e dividendos
distribuídos, que são isentos de imposto pela legislação brasileira39. Em contraste,
sustentam que os investimentos no país permaneceram estagnados por mais de uma
década desde que tais medidas foram implementadas, o que demonstra que não
surtiram o efeito incentivador desejado.
A concessão de incentivos fiscais, portanto, longe de ser sinônimo de eficácia
na consecução de objetivos extrafiscais, poderá provocar efeitos prejudiciais à
economia e a sociedade, quando não lastreada em dados empíricos e devido
acompanhamento dos resultados almejados. Deve-se levar em conta, em última
instância, que é a sociedade que termina por arcar com os custos dos benefícios
fiscais, o que tem o potencial de provocar efeitos regressivos na distribuição da renda
brasileira.
Outra questão que tem sido elencada como foco de preocupação, diz com o
desdobramento do efeito regressivo das normas tributárias indutoras entre agentes
que atuam em um mesmo segmento. Isso porque, os agentes economicamente mais
fortes tem maiores condições em suportar o aumento dos custos fiscais sem alterar
38 A isenção concedida a dividendos e a possibilidade de dedução dos juros sobre capital próprio,
revelam nítidas medidas com objetivo extrafiscal, já que buscam intervir sobre o comportamento e induzir a adoção de condutas socialmente ou economicamente desejáveis.
39 “Essa situação seria revertida se os lucros e dividendos distribuídos voltassem a ser tributados; o imposto de renda se tornaria mais progressivo e as alíquotas efetivas atingiriam no topo da distribuição uma média de 13,2% ou 17,5% se a tributação ocorresse com uma alíquota linear de 15% ou na atual tabela progressiva, respectivamente; nessa hipótese, o potencial distributivo do imposto de renda (mensurado pela queda no índice de Gini) cresceria para cerca de 4%, equiparando-se ao verificado no Uruguai e México e aproximando-se do verificado na OCDE.” (GOBETTI; ORAIR, 2015, p. 40).
35
sua conduta prejudicial aos interesses sociais, enquanto aqueles menos favorecidos
terminam por sucumbir ante o agravamento do ônus fiscal. Nesta situação, a norma
indutora deixaria de atingir seu objetivo para servir de instrumento de fortalecimento
das posições dominantes de mercado e eliminação da concorrência.
Ponto sobre o qual nos revela de especial interesse, posto que relacionado ao
objeto deste trabalho, relaciona-se com as consequências decorrentes da concessão
de incentivos fiscais no âmbito de um Estado federal, que impactam a arrecadação de
outro ente (que não aquele detentor da competência tributária). Na acepção de Hofling
citado por Schoueri, cuida-se de “cortesia com chapéu alheio”, consistindo na adoção
de política extrafiscal sem que o ente competente assuma os encargos financeiros
decorrentes da desoneração (SCHOUERI, 2005, p. 68). É o que alerta José Márcio
Oliveira quando afirma que as renúncias do ICMS, imposto de competência estadual,
impactam as finanças municipais, haja vista que 25% da sua arrecadação é
transferida aos Municípios40 (OLIVEIRA, 2003, p. 112-113).
2.3 Análise jurídica da extrafiscalidade enquanto instituto de direito tributário
De tudo o que foi dito até aqui sobre a extrafiscalidade, é possível confirmar a
advertência feita anteriormente, de que o fenômeno possui diferentes feições e
desdobramentos. O que se mostra necessário - antes de prosseguir com a análise
que se pretende desenvolver -, é saber se a extrafiscalidade quando incorporada ao
campo tributário, possui alguma qualificação que a permita distinguir enquanto
instituto que mereça ser estudado sob essa ótica. Ou, se ao contrário, trata-se de
tarefa inócua, tendo em vista que possivelmente estaria restrita à esfera das finanças
públicas; o que fica, a propósito, reforçado pela posição de alguns juristas que
parecem sustentar uma definição extraída da Ciência das Finanças41, limitando-se a
descrever o seu objeto a partir de critérios que se avaliam como extrajurídicos e que
não guardam relação com a função da norma tributária.
40 Especificamente em relação a esse imposto, o problema é ainda mais grave tendo em vista que a
concessão de benefícios é usualmente concedida pelo próprio Executivo, usurpando a competência do Legislativo para editar lei estadual a esse respeito. Em face dessa circunstância, afirma José Márcio Oliveira que em um cenário ideal, o Legislativo, através dos seus componentes deputados revistos de representação local, deveria avaliar o impacto que a concessão de incentivos fiscais provocaria sobre regiões e municípios (OLIVEIRA, 2003, p. 114).
41 Por Ciência das Finanças se está a referir a ciência que tem por objeto o estudo da atividade fiscal e não o direito financeiro que disciplina o exercício dessa mesma atividade.
36
A respeito do tema, convém recorrer à advertência de Ribeiro:
A abordagem da extrafiscalidade pelo direito tributário sempre foi tema controverso. Sobretudo, porque a finalidade da tributação não é intrínseca aos institutos tributários, mas depende sempre do contexto em que é lançada. [...] Em casos concretos, as pretensões fiscais e extrafiscais da tributação raramente se manifestam isoladamente em determinados tributos ou institutos tributários. (RIBEIRO, 2013, p. 48).
De fato, como aludido anteriormente, parte da doutrina trata de definir a
extrafiscalidade enquanto forma de tributação alinhada com objetivos não fiscais.
Embora verdadeira tal afirmação, para que se reclame tratamento jurídico não basta
que o objeto seja definido apenas com base em critérios finalísticos. Caso contrário,
seria tormentosa a identificação de tributo – ou de norma tributária - que tivesse como
característica ser orientado à finalidade arrecadatória ou a fim diverso (social,
econômico e político), justamente pela sobreposição desses mesmos fins no plano da
sua aplicação.
Vem se desenvolvendo, contudo, corrente que enxerga na extrafiscalidade a
utilização do tributo não apenas como instrumento financeiro para que sejam
alcançados projetos sociais e econômicos, mas como mecanismo de indução de
comportamentos para que sejam atingidos fins juridicamente relevantes.
À primeira vista, não seria possível distinguir o objeto da ciência financeira e do
Direito, já que ainda que analisado o regime jurídico da extrafiscalidade, serão
encontradas definições de ‘finalidades’ comuns entre ambos campos do
conhecimento científico, além da utilização de um mesmo instrumental para que sejam
alcançadas - qual seja o tributo.
Sem embargo, o modo como o fenômeno será compreendido e os efeitos
decorrentes certamente serão distintos. Ao se invocar o Direito como parâmetro de
pesquisa, o que importa saber é como (e se) essa área do conhecimento concebe a
extrafiscalidade, extraindo os necessários contornos jurídicos através da análise
normativa, isto é, da norma enquanto ente lógico.
Por isso, considera-se que a investigação da extrafiscalidade na esfera jurídico-
tributária somente poderá ser feita enquanto instrumento de indução de
comportamentos, por meio de (des)estímulos à adoção de condutas que possam
atingir fins constitucionalmente relevantes.
37
Não é qualquer finalidade que justifica o tratamento jurídico da extrafiscalidade,
mas apenas aqueles fins que pertencem ou fazem parte do Direito.
A respeito do tema, pontua Mendes:
A Doutrina responde, no mais das vezes, que o tributo de cunho extrafiscal tem por objetivo influir diretamente numa conduta social. Não é, contudo, a concreta influência e nem apenas aquela previsível a partir do exame da norma. Para se caracterizar a extrafiscalidade não é suficiente que a imposição tributária interfira com o comportamento, mas sim que haja uma razão jurídica para tal influência. (MENDES, 2009, p. 63).
O efeito indutor da tributação poderá ser, por vezes, indesejado ou até mesmo
não antecipado pelo Legislador. Pode, quando muito, sequer apresentar relevância
jurídica. O Direito somente deve ser importar com a extrafiscalidade quando presente
uma indução de comportamento que esteja diretamente relacionada à perseguição de
fim tutelado pelo ordenamento jurídico.
Para uma abordagem jurídica do tema, há que se partir do estudo da
extrafiscalidade como espécie, também denominada “norma tributária indutora”. A
dificuldade, quiçá, reside na circunstância de que na maioria dos casos não é possível
distinguir a norma tributária indutora das demais normas de cunho tributário42, uma
vez que - como salientado por outros autores - os fins fiscais e extrafiscais se
confundem no plano da norma jurídica.
Enfim, resta saber se existe critério que autoriza a identificar a ‘norma tributária
indutora’ como ente normativo distinto e autônomo. Como adverte Schoueri, “a
questão que se apresenta é se as normas tributárias indutoras possuem alguma
característica que permita ao intérprete diferenciá-las, enquanto categoria diversa de
outras normas” (SCHOUERI, 2005, p. 16).
Em face desse desafio, no próximo capítulo serão analisadas as diferentes
correntes que se propõem a identificar a extrafiscalidade no plano jurídico a partir de
critérios finalísticos e funcionais. Em seguida, será buscada uma resposta à indagação
de existir uma dita norma tributária indutora como nova espécie de norma jurídica.
2.4 Critérios de identificação da norma tributária indutora
42Segundo Corrêa, “[...] não é fácil afastar a ‘zona cinzenta’ que separa a extrafiscalidade da tributação,
bem como aclarar os casos que se poderiam denominar de ‘área mista’, onde tanto a extrafiscalidade como a tributação coexiste de forma marcante” (CORRÊA, 1964, p. 60).
38
Em capítulo anterior, ficou demonstrado que expressiva parcela da doutrina
parece sustentar que a fiscalidade e a extrafiscalidade não poderiam existir
isoladamente no plano da norma tributária. Partem do pressuposto de que toda norma
tributária importa na arrecadação de recursos financeiros43 e que cumprem
simultaneamente com importante função social.
Talvez essa conclusão seja especialmente verdadeira se o objetivo for
conceber a extrafiscalidade como nova modalidade de tributo, cujo fim não seja
arrecadatório ou que não provoque indução alguma de comportamento. Entretanto,
não é esta a pretensão que se faz quando se invoca a norma indutora como
desdobramento da norma tributária. A distinção, longe de se servir a meros fins
didáticos, há que se feita para que se permita analisar o instituto e definir seus precisos
contornos jurídicos.
A sua identificação, no entanto, não tem sido tarefa das mais fáceis, já que a
concepção em torno da extrafiscalidade tem sido centrada em torno de uma noção
construída pela Ciência das Finanças - e não propriamente do Direito. Buscam, estes
autores, investigar a norma tributária a partir da sua finalidade ou efeito produzido,
tentativa esta que tem se revelado insuficiente para a sua compreensão enquanto
instituto jurídico.
Na visão de Leão (2015), para a identificação da norma tributária indutora
dentro do sistema normativo não seria suficiente recorrer apenas ao critério relativo
aos seus efeitos. Ao se valer da classificação proposta por Alabern (2009), defende a
necessidade de que se identifique na edição da norma a presença dos seguintes
critérios distintivos: (i) uma deduzível finalidade não arrecadatória, (ii) a existência de
elementos extrafiscais impregnados na própria norma e (iii) o incentivo à adoção das
condutas e operações de acordo com a finalidade extrafiscal perseguida, sempre por
meio da modificação da carga tributária (por aumento ou diminuição).
Corrêa também elenca três elementos basilares da extrafiscalidade, sendo eles
(i) estimular o comportamento das pessoas, (ii) provocar conscientemente esse
estímulo e (iii) não visar, fundamentalmente, a arrecadação de recursos primários
(CORRÊA, 1975, p. 2).
43 Schoueri alerta que “por mais que um tributo seja concebido, em sua formulação, como instrumento
de intervenção sobre o Domínio Econômico, jamais se descuidará da receita dele decorrente, tratando o próprio constituinte de disciplinar sua destinação” (SCHOUERI, 2005, p. 16).
39
Em exame mais acurado da matéria, Schoueri (2005) busca classificar os
critérios sobre os quais a doutrina busca divisar as normas tributárias indutoras
daquelas ditas arrecadatórias. Na visão do citado doutrinador existiriam duas
principais linhas teóricas para identificação das referidas normas: finalístico e
pragmático. Cada uma dessas linhas de pensamento são subdivididas em diferentes
correntes, como se passa a expor.
O critério finalístico objetiva diferenciar as normas indutoras das
“arrecadadoras” ou “simplificadoras” de acordo com a sua finalidade subjetiva ou
objetiva, ou pela combinação dos dois aspectos. Pelo aspecto puramente subjetivo é
investigada a finalidade buscada pelo legislador. Tal concepção é prontamente
rejeitada, uma vez que a mera intenção do legislador, quando não acompanhada por
qualquer dado objetivo na lei escrita, torna-se irrelevante para efeito da análise e
identificação da norma tributária indutora.
Reconhecida a insuficiência do aspecto subjetivo e recorrendo ao critério
objetivo, este se volta – como o próprio nome diz – à busca de elementos objetivos e
sinais que permitam analisar o aspecto volitivo da norma. O simples efeito decorrente
da norma, sob esse aspecto, não seria suficiente para a configuração da norma
indutora, pois poderia não decorrer de uma vontade manifestada pelo legislador
(BOHM apud SCHOUERI, 2005, p. 18).
Após discorrer sobre os tais indícios objetivos elencados pela doutrina - como
critério para identificação da finalidade perseguida pelo legislador -, Schoueri (2005)
critica os elementos distintivos sugestionados por entender pela existência de (i) uma
crescente necessidade de recursos por parte do Estado, o que afastaria o requisito da
‘falta de necessidade financeira da parte do Estado’ como indício a revelar a existência
de um tributo indutor; (ii) a impossibilidade de se mensurar de antemão os custos da
atividade fiscalizatória, o que refuta a suposição de que a norma tributária indutora
possa revelar um ônus superior à contrapartida da receita arrecadada; (iii) a existência
de limitações ao poder de tributar relativas ao princípio do não confisco, o que termina
por impor um limite ao agravamento do dever tributário com o fim de desencorajar o
contribuinte a adotar o comportamento não desejado.
As críticas tecidas em relação à adoção de critérios objetivos ou subjetivos, são
igualmente estendidas para a corrente que conjuga ambos os elementos para
identificar a singularidade da norma tributária indutora. A primeira advertência que se
faz é que o apego a elementos puramente objetivos pode terminar por validar normas
40
que ultrapassam e violam tradicionais limites ao poder de tributar, sob a justificativa
de que o caráter intervencionista legitimaria que fossem flexibilizadas essas
restrições. Assim, os teóricos que migraram para essa corrente passaram a
reconhecer a necessidade de se ter em conta ao lado do caráter objetivo o aspecto
subjetivo enquanto finalidade manifestada na edição da Lei.
Mesmo que relevantes os aspectos objetivos44 e subjetivos45 elencados pelos
adeptos dessa corrente, tais elementos não seriam suficientes para distinguir com
clareza as diferenças entre normas arrecadatórias e indutoras. Como demonstrado,
os elementos objetivos, por si só, podem desencadear no arbítrio e na cobrança de
tributos à revelia dos limites impostos pelo ordenamento jurídico à tributação. Ocorre
que a conjugação com elementos subjetivos também não se revelaria satisfatória ao
objetivo proposto, dado que a finalidade buscada pelo legislador no momento da
edição da norma pode, na maioria dos casos, não ser expressa, tendo em vista que
dá sua omissão também pode se extrair força equivalente ao ato de legislar
(SCHOUERI, 2005, p. 22).
O critério da vontade objetivada na lei (ou, melhor colocado, da vontade objetiva
do legislador) nada mais é que desdobramento da corrente finalística, porém que
sustenta a existência da norma indutora sempre que fossem identificadas situações
equivalentes tratadas de modo diferente, ou seja, sem que seja possível identificar
diferenças baseadas na capacidade contributiva. Em outras palavras, seriam
arrecadatórias as normas que atendessem a capacidade contributiva e indutoras
aquelas em que o princípio deixasse de ser observado46. A crítica que se faz é que
não seria absolutamente correto dizer que o princípio da capacidade contributiva
deixaria de ser aplicado no plano das normas tributárias indutoras47, até por ser
duvidoso que referidas espécies possam ultrapassar o limite do não confisco –
44 Dentre os critérios objetivos ainda não elencados anteriormente, cite-se o objeto da tributação, a
base de cálculo (inexistência de conexão com a capacidade econômica revelada pelo fato gerador) e alíquota (variação para determinados grupos ou setores) do tributo, além da introdução do tributo não correlacionada a uma necessidade de suprir uma demanda financeira por parte do Estado, a constatação de uma receita de tributo decrescente e ausência de intenção de melhoramento técnico-fiscal.
45 Dentre eles as atas parlamentares, pacotes econômicos (contexto da medida), ausência de escopo fiscal e efetiva mudança de comportamentos dos contribuintes.
46 Para isso, todavia, seria necessário ter em conta o que seria uma tributação com viés arrecadatório, para a partir dessa concepção determinar o desvio da capacidade contributiva.
47 Cf. SCHOUERI, 2005; LEÃO, 2015.
41
entendidos por alguns como princípio derivado da capacidade contributiva48. Soma-
se a isso a crítica feita por Schoueri (2005), que considera insatisfatórios os resultados
apresentados por aqueles que buscam a identificação da norma indutora a partir do
atendimento à capacidade contributiva49. Na lição do autor:
Tendo em vista o objetivo de buscar o regime jurídico que se impõe ao legislador quando, valendo-se de normas tributárias, promove, intervenção na economia, seria por demais restritiva a análise que se limitasse àquelas normas contrárias ao princípio da capacidade contributiva, já que [...] também normas conformes àquele princípio podem servir de instrumento de intervenção econômica. A falha do critério proposto pode ser assim explicitada: a presença da finalidade indutora, na norma tributária, não exclui possa o legislador ter, igualmente, outra finalidade (arrecadadora ou simplificadora). (SCHOUERI, 2005, p. 25).
Ao concluir pelo insucesso da corrente finalística na definição de um critério
suficiente para a identificação da norma indutora, Schoueri (2005) propõe que se
recorra à análise pragmática do Direito50 para atingir esse mesmo objetivo. A visão
pragmática propõe que a investigação do objeto seja feita a partir da eficácia das
normas jurídicas. Dado o marco teórico adotado pelo autor, verifica-se que a eficácia
tal como delineada por Ferraz Júnior (1994) está relacionada a uma aptidão das
normas, mais ou menos, extensa, para produzir efeitos por ocasião da sua aplicação.
Valendo-se de uma interpretação adotada por Vogel (VOGEL apud SCHOUERI, 2005,
p. 27) reconhece a relevância de que no trato da norma tributária indutora se proceda
à sua identificação a partir de critérios funcionais. O que significaria dizer, na visão
interpretada a partir da obra de Vogel, que qualquer norma que verse sobre impostos
possui a função arrecadatória e, ao mesmo tempo, pode desempenhar outras três
atribuições (simultaneamente ou não): função de distribuir a carga tributária através
da adoção de critérios de justiça distributiva, função indutora de comportamentos e
função simplificadora do sistema tributário51. A identificação da norma tributária 48 Em sentido inverso, Ricardo Torres (2003) sustenta que a proibição de excesso, dentre as quais se
encontra a vedação de confisco, é uma vedação decorrente dos direitos fundamentais e não uma característica da capacidade contributiva.
49 Cita o autor exemplo de grande valia, que diz com a tributação pelo imposto de renda dos juros sobre capital próprio. Segundo alega, a finalidade pretendida seria a capitalização das empresas, o que evidenciaria o finalismo extrafiscal. Ao mesmo tempo, concederia ao investidor tratamento equivalente àquele obtido no mercado financeiro de renda fixa, o que demonstraria o atendimento ao princípio da capacidade contributiva. Neste caso, a norma atenderia simultaneamente ao finalismo extrafiscal como ao fiscal, sem perder, por isso, seu viés indutor.
50 Extraída a análise pragmática a partir do método delineado por Ferraz Júnior (1994). 51 Em sentido semelhante, Tipke (1984, p. 523) afirma que a disciplina tributária não é fundado apenas
no princípio da capacidade contributiva, mas também em princípios atinentes ao Estado social e à
42
indutora serviria assim, apenas como corte abstrato ou metodológico, para ressaltar
uma das funções desempenhas pela norma tributária52.
Tem-se, aqui, novo enfoque para a questão: no lugar de identificarem-se normas tributárias indutoras por sua finalidade, estuda-se o efeito indutor das normas tributárias [...]. A referência a tais normas, enquanto corte abstrato, apenas servirá para realçar uma função (ou uma das várias funções) que a norma tributária desempenha [...] por normas tributárias indutoras se entende um aspecto das normas tributárias, identificando a partir de uma de suas funções, a indutora. (SCHOUERI, 2005, p. 29).
Schoueri (2005) aceita o fato de que uma norma editada com fins
arrecadatórios possa ser mantida por seus efeitos indutores, inclusive podendo ser
julgada constitucional. Também Alcides Costa, ao prefaciar a obra do citado autor,
termina por fazer uma advertência e concordância sobre o efeito indutor da norma não
desejado ou antecipado pelo legislador:
Mas vou além. A indução a certo comportamento pode não ter sido desejada pelo legislador ou sequer prevista por ele. É o que ocorre quando um determinado ente tributante institui impostos excessivos, o que leva empreendimentos novos a se dirigirem para o território de outros entes tributantes. Exemplo concreto foi o deslocamento das empresas de ‘leasing’ do Município de São Paulo para Municípios vizinhos onde o Imposto sobre Serviços sobre essa atividade era sensivelmente menor. (COSTA, 2005, prefácio).
A crítica que se faz ao posicionamento adotado pelos doutrinadores é a de que,
ao desconsiderar o aspecto subjetivo, terminam por incorrer nos mesmos vícios
daqueles que sustentavam a identificação da norma indutora a partir de critérios
puramente objetivos, dentre eles de que seria possível alcançar esse fim sem
considerar a intenção do legislador (mesmo que por intenção se entenda a vontade
objetivada na norma).
Ao propor o abandono do caráter finalístico para que seja estudado o efeito
indutor das normas tributárias, termina-se por incluir neste escopo todo o universo de
consequências advindas da imposição fiscal, ainda que não contemplados
previamente pelo Legislador. Em último caso, olvida-se que a finalidade (ao lado da
simplificação do sistema tributário. Assim, poderiam se distinguir normas com objetivo financeiro (que servem para acobertar as necessidades financeiras do Estado e se orientam pela capacidade contributiva), normas com objetivo social (aquelas de cunho intervencionista ou regulatório, motivadas por políticas sociais, econômicas, culturais, na área da saúde e etc.) e normas de simplificação (para facilitar o processo de tributação, torna-lo mais simples e prático).
52 Nesta acepção, não existiria uma norma tributária indutora per se, mas a função indutora seria uma das manifestações possíveis da norma tributária.
43
função) é aspecto relevante para a definição das normas tributárias indutoras e que
dela não se pode distanciar.
A questão tampouco passou despercebida por Mendes, que em sua tese
pondera:
Na destacada obra, contudo, seu autor (o ilustre Professor Titular de Legislação Tributária da Faculdade de Direito da USP), desconsidera o aspecto intencional (subjetivo do legislador, bem como objetivo da lei), para se fixar na função que o diploma normativo exerce, com enfoque no destinatário. Apesar de não concordarmos em afastar o critério intencional, cremos ser sobremaneira relevante o enfoque promovido por Schoueri na função e no destinatário da norma [...]. (MENDES, 2009, p. 64).
Como pontua Mendes, função e finalidade se diferenciam a partir da sua
posição relacional entre os agentes comunicacionais. A função estabelece o vínculo
comunicacional entre enunciado e enunciatário, ou entre norma e destinatário. Já a
finalidade estaria na relação entre o emissor e a mensagem (MENDES, 2009, p. 98).
A partir dessa constatação, questiona o autor que seria de se estranhar que
uma norma possuísse determinada função, sem que o seu emissor/enunciador tivesse
tal intenção. Não obstante, reconhece duas situações em que a função da norma
poderia ser aferida exclusivamente por sua relação com o destinatário. A primeira
delas, por motivo de acontecimento causal e não intencional, como poderia ocorrer
com determinada lei natural que reprimisse a conduta do seu destinatário (a título
ilustrativo, cita que a lei da gravidade poderia evitar que um homem saltasse de
penhascos sob pena de se ferir). Ainda assim, alerta que seria difícil sustentar que
uma lei natural apresentasse uma dada função ao homem (no exemplo citado, a lei
da gravidade não se prestaria para evitar que homens pulassem de penhascos), sem
falar que as normas jurídicas são marcantemente de cunho intencional e não natural,
o que afastaria esta hipótese do campo jurídico. A segunda possibilidade diz com o
efeito ser provocado sem que corresponda a uma prévia intenção do emissor. Seriam
aquelas situações em que a intenção do enunciador não corresponde ao resultado
produzido no enunciatário (como elogiar alguém, mas as palavras serem interpretadas
ofensivamente). Finalmente conclui não crer que “as regras jurídicas sejam
produzidas sem intenção e que a sua função decorra tão-só do efeito sobre o
destinatário, no caso, não intencionado” (MENDES, 2009, p. 98). Assinala que a
comunicação pressupõe a participação de dois agentes e que a investigação da
norma jurídica (por se incluir na classe dos signos comunicacionais) exige que se
44
considere tanto o enunciador como o enunciatário. Fixar-se tão somente na função da
norma - embora importante para a definição da extrafiscalidade - seria partir de uma
visão pragmática incompleta53, tendo em vista a necessidade de que sejam
conciliados os dois aspectos do ato comunicacional: finalidade e função54.
Ao elencar critérios jurídicos para aferição da extrafiscalidade (ou da norma
tributária indutora), propõe Mendes que se utilizem elementos contextuais inerentes à
própria dicção do direito positivo. Convêm dizer que a posição do autor é a de que a
intenção do legislador não seria relevante a essa identificação se não fosse veiculada
por ‘palavras’ mediante o procedimento previsto pela própria ordem jurídica
(MENDES, 2009, p. 220). Com isso, parece se aproximar da corrente que sustenta a
identificação da norma indutora através da vontade objetivada na lei, já que tanto a
finalidade como a função seriam buscadas no próprio texto da lei e não em elementos
‘extra textuais’.
Dentre os critérios de aferição, três são destacados pelo autor: (i) o emprego
de palavras e expressões de significado intencional55, (ii) a relação entre normas
gerais e especiais56 e (iii) o uso de critérios não eidéticos na elaboração da norma de
incidência tributária57 (MENDES, 2009, p. 303).
A deficiência na classificação proposta estaria no fato de que o próprio
doutrinador admite que os critérios não seriam exclusivos e que sua presença não
indica necessariamente a existência do escopo extrafiscal da norma. Todavia, a teoria
apresentada tem o mérito de demonstrar que em uma análise pragmática – a que se
propõe Schoueri (2005) - o critério finalístico há que ser levado em conta na
53 Vale ressaltar, nesse ponto, que não é nosso objetivo defender de antemão uma análise pragmática
do objeto, mas que ao assim proceder os autores que se filiam a essa corrente não podem se descuidar do elemento finalidade.
54 Como arremata Mendes, “para atingir uma determinada finalidade, o direito deve apresentar uma certa função; por outro lado, exerce uma dada função para cumprir uma certa finalidade (uma intenção)”.
55 Esse seria identificado quando o direito positivo adotasse termos cujo significativo fosse forte indício da intenção do enunciador em encorajar ou desencorajar condutas. Seriam, na acepção proposta, as próprias regras constitucionais atributivas de competência para a prescrição de regras programáticas de encorajamento ou desencorajamento, como o estabelecimento de regimes favoráveis a micro e pequenas empresas, ou a instituição de imposto sobre a propriedade territorial rural com a finalidade de desestimular a improdutividade.
56 Referida relação apontaria para a provável existência de norma com finalidade extrafiscal, dado que o dever tributário estatuído pela norma geral fosse excepcionado pela norma especial através de mecanismos de estímulo/desestímulo (como exemplo, o agravamento ou redução da alíquota nominal de determinado tributo ou qualquer outra modificação do aspecto quantitativo da norma tributária).
57 Significa dizer que o caráter extrafiscal seria aferível por meio da presença ou introdução de critérios não essenciais da norma de incidência.
45
identificação das normas tributárias indutoras e que a intenção do legislador ganha
relevância apenas quando presente no contexto da norma. Aliás, não se teria como
abordar o problema proposto diante de visão que se limitasse a enxergar na
extrafiscalidade um mero acontecimento causal, não dotado de intencionalidade58.
Com efeito, a finalidade se reveste de capital importância para legitimar a
própria norma tributária indutora, já que ela pressupõe um valor protegido pelo
ordenamento jurídico e que se propõe seja alcançado. Como assinala Mendes, no
caso da extrafiscalidade “a finalidade jurídica é essencialmente axiológica [...] a edição
de uma norma decorre de uma intenção, busca atingir uma finalidade e, portanto,
garantir um valor” (MENDES, 2009, p. 66). Por ser problemático o isolamento da
finalidade perseguida pelo legislador e também ser sabido que todo tributo possui, em
maior ou menor grau, efeito indutor sobre o comportamento, ainda que não desejado,
concorda-se com Schoueri (2005) no ponto em que reconhece que esse critério é
insuficiente para a identificação da norma indutora; o que não significa dizer que ele
deve ser desprezado.
Com razão a identificação das normas tributárias indutoras através de critérios
finalísticos (subjetivos, objetivos, mistos ou vontade objetivada na lei) tem se mostrado
insuficiente e insatisfatória para divisar com clareza a existência de uma espécie
distinta da norma tributária clássica (arrecadatória).
Para que seja atingido o objetivo proposto, revela-se necessário conjugar a
finalidade perseguida pelo legislador com a função normativa da extrafiscalidade.
Tanto a finalidade como a função, ora referidas, são extraídas do próprio ordenamento
jurídico, não se admitindo que possam ser empregadas definições extraídas da
ciência das finanças ou de qualquer outro departamento do conhecimento científico.
A análise que se propõe é essencialmente jurídica, daí a necessária referência que
há de guardar no estudo do seu objeto.
Para encerrar a análise quanto à conformação jurídica da norma tributária
indutora, nos próximos capítulos será tratada a estrutura normativa da extrafiscalidade
e em seguida a finalidade que justifica ou legitima a sua existência. Através da
conjugação desses dois critérios, acredita-se ser possível identificar a norma tributária
indutora, servindo de suporte para a investigação que se pretende fazer nesse
trabalho.
58 A intervenção do Estado pressupõe caráter finalístico, já que não se pode falar em atuação do através
de elementos circunstanciais e não passíveis de manipulação.
46
2.5 Norma tributária indutora enquanto ente lógico-jurídico
2.5.1 Definição da norma jurídica segundo a teoria da norma jurídica proposta por
Hans Kelsen
Segundo Kelsen, o Direito é uma ordem normativa dirigida à conduta do homem
ou um sistema de normas que regulam o comportamento humano. O caráter diretivo
da norma jurídica se encontra presente tanto no prescrever determinada conduta
como também a permitir, bem como no conferir poder de a realizar. A função do Direito
seria, portanto, prescrever, permitir e conferir poderes ou competência (KELSEN,
1998, p. 4). Como sintetiza Kelsen (1998), a norma quer significar que algo ‘deve ser’
ou acontecer, devendo o homem se conduzir de determinada maneira.
Ao tratar o “deve-ser” como um operador deôntico intraproposicional do
consequente normativo, que aproxima dois ou mais sujeitos em torno de uma previsão
de conduta que deve ser cumprida por um e exigida por outro, Paulo de Barros
Carvalho triparte a sua classificação em modais deônticos do tipo “proibido”,
“permitido” e “obrigatório” (CARVALHO, 2006, p. 29).
Coêlho (1999), a seu turno, propõe que seja feita distinção entre orações
descritivas e diretivas, restando às últimas a intenção de influir no comportamento
alheio e podendo se expressar pela utilização dos modais “obrigatório”, “permitido” e
“proibido”. Ressalta, contudo, que a inexistência de tais expressões linguísticas não
retira da oração o seu caráter diretivo e que a utilização dos chamados modais
deônticos não é condição suficiente à configuração da ‘diretividade’.
Segundo o celebrado autor, o “Direito é um sistema normativo que correlaciona
uma hipótese determinada a uma solução normativa” (COÊLHO, 1999, p. 72),
bastando, no seu entender, para qualificar um sistema normativo que entre os seus
enunciados exista uma norma vinculando determinado fato com uma permissão,
proibição ou obrigação.
Ao formular uma proposta de tipologia normativa, Coêlho (1999) identifica o
dever de pagar tributo como norma de conduta ou comportamento59, podendo se falar,
para fins de corte metodológico, em uma norma tributária ou de tributação. As normas
de condutas seriam identificadas como aquelas que impõe comportamentos, ou seja,
59 Becker (2007) também identifica as leis do Direito Tributário como regras de conduta ou leis de
direção.
47
que estatuem condutas positivas (obrigação) ou negativas (proibição). Exibiriam
estrutura hipotética, em que se relaciona determinada hipótese a uma consequência
(se A é, B deve ser), que somente surge a partir da ocorrência do fato jurígeno
delineado na hipótese normativa. A norma tributária, por sua vez, apresentaria idêntica
estrutura dual, pois diante da ocorrência no mundo fenomênico de fato descrito na
hipótese de incidência normativa (v.g. auferir renda), decorreria, por derivação lógica,
o consequente normativo para imputar a obrigação de pagar tributo (v.g. se auferir
renda, deve pagar imposto de renda). Enfim, na sua hipótese de incidência consta a
descrição de fatos lícitos e na sua consequência estaria presente o dever de pagar
tributo.
