44
15 O 3 Fases de um Empreendimento e Aspectos Ambientais empreendimento habitacional pode ser dividido em três fases distintas: planejamento, construção e ocupa- ção, as quais estão subdivididas em etapas, conforme apresentado no Quadro 2. Quadro 2 – Fases e etapas de um empreendimento habitacional Fases Etapas Identificação da demanda Planejamento Seleção de áreas Projeto Terraplenagem Construção Edificação e demais obras Bota-fora Paisagismo Ocupação Uso Ampliação Em situações nas quais haja apenas uma área disponível, não há o estudo de al- ternativas para seleção de glebas e terrenos. Portanto, o planejamento do empreendimen- to estaria voltado à etapa de projeto para o local apresentado. Caso se pretenda somente medidas e ações corretivas em uma ocupação já instalada, os trabalhos corresponderiam apenas à fase de ocupação. Não se contemplou a fase de desativa- ção do conjunto habitacional, pois tal con- dição é pouco comum e menos relevante nos empreendimentos de interesse social no Bra- sil. No entanto, essa fase precisa ser consi- derada em situação específica de remoção em favelas e outros tipos de habitação sub- normal, na qual deve ser implementado um projeto urbanístico na área desocupada. Apresentam-se, a seguir, as atividades estimadas como mais significativas em cada uma das fases do empreendimento, embora possam ser eventualmente reconhecidas ou- tras atividades na modificação do meio am- biente, cuja situação particular não foi previs- ta, devido ao tipo de projeto adotado ou a condições ambientais bastante específicas de sua localização. 3.1 PLANEJAMENTO O planejamento de conjuntos habita- cionais produzidos pelo setor público segue, em uma situação típica, uma determinada

Fases de um Empreendimento e Aspectos · PDF file17 CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS Um dos fundamentos que permitirão uma abordagem ambiental integrada,

Embed Size (px)

Citation preview

15

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

O

3

Fases de umEmpreendimento eAspectos Ambientais

empreendimento habitacional podeser dividido em três fases distintas:planejamento, construção e ocupa-

ção, as quais estão subdivididas em etapas,conforme apresentado no Quadro 2.

Quadro 2 – Fases e etapas de um

empreendimento habitacional

Fases Etapas

Identificação da demanda

Planejamento Seleção de áreas

Projeto

Terraplenagem

ConstruçãoEdificação e demais obras

Bota-fora

Paisagismo

OcupaçãoUso

Ampliação

Em situações nas quais haja apenasuma área disponível, não há o estudo de al-ternativas para seleção de glebas e terrenos.Portanto, o planejamento do empreendimen-to estaria voltado à etapa de projeto para olocal apresentado. Caso se pretenda somente

medidas e ações corretivas em uma ocupaçãojá instalada, os trabalhos corresponderiamapenas à fase de ocupação.

Não se contemplou a fase de desativa-ção do conjunto habitacional, pois tal con-dição é pouco comum e menos relevante nosempreendimentos de interesse social no Bra-sil. No entanto, essa fase precisa ser consi-derada em situação específica de remoçãoem favelas e outros tipos de habitação sub-normal, na qual deve ser implementado umprojeto urbanístico na área desocupada.

Apresentam-se, a seguir, as atividadesestimadas como mais significativas em cadauma das fases do empreendimento, emborapossam ser eventualmente reconhecidas ou-tras atividades na modificação do meio am-biente, cuja situação particular não foi previs-ta, devido ao tipo de projeto adotado ou acondições ambientais bastante específicas desua localização.

3.1 PLANEJAMENTO

O planejamento de conjuntos habita-cionais produzidos pelo setor público segue,em uma situação típica, uma determinada

16

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

seqüência de etapas (Quadro 2): tem, porinício, a identificação da demanda por habita-ções, com definição de metas numéricas dehabitações a construir, sucedida por seleçãode área (ou de áreas) para a implantação doempreendimento e finalizando com a elabo-ração de projetos. Em relação à conduçãodesse processo pelo setor privado, os progra-mas desenvolvidos costumam ser mais res-tritos e a área já previamente definida.

Nessa primeira fase, tende a não havermudanças nos processos originais do meio,porém nela se definem as alterações ambien-tais que ocorrerão durante a construção e aocupação do empreendimento. No Brasil, afase de planejamento tem sido realizada deforma insatisfatória, principalmente naquelesempreendimentos destinados à população debaixa renda.

Resultam basicamente em adaptaçõesdos terrenos a um projeto preconcebido, exi-gindo muitas vezes um volume grande decortes e aterros, ao invés de orientações ur-banísticas para elaborar projetos de acordocom a área determinada. Como as vertentesmenos inclinadas estão pouco disponíveis,tanto com ocupação já instalada quantoconstituindo reservas de especulação imo-biliária, normalmente sobram os piores ter-renos, que conduzem a impactos ambientaismais expressivos, ou áreas situadas nos li-mites urbanos, desprovidas da infra-estru-tura necessária.

Reurbanização de favelas pode deman-dar, também, a implementação de conjuntos

habitacionais, na maioria das vezes vertica-lizados, para reassentamentos (fora da áreada favela) ou relocação (nos limites da pró-pria favela). Ambas as situações apresentamcaracterísticas peculiares, mais complexas doque de outros empreendimentos de interessesocial, principalmente em quatro aspectos:

1. No estabelecimento de condições, prin-cipalmente de apropriação dos espa-ços exteriores, diferentes das instituídaspela legislação e normas urbanísticas eambientais.

2. Nas relações às vezes conflituosas com osmoradores, durante remoções provisóriaspara relocações, ou relativas à localizaçãodo reassentamento, tendo como referênciaas residências de origem, o que normal-mente implica em separação de ligaçõesfamiliares fundamentais para o cotidianodaquela população, além de mudanças paralocais isolados com deficiência de infra-es-truturas e serviços disponíveis anterior-mente, ou mesmo dificultando o novo aces-so aos locais de trabalho e estudo.

3. No reconhecimento da realidade especialdos conjuntos destinados à relocação, bus-cando aprovar medidas legais que viabili-zem sua regularização urbanística, fun-diária e técnica.

4. Na participação do Poder Público na gestãocontinuada do novo empreendimento, es-tabelecendo responsabilidades nas açõesde operação, manutenção, melhoria e alte-ração dos serviços públicos urbanos.

17

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Um dos fundamentos que permitirãouma abordagem ambiental integrada, nessase demais situações de empreendimentohabitacional de interesse social, trata da con-cepção da política habitacional, que deve ne-cessariamente estar inserida na política ur-bana, mais global. Assim, o empreendimentohabitacional deve partir, desde seu planeja-mento, de uma ação coordenada entre ór-gãos municipais (como aqueles ligados às se-cretarias de obras e meio ambiente, defesacivil, Poder Judiciário), incluindo, preferen-cialmente, diferentes esferas de governo es-tadual e federal, além do setor privado e or-ganizações não-governamentais. Apresen-tam-se, a seguir, as etapas usuais da fase deplanejamento.

3.1.1 Identificação da Demanda

Excetuando situações de reurbanizaçãode favelas, que têm se mostrado prioritáriasem ações municipais, a etapa de identificaçãoda demanda inicia-se pela divulgação deeventual programa habitacional a ser imple-mentado pelo Poder Público. Abre-se, parale-lamente, a inscrição de interessados em obtercasa própria em um conjunto habitacional.

Ao se inscrever, o interessado geral-mente preenche um formulário, onde devefornecer informações, tais como renda, com-posição familiar, situação de emprego, situa-ção atual de moradia. De posse de um con-junto de fichas desta natureza, o municípioestaria teoricamente apto para caracterizarseu déficit habitacional, não só no restrito

âmbito quantitativo como também no quediz respeito a condições qualitativas.

Entretanto, como as fichas usuais selimitam basicamente à obtenção de informa-ção para identificar metas numéricas de habi-tação a construir, os futuros moradores nor-malmente não participam nas decisões dosprogramas providos pelo setor público, a nãoser, eventualmente, em casos envolvendoconstrução de conjuntos por mutirão e ajuda-mútua. Assim, tanto o local onde se situa oconjunto habitacional, como o tipo de unida-de, não se encontram efetivamente em con-sonância com as reais necessidades dosusuários.

Se, teoricamente, a identificação dediferentes perfis na demanda deveria influirna caracterização do programa a implemen-tar, a tendência é a de se observar, na prática,o estabelecimento de programas habitacio-nais bastante homogêneos e padronizados.Tais programas apresentam, geralmente,magnitude bastante inferior à própria de-manda e são caracterizados por concentraçãoespacial, desconsiderando questões de loca-lização associadas às necessidades e origemdos moradores.

Os tipos de edificações empregadostambém seguem padrões preestabelecidos.Em determinados municípios, empregam-seapenas prédios de apartamentos de doisdormitórios, em gritante dissonância com avasta gama de composições familiares pre-sentes; em outros municípios, utilizam-seapenas casas térreas geminadas ou isoladas,

18

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

evolutivas (que permitem ampliações),podendo atingir até três ou quatro dormitó-rios, mesmo que destinadas a um único mo-rador. Tais fatos não permitem estabelecer,hoje, uma clara identificação de vínculos en-tre demanda e oferta.

Além disso, os programas muitas vezesescapam, pelo menos parcialmente, ao âm-bito de decisão das administrações munici-pais, passando a se concentrar na esfera es-tadual ou mesmo na federal. Conseqüente-mente, muitas decisões são tomadas semapreciar, na sua justa medida, a natural he-terogeneidade que se associa à demanda decada município. Neste quadro, ao futuromorador acaba se associando, pelo lado doagente promotor, uma imagem de figura ab-solutamente anônima, que, juntamente cominúmeras outras famílias anônimas, compar-tilhará um espaço da cidade.

O anonimato torna-se ainda mais pa-tente quando as unidades são sorteadas en-tre os diversos pretendentes. Este proce-dimento tem sido adotado pelos programasgovernamentais, como os da Companhia deDesenvolvimento Habitacional e Urbano doEstado de São Paulo — CDHU, para novosconjuntos habitacionais paulistas. Visandoprincipalmente a transparência na distribui-ção de habitações, o sorteio pretende de-monstrar a isenção dos governantes no pro-cesso, eliminando as suspeitas, pelo menosno âmbito local, de favorecimentos políticos.

Contudo, se, por um lado, o processo émais transparente, comparado a situações

anteriores, por outro acaba confirmando, in-felizmente, o quadro de inadequações dosconjuntos habitacionais oferecidos. Assim, éfortemente desejável que, nesse tipo de em-preendimento, se consiga estabelecer víncu-los preliminares entre os futuros moradores,para assegurar, no futuro, um espírito co-munitário. Com um sorteio totalmente alea-tório, dificilmente será estabelecida uma re-lação sinérgica entre os futuros moradores,fundamental para viabilizar uma comunidadeconsciente e preparada para administrar todaa gama de problemas que se instaura na fasede ocupação dos conjuntos.

A prática de sorteio deve ser mantidano sentido de garantir a lisura do processo.Porém, deve ser feita de maneira dirigida paramelhor atender casos específicos, como, porexemplo, aqueles relacionados com pessoascom deficiências físicas ou idade avançada,privilegiando esses moradores para ocupaçãodo andar térreo. As informações de neces-sidades especiais de moradores devem sertratadas pelos futuros usuários do empre-endimento habitacional, estabelecendo crité-rios para o sorteio e contribuindo para a inte-gração do grupo.

Uma das formas alternativas que temsido apresentada é o desenvolvimento deprogramas de orçamento participativo dahabitação, onde as famílias são organizadasem núcleos que discutem priorização e me-canismos de atendimento do Poder Públicona construção de novas moradias. Tais pro-gramas devem avançar com a participação

19

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

dos futuros moradores nas demais etapas doplanejamento e nas fases de construção eocupação do empreendimento.

Nos empreendimentos conduzidos pelosetor privado, o futuro morador tende, emgeral, a ser também anônimo, e as soluçõesadotadas nos conjuntos igualmente baseiam-se em padronização pronunciada, não per-mitindo estabelecer elo entre necessidadesdos diferentes usuários e “produtos” ofere-cidos. Esta característica se quebra apenasem casos mais particulares de determinadasassociações privadas — as cooperativas —que circunstancialmente conseguem imprimirum tom pouco mais individualizado, em al-guns raros conjuntos.

Assim, as conseqüências ambientais daidentificação inadequada da demanda corres-pondem a impactos negativos ao segmentoantrópico relativo ao morador. Para evitarproblemas futuros, recomendam-se os se-guintes procedimentos nessa etapa:

� avaliar as necessidades dos fu-turos moradores, considerandoa sua origem, composição fami-liar e localização de suas ativida-des de trabalho e educação; e

� criar mecanismos de participa-ção dos usuários nas outras eta-pas de planejamento.

A seguir, discorre-se sobre as principaisquestões que devem ser tratadas nas duasetapas seqüentes do planejamento, de modoa que possam ser reportadas também paraas demais fases: a primeira trata da seleçãode áreas disponíveis, e a segunda correspon-de à escolha do tipo de projeto. Entretanto,estes procedimentos não são estanques, ouseja, durante a seleção da área do empre-endimento, o tipo de projeto inicialmente pro-posto deve ser retomado, estando sujeito amodificações ou adaptações de acordo comas alternativas de terreno existentes.

