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FACULDADE DE DESPORTO UNIVERSIDADE DO PORTO A ACTIVIDADE FÍSICA NO PROCESSO DE REABILITAÇÃO DE PESSOAS COM LESÃO VÉRTEBRO-MEDULAR: ESTUDO EXPLORATÓRIO LONGITUDINAL DE PESSOAS ATENDIDAS NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS MANAUS (AMAZONAS) Dissertação apresentada com vista à obtenção do Grau de Mestre em Ciências do Desporto, na Área de Especialização em Actividade Física Adaptada de acordo com o Decreto-lei 216/92, de 13 de Outubro. Orientadora: Professora Doutora Maria Adília Sá Pinto Marques Silva Co-Orientadores: Professora Doutora Káthya Augusta Thomé Lopes Professor Doutor Rui Corredeira Rosângela Martins Gama Porto, Outubro de 2009

FACULDADE DE DESPORTO - repositorio-aberto.up.pt · VI honestidade e serenidade pelo que você faz e acredita me contagiou. Obrigada por tudo. À Professora Maria Adília Silva que,

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FACULDADE DE DESPORTO

UNIVERSIDADE DO PORTO

A ACTIVIDADE FSICA NO PROCESSO DE REABILITAO DE PESSOAS

COM LESO VRTEBRO-MEDULAR: ESTUDO EXPLORATRIO

LONGITUDINAL DE PESSOAS ATENDIDAS NO HOSPITAL

UNIVERSITRIO GETLIO VARGAS MANAUS (AMAZONAS)

Dissertao apresentada com vista obteno

do Grau de Mestre em Cincias do Desporto,

na rea de Especializao em Actividade

Fsica Adaptada de acordo com o Decreto-lei

216/92, de 13 de Outubro.

Orientadora: Professora Doutora Maria Adlia S Pinto Marques Silva

Co-Orientadores: Professora Doutora Kthya Augusta Thom Lopes

Professor Doutor Rui Corredeira

Rosngela Martins Gama

Porto, Outubro de 2009

Ficha de Catalogao

Gama, R. M. (2009). A actividade fsica no processo de reabilitao de pessoas

com leso vrtebro-medular: estudo exploratrio longitudinal de pessoas

atendidas no hospital universitrio Getlio Vargas Manaus. Porto: R. Gama.

Dissertao de Mestrado apresentado Faculdade de Desporto da

Universidade do Porto.

Palavras-chave: ACTIVIDADE FSICA ADAPTADA, LESO VRTEBRO-

MEDULAR, AVALIAO FUNCIONAL, REABILITAO, PROAMDE.

DEDICATRIA

Em memria ao meu irmo Davi Martins,

das minhas amigas Franciney dos Santos Fernandes e

Raimunda Rodrigues dos Santos e a minha Orientadora

Maria Adlia Silva, os quais ensinaram-me que,

a diferena entre o possvel e o impossvel reside

no grau de determinao de cada um.

(Tommy Lasorda)

V

AGRADECIMENTOS

Ao ingressar no mestrado, sabia que os prximos dois anos da minha vida

poderiam ser difceis, pois teria que ir para longe da famlia e amigos, mas

tambm sabia que iria conhecer, compartilhar e aprender com nova cultura,

novos hbitos e novos amigos. Por isso deixo aqui registados meus sinceros

agradecimentos queles que contriburam ao longo de todo esse percurso. Sei

que nem todos estaro citados aqui, mais sintam-se agradecidos.

Aos anjos que sempre me protegem e acompanham-me em todos os passos

da minha vida. Muitos destes anjos esto aqui na terra. Os quais chamo de

Amigos.

Aos meus familiares, especialmente a minha me e aos meus sobrinhos que

souberam compreender e suprir minha ausncia nos momentos difceis da

famlia. Sei que foram feitos muitos sacrifcios por esse mestrado. Obrigada

Daniela, Davi e Rosenilda Martins por toda ajuda, carinho e dedicao minha

me.

Faculdade de Educao Fsica da Universidade Federal do Amazonas,

instituio que auxiliou minha vinda a Portugal.

Ao PROAMDE que possibilitou meu ingresso ao mestrado. Estendo aqui meu

agradecimento a todos os colegas e amigos do projecto, que me incentivaram

e ajudaram nessa caminhada, especialmente aos meus amigos Keegan,

Cristian, Solange, Barbosa, Guaracema, Teresinha, Anny, Mirca Graziela,

Minerva, Viviane, Eva, Leonardo, Rosemar e Talita. Assim como aos alunos do

projecto que contriburam para com o estudo.

Coordenadora do PROAMDE, Professora, co-orientadora e Amiga Kthya

Augusta Thom Lopes que, sempre presente, teve uma grande influncia neste

meu percurso. ela, tambm, responsvel pela mudana de atitude na vida de

muitos deficientes na cidade de Manaus. A demonstrao de amor,

VI

honestidade e serenidade pelo que voc faz e acredita me contagiou. Obrigada

por tudo.

Professora Maria Adlia Silva que, para alm de ser a luz no percurso da

minha dissertao como minha orientadora, me acolheu de braos abertos no

Gabinete de Actividade Fsica Adaptada. Foi a sua dedicao, integridade,

respeito, perfeccionismo, pacincia, sinceridade, carinho, amizade e amor pela

docncia, que contribui em muito para a minha aprendizagem, em todos os

aspectos.

Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, em nome de seu

presidente do Conselho Directivo Prof. Dr. Jorge Bento, e ao Gabinete de

Actividade Fsica Adaptada que me brindaram com o curso de mestrado.

Ao Professor Rui Corredeira pela amizade, carinho, e apoio em todos os

momentos que foram necessrios, principalmente na finalizao da

dissertao.

Professora Ctia Borges pelas palavras de carinho e incentivo.

Ao Professor Andr Seabra e ao professor Maia, pela colaborao, nos

momentos de dvidas com a estatstica do trabalho.

Aos amigos, que tambm esto nessa caminhada e que em algum momento,

ou, em todos, estiveram presente nesse percurso. Amigos-famlia, os quais

compartilhamos as angustias e as alegrias. Obrigada: Tharcsio, Hulda, Rose

Autran, Brunna, Daniele Holanda, Sheila, ngela, Rosana, Silvana, Patrcia,

Dbora, Ricardo, Fernanda, Socorro e Slvio Birolo.

Aos amigos da minha turma de mestrado que me receberam de braos

abertos. Que compartilharam seu espao e os seus conhecimentos. Estendo

este agradecimento aos amigos portugueses (sei que amigos no tem

VII

nacionalidade) que me apoiaram e partilharam comigo as suas casas e as suas

famlias. Que estiveram sempre presentes nos momentos em que precisei.

Obrigada, especialmente a Snia Alexandra, Filipa Moura, Ricardo Neves,

Eliana Oliveira, Eva Martins, Olinda, Ins, Aurlia e Nuno

minha famlia portuguesa adoptiva, Sra. Alexandrina e Sr. Amadeu Arajo,

que me ensinaram muito sobre esta terra e compartilharam a sua casa, a sua

famlia e momentos inesquecveis.

minha amiga e irm Agripina Corra, pela dedicao, apoio e carinho.

Amabilly e Yasmin Martins, juntamente com a Ana Clara e o Joo Pedro que

se privaram da minha presena em um momento muito importante para vocs.

Vocs foram as peas propulsoras para este Mestrado. Amo vocs.

minha amiga Ana Justa por toda a sua disponibilidade, pacincia, dedicao,

carinho, compreenso e apoio incondicional minha famlia. Obrigada por tudo

A todos s posso dizer que sem o apoio e amizade de vocs teria sido mais

difcil. Muito Obrigada.

IX

NDICE GERAL

AGRADECIMENTOS ..... III

NDICE GERAL .. VI

NDICE DE FIGURAS ..... VIII

NDICE DE QUADROS . IX

RESUMO .... XII

ABSTRACT ... XIII

RESUM

ABREVIATURAS .... XIV

1. INTRODUO ... 03

2. REVISO DA LITERATURA ...... 06

2.1 Leso Vrtebro-Medular

2.1.1 Algumas Consideraes de Anatomia e de Neuroanatomia . 06

2.1.2 Conceito . 09

2.1.3 Complicaes Clnicas . 16

2.1.4 Impacto e Adaptao Psicossocial da Leso Vrtebro-Medular .. 24

2.1.5 Factores Epidemiolgicos ... 33

2.2 Actividade Fsica

2.2.1 Aspectos Histricos .. 41

2.2.2 Actividade Fsica e Leso Vrtebro-Medular ... 44

3. OBJECTIVOS, HIPOTESES E VARIVEIS .... 52

4. MATERIAL E MTODOS .... 54

4.1 Amostra 54

4.2 Procedimentos Metodolgicos .. 55

4.2.1 Instrumento . .. 56

4.3 Programa de Actividade Motora para Deficientes .... 57

X

4.4 Procedimentos Estatsticos 60

5. APRESENTAO DOS RESULTADOS .. 61

5.1 Apresentao dos dados sciodemogrficos ..... 62

5.2 Apresentao dos dados da avaliao funcional . 67

6. DISCUSSO DOS RESULTADOS 96

6.1. Dados sciodemogrficos . 96

6.2. Avaliao Funcional . 99

7. CONCLUSES E SUGESTES .. 105

8. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ... 128

ANEXOS ........ XV

XI

NDICE DE FIGURAS

Figura 1 Nvel da LVM e Comprometimento ...82

Figura 2 Dados da amostra em funo do sexo ....82

Figura 3 Dados da amostra em funo dos escales etrios ..94

Figura 4 Dados da amostra em funo da zona de provenincia ...45

Figura 5 Dados da amostra em funo do estado civil .40

Figura 6 Dados da amostra em funo das habilitaes Literrias .50

Figura 6.1 Dados da amostra em funo das habilitaes literrias: completa

ou Incompleta .89

Figura 7 Dados da amostra em funo da distribuio de renda 39

Figura 8 Dados da amostra em funo da etiologia da leso ..45

Figura 9 Dados da amostra em funo do comprometimento neurolgico 33

Figura 10 Dados da amostra em funo do tipo de leso: completa ou

incompleta ...58

Figura 11 Dados da amostra em funo do tempo de leso 78

Figura 12 Dados da amostra em funo da existncia da lcera de presso

.90

Figura 13 Total de pontuao geral ..88

Figura 14 Valores mdios de percentuais por categorias .56

Figura 15 Valor mdio relativo ao item cuidados pessoais em relao ao total

da amostra nos dois momentos ...49

Figura 16 Valor mdio relativo ao item cuidados com a aparncia em relao

ao total da amostra nos dois momentos .60

Figura 17 Valor mdio relativo ao item posio e manejo em CR em relao

ao total da amostra nos dois momentos .84

Figura 18 Valor mdio relativo ao item transferncia e mobilidade em relao

ao total da amostra nos dois momentos ....89

Figura 19 Valor mdio relativo ao item cuidados mobilidade no colcho em

relao ao total da amostra nos dois momentos ..96

XII

NDICE DE QUADROS

Quadro 1 Nmero de Internaes hospitalares no SUS Brasil por traumas

totais, por traumas de coluna e por comprometimento de coluna, de

2000 a 2005. Adaptado de Tuono (2008) ..95

Quadro 2 Comprometimento da medula, segundo o nvel da leso (Nmero e

%), Brasil 2000 a 2005 (Tuono, 2008, p.72) ..98

Quadro 3 Custo dia e gasto mdio (em Reais) das internaes hospitalares

SUS - Brasil por traumas de coluna e comprometimento segundo

nvel da leso, em 2005 (Tuono, 2008, p.80) ...86

Quadro 4 Distribuio da amostra por sexo e grupos etrios. Mdia, desvio

padro, valor mnimo e mximo ..88

Quadro 5 Distribuio da amostra por sexo e tipo de leso. Mdia, desvio

padro, valor mnimo e mximo ..91

Quadro 6 Distribuio da amostra por tipo leso, completo e incompleto.

