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FACULDADES DE ENSINO SUPERIOR DA PARAIBA - FESP
BACHARELADO EM DIREITO
JOSÉ GERALDO MEDEIROS FILHO
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA: A Sonegação Fiscal e o seu Combate
JOÃO PESSOA
2013
JOSÉ GERALDO MEDEIROS FILHO
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA: A Sonegação Fiscal e o seu Combate
Artigo Científico apresentado à Coordenação do
Curso de Direito da Faculdade de Ensino Superior
da Paraíba - FESP, como exigência parcial para a
obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof.
JOÃO PESSOA
2013
M488c Medeiros Filho, José Geraldo
Crimes contra a ordem tributária: a sonegação fiscal e o seu combate / José Geraldo Medeiros Filho. – João Pessoa, 2013.
20f.
Artigo (Graduação em Direito) Faculdade de Ensino Superior da
Paraíba – FESP.
1. Creimes tributários 2. Direito tributário 3. Ordem tributária I.
Título.
BC/FESP CDU: 34:336.2(043)
JOSÉ GERALDO MEDEIROS FILHO
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA: A Sonegação Fiscal e o seu Combate
Artigo Científico apresentado à Banca
Examinadora de Artigos Científicos da Faculdade
de Ensino Superior da Paraíba – FESP, como
exigência parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
Aprovada em: ____/____/____
BANCA EXAMINADORA
____________________________
Orientador
_________________________________
Membro da Banca Examinadora
_________________________________
Membro da Banca Examinadora
1
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA: A Sonegação Fiscal e o seu Combate
JOSÉ GERALDO MEDEIROS FILHO*
RESUMO
Desde os primeiros momentos em que os homens passaram a viver em comunidade, surgiu a
necessidade da criação de mecanismos de se financiarem para promover a sua proteção. Ao longo
do tempo o Estado evoluiu, tendo hoje em dia a principal função de manter o equilíbrio social, o
que passa pela distribuição de rendas, que se dá através de uma política tributária. Nessa ótica,
considera-se a própria sociedade como o bem jurídico protegido pelo Estado no combate aos
Crimes Contra a Ordem Tributária, cujas situações configuradoras foram estabelecidas através da
Lei Nº 8.137/90.
Palavras chave: Crimes tributários. Direito tributário. Ordem tributária.
“Só conheço duas espécies de governos: os bons e os maus. Os bons que estão ainda por
fazer; os maus, em que toda a arte consiste, por diferentes meios, em passar o dinheiro
da parte governada à bolsa da parte governante. Aquilo que os governos antigos
arrebatavam pela guerra, nossos modernos obtêm com mais segurança pelo fiscalismo. É
apenas a diferença desses meios que constitui sua variedade. Creio, no entanto, na
possibilidade de um bom governo em que, respeitadas a liberdade e a propriedade do povo, ver-se-ia resultar o interesse geral, em contraposição ao interesse particular.”
Claude-Adrien Helvétius, Carta a Montesquieu (1748)
1 INTRODUÇÃO
É fato corrente nas democracias contemporâneas os cidadãos se organizarem cada vez
mais com o principal objetivo de conquistarem os seus direitos, que se expandem por todos os
setores da sociedade. Esses reclames se dão tanto através de seus representantes escolhidos para
esse fim, que são os políticos eleitos, como também, e mais intensamente nos últimos tempos,
através da intitulada governança global, que nada mais é do que organizações não
governamentais.
* Graduando em Direito pela Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP. Email: <[email protected]>.
2
Existe um princípio da economia que afirma que “o homem é insaciável por sua própria
natureza”. Em rápidas palavras, esse princípio nada mais afirma que o ser humano sempre está
em busca de algo que ainda não conseguiu. No momento em que consegue aquilo que buscava,
cria imediatamente um outro desejo e em busca dele segue. Esse processo ocorre dentro de uma
cadeia de substituição contínua de prioridades, fazendo com que sempre pense em se buscar, ter,
alcançar, conquistar... Assim, criamos um cenário prioritariamente da exigência para com
terceiras pessoas, físicas ou jurídicas, envolvidas no processo, fazendo com que, as vezes, nos
esqueçamos de exigir de nós próprios a nossa participação na conquista, principalmente quando
ela é dissipada por toda a sociedade.
Não nos causa estranheza ouvirmos dos cidadãos, de uma forma geral, constantes
reclamações quando eles são chamados a participarem dos custos do financiamento das despesas
do Estado, principalmente quando não é a ele perceptível o retorno que possa ter pessoalmente.
Por vários fatores construídos ao longo dos tempos, as pessoas são tendentes a associar o seu
desprendimento nos custos com a manutenção do Estado, a desvios desses recursos praticados
por aqueles que detêm e se encontram no Poder.
Pode-se dizer que isso era uma resultante da forma de atuação do Estado que pouco se
importava com a proteção e bem estar da sua população, aliado a forma extremamente coercitiva
da exigência em que a coletividade participasse das despesas. Para os que então detinham o
poder, nada mais importante do que o cidadão destinar parte de sua produção ao ente estatal, por
eles representados, não importando os reflexos que poderiam vir a ter até na sobrevivência
familiar. Daí vir a primeira designação para esse tipo de cobrança estatal que foi o “imposto”,
cujo significado é: “que se impôs; colocado; posto; que se obrigou a aceitar ou realizar”1.
