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Faculdade Boa Viagem/ DeVry Brasil Centro de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração - CPPA Mestrado Profissional em Gestão Empresarial Raíssa Braga Campelo Invisibilidade social e vulnerabilidade consumerista: a prática de crimes em busca de marcas exclusivas por pessoas de baixa renda Recife, 2015

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Faculdade Boa Viagem/ DeVry Brasil

Centro de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração - CPPA

Mestrado Profissional em Gestão Empresarial

Raíssa Braga Campelo

Invisibilidade social e vulnerabilidade consumerista: a prática de crimes em busca de

marcas exclusivas por pessoas de baixa renda

Recife, 2015

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FACULDADE BOA VIAGEM - DEVRY BRASIL

CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO EMPRESARIAL

CLASSIFICAÇÃO DE ACESSO A DISSERTAÇÕES

Considerando a natureza das informações e compromissos assumidos com suas fontes, o

acesso a dissertação do Mestrado Profissional em Gestão Empresarial - MPGE do Centro de

Pesquisa e Pós-Graduação em Administração – CPPA – da Faculdade Boa Viagem é definido

em três graus:

Grau 1: livre (sem prejuízo das referências ordinárias em citações diretas e indiretas);

Grau 2: com vedação a cópias, no todo ou em parte, sendo, em consequência, restrita a

consulta em ambientes de bibliotecas com saída controlada;

Grau 3: apenas com autorização expressa do autor, por escrito, devendo, por isso, o

texto, se confiado a bibliotecas que assegurem a restrição, ser mantido em local sob

chave ou custódia;

A classificação desta dissertação se encontra, abaixo, definida por seu autor.

Solicita-se aos depositários e usuários sua fiel observância, afim de que se preservem as

condições éticas e operacionais da pesquisa científica na área de administração.

Título da Dissertação: “INVISIBILIDADE SOCIAL E VULNERABILIDADE

CONSUMERISTA: A PRÁTICA DE CRIMES EM BUSCA DE MARCAS EXCLUSIVAS

POR PESSOAS DE BAIXA RENDA”.

Nome do(a) autor(a): Raíssa Braga Campelo.

Data da Aprovação: 03 de setembro de 2015.

Classificação conforme especificação acima:

Grau 1

Grau 2

Grau 3

Recife, 22 de setembro de 2015.

Assinatura do(a) Autor(a)

Raíssa Braga Campelo

X

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Invisibilidade social e vulnerabilidade consumerista: a prática de crimes em busca de

marcas exclusivas por pessoas de baixa renda

Dissertação apresentada ao programa de

mestrado em gestão empresarial, do Centro de

Pesquisa e Pós-Graduação em Administração

da Faculdade Boa Viagem - DeVry Brasil,

para obtenção do grau de Mestre, sob a

orientação da professora Dra. Janaína de

Holanda Costa Calazans.

Recife, 2015

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Catalogação na fonte - Biblioteca da Faculdade Boa Viagem - DeVry, Recife/PE

C193i Campelo, Raíssa Braga.

Invisibilidade social e vulnerabilidade consumerista: a prática de

crimes em busca de marcas exclusivas por pessoas de baixa renda /

Raíssa Braga Campelo. – Recife: FBV | DeVry 2015.

111 f.

Orientador(a): Janaína de Holanda Costa Calazans. Dissertação (Mestrado) Gestão Empresarial –Faculdade Boa

Viagem - DeVry.

Inclui apêndice

1. Consumidor. 2. Vulnerabilidade. 3. Violência social. 4.

Criminalidade. I. Título. DISS 658[15.1]

Ficha catalográfica elaborada pelo setor de processamento técnico da Biblioteca da FBV | DeVry

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Dedico esse trabalho aos seres humanos mais

incríveis: meus pais, Dilermando e Claudete,

com os quais aprendi e aprendo o significado

da vida, através da cristandade, humildade,

honestidade e dignidade praticada por eles.

Aos meus filhos, Will e Ana Witória, e ao meu

esposo, Antônio Sérgio, por tamanha

compreensão da minha corriqueira ausência e

pela demonstração de amor, carinho e orgulho,

que me fazem perseverar na busca dos meus

objetivos.

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AGRADECIMENTOS

Incialmente, ao Pai Eterno, Aquele que permanece ao meu lado em todas as horas, que fala

comigo como o mais íntimo amigo, que me dá bronca quando penso em desistir, que me

guarda e guarda os meus a cada minuto, que me faz forte quando me sinto fraca, que guia, a

cada momento, a minha mente, os meus passos, a minha fala... Deus, Querido Deus, a Ti toda

honra e glória!

Aos meus amados, Wil e Ana Witória, tudo é por eles. Que eles perdoem a minha ausência e

impaciência. A busca dos meus objetivos profissionais trouxe o ônus de não acompanhá-los

como gostaria, mas meu pensamento permanece interligado a cada um. Não tenho dúvidas de

que os assistirei como homem e mulher de bem, formados, tanto na profissão escolhida, como

na faculdade da vida. São para a minha vida o que os órgãos vitais significam para o meu

corpo.

Ao amor da minha vida, Sérgio, companheiro, amigo, marido, namorado, colega... não teria

conseguido alcançar nenhuma meta sem a sua pessoa. Pai e marido que permaneceu firme

nessas funções na minha ausência, e ainda disposto, com um sorriso no rosto, a me apoiar em

cada projeto pessoal. É um presente de Deus em minha vida, meu complemento.

Aos meus “Painho” e “Mainha”, Dilermando e Claudete, que além de me darem a vida,

perpetuam o cuidado e o amor por mim. Agradeço a Deus pela dádiva de ser filha deles, com

os quais aprendi os mais altos valores da vida: a cristandade, a humildade, a caridade, a

honestidade. Como sou grata a Deus por conceder o privilégio de ver meus filhos aprenderem

com eles as mesmas lições! Devo-lhes cada degrau alcançado e agradeço, emocionada, o

brilho visível em seus olhos, a cada conquista que obtenho. Meu amor é eterno e

incondicional!

Aos meus irmãos, fonte de inteligência e exemplos de garra e determinação: “Nanane”,

inspiração da escrita; “Pô”, modelo de racionalidade; Diogo, manual vivo do ser humano.

Agradeço por serem os meus irmãos, por me orgulharem por tão lindas caminhadas pessoais e

profissionais. Agradeço-lhes, ainda, pelos presentes que trouxeram ao mundo: por Matheus,

“Guinho”, João Pedro e Rafael; eles que são a continuidade da inteligência, da ternura, do

bom caráter e da determinação.

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À minha mestra, “Jana”, a “DIVA” dos seus alunos. Sua postura vai além de uma orientadora.

Profa. Dr

a. Janaína de Holanda Costa Calazans, que orgulho desse nome como minha

orientadora! Nome que farei questão de honrar e mencionar, a cada trabalho científico e em

cada passagem como orientadora. Mestra que tem meu respeito e admiração pela competência

aplicada na ciência, e por tamanha dedicação e profissionalismo com que trata seus alunos.

Feliz do aluno que passa por suas mãos de fada, que proporcionam o saber contínuo.

Agradeço por ter me aceito, por ter acreditado em mim!

À irmã que a vida me deu, Paula Rocha. Não há como agradecer tamanho apoio, imensurável.

Nossa relação profissional transborda esse sentido, fazendo com que sejamos irmãs da vida.

Sou privilegiada por sua convivência.

À minha mãe da vida, Perpétua Dantas. Como é bom sentir o afago dos seus braços protetores

e justos! Grata por eles me abraçarem desde o caminho da faculdade. O orgulho é

inestimável!

Ao pequeno grande “Arqui”, a quem agradeço os ensinamentos e o apoio profissional. Somos,

hoje, a grande equipe ICP!

Aos meus amigos-irmãos, contemporâneos de faculdade, em ordem alfabética: Diogo,

Eduardo, Isabel, Luciana, Monique, Nadilene, Patrícia, Raniere, Regina. Obrigada pelo

incentivo e pela torcida. Não há como subir um degrau sem lembrar deles. Amo cada um!

À minha grande parceira, “Verinha”, a quem enxergo como uma tia coruja, cuidadosa e

preocupada com o meu bem, agradeço por tudo!

À minha, inicialmente colega e, posteriormente, amiga, Tatiana, certamente todo sacrifício se

tornou mais leve na sua companhia.

Ao meu hoje amigo, Hélder França, um dos mais incríveis seres humanos que conheci,

agradeço tamanho apoio, que foi além das caronas solidárias.

Às minhas companheiras, Karla e Brenda, lamento termos conhecido-nos no final de tudo...

mas como valeu à pena conhecê-las! Espero que a nossa amizade perdure.

Aos caros colegas que convivi durante esse período, aos professores que se prontificaram a

compartilhar o saber e à coordenação do MPGE, os quais cumprimento em nome da estimada

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“Dorinha”, anjo de luz na vida dos que se permitiram aprender, não apenas a Metodologia

Científica, mas também o que vai além dela.

À Paulo Siqueira, diretor da Unidade Prisional, onde foi realizada a pesquisa, agradeço pela

sensibilidade, apoio e presteza.

À afilhada e amada Silmara, pela imensurável ajuda nas digitações dos slides dos trabalhos a

serem apresentados, nos ajustes de formatação, tudo com o brilho nos olhos de buscar me

ajudar para que sempre desse certo.

Aos caros estagiários e advogados, colegas de escritório, em especial Kelvin, pela valiosa

contribuição nos ajustes metodológicos, verdadeiros parceiros do dia a dia; alunos, demais

colegas de trabalho, amigos de longas e curtas datas e familiares, os meus agradecimentos.

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RESUMO

O presente trabalho retrata a análise da simetria entre o consumo e o crime, a partir do

contexto de uma sociedade moderna que impõe uma série de comportamentos que o indivíduo

adota como meio de sobrevivência social. Objetiva-se investigar a relação entre o consumo e

a criminalidade, a partir da apreciação crítica da vulnerabilidade do consumidor sujeito à

violência social, sob a perspectiva de invisibilidade. Nesse diapasão, o referencial teórico

discute os efeitos advindos da globalização moderna que alcançam, indubitavelmente, o

consumismo, em uma época em que a relação de consumo passou a ser uma necessidade de

cunho social, conquanto define a posição que se ocupa no espaço comunitário. Inexistir na

sociedade, em razão do consumo a que se propõe o cidadão, é um efeito devastador que atinge

os direitos inerentes ao homem, a ponto de ferir a dignidade da pessoa humana. A violência

social advém destes efeitos, considerando que é o ato oriundo da percepção de invisibilidade

do consumidor que se encontra fora dos grupos formados pela adesão à marca exclusiva. A

interpretação dos dados analisados indica que a força da exclusividade da marca não se

concentra apenas na definição da concorrência, indo além, quando se propõe a definir critérios

sociais dos indivíduos, contribuindo para o efeito da exclusão social, quando inclui,

seletivamente, consumidores que passam a ostentar uma condição de pertencimento que eleva

a autoestima, a ponto de incutir um sentimento de superioridade sobre aqueles que não se

fizeram incluir. A violência social permeia em um mercado de consumo agressivo que divide,

exclui, provoca sentimentos e eleva a essencialidade do consumo, não como necessidade da

aquisição de produtos, mas a necessidade de aquisição de posição social. O consumidor,

vulnerável por sua própria natureza, centro de direitos e garantias na legislação vigente que o

protege, passa a ser, na sociedade moderna, compelido a consumir, passando a ser alvo de

(in)visibilidade social.

Palavras-chave: Consumidor. Vulnerabilidade. Violência social. Criminalidade.

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ABSTRACT

The present work portrays the analysis of the symmetry between the consumption and the

crime, from the context of a modern society what imposes a series of behaviors which the

individual adopts as a means of social survival. It objective investigate the relationship

between the consumption and the criminality, as from the critical appreciation of consumer

vulnerability subject to the social violence, under the perspective of invisibility. In this

diapason, the theoretical reference discusses the effects arising from modern globalization

accessing doubtless, the consumerism, in a time when the consumer relationship passed

become a necessity of social imprint, while defines the position it that occupies in the

community space. Non-existence in the society on grounds of consumption to the which it

proposes the citizen, is a devastating effect which reaches the rights inherent to Man, to the

point of injure the dignity of the human person. The social violence comes from these effects,

considering it is the act originated of the perception of invisibility of the consumer that lies

outside of the groups formed by joining the exclusive brand. The interpretation of the

analyzed data indicates that the force of the exclusivity of the brand focuses not only on the

definition of competition, going beyond, when it proposes to define social criteria of

individuals, contributing to the effect of social exclusion, when includes, selectively,

consumers what begin to flaunt a belongingness condition that elevates the self-esteem to the

point of instill a sense of superiority over those who did not include. The social violence

permeates in an aggressive consumer market what divide, excludes, provokes feelings and

elevates the essentiality of consumption, not as necessity of acquisition of products, but the

necessity to acquisition of social position. The consumer, vulnerable by its very nature, center

of rights and guarantees in the current legislation that protects it, passes to be, in modern

society, compelled to consume, becoming the target of social (in) visibility.

Keywords: Consumer. Vulnerability. Social violence. Crime.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Registros de trabalhos científicos encontrados nos portais da Scielo e Capes....... 17

Quadro 2 - Caminho metodológico .......................................................................................... 50

Quadro 3 - Caminho metodológico ........................................................................................ 522

Quadro 4 - Contextualização metodológica ........................................................................... 588

Quadro 5 - Caminho metodológico ......................................... Erro! Indicador não definido.9

Quadro 6 - Caminho metodológico .......................................................................................... 60

Quadro 7 - Categorias temáticas ............................................................................................. 666

Quadro 8 - Análise entrevista x objetivos .............................................................................. 933

Quadro 9 - Análise entrevista x objetivos .............................................................................. 955

Quadro 10 - Análise entrevista x objetivos ............................................................................ 966

Quadro 11 - Análise entrevista x objetivos ............................................................................ 988

Quadro 12 - Análise entrevista x objetivos ............................................................................ 100

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 11

1.1 Contextualização da pesquisa .......................................................................................... 12

1.2 Problema de pesquisa ....................................................................................................... 14

1.3 Objetivos ............................................................................................................................ 14

1.3.1 Objetivo geral .................................................................................................................. 14

1.3.2 Objetivos específicos ...................................................................................................... 15

1.4 Justificativas da pesquisa ................................................................................................ 15

1.5 Estrutura da dissertação .................................................................................................. 17

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ...................................................................................... 19

2.1 Violência social e significações sociofilosóficas .............................................................. 19

2.1.1 Violência social em Hanah Arendt .................................................................................. 20

2.1.2 Invisibilidade como exclusão .......................................................................................... 22

2.1.3 Violência simbólica em Pierre Bourdieu ......................................................................... 24

2.2 O poder exclusivo da marca ............................................................................................ 26

2.2.1 Exclusividade: o que busca a marca? .............................................................................. 27

2.3 Direito consumerista: consumo x consumidor vulnerável ............................................ 28

2.3.1 Consumo x consumismo .................................................................................................. 29

2.3.2 Vulnerabilidade consumerista ......................................................................................... 32

2.3.2.1 Conceito genérico ......................................................................................................... 33

2.3.2.2 Conceito jurídico .......................................................................................................... 33

2.3.3 Vulnerabilidade aos olhos do CDC ................................................................................. 34

2.3.4 Proteção ao consumidor vulnerável: direito de inclusão ................................................. 36

2.3.5 Exclusividade da marca x exclusão do consumidor ........................................................ 36

2.3.6 Inclusão exclusiva: efeito da exclusividade da marca como violência social ................. 37

2.4 Legislação consumerista (in) eficaz na forma inibidora de consumo exacerbado ...... 40

2.4.1 A inclusão do consumidor como direito na legislação consumerista vigente ................. 40

2.5 A busca pela visibilidade social: caminho para o mundo do crime ............................. 42

2.5.1 O homem não nasce criminoso ........................................................................................ 44

2.5.2 Reprimenda do crime x políticas públicas consumeristas ............................................... 46

3 METODOLOGIA ................................................................................................................ 48

3.1 A escolha do método ......................................................................................................... 48

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3.2 Locus da pesquisa ............................................................................................................. 50

3.3 Sujeitos da pesquisa .......................................................................................................... 51

3.4 Técnica de coleta dos dados ............................................................................................. 53

3.5 Técnica de análise dos dados ........................................................................................... 57

3.6 Limites da pesquisa .......................................................................................................... 61

3.7 Limitações da pesquisa ..................................................................................................... 62

4 APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA .............. 65

4.1 Apresentação dos sujeitos pesquisados ........................................................................... 66

4.2 Análise e discussão das unidades de significado das categorias temáticas .................. 68

4.2.1 Presos detentores de baixa renda ..................................................................................... 68

4.2.2 Evidências de invisibilidade e inexistência social ........................................................... 73

4.2.3 A busca da inclusão através do consumo de marcas exclusivas ..................................... 81

4.2.4 Prática de crimes contra o patrimônio em busca de consumo ......................................... 87

4.3 Confirmação dos objetivos na análise dos dados ........................................................... 92

5 CONCLUSÕES ................................................................................................................ 1012

5.1 Percepção e experiência ................................................................................................. 105

5.2 Sugestões .......................................................................................................................... 106

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 107

APÊNDICE A – ROTEIRO DA ENTREVISTA INDIVIDUAL ..................................... 110

APÊNDICE B – TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE ENTREVISTA ............................. 111

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1 INTRODUÇÃO

Este capítulo conduz a apresentação do estudo em comento a partir da temática da pesquisa

realizada, a qual propõe uma investigação acerca do liame entre o consumo e o crime, no

sentido de constatar a relação entre a busca pelo consumo e a conduta criminosa.

A problematização do tema aponta a contextualização entre os fenômenos do consumo e da

criminalidade, perpassando por conceitos entrelaçados, na medida em que provoca o estudo

conceitual da vulnerabilidade consumerista e da invisibilidade social, bem como os seus

alcances na sociedade contemporânea, considerando os efeitos da necessidade do uso de

marcas exclusivas por pessoas detentoras de baixa renda.

Os objetivos se propõem a indagar, sob o ponto de vista reflexivo, de que maneira a

necessidade do consumo estimula a conduta criminosa e se alinham nessa perspectiva,

sugerindo a identificação, análise e investigação da proposta temática. Por fim, o presente

capítulo aponta as justificativas da pesquisa, no âmbito teórico ou prático, delineando sua

pertinência no campo científico e sua contribuição material, e conclui com a apresentação da

estrutura da dissertação.

A criminalidade é campo de estudo da pesquisadora que, na condição de advogada, é

militante na área. Também é membro do Instituto de Criminologia de Pernambuco e da

Comissão de Direitos Humanos da OAB/ PE – Caruaru, além de, como professora, ministrar

aulas das cadeiras atreladas ao direito penal.

Decerto, o aumento da criminalidade é tema de alcance nacional e até internacional. No

entanto, o que veio a inquietar a pesquisadora com a propositura do tema foi o fato do

crescente número de crimes contra o patrimônio e, ainda, os relatos informais dos autores dos

crimes, no sentido de atribuir a conduta à necessidade de consumo.

A ansiedade da pesquisadora em saber se, de fato, o consumo pode ser uma das causas que

leva à ocorrência dos crimes contra o patrimônio e, consequentemente, contribui para o

aumento dos números, resultou na formulação do objetivo geral da presente pesquisa.

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1.1 Contextualização da pesquisa

Analisa-se a vulnerabilidade do consumidor, considerando os efeitos do consumo na atual

sociedade, os quais impõem a necessidade do consumidor existir na sociedade, a partir da

inclusão de grupos, formados pelas marcas exclusivas. A atualidade evidencia a

vulnerabilidade social do consumidor que necessita ultrapassar o consumo básico para existir,

de fato, na sociedade.

Discute-se a imposição do consumo como uma vertente de violência social contra o

consumidor, que se vê compelido a consumir sob pena de inexistir socialmente, uma vez que,

sem estar inserido nos grupos norteadores do consumo, é inexistente perante a sociedade.

Discorre-se acerca do conceito de vulnerabilidade nas suas mais diversas vertentes, passando

pelo âmbito jurídico, com ênfase no direito consumerista, a partir do qual se discute a

repercussão do consumismo na sociedade e as consequências na vida do ser humano.

Contextualizam-se as vertentes temáticas do consumo e da criminalidade, fazendo uma alusão

à violência social, no sentido de se encontrar ou não inserida no contexto dos direitos e das

garantias direcionadas ao consumidor, quanto à proteção à vulnerabilidade social.

O debate acerca da violência social traz uma reflexão, indicando ser a mesma uma das causas

do efeito do consumo na atualidade, levando o consumidor a inexistir perante à sociedade

quando não consegue se incluir nos grupos caracterizados pela exclusividade da marca,

ratificando que a condição de existência social é a visibilidade através do consumo.

Indaga-se, nessa seara: qual o mecanismo a ser utilizado por pessoas detentoras de baixa

renda, para se fazerem inserir no mundo consumista?

O tema do presente trabalho surge a partir da percepção dos efeitos do consumismo imposto

pela sociedade, da exclusividade da marca na sociedade atual, aliada à inquietação no sentido

de identificar a necessidade de consumo para inclusão social. Seria a necessidade de consumo,

um meio de violência? Como buscar um poder aquisitivo que permita o consumo? Estariam

os crimes contra o patrimônio relacionados à necessidade de consumir?

O tema se contextualiza, ainda, na necessidade de identificar omissões e efeitos que

perpassam na relação de consumo, excluindo aquele que não tem acesso ao consumo exigido

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pela sociedade, chegando a buscar condições para tanto, através da violência, mais

precisamente através dos crimes contra o patrimônio.

A partir do conceito de violência social, analisa-se o consumo, perpassando pela

invisibilidade e vulnerabilidade a que estão sujeitos os consumidores, seja pela própria

condição vulnerável, seja pela discrepância entre a existência legal dos direitos e garantias e a

sua inaplicabilidade para o consumidor que convive em subinclusão social, sobretudo no

sentido de ser excluído no âmbito do consumo.

Investiga-se, a partir do tema proposto, se o consumo e a criminalidade se relacionam e se o

consumo, de fato, abre portas para o mundo do crime, além de verificar as formas de exclusão

do consumidor na vida social, afinal, a sociedade contemporânea exige a utilização do

consumo e exclui do contexto social o consumidor que não tem acesso às marcas exclusivas.

O tema advém, portanto, da inquietude de questionar a exclusão do consumidor como um dos

possíveis frutos da invisibilidade, analisando se a violência social e a criminalidade advêm,

também, da vulnerabilidade do consumidor, exposto à exclusão.

Em suma, o tema propõe a investigação de uma possível causa de violência por meio da

exclusão do consumo, verificando o reflexo da exclusividade da marca, no sentido de incluir o

público que se busca e, ao mesmo tempo, promover a exclusão das pessoas que detêm baixa

renda, gerando uma possível violência social, instigando a criminalidade. A causa que enseja

o conflito entre o direito de exclusividade da marca e o direito à inclusão social do

consumidor deve ser buscada por meio de uma análise do reflexo social que emerge.

O estudo do tema proposto se dá como uma busca de possível diagnóstico, sob a perspectiva

de indicadores que venham a demonstrar falhas e omissões no que concerne ao equilíbrio da

liberdade da exclusividade da marca e o direito de inclusão social do consumidor. Até que

ponto essa ótica de consumo na sociedade impõe a prática de violência e de criminalidade,

diante do reflexo da invisibilidade social?

A presente pesquisa busca identificar pessoas que, pelo consumismo, vieram a ser vítimas de

invisibilidade social e, como consequência, se dispuseram a praticar atos de violência, em

busca da oportunidade de consumir e se inserir no contexto social, previamente definido.

Analisando o presente tema sob a ótica da sua pertinência e viabilidade, segundo as

justificativas do presente estudo, abordadas em tópico próprio, uma vez identificada a relação

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entre o consumo e a criminalidade, é possível apontar uma causa do aumento de violência por

meio dos efeitos do consumo, viabilizando, efetivamente, mecanismos de novos pensares

acerca de estratégias sociais e governamentais voltadas à políticas públicas inovadoras que

venham a atingir o foco da questão.

Diante de todo contexto da pesquisa, a problemática que permeia a temática se debruça na

identificação da relação entre a criminalidade e o consumo, a partir da ocorrência da violência

social, sugerindo analisar se a necessidade imposta pelo consumo enseja a ocorrência do

crime, ao passo que se busca meios “eficazes” e “rápidos” para consumir.

Daí a percepção do olhar científico sobre o tema, considerando a necessidade de se investigar

a relação entre o consumo e a criminalidade.

1.2 Problema de pesquisa

A problemática consiste na investigação da relação entre consumo e criminalidade,

questionando se a necessidade do consumo implica em prática criminosa e indagando:

Considerando a invisibilidade social vivenciada por pessoas de baixa renda, de que forma a

necessidade do consumo funciona como estímulo à conduta criminosa?

