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Prof. RITA FREITAS
LICENCIADA EM HISTRIA
PS GRADUADA ESPECIALISTA EM PLANEJAMENTO EDUCACIONAL E POLTICAS PBLICAS
PS GRADUADA ESPECIALISTA EM EDUCAO INCLUSIVA
PS GRADUADA ESPECIALISTA EM CULTURA AFRO BRASILEIRAS
PS GRADUANDA ESPECIALISTA EM DOCENCIA DO ENSINO SUPERIOR
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I UNIDADE 1. APRENDENDO FILOSOFIA
Provavelmente muitos de vocs nunca estudaram filosofia ou leram o livro de algum filsofo.
Desse modo, ao ficarem sabendo que estudariam filosofia no ensino mdio devem ter se
perguntado: O que filosofia? O que ns vamos estudar em filosofia? Alguns podem estar
curiosos e outros preocupados.
Antes de respondermos essas perguntas importante fazermos algumas uma observaes:
para estudar filosofia preciso uma dedicao a leitura, pois na nossa disciplina nosso
principal material de trabalho sero os TEXTOS. Utilizaremos tanto os textos clssicos
escritos pelos filsofos como textos de revistas e jornais que nos auxiliem a estudar
determinados problemas filosficos.
Para comearmos a entender o que a filosofia e o que os filsofos estudam vamos observar o
afresco do pintor renascentista Rafael:
Essa pintura de Rafael tem o nome de Filosofia. Vemos
primeiramente no afresco uma mulher que representa a
filosofia segurando dois livros. Na mo esquerda ela tem
um livro sobre Moral j na mo direita um livro
sobre a Natureza. Esses dois livros segurados pela
mulher da pintura nos ajudam a compreender o qu a
filosofia estuda. A filosofia surgiu primeiramente como
uma investigao da Natureza, ou seja, tudo aquilo que
no produzido pelo ser humano, tal como o movimento
dos astros, a cheia dos rios, a mudana das estaes.
Posteriormente a filosofia passou a se interessar pelo estudo do
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prprio ser humano e pelas coisas que s existem porque foram produzidas pelos seres
humanos. O livro sobre Moral que a mulher da pintura segura representa o conhecimento
dessas coisas que so produzidas pelo homem. Se pensarmos, por exemplo, nas noes de
bem e mal, veremos que elas s existem onde existe o ser humano, elas no se encontram na
natureza entre os animais ditos irracionais, os vegetais ou os minerais. importante levarmos
em considerao que a moral no a nica coisa produzida pelos seres humanos que a
filosofia estuda. Os filsofos tambm se dedicam ao estudo das cincias e das tecnologias, da
poltica, da arte, das religies. Tudo isso foi produzido pela humanidade, de modo que ao
conhecermos essas coisas conhecemos melhor o prprio ser humano. Scrates, o mais famoso
filsofo da Grcia Antiga, ao se consultar no orculo da cidade de Delfos ouviu o seguinte:
Conhece-te a ti mesmo! Scrates no foi para casa e ficou sozinho tentando conhecer quem
era ele, muito pelo contrrio, o filsofo passou a perambular pelas ruas de Atenas debatendo
com as pessoas sobre poltica, cincia, arte, religio e moral. O que Scrates nos ensina que
investigar aquilo que foi produzido pela humanidade a melhor forma dos seres humanos
conhecerem o que eles so.
J sabemos ento o que os filsofos estudam: 1) a natureza, ou seja, as coisas que no foram
produzidas pelos seres humanos; 2) o ser humano e tudo que produzido por ele, isto , a
moral, a poltica, as religies, as leis, a arte, a cincia, a tecnologia. Vemos que os filsofos
estudam muitas coisas e muitas coisas que eles estudam tambm so estudadas por outros
profissionais como o bilogo, o fsico, o qumico, o socilogo, o economista, o psiclogo ou o
historiador. Mas o que o filsofo faz de diferente? O que distingue a filosofia de outras formas
de conhecimento? Para entendermos isso voltemos a observar a pintura de Rafael.
Na pintura de Rafael ao lado da mulher que simboliza a filosofia h dois querubins. Eles
carregam duas placas com a inscrio em latim Causarum Cognitio, que significa Conhea atravs da causas. Rafael pretende com essa imagem fazer uma aluso ao filsofo grego Aristteles. Foi Aristteles que afirmou que a filosofia o conhecimento das causas
primeiras. Sendo assim, a filosofia aborda aqueles temas que descrevemos acima buscando
compreender suas causas. A filosofia aborda esses temas fazendo as seguintes perguntas: "Por
qu?", "Como?", "Para qu?" e "De que feito?". Isso que distingue a filosofia de outras
formas de conhecimento, uma busca incessante das causas primeiras.
Calma, calma, calma! Talvez essa histria de causas primeiras ainda no esteja clara para
vocs. Vamos entender isso melhor j, j.
1.1. O CONHECIMENTO DAS CAUSAS PRIMEIRAS
Segundo Aristteles a filosofia o conhecimento das causas primeiras. Mas o qu esse
filsofo grego queria dizer com isso? Quais so essas causas primeiras? Antes de comearmos
a entender isso importante sabermos que Aristteles enumera quatro causas diferentes:
causa material, causa formal, causa eficiente e causa final. As histrias em quadrinhos abaixo
vo nos ajudar a compreender quais so essas causas que a filosofia busca conhecer. Vejamos
o primeiro quadrinho:
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Acima temos o quadrinho da Mafalda desenhado pelo cartunista argentino Quino. No
quadrinho temos a personagem Mafalda com seu amigo Miguelito. Nesse quadrinho temos
um bom exemplo disso que Aristteles chama de causa material. Para Aristteles a causa
material diz respeito s menores partes ou os materiais de que algo feito. O filsofo que
busca conhecer a causa material de algo faz a seguinte pergunta: de qu feito isto? No
quadrinho o personagem Miguelito, graas a sua imaginao infantil, supe que o mar feito
de sopa, ou seja, ele acredita que a causa material do oceano a sopa, a sopa o material de
que feito o mar. Mafalda por no gostar muito de sopa no se sente muito bem com a
especulao de seu amiguinho.
O prximo quadrinho da Mafalda vai nos ajudar a entender o que Aristteles chama de causa
formal.
No quadrinho acima Mafalda olhando o dicionrio descobre a definio, o conceito de
democracia que : um governo em o poder poltico exercido pelo povo. Aristteles chama
de causa formal uma definio, um conceito que serve de modelo para alguma coisa. Por
exemplo, um carpinteiro ao construir uma cadeira ter em mente o conceito de cadeira, isto ,
a ideia de uma pea mobiliria utilizada para se sentar com quatro pernas e um encosto para
as costas. Essa noo a causa formal e ela servir de modelo para o carpinteiro. Podemos
pensar outro exemplo a partir do quadrinho da Mafalda. A ideia de um governo em que o povo exerce o poder o modelo, a causa formal de um pas que queira ser democrtico. Mafalda parece no achar possvel que esse tipo de modelo possa ser realizado, tanto que ela
passa o dia inteiro rindo depois de conhecer o conceito de democracia. Ao investigar a causa
formal os filsofos perguntam: como ? o qu define isto?
O conceito de causa eficiente ser explicado com a ajuda do prximo quadrinho:
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Nesse quadrinho vemos Mafalda, seu amigo Filipe e seu irmo Guile. O irmo de Mafalda
pergunta se o calor culpa do governo. Guile acha que foi o governo que deu incio, que
provocou o aparecimento do calor. O garotinho pergunta isso provavelmente porque ele
sempre escutou os adultos falando que uma coisa ruim sempre culpa do governo. O que
Aristteles chama de causa eficiente aquilo que d incio, aquilo que faz algo surgir. O
personagem Guile acha que o governo causa eficiente do calor, j que ele acha que foi o
governo que comeou o calor. Ao investigar a causa eficiente os filsofos perguntam: o que
fez comear algo? o qu deu incio a uma ao? Vejamos outro exemplo. O filsofo francs
Jean-Jaques Rousseau buscou compreender como surge a desigualdade entre os homens. Por
que uns tem poder e outros no? Por que uns so ricos e outros pobres? Por que uns mandam
e outros obedecem? Para Rousseau a desigualdade surge com o aparecimento da propriedade
privada. Para ele antes os homens tinham tudo em comum, todas as coisas pertenciam a todos.
A partir do momento que algum homem cerca a terra e fala isso meu e no seu, surge a
propriedade privada, e com isso a desigualdade. Ou seja, podemos dizer que para Rousseau a
propriedade privada a causa eficiente da desigualdade entre os homens, pois ela que faz
surgir a desigualdade.
Por ltimo temos agora a causa final. Vejamos o ltimo quadrinho da Mafalda.
Neste quadrinho a personagem Mafalda se surpreende com os operrios furando, martelando e
batendo em uma rua. Com sua inocncia infantil Mafalda quer saber qual o objetivo dos
operrios, qual a finalidade dessas atividades praticadas por ele. Por isso ela pergunta se os
operrios esto querendo que a rua confesse algo. No entendimento da garotinha os operrios
parecem estar torturando a rua. Aristteles chama de causa final aquilo que o objetivo
aquilo que a finalidade de alguma coisa ou alguma ao. Para Mafalda a causa final dos
operrios fazer com que a rua confesse algo. Quando os filsofos investigam a causa final
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eles perguntam: Para qu isso? Para qu se faz isso? Assim, um filsofo que estuda a
poltica pode querer investigar para qu os homens criam leis?
Se as quatro causas que os filsofos buscam explicar ainda no esto claras para vocs, vejam
os quadrinhos abaixo em que Aristteles as explicam junto com seu aluno Alexandre Magno,
que posteriormente se tornou Alexandre o grande.
ATIVIDADES
1. Construa uma tabela explicando as quatro causas que a filosofia estuda. Na tabela
deve conter o nome das causas, a definio de cada uma delas, um exemplo de cada e a
pergunta feita quando se busca compreend-las.
2. Encontrando as quatro causas nos textos: Leia os textos abaixo buscando identificar
uma das quatro causas descritas por Aristteles. Depois de ler voc deve indicar: qual
o tipo da causa (material, formal, eficiente e final)? o qu a causa? A causa causa de
qu? Vejam os dois exemplos abaixo.