Podemos afirmar, hoje, que a sociedade sofreu grandes transformações fazendo com que
os seus integrantes tenham um elevado nível de conscientização no sentido de fazer exigir do
Estado o retorno, em seu benefício, dos recursos por ele arrecadados, através de políticas
públicas. Embora ainda existam pessoas dentro da esfera do poder, ou mesmo fora dela, que
tenham a visão medieval de se apossar dos recursos públicos em seu favor, isso não poderá servir
de argumento para que não venhamos a participar do rateio das despesas públicas. Devemos sim,
além de darmos nossa parcela de contribuição, exigir desse mesmo Estado, através dos meios
1 HOUAISS, Antonio; VILLAR, Mauro de Salles; FRANCO, Francisco Manoel de Mello. Dicionário Houaiss da
língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009, p. 1056.
3
legais que nos são postos, que ele crie instrumentos e adote ações para inibir a prática do mau uso
dos recursos públicos, bem como fazer com que os recursos cheguem aos seus cofres sem que
sejam atropelados no meio do caminho por pessoas que deles se apoderam utilizando-se de meios
escusos.
A identificação dos principais práticas ilegais adotadas pelas pessoas com o objetivo de
se eximirem do pagamento dos tributos a que estão sujeitas e obrigadas ao seu pagamento, bem
como a reação legal que o estado brasileiro pode adotar para que se evite essa prática criminosa
que tem seus reflexos em toda a sociedade, é o principal foco que daremos neste trabalho.
2 BREVE HISTÓRICO DO TRIBUTO
No período denominado de pré-história os homens viviam em uma sociedade
desorganizada, morando em cavernas, lutando contra os grandes predadores, o clima, frio ou
quente, e a fome. Viviam do que encontravam na natureza. Não tinham ainda o conhecimento
nem a percepção para produzirem alimentos, fato esse que provocava uma intensa mudança de
moradia sempre em busca de sua sobrevivência e segurança. Eram nômades.
A medida em que esses povos descobriam técnicas de produção agrícola e de
domesticação de animais foram se fixando ao solo, deixando de serem nômades, o que tornava a
terra cultivada objeto de cobiça, gerando assim grandes conflitos pela sua posse. Naturalmente
entre os integrantes das comunidades foram surgindo seus líderes, aos quais todos os demais,
assim como aos deuses, lhes ofereciam presentes de forma espontânea. Esses presentes eram
denominados tributos.
Com a intensificação das guerras entre os povos, o tributo começa a adquirir uma
característica compulsória, tendo em vista que os povos vencidos eram obrigados a entregar aos
vencedores todos os seus bens, quando não a si próprios.
Os Assírios, há 3.000 anos a.C, que era um povo essencialmente guerreiro, pois vivia de
saques, ficaram conhecidos pela sua crueldade com os povos vencidos na exigência dos impostos
e tributos que deveriam ser pagos. Na antiguidade o Rei Davi, embora não tenha construído o seu
reino com base em saques, segue a mesma linha de exigência de tributos dos povos vencidos. Já o
seu sucessor, Salomão, que adotou uma política de expansionismo, se viu obrigado a exigir
4
também uma alta carga de impostos do seu próprio povo, o que causou grande descontentamento
pelo empobrecimento gerado na população.
Sempre na mesma linha de raciocínio de exploração dos povos vencidos, os romanos
consideravam os tributos como sendo uma reparação de guerra, enquanto que os gregos
utilizavam os tributos como um meio de defesa coletiva do seu povo.
Na Idade Média quando prevaleceu o sistema feudal, os servos que habitavam as terras
dos senhores feudais eram obrigados a pagar tributos, que receberam várias denominações (talha,
corvéia, banalidades, etc.), em forma de trabalho e de mercadorias. Na realidade funcionava um
regime de escravidão disfarçada uma vez que quase tudo o que os servos produziam ia para os
senhores feudais, sobrando-lhes apenas um pouco para a sobrevivência da sua família.
Com o início da Idade Moderna se dá a transformação dos feudos em reinados, quando
se tem os primórdios da formação dos Estados atuais. Diante de um comércio em crescimento
cujo monopólio cabia a aliança árabe-italiano (genoveses, venezianos, etc.), os reis, que já se
encontravam fortalecidos, se viram necessitados de financiar os seus projetos de crescimento e
sustentação no poder, o que passava pelas grandes navegações. Foi dessa época que começou a se
cobrar tributos em forma de moeda.
Iniciando-se com uma completa desorganização fiscal, os Estados viram-se obrigados a
desenvolverem políticas com o fim de lhes dá sustentação financeira, o que passava
necessariamente pela instituição de uma estrutura fiscal organizada. E foi nessa linha que temos
nos dias atuais uma completa sustentação dos Estados contemporâneos vinculados a adoção de
uma política fiscal em seus mais diversos aspectos, nas mais contraditórias correntes econômicas,
sejam monetaristas, sejam fiscalistas de controle do superávit fiscal, sejam heterodoxas
Keynesianas de intervenção do Estado na economia, todas elas passam pela política arrecadatória
implementada pelo governo.
O Brasil, onde se implementou inicialmente uma concepção arrecadatória de
transferência de riquezas para a metrópole, foi palco de várias revoltas da população contra os
tentáculos do Leviatã português, pois achavam aqueles que era função da colônia arcar com as
despesas da corte, sem que houvesse contrapartida. Não muito distante daquela época nos
encontramos nos dias atuais, visto que a política exigida pelos organismos internacionais de
estrito controle dos superavit’s primários com o objetivo de se honrar as dívidas da forma que é
exigida, deixa a desejar o retorno aos seus cidadãos, em sentido amplo, dos recursos deles
5
amealhados. Tal qual na época da Conjuração Mineira a população cada vez mais cobra dos seus
governantes o retorno daquilo que eles dispõem ao Estado.
Nesse sentido tem a sociedade o direito e dever de exigir que os recursos arrecadados
sejam melhor utilizados em políticas públicas. Mas, ao mesmo tempo, deve exigir que o Estado
esteja sempre presente no combate àqueles que se utilizam de meios escusos com o objetivo de se
eximirem do pagamento dos tributos a que estão sujeitos, prática essa delituosa com graves
conseqüências para toda a sociedade.
