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carta do leitor

O Bar da Frente, localizado na Praça da Bandei-ra, venceu a edição 2014 do “Comida di Buteco”. Estreante no concurso, o boteco foi premiado com o petisco “porquinho de quimono” – uma massa recheada com costelinha suína defumada e requei-jão de ervas, acompanhada de molho agridoce. Ao todo, 31 bares participaram da votação para escolha do melhor petisco carioca. O aconchegante Bar da Frente fica na Rua Barão de Iguatemi, 388 – Lj 1. Telefone: 2502-0176.

“Temos muito orgulho de representar uma região onde um almoço no quintal e cadeiras na calçada podem transformar-se num grande evento; afinal, comemorar e bebemorar são especialidades do morador da Zona Norte.” Amei esse editorial! A Revista Fala Zona Norte me representa! Parabéns, equipe!

Vera Lúcia Gomes – Madureira – RJ.■ ■ ■ ■ ■ ■

Achei bem interessante e enriquecedor o texto que fala da história da formação do Complexo do Alemão. Temos dezenas de comunidades na Zona Norte que, com certeza, devem ter histórias interessantes e curio-sas. Moro atualmente em Padre Miguel, na Zona Oeste, mas sou ex-moradora da região e tive o prazer de receber um exemplar da revista na Feira de São Cristóvão. Gostei muito. Tá aí minha sugestão. Saudações!

Tayane Azevedo – Padre Miguel – RJ.■ ■ ■ ■ ■ ■

Olá, equipe! Vocês não acham que seria legal publicar receitas en-caminhadas por leitores na seção de Gastronomia, umas receitas dife-rentes? A gente já sabe de cor e salteado como fazer feijoada e mocotó. Nada contra a Tia Surica, hein, gente, por favor! Ela é uma querida! É só uma sugestão.

Maria José Oliveira – Tijuca – RJ.■ ■ ■ ■ ■ ■

Bacana a Revista Fala Zona Norte. Bom ter uma publicação voltada para nossa gente. Sugiro que abordem temas infantis com dicas de atra-ções, como teatro e shows, por exemplo.

Abraços!Maria Regina Coutinho – S. Cristóvão – RJ. Fala Zona NorteConforme sugerido pela nossa leitora Gláucia Regina, do Engenho

Novo, passamos a dedicar, a partir desta edição, uma seção para Estéti-ca, Beleza e Moda. Obrigada, Gláucia, sua opinião foi de grande impor-tância para nós.

Agradecemos a participação dos leitores e informamos que todas as sugestões estão sendo analisadas pelo Conselho Editorial.

Envie também a sua sugestão para [email protected]

Comida di Buteco 2014 é da Zona Norte!

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EXPEDIENTE

Sumário EDITORIAL“A Revista Fala Zona Norte me

representa!” Retiramos esta frase da carta de uma leitora, uma das mui-tas cartas que não param de chegar a nossa redação com opiniões, críticas e sugestões. Sinal de que estamos no caminho certo. Retratamos aqui, com a maior fidelidade possível, as pesso-as, os lugares, os costumes e as coisas desta região tão querida da cidade.

E é nesse ritmo que quem estrela nossa matéria de capa é Hélio Antô-nio do Couto Filho, mais conhecido como Hélio de La Peña. Sua veia hu-morística falou mais alto do que o ta-lento para os cálculos e ele tornou-se um dos maiores humoristas do Brasil. Nascido e criado no bairro da Vila da Penha, o artista jogou muita bola e roubou goiaba na vizinhança, estórias pitorescas que você vai ficar por den-tro nesta edição.

É tempo de Copa do Mundo e festa junina, mas você sabe como surgiram os festejos juninos? Vai ficar sabendo na seção “História do lugar”, onde o jornalista Ronaldo Luiz-Martins traça

um paralelo entre as comemorações e as Copas do Mundo, que sempre acontecem no mesmo período a cada quatro anos.

Nossa dica de turismo é um pas-seio enriquecedor à Fundação Oswal-do Cruz, em Manguinhos. O local, aberto à visitação pública e gratuita, abriga exposições variadas onde pas-sado e presente se misturam em per-feita harmonia no Museu da Vida.

Veja também a nova moda que vem fazendo a cabeça da galera na Zona Norte. Os turbantes, com seus coloridos e amarrados, dão o toque na nova tendência, que alia estilo e pra-ticidade.

E mais! Numa entrevista exclusi-va, Marcos Falcon, vice-presidente da Portela, conta como em menos de um ano a nova administração da tradicional escola da Zona Norte saiu da área de rebaixamento e alcançou o honroso terceiro lugar, para alegria de componentes e admiradores da azul-e-branco de Madureira.

Vem com a gente! Boa leitura!

MERCADÃO SUSTENTÁVEL

FESTA JUNINA E A COPA DO MUNDO

ESPETINHO NOSSO DE CADA DIA

SE AMARRE NESSA IDEIA!

FALCON FAZ BALANÇO DE UM ANO DA NOVA ADMINISTRAÇÃO DA PORTELA

HÉLIO DE LA PEÑA DA VILA DA PENHA!

DIREITO E PROTEÇÃO ANIMAL

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, O MUSEU DA VIDA

LIMA BARRETO DE “TODOS OS SANTOS”

SOU DA PENHA 2

INAUGURAÇÃO DA TRANSCARIO-CA EM MADUREIRA

GRUPO 100% SUBURBANO PROMOVE RODA DE CHORO EM OLARIA

ZONA NORTE, CAPITAL DO MUNDO

BALUARTES DE TURIAÇU – 15 ANOS DE SAMBA DE QUALIDADE

BACALHOADA

Realização: IGPL Comunicação e Marketing Ltda.Jornalista Responsável: Luciana Paiva - MTB: 27.242Colaboradores: Fernanda Borriello, Tia Surica, Ronaldo Martins, Pedro Joaquim, Iracema Martins e Joaquim Ferreira dos SantosFotos: Sebastião Silvério, Willy Shampoo e Pedro JoaquimRevisão: José Bernardino CottaTiragem: 15.000 exemplaresDiagramação: IGPL Comunicação e MarketingPublicidade: Email: [email protected] Telefones: (21) 3415-0355 / 7828-7072 / 7828-7073 / 98440-4561

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34A Revista Fala Zona Norte não se responsabiliza pelas opiniões emiti-das nas matérias e nos artigos assinados por seus colaboradores.

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Imaginem a conta de água de um dos mais importantes centros comerciais do Rio de Janeiro com mais de 500 lojas e cerca de 80 mil pessoas circulando diaria-mente. E foi pensando, primeiro, na economia que o projeto come-çou em 2008, segundo Antonio Rodrigues do Tanque Filho, sín-dico do Mercadão.

— Num primeiro momento, houve a preocupação com a eco-nomia, com os gastos do condo-mínio; então me veio a ideia de aproveitar a água da chuva. Esta-ríamos, ao mesmo tempo, dentro do contexto de sustentabilidade,

O Dia Mundial do Meio Am-biente, comemorado em 5 de ju-nho, é uma oportunidade para as pessoas repensarem o quanto são responsáveis pelo planeta Terra. Aproveitando a data, procuramos na Zona Norte do Rio exemplos e iniciativas que buscam preservar o meio ambiente. Encontramos no Mercadão de Madureira um con-junto de ações sustentáveis e de valorização da natureza. O des-taque é para o Projeto Água Eco-lógica, um sistema de captação e tratamento da água da chuva, que é reaproveitada para uso nos va-sos sanitários do estabelecimento.

Mercadão Sustentávelafinal, o planeta clama por uma consciência ambiental de todos nós, e ainda atendendo à Lei Es-tadual nº 4.393, que determina a obrigatoriedade das empresas projetistas e de construção civil a prover os imóveis residenciais e comerciais de dispositivo para captação de águas da chuva.