1.3 Objetivos

1.3.1 Objetivo geral

Verificar de que maneira a necessidade do consumo de pessoas de baixa renda, provocada

pela invisibilidade social, estimula a prática criminosa.

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1.3.2 Objetivos específicos

1. Identificar se os crimes contra o patrimônio podem ser motivados pela necessidade de

consumo por pessoas de baixa renda, ou se a hipótese é refutada a partir do arcabouço teórico

e das pesquisas realizadas.

2. Analisar se a busca pelo consumo de marcas exclusivas surge da necessidade de inclusão,

diante do sentimento de inexistência e invisibilidade social.

3. Investigar quais os aspectos de violência social que condicionam a prática de crimes contra

o patrimônio.

1.4 Justificativas da pesquisa

Objetivamente, demonstra-se a relevância e a pertinência do estudo em tela no âmbito teórico

e prático, concomitantemente.

Prioristicamente, o presente estudo dá subsídio para a sugestão de estudos futuros,

considerando que a literatura atual se debruça no estudo individualizado do crime e do

consumo. No entanto, não aprofunda a relação entre esses fenômenos. Evidencia-se, a partir

dessa análise, as lacunas existentes acerca da junção dos conceitos, no sentido de investigar se

essa relação pode ter afinidade no que concerne ao aumento da violência e da criminalidade, e

ainda, se advém da vulnerabilidade existente nas pessoas detentoras de baixa renda.

Demonstra, ao mesmo tempo, relevância prática, que se manifesta na importância social e

econômica, pois revela informações que alimentarão dados a serem utilizados por órgãos,

entidades e instituições que vivenciam experiências com consumo e, também, com violência,

a exemplo das Secretarias Estaduais de Defesa Social. O resultado da presente pesquisa

demonstrará aos setores da economia, o impacto da necessidade do consumo na sociedade, e

ainda, aos órgãos de segurança, se o consumo pode atrair a prática de crimes.

Por outro lado, a pesquisa aponta grande serventia aos parlamentares, no sentido de apontar a

relação entre o consumo e a criminalidade, indicando a necessidade da análise temática no

contexto dos projetos de lei, voltados à economia e à criminalidade.

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Em suma, o tema em discussão nasce a partir da necessidade de investigação da relação entre

consumo e criminalidade. O consumo, o consumismo, a vulnerabilidade, a violência, a

invisibilidade social, a criminalidade, são temas que perpassam, atualmente, em diversas teses

investigativas. No entanto, isoladamente e de forma individualizada, não trazendo à baila a

discussão acerca da gritante violência social gerada por sua relação. A literatura atual dispõe

de um arcabouço teórico voltado para o consumo e para o crime, isoladamente. Entretanto,

não se debruça no estudo de um consumo cada vez mais desordenado e incontrolável, capaz

de mover a origem criminosa.

Encontra-se estudo de consumo voltado para o desenvolvimento, a cultura, o capitalismo,

ainda o estudo do crime conceitual em suas espécies, bem como no sentido de violência física.

No entanto, não se vislumbram registros de pesquisas específicas acerca do tema proposto;

não há estudos interligados entre o crime e o consumo na perspectiva de invisibilidade social.

Segundo pesquisa nos portais CAPES e SCIELO, com base na análise das frases indicadas,

não há estudo específico acerca da prática de crimes através da necessidade de consumo,

considerando os temas localizados, segundo a contextualização das palavras chaves.

Os estudos no Brasil revelam que, acerca do tema abordado, no contexto geral, apenas há

indicadores dos conceitos de crime e consumo, além de estudos temáticos que envolvem os

dois institutos isoladamente; cada um em uma perspectiva distinta, dentro dos seus conceitos

e elementos próprios. Praticamente, os temas relacionam consumo e crime, como consumo de

drogas e não como consumo de objetos e marcas. Estudos específicos acerca dos temas

consumo e crime, em uma abordagem de interdisciplinaridade, inexiste.

Em busca nos portais referidos, com análise aprofundada dos resultados encontrados, verifica-

se que os estudos e as pesquisas se repetem nos seus temas e títulos entre eles - SCIELO e

CAPES, demonstrando a restrição de abordagem temática.

Uma vez pesquisado e analisado cada resultado apresentado, essencialmente fora localizado

apenas um estudo que corrobora com a temática em comento e mesmo assim, ainda não se

debruça na análise do crime como um meio efetivo para o acesso ao consumo, segundo os

pormenores tratados nessa pesquisa. Daí a conclusão da viabilidade do presente estudo,

considerando que o tema, apesar de pertinente diante dos anseios de consumo da sociedade,

não vem sendo debatido, fazendo parte de uma lacuna a ser preenchida. Detalha-se no quadro

abaixo:

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Quadro 1 - Registros de trabalhos científicos encontrados nos portais da Scielo e Capes

Fonte: Consulta realizada pela autora em 11 jul 2015

Surge, pois, a necessidade de investigar a relação desses fenômenos, face o nítido entrelace

entre si. Daí, a relevância do estudo em tela, como meio de preencher as lacunas teóricas da

atual literatura científica, justificando-se como ciência e ensejando a continuidade do presente

estudo, revelando a necessidade de aprofundamento.

1.5 Estrutura da dissertação

Concluindo o presente capítulo introdutório, que indica a contextualização da pesquisa, bem

como, a problemática abordada e, ainda, os seus objetivos e justificativas, apresenta-se,

suscintamente a estrutura desse trabalho, apontando os demais capítulos.

No segundo capítulo, inicialmente, tem-se a fundamentação teórica, basilar para a temática do

estudo em tela, iniciando com a discussão da violência social e suas significações, permeando

na visão do conceito em Hanah Arendt, na análise do instituto da invisibilidade com a

capacidade de exclusão e, por fim, com a abordagem da violência simbólica, segundo Pierre

Bourdieu.

Prosseguindo, o referencial aponta, no próximo tópico, o poder exclusivo da marca, sob a

perspectiva da busca pela exclusividade, dando continuidade, em tópico próprio, à análise da

vulnerabilidade no direito consumerista, sob o prisma do consumismo praticado na sociedade

capitalista. O tópico aborda, ainda, a vulnerabilidade aos olhos da legislação vigente,

perpassando na proteção do consumidor frágil, amparado no direito de inclusão, e finaliza o

TERMO PESQUISADO SCIELO

GERAL

SCIELO

ESPECÍFICO

CAPES

GERAL

CAPES

ESPECÍFICO

Consumo e crime 15 1 42 1

o mesmo

encontrado no

portal Scielo

Crime como meio de

consumo

0 0 8 0

Invisibilidade social,

consumo e crime

0 0 14 0

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contexto descrevendo a inclusão exclusiva com o poder de produzir efeitos de violência

social.

O corpo do segundo capítulo conclui com a visão da legislação consumerista diante da análise

do consumo exacerbado exigido pela sociedade capitalista, se contrapondo ao direito de

inclusão do consumidor perante a sociedade. Ato contínuo, encerra a discussão com a análise

da busca pela visibilidade social através do crime, afirmando que o homem não nasce

criminoso, mas desenvolve a prática do ilícito diante das circunstâncias sociais vivenciadas e

finalmente, aponta a possibilidade de reprimenda do crime, através de políticas públicas

consumeristas.

O terceiro capítulo envolve a metodologia utilizada na pesquisa, indicando a escolha do

método e o locus, apresentando os sujeitos entrevistados e detalhando as técnicas de coleta de

dados e de análise de dados. Por fim, analisa os limites e as limitações da pesquisa,

demonstrando um desenho geral das ações de investigação do presente estudo temático.

O quarto capítulo enfatiza a apresentação, análise e discussão dos resultados obtidos.

Inicialmente, apresenta os sujeitos da pesquisa, quais sejam os presos por prática de crimes

contra o patrimônio, analisando o fator da baixa renda auferida pelos mesmos, sob a

perspectiva da necessidade de consumo. Dá continuidade com a análise das evidências de

invisibilidade e inexistência social, bem como da busca da inclusão através do consumo,

extraída das entrevistas realizadas e finaliza com a demonstração das atitudes evidenciadas na

trajetória de ocorrência de crimes em busca do consumo.

A conclusão da pesquisa se apresenta no quinto capítulo, com a percepção e experiência da

pesquisadora com o estudo realizado, apontando sugestões extraídas da análise dos dados.

A estrutura do trabalho encerra-se com a indicação das referências basilares do tema e

complementa o desenho da pesquisa com a apresentação do roteiro da entrevista individual e

do termo de autorização de entrevista, ambos no formato de apêndice.

Em suma, a estrutura se compõe de cinco capítulos, quais sejam a introdução; a

fundamentação teórica; a metodologia; a apresentação, análise e discussão dos resultados da

pesquisa e a conclusão, esta com a indicação das sugestões conclusivas.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A construção da presente fundamentação buscou amparar a temática da pesquisa, no sentido

de afirmar as propostas evidenciadas nos objetivos indicados no trabalho. O arcabouço teórico

se fundou na consulta de diversas fontes científicas, como livros, revistas, artigos, os quais

foram selecionados sob o critério da temática proposta.

2.1 Violência social e significações sociofilosóficas

Prioristicamente, é necessário que se compreenda a logística da violência social para

compreender os fatores que estão atrelados à vulnerabilidade do consumidor. O consumo,

atualmente, é um crescente e debatido assunto, nas mais diversas searas sociais e jurídicas, no

que concerne à evolução tecnológica e legal; tanto é verdade, que muito se discute acerca de

reflexos e impactos sociais, a partir do consumo, a exemplo do superendividamento tão

crescente, sob a justificativa de que o cidadão, cada vez mais, vem tentando se incluir na

sociedade por meio da visibilidade.

É preciso um debruçar sobre as possíveis causas que levam à ocorrência do anseio pelo

consumo, ressaltando a necessidade de inclusão como um possível fator, considerando a

invisibilidade presente na vida daqueles consumidores, diante da sua classe social, cultural,

econômica, entre outras. A partir dessa análise, passa-se a vislumbrar que a exclusão social

pode ser vista, indubitavelmente, como um ato de violência capaz de gerar outras espécies de

violência. Estudar a visibilidade como condição humana, é estudar a garantia dos direitos

básicos do cidadão, como essencial para uma vivência regrada, longe dos preconceitos, das

indiferenças e próxima da oportunidade e da inclusão. O homem só passa a ser concreto,

quando se vê inserido no contexto social, sem a garantia dos direitos, será um homem abstrato

(BOBBIO, 2004).

São travadas na violência social inúmeras relações; não apenas aquelas que dizem respeito à

violência física, mas, também, aquela que advém da sociedade, perpassando pela ideia de

exclusão. Nela, se verificam inúmeros problemas visíveis de cidadãos que, por muitas vezes,

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se vêem invisíveis, mesmo existindo. Na investigação aqui proposta, é importante,

inicialmente, analisar os conceitos que impulsionam o presente tópico dessa pesquisa, quais

sejam, invisibilidade e violência social para, só a partir da elaboração de uma estrutura teórica

viável, compreender as relações existentes entre violência e consumo.

A violência perpassa por vários âmbitos, adentrando no imaginário, exalando temor e

condicionando as relações sociais (BAUMAN, 2001).

2.1.1 Violência social em Hanah Arendt

Não há como se debruçar sobre a violência social, sem antes vislumbrar o conceito genérico

de violência. Várias são as vertentes da violência, tanto que a mesma pode ser analisada,

desde a concepção imaginária, a exemplo do medo, até a violência real e física. Nesse

contexto, pode-se analisar que a violência sempre estará atrelada a algum elemento que, para

Arendt (1985), é abrangido pela arbitrariedade. Não há que se cogitar que a violência é fato

surgido recentemente. Ao contrário, insurge na humanidade desde sempre, demonstrando a

sua potencialidade nas relações sociais. Não há que se conceber e não se pretende com o

presente estudo, que a violência seja compreendida a ponto de detectar os efeitos que a

ensejam. Entretanto, há de se constatar que a compreensão acerca da violência possibilita a

análise profunda da relevância social que tem os seus efeitos.

Registre-se que a violência, presente nas relações humanas, ocorre desde as relações sociais,

considerando-se que pode advir de condutas ativas ou omissivas, físicas ou morais.

Conquanto, a violência social é, sem dúvida alguma, a violação que advém da hostilidade no

meio social, cujo efeito é transformar vítimas que, possivelmente, passarão a ser autoras de

outras espécies de violência, futuramente. A compreensão do conceito de vítimas de violência

não pode e não deve ser restrito à conduta de violência física, devendo ser analisada, também,

a partir da posição social que a mesma possui perante à sociedade, indicando, portanto, outra

forma de violência, a partir da invisibilidade social, praticada através dos atos e omissões

inerentes ao preconceito e hostilização, fatores que levam, indubitavelmente, à exclusão.

Segundo o entendimento de Arendt (1985), demonstrado anteriormente, o conceito de

violência não pode ser considerado único, diante da sua capacidade de disseminar efeitos

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diversos, o que vem a ser corroborado por Maffesoli (1987), quando indica que a violência

tem a capacidade de se desenvolver através de várias formas, externando vários significados,

uma vez que não se concentra ou se limita às lesões no corpo, se concretizando em condutas

sociais que ferem tanto quanto a violência física, pelo poder de tornar invisível e inexistente o

ser que busca espaço social.

É na perspectiva de trazer a violência como um meio capaz de atingir inúmeras violações de

direito que o presente trabalho busca relacionar o consumo, conquanto a invisibilidade social

é capaz de violentar a ponto de transformar a vítima da violência social em autor de outras

espécies de violência. Ora, como não vislumbrar, diante da atual modernidade, que a violência

não se insere no contexto social, cultural, político e, sobretudo, econômico? Vive-se a era do

poder, na qual o poder econômico determina quem existe e quem inexiste, socialmente, daí a

concepção de invisibilidade perversa, apontada por Sales (2007), em que a visibilidade

econômica se sobrepõe aos valores de cidadania. Contempla-se, pois:

A violência é, pois, manifestação do poder, expressão de como as relações

sociais estão aqui organizadas, de como o capitalismo se engendrou e se

perpetua no país. É exploração, opressão e dominação, mas não é somente

força pura, é também ideologia e sutileza (SALES, 2007, p. 59).

A força da violência física não pode ser considerada mais ou menos intensa que aquela

utilizada na violência social, analisando-se que a força moral tem o poder de destruição

psicológica e emocional, provocando efeitos desastrosos e irreparáveis. Nesse contexto, a

violência deve ser compreendida como uma ação que nasce e se reproduz pela força, no

sentido de se sobrepor com seu ponto de vista em relação aos demais, gerando uma

superioridade sobre um grupo de pessoas que, por essa condição subalterna, estaria violentado

(SILVA, 2004).

Enfatiza-se, pois, que a força da violência será analisada em graus, a partir dos impactos

gerados, determinando e indicando os efeitos produzidos. Tem-se uma diversidade de

elementos e conceitos que perpassam na violência:

Uma, de caráter mais psicológico, é que elas são assim denominadas, com

frequência, muito mais pelo impacto emocional que produzem no imaginário

das pessoas do que por suas razões objetivas consistentes. Outra razão, de

caráter mais filosófico, é a dificuldade de encontrar um princípio racional

que explique essas ações, particularmente sob o impacto emocional dos seus

efeitos. Outra, de caráter mais antropológico, é que a qualificação das ações

como violentas permite desqualificar seus autores, tornando-os a expressão

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máxima da desumanidade, rebaixando-os, equivocadamente, ao nível da

animalidade, mundo onde não há lugar para a violência por não existir nele

liberdade, intencionalidade, nem consciência, todas elas características da

condição humana dos homens. Se toda palavra é por natureza polissêmica,

susceptível de múltiplos sentidos, há algumas em particular que adquirem

um sentido tal que lhes confere um potencial evocativo capaz de provocar

intensas reações racionais ou emocionais nas pessoas. Este parece ser o caso

da palavra violência e dos adjetivos correspondentes, cujo poder evocativo

faz com que a força do seu sentido seja maior que a do seu significado

(PINO, 2007, p. 765).

Portanto, partindo do pressuposto de que a violência perpassa em vastas vertentes, a social é

uma espécie de violência tão agressiva e inaceitável quanto qualquer outra espécie, capaz de

provocar, diante do efeito de invisibilidade, outras espécies de violência.

2.1.2 Invisibilidade como exclusão

Conforme vislumbrado acima, a invisibilidade é norteada pela violência social, conquanto

perpassa na ideia de exclusão. Ocorre que, em razão da natureza da presente discussão,

analisa-se uma vertente de violência, a partir do contexto social, considerando que se busca no

estudo em tela, pesquisar a relação existente entre violência social e invisibilidade do

consumidor vulnerável, tomando como ponto de coesão entre esses dois conceitos, a

ocorrência da exclusão inclusiva do consumo.

Imprescindível trazer à baila da presente discussão a análise do fenômeno da invisibilidade

que se amolda à violência social. Afinal, ser invisível socialmente é não se enquadrar nos

padrões determinados pela sociedade, no que concerne à classe social, econômica, cultural,

dentre outras. Diante dos padrões predefinidos pela sociedade, o indivíduo que não se

enquadra no mesmo passa a ser invisível, porquanto não é existente, passando a pertencer a

uma classe de exclusão. Por tal razão, vislumbra-se a invisibilidade como elemento da

violência, uma vez que surge da violência social, confrontando com os valores de cidadania e

com os direitos e garantias fundamentais, inerentes à dignidade da pessoa humana

(LINDGREN, 2005).

O consumidor, por sua vez, se trata de um ser vulnerável, conforme já tratado anteriormente

em tópico próprio. Entretanto, essa vulnerabilidade pode e deve ser compreendida como

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capaz de alcançar a problemática da exclusão social. Estaria o consumidor diante de uma

dupla vulnerabilidade? Propõe-se, com o presente estudo, investigar se há relação entre a

violência social e o efeito da exclusão no consumo, no sentido de buscar a invisibilidade do

consumidor como um ato de violência e como possível causa de ensejo à ocorrência de outras

espécies de violência, partindo do princípio de análise de que o consumidor invisível pode,

diante da vulnerabilidade a que está sujeito, pretender ser visto e notado com ações contrárias

à lei.

É um caminho interligado entre vulnerabilidade e invisibilidade que pode levar o consumidor

a ser autor e vítima de violência ao mesmo tempo. A que condição humana está sujeito o

consumidor invisível perante a sociedade? Estaria o alto índice de violência real (mais

precisamente, nos crimes contra o patrimônio) ligado ao fator socioeconômico que, sem

sombra de dúvidas, norteia a condição humana do indivíduo?

Partindo-se do pressuposto do que não vem a ser conceituado como violência, tem-se que a

violência advém dos elementos socioeconômicos e culturais, os quais possuem a força

necessária para provocar os efeitos da violência social, a partir da invisibilidade. Assim,

violência não se restringe à agressão física, mas engloba todas as agressões à alma, mesmo as

que não resultam em marcas visíveis e aparentes.

Comunga-se, pois, que a violência não gira, apenas, em torno de crimes brutais, considerando

que a violência social tem a capacidade destrutiva das frustrações morais, psicológicas e

emocionais, a ponto de provocar efeitos que chegam à perda da própria identidade daquele

que sofre a consequência da invisibilidade, que agride e violenta.

Sendo assim, busca-se, nesse estudo, analisar os efeitos do consumo, a partir da exclusão

inclusiva da marca, como fator de violência social. Pretende-se ir mais adiante e não apenas

investigar a violência social a partir da vulnerabilidade inerente ao consumidor, mas também

vertentes, a exemplo da omissão presente na legislação consumerista vigente. Ademais,

anseia-se verificar se as condições socioeconômicas definem a escolha do consumidor e,

ainda, se a frustração da exclusão tem liame direto com a prática de violência, mais

precisamente nos crimes contra o patrimônio. É necessário perceber a que condição humana

estão sujeitos os consumidores invisíveis e inexistentes na sociedade e quais as consequências

dessa invisibilidade que, indubitavelmente, é uma forma de violência, qual seja a violência

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social. Ademais, pertinente observar se o grau de vulnerabilidade social do consumidor está

delineado no contexto do Código de Defesa do Consumidor, legislação protetiva do mesmo.

A vulnerabilidade expressa no tema proposto deve ser vista a partir de diversas vertentes,

sobretudo, partindo do princípio que, segundo a legislação vigente, ela é atrelada ao

consumidor por esse ser, literalmente, a parte mais frágil na relação de consumo e, por essa

condição, é que há inúmeras vertentes protetivas voltadas ao consumidor, que devem ser

concretizadas com o status de prioridade absoluta, garantindo a proteção defendida pelo

Código de Defesa do Consumidor e inclusive pela Lei Maior, a Constituição Federal, sob a

ótica dos direitos humanos (FILOMENO, 2012).

É salutar examinar a vulnerabilidade de exclusão como fator essencial à presente pesquisa.

Afinal, não se encontrando a mesma nas justificativas de inclusão social, como direito basilar

obrigatório na legislação vigente, não estaria inserido no contexto de violência social e,

consequentemente, o consumo de inclusão exclusiva não teria qualquer correlação com

violência.

2.1.3 Violência simbólica em Pierre Bourdieu

Conforme demonstrado nesse tópico, o conceito de violência se sobrepõe à agressão corporal,

considerando que se alarga em condutas sociais que levam o ser humano, vítima da violência,

ao sentimento de exclusão.

Segundo a abordagem da sociedade capitalista que impõe o consumo como critério de

inclusão, a violência social é simbolizada na hierarquização, que se compreende na existência

de uma classe dominante que determina a cultura a ser absorvida pela classe dominada. Não

seria uma cultura natural, mas imposta em uma construção social (BOURDIEU, PASSERON,

1992).

A sociedade passa a determinar padrões de cultura, adequando valores próprios como critério

para diferenciação de grupos. Com o poder de, literalmente, separar as classes sociais, passa a

violentar os menos favorecidos economicamente. Quem não se adéqua aos padrões culturais

passa a ser excluído da sociedade.

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A violência, simbolizada na opressão praticada pela classe dominante, cria uma classe

oprimida que passa a contemplar seres invisíveis e inexistentes perante a sociedade, que

sequer se dão conta que se tratam de vítimas de uma violência simbólica, praticada pela elite

do poder, concretizada nas leis do Estado, na formação de elite da mídia e na reprodução

cultural da escola (BOURDIEU, PASSERON, 1992).

O excluído passa a se sentir imperfeito e desigual e se coloca em um contexto de inferioridade

social, acatando a imposição de humilhação e rejeição (BAUMAN, 1999). As vítimas

enfrentam a violência com novas ações de violência, conquanto, se aceitam violentados e

estigmatizados pela sociedade, se propondo a uma violência omissiva. Eis a interpretação do

conceito de violência simbólica.

A própria lei passa a definir critérios de grupos, ainda que diante de ações afirmativas e

inclusivas. Ora, a partir do momento em que a própria lei define critérios de cotas para negros

e pobres, por exemplo, está ratificando a diferenciação desses grupos, indicando a

desigualdade. É uma verdadeira inclusão de exclusão.

A seleção de grupos se dá em diversos âmbitos, até mesmo na esfera judicial, quando

demonstra, claramente, os encaminhados às prisões, indicando comunidades carcerárias

repletas de pessoas invisíveis socialmente, os inexistentes sociais, os rejeitados, os excluídos

(BAUMAN, 1999).

A imposição do poder cria classes diferenciadas, grupos majoritários e minoritários.

Essencialmente, a violência simbólica é a concretização do poder simbólico, poder invisível

que se evidencia nas ações de uma cultura imposta pela classe dominante, cujos efeitos

padronizam grupos diferenciados que se distinguem pelo privilégio de uns e exclusão de

outros (BOURDIEU, 2012).

A violência simbólica, pois, retrata a perversidade da exclusão, da invisibilidade e da

inexistência social. É a violência social que impõe uma cultura artificial construída através da

formação de grupos padronizados, se diferenciando entre o poder e a opressão.

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2.2 O poder exclusivo da marca

Em que pese o presente estudo tanto discorrer acerca dos direitos inerentes aos consumidores,

há de se conceber que os fornecedores, em que pese não serem considerados a parte mais

frágil da relação de consumo, são vistos, também, como passíveis de direitos.

Um dos direitos inerentes aos fornecedores é a liberdade de expor produtos no mercado, desde

que estejam de acordo com os padrões de segurança e respeitem os limites impostos pela

legislação vigente. O que deve ser observado, inexoravelmente, é que o direito de liberdade

do fornecedor em evidenciar sua marca no mercado não pode se contrapor aos direitos

inerentes ao consumidor.

É tão evidente o poder que a marca tem sobre a pessoa que a exclusividade de seu consumo

chega a ser comparado ao sentimento religioso e espiritual do consumidor, segundo

Lindstrom (2009) que, em pesquisa, buscou provar, cientificamente, a ligação entre as marcas

e a religiosidade.