3.1.2 Seleção de Áreas

Da mesma forma que a etapa de iden-tificação da demanda, a seleção de áreas temsido, no Brasil, realizada de forma precária.É prática comum, na fase de escolha de locaispara instalação de conjuntos habitacionais,a indicação a priori da área destinada à ocu-pação, sem análise prévia de alternativas.

Assim, por exemplo, vazios urbanos, jádotados de infra-estrutura, são relegados anteo seu espaço disponível, nem sempre condi-zente com a prática estabelecida de conjuntoshabitacionais de grande porte. Argumentan-do-se da necessidade de busca de supostaseconomias de escala nos empreendimentos,os conjuntos estão geralmente situados naperiferia urbana, nos quais o custo para o es-tabelecimento da infra-estrutura necessária,relativamente muito alto, não é contabilizadoem seu orçamento. Isso sem levar em conta

20

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

ainda os custos das reparações ambientaisdecorrentes da degradação.

Acrescenta-se a isso um outro aspectoque começa a se ressaltar no processo de es-colha de áreas, sobretudo em médias e gran-des cidades. Trata-se do fato de que, assimcomo ocorre em relação à habitação, há tam-bém uma crescente dificuldade, ou desaten-ção, na definição de áreas para disposição deresíduos sólidos, o que tem feito de grandesterrenos desocupados um atrativo para o lan-çamento inadequado e irregular de lixo.

Com o tempo, dada a crescente escas-sez de imóveis com preços baixos, essas áreassão valorizadas e passam a despertar tambémo interesse para outros fins, tais como o deprojetos habitacionais. Somam-se a esse con-texto, os terrenos outrora ocupados por indús-trias, cujo reuso para habitação é igualmentecrescente. Para tanto, requer uma investiga-ção prévia sobre os níveis de contaminaçãopresentes no solo e nas águas superficiais esubterrâneas do local, o que, aliada à execu-ção de prováveis medidas de descontamina-ção, contribui para elevar o custo do projeto.

É importante destacar que, no caso dasintervenções habitacionais conduzidas peloPoder Público, tende a existir um espectrobem mais amplo de possibilidades de locali-zação de conjuntos habitacionais no tecidourbano, permitindo, por exemplo, a opçãopor conjuntos mais pulverizados, com a uti-lização de vazios urbanos até mesmo maiscentrais, envolvendo-se aí também terras pú-blicas ociosas. Mesmo que esses vazios ur-

banos possam apresentar terrenos mais va-lorizados, seriam evitados, assim, maioresinvestimentos em infra-estrutura e os pró-prios efeitos negativos que se associam aomodelo “grandes conjuntos na periferia” que,infelizmente, prevalece.

Terrenos declivosos relegados, no pro-cesso de urbanização, quase sempre dão es-paço ao nascimento de assentamentos infor-mais (favelas), com freqüente instauraçãode problemas sociais, ambientais e de segu-rança geotécnica. Assim, em situações espe-cíficas de grandes centros urbanos, com defi-ciência habitacional e de áreas disponíveis,a rigor, seria até mesmo desejável que em-preendimentos habitacionais de interessesocial fossem também implantados em vaziosurbanos com declividades até mesmo supe-riores aos 20% usualmente adotados comoreferência. Essa condição, no entanto, só de-ve ser aceita desde que utilizando tipologiasurbanísticas e de edificações adequadas, como Poder Público assumindo o eventual au-mento de custo que obras em tais condiçõespossam requerer.

Ainda que os terrenos sejam escolhidoscom algum critério no que diz respeito àsdeclividades presentes, tem-se percebidoque, ante as limitadas tipologias de edifica-ções em uso, há, assim mesmo, necessidadede extensas movimentações de terra. Estefato se agrava, naturalmente, em regiões derelevo mais acidentado, quando os volumesde terra a movimentar podem assumir di-mensões ainda maiores.

21

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Para ilustrar a forte tendência de loca-lização de conjuntos habitacionais nos limitesda área urbana, nos empreendimentos pro-movidos pelo Poder Público pode-se men-cionar resultados de pesquisa desenvolvidapelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas doEstado de São Paulo — IPT entre 1996 e1998, em 50 conjuntos habitacionais situadosem diversos municípios do Estado de SãoPaulo, construídos entre 1990 e 1992 pelaCompanhia de Desenvolvimento Habitacionale Urbano do Estado de São Paulo — CDHU(IPT, 1998). Nesse estudo, constatou-se que,dos 50 conjuntos estudados, apenas 9 si-tuavam-se em áreas com características es-sencialmente urbanas. Dos restantes, 35 lo-calizavam-se em regiões no limite urbano-rural, além de 6 constituindo corpos isoladosda formação urbana do município.

Além da tendência de situação nos limi-tes de áreas rurais, em locais originalmentesem infra-estrutura, notou-se que, em 18 dos50 conjuntos estudados, havia nas proxi-midades fatores potencialmente prejudiciaissob o ponto de vista ambiental. Entre essesfatores, destacam-se minerações, aeropor-tos, ferrovias, pólos industriais poluentes,áreas rurais sujeitas a freqüentes queimadas,lixões e estações de tratamento de esgotos.

Assim, para a localização de novos con-juntos habitacionais, deve-se observar o pla-nejamento urbano que, em muitos municí-pios, são traduzidos em planos diretores, de-finindo a priori a localização de áreas desti-nadas à implantação de habitações de inte-

resse social. Mesmo que a tendência seja ade seleção de áreas “favoráveis”, sob o pontode vista do rígido zoneamento que tem ca-racterizado o planejamento urbano no Brasil,o mesmo pode não ocorrer sob o ponto devista ambiental, em sua acepção mais ampla.

Não é raro, portanto, o choque de al-guns requisitos ambientais com a legislaçãode cunho urbanístico. Pela legislação urbana,é possível construir, por exemplo, imensosloteamentos ou conjuntos habitacionais, emque cada palmo de terreno legalmente edifi-cável é aproveitado, sem se levar em contao resultado do ambiente construído que terálugar. Ainda que se intua que o resultadoambiental poderá não ser bom, não se dispõede elementos inquestionáveis de julgamentoe que permitam conter tais projetos porintermédio de leis ambientais. Exemplifican-do, considere-se que numa determinada re-gião da cidade, onde se tenciona implementarum empreendimento habitacional de inte-resse social, possibilite-se, por meio do pla-nejamento municipal, a existência de indús-trias inconvenientes ou perigosas. Isto con-tra-indicaria a implantação de um conjunto.

Portanto, o tratamento ambiental ultra-passa as soluções pontuais de um empreen-dimento. Insere-se em um contexto maiorrelacionado à política urbana, que deve orien-tar os aspectos a serem considerados no em-preendimento.

Apresentam-se, a seguir, as principaisquestões tratadas durante a seleção de áreas,na fase de planejamento de um empreendi-

22

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

mento habitacional, para o estabelecimentode requisitos de natureza urbanística e ava-liação ambiental da localização dos conjuntos.

3.1.2.1 Identificação de problemas

ambientais no local e arredores

Como referido anteriormente, constata-se que muitos conjuntos habitacionais jáinstalados situam-se em locais contaminadospor usos anteriores ou localizam-se em áreaspróximas a fontes notáveis de problemasambientais.

Para não se incorrer no primeiro caso,tem-se tornado cada vez mais necessária ainvestigação da ocupação anterior da área,ou seja, o levantamento de seu passivo am-biental. Caso o terreno tenha sido utilizadopara disposição de resíduos, ou mesmo, te-nha sido ocupado por indústria, com possi-bilidades de contaminação do solo e daságuas superficiais e subterrâneas, a situaçãorequer uma investigação prévia.

A avaliação do passivo ambiental sub-sidia e orienta os levantamentos dos níveisde contaminação presentes, cujos resultadosservirão para indicar medidas corretivas, senecessárias, ou mesmo inviabilizar econo-micamente o local. Caso contrário, as con-seqüências do problema atingirão os futurosusuários, bem como os responsáveis peloempreendimento. No caso do empreendedor,além dos diversos aspectos de responsabili-dade civil, existe a necessidade de descon-taminação do local. Cabe destacar que há

tendência internacional de que o próprio fi-nanciador seja considerado como co-respon-sável, juntamente com o empreendedor.

No segundo caso, de localização emáreas próximas a fontes notáveis de proble-mas ambientais, é necessária a verificaçãoda ocupação circunvizinha, tais como lixões,aeroportos, ferrovias, minerações e indús-trias poluentes. Outros problemas, menos co-nhecidos ou divulgados, passam hoje tam-bém a se incorporar paulatinamente às preo-cupações na localização de habitações. É ocaso de efeitos de campos magnéticos gera-dos por linhas de transmissão de energia elé-trica e de telefonia, que têm sido associadosa disfunções orgânicas em seres vivos. Alémdesses, destacam-se processos de meio físicodeflagrados em áreas vizinhas e com possi-bilidade de afetar a área do empreendimento,tais como erosões, assoreamentos e insta-bilizações em taludes.

Os locais com problemas apresentam di-ferentes graus de contaminação ou raios deinfluência, cuja aferição usualmente remete aperegrinações por diversos órgãos e institui-ções, sendo que alguns podem ser neutraliza-dos com expedientes economicamente acei-táveis, outros não. No que diz respeito a fontesde poluição do ar, as condições de clima localpodem fazer com que até mesmo fontes rela-tivamente distantes exerçam influência am-bientalmente negativa sobre o conjunto. Istoconduz a estudar, por exemplo, a relação fontepoluente/conjunto habitacional, considerando-se os ventos dominantes na região.

23

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Esse grupo de problemas ambientais nolocal e entorno do empreendimento, que de-vem ser avaliados, constitui as situações derisco. Considerou-se como risco a relação en-tre possibilidade de ocorrência de um pro-cesso e suas conseqüências socioeconômicaspotenciais. Assim, o tratamento das situaçõesde risco deve resultar da conjugação entrezonas de suscetibilidade a determinados pro-cessos do meio físico e a ocupação da áreacom possibilidade de ser atingida.

Embasado neste raciocínio, na seleçãode área para um empreendimento habitacio-nal deve-se avaliar as condições de estabi-lidade dos terrenos, determinando, para cadaalternativa, a tipologia e a suscetibilidade dolocal aos processos que possam levar à ocor-rência de danos socioeconômicos, e as conse-qüências potenciais e graus de risco asso-ciados às diferentes zonas de suscetibilidade.

Para identificar situações de risco oufontes de problemas que contra-indiquem aimplantação do conjunto na área ou que ne-cessitem de tratamento prévio, sugerem-seos seguintes procedimentos:

� pesquisar a região destinada àimplementação do conjunto,identificando eventuais fontespróximas de problemas ambien-tais e levantar o passivo ambien-tal da área destinada ao empre-endimento;

� investigar as situações de risco,analisando a suscetibilidade aprocessos do meio físico, da áreaescolhida para o empreendimen-to, utilizando informações e dadosbásicos, tais como, geologia, so-los, declividades, pluviometria ehistórico de eventos;

� realizar mapa de risco potencial,considerando a inserção do em-preendimento na área;

� analisar ventos dominantes e ve-rificar se estes não tendem a tra-zer emissões atmosféricas prove-nientes de lixões, indústrias, la-goas de tratamento de esgotos,dentre outros, mesmo os relati-vamente distantes;

� identificar a possibilidade e custode eliminação das fontes próxi-mas ou dos níveis de contamina-ção da área do empreendimento,mediante expedientes de reco-nhecida eficácia técnica;

� no caso de impossibilidade téc-nica ou econômica de eliminaçãode risco na área destinada aoempreendimento, ou de atenua-ção aceitável de seus efeitos, con-tra-indicar a implantação do con-junto no local; e

24

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

estanque, impermeável às outras funções dacidade, que se adota desde o surgimento dosdenominados bairros-dormitórios. Torna-sedesejável maior mescla de funções em ummesmo setor da cidade, o que, por um lado,favorece um desenvolvimento urbano maisequilibrado, embora, por outro lado, dificultea administração de conflitos entre usos.

Em situação inversa da apresentadaanteriormente, de possibilidade de problemasambientais no local destinado ao empreen-dimento ou no seu entorno, na seleção deáreas deve-se considerar conflitos que podemocorrer com a implementação do empreen-dimento. Tais conflitos raramente são consi-derados na escolha de uma área para umempreendimento habitacional.

Dois fatores determinantes de even-tuais conflitos merecem estudos mais de-talhados:

1. A potencialidade da área para outros usos.

2. Os reflexos da urbanização em ocupaçõesjá consolidadas, tais como reservatóriopara abastecimento d’água ou geração deenergia elétrica, unidades de conservação,olericulturas ou “cinturões verdes” deabastecimento hortícola.

Uma das formas de evitar ou reduzirconflitos com outros usos já existentes nolocal é proporcionar a interação dos mora-dores do conjunto habitacional com ativida-des pertinentes àquelas dos arredores. Porexemplo, no caso de existência de um parque

� no caso de fontes neutralizáveis,providenciar e documentar com-promisso com a eliminação, ou deatenuação aceitável de seus efei-tos, identificando os níveis a obter,os prazos e os responsáveis pelaexecução e fiscalização.