O Projeto Água Ecológica re-cebeu em 2009 o Prêmio do Mé-rito Ambiental do Centro de Li-teratura do Museu Histórico do Exército e Forte de Copacabana. O prêmio é oferecido a institui-ções e pessoas que atuam positi-vamente na preservação do meio

meio ambiente

Armazenamento da água ecológico

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é usada em trabalhos sociais nas comunidades do entorno do Mer-cadão de Madureira.

A administração do mercado também implantou um sistema de recolhimento de papel e papelão, além de pilhas, baterias, lâmpa-das e outros materiais de descarte mais difícil para reciclagem. En-tre os projetos futuros, está a ins-talação de lâmpadas de LED em todo o mercado.

— Começamos com experi-ência em nossa sala e estamos implantando, aos poucos, nas ga-lerias do Mercadão, pois é uma mudança que custa caro; mas estamos colaborando com a di-minuição do aquecimento global. O uso de um produto sustentável contribui para a preservação do meio ambiente e as lâmpadas de LED cumprem muito bem essa função, pois consomem menos energia, se comparadas com ou-tros tipos de lâmpadas, e ainda não emitem muito calor. O futuro é o LED! – disse Antonio Tanque.

Conheça as ações do Mercadão Sustentável.

Acesse http://www.mercadao-demadureira.com/

ambiente e da cultura nacional.Segundo Antonio Tanque, são

recolhidos atualmente mais de 170 mil litros de água por coleta e o objetivo é chegar a 240 mil litros. A diferença na conta de água também foi bastante signi-ficativa.

— Começamos retirando oito mil litros em 2008. Um ano depois já eram 60 mil e hoje são 178 mil litros por coleta. Teve mês aqui que economizamos R$ 23 mil na conta de água. Ser ecologicamen-te correto também dá lucro – diz o administrador.

Em 2012, o Mercadão passou a ser Patrimônio Cultural Carioca, título concedido pela Prefeitura do Rio. O importante estabeleci-mento comercial da cidade, que irá completar 100 anos de existên-cia em outubro de 2014, também tem na bagagem outras importan-tes iniciativas que muito colabo-ram para a preservação do meio ambiente.

Pensando em ajudar a resolver

os entupimentos das tubulações e redes de esgoto, problema recor-rente no local, o Mercadão de Ma-dureira criou um ponto de coleta de óleo, o primeiro Ecoponto da Zona Norte. Os primeiros convo-cados a participar foram os co-merciantes locais, principalmen-te donos de bares. No entanto, a ideia logo cresceu e o Ecoponto também recebe óleo de cozinha, usado de frequentadores e de mo-radores da região. Segundo An-tonio Tanque, o óleo recolhido é vendido e a verba arrecadada

Antonio Tanque com a subsíndica do Mercadão Sheila Reis

Sistema de captação de água da chuva

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Popularizada por todo o Brasil, particularmente no Nordeste, as Festas Juninas têm suas origens na Europa da Idade Média. Antigas festas pagãs, associadas ao início do verão e das colheitas, foram pelo Cristianismo ajustadas em louvor a São João Batista, em 24 de junho, e, mais tarde, estendidas

Festa Junina e a Copa do Mundo

História do lugar Ronaldo Luiz-Martins / Iracema Martins

a São Pedro (29 de junho) e Santo Antônio (13 de junho). Comum nas aldeias portuguesas, as Festa Juninas foram trazidas para o Bra-sil no final do século XVI, quando aqui instalados os primeiros en-genhos de açúcar. Sem que haja maior notícia de ocorrência em área urbana, já no século XVII,

nas regiões rurais da Cidade do Rio de Janeiro, nos terreiros de engenhos e fazendas, em noites de 23 de junho, consideradas as mais frias do ano, 13 ou 29 do mesmo mês, com toda área engalanada de arcos de bambu e folhas de pal-meira, e o chão de terra coberto de folhas, era festejado o nascimento

Rua do Engenho de Dentro decorada para a Copa do Mundo de 2010 na África do Sul.

Foto de divulgação na internet.

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de São João com grande fogueira, bandeira do santo, comidas, be-bidas e danças que rusticamente copiavam o vira português. No início do século XX, com a ur-banização, as festas passaram a ocupar os grandes quintais então existentes nas residências, sendo para elas convidados amigos e vi-zinhos. Conservando a fogueira, a ornamentação de bambus e fo-lhas, as comidas e bebidas rurais, a dança, desde o século anterior satirizando a influência francesa nos salões e conservando ainda traços do vira, passava a formar a quadrilha marcada em que as vestimentas e chapéus, nos salões mais apurados e elegantes, como sátira aos tempos rurais ou “caipi-ras”, foram substituídos por rou-pas remendadas e chapéus de pa-lha. Da Europa, por influência das experiências de Bartolomeu de Gusmão, veio também o balão de papel, ao qual, associando as tra-dições das luminárias festivas dos

Festa Junina em praça da Zona Norte Foto de divulgação na internet

grandes eventos no Centro, que eram formadas por velas acessas em copos coloridos, foram adi-cionados as lanterninhas e ban-deirinhas de papel. Como havia também realização destas festas no dia dedicado a Santo Antônio, considerado o santo casamentei-ro, quando muitos casamentos se realizavam, em sátira e extensivo à dança de quadrilha, foram adi-cionados os casamentos na roça,

Ganhando mais elementos como as pinturas de temas de futebol no as-

falto e muros, tro-cando a fogueira

pela churrasqueira, samba e bateria,

surgia uma varian-te às Festas Juni-

nas, só realizada de quatro em quatro anos: as Festas de Copa do Mundo.

Rua da Zona Norte decorada pela Copa do Mundo de 2010 na África do Sul.

Foto de divulgação na internet.

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para o qual os noivos e seus con-vidados chegavam ao terreiro em carros de boi ornamentados. Com a evolução urbana, diminuindo os lotes e com maior edificação nestes, reduzidos os quintais e aumentada a frequência, as festas passaram às ruas e o dançar qua-drilhas tornou-se uma competição

entre grupos, em geral de ruas vi-zinhas e mesmo de bairros.

Distante do cenário da Segun-da Guerra Mundial e sem sofrer as destruições nela ocorrida no pós-guerra, o Brasil foi escolhido para sediar a IV Copa do Mundo em 1950. Coincidentemente, a pri-meira partida do campeonato no

Estádio do Maracanã, em que o Brasil venceu por 4 a 0 o México, ocorreu em 24 de junho, dia de São João. A euforia desta vitória deu às Festas Juninas neste dia um novo brilho, onde as danças e balões a ela se referiam. A véspera de São Pedro, 28, em seu segundo jogo, o Brasil, apesar do empate com a

A partir de 12 de junho, véspera de Santo Antônio, primeira fes-ta junina, o Brasil joga em casa, motivo para com maior calor serem enfeitadas as ruas de verde e amarelo, pintados o asfalto

e os muros, afinadas baterias e montadas as churrasqueiras.

Rua da Zona Norte decorada pela Copa do Mundo de 2010 na África do Sul.Foto de divulgação na internet.

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Su-í ç a ,

em 2 a 2, garan-

tia a sua classi-ficação às semifinais,

e no dia seguinte as festas juninas repetiam as mesmas mar-cas de euforia. A triste derrota, 2 a 1 para o Uruguai, e a perda da Copa aconteceriam dezessetes dias depois e já as festas juninas haviam passado. Na Copa de 1954, nos festejos de São João, havia um clima de expectativa e euforia. No dia 16, o Brasil ha-via derrotado o México por 5 a 0 e, apesar do empate de 1 a 1 com a Iugoslávia em 19, estava classificado para seguir às quar-tas de final. Nas decorações das festas, apareceram bandeirinhas verde e amarelo, bem como nas roupas e chapéus. Em Irajá, foi feito um imenso balão no for-mato do escudo da CBD, sendo solto ao final da tarde. Logo ao ganhar altura em que se tornou visível, com grande comprimen-to, mas de estreita largura, o ven-to virou o balão, que se queimou em poucos segundos. Parte das festas locais perderam o brilho, pois a queima do balão foi toma-da como sinal de mau agouro. No dia 27, o Brasil, perdendo de 4 a 2 para a Hungria, foi elimina-do, fazendo com que nas festas de São Pedro, pouco concorridas, todos os símbolos de euforia de-saparecessem.

