141
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP Fernanda Ramos Pazello DESONERAÇÕES TRIBUTÁRIAS DAS OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO: A IMUNIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS E A ISENÇÃO DO ISS MESTRADO EM DIREITO São Paulo 2008

Fernanda Ramos Pazello

  • Upload
    fvg50

  • View
    11

  • Download
    5

Embed Size (px)

DESCRIPTION

tributário errsd

Citation preview

Page 1: Fernanda Ramos Pazello

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULOPUC/SP

Fernanda Ramos Pazello

Desonerações tributárias Das operações De exportação: a imuniDaDe Das contribuições sociais e a isenção Do iss

MESTRADO EM DIREITO

São Paulo

2008

Page 2: Fernanda Ramos Pazello

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULOPUC/SP

Fernanda Ramos Pazello

Desonerações tributárias Das operações De exportação: a imuniDaDe Das contribuições sociais e a isenção Do iss

MESTRADO EM DIREITO

TeseapresentadaàBancaExaminadoracomoexigênciaparcialparaaobtençãodo títulodeMestre emDireitodoEstado–Subárea:DireitoTributário,pelaPontifíciaUniversidadeCatólicadeSãoPaulo, soborientaçãodoProfessorEstevãoHorvath.

São Paulo

2008

Page 3: Fernanda Ramos Pazello

BancaExaminadora

______________________________________________

______________________________________________

______________________________________________

iii

Page 4: Fernanda Ramos Pazello

Dedico este trabalho ao meu marido, NelsoN TrombiNi JuNior,pelo auxílio, paciência

e incentivo na elaboração da dissertação.

Aos meus amados pais,roberTo TaNus PazelloeelizabeTh ramos Pazello,

por sempre confiarem na minha capacidade, apoiando totalmente a realização dos meus sonhos.

Ao escritórioPiNheiro NeTo advogados e, em especial, aos meus amigos

José roberTo PisaNi, sérgio FariNa Filho,Tércio chiavassa eDiego CalDas R. De simone,pelas contribuições valorosas

para o início e o término do Curso de Mestrado.

Por fim, um agradecimento especial ao Doutor ProfessoresTevão horvaTh,

pela valiosa orientação dispensada ao presente estudo.

iv

Page 5: Fernanda Ramos Pazello

RESUMO

Opresentetrabalhobuscaanalisaraabrangênciadaimunidadetributáriadascontri-buiçõessociaissobreasreceitasdecorrentesdeexportação,bemcomoosentidoeoalcancedaisençãotributáriadoImpostoSobreServiçodeQualquerNatureza(“ISS”)sobreaexportaçãodeserviços.

Otrabalhocompõe-sedecincocapítulosdistintos.Inicialmente,cuida-sededelimitarotemaedemonstraraimportânciadoseuestudo,bemcomoestabeleceraspremissasnecessá-riasparaoaprofundamentodadiscussão.Assim,nosdedicamosàanálisedealgunsaspectosrelacionadosàscompetênciastributáriastraçadasnoSistemaConstitucionalBrasileiro,maisespecificamente à repartição de competências entre os entes políticos, à classificação dos tribu-tosemespécies,àscaracterísticasdascontribuiçõessociais,aoslimitesdopoderreformadoreàfunçãodaleicomplementar.

Em seguida, tratamos da acepção de extrafiscalidade e analisamos sua influência sobre osprincípiosinformadoresdoSistemaConstitucionalTributário.Após,abordamosdoisinsti-tutostributáriosligadosàdesoneraçãotributária,quaissejam:aimunidadeeaisenção,apri-morandooestudosobreainterpretaçãodasnormasimunizanteseisentivas.Posteriormente,delimitamos o conceito de operação de exportação, examinamos sua tributação no Brasil e defi-nimos qual é a finalidade atribuída pelo Sistema Constitucional às operações de exportação.

Por fim, desenvolvemos uma visão crítica e científica dos dois temas que nos propo-mosaestudar,paraconcluirque(i)aimunidadedasreceitasdecorrentesdeexportaçãoabrangetambémaContribuiçãoSocialsobreoLucro(“CSL”),aContribuiçãoProvisóriasobreMovi-mentaçãoFinanceira(“CPMF”),avariaçãocambialativadecorrentedereceitadeexportaçãoeasvendasefetuadasàZonaFrancadeManaus(“ZFM”);e(ii)anormaisentivadoISSalcançaosserviçoscujoresultado(entenda-sebenefício)foiauferidoportomadorestrangeiro.

palavras-chave: desoneraçãotributária–operaçãodeexportação–contribuiçãosocial–ISS–exportaçãodeserviço–receitadecorrentedeexportação–variaçãocambial.

v

Page 6: Fernanda Ramos Pazello

ABSTRACT

Thisworklooksintotheextentoftaximmunityrelatingtosocialcontributiononex-portincome,andalsoaddressesthemeaningandextentoftaxexemptionofTaxonServicesofanyKind(“ISS”)leviedonserviceexports.

This paper is divided into five distinct chapters. The first chapter delimits the matter understudyanditsimportance,andsetsoutthepremisesthatwillbepivotaltodelveintothissubject.Inthischapter,wewill thusanalyzesomeaspectsrelatingtothelevelsoftaxcom-petenceoutlinedin theBrazilianconstitutionalsystem,notably theallocationof jurisdictionamong political entities; classification of taxes into distinct types; the characteristics of social contributions;thelimitsofappellateauthorities;andtheroleofsupplementarylaw.

We shall then turn to the concept of extra-fiscal policy (extrafiscalidade) and its influen-ceontheprinciplesundertheConstitutionalTaxationSystem.Subsequently,wewilladdresstwotaxinstitutionsrelatingtotaxreduction,namely,taximmunityandexemption,delvingintotheinterpretationofimmunityandexemptionrules.Wewillthendelimittheconceptofexporttransactions, analyzing their taxation in Brazil and defining the purpose attributed by the Cons-titutionalSystemtoexporttransactions.

Finally, we will build critical and scientific views on two issues under scrutiny, con-cluding that (i) immunity to export income also extends to the Social Contribution on Profits (“CSL”),ProvisionalContributiononFinancialTransactions(“CPMF”),positiveexchangeva-riationsfromexportincomeandsalestotheManausFreeTradeZone(“ZFM”);and(ii)theISSexemption rule reaches the services whose results (namely, benefit) were earned by the foreign taker.

KeyworDs:taxrelief–exporttransactions–socialcontribution–taxonservices(ISS)–serviceexports–exportincome–exchangevariation.

vi

Page 7: Fernanda Ramos Pazello

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃOEESTABELECIMENTODEPREMISSAS................................... 1

1.1 Importânciadotemaedelimitaçãodotrabalho.................................................. 1

1.2 SistemaConstitucionalTributário....................................................................... 5

1.2.1 Competênciatributária............................................................................ 7

1.2.1.1 Classificação dos tributos: as modalidades tributárias.............. 14

1.2.1.2 Contribuiçõessociais:artigo149daCF/88.............................. 17

1.2.1.3 Emendasconstitucionaisemmatériatributária:limitesdopoderreformador................................................................................. 21

1.2.1.4 Afunçãodaleicomplementaremmatériatributária................ 28

2. EXTRAFISCALIDADE............................................................................................. 34

2.1 Acepçãoadotada................................................................................................. 34

2.2 Sua influência sobre os princípios informadores do Sistema Constitucional Tributário............................................................................................................ 37

2.2.1 Noçãodeprincípio.................................................................................. 37

2.2.2 Princípiorepublicano.............................................................................. 39

2.2.3 Princípiofederativo................................................................................. 44

2.2.4 Princípiodalegalidade............................................................................ 45

2.2.5 Princípiodasegurançajurídica............................................................... 46

3. DESONERAÇÕESTRIBUTÁRIAS.......................................................................... 49

3.1 Imunidadetributária............................................................................................ 50

3.2 Isençãotributária................................................................................................. 55

3.3 Interpretaçãodasnormasimunizanteseisentivas.............................................. 58

4. OPERAÇÕESDEEXPORTAÇÃO............................................................................ 65

4.1 Propostaconceitual............................................................................................. 65

4.2 TratamentoatribuídopelaConstituiçãoFederalde1988................................... 66

vii

Page 8: Fernanda Ramos Pazello

4.2.1 Suatributação.......................................................................................... 66

4.2.1.1 Imposto de Exportação: caráter extrafiscal............................... 66

4.2.1.2 IPIeICMS:imunidadeintegrada.............................................. 67

4.2.1.3 ISS:isençãoheterônoma........................................................... 70

4.2.1.4 AscontribuiçõessociaiseaCide.............................................. 71

4.2.2 Finalidadeconstitucional......................................................................... 72

5. QUESTÕESASEREMDEBATIDAS........................................................................ 76

5.1 Imunidadedasreceitasdeexportaçãoparaascontribuiçõessociais................. 76

5.1.1 ImunidadeaplicávelàCSL..................................................................... 78

5.1.2 ImunidadeaplicávelàextintaCPMF...................................................... 88

5.1.3 Imunidadeaplicávelàvariaçãocambialativadecorrentedereceitadeexportação............................................................................................... 93

5.1.4 VendasefetuadasàZonaFrancadeManaus........................................... 99

5.2 OISSeaexportaçãodeserviços........................................................................ 103

5.2.1 Pressupostoconstitucional...................................................................... 103

5.2.2 Afunçãodaleicomplementar................................................................. 104

5.2.3 Earegra-matrizdeincidênciatributária................................................. 106

5.2.4 Osentidoeoalcancedoartigo2.ºdaLC116/2003............................... 111

5.2.5 AdecisãodoSuperiorTribunaldeJustiça.............................................. 119

6. SÍNTESECONCLUSIVA........................................................................................... 122

7. REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS........................................................................ 128

viii

Page 9: Fernanda Ramos Pazello

1

INTRODUÇÃO E ESTABELECIMENTO DE PREMISSAS

1.1 Importância do tema e delimitação do trabalho

Até meados de 2002, o desempenho das exportações no Brasil era pífio. A partir de

então,oBrasilpassouaviverumcenárioinverso,comumaaltataxadecrescimentodasex-portaçõesbrasileiras,oquetemsidomuitoprofícuoaoPaís,namedidaemqueacarretaumelevado desenvolvimento econômico, com influência nos setores da indústria, do comércio, da prestaçãodeserviçosedaagricultura.

OBrasil,emrazãodosseusdiversostributosindiretossobreaproduçãoeaexpor-

taçãodeprodutosemercadorias,necessitadeinstrumentosjurídicosadequadosparagarantir

igualdadedeoportunidadesaosexportadoresbrasileirosnocomérciointernacional.Issoporque

ésabidoqueaexportaçãodetributosgeraumaumentodovalordosprodutosemercadorias

exportadas,desfavorecendoocrescimentonacionaleaformaçãodobalançodepagamento.

Verificaremos que o ordenamento jurídico brasileiro tem se preocupado em diminuir acargatributáriaincidentesobreasoperaçõesdeexportação,sejamasexportaçõesdeprodu-tos/mercadoriasouasexportaçõesdeserviços.AConstituiçãoFederalde1988(“CF/88”),comsuasdiversasalterações,bemcomoohistóricolegislativodetributaçãonoBrasil,nãodeixamdúvidas a respeito disso. No entanto, algumas questões relacionadas à tributação das operações de exportação encontram divergência entre a interpretação dada pelo poder tributante, peladoutrinaepelajurisprudência.

Inicialmente,cabe-nosperguntar:oqueéumaoperaçãodeexportação?Quandoocor-reaexportaçãodeumproduto/mercadoriaoudeumserviço?Oobjetivodopresentetrabalhoé, imprimindo uma visão científica, responder a tais indagações para que possamos analisar a tributaçãodasoperaçõesdeexportação,otratamentodadopelanossaCartaMagnaàsexpor-taçõesealgumasquestõespontuaisqueencontramdivergêncianadoutrinaenajurisprudênciarelacionadasàsdesoneraçõestributáriasdasexportaçõesdeprodutos/mercadoriaseserviços.

ACartaMagna,emsuaredaçãooriginal,jáprevia–eaindaprevê–aimunidadetri-

butáriadoImpostosobreProdutoIndustrializado(“IPI”)sobreprodutosindustrializadosdes-

Page 10: Fernanda Ramos Pazello

tinadosaoexterior(artigo153,§3.º,incisoIII).1Referidotributo,decompetênciafederal,énão-cumulativo,ouseja,ocontribuintepoderácompensaroquefordevidoemcadaoperaçãocomomontantecobradonasanteriores.

Alémdisso, antesdaEmendaConstitucional42,de19.12.2003 (“EC42/2003”), oImpostosobreaCirculaçãodeMercadorias(“ICMS”)nãoincidiasobreasoperaçõesquedes-tinassem produtos industrializados ao exterior, excluídos os semi-elaborados definidos em lei complementar.ApósaEC42/2003,aimunidadedoICMSpassouaabrangerasoperaçõesquedestinemmercadoriasparaoexterior,bemcomoserviçosprestadosadestinatáriosnoexterior.Nestecaso,aprópriaCartaMagnaassegurouamanutençãoeaproveitamentodomontantedoimpostocobradonasoperaçõeseprestaçõesanteriores(artigo155,§2.º, incisoX,alíneaa,incisoXII,alíneae).2

NoqueconcerneaoImpostosobreServiçosdeQualquerNatureza(“ISS”),aCF/88atribuicompetênciaàleicomplementarparaexcluirasoperaçõesdeserviçosparaoexteriordatributaçãodesteimposto(artigo156,§3.º,incisoII).3ALeiComplementar116,de31.7.2003

� “[...]Art.�53.CompeteàUniãoFederalinstituirimpostossobre:

[...]

IV–produtosindustrializados.

[...]

§3.ºOimpostoprevistonoincisoIV:

[...]

II–seránãocumulativo,compensando-seoquefordevidoemcadaoperaçãocomomontantecobradonasanteriores.

III–nãoincidirásobreprodutosindustrializadosdestinadosaoexterior.

[...].”� “[...]Art.�55.CompeteaosEstadoseaoDistritoFederalinstituirimpostossobre:

[...]

II–operaçõesrelativasàcirculaçãodemercadoriasesobreprestaçõesdeserviçosdetransporteinterestadualeintermunicipaledecomunicação,aindaqueasexportaçõeseasprestaçõesseiniciemnoexterior;

[...]

§�.ºOimpostoprevistonoincisoII:

[...]

X–nãoincidirá:

a) sobreoperaçõesquedestinemmercadoriasparaoexterior,nemsobreserviçosprestadosadestinatáriosnoexterior,asseguradaamanutençãoeoaproveitamentodomontantedoimpostocobradonasoperaçõeseprestaçõesanteriores;

[...]

XII–cabeàleicomplementar:

[...]

e)excluirdaincidênciadoimposto,nasexportaçõesparaoexterior,serviçoseoutrosprodutosalémdosmen-cionadosnoincisoX,a;[...].”

3 “[...]Art.�56.CompeteaosMunicípiosinstituirimpostossobre:

[...]

Page 11: Fernanda Ramos Pazello

3

(“LC116/2003”)instituiuaisençãodeISSsobreasoperaçõesdeexportaçãodeserviços.No

entanto,háumadiscussãodoutrináriaejurisprudencialsobreoqueseriaumaexportaçãode

serviços para fins da aplicação da isenção em questão. Este tema será analisado com profundi-

dadenopresentetrabalho.

Seguindo a mesma linha, os legisladores complementar e ordinário sempre isenta-

ramasreceitasdecorrentesdeexportaçãodascontribuiçõesaoProgramadeIntegraçãoSocial

(“PIS”) e ao Financiamento da Seguridade Social (“Cofins”).4ComapromulgaçãodaEmenda

Constitucional33/2001(“EC33/2001”),oartigo149,§2.º,incisoI,daCF/885passouaimpe-

dirqueaUniãoFederaltributasseporintermédiodecontribuiçõessociaisedecontribuiçõesde

intervençãonodomínioeconômicoasreceitasdecorrentesdeexportação.Háumadivergência

entreoFiscoeoscontribuintessobreaabrangênciadareferidaimunidade.Quecontribuições

sociaisseriamafetadas?Seriamsomenteascontribuiçõesincidentessobreasreceitas?Procu-

raremosrespondertaisindagaçõesnopresentetrabalho.

Poroutrolado,aCF/88,emsuaredaçãooriginal,conferiucompetênciatributáriaà

UniãoFederalpara instituir impostosobreaexportação,paraoexterior,deprodutosnacio-

naisounacionalizados(artigo153,incisoII).6Trata-sedodenominadoImpostodeExportação

(“IE”). Em razão de seu caráter extrafiscal, o IE é um tributo que visa atender interesses sociais,

políticoseeconômicosinterferindonocomportamentodoscidadãos.Pode-sedizerqueoIE

éumimportanteinstrumentodecontroledacargatributáriaincidentesobreasoperaçõesde

exportação, podendo influir tanto para estimular quanto para desestimular as operações de ex-

portaçãodedeterminadosprodutos.

III–serviçosdequalquernatureza,nãocompreendidosnoart.�55,II,definidosemleicomplementar.

[...]

§3.ºEmrelaçãoaoimpostoprevistonoincisoIIIdocaputdesteartigocabeàleicomplementar:

[...]

II–excluirdasuaincidênciaexportaçõesdeserviçosparaoexterior.[...].”� NavigênciadaLC70/9�(Cofins)edaLei7.7��/88(PIS),asreceitasdeexportaçãoeramisentasdetaisexa-

ções.ComavigênciadaLei9.7�8/98,quepassouadisciplinarreferidascontribuições(atualmenteprevistasnasLeis�0.637/�00�e�0.833/�003),aisençãopermaneceunoartigo��,incisoIIe§�.º,daMedidaProvi-sória�.99�,de��.��.�999(reeditadaatéaMedidaProvisória�.�58-35,de��.8.�00�,atéentãoemvigorporforçadoartigo�.ºdaEC3�,de��.9.�00�).

5 “[...]Art.��9.[...]

§�.ºAscontribuiçõessociaisedeintervençãonodomínioeconômicodequetrataocaputdesteartigo:

I–nãoincidirãosobreasreceitasdecorrentesdeexportação[...].”6 “[...]Art.�53.CompeteàUniãoinstituirimpostossobre:

[...]

II–exportação,paraoexterior,deprodutosnacionaisounacionalizados[...].”

Page 12: Fernanda Ramos Pazello

Paraquepossamosimprimirumavisãocríticasobreatributaçãodasoperaçõesdeex-portação no Brasil, faz-se necessário, inicialmente, fixar algumas premissas. Assim, traremos uma noçãodosistemaconstitucionaltributário,principalmentenoquetange(i)àrigidezconstitucionale (ii)àscompetências tributárias.Estabeleceremos,ainda,premissas relacionadasàsseguintesmatériastributárias:ascontribuiçõessociais,oslimitesdopoderreformador(emendaconstitucio-nal)eàfunçãodaleicomplementar.Taispremissasserãonecessáriasparaquepossamostratardatributação das operações de exportação e dos temas conflitantes apontados acima.

Considerandoqueasdesoneraçõestributáriasestãointimamenteligadasàidéiadeex-trafiscalidade, dedicaremos um capítulo à concepção da extrafiscalidade e sua influência sobre os princípios norteadores do Direito Tributário. Após, apresentaremos conceitos e definiremos institutosnecessáriosparaodesenvolvimentodopresentetrabalho,comoadesoneraçãotribu-tária,comênfaseaosinstitutosdaisençãoedaimunidadetributárias,comointuitodedelimi-tarmosseuspapéisnaaçãodetributareométododeinterpretaçãodasnormasimunizanteseisentivas.

Posteriormente, abordaremos o conceito de operação de exportação e o tratamentodadopelaConstituiçãoFederalepelolegisladorinfraconstitucional,comênfaseàsuatributa-ção e às finalidades constitucionalmente desejadas. Após o estabelecimento das premissas e a delimitaçãodosconceitosdedesoneraçãotributáriaeoperaçãodeexportação,estaremosaptosanosaprofundarnadiscussãodostemasjámencionadosreferentesàimunidadedasreceitasdeexportação,àscontribuiçõessociaiseàisençãodoISSparaasexportaçõesdeserviços.

Conduzir-nos-emospelosensinamentosdeGeraldoAtaliba,7peloqual

[...] qualquer proposta exegética objetiva e imparcial, como convém a umtrabalho científico, deve considerar as normas a serem estudadas em harmonia comocontextogeraldosistemajurídico.Ospreceitosnormativosnãopodemsercorretamenteentendidosisoladamente,mas,pelocontrário,haverãodeserconsiderados à luz das exigências globais do sistema, conspicuamente fixa-dasemseusprincípios.Emsuma,somenteacompreensãosistemáticapoderáconduziraresultadosseguros.Éprincipalmenteacircunstânciademuitosin-térpretesdesprezarem taispostuladosmetodológicosquegeraasdisparida-desconstantementeregistradasemmatériadepropostasdeinterpretação.Porúltimo, é de se sublinhar, enfaticamente, que – antes de qualquer esforço de análisedirigidoaonívellegislativo–impõe-seaconsideraçãodoquadrodeexigênciasconstitucionaisqueinformaoregimejurídicoglobaldasrelaçõesEstado/cidadão[...].

7 GeraldoAtaliba.República e Constituição.AtualizadoporRosoleaMirandaFolgosi.�.ed.SãoPauloMalhei-ros,�00�.p.�79.

Page 13: Fernanda Ramos Pazello

5

1.2 Sistema Constitucional Tributário

Sistema é um conjunto harmônico, ordenado e unitário de elementos reunidos emtornodeumconceitofundamental.Osistemajurídicoéformadoporprincípioseregrasqueseharmonizamemtornodeumconceitofundamental,e,dentrodosistema,formam-sesubsiste-masbaseadostambémemconceitosfundamentais.

Nãodevemosverosistemadenormascomoumconjuntocaóticoderegraseprincí-pios.Emverdade,trata-sedeumconjuntodenormasqueseinter-relacionamharmonicamente,segundorelaçõesdecoordenaçãoesubordinação.

Osistemadodireitoéunitárioehomogêneo.SegundoPaulodeBarrosCarvalho,8osistemadoDireitoofereceumaparticularidade,qualsejamsuasnormasestãodispostasnumaestruturahierarquizada,regidapelafundamentaçãoouderivação,queseoperatantonoaspectomaterial quantono formal ouprocessual.Tal característica imprimedinamismoao sistema,uma vez que ele próprio regula sua criação e suas transformações. Conforme afirmado por Ge-raldoAtaliba,9“[...]ossistemasnãosãoformadospelasomadeseuselementos,maspelacom-posiçãohierárquicaesistemáticadasnormasqueocompõem[...]”.Assim,asnormasinferioresencontramfundamentodevalidadenasnormassuperiores,eofundamentodevalidadedetodasasnormasjurídicaséaConstituiçãoFederal.

Paraestudarqualquersistema,comoo(sub)sistemaconstitucionaltributário,impõe-se trilhar um caminho, ou seja, definir um método e colocar premissas, para que seja possível a solução de conflitos de forma segura e ordenada. As normas integrantes do sistema jurídi-codevemseranalisadaslevandoemconsideraçãoosistemacomoumtodo.Osprincípioseasregrasdevemserinterpretadosconjuntaeharmonicamente,nãosendopossívelconsiderarumaregraouumprincípioisoladamente.Poressemotivo,oestudodosistemaconstitucionaltributáriodeverápautar-se, inicialmente,peloestudodosistemaconstitucional.Nãosepodequererconhecerasnormasconstitucionaistributárias,semantesconhecerasdemaisnormasconstitucionaisgerais.

Aordemjurídicabrasileiraéumsistemadenormas,compostoporsubsistemasqueseentrelaçamemdiversasdireções,masqueseafunilamnabuscadofundamentoqueéaConsti-tuição Federal do Brasil. A Constituição Federal consiste na institucionalização do Poder Públi-co.Étambémumsubsistemadenormasqueocupaotópicosuperiordapirâmidehierárquica.

8 Curso de direito tributário.�7.ed.SãoPaulo:Saraiva,�005.p.�37.9 Sistema constitucional tributário brasileiro.SãoPaulo:RT,�968.p.�0.

Page 14: Fernanda Ramos Pazello

6

EssesubsistemainformaaorganizaçãodoEstadoepincelaascaracterísticasdominantesdasinstituiçõesquealegislaçãocomumposteriormentedisciplina.Opredomínioédasregrasdeestruturaemdetrimentodasregrasdecomportamento.10

OSistemaConstitucionalTributárioéformadoporprincípioseregrasconstitucionais,quedisciplinamoexercíciodatributação(funçãoestataldearrecadardinheiroatítulodetribu-to). Abarca a relação entre o poder público e os indivíduos.

Quantomaioragamaderegraseprincípiosconstitucionaistributários,maiscomple-xoerígidoseráosistemaconstitucionaltributário,oquerevelamenorliberdadedolegisla-dor ordinário e maior garantia dos contribuintes. Será mais plástico ou flexível, se o sistema possuirmenosnormastributárias,oquepermitesuaconformaçãoàsnecessidadesdetempoecircunstâncias,umavezquesuasprescriçõessãogenéricasesintéticas,revelandomaiorliberdadededesenvolvimentoeintegraçãopelolegisladorordinário,peloscostumesepelasinterpretaçõesvariadas.

AConstituiçãoFederalbrasileiraédotiporígida.Damesmaforma,oSistemaCons-titucionalTributáriobrasileiroémuitorígido,complexoeextenso.SegundoGeraldoAtaliba,oprincípioimplícitodarigidezéomaisimportanteprincípioconstitucionaltributário.11Referidoprincípio influi na estrutura do sistema constitucional tributário, em sua aplicação e interpreta-ção, bem como nos institutos financeiros. Isso porque o constituinte pretendeu tratar de toda a matériatributária,taiscomoadiscriminaçãodascompetênciastributárias,osfatostributáveis,osprincípioseregrasaplicáveisàtributação,paraqueolegisladorordinárioapenasoobede-cesse,semnenhumgraudeelasticidade.

Oconstituinteconferiuaoslegisladoresordináriosfederal,estadualemunicipalcom-petências específicas, delimitadas e circunscritas. Ou seja, cada ente político exercerá seu poder delegislaremmatériatributáriaearrecadartributodentrodesuasesferasdecompetência.Oprincipalobjetivodoconstituinteaopreveradiscriminaçãodecompetênciaera–eaindaé–darefetividadeaosprincípios da Federação e da autonomia dos Municípiosnoexercíciodesuascompetências tributárias. Tal rigidez visa à harmonia do sistema e evitar conflitos entre os entes políticos.

�0 Sobreasnormasdecondutaeasnormasdeestrutura,PaulodeBarrosCarvalhoentendeque“[...]asprimeirasestãodiretamentevoltadasacondutadaspessoas,nasrelaçõesdeintersubjetividade;asdeestruturaoudeor-ganizaçãodirigem-seigualmenteparaascondutasinterpessoais,tendoporobjeto,porém,oscomportamentosrelacionadosàproduçãodenovasunidadesdeônticas,motivopeloqualdispõemsobreórgãos,procedimentoseestatuemdequemodoasregrasdevemsercriadas,transformadasouexpulsasdosistema.[...]”(Curso...,cit.,p.��0).

�� GeraldoAtaliba.Sistema...,cit.

Page 15: Fernanda Ramos Pazello

7

Antesdeabordarmosacompetênciatributária,faz-senecessáriotratardosprincípiosqueinterferemnosistematributário.Talestudoserádefundamentalimportâncianomomentoemqueanalisarmososentidoeoalcancedasnormasrelacionadasàdesoneraçãotributáriadasoperaçõesdeexportação.

1.2.1 Competência tributária

AConstituiçãoFederaldelineouoexercíciodacompetênciatributáriaaoestabelecerqualentepolíticoteriapoderesparainstituirtributoemrelaçãoadeterminadofatoeconômico.NosdizeresdeRoqueAntonioCarrazza,aCartaMagna

[...]delimitouocampotributáveledeu,emcaráterprivativo,umapartedeleàUniãoFederal,outra,acadaumdosEstados;aindaoutra,acadaumdosMu-nicípios; e, a última, ao Distrito Federal. Por outro giro verbal, a União, cada umdosEstados,cadaumdosMunicípioseoDistritoFederalreceberam,daConstituição,umcampotributávelpróprio[...].12

Opodertributárioéinerenteatodapessoapolítica.Aspessoaspolíticas,nocaso,aUniãoFederal,osEstados,osMunicípioseoDistritoFederal,podemeditar leis tributárias,exercendoascompetênciastributáriasatribuídaspelaConstituiçãoFederal.Nãoháhierarquiaformalentreaspessoaspolíticas,estandotodasniveladas,emdecorrênciadoprincípiofedera-tivo,desenvolvidonoitemacima.

AConstituiçãoFederalhouveporbemdisciplinaroexercíciodacompetência tri-butária para evitar que houvesse conflito entre as pessoas políticas e até mesmo tributação irracional,oquelevariaaocaos.Porintermédiodomecanismodenominadodiscriminaçãoderendas,aConstituiçãoFederalatribuiucertosfatoseconômicosadeterminadapessoapo-lítica,permitindoqueexerçasuacompetênciatributáriaemfacedofatoeconômicoeleitoedeformaexclusiva.

DeacordocomRoqueCarrazza,13ascompetênciasdaUnião,dosEstados,doDistritoFe-deraledosMunicípiosestãotraçadosnaConstituiçãoFederal,visandoàefetividadedosprincípiosfederativoedaautonomiadosMunicípios.Ademais,conformeenfatizado,oslimitesaoexercíciodetaiscompetênciastambémestãoprevistosnaprópriaConstituição,nãopodendoosentespolíticossubjugaraautonomiadosdemaisentespolíticos,umavezquesãoentidadesisônomas.

�� RoqueAntonioCarrazza. Curso de direito constitucional tributário.��.ed.rev.,ampl.eatual.atéaEmendaConstitucionaln.º�8/�005.SãoPaulo:Malheiros.�005.p.�7�.

�3 Idem.Curso...,cit.

Page 16: Fernanda Ramos Pazello

8

Acompetênciatributáriaconsistenafaculdadeparaeditarleisquecriem,in abstracto,tributos.Asnormassobrecompetênciatributáriasãonormasdeestrutura,namedidaemquedisciplinamaproduçãodeoutrasnormas,determinandoquempodeexercitá-las,dequeformaedentrodequelimitestemporaiseespaciais.NaspalavrasdeHamiltonDiasdeSouza,14ascompetênciastributáriasimplicam, de um lado, uma afirmação do poder fiscal de seu titular; de outro,porém,implicamumanegaçãodestemesmopoder.

ParaHumbertoÁvila,asnormasdecompetênciatributáriasãolimitaçõesmateriaisaopoder de tributar. Prossegue afirmando:

[...]naperspectivadasuadimensãoenquantolimitaçãoaopoderdetributar,as regras de competência qualificam-se do seguinte modo: quanto ao nível em quesesituam,caracterizam-secomolimitaçõesdeprimeirograu,porquantoseencontramnoâmbitodenormasqueserãoobjetodeaplicação;quantoaoobjeto, qualificam-se como limitações positivas, na medida em que exigem, naatuaçãolegislativadeinstituiçãoeaumentodequalquertributo,aobser-vânciadoquadrofáticoconstitucionalmente traçado;quantoàforma,reve-lam-secomolimitaçõesexpressasemateriais,namedidaemque,sobreseremexpressamenteprevistasnaConstituiçãoFederal (arts.153a156,especial-mente),estabelecempontosdepartidaparaadeterminabilidadeconteudísticadopoderdetributar[...].15

NoBrasil,emrazãodoprincípiodalegalidade,ostributosdevemsercriadospormeiodeleiordinária,comalgumasexceçõesdetributosquedevemserinstituídosporleicomple-mentar.Taisleis,aoinstituiremostributos,devemdescreversuashipótesesdeincidência,basedecálculo,alíquotaesujeitos.Portanto,acompetênciatributáriaguardaíntimaligaçãocomaidéiadenascimentodotributo,ouseja,criaçãodotributoporintermédiodeumprocessolegis-lativo,sendológicaecronologicamenteanterioraonascimentodotributo.Assim,acompetên-ciatributáriaesgota-senalei.Apósaediçãodaleicriandootributo,nãohámaisquefalaremcompetênciatributária,massimemcapacidadetributáriaativa(arrecadação).

SegundoRoqueCarrazza,16acompetênciatributáriaapresentaasseguintescaracterísti-cas:(i)privatividade,ouseja,cadaentepolíticopossuisuafaixatributáriaprivativa;(ii)indele-gabilidade,poisévedadoaoentepolíticodelegarsuacompetênciatributáriaparaterceirapessoa;(iii)incaducabilidade,ouseja,nãocaducaodireitodapessoapolíticadelegislarsobretributos;(iv)inalterabilidade,umavezquenãopodeterduasdimensõesampliadaspelaprópriapessoapolítica;(v)irrenunciabilidade,ouseja,osentespolíticosnãopodemrenunciaràscompetênciastributárias,poissetratadedireitoindisponível;e(vi)facultatividade,poisapessoapolíticapode

�� Acompetência tributáriaeseuexercício:aracionalidadecomolimitaçãoaopoderde tributar. In:RobertoFerraz(Coord.).Princípios e limites da tributação.SãoPaulo:QuartierLatin,�005.p.�60.

�5 Sistema constitucional brasileiro.SãoPaulo:Saraiva,�00�.p.�59.�6 Curso...,cit.

Page 17: Fernanda Ramos Pazello

9

criar o tributo quando quiser. Verifica-se, portanto, que, ao atribuir competência tributária, a CF/88 estáhabilitandodeterminadapessoapolíticaparatributar,sendo-lhefacultadocriarotributo,au-mentaroudiminuiracargatributáriaou,atémesmo,nãotributar.

A Constituição Federal, ao discriminar as competências tributárias, definiu quais se-riamasregras-matrizesdecadaexação,ouseja,ahipótesedeincidênciapossível,ossujeitospossíveis, a base de cálculo e as alíquotas possíveis.Assim, o legislador, ao criar o tributo(modalidadetributária),nãopodefugirdestearquétipoconstitucional.Trata-sedomínimone-cessáriodecadamodalidadetributária.

SegundoPaulodeBarrosCarvalho,

[...]aregra-matrizdeincidênciatributáriaé,porexcelência,u’anormadecondu-ta, vertida imediatamente para disciplinar a relação do Estado com seus súditos, tendoemvistacontribuiçõespecuniárias.Concretizando-seosfatosdescritosnahipótese,deve-seraconseqüência,eesta,porsuavez,prescreveumaobrigaçãopatrimonial.Nela,encontraremosumapessoa(sujeitopassivo)obrigadaacum-prirumaprestaçãoemdinheiro.Eisodever-sermodalizado[...].17

Em seu artigo 153,18 a Constituição Federal prescreve a competência tributária daUniãoFederalparainstituirimpostossobre(i)importaçãodeprodutosestrangeiros(“II”);(ii)exportaçãoparaoexteriordeprodutosnacionaisounacionalizados(“IE”);(iii)rendaepro-ventosdequalquernatureza (“IR”); (iv)produtos industrializados (“IPI”); (v) operaçõesdecrédito,câmbioeseguro,ourelativasatítulosouvaloresmobiliários(“IOF”);(vi)propriedadeterritorialrural(“ITR”);e(vii)grandesfortunas.

Emseuartigo155,19 aConstituiçãoFederalprescreveacompetência tributáriadosEstadosedoDistritoFederalparainstituirimpostosobre(i)transmissãocausa mortisedoação,

�7 PaulodeBarrosCarvalho. Curso...,cit.,p.3�7.�8 “[...]Art.�53.CompeteàUniãoinstituirimpostossobre:

I–importaçãodeprodutosestrangeiros;

II–exportação,paraoexterior,deprodutosnacionaisounacionalizados;

III–rendaeproventosdequalquernatureza;

IV–produtosindustrializados;

V–operaçõesdecrédito,câmbioeseguro,ourelativasatítulosouvaloresmobiliários;

VI–propriedadeterritorialrural;

VII–grandesfortunas,nostermosdeleicomplementar.[...].”�9 “[...]Art.�55.CompeteaosEstadoseaoDistritoFederalinstituirimpostossobre:

I–transmissãocausa mortisedoação,dequaisquerbensoudireitos;

II–operaçõesrelativasàcirculaçãodemercadoriasesobreprestaçõesdeserviçosdetransporteinterestadualeintermunicipaledecomunicação,aindaqueasoperaçõeseasprestaçõesseiniciemnoexterior;

III–propriedadedeveículosautomotores.[...].”

Page 18: Fernanda Ramos Pazello

�0

dequaisquerbensoudireitos(“ITCMD”);(ii)operaçõesrelativasàcirculaçãodemercadoriasouprestaçõesdeserviçosdetransporteinterestadualeintermunicipaledecomunicação,aindaqueasoperaçõeseasprestaçõesseiniciemnoexterior(“ICMS”);(iii)propriedadedeveículosautomotores(“IPVA”).

Emseuartigo156,20 aConstituiçãoFederalprescreveacompetência tributáriados

Municípiosparainstituirimpostossobre(i)propriedadepredialeterritorialurbana(“IPTU”);

(ii)transmissãointer vivos,aqualquertítulo,poratooneroso,debensimóveis,pornatureza

ouacessãofísica,ededireitosreaissobreimóveis,excetoosdegarantia,bemcomocessãode

direitosasuaaquisição(“ITBI”);e(iii)serviçosdequalquernatureza(“ISS”).

Ademais,oartigo14821daConstituiçãoFederaldeterminaqueaUniãoFederalpoderá

instituir,medianteleicomplementar,empréstimoscompulsórios(i)paraatenderdespesasex-

traordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; e (ii) no

caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional.

Além disso, seu artigo 154,22 autoriza a União Federal a instituir, (i) mediante lei

complementar,impostosnãoprevistosnoartigo153,desdequesejamnão-cumulativosenão

tenhamfatogeradoroubasedecálculoprópriosdosdiscriminadosnaConstituiçãoFederal

(competênciaresidual);e(ii)naiminênciadeguerraexterna,impostosextraordinários,com-

preendidosounãoemsuacompetênciatributária,osquaisserãosuprimidos,gradativamente,

cessadasascausasdesuaextinção(competênciaextraordinária).

�0 “[...]Art.�56.CompeteaosMunicípiosinstituirimpostossobre:

I–propriedadepredialeterritorialurbana;

II–transmissãointer vivos,aqualquertítulo,poratooneroso,debensimóveis,pornaturezaouacessãofísica,ededireitosreaissobreimóveis,excetoosdegarantia,bemcomocessãodedireitosasuaaquisição;

III–serviçosdequalquernatureza,nãocompreendidosnoart.�55,II,definidosemleicomplementar.

IV–(Revogado.).[...].”�� “[...]Art.��8.AUnião,medianteleicomplementar,poderáinstituirempréstimoscompulsórios:

I–paraatenderadespesasextraordinárias,decorrentesdecalamidadepública,deguerraexternaousuaimi-nência;

II–nocasodeinvestimentopúblicodecaráterurgenteederelevanteinteressenacional,observadoodispostonoart.�50,III,b.

Parágrafoúnico.Aaplicaçãodosrecursosprovenientesdeempréstimocompulsórioserávinculadaàdespesaquefundamentousuainstituição.[...].”

�� “[...]Art.�5�.AUniãopoderáinstituir:

I–medianteleicomplementar,impostosnãoprevistosnoartigoanterior,desdequesejamnãocumulativosenãotenhamfatogeradoroubasedecálculoprópriosdosdiscriminadosnestaConstituição;

II–naiminênciaounocasodeguerraexterna,impostosextraordinários,compreendidosounãoemsuacom-petênciatributária,osquaisserãosuprimidos,gradativamente,cessadasascausasdesuacriação.[...].”

Page 19: Fernanda Ramos Pazello

��

Verifica-se, portanto, que, além das competências previstas no artigo 153, o consti-tuinteoriginárioatribuiucompetênciaàUniãoFederalparainstituirempréstimocompulsó-rio,impostosresiduaiseimpostosextraordinários,desdequeobservadoscertosrequisitosousituações.

Alémdisso,emseuartigo149,23aConstituiçãoFederaltambématribuiucompetênciaàUniãoFederalparainstituircontribuiçõessociais,deintervençãododomínioeconômicoede interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivasáreas.

Ascontribuiçõesdeintervençãonodomínioeconômico(“Cide”)deverãointervirpo-sitivamentenaordemeconômica(v.g.,AFRMM,Fust,Cidesobreroyalties,Cidesobrecom-bustíveis, Funtel, Condecine, etc.). Já as contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas deverão custear as pessoas jurídicas de direito público ou privado que têm por escopo fiscalizar e regular o exercício de determinadas atividades, bem como represen-tar, coletiva ou individualmente, categorias profissionais, defendendo seus interesses (v.g.,ascontribuiçõesqueosadvogadoseosestagiáriospagamàOrdemdosAdvogadosdoBrasileas contribuições que os médicos pagam ao Conselho Regional de Medicina, etc.). Por fim, as contribuições sociais deverão financiar a ordem social.

Comexceçãodealgumascontribuiçõessociais,comoasprevistasnoartigo195,emqueháindicaçãodofatoeconômicoasertributado,olegisladorconstituintenãoindicouosfatos econômicosa serem tributadospelas contribuiçõesdoartigo149,mas tão-somenteasfinalidades que devem ser cumpridas por tais contribuições.

Oartigo19524 da Carta Magna, ao tratar de contribuições sociais que devem financiar aSeguridadeSocial,elegeuosfatoseconômicosaseremobjetodetributaçãoporessascontri-

�3 “[...]Art.��9.CompeteexclusivamenteàUnião instituircontribuiçõessociais,de intervençãonodomínioeconômicoedeinteressedascategoriasprofissionaisoueconômicas,comoinstrumentodesuaatuaçãonasrespectivasáreas,observadoodispostonosarts.��6,III,e�50,IeIII,esemprejuízodoprevistonoart.�95,§6.º,relativamenteàscontribuiçõesaquealudeodispositivo.[...].”

�� “[...]Art.�95.Aseguridadesocialseráfinanciadaportodaasociedade,deformadiretaeindireta,nostermosdalei,medianterecursosprovenientesdosorçamentosdaUnião,dosEstados,doDistritoFederaledosMu-nicípios,edasseguintescontribuiçõessociais:

I–doempregador,daempresaedaentidadeaelaequiparadanaformadalei,incidentessobre:

a)afolhadesaláriosedemaisrendimentosdotrabalhopagosoucreditados,aqualquertítulo,àpessoafísicaquelhepresteserviço,mesmosemvínculoempregatício;

b)areceitaouofaturamento;

c)olucro;

II–dotrabalhadoredosdemaisseguradosdaprevidênciasocial,nãoincidindocontribuiçãosobreaposenta-doriaepensãoconcedidaspeloregimegeraldeprevidênciasocialdequetrataoart.�0�;

Page 20: Fernanda Ramos Pazello

��

buições,asaber:(i)afolhadesalárioedemaisrendimentosdotrabalhopagosoucreditados(contribuição previdenciária); (ii) o faturamento ou a receita (Cofins); (iii) o lucro (CSL); (iv) osvalorespagosao trabalhadoroudemaisseguradosdaprevidênciasocial (contribuiçãoaoINSS);(v)areceitadeconcursosprognósticos;e(vi)aimportaçãodebensouserviços(PIS-Importação e Cofins-Importação).

Alémdisso,referidodispositivo,emseu§4.º,25permitiuainstituiçãodeoutrasfon-tesdestinadasagarantiramanutençãoouexpansãodaseguridadesocial,desdequeobede-cidooartigo154,incisoI(leicomplementar,não-cumulatividadeefatogeradordiversodosimpostos).Comoexemplodemodalidadetributáriainstituídacombaseemtalcompetênciaresidual,temosascontribuiçõesinstituídaspelaLeiComplementar110,de2001,incidentessobreadespedidadeempregadosemjustacausaearemuneraçãomensaldotrabalhador.

Também são contribuições para o financiamento da seguridade social (i) a contribui-çãoprevidenciáriadeservidoresfederais(artigo40);26e(ii)acontribuiçãoprevidenciáriadosservidoresestaduaisemunicipais(artigo149,§1.º).27

Além das contribuições sociais financiadoras da seguridade social, há também as “contribuiçõeslegaisconstitucionalizadas”,28conformedenominaçãododoutrinadorHumber-toÁvila,29 que são: (i) a contribuição ao PIS, destinado ao financiamento do programa de se-guro-desemprego(artigo239);30(ii)ascontribuiçõescompulsóriasdosempregadoressobrea

III–sobreareceitadeconcursosdeprognósticos.

IV–doimportadordebensouserviçosdoexterior,oudequemaleiaeleequiparar[...].”�5 “[...]Art.�95.[...]

§�.ºAleipoderáinstituiroutrasfontesdestinadasagarantiramanutençãoouexpansãodaseguridadesocial,obedecidoodispostonoart.�5�,I.[...].”

�6 “[...]Art.�0.AosservidorestitularesdecargosefetivosdaUnião,dosEstados,doDistritoFederaledosMu-nicípios,incluídassuasautarquiasefundações,éasseguradoregimedeprevidênciadecarátercontributivoesolidário,mediantecontribuiçãodorespectivoentepúblico,dosservidoresativoseinativosedospensionis-tas,observadoscritériosquepreservemoequilíbriofinanceiroeatuarialeodispostonesteartigo.[...].”

�7 “[...]Art.��9.[...]

§�.ºOsEstados,oDistritoFederaleosMunicípiosinstituirãocontribuição,cobradadeseusservidores,paraocusteio,embenefíciodestes,doregimeprevidenciáriodequetrataoart.�0,cujaalíquotanãoseráinferioràdacontribuiçãodosservidorestitularesdecargosefetivosdaUnião.[...].”

�8 JoséEduardoSoaresdeMellodenominataiscontribuiçõesdesociaisgenéricas.�9 Sistema...,cit.,p.�56.30 “[...]Art.�39.AarrecadaçãodecorrentedascontribuiçõesparaoProgramadeIntegraçãoSocial,criadopela

LeiComplementarn.º7,de7desetembrode�970,eparaoProgramadeFormaçãodoPatrimôniodoServidorPúblico,criadopelaLeiComplementarn.º8,de3dedezembrode�970,passa,apartirdapromulgaçãodestaConstituição,afinanciar,nostermosquealeidispuser,oprogramadoseguro-desempregoeoabonodequetratao§3.ºdesteartigo.

§�.ºDosrecursosmencionadosnocaputdesteartigo,pelomenosquarentaporcentoserãodestinadosafinan-ciarprogramasdedesenvolvimentoeconômico,atravésdoBancoNacionaldeDesenvolvimentoEconômicoeSocial,comcritériosderemuneraçãoquelhespreservemovalor.

Page 21: Fernanda Ramos Pazello

�3

folha de salários, destinadas às entidades privadas de serviço social e de formação profissional

vinculadasaosistemasindical(artigo240);31e(iii)acontribuiçãoparaosalário-educação,des-

tinadaàeducação(artigo212,§5.º).32

Alémdisso,oSistemaTributárioNacionalconviveunoperíodode1996a2007coma

CPMF,instituídapeloartigo7433dosAtosdasDisposiçõesConstitucionaisTransitórias(“ADCT”).

Trata-se de uma contribuição social incidente sobre as movimentações financeiras, com a finalidade

de financiar o Fundo Nacional de Saúde, a previdência social e a assistência social.

Por fim, é importante destacar o artigo 149-A,34queatribuicompetênciaaosMuni-

cípioseDistritoFederalparainstituiracontribuiçãoparaocusteiodoserviçodeiluminação

pública. Referido dispositivo foi incluído pela Emenda Constitucional 39, de 19.12.2002, de

questionávelconstitucionalidade,tendoemvistasuanaturezajurídica.

§�.ºOspatrimôniosacumuladosdoProgramadeIntegraçãoSocialedoProgramadeFormaçãodoPatrimô-niodoServidorPúblicosãopreservados,mantendo-seoscritériosdesaquenassituaçõesprevistasnasleisespecíficas,comexceçãodaretiradapormotivodecasamento,ficandovedadaadistribuiçãodaarrecadaçãodequetrataocaputdesteartigo,paradepósitonascontasindividuaisdosparticipantes.

§3.ºAosempregadosquepercebamdeempregadoresquecontribuemparaoProgramadeIntegraçãoSocialouparaoProgramadeFormaçãodoPatrimôniodoServidorPúblico,atédoissaláriosmínimosderemunera-çãomensal,éasseguradoopagamentodeumsaláriomínimoanual,computadonestevalororendimentodascontasindividuais,nocasodaquelesquejáparticipavamdosreferidosprogramas,atéadatadapromulgaçãodestaConstituição.

§�.ºOfinanciamentodoseguro-desempregoreceberáumacontribuiçãoadicionaldaempresacujoíndicederotati-vidadedaforçadetrabalhosuperaroíndicemédiodarotatividadedosetor,naformaestabelecidaporlei.[...].”

3� “[...]Art.��0.Ficamressalvadasdodispostonoart.�95asatuaiscontribuiçõescompulsóriasdosemprega-doressobreafolhadesalários,destinadasàsentidadesprivadasdeserviçosocialedeformaçãoprofissionalvinculadasaosistemasindical.[...].”

3� “[...]Art.���.[...]

§5.ºAeducaçãobásicapúblicaterácomofonteadicionaldefinanciamentoacontribuiçãosocialdosalário-educação,recolhidapelasempresasnaformadalei.[...].”

33 “[...]Art.7�.AUniãopoderáinstituircontribuiçãoprovisóriasobremovimentaçãooutransmissãodevaloresedecréditosedireitosdenaturezafinanceira.

§�.ºAalíquotadacontribuiçãodequetrataesteartigonãoexcederáavinteecincocentésimosporcento,facultadoaoPoderExecutivoreduzi-laourestabelecê-la,totalouparcialmente,nascondiçõeselimitesfixadosemlei.

§�.ºÀcontribuiçãodequetrataesteartigonãoseaplicaodispostonosarts.�53,§5.º,e�5�,I,daConstituição.

§3.ºOprodutodaarrecadaçãodacontribuiçãodequetrataesteartigoserádestinadointegralmenteaoFundoNacionaldeSaúde,parafinanciamentodasaçõeseserviçosdesaúde.

§�.ºAcontribuiçãodequetrataesteartigoterásuaexigibilidadesubordinadaaodispostonoart.�95,§6.º,daConstituição,enãopoderásercobradaporprazosuperioradoisanos.[...].”