O intuito da norma jurídica (e também daquela do tipo tributária) está em influir
na direção do comportamento do indivíduo, garantindo-se a observância do preceito
normativo através de técnica de motivação indireta, qual seja a instituição de uma
segunda norma (norma de sanção) para punir a conduta inversa àquela que se
considera desejável (COELHO, 1999, p. 43).
A propósito, sobre o tema das sanções, o seu papel é tão central na teoria
normativa de Kelsen (1998), que apesar de tê-la revisitado em edição póstuma para
modificar a sua classificação entre normas primárias e secundárias, sustenta que as
normas de conduta e sanção estão intimamente ligadas, não dispondo as normas que
prescrevem determinada conduta de autonomia em relação àquelas que estatuem
uma sanção ao descumprimento da conduta prescrita.
Se uma ordem jurídica ou uma lei feita pelo parlamento contém uma norma que prescreve uma determinada conduta e uma outra norma que liga à não-observância da primeira uma sanção, aquela primeira norma não é uma norma autônoma, mas está essencialmente ligada à segunda; ela apenas estabelece - negativamente - o pressuposto a que a segunda liga a sanção. (KELSEN, 1998, p. 39).
Em que pese a aludida vinculação entre normas primárias e secundárias, é
preciso que seja feita a distinção entre norma tributária de conduta e norma de sanção,
pois se tratam de espécies distintas. A norma de conduta terá sempre por hipótese de
incidência um fato lícito, que é permitido, e a norma sancionadora sempre um fato
ilícito, decorrente do descumprimento do preceito de regra que empresta àquela
conduta o sentido de ser proibido. Como nos ensina Kelsen (1998), o ilícito é o
48
pressuposto de uma sanção e a sanção é decorrência do ilícito60, isto é, a sanção
constitui ato de coação contra o descumprimento de uma conduta (ação ou omissão
humana) considerada prescrita ou conforme ao Direito, por ser socialmente desejável.
Ao aplicar os conceitos de lícito e ilícito à norma jurídica tributária, Coêlho
propõe a definição de tributo como “toda prestação pecuniária, em favor do Estado ou
de pessoa por ele indicada, tendo por causa um fato lícito, previsto em lei, instituidor
de relação jurídica”, diferenciando-se, portanto, da multa que, “embora prevista em lei
em favor do Estado, decorre de um fato ilícito” (COÊLHO, 1999, p. 107).
Resta saber se a norma tributária indutora possuiria alguma característica que
a diferencie, no plano normativo, da norma de conduta ou simplesmente da chama
norma tributária.
2.5.2 Classificação da norma tributária indutora como espécie de norma jurídica
Ao refletir sobre o caráter normativo da denominada ‘norma tributária indutora’,
Pacheco (2000) identifica uma terceira espécie de norma jurídica, que não obriga e
tampouco proíbe, porém incentiva o cidadão a seguir determinado comportamento
diante da expectativa de obtenção de determinada vantagem ou prêmio. Sobre o
mecanismo de funcionamento das normas tributárias indutoras, elucida a autora:
Neste caso, a norma jurídica, indutora de comportamento, também será seguida de uma norma secundária cuja finalidade é reassegurar o cumprimento da primeira e conceder-lhe o prêmio prometido. São as sanções premiais, tais como chamadas pela doutrina estrangeira [...] (PACHECO, 2000, p. 8).
Tradicionalmente, Kelsen (1998) elenca as funções desempenhadas pela
norma jurídica como sendo de dois tipos: obrigação e proibição. Não obstante, afirma
que o caráter prescritivo da norma convive ao lado de outras atribuições que
60 Sobre os conceitos de lícito e ilícito, aponta o autor: “[...] O que transforma este fato num ato jurídico
(lícito ou ilícito) não é a sua facticidade, não é o seu ser natural, isto é, o seu ser tal como determinado pela lei da causalidade e encerrado no sistema da natureza, mas o sentido objetivo que está ligado a esse ato, a significação que ele possui. O sentido jurídico específico, a sua particular significação jurídica, recebe-a o fato em questão por intermédio de uma norma que a ele se refere com o seu conteúdo, que lhe empresta a significação jurídica, por forma que o ato pode ser interpretado segundo esta norma. A norma funciona como esquema de interpretação. Por outras palavras: o juízo em que se enuncia que um ato de conduta humana constitui um ato jurídico (ou antijurídico) é o resultado de uma interpretação específica, a saber, de uma interpretação normativa” (KELSEN, 1998, p. 3).
49
porventura venham a ser exercidas, dentre elas a permissiva61 e a que confere
poderes. A circunstância de não ter sido abordada na teoria kelseniana a função
indutora parece ter a sua razão de ser, pois apenas recentemente é que começou a
se sentir com mais intensidade a intervenção do estado na esfera social e econômica.
Houve, por certo, um crescente abandono da concepção tradicional em torno
do papel do Estado, com transição de uma postura liberal para intervencionista, que
terminou por gerar reflexo na esfera jurídica. Surgiu, assim, uma concepção até então
desconhecida, de utilização da norma como mecanismo de intervenção em aspectos
conjunturais da economia e do meio social, utilizando-se, para tanto, do tributo como
instrumento de indução de comportamento.
Regina Helena Costa bem identifica essa situação ao ressaltar que a evolução
do papel do Estado, inicialmente revestida de postura liberal, para uma atuação
intervencionista, voltada à consecução de inúmeros objetivos estatuídos na
Constituição, proporcionou que se manifestasse a dupla faceta dos tributos, como
meios geradores de receita e também como instrumentos eficientes para a
persecução dessas finalidades constitucionais (COSTA, 2005, p. 312).
Na mesma linha, Bobbio destaca a profunda transformação ocorrida em
diversos países que deu origem ao Welfare State62, fazendo com que se notasse uma
perseguição por parte dos órgãos públicos de novos fins propostos à ação do Estado,
através de inovadoras técnicas de controle social distintas daquelas tradicionalmente
existentes. Cita, como exemplo do tradicionalismo presente na teoria geral do direito,
o engessamento conceitual encontrado na definição de obrigação, que se limitava a
ser explicada em termos de sanção e coação, revelando uma imagem simplista que
vinha sendo observada na ação do Estado liberal clássico. Com o surgimento do
Estado Social, despontam novas técnicas de controle social que se caracterizam pelo
emprego, cada vez mais difundido, de técnicas de encorajamento, em substituição,
ou mesmo em acréscimo, àquelas usualmente conhecidas de proteção a atos lícitos
e repressão a atos ilícitos63. O controle social se desvencilha de uma posição passiva
61 Vale dizer que a função permissiva parece ter sido desconsiderada por Pacheco (2000) ao elencar
que as normas jurídicas seriam de apenas dois tipos, obrigação e proibição. 62 Ou Estado do Bem-Estar Social (tradução nossa). 63 Nesse ponto, o autor se refere às técnicas tradicionais como revestindo a finalidade de
desencorajamento. Porém, importa dizer, que ao retomar o tema mais adiante, reconhece que também as técnicas de encorajamento do Estado poderiam ser aplicadas, ainda que raramente, às normas negativas (que se caracterizam por comandos negativos, geralmente vinculados a proibições), tanto no desencorajar a fazer quanto no encorajar a não fazer.
50
- preocupada em desfavorecer as ações nocivas - para um controle ativo - preocupado
em favorecer as ações vantajosas mais do que em reprimir as nocivas (BOBBIO,
2007, p. 2).
Ao confrontar o objeto de estudo à teoria de Bobbio (2007, p. 16), a função
indutora parece se enquadrar como técnica de encorajamento64, que não pretende
agir diretamente sobre o comportamento indesejado, mas que busca influenciar por
meios psíquicos o destinatário da norma a adotar ou não determinada conduta. Trata-
se de medida tida pelo autor como indireta, posto que o comportamento, mesmo que
indesejado, é sempre possível de ser realizado, diferenciando-se das medidas diretas
que colocam o destinatário da norma em condição de não poder violar o seu conteúdo
ou subtrair-se à sua execução; ora impedindo a sua violação e ora compelindo a sua
execução (vigilância e o recurso ao uso da força).
Quanto às técnicas de encorajamento, importa dizer que estas podem ser
realizadas por intermédio de dois expedientes distintos, seja ao atribuir uma resposta
favorável ao comportamento já realizado (que seria a própria situação em que pela
via da consequência seria concedida uma sanção positiva ou prêmio), como pela
facilitação do comportamento que ainda está pendente de ser realizado (em momento
anterior ou concomitante ao comportamento que se pretende encorajar)65.
Entretanto, não se pode desconsiderar o lado desencorajador da função
indutora, que resulta do fato de não terem sido abandonadas as técnicas repressivas
do ordenamento jurídico. Ao mesmo tempo em que incentiva a adoção de
determinada conduta, desestimula-se que seja adotado comportamento contrário,
produzindo, como nas técnicas de encorajamento, consequências desagradáveis ou
tornando mais penosa a conduta não desejada66.
A norma tributária indutora seria técnica do primeiro tipo – consequencial -, pelo
fato de ter como objetivo induzir ou estimular o indivíduo a adotar determinado
64 Como assinala Bobbio, em um ordenamento tradicionalmente repressivo, existem três modos típicos
de impedir uma ação indesejada: tornando-a impossível, difícil ou desvantajosa. Em contraste, um ordenamento promocional busca tornar a ação desejada necessária, fácil e mais vantajosa (BOBBIO, 2007, p. 15-16).
65 Pelo aspecto do favorecimento, ou melhor, da facilitação, o comportamento indesejado seria ameaçado não só por uma pena, como também por se tornar ele uma conduta mais penosa. A adoção da conduta desejada seria facilitada, tornando-se a mais atrativa também sob esse aspecto e não apenas da recompensa.
66 Em que pese a diferenciação por Bobbio das técnicas de encorajamento e desencorajamento, não se pode negar que se trata de um mesmo viés compreendido sob dois ângulos distintos. Toda medida que busca encorajar, tem o feito de desencorajar, e vice-versa.
51
comportamento atraído pela concessão de vantagem fiscal ou sob a ameaça do
agravamento do dever tributário. Não se proíbe que venha a adotar conduta
alternativa, ainda que mais onerosa, que para todos os efeitos é considerada lícita e
também prescrita pelo Direito. Ou seja, a norma oferece ao indivíduo a possibilidade
de se comportar de forma alternativa, de modo que estatui opções de comportamento
sujeitas à sua liberdade de escolha67. A motivação é essencialmente de cunho
financeiro68, operacionalizando-se a indução através da expectativa de obtenção de
vantagem fiscal69. Muito além de estatuir uma obrigação, a norma prevê uma opção
ou alternativa, que será incentivada ou induzida através do estímulo, vantagem ou
redução do dever tributário. Entretanto, convêm que fique claro que a possibilidade de
se verificar (e, por vezes, o desejo de evitar) o consequentemente normativo é que
motiva a indução, não podendo se falar em estímulo do tipo ‘facilitador’ no tocante à
norma tributária. O próprio tributo, que resulta como consequência da norma, não
coaduna com técnica do tipo facilitador, que é preexistente ou contemporânea ao fato
descrito na hipótese normativa.
Em todo caso, ao contemplar a indução como nova função exercida pela norma
jurídica, considera-se tratar de mera extensão da norma de conduta e não
propriamente de espécie normativa desconhecida70. Até porque, como já vinha sendo
assinalado por Kelsen (1998), o Direito possui nítida pretensão de influir no
comportamento das pessoas, utilizando-se da norma para prescrever e dirigir
condutas humanas. A indução nada mais é que nova forma de dirigir o comportamento
alheio, desta vez incentivando a adoção da conduta prescrita por meio da expectativa
de redução do gravame fiscal previsto no consequente normativo71, e não sob ameaça
de sanção72.
67 Marcos Oliveira atribui à tributação extrafiscal a grande tarefa de salvaguardar a liberdade do
contribuinte, ao estatuir alternativa de escolha de gravame mais ameno (OLIVEIRA, 1999, p. 38). 68 Sob essa concepção, os modais deônticos listados por Paulo de Barros Carvalho (2006) e Coêlho
(1999) não deixam de existir, porém o viés marcante da norma indutora é de induzir comportamentos e não preestabelecer condutas prescritas ou permitidas, até por oferecer ao contribuinte a possibilidade de seguir uma conduta alternativa.
69 O incentivo à adoção da conduta desejada será feito através da concessão de vantagem (estímulo) ou redução da carga tributária, ainda que eventualmente possa não surtir os efeitos desejados.
70 Por espécie, considera-se que são apenas duas, norma de conduta e norma de sanção. 71 Na lição de Corrêa, “a extrafiscalidade [...] só estimula o comportamento das pessoas, acenando
para esse fim com uma vantagem econômica em favor da pessoa sujeita à imposição” (CORRÊA, 1964, p. 48-49).
72 A não ser que se considere a existência da chamada sanção premial, que, por nós, deixa de ser adotada, por não ser admissível supor a existência de uma norma de sanção cujo antecedente não
52
Schoueri parece comungar do entendimento apresentado, como se nota da
passagem abaixo extraída da sua obra73:
Ao se destacar uma função da norma tributária, in casu, a função indutora, o que se faz é um novo desdobramento da norma primária. Ter-se-á, uma primeira norma primária, na qual se fará presente a própria indução, pelo legislador, que, do ponto de vista jurídico, nada mais é que uma ordem para que o sujeito passivo adote certo comportamento. Não se perfazendo o comportamento, nasce obrigação tributária que colocará o sujeito passivo em situação mais onerosa que aquela em que se situaria se adotado o comportamento prescrito pelo legislador. Finalmente, não se altera a norma secundária, já que do descumprimento da obrigação tributária, surgirá providência sancionatória, aplicada pelo Estado. (SCHOUERI, 2005, p. 31).
Comunga-se da posição do autor no ponto em que identifica a função indutora
como um novo desdobramento da norma primária, inclusive se fazendo presente a
direção de conduta por uma ordem prescritiva e não só indutiva: a se incorrer na
hipótese normativa, ainda que de norma com atribuição indutora, estará sujeita a
determinada consequência com nascimento de uma obrigação. Aliás, a própria teoria
positivista dá conta de que seria descabido falar em uma nova espécie de norma
jurídica quando o objeto a que se está aludindo manifesta-se como nova feição da
norma de conduta. Tanto a indução como a prescrição contida na norma, tem por
objetivo dirigir a conduta, ainda que através de critérios motivacionais distintos. Em
todo o caso, o comando ou a prescrição não deixam de estar presentes, podendo se
falar até em uma função dúplice da norma de conduta (dirigir e induzir a conduta).
Divergimos, porém, da premissa de que seria possível estudar a função
indutora presente nas normas tributárias sem levar em conta sua finalidade.
contenha em sua descrição o descumprimento de dever legal enunciado por outra norma, ou seja, não ter por hipótese um ilícito.
73 Em sua obra, o autor traz exemplo que permite compreender melhor o que significado da expressão “desdobramento da norma primária”. De acordo com Schoueri (2005), na estrutura as normas tributárias indutoras o legislador vincula a determinada hipótese um consequente que poderá ser uma redução ou agravamento de natureza tributária. Toma-se como hipótese a progressividade do Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana em virtude de não ter o proprietário atendido à função social da propriedade. Na compreensão do autor, existiria uma primeira norma primária – na qual se fará presente a indução - que pressupõe, por hipótese, que o proprietário tenha cumprido com a função social do imóvel; uma segunda norma primária em que a função social da propriedade não tivesse sido cumprida, gerando a progressividade da alíquota do imposto; e, por fim, a norma secundária que imputasse determinada coação estadual por não ter sido o tributo recolhido. O entendimento, embora digno de nota, não resiste à crítica de que, se por norma tributária indutora se entende apenas uma das funções exercidas pela norma tributária, a norma jurídica a ser perfectibilizada não admitiria desdobramentos. O desdobramento da norma jurídica, enfim, não se compatibiliza com a estrutura normativa.
53
Primeiramente, há que se registrar que por ‘função’ susenta-se ser o caráter
diretivo da norma jurídica que se manifesta através da prescrição, permissão e
indução de comportamentos. Em sentido contrário, Schoueri (2005) parece adotar
uma concepção de função mais abrangente, englobando o caráter distributivo,
simplificador, arrecadador e interventivo da norma tributária. Na visão positivista, tais
aspectos não seriam identificados propriamente como função da norma, mas sim
enquanto finalidade.
Conquanto a função indutora possa parecer acidental, ela somente se reveste
de relevância jurídica quando associada a uma finalidade que lhe dá caráter de
legitimidade (ou validade). Para que se possa falar em função da norma, antes há que
se pressupor a existência de uma finalidade, senão se estaria a tratar dos efeitos
observados na aplicação do Direito (regulação de conduta) e não em uma função
normativa propriamente dita. Esta questão ficará mais clara no tópico seguinte em que
estivermos a tratar da finalidade da norma tributária.
Enfim, do que exposto no presente capítulo ficou constatado que a norma
tributária indutora não se trata de espécie autônoma em relação ao gênero norma
jurídica, mas apenas desdobramento ou extensão da norma de conduta. Por isso,
sempre que utilizado o termo no presente trabalho será feito com referência à função
indutora desempenhada pela norma tributária, sem que, para isso, seja descuidado
da finalidade jurídica perseguida por meio desse expediente. Não custa lembrar que
a análise que se propõe é essencialmente jurídica, daí que os efeitos decorrentes da
aplicação da norma são relevantes até o ponto em que revelam sua função e
finalidade.
2.5.3 Identificação das normas tributárias indutoras a partir do seu fundamento de
validade
Antes de tratar da finalidade propriamente dita, é preciso que fique
perfeitamente claro que não se está refutando a constatação de que toda norma
tributária - ainda que não estruturada para esse específico fim - possa apresentar
efeito indutor. A questão já foi, inclusive, debatida neste trabalho, do que nos
socorremos, apenas a título de reforço argumentativo, da observação feita por Nabais,
para quem toda a “fiscalidade tem inerente uma certa dose de extrafiscalidade [...]
mesmo quando a extrafiscalidade não tenha se feito presente nos propósitos do
54
legislador ao moldar a disciplina dos tributos” (NABAIS, 2005, p. 423). Com base
nesse pressuposto, o autor propõe que a extrafiscalidade seja classificada em sentido
próprio e outro impróprio ou imanente que acompanha as normas de direito fiscal. Por
extrafiscalidade em sentido impróprio se tem o reconhecimento, quase que inevitável,
dos efeitos econômicos e sociais presentes na generalidade das normas tributárias,
mesmo que imputados pelo legislador de forma secundária ou acessória. Nas
situações em que esses mesmos efeitos são perseguidos de forma primária ou direta,
estaria o intérprete diante do sentido próprio da extrafiscalidade (NABAIS, 2005).
A utilização da extrafiscalidade em sentido próprio ou qualquer sentido
equivalente que lhe queira atribuir, somente é autorizada ante a constatação de se
estar perseguindo um fim ou fundamento constitucional. Para isso há que se conjugar
a função da norma com sua finalidade - já que se a função é, como demonstrado,
insuficiente para caracterizar a norma tributária indutora, também a finalidade
isoladamente não se presta a esse objetivo. Não é, portanto, a simples perseguição
de uma finalidade constitucional que caracteriza a extrafiscalidade como própria.
À idêntica conclusão também chegou Papadopol (2009, p. 22), para quem os
valores recolhidos em decorrência da função arrecadatória também se destinam à
promoção de finalidades constitucionais. Contudo, não seria o destino do produto da
arrecadação que permitiria a classificação dos tributos como fiscais ou extrafiscais74.
Fosse assim, a dotação dos recursos paga pagamento de professores da rede de
ensino pública ou pavimentação de estradas, a título de exemplo, caracterizaria o
cumprimento de finalidades de interesse público diversas (saúde, educação,
segurança e etc.).
Para que fique caracterizada a extrafiscalidade enquanto espécie ou própria,
exige-se que a realização de um fim constitucional seja feita de modo direto e
imediato, através do mecanismo da indução de comportamento.
Em resumo, a caracterização de um tributo ou de uma medida de exoneração tributária como extrafiscal depende de sua colaboração direta e imediata para a concretização de fins constitucionais. Assim, por exemplo, a progressividade das alíquotas de IPTU no tempo, na forma do artigo 182, §4º, II, da Constituição Federal c/c 7º da Lei 10.257/01, serve como instrumento direto e imediato para incentivar o cumprimento das regras de ocupação do solo urbano traçadas pelo plano diretor municipal. Dito em outas palavras, o aumento gradual da carga tributária a cada ano de má utilização do solo urbano serve como meio ou instrumento direto para incentivar o cumprimento
74 Considera-se essa divisão, entre tributos fiscais e extrafiscais, imprópria, já que, como demonstrado,
se tratam de funções presentes na norma tributária e que podem se manifestar simultaneamente.
55
do plano diretor municipal, o que permite a caracterização do tributo como extrafiscal [...]. (PAPADOPOL, 2009, p. 23).
O parâmetro para se aferir se a finalidade é buscada de modo direto ou não,
deve ser necessariamente a função desempenhada pela norma jurídica. Sempre que
se tratar de norma que por meio da função indutora busca alcançar finalidade cujo
conteúdo está pré-concebida na Constituição, ter-se-á a identificação da própria feição
indutora ou extrafiscal da norma tributária.
De toda sorte, a relevância jurídica da finalidade está no fato de que serve de
fundamento de validade (e também como conteúdo de validade) para a instituição da
norma tributária indutora, sem a qual não seria possível verificar sua adequação para
com o ordenamento jurídico.
Ao tratar da validade do Direito, sustenta Kelsen (1998, p. 139) que a ordem
jurídica não é um sistema de normas ordenadas no mesmo plano, mas uma
construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas75. Uma
norma somente seria válida porque teria sido produzida na forma determinada por
outra norma, que lhe é superior e de onde retira fundamento de validade - segue-se,
por esse caminho, até se chegar à uma dita norma fundamental do ordenamento
jurídico. Quanto ao conteúdo da norma, este seria, em tese, irrelevante para a
investigação da sua validade. Na visão do autor, uma norma jurídica não é válida
porque tem determinado conteúdo, ou seja, pelo fato do seu conteúdo poder ser
deduzido de uma norma fundamental pressuposta, mas sim por ser criada de
determinada forma que é pressuposta por essa mesma norma fundamental. Todavia,
ao tratar da estrutura escalonada da ordem jurídica, reconhece a existência de normas
que determinam o processo pelo qual outras são produzidas, mas também admite
como possível que seja determinado – ainda que não totalmente - o conteúdo da
norma que será produzida76.
75 Nesse mister, não se deve confundir os conceitos de norma e lei, por ser a segunda um ente positivo
e a primeira um ser lógico (COÊLHO, 1999, p. 92). Normalmente a norma decorre de um conjunto de leis conjugadas, ou, se preferir de um feixe de regras jurídicas. A validade, para Coêlho (1999), seria assim uma questão pertinente ao plano da lei e não da norma.
76 “A Constituição, que regula a produção de normas gerais, pode também determinar o conteúdo das futuras leis. E as Constituições positivas não raramente assim procedem ao prescrever ou ao excluir determinados conteúdos. No primeiro caso, geralmente apenas existe uma promessa de leis a fixar e não qualquer obrigação de estabelecer tais leis, pois, já mesmo por razões de técnica jurídica, não pode facilmente ligar-se uma sanção ao não-estabelecimento de leis com o conteúdo prescrito. Com mais eficácia, porém, podem ser excluídas pela Constituição leis de determinado conteúdo.” (KELSEN, 1998, p. 156).
56
Parece transparecer, até pelas próprias peculiaridades da competência
reguladora e tributária a ser tratada no capítulo seguinte, que a produção de normas
tributárias com função indutora deflui da competência prevista em normas de
produção de conteúdos pré-estabelecidos pelo texto constitucional77. Em outras
palavras, a norma tributária indutora apenas poderia ser criada ou instituída nas
situações autorizadas ou previstas na Constituição.
Também Heleno Torres entende ser mais apropriado falar em uma fiscalidade
vinculada a razões constitucionais, do que em extrafiscalidade enquanto finalidade da
tributação, o que bem demonstra que a norma tributária indutora deve ser
compreendida no contexto da Constituição (TORRES, 2005, p. 26).
Embora assevere que as “pretensões extrafiscais” possam advir da vontade do
legislador - e não apenas diretamente do Constituinte78 -, Mendes identifica, no
capítulo do “Sistema Tributário Nacional” do texto constitucional, inúmeras regras
enunciadas com nítida pretensão extrafiscal. Enumera referidas regras de acordo com
a sua específica finalidade em normas que autorizam, normas que determinam e até
normas que proíbem a edição de outras normas com intento extrafiscal (MENDES,
2009, p. 197-198). A Constituição, de fato, é repleta de tais regras, ora prescrevendo
a produção de normas com conteúdo extrafiscal e ora facultando o seu emprego. Não
há espaço para que o legislador possa agir sem que observada a outorga de
competência constitucional em razão da matéria.
Ao tratar da finalidade como fundamento de validade da norma tributária
indutora, o objetivo é demonstrar que por finalidade se identifica a própria noção de
conteúdo preconizada pela teoria positivista e que é utilizada para fins de conferir
competência para criação de outras normas jurídicas.
No que se refere à finalidade (ou conteúdo) que fundamenta a introdução da
função indutora, há que se recorrer à teoria das causas em matéria tributária, tal qual
sustentada por Schoueri (2005), para um adequado exame da questão. A teoria das
77 Carrazza sustenta que a Constituição seria para as pessoas políticas a ‘Carta das Competências’,
indicando o que podem, o que não podem e o que devem fazer, inclusive e principalmente em matéria tributária (CARRAZZA, 2003, p. 444).
78 Alguns autores, como Fanucchi partem da constatação da extrafiscalidade como sendo fenômeno de origem infraconstitucional, para somente então reconhecer que existiriam manifestações da extrafiscalidade na própria Constituição ou, nas suas palavras, de tributos extrafiscais por origem constitucional (FANUCCHI, 1975, p. 56). A nosso ver, trata-se de uma interpretação distorcida, uma vez que a extrafiscalidade é originária da Constituição, somente podendo ser reputada válida se observado o conteúdo pré-traçado pelas normas de competência constitucional.
57
causas propõe que seja investigada uma justificação para determinada exigência
comportamental, sendo de grande utilidade para a legitimação das normas tributárias.
A questão já havia sido abordada por Canto (19--, p. 22), que ao tratar das
obrigações derivadas ou segunda a lei (ex lege) – como sabidamente é o caso das
obrigações tributárias - preferia que fosse utilizada a expressão fundamento no lugar
de causa sempre que se estivesse a tratar do tema. Ao analisar a causa pela qual os
contribuintes são movidos a pagar tributo, reconhece que não o fazem simplesmente
porque a lei assim o determina, mas por vislumbrar uma finalidade prática encontrada
na conveniência de permitir ao Estado contar com os recursos necessários ao
preenchimento de seus fins. O fundamento do tributo residiria, em último caso, na
necessidade de municiar o poder público com meios econômicos para preencher seus
fins coletivos.
Especificamente no emprego da tributação com função indutora, exige-se que
sejam trazidos novos fundamentos (finalidades) para sustentar a sua existência e que
são substancialmente distintos daqueles que justificam a própria arrecadação de
recursos para fazer frentes às despesas públicas.
Ao tratar do problema sob este prisma, Schoueri assinala que a tributação
extrafiscal exige que sejam buscados novos valores juridicamente consagrados para
legitimar a sua criação:
[...] Nesse sentido (de justificação), não se podem desprezar os avanços que aquela teoria ofereceu, ao investigar o elemento teleológico da norma, enquanto justificação da última. Assim, se uma norma tributária encontra sua justificação na necessidade financeira do Estado, i.e., concluindo-se que o ordenamento jurídico pressupõe a existência do Estado e para tanto prevê a tributação, então entender-se-á que a norma tributária que venha a colocar em risco aquela existência extrapolará sua fundamentação, exigindo, daí, do intérprete, a busca de novos valores juridicamente prestigiados, sob o risco de sua incompatibilidade com o Ordenamento Jurídico. (SCHOUERI, 2005, p. 153).
Assim, considera que as normas tributárias indutoras não encontram, tal qual
os impostos, sua justificação na necessidade financeira do Estado, mas sim na
intervenção do Estado sobre o Domínio Econômico79. Nesse sentido, devem buscar
sua fundamentação em cada ato de intervenção praticado, assinalando que “seu
79 “Com base na teoria das causas, inclui-se na idéia de imposto uma justificativa: prover o Estado com
meios econômicos para cumprir seus fins coletivos. Ora, se as normas tributárias indutoras têm causa (justificação) diversa, então sua veiculação por meio de impostos exige que sejam elas investigados pela causa que lhes é própria, não pela causa dos impostos.” (SCHOUERI, 2005, p. 221).
58
emprego sofre as mesmas restrições e motivações de outras formas de intervenção
na economia” (SCHOUERI, 2005, p. 167). O regime jurídico será, por conseguinte,
distinto, por envolver além dos limites impostos à competência em matéria tributária,
aqueles aplicáveis às de natureza regulatória.
Também Ávila (2005) reconhece nos impostos com finalidade extrafiscal uma
justificação distinta da aplicável aos princípios gerais da tributação. Ao listar as
finalidades que podem justificar o modo de instituição dos impostos, enumera uma
série de valores protegidos pela Constituição:
[...] ao Estado incumbe também estimular e realizar os princípios gerais da atividade econômica (arts. 170 e ss.), bem como zelar pela concretização de outros tantos fins, como a manutenção do Estado Federativo (art. 18), a preservação da eficiência administrativa (art. 37), a garantia da segurança pública (art. 144), a implementação da política urbana (arts. 182 e 183), a garantia da função social da propriedade (art. 184 a 191), a preservação da ordem social (arts, 193 a 231), a evolução da ciência e da tecnologia (arts. 218 a 234), a proteção do meio ambiente (art. 225) e da família (arts. 231 e 232), a fiscalização e o controle sobre o comércio exterior (art. 237). (ÁVILA, 2005, p. 742-743).
A mitigação e flexibilização de consagradas garantias constitucionais ou
limitações constitucionais ao poder de tributar, aplicáveis comumente à conformação
das leis que instituem normas tributárias arrecadatórias, revela a distinção de
tratamento inclusive em nível constitucional das normas indutoras, que somente
podem ser reputadas como válidas ou legítimas se atendidos a critérios de justificação
(causa) constitucionais distintos daqueles comumente aplicáveis às normas com fins
meramente arrecadatórias, como bem exposto por Ávila (2005).
O que os autores anteriormente citados procuram revelar é que, no caso dos
impostos, não só a necessidade financeira do Estado e o princípio da capacidade
econômica, podem justificar sua conformação ao ordenamento jurídico e servir de
critério para legitimar a sua cobrança. Também outros valores, inclusive aqueles de
ordem extrafiscal, relacionados com a intervenção estatal sobre os meios econômico
e social, trazem uma justificação para o modo como essa espécie tributária será
instituída e exigida. Embora essa lógica seja inicialmente aplicada aos impostos, como
será demonstrado mais adiante, outras espécies tributárias também poderão ter causa
de justificação distinta daquela que lhes é comumente atribuída.
Temos, portanto, que a finalidade é causa legitimadora da norma tributária
indutora, servindo ao lado da função como critério para identificação da
59
extrafiscalidade, também classificada como própria, direta ou em espécie.
Feito esse necessário escorço teórico, que possibilita a identificação da feição
jurídica da extrafiscalidade, principalmente da sua função normativa e finalidade, cabe
adentrar a questão em torno da competência tributária e reguladora, com o fito de
saber até onde os entes federados podem (e devem) instituir normas com função
indutora; importando, para tanto, saber a sua aplicabilidade às diferentes espécies
tributárias e em consonância com a competência legislativa repartida pelo texto
constitucional.
61
3 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E REGULADORA APLICADAS À
EXTRAFISCALIDADE
3.1 Competência tributária para edição de normas tributárias indutoras
Ao iniciar esse capítulo, parte-se do pressuposto de que por competência
tributária se percebe o próprio exercício da capacidade para criar e instituir tributos
com base em critérios materiais e formais estabelecidos pelo texto constitucional.
Trata-se, na lição de Carrazza, de faculdade conferida às pessoas políticas para editar
leis que criem, em abstrato, tributos e que busca seu fundamento de validade na
própria Constituição80. Ou, melhor dizendo, habilitação ou faculdade potencial que a
Constituição Federal confere a determinadas pessoas para que, por meio de lei,
tributem81 (CARRAZZA, 2003, p. 436).
Seria equivocado se supor que os entes federados são dotados de ampla
autonomia para a criação e cobrança de impostos, taxas e contribuições, tendo em
vista que, no Brasil, as pessoas políticas não detêm poder tributante, sendo a elas
outorgada simples competência em matéria tributária82. Novamente recorrendo a
Carrazza, temos que a competência tributária seria tema exclusivamente
constitucional, tendo sido esgotada pelo constituinte. As normas infraconstitucionais
explicitariam, quando muito, o que se encontra implícito na Carta Fundamental, não
podendo agregar nada de substancialmente novo (CARRAZZA, 2013, p. 444).