A) A alma corprea, composta de partculas sutis, difusa por toda a estrutura corporal [...]. (Antologia de textos. Epicuro)
B) [...] a unio entre o homem e a mulher tem por fim no somente a procriao, mas a perpetuao da espcie [...]. (Segundo tratado sobre o governo civil. John Locke)
C) O governo do estado moderno no se no um comit para gerir os negcios comuns de toda a classe burguesa. (Manifesto do partido comunista. Karl Marx)
EXEMPLOS:
[...] a origem de todas as sociedades, grandes e duradouras, no a boa vontade mtua que os homens tm entre si, mas sim o medo mtuo que nutriam uns pelos outros. (Do Cidado. Thomas Hobbes)
Tipo de causa: causa eficiente
O que a causa? O medo mtuo entre os homens
A causa causa de qu? Todas as sociedades grandes e duradouras
Esse texto trata da causa eficiente. Ele mostra que a causa eficiente de todas as
grandes sociedades o medo mtuo entre os homens, ou seja, o que faz surgir as
grandes sociedades o medo mtuo entre os homens.
A Cidade uma sociedade estabelecida, com casas e famlias, para viver bem, isto , para se levar uma vida perfeita e que se baste a si mesma. (Poltica. Aristteles)
Tipo de causa: causa final
O que a causa? Viver bem, levar uma vida perfeita
A causa causa de qu? A Cidade
Esse texto trata da causa final. Ele mostra que o bem viver a causa final da Cidade,
ou seja, a finalidade da Cidade proporcionar um bem viver para as pessoas.
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D) O nico objetivo do Estado proteger os indivduos uns dos outros e todos juntos de inimigos externos. (A arte de insultar. Arthur Schopenhauer)
E) A verdadeira e legtima meta das cincias a de dotar a vida humana de novos inventos e recursos. (Novum Organum. Francis Bacon)
F) Disfunes do crebro explicam atitudes violentas (Notcia. Site Terra)
3. Os quadrinhos abaixo so da tira Calvin e Hobbes (traduzido como Calvin e Haroldo) do cartunista Bill Watterson. Calvin, o garotinho dos quadrinhos, uma
criana bem curiosa, ele est o tempo todo fazendo perguntas que envolvem as quatro
causas descritas por Aristteles. Procure identificar nas histrias abaixo quais causas
Calvin investiga, justifique suas respostas.
A)
B)
1.2. A EXPLICAO MITOLGICA DO MUNDO
A filosofia surge por volta do sculo VII a.C na Grcia Antiga. Havia outra forma de
explicao do mundo antes do surgimento da filosofia, a explicao por meio da mitologia. A
mitologia o conjunto de mitos de um determinado povo. Mas afinal, o qu um mito? Um
mito uma narrativa sobre a origem de alguma coisa (origem dos astros, da Terra, dos
homens, das plantas, dos animais, do fogo, da gua, dos ventos, do bem e do mal, da sade e
da doena, da morte, dos instrumentos de trabalho, das raas, das guerras, do poder, etc.).
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O Mito (Mythos) narrado pelo poeta-rapsodo, que escolhido pelos deuses transmitia o
testemunho incontestvel sobre a origem de todas as coisas, oriundas da relao sexual entre
os deuses, gerando assim, tudo que existe e que existiu. Os mitos tambm narram o duelo
entre as foras divinas que interferiam diretamente na vida dos homens, em suas guerras e no
seu dia-a-dia, bem como explicava a origem dos castigos e dos males do mundo. Ou seja, a
narrativa mtica uma genealogia da origem das coisas a partir de lutas e alianas entre as
foras que regem o universo. Por exemplo, o poeta Homero, na Ilada, obra que narra a guerra
de Tria, explica por que, em certas batalhas, os troianos eram vitoriosos e, em outras, a
vitria cabia aos gregos. Os deuses estavam divididos, alguns a favor de um lado e outros a
favor do outro. A cada vez, o rei dos deuses, Zeus, ficava com um dos partidos, aliava-se com
um grupo e fazia um dos lados - ou os troianos ou os gregos - vencer uma batalha. A causa da
guerra, alis, foi uma rivalidade entre as deusas. Elas apareceram em sonho para o prncipe
troiano Paris, oferecendo a ele seus dons e ele escolheu a deusa do amor, Afrodite. As outras
deusas, enciumadas, o fizeram raptar a grega Helena, mulher do general grego Menelau, e
isso deu incio guerra entre os humanos.
[...] Na Nova Guin, numerosos mitos falam de longas viagens pelo mar, fornecendo assim
modelos aos navegadores atuais, bem como modelos para todas as outras atividades, quer se trate de amor, de guerra, de pesca, de produo de chuva, ou do que for... A narrao
fornece precedentes para os diferentes momentos da construo de um barco, para os tabus
sexuais que ela implica etc. Um capito, quando sai para o mar, personifica o heri mtico2 Aori. Veste os trajes que Aori usava, segundo o mito; tem como ele o rosto enegrecido e,
ESTUDO DIRIGIDO
- O texto abaixo do filsofo Mircea Eliade trata dos mitos. Leia, interprete e responda
as questes.
O mito conta uma histria sagrada, quer dizer, um acontecimento primordial que teve lugar
no comeo do Tempo, desde o incio. Mas contar uma histria sagrada equivale a revelar
um mistrio, pois as personagens do mito no so seres humanos: so deuses ou Heris
civilizadores. Por esta razo seus feitos constituem mistrios: o homem no poderia
conhec-los se no lhe fossem revelados. O mito pois a histria do que se passou em
tempos idos, a narrao daquilo que os deuses ou os Seres divinos fizeram no comeo do
Tempo. Dizer um mito proclamar o que se passou desde o princpio. Uma vez dito, quer dizer, revelado, o mito torna-se verdade apodtica
1: funda a verdade absoluta. assim porque foi dito que assim, declaram os esquims netsilik a fim de justificar a validade de sua histria sagrada e suas tradies religiosas. O mito proclama a apario de
uma nova situao csmica ou de um acontecimento primordial.
[...] Cada mito mostra como uma realidade veio existncia, seja ela a realidade total, o
Cosmos, ou apenas um fragmento: uma ilha, uma espcie vegetal, uma instituio humana.
Narrando como vieram existncia as coisas, o homens explica as e responde
indiretamente a uma outra questo: por que elas vieram existncia? O por que insere se sempre no como. E isto pela simples razo de que, ao se contar Como uma coisa nasceu, revela se a irrupo do sagrado no mundo, causa ltima de toda existncia real.
[...] A funo mais importante do mito , pois, fixar os modelos exemplares de todos os ritos e de todas as atividades humanas significativas: alimentao, sexualidade, trabalho,
educao etc. Comportando se como ser humano plenamente responsvel, o homem imita
os gestos exemplares dos deuses, repete as aes deles, quer se trate de uma simples funo
fisiolgica, como a alimentao, quer de uma atividade social, econmica, cultural, militar
etc.
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1.3. OS PRIMEIROS FILSOFOS
A filosofia surgiu quando alguns gregos, admirados e espantados com a realidade,
insatisfeitos com as explicaes que a tradio lhes dera (atravs dos mitos), comearam a
fazer perguntas e buscar respostas para elas, demonstrando que o mundo e os seres humanos,
os acontecimentos naturais, os acontecimentos humanos e as aes dos seres humanos podem
ser conhecidos pela razo humana. Em suma, a Filosofia surgiu quando alguns pensadores
gregos se deram conta de que a verdade do mundo e dos homens no era algo secreto e
misterioso, que precisasse ser revelado por divindades a alguns escolhidos, mas que, ao
contrrio, podia ser conhecida por todos por meio das operaes mentais de raciocnio, que
so as mesmas em todos os seres humanos.
De acordo com a tradio histrica, a fase inaugural da filosofia grega conhecida como
perodo pr-socrtico. Esse perodo abrange o conjunto das reflexes filosficas
desenvolvidas desde Tales de Mileto (640-548 a. C.) at Scrates (469-399 a.C.). Os
primeiros filsofos buscam o princpio absoluto (primeiro e ltimo) de tudo o que existe. O
princpio o que vem e est antes de tudo, no comeo e no fim de tudo, o fundamento, o
fundo imortal e imutvel, incorruptvel de todas as coisas, que as faz surgir e as governa. a
origem, mas no como algo que ficou no passado e sim como aquilo que, aqui e agora, d
origem a tudo, perene e permanentemente. No vasto mundo Grego, a filosofia teve como
bero a cidade de Mileto, situada na Jnia, litoral ocidental da sia Menor. Caracterizada por
mltiplas influncias culturais e por um rico comrcio, a cidade de Mileto abrigou os trs
primeiros pensadores da histria ocidental a quem atribumos a denominao de filsofos. So
eles: Tales, Anaximandro e Anaxmenes.
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Em outras palavras, os primeiros filsofos queriam descobrir, com base na razo e no na
mitologia, o princpio substancial existente em todos os seres materiais. Os pr-socrticos
ocuparam-se em explicar o universo e examinavam a procedncia e o retorno das coisas. Os
primeiros filsofos gregos tentaram responder pergunta: Como possvel que todas as
coisas mudem e desapaream e a Natureza? Para tanto, procuraram um princpio a partir do
qual se pudesse extrair explicaes para os fenmenos da natureza. Um princpio nico e
fundamental que permanecesse estvel junto ao sucessivo vir-a-ser. Esse princpio absoluto
que os primeiros filsofos buscavam seria a chave de explicao da existncia, morte e
mudana nos seres. As atividades a seguir mostram como Tales pensava esse princpio.
4. SCRATES: CONHECE-TE A TI MESMO!
O filsofo ateniense Scrates (470 a.C.-399 a.C.) considerado um divisor de guas na
filosofia. Antes os filsofos estavam mais preocupados em explicar o funcionamento da
ESTUDO DIRIGIDO
- Os textos abaixo tratam das principais idias de Tales. Depois de l-los respondam as
questes.
A maior parte dos primeiros filsofos considerava como os nicos princpios de todas as
coisas os que so de natureza da matria. Aquilo de que todos os seres so constitudos, e de
que primeiro so gerados e em que por fim se dissolvem, [...] tal , para eles, o elemento, tal
o princpio dos seres; e por isso julgam que nada se gera nem se destri, como se tal natureza
subsistisse sempre Pois deve haver uma natureza qualquer, ou mais do que uma, donde as outras coisas se engendram, mas continuando ela mesma. Quanto ao nmero e natureza
destes princpios, nem todos dizem o mesmo. Tales, o fundador da filosofia, diz ser gua [o
princpio] ( por este motivo tambm que ele declarou que a terra est sobre gua), levando
sem dvida a esta concepo por ver que o alimento de todas as coisas o mido, e que o
prprio quente dele procede e dele vive [...]. Por tal observar adotou esta concepo, e pelo
fato de as sementes de todas as coisas terem a natureza mida; e a gua o princpio da
natureza para as coisas midas (). (ARISTTELES. Metafsica, I, 3.983 b6) .
1. O que investigavam os primeiros filsofos?
2. O que Tales considerava o princpio de todas as coisas?
3. Como Tales chegou s suas concluses?
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natureza. Diferentemente dos antigos filsofos, Scrates cada um deveria, primeiro e antes de
tudo, conhecer-se a si mesmo.