3.1.2.2 Avaliação da compatibilidade

ambiental com outros usos

O denominado “urbanismo moderno”caracterizou-se por uma forte setorização dacidade, dissociando funções e baseando-se nacirculação. Tal concepção tem sido hoje ques-tionada, tendo em vista um comportamentoespontâneo bastante diferente no desenvol-vimento das cidades, além da observação devantagens concretas que ocorrem com maiormescla de funções urbanas em uma mesmaárea ou região, dentre as quais se destacam:

a) possibilidade de redução de deslocamentosintra-urbanos, com a localização, em mes-ma área ou região da cidade, ou em áreasou regiões vizinhas, de setores habitacio-nais e de atividades geradoras de emprego;e

b) uso local mais intensivo e menos anônimodos espaços públicos, favorecendo atémesmo aspectos de segurança patrimoniale pessoal.

Não deve mais ser mantida a visão sim-plista e incondicional do setor habitacional

25

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

municipal ou outro tipo de unidade de con-servação vizinho, pode-se estabelecer pro-gramas de educação ambiental e atividadeseconômicas com emprego de moradores, deforma a integrá-los e torná-los co-respon-sáveis na fiscalização e manutenção da área.

Também, a área objeto de estudo parao empreendimento habitacional pode englo-bar reservas minerais de grande importânciasocioeconômica para o município ou para aregião. Essas reservas teriam seu aproveita-mento impossibilitado na medida em que, umavez implementado o empreendimento, nãoseria mais possível o desenvolvimento de umaatividade de mineração. Por este motivo, epara evitar conflitos, inclusive de natureza ju-rídica, convém que se analise, também, aeventual oneração da área em estudo comrelação aos títulos minerários. Pelo fato de osminerais serem bens da União, distintos dapropriedade do solo, a oneração da área ocor-re em outra instância (atualmente no Departa-mento Nacional da Produção Mineral – DNPM),e não nos cartórios de registros de imóveis.

Na seleção de áreas para empreendimen-tos habitacionais, uma estratégia importantepara evitar o agravamento desses fatores gera-dores de conflitos é a consideração da existênciaprévia de minerações em operação ou em de-senvolvimento (fase de pré-operação), evitan-do-se, assim, a proximidade das futuras mora-dias com essas atividades. Em contrapartida,áreas já utilizadas pela mineração, desde quecorretamente estabilizadas pela adoção de me-didas compatíveis de recuperação, podem se

constituir em localizações para empreendi-mentos habitacionais.

Outra questão essencial na definição dolocal para o empreendimento é de naturezasocioeconômica, política e cultural, referindo-se à legislação que pode impor restrições deuso. Trata-se das leis sobre gestão urbana,meio ambiente, aproveitamento de recursosnaturais, tais como hídricos, minerais e paisa-gísticos, e outras legislações que têm sido cria-das e intensamente modificadas nas décadasmais recentes por meio de novas leis, decre-tos, medidas provisórias, portarias e resoluções.

Assim, sob o ponto de vista ambientalurbano, torna-se desejável alguma mescla defunções, desde que não se configurem con-flitos notáveis de uso do solo. Para assegurarque os usos do solo previstos para a regiãopropiciem interações de forma a não afetar aqualidade ambiental e a dinâmica do conjunto,recomendam-se os seguintes procedimentos:

� estudar documentação referenteao planejamento da área/região,contemplando:

• plano diretor do município;

• planos de desenvolvimento es-pecíficos para a área/região; e

• potencialidade mineral, comanálise de eventual oneração daárea em relação aos títulos mi-nerários nos órgãos competen-tes (requerimentos de pesquisae lavra);

26

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

municipais, estaduais e federais, que às vezessão ignoradas.

a) Sistema viário

A conexão adequada de moradias comsua área de entorno e a cidade como umtodo interfere na qualidade de vida de seusmoradores, considerando-se tanto o tempoque se compromete nos deslocamentos ne-cessários, como o próprio acesso de veículosindispensáveis ao funcionamento do conjuntohabitacional (por exemplo, transporte cole-tivo, ambulância, viaturas policiais para se-gurança dos moradores e caminhões de cole-ta de lixo). Nos moldes atuais, a crescentenecessidade de deslocamentos intra-urbanosconduz ao cuidado de se localizar conjuntosem áreas cujo sistema viário tenha conti-nuidade e fluência até o centro da cidade, oua subcentros. Para isso, pesa não só o traçadogeométrico das vias, mas também seu estadode conservação.

Para assegurar condições adequadas deacesso e deslocamentos dos moradores aocentro da cidade (ou a subcentros), sugerem-se os seguintes procedimentos:

� verificar a existência de vias deacesso adequadas, tanto em re-lação ao porte como à pavimen-tação, a partir do centro da ci-dade (ou de subcentro) até aárea do empreendimento;

� pesquisar em órgãos do PoderPúblico local a necessidade/pos-sibilidade de introdução, na le-gislação urbana, de mecanismosque favoreçam a diversificaçãode funções na área/região e aomesmo tempo impeçam a imple-mentação de fontes de proble-mas ambientais; e

� desenvolver programas de inte-ração dos moradores do empre-endimento com os usos existen-tes na circunvizinhança.

3.1.2.3 Identificação da disponibilidade

de infra-estrutura urbana ou

compromisso de sua

implantação

Dentre os principais suportes para ofuncionamento do empreendimento, apre-sentam-se, a seguir, as infra-estruturas ur-banas consideradas imprescindíveis parapossibilitar condições e qualidade de subsis-tência ao novo ambiente a ser construído.Trata-se do sistema viário, transporte cole-tivo, abastecimento de água, esgotamentosanitário, coleta municipal de lixo, redes lo-cais de drenagem, fornecimento de energiaelétrica e previsão de iluminação pública, te-lefonia, equipamentos comunitários, equipa-mentos públicos e estabelecimentos comer-ciais. Salienta-se que muitos dos procedi-mentos propostos são exigências de órgãos

27

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

letivo específico fica atrelada à localização doconjunto na malha urbana e, eventualmente,em cidades pequenas (quando os conjuntospodem ser implantados mais próximos aocentro) torna-se prescindível a disponibilidadede linhas de ônibus ou de transporte ferro-viário (metrô e trem suburbano).

Para garantir qualidade de vida aos mo-radores, mostra-se necessária a avaliaçãodas distâncias a percorrer para o desenvol-vimento das atividades cotidianas (trabalho,estudo etc.), identificando-se a necessidadede meios de transportes e assegurando-setransporte coletivo. Sua implementação estádiretamente relacionada com as condiçõesdo sistema viário. Para assegurar a disponi-bilidade de transporte da população do con-junto para o centro da cidade ou para sub-centros já atendidos por linhas de transportecoletivo, recomendam-se os seguintes pro-cedimentos:

� exigir documentação, em órgãosda administração pública e em-presas de ônibus, que assegureo transporte coletivo para o con-junto, a partir de sua entrada emfuncionamento;

� verificar a disponibilidade de li-nhas de metrô ou trens subur-banos, ou a previsão de sua im-plementação, em regiões metro-politanas; e

� na região do conjunto, verificaro porte das vias de acesso, quedeve se coadunar com o tamanhodo empreendimento. Como refe-rência, para pequenos conjuntos(com até cerca de 100 unidadeshabitacionais), pode-se tolerar oacesso por simples vias locais,desde que haja proximidade auma via principal (que deve es-tar, preferencialmente, num raiode cerca de 500 m do local). Apartir daí, torna-se progressiva-mente desejável o acesso atravésde uma via principal, podendofazer-se necessária, conforme oporte e a situação do conjunto,até mesmo uma via arterial;

� avaliar situações de fluxo nos ho-rários de pico; e

� no caso de inadequação de aces-sos, obter compromisso com suamelhoria (documentado) nos ór-gãos competentes.

b) Transporte coletivo

Estreitamente vinculadas à infra-estru-tura do sistema viário, é freqüente observarem conjuntos habitacionais, às vezes distantesdo centro da cidade ou de subcentros, defi-ciências de transporte coletivo, verificando-se até mesmo ausência, em alguns casos. Evi-dentemente, a necessidade de transporte co-

28

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

� acompanhar o cumprimento demetas e prazos estabelecidos pa-ra a implantação de novas linhasde ônibus e/ou observar a ma-nutenção/incremento do serviçode transporte coletivo existente.

c) Abastecimento de água

O abastecimento de água de qualidadesanitariamente adequada e o esgotamentosanitário compreendem serviços públicos degrande impacto no que diz respeito à salu-bridade ambiental. A Portaria no 1.469/2000,do Ministério da Saúde (BRASIL, 2001), esta-belece o padrão de potabilidade da água deabastecimento.

Na acepção genérica, morar inclui abri-go e provisões essenciais. A água é uma pro-visão essencial intrinsecamente vinculada àmoradia. Portanto, na fase de planejamentode um empreendimento habitacional, o abas-tecimento de água deve ser assegurado.

Há que se destacar o preceito consti-tucional que atribui ao município a compe-tência pelo abastecimento de água. Observa-se que, mesmo quando adotada solução indi-vidualizada por poços freáticos, por exem-plo, a competência do Poder Público munici-pal continua a ser aplicável, o qual, no exem-plo mencionado, deve fiscalizar e controlaras condições que garantam o abastecimentoem quantidade e qualidade sanitária e am-bientalmente seguras.

A captação de água para abastecimentopúblico é amparada e disciplinada pela mo-derna legislação federal e estadual. O muni-cípio, no exercício de sua competência legal,faz uso dessa legislação para diretamente ofe-recer o serviço de abastecimento (captação,tratamento, reservação e distribuição da água)ou concedê-lo. O empreendedor habitacionaldeve buscar na autoridade municipal asinformações e condições para o abastecimentode água de determinada área sob análise.

Nos centros urbanos com razoável graude desenvolvimento de infra-estruturasurbanas estabeleceu-se uma modalidade deempreendimento habitacional onde o empre-endedor é responsável pela implementaçãodas unidades habitacionais e da infra-estru-tura essencial (abastecimento de água, esgo-tamento sanitário, drenagem de águas plu-viais e sistema viário). Nesse caso, é parti-cularmente importante a total integração dossistemas implantados aos sistemas existen-tes. Destaca-se aqui que a referida integraçãosomente será obtida, estando o empreendi-mento implantado, caso haja perfeita defini-ção de responsabilidades e compromissosentre o agente empreendedor e o Poder Pú-blico municipal.

No caso de sistema integralmente lo-cal de abastecimento, isto é, estruturas queenvolvam captação, tratamento, reservaçãoe distribuição, deverá ser obtida outorgaprévia dos organismos competentes (federaise estaduais) para ser realizada a captaçãona quantidade necessária. O documento ofi-

29

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

cial que concede o direito à captação de água,a outorga, aplica-se às águas superficiais eà água subterrânea. No caso de águas su-perficiais, o manancial pode ser de compe-tência da esfera estadual, no caso dos cursoscontidos no limite do estado, ou da esferafederal, no caso dos cursos que sejam divisasentre estados, atravessem mais de um esta-do ou formem fronteiras com outros países.

Além do abastecimento para o consumodoméstico, deve-se prever também a reservade água para incêndio em sistemas habita-cionais com área construída acima de 750m2 e altura das edificações maior que 12 maté o piso do último pavimento (ABNT, 2000).

Atualmente, as águas superficiais sãobens da União ou do Estado, enquanto queas águas subterrâneas são bens do Estado;em ambos os casos, o seu uso depende deoutorga prévia e de normas específicas esta-belecidas pelos organismos gestores (fede-rais e estaduais). Para assegurar o abaste-cimento aos moradores, além da eventualnecessidade de reserva de água para incên-dio, sugerem-se os seguintes procedimentos:

� consultar o Poder Público mu-nicipal sobre as possibilidades econdições para o abastecimentopúblico de água nas áreas objetode estudo para o empreendimen-to habitacional;

� fazer análise técnica preliminar daspossibilidades de abastecimento edas soluções tecnológicas decor-rentes no âmbito do sistema públi-co e do sistema predial de abasteci-mento, segundo as condições ofe-recidas e/ou negociadas pelo oucom o Poder Público municipal;

� caso a solução vislumbrada impli-que em execução de obra pelo pró-prio empreendedor, obter e obser-var rigorosamente as condicionan-tes técnicas e procedimentos pro-cessuais estabelecidos pelo órgãomunicipal prestador do serviço deabastecimento (departamento, au-tarquia, companhia mista ou empre-sa privada);

� obter aprovação e compromissoformal do Poder Público municipalpara garantir o abastecimento se-gundo o sistema definido e aprova-do para o empreendimento. Essecompromisso deve explicitar ostermos exatos das responsabilida-des das partes;

� caso o empreendedor seja respon-sável pela implementação da infra-estrutura essencial (abastecimentode água, esgotamento sanitário,drenagem de águas pluviais e sis-tema viário), estabelecer a total in-tegração dos sistemas implantadosaos sistemas existentes;

30

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

� no caso de sistema integralmentelocal de abastecimento, obter ou-torga prévia dos organismoscompetentes (federais e estadu-ais) para ser realizada a captaçãona quantidade necessária; e

� caso seja necessária reserva deágua para incêndio, seguir osprocedimentos de acordo comnormas técnicas, como a NBR13714 (ABNT, 2000), além deeventuais decretos estaduais,relativos ao Corpo de Bombeiros.

d) Esgotamento sanitário

Ao lado do abastecimento de água ecomo decorrência deste, segundo a tecno-logia culturalmente consagrada ao longo dahistória, o esgotamento sanitário faz partede um conjunto de serviços públicos de gran-de significado no que diz respeito à salubri-dade ambiental.