3� “[...]Art.��9-A.OsMunicípioseoDistritoFederalpoderãoinstituircontribuição,naformadasrespectivasleis,paraocusteiodoserviçodeiluminaçãopública,observadoodispostonoart.�50,IeIII.

Parágrafoúnico.Éfacultadaacobrançadacontribuiçãoaqueserefereocaput,nafaturadeconsumodeener-giaelétrica[...].”

Page 22: Fernanda Ramos Pazello

��

OquesedenotadasnormasdecompetênciatributáriaéqueaCF/88deupoucamar-gemdeliberdadeaolegisladordosentespolíticos,oraindicandoofatoeconômicoasertribu-tável(oquevinculaosdemaiscritériosdaregra-matrizdeincidênciatributária),oraestabele-cendo suas finalidades. Nelson Trombini Junior, ao tratar das normas de estrutura que atribuem competênciatributária,constatouque

[...] todos os tributos ou se justificam em razão da ocorrência de determina-do fato ou situação, ou para atender determinada finalidade. O importante é reconhecer que tanto os fatos, ou situações, como as finalidades devem estar precisamenteprevistosnotextoconstitucionalparavalidaranormadecom-portamentotendenteacriarumamodalidadetributária[...].35

1.2.1.1 Classificação dos tributos: as modalidades tributárias

Noitemacima,tratamosdasmodalidadestributáriasprevistasnaCartaMagna.Taismodalidadestributáriassãoalvodecalorosasdiscussõesacadêmicasarespeitodamelhorfor-ma de agrupá-las em categorias ou espécies. Trata-se do palpitante tema da classificação dos tributosemespéciestributárias.

O objetivo de classificar os tributos em espécie, conforme enfatiza o mestre Nelson TrombiniJunior,

[...]éreuniremumamesmaclasse,aseroportunamentenomeada,diversasmodalidades tributárias que detenham as mesmas prioridades essenciais, a fim depermitirumestudoconjuntodesuascaracterísticasprincipaisedeseremconotadas por um único termo (nome juris) que as identifique dentro do sis-tema[...].36

A importância de propor uma classificação das modalidades tributárias em espécies, gruposoucategoriasé,fundamentalmente,aprofundaroconhecimentodosatributosessenciaisdas modalidades tributárias (conhecimento dos objetos). Além disso, a classificação dos tribu-tos contribui para o estabelecimento de termos precisos para identificar as espécies encontradas, aprimorando o rigor terminológico do discurso científico (finalidade científica).

Por esses motivos, não poderíamos deixar de tratar da classificação dos tributos, in-dicando as principais correntes doutrinárias que se preocuparam em propor uma classificação das modalidades tributárias em espécie. No entanto, não nos aprofundaremos na polêmica,

35 NelsonTrombiniJunior. As espécies tributárias na Constituição Federal de 1988.SãoPaulo:MPEditora,�006.p.��.

36 Idem,ibidem,p.��.

Page 23: Fernanda Ramos Pazello

�5

tampouco adotaremos uma das propostas classificatórias, visto que nos basta apenas determinar ametodologiaqueempregaremosaocuidardostributos.

AntesdaConstituiçãoFederalde1988,osdoutrinadoresAlfredoAugustoBecker,37Amílcar de Araújo Falcão38eAliomarBaleeiro39 propuseram uma classificação para os tributos. Becker, dando ênfase à base de cálculo como elemento identificador da natureza jurídica dos tributos, dizia que o tributo poderia ser um imposto ou uma taxa. Amílcar Falcão classificou os tributos em impostos, taxas e contribuição de melhoria. Por fim, Aliomar Baleeiro, já analisan-doaCFcomasalteraçõesefetuadaspelaEmendaConstitucional1/69(“EC1/69”),reconheceuaexistênciadeumaquartaespécietributária,quaissejamascontribuiçõesespeciais.

EmrazãodapromulgaçãodaCF/88,osdoutrinadoresdebruçaram-senovamentesobreo tema da classificação dos tributos, objetivando, principalmente, incluir as novas modalidades tributárias, a saber, as contribuições e os empréstimos compulsórios, na proposta classificatória.

Umadascorrentesmaisprestigiadaspeladoutrinanacionaléaquepropõeaclássicaclassificação tripartite dos tributos em imposto, taxa e contribuição de melhoria, elaborada por GeraldoAtalibanasuabrilhanteobraHipótese de incidência tributária.40Comfundamentojána CF/88, especificamente em seu artigo 145, admite-se que os tributos podem ser vinculados ounão-vinculados.Ocritériojurídicoestánoaspectomaterialdotributo.Oaspectomaterialpodeseradescriçãodeumaatuaçãoestatal(tributovinculado)ouadescriçãodeumfatoqual-quernãoconsistenteematividadeestatal(tributonão-vinculado).

Dentrodestaconcepção,haveriatrêsespéciesdetributos:osimpostos,astaxaseascontribuiçõesdemelhoria.Osimpostosteriamcomohipótesedeincidênciaumfatoqualquer;astaxasteriamcomohipótesedeincidênciaumaatuaçãoestataldiretamentereferidaaoobri-gado;eascontribuiçõesdemelhoriateriamcomohipóteseumaatuaçãoestatalindiretamentereferidaaoobrigado.

Filiam-seaesta teoriaPaulodeBarrosCarvalho,41 enfatizandoobinômiohipótesedeincidência/basedecálculo,parademonstrarqueéprecisoexaminaradescriçãohipotéticado fato jurídico tributário e, antes de mais nada, a base de cálculo, para definir a natureza do

37 AlfredoAugustoBecker.Teoria geral do direito tributário.3.ed.SãoPaulo:Lejus,�998.38 AmílcardeAraújoFalcão.Fato gerador da obrigação tributária.�.ed.SãoPaulo:RT,�97�.39 AliomarBaleeiro.Direito tributário brasileiro.AtualizadoporMisabelAbreuMachadoDerzi.��.ed.Riode

Janeiro:Forense,�005.�0 GeraldoAtaliba.Hipótese de incidência tributária.6.ed.SãoPaulo:Malheiros,�000.�� PaulodeBarrosCarvalho.Curso...,cit.,p.�3.

Page 24: Fernanda Ramos Pazello

�6

tributo;SachaCalmonNavarroCoêlho,42reconhecendoaimportânciadofatogeradoremde-trimento do motivo ou finalidade do tributo; e Roque Antonio Carrazza.43Paraestesautores,ascontribuiçõeseosempréstimoscompulsóriospossuíamnaturezatributária,masnãosãoumanovaespécietributária,revestindo-sedanaturezadeimposto,taxaoucontribuiçãodemelhoria,dependendodesuahipótesedeincidência/basedecálculo.

Outracorrentedoutrináriaéaqueadmiteaexistênciadecincoespéciestributárias,asaber:imposto,taxa,contribuiçãodemelhoria,contribuiçãoeempréstimocompulsório(visãoqüinqüepartite).Assim,osimpostosseriamnãovinculadosaumaatuaçãoestatal,astaxaseas contribuições de melhoria seriam vinculadas a uma atuação estatal direta ou indireta, ascontribuições teriam destinação específica e os empréstimos compulsórios seriam tributos res-tituíveis.JoséEduardoSoaresdeMelo,44HugodeBritoMachado45eMárcioSeveroMarques46filiam-se a esta corrente.

Noentanto,data maxima venia, tal proposta classificatória não sobrevive a uma me-lhoranálise.Emborareconheçaaspeculiaridadesdascontribuiçõesedosempréstimoscompul-sórios, atribuindo a eles uma espécie tributária, trata-se de um mero esforço classificatório, na medida em que se baseia em mais de um critério classificatório. Acreditamos que um método classificatório somente pode adotar um critério para distribuir os objetos em classes.

Com o passar dos anos, verificou-se um esforço da doutrina em elaborar uma verdadei-ra classificação dos tributos, considerando um único critério e as inovações da CF/88. Nelson TrombiniJunior,47recorrendoàobradeMarcoAurélioGreco,48 propôs uma nova classificação dos tributos, privilegiando suas finalidades. O critério adotado foi a técnica de validação cons-titucional,ouseja,dependendodotipodevalidaçãodanormadetributação(leiinstituidoradamodalidadetributária)adotadapelanormadeestrutura(atribuidoradecompetênciatributária),ostributospoderãoserseparadosemduasclasses:tributoscondicionais(quedependemdeumfato ou evento constitucionalmente qualificado) e tributos finalísticos (que dependem da indi-cação de uma finalidade constitucionalmente prestigiada).

�� SachaCalmonNavarroCôelho.Comentários à Constituição de 1988:sistematributário.3.ed.RiodeJaneiro:Forense,�99�.

�3 RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.�� José Eduardo Soares de Melo. Contribuições sociais no sistema tributário. �. ed. São Paulo: Malheiros,

�003.�5 HugodeBritoMachado.Curso de direito tributário.�3.ed.SãoPaulo:Malheiros,�998.�6 MárcioSeveroMarques.Classificação constitucional dos tributos.SãoPaulo:MaxLimonad,�000.�7 NelsonTrombiniJunior.As espécies...,cit.�8 MarcoAurélioGreco.Perfilconstitucionaldascontribuiçõesde intervençãonodomínioeconômico. In:

––––––(Coord.).Contribuições de intervenção no domínio econômico e figuras afins.SãoPaulo:Dialética,�00�.

Page 25: Fernanda Ramos Pazello

�7

Assim,teríamosasseguintesespéciestributárias:(i)osimpostos,comotributoscon-dicionais cuja materialidade constitucional reflete capacidade contributiva não vinculada a uma atuaçãoestatal;(ii)astaxas,tambémcomotributoscondicionaisvinculadoscujobenefíciodaatuação estatal se traduz na prestação de um serviço público ou no exercício do poder de polí-cia;(iii)ascontribuiçõesdemelhoria,comotributoscondicionaisvinculadoscujobenefíciodaatuação estatal se constitui numa valorização decorrente de obra pública; (iv) as contribuições extraordinárias, que são tributos finalísticos cuja temporalidade da finalidade constitucional é transitória (caso das contribuições de intervenção do domínio econômico, dos empréstimoscompulsórios e dos impostos extraordinários); e, finalmente, (v) as contribuições ordinárias, que são tributos finalísticos cuja temporalidade da finalidade constitucional é permanente (como é o caso das contribuições sociais e de interesse de categorias profissionais).49

Importa-nos notar que as classificações propostas no Direito devem levar em considera-ção o conjunto de normas válidas, em determinado espaço e tempo. A classificação proposta aci-ma dá ênfase a um aspecto considerado pedra de toque na CF/88, quais sejam os fins extrafiscais dostributoseaidéiadeestadopromocional.Ouseja,ostributosnãovisamsomentearrecadardi-nheiro aos cofres públicos, mas atingir finalidades constitucionalmente protegidas, como a saúde, a assistência social, a previdência, a economia, a educação e diversas outras finalidades. Assim, considerando que para alguns tributos a finalidade é mais importante do que atender a arrecada-ção, faz-se necessário enfatizar tal característica em uma proposta classificatória dos tributos.

Percebe-se quão intrigante e importante é o tema da classificação dos tributos. Não obstante isso, para fins metodológicos, importa-nos registrar que, quando tratarmos de uma ou de outra modalidade tributária, como o PIS, a Cofins, a CSL ou a CPMF, não estaremos preo-cupadosemalocartaismodalidadestributáriasnestaounaquelaespécietributária,poisnãosemostranecessárioparaasconclusõesdestetrabalho.

1.2.1.2 Contribuições sociais: artigo 149 da CF/88

Oartigo149daCF/88atribuiucompetênciaàUniãoFederalparainstituirtrêstiposdecontribuições,quaissejam:(i)sociais;(ii)deintervençãonodomínioeconômico;e(iii)deinteresse das categorias profissionais ou econômicas. Impende-nos verificar quais são as moda-lidadestributáriasinseridasnaexpressão“contribuiçõessociais”,namedidaemquetalestudoserárelevanteparaaferirmososentidoeoalcancedaimunidadedereceitadeexportaçãopre-vistanoartigo149,§2.º,incisoII,daCF/88.50

�9 NelsonTrombiniJunior.As espécies...,cit.,p.�86.50 “[...]Art.��9.[...]

§�.ºAscontribuiçõessociaisedeintervençãonodomínioeconômicodequetrataocaputdesteartigo:

I–nãoincidirãosobreasreceitasdecorrentesdeexportação;[...].”

Page 26: Fernanda Ramos Pazello

�8

ConformebemressaltadoporHumbertoÁvila,51aopreverascontribuições,aCartaMagna optou pela técnica da delimitação de comportamentos vinculados a finalidades. Ou seja, sãoregrasdecompetênciatributáriacommençãoexpressadequeoexercíciodestepoderdeveservir de instrumento para promover determinadas finalidades.

As contribuições são um instrumento para a promoção de finalidades constitucional-mentepostasemcaráterpermanentee,portanto,sãodevidasparapromoveremideais,indepen-dentemente de valores específicos.52Partindodestaconcepção,ascontribuições sociais seriamaquelasmodalidadestributáriascriadasparaatingirepromoveraordemsocial.

Deacordocomoartigo19353daCF/88,aOrdemSocialtemcomobaseoprimadodotrabalhoecomoobjetivoobem-estareajustiçasocial.OTítuloVIIIdaCF/88,destinadoàOrdemSocial,disciplinouemâmbitoconstitucionalosseguintestemas:(i)SeguridadeSocial,que abrange Saúde, Previdência Social e Assistência Social; (ii) Educação, Cultura e Desporto; (iii)CiênciaeTecnologia;(iv)ComunicaçãoSocial;(v)MeioAmbiente;(vi)Família,Criança,AdolescenteeIdoso;e(vii)Índios.

Portanto, todas as modalidades tributárias que pretendam financiar a ordem social es-tarãoabrangidasnaexpressão“contribuiçõessociais”doartigo149.Aseguir,enunciaremosasmodalidadestributáriasinseridasnaexpressão“contribuiçõessociais”,asquaisnosinteressamparaodesenvolvimentodopresentetrabalho,jáenfatizandodesdeentãoquenãosetratadeuma análise exaustiva, mas suficiente para o objetivoaquenospropomos.

A Seguridade Social visa assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à as-sistênciasocial,segundoosparâmetrosprevistosnoartigo19454daCF/88.55Oartigo195prevê

5� HumbertoÁvila. Sistema…,cit.,p.�50.5� Idem,ibidem,p.�53-�5�.53 “[...]Art.�93.Aordemsocialtemcomobaseoprimadodotrabalho,ecomoobjetivoobem-estareajustiça

sociais.[...].”5� “[...]Art.�9�.Aseguridadesocialcompreendeumconjuntointegradodeaçõesdeiniciativadospoderespúbli-

cosedasociedade,destinadasaassegurarosdireitosrelativosàsaúde,àprevidênciaeàassistênciasocial. Parágrafoúnico.Competeaopoderpúblico,nostermosdalei,organizaraseguridadesocial,combasenos

seguintesobjetivos: I–universalidadedacoberturaedoatendimento; II–uniformidadeeequivalênciadosbenefícioseserviçosàspopulaçõesurbanaserurais; III–seletividadeedistributividadenaprestaçãodosbenefícioseserviços; IV–irredutibilidadedovalordosbenefícios; V–eqüidadenaformadeparticipaçãonocusteio; VI–diversidadedabasedefinanciamento; VII–caráterdemocráticoedescentralizadodaadministração,mediantegestãoquadripartite,compar-

ticipaçãodos trabalhadores,dosempregadores,dosaposentadosedoGovernonosórgãoscolegiados.[...].”

55 RicardoLoboTorresnosensinaqueaSeguridadeSocialéasegurançadosdireitossociaisecresceudeimportânciacomodesenvolvimentodoEstadoSocialdeDireito.É,preponderantemente,umdireitoa

Page 27: Fernanda Ramos Pazello

�9

que a seguridade social seria financiada por toda a sociedade, mediante recursos provenientes dasseguintescontribuições sociais: (i) contribuição previdenciária; (ii) Cofins; (iii) CSL; (iv) contribuiçãodoINSS;(v)contribuiçãosobreconcursodeprognósticos;e(vi)PIS-Importaçãoe Cofins-Importação.

Confira-se, a seguir, quadro ilustrativo das modalidades tributárias do artigo 195, com aindicaçãodosujeitopassivoefatoeconômicotributável:

Sujeito passivo Fato econômico Contribuição Social

Empregador,daempresaedaentidadeaelaequiparadanaformadalei

Folhadesaláriosedemaisrendimen-tosdotrabalhopagosoucreditados,aqualquertítulo,àpessoafísicaquelhepreste serviço, mesmo sem vínculoempregatício

Contribuiçãoprevidenciária

Empregador,daempresaedaentidadeaelaequiparadanaformadalei

Receitaouofaturamento Cofins

Empregador,daempresaedaentidadeaelaequiparadanaformadalei

Lucro CSL

Trabalhadoredosdemaisseguradosdaprevidênciasocial

Folhadesaláriosedemaisrendimen-tosdotrabalho

ContribuiçãoaoINSS

Titulardosconcursosdeprognósticos Receitadeconcursosdeprognósticos Contribuição sobre receita deconcursosdeprognósticos

Importadordebensouserviçosdoexte-rior,oudequemaleiaeleequiparar

Importação de bens e serviços doexterior

PIS-Importação e Cofins-Im-portação

AsduasmodalidadestributáriasinstituídaspelaLeiComplementar110/2001,inci-dentessobreadespedidadeempregadosemjustacausaearemuneraçãomensaldotraba-lhador,tambémsãocontribuiçõessociais,namedidaemqueforamcriadascomfundamentono artigo 195, § 4.º, da CF/88 e para financiar o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (“FGTS”).

Asmodalidades tributáriasdisciplinadasnoartigo195daCF/88estão inseridasnaexpressão“contribuiçõessociais”doartigo149daCF/88.Nessesentido,GilbertodeUlhôaCanto,AntonioCarlosGarciadeSouzaeMarceloBeltrãodaFonseca,emartigo intituladoContribuiçõessociaisjádizia:

prestaçõespositivasdoEstado,oqueadistinguesubstancialmentedasegurançadosdireitosfundamen-tais.Aseguridadesocialé formadegarantiados riscossociais (velhice, invalidez,desemprego,etc.).SobreaCF/88,oprestigiadoautoradmitequehouveadiluiçãodaparafiscalidadenafiscalidade,gerandoumgrandesistemadeseguridadefinanciadoporcontribuiçõessociaispagaspelosquenãousufruemdasprestaçõesestatais(asempresas)(Asegurançajurídicaeaslimitaçõesconstitucionaisaopoderdetribu-tar.In:RobertoFerraz(Coord.).Princípios e limites da tributação.SãoPaulo:QuartierLatin,�005.p.�37-�38).

Page 28: Fernanda Ramos Pazello

�0

[...]Nãomeparecequeprocedaadistinção,poisoart.149daConstituiçãofalademodoclaroemcontribuiçõessociais,deintervençãonodomínioeco-nômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas. O art. 195 aludeacontribuiçõessociais,justamenteumadastrêscategoriasreferidasnoart.149.Portanto,nãohácomodizerqueestefalacomcontribuiçõessociaisdiferentesdasprevistasnoart.149[...].56

Notocanteàscontribuiçõeslegaisconstitucionalizadas,temosasseguintespondera-ções.AcontribuiçãoaoPIS,previstanoartigo239daCF/88,eacontribuiçãoaosalário-educa-ção,previstanoartigo212,§5.º,daCF/88,tambémsãocontribuiçõessociais,poisaprimeiravisa ao financiamento do programa de seguro-desemprego e a segunda, ao financiamento da educação.EssasduasmodalidadestributáriasexistiamantesdaCF/88e,paraquepudessemcontinuar existindo, suas legislações foram recepcionadas pela Carta Magna. Por fim, temos a contribuição destinada às entidades privadas de serviço social e de formação profissional vin-culadasaosistemasindical,tambémdecunhosocial.

Anormamatrizdestasmodalidadestributáriaséoartigo149daCF/88.Algumascon-tribuições sociais possuem regras específicas no artigo 195 ou em outros dispositivos constitu-cionais. Confira-se o voto do Ministro Carlos Velloso do STF:57

Examinemosmaisdetidamenteessascontribuições.Ascontribuiçõessociais, falamos,desdobram-seema.1.contribuiçõesdeseguridadesocial:estãodisciplinadasnoart.195,I,IIeIII,daConstituição.Sãoas contribuiçõesprevidenciárias, as contribuiçõesdoFinsocial, asdaLein.º7.689,oPISeoPasep(CF,art.239).Nãoestãosujeitasàanterio-ridade(art.149,art.195,parág.6.º);a.2.outrasdeseguridadesocial(art.195,parág.4.º):nãoestãosujeitasàanterioridade(art.149,art.195,parág.6.º).Asuainstituição,todavia,estácondicionadaàobservânciadatécnicadacompetência residualdaUnião,acomeçar,paraasua instituição,pelaexigênciadeleicomplementar(art.195,parág.4.º;art.154,I);a.3.ascon-tribuições sociaisgerais (art. 149):oFGTS,o salário-educação (art. 212,parág.5.º),ascontribuiçõesdoSenai,doSesi,doSenac(art.240).Sujeitam-seaoprincípiodaanterioridade.[...]A norma matriz das contribuições sociais, bem assim das contribuições de intervenção e das contribuições corporativas, é o art. 149 da Constituição Federal[...](grifosnossos).

Por fim, resta-nos analisar a extinta CPMF. Trata-se de uma modalidade tributária institu-ída pelo artigo 74 do ADCT para financiar a saúde (Fundo Nacional da Saúde), a previdência social eaassistênciasocial(FundodeCombateàPobreza).Semadentrarmosnaquestãoacercadacons-

56 Caderno de Pesquisas Tributárias,SãoPaulo,co-ediçãoCentrodeExtensãoUniversitáriaeEditoraResenhaTributária,n.�7,p.39,�99�.

57 RecursoExtraordinário�38�8�-8,DJ�8.8.�99�.

Page 29: Fernanda Ramos Pazello

��

titucionalidadedoartigo74doADCTporofensaaoartigo195,§4.º,daCF/88,58noslimitaremosa afirmar que, em razão de sua finalidade, a CPMF também é uma “contribuição social”.59

1.2.1.3 Emendas constitucionais em matéria tributária: limites do poder reformador

AsConstituiçõesdospaísessãocriadaspeloPoderConstituinte,queapresentaafa-culdadedeorganizaroEstado,semnenhumalimitaçãodedireitopositivointerno.Logoabaixodopoderconstituinte,háopoderreformadoroupoderconstituintederivado,denaturezacons-tituída.60-61EmboraasConstituiçõessepretendameternas,sãomutáveise,portanto,necessitamde alterações ao longo do tempo. Carlos Aires Britto nos ensina que reforma significa “dar melhorforma”,ouseja,conferirmelhorformaàscoisas.OpoderreformadordevetrabalharcertasnormasdaConstituiçãoparamelhorserviràprópriaConstituição.Portanto,oobjetivodareformanãodeveserfraudarosprincípiosaxiaisdaConstituição,poissãoestesprincípiosqueconferemidentidadeàConstituição.

Segundo Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior, as Constituições, quanto à sua mutabilidade (alterabilidade), podem ser flexíveis, rígidas ou semi-rígidas (ou semiflexíveis).62AsConstituições flexíveis não exigem, para sua alteração, qualquer processo maissolene,podendoseralteradapeloprocedimentodaleiordinária.AsConstituiçõesrígidasdemandamparasuaalteraçãoumcritériomaissoleneedifícildoqueoprocessodeelaboraçãoda lei ordinária. Por fim, as Constituições semi-rígidas apresentam uma parte que impõe muta-çãoporumprocessomaissoleneeoutrapartesemexigência.Ressalte-sequeasConstituições

58 HumbertoÁvilaentendeque“[...]nãoháoutrasfinalidadessociaisalémdaquelasqueaprópriaConstitui-çãointituloudesociais,easfinalidadessociaispossuemfontesdereceitasjáespecificadasnoartigo�95e,quandosetratadefinalidadesocialquenãoseincluinasaúde,naassistênciaeprevidênciasocial,háartigosespecíficosprevendoregrasdecompetência.SeaUniãoFederalpudesseinstituircontribuiçõessociaisgerais,nãohaveriasentidoparaasregrasespecíficasdecompetênciaprevistasnosartigos���,§5.º,�39e��0.Se,deumlado,aprevisãodeoutrascontribuiçõesalémdaquelasprevistasnoartigo�95representaqueháoutrasfinalidadessociaisalémdaquelasneleespecificadas,deoutro,significaqueasoutrasfinalidadestêmfontesespecíficas[...]”(Sistema...,cit.,p.�58-�59).

59 OSTF,nojulgamentodaADI��97/8,rel.Min.CarlosVelloso,enquadrouaCPMFnoroldasoutrascontri-buiçõesdaseguridadesocial,in verbis:

“[...]AcontribuiçãoinstituídapelaEC��/96tem,emprincípio,legitimidade,porqueinstituídaparafinanciarasaúde.É,portanto,umacontribuiçãosocial,incluídanaclassedas“outrascontribuições”inscritasno§�.ºdoart.�95daConstituiçãoFederal[...].”

60 RoqueCarrazzanosensinaquedevemosdistinguiroPoderConstituinteorigináriodoPoderConstituintederi-vado.Paraoexercíciodoprimeiro,nãoexistemquaisquerlimitesjurídicos,porquantoele,livrepornatureza,navegaaosabordasforçassociais.OPoderConstituinteoriginárioestáforadosistemajurídico.AocontrárioocorrecomoPoderConstituintederivado,umavezquefoioutorgadopelaLeidasLeise,porisso,estásujeitoàslimitaçõesimplícitaseexplícitas(Curso...,cit.,p.79-80).

6� “[...]DiversamentedoPoderConstituinteOriginário,queépolítico,oDerivadoéjurídico,poisapenasrevelaoexercíciodeumacompetênciareformadora.[...]”,conformelecionamLuizAlbertoDavidAraújoeVidalSerrano(Curso de direito constitucional.SãoPaulo:Saraiva,�998.p.��).

6� LuizAlbertoDavidAraújoeVidalSerranoNunesJúnior.Curso...,cit.,p.�-5.

Page 30: Fernanda Ramos Pazello

��

sempre apresentam um núcleo material imutável, ou seja, que não pode ser alterado nem mes-mopeloprocessomaiscriterioso.Sãoasdenominadascláusulaspétreas.63

AConstituiçãoFederalbrasileirade1988érígida,namedidaemqueapresentalimi-tesformais,circunstanciaisemateriaisparaasuaalteração(artigo60).64.Oslimitesformaiscompreendemoprocedimentoimpostoàrealizaçãodareformaeestãoprevistosnoartigo60,incisosIaIII,§§2.ºe3.º,asaber:

(i) aCF/88poderáseremendadamedianteproposta:(a)deumterço,nomínimo,dosmembrosdaCâmaradosDeputadosoudoSenadoFederal; (b)doPresidentedaRepública; (c) de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Fe-deração,manifestando-se,cadaumadelas,pelamaioriarelativadeseusmembros;

(ii) apropostaserádiscutidaevotadaemcadaCasadoCongressoNacional,emdoisturnos,considerando-seaprovadaseobtiver,emambos,trêsquintosdosvotosdosrespectivosmembros;e

(iii)aemendaàConstituiçãoserápromulgadapelasMesasdaCâmaradosDeputadosedoSenadoFederal.

Quantoaoslimitescircunstanciais,destaca-seofatodequeaConstituiçãonãopode-ráseremendadanavigênciadeintervençãofederal,deestadodedefesaoudeestadodesítio(artigo 60, § 1.º). Por fim, quanto aos limites materiais,o§4.ºdoartigo60daCF/88prescrevequenãoseráobjetodepropostadeemendatendenteaabolir:(i)aformafederativadoEstado;

63 DeacordocomCarlosAyresBrito“[...]ascláusulaspétreassãoaquelapartedaConstituiçãoquenãoadmitesequeraexceçãodasemendas[...]”(AConstituiçãoeomonitoramentodesuasemendas.Direito do Estado:novosrumos.SãoPaulo:MaxLimonad,�00�.t.�,p.66).

6� “[...]Art.60.AConstituiçãopoderáseremendadamedianteproposta: I–deumterço,nomínimo,dosmembrosdaCâmaradosDeputadosoudoSenadoFederal; II–doPresidentedaRepública; III–demaisdametadedasAssembléiasLegislativasdasunidadesdaFederação,manifestando-se,cadauma

delas,pelamaioriarelativadeseusmembros. §�.ºAConstituiçãonãopoderáseremendadanavigênciadeintervençãofederal,deestadodedefesaoude

estadodesítio. §�.ºApropostaserádiscutidaevotadaemcadaCasadoCongressoNacional,emdoisturnos,considerando-se

aprovadaseobtiver,emambos,trêsquintosdosvotosdosrespectivosmembros. §3.ºAemendaàConstituiçãoserápromulgadapelasMesasdaCâmaradosDeputadosedoSenadoFederal,

comorespectivonúmerodeordem. §�.ºNãoseráobjetodedeliberaçãoapropostadeemendatendenteaabolir: I–aformafederativadeEstado; II–ovotodireto,secreto,universaleperiódico; III–aseparaçãodosPoderes; IV–osdireitosegarantiasindividuais. §5.ºAmatériaconstantedepropostadeemendarejeitadaouhavidaporprejudicadanãopodeserobjetode

novapropostanamesmasessãolegislativa.[...].”

Page 31: Fernanda Ramos Pazello

�3

(ii)ovotodireto,secreto,universaleperiódico;(iii)aseparaçãodosPoderes;e(iv)osdireitosegarantiasfundamentais.

Alémdasproibiçõesexplícitas,háproibiçõesimplícitas.SegundoUadiLammêgoBulos,65

[...]asproibiçõesimplícitas,tambémchamadasdetácitasouinerentes,con-cernemàsupressãodaprópriatitularidadedopoderconstituinte,oque,valedizer,de certasnormasconsideradas inalteráveisquandoda feituradoDo-cumentoMaior.Transgredi-lasseriaviolaraprópriamanifestaçãoinicial,au-tônomaeincondicionadadopodercriadordaLeidasLeis[...].

UadiLammêgoBulos,citandoNelsondeSousaSampaio,indicaquaisseriamasproi-biçõesimplícitas,asaber:(i)asnormasquedizemrespeitoaosdireitosfundamentais,podendoumareformaconstitucionalampliá-los,masnãorestringi-los;(ii)asnormasconcernentesaotitulardopoderconstituinte,umavezqueumareformaconstitucionalnãopodealteraratitula-ridadedapotestade queinseriunaConstituiçãooprópriopoderreformador;(iii)asnormasrelati-vasaotitulardopoderreformador;e(iv)asnormasreferentesaoprocessodaprópriaemenda.

A rigidez constitucional visa dificultar o processo reformador da Constituição; assegu-raraestabilidadeconstitucional;eresguardarosdireitosegarantiasfundamentais,mantendoestruturas e competências, paraproteger as instituições.Anão-observânciadequalquerdoslimitesimpostospeloordenamentoconstitucionalacarretaráadecretaçãodeinconstitucionali-dadedaemendaconstitucional.

Emmatériatributária,aanálisedoslimitesdopoderreformadormedianteaediçãodeemendasconstitucionaisédesumaimportância,umavezque,conformejádemonstradoexaus-tivamenteacima,oconstituinteorigináriodesceuapormenoresparatratardascompetênciastributárias,bemcomoparaestipularasregraseprincípiosqueenvolvematributação.

HumbertoÁvila,aotratardarigidezdoSistemaTributário,reconheceuque

[...]oSistemaTributárioNacionaléumsistemarígido.Essashámuitoconhe-cidasrigidezeexaustividadedecorremdedoisfundamentos:deumlado,asregrasdecompetênciaearepartiçãodasreceitassãointensamentereguladaspelaprópriaConstituição.TodososimpostosdaUnião(art.153),dosEstados(art. 155) e dos Municípios (art. 156) são definidos pela própria Constituição.

65 UadiLammêgoBulos.Mutação constitucional.SãoPaulo:Saraiva,�997.p.37.

Page 32: Fernanda Ramos Pazello

��

OsrequisitosnormativosparasuainstituiçãosãoinstituídospelaConstituiçãomesma[...].66

Oautorobservaqueainstituiçãodasregrasdecompetênciaemnívelconstitucionalconduz a uma rigidez modificativa do Sistema Tributário Nacional. Considerando que suas nor-maspossuemhierarquiaconstitucional,nãopodemseralteradasporleiordinária,massomentemediante procedimento específico previsto para reforma constitucional, qual seja emenda cons-titucionalnostermosdoartigo60.

Ainda no entender deste autor, a rigidez específica das normas tributárias é diretamen-teouindiretamenteinstituída,considerandoque:(i)algumassãodenominadas“garantias”(le-galidade, igualdade, irretroatividade, anterioridade, proibição de tributo com efeito de confisco, imunidades); (ii) outras normas mantêm relação com os princípios fundamentais (princípiofederativo,democráticoedaseparaçãodosPoderes);e(iii)outras,ainda,mantêmrelaçãocomos direitos e garantias individuais cuja modificação é vedada.

Conforme visto nos itens acima, o princípio federativo influencia diretamente as nor-masdetributação.Oconstituinteoriginárioindicouacompetênciadecadaentepolítico(União,Estados,MunicípioseDistritoFederal),paraquepudessemagircomautonomiaedeformaisonômica.Assim, somos da opinião de que uma emenda constitucional que vise alterar asnormasdecompetênciatributária,pararetiraracompetênciadosEstados,dosMunicípiosoudoDistritoFederal,seráinconstitucional,poisestaráafetandoaformafederativa,queenglobaaautonomiadosEstadosetambémdosMunicípios.

Sobre a autonomia dos Municípios, filiamo-nos ao entendimento do Professor Roque AntonioCarrazza:

[...]defato,nãofariasentidoqueaLeiMaiordoPaís,tendoatribuídoaosMuni-cípiospoderconstituintedecorrente(elesvotamsuasleisorgânicas,obedecidosapenas os princípios jurídicos sensíveis da Constituição da República), abrisse espaçoaqueopoderconstituintederivadoabolisse,aindaqueemparte,aapti-dãoqueaConstituiçãoFederallhesdeuparaseautogovernarem.Istopoderia,até,emalgunscasos, ferirdireitosegarantias individuais(outracláusulapé-trea),jáqueosmunicípiosestariamsujeitos,aqualquertempo,averemanula-das,peloCongressoNacional,prerrogativasefaculdadesquelhestivessemsidooutorgadaspelalegislaçãomunicipal [...].67

Notocanteàs limitaçõesaopoderde tributar,comoosprincípios,asgarantiaseasimunidadestributárias,entendemosqueasemendasconstitucionaistambémnãopodemretirar

66 HumbertoÁvila. Sistema...,cit.,p.�09.67 RoqueAntonioCarrazza.Curso…,cit.,p.�6�.

Page 33: Fernanda Ramos Pazello

�5

oudiminuirtaisnormas,jáquerepresentamdireitosegarantiasindividuaisdoscontribuintes.68AliomarBaleeirojádiziaque

[...]agrandemassadasimunidadesedosprincípiosconsagradosnaConsti-tuiçãode1988,dosquaisdecorremlimitaçõesaopoderdetributar,sãomerasespecializaçõesouexplicaçõesdosdireitosegarantiasindividuais(legalida-de,irretroatividade,igualdade,generalidade,capacidadeeconômicadecon-tribuir,etc.)oudeoutrosgrandesprincípiosestruturais,comoaformafederalde Estado (imunidade recíproca dos entes públicos estatais). São, portanto, imodificáveis por emenda, ou mesmo por revisão, já que fazem parte daquele núcleo de normas irredutíveis, a que se refere o art. 60, § 4.º, da Constituição. Tantoosprincípioscomoasimunidadesproduzemefeitossimilares:limitamopoderdetributar[...].69

O Ministro Sepúlveda Pertence, analisando as decisões do STF, constatou que o en-tendimentodestaCortetem“sidonosentidodeinterpretarextensivamenteecomgranderigoressatendênciaàabolição,demodoavislumbrá-la,àsvezes,quandosimplesmenteafetaumdosprincípiosintocáveis”.70 Foi o que se verificou no julgamento da constitucionalidade da EC 3/93,71queautorizouacriaçãodoIPMFsemaobservânciadoprincípiodaanterioridade.Nestaocasião,oSTFdecidiuqueoprincípiodaanterioridadeseriaumdireitofundamentalcompre-endidoentreascláusulaspétreaseque,portanto,nãopoderiaserdesconsideradonacriaçãodestetributo.

SomosdaopiniãodequeasemendasconstitucionaispodemdiminuiracompetênciatributáriadosEstados,DistritoFederaleMunicípiosnashipótesesemquesepretendeprivile-giardireitosegarantiasindividuais,comoocorre,porexemplo,nahipótesedainclusãodeumaimunidade tributáriaoudepermissãoparauma isenção tributária.Nossaposiçãosobreestetemaénecessária,umavezqueaimunidadetributáriadoICMSedascontribuiçõessociaise

68 Confira-seo entendimentodeRoqueAntonioCarrazza sobreoprincípiodaanterioridade: “[...]Melhorexplicitando,dentreascláusulaspétreas,inscrevem-seosdireitosegarantiasindividuais(art.60,§�.º,IV,daCF).Ora,oprincípiodaanterioridadetributáriaéumdireitoindividualdocontribuinte.Tantoquealeiquelheconcedeumavantagemfiscal(v.g.,quelhereduzacargatributária,ouquelheconfereumaisenção)podeincidirimediatamenteou,até,seforexpressanestesentido,retroagir;nãoprecisaobedeceraoprincí-piodaanterioridade,quesóseoperaemseufavor,istoé,quandoaleicriaouaumentaumtributo.Logo,oprincípiodaanterioridadenãopoderiatersidoatropelado(comoofoi)porumaemendaconstitucional.

Nemsedigaque,havendoexceçõesaoprincípiodaanterioridade,nadaimpediriaqueseurolfosseampliadoporumaemendaconstitucional.Équetaisexceçõesbrotaramdiretamentedopoderconstituinteoriginário(dequeestavainvestidaaAssembléiaNacionalConstituinte).Opoderconstituintederivado,únicoquerestaaoCongressoNacional,nãopodiacriarnovasexceçõesaoprincípio.[...]”(Curso…,cit.,p.�98).

69 AliomarBaleeiro.Limitações constitucionais ao poder de tributar.AtualizadoporMisabelAbreuMachadoDerzi.7.ed.RiodeJaneiro:Forense,�005.p.��.

70 JoséPauloSepúlvedaPertence.DireitodoEstado:novosrumos.In:PauloModesto;OscarMendonça(Co-ord.).Direito constitucional.OcontroledeconstitucionalidadedasemendasconstitucionaispeloSupremoTribunalFederal:crônicadejurisprudência.SãoPaulo:MaxLimonad,�00�.t.�,p.�3.

7� ADIn939,�5.��.�993,SydneySanches,RTJ�5�/755.

Page 34: Fernanda Ramos Pazello

�6

deintervençãonodomínioeconômicorelativamenteàsoperaçõesdeexportação,bemcomoapossibilidadedeisençãodoISSsobreexportaçãodeserviçosparaoexterior,decorremdealte-raçõesefetivadasporemendasconstitucionais.

AEC42/2003ampliouaimunidadetributáriadoICMS,previstanoartigo155,incisoX,alíneaa.AredaçãooriginalpreviaaimunidadedoICMSparaoperaçõescomprodutosindustria-lizadosdestinadosaoexterior.Areferidaemendaampliouaimunidadeparaabrangeroperaçõescommercadoriasdestinadasaoexterioretambémserviçosprestadosadestinatáriosnoexterior.72Ressalte-sequeaLeiComplementar87,de1996(“LC87/96”),emseuartigo32,73jápreviaaisençãodeICMSsobreestashipótesespresentesnaEC42/2003.

Antesdaalteraçãoconstitucional,RoqueAntonioCarrazzajásemanifestavapelain-constitucionalidadedaLC87/96,vistoquetalisençãoteriaampliadoaimunidadeprevista.AEC 42/2003 transformou tal isenção em imunidade. Confira-se o entendimento do autor sobre areferida:

[...]namedidaemqueaEmendaConstitucionaln.º42/2003,dandonovare-dação ao art. 155, § 2.º, X, “a”, da CF, “reiterou” o conteúdo do art. 32, I, da LeiComplementar87/1996e,comisso,esvaziou,porcompleto,acompetên-ciaqueosEstadoseoDistritoFederaloriginariamentetinhamparatributarexportaçõesdemercadoriasquenãofossemprodutosindustrializados,tam-bémelaagrediufrontalmenteacláusulapétreadoprincípiofederativo(art.60,§4.º,I,daCF)[...].74

Não nos filiamos a esta posição doutrinária, por considerarmos que a imunidade tribu-táriatrazidanobojodaEC42/2003visaprotegerumvalorconstitucionalmentereconhecido,

7� “[...]Art.�55.CompeteaosEstadoseaoDistritoFederalinstituirimpostossobre:

[...]

II–operaçõesrelativasàcirculaçãodemercadoriasesobreprestaçõesdeserviçosdetransporteinterestadualeintermunicipaledecomunicação,aindaqueasoperaçõeseasprestaçõesseiniciemnoexterior;

[...]

§�.ºOimpostoprevistonoincisoIIatenderáaoseguinte:

[...]

X–nãoincidirá:

a)sobreoperaçõesquedestinemmercadoriasparaoexterior,nemsobreserviçosprestadosadestinatáriosnoexterior,asseguradaamanutençãoeoaproveitamentodomontantedoimpostocobradonasoperaçõeseprestaçõesanteriores;[...].”

73 “[...]Art.3�.ApartirdadatadepublicaçãodestaLeiComplementar:

I–oimpostonãoincidirásobreoperaçõesquedestinemaoexteriormercadorias,inclusiveprodutosprimárioseprodutosindustrializadossemi-elaborados,bemcomosobreprestaçõesdeserviçosparaoexterior;

II–darãodireitodecrédito,quenãoseráobjetodeestorno,asmercadoriasentradasnoestabelecimentoparaintegraçãoouconsumoemprocessodeproduçãodemercadoriasindustrializadas,inclusivesemi-elaboradas,destinadasaoexterior;

III–entraemvigorodispostonoAnexointegrantedestaLeiComplementar.[...].”7� RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.390.

Page 35: Fernanda Ramos Pazello

�7

qualsejafavorecerasexportações,possibilitandoqueasmercadoriaseserviçoscheguemaomercadointernacionalcombonspreços(desenvolvimentonacional)eevitandoaexportaçãodetributos.Portanto,anossover,aEC42/2003,nesteaspecto,éconstitucional.Idênticoargumen-toaplica-seàEC33/2001queexcluiuasreceitasdeexportaçãodaincidênciadascontribuiçõessociaisedeintervençãonodomínioeconômico(artigo149,§2.º,incisoI).

NelsonTrombiniJuniorbemenfatizaaidéiadeque

[...] a mudança de uma Constituição, seja ela rígida ou flexível, é inevitável. Seelanãoseadaptaàsalteraçõesquepermanentementeseprocessamnasre-laçõesdinâmicasdasociedade,perdesuaefetividade,sejapelarupturarevo-lucionária,sejapelacaducidade,queBurdeautãobemexaminousobotítuloDècheancedêsConstitutions.Háduasformasdealteraçãoconstitucional.Aque modifica a Constituição com expressão positiva é chamada de reforma. Quando a Constituição se modifica com expressão consuetudinária, denomi-namosmutação[...].75

Considerando os anseios da nossa sociedade por desenvolvimento nacional, transfigu-radononossoordenamentojurídico,bemcomoaconjunturapolíticaeeconômica,quereque-remaglobalizaçãoeoestímuloaocomérciointernacionalpelospaísesemergentes,comoéocasodoBrasil,acreditamosserinevitávelestimularasoperaçõesdeexportação,comintuitodeimprimirmaiorcompetitividadedoBrasilnomercadoexterno,porintermédiodacriaçãodenormasdeimunidadeeisençãotributárias.

NoqueconcerneaoISS,aEmendaConstitucional3,de1993(“EC3/93”), inseriuoincisoIIIaoparágrafo3.ºdoartigo156,parapermitirqueumaleicomplementarexcluadaincidênciadoISSexportaçõesdeserviçosparaoexterior.76Anossover,referidaalteraçãocons-titucionaltambémsecoadunacomoartigo60daCF/88,poisnãoaboleoprincípiofederativoe,poroutrolado,favoreceasexportaçõesdeserviços,umdosanseiosexpressamentereconhe-cidospelanossaConstituição.

Outroassuntoquegeradiscussãorefere-seàpossibilidadedeemendaconstitucionalcriartributo.AoanalisaraEmendaConstitucional21/99(“EC21/99”),quecriouaCPMF,Carrazzaaprofundou-senoassuntoechegouàconclusãodequenãoédadoàemendacons-

75 NelsonTrombiniJunior.Limitesmateriaisdacompetênciareformadora.Revista de Direito Social,SãoPaulo,v.6,p.6�,�00�.

76 “[...]Art.�56.CompeteaosMunicípiosinstituirimpostossobre:

[...]

III–serviçosdequalquernatureza,nãocompreendidosnoartigo�55,II,definidosemleicomplementar.

§3.ºEmrelaçãoaoimpostoprevistonoincisoIII,cabeàleicomplementar:

[...]

II–excluirdasuaincidênciaexportaçõesdeserviçosparaoexterior.[...].”

Page 36: Fernanda Ramos Pazello

�8

titucionalcriarouaumentartributos,umavezque(i)aCF/88atribuiutalcompetênciaàleidapessoapolíticacompetenteenãoàemendaconstitucional,que,aseuver,nãoélei;e(ii)oprocessodeelaboraçãodaemendaconstitucionalnãopossuiaparticipaçãodoPoderExe-cutivo,sejanasanção,sejanapromulgação,sejanapublicação(aocontráriodoqueocorrenoprocessode elaboraçãoda lei), não sendo, portanto, veículoprópriopara a criaçãoouaumentodetributo.

Novamente,nãocorroboramoscomtalentendimento.Anossover,acriaçãoouau-mentodetributospormeiodeemendaconstitucionalnãoofendeoprincípiofederativo,ase-paraçãodosPodereseosdireitosegarantiasfundamentais.Naverdade,seédadoàleicriarouaumentartributo,oquesepoderiadizerdaopçãodolegisladorpelautilizaçãodaemendaconstitucional,quepossuiumprocedimentomaissoleneerígido?Portanto,entendemosqueacriaçãodaCPMFporintermédiodeemendaconstitucionalnãoofendeoartigo60,§4.º,daCF/88,poisoprocedimentoparaaelaboraçãodeumaemendaémaisrigorosodoqueparaaelaboraçãodeumalei,nãohavendonenhumaviolaçãoconstitucional.

1.2.1.4 A função da lei complementar em matéria tributária

Alei complementarconsisteemumveículo introdutordenormaseencontra-seprevista nos artigos 59, inciso II,77 e 69,78 ambos da CF/88. De acordo com José SoutoMaiorBorges,79asleiscomplementarespodemserconceituadasemsentidoamploouestri-to. O sentido amplo leva em consideração o conteúdo material da lei complementar. Assim, são leis complementares as que completam a eficácia das normas constitucionais, ou seja, completam a Constituição Federal, tornando eficazes seus dispositivos e princípios, não auto-executáveis.

Osentidoestritolevaemconsideraçãoorequisitoformaldaleicomplementar,pre-vistopelaConstituiçãoFederal.NoDireitobrasileiro,leicomplementaréleidaUniãoFede-

77 “[...]Art.59.Oprocessolegislativocompreendeaelaboraçãode:

I–emendasàConstituição;

II–leiscomplementares;

III–leisordinárias;

IV–leisdelegadas;

V–medidasprovisórias;

VI–decretoslegislativos;

VII–resoluções.

Parágrafoúnico.Leicomplementardisporásobreaelaboração, redação,alteraçãoeconsolidaçãodas leis.[...].”

78 “[...]Art.69.Asleiscomplementaresserãoaprovadaspormaioriaabsoluta.[...].”79 JoséSoutoMaiorBorges.Lei complementar tributária.SãoPaulo:RT,�975.

Page 37: Fernanda Ramos Pazello

�9

ral,leidaordemcentral,quedeveseraprovada,nomínimo,pelamaioriaabsolutadasduasCasasdoCongressoNacional,observados,nasuaelaboração,osdemaistermosdevotaçãodas leisordinárias, tendoporobjeto regularpreceitos constitucionais cuja aplicaçãodelesdependaexpressamente.

Assim,pode-sedizerque,dopontodevistaformal,aleicomplementardeveserapro-vadapormaioriaabsolutadosmembrosdoCongressoNacional,e,dopontodevistamaterial,a lei complementar possui conteúdos predeterminados pela Constituição.

Quanto à hierarquia das leis complementares, perfilhamos o entendimento de que a leicomplementarsomenteseencontraentreaConstituiçãoealeiordináriaquando:(i)regu-la o modo de elaboração, redação, modificação e consolidação das leis ordinárias (hierarquia formal-procedimental); e (ii) estabelece normas gerais predeterminadoras do conteúdo das leis ordinárias(hierarquiamaterial-conteudística).80Nasdemaishipóteses,nãoháhierarquiaentreleicomplementareleiordinária.

Emmatériatributária,aCF/88atribuiuimportantesfunçõesàleicomplementar.Con-fira-se:

[...]Art.146.Cabeàleicomplementar:I – dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, osEstados,oDistritoFederaleosMunicípios;II–regularaslimitaçõesconstitucionaisaopoderdetributar; III–estabelecernormasgeraisemmatériadelegislaçãotributária,especial-mentesobre:a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impos-tosdiscriminadosnestaConstituição,adosrespectivosfatosgeradores,basesdecálculoecontribuintes; b) obrigação,lançamento,crédito,prescriçãoedecadênciatributários;c) adequadotratamentotributárioaoatocooperativopraticadopelassocieda-descooperativas. d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplifica-dosnocasodoimpostoprevistonoart.155,II,dascontribuiçõesprevistasnoart.195,Ie§§12e13,edacontribuiçãoaqueserefereoart.239.Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d,tambémpo-derá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União,dosEstados,doDistritoFederaledosMunicípios,observadoque:I–seráopcionalparaocontribuinte;

80 HumbertoÁvila.Sistema…,cit.,p.�3�.

Page 38: Fernanda Ramos Pazello

30

II–poderãoserestabelecidascondiçõesdeenquadramentodiferenciadasporEstado;III – o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela derecursospertencentesaosrespectivosentesfederadosseráimediata,veda-daqualquerretençãooucondicionamento; IV – a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes.[...]

