2
RADAR PAPO-CABEÇA TRAçO: Página de Cambaco que revela o estilo minimalista de Manu Maltez 52 Go Outside 07.17 GO OUTSIDE: O elefante é real- mente especial para você? MANU MALTEZ: Desde a infân- cia, tenho a impressão de ter visto um ao vivo no zoológico. Acho que o elefante está em nosso inconsciente desde sempre. Tenho um fascínio pelas histórias sobre sua memória e sensibilidade. São seres fascinantes. O enredo do livro tem tudo a ver com memória e inconsciente. O “homem-ele- fante” que eu criei nos desenhos carrega tudo isso em seu pisar. Como se desenvolveu Cambaco, da música ao livro? Surgiu primeiramente como uma música, que fiz em parce- ria com o compositor Vicente Barreto. Ele me apresentou a obra, instrumental, e a partir daí fiz a letra; a música ficou tão carregada de imagens e sig- nificados que acabou virando o nome do disco dele (para o qual também criei a arte). Em segui- da, veio um curta de animação e, agora, este livro. Corre o risco de seu livro ser ven- dido na seção infanto-juvenil... Eu nunca disse que é um livro infanto-juvenil e, aliás, tenho medo dessas subdivisões. Des- confio de qualquer coisa desse tipo quando se trata de criar, de fazer arte. Quando crio um livro, nunca penso para qual tipo de público ele se destina. No momento você já está traba- lhando em um novo projeto? Em 2014, lancei pelo selo Sesc o filme O Diabo Era Mais Embaixo, que mistura cinema-animação com música. No momento, estou fazendo algo semelhante, que envolve um livro, um disco e um filme, chamado O Rabequei- ro Maneta e a Fúria da Natureza, um projeto selecionado pelo programa Rumos Itaú Cultural. DIVULGAçãO “Cambaco” é uma palavra usada em Moçambique – país africano cuja língua oficial é o português – para designar um elefante velho que se separa da manada para vaguear solitário esperando a morte chegar (seja por razões naturais ou pelo encontro inesperado com um caçador interessado em seu marfim). Quando o multiartista paulista Manu Maltez descobriu o significado de “cambaco”, ele a relacionou a um estado de espírito. “Não foi à toa que essa palavra me veio à mente quando o [músico e compositor] Vicente Barreto me mostrou uma de suas músicas para eu compor a letra”, diz Manu. A música virou o curta-metragem Cambaco, de 2015, uma animação ilustrada por Manu – e que agora vira também um livro. O artista trabalha com diversas linguagens. Seu estilo único de desenhar começa com um risco minimalista e despretensioso, assume o aspecto de um esboço e, como em um passe de mágica, ganha formatos hiper-realistas que deixam claro um movimento perfeito. Conforme as páginas são viradas, a jornada do elefante solitário é entremeada com cenários apo- calípticos de uma natureza modificada pelo homem e por sutilezas mitológicas e oníricas. “Cambaco é um novo e inesperado momento de vida”, explica Manu. “Uma estranha calma que tem estado pre- sente em mim desde que comecei essa fase.” A seguir, ele fala mais sobre seu mais recente trabalho. ALMA DE ELEFANTE LIVRO Cambaco, de Manu Maltez. R$ 45, 80 páginas | edicoessm.com.br Por Mario Mele

radarƒ³digo-do-Surfista.pdf · 2017. 8. 14. · sobre o quanto nós, seres modernos, estamos perdendo o senso de confi ança e a capacidade de adaptação. Por isso, o fi lme é

  • Upload
    others

  • View
    5

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: radarƒ³digo-do-Surfista.pdf · 2017. 8. 14. · sobre o quanto nós, seres modernos, estamos perdendo o senso de confi ança e a capacidade de adaptação. Por isso, o fi lme é

radar

PA P O - CA B E Ç A

TRAçO:Página de Cambaco que revela o estilo minimalista de Manu Maltez

52 Go Outside 07. 17

GO OUTSIDE: O elefante é real-

mente especial para você?

MANU MALTEZ: Desde a infân-

cia, tenho a impressão de ter

visto um ao vivo no zoológico.

Acho que o elefante está em

nosso inconsciente desde

sempre. Tenho um fascínio pelas

histórias sobre sua memória

e sensibilidade. São seres

fascinantes. O enredo do livro

tem tudo a ver com memória e

inconsciente. O “homem-ele-

fante” que eu criei nos desenhos

carrega tudo isso em seu pisar.

Como se desenvolveu Cambaco,

da música ao livro?

Surgiu primeiramente como

uma música, que fiz em parce-

ria com o compositor Vicente

Barreto. Ele me apresentou a

obra, instrumental, e a partir

daí fiz a letra; a música ficou

tão carregada de imagens e sig-

nificados que acabou virando o

nome do disco dele (para o qual

também criei a arte). Em segui-

da, veio um curta de animação

e, agora, este livro.

Corre o risco de seu livro ser ven-

dido na seção infanto-juvenil...

Eu nunca disse que é um livro

infanto-juvenil e, aliás, tenho

medo dessas subdivisões. Des-

confio de qualquer coisa desse

tipo quando se trata de criar, de

fazer arte. Quando crio um livro,

nunca penso para qual tipo de

público ele se destina.

No momento você já está traba-

lhando em um novo projeto?