Como conseqüência inevitável da provi-são essencial da água ao ato do morar, re-sultam tipos diversos de águas residuárias,os esgotos. Estes devem ser adequadamenteafastados do contato humano, tratados edispostos no meio ambiente de maneira se-gura. Em geral, os esgotos são fontes deimpactos ambientais negativos dado as con-seqüências que podem causar à saúde, alémde outros problemas no meio ambiente.

Decorrem dessas premissas gerais queo serviço público de esgotamento sanitáriodeve cumprir as seguintes funções:

1. Afastar as águas residuárias do contatoanimal.

2. Tratar essas águas, visando condicioná-las ao obedecimento de parâmetros técni-cos de ordem sanitária e ambiental.

3. Dispor os efluentes tratados no meio am-biente, respeitando critérios adequados deimpacto ambiental.

O atendimento dos critérios geraisenunciados pode ser obtido segundo diferen-tes concepções e tecnologias. A concepçãoe a tecnologia associada podem ser essen-cialmente locais ou, na vertente oposta, inte-grarem grandes sistemas públicos compostospor redes coletoras e de afastamento, trata-mento em estações e disposição final.

Analogamente ao abastecimento deágua, deve-se ter em conta o preceito cons-titucional que atribui ao município a compe-tência pelo esgotamento sanitário. Reportan-do-se ao exemplo dado, no caso de abaste-cimento individual, cumpre mencionar quetambém no caso do esgotamento sanitário asolução individualizada está sob competênciado Poder Público municipal.

O Poder Público municipal, no exercíciode sua competência legal, faz uso da legis-lação relativa aos sistemas de esgotamentosanitário, para estabelecer os regulamentostécnicos a serem obedecidos na esfera de

31

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

sua competência. O empreendedor habitacio-nal deve buscar na autoridade municipal asinformações e condições para a análise desoluções para o esgotamento sanitário dedeterminada área sob análise.

Em diversos centros urbanos, foramconstruídos conjuntos habitacionais que nãodispunham de redes coletoras de esgoto ousolução individual corretamente operada.Resultaram problemas, principalmente aque-les relativos à saúde, ilustrados pelos altosíndices de mortalidade infantil, e outros rela-tivos a impactos deletérios no meio ambiente.

As preocupações com a saúde públicae o meio ambiente cresceram e as exigênciassobre o saneamento básico em geral passa-ram a ser explicitamente consagradas na Lei.No caso do Estado de São Paulo, por exem-plo, na fase de licenciamento, os conjuntoshabitacionais só são aprovados se contaremcom solução integral de esgotamento sani-tário de forma integrada à solução geral exis-tente ou proposta para o município.

Para assegurar o esgotamento sanitárioadequado, recomendam-se os seguintesprocedimentos:

� consultar o Poder Público mu-nicipal sobre as possibilidades econdições para o esgotamentosanitário nas áreas objeto de es-tudo para o empreendimento ha-bitacional;

� análise técnica preliminar daspossibilidades de esgotamentosanitário e das soluções decorren-tes no âmbito do sistema públicoe privado de esgotamento sa-nitário, segundo as condições ofe-recidas e/ou negociadas pelo oucom o Poder Público municipal;

� caso a solução vislumbrada impli-que em execução de obra pelo pró-prio empreendedor, obter e obser-var rigorosamente as condicionan-tes técnicas e procedimentos pro-cessuais estabelecidos pelo órgãomunicipal prestador do serviço deesgotamento (departamento, au-tarquia, companhia mista ou em-presa privada);

� obter aprovação e compromissoformal do Poder Público munici-pal para garantir o esgotamentosegundo o sistema definido eaprovado para o empreendimen-to. Esse compromisso deve expli-citar os termos exatos das res-ponsabilidades das partes;

� nos centros urbanos onde o em-preendedor é responsável pelaimplantação das unidades habi-tacionais e da infra-estrutura es-sencial (abastecimento de água,esgotamento sanitário, drenagem

32

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

de águas pluviais e sistema viá-rio), é particularmente importan-te a total integração dos sistemasimplantados aos sistemas exis-tentes;

� no caso de sistema integralmentelocal de esgotamento, isto é, es-truturas que envolvam coleta,afastamento, tratamento e dispo-sição final, deverá ser obtida li-cença prévia dos organismoscompetentes (federais e esta-duais) para ser realizada a dispo-sição final. O documento oficialque licencia o sistema que dispõeefluentes tratados estará fundadona Resolução Conama 20 (BRA-SIL, 1992b), com eventuais exi-gências adicionais da legislaçãoestadual e municipal; e

� caso seja inviável a implementa-ção de um sistema de esgotamen-to sanitário baseado em rede ur-bana, pode ser utilizado sistemaindividualizado ou comunitário dotipo fossa séptica, seguido de fil-tro anaeróbio, projetado e cons-truído de acordo com a norma téc-nica NBR 7229 (ABNT, 1993).

e) Coleta municipal de lixo

A existência de serviço de coleta de lixono local onde será localizado o empreen-dimento é um dos aspectos estruturais que

deve ser considerado no planejamento da áreaa ser ocupada. Isso porque, como grande par-te dos conjuntos habitacionais são construídoslonge dos centros urbanos, essa distância seráum elemento complicador para a extensão doserviço de coleta do lixo do município até oempreendimento. Quanto maior for a distân-cia a ser percorrida pelos veículos coletoresde lixo, mais oneroso se tornará esse serviçopara a Prefeitura e, em conseqüência, maisdifíceis as negociações para garantia da coletana freqüência adequada.

Desde a ocupação da primeira unidade,já é absolutamente necessário que estejaestabelecido o sistema de coleta, sob penade vir a surgir nas proximidades do conjuntoum depósito irregular de lixo. Essa situação,além de ilegal, vem acompanhada de todasas conseqüências para o meio ambiente, in-cluindo a saúde pública, como, por exemplo,a proliferação de insetos e roedores e a po-luição do lençol freático, do ar e do solo.

Impõe-se, portanto, que a distância en-tre o local do empreendimento e o perímetrourbano seja avaliada, assim como devemhaver entendimentos prévios para asseguraro fornecimento do serviço de coleta de lixopara os moradores do conjunto, seja ele exe-cutado pela Prefeitura ou terceirizado, rea-lizado por empreiteiras.

Dados sobre o funcionamento do ser-viço de coleta do município, tais como itine-rário dos veículos coletores e periodicidadeda coleta, deverão também ser objeto de

33

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

levantamentos, pois não só serão úteis paraa avaliação da adequação do local para aimplantação do conjunto, mas também pode-rão orientar a elaboração do projeto, no to-cante à localização das lixeiras, dimensõesnecessárias para acondicionamento do lixo,entre outras medidas necessárias.

Para garantir a coleta periódica do lixopelo serviço público municipal, evitando-sea criação de depósitos de lixo irregulares nasproximidades, sugerem-se os seguintes pro-cedimentos:

� verificar a possibilidade de ex-tensão e o funcionamento da co-leta municipal de lixo no mu-nicípio;

� obter, na Prefeitura Municipal (e,se for o caso, nas empresas ter-ceirizadas), documentos que ga-rantam que o serviço municipalde coleta de lixo será estendidoaté o local da instalação do con-junto habitacional, no prazo efreqüência requeridos; e

� obter orientações para constru-ção dos pontos de armazena-mento e de apresentação do lixoà coleta.

f) Fornecimento de energia elétrica eprevisão de iluminação pública

Ainda que, como tendência geral, o for-necimento de energia elétrica venha sendo

assegurado em praticamente todos os con-juntos habitacionais construídos, cabe sem-pre relembrar a necessidade de verificar aefetiva previsão de fornecimento satisfatórioa partir da data do início de entrega de uni-dades. O mesmo se aplica à iluminação pú-blica e, para este item, vale observar que écomum uma particular deficiência nos siste-mas encontrados. Ainda que as vias internasa conjuntos habitacionais tendam a ser do-tadas de iluminação pública satisfatória, omesmo não ocorre com áreas internas aoconjunto destinadas a futuros equipamentospúblicos, comunitários ou comerciais, que ànoite tendem a ficar às escuras, prejudicandoa segurança dos moradores.

Para assegurar o fornecimento de ener-gia elétrica adequado ao número de unidadeshabitacionais que será construído, assimcomo a instalação de iluminação pública, de-vem-se adotar os seguintes procedimentos:

� exigir documentação, a ser ob-tida junto à concessionária, queassegure o fornecimento ade-quado de energia elétrica para oconjunto;

� conseguir compromisso de ilu-minação de áreas que tendem apermanecer vagas, no aguardoda construção de equipamentospúblicos, comunitários e de co-mércio; e

34

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

mento local na demanda por equipamentoscomunitários, públicos e por estabelecimen-tos de comércio e de prestação de serviços.Neste caso, a demanda é geralmente absor-vida nos equipamentos já disponíveis naregião. Porém, à medida que se evolui paraconjuntos de médio e grande porte, eles emsi passam a ser referenciais desse tipo dedemanda, criando freqüentemente a neces-sidade de investimentos públicos na cons-trução e manutenção de equipamentos, taiscomo escolas, creches, postos de saúde eparques, além da necessidade de previsãode áreas para estabelecimentos comerciais.

Nos projetos, a tendência é a de se re-servar áreas para tais finalidades nos própriosconjuntos, contando-se que o Poder Públicomunicipal ou estadual venha a construir emanter os equipamentos necessários. Porém,no Brasil, é conhecida a carência que se as-socia a equipamentos públicos de educação,saúde e lazer, assim como a guarnição detais equipamentos com as equipes de pro-fissionais necessárias.

Dessa forma, conjuntos de médio agrande porte acabam, muitas vezes, sendoconstruídos sem os equipamentos necessá-rios, apenas com reserva de área para suaimplementação, e sua população tem de bus-car o atendimento em outros bairros, às ve-zes distantes. Com o passar do tempo, mui-tas dessas áreas acabam sendo invadidas eocupadas irregularmente.

Torna-se mais seguro, nesse quadro,buscar áreas para o empreendimento habita-

� acompanhar o cumprimento demetas e prazos estabelecidos pa-ra o fornecimento de energia elé-trica e instalação de iluminaçãopública, condicionando a entregade unidades habitacionais à entra-da em funcionamento do sistema.

g) Telefonia

É desejável que conjuntos habitacionaissejam dotados de telefones públicos a partirde sua entrada em uso. Também ligaçõesparticulares devem estar previstas, para cur-to e médio prazo. Para assegurar a possi-bilidade de comunicação à distância a todosos moradores, recomendam-se os seguintesprocedimentos:

� exigir documentação, a ser ob-tida junto à concessionária, queassegure a instalação de telefo-nes públicos e de linhas particu-lares para o conjunto; e

� acompanhar o cumprimento demetas e prazos.

h) Equipamentos comunitários,equipamentos públicos eestabelecimentos comerciais

Um conjunto habitacional de pequenoporte, em uma determinada região da cidade,tende a significar apenas um pequeno incre-

35

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

cional onde já estejam disponíveis equipa-mentos comunitários e públicos, assim comoalgum comércio e estabelecimentos de pres-tação de serviços. O dimensionamento des-sas necessidades deve ser apoiado por es-tudo das características demográficas da po-pulação que se almeja atender.

Para analisar a disponibilidade, na re-gião da área selecionada, de equipamentospúblicos e comunitários (com ênfase em cre-che, pré-escola, escola de primeiro grau e pos-to de saúde), assim como de estabelecimentoscomerciais (com ênfase em farmácias e emestabelecimentos de comércio diário), reco-mendam-se os seguintes procedimentos:

� dimensionar as demandas porequipamentos comunitários, públi-cos e comerciais;

� exigir documentação mostrando alocalização dos equipamentos pú-blicos e comunitários na região daárea selecionada;

� exigir documentação de compro-misso de construção de novos equi-pamentos, quando for o caso; e

� acompanhar o cumprimento de me-tas e prazos estabelecidos para aimplementação de novos equipa-mentos públicos e comunitários, ve-rificando a manutenção de níveissatisfatórios de atendimento desaúde e de educação.

3.1.3 Projeto

Atualmente, existe a tendência de seobservar o estabelecimento de programashabitacionais bastante homogêneos e padro-nizados, além de desvinculados da políticaurbana geral. São caracterizados por tiposde edificações semelhantes, independente-mente dos atributos do terreno, e impostossem denotar critérios cristalinos na sua es-colha, muitas vezes sem compromisso degeração e gestão posterior de infra-estruturae serviços públicos, o que acarreta prejuízosao ambiente, incluindo a própria obra.