O autor evidencia, na sua pesquisa, a marca como ícone pessoal, nominando-a de quebrável,

considerando a possibilidade de se reconhecer uma marca, ainda quando o produto não se

apresenta em sua plenitude. Nesse sentido:

Nessa parte da pesquisa, optei por examinar a força de marcas icônicas como

Apple, Guinness, Ferrari e Harley-Davidson, não apenas porque essas são

marcas populares, mas também porque são marcas que eu chamo de

“quebráveis”. “Quebre sua marca” é uma expressão que remonta a 1915,

quando a Coca-Cola pediu que um designer em Terre Haute, Indiana, criasse

uma garrafa que os consumidores pudessem reconhecer como uma garrafa

de Coca-Cola mesmo que estivesse estilhaçada em mil pedaços

(LINDSTROM, 2009, p. 108).

A marca, diante do seu poder reflexivo sobre o consumidor pode ser reconhecida, ainda que

distante da sua forma perfeita. A marca que pode ser considerada quebrável é aquela que

busca ostentar uma posição de poder, de exclusividade.

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2.2.1 Exclusividade: o que busca a marca?

É comum, no mundo do consumismo, se ouvir o termo exclusividade. Substancialmente,

expor uma marca com exclusividade é selecionar, intrinsicamente, o público a ser atingido.

Este trabalho propõe buscar, na legislação vigente, os limites da liberdade da marca em

promover a exclusividade, conquanto essa provoca efeitos de exclusão social, afinal, se é

exclusivo exclui.

A exclusividade da marca advém, geralmente, da forma econômica, considerando que o valor

inerente ao produto define a sua clientela. Surge, então, o choque de direitos e garantias.

Afinal, a definição de valores dos produtos, em busca da exclusividade, estaria permeando no

abuso de poder econômico e assim provocando a exclusão do consumidor? Quais os limites

da exclusividade da marca?

Em decisão judicial, oriunda de ação ordinária proposta pela Apple, a fim de retirar a

exclusividade da marca Gradiente sobre o Iphone, o Juiz Federal da 25ª Vara Federal do Rio

de Janeiro, Dr. Eduardo André Brandão de Brito Fernandes, ressaltou:

Eduardo André Brandão de Brito Fernandes determinou que o aparelho da

Gradiente tenha o nome acompanhado pela marca (Gradiente iphone),

enquanto a Apple poderá vender seus celulares apenas com a marca iPhone.

O registro junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial foi

considerado parcialmente nulo por ele.

Para o juiz, caso a Gradiente fosse autorizada a adotar o nome de forma

livre, a Apple seria amplamente prejudicada, “pois toda fama e clientela de

seu produto decorreram de seu nível de competência e grau de excelência.

Assim, a pulverização do mercado no Brasil representaria uma punição para

quem trabalhou pelo sucesso do produto, afirma ele.

Em sua decisão, o juiz afirma que a proteção da marca tem como principais

objetivos afastar a concorrência desleal e evitar que o consumidor cometa

erros na hora da compra. Por outro lado, aponta ele, a livre concorrência não

é absoluta e irrestrita, com o estabelecimento de limites e regras entre

concorrentes para evitar que a liberdade ilimitada cause prejuízos à parte.

A exclusividade da marca deve limitar-se, pois, dentro da sua própria liberdade de

concorrência. Os fornecedores devem primar pela lealdade do mercado, no sentido de não

provocar o abuso de poder econômico e, consequentemente, a eliminação de concorrência

(FILOMENO, 2012).

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A eliminação da concorrência não fere, tão somente, os pares fornecedores, mas, sobretudo, o

consumidor que se vê diante da ausência de opção, submetendo-se às imposições da

exclusividade.

A marca que busca exclusividade surge no mercado com imposição, transferindo para o

consumidor a responsabilidade de dar sentido ao produto, a ponto de transformar um produto

igual a outro em exclusivo (LINDSTROM, 2009).

É com o intuito de buscar sentido no produto, que o consumidor passa a trazer sentido para

sua própria existência social, se vendo na particularidade do produto.

2.3 Direito consumerista: consumo x consumidor vulnerável

O Código de Defesa do Consumidor inova a sociedade contemporânea, visando garantir uma

relação de consumo de qualidade, prezando pela qualidade, transparência e igualdade entre as

partes. Daí se constrói, a partir do princípio basilar da vulnerabilidade do consumidor, em

razão de considerar o mesmo a parte mais fragilizada da relação. É uma norma de cunho

social, organizada na forma de microssistema, cuja função é facilitar a interpretação de

direitos e garantias (BENJAMIN, MARQUES, BESSA, 2013).

Ainda segundo os autores, o direito consumerista eleva a posição do consumidor, ostentando

para o mesmo a condição de sujeito de direito, quando aponta uma gama de direitos, rotulados

como básicos, quais sejam, vida, saúde e segurança; liberdade de escolha; informação;

transparência e boa-fé; proteção contratual; prevenção e reparação de danos morais e

materiais; acesso à justiça e inversão do ônus da prova; serviços públicos adequados e

eficazes.

A identificação deste novo sujeito de direitos, deste grupo de não iguais, de

vulneráveis, nos arts. 1º a 4º, não estaria completa se não houvesse a lista de

direitos básicos no art. 6º do CDC. No caso brasileiro, trata-se da realização

de um direito fundamental (positivo)de proteção do Estado para o

consumidor (art. 5º, XXXII, da CF/1988). O consumidor foi identificado

constitucionalmente (art. 48 do ADCT) como agente a ser necessariamente

protegido de forma especial, e esta tutela foi concretizada através do CDC e

sua lista de direitos básicos do consumidor (BENJAMIN, MARQUES,

BESSA, 2013, p. 70).

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É necessário trazer à baila o conceito doutrinário de consumidor a fim de compreendê-lo

como sujeito de direito. Ressalte-se que o aspecto conceitual traz uma gama de vertentes,

perpassando pelo conceito de consumidor, que, do ponto de vista econômico, caracteriza-se

quando identificado como destinatário de produtos, independentemente de adquiri-los.

Quanto ao aspecto psicológico, perfaz-se pelo sujeito que se coloca como centro de

investigações, no sentido de detectar a razão de suas preferências e interesses consumistas.

Quanto à vertente sociológica, consumidor vem a se caracterizar pela natureza do produto que

consome, a partir do grupo a que pertence. Os grupos são capazes de se reconhecerem pela

identificação da marca.

O aspecto literário e filosófico define o consumidor como o ser que perpassa pelo alvo da

ideologia consumista atual, implícita na sociedade (FILOMENO, 2012).

Considerando o conceito de consumidor sob diversos aspectos, percebe-se que, para que ele

exista, necessariamente deve existir o consumo. E o que vem a ser consumo, considerando a

relação necessária, da qual o consumidor é protagonista? Seria o consumismo, uma ação

dependente da imposição social.

Nessa perspectiva, partindo da acepção do conceito de consumidor, sobretudo no aspecto

sociológico, indaga-se acerca das possíveis omissões presentes na legislação vigente, que

tanto se propõe a proteger o consumidor. Ora, considerando os efeitos impostos pela

sociedade, que induz o consumo como necessário e essencial, a ponto do consumidor se ver

compelido a consumir como meio de se fazer incluir socialmente, necessário se faz buscar

diagnosticar se a legislação vigente consumerista, de fato, tende a proteger o consumidor,

considerando a necessidade de inclusão social.

2.3.1 Consumo x consumismo

O consumo é algo que perpassa na própria existência, considerando que a vida impõe a

prática da aquisição de produtos. Afinal, como subsistir sem consumir o que se necessita?

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É primordial destacar, porém, que o consumismo, entendido como a necessidade de consumo

exacerbado, está presente na sociedade capitalista, esta que aponta os valores do ser humano

em torno da mercadoria.

A necessidade humana, na perspectiva de consumo nas sociedades capitalistas, é o ponto de

análise do presente tópico, considerando que é imprescindível estabelecer uma ótica no que

concerne o conceito de consumo. Seria o consumo uma necessidade básica? O que pode ser

considerado básico na atual sociedade capitalista?

O contexto de sociedade capitalista se identifica com o conceito de mercadoria, partindo da

premissa que essa tem o condão de satisfazer as mais diversas necessidades humanas, sejam

elas básicas ou supérfluas. O ser humano que adere ao capitalismo consumerista busca valores

próprios em mercadorias, que podem ser utilizadas para subsistência ou mesmo para atender

anseios e fantasias. O fato é que a mesma mercadoria, considerando a coisa objeto de

consumo, pode se apresentar de diversas formas, a depender da necessidade humana (MARX,

1983).

O sistema de produção capitalista se concretiza nas sociedades consumistas com a criação do

mercado liberal. Para Marx (1983), as mercadorias se apresentam em sua forma natural ou em

forma de valor, possuindo duplo sentido. A mercadoria, pois, atende o consumo como objeto

de uso ou como portadora de valor.

Tão crescente é a visão de consumo na atualidade que a legislação mais recente engloba uma

lei especial direcionada ao consumidor, diante da necessidade imposta pela evolução social.

Na verdade, o consumo passou a ser um dos pontos tratados com a máxima atenção na seara

jurídica, uma vez que veio a se tornar foco de litígios constantes.

O que vem a ser consumo, de fato, considerando que esse conceito perpassa pela via

psicológica, cultural e social? Há um critério para definir o grau recomendável exato de

consumo? Quando o consumo passa a ser visto como excessivo e prejudicial?

As indagações acima esboçadas se sustentam na hipótese do consumo dar lugar ao

consumismo, considerando a possibilidade de se consumir além da própria necessidade. Mas,

o que deve se entender por necessidade na atual sociedade?

Prioristicamente, há de se conceber que o consumo é medido pela gama de mutação,

multiplicação e rotatividade de produtos e serviços disponibilizados no mercado, afinal,

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consome-se o que se tem à vista, o necessário para atender às necessidades pessoais

(BAUDRILLARD, 2003). E o que vem a significar necessidades pessoais na atualidade?

A atual sociedade capitalista impõe um padrão de vida baseado no grau de consumo, de forma

que os destaques e a visibilidade das pessoas advêm, principalmente, do grau de consumo,

conquanto o supérfluo e o excedente acende o indivíduo na sociedade, trazendo a sensação de

existência (BAUDRILLARD, 2003).

Mas, o que se compreende por supérfluo, se até na miséria existe algo que vai além da pura

necessidade? É no supérfluo que a existência social se firma? (BAUDRILLARD, 2003).

Possivelmente, essa existência social a partir do consumo que gera o consumismo advenha

dos efeitos da globalização. É perceptível que o poder de consumo passou a medir o grau de

felicidade, prazer e satisfação das pessoas, considerando que o consumo significa

reconhecimento social, pois é a partir dele que se busca a igualdade social (CONTE,

OLIVEIRA, HENN, WOLFF, 2007).

Atualmente, a procura pela felicidade impõe, como ação preliminar, a busca pela igualdade

social, a qual se pauta, também, na base do consumo. Precisa-se consumir para existir

igualitariamente (BAUDRILLARD, 2003). A sociedade equilibra seus padrões através do

poder de compra, da participação de grupos sociais definidos pelo consumo, e tudo isso gera o

consumismo.

As classes sociais reconhecem o indivíduo pelo produto que consome, ou seja, pelo carro que

possui, pela marca que veste, pelos locais que frequenta... a cidadania da existência só surge

após a seleção de critérios consumistas, conquanto apenas se existe a partir do que se

consome. O indivíduo que não ultrapassa o crivo da existência inexiste, literalmente, sofrendo

os efeitos da disparidade social, sustentada na discriminação, na hostilização.

É o consumismo, pois, uma esfera necessária para se surgir materialmente e culturalmente na

sociedade. Depende-se do consumo para se existir de fato. Enquanto o consumo vem se

basear na aquisição do que é necessário, primariamente, o consumismo vem impor

necessidades secundárias que baseiam a existência social. Essa é a lógica do consumo, que

impõe a medida de valores, a partir do que se possui e se detém (BAUDRILLARD, 2003).

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Para existir, o indivíduo necessita estar inserido em grupos vistos e reconhecidos pelos

padrões sociais, o que só será possível através do poder de compra seletiva; ou seja, através

das necessidades atendidas pelo consumismo.

A atualidade aponta para uma sociedade hierarquizada devido à diferenciação de visibilidade

(material, cultural, laboral...), de forma que a existência dependerá do consumismo, ou seja,

do poder de consumo, pautado na exigência dos grupos aceitos e vistos na sociedade.

A sociedade capitalista se comunica a partir do consumo; O consumo constitui um mito. Isto

é, revela-se como palavra da sociedade contemporânea sobre si mesma; é a maneira como a

nossa sociedade se fala (BAUDRILLARD, 2003).

Comungando com o entendimento acima, na perspectiva de se analisar o consumismo a partir

do consumo excessivo, há de se concluir que o excesso perde a sua essência por surgir da

necessidade imposta pela sociedade, que versa na visibilidade existencial. O excesso, o

supérfluo, mesmo não perpassando por uma necessidade primária do ser humano, circunda

em uma necessidade secundária; no entanto, primordial para a existência social, conquanto

existir socialmente depende do acesso às necessidades que vão além das básicas para a

existência natural, porém que são consideradas fundamentais para a existência social.

Tão logo aprendem a ler, ou talvez bem antes, a “dependência das compras”

se estabelece nas crianças. Não há estratégias de treinamento distintas para

meninos e meninas – o papel do consumidor, diferentemente de produtor, não

tem especificidade de gênero. Numa sociedade de consumidores, todo mundo

precisa ser, deve ser e tem que ser um consumidor por vocação (ou seja, ver e

tratar o consumo como vocação). Nessa sociedade, o consumo visto e tratado

como vocação é ao mesmo tempo um direito e um dever humano universal

que não conhece exceção (BAUMAN, 2008, p. 73).

A atual sociedade se modernizou, também, na imposição consumerista, de modo que

consumir não mais se trata de uma vontade livre, de um vínculo com as necessidades sociais.

2.3.2 Vulnerabilidade consumerista

Considerando que a vulnerabilidade permeia no Código de Defesa do Consumidor como

sendo o elo entre o direito e a garantia do consumidor (este que é considerado a parte mais

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frágil da relação de consumo), faz-se necessário destacar e delinear o que, de fato, vem a ser

vulnerabilidade; não apenas no ponto de vista jurídico, mas perpassando pelo seu conceito

genérico. A seguir, indica-se:

2.3.2.1 Conceito genérico

A palavra vulnerabilidade advém de uma interpretação acerca da fragilidade. Ser vulnerável é

ser frágil, é estar sujeito a algo, em uma situação de desequilíbrio, ou seja, exposto a uma

situação em pé de desigualdade a um opositor.

O conceito genérico da vulnerabilidade pode ser entendido, segundo Brito (2006), como o

estado do indivíduo que se encontra na iminência de sofrer ataques.

Vasto é o conceito do termo vulnerabilidade, conquanto pode ser extenso a diversos âmbitos,

seja simplesmente técnico, social, econômico, jurídico, enfim. No entanto, em que pese haver

uma gama de vertentes acerca da palavra, o seu conceito se concentra no mesmo sentido, qual

seja o de externar o estado de fragilidade.

2.3.2.2 Conceito jurídico

Partindo do pressuposto do que vem a significar o termo vulnerabilidade, concebe-se que,

juridicamente falando, o seu lugar ostenta uma posição de equilíbrio, conquanto existe no

mundo legal com o propósito de equilibrar e igualar uma relação jurídica.

Quando se estreita o termo para o mundo jurídico, de logo se remete para o âmbito do

consumidor, considerando que o Diploma Legal inerente surge norteado por princípios, entre

eles o princípio da vulnerabilidade.

O conceito jurídico da vulnerabilidade permanece em uma posição entre o conceito genérico e

o conceito filtrado aos olhos do Código de Defesa do Consumidor, homogeneizando-se, por

vezes, entre si, em razão dos coincidentes propósitos.

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2.3.3 Vulnerabilidade aos olhos do CDC

Conforme ventilado anteriormente, a vulnerabilidade permeia no Código de Defesa do

Consumidor (CDC) como princípio basilar, considerando a necessidade de garantir ao

consumidor uma posição igualitária na relação de consumo. Para Filomeno (2012), o diploma

legal mencionado busca harmonizar as relações de consumo, nas quais o consumidor surge

em uma posição de absoluta desproporcionalidade, sendo considerado, portanto, a parte

vulnerável dessa relação. O entendimento expressado é corroborado com Brito (2006), que

expõe que a vulnerabilidade se materializa no direito do consumidor, sendo, essencialmente, o

ponto de partida que envolve a teoria consumerista.

Impõe-se, pois, o conhecimento do instituto da vulnerabilidade como princípio norteador do

direito consumerista, além de pressuposto básico para a correta aplicação da lei, tendo em

vista que sua natureza jurídica se dispõe a salvaguardar o consumidor.

Insta salientar que a vulnerabilidade constante no CDC ultrapassa os limites de proteção

meramente econômica, atingindo outras vertentes, a exemplo do acesso a informações.

Por vulnerabilidade, há de se entender a fragilidade dos consumidores, em

face dos fornecedores, quer no que diz respeito ao aspecto econômico e de

poder aquisitivo, quer no que diz respeito às chamadas informações

disponibilizadas pelo próprio fornecedor ou ainda técnica (FILOMENO,

2012, p. 13).

A vulnerabilidade, ainda segundo Filomeno (2012), acompanha o consumidor desde a fase

pré-contratual até a fase pós-contratual, considerando que o consumidor, na relação de

consumo, fica a mercê do que o fornecedor deseja oferecer.

Um exemplo claro de vulnerabilidade inerente ao consumidor é o contrato de adesão, onde o

mesmo é literalmente vinculado ao que predispõe o fornecedor, através das cláusulas

contratuais. Nesses casos, além da ausência de informação jurídica para compreensão do

contrato, falta ao consumidor a opção de escolha, tendo em vista se tratar de opção única de

aquisição e de consumo.

Porém, diante do tema que o presente trabalho propõe, indaga-se: até que ponto a legislação

vigente abraça essa vulnerabilidade tão inerente ao consumidor? A proteção ao consumidor,

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no CDC, abrange todas as limitações e fragilidades inerentes ao consumidor ou se resume a

vislumbrar apenas a hipossuficiência econômica e jurídica? Estaria o princípio da

vulnerabilidade presente em todos os âmbitos, de forma a garantir a equiparação na relação de

consumo ou ainda se propõe a fundamentar esses direitos e essas garantias, até então

camufladas ou inexistentes?

O Código de Defesa do Consumidor surge na legislação vigente como um sistema

direcionador de direitos positivados (BENJAMIN, MARQUES, BESSA, 2013), em razão dos

reflexos da contemporaneidade, na qual o consumo traz uma série de efeitos importantes para

a globalização. O CDC, na verdade, ainda segundo os autores, veio ratificar a proteção

afirmativa dos consumidores, segundo o que dispõe a Constituição Federal.

Um direito que surge como ação afirmativa; no entanto, com inúmeras indagações acerca das

suas garantias, frente os efeitos da modernidade. Seria a garantia ou a busca de um direito.

Nesse sentido:

O problema do fundamento de um direito apresenta-se diferentemente

conforme se trate de buscar o fundamento de um direito que se tem ou de um

direito que se gostaria de ter. No primeiro caso, investigo no ordenamento

jurídico positivo, do qual faço parte como titular de direitos e deveres, se há

uma norma válida que o reconheça e qual é essa norma; no segundo caso,

tentarei buscar boas razões para defender a legitimidade do direito em

questão e para convencer o maior número possível de pessoas (sobretudo as

que detêm o poder direito ou indireto de produzir normas válidas naquele

ordenamento) e reconhecê-la (BOBBIO, 2004, p. 15).

É nessa vertente, em discutir e diagnosticar a omissão da legislação vigente, no que concerne

às reais garantias oferecidas ao consumidor, que o presente trabalho pretende trilhar. Afinal,

os efeitos da globalização da pós-modernidade produzem uma gama de consequências que

atingem o âmbito do consumo e, consequentemente, a pessoa do consumidor, sobretudo no

aspecto social, quando leva-o a desejar surgir na sociedade e reafirmar a sua identidade,

através do consumo.

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2.3.4 Proteção ao consumidor vulnerável: direito de inclusão

Após evidenciar o poder da marca sobre a vida do consumidor, resta discutir acerca da

proteção a esse consumidor que, pela exclusividade da marca, se vê excluído socialmente.

Conforme vislumbrado, a vulnerabilidade presente na legislação consumerista se propõe a

protege-lo, no sentido de equiparar a relação de consumo, perpassando pela garantia de

direitos básicos, essenciais ao ser humano.

Indaga-se, pois: sua inclusão social se encontra inserida como direito básico na legislação

vigente? Ora, o poder da marca detém a capacidade de inseri-lo nos grupos sociais, bem como

de excluir; afinal, se mostra exclusiva, incluindo apenas uma gama de consumidores.

2.3.5 Exclusividade da marca x exclusão do consumidor

A exclusividade da marca, a princípio, deve ser vista como um direito do fornecedor, voltada

à possibilidade de propor elevar sua marca no mercado, através de uma publicidade dirigida a

uma clientela específica.

A marca, ao se mostrar exclusiva no mercado, produz efeitos, dentre outros, sociais. Nesse

momento, vislumbra-se um choque de direitos, considerando que o maior e mais potente

efeito da exclusividade é a exclusão em si. Afinal, a inclusão alcança apenas alguns e, a partir

de então, os não inseridos nessa exclusividade chegam a, simplesmente, inexistir. E a

vulnerabilidade social do consumidor? Estaria o consumidor protegido, na legislação vigente,

dos efeitos da exclusividade do consumo?

Grupos começam a ser formar e as pessoas passam a vivenciar um sentimento de

pertencimento, chegando a identificarem-se entre si, através da marca. É a exclusividade de

alguns (LINDSTROM, 2009).

Pessoas que jamais se viram, passam a se identificar pela marca, reconhecendo-se pela

singularidade do consumo. Nesse sentido:

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Você já sorriu com cumplicidade para a pessoa na esteira de corrida ao lado

da sua ao notar que vocês estavam usando a mesma marca de tênis

esportivo? Ou buzinou e acenou para um sujeito na pista ao lado porque,

como você, ele estava dirigindo um Toyota Scion? O meu argumento é o

seguinte: quer você goste da Nike, da Neutrogena, da Absolut ou da Harley-

Davidson, é provável que tenha uma sensação de pertencimento quando está

entre usuários daquela marca – é como ser membro de um clube não tão

exclusivo assim (LINDSTROM, 2009, p. 100).

Tão nítido é o sentimento de pertencimento, que o consumidor passa a absorver um

sentimento de rivalidade com marcas oponentes àquelas a que prefere e atribui o título de

mais forte e mais cativante e atraente. A concorrência de uma marca contra a outra reflete,

pois, em um consumidor contra o outro.

O mundo consumerista da concorrência passa a ter a sua frente marcas concorrentes com

consumidores que saem em sua defesa. A Coca-Cola x Pepsi passa a ter o grupo de

consumidores da Coca-Cola contra o grupo de consumidores da Pepsi (LINDSTROM, 2009).

O consumidor se vê, assim, à mercê do poder da marca, não possuindo direito de escolha,

senão buscar pertencer a um grupo de consumo, para não se ver como inexistente na

sociedade. Conquanto, um dos efeitos da pós modernidade é a identificação e o

reconhecimento entre as pessoas, através da marca. Quem não aderir ao uso de uma marca

exclusiva, com alcance de reconhecimento popular, está, portanto, excluído do contexto

social? Ao que parece, sim.

2.3.6 Inclusão exclusiva: efeito da exclusividade da marca como violência social

Conforme aprofundado em tópico próprio, a violência social pode ser evidenciada a partir da

invisibilidade pessoal, quando o ser humano existe com o sentimento de inexistência perante a

sociedade.

Existir na sociedade, sobretudo na sociedade moderna, consiste em pertencer aos grupos

aceitos e identificados pela mesma. No contexto, são inseridos os grupos formados a partir do

consumo.

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Qual a relação entre a violência social e o consumo, senão o efeito de inclusão exclusiva que a

marca possui? Que espécie de inclusão é essa que inclui pela via de consumo e, ao mesmo

tempo, exclui pela ausência dele?

A aquisição de determinado produto, o consumo em si, passou a ser uma obrigatoriedade do

ser humano, que ultrapassa o desejo e a necessidade do produto, pois consiste na condição de

existência social. Interpreta-se:

Pense na recente campanha da Hertz e seu slogan: “We`re Hertz and they`re

not” (Nós somos a Hertz e eles, não”). Ou nos anúncios de tevê nos quais o

usuário da Apple, interpretado por um profissional liberal urbano, descolado

e bonito que a maioria dos homens deseja ser, e o usuário de um PC, um

gorducho esquisito que usa óculos, debatem sobre os respectivos méritos de

seus sistemas operacionais (e o usuário da Apple, é claro, sai ganhando)

(LINDSTROM, 2009, p. 102).

A opção de compra, portanto, consiste na necessidade de pertencer a um grupo aceito pela

sociedade. Não fazer parte do grupo visto com bons olhos leva o consumidor a uma condição

de invisível, conquanto inexiste socialmente.