Dizem que Scrates era um homem feio, mas, quando falava, era dono de estranho fascnio.
Procurado pelos jovens, passava horas discutindo na praa pblica. Interpelava os transeuntes,
dizendo-se ignorante, e fazia perguntas aos que julgavam entender determinado assunto.
Colocava o interlocutor em tal situao que no havia sada seno reconhecer a prpria
ignorncia. Com isso Scrates conseguiu rancorosos inimigos. Mas tambm alguns
discpulos. O interessante e que na segunda parte do seu mtodo, que se seguia destruio da
iluso do conhecimento, nem sempre se chegava de fato a uma concluso efetiva. Sabemos
disso no pelo prprio Scrates, que nunca escreveu, mas por seus discpulos, sobretudo
Plato e Xenofonte.
Scrates se indisps com os poderosos do seu tempo, sendo acusado de no crer nos deuses
da cidade e corromper a mocidade. Por isso foi condenado e morto. Costumava conversar
com todos, fossem velhos ou moos, nobres ou escravos, preocupado com o mtodo do
conhecimento. Scrates parte do pressuposto "s sei que nada sei", que consiste justamente na
sabedoria de reconhecer a prpria ignorncia, ponto de partida para a procura do saber.
Por isso seu mtodo comea pela parte considerada "destrutiva", chamada ironia (em grego,
perguntar fingindo ignorncia"). Nas discusses afirma inicialmente nada saber, diante do oponente que se diz conhecedor de determinado assunto. Com hbeis perguntas, desmonta as
certezas at o outro reconhecer a ignorncia. Parte ento para a segunda etapa do mtodo, a
maiutica (em grego, "parto"). D esse nome em homenagem a sua me, que era parteira,
acrescentando que, se ela fazia parto de corpos, ele "dava luz" ideias novas.
Scrates, por meio de perguntas, destri o saber constitudo para reconstru-lo na procura da
definio do conceito. Esse processo aparece bem ilustrado nos dilogos relatados por Plato,
e bom lembrar que, no final, nem sempre Scrates tem a resposta: ele tambm se pe em
busca do conceito e s vezes as discusses no chegam a concluses definitivas. As questes
que Scrates privilegia so as referentes moral, da perguntar em que consiste a coragem, a
covardia, a piedade, a justia e assim por diante. Diante de diversas manifestaes de
coragem, quer saber o que a "coragem em si", o universal que a representa. Ora, enquanto a
filosofia ainda nascente, precisa inventar palavras novas, ou usar as antigas dando-lhes
sentido diferente. Por isso Scrates utiliza o termo logos, que na linguagem comum
significava "palavra", "conversa", e que no sentido filosfico passa a significar "a razo que
se d de algo", ou mais propriamente, conceito. Quando Scrates pede o logos, quando pede
que indiquem qual o logos da justia, o qu a justia, o que pede o conceito da justia, a
definio da justia.
1.4. O MITO DA CAVERNA
Scrates comeou a fazer suas perguntas buscando conhecer o conceito de justia, de bem, de
belo. Perguntava ele: o qu faz uma ao ser justa? Um poltico ao aumentar o seu salrio de
17 mil reais para 24 mil, dir que o aumento foi justo. Mas o qu a justia para ele dizer que
sua ao justa? Algum poder dizer: a justia no nada, no existe justia. No entanto, se
admitirmos que no existe justia, jamais poderemos reclamar que algum agiu de maneira
injusta conosco.
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Esse exemplo acima mostra uma coisa que Scrates comeou a reparar entre seus
conterrneos gregos. A maioria das pessoas tem opinies sobre vrios temas, mas no tem
conhecimento sobre eles. Falam da justia, mas no sabem dizer o qu a justia, falam da
bondade, mas no sabem dizer o qu a bondade. Vejamos outro exemplo. Joana conseguiu
um emprego pblico por meio de um parente seu que se tornou poltico, ento ela afirma: Ele uma boa pessoa!. Quatro anos depois o parente de Joana perde a eleio, outro poltico entra no lugar. Joana demitida e o novo poltico coloca um parente dele no lugar dela.
Ento, Joana afirma: Esse cara um mau-carter, corrupto e safado!. Duas aes parecidas so julgadas de maneiras diferentes, uma vista como exemplo de bondade, outra como uma
ao reprovvel. Isto mostra que no exemplo acima a personagem Joana no tem muita noo
do conceito de bondade, isto , ela no tem muita noo do que define uma ao boa.
Para Scrates h uma distino entre opinio e conceito. A opinio algo que a pessoa tem
mais nunca parou para pensar por que ela pensa daquele jeito. A opinio varia o tempo todo
de acordo com as circunstncias, alm de variar de pessoa para pessoa. J o conceito algo
justificado, fundamentado. O conceito resultado do pensamento, da reflexo, chegamos ao
conceito no por acaso, mas por meio de uma investigao rigorosa.
Mas como so formadas em ns as opinies? Como acabamos acreditando em ideias que
nunca sequer paramos para pensar por que as possumos? Scrates busca explicar isso no
famoso Mito da caverna. Essa histria se encontra no livro de Plato chamado A repblica.
Na histria o personagem Scrates conta a seguinte histria: Imagina uma caverna onde esto acorrentados os homens desde a infncia, de tal forma que, no podendo se voltar para a
entrada, apenas enxergam o fundo da caverna. A so projetadas as sombras das coisas que
passam s suas costas, onde h uma fogueira. Se um desses homens conseguisse se soltar das
correntes para contemplar luz do dia os verdadeiros objetos, quando regressasse, relatando o
que viu aos seus antigos companheiros, esses o tomariam por louco, no acreditando em suas
palavras.
Nessa histria as sombras representam as
opinies equivocadas que adquirimos da
realidade, isto porque a sombra sempre
algo inconstante que muda o tempo todo de
acordo com a variao dos reflexos, de
modo que podemos ser levados a enganos
por causa delas, tal como na caricatura ao
lado. Deste modo, o fato de nossos
sentidos nos enganarem faz com que
estejamos sempre sujeitos a tomar o
verdadeiro pelo falso, a aceitar as sombras
como a verdadeira realidade. Na
Antiguidade e na Idade Mdia, por
exemplo, as pessoas acreditavam que a
Terra ficava sempre parada, e o sol girava
em torno dela. Esta opinio era
fundamentada muito mais em uma
percepo dos nossos sentidos do que em
estudos astronmicos. Expliquemos. Todos
os dias ns vemos o sol nascer de um lado e desaparecer do outro lado. Parece que estamos
parados e o sol girando em torno de ns. Sem contar que no conseguimos perceber o
movimento de translao da Terra, isto , no conseguimos perceber que ela est se
movimentando, girando em torno do sol.
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Vemos ento que, para Scrates muitas das opinies falsas surgem porque nossos sentidos nos
enganam. No entanto, h outra forma como adquirimos opinies em vez de conceitos
quando nos deixamos influenciar somente pelo senso-comum. O senso-comum o conjunto
de ideias e concepes ensinadas pela tradio e que a maioria das pessoas aceitam sem fazer
a pergunta: por que tenho que aceitar isso? At pouco tempo atrs, julgava-se que mulher
decente no saa de casa para trabalhar, ficava em casa cuidando da casa e das crianas para o
marido. As primeiras mulheres que questionaram essa opinio eram vistas com maus olhos.
No Mito da caverna vemos que quando o prisioneiro libertado conta que o mundo est do
lado de fora, sendo as sombras meras iluses, ele tambm visto com maus olhos. O
prisioneiro liberto questiona o senso-comum dos outros prisioneiros. Outro exemplo de como
o senso-comum forma opinies equivocada em ns, e no conceitos, basta pensarmos no caso
do racismo. Uma pessoa criada em um ambiente racista, no meio de uma famlia racista,
cresce acreditando que brancos so superiores aos negros. Embora na famlia dessa pessoa se
aceite de maneira inquestionvel a superioridade dos brancos, no existe nenhum estudo que
comprove tal superioridade, sendo que a nica diferena entre negros e brancos est no fato
de os primeiros terem um pouco mais de melanina na pele. O senso-comum pode ser
reproduzido pela famlia, pela televiso, pelas escolas, pelo cinema, pela msica, etc. Scrates
acreditava que aceitar as opinies do senso-comum se eximir da atividade de pensar,
deixando ento que outro pense por voc.
ATIVIDADES
1. Leia e interprete a letra da msica e o quadrinho abaixo para depois responder as
questes.
Televiso Tits
A televiso me deixou burro, muito burro demais
Agora todas coisas que eu penso me parecem iguais
O sorvete me deixou gripado pelo resto da vida
E agora toda noite quando deito boa noite, querida.
cride, fala pra me
Que eu nunca li num livro que um espirro fosse um vrus sem cura
V se me entende pelo menos uma vez, criatura!
cride, fala pra me!
A me diz pra eu fazer alguma coisa mas eu no fao nada
A luz do sol me incomoda, ento deixo a cortina fechada
que a televiso me deixou burro, muito burro demais
E agora eu vivo dentro dessa jaula junto dos animais.
cride, fala pra me
Que tudo que a antena captar meu corao captura
V se me entende pelo menos uma vez, criatura!
cride, fala pra me!
TITS. Televiso, 1985.
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a. Tanto a msica quanto o quadrinho, tratam do mesmo tema? Explique. b. possvel dizer que tanto o quadrinho quanto a msica mostram que a televiso
nos ensina a buscar conhecer aquilo que Scrates chama de conceito? Sim ou no? Justifique.
c. Indique passagens da msica e do quadrinho que mostram a televiso como uma forma de reproduzir ideias e concepes do senso-comum.
2. AS RELIGIES E O SAGRADO
A missa no domingo, a pregao do pastor, os batuques do candombl, a peregrinao a
Meca, o sacrifcio de animais ou as oraes no muro das lamentaes. Todos esses eventos
so considerados manifestaes religiosas, todos eles esto ligados a alguma religio. Mais
afinal o que uma religio? Como que atividades to diferentes podem ser reunidas sob um
nico nome, isto , religio. O que tem em comum o islamismo, o cristianismo, o judasmo e
o candombl para serem chamados de religio? Alguns podero dizer: religio porque
acredita em Deus! Errado! Existem as religies politestas que acreditam em diversos deuses.
Ou seja, acreditar em Deus no critrio para definir se algo uma religio ou no. O filsofo
e historiador romeno Mircea Eliade buscou entender o que uma religio. Ele investigou
quais caractersticas em comum tem atvidades to diferentes.