Iniciada a Copa de 1958, no

dia 8 de junho, a primeira vi-tória do Brasil por 3 a 0 sobre a Áustria animou a decoração dos arraiais em verde e amarelo, po-rém ainda sem o clima de muita festa. Mas, no São João, a euforia começou a explodir, pois pela ma-nhã, ao derrotar a França por 5 a 2, a seleção brasileira chegava à grande final. No final da manhã do domingo 29, por 5 a 2 sobre a Suécia, o Brasil conquistava a sua primeira Copa. Uma grande explosão de alegria tomou todo o país com as ruas invadidas pelo povo. Nos arraiais juninos, a festa começou mais cedo, com fogos, balões e quadrilhas, que logo se aprontaram. Porém, nesta festa, algo mudou: a música junina foi substituída pelo samba, as quadri-lhas viraram cordões e o quentão perdeu para a cerveja.

Tomado como bom pressá-gio, em 1962, quando a Copa do Mundo se iniciou 13 dias antes da primeira festa junina, a vitória do Brasil na abertura contra o Méxi-co (2 x 0) precipitou a organiza-ção de arraiais em ruas decoradas com temas verde e amarelo e de futebol. Novamente, as comemo-rações das vitórias esportivas se integravam às festas juninas, sen-do a de Santo Antônio pela classi-ficação do Brasil às finais, e antes mesmo de São João, a 17, com o bicampeonato brasileiro.

Quando a Copa do Mundo de 1966 se iniciou, em 11 de julho, o período das festas juninas já ha-via terminado. Como preparo às festas de vitórias, o que não acon-teceu, pois o Brasil não passou da primeira fase, sendo eliminado

pela Hungria (3 x 1) e Portugal (3-0), os arraiais de ruas se es-tenderam em tempo com nova decoração. Também em 1970, a Copa do Mundo começou antes das festas (31/5) e, renovando a esperança de vitórias. os arraiais de rua em verde e amarelo foram antecipadamente montados. As festas, independentemente das tradicionais datas, se realizaram nos dias 3, 7, 10, 14, 17 e torna-ram-se grandiosas em 21 com o tricampeonato.

Ganhando mais elementos como as pinturas de temas de fu-tebol no asfalto e muros, trocan-do a fogueira pela churrasqueira, samba e bateria, surgia uma va-riante às Festas Juninas, só reali-zada de quatro em quatro anos: as Festas de Copa do Mundo. Depois de 1970, tornando-se comuns em vários pontos do Brasil, dez edi-ções já ocorreram. Para elas, as indústrias criaram produtos, como a grande variedade de plásticos verde e amarelo, bandeiras, cha-péus e outros. O comércio passou a se preparar para vendas volumo-sas onde até itens extemporâneos, como latas de tinta de parede, são de grande procura.

Neste ano, 2014, realiza-se no Brasil a 20ª Copa do Mundo de Futebol. A partir de 12 de ju-nho, véspera de Santo Antônio, primeira festa junina, o Brasil joga em casa, motivo para com maior calor serem enfeitadas as ruas de verde e amarelo, pinta-dos o asfalto e os muros, afina-das baterias e montadas as chur-rasqueiras. Vem aí a 14ª Festa de Copa do Mundo.

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Espetinho nosso de cada dia

ENTRETENIMENTO

“Busco vendedor de espe-tinhos de churrasco que more em Bonsucesso... pagarei bem de acordo com suas vendas... quem tiver interesse ligar para 999999999.” O número é fictí-cio, mas o anúncio é real e es-tava no site bomnegocio.com,

oferecendo a vaga para quem se habilitasse a trabalhar, preparan-do e servindo churrasquinhos no bairro da Zona Norte do Rio. A atividade ganha, a cada dia, mais adeptos na região e a clientela desse tipo de iguaria de rua está cada vez mais exigente; afinal a

concorrência é grande. Eles estão por toda parte: nas calçadas, nas esquinas, nas praças e onde quer que haja movimento.

Ulisses Souza, supervisor de segurança, é freguês assíduo do churrasquinho do Harry, na es-quina das Ruas Uruguai e Ge-

Churrasquinhos tomam conta da cidade

Feijão há 30 anos com seu churrasquinho em Madureira

Luciana Paiva

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neral Espírito Santo Cardoso, na Tijuca.

— Pelo menos, umas duas ve-zes na semana eu passo por aqui e levo uns dois espetos para via-gem. Minha filha adora – afirmou o morador do Andaraí.

Flávia Nascimento, 40, e Ales-sandro Freitas, 41, são advogados moradores da Tijuca e clientes do churrasquinho do Harry.

— A gente vem sempre aqui comer um chur-rasquinho e re-laxar um pouco. Aqui o churrasco e o atendimento são excelentes. Além do mais, moramos bem perto e não preci-samos nem tirar o carro da gara-gem – afirma. Giovana Nasci-mento, a estu-dante de 11 anos, filha do casal,

sempre acompanha os pais e é fã do espetinho de carne.

O apelido “Harry” foi dado pelos clientes a Erimar Oliveira Costa, 28 anos, há 5 no ponto da Tijuca onde vende, segundo ele, cerca de 400 espetinhos por noi-te.

— Qualidade e bom atendi-mento fazem nosso diferencial.

Acho que o ambiente familiar e a proximidade com a delegacia do bairro (19ª DP) também ajudam a atrair mais clientes – diz o ex-porteiro e morador do bairro do Engenho Novo. No Harry, cada espeto sai a R$ 4. Lá tem salsi-chão, queijo coalho, kafta, carne, linguiça, frango e misto.

Em outro ponto movimenta-do da Zona Norte, encontramos o churrasquinho do Edmílson Cazuni, na esquina das Ruas Ba-rão do Bom Retiro e Grajaú, no Grajaú. Aos 41 anos, o ex-taxista trabalha há 8 no ramo e agora já até fornece para outros churras-queiros da cidade.

— No começo, eu queria entrar para o negócio, mas não entendia nada. Um amigo me orientou e agora consegui expandir e mon-tei uma minifábrica de espetinhos prontos para churrasco. Forneço para vários churrasqueiros – co-

Flávia Nascimento e Alessandro Freitas clientes do churrasquinho do Harry.

Harry de ex-porteiro a vendedor de churrasquinho

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me-mora o

paranaense que vende cerca

de 300 espetinhos por noite.

Foi fugindo dos engarrafa-mentos no trânsito por conta das obras da Transcarioca, que o ca-sal Roberto Alvarez e Fernanda Montenegro conheceu o chur-rasquinho do Feijão, localizado na Rua Dona Clara, em Madu-reira.

— Passávamos por aqui para evitar o trânsito e sempre vía-mos a barraca cheia e o cheiro bom nos acompanhava. Um dia, decidimos parar para provar e viramos fregueses. Agora não tem mais engarrafamentos, mas a

gente continua passando por aqui — afirmou o empresário que tra-balha em São Cristóvão e mora em Bento Ribeiro.

Feijão, como é conhecido

Luiz Carlos Almeida, de 64 anos, cerca de 30 deles como vendedor de churrasquinho em Madureira.

— Comecei na Rua Domingos Lopes, onde fiquei por pelo me-nos 20 anos antes de vir pra cá. Conheço essa garotada toda que vi crescer, comendo meu chur-rasquinho. O pessoal passa aqui de carro e nem sai do volante. Geralmente já sei a quantidade e o que eles querem levar – diz o churrasqueiro.

Na barraca do Feijão, o espeti-nho sai a R$ 3. O cliente ainda tem a opção de farofa, arroz e molho e, com mais R$ 4, leva um v e r d a d e i r o jantar.