Ao discriminar as competências em matéria tributária, a Constituição tratou de
estabelecer a ‘norma-padrão de incidência’ ou o arquétipo constitucional ou a regra-
matriz de cada exação (CARRAZZA, 2003, p. 448). Isso significa dizer que ela teve o
cuidado de definir em relação às diferentes espécies tributárias a hipótese de
incidência possível, o sujeito ativo e passivo possíveis, e a base de cálculo e alíquota
80 Ao propor um conceito ao termo, Carrazza diz que “competência tributária é a possibilidade de criar,
in abstracto, tributos, descrevendo, legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas bases de cálculo e suas alíquotas” (CARRAZZA, 2003, p. 437).
81 Cabe ainda citar a advertência do autor para que a Constituição brasileira não tratou, ela própria, de criar tributos, mas apenas discriminar a competência para que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, venham a fazê-lo por meio da lei.
82 As pessoas políticas, no Brasil, não detêm poder tributário. Poder existia na Assembleia Nacional Constituinte, tendo retornado ao povo após a promulgação da Constituição e sido substituído pelas competências tributárias repartidas entre a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal (CARRAZZA, 2003, p. 436).
62
possíveis. Em último caso, estabeleceu os fatos imponíveis em potencial segundo
bases econômicas pressupostas83.
Não se vislumbra competência tributária (salvo o seu exercício) fora do texto
constitucional, estando ali especificadas todas as possibilidades sobre as quais o
legislador poderá se valer para a instituição de determinado tributo. Com efeito, o
legislador encontra-se vinculado à norma de incidência do tributo delineada no texto
constitucional. E, nesta condição, recebe da Constituição competência privativa84 para
a criação de impostos, taxas e contribuições, segundo critérios materiais e em razão
da sua competência reguladora ou administrativa.
Feitas tais considerações, importa no estudo das espécies tributárias identificar
os seus critérios de diferenciação, para que seja possível distinguir um tributo do outro
com intuito de reproduzir uma classificação que seja considerada útil. Ocorre que os
diferentes critérios adotados para identificar os tributos terminam por desdobrar em
distintas classificações, desde a dicotômica, que enquadra os tributos em duas
espécies (impostos e taxas), passando pela tricotômica, que se trata de
desdobramento da primeira com a subdivisão em taxas e contribuições de melhoria,
até chegar na pentapartite, que classifica os tributos em impostos, taxas, contribuições
de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais.
Conquanto distintas as classificações, os critérios sobre os quais elas se
baseiam são apenas de dois tipos: intrínseco e extrínseco. O critério intrínseco busca
a distinção dos tributos de acordo com o seu fato gerador, ora diretamente vinculado
à uma atuação estatal e ora não. Por outro lado, pelo critério extrínseco, parte-se da
diferenciação a partir de elementos externos ao objeto, que no caso dos tributos está
83 A esse respeito, anota Ávila (2005, p. 742) que “se os impostos deverão ser graduados segundo a
capacidade econômica, é porque o substrato econômico na hipótese de cada imposto é pressuposto pela própria Constituição”. Arremata que somente poderiam ser tributadas as atividades que estejam relacionadas à renda, patrimônio ou consumo, que sejam indicativas de expressão econômica.
84 O caráter privativo das competências tributárias pode ser encontrado tanto em relação aos impostos como às taxas e contribuições de melhoria. Como anota Carrazza (2003, p. 566), a “Magna Carta traçou a regra-matriz da incidência (o arquétipo genérico) daqueles [impostos] que podem ser criados, sempre em caráter exclusivo, pela União, pelos Estados, pelos Municípios [...]”. Em matéria de impostos, a competência foi partilhada segundo um critério material, que pode ser verificado através da descrição de fatos e possíveis hipóteses de incidência, que denotam capacidade econômica do sujeito passivo que neles incorrer. Quanto às taxas e contribuições de melhoria, adverte o doutrinador que a sua competência não seria do tipo comum pelo simples fato de que tanto a União quanto os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, estão habilitados a instituir referidas espécies. Isso porque, as taxas e contribuições de melhoria somente podem ser criadas pela pessoa política que revestir competência administrativa para realizar a atuação estatal e que é pressuposta no fato gerador do tributo.
63
relacionado à sua destinação legal85. O Código Tributário Nacional (CTN),
recepcionado pelo atual ordenamento constitucional86, parece ter adotado o critério
intrínseco para classificar os impostos e taxas, já que considera irrelevante a
destinação legal do produto da arrecadação para efeito de definição das espécies
tributárias (artigo 4º). Ao mesmo tempo classifica os impostos pelo seu fato gerador
que prefigura uma situação independente de qualquer atividade estatal específica
(artigo 16). No entanto, o próprio Código trata de ressalvar a existência de outras
espécies - mesmo que não as repute como tributárias -, enumeradas em seu artigo
217, que seriam justamente as diversas contribuições existentes. Embora o critério
intrínseco seja relevante para classificar as espécies dos impostos e das taxas,
reputa-se insuficiente para o adequado exame das contribuições e dos empréstimos
compulsórios, cuja destinação legal é prefigurada na sua hipótese de incidência,
inclusive constitucional. Nesse ponto, há de se convir com Amaro (2012) quando
reclama que se a destinação do tributo faz parte da composição da norma jurídica
constitucional definidora de competência, ela passa a se tornar um dado jurídico, que
além de ter relevância na definição do regime jurídico aplicável, presta-se a distinguir
determinada espécie tributária das demais87. E se a destinação integra o regime
jurídico específico do tributo, não se poderia negar que se trata de critério jurídico
necessário à sua distinção88.
Também Oliveira (2007, p. 40) partilha desse modo de pensar ao consignar que
em alguns tributos, como as contribuições e empréstimos compulsórios, a finalidade
ou destinação específica seria vinculada ao fato gerador, servindo de critério de
justificação na sua instituição. Em outras palavras, a finalidade seria relevante para
‘adjetivar’ o fato gerador típico (principal) de certos tributos, integrando-os como fatos
geradores acessórios.
85 Outros falam ainda do critério da restituibilidade, que de fato será aplicada aos empréstimos
compulsórios, cuja instituição pressupõe sua devolução ao final de termo previamente fixado. 86 Ao recepcionar, ainda que parcialmente, a classificação feita pelo CTN, a Constituição terminou por
encampar os critérios de diferenciação adotados por aquele diploma legal. 87 Na lição do autor, haveriam situações em que a destinação vinculada do tributo seria prevista pela
própria Constituição, sendo aspecto integrante do regime jurídico da figura tributária. Nestes casos, não se poderia ignorar a sua destinação, nem a descartar como critério que permita distinguir a figura tributária de todas as outras, já que essa circunstância passar a ter influência no seu regime jurídico.
88 Assinala Amaro que a destinação, via de regra, não integra a definição do regime jurídico dos tributos. Todavia, quando a destinação seja valorizada pela norma constitucional de competência, passa a representar critério hábil para distinguir determinada espécie tributária de todas as outras que não lhe apresentam a mesma especificidade (AMARO, 2012, p. 101).
64
Assim, depreende-se que o critério extrínseco, ao lado do intrínseco, mostra-
se relevante para apontar as diferenças entre espécies tributárias, que podem ser
assim sintetizadas do ponto de vista da sua destinação:
[...] há que se convir que todos os tributos acabam tendo um destino determinado: a) os impostos servem para atender às necessidades gerais da coletividade; b) as taxas são utilizadas para retribuir os ônus inerentes ao exercício regular do poder de polícia e os serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ou postos à disposição dos particulares; c) a contribuição de melhoria relaciona-se com a valorização do bem particular em razão de obra pública; d) os empréstimos compulsórios visam a atender calamidades públicas como guerra externa, ou sua iminência, e investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional; e) as contribuições objetivam a regulação da economia, os interesses de categorias profissionais e o custeio da seguridade social, e educacional. (MELO, 2000a, p. 35).
Em que pese os critérios intrínsecos e extrínsecos serem da maior utilidade à
diferenciação entre as diferentes espécies tributárias, ao se examinar a veiculação da
norma tributária indutora por meio de qualquer dos tipos acima enumerados, depara-
se com a insuficiência desses parâmetros para efeito de identificar a existência da
própria função indutora como para verificar a existência de conformação na utilização
desse expediente na figura de impostos, taxas e contribuições.
Em tópico anterior, foi demonstrado que a finalidade é aspecto relevante para
identificar as normas tributárias indutoras, atuando ao lado da função como importante
critério de verificação e justificação da extrafiscalidade no plano do ordenamento
jurídico. Ao diferenciar as espécies tributárias segundo a destinação legal do produto
da sua arrecadação, infere-se que por este critério (extrínseco) não é possível
distinguir a função indutora presente nas normas tributárias. Isso em razão de o
aspecto indutor da norma jurídica não se fazer presente no momento da destinação
do produto da arrecadação e sim na própria incidência da norma. O destino dos
recursos arrecadados diz de perto com a função arrecadatória da norma tributária,
que tem as suas propriedades definidas de acordo com o tipo de tributo sob o qual
veiculado. Significa dizer que a destinação está relacionada à função arrecadatória da
norma jurídica, servindo como critério para diferenciar as espécies tributárias entre si.
Contudo, ao tratar da norma tributária indutora, há de se ter em conta que o critério
que permite a sua identificação é aquele relacionado à busca de uma finalidade que
consiste em intervenção estatal sobre os meios econômico e social.
Para compatibilizar a norma indutora com os diferentes tributos existentes, não
basta partir do emprego da tributação com finalismo extrafiscal sob pena de
65
desnaturar a própria definição da espécie tributária (também a extrafiscalidade está
sujeita ao regime tributário e deve respeitar os limites que conformam a própria
estrutura de determinado tributo). Antes, porém, convém que sejam analisadas as
diferentes espécies de tributos existentes e as possibilidades de que sejam utilizados
para fins de intervenção sobre o domínio econômico. Não custa lembrar que por meio
da extrafiscalidade não se propõe a criação de espécie tributária nova, mas que sejam
utilizadas as já existentes, no limite da sua conformação jurídica.
A questão passa a ser, portanto, como anota Schoueri, saber se uma espécie
tributária possui em sua definição alguma característica que impossibilite ou restrinja
o emprego de normas tributárias indutoras (SCHOUERI, 2005, p. 130).
Partindo do pressuposto de que no presente trabalho se busca uma
investigação restrita da extrafiscalidade no âmbito do Estado de Minas Gerais, serão
analisadas no tópico seguintes apenas os tributos que se conformam à competência
tributária dos estados-membros.
Feitas tais considerações, passa-se ao exame da conformação dos impostos,
taxas e contribuições de melhoria, ao regime das normas tributárias indutoras.
3.1.1 Impostos
Ao qualificar os impostos segundo os critérios anteriormente delineados, temos
que no seu fato gerador se encontra a descrição de hipótese que independe de
qualquer atividade estatal referível ao contribuinte89, aliado a uma proibição de que a
receita decorrente da sua arrecadação seja vinculada a órgão, fundo ou despesa90.
A inserção das normas tributárias indutoras através dessa espécie exige, no
entanto, que se vá além da mera distinção que os impostos apresentam em relação
às demais figuras tributárias, para que seja investigada a sua própria finalidade (ou
finalidades).
A cobrança dos impostos se justifica, em regra, em virtude da necessidade que
o Estado possui em encontrar recursos financeiros para atender às exigências da
coletividade ou necessidades gerais do Estado (SCHOUERI, 2005, p. 165). As normas
tributárias indutoras quando assumem a roupagem dos impostos não encontram sua
89 Artigo 16 do Código Tributário Nacional. 90 Artigo 167, inciso IV, da Constituição.
66
justificativa na necessidade financeira do Estado, mas sim na utilização dessa figura
como instrumento de intervenção do Poder Público sobre o Domínio Econômico.
Segundo Schoueri, a compatibilidade entre as normas tributárias indutoras e os
impostos se manifestaria pelo fato de que ambos integram o objetivo de construção
de uma sociedade livre, justa e solidária, insculpido no art. 3º da Constituição Federal.
No caso dos impostos fundados na necessidade arrecadatória do Estado, a
solidariedade seria manifestada pela via da capacidade contributiva. E, quando
presentes fundamentos da Ordem Econômica na idealização do imposto (artigo 170
da Constituição Federal), haveria que se considerar a finalidade de assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social (SCHOUERI, 2005 p. 168).
Outras razões, de estatura constitucional, justificam a compatibilidade das
normas tributárias indutoras com os impostos. Com efeito, a própria Constituição
elenca no capítulo do “Sistema Tributário Nacional” determinadas hipóteses em que
os entes públicos detêm competência para utilizar os impostos com função indutora.
Assim, identifica-se a existência de previsões gerais, aplicáveis não apenas aos
impostos, como a faculdade conferida ao legislador complementar para estabelecer
critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da
concorrência (artigo 146-A). Ou ainda a competência da União para conceder
incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-
econômico entre as diferentes regiões do País (artigo 151, inciso I). E também, são
encontradas previsões específicas aos impostos, como a não aplicação do princípio
que estipula a proibição de cobrança de tributos no mesmo exercício em que haja sido
publicada a lei que os instituiu ou aumentou (artigo 150, § 1º), aos impostos sobre a
importação de produtos estrangeiros (artigo 153, inciso I), ou sobre a exportação de
produtos nacionais (artigo 153, inciso II). Sem falar na cobrança do imposto sobre a
propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo, em caso de
subutilização ou não edificação de solo urbano (artigo 182, parágrafo 4º, inciso II)91
(BRASIL, 1988).
O critério para identificar tais disposições constitucionais como atinentes à
extrafiscalidade, reside justamente na possibilidade de que o imposto seja utilizado
como instrumento de intervenção econômica e social, atendendo a finalidade diversa
da mera arrecadação de recursos para fazer frente às despesas públicas. Não há de
91 Nota-se que referida disposição se encontra inserida no próprio capítulo da ordem econômica, o que
demonstra que se trata de nítida previsão de utilização do imposto com função indutora.
67
se admitir que determinadas derrogações às tradições limitações ao poder de tributar
sejam concedidas sem propósito, mas apenas enquanto justificativa para que sejam
alavancados outros valores encampados pelo texto constitucional.
Interessa, nesse ponto, referir à constatação feita por Godoi, que ao tratar da
compatibilidade da extrafiscalidade com o princípio da igualdade – representativo de
importante critério informador da tributação -, defende que essa análise não pode ser
feita apenas pela acepção da igualdade em seu sentido formal (qual seja, de conferir
tratamento igual a todos os seres que ocupam a mesma categoria essencial), senão
também pela igualdade enquanto exigência de discriminações não arbitrárias e
compatíveis com os valores positivados na Constituição92. Assim, outros valores e
objetivos constitucionais poderiam servir como autorizadores de discriminações
legislativas, principalmente quando de índole política econômica e reforma social
(GODOI, 1999, p. 194).
Ao se referir ao princípio da capacidade contributiva e o limite traçado pela
vedação ao confisco, Grupenmacher afirma que o respeito à capacidade contributiva
não se mostra possível em sua plenitude nos tributos marcados pelo caráter
extrafiscal. Todavia, entende ser possível falar em eficácia mínima do princípio, por
ser inadmissível o caráter confiscatório do tributo (GRUPENMACHER, 2017).
Por outro lado, Derzi afirma que as derrogações ao princípio da capacidade
econômica em virtude da tributação extrafiscal não seriam ofensas à igualdade formal,
desde que submetidas às regras de regularidade e igual tratamento entre seres da
mesma categoria essencial. A Constituição obstaria o tratamento discriminatório para
atividades identicamente situadas, como sabidamente ocorreria no caso de norma
legal que concedesse estímulos a certos proprietários de terra em detrimento de
outros em igualdade de condições. Nestas situações, o tratamento quanto ao imposto,
92 Ao sustentar sua teoria, Godoi parte do princípio da capacidade contributiva como subprincípio que
opera a igualdade, para daí superar as antinomias existentes entre a capacidade contributiva e medidas de extrafiscalidade. Segundo ele, três correntes teóricas poderiam ser visualizadas na legitimação de medidas extrafiscais. A primeira, que reputa como ilegítimas tais medidas. A segunda, que propõe que o princípio da igualdade seja mais amplo que o princípio da capacidade contributiva, permitindo-se que outros valores protegidos por normas constitucionais possam também justificar discriminações legislativas. E a terceira, que diferencia os conceitos de capacidade econômica e capacidade contributiva, sendo a primeira conceituada como ‘potência econômica global’ e a segunda um conceito que abarca um valor implícito e decorrente dos ideais expressos na Constituição. Esta última pretende demonstrar que na capacidade contributiva não se abarca tão somente o conceito da capacidade econômica, senão outros valores e metas constitucionais como autorizadores de discriminações legislativas lícitas, principalmente de índole de política econômica e de reforma social (GODOI, 1999, p. 193-196).
68
incentivos, prêmios, isenções ou progressividade sancionante, teria que ser
radicalmente idêntico (DERZI, 2004, p. 114).
A posição da autora pode ser explicada pela existência de diferentes níveis de
igualdade, cujos primeiros critérios de diferenciação (dentre eles o da capacidade
econômica) são superados à vista de justificativa extrafiscal, resultando em um
segundo nível de diferenciação que deve ser respeitado. Seria inadmissível, portanto,
que aqueles que se encontram em uma mesma categoria essencial fossem
discriminados com base em critérios não constitucionais, mas puramente arbitrários93.
Voltando ao tema central, não há de se olvidar que a utilização das normas
tributárias indutoras na figura dos impostos não se prende apenas aos casos
expressamente estipulados pelo texto constitucional, como também naquelas
situações autorizadoras, em que não há incompatibilidade com a disciplina própria
dessa espécie tributária. Retornaremos à essa questão quando estivermos a tratar da
extrafiscalidade no âmbito do Estado de Minas Gerais, em que será demonstrada a
aplicação prática de tais pressupostos teóricos.
3.1.2 Taxas
Diferentemente dos impostos, as taxas têm o seu fato gerador caracterizado
por uma obrigação que nasce da realização de uma atividade estatal vinculada ou
relacionada de modo específico ao contribuinte (CARRAZZA, 2003, p. 469). Em outras
palavras, as taxas são tributos cuja hipótese de incidência consiste em atuação estatal
diretamente referida ao contribuinte, podendo se tratar da prestação de um serviço
público ou da realização de ato de polícia.
Baleeiro ressalta o caráter contraprestacional da taxa, ao assinalar que a sua
cobrança é feita em razão de alguém se utilizar de serviço público específico e
divisível, de caráter administrativo ou jurisdicional, ou de quem o tem à sua disposição,
e ainda quando provoca em seu próprio benefício despesa especial aos cofres
públicos (BALEEIRO, 2010, p. 540).
93 Exemplo citado por Derzi e que se mostra útil para a compreensão do tema, diz com a imunidade
conferida aos produtos industrializados destinados ao exterior. Tem-se, no caso, nítida relativização do princípio da capacidade econômica, tendo em vista que também os exportadores demonstram ter capacidade em contribuir aos gastos públicos. Porém, ao conceder a imunidade, a Constituição se pautou por critério diverso daquele atinente à justiça distributiva, contemplando outros valores igualmente relevantes, tais como o desenvolvimento nacional, o equilíbrio da balança de pagamento e o pleno emprego (DERZI, 2004, p. 113).
69
Partindo do pressuposto de que a taxa é cobrada em razão da atividade estatal,
Schoueri identifica a presença do sinalagma, isto é, a taxa é a contraprestação que o
contribuinte pagaria ao Estado em razão de sua atuação em função daquele
(SCHOUERI, 2005, p. 168-169).
Logo, o fundamento ou justificativa para a cobrança da taxa (critério
extrínseco), estaria no seu caráter contraprestacional ou sinalagmático94, não se
medindo por exata correspondência entre o custo da atuação estatal e o montante
cobrado a título de tributo, e sim por uma medida de razoável equivalência95.
Sobre a compatibilidade do regime das taxas com a inserção das normas
tributárias indutoras, Schoueri - conquanto deixe claro que o tema não seja pacífico96
- alerta que nestes casos a legitimação desta espécie tributária já não seria encontrada
no princípio da razoável equivalência. A nova justificativa a ser buscada estaria na
própria intervenção estatal sobre o Domínio Econômico (SCHOUERI, 2005, p. 180).
Ao final da sua exposição, conclui que:
[...] também as taxas permitem que sua disciplina se faça mediante a inserção de normas tributárias indutoras. Estas, não tendo sua fundamentação na necessidade financeira do Estado nem no princípio da equivalência, requerem justificação baseada na necessidade do Estado de intervir sobre o Domínio Econômico. Ademais, dado que o fato gerador da taxa implica uma prestação estatal, não se aceita venha a norma tributária indutora a indicar comportamento contrário ao que motivou a própria prestação estatal. (SCHOUERI, 2005, p. 181).
A despeito da posição do aludido doutrinador sobre o tema, há que ser levado
em conta que inexiste dispositivo constitucional expresso pré-estabelecendo o
emprego das taxas com função indutora97. Cumpre observar, no entanto, que na
94 Essa mesma ideia é repetida por Carrazza que reconhece que a taxa serve para retribui
pecuniariamente o serviço público ou as diligências que levariam ao ato de polícia. Dessa forma, a taxa só poderia ser exigida daquela pessoa alcançada pela atuação estatal e desde que o tributo tenha por base de cálculo o custo desta atuação - senão o custo, ao menos uma correlação entre ambas (CARRAZZA, 2003, p. 485).
95 Cf. Schoueri, 2005, p. 176. 96 Ávila considera que as taxas não são instituídas para promover algo que ainda não existe, limitando-
se a para custear uma atividade estatal específica. Nesse sentido, considera que não se prestariam a servir de instrumento para atingir finalidades extrafiscais (ÁVILA, 2009, p. 65).
97 A não ser, quiçá, a própria imunidade no pagamento de taxas prevista no art. 5º, inciso XXXIV, da Constituição, que assegura o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder, além do direito à obtenção de certidões em repartições públicas. Nestes casos, poderia ser dito que pretendeu o constituinte assegurar o exercício de direito fundamental pelo cidadão sem que seja demovido diante da expectativa de arcar com contraprestação pela prestação de serviço público. Todavia, considera-se se tratar de fundamentação ligeiramente distinta, que diz propriamente com impedimento a que o Estado possa se valer das taxas
70
outorga de capacidade para criação e instituição de taxas, a Constituição condicionou
o seu exercício à necessária competência administrativa do ente público, o que
justifica que no desempenho dessa função possa se utilizar desta figura tributária para
provocar um estímulo ou desestímulo ao comportamento dos indivíduos atingidos pela
atividade estatal.
Explicitando melhor a tese ora sustentada, tem-se que a Constituição não tratou
de repartir a competência para instituição de taxas segundo um critério material, tal
qual fez com os impostos. Na realidade, conferiu à União e também aos Estados,
Distrito Federal e Municípios, competência tributária para instituir taxas, em razão do
exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços
públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postas a sua disposição
(artigo 145, inciso II)98. Embora possa aparentar se tratar de competência do tipo
comum, ou seja, conferida a todas as pessoas políticas, Carrazza (2003, p. 574)
adverte que as taxas e contribuições de melhoria somente podem ser criadas pela
pessoa política que revestir competência administrativa para prestar o serviço público,
para praticar o ato de polícia ou realizar a obra pública99. O entendimento parece ser
acertado se for levado em conta que o exercício do poder de polícia e a prestação de
serviços públicos, por envolver atuação estatal, estão disciplinados e discriminados
pelo texto constitucional. A União, assim, é o ente que reúne maior número de
competências administrativas privativas, como se verifica da análise do artigo 21 da
Constituição (como exemplo, emitir moeda, administrar as reservas cambiais do País,
fiscalizar as operações de natureza financeira e manter o serviço postal), sem falar na
sua extensa competência legislativa ou reguladora enumerada pelo artigo 22
(competência privativa para legislar sobre direito civil, águas, energia, informática,
seguridade social, e dentre outras matérias). Aos Estados foi atribuída a competência
do tipo de residual, reservando-lhes a Constituição atuação naqueles campos não
atribuídos à União e tampouco aos Municípios. E, finalmente, aos Municípios
para dissuadir o exercício de direitos fundamentais. Trata-se, em último caso, da própria negação da extrafiscalidade, ou seja, de limitação a que o Poder Público possa se utilizar do tributo com efeitos indutores ou inibitórios.
98 Em cima dessa constatação, Ribeiro entende que no exercício da capacidade tributária relativa às taxas e contribuições de melhoria, os entes federados teriam ampla liberdade para exercer o poder de indução extrafiscal (RIBEIRO, 2013, p. 83).
99 “Obviamente, os serviços públicos, as diligências ensejadoras dos atos de polícia e as obras públicas devem estar dentro da faixa de atribuições (da competência administrativa) da pessoa política que instituir os tributos vinculados (taxas e contribuição de melhoria).” (CARRAZZA, 2003, p. 575).
71
compete, precipuamente, legislar sobre assuntos de interesse local (artigo 30, inciso
I) e prestar serviços de igual natureza (artigo 30, inciso V) (BRASIL, 1988).
Enfim, todas as competências que envolvem atuação do Estado através da
prestação de serviços públicos ou o exercício de poder de polícia referíveis a
determinada pessoa, justificam a instituição de taxa para custear a atividade exercida.
Antes que seja instituída a taxa, explica Carrazza (2003, p. 574) que é mister
que seja instituída lei regulando a atuação estatal no campo a que se pretende a
cobrança do tributo. A pessoa política não deve possuir apenas competência material
para realizar a atividade estatal (na prestação de um serviço público ou no exercício
do poder de polícia), como também exige-se que tenha disciplinado, por meio de lei,
tal atuação. Se assim o é, não poderia determinado ente invadir a competência
administrativa de outro, instituindo taxa sobre determinada atividade que não lhe
tivesse sido reserva pela Constituição. Não haveria, a esse respeito, competência
comum em matéria de taxas. Todos os entes políticos estão habilitados a instituir
referida espécie, desde que dentro da competência administrativa que lhes tiver sido
reservada pelo texto constitucional.
Em que pese ser aceito que em determinadas competências possa subsistir o
caráter privativo ou exclusivo, a crítica que se faz à posição sustentada é a de que
seria igualmente certo que o texto constitucional prevê hipóteses em que a
competência será comum às pessoas políticas, dentre elas aquelas previstas no artigo
23 da Constituição (cuidar da saúde e assistência pública, proporcionar meios de
acesso à cultura, educação, ciência e tecnologia, proteger o meio ambiente e
combater a poluição, fomentar a produção agropecuária, e entre outras) (BRASIL,
1988).
Isto posto, não seria admissível tratar a competência em matéria de taxas como
essencialmente privativa, dada a circunstância de existirem áreas de atuação estatal
em que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, partilham de
atribuições comuns e concorrentes.
A constatação de que a competência para instituir taxas decorre diretamente
das atribuições administrativas repartidas pelo constituinte, torna necessário que essa
específica atuação do Estado seja não só determinante para a identificação da
referida espécie como também para avaliar a possibilidade de seja introduzida a
norma tributária indutora. Significa dizer que a possibilidade de utilização das taxas
com função indutora decorre da própria necessidade de se legitimar a atividade estatal
72
por meio de outros valores que não aqueles preconizados exclusivamente pelo
princípio da equivalência.
A cobrança das taxas com base em outros valores que não aqueles
decorrentes da ideia de sinalagma foi bem sopesada por Kloepfer (KLOEPFER apud
SCHOUERI, 2005, p. 177), quando reconhece no direito alemão uma exigência,
decorrente da lei fundamental, de que exista compatibilidade entre o conceito
constitucional de taxa e o efeito indutor. Na interpretação feita por Schoueri, o
doutrinador alemão teria identificado que a competência para instituição das taxas
seria um anexo da competência administrativa, ficando submetida aos objetivos gerais
da administração pública. Ocorre que os objetivos buscados pela lei que regula a
atuação estatal vão muito além do seu mero exercício, alcançando, inclusive,
situações que demandam a intervenção do Estado para produzir efeitos sobre o meio
econômico e social. A função indutora teria sua atuação voltada para o atingimento
dessas finalidades, compatibilizando-se com o regime das taxas.
De outra forma, também se poderia admitir dita compatibilidade, ao
compreender o princípio da equivalência com o escopo mais amplo e não restrito ao
custo da atuação estatal diretamente referida ao contribuinte. A equivalência deveria
ser medida em face de todos os desdobramentos advindos do serviço público ou do
poder de polícia, também alcançando aquelas situações em que exista uma atuação
indireta do Estado100. Ao regular o poder de polícia ambiental, por exemplo, o custo
desse exercício não estaria exclusivamente na fiscalização da atividade do
contribuinte, perpassando também toda a atuação do Estado na tutela do meio
ambiente e que teria como se relacionar, ainda que de forma indireta, em decorrência
daquela atividade que está sendo objeto de tutela.
Nesse sentido, a advertência de Marcos Oliveira sobre a face impositiva do
princípio do poluidor-pagador, cujo significado aponta para o dever do Estado em
cobrar do poluidor contribuições públicas (tributos) em função de sua atividade
poluidora. Todavia, essa cobrança, diga-se necessária, não se limitaria aos custos
decorrentes dos serviços públicos específicos necessárias à preservação e
100 Não se está a defender que toda e qualquer consequência advinda da atividade estatal deva ser
incluída no conceito de equivalência. O que se pretende demonstrar é que a ideia de custo construída não se pode medir pelo simples impacto direto do serviço público prestado ou do poder de polícia exercido. Existem efeitos secundários que, por vezes, são imperceptíveis e não ligados diretamente àqueles fatos primários. E tal repercussão econômica deve ser levada em conta, até para que não avulte em oneração excessiva dos cofres públicos.
73
recuperação do meio ambiente, além daqueles relativos à fiscalização ou
monitoramento ambientais, como também sobre os custos gerais da atuação estatal
(OLIVEIRA, 1999, p. 42).
Não se pretende descuidar da natureza específica da taxa e da necessária
referibilidade ao contribuinte. O objetivo aqui exposto é demonstrar que, por razões
extrafiscais, justifica-se sejam incluídos no custo da atuação estatal não apenas
aqueles valores diretamente relacionadas ao serviço prestado ou poder de polícia
exercido, como também aqueles indiretos relativos ao impacto da sua atividade, que,
por vezes, não podem ser mensurados e impactam significativamente a sociedade.
Neste caso, estaria legitimada a cobrança exacerbada a título de taxa para inibir a
conduta ou atividade socialmente indesejada, provocando nítido efeito indutor101.
3.1.3 Contribuições de Melhoria
A contribuição de melhoria tem por descrição no seu fato gerador uma atuação
estatal que consiste em obra pública da qual decorra valorização imobiliária
(melhoria), estando presente na sua justificação a ideia do “sinalagma” anteriormente
apontada quanto às taxas.
Com razão, a contribuição não é cobrada por qualquer obra pública, mas
apenas em decorrência daquela de que resulte valorização imobiliária e que possa
ser referível a determinado grupo de contribuintes. Justamente, por isso, Amaro
identifica fundamento comum da contribuição de melhoria com o das taxas, que
consiste no fato da atuação estatal poder ser referível a um indivíduo, ou a um grupo
de indivíduos, devendo ser financiada por tributos específicos contra esses mesmos
indivíduos; e não pelos tributos (impostos) arrecadados de toda a coletividade102
(AMARO, 2012, p. 70).
Ao tratar da inserção das normas tributárias indutoras na estrutura das
contribuições de melhoria, Schoueri parte do pressuposto de que a existência da obra
101 Não se vislumbra, nesse ponto, incompatibilidade com a premissa adotada por Schoueri (2005, p.
180), no sentido de que não seria aceitável que o Estado, por meio do poder de polícia, buscasse limitar atividade que fosse incentivada por outro instrumento. Neste caso, não se está pressupondo a fiscalização de atividade incentivada, mas indesejada. Tampouco há contradição com a situação inversa, qual seja incentivo por função indutora inserida na própria taxa criada por conta daquele exercício do poder de polícia.
102 Nas palavras de Amaro, ao tratar do fundamento lógico que embasa a contribuição de melhoria, “se a coletividade não deve financiar a obra que enriquece um grupo de indivíduos, também não se pode empobrecer esse grupo, para financiar uma obra que interessa à coletividade” (AMARO, 2012, p. 71).
74
pública e da consequente melhoria (ou valorização imobiliária) seriam requisitos
essenciais para a sua cobrança. Pondera que seria admissível a existência de outras
motivações – que não o sinalagma - para legitimar as normas tributárias que veiculam
uma contribuição de melhoria, como a necessidade de intervenção do Estado sobre o
Domínio Econômico (SCHOUERI, 2005, p. 189). Entretanto, as razões invocadas pelo
autor não são convincentes.
Por primeiro, na contribuição de melhoria se tem como pressuposto de
incidência que dá atuação estatal decorra uma valorização imobiliária, estando ali
especificada a sua finalidade e critério de legitimação. Partindo dessa constatação,
seria incompatível com o regime das contribuições de melhoria imaginar que dá sua
cobrança possa decorrer indução ao comportamento dos indivíduos. Não detém o
indivíduo de autonomia para praticar conduta diversa daquela da qual decorre a
cobrança do tributo. A não ser que se admita o incentivo à alienação e especulação
imobiliária por ocasião do início das obras públicas e da iminente ameaça de cobrança
da contribuição de melhoria - o que parece não se tratar de finalidade alinhada com
valor protegido (ou perseguido) pelo texto constitucional. Diferentemente das taxas,
em que o contribuinte pode optar por se comportar de modo a evitar a sua incidência
ou ser incentivado a adotar conduta alinhada com os objetivos da atuação estatal, nas
contribuições de melhoria não há esfera de escolha do indivíduo, o que descaracteriza
o intento indutor presente na extrafiscalidade.