A palavra religio vem do latim: religio, formada pelo prefixo re (outra vez, de novo) e o
verbo ligare (ligar, unir, vincular). A religio um vnculo, re-liga o homem ao sagrado. Toda
religio tem essa funo, estabelecer um vnculo entre os homens e algo sagrado. Mas o o
sagrado? Sagrado , pois, a qualidade excepcional boa ou m, benfica ou malfica, protetora ou ameaadora que um ser possui e que o separa e distingue de todos os outros. O sagrado pode suscitar devoo e amor, repulsa e dio. Esses sentimentos suscitam um outro: o
respeito feito de temor. Nasce, aqui, o sentimento religioso e a experincia da religio.
A manifestao de algo sagrado chamado por Mircea Eliade de hierofania. A manifestao
do sagrado pode se dar por meio de uma pedra, uma rvore, uma montanha, uma pessoa. Na
religio crist, por exemplo, a manifestao do sagrado se d por meio da encarnao de Deus
em Jesus Cristo. Em todos esses fenmenos existe a compreenso de que algo que pertence a
uma ordem diferente ou a um outro mundo se manifesta no nosso mundo profano. O profano justamente aquilo que no sagrado.
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Na imagem ao lado vemos a foto da mesquita de
Meca, este um lugar considerado sagrado pelos
Mulumanos. Embaixo da foto da mesquita vemos
a foto de um templo hindu. Logo abaixo vemos um
barraco de candombl. O que a mesquita, o
templo e o barraco tm em comum? Todos eles
so lugares considerados sagrados para as suas
respectivas religies.
Toda religio constituda por espaos sagrados,
ou seja, lugares privilegiados onde o homem
religioso pode entrar em contato com o sagrado. O
espao sagrado pode ser uma igreja, uma mesquita
ESTUDO DIRIGIDO
-O texto abaixo do livro O sagrado e o profano do filsofo e historiador Mircea Eliade.
Leia atenciosamente o texto para em seguida responder as questes.
.....................................................................................................................................................
Para o homem religioso, o espao no homogneo1: o espao apresenta roturas
2, quebras;
h pores de espao qualitativamente diferentes das outras. No te aproximes daqui, disse o Senhor a Moiss; tira as sandlias de teus ps, porque o lugar onde te encontras uma terra
santa. (xodo, 3: 5) H, portanto, um espao sagrado, e por conseqncia forte, significativo, e h outros espaos no sagrados, e por conseqncia sem estrutura nem
consistncia, em suma, amorfos3.
2.1. O espao sagrado
uma
sinagoga, um barraco de candombl. No entanto, os espaos sagrados no so somente
construes humanas. Existem montanhas, florestas, campos que podem ser considerados
espaos sagrados.
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[...] A fim de pr em evidncia a no homogeneidade do espao, tal qual ela vivida pelo
homem religioso, pode-se fazer apelo a qualquer religio. Escolhamos um exemplo ao
alcance de todos: uma igreja, numa cidade moderna. Para um crente, essa igreja faz parte
de um espao diferente da rua onde ela se encontra. [...] Assim acontece em numerosas
religies: o templo constitui, por assim dizer, uma abertura para o alto e assegura a comunicao com o mundo dos deuses.
[...] Todo espao sagrado implica uma hierofania4, uma irrupo do sagrado que tem
como resultado destacar um territrio do meio csmico que o envolve e o torna
qualitativamente diferente. Quando, em Haran, Jac viu em sonhos a escada que tocava
os cus e pela qual os anjos subiam e desciam, e ouviu o Senhor, que dizia, no cimo: Eu sou o Eterno, o Deus de Abrao!, acordou tomado de temor e gritou: Quo terrvel este lugar! Em verdade aqui a casa de Deus: aqui a Porta dos Cus! Agarrou a pedra de que fizera cabeceira, erigiu a em monumento e verteu azeite sobre ela. A este lugar
chamou Betel, que quer dizer Casa de Deus (Gnesis, 28: 1219).
[...] Quando no se manifesta sinal algum nas imediaes, o homem provoca o, pratica,
por exemplo, uma espcie de evocao com a ajuda de animais: so eles que mostram que
lugar suscetvel de acolher o santurio ou a aldeia. Trata-se, em resumo, de uma
evocao das formas ou figuras sagradas, tendo como objetivo imediato a orientao na
homogeneidade do espao. Pede se um sinal para pr fim tenso provocada pela
relatividade e ansiedade alimentada pela desorientao, em suma, para encontrar um
ponto de apoio absoluto. Um exemplo: persegue se um animal feroz e, no lugar onde o
matam, eleva se o santurio; ou ento pe se em liberdade um animal domstico um touro, por exemplo , procuram-no alguns dias depois e sacrificam no ali mesmo onde o encontraram. Em seguida levanta se o altar e ao redor dele constri se a aldeia (Mircea
Eliade. O sagrado e o profano). 1Homogneo: aquilo que no possui partes ou elementos diferntes.
2Rotura: ruptura; rachadura.
3Amorfo: aquilo que no tem forma; desorganizado
4Hierofania: manifestao ou apario de algo sagrado.
1. Explique como o homem religioso compreende o espao.
2. Qual a funo do espao sagrado?
3. O texto mostra dois modos diferentes de se escolher um espao que ser
considerado sagrado. Explique cada um deles.
2.2. Os ritos
Porque a religio liga humanos e divindade, porque organiza o espao e o tempo, os seres
humanos precisam garantir que a ligao e a organizao se mantenham e sejam sempre
propcias. Para isso so criados os ritos. Vemos ento que o rito outra caracterstica comum
a todas as religies.
O rito uma cerimnia em que gestos determinados, palavras determinadas, objetos
determinados, pessoas determinadas e emoes determinadas adquirem o poder misterioso de
presentificar o lao entre os humanos e a divindade. Para agradecer dons e benefcios, para
suplicar novos dons e benefcios, para lembrar a bondade dos deuses ou para exorcizar sua
clera, caso os humanos tenham transgredido as leis sagradas, as cerimnias ritualsticas so
17
de grande variedade. No entanto, uma vez fixada os procedimentos de um ritual, sua eficcia
depender da repetio minuciosa e perfeita do rito, tal como foi praticado na primeira vez,
porque nela os prprios deuses orientaram gestos e palavras dos humanos. Um rito religioso
repetitivo em dois sentidos principais: a cerimnia deve repetir um acontecimento essencial
da histria sagrada (por exemplo, no cristianismo, a eucaristia ou a comunho, que repete a
Santa Ceia); e, em segundo lugar, atos, gestos, palavras, objetos devem ser sempre os
mesmos, porque foram, na primeira vez, consagrados pelo prprio deus. O rito a
rememorao perene do que aconteceu numa primeira vez e que volta a acontecer, graas ao
ritual que abole a distncia entre o passado e o presente.
2.3. Os objetos simblicos
A religio no sacraliza apenas o espao e o tempo, mas tambm seres e objetos do mundo,
que se tornam smbolos de algum fato religioso. Os seres e objetos simblicos so retirados de
seu lugar costumeiro, assumindo um sentido novo para toda a comunidade protetor, perseguidor, benfeitor, ameaador. assim, por exemplo, que certos animais se tornam
sagrados, como a vaca na ndia, o cordeiro perfeito consagrado para o sacrifcio da pscoa
judaica. assim, por exemplo, que certos objetos se tornam sagrados, como o po e o vinho
consagrados pelo padre cristo, durante o ritual da missa. Tambm objetos se tornam
smbolos sagrados intocveis, como os pergaminhos judaicos contendo os textos sagrados
antigos, certas pedras usadas pelos chefes religiosos africanos, etc.
A religio tende a ampliar o campo simblico. Ela o faz, vinculando seres e qualidades
personalidade de um deus. Assim, por exemplo, em muitas religies, como as africanas, cada
divindade protetora de um astro, uma cor, um animal, uma pedra e um metal preciosos, um
objeto santo.
A figurao do sagrado se faz por smbolos: assim, por exemplo, o emblema da deusa
Fortuna era uma roda, uma vela enfunada e uma cornucpia; o da deusa Atena, o capacete e a
espada; o de Hermes, a serpente e as botas aladas; o de Oxossi, as sete flechas espalhadas pelo
corpo; o de Iemanj, o vestido branco, as guas do mar e os cabelos ao vento; o de Jesus, a
cruz, a coroa de espinhos, o corpo glorioso em ascenso.
1Aborgenes: nativo; indgena.
2Circunciso: retirada cirrgica do prepcio, praticada por razes higinicas e/ou religiosas.
3Sabatino: relativo ao sbado.
4 Hierogamia: casamento das divindades.
5Paleo-oriental: do velho Oriente.
6Sumrios: relativo ou pertencente Sumria, antigo pas da Mesopotmia (sia) , ou o que seu natural ou
habitante 7Fecundidade: fertilidade.
8Regenerado: renovado; restaurado.
1. O que os rituais religiosos tomam como modelo?
2. Nos rituais de casamento qual acontecimento os homens pretendem imitar?
3. Que resultados espera-se atingir por meio dos rituais de casamento?
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ESTUDO DIRIGIDO
-O texto abaixo do filsofo e historiador Mircea Eliade foi retirado do livro O sagrado e
o profano. Leia atenciosamente o texto para em seguida responder as questes.
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..........................
Antes de falarmos da Terra, precisamos apresentar as valorizaes religiosas das guas, e
isso por duas razes: (1) as guas existiam antes da Terra (conforme se exprime o Gnesis,
as trevas cobriam a superfcie do abismo, e o Esprito de Deus planava sobre as guas); (2) analisando os valores religiosos das guas, percebe-se melhor a estrutura e a funo do
smbolo. Ora, o simbolismo desempenha um papel considervel na vida religiosa da
humanidade [...].
[...] O simbolismo das guas implica tanto a morte como o renascimento. O contato com a
gua comporta sempre uma regenerao1: por um lado, porque a dissoluo seguida de
um novo nascimento[...]. Ao dilvio ou submerso peridica dos continentes (mitos do tipo Atlntica) corresponde, ao nvel humano, a segunda morte do homem [...]. A imerso nas guas equivale no a uma extino definitiva, e sim a uma reintegrao
passageira no indistinto, seguida de uma criao, de uma nova vida ou de um homem novo. [...] Em qualquer conjunto religioso em que as encontremos, as guas conservam
invariavelmente sua funo: desintegram, abolem as formas, lavam os pecados, purificam e, ao mesmo tempo, regeneram. [...]O homem velho morre por imerso na gua e d nascimento a um novo ser regenerado. Este simbolismo admiravelmente expresso por
Joo Crisstomo (Homil. in Joh., XXV, 2), que, falando da multivalncia2 simblica do
batismo, escreve: Ele representa a morte e a sepultura, a vida e a ressurreio... Quando mergulhamos a cabea na gua como num sepulcro, o homem velho fica imerso, enterrado
inteiramente; quando samos da gua, aparece imediatamente o homem novo (Mircea Eliade. O sagrado e o profano).