Háduas correntesdoutrinárias relativas à interpretaçãodo artigo146.Acorrentedicotômica, defendida por José Souto Maior Borges, Paulo de Barros Carvalho e MarçalJusten Filho, interpretando de forma sistemática, entende que a lei complementar possuiapenasduasfunções.DeveestabelecernormasgeraisdeDireitoTributáriovisandodisporsobre conflitos de competência ou regular as limitações constitucionais ao poder de tributar. Segundo esta corrente, não é dada à lei complementar tratar sobre fato gerador, redefinição detributosesuasespécies,basesdecálculoecontribuintes,anãoserquesejaparaatenderas finalidades indicadas acima: dirimir conflitos entre entes políticos ou regular as limitações constitucionaisaopoderdetributar.

Jáacorrentetricotômica,defendidaporHumbertoÁvila,LucianoAmaroeEuricodeSanti,interpretaoartigo146deformaliteral,ouseja,aleicomplementaremmatériatributáriatem três funções: (i) dispor sobre conflitos de competência; (ii) regular as limitações constitu-cionaisaopoderdetributar;e(iii)estabelecerasnormasgeraisdeDireitoTributário.

AsnormasgeraisdeDireitoTributáriosãocompostaspormatériasquenecessitamdeumauniformizaçãopelolegislador,paraevitarquetenhamtratamentodiversoporcadaentepolítico.OCódigoTributárioNacional(“CTN”)éomaiorexemplodediplomalegalquetratadasnormasgeraisdeDireitoTributário,poisécompostopornormasqueprescre-vem condutas, definem conceitos tributários e disciplinam regimes jurídicos a serem segui-dosportodososentespolíticosnaaçãodetributar.AsnormasgeraisdeDireitoTributáriovisamtrazerharmoniaaosistemae,porisso,possuemfundamentalimportâncianosistemaconstitucionaltributário.

Concordamoscomacorrentetricotômica,tambémacolhidapeloSTF.81Anossover,cabeàleicomplementarestabelecerasnormasgeraisdeDireitoTributáriovisandoàuniformi-zaçãoeàharmoniadosistemajurídico.Noentanto,entendemosquehálimitesconstitucionaisàutilizaçãodeleicomplementar,decaráternacional,emmatériatributária.Senão,vejamos.

8� Nesse sentido, confira-se o Recurso Extraordinário 36�.8�9-6/RJ, �.ª Turma, Rel. Min. CarlosVelloso, j.�3.��.�005.

Page 39: Fernanda Ramos Pazello

3�

Aspessoaspolíticasconstitucionaisestãodotadasdeigualdadejurídica.Trata-sedaefetivaçãodoprincípiofundamentaldafederaçãobrasileira,reconhecidopelaConstituiçãoFe-deralepelaregraquefacultaàUniãointervirexcepcionalmentenaesferadosEstados-mem-bros.AUnião,osEstadoseosMunicípioscoexistemepossuemcompetênciasexclusivascons-titucionalmente fixadas.

Conformevimosacima,háumrígidoesquemaconstitucionalderepartiçãodecompe-tências, que reserva campos específicos de atuação legislativa às pessoas políticas. O princípio daisonomiadaspessoaspolíticasconsistenaaceitaçãodequenãoháhierarquiaentreasnor-masemanadasdaUnião,dosEstadosedosMunicípios.

Nocasodasleisordináriasfederais,estaduaisemunicipais,nãoháhierarquiaentreelas,poissetratadeumadecorrênciadoprincípiodaisonomiadestesentes.Portanto,oprin-cípio da isonomia entre as pessoas constitucionais significa essencialmente que (i) a União, EstadoseMunicípiossãoentidadescujaexistênciaestáconstitucionalmenteprevista,reguladastambém as condições de sua atuação; e (ii) a competência está constitucionalmente fixada, com prevalecimentodocritériodarigidez.

Noentanto,emcertassituações,háanecessidadedeediçãodenormasgeraisdeDireitoTributário,medianteautilizaçãodeleicomplementar,decaráternacional,nabuscadauniformi-zaçãodosistema,ouseja,paraquetodososentespolíticosadotemumamesmamedida.

ConcluímosoraciocíniocomosensinamentosdeRoqueAntonioCarrazza:

[...] A lei complementar que vier a “dispor sobre conflitos de competência, em matériatributária”,“regularlimitaçõesconstitucionaisaopoderdetributar”ou “estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária” – tantoquantoqualqueroutraleicomplementar–subordina-seàConstituiçãoeaosseusgrandesprincípios.Com isso pretendemos significar que esta lei complementar não tem a prer-rogativadebuscarnelaprópriaseufundamento de validade.Muitopelocon-trário:elasópoderáirradiarefeitosse e enquanto estiverdentrodapirâmide jurídica, em cuja cúspide situam-se as normas constitucionais. Esta verdade científica não pode ser contestada.Admitimos,numesforçodearranjo,quealeicomplementarsobfocotemáticopoderáiluminarospontosmaisoumenosobscurosdenossosistemaconsti-tucionaltributário,desdequeabsolutamentenãooalterenem,muitomenos,odestrua.Sendoassim,vemos,comfacilidade,quealeicomplementarprevistanoart.146 da CF só pode reforçar o perfil constitucional de cada tributo, desenhan-do-omaisemdetalheecircunscrevendoseusexatoscontornos,tudoparaque,na prática, não surjam conflitos de competência tributária entre as pessoas

Page 40: Fernanda Ramos Pazello

3�

políticas.ParafraseandoPontesdeMiranda,podemosdizerqueestaleicom-plementaré“umaleisobreleisdetributação”.[...].82

Alémdafunçãode editar normas gerais em matéria tributária e dispor sobre conflitos decompetência,HumbertoÁvila83indicaasdemaisfunçõesdaleicomplementaremmatériatributária,asaber:

(i) instituição de tributos específicos, tais como os empréstimos compulsórios e os impostosdecompetênciaresidualdaUniãoFederal;

(ii) regulaçãodaslimitaçõesaopoderdetributar,umavezqueseexigeleicomple-mentarparaogozodaimunidadedasinstituiçõesdeeducaçãoeassistênciasocial(artigo150,VI,c,daCF/88);84

(iii)delimitaçãodasregrasdecompetência,ouseja,limitaroâmbitomaterialdasre-gras de competência quando a CF o exige e determinar o âmbito material dasregras de competência de modo a evitar conflitos de competência;

(iv) definir um tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresasdepequenoporte;e

(v) estabelecercritériosespeciaisdetributaçãocomoobjetivodeprevenirdesequilí-briosdaconcorrência,semprejuízodacompetênciadeaUnião,porlei,estabele-cernormasdeigualobjetivo.

Noque concerne à tributaçãodasoperaçõesde exportação, cumpredestacarque aCF/88atribuiuàleicomplementarafunçãode:(i)excluirdaincidênciadoICMSoutrosservi-çoseprodutosnãodiscriminadosnaimunidadetributáriarelativaàsoperaçõesdeexportaçãodoartigo155,§2.º,incisoX,alíneaa(artigo155,§2.º,incisoXII,alíneae);e(ii)excluirdaincidênciadoISSasexportaçõesdeserviçosparaoexterior(artigo156,§3.º,incisoII).

Naprimeirahipótese,éimportantesalientarqueaEC42/2003abrigounashipótesesdeimunidadeasmercadoriasdestinadasaoexterioreosserviçosprestadosadestinatáriosno

8� ICMS.�0.ed.SãoPaulo:Malheiros,�005.p.�37-�38.83 HumbertoÁvila.Sistema...,cit.,p.�33-���.8� “[...]Art.�50.Semprejuízodeoutrasgarantiasasseguradasaocontribuinte,évedadoàUnião,aosEstados,

aoDistritoFederaleaosMunicípios:

[...]

VI–instituirimpostossobre:

[...]

c)patrimônio,rendaouserviçosdospartidospolíticos,inclusivesuasfundações,dasentidadessindicaisdostrabalhadores,dasinstituiçõesdeeducaçãoedeassistênciasocial,semfinslucrativos,atendidososrequisitosdalei;[...].”

Page 41: Fernanda Ramos Pazello

33

exterior.Noentanto,olegisladordaemendaesqueceu-sederevogaroartigo155,§2.º,incisoXII,alíneae,daCF/88,quesomentefaziasentidoemfacedaantigaimunidadequeabrangiasomente os produtos industrializados, excluídos os semi-elaborados definidos em lei comple-mentar.Portanto,nãotrataremosdestedispositivoconstitucional.

Quantoàsegundahipótese,afunçãodaleicomplementarrefere-seàquelasregrasdecompetênciacujoâmbitomaterialdeincidênciapodeserobjetoderestriçãopormeiodeleicomplementar.Ouseja,cabeàleicomplementardeterminaraexclusãodoISSsobreasopera-çõesdeexportaçãodeserviços,e,casosejaeditada,deveráserobservadaportodososMunicí-pios,oquetraráuniformizaçãoeharmoniaaosistema.

AfunçãodaleicomplementarfoiexercidapelapublicaçãodaLC116/2003quede-terminouaexclusãodestamodalidadetributárianasoperaçõesdeexportaçãodeserviços.Aaplicação,osentidoeoalcancedestanormaserãoanalisadosemmomentooportuno,inclusiveporsetratardeumdosobjetivosdopresentetrabalho.

Page 42: Fernanda Ramos Pazello

3�

2EXTRAFISCALIDADE

2.1 Acepção adotada

O termo extrafiscalidade foi analisado por estudiosos que alternam em apresentar acepçõesmaisamplasourestritas,clássicasoumodernasdovocábulo.Aacepçãomaisrestrita,adotadaporFábioFanucchi,RuyBarbosaNogueira,MisabelDerzi,JoséCasaltaNabaiseHéc-tor Villegas, pressupõe que a extrafiscalidade encontra-se veiculada em institutos que implicam aumento ou redução da carga tributária com o fim de realizar valores econômicos mediante incentivos ou dificuldades tributárias.

Uma visão ampliada do termo crê que a extrafiscalidade, além de estímulos e desestí-mulosacomportamentos,encontra-sepresenteemtodoexpedientetributárioquevise,inten-cionalounãointencionalmente,realizarvaloresqueexcedamàmeraarrecadaçãodetributos,embora em conjunto com o objetivo arrecadatório. Neste caso, a extrafiscalidade não se limita-riaainduzirouimprimircomportamentos,nemapenasaimprimirobjetivoseconômicos,mastambémculturais,artísticosedesportivos,entreoutros.

Marcus de Freitas Gouvêa, em estudo aprofundado sobre a extrafiscalidade no Direito Tributário,adotouumavisãomaisampla,fundadanosestudosdeRicardoLoboTorres,PaulodeBarrosCarvalhoeErosRobertoGrau.Segundoesteautor,

[...] a extrafiscalidade se constitui em “algo mais” que a obtenção de receitas tributárias;liga-seavaloresconstitucionais;podeserrepresentadaporisen-ções, benefícios fiscais, progressividade de alíquotas, finalidades especiais, entreoutrasformasqueassume,criandodiferençasentreosindivíduos,quesão em última análise agentes políticos, econômicos e sociais [...].85

Adotaremos tal concepção para tratar da extrafiscalidade e seus efeitos sobre os prin-cípioseosinstitutostributários(taiscomoaimunidadeeaisenção).

A extrafiscalidade está intimamente ligada à fiscalidade e ao Direito Tributário. Segun-doPaulodeBarrosCarvalho,

[...] consistindo a extrafiscalidade no emprego de fórmulas jurídico-tributárias para a obtenção de metas que prevalecem sobre os fins simplesmente arreca-

85 A extrafiscalidade no direito tributário.BeloHorizonte:DelRey,�006.p.9-�0.

Page 43: Fernanda Ramos Pazello

35

datóriosderecursosmonetários,oregimequehádedirigirtalatividadenãopoderiadeixardeseraqueleprópriodasexaçõestributárias[...].86

Enrico De Mita bem enfatizou a idéia de extrafiscalidade dos tributos ao afirmar que

[...] um imposto pode ser preordenado a fins extrafiscais, isto é, não tanto vi-sando obter uma receita para o Estado (que é o fim fiscal, obter receita), mas outros fins com relação aos quais o imposto assume um perfil instrumental. Este perfil instrumental pode assumir um outro aspecto: a estrutura ordinária do imposto é modificada em vista do objetivo político que se quer perseguir. Existeassimafunçãodesincentivadoraeincentivadoradatributação[...].87

Conforme bem elucidado porAngela Maria da Motta,88 a extrafiscalidade vem ex-pressaemnormasalheiasànormamatrizdeincidênciatributária,comoéocasodasnormasconstitucionaisdeimunidadetributáriaedasnormasordináriasdeisençãotributária.Nãoobs-tante isso, a extrafiscalidade também poderá impregnar a própria norma matriz de incidência tributária,comoéocasodasalíquotasseletivasdoIPIedoICMS.

EntendemosqueoDireitodeveserutilizadocomoinstrumentoparapromoverobemco-mum,regulandoavidasocial.EsseéocaráterfuncionaldoDireito,conformevistoporNorbertoBobbioemsuaobraDa estrutura à função.89 Por esse motivo, não combatemos o caráter extrafiscal dadoaostributosjustamenteporquetambémcorroboramosqueoDireitoTributáriodeveservistocomouminstrumentodetransformaçãosocial,intervindonaeconomia,napolíticaenasociedade.

SegundoRaimundoBezerraFalcão,90 a tributação extrafiscal caminha de mãos dadas comointervencionismodoEstado,sendo,portanto,umimportantefatordemudançasocial.Damesma forma, Alfredo Augusto Becker acredita no potencial da extrafiscalidade ao afirmar que “a principal finalidade de muitos tributos [...] não será a de um instrumento de arrecadação de recursos para o custeio das despesas públicas, mas a de um instrumento de intervenção estatal nomeiosocialenaeconomiaprivada”.91

Uma política tributária fundada na extrafiscalidade é um forte instrumento de desestí-muloouestímuloaodesenvolvimentoeconômicoesociocultural.Hádiversosfatoreseconô-

86 PaulodeBarrosCarvalho.Curso...,cit.,p.�50.87 EnricoDeMita.Oprincípiodacapacidadecontributiva.In:RobertoFerraz(Coord.).Princípios e limites da

tributação.SãoPaulo:QuartierLatin,�005.p.��7.88 AngelaMariadaMottaPacheco.Extrafiscalidadeeoimpostodeexportação.In:LuísEduardoSchoueri

(Coord.).Direito tributário.HomenagemaAlcidesJorgeCosta.SãoPaulo:QuartierLatin,�003.v.�,p.5�5-5�6.

89 Da estrutura à função.Novosestudosdateoriadodireito.SãoPaulo:Manole,�007.90 Tributação e mudança social.RiodeJaneiro:Forense,�98�.p.�7.9� AlfredoAugustoBecker.Teoria geral do direito tributário.3.ed.SãoPaulo:Lejus,�998.p.5�8.

Page 44: Fernanda Ramos Pazello

36

micossensíveisaostributos,comoprodução,natureza,capital,emprego,trabalhoetecnologia,

acúmulo de capitais, política de investimentos, comércio interno e internacional, câmbio, con-

sumo,taxasdejuros,etc.

Quantoaodesenvolvimentosociocultural,queabrangeelementoscomoafamília,

seguridadesocial,educação,culturaedesporto,podemosdarcomoexemploascontribui-

ções sociais, que são tributos finalísticos, ou seja, o produto de sua arrecadação é destinado

àproteçãodevaloressociaisconstitucionalmenteassegurados,comoaprevidênciasocial,a

assistência social, a saúde, a educação. Marcus de Freitas Gouvêa nos ensina que os valores

constitucionaispossibilitamqueofatogeradordacontribuiçãoatueemdesfavordeumgru-

po (empregadores, proprietários de terra) e que a finalidade do tributo aja em favor do grupo

oposto (empregados, camponeses), sem que se perca de vista a referibilidade da exação,

característica que a mantém diferenciada dos impostos e que constitui critério de verificação

desuaconstitucionalidade.

Estamos tratando da extrafiscalidade no destino do produto arrecadado para a reali-

zaçãodevaloresconstitucionais(desenvolvimentoeconômicoesociocultural).SegundoWer-

ther Botelho Spagnol, “as contribuições especiais são tributos destinados ao financiamento de

gastos públicos específicos, atuando como instrumento de intervenção do Estado nos campos

socialeeconômico”.Ademais,

[...]nãosepodeconceberoEstadoDemocráticodeDireitodissociadodeumatributação com finalidades amplas, que não se resumam na mera fiscalidade, [pois] a utilização da tributação com finalidades não fiscais é um instrumento defundamentalimportânciaparaaconsecuçãodosobjetivosdapolíticaeco-nômicadoEstadoDemocráticodeDireito.92

Conforme veremos no decorrer deste trabalho, a extrafiscalidade influencia os princí-

piosinformadoresdoDireitoTributárioetambémseusinstitutos,namedidaemqueosprin-

cípioseasdesoneraçõestributárias(comoasimunidades,as isenções,areduçãodebasede

cálculo e alíquota) encerram em si um fim extrafiscal, uma vez que visam atingir fins externos,

ouseja,econômicos,políticose/ousociais.

9� WertherBotelhoSpagnol.As contribuições sociais no direito brasileiro.RiodeJaneiro:Forense,�00�.p.5�,�8e�5.

Page 45: Fernanda Ramos Pazello

37

2.2 SuainfluênciasobreosprincípiosinformadoresdoSistemaConstitucionalTribu-

tário

2.2.1 Noção de princípio

Inicialmente,cabe-nos trazernossaacepçãodo termoprincípio.Há regrasque,por

serem intensamente carregadas de valor, exercem significativa influência em uma porção do

ordenamentojurídico,informandoacompreensãodediversossegmentos.Taisregrassãodeno-

minadas“princípios”.

Osprincípiosaparecemcomolinhasdiretivasqueiluminamacompreensãodese-

toresnormativoseexercemumareaçãocentrípeta,namedidaemqueatraememtornode

si regras jurídicas que passam a ser influenciadas e manifestam a força de sua influência.93

De acordo com Geraldo Ataliba, os princípios expressam “[...] a substância última do que-

rerpopular,seusobjetivosedesígnios,aslinhasmestrasdalegislação,daadministraçãoe

da jurisdição. Por estas não podem ser contrariados; têm que ser prestigiados até as últimas

conseqüências”.94

Osprincípiossãoenunciadossimplesoucomplexossemprepassíveisdeexpressãoem

proposiçõesdescritivasouprescritivas.Osprincípios,sejamelesprescritivosoudescritivos,

podem ser gerais e específicos, explícitos ou implícitos e, ainda, ser classificados como empí-

ricos,lógicos,ontológicos,epistemológicosouaxiológicos.Nãoháhierarquiaentreprincípios

explícitos e implícitos, ou seja, o fato de um princípio estar expresso não significa que é mais

importantequeumprincípioimplícito.

PaulodeBarrosCarvalho95sustentaoentendimentodeque,dentrodeumacomuni-

dade, há um núcleo coincidente de valores básicos, pois os indivíduos vivem em um mesmo

espaço e no mesmo tempo. No entanto, por serem núcleos com forte carga abstrata, precisam

serdepuradosmediantemecanismointegradoreconsciente.Aquiresideaideologia,conjunto

deavaliaçãodosprópriosvalores.Asideologiasoperamcomosistemasrígidoselimitados,que

hierarquizam os valores, organizando-os e permitindo que os identifiquemos.

93 PaulodeBarrosCarvalho.Curso...,cit.9� GeraldoAtaliba.República e Constituição,cit.,p.3�5.95 PaulodeBarrosCarvalho.Sobreosprincípiosconstitucionaistributários.Revista de Direito Tributário,São

Paulo,n.65,p.��3.

Page 46: Fernanda Ramos Pazello

38

Portanto, princípio é uma regra portadora de núcleos significativos de grande magni-tude, influenciando a orientação das regras jurídicas, outorgando unidade sistêmica e servindo defatordeagregaçãodeoutrasregrasdosistemapositivo.SegundoHumbertoÁvila,“[...]osprincípios são normas imediatamente finalísticas. Estas estabelecem um estado ideal de coisas a serbuscado,porisso,exigemaadoçãodecomportamentoscujosefeitoscontribuamparaapro-moção gradual daquele fim[...]”.96Oestadoidealdecoisasquesepretendebuscaroupreservarpelosprincípiospodesermaisoumenosamplo.Osprincípiosquesecaracterizamporimporarealizaçãodeideaismaisamplossãodenominadosde“sobreprincípios”.

Oconceitodeprincípiojurídicoseriaodeumenunciadológico,implícitoouexplícito,queocupaposiçãodedestaquenoordenamentojurídico,emrazãodesuageneralidadeedosvalores nele insertos, influenciando na interpretação e aplicação das regras jurídicas inseridas no mesmo sistema jurídico, uma vez que os princípios mais amplos influenciam também na interpretaçãoeaplicaçãodosprincípiosmaisrestritos.Daíaimportânciadoseuestudoparaopresentetrabalho.

Osprincípiosdevemconvivercomoutrasregraseprincípios,visandoàharmoniadosistema.Assim,oDireitopodeservistocomoumconglomeradodenormasbemestruturadas,interligadasporcritériosdecoordenaçãoesubordinação.Ojurista,aoanalisaroDireito,deve,inicialmente,aferiras idéiasquemais seaproximamdosprincípiospara,poucoapouco, irdescendoemdireçãoàsregrasjurídicas.Portanto, os princípios jurídico-constitucionais são a base de um ordenamento jurídico, devendo ser observados no momento da interpretação e aplicação das normas jurídicas.

Osvaloreseideologiasexistentesemumasociedadesãoaplicadosparaseelaboraremasnormasjurídicas.AciênciadoDireitonãodevesevalerdeideologiasprópriasparatentarcompreenderedescreverodireitoposto.Noentanto,nãoépossíveldemarcarcritériosobjeti-vosparaseaplicaremosprincípios,quesempreterãoumcampodesubjetividade.Assim,

[...] a interpretaçãodosprincípios, comonormasqueverdadeiramente são,dependedeumaanálisesistemáticaqueleveemconsideraçãoouniversodasregras jurídicas, enquanto organização sintática (hierarquia sintática) e en-quantoorganizaçãoaxiológica(hierarquiadosvaloresjurídicos),poisassimcomoumaproposiçãoprescritivadodireitonãopodeserapreciadaindepen-dentementedosistemaaquepertence,outrotantoacontececomosvaloresjurídicos injetadosnasestruturasnormativas.Desseprocessode integraçãoresultaráoentendimentodamensagemprescritiva,emsuaintegridadesemân-tica,sempreelásticaemutável[...].97

96 Sistema...,cit.,p.38.97 PaulodeBarrosCarvalho.Sobreosprincípiosconstitucionaistributários,cit.,p.��3.

Page 47: Fernanda Ramos Pazello

39

SegundoEduardoGarcíadeEnterría,98 os princípios representamabasede todoo

sistemajurídico.Poressemotivo,aofensaaumprincípioémaisgravedoqueaofensaauma

regra, pois significa subversão de todo o sistema jurídico e falência de suas estruturas.

GeraldoAtalibajádiziaque“[...]acompreensãodetodaequalquerinstituiçãodedi-

reito público, positivamente adotada por um povo, depende da prévia percepção dos princípios

fundamentaispostosnasuabaseporessemesmopovo,nasuamanifestaçãopolíticaplena:a

Constituição[...]”.99

OSistemaConstitucionalTributáriobrasileiroéformadoporregraseprincípios,ge-

rais ou específicos, implícitos ou explícitos. Tais princípios representam limites à ação de tri-

butar e contribuem para impedir abusos por parte do Poder Público.100GeraldoAtaliba,emsua

primorosaobraRepública e Constituição,reconheceuqueosdoisprincípiosmaisimportantes

donossoordenamentojurídicosãooprincípiorepublicanoeoprincípiofederativo.101

2.2.2 Princípio republicano

Oprincípio republicanoéumsobreprincípiogeral.PartedaidéiadequeoBrasilé

uma República, conforme prescrito por nossa Constituição Federal (artigo 1.º), que também

traça o perfil e as peculiaridades da República brasileira.

98 La Constitución como norma y el Tribunal Constitucional.Madrid:Civitas,�985.p.98.99 GeraldoAtaliba.República e Constituição,cit.,p.�5.�00 Confira-seoentendimentodeHumbertoÁvilaaotratardarigidezdosistemajurídicotributárioemrazãodos

seusprincípiosinformadores:

“[...]Arigidezespecíficadasnormastributáriasétambémdiretaeindiretamenteinstituída:algumassãodeno-minadas‘garantias’(art.�50:legalidade,igualdade,irretroatividade,anterioridade,proibiçãodetributocomefeitosdeconfisco,imunidades);outrasnormasmantêmrelaçãocomosprincípiosfundamentais(princípiofederativo,democráticoedaseparaçãodosPoderes)oucomosdireitosegarantiasindividuaiscujamodifica-çãoévedada.Valedizer:mesmoqueosdireitosnãoestejamprevistosnoTítuloIIdaConstituição,queregulaosdireitosegarantiasindividuais,elesestãoincluídosnaproibiçãodemodificaçãoseforemdecorrentesdoregimeedosprincípiosadotadospelaConstituiçãooudostratadosinternacionaisemqueaRepúblicaFe-derativadoBrasilsejaparte(art.5.º,§�.º,CF).Issovalenãoapenasparaaslimitaçõesaopoderdetributarprevistasnoartigo�50edenominadas“garantias”,mastambémparaosdireitosfundamentaisgarantidospelaConstituiçãocomoumtodo,comoéocasodaproteçãodafamília,dapropriedadeedaliberdade[...]”(Hum-bertoÁvila.Sistema...cit.,p.��0).

�0� Assimasseveraoautor:“[...]NoBrasilosprincípiosmaisimportantessãoosdafederaçãoedarepública.Porisso,exercemfunçãocapitulardamaistranscendentalimportância,determinandoinclusivecomosedeveinterpretarosdemais,cujaexegeseeaplicaçãojamaispoderãoensejarmenoscabooudetrimentoparaaforça,eficáciaeextensãodosprimeiros(v.CelsoAntônioBandeiradeMello.Elementos de direito administrativo.SãoPaulo:RT,�980.p.�30)[...]”.

Page 48: Fernanda Ramos Pazello

�0

República é o tipo de governo, fundado na igualdade formal das pessoas, em que os

detentoresdopoderpolíticoexercememcarátereletivo,representativo(emregra),transitório

ecomresponsabilidade.Desteconceitodepreendem-seasseguintescaracterísticas:(i)éforma

deGoverno;(ii)todososcidadãostêmamesmadignidadesocialesãoiguaisperantealei,sem

distinçãodecondiçõessociaisepessoais;(iii)osdetentoresdospoderespolíticossãooslegis-

ladoreseosmembrosdoPoderExecutivo,sendoopovoodetentordopoderpolíticoemcaráter

originário;(iv)osdetentoressãoescolhidospelopovo,ouseja,sãoeleitossegundoavontade

dopovo(soberaniapopular);e(v)osdetentoresrepresentamopovo(representatividade).102

Opovonãoseautogoverna,excetonoscasosdeplebiscito, referendoe iniciativa

popular,mecanismosprevistosnosistema jurídicoconstitucionalbrasileiro.Noentanto,o

povoéafontedopoderpolíticoetransferetalpoderaosrepresentanteseleitos,porintermé-

diodosufrágiouniversaledovotodiretoesecreto.Emboraoprincípiorepublicanonãoseja

cláusulapétrea,ovotodireto,secreto,universaleperiódiconãopodeserretiradodosistema

jurídicoconstitucional, em razãodoexpostonoartigo60,§4.º, daCF/88.103Talpreceito

tornaefetivoosistemarepresentativoeoregimedemocráticoe,porviadeconseqüência,o

regimerepublicano.

�0� Oprincípiorepublicanoé“[...]desdobradoemtodasassuasconseqüências,aolongodotextoconstitucional:inúmerasregrasdandooconteúdoexatoeaprecisaextensãodatripartiçãodopoder;mandatospolíticosesuaperiodicidade,implicandoalternâncianopoder;responsabilidadesdosagentespúblicos,proteçãoàsli-berdadespúblicas;prestaçãodecontas;mecanismosdefiscalizaçãoecontroledopovosobreogoverno,tantonaesferafederalcomoestadualoumunicipal;aprópriaconsagraçãodosprincípiosfederaledaautonomiamunicipaletc.Tudoissoaparece,formandoacontexturaconstitucional,comodesdobramento,refração,con-seqüênciaouprojeçãodoprincípio,expressõesconcretasdesuasexigências[...]”(GeraldoAtaliba,República e Constituição,cit.,p.�7-�8).

�03 “[...]Art.60.AConstituiçãopoderáseremendadamedianteproposta:

I–deumterço,nomínimo,dosmembrosdaCâmaradosDeputadosoudoSenadoFederal;

II–doPresidentedaRepública;

III–demaisdametadedasAssembléiasLegislativasdasunidadesdaFederação,manifestando-se,cadaumadelas,pelamaioriarelativadeseusmembros.

§�.ºAConstituiçãonãopoderáseremendadanavigênciadeintervençãofederal,deestadodedefesaoudeestadodesítio.

§�.ºApropostaserádiscutidaevotadaemcadaCasadoCongressoNacional,emdoisturnos,considerando-seaprovadaseobtiver,emambos,trêsquintosdosvotosdosrespectivosmembros.

§3.ºAemendaàConstituiçãoserápromulgadapelasMesasdaCâmaradosDeputadosedoSenadoFederal,comorespectivonúmerodeordem.

§�.ºNãoseráobjetodedeliberaçãoapropostadeemendatendenteaabolir:

I–aformafederativadeEstado;

II–ovotodireto,secreto,universaleperiódico;

III–aseparaçãodosPoderes;

IV–osdireitosegarantiasindividuais.

§5.ºAmatériaconstantedepropostadeemendarejeitadaouhavidaporprejudicadanãopodeserobjetodenovapropostanamesmasessãolegislativa.[...].”

Page 49: Fernanda Ramos Pazello

��

Emmatériatributária,aleiquecriaotributoexercitaacompetênciatributáriavisando

aointeressedopovoeparaobem-estardoPaís.Aleinãopodepreverprivilégiostributários

aosindivíduos,poistodosdevemseralcançadospelatributação(princípiodaigualdade).Além

disso,ascompetênciastributáriassomentepodemserexercidaspelaspessoaspolíticas,para

satisfazer interesses públicos. Tal afirmação atende o ideal republicano.

O princípio republicano, como sobreprincípio que é, influencia diretamente outros

princípiosconstitucionais.Emmatériatributária,podemosdizerqueoprincípiorepublicano

implica observância ao princípio da isonomia, da capacidade contributiva e do não-confisco.

Oprincípio da isonomiaemmatériatributáriaconsistenaexigênciadequealei,tan-

toaosereditadaquantoaoseraplicada,(i)nãodiscrimineoscontribuintesqueseencontrem

emsituaçãoequivalente;e(ii)discrimine,namedidadesuasdesigualdades,oscontribuintes

quenãoseencontramemsituaçãojurídicaequivalente(artigo150,incisoII,daCF/88).104

Referido princípio interage com a extrafiscalidade, conforme bem enfatizado por Sacha Cal-

monNavarroCoêlho:

[...]Emcertassituaçõesolegisladorestáautorizadoatratardesigualmenteaosiguais, sem ofensa ao princípio, tais são os casos derivados da extrafiscalidade edopoderdepolícia.

A extrafiscalidade é a utilização dos tributos para fins outros que não os da simplesarrecadaçãodemeiosparaoEstado.Nestahipótese,otributoéins-trumentodepolíticaseconômicas,sociais,culturais,etc.

[...]

Passemosaosexemplos.Nãorepugnaaoprincípiodaisonomia:A)atributa-çãoexarcebadadecertosconsumosnocivos,taiscomobebidas,fumoecartasdebaralho;B)oimpostoterritorialprogressivoparapenalizaroausentismoou o latifúndio improdutivo; C) o IPTU progressivo pelo número de lotes vagosoupelotempo,paraevitaraespeculaçãoimobiliária,àreveliadointe-ressecomumcontraafunçãosocialdapropriedade;D)imunidades,isenções,reduções, compensações para partejar o desenvolvimento de regiões maisatrasadas;E)idemparaincentivarasartes,aeducação,acultura,oesforçoprevidenciárioparticular(seguridade)[...].105

�0� “[...]Art.�50.Semprejuízodeoutrasgarantiasasseguradasaocontribuinte,évedadoàUnião,aosEstados,aoDistritoFederaleaosMunicípios:

[...]

II–instituirtratamentodesigualentrecontribuintesqueseencontrememsituaçãoequivalente,proibidaqual-querdistinçãoemrazãodeocupaçãoprofissionaloufunçãoporelesexercida,independentementedadenomi-naçãojurídicadosrendimentos,títulosoudireitos;[...].”

�05 Manual de direito tributário.RiodeJaneiro:Forense,�00�.p.�30.

Page 50: Fernanda Ramos Pazello

��

Oprincípiorepublicanotambémtransparecenoprincípio da capacidade contributiva,expressamenteprevistonoartigo145,§1.º,daConstituição.106Segundotalprincípio,quemtemmaiorriquezadeve,emtermosproporcionais,pagarmaistributodoquequemtemmenorriqueza. A capacidade contributiva informa a fiscalidade, uma vez que impõe ao Estado cobrar tributos de seus súditos que tenham capacidade para ser tributados. Tal princípio está ligado aoprincípiodaisonomia,vistoqueoquemensuraaigualdadeoudesigualdadeéacapacidadecontributivadocontribuinte.

Ascaracterísticasatribuídasaalgunstributosdegeneralidade,universalidadeepro-gressividadedãoefetividadeaoprincípiodacapacidadecontributivae,aomesmotempo,pos-suem feições extrafiscais. A generalidade pressupõe que tudo aquilo que for renda deverá ser tributado (Imposto sobre a Renda). Já a universalidade consiste na tributação de todos queauferem renda (Imposto sobre a Renda). Por fim, a progressividade constitui a aplicação de alí-quotasmajoradasparaosquepossuembasedecálculomaior(IR,ITReIPTU).Ouseja,quempodemaispagamais.

SegundoMarcusdeFreitasGouvêa,

[...] A generalidade e a universalidade têm um caráter preponderantemente fis-cal,relativoàamplitudedabasedecálculo,masatendeaosanseiosdeigual-dade,porquantoproíbedistinçõesnatributaçãodepessoas(emvirtudedesuaposiçãosocial)ederendas(emvirtudedesuafonte).Jáaprogressividade,anossover,atendetantoàcapacidadecontributivaquan-to à extrafiscalidade. Uma alíquota progressiva, ao majorar a carga tributária desujeitoscomcapacidademaiordecontribuir,reduzoônustributáriodaque-lescomcapacidademenor,agindoassimnareduçãodedesigualdadesentreindivíduos,conformepreconizaoart.3.º,III,daConstituição[...].107

Oprincípiodacapacidadecontributivaéencontradotambémnaseletividadeenanão-cumulatividadedostributos.OICMSedoIPIpossuemalíquotasseletivasemrazãodobemouserviçoemcujaoperaçãoincideotributo.Damesmaforma,aCartaMagnaprevêdiferenciaçãodealíquotaebasedecálculoparaascontribuiçõessociaisemrazãodaatividadeeconômicaeutilizaçãodemão-de-obra.Jáanão-cumulatividadepressupõeoabatimentodoimpostodevidonasoperaçõesanterioresnasoperações futuras.Tantoa seletividadequantoanão-cumulati-vidade também se prestam a finalidades extrafiscais. De acordo com o autor acima citado, os

�06 “[...]Art.��5.

§�.ºSemprequepossível,osimpostosterãocaráterpessoaleserãograduadossegundoacapacidadeeco-nômicadocontribuinte,facultadoàadministraçãotributária,especialmenteparaconferirefetividadeaessesobjetivos,identificar,respeitadososdireitosindividuaisenostermosdalei,opatrimônio,osrendimentoseasatividadeseconômicasdocontribuinte.[...].”

�07 A extrafiscalidade…,cit.,p.6�.

Page 51: Fernanda Ramos Pazello

�3

tributos cumulativos incentivam a concentração do processo produtivo e, assim, beneficiam apenas bens cuja cadeia de produção é mais curta. Já a seletividade onera os produtos supérfluos emdetrimentodosprodutosessenciais,alémdegravarpesadamenteatividadesdebaixoriscoeconômicoeelevadoriscosocialoufavoreceratividadesestratégicas.108

VictorUckmar,aotratardosprincípioscomunsdoDireitoConstitucionalTribu-tário, não escapou da análise dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva,esclarecendoque

[...] igualdade perante os ônus públicos significa justiça tributária, no sentido pré-jurídicoemoralaoqualfazemfreqüentemençãonãosóosjuristasmastambémoseconomistas,eistocomo“exigênciadequeasdiversasclassesdecidadãos,especialmenteasdiversascategoriasdeprodutores,concorramàscargas comuns, impostas para o exercício das atividades públicas, na medida emqueresultadaaplicaçãodealgunscritérios-gerais,comoodapotenciali-dadeeconômicaefetivadoscontribuintes,oudaintensidadedasuaparticipa-ção na fruição dos serviços públicos. Esta exigência se põe, acima de tudo, aolegislador,aoqual,nosordenamentosporeleelaborados,devepôrcomofim, precisamente a distribuição equânime dos ônus tributários. Se, depois, tal exigênciaéefetivamenterealizada,éoutroassunto![...].109

Verifica-se, portanto, o caráter extrafiscal destes dois princípios.

Oprincípio do não-confisco(artigo150,incisoIV,daCF/88)110derivadoprincípiodacapacidadecontributiva,aoexigirdolegisladorcondutamarcadapeloequilíbrio,pelamode-ração e pela medida na quantificação dos tributos, tudo tendo em vista um Direito Tributário justo.Otributonãopodeesgotarariquezatributável.Noentanto,emdeterminadassituaçõesoprincípio do não-confisco interage com a extrafiscalidade admitindo excessos. É o caso do IPI mais gravoso para produtos supérfluos e do IR progressivo.

Percebe-se,portanto,quedoprincípiorepublicano,consideradosobreprincípioconsti-tucional geral, extraem-se princípios constitucionais específicos à ação de tributar, notadamente os princípios da igualdade, da capacidade contributiva e do não-confisco, com feições fiscais e extrafiscais.

�08 A extrafiscalidade…,cit.,p.63.�09 VictorUckmar.Princípios comuns de direito constitucional tributário.SãoPaulo:RT,�976.p.7�.��0 “[...]Art.�50.Semprejuízodeoutrasgarantiasasseguradasaocontribuinte,évedadoàUnião,aosEstados,

aoDistritoFederaleaosMunicípios:

[...]

IV–utilizartributocomefeitodeconfisco;[...].”

Page 52: Fernanda Ramos Pazello

��

2.2.3 Princípio federativo

Damesmaformaqueoprincípiorepublicano,oprincípio federativo,consideradotam-bém sobreprincípio constitucional geral, influencia a tributação. Federação é uma associação, umauniãoinstitucionalizadadeEstados,quedálugaraumnovoEstado,diversodosquedeleparticipam.ParaoDireito,oEstadonadamaisédoqueoordenamentojurídico,originárioesoberano,deumpovo,estabelecidoemumdadoterritório.Éoriginárioporquenãodependenemderivadeoutro;esoberano,porquesuperioraqualquerpessoaouinstituiçãoquenelevivaouexista.OpoderqueregeoEstadodenomina-segovernoeseresolvenumafaculdadedeco-mandoaqueacoletividadedeveobediência.

NoBrasil,oprincípiofederativoéverdadeiracolunamestradosistemajurídico,noqualconvivemharmonicamenteaordemjurídicaglobal(oEstadobrasileiro)easordensju-rídicasparciais(aUniãoeosEstados-membros).AUniãoeosEstados-membrossãoiguais,ouseja,nãoháhierarquiaentreeles.Oquehásãocamposdeaçãoautônomoseexclusivos,estritamentetraçadosnaCartaSuprema,queleialgumapodealterar.Alémdisso,afederaçãoéindissolúvel, em razão da rigidez constitucional (artigo 60, § 4.º, da CF/88). Portanto, há uma coexistênciadasautonomiasfederaiseestaduais.

Asleisnacionais,estaduaisemunicipaisocupamomesmonível,etodasencontramseufundamentodevalidadenaprópriaCartaMagna,ocupandocamposdeatuaçãoexclusivosemuitobemdiscriminados.Alémdisso,asváriasordensjurídicassãoisônomas.Noentanto,conformeenfatizadoporRoqueAntonioCarrazza,

[...] essa igualdade jurídica – como bem demonstrou Souto Maior Borges– absolutamente não significa que a União e os Estados se confundem, mas, apenas,quesuasatribuições,conquantodiversas,correspondemafeixesdecompetênciapostosematuaçãomedianteprincípiosenormasestatuídosnaLex Major.Asdiferençasentreelesnãoestão,repetimos,nosníveishierár-quicosqueocupam;estão,sim,nascompetênciasdistintasquereceberamdaprópriaConstituição[...].111

Portanto, os Estados-membros no Brasil são entidades públicas territoriais dotadas de autonomia legislativaeconstitucional.São juridicamente iguaisentre si,possuindoosmes-mosdireitosedeveres.Participamda formaçãodavontadenacional.Emmatéria tributária,oprincípiofederativoimpõequeascompetênciastributáriastraçadasnaCartaMagnasejamobservadas,sobpenadehaverinvasãodecompetênciadaUniãonosEstadosevice-versa,de-sequilibrandotodoosistemajurídico.

��� RoqueAntonioCarrazza.Curso…,cit.,p.�38-�39.

Page 53: Fernanda Ramos Pazello

�5

Nesteponto,éimportantetratardoprincípiodaautonomia dos Municípios,umavezque decorre do ideal federativo e influencia o sistema tributário brasileiro. Os Municípios não participamdavontadejurídicanacional,dadoquenãotêmintegrantesnoCongressoNacional.Alémdisso,aautonomiamunicipalnãoécláusulapétrea.Noentanto,ascompetênciasatribu-ídasconstitucionalmenteaosMunicípiosdenotamsuaautonomiaperanteosEstados-membroseaUnião.OsMunicípiospodemgovernar-seeadministrar-sesemainterferênciadosoutrospoderes. A própria Constituição Federal outorgou competência política, administrativa, finan-ceiraetributáriaaosMunicípios,nãopodendoosEstadosnemaUniãotolhê-las.

Ligando a extrafiscalidade à idéia de realização de valores constitucionais, podemos afirmar que, quando uma norma tributária visa atender aos princípios federativo e da autonomia dos Municípios, estará interagindo com a extrafiscalidade, pois voltada à realização deste valor político-constitucional.

2.2.4 Princípio da legalidade

Além dos sobreprincípios da república e da federação, dos quais decorrem diversos outros princípios que influenciam a tributação no Brasil, devemos tratar de um dos principais princípiosnaaçãodetributar,queéoprincípio da legalidade.OEstadodeDireitoasseguraoprincípiodalegalidadecomoexpressãodavontadepopular.OcontroledaconstitucionalidadeexprimeaidéiadequeoEstadodevereconhecereassegurarosdireitosinvioláveisdaspessoas(princípioliberal)eoprincípiodademocracia.

Assim,sóaleipodecompeliraspessoasafazeroudeixardefazeralgumacoisa.Avidasocialnãoépossívelsemquehajarestriçõesàatividadeindividual.Taisrestriçõesde-vemestaremlei,produzidapelosrepresentantesdopovoeconformeprocedimentoprevistoparatanto.

Emmatériatributária,oprincípiodalegalidadegaranteasegurançadaspessoasdiantedatributação.AprópriaConstituiçãoFederalreforçoutalprincípionacriaçãoeaumentodostributos,sendocompetênciaexclusivamentedoPoderLegislativo(artigo150,incisoI).112As-sim,opatrimôniodocontribuintesomentepodeseratingidoquandoexpressamenteprevistoemlei.Ademais,osdeveresinstrumentaistambémdevemserprevistosemlei.

��� “[...]Art.�50.Semprejuízodeoutrasgarantiasasseguradasaocontribuinte,évedadoàUnião,aosEstados,aoDistritoFederaleaosMunicípios:

I–exigirouaumentartributosemleiqueoestabeleça;[...].”

Page 54: Fernanda Ramos Pazello

�6

OprincípiodalegalidadenoDireitoTributárioapresentacaracterísticaspeculiares.Otipotributáriohádeserumconceitofechado,seguro,exato,rígido,precisoereforçadordase-gurançajurídica.Porissoque,emmatériatributária,oprincípio passou a ser denominado “da estrita legalidade”.NãocabemanalogiapeloJudiciárionemdiscricionariedadepeloExecuti-vo.Alémdisso,aleidevesertaxativaeexaustivasobrearealidadetributária,evitandoconcei-tosindeterminados,fórmulasabertasoucláusulasgerais(princípiodatipicidade).Conclui-se,portanto,quesóquandoaleitributáriaéeditadapelapessoapolíticaquetemcompetênciaparafazê-loresultaatendidooprincípiodalegalidade.

A Constituição Federal, em razão do caráter extrafiscal de alguns tributos, possibilitou queamajoraçãooureduçãodesuasalíquotasnãofossematériareservadaàleiemsentidofor-mal. Assim, o II, o IE, o IPI e o IOF, por serem impostos com caráter eminentemente extrafiscal (regulatório),podemtersuasalíquotasmajoradasoureduzidaspeloPoderExecutivo,atendidasascondiçõeseoslimitesestabelecidosemlei(§1.ºdoartigo153daCF/88).

2.2.5 Princípio da segurança jurídica

Nãopoderíamosdeixardeabordarosobreprincípio da segurança jurídica,queajudaapromoverosvaloressupremosdasociedade,inspirandoaediçãoeaboaaplicaçãodasleisedosregulamentos,dassentençasedosatosadministrativos.

SegundoGeraldoAtaliba,

[...]odireitoé,porexcelência,instrumentodesegurançajurídica,éoqueasse-guraagovernanteeagovernadosseusrecíprocosdireitosedeveres,tornandoviávelavidasocial.Porisso,pode-sesustentarquequantomaisjuridicamenteseguraforumasociedade,tantomaiscivilizadaserá.Essemesmoautor,citan-doAlbertoXavier,assinalaquehaverásegurançajurídicaondehouverumarigorosadelimitaçãodasesferasjurídicase,sobretudo,quandoissoocorrernodireito público, como sólido pilar dos direitos subjetivos privados – liberdade epropriedade–enãodeixelugarparaocontingentearbitrário[...].113

OEstadodeDireitotrazconsigoasegurançajurídicaeaproibiçãodearbitrariedade(desviodepoder).OtributoéumarelaçãojurídicaentreocontribuinteeoFisco,tendoporbasealei,emmoeda,igualitáriaedecorrentedeatolícitoqualquer.

Oartigo5.ºdaConstituiçãoFederalreconheceeasseguraosdireitosqueformamopatrimônioirretratáveldapersonalidadehumana,ouseja,osdireitosquepertencemaohomem

��3 GeraldoAtaliba.República e Constituição,cit.,p.���.

Page 55: Fernanda Ramos Pazello

�7

entendidocomoserlivre.Taldispositivoimpedequeatosinvistamcontraosdireitosfunda-

mentais.OEstadodeveimpedirquesejamviolados,comotambémgarantirquesejamaplica-

dos.Poressemotivo,aaçãodetributardosentespolíticosdeverespeitarosdireitosindividuais

easgarantias(Estatutodocontribuinte).

AConstituiçãoFederal,aoregularaslimitaçõesaoexercíciodascompetênciastribu-

táriaseelencarosdireitosegarantiasfundamentais,visouprotegerocontribuintecontraatos

arbitráriosdoFisco.Issoporqueosmerosinteressesarrecadatóriosnãoseconfundemcomo

interesse público.

Oprincípiodasegurançajurídicaenglobaosseguintesprincípiosconstitucionais:da

legalidade,quedeterminaqueacriaçãoouaumentodotributodependedelei;datipicidade,

queexigequeo tipo tributárioesteja taxativamenteprevistoemlei;da irretroatividade,que

vedaacobrançadetributosemrelaçãoafatosgeradoresocorridosantesdavigênciadaleique

osinstituiuouaumentou;edaanterioridadeounão-surpresa,quevedaacobrançadeimposto

no mesmo exercício financeiro da publicação da lei, respeitado o período mínimo de 90 dias

dapublicaçãodalei;eacobrançadecontribuiçãoantesde90diasdapublicaçãodalei(prazo

nonagesimal).

Damesmaformaqueoprincípioda legalidade,osprincípiosdaanterioridadeeda

irretroatividade estão ligados à extrafiscalidade. Há exceções ao princípio da anterioridade em

razão do caráter extrafiscal do tributo. É o caso dos impostos extraordinários de guerra, dos

empréstimos compulsórios de guerra e de calamidade pública e de alguns impostos do artigo

153(II,IE,IPIeIOF)(§1.ºdoartigo150daCF/88).Quantoàirretroatividade,podemosdizer

que se trata de uma limitação temporal aos efeitos extrafiscais da norma tributária, conforme

sustentaMarcusdeFreitasGouvêa.114

Dosprincípiosacimaelencados,percebe-seque todososprincípiosconstitucionais

tributários, sejam gerais ou específicos, entroncam-se e interpenetram-se, sendo impossível

obedeceraum,semobedeceraosdemais.115

��� A extrafiscalidade...,cit.,p.7�.��5 Ressalte-sequeháoutrosprincípiosaseremobservadospeloEstado,alémdosindicadosacima,quetambém

interferemnoexercíciodopoderdetributar,comooprincípio(i)dacertezadodireito;(ii)dajustiça;(iii)dauniversalidadedajurisdição;(iv)queconsagraodireitodeampladefesaedodevidoprocessolegal;(v)queafirmaodireitodepropriedade;(vi)daliberdadedetrabalho;(vii)dasupremaciadointeressepúblicoaodoparticular;e(viii)daindisponibilidadedosinteressespúblicos.