Mdia, desvio padro, valor mnimo e mximo .80

Quadro 7 Valores mdios de pontuao por categorias ...87

Quadro 8 Valor mdio da pontuao mxima do item cuidados pessoais 90

Quadro 9 Valor mdio da pontuao mxima do item cuidados com a

aparncia .....96

Quadro 10 Valor mdio da pontuao mxima do item posio e manejo em

CR ..98

Quadro 11 Valor mdio da pontuao mxima do item transferncia e

mobilidade 78

Quadro 12 Valor mdio da pontuao mxima do item mobilidade no colcho

....86

Quadro 13 Valor relativo a avaliao funcional do item cuidados pessoais de

medidas repetidas em funo do sexo ....85

Quadro 14 Valor relativo a avaliao funcional do item cuidados com a

aparncia de medidas repetidas em funo do sexo ..84

Quadro 15 Valor relativo a avaliao funcional do item posio e manejo em

CR de medidas repetidas em funo do sexo ..86

XIII

Quadro 16 Valor relativo a avaliao funcional do item transferncia e

mobilidade de medidas repetidas em funo do sexo .78

Quadro 17 Valor relativo a avaliao funcional do item mobilidade no

colcho de medidas repetidas em funo do sexo ..84

Quadro 18 Resultados da avaliao funcional do item cuidados pessoais de

medidas repetidas em funo do tipo de leso ..93

Quadro 19 Resultados da avaliao funcional do item cuidados com a

aparncia de medidas repetidas em funo do tipo de leso

.92

Quadro 20 Resultados da avaliao funcional do item posio e manejo em

CR de medidas repetidas em funo do tipo de leso 90

Quadro 21 Resultados da avaliao funcional do item transferncia e

mobilidade de medidas repetidas em funo do tipo de leso

.....................................................................................................80

Quadro 22 Resultados da avaliao funcional do item mobilidade no

colcho de medidas repetidas em funo do tipo de leso ....85

Quadro 23 Resultados da avaliao funcional do item cuidados pessoais de

medidas repetidas em funo da leso completa e leso

incompleta ....88

Quadro 24 Resultados da avaliao funcional do item cuidados com a

aparncia de medidas repetidas em funo da leso completa e

leso incompleta .70

Quadro 25 Resultados da avaliao funcional do item posio e manejo em

CR de medidas repetidas em funo da leso completa e leso

incompleta 92

Quadro 26 Resultados da avaliao funcional do item transferncia e

mobilidade de medidas repetidas em funo da leso completa e

leso incompleta .91

Quadro 27 Resultados da avaliao funcional do item mobilidade no

colcho de medidas repetidas em funo da leso completa e

leso incompleta .....97

XIV

Quadro 28 Resultados da avaliao funcional do item cuidados pessoais de

medidas repetidas em funo do tempo de leso ...100

Quadro 29 Resultados da avaliao funcional do item cuidados com a

aparncia de medidas repetidas em funo do tempo de leso

......101

Quadro 30 Resultados da avaliao funcional do item posio e manejo em

CR de medidas repetidas em funo do tempo de leso .....102

Quadro 31 Resultados da avaliao funcional do item transferncia e

mobilidade de medidas repetidas em funo do tempo de leso

..103

Quadro 32 Resultados da avaliao funcional do item mobilidade no

colcho de medidas repetidas em funo do tempo de leso

..104

XV

RESUMO

Face ao crescente aumento dos casos de Leso Vrtebro-Medular,

assiste-se, tambm, ao aumento e desenvolvimento de recursos de apoio aos

indivduos com esse tipo de leso, os quais visam uma melhoria da sua

qualidade de vida. Deste modo, traam-se novas estratgias com o objectivo

de proporcionar uma vida com mais independncia e/ou autonomia, a estes

indivduos, independentemente da extenso de sua leso.

Este estudo teve como objectivo investigar a contribuio da Actividade

Fsica, no caso vertente atravs do Programa de Actividade Motora para

Deficientes - PROAMDE, no processo de reabilitao de indivduos com Leso

Vrtebro-Medular, na cidade de Manaus, Brasil. O estudo foi realizado com

tempo finito de 22 dias e com uma periodicidade de 2 vezes por semana.

Tratou-se de um estudo exploratrio longitudinal, tendo sido feita uma

avaliao em dois momentos: inicial e final, com o preenchimento de uma ficha

adaptada pelo projecto PROAMDE. A amostra foi constituda por 52 indivduos,

6 do sexo feminino e 46 do sexo masculino, com idades compreendidas entre

os 16 e os 63 anos (3010,8), sendo 38 deles paraplgicos e 14 tetraplgicos.

Do total de participantes, 31 apresentavam leso completa e 21 leso

incompleta, com o tempo de leso a variar entre menos de 1 ano at 16 anos.

Os resultados evidenciaram que, aps a interveno, o grupo obteve um ganho

de 34% no total de pontuao mxima, em relao as actividades que

passaram a ser realizadas. Foi ainda observada evoluo em todos os itens

avaliados no Programa.

Os resultados deste estudo parecem fornecer bons indicativos sobre o

contributo que a Actividade Fsica poder dar ao processo de reabilitao

funcional de indivduos com Leso Vrtebro-Medular. Neste sentido a

interveno do PROAMDE, parece pois, sugerir um desenvolvimento e

melhoria do padro motor dos indivduos participantes do estudo.

Palavras-chave: ACTIVIDADE FSICA ADAPTADA, LESO VRTEBRO-

MEDULAR, AVALIAO FUNCIONAL, REABILITAO, PROAMDE.

XVII

ABSTRACT

Given the growing number of cases of spinal cord injury, there has also been an

increase and resource development support to individuals with this type of

injury, which will improve their quality of life. Thus, new strategies are drawn up

in order to provide a more independent life and/or autonomy to these

individuals, regardless of the extent of their injury.

This study was aimed at the investigation of the contribution of physical activity,

in this case through the "Motor Activity Program for the Handicapped -

PROAMDE", in the process of rehabilitation of individuals with Spinal Cord

Injury in the city of Manaus, Brazil. The study was carried out with a finite time

of 22 days and with a 2 times per week frequency. This was an exploratory

longitudinal study assessed in two stages: initial and final by filling up a form

adapted to the PROAMDE project. The sample consisted of 52 individuals, 6

females and 46 males, aged between 16 and 63 years (30 10.8), 38 of them

paraplegics and 14 quadriplegics. From the included participants, 31 had

complete injury and 21 incomplete injury, injury time varying from less than 1

year to 16 years. For the conducted activities the results showed that, after

intervention, the group had a 34% gain in the total maximum score. It was also

observed changes in all items evaluated by the Program.

The results of this study seem to provide good directions on the contribution

that physical activity can make on the process of functional rehabilitation of

individuals with spinal cord injury. Therefore, in this sense, the PROAMDE

intervention seems to suggest a motor pattern development and improvement

on this study's participating individuals

Keywords: ADAPTED PHYSICAL ACTIVITY, SPINAL CORD INJURY,

FUNCTIONAL ASSESSMENT, REHABILITATION, PROAMDE.

XIX

RESUM

Face la croissance des cas de Lsion Vertebro-Mdulaire, on assiste

paralllement une croissance et dvloppement des ressources de soutien

aux sujets avec ce type de lsion, qui visent une amlioration de sa qualit de

vie. Ainsi, on trace de nouvelles stratgies ayant comme but doffrir ces

individus, une vie plus indpendente et/ou autonome, indpendamment de

lextension de sa lsion.

Cette tude a eu comme but de rechercher la contribuition de lActivit

Physique, en ce cas, travers de Programme de lActivit Motrice pour

handicaps PROAMDE, dans le processus de rabilitation dindividus avec

Lsion Vertebro- Medulaire, dans la ville de Manaus, Brsil. Ltude a t

ralise en 22 jours et avec une priocit de deux fois par semaine.

Il sagit dune tude exploratoire longitudinnelle, ayant t faite une valuation

en deux moments: au dbut et la fin du programme, avec le remplissage

dune fiche adapte par le projet PROAMDE. Lechantillonnage t constitu

par 52 individus, 6 du sexe fminin et 46 du sexe masculin, entre les 16 et 63

ans (3010,8), dont 38 paraplgiques et 14 tetraplgiques.

Du total de ces participants, 31 prsentaient une lsion complte et 21 une

lsion incomplte, avec un temps de lsion variant entre 1 an et 16 ans. Les

rsultats ont montr que le groupe soumis lintervention de ce programme a

obtenu un gain de 34% (dans le total de ponctuation maxime) face

lvaluation initiale. On a encore observ lvolution, en tous ces itens

dvaluation dans le Programme.

Les rsultats de cette tude semblent fournir de bonnes rfrences sur lapport

de lActivit Physique pour le processus de rabilitation fonctionnelle dindividus

avec Lesion Vertebro-mdulaire. En ce sens, lintervention du PROAMDE,

semble donc, suggrer un dvloppement et amlioration des skills moteurs

des individus participants de cette tude.