São apresentados, a seguir, temas rela-cionados com o ambiente, que devem sertratados nos projetos, com os principais re-quisitos que devem ser observados.

3.1.3.1 Elaboração de plano de

desenvolvimento integrado

Uma condição que normalmente seapresenta é o empreendimento habitacionalde interesse social não constituir parte inte-grante e específica da política urbana geral,esquecendo-se que o problema ambiental nãoé exclusividade de um grupo restrito de usuá-rios. A falta de preocupação de inserção física,jurídica, urbanística e social da população debaixo poder aquisitivo na cidade induz, dentreoutras situações decorrentes, ao não-com-promisso de geração de infra-estrutura e ser-viços públicos, além de desvincular do PoderPúblico sua gestão posterior.

36

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

A elaboração de um plano de desen-volvimento integrado pelo empreendedordeve ser a base para iniciar qualquer projetohabitacional de interesse social, objetivandoa integração da área do empreendimentocom as demais ações do Poder Público mu-nicipal. Esse plano deve buscar mecanismospara viabilização do produto habitacional,considerando, dentre outras questões, aordenação municipal do uso e ocupação dosolo, com execução de projetos articuladosde infra-estrutura, de ampliação da qualidadee cobertura dos serviços sociais e de apoioao desenvolvimento comunitário.

O plano de desenvolvimento integradodeve iniciar na fase de planejamento do em-preendimento, porém deve ter continuidadenas demais fases, alimentado por programasde avaliação e gestão ambiental, conformeserão recomendados. É importante lembrarque a gestão do plano deve interagir com osusuários e, portanto, deve apresentar umaproposta de organização abrangendo as obri-gações do Poder Público, de promoção e con-tinuidade dos serviços, e dos moradores, notrato dos espaços coletivos.

Além disso, como a ocupação evolui, oplano deve apresentar flexibilidades que per-mitam incorporar mudanças, a partir de li-mites e responsabilidades inicialmente esta-belecidos, evitando contradições e discre-pâncias entre os momentos das diferentesfases do empreendimento. Para assegurarmelhores condições de gestão ambiental dosempreendimentos habitacionais, apontam-se

a seguir as questões que devem ser tratadasem um plano de desenvolvimento integrado:

� recomendar a elevação do padrão dehabitabilidade integrando o empre-endimento no desenvolvimento ur-banístico da cidade, com medidaspara a instalação de infra-estruturae serviços públicos, seu monitora-mento e avaliações posteriores, emum processo contínuo de gestão, es-tabelecendo-se responsabilidades;

� possibilitar o aumento do poder a-quisitivo dos moradores, com umprograma de desenvolvimento comações de apoio na busca de empre-go, desenvolvimento de cursos téc-nicos profissionalizantes, além deredução de despesas com medidascomo reestruturação tarifária e definanciamento;

� corrigir problemas jurídicos de pro-priedade da terra em situações irre-gulares, tal como na construção deconjuntos para relocação de popu-lação de favelas, além de revisão denormas técnicas relativas a infra-es-trutura e sistemas construtivos; e

� promover a organização e o envol-vimento da comunidade no proces-so de urbanização, principalmentena integração com a vizinhança eno trato dos espaços coletivos epúblicos.

37

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

3.1.3.2 Adequação às características

geométricas do terreno

A partir da década de 70, até os nossosdias, o Estado praticamente só tem trabalha-do, em seus conjuntos, com duas principaistipologias de edifícios: casas térreas (isoladasou geminadas) e prédios de até quatro oucinco pavimentos, em geral compostos porduas “lâminas” intermediadas por caixa deescadas, definindo uma planta em “H”. Mesmoque se verifiquem raras exceções, em algunsprojetos isolados e em projetos mais recentes,o mesmo padrão se espalhou de norte a suldo país, em terrenos das mais diversas carac-terísticas topográficas. Os 50 conjuntos es-tudados pelo Instituto de Pesquisas Tecno-lógicas do Estado de São Paulo (IPT, 1998)confirmam essas tipologias básicas nas maisdiversas situações geográficas, geológicas,topográficas, culturais e de clima.

Uma das formas predominantementeempregadas nas construções do tipo casa cor-responde a casas térreas isoladas similares,cujo projeto está calcado em lotes planos.Utilizam-se ainda recuos laterais, de frente ede fundo. Tratam-se de unidades ampliáveis,com um ou dois dormitórios na fase inicial.Uma outra forma para unidades de tipo casa,utilizada com menor freqüência, correspondea um par de unidades térreas geminadas, e étambém destinada a lotes planos. A frentemínima utilizada para cada par de unidades éde 14,3 m, o que acaba igualmente exigindo,em encostas, terraplenos para a obtenção doslotes planos necessários.

A segunda tipologia empregada refere-se a prédios com quatro pavimentos, compequenas variações de planta na unidade-tipo (que contém sempre dois dormitórios).As variações utilizadas dizem mais respeitoà forma de agrupamento horizontal de lâmi-nas que, em apenas uma modalidade, admi-tem desníveis por volta de 1,5 m entre blo-cos, com o que se confere uma certa possi-bilidade de melhor adequação à topografia.Tal recurso é, porém, bastante limitado e derara utilização.

Do ponto de vista do projeto urbanís-tico, os conjuntos habitacionais também em-pregam soluções razoavelmente uniformese utilizam diretrizes gerais de arruamento for-necidas pelas prefeituras municipais. Os viá-rios têm dimensões e características impos-tas, sem um estudo de alternativas que consi-dere as diferentes situações de cada local ouregião, com terrenos e prioridades desiguaisde seus usuários.

Assim, à demanda de grandes terraple-nos capazes de comportar o reduzido lequede opções de tipologias de edifícios agregam-se em geral projetos urbanísticos bastanteconvencionais, tendentes à grelha hipodâ-mica (disposição em grade retangular). Taisprojetos apresentam, muitas vezes, ruas ex-cessivamente largas, para uma baixa utili-zação efetiva, e greides, no geral, abaixo de12%, mais uma vez aumentando a neces-sidade de grandes terraplenos em terrenosmais acidentados.

38

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

Levando-se em conta a tendência gene-ralizada de asfaltamento das vias, de colo-cação de guias e sarjetas e, por parte dosmoradores, de pavimentação dos passeios,percebe-se que elevados investimentos aca-bam se realizando em espaços de circulação,para um uso pouco intenso e para resultadosduvidosos, e que poderiam ser aplicados emquestões mais necessárias no projeto.

Cabe comentar que áreas para estacio-namentos são também altamente demanda-tárias de movimentos de terra em terrenosmais acidentados. Usualmente, em conjuntoshabitacionais de prédios utiliza-se um núme-ro de vagas equivalente à metade do númerode unidades habitacionais, em detrimento deoutras infra-estruturas prioritárias aosusuários. Pelos dados obtidos em pesquisa(IPT, 1998), percebe-se que este número,na maioria dos casos, poderia ser reduzido,sem prejuízos mais notáveis. Em nenhum dosconjuntos estudados na pesquisa foramutilizadas unidades habitacionais (ou prédios)com acesso exclusivo para pedestres.

As minguadas tipologias de edifícios eos sistemas viários amplos e convencionais,nos programas do Estado, quando aplicadosa terrenos pouco mais acidentados, exigemexpressivas terraplenagens. Estas tendem aestar subdivididas em duas etapas básicas:

1. Para fornecer as condições de implemen-tação dos sistemas viários convencionais,tendentes à grelha hipodâmica (forma degrade retangular), nos greides considera-

dos toleráveis pela legislação, transformamos terrenos íngremes em terrenos comdeclividade mais suave, com grandes movi-mentos de terra, que remetem os grandesdesníveis, na medida do possível, para aperiferia do conjunto ou para transiçõesentre partes do mesmo conjunto (como,por exemplo, divisas de fundos entre lotes).

2. Em uma segunda etapa, criam-se os pa-tamares destinados a conter as edifica-ções, sejam elas casas térreas ou sobradosisolados ou geminados, sejam prédios.

Assim, durante o período de constru-ção, e na fase inicial de uso, as superfícies desolos expostos sujeitos à erosão tendem aser extensas nos conjuntos, isto sem contaros taludes não tratados, sujeitos à ocorrênciade escorregamentos. Proposta de sistemaconstrutivo adequado às características geo-métricas do terreno é mostrado na Figura 3.

Os impactos ambientais negativos dasatividades de terraplenagem, exigidas noprojeto, assumem maiores proporções emconseqüência de implementação dos movi-mentos de terra de forma sistemática e con-tínua, mesmo que a construção aconteça me-ses depois, ficando o solo exposto por longoperíodo. Outrossim, desconsideram-se, emempreendimentos habitacionais de interessesocial, os projetos paisagísticos, que, alémde interagirem na adaptação do empreen-dimento com o contexto regional da paisa-gem, também devem participar como parteintegrante das obras de contenção.

39

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Fonte: FLÁVIO FARAH – IPT.

Figura 3 – Proposta de sistema construtivo híbrido(estrutura de embasamento de aço e construção convencional sobreposta)

que dispensa maiores movimentos de terra na ocupação de encostas

Exemplo tradicional de conjunto alta-mente problemático, neste sentido, é o deSanta Etelvina (zona leste do Município de SãoPaulo, nas proximidades do Município deFerraz de Vasconcelos). Construído pelaCompanhia Metropolitana de Habitação de SãoPaulo – Cohab/SP, no início da década de 80,a terraplenagem necessária à implantação doprojeto ultrapassou 5.000.000 m3 (IPT,1983).Esse conjunto sofreu intensas instabilizaçõesde terreno, tendo em vista a ação de chuvassobre solos expostos (Figura 4).

Nos intensos movimentos de terra exe-cutados, com a retirada do solo superficial,expuseram-se solos de alteração bastante

frágeis com relação à erosão e, além disso,verificou-se até mesmo a construção de ater-ros sobre vegetação de porte arbóreo, emdeterminados trechos da gleba, o que tendea ser comprometedor, sob o ponto de vistageotécnico.

Para se ter noção do volume de terramovimentado para a construção do conjuntode Santa Etelvina, o mesmo equivale a cercade 21% do que foi necessário para a implan-tação da usina hidrelétrica de Itaipu, umadas maiores hidrelétricas do Planeta. Segun-do a Itaipu Binacional (1997), a implantaçãoda usina exigiu 23,4 milhões de m3 de esca-vação em terra. Considerando que se pre-

40

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

via, para o conjunto de Santa Etelvina, aconstrução de 40.000 unidades habitacionais,verifica-se ainda que se movimentou o equi-valente a 125 m3 de terra, por unidade habi-tacional. Na época de sua consolidação, es-

timou-se que o custo de cada residência, anteas obras de recuperação que se tornaram ne-cessárias, teria alcançado o valor de mercadoequivalente a um apartamento na avenidaPaulista, área nobre de São Paulo.

Fonte: FARAH (1998).

Figura 4 – Vista do conjunto habitacional Santa Etelvina, da Cohab/SP,

em fase final de construção, em 1983

41

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Em conjuntos habitacionais mais recen-tes, verificou-se que o índice de terraplena-gem não tem diminuído. No que pese o fatode se dispor de poucas informações sobremovimentos de terra (apenas para 16 dos50 conjuntos estudados na pesquisa do IPT),nota-se que perduram, em vários casos, asextensas terraplenagens e que, em pelo me-nos sete conjuntos, o volume de terra movi-mentado, por unidade habitacional, foi atésuperior ao verificado para Santa Etelvina,mesmo em terrenos com declividade médiaoriginal igual ou inferior aos 12%.

A terraplenagem normalmente é neces-sária, mas deve ser implementada com for-mas, cuidados e dimensões adequadas. Emconjuntos com terrenos mais acidentados, nosmoldes atuais de projeto, que podem serconsiderados inadequados, a tendência é aexecução prévia de uma extensa terraplena-gem para ajuste total da gleba a declividadesmais suaves, com platôs ou bermas, onde seassentarão as casas ou prédios previstos. Pararemodelar os terrenos em situações mais pla-nas, necessárias à implantação das tipologiasatualmente em uso nos programas habitacio-nais, e visando evitar a necessidade de obrasde contenção em espaços públicos, os proje-tos transferem os desníveis, com freqüência,para divisas de fundos e laterais de lotesdestinados a casas ou prédios.

O escasso repertório de desenho urba-no adotado em loteamentos tende também,na medida do possível, a reproduzir a formade grade retangular, só abandonada nos tre-

chos de absoluta inviabilidade de implanta-ção. Nesse caso de loteamentos, vias princi-pais, justamente as mais largas, são maisfreqüentemente dispostas à meia encosta,em direções próximas às das curvas de nível,procurando manter baixos greides. Isto resul-ta em movimentos de terra pronunciados edetermina, nas faixas lindeiras, lotes comgrandes desníveis em relação às vias, comtestadas que são, na realidade, grandes talu-des de corte ou de aterro, às vezes com vá-rios metros de altura. É comum encontrarlotes nestas condições em diversas cidadesbrasileiras, às vezes com desníveis até mes-mo superiores aos 10 m.