No que se refere às situações específicas de isenção dessa espécie tributária,
mesmo que se admita a aplicação da exoneração fiscal como expediente do tipo
extrafiscal, há de ser ter em conta que nem toda isenção está relacionada à
extrafiscalidade enquanto espécie103. Ou seja, a existência de intuito indutor não é a
única razão que justifica a concessão de uma isenção. Outras razões, inclusive
derivadas da capacidade contributiva, podem justificar que determinado proprietário
de imóvel seja isento da contribuição de melhoria (como poderia ocorrer na realização
de obra pública em região de baixa renda). Cabe, nesse ponto, trazer a lição de
Coelho, para quem nas taxas e contribuições de melhoria o princípio da capacidade
contributiva se realizaria negativamente (incapacidade contributiva), gerando
remissões e reduções subjetivas do montante a pagar em relação ao sujeito passivo
103 “Isenção tributária é técnica que serve tanto aos objetivos extrafiscais (gênero) como aos
arrecadatórios e aos simplificadores. A diferença não se encontra no modo de agir a norma, mas em sua função e, por conseguinte, em seu regime jurídico.” (SCHOUERI, 2005, p. 207).
75
sem capacidade econômica real. Cita, como exemplo, a isenção da taxa judiciária
concedida aos hipossuficientes e a redução ou isenção da contribuição de melhoria
em relação aos miseráveis que, mesmo sem querer, tiveram suas humildes
residências beneficiadas por obras públicas extremamente valorizadoras (COELHO,
2005, p. 56). Logo, apesar de ser admitida as hipóteses de isenção aplicáveis a esta
espécie tributária, não nos parece que a aplicação desse expediente seja feita com
viés indutor ou pretendendo modular a conduta do contribuinte, uma vez que, como
demonstrado, a sua esfera de escolha é reduzida, não se fazendo presente a
possibilidade de adoção de comportamento diverso.
Diferentemente, portanto, das espécies anteriormente apresentadas em que se
reconheceu a aplicação da norma tributária indutora, quanto às contribuições de
melhoria se nega esse expediente, pois a conformação desse tributo não coaduna
com a presença da função indutora.
Concluído o exame da aplicação da extrafiscalidade aplicável às espécies
tributárias de competência dos estados-membros, passa-se a análise a relação da
competência reguladora com a capacidade para instituir tributos com efeito indutor.
3.2 Relação da competência reguladora com a capacidade para instituir tributos
com efeito indutor
Questão que se faz pertinente ao presente trabalho diz com as implicações
decorrentes da instituição de tributos com efeito indutor à vista da competência
legislativa ou reguladora conferida aos entes públicos.
A competência legislativa seria aquela mais abrangente, envolvendo a
repartição de competências levadas a termo pelo constituinte, nos artigos 22 a 30 do
texto constitucional. Trata-se, na visão de Souza, de competência legislativa para
atender aos interesses dos diversos níveis da Administração, assim como para legislar
sobre “intervenção” ou “ação econômica”104, através de regulamentações, regulações
e planejamento (SOUZA, 1999, p. 351).
Já a competência reguladora seria compreendida enquanto expressão do
poder de regular (soberania regulatória), que segundo Nogueira, seria o poder de
104 Acrescenta que a competência concorrente da União, Estados e Distrito federal, é que seria
nominalmente referida ao Direito Econômico.
76
promover o interesse público pela limitação e regulação da liberdade, além do
interesse e da propriedade105. Regular, neste contexto, seria estabelecer regras,
dirigir, governar, sempre dentro das limitações impostas em decorrência da repartição
de atribuições constitucionais (NOGUEIRA, 1995, p. 181-182).
José dos Santos Carvalho Filho (2012, p. 903) acena para a existência de um
Estado Regulador, que se incumbe de estabelecer regras disciplinadoras da ordem
econômica com o objetivo de ajustá-la aos ditames da justiça social. O mandamento
da atribuição reguladora se faria presente no artigo 174 da Constituição, a qual
preceitua que “como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo
este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado”106 (BRASIL,
1988).
Quando figura como regulador, o Estado não deixa sua posição interventiva. A intervenção nesse caso se verifica através das imposições normativas destinadas principalmente aos particulares, bem como de mecanismos jurídicos preventivos e repressivos para coibir eventuais condutas abusivas. (CARVALHO FILHO, 2012, p. 904).
Ao tratar das competências atribuídas ao Estado-Regulador, o doutrinador
identifica que o sistema de partilha constitucional de atribuições prioriza o papel da
União Federal no exercício da função reguladora107. No entanto, reforça que no campo
105 Schoueri compreende a intervenção sobre o Domínio Econômico como tendo origem no poder de
regular, que não se confunde com o poder de tributar, encontrado no campo de exigência de tributos (SCHOUERI, 2005, p. 320).
106 Sobre as três formas de atuação do Estado, Carvalho Filho compreende a fiscalização como a atividade de verificação dos agentes econômicos para que sejam evitadas formas abusivas de comportamento de alguns particulares em detrimento de setores menos favorecidos (consumidores e hipossuficientes); já o incentivo representaria o estímulo que o governo deve promover para o desenvolvimento econômico e social do país (através de isenções fiscais, aumento de alíquotas do imposto sobre a importação, abertura de créditos especiais para setores estratégicos); e, finalmente, o planejamento estaria no estabelecimento de metas a serem alcançadas pelo governo no ramo da economia em determinado período futuro (CARVALHO FILHO, 2012, p. 903-904). A nosso ver, a extrafiscalidade se faria sentir com mais força no campo do incentivo, por se tratar de campo em que a intervenção por indução encontra terreno mais fértil.
107 Essa opinião é partilhada por Nogueira, que adverte que as finanças públicas modernas possuem uma tendência a restringir a autonomia local, de forma que só o poder central deveria se ocupar da conjuntura econômica e mesmo tomar decisões de orientação das despesas públicas (NOGUEIRA, 1995, p. 186). Em posição semelhante, Souza elenca o extenso rol das competências legislativas que foram mantidas com exclusividade para a União, desde a emissão de moedas, passando pelas águas, energia, informática, telecomunicações, radiodifusão, sistema monetário, comércio exterior e interestadual, jazidas, minas, poupança, até chegar na propaganda comercial. Ao final, conclui que “tão amplo espectro praticamente cobre todo o âmbito da atividade econômica do País” (SOUZA, 1999, p. 352).
77
da competência legislativa concorrente (artigo 24 do texto constitucional), a
Constituição teria contemplado algumas funções supletivas para os Estados e o
Distrito Federal. Assim é que a essas pessoas caberia legislar concorrentemente
sobre direito econômico e financeiro, produção e consumo, e proteção do meio
ambiente. Vale ressaltar nestes casos que a competência da União alcançaria a
edição de normas gerais e as demais entidades políticas normas suplementares108.
A relevância do tema ora tratado está no fato de que as normas indutoras,
quando empregadas como mecanismo de intervenção do Estado no meio econômico
e social, teriam sua atuação pautada pelo poder de regular ou a competência assim
conferida aos entes políticos. Como bem anota Schoueri, apesar de serem
introduzidas no ordenamento jurídico se utilizando do tributo como veículo de atuação,
sob o aspecto material respondem como instrumento de intervenção do Estado sobre
o Domínio Econômico (induzindo o comportamento dos contribuintes através de
estímulos financeiros positivos ou negativos). O regime jurídico das normas tributárias
indutoras seria, portanto, de duas naturezas. Do ponto de vista formal estaria sujeita
às regras disciplinadoras da competência tributária e por força da matéria que regulam
às regras de competência legislativa ou reguladora, o que autoriza concluir pela
necessária concomitância de competências constitucionais para que possam ser
introduzidas as normas tributárias indutoras (SCHOUERI, 2005, p. 327).
Ao tratar do tema, Ribeiro reconhece que em determinas situações a
competência para intervir sobre o domínio econômico seria condizente com a
competência tributária estabelecida pela Constituição. Todavia, alerta que em outros
casos não seria possível extrair essa correspondência. Como exemplo, cita o caso da
competência privativa da União para legislar sobre o comércio exterior e interestadual,
a despeito do imposto sobre a circulação de mercadorias de competência estadual
(ICMS) incidir na importação, exportação e destinação da mercancia a outros estados.
Em todo o caso, sustenta que as limitações constitucionais ao poder regulatório
também se aplicariam à capacidade de intervenção do Estado no domínio econômico
pela via da tributação. Incidiriam limitações em decorrência do instrumento utilizado,
sujeita ao regime jurídico tributário, e também quanto à finalidade buscada, submetida
aos princípios e regras da ordem econômica. Encerra sua exposição dizendo que a
108 Como, aliás, estabelece de modo expresso o § 2º do art. 24 da Constituição: “a competência da
União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados” (BRASIL, 1988).
78
capacidade de intervenção extrafiscal das pessoas políticas se equilibraria entre o
exercício de suas competências tributárias privativas e os limites a esse exercício
estabelecidos pela Constituição, ora a tratar dos seus tributos e ora pela repartição
federativa das competências legislativas (RIBEIRO, 2013, p. 85).
Com relação ao tema, a observação do autor tem o mérito de identificar
espaços em que não há perfeita correspondência entre a competência reguladora e
tributária. Além da situação outrora mencionada, outros casos podem ser extraídos
da própria Constituição, dentre eles a competência da União para legislar sobre
energia e telecomunicações, em contraposição à competência dos Estados e do
Distrito Federal para fazer incidir tributo sobre a circulação de mercadorias, aí incluída
a energia elétrica, e principalmente os serviços de comunicação. Ou também a
competência da primeira para legislar sobre transporte e a dos segundos para instituir
imposto sobre serviços de transporte intermunicipal e interestadual.
Embora não se possa deixar de reconhecer a existência das mencionadas
interseções entre competências de natureza distinta e entes autônomos, a
competência para fazer incidir tributos com função indutora somente poderá ser
exercida quando houver coincidência entre a competência tributária e reguladora. Não
se pode admitir como legítima a instituição de determinado tributo por pessoa
detentora de competência tributária com vistas à intervenção em campo de atuação
que escapa da sua capacidade reguladora. Mesmo na hipótese anteriormente
levantada, de competência dos Estados para instituição de imposto sobre a
importação de mercadorias, esta atuação deverá ser feita sem fins regulatórios. O
fundamento constitucional que autoriza a tributação nestes casos é evitar que o
produto nacional tenha tratamento mais gravoso que aquele importado (o que
certamente ocorreria se a mercadoria importada não fosse sujeita à incidência do
ICMS). Contudo, admitir que os Estados e o Distrito Federal possam instituir alíquotas
mais gravosas para mercadorias importadas em detrimento das nacionais, seria
conferir aos referidos entes políticos competência material não outorgada pela
Constituição; que, inclusive, encontra óbice no artigo 152 da Constituição109.
No capítulo anterior, em que foi abordado o critério de justificação das taxas e
das contribuições de melhoria, a interdependência entre a competência tributária e a
administrativa ficou bastante clara, até pela circunstância do fato gerador dessas
109 Segundo o dispositivo, seria vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, estabelecer
diferença de tratamento tributário entre bens e serviços em razão da sua procedência ou destino.
79
espécies tributárias estar vinculado a um agir estatal específico ao contribuinte. Não
seria legítima a atuação estatal que não tivesse como pressuposto a existência de
competência em razão da matéria. Todavia, no caso dos impostos instituídos com fins
extrafiscais essa aludida dependência também se mostra visível, podendo ser
extraída finalidade que consiste na perseguição de valor protegido pela Constituição
e cuja competência reguladora foi cometida a uma pessoa política.
A propósito, esta a posição adotada por Mendes, para quem a discriminação
constitucional de competências para a instituição de impostos não se limita a indicar
fatos sociais relevantes economicamente para atender às finalidades fiscais de
obtenção de recursos. Antes, também se faz presente o intuito de que tais exações
sirvam de expedientes capazes para direcionar condutas através da função
extrafiscal. Para isso, faz-se necessário relacionar as competências tributária e
regulatória (MENDES, 2009, p. 246). Como bem exemplifica o autor:
É da competência da União legislar privativamente sobre comércio exterior (art. 22, inciso VIII), logo é desta mesma Pessoa Política a competência para instituir impostos sobre estas condutas, isto é, o imposto de importação e o de exportação. Também é privativo da União legislar sobre direito agrário (art. 22, inciso I), bem como “desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social” (art. 184), logo o importo [sic.] territorial rural é de sua competência tributária. [...] Por outro lado, como a política de desenvolvimento urbano é de competência municipal (art. 182), o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana também o é. Não podemos deixar de constatar ser igualmente da União a competência administrativa para “fiscalizar as operações de natureza financeira” (art. 21, inciso VIII), bem como a legislativa para disciplinar o sistema financeiro nacional [...]. Logo, também é da União a competência tributária para estabelecer o imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários. (MENDES, 2009, p. 246).
Nogueira (1995, p.187) parte de exemplo semelhante, senão idêntico, ao
pontuar que quando o constituinte desejou proceder à reforma agrária conferiu à
União, como instrumento para sua implantação ou regulação, competência para
legislar sobre o imposto territorial rural110. Quis, com isso, demonstrar que a
competência para criação do imposto sobre a propriedade rural foi propositalmente
outorgada ao ente político que detinha a competência material para intervir na reforma 110 Cita ainda exemplo envolvendo lei do Município de Americana que criou um chamado adicional de
imposto territorial urbano por meio do qual o tributo seria proporcional e progressivamente agravado em razão do número ou quantidade de lotes de terrenos que possuam os proprietários. No seu entender, ao assim proceder o Município teria usurpado da competência legislativa da União para legislar sobre o direito de propriedade, cabendo a ela, com exclusividade, regular o uso, gozo ou exercício desse direito.
80
agrária. Alia-se o necessário papel extrafiscal do tributo com a possibilidade de que
fosse utilizado pelo ente competente para alcançar determinado fim constitucional; o
que revela, em último caso, uma predisposição do constituinte para que o imposto
fosse utilizado como mecanismo de intervenção sobre o domínio econômico.
Em outra obra de sua autoria, Nogueira retoma sua posição sobre o assunto
ao citar, como exemplo, que se um Estado-membro não pode conceder de forma
isolada incentivo fiscal do antigo ICM (hoje ICMS) que interfira em aspectos da
economia fiscal, justamente porque a regulação dessa competência é da União,
tampouco poderia um Município gravar a tributação do imposto territorial urbano ou
predial com o fito de regular o direito de propriedade (que também escapa da sua
capacidade reguladora). Em síntese, defende que a função regulatória dos tributos é
reconhecida no sistema tributário nacional, porém dentro do princípio das atribuições
de cada nível de governo (NOGUEIRA, 1971, p. 156).
Daí que, diante dos posicionamentos anteriormente apresentados, mostra-se
insuperável a cumulação de competências constitucionais para que seja instituída a
norma tributária indutora. Com efeito, o seu emprego sofre das mesmas restrições e
motivações de outras formas de intervenção na economia, devendo ser confrontadas
com princípios da Ordem Econômica, além daqueles limites impostos pelo regime
tributário (SCHOUERI, 2005, p. 167)111.
No capítulo seguinte, em que estivermos a tratar da instituição da norma
tributária indutora no plano estadual, a nossa análise não se desvirtuará do necessário
confronto entre a competência material e tributária atribuída ao estados federados,
para que possa ser investigada a função indutora dos tributos estaduais.
111 Em outra passagem, afirma que “justificando-se as normas tributárias indutoras, nas taxas, a partir
dos princípios da Ordem Econômica, também estes assumem papel relevante na limitação das primeiras.” (SCHOUERI, 2005, p. 180).
81
4 EXTRAFISCALIDADE NO ÂMBITO DOS ESTADOS FEDERADOS
4.1 Contextualização da extrafiscalidade aplicável aos estados federados
Ao iniciar o presente trabalho se destacou que a extrafiscalidade foi identificada
pela Ciência das Finanças a partir do estudo das chamadas “finanças funcionais”, que
nada mais é do que a utilização dos instrumentos financeiros, dentre eles os tributos,
para atuar sistematicamente sobre a conjuntura econômica.
O contexto de surgimento da extrafiscalidade está intrinsecamente associado
com a mudança ocorrida no papel do Estado, saindo de uma postura liberal e
passando para uma dita intervencionista. Esse acontecimento terminou por se irradiar
na esfera jurídica, surgindo concepção até então desconhecida, da utilização da
norma tributária, ou do tributo propriamente dito, como mecanismo de intervenção em
aspectos conjunturais da economia e do meio social.
Ao assim proceder, surgiu o que Schoueri (2005) passou a denominar de
‘norma tributária indutora’, que, como demonstrado, não se trata de espécie normativa
nova, mas apenas de desdobramento da norma de conduta que se caracteriza pela
função e finalidade que lhe são peculiares.
Por se tratar de norma veiculada através do instrumento tributário e que objetiva
a intervenção do Estado sobre o Domínio Econômico, está sujeita a um regime misto,
tanto derivado da competência tributária como da competência reguladora. A pessoa
política que pretende se utilizar do tributo para o exercício de política extrafiscal, deve,
portanto, cumular competências constitucionais, sem o qual não lhe será lícito atuar
fora do campo das suas atribuições materiais.
O ordenamento jurídico brasileiro encampa a forma federativa de Estado,
conferindo aos entes federados competência em matéria tributária para que seja
garantida sua autonomia financeira. Diferentemente de outros países, o poder central
não conta com competência exclusiva para fazer editar normas de instituição e
cobrança de tributos, tendo essa atribuição sido compartilhada com os poderes
estaduais e municipais.
É inegável, contudo, que a União encabeçou a maior parte das competências
em matéria tributária, tanto no que se refere aos impostos como às contribuições
82
especiais, inclusive sendo relevante destacar sua competência residual para fazer
editar novos impostos não elencados previamente pelo constituinte112.
Aos Estados, em específico, restou a competência para fazer instituir impostos
sobre a transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos (ITCMD);
operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações
e as prestações se iniciem no exterior (ICMS); e sobre a propriedade de veículos
automotores (IPVA). Além destes, outros tributos113 compõe sua esfera de
competência, como a possibilidade de instituir taxas em razão do exercício do poder
de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e
divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; e ainda contribuição
de melhoria, decorrente de obras públicas por ele realizadas.
Embora seja no campo das taxas e das contribuições de melhoria que se faz
sentir a maior dependência entre as competências tributárias e administrativas, não
se pode negar que, guardadas as devidas proporções, a repartição das atribuições
para instituição de impostos e contribuições também tenha levado em conta essa
estreita relação114. Inclusive, vale dizer, agregando à essa equação a competência
legislativa ou reguladora de cada ente federado, campo em que se revela propícia a
utilização do tributo com função indutora. Talvez não de um ponto de vista
estritamente vinculado e nem considerando todas as possíveis implicações do uso
das diferentes espécies tributárias como instrumento de intervenção no Domínio
Econômico - sem falar na importância de que fosse feita uma distribuição que tivesse
em boa conta o tamanho dos gastos a serem incorridos pelas pessoas políticas no
exercício das suas competências materiais115. Ainda assim, mostra-se, ao menos em
112 Desde que os impostos sejam instituídos mediante lei complementar, não sejam idênticos aos já
existentes, observem a não cumulatividade e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos impostos discriminados na Constituição; além de ser autorizado a instituição de impostos extraordinários na iminência ou no caso de guerra externa (artigo 154 da Constituição).
113 Destaca-se, em menor medida, a possibilidade de que façam instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário próprio, tal qual elencado pelo § 1º do artigo 149 da Constituição.
114 Esta é a posição de Oliveira, para quem haveria no Brasil, “através do sistema tributário nacional (Título VI, capítulo I da Constituição), uma partilha constitucional de rendas (arts. 145, 148, 153, 154, 155 e 156) que corresponde à divisão constitucional de competências político-administrativas entre a União (art. 21), os Estados (art. 25), o Distrito Federal (art. 32) e os Municípios (art. 30).” (OLIVEIRA, 2007, p. 35).
115 O fato de determinado ente contar com maior número de competências, não significa que estas se traduzem em maior gasto público, já que, a título de exemplo, as despesas com segurança pública, a cargo prioritário dos Estados, podem superar em muito diversas competências administrativas menos complexas da União.
83
nível preliminar, condizente o fato de ter sido centralizada grande parte da
competência tributária em torno da União diante do extenso rol de competências
administrativas e reguladoras a ela conferidas pela Constituição.
A circunstância de ter o constituinte priorizado o papel da União Federal no
exercício da função reguladora, não exime os Estados de se incumbir do seu dever
constitucional de dar cumprimento às suas atribuições, ainda que concorrentes,
podendo se valer da sua atuação para praticar a intervenção sobre o meio econômico
e social. Assim é que se destaca a sua atuação supletiva em matérias como a
proteção e defesa da saúde; a proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico,
turístico e paisagístico; a proteção ao meio ambiente e o controle da poluição; e
também legislar sobre produção e consumo; direito financeiro, econômico e
urbanístico; educação, cultura, ensino, ciência e tecnologia; e dentre outros temas
relevantes.
Como adverte Schoueri, a competência para intervir sobre o Domínio
Econômico deve ser examinada à luz do artigo 24 da Constituição, já que é ali que se
encontra o tratamento da competência para legislar sobre matérias como direito
econômico, produção e consumo, ou proteção do meio ambiente e controle da
poluição. Essa competência, dita reguladora, é exercida de forma concorrente entre a
União, os Estados e o Distrito Federal, cabendo àquela o estabelecimento de normas
gerais e aos demais as de ordem supletiva (SCHOUERI, 2005, p. 339).
Em que pese o entendimento adotado - que restringe o intervencionismo ao
campo da competência regulatória -, cogita-se da intervenção sobre o Domínio
Econômico também no campo das competências administrativas, tendo em vista que
se trata de importante atribuição conferida às pessoas políticas para que possam
modificar a ordem econômica e social existente. De acordo com Carvalho Filho (2012,
p. 906), as atividades relacionadas à competência administrativa comum também
representam modalidade de intervenção estatal no domínio econômico. O constituinte
conferiu a todas as entidades federativas a incumbência de, concorrentemente,
proteger o meio ambiente, fomentar a produção agropecuária, organizar o
abastecimento alimentar, combater as causas da pobreza e promover a integração
social dos segmentos hipossuficientes. Sendo assim, nada mais coerente que admitir
que no exercício da prestação estatal, característica do exercício das competências
materiais ou administrativas, também se observe a busca pelo intervencionismo.
84
Voltando ao tema central, assiste razão a Schoueri no ponto em que afirma que
o campo de atuação dos Estados não parece pequeno. A atribuição conferida à União
para o estabelecimento de normas gerais não significa que o constituinte tenha
menosprezado o papel dos Estados no exercício da competência suplementar.
Enxerga que, ao assim proceder, o texto constitucional teria imposto um freio à
atuação da União para regular exclusivamente aquilo que tenha relevância nacional.
Trata-se-ia de evidente manifestação do desejo do constituinte em alargar a
competência estadual em detrimento da federal, promovendo a descentralização116
(SCHOUERI, 2005, p. 340).
Apesar de admitir a atuação dos Estados na intervenção sobre o Domínio
Econômico, salienta que esta deve ser tomada com a devida cautela, restringindo-se
ao interesse local, dada a possibilidade de a legislação estadual transbordar as
fronteiras do ente federado e repercutir nacionalmente. Cuida-se de preocupação que
tem toda a sua razão de ser, principalmente para se coibir a invasão da competência
de um entre federado pelo outro.
Em vista dessa conjuntura, o próprio texto constitucional foi estruturado em
diversas partes de forma a prevenir o desequilíbrio federativo. Corrêa, ao examinar o
ordenamento jurídico anterior àquele inaugurado pela Constituição de 1998, já tratava
de elencar limites ao pleno emprego da extrafiscalidade por parte dos estados e
municípios brasileiros. Estes, dizia, eram de dois tipos. O primeiro, traduzindo-se em
limitação do tipo quantitativa, estava no caráter centralizador da reforma tributária
brasileira oriunda da Emenda Constitucional n. 18/65, que conferiu à União o maior
número de impostos, reservando aos Estados, o Imposto sobre Operações Relativas
à Circulação de Mercadorias (ICM) e o Imposto sobre Transmissão, e aos Municípios
o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), além do Imposto
sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) (CORRÊA, 1975, p. 3-4). Nas suas
palavras:
Na verdade, o que se manifesta como quase exclusiva participação do Poder Central no emprego dos incentivos fiscais, nada mais é do que uma avassaladora massa de impostos pertencentes à União em confronto com o
116 Vale ressaltar, neste ponto, que o próprio jurista identifica que a legislação dos estados e a federal
não estão no mesmo plano, uma vez que o parágrafo 4º do artigo 24 da Constituição teria assegurado a supremacia do direito federal ao dispor que a competência dos Estados somente seria plena à vista da inexistência de lei federal. Não se considera que se trata de supremacia de uma ordem sobre a outra, apenas que os Estados também poderão editar normas gerais se houver negligência da União no exercício desse papel.
85
exíguo número de impostos atribuídos aos outros entes da Federação. (CORRÊA, 1975, p. 4).
Não obstante tenham se referido à ordem constitucional anterior, mesmo após
a Constituição de 1988 é possível encontrar cenário similar, dada a aglutinação da
competência em matéria de impostos e contribuições em torno da União, e
praticamente a manutenção da capacidade tributária dos Estados e Municípios.
Portanto, nem sempre será viável aos Estados utilizar dos tributos sob sua
competência para fazer cumprir suas atribuições reguladoras, especialmente para
praticar a intervenção sobre o Domínio Econômico. Existem restrições materiais e
formais a esse respeito, que podem ser resumidas nos aspectos estruturais e
finalísticos de cada espécie tributária. Em outras palavras, nem todo tributo se presta
a cumprir com determinada atribuição regulatória. Algumas espécies, por suas
próprias características, são mais ou menos aptas a realizar determinada intervenção,
principalmente os impostos que são segregados por campos de competência material.
Ao lado das limitações quantitativas, estariam também aquelas decorrentes da
interferência da União através da concessão de incentivos sobre os impostos
pertencentes a Estados e Municípios. Este, talvez, o ponto mais polêmico se
comparado ao ordenamento atual. De fato, alguns dispositivos constitucionais, como
o parágrafo 3º, inciso II do artigo 156, autorizam a lei complementar federal a excluir
da incidência do ISSQN as exportações de serviços para o exterior. Outros, como o
parágrafo 2º, incisos IV, V e XII, alínea “g”, todos do artigo 155, determinam que o
Senado Federal estabeleça alíquotas do ICMS sobre as operações e prestações
interestaduais, além da faculdade de estabelecer alíquotas mínimas nas operações
internas, inclusive regulando através de lei complementar a forma como, mediante
deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais
serão concedidos e revogados117. Estas limitações ou interferências na competência
tributária, entretanto, restringem-se aquelas hipóteses excepcionais listadas pelo texto
constitucional e somente se justificam se utilizadas para preservar a competência
material da União Federal. Enxerga-se nestes tributos, de competência dos Estados,
Distrito Federal e Municípios, a possibilidade de que possam interferir no equilíbrio da
117 A situação se repete em relação ao ITCMD, cujas alíquotas máximas serão fixadas pelo Senado
Federal (parágrafo 1º, inciso IV do artigo 155 da Constituição), e do IPVA, cujas alíquotas mínimas são fixadas pelo Senado Federal (parágrafo 6º, inciso I do artigo 155 da Constituição) (BRASIL, 1988).
86
federação, daí a sua necessária regulação pelo poder central.
Em posição mais conservadora sobre o assunto ora tratado, Ricardo Torres
contextualiza a criação do ICMS como inovação na tributação plurifásica, cuja
pretensão é incidir apenas sobre o valor agregado ou acrescido. Os argumentos de
ordem econômica a justificar a sua substituição pelo então imposto de vendas e
consignações, que possui nítido efeito cumulativo, estaria na neutralidade na
formação dos preços118, no desestímulo à integração vertical das empresas, na
aptidão para incentivar exportações mediante a técnica da restituição do tributo pago
internamente e a sua capacidade para sustentar as economias dos Estados-membros
por meio da política de diversificação de alíquotas e bases de cálculo. Desde então,
tratava o autor de reconhecer que o tributo, de competência estadual, apresenta seus
maiores problemas nos aspectos ligados ao federalismo (TORRES, 2000, p. 331).
Na mesma linha, referindo-se à reforma oriunda da Emenda Constitucional n.
18/65, Nogueira (1971, p. 151) salienta que os próprios precursores da reforma
identificaram dentro da competência tributária dos Estados-membros a principal fonte
dos problemas relacionadas à integração econômica e unidade nacional, o que
ensejou o reforço das normas que proíbem a tributação discriminatória e os entraves
fiscais às operações interestaduais e intermunicipais. Para evitar uma ‘guerra
tributária’ entre Estados produtores e consumidores - tomando o antigo ICM (hoje
ICMS) como arma119 -, foram tomadas providências para que esse imposto fosse
neutro, de cunho exclusivamente fiscal e não dotado de finalidade regulatória. Na
visão do autor, sua finalidade seria exclusivamente fornecer parte da receita
necessária aos Estados-Membros e aos Municípios para fazer frente às suas
despesas públicas. Acrescenta que o então ICM não poderia ser utilizado pelos
Estados como instrumento regulador da economia, fomentando ou desencorajando
atividades, isto é, não se trataria de imposto hábil a atuação extrafiscal120. A
justificativa estaria no aludido princípio da uniformidade da alíquota para todas as
118 Cf. Morsch, 2006, p. 85. 119 “O ICMS passa a ser usado como instrumento de captação de investimentos, vindo a ser fator
determinante na escolha de alocação de recursos pelo agente econômico.” (MORSCH, 2006, p. 74). 120 Também Morsch, conquanto identifique que tem sido o ICMS predominantemente desvirtuado e
utilizado como instrumento extrafiscal de desenvolvimento da economia, defende que a sua finalidade deveria ser basicamente fiscal, ou seja, o principal objetivo do tributo deveria ser arrecadar recursos financeiros para satisfação das necessidades públicos e promoção dos direitos fundamentais (MORSCH, 2006, p. 58).
87
mercadorias gravadas pelo imposto, conjugada com a suposição de ser a intervenção
sobre o meio econômico tarefa precípua do poder central121.
Conquanto admita a possibilidade dos Estados praticarem a intervenção sobre
o Domínio Econômico, Schoueri diz que em relação ao ICMS buscou o legislador
constituinte que fosse regulado, em suas linhas maiores, por meio de lei
complementar, de modo a dificultar que normas tributárias indutoras fossem além do
campo de alcance da própria competência material estadual (SCHOUERI, 2005, p.
350).
Assiste razão a essa parcela da doutrina quando identifica a existência de
limitações ao emprego dessa espécie tributária para a prática da extrafiscalidade. No
entender de Corrêa (1975, p. 5), à vista das limitações constitucionais existentes122,
ficam os Estados impedidos de estabelecer, por si só, alíquotas gravosas para
desestimular certos comportamentos, como uma alíquota exacerbada de ICMS para
constranger uma indústria poluente a corrigir o fator da causa de poluição. Ou a
utilização de incentivos e outros benefícios fiscais – à míngua de autorização obtida
em convênio com os demais Estados -, para abrandamento da tributação do ICMS
com vistas à promoção do desenvolvimento123. Isso não significa que não possam tais
entes levar a termo referidos programas constitucionais, mas apenas que se tratam
de precauções a que não se promova o desenvolvimento regional em detrimento do
nacional.
Com isso, na verdade, não se excluiu a utilização do emprego das isenções de ICM como estímulo ao desenvolvimento urbano, pois, desde que haja convênio nesse sentido, o resultado pode ser atingido. Mas, como o interesse pelo desenvolvimento urbano é caracteristicamente regional, o convênio firmado entre todos os estados da federação, limitara o emprego desse mecanismo extrafiscal, apenas aos casos de interesse predominantemente nacional. (CORRÊA, 1975, p. 6).
Para regularmente assim proceder é necessário que a medida não transborde
o campo da competência suplementar, produzindo efeitos apenas em âmbito local.
121 “Exatamente por isso não só o imposto progressivo sobre a renda, mas também o Imposto de
Produtos Industrializados, com alíquotas seletivas em função da essencialidade dos produtos, ambos de competência Federal é que têm, além da finalidade de produção de receita, o caráter de instrumento de extrafiscalidade.” (NOGUEIRA, 1971, p. 152).
122 Dentre as que não foram anteriormente citadas, destaca-se a necessidade de adoção de alíquota uniforme em todo o território nacional, podendo ser diferenciadas apenas por produtos (parágrafo 4º, alínea “a” do artigo 155 da Constituição) (BRASIL, 1988).
123 No entendimento destes autores, a lei isencional deveria ser originária do próprio poder tributante e não sofrer trais restrições.
88
Ou, caso contrário, que exista a conjugação de esforços entre os Estados para que
de comum acordo adotem incentivos e benefícios fiscais de impacto nacional,
tornando-se, em qualquer das situações apresentadas, viável a utilização do ICMS
com fins indutores ou extrafiscais.