1Regenerao: renovao; restaurao.
2Multivalncia: qualidade de multivalente. (multivalente: que possui vrias utilidades, vrios significados.
1. A gua um smbolo que aparece em diversas religies com. Quais funes so
atribudas a ela?
2. Explique o simbolismo do batismo na religio crist.
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Jeitinho brasileiro!
Estavam na china um brasileiro, um americano e um argentino.
Estavam bebendo na praa.
S que na China isso proibido e eles foram pegos em flagrante.
Presos, foram mandados ao Juiz pra receberem sua sentena.
O Juiz deu uma bronca enorme e disse que cada um ia receber
20 chicotadas como punio.
S que estavam em transio entre o ano do co e o do rato,
ento cada prisioneiro tinha direito um pedido:
- Voc americano! Seu pas racista, capitalista e eu odeio
vocs, mas promessa promessa!
Qual o seu desejo, desde que seja no escapar da punio?
- Quero que amarrem 1 travesseiro nas minhas costas!
- Que assim seja! E tome as chicotadas com o travesseiro nas costas...
L pela dcima chicotada o travesseiro cedeu e o americano levou 10 chicotadas.
- Sua vez argentino! Seu povo muito arrogante e trapaceiro.
Odeio vocs, mas promessa promessa!! Qual o seu desejo?
- Que amarrem 2 travesseiros nas minhas costas!
E assim foi. L pela dcima quinta chicotada os travesseiros
cederam e o argentino tomou 5 das 20 chicotadas. Mas ficou
feliz por que passou a perna no americano!Foi a vez do brasileiro.
- Ora, ora, voc brasileiro... povo simptico, bom de
futebol, humilde... como eu gosto do seu povo voc ter 2
pedidos!!
- Bem, eu queria levar 100 chicotadas...
- Espantoso!! Ainda por cima corajoso!! Seu pedido ser
realizado!! Qual o prximo?
- Amarra o argentino nas minhas costas!!!...
Fonte: http://www.piadasonline.com.br!
II UNIDADE
3. O QU UMA AO MORAL?
A piada ao lado o ponto de partida para o tema que comearemos a estudar: a ao Moral.
No texto vemos como determinadas caractersticas de uma pessoa se devem ao fato de ela
pertencer a algum povo. Vemos na piada, por exemplo, que o juiz chins considera o
americano racista, o argentino trapaceiro e o brasileiro simptico. De certa forma cada povo
tem os seus costumes e caractersticas bem particulares, e o fato de eu pertencer a este povo
pode fazer com que minhas aes sejam fruto dos costumes e tradies locais. A piada, por
exemplo se chama jeitinho Brasileiro. Comumente chamamos de jeitinho brasileiro
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PENSANDO NOSSO TEMPO
-Leia a notcia abaixo para depois responder as questes.
Estudantes protestam contra aumento de salrio deputados em frente assemblia
Estudantes e sindicalistas realizaram um protesto em frente Assembleia Legislativa do
Esprito Santo (Ales) na tarde desta segunda-feira (27) contra o reajuste de 61,8% nos
vencimentos dos deputados estaduais. A manifestao ocorreu simultaneamente em diversas
capitais brasileiras, contra ao aumento dos salrios de deputados federais e senadores no
Congresso Nacional. Segundo os manifestantes, a ideia mostrar que a populao no se
conforma com o aumento que elevou de R$ 12.384,00 para R$ 20.042,34 o salrio dos
parlamentares, aprovado na ltima tera-feira (21).
Universitrios como Thiago Moreira de Carvalho, 21 anos, estiveram com narizes de
palhao, cartazes e distriburam um manifesto de repdio em relao ao aumento dos
parlamentares. "O capixaba precisa ficar atento a essas coisas. Precisa protestar mesmo. De
uma forma civilizada e trazendo os esclarecimentos para toda a populao. preciso fazer
um barulho para o povo ficar ciente da situao", afirmou.
aquela esperteza que o brasileiro tem para resolver problemas em situaes difceis. Nem
sempre essa esperteza acompanhada de solues muito honestas.
J sabemos ento que nossas aes podem ser motivadas por determinados costumes e
tradies do lugar onde nascemos. No entanto, o fato de agirmos de acordo com costumes e
tradies quer dizer que nossa ao seja moral? Vrias vezes vemos pessoas que usam do
jeitinho brasileiro e depois so acusadas de imorais. Os polticos so o melhor exemplo
disso. Eles sempre do aquele jeitinho de conseguir um emprego pblico para um parente
mesmo existindo leis que probem o nepotismo. Um dos meios para eles conseguirem isso o
nepotismo cruzado. Ou seja, um poltico coloca o parente de algum amigo poltico em um
cargo pblico, em seguida o amigo emprega algum parente dele.
Vemos ento que agir de acordo com os costumes e tradies no suficiente para fazer de
uma ao uma ao moral. Mas o que faz uma ao ser moral? Qual o critrio que distingue
uma ao moralmente boa de uma ao moralmente m? Esses so problemas que a filosofia
sempre buscou responder e que agora vocs podero estudar.
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Em frente a um carro de som que chamou a ateno dos cidados que passaram em frente
escadaria da Assembleia, o presidente do Sindicato dos Servidores Pblicos do Esprito Santo
(Sindipblicos-ES), Gerson Correia de Jesus, afirmou que o aumento foi legal do ponto de
vista da lei, mas imoral do ponto de vista da tica de um representante pblico. "O aumento
em si est previsto em lei. O que no podemos aceitar essa imoralidade do momento. Um
aumento desses concedido em fim de mandato, com a chegada de novos deputados e com os
atuais fazendo isso com a sociedade. No podemos aceitar isso. Deveria ser respeitado pelo
menos o que dado sociedade. O reajuste do salrio mnimo, por exemplo, foi de 6%",
explicou. (A GAZETA)
1. Por que os polticos so pessoas geralmente acusadas de cometer atos imorais?
2. O que voc entende quando os manifestantes dizem que o aumento foi legal mas
imoral?
3. Para voc o que define uma ao moral e uma ao imoral?
4. Voc tambm considera que o aumento dos salrios dos deputados imoral? Justifique
sua resposta.
3.1. KANT: O FILSOFO DA MORAL
Durante a Idade Mdia, a viso teocntrica do mundo fez com que os valores religiosos
impregnassem as concepes ticas, de modo que os critrios do bem e do mal se achavam
vinculados f e dependiam da esperana de vida aps a morte.
No entanto, a partir da Idade Moderna, culminando no movimento da Ilustrao no sculo
XVIII, a moral se torna laica, secularizada. Ou seja, ser moral e Ser religioso no so plos
inseparveis, sendo perfeitamente possvel que um homem ateu seja moral. O movimento
intelectual do sculo XVIII conhecido como Iluminismo, Ilustrao ou Aufklrung e que
caracteriza o chamado Sculo das Luzes exalta a capacidade humana de conhecer e agir pela
"luz da razo".
A mxima expresso do pensamento iluminista se encontra em Kant (1724 -1804). Para Kant
a razo no s a capacidade de humana de conhecer o mundo. Ou seja, a razo no
somente um instrumento que ns temos e os animais no e que nos permite aprender,
matemtica, fsica, filosofia, biologia, etc. A razo tambm a capacidade humana de
discernir uma ao moralmente boa de uma ao moralmente m. por ser racional que o
homem cria distines entre o certo e o errado, o bom e o mau. Para os animais essas
distines no existem.
Para Kant, todo ser humano possui dentro de si um critrio para distinguir o certo do errado,
ou seja temos a capacidade racional de saber se uma ao moral ou no. Essa capacidade
ns no aprendemos com ningum, mas ela pertence prpria natureza humana. Segundo
Kant a razo nos ensina que para uma ao ser moral ela tem que estar de acordo com a
seguinte lei: Age de tal modo que possa querer que a mxima de sua ao se torne valor universal. Por exemplo, pensemos no exemplo do poltico que rouba o dinheiro pblico. Ao
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observar essa lei da razo ele pode fazer as perguntas: e se todos agirem como eu? E se todos
tiverem o direito de roubar? O poltico chegar a concluso de que se todos roubarem ele no
conseguir nem manter a posse daquilo que roubou. Logo, ele no vai querer que todos ajam
de maneira semelhante. A razo o diz que o seu modo de agir no pode se tornar universal,
isto , ele no quer que todos roubem porque sabe que roubar imoral. Se sua ao fosse moral ele no veria problemas nenhum em todos agirem da mesma forma.
Vemos que para Kant todos sabem e todos podem distinguir uma ao moral de uma ao
imoral. No entanto, nem todos agem de acordo a razo, de acordo com a moral. Por que isso
acontece? Vejamos o quadrinho abaixo do cartunista Bill Watterson.
No quadrinho temos os personagens Calvin e Hobbes (Calvin e Haroldo na verso traduzida
para o portugus). Calvin o garotinho, Hobbes o tigre. Na tirinha Hobbes diz duvidar que o
ser humano precise de alguma coisa alm dele mesmo para cometer atos imorais. Kant tem
uma viso parecida com a do personagem do quadrinho. Pertence prpria natureza humana a
possibilidade de agir de maneira imoral. Isto porque o ser humano no somente um ser
racional. Tambm somos seres naturais, submetidos causalidade necessria da Natureza.
Nosso corpo e nossa psique so feitos de apetites, impulsos, desejos e paixes. A Natureza
nos impele a agir por interesse. Este a forma natural do egosmo que nos leva a usar coisas
e pessoas como meios e instrumentos para o que desejamos.
Por ser um ser racional e ao mesmo tempo um ser natural movido por interesses pessoais o
homem acaba muitas vezes vivendo um conflito. A pessoas podem ter desejos que contrariam
a razo, que contrariam a moral. A natureza nos impele a agir como animais buscando
somente a satisfao imediata, mais a razo diz que a ao contra a moral. A razo acaba
funcionando como uma voz interior que diz para agirmos de outra forma e luta contra os
instintos. Vemos isso no quadrinho da Mafalda, personagem do cartunista argentino Quino:
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3.2. MORAL, INTENO E RELIGIO
Neste quadrinho vemos o personagem Calvin querendo saber se ele ter alguma recompensa
em uma outra vida para o seu bom comportamento. Calvin parece demonstrar que no faz
muito sentido agir corretamente se no somos recompensados. Para Kant praticar uma boa
ao no necessariamente agir moralmente. Uma celebridade pode ajudar necessitados com
doaes s para ganhar um destaque na mdia. Embora essas doaes ajudem muitas pessoas,
a celebridade foi movida por interesses pessoais. A ao moral tem um fim em si mesmo, ela
no um meio para se atingir algum fim. O indivduo age de determinada maneira pois
considera ser o seu dever agir daquela forma. A sua inteno agir moralmente. Como nunca
vemos as intenes, mas s as aes, difcil determinar se uma pessoa est agindo por
interesse ou no.