Fernanda Montenegro e Roberto Alvarez. O casal é fã dochurrasquinho do Feijão, em Madureira

Luciana Torres no churrasquinho do Edmílson Cazuni no Grajaú

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Se amarre nessa ideia!Comportamento

Quem ainda não viu uma cele-bridade da TV, do cinema ou das passarelas da moda, encabeçando um turbante nos últimos tempos? Lenços e faixas vêm fazendo a cabeça de homens e mulheres com os mais variados amarrados. Deusa de Malê, atuante no setor de moda afro e dona do Atelier Divindade Nagô, explica que o acessório é prático e acrescenta charme ao visual para as mais di-versas ocasiões, seja dia ou noite.

— Esquentou? Esfriou? Isso também não é problema, já que o tecido pode proteger do Sol em

Turbantes fazem a cabeça de homens e mulheres na Zona Nortedias de calor e aquecer nos dias mais frios. Homens, mulheres, crianças e idosos. Todos podem usar um lindo turbante – afirma Deusa de Malê, que tem como nome de batismo Carla Regina Simões e é tataraneta de escra-vos.

O turbante consiste em uma grande tira de pano enrolada so-bre a cabeça. Seu uso é muito comum na Índia, no Bangladesh, no Paquistão, no Afeganistão, no Oriente Médio, no norte e leste da África (principalmente no Quê-nia), no sul da Ásia e em algumas regiões da

Jamaica. Nesses lugares, além de funcionar como adorno, repre-senta também proteção religiosa.

Os turbantes foram trazidos para o Ocidente na década de 30, pelo estilista francês Paul Poiret, e logo virou peça chave das se-nhoras da alta sociedade. Na his-tória, o acessório esteve presente como símbolo de resistência ne-gra na década de 60 e ganhou se-guidoras importantes como Gre-ta Garbo, Simone de Beauvoir e Carmem Miranda.

No Brasil, a forte influência da cultura africana fez da Cidade de Salvador, na Bahia, uma grande referência no uso dos turbantes. Eles estão nas cabeças das vende-doras de acarajé, dos integrantes dos blocos afros, como o Ilê Aiê, e dos seguidores do Candomblé.

Aqui, na Zona Norte, o turban-te tornou-se peça chave para com-

por o visual, não importa qual seja o seu estilo. A diferença

está na forma de amarrar. Ao lado alguns exemplos, fornecidos pelo Atelier Di-vindade Nagô, para quem quiser amarrar-se nessa ideia. www.facebook.com/atelierdivindade.nago

Foto: Atelier Divindade Nagô

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Falcon faz balanço de um ano da nova administração da Portela

portela verdade

“Tradicional Escola da zona norte revive seus momentos de glória!”Atolada em dívidas, ações tra-

balhistas, bloqueios e penhoras. Este foi o quadro encontrado pela administração Portela Verdade, eleita em 18 de abril de 2013, en-cabeçada por Serginho Procópio, Marcos Falcon e Monarco, como presidente de honra. Faltava me-nos de um ano para o desfile de 2014 e o grupo assumia com a di-fícil missão de tirar a tradicional escola da Zona Norte do buraco, resgatar a autoestima e a confiança dos portelenses. Para a felicidade

dos componentes e admiradores da azul-e-branco de Madureira, a escola, que nos últimos anos lutou contra o rebaixamento, não só fez um belíssimo carnaval, mas bri-gou pelo título, ficando em tercei-ro lugar. Falcon, vice-presidente da Portela, fala, nesta entrevista, das conquistas e desafios da agre-miação.

O que é a Portela hoje, um ano depois que o Grupo Portela Verdade assumiu o comando da

escola?Nós podemos dizer que a Por-

tela voltou a ser a Portela. Os portelenses voltaram a se sentir respeitados, reconhecidos e com a esperança renovada. Uma Portela que sonha e acredita nela. A Por-tela sobreviveu pela força do seu passado e nós, da administração Portela Verdade, reconhecemos sua força e necessidade de agre-garmos conhecimento à experiên-cia dos grandes baluartes. Resga-tamos os verdadeiros portelenses

Foto grande: Marcos Falcon em seu gabine-te. Foto menor abaixo: Monarco, presidente

de honra, Falcon, vice-presidente e

Serginho Procópio, presidente.

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e sabemos que sem essa união nós não chegaremos a lugar algum. A Portela de hoje sabe a responsabi-lidade que tem.

Como a nova administração encontrou a Portela?

Encontramos salários atrasa-dos e vários impostos que não foram recolhidos. Contas astro-nômicas de água e luz, ações trabalhistas, bloqueios e penho-ras. Encontramos um barracão abandonado sem se quer um vaso sanitário. Para ter uma ideia, os bustos dos fundadores e maiores mitos da Portela, Paulo Benjamin de Oliveira e Natalino José do Nascimento, estavam esquecidos e abandonados. Os bustos foram revitalizados e postos à frente da escola, iluminados, recebendo nossos convidados. Por tudo que Paulo da Portela e Natal fizeram

e brigaram pela Portela, eles não podem cair no esquecimento. São nomes que devem servir-nos de lição, ensinamento, estímulo e consciência. Nós representamos a Portela e sua história marcante no universo do samba. Um acervo de belíssimas canções e poemas, pela qualidade magistral de seus poetas, cantores, compositores. Os que já se foram e os que feliz-mente ainda estão em nosso con-vívio. Temos que dar a cada um deles o valor merecido. Eles são referência para os mais jovens e alegria para os mais velhos. Gra-ças a Deus a Portela Verdade che-gou e uniu todas as gerações. A Portela se manteve digna e essen-cialmente vive essa sua história.

A Portela entrou na Avenida com um carnaval sem dívidas?

Assumimos a Portela sabedo-res de algumas mazelas, mas não imaginávamos que eram tantas. Isso não nos fez esmorecer, pelo contrário. Fez com que nos unís-semos ainda mais. Aumentamos nosso cuidado com os gastos e conseguimos ir para Avenida com o carnaval totalmente pago. Isso tudo foi fruto de um empenho muito grande e um senso de res-ponsabilidade de que me orgulho, sem soberba ou qualquer outro tipo de sentimento. Eu, Serginho Procópio, e Monarco, nosso pre-sidente de honra, abraçamos com muita coragem, determinação, fé a importância dessa união. Des-taco a importância de nosso car-navalesco, Alexandre Louzada, que foi um super-herói, um “Su-perLouzada”. Antes do carnaval,

ele teve problemas de saúde, mas foi um guerreiro. Meu aplauso e meu respeito ao Louzada, que não arredou um só minuto de nosso barracão.

Fale sobre os ensaios para a comunidade.

Vínhamos fazendo os ensaios técnicos para o carnaval aqui na Estrada do Portela. Percebemos, junto à competente Comissão de Harmonia, a necessidade de en-saiarmos em um espaço mais se-melhante à Sapucaí. Neste caso, as opções eram a Rua Carolina Machado e a Estrada Intendente Magalhães. A Carolina Machado estava impossibilitada nas datas de nossos ensaios. A Intendente Magalhães tem uma pista favorá-vel. Além disso, nós tínhamos o compromisso de manter o contato com o povo daquela região, da-quela localidade. Mesmo porque a Portela não é de Oswaldo Cruz e Madureira. A Portela é do Brasil inteiro, é do mundo.

E o futuro da Portela?O objetivo da Portela é mui-

to simples e fácil. A Portela quer ganhar o carnaval. Com respeito às coirmãs, que também desejam a mesma coisa, a Portela deseja muito mais. A Portela quer o títu-lo, vai brigar pelo título e fazer de tudo para vencer. Enquanto Deus me der força e saúde, ninguém vai sacanear a Portela!

Descreva a administração atual da Portela em uma frase.

Portela Verdade é comprometi-mento. Quem ousa, vence!

“Enquanto Deus me der força e saúde, nin-guém vai sacanear a

Portela!”

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capa

Hélio de La Peña da Vila da Penha!