Procurando atenuar os desníveis entreo viário e os lotes, utiliza-se então o deno-minado “desbaste de quadra” que, por meiode novos movimentos de terra, acaba deixan-do expostas camadas de solo menos resis-tentes, com intensa aceleração de processoserosivos e de outras instabilizações de terre-no, tais como os deslizamentos. Às mutila-ções geradas para implementar o loteamen-to, seguem-se as destinadas à construçãode casas: são predominantes em auto-cons-trução, na maioria das vezes sem projeto,pelo menos do ponto de vista formal.

Na auto-construção, as casas tendemtambém a reproduzir, na medida do possível,tipologias destinadas a terrenos planos. Aprópria Prefeitura do Município de São Paulo,por extenso período, forneceu à populaçãode baixa renda plantas pré-aprovadas, desti-nadas claramente a terrenos planos, bastante

42

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

similares às casas térreas isoladas utilizadasnos programas habitacionais do Estado. Mui-tas dessas casas foram construídas em ter-renos íngremes, o que só se possibilitava me-diante grandes movimentos de terra nos lotes.

Em loteamentos mais antigos, em en-costas, podem ainda hoje ser observadascasas assentadas sobre estruturas de con-creto que, intermediando o primeiro piso e oterreno, permitiam soluções menos deman-dantes de movimentos de terra. Construía-se um “tabuleiro sobre pilotis” e, sobre este,apoiava-se uma casa térrea ou um sobrado.A pauperização crescente da população pra-ticamente afastou a possibilidade do uso des-ta solução: hoje é inviável, para as faixas depopulação de renda baixa, arcar com o custodo volume do concreto necessário. Por outrolado, para remodelar o terreno, o dispêndiodo auto-construtor pode se resumir ao seupróprio esforço físico ou, se conseguiu juntaralgum dinheiro (bem menos que o necessáriopara uma estrutura de concreto), podecontratar um tratorista para fazer o serviço.

O processo de ocupação e de consoli-dação de loteamentos populares se carac-teriza, ainda, por uma certa lentidão. Lotesjá transformados drasticamente e ocupadosconvivem com terrenos vagos desprotegidosapós a terraplenagem, com taludes expostose “redes” improvisadas de drenagem, poten-cializando mais uma vez erosões e escorre-gamentos. Percebe-se, ainda, que os ladosmaiores dos lotes tendem a ser dispostosperpendicularmente às curvas de nível, o que

obriga movimentos de terra mais pronun-ciados para a implantação das casas.

Sob o ponto de vista essencialmentegeométrico, caso se utilizassem lotes com ladomaior paralelo às curvas de nível, possibilitar-se-iam casas com lado maior na mesmadireção, atenuando-se significativamente osmovimentos de terra. Nunca se usa, porém,esse expediente, devido à maior densidadede vias que passa a se fazer necessária, oque agravaria os custos para o loteador.

Há ainda um claro conflito entre as exi-gências das normas técnicas e legislações ur-banísticas (e das próprias posturas técnicasusualmente aplicadas ao parcelamento dosolo) e a possibilidade de se ter formas deparcelamento do solo menos devastadorasem encostas. Em terrenos de declividademais acentuada, é usual a necessidade dese seguir as exigências normativas apenaspor meio de dramáticos movimentos de terra,quase sempre dando espaço a situações derisco e à degradação ambiental.

A forma tradicional de simples parcela-mento do solo, quando aplicada a encostas,tem representado, na prática, duas etapasde inadequações. A primeira é caracterizadapelas pesadas transformações iniciais doterreno por terraplenagem, para a implemen-tação de vias e lotes, com desdobramentosnegativos locais, periféricos e na cidade comoum todo. A outra, mais pulverizada no tempoe no espaço, diz respeito às edificações,quando novas mutilações de terreno se ve-

43

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

rificam, dando espaço a novos efeitos ne-gativos, incluindo riscos.

O problemático espaço urbano geradoem encostas, pelos loteamentos populares,representa assim, em última instância, maisuma manifestação da inadequação da alter-nativa de urbanização que a legislação impõeà população de menor poder aquisitivo. Osespaços urbanos resultantes, conhecidos desobejo, além de exporem os mais pobres auma série de “deseconomias” e riscos, tantona auto-construção como nos conjuntos, têmse mostrado de péssima qualidade.

Em conseqüência da abordagem am-biental inadequada, os principais problemasverificados em conjuntos habitacionais são:leitos das ruas erodidos; ruas de elevadadeclividade longitudinal sem qualquer tipo depavimentação ou proteção, que facilmentese transformam em verdadeiras boçorocas(atingindo, em alguns casos, mais de 20 mde profundidade) e causando aterros e corteserodidos e em processo de ruptura; drena-gens destruídas; sistema viário e edificaçõescomprometidas. Tais condições se desenvol-vem no local e atingem áreas circunvizinhas.

Como pôde ser visto até o momento, épatente a inadequação do modelo usual deocupação em conjuntos habitacionais condu-zidos pelo Poder Público, mormente quandose trata da ocupação de terrenos acidenta-dos. Em relação aos conjuntos habitacionaisprojetados e construídos pelo setor privado,ainda que não seja freqüente a construçãode unidades do tipo casa e que se incorpo-

rem, ao escasso rol de tipologias, as “torres”(edifícios com mais de cinco pavimentos), oprincípio geral de extensas terraplenagensprevalece.

Para assegurar melhores condições am-bientais dos empreendimentos habitacionais,apontam-se a seguir requisitos de projetosque considerem novas tipologias e caracterís-ticas geométricas do terreno:

� buscar novas tipologias, capazesde inverter práticas comuns deadaptação das características doterreno ao projeto, compatibili-zando-as com o relevo, os pro-cessos do meio físico presentesou potenciais e os parâmetrosgeotécnicos dos solos;

� especificar procedimentos deproteção do sistema viário con-tra processos erosivos;

� elaborar e adequar o projeto demovimentos de terra, cuidandoda especificação de proteção su-perficial e/ou de estruturas decontenção para taludes;

� tratar, no projeto, de áreas queficarão expostas a processos demeio físico, tais como erosões, as-soreamentos, inundações e es-corregamentos, devendo-se evitarque obras de contenção neces-sárias fiquem a cargo dos futurosmoradores; e

44

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

� elaborar e adequar o projeto dedrenagem interna ao conjunto,com terminações do sistema dedrenagem e sua conexão comredes do entorno ou sistemas lo-calizados de lançamento, asse-gurando a preservação de ter-renos vizinhos. A especificaçãode cuidados na implantação dosistema de drenagem deve per-mitir que este, ao término dasobras, esteja totalmente livre,desobstruído e desassoreado.

3.1.3.3 Localização de equipamentos

públicos, comunitários e de

áreas comerciais

Muitos conjuntos, principalmente os demédio e grande porte, demandam, em seuinterior, áreas destinadas ao uso coletivo oupúblico (tais como praças e sistemas de lazer)e áreas destinadas à implementação de equi-pamentos públicos e comunitários, bem co-mo de estabelecimentos comerciais. Nemsempre tais áreas são utilizadas de imediato,podendo atravessar anos sem ocupação,sujeitando-se assim à falta de manutenção.

A concepção, gestão e melhoria dessasáreas devem estar previstas no plano dedesenvolvimento integrado, evitando que,até sua implementação, assumam feiçõesgerais de degradação, com o lançamento delixo e entulho e com a exposição a erosões,além de invasões por ocupações informais.

Cabe, na fase de projeto, minimizar aexposição de tais áreas à degradação, situan-do-as em porções mais centrais do conjunto.Quando situadas no perímetro, tendem a sermenos cuidadas. Em porções mais centrais,sob as vistas de mais moradores, criam-secondições de organização maior para pleiteara necessária manutenção periódica. Assim,é mais recomendável que as divisas do con-junto sejam constituídas por terrenos incor-porados a unidades habitacionais ou a con-domínios, e não por áreas de caráter público.

Em geral, as porções dos terrenos maisproblemáticas à ocupação, cujas caracterís-ticas do meio físico tornariam as edificaçõesmais custosas (trechos alagadiços em fundode vale, sujeitos à inundação, ou encosta comelevada declividade natural, mais suscetíveisaos processos erosivos e de escorregamen-to), costumam ser destinadas como áreaslivres ou institucionais, transferidas ao PoderPúblico municipal. A não incorporação efetivade tais terrenos no uso urbano planejado abreespaço para invasões futuras, geralmente emsituações de risco.

Quando se instalar os equipamentos co-munitários em locais mais problemáticos ouem áreas degradadas, os terrenos devem serimediatamente recuperados e ocupados, in-tegrando-os ao empreendimento habitacionale evitando sua invasão. Essa ação, em áreasde lazer, pode se dar pela utilização de ele-mentos nativos dos meios biótico e físico emum contexto regional da paisagem, interfe-rindo nos resultados de funções determi-

45

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

nadas do empreendimento, tanto de estabi-lidade quanto de lazer e estética.

Sistemas de lazer são freqüentementeutilizados para designar simples arremates doconjunto com o entorno, muitas vezes sendoconstituídos por taludes íngremes, sem possi-bilidade prática de uso. Tendo em vista que adisponibilidade de sistemas de lazer constituiitem relevante para a obtenção de bons re-sultados em termos de qualidade de vida,sugere-se um especial cuidado na definiçãode áreas para este fim, selecionando-se tre-chos de terreno com efetiva possibilidade dedesenvolvimento de atividades de lazer.

Recomendam-se, a seguir, requisitosque tratem da localização dos equipamentospúblicos, comunitários e de áreas comerciaiscomo um dos recursos na elaboração do pro-jeto, propiciando melhores condições am-bientais do empreendimento:

� observar se o projeto atende a cen-tralidade, no conjunto, das áreasnecessárias para equipamentospúblicos e comunitários e áreas co-merciais. Somente tolerar localiza-ção periférica de tais áreas quandojunto a trechos tipicamente urba-nos, já ocupados e consolidados noentorno, de caráter público, possi-bilitando compartilhamento com osmoradores do entorno e maior pos-sibilidade de pressão pela manu-tenção adequada; e

� sempre que possível, utilizar, nasáreas de lazer, massas de vegeta-ção com fisionomia florestal se-melhante às matas nativas da re-gião, respeitando o espaço e ascaracterísticas naturais do local.

3.1.3.4 Planejamento do projeto de

infra-estrutura interna

Além de se planejar o abastecimento deágua, a solução para o esgotamento sanitário,o fornecimento de energia elétrica e outrasinfra-estruturas previstas na seleção de áreaspara implementação do empreendimentohabitacional, é necessário considerar tambéma construção de redes locais de drenagem.

Conjuntos habitacionais implicam a im-permeabilização de parte significativa do ter-reno original e na formação de fluxos concen-trados de águas pluviais. Uma das principaisfontes de problemas de degradação do solo,em regiões onde se constróem conjuntos ha-bitacionais, diz respeito à deficiência de pre-visão e concepção adequada de sistemas dedrenagem na interface entre o conjunto eseu entorno imediato.

Freqüentemente situados em limitescom áreas rurais, conjuntos habitacionaismuitas vezes despejam suas águas pluviaisem fluxos concentrados, sobre terrenos vizi-nhos, acelerando o processo erosivo no lo-cal. O mesmo ocorre em regiões urbanas me-nos consolidadas, onde erosões podem sig-

46

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

nificar perdas patrimoniais mais sensíveis,prejudicando lotes urbanos ainda vagos,circunstancialmente envolvendo a destruiçãode edifícios, incluindo portanto riscos, alémde evidentes danos ambientais. Também, aságuas concentradas no conjunto podem gerarinundações, se lançadas em pontos sem con-tinuidade adequada para o escoamento.

Afora assegurar a infra-estrutura inter-na, é necessária ainda a avaliação do projetodas redes internas para o atendimento ade-quado aos usuários. Para tanto, estão lista-dos, a seguir, requisitos relativos à verificaçãoda infra-estrutura interna, como um dos pas-sos necessários na elaboração do projeto,propiciando melhores condições ambientaisdo empreendimento:

� adotar redes de água, de esgotos,de eletricidade e de iluminação pú-blica, internas ao conjunto, asse-gurando-se o atendimento ade-quado a todas as unidades;

� adotar a disposição do postea-mento, assegurando-se sua nãointerferência em acessos a uni-dades/condomínios;

� adotar a iluminação pública nosarruamentos e áreas públicas pre-vistas (incluindo sistemas de la-zer, áreas destinadas a equipa-mentos públicos, comunitários ecomércio), assegurando-se suasuficiência;

� verificar as possibilidades de cir-culação viária interna e de acessoà malha urbana, estabelecendosua correção;

� identificar a existência de redes lo-cais de drenagem pública e verifi-car sua capacidade em receber osnovos fluxos de água concentra-dos que terão origem no conjunto.Observar a localização de pontosmais favoráveis de lançamento,que deverão ser contemplados noprojeto do conjunto. Caso a redenão esteja adequada ao recebi-mento dos novos fluxos, obtercompromisso documentado desua adequação em tempo hábil;

� no caso de inexistência de rede pú-blica de drenagem na região e dehaver previsão de construção nolocal, obter documentação decompromisso de implementação;

� no caso de inexistência de rede pú-blica de drenagem local e de nãohaver previsão para sua constru-ção, identificar pontos mais favo-ráveis de concentração e lança-mento, que deverão ser conside-rados no projeto básico. Observar,também, a necessidade de previ-são de obras de extremidade nosistema de drenagem, como dis-sipadores de velocidade de escoa-mento e vertedouros; e

47

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

� atrelar a entrega de unidades à im-plantação completa do sistema dedrenagem do conjunto, destacan-do a execução de obras de desti-nação, no entorno, das águascaptadas.

