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ESCOLA BÁSICA DA VENDA DO PINHEIRO PORTUGUÊS – 9.º ANO FICHA DE REVISÕES 2012/2013 Prof.ª Sílvia Rebocho Um fio de fumo nos confins do mar (...) Por isso a minha mãe achou que, ao fim de nove anos, a minha carreira académica podia perfeitamente dar-se por concluída. - Por que não vai ela para um curso de cinema? – perguntou o Crispim, decerto cheio de pena de não ter a minha idade, acrescentando imediatamente: - Só com o 9º ano vai ter sérias dificuldades em enfrentar o mercado de trabalho. Ainda para mais com estas leis comunitárias. Ninguém sabia que leis eram aquelas, mas também ninguém se deu ao trabalho de perguntar, e o Crispim ficou um bocado pendurado. Estudar mais, para quê, perguntava a minha mãe, adiantando logo histórias ouvidas no Jardim da Parada, a filha da D. Alzirinha da retrosaria, por exemplo, queimara as pestanas e o dinheiro dos pais a tirar um curso superior, e agora estava a vender pipocas num dos cinemas das Amoreiras, e era porque a mãe conhecia o gerente e metera uma cunha. Depois vinha ainda o sobrinho do Sr. Arménio do talho, que, ao fim de cinco anos na Universidade e o direito a usar Dr. antes do nome, fora parar às camionetas de recolha do lixo, como única alternativa ao desemprego. A minha mãe conseguia, em cinco minutos, arranjar meia dúzia de exemplos muito jeitosos. Diante disso, e por mais que a Nani lhe dissesse que as minhas capacidades intelectuais mereciam, pelo menos, que eu fizesse o 12º ano, e on verrait après, a minha mãe continuou na dela: - A Mina acaba o 9º ano e vai à vida. Murmurando, logo de seguida: - Eu andei na Universidade e a minha vida é o que se vê. O Crispim também intercedeu por mim, evidentemente, ele só quer o meu bem e além disso está sempre, sempre, ao lado da cultura, mas a minha mãe quando se lhe enfia uma coisa na cabeça, nada a fazer: - Tu não pertences à família e por isso não te metas no assunto. Quer dizer: para aguentar as reuniões dos encarregados de educação, ele já pertence à família; para ter opinião sobre o meu destino, já é de fora. É assim que a minha mãe o leva. E o palerma aguenta tudo. (...) Alice Vieira, Um fio de fumo nos confins do mar, Ed. Caminho

Ficha Revisões 9

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ESCOLA BÁSICA DA VENDA DO PINHEIRO PORTUGUÊS – 9.º ANO

FICHA DE REVISÕES 2012/2013 Prof.ª Sílvia Rebocho

Um fio de fumo nos confins do mar (...) Por isso a minha mãe achou que, ao fim de nove anos, a minha carreira académica podia perfeitamente dar-se por concluída. - Por que não vai ela para um curso de cinema? – perguntou o Crispim, decerto cheio de pena de não ter a minha idade, acrescentando imediatamente: - Só com o 9º ano vai ter sérias dificuldades em enfrentar o mercado de trabalho. Ainda para mais com estas leis comunitárias. Ninguém sabia que leis eram aquelas, mas também ninguém se deu ao trabalho de perguntar, e o Crispim ficou um bocado pendurado. Estudar mais, para quê, perguntava a minha mãe, adiantando logo histórias ouvidas no Jardim da Parada, a filha da D. Alzirinha da retrosaria, por exemplo, queimara as pestanas e o dinheiro dos pais a tirar um curso superior, e agora estava a vender pipocas num dos cinemas das Amoreiras, e era porque a mãe conhecia o gerente e metera uma cunha. Depois vinha ainda o sobrinho do Sr. Arménio do talho, que, ao fim de cinco anos na Universidade e o direito a usar Dr. antes do nome, fora parar às camionetas de recolha do lixo, como única alternativa ao desemprego. A minha mãe conseguia, em cinco minutos, arranjar meia dúzia de exemplos muito jeitosos. Diante disso, e por mais que a Nani lhe dissesse que as minhas capacidades intelectuais mereciam, pelo menos, que eu fizesse o 12º ano, e on verrait après, a minha mãe continuou na dela: - A Mina acaba o 9º ano e vai à vida. Murmurando, logo de seguida: - Eu andei na Universidade e a minha vida é o que se vê. O Crispim também intercedeu por mim, evidentemente, ele só quer o meu bem e além disso está sempre, sempre, ao lado da cultura, mas a minha mãe quando se lhe enfia uma coisa na cabeça, nada a fazer: - Tu não pertences à família e por isso não te metas no assunto. Quer dizer: para aguentar as reuniões dos encarregados de educação, ele já pertence à família; para ter opinião sobre o meu destino, já é de fora. É assim que a minha mãe o leva. E o palerma aguenta tudo. (...)