Pertencer a um grupo aceito pela sociedade é uma questão de sobrevivência social, e o

consumidor, indubitavelmente, se encontra compelido a consumir, tendo ferido diversos

direitos básicos que lhes são inerentes, sobretudo o da liberdade de escolha.

Dessa forma, o termo violência se perfaz em duas vertentes, alcançando o consumidor como

vítima da violência social e, também, como autor da violência real, considerando que a revolta

daquele que não se vê em condição de se incluir socialmente pode o levar a praticar condutas

criminais em busca da possibilidade de consumo. Na verdade, é, também, nessa vertente, que

o presente trabalho se propõe.

A modernidade impõe exclusividade em diversos âmbitos, a exemplo de grupos sociais

virtuais que excluem aqueles que não tem acesso à tecnologia necessária para tanto.

Ao lançar seu serviço Gmail, a Google atraiu seguidores de uma maneira

diabolicamente astuta. Ao disponibilizar o serviço apenas para usuários

convidados, o Gmail se transformou quase em uma religião virtual; ao

receber o convite de um amigo para se unir ao grupo, você se sentia como se

tivesse sido aceito em uma comunidade semiexclusiva e vitalícia (só após ter

obtido cerca de dez milhões de usuários é que o Gmail abriu suas portas para

meros mortais). A American Express tinha uma estratégia semelhante de

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disponibilização apenas para convidados quando lançou seu ultraexclusivo

centurion Black Card nos Estados Unidos; dezenas de milhares de

consumidores ligaram, pedindo para serem colocados na listagem. Todas as

religiões, e todas as marcas, não tratam seus convertidos da mesma maneira,

fazendo com que eles se sintam honrados por fazer parte daquele grupo?

(LINDSTROM, 2009, p. 104).

A busca por autoafirmação vem transformando o consumidor em escravo da marca,

considerando que sua adesão de compra é essencial para a sua inclusão social. Daí a

inquietação, no sentido de analisar e diagnosticar até que ponto esse consumidor é protegido,

no sentido de não se ver compelido a consumir, como uma necessidade de existência perante

à sociedade.

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2.4 Legislação consumerista (in) eficaz na forma inibidora de consumo exacerbado

O CDC – Código de Defesa do Consumidor chegou ao ordenamento jurídico brasileiro com

uma ideia protecionista em favor do consumidor, englobando, no diploma legal, inovações

com garantias de diversas vertentes. Essas garantias em torno do consumidor se justificam

pela sua condição de vulnerabilidade, sendo a parte frágil na relação de consumo.

Ocorre que, em que pese ser visível a tendência de proteção da legislação vigente em favor do

consumidor, muito se deixou a desejar, considerando a omissão na letra da lei quanto às

questões sociais que advêm do consumo.

O consumo, atualmente considerado um pilar social, tem o condão de incluir ou excluir

pessoas, a depender do seu grau, diante da formação de grupos determinados pela sociedade.

Por sua vez, o efeito de exclusão proveniente do consumo é tema não abordado na atual

legislação, uma vez que o direito de inclusão não é garantido ao consumidor. Porém, de que

forma a legislação poderia garantir a inclusão social do consumidor? É o que se discute no

presente tópico.

2.4.1 A inclusão do consumidor como direito na legislação consumerista vigente

O presente estudo se volta à esfera consumerista, transpassando pela criminalidade. Não se

pretende, sob hipótese alguma, evidenciar um discurso jurídico na sistemática do trabalho. No

entanto, pela própria natureza do tema, necessário se faz perpassar pela seara jurídica, ainda

que timidamente, como forma de elevar os esclarecimentos de institutos pertinentes ao estudo.

Diante dos efeitos de uma sociedade de exigências e riscos, a legislação vigente inseriu no

ordenamento jurídico uma lei especial voltada para a proteção ao consumidor. Em que pese

nascer uma lei com preocupação especial ao consumidor, observando diversos aspectos de

vulnerabilidade, vislumbra-se que o legislador não previu a vulnerabilidade consumerista

frente aos efeitos sociais do consumismo.

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Partindo da ideia de existência social, no tema discutido no presente estudo, vê-se,

claramente, que o consumidor vive à mercê da classificação social do ser humano,

considerando que o valor humano passou a ser condicionado ao poder de consumo.

Questiona-se, pois, a necessidade da presença de um dispositivo legal que norteie o

desequilíbrio social do consumo, de forma a garantir a existência social do indivíduo que não

pode ultrapassar o consumo das suas necessidades básicas para a existência social.

As propagandas, ao igualarem produtos e consumidores, colocam estes

últimos sempre em desvantagem frente aos superpoderes dos quais estão

investidos os objetos, indicando qual a decisão que se deve tomar se

quisermos a felicidade (CONTE, OLIVEIRA, HENN, WOLFF, 2007, p. 98).

Até que ponto o consumidor é protegido na legislação vigente, se a sua condição de

vulnerável social não é evidenciada nos dispositivos legais? Ora, o sentimento de felicidade,

prazer, reconhecimento, etc está voltado ao poder de consumo. Estar bem significa estar

coberto de produtos e marcas reconhecidos no meio social (CONTE, OLIVEIRA, HENN,

WOLFF, 2007).

Não se atinge a proteção do consumidor se a principal vulnerabilidade não é vista e tratada, o

que leva ao entendimento de que, certamente, o problema perpassa na esfera da efetivação de

políticas públicas, o que será tratado em tópico específico.

Pretende-se, no presente estudo, desenvolver, sistematicamente, um raciocínio que leve à

compreensão do liame entre o consumo e a criminalidade, se fazendo necessário, portanto, a

análise de todas as possibilidades e critérios envolvidos no contexto temático.

Se é possível identificar que há uma omissão na legislação no que concerne à proteção da

vulnerabilidade social do consumidor, por outro lado, há de se investigar se a inclusão social

do consumidor como direito na legislação vigente deve dizer respeito à possibilidade de se

enfrentar a exclusão inclusiva da marca.

Como já tratado em tópicos anteriores, a sociedade atual exclui a partir da inclusão em grupos

seletivos de marcas e produtos. Suficiente examinar que os grupos sociais se identificam,

também, senão principalmente, pelo modo de se vestir, pelos produtos usados ou pelas marcas

escolhidas, o que, por si só, já demonstra que aquele que não detém condições de utilizar as

mesmas marcas, produtos e serviços de determinados grupos, automaticamente está fora, por

sua vez, excluído socialmente.

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A sociedade consumerista impõe, portanto, a inclusão social a partir do acesso aos produtos e

serviços oferecidos pelo mercado. Na verdade, o ser humano passou a ser visto, literalmente,

como uma embalagem e avaliado como o produto que consome.

O que fazer para buscar existir, socialmente? Quais os sentimentos que visitam a mente do

excluído?

É a partir desse contexto que o presente estudo indaga se há uma relação próxima entre a

criminalidade e o consumo, considerando a possibilidade da ocorrência de crimes como busca

por possibilidades de consumo e, consequentemente, por inclusão social.

Em suma, se os fenômenos da criminalidade e do consumo se relacionam e se essa relação

surge diante da exigência de consumo da sociedade, há de se presumir que falta ao

consumidor uma proteção social, de forma que se depreende que o CDC não incluiu, entre os

vários direitos previstos, o direito do consumidor em se manter em sociedade,

independentemente do grau de consumo exercido.

2.5 A busca pela visibilidade social: caminho para o mundo do crime

Prioristicamente, faz-se necessário indagar a razão pela qual o homem se sente incomodado

em inexistir perante à sociedade?

Concebe-se, pela própria natureza humana, que o homem é movido por sentimentos e

emoções que norteiam sua vida; seu caráter, seus costumes, enfim. A exclusão soa como um

sentimento de impotência e revolta que leva o ser humano a indagar o porquê e ir buscar uma

explicação e uma solução.

Certamente, a busca por solução terá caminhos diversos, a depender do meio social e cultural

de cada um e é nessa perspectiva que pode estar a decisão pelo mundo do crime. A

necessidade do consumo desperta naquele que se vê sem oportunidades a alternativa de buscar

se incluir e existir socialmente pela via ilícita, conquanto quer mostrar que também pode ser

reconhecido.

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É a busca pela existência social e a ânsia pela autonomia; pela autoafirmação, pela construção

da própria identidade, da felicidade. E, como se comportar enquanto cidadão que depende do

consumo para existir perante a sociedade?

Se a cultura consumista é o modo peculiar pelo qual os membros de uma

sociedade de consumidores pensam em seus comportamentos ou pelo qual se

comportam “de forma irrefletida” – ou, em outras palavras, sem penar no

que consideram ser seu objetivo de vida e o que acreditam ser os meios

corretos de alcança-lo, sobre como separam as coisas e os atos relevantes

para esse fim das coisas e os atos que descartam como irrelevantes, acerca de

o que os excita e o que os deixa sem entusiasmo ou indiferentes, o que os

atrai e o que os repele, o que os estimula a agir e o que os incita a fugir, o

que desejam, o que temem e em que ponto temores e desejos se equilibram

mutuamente -, então a sociedade de consumidores representa um conjunto

peculiar de condições existenciais em que é elevada a probabilidade de que a

maioria dos homens e das mulheres venha a abraçar a cultura consumista em

vez de qualquer outra, e de que na maior parte do tempo obedeçam aos

preceitos dela com máxima dedicação (BAUMAN, 2008, p. 70).

Se render à cultura consumista depende de condições e, especificamente, depende diretamente

do poder de compra que se tem. Considerando, pois, que o consumo se comunica com o poder

econômico no meio social, é razoável levantar a hipótese que a ocorrência de crimes com o

intuito de adquirir valores pode advir da necessidade de consumo.

É um percurso de raciocínio que leva à reflexão. Para existir socialmente, precisa-se estar

inserido em grupos seletos; para inserir-se nos grupos impõe-se o consumo dos produtos e

serviços reconhecidos, socialmente; para consumir, precisa-se de renda.

Não se pretende, sequer superficialmente, justificar positivamente a conduta de praticar

crimes com o propósito de buscar valores para o consumo. No entanto, busca-se pesquisar

essa possibilidade como fato concreto na sociedade. Afinal, é necessário se chegar a uma

explicação lógica para se evidenciar possibilidades de correção.

O fato, é que a busca pelo consumo pode trazer explicações para as condutas criminosas,

sejam elas cometidas pela parcela mais pobre ou mais abastada. O pequeno furto para

subsistência ou a corrupção dos grandes políticos podem ser práticas criminosas voltadas ao

consumo. A diferença está na análise de punição, segundo a escala social, e na comunidade

carcerária que, em sua maioria, se perfaz de pessoas das camadas inferiores da sociedade

(BAUMAN, 1999).

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O menos favorecido busca existir através da visibilidade social; o mais favorecido busca se

manter nos grupos seletos da sociedade, ostentando o padrão imposto por ela. Os efeitos

dessas buscas diferenciadas e similares, ao mesmo tempo, se revelam na criminalidade, pois,

podem utilizar, como meio, a conduta criminosa. Seriam algumas das consequências da

globalização (BAUMAN, 1999).

A grande questão que permeia nessa seara de discussão é indagar: para haver inclusão e

visibilidade social, busca-se a prática de crimes ou não há justificativa para tanto? Busca-se

constatar se, de fato, o consumo, no âmbito do consumismo exacerbado imposto pela

sociedade, pode ensejar a prática de condutas criminosas. É necessário, diante desse contexto,

identificar se o crime é motivado pelo consumo.

2.5.1 O homem não nasce criminoso

A temática impõe a necessidade de circundar o estudo conceitual do homem, do consumo e

do crime, diante de todo esse contexto.

Seria ilógico levantar a possibilidade da ocorrência de crime por meio da necessidade do

consumo, sem trilhar uma análise do que motiva o homem a cometer crimes. Não se trata de

um estudo criminológico aprofundado, porém, de uma explicação comportamental.

A ciência aponta que o crime pode advir de diversas vertentes, perpassando pelo âmbito

mental, emocional, casual, social, econômico, dentre tantos outros. Não se busca justificar

positivamente a conduta criminosa, mas levantar uma justificativa explicativa para o

fenômeno do crime.

Diante da presente temática, enfoca-se os âmbitos social e econômico no sentido de

demonstrar que o crime, quando motivado por questões que envolvem, diretamente, tais

focos, traz consigo uma explicação, um porquê, não ocorrendo sob a justificativa de que o

homem já nasce criminoso.

Ora, se há uma deficiência na saúde mental do individuo, o crime já traz a explicação obvia,

através da ausência de entendimento (MEDEIROS, 2004). No caso, há uma justificativa para

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se praticar o crime, há uma razão, uma explicação, um porquê, etc. Por mais que seja uma

conduta reprovável, se busca, ilicitamente, a aquisição de valores e condições para se

consumir e, consequentemente, surgir na sociedade como ser, de fato.

Quem comete delitos nessa perspectiva demonstra que o crime é o caminho mais rápido para

se combater a exclusão social e que a conduta é decidida como solução às diferenças entre as

pessoas. É o não ter o que o outro tem (CONTE, OLIVEIRA, HENN, WOLFF, 2007).

A questão é compreendida quando se relaciona o consumo e o crime, e se indaga: qual a

motivação para roubar, furtar e traficar? Por que é necessário cometer o crime? A resposta

está na solução urgente de se manter existente e incluído na sociedade.

Correto? Não, mas explicativo. Saída rápida pensada para todos? Não, mas por aqueles sem

acesso à cultura da boa educação e formação. O crime pode estar em uma linha tênue entre a

inclusão e a exclusão social.

A rejeição e a exclusão são humilhantes e pretendem isso; visam a fazer o

rejeitado/excluído aceitar sua imperfeição e inferioridade social. Não admira

que as vítimas ergam uma defesa. Em vez de aceitarem docilmente a sua

rejeição e converter a rejeição oficial em auto-rejeição, elas preferem rejeitar

os que as rejeitam. Para isso, o rejeitado/excluído recorre aos únicos meios à

sua disposição, todos contendo alguma dose de violência; é o único recurso

que pode aumentar seu “poder de prejudicar”, único poder que podem opor ao

poder esmagador dos que os rejeitam e excluem. A estratégia de “rejeitar os

que rejeitam” logo afunda nos estereótipo do rejeitado, acrescentando à

imagem do crime a inerente propensão do criminoso à reincidência

(BAUMAN, 1999, p. 134/135).

Diante do cenário, onde estaria a solução para a minimização de crimes que envolvem essas

espécies de justificativas? Estaria na reprimenda à sua ocorrência? Ora, se há uma

possibilidade concreta de se evidenciar na necessidade de consumo, vislumbra-se que se faz

necessário aprofundar o tema, constatar a hipótese levantada e tratar da fonte do problema,

que é social e não, exclusivamente, criminal.

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2.5.2 Reprimenda do crime x políticas públicas consumeristas

O raciocínio tratado no presente tópico consiste em encontrar uma resposta para a indagação:

o que fazer? De um lado, tem-se uma sociedade que exige o consumismo para que o indivíduo

se mantenha existente e incluído nela, do outro tem-se pessoas buscando encontrar um

caminho mais rápido da inclusão e existência social, através de condutas ilícitas.

A princípio, tende-se a acreditar que, como solução, ter-se-ia a reprimenda do crime, ou seja,

trata-lo com o rigor necessário. No entanto, esse raciocínio retira o consumo como foco.

Antes de mais nada, saliente-se que o presente tema não trata de crime numa perspectiva

penalista pura, mas do crime advindo da seara consumerista, sendo assim há de se evidenciar

o consumo como vertente nessa construção científica.

Nessa seara, tem-se que a solução não se encontra no âmbito da reprimenda, mas no de

efetivação de políticas públicas da esfera consumerista, partindo do raciocínio de que se o

consumo é, também, o foco e o motivo para a busca do crime, é ele que deve ser pensado,

revisto e reformulado.

O contexto em epígrafe remete à análise do tópico próprio que trata do consumismo enquanto

consumo exacerbado, e ousa vislumbrar que, certamente, uma solução social e criminal

estaria nesse contexto. Conquanto, tratar do consumismo significa dar nova roupagem ao

conceito de inclusão e visibilidade social e, ao mesmo tempo, inibir práticas criminosas

advindas da necessidade e do anseio social de se ver existente, de fato.

Resta, pois, uma diagnose aprofundada de quais políticas públicas preencheriam tantas

lacunas sociais; quais medidas legislativas supririam a omissão patente do CDC e de que

forma essas ações poderiam inibir as práticas criminosas.

A pretensão do presente trabalho é, também, contribuir para possíveis diagnósticos e soluções,

de forma que a ideia foi lançada no sentido de levantar a hipótese da ocorrência de crimes

advir, também, da necessidade de consumo e, por sua vez, evidenciar o nascimento de

possibilidades que inibam e minimizem as condutas ilícitas no meio social.

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A verdade, é que está constatado que o consumo é fenômeno social capaz de blindar

determinados grupos e expor outros a uma situação de vulnerabilidade existencial. Daí, a

questão consumerista ser tratada como via de crime.

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3 METODOLOGIA

O presente capítulo demonstrará o caminho metodológico percorrido, justificando o método

utilizado e indicando os procedimentos que foram aplicados para atenderem a proposta do

problema de pesquisa.

Apontará, em tópicos próprios, a escolha do método, o locus da pesquisa, os sujeitos da

pesquisa, a técnica de coleta dos dados e a técnica da análise dos dados.

3.1 A escolha do método

Compreende-se a metodologia e, consequentemente, a escolha do método, como o horizonte,

o norte, o caminho, enfim, o mapa que demonstra a passagem percorrida, no sentido de

alcançar os objetivos do estudo em tela. Analisa-se:

A escolha de um caminho científico supõe que, para estudar um fenômeno

cientificamente, este deve ser medido. Em outras palavras, o fenômeno deve

ser perceptível, sensível e classificável, ainda que o cientista social possa

trabalhar com conceitos teoricamente abstratos, tais como: amor,

aprendizagem e qualidade de vida; antes de estudá-los empiricamente, deve

procurar comportamentos, estímulos, características ou fatos que

representem estes conceitos (RICHARDSON, 1989, p.21).

A presente pesquisa, diante de seus objetivos propostos, impõe a abordagem de cunho

qualitativo, tendo em vista que o tema em comento exige o estudo dos fenômenos da

criminalidade e do consumo, determinando a compreensão do que verdadeiramente significa a

visibilidade como condição humana e a violência social, além de ordenar o entendimento do

conceito de consumidor vulnerável e dos efeitos de exclusão provocados pelas marcas que

buscam incluir grupos preordenados e pré-selecionados.

A pesquisa qualitativa é delineada a partir da problemática, uma vez que, segundo os

objetivos apontados, caminha em um mundo de conclusões, ações, críticas, motivações,

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pretensões, crenças, valores, e permeia no universo das percepções, dos sentimentos

(LAKATOS, 2010).

Acredita-se que o presente trabalho encontra consonância em uma pesquisa qualitativa,

partindo do pressuposto de que não há o que quantificar no presente estudo, mas sim

demonstrar significados a partir das percepções, sentimentos, sensações e interpretações.

A abordagem qualitativa possibilita investigar a relação entre o consumo e a criminalidade, o

que implica no estudo fenomenológico, afinal, resta imposto o estudo didático desses

fenômenos sob a essência de cada um, ultrapassando os limites conceituais e adentrando no

contexto como um todo, transpondo os limites do existencialismo.

O estudo do tema visa a busca por explicações, percepções, sentimentos... que foram

absorvidos através de entrevista semiestruturada, considerando a necessidade de perceber a

lógica da mente do sujeito que afirma ter seguido o caminho da criminalidade em busca do

consumo, objetivando a visibilidade e existência social.

A pesquisa se revela exploratória, de caráter de estudo e discussão, segundo a indicação dos

objetivos. É salutar frisar que houve a necessidade do aprofundamento do estudo da

criminalidade e do consumo de forma atrelada, relacionada, conquanto o estudo isolado

desses fenômenos não seria capaz de revelar o que aponta o problema de pesquisa, que

buscou respostas à seguinte indagação: Considerando a invisibilidade social vivenciada por

pessoas de baixa renda, de que forma a necessidade do consumo funciona como estímulo à

conduta criminosa?

Para comprovar a teoria explorada, insurgiu a necessidade da pesquisadora se dirigir até uma

Unidade Prisional, qual seja, a Penitenciária Juiz Plácido de Souza, no Município de Caruaru

– PE, considerando que a problematização da temática foi enfatizada por meio de entrevista

nesse ambiente, conforme se aponta em tópicos próprios, os sujeitos e a devida técnica.

Necessariamente, o tema foi investigado em ambiente próprio e condizente com a perspectiva

dos objetivos traçados, afinal, a pesquisa deve ter como principal ferramenta o próprio

ambiente e o investigador que coletará dados interpretativos (BOLGDAM e BICKLEM,

1986).

Em suma, o tipo de pesquisa se caracterizou na abordagem qualitativa, através do método de

estudo fenomenológico e do caráter exploratório, conforme apresenta o quadro abaixo:

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Quadro 2 - Caminho metodológico

CAMINHO

METODOLÓGICO

CARACTERIZAÇÃO DA

PESQUISA

ADEQUAÇÃO AOS

OBJETIVOS

Abordagem dos dados Qualitativa Busca-se a percepção do

preso, sujeito de baixa

renda, da necessidade de

consumo e da prática de

crimes.

Método de pesquisa Fenomenológico A abordagem qualitativa

perpassa no instrumento de

estado fenomenológico da

criminalidade e do

consumo, em sua essência,

ultrapassando os limites

conceituais, transpondo os

limites do existencialismo.

Fonte: Elaboração própria, 2015

3.2 Locus da pesquisa

Sabendo-se que a presente pesquisa tem um olhar fenomenológico, a partir do método

indicado, o locus relaciona-se com o objeto de estudo, qual seja, no caso em tela, o consumo e

a criminalidade.

Ainda que a pesquisa tenha sido realizada na Unidade Prisional – Penitenciária Juiz Plácido

de Souza – PJPS, no Município de Caruaru (PE), local aonde se encontram os sujeitos da

pesquisa, o campo de estudo foi o instituto da criminalidade e o consumo, razão pela qual o

locus se definiu nesses fenômenos.

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Para que o desenho da pesquisa se ajustasse aos objetivos, se fez necessário utilizar a técnica

empregada voltada ao locus consumo e ao locus criminalidade, considerando que buscou-se

evidenciar a relação desses fenômenos, a partir da ocorrência de crimes contra o patrimônio

por pessoas detentoras de baixa renda.

3.3 Sujeitos da pesquisa

Considerando que a problemática do estudo realizado indaga se a necessidade de consumo

funciona como estímulo à conduta criminosa, a presente pesquisa se delineia no universo de

homens presos em razão da prática de condutas criminosas.

A amostra da pesquisa indica o número de cinco presos, detentores de poder aquisitivo baixo.

A idade compreende 20 e 45 anos; o tipo penal analisado está voltado aos crimes contra o

patrimônio, os quais apontam, segundo dados indicados pela Secretaria Executiva de

Ressocialização – SERES, aproximadamente 50% dos crimes praticados no Estado de

Pernambuco. Dado interessante que precisa ser investigado em torno do consumo.

Elaboração própria, 2015

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A opção dos sujeitos da presente pesquisa indica a viabilidade da investigação temática, qual

seja a relação entre a criminalidade e o consumo. Destaque-se que os crimes contra o

patrimônio são alvos daqueles que buscam adquirir vantagem pecuniária. Em relação à opção

do gênero masculino, depreende-se da constatação prática, através do campo profissional da

pesquisadora, que se trata de população carcerária, numericamente maior em comparação ao

do gênero feminino, revelando uma maior efetividade dos resultados da pesquisa.

Os dados são confirmados pela Secretaria Executiva de Ressocialização do Estado de

Pernambuco, apontando que, no Estado, a comunidade carcerária feminina representa um

percentual em torno de 0,5%, em comparação à população masculina. O número de presídios

femininos não chega a 2%, considerando o total de encarceramentos construídos no Estado.

Portanto, a população carcerária masculina representa 99,5%, aproximadamente.

Quanto à idade apontada, se mostra reveladora dos desejos e necessidades diferenciados,

tendo em vista que compreende a fase da juventude e a fase adulta, condensando as

preferências diversificadas de consumo, por isso a indicação se deu nessa faixa etária.

Com relação à classificação de baixa renda, partiu-se do pressuposto de investigar o fator

necessidade, advinda da ausência de condições de suprir os desejos oriundos do consumo.

Quadro 3 - Caminho metodológico

CAMINHO

METODOLÓGICO

CARACTERIZAÇÃO DA

PESQUISA

ADEQUAÇÃO AOS

OBJETIVOS

LOCUS Consumo e criminalidade Relação entre si

UNIVERSO Presos acusados por crimes

contra o patrimônio

Sujeitos passivos de violência

social em busca da necessidade

de consumo

AMOSTRA

5 presos por crimes contra o

patrimônio;

Idade entre 20/45 anos;

Detentores de baixa renda.