Page 56: Fernanda Ramos Pazello

�8

A partir da noção de princípio e da análise dos princípios consagrados pela nossaConstituição, poderemos interpretar as normas jurídicas com o intuito de definir seu alcance e seusentido.RoqueAntonioCarrazzajádiziaque

[...] essa tarefa [da interpretação], voltada, precipuamente, à descoberta damens legis(davontadedoEstadocontidananormajurídica),exigeacons-tante invocaçãodosgrandesprincípios,mormenteem facedasdisposiçõesincertasedaspalavrasequivocadasoupolissêmicasquecostumamremarcarnossos textos legislativos. Afinal, a procura pela verdade científica não pode terminarna simples leituradeum texto legislativo (aindamaisquandoelebrigacomtextolegislativohierarquicamentesuperior)[...].116

Dessa forma, procuramos demonstrar no presente capítulo a influência da extrafiscali-dadesobreosprincípiosinformadoresdoDireitoTributário.Ademais,pudemosperceberqueafiscalidade e a extrafiscalidade não se excluem, mas se completam, pois “[...] não há fiscalidade (arrecadação) que não importe outras conseqüências, nem extrafiscalidade, que se opere sem a arrecadaçãodereceitastributárias[...]”.117

��6 RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.��.��7 MarcusdeFreitasGôuvea.A extrafiscalidade...,cit.,p.80.

Page 57: Fernanda Ramos Pazello

�9

3DESONERAÇÕES TRIBUTÁRIAS

Atributaçãovisaessencialmente obter recursos financeiros da área privada para trans-ferir à área pública a fim de que o Estado possa cumprir as tarefas que a Constituição previu. Ostributosconstituemoinstrumentoutilizadopelosentespolíticosparaarrecadar.Noentanto,além da função arrecadatória, de abastecer os cofres públicos, verificamos acima que os tributos também possuem uma carga extrafiscal, ou seja, buscam atingir situações consideradas valiosas pelo ordenamento jurídico no campo da saúde, educação, cultura, assistência social, desenvol-vimentoeconômico,entreoutros.

PaulodeBarrosCarvalhojánosdiziaque

[...]hátributosqueseprestam,admiravelmente,paraaintroduçãodeexpe-dientes extrafiscais. Outros, no entanto, inclinam-se mais ao setor da fiscalida-de.Nãoexiste,porém,entidadetributáriaquesepossadizerpura,nosentidode realizar tão-só a fiscalidade, ou, unicamente, a extrafiscalidade. Os dois objetivos convivem, harmônicos, na mesma figura impositiva, sendo apenas lícito verificar que, por vezes, um predomina sobre o outro [...].118

As desonerações tributárias estão intimamente ligadas à idéia de extrafiscalidade dostributos.SegundoSachaCalmonNavarroCoêlho,emseulivroTeoria geral do tributo e da exoneração tributária,119seriamexoneraçõestributáriasasimunidades,asisenções,asreduçõesdebasedecálculooualíquota,oscréditospresumidos,asrestituiçõesdetributos,asfacilidadesnocumprimentodedeveresformaisealgumascompensações.Taisinstitutostributários estariam diretamente relacionados à extrafiscalidade pelo fato de buscarem atingir situaçõesecomportamentosparaprivilegiarvaloreseconômicos,sociaise/oupolíticos,al-gunsconstitucionalmenteprotegidos.120

Nestepontodo trabalho, cumpre-nos fazerumcortemetodológico.Trataremos so-mentededuasformasdedesoneraçõestributárias,asaber:aimunidadetributáriaeaisenção

��8 PaulodeBarrosCarvalho.Curso...,cit.,p.��8-��9.��9 BeloHorizonte:DelRey,�000.��0 ÂngelaMariadaMottaPacheconosensinaque“[...]Asimunidades,desentidolargoeabrangentesão,porém,

apenasumadasformasdedesoneração.Noníveldalegislaçãoordinária,asleisintrodutorasdaisenção,re-duçãodabasedecálculoealíquotasrealizamigualmenteoutrasformasdedesoneraçãoprestigiandoodesen-volvimentoeconômico,regionaloulocal.Estimulamalocalizaçãodeindústrias,acriaçãodeloteamentos,noafãdacriaçãodenovasriquezas,aumentodeempregoseconsolidaçãodecentroshabitacionaisorganizadosàpopulaçãodebaixarenda.[...]”(ÂngelaMariadaMottaPacheco.Extrafiscalidadeeoimpostodeexportação.In:LuísEduardoSchoueri(Coord.).Direito tributário.HomenagemaAlcidesJorgeCosta.SãoPaulo:Quar-tierLatin,�003.v.�,p.5�5.

Page 58: Fernanda Ramos Pazello

50

tributária.Talcorte faz-senecessárioemrazãodoescopodopresente trabalho,qualsejaasdesoneraçõestributáriasrelativasàsoperaçõesdeexportaçãonoqueconcerneàimunidadedascontribuiçõessociaiseàisençãodoISS.

Assim,nospróximositens,analisaremososinstitutostributáriosdaimunidadeedaisenção, com o fim de definir seu conceito, suas diferenças e a forma de interpretação das nor-masimunizanteseisentivas.

3.1 Imunidade tributária

Conformejádesenvolvidoacima,oordenamentojurídicoéumsistemaformadopornormasjurídicas,organizadassegundoumacoerênciainternadesentido.Taisnormaspodemserdeestrutura,ouseja,relativasàorganização,competênciaemétododeproduçãodeoutrasnormas;oudeconduta,ouseja,relativasàprescriçãodecomportamentos.

A competência tributária está definida em normas de estrutura e consiste na imposição deparceladopoderdelegislaraosentespolíticosparaqueproduzamleisdescritivasderegras-matrizesde incidência tributária.Emrazãodoprincípiofederativo,acompetência tributáriadeveserrepartidaentreosentespolíticos.

AscompetênciastributáriasestãodistribuídasdeformarígidaeexaustivanaCons-tituiçãoFederal,segundoamaterialidadedasregras-matrizesdeincidênciatributária.Paraacompreensãodestamaterialidade,olegisladordevesevoltarparaoprópriosistema,buscandoosconceitosconstitucionaisnasnormaseprincípiosconstitucionais.Taisnormaseprincípiossãolimitesparaopoderdetributar.

AimunidadetributáriaéuminstitutodeDireitoTributárioquecolaboranodesenhodascompetênciasimpositivasdosentestributários.Trata-sederegraconstitucionalmentepre-vista,quedeverádelinearoslimitesemqueolegisladorpoderáatuarparafazerincidirumaregra-matrizdeincidênciatributária.

Carrazza nos ensina que a imunidade tributária opera no plano da definição da competência tributária,reduzindoasdimensõesdocampotributáriodaspessoaspolíticas,tendoanormaimuni-zanteoduplopapel de fixar a competência tributária e conferir ao seu destinatário um direito público subjetivo.121CorroboramoscomosensinamentosdeClélioChiesanosentidodeque

��� RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.677-68�.

Page 59: Fernanda Ramos Pazello

5�

[...]asnormasdecompetênciaeasnormasdeimunidadenascemjuntas,poisdecorrem de uma criação instantânea do Poder Constituinte Brasileiro, ouposteriormentepeloPoderReformador,comoformadedelinearocampodeincidênciatributáriadosentespolíticos[...].122

DeacordocomPaulodeBarrosCarvalho,123 a imunidade tributária é uma classe finita eimediatamentedetermináveldenormasjurídicascontidasnotextodaConstituiçãoFederalequeestabelecedemodoexpressoaincompetênciadaspessoaspolíticasdedireitoconstitucio-nalmente interno para expedir regras instituidoras de tributos que alcancem situações específi-cas e suficientemente caracterizadas.

Regina Helena Costa, em sua aclamada obra Imunidades tributárias, após análiseexaustivadosconceitosdeimunidadetributáriaatribuídospordoutrinadoresdecalibre,con-cluiuqueaimunidadetributáriapodeservistasobdoisaspectos:(i)oformal,ouseja,aimuni-dadeéaimpossibilidadedetributação–ouintributabilidade–depessoas,bensesituações,re-sultantedavontadeconstitucional;e(ii)omaterialousubstancial,ouseja,aimunidadeconsisteno direito público subjetivo, de certas pessoas, de não se sujeitarem à tributação, nos termos delimitadosporestanormaexonerativa.124

Como a imunidade tributária é um direito público subjetivo, conferido a determinada pessoaparaquenãosejatributadaemrazãodedadasituação,trata-sedeumdireitoindividual,protegidoporcláusulapétrea,nostermosdoartigo60,§4.º,daCF/88.Assim,emrazãodarigidezconstitucionaldonossoordenamentojurídico,asimunidadestributáriasnãopodemsersuprimidasourestringidasporemendaconstitucionalnemporqualqueroutroveículointrodu-tor,aomenosquesejapromulgadaumanovaconstituição.

A imunidade tributária pode ser classificada em objetiva ou subjetiva. A imunidade objetivaprotegeosobjetosaseremtributados,comoaimunidadedoslivros,jornais,periódicosedopapeldestinadoàsuaimpressão;poroutrolado,aimunidadesubjetivaserefereaoscasosemqueolegisladorconstituintepretendeuprotegerosujeitopassivo,comonocasodaimuniza-çãodasentidadesassistenciaisedeeducação.Noentanto,comoobservaCarrazza,aimunidadeé sempre subjetiva, visto que invariavelmente beneficia pessoas, quer por sua natureza jurídica (imunidadesubjetiva),querpelarelaçãoqueguardamcomdeterminadosfatos,bensousitua-ções(imunidadeobjetiva).125

��� A competência tributária do Estado brasileiro. Desonerações nacionais e imunidades condicionadas. SãoPaulo:MaxLimonad,�00�.p.�05-���.

��3 Curso...,cit.,p.�8�-�87.��� ReginaHelenaCosta.Imunidades tributárias:teoriaeanálisedajurisprudênciadoSTF.�.ed.rev.eatual.São

Paulo: Malheiros,�006.p.5�.��5 RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.677.

Page 60: Fernanda Ramos Pazello

5�

Damesmaformaqueosprincípios,asimunidadestributáriasrepresentamlimitaçõesconstitucionaisaopoderdetributar,poiscompõemoâmbitodeexercíciodacompetênciatribu-táriaatribuídaconstitucionalmenteacadapessoapolítica.Noentanto,emboraasimunidadeseosprincípiosaproximem-se,nãoseconfundem.

Demonstramosnoitemdedicadoaosprincípiosqueestessãonormasjurídicascomforte conteúdo axiológico e alto grau de abstração e generalidade, cumprindo o papel de orien-tarainterpretaçãoeaaplicaçãodeoutrasnormas.ReginaHelenaCosta126bemdestacouadis-tinçãoentreprincípioseimunidades,asaber:(i)osprincípiosorientamoválidoexercíciodacompetênciatributária,enquantoasimunidadesdemarcamaamplitudedasnormasdecompe-tênciatributária,inibindooseuexercício;e(ii)osprincípiossãomarcadospelageneralidadeeabstração, ao passo que as imunidades são aplicáveis a situações específicas.127

Assim, enquanto a imunidade tributária ajuda a desenhar a competência tributária,osprincípiosdevemserobservadosnomomentodoexercíciode talcompetência tributária.Emborageremosmesmosefeitos–limitamopoderdetributar–,estabelecemcoisasdistintas.Nãoobstanteadistinçãoentreambos,AliomarBaleeironosmostraqueasimunidadestributá-riasdevemseranalisadasàluzdosprincípios,umavezqueencerramvaloresque,namaioriadasvezes,estãodeformaimplícitaouexplícitanosprincípios.Umnãoconvivesemooutro.Paraentenderumaimunidadetributária,deve-se,antesdisso,compreenderosprincípiosquenorteiam o sistema jurídico. Confira-se:

[...]Assim, ambos, princípios e imunidades, não se aproximam apenas emrazãodos efeitos queprovocam: limitações aopoder de tributar.Masumaimunidaderepresentaaindaumaconseqüênciaexpressaouimplícita(sene-cessária) de um princípio. A imunidade recíproca das pessoas públicas estatais derivadaautonomiaquelheséinerentequandoseadotaoprincípiofedera-tivo;aimunidadedasinstituiçõesdeeducaçãoeassistênciasocialderivadaausênciadacapacidadeeconômica.[...]128

Queremosdemonstrarqueasimunidadestributárias,aoimpediroexercíciodacom-petênciatributáriasobredeterminadosfatos,pessoasoubens,sãoreveladorasdevaloresprivi-legiadospelaConstituiçãoFederal.JoséSoutoMaiorBorgesnosensinaque,

[...] analisada sob o prisma do fim, objetivo ou escopo, a imunidade visa a as-segurarcertosprincípios fundamentaisao regime,a incolumidadedevalores

��6 ReginaHelenaCosta.Imunidades tributárias...,cit.,p.3�-35.��7 HumbertoÁvilaconstataqueasregrasdeimunidadelimitamarepartiçãodecompetênciaeaslimitaçõesem

sentidoestrito,comoosprincípios,limitamoexercíciolegítimodascompetênciastributárias(Sistema...cit.,p.8�).

��8 AliomarBaleeiro.Limitações...,cit.,p.�33.

Page 61: Fernanda Ramos Pazello

53

éticoseculturaisconsagradospeloordenamentoconstitucionalpositivoequesepretendemanterlivresdasinterferênciasouperturbaçõesdatributação[...].129

AConstituiçãoFederalprevêasseguintesimunidadestributáriasparaimpostos:

(i) artigo150

– imunidaderecíprocadaspessoaspolíticas;

– sobretemplosdequalquerculto;

– sobrepatrimônio,rendaouserviçosdospartidospolíticos,inclusivefunda-ções,dasentidadessindicaisdostrabalhadores,dasinstituiçõesdeeducaçãoede assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos de lei; e

– sobrelivros,jornais,periódicosepapeldestinadoasuaimpressão;

(ii) artigo153,§3.º,incisoIII–oIPInãoincidirásobreprodutosindustrializadosdestinadosaoexterior;

(iii) artigo153,§4.º, incisoII–oITRnãoincidirásobrepequenasglebasrurais,definidas em lei, quando as explore, só ou com sua família, o proprietário que nãopossuaoutroimóvel;

(iv) artigo 153, § 5.º – o ouro somente pode ser tributado pelo IOF se for definido como ativo financeiro ou instrumento cambial. Está imune aos demais impos-tos;

(v) artigo155,§2.º,incisoX,alíneaa–oICMSnãoincidesobreasoperaçõesquedestinemaoexteriormercadorias,nemsobreserviçosprestadosadestinatáriosnoexterior;

(vi) artigo155,§2.º,incisoX,alíneab–oICMSnãoincidesobreoperaçõesquedestinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líqui-dosegasososedelederivados,eenergiaelétrica;

(vii) artigo153,§3.º–asoperaçõesrelativasàenergiaelétrica,serviçosdeteleco-municação,derivadosdepetróleo,combustíveisemineraisdoPaísestãoimu-nesaoutrosimpostos,comexceçãodoICMS,IIeIE;

(viii) artigo156,incisoII,§2.º,incisoI–nãoincideoITBIsobreatransmissãodebensoudireitosincorporadosaopatrimôniodepessoajurídicaemrealizaçãodecapital,ounatransmissãodebensoudireitosdecorrentesdefusão,incorporação,cisãoouextinçãodapessoajurídica,saldoseestaforaatividadepreponderantedoadquirente;e

��9 JoséSoutoMaiorBorges.Isenções tributárias.�.ed.SãoPaulo:SugestõesLiterárias,�980.p.�8�-�85.

Page 62: Fernanda Ramos Pazello

5�

(ix) por fim, artigo 184, § 5.º – as operações de transferência de imóveis desapro-priados para fins de reforma agrária são imunes aos impostos federais, estaduais emunicipais.

Emrelaçãoàstaxas,asimunidadestributáriasalcançam(i)odireitodepetiçãoaosPo-deres Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; (ii) a obtenção de certidões em repartições públicas; (iii) gratuidade do casamento civil; (iv) serviço de transporte coletivoparaosmaioresde65anos;(v)aosreconhecidamentepobres,direitoaoregistrocivildecasamentoecertidãodeóbito;(vi)custasjudiciaisnocasodeaçãopopular;e(vii)habeas corpus ehabeas data.

Ademais, quanto às contribuições, ressalte-se: (i) a imunidade das entidades benefi-centesdeassistênciasocialnoquetangeàscontribuiçõesparaaSeguridadeSocial(artigo195,§7.º);(ii)aimunidadedacontribuiçãoprevidenciáriasobreaposentadoriaepensãoconcedidaspeloregimegeraldePrevidênciaSocial(artigo195,incisoII);(iii)aimunidadedascontribui-çõesparaaSeguridadeSocialparaoscarenteseinválidos(artigo203);e(iv) a imunidade das receitas decorrentes de exportação no que tange às contribuições sociais e de intervenção do domínio econômico.

HumbertoÁvilaelucidacommaestriaa idéiadequeas imunidadestributáriaspre-vistas no ordenamento jurídico visam proteger valores constitucionalmente reconhecidos.130Confira-se:

[...]Acompetênciatributária,noentanto,éresultadodaanáliseconjuntadeduasespéciesdenormasjurídicas:deumlado,dasnormasqueatribuempoderao Estado para instituir tributos por meio da especificação dos fatos e situações que torna suscetíveisde tributação (normasdecompetência);deoutro,dasnormasquesubtraempoderdoEstadosobredeterminadosfatosesituaçõesquetornainsuscetíveisdetributação(normaslimitativasdacompetência).AparceladopoderdoEstadoparainstituirtributoséresultadodopoderquelheatribuimenosopoderquelheésubtraído,nostermosdaConstituição.Asatividadeseobjetosqueestãoforadopoderdetributarsãodecorrênciadosfins a serem promovidos pelo Estado.OsfatosesituaçõesexcluídosdopoderdetributardoEstadocorrespondemafatosesituaçõescujasomaformaatividadesaseremestimuladaspeloEstado.OdeverdeoEstadogarantiraestruturafederativaimplicaexcluirdecadaentefederadoopoderdetributaropatrimônio,rendaouserviçodosoutros(art.150,VI,“a”).OdeverdeoEstadoestimularegarantiraliberdadereligiosaedecultoimplicaexcluirdatributaçãoostemposdequalquerculto(art.150,

�30 SegundoBernardoRibeirodeMoraes,aimunidadeconstituiummeiopolíticoutilizadopeloconstituintequepossuioescopodepreservarcertosvaloreséticoseculturaisqueaordemjurídicaprocuraprotegerpormeiodelimitaçõesaoPoderFiscal(BernardoRibeirodeMoraes.Aimunidadetributáriaeseusnovosaspectos.In:IvesGandradaSilvaMartins(Coord.).Imunidades tributárias.SãoPaulo:RT,�998.p.��9).

Page 63: Fernanda Ramos Pazello

55

VI,“b”).OdeverdoEstadoemgarantiroprocessodemocrático,emerradicarapobrezaepromoverodesenvolvimentosocialimplicaexcluirdatributaçãoopatrimônio,rendaouserviçosdospartidospolíticos,dasentidadessindicaisdos trabalhadores, das instituições de assistência social sem fins lucrativos (art.150,VI,“c”).OdeverdeoEstadoestimularadifusãodeidéiasimplicaaproibiçãodetributaroslivros,jornais,periódicoseopapeldestinadoàsuaimpressão(art.150,VI,“d”).

Isso equivale adizerque acausa justificativa da imunidade é facilitar, por meio da exclusão dos encargos tributários, a consecução de finalidades que devemseratingidaspelopróprioEstado.

[...].131

Asimunidadestributáriassão,portanto,normasconstitucionaisdeestruturaquede-limitam a competência tributária dos entes políticos com o fim de proteger um valor constitu-cionalmenteassegurado.Nopróximoitem,trataremosdoinstitutodaisençãotributáriaesuasdiferençasnotocanteàsnormasimunizantes.Após,reservamosumitemparaanalisarmosainterpretaçãodasnormasrelativasàimunidadeeisençãotributárias.

3.2 Isenção tributária

AConstituiçãoFederal,aomesmotempoemquediscriminouascompetênciastribu-tárias,conferiuafaculdadedeaspessoaspolíticasexercitaremestascompetências,inclusiveisentandodeterminados fatos,bens, situaçõesoupessoas.132Trata-sedo institutoda isençãotributária,previstanoartigo175,incisoI,doCTN,133comoumadashipótesesdeexclusãodocréditotributário.

SeguindoasliçõesdePaulodeBarrosCarvalho,asisençõestributáriassãonormasdeestrutura, do plano da legislação ordinária, que trazem modificações no âmbito da regra-matriz deincidênciatributária(normadeconduta),ouseja,subtraemparceladocampodeabrangênciadocritériodoantecedenteoudoconseqüentedaregra-matrizdeincidênciatributária.Anormaisentivainvestecontraumoumaisdoscritériosdaregra-matrizdeincidênciatributária(mate-rial,espacial,temporal,quantitativooupessoal),mutilando-osparcialmente.Amutilaçãonão

�3� HumbertoÁvila.Sistema...,cit.,p.�09.�3� RoqueAntonioCarrazzaenfatizaaidéiadequeacompetênciaconstitucionalparatributarsupõeaopçãoentre

criartributos,ounão,eimplica,porigual,afaculdadedeisentardaincidênciatributáriadeterminadaspesso-as,coisasousituações(Curso...,cit.,p.80�).

�33 “[...]Art.�75.Excluemocréditotributário:

I–aisenção;

II–aanistia.

Parágrafoúnico.Aexclusãodocréditotributárionãodispensaocumprimentodasobrigaçõesacessóriasde-pendentesdaobrigaçãoprincipalcujocréditosejaexcluído,oudelaconseqüente.[...].”

Page 64: Fernanda Ramos Pazello

56

pode ser total. Além disso, a subtração do campo de abrangência não significa mera redução da basedecálculooualíquota.

Ofenômenoéoseguinte:encontrodeduasnormasjurídicas,sendoumaaregra-matrizdeincidênciatributáriaeaoutraaregradeisenção,comseucarátersupressordaáreadeabran-gênciadequalquerdoscritériosdaregra.134Éimportantedestacarqueháumnovopensamentojurídico,desenvolvidoporEliudJoséPintodaCosta,queentendequealeiisentivanãoformaumanormajurídicaposterior,impedindoqueanormajurídicatributáriaproduzatodososseusefeitos.Naverdade,anormaisentivaintegraanormajurídicatributária,conferindo-lhenovascaracterísticas.Assim,aisençãonãomutila,masemprestanovasfeiçõesaumdoscritériosdaregra-matrizdeincidênciatributária.135

Tantoaimunidadequantoaisençãosãohipótesesdenão-incidênciatributária.Nessesentido, Paulo de Barros Carvalho afirma que

[...]Háconsensoentreosespecialistasnoconsignarasdiferençasentreimu-nidade,isençãoenão-incidência,convindodizerque,ultimamente,vempros-perandoaliçãomedianteaqualastrêscategoriasmereceriamconsiderar-secasosdenão-incidência,agregando-seacadauma,pelaordem,asseguintesexpressões:estabelecidanaConstituição(imunidade);previstaemlei(isen-ção);epuraesimples(não-incidênciaemsentidoestreito)[...].136

Aindasegundoesteautor,nãohásimilitudeentreosinstitutosdaimunidadeedaisen-ção,excetoofatodeseremnormasjurídicasválidasnosistema,integraremaclassedasnormasdeestruturaetrataremdematériatributária.137Enquantoaimunidadeéumanormaconstitucio-nalqueexerceafunçãodecolaborarnodesenhodascompetênciastributárias,aisençãoestánoplanodalegislaçãoordináriaeoperacomoumredutordocampodeabrangênciadeumdoscritériosda regra-matrizde incidência tributária.138Ouseja,enquantoa imunidadeoperanoplano da definição de competência, a isenção o faz no plano do exercício da competência.

Asisençõestributáriaspodemserconcedidasporleiordinária;porleicomplementar;por tratado internacional, devidamente aprovado, ratificado e promulgado; e por decreto legis-

�3� PaulodeBarrosCarvalho.Curso…,cit.,p.�90-�9�.�35 Idem,ibidem,p.8�7-8�8.�36 Idem,p.�7�.�37 ReginaHelenaCostadestacaqueaimunidadeeaisençãotêmpontosemcomum:�)ambassãoregrasde

estrutura,queestabelecemaincompetênciaparatributar;�)sãoregrasparciais,deexceção,quesófazemsen-tidoemcombinaçãocomanormaatributivadecompetênciatributária(nocasodaimunidade)edahipótesedeincidênciatributária(nocasodaisenção);3)podemterporobjetoqualquermodalidadetributária;e�)sãojustificadaspelaperseguiçãodefinsconstitucionais(Imunidades tributárias...,cit.,p.�05).

�38 PaulodeBarrosCarvalho.Curso…,cit.,p.�88.

Page 65: Fernanda Ramos Pazello

57

lativo estadual ou do Distrito Federal, em matéria de ICMS. Exemplificativamente, são casos deisençãotributária:

(i) anormaqueisentadoimpostoderendadapessoafísicaarendamenordoqueR$1.058,00(ummilecinqüentaeoitoreais)(artigo3.ºdaLei9.250/95):

(ii) anormaqueisentaasredesdedormir,oscaixõesfunerárioseoqueijotipoMinasdoIPI;

(iii)anormaquenãoconsideraoperaçãodeindustrializaçãoafabricaçãodeóculos,mediantereceita(IPI);e

(iv)anormaqueisentaosserviçosdeexportaçãodaincidênciadoISS.

Ofundamentodaisençãotributáriaéaausênciadecapacidadeeconômicadobene-ficiário ou os objetivos de utilidade geral ou de oportunidade política que o Estado pretende quesejamalcançados.139 Assim, a isenção tributária justifica-se em razão da falta de capaci-dadeeconômicaaliadaa

[...] motivos de interesse geral sugeridos por determinados fins econômicos e sociais, que justificam, no interesse do País, que algumas classes de con-tribuintesnãopaguemtributos,ouospaguememmenorquantiaqueoutras,com o fito de promover uma nova atividade, ou, ainda, que não se gravem determinadasclassesdecontribuintesquecarecemdeaumentarseuníveldevida,suaculturaousuaspotencialidadeseconômicas[...].140

SachaCalmonNavarroCoêlhoentendequeasimunidadessãovoltadasparavalores“caros”,quesedestinamadurarmais,enquantoasisençõesabrigaminteressesmaiscomuns,que por sua natureza se modificam com maior freqüência.141Nessesentido,ReginaHelenaCos-ta classifica as isenções em técnicas ou políticas. As isenções técnicas são legitimamente reco-nhecidasanteaausênciadecapacidadecontributiva(exemplo,apreservaçãodomínimovital)easisençõespolíticasconstituemverdadeirasexceçõesaoprincípiodacapacidadecontributiva,pois beneficiam, em regras, pessoas que detêm capacidade para contribuir.142

Valemo-nosdaconclusãodeMariaPaulaFarinaWeidlichnosentidodeque

[...]aimunidadeeaisençãotributáriasãoinstitutosquenãoseconfundem.Aprimeira,previstananormaconstitucional,comoregradeestrutura,deli-

�39 RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.806.��0 BenedettoGriziottiapudRoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.806.��� SachaCalmonNavarroCoêlho. OcontroledaconstitucionalidadedasleisedopoderdetributarnaConstitui-

çãode�988.3.ed.rev.,atual.eampl.BeloHorizonte:DelRey,�999.p.36�.��� ReginaHelenaCosta.Imunidades tributárias…,cit.,p.�06.

Page 66: Fernanda Ramos Pazello

58

mitando o campo das competências tributárias, resguarda valores sociais eéticos;asegunda,dispostanaleicomplementarouleiordinária,viabilizain-teressescomunsconsistentesemregrasdeconduta,situando-se,portanto,empatamaresbemdistintos,inclusive,hierarquicamentelocalizadosemgrausdi-versos,oprimeiroconsideradosuperioraosegundo,principalmenteemrazãodaimportânciadepreservaralgumaspessoas,bensousituaçõesdoônusdatributação, a fim de propiciar a cooperação dos entes privados com as ativida-desestatais,essenciaisparaodesenvolvimentodasociedade[...].143

Apósessasdigressões,concluímosqueaimunidadetributáriaeaisençãotributáriasãoinstitutosdoDireitoTributárioqueseassemelhamnamedidaemquepretendemdesoneraratributação,masquenãoconfundem,vistoque(i)asimunidadessãoprevistasemnormascons-titucionaisevisamprotegervaloresfundamentaisdasociedade;e(ii)asisençõessãoprevistasemleievisamviabilizarinteressesdasociedade.Aimunidadeatingeanormadecompetênciatributáriaeaisenção,anormaqueprevêaregra-matrizdeincidênciatributária.

3.3 Interpretação das normas imunizantes e isentivas

Ainterpretaçãotemporescopodarosentidoeoalcancedasnormasjurídicas.Oqueseprocurapor intermédioda interpretaçãoéevidenciaromens legis,ouseja,avontadedoEstadoimplícitananormajurídica.Atémesmoasnormasconstitucionais,queencontramsuavalidadeemsimesmas,devemserinterpretadas.Paraqueseobtenhaêxitonoprocessodein-terpretação,ointérpretedevebuscarosprincípiosjurídico-constitucionais,quesãovetoresdetodoosistemajurídico.

As normas constitucionais possuem algumas características específicas que influen-ciamnasuainterpretação.Sãonormassuperioresemrelaçãoàsdemais(supremaciadaCons-tituição);sualinguagemapresentamaiorgeneralidadeeabstração,poisemsuamaiorpartesãonormasdeestrutura;epossuemumcaráterpolítico,poistêmporobjetoajurisdicizaçãodopoderpolítico.

Emrazãodetaispeculiaridades,asnormasconstitucionaisnãopodemserinterpretadasconsiderandosomenteainterpretaçãochamada“literal”ou“gramatical”.Deveconsiderartodooordenamentojurídicoe,principalmente,osprincípiosqueonorteiam,paraqueseencontremorealsentidoealcancedanormajurídica.ReginaHelenadaCosta,seguindoasliçõesdeCanotilho,nosensinaqueainterpretaçãoliteraléapenasaetapainicialdoprocessointerpretativodasnormasconstitucionais.Ointérpreteeoaplicadordaleidevemsevalerdainterpretaçãosistemáticae

��3 MariaPaulaFarinaWeidlich.Imunidade tributária das instituições sem fins lucrativos.SãoPaulo:MPEdito-ra,�005.p.3�.

Page 67: Fernanda Ramos Pazello

59

tambémdainterpretaçãoteleológica,poissãoosmétodosinterpretativosmaisimportantes.Con-firam-se as explicações da ilustre professora sobre estes dois métodos interpretativos:

[...] A interpretação sistemática deflui da aplicação do princípio da unidade do ordenamento jurídico, sendo sua especificação o princípio da unidade da Constituição,segundooqualaConstituiçãoéumtodoharmônico.Medianteainterpretaçãosistemáticaobserva-seaConstituiçãocomoumcor-ponormativo,demodoquenãosepodecompreenderumadesuasnormasisoladamentedocontextoemqueseinsere.A interpretação teleológica, por seu turno, diz com o espírito e a finalidade da norma.CarlosMaximiliano,umdosmaioresestudiososdeHermenêuticadonosso Direito, afirma ser o método teleológico aquele que merece preponde-râncianainterpretaçãodaConstituição.Comefeito,ainterpretaçãodanormajurídica,comosabido,deveconsiderar,antes de qualquer aspecto, sua finalidade, seus objetivos. Trata-se do método interpretativo mais consentâneo com a eficácia social da norma, vale dizer, comaproduçãodeefeitosinconcreto,porocasiãodasuaaplicação.144

Conformevistonodecorrerdestetrabalho,anormadeimunidadeéumanormacons-titucional de finalidade, ou seja, busca atender um objetivo, para que seja dada efetividade aos princípios e valores da Constituição Federal. Carlos Maximiliano, em sua consagrada obraHermenêutica e aplicação do direito, nos orienta a interpretar as normas de finalidade pelo mé-todoteleológico,ouseja,considerandoosobjetivosparaasquaisestasnormasforamcriadas.Confira-se:

[...]Considera-seoDireitocomoumatendênciaprimariamentenormativaoufinalística;por issomesmoa sua interpretaçãoháde ser,naessência, tele-ológica.O hermeneuta sempre terá em vista o fim da lei, o resultado que a mesma precisa atingir em sua atuação prática. A norma enfeixa um conjunto de providências, protetoras, julgadas necessárias para satisfazer a certas exi-gências econômicas e sociais; será interpretada de modo que melhor corres-ponda àquela finalidade e assegure plenamente a tutela de interesse para a qual foi regida.[...]Não se deve ficar aquém, nem passar além do escopo referido; o espírito da norma há de ser entendido de modo que o preceito atinja completamente o objetivo para o qual a mesma foi feita, porémdentrodaletradosdispositivos.Respeita-se esta, e concilia-se com o fim. Isolado,oelementoverbal talvezimobilizasseoDireitoPositivo,por lhe tirar todooelastério.Enquadra,defato, o último em forma abstrata, que encerra o escopo social; porém este, comoelementomóvel,conduziráojuristaàsaplicaçõesdiversasesucessivasdequeafórmulaésuscetível.Destemodoaleiadquireomáximodededuti-bilidade[...](grifosnossos).145

��� ReginaHelenaCosta.Imunidades tributárias…,cit.,p.��3.��5 CarlosMaximiliano.Hermenêutica e aplicação do direito.�6.ed.RiodeJaneiro:Forense.�997.p.

�5�-�55.

Page 68: Fernanda Ramos Pazello

60

A imunidade tributária tem como objetivo atender certos fins de relevante interesse público, privilegiando certos valores, protegendo-os e dando-lhes eficácia.146Taisobjetivossãofacilmente verificáveis e devem ser considerados pelo intérprete e pelo aplicador do Direito paraquerealmentesejamatingidosemsuaplenitude,semrestriçõesoualargamento.

DeacordocomJoséArturLimaGonçalves,147 para que possamos definir a abrangên-cia de uma imunidade tributária, devemos buscar o conteúdo, sentido e alcance do valor que o constituinte pretendeu proteger. Cabe ao legislador dos entes políticos compreender e definir o alcancedasnormasdeimunidade,paraqueosparticularespossampreveraaçãodoEstado.Noentanto, havendo conflito entre normas e princípios para a compreensão da imunidade, devem-seprivilegiarosprincípios,quepossuemcargaaxiológicamarcante.

OintérpreteouaplicadordoDireitodevemseorientarpelosvaloreseprincípiosin-sertosnaConstituiçãoFederalpara interpretar asnormas imunizantes.Sendoassim,devembuscarumainterpretaçãoampla,semdescurardoefeitoeconômico,paraquearazãodeserdaimunidadeseefetive.RoqueCarrazzajánosdiziaqueaimunidadeéamplaeindivisível,nãoadmitindo,nemporpartedolegisladornemdoaplicadordodireito,restrições.148

O SupremoTribunal Federal (“STF”), no julgamento do RE 102.141-1, acolheu oentendimentodoutrináriodequeainterpretaçãodosdispositivosconstitucionaisimunizantesdeveserampla.Confira-se:

[...]ImunidadeTributária.Livro.Constituição,art.19,III,alínea“d”.Emsetratandodenormaconstitucionalrelativaàsimunidadestributáriasge-néricas,admite-se a interpretação ampla, de modo a transparecerem os prin-cípios e postulados nela consagrados.Olivro,comoobjetodaimunidadetributária,nãoéapenasoprodutoacabado,masoconjuntodeserviçosqueorealiza,desdearedação,atéarevisãodeobra,semrestriçãodosvaloresqueoformamequeaConstituiçãoprotege[...]149(grifosnossos).

��6 JoséManoeldaSilva,emseuartigoImunidadesconstitucionais–escopoe incompreensão,filia-seaesseentendimento,aoafirmarque“[...]aimunidade,parasurtirefeito,hádeconsubstanciar-seemtextoconsti-tucional.Eécertoquetodaordenaçãosepõenamedidaemquebuscaumfim.DaíohaverassinaladoLopesdaCostaqueparadisporéindispensávelumfim.Nãoseconcebeordemsemfinalidade.Seassimoé,porcorretoqueainserçãodoinstitutodaimunidadenoteorconstitucionaltemumobjetivooufim.Nãoseadmiteoacolhimentododiscursolegalconstitucionaldeumcomandosemqueneleinsitamenteseencontreumafinalidade.RubensGomesdeSousa,fazendonotávelestudosobreaimunidadeprevalecenteparaopapel,en-fatizouaoiníciodeseuparecequetodaimunidadetemumsentidofinalístico[...]”(In:RuyBarbosaNogueira(Coord.).Direito tributário atual.SãoPaulo:ResenhaTributária,�995.v.��,p.�6�).

��7 JoséArturLimaGonçalves.Aimunidadetributáriadolivro.In:HugodeBritoMachado(Coord.).Imunidade tributária do livro eletrônico.SãoPaulo:IOBInformaçõesObjetivas,�998.

��8 RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.680.��9 RE�0�.���-�.

Page 69: Fernanda Ramos Pazello

6�

Valeconferir,também,trechodovotodoMinistroCarlosMadeiranojulgadoacima,queexplicitaoentendimentodoPretórioExcelsonosentidodeadotarumainterpretaçãoampladasnormasconstitucionaisdeimunidadetributária,inclusivemedianteautilizaçãodométodosistemáticoeteleológico:

[...]Daí por que a interpretação das normas constitucionais de imunidade tributária é ampla, “no sentido de que todos os métodos, inclusive sistemáti-co, o teleológico, etc., são admitidos”, como anota Amílcar de Araújo Falcão (RDA66/372).Ainterpretaçãosistemáticadanormaconstitucionallevaàconclusãodequeoquecaracterizaasimunidadesé“acircunstânciadequecomelasolegis-lador constituinte procura resguardar, assegurar ou manter incólume certosprincípios, idéias-forçaoupostuladosqueconsagracomopreceitosbásicosdoregimepolítico,aincolumidadedevaloreséticoseculturaisqueoorde-namentopositivoconsagraepretendemanterlivresdeeventuaisinterferên-ciasouperturbações,inclusivepelaviaoblíquaouindiretadetributação”.Asimunidades,dizaindaoautoracimacitado–comoasdemaislimitaçõesaopoderdetributar,consoanteoensinamentodeAliomarBaleeiro,têmassimacaracterísticadedeixar“transparecersuaíndolenitidamentepolítica”,o que impõe ao intérprete a necessidade de fazer os imprescindíveis confrontos e as necessárias conotações de ordem teleológica, toda vez que concretamente tiver de dedicar-se à exegese dos dispositivos constitucionais instituidores de tais princípios[...](grifosnossos).

No mesmo sentido, confira-se parte do voto proferido pelo Ministro Relator Célio Borja,noRE109.484-2, in verbis:

[...] Esta Corte já firmou que é ampla a imunidade do artigo 19, III, d,daCons-tituiçãoFederal.[...]Àteleologiadanormadoartigo19,III,d,CF–tãobemapreendida,nosseusefeitoseconômicos,peloexcertoacimatranscrito–aduzieu,emvotosufra-gâneodoeminenteRelatordoRE101.441-5-RS,MinistroSidneySanches,argumentoexegéticodecarátersistemático-jurídicoquemepareceoportunorelembrar.Tenhoque,segundoaConstituição,aimunidadetributáriadolivro,dojornaledoperiódico,bemcomoadopapeldestinadoàsuaimpressão,éancilardaliberdadedeclaradanoseuartigo153,§8.º,decujoconceitosãonotasessen-ciaisatransmissãoeadifusãodoconhecimentoedainformação.Aproteçãoconstitucional,emdebatenãosepoderestringir,portanto,àfasedeproduçãodo livro, jornal edoperiódicoapenas,mashádeestender-se,necessariamente,aquelasoutrasatividadeindispensáveisàcirculaçãodoco-nhecimentoedainformaçãocontidasemtaisobjetos.150

SobreajurisprudênciadoSTF,HumbertoÁvilaconcluique

�50 Nomesmosentido,RE��6.�9�.

Page 70: Fernanda Ramos Pazello

6�

[...]ajurisprudênciadoSupremoTribunalFederaltemnormalmenteaplicadoàsnormasrelativasàimunidade,demodoteleológico,nosentidodeexaminaros fins subjacentes às normas constitucionais, de sorte a abranger na imunida-de os fatos necessários à garantia dos fins públicos referentes às imunidades. A imunidade qualifica-se como meio para garantir a promoção de determinados fins públicos. Ela não pode ser excluída, caso contrário a função pública das instituiçõesseriarestringida[...].151

Assim,entendemosquea interpretaçãoaserdadaàsnormas imunizantes,comoas

imunidadesqueatingemasoperaçõesdeexportação,deveráserampla,levandoemconsidera-

çãoseusobjetivoseosprincípiosevaloresqueanormapretendealbergar(interpretaçãoteleo-

lógica),bemcomoosdemaisdispositivosdoordenamentojurídico(interpretaçãosistemática).

Noentanto,ainterpretaçãodeverásernaexatamedida,ouseja,nãopodepretendertorná-la

maiorqueoprópriopoderqueestásendolimitadoemuitomenospreverumsentidotãoestrito

queinibaaproteçãodovalor.

É de curial importância analisar o artigo deYonne Dolacio de Oliveira, intitulado

Imunidades tributáriasnaConstituiçãode1988,152noqueconcerneàaplicaçãodoprincípio

da capacidade contributiva nas normas de imunidade tributária.Ao distinguir a capacidade

contributiva da capacidade econômica, afirmando que a capacidade contributiva pressupõe a

econômica,masquearecíprocanãoéverdadeira,YonneDolaciodeOliveiraasseveraque

[...]as imunidadescaracterizamcasosdeencorajamentodecomportamentoou de extrafiscalidade favorecedora em decorrência de princípios e valores reconhecidoseconsagradosnaLeiSuprema,razãoporqueédesconsideradaacapacidadecontributiva.[...].153

CitandoAmílcarFalcão,RuyBarbosaNogueira,KlausTipkeeFrancescoMoschetti,

adoutrinadorasustentaque(i)asnormascomobjetivossociaistêmodomíniodeoutrosprin-

cípios (de política social, econômica, cultural ou de saúde) que não o da capacidade de contri-

buição;(ii)paraainterpretaçãoeaplicaçãodasnormasimunizantes,acapacidadeeconômica

éirrelevanteeacapacidadecontributivaafastada;e(iii)aintençãodaimunidadedeveabarcar

aidéiademelhoraracapacidadeeconômicadoimune,paraqueestepossamelhoratenderàs

suas finalidades que são as mesmas que a do Estado.

�5� HumbertoÁvila.Sistema...,cit.,p.��0.�5� YonneDolaciodeOliveira.ImunidadestributáriasnaConstituiçãode�988.Direito tributário atual.SãoPau-

lo:ResenhaTributária,�99�.v.��-��.�53 YonneDolaciodeOliveira. Imunidades tributáriasnaConstituiçãode�988.Direito tributário atual.,São

Paulo:ResenhaTributária.Co-ediçãoInstitutoBrasileirodeDireitoTributário,�99�.v.��e��,p.3.3�6.

Page 71: Fernanda Ramos Pazello

63

Portanto,somosdaopiniãodequeasnormasdeimunidadetributáriaencerramvaloresmaiores (social, econômico, cultural, educacional, de saúde, religioso, de divulgação da livre expressãodopensamento)do que a mera verificação de capacidade contributiva do imune. Em verdade,

[...]ainterpretaçãodospreceitosimunizanteshádeseroquantopossívelfa-vorávelaocontribuinte,postoexpressaremavontadedoConstituinte–ex-plicitamentemanifestada– depreservar da tributaçãovalores departicularsignificado político, social ou econômico [...].154

Asnormasdeisenção,damesmaformaqueasnormasdeimunidadetributária,sãonormas de finalidade, já que a isenção tributária também “[...] é um forte instrumento de ex-trafiscalidade [...]”.155 PaulodeBarrosCarvalhonos lembraque as autoridades legislativas,manejandooinstrumentodaisençãotributária,dosamequilibradamenteacargatributáriaparaque certos segmentos sociais ou geográficos possam se desenvolver; fomentam as grandes ini-ciativas de interesse público; e/ou incrementam a produção, o comércio e o consumo.156

Noqueconcerneàinterpretaçãodasnormasdeisençãotributária,háregraexpressa(artigo111,incisoII,doCTN)queprescrevequeanormaqueoutorgaisençãodeveserinter-pretada literalmente.PaulodeBarrosCarvalhocritica taldispositivo legalporentenderquesomente a interpretação literal (plano sintático) não é suficiente para apreender o verdadeiro conteúdo da norma, devendo o intérprete aprofundar-se nos planos semânticos e pragmáticos.157Nãoobstanteisso,devemosnosrenderaofatodequeainterpretaçãodasnormasisentivasdevesedardeformarestritivaenãoampliativacomoocorrecomasnormasrelativasàsimunidadestributárias,umavezquevisamrealizarvaloresmenoreseque,casointerpretadaamplamente,poderáofenderosprincípiosdaisonomiaedacapacidadecontributiva.

OSuperiorTribunaldeJustiça(“STJ”)acolheutalposição,nosseguintestermos:

TRIBUTÁRIO–IMUNIDADE–IPTU–ENTIDADEEDUCACIONALES-TRANGEIRA.1.Oartigo150,VI,“c”,daCFdeveserinterpretadoemcombinaçãocomoart.14doCTN,expressamenterecepcionadonoADCT(art.34§5.º).2. A imunidade, como espécie de não incidência, por supressão constitucio-nal, segundo a doutrina, deve ser interpretada de forma ampla, diferentemen-te da isenção, cuja interpretação é restrita, por imposição do próprio CTN (art. 111).

�5� RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.685.�55 PaulodeBarrosCarvalho.Curso...,cit.,p.�97.�56 Idem,ibidem,p.�97.�57 Idem,p.�06-�08.

Page 72: Fernanda Ramos Pazello

6�

3. Ensino é forma de transmissão de conhecimentos, de informações edeesclarecimentos,entendendo-seeducacionalaentidadequedesenvolveatividade para o preparo, desenvolvimento e qualificação para o trabalho (art.205CF).4.Acobrançademensalidadesnãodescaracterizaaentidadeimunesenãohádistribuiçãoderendas,lucroouparticipaçãonosresultadosempresariais.5.Entidadeque,gozandodaimunidadehámaisdequarentaanos,nãoestáobrigadaarecadastrar-se,anoaano,parafazerjusaobenefícioconstitu-cional.6.Recursoordinárioimprovido.158

�58 RecursoOrdinário�0030��837�0,�.ªTurma,Rel.Min.ElianaCalmon,DJ�.8.�00�.

Page 73: Fernanda Ramos Pazello

65

4OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO

4.1 Proposta conceitual

No presente capítulo, delimitaremos o conteúdo semântico de operação de exportação. Overboexportaréaplicávelnosentidoderemeter,deslocardoterritóriodoexportadorparaoutro. Em sua definição do vocábulo, De Plácido e Silva assevera:

[...]Exportação.Derivadodolatimexportatio, de exportare (levarparafora),indica,naterminologiacomercialejurídica,todoatoderemessadeumamer-cadoriaouprodutoparaoexterior,istoé,paraforadopaísemquefoiprodu-zida.Tecnicamente,pois,ovocábuloexportaçãoenvolve,simplesepuramente,osentidodesaídademercadoriasparapaísestranho.Dessemodo,nãoseentendeexportação,acirculaçãooutrânsitodamercado-riadentrodeumpaís,istoé,emseuslimitesterritoriais,poisqueexportaré mandar para fora.E,juridicamente,para fora quer significar para outro país ouparapaísestrangeiro.Opõe-se,assim,àimportação,queéamercadoriaouoprodutotrazido para o interiordeumpaís.Éoatodetrazer,paraconsumointerno,amercadoriaestrangeira.Nesta razão é que, na terminologia fiscal, direitos ou impostos de exportação entendem-sedireitosouimpostosdesaída da mercadoriaparaoestrangeiro[...].159

Asoperaçõesdeexportaçãoenvolvemprodutosouserviços.Produtoégênerodoqualmercadoriaéespécie,sendooprimeiroconceituadocomoumbemmóvelecorpóreoeosegun-doseriaumbemmóvelecorpóreo,destinadoaocomércio.160Serviçoéumbemnão-corpóreoe que pode ser definido como uma atividade caracterizada como um esforço humano (obrigação defazer)empreendidoporalguém(prestadordoserviço)aoutrem(tomadordoserviço).

Assim,delimitaremosoconceitodeoperaçãodeexportaçãoatodoatodeexportar,remeter produtos ou serviços para países estrangeiros, incluídos os produtos das indústrias, dos estabelecimentoscomerciais,dosserviços,dasartesoumatérias-primasnacionais.161

�59 DePlácidoeSilva.Vocabulário jurídico.�7.ed.RiodeJaneiro:Forense,�007.p.586.�60 Entendemosqueosbensvirtuaisnãopodemserdefinidoscomoprodutos,namedidaemquesãobensincor-

póreos,ouseja,nãosãocoisasmateriaisecomexistênciafísica.�6� Éimportantedestacarquehádiscussõesdoutrináriasejurisprudenciaisacercadaequiparaçãoàexportação

dasvendasdemercadoriasdeorigemnacionalparaconsumoouindustrializaçãoefetuadasàZonaFrancadeManaus,tendoemvistaoDecreto-lei�88,de�967,queassimprescreve:

Page 74: Fernanda Ramos Pazello

66

Aspartesenvolvidasnasoperaçõesdeexportaçãosão:(i)nocasodeprodutos,oex-portadorbrasileiroeoimportadorestrangeiro;e(ii)nocasodeserviços,oprestadorbrasileiroeotomadorestrangeiro.

Emambasashipótesesdevehaveraremessadosprodutosouserviçosparaospaísesestrangeiros. No caso dos produtos, a remessa do produto ao exterior configura-se no momento do despacho aduaneiro. Por se tratar de um bem corpóreo, não há dificuldades em verificar a ocor-rênciadaexportação.Omesmonãoocorrerelativamenteaosserviços,jáquenãoétãosimplesaverificação da ocorrência da sua exportação, uma vez que se trata de um bem incorpóreo.

Seoserviçofoiprestadonoexteriorporprestadorbrasileiro,evidentementehouveaexportaçãodoserviço.Noentanto,seoserviçofoiprestadonoBrasilatomadorestrangeiro,como verificaremos se houve a exportação do serviço? Inicialmente, é importante distinguir os serviçosdemeiodosserviçosderesultado.Nosserviçosdemeio,ocontratadobrasileiroseobrigaafazerumdeterminadoesforço,semobrigaçãodeatingirumresultado.Nosserviçosderesultado, o contratado brasileiro deve atingir um determinado fim.

Entendemosque,paraquesedêaexportação,obenefíciodoserviçodeveseraufe-ridodiretamentepelotomadorestrangeiro.Assim,(i)nocasodeserviçodemeio,osesforçosempreendidospeloprestadorbrasileironoBrasildevemvisarobenefíciodiretodotomadorestrangeiro,aindaqueoresultadoobtidonãolhesejafavorável;e(ii)nocasodeserviçoderesultado, o fim alcançado deve beneficiar diretamente o tomador estrangeiro. Tal questão é de fundamental importância para definirmos as hipóteses em que há exportação de serviço e será retomada em capítulo específico dedicado à isenção do ISS sobre a exportação de serviços.