3 ELISÃO, EVASÃO E ELUSÃO FISCAL
3.1 ELISÃO FISCAL (PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO LEGAL)
É fato bastante difundido no meio que as pessoas que figuram no pólo passivo das
relações tributárias devem buscar meios de reduzirem o volume de recursos que terão que
destinar com o pagamento dos tributos a que estão sujeitos. São várias as alegações por eles
utilizadas, que vão desde uma excessiva carga de tributos que onera consideravelmente o preço
final dos produtos, até a propalada má utilização dos recursos arrecadado pelos governos. Na
verdade, seja por qual razão for, o não recolhimento dos tributos utilizando-se de meios
juridicamente tidos como legais, ou ilegais, torna-se fato real no seio da sociedade.
A palavra elisão tem a sua origem no latim, e significa suprimir, eliminar. No sentido da
palavra, utiliza-se a prática da elisão fiscal com o objetivo principal de diminuir o pagamento dos
tributos através da sua supressão ou eliminação. Para os seus defensores, constitui-se em um
direito do contribuinte assegurado pela nossa constituição federal, uma vez que ele está agindo no
seu interesse dentro da lei.
Configura-se Elisão Fiscal a prática de planejamento tributário que, respeitando o
ordenamento jurídico, é utilizado com a principal finalidade de reduzir, ou anular, o resultado
tributário a que está submetido o sujeito passivo da relação tributária. O contribuinte, utilizando-
se dos meios legais evita que o negócio jurídico chegue a gerar a obrigação fiscal e,
consequentemente, nasça a sua obrigação de pagar o tributo.
Em outras palavras, para que seja considerada elisão fiscal a técnica legal terá que ser
utilizada pelo contribuinte antes da ocorrência do fato gerador da obrigação principal, que é quem
6
determina a natureza jurídica do tributo. Por essa razão, a elisão fiscal é considerada nos meios
jurídicos-tributários como sendo lícita.
De uma forma geral considera-se como sendo duas as formas de se praticar a elisão
fiscal, embora sejam elas muito parecidas entre si: a) a decorrente da própria lei; b) a decorrente
de lacunas e brechas existentes na lei. No primeiro caso, pode-se afirmar que a possibilidade de
se praticar a elisão fiscal encontra respaldo na própria vontade clara e consciente do legislador
que oferece a chance do contribuinte ter benefícios fiscais. Nesse caso em algumas situações é
possível que o fato gerador da obrigação tributária venha a ocorrer, e posteriormente seja
afastado, como nos casos de incentivos fiscais para instalação de indústrias em uma determinada
região do país. Já no segundo caso o contribuinte faz a opção de evitar a ocorrência do fato
gerador em uma determinada situação, fazendo com que apareça em situações mais vantajosas
para ele, como, por exemplo, as empresas de prestação de serviços que transferem sua sede para
as cidades cuja alíquota de ISS sejam menores.
Embora seja por muitos considerados como a principal forma de se combater a elisão
fiscal, o parágrafo único do art, 116 do CTN a nosso ver não atende a essa finalidade. Na
realidade, por ser considerado como um meio legal e legítimo de se reduzir a carga tributária a
que o contribuinte está sujeito, não se visualiza meios legais, ou mesmo a necessidade de se
combater a elisão fiscal. Procura-se, sim, identificar se realmente a prática configura-se como
sendo elisiva, caso positivo, aceitá-la, caso negativo, combater por não ser mais considerado
como elisão fiscal, e sim um crime tributário com outra configuração.
3.2 EVASÃO FISCAL (PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ILEGAL)
Outra forma de planejamento tributário que é utilizado pelo sujeito passivo da obrigação
tributária é a Evasão Fiscal, que consiste na utilização de procedimentos que violem diretamente
a legislação fiscal em vigor. Ou seja, o contribuinte se utiliza de meios escusos para se eximir do
pagamento dos tributos por ele devidos, ou mesmo conseguir a sua redução ou o seu retardo.
Trata-se de ação deliberada de confronto com as normas legais, uma vez que o
contribuinte tem consciência de que está praticando atos ardilosos, ou seja, conscientemente e
intencionalmente o contribuinte age em confronto com a Lei. Assim, por se encontrar presente o
elemento intencional caracterizador da ocorrência do dolo, a prática da Evasão Fiscal é
7
considerada como um Crime Contra a Ordem Tributária, levando a responsabilizar pelo
cometimento do crime as pessoas nele envolvidas.
Considerando que a natureza jurídica do tributo é determinada pelo seu fato gerador,
para que seja considerado a ocorrência da evasão fiscal primeiro se faz necessário que haja
ocorrido as situações causadoras do seu nascimento. A partir desse momento, o contribuinte
utiliza-se de técnicas, consideradas escusas, com o objetivo de enganar o fisco no sentido de não
lhe dar conhecimento do nascimento da obrigação tributária, e se der conhecimento que não seja
na sua totalidade. Ou seja, o tributo já é devido, mas o contribuinte deixa de recolhê-lo, recolhe a
menor ou retarda o seu recolhimento, procurando sair da relação tributária então surgida. Sem
conhecimento da existência da obrigação tributária principal fica a Fazenda Pública refém desses
recursos, que, por sua vez, passarão a ser utilizados pelo próprio contribuinte que deu origem à
ilegalidade.