Outra coisa importante no quadrinho acima que Calvin quer orientar as suas aes por uma
ideia religiosa: a vida aps a morte. Para ele se houver uma vida depois da morte vale a pena
agir corretamente, se no houver no vale. Esta situao lembra a famosa frase de Dostoievski
presente no seu romance Os irmos Kamarazov: Se Deus no existe, tudo permitido. No
entanto, para Kant ideias e princpios religiosos no so necessrios para o homem agir
moralmente. Na razo o homem j encontra um critrio para a ao moral, o imperativo
categrico: Age de tal modo que possa querer que a mxima de sua ao se torne valor
universal. Deste modo, um descrente que no possui religio no agir de modo imoral s
por causa disso.
Embora no seja necessrio ser religioso para agir moralmente, Kant entende que a religio
pode fornecer exemplos que sirvam de estmulo. Na f crist, por exemplo, Kant diz que
cristo apresentado como aquele que resiste as tentaes, sacrifica seus interesses particulares
age pelo dever e o difundi ao seu redor. Para o filsofo alemo o que menos importa se o
Cristo realizava milagres ou se era o messias. A maior contribuio dele foi servir de modelo
moral, de modo a estimular as pessoas a tentarem agir de modo semelhante. A religio crist
ao incitar (atravs dos seus credos) os fiis a tomarem Cristo como um arqutipo para sua
conduta, nada mais faz do que incit-los a agir de acordo com o dever moral que a razo d a
si mesma. nesse sentido que se deve entender o seguinte dito de Kant: [...] pode dizer-se
que, entre a razo e a Escritura, existe no s compatibilidade, mas tambm harmonia de
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modo que quem segue uma (sob a direo dos conceitos morais) no deixar de coincidir com
a outra.
3.3. MORAL E FELICIDADE
O fato de o homem poder se guiar pela razo agindo moralmente no garante a ele uma vida
feliz. A ao moral pode despertar a ira dos outros, alm do isolamento. Imagine um poltico
que atormentado por sua conscincia decida denunciar um esquema de corrupo presente no
congresso. Apesar de ele tomar essa atitude com satisfao, pois sabe que a coisa certa a
fazer, as conseqncias que cairo sobre ele podem ser terrveis: perseguio, ameaas a
familiares, isolamento, expulso do partido. Tais consequncias com certeza no
proporcionaro a ele uma vida tranquila e feliz. Apesar da ao moral no garantir a
felicidade e no ser motivada por uma busca da felicidade, Kant julga que o indivduo que age
moralmente digno de ser feliz, isto , ele mer
4. POLTICA SE DISCUTE
No quadrinho acima, h no dilogo entre Calvin e Hobbes uma stira a um fenmeno muito
comum nas sociedades modernas: a apatia poltica. O desinteresse das pessoas pela poltica
surge por vrios motivos: decepo com escndalos de corrupo, a falsa crena de que a
poltica no interfere nas nossas vidas, o comodismo, e tambm por se ter uma viso no
muito clara do que poltica e o que discutir poltica.
Falar de poltica no s conversar sobre quem voc vai votar. Para entendermos o que
poltica, cabe observarmos o significado dessa palavra. Poltica etimologicamente deriva da
palavra grega polis, que significa cidade-Estado. A expresso grega ta politika (poltica)
significa os assuntos da polis (cidade-Estado. Para os gregos os assuntos da polis dizem
respeito a todos os cidados, no s aqueles que ocupam cargos no governo. Mas quais so os
assuntos da polis? As leis, os costumes, a criao de estradas, a cobrana de impostos, a
administrao dos bens pblicos, a organizao da defesa e da guerra, etc.
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ESTUDO DIRIGIDO
TEXTO 1
- O texto abaixo do italiano Noberto Bobbio trata da falta de interesse pela poltica nas
democracias modernas. Leia e interprete o texto para responder as questes abaixo.
O cidado no educado
A educao para a cidadania foi um dos temas preferidos da cincia poltica americana nos
anos cinquenta, um tema tratado sob o rtulo da cultura poltica e sobre o qual foram
gastos rios de tinta que rapidamente perdeu a cor: das tantas distines, recordo aquela
estabelecida entre cultura para sditos, isto , orientada para os output1 do sistema (para os
benefcios que o eleitor espera extrair do sistema poltico), e cultura participante, isto ,
orientada para os input2, prpria dos eleitores que se consideram potencialmente
empenhados na articulao das demandas3 e na formao das decises.
Olhemos ao nosso redor. Nas democracias mais consolidadas assistimos impotentes ao
fenmeno da apatia4 poltica, que frequentemente chega a envolver cerca da metade dos que
tm direito ao voto. Do ponto de vista da cultura poltica, estas so pessoas que no esto
orientadas nem para os output nem para os input.
No nosso contexto os assuntos da polis se ampliaram. So temas polticos que dizem respeito
a todos: a gerao de emprego, a reduo da misria, o saneamento bsico, a melhoria da
sade, dos transporte pblico, da educao e da segurana pblica, dentre outros. Mesmo
quem no quer nem ouvir nem falar sobre tais temas no consegue escapar de ter sua vida
influenciada por eles.
O ANALFABETO POLTICO
O pior analfabeto o analfabeto poltico. Ele no ouve, no fala, nem participa dos
acontecimentos polticos. Ele no sabe que o custo de vida, o preo do feijo, do peixe, da
farinha, do aluguel, do sapato e do remdio dependem das decises polticas.
O analfabeto poltico to burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a
poltica. No sabe o imbecil que, da sua ignorncia poltica, nasce a prostituta, o menor
abandonado, e o pior de todos os bandidos, que o poltico vigarista, pilantra, corrupto e
lacaio das empresas nacionais e multinacionais
(Bertolt Brecht)
.
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Esto simplesmente desinteressadas daquilo que, como se diz na Itlia com uma feliz
expresso, acontece no palcio. Sei bem que tambm podem ser dadas interpretaes
benvolas da apatia poltica. Mas at mesmo as interpretaes mais benvolas no
conseguem me tirar da cabea que os grandes escritores democrticos se recusariam a
reconhecer na renncia ao uso do prprio direito um benfico fruto da educao para
cidadania. Nos regimes democrticos, como o italiano, onde a porcentagem dos votantes
ainda muito alta (embora diminua a cada eleio), existem boas razes para se acreditar que
esteja em diminuio o voto de opinio e em aumento o voto de permuta5, o voto, para usar
a terminologia assptica6 dos cientistas polticos, orientado para os output, ou, para usar
uma terminologia mais crua mas talvez menos mistificadora, o voto clientelar, fundado
(frequentemente de maneira ilusria) sobre o apoio poltico em troca de favores pessoais.
(BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia)
1Output: sada resultado
2Input: entreda.
3Demandas: necessidades.
4Apatia: falta de nimo; desinteresse.
5Permuta: troca.
5Assptica: extremamente limpo
1. Explique o que significa se orientar pelo output do sistema poltico e o que significa
se orientar pelo input.
2. Explique o fenmeno da apatia poltica.
3. Voc acha que no Brasil os cidados esto mais interessados pelo output ou pelo
input do sistema poltico? Justifique.
4. No texto acima Norberto Bobbio faz algumas observaes sobre a poltica no seu
pas, a Itlia. Nestas observaes o qu h de semelhante entre a Itlia e o Brasil?
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TEXTO 2
- O texto abaixo discute o comportamento poltico dos cidados brasileiros. Leia e
interprete para responder as questes a seguir.
O brasileiro condena o brasileiro
Nossa tradio cultural, por diversas razes, criou um ideal de cidadania poltica sem
vnculos com a efetiva vida social dos brasileiros. Na teoria aprendemos que devemos
ser cidados; na prtica, que no possvel, nem desejvel comportarmo-nos como
cidados. A face poltica do modelo de identidade nacional permanentemente corroda
pelo desrespeito aos ideais de conduta. Idealmente, ser brasileiro significa herdar a
tradio democrtica na qual todos somos iguais perante a lei e onde o direito vida,
liberdade e busca da felicidade uma propriedade inalienvel de cada um de ns; na
realidade, ser brasileiro significa viver em um sistema socioeconmico injusto, onde a
lei s existe para os pobres e para os inimigos e onde os direitos individuais so
monoplio dos poucos que tm muito.
Preso nesse impasse, o brasileiro vem sendo coagido a reagir de duas maneiras. Na
primeira, com apatia e desesperana. o caso dos que continuam acreditando nos
valores ideais da cultura e no querem converter-se ao cinismo das classes dominantes e
de seus seguidores. Essas pessoas experimentam uma notvel diminuio da auto-estima
na identidade de cidado, pois no aceitam conviver com o baixo padro de moralidade
vigente, mas tampouco sabem como agir honradamente sem se tornarem vtimas de
abusos e humilhaes de toda ordem. Deixam-se assim contagiar pela inrcia ou sonham
em renunciar identidade, abandonando o pas. Na segunda maneira, a mais nociva, o
indivduo adere a tica da sobrevivncia ou lei do vale-tudo: pensa escapar a
delinquncia, tornando-se delinquente.
Nos dois casos, obviamente, perde-se a confiana na ideia de justia, legalidade e
interesse comum. o primeiro passo para o imprio do banditismo o modo de
convvio social em que a lei se confunde com o interesse de um indivduo ou de um
grupo e a fora substitui o dilogo. No banditismo, as leis do lugar ao mercado da
violncia, que tende expanso ilimitada. Numa sociedade regida pela moral da
delinqncia, a cada dia se inventam novas formas de transgresso e de desmoralizao
das leis e novas formas de submisso dos mais fracos aos mais fortes.
(COSTA, Jurandir F. O brasileiro condena o brasileiro. Superinteressante, So Paulo, 5 (11): 35, Nov.
1991.)
1. Vocs concordam com a anlise do psicanalista Jurandir F. Costa? Por qu?
2. Identifiquem os dois tipos de cidados citados no texto. Como eles agem no dia-a-
dia?
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4.1. O QU A FILOSOFIA TEM A DIZER SOBRE A POLTICA?
Participamos da poltica ao votar, ao participar de uma greve ou manifestao, boicotando um
produto importado, conversando sobre a situao de insegurana do bairro, ou da situao de
abandono da sade pblica. Estamos o tempo todo discutindo poltica de maneira informal,
mesmo sem saber que estamos fazendo isso.