4.2 TratamentoatribuídopelaConstituiçãoFederalde1988

4.2.1 Sua tributação

4.2.1.1 Imposto de Exportação: caráter extrafiscal

Nesteponto,oqueinteressaaopresentetrabalhoéanalisaratributaçãodasoperaçõesdeexportação.Asoperaçõesdeexportação,aoexterior,deprodutosnacionaisounacionaliza-

“Art.�.ºAexportaçãodemercadoriasdeorigemnacionalparaconsumoouindustrializaçãonaZonaFrancadeManaus,oureexportaçãoparaoestrangeiro,seráparatodososefeitosfiscais,constantesdalegislaçãoemvigor,equivalenteaumaexportaçãobrasileiraparaoestrangeiro”.

Page 75: Fernanda Ramos Pazello

67

dos,sãotributadasdiretamentepeloImpostodeExportação(“IE”),nostermosdoartigo153,incisoII,daCF/88.162

Tal imposto possui caráter eminentemente extrafiscal, pois visa controlar o comércio exterior,sendouminstrumentodepolíticaeconômica.MizabelDerzi,aoatualizarolivrodeAliomarBaleeiro,163-164intituladoDireito tributário brasileiro,assimsemanifesta:

[...]Ocaráter extrafiscal do Imposto de Exportação é evidente e sua cobrança meramenteeventualdestina-sea regularomercadoexterno.Como resumeHugodeBritoMachado:“Por isto, a incidência do Imposto de Exportação fica a depender de situações ocasionais, ligadasàconjunturaeconômica.Sódiantede situaçõescomoaelevaçãodepreços,nomercadoexterno,deprodutosbrasileirosexportáveisoudanecessidadedegarantiroabastecimentodomercadointerno,oimpostodeve ser exigido. Sua finalidade específica, então, é regular o mercado ex-terno.Naprimeiradasduassituaçõesacimaenunciadas,eleretiraoexcessoderemuneraçãodosprodutosnacionais,paraformarreservasmonetárias.Nasegunda,alémdisso,eledesestimulaasexportaçõesembenefíciodoconsu-midornacional”(Cf.CursodeDireitoTributário,5.ªed.,RiodeJaneiro,Ed.Forense,1992,p.210).[...].165

EdisonCarlosFernandes,emartigointituladoTratamentodoImpostosobreExpor-taçãonasnormastributáriasdoMercadoComumdoSul–Mercosul,destacaqueoIEpodeseraplicadocomintuitoprotecionistademanternoPaísumprodutoutilizadonoseuprocessoprodutivo (por exemplo, matéria-prima) ou até mesmo para se tornar auto-suficiente no tocante adeterminadoprodutoporrazõesdesegurançaedefesanacional(porexemplo,bensalimenta-res).Trata-sedeuminstrumentodeproteçãodomercadointerno.166

4.2.1.2 IPI e ICMS: imunidade integrada

Deacordocomoartigo153,§3.º,incisoIII,daCF/88,asoperaçõesdeexportaçãodeprodutos industrializados são imunes ao IPI.Alémdisso, asoperaçõesde exportaçãode

�6� “[...]Art.�53.CompeteàUniãoinstituirimpostossobre:

[...]

II–exportação,paraoexterior,deprodutosnacionaisounacionalizados.[...].”�63 AliomarBaleeiro.Direito tributário brasileiro,cit.,p.��9.�6� Vale,também,atranscriçãodoentendimentodeAliomarBaleeirosobreoimpostodeexportação:

“[...]Discutiu-se,durantegerações,ocaráterantieconômicodessetributo,que,emgeral,operacontraopaísnaconcorrência internacional,onerandoosartigosdesuaproduçãoedeseucomérciocomoestrangeiro.Prevaleceuacertadamenteaopiniãodeque,aoinvésdasupressão,deveriaserreservadoacasoseconjunturasespeciais,comoarmadaPolíticaComercialdoExterior,CambialeMonetária.AssimofizeramaEmendan.º�8eaCFde�967.[...]”(Direito tributário brasileiro,cit.,p.���)

�65 AliomarBaleeiro.Direito tributário brasileiro,cit.,p.��9.�66 Revista Dialética de Direito Tributário,n.70,p.35,jul.�00�.

Page 76: Fernanda Ramos Pazello

68

mercadorias,serviçosdetransporteedecomunicaçãosãoimunesaoICMS(155,§2.º,incisoX,alíneaa,comaredaçãodadapelaEC42/2003).NoqueconcerneaoICMS,doisaspectosdevemserressaltados:

(i) aCF/88asseguraodireitoàmanutençãoeaproveitamentodomontantedoim-posto cobrado nas operações e prestações anteriores, privilegiando o princípioabsolutodanão-cumulatividade;e

(ii) aCF/88atribuicompetênciaàleicomplementarparaexcluirdaincidênciadoICMS,nasexportaçõesparaoexterior,serviçoseoutrosprodutosalémdosmencionadosnoincisoX,alíneaa,doartigo155,§2.º(artigo155,incisoXII,alíneae).

JoséEduardoSoaresdeMelo,aoanalisaraimunidadedoICMSparaasoperaçõesdeexportação,enfatizaque

[...] a regra imunitóriaobjetiva facilitar a exportaçãodianteda competiçãointernacional,constituindoumautênticoinstrumentoparaarealizaçãodoco-mércioexterioreoingressodedivisas,colimandoumasituaçãopositivanabalançadepagamentos[...].167

HugodeBritoMachadoconcordacomautilizaçãodasimunidadesparaprivilegiarasexportações,aodizerque

[...] é comum em todo o mundo a imunidade nas exportações de produtosindustrializados.Tributarasexportaçõesmuitasvezesinviabilizaomercadoexternoeterminaporprejudicarodesenvolvimentoeconômicodopaísqueadota talprática.Emse tratandodeprodutos industrializados,a imunidadeajudaacriarempregos,namedidaemqueestimulaasexportaçõeseincre-menta,conseqüentemente,aatividadeindustrial[...].168

Confira-se, também, o entendimento de Roque Carrazza sobre a imunidade do ICMS sobreasoperaçõesdeexportação:

[...] O objetivo da norma constitucional em exame é favorecer as exporta-çõesdemercadoriaseaprestaçãodeserviçosdetransporteedecomunicaçãoadestinatários localizadosnoexterior, fazendocomque taismercadoriaseserviços tenham bons preços no mercado internacional. Uma das fórmulasencontradasparaissofoijustamentecolocarasalvodoICMStaisoperaçõeseprestações.Aimunidadeemfococonsagraoprincípiododestino(tambémchamadoprin-cípiodopaísdodestino),queregula,emmatériadetributosindiretos,asope-

�67 JoséEduardoSoaresdeMelo.ICMS:teoriaeprática.5.ed.SãoPaulo:Dialética,�00�.p.3�5.�68 HugodeBritoMachado.Nãoincidência,imunidadeseisençõesdoICMS.Revista dos Tribunais,SãoPaulo,

ano86,v.7��,p.�7,ago.�997.

Page 77: Fernanda Ramos Pazello

69

raçõesinternacionaisdebenseserviços.Deacordocomesteprincípio,atran-sação internacionaldeveser tributadaapenasumavez,nopaís importador,comaconseqüenteexoneraçãodas imposições sofridasnopaísdeorigem,justamenteparaquenãohaja“exportaçõesdeimpostos”[...].169

Concordamoscomaposiçãodoilustreautoracimacitado170nosentidodequeaimu-nidadedoICMSedoIPIrelacionadaàsoperaçõesdeexportaçãonãovisamprotegerapessoadoexportador,masasexportaçõesdeprodutosemercadorias.Ouseja,aimunidadedevebe-neficiar todos que contribuem para que a exportação se verifique, tais como os fornecedores de componentesutilizadosparaaproduçãodedeterminadoproduto.

No caso, deve-se imprimir uma interpretação teleológica aos artigos 153 e 155 daConstituiçãoFederal,paraquea imunidadeabranja todasasoperaçõesquedealgummodoconcorremparaqueseperfaçaavendaparaoexteriordeprodutosoumercadorias.Portanto,ocontribuintequecomprovarqueoprodutooumercadoriacomaqualestápraticandoaoperaçãoirá, a final, para o exterior tem o direito subjetivo de não pagar o imposto específico.

ReginaHelenaCosta,aotratardaimunidadedoIPIsobreasoperaçõesdeexportaçãoemanifestandosuaconcordânciacomoentendimentodeRoqueCarrazza,enfatizaque“[...]cui-da-se de imunidade objetiva e política, cuja finalidade é incentivar as exportações de produtos industrializados.Vemenfatizaramáximauniversalsegundoaqual‘deve-seexportarprodutos,nãotributo’”.171

Outroaspectoanalisadopelo ilustredoutrinadorRoqueCarrazzaéa imunidadedoICMSsobreotransporte,aolongodoterritórionacional,atéopontodeembarqueparaoexte-rior(a)dasprópriasmercadorias(autotransporte);e(b)demercadoriasdeterceiro,aindaqueporforçadeumcontratooneroso.Noseuentender,otransporteinterestadualouintermunicipalquelevaprodutosoumercadoriasaoportoouaeroporto,deondeseguemparaoexterior,éati-vidade-meioalcançadapelaimunidade.

Aextensãoda imunidadeemquestãoàsoperaçõesquecontribueme/ouconcorremparaaexportaçãoéchamadapeladoutrinade“imunidadeintegrada”.Esteentendimentovisaobedeceraoprincípiodotratamentoigualitário,assimcomooidealdealargamentodasexpor-tações.Ora,aosefalarnaatividadeexportadora,nãosepodeignorarqueoexportadorpropria-mente dito não é o único responsável pela remessa de um produto ao estrangeiro. Na verdade,

�69 RoqueAntonioCarrazza.ICMS...,cit.,p.388.�70 Idem,ibidem,p.�6�-�6�.�7� ReginaHelenaCosta.Imunidades tributárias...,cit.,p.�93-�9�.

Page 78: Fernanda Ramos Pazello

70

deve-seteremmenteaexistênciadetodaumacadeiaprodutivaquefazparteintegrantedesteato último que é a exportação. Exemplo: como ocorreria a exportação de sapatos do Rio Grande doSulparaoexteriorsemaparticipaçãodiretadosresponsáveispelocouro,pelaborracha,pelatinta, pelos fios, pelo transporte?

4.2.1.3 ISS: isenção heterônoma

NoquetangeaoISS,impostodecompetênciadosMunicípioseDistritoFederaleinciden-tesobreosserviçosdequalquernatureza,aCF/88,emseuartigo156,§3.º,incisoII,atribuicompe-tênciaàleicomplementarparaexcluirdesuaincidênciaexportaçõesdeserviçosparaoexterior.Emjulhode2003,foipublicadaaLC116/2003excluindoaexportaçãodeserviçosdaincidênciadoISS.Trata-se da única hipótese em que se admite a isenção heterônoma (isenções concedidas por pessoa diversadaquelaquetemcompetênciaconstitucionalparainstituirotributo).

AlgunsdoutrinadorestratamodispositivoconstitucionalacimacomoumanormadeestruturaqueautorizaaleicomplementarisentarasoperaçõesdeexportaçãodoISSeoutrosdoutrinadoresentendemquesetratadeumanormadeimunidade.

IvesGandradaSilvaMartins172entendequesetratadenormadeimunidade,umavezque(i)aleicomplementarapenasdeveráreproduziroqueestánotextoconstitucional;e(ii)aleicomplementarnãopoderápermitiraincidênciadoISSsobreaexportaçãodeserviçosparaoexterior.Sendoumaimunidade,seriaumanormaauto-aplicáveleque,portanto,nãodependeriadaediçãodeleicomplementar.Assim,mesmoquenãohajaleicomplementar,osMunicípiosestãoimpedidosdetributarpeloISSasexportaçõesdeserviço.

LucianoAmaro173entendequeanormaemquestãoencerraumaimunidadetributáriaenão uma isenção, por entender que a lei complementar atuará no âmbito da definição da compe-tênciatributária,domínioprópriodaimunidade.Emnotaderodapé,GabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros174admitemque,emboratenhamtratadooartigo156,§3.º,incisoII,daCF/88comonormaqueautorizaainstituiçãodeumaisenção,nãoseriaabsurdoouincorretoquetaldispositivoconstitucionalprevisseumanormadeimunidadenãoauto-aplicável,poisdepen-dentedeleicomplementarqueainstitua.

�7� IvesGandradaSilvaMartinseCelsoRibeiroBastos.Comentários à Constituição do Brasil.SãoPaulo:Sa-raiva,�990.v.6,t.I,p.576-579.

�73 LucianoAmaro.Direito tributário brasileiro.��.ed.SãoPaulo:Saraiva.�005.p.�60.�7� GabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros.OISSeexportaçãoeimportaçãodeserviços.In:MarceloMa-

galhãesPeixoto;IvesGandradaSilvaMartins(Org.).ISS e a LC 116/2003.Curitiba:Juruá,�00�.p.�00.

Page 79: Fernanda Ramos Pazello

7�

Anossover,anormaprevistanoartigo156,§3.º,incisoII,daCF/88encerraumanormaqueautorizaainstituiçãodeumaisenção heterônoma,poisapenaspermitequealeicomplemen-tarexcluadaincidênciadoISSasoperaçõesdeexportação.Portanto,referidanormadependedeleicomplementarexcluindoaincidênciadoISSsobreasoperaçõesdeexportaçãoedisciplinandosuascondições.Semaleicomplementar,nãoháisençãodoimpostomunicipal.175

ConcordamoscomaopiniãodeReginaHelenaCosta,nosentidodeque

anormaconstitucionaldeveexaurir adisciplinados limitesda situaçãodeintributabilidadeparaquesepossareconheceraexistênciadeimunidade.Aocontrário, se a tipificação da situação não advier integralmente da Lei Maior seustatusnãoserádeimunidade,massomentedeisenção.Paranós,asnor-masconstitucionaisapontadas,emverdade,versamsobrehipótesesdeisen-çãoheterônoma–quaissejam,aquelasoutorgadasporpessoapolíticadistintadaquelacompetenteparaa instituiçãodo tributocorrespondente,postonãoesgotarem o perfil normativo da situação infensa à tributação [...].176

Portanto, considerando que a tipificação da situação não se encontra na norma consti-tucional,estamosdiantedeumaisençãoheterônoma.

Hácontrovérsianadoutrinaenajurisprudênciasobreoqueseentendeporexportaçãode serviço. Este tema será analisado em item específico.

4.2.1.4 As contribuições sociais e a Cide

No fim de dezembro de 2001, o legislador constituinte derivado, por intermédio da EC 33/2001,fezincluiraimunidadedereceitasdecorrentesdeexportaçãosobreascontribuiçõessociaiseascontribuiçõesdeintervençãododomínioeconômico(artigo149,§2.º,incisoI),impedindo,assim,quetaiscontribuiçõesalcançassemasoperaçõesdeexportação.Aabrangên-ciadetalimunidadeéobjetodecalorosasdiscussõesdoutrináriasejurisprudenciais.Algunsentendemquetalimunidadeaplica-sesomenteàscontribuiçõesincidentessobreareceita,casodo PIS e da Cofins. Outros defendem que referida imunidade inclui todas as contribuições sociais incidentes sobre as operações de exportação, tendo em vista a finalidade da norma e a interpretaçãoamplaquesedáàsnormasimunizantes.Dedicaremosumitemparaabordarcomprofundidadeestetema.

�75 OPlenodoSTF,deformaindireta,nojulgamentodoAgravoRegimentalnoMandadodeInjunçãonº590-�,decidiuque,nessecaso,atribui-seàleicomplementaropoderdeescolherosserviçosqueficarãoisentos,conformerazõesdepolíticatributária.

�76 ReginaHelenaCosta.Imunidades tributárias...,cit.,p.�07-�08.

Page 80: Fernanda Ramos Pazello

7�

HelenoTôrresconcluicommaestriao tratamentodadopelanossaCartaMagnaàsoperaçõesdeexportação:

[...] Para as exportações, o texto constitucional vigente afirma o princípio do paísdedestinoparaa tributaçãodeprodutosnocomérciointernacional,aoprescreverquenãoincidirãoimpostossobreprodutosdestinadosaoexterior,atítulodeIPI(art.153,§3.º,III)ouICMS(art.155,§2.º,X,“a”),bemcomocontribuiçõessociaisedeintervençãonodomínioeconômico(art.149,§2.º,I);e,nahipótesedosserviços,nãoseaplicandooISS(art.156,§3.º,II)eoICMS(art.155,§2.º,X,“a”),noscasosemqueestepodeincidir,alémdascontribuiçõesacimaindicadas,quantoàsreceitasdecorrentesdeexportação.Eemparaleloataisimunidades,emergeoregimedecréditocomométodocomplementar da não cumulatividade, na medida em que plurifasia não seencerranumatodeconsumointerno[...].177

Verifica-se, portanto, que a Constituição Federal impôs imunidades tributárias ou pre-viumecanismos(leicomplementar)paraexcluirasoperaçõesdeexportaçãodatributaçãodedeterminados tributos (instituto da isenção). Tais medidas de desoneração tributária coadu-nam-secomaintençãodoordenamentojurídicobrasileirodeevitaraexportaçãodetributose,aomesmotempo,proporcionarumefetivodesenvolvimentoaomercadonacional,conformeveremosaseguir.

4.2.2 Finalidade constitucional

AnalisandootratamentotributárioprevistonaCF/88paraasoperaçõesdeexportação,constatamosque(i)asoperaçõesdeexportaçãosãoimunesaoICMSeaoIPI;(ii)ascontribui-çõessociaisedeintervençãododomínioeconômiconãoincidemsobreasreceitasdecorrentesdeexportação;e(iii)leicomplementarpodeexcluirasoperaçõesdeexportaçãodaincidênciadoISS.Aliás,atémesmoantesdainclusãodaimunidadedoartigo149,§2.º,incisoI,pelaEC33/2001, o legislador ordinário isentava tais operações da incidência do PIS e da Cofins.

O afastamento da tributação das operações de exportação é decorrência de finalidades játraçadasnasConstituiçõesFederaisanterioresequeforammantidasnaConstituiçãoFederalde1988.SegundoMisabelDerzi,aoatualizarolivrodeAliomarBaleeiro,

[...]aConstituiçãode1988,abrigandoastendênciasdasanteriores,émarcadaporduascaracterísticasrelevantesnapolíticatributária,direcionadaaodesen-volvimento: estímulo ao desenvolvimento industrial, voltado à exportação;eincentivoaodesenvolvimentoharmoniosodaFederação,pelareduçãodasdesigualdadesregionais.Assimforamrepetidasasimunidadesquemarcaram

�77 HelenoTaveiraTôrres.OIVAnaexperiênciaestrangeiraeatributaçãodasexportaçõesnodireitobrasileiro.Revista Fórum de Direito Tributário,BeloHorizonte,ano3,n.�6,p.58,jul.-ago.�005.

Page 81: Fernanda Ramos Pazello

73

as Constituições anteriores, das últimas décadas como a imunidade do impos-toincidentesobreaproduçãoindustrialdestinadaaoexterior(art.153,§3.º,III)eaimunidadedoimpostosobreacirculaçãodessesmesmosprodutosnasoperaçõesdeexportaçãoart.155,§2.º,X,a).ComoregistrouAliomarBale-eiro,trata-sedeumapolíticadestinadaaimpedirouaatenuaraexportaçãodeimpostos,queafetamacompetitividadedosprodutosnacionaisnomercadoexterno,aobtençãodedivisaseoequilíbriodabalançadepagamentos.Coe-rentemente,tantooscréditosincidentessobreaproduçãoouacirculaçãonasetapasanterioreserammantidosparaabatimentooudevolução,demodoqueosprodutosnacionaischegassemaoexteriorlivresdetributos[...].178

Tal finalidade está expressa no artigo 3.º da Constituição Federal de 1988, que as-seguraoprincípiododesenvolvimentoeconômico,aoprescreverque“constituemobjetivosfundamentais da República Federativa do Brasil: II – garantir o desenvolvimento econômico”. Ésabidoqueodesenvolvimentonacionaldependedeumresultadofavoráveldocomércioin-ternacional,principalmenteapósacrescenteintegraçãodaseconomias,principalmentenoquedizrespeitoàproduçãodemercadoriaseserviços.Portanto,asdesoneraçõestributáriasrelacio-nadasàsoperaçõesdeexportaçãotêmcomofundamentoovalorexpressonocitadodispositivoconstitucional,ouseja,odesenvolvimentoeconômicodoBrasil.

DuarteIvoCruznosrelembraque

[...] o incremento da exportação significa, antes de mais, a expansão e aperfei-çoamentodoparqueindustrial,odesenvolvimentotecnológicodaprodução;o incremento da comercialização respectiva; em suma – o reforço de umapotencialidadederiqueza,dequalidadedevida,necessáriosaobem-estarna-cional[...].179

Logo, o que se verifica é que a política de expansão da exportação transcende os inte-resses privados, em razão das implicações nos campos econômico, político e financeiro.

Asdesoneraçõestributáriasparaasoperaçõesdeexportaçãosãoumestímulodena-tureza fiscal, na medida em que representam um instrumento extrafiscal com efeitos políticos eeconômicos,ouseja,incentivarasoperaçõesdeexportaçãoedarcondiçõesconcretasparaqueseefetivem,visandoodesenvolvimentodaeconomianacional.Asdesoneraçõestributáriasvisammanteroresultadofavoráveldasexportações,desonerandoocustodoprodutobrasileiro,tornando-ocompetitivo.Logo,nabuscadosuperávitprimário,ouseja,dabalançacomercial,

�78 AliomarBaleeiro.Limitações...,cit.,p.�67.�79 DuartoIvoCruz.Enquadramentojurídicoeeconômicodaexportação.Revista de Direito Mercantil,n.�7,

p.�5.

Page 82: Fernanda Ramos Pazello

7�

é um objetivo claro da globalização, tendo em vista a dificuldade de os países em desenvolvi-mentoparticiparemefetivamentenaeconomiamundial.180

ConformeressaltadoporJohnF.Due,emlivrointituladoTributação indireta nas econo-mais em desenvolvimento,citadoporHelenoTaveiraTôrres,181semprequeopreçodaexportaçãoincluir certo elemento fiscal, prejudicando os exportadores, caberá ao Estado adotar medidas ur-gentesparasuperarasinevitáveisdistorçõescomerciais,sobpenadeocorrerumdesfavorecimen-todaposiçãodosprodutoresnacionaisnomercadointernacionalemrelaçãoàsempresasdepaí-sesquenãoimpõemtributos.Trata-sedaadoçãodoprincípiododestino(exportaçõessãoisentaseimportaçõessãotributáveis),tambémseguidopelospaísesdoMercosul(Argentina,UruguaieParaguai),bemcomopelospaíseseuropeus,182emcertassituações.183

Essaéatendênciamundial.HelenoTôrres,184aoanalisaroIVAeuropeueatributaçãodasoperaçõesdeexportação,constatouquenoregimetributáriovigentenaUniãoEuropéiaasoperaçõesdeexportaçãodebensconferemaosprodutoresdosbensouresponsáveispelaex-portaçãodoisdireitossubjetivos:(i)não-incidênciatributária;e(ii)reconhecimentododireitodedevoluçãodostributosincidentesnasdistintasoperaçõesdeaquisiçõesdebensoutomadasde serviços para obter o produto a ser exportado como resultado. Ainda, o autor verifica que paísescomoChile,Bolívia,Equador,PerueVenezuelatambémestãoseguindotaltendênciaaoexcluirtodososimpostoschamadosindiretosqueincidamsobreosbensdestinadosàex-portação.Damesmaforma,osEstadosUnidos,México,JapãoeCanadáprocurampreservaracompetitividadedesuaseconomiasnomercadointernacional.

Considerando os ensinamentos de José Antonio Minatel, a nosso ver, não há dúvida acercadalegitimidadeconstitucionaldoafastamentodatributaçãosobreasoperaçõesdeex-portação,umavezque

�80 CarmenSaraivaeSilviaFonseca.AimunidadedareceitadaexportaçãoemfacedaContribuiçãoSocialsobreoLucroLíquido.Repertório IOB de Jurisprudência, Tributário, Constitucional e Administrativo, v.�,p.7�,jan.-dez.�00�.

�8� HelenoTôrres.OIVAnaexperiênciaestrangeira...,cit.,p.�9.�8� MarceloMarquesRoncagliaasseveraqueoImpostosobreValorAgregado(IVA)europeusesujeita,emregra,

aoprincípiododestino.Nesteaspecto,oautorressaltaque(i)oIVAeuropeu,emboradevesseobservaroprin-cípiodaorigemparaacabarcomoscontrolesaduaneiros,entendeuporbemaplicaroprincípiododestinoemrazãodeeventuaisdesequilíbriosarrecadatórios;(ii)oIVAsubstituionossoICMS,IPIeISS;(iii)alegislaçãodoIVAprevêoqueéentregadebensequetodoorestoéprestaçãodeserviços,exemplificando;e(iv),porfim,osserviçostributadospeloIVAobedecemaoprincípiodaorigem,paradoxalmente(OISSeaimportaçãoeexportaçãodeserviços.Revista Dialética de Direito Tributário,v.��9,p.98-���,jun.�006).

�83 Nessesentido,confira-seartigodeLuísEduardoSchoueri.ISSsobreaimportaçãodeserviçosdoexterior,Revista Dialética de Direito Tributário,n.�00.

�8� HelenoTôrres.OIVAnaexperiênciaestrangeira...,cit.,p.�9-56.

Page 83: Fernanda Ramos Pazello

75

[...]obemjurídicotuteladoparaoutorgadaimunidadetemavercomoincre-mentoefetivodovolumedoingresso(receita)dedivisascambiais,situaçãoeconômicacomrelevânciaparaoEstadobrasileiro,abstraindo-sedoeventualresultado econômico positivo (lucro) auferido nessas operações, qualificativo quesóinteressaaopróprioexportadorenãoaoEstado[...].185

Assim,partindodeste raciocínio, asdesonerações tributárias sobreasoperaçõesdeexportação têm por objetivo diminuir a carga tributária dos bens e serviços exportados, vi-sando desenvolver a exportação no Brasil e, assim, beneficiar a economia nacional,186dentrodaconcepçãodoprincípiododestino.Ovalorquesepretendeprotegercomautilizaçãodasdesoneraçõestributáriasnasoperaçõesdeexportaçãoéodesenvolvimentonacionalmedianteoincrementodaexportação,nostermosdoartigo3.ºdaCF/88edoprincípiodaneutralidadefiscal internacional.

�85 JoséAntonioMinatel.Conteúdo do conceito de receita e regime jurídico para sua tributação.SãoPaulo:MPEditora,�005.p.��9.

�86 Sobreoassunto,FábioArtigasGrillo,emartigointituladoTributaçãodasexportaçõesnoMercosul,constataqueospaísesemergentesdevempromoverpolíticasdecomércioexteriornitidamenteestimuladorasdasex-portações,easrazõeseosmotivosestãorelacionadosàeficiêncianodesempenhodaatividadefinanceiradoEstado.Assimleciona:

“[...]Comefeito,nãohádúvidadaextremaeficiênciadautilizaçãodasreceitaspúblicasdecorrentesdasati-vidadesdeexportação,especificamentenoquedizrespeitoàsolvabilidadedascontaspúblicas.Asreceitaspúblicasdecorrentesdosetorexterno,objetivamentedaentradadedívidasrelacionadasàsoperaçõesdeex-portações,representamcrucialimportâncianasfinançaspúblicas.

Ocomérciointernacionaléfundamentalporque,paraumdadoníveldeconsumointerno,areceitadeexpor-tação–receitalíquidadeduzidasasimportações–aumentaapoupançaagregadainternaegeracapacidadedeimportarinsumoseprodutosintermediários.

Maisqueisso,asreceitasdeexportaçãocontribuemparaoaumentodareceitapúblicatributária,permitindoassimqueessareceitalíquidasejasomadaaoinvestimentopúblicosemaumentodacargatributáriasobreaativi-dadeinterna.Comoregrageral,asexportaçõessãomaisfacilmentetributáveisqueamaioriadostiposdeproduçãoparaomercadointerno,porcausadeseugraudeconcentraçãoemníveldeproduçãoecomércio.[...]”(Revista Tributária e de Finanças Públicas,Coord.DejalmadeCampos,SãoPaulo:RT,ano��,jul.-ago.�006).

Page 84: Fernanda Ramos Pazello

76

5QUESTÕES A SEREM DEBATIDAS

5.1 Imunidade das receitas de exportação para as contribuições sociais

AEC33/2001acrescentouo§2.º, incisoI,aoartigo149,parainseriraimunidadetributáriadascontribuiçõessociaisedeintervençãododomínioeconômicosobre“asreceitasdecorrentesdeexportação”,comaseguintedicção:

[...]Art.149.[...]§2.ºAscontribuiçõessociaisedeintervençãonodomínioeconômicodequetrataocaputdesteartigo:I–nãoincidirãosobreasreceitasdecorrentesdeexportação[...].

Cumprerecordarque,nocapítulodedicadoàoperaçãodeexportação,delimitamososeuconceitocomotodoatodeexportar,remeterprodutosouserviçosparapaísesestrangeiros,incluídos os produtos das indústrias, dos estabelecimentos comerciais, dos serviços, das artes oumatérias-primasnacionais.

Nocasodaexportaçãodeserviço,obenefíciodoserviçodeveserauferidodiretamentepelo tom☺ador estrangeiro. Assim, (i) no caso de serviço de meio, os esforços empreendidos peloprestadorbrasileironoBrasildevemvisarobenefíciodiretodotomadorestrangeiro,aindaque o resultado obtido não lhe seja favorável; e (ii) no caso de serviço de resultado, o fim obtido deve beneficiar diretamente o tomador estrangeiro.

Quandooexportadorvendeseusprodutosouserviçosparaomercadoexterno,auferereceitas,apuradas,principalmente,emduascircunstâncias:medianteaconversão,emmoedanacional,dovalorexpressoemmoedaestrangeira,àtaxadecâmbiodadatadeembarquedosprodutos;eaapuradapeladiferençadecorrentedaalteraçãonataxadecâmbioocorridaentreadatadoembarqueeadatadofechamentodocontratodecambio.187Taisreceitas,pornãoes-

�87 Orecebimentodovalordasexportaçõesbrasileirasencontra-sedisciplinadanaResolução3.389,de�.8.�006(DOU7.8.�006).Deacordocomareferidaresolução,valedestacar:(i)osexportadoresbrasileirosdemerca-doriaseserviçospodemmanternoexteriorovalorcorrespondentea,nomáximo,30%(trintaporcento)dareceitadeexportações,devendoaparcelarestanteserobjetodecelebraçãoeliquidaçãodecontratodecâmbioeminstituiçãointegrantedosistemafinanceiroautorizadaaoperarnomercadodecâmbionoPaís;(ii)asope-raçõesdecâmbiosãoliquidadasmedianteaentregadovaloremmoedaestrangeiraoudodocumentoqueorepresenteaobancocomoqualtenhasidocelebradoocontratodecâmbio;(iii)oscontratosdecâmbiopodemsercelebradosparaliquidaçãoprontaoufutura,préviaouposteriormenteaoembarquedamercadoriaoupres-

Page 85: Fernanda Ramos Pazello

77

taremvinculadasaqualqueroperaçãonomercadointerno,apresentamanaturezade“receitasdecorrentesdeexportação”.

Em relação às contribuições sociais incidentes sobre a receita (Cofins e PIS), bem como às contribuições de intervenção no domínio econômico, não há dúvida acerca da aplica-ção da imunidade prevista no artigo 149. Dúvidas surgem no que concerne à aplicação de tal imunidadeparaaCSLeaCPMF,assimcomoemrelaçãoaosvaloresdevariaçãocambialativadecorrentedereceitadeexportação.

OFiscoFederalentendequetalimunidadesomenteabrangeascontribuiçõessociaisque possuem a receita como fato gerador, no caso, a Cofins e o PIS, nos termos do artigo 195, incisoI,alíneab,daCF/88.Portanto,noseuentender,comoaCSLeaCPMFnãopossuemareceita como base de cálculo, e sim o lucro e a movimentação financeira, respectivamente, tais modalidadestributáriasnãoestariamabrangidaspelaimunidade.188

taçãodoserviço;(iv)orecebimentodovaloremmoedaestrangeiradecorrentedeexportaçõesdeveocorrermediantecréditodocorrespondentevaloremcontanoexteriormantidaembancopelopróprioexportadorouacritériodaspartes,mediantecréditoemcontamantidanoexteriorporbancoautorizadoaoperarnomercadodecâmbionoPaís;e(v)osrecebimentosdeexportaçãoemmoedanacionalsãoadmitidosquandoprevistosnoregistrodeexportaçãonoSiscomex.

�88 MinistériodaFazenda

SecretariadaReceitaFederal

SuperintendênciaRegionaldaReceitaFederal

�0.ªRegiãoFiscal

SoluçãodeConsultan.�99,de��denovembrode�003

Assunto:ContribuiçãoSocialsobreoLucroLíquido–CSL

Ementa:Imunidade.Contribuiçõessociais.Receitasdeexportação.Aimunidadedasreceitasdecorrentesdeexportação, relativamenteàscontribuições sociais ede intervençãonodomínioeconômico,nãoalcançaaContribuiçãoSocialsobreoLucroLíquido.

DispositivosLegais:Art.��9,§�.º,incisoI,daConstituiçãoFederal;EmendaConstitucionaln.º33,de��dedezembrode�00�,art.�.º.

VeraLúciaRibeiroConde

ChefedaDivisãodeTributação

................................................................................................................................

MinistériodaFazenda

SecretariadaReceitaFederal

SuperintendênciaRegionalDaReceitaFederal

9.ªRegiãoFiscalDISIT

SoluçãodeConsultan.03�,de�5defevereirode�003

Assunto:ContribuiçãoProvisóriasobreMovimentaçõesouTransmissõesdeValoresedeCréditoseDireitosdeNaturezaFinanceira–CPMF.

Ementa:Imunidade.Aimunidadeconferidapelo§�.º,incisoI,doartigo��9daConstituiçãoFederalalcançaapenasascontribuiçõessociaisquepossuemcomobasedeincidênciaasreceitasdecorrentesdeexportação,nãoatingindoaCPMF.

DispositivosLegais:Arts.��9,§�.º,incisoI,e�95,incisoI,daConstituiçãoFederaleart.6.ºdaLein.9.3��/96.

Page 86: Fernanda Ramos Pazello

78

Jánotocanteàvariaçãocambialativadecorrentedereceitadeexportação,asAutori-dades Administrativas atribuem a natureza de receita financeira e não de receita decorrente de exportação.189

ValefrisarqueaCPMFfoiextintaemdezembrode2007.Alguns,portanto,poderiamdizerqueadiscussãoacercadaabrangênciadaimunidadeparaaCPMFteriaperdidoseuobje-to.Noentanto,emrazãodoprazoprescricionalaquefazjusocontribuinteparaarepetiçãodoindébitotributário,taldiscussãocontinuaacesa.Ora,casoseconcluaqueaCPMFnãopoderiaincidirsobreasoperaçõesdeexportação,restariaaoscontribuintesaviadosolve et repete,nostermosdosartigos165e168doCTN.

Paraquepudéssemosnosaprofundarnaabrangênciadaimunidadeemquestão,delimi-tandoseusentidoealcance,colocamosnodecorrerdestetrabalhoalgumaspremissas,asaber:(i)ainserçãodestaimunidadepelaEC33/2001éconstitucional,namedidaemquenãoofendeoartigo60,§4.º,daCF/88e,aomesmotempo,visaprivilegiarumdosvaloresprotegidospelonossoordenamento:odesenvolvimentonacionalmedianteoincrementodaexportação;(ii)anormamatrizdetodasascontribuiçõessociaiséoartigo149daCF/88;(iii)aCSLeaCPMFsão contribuições sociais, pois suas finalidades estão relacionadas ao financiamento da ordem social; e (iv) as normas imunizantes são normas de finalidade e, portanto, devem ser interpre-tadas de forma sistemática e teleológica, a fim de que os valores a que se pretendeu privilegiar sejamrealmenteassegurados.

5.1.1 Imunidade aplicável à CSL

Analisemos, de início, o caso específico da CSL. Referida modalidade tributária deve incidirsobreolucrodaspessoasjurídicas,nostermosdanormadecompetênciatributáriainser-tanoartigo195,incisoI,alíneac,daCF/88.190AUniãoFederalinstituiuaCSLporintermédio

�89 Assunto:ContribuiçãoparaoFinanciamentodaSeguridadeSocial–Cofins

Ementa:Variaçãocambial.Receitadeexportação.Não-configuração.Asreceitasfinanceirascorrespondentesàsvariaçõescambiaiscompõemabasedecálculodacontribuição,nãoconfigurandoreceitasdeexportação.PeríododeApuração:0�/0�/�000a3�/��/�000(Acórdãon.��5de��dedezembrode�00�,da3.ªTurmadaDelegaciadaReceitaFederalemCuritiba).

[...]

Assunto:ContribuiçãoparaoPIS/Pasep

Ementa:Variaçãocambial.Receitadeexportação.Não-configuração.Asreceitasfinanceirascorrespondentesàsvariaçõescambiaiscompõemabasedecálculodacontribuição,nãoconfigurandoreceitasdeexportação.PeríododeApuração:0�/0�/�000a3�/��/�000(Acórdãon.���de��dedezembrode�00�,da3.ªTurmadaDelegaciadaReceitaFederalemCuritiba).

�90 “[...]Art.�95.Aseguridadesocialseráfinanciadaportodaasociedade,deformadiretaeindireta,nostermosdalei,medianterecursosprovenientesdosorçamentosdaUnião,dosEstados,doDistritoFederaledosMu-nicípios,edasseguintescontribuiçõessociais:

I–doempregador,daempresaedaentidadeaelaequiparadanaformadalei,incidentessobre:

Page 87: Fernanda Ramos Pazello

79

daLei7.689,de1988.Deacordocomoseuartigo2.º,191abasedecálculodotributoéovalor

doresultadodoexercícioantesdaprovisãodoimpostoderenda.

Umainterpretaçãoliteraldaimunidadeprevistanoartigo149edadicçãodoartigo

195poderiaconcluirpelanão-aplicaçãodaimunidadeemtelaàCSL,dadoquereceitaelucro

sãoconceitosdiversosequesecontrapõemnotextoconstitucional(videartigos195,incisoI,

alíneasbec).Noentanto,“interpretarumtextonormativo,maisdoquesimplesmenteentender

as palavras, é captar seu conteúdo e suas implicações práticas”.192Éoquefaremos.

Embora a Constituição Federal não defina “lucro”, acreditamos que há um conceito

pressupostopelaprópriaConstituição,umavezque“lucro”temumaacepçãotécnica.Portanto,

ao se referir a lucro, a Constituição quis que a contribuição recaísse sobre um resultado final,

quelevasseemcontaasreceitasdapessoajurídica.Senão,vejamos.

a)afolhadesaláriosedemaisrendimentosdotrabalhopagosoucreditados,aqualquertítulo,àpessoafísicaquelhepresteserviço,mesmosemvínculoempregatício;

b)areceitaouofaturamento;

c)olucro;

II–dotrabalhadoredosdemaisseguradosdaprevidênciasocial,nãoincidindocontribuiçãosobreaposenta-doriaepensãoconcedidaspeloregimegeraldeprevidênciasocialdequetrataoart.�0�;

III–sobreareceitadeconcursosdeprognósticos.

IV–doimportadordebensouserviçosdoexterior,oudequemaleiaeleequiparar[...].”�9� “[...]Art.�.ºAbasedecálculodacontribuiçãoéovalordoresultadodoexercício,antesdaprovisãoparao

impostoderenda.

§�.ºParaefeitododispostonesteartigo:

a)seráconsideradooresultadodoperíodo-baseencerradoem3�dedezembrodecadaano;

b)nocasodeincorporação,fusão,cisãoouencerramentodeatividades,abasedecálculoéoresultadoapuradonorespectivobalanço;

c)oresultadodoperíodo-base,apuradocomobservânciadalegislaçãocomercial,seráajustadopela:

�–adiçãodoresultadonegativodaavaliaçãodeinvestimentospelovalordepatrimôniolíquido;

�–adiçãodovalordereservadereavaliação,baixadaduranteoperíodo-base,cujacontrapartidanãotenhasidocomputadanoresultadodoperíodo-base;

3–adiçãodovalordasprovisõesnãodedutíveisdadeterminaçãodolucroreal,excetoaprovisãoparaoIm-postodeRenda;

�–exclusãodoresultadopositivodaavaliaçãodeinvestimentospelovalordepatrimôniolíquido;

5–exclusãodoslucrosedividendosderivadosdeinvestimentosavaliadospelocustodeaquisição,quetenhamsidocomputadoscomoreceita;

6–exclusãodovalor,corrigidomonetariamente,dasprovisõesadicionadasnaformadoitem3,quetenhamsidobaixadasnocursodeperíodo-base.

§�.ºNocasodepessoajurídicadesobrigadadeescrituraçãocontábil,abasedecálculodacontribuiçãocorres-ponderáadezporcentodareceitabrutaauferidanoperíodode�.ºdejaneiroa3�dedezembrodecadaano,ressalvadoodispostonaalíneabdoparágrafoanterior.

[...].”�9� RoqueAntonioCarrazzaeEduardoBottalo.Operaçõesdeexportaçãoeequiparadaseimunidadeàcontribui-

çãosocialsobreolucro.Revista Dialética de Direito Tributário,SãoPaulo,n.9�,p.���.

Page 88: Fernanda Ramos Pazello

80

Lucroéuminstitutodedireitosocietário.DeacordocomaLeidasSociedadesAnôni-mas(“S.A.”)(Lei6.404,de1976),lucroéadisponibilidadederiquezanovaapresentadapelapessoa jurídica ao cabo do período de apuração. Confiram-se os artigos 186, 190 e 191:

SeçãoIVDemonstraçãodeLucrosouPrejuízosAcumuladosArt.186.Ademonstraçãodelucrosouprejuízosacumuladosdiscriminará:I–osaldodoiníciodoperíodo,osajustesdeexercíciosanterioreseacorreçãomonetáriadosaldoinicial;II–asreversõesdereservaseolucrolíquidodoexercício;III–astransferênciasparareservas,osdividendos,aparceladoslucrosincor-porada ao capital e ao saldo ao fim do período.§1.ºComoajustesdeexercíciosanterioresserãoconsideradosapenasosde-correntes de efeitos de mudança de critério contábil, ou da retificação de erro imputáveladeterminadoexercícioanterior,equenãopossamseratribuídosafatossubseqüentes.§ 2.ºA demonstração de lucros ou prejuízos acumulados deverá indicar omontante do dividendo por ação do capital social e poderá ser incluída nademonstraçãodasmutaçõesdopatrimôniolíquido,seelaboradaepublicadapelacompanhia.[...]ParticipaçõesArt.190.Asparticipaçõesestatutáriasdeempregados,administradoresepar-tes beneficiárias serão determinadas, sucessivamente e nessa ordem, com base noslucrosqueremanesceremdepoisdededuzidaaparticipaçãoanteriormentecalculada.Parágrafo único. Aplica-se ao pagamento das participações dos administrado-res e das partes beneficiárias o disposto nos parágrafos do art. 201.LucroLíquidoArt. 191. Lucro líquido do exercício é o resultado do exercício que remanescer depois de deduzidas as participações de que trata o art. 190.

RoqueAntonioCarrazzaeEduardoD.Bottallo, emartigo intituladoOperaçõesdeexportaçãoeequiparadaseimunidadeàContribuiçãoSocialsobreoLucro,concluemque

da análisedestes artigos ressai nitidamenteque lucro–basede cálculodaCSSL–éoresultadopositivoexperimentadopelapessoajurídica,numdadoperíododeapuração,abatidososvaloresempregadosparaobtê-lo.O lucroensejaumacréscimonacapacidadeeconômicadocontribuinteou,sepreferir-mos,reveladisponibilidadederiquezanova.193

CarmenFerreiraSaraivaeSilviaSaraivaFonseca,194analisandoosconceitosdelucroereceita,constatamquesãoinstitutosinterdisciplinares,ouseja,possuemfeiçõesdiversasde-pendendodamatériaemquesãoempregados.

�93 RoqueAntonioCarrazzaeEduardoBottalo.Operaçõesdeexportação...,cit.,p.���.�9� CarmenFerreiraSaraivaeSilviaSaraivaFonseca.Aimunidadedareceita...,cit.,p.68-69.

Page 89: Fernanda Ramos Pazello

8�

NoDireitoComercial,aLeidasS.A.distingueosinstitutosemseuartigo187:

SeçãoVDemonstraçãodoResultadodoExercícioArt.187.Ademonstraçãodoresultadodoexercíciodiscriminará:I–areceitabrutadasvendaseserviços,asdeduçõesdasvendas,osabatimen-toseosimpostos;II–areceitalíquidadasvendaseserviços,ocustodasmercadoriaseserviçosvendidoseolucrobruto;III – as despesas com as vendas, as despesas financeiras, deduzidas das recei-tas,asdespesasgeraiseadministrativas,eoutrasdespesasoperacionais;IV–olucroouprejuízooperacional,asreceitasedespesasnãooperacionais;V–oresultadodoexercícioantesdoimpostoderendaeaprovisãoparaoimposto;VI–asparticipaçõesdedebêntures,deempregadoseadministradores,mesmona forma de instrumentos financeiros, e de instituições ou fundos de assistên-ciaouprevidênciadeempregados,quenãosecaracterizemcomodespesa;VII–olucroouprejuízolíquidodoexercícioeoseumontanteporaçãodocapitalsocial.§1.ºNadeterminaçãodoresultadodoexercícioserãocomputados:a)asreceitaseosrendimentosganhosnoperíodo,independentementedasuarealizaçãoemmoeda;eb)oscustos,despesas,encargoseperdas,pagosouincorridos,corresponden-tesaessasreceitaserendimentos.§2.º(Revogado.)

Na Contabilidade, a receita é definida,emsentidoamplo,comoaexpressãomonetáriaconferidapelomercadoàproduçãodebenseserviçosdaentidadeemdeterminadoperíodo;decorredasoperaçõesrelacionadasàvendadebenseprodutos,prestaçõesdeserviçoseaindaoresultado positivo de aplicações financeiras; a recuperação do custo como produto da atividade econômica.Porseuturno,lucroéadiferençapositivaentreasreceitaseoscustosedespesasemdeterminadoperíodo;ésobreovalorqueasociedadepodeproduzircomoresultadodaaplica-çãodocapitaledeoutrosrecursosnaatividadeprodutiva;recuperaçãodoprodutodaatividadeeconômicaporimportânciasuperioràdocusto.

ODireitoEconômicoconceituareceitacomoautilidadedacoisa,asuacapacidadedesatisfazerasnecessidadesdosujeito;elucro,comoovaloreconômico,diminuídosoesforço,osacrifício,otrabalhoparaobtê-la.AEconomiaentendequeareceitaconstituiaremuneraçãobrutadosfatoresdeproduçãoeolucro,aremuneraçãolíquidadosfatoresdeproduçãodepoisdeexcluídooseuesforço.

Emlinguagemculta,receitaéototaldassomasdedinheiroqueumapessoanaturaloujurídicarecebedentrodecertoespaçodetempo,relativamenteaosseusnegócios,proventosourendas;elucroéointeresse,proveitoquesetiradeumaoperaçãocomercial,industrial,entre

Page 90: Fernanda Ramos Pazello

8�

outros;ganhoqueseobtémdequalquerespeculação,depoisdedescontadasasdespesas;ganholíquido;proveito,utilidade,vantagem.

Por fim, em Direito Tributário, os institutos de receita e lucro são especificados da seguinteforma:

–receitaéovalordo faturamentomensal (receitabruta), assimentendidaa to-talidadedas receitasauferidas, independentementedaatividadeexercidapelocontribuinte e da classificação contábil adotada para a escrituração das receitas, admitidas as exclusões e as deduções previstas na legislação em vigor para fins de apuração da base de cálculo do PIS e da Cofins; e

–lucrolíquidodoexercíciodeveserdeterminadocomobservânciadospreceitosdaleicomercial(Decreto-lei1.598,de26.12.1977).AbasedecálculodaCSLdevidapelaspessoasjurídicastributadascombasenolucrorealéovalordoresultadodoexercício,antesdaprovisãoparao impostoderendaajustadopelasadiçõeseexclusõeslegais(Lei7.689/88).AbasedecálculodaCSLdevidapelaspesso-as jurídicas tributadascombaseno lucropresumidoouarbitradoeporaquelasdispensadasdeescrituraçãocontábiléolucrolíquidocorrespondentea12%dareceita bruta, na forma definida na legislação vigente (Leis 9.249/95, 9.430/96 e 10.684/2003).

AreceitatambémébasedecálculodaCSL,comonocasodaspessoasjurídicastri-butadascombasenolucropresumido.Noscasosdetributaçãopelolucropresumido,abasedecálculodaCSLé,necessariamente,ovalorcorrespondentea12%dareceitabruta,nostermosdoartigo29daLei9.430/96.195

�95 Lei9.�30/96.

“Art.�9.Abasedecálculodacontribuiçãosocialsobreolucrolíquido,devidapelaspessoasjurídicastributa-dascombasenolucropresumidoouarbitradoepelasdemaisempresasdispensadasdeescrituraçãocontábil,corresponderáàsomadosvalores:

I–dequetrataoart.�0daLein.º9.��9,de�6dedezembrode�995;

II–osganhosdecapital,osrendimentoseganhoslíquidosauferidosemaplicaçõesfinanceiras,asdemaisreceitaseosresultadospositivosdecorrentesdereceitasnãoabrangidaspeloincisoanterioredemaisvaloresdeterminadosnestaLei,auferidosnaquelemesmoperíodo.”

Lei9.��9/95

“Art.�0.Abasedecálculodacontribuiçãosocialsobreolucrolíquido,devidapelaspessoasjurídicasqueefe-tuaremopagamentomensalaquesereferemosarts.�7e�9a3�daLeino8.98�,de�0dejaneirode�995,epelaspessoasjurídicasdesobrigadasdeescrituraçãocontábil,corresponderáadozeporcentodareceitabruta,naformadefinidanalegislaçãovigente,auferidaemcadamêsdoano-calendário,excetoparaaspessoasjurí-dicasqueexerçamasatividadesaqueserefereoincisoIIIdo§�.ºdoart.�5,cujopercentualcorresponderáatrintaedoisporcento.”