Como exemplo citamos as técnicas mais utilizadas para se praticar a evasão fiscal,
dentre outras, que são a da Nota Fiscal Fria e a da Nota Fiscal Calçada. A Nota Fiscal Fria
consiste na falsificação do próprio documento fiscal, ou seja, é uma nota fiscal legalmente
inexistente, cujos valores nela expressos não serão escriturados na contabilidade da empresa. Já
na Nota Fiscal Calçada quando do seu preenchimento o contribuinte que utiliza talonário coloca
após a 1ª via da nota fiscal a ser emitida algum elemento que impeça que o valor real a ser
registrado seja copiado nas vias seguintes, as quais serão preenchidas posteriormente com valores
menores. Se o meio de emissão de notas fiscais é o eletrônica, o calçamento da nota se dá através
da alteração dos programa do computador. De uma forma ou de outra, o valor a ser escriturado
será sempre os que não constam na 1ª via da Nota Fiscal, ou seja, os menores.
3.3 ELUSÃO FISCAL
Embora ainda não exista uma grande aceitação doutrinária, pois muitos consideram
como sendo situações já presentes tanto na elisão fiscal quanto na evasão fiscal, pode-se
considerar a disponibilidade de mais um instrumento que possa levar a que não haja a subsunção
tributária de um determinado fato gerador. Trata-se da Elusão Fiscal, que para muitos é tratada
como sendo a evasão lícita, e para outros como sendo a elisão ineficaz.
8
Na realidade a elusão fiscal pode ser considerada como sendo um misto entre a elisão
fiscal e a evasão fiscal, visto que em sua essência contem elementos das duas condutas
mencionadas: a licitude e a ilicitude.
Pode-se dizer que o contribuinte não utilizou-se de instrumentos que sejam
essencialmente ilícitos, visto que a sua prática foi se utilizar de situações previstas na legislação.
Mas, uma vez que ele não se encontra no campo instituído pelo ordenamento jurídico, no
momento em que dele faz uso em seu benefício com a contra-partida de prejuízo fiscal para o
Estado, considera-se que se tenha praticado um ato ilícito.
O contribuinte faz simulações através de uma combinação de atos tidos como lícitos,
mas que estão desprovidos de elementos que lhe proporcione uma segurança jurídica, com o
principal objetivo de dissimular a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Dessa forma
pode-se considerar dois momentos passíveis em que seja praticada a elusão fiscal: antes ou
depois do fato gerador. Em todo caso, havendo conhecimento desse procedimento por parte do
fisco, deve-se proceder com o lançamento de ofício para cobrar totalmente, ou o que falta, do
imposto apurado.
Podemos citar como exemplo o fato de duas pessoas (X e Y) constituírem uma empresa
(A) com capital social na ordem de R$ 300.000,00, com participação de 50% cada um. A pessoa
X integraliza sua parte de R$ 150.000,00 em moeda, enquanto que a pessoa Y integraliza sua
parte através de um imóvel de mesmo valor. Algum tempo depois a sociedade é dissolvida, e na
divisão do capital social o imóvel é destinado ao sócio X e o dinheiro ao sócio Y, o que
caracteriza uma venda de imóvel dissimulada.
A principal de forma de se combater a prática da elusão fiscal é a utilização do previsto
no Parágrafo único do art. 116 do CTN, que, muito embora seja conhecido como uma norma anti-
elisiva, a sua aplicabilidade leva a ser considerada como uma norma anti-elusiva, uma vez que as
situações em que se aplicada a norma jurídica citada leva a conclusão de que o ato praticado não
estava de acordo com o que se pretende alcançar
4 CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA
Para que possamos ter um melhor entendimento das situações previstas pelo legislador
como se tratando de Crimes Contra a Ordem Tributária, necessariamente teremos que recorrer a
conceitos jurídicos específicos de outros ramos do direito, principalmente o Direito Penal.
9
A Teoria do Crime preconiza que para que uma ação seja convertida em delito se faz
necessário a presença de três elementos: o fato típico, a antijuridicidade e a culpabilidade,
podendo ele ser conceituado sob os aspectos material, formal ou analítico. É o que temos
conceituado no nosso Código Penal (BRASI, 2013).
4.1 O BEM JURÍDICO PROTEGIDO
Para que determinado ato praticado pelo agente venha a ser considerado como crime se
faz necessário que tenha ocorrido lesão ao bem jurídico que deva ser protegido pelo Estado.
Dentro de uma visão mais ampla do direito pode-se dizer que existem ilícitos de natureza penal,
civil, administrativa, etc., cujas diferenças da ilicitude podem ser consideradas como inexistentes
entre si. Mas de acordo com Rogério Greco “o ilícito penal, justamente pelo fato de o Direito
Penal proteger os bens mais importantes e necessários à vida em sociedade, é mais grave". 2
Embora não seja pacífica a identificação do bem jurídico atingido pelo agente que
pratica o Crime Contra a Ordem Tributária, pois a grande tendência é achar que a lesão ocorreu à
Fazenda Pública, e os mais conservadores ainda apontam como sendo o próprio governo a parte
lesada, na realidade o reflexo final se dá na própria sociedade e, notadamente, na população de
mais baixa renda, uma vez que o resultado da arrecadação tributária deve representar uma
distribuição de renda na população, muito embora os resultados das ações do Estado terminem
por atingir todas as camadas da sociedade.
Na estrutura do Estado brasileiro, cabe ao Poder Executivo arrecadar e fiscalizar os
recursos advindos da sociedade. Mas, embora seja precípuo o exercício dessas funções, pode-se
afirmar que os governos não são os possuidores dos bens jurídicos atingidos pelo crime tributário,
pois a eles cabe a função de intermediação entre os agentes sociais com o objetivo de diminuir as
diferenças de condições de vida, e para isso utiliza-se do seu poder coercitivo. Assim, por ser a
sociedade como um todo, e principalmente os integrantes das classes menos favorecidas, os
diretamente atingidos pelo resultado da ilicitude praticada pelo agente quando se utiliza de meios
não convencionais para se eximir do pagamento dos tributos a que estão sujeitos, que
teoricamente não mais lhes pertence, deve o Estado se fazer presente no combate a essa prática.