Necessidade de consumo pela

baixa renda auferida.

Fonte: Elaboração própria, 2015

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3.4 Técnica de coleta dos dados

A escolha do instrumento para a coleta de dados atendeu aos objetivos propostos na pesquisa.

Conforme já esboçado em outros tópicos, o método fenomenológico norteou a investigação

em comento, adequando o estilo de pesquisa presente a partir do estudo conceitual e

existencial da criminalidade e do consumo, perpassando pelo seu contexto a partir da

interpretação mental dos sujeitos da pesquisa.

A técnica de coleta de dados se deu com a entrevista semiestruturada, visando uma maior

flexibilidade do roteiro e a possibilidade de novas formulações de questionamentos no

decorrer da entrevista (SILVA, GODOI e BANDEIRA-DE-MELO, 2010).

A entrevista teve o propósito de identificar, segundo os objetivos específicos, a relação entre o

crime contra o patrimônio e o consumo, fluindo com a exposição efetiva da fala dos

entrevistados, sujeitos da pesquisa, contextualizando a temática e suas nuances.

O roteiro da entrevista (APÊNDICE A) comportou três blocos, sendo o primeiro de

identificação pessoal do entrevistado, abordando ainda o patamar da renda auferida antes da

prisão. O segundo bloco apontou questionamentos que visaram identificar a ocorrência dos

crimes praticados e, por fim, o terceiro bloco indicou perguntas que buscaram identificar os

sentimentos dos entrevistados segundo a visão do consumo, com ênfase na necessidade de uso

de marcas exclusivas e com foco na percepção de inexistência e invisibilidade social, bem

como acerca da ocorrência dos crimes cometidos.

O roteiro da entrevista se coadunou com os objetivos específicos da presente pesquisa,

conforme delineado a seguir:

O primeiro objetivo buscou identificar se os crimes contra o patrimônio podem ser motivados

pela necessidade de consumo por pessoas de baixa renda, o que foi buscado no roteiro

proposto na entrevista, sobretudo no primeiro e terceiro bloco, quando se abordou a renda

auferida pelo entrevistado, bem como seus sentimentos em relação à ocorrência dos crimes

cometidos e suas motivações.

O segundo objetivo indicou a análise da busca pelo consumo de marcas exclusivas a partir da

necessidade de inclusão, diante do sentimento de inexistência e invisibilidade social.

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Coadunou-se com o terceiro bloco do roteiro da entrevista, o qual abordou essas perspectivas

de forma incisiva.

Por fim, o terceiro objetivo visou investigar quais os aspectos de violência social que

condicionam a prática de crimes contra o patrimônio. O segundo e terceiro bloco do roteiro da

entrevista apontou exatamente o que propôs o objetivo em tela, considerando que o seu bojo

buscou do entrevistado a revelação da percepção própria de existência e visibilidade social,

bem como das motivações das condutas criminosas praticadas.

Aplicou-se a técnica, qual seja a entrevista semiestruturada, por meio de anotação, gravação e

filmagem dos entrevistados, mediante termo de autorização assinado (APÊNDICE B), a fim

de possibilitar a transcrição fidedigna do contexto, o que viabilizou uma análise efetiva dos

dados coletados.

Toda técnica utilizada baseou-se nas fontes de pesquisa buscadas, através de consultas a

livros, artigos e revistas. Foi possível a identificação da pesquisadora com a aplicação da

técnica, com a observância aos objetivos propostos.

Inicialmente, para o caminho de coleta de dados, estabeleceu-se o planejamento de ações:

1ª ação: Análise da comunidade carcerária na PJPS – Penitenciária Juiz Plácido de Souza;

2ª ação: Identificação dos presos por crimes contra o patrimônio;

3ª ação: Identificação de presos por crimes contra o patrimônio com histórico de reincidência

específica;

4ª ação: Identificação de presos por crimes contra o patrimônio, segundo os critérios de renda

e idade, adotados e delineados na pesquisa;

5ª ação: Seleção dos sujeitos da pesquisa a serem entrevistados;

6ª ação: Contato entre a pesquisadora e os selecionados para solicitação de disponibilidade de

concessão de entrevista;

7ª ação: Seleção para os sujeitos da pesquisa, segundo disponibilidade de concessão de

entrevista;

8ª ação: Realização de entrevista com os sujeitos da pesquisa.

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As ações descritas foram essenciais para a seleção criteriosa dos sujeitos, considerando os

propósitos dos objetivos, os quais se direcionaram a sujeitos a serem escolhidos sob

determinados critérios, segundo a temática da pesquisa.

O critério, pois, foi intencional:

[...] é imperativo selecionar uma boa amostra. A amostragem, como visto na

coleta de dados quantitativos, pode ser feita de diversas formas. Mas nas

pesquisas qualitativas, porque como não haverá a possibilidade de se

justificar a escolha por meio de números ou questões estatísticas, há que se

comprovar que o grupo selecionado (ou caso escolhido) é representativo do

fenômeno que se deseja investigar. [...]

Para pesquisas qualitativas o método de composição da amostra mais

utilizado é a amostra intencional. A justificativa é a facilidade de encontrar

eventos ou pessoas dispostas a participar (MALHEIROS, 2011, p. 192).

Considerando o planejamento de ações, proposto pela pesquisadora para a coleta de dados,

inicialmente a pesquisadora buscou informações acerca da comunidade carcerária da PJPS –

Penitenciária Juiz Plácido de Souza, identificando um número elevado de presos acusados de

crimes contra o patrimônio, certificando, assim, a viabilidade inicial da escolha dos sujeitos

para a pesquisa, ratificando o local indicado como o campus do estudo em tela.

Na segunda ação do planejamento, a pesquisadora teve acesso às pastas de arquivo do setor

penal da Unidade Prisional, identificando os cadastros dos presos por crimes contra o

patrimônio. Em ato contínuo, como terceira ação, identificou os presos reincidentes nesses

tipos penais, selecionando os que apresentaram número mais elevado de condutas criminosas.

Uma vez selecionados, os presos com maior número de crimes contra o patrimônio, a

pesquisadora, obedecendo a indicação da quarta ação, passou a selecionar os sujeitos pelo

critério de idade e renda, segundo as determinações metodológicas da pesquisa. Identificou,

dentre os presos com número elevado de crimes contra o patrimônio, aqueles com idade entre

20 e 45 anos e com renda incompatível com os produtos oriundos dos crimes perpetrados.

Em cumprimento à quinta ação, a pesquisadora selecionou dez presos, segundo os critérios

acima apontados, seguindo para a realização da sexta ação, buscando identificar, dentre os

presos selecionados, os que se disponibilizariam a serem pesquisados, por meio de

entrevistas.

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Dos dez presos indagados, dois recusaram, e, atendendo a indicação da sétima ação, a

pesquisadora optou pelos cinco presos com maior índice de práticas criminosas, dentre os oito

que aceitaram ser entrevistados.

A oitava ação se concretizou com a realização da entrevista aos presos selecionados, após

todos os critérios acima apontados. Cinco presos com os seguintes perfis:

Idades de 24, 29, 30, 31, 41 anos.

Crimes de furto, roubo, receptação, latrocínio.

Rendas auferidas incompatíveis com a aquisição dos produtos adquiridos nos crimes

praticados.

Diante das oito ações concluídas, a pesquisadora apresentou ao Diretor da unidade Prisional

os selecionados, pedindo autorização para a filmagem e gravação de áudio das entrevistas,

sendo concedida a autorização de todos os áudios e de apenas uma filmagem, justificando-se

pelas regras administrativas daquela Unidade, bem como com as orientações da Secretaria de

Ressocialização do Estado de Pernambuco, cujos argumentos foram expostos de forma verbal,

sendo, de imediato, acolhidos pela pesquisadora.

O preso apontado pela direção da Unidade para ser filmado durante a entrevista foi M. E. M.

F. de 29 anos, tendo em vista que o mesmo logo se prontificou e autorizou, quando indagado.

A entrevista se deu em uma sala no espaço contíguo da cozinha da Unidade Prisional, em

razão da ausência de estrutura física da Unidade para a concessão de uma sala à disposição da

pesquisadora, esta que se esforçou em adequar o ambiente da forma mais apropriada,

atendendo às necessidades de iluminação, silêncio e conforto mínimo para que a entrevista

fluísse sem inquietações ou intervenções, conforme explícito no tópico de limitações da

pesquisa.

No início das entrevistas, iniciando a coleta de dados propriamente dita, a pesquisadora expôs

o propósito da mesma, deixando, mais uma vez, cada entrevistado ciente da livre escolha de

ser sujeito da pesquisa. Apresentou o teor do termo de autorização (APÊNDICE B), que foi

devidamente lido e assinado por cada entrevistado.

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A entrevista indicada pela metodologia aplicada foi a semiestruturada, em razão da pretensão

da pesquisa. Através dessa espécie de entrevista, é possível uma maior flexibilidade do

roteiro, de forma que o pesquisador tem a faculdade de formular novas indagações no

decorrer da entrevista, caso ache viável e necessário. (SILVA, GODOI e BANDEIRA-DE-

MELO, 2010).

A entrevista seguiu a pauta exposta no roteiro (APÊNDICE A) e buscou investigar as

trajetórias criminosas dos sujeitos da pesquisa, com base na percepção e no sentimento de

inexistência e invisibilidade social.

Observou-se, no teor das entrevistas dos sujeitos pesquisados, as ações criminosas descritas e

as atitudes isoladas em cada crime mencionado, extraindo-se, das falas dos entrevistados, as

evidências e as motivações de cada prática, segundo a relação entre crime e consumo.

A entrevista foi finalizada com as conclusões gerais do contexto da pauta orientadora da

entrevista e com os agradecimentos da pesquisadora pela disponibilidade do

entrevistado/pesquisado.

3.5 Técnica de análise dos dados

Uma vez aplicada a técnica de coleta dos dados, a apresentação se deu sob a ótica da análise

de conteúdo, tendo em vista ser a técnica que se coaduna com a abordagem e o método da

pesquisa em tela.

A análise de conteúdo compreende fases essenciais, que vão desde a pré-análise até a

interpretação dos resultados. (BARDIN, 1977).

A problemática, delineada nos objetivos, foi categorizada a partir dos contextos que

nortearam a temática, propondo a análise de conteúdo dos resultados.

A trajetória metodológica, conforme demonstrado, segue a abordagem qualitativa, o que

revela a análise de conteúdo como a mais aplicável forma de análise de dados.

(MALHEIROS, 2011).

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A análise dos dados tem como base a categorização temática, selecionada a partir de

indicações temáticas abordadas nos objetivos, o que segue a orientação da análise de conteúdo

que exige a passagem de etapas de planejamento a partir da codificação do material de

pesquisa. (BARDIN, 1977).

O caminho metodológico trilhado na presente pesquisa segue o delineamento dos objetivos

propostos e da problemática temática, que se contextualizam, segundo expõe o quadro abaixo:

Quadro 4 - Contextualização metodológica

PROBLEMATIZAÇÃO OBJETIVO

GERAL

OBJETIVOS

ESPECÍFICOS

Considerando a invisibilidade

social vivenciada por pessoas

de baixa renda, de que forma

a necessidade do consumo

funciona como estímulo à

conduta criminosa?

Verificar de que maneira a

necessidade do consumo de

pessoas de baixa renda,

provocada pela

invisibilidade social,

estimula a prática criminosa.

1. Identificar se os crimes

contra o patrimônio podem

ser motivados pela

necessidade de consumo por

pessoas de baixa renda, ou

se a hipótese é refutada a

partir do arcabouço teórico e

das pesquisas realizadas.

2. Analisar se a busca pelo

consumo de marcas

exclusivas surge da

necessidade de inclusão,

diante do sentimento de

inexistência e invisibilidade

social.

3. Investigar quais os

aspectos de violência social

que condicionam a prática

de crimes contra o

patrimônio.

Fonte: Elaboração própria, 2015

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As técnicas utilizadas comunicam-se entre si, devido o que propõe cada objetivo e diante da

contextualização dos mesmos com a problemática exposta.

Quadro 5 - Caminho metodológico

CAMINHO

METODOLÓGICO

CARACTERIZAÇÃO DA

PESQUISA

ADEQUAÇÃO AOS

OBJETIVOS

TÉCNICA DE COLETA

DOS DADOS

Entrevista semiestruturada Busca-se extrair da fala a

motivação da conduta criminosa

e sua relação com o consumo,

através do contato entre

pesquisador e entrevistado,

elevando o avanço qualitativo da

pesquisa.

TÉCNICA DE ANÁLISE

DOS DADOS

Análise de conteúdo das

categorias temáticas deduzidas

do teor das entrevistas,

cruzando-se os resultados com

as reflexões inferidas na

problemática

Análises:

Categorização temática x

entrevista

Questionamentos x objetivos

Fonte: Elaboração própria, 2015

Considerando, finalmente, que os objetivos devem ser justificados e amparados teoricamente,

a presente pesquisa adéqua o objetivo geral às categorizações, segundo a codificação indicada

pela análise de conteúdo, e os objetivos específicos, por sua vez, se referenciam no arcabouço

teórico, que é pilar referencial do presente estudo.

Os aspectos conceituais indicam a viabilidade da temática proposta, segundo a

problematização exposta nos objetivos que norteiam a pesquisa. O quadro a seguir demonstra

palavras categorizadas, extraídas a partir da temática do estudo em tela.

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Contextualizando a metodologia e a fundamentação teórica, demonstra-se que o tema de

estudo aponta os conceitos das categorias intencionalmente selecionadas, justificando a

pesquisa.

Quadro 6 - Caminho metodológico

CATEGORIZAÇÃO OBJETIVOS FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

INVISIBILIDADE

SOCIAL

Violência social

1,2,3

• A invisibilidade é elemento de violência

(LINDGREN, 2005);

• O homem só passa a ser concreto quando

se vê inserido no contexto social, sem a

garantia dos direitos será um homem

abstrato. (BOBBIO, 2004);

• O conceito de violência não pode ser

considerado único, diante da sua

capacidade de disseminar efeitos diversos

(ARENDT, 1985), (MAFFESOLI, 1987).

VULNERABILIDADE

CONSUMERISTA

Consumo

Consumismo

2

• A atual sociedade se moderniza, também,

na imposição consumerista, conquanto

consumir não mais se trata de uma

vontade livre, mas vinculada às

necessidades sociais. (BAUMAN, 2008)

• É no supérfluo que a existência social se

firma. (BAUDRILLARD, 2003)

CRIMINALIDADE

COMO MEIO DE

CONSUMO

Inclusão exclusiva

1,3

• Consumo é medido pela gama de

mutação, multiplicação e rotatividade de

produtos e serviços disponibilizados no

mercado. (BAUDRILLARD, 2003)

• É perceptível que o poder de consumo

passou a medir o grau de felicidade,

prazer e satisfação das pessoas,

considerando que o consumo significa

reconhecimento social, pois é a partir

dele que se busca igualdade social.

(CONTE, OLIVEIRA, HENN, WOLFF,

2007);

• Grupos começam a se formar e as

pessoas passam a vivenciar um

sentimento de pertencimento, chegando a

se identificarem, entre si, através da

marca (LINDSTROM, 2009). Fonte: Elaboração própria, 2015

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3.6 Limites da pesquisa

Os recortes da presente pesquisa atenderam os seus delineamentos, segundo a relevância

desenhada no tema, nos objetivos, na justificativa e na metodologia.

Conforme apontado nos tópicos próprios, a pesquisa se deu no locus – Consumo e

criminalidade, considerando o recorte temático de cunho fenomenológico, que dependia do

estudo sistemático de ambos institutos, nas suas formas individualizadas, e contextualizadas

sob a visão de interdisciplinaridade.

Em que pese o locus da presente pesquisa se dá no campo do estudo dos fenômenos acima

apontados, o campo da pesquisa foi a PJPS – Penitenciária Juiz Plácido de Souza, na Cidade

de Caruaru – PE, tendo em vista ser o local onde encontram-se os sujeitos entrevistados para a

coleta de dados.

Considerando a metodologia do estudo em tela, os sujeitos da pesquisa foram apontados com

as seguintes características:

1. Pessoas encarceradas;

2. Homens;

3. Idade entre 20 e 45 anos;

4. Número de cinco entrevistados;

5. Acusados por crimes contra o patrimônio;

6. Detentores de renda baixa, tendo como parâmetro, a incompatibilidade com os

produtos adquiridos por meio da ação criminosa.

A pesquisa, pois, desenhou-se com os limites acima expostos, não transpassando os recortes

determinados pela temática e metodologia, atendendo às expectativas dos objetivos propostos,

segundo a problemática apresentada.

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3.7 Limitações da pesquisa

Conforme propõe a temática do presente estudo, a pesquisa engloba o consumo dentro de uma

perspectiva de crime, o que impõe dificuldades naturais, em razão da própria abordagem que

determina a coleta de dados, através de pessoas que praticaram crimes, quais sejam, crimes

contra o patrimônio.

Segundo os limites da pesquisa, já apresentados, a mesma se deu em uma comunidade

carcerária, ou seja, em um ambiente voltado à restrição de liberdade de pessoas acusadas de

crimes, o que exigiu da pesquisadora uma cautela acima da normalidade, considerando o

ambiente, os sujeitos envolvidos, a restrição de acesso a documentos pertinentes à pesquisa,

dentre outras questões delineadas a seguir.

A princípio, a dificuldade esteve voltada à autorização para a realização da pesquisa, uma vez

que foram necessárias várias demonstrações do cunho científico da pesquisa. Em que pese ser

notória a conduta solícita da direção da Unidade Prisional, essa se restringe às determinações

e autorizações à nível de secretaria estadual, qual seja, a Secretaria de Ressocialização e

Defesa Social. Contudo, a pesquisadora ultrapassou o primeiro obstáculo, de forma que houve

a devida autorização para a realização da pesquisa.

A próxima dificuldade encontrada se deu no aspecto documental, uma vez que, mesmo diante

do acesso ao arquivo da Unidade, foi necessária a realização de uma seleção dos possíveis

sujeitos da pesquisa, segundo critérios direcionados pela metodologia proposta, sendo

valorizados os dados de idade, espécie de crimes, indicação de renda e reincidência. A ação

indicada levou um dia, com aproximadamente cinco horas contínuas, voltadas para a seleção

documental.

Uma vez escolhidos os possíveis sujeitos da pesquisa, mais uma dificuldade foi enfrentada: a

autorização de gravação das futuras entrevistas, objetivando a análise fidedigna do teor das

mesmas no momento da análise. Sob o argumento da restrição de concessão de imagens dos

sujeitos encarcerados, a direção se limitou a autorizar a filmagem de apenas um entrevistado,

permitindo a gravação de áudio dos demais sujeitos indicados para as entrevistas. Todos os

entrevistados aceitaram assinar os termos de autorização das respectivas gravações das

entrevistas.

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Não houve dificuldade, a princípio, na aceitação dos sujeitos em concederem as entrevistas.

No entanto, iniciada a fala da pesquisadora, esta sentiu o receio de três, dos cinco sujeitos

entrevistados, no sentido de temerem falar sobre as suas condutas criminosas e serem

prejudicados nos processos em trâmite na Justiça. Para superar a dificuldade encontrada, a

pesquisadora não mediu esforços em explicar e esclarecer o cunho da pesquisa, assegurando a

não implicação do processo criminal perante a Justiça, diante das informações prestadas. Na

verdade, restou necessário o comprometimento da pesquisadora, perante os sujeitos, em não

repassar as informações obtidas nas entrevistas para os processos em trâmite. Após o

compromisso firmado, a pesquisadora sentiu a tranquilidade dos sujeitos, no sentido de

exporem suas condutas, motivações, sentimentos, justificativas e razões atreladas ás condutas

criminosas relatadas.

Uma forte limitação da pesquisa foi o ambiente onde se deram as entrevistas – uma ante-sala

contígua à cozinha da Unidade Prisional. O lugar foi indicado, apontado e escolhido diante da

falta de opção e, por ser dentro do local, o ambiente menos impraticável à realização das

entrevistas.

As principais dificuldades do ambiente foram o forte barulho em volta do lugar, bem como a

constante entrada e saída de alguns detentos, em razão da prestação de serviço no interior da

cozinha. Para superar a dificuldade encontrada e tornar possível a realização das entrevistas, a

pesquisadora solicitou a restrição do ambiente apenas às pessoas envolvidas, quais sejam,

pesquisadora e sujeito a ser entrevistado. Solicitou, ainda, a compreensão das pessoas que se

encontravam nas salas vizinhas àquela, no sentido de promoverem o silêncio adequado ao

momento, o que foi, de pronto, atendido.

Uma vez superadas as limitações encontradas, na medida do possível, segundo as condições

do ambiente de uma Unidade Prisional, as entrevistas foram realizadas e devidamente

gravadas, sendo uma com imagem e quatro apenas com áudio. As entrevistas fluíram,

atendendo aos questionamentos do roteiro predisposto, havendo considerações importantes e

espontâneas dos entrevistados, as quais foram de suma importância para análise dos objetivos

propostos.

A pesquisadora sentiu a adesão dos sujeitos, no sentido de desejarem participar das

entrevistas, não havendo nenhuma percepção de constrangimento ou algo da espécie.

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Em suma, em que pese ter havido intercorrências durante a realização da pesquisa em

comento, as dificuldades foram superadas e não impediram a devida realização, sendo

satisfatória a coleta de dados e suficientes para a precisa análise.

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4 APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA

O presente capítulo, em consonância com o caminho metodológico exposto, apresentará,

analisará e discutirá os resultados da pesquisa proposta, segundo os dados colhidos.

A partir do objetivo geral e considerando a técnica de análise de dados pela via de análise de

conteúdo, a pesquisadora selecionou, quando da análise dos dados colhidos, as semelhanças e

contrapontos identificados no teor das entrevistas (BAPTISTA, 2007).

Os presos entrevistados indicaram atitudes, sentimentos, percepções que se assemelharam

entre si, levando os contextos traçados à análise de palavras chave inerentes à temática da

presente pesquisa, tratadas, segundo Malheiros (2011), como unidades de significado, as

quais devem se antecipar às categorias temáticas, criadas para condensá-las.

Diante das unidades de significados, extraídas exclusivamente da coleta de dados, a

pesquisadora instituiu duas categorias temáticas, nominando de:

Ausência de consumo;

Busca do consumo.

A primeira categoria temática foi nominada pela pesquisadora de ausência de consumo, diante

das indicações dos presos entrevistados, quanto ao caminho dos crimes cometidos. Indicaram,

intrinsecamente, a ausência de consumo, quando apontaram a renda auferida como

incompatível para o consumo necessário e quando evidenciaram sentimentos de invisibilidade

e inexistência social.

A segunda categoria temática, nominada de busca do consumo, se baseou também nos relatos

apontados pelos presos entrevistados, quando externaram as motivações dos crimes

cometidos. Externaram a necessidade do consumo de marcas exclusivas para a inclusão

social, além de afirmarem que os crimes praticados tiveram como motivação a busca pelo

consumo.

Assim, as categorias temáticas se apresentam da seguinte forma:

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Quadro 7 - Categorias temáticas

CATEGORIAS TEMÁTICAS UNIDADES DE SIGNIFICADO

AUSÊNCIA DE CONSUMO

• Presos detentores de baixa renda;

• Evidências de invisibilidade e

inexistência social.

BUSCA DO CONSUMO

• A busca da inclusão através do consumo

de marcas exclusivas;

• Prática de crimes contra o patrimônio

em busca de consumo.

Fonte: Elaboração própria, 2015

4.1 Apresentação dos sujeitos pesquisados

Primeiramente, apontar-se-á os sujeitos pesquisados na Unidade Prisional onde realizou-se a

pesquisa, segundo os critérios de baixa renda, espécie de crime – crimes contra o patrimônio,

evidências de invisibilidade e inexistência social, e motivação da busca pelo consumo através

da necessidade de inclusão.

Foram entrevistados cinco sujeitos, abaixo apresentados pelas iniciais dos seus nomes, com o

propósito de preservar a identidade de cada um.

1. M.E.M.F.

2. E.B.S.

3. E.B.S.

4. J.R.N.

5. T. M. B. S.

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Reforçando-se que os presos entrevistados não foram escolhidos aleatoriamente, buscou-se

adequar cada sujeito aos enfoques da temática proposta, conforme delineado na metodologia

descrita.

O preso M. E. M. F, 29 anos, ensino fundamental incompleto, encontra-se preso em razão de

ter cometido oito assaltos de cargas, demonstrando o objetivo de adquirir valores em dinheiro,

como resultado das condutas criminosas perpetradas. Preso em flagrante por um dos crimes,

passou a receber os decretos prisionais dos demais, cujos processos se encontravam em

tramitação, com as respectivas acusações, totalizando oito.

À época dos crimes e da prisão, o preso em comento possuía emprego, laborando como

vendedor de cestas básicas, auferindo renda oriunda de comissão das vendas realizadas.