“Estudei muito Cálculo Diferencial, Fenômeno dos Transportes, Matemática

Financeira...coisas que hoje não tenho mais a menor ideia

do que sejam.”

Fotos: Sebastião Silvério

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Hélio de La Peña é o nome artístico de Hélio Antônio do Couto Filho, o carioca nascido e criado na Vila Penha, na Zona Norte do Rio, que estudou Enge-nharia de Produção na Universi-dade Federal do Rio de Janeiro, mas que encontrou nas artes e no humor, para nossa alegria, seu grande dom. Aos 54 anos, o ator, escritor, e compositor tem dois livros publicados, diversas participações em cinema e TV e músicas com parceiros como o sambista Arlindo Cruz. Nesta entrevista exclusiva, Hélio de La Peña fala de sua infância na Zona Norte e de sua carreira. O botafoguense, e pai de três fi-lhos, conta com orgulho como foi largar o emprego seguro de engenheiro para aceitar o con-vite para escrever o programa TV Pirata, da TV Globo, um dos melhores do gênero na televisão brasileira.

Fale sobre sua vivência na Zona Norte? Onde estudou, lu-gares que frequentava e seus hábitos.

M i n h a Zona Nor-te tem sabor de infância. Nasci na Vila da Penha e saí de lá aos 20 e poucos anos. Minha infância foi jogando bola na rua, an-dando de bi-cicleta, rou-bando goiaba na casa da vi-zinha, olhan-do assustado o acampa-mento de ci-ganos. Estu-dei em duas escolas pú-

blicas: a Miguel Ângelo, onde fui aluno da minha mãe, e na Desembargador Montenegro. Era um moleque quieto, estu-dioso, minha mãe era linha-du-

Eu, o mais velho, com meus irmãos Pedro, Denise e Sérgio. Ainda tem o César, que não tinha nascido.

Com o uniforme de escola pública e merendeira, em frente ao Desoto, a banheira de 1953 com que rodávamos o Rio, dentro dele ou, eventualmente, empurrando.

Eu e minha pro-fessora Edith, da

Escola Desembar-gador Montene-

gro, hoje dentro do conjunto do Ipase

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ra. Mas tinha muitos amigos. Como o bairro era tranquilo, meus pais não se importavam se eu sumisse pelos quartei-rões, desde que tivesse feito o dever de casa! Frequentava o Mercadão de Madureira – até o barbeiro era lá – e também as Casas da Banha, da Edgard Ro-mero, com minha avó. Meu pai me obrigou a aprender a nadar no Olaria, na época detestava, hoje adoro. Na adolescência, fui muito aos cines Madureira 1 e 2, onde hoje é o Shopping dos Peixinhos. Também fre-quentei os bailes de Black Mu-sic, do Kosmos Country Club, na Avenida Meriti, e os bailes de carnaval no CBSM na mi-nha rua.

Como você ingressou na vida artística?

Comecei escrevendo no jor-nal que criamos na faculda-de de Engenharia, o Casseta Popular. Era uma brincadeira apenas. Mais tarde, fomos con-vidados para sermos redatores da TV Globo, onde fizemos o programa TV Pirata. Quando acabou, apresentamos um pro-jeto de programa que veio a se tornar o Casseta & Planeta Ur-gente!.

E o seu talento para o hu-mor? Quando despertou?

Gostava de ler e de escrever. Também tinha uma verve de go-zador, mas era acanhado, prati-cava zoando meus irmãos mais

novos. Na faculdade, entrei para o movimento estudantil. Achava os caras muito sérios e sisudos. Eu, Beto Silva e Marcelo Madu-reira éramos da mesma turma e resolvemos criar um jornalzinho pra sacanear a política estudan-til que se levava a sério demais. Fui-me soltando, a ponto de en-carar performances em showzi-nhos de bares. Mas nunca fiz curso de teatro ou interpretação.

Você também atuou no cine-ma. Fale um pouco sobre isso.

Atuei nos filmes do Casseta – “A Taça do Mundo é Nossa” e “Seus Problemas Acabaram”. Também trabalhei no filme “Muita Calma Nessa Hora 2”, fazendo uns seis ou sete perso-

Hélio de La Peña e os filhos João e Antônio – Tradicional churros na praça.

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nagens – eram diversos segu-ranças, cada um de um jeito. Foi muito divertido, todas as vezes. Muito ensaio, concentração, mas na hora do set era uma brin-cadeira boa.

E o Hélio de La Peña escri-tor, como foi sua experiência com a publicação de dois li-vros?

Exercitei trabalhos-solos, já que tinha experiência de criar em grupo com os cassetas. Bus-quei escrever obras que tives-sem a ver com a minha vivência. O primeiro deles foi o Livro do Papai, que escrevi quando tive meu segundo filho, o João. Criei uma espécie de livro de “antia-

juda”, dando conselhos aos pais de primeira viagem que nunca deveriam ser seguidos. Depois escrevi Vai na Bola, Glander-son, onde explorei minha vi-

vência de su-búrbio e minha paixão pelo fu-tebol. Este livro vai virar filme. Adaptei com Je-ferson De e L.G. Bayão para o longa Correndo Atrás. No mo-mento, estamos correndo atrás da grana pra realizá-lo. Mas está bem enca-minhado – te-mos Lázaro Ra-mos e Heloísa Perissé encabe-çando o elenco.

Você também

já andou com-pondo música. Como aconte-ceu a parceria

com Arlindo Cruz no samba da TV Globo?

Além das músicas e paródias que fiz com os cassetas, tanto para os programas quanto pra nossos shows e discos, tenho al-gumas parcerias por aí. Arlindo Cruz é meu parceiro mais famo-so. Temos algumas coisas jun-tos, uma delas, Citações, está no seu CD Batuques e Romances. Criamos, junto com Mu Cheba-bi e Franco Lattari, o Samba da Globalização, que lançou a pro-gramação da Globo por cinco anos, cada vez uma nova versão pra encaixar os nomes dos ato-res dos programas.

O programa TV Pirata foi um dos melhores programas de humor da TV. Conte sobre sua experiência.

Era engenheiro, quando re-cebemos o convite. Larguei o emprego no ato e mergulhei de cabeça na aventura. Foi sen-sacional, escrever para gran-des atores, como Cláudia Raia, Marco Nanini, Regina Casé, Ney Latorraca dentre outras

Hélio de La Peña – humorista se sente em casa

Hélio de La Peña com os filhos em uma das ruas onde viveu sua infância

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feras. Parecia um sonho, escre-ver os quadros e ter uma equipe enorme e competente pra pro-duzir cenários, figurinos, trilha sonora...

Fale sobre o tempo de facul-dade.

Foi um tempo divertido e im-portante. Conheci muita gente, aprendi uma profissão que me foi muito útil, apesar de não ser

Tal pai tal filhos – assim como o pai, João e Antônio adoram jogar bola.

exatamente o que queria fazer. Ao mesmo tempo, a vida fora de sala de aula foi muito rica. Fa-zia política, escrevia a Casseta Popular, agitava o cineclube da faculdade, mas também estudei muito Cálculo Diferencial, Fe-nômeno dos Transportes, Mate-mática Financeira...coisas que hoje não tenho mais a menor ideia do que sejam.

Fale sobre o Casseta e Pla-neta.

Uma experiência inesquecí-vel! Durante 18 anos tivemos um programa líder de audiência na maior emissora do país! Acho que escrevemos nosso nome na história da TV brasileira. Fomos os primeiros a zoar a programa-ção da TV, a levar o humor para as ruas, a fazer o povo falar, a fazer viagens contando piadas, a cobrir Copas do Mundo com hu-mor, a sacanear – e muito! – os políticos. Sem falar nas Organi-zações Tabajara, que resultaram num bordão. Quando alguma coisa é vagabunda, o pessoal logo fala que é meio tabajara. Foi muito bom, mas o grupo não voltará a ter outro programa na TV, não temos planos de voltar a atuar juntos.