2 GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. 9. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007, p. 139.
10
Pode-se dizer, por fim, que o bem jurídico protegido pelo Estado quando atua no combate as
práticas ilícitas tributárias é o direito difuso da própria sociedade.
4.2 TIPOS PENAIS E LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA: Lei Nº 8.130/90 – art. 1º e 2º - natureza
jurídica
A tipicidade é uma característica comum a toda norma jurídica penal, porque é nela que
se descreve a conduta objetiva ou subjetiva do agente que uma vez praticada constitui uma
antijuridicidade. Intrinsecamente relacionada com o princípio da legalidade, uma vez que deve
necessariamente estar consubstanciada em norma jurídica, teve a sua inspiração em Rousseau e
Beccaria e sua consagração na Declaração dos Direitos do Homem de 1789. Em sua defesa
afirmava Cesare Beccaria que “só as leis podem decretar penas para os delitos, e esta autoridade
não pode ser maior do que a do legislador”.3
No Direito Penal o princípio da tipificação penal é elemento necessário e fundamental na
aplicação da norma. Consagrado na nossa Constituição Federal de 1988, o princípio da
anterioridade conjuntamente com o princípio da legalidade compõem o denominado “princípio da
Reserva Legal”, ao estabelecer no inciso XXXIX do art. 5º que "não há crime sem lei anterior
que o defina, nem pena sem prévia cominação legal". Afirma-se que para que uma ação ou
omissão venha a ser considerada como crime, necessário se faz que exista uma norma anterior ao
fato tipificando-as como tal.
Apesar de ser considerado um Crime Contra a Ordem Tributária, com regência através
de legislação específica, a sonegação fiscal também se sujeita ao Princípio da Reserva Legal, até
porque o resultado proveniente do evento da sua prática necessariamente redundará em
penalidade cuja essência se encontra no Direito Penal. Vale dizer que o fato imponível do crime
de sonegação fiscal interessa tanto ao Direito Tributário quanto ao Penal. Ao primeiro para
legitimar a exigência do pagamento do que fora sonegado, e ao segundo para punir o agente que
praticou a sonegação. O diferencial nesse caso é que, a nosso ver, o bem jurídico lesado tem
natureza supra-individual, é difuso, ou seja, é toda a sociedade, só podendo ser concebido e
entendido sob uma perspectiva comunitária.
3 BECCARIA, Cesare, Dos Delitos e das Penas. 2000. p. 29.
11
No Brasil não é recente a preocupação que se tem em reprimir as condutas que tenham
como finalidade o não recolhimento dos tributos através da utilização de meios ilícitos. O Código
Criminal do Império de 1830, em seu art. 177, representa o primeiro disposit ivo legal que
condena as ações que resulta em não pagamento de tributos ao criminalizar o contrabando e o
descaminho4. No mesmo diapasão, o Código Penal Republicano de 1890 reafirma o conteúdo do
código anterior com respeito ao contrabando, porém dá-lhe uma nova capitulação regrando esses
como sendo Crimes Contra a Fazenda Pública.1
Embora pareça ter uma composição diferente, até porque sofreu fortemente a influência
da corrente individualista, o Código Penal de 1940 dá a prática do contrabando, conforme
previsto no seu art. 334, tratamento parecido com o que constava no Código Criminal do Império
de 1830 (4). Podemos dizer até que houve um retrocesso com relação ao Código de 1890 que
considerou o contrabando como sendo um Crime Contra a Fazenda Pública, ao tratá-lo sob um
ponto de vista do patrimônio individual considerando-o como Crime Praticado Por Particular
Contra a Administração Pública em Geral.
Encontrava-se o Estado brasileiro sem uma legislação específica que tratasse dos crimes
de evasão fiscal, desde a sua tipificação até a estipulação das penas passíveis de serem aplicadas.
Não resta dúvida que com o flanco completamente aberto, se não ocorreu um estímulo, ao menos
facilitou com que houvesse um crescente aumento de evasão tributária, ocasionando sérias
conseqüências nas contas públicas.
Diante dessa situação, e considerando a necessidade de pelo menos inibir a prática de
atos que redundassem em não recolhimento tributário, em 1965 foram editadas as leis Nº 4.357 e
Nº 4.729, que criaram, respectivamente, a figura do crime de apropriação indébita pelo não
recolhimento de impostos (Imposto de Renda, Imposto de Consumo e Imposto sobre valor de
selos recebidos de terceiros, pelos estabelecimentos sujeitos aos regimes de venda especial), a
qual não será tratada neste trabalho, e o crime de sonegação fiscal.
Na análise da Lei Nº 4.729/65 identifica-se que a sua pretensão é tutelar como bem
jurídico o patrimônio público de uma forma geral, uma vez que ela previa a intenção do agente
4 Código Penal de 1940 - Art. 177, Importar ou exportar gêneros, ou mercadorias prohibidas; ou não pagar os direitos
dos que são permitidos, na sua importação ou exportação. Penas – perda das mercadorias ou gêneros, e de multa
igual à metade do valor delles. (BRASIL, 2013)
12
em praticar a ação configurada do crime de sonegação, tendo eleito quatro condutas reprováveis
de redução ou supressão de tributos, e adotando como núcleo a falsidade ideológica
e a falsidade material. Assim, considerava-se configurado o crime de sonegação fiscal se
constatada a presença de qualquer das condutas previstas como forma de eximir-se do pagamento
do tributo, independentemente do efetivo resultado. A esse respeito se posicionou Rui Stoco
quando afirmou que a previsão contida no artigo 1º da Lei Nº 4.729/65 “deixam claro que os
tipos não reclamam a efetiva sonegação do tributo para a consumação, afinal o simples propósito
ou a mera intenção já eram aptos à consumação do delito fiscal”5.