3.1.3.5 Planejamento da disposição e

destinação do lixo domiciliar

Um dos aspectos de relevância ambien-tal que deve ser considerado quando da ela-boração do projeto é a questão da disposiçãocorreta do lixo domiciliar, levando-se em con-ta, inclusive, a possibilidade de implantaçãode programa de coleta seletiva e reciclagemde lixo pelos moradores. Embora o lixo do-miciliar somente vá ser gerado após a ocu-pação das unidades, a incorporação dessaquestão ao projeto deve ser feita quando doplanejamento, adequando as instalações demaneira a facilitar sua posterior utilização pa-ra as atividades específicas de coleta seletiva.

A primeira preocupação deverá ser comrelação à disposição do lixo comum. Deve-seavaliar a necessidade de projetar, além de li-xeiras – onde o lixo é colocado para retiradapela coleta pública -, alguns depósitos inter-mediários mais próximos aos prédios, onde olixo seja armazenado pelos moradores, sendoposteriormente transportado para as lixeiras.A necessidade de construção de depósitos in-termediários dependerá, dentre outros aspec-

tos, da extensão do empreendimento, perio-dicidade da coleta pública, quantidade deresíduos a ser gerada e leis municipais queregulamentam o tema.

As dimensões das lixeiras ou depósitosintermediários devem ser calculadas combase na quantidade prevista de resíduos aser gerada (em geral 1,0 kg/habitante/dia),considerando-se o número de moradores ea freqüência da coleta pública no município.As lixeiras devem ser construídas o maispróximo possível das linhas de itinerário dasempresas coletoras, para facilitar a retirada.

Além da disposição correta do lixo co-mum, deve-se incorporar no projeto a idéiada realização de coleta seletiva de lixo pelosmoradores, o que pressupõe basicamente aconfecção de estruturas para depósito dosmateriais recicláveis, separadamente do res-to do lixo (Figura 5). Nos municípios ondeexiste coleta seletiva de lixo realizada pelaPrefeitura, esses resíduos, após a separação,são encaminhados à coleta pública.

Entretanto, na grande maioria dos mu-nicípios, esse trabalho ainda não é realizadopela municipalidade. Portanto, os resíduos re-cicláveis resultantes da coleta seletiva podemser comercializados pelos moradores, consti-tuindo-se em uma fonte extra de recursos.Embora normalmente reduzidos, serão semprebem-vindos, especialmente tratando-se deempreendimentos de interesse social. Nessecaso, porém, é necessário verificar quais osmateriais e quais as condições para a comer-cialização, garantindo-se comprador.

48

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

A inclusão da coleta seletiva na elabo-ração do projeto facilitará sua implantaçãoposterior e não acarretará acréscimo de des-pesas pois, por exemplo, espaços e cantosinaproveitados, verificados na planta, pode-rão ser destinados para depósito dos reciclá-veis. Da mesma forma, poderá ser planejado,a priori, espaço extra nos andares para colo-cação de uma lixeira específica para os reci-cláveis. Se, entretanto, essa questão for ig-norada no projeto, os futuros moradores po-derão ter maiores dificuldades para organizare operacionalizar a coleta seletiva, sendoobrigados a optar por soluções precárias e

muitas vezes inadequadas para disposição,armazenamento e retirada dos materiaisrecicláveis.

Sugerem-se, a seguir, requisitos relati-vos ao lixo domiciliar, como um dos recursosna elaboração do projeto, propiciando melho-res condições ambientais do empreendimento:

� calcular as dimensões das lixei-ras destinadas ao lixo comum deacordo com o número previstode moradores e a periodicidadeda coleta pública;

Fonte: INSTITUTO GEA.

Figura 5 – Depósito de materiais recicláveis em condomínio habitacional

(Condomínio Trafalgar Square) em São Paulo-SP

49

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

� projetar a localização das lixeirasem local de fácil acesso pelosmoradores e que sejam tambémadequadas à retirada pelas em-presas coletoras; e

� prever espaços para colocação decoletores para recicláveis nos an-dares dos prédios de apartamen-tos e para seu depósito e arma-zenamento nas áreas comuns.

3.1.3.6 Adequação às características

do clima local

A rigidez das tipologias urbanísticas ede edificações atualmente empregadas, naconstrução habitacional de interesse social,parece querer indicar, ainda, que se encon-trou uma “fórmula mágica” de adequação daconstrução às condicionantes de clima. Afinal,as mesmas casas ou prédios são construídosaos milhares, com a utilização dos mesmosmateriais e componentes, de norte a sul doPaís, seja em regiões temperadas, seja emregiões de clima quente e úmido, seja emregiões quentes e secas.

Até em uma mesma região existem atri-butos geomorfológicos, tais como unidadese elementos diferenciados do relevo, que so-licitam soluções também diferenciadas. Algu-mas dessas soluções podem corresponderapenas à disposição das edificações, de formaa evitar bloqueio ou concentração de vento,áreas com sombras permanentes e outrosproblemas relacionados ao clima.

Evidentemente, as construções utiliza-das em programas habitacionais de interessesocial têm sido, em sua maioria, inadequadassob o ponto de vista do clima (temperatura,umidade). Ainda que seja possível, com ouso dos mesmos materiais e componentesconstrutivos, obter diferentes resultados dedesempenho térmico, desde que o projetoarquitetônico (e urbanístico) preveja detalhesadequados, não é isto o que ocorre. Em nomeda economia, usa-se também o mesmo pro-jeto, em qualquer situação climática.

Em se tratando de população de baixarenda, a decorrência de projetos inadequa-dos em relação ao clima é, em primeiro lu-gar, a “condenação” a uma provável situaçãocrônica de desconforto térmico para o mora-dor. Em um cenário mais otimista, que admitaa possibilidade de compra e manutenção, pe-los moradores, de ventiladores, aquecedoresou mesmo condicionadores de ar, verifica-se a contrapartida de um consumo de energiaelétrica mais acentuado na habitação, tam-bém indesejável sob o ponto de vistaambiental.

O meio técnico tem avançado, colocan-do à disposição dos projetistas diversosmétodos para análise de desempenho de edi-ficações quanto ao conforto térmico, consi-derando os condicionantes naturais, mate-riais e componentes construtivos, expedien-tes de projeto (tanto de unidades habita-cionais quanto de implantação), arborização,dentre outros. Trata-se, portanto, de lançarmão de tais recursos, mais uma vez com a

50

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

provável adoção de novas tipologias adequa-das, agora, a cada tipo de clima.

Sugere-se, assim, requisito que tratedo clima como um dos recursos na elabo-ração do projeto, para propiciar melhorescondições ambientais do empreendimento:

� adequar ao clima local as carac-terísticas das unidades habita-cionais típicas e de suas formasde implementação no conjunto,visando otimizar o desempenhoquanto ao conforto ambiental.

3.1.3.7 Adaptação cultural

Nas últimas décadas, a crescente ten-dência à globalização da economia foi re-forçando uma antiga aspiração da ArquiteturaModerna, qual seja, a da consolidação de umaArquitetura Internacional. Se, na raiz, essaaspiração visava a democratização da Arqui-tetura e, principalmente, sua extensão às ca-madas de renda mais baixa da sociedade,como resultado foram desaparecendo dosconjuntos habitacionais elementos ou refe-rências que pudessem associá-los à culturaespecífica de cada lugar.

Por sua vez, os meios de comunicação– principalmente a televisão – tendem a ni-velar as aspirações regionais, fazendo comque o processo de “pasteurização cultural”permita tratar da mesma forma a concepçãode um conjunto habitacional, por exemplo,

em Macapá (AP) e em São Joaquim (SC),onde evidentemente ocorrem valores cultu-rais autóctones importantes, que não serefletem nos conjuntos.

Não se trata aqui da defesa de umaarquitetura cosmética, onde a título de “men-ção cultural” colocam-se frisos ou pinturascom motivos buscados na cultura local, sobreum único modelo de casa. Trata-se, isto sim,de recuperar, nas próprias formas tradicionaisde construir da região, os ensinamentos tãonecessários à melhor adequação da Arquite-tura ao local. Tal procedimento extrapola aquestão plástica e envereda, por exemplo, navalorização de materiais locais, se possível, ena forma de agregá-los em uma habitação,respondendo ainda às condicionantes de climae respeitando costumes e tradições locais noque diz respeito ao uso dos espaços da casa.

Sugere-se, assim, requisito que trate aquestão cultural como um dos recursos naelaboração do projeto, para propiciar melho-res condições ambientais do empreen-dimento:

� verificar a ocorrência de traçosculturais diferenciados na regiãoe, constatadas particularidadesrelevantes, procurar sua efetivaincorporação ao projeto.

3.1.3.8 Cuidados com a privacidade

Mesmo destacando a necessidade de in-teração entre os usuários de um empreendi-

51

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

mento habitacional e a importância de apli-cação do conceito de unidades de vizinhançana relação com as ocupações do entorno, étambém fundamental contemplar a indivi-dualidade desses usuários. Para respeitar suaprivacidade, o projeto pode se municiar decomponentes construtivos e arranjos ade-quados das moradias e do seu sistema decirculação, bem como se utilizar de expedien-tes relacionados com o projeto paisagístico,tratando tanto do aspecto visual como dequestões relacionadas a ruídos.

Indicam-se, a seguir, requisitos que tra-tem da privacidade como um dos recursosna elaboração do projeto, propiciando me-lhores condições ambientais do empreen-dimento:

� verificar se as características doprojeto de unidades habitacionaise de implantação asseguramprivacidade adequada aos mora-dores, no interior das moradias; e

� verificar se não há circulações pú-blicas junto a janelas de unidades.

3.1.3.9 Escolha dos componentes

construtivos e modulação

A disponibilidade, no mercado, de di-versos componentes construtivos com possi-bilidade de emprego em programas de habi-tação de interesse social leva a crer que cadaprojeto deva incorporar claramente as ca-

racterísticas dos componentes a utilizar.Deve-se valer da consideração das medidasde cada componente em sua relação com odimensionamento dos ambientes e do edifíciocomo um todo, e do desempenho potencialde cada sistema de construção.

Igualmente, a escolha do sistema cons-trutivo deve contemplar a previsão de futurasampliações das moradias, apresentando de-talhes construtivos, seja com os mesmoscomponentes básicos, seja para sistemasconvencionais. Seria também desejável queos projetos previssem a possibilidade de usoparcial de habitações como estabelecimentoscomerciais, que usualmente vão sendo incor-porados no empreendimento, os quais devemestar previstos no plano de desenvolvimentointegrado.

Projetar considerando a modulação doscomponentes construtivos disponíveis signi-fica, além de evitar conflitos posteriores denormas técnicas e legais de usos de espaçoscoletivos e públicos, também minimizar a ge-ração de entulho na obra e maior racionali-zação da construção. Por outro lado, a consi-deração do desempenho potencial reduz orisco de insucessos.

Atualmente, somam-se aos produtos,tanto tradicionais como inovadores, umanova categoria de materiais para a constru-ção, aqueles produzidos a partir de rejeitosde outros processos. A ação de aproveita-mento de rejeitos é mais do que desejável,sendo tida até como necessária; entretanto,

52

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

deve ser examinada com cuidado, pois cons-titui ainda temas em pesquisa e estudo. Jáexistem critérios e métodos para a avaliaçãodo desempenho potencial de produtos inova-dores, sem avaliar seu desempenho am-biental, principalmente considerando todo oseu ciclo de vida.

Recomendam-se, a seguir, requisitosque tratem dos componentes construtivoscomo um dos recursos na elaboração do pro-jeto, propiciando melhores condições am-bientais do empreendimento:

� verificar a adequação do projetoà modulação dos componentesconstrutivos a empregar, ponde-rando dentre os tipos disponíveisno mercado, de forma a reduzirperdas;

� observar se o sistema construti-vo adotado no projeto privilegiaa utilização de materiais e com-ponentes construtivos de produ-ção local ou regional, ou se temrisco ambiental potencial, emrazão da incorporação de resí-duos industriais, ou se tem de-sempenho potencial satisfatório,fundamentalmente sua dura-bilidade;

� buscar informações que per-mitam analisar o desempenhoambiental dos componentesconstrutivos durante todo o seuciclo de vida; e

� observar se o sistema constru-tivo adotado no projeto adapta-se às características da mão-de-obra e de recursos técnicoslocais.

3.1.4 Quadro-Síntese daFase de Planejamento

Foram apresentados os principais as-pectos ambientais que devem ser observadosdurante a fase de planejamento, de modo aevitar problemas nas demais fases do em-preendimento. Alguns desses aspectos sãomostrados na Figura 6.