Outros impostos, como o ITCMD e o IPVA, sofrem com esse mesmo tipo de
restrição, dada a regulação das suas alíquotas máximas e mínimas pelo Senado
Federal. Vale lembrar que o principal efeito indutor da norma tributária decorre do
aumento124 ou redução125 da carga tributária, o que se viabiliza, no caso dos impostos,
majoritariamente pela manipulação das suas alíquotas. Em vista da rigidez existente
na fixação destas, fica reduzido o espaço de atuação dos Estados para fazer oscilar
o gravame fiscal de forma a induzir os contribuintes a adotarem condutas socialmente
desejáveis. O que tampouco significa que não exista margem de atuação, porém
reduzida.
Acredita-se, pois, que após o advento da Constituição de 1988 não se
sustentam as alegações contrárias ao exercício pelos estados-membros da utilização
dos tributos de sua competência como instrumento de intervenção no domínio
econômico. Fosse assim, estaria sendo negligenciado o imenso potencial do ICMS,
ITCMD e IPVA, para alcançar fins constitucionalmente relevantes distintos da mera
arrecadação e de incumbência dos Estados. Ao mesmo tempo, há de se reconhecer
a competência da União, ou mais bem colocado do Congresso Nacional, para
regulamentar determinados aspectos desses impostos, exaustivamente enumerados
pelo texto constitucional, com vistas a evitar uma indesejável guerra tributária e
prejuízo ao equilíbrio federativo.
Definidas tais premissas iniciais, passa-se ao exame das matérias em que
caberá aos Estados instituir norma tributária indutora no exercício da extrafiscalidade.
124 Schoueri fala em técnica de agravamento quando a norma tributária indutora torna mais oneroso o
comportamento indesejado, aumentando os custos do contribuinte, que fica mais propenso a adotar comportamento alternativo, menos oneroso. Este efeito pode ser obtido através da criação de tributo antes inexistente ou pelo incremento da tributação de tal comportamento (SCHOUERI, 2005, p. 205).
125 Pela via da redução, ou também vantagens como aponta Schoueri, as normas tributárias indutoras incentivam a adoção de comportamentos desejados pelo legislador. Sabendo que os contribuintes buscam economizar tributos, o efeito indutor pela via da vantagem é obtido através do alívio da pressão fiscal, seja através da isenção (ainda que parcial, e aqui entendida como não extensível às técnicas arrecadatórias ou simplificadoras) e de outras técnicas, como a depreciação acelerada de bens do ativo na área do imposto de renda, gastos dedutíveis com pesquisa e desenvolvimento e finalmente os créditos fiscais, permitindo ao contribuinte reduzir o montante da dívida tributária (SCHOUERI, 2005, p. 206).
89
4.2 Esferas de regulação e atuação dos Estados com possibilidade de
introdução da norma tributária indutora
4.2.1 Aspectos gerais
Dentro da competência legislativa dos Estados, tivemos a oportunidade de
destacar que essa atribuição teria sido idealizada pelo constituinte como sendo do tipo
residual, ou seja, limitando-se aos temas não atribuídos à União e tampouco aos
Municípios.
Especificamente em matéria reguladora, alguns autores126 apontam que a
Constituição teria incluído a participação dos Estados no campo da competência
legislativa concorrente (artigo 24 do texto constitucional), a partir da qual à União
caberia a edição de normas gerais e aos demais entes as normas de cunho
suplementar.
É justamente nesse campo (e em menor medida na esfera de competência
residual de que trata o parágrafo 1º do artigo 25 da Constituição) que se encontra a
possibilidade de instituição de normas tributárias indutoras, desde que observada a
repartição constitucional quanto às espécies tributárias127.
Aos Estados compete principalmente o ICMS, ITCD e IPVA, além das taxas
pelo exercício do poder de polícia e prestação de serviços públicos específicos e
divisíveis, sem falar das contribuições de melhoria pelas obras públicas que concluir.
Como demonstrado em capítulo anterior, estas últimas não são passíveis de servirem
de veículo a normas tributárias indutoras, motivo pelo qual são excluídas da presente
análise. Quanto às demais espécies, caberá aos Estados e ao Distrito Federal se valer
da sua competência reguladora para que seja praticada a intervenção tomando o
tributo como instrumento de atuação.
Revendo os estudos que vem sendo produzidos sobre o assunto, identifica-se
na proteção ao meio ambiente e no combate à poluição, os campos de maior
envolvimento da doutrina no que se refere à aplicação da extrafiscalidade. Inúmeras
126 Dentre eles, Carvalho Filho (2012). 127 A título de exemplo, o Estado não poderia invocar uma competência tributária para instituir o imposto
sobre operação financeiras por lhe ser reservada a competência legislativa supletiva para tratar de direito financeiro.
90
análises vêm sendo desenvolvidas, principalmente à vista de um movimento global128
que defende a necessidade de redução nas emissões de carbono e que se promova
o desenvolvimento sustentável. Vale ressaltar que se encontra em estágio avançado
a sistematização de um tributo ecológico, expressão que será melhor compreendida
adiante.
O consumo é outro segmento que tem ganhado especial atenção,
principalmente por sua capacidade de mitigar distorções decorrentes da
essencialidade ou superficialidade de alguns produtos, e também a orientar opções
mais conscientes e benéficas por parte dos usuários ou consumidores129. A oneração
na tributação do tabaco e das bebidas alcóolicas tem sido apontada como caso
paradigmático, em que a tributação estaria a exercer intencional estímulo à adoção
de condutas mais saudáveis ou menos nocivas à saúde. Em contraposição, a
desoneração na tributação de medicamentos e equipamentos necessários à
prestação de serviços médico-hospitalares, são bons exemplos em que se intenta
promover a saúde pública.
Cita-se ainda, embora de forma bastante incipiente, posições em torno da
utilização da tributação para fins de proteção do patrimônio histórico, artístico e
cultural; o acesso à cultura, educação, ciência, tecnologia, pesquisa e inovação; entre
outros temas que vem sendo objeto de análise por parte da ciência jurídica.
Todos os campos anteriormente citados são passíveis de regulação
(intervenção) por parte dos Estados, ainda que supletiva e concorrentemente. A
seguir, serão analisados os principais deles, apontando-se em que medida a norma
tributária indutora poderá ser instituída para induzir a adoção de comportamentos
socialmente relevantes.
4.2.2 Proteção ao meio ambiente e controle da poluição
A proteção ao meio ambiente e o controle da poluição, são matérias que se
encontram inseridas na competência legislativa concorrente da União, dos Estados e
do Distrito Federal, ao lado de temas afins como florestas, caça, pesca, fauna,
128 Estes estudos vem sendo capitaneados principalmente pela Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) em conjunto com a Agência Europeia do Ambiente (AEA), conforme bem salientado por Alexandre de Oliveira Netto (2014, p. 7).
129 Cf. Moraes (2011, p. 16).
91
conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais (artigo 24 da
Constituição).
A preocupação do constituinte com o meio ambiente foi tão marcante que além
de compartilhar entre os entes federados a competência legislativa quanto ao assunto,
estabeleceu aquela de natureza material ou administrativa para que os Estados de
forma concorrente com a União, o Distrito Federal e os Municípios, ficassem
incumbidos da sua efetiva proteção e do combate à poluição em qualquer de suas
formas; além de lhes ser reservada a preservação das florestas, fauna e flora (artigo
23 da Constituição), e ainda legislar supletivamente sobre responsabilidade por dano
ao meio ambiente (artigo 24, inciso VIII da Constituição) (BRASIL, 1988).
Ao enfrentar o tema sob a ótica tributária, identifica a doutrina que o tributo
poderia ser utilizado como ferramenta para que sejam realizadas referidas atribuições
constitucionais. Como salienta Marcos Oliveira, dentre os meios de prevenção e
combate à poluição, o tributo serve como mecanismo eficiente para proporcionar ao
Estado recursos para agir em prol desse objetivo, como também para estimular
condutas não-poluidoras e desestimular as poluidoras. Destaca-se em sua obra a
definição do conceito do princípio do poluidor-pagador, que possuiria dois sentidos. O
primeiro, do tipo impositivo, que seria traduzido em dever estatal de cobrar do poluidor
as contribuições públicas (ou tributo) em função de sua atividade poluidora, de forma
a transferir a ele os custos dos serviços públicos gerais ou específicos necessários à
preservação e recuperação ou à fiscalização e ao monitoramento ambientais
(OLIVEIRA, 1999, p. 38). Trata-se, a nosso ver, da própria utilização da espécie das
taxas previstas no ordenamento pátrio para cumprir com esse objetivo. O único ponto
de empecilho estaria na proposta de que sejam transferidos a determinado
contribuinte os ônus relativos ao custeio geral dos serviços públicos, o que na teoria
poderia ser vedado por incompatibilidade com o pressuposto de incidência (fato
gerador) das taxas. No entanto, a justificativa para se alargar a sua base tributável –
extrapolando a noção de custeio específico - estaria na própria utilização dessa figura
tributária como instrumento de intervenção no domínio econômico.
A outra faceta elencada pelo jurista, seria do tipo seletivo, que significa a
graduação do tributo de forma a incentivar atividades, processos produtivos ou
consumos “ecologicamente corretos” (não-poluidores), e por outro lado desestimular
o emprego de tecnologias defasadas, a produção e o consumo de bens
“ecologicamente incorretos” (prejudiciais à preservação ambiental).
92
Embora identifique apenas nesse segundo grupo (do tipo seletivo) o campo da
tributação extrafiscal, infere-se que também naquele outro, tomado como impositivo,
poderia ser empregada a norma tributária indutora. Ao se impor uma majoração da
tributação pelo maior ônus incorrido com a proteção ambiental e por se abandonar a
legitimação com base no princípio da razoável equivalência (aplicável às taxas) em
prol de novos valores encampados no capítulo da Ordem Econômica - como o da
defesa do meio ambiente (previsto no artigo 170, inciso VI, da Constituição) -, justifica-
se que também pelo viés impositivo possa ser instituída norma tributária indutora.
Ao tratar da tributação aplicada à preservação do meio ambiente, também
resumida sob a expressão “tributação ambiental”, Helena Costa (2005, p. 313), em
posição semelhante à de Marcos Oliveira (1999), a define como o emprego de
instrumentos tributários com intuito de gerar os recursos necessários à prestação de
serviços públicos de natureza ambiental, bem como para orientar o comportamento
dos contribuintes à proteção do meio ambiente. No seu entender, variados
expedientes poderiam ser utilizados para alcançar esse objetivo, desde a concessão
de incentivos fiscais130, tais como as isenções e deduções da base tributável, até a
adoção das técnicas de progressividade e diferenciação de alíquotas131. E, nesse
sentido, todas as espécies tributárias seriam capazes de atingir tal fim: impostos,
taxas, contribuição de melhoria e, também, as contribuições de intervenção no
domínio econômico132.
A respeito do tema, vem ganhando destaque no direito comparado a
sistematização dos denominados tributos ambientais ou ecológicos. Analisando as
diferentes posições doutrinárias sobre o seu conceito, Alexandre de Oliveira Netto
130 De acordo com Marcos Oliveira, a indução provoca pelos incentivos fiscais instituídos como
instrumento econômico de promoção de defesa do meio ambiente, está justamente na realização de que a sua rejeição por uns do favor fiscal, e a consciente escolha de seguir poluindo, implica em pagar mais imposto. Entrementes, aqueles que optam por se aprimorar tecnologicamente e deixar de poluir, pagarão menos impostos ou até imposto algum. Cuida-se de uma escolha pautada na própria liberdade do indivíduo em continuar ou encerrar ou adaptar suas atividades, pagando mais ou menos imposto (OLIVEIRA, 1999, p. 40).
131 Em relatório produzido pela Agência Europeia do Ambiente (2008), considerou-se que as taxas ambientais podem contribuir para a realização de mudanças estruturais na produção e consumo, ao corrigir a fixação de preços e as distorções de mercado. É tornar, nas palavras de Birnfeld, mais lucrativas as condutas amigas do meio ambiente, por conta que, a partir da tributação extrafiscal ambiental, as condutas opostos passam a se revelar menos lucrativas ou até deficitárias (BIRNFELD, 2013, p. 262).
132 Registre-se a discordância de Betina Grupenmacher, para quem algumas espécies tributárias seriam vocacionadas para a extrafiscalidade, como os Impostos de Importação e Exportação, Imposto sobre Produtos Industrializados e IOF, enquanto outros não teriam semelhante admitidão, como seria o caso das contribuições ao PIS e à COFINS (GRUPENMACHER, 2015).
93
identifica o uso genérico do termo ‘tributo ambiental’, ora para fazer referência a um
tributo ordinário que tenha algum critério de diferenciação ecológica, ora para se referir
a um tributo que incida diretamente sobre a emissão de poluentes (NETTO, 2014, p.
7). Em outra obra, José Marcos de Oliveira trata dos tributos ambientais como sendo
conhecidos pela expressão ‘tributos verdes’. Segundo ele, ‘tributos verdes’ seria
expressão leiga que faz referência a tributos que tem motivação ambiental. No seu
entender, existem dois sentidos para os chamados tributos verdes ou ambientais. Pelo
sentido estrito, tributo ambiental significaria um tributo novo cobrado em razão do uso
ou exploração do meio ambiente pelos agentes econômicos. Já o sentido amplo,
estaria relacionado a tributo tradicional ou ordinário, adaptado a servir aos esforços
de proteção ambiental (OLIVEIRA, 2007, p. 63).
Helena Costa chega a identificar os tributos ambientais em âmbito global como
sendo aqueles introduzidos no ordenamento por motivos ambientais ou por revestirem
efeitos ambientais independente das razões que levaram à sua exigência. Voltando-
se à experiência francesa, alemã e norte-americana, verifica que a introdução dos
chamados tributos ambientais seria duplamente vantajosa, ora estimulando o
comportamento individual, que espontaneamente passaria a ser orientar de modo a
evitar a tributação mais gravosa, e ora compensando a pouca eficácia encontrada no
exercício do poder de polícia (COSTA, 2005, p. 313).
Em atenção aos conceitos empregados em nível internacional, José Marcos de
Oliveira trata de classificar os tributos ambientais em effluent charges (encargos sobre
efluentes) e administrative charges133 (encargos administrativos), user charges134
(encargos de usuário), product charges135 (encargos sobre produtos), environmental
surtaxes136 (adicionais ambientais). Entretanto, para fins de enquadramento no ramo
do direito tributário, propõe nova classificação reunindo os encargos sobre efluentes
e encargos administrativos na figura das taxas de polícia, em se tratando de
contrapartida às atividades públicas referidas aos contribuintes poluidores; os
encargos sobre o usuário estariam relacionados às taxas pela utilização dos serviços
de coleta, tratamento e disposição do esgoto; e finalmente os encargos sobre produtos
133 Cobrados em face das atividades públicas de controle, autorização, registro e fiscalização, inclusive
em relação às descargas poluentes líquidas, aéreas ou sonoras. 134 Cobrados pela utilização dos sistemas de esgotamento sanitário público. 135 Cobrados sobre o preço dos produtos poluentes, podendo ser adotado um sistema de graduação
de alíquotas que permite o incentivo ou desestímulo à produção e ao consumo de bens com mais ou menos mérito frente às políticas ambientais.
136 Cobrados como majoração do imposto sobre a renda.
94
e adicionais ambientais seriam reunidos sob a figura dos impostos referidos à
atividade econômica dos contribuintes ou ao seu resultado (OLIVEIRA, 1999, p. 43-
44).
Ao transpor referidas conclusões à realidade brasileira, surge uma
preocupação de que a experiência nacional tenha se revelado bastante incipiente no
campo da tributação ambiental137. Essa circunstância motivou Helena Costa (2005, p.
322) a afirmar, em obra publicada há mais de uma década, que o sistema de disciplina
de condutas em matéria ambiental ainda era pautado no que a comunidade jurídica
conhecia como sistema de “comando e controle” (comand and control). Esse método
se baseia na edição de normas dirigidas aos particulares para que adotem
comportamentos afinados com a preservação ambiental - como de fato ocorre na
intervenção por indução -, porém cujo cumprimento é fiscalizado através do exercício
de controle inerente à polícia administrativa, filiando-se finalmente à intervenção por
direção. Prossegue afirmando que o sistema de tributos ambientais apresenta
vantagem se comparado ao mecanismo clássico de controle. A tributação indutora
estimula o comportamento individual em prol de uma postura ambiental mais correta,
que somente é concretizada mediante o caminho do incentivo financeiro. Em
contraposição ao sistema clássico, aquele decorrente da implantação de tributos
ambientais não exige infra-estrutura ou fiscalização do aparelhamento administrativo
para que seja garantido o poder de polícia. Não há que se olvidar que, a despeito da
praticidade do pensamento apresentado, o sistema de tributos exige um relevante
grau de fiscalização no cumprimento das obrigações tributárias, sem o qual não será
evitada a evasão fiscal138.
Bannwart e Terasaca (2014, p. 73) se filiam a posição semelhante, ao apontar
que a maior parte dos economistas costuma preferir os impostos corretivos à
137 “Conforme anteriormente observado, a experiência de tributação ambiental no Brasil é incipiente,
decorrência natural da pouca conscientização de nossa sociedade sobre a necessidade de preservação do meio ambiente. Mas é possível apontar algumas incursões efetuadas no campo da tributação ambiental.” (COSTA, 2005, p. 323).
138 Não é objeto deste trabalho comparar os custos entre o incremento do aparelhamento estatal para o exercício da atividade de polícia administrativa e o aumento daqueles decorrentes da fiscalização por parte da Fazenda Pública do recolhimento dos tributos sobre agentes incumbidos da exploração dos recursos naturais. Não há base de dados suficientes a essa comparação. Contudo cogita-se ser necessário salientar que a fiscalização no cumprimento das obrigações tributárias exige ou demanda elevados custos e que se tornam ainda mais expressivos quando o tributo é utilizado como instrumento de intervenção no domínio econômico.
95
regulamentação139 ou à livre negociação entre agentes econômicos quanto às
externalidades140, uma vez que os impostos poderiam reduzir a poluição a um custo
menor para a sociedade. Os impostos corretivos seriam aplicados de forma a corrigir
as falhas de mercado, introduzindo um sistema de tributos que afetaria a relação entre
o benefício marginal141 e custo marginal142 de uma determinada atividade, garantindo-
se um nível eficiente de emissão de poluentes. Enquanto uma determinada
regulamentação venha a exigir a redução de poluentes a determinado nível por
período, atingindo-se o objetivo proposto assim que alcançado aquele patamar (v.g.
300 toneladas por ano), o sistema de tributos pode representar um incentivo a que se
reduza ainda mais aquele patamar (menor do que 300 toneladas).
Voltando à Helena Costa (2005), ao elencar as incursões feitas pelo Estado
brasileiro no campo da tributação ambiental, a autora identifica na esfera de
competências tributárias da União as maiores possibilidades de emprego de
instrumento fiscais com eficácia ambiental143. Cita, como exemplos, o Decreto Federal
n. 775/1993 que estabeleceu alíquotas diversificadas do IPI para veículos movidos a
gasolina e para aqueles movidos a álcool, que apesar de ter como objetivo manifesto
o incentivo à produção de etanol em detrimento da importação de petróleo, resulta,
por consequência, na redução dos níveis de poluição atmosférica das cidades. Ou da
139 Por regulamentação afirmam ser a atuação do governo no sentido de determinar a conduta das
empresas, tornando obrigatórias ou proibidas algumas ações. O problema dessa forma de controle é de que toda atividade, em maior ou menor medida, produz algum nível de poluição, tornando-se inviável proibir todas elas.
140 Como explicam os autores, o teorema de Coase defende a liberalização do mercado, eliminando o Estado subvencionador e o Estado elevador de impostos. Caso exista uma externalidade gerada pela atividade poluidora, gerando um impasse entre dois agentes econômicos, a livre negociação entre eles levaria a um nível ótimo de emissão dos poluentes. Criticam, contudo, a posição sustentada por Coase, ao sustentar que apresenta problemas relativas a custos de transações, comportamento free-rider e falhas quanto a informações insuficientes relativas aos custos e beneficiados associados às externalidades. A título de exemplo, em um cenário hipotético em que varias companhias pesqueiras decidissem indenizar uma indústria química para reduzir os poluentes despejados sobre um lago do qual detivesse direito de exploração, caso uma dessas companhias decidisse não arcar com o valor, seria beneficiada pela diminuição da poluição do lago. Ou seja, não contribuiria com o acordo firmado, mas se aproveitaria dos seus benefícios, aumentando os seus lucros de forma desproporcional. Esta situação poderia levar, inclusive, à impossibilidade de acordo, pois o valor excederia as possibilidades das companhias pesqueiras cooperantes.
141 Por benefício marginal, entende-se o benefício adicional de produzir uma unidade a mais de bem ou serviço.
142 O custo marginal seria o valor a mais que se paga pela produção quando se aumenta uma unidade adicional do bem ou serviço.
143 Jeronimo e Freitas citam como exemplos de instrumentos tributários que visam proteger o meio ambiente, dentre outros, o ICMS ecológico, a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA) e as cobranças de crédito de carbono oriunda do mecanismo de desenvolvimento limpo (JERONIMO; FREITAS, 2013, p. 72).
96
autorização para dedução da base de cálculo do Imposto sobre a Renda das
importâncias empregadas em projetos de reflorestamento e a exclusão da base do
Imposto Territorial Rural das áreas de preservação permanente e de reserva legal. À
época em que publicada a citada obra da autora, a União havia acabado de instituir a
Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA), cujo objetivo era o controle e
fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos
naturais. Vale ressaltar que taxa semelhante, inclusive de mesmo nome, fora instituída
pelo Estado de Minas Gerais através da Lei Estadual n. 14.940, de 29 de dezembro
de 2003.
No âmbito dos Estados tem sido apontada a experiência do “ICMS
Ecológico”144, que consiste na definição de critérios para a distribuição de parcela da
arrecadação desse imposto com base na implementação de políticas ambientais pelos
Municípios. Entretanto, como bem adverte Helena Costa, não se trata propriamente
de instrumento tributário, mas de natureza financeira145 (COSTA, 2005, p. 324). De
nossa parte, embora seja considerada louvável a iniciativa, não se trata de caso em
que se identifica a existência de norma tributária indutora. A medida não procura
incentivar o comportamento dos contribuintes e tampouco a intervir sobre o meio
econômico, mas levar os entes municipais a adotar medidas de proteção ambiental e
combate à poluição.
Outra medida elencada, porém de menor expressão, diz com a taxa de
preservação ambiental exigida no Distrito Estadual de Fernando de Noronha, que foi
instituída pelo Estado de Pernambuco, nos termos do artigo 82, inciso I, da Lei
Estadual n. 10.403, de 29 de dezembro de 1989. O seu fato gerador é a utilização,
efetiva ou potencial, por parte dos turistas ou visitantes, da infra-estrutura física
implantada no Distrito Estatal e do acesso e fruição ao patrimônio natural e histórico
do Arquipélago (artigo 84). A taxa ganha esse nome por ser destinada a assegurar a
manutenção das condições ambientais do sítio ecológico. Apesar de transparecer
144 “O ICMS ecológico é um instrumento oferecido pelo estado aos governos locais, como um incentivo
à proteção do meio ambiente e constitui também uma regulação não coercitiva produzindo resultados melhores e mais rápidos do que se o estado aplicasse os instrumentos fiscais tradicionais de comando e controle, penalizando os governos locais que não cumpram suas responsabilidades de tratar, por exemplo, os efluentes urbanos. O dinheiro compensa os municípios que criam e programam parques e áreas protegidas, é o chamado ICMS-verde que incentiva a preservação do meio ambiente por meio do princípio protetor-recebedor.” (JERONIMO; FREITAS, 2013, p. 72).
145 A posição é compartilhada por Oliveira para quem seria instituto de Direito Financeiro e não jurídico-tributário. Quando muito, complementaria o chamado sistema tributário de financiamento intrafederativo (OLIVEIRA, 2007, p. 36-37).
97
nítida medida de cunho arrecadatório, instituída para fazer frente às despesas
incorridas com a prestação de serviço público específico e divisível, o seu caráter
extrafiscal ou indutor transparece na circunstância de estabelecer uma cobrança
escalonada, que será majorada à medida em que o visitante resolver permanecer por
maior período no local146. Não parece que o legislador estadual tenha buscado através
dessa medida unicamente inibir a visita de turistas ou visitantes ao local, e sim
controlar o fluxo de pessoas no sítio, evitando que o tempo de permanência seja
prolongado, sobrecarregando o ecossistema local. É o que se verifica, a propósito,
quando a Lei prevê a cobrança em dobro do tributo nos casos em que for extrapolado
o período inicialmente previsto de permanência do visitante ou turista sem devido e
prévio agendamento.
Helena Costa elenca ainda outras propostas para transformação dos impostos
estaduais em medidas aptas a viabilizar a adoção de condutas afinadas com a
proteção do meio ambiente. Em relação ao ICMS, diz que este pode ser seletivo em
função da essencialidade das mercadorias e serviços, e que, com base nesse
146 Segue a transcrição do artigo 86 da citada Lei Estadual, cujo teor estabelece a base de cálculo da
taxa e os valores que serão exigidos pelo tempo de permanência do visitante ou turista: Art. 86. A base de cálculo da Taxa de Preservação Ambiental será obtida em razão dos dias de permanência do visitante ou turista no Distrito Estadual de Fernando de Noronha, de acordo com os seguintes critérios: I - para cada dia de permanência incidirá o valor correspondente a R$ 64,25 (sessenta e quatro reais e vinte e cinco centavos), até o limite máximo de 10 (dez) dias; II - do quinto ao décimo dia de permanência, incidirá o valor da diária referida no inciso I, deduzidos os valores a seguir indicados: a) quinto dia: R$ 5,14 (cinco reais e quatorze centavos); b) sexto dia: R$ 23,13 (vinte e três reais e treze centavos); c) sétimo dia: R$ 41,12 (quarenta e um reais e doze centavos); d) oitavo dia: R$ 59,11 (cinquenta e nove reais e onze centavos); e) nono dia: R$ 77,10 (setenta e sete reais e dez centavos); e f) décimo dia: R$ 95,09 (noventa e cinco reais e nove centavos); III - para cada dia excedente a partir do décimo primeiro dia, incidirá o valor da diária referida no inciso I, acrescido, progressiva e cumulativamente, de mais R$ 12,85 (doze reais e oitenta e cinco centavos), por cada dia excedente; e IV - a atualização dos valores previstos nos incisos I a III deve ser realizada anualmente, com base na variação acumulada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, ou outro que vier a substituí-lo, observando-se: a) a mencionada variação será aquela verificada no período do mês de dezembro de cada exercício ao mês de novembro seguinte; b) a atualização obtida na forma prevista neste inciso somente terá vigência a partir de janeiro do exercício subsequente ao período indicado na alínea “a”; e c) para os efeitos do disposto na alínea "a”, o primeiro período a ser considerado será de dezembro de 2015 a novembro de 2016. Parágrafo único. O valor da Taxa de Preservação Ambiental, que se referir aos dias excedentes ao período inicialmente previsto será cobrado em dobro quando a permanência do visitante ou turista no Arquipélago de Fernando de Noronha não estiver devida e previamente agendada e autorizada pela Administração-Geral.
98
permissivo constitucional, seria permitida a adoção de alíquotas mais gravosas para
as operações com produtos tóxicos ou poluentes, criando um desincentivo ao seu
consumo147. Outro imposto que poderia servir a esse propósito seria o IPVA, que teria
suas alíquotas graduadas em função da preservação ambiental, observando-se o
incentivo a veículos movidos a combustíveis menos poluentes (álcool, gás natural ou
energia elétrica) e o agravamento do ônus fiscal a inibir a aquisição de veículos que
não os utilizam (COSTA, 2005, p. 326).
Além destas, inúmeras outras medidas extrafiscais podem ser implementadas
pelos Estados, como a concessão de incentivos ou benefícios fiscais a produtos
cultivados sem agrotóxicos ou que utilizam insumos recicláveis, ou a desoneração dos
serviços de transporte coletivo intermunicipais como forma de incentivar a sua
utilização em massa e, consequentemente, reduzindo o número de veículos em
circulação.
Em relação às taxas, também é possível que sejam instituídas, inclusive com
agravamento do ônus fiscal, para cumprir com objetivos de intervenção no domínio
econômico e ambiental. José Marcos Oliveira contextualiza a criação de taxas para
os serviços públicos de licenciamento e fiscalização, e de limpeza ou recuperação
ambiental, relacionadas ao tipo de estabelecimento, área fiscalização e também
volumes de emissões, despejos ou produção de resíduos poluidores (OLIVEIRA,
2007, p. 81). No seu entender:
[...] devido ao alto custo dos serviços ambientais, e a fortiori sendo de elevado valor o tributo correspondente, a simples instituição das taxas ambientais produz um efeito psicológico, extrafiscal, imediato, induzindo o poluidor a buscar alternativas de comportamento não-poluidor para furtar-se a ser identificado como contribuinte, ou pelo menos diminuir o montante da taxa que lhe cabe pagar. (OLIVEIRA, 2007, p. 90).
Com relação às medidas sugeridas, transparece o nítido caráter indutor ou
extrafiscal a ser atribuído à norma tributária, que pretende induzir o sujeito passivo a
adotar determinando comportamento, estando, em qualquer caso, afinando com o
desiderato constitucional de proteção ao meio ambiente e controle da poluição.
Para encerrar a análise quanto ao controle da poluição, registra-se a existência
de posições em torno da criação de um tributo sobre as emissões de carbono.
147 Cita-se ainda, como exemplo, a restituição do imposto sobre vasilhames, mencionada por José
Marcos de Oliveira (2007, p. 60), que ocorreria por ocasião da devolução dos recipientes.
99
A ideia de que seja instituído um tributo que incida diretamente sobre a emissão
de poluentes não é nova, tendo inclusive sido mencionada no decorrer desse capítulo.
Tem sido levantada a possibilidade de criação de um imposto sobre unidade de
poluição emitida, cujo objetivo seria impactar os custos das atividades poluidoras e,
com isso, incentivar as empresas a buscar meios alternativos de produção mediante
o uso de tecnologia limpa. A proposta que vem ganhando maior relevância em nível
internacional, como bem identifica Bannwart e Terasaca, seria a criação de um
imposto vinculado à emissão de carbono, cujo objetivo seria coibir a emissão dos
gases de efeito estufa, mais especificamente o dióxido de carbono, através da
internalização das externalidades decorrentes desta forma de poluição (BANNWART;
TERASACA, 2014, p. 76).
A par dos evidentes problemas ligados à tributação sobre a emissão de
carbono, dos quais são listados por Bannwart e Terasaca aqueles relativos ao valor
do tributo148, a base tributável149 e os impactos no comércio internacional150, há de se
questionar a própria viabilidade jurídica na instituição de tributo que tenha por base
um fato material que não apresenta, por si só, expressão econômica. Contra essa
preocupação, invocam tais autores que a maior emissão de carbono ensejaria na
presunção lógica de possuir a empresa maior capacidade contributiva, com base na
suposição de que a emissão de carbono estaria diretamente associada aos níveis
superiores de produção. Embora reconheçam que essa correlação não seja
necessariamente verdadeira, uma vez que empresas de grande porte e grande
poderia econômico podem vir a diminuir sua emissão de carbono através do emprego
de sistemas sustentáveis, defendem que o modelo brasileiro de tributação prevê
casos em que mesmo diante da ausência de capacidade contributiva subjetiva o ônus
tributário não seria reduzido. Citam como exemplo uma pessoa hipossuficiente que
recebe veículo importado de presente, porém que não terá seu IPVA diminuído por
sua situação pessoal (BANNWART; TERASACA, 2014, p. 79-80).
148 Neste caso, o valor deveria acompanhar a correção monetária e a inflação, além de variar na medida
em que novos dados permitam tirar conclusões sobre os efetivos custos e benefícios na redução da emissão.
149 No que se refere à base tributável, a dificuldade residiria justamente na necessidade de se dimensionar o tributo de acordo com os ramos de atuação das empresas, já que cada uma produziria e emitiria carbono em diferentes níveis.
150 Trata-se de preocupação com a potencial migração de empresas a outros países com leis mais brandes e ausência de imposto sobre o carbono.
100
Apesar de sedutora essa linha de pensamento, temos que não há de se
confundir a exigência de graduação dos impostos segundo a capacidade subjetiva do
contribuinte com o pressuposto de que para que seja instituído o tributo há de ser
observada a existência desta mesma capacidade na sua acepção objetiva. Como
anota Pacheco (2005, p. 338), “na escolha do fato presuntivo de riqueza repousa o
princípio da capacidade contributiva”, que significa dizer que as relações jurídico-
tributárias são construídas a partir da designação de fatos que revelam uma possível
ou provável capacidade de contribuir para os cofres do Estado, isto é, fatos
significativos de riqueza. A emissão de carbono não é, singularmente considerada,
acontecimento que manifesta capacidade da pessoa que lhe dá causa em contribuir
para os cofres públicos. Mesmo razões de ordem extrafiscal não poderiam suplantar
essa necessidade de que seja manifestada base econômica para que o tributo possa
ser instituído.