Com a promulgação da Constituição Federal em 1988 que traz no seu bojo tanto
questões de cunho liberal quanto social, e passando o Estado brasileiro por séria crise na
economia, foi imperioso que se procurasse instrumentos de estabilização da economia. Passava
também a política brasileira por um período de pseudo-moralização que utilizava como principal
instrumento o poder coercitivo estatal.
Foi nesse cenário que editou-se a Lei Nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que teve
como principal objetivo tratar dos crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e Contra as
Relações de Consumo. A nossa ênfase será dada aos dispositivos que tratam dos crimes contra a
Ordem Tributária por ser o objetivo do presente trabalho, e que são definidos nos artigos 1º e 2º
do mencionado diploma legal.
Foi a intenção do legislador colocar em um único diploma legal todas as situações que
caracterizassem crimes contra a Ordem Tributária, fossem eles de natureza material ou apenas de
resultado, exigindo-se, porém, a presença do dolo, por ser um tipo de crime que para que ocorra a
sua configuração se exige a presença do elemento objetivo, ou seja, a vontade de se praticar o
delito.
Dessa forma o art. 1º da Lei 8.137/90 é bastante taxativo na caracterização do crime
contra a ordem tributária. Na redação está patente a exigência da materialização do fato. Ao
sujeito ativo do delito não se faz necessário apenas que tenha tido a intenção de praticá-lo, exige-
se que o crime tenha ocorrido como resposta a uma das ações descritas nos seus incisos. Fica
claro que é a supressão ou redução do tributo o elemento configurador do crime, o tipo penal, que
deve ser apurado através de procedimento administrativo fiscal constituindo definitivamente o
5 STOCO, Rui. Leis penais especiais e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1997, p. 2087.
13
crédito tributário, que é peça imprescindível para a ação penal, que sem ela não pode ter
prosseguimento, conforme está pacificado pelo STF através da Súmula Vinculante 24, que
estabelece: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos
I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.
Quando da edição da Lei Nº 8.137/90 muitas questões surgiram a respeito da
interpretação que deveria ser dada ao seu artigo 2º. Por serem nele previstas apenas condutas que,
uma vez praticadas, configuram o crime contra a Ordem Tributária, sem a exigência do resultado,
estaríamos diante de crimes de tipos formais, e não de crimes de tipo materiais descritos no artigo
anterior.
Embora guarde muita semelhança com o que está previsto na Lei Nº 4.729/65, que
definiu os crimes de Sonegação Fiscal, e até entendemos que foi essa a intenção do legislador,
essa concepção é bastante questionada no meio jurídico. A esse respeito o STJ se posicionou
quanto a necessidade da constituição prévia do crédito tributário para que as condutas descritas
no art. 2º da Lei Nº 8.137/90, sejam consideradas fraudulentas. É esse o teor de acórdão do STJ
de relatoria do Ministro Nilson Naves, cuja ementa transcrevemos a seguir:
Ainda que possua natureza formal a prática atribuída ao paciente – aquela descrita no art.
2º, I, da Lei nº 8.137/90 –, em casos tais, de igual forma, o procedimento penal não
prescinde do prévio esgotamento da esfera administrativa, ou seja, também se faz
necessária a constituição definitiva do crédito tributário.” (HC 73.353/RJ, Rel. Ministro
NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 06/05/2008, DJe 24/11/2008).(BRASIL, 2013)
Assim podemos dizer que atualmente para que se possa considerar caracterizado o crime
contra a Ordem Tributária além da presença do dolo se faz necessário que se prove a
materialização desse crime, ao que se faz através da constituição do crédito tributário através do
lançamento de ofício do que havia sido sonegado, ou ao menos tentado. Ou seja, hoje está
praticamente pacificado que esse tipo de crime é de natureza material.
5 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE
Em relação às questões tributárias pode-se dizer que a primeira vez em que se tratou da
extinção de punibilidade para os crimes regidos pelas normas específicas se deu através do §1º do
art. 11 da Lei Nº 4.357/64. Embora tratasse especificamente das situações em que se
caracterizasse o crime de apropriação indébita, o dispositivo foi taxativo ao afirmar que se os
14
débitos fiscais fossem recolhidos “antes da decisão administrativa de primeira instância no
respectivo processo fiscal” o fato típico criminal deixava de ser punível.
Posteriormente quando da definição dos crimes de sonegação fiscal através da Lei Nº
4.729/65, esta tratou no seu art. 2º da extinção da punibilidade dos crimes nela previstos, caso
houvesse o recolhimento dos tributos sonegados antes do início da respectiva ação fiscal.
Percebe-se claramente que a intenção do legislador foi o de inibir a própria prática do evento
crime, uma vez que a sua extinção estava vinculada a procedimentos administrativos fiscais, que
iniciados teria o autor que ser incriminalizado se constatada a ocorrência da infração.
Na sequência vieram outros diplomas legais que tratavam especificamente da repressão
a sonegação fiscal, quais sejam o Decreto-Lei Nº 157/67 e Nº 316/67, que, em suma, ampliavam
o prazo para pagamento até a decisão administrativa de primeira instância, sendo que o segundo
se referia ao Imposto Sobre Produtos Industrializados.
Novo tratamento da extinção da punibilidade só veio a ser dado quando da edição da Lei
Nº 8.137/90, que previa, em seu art. 14, a extinção da punibilidade quando o agente efetuasse o
pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive dos seus acessórios (multa e juros), antes
do recebimento da denúncia pelo judiciário. Este foi um dispositivo que durou pouco, pois diante
das várias discussões que surgiram no meio jurídico bem como pelo quadro político institucional
por que passava o país, ele foi expressamente revogado no ano seguinte pelo art. 98 da Lei Nº
8.383.