As principais questões que devem serapreciadas durante essa fase, de acordo comas considerações tratadas nas etapas deidentificação da demanda, seleção de árease elaboração do projeto, são apresentadasno Quadro 3. Constitui uma síntese dasrecomendações contempladas como relevan-tes nessa primeira fase, e que visam fornecermelhores condições ambientais ao empreen-dimento habitacional.

53

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Fonte: ARQUIVO IPT. Montagem de Waldyr Dantas Cortez.

Figura 6 – Alguns aspectos ambientais a serem observados na etapa de seleção de área(problemas ambientais no entorno, disponibilidade de infra-estrutura) e de projeto

(características do terreno)

54

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

Quadro 3 – Recomendações na fase de Planejamento,

considerando as alterações previstas nos processos ambientais

Etapas Atividades Alterações Ambientais Ações e Medidas Recomendadas

• avaliar as necessidades dos futuros moradores.Adequação às considerando a composição familiar e a

IDENTIFICAÇÃO necessidades • meio antrópico: relacionadas à qualidade localização de suas atividades de trabalho eDA DEMANDA dos futuros de vida dos futuros usuários. educação; e

usuários • criar mecanismos de participação dos usuáriosnas outras etapas de planejamento.

• pesquisar a região destinada aoempreendimento, identificando eventuaisfontes próximas de problemas ambientais elevantando o passivo ambiental da área;

• investigar as situações de risco, analisando asuscetibilidade a processos do meio físico,utilizando informações e dados básicos, taiscomo geologia, solos, declividades,pluviometria e histórico de eventos;

• realizar mapa de risco potencial, considerandoa inserção do empreendimento na área;

• meio físico: deflagradas em áreas vizinhas • analisar ventos dominantes e verificar se estese com possibilidade de atingir a área do não tendem a trazer emissões atmosféricas

Identificação empreendimento; e provenientes de lixões, indústrias e lagoas dede problemas • meio antrópico: relacionadas com a tratamento de esgotos;ambientais no qualidade de vida dos usuários advindas • identificar a possibilidade e o custo delocal e entorno de fontes notáveis de problemas ambientais eliminação de risco da área do

em áreas próximas. empreendimento;• no caso de impossibilidade técnica ou

SELEÇÃO econômica de eliminação da fonte e/ouDE ÁREAS descontaminação da área destinada ao

empreendimento (ou de atenuação aceitávelde seus efeitos), contra-indicar a área;

• no caso de fontes neutralizáveis, providenciare documentar compromisso com a eliminaçãoou de atenuação aceitável de seus efeitos,identificando os níveis a obter, os prazos e osresponsáveis pela execução e fiscalização; e

• desenvolver programas interagindo osmoradores com o entorno.

• nos três segmentos do meio ambiente:relacionadas à necessidade de construçãodo sistema viário, transporte coletivo,

Identificação da abastecimento de água, esgotamento • verificar a disponibilidade de infra-estrutura oudisponibilidade sanitário, coleta de lixo, redes locais de assegurar sua implementação, obtendo o

de infra-estrutura drenagem, fornecimento de energia elétrica, compromisso com os órgãos competentes,telefonia, equipamentos públicos e estabelecendo metas, prazos e monitoramento.comunitários, assim como estabelecimentoscomerciais.

(continua)

55

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Quadro 3 – Recomendações na fase de Planejamento,

considerando as alterações previstas nos processos ambientais

Etapas Atividades Alterações Ambientais Ações e Medidas Recomendadas

••••• estudar a documentação referente aoplanejamento da área/região, contemplando:- plano diretor do município;- planos de desenvolvimento específicos para a área/região;

••••• meio antrópico: relacionadas a conflitos com - potencialidade mineral, com análise deAvaliação da outros usos do solo previstos para a mesma eventual oneração da área em relação aos

SELEÇÃO compatibilidade área ou a incorporar no planejamento do títulos minerários junto aos órgãosDE ÁREAS ambiental com município, tais como mineração, atividades competentes (requerimento de pesquisa e

outros usos agrícolas, reservatórios e unidades de lavra).conservação. • pesquisar junto ao Poder Público local a

necessidade/possibilidade de introdução, nalegislação urbana, de mecanismos dediversificação de funções na área/região e aomesmo tempo impeçam a implementação defontes de problemas ambientais.

••••• recomendar a elevação do padrão dehabitabilidade integrando o empreendimentono desenvolvimento urbanístico da cidade, commedidas para a instalação de infra-estrutura eserviços públicos, seu monitoramento eavaliações posteriores, em um processocontínuo de gestão, estabelecendo-seresponsabilidades;

• possibilitar o aumento do poder aquisitivo dosElaboração moradores, com um programa dede plano de • nos três segmentos do meio ambiente, desenvolvimento sustentável, com medidas

desenvolvimento particularmente no meio antrópico. como reestruturação tarifária e deintegrado financiamento;

PROJETO • corrigir problemas jurídicos de propriedade daterra em situações irregulares, tal como naconstrução de conjuntos para relocação depopulação de favelas, além de revisão denormas técnicas relativas a infra-estrutura esistemas construtivos; e

• promover a organização e o envolvimento dacomunidade no processo de urbanização,principalmente na integração com a vizinhançae no trato dos espaços coletivos e públicos.

• meio físico: em conseqüência de tipologias • buscar novas tipologias, capazes de inverterAdequação às de projeto inadequadas ao terreno, exigindo práticas comuns de adaptação dascaracterísticas extensas terraplenagens e induzindo a características do terreno ao projeto,geométricas ocorrência de instabilidades; compatibilizando-as com o relevo, osdo terreno • meio biótico: devido ao desmatamento e processos do meio físico presentes ou poten-

fasta de projeto paisagístico; e ciais e os parâmetros geotécnicos dos solos;

(continuação)

(continua)

56

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

Quadro 3 – Recomendações na fase de Planejamento,

considerando as alterações previstas nos processos ambientais

Etapas Atividades Alterações Ambientais Ações e Medidas Recomendadas

• especificar procedimento de proteção dosistema viário contra processos erosivos;

• elaborar e adequar o projeto de movimentosde terra, cuidando da especificação deproteção superficial e/ou de estruturas decontenção para taludes;

• tratar, no projeto, de áreas que ficarãoexpostas a processos de meio físico, tais como

Adequação às • meio antrópico: devido às alterações dos erosões, assoreamentos, inundações e

características processos do meio físico e biótico, elevando escorregamentos, devendo-se evitar que obras

geométricas significativamente o custo do empreendi- de contenção necessárias fiquem a cargo dos

do terreno mento e reduzindo a qualidade de vida dos futuros moradores; eusuários. • elaborar e adequar o projeto de drenagem

interna ao conjunto, com terminações dosistema de drenagem e sua conexão com redesdo entorno ou sistemas localizados delançamento, assegurando a preservação deterrenos vizinhos. A especificação de cuidadosna implantação do sistema de drenagem devepermitir que este, ao término das obras, estejatotalmente livre, desobstruído e desassoreado.

PROJETO• meio físico: pelo uso inadequado do

terreno previsto para equipamentos• tolerar localização periférica dessas áreaspúblicos e comunitários, causando

somente quando junto a trechos tipicamenteLocalização de contaminação do solo e da água, eurbanos, já ocupados e consolidadosequipamentos instabilizações de vertentes;no entorno; epúblicos • meio biótico: pelo abandono de áreas

comunitários destinadas a parques e jardins; • utilizar, nas áreas de lazer, massas de

e de áreas • meio antrópico: pela redução da qualidade vegetação com fisionomia florestal semelhante

comerciais de vida dos usuários, na falta de às matas nativas da região, respeitando o

equipamentos públicos, comunitários e espaço e as características naturais do local.

áreas comerciais.

• meio antrópico: reduzindo a qualidade de • adequar ao clima local as características dasAdequação às vida dos usuários com desconforto térmico unidades habitacionais típicas e de suas formascaracterísticas e exigindo compensações com maior de implementação no conjunto, visandodo clima local consumo de energia. otimizar o desempenho quanto ao conforto

ambiental.

• adotar redes de água, esgoto, eletricidade eiluminação pública, internas ao conjunto,

Planejamento • meio antrópico: pela redução da qualidade assegurando-se o atendimento adequado ado projeto de de vida dos usuários, na falta de todas as unidades;infra-estrutura infra-estrutura interna. • adotar a disposição do posteamento,

interna assegurando-se sua não interferência emacessos a unidades/condomínios;

(continuação)

(continua)

57

CAPÍTULO 3 - FASES DE UM EMPREENDIMENTO E ASPECTOS AMBIENTAIS

Quadro 3 – Recomendações na fase de Planejamento,

considerando as alterações previstas nos processos ambientais

Etapas Atividades Alterações Ambientais Ações e Medidas Recomendadas

• adotar a iluminação pública nos arruamentos eáreas públicas previstas (incluindo sistemas delazer, áreas destinadas a equipamentospúblicos, comunitários e comércio),assegurando-se sua suficiência;

• verificar as possibilidades de circulação viáriainterna e de acesso à malha urbana,estabelecendo sua correção;

• identificar a existência de redes locais dedrenagem pública e verificar sua capacidadeem receber os novos fluxos de águaconcentrados que terão origem no conjunto.

PlanejamentoCaso a rede não esteja adequada ao

do projeto de• meio antrópico: pela redução da qualidade recebimento dos novos fluxos, obter

infra-estruturade vida dos usuários, na falta de compromisso documentado de sua adequação

internainfra-estrutura interna. em tempo hábil;

• no caso de inexistência de rede pública dedrenagem na região e de haver previsão deconstrução no local, obter documentação decompromisso de implementação. Se nãohouver previsão para sua construção, identificar

PROJETO pontos mais favoráveis de concentração elançamento. Observar, também, a necessidadede previsão de obras de extremidade nosistema de drenagem, como dissipadores develocidade de escoamento e vertedouros; e

• atrelar a entrega de unidades à implantaçãocompleta do sistema de drenagem do conjunto,destacando a execução de obras de destinação,no entorno, das águas captadas.

• calcular as dimensões das lixeiras destinadasao lixo comum de acordo com o númeroprevisto de moradores e a periodicidade dacoleta pública;

Planejamento • meio antrópico: pela redução da qualidade • projetar a localização das lixeiras em local deda disposição e de vida dos usuários e, eventualmente, fácil acesso pelos moradores e que sejam

encaminhamento no custo de adaptações futuras ou receitas também adequadas à retirada pelas empresasdo lixo domiciliar de recicláveis. coletoras; e

• prever espaços de coletores para recicláveis nosandares dos prédios de apartamentos e para seudepósito e armazenamento nas áreas comuns.

• meio antrópico: em relação à preservação • verificar a ocorrência de traços culturaisAdaptação de valores culturais específicos e impor- diferenciados na região e, constatadas

cultural tantes de cada região. particularidades relevantes, procurar suaefetiva incorporação ao projeto.

(continuação)

(continua)

58

HABITAÇÃO E MEIO AMBIENTE - Abordagem integrada em empreendimentos de interesse social

Quadro 3 – Recomendações na fase de Planejamento,

considerando as alterações previstas nos processos ambientais

Etapas Atividades Alterações Ambientais Ações e Medidas Recomendadas

••••• verificar se o projeto assegura privacidadevisual adequada aos moradores, no interiorCuidados com ••••• meio antrópico: relacionadas à qualidadedas moradias; ea privacidade de vida dos usuários.

• verificar se não há circulações públicas junto ajanelas de unidades.

• verificar a adequação do projeto à modulaçãodos componentes construtivos a empregar,ponderando dentre os tipos disponíveis nomercado, de forma a reduzir perdas;

PROJETO • observar se o sistema construtivo privilegia autilização de materiais e componentes

Escolha dos • meio físico: relacionadas à geração de construtivos de produção local ou regional, oucomponentes entulhos na obra; e se tem risco ambiental potencial, em razão daconstrutivos e • meio antrópico: relacionadas ao custo incorporação de resíduos industriais, ou se

modulação da obra e geração de empregos. tem desempenho potencial satisfatório,fundamentalmente sua durabilidade;

• buscar informações que permitam analisar odesempenho ambiental dos componentesconstrutivos durante todo o seu ciclo de vida; e

• observar se o sistema construtivo adapta-se àscaracterísticas da mão-de-obra e de recursostécnicos locais.

(continuação)

3.2 CONSTRUÇÃO

A fase de construção do empreendi-mento envolve atividades com maior inter-ferência no ambiente, compreendendo desdealterações nos processos naturais de movi-mentação de massa, a partir das terraple-nagens e obras para execução da infra-es-trutura e edificações, até a geração e dispo-sição de entulhos resultantes. A finalizaçãodessa fase constitui, geralmente, a etapa depaisagismo, onde a vegetação também par-ticipa enquanto contenção, tal como na pro-teção ao processo erosivo de vertentes.

As principais etapas e atividades da fasede construção são apresentadas a seguir,considerando as conseqüências de ações ina-dequadas dessa fase e recomendando proce-dimentos para sua abordagem ambientalintegrada.

3.2.1 Terraplenagem

Trata-se do movimento de terra neces-sário para amoldar os terrenos para a cons-trução de uma obra, constituindo-se em umconjunto de operações de escavação, trans-porte, disposição e compactação de terras,