Contudo, existe outra maneira de se falar de poltica. A filosofia busca, por exemplo, falar
sobre poltica formulando explicaes cientficas. Nesse caso, os filsofos levantam questes
como: Por que uma forma de governo melhor que outra? O qu faz uma lei ser considerada
justa? O qu o direito? A religio deve se envolver com a poltica? A poltica deve ser
guiada pela moral? Por que h desigualdade entre os homens?Por que o homem um animal
poltico?
4.2. ARISTTELES: O HOMEM UM ANIMAL POLTICO
Aristteles (384-322 a.C.) nasceu em Estagira, na Calcdica
(regio dependente da Macednia). Seu pai era mdico de Filipe,
rei da Macednia. Mais tarde. Alexandre, filho de Felipe, foi
discpulo de Aristteles at o momento em que precisou assumir
precocemente o poder e continuar a expanso do imprio.
Frequentou a Academia de Plato e a fidelidade ao mestre foi
intercalada por crticas que mais tarde justificaria dizendo: "Sou
amigo de Plato, mas mais amigo da verdade".
As principais ideias da filosofia poltica de Aristteles foram
escritas no livro A poltica. Desde as primeiras pginas de seu
livro A poltica, Aristteles explica a origem do Estado enquanto
valendo-se de uma reconstruo histrica das etapas atravs das
quais a humanidade teria passado das formas primitivas s formas
mais evoludas de sociedade, at chegar sociedade perfeita que
o Estado. Aristteles v a evoluo da sociedade humana como
uma passagem gradual de uma sociedade menor para uma mais ampla. Os homens seriam
para Aristteles por natureza animais polticos. Sendo o Estado o resultado do
desenvolvimento dessa natureza humana. A poltica define a prpria essncia do homem,
e o Estado considerado uma instituio natural.
O raciocnio de Aristteles o seguinte: os homens buscam sempre um bem, algo que
os tornem felizes. Mas sozinho o homem no consegue prover tudo que precisa para
ser feliz, por isso os homens se associam em grupos para poder alcanarem a
felicidade. O primeiro grupo que os homens formaram foi a famlia, estas foram
unificadas por laos sanguneos. A sociedade que em seguida se formou de vrias famlias
chama-se aldeia. Da unio de vrias aldeias surgiu o Estado.
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Mas afinal, o que o Estado? Nas aulas de geografia vocs aprenderam que Estados so
divises territoriais de determinados pases. Por exemplo, no Brasil so Estados o Esprito
Santo, So Paulo, Rio de Janeiro, etc. Contudo, essa mesma palavra usada com outro
sentido no campo da filosofia poltica. Estado aqui significa uma nao com territrio prprio,
politicamente organizado por meio de leis e que possui instrumentos de represso para fazer
valer o direito (a polcia, por exemplo), alm disso possui um exrcito para proteger os seus
espaos. Nesse caso o Brasil um Estado, a Argentina, a Frana, a Alemanha, etc. Na Grcia
do tempo de Aristteles as cidades eram chamadas de cidades-Estado, isto porque elas eram
independentes umas das outras, no se encontravam submetidas ao mesmo governo. As
cidades gregas eram como os pases hoje.
Os Estados podem ser organizados em diversas formas de governo. Hoje no Brasil, por
exemplo, o governo organizado na forma de uma democracia. Aristteles foi um dos
primeiros filsofos a elaborar um estudo sobre as diversas formas de governo. Abaixo
leremos um texto do filsofo grego onde ela traa essa distino das formas de governo.
4.3. A POLTICA E A MORAL: MAQUIAVEL
ESTUDO DIRIGIDO
- O texto a seguir um trecho do livro A poltica de Aristteles. A partir da leitura do
texto construa uma tabela explicativa com as formas de governo descritas por
Aristteles. A tabela deve conter tanto as formas que contribuem para a felicidade
geral quanto as formas degeneradas.
Formas de governo
O governo o exerccio do poder supremo do Estado. Este poder s poderia estar ou nas
mos de um s, ou da minoria, ou da maioria das pessoas. Quando o monarca, a minoria ou
a maioria no buscam, uns ou outros, seno a felicidade geral, o governo necessariamente
justo. Mas, se ele visa ao interesse particular do prncipe ou dos outros chefes, h um
desvio. O interesse deve ser comum a todos ou, se no o for, no so mais cidados.
Chamamos monarquia o Estado em que o governo que visa a este interesse comum
pertence a um s; aristocracia, aquele em que ele confiado a mais de um, denominao
tomada ou do fato de que as poucas pessoas a que o governo confiado so escolhidas
entre as mais honestas, ou de que elas s tm em vista o maior bem do Estado e de seus
membros; repblica, aquele em que a multido governa para a utilidade pblica [...]
[...] Estas trs formas podem degenerar: a monarquia em tirania; a aristocracia em
oligarquia; a repblica em democracia. A tirania no , de fato, seno a monarquia voltada
para a utilidade do monarca; a oligarquia, para a utilidade dos ricos; a democracia, para a
utilidade dos pobres. Nenhuma das trs se ocupa do interesse pblico. Podemos dizer ainda,
de um modo um pouco diferente, que a tirania o governo desptico exercido por um
homem sobre o Estado, que a oligarquia representa o governo dos ricos e a democracia o
dos pobres ou das pessoas pouco favorecidas.
(Aristteles. A poltica)
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No livro O prncipe, Maquiavel ensina o
que os governantes devem fazer para se
manter no poder
A filosofia poltica moderna comea com a obra de Maquiavel (1469-1527). Nascido em
Florena, Itlia, Maquiavel foi um dos grandes responsveis pela noo moderna de poder.
Em Maquiavel tambm encontramos uma renovao do sentido e da relao entre tica e
poltica. Desta forma, muito folclore se construiu em torno de seu nome e de sua pessoa,
principalmente pela interpretao precipitada que se fez muitas vezes de seu pensamento.
Maquiavel foi compreendido como algum
imoral e desprovido de quaisquer valores. Por
isso a perspectiva do termo maquiavlico
sempre pejorativa. Mas, seria Maquiavel digno
desta fama? O que ele pretendia? Vamos por
partes.
Maquiavel choca por fazer uma anlise do
homem considerando-o a partir de uma de suas
facetas, a do egosmo. Se para Aristteles e para o
pensamento greco-cristo no geral o homem
buscava a vida em sociedade, o bem viver como
algo natural, para Maquiavel os homens tendem diviso e desunio.
Seu livro mais conhecido, O Prncipe, um conjunto de recomendaes para que os
governantes ascendam ao poder e mantenha-se
como lder. Suas recomendaes podem ser
resumidas na mxima os fins justificam os
meios, que significa que todos os recursos
honrveis ou no devem ser utilizados para a conquista e a manuteno do poder. Para chegar
a este objetivo, tudo era vlido, inclusive mentir, enganar, trair e matar. Maquiavel argumenta
que o governante deve ser dissimulado quando necessrio, porm nunca deixando
transparecer sua dissimulao. No necessrio, a um prncipe, possuir todas as qualidades,
mas preciso parecer ser piedoso, fiel, humano, ntegro e religioso j que s vezes
necessrio agir em contrrio a essas virtudes.
Vemos que para Maquiavel a moral no uma questo poltica. No existe certo e errado na
poltica. O que existe o que serve para se manter no poder e o que no serve. Maquiavel
comenta que aquele que trocar o que se faz por aquilo que se deveria fazer aprende antes sua
runa do que sua preservao; pois um homem que queira fazer em todas as coisas profisso
de bondade deve arruinar-se entre tantos que no so bons.
Outra ideia bem famosa defendida por Maquiavel no livro O Prncipe a de que os
governantes para se manterem no poder devem ser temidos. Segundo Maquiavel, melhor
para um governante ser temido do que amado, o temor de uma punio faz os homens
pensarem duas vezes antes de trair seus lderes. O temor surge das punies. O lder deve ser
cruel quanto s penas com as pessoas, mas nunca no carter material, Maquiavel diz que "as
pessoas esquecem mais facilmente a morte do pai, do que a perda da herana". Punir as
pessoas materialmente as torna revoltadas, em vez de provocar o temor do governante.
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A obra de Maquiavel, criticada em toda a parte, atacada por catlicos e protestantes,
considerada ateia e satnica, tornou-se, porm, a referncia obrigatria do pensamento
poltico moderno. A ideia de que a finalidade da poltica a tomada e conservao do poder e
que este no provm de Deus, nem de uma ordem natural feita de hierarquias fixas exigiu que
os governantes justificassem a ocupao do poder. Em alguns casos, como na Frana e na
Prssia, surgir a teoria do direito divino dos reis. Na maioria dos pases, porm, a concepo
teocrtica no foi mantida e, partindo de Maquiavel, os tericos tiveram que elaborar novas
teorias polticas.
Essas novas teorias no pretendiam mais mostrar porque o Estado uma obra de Deus, ou
fruto do desenvolvimento natural do homem. Elas queriam responder questes como: por que
indivduos isolados formam uma sociedade? Por que indivduos independentes aceitam
submeter-se ao poder poltico e s leis?
4.4. A RELIGIO TEM ALGUMA COISA A VER COM A POLTICA?
John Locke (1632 - 1704), filsofo ingls, era mdico e descendia de uma famlia de
burgueses comerciantes. Com a obra Dois tratados sobre o governo civil, tornou-se o grande
terico do liberalismo, cujas ideias iriam repercutir em todo o sculo XVIII, dando
fundamento filosfico s revolues ocorridas na Europa e nas Amricas.
Para Locke, a separao entre a Religio e o Estado algo que reside na natureza e finalidade
de ambos. Apesar disso, aquelas que advogam a falsa religio tm sustentado a sua unidade
para melhor prosseguirem os seus interesses particulares. O resultado a intolerncia
religiosa. Locke entende que a nica forma de acabar com a mesma separar aquilo que por
natureza distinto. Locke estudou as relaes entre Igreja e Estado na sua obra Carta sobre a
tolerncia.
a) Estado. O domnio do Estado o da ordem pblica, garantindo, defendendo e promovendo
o desenvolvimento dos interesses particulares. O Estado foi constitudo por mtuo acordo
entre homens livres para resolverem os seus conflitos e protegerem os seus direitos. Est ao
servio dos cidados e sob forma alguma pode atentar contra os seus direitos naturais
(liberdade, vida e bens).
b) Igreja. O domnio da Igreja o culto pblico a Deus e o encorajamento dos homens para
que levem uma vida virtuosa e piedosa a fim de salvarem as suas almas. As Igrejas so
assembleias livremente constitudas e qualquer um as pode criar. Nenhuma tem mais
autoridade ou se pode arrogar ser mais verdadeira que outra. Apenas Deus sabe qual a
verdadeira, e s a Ele compete julgar a conduta dos seus membros. A organizao e a
hierarquia nas Igrejas resultam da vontade dos homens e no de Deus.