XXI

ABREVIATURAS

ASIA American Spinal Injury Association

AVDs Actividades de Vida Diria

BPC Benefcio da Prestao Continuada

CR Cadeira de Rodas

EUA Estados Unidos da Amrica

FAF Ferimento por projcteis de arma de fogo

FEF Faculdade de Educao Fsica

HDL High Density Lipoprotein ou Lipoprotena de Alta Densidade

HUGV Hospital Universitrio Getlio Vargas

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

ICSSPE International Council of Sport Science and Physical Education

IFAPA International Federation of Adapted Physical Activity

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira

LDB Lei de Directrizes e Bases da Educao

LVM Leso Vrtebro-Medular

MI Membros Inferiores

MS Membros Superiores

NMI Neurnio Motor Inferior

NMS Neurnio Motor Superior

OMS Organizao Mundial de Sade

PAPS Programa de Preparao para Alta de Sequelados e seus Familiares

PROAMDE Programa de Actividade Motora para Deficientes

SCI Spinal Cord Injury

R$ -Reais

SAME Servio de Atendimento Mdico e Estatstico

SNA Sistema Nervoso Autnomo

SUS Sistema nico de Sade

UFAM Universidade Federal do Amazonas

1. INTRODUO

3

1. INTRODUO

Sabemos que as pessoas com deficincia, por virtude da incapacidade

fsica, motora ou qualquer outra, possuem certas limitaes, variando estas

com o grau da sua deficincia. A Leso Vrtebro-Medular (LVM) uma dessas

deficincias. considerada um acometimento grave que pode gerar alteraes

permanentes na vida das pessoas. Por ser a medula espinal o condutor de

impulsos nervosos sensitivos e motores entre o crebro e as demais regies do

corpo, uma leso pode interromper essa comunicao e alterar a funo

normal da motricidade, da sensibilidade e das funes vitais. De acordo com a

American Spinal Injury Association - ASIA (1999), a LVM a diminuio ou

perda da funo motora e/ou sensorial e/ou anatmica, podendo ser uma leso

completa ou incompleta, devido ao comprometimento dos elementos neurais

dentro do canal vertebral.

No Brasil, o ltimo censo realizado em 2000, pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatstica (IBGE), revela que h cerca de 24,5 milhes de

pessoas (14,5%) com alguma alterao auditiva, fsica, mental ou visual. Dos

quais 1.901.892 (14,7%) esto nos estados do Norte, zona na qual faz parte a

cidade em que foi desenvolvida a pesquisa. Deste total 63.502 (3,3%) possuem

comprometimento na funcionalidade paraplegia, tetraplegia, hemiplegia, entre

outros, sendo neste percentual que centramos nossa pesquisa, ou seja, com as

pessoas com tetraplegia ou paraplegia.

Em um artigo publicado no Jornal Brasileiro de Medicina, Ortigara,

Wchter, Brollo, Castro, Novaes, Santos, et al., (2003), descrevem que das

leses traumticas da coluna vertebral, aproximadamente 55% ocorrem na

coluna cervical, 15% na coluna torcica, 15% na coluna toracolombar e 15% na

coluna lombosacral. Nos Estados Unidos da Amrica (EUA), cerca de 10 mil

pessoas por ano, principalmente jovens e adultos sadios, tornam-se

tetraplgicos ou paraplgicos em consequncia de leso da medula espinal.

De acordo com as pesquisas publicadas pela rede de hospitais Sarah

Kubitschek, no Brasil, estima-se que ocorram cerca de 11.300 novos casos por

ano, ou seja, 71 casos por milho de habitantes.

4

Dados no publicados, obtidos no Programa de Actividade Motora para

Deficientes (PROAMDE), na cidade de Manaus, entre os anos de 2000 a 2007,

mostram que foram atendidos 294 indivduos com trauma da coluna vertebral,

sendo que 80,2% tiveram algum tipo de comprometimento neurolgico. Muitas

dessas pessoas esto em casa sem conhecimento de seus potenciais vivendo

sem novas perspectivas.

Por conseguinte, a LVM pode acarretar uma serie de problemas

psicossociais. Aps a leso a pessoa pode apresentar, alm da deficincia

fsica, uma serie de incapacidades e desvantagens, precisando de um longo

processo de reabilitao. Algumas dessas pessoas se tornaro usurios de

cadeira de rodas (CR), necessitando de novos aprendizados para habilidades

motoras especficas em busca de melhoria das funes motoras ou/e

sensitivas e do bem-estar a visar uma melhor autonomia, pois a incapacidade

para locomoo independente um dos factores, para a pessoa com LVM, que

se transforma num grande desafio, tanto no aspecto fsico como psicolgico.

Portanto, temos que buscar alternativas para auxiliar no processo de

reabilitao destas pessoas, assim como desenvolver trabalhos que levem ao

conhecimento da comunidade em geral, de informaes sobre esse trauma,

pois com o aumento da violncia urbana e outros factores que surgem na

sociedade actual, as pessoas esto mais expostas a esse tipo de leso.

O facto de conviver com essas pessoas e saber de seus potenciais

geraram preocupaes, por perceber que elas no acreditam que possam

continuar efectuando quase tudo que faziam antes da leso, s que de maneira

adaptada. Na busca de alternativas capazes de proporcionar melhorias na

mobilidade, e consequentemente na auto-estima e autonomia destas pessoas,

houve interesse em realizar este trabalho. Por conseguinte, a presente

dissertao pretende saber qual o contributo da actividade fsica no progresso

da dependncia funcional das pessoas com LVM dentro de um projecto

multidisciplinar.

Em busca desta resposta elaboramos o seguinte objectivo geral:

descrever o contributo da actividade fsica no processo de reabilitao de

pessoas com Leso Vrtebro-Medular.

5

Aps a introduo geral, torna-se necessrio descrever a estruturao

do trabalho. Este estudo caracteriza-se por ser de ordem exploratrio

longitudinal, tendo em vista que a temtica abordada trata-se de uma pesquisa

que busca encontrar correlao entre variveis, atravs de observaes

repetidas dos mesmos itens em diferentes momentos.

No primeiro captulo fazemos uma breve introduo ao trabalho,

evidenciando os aspectos substanciais do mesmo e apresentando os

objectivos que orientaram toda a sua elaborao.

No segundo captulo fazemos uma reviso da literatura acerca da

Leso Vrtebro-Medular, designadamente algumas consideraes da anatomia

e da neuroanatomia, conceito, complicaes clnicas, impacto e adaptao

psicossocial e alguns factores epidemiolgicos. Em seguida abordamos a

actividade fsica nos seus aspectos histricos e a actividade fsica relacionada

Leso Vrtebro-Medular.

O captulo trs onde descrevemos os objectivos do nosso estudo,

suas hipteses e variveis.

Seguindo expomos, no captulo quatro, as questes metodolgicas

com descrio da amostra, os procedimentos, o instrumento, o PROAMDE e os

procedimentos estatsticos.

No captulo cinco procedemos apresentao dos resultados, fazendo

inicialmente uma anlise dos dados scio demogrficos, seguida da anlise da

avaliao funcional.

O captulo seis diz respeito discusso dos resultados apresentados no

captulo anterior.

O captulo sete apresenta as concluses seguidas de algumas

sugestes para estudos futuros.

Por ltimo expomos os captulos oito e nove, com as referncias

bibliogrficas e os anexos, respectivamente.

2. REVISO DA LITERATURA

9

2. REVISO DA LITERATURA

2.1 Leso Vrtebro-Medular

2.1.1 Algumas Consideraes de Anatomia e de Neuroanatomia

Faz-se necessrio falar da anatomia e neuroanatomia da coluna e da

medula para melhor entendimento. A coluna cervical, por exemplo, o elo

flexvel entre a plataforma sensorial do crnio (viso, audio, olfacto) e o

tronco. Entre as suas principais funes esto o suporte, movimentao da

cabea e proteco das estruturas do sistema nervoso e vascular. A coluna

combina fora e movimentao, que realizado por meio de um complexo

sistema articular. Para o seu funcionamento adequado existe equilbrio entre a

fora muscular e sua flexibilidade. A coluna cervical realiza em media 600

movimentos por hora ou 1 a cada 6 segundos (Hall & Lindzey, 1984).

O corpo vertebral constitudo por uma fina camada externa de osso

cortical com o seu interior preenchido por osso esponjoso. O volume dos

corpos vertebrais aumenta progressivamente da regio craniana para a regio

caudal, o que demonstra uma adaptao do ser humano s cargas impostas

coluna ao longo do seu eixo. Suas vrtebras so conectadas por articulaes

entre os corpos e entre os arcos neurais; elas articulam-se de modo a conferir

estabilidade e flexibilidade coluna, necessria para a mobilidade do tronco,

postura, equilbrio e suporte de peso (Gardner, Gray & Rahilly, 1988).

A musculatura da coluna vertebral tambm desempenha importante

funo na manuteno de estabilidade, equilbrio e ainda auxilia na

movimentao dos membros. Ela participa nos mecanismos de absoro dos

impactos, aliviando a coluna de grandes sobrecargas, alm de proteger contra

traumatismos.

A coluna vertebral formada, em mdia, por 33 vrtebras, (7 cervicais,

12 torcicas, 5 lombares, 5 sacrais e 4 ou 5 coccgeas). (Machado, 1993). J a

medula espinal formada por 31 pares de nervos espinhais (8 cervicais, 12

torcicos/dorsal, 5 lombares, 5 sacrais e 1 coccgeo) e est dividida em quatro

10

reas: cervical (pescoo), torcica (peito e parte alta das costas), lombar (parte

baixa das costas) e sacral (cccix). Cada rea representada por uma letra (C,

T, L, ou S). As vrtebras presentes em cada rea da coluna vertebral so

numeradas a partir das mais superiores. Quanto a relao entre vrtebra e

nervo espinhal, o primeiro nervo cervical - C1, emerge entre o atlas e o osso

occipital, de C2 a C7 emergem acima de sua vrtebra correspondente e C8

emerge entre a stima vrtebra cervical e a primeira torcica. Os outros nervos

emergem abaixo de suas vrtebras correspondentes.

A medula espinal encontra-se no canal vertebral. Ela estende-se

geralmente do formen magno primeira vrtebra lombar, podendo ocorrer

variaes. H uma rea cervical formando o plexo braquial e outra na rea

lombar referente ao plexo lombo-sacral (Machado, 2002).

O nervo espinal formado pela fuso de duas razes, uma ventral e

outra dorsal. A raiz ventral possui apenas fibras motoras (eferentes) cujos

corpos celulares esto situados na coluna anterior da substncia cinzenta da

medula e inerva a pele do pescoo, parte anterior e lateral do trax, abdmen e

membros, sendo que as razes ventrais de C5 a T1 formam o plexo braquial e

inervam os membros superiores e as razes L2 a S4 formam o plexo lombo-

sacral a inervar os membros inferiores. A raiz dorsal possui fibras sensitivas

(aferentes) cujos corpos celulares esto situados no gnglio sensitivo da raiz

dorsal, que se apresenta como uma poro dilatada da prpria raiz, ela inerva

a pele, facetas articulares e musculatura erectora da coluna vertebral (Guyton,

2002).

Toda a informao sensorial advm dos segmentos somticos do

corpo que penetra na medula espinal atravs das razes posteriores. Ao entrar

na medula as fibras se separam em duas divises, uma medial e outra lateral.

As fibras medial penetram nas colunas dorsais da medula e ascendem

directamente ao crebro, enquanto as fibras laterais se dirigem para cima na

extenso de um a seis segmentos e para baixo por um ou dois segmentos, e

ento fazem sinapse como as clulas do corno dorsal, que do origem aos

tractos espino-talmicos ventral e lateral (Machado, 2002). Faz-se necessrio

definir a palavra tracto feixe de fibras nervosas com aproximadamente a

11

mesma origem, mesma funo e mesmo destino. As fibras podem ser

mielnicas e amielnicas. Na denominao de um tracto, se usam dois nomes: o

primeiro indicar a origem e o segundo a terminao das fibras. Pode haver um

terceiro nome a indicar a posio do tracto. Por exemplo, tracto crtico-espinal

lateral se origina no crtex, terminam na medula espinhal e se localiza no

funculos lateral da medula.