Todavia, ainda que se considere a acepção da capacidade contributiva como
mais abrangente que aquela de ordem econômica e que se admita a instituição de
tributo que tenha por fato imponível as emissões de carbono, chegar-se-á a conclusão
de que a competência dos Estados para assim proceder é bastante limitada, senão
nula. Isso porque, segundo Bannwart e Terasaca a tributação sobre as emissões
deveria ser realizada por meio de impostos e não taxas, ou seja, de tributo não
vinculado a incidir sobre a emissão de dióxido de carbono na atmosfera (BANNWART;
TERASACA, 2014, p. 79). Apesar de não terem esclarecido os motivos pelos quais a
taxa não poderia ser empregada para esse fim, considera-se que a razão está
justamente no seu pressuposto de incidência, que há de consistir na prestação de
serviço público específico e divisível, ou no exercício do poder de polícia (atividade
estatal vinculada); ambas situações supostamente inexistentes na espécie a ser
onerada. Quanto à utilização de impostos para esse objetivo, seria necessária a
criação de tributo até agora inexistente, e cujo aspecto material não foi antecipado
pela Constituição na repartição das competências em matéria de impostos. Sendo
assim, caberia à União, dentro da sua competência residual, instituir imposto desta
natureza.
Em que pese ter sido a figura das taxas desconsiderada para fins de oneração
das emissões de carbono - e indução dos poluidores a práticas mais sustentáveis -,
defende-se o seu uso, inclusive pelos Estados, conquanto seja demonstrado que o
maior nível de poluição praticado pelos agentes econômicos esteja diretamente
101
relacionado à fiscalização administrativa a ser exercida. A atribuição conferida aos
Estados de controle da poluição exige que atividades poluentes sejam fiscalizadas
pelo Poder Público. Neste caso, a base da taxa poderia ser fixada de acordo com os
níveis de carbono emitidos, já que diretamente relacionada à atividade de controle da
poluição, além de ser majorada sob o fundamento de necessidade de intervenção
sobre o Domínio Econômico.
Alternativamente à instituição de um imposto sobre o carbono, poderia ser
criada uma taxa, sempre observada a necessidade de atuação estatal na prestação
de serviço específico e divisível, ou exercício do poder de polícia.
Interessante notar, quanto às possíveis implicações da imposição de uma ‘taxa
de carbono’ no PIB brasileiro, que em estudo conduzido por Silva e Gurgel (2010)
sobre um hipotético cenário de instituição de imposto sobre as emissões de Gases do
Efeito Estufa (GEE) pelo Brasil, no valor de US$ 20 por tonelada a partir de 2015 (e
vigorando até 2050), concluiu-se que a sua implementação representaria uma
pequena alteração na inclinação da trajetória de crescimento da economia (queda de
6% do PIB no último ano simulado – 2050) associado a reduções de 52% em emissões
derivadas do uso de energia. Ou seja, ao menos teoricamente, sugere-se que a
tributação das emissões de carbono tem impacto significativo na redução de poluentes
na atmosfera.
4.2.3 Produção e Consumo
Outros campos afins que vem sendo reconhecidos como propícios à tributação
extrafiscal ou instituição de normas tributárias indutoras, são aqueles relativos à
produção e consumo.
Dispõe a Constituição, em seu artigo 24, inciso V, acerca da competência
concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal, para legislar em matéria
de produção e consumo (BRASIL, 1988). Interessante notar que a regulamentação de
tais temas irradia efeitos para outras áreas, principalmente da saúde pública (como
será exposto adiante), dada a sua capacidade de influir no hábito de consumo de
produtos noviços à saúde humana ou incentivar e facilitar a aquisição daqueles outros
imprescindíveis à sua conservação. Em países, como na Comunidade Europeia e nos
Estados Unidos, os tributos indiretos que incidem sobre produtos que prejudicam a
102
saúde dos consumidores ou poluem o ambiente, tem recebido a alcunha de ‘impostos
especiais de consumo’151 ou ‘excise taxes’.
O tributo, neste contexto, serve como importante ferramenta de intervenção
sobre o meio econômico e social, pois quando instituído sobre o consumo afetaria o
hábito dos consumidores em razão da sua capacidade de influir nos preços dos
produtos152, além de ser importante ferramenta para o desenvolvimento industrial
através das políticas de desoneração tributária e incentivos fiscais aos processos
produtivos.
Morsch identifica no caso dos impostos sobre o consumo, a existência da
extrafiscalidade153 a partir do potencial de ingerência sobre preços relativos. Segundo
a autora, ao manipular a tributação sobre o consumo, o ente responsável pela política
fiscal termina por regular a produção de bens consumíveis no mercado interno,
podendo chegar a alterar até mesmo o equilíbrio concorrencial e a alocação de
investimentos em certas regiões do país em prejuízo de outras (MORSCH, 2006, p.
38).
Com relação à participação dos Estados em matéria de consumo, referida
atribuição se mostra especialmente relevante por cumular as competências
reguladora e tributária. Aos Estados compete legislar sobre consumo e também
instituir imposto sobre o consumo de mercadorias e serviços de transporte
intermunicipal e comunicação (ICMS); muito embora quanto a esse último tenham sido
feitas ressalvas na sua utilização como instrumento de intervenção no Domínio
Econômico. Convém salientar que além da preocupação de se resguardar o emprego
do ICMS para não gerar desequilíbrio ao desenvolvimento nacional, Morsch elenca
outros problemas oriundos do desvirtuamento do sistema de impostos sobre o
consumo. Nesse sentido, cita a obrigação de compensação de perdas de arrecadação
com alíquotas cada vez mais altas sobre outros produtos, sem falar nos traços
deixados na legislação pelas incontáveis exceções e regimes especiais, que são
151 Como se nota em informativo produzido pela Comissão Europeia, órgão executivo da União
Europeia (COMISSÃO EUROPÉIA. Relatório da comissão ao conselho e ao parlamento europeu: sobre a aplicação e avaliação da Diretiva 2008/118/CE, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo. Bruxelas, 21 Abr. 2017. 184 final).
152 Explicita Moraes que o consumo seria segmento em que se verifica larga utilização da extrafiscalidade, seja para mitigar as distorções da tributação sobre o consumo como para orientar opções mais conscientes e benéficas (MORAES, 2011, p. 16).
153 Que na sua concepção seria qualquer finalidade não-arrecadatória do Direito Tributário, correspondendo a todo objetivo previsto na Constituição que possa ser alcançado por meio de uma política fiscal.
103
criados para permitir a coexistência de situações especiais, oriundas do
intervencionismo (e normalmente concedidas sob a forma de benefícios fiscais), com
o direito comum (MORSCH, 2006, p. 42). Além, disso, no seu entender:
[...] deve-se ter presente que, embora a extrafiscalidade possa ser legítima para o alcance, sob o ditame da justiça social, de princípios previstos na ordem econômica da Constituição brasileira, em especial o da redução das desigualdades regionais e sociais, o ICMS imposto do tipo IVA, foi instituído para assegurar neutralidade fiscal à tributação do consumo. (MORSCH, 2006, p. 48).
Em estudo sobre a renúncia fiscal no Estado de Minas Gerais, durante o
período de 1996 a 2002, José Márcio de Oliveira (2003, p. 115) conclui de modo
semelhante ao reputar que as políticas de renúncia implementadas através da
concessão de incentivos fiscais gera uma complexidade cada vez maior na legislação
tributária. Isso porque, as normas que disciplinam as obrigações tributárias a serem
cumpridas pelos contribuintes convivem com inúmeras exceções, o que provoca um
aumento substancial no número de artigos, acompanhada da edição de decretos que
ocupam boa parte dos regulamentos. Além de aumentar os custos das empresas e
dos próprios órgãos arrecadadores, pela maior complexidade da legislação,
provocaria queda na neutralidade tributária154.
Embora sejam pertinentes as preocupações em torno da preservação da
neutralidade concorrencial, não se está de acordo com a posição de Morsch quando
defende que as reformas no campo do ICMS deveriam eliminar sua utilização
extrafiscal (MORSCH, 2006, p. 87). Como já abordado anteriormente nesta obra,
existe espaço para o emprego legítimo da norma tributária indutora pelos Estados,
utilizando-se do ICMS para alcançar fins constitucionais a eles cometidos em matérias
como a produção, consumo e saúde pública. Pensar de modo diferente seria esvaziar
a utilização desse imposto como importante ferramenta para a concretização de tais
valores e objetivos prestigiados constitucionalmente, além de restringir a atuação dos
Estados no exercício da sua competência reguladora e administrativa.
A atual conjuntura de utilização do ICMS em desacordo com preceitos
constitucionais, ou para a prática de guerra fiscal entre os Estados, não autoriza
concluir que o cenário ideal seria acabar com a sua utilização extrafiscal. Quando
154 O autor chega a sustentar, inclusive, que parte dos benefícios representaria verdadeiro movimento
de privatização do Estado pelo poder político-econômico.
104
muito, há de serem respeitados os limites a essa atuação e instituídos mecanismos
de controle efetivos para que não sejam extrapoladas as limitações impostas na
outorga de competências constitucionais.
Outra questão pertinente à aplicação do ICMS como instrumento de regulação
do consumo diz com a possibilidade de que o princípio da seletividade seja aplicado
a esse fim.
A seletividade do ICMS encontra previsão no parágrafo 2º, inciso III do artigo
155 da Constituição, que estipula que o imposto poderá ser seletivo em função da
essencialidade das mercadorias e dos serviços. À primeira vista, trata-se de faculdade
conferida aos Estados e ao Distrito Federal, porém uma vez instituída há de ser
observada em relação à integralidade bens e serviços.
De acordo com Melo (2000b, p. 245), a seletividade constitui princípio a ser
rigorosamente obedecido no âmbito do IPI e de modo permitido no caso do ICMS.
Consiste, basicamente, na distinção entre cargas tributárias aplicadas a diferentes
produtos, mercadorias e serviços, traduzindo-se em alíquotas não coincidentes. Ao
ser instituído deve guardar observância aos valores colhidos pelo constituinte, como
o salário mínimo, que toma em considerações as necessidades vitais básicas do ser
humano, dentre eles a moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário,
higiene, transporte e previdência. Sob esse aspecto, a seletividade se aproximaria do
campo de tributação fiscal, no qual se busca alcançar a realização do princípio da
capacidade contributiva por meio da oneração daqueles indivíduos que revelam maior
capacidade em arcar com as despesas públicas155. Contudo, o autor elenca ainda
outros valores que devem ser levados em conta na realização do princípio da
seletividade, dentre eles a dignidade da pessoa humana, a erradicação da pobreza e
da marginalização, e a redução das desigualdades sociais. Tais fins se reportam ao
campo da tributação extrafiscal, no qual são buscados fins distintos da mera
arrecadação segundo a capacidade contributiva.
Ao tratar do tema, porém desta vez envolvendo a seletividade aplicável ao IPI,
Moreira e Motta afirmam que o citado princípio além de se manifestar como expressão
155 Ensina Morsch que a constatação de que o ICMS repercute no consumidor final, leva ao seu uso de
forma seletiva, “incidindo de maneira menores gravosa sobre os bens relativos ao mínimo existencial (vestuário, alimentos da cesta básica, etc.)” (MORSCH, 2006, p. 59). Busca-se, por meio desse expediente, atenuar a regressividade do imposto indireto e realizar o princípio da capacidade contributiva
105
da igualdade em matéria tributária, também atende aos escopos do legislador quando
ele maneja o tributo de forma extrafiscal (MOREIRA; MOTTA, 2017, p. 37).
Assim é que tem se falado na seletividade como critério de concretização da
extrafiscalidade. O princípio seria utilizado como mecanismo para justificar a
graduação das alíquotas do ICMS de forma a atingir fins juridicamente relevantes156,
não estando ausente a constatação de intervenção do Estado sobre o domínio
econômico. Caso a seletividade seja uma porta de entrada concedida pelo
ordenamento a esse objetivo, não se vê incompatibilidade entre a corrente que
pretende justificar a intervenção através desse princípio ou pela necessidade de se
regular o consumo.
Aos Estados, portanto, cabe a utilização do ICMS, desde que respeitados os
limites à essa utilização, para regular a produção e consumo, induzindo os
consumidores a adotar comportamentos que incentivem o desenvolvimento
econômico. Outros tributos também podem ser utilizados em prol desse objetivo,
como o IPVA para incentivar a produção de veículos menos poluentes ou a instituição
de taxas com encargos exacerbados para fiscalizar produtos danosos à população,
mas cuja comercialização é autorizada.
Dentro da compreensão de que o consumo alcança outras áreas que com ele
se relacionam, passa-se a examinar a extrafiscalidade na saúde pública.
4.2.4 Proteção e defesa da saúde
A proteção e defesa da saúde estão listados dentro das competências
administrativas (artigo 23, inciso II da Constituição) e reguladoras (Artigo 24, inciso
XII) dos Estados e do Distrito Federal.
Ao se examinar o emprego por parte de tais entes da norma tributária indutora
como medida para a concretização desses valores, constata-se que o tributo
desempenha papel relevante nos campos da prevenção e amparo à saúde pública.
Esta, inclusive, a conclusão de Bernaud, para quem seria inegável que a tributação,
156 Registre-se a divergência de Morsch, para quem a seletividade não seria expressão da
extrafiscalidade, mas sim de atenção à capacidade contributiva, limitando-se a primeira à concessão de benefícios fiscais como forma de intervenção no domínio econômico e promoção de desenvolvimento (MORSCH, 2006, p. 59).
106
como política pública, pode auxiliar na promoção do direito fundamental à saúde, em
especial, na sua função preventiva (BERNAUD, 2015, p. 145).
Em iniciativas como o combate ao consumo de tabaco157, identifica a autora
que a tributação tem se mostrado como ferramenta importante para retardar a
iniciação no vício. A razão encontrada estaria no fato de que o incremento dos preços,
por meio dos impostos, faz com que os potenciais usuários, principalmente os mais
vulneráveis, repensem seu consumo em função do peso no bolso que ele representa.
Em outras situações, essas iniciativas não teriam chegado a ser tão bem-sucedidas,
como é o caso da tributação das bebidas alcóolicas, que supostamente não teria sido
tão fortemente atingida pelo encargo dos tributos158. Sobre esse caso em específico,
cita um provável desinteresse do Governo em controlar o consumo do álcool, aliado a
um poder da indústria do setor, como fatores que impedem afirmar que a tributação
tenha se incumbido da sua função inibitória ou indutora de comportamentos,
estimulando hábitos de consumos mais saudáveis159. Não obstante, a tributação das
bebidas alcóolicas, se adequadamente conduzida, poderia resultar em práticas menos
nocivas no seu consumo.
Ao abordar o emprego da extrafiscalidade em cenário semelhante, envolvendo
a redução no consumo dos alimentos não saudáveis, identifica o potencial de que
sejam atingidos os mesmos efeitos esperados na tributação dos cigarros e das
bebidas alcóolicas, ou seja, uma redução ou inibição em seu consumo. Todavia,
salienta que a medida apresenta controvérsia entre os estudos produzidos acerca do
tema, inclusive fora do país, já que os resultados podem se mostrar conflitantes.
Enquanto não resolvido esse impasse, o consumo de refrigerantes e alimentos
processados estaria contribuindo para o aumento do índice de pessoas com
sobrepeso e obesidade. Para alterar essa realidade, propõe a combinação de uma
tributação majorada sobre alimentos nocivos, contrabalanceada por subsídios aos
alimentos saudáveis. De nada adiantaria, na sua concepção, majorar a tributação
157 Salienta que tempos atrás, o consumo do cigarro não aparentava ser altamente prejudicial, mas que
na atualidade pode ser identificada uma repressão social ao seu consumo. Justamente por conta dessa posição social, não se chegar a questionar os elevados impostos incidentes sobre o tabaco, existindo um certo consenso em torno da efetividade e do impacto da tributação extrafiscal sobre o consumo de cigarro.
158 Ao menos não como agravamento do ônus fiscal até o ponto em que fosse sentida uma redução no seu consumo.
159 Segundo relata, apesar da bebida se demonstrar em inúmeros casos mais prejudicial do que o cigarro – em função dos seus efeitos imediatos responsáveis por acidentes de trânsito e episódios de violência -, a aceitação do seu consumo tem sido responsável por um desinteresse público na sua contenção.
107
sobre alimentos não saudáveis, se os preços daqueles benéficos à saúde
continuassem superiores.
Partindo dessas três áreas listadas por Bernaud (2015), passa-se a examinar
os principais avanços que tem sido feitos no estudo e compreensão da tributação
associada ao consumo de tabaco, bebidas alcóolicas e alimentos não saudáveis.
A começar pela relação da tributação indutora e o consumo tabaco, destaca-se
importante relatório produzido pela Organização ‘Campanha para Crianças Livres de
Cigarro’ (2014, tradução nossa160), que ao investigar a realidade brasileira (período
de 2000 a 2013), concluiu que as vendas de cigarros caíram de 5,56 bilhões de maços
em 2006 para 3,8 bilhões de maços em 2013, e que o número de fumantes no Brasil
caiu de 21,35 milhões em 2006 para 17,10 milhões em 2013. Os responsáveis pelo
relatório afirmam que entre 2006 e 2013, o preço real médio dos cigarros aumentou
74% no país, após um aumento de 116% no valor real da carga tributária sobre o
tabaco. No mesmo período, as vendas de cigarro caíram 32%. Segundo eles, a forma
mais eficaz para reduzir o consumo do tabaco seria aumentar o preço dos produtos
dele derivados através da majoração da carga tributária. Preços mais altos incentivam
fumantes a parar de fumar, evitam que novos fumantes apareçam e reduzem a
quantidade de tabaco consumido entre os fumantes que se mantem no vício. Não
foram levados em conta naquele estudo outros fatores a influenciar a redução no
consumo do tabaco161. O que mais chama a atenção, todavia, é que no período
analisado a receita com a carga tributária sobre o tabaco aumentou de R$ 3,5 bilhões
para 5,1 bilhões (em valores de 2013), mesmo com a queda nas vendas do produto.
Essa constatação reafirma o que antes foi dito sobre o fato da norma tributária indutora
também produzir efeito arrecadatório, inclusive tendo sido verificado neste caso um
aumento expressivo da arrecadação tributária.
Outro estudo sobre o tema apresentado pela Aliança de Controle do Tabagismo
160 Campaign for Tobacco-Free Kids. 161 Outra questão levantada pelo relatório seria da reação da indústria ao aumento da carga tributário,
tendo sido apresentado como principal argumento contrário à essa majoração o crescimento do comércio ilícito, já que cria uma diferença no preço entre cigarros pagos e ilegais. Os próprios autores, no entanto, ressaltam que a estratégia de preços da indústria tem se mostrado em descompasso com essa preocupação, já que nos anos 2000, quando as cargas tributárias foram reduzidas em termos reais, a indústria não repassou os ajustes ao consumidor. Os preços no varejo foram mantidos, assim como a diferença para cigarros contrabandeados. No ano de 2009, quando uma segunda rodada de aumento de tributos foi implementada, a indústria aumentou os preços de cigarros, bem acima dos aumentos verificados na carga tributária, mostrando pouca ou nenhuma preocupação no desequilíbrio de preços entre cigarros legais e ilegais.
108
(2013), no qual se pretendeu investigar a demanda de fumar por grupo de renda ou
nível educacional162, constatou que pessoas com menor nível de escolaridade
consumiram menos cigarros por dia se comparado com aquelas de maior nível de
educação (independente da faixa etária e sexo). Segundo os pesquisadores, uma
possível explicação estaria no fato de que pessoas com menor escolaridade podem
vir a dispor de menor renda e menos recursos para a compra de cigarros, o que sugere
que o aumento dos preços na oferta de produtos derivados do tabaco tende a produzir
um alto impacto sobre esse grupo. Entretanto, de forma um tanto paradoxal,
constatou-se que mesmo ante o sucesso alcançado na implementação de políticas de
controle do tabaco no Brasil163, dentre elas aquelas de cunho tributário que provocam
aumento de preços dos produtos, aqueles de menor renda seriam - percentualmente
falando – os que mais fumam, têm maior exposição ao tabagismo passivo, tem menor
percepção das mensagens de alerta à saúde, menor índice de abandono ao
tabagismo, gastam proporcionalmente mais dinheiro para comprar produtos de
tabaco, morrem mais de doenças a ele relacionadas e dentre outras consequências.
A percepção dos autores é de que as políticas de controle não levaram em conta as
sensíveis desigualdades socioeconômicas da população, o que pode ter levado a uma
concentração da epidemia de tabaco na população menos favorecida164.
Questão relevante a ser destacada nesse estudo, foi o levantamento das
políticas de controle do tabaco implantadas no Brasil, principalmente aquelas
relacionadas aos impostos. Dentre os impostos e taxas identificadas sobre os
cigarros, destacam os pesquisadores o papel do ICMS, cujas alíquotas para os
cigarros estariam à época entre 25 e 27% do preço final de venda165. Desde já se
percebe a importância do papel dos Estados nas políticas de controle no consumo de
tabaco, representando o ICMS expressiva parcela do seu preço final de venda166. A
participação dos Estados pode, inclusive, ir além, como se nota de relato acerca de
iniciativa do Rio Grande do Sul, que teria sido o primeiro Estado no Brasil a adotar
162 Além de avaliar diferentes reações aos impostos e outras políticas de controle do tabaco. 163 Que significaram na redução da prevalência do uso de cigarros. 164 Segundo o estudo produzido, a aparente ausência de foco sobre as diferenças socioeconômicas
levou a uma redução do consumo proporcionalmente muito superior nos grupos mais educados, que, ao que tudo indica, teriam tido mais acesso à informação, mais oportunidades de tratamento e que seriam sensibilizadas de modo diferencial por estas informações de forma a reduzir o consumo.
165 Apenas três estados ao tempo possuiriam alíquotas mais elevadas, sendo eles Paraná, com 29%, Mato Grosso, com 37% e Amazonas, com 30%.
166 Somente equiparável ao IPI, que foi identificado, em 2012, como correspondente a uma participação entre 29,7% e 36% do preço final de venda.
109
uma lei de controle ao tabaco (Lei Estadual n. 7.813/1983).
Ainda sobre o tema relativo aos ‘impostos especiais sobre o consumo’ ou
“excise taxes”, como vem sendo conhecidos os tributos indiretos que incidem sobre
produtos prejudiciais à saúde dos consumidores, tem se discutido a respeito da forma
mais efetiva de sua cobrança para inibir comportamentos, se por um sistema de
alíquota específica (fixa) ou sobre o valor da mercadoria (ad valorem).
Em análise dos tributos incidentes sobre o tabaco, a Organização “Campanha
para Crianças Livres de Cigarro” (2012) produziu um relatório no qual identifica
vantagens e desvantagens na utilização do sistema de alíquotas específicas ou
variáveis. Segundo os autores, ambos os tipos podem ser empregados para a
tributação do tabaco, porém em países de baixa e média renda os tributos específicos
(que são ajustados de acordo com a inflação) deveriam ser preferíveis por serem mais
fáceis de administrar e garantir uma arrecadação previsível para o Governo. Além do
mais, impostos ou tributos fixos, seriam mais efetivos em reduzir o consumo após um
aumento da carga tributária. A simplicidade e uniformidade do sistema de tributação
do tabaco também tem sido elencada como um fator de redução do seu consumo,
além de ganho de eficiência e incremento na arrecadação tributária.
A desvantagem apontada quanto à utilização dos impostos fixos estaria nas
erosões causadas na sua base pela inflação, que deveria ser compensada por um
ajuste periódico do seu valor. Outro fator prejudicial estaria na possibilidade de que
seja reduzido o impacto de tais tributos através da alteração nas características do
produto. Assim, se a exação recai sobre número de maços de cigarros (como
comumente ocorre), os produtores poderiam aumentar o tamanho da caixa da
embalagem para reduzir o peso da carga tributária. As suas vantagens estariam no
fato de representar uma arrecadação mais previsível, facilidade na determinação do
montante devido e na administração do tributo (somente sendo coletadas uma vez, o
que torna a evasão fiscal menos provável). Em contraposição, o sistema de alíquotas
ad valorem apresentaria uma série de desvantagens, desde a redução nos preços dos
produtos para relativizar o peso da tributação (esse problema é mitigado pelo uso de
tributos específicos, que não oscilam ao sabor das estratégias de fixação de preço
das indústrias do setor) até a dificuldade em prever a arrecadação tributária ao longo
do tempo e o montante da tributação incidente sobre os produtos nocivos. Sem
mencionar as diferenças que passam a surgir entre os preços dos produtos, levando
os consumidores a aumentar o seu consumo sobre aqueles mais baratos ou a
110
substituir o uso daqueles de maior preço por outros de menor. De toda sorte, o sistema
de alíquota variável não sofre com os efeitos causados pela inflação e são eficientes
instrumentos na redução da margem de lucro das indústrias.
Em artigo discutindo tema semelhante, desta vez envolvendo a relação entre
os tributos incidentes sobre bebidas alcóolicas e a compulsão no seu consumo nos
Estados Unidos, Xuan et al (2015) pretenderam investigar como a variação em
modelos de tributação adotados pelos diferentes Estados norte-americanos poderiam
impactar em comportamentos compulsivos relacionados à ingestão de álcool. Em
conclusão, verificou-se que a combinação de diferentes modelos de tributação, ora
incorporando tributos com base no volume de bebida (alíquotas fixas) e ora com base
no seu valor (alíquotas ad valorem), demonstrou-se capaz de diminuir
significativamente o consumo compulsivo de álcool. Os problemas associados a cada
um desses sistemas de alíquotas foram parecidos com aqueles já citados, dentre eles
a erosão causada pela inflação nos tributos por valor fixo ou volume, e a disparidade
entre preços causada por modelos de tributação de alíquota variável, o que leva à
substituição por marcas de bebida mais baratas167. Neste último caso, a adoção de
políticas de preços mínimos poderia limitar o deslocamento para marcas de menor
preço.
Também tem sido discutida a relação da tributação sobre alimentos não
saudáveis (unhealthy foods) enquanto política pública na área da saúde. Em relatório
produzido pela “Aliança para Prevenção de Doenças Crônicas”168 (2013, tradução
nossa), constatou-se existirem evidências de que tributos direcionados a
determinados tipos de alimentos contendo quantias não saudáveis de gordura e
açúcar, desde que altos o suficiente, são fortes fontes motivadoras para que pessoas
modifiquem seus hábitos de consumo, passando a adquirir menos desses alimentos
sobretaxados e mais de outros.
Segundo os autores responsáveis pelo relatório, o interesse na utilização da
tributação para induzir hábitos mais saudáveis, especialmente relacionados à
alimentação das pessoas, surge a partir de uma experiência bem sucedida na
tributação do álcool e do cigarro. Ao se investigar possíveis aplicações do que foi
apreendido com as estratégias de redução no consumo de tabaco, tem sido 167 Os próprios pesquisadores salientam que existem evidências de que essa relação não seja
observada em relação ao tabaco, pois que os países que adotem sistemas de alíquota fixa tendem a possuir menos fumantes do que aqueles que utilizam um modelo misto.
168 Alliance for the Prevention of Chronic Disease.
111
identificado três principais enfoques para incentivar hábitos nutritivos e reverter o
quadro de crise de obesidade. São eles relacionados à tributação dos alimentos não
saudáveis (Junk Food), das bebidas açucaradas (Sugar Sweetened Beverages –
SSB)169 e uma reforma da tributação sobre alimentos.
Quanto à primeira situação, têm sido colhidas evidencias de que a tributação
de alimentos não saudáveis oferece um excelente estímulo financeiro para prevenção
da obesidade. Aliado a isso, incentivam os produtores a promover uma alteração no
seu processo industrial para reduzir os níveis de gordura, sal e açúcar contidos nos
alimentos processados, como forma de manter sua participação de mercado. Todavia,
é igualmente certo que existe uma certa complexidade na tributação desses ‘alimentos
não saudáveis’, o que levou, inclusive, à uma experiência mal sucedida na Dinamarca.
Naquele país foi introduzido em Outubro de 2011 um tributo específico sobre gordura
(fat tax), cuja incidência alcançava produtos como manteiga, leite, queijos, pizza,
carne, óleo e alimentos processados, desde que contivessem mais de 2,3% de
gordura saturada. Em Novembro de 2012, o Ministério da Fazenda Dinamarquês
anunciou o fim desse tributo, sob o argumento de que a política teria não só falhado
em alterar os hábitos de consumo dos seus cidadãos, como incentivado o comércio
com outros países da fronteira, colocado em risco cargos de trabalho e representado
um pesadelo burocrático para produtores e pontos de venda.
De um modo geral, o relatório aponta que alguns experimentos lograram
demonstrar que quando alimentos saudáveis são mais baratos do que aqueles não
saudáveis, as pessoas possuem uma tendência maior a adquirir itens mais benefícios
para a saúde. Assim, não basta, como outrora apontado em relação a Bernaud,
sobretaxar alimentos nocivos, sem subsidiar aqueles ditos saudáveis. Nos dizeres da
autora “de nada adianta que o quilograma de sorvete suba para, hipoteticamente, R$
5,00 enquanto um quilograma de maça custar os mesmos R$ 5,00” (BERNAUD, 2015,
p. 147). O sorvete, nesta hipótese, permaneceria mais atrativo aos consumidores, o
que exigiria que a maçã recebesse subsídios diretos para baratear o seu custo.
Em outro estudo, no qual se pretendeu investigar os efeitos de um ‘tributo de
alimentos não saudáveis’ (fax tax) sobre os nutrientes consumidos pelas famílias
169 Concluíram Brownell e outros (2009), em estudo produzido sobre o tema, que o efetivo de um tributo
somente pode ser estudado após a sua implementação, porém que alguns dados sugerem que a instituição de um imposto sobre bebidas açucaradas poderia reduzir o seu consumo. Ao mesmo tempo, o tributo geraria incremento na arrecadação, cuja receita poderia ser utilizada em políticas de prevenção à obesidade e outros programas na área da saúde.
112
francesas, observaram Allais, Bertail e Nichèle (2008) que a questão da tributação de
determinados alimentos riscos em gordura saturada e açúcar poderia se revelar
ambígua e com mínimos efeitos sobre a ingestão de nutrientes. Seriam controvertidos
os efeitos porque ao aumentar o preço dos alimentos para reduzir o consumo de
calorias e/ou gordura também implica na redução da ingestão de outros nutrientes
considerados bons para a saúde. Citam como exemplo o incremento dos preços de
queijos e manteiga, que apesar de reduzir a ingestão de calorias, gordura saturada e
sódio, também reduz o consumo de vitamina D, cálcio, ferro e magnésio. Outro ponto
a ser considerado, seria o fato de existirem evidências de que os preços de alimentos
se mostram marcantemente inelásticos no consumo de tais bens. Assim, estima-se
que um tributo de 10% sobre determinada categoria de alimento rico em calorias
representa baixo impacto no curto prazo, ainda que no longo tenha resultados não
negligenciáveis sobre o peso corporal. Ainda que se considere essa perspectiva de
longo prazo, em algumas situações podem levar até oito anos para que sejam surtidos
os efeitos esperados.
Associada a essa constatação, identificam tais autores que o fato desses
produtos sobretaxados possuírem uma demanda inelástica, resulta em expressiva
arrecadação de tributos e ao mesmo tempo provoca um efeito regressivo extremo na
tributação170. Em último caso, questiona-se a própria relevância na instituição de um
tributo específico sobre alimentos não saudáveis como medida para influenciar na
ingestão de nutrientes pelas famílias. Qualquer política dessa natureza seria
inadequada para, de forma efetiva e substancial, afetar o consumo das famílias
francesas, além de resultar em efeitos ambíguos. Soma-se a isso que não estaria
sendo avaliado, no cenário inicialmente proposto, o possível impacto de um tributo
desse tipo sobre a indústria de alimentos. Hipoteticamente, para evitar a redução no
volume de vendas, poderia a indústria alterar a composição dos seus produtos,
introduzindo componentes de maior custo ou implementando novas técnicas de
produção, tornando o produto final menos acessível à população em geral e
agravando disparidades socioeconômicas relacionadas ao consumo.
No que se refere à experiência brasileira, Leifert e Lucinda se propuseram a
170 A despeito dessa constatação, consideram em um cenário simulado que para provocar um maior
impacto sobre o total de energia ingerida – e também de gordura saturada - pelas famílias francesas, deveriam ser tributados alimentos como manteiga e queijo, produtos açucarados e gordurosos, e refeições prontas.
113
fazer análise semelhante envolvendo os efeitos de um imposto sobre alimentos
‘engordativos’ como forma de combater a epidemia de obesidade no país. Ao simular
a aplicação de tributo desse tipo, tomando como base a demanda por alimentos
encontrada na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF)171, concluíram que a
política poderia de fato aumentar a demanda por alimentos saudáveis. Em
contraposição, também seria elevado o consumo de alimentos ricos em sódio, o que
se revela prejudicial por estar a sua ingestão associada a doenças cardíacas e
hipertensão. Ao simular cenários alternativos, no qual foi combinada uma política
tributária com subsídios e isenção fiscal a alimentos mais saudáveis, identificou-se a
redução do consumo de alimentos engordativos ou ricos em sódios. As evidências
encontradas indicam que quanto maior for o subsídio para os alimentos saudáveis,
menor seria a ingestão média de ácidos graxos saturados, sódio, lipídios e calorias
(LEIFERT; LUCINDA, 2012, p. 17). Em termos de consumo de alimentos, portanto,
não parece ser viável combater o problema apenas através da tributação de alimentos
não saudáveis ou engordativos, senão conjugando essa política com medidas de
subsídio e incentivo fiscal a alimentos saudáveis.