Page 91: Fernanda Ramos Pazello

83

Ou seja, a CSL, nesse caso específico, incide sobre sua receita bruta! Tal fato, por si só, já confirmaria a não-incidência da CSL sobre as receitas de exportação auferidas pelas pessoas jurídicasquerecolhemaCSLpelolucropresumido.Entretanto,mesmoasempresasexportado-rasqueapuramaCSLcombasenolucrorealtambémnãopodemtersuasreceitasdecorrentesdeexportaçãosujeitasàincidênciadaCSL.

Conforme visto das definições extraídas de diversas disciplinas, a receita compõe o lucro,quenadamaisédoqueareceitadepuradapelasdespesas,ajustadopelasadiçõeseex-clusõesprevistasnalegislaçãotributária.Portanto,adespeitodeabasedecálculodaCSLserolucro,aabrangênciadaimunidadedecorredequeareceitadeexportaçãonãodevesercon-sideradanocômputodabasedecálculodestetributo.Nãoestamosquerendodizerquereceitaélucro,mastão-somentequeareceitadecorrentedaexportaçãodebenseserviçoscompõeolucroedeveserexcluídaemrazãodaimunidadeemtela.196

Miguel Hilú Neto197 defendea idéiadequeoconceitode lucro,previstonaCons-tituiçãoFederal, tambéméumconceito técnico,sendosuasdiretrizesextraídasdepreceitoscontábeis, regulados em específico ou por normas de Direito Comercial, em especial a Lei das S.A.(Lei6.404/76).Conclui,assim,queoconceitodelucrocorrespondeaototaldasreceitasauferidaspelapessoajurídica,subtraídasdetodasasdespesasecustosincorridosporela,inclu-siveosoriundosdoimpostosobrearendaedaprópriaCSL.

Assim,nocômputodabasedecálculodaCSL,todoequalquercontribuintepossuiodireitoconstitucionaldeexcluirsuas“receitasdecorrentesdeexportação”,demodoaapurar(ounão)aexistênciadelucroapartirdesuasdemaisreceitasapenas,masjamaisapartirdesuas“receitasdecorrentesdeexportação”.Estedireitoconstitucional,líquidoecertodocon-tribuinte,independeinclusivedaformadeapuraçãoouregimedetributaçãoaqueesteestejaeventualmentesujeito,sejacombasenolucroreal,presumidooumesmoarbitrado.

Ora,seaintençãodolegisladorconstituintederivadofoidesonerarasreceitasdecor-rentesdeexportação,olucro–queapenaspoderáexistireserapuradoapartirdaobtençãode

�96 Confiram-seosdizeresdeCarmenFerreiraSaraivaeSilviaSaraivaFonseca(Aimunidadedareceita...,cit.,p.65):“[...]ÉverdadequeaCSSLnãotemcomofatogeradorasreceitasbrutas,masolucroauferidopelapessoaempresarialcomaquelasreceitas.Éverdadequeolucroéconceitodiferentedoconceitodereceita.Receitanãoélucro,lucronãoéreceita.Mastambéméverdadequeolucrocomasexportaçõesestácontidonoconceitodereceitadasexportações.Aoexcluirdocampodacompetênciatributáriaasreceitasformadorasdolucro(nãopropriamenteolucro),aEmendaConstitucionaln.º33/0�protegeudeformaamplaaefetivaaexportaçãonacional.[...]”.

�97 MiguelHilúNeto.OconceitosistemáticodelucroparaaCSL.In:GuilhermeCezaroti(Coord.).Contribui-ções.SãoPaulo:QuartierLatin,�003.p.�36-�39.

Page 92: Fernanda Ramos Pazello

8�

umareceita–,eventualmenteapuradoapartirdeumareceitadeexportação,devesernecessa-riamentedesonerado.Há,portanto,vínculoindissociávelentrereceitaelucroaafastarcom-pletamentequalquerinterpretaçãorestritivadodispositivoconstitucionalimunizanteemtela.Nessesentido,orientaadoutrinadeCarrazzaeBottalo:

[...]asdiferençasentrereceitaelucro,conquantoexistam,nãosustentamaassertivadequeseestariadiantederealidadesreciprocamenteexcludentes.Istoporque,areceitanãoexcluiolucro,evice-versa.Assim,háperfeitacom-patibilidadeentreestesdoisconceitos,jáqueolucro–sobosânguloseconô-mico,contábile,sobretudo,tributário–nada mais é que a receita depurada,istoé,a receita que teve expungidos os custos e despesas necessários à sua obtenção.

Ora, na medida em que a imunidade instituída pela EC n.º 33/01 objetivaincentivaroperaçõesdeexportação,desonerando-asdecontribuiçõessociais,segue-sequeo termo receitas, empregado no art. 149, § 2.º, I, do Diploma Magno, há de ser entendido em sentido amplo,demodoaalbergarnãosóascontribuiçõesqueincidemsobreofaturamento(art.195,I,b,daCF),como a que toma por base de cálculo o lucro (art. 195, I, c, da CF). Afinal, como visto, lucro nada mais é que a receita ajustada[...](grifosnossos).198

FernandoDantasCasilloGonçalves,199 aplicandouma interpretação teleológicanosmoldesemquepropugnadopelo ilustreMinistroJoséDelgado,200 entende que o significado de “não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação” é toda cobrança, carga fiscal, exigibilidade,incidênciadenormainstituidoradeônustributário(termo:incidirão)sobretudoaquiloqueingressounopatrimôniodaempresaemdecorrênciadeexportaçãorealizada(termo:receitasdecorrentesdeexportação).SomentemediantetalinterpretaçãoaimunidadeinstituídapelaEC33/2001desoneraráasreceitasdecorrentesdeexportaçãodascontribuiçõessociais.

Assimsendo,aimunidadedeveabrangernãoapenasascontribuiçõesincidentessobreareceita–emrelaçãoàsquais,aliás,asreceitasdeexportaçãojánãoeramsequersujeitas,emrazãodaisençãoanteriormenteprevista–,mastambémascontribuiçõesqueincidemsobreolucro.Assim,nãohácomosefurtaràconclusãodequeaimunidadeemquestão,visandodeso-nerarasexportaçõesbrasileiras,tambémseaplicaàCSL.

�98 RoqueAntonioCarrazzaeEduardoBottalo.Operaçõesdeexportação...,cit.,p.�08e��5.�99 Cofins,PISECSLL–VariaçõescambiaisativasecréditopresumidodoIPIdaLein.º9.363/96–Imunidade

dasreceitasdecorrentesdeexportação–Artigo��9daConstituiçãoFederal.Repertório IOB de Jurisprudên-cia,Riodejaneiro,v.�,n.6,p.�36,�.ªquinzenademar.�00�.

�00 JoséDelgadodiziaque“ainterpretaçãodeseualcancehádesevoltarparanãoenfrentarcomosendoumfavorouumarenúnciafiscal.Asuaatuaçãotemforçadelimitaropoderdetributar,considerando-seanecessidadedepreservaçãodedeterminadosvalorestidoscomoindispensáveiserelevantesparaasociedade.Há,portan-to,umarazãoprincipiológicademaioralcancepresenteemqualquerespéciedeimunidadequesevinculaaovalorquevisaaproteger[...]”.(Imunidadetributária–Aspectoscontrovertidos.Imunidadestributárias.Pesquisas Tributárias,NovaSérie,SãoPaulo:RT,n.�,p.55,�998).

Page 93: Fernanda Ramos Pazello

85

Logo,considerandoqueaCF/88determinaclaramenteanão-incidênciadascontribui-

çõessociaissobreasreceitasdecorrentesdeexportaçãoequeasreceitasconstituemaprópria

base(decálculo)parasechegaraolucro,conclui-sequeareferidanormaconstitucionalcon-

fereimunidadeàCSL.

OPoderJudiciáriojáanalisouaabrangênciadestaimunidadeparaaCSLemalgu-

masoportunidades,masaindanãoháumentendimentosedimentadopelosTribunaisSupe-

riores.HáacórdãosdosTribunaisRegionaisFederais(“TRF”)das2.ª,3.ª,4.ªe5.ªRegiões

entendendoqueaimunidadedoartigo149nãoseaplicaàCSL,201combasenosmaisvaria-

dosargumentos,asaber:

(i) receitaelucrosãoinstitutosdiferenciadosexplicitamentepelaConstituiçãoFede-

rale,portanto,possuemtributaçõesdistintascomregimesjurídicospróprios;

(ii) a imunidade em questão refere-se ao fato gerador, razão pela qual somente se

aplicaàscontribuiçõessociaisquetenhamcomofatogeradorofaturamentoou

receita,oquenãoéocasodaCSL;

(iii)ashipótesesimunizantesdevemrecebertratamentorestritivo,nostermosdoarti-

go111doCTN;

(iv)atributaçãodareceitaémuitomaisonerosaqueatributaçãodolucro,poisaose

tributarareceitaautomaticamenteseagregaaocustodosprodutoseosencarece,

sendorepassadaaoconsumidor.Nãoéoqueocorrenocasodolucro,queatinge

apenasosganhosreaisdaempresa,apuradosdentrodeespaçoslargosdetempo,

impedindo seu repasse aos preços ou, ao menos, dificultando; e

(v) aCSLnãoécontribuiçãosocialgeral,mascontribuiçãoparaaSeguridadeSocial,

cujaregra-matrizéoartigo195,enãooartigo149.

Osargumentosdesenvolvidosacimanãosesustentam.Asnormasdeimunidadesãonor-

mas de finalidade e, como tal, devem ser interpretadas de forma sistemática e teleológica, para que

�0� Confiram-se os seguintes acórdãos: Apelação Cível �00�.7�.0�.00307�-�/SC, Relatora Desembarga-dora FederalVânia Hack deAlmeida, da �.ªTurma doTRF da �.ª Região, j. ��.�.�008;Apelação Cível�005.7�.0�.00�880-�/SC,RelatorDesembargadorFederalAntonioAlbinoRamosdeOliveira,�.ªTurmadoTRFda�.ªRegião,DJ��.5.�006;ApelaçãoCível3���0�/ES,DesembargadorFederalFernandoMarques,�.ªTurmadoTRFda�.ªRegião,DJ0�.�0.�00�;ApelaçãoCível�760�0/SP,RelatorDesembargadorFederalCarlosMuta,3.ªTurmadoTRFda3.ªRegião,DJ�9.7.�006;eAgravodeInstrumento59999/CE,Desembar-gadorFederalNapoleãoMaiaFilho,TRFda5.ªRegião,DJ9.��.�005;ApelaçãoCível�006.7�.08.0�595�-6/RS,da�.ªTurmadoTRFda�.ªRegião,DJ�9.9.�007.

Page 94: Fernanda Ramos Pazello

86

consigamcumprirseuobjetivo.Aimunidadedoartigo149buscanãoexportartributose,portanto,nãotributarasreceitasdeexportação.Ora,aosepermitirqueolucroasertributadopelaCSLsejacompostopelareceitadeexportação,indiretamenteseestarátributandotaisreceitaseexportandotributo, pois tal efeito também influenciará no custo do produto ou serviço.

AjurisprudênciadosTribunaisRegionais sevaledeuma interpretação literal,paraconcluirqueaprópriaCFdiferencioureceitaelucro,poisautorizouaincidênciadedetermi-nados tributos sobre a receita (PIS e Cofins) e outros sobre o lucro (CSL). Não se questiona o fatodequelucroereceitasãoinstitutosdistintos.Naverdade,oquedemonstramosacimaéqueofatoeconômicodenominadolucroécompostoporreceitae,porconseguinte,porreceitadeexportação.Portanto,areceitadeexportaçãotambémnãopodesertributadapelaCSL.

Aliás,emnenhummomentoanormaimunizantequisdizerqueaimunidadeatingiriaapenasascontribuiçõessociaisincidentessobreareceita,mastão-somentequeasreceitasdeexportaçãoestariamimunesàscontribuiçõessociais.Eisomens legis danorma,ouseja,impe-dirqueasreceitasdeexportaçãosejamtributadaspelascontribuiçõessociais.

Por fim, cumpre frisar que desenvolvemos no item dedicado às contribuições sociais a tesedequeanormamatrizdetodasascontribuiçõessociais,semexceção,éoartigo149.Por-tanto, suas prescrições abrangem todas as contribuições que financiam a ordem social. Obvia-mentequealgumasprescriçõesaplicam-seaalgumascontribuiçõessociaisenãoaoutras,comoéocasodaimunidadedereceitadecorrentedeexportação,quesomenteabarcaascontribuiçõessociaisquepossamviratributarasreceitasdeexportação.

Transcrevemos,aseguir,oentendimentodedoisDesembargadoresFederaisdoTri-bunal Regional Federal da 3.ª Região sobre a imunidade em tela, manifestado em decisõessingulares:

[...]comoolucroéoresultadodadiferençaentrereceitasedespesas,aexclu-sãodaincidênciadascontribuiçõessociaissobreasreceitasdecorrentesdeex-portaçãotambémgeraasuaexclusãoemrelaçãoaolucro.ExcluiraCSLdestebenefícioproporcionariatributaçãoindiretadeumaespéciedecontribuiçãosocialsobreumapartedasreceitasdecorrentesdeexportação,violandoodis-postonoart.149,§2.º,I,daCF.

Portanto,olucrodecorrentedasoperaçõesdeexportaçãonãosofreráainci-dênciadaCSLapós11/12/2001,dataqueentrouemvigoraECn.º33/2001[...]

(Despacho da Desembargadora Federal Consuelo Yoshida no Agravo n.º2004.03.00.000349-1,em4.2.2004.)

Page 95: Fernanda Ramos Pazello

87

[...]Emboraumainterpretaçãoliteralleveàconclusãodequeaexpressão“re-ceitas”constantenoincisoI,do§2.º,doartigo149,daConstituiçãoFederal,refira-se exclusivamente à alínea b,doincisoI,doartigo195dareferidaCarta;ouseja,limitaaimunidadeàscontribuiçõessociaisinstituídassobreareceitaou o faturamento da pessoa jurídica, especificamente no tocante à Cofins e ao PIS, entendo,queopreceito imunizador,objetivana realidadeabrangerosresultadospecuniáriosdiretamenteligadosàsoperaçõesdeexportação,sendoestaarealvontadedoconstituintecomaexpressãoreceitas.

Destarte,osconceitosdereceitaelucroestãoestritamenterelacionados,umavezqueolucroéauferidodeumareceita[...].

(Despacho do Juiz Federal Convocado Manoel Álvares no Agravo n.º2004.03.00.000020-9,em14.4.2004.)

VejamquetaisaplicadoresdoDireitosevaleramdeumainterpretaçãosistemáticae

teleológicaparadelimitaraabrangênciadaimunidadeemanálise,concluindoqueestaseaplica

àCSL,umavezqueosconceitosdelucroereceitaestãorelacionadoseaintençãodolegislador

constituinteédesonerarasoperaçõesdeexportaçãodequalquerincidênciatributária.

Destaque-sequeoSTFmanifestou-sesobreoassunto,masapenasemumjuízoprovi-

sório.NojulgamentodaAçãoCautelar1.738-6/SP,oPlenodoSTF,sobarelatoriadoMinistro

CezarPeluso,atribuiuefeitosuspensivoaorecursoextraordináriointerpostopelocontribuinte,

porentenderque:

(i) abasedecálculodaCSLcompõe-sedeelementoeconômicohauridodiretamente

dasreceitasdeexportação;

(ii) opreceitodaimunidadetendeaexcluirtodareceitadecorrentedeexportaçãoàin-

cidênciadequaisquercontribuiçõessociaisedaCide,nãodevendosepredestinar

apenasparaascontribuiçõesincidentessobreareceita;e

(iii)aracionalidadedaEC33/2001,relacionadaàpolíticadedesoneraçõestributárias

das exportações, em razão do princípio da neutralidade fiscal internacional, con-

firma o incondicional objetivo da norma de imunidade de não tributar as receitas

deexportaçãopelaCSL.

Taisassertivascoadunam-secomasidéiasqueestamosnosesforçandoemdefendere

queculminamcomaaplicaçãodaimunidadedoartigo149paraaCSL.

Page 96: Fernanda Ramos Pazello

88

5.1.2 Imunidade aplicável à extinta CPMF

ACPMFtemcomofundamentodevalidadeoartigo74doADCT,queautorizouaUniãoFederala instituircontribuiçãoprovisóriasobremovimentaçãoou transmissãodevalores e de créditos e direitos de natureza financeira. Referido artigo foi acrescentado pela Emenda Constitucional 12, de 15.8.1996 (“EC 12/96”), que, ainda, determinou que (i) oproduto da arrecadação seria destinado ao Fundo Nacional da Saúde, para financiamento das ações e serviços da saúde; e (ii) tal contribuição não poderia ser cobrada por prazo superior adoisanos.

ACPMFfoidisciplinadapelaLei9.311,de1996e,posteriormente,prorrogadapelaLei9.539,de12.12.1997atéjaneirode1999.202Oartigo1.ºdaLei9.311/96prescreveuqueofatogeradordaCPMFéamovimentaçãooutransmissãodevaloresedecréditosdenaturezafinanceira e lançamentos de débitos ou créditos em contas correntes, independentemente da

origemdoscréditos,nosseguintestermos:

[...]Art.1.ºÉ instituídaaContribuiçãoProvisória sobreMovimentaçãoouTransmissão deValores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira –CPMF.

Parágrafo único. Considera-se movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira qualquer operação liquidada ou lan-çamentorealizadopelasentidadesreferidasnoart.2.º,querepresentemcir-culaçãoescrituraloufísicademoeda,edequeresulteounãotransferênciadatitularidadedosmesmosvalores,créditosedireitos.[...]

Em18.3.1999,foipublicadaaEmendaConstitucional21(“EC21/99”),incluindoo

artigo75aoADCTpara(i)prorrogarreferidacontribuiçãopormais36meses;e(ii)destinar

partedoprodutodaarrecadaçãoaocusteiodaprevidênciasocial.Posteriormente,em12.6.2002,

foipublicadaaEmendaConstitucional37(“EC37/2002”),paraincluiroartigo84doADCT,

prorrogandonovamenteacobrançadaCPMFaté31.12.2004edestinandopartedoprodutoda

arrecadaçãoparaoFundodeCombateeErradicaçãodaPobreza.203 Por fim, em 19.12.2003, foi

�0� “Art.�.ºObservadasasdisposiçõesdaLein.º9.3��,de��deoutubrode�996,aContribuiçãoProvisóriasobreMovimentaçãoouTransmissãodeValoresedeCréditoseDireitosdeNaturezaFinanceira–CPMFincidirásobreosfatosgeradoresocorridosnoprazodevinteequatromeses,contadoapartirde�3dejaneirode�997.”

�03 “Art.8�.Acontribuiçãoprovisóriasobremovimentaçãooutransmissãodevaloresedecréditosedireitosdenaturezafinanceira,previstanosarts.7�,75e80,I,desteAtodasDisposiçõesConstitucionaisTransitórias,serácobradaaté3�dedezembrode�00�.

§�.ºFicaprorrogada,atéadatareferidanocaputdesteartigo,avigênciadaLein.º9.3��,de��deoutubrode�996,esuasalterações.

Page 97: Fernanda Ramos Pazello

89

publicadaaEC42/2003,prorrogandoacobrançadaCPMFaté31.12.2007,e,atualmente,não

hámaisaCPMF.

DemonstramosnoitemdedicadoàscontribuiçõessociaisqueaCPMFéumacontri-

buição social, na medida em que visa financiar a ordem social, mediante os recursos destinados

à saúde, à previdência social e à assistência social. Além disso, defendemos no item acima que

aimunidadeconcedidapeloartigo149,§2.º,I,daCF/88nãoserestringeàreceitaenquanto

fatogerador,masdizrespeitoàreceitacomosituaçãoeconômica,quepodeestarpresenteem

maisdeumfatogeradortributário.

AhipótesedeincidênciadaCPMFéaoperaçãobancáriaquedisponibiliza,emmoeda

nacional,areceitadeexportaçãoauferidapelaempresabrasileira.Apósarealizaçãoefetivada

exportação,cabeàempresaimportadoradisponibilizarovalordatransaçãoparaquesejareme-

tido a uma instituição financeira brasileira designada pela empresa brasileira.

Referidainstituiçãodisponibilizaráemreaisareceitadecorrentedaexportaçãopara

aempresabrasileira,medianteacelebraçãodeumContratodeCâmbio(“CC”).Valeressaltar

queocontratodecâmbioéindispensávelparaaentradaefetivadareceitadeexportaçãono

patrimôniodaempresabrasileira,tendoemvistaaprevisãodoDecreto857,de11.9.1969(“De-

creto857/69”),quevedaacirculaçãodemoedaestrangeiranoPaís.204Atítuloilustrativo,vale

aanálisedoesquemaaseguir:

§�.ºDoprodutodaarrecadaçãodacontribuiçãosocialdequetrataesteartigoserádestinadaaparcelacorres-pondenteàalíquotade:

I–vintecentésimosporcentoaoFundoNacionaldeSaúde,parafinanciamentodasaçõeseserviçosdesaúde;

II–dezcentésimosporcentoaocusteiodaprevidênciasocial;

III–oitocentésimosporcentoaoFundodeCombateeErradicaçãodaPobreza,dequetratamosarts.80e8�desteAtodasDisposiçõesConstitucionaisTransitórias.

§3.ºAalíquotadacontribuiçãodequetrataesteartigoseráde:

I–trintaeoitocentésimosporcento,nosexercíciosfinanceirosde�00�e�003;

II–oitocentésimosporcento,noexercíciofinanceirode�00�,quandoseráintegralmentedestinadaaoFundodeCombateeErradicaçãodaPobreza,dequetratamosarts.80e8�desteAtodasDisposiçõesConstitucio-naisTransitórias.”

�0� “[...]Art.�.ºSãonulosdeplenodireitooscontratos,títulosequaisquerdocumentos,bemcomoasobrigaçõesque,exeqüíveisnoBrasil,estipulempagamentoemouro,emmoedaestrangeira,ou,poralgumaforma,res-trinjamourecusem,nosseusefeitos,ocursolegaldocruzeiro.[...].”

Page 98: Fernanda Ramos Pazello

90

Brasil Exterior

Momento 3: remessa da receita de

exportação para o Brasil

Momento 4: celebração do Momento 2: remessa do valor da

Contrato de Câmbio (“CC”). transação

Disponibilidade do valor da transação em reais

R$ US$

Momento 1: exportação das mercadorias

Instituição financeira

autorizada

Empresa exportadoraEmpresa importadora

Instituição financeira da

importadora

ApósacelebraçãodoContratodeCâmbio(momento4),osvaloresdecorrentesda

exportaçãosãodisponibilizadosemreaisparaaempresabrasileiraemumacontaexporta-

dora,e,paraqueaempresabrasileirapossautilizaressesvalores,deve,necessariamente,

promover sua movimentação ativa financeira, ocasião na qual tais valores sofrem a inci-

dênciadaCPMF.

Verifica-se, portanto, que a movimentação ativa financeira (base de cálculo da CPMF)

decorrenecessariamentedapercepçãodeumareceita. SeaCPMFestásendorecolhidasobre

amovimentaçãodevaloresqueingressaramnacontabancáriadocontribuinteporintermédio

daoperaçãodeexportação,oqueestásendotributadoéaprópriareceitadeexportação,oque

évedadoporcontadaimunidadedoartigo149.

Assim, qualquer benefício fiscal concedido à receita alcança, inevitavelmente, a inci-

dência tributária prevista sobre a movimentação financeira, motivo pelo qual é evidente que a

imunidadeconcedidapeloartigo149,§2.º,I,daCF/88tambémseaplicaàCPMF.

Page 99: Fernanda Ramos Pazello

9�

RodrigodeSalazareFernandes,205emartigointituladoACPMFeaimunidadedasreceitasdeexportaçãoemrelaçãoàincidênciadascontribuiçõessociais,ressaltaquearatio essendi daimunidadeemquestãoéclara:anão-incidênciadascontribuiçõessociaissobreasreceitasauferidascomoperaçõesdeexportaçãoestimularáoexportadoradesenvolverseusne-gócios dirigidos ao mercado externo, estimulando a exportação, que é a finalidade da norma.

Aliás,muitooportunomencionarmosa tesedesenvolvidaporesteautor206 sobreahipótesedeincidênciadaCPMF,combasenoentendimentodoMinistroIlmarGalvãonoin-cidentedeinconstitucionalidadedaEC37/2002.207SegundooMinistroIlmarGalvão,aCPMFofendeoprincípiodacapacidadecontributiva,umavezqueoqueefetivamenteétributadoporestetributoéopatrimôniodocontribuinte,ouseja,oqueocontribuinteestámovimentandofinanceiramente em sua conta bancária. Isso porque a simples movimentação bancária de va-lores não exprime com fidelidade a real situação econômica do contribuinte e, portanto, não representaumfatoeconômico.

Emrazãodesteentendimento,oautorconclui,compropriedade,queamovimentaçãofinanceira de valores e créditos é apenas um elemento da hipótese de incidência da CPMF, sendoasuabasedecálculoopatrimôniodocontribuinte.Ora,seaCPMFestásendorecolhidasobreamovimentaçãodevaloresqueingressaramnacontabancáriadocontribuinteporinter-médiodeoperaçõesdeexportação,restaevidentequeoqueestásendotributadoéaprópriareceitadeexportação.

Portanto,oargumentodoFiscoFederaledealgunsaplicadoresdoDireitonosentidode que a imunidade do artigo 149 somente se aplica à Cofins e ao PIS por se tratar das únicas contribuiçõesquetêmcomofatogeradorareceitanãoencontranenhumrespaldoaoanalisar-mosdetidamenteaCPMF.

A CPMF, da mesma forma que o PIS e da Cofins, também incide diretamente sobre asreceitasdeexportação,vistoque,emdiversashipóteses,aosetributaramovimentaçãoban-cária,estão-setributandoosvaloresrecebidosatítulodereceitadeexportação.Comefeito,éevidentequetalcontribuiçãosocialéalcançadadamesmaformapelaimunidadeprevistanoartigo149,§2.º,I,daConstituiçãoFederal,umavezqueoseufatogerador–amovimentaçãode recursos financeiros – identifica-se com a situação econômica da receita.

�05 ACPMFeaimunidadedasreceitasdeexportaçãoemrelaçãoàincidênciadascontribuiçõessociais. Revista de Estudos Tributários,n.39,p.��0,set.-out.�00�.

�06 Ibidem,p.���-���.�07 ADIn�.666-6,DistritoFederal.ÍntegracontidanoRepositóriodeJurisprudênciadaRDDT89/�6�-�67,DJU

6.��.�00�.

Page 100: Fernanda Ramos Pazello

9�

APrimeiraSeçãodoTribunalRegionalFederalda4.ªRegião208reconheceuqueaimu-nidadedoartigo149aplica-seàCPMFquandoosvaloresforemauferidosemrazãodavendadamoedaestrangeirapeloexportadoraoBancoautorizadoe levadaacréditoemsuacontacorrente,bemcomonashipótesesdeadiantamentoe liquidaçãodocontratodecâmbiopeloexportador,nosseguintestermos:

[...]Todavia,entendohaverumaparticularidadenotocanteaosvaloresqueingressamnoPaís,decorrentesdaexportaçãofeitapelaparteimpetrante.Comefeito,paraqueoimportadorpaguepelamercadoriaquelheéexpor-tada, faz-se necessária uma operação de câmbio para transformar a moedaestrangeiraemnacional.Naprática,éumacomprademoedaestrangeiraquesópodeserfeitaporentidadesbancáriaspreviamenteautorizadaspeloBancoCentral do Brasil, que atuam nesta área do mercado financeiro.Aquantiacorrespondente,emreais,damoedaestrangeiravendidapeloexpor-tador ao Banco e levada a crédito em sua conta corrente representa, sem dúvi-da,ovalordareceitaauferidanaexportaçãoe,portanto,imuneàincidênciadoCPMF.Frise-sequesomenteesseprimeirolançamentodecréditoéalbergadopelaimunidade.Jáossaquesposterioresquevenhamaserrealizadosestãoordinariamentesujeitosàcontribuiçãodebatidanosautos.[...]Omesmotratamentodeveserdadoaosvalorescreditadosnacontacorrentedoexportador, recebidospor forçadocontratodeadiantamentodecâmbio(financiamento de exportação) firmado com o Banco, o qual adquire toda a moedaestrangeiracorrespondenteaovalordamercadoria,aindanãoembar-cadaparaopaísdedestino.Nessecasoénecessárioressaltarquesomenteesseprimeirolançamentodecréditoemcontacorrenteéamparadopelaimunida-de.Jáamovimentaçãoposteriorquevenhaaserfeitaestásujeitaàincidênciadaexaçãoquestionadanestefeito.Noutroponto,aliquidaçãodocontratodeadiantamentodecâmbio,peloex-portadoraoBanco,sedáquandolheéfeitaaremessadovalordasmercadoriasvendidasaoimportador.Ainstituiçãodecréditopromoveatransformaçãodamoedaestrangeiraemreais,utilizandoessesrecursosnasatisfaçãodosaldodevedordocontratodeadiantamentodecâmbio.Esselançamentodecréditona conta gráfica do contrato de adiantamento de câmbio, liquidando o saldo devedor,porsetratarderecursooriundodereceitaauferidanaexportação,éimuneàCPMF.[...].

Nãoobstanteisso,comopodemosdarefetividadeàimunidadeemquestãocomrela-çãoàCPMF?Arespostaatalindagaçãoéaseguinte:ocontribuintedeveefetuaraaberturadeumacontabancária,emseparadoedestacadadasdemais,destinadaexclusivamenteaodepó-sitodevaloresauferidosemrazãodassuasoperaçõesdeexportação.Portanto,somenteserãodepositadososrecursosdaempresaprovenientesdeexportaçãoe,porisso,asmovimentaçõesdosvaloresalidepositadosdizemrespeitoexatamenteàstransaçõesbancáriasdereceitasdeexportação.

�08 EmbargosInfringentesemApelaçãoCível�00�.7�.0�.006�63-�/SC,RelatorparaAcórdãoDesembargadorFederalDirceudeAlmeidaSoares,DJ7.��.�006.

Page 101: Fernanda Ramos Pazello

93

5.1.3 Imunidade aplicável à variação cambial ativa decorrente de receita de exportação

Avariaçãocambialconsistenadiferençaentreareceitajácontabilizadacombasenoregimedecompetênciaeareceitaefetivamenteauferida.Estadiferençasurgeemfacedocâm-bio flutuante adotado no Brasil, ou seja, em razão da desvalorização ou valorização da moeda nacional.Nocasodedesvalorização,teremosvariaçãocambialativa.Nocasodevalorização,teremosvariaçãocambialpassiva.

Avariaçãocambialdecorrentedereceitadeexportaçãonadamaisédoqueadiferençaregistradapelacontabilidadeentreareceitajácontabilizadaeareceitaefetivamenteauferida,ocasiãonaqualteremosreceitaoudespesacambialdeexportação.DaíporqueJoelGonçalvesdeLimaJunior,209aoanalisarotema,concluiuqueasvariaçõescambiais(receitasoudespesas)decorrentesdeoperaçõesdeexportaçãonãopassamdeajustecontábildasreceitasdeexporta-ção,paraqueacontabilidadepossaretratararealidade.Querealidade?Adequeovalorconta-bilizadonadatadaexportaçãonãoéovalorefetivamenterecebidopeloexportador,emrazãodadesvalorizaçãoouvalorizaçãodamoeda.

NoentenderdoFiscoFederal,adiferençapositivaauferidaemrazãoda receitadeexportação, ou seja, a receita cambial de exportação não está abrangida pela imunidade doartigo 149, pois tal receita tem a natureza de receita financeira, nos termos do artigo 9.º da Lei 9.718/98,queassimdispõe:

[...]Asvariaçõesmonetáriasdosdireitosdecréditoedasobrigaçõesdocon-tribuinte, em função da taxa de câmbio ou de índices ou coeficientes aplicá-veis por disposição legal ou contratual serão consideradas, para efeitos dalegislaçãodoimpostoderenda,dacontribuiçãosocialsobreolucrolíquido,da contribuição PIS/Pasep e da Cofins, como receitas ou despesas financeiras, conformeocaso.[...].

Ouseja,osvaloresdecorrentesdaoscilaçãodamoedaestrangeiraentreadatadoem-barqueeadatadopagamentonoscontratosinternacionaisdevendademercadoriaouprestaçãode serviços devem ser entendidos como “variação cambial ativa” e, portanto, receitas financei-ras tributáveis, em sua óptica, pelas contribuições sociais, no caso, PIS, Cofins, CSL e CPMF.210Nessesentido,cumpreenfatizarqueaPortariadoMinistériodaFazenda356,de1998,emseuincisoIII,informaqueasdiferençasadvindasdealteraçãodataxadecâmbio,ocorridasentre

�09 JoelGonçalvesdeLimaJunior.IlegitimidadedoPISedaCofinssobreasvariaçõescambiaisdecorrentesdeexportação.Revista Dialética de Direito Tributário,n.��3,p.�9,dez.�005.

��0 Éimportantedestacarque,desdeagostode�00�,asreceitasfinanceiras,emboratributáveispeloPISepelaCofinsàalíquotade�,65%e7,6%,nostermosdasLeis0.637/�00�e�0.833/�003,estãomomentaneamentesujeitasàalíquotazero,nostermosdoDecreto5.�6�,de30.7.�00�.Lembramos,noentanto,que,se,aqual-quermomento,oreferidodecretoforrevogado,avigênciadasalíquotasretornaráautomaticamente.

Page 102: Fernanda Ramos Pazello

9�

adatadofechamentodocontratodecâmbioeadatadoembarque,serãoconsideradascomovariaçõescambiaispassivasouativas.

Ora,osvaloresapuradosemdecorrênciadaoscilaçãoentreadatadoembarqueeadatadopagamentodoscontratosinternacionaisdeexportaçãodemercadoriasouserviços,narealidade,possuemnaturezadereceitadeexportaçãoenãodereceitaoriginadadeinvestimen-tofeitoemmoedaestrangeira.Poressemotivo,éinconstitucionalatributaçãodetaisvalorespelascontribuiçõessociais.Senão,vejamos.

Deinício,cumprenotarqueasexportaçõesbrasileirasdemercadoriasestãosujeitasàcontrataçãodecâmbio,oquepressupõeaexistênciadeumacontrataçãodareferidaoperaçãoemmoedaestrangeira.Ademais,asoperaçõesdecâmbioreferentesàsexportaçõespodemsercelebradaspréviaouposteriormenteàefetivaexportação.

Portanto,aodesenvolverasuaatividadeexportadora,asempresasexportadorasbrasilei-rascelebramacontrataçãodocâmbioantesouapósaexportação.Noentanto,emambososcasos,areceitadecorrentedessasexportaçõesésempreumasó,ouseja,éopreço(valor)contratadocomoimportadorestrangeiro(compradordesuasmercadoriasoutomadordosserviços).

A verificação de uma “variação cambial ativa” entre a data do embarque da mercadoria aoexteriorouprestaçãodoserviçoeadatadaefetivaçãodocâmbiorelativoàexportação211nãotemocondãodetransformaroqueéoprodutodoadimplementodaoperaçãodeexportaçãoemalgodiversode“receitadaexportaçãorealizada”(ou,aomenos,receitadela“decorrente”).

É evidente que a diferença verificada entre a data da exportação e a data do recebimen-totemanaturezadereceitadeexportação.Entendimentocontrárioofendeoartigo110doCTN,que impede a lei tributária de alterar a definição, o sentido e o alcance de institutos, conceitos e formasdeDireitoPrivado.Nocaso,oFiscoFederal,aopretendertratarreceitadeexportaçãocomo receita financeira por se cuidar de variação cambial ativa está alterando a definição, o

��� A Portaria 356, de 5.��.�988, do Ministério da Fazenda (“Portaria MF 356/88”), definiu meramente paracontroledofluxodemoedaestrangeiranabalançacomercial,ocritériodeconversãodemoedaestrangeiraparaefeitoderegistrodareceitabrutadevendasnasexportaçõesdeprodutosmanufaturadosnacionais,nosseguintestermos:

“[...]I–Areceitabrutadevendasnasexportaçõesdeprodutosmanufaturadosnacionaisserádeterminadapelaconversão,emcruzados,deseuvalorexpressoemmoedaestrangeiraàtaxadecâmbiofixadanoboletimdeaberturapeloBancoCentraldoBrasil,paracompra,emvigornadatadeembarquedosprodutosparaoexterior.

[...]

II–Asdiferençasdecorrentesdealteraçãonataxadecâmbio,ocorridasentreadatadofechamentodocontratodecâmbioeadatadoembarque,serãoconsideradascomovariaçõesmonetáriaspassivasouativas.[...]”.

Page 103: Fernanda Ramos Pazello

95

conteúdo e o alcance daquilo que o Direito Privado sempre considerou como receita de expor-tação,oumelhor,preçorelativoaumacompraevendainternacionalouprestaçãodeserviçointernacionalperfeitoeacabado.

JoelGonçalvesdeLimaJuniorbemlembrouqueaoperaçãodeexportaçãodemerca-doriaouserviçoéofatordeterminanteparaquesurjaareceitacambialativae,poressemotivo,é o que define a natureza jurídica destas receitas. Por outro lado, a oscilação do câmbio é um evento aleatório e que é irrelevante para definir a natureza jurídica das receitas cambiais, uma vezqueaoscilaçãodocâmbionãodariacausaàvariaçãocambialativasenãotivesseocorridoaoperaçãodeexportação.Assim,esteautorconclui:

[...]ofatodeoregistrocontábilretrataressesvalorescomoreceitascambiaisnãodeterminaanaturezajurídicadessasreceitas.Taisvalorestêmnaturezajurídicadereceitasdeexportação,porquantoseoriginametêmsuacausanasoperaçõesdevendasaoexterior,jáqueaexportaçãoéofatojurídicoquelhedeucausa.ComoponderaMarcoAurélioGreco,“nãoéamaneirapelaqualvier a ser contabilizada determinada figura que irá determinar sua natureza jurídica para fins de incidência” [...].212

Oexportador,aoefetuaratransferênciadapropriedadedamercadorianomomentodaexportaçãoouprestaroserviço,torna-secredoremrelaçãoaopreçoacordado.Portanto,aquantidadededólaresrelativaàoperaçãodeexportaçãodeveseramesmaquantidadededóla-resrecebidanadatadaliquidação,convertidaemreais.Diantedisso,areceitaapuradaentreadatadaexportaçãoeadatadaliquidaçãodevesertratadacomoreceitaoriginadadeexportação,umavezqueédecorrênciadiretaeexclusivadaexportaçãoefetuada.

A diferença verificada entre a receita contabilizada e a receita auferida passa de mero reflexo de flutuações na taxa de câmbio, mantido o valor da contratação, que é adimplido em dólaresnorte-americanos,possibilitandoaocredordaobrigaçãogeradaorecebimentodopre-çoanteriormenteajustado,semprejuízoquantoaumaeventualperdadepoderaquisitivodamoedanacional.Assim,éevidentequetalvaloréreceitabrutadecorrentedaexportaçãodeprodutosouserviçosnacionais.

Portanto,restaevidentequeomontanterecebidopelaempresabrasileiraemreaisnoBrasil–e independentementedadatadoembarquedarespectivamercadoriaaoexterior,dadatadaprestaçãodoserviço,dadatadaefetivaçãodocâmbiooumesmodataxa(decâmbio)aplicada–nadamaisédoqueopreçoacordadocomoimportadorestrangeiroparaumaope-raçãodeexportaçãodemercadoriaouserviço.Talvalorhádesertratadocomopreço recebido

��� JoelGonçalvesdeLimaJunior.IlegitimidadedoPISedaCofins...,cit.,p.50.

Page 104: Fernanda Ramos Pazello

96

pelaempresabrasileiraemdecorrênciaclaradereceita(puramente)decorrente de suas expor-tações.

Alémdisso,háoutromotivo.Essareceitapodeserconsideradaumacessóriodocon-tratodeexportaçãoe,comotal,tambémsujeitaàimunidadeestabelecidanaCF.Nessesentido,dispõeoartigo92doCódigoCivil:213“[...]Art.92.Principaléobemqueexistesobresi,abs-trataouconcretamente;acessório,aquelecujaexistênciasupõeadoprincipal.[...]”.

Oraciocínioseriaoseguinte:seovalorprincipaléimune,eventualvaloracessóriotambémoserá,deacordocomopróprioCódigoCivileoentendimentomanifestadopeloPa-recerNormativodaCoordenadoriadoSistemadeTributação(“CST”)21,de20.4.1979,queassimprescreve:

[...]1.Quandoempresasrealizamvendasparapagamentoaprazo,empresta-ção única ou em série de prestações, ocorre muitas vezes a cobrança, além do preço da mercadoria, de acréscimos a título de custos financeiros. Empresas varejistas têm manifestado dúvida no tratamento que deve ser dado ao custo do financiamento; se complemento do preço de venda, se receita financeira.2.ALein.6.463/77determinaquedafaturadevendaconstem,separadamen-te, o valor da mercadoria e o custo do financiamento, que compõem o valor total da operação. O custo do financiamento corresponde a todos os valores acima do principal a ser financiado, pagos pelo comprador em decorrência do financiamento concedido (Portaria MF n. 75/78), e pode compreender juros, correçãomonetária, impostos,gastoscompublicidadeecomadministraçãode crediário, bemcomooutros custosdeoperaçãodevendacarregados aocomprador(Resoluçãon.102,de17/04/79,doConselhoInterministerialdePreços, publicada no Diário Oficial de 18104/79).3.Quandoumaempresacomercialouindustrialrealizavendaaprazo,comacréscimoatítulodejurosououtrosencargos,nãoestárealizandooperaçãofinanceira ativa: estas são privativas das instituições financeiras autorizadas a funcionarpeloBancoCentraldoBrasil(Leisns.4.595/64e4.728/65).Antes,talacréscimointegraovalordaoperaçãodevenda,pornaturezaeporexpres-sa definição legal.4. Assim sendo, o montante do custo do financiamento, como acima definido, devereceberomesmotratamentocontábilqueovalordamercadoriaaquecorresponda,qualseja,aestritaaplicaçãodoregimedecompetência.Assimprocedendo,ointeirovalordaoperação(valordamercadoriamaiscustodofinanciamento) integrará a receita bruta – e portanto comporá o lucro líquido –doexercícioemquesederavenda.[...]

Notocanteaoartigo9.ºdaLei9.718/98,queprescrevequeasvariaçõescambiaisse-rão consideradas receitas ou despesas financeiras para fins de incidência do Imposto de Renda, da CSL, do PIS e da Cofins, entendemos que (i) referido dispositivo legal não pode ser inter-

��3 InstituídopelaLei�0.�06,de�0.�.�00�.

Page 105: Fernanda Ramos Pazello

97

pretadodeformaaexcluirourestringiroalcancedaimunidadedoartigo149;e(ii)seassimfosse,estaríamosfazendoletramortadaimunidadedoartigo149,vistoqueseestariadandoliberdade à lei ordinária para criar presunções ou ficções jurídicas (equiparar receita cambial de exportação à receita financeira).

Umasingelaanálisedotextoconstitucionalnãodámargemàinterpretaçãodiversa:“Artigo149.[...]§2.ºAscontribuiçõessociais[...]dequetrataocaputdesteartigo:I–nãoin-cidirãosobreasreceitasdecorrentesdeexportação”.SegundoodicionárioAurélio,“decorrer”equivalea“originar-se,derivar-se”.Assim,éclaroeevidentequequalquerreceita–mesmoquedenominada“variaçãocambialativa”dosdireitoscreditóriosdessaexportação–quetenhaasuaorigemnaprópriaexportaçãoéimuneàexigênciadascontribuiçõessociais.

Portanto, considerando que o objetivo da EC 33/2001 é, sem dúvida, a desoneração ampladasexportações,demodoaconferirmaiorcompetitividadeaosprodutoseserviçosna-cionais,aimunidadeabrangetodoovalordecorrentedaexportação,oquedemonstraaimpro-priedadedatesedefendidapeloFiscoFederal.

Em suma, a chamada “variação cambial ativa” não passa de mero reflexo do valor do real perante a moeda estrangeira em razão de flutuações ocorridas na taxa de câmbio. Assim, uma eventual verificação de “variação cambial ativa” não constitui uma nova receita de nature-za financeira, mas, sim, é parte integrante da própria receita decorrente da exportação.

EsseéoentendimentodeJoséAntonioMinatel,in verbis:

[...] Com essa configuração, estando expresso que a regra de imunidade impe-deaincidênciadecontribuiçõessobre“asreceitasdecorrentesdeexportação”,é fora de dúvida que o evento qualificado constitucionalmente abrange todo oingresso(receita)remuneradordonegóciojurídicodaoperaçãodeexporta-ção,inclusiveasdenominadasvariaçõescambiaisativasresultantesdecrité-riosdeconversãodamoedaestrangeiraemmoedanacional,sendoirrelevantehaver,emrelaçãoaoembarquedosprodutos,prévioouposteriorfechamentode contrato de câmbio. Neste sentido, para quantificação da receita de expor-tação, imune às contribuições, é relevante o momento do ingresso financeiro provenientedaexportaçãoenãoomomentodoembarquedosprodutos,sen-do imprestáveis,para tanto,as regras traçadaspelaadministração tributáriaquevisamaoreconhecimentodoresultadodessasoperações,poistomamomomento do embarque como termo final para valorar a receita contratada na operação, com a específica finalidade de apurar o resultado mediante con-traposiçãodoscustosincorridosatéaquelemomento.Melhorexplicando,asregras do imposto sobre a renda que definem o momento para aferição da

Page 106: Fernanda Ramos Pazello

98

receitadeexportaçãonãoservemparaavaliaçãodomomentoemqueareceitaéauferida,paraefeitodaimunidadedascontribuições.[...].214

Diante de todo o exposto, conclui-se que a diferença positiva verificada entre a receita contabilizadaeareceitaauferidaemrazãodeumaoperaçãodeexportaçãonão devesertribu-tada pelas contribuições sociais, no caso PIS, Cofins, CSL e CPMF, por se tratar de receita de exportação ou mero reflexo da receita de exportação (acessório segue o principal), nos termos doartigo149,§2.º,incisoI,daCF/88(comaredaçãodadapelaEC33/2001).215-216

��� JoséAntonioMinatel.Conteúdo do conceito...,cit.,p.�50.��5 AntesdaEC33/�00�,taisvaloresdeveriamserconsideradoscomoreceitasisentasdoPISedaCofins,com

basenosartigos5.ºdaLei7.7��/88,7.ºdaLC70/9�e��daMP�.�58-35/�00�.��6 Porfim,valetranscreverimportanteAcórdão,prolatadopeloTribunalRegionalFederalda�.ªRegião,reco-

nhecendoqueosvaloresrelativosàsdenominadas“variaçõescambiaisativas”provenientesdereceitadeex-portaçãonãodevemsertributadospeloPISepelaCofins,tendoemvistaaimunidadeprevistaparaasreceitasdecorrentesdeexportação:

“[...]

Ementa

Receitasfinanceirasprovenientesdeexportação.Pis/Cofins.Isenção.Imunidade.

AisençãodoPISedaCofinsdasreceitasprodutosdeexportaçãofoialçadaàimunidadeconstitucionalpeloart.��9,§�.º,I,nãohavendonesteouemqualquerdispositivoinfraconstitucionalrestriçãoaquaisreceitasnãosãoabarcadaspelasnormas.Destaforma,mesmoquereceitasfinanceiras,seprovenientesdevariaçãocambialdeprodutodeexportação,nãopodemsofrerastributaçõesemcomento.

[...]

Voto

Aimpetranteeempresaatuantenomercadodeengenharia,manufaturaevendasdemotoresesistemasautomo-tivosparaveículoslevesepesados,sendograndepartedesuaproduçãoobjetodeexportação.ConsiderandoaregraisentivadePISeCofinsdasreceitasdeexportação,pretendeexcluirdabasedecálculodetaisexaçõesasreceitasfinanceirasdecorrentesdevariaçãocambialdosvaloresaserempercebidosnestasoperações.

RelativamenteaoPIS,asreceitasdecorrentesdeexportaçãoforamexcluídasdesuabasedecálculopeloart.�.ºdaLei9.00�/95,determinaçãomantidaquandodapromulgaçãodaLei9.7�5/98.NoquetangeàCofins,aisençãofoiprevistanapróprianormaqueainstituiu,qualsejaoart.7.ºdaLC70/9�,oquefoigarantidocomaediçãodaMP�.858/99,quetratoutambémdoPIS:

“Art.��.Emrelaçãoaosfatosgeradoresocorridosapartirde�.ºdefevereirode�999,sãoisentasdaCofinsasreceitas:

[...]

II–daexportaçãodemercadoriasparaoexterior.

[...]

§�.ºSãoisentasdacontribuiçãoparaoPIS/PasepasreceitasreferidasnosincisosIaIXdocaput. [...]”.

AtravésdaEC33/�00�,aisençãojáprevistaemnormasinfralegaisfoialçadaàimunidadeconstitucional,introduzidanoSistemaTributárioNacionalpeloart.��9,§�.º,I,daCRFB/88.Dispõeamatrizjurídicacons-titucional:

“Art.��9.CompeteexclusivamenteàUniãoinstituircontribuiçõessociais,deintervençãonodomínioeconô-micoedeinteressedascategoriasprofissionaisoueconômicas,comoinstrumentodesuaatuaçãonasrespec-tivasáreas,observadoodispostonosarts.��6,III,e�50,IeIII,esemprejuízodoprevistonoart.�95,§6.º,relativamenteàscontribuiçõesaquealudeodispositivo.

[...]

§�.ºAscontribuiçõessociaisedeintervençãonodomínioeconômicodequetrataocaputdesteartigo:

I–nãoincidirãosobreasreceitasdecorrentesdeexportação;

[...]”.

Page 107: Fernanda Ramos Pazello

99

5.1.4 Vendas efetuadas à Zona Franca de Manaus

AZonaFrancadeManaus(“ZFM”)foiinstituídapelaLei3.173/57,posteriormentealteradapeloDecreto-lei288,de1.º.2.1967(“DL288/67”),comointuitodecriarnointeriordaAmazôniaumcentroindustrial,comercialeagropecuáriodotadodecondiçõeseconômicasquepermitamseudesenvolvimento,emfacedosfatoreslocaisedagrandedistânciaaqueseencontramoscentrosconsumidoresdeseusprodutos(artigo1.ºdoreferidodecreto).