As informaes motoras mais importantes terminam directa ou

indirectamente nos neurnios motores somticos, constituindo as vias motoras

descendentes somticas.

Outro tipo especial de nervo chamado Nervos Autnomos. Na LVM

estes nervos so muito importantes dado que controlam os vasos sanguneos e

o corao. Os nervos autnomos so divididos em dois tipos: simpticos e

parassimpticos (Machado, 2002).

Para este autor os nervos simpticos ajudam a controlar a presso

arterial de acordo com a necessidade fsica do corpo. Quando estimulados,

provocam aumento dos batimentos cardacos e tambm causam constrio

dos vasos sanguneos atravs do corpo, pois a quantidade de sangue que

retorna ao corao diminui e provoca, com esse efeito, um aumento da presso

arterial. Outros efeitos incluem um aumento de sudorese e da irritabilidade ou

da sensao de ansiedade. Quando a LVM acima de T6, os nervos

simpticos abaixo se tornam desconectados dos nervos acima da leso, eles

continuam a actuar automaticamente uma vez que o perodo inicial do choque

medular termina. Qualquer estmulo dos nervos simpticos pode torn-los

hiperactivos e a esta hiperactividade chamamos de disreflexia autonmica.

J os nervos parassimpticos agem de modo oposto aos nervos

simpticos, e surgem de duas reas: uma comea ao nvel do crebro e parte

superior da medula que so as fibras que suprem os rgos do abdmen,

corao, pulmo e pele acima da cintura, e a outra comea ao nvel sacro e

parte inferior da medula, so os nervos que suprem os rgos de reproduo,

plvis e membros inferiores (MI). Depois de uma LVM os nervos

parassimpticos que comeam ao nvel do crebro continuam a trabalhar

normalmente, mesmo durante a fase de choque medular. Quando ocorre uma

12

disreflexia, os nervos parassimpticos tentam controlar o rpido aumento da

presso arterial, a diminuir os batimentos cardacos (Machado, 2002).

A coluna vertebral uma parte muito importante do nosso corpo.

responsvel pela estrutura e sustentao do corpo, alm de proteger a medula

espinal e suas razes. A medula espinal por sua vez responsvel pela

conexo entre o crebro e as outras partes do corpo, ajudando a controlar os

movimentos e funcionamento dos rgos. Dai a importncia de proteger a

coluna vertebral e, consequentemente, a medula espinal, pois quando ocorre

alguma agresso que venha causar compresso ou ruptura da medula,

teremos algumas mobilidades e funes vitais alteradas.

2.1.2 Conceito

A Leso Vrtebro-Medular pode ser definida por um rompimento

completo ou incompleto dos tractos nervosos, responsveis pela transmisso e

coordenao motora e sensorial, assim como pelo controlo autnomo do

sistema de rgos.

A medula espinal faz parte do sistema nervoso central, que tem como

papel final mais importante o controlo das vrias actividades corporais. Isto

feito atravs do controlo da contraco dos msculos esquelticos de todo o

corpo e da contraco dos msculos lisos dos rgos internos e a secreo

das glndulas excrinas e endcrinas em muitas partes do corpo. Estas

actividades so colectivamente chamadas de funes motoras do sistema

nervoso e os msculos e glndulas so chamados de efectores porque

efectuam as funes ditadas pelos sinais nervosos (Guyton, 2002). Operando

paralelamente ao eixo motor, h outro sistema semelhante, chamado sistema

nervoso autnomo (SNA), que est ligado actividade de msculos

involuntrios como, por exemplo, o msculo cardaco e certas glndulas

produtoras de hormonas. O sistema nervoso autnomo tambm controla os

aparelhos, digestivo, respiratrio e cardiovascular. Estes sistemas trabalham de

modo involuntrio e a sua funo principal manter o equilbrio interno dos

rgos dentro do corpo (Machado, 2002).

13

A medula espinal transporta as informaes do crebro ao resto do

corpo e do mesmo para o crebro. Tem a espessura de um dedo, com o

comprimento da base da cabea at o coccgeo sendo protegida por uma

espcie de tubo. Etimologicamente, a medula significa o miolo. uma massa

cilndrica de tecido nervoso situado dentro do canal vertebral sem, entretanto,

ocup-lo completamente, pois termina ao nvel da 2 vrtebra lombar. Abaixo

deste nvel, o canal vertebral contm apenas meninges e as razes nervosas

dos ltimos nervos espinais, que constitui a cauda equina. No homem adulto

mede aproximadamente 45 centmetros, sendo um pouco menor na mulher. O

crescimento desigual entre a coluna e a medula faz com que no exista

correspondncia entre a vrtebra e o segmento medular subjacente (Machado,

2002).

A medula organizada em segmentos ao longo de sua extenso. As

razes nervosas de cada segmento inervam regies especficas do corpo. Os

segmentos da medula cervical (C1 a C8) controlam a sensibilidade e o

movimento da regio cervical e dos membros superiores. Os segmentos

torcicos (T1 a T12) controlam o trax, abdmen e parte dos membros

superiores (MS). Os segmentos lombares (L1 a L5) esto relacionados com

movimentos e sensibilidade dos membros inferiores. Os segmentos sacrais (S1

a S5) controlam a sensibilidade da regio genital e funcionamento da bexiga e

intestino (Moffat & Vickerv, 2002).

A medula constituda por clulas nervosas, denominadas de

neurnios e por longas fibras nervosas chamados axnios, que so

prolongamentos dos neurnios e formam as vias espinais. Essas vias podem

ser:

Descendentes (as vias motoras), conduzem sinais gerados no crebro

fazendo sinapse com os neurnios medulares, sendo que alguns desses

neurnios esto relacionados com o movimento e o controle visceral no

sistema autnomo e dividem-se em dois grupos: vias piramidais compreendem

aos tractos crtico-espinais anterior e lateral, e vias extrapiramidais que

correspondem ao tecto-espinal, vestbulo-espinal, rubro-espinal e retculo-

espinal (Machado 2002);

14

Ascendentes (vias sensitivas), conduzem sinais relacionados com a

sensibilidade que so gerados na periferia em vrias partes do corpo, e so

levados para o crebro. Muitos dos axnios so envolvidos por bainhas que

contm uma substncia complexa constituda por gordura, chamada mielina,

que permite que a conduo dos estmulos nervosos seja mais rpida. Os

neurnios esto localizados na parte mais central da medula (Machado, 2002).

Devido importante funo da medula, em estabelecer a comunicao

entre o crebro e o restante do organismo por meio dos nervos motores e

sensitivos, os traumatismos nesta regio podem acarretar alteraes sseas da

coluna, e tambm nervosa da medula, que so as LVM que podem causar

complicaes graves, como rompimento completo ou incompleto das vias

nervosas. O surgimento da LVM abrupto, em decorrncia de fracturas,

luxaes ou ferimentos na medula espinal que afecta a conduo de sinais

motores e sensitivos atravs das reas lesionadas, danifica uma rede neural

complexa e implica no mal funcionamento do controlo autnomo dos sistemas

e de rgos (Lpez, Laurentys-Medeiros, 2001).

Na maioria das vezes a LVM causada por traumas que rompem ou

comprimem a medula, por quebra ou deslocamento da vrtebra e tambm por

armas ou projcteis que danificam a medula sem afectar a vrtebra.

A etiologia da LVM pode ser traumtica; provocada por ferimentos com

projcteis de arma de fogo (FAF), acidentes de viao, desporto e quedas

entre outros; e no traumtica, onde destacam-se as tumorais, as infecciosas,

as vasculares e as degenerativas (Lianza, Casalis, Greve & Eichberg, 2001). A

agresso traumtica resulta de uma seco ou dilacerao parcial ou completa

dos feixes nervosos da medula espinal, implicando perdas sensoriais, motoras,

sexuais, descontrolo dos esfncteres da bexiga e do intestino, complicaes

nas funes respiratria, trmica e circulatria, espasticidade e dor (Galvin &

Godfrey, 2001). As leses traumticas so decorrentes de esmagamento,

hemorragia, edema e infarto. Nos acidentes de viao, mergulho, desporto e

quedas, tipicamente no seccionam a medula, enquanto, nas leses

provocadas por projcteis de arma de fogo e armas brancas seccionam

directamente os neurnios medulares (Lianza, et al., 2001).

15

A LVM pode ocorrer em diversas alturas e formas, por diversas causas.

Conforme a altura na medula e a gravidade da leso, haver maior ou menor

comprometimento dos movimentos, da sensibilidade, do controlo de

esfncteres, do funcionamento dos rgos, da circulao sangunea e controlo

de temperatura, sendo que, alm da leso na medula, pode ocorrer tambm

uma leso no sistema nervoso autnomo ou alteraes no mesmo. A leso

ocorre devido a morte dos neurnios na medula e a quebra de comunicao

entre os axnios oriundos do crebro e suas conexes com os neurnios da

medula, interrompendo, assim, a comunicao entre o crebro e todas as

partes do corpo que ficam abaixo da leso.

O nvel da leso determinado pelo ltimo segmento sensitivo e/ou

motor preservado em ambos os lados do corpo, pois, abaixo dele as funes j

esto alteradas. H uma busca do local exacto da leso na coluna, a observar

em qual zona o indivduo apresenta fraqueza, paralisia ou outra perda da

funo, pode ocorrer em diversas alturas da coluna vertebral. O nvel

neurolgico estabelecido como sendo o nvel mais baixo onde ainda

encontrada alguma evidncia de funo ou sensao muscular sem

preservao (Lpez & Laurentys-Medeiros, 2001).

Quanto mais alta for a leso na medula, ou seja, quanto mais prxima

cabea, maior a perda das funes motora, sensitiva e autnoma (figura 1)

e maiores as alteraes metablicas no organismo (Lianza et al., 2001).

16

Figura 1 Nvel da LVM e comprometimento.

De acordo com Lpez e Laurentys-Medeiros, 2001 as leses podem

ser:

Completas, quando no h funo motora e sensitiva preservada ao

nvel de segmento sacral, havendo perda de todas as sensaes para

temperatura, tctil, dolorosa, presso e localizao de partes do corpo no

espao, abaixo da leso e alterao do controlo do esfncter (urinrio e fecal);

Incompletas, quando lesionam parcialmente a medula, as funes

motoras e sensitivas esto preservadas ao nvel sacral. So includas nessas

sensaes sacrais uma profunda sensao anal e a contraco voluntria da

musculatura do esfncter anal, que utilizada para demonstrar se a funo est

ou no preservada. Devido diversidade relacionada s leses incompletas,

denominaram-se algumas sndromes relacionadas LVM: Sndrome de Brown-

Sequard, Sndrome Medular Anterior, Sndrome medular Central, Sndrome

Medular Posterior, Sndrome do Cone Medulas, Sacro Preservado e Leses da

Cauda Equina.