O segundo preso entrevistado foi E. B. S., 24 anos, não alfabetizado, indicando apenas saber

escrever o seu nome. O encarceramento se mantém pelo fato de duas condutas criminosas,

quais sejam um furto de dinheiro em espécie e dois roubos de aparelhos celulares.

Quando praticou as condutas criminosas, encontrava-se desempregado, destituído de renda

certa e fixa. Foi preso em razão do cometimento dos crimes de roubo.

E. B. S., 41 anos, ensino fundamental incompleto, tem sua prisão mantida pela prática de

quatro furtos, concomitantemente de dinheiro e aparelhos celulares. No decorrer das práticas

criminosas, foi preso e solto várias vezes, sempre retornando ao cárcere pela reiteração das

condutas voltadas ao crime de furto.

À época da última prisão, mantida até então, em decorrência dos crimes praticados, o mesmo

encontrava-se laborando como vigilante residencial e possuía renda mensal fixa.

O preso J. R. N., 30 anos, ensino fundamental incompleto, encontrava-se laborando como

autônomo na Cidade de Santa Cruz, quando foi preso em razão de sentença condenatória

superveniente, ou seja, decisão em processo de crime anterior, embora o julgamento fora

arbitrado posteriormente. Como a sentença foi condenatória e concluiu pelo cumprimento de

pena em regime fechado, o preso em tela foi recolhido ao cárcere para o efetivo cumprimento.

O histórico de trabalho do preso, à época dos crimes praticados, diversificou-se. Durante a

ocorrência de um crime de roubo, para subtração de dinheiro, a princípio se encontrava

desempregado, vendendo cerveja em festas, depois, ao sair em cumprimento de pena em

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regime aberto, passou a trabalhar como vendedor de confecção, na condição de autônomo,

quando foi preso sob a acusação do crime de latrocínio, do qual o se diz inocente.

O último preso entrevistado foi T.M.B.S., 31 anos, ensino médio completo. À época da prisão,

era agente da FUNASE, na Cidade de Caruaru. Foi preso, inicialmente, pela acusação do

crime de receptação de carga roubada e, posteriormente, preso novamente sob a acusação do

crime de latrocínio, pelo qual se encontra encarcerado cumprindo pena.

4.2 Análise e discussão das unidades de significado das categorias temáticas

4.2.1 Presos detentores de baixa renda

A baixa renda é um dos fatores analisados nos objetivos específicos, apresentando-se como

uma categoria temática da análise de conteúdo. O tema propõe a investigação da relação entre

o consumo e a criminalidade, apontando a necessidade de inclusão do consumidor, sujeito à

violência social sob a perspectiva da invisibilidade.

A baixa renda permeia na verificação da necessidade do consumo sob a ótica de inclusão. É,

inclusive, ponto indicado no primeiro objetivo específico.

É necessário frisar que o tema propõe uma linha imaginária que segue fazendo a seguinte

análise: A pessoa detentora de baixa renda, em razão da necessidade de inclusão pela via de

consumo, é levada à prática de crimes contra o patrimônio, em busca de aquisição de marcas,

valores ou bens?

A partir da coleta de dados da entrevista, restou verificado que, de fato, a baixa renda implica

na necessidade de consumo pela via de inclusão, uma vez que, para se incluir na sociedade e

não sofrer violência social, é necessário consumir o que se exige para se incluir.

Extraiu-se das entrevistas que não existe um padrão oficial para a aferição da baixa renda,

pois isso dependerá do que se busca na inclusão, em que grupo pretende pertencer. Os presos

entrevistados apontaram rendas diversas, porém, uma singularidade na prática de crimes, o

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que incita a ratificação que uma renda alta ou baixa dependerá da necessidade do detentor da

renda.

Primeiro entrevistado: M.E.M.F.

O primeiro preso entrevistado, quando indagado acerca da atividade que exercia antes de ser

preso e a renda que auferia, indicou que, à época dos crimes que cometeu, possuía “renda

boa”, oriunda da atividade de vendedor.

Afirmou, ao ser perguntado se a renda auferida era suficiente para sua manutenção, que, como

vendedor de cestas básicas, recebia comissão pelas vendas que efetivava e isso lhe trazia uma

renda que lhe permitia comprar o que precisava:

Eu recebia R$700,00 (setecentos reais). Às vezes eu recebia o dobro disso. O

dinheiro que eu recebia dava pra comer e comprar as coisas que eu

precisava.

Analisa-se com essa fala, que a renda indicada pelo preso era considerada suficiente para que

o mesmo adquirisse o que precisava à época, ou seja, o necessário para a sua subsistência.

No entanto, na continuidade da fala de M. E. M. F., a pesquisadora analisou que essa mesma

renda, até então capaz de garantir o sustento do mesmo, passa a ser considerada baixa, tendo

em vista que o preso passa a apontar outras necessidades, não comportadas pela renda

auferida. Relata o preso entrevistado:

A renda era boa pra o que era básico, mas eu precisava de mais coisa pra ter

presença.

O que se extrai da fala, acima apontada, é que o conceito de baixa renda oscila a depender das

necessidades sentidas. No caso em tela, as necessidades não se limitavam ao que era

considerado básico. Necessidade para M. E. M. F. também era “ter presença”, ou seja, ter

acesso ao consumo.

A análise do contexto da fala ratifica o que se discute no tópico que aborda o consumo e o

consumismo em uma sociedade capitalista. O objeto de consumo se apresenta de formas

diferentes, conforme as necessidades humanas (MARX, 1983).

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Segundo entrevistado: E.B.S.

Quando indagado acerca da atividade que exercia e da renda auferida, o preso entrevistado

informou que se encontrava desempregado à época da ocorrência dos crimes.

Respondendo à pergunta da suficiência da renda para a sua manutenção, disse que se

mantinha, juntamente com a sua família, com a renda ofertada pelo seu genitor.

Eu não trabalhava não, nunca aparecia serviço. Vivia com o que meu pai

mandava, que era R$300,00 por mês. Pra mim, minha mãe e dois irmãos. O

resto, minha mãe conseguia fazendo faxina, mas era pouco, mal dava pra

comprar o que comer.

Como se vê, o entrevistado não possuía renda compatível com o livre consumo quando

cometeu os crimes.

E. B. S chega a se intitular como “menino de rua”, afirmando que essa condição foi imposta

pela falta de oportunidade de trabalho.

Terminei indo pras ruas, virei menino de rua. Andava atrás de trabalho e não

conseguia, aí terminei, bem dizer, morando na rua. Quando fazia um bico,

levava o dinheiro pra minha mãe, mas era pouco.

É muito clara a fala do preso quando aponta uma condição, quase que de miserabilidade,

afinal, falta-lhe o necessário da própria subsistência, quando se analisa a sua referência “mal

dava pra comprar o que comer.”

Outro fato que chama a atenção da pesquisadora, é a fala indicando que o que era proveniente

do labor era destinado à subsistência: “Quando fazia um bico, levava o dinheiro pra minha

mãe, mas era pouco.” Adiante, em tópico próprio, perceber-se-á que a fala aponta que o

dinheiro buscado através do crime era destinado ao consumo de itens diversos de alimentos; o

entrevistado indica, de pronto, o consumo de roupas com o sentimento de busca pela

visibilidade. Interpreta-se como o consumo básico para a subsistência social.

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Terceiro entrevistado: E.B.S.

O terceiro preso E. B. S indicou sua renda considerada baixa, não quis indicar valores, porém

afirmou a mesma como suficiente para a sua manutenção, junto à família, à época da

ocorrência dos crimes. Fez questão de dizer que a renda era suficiente para a aquisição de

alimentos, pagamento de aluguel e faturas de fornecimento de energia e água.

Ganhava pouco, mas que dava pra comprar as coisas que precisava. Não

precisava fazer nada disso não.

O entrevistado se mostrou, a todo tempo da entrevista, muito consciente das suas condutas

criminosas, inclusive se dizendo arrependido, justificando que na sua profissão de vigilante de

rua, era respeitado pelos moradores e tinha condições de prover o sustento básico de sua

família.

Era respeitado por todo mundo, mas, por causa do vício da droga, acabei

fazendo o que não presta.

A todo tempo, fez questão de deixar muito claro que a motivação de suas condutas criminosas

foi o vício da droga.

Quarto entrevistado: J.R.N.

J. R. N. inicia a entrevista apresentando-se e apresentando a sua renda à época dos crimes

cometidos. Indagado acerca da suficiência de sua renda e a origem dela, respondeu:

Na época desse roubo e desse latrocínio eu não trabalhava. Vendia cerveja

em festa. Minha família vende.

Não era renda não, era um trocado. Eu e meus irmão vendia pra ajudar em

casa. Eu e meus irmão se ajudava. Mas a gente não comprava nada pra nós

não, era só pra comida mesmo.

O preso entrevistado considera-se sem renda à época dos crimes cometidos. A sua fala revela

que a renda é medida pelo poder de compra e de consumo, quando se reporta que “não era

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uma renda, era um trocado”, e, ainda, quando diz que não era suficiente para nada, além da

alimentação.

Dessa forma, fica claro que J. R. N. não era satisfeito com aquela renda porque a mesma era

insuficiente para adquirir além do que necessitava basicamente, era incompatível com o

desejo de consumo. Ele ainda acrescenta que:

O dinheiro ficava em casa com meus irmão e com minha mãe pra comprar

comida e alguma coisa. E dinheiro pra comprar as coisas de nós, a gente ia

roubar dos outro, fazer furto aí na feira. Era como dava pra comprar alguma

coisa.

A interpretação da fala do preso entrevistado corrobora com a ideia de que o básico a

consumir depende da necessidade de cada indivíduo. O que é supérfluo para uns é básico para

outros.

“As coisa de nós”, para J. R. N., era o básico, ainda que estivesse além das suas necessidades

emergenciais. Básico está inserido no poder de consumo do que é necessário para se manter

em sociedade e segue o ritmo do consumo social, que é moldado e estendido pela

disponibilização de opções de produtos no mercado (BAUDRILLARD, 2003).

Quinto entrevistado: T. M. B. S.

O último preso entrevistado foge às características dos demais por algumas razões. Tem

escolaridade mais elevada que os outros entrevistados e indica uma renda auferida, à época da

ocorrência dos crimes, mais elevada que as indicadas pelos mesmos.

Contextualiza as respostas às perguntas sobre sua renda, se mostrando uma pessoa

extremamente esclarecida. Faz questão de dizer que, quando foi preso, era agente da

FUNASE – Fundação de Atendimento Sócio Educativo. Trabalhava, portanto, na recuperação

de adolescentes em conflito com a lei.

Quando perguntado se a renda auferida á época do cometimento dos crimes era suficiente

para se manter, confirma que a renda ultrapassava quatro salários mínimos, porém,

acrescenta:

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O dinheiro some, não dá pra nada.

T. M. B. S. prossegue a sua fala dizendo que sua renda era insuficiente para o que

“precisava”, tendo em vista o significado de viver bem, que vai além do essencial para

sobreviver.

Para viver bem é preciso mais dinheiro, e viver bem não é ter apenas o necessário para

sobreviver, é preciso ter dinheiro pra ser respeitado lá fora.

É imprescindível reafirmar que o conceito de alta ou baixa renda depende das necessidades

demonstradas. A renda auferida pelo preso entrevistado, à época dos crimes cometidos, não é

baixa, considerando a média de padrão de vida atual. No entanto, torna-se baixa à medida que

não atende às necessidades sentidas, em razão do desejo de consumo.

As entrevistas revelam que a necessidade de consumo dos entrevistados varia de acordo com

a necessidade de inclusão, o que ratifica a conclusão de que o critério de baixa ou alta renda

depende do que busca o detentor da renda.

4.2.2 Evidências de invisibilidade e inexistência social

A invisibilidade social é o poder abstrato da exclusão do ser humano. A pessoa que não

consegue se inserir nos padrões sociais estabelecidos pelos grupos formados passa a ser

invisível, inexistente, portanto.

O ser humano excluído da sociedade é violentado a partir do sentimento de inexistência e de

invisibilidade, pois vê sua cidadania afetada, uma vez que a violência social atinge os direitos

e garantias fundamentais do ser humano (LINDGREN, 2005).

Na seara da violência simbólica, discutida em tópico próprio, resta evidente que na sociedade

capitalista há duas classes que se contrapõem, considerando que a classe dominante impõe os

ditames à classe dominada, que se torna oprimida (BOURDIEU, PASSERON, 1992).

Para Santos (2008), a sociedade atual insere-se em um mundo de globalização perversa,

tornando a vida pessoal e social refém de um sistema de economia. Nesse contexto, a

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violência social leva o indivíduo a um estado insignificante, considerando que o mesmo passa

a inexistir socialmente, ao passo que é excluído do contexto de visibilidade, segundo os

padrões impostos.

Partindo da abordagem temática e do respaldo teórico, a pesquisadora buscou estabelecer

perguntas que identificassem a experiência de sentimentos voltados à existência social,

buscando relacionar a fala desenvolvida ao conceito de violência, no contexto de inexistência

e invisibilidade social.

Primeiro entrevistado: M.E.M.F.

O conteúdo da entrevista do preso M. E. M. F. demonstra, claramente, que o mesmo enxerga

a aparência visual como essencial para se manter inserido na sociedade. A fala, evidenciada

também no tópico inerente à análise da baixa renda, revela e demonstra um evidente

sentimento de invisibilidade social:

A renda era boa pra o que era básico, mas eu precisava de mais coisa pra ter

presença.

A fala acima apontada respondeu ao questionamento da necessidade de uma pessoa para se

manter em sociedade. O “ter presença”, mencionado pelo preso entrevistado, revela o

sentimento de visibilidade e existência social. Confrontando a fala destacada com os pontos

que tratam, de um lado de baixa renda, e de outro, de invisibilidade e inviabilidade social,

analisa-se que a baixa renda é capaz de gerar necessidades que levam ao sentimento de

exclusão social.

A entrevista é retomada e o entrevistado segue ratificando o sentimento de invisibilidade

social:

Pratiquei o crime porque quis. Queria gastar, gastar com tudo, gastar.

Comigo, com a casa, comprar roupa, carro, moto...

Contextualizando as falas, o “ter presença” consiste no possuir. A busca pelo consumo é

imposta como condição de visibilidade, partindo do pressuposto que o sentimento

compreendido é o de que o ser humano necessita ter para poder ser.

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Quando indagado se uma pessoa que não possui uma boa condição financeira é aceita na

sociedade da mesma forma de outra que possui alta renda, o preso é redundante nas falas

anteriores e ratifica o que externou anteriormente. A fala, abaixo descrita, é um indicador

dessa conclusão:

A pessoa tem que ter presença pra conseguir alguma coisa, tem que tá

arrumado, né? Mas, o que vale é dignidade, né?

É o ter para ser, de fato. A pesquisadora analisou, ainda, que o preso entrevistado inseriu o

termo dignidade na fala, contextualizando a ideia de presença com dignidade. A expressão

“né”, em que pese demonstrar um tom interrogativo, expressa uma afirmação em busca de

uma confirmação. Analisando as expressões observadas e registradas no momento da

entrevista, a pesquisadora concluiu que o entrevistado buscou, com essa expressão, um apoio

à sua conclusão, quanto ao conceito de dignidade em torno da visibilidade.

Esse conjunto de sentimentos na fala se fundamenta no referencial teórico quando aponta que

a violência social, concretizada através das condutas que levam o ser humano a se sentir

inexistente e invisível perante a sociedade, é capaz de atingir os direitos fundamentais do ser

humano (LINDGREN, 2005).

Segundo entrevistado: E.B.S.

Os dados colhidos, através da entrevista de E. B. S., revelam que as necessidades do mesmo

ultrapassavam, à época dos crimes praticados, a esfera de subsistência natural, ou seja o

consumo de alimentação.

Sua necessidade de consumo vai além quando choca com as evidências de invisibilidade e

inexistência social, condição que modifica o status de alguns produtos de supérfluos para

básicos, partindo do pressuposto que são capazes de atribuir a identidade social de alguém,

por mais que estejam além do suficiente para a subsistência.

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E. B. S. demostra, com a sua fala, ter sido violentado sistematicamente, partindo do

pressuposto de que a violência não tem conceito isolado, em razão de deter o poder de

produzir efeitos diversos, inclusive efeitos sociais (MAFFESOLI, 1987).

Para E. B. S., a aquisição de roupa, por exemplo, tem o condão de lhe trazer visibilidade, de

forma que não pode ser analisada como consumismo, mas como consumo básico, necessário

para sua existência social. Responde, quando indagado, acerca do que é necessário para ser

importante na sociedade:

Uma pessoa bem vestida é logo olhada, um mal vestido é visto como

malandro. Até a polícia trata diferente. O mal vestido é espancado, o bem

vestido a polícia deixa passar.

O preso evidencia, da mesma forma que o primeiro preso entrevistado, a divisão de classes

sociais. Nesta fala, a divisão de grupos seria determinada pela roupa utilizada.

Quando indagado se uma pessoa que não possui uma boa condição financeira é aceita na

sociedade da mesma forma de outra que possui alta renda, balança a cabeça que não,

imediatamente. Ratifica sua percepção de divisão de classes sociais em outra fala, inclusive,

intrinsecamente, faz menção a uma classe social opressora que violenta, através de

julgamentos feitos por critérios de consumo.

A sociedade julga demais, pelo modo de vestir, de falar. Condena demais. As

pessoas não me tratavam bem por eu ser um menino de rua, até o jeito de

olhar. A pessoa percebe o jeito de olhar diferente. O povo das lojas, o povo

das vendas, o povo da rua.

A fala do entrevistado aponta um sentimento de exclusão social e, intrinsecamente, a ânsia de

vencer essa situação, tornando-se visível socialmente. No entanto, como se percebe no

decorrer da pesquisa, não se busca o caminho da visibilidade através do acesso à educação, à

cultura ou à formação. Segundo a análise do contexto das entrevistas e os tons das falas,

seguramente, por ser o crime um caminho mais rápido para solucionar um problema que é

emergente e sistemático, intensificando a violência social pelo decurso de tempo.

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Mais uma análise acerca da categoria temática de ausência de consumo, ratificando que o ter é

condição para o existir socialmente.

Terceiro entrevistado: E.B.S.

Apesar de E. B. S. indicar a sua renda como compatível para a aquisição de suas necessidades

básicas, ao ser indagado acerca do que é preciso ter para ser importante na sociedade, e se

uma pessoa que não possui uma boa condição financeira é aceita na sociedade da mesma

forma que outra que possui alta renda, o mesmo se emocionou e lembrou do filho.

Precisava de uma roupa melhor pra passear com meu filho.

E, após essa fala, passou a enfatizar a via de consumo como condição para inclusão social.

A pessoa bem vestida não tem aquela desconfiança. Uma roupa melhor é

melhor pra os outro não olhar feio pra pessoa.

Essa fala ratifica os posicionamentos dos demais entrevistados, no sentido de indicar que a

aparência de uma pessoa tem o poder de incluir, de revelá-la socialmente. O nível de consumo

passou a ser parâmetro de prazer e felicidade, diante de sua capacidade de produzir efeitos de

reconhecimento e igualdade social (CONTE, OLIVEIRA, HENN, WOLFF).

Quarto entrevistado: J.R.N.

Dando continuidade à entrevista, a pesquisadora passou a indagar J. R. N. acerca da temática

da invisibilidade social, indagando ao mesmo, inicialmente, o que achava necessário possuir

para ser considerado importante na sociedade.

O preso foi muito enfático na sua resposta, afirmando que:

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Você só vale alguma coisa se tiver o que mostrar. Se não tiver nada, não vale

nada.

É a mesma ideologia dos demais entrevistados, no sentido de expressar sentimentos de

inexistência social, sob a interpretação de que é necessário ter para poder ser.

J. R. N. tende na sua fala a explicar que quando conseguiu trabalho, saiu do mundo do crime e

se recuperou, mas para isso teve que se mostrar à sociedade, segundo seus padrões:

Quando arrumei umas coisinha, comecei a andar diferente, comprei roupa e

consegui um emprego. Fui ser vendedor.

A fala do preso entrevistado revela, portanto, que só conseguiu emprego, após consumir o

necessário para tanto, ratificando a necessidade do consumo para sobreviver socialmente. J. R. N.

aponta, claramente, o crime como um caminho para a dignidade.

Estende a sua fala, fazendo questão de dizer que foi preso novamente por uma acusação injusta,

enquanto cumpria pena fora do presídio. Quando retornou à prisão, se encontrava trabalhando, ainda

com vendas, porém, na condição de autônomo.

É perceptível, durante a fala de J. R. N., que o mesmo fica envaidecido quando afirma que

chegou a conseguir viver dignamente, consumindo através de renda auferida através do

trabalho.

Em Santa Cruz, eu tinha confiança, era bem visto porque vivia trabalhando.

Andava bem vestido, isso influencia também.

Não pode andar com roupa rasgada, velha, senão já vão dizer que você não

tem nada, é maloqueiro.

O ponto da entrevista é concluído quando a pesquisadora indaga ao entrevistado, se uma

pessoa que não possui uma boa condição financeira é aceita na sociedade, da mesma forma

que outra que possui alta renda.

J. R. N., quando responde negativamente, estabelece um paralelo da sua vida, indicando que

tudo mudou quando o mesmo passou a andar bem vestido. Relembra a época em que era

vendedor de cerveja da seguinte forma:

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O povo olhava com medo pra mim, eu não tinha nada, parecia um

maloqueiro, um trombadinha.

Imprescindível ressaltar a fala do entrevistado quanto à expressão “nada”, que se mostra

relativizada quando refletida no contexto de consumo. Para o entrevistado, o “nada” se refere

ao supérfluo exigido pela sociedade; o necessário à subsistência humana se revela fora do

contexto, uma vez que o excessivo passa a ser o básico e o essencial à subsistência social.

Os dados colhidos na entrevista de J. R. N., ratificam a fala dos demais entrevistados,

afirmando o conceito de invisibilidade e inexistência social. A busca pelo ter se justifica pela

necessidade do ser, perante à sociedade.

O preso afirmou, categoricamente, com a sua experiência, que não se inicia uma vida social

quando não se tem poder de compra. Ratificou, com muita propriedade, que a ausência do

consumo leva a uma abstração humana, e a violência vai se concretizando sobre aquele que

não conseguiu se estabelecer socialmente.

É uma violência sistemática, que se firma através dos atos sociais que revelam elementos de

invisibilidade e inexistência (LINDGREN, 2005).

Quinto entrevistado: T. M. B. S.

Em que pese o preso entrevistado declarar possuir, à época dos crimes, uma renda razoável e

demonstrar se tratar de uma pessoa esclarecida, do ponto de vista de escolaridade, da

linguagem e do comportamento, passa a relatar fatos que revelam sentimentos de inexistência

e invisibilidade social.

A pesquisadora pergunta a T. M. B. S. acerca do que é necessário ter para ser importante na

sociedade, que responde:

Deixando o ex presidiário de lado, o status diz muito. A sociedade respeita e

vê de outra forma. Você é visto pela aparência.

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Na concepção de T. M. B. S., a aparência é a identidade de alguém. É através dela que, de

fato, passa a existir socialmente. O que é isso, senão o conceito de invisibilidade e

inexistência social?

Segue a fala, fazendo questão de revelar o desejo de consumo pelas mais diversas formas,

apontando o consumismo como necessidade básica para se manter em sociedade.

Ostentar é tá com dinheiro no bolso, bem vestido, bem montado e rodeado

de mulheres.

Pergunta a pesquisadora: “Uma pessoa que não possui uma boa condição financeira é aceita

na sociedade da mesma forma de outra que possui alta renda?” T. M. B. S. de imediato,

responde com a seguinte fala:

Quando você tem status fica rodeado de amigos, sem nada disso você tá na

minoria, na exclusão. Excluído de várias coisas.

As palavras “minoria” e “exclusão” chamam a atenção, afinal, são sinônimos da inexistência e

da invisibilidade social. Conquanto são efeitos da violência social, estabelecida pela via do

consumo.

A fala de T. M. B. S corrobora com o pensamento de Baudrillard (2003), no sentido de

afirmar que a existência social se firma no supérfluo.

Resta, evidente, que a invisibilidade e a inexistência social advêm de uma exclusão pautada

pelo nível de consumo. A divisão de classes sociais é uma forma de violência por retirar do

homem o seu direito de pertencer à sociedade, independentemente do que possua.

Os presos entrevistados foram unânimes no ponto de vista da invisibilidade social. Todos

demonstraram que a ausência do consumo leva à inexistência social, em razão da sociedade

impor padrões que provocam inclusão de uns e exclusão de outros.

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4.2.3 A busca da inclusão através do consumo de marcas exclusivas

Buscando a confirmação ou negativa da temática da pesquisa, no que concerne à inclusão

social através da busca do consumo de marcas exclusivas, a pesquisadora desenvolveu

perguntas voltadas ao sentimento de exclusão perante à sociedade.