Em resumo, apesar da existência de controvérsia sobre o tema, o objetivo é
demonstrar que o tributo pode ser utilizado de forma mais ou menos efetiva como
mecanismo de indução de comportamentos, que tenha como fim a promoção da
saúde.
Aliás, o emprego da função indutora para que seja atingido o valor da saúde
não se resume aos casos acima listados, em que o tributo é utilizado como mecanismo
de atuação preventiva nessa área. Outras hipóteses há em que se autoriza a
instituição da norma tributária indutora para o tratamento de doenças e outras
mazelas, desde o incentivo fiscal à aquisição de máquinas e equipamentos de uso
médico-hospitalar, até medidas de estímulo ao ensino, pesquisa e à inovação com o
objetivo de que sejam descobertas novas curas ou tratamentos para doenças e
enfermidades. Pode-se falar até em medidas de desoneração de determinados bens
como forma de incentivar a sua aquisição, em que se destaca a venda de
preservativos para o combate às doenças sexualmente transmissíveis.
Enfim, a possibilidade de atuação dos Estados na área da proteção e defesa
da saúde, através da utilização dos tributos de sua competência para praticar a
171 Segundo dados divulgados pelo IBGE no período de 2008/2009.
114
intervenção no meio econômico e social, encontra variadas possibilidades.
4.2.5 Outros ramos de regulação e atuação dos Estados
Nos tópicos anteriores foram abordados os principais campos de atuação
reguladora e administrativa dos Estados em que a doutrina consentiu com a
possibilidade de introdução da tributação extrafiscal ou da norma tributária indutora.
Sem embargo, o seu emprego não se resume a tais esferas, pois inúmeras são as
competências dos estados-membros e pouco exploradas são a maioria delas.
Aos Estados cabe intervir, utilizando-se do tributo como instrumento de ação -
e desde que observada a sua competência em matérias de impostos e taxas -, nos
setores da educação, cultura, ciência, tecnologia, proteção ao patrimônio histórico e
cultural, saneamento básico, segurança pública, integração das pessoas portadoras
de deficiência, e inúmeros outros. Busca-se, com isso, induzir comportamentos
tendentes a fins constitucionalmente relevantes nestas áreas.
Assim é que se notam iniciativas como a de Vieira e Júnior (2015) que procuram
compreender a proteção do patrimônio histórico e cultural da Cidade de Belém (PA)172
sob a ótica da função promocional do direito, ou seja, da própria aplicação da
extrafiscalidade. Neste artigo em específico, concluíram que as técnicas de
encorajamento instituídas pelo Município de Belém (incentivos fiscais e prêmios
relacionados ao IPTU) não seriam eficientes ao objetivo proposto, diante do ínfimo
número de imóveis alcançados pela medida.
Embora tenham se referido a uma atuação do Município, é inegável que o
Estado também pode contribuir para a proteção do patrimônio urbano, através de
medidas que tenham outros tributos como objeto. Neste contexto, não se descarta um
incentivo relativo ao ICMS aos comerciantes que se instalarem na região e
colaborarem com a manutenção e preservação das estruturas arquitetônicas dos
prédios. Ou ainda um subsídio às chamadas ‘taxas de incêndio’, que são comumente
cobradas pelos Estados em razão do risco de incêndio na edificação, por aqueles
172 Como narram os autores, a cidade de Belém foi o primeiro núcleo colonial português na Amazônia,
que durante a denominada Belle Èpoque (final do século XIX e início do século XX), ganhou uma arquitetura muito bela e suntuosa, sob a influência dos conceitos parisienes de intervenção urbana. Foi o período que teria proporcionado o maior e mais consistente legado arquitetônico e cultural da cidade que até hoje permanece, porém que está sofrendo com um processo de degradação e abandono dos imóveis situados na sua parte mais antiga.
115
contribuintes que exercem atividade de comércio, indústria e prestação de serviços.
Além destas, outras medidas são cabíveis, como aquelas que buscam
incentivar o investimento privado em projetos culturais, esportivos e educacionais, ou
a desoneração de equipamentos de segurança pública e de uso no desenvolvimento
de novas tecnologias, os benefícios a melhorias em sistemas de saneamento básico
e muitas outras que decorrerem desses mesmos objetivos inseridos na competência
dos estados-membros.
Definidas essas questões, passa-se a examinar no caso concreto do Estado de
Minas Gerais como a extrafiscalidade tem sido aplicada ou mesmo se tem sido
utilizada como instrumento de intervenção em área de sua atuação reguladora.
4.3 Investigação da norma tributária indutora no Estado de Minas Gerais
4.3.1 Pressupostos teóricos de investigação
Nesse derradeiro tópico, o nosso objetivo é explorar a legislação tributária do
Estado de Minas Gerais com o objetivo de averiguar se a tributação com feição
indutora vem sendo utilizada para alcançar fins constitucionalmente relevantes nas
áreas de competência administrativa e reguladora outorgada aos Estados.
Não pretendemos, com isso, esgotar o assunto, até porque a definição do que
seja extrafiscalidade ou os critérios de sua identificação no plano da norma tributária
ainda encontra divergência entre a doutrina especializada. Não obstante, ao
prosseguir com o objetivo de fazer um levantamento das principais medidas – ditas
‘extrafiscais’ - que porventura tenham sido adotadas pelo Estado de Minas Gerais,
nos socorremos da conjugação dos elementos finalidade e função para a
caracterização da norma tributária indutora. Em poucas palavras, sempre que se tratar
de norma que tem por finalidade realizar conteúdo valorativo e programático previsto
na Constituição, induzindo condutas através do consequente normativo, ter-se-á a
identificação da própria feição indutora ou extrafiscal da norma tributária.
Para melhor análise do tema, subdivide-se a investigação por espécie de tributo
analisada: impostos e taxas. Deixa-se de abordar a contribuição de melhoria por já ter
sido salientado que se trata de modalidade que não coaduna com o regime da norma
tributária indutora.
116
4.3.2 Extrafiscalidade quanto aos Impostos Estaduais
A extrafiscalidade na figura dos impostos é possível desde que a justificativa
para sua instituição seja distinta da necessidade que tem o Estado em arrecadar
recursos para o atendimento das despesas públicas. Ao contrário, deve encontrar
suporte na permissão conferida ao ente público para que pratique a intervenção sobre
o meio social e econômico.
Por decorrência lógica, somente será lícito à pessoa política instituir a norma
tributária indutora se reunir as competências em matéria tributária e reguladora,
restringindo-se a sua atuação àqueles tributos que lhe tenham sido outorgados pelo
constituinte e limitada a sua intervenção aos campos materiais reservados pela
Constituição.
Sem perder de vistas tais pressupostos, identifica-se que aos Estados e ao
Distrito Federal foi outorgada competência para instituir impostos sobre a transmissão
causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos (ITCMD); operações relativas à
circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual
e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem
no exterior (ICMS); e finalmente sobre a propriedade de (IPVA).
Ao investigar a legislação do Estado de Minas Gerais relativa aos tributos acima
listados, sobressaem duas leis em que se reputa marcante o caráter extrafiscal
conferido à norma tributária que institui modalidade de imposto. São elas a Lei
Estadual de Minas Gerais n. 14.937, de 23 de dezembro de 2003, e a Lei Estadual n.
17.615, de 4 de julho de 2008.
A primeira, Lei Estadual n.14.937/03, cuida de instituir e dispor sobre o IPVA.
Dentre os dispositivos que são de interesse para a temática tratada, destaca-se o
parágrafo 6º do seu artigo 7º que estabelece redução da base de cálculo do imposto
em 30% (trinta por cento) para veículo movido, exclusivamente, a álcool etílico hidrato
combustível. Nesta hipótese específica, tem-se nítida situação de incentivo financeiro
sendo concedido aos contribuintes que passarem a adquirir e manter a propriedade
de veículos menos poluentes. Como salientado outrora, o fim mais evidente que
estaria sendo perseguido pela norma estaria na proteção do meio ambiente, campo
que se insere na atribuição administrativa e regulatória dos Estados. Aliado a esse
fato, a redução do encargo fiscal estaria servindo como instrumento de indução de
117
comportamentos tendentes a esse objetivo173. Outro aspecto a ser destacado na
referida Lei, diz com a isenção concedida aos veículos de pessoas com deficiência
física, visual, mental severa ou profunda, ou autista (artigo 3º, inciso III); e ao veículo
declarado de valor histórico pela Fundação Instituto Estadual do Patrimônio Histórico
e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG). Embora no primeiro caso possam ser
suscitadas dúvidas quanto à existência do caráter extrafiscal – tendo em vista que
tanto a finalidade como a função da norma não estão absolutamente claras174 -, tem-
se que ao desonerar referidos destinatários se estabeleceu um incentivo a que
possam adquirir e manter veículos em seu nome, o que está alinhado como uma das
atribuições conferidas aos Estados que é zelar pela proteção e integração das
pessoas portadoras de deficiência. Com relação à segunda hipótese exonerativa,
pode-se alegar uma intenção deliberada de zelar pela proteção do patrimônio
histórico, promovendo-se uma indução a que seja conservado referido bem à vista da
não incidência do gravame fiscal que poderia provocar justamente o efeito contrário.
Na mesma linha do que apontado anteriormente, a Lei Estadual n. 17.615/08
procura alcançar objetivo extrafiscal semelhante, ao estabelecer que o contribuinte do
ICMS que apoiar financeiramente projeto cultural poderá deduzir do valor do imposto
devido mensalmente os recursos aplicados no referido projeto, atendidos os
parâmetros estabelecidos pela Lei175 (artigo 3º). Soma-se a isso a possibilidade de
173 Salienta-se que a lei mineira do IPVA estabelece em seu artigo 10 alíquotas do imposto distintas
para o tipo de veículo automotor, variando de 4% para automóvel, veículo de uso misto ou utilitário, e outros não especificados, até 1% para ônibus, micro-ônibus, caminhão, caminhão-trator e aeronave. O tratamento diferenciado poderia sugerir uma predileção do legislador pelo incentivo ao transporte coletivo e público, porém não há especificação quanto ao tipo de destinação que se dá o bem, além de terem sido incluídos modelos de automóveis que podem ou não se prestar a esse objetivo, o que descaracteriza qualquer intenção de se instituir uma medida extrafiscal.
174 Ao buscar desonerar a aquisição de veículos automotores por pessoas portadoras de deficiência, não se sabe ao certo, até pela ausência de outros elementos, se a norma está predispondo a adoção de determinado comportamento por parte do seu destinatário (o que configuraria a função indutora) ou se está conferindo tratamento diferenciado ao contribuinte por questões diversas, de ordem distributiva, alinhada com os aspectos envolvidos na fiscalidade propriamente dita. Vale lembrar que, por vezes, tais veículos adquiridos por essas pessoas tem de ser adaptados às suas necessidades especiais, o que envolve um encarecimento do produto e alto custo na sua aquisição.
175 Nos termos da Lei, a dedução é efetivada a cada mês e somente pode ser iniciativa após o efetivo repasse dos recursos ao empreendedor cultural. Em qualquer caso, não pode exceder aos seguintes limites: I - 10% (dez por cento) do valor do ICMS devido no período, até atingir o valor total dos recursos dedutíveis, para empresa cuja receita bruta anual se situe entre o limite máximo de faturamento da empresa de pequeno porte, definido na Lei Complementar Federal n. 123, de 14 de dezembro de 2006, e o montante de quatro vezes esse limite; II - 7% (sete por cento) do valor do ICMS devido no período, até atingir o valor total dos recursos dedutíveis, para empresa cuja receita bruta anual se situe entre o montante máximo permitido para
118
que o contribuinte que venha a apoiar financeiramente projeto cultural possa quitar
débitos inscritos em dívida ativa, há mais de doze meses, com 25% de desconto
(artigo 5º). Em todos esses casos, vislumbra-se nítida indução de comportamentos
para que seja concedido financiamento privado a projetos culturais de interesse ou
circulação pública176. Transparece, portanto, a feição indutora da norma tributária, cuja
finalidade é através do encargo fiscal incentivar o apoio cultural, em áreas como as
artes cênicas (teatro, dança, circo e etc.), audiovisual (cinema, vídeo, novas mídias e
congêneres), artes visuais, música, literatura e dentre outras (artigo 8º).
Ao analisar a lei mineira de incentivo à cultura, Gouvêa (2006) concorda com a
existência da extrafiscalidade no benefício concedido pelo Estado de Minas Gerais.
No seu entender, neste caso em específico, não haveria redução da obrigação
tributária, ainda que a legislação utilize o termo ‘desconto’. Isso porque, o contribuinte
pagaria parte do tributo ao agente cultural e outra parte ao Fisco, podendo,
eventualmente, ter despesa maior com o projeto cultural que o benefício fiscal
correspondente.
Conquanto do ponto de vista financeiro possa inexistir efetivo ganho por parte
do contribuinte, não se pode afirmar, como pretende o citado autor, que o agente
cultural recebe parcela do tributo e que a receita dele decorrente estaria sendo
repartida. O próprio regime jurídico dos impostos impede que a sua arrecadação seja
previamente vinculada a determinado fim ou despesa, aliada à circunstância de não
ser o agente cultural sujeito ativo da relação tributária. Além do mais, há de ser
salientado que o apoio a projeto cultural traz, por vezes, benefícios indiretos à
instituição financiadora, como a exposição da sua marca e o fortalecimento
institucional177. Fosse o contrário, em se tratando de mero tributo pago a duas
pessoas, o contribuinte poderia sequer se sentir atraído a praticar o incentivo cultural.
as empresas classificadas no inciso I e o valor de oito vezes o limite máximo de faturamento da empresa de pequeno porte, definido na Lei Complementar Federal n. 123, de 2006; e III - 3% (três por cento) do valor do ICMS devido no período, até atingir o valor total dos recursos dedutíveis, para empresa cuja receita bruta anual seja superior ao montante máximo permitido para as empresas classificadas no inciso II.
176 É o que, aliás, estabelece o artigo 9º da mencionada Lei: “somente poderão ser beneficiados pelo incentivo fiscal concedido por esta Lei os projetos culturais que visem à exibição, à utilização ou à circulação públicas de bens culturais, sendo vedada a concessão de incentivo a projeto destinado ou restrito a circuitos privados ou coleções particulares”.
177 Esta opinião é compartilhada por José Márcio Oliveira ao reconhecer que as empresas privadas tem como fonte motivadora o lucro, buscando financiar projetos com potencial retorno em imagem e marketing. Em virtude dessa peculiar condição, afirma que o Estado não poderia limitar sua política cultural ao campo dos benefícios fiscais, já que projetos culturais de baixo retorno econômico, mas de grande importância, poderiam ficar sem investimento (OLIVEIRA, 2003, p. 118).
119
Divergências à parte, o debate serve para o fim de que seja considerada a
existência de verdadeira norma tributária indutora, que provoca o estímulo à adoção
de comportamentos em prol da promoção da cultura. Ainda que se considere que os
custos do contribuinte com o apoio cultural possam superar o benefício concedido, a
mera existência de um incentivo fiscal pode favorecer essa conduta, atrelando a ela
uma contrapartida financeira que normalmente não seria aplicada.
Ainda em se tratando de utilização do ICMS como instrumento indutor, há que
se recorrer ao Decreto Estadual n. 43.080/02, que instituiu o regulamento do imposto
no Estado de Minas Gerais (RICMS/02). A introdução da norma tributária indutora no
regramento do ICMS mineiro se percebe mais fortemente nos capítulos da alíquota
do tributo, bem como naqueles dispositivos e anexos que tratam dos benefícios fiscais
(isenções, créditos presumidos e redução da base de cálculo).
A começar pelas alíquotas do ICMS no Estado de Minas Gerais, verificou-se a
adoção do princípio da seletividade com fixação de alíquotas gravitando entre o
mínimo de 7% e o máximo de 30%. Levando em conta que a alíquota residual é de
18%, determinadas mercadorias como cigarros e produtos de tabacaria, além de
bebidas alcóolicas178, armas e munições, e fogos de artifício, são tributadas em um
patamar superior de 25%. Nesse ponto, reputa-se existir intuito extrafiscal uma vez
que os dois primeiros produtos listados são comumente associados com políticas que
buscam criar um desincentivo ao seu consumo. Quanto aos demais, há fortes razões
para considerar cenário semelhante, dada a própria periculosidade que lhes é
intrínseca. Nada obstante, são contemplados com alíquota semelhantes
determinados bens como a energia elétrica consumida pela classe comercial ou
artigos de toucador utilizados para higiene pessoal, cujo consumo, em princípio, não
encontra razão para ser desestimulado e que tampouco merece um tratamento mais
gravoso sob a justificativa de ser suntuoso. Ainda mais dissonante seria o fato da
alíquota teto de 30% se aplicar às operações de fornecimento de energia elétrica para
consumo residencial e a terceira maior, de 27%, para a prestação de serviço de
comunicação. Tanto a energia elétrica de uso residencial como os serviços de
comunicação, são essenciais à população e dificilmente pode se dizer que o legislador
estaria procurando inibir o seu consumo. Assim, não são todos os produtos
contemplados com alíquotas mais gravosas (ou superior à nominal) que se incluem
178 Com exceção das cervejas, chopes e aguardentes de cana ou de melaço. As cervejas e chopes
alcóolicos, por exemplo, estão sujeitos à alíquota de 23%.
120
em uma política de intervenção com intento extrafiscal, podendo mesmo existir razão
para que recebam esse tratamento por se tratarem de bens supérfluos e reveladores
de capacidade contributiva (como é o caso das embarcações de esporte e recreação,
dos artefatos de joalheira ou ourivesaria) ou até motivo algum aparente, conforme
explanado em relação à energia e determinados artigos de higiene pessoal. Adequado
exemplo de norma indutora seria aquela que estipula a alíquota de 14% para as
operações com álcool para fins carburantes e de 27% para a gasolina com a mesma
finalidade. No caso de tais bens, incentiva-se a substituição de um combustível mais
poluente por outro menos poluente, que é tributado à alíquota menos gravosa179.
Outros exemplos de incentivos que estariam sendo concedidos sob a forma de
alíquota reduzida podem ser encontrados na alíquota reduzida de 7% para a energia
elétrica destinada ao produtor rural a ser utilizada na atividade de irrigação no período
noturno, ou a de 12% para determinadas máquinas, aparelhos e equipamentos, que
são comumente utilizados em atividades industriais e de prestação de serviços.
Tratam-se de situações em que a finalidade mais evidente é atender a um imperativo
de incentivo à produção (área inserida na competência dos Estados), operando como
mecanismo de indução rumo ao aprimoramento e desenvolvimento de tais processos.
Com relação aos benefícios fiscais, especificamente o da isenção, o Anexo I
do RICMS/02 de MG elenca uma lista de 223 itens. Entretanto, como tratado
anteriormente, não são todas as isenções em matéria tributária expedientes do tipo
extrafiscal, podendo mesmo existir razões de cunho arrecadatório e simplificador que
justificam a sua instituição. A maior parte delas, ao menos no que toca ao ICMS
mineiro, tem por fundamento uma justificativa distinta da necessidade de intervenção
sobre o domínio econômico. Ainda assim, como expedientes do tipo extrafiscal, alguns
casos são dignos de destaque. A começar pela isenção de ICMS aplicada à doação
de mercadoria à Secretaria de Estado de Educação para emprego na rede oficial de
ensino; a saída de inseticida, fungicida, vacina ou soro, para uso na agricultura e
pecuária; ou a entrada de medicamentos importados do exterior por pessoa física180;
a saída de obra de arte promovida pelo próprio autor; a entrada, decorrente de
importação do exterior, de máquina, equipamento, aparelho, instrumento ou material
179 A situação fica ainda mais evidente quando se aplica a alíquota de 12% para a aquisição de kit para
gás natural veicular (GNV). 180 Desde que não tenha havido contratação de câmbio e não haja incidência do Imposto sobre a
Importação (II).
121
(ou seus respectivos acessórios ou ferramentas), promovida por estabelecimento
industrial para uso exclusivo em sua atividade produtiva181; além de inúmeros outras
hipóteses em que a finalidade seja a intervenção sobre o domínio econômico, e nos
quais a norma procura induzir o comportamento dos indivíduos, que passam a
desenvolver ações em áreas econômicas e sociais de interesse do Estado (fomento
à produção agropecuária, tecnologia, educação, cultura, arte e etc.).
Também no campo da redução da base de cálculo - que equivale a modalidade
de benefício fiscal representativo de isenção parcial -, notam-se incentivos sendo
concedidos para estimular o desenvolvimento econômico, como a previsão na
redução de 60% na base do imposto para produtos de uso na agricultura e pecuária,
tais como inseticida, vacina e outros; ou a redução de 33,33% aplicada na saída de
biodiesel resultante da industrialização de grãos, sebo bovino, sementes ou palma; e
também a redução de 61,11% na entrada decorrente de importação do exterior de
equipamento médico-hospitalar, sem similar nacional, realizada por clínica ou hospital.
Em todos esses casos, o objetivo da norma é incentivar o consumo em determinadas
atividades para que possa haver incremento na produção ou melhoria nas condições
técnicas da operação, modernização de equipamentos e consequentemente a
promoção das áreas de atuação reguladora dos estados federados (agricultura,
pecuária, meio ambiente e saúde).
Outra espécie de benefício fiscal relativo ao ICMS em que a instituição da
norma tributária indutora se faz sentir é na concessão de crédito presumido182. Chama
a atenção, neste particular, a concessão de crédito no valor equivalente a 60% do
valor do imposto sobre as saídas internas do produto denominado adesivo hidroxilado,
cuja matéria-prima consiste em material resultante do processo de moagem ou
trituração de garrafa do tipo PET. Claramente a legislação está a incentivar os
processos de reciclagem e almejando a proteção ambiental ou o controle da poluição.
Outra medida de claro intento extrafiscal é a concessão de crédito presumido de até
100% do valor do imposto para incentivar a industrialização por encomenda realizada
por estabelecimento situado no Estado de Minas Gerais. Neste caso, contudo,
questiona-se a própria medida instituída, já que ela termina por impactar a economia
181 Desde que sejam destinados a integrar o seu ativo permanente e que a operação sejam
simultaneamente isenta do Imposto sobre a Importação (II) e amparada por programa especial de exportação (Programa BEFIEX), aprovado até 31 de dezembro de 1989.
182 O crédito presumido consiste em um crédito fictício concedido ao contribuinte para desconto do saldo de imposto a pagar.
122
nacional ao estabelecer tratamento fiscal mais favorável aos contribuintes mineiros
em detrimento daqueles de outro Estado.
Com relação ao aludido ‘ICMS ecológico’, que tem sido taxado por alguns
autores como exemplo de medida extrafiscal, não se infere tratar-se de norma
tributária indutora. Em capítulo anterior foi demonstrado que o ‘ICMS ecológico’ não
se utiliza do instrumento tributário para induzir comportamentos, limitando-se a servir
como critério para repartir a própria arrecadação do ICMS. Por atuar em momento
posterior à própria incidência e recolhimento do imposto, trata-se de instrumento
financeiro para que os destinatários da arrecadação, os Municípios, adotem políticas
em prol da preservação do meio ambiente. Neste caso, a medida poderia estar
inserida no que vem sendo convencionado de forma mais abrangente como
extrafiscalidade183, porém não se confunde com a sua manifestação enquanto
espécie, sujeita ao regime tributário.
Finalmente, no que se refere ao ITCMD, encontra-se na lei instituidora desse
imposto (Lei Estadual n. 14.941/03) a existência de normas que preveem isenção com
finalidade indutora, dentre elas aquela concedia à doação de bem imóvel pelo poder
público com o fim de atrair empresas industriais e comerciais para determinado
Município, ou ainda aquelas doações vinculadas a programa de incentivo ao esporte
ou a programa de incentivo à cultura. Nestas situações, o objetivo da isenção é
incentivar a adoção de determinadas condutas, desonerando as operações para que
possam ser alcançados fins socialmente relevantes nos campos da atração de
investimentos, incentivo ao esporte e promoção da cultura.
4.3.3 Extrafiscalidade quanto às Taxas
A legislação tributária do Estado de Minas Gerais prevê inúmeros tipos de taxas
cobradas em razão do exercício do poder de polícia ou pela prestação de serviço
público específico e divisível. Coube ao Decreto Estadual n. 38.886/97 reunir e
regulamentar as principais taxas estaduais184, que podem ser assim listadas: taxa de
183 Esta, inclusive, a posição de Alexandre Costa para quem “quando abordamos o aspecto finalístico
da utilização de recursos tributários, que se dá através do emprego dos mesmos, buscando determinados fins e com o propósito de influir nos domínios de ciências como a economia, sociologia e a política, não somente com utilização de benefícios na origem da incidência tributária, mas também direcionado a distribuição dos recursos arrecadados, estamos empregando a extrafiscalidade de uma forma ampliada” (COSTA, 2008, p. 21).
184 Artigo 3º do Decreto Estadual n. 38.886/97.
123
expediente; taxa florestal; taxa judiciária; taxa de segurança pública; taxa de
licenciamento para uso ou ocupação da faixa de domínio das rodovias; taxa de
controle e fiscalização ambiental do Estado de Minas Gerais; taxa de fiscalização
judiciária; custas judiciais; emolumentos relativos aos atos notariais e de registro; taxa
de controle, monitoramento e fiscalização das atividades de pesquisa, lavra,
exploração e aproveitamento de recursos minerários (TFRM); e taxa de fiscalização
sobre serviços públicos de abastecimento de água e saneamento (TFAS). Cada
espécie tem, por sua própria designação, uma atribuição específica e designa a
atuação estatal referida ao seu objeto.
Importante notar que a competência em matéria de taxas está adstrita à
necessária existência da competência administrativa, sem a qual não poderá o ente
político exercer função ou regulação que não lhe tenha sido reservada pela
Constituição. Ao Estado de Minas Gerais compete, portanto, a instituição das taxas
que perpassam a sua competência material, não podendo se descuidar desse
indispensável requisito.
Igualmente digno de observação é a circunstância de que a taxa - enquanto
espécie tributária cobrada em razão da atividade estatal - está justificada no caráter
contraprestacional ou sinalagtmático que lhe é intrínseco. Ao admitir a utilização das
taxas com função indutora, o que se faz é alterar o critério que legitima a sua cobrança,
para autorizar que sejam exigidas com base na necessidade de intervenção estatal
sobre o Domínio Econômico. Não se desnatura, com isso, a própria estrutura das
taxas, que continuam a ter por fato gerador uma atuação estatal específica ao
contribuinte. No entanto, admite-se a graduação do seu montante para provocar
estímulo ou desestímulo a condutas individuais, sempre com objetivo de que sejam
alcançados fins constitucionalmente relevantes.
A seguir, são examinadas as principais taxas instituídas pelo Estado de Minas
Gerais em que se identifica potencial emprego da norma tributária indutora.
Começando pela taxa de expediente, trata-se de modalidade cobrada sobre o
exercício de atividades especiais dos organismos do Estado, relativamente ao
licenciamento e ao controle de ações que interessam à coletividade, e sobre as
atividades praticadas por pessoas físicas ou jurídicas, controladas por repartições ou
124
autoridades estaduais185. É exigida ainda, de forma genérica, sobre a utilização,
efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível prestado ao contribuinte
ou posto à sua disposição186. O seu montante varia conforme o tipo de expediente que
está sendo praticado, apesar de que na maioria dos casos é cobrada no valor de até
R$ 500,00. Nesse sentido, chama a atenção que o expediente descrito como ‘análise
dos pedidos de importação, com diferimento do ICMS, de mercadoria destinada a
integrar o ativo permanente do adquirente’, e também de ‘análise de pedido de
alteração de despacho autorizativo de importação com diferimento do ICMS’, são
tributados no montante de R$ 1.300,56, superando o patamar fixado para a maioria
dos expedientes. Embora tenham sido identificados outros serviços públicos cuja
cobrança se dá em valor maior que o descrito, não se pode deixar de notar um
possível intento extrafiscal por parte do ente público ao exigir taxa com valor majorado
para criar um obstáculo à importação de mercadorias. Tal hipótese, contudo, deve ser
logo descartada, dada a circunstância de não contarem os Estados com competência
administrativa ou reguladora para dispor sobre comércio exterior, aliado ao fato da
taxa ser cobrada exclusivamente sobre casos envolvendo diferimento do ICMS, o que
não alcançaria as demais importações normalmente tributadas. Além do mais, apenas
pelo valor em cobrança não é possível mensurar se a exigência estaria desvinculada
da razoável equivalência a justificar a cobrança da contraprestação187.
Outra espécie de taxa em que se vislumbra um potencial uso extrafiscal seria
aquela do tipo ‘judiciária’, que é cobrada pela ação, a reconvenção ou processo
judicial, contencioso ou voluntário188. Ao analisar os dispositivos que fundamentam a
sua exigência, identifica-se hipótese de isenção às habilitações para casamento,
indicando uma possível intenção do legislador em incentivar a constituição da família.
Se diz possível por vislumbrar o fim constitucional específico através da previsão
contida no artigo 226 do texto constitucional, que estipula a família como base da
sociedade e detentora de especial proteção do Estado. Ou seja, ao se isentar as
habilitações para casamento do pagamento da taxa se está perseguindo finalidade
constitucional e ao mesmo tempo induzindo os indivíduos a se unirem em matrimônio
185 Visando a preservação da saúde, higiene, ordem, costumes, tranquilidade pública e da garantia
oferecida ao direito de propriedade (artigo 5º, inciso I, alínea “b” do Decreto Estadual n. 38.886/97). 186 Artigo 5º, inciso II do Decreto Estadual n. 38.886/97. 187 Em todo o caso, como demonstrado, trata-se de valor que supera em muito a taxa cobrada em
outros expedientes, de descrição e execução até mais complexa. Á míngua de outros elementos mais concretos, não é possível afirmar como o Estado chegou a esse valor.
188 Artigo 17 do Decreto Estadual n. 38.886/97.
125
sem que sejam onerados por esse fato. Por outro lado, há que se levar em conta que
o parágrafo 1º do citado artigo 226 estabelece que o casamento é civil e gratuita a sua
celebração. Neste caso, não caberia à norma estadual dispor de forma diferente,
estando adstrita à regra de imposição constitucional. Sobre essa situação em
particular, pode ser dito que o intento extrafiscal estaria prefigurado
constitucionalmente.
Cita-se ainda, dentro da análise que está sendo desenvolvida, a taxa de
segurança pública, cuja cobrança é feita pela utilização de serviços específicos e
divisíveis, prestados pelos órgãos da administração estatal, ou colocados à disposição
de pessoas físicas ou jurídicas cujas atividades exijam do poder público estadual
permanente vigilância policial ou administrativa189. A taxa é exigida ainda pela
utilização de serviços prestados pelo Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais190,
além da utilização potencial do serviço de extinção de incêndios191. Interessa, para
efeito de identificação da existência de norma tributária indutora, voltar-se às inúmeras
isenções192 concedidas aos atos e documentos relativos às promoções de caráter
recreativo193, aos estabelecimentos de interesse turístico194, ao funcionamento de
estabelecimento teatral ou de exibição de películas cinematográficas, e os eventos
esportivos profissionais e amadores realizados no Estado. Todas essas hipóteses
exoneradas pelo legislador são revestidas de marcantes aspectos culturais, artísticos
e esportivo, sobre os quais detêm o Estado competência reguladora e incumbência
constitucional na sua facilitação de acesso. Por isso é que se diz que a norma atuaria
de forma a estimular condutas que levassem à promoção de tais eventos ou que se
tornassem mais acessíveis à população em geral. Outro caso de destaque seria
relativo à peculiaridade envolvendo a cobrança pela utilização do serviço de extinção
de incêndio. Sobre essa hipótese, dispõe o regulamento que não será considerado
para efeito de cobrança na área do imóvel sob risco de incêndio e pânico, edificada
ou não, aquelas áreas destinadas a jardinagem, reflorestamento e mata nativa. É
evidente, por sua própria natureza, que tais espaços (não edificados) estão
189 Visando à preservação da segurança, da tranquilidade, da ordem, dos costumes e das garantias
oferecidas ao direito de propriedade (artigo 24, inciso I, Decreto Estadual n. 38.886/97). 190 Sempre que o interesse do particular predominar sobre o interesse público (artigo 24, inciso III,
Decreto Estadual n. 38.886/97). 191 Artigo 24, inciso IV, Decreto Estadual n. 38.886/97. 192 Artigo 27 do Decreto Estadual n. 38.886/97. 193 Desde que o total da renda seja destinado a instituições de caridade, devidamente reconhecidas. 194 Assim considerados pelos órgãos competentes do Estado, desde que registrados na Empresa
Brasileira de Turismo (EMBRATUR).
126
suscetíveis à propagação de incêndio, mas foram excluídas da cobrança como forma
de servir de incentivo financeiro a que sejam preservadas e não exploradas para uso.
Seguindo adiante, destacam-se como possíveis e relevantes mecanismos
indutores alinhados com o escopo ambiental a taxa de controle e fiscalização
ambiental do Estado de Minas Gerais (TFAMG), prevista na Lei Estadual n. 14.940/03,
e a taxa de controle, monitoramento e fiscalização das atividades de pesquisa, lavra,
exploração e aproveitamento de recursos minerários (TFRM), instituída pela Lei
Estadual n. 19.976/11. Em ambos os casos chama a atenção a forma em que foi fixado
o valor da taxa, que não é necessariamente cobrada em função do custo da atividade
estatal (ou uma razoável equivalência a esta). Antes, os critérios que legitimam a sua
cobrança – e o montante a elas atribuído - somente poderia ser justificado ante a
necessidade de proteção ao meio ambiente, que se faz através da intervenção do
Estado sobre o Domínio Econômico.