17

A ASIA descreveu uma escala de restries da deficincia, para ajudar

a definir a extenso das LVM (Staas, Formal, Fredman, Fried, & Read, 2002).

ASIA A Completa: nenhuma funo sensorial ou motora nos

segmentos sacrais S4-S5.

ASIA B Incompleta: nenhuma funo motora, porm alguma funo

sensorial preservada abaixo do nvel neurolgico incluindo os

segmentos sacrais S4-S5.

ASIA C Incompleta: funo motora preservada abaixo do nvel

neurolgico e mais da metade dos msculos chave tm grau de fora

muscular abaixo de 3.

ASIA D Incompleta: funo motora preservada abaixo do nvel

neurolgico e pelo menos metade dos msculos chave abaixo do nvel

neurolgico tm grau de fora muscular maior ou igual a 3.

ASIA E Normal: funo motora e sensitiva normais.

De acordo com Greve, Casalis e Barros (2001), actualmente a

graduao da ASIA aceita internacionalmente e deve ser utilizada para

uniformizar a linguagem universal e favorecer a comunicao cientfica.

Os termos usados para descrever as pessoas que sofrem esse tipo de

trauma indicam o nvel geral da leso na coluna vertebral e a perda da funo.

Podem ser classificadas dentro de dois esquemas bsicos (Lpez & Laurentys-

Medeiros, 2001):

Tetraplegia, quando existe evidncias da perda funcional e sensitiva

acima ou ao nvel de T1, resulta em diminuio funcional de membro superior

assim como tronco, pernas e rgo plvicos, havendo uma insuficincia

respiratria devido ao comprometimento do nervo frnico, o qual comanda a

contraco do diafragma. Refere-se a diminuio ou perda da funo sensitiva

e/ou motora nos segmentos cervicais da medula devido a danos dos elementos

neurais dentro do canal medular.

Paraplegia, quando h perda funcional abaixo do nvel T1 e representa

uma faixa extensa de disfunes neuromusculares. Refere-se a diminuio ou

perda da funo motora e/ou sensitiva dos segmentos torcicos, lombares ou

sacrais no cordo medular. Na paraplegia, a funo do membro superior est

18

preservada, mas dependendo do nvel de leso, o tronco, os membros

inferiores (MI) e os rgos plvicos podem estar comprometidos.

De acordo com Lianza (2001), as estatsticas mostram que 60-65% das

pessoas com leso cervical apresentam tetraplegia incompleta, e quase 100%

das pessoas com leso torcica manifestam paraplegia completa.

At dcada de 1940, muitas pessoas que sofreram LVM, seja por

traumas, doenas e outros acidentes, no eram submetidas a um tratamento

adequado. Esse facto era a causa da maioria dos bitos, devido s

complicaes resultantes. A maioria desse tipo de leso ocorria em guerras e

as pessoas morriam em poucas semanas devido a infeces do trato urinrio e

lcera de presso. Esses factores foram averiguados mediante estudos de

Gondim, Oliveira e Rola (1998). Que constataram que durante a Primeira

Guerra Mundial, devido ao elevado nmero de indivduos acometidos por LVM,

foram realizadas grandes observaes dos efeitos imediatos de LVM, sendo

que 80% das vtimas morria nas primeiras semanas em decorrncia,

principalmente, de infeces, mas, verificou-se tambm, que sobreviviam, em

sua maioria, as pessoas com leses parciais, contribuindo com os estudos

actuais que beneficiam, tratam, previnem e promovem sade das pessoas com

LVM. Esse crescimento deve-se, principalmente, ao primeiro estudo de

Guttmann, no Hospital Stoke Mandeville, onde abordou um tratamento

apropriado para tais pessoas (Hall & Lindzey, 1984).

Embora a expectativa de vida, nos dias actuais, ainda seja mais baixa

do que da populao geral, a taxa de mortalidade decresceu

consideravelmente aps a segunda Guerra Mundial, de 30% nos anos 60, para

15% e 6% nas dcadas de 1970 e 1980. Dentre os factores responsveis por

esse declnio encontram-se a melhoria dos cuidados de enfermagem e manejo

medico de emergncia, o desenvolvimento de antibiticos, o avano da

tecnologia biomdica e o aprimoramento das unidades de tratamento da LVM,

o surgimento de equipas de reabilitao multidisciplinares e o

acompanhamento mdico regular (Hartkopp, Bronnum-Hansen, Seidenschnur

& Biering-Sorensen, 1997).

19

A LVM a interrupo da comunicao entre o crebro e a medula,

causando alteraes que podem ser permanente. Com isso deve-se buscar

recursos para auxiliar esses indivduos a lidarem com esse agravo inesperado,

pois sua vida mudar, momentnea ou permanentemente aps uma LVM. E

um dos recursos importantes que defendemos, juntamente com a interveno

mdica, a interveno ainda no leito por uma equipe multidisciplinar, pois

quanto antes o indivduo conhecer sobre sua nova condio maior ser

possibilidade de adaptar-se a ela.

2.1.3 Complicaes Clnicas

Actualmente em funo dos diversos recursos, o aumento da

perspectiva de vida das pessoas com LVM mais frequente, tornando-se

necessrio aos profissionais de sade e reas afim que lidam com essa

populao, um maior conhecimento sobre o assunto, principalmente sobre as

complicaes clnicas que podem estar associadas s pessoas com LVM

(Gondim et al., 1998). Com esse enfoque iremos citar algumas complicaes

que podem ocorrer a indivduos com esse tipo de leso.

Choque Medular

Caracteriza-se pela perda da sensibilidade, dos movimentos e do tnus

nos msculos inervados pelos segmentos medulares situados abaixo da leso.

H tambm reteno da urina e das fezes. Contudo, aps um perodo varivel,

reaparecem os movimentos reflexos, que se tornam exagerados, e aparece o

sinal de Babinski. Nas leses de seco completa, no h recuperao da

motricidade voluntria ou da sensibilidade. Pode haver, entretanto, uma certa

recuperao reflexa do mecanismo de esvaziamento vesical (Machado, 2002).

Este perodo pode manter-se durante dias ou meses, porm a durao mdia

de aproximadamente trs semanas (Lianza et al., 2001).

Alteraes da Motricidade

20

Pode ser da motricidade voluntaria, do tnus ou dos reflexos. A diminuio

da fora muscular denomina-se paresia; a ausncia total de fora a

impossibilitar o movimento, paralisia (ou plegia). Nas alteraes decorrentes de

leses do sistema nervoso pode haver ausncia (arreflexia), diminuio

(hiporreflexia) ou aumento (hiper-reflexia) dos reflexos msculo-tentinosos. J

as alteraes do tnus podem ser de aumento (hipertonia), diminuio

(hipotonia) ou ausncia (atonia). Por tnus entende-se o estado de relativa

tenso em que se encontra permanentemente um msculo normal em repouso

(Machado, 2002).

As paralisias com hiporreflexia e hipotonia so denominadas paralisias

flcidas. Caracterizam-se pela sndrome do neurnio motor inferior ou

perifrico, que resulta de leso dos neurnios motores da coluna anterior da

medula (ou dos ncleos motores dos nervos cranianos). Ocorre em pouco

tempo atrofia da musculatura inervada por perda da aco trfica dos nervos

sobre os msculos. As paralisias com hiper-reflexia e hipertonia so

denominadas paralisia espsticas. Ocorrem na sndrome do neurnio motor ou

central, onde a leso se localiza nas vias motoras descendentes, em especial

no tracto crtico-espinhal (ou nas reas motoras do crtex cerebral). Neste

caso, a atrofia muscular discreta, pois os msculos continuam inervados

pelos neurnios motores inferiores (NMI) e o sinal de Babinski positivo

(Machado, 2002).

Alteraes da Sensibilidade

As principais alteraes da sensibilidade so:

Anestesia, desaparecimento total de uma ou mais modalidades de

sensibilidade aps estimulao adequada. O termo emprega-se mais

frequentemente para a perda da sensibilidade tctil, reservando-se o termo

analgesia para perda da sensibilidade dolorosa;

Hipoestesia, diminuio da sensibilidade;

Hiperestesia, aumento da sensibilidade;

21

Parestesias, aparecimento, sem estimulao, de sensaes

espontneas e mal definidas como, por exemplo, o formigamento;

Algias, dores em geral.

Disreflexia Autonmica ou Crise Autonmica Hipertensiva

uma complicao frequente nas leses acima do nvel T6, que requer

um tratamento imediato, para evitar uma confuso mental, coma e morte, pois

pode provocar derrame vascular cerebral. Qualquer estimulo que,

normalmente, causaria dor e desconforto na pessoa sem leso, na pessoa que

no sente por causa de uma LVM pode causar uma crise de disreflexia.

Manifesta-se por reflexos autonmicos em massa, desencadeadas por

estmulos nocivo receptivos aferentes da pele e vsceras abaixo do nvel da

leso, a resultar em ampla variedade de respostas simpticos e

parassimpticos (Schneider, 1994). Algumas caractersticas podem ser: sbito

incio de hipertenso arterial e dor de cabea que pode estar associada

sudorese, bradicardia ou taquicardia, manchas no corpo, rubor facial,

congesto nasal, dispneia e aumento da espasticidade.

Alteraes Respiratrias

As pessoas com LVM tm em maior ou menor grau, dependendo do

nvel da leso, comprometimento da musculatura respiratria, a causar uma

hiperventilao pulmonar, que pode ser agravada por leses pulmonares ou

torcicas, sendo uma das causas de mortalidade durante a fase aguda (Lianza

et al., 2001).

A LVM alta que atinge os segmentos C1 a C5 envolve os nervos

frnicos e causa a paralisia parcial ou completa do diafragma e a paralisia dos

msculos intercostais externos que limita a extenso lateral do grcil costal

mdio e superior. Devido leso, o diafragma no consegue contrair e,

consequentemente, o grcil costal inferior no se expande lateralmente durante

a inspirao. A pessoa com tetraplegia alta no consegue contrair o diafragma

22

e os msculos intercostais, sendo auxiliada somente pelos msculos

acessrios, cuja contraco gera uma presso pleural negativa a puxar a

parede abdominal para dentro (Azeredo, 2001).

Alteraes Sexuais

As alteraes dependero do nvel e do tipo de leso vrtebro-medular.

As pessoas com leso do tipo neurnio motor superior (NMS) apresentam

maior percentagem de ereco do que aqueles com leso do tipo neurnio

motor inferior (NMI), enquanto a ejaculao se encontra mais alterada nas

pessoas com leso do NMS (Lianza et al., 2001). A ejaculao se dar pelo

comando dos centros medulares T11-L2 e S2, S3 e S4.