Portanto,oobjetivodacriaçãodaZFMéfomentarodesenvolvimentoeconômicodaregião,medianteconcessãodeestímulosàsempresasindustriaisquealiseinstalem.Osestímu-losconsistemnareduçãooueliminaçãodegravamesdenaturezaaduaneiraoutributária.

A fim de incentivar as atividades nessa região, o legislador, por meio do artigo 4.º do DL288/67,previu,expressamente,queassaídasparaaZFMequiparar-se-ãoàsexportações,in verbis:

Art.4.ºAexportaçãodemercadoriasdeorigemnacionalparaconsumoouin-dustrializaçãonaZonaFrancadeManaus,oureexportaçãoparaoestrangeiro,será para todos os efeitos fiscais, constantes da legislação em vigor, equivalen-teaumaexportaçãobrasileiraparaoestrangeiro.

Comisso,asoperaçõespraticadascomasempresasestabelecidasnaZFMforamequi-paradasaexportações.AZFMfoirecepcionadapelaConstituiçãoFederalde1988,pormeiodoartigo40doAtodasDisposiçõesConstitucionaisTransitórias(“ADCT”),queassimdeterminou:

Naesteiradestepermissivo,foieditadaaMP�.�58-35/0�que,convertidanaLei�0.637/0�,nãodestoadetodasasleiscitadas.

Destaforma,nãorestaqualquerdúvidaacercadaimunidadeeisençãodasreceitasprodutosdeexportação,cabendo,nocasodosautos,estenderoalcancedestasnormasque,fortenoart.���,II,doCTN,devemserliteralmenteinterpretadas.

Tenhoque,emquepeseoart.9.ºdaLei9.7�8/98determinequeasvariaçõesmonetáriasserãoconsideradascomoreceitasoudespesasfinanceiras, talprevisãonãoabarcaaquelesvaloresobtidospeloscontribuintesemsededeoperaçãodeexportação,eisquehádisposiçãoconstitucionaleinfraconstitucionalexcluindotaisparcelasdatributaçãodoPISedaCofins.Esteoteordodispositivoemcomento:

“Art.9.ºAsvariaçõesmonetáriasdosdireitosdecréditoedasobrigaçõesdocontribuinte,emfunçãodataxadecâmbiooudeíndicesoucoeficientesaplicáveispordisposiçãolegaloucontratualserãoconsideradas,paraefeitosdalegislaçãodoimpostoderenda,dacontribuiçãosocialsobreolucrolíquido,dacontribuiçãoPIS/PasepedaCofins,comoreceitasoudespesasfinanceiras,conformeocaso”.

Tenhoquereceitasdeexportação,nalíteradosdispositivossupratranscritos,sãotodososvaloresresultantesdarealizaçãodavendademercadoriasparaoexterior,oquedeveabarcaraexpressãopecuniáriaemmoedanacionaldecorrentedaexportação,computando-senelaasvariaçõesdaídecorrentes,postoquetambéminte-grantesdestasreceitas.

A simples classificaçãodas “variaçõesmonetáriasdecorrentesdaexportação”como“receitasfinanceiras”nãotemocondãodeafastarregrasclarasdeimunidadeeisenção,porquenãopossuemqualquerrestrição.[...](ApelaçãoCívelemMandadodeSegurança�00�.7�.08.007706-8/RS,RelatoraDesembargadoraFederalMariaLúciaLuizLeiria,�.ªTurmadoTribunalRegionalFederalda�.ªRegião,DJ��.��.�00�).

Page 108: Fernanda Ramos Pazello

�00

Art.40.ÉmantidaaZonaFrancadeManaus,comsuascaracterísticasdeárealivre de comércio, de exportação e importação, e de incentivos fiscais, pelo prazodevinteecincoanos,apartirdapromulgaçãodaConstituição.Parágrafo único. Somente por lei federal podem ser modificados os critérios quedisciplinaramouvenhamadisciplinaraaprovaçãodosprojetosnaZonaFrancadeManaus.

RoqueCarrazza,217aointerpretarreferidodispositivoconstitucional,asseveraqueatéoanode2013(25anosapósoanode1988)estáasseguradaapreservaçãodetodaaestruturade incentivos, inclusive fiscais, em prol da ZFM.

As receitas de operações de exportação eram isentas do PIS e da Cofins com base nos artigos5.ºdaLei7.714/88e7.ºdaLC70/91,queassimprescreviam:

Art.5.ºParaefeitodecálculodacontribuiçãoparaProgramadeFormaçãodo Patrimônio do Servidor Público (PASEP) e para o Programa de Integração Social(PIS)dequetrataoDecreto-lein.º2.445,de29dejunhode1988,o valor da receita de exportação de produtos manufaturados nacionais poderá ser excluído da receita operacional bruta.[...]Art.7.ºÉaindaisentadacontribuiçãoavendademercadoriasouserviços,destinadosaoexterior,nascondiçõesestabelecidaspeloPoderExecutivo.

Noqueinteressaàpresentediscussão,(i)oartigo5.ºdaLei7.714/88foialteradopelaMedidaProvisória622,de22.9.1994,paraexcluirasvendasefetuadasàZFMdaisençãoemquestão;218e(ii)oartigo23,incisoII,alíneasbec,daMedidaProvisória1.858-6,de29.6.1999,revogouosartigos5.ºdaLei7.714/88e7.ºdaLC70/91apartirde30.6.1999.219

��7 Curso….,cit.,p.595.��8 “[...]Art.�.ºOart.5.ºdaLeinº7.7��,de�9dedezembrode�988,acrescidodos§§�.ºe�.º,passaavigorar

comaseguinteredação:

‘Art.5.ºParaefeitodedeterminaçãodabasedecálculodascontribuiçõesparaoProgramadeIntegraçãoSo-cial–PISeparaoProgramadeFormaçãodoPatrimôniodoServidorPúblico–PASEP,instituídaspelasLeisComplementaresn.º7,de7desetembrode�970,e8,de3dedezembrode�970,respectivamente,ovalordareceitadeexportaçãodemercadoriasnacionaispoderáserexcluídodareceitaoperacionalbruta’.

§�.ºSerãoconsideradasexportadas,paraefeitododispostonocaputdesteartigo,asmercadoriasvendidasaempresacomercialexportadora,dequetrataoart.�.ºdoDecreto-lein.º�.��8,de�9denovembrode�97�.

§�.ºAexclusãoprevistanesteartigonãoalcançaasvendasefetuadas:

a)aempresaestabelecidanaZonaFrancadeManaus,naAmazôniaOcidentalouemÁreadeLivreComércio;[...].”

��9 “[...]Art.�3.Ficamrevogados:

I–apartirde�8desetembrode�999,oincisoIIdoart.�.ºdaLein.º9.7�5,de�5denovembrode�998;

II–apartirde30dejunhode�999:

a)osincisosIeIIIdoart.6.ºdaLeiComplementarn.º70,de30dedezembrode�99�;

b)oart.7.ºdaLeiComplementarn.º70,de�99�,eaLeiComplementarn.º85,de�5defevereirode�996;

c)oart.5.ºdaLeinº7.7��,de�9dedezembrode�988,eaLein.º9.00�,de�6demarçode�995;[...].”

Page 109: Fernanda Ramos Pazello

�0�

Concomitantemente,areferidamedidaprovisóriafezpublicaroartigo14paraisentardo PIS e da Cofins, a partir dos fatos geradores de 1.º.2.1999, as receitas de exportação de mer-cadoriasparaoexterior,excluídasasreceitasdecorrentesdasvendasefetuadasaZFM.220NasalteraçõesdaMP,amençãoàZFMfoiretirada.

Éimportantenotarque,emdezembrode2004,foipublicadaaLei10.996quereduziua zero as alíquotas do PIS e da Cofins incidentes sobre as receitas de vendas de mercadorias destinadasaoconsumoouàindustrializaçãonaZFMporpessoajurídicaestabelecidaforadaZFM.221

AsvendasefetuadasaZFMsãoequiparadasàreceitadeexportação,nostermosdoartigo4.ºdoDL288/67.AjurisprudênciadoSTJreconhecequeasvendasrealizadasàZFMsãoigualadasàexportação.Vejamos:

��0 “[...]Art.��.Emrelaçãoaosfatosgeradoresocorridosapartirde�.ºdefevereirode�999,sãoisentasdaCO-FINSasreceitas:

I–dosrecursosrecebidosatítuloderepasse,oriundosdoOrçamentoGeraldaUnião,dosEstados,doDistritoFederaledosMunicípios,pelasempresaspúblicasesociedadesdeeconomiamista;

II–daexportaçãodemercadoriasparaoexterior;

III–dosserviçosprestadosapessoafísicaoujurídicaresidenteoudomiciliadanoexterior,cujopagamentorepresenteingressodedivisas;

IV–dofornecimentodemercadoriasouserviçosparausoouconsumodebordoemembarcaçõeseaeronavesemtráfegointernacional,quandoopagamentoforefetuadoemmoedaconversível;

V–dotransporteinternacionaldecargasoupassageiros;

VI–auferidaspelosestaleirosnavaisbrasileirosnasatividadesdeconstrução,conservaçãomodernização,conversão e reparode embarcaçõespré-registradasou registradasnoRegistroEspecialBrasileiro–REB,instituídopelaLein.º9.�3�,de8dejaneirode�997;

VII–defretedemercadoriastransportadasentreoPaíseoexteriorpelasembarcaçõesregistradasnoREB,dequetrataoart.��daLein.º9.�3�,de�997;

VIII–devendasrealizadaspeloprodutor-vendedoràsempresascomerciaisexportadorasnostermosdoDe-creto-lein.º�.��8,de�9denovembrode�97�,ealteraçõesposteriores,desdequedestinadasaofimespecí-ficodeexportaçãoparaoexterior;

IX–devendas,comfimespecíficodeexportaçãoparaoexterior,aempresasexportadorasregistradasnaSe-cretariadeComércioExteriordoMinistériodoDesenvolvimento,IndústriaeComércio;

X–relativasàsatividadesprópriasdasentidadesaqueserefereoart.�3.

§�.ºSãoisentasdacontribuiçãoparaoPIS/PASEPasreceitasreferidasnosincisosIaIXdocaput. §�.ºAsisençõesprevistasnocaputenoparágrafoanteriornãoalcançamasreceitasdevendasefetuadas:

I–aempresaestabelecidanaZonaFrancadeManaus,naAmazôniaOcidentalouemáreadelivrecomércio;

II–aempresaestabelecidaemzonadeprocessamentodeexportação;

III–aestabelecimentoindustrial,paraindustrializaçãodeprodutosdestinadosaexportação,aoamparodoart.3.ºdaLein.º8.�0�,de8dejaneirode�99�.[...].”

��� “[...]Art.�.ºFicamreduzidasa0(zero)asalíquotasdaContribuiçãoparaoPIS/PASEPedaContribuiçãoparaoFinanciamentodaSeguridadeSocial–COFINSincidentessobreasreceitasdevendasdemercadoriasdes-tinadasaoconsumoouàindustrializaçãonaZonaFrancadeManaus–ZFM,porpessoajurídicaestabelecidaforadaZFM.

§�.ºParaosefeitosdesteartigo,entendem-secomovendasdemercadoriasdeconsumonaZonaFrancadeManaus–ZFMasquetenhamcomodestinatáriaspessoasjurídicasqueasvenhamutilizardiretamenteouparacomercializaçãoporatacadoouavarejo.[...].”

Page 110: Fernanda Ramos Pazello

�0�

TRIBUTÁRIO–COFINS–ZONAFRANCADEMANAUS–ISENÇÃO–INTELIGÊNCIADOART.4.ºDODL288/67.O conteúdo do art. 4.º do Dec.-lei 288/67 foi o de atribuir às operações da ZonaFrancadeManaus,quantoa todosos tributosquediretaou indireta-menteatingemexportaçõesdemercadoriasnacionaisparaessaregião,regimeigualaoqueseaplicanoscasosdeexportaçõesbrasileirasparaoexterior.Aisenção da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – Cofins, concedidapelaLeiComplementarn.70/91àexportaçãodemercadorias,étambémaplicávelàsoperaçõesrelativasàZonaFrancadeManaus.Preceden-tes.Recursoespecialprovido(STJ,2.ªTurma,REsp144.785/SP,Rel.Min.PauloMedina,j.16.12.2002).TRIBUTÁRIO–ICM–ZONAFRANCADEMANAUS.Aexportaçãodemercadoriasdeorigemnacionalparaconsumoouindustriali-zação na Zona Franca de Manaus será para todos os efeitos fiscais, constantes dalegislaçãoemvigor,equivalenteaumaexportaçãobrasileiraparaoestran-geiro (DL 288/67, art. 4.º); verificado, no entanto, que, a despeito da desti-nação,asmercadoriasnãochegaramàZonaFrancadeManaus,aoperaçãoétributadasegundooregimecomum,aplicando-seamultaprópria.Recursoespecialnãoconhecido(STJ,2.ªTurma,REsp74.814/SP,Rel.Min.AriPar-gendler,j.4.8.1998,DJ24.8.1998).TRIBUTÁRIO–ICMS–ZONAFRANCADEMANAUS.Aexportaçãodemercadoriasdeorigemnacionalparaconsumoouindustria-lizaçãonaZonaFrancadeManaus,oureexportaçãoparaoestrangeiro,serápara todos os efeitos fiscais, constantes da legislação em vigor, equivalente a umaexportaçãobrasileiraparaoestrangeiro(Del.288/1967,art.4.º);poucoimporta se o destinatário seja o consumidor final, a lei não fez essa distinção. Recursoespecialnãoconhecido(STJ,2.ªTurma,REsp34.388/SP,Rel.Min.AriPargendler,j.30.10.1996,DJ19.5.1997).TRIBUTÁRIO–CONTRIBUIÇÃOEADICIONALDOIAA–DL308/67.1.Asmercadoriasque,saindodoterritórionacional,destinam-seàZonaFran-cadeManaus,têmtratamentotributárioidênticoaodadoàsmercadoriases-trangeiras.2.ODL288/67,aocriaraZonaFrancadeManaus,isentoudetodosostri-butosasmercadorias,estrangeirasounacionais,seutilizadasouconsumidasnaquelaárea.3.Isençãodecontribuiçãoimpugnada(precedentes).4.Recursoespecialimprovido(STJ,2.ªTurma,REsp193.172/PE,Rel.Min.ElianaCalmon,j.21.6.2001,DJ10.9.2001).

OSTF,nojulgamentodaADI2.348-9/DF,em7.12.2000,tambémanalisouestaques-tão.MerecedestaquetrechodovotodoilustreMinistroNelsonJobimquereforçaoargumentodequeavendademercadoriasaZFMdeveservistacomoumaexportaçãodemercadoriasdoBrasilparaoexterior:

[...]AZonaFrancadeManaus,porforçadoreferidoDecreto,étratadacomoárea estrangeira. Isto significa que as vendas ou remessas de mercadorias, sejaparaconsumo,sejaparareexportaçãoouindustrialização,enviadasparaa

Page 111: Fernanda Ramos Pazello

�03

ZonaFrancadeManaus,sãotratadas,repito,porforçadoDecreto-lein.º288,comoexportaçãoparaoexterior.Diz expressamente: “será para todos os efeitos fiscais, constantes da legis-laçãoemvigor,equivalenteaumaexportaçãobrasileiraparaoestrangeiro”.Ou seja, toda a venda de mercadorias do território nacional, por exemplo, mercadorias originárias de São Paulo destinadas à Zona Franca de Manaus, para consumo ou industrialização na Zona Franca, ou reexportação, são tratadas, pelo Decreto, para efeitos fiscais, como exportação brasileira para estrangeiro.[...].

Ora,seasvendasdemercadoriasàZFMsãoconsideradasexportações,nostermosdoDL288/67,éevidentequeaestasoperaçõesseaplicaaimunidadetributária,nostermosdoartigo149,caput e§2.º,incisoI,daCF/88,acrescentadopelaEC33/2001.

HáacórdãodoConselho de Contribuintesquereconhecequenãohánecessidadedelegislação específica para garantir a isenção do PIS e da Cofins para as mercadorias enviadas à ZFM,soboargumentodeque“[...]exigirdispositivoexpressoéconferirletramortanãosóaoDecreto-lein.º288/67eaosatosconstitucionais,queasseguramodesenvolvimentodaZonaFrancadeManaus,comoàdecisãodoSupremoTribunalFederal [...]” (Acórdão201-79.407,Rel.FabiolaCassianoKeramidas,da1.ªTurmadoSegundoConselho,data29.6.2006).Idênti-coentendimentoaplica-separaocasodaimunidade.

Portanto,aimunidadetributáriadoartigo149daCF/88aplica-seàsvendasefetuadasàZFMporseremequiparadasàexportação,sendoinconstitucionalqualquernormainfracons-titucional que pretenda exigir as contribuições sociais (PIS, Cofins, CSL e CPMF) sobre tais receitas.

5.2 O ISS e a exportação de serviços

5.2.1 Pressuposto constitucional

Oartigo156,incisoI,daCF/88outorgoucompetênciaaosMunicípioseaoDistritoFederalpara instituir impostosobreserviçosdequalquernatureza,nãocompreendidosnoartigo 155, inciso II, definidos em lei complementar. Portanto, (i) o ISS não pode incidir sobreaprestaçãodeserviçosdetransporteinterestadualeintermunicipalesobreosserviçosdecomunicação;e(ii)osserviçosaseremtributadospeloISSdevemestarprevistosemleicomplementar.

Page 112: Fernanda Ramos Pazello

�0�

Ressalte-sequeoSTF222eoSTJ223 já pacificaram o entendimento no sentido de que a listadeserviçosdoISS,previstaemleicomplementar,temcarátertaxativoerestritivo,enãoexemplificativo ou sugestivo. Portanto, de acordo com o entendimento do Poder Judiciário, aindaquehajatodososelementosnecessáriosàincidênciadoISS,éessencialadescriçãodoserviçoemumdositensdalista,sobpenadenãoconcretizaçãodaregra-matrizdeincidênciadoimpostoeofensaaoprincípiodalegalidadetributária.

Muitosdoutrinadores,comoRoqueAntonioCarrazza,nãoconcordamcomtalposi-cionamento,porentenderemqueofendeosprincípiosfederativoedaautonomiadosMunicí-pios,vistoquecaberiaàUniãoFederal,porintermédiodaediçãodeleicomplementar,indicarquaisseriamosserviçostributáveispeloISS,podendoatémesmoesvaziaracompetênciaqueosMunicípiosreceberamdaCF/88.Noentenderdocitadoautor,alistaéapenassugestivae,portanto,dispensável, tantopelo legisladormunicipalquantopelo juizepeloadministradorpúblico.224Trataremosdafunçãodaleicomplementarmaisadiante.

O § 2.º do artigo 156 da CF/88 prescreve que também cabe à lei complementar (i) fixar asalíquotasmáximasemínimas(acrescentadopelaEmendaConstitucional37,de12.6.2002–“EC37/2002”);(ii)excluirdasuaincidênciaexportaçõesdeserviçosparaoexterior(acres-centadopelaEC3/93);e(iii)regularaformaeascondiçõescomoisenções,incentivosebene-fícios fiscais serão concedidos e revogados (acrescentado pela EC 37/2002).

5.2.2 A função da lei complementar

AntesdaCF/88,osserviçosdequalquernatureza jáeram tributadospelo ISScombasenoDecreto-lei406,de31.12.1968(“DL406/68”),alteradopelaLeiComplementar56,de15.12.1987(DOU16.12.1987)(“LC56/87”)erecepcionadopelaCF/88comoleicomplemen-tar,tendoemvistaodispostonoparágrafo5.ºdoartigo34doAtodasDisposiçõesConstitucio-naisTransitórias(“ADCT”).225Atualmente,aleiquedisciplinaoISSéaLC116/2003,editadapelaUniãoFederaledecaráternacional.

��� Recurso Extraordinário 7�.�77/SP, Rel. Min. RodriguesAlckmin, RTJ 70/���, e Recurso Extraordinário77.�83/SP,Rel.Min.AliomarBaleeiro,RTJ73/�90.

��3 RecursoEspecial�0�698,�.ªTurmadoSTJ,Rel.Min.FranciscoPeçanhaMartins,de9.6.�003,eRecursoEspecial�36�09,�.ªTurmadoSTJ,Rel.Min.GarciaVieira,de�0.9.�00�.

��� RoqueAntonioCarrazza.Curso...,cit.,p.909.��5 “[...]Art.3�.[...]

§5.ºVigenteonovosistematributárionacional,ficaasseguradaaaplicaçãodalegislaçãoanterior,noquenãosejaincompatívelcomeleecomalegislaçãoreferidanos§§3.ºe�.º.[...].”

Page 113: Fernanda Ramos Pazello

�05

ALC116/2003temcomodestinatárioosMunicípios.Assim,osMunicípios,noexer-cíciodaaçãodetributarpeloISS,devemobservaraLC116/2003,queestabeleceoscritériosdaregra-matrizdeincidênciatributáriadoISS,asaber:material,temporal,espacial,pessoalequantitativo.Alémdisso,aLC116/2003disciplinaasquestõesprevistasnoartigo156,§3.º,daCF/88eindicaosserviçostributáveispeloimpostomunicipal.

NocasodoISS,olegisladorconstituinteoriginárioouderivadopreviuexpressamentealgumashipótesesemquealeicomplementarserianecessária,quaissejam:indicarosserviçosa serem tributados pelo ISS, fixar as alíquotas máximas e mínimas, isentar a exportação de serviços e regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidoserevogados.

Alémdisso,percebeu-seanecessidadededisciplinarporintermédiodeleicomple-mentar,decaráternacional,oscritériosdaregra-matrizdeincidênciatributáriadoISS,visandouniformizartaiscritériosparatodososMunicípios(artigo146,incisoIII,alíneaa).

No item dedicado à função da lei complementar em matéria tributária, filiamo-nos à correntetricotômica,poisentendemosnecessáriaapresençadaleicomplementarparaestabe-lecerasnormasgeraisdeDireitoTributáriovisandoàuniformizaçãoeàharmoniadosistemajurídico,acreditandoquedevehaverlimitesconstitucionaisàutilizaçãodeleicomplementar,decaráternacional,emmatériatributária.

Nocasoemanálise,anecessidadedeleicomplementarparaestabelecernormasge-raisdeDireitoTributáriorelacionadasaoISSvisaatenderuminteressemaior,ouseja,evitarque cada Município tribute da forma como lhe convém, gerando “guerra fiscal” entre os entes políticoseincertezasaoscontribuintes.Nocaso,conformebemditoporAliomarBaleeiro,226asnormasgeraisdeDireitoTributáriosobrepõem-seàsordensjurídicasparciais(federais,es-taduaisoumunicipais).

Confira-se a posição de Misabel Derzi, ao atualizar o livro de Aliomar Baleeiro, sobre oassunto:

[...] O Estado intervencionista e planificador, que visa a controlar e possibilitar um planejamento econômico e financeiro nacional, teve que adotar determi-nadosinstrumentosquepudessemestabelecerdiretrizesparaaproduçãodasordensjurídicasparciaisfederal,estadualemunicipal.

��6 AliomarBaleeiro.Direito tributário brasileiro,cit.,p.��.

Page 114: Fernanda Ramos Pazello

�06

Se,emváriosEstadosunitários,comonaFrançaounaEspanha,razõestéc-nico-jurídicas, à vista da crescente participação da administração pública na dinâmicaeconômicadenossosdias,recolhendoastransformaçõesemudan-çasimpostasnademandasocial,impuseramaelaboraçãodenormasgerais,que disciplinassem os tributos e as finanças públicas em geral e que se colo-cassememposiçãodeprincípiosgeraisorientadoresdasleisordináriasespe-ciais,tantomaissefezsentir,nosEstadosdeformafederalcomononosso,anecessidade de um instrumental jurídico coerente, que dirimisse conflitos de competênciaentreaspessoasestataistributantes,quefacilitasseareformadeestruturas e instituições conducentes à produção eficiente e à justa distribuição darendanacional.[...].227

Assim,dentrodesteespírito, entendemosqueaLC116/2003, aopreverasnormasgeraisrelacionadasaoISSealistadeserviçosdoISS,visaàuniformizaçãoeàharmoniadosistema tributário, com intuito de dirimir eventuais conflitos de competência e assegurar os direitosdoscontribuintes.

Nãoobstanteisso,cumpreteremmentequeafunçãodaleicomplementarnãoéilimi-tada.DevesimestabelecerasnormasgeraisdeDireitoTributário,oqueinclui,nocasodoISS,preveroscritériosdaregra-matrizdeincidênciatributáriaeasdemaisquestõesautorizadaspelaCF/88.Noentanto,entendemosqueasleiscomplementaresnãopoderiampreverhipótesedeisençãooureduçãodocampodeincidênciadoISSsemautorizaçãoconstitucionalparatanto,sobpenadeofensaaoprincípiofederativoedaautonomiadosMunicípios.Casohouvessetalpermissão,aleicomplementarpoderiaesvaziaracompetênciatributáriadosMunicípios,dese-nhandoaregra-matrizdeincidênciatributáriadoISScomomelhorlheconviesse.

5.2.3 E a regra-matriz de incidência tributária

OarquétipotributáriodoISSencontra-seprevistonaConstituiçãoFederal.Oseucri-tériomaterial,deacordocomJoséEduardoSoaresdeMelo,228éaprestaçãodeserviçoquecompreendaumnegóciojurídicopertinenteaumaobrigaçãodefazerdeconformidadecomospostuladosediretrizesdoDireitoPrivado.SópodeincidirISSondehajaobrigaçãodefazer,ouseja,ondeháesforçohumanoaterceiros.

SoaresdeMelo,citandoAiresF.Barreto,229reconhecequeháumconceitoconstitucio-nal de serviço, como “[...] prestação de esforço humano a terceiros, com conteúdo econômico, emcaráternegocial,sobregimededireitoprivado,tendenteàobtençãodeumbemmaterial

��7 AliomarBaleeiro.Direito tributário brasileiro,cit.,p.��.��8 JoséSoaresdeMelo.Aspectos teóricos e práticos do ISS.�.ed.SãoPaulo:Dialética,�005.��9 Idem,ibidem,p.��.

Page 115: Fernanda Ramos Pazello

�07

ouimaterial[...]”.Econtinuadizendoquereferidoconceitoabrange:a)asobrigaçõesdefazer;b) os serviços submetidos ao regime de Direito Privado, não incluindo, portanto, o serviço pú-blico; c) os serviços que revelem conteúdo econômico, realizados em caráter negocial, o que afastaosserviçosprestadosasimesmoouemregimefamiliaroudesinteressadamente;ed)osserviçosprestadossemrelaçãodeemprego.

ParaAiresF.Barreto,

[...] só a prestação de serviço é tributável, porque o conteúdo econômico indi-ca o prestador como o verdadeiro beneficiário da retribuição que, de alguma maneira, é o modo objetivo de mensuração desse mesmo conteúdo econômi-co.Oconsumo,afruiçãoeautilizaçãodoserviçonãopodemserpostosouen-tendidoscomocompreendidosnessamaterialidadedahipótesedeincidênciaporqueossujeitosdasaçõesdeconsumir,fruireutilizarsão,necessariamente,diferentesdoprestadordoserviço[...].230

Diantedoexposto, concluímosqueo fatogeradordo ISSéaprestaçãode serviçoentendidacomoaquelaatividadecaracterizadacomoumesforçohumano(obrigaçãodefazer)empreendidoporalguém(prestadordoserviço)aoutrem(tomadordoserviço),emdecorrênciada celebração de contrato que possua um conteúdo econômico (preço do serviço).231

OcritériotemporaldoISSéomomentodaefetivaocorrênciadaprestaçãodoserviço,queseconcluicomaentregadoresultadodotrabalho.SegundoAiresF.Barreto,

[...]érelevanteadistinçãoentreserviçoscujaprestaçãoéfracionáveleservi-çosemqueacindibilidadenãosefazpossível.Quandoosserviçosnãoforemcindíveis,ofatotributáriosóseráreputadoocorridoaotérminodaprestação.Diversamente,seosserviçosforemcindíveis,ofatopodesertidocomoveri-ficado na conclusão de cada etapa, ou e,m cada fração de tempo em que seja divisívelaprestação[...].232

AdeterminaçãodocritérioespacialdoISSédefundamentalimportânciaparaevitarconflito de competência entre os Municípios, principalmente nas hipóteses em que há vários Municípiosenvolvidosnaprestaçãodoserviço.Poressemotivo,coubeà leicomplementardefinir o critério espacial do ISS.

�30 AiresF.Barreto.ISS na Constituição e na lei.�.ed.SãoPaulo:Dialética,�005.p.3�.�3� Oartigo�.ºdaLC��6/�003prescreveque“[...]OImpostoSobreServiçosdeQualquerNatureza,decompe-

tênciadosMunicípiosedoDistritoFederal,temcomofatogeradoraprestaçãodeserviçosconstantesdalistaanexa,aindaqueessesnãoseconstituamcomoatividadepreponderantedoprestador[...]”.

�3� AiresF.Barreto.ISS–momentodaocorrênciadofatotributário.Repertório IOB de Jurisprudência,p.75,�.ªquinzenafev.�995.

Page 116: Fernanda Ramos Pazello

�08

Oartigo3.ºdaLC116/2003estabeleceu,comoregrageral,queoimpostoserádevidonolocaldoestabelecimentoprestadorou,nafaltadeste,nolocaldodomicíliodoprestador.Ademais, estabeleceu hipóteses específicas em que o imposto será devido no local da prestação deserviços.233

�33 “[...]Art.3.ºOserviçoconsidera-seprestadoeoimpostodevidonolocaldoestabelecimentoprestadorou,nafaltadoestabelecimento,nolocaldodomicíliodoprestador,excetonashipótesesprevistasnosincisosIaXXII,quandooimpostoserádevidonolocal:

I–doestabelecimentodotomadorouintermediáriodoserviçoou,nafaltadeestabelecimento,ondeeleestiverdomiciliado,nahipótesedo§�.ºdoart.�.ºdestaLeiComplementar;

II–dainstalaçãodosandaimes,palcos,coberturaseoutrasestruturas,nocasodosserviçosdescritosnosubi-tem3.05dalistaanexa;

III–daexecuçãodaobra,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.0�e7.�9dalistaanexa;

IV–dademolição,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.0�dalistaanexa;

V–dasedificaçõesemgeral,estradas,pontes,portosecongêneres,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.05dalistaanexa;

VI–daexecuçãodavarrição,coleta,remoção,incineração,tratamento,reciclagem,separaçãoedestinaçãofinaldelixo,rejeitoseoutrosresíduosquaisquer,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.09dalistaane-xa;

VII–daexecuçãodalimpeza,manutençãoeconservaçãodeviaselogradourospúblicos,imóveis,chaminés,piscinas,parques,jardinsecongêneres,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.�0dalistaanexa;

VIII–daexecuçãodadecoraçãoejardinagem,docorteepodadeárvores,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.��dalistaanexa;

IX–docontroleetratamentodoefluentedequalquernaturezaedeagentesfísicos,químicosebiológicos,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.��dalistaanexa;

X–(Vetado.); XI–(Vetado.); XII–doflorestamento,reflorestamento,semeadura,adubaçãoecongêneres,nocasodosserviçosdescritosno

subitem7.�6dalistaanexa;

XIII–daexecuçãodosserviçosdeescoramento,contençãodeencostasecongêneres,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.�7dalistaanexa;

XIV–dalimpezaedragagem,nocasodosserviçosdescritosnosubitem7.�8dalistaanexa;

XV–ondeobemestiverguardadoouestacionado,nocasodosserviçosdescritosnosubitem��.0�dalistaanexa;

XVI–dosbensoudodomicíliodaspessoasvigiados,seguradosoumonitorados,nocasodosserviçosdescri-tosnosubitem��.0�dalistaanexa;

XVII–doarmazenamento,depósito,carga,descarga,arrumaçãoeguardadobem,nocasodosserviçosdes-critosnosubitem��.0�dalistaanexa;

XVIII–daexecuçãodosserviçosdediversão,lazer,entretenimentoecongêneres,nocasodosserviçosdes-critosnossubitensdoitem��,excetoo��.�3,dalistaanexa;

XIX–doMunicípioondeestásendoexecutadootransporte,nocasodosserviçosdescritospelosubitem�6.0�dalistaanexa;

XX–doestabelecimentodotomadordamão-de-obraou,nafaltadeestabelecimento,ondeeleestiverdomi-ciliado,nocasodosserviçosdescritospelosubitem�7.05dalistaanexa;

XXI–dafeira,exposição,congressooucongênereaquesereferiroplanejamento,organizaçãoeadministra-ção,nocasodosserviçosdescritospelosubitem�7.�0dalistaanexa;

XXII–doporto,aeroporto,ferroporto,terminalrodoviário,ferroviáriooumetroviário,nocasodosserviçosdescritospeloitem�0dalistaanexa.

§�.ºNocasodosserviçosaqueserefereosubitem3.0�dalistaanexa,considera-seocorridoofatogeradoredevidooimpostoemcadaMunicípioemcujoterritóriohajaextensãodeferrovia,rodovia,postes,cabos,dutosecondutosdequalquernatureza,objetosdelocação,sublocação,arrendamento,direitodepassagemoupermissãodeuso,compartilhadoounão.

Page 117: Fernanda Ramos Pazello

�09

Oartigo4.ºdaLC116/2003preceituouestabelecimentoprestadorcomo

[...]o localondeocontribuintedesenvolvaaatividadedeprestar serviços,de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contatoouquaisqueroutrasquevenhamaserutilizadas[...].

AproblemáticaemtornodocritérioespacialdoISScinge-senaaplicaçãodoprincípiodaterritorialidadedaleitributária.Osdoutrinadoreseajurisprudênciaanalisamofatodealeimunicipal transpor seus limitespara incidir sobre serviçoprestadoemoutroMunicípio.Ouseja,aoseaceitarcomocritérioespacialolocaldoestabelecimentoprestador,emdiversashi-póteses,aleiaplicávelsobreoserviçoprestadonoMunicípioXseráaproduzidaeaquepossuivigêncianoMunicípioY.OcritériomaterialsedeunoMunicípioX,masaleiaplicáveléadoMunicípioY.Poressemotivo,entendemqueocritérioespacialdoISSdeveserodolocalondeoserviçofoiprestado,ouseja,ondeserealizouocritériomaterial.234

Não nos cabe aprofundar neste assunto, que rendeu e ainda rende ricas discussõesdoutrináriasejurisprudenciais,umavezquenãoéoescopodopresentetrabalho.Noentanto,para fins metodológicos, adotaremos o critério espacial previsto na LC 116/2003, ou seja, se o prestadorforpessoajurídica,oISSserádevidonolocaldoestabelecimentoprestador,comoregra;e,seforpessoafísica,o impostoserádevidono localdodomicíliodoprestador,nostermosdosartigos3.ºe4.ºdaLC116/2003.Ouseja,oelementodeconexão,emregra,seráaorigemdoserviço.

Aindasobreocritérioespacial,cabe-nosanalisarashipótesesemqueoserviçofoiintegralmenteprestadonoexteriorporprestadorbrasileiroatomadorestrangeiro.Anossover,aleimunicipalnãopodealcançarfatosgeradoresocorridosnoexterior.Asnormasmunicipaisnão têm poderes extraterritoriais. Nesse sentido, confira-se decisão do STJ:235

[...]EMENTANÃOINCIDÊNCIATRIBUTÁRIA–IMUNIDADE–COISAJULGADA.AleimunicipalnãopodealcançarfatosgeradoresocorridosnoexterioreoISSsóincidesobreserviçosdescritosnalistaanexaaoDecreto-lei834/69,prestadosnoslimitesdomunicípio,excepcionalmente,emoutrosmunicípiosbrasileiros.

§�.ºNocasodosserviçosaqueserefereosubitem��.0�dalistaanexa,considera-seocorridoofatogeradoredevidooimpostoemcadaMunicípioemcujoterritóriohajaextensãoderodoviaexplorada.

§3.ºConsidera-seocorridoo fatogeradordo impostono localdoestabelecimentoprestadornos serviçosexecutadosemáguasmarítimas,excetuadososserviçosdescritosnosubitem�0.0�.[...].”

�3� VideRecursoEspecial5�00�/PE,Rel.Min.DemócritoReinaldo,�.ªTurmadoSTJ,de8.5.�995.�35 RecursoEspecial�6.8�7-�/SP,Rel.Min.GarciaVieira,�.ªTurmadoSTJ,de�6.9.�99�.

Page 118: Fernanda Ramos Pazello

��0

[...]VOTO[...]Ora,omunicípiosópodetributarosserviçosprestadosemseuterritórioe,excepcionalmente,emoutrascomunas,massempredentrodoBrasil.Estamosdiantedenãoincidênciatributária.[...]

Deacordocomoprincípiodaterritorialidade,implícitonaCF/88,aspessoaspolíticaspodemexpedirnormascomvigênciadentrodeseuslimitesterritoriais.Portanto,aregraéqueanormajurídicacolhaapenasfatosjurídicosquevenhamaocorrerdentrodeseuterritório.

AsexceçõesaoprincípiodaterritorialidadeestãoexpressamenteprevistosnaConsti-tuiçãoFederal.Éocaso,porexemplo,doslucrosauferidosnoexteriorquesãotributadospeloImpostodeRenda (princípiodauniversalidade)edos serviçosprestados foradoMunicípio(sujeitopassivodaobrigaçãotributária).

Emrazãodoprincípiodaterritorialidadeedaausênciadeprevisãoconstitucional,aprestaçãodeserviçosintegralmentenoexterioratomadorestrangeiro,cujoresultadoláseve-rifique, escapa a incidência do imposto, uma vez que o fato não ocorre nos limites territoriais doBrasil.

Poressemotivo,apremissaqueadotaremosédequeosserviçosprestadosintegral-mentenoexteriorporprestadorbrasileiroatomadorestrangeiroestãoforadocampodeinci-dênciadoISS(hipótesedenão-incidênciatributária).Aindaqueseentendapelanão-aplicaçãodoprincípiodaterritorialidade,poderíamosaplicaraisençãoheterônomadoISSporsetratardeexportaçãodeserviços,conformeveremosaseguir.

Ressalte-sequeseconsideramserviçosprestadosintegralmentenoexteriorosserviçosrealizadosforadoBrasil,cujoresultadosedeuforadoBrasil.Nashipótesesemqueoserviçoapenas iniciou-se no exterior ou foi prestado no exterior, mas o resultado (beneficiário direto) ocorreunoBrasil,háregraexpressadaLC116/2003determinandosuatributaçãopeloISS.236Referida tributaçãoestá sendoobjetodequestionamentoquantoà suaconstitucionalidadeelegalidade,masnãoserátratadanopresentetrabalho.

Por fim, cumpre-nos indicar os critérios do conseqüente da regra-matriz de inci-dênciatributáriadoISS.OsujeitoativoéoMunicípio(ouoDistritoFederal)dolocaldo

�36 “[...]Art.�.º[...]

§�.ºOimpostoincidetambémsobreoserviçoprovenientedoexteriordoPaísoucujaprestaçãosetenhainiciadonoexteriordoPaís.[...].”

Page 119: Fernanda Ramos Pazello

���

estabelecimentoprestadoroudodomicíliodoprestador.Osujeitopassivo(contribuinte)éoprestadordoserviço.Abasedecálculoéopreçodoserviçoeaalíquotamínimaéde2%237eamáxima,de5%.238

5.2.4 O sentido e o alcance do artigo 2.º da LC 116/2003

AEC3/93acrescentou,deformaconstitucional,239oincisoIIaoartigo156,§3.º,daCF/88paraatribuircompetênciaàleicomplementarcomoobjetivodeexcluirdaincidênciadoISSasexportaçõesdeserviçosparaoexterior.

AlgunsdoutrinadorestratamodispositivoconstitucionalacimacomoumanormadeestruturaqueautorizaaleicomplementarisentarasoperaçõesdeexportaçãodoISSeoutrosdoutrinadoresentendemquesetratadeumanormadeimunidade.

IvesGandradaSilvaMartins240entendequesetratadenormadeimunidade,umavezque(i)aleicomplementarapenasdeveráreproduziroqueestánotextoconstitucional;e(ii)aleicomplementarnãopoderápermitiraincidênciadoISSsobreaexportaçãodeserviçosparaoexterior.Sendoumaimunidade,seriaumanormaauto-aplicáveleque,portanto,nãodependeriadaediçãodeleicomplementar.Assim,mesmoquenãohajaleicomplementar,osMunicípiosestãoimpedidosdetributarpeloISSasexportaçõesdeserviço.

Emnotaderodapé,GabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros241admitemque,em-boratenhamtratadooartigo156,§3.º,incisoII,daCF/88comonormaqueautorizaainstituiçãodeumaisenção,nãoseriaabsurdoouincorretoquetaldispositivoconstitucionalprevisseumanormadeimunidadenãoauto-aplicável,poisdependentedeleicomplementarqueainstitua.

Anossover,conformejáestabelecemosnoitemdedicadoàisençãotributária,anormaprevistanoartigo156,§3.º,incisoII,daCF/88encerraumanormaqueautorizaainstituição

�37 Videartigo88doADCT:“[...]EnquantoleicomplementarnãodisciplinarodispostonosincisosIeIIIdo§3.ºdoart.�56daConstituiçãoFederal,oimpostoaqueserefereoincisoIIIdocaputdomesmoartigo:

I–teráalíquotamínimadedoisporcento,excetoparaosserviçosaquesereferemositens3�,33e3�daListadeServiçosanexaaoDecreto-lein.º�06,de3�dedezembrode�968;

II–nãoseráobjetodeconcessãodeisenções,incentivosebenefíciosfiscais,queresulte,diretaouindireta-mente,nareduçãodaalíquotamínimaestabelecidanoincisoI.[...].”

�38 Videartigo8.ºdaLC��6/�003:“[...]AsalíquotasmáximasdoImpostoSobreServiçosdeQualquerNaturezasãoasseguintes:I–(Vetado.);II–demaisserviços,5%(cincoporcento).[...].”

�39 Estabelecemostalpremissanoitemdedicadoaopoderreformador.��0 IvesGandradaSilvaMartins.Comentários...,cit.,p.576-579.��� GabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros.OISSeexportaçãoeimportaçãodeserviços,cit.,p.�00.

Page 120: Fernanda Ramos Pazello

���

deumaisenção heterônoma,poisapenaspermitequealeicomplementarexcluadaincidênciadoISSasoperaçõesdeexportação.Portanto,referidanormadependedeleicomplementarex-cluindoaincidênciadoISSsobreasoperaçõesdeexportaçãoedisciplinandosuascondições.Semaleicomplementar,nãoháisençãodoimpostomunicipal.242

Ademais,éimportantedestacarque,anossover,nãoháantinomiaentreoartigo156,§3.º,incisoII(isençãodasexportaçõesdeserviçoporleicomplementar),eoartigo151,in-cisoIII,ambosdaCF/88(vedaçãoàUniãodeinstituirisençõesdetributosquenãosãodesuacompetência),umavezqueoprimeiroélex speciales (disciplina uma situação específica, que buscapromoverodesenvolvimentonacionalefomentarocomérciointernacionalquepromoveingressodedivisasnoPaís)emrelaçãoaosegundoqueélex generalis.

Dentrodestaperspectiva,aLC116/2003desoneroudoISSasexportaçõesdeserviços,aodeterminarque“oimpostonãoincidesobreasexportaçõesdeserviçosparaoexteriordoPaís”(artigo2.º,incisoI).Trata-sedeisençãomunicipalconcedidapelaUniãoFederal,combaseemautorizaçãoconstitucional,afastandoaincidênciadoISSsobreasexportaçõesdeserviços.

Conformedesenvolvemosnoitemdedicadoàsoperaçõesdeexportação,aexportaçãodeserviçospressupõequeaspartesenvolvidassejamoprestadorbrasileiroeotomadorestran-geiro.Alémdisso,aotratarmosdocritérioespacialdoISS,concluímosque,nocasodeserviçosprestadosintegralmentenoexteriorporprestadorbrasileiro,nãoháquefalaremincidênciadoISS,tendoemvistaaadoçãodoprincípiodaterritorialidade.Aleimunicipalnãopodealcan-çar fatos geradores ocorridos no exterior e que lá se verifiquem. Assim, os serviços prestados integralmentenoexteriorporprestadorbrasileiroatomadorestrangeiro,cujoresultado(bene-ficiário direto) ali se apresentar, encontram-se abrangidos pelo conceito de exportação de servi-ços,masestãoforadocampodeincidênciadoISS,considerandoaregra-matrizdeincidênciatributáriadestetributoeoprincípiodaterritorialidade.

Dúvidas surgem quando o serviço é prestado por prestador brasileiro no Brasil a to-madorestrangeiro,tendoemvistaanecessidadedeaveriguarsehouvesuaremessaaoexteriorpara configurar a exportação. Conforme concluímos no item destinado à operação de exporta-ção, o serviço será exportado se seu resultado se verificar no exterior, ou seja, se o beneficiário diretodoserviçoforotomadorestrangeiro.

��� OPlenodoSTF,deformaindireta,nojulgamentodoAgravoRegimentalnoMandadodeInjunção590-�,decidiuque,nessecaso,atribui-seàleicomplementaropoderdeescolherosserviçosqueficarãoisentos,conformerazõesdepolíticatributária.

Page 121: Fernanda Ramos Pazello

��3

No entanto, para fins de incidência do ISS, a compreensão do conceito de exportação de serviços deve ser analisada em conjunto com o esclarecimento previsto no parágrafo único doartigo2.ºdaLC116/2003.

O parágrafo único do artigo 2.º da LC 116/2003 esclareceu que a isenção em questão não se aplica aos serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que opagamentosejafeitoporresidentenoexterior.

A nosso ver, o parágrafo único não encerra uma exceção à isenção sobre a exportação de serviços, mas apenas um esclarecimento. A hipótese aventada pelo parágrafo único não é de exportação de serviços. Ora, conforme afirmamos acima, se entendermos resultado como beneficiário da utilidade, é evidente que o mero pagamento feito por residente no exterior não configura exportação de serviços, no caso de o beneficiário da utilidade estar localizado no Bra-sil. Portanto, o parágrafo único apenas esclareceu.

AnormadeisençãodoISSparaaexportaçãodeserviços,previstanaLC116/2003,criaumbenefícioàexportaçãodeserviçose,aomesmotempo,esclarecequeoserviçonãoseconsidera exportado se o resultado aqui se verificar.

GabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros243entendemqueaintençãodolegisladorcomplementarfoiinstituiruma“normaantielisão”doISS,impedindoacriaçãodemecanismosinternacionais de planejamento fiscal envolvendo o ISS. Ou seja, o fato de o pagamento do ser-viçoterorigemnoexteriorouacontecernoexteriornãoalteraadestinaçãodoserviço.

Assim,édefundamentalimportânciaacompreensãodotermo“resultado”.Resultadoéconseqüência,efeito,seguimento.Ouseja,paraquehajaefetivaexportaçãodoserviçode-senvolvidonoBrasil,oserviçonãopoderáterconseqüênciasouproduzirefeitosnoPaís.Osefeitos do serviço devem se verificar no exterior.

Os autores exemplificam tal idéia das seguintes formas:

(i) companhia aérea com sede naAlemanha, com rotas aéreas que transitam peloBrasil, sofre danificações em território nacional. Contrata serviços de técnicos brasileirosparaconsertodoequipamento.Oresultadoimediatoéoconsertodoequipamentoparaseguimentodasatividadesnormaisdaempresa.Ouseja,ore-

��3 GabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros.OISSeexportaçãoeimportaçãodeserviços,cit.,p.�99-�08.

Page 122: Fernanda Ramos Pazello

���

sultado imediato do reparo da aeronave terá como beneficiário a empresa alemã, produzindo seus efeitos naAlemanha. Portanto, trata-se de uma exportação deserviços;e

(ii) investidorresidentenosEstadosUnidoscontrataumaempresaquedesempenhatrabalhos para análise econômico-financeira do País. Com base no relatório pro-duzidoporempresabrasileira,oinvestidor-contratanteresolveinvestirnoBrasilou não. Na hipótese, o resultado do serviço verifica-se nos Estados Unidos, onde se encontra o verdadeiro beneficiário. O que importa para definir se o serviço foi exportado ou não é o resultado imediato do serviço, ou seja, quem se beneficiou do serviço.Nãoimportaoresultadomediato(decisãodeinvestirnoBrasilounão).

Paraoscitadosautores,hádoiselementosvitaisparaacaracterizaçãodo“resultado”:o beneficiário efetivo do serviço (que deve estar fixado no exterior) e a delimitação dos efeitos imediatos (diretos) da prestação do serviço, descartando os efeitos secundários. O beneficiário efetivo(tomadordoserviço)deveresidirnoexterioreexistircomofonteprodutoranoexteriorparaquehajaexportaçãodeserviço.

No Direito Tributário internacional, o conceito de beneficiário efetivo pressupõe que o beneficiário tenha residência em um dos Estados signatários da convenção internacional para evi-tar a dupla tributação e que a pessoa remunerada seja o beneficiário efetivo dos rendimentos.

Portanto,considerandotalacepção,osautoresconcluemqueanormadesoneradoradoISSsobreasexportaçõespretendequesomentesejaconsideradaexportaçãodeserviçoseosre-sultados se verificarem no exterior, ou seja, que o beneficiário daquele serviço esteja localizado noexterior.Ademais,deve-seconsiderarsomenteoresultadoimediatoediretodosserviços,ouseja,oresultadoquecompunhaoobjetodarequisiçãodoserviço.

Confira-se a posição de Marcelo Marques Roncaglia sobre a intenção do legislador em relaçãoàexceçãoemquestão:

[...]Nocasoconcreto,aodizerquenãohaveráisençãodeISSseosresulta-dos se verificarem no Brasil e tornar sem importância a origem dos recursos, parecequeolegisladortentouevitarqueoscontribuintes,pelautilizaçãodesociedadesnoexterior,deixemdepagaro ISSsobre serviçosprestadosnoBrasil e cujautilidade será fruída tambémnoBrasil.Busca-se,pois, evitarautilizaçãodasformasjurídicascomopropósitodeimpediraincidênciadaregra-matrizdoimposto.Issoporque,senãohouvesseanormaemcomento,oscontribuintespoderiamprestar serviços a tomadores localizadosnoBrasil,mas solicitarqueo seupagamentofosserealizadoporempresaestrangeira.Assim,essasimplesmo-

Page 123: Fernanda Ramos Pazello

��5

dificação faria com que uma operação estritamente interna fosse beneficiada pela isenção, o que definitivamente não é o objetivo da lei. [...].244

Olegisladortentouevitarqueoscontribuintes,pelautilizaçãodesociedadesnoex-

terior,deixemdepagaroISSsobreserviçosprestadosnoBrasilecujautilidadefoifruídapor

empresalocalizadanoBrasil,umavezqueapenasoseupagamentosedeuporempresaestran-

geira.Busca-seevitarautilizaçãodasformasjurídicascomopropósitodeimpediraincidência

doISS.Ora,aexportaçãodemercadoriasobedeceàmesmaregra(guardadasasdevidaspropor-

ções),ouseja,amercadoriadevedeixaroterritóriobrasileiroparaseconsiderarexportada.