Com a instituição do Plano Real em 1994, que tinha como principal objetivo o combate
do processo inflacionário através do controle das contas públicas proporcionado, dentre outros
fatores, pelo aumento da arrecadação tributária, e tendo como princípio que o principal objetivo
da política tributária é o processo de financiamento do Estado, e não a criminalização dos seus
agentes sonegadores, a extinção da punibilidade foi retomada através da Lei Nº 9.249, de 26 de
dezembro de 1995, que praticamente reeditou em seu art. 34, o dispositivo legal anteriormente
revogado6. Como vemos, segui-se o mesmo diapasão de considerar como último momento para
que o agente praticante do crime tivesse extinta a sua punibilidade o recebimento da denúncia.
Vasta discussão passou a existir entre doutrinadores no sentido de que a Lei ao afastar o
dolo penal tributário pelo pagamento do “quantum debeatur” em sua integridade não era
6 Art. 34 da Lei N 9.249/95 – Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro
de 1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou
contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia
15
extensiva aos agentes que apresentassem a vontade de realizar o pagamento mas que, por
condições diversas, não dispusesse de toda a quantia exigida, se dispunha a parcelá-la nas
condições estabelecidas pela legislação fiscal. Embora a administração fazendária,
principalmente a federal, não se dispusesse a aceitar a tese levantada, o judiciário quando
provocado seguia a linha da aceitação, como bem ficou demonstrado em decisão proferida pela
então juíza, hoje ministra do STF, Eliana Calmom, nos seguintes termos: “Proposta de
parcelamento bem anterior à denúncia, mas só deferido em data posterior. Desinfluência do
processo burocrático... Manifestada a intenção de pagar, mesmo parceladamente, antes da
denúncia, extinta está a punibilidade”.7
Várias outras decisões foram proferidas na mesma linha ao que fez com que a
administração fazendária passasse a rever o seu posicionamento sobre o assunto. Primeiramente
de uma forma mais tímida a Lei Nº 9.964/00, em seu art. 15, considerava suspensa a pretensão
punitiva do Estado aos agentes aderentes ao programa de parcelamento nela previsto que
tivessem praticados crime contra a Ordem Tributária8. Para atender os diversos interesses
envolvidos, tanto do governo quanto dos devedores, quando da edição da Lei Nº 10.684, de 30 de
maio de 2003, que diz na sua ementa dispor, também, “sobre parcelamento de débitos junto à
Secretaria da Receita Federal, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e ao Instituto Nacional
do Seguro Social”, finalmente assumiu-se, de uma forma bastante ampla, a suspensão da
punibilidade dos crimes praticados contra a ordem tributária e correlatos quando os débitos
fossem parcelados. 9
Atualmente esse regramento está estabelecido nos artigos 68 e 69, e seus parágrafos
únicos, da Lei Nº 11.941, de 27 de maio de 2009, que trata taxativamente das situações em que se
considera extinta ou suspensa a punibilidade dos agentes que praticaram Crimes Contra a Ordem
Tributária, ou a eles correlatos.
7 COSTA, Cláudio. Crimes de sonegação fiscal. Rio de Janeiro: Revan, 2003, p. 111. 8 Art. 15. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137,
de 27 de dezembro de 1990, e no art. 95 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, durante o período em que a
pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no Refis, desde que a inclusão no
referido Programa tenha ocorrido antes do recebimento da denúncia criminal 9 Art. 9 da Lei Nº 10.684/03 - É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts.
1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos
aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento. (BRASIL, 2013)
16
A discussão ainda anda muito longe de terminar sobre a oportunidade e razoabilidade da
edição desses institutos diretamente relacionados com o impedimento da aplicação da legislação
penal àqueles agentes que tenham sonegado recursos públicos.
Duas foram as correntes que claramente se formaram: os que acham que devido a alta
carga tributária o agente quase sempre é forçado a tomar atitudes que se conflitam com a
legislação penal em benefício da sustentação de seus negócios, com reflexos na geração de
empregos, e os que se posicionam firmemente em defesa dos interesses públicos, representados
por uma distribuição de rendas mais equitativa oriunda dos tributos, não se justificando, em
qualquer hipótese, que esses recursos fiquem nas mãos de poucos quando deveria ser gasto com
toda a sociedade.
Não entraremos no foco dessa discussão, mas considerando que o principal objetivo da
administração tributária é trazer para a sociedade aquilo que lhe cabe, não questionando se está
ou não sendo bem aplicado, uma vez que detectada a situação que incorreu o agente em praticar o
Crime Contra a Ordem Tributária, e estando este se dispondo a reparar a situação causadora
daquela infração penal, creio que é muito mais plausível dar a oportunidade de reparação com a
permanência do agente na sociedade do que promover o seu isolamento aplicando pena
meramente exemplificativas, que, tem-se provado, não traz nem a reparação do dano material
nem social do agente, pois nada garante que o mesmo não venha a praticá-lo novamente.
6 REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS
Considerando que os tributos representam um interesse da sociedade, muito embora seja
administrado pelo Poder Público da esfera Executiva, os Crimes Contra a Ordem Tributária são
todos eles de ação penal pública incondicionada, conforme prevê o art. 15 da Lei 8.137/9010.
Assim, por ser o detentor da legitimidade estatal, cabe ao Ministério Público o ajuizamento da
ação penal relativa a esses delitos.
Embora qualquer pessoa possa levar ao conhecimento do Ministério Público a
ocorrência de prática que configurem crime contra a Ordem Tributária, em regra essa
comunicação é feita pelos órgãos estatais responsáveis pela fiscalização tributária.