Quando ocorre uma LVM alta a funo sexual fica deficiente, ocorrendo

nos homens priapismo precoce. Com o tempo este cede a vez a uma ereco

ou ejaculao reflexa, porm no psicognica, pois os comandos que saem do

crebro em direco aos rgos genitais so bloqueados no ponto onde existe

a leso, sendo que a ereco reflexa estar presente, devido ao arco reflexo

permanecer preservado. Esta ereco comandada pelo centro medular sacral

situado aos nveis S2, S3 e S4. Na ereco psicognica os estmulos so

causados por desejo visual, tctil, cheiro, sons, pensamentos, etc. Ela

comandada pelo centro medular toracolombar a nveis T11-L2.

No caso das mulheres que sofreram LVM alta, no incio, entram na fase

de amenorreia onde temporariamente ficaro sem ovular. Terminada esta fase

a menstruao volta a ocorrer como antes da leso e a mulher poder ter filhos

(Umphred, 1998).

Disfuno Vesical

Associado a um quadro inactivo na LVM, o indivduo depara com a

impossibilidade de um controlo adequado dos esfncteres, causando

complicaes de incontinncia.

23

Dependendo do nvel da leso e seus efeitos sobre a funo vesical, a

bexiga pode passar a ter dois tipos de comportamento:

Tipo Espstica (Bexiga Neurognica Reflexa - leso do NMS), comum

nas leses acima do nvel sacral (T12). Causada por interrupo de todos os

feixes sensitivos e motores acima do centro sacro da mico. As pessoas com

LVM no percebem nenhuma sensao e no tm condio de,

voluntariamente, iniciar ou inibir a mico. Passam a acumular uma quantidade

menor de urina do que antes da leso e os msculos da bexiga passam a ter

contraco involuntria com perdas frequentes de urina, ou seja, sua funo

vesical reflexa;

Tipo Flcida (Bexiga Neurognica Autnoma - leso do NMI) ocorre

quando a leso localizada no centro sacral de mico ou em vias de conexo

entre a bexiga e o centro sacral (leses do cone ou da cauda equina). O

esvaziamento fica dependente da inervao intramural da bexiga, que

incapaz de provocar contraces eficazes, deste modo h reteno da urina. A

pessoa com LVM no sente o enchimento vesical, e passa a acumular uma

quantidade maior de urina porque os msculos da bexiga no se controlam

mais e isto faz com que grande quantidade de urina fique retida dentro da

bexiga, muito acima da capacidade favorecendo a formao de clculos e o

refluxo de urina da bexiga para os rins, coloca em risco a funo renal.

Alteraes Gastrointestinais

A LVM determina alteraes do controle intestinal, nas leses de nvel

mais alto, pode causar constipao crnica que est relacionada com

inactividade da parede intestinal. Pois, com o dano da LVM, h diminuio ou

abolio do peristaltismo acompanhado de reteno fecal, devido atonia de

todo o aparelho gastrointestinal. Estas alteraes podem levar ao aumento do

volume das vsceras intestinais, que acarretam diminuio da excurso do

diafragma, acentuando as dificuldades respiratrias (Lianza et al., 2001). Nas

leses mais baixas pode causar incontinncia, ou seja, eliminao acidental de

fezes.

24

O acmulo de suco gstrico associado vasodilatao, inerte pela

leso do SNA, parece ser o factor etiolgico na formao de rea necrtica na

mucosa gstrica levando s lceras de estresse. Algumas das complicaes

mais frequentes so: hemorragia gastrointestinal, obstruo gastrointestinal,

necrose intestinal e pancreatite (Lianza et al., 2001).

Alteraes Vasculares

Pessoas com LVM podem apresentar desde estgios iniciais,

alteraes vasomotoras com modificaes hemodinmicas que podero dar

origem a graves complicaes, entre as quais:

Trombose Venosa Profunda

o aparecimento de cogulos de sangue chamado trombo, devido a

falta de actividade regular. O trombo formado na perna pode se desprender e

viajar para outras partes do corpo. Se isto ocorrer, ele passa a ser chamado de

mbolo e um dos lugares mais comuns para um mbolo se hospedar o

pulmo. Os sinais mais frequentes so, panturrilha ou coxa, de uma das pernas

mais quente e com edema, do que a outra. Vrios factores incidem na

formao de trombos, sendo a localizao mais frequente a nvel das veias da

panturrilha e plvicas. Dentre esses factores destacam-se: - Diminuio da

velocidade circulatria devido a: paralisia muscular (que normalmente cumpre a

funo de bomba), ausncia do controlo vasomotor, repouso prolongado no

leito; - Na pessoa tetraplgica ou de leso torcica alta, onde a musculatura

intercostal e abdominal esto ausente ou muito prejudicada, o retorno venoso

para as cavidades cardacas direita est diminudo devido a uma menor

presso negativa intratorcica (Lianza et al., 2001).

Embolia Pulmonar

quando o trombo se desprende e se hospeda no pulmo. uma das

complicaes mais graves na tetraplegia ou paraplegia, sendo sua incidncia

maior na fase aguda, nas pessoas com leses completas e, especialmente,

nas leses de topografia cervical ou torcica alta. Pode ser fatal nas pessoas

tetraplgicas, pois uma obstruo de 65% da circulao pulmonar leva a uma

25

falha aguda mecnica das cavidades cardacas direita (Lianza et al., 2001).

Seus principais sintomas so a diminuio repentina da respirao, dor no

peito ou nas costas e tosse de aparecimento sbito.

Distrbios de Humor

Particularmente a depresso e falta de auto-estima, so frequentes em

pessoas com LVM. A depresso um sentimento de tristeza intensa. Ela pode

ocorrer aps uma perda recente ou um outro evento triste. O humor

persistentemente rebaixado, apresentando-se como tristeza, angstia ou

sensao de vazio, tambm pode apresentar diminuio do interesse e prazer

em actividades que antes sentiam satisfao. Em algum momento durante seu

processo de reabilitao o indivduo com LVM vai apresentar alguma destas

caractersticas. Podendo atrapalhar no seu processo de reabilitao.

lceras de Presso

A perda da sensibilidade impede que o indivduo receba a informao

de reas sob presso de longa permanncia. Quando h essa interrupo da

circulao sangunea por tempo prolongado em determinada rea do corpo, as

clulas morrem e surgem as lceras, ou seja, quando por qualquer motivo, o

mecanismo de defesa falha, a presso contnua leva a um deficit circulatrio e

esta isquemia evolui para necrose, que a formao de uma lcera. Elas

surgem, geralmente, nas reas onde os ossos so poucos protegidos por

msculos. uma das complicaes comuns e debilitantes encontradas em

pessoas com LVM, que podem ser responsveis por hospitalizaes e longos

perodos de imobilidade.

As lceras por presso classificam-se por estdios. Estdio 1, a lcera

no est formada, a pele intacta, est apenas avermelhada. Estdio 2, a pele

est avermelhada e inflamada (geralmente com bolhas) e sua destruio

comea nas camadas mais externas. Estdio 3, a lcera abre-se para o

exterior atravs da pele, deixando expostas as camadas mais profundas.

26

Estdio 4, a lcera estende-se profundamente atravs da pele e da gordura at

ao msculo. Estdio 5, o prprio msculo destrudo. Estdio 6, v-se o osso

subjacente, danificado e por vezes infectado. A infeco retarda a cura das

lceras superficiais e pode constituir uma ameaa mortal nas lceras mais

profundas.

A rea sobre presso precisa ser aliviada, atravs de mudanas de

decbitos do indivduo, para que haja aumento do fluxo sanguneo na regio

comprimida para evitar as lceras por presso.

Hipotenso Ortosttica

Sabe-se que as mudanas posturais em pessoas sem leso se

acompanham de alteraes na presso arterial e no tnus vascular, sendo o

SNA responsvel por essas modificaes. Essas alteraes visam manter as

condies hemodinmicas em nveis aceitveis. Nas pessoas com LVM,

especialmente cervical e torcica alta, a regulao do SNA est interrompida,

com a consequente perda no controlo do tnus vasomotor, tanto a nvel dos

vasos perifricos como da circulao visceral abdominal. As mudanas bruscas

de decbito horizontal para a posio erecta levam, por resultante, ao quadro

de hipotenso ortosttica. Caracteriza-se por viso turva, vertigem, fraqueza,

zumbidos, taquicardia, cefaleia e, s vezes, formigamento.

Regulao Trmica

O correcto controlo da temperatura corporal depende de um complexo

mecanismo neuroendcrino-vascular. As funes das glndulas sudorparas

depende dos estmulos aferente e eferente proveniente do sistema nervoso

central e perifrico que apresentam uma importncia fundamental na sua

regulamentao, entre os quais: a medula, suas razes e a inervao pr e ps-

ganglionar. A interrupo provocada pela LVM leva a alteraes homeotermia

do tetraplgico ou paraplgico, especialmente com leses acima do segmento

medular T6. O grau destas alteraes depender do tipo, nvel e do tempo de

27

leso. Nos casos de leses completas, o indivduo precisa basear-se nas

referncias sensitivas provenientes da regio da cabea e pescoo, para

auxiliar a determinao das temperaturas ambientais apropriadas. muito

importante manter o controlo da temperatura ambiente, j que de sua

regularidade depender homeotermia do indivduo com esse tipo de leso

(Lianza et al., 2001).

Faz-se necessrio abrir um espao para falar sobre outro factor que

pode influenciar durante o perodo de reabilitao da pessoa com LVM. So as

espasticidade ou espasmos musculares. um distrbio frequente nas leses

congnitas ou adquiridas do Sistema Nervoso Central, afecta o sistema

msculo-esqueltico e limitada a funo motora normal, ocorrem quando os

msculos se contraem e no conseguem mais relaxar. Geralmente acontecem

como um reflexo incapaz de ser controlado voluntariamente.

H um aumento gradual nos seis primeiros meses, atingindo um

patamar aps um ano de leso. desencadeada por mltiplos estmulos

internos e externos, como por exemplo, alterao de posio, estmulos

cutneos, temperatura ambiental, roupas apertadas, pedra nos rins ou na

bexiga, bolo fecais, bloqueio de cateter, infeces do trato urinrio, lceras de

decbito e estresse emocional (Winnick, 2004).

Inicialmente a espasticidade dificulta o posicionamento cmodo do

indivduo, prejudica as tarefas de vida diria como alimentao, locomoo,

transferncia e os cuidados de higiene. Quando no tratada causa

contracturas, rigidez, luxaes, dor e deformidades.

2.1.4 Impacto e Adaptao Psicossocial da Leso Vrtebro-Medular

A pessoa com Leso Vrtebro-Medular sofre um impacto muito grande

e tem sua vida e seu corpo modificados e invadidos por uma srie de

alteraes.

As leses e os traumas causados por acidentes e violncia geram altos

custos emocionais e sociais s vtimas e suas famlias.