O autor citado, ao identificar o conteúdo semântico de “resultado”, entende que esse

seriaoprodutodaprestação,ouseja,obemmaterialouimaterialobtidoporintermédiodoes-

forçohumano.Assim,aexportaçãodoserviçosedariaquandooresultado,ouseja,autilidade,

fossefruídanoexterior.Portanto,oqueimportanesteentendimentoéolocalondeseráfruído

oresultado,assimentendidocomoutilidade.

Aqui, cumpre-nos destacar a distinção do conteúdo semântico de “resultado” atribuído

pelosautoresacimacitados.EnquantoGabrielTroianellieJulianaGueirosentendemqueore-

sultado identifica-se com a idéia de beneficiário efetivo do efeito imediato, Marcelo Roncaglia

considera que o resultado identifica-se com a idéia de onde se dá a fruição da utilidade. Por-

tanto, para os primeiros, a exportação do serviço se daria nas hipóteses em que o beneficiário

diretodoefeito imediato fosseumtomadorestrangeiro;e,paraosegundo,aexportaçãodo

serviçosomentesedarianashipótesesemqueautilidadefossefruídanoexterior.Ouseja,para

osprimeiros,importasomentequemauferiuobenefício;e,paraosegundo,importatambém

ondefoifruídaautilidade.

Humberto Ávila245 também analisou a isenção em questão em parecer elaborado a

pedidodeempresabrasileiraepublicadonaRevista Dialética de Direito Tributário.Oparecer

tratadosserviçosde(i)data center;e(ii)coordenaçãoparaodesenvolvimentodeprodutos,as-

sessoriaeconsultoriaparaimplementaçãodenovatecnologia/inovação,voltadosatomadores

localizadosnoexterior.Oprimeiroserviçodestina-seàsdemaisempresasdogruponaAmérica

Latinaeosegundo,àsempresaslocalizadasemvárioslugaresdomundo,foradoBrasil.

��� MarceloMarquesRoncaglia.OISSeaimportaçãoeexportaçãodeserviços,cit.,p.98-���.��5 HumbertoÁvila.ImpostosobreaPrestaçãodeServiçosdeQualquerNatureza.Exportaçãodeserviços.Lei

Complementarn.º��6/�003.Isenção:requisitosealcance.Conceitosde“desenvolvimento”deserviçoe“ve-rificação”doseuresultado.RevistaDialética de Direito Tributário,n.�3�,p.�0�-�09,nov.�006.

Page 124: Fernanda Ramos Pazello

��6

Destaque-sequeasAutoridadesAdministrativasMunicipaisemitiramparecerentenden-doquetaisserviçosdeveriamsertributadospeloISS,poissãoprestadosnoMunicípio,poucoim-portandoquesedestineausuáriolocalizadonoexterior.Ouseja,emrazãodaautonomiamunici-pal, se o serviço é prestado no Município e há emissão de nota fiscal, então é devido o imposto.

Analisandooprincípiofederativo,ocitadopareceristaconcluiqueosentesfederados,emboraautônomos,nãotêmautonomiaabsoluta,nemcompetênciailimitadarelativamenteaoqueépraticadonoseuterritório,umavezqueoidealfederativoéumcompromissoentreauniformi-dadeeadiversidade,ouentreaautonomiadoentefederadoeaunidadedaFederação.Amedidadauniformidadeedadiversidadedependerádasnormasconstitucionaisestabelecidas,eumdosinstrumentosdeconcretizaçãodoidealparcialdeuniformidadefederativaéaleicomplementar.

NocasodoISS,aConstituiçãoFederalreservouàleicomplementarafunçãodeesta-belecerasalíquotasmínimasemáximasdoimposto,aexclusãodaexportaçãodeserviçosdasuaincidênciaeascondiçõesdeisençõesebenefícios.Noqueinteressaaopresente,aConsti-tuição Federal já estabeleceu o ideal de favorecimento da exportação de serviços como finalida-de justificadora da uniformidade e unidade federativas. Nesse sentido, preceitua o autor:

[...]Équeaexportaçãodeserviços,pelaconexãoquemantémcomocomér-cioexteriorecomasrelaçõesinternacionais,ématériaprópriadaunidadedosentes federados, isto é, da República Federativa do Brasil, e não da diversida-dedosentesfederados,especialmentedosMunicípios[...].246

Assim, em razãoda competência limitadadosMunicípios,o autor constataqueosMunicípiosnãotêmpoderdeexigiroISSapenasetão-somenteporqueoserviçofoi,dealgummodo,prestadonoterritóriobrasileiro.

HumbertoÁvilaentendequeaisençãoprevistanoartigo2.ºdaLC116/2003dependedacompreensãodedois conceitos: desenvolvimento do serviçoe resultado do serviço.Taisconceitos dependem da análise da definição de serviço. De acordo com o STF, serviço é o es-forçohumanoempreendidoembenefíciodeoutrem(obrigaçãodefazer).Assim,paraoautor,oresultadodoserviçoéautilidadequeelevisacriar.Oesforçohumanoéoseudesenvolvimentoeoresultado,suautilidade.Otomadordoserviço,quandocontrataumserviço,queroresultadodoesforçohumano.

Diantedestaidéia,oautorconcluiquenãohaveráisençãoquandoautilidadecriadapor meio do esforço humano se verificar no território brasileiro. Ao contrário, haverá isenção

��6 HumbertoÁvila.ImpostosobreaPrestaçãodeServiços…,cit., p.�03.

Page 125: Fernanda Ramos Pazello

��7

quandoautilidadecriadapormeiodoesforçohumanosedernoexterior.Portanto,oqueinte-ressaaoautoréondesedeuafruiçãodoresultado(utilidade)paradeterminaraocorrênciadaexportação.

No entanto, ao prosseguir em seu raciocínio, o autor afirma que “todas essas conside-rações conduzem ao entendimento de que o esforço humano praticado com a finalidade de criar utilidadeparatomadorlocalizadonoexterioréobjetodeisençãodoISS,nostermosdaLC116/2003”.247 Verifica-se, permissa venia aobrilhanteautor,aconfusãodeconceitos.Emalgu-mas circunstâncias trata resultado como utilidade e em outro momento, como o beneficiário da utilidade (tomador do serviço), para fins da aplicação da isenção do ISS.

Paraoautor,olegisladorcomplementarcindiuoserviçoemduasunidadesdemedida:desenvolvimento e resultado. Se ambos se verificarem dentro ou fora do território brasileiro, a competênciaédoMunicípionoprimeirocasoedopaísestrangeironosegundocaso.Agora,seodesenvolvimentoocorrernoBrasileoresultadoforadele,aplica-searegradeisenção.

Entendemos que o autor, ao invocar que a regra de isenção é substancialmente finalísti-ca, deveria trabalhar com o conceito de “resultado” entendido como o beneficiário da utilidade. Assim,saber“qualoresultadodecorrentedesseesforço,eondeeleéauferido”248 significaria identificar o beneficiário da utilidade do esforço empreendido pelo prestador brasileiro. Se o beneficiário é estrangeiro, então estaremos diante de uma exportação de serviço. Aliás, essa é a premissa utilizada pelo autor, em que pese a confusão apontada. Confira-se: “[...] enquadram-se na regra de isenção os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado se verifique no exterior. Odestinodoresultadoatraiaincidênciadaregradeisenção.Eisopontocrucial”.249

Com isso, o autor conclui que é “[...] isento o esforço humano praticado com a finali-dadedecriarutilidadeparatomadorlocalizadonoexterior[...]”.250

LuísEduardoSchoueri251 também analisou o tema, definindo “resultado” como “onde oserviçotrouxeutilidade”.Assim,“nacontrataçãodeumadvogadoemjuízo,autilidadedar-se-áno lugarondeocorrea lide;numserviçode topógrafo,no lugarondeestivero terrenoetc.”.252Logo,paraoautor,oresultadoconfunde-secomutilidadee,assim,seautilidadedeu-

��7 HumbertoÁvila.ImpostosobreaPrestaçãodeServiços…,cit., p.�07.��8 Idem,ibidem,p.�07.��9 Idem,p.�08.�50 Idem,p.�08.�5� LuísEduardoSchoueri.ISSsobreaimportaçãodeserviçosdoexterior,cit.,p.�5.�5� Idem,ibidem,p.�8.

Page 126: Fernanda Ramos Pazello

��8

se no Brasil, não há exportação de serviço, independentemente de o beneficiário desta utilidade

serestrangeiroounão.

Corroboramoscomoentendimentodosdoutrinadoresacimacitadosnoqueconcerne

(i)àseparaçãodoserviçoemdesenvolvimentoeresultado;e(ii)àimportânciadedelimitaro

conteúdo semântico de “resultado” para verificar se o serviço foi exportado. Considerando a

finalidade da norma de isenção em questão e o esclarecimento previsto no parágrafo único do

artigo2.ºdaLC116/2003,acreditamos que “resultado” deve ser entendido como o beneficiá-

rio da utilidade obtida pelo esforço humano empreendido.

Assim,seobenefíciodecorrentedautilidadeobtidacomoesforçohumanoforusufru-

ído por beneficiário situado no exterior, configurar-se-á a exportação do serviço. Ao contrário,

se o benefício for usufruído por beneficiário situado no Brasil, então não estaremos diante de

umaexportaçãodeserviços.

ValeatranscriçãodaconclusãodeGermanAlejandroSanMartínFernández:

[...] Seria de uma ilogicidade flagrante a descaracterizar o ISS como tributo neutroanãoutilizaçãodocritériodo resultadonodestino,expressoparaaisenção das exportações, para fins de identificar quais os serviços provenientes doexterioraptosaseremtributadospelosmunicípios.Daíadesoneraçãonaexportaçãodeserviçosdependerdafruiçãomaterialdaprestaçãodeserviçosnoexterior,masdesdequeoresultadodaprestação,autilidadematerialouimaterial,seja“consumida”foradoPaís[...].253

Assim,concluímosque:(i)seoserviçodesenvolver-senoexteriorporprestadorbra-

sileiro e o benefício for auferido pelo tomador estrangeiro, configura-se exportação de serviço,

masnãoháincidênciadoISS(hipótesedenão-incidência);(ii)seoserviçodesenvolver-seno

Brasil por prestador brasileiro e o benefício for auferido pelo tomador estrangeiro, configura-se

exportação de serviço e aplica-se a norma de isenção do artigo 2.º da LC 116/2003; e, por fim,

(iii)seoserviçodesenvolver-senoBrasileoseubenefícioforauferidoporempresabrasileira,

aindaquenãosejaatomadora,nãoháexportaçãodeserviço,nostermosemquedispostopelo

parágrafo único do artigo 2.º da LC 16/2003.

�53 GermanAlejandroSanMartínFernández.OISSQN(impostosobreserviçosdequalquernatureza)incidentesobreimportaçãodeserviçoseoalcancedaexpressão“cujoresultadoseverifiquenoPaís”eaisenção(hete-rônoma)naexportaçãoprevistanaLCn.º��6/�003.Revista de Direito TributárioInternacional,SãoPaulo:QuartierLatin,ano�,n.6,p.�5,ago.�007.

Page 127: Fernanda Ramos Pazello

��9

Ainterpretaçãofeitaacimasecoadunacomoobjetivodoconstituinteedolegislador,qualsejadesonerarasexportaçõesdeserviçosdoISSnashipótesesemqueoserviçoforreali-zadoporprestadorbrasileirovisandoaobenefíciodetomadorestrangeiro.

Por fim, entendemos de grande valia a aplicação do artigo 108, inciso II, do CTN, para solucionar as dúvidas que aparecerão. Referido dispositivo legal prescreve que “na ausência dedisposiçãoexpressa,aautoridadecompetenteparaaplicaralegislaçãotributáriautilizará,sucessivamente,naordemindicada:II–osprincípiosgeraisdodireitotributário”.Nestecon-texto,nãohaveriamotivoparaexcluirosprincípiosgeraisdeDireitoTributárioInternacional,entreeles,oprincípiodaneutralidadenatributaçãodocomércioexterior(semprequepossível,deverãoserevitadassituaçõesemqueambosospaísestributemoserviçoounenhumdospaísestributeoserviço).

5.2.5 A decisão do Superior Tribunal de Justiça

APrimeiraTurmadoSTJ,emjulgamentorealizadonodia15.8.2006epublicadonoDiário de Justiça de 25.9.2006, analisou o serviço relativo à retificação, reparo e revisão de motoreseturbinasdeaeronavesestrangeiras,realizadoporempresabrasileiraaumtomadordeserviçosituadonoexterior(empresaaérea),eaabrangênciadanormadeisençãodoISS,previstanaLC116/2003(REsp831.124/RJ).

Reitere-se que o artigo 2.º e parágrafo único da LC 116/2003 prevêem isenção de ISS naexportaçãode serviços, esclarecendoque taldesoneraçãonão se aplicanashipótesesdeserviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feitoporresidentenoexterior,pornãosetratardesituaçãodeexportaçãodeserviço.

Oserviçoemanáliseéoseguinte:asturbinasemotoreseramremetidosdoexteriorpara o Brasil e, após a prestação dos serviços de reparo, retífica e revisão, eram devolvidos ao exteriorparasereminstaladosnasaeronavesdasempresasaéreascontratantesdosserviços,queasutilizariamforadoterritórionacional.

Pormaioriadevotos,254oSTJentendeuqueoobjetivodacontrataçãodaempresabra-sileiraeraoefetivoconsertodosbensequetalserviçofoiconcluídonoterritóriobrasileiro.Poresse motivo, referido serviço não poderia ser qualificado como exportação de serviços, para fins deincidênciadanormadeisençãodoISS.

�5� MinistroJoséDelgado(Relator),acompanhadodosMinistrosFranciscoFalcão,LuizFuxeDeniseArruda.VencidooMinistroTeoriAlbinoZavascki.

Page 128: Fernanda Ramos Pazello

��0

Taldecisãobaseia-senaposiçãodepartedadoutrinadeque,noqueserefereaoISS,determinadoserviçosóseconsideraexportadoquandoefetivamenteprestadoemterritórioes-trangeiro. Confira-se parte da ementa:

[...]4. Nos termos do art. 2.º, inciso I, parágrafo único, da LC 116/03, o ISSQN nãoincidesobreasexportaçõesdeserviços,sendotributáveisaquelesdesen-volvidos dentro do território nacional cujo resultado aqui se verifique, ainda queopagamentosejafeitoporresidentenoexterior.In casu,arecorrenteécontratadaporempresasdoexteriorerecebemotoreseturbinasparareparos,retífica e revisão. Inicia, desenvolve e conclui a prestação do serviço dentro doterritórionacional,exatamenteemPetrópolis,EstadodoRiodeJaneiro,esomentedepoisdetestados,envia-osdevoltaaosclientes,queprocedemàsuainstalaçãonasaeronaves.5.ALeiComplementar116/03estabelececomocondiçãoparaquehajaex-portação de serviços desenvolvidos no Brasil que o resultado da atividadecontratada não se verifique dentro do nosso País, sendo de suma importância, porconseguinte,acompreensãodotermo“resultado”comodispostonopará-grafo único do art. 2.º.6.Naacepçãosemântica,“resultado”éconseqüência,efeito,seguimento.As-sim,paraquehajaefetivaexportaçãodoserviçodesenvolvidonoBrasil,elenãopoderáaquiterconseqüênciasouproduzirefeitos.Acontráriosenso,osefeitosdecorrentesdosserviçosexportadosdevem-seproduziremqualqueroutroPaís.Énecessário,pois,ter-seemmentequeosverdadeirosresultadosdoserviçoprestado,osobjetivosdacontrataçãoedaprestação.7. O trabalho desenvolvido pela recorrente não configura exportação de ser-viço,poisoobjetivodacontratação,oresultado,queéoefetivoconsertodoequipamento,étotalmenteconcluídononossoterritório.ÉinquestionávelaincidênciadoISSnopresentecaso,tendoincidênciaodispostonoparágrafoúnico, do art. 2.º, da LC 116/03: “Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamentosejafeitoporresidentenoexterior”.[...]

OMinistroRelator JoséDelgado,pretendendoaplicaroentendimentomanifestadopelosdoutrinadoresGabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros,255partedapremissadequeaexportaçãodoserviço,nostermosdanormadeisençãodoISS,pressupõequeaatividadecontratada não se verifique dentro do nosso país. Ou seja, o resultado, entendido como conse-qüênciaouefeito,nãopodesedarnoBrasil.

Ovotoconsideraqueoresultadodoserviçoéoconsertodosmotoreseturbinas.As-sim,setalconsertoocorreunoBrasil,nãohouveexportaçãodeserviço.No entanto, entende-mos que não é essa a posição dos doutrinadores Gabriel Lacerda Troianelli e Juliana Gueiros

�55 GabrielLacerdaTroianellieJulianaGueiros.OISSeexportaçãoeimportaçãodeserviços,cit.,p.�09-�08.

Page 129: Fernanda Ramos Pazello

���

no artigo em referência, tal como enfatizado acima.Naverdade,osautorescitadosconcluemque “resultado” deve ser entendido como “beneficiário efetivo” do serviço.

Na hipótese de serviço de reparo, retífica e revisão de motores e turbinas de aeronaves estrangeiras por empresa brasileira contratada por tomador sediado no exterior, verificamos que (i) o beneficiário efetivo do serviço é a empresa sediada no exterior; e (ii) o resultado imediato é oconsertodeaeronavesparaqueaempresaestrangeirapossaretornarsuasatividades,ouseja,osefeitossederamnoexteriorenãonoBrasil.Portanto,aocontráriodoquerestoudecididopelo STJ, tal serviço qualifica-se como exportação de serviço para fins de aplicação da norma deisençãodoISSprevistanaLC116/2003.

NoentenderdovotodoMinistroJoséDelgado,somentehaveriaexportaçãodeserviçoseoconsertodasaeronavesestrangeirassedessenoexterior.Ora,seoserviçofosserealizadonoexterioreoresultado láocorresse,estaríamosdiantedeumaexportaçãodeserviço,masseriaumahipótesedenão-incidênciadoISS(serviçoprestadointegralmentenoexteriorequeestáforadocampodeincidênciadoISS,conformedesenvolvemosacima).

OMinistroTeoriAlbinoZavascki,querestouvencidonestejulgamento,partiudeou-traconcepçãodotermo“resultado”.Segundoseuentendimento,o“resultado”doserviçonãose confunde com a “conclusão” de sua prestação. Assim, a melhor maneira de identificar onde se verificaria o resultado de determinado serviço, para fins de aplicação da norma de isenção doISS,seriadelimitarolocaldeconsumodoserviçoque,nomaisdasvezes,coincidecomodomicíliodotomador,independentementedolocaldaprestação.

A nosso ver, a interpretação que melhor se adapta com a finalidade da norma de isen-ção do ISS é a que considera “resultado” como o beneficiário efetivo do serviço, ou seja, quem usufruiudoserviçoprestado.

A decisão do STJ em análise foi a primeira e única que examinou a definição de expor-tação de serviço para fins de aplicação da regra de isenção do ISS. Ainda não há outras decisões sobreoassuntoenãosabemoscomoaSegundaTurmadoSTJprocederácomtalquestão.Porora,aguardaremosaevoluçãodajurisprudênciaeesperamostercontribuídoparaotemacomasdigressõesfeitasnopresentetrabalho.

Page 130: Fernanda Ramos Pazello

���

6SÍNTESE CONCLUSIVA

Chegamos ao final do nosso trabalho, esperando ter cumprido seu objetivo que consis-tenaanálisedasdesoneraçõestributáriasrelacionadasàsoperaçõesdeexportação,comênfaseà imunidadetributáriaprevistanoartigo149,§2.º, incisoI,daCF/88eà isençãotributáriaprevistanoartigo2.ºdaLC116/2003.

Inicialmente, definimos algumas premissas necessárias para o desenvolvimento deste trabalho,asaber:

1. Osistemaconstitucionaltributárioéformadoporprincípioseregrasquediscipli-namoexercíciodatributação.Trata-sedeumsistemarígido,umavezqueoconstituintepres-creveudetalhadamenteascompetênciastributáriaseoslimitesaopoderdetributar,nãodandoqualquer margem de liberdade ao legislador de cada ente político (União Federal, Estados,MunicípioseDistritoFederal)naaçãodetributar.

2. A competência tributária consiste na faculdade atribuída aos entes políticos deeditaremleisquecriemin abstracto tributos.AConstituiçãoFederal,aodiscriminarascom-petências tributárias, definiu quais seriam as regras-matrizes de cada tributo, ou seja, o fato econômicopossíveldesertributadoporcadaentepolítico.

3. É importante a classificação dos tributos em espécies, para que seus atributos pos-samsermelhorestudadose,alémdisso,paraquesejamestabelecidostermosmaisprecisosparacada espécie tributária. No entanto, apenas para fins metodológicos, registramos que não nos filiaremos a essa ou aquela corrente doutrinária, e, quando tratarmos das modalidades tributá-rias, tais como o PIS, a Cofins, a CSL, não nos preocuparemos em alocá-las nesta ou naquela espécietributária.

4. Ascontribuiçõesprevistasnoartigo149daCF/88sãoinstrumentoparaapromo-ção de finalidades constitucionais, na medida em que o constituinte, ao prever as contribuições, optou pela técnica da delimitação de comportamentos vinculados a finalidades. As contribui-ções sociais são aquelas modalidades tributárias que visam financiar a ordem social, tais como, no que interessa ao presente, o PIS (seguro-desemprego), a Cofins (seguridade social), a CSL (seguridade social) e a CPMF (saúde, previdência e assistência social). A norma matriz das contribuiçõessociaiséoartigo149.

Page 131: Fernanda Ramos Pazello

��3

5. Noquepertineaos limitesdopoder reformador, entendemosqueumaemendaconstitucional nãopode retirar a competência tributária dosEstados, dosMunicípios oudoDistritoFederalsobpenadeofensaaoprincípiofederativo(cláusulapétrea),maspodediminuiracompetênciatributáriadestesentesnashipótesesemquesepretendeprivilegiardireitosega-rantiasindividuais,comoéocasodainclusãodeumaimunidadetributáriaoupermissãoparainstituiçãodeumaisenção.

6. Assim,seriaconstitucional(i)aEC42/2003,queaumentouaimunidadedasope-raçõesdeexportaçãopeloICMS;e(ii)aEC33/2001,queacrescentouaimunidadedascon-tribuições sociais e de intervenção no domínio econômico sobre as receitas decorrentes deexportação;e(iii)aEC3/93,queincluiupermissãoconstitucionalparaqueleicomplementar,decaráternacional,isentasseaexportaçãodeserviços(isençãoheterônoma),poistaisreformasconstitucionaisvisamatingirumvalor(desenvolvimentonacional)quesereverteráparatodaasociedade.

7. Aleicomplementar,dopontodevistaformal,possuiumprocedimentomaisrigo-roso do que a lei ordinária, e, do ponto de vista material, tem conteúdos predeterminados pela Constituição.Quandoaleicomplementartratadematériasdesuacompetência,elaéhierar-quicamentesuperioràleiordinária.Casocontrário,ambasasleis–complementareordinária–possuemidênticahierarquia.Emmatériatributária,aleicomplementarénecessáriaparaes-tabelecer as normas gerais, dispor sobre conflitos de competência e regular as limitações consti-tucionaisaopoderdetributar,hajavistaoanseiodonossosistematributárioporuniformizaçãoeharmonia.ACF/88,aoatribuircompetênciaàleicomplementarparapreverisençãotributáriadoISSsobreasoperaçõesdeexportação,estáuniformizandoosistema,umavezque,aosereditadaditaleicomplementar,todososMunicípiosnãotributarãoaexportaçãodeserviços.

Após, tratamos de analisar a concepção de extrafiscalidade e delimitar os conceitos de desonerações tributárias e operações de exportação, ocasião na qual verificamos que:

1. Adotaremos uma visão ampliada do termo extrafiscalidade, pois entendemos que, além de estímulos e desestímulos a comportamentos, a extrafiscalidade encontra-se presente em todoexpedientetributárioquevise,intencionalounãointencionalmente,realizarvaloresqueex-cedamàmeraarrecadaçãodetributos,emboraemconjuntocomoobjetivoarrecadatório.Nestecaso, a extrafiscalidade não se limitaria a induzir ou imprimir comportamentos, nem apenas a imprimirobjetivoseconômicos,mastambémculturais,artísticosedesportivos,entreoutros.

2. A extrafiscalidade influencia os princípios informadores do Direito Tributário e tambémseusinstitutos,namedidaemqueosprincípioseasdesoneraçõestributárias,comoas

Page 132: Fernanda Ramos Pazello

���

imunidades, as isenções, a redução de base de cálculo e alíquota, encerram em si um fim extra-fiscal, uma vez que visam atingir fins externos, ou seja, econômicos, políticos e/ou sociais.

3. Ossobreprincípioseosprincípiosconstitucionais,comonormascomfortecargaaxiológica, influenciam diretamente a ação de tributar, seja no momento da interpretação das normastributárias,sejanomomentodesuaaplicação.Ossobreprincípiosrepublicano,fede-rativo(incluindoaautonomiamunicipal)edasegurançajurídica,bemcomoosprincípiosdalegalidade, da isonomia, da capacidade contributiva, da anterioridade e do não-confisco, bem comoosdemaisprincípiosprevistosnaCF/88representamlimitesàaçãodetributareimpedemabusos por parte do Poder Público.

4. Há tributos com caráter eminentemente fiscal (arrecadação de dinheiro aos cofres públicos) e tributos com uma forte carga de extrafiscalidade (atingir situações consideradas valiosaspeloordenamentojurídico).Asdesoneraçõestributáriasestãointimamenteligadasàidéia de extrafiscalidade dos tributos, uma vez que, por intermédio da imunidade, da isenção, da redução de base de cálculo ou dos incentivos fiscais, o que se pretende é atingir comportamen-toseprivilegiarvalores.Nopresentetrabalho, trataremosapenasdasimunidadese isençõestributáriasrelacionadasàsoperaçõesdeexportação.

5. As imunidades tributárias sãonormasconstitucionaisqueajudamadesenhar acompetênciatributáriaimpedindooseuexercíciosobredeterminadosfatos,pessoasoubens,para assegurar certosprincípios e/ouvalores constitucionalmenteprotegidos. Já as isençõestributáriassãonormas infraconstitucionaisque reduzemumdoscritériosda regra-matrizdeincidência tributária, em razão da ausência de capacidade econômica do beneficiário ou dos ob-jetivos de utilidade geral ou de oportunidade política do Estado. Em razão de suas finalidades, asnormasimunizantesdevemserinterpretadasdeformaamplaparaqueseatinjaomens legis (interpretaçãoteleológica),enquantoasnormasisentivasdevemserinterpretadasdeformares-tritiva,nostermosdoCTN.

6. Operaçãodeexportaçãoétodoatodeexportar,remeterprodutosouserviçosparapaíses estrangeiros, incluídos os produtos das indústrias, dos estabelecimentos comerciais, das artes ou matérias-primas nacionais. Não há dificuldades em verificar a ocorrência da exportação deumamercadoria,umavezque(i)sedáentreumexportadorbrasileiroeumimportadorestran-geiro;(ii)setratadeumbemcorpóreo;e(iii)seefetivanomomentododespachoaduaneiro.

7. Aexportaçãodeserviçosocorreentreumprestadorbrasileiroeumtomadores-trangeiro.Paraque sedêa exportação, énecessárioqueobenefíciodo serviço seja auferi-dodiretamentepelotomadorestrangeiro.Assim,(i)nocasodeserviçodemeio,osesforços

Page 133: Fernanda Ramos Pazello

��5

empreendidospeloprestadorbrasileironoBrasildevemvisarobenefíciodiretodotomadorestrangeiro,aindaqueoresultadoobtidonãolhesejafavorável;e(ii)nocasodeserviçoderesultado, o fim obtido deve beneficiar diretamente o tomador estrangeiro.

8. Considerando os fatos econômicos eleitos pelo constituinte, as operações deexportação são objeto de tributação pelos seguintes tributos: IE, IR, IPI, ICMS, ISS, Cofins, PIS,CSL,CPMFecontribuiçõesdeintervençãonodomínioeconômico.Nãoobstanteisso,nocasodoIPIedoICMS,háimunidadetributáriasobretaisoperações.NocasodoISS,háautorizaçãoconstitucionalparaquealeicomplementardesonereaexportaçãodeserviços.Por fim, as receitas decorrentes de exportação são imunes às contribuições sociais e de inter-vençãonodomínioeconômico.

9. Umdosobjetivosdosistemajurídicobrasileiro,concebidocomoumEstadoDe-mocráticoeSocialdeDireito,éodesenvolvimentonacional.Oafastamentodatributaçãodasoperações de exportação é mais um mecanismo extrafiscal que visa (i) estimular as exportações, possibilitandoacompetitividadedoBrasilnoexterior;e(ii)garantirqueostributosnãosejamexportados(princípiododestino).Portanto,asimunidadeseisençõestributáriasrepresentammaisummecanismoadotadopeloDireitoparaatenderoobjetivodedesenvolvimentonacionalegarantirdireitosfundamentais.

Apósestasdigressões,sentimo-nosaptosaanalisarosentidoeoalcancedaimunidadetributáriadoartigo149,§1.º,daCF/88edaisençãodoISSsobreaexportaçãodeserviços,ocasiãonaqualconcluímosque:

1. As receitas decorrentes de exportação são base de cálculo da Cofins (receita) e do PIS (receita), razão pela qual não há dúvida acerca da aplicação de tal imunidade para tais exações. Quanto à CSL (lucro) e à CPMF (movimentação financeira), considerando que (i) tais exaçõessãocontribuiçõessociais;(ii)asreceitasdecorrentesdeexportaçãocompõemabasedecálculodestasexações;e(iii)asimunidadesdevemserinterpretadasdeformaampla,sis-temáticaeteleológica,osvaloresdecorrentesdereceitadeexportaçãotambémnãodevemsertributadosportaisexações.

2. Osvaloresdevariaçãocambialativadecorrentedereceitadeexportaçãotambémestãoabrangidospelaimunidadedoartigo149,namedidaemquesãoreceitasdeexportaçãoou,aomenos,acessóriodareceitadeexportação,oqueconduzàaplicaçãodomesmotratamen-totributário(artigo92doCódigoCivil).Portanto,taisvaloresdevariaçãocambialativanãodevem ser tributados pelas seguintes modalidades tributárias: PIS, Cofins, CSL e CPMF.

Page 134: Fernanda Ramos Pazello

��6

3. AsvendasefetuadasàZFMsãoequiparadasàexportaçãocombasenoartigo4.ºdoDL288/67.Poressemotivo,aimunidadetributáriadoartigo149tambématingetaisreceitasdecorrentesdevendasefetuadasàZFM.

4. NocasodoISS,oartigo156,incisoIII,daCF/88outorgoucompetênciaaosMu-nicípioseaoDistritoFederalparainstituirimpostoincidentesobreserviços,desdeque(i)nãocompreendidosnocampodeincidênciadoICMS;e(ii)expressamenteprevistosemleicom-plementar.

5. Olegisladorconstituinteoriginárioouderivadopreviualgumashipótesesrelacio-nadasaoISSemqueserianecessáriaautilizaçãodeleicomplementar,visandoàuniformizaçãodo sistema jurídico e para evitar conflitos de competência entre os entes políticos (principal-menteentreosMunicípios).Assim,dependede lei complementar: a indicaçãodos serviçostributáveis pelo ISS, a fixação das alíquotas máximas e mínimas, a isenção da exportação de serviços, a regulação da forma e condições das isenções, incentivos e benefícios fiscais conce-didosourevogadoseoscritériosdaregra-matrizdeincidênciatributária.

6. Atualmente,aLC116/2003disciplinaoISS.Oseufatogeradoréaprestaçãodeserviços, ou seja, a prestação de esforço humano a terceiros, com conteúdo econômico, em caráternegocial,sobregimedeDireitoPrivado,tendenteàobtençãodeumbemmaterialouimaterial.Ocritériotemporaléomomentodaefetivaocorrênciadaprestaçãodoserviçoeocritérioespacialéolocaldoestabelecimentoprestador,ou,nafaltadeste,olocaldodomicíliodoprestador.

7. Oartigo2.ºdaLC116/2003isentouasexportaçõesdeserviçoseesclareceuque,nos casos em que o resultado do serviço verificar-se no Brasil, não há exportação de serviço. O sentido e o alcance da norma de isenção em questão dependem do significado que se dê ao ter-mo“resultado”.Concordamosqueserviçopodeserdivididoemdesenvolvimentoeresultado.Assim, considerando a finalidade da norma (não exportar tributos), resultado deve ser entendido como quem auferiu o benefício obtido em razão do serviço prestado. Ou seja, se o beneficiário encontrar-senoexterior,estamosdiantedeumaexportaçãodeserviço.Casocontrário,nãoháexportaçãodeserviço.

8. Entendemos que a norma de isenção aplica-se nas hipóteses em que o serviçofoidesenvolvidonoBrasilporprestadorbrasileiroeoresultado(entenda-sebenefício)foidi-retamenteauferidoportomadorestrangeiro.Ahipótesedeserviçoprestadointegralmentenoexterior(desenvolvimentoeresultado)estáforadocampodeincidênciadoISS,emrazãodoprincípio da territorialidade, acolhido pelo STJ. Por fim, se o serviço foi prestado no Brasil e o

Page 135: Fernanda Ramos Pazello

��7

resultado aqui se verificou, ou seja, o beneficiário do serviço está no Brasil, não há exportação de serviço, como bem ressaltado no parágrafo único do artigo 2.º da LC 116/2003.

9. OSTJ,aoanalisarumcasoconcretodereparodeturbinadeaviãoporprestadorbrasileironoBrasilparatomadorestrangeiro,entendeuquenãoháexportaçãodeserviçose,poressemotivo,afastouaaplicaçãodaregradeisençãodoISS.NoentenderdoSTJ,oresultadodeu-senoBrasil,umavezqueaturbinafoiconsertadaaqui.Assim,sóhaveriaexportaçãodeserviçoseoserviçofosseprestadonoexterior.

10. Entendemosque,seoserviçofosseprestadointegralmentenoexterior,estaríamosdiantedeumahipótesedenão-incidênciadoISS.Alémdisso,acreditamosqueoSTJnãocon-siderou a finalidade da norma de isenção. Ora, se o prestador é brasileiro e presta um serviço visandoaobenefíciodetomadorestrangeiro,éevidentequeháexportaçãodeserviço,isentadoISS.Odesenvolvimentodoserviçodeu-senoBrasil,masoresultado(entenda-sebenefício)foiauferidoportomadorestrangeiro.Issoéexportaçãodeserviço!

Page 136: Fernanda Ramos Pazello

��8

7

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARO,Luciano.Direito tributário brasileiro.11.ed.SãoPaulo:Saraiva.2005.

ARAÚJO,LuizAlbertoDavid;NUNESJÚNIOR,VidalSerrano.Curso de direito constitucio-nal.SãoPaulo:Saraiva,1998.

ATALIBA,Geraldo.Hipótese de incidência tributária.6.ed.SãoPaulo:Malheiros,2000.

______.República e Constituição.AtualizadoporRosoleaMirandaFolgosi.2.ed.SãoPaulo:Malheiros,2004.

______.Sistema constitucional tributário brasileiro.SãoPaulo:RT,1968.

ÁVILA,Humberto. Imposto sobreaPrestaçãodeServiçosdeQualquerNatureza.Exporta-çãodeserviços.LeiComplementarn.º116/2003.Isenção:requisitosealcance.Conceitosde“desenvolvimento” de serviço e “verificação” do seu resultado. RevistaDialética de Direito Tributário,n.134,p.101-109,nov.2006.

______.Sistema constitucional brasileiro.SãoPaulo:Saraiva,2004.

______.Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros,2003.

BALEEIRO,Aliomar.Direito tributário brasileiro.AtualizadoporMisabelAbreuMachadoDerzi.11.ed.RiodeJaneiro:Forense,2005.

______.Limitações constitucionais ao poder de tributar.AtualizadoporMisabelAbreuMa-chadoDerzi.7.ed.RiodeJaneiro:Forense,2005.

BARRETO,AiresF.ISS–momentodaocorrênciadofatotributário.Repertório IOB de Juris-prudência,n.4/95,CadernoI,2.ªquinzenafev.1995.

______.ISS na Constituição e na lei.2.ed.SãoPaulo:Dialética,2005.

______;BARRETO,PauloAyres.Imunidades tributárias:limitaçõesconstitucionaisaopoderdetributar.SãoPaulo:Dialética,2001.

BECKER,AlfredoAugusto.Teoria geral do direito tributário.3.ed.SãoPaulo:Lejus,1998.

BOBBIO,Norberto.Da estrutura à função.Novos estudosda teoriadodireito.SãoPaulo:Manole,2007.

Page 137: Fernanda Ramos Pazello

��9

BORGES, José Souto Maior. Introdução ao direito financeiro. São Paulo: Max Limonad,1998.

______.Isenções tributárias.2.ed.SãoPaulo:SugestõesLiterárias,1980.

______.Lei complementar tributária.SãoPaulo:RT,1975.

BRITO,CarlosAyres.AConstituiçãoeomonitoramentodesuasemendas.Direito do Estado:novosrumos.SãoPaulo:MaxLimonad,2001.t.1.

BULOS,UadiLammêgo.Mutação constitucional. SãoPaulo:Saraiva,1997.

CANTO,GilbertodeUlhôa;SOUZA,AntonioCarlosGarciade;FONSECA,MarceloBeltrãoda.Contribuiçõessociais.Caderno de Pesquisas Tributárias,SãoPaulo,co-ediçãoCentrodeExtensãoUniversitáriaeEditoraResenhaTributária,n.17,1992.

CARRAZZA,RoqueAntonio.Curso de direito constitucional tributário.21.ed.rev.,ampl.eatual.atéaEmendaConstitucionaln.º48/2005.SãoPaulo:Malheiros.2005.

______. ICMS.10.ed.SãoPaulo:Malheiros,2005.

______; BOTTALO,Eduardo.Operaçõesdeexportaçãoeequiparadaseimunidadeàcontribui-çãosocialsobreolucro.Revista Dialética de Direito Tributário,SãoPaulo,n.91.

CARVALHO,PaulodeBarros.Curso de direito tributário.17.ed.SãoPaulo:Saraiva,2005.

______.Direito tributário: fundamentos jurídicosda incidência tributária.2.ed.SãoPaulo:Saraiva,1999.

______.Sobreosprincípiosconstitucionaistributários.Revista de Direito Tributário,SãoPau-lo,n.65.

CASÁS, José Osvaldo. Os princípios no direito tributário. In: FERRAZ, Roberto (Coord.).Princípios e limites da tributação.SãoPaulo:QuartierLatin,2005.

CHIESA, Clélio. A competência tributária do Estado brasileiro. Desonerações nacionais eimunidadescondicionadas.SãoPaulo:MaxLimonad,2002.

CÔELHO,SachaCalmonNavarro.Comentários à Constituição de 1988:sistematributário.3.ed.RiodeJaneiro:Forense, 1991.

______. O controle da constitucionalidade das leis e do poder de tributar na Constituição de 1988.3.ed.rev.,atual.eampl.BeloHorizonte:DelRey,1999.

______. Manual de direito tributário.RiodeJaneiro:Forense,2001.

______. Teoria geral do tributo e da exoneração tributária.BeloHorizonte:DelRey,2000.

Page 138: Fernanda Ramos Pazello

�30

COSTA,ReginaHelena.Imunidades tributárias:teoriaeanálisedajurisprudênciadoSTF.2.ed.rev.eatual.SãoPaulo:Malheiros,2006.

CRUZ,Duarto Ivo.Enquadramento jurídicoeeconômicodaexportação.Revista de Direito Mercantil,n.17.

DELGADO,José.Imunidadetributária–Aspectoscontrovertidos.Imunidadestributárias.Pes-quisas Tributárias–NovaSérie,SãoPaulo:RT,n.4,1998.

DEMITA,Enrico.Oprincípiodacapacidadecontributiva. In:FERRAZ,Roberto (Coord.).Princípios e limites da tributação.SãoPaulo:QuartierLatin,2005.

DEPLÁCIDOESILVA.Vocabulário jurídico.14.ed.RiodeJaneiro:Forense,2007.

FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 2. ed.SãoPaulo:RT,1971.

FALCÃO,RaimundoBezerra.Tributação e mudança social.RiodeJaneiro:Forense,1981.

FERNANDES,EdisonCarlos.TratamentodoImpostosobreExportaçãonasnormastributáriasdoMercadoComumdoSul–Mercosul.Revista Dialética de Direito Tributário,n.70,jul.2001.

FERNANDES,RodrigodeSalazar.ACPMFeaimunidadedasreceitasdeexportaçãoemre-laçãoàincidênciadascontribuiçõessociais.Revista de Estudos Tributários,n.39,set.-out.2004.

FERNÁNDEZ,GermanAlejandroSanMartín.OISSQN(impostosobreserviçosdequalquernatureza)incidentesobreimportaçãodeserviçoseoalcancedaexpressão“cujoresultadoseverifique no País” e a isenção (heterônoma) na exportação prevista na LC n.º 116/2003. Revis-ta de Direito Tributário Internacional,SãoPaulo:QuartierLatin,ano2,n.6,ago.2007.

FERRAZJÚNIOR,TércioSampaio.Introdução ao estudo do direito.2.ed.SãoPaulo:Atlas,1994.

GALHARDO,LucianaRosanova.Rateio de despesas no direito tributário.SãoPaulo:QuartierLatin,2004.

GARCÍADEENTERRÍA,Eduardo.La Constitución como norma y el Tribunal Constitucio-nal. Madrid:Civitas,1985.

GONÇALVES, Fernando Dantas Casillo. Cofins, PIS E CSLL – Variações cambiais ativas e créditopresumidodoIPIdaLein.º9.363/96–Imunidadedasreceitasdecorrentesdeexporta-ção–Artigo149daConstituiçãoFederal.Repertório IOB de Jurisprudência,Riodejaneiro,v.1,2.ªquinzenamar.2004.

Page 139: Fernanda Ramos Pazello

�3�

GOUVÊA,MarcusdeFreitas.A extrafiscalidade no direito tributário.BeloHorizonte:DelRey,2006.

GRECO,MarcoAurélio.Contribuições: uma figura “sui generis”. São Paulo: Dialética, 2000.

______. Perfil constitucional das contribuições de intervenção no domínio econômico. In: ______. (Coord.).Contribuições de intervenção no domínio econômico e figuras afins.SãoPaulo:Dialé-tica,2001.

GRILLO,FábioArtigas.TributaçãodasexportaçõesnoMercosul.Revista Tributária e de Fi-nanças Públicas, Coord.DejalmadeCampos,SãoPaulo:RT,ano14,jul.-ago.2006.

GRUPENMACHER,BetinaTreiger.Eficácia e aplicabilidade das limitações constitucionais ao poder de tributar.SãoPaulo:ResenhaTributária,1997.

HILÚNETO,Miguel.OconceitosistemáticodelucroparaaCSL.In:CEZAROTI,Guilherme(Coord.).Contribuições.SãoPaulo:QuartierLatin,2003.

HORVATH, Estevão. Classificação dos tributos. In: BARRETO, Aires F.; BOTTALLO, Eduar-doDomingos(Coord.).Curso de iniciação em direito tributário.SãoPaulo:Dialética,2004.

IVO,Gabriel.Incidênciadanormajurídica–ocercodalinguagem.Revista de Direito Tribu-tário,v.79,p.189.

LIMAGONÇALVES,JoséArtur.Aimunidadetributáriadolivro.In: MACHADO,HugodeBrito(Coord.).Imunidade tributária do livro eletrônico.SãoPaulo:IOBInformaçõesObje-tivas,1998.

______. Imposto sobre a renda:pressupostosconstitucionais.SãoPaulo:Malheiros,2002.

LIMA JUNIOR, Joel Gonçalves de. Ilegitimidade do PIS e da Cofins sobre as variações cam-biaisdecorrentesdeexportação.Revista Dialética de Direito Tributário,n.123,dez.2005.

MACHADO,HugodeBrito.Curso de direito tributário.13.ed.SãoPaulo:Malheiros,1998.

______. Nãoincidência,imunidadeseisençõesdoICMS.Revista dos Tribunais,SãoPaulo,ano86,v.742,ago.1997.

MARTINS,IvesGandradaSilva(Coord.).Imunidades tributárias.SãoPaulo:RT,1998.

______;BASTOS,CelsoRibeiro.Comentários à Constituição do Brasil.SãoPaulo:Saraiva,1990.v.6,t.I.

MARQUES,MárcioSevero.Classificação constitucional dos tributos.SãoPaulo:MaxLimo-nad,2000.

Page 140: Fernanda Ramos Pazello

�3�

MAXIMILIANO,Carlos.Hermenêutica e aplicação do direito.16.ed.RiodeJaneiro:Foren-

se,1997.

MELO,JoséEduardoSoaresde.Aspectos teóricos e práticos do ISS.4.ed.SãoPaulo:Dialé-

tica,2005.

______.Contribuições sociais no direito tributário.4.ed.SãoPaulo:Malheiros,2003.

______.ICMS:teoriaeprática.5.ed.SãoPaulo:Dialética,2002.

______; LIPPO,LuizFrancisco.A não-cumulatividade tributária(ICMS,IPI,ISS,PISeCO-

FINS).2.ed.SãoPaulo:Dialética,2004.

MINATEL,JoséAntonio.Conteúdo do conceito de receita e regime jurídico para sua tributa-

ção.SãoPaulo:MPEditora,2005.

MORAES,BernadoRibeirode.Aimunidadetributáriaeseusnovosaspectos.In:

OLIVEIRA,YonneDolaciode.ImunidadestributáriasnaConstituiçãode1988.Direito tribu-

tário atual.SãoPaulo:ResenhaTributária,1992.v.11-12.

PACHECO, Angela Maria da Motta. Extrafiscalidade e o imposto de exportação. In: SCHOUE-

RI,LuísEduardo(Coord.).Direito tributário.HomenagemaAlcidesJorgeCosta.SãoPaulo:

QuartierLatin,2003.v.1.

PAULSEN,Leandro.Direito tributário:ConstituiçãoeCódigoTributárioàluzdadoutrinaeda

jurisprudência.3.ed.PortoAlegre:LivrariadoAdvogado,2001.

PERTENCE, José Paulo Sepúlveda. Direito do Estado: novos rumos. In: MODESTO, Paulo;

MENDONÇA,Oscar(Coord.).Direito constitucional.Ocontroledeconstitucionalidadedas

emendasconstitucionaispeloSupremoTribunalFederal:crônicadejurisprudência.SãoPau-

lo:MaxLimonad,2001.t.1.

PIERDONÁ,ZéliaLuiza.Odireitoprevidenciáriocomodireitofundamental.Revista de Direi-

to Social,SãoPaulo,v.6,2002.

PIRES,AdilsonRodrigues.Curso de direito tributário brasileiro.CoordenaçãodeMarcusLí-

vioGomeseLeonardoPietroAntonelli.SãoPaulo:QuartierLatin,2005.v.1,capítulo18.

RONCAGLIA,MarceloMarques.OISSeaimportaçãoeexportaçãodeserviços.Revista Dia-

lética de Direito Tributário,v.129,p.98-111,jun.2006.

SANTI,EuricoMarcosDinizde.Lançamento tributário.SãoPaulo:MaxLimonad,1996.

Page 141: Fernanda Ramos Pazello

�33

SARAIVA,Carmen;FONSECA,Silvia.AimunidadedareceitadaexportaçãoemfacedaCon-tribuiçãoSocialsobreoLucroLíquido.Repertório IOB de Jurisprudência, Tributário, Cons-titucional e Administrativo, v.1,jan.-dez.2004.

SCHOUERI,LuísEduardo.ISSsobreaImportaçãodeServiçosdoExterior.Revista Dialética de Direito Tributário,n.100.

SILVA,JoséManoel.Imunidadesconstitucionais–escopoeincompreensão.In:NOGUEIRA,RuyBarbosa(Coord.).Direito tributário atual.SãoPaulo:ResenhaTributária,1995.v.14,p.162.

SOUZA,HamiltonDiasde.Acompetência tributáriae seuexercício:a racionalidadecomolimitaçãoaopoderdetributar.In:MARTINS,IvesGandradaSilva(Coord.).Estudos sobre o imposto de renda(emmemóriadeHenryTilbery).SãoPaulo:ResenhaTributária,1994.

______. ______.In:FERRAZ,Roberto(Coord.).Princípios e limites da tributação.SãoPaulo:QuartierLatin,2005.

SPAGNOL,WertherBotelho.As contribuições sociais no direito brasileiro.RiodeJaneiro:Forense,2002.

TÔRRES,HelenoTaveira.OIVAnaexperiênciaestrangeiraeatributaçãodasexportaçõesnodirei-tobrasileiro.Revista Fórum de Direito Tributário,BeloHorizonte,ano3,n.16,jul.-ago.2005.

TORRES,RicardoLobo.Asegurançajurídicaeaslimitaçõesconstitucionaisaopoderdetri-butar.In:FERRAZ,Roberto(Coord.).Princípios e limites da tributação.SãoPaulo:QuartierLatin,2005.

______. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário.2.ed.RiodeJaneiro:Reno-var,2000.

TROIANELLI,GabrielLacerda;GUEIROS,Juliana.OISSeexportaçãoeimportaçãodeser-viços.In:PEIXOTO,MarceloMagalhães;MARTINS,IvesGandradaSilva(Org.).ISS e a LC 116/2003.Curitiba:Juruá,2004.p.199-208.

TROMBINIJUNIOR,Nelson.As espécies tributárias na Constituição Federal de 1988.SãoPaulo:MPEditora,2006.

______.Limitesmateriaisdacompetênciareformadora.Revista de Direito Social,SãoPaulo,v.6,2002.

UCKMAR, Victor. Princípios comuns de direito constitucional tributário. São Paulo: RT,1976.

WEIDLICH,MariaPaulaFarina.Imunidade tributária das instituições sem fins lucrativos.SãoPaulo:MPEditora,2005.