A TFAMG tem por fato gerador o exercício regular do poder de polícia conferido
à Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) e o Instituto Estadual de Florestas
(IEF), para controle e fiscalização de atividades potencialmente poluidoras e
utilizadoras de recursos naturais195. Embora as pessoas físicas sejam contribuintes
em potencial desta espécie, desde a data da sua instituição não é exigido valor algum
em relação a elas a esse título por motivo de isenção concedida na legislação. Em
relação às pessoas jurídicas, o legislador optou por determinar o valor da taxa de
forma escalonada, de acordo com o porte da empresa196 e segundo o grau do
potencial de poluição ou utilização dos recursos naturais197. As microempresas que
desenvolvem atividade enquadrada nos graus pequeno e médio, não estão sujeitas a
195 Artigo 6º da Lei Estadual n. 14.940/03. 196 Seguem definições de porte da empresa utilizadas pelo artigo 2º da Lei Estadual n. 14.940/03:
I- microempresa a pessoa jurídica ou o empresário, assim definido na Lei Federal n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, cuja receita bruta anual seja igual ou inferior ao limite estabelecido no inciso I do art. 3º. da Lei Complementar Federal n. 123, de 14 de dezembro de 2006; II- empresa de pequeno porte a pessoa jurídica ou o empresário, assim definido na Lei Federal n. 10.406, de 2002, cuja receita bruta anual se enquadre nos limites estabelecidos no inciso II do art. 3º. da Lei Complementar Federal n. 123, de 2006; III- empresa de médio porte a pessoa jurídica ou o empresário, assim definido na Lei Federal n. 10.406, de 2002, cuja receita bruta anual seja superior ao limite máximo estabelecido no inciso II do art. 3º. da Lei Complementar Federal n. 123, de 2006, e igual ou inferior a R$12.000.000,00 (doze milhões de reais); IV- empresa de grande porte a pessoa jurídica ou o empresário, assim definido na Lei Federal n 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que tiver receita bruta anual superior a R$12.000.000,00 (doze milhões de reais).
197 Anexo III da Lei Estadual n. 14.940/03.
127
pagamento algum. A partir do grau alto, as microempresas passam a contribuir com
um valor trimestral de R$ 78,03 chegando até R$ 3.511,51 para as empresas de
grande porte198. Estranha notar que o porte da empresa não está necessariamente
relacionado ao custo da atuação estatal199. Ainda mais se for levado em conta que
determinadas pessoas físicas, apesar de estarem desoneradas, podem exercer
atividade poluidora ou utilizadora de recursos naturais em patamar muito superior ao
de inúmeras empresas. Outro ponto que gera indagação é se o grau poluidor ou
utilizador de recursos estaria a dimensionar o poder de polícia, o que não parece ser
igualmente certo. À toda evidência, o critério da razoável equivalência não estaria a
justificar a cobrança da taxa. Ao contrário, por se tratar de taxa com pretensão de
promover a proteção ambiental e o controle da poluição, razões de ordem extrafiscal
passam a legitimar a sua incidência e a instituição de um regime diferenciado de
tributação que pretende inibir condutas lesivas ao meio ambiente. Isso ocorre pelo fato
de taxas mais brandas e uniformes não atingirem com a mesma intensidade diferentes
níveis de contribuintes. Para que empresas de maior porte venham a adotar práticas
mais sustentáveis, revela-se necessário que o encargo tributário seja mensurado de
acordo com a sua capacidade de absorver o custo do tributo e mesmo assim sustentar
a sua posição concorrencial. Quanto menor for o valor da taxa, menos estará inclinada
a adotar o comportamento pretendido pelo legislador e mais prejudicadas serão as
empresas de menor porte que dificilmente poderão competir em igualdade de
condições200. Além de buscar a proteção do meio ambiente e o controle da poluição,
pretende alcançar esse objetivo com proteção à neutralidade concorrencial. Em
síntese, a TFAMG apresenta em sua estrutura elementos que permitam identificar a
existência - ainda que potencial - de norma tributária indutora.
Cenário semelhante pode ser encontrado no tratamento da TFRM, que se
198 Vale ressaltar que o valor da taxa é fixado em Ufemgs e que, para o exercício de 2017, foi
estabelecida em R$ 3,2514, conforme a Resolução do Estado de Minas Gerais n. 4.952/2016. 199 Convém salientar que esta não é a posição do Supremo Tribunal Federal, que em mais de uma
oportunidade salientou a possibilidade de que a taxa utilizasse base própria de tributo, desde que não verificada identidade integral entre uma base e a outra. Aliás, em caso envolvendo a própria TFAMG, decidiu por ocasião do ARE n. 896.740 AgR/MG que o fato do legislador ter eleito como base da taxa o porte da empresa não causaria afronta ao entendimento já manifestado por aquela Corte.
200 E não se diga que se trata de uma imposição decorrente da sua capacidade contributiva, que, em princípio, tem a sua aplicação mitigada quanto às taxas. O princípio que as informa, em regra, é do sinalagma, que impõe uma cobrança alinhada com a razoável equivalência entre a prestação e o custo da atuação estatal.
128
refere a taxa que tem como fato gerador201 o exercício regular do poder de polícia
sobre a atividade de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento, realizada no
Estado, de determinados recursos minerários202. Segundo estabelece a sua lei
instituidora, não será exigido o pagamento a esse título por parte da empresa com
receita bruta anual igual ou inferior a R$ 5.364.810,00. Em contraposição, as demais
empresas estão sujeitas ao recolhimento da taxa à razão de R$ 3,2514203 por tonelada
de minério. Não há razão jurídica aparente para que empresas de menor faturamento
sejam desoneradas da taxa, até porque exercem atividades semelhantes àquelas que
auferem maior receita bruta e exigem do Estado a mesma iniciativa de fiscalização.
Somente por razões de intervenção no domínio econômico é que se pode justificar e
legitimar a distribuição de encargos diferenciados entre contribuintes que exigem do
Estado atuação semelhante. Convêm salientar que por ocasião da sua própria
formulação, a redação original do artigo 7º, inciso I da Lei Estadual n. 19.976/11,
dispunha que os recursos minerários que fossem destinados à industrialização no
próprio Estado204 estariam isentos do pagamento da taxa. Não há dúvidas, portanto,
que o objetivo era incentivar o crescimento da indústria mineira, já que o exercício do
poder de polícia não deixaria de ser realizado neste caso. A feição indutora da taxa
não desperta maiores indagações, porém quanto à finalidade que lhe dá suporte
existem sérios questionamentos a respeito da sua constitucionalidade, o que motivou
o ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.785 perante o Supremo
Tribunal Federal205. Dentre os argumentos apresentados pela entidade responsável
pela ação, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), constam as alegações de que
a base de cálculo da TFRM seria própria de imposto e que as projeções de
201 Artigo 1º da Lei Estadual n. 19.976/11. 202 São eles a bauxita, metalúrgica ou refratária; terras-raras; minerais ou minérios que sejam fonte,
primária ou secundária, direta ou indireta, imediata ou mediata, isolada ou conjuntamente com outros elementos químicos, de chumbo, cobre, estanho, ferro, lítio, manganês, níquel, tântalo, titânio, zinco e zircônio.
203 Vale ressaltar que o valor da receita bruta para fins de isenção e de recolhimento da taxa, são fixados em Ufemgs e que, para o exercício de 2017, esta foi estabelecida em R$ 3,2514, conforme a Resolução do Estado de Minas Gerais n. 4.952/2016.
204 Salvo quando destinados a acondicionamento, beneficiamento ou pelotização, sinterização ou processos similares.
205 Dentre os argumentos apresentados pela entidade responsável pela ação, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), suscita-se que a base de cálculo da TFRM seria própria de imposto e as projeções de arrecadação do tributo superariam o total de despesas realizados nos últimos anos pelas Secretarias de Estados envolvidas no exercício do poder de polícia. Tal alegação apenas confirma que se trata de taxa que encontra não encontra sua justifica no princípio da razoável equivalência. Resta saber se o Supremo se incumbirá de analisar a questão sob a ótica de legitimação da taxa (e seu valor) através da necessidade de intervenção do Estado sobre o Domínio Econômico.
129
arrecadação do tributo superariam o total de despesas realizados nos últimos anos
pelas Secretarias de Estados envolvidas no exercício do poder de polícia. A se
confirmar que o produto da arrecadação não possui, em tese, correspondência com o
custo da atuação estatal, confirma-se a suposição de que não se trata de taxa que
encontra sua justifica no princípio da razoável equivalência. Resta saber se o Supremo
se incumbirá de analisar a questão da legitimação da taxa (e seu valor) pela ótica da
necessidade de intervenção do Estado sobre o Domínio Econômico.
Quanto às demais taxas estaduais analisadas, não foi possível identificar
nenhum traço marcante de extrafiscalidade a justificar uma atuação interventiva do
Estado.
4.3.4 Resultados encontrados a partir da análise desenvolvida
Concluída a análise proposta, verificou-se que o Estado de Minas Gerais possui
importantes iniciativas em torno da utilização do tributo com função indutora ou
extrafiscal. Dentre elas, destaca-se a previsão na legislação tributária de redução da
base de cálculo do IPVA para veículos movidos, exclusivamente, a álcool etílico
hidrato combustível; a possibilidade de dedução dos recursos aplicados em projetos
culturais da base de cálculo do ICMS; a alíquota mais gravosa de ICMS (25%) para
cigarros e grande parte das bebidas alcóolicas, além de armas e munições; a alíquota
de ICMS reduzida de 14% para as operações com álcool para fins carburantes e de
27% para a gasolina com a mesma finalidade, sem falar nas alíquotas reduzidas de
7% para a energia elétrica destinada ao produtor rural para ser utilizada na atividade
de irrigação no período noturno, ou de 12% para determinadas máquinas, aparelhos
e equipamentos, utilizadas em processos industriais e de prestação de serviços.
Listam-se ainda as hipóteses de isenções, reduções da base de cálculo e créditos
presumidos em matéria de ICMS, cujo objetivo é incentivar condutas em prol da
cultura, educação, meio ambiente e saúde, bem como da atividade produtiva
(industrial, agrícola e agropecuária). Em relação ao ITCMD, encontra-se a isenção
concedida à doação de bem imóvel pelo poder público com o fim de atrair empresas
industriais e comerciais para determinado Município, ou ainda da isenção para
doações vinculadas a programa de incentivo ao esporte ou à cultura. Todas essas
iniciativas tem a capacidade de provocar estímulo a adoção de comportamentos
130
socialmente desejáveis, nas áreas de atuação em que o Estado detém competência
reguladora ou administrativa.
Quanto à introdução da norma tributária indutora na figura das taxas, outras
iniciativas foram identificadas na legislação mineira, embora mais discretas, como a
isenção da taxa judiciária para o processo de habilitação para casamento; ou as
isenções da taxa de segurança pública concedida aos atos e documentos relativos a
promoções de caráter recreativo, estabelecimentos de interesse turístico,
funcionamento de estabelecimento teatral ou de exibição de películas
cinematográficas e eventos esportivos profissionais e amadores realizados no Estado.
Ainda a despeito da conhecida ‘taxa de incêndio’ - submodalidade da taxa de
segurança pública - consta a previsão de que áreas de preservação ambiental não
ingressam no seu cálculo. Nestes casos, vislumbra-se potencial efeito indutor através
da concessão de incentivo fiscal para que sejam atingidos objetivos em áreas de
interesse social (meio ambiente, cultura, educação, turismo e entre outros).
Finalmente, tem-se exemplo mais próximo da extrafiscalidade na figura das taxas de
controle e fiscalização ambiental (TFAMG), e de controle, monitoramento e
fiscalização das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de
recursos minerários (TFRM), em que o montante cobrado não é necessariamente
fixado de acordo com o custo da atuação estatal, mas de forma a tornar mais ou
menos onerosas determinadas situações, resultando na intervenção estatal no
domínio econômico.
Todas essas medidas representam importante evolução na utilização da norma
tributária indutora como ferramenta de intervenção estatal. Apesar disso, considera-
se que as iniciativas ainda são bastante circunstanciais, isoladas e, por vezes, em
aparente conflito com outras normas da legislação estadual. Como exemplo dessa
última situação, tem-se o atual panorama da tributação das bebidas alcóolicas. A
graduação da sua alíquota é de 25%, com exceção das cervejas e chopes alcóolicos,
beneficiadas com alíquota reduzida de 23%. O RICMS/02206 estabelece, todavia, que
as microcervejarias, nas operações de vendas internas de cerveja e chope artesanais
produzidos pelo próprio estabelecimento207, são contempladas com benefício de
crédito presumido de forma que a carga tributária resulte em 8%. Vê-se, neste quesito,
que em alguns casos a produção de bebida alcóolica chega a ser incentivada pelo
206 Artigo 75, inciso XL, RICMS/02. 207 Desde que destinados a contribuinte do imposto.
131
Estado. Outra situação tanto atípica diz com a alíquota aplicável à incidência do ICMS
sobre a energia elétrica consumida pela classe comercial e para consumo residencial,
nos patamares, respectivos de 25% e 30%. Inclui-se também a alíquota majorada de
27% para serviços de comunicação. Nestes casos, certos bens reputados essenciais
à população estão sendo tributados mais gravemente que outros nocivos à saúde,
como os cigarros e as bebidas alcóolicas.
Além do mais, iniciativas em prol da proteção do meio ambiente e controle da
poluição, são bastante incipientes e pouco expressivas. Falta a definição de alíquotas
mais gravosas, tanto do IPVA como do ICMS, para veículos e produtos tóxicos e
poluentes. Poderia ainda ser implantada uma iniciativa coordenada de concessão de
incentivos ou benefícios fiscais a produtos cultivados sem agrotóxicos ou que utilizam
insumos recicláveis. Também caberia um benefício fiscal direcionado e específico ao
ICMS cobrado pelo serviço de transporte coletivo, evitando a circulação de maior
número de veículos e, consequentemente, reduzindo os índices de poluição. No
campo das taxas, seria impactante a instituição de espécie que tivesse por objeto a
fiscalização e controle das emissões de carbono, algo que parece estar alinhado com
o que vem sendo discutido em nível global e que ainda é pouco explorado no país.
Dada a competência reguladora do Estado sobre o controle da poluição, esta iniciativa
não teria que partir diretamente da União, podendo ser instituída pelas entidades
federadas.
Em relação à tributação do consumo, como já antecipado anteriormente, há
uma conivência e até incentivo à circulação de certas bebidas alcóolicas, como as
cervejas e chopes. Quanto ao cigarro, embora sujeito à alíquota de 25%, que é
superior à residual de ICMS, falta a implementação de um sistema misto de tributação
(alíquotas fixas e variáveis) ou simplesmente de alíquotas fixas, política que tem se
revelado mais bem sucedida na redução do consumo de tais bens (incluindo-se as
bebidas alcóolicas). No que se refere aos alimentos não saudáveis, apesar do tema
ser bastante controverso, inclusive entre os pesquisadores, inexiste uma política fiscal
coordenada no âmbito do Estado de Minas Gerais que procure tratar do assunto.
Quando muito, alguns alimentos são contemplados com benefícios fiscais ou
alíquotas reduzidas208, sem que seja analisado a sua prejudicialidade ou não para a 208 É o caso do arroz, feijão, fubá de milho, farinha de milho e farinha de mandioca, quando de produção
nacional, contemplado com alíquota de 12% de ICMS (artigo 42, inciso I, alínea “b”, subalínea “b.1”, RICMS/02).
132
saúde humana. A única exceção, talvez, seria na isenção de ICMS concedidas à
determinadas frutas frescas209 e a outros vegetais ou legumes, tais como abóbora,
abobrinha, batata-doce, berinjela, beterraba, brócolis, cará, couve-flor, espinafre e
entre outros. De nada adianta, todavia, isentar determinados produtos, considerados
saudáveis, enquanto outros menos saudáveis continuam com preços mais
competitivos e diante de uma tributação marcantemente arrecadatória com alíquotas
nominais. Os refrigerantes, a título de exemplo, apenas estão sujeitos a uma alíquota
mais gravosa, acaso importados de países não-membros do Acordo Geral de Tarifas
e Comércio (GATT)210. Todos os demais produtos dessa natureza estão sujeitos à
alíquotas mais modestas de ICMS, consideradas residuais. Por isso é que se fala que
nesse campo há que se alinhar uma política pública que busque evitar tais
desequilíbrios.
Em outros campos de atuação reguladora e administrativa do Estado, a
extrafiscalidade tem sido discreta e pouco explorada. Não foi possível identificar um
conjunto coordenado de medidas que tenham por objeto incentivar condutas em prol
do desenvolvimento da ciência, tecnologia, pesquisa e inovação; ou da proteção de
documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural; além da
expansão no campo da saúde e na preservação das florestas, fauna e flora; áreas
estas em que se vislumbra a relevância de uma tributação com fins indutores.
209 Anexo I, item 12, alínea “j”, RICMS/02. 210 Artigo 42, inciso I, alínea “a”, subalínea “a.2”, RICMS/02.
133
5 CONCLUSÃO
A partir da Ciência das Finanças se identifica fenômeno que consiste na adoção
pelo Estado de uma série de medidas que tem por objetivo influir sobre a conjuntura
econômica, corrigindo depressões econômicas e pretendendo modificar estruturas
subdesenvolvidas. Abandona-se, neste mister, a orientação em torno das ‘finanças
neutras’, que se limitam a apregoar uma posição eminentemente conservadora do
Estado, para assumir a das ‘finanças funcionais’, que defende a utilização dos
instrumentos financeiros para fins ‘extrafiscais’.
As finanças funcionais ou extrafiscais colocam em evidência a atividade
financeira estatal dirigida para a intervenção sobre a economia. Dentre os meios que
se utiliza o Poder Público para alcançar tal objetivo, destaca-se o tributo como
relevante instrumento de atuação.
O desafio do Direito passa a ser, portanto, desvendar se a utilização do tributo
com fins ‘extrafiscais’, ou simplesmente extrafiscalidade, reclama tratamento jurídico
diferenciado e se possui alguma qualificação que justifique seja estudado sob essa
ótica.
Parte do problema na resolução dessa questão reside na circunstância de que
grande parte dos juristas define a extrafiscalidade a partir de conceito extraído da
ciência das finanças, isto é, como forma de tributação que não está prioritariamente
relacionada ao objetivo do Estado em arrecadar recursos para fazer frente às
despesas públicas. Ao assim proceder, descuida-se dos necessários contornos
jurídicos que devem existir para que se reclame tratamento jurídico diferenciado.
Vem se desenvolvendo, contudo, corrente que enxerga na extrafiscalidade a
utilização do tributo como mecanismo de indução de comportamentos para que sejam
atingidos fins juridicamente relevantes. Trata-se de concepção em torno da
extrafiscalidade enquanto espécie, também conhecida como norma tributária indutora,
que contempla todos os casos em que o instrumento tributário estaria sendo utilizado
para regular, modificar, direcionar, desestimular o comportamento dos cidadãos com
o firme propósito de buscar a intervenção sobre o domínio econômico.
Para que seja identificada a norma tributária indutora no plano jurídico, não
basta recorrer à sua finalidade (ou efeitos) e tampouco à sua função (assim
compreendida dentro de uma visão pragmática). Ao contrário, há que conjugar a
finalidade perseguida pelo legislador - que se encontra lastreada em fim delineado
134
pela Constituição - com a função indutora de comportamentos exercida pelo comando
da norma. A esse respeito, sublinhou-se que a norma tributária indutora não se trataria
de espécie normativa nova, mas mero desdobramento ou extensão da norma de
conduta, tal qual classificação proposta pela teoria positivista. A sua finalidade teria a
incumbência de servir como fundamento de validade jurídica, devendo ser observado
que ao ser invocada razão distinta para instituição de determinado tributo, há que ser
buscado no ordenamento causa que legitima a sua cobrança. Especificamente no
caso da norma tributária indutora, a causa que justifica a sua existência está na
necessidade de intervenção do Estado sobre o Domínio Econômico.
Em se tratando de intervenção estatal, pressupõe-se que a pessoa política que
pretenda instituir norma com intento extrafiscal cumule competências constitucionais,
tanto em matéria reguladora como tributária. Com exceção da contribuição de
melhoria, as demais espécies tributárias analisadas - impostos e taxas - coadunam
com o regime da norma tributária indutora.
Sem embargo, não só a competência reguladora é que justifica a instituição de
norma com intento extrafiscal, senão também a competência administrativa acometida
às entidades políticas legitimam essa especial atuação. Isso em razão de se tratar de
importante atribuição conferida às pessoas políticas para que possam modificar a
ordem econômica e social existente.
Ao proceder à análise da extrafiscalidade aplicada aos Estados-membros,
identificaram-se limites a essa atuação do tipo quantitativo, dada a aglutinação de
competências em torno da União, como também restrições impostas pela interferência
do poder central na regulação de alguns aspectos relacionados aos tributos de
competência dos demais entes. Além do mais, especificamente em relação aos
Estados, a sua atuação em matéria reguladora seria meramente supletiva, o que
impede que edite normas que possam produzir efeitos de alcance nacional ou que
provoquem o desequilíbrio da federação (impera a necessidade de preservação da
integração econômica e unidade nacional). Isso não significa que não possam os
Estados exercer a intervenção sobre o Domínio Econômico, utilizando-se do tributo
como instrumento de ação, mas apenas que determinadas cauteladas devem ser
adotadas para que a sua atuação se restrinja ao interesse local.
Nesse sentido, é possível dizer que atribuição reguladora conferida à União
para a edição de normas gerais não significa que tenha sido desprezado o papel dos
Estados no exercício da competência suplementar. Pode-se, inclusive, enxergar
135
referida situação de modo inverso, à medida em que a União caberá regular
exclusivamente aquilo que tenha relevância nacional e aos demais entes federados
todo o resto, promovendo-se verdadeira descentralização na competência legislativa.
Analisando-se os campos de atuação reguladora do Estado, identificou-se a
partir das posições doutrinárias existentes potencial emprego da norma tributária
indutora em áreas como a proteção ao meio ambiente e o controle da poluição; ou da
produção e consumo; e em menor medidas para fins de proteção do patrimônio
histórico, artístico e cultural; o acesso à cultura, educação, ciência, tecnologia,
pesquisa e inovação; entre outros temas.
Diante dessas constatações e assumidos tais pressupostos teóricos, passou-
se a se referir à legislação tributária do Estado de Minas Gerais para saber como e
em que medida a extrafiscalidade estaria sendo aplicada, ou mesmo se é que estaria
sendo utilizada.
O resultado da investigação proposta foi de que o Estado possui importantes
iniciativas em torno da utilização do tributo com função indutora ou extrafiscal, e vem
se utilizando da norma tributária indutora para perseguir fins constitucionalmente
relevantes dentro da sua área de atuação reguladora e administrativa.
Dentre essas iniciativas, destacou-se a previsão na legislação tributária de
redução da base de cálculo do IPVA para veículos movidos, exclusivamente, a álcool
etílico hidrato combustível; a possibilidade de dedução dos recursos aplicados em
projetos culturais da base de cálculo do ICMS; a alíquota mais gravosa de ICMS (25%)
para cigarros e grande parte das bebidas alcóolicas, além de armas e munições; a
alíquota de ICMS reduzida de 14% para as operações com álcool para fins
carburantes e de 27% para a gasolina com a mesma finalidade, sem falar nas
alíquotas reduzidas de 7% para a energia elétrica destinada ao produtor rural para ser
utilizada na atividade de irrigação no período noturno, ou de 12% para determinadas
máquinas, aparelhos e equipamentos, utilizadas em processos industriais e de
prestação de serviços. Listou-se ainda as hipóteses de isenções, reduções da base
de cálculo e créditos presumidos em matéria de ICMS, cujo objetivo é incentivar
condutas em prol da cultura, educação, meio ambiente e saúde, bem como da
atividade produtiva (industrial, agrícola e agropecuária). Em relação ao ITCMD,
encontrou-se isenção sendo concedida à doação de bem imóvel pelo poder público
com o fim de atrair empresas industriais e comerciais para determinado Município, ou
ainda da isenção para doações vinculadas a programa de incentivo ao esporte ou à
136
cultura. Todas essas iniciativas tem a capacidade de provocar estímulo a adoção de
comportamentos socialmente desejáveis, nas áreas de atuação em que o Estado
detém competência reguladora ou administrativa.
Em relação à figura das taxas, identificou-se a existência de regime de norma
tributária indutora na legislação mineira através de iniciativas que procuram alcançar
intento extrafiscal, como a isenção da taxa judiciária para o processo de habilitação
para casamento; ou as isenções da taxa de segurança pública concedida aos atos e
documentos relativos a promoções de caráter recreativo, estabelecimentos de
interesse turístico, funcionamento de estabelecimento teatral ou de exibição de
películas cinematográficas e eventos esportivos profissionais e amadores realizados
no Estado. Ainda a despeito da conhecida ‘taxa de incêndio’ - submodalidade da taxa
de segurança pública –, constatou-se a previsão de que áreas de preservação
ambiental não ingressam no seu cálculo. Nestes casos, vislumbra-se potencial efeito
indutor através da concessão de incentivo fiscal para que sejam atingidos objetivos
em áreas de interesse social (meio ambiente, cultura, educação, turismo e entre
outros). Finalmente, tem-se exemplo mais próximo da extrafiscalidade na figura das
taxas de controle e fiscalização ambiental (TFAMG), e de controle, monitoramento e
fiscalização das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de
recursos minerários (TFRM), em que o montante cobrado não é necessariamente
fixado de acordo com o custo da atuação estatal, mas de forma a tornar mais ou
menos onerosas determinadas situações, resultando na intervenção estatal no
domínio econômico.
Todas essas medidas representam importante evolução na utilização da
extrafiscalidade ou da norma tributária indutora como ferramenta de intervenção
estatal. Apesar disso, considerou-se que as iniciativas ainda são bastante
circunstanciais, isoladas e, por vezes, em aparente conflito com outras normas da
legislação estadual. Como exemplo dessa última situação, tem-se o atual panorama
da tributação das bebidas alcóolicas. A graduação da sua alíquota é de 25%, com
exceção das cervejas e chopes alcóolicos, beneficiadas com alíquota reduzida de
23%. A legislação estabelece, todavia, que as microcervejarias, nas operações de
vendas internas de cerveja e chope artesanais produzidos pelo próprio
estabelecimento, são contempladas com benefício de crédito presumido de forma que
a carga tributária resulte em 8%. Vê-se, neste quesito, que em alguns casos a
produção de bebida alcóolica chega a ser incentivada pelo Estado.
137
Outra situação um tanto atípica diz com a alíquota aplicável à incidência do
ICMS sobre a energia elétrica consumida pela classe comercial e para consumo
residencial, nos patamares, respectivos de 25% e 30%. Inclui-se também a alíquota
majorada de 27% para serviços de comunicação. Nestes casos, certos bens
reputados essenciais à população estão sendo tributados mais gravemente que outros
nocivos à saúde, como os cigarros e as bebidas alcóolicas.
A realidade das alíquotas de imposto desperta verdadeira preocupação, até
porque, embora majorada em relação a determinados bens (como os nocivos à
saúde), não se sabe, à míngua de outros elementos, se o seu patamar é suficiente
para provocar um expressivo agravamento ao dever fiscal que provoque indução de
comportamentos. Esta, contudo, vale dizer, não é uma questão que aflige apenas o
ICMS mineiro, senão a extrafiscalidade como um todo. Se é sabido que a norma
tributária indutora procura criar uma indução na conduta dos indivíduos, discute-se até
que ponto a eficácia da norma seria relevante para justificar a sua existência.
Com relação às iniciativas em prol da proteção do meio ambiente e controle da
poluição, verificou-se serem bastante escassas e pouco expressivas. Falta a definição
de alíquotas mais gravosas, tanto do IPVA como do ICMS, para veículos e produtos
tóxicos e poluentes. Poderia ainda ser implantada uma iniciativa coordenada de
concessão de incentivos ou benefícios fiscais a produtos cultivados sem agrotóxicos
ou que utilizam insumos recicláveis. Também caberia um benefício fiscal direcionado
e específico ao ICMS cobrado pelo serviço de transporte coletivo, evitando a
circulação de maior número de veículos e, consequentemente, reduzindo os índices
de poluição. No campo das taxas, seria impactante a instituição de espécie que tivesse
por objeto a fiscalização e controle das emissões de carbono, algo que parece estar
alinhado com o que vem sendo discutido em nível global e que ainda é pouco
explorado no país. Dada a competência reguladora do Estado sobre o controle da
poluição, esta iniciativa não teria que partir diretamente da União, podendo ser
instituída pelas entidades federadas.
Em relação à tributação do consumo, como já antecipado anteriormente, há
uma conivência e até incentivo à circulação de certas bebidas alcóolicas, como as
cervejas e chopes. Quanto ao cigarro, embora sujeito à alíquota de 25%, que é
superior à residual de ICMS, falta a implementação de um sistema misto de tributação
(alíquotas fixas e variáveis) ou simplesmente de alíquotas fixas, política que tem se
revelado mais bem sucedida na redução do consumo de tais bens (incluindo-se as
138
bebidas alcóolicas). No que se refere aos alimentos não saudáveis, apesar do tema
ser bastante controverso, inclusive entre os pesquisadores, inexiste uma política fiscal
coordenada no âmbito do Estado de Minas Gerais que procure tratar do assunto.
Quando muito, alguns alimentos são contemplados com benefícios fiscais ou
alíquotas reduzidas, sem que seja analisado a sua prejudicialidade ou não para a
saúde humana. A única exceção, talvez, seria na isenção de ICMS concedidas à
determinadas frutas frescas e a outros vegetais ou legumes, tais como abóbora,
abobrinha, batata-doce, berinjela, beterraba, brócolis, cará, couve-flor, espinafre e
entre outros. De nada adianta, todavia, isentar determinados produtos, considerados
saudáveis, enquanto outros menos saudáveis continuam com preços mais
competitivos e uma tributação marcantemente arrecadatória com alíquotas nominais.
Os refrigerantes, a título de exemplo, apenas estão sujeitos a uma alíquota mais
gravosa, se importados de países não-membros do GATT. Todos os demais produtos
dessa natureza estão sujeitos à alíquotas mais modestas de ICMS, consideradas
residuais. Por isso é que se fala que nesse campo há que se alinhar uma política
pública que busque evitar tais desequilíbrios.
Nos demais campos de atuação reguladora e administrativa do Estado, a
extrafiscalidade tem sido discreta e pouco explorada. Não foi possível identificar um
conjunto coordenado de medidas que tenham por objeto incentivar condutas em prol
do desenvolvimento da ciência, tecnologia, pesquisa e inovação; ou da proteção de
documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural; além da
expansão de políticas no campo da saúde e na preservação das florestas, fauna e
flora; áreas estas em que se vislumbra a relevância de uma tributação com fins
indutores.
Outra questão que se diz da maior importância, trata dos conhecidos incentivos
fiscais que vem sendo concedidos pelo Estado de Minas Gerais em desacordo com
normas e preceitos constitucionais, bem como decorrentes da sua regulamentação
via lei complementar. Esta infringência pode se dar tanto em violação direta à regra
que estabelece a necessidade de deliberação dos Estados e do Distrito Federal para
que tais benefícios fiscais sejam concedidos ou revogados, como por pretender influi
em campo que escapa ao de sua competência material. Neste último caso, também
se encontram medidas contrárias, que consistem no agravamento fiscal de
determinada conduta para que seja inibida.
139
Na situação em que são concedidos benefícios fiscais em desacordo com
preceitos constitucionais, vale lembrar que não se trata de exclusividade verificada em
relação ao Estado de Minas Gerais, mas à praticamente todos os demais estados-
membros da federação. É o que se convencionou apelidar de ‘Guerra Fiscal’, que
consiste na extrafiscalidade em sua acepção perversa, ao pressupor a utilização do
instrumento tributário como ferramenta de atração de investimentos, porém em
prejuízo ao equilíbrio nacional211.
Por outro lado, também se verifica situação de infringência a normas
constitucionais nas hipóteses em que os Estados acabam transbordando a sua
atuação supletiva e residual para se imiscuir nas funções constitucionalmente
atribuídas à União. Em que pese existir nestas situações evidente intento extrafiscal,
as medidas não se justificam por não estarem alinhadas com objetivos constitucionais
legítimos.
De toda forma, a preocupação em torno do desvirtuamento da extrafiscalidade
não pode justificar, como pretendem alguns, que os Estados e o Distrito Federal sejam
tolhidos na sua incumbência de dar cumprimento às suas atribuições constitucionais,
inclusive através da utilização do tributo como instrumento de intervenção no Domínio
Econômico.
Afinal, o defeito não está no instituto em si, mas no mau uso que vem sendo
feito em relação a ele, o que exige o devido controle por parte dos órgãos
competentes.
211 Como exemplo dessa situação, cita-se a previsão contida no artigo 223 do Decreto Estadual n.
43.080/02, por meio do qual o Poder Executivo fica autorizado a adotar medidas “necessárias à proteção da economia do Estado”, sempre que outra unidade da Federação conceder benefício ou incentivo fiscal ou financeiro-fiscal em desacordo com o procedimento estabelecido na Constituição.
141
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