28

Segundo Pereira (1982). O lesionado vrtebro-medular passa por um

regresso, tornando-se dependente em varias situaes:

As suas vontades tm que ser satisfeitas por outros;

No tem controlo sobre as suas necessidades, o que produz graves

dificuldades de reaces e independncia;

A sua mobilidade est comprometida:

As actividades de vida diria, que eram simples, tornam-se agora

dificultadas:

Encontra-se impedido de realizar o trabalho que antes desempenhava,

e a sua integrao no mundo laboral revestida de grandes

dificuldades;

A instalao de incapacidade em termos sexuais, aspecto que a

sociedade valoriza de forma notvel;

Sente alterado seu esquema corporal; uma vez que s pode expressa

parcialmente a vivencia, como se fosse apenas meia pessoa,

alteraes da sensibilidade, e o facto de permanecer sempre em

cadeira de rodas, contribuem para essa distoro de imagem corporal;

Por vezes a distoro do tipo autista e pensamentos pessimistas,

impedem a pessoa com LVM tenha uma participao mais activa no

programa de reabilitao, confiando na evoluo a cargo da prpria

natureza;

Por fim, a pessoa com LVM receia o momento da alta, teme o fracasso

de sua integrao, retorno a casa, os problemas que vai encontrar na

famlia, as dificuldades em enfrentar os amigos e como manter ou

activar novos centros de interesses.

Outra situao que influencia a vida do indivduo com LVM o factor

sade, que engloba uma esfera muita complexa de definies e conceitos,

partindo da origem da palavra Salute, que em latim, significa salvao,

conservao da vida; estdio cujas funes orgnicas, fsicas e mentais se

encontram em situao desejvel. Pensando nas condies das pessoas com

LVM este aspecto pode encontra-se desfavorvel, sendo que tanto a pessoa

com a sua famlia necessita adaptarem-se s perdas e mudanas ocorridas

29

As mudanas no auto-conceito e auto-imagem, das pessoas com LVM,

podero ter consequncias no seu comportamento em relao ao seu prprio

corpo ou mesmo na interaco estabelecida com outras pessoas. Pois, a auto-

imagem e a imagem corporal tm influncia sobre o bem-estar das pessoas.

Entende-se por auto imagem, a imagem que o indivduo tem de si prprio

diante de sua insero no meio em que vive. A imagem corporal no entanto

refere-se ao conceito de corpo que o indivduo tem de si, ou seja, a forma fsica

de seu corpo enquanto algo aceitvel ou no, segundo seus prprios conceitos

de beleza (Sawey e Telford, 1971). A pessoa tem um quadro mental de si e

tem por base as inmeras experiencias do passado, presente e perspectivas

no futuro, a pessoa com LVM poder ter, momentnea ou permanentemente,

essas perspectivas abaladas. A doena ou as leses graves interferem de

forma sbita na auto-imagem; a adaptao s mudanas impostas pelos

traumas pode afectar a identidade do indivduo, podendo causar srios

problemas de adaptao a sua nova condio de vida.

De acordo com Berger e Mclnman (1993), um auto-conceito positivo

um componente central do bem-estar psicolgico e a auto-estima

criticamente ligada qualidade de vida fenomenologicamente experimentada.

O auto-conceito e a personalidade do indivduo so influenciados pelas

experincias durante seu desenvolvimento, portanto a existncia de uma

deficincia pode influenciar positiva ou negativamente na sua formao.

Segundo Slvia (1998), o auto-conceito formado por processos psico-

sociais, ou seja, determinado pela percepo que o indivduo possui sobre as

reaces que os outros tm relativamente a si, como tambm pela sua

interpretao da realidade. A formao do auto-conceito interpessoal, por se

d a partir de concepes e aces da prpria pessoa, influenciados pela

sociedade.

A pessoa com LVM sofre impacto tanto em seu estado fsico como

tambm o seu estado emocional, pois seu papel diante de sua famlia, amigos

e da sociedade est afectado e os mesmos tero que aprender a lidar com a

nova situao. O modo pelo qual a pessoa com LVM enfrenta as limitaes

impostas pela deficincia e se adapta aos diversos papis sociais tem sido

30

considerado como um dos principais focos da pesquisa psicolgica junto a esta

populao (Galvin & Godfrey, 2001; Kennedy, Marsh, Lowe, Grey, Short, &

Rogers, 2000).

Pessoas que so acometidas subitamente por uma deficincia podem

manifestar determinadas reaces, mesmo que em ordem de acontecimentos

diferentes. Tendo com base Brunner e Suddart (1993), dividiremos essas

manifestaes, tambm, em trs estdios:

Primeiro Estdio refere-se transio do estado de sade para o

estado de doena, que pode provocar em algumas pessoas um estado de

confuso, no qual no consegue perceber a magnitude do acontecimento.

Nesta fase a pessoa interrompe seu vnculo com o mundo exterior, numa

tentativa inconsciente de proteger a sua imagem corporal. Esse estdio

tambm conhecido como Fase de Choque.

Segundo Estdio, comea a perceber sua situao, porm de forma

distorcida, por no ter condies de aceit-la, tentando manter assim sua

imagem antiga. Esta fuga evita que entre em ansiedade e/ou depresso, porm

expressa falta de interesse por assuntos actuais e familiares. Comummente,

nesta fase reage de forma regressiva, aceitando as orientaes de forma

passiva, sem iniciativa. Pode manifestar sentimentos de raiva, frustraes,

ressentimentos, sensao de desespero, tristeza, negao e depresso. Esse

estdio tambm conhecido com Fase de Negao.

Terceiro Estdio o perodo em que a pessoa comea a adquirir

conscincia de sua real situao. Nesta fase o lesionado vrtebro medular

comea a experimentar as mudanas de sua primeira imagem. A permanncia

da paralisia, a perda do controlo do esfncter, o medo de tornar-se uma carga

para seus familiares e as possveis implicaes nas interaces sociais lhe

provocam um forte sentimento de desamparo e intensa ansiedade, levando-o a

um estado de depresso. Esta depresso comummente se traduz mediante

queixas fsicas contnuas, manifestadas especialmente por dor. Outras vezes a

sensao de desvalorizao pessoal to forte que podem surgir ideias

suicidas. J no pode ocultar-se dentro da fase defensiva de negao, vendo-

se forado a recompor sua auto-imagem numa forma mais realista. Esse

31

estdio conhecido tambm como Fase do Reconhecimento e Fase de

Adaptao, quando a pessoa j age activamente no processo de reabilitao,

realista, coopera para atingir as metas estabelecidas.

comum presenciar esses estdios na pessoa com LVM. Tem Incio

quando a pessoa encontra-se no leito e, estende-se at a reabilitao, muitas

vezes, exigindo acompanhamento constante de psiclogo. O conhecimento

destas fases e possveis complicaes psicolgicas associadas, permite-nos

auxiliar a pessoa com LVM com maior respaldo, ajudando, assim, a resgatar

sua condio psicolgica e fsica, e consequentemente, sua integrao social.

Amaral (1995) comenta sobre os mecanismos de defesa do ego,

descrevendo-os como as estratgias utilizadas pela pessoa para manuteno

do equilbrio intrapsquico, atravs da eliminao de uma fonte de insegurana,

perigo, tenso ou ansiedade. Isto significa que os mecanismos defensivos

esto presentes no ajustamento e desenvolvimento da personalidade e no

apenas em processos patolgicos.

Segundo Murta e Guimares (2001), sentimentos de desamparo e falta

de controlo sobre a vida so tambm experiencias descritas por portadores de

LVM. Craig, Hancock e Chang (1994) investigaram os efeitos da LVM sobre as

percepes de controlo, auto-estima e estilo de ajustamento de pessoas com

LVM e de pessoas fisicamente normais em quatro ocasies durante dois anos.

Os resultados mostram que o grupo de pessoas com LVM percebia sua vida

como externamente controlada, apresentava menor auto-estima e mais

desamparo e desesperana do que o grupo fisicamente normal. Outro foco de

insatisfao com a vida e facilitador da depresso nestas pessoas so as

dificuldades de mobilidade. Tate, Forchheimer, Maynard e Dijkers (1994)

encontraram forte associao entre depresso e dependncia fsica.

Para os pesquisadores Fuhrer, Rintala, Hart, Clearman e Young

(1993), ao investigarem o mesmo tema, encontraram um ndice maior de

satisfao de vida relacionada mobilidade, integrao social, ocupao,

suporte social e sade auto-avaliada. Os autores concluram que a satisfao

de vida mais relacionada aos papis sociais do que ao prejuzo fsico e

32

inabilidade. Outras variveis que predizem o ajustamento desta populao so

relativas ao indivduo e seu ambiente (Murta & Guimares, 2001).

Outro factor que tem grande influncia no impacto psicolgico da

pessoa com LVM a percepo que se tem do corpo aps a leso pois, o

sentimento de identidade comea a surgir com base na identidade corporal, ou

seja, a noo de identidade pessoal est directamente vinculada ao corpo, j

que este funciona como um instrumento de projeco do ser no espao

sociocultural. O corpo o local onde o indivduo se reconhece como ser

individual, nico a partilhar, ao mesmo tempo, significaes comuns a todo o

grupo social. O reconhecimento do indivduo dado, muitas vezes, a partir da

percepo que ele ou as pessoas tm do seu corpo.

O corpo, ao servir de mediador entre a individualidade e a

colectividade, est absorvido de smbolos culturalmente partilhveis e comuns.

Deste modo, deve-se perceber a ligao social que o corpo capaz de delinear

em detrimento do relacionamento social sendo, ao mesmo tempo, objecto de

exposio externa e base do indivduo e de sua suposta identidade.

As distintas posies e concepes frente ao corpo atingem e

influenciam, directa ou indirectamente, as vises sobre o corpo deficiente,

pois, em geral, o deficiente no encontra-se nos padres, concepes e

valores das categorias da sociedade, sendo o indivduo incomum e estranho.

Todas essas representaes esto inseridas na cultura de uma sociedade.

Para Amaral e Coelho (2002), a existncia de um sistema de

representaes que oferece sentido e ordenao ao mundo perceptvel o que

se chama de cultura, ou seja, aquilo que assegura a existncia de um grupo

humano como tal. Tudo o que foge ordenao da cultura, tudo que

representa anormal, estranho, tudo que intersticial e ambguo, tudo que foge

s regras e de seu controlo algo que causa medo e inquietao, que se

converte imediatamente em fonte de perigo. A sociedade estabelece suas

regras em relao aos indivduos que no correspondem a suas

categorizaes, pois seus meios e seus valores culturais so concretizados no

modo pelo qual ela se organiza.

33

Krause e Kjorsvic (1992) conduziram um estudo prospectivo ao longo

de quatro anos para identificar variveis preditoras de sobrevivncia e

mortalidade entre pessoas com LVM e constataram que os sobreviventes: -

eram socialmente activos; - apresentavam baixos nveis de dependncias,

solido e depresso; e relatam poucos problemas com acessibilidade,

recreao, preconceito e estresse emocional. Os autores concluram que

variveis psicolgicas so melhores preditoras de sobrevivncia do que

variveis psicossociais e de estilo de vida para o aumento da longevidade entre

pessoas com LVM. evidente que o modo como o indivduo administra as

consequncias impostas pela leso importante para a sade.