10 Lei 8.137/90, Art. 15. Os crimes previstos nesta lei são de ação penal pública, aplicando-se-lhes o disposto no art.
100 do Decreto-Lei Nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal (BRASIL, 2013)
17
Com o objetivo de instrumentalizar esse procedimento, a Administração Tributária
Federal instituiu a Representação Fiscal Para Fins Penais (RFPFP). Sendo a fase administrativa
da ação penal, esta só deverá ser elaborada após a constituição do crédito tributário através do
auto de infração.
Apesar de ser o art. 83 da lei 9.430/96 bastante taxativo quanto ao momento do
encaminhamento da RFPFP ao Ministério Público, que será somente “depois de proferida a
decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário
correspondente”11 , contra ele se insurgiu o Procurador-Geral da República por meio da ADIN Nº
1.571-1, alegando que as instâncias administrativas e judiciais eram independentes, e ao vincular
o ajuizamento da ação penal pública incondicionada à prévia comunicação dos agentes fiscais
estava-se violando o art. 129, I, da Constituição Federal. Essa ADIN foi julgada improcedente
pelo STF com o argumento de que o MP pode ajuizar a ação independentemente de receber a
RFPFP, desde que ele tenha conhecimento, por quaisquer outros meios, do lançamento definitivo
do crédito tributário.
Atualmente a RFPFP, no que se refere ao previsto nos artigos 1º e 2º da Lei Nº 8.137/90,
é disciplinada pela Portaria RFB Nº 2.439, de 21 de dezembro de 2010, a qual determina que em
se constatando indícios da prática de Crimes Contra a Ordem Tributária ou de apreensão de bens
sujeitos à pena de perdimento, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil deverá formalizar a
mencionada representação em autos apartados do processo administrativo fiscal.
Quanto ao momento da sua formalização, a Receita Federal está em completa sintonia
com a orientação do STF ao condicionar expressamente o encaminhamento da RFPFP ao
Ministério Público a decisão final administrativa confirmando o crédito tributário e o seu
respectivo pagamento ou parcelamento. Essa posição do órgão fiscalizador leva em consideração
o entendimento de que os crimes tributários como previstos na Lei Nº 8.137/90 são de natureza
material, visto que depende do seu efetivo resultado.
11 Lei 9.430/96, art. 83 - A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária
previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social,
previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), será
encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a
exigência fiscal do crédito tributário correspondente. (Redação dada pela Lei nº 12.350, de 2010) (BRASIL,
2013)
18
7 CONCLUSÃO
É indiscutível que o Estado brasileiro adotou uma política tributária que se tornou
bastante onerosa para a população, a qual foi plenamente intensificada durante a década de 1990,
cujo principal objetivo era o de alcançar o superavit primário determinado pelos organismos
credores internacionais do Brasil, passando por um arrocho das constas públicas bem como pelo
aumento da arrecadação tributária, o que fez com que a carga tributária fosse elevada de cerca de
25% do PIB no início, para aproximadamente 37% no final da década.
Se comparada com a carga tributária de países tidos como desenvolvidos, tipo Suécia,
Suiça, e Japão, chegaremos à conclusão de que a carga tributária brasileira não é das maiores. A
diferença se encontra exatamente no retorno propiciado pelo Estado arrecadador a grande massa
de contribuintes. No Brasil, nunca antes, e atualmente com menor discrepância, o produto da
arrecadação foi direcionado para se manter um equilíbrio maior entre os integrantes da sua
população com adoção de políticas públicas de inclusão social, com investimentos nas áreas de
saúde, educação e segurança como prioridade.
Mesmo diante desse cenário nebuloso de seriedade no trato da coisa pública poderá isso
servir de argumento justificativo para que parte da população se aproprie do que pertence a toda a
sociedade utilizando-se de meios ardilosos. Nesse ponto acertou o legislador ao instituir
instrumentos legais de penalização dos agentes que não querem participar do financiamento do
Estado brasileiro e, ainda por cima, ficar o que não lhe pertence, quando não subtraído de outrem
no momento em que assume a posição de substituto tributário.
Apesar de defender a rigidez na aplicação da legislação quando se trate da prática do
crime contra a Ordem Tributária, temos que levar em consideração qual o principal objetivo da
política tributária: trazer aos cofres públicos aquilo que lhe cabe ou colocar em recintos prisionais
aqueles que em um determinado momento infringiu dispositivo legal mas se dispõe a fazer a sua
total reparação? Não existe erro insanável. O resultado do erro pode até ser insanável, mas o erro
sempre poderá ser sanado. Todos merecem oportunidades na vida, mesmo quando agem de forma
intencional na prática de uma ação conflitante com as normas legais.
A doutrina brasileira com relação ao Direito Penal, na sua essência, adotou a teoria mista
unificadora. Mas em matérias específicas é fácil constatar a adoção de outras teorias, como é o
caso da Lei dos Juizados Especiais que adota a Teoria Retributiva, cuja finalidade é a reparação
19
do dano. A nosso ver, o legislador ao criar os diversos institutos relativos ao direito penal
tributário se baseou na Teoria Retributiva pois, ao oportunizar o agente infrator a corrigir o seu
erro com o pagamento integrar do que havia sido sonegado do Estado, está pensando, acima de
tudo, na reparação do dano como fator principal para extinção da relação penal então
estabelecida.
ABSTRACT
From the earliest times when men were living in the community, the need of mechanisms to
finance to promote their protection. Over time the state has evolved, and today the main function
of maintaining social equilibrium, which passes through the income distribution, which is given
through a tax policy. From this perspective, it is society itself as the legal interest protected by the
state to combat the Crimes Against Tax Order, whose situations configuradoras were established
by Law No. 8.137/90.
Keywords: Tax Crimes. Tax law. Tax order
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