Quais são seus trabalhos atuais e projetos futuros?

No momento, faço a série A Segunda Dama, um trabalho de ator, e mantenho meu blog www.casseta.com.br/lapena, além do meu facebook e do twitter. Na Copa, estarei na co-bertura do SporTv nos diversos programas, me revezando com os outros cassetas, comentan-do o que rola no campo e fora dele. Estou produzindo meu filme Correndo Atrás, planejo lançar um outro livro com meu amigo e cartunista Adão Itur-rusgarai, escrevo para revistas, faço natação no mar, torço pelo Botafogo e dou atenção aos fi-lhos e à minha mulher, senão o bicho pega!

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mente na Zona Norte, o Governo crie e mantenha uma clínica pública para atendimento aos animais, cujo os donos não podem pagar. E neste mesmo local possa fun-cionar um abrigo com estrutura adequada e digna para atender aos animais abandonados.

Soube de uma história comovente outro dia. Na Fa-vela Santa Marta, havia uma cadelinha abandonada, com desnutrição, doenças de pele e com sinais de maus-tra-tos.Ela foi batizadas pelos moradores de Martinha.

Martinha contou com um amigo meu, Thiago Firmi-no, que acionou a entidade Paraíso dos Focinhos, que foi ao local e recolheu Martinha. Ela foi tratada e, após curada, será colocada para adoção.

Mas, quantas Martinhas vimos por aí?!Na minha rua, por exemplo, apareceu um gatinho

abandonado, assustado, mas muito meigo.Observei e percebi que parecia não ter dono. Foi aí

que comecei a alimentá-lo e dar carinho todos os dias, porém, não posso ficar com ele, por conta de ter cachor-ro em casa.

Estou chamando-o de Miauzi-nho. Ele é muito meigo, carinhoso e precisa de um lar.

Como Miauzinho e Martinha, existem milhares de animais nas ruas da nossa Zona Norte e aqui neste espaço deixo uma reflexão para nossos leitores para que não permitam maus-tratos aos ani-mais.

E aos governantes sugiro/so-licito um trabalho voltado para este assunto. Defesa dos animais também é algo muito sério e eles merecem nosso carinho e respeito.

Muitas vezes, nas horas mais difíceis, são eles que estão do nosso lado e não pedem nada em troca para nos dar carinho e muito amor.

social

Direito e proteção animal

Cada vez que saio pelas ruas da Zona Norte, acabo deparando com muitos animais, cães e gatos, perambu-lando, abandonados, sofrendo maus-tratos.

Não consigo compreender como as pessoas podem pegar um filhote e depois, quando ele cresce um pouco, abandoná-lo da forma mais cruel possível.

Eu, como amante e defensora dos animais, me re-volto com tais atitudes, já que os animais são seres in-defesos e que só sabem dar muito amor e carinho para aqueles que os adotam.

A decisão de criar um filhote deve levar em conta que eles precisam, nos primeiros meses de vida, de cuidados semelhantes ao de uma criança pequena. Precisam de comida, educação, higiene e muito carinho.

E quando eles crescem e começam,muitas vezes, a roer móveis e outros objetos da casa, seus donos, não querendo ter trabalho, os abandonam.

Fora o abandono, muitos animais sofrem com agres-sões e violência gratuita.

Na internet todos os dias vejo manifestações sobre a aprovação de leis que possam responsabilizar e penali-zar quem realizar maus-tratos contra animais.

Hoje em dia existem abrigos de entidades sem fins lucrativos que conseguem atender parte da demanda de animais abandonados e que sofreram maus-tratos, mas a dificuldade em se manter projetos neste sentido inviabili-zam a cada dia que estas instituições sobrevivam.

Eu defendo que, em nosso Rio de Janeiro e principal-

Fernanda Borriello

Fernanda Borriello é Superintendente de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos – SEASDH-RJ

Foto: Thiago Firmino

Foto: Fernanda Borriello

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A ideia que a maioria de nós tem de um museu, com um único prédio que abriga exposições, é bem diferente na Avenida Brasil

TURISMO

Fundação Oswaldo Cruz, O Museu da VidaVisita guiada é opção de lazer para todas as idades

4.365, endereço onde se localiza uma instituição centenária e vital para o progresso da Medicina no país, a Fundação Oswaldo Cruz

(Fiocruz), que se espalha por uma área de 270 mil metros qua-drados em Manguinhos, na Zona Norte do Rio. Para passar para

O imponente castelo da centenária Fiocruz

Luciana Paiva

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o público a história e as curio-sidades do lugar, ali funciona o Museu da Vida, que engloba di-versas áreas temáticas separadas fisicamente pelo campus da Fun-dação. Entre elas, a que desperta maior interesse, é o imponente castelo, estilo mourisco, que pode ser avis-tado de vários pontos da ci-dade. O local é aberto à visita-ção pública, um programa de la-zer e enriqueci-mento cultural para todas as

idades.P r o j e t a d o

pelo arquite-to português Luiz Moraes Júnior, o Pa-vilhão Mou-risco se man-tém ainda hoje como a sede da Fiocruz e maior símbolo da instituição e foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Ar-tístico Nacio-nal (IPHAN) em 1981. A c o n s t r u ç ã o durou 13 anos (1905 a 1918) e contou com materiais e mão de obra

importados.– Foram trabalhadores imi-

grantes espanhóis, italianos e portugueses porque naquela época não havia profissionais e

nem produtos que atendessem ao projeto aqui no Brasil. Os materiais incluem mármores italianos, azulejos portugueses, louças inglesas e mosaicos fran-ceses – explica Renato Gama-Rosa, arquiteto e pesquisador da Fiocruz. Segundo ele, uma equipe composta por arquite-tos, engenheiros e historiadores é responsável pela manutenção do importante conjunto arquite-tônico, que abriga o mais anti-go elevador em funcionamento na cidade, vindo da Alemanha e instalado em 1909.

A visitação ao Museu da Vida inclui áreas temáticas fisica-mente separadas, como explica o historiador e coordenador do Museu da Vida, Alessandro Ma-chado.

– A visita guiada começa pelo Centro de Recepção, onde o vi-sitante embarca num trenzinho, numa estação estilo inglesa, que distribui o público. Temos o Parque da Ciência, Ciência em Cena, a Exposição (sempre com um tema diferente relacionado à saúde). No castelo o visitante

Numa das exposições, réplica gigante do mosquito transmissor da dengue

Peça teatral no roteiro da visita guiada

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entra em contato com o passa-do e o presente. Lá estão a pre-sidência da instituição, setores administrativos e diversas salas de exposição do Museu da Vida.

As visitas são agendadas por telefone e o público também pode conhecer a Biblioteca, com obras raras, e a mesa de reuni-ões, onde sentavam Carlos Cha-gas e Oswaldo Cruz.

A histórica instituição abri-gou pesquisadores como Carlos Chagas, que ajudou a aca-bar com as epidemias de febre amare-la e varíola, que aterrori-zavam o Rio no início do século XX. Na atuali-dade, a Fio-cruz é uma referência na Medicina, no Brasil e no

mundo. Seu imponente castelo encanta e fascina o imaginário de adultos e crianças. Percorrer o enorme terreno da fundação é tarefa fácil e divertida a bordo do trenzinho que leva o visitan-te a todas as atrações. O local é arborizado e agradável, sendo uma excelente opção para fugir da confusão da cidade, mesmo estando bem no meio dela. Se-gundo Alessandro Machado, não é raro ver famílias aproveitando

do bom espaço para realizar ver-dadeiros piqueniques durante a visitação. Vale a pena conferir

Serviço:Avenida Brasil, 4.365, cam-

pus da Fiocruz, em Manguinhos (passarela 6 da via expressa). Vi-sitação: de terça a sexta, das 9h às 16h30, mediante agendamento. Aos sábados, visitação livre das 10h às 16h. Grátis. Informações e agendamento: 2590-6747.