Em 2014, lancei pelo selo Sesc o

filme O Diabo Era Mais Embaixo,

que mistura cinema-animação

com música. No momento,

estou fazendo algo semelhante,

que envolve um livro, um disco e

um filme, chamado O Rabequei-

ro Maneta e a Fúria da Natureza,

um projeto selecionado pelo

programa Rumos Itaú Cultural. div

ulg

ão

“Cambaco” é uma palavra usada em Moçambique – país africano cuja língua oficial é o português – para designar um elefante velho que se separa da manada para vaguear solitário esperando a morte chegar (seja por razões naturais ou pelo encontro inesperado com um caçador interessado em seu

marfim). Quando o multiartista paulista Manu Maltez descobriu o significado de “cambaco”, ele a relacionou a um estado de espírito. “Não foi à toa que essa palavra me veio à mente quando o [músico e compositor] Vicente Barreto me mostrou uma de suas músicas para eu compor a letra”, diz Manu.

A música virou o curta-metragem Cambaco, de 2015, uma animação ilustrada por Manu – e que agora vira também um livro. O artista trabalha com diversas linguagens. Seu estilo único de desenhar começa com um risco minimalista e despretensioso, assume o aspecto de um esboço e, como em um passe de mágica, ganha formatos hiper-realistas que deixam claro um movimento perfeito.

Conforme as páginas são viradas, a jornada do elefante solitário é entremeada com cenários apo-calípticos de uma natureza modificada pelo homem e por sutilezas mitológicas e oníricas. “Cambaco é um novo e inesperado momento de vida”, explica Manu. “Uma estranha calma que tem estado pre-sente em mim desde que comecei essa fase.” A seguir, ele fala mais sobre seu mais recente trabalho.

AlmA de elefAnte

liVrO

Cambaco, de Manu Maltez. R$ 45, 80 páginas | edicoessm.com.br

Por mario mele

Page 2: radarƒ³digo-do-Surfista.pdf · 2017. 8. 14. · sobre o quanto nós, seres modernos, estamos perdendo o senso de confi ança e a capacidade de adaptação. Por isso, o fi lme é

07.17

A nOVA AVentURA

Aventuras épicas merecem ser registradas e, provavelmente, foi este o objetivo inicial de cinco amigos que decidiram dar uma grande volta no Alasca por trilhas, rios e mares selvagens. A mis-são começou de caiaque oceânico pelo Mar de Bering. Em segui-da, usando fat bikes e botes infl áveis portáteis, exploraram cantos escondidos da Península de Kenai, onde viram ursos e remaram ao lado de baleias. Nesse documentário, além de se mostrarem totalmente inseridos na nova era da aventura, cujos equipamentos evoluídos encurtaram e interligaram as distâncias, eles fi losofam sobre o quanto nós, seres modernos, estamos perdendo o senso de confi ança e a capacidade de adaptação. Por isso, o fi lme é uma inspiração para revertermos isso.

SURfAndO A PRÓPRIA VIdA

Por tudo o que representa no surf, o sul-africano Shaun Tomson, 61, teria boas histórias para contar. Como competidor, foi o primeiro cara a quebrar a hege-monia australiana no esporte, tornando-se campeão mundial, em 1977. E, como integrante da geração Free ride – ao lado de Mark richards e rabbit Bartholo-mew –, revolucionou o esporte em atitude e estilo. Sua vida pessoal também é recheada de grandes emoções, nem sempre boas: Shaun, que fundou duas mar-cas milionárias de surf durante as décadas de 1980 e 1990, perdeu um fi lho de 15 anos em 2006, em consequência de uma brincadeira imprudente de adoles-cente. No livro O Código do Surfi sta (lançado originalmente em 2011 e que agora ganha versão em português), o sul-africano passa a limpo seus altos e baixos e revela como conseguiu redescobrir a felicidade depois de uma perda irreparável.

O Código do Surfi sta: Doze Lições Simples para Surfar a Vida, de Shaun Tomson (com Patrick Moser). R$ 42, 168 páginas | editoragaia.com.br

PA P O - CA B E Ç A

liVrO

Instruments of Adventure, de Bjørn Olson. Grátis no vimeo.com/221110753

DOCUMENTÁriO

07. 17 Go Outside 53

PInK flOYd de PROteStODepois de 25 anos sem lançar um álbum com inéditas, o inglês roger Waters, mais conhecido como um dos líde-res-fundadores e baixista do Pink Floyd, não decepcionou com Is This Life We Really Want?. Em boa parte porque os ecos do Floyd estão facilmente audíveis no novo disco, em faixas como “Smell the roses” (que parece uma releitura de “Have a Cigar”, do álbum Wish We Were Here) e “Déjà Vu” (que lembra passagens de Animals). Mas é inegável que, em tempos de Trump, Brexit e refugiados de guerra, ro-ger, hoje com 73 anos, está mais porta-voz do bom senso do que nunca. Os ambientes sonoros formados por arranjos de cordas e solos de guitarra, porém, não deixam Is This Life We Really Want? com cara de um simples disco de protesto – por mais que você tenha a resposta na ponta da língua.

Is This Life We Really Want?, de Roger Waters. uS$ 11 (download); uS$ 35 (lP) | rogerwaters.com

MÚSiCA