Partindo-se do conceito de vulnerabilidade consumerista como consequência do consumismo,

exigido na sociedade capitalista atual, tem-se que o consumo perdeu a sua natureza de

liberdade, passando a ser imposto pela sociedade, como uma necessidade de inclusão

(BAUMAN, 2008).

Necessário chamar à atenção para o consumo de marcas exclusivas; essas que levam a pessoa

que busca seu consumo a uma sensação de pertencimento, a ponto de grupos se identificarem,

entre si, pela marca que usam (LINDSTROM, 2009).

A marca, pois, também atinge uma série de desejos consumeristas, que se espalham em

diversas espécies de produtos, a exemplo de roupas, eletrodomésticos, aparelhos de telefone,

automóveis e, até mesmo, ambientes sociais e bebidas.

A identidade pessoal é baseada no que se veste, se come, se bebe, se calça, o lugar que se

frequenta, o que se usa. É o ter para poder ser.

Primeiro entrevistado: M.E.M.F.

O preso entrevistado é detentor de uma fala que confirma o sentimento de inclusão pela via de

consumo, segundo o que expõe quando afirma o seguinte:

Não vou me vestir pra sociedade, vou me vestir pra mim, mas quem se veste

melhor é mais importante pra sociedade.

Com essa fala, o entrevistado já responde à pergunta que questiona se o uso de determinadas

marcas importa para as pessoas. A princípio, a pesquisadora analisou na fala “Não vou me

vestir pra sociedade, vou me vestir pra mim,,,”, um conteúdo voltado à uma conscientização

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social no aspecto de exclusão, partindo do pressuposto de que o valor atribuído pela

sociedade, pelo aspecto visual, não interferiria no sentimento de inclusão.

No entanto, a fala segue: “...mas quem se veste melhor é mais importante pra sociedade.” O

complemento da frase dita pelo preso entrevistado indica que a roupa usada por uma pessoa

indicará a importância da mesma perante à sociedade.

A pesquisadora analisa na fala indicada que o preso necessita possuir determinadas coisas

para se sentir importante na sociedade, ou seja, para existir, efetivamente, no plano social.

Sobretudo, na análise conjunta da fala acima com outra fala, indicada anteriormente:

Pratiquei o crime porque quis. Queria gastar, gastar com tudo, gastar.

Comigo, com a casa, comprar roupa, carro, moto...

O querer gastar leva à aquisição do que se necessita para aparecer, socialmente. É a busca

pela visibilidade social, essa que ratifica a concretização do homem, uma vez que o mesmo só

deixa de ser abstrato quando se vê inserido no contexto social (BOBBIO, 2004).

A ideia de divisão de classes sociais formadas em razão do capitalismo, segundo Bourdieu,

Passeron (1992), onde uma classe domina a outra, fica muito latente na fala do preso, que

revela uma série de fatores importantes para análise, como o uso da marca como elemento

essencial para essa divisão social.

Quando a pesquisadora passa a indagar o entrevistado, se o mesmo gosta de usar roupas e

objetos de marcas famosas, se o uso de marcas famosas lhe faz bem e quais as marcas que o

mesmo gostaria de consumir, o mesmo responde:

Se você chega perto da classe A, quem tem condição olha direito pra quem

tá com roupa boa... Prefiro comprar roupa boa, você vai comprar roupa da

sulanca?... Uma pessoa que não usa marca famosa não consegue ficar perto

da classe deles.

Analisa-se o consumo pela marca inclusiva como porta de entrada para a inclusão social, de

forma muito clara. A princípio, o preso estabelece, em sua fala, uma divisão de classes

sociais, nominando-a, inclusive, de “classe A”. Ao mesmo tempo, intrinsicamente, aponta a

classe dominante, com as seguintes palavras: “... quem tem condição olha direito pra quem tá

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com roupa boa...”, ou seja, o conteúdo da fala esclarece que a classe dominante procede com

um juízo de admissibilidade para aceitação ou rejeição daquela pessoa no contexto social.

A marca não é uma livre escolha, mas sim, apontada como aquela que tem efeito de

visibilidade social. Pela fala do preso analisa-se que a marca que o mesmo gostaria de

consumir é aquela que tem a capacidade de incluí-lo socialmente.

O sentimento de inclusão social e sua busca através do consumo concretiza-se no final da fala,

quando o preso sugere que prefere comprar “roupa boa”. Continua a fala conceituando a

exclusão social, quando, de maneira desprendida diz, que “uma pessoa que não usa marca

famosa não consegue ficar perto deles”, ou seja, perto da classe dominante, aquela que impõe

o padrão.

Em resposta à pergunta: “Se você mostrar às pessoas que possui marcas caras, consegue ter

oportunidade de emprego e amizade?”, o preso, de imediato, balança a cabeça,

afirmativamente, e fala de forma muito convicta: “claro que sim.”

Com a fala de M. E. M. F, resta muito evidente que o consumo das marcas exclusivas, ou

seja, aquelas apontadas como aceitas na sociedade, que dependem de uma alta renda para

serem adquiridas, é a condição de inclusão social. Reitere-se a ideia de que é necessário ter

para poder ser.

Segundo entrevistado: E.B.S.

A pesquisadora segue a entrevista com E. B. S. e indaga se o mesmo gosta de usar roupas e

objetos de marcas famosas.

A pessoa vestida com Rota do mar, Indios. A pessoa bem vestida, os outros

olham diferente.

Com a fala, o entrevistado antecipa as respostas a outras indagações, pois além de indicar

algumas marcas, demonstra que o uso das mesmas lhe fariam bem. A fala: “A pessoa bem

vestida, os outros olham diferente”, ainda responde afirmativamente que o uso de marcas

caras e conhecidas de roupas ou objetos, importa para as pessoas, pois o entrevistado

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interpreta o comportamento das pessoas através do olhar avaliativo, sob o critério do uso de

marcas.

Finalizando o bloco, a pesquisadora indaga E. B. S., se o mesmo tivesse mostrado às pessoas

que possuía marcas caras, teria conseguido oportunidade de emprego e de amizades. O

mesmo responde com outras perguntas, com um ar de surpresa:

Eu? Quem ia dar emprego a um menino mal vestido? Se eu fosse bem vestido

era diferente, não tinha vindo pra cá. Eu queria era trabalhar, mas nunca

arrumei serviço

.

E. B. S. confirma que a inclusão social, em vários sentidos, depende do consumo. Aponta

marcas conhecidas, indica gestos de exclusão por parte das pessoas, afirma falta de

oportunidade social pela ausência de consumo.

Terceiro entrevistado: E.B.S.

Quando a pesquisadora passou a formular as perguntas inerentes ao uso de marcas exclusivas,

o preso entrevistado inclinou que sempre buscou adquirir produtos “de marcas famosas” para

a sua casa, em razão das mesmas serem “boas” e de sentir bem, junto à sua família, “usando o

que é bom e melhor”.

Se puder comprar coisa de marca é bom.

Indagado se a oportunidade de emprego e amizades depende do uso de marcas caras,

respondeu negativamente e justificou relembrando que possuía o respeito das pessoas que

residiam nas redondezas onde trabalhava como vigilante.

E. B. S. ratifica que “a pessoa bem vestida é olhada melhor”, quando é indagado se usar

marcas caras e conhecidas de roupas ou objetos importa para as pessoas. Acrescenta, ainda,

que:

Não compro pra mim, mas compro tudo do bom pra meu filho, porque ele

tem que andar direito, com coisa boa, pra ninguém olhar feio pra ele.

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As falas do preso entrevistado se contradizem; ora ele afirma que oportunidade de emprego e

amizade independe do consumo e uso de marcas caras, ora ele indica que as pessoas são

melhor vistas a depender do que usa. A mudança do discurso no contexto da fala pode ser

explicada como uma forma de justificar os atos, o que é analisado no contexto geral extraído

da entrevista de E. B. S.

Ainda se inclina à necessidade do consumo como forma de inclusão, quando justifica a

preocupação em garantir ao seu filho o uso de produtos que garantam que o mesmo não sofra

efeitos de violência social.

Quarto entrevistado: J.R.N.

O preso passa a ser indagado acerca da busca da inclusão, através do consumo de marcas

exclusivas. A pesquisadora inicia perguntando se o mesmo gosta de usar roupas e objetos de

marcas famosas. J. R. N. diz que quando tinha condições de adquirir produtos com a sua

renda, gostava de comprar “coisa boa”, mas que não precisava ser “de marca”.

A fala do preso entrevistado chama à atenção, pois apesar de indicar a indiferença pelo uso de

marcas determinadas, aponta várias, como se fosse um desejo de consumo.

Comprava roupa, mas não precisava ser da seaway, cyclone, saka praia.

Torna-se muito mais evidente seu desejo de consumo, quando passa um pequeno tempo em

silêncio e fala, espontaneamente, a frase:

A gente só via os outro usando.

A fala é reveladora do desejo de consumir marcas capazes de incluir socialmente em uma

classe detentora de consumo. Analisa-se que J. R. N. se autoexclui quando se refere ao não

uso de determinadas marcas lembradas: “os outro”. È uma classe à qual não pertence.

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Segue falando sobre sua vida, afirmando que só veio comprar “coisa melhor” quando “teve

condição”.

Usava roupa da sulanca mesmo, não tinha dinheiro pra usar roupa boa.

Quando indagado se mostrando às pessoas que possuía marcas caras, conseguiria

oportunidade de emprego e amizade, ratificou a fala já delineada no tópico que trata da baixa

renda, reiterando que apenas veio a conseguir emprego quando passou a se vestir melhor.

Acrescentou, já antecipando a indagação acerca da importância do uso de marcas para as

pessoas, que:

Quem anda maltratado com roupa velha e rasgada afasta as pessoas.

Mais uma vez, resta evidente a divisão de classes sociais, instituída pelo uso de marcas

exclusivas, determinadas pela sociedade. Examina-se, na fala de J. R. N., que ele se coloca em

um grupo de menor valor, por não fazer parte do grupo detentor do consumo, capaz de usar

“roupa boa”.

Quinto entrevistado: T. M. B. S.

A pesquisadora passa a indagar o preso acerca do uso de marcas exclusivas, como via de

inclusão. Indaga o mesmo se gosta de usar roupas e objetos de marcas famosas. T. M. B. S

responde com uma única palavra: “claro!”

Segue a entrevista e o preso é perguntado se o uso de marcas famosas lhe fazem bem e quais

as marcas que gosta ou gostaria de usar. Responde, de logo, afirmando que “as melhores,

todas.” E acrescenta:

Você é visto pela aparência, se compra objeto inferior é criticado. Até se vai

pra um hospital ruim ou bom, isso é visto.

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Com a resposta, o preso já antecipa a próxima pergunta que seria se o uso de marcas caras e

conhecidas de roupas ou objetos importa para as pessoas.

Neste momento, a pesquisadora analisa que T. M. B. S. estabelece a divisão de classes sociais,

apontando o consumo como critério. Interessante, que o mesmo faz questão de mencionar, até

mesmo, os ambientes frequentados pelas pessoas, quando se refere a um hospital.

Responde, ainda, quando perguntado se a oportunidade de emprego e boas amizades

dependem do uso de marcas caras, que dependem exclusivamente. Ratifica uma fala anterior,

quando aduz que “a forma como uma pessoa se veste, o que ela bebe, come, o que ela usa, o

ambiente que frequenta, é o que diz quem são as amizades dela e o que ela pode conseguir.”

Em suma, os dados revelam que a marca do que se consome tem o poder social de excluir, ao

passo que inclui tão somente os que fazem parte dos grupos seletos. Os entrevistados,

inclusive E. B. S., na contextualização da sua fala, por vezes contraditória, apontam a inclusão

através do consumo de marcas exclusivas, essas interpretadas como escolhidas; não do ponto

de vista da livre opção, mas como as que são capazes de se destacarem na sociedade.

4.2.4 Prática de crimes contra o patrimônio em busca de consumo

Para se analisar a ocorrência de crimes contra o patrimônio em busca de consumo, necessário

se fez as análises que antecedem essa seara, segundo a proposta temática.

A pesquisadora se ateve à questão da renda dos presos entrevistados, bem como às percepções

quanto aos sentimentos de invisibilidade e inexistência social, passando pela análise, ainda,

das evidências quanto à busca da inclusão social, por meio do consumo de marcas exclusivas.

É um caminho trilhado, onde um fator está intimamente atrelado ao outro e leva à conclusão

de que uma coisa leva à outra, um acontecimento provoca o outro.

Nesse contexto, após a pesquisadora buscar evidências acerca da renda, do sentimento de

violência social atrelado à invisibilidade, exclusão e inexistência, bem como da busca da

inclusão social por meio do consumo, passou a buscar dados quanto às trajetórias dos crimes

praticados pelos presos entrevistados, com enfoque na análise da motivação do crime.

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Com a informação da prática de crimes contra o patrimônio, a pesquisadora passou a buscar

dados que confirmassem ou negassem a motivação pela via do consumo.

Uma vez já delineados nas perguntas de apresentação, os crimes cometidos pelos presos

entrevistados e a quantidade de ocorrências criminosas, inclusive mencionados em tópico

próprio, quando da apresentação dos sujeitos, passa-se a analisar a motivação dos crimes

cometidos.

Primeiro entrevistado: M.E.M.F.

Para buscar informações acerca da motivação dos crimes praticados por M. E. M. F, a

pesquisadora passou a tecer as perguntas da entrevista direcionadas para esse contexto. Não

houve recusa às respostas. No entanto, as mesmas negaram que a motivação dos crimes tenha

sido a busca do consumo, ou seja, a necessidade do consumo não teria estimulado as suas

práticas criminosas.

Vou dizer a verdade, ia pela drenalina, me sentia bem na hora que tava

fazendo. É ISSO MESMO? SE FOR TEM QUE COLOCAR (SIC)

A fala externada por M. E. M. F. se contrapõe com a ideia de que o crime tem uma motivação

própria, no caso em tela, o consumo. Afinal, conforme explanou, os crimes praticados não

tiveram uma razão, senão o bem estar do momento e a adrenalina, citada pelo mesmo de

“drenalina”, conforme aponta a fala acima.

Ocorre que, antes de externar o que acima foi exposto, o preso afirma que:

Pratiquei o crime porque quis. Queria gastar, gastar com tudo, gastar.

Comigo, com a casa, comprar roupa, carro, moto...

Ou seja, M. E. M. F. já havia confirmado que a motivação do crime foi a busca pelo consumo,

uma vez que praticou o crime porque queria “gastar, gastar com tudo, comprar roupa, carro,

moto...”

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Em que pese afirmar que a conduta criminosa deu-se pela adrenalina e pelo bem estar daquele

momento, antecede essa fala, afirmando que cometeu o crime para gastar, ou seja, para

consumir.

A fala que nega a busca pelo consumo, quando afirma que a motivação foi o bem estar, este

analisado como a adrenalina do momento, torna-se isolada, ante o contexto de toda entrevista

que se inclina à confirmação da baixa renda e à necessidade do consumo em busca de

inclusão. Ou seja, vai de encontro aos sentimentos de invisibilidade social externados por M.

E. M. F. Por outro lado, analisando a expressão “bem estar” no contexto econômico, como

resultado produzido pelo produto do crime, há de se conceber que estaria inserido na seara do

consumo.

Pela fidedignidade da pesquisa, todo dado deve ser, imparcialmente, apresentado, analisado e

discutido. A fala, acima demonstrada, foi tratada como um dado relevante, porém, sem

tendências à confirmação ou negativa do tema; daí, a relevância de não ter sido omitido.

Segundo entrevistado: E.B.S.

Quanto à motivação dos crimes cometidos, E. B. S. confirma que deu-se para a busca do

consumo, de fato. Aponta, inclusive, a falta de opção, de oportunidades que o levassem a um

caminho inverso:

Furtei, roubei, atrás de dinheiro pra comprar o que precisava. Pra se vestir.

Sabia que não era certo e que eu podia cair.

Se tivesse um trabalho, não tinha entrado nessa vida, não tava aqui.

Eu precisava de muitas coisas. Tinha que me virar.

O preso aponta o crime como a única alternativa para a busca do consumo e deixa claro que

cometeu os crimes em busca de dinheiro, a fim de suprir as suas necessidades existenciais.

Enfatiza, ainda, na sua fala que, se tivesse um trabalho, não teria buscado o crime como

alternativa.

Analisando essa fala em consonância com as demais falas do preso entrevistado, é evidente

que a falta de trabalho deu-se pela ausência de consumo, uma vez que E. B. S. mostrou-se em

condições incompatíveis com o padrão social para se inserir no mercado de trabalho.

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90

Os crimes foram os caminhos encontrados por E. B. S. para aproximar-se da existência social.

Afinal, por essa via, segundo seus posicionamentos na entrevista, seria possível possuir

condições de adquirir os produtos necessários para subsistir e viver e sociedade, dignamente,

ainda que essa dignidade carregasse o preço de uma conduta criminosa.

Terceiro entrevistado: E.B.S.

Quanto à motivação dos crimes cometidos por E. B. S., o mesmo é conciso e afirma em

poucas palavras, que foi levado à criminalidade pelo vício das drogas. De fato, afirma que

cometeu os crimes contra o patrimônio em busca de dinheiro. No entanto, não com o objetivo

do consumo de produtos, mas para o consumo de drogas ilícitas.

Era só por causa da droga mesmo.

Faz questão de ratificar cada palavra, anteriormente dita, relembrando que não precisava

cometer os crimes para consumir produtos, pois o que auferia de renda, ainda sendo baixa,

com sacrifício e economia, era possível.

Portanto, nega a problemática da pesquisa quanto à motivação da ocorrência de crime pela

necessidade de consumo, o que é analisado pela pesquisadora com imparcialidade, a fim de

garantir a fidelidade dos resultados encontrados.

Quarto entrevistado: J.R.N.

J. R. N. evidencia, em toda a sua fala, que iniciou a prática de crimes em busca do consumo.

Afirmou, conforme demonstrado nas falas anteriores, que a renda que conseguia era

insuficiente para o consumo, além da alimentação da família.

Em busca de consumir além do básico para a subsistência, afirma que procurou o caminho do

crime, por não ter outra alternativa.

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E dinheiro pra comprar as coisas de nós? A gente ia roubar dos outro, fazer

furto aí na feira. Era como dava pra comprar alguma coisa.

A tendência ao crime, pelas palavras do preso entrevistado, é o desejo de inclusão social, por

meio do consumo. É seguir um padrão inerente aos grupos aceitos; é participar do que os

incluídos participam. É imitar as práticas inclusivas.

Roubava pra curtir como os outro faz. Ia roubar pra poder sair, curtir, beber,

tomar cachaça, usar droga.

Queria curtir, não tinha dinheiro, fazer o que? Roubar!

É a nítida busca pelo consumo, através da prática criminosa. A alternativa do crime, imposta

pelo consumo, fica ainda mais clara na fala de J. R. N. quando indica que, tão logo começou a

trabalhar e adquirir condições de consumo, deixou de lado a vida do crime. O trabalho passou

a dar alternativa diversa ao preso, que conseguiu, sem a prática criminosa, sentir-se incluído

socialmente.

Fez questão de apontar os produtos que conseguiu adquirir, por meio da renda proveniente do

trabalho, e ratificou que assim que conseguiu oportunidade de trabalho, não mais buscou

renda por meio de crimes contra o patrimônio.

Depois comecei a trabalhar como vendedor e depois pra mim. Comecei a

comprar as coisa pra casa, pra mim e parei de fazer coisa errada... Comprei

estante, mesa, televisão, um carrinho velho...

Analisa-se em J. R. N. que foi necessário que o mesmo aderisse às práticas criminosas, para

adquirir condições de existir socialmente, no caso em tela, consumir produtos, frequentar

lugares e ambientes sociais, e até trabalhar. O preso entrevistado externa que para adquirir

trabalho, teve que buscar condições de se apresentar com boas roupas.

Quando arrumei umas coisinha, comecei a andar diferente, comprei roupa e

consegui um emprego. Fui ser vendedor.

Com trabalho e com condições de viver, de forma inclusiva na sociedade, o crime não mais

foi o meio de renda de J. R. N. que passou a sobreviver do seu labor.

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Quinto entrevistado: T. M. B. S.

Finalmente, o preso é indagado sobre o motivo que o levou a praticar os crimes. T. M. B. S.

não hesita em responder:

Não tem justificativa para cometer o crime, roubei pra ter status.

Diante da renda, anteriormente indicada por T. M. B. S., a pesquisadora insiste e busca

indagar se, de fato, o mesmo possuía necessidade de consumo. O preso responde que para o

padrão que ele precisava manter, sim.

Pra viver ostentando é caro. A maioria dos crimes hoje é por isso, quem não

quer ter uma mulher bonita do lado e um carro novo?

Todas as falas do preso entrevistado são inclinadas a afirmar que os crimes cometidos

ocorreram em busca do consumo, que por sua vez, têm o condão de afirmar as pessoas

perante à sociedade.

Resta evidenciado, diante dos dados da maioria dos entrevistados, que o consumo imposto

pela sociedade é uma via de conduta criminosa, conquanto quem necessita consumir para

existir socialmente, busca o caminho do crime contra o patrimônio, como um caminho mais

célere para atingir o objetivo.

É a dignidade social em confronto com a dignidade moral. O ser humano, vítima de violência

social, quando escolhe a via criminosa, como caminho mais viável e célere para consumir,

encontra uma solução para sua existência perante a sociedade; encontra dignidade, ainda que

essa seja reprovada pela moralidade.

4.3 Confirmação dos objetivos na análise dos dados

Após a análise e discussão exaustiva dos dados colhidos, analisa-se cada entrevista, em

consonância com os objetivos específicos propostos, também resumidos em quadros próprios:

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93

1. Identificar se os crimes contra o patrimônio podem ser motivados pela necessidade de

consumo por pessoas de baixa renda, ou se a hipótese é refutada a partir do arcabouço teórico

e das pesquisas realizadas.

2. Analisar se a busca pelo consumo de marcas exclusivas surge da necessidade de inclusão,

diante do sentimento de inexistência e invisibilidade social.

3. Investigar quais os aspectos de violência social que condicionam a prática de crimes contra

o patrimônio.

M.E.M.F, 29 ANOS – Vendedor de cestas básicas. Oito assaltos - Carga.

O primeiro entrevistado, M. E. M. F., confirma os três objetivos específicos, considerando o

contexto geral de sua fala. No entanto, o objetivo número um é negado em uma fala isolada

do preso, quando afirma que praticou os crimes pela adrenalina e pelo bem estar.

Considerando que a frase suscitada está inserida em um contexto imensamente mais amplo do

que a frase em si e havendo reiteradas análises no conteúdo da fala, inclusive com atenção aos

gestos e expressões de cada momento, é pertinente acrescentar que essa fala, por si só, é

incapaz de anular todo conjunto revelado por M. E. M. F., o qual indica, com muita clareza,

antes da fala indicada, que cometeu o crime com o intuito de gastar, ou seja, de consumir.

Sua fala induz a afirmação temática, no sentido de indicar que a ausência de consumo pela

baixa renda leva à inexistência e invisibilidade social e que a busca de inclusão se dá pela

aquisição de marcas exclusivas.

Quadro 8 - Análise entrevista x objetivos

QUESTIONAMENTOS

TEMÁTICOS ENTREVISTA FILTRADA

AFIRMAÇÃO/

NEGATIVA

DOS

OBJETIVOS

1. A BAIXA RENDA

PROVOCA

INVISIBILIDAE

SOCIAL?

“A pessoa tem que ter presença pra

conseguir alguma coisa, tem que tá

arrumado né?... Mas, o que vale é

dignidade, né?”

2

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94

2. A NECESSIDADE DE

CONSUMO ESTIMULA

A CONDUTA

CRIMINOSA?

“Eu era vendedor de cesta básica e ganhava

comissão... “

“Pratiquei o crime porque quis. Queria

gastar... Gastar com tudo... Gastar...

Comigo, com a casa... Comprar roupa,

carro, moto...”

1, 3

3. O CRIME CONTRA

O PATRIMÔNIO

PRATICADO POR

PESSOAS DE BAIXA

RENDA É MEIO DE

BUSCA DO

CONSUMO?

“Vou dizer a verdade, ia pela drenalina, me

sentia bem na hora que tava fazendo.”

1

4. O CONSUMO DE

MARCAS

EXCLUSIVAS E O

PADRÃO DE VIDA

ELEVADO INCLUEM

SOCIALMENTE?

“Tendo dinheiro eu compro o que é bom,

né?”

“Não vou me vestir pra sociedade, vou me

vestir pra mim, mas quem se veste melhor é

mais importante pra sociedade.”

“Se você chega perto da classe “A” quem

tem condição olha direito pra quem tá com

roupa boa... Prefiro comprar roupa boa,

você vai comprar roupa da sulanca?... Uma

pessoa que não usa marca famosa não

consegue ficar perto da classe deles.”