Como cita Souza (1994, p. 33), a dependncia em relao a terceiros,

o isolamento social advindo aps a leso e o diagnstico de irreversibilidade da

leso pode levar a um estado de elevada insatisfao face prpria situao.

Este estado pode levar muitas pessoas falta de motivao para a vida social

e profissional, ao descuido com a prpria sade e segurana, apatia,

depresso e demais alteraes comportamentais, entre outras consequncias.

Sendo a motivao um factor muito importante, no perodo de reabilitao e

durante a vida da pessoa com LVM.

Guttmann (1977) define motivao como o conjunto de factores que

promovem ou aumentam a disposio para determinados modos de

comportamento. Aps a leso, as pessoas com LVM, confrontam-se com

vrios dilemas a serem superados, precisando despertar o motivo inserido em

seu ntimo para continuar sua rotina depois do trauma. A actividade fsica um

dos factores motivacionais para atingirem esses objectivos.

Para Samulski (1995) a motivao caracterizada como um processo

activo, intencional e dirigido a uma meta, o qual depende da interaco de

factores pessoais (intrnsecos) e ambientais (extrnsecos). Ento cada

condio interna que induz o comportamento ou pensamento pode ser

chamado de motivo. Em casos de leses mais recentes, o trauma que

entusiasma ou no o pensamento e direcciona o comportamento da pessoa.

Outros factores que causam impacto na vida da pessoa com LVM

esto relacionados ao emprego e s habilitaes literrias. Mesmo com a

34

existncia de leis, a incluso de deficientes no mercado de trabalho ainda um

desafio. No Brasil, a Lei Federal 8213/91garante obrigatoriedade de reserva de

vagas para pessoas deficientes, com os seguintes percentuais de acordo com

o nmero de empregados, 2% nas empresas que tm de 101 a 200, 3% nas de

201 a 500, 4% nas de 501 a 1000 e 5% nas que tiverem mais de 1000. Porm

h alguns agravantes, as pessoas, geralmente, possuem um baixo grau de

habilitaes literrias e no tm qualificao para os empregos oferecidos.

Observa-se em alguns estudos que a maioria das pessoas com LVM possui o

ensino fundamental incompleto, o que dificulta sua entrada no mercado de

trabalho. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) relata que

32,9% da populao sem habilitaes literrias ou com menos de 3 anos de

estudo deficiente e apenas 10% das pessoas com deficincia esto entre os

com mais de 11 anos de estudo. Dados do Instituto Nacional de Estudos e

Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira (INEP) apontam, apenas, 0,15% de

pessoas deficientes entre os universitrios do Brasil.

De acordo com a Lei de Directrizes e Bases (LDB) a educao no

Brasil est dividida em Educao Bsica e Educao Superior (graduao e

ps-graduao). A Educao Bsica abrange: Educao Infantil (creches e pr-

escola); Ensino Fundamental (1 ciclo alfabetizao, 1 e 2 srie; 2 ciclo

3 e 4 sries; 3 ciclo 5 e 6 sries; 4 ciclo 7 e 8 sries) e Ensino Mdio

(9, 10 e 11 sries). Sendo que ainda temos as Modalidades de Ensino

(Educao de Jovens e Adultos; Educao Especial e Educao Indgena).

Quanto a diviso de classes sociais relacionadas a salrio mnimo

(s.m.), segundo o IBGE, no Brasil esto definidas como: Classe A - acima de

30 s.m; Classe B de 15 a 30 s.m.; Classe C de 6 a 15 s.m.; Classe D de 2

a 6 s.m.; Classe E at 2 s.m. A legislao brasileira tambm garante 1 salrio

mnimo mensal, chamado Benefcio da Prestao Continuada (BPC) s

pessoas com deficincia que tenham renda familiar inferior de salrio

mnimo, ou seja, quelas pessoas que esto na faixa de misria.

A presena de uma LVM exercer uma influncia significativa, no

somente na forma como estas pessoas se identificam, mas tambm na

maneira como as mesmas se percebem e como vo sobreviver, pois sua vida

35

completamente alterada, isso vai gerar factores marcantes para sua adaptao

a um mundo desconhecido.

A sobrevivncia de uma pessoa com LVM no depende somente do

nvel da leso, mas tambm da motivao do indivduo durante seu processo

de reabilitao e durante sua vida. Como pode-se observar as pessoas com

LVM podem ter vrias alteraes; tanto no aspecto clnico como pessoal; que

podem gerar barreiras de convvio social, originando um rebaixamento da auto-

estima, sentimento de inutilidade e at isolamento. Esses sentimentos

associado a outros factores, como: deixar de ser (muita das vezes) a pessoa

responsvel pela renda familiar e passar a ser um fardo para a famlia, a falta

de emprego e renda, salrios baixos, a falta de qualificao para um novo

trabalho, a falta de apoio para a reabilitao, a imagem corporal alterada,

sentimento de revolta, tristeza, entre outros, podem alterar a qualidade de vida

dessas pessoas, pois, de acordo com Dantas, Sawada & Malerbo, (2003), para

a Organizao Mundial de Sade (OMS), qualidade de vida a percepo do

indivduo em relao a sua posio na vida, no contexto da cultura e do

sistema de valores nos quais vive e em relao aos seus objectivos,

expectativas, padres e preocupaes. Essa definio inclui seis domnios

principais: sade fsica, estado psicolgico, nveis de independncia,

relacionamento social, caractersticas ambientais e padro espiritual. Na

pessoa com LVM todos esses domnios, pelo menos momentaneamente,

estaro afectados.

Ento, nesse contexto, no apenas a pessoa com LVM, mas tambm

sua famlia precisam ajustar-se a nova situao. Eles precisam ter uma clara

compreenso da deficincia, e o que isso poder significar em termos de

dependncia de vida diria. importante que o indivduo e sua famlia tenham

conscincia no apenas de seu potencial de realizao no aspecto fsico, mas

tambm das limitaes que podero ocorrer devido a sua deficincia. Pois isso

poder ajud-lo a desenvolver atitude realista sobre sua condio.

A actividade fsica busca descobrir e ampliar o potencial residual

nessas pessoas mostrando-lhes suas capacidades e dando-lhes motivos

positivos para redireccionarem suas atitudes e suas razes. Pois as perdas de

36

papis e responsabilidades, na famlia e na sociedade, provocam mudanas

nos hbitos e no estilo de vida do indivduo e exige que o mesmo atribua novos

significados sua existncia, adaptando-se s limitaes fsicas e s novas

condies ocasionadas pela leso

2.1.5 Factores Epidemiolgicos

A distribuio das fracturas ao longo da coluna vertebral homognea,

e est relacionada com as diferenas anatmicas e funcionais dos diferentes

segmentos da coluna vertebral. As fracturas da coluna torcica e lombar so as

mais frequentes do esqueleto axial e correspondem a cerca de 89% de todas

as fracturas (Defino, 1999). Na literatura, a incidncia de leso neurolgica

chega a 40% nas fracturas cervicais e 15 a 20% nas facturas torcicas (Koch,

Graells & Zaninelli, 2007).

Lianza (2001) afirma que o aumento da LVM, nas ltimas dcadas,

devido principalmente as leses traumticas (80%) provocadas por projctil de

arma de fogo, acidentes de viao, desporto e quedas.

Tem-se notado um aumento de incidncia das LVM, com

comprometimento neurolgico das fracturas da coluna. A incidncia deste tipo

de leso apresenta variaes nos diferentes pases.

De acordo com Campos, Ribeiro, Listik, Pereira, Sobrinho e Raporpot

(2008) estima-se que no Brasil ocorram mais de 10.000 novos casos de LVM a

cada ano.

Estima-se que na Alemanha ocorram 17 novos casos por milho de

habitantes, nos Estados Unidos da Amrica varia entre 32 a 52 novos casos

por milho de habitantes (Defino, 1999).

Nos EUA, entre 1935-1944, houve 22 leses por milho de habitante,

entre 1965-1974, 67 leses por milho e no perodo de 1975-1981, 71 leses

por milho de habitantes (Seklon & Fehlings, 2001). No entanto, segundo os

mesmos autores, houve uma diminuio de mortalidade de 36 por milho de

1965-1974 para 32 por milho de 1975-1981.

37

Nos EUA, nos anos de 1970 a 1980, permaneceram como principais

causas de LVM, os acidentes de viao, as quedas e os actos de violncia.

Porm, a violncia j estava a aumentar, entre 1973-1978, esse factor era

responsvel por 13% das leses; no perodo de 1979-1982, 15,1%; de 1983-

19986, 17,2%; em 1987-1990, 20,8%; e no perodo de 1991-1994, 30,4%. Esta

mudana pode ter sido causada tanto pela menor incidncia de acidentes de

viao, quanto pelo aumento da violncia, principalmente no meio urbano

(Waters & Adkins, 1997).

Mesmo com o aumento da violncia, os acidentes de viao ainda so

as principais causas de LVM, nos EUA, como pode ser observado nos dados

do National Spinal Cord Injury Statistical Center (2009), onde, desde de 2005,

as leses por acidente de viao, so responsveis por 42,1% dos casos

notificados pelo Spinal Cord Injury (SCI), seguidas das quedas, actos de

violncia (principalmente ferimento por projctil de arma de fogo (FAF) e

actividades desportiva e recreativas. Ainda de acordo com o SCI, estima-se

que a incidncia anual de leso da medula nos E:U:A. de aproximadamente

40 casos por milho de habitantes ou cerca de 12.000 casos novos a cada ano.

Algumas pesquisas realizadas em Portugal (Bastos, 1998; Magalhes,

2005; Andrade & Gonalves, 2006; Galhordas, 2006) mostram que as

principais causas de LVM so os acidentes de viao, acidentes de trabalhos,

quedas e leses no-traumticas, com predominncia do sexo masculino,

sendo a faixa etria mais acometida entre 20 a 39 anos.

No Brasil, a LVM apresenta-se, actualmente, como um grande

problema de sade pblica, onde se observa um ndice elevado de pessoas

com esse tipo de leso. Na maioria dos casos as leses tm origem traumtica,

sendo que as causas externas mais frequentes, segundo os estudos

pesquisados, so acidentes de viao, quedas e os ferimentos por projctil de

arma de fogo.

A seguir ser apresentado, em ordem cronolgica, o percentual de

algumas variveis scio demogrfica de alguns estudos realizados no Brasil

com pessoas com LVM.

38

No estudo de Flores, Nascimento, Pereira e Suzuki. (1999), no Hospital

de Base do Distrito Federal, com 45 indivduos tendo como causada o

ferimento por projcteis de arma de fogo. Observa-se que 84,5% do sexo

masculino e 15,5% do sexo feminino, com predomnio na faixa etria entre os

20 e 30 anos e as vrtebras mais acometida foram as lombares (58%), seguida

das torcica (25%) e cervical (17%). Com 66,7% de leso incompletas e 33,3%

completas

Em um estudo reali