Vemos que com Locke o Estado no deve ser confessional, ou seja, o Estado no deve
declarar possuir uma religio oficial. Para o filsofo ingls o Estado deve ser laico, secular.
Um Estado laico aquele que no sofre interferncia das religies e dos religiosos, no se
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encontra submisso a Igreja e no fundamenta suas leis se baseando em recomendaes dos
livros sagrados.
PENSANDO NOSSO TEMPO
- Leia e interprete as notcias abaixo para responder as questes.
Ministrio Pblico pede retirada de smbolos religiosos de rgos pblicos em SP
O Ministrio Pblico Federal em So Paulo pediu que a Justia obrigue a Unio a retirar
todos os smbolos religiosos fixados em locais de grande visibilidade e atendimento ao
pblico em rgos pblicos federais no Estado. No pedido, a Procuradoria Regional dos
Direitos do Cidado pede tambm a aplicao de multa diria simblica de R$ 1 em caso de
descumprimento. A multa dever servir como um contador do desrespeito determinao
judicial. O prazo proposto pelo Ministrio Pblico para a retirada dos smbolos de at 120
dias aps a deciso.
Segundo o Ministrio Pblico, a ostentao de smbolos religiosos seria uma ofensa
liberdade de crena dos cidados. Alm disso, o rgo argumenta que a Constituio Federal
determina que o Brasil um Estado laico, ou seja, onde no h vinculao entre o poder
pblico e a religio. Para o procurador regional dos Direitos do Cidado e autor da ao,
Jefferson Aparecido Dias, cabe ao Estado proteger todas as manifestaes religiosas sem
tomar partido de alguma. "Quando o Estado ostenta um smbolo religioso de uma
determinada religio em uma repartio pblica est discriminado todas as demais ou
mesmo quem no tem religio afrontando o que diz a Constituio", defendeu. (Folha
Online)
1. O texto faz referncia ao conflito entre duas instituies. John Locke escreveu sobre
esse conflito. Quais instituies so essas?
2. Quais argumentos o Ministrio Pblico utiliza para pedir a proibio da ostentao
de smbolos religiosos em rgos pblicos?
Aumentam denncias contra intolerncia religiosa no Rio
As denncias de ofensa religio vm crescendo no estado do Rio de Janeiro, onde, at
novembro de 2008, a Lei Ca, que considera crime a intolerncia religiosa, no estava
includa no sistema das delegacias legais. Com a mudana recente, ainda no h nmeros ou
estatsticas para mensurar esse movimento, mas, segundo o delegado Henrique Pessoa,
coordenador do setor de inteligncia da Polcia Civil, hoje h praticamente um registro por
dia nas delegacias do estado. Nessa guerra da f, os seguidores de religies afro-brasileiras
so as vtimas mais frequentes.
Segundo o delegado, os devotos da umbanda e do candombl esto entre as maiores vtimas.
J evanglicos e judeus ainda no apareceram entre os registros. [...] Os adeptos da
umbanda e do candombl no esto mais dispostos a apanhar calados. J os judeus sofrem
preconceito, mas um preconceito velado. E aumentou muito o respeito pela comunidade
judaica tambm. De acordo com a Lei Ca (nmero 7.716), a pena para intolerncia
religiosa pode variar de um a trs anos. Mas, no caso de uso da mdia para difundir a
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5. A DEMOCRACIA EM QUESTO
Muitas vezes podemos rir como a personagem Mafalda ao imaginarmos que a democracia era
para ser uma forma de governo em que o povo soberano, isto , que o povo exerce o poder.
Vivemos num pas cuja democracia a forma de governo adotada, mas nem sempre a voz do
povo escutada.
A palavra democracia vem do grego demos ("povo") e kratia, de krtos ("governo", "poder",
"autoridade"). Os atenienses so o primeiro povo a elaborar teoricamente o ideal democrtico,
dando ao cidado a capacidade de decidir os destinos da plis (cidade-estado grega).
Habituado ao discurso, o povo grego encontra na gora (praa pblica) o espao social para o
debate e o exerccio da persuaso.
Na Grcia a democracia era direta, ou seja, os cidados participavam diretamente da vida
pblica, no havia escolha de representantes polticos. No mundo moderno surgiu a
democracia representativa. Pases como o Brasil possuem esse tipo de regime poltico. Na
democracia representativa os cidados atravs de eleies concedem mandatos a
representantes que passaro a exercer autoridade em seu nome.
A democracia moderna pretende garantir direitos individuais que preservem a privacidade e
liberdade, vida e bens dos cidados. Alm de direitos que garantam a participao dele na
vida poltica seja atravs do direito de voto, greve, ou de fazer parte de alguma organizao
(sindicato, associao de moradores, partido).
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Geralmente em democracias como a brasileira o governo organizado em trs poderes
democrticos. Tal forma de organizao das democracias modernas em trs poderes diferentes
foi inspirada pelas ideias do filsofo francs Montesquieu (1689-1755). Montesquieu
escreveu sobre essa organizao do governo em trs poderes no seu livro o Esprito das Leis.
A partir da leitura do texto de Montesquieu logo abaixo entenderemos quais so esses trs
poderes e porque o filsofo sugeriu que os governos deviam ser organizados dessa forma.
5.1. DILEMAS DA DEMOCRACIA: A TECNOCRACIA
ESTUDO DIRIGIDO
- Leia e interprete o trecho do livro Do esprito das leis de Montesquieu. A seguir responda as
questes.
Os trs poderes
Para que no se possa abusar do poder, preciso que, pela disposio das coisas, o poder limite o
poder. [...] Existem em cada Estado trs tipos de poder: o poder legislativo, o poder executivo [...] e
o poder judicirio [...]. Com o primeiro, o prncipe ou o magistrado cria leis por um tempo ou para
sempre e corrige ou anula aquelas que foram feitas. Com o segundo, ele faz a paz ou a guerra, envia
ou recebe embaixadas, instaura a segurana, previne invases. Com o terceiro, ele castiga os crimes,
ou julga as querelas1 entre os particulares.
A liberdade poltica, em um cidado, esta tranqilidade de esprito que provm da opinio que
cada um tem sobre a sua segurana; e para que se tenha esta liberdade preciso que o governo seja
tal que um cidado no possa temer outro cidado. Quando na mesma pessoa ou no mesmo corpo de
magistratura o poder legislativo est reunido ao poder executivo, no existe liberdade, pois pode-se
temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado apenas estabeleam leis tirnicas para execut-las
tiranicamente. No haver tambm liberdade se o poder de julgar no estiver separado do poder
legislativo e do executivo. Se estivesse ligado ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a
liberdade dos cidados seria arbitrrio, pois o juiz seria legislador. Se estivesse ligado ao poder
executivo, o juiz poderia ter a fora de um opressor.
Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos principais, ou dos nobres, ou do
povo, exercesse esses trs poderes: o de fazer leis, o de executar as resolues pblicas e o de julgar
os crimes ou as divergncias dos indivduos. (Montesquieu. Do esprito das leis)
1Querelas: disputas.
1. Construa uma tabela explicativa com os trs poderes descritos por Montesquieu. A tabela
deve conter o nome do cargo dos principais representantes de cada poder no Brasil. Por
exemplo, presidente, governador, juiz, etc.
2. Para Montesquieu, por que necessrio essa organizao da democracia em trs
poderes?
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A palavra tecnocracia formada por duas palavras de origem grega. A palavra tkhn que
significa tcnica e krtos que significa 'governo, poder, domnio'. Tecnocracia seria o
governo exercido por aqueles que dominam as tcnicas, que detm o saber tecnolgico. A
palavra tecnocracia parece ter sido criada pelo ingls, radicado nos EUA, William Henry
Smyth (1855-1940), para designar 'um novo sistema e filosofia de governo, no qual os
recursos industriais de uma nao seriam organizados e manipulados por pessoas
tecnicamente competentes, para o bem-comum, em vez de serem deixados sob controle de
interesses privados, para benefcio prprio'; a partir de 1932 essa palavra passou a fazer parte
do vocabulrio da filosofia poltica.
O termo tecnocracia passou a ser utilizado para designar um fenmeno que toma propores
cada vez maiores nos pases democrticos: a importncia das pessoas tecnicamente
competentes para a administrao do governo. Compreenderemos porque esse fenmeno
(tecnocracia) um dilema da democracia estudando o texto abaixo.
- O texto abaixo do livro O futuro da democracia, do italiano Norberto Bobbio. Leia e
interprete para responder as questes.
[...] Na medida em que as sociedades passaram de uma economia familiar para uma economia de
mercado, de uma economia de mercado para uma economia protegida, regulada, planificada
aumentaram os problemas polticos que requerem competncias tcnicas. Os problemas tcnicos
exigem por sua vez experts, especialistas, uma multido cada vez mais ampla de pessoal
especializado. H mais de um sculo Saint-Simon havia percebido isto e defendido a substituio
do governo dos legisladores pelo governo dos cientistas. Com o progresso dos instrumentos de
clculo, que Saint-Simon no podia nem mesmo de longe imaginar, a exigncia do assim chamado
governo dos tcnicos aumentou de maneira desmesurada
Tecnocracia e democracia so antitticas1: se o protagonista
2 da sociedade industrial o
especialista, impossvel que venha a ser o cidado qualquer. A democracia sustenta-se sobre a
hiptese de que todos podem decidir a respeito de tudo. A tecnocracia, ao contrrio, pretende que
sejam convocados para decidir. Na poca dos Estados absolutos, como j afirmei, o vulgo devia ser
mantido longe dos arcana imperii3 porque era considerado ignorante demais. Hoje o vulgo
certamente menos ignorante. Mas os problemas a resolver tais como a luta contra a inflao, o
pleno emprego, uma mais justa distribuio da renda no se tornaram por acaso crescentemente
mais complicados? No so eles de tal envergadura4 que requerem conhecimentos cientficos e
tcnicos em hiptese alguma menos misteriosos para o homem mdio de hoje (que apesar de tudo
mais instrudo)?
1Antitticas: contrrios; esto em oposio.
2Protagonista: que ocupa papel de destaque.
3Arcana imperii: autoridades ocultas, misteriosas.
4Envergadura: importncia; peso.
1. Por que a democracia e a tecnocracia so antitticas?
2. O qu props Saint-Simon?
3. Quais so os complexos problemas que acabam tornando necessrio a participao dos
especialistas no governo?
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5.2. DILEMAS DA DEMOCRACIA: A DESIGUALDADE ENTRE OS IGUAIS
O quadrinho acima mostra uma situao muito comum nos pases com regime democrtico
a desigualdade entre os iguais. Apesar de a democracia buscar garantir a participao poltica e o direito de todos, nem sempre isso acontece. Uma boa parte da populao acaba
sendo e