2

Fonte: Elaboração própria, 2015

E.B.S, 24 ANOS – Desempregado. Um furto e dois roubos – Dinheiro e aparelho celular.

O segundo entrevistado também responde aos objetivos específicos afirmativamente. Na sua

fala, resta identificado que os crimes cometidos tiveram como motivação a busca do consumo,

atendendo, pois, ao primeiro objetivo específico da pesquisa.

Quanto ao segundo objetivo específico, os dados extraídos da entrevista de E. B. S. indicam

que o sentimento de invisibilidade e inexistência social o levaram à busca pela inclusão, essa

que impõe o consumo de marcas exclusivas da sociedade.

O terceiro objetivo foi evidenciado na fala do preso entrevistado, quando apontou que

cometeu os crimes contra o patrimônio para consumir o necessário para existir diante da

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95

sociedade. Ratificou, pois, os aspectos de violência social vivenciados, a partir da exclusão

sofrida.

Quadro 9 - Análise entrevista x objetivos

QUESTIONAMENTOS

TEMÁTICOS ENTREVISTA FILTRADA

AFIRMAÇÃO/

NEGATIVA

DOS

OBJETIVOS

1. A BAIXA RENDA

PROVOCA

INVISIBILIDAE

SOCIAL?

“A sociedade julga demais, pelo modo de

vestir, de falar... Condena demais.”

“As pessoas não me tratavam bem por eu

ser um menino de rua, até o jeito de olhar...

A pessoa percebe o jeito de olhar diferente...

O povo das lojas, o povo das vendas, o povo

da rua.”

2

2. A NECESSIDADE DE

CONSUMO ESTIMULA

A CONDUTA

CRIMINOSA?

“Uma pessoa bem vestida é logo olhada, um

mal vestido é visto como malandro... Até a

polícia trata diferente... O mal vestido é

espancado, o bem vestido a polícia deixa

passar.”

“Se tivesse um trabalho, não tinha entrado

nessa vida, não tava aqui... Eu precisava de

muitas coisas... Tinha que me virar.”

1,2,3

3. O CRIME CONTRA

O PATRIMÔNIO

PRATICADO POR

PESSOAS DE BAIXA

RENDA É MEIO DE

BUSCA DO

CONSUMO?

“Furtei, roubei atrás de dinheiro pra comprar

o que precisava... Pra se vestir...”

“Sabia que não era certo e que eu podia

cair...”

1,3

4. O CONSUMO DE

MARCAS

EXCLUSIVAS E O

PADRÃO DE VIDA

ELEVADO INCLUEM

SOCIALMENTE?

“A pessoa vestida com rota do mar, indius...

A pessoa bem vestida, os outros olham

diferente.”

2

Fonte: Elaboração própria, 2015

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E.B.S., 41 ANOS. Vigilante residencial. Quatro furtos - Celular e dinheiro.

Em análise aos dados colhidos na entrevista de E. B. S., em consonância com os objetivos

específicos, a pesquisadora verificou que o mesmo não confirma o primeiro objetivo,

conquanto não aponta a motivação da ocorrência dos crimes praticados em razão da busca de

consumo.

Aponta a razão da prática de crimes ser a busca pelo consumo de drogas, inclusive, afirmando

que, com a renda auferida, ainda que baixa, era capaz de garantir o sustento da família, ainda

que com sacrifício.

Quanto ao segundo objetivo específico, a pesquisadora considera, confirmado quanto à

análise dos dados do preso entrevistado, uma vez que mesmo tendo afirmado que o uso de

marcas caras não influencia na oportunidade de emprego e amizades, inclinou-se, em todas as

partes de sua fala, em afirmar que a aparência visual é importante para a aceitação da

sociedade e que uma pessoa é bem ou mal vista socialmente pelo que usa, ou seja, pelo que

consome, segundo os padrões estabelecidos pela sociedade.

A fala traduz o sentimento de inclusão social pela via do consumo. A análise é que o

entrevistado, como os demais, também ratificou a ideia de que é necessário ter para poder ser.

Considerando que o motivo ensejador dos crimes cometidos pelo preso foi o vício de drogas

ilícitas, externado em sua fala, e não se contradizendo em nenhum outro ponto da

contextualização do conteúdo, resta evidenciado que o terceiro objetivo específico não foi

confirmado, segundo a coleta de dados extraída da entrevista.

Quadro 10 - Análise entrevista x objetivos

QUESTIONAMENTOS

TEMÁTICOS ENTREVISTA FILTRADA

AFIRMAÇÃO/

NEGATIVA

DOS

OBJETIVOS

1. A BAIXA RENDA

PROVOCA

INVISIBILIDAE

SOCIAL?

“Era respeitado por todo mundo... Mas por

causa do vício de droga, acabei fazendo o

que não presta.”

1

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2. A NECESSIDADE DE

CONSUMO ESTIMULA

A CONDUTA

CRIMINOSA?

“Ganhava pouco, mas que dava pra comprar

as coisa que precisava... Não precisava fazer

nada disso não.”

1

3. O CRIME CONTRA

O PATRIMÔNIO

PRATICADO POR

PESSOAS DE BAIXA

RENDA É MEIO DE

BUSCA DO

CONSUMO?

“Era só por causa da droga mesmo.”

1

4. O CONSUMO DE

MARCAS

EXCLUSIVAS E O

PADRÃO DE VIDA

ELEVADO INCLUEM

SOCIALMENTE?

“A pessoa bem vestida não tem aquela

desconfiança... Uma roupa melhor é melhor

pra os outro não olhar feio pra pessoa.”

“Se puder comprar coisa de marca é bom.”

“Não compro pra mim... mas compro tudo

do bom pra meu filho, porque ele tem que

andar direito, com coisa boa, pra ninguém

olhar feio pra ele.”

2

Fonte: Elaboração própria, 2015

J.R.N, 30 ANOS. Desempregado, depois vendedor e autônomo em confecção.

Roubo/latrocínio–Dinheiro.

O preso J. R. N. confirma os três objetivos específicos da pesquisa, sem qualquer contradição.

Todas as suas falas, praticamente, levam à ideia do contexto temático.

Quanto ao objetivo número um, os dados extraídos da entrevista do preso indicam que os

crimes foram motivados pela necessidade de consumo, em razão da baixa renda auferida.

Fortalece ainda mais a afirmação, quando demonstra que assim que conseguiu auferir renda

através de trabalho, não mais cometeu crimes, tendo em vista que passou a ter poder de

compra, consumindo o necessário para justificar o sentimento de inclusão social.

O segundo objetivo específico também resta afirmado. O preso aduz na sua fala,

intrinsecamente, que fazia parte de uma classe menos favorecida por não possuir o que a outra

classe possuía. O consumo de marcas exclusivas era um desejo, sobretudo o desejo de

pertencimento à sociedade. O preso revelou que, enquanto não fez uso de marcas impostas

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pela sociedade, foi invisível e inexistente perante às pessoas, só passando a ser respeitado

quando obteve poder de compra.

O terceiro objetivo resta caracterizado no contexto da entrevista do preso J. R. N., o qual

revelou, através de sentimentos de desigualdade e menosprezo, que foi violentado socialmente

pela exclusão. Por essa razão, teria aderido às práticas criminosas, a fim de adquirir condições

de consumo para se insurgir na sociedade. Foi necessária a conduta ilícita para se chegar à

dignidade social.

Quadro 11 - Análise entrevista x objetivos

QUESTIONAMENTOS

TEMÁTICOS ENTREVISTA FILTRADA

AFIRMAÇÃO/

NEGATIVA

DOS

OBJETIVOS

1. A BAIXA RENDA

PROVOCA

INVISIBILIDAE

SOCIAL?

“Você só vale alguma coisa se tiver o que

mostrar. Se não tiver nada, não vale nada.”

“O povo olhava com medo pra mim, eu não

tinha nada, parecia um maloqueiro, um

trombadinha.”

“Em Santa Cruz, eu tinha confiança, era

bem visto porque vivia trabalhando...

Andava bem vestido, isso influencia

também... Não pode andar com roupa

rasgada, velha, senão já vão dizer que você

não tem nada, é maloqueiro.”

2

2. A NECESSIDADE DE

CONSUMO ESTIMULA

A CONDUTA

CRIMINOSA?

“E dinheiro pra comprar as coisas de nós? A

gente ia roubar dos outro, fazer furto aí na

feira. Era como dava pra comprar alguma

coisa.”

“Roubava pra curtir como os outro faz. Ia

roubar pra poder sair, curtir, beber, tomar

cachaça, usar droga...”

“Quando arrumei umas coisinha, comecei a

andar diferente, comprei roupa e consegui

um emprego. Fui ser vendedor.”

1,3

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3. O CRIME CONTRA

O PATRIMÔNIO

PRATICADO POR

PESSOAS DE BAIXA

RENDA É MEIO DE

BUSCA DO

CONSUMO?

“Queria curtir, não tinha dinheiro, fazer o

que? Roubar!”

“Depois comecei a trabalhar como vendedor

e depois pra mim. Comecei a comprar as

coisa pra casa, pra mim e parei de fazer

coisa errada... Comprei estante, mesa,

televisão, um carrinho velho...”

1,2,3

4. O CONSUMO DE

MARCAS

EXCLUSIVAS E O

PADRÃO DE VIDA

ELEVADO INCLUEM

SOCIALMENTE?

“Comprava roupa, mas não precisava ser da

seaway, cyclone, saka praia... A gente só via

os outro usando.”

“Usava roupa da sulanca mesmo, não tinha

dinheiro pra usar roupa boa.”

2

Fonte: Elaboração própria, 2015

T.M.B.S., 31 ANOS. Agente FUNASE. Latrocínio (carro) e receptação de carga.

O último preso entrevistado confirma os objetivos específicos propostos, sem qualquer

ressalva. O primeiro objetivo resta completamente desenhado na fala do mesmo, uma vez que

afirma, categoricamente, que cometeu o crime para consumir. Sua renda, em que pese se

mostrar em valores razoáveis, torna-se baixa, diante da necessidade de consumo demonstrada.

T. M. B. S. faz questão de dizer que a renda auferida não era capaz de suprir o que necessitava

para se fazer existente na sociedade.

T. M. B. S. também confirma o segundo objetivo específico na sua fala. Os dados colhidos

são reveladores que a exclusão social é vivenciada pelas pessoas que não conseguem

consumir o suficiente para fazerem parte dos grupos sociais, estabelecidos pelas marcas

intituladas como referência, seja inerente ao uso de roupa, ao consumo de bebida ou ao

ambiente a ser frequentado. Resta evidenciado que o receio de sofrer violência social, através

dos efeitos da invisibilidade e inexistência social, levaram o preso entrevistado a buscar se

incluir na sociedade através do consumo.

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O terceiro objetivo também é afirmativo, sob a análise do contexto de dados extraído da fala

de T. M. B. S., uma vez que o mesmo aponta a divisão de classes, entre incluídos e excluídos,

socialmente, como aspecto de uma violência social, que implica na necessidade de consumo,

que é buscada através do crime contra o patrimônio.

Quadro 12 - Análise entrevista x objetivos

QUESTIONAMENTOS

TEMÁTICOS ENTREVISTA FILTRADA

AFIRMAÇÃO/

NEGATIVA

DOS

OBJETIVOS

1. A BAIXA RENDA

PROVOCA

INVISIBILIDAE

SOCIAL?

“Deixando o ex presidiário de lado, o status

diz muito... A sociedade respeita e vê de

outra forma... Você é visto pela aparência.”

2,3

2. A NECESSIDADE DE

CONSUMO ESTIMULA

A CONDUTA

CRIMINOSA?

“Não tem justificativa para cometer o crime,

roubei pra ter status“.

“Pra viver ostentando é caro... A maioria

dos crimes hoje é por isso, quem não quer

ter uma mulher bonita do lado e um carro

novo”?

1,2,3

3. O CRIME CONTRA

O PATRIMÔNIO

PRATICADO POR

PESSOAS DE BAIXA

RENDA É MEIO DE

BUSCA DO

CONSUMO?

“O dinheiro some, não dá pra nada...”

3

4. O CONSUMO DE

MARCAS

EXCLUSIVAS E O

PADRÃO DE VIDA

ELEVADO INCLUEM

SOCIALMENTE?

“Ostentar é tá com dinheiro no bolso, bem

vestido, bem montado e rodeado de

mulheres.”

“Quando você tem status fica rodeado de

amigos, sem nada disso você tá na minoria,

na exclusão... Excluído de várias coisas.”

“Você é visto pela aparência, se compra

objeto inferior é criticado... Até se vai pra

um hospital ruim ou bom, isso é visto.”

1,2,3

Fonte: Elaboração própria, 2015

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Ressalte-se, por fim, que a prática dos crimes visaram a busca por dinheiro, tanto que os

objetos furtados ou roubados eram transformados em valores e, a partir de então, destinados

ao consumo de produtos das mais variadas espécies, desde a aquisição de coisas até à

presença em determinados locais de visibilidade na sociedade.

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5 CONCLUSÕES

A temática da pesquisa abordou a invisibilidade social e a vulnerabilidade consumerista, no

sentido de verificar de que maneira a necessidade do consumo, por pessoas de baixa renda,

estimula a prática criminosa. Para alcançar o objetivo da pesquisa, cinco pessoas, escolhidas

pelo perfil adequado aos critérios metodológicos, participaram de entrevistas e esboçaram

suas experiências vivenciadas, sob análise da interdisciplinaridade entre o crime contra o

patrimônio e a necessidade de consumo.

O caminho metodológico para a coleta de dados foi trilhado por meio da técnica de entrevista,

através da qual a pesquisadora conseguiu abordar toda pauta pertinente à temática, extraindo

as informações necessárias para concluir que, essencialmente, a baixa renda provoca a

ausência de consumo, o que leva à exclusão social, a qual se tenta abominar através da

conduta criminosa, onde se encontra um meio rápido para se buscar consumir.

A partir dos dados colhidos nas entrevistas, onde os presos entrevistados, em sua maioria,

confirmaram os objetivos propostos na pesquisa, a pesquisadora estabeleceu duas categorias

temáticas, nominando as mesmas de ausência de consumo e busca do consumo, uma vez que

a fala dos entrevistados indicou várias vertentes que ensejaram as duas categorias.

Quanto à ausência de consumo, evidenciou-se a baixa renda dos presos, os quais indicaram

que a mesma é o fator principal da necessidade de consumir. A pesquisadora concluiu que o

critério para medir a renda não pode ser estabelecido, tão somente, a partir dos valores de

renda auferidos, mas, sobretudo, pelas necessidades sentidas. Uma renda de valor razoável

pode ser considerada baixa, a partir da necessidade de compra superior à capacidade de gasto.

Ainda na categoria temática da ausência de consumo, os presos demonstraram as suas

necessidades, através de evidências de invisibilidade e inexistência social. As necessidades

apontadas foram as mesmas, todas advindas dos efeitos da exclusão social. Restou

evidenciado que, a subsistência depende, também, do poder de compra, uma vez que uma

pessoa só consegue ser concreta, de fato, existindo e sendo, efetivamente, vista na sociedade,

se detiver condições de consumo do que vai além da subsistência natural do homem.

A categoria temática da ausência de consumo, estendida pelas unidades de significado (presos

detentores de baixa renda e evidências de invisibilidade e inexistência social) é concluída sob

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103

a análise de que essa ausência é patente nas classes sociais menos favorecidas e provoca

violência social, através dos efeitos de invisibilidade e inexistência social.

A segunda categoria temática, nominada de busca de consumo, é composta por duas unidades

de significado (a busca da inclusão através do consumo de marcas exclusivas e prática de

crimes contra o patrimônio em busca de consumo). Os presos entrevistados evidenciaram que

a ausência de consumo de marcas exclusivas, essas interpretadas como os produtos e

ambientes aceitos na sociedade, leva à exclusão. Assim, seguindo o raciocínio confrontante,

para se incluir socialmente, faz-se necessário o uso de marcas exclusivas, no sentido das que

são impostas por um modelo social.

Restou muito evidente pelos presos, com a exceção de um, que a motivação da prática

criminosa foi a busca pelo consumo, diante da necessidade de inclusão. Os presos relataram

experiências que retrataram uma divisão de classes na sociedade, estabelecidas sob o critério

do consumo.

Conclui-se, pois, com a categoria temática da busca de consumo, que a busca por produtos de

marcas estabelecidas na sociedade não se contextualiza no conceito de consumismo, mas de

consumo; porquanto é necessidade básica do cidadão para manter-se em sociedade. Daí a

opção de se inserir em práticas criminosas, como um meio viável e possível.

A pesquisadora concluiu, ainda, que em que pese os presos terem indicado rendas diferentes,

as necessidades foram voltadas para o consumo inclusivo, ou seja, os anseios se revelaram na

busca pela inclusão social, como fuga dos efeitos da violência social, concretizada na divisão

de classes, onde uma delas se torna inexistente e invisível. Os sentimentos ainda são

corroborados, mesmo quando se analisa que os presos indicaram idades diversas e graus de

escolaridade distintos.

Extraiu-se da pesquisa que a busca pelo consumo, através da via do crime, independe de

idade, escolaridade e renda. Nenhum desses fatores tem a força de mudar o rumo da trajetória;

porquanto, a prática criminosa surge de uma necessidade comum a todos, da inclusão social,

essa que pode exigir padrões mais ou menos elevados, tudo a depender da sociedade na qual

se está inserido.

Em suma, os objetivos específicos propostos foram confirmados na pesquisa, na medida em

que cada um foi analisado conforme os dados extraídos em cada entrevista. O segundo

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entrevistado - E. B.S. -, o quarto entrevistado – J. R. N. - e o quinto entrevistado – T. M. B. S.

-, confirmam, integralmente, os três objetivos específicos da pesquisa. As entrevistas do

primeiro e terceiro entrevistados, M. E. M. F. e E. B. S., respectivamente, demonstraram

algumas peculiaridades acerca dos objetivos propostos, o que foi observado com

imparcialidade devida pela pesquisadora.

M.E.M.F., em uma análise conclusiva, confirmou todos os objetivos, ainda que o primeiro

objetivo tenha sido confirmado inicialmente e negado em momento posterior, pois uma única

curta frase, diante do contexto da entrevista do preso, após uma análise exaustiva e

comparativa não conseguiu anular as demais falas. Os demais objetivos foram confirmados

em toda a fala do entrevistado.

E. B. S., terceiro entrevistado, não confirma o primeiro e o terceiro objetivo, tendo em vista

que foi categórico em afirmar que foi levado à prática criminosa pela via de consumo das

drogas; o segundo objetivo restou confirmado quanto ao sentimento de invisibilidade e

inexistência social, combatidas na sociedade, na visão do preso entrevistado, através do

consumo.

A pesquisa evidenciou, ainda, que os sujeitos entrevistados não buscaram o caminho da

visibilidade através do acesso à educação, à cultura ou à formação. Segundo a análise do

contexto das entrevistas e dos tons das falas dos mesmos, constatou-se que a opção pelo crime

se deu por esse demonstrar ser uma via mais rápida para solucionar o problema da

invisibilidade social, gerado pela ausência de consumo, na medida que o tempo prolongado

significa a intensificação da violência social, essa que é reiterada a cada sensação de

inexistência e abstração humana.

Portanto, a temática do estudo em tela resta confirmada, concluindo-se, em resposta ao

objetivo geral e em consonância com os objetivos específicos, que a ocorrência de crimes

contra o patrimônio nasce a partir da necessidade de inclusão social, buscada através do poder

de consumo, incompatível com a baixa renda auferida.

Antecipando as sugestões, abaixo indicadas em tópico próprio, os resultados da pesquisa

indicam a necessidade de novos estudos em torno da temática, essa que envolve,

estatisticamente, os crimes mais cometidos no Estado de Pernambuco, bem como com

sujeitos do sexo masculino, que contemplam a maioria excessiva da comunidade carcerária.

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A partir dos resultados da análise presente, exsurgem novas indagações a serem buscadas e

respondidas:

Por que a população carcerária feminina perfaz um número estatístico imensamente menor?

Significa dizer que a população feminina não busca o crime para atender às necessidades de

consumo?

Qual a necessidade de consumo do sexo feminino?

Qual o percentual dos crimes contra o patrimônio, praticados pelo sexo feminino?

Por que razão os crimes contra o patrimônio apontam aproximadamente 50% das condutas

criminosas praticadas?

Qual o percentual de crimes contra o patrimônio estimulados pela busca do consumo?

Em suma, a pesquisa aponta um dado: o crime pode advir da necessidade de consumo, diante

dos sentimentos de invisibilidade e inexistência social. Resta ao mundo científico estender o

estudo e avançar nos resultados com novos dados, os quais são de extrema importância para a

sociedade, uma vez que apontam problemas emergentes e sistemáticos que, a partir de então,

podem ser solucionados ou minimizados.

5.1 Percepção e experiência

A temática em tela, em que pese ter sido uma inquietação da pesquisadora, causou uma certa

insegurança, diante da possibilidade da negativa da proposta do estudo. Decerto, sabe-se que a

negativa não deixa de ser um dado, porém, seria frustrante continuar inquieta por discordar

que o crime advém da natureza humana, em tom de agressividade, sem que esteja vinculado a

uma razão.

A percepção da pesquisa é de que tem extrema pertinência, diante da viabilidade

demonstrada, tendo em vista que trouxe um dado de grande importância e relevância,

sobretudo na seara econômica e criminal. São dois conceitos isolados: crime e consumo, que,

no entanto, com a presente pesquisa, se mostram entrelaçados e intimamente ligados. É a

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certeza de que a economia interfere nos índices criminais, especialmente quando eleva o

consumo, a ponto de estabelecer divisões de classes sociais e provocar a exclusão das pessoas

que não se adequam aos padrões estabelecidos.

5.2 Sugestões

Sugere-se a utilização dos dados colhidos na presente pesquisa nos órgãos ligados à

criminalidade, segurança pública, economia, e ainda, aos poderes legislativos. Com os dados

em tela, será possível investigar, de forma mais profunda e acentuada, as causas do aumento

da criminalidade, quando o consumo está como foco de inclusão social.

Os sentimentos narrados pelos presos por crimes contra o patrimônio revelam um dado

interessante, no sentido de uma contínua investigação na mesma linha de raciocínio em outras

espécies de crime, bem como, em outros segmentos da população.

A pesquisa em comento se limitou a um recorte voltado aos crimes contra o patrimônio e a

sujeitos presos pela prática desses crimes. A réplica da pesquisa com pessoas que cometeram

esses tipos de crime e que se encontram em liberdade implica em um dado importante, no

sentido de saber acerca da continuidade ou não dos delitos e suas razões. A sua repetição com

foco na ocorrência de outros crimes, também, pode complementar os resultados encontrados.

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APÊNDICE A – ROTEIRO DA ENTREVISTA INDIVIDUAL

BLOCO 1 – IDENTIFICAÇÃO

1. Qual o seu nome?

2. Qual a sua idade?

3. Até que série estudou?

4. Qual a atividade que exercia antes de ser preso?

5. Qual a sua renda antes de ser preso?

BLOCO 2 – IDENTIFICAÇÃO DAS PRÁTICAS CRIMINOSAS

1. Qual o crime que cometeu?

2. É a primeira vez que cometeu crime?

BLOCO 3 – IDENTIFICAÇÃO DOS SENTIMENTOS DOS PRESOS, SEGUNDO A

VISÃO DO CONSUMO E A OCORRÊNCIA DE CRIMES

1. A renda que tinha, antes de ser preso, era suficiente para se manter?

2. Gosta de usar roupas e objetos de marcas famosas?

3. O uso das marcas famosas lhe faz bem?

4. Quais as marcas que gosta ou gostaria de consumir?

5. Se você mostrar às pessoas que possui marcas caras, consegue ter oportunidade de emprego

e amizade?

6. O que é preciso ter para ser importante na sociedade?

7. Usar marcas caras e conhecidas de roupas ou objetos importa para as pessoas?

8. Uma pessoa que não possui uma boa condição financeira é aceita na sociedade da mesma

forma de outra que possui alta renda?

9. Por que cometeu o crime?

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APÊNDICE B – TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE ENTREVISTA

CPPA - CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

MPGE – MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO EMPRESARIAL

FBV – FACULDADE DE BOA VIAGEM DEVRY BRASIL

Pesquisadora: Raíssa Braga Campelo

Tema da pesquisa: Invisibilidade social e vulnerabilidade consumerista: a prática de

crimes em busca de marcas exclusivas por pessoas de baixa renda

AUTORIZAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DO ENTREVISTADO COMO SUJEITO DA

PESQUISA

Eu, __________________________________________________, portador do

RG________________, do CPF_____________________, abaixo assinado, após o devido

esclarecimento do objetivo da entrevista a ser realizada, concordo em dela participar e me

proponho a assinar o presente termo, de livre e espontânea vontade, consentindo a gravação

de todo teor da entrevista.

Local e data :__________________________________________________

Assinatura do sujeito da pesquisa:

________________________________________________

____________________________________

Raíssa Braga Campelo

Pesquisadora Responsável