Exposições e contação de histórias no castelo Construção é tombada pelo IPHAN

Museu da Vida inclui várias áreas temáticas

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personalidade

Lima Barreto de “Todos os Santos”

Quem faz o trajeto do subúrbio para o Centro do Rio e vice-ver-sa, principalmente de trem, pas-sa quase que despercebidamente por Todos os Santos, bairro corta-do pela Estrada de Ferro da Cen-tral do Brasil e localizado entre os bairros do Méier, Cachambi e Engenho de Dentro. Lá não há parada de trem desde os anos 60, quando a estação foi desativada. Por sua delimitação geográfica – dividido pela linha férrea com o trânsito dificultado entre am-bos os lados –, Todos os Santos é tradicionalmente residencial, com poucas áreas para lazer e um discreto comércio, voltado basi-camente para a população local.

Foi nesse simpático bairro, mais precisamente na Rua Major Mascarenhas, que viveu o escri-tor Afonso Henriques de Lima Barreto, mais conhecido como Lima Barreto. Jornalista, neto de escravos, que em sua obra de temática social privilegiou os

pobres, os boêmios e os arruinados. Também foi duro crítico dos privilé-gios desfrutados por mili-tares e famílias aristocrá-ticas da República Velha.

Afonso Henrique de Lima Barreto nasceu no

Rio de Janeiro no dia 13 de maio de 1881, sete anos antes de a Princesa Isabel assinar a Lei Áu-rea abolindo oficialmente a escravidão dos negros no Brasil. Filho de Joaquim Henriques de Lima Barreto e Amália Au-gusta, ambos mestiços e pobres, sofreu muito precon-ceito a vida toda.

O mula-to, vítima do racismo num Brasil que mal acabara de abolir ofi-cialmente a escravatura, ficou órfão de

mãe ainda criança. Teve oportu-nidade de boa instrução escolar e concluiu o curso secundário no conceituado Colégio Pedro II, no Centro do Rio, onde os estudan-tes eram, em sua maioria, oriun-dos da elite econômica. Por ser bom aluno, em 1897, foi admi-tido no curso de Engenharia da Escola Politécnica, no Largo de São Francisco, porém foi obriga-

Lima Barreto, na época da 1ª edição do Recordações do Es-

crivão Isaías Caminha (1909).

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Recordações do Escrivão Isa-ías Caminha, romance, 1909Aventuras do Dr. Bogoloff, humor, 1912Triste Fim de Policarpo Qua-resma, romance, 1915Numa e Ninfa, romance, 1915Vida e Morte de M. J. Gonza-ga e Sá, romance, 1919Os Bruzundangas, sátira polí-tica e literária, 1923Clara dos Anjos, romance, 1948Coisas do Reino do Jambon, sátira política e literária, 1956Feiras e Mafuás, crônica, 1956Bagatelas, crônica, 1956Marginália, crônica sobre folclore urbano, 1956Vida Urbana, crônica sobre folclore urbano, 1956

Obras de Lima Barreto

do a abandoná-lo em 1902 para assumir o sustento dos irmãos, já que seu pai havia enlouquecido. Data dessa época sua entrada no serviço público como copista na Secretaria da Guerra. O cargo, somado às muitas colaborações em diversos impressos, garantia-lhe algum sustento financeiro.

Em 1905, Lima Barreto passou a escrever para o jornal Correio da Manhã, noticioso de grande prestígio naquela época. Em 1909, publicou seu primeiro romance Recordações do Escrivão Isaías Caminha, que conta a trajetória de um jovem mulato, que, vindo do interior, sofre sérios preconceitos raciais. Em 1915, escreveu Triste Fim de Policarpo Quaresma, e, em 1919, escreve Vida e Morte de M.J.Gonzaga de Sá. Esses três ro-

mances apresentam nítidos traços autobiográficos do escritor.

Com uma linguagem descuida-da, suas obras são impregnadas de preocupação com os fatos histó-ricos e com os costumes sociais. Lima Barreto tornou-se uma espé-cie de cronista e um caricaturista que se vingava da hostilidade dos escritores e do público burguês. Poucos aceitavam seus contos e romances que revelavam a vida cotidiana das classes populares.

Com seu espírito inquieto e rebelde, e inconformado com a mediocridade, o jornalista Lima Barreto se entregou ao álcool. Suas constantes depressões, que o levaram a pelo menos duas in-ternações em hospícios, ajuda-ram a abreviar-lhe a vida. Morreu aos 41 anos em 01 de novembro de 1922, vítima de um ataque cardíaco. Coincidentemente era dia de Todos os Santos. Morreu em sua casa, na Rua Major Mas-carenhas, 46, na Zona Norte do Rio. Ele costumava chamar sua modesta residência de “Vila Qui-lombo”.

Combativo em denunciar as mazelas sociais e o racismo no país, Lima Barreto escreveu em seu diário íntimo: “É triste não ser branco.” O escritor só veio a ser reconhecido fundamental-mente para a Literatura Brasilei-ra após o seu falecimento. Mais da metade de seus livros tem pu-blicação póstuma. Em março de 2011, quase noventa anos após sua morte, a Prefeitura do Rio er-gueu um busto do escritor carioca na Rua do Lavradio no Centro da cidade para homenageá-lo.

Busto em sua homenagem na Rua do Lavradio, no Centro da cidade

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Sou da Penha 2canal aberto

Como eu ia dizendo, até ser interrompido pelo tiroteio no Alemão, pela metralhadora Lurdinha do Tenório Cavalcânti e pela Remington do Da-vid Nasser escrevendo “Penha, Penha, eu vim aqui me ajoelhar” — eu sou daquelas bandas. O vizi-nho da direita ensinava o papagaio a dizer “Casas da Banha” para concorrer ao prêmio na Discoteca do Chacrinha. O da esquerda recebia o espírito de Nero, o imperador de Roma, e só depois saía para trabalhar como engolidor de fogo no Largo da Ca-rioca. Acredite se quiser, dizia um programa da Na-cional tocando no resto da rua. Parece a Macondo, de García Márquez, a Penny Lane, do Paul McCart-ney. É a Vila da Penha que vai em todos nós. Pois eu nasci ali, num clima quente, duas quadras depois de onde estão estacionadas as tropas do Beltrame e um pouco para cá da quadra de ensaios do Bohêmios de Irajá. Apenas um morador sem importância da casa de pedra no meio do caminho entre a barraca que vendia maçã do amor no Parque Shanghai e o core-to de Vaz Lobo, do ano em que homenageou o Sput-nik. Uma moça de sarongue canta “Laranja da Bahia tem o umbigo de fora, por que é que você, Maria, escondeu o seu até agora?” — mas isso não vem ao caso. Sou da área, do pique-esconde, da cabra-cega, do pique-bandeira, do morto-vivo, do jogo da amarelinha e do terreiro do Seu Sete da Lira soltan-do fumaça pelo charuto. Sou da Penha Circular, do calor do cão, da baixada suburbana, um quinzinho qualquer fichado como dimenor pelo delegado Nél-son Duarte, da Invernada de Olaria, por ter pulado a roleta sem pagar o trem. Nada a declarar a não ser o de sempre. “Marraio, feridô sou rei.” Deus guarde o senhor delegado, com sua gomalina e terno bran-co. Era um dos homens de ouro do Esquadrão da Morte, um sujeito sobre o qual nada constava a não ser o fato de ir ao programa do Flávio Cavalcanti e

dizer “a polícia como um toldo”. Sou a tudo grato e tomei nota no caderno de caligrafia. Obrigado tam-bém ao padre de sotaque alemão que, ao ouvir o ba-rulho das crianças levantando para receber a hóstia consagrada na missa de domingo dizia: “Levantou a cavalaria.” A todos, peço bênção e saúdo com fi-gurinhas das balas Ruth, uma umbigada da mulata que me vai ao lado no bonde 98 (Irajá-Madureira) e o primeiro gole da que matou o guarda ao pé do balcão. A Penha ainda me serve de toldo, e, agora, numa gravação recente de Caetano Veloso para o mesmo baião de David Nasser, peço que ela traga “proteção para o meu lar”.