Alice Vieira, Um fio de fumo nos confins do mar, Ed. Caminho

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I – COMPREENSÃO ESCRITA

1. Identifica as personagens do texto. 1.1 Classifica-as de acordo com a sua importância na ação. 2. Transcreve a frase que dá origem ao problema existente no texto transcrito. 2.1 Resume-o em poucas linhas. 2.2.Manifesta a tua opinião e refere a personagem com que mais te identificas. Justifica. 2.3 Enumera, de acordo com o texto, as situações que atualmente afetam os jovens no pós-estudo. 3. Que sentimentos dominam as personagens, quando se referem à narradora? 3.1 Como classificas a narradora, quanto à presença? Justifica com um exemplo do texto. 4. Explica, por palavras tuas, esta frase: “ A Mina acaba o 9º ano e vai à vida. “. 5. Que modo de apresentação do discurso domina o excerto transcrito? Apresenta duas razões que justifiquem a tua resposta.

II – FUNCIONAMENTO DA LÍNGUA

1. Identifica a classe e a subclasse de cada uma das palavras que constitui a frase que se segue: A minha mãe conseguia arranjar alguns exemplos muito jeitosos! . 2. Indica o processo de formação do advérbio “imediatamente“. 3. Que tipos de frase encontras no texto? Exemplifica cada caso. 4. Faz a análise sintática da frase: Naquele dia, o Crispim deu-me o seu apoio! . 5. Divide a seguinte frase complexa em orações e classifica-as: “A Mina acaba o 9º ano e vai à vida.“ .

III – EXPRESSÃO ESCRITA

Escrever é exprimirmo-nos e exprimir o mundo que nos rodeia. Por isso, compõe um pequeno texto em que nos fales de um dos teus sonhos ou de um dos teus projetos, ao terminares o 9º ano.

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SOLUÇÕES

I – COMPREENSÃO ESCRITA

1. As personagens do texto são a Mina, a sua mãe, o Crispim, a filha da D. Alzirinha da retrosaria, o sobrinho do Sr. Arménio do talho e a Nani. 1.1 De acordo com a sua importância na ação, a Mina é a personagem principal; a sua mãe e o Crispim são personagens secundárias; a filha da D. Alzirinha da retrosaria, o sobrinho do Sr. Arménio do talho e a Nani são personagens mencionadas ou aludidas. 2. A frase que dá origem ao problema existente no texto transcrito é “Por isso a minha mãe achou que, ao fim de nove anos, a minha carreira académica podia perfeitamente dar-se por concluída.”. 2.1 O problema é que a mãe da Mina acha que a filha deve ficar-se pelo 9º ano, já que a continuação dos estudos não significa a obtenção de emprego. O Crispim tem uma ideia contrária, uma vez que acredita que dessa forma a rapariga terá mais dificuldades em enfrentar o mercado de trabalho. 2.2.Resposta pessoal 2.3 De acordo com o texto, as situações que atualmente afetam os jovens no pós-estudo são o desemprego e a necessidade de aceitar trabalhos que ficam aquém da qualificação de cada um. 3. Quando se referem à narradora, o Crispim manifesta pena e tenta defender os seus interesses. A mãe da Mina parece decidida, mostrando o seu lado mais pragmático. 3.1 A narradora, quanto à presença, é participante, já que utiliza a 1ª pessoa gramatical, para contar um episódio no qual intervém. Um exemplo do texto que o pode justificar é “O Crispim também intercedeu por mim (…) mas a minha mãe (…)”. 4. A frase significa que, depois do 9.º ano, a Mina deixará de estudar e vai começar a trabalhar. 5. O modo de apresentação do discurso predominante é a narração, porque se conta uma história e constitui um momento de avanço na narrativa.

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II – FUNCIONAMENTO DA LÍNGUA

1. A – determinante artigo definido minha – determinante possessivo mãe – nome comum, concreto conseguia – forma verbal do verbo conseguir no pretérito imperfeito do indicativo, 3ª pessoa do singular arranjar – verbo no infinitivo alguns – determinante indefinido exemplos – nome abstrato muito – advérbio de quantidade jeitosos – adjetivo no grau superlativo absoluto analítico 2. “imediatamente“ – palavra derivada por sufixação 3. Existem frases dos tipos declarativo (“A Mina acaba o 9.º ano e vai à vida.”); interrogativo (“- Por que não vai ela para um curso de cinema?”) e imperativo (“…não te metas no assunto.”). 4. Naquele dia – C.C. de Tempo o Crispim - Sujeito deu-me o seu apoio - Predicado me – C. Indireto o seu apoio – C. Direto 5. A Mina acaba o 9º ano – oração coordenada e vai à vida – oração coordenada copulativa

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