Eu sou aquele ali, moendo vidro na linha de trem para fazer cerol, aquele acolá colocando gilete na rabiola da pipa, e ainda aquele outro tomando uma colher de óleo de fígado de bacalhau para manter a memória sempre viva. É ela agora quem me conduz a bordo do 355 (Tiradentes-Madureira) até a Adega d’Ouro, em Vicente de Carvalho, para comer uma posta de bacalhau. É a memória quem retrocede até a cancela da estação de Irajá, passa pelo Cacique de Ramos, o Bafo da Onça, de Oswaldo Nunes, e sobe na calçada da Carmela Dutra, onde a norma-lista me diz que precisa de um menino para lhe uri-nar nos pés e curar uma frieira. Salve a Medicina suburbana, o emplastro Sabiá e o xarope de alcatrão de São João da Barra. Se não me falha a memória, e salve também a ajuda do Biotônico Fontoura, eu

Nova viagem afetiva ao cenário da guerra carioca

Joaquim Ferreira dos SantosFoto: Divulgação

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sou aquele outro, no canto do vídeo, crente nas ora-ções de Júlio Louzada ao Menino Jesus de Praga e ao mesmo tempo agradecido à cozinheira, neta de escravos, fã de Anísio Silva, por ter curado uma es-pinhela caída com banho de arruda e reza forte. Eu sou da Vila da Penha, da Penha sempre a me Circu-lar, e tenho como mantra as canções “Guará, Guará, melhor refrescante não há” e “O meu coração é só de Jesus, a minha alegria é a santa cruz”, músicas que dedico àquela moça de saia de tergal plissada e blusa banlon vinho, comendo algodão-doce no ban-co à esquerda de quem entra no Parque Ari Barroso.

Eu morei ali, dá para ver direitinho no Google Earth, um pouco mais para cá da fábrica de biscoi-tos Piraquê, um pouco para lá da Lira do Xopotó no coreto do Jardim do Méier, exatamente ali na-quele quarto escuro onde o menino está soltando da caixa de fósforos os vaga-lumes que caçou na rua. A noite daquele quarto piscava mais bonita que as estrelas no céu de Van Gogh, mais irreal

que todos os fogos do réveillon de Copacabana, mais frenética que todos os neons de Times Squa-re, mas ele só saberia disso muitos anos depois e só não seria tarde demais porque arquivou a cena bem guardada graças aos bons serviços prestados à memória da criança suburbana pela gemada de Caracu batida com ovo, canela e noz-moscada. De vez em quando, os vaga-lumes ainda piscam nos dedos do menino, e isso faz com que ele se lembre do cheiro de capim molhado do Largo do Bicão, do medo de morrer de vento encanado, do prazer de um pião rodando na palma da mão, ou de al-guma menina perguntando se uva, pera ou maçã — e ele escreve longas histórias no jornal, às ve-zes tão mais compridas que a estrada de Brás de Pina, às vezes tão mais tristes que as rolinhas que ele prendia no alçapão do quintal. É o Bope das forças afetivas que ele desenvolveu e para sempre carrega, em caixas de fósforos Olho, Pinheiro ou Beija-Flor, no bolso da japona. É o que o menino pode fazer pelos vizinhos.

Quer evocar o guarda-noturno, os sacos de doce de Cosme e Damião, o jacaré que dormia embaixo da sua cama, o vendedor de Chica Bon e mais as armas de Jerônino, o herói do sertão, para que a memória dos bons dias ajude a apagar as balas traçantes e faça acender de novo o inesquecível pisca-pisca dos vaga-lumes no meio da noite da Penha Circular.

Igreja da Penha

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ACONTECE

A presidente Dilma Rousseff esteve na Zona Norte em 1º de junho onde participou da inaugu-ração do BRT Transcarioca, corredor de ônibus expresso que liga o Aeroporto Internacional Tom Jobim à Barra da Tijuca passando por 27 bairros.

Vale a pena conferir a Roda de Choro que o Grupo 100% Suburbano promove todo terceiro domingo do mês na Pça. Ramos Figueira, em Olaria, reduto de Pixinguinha. O objetivo é valorizar o gênero musical genuinamente carioca. No dia 21 de abril de 2014, aconteceu mais uma edição do “Trem do Choro”, que foi da Central do Brasil a Olaria, abrindo a Semana Nacional do Choro. O homenageado foi o músico Hamilton de Holanda. A Roda de Choro começa às 15h e basta levar um quilo de alimento não perecível.

Grupo 100% Suburbano promove Roda de Choro em Olaria

Com 39 km de extensão, o percurso tem 47 esta-ções e cinco terminais de integração. Em Madurei-ra, Dilma foi recebida pela Velha Guarda da Por-tela e do Império Serrano, tradicionais escolas de samba da região.

Inauguração da Transcarioca em Madureira

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Foto: Jeanine Gall

No último dia 10 de maio, uma das melhores ro-das de samba da Zona Norte, o Baluartes de Turiaçu, comemorou 15 anos de existência. A festa foi na Are-na Carioca, dentro do Parque Madureira. Batizada por Tia Doca, saudosa pastora da Portela, a roda de samba acontece todo primeiro domingo do mês, sob o comando de Cizinho, Lelei Sabino e Paulo Omar. Estrada do Otaviano, 271, a partir das 17h com entra-da franca.

Baluartes de Turiaçu – 15 anos de samba de qualidade

E mais uma vez na história do futebol os olhos do mundo estarão voltados para o nosso Mara-canã e a Zona Norte será por um dia a capital do mundo. A grande final da Copa de 2014 será em 13 de julho. Esperamos por 64 anos desde 16 de julho de 1950. Na ocasião, mesmo sendo sede e favorito, o Brasil entregou a taça ao Uruguai, no episódio que ficou conhecido como “Maracana-ço”, num dos maiores reveses da história do fu-tebol. O placar foi 2 x 1 e as lembranças não são as melhores. Queremos uma nova história pra contar, mas isso já é assunto para nossa próxima edição. Boa sorte, Brasil!

Zona Norte, Capital do Mundo

Foto: Renan Bacellar - Café das 4

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Ingredientes:

2kg. de bacalhau2kg. de batata ½ cabeça de alho 1kg. de cenoura 2 pés de brócolis 1 kg. e ½ de cebolas pequenas 1 cebola grande 2 tomates 6 colheres (de sopa) de massa de tomate6 ovos 500g. de azeitonas pretas sal a gosto

BACALHOADATia Surica da Portela

gastronomia

O bacalhau deve ser colocado de molho de um dia para o outro, trocando-se a água ao me-nos quatro vezes para retirar o excesso de sal .

No dia seguinte, coloque o bacalhau para ferver em uma panela com água. Depois da fervura, retire as cascas e as espinhas grandes do bacalhau e separe em pedaços médios.

Na mesma água em que o bacalhau foi fer-vido, coloque as batatas para cozinhar. Quan-do estiverem cozidas, retire da panela e re-serve. Faça o mesmo com as cenouras, com as cebolas e, por fim, com o brócolis cortado pelos talos.

Coloque para cozinhar 6 ovos. Quando es-friarem, retire as cascas e corte em fatias. Re-serve.

Arrume os pedaços de bacalhau e os de-mais ingredientes em uma ou duas travessas ou tabuleiros grandes. Tome cuidado para que as gemas não se separem das claras dos ovos. Distribua as azeitonas pelas travessas.

Em uma panela média, coloque um pou-co de óleo e deixe dourar ½ cabeça de alho (bem socado) e uma cebola grande picadi-nha. Acrescente dois tomates bem picados e um pouco de massa de tomate até formar um molho. Adicione um fio de vinagre de vinho e uma pitada de sal.

Despeje esse molho quente por cima da ba-calhoada já arrumada nas travessas e sirva.

Acompanha arroz branco.Coloque na mesa um bom azeite.

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