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 A NOVA SÚMULA 425 DO TST. ENSAIO PARA O FIM DO JUS POSTULANDI? Hugo Raphael da Costa Dias 1 1 INTRODUÇÃO  Nos dias atuais, cresce assustadoramente o número de processos trabalhistas, fato que sobrecarrega tanto o trabalho de magistrados quanto de servidores públicos. Um dos motivos desse aumento está relacionado com um dos princípios consagrados do direito do trabalho: o  jus  postulandi . Ocorre que o trabalhador desinformado vem postulando pedido por pedido, ou seja, numa reclamação requer apenas verbas rescisórias, em outra, horas extras ou outras parcelas. Isso conseqüentemente vai gerando o chamado efeito bola de neve, tumultuando a pauta dos  juízes e enchendo as mesas dos servidores de processos para cumprirem expediente. Tal fato não ocorreria se o empregado estivesse assistido por um advogado, que normalmente reuniria numa única reclamação todos os pedidos. Recentemente, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 425, que estabelec e os casos em que cabe o  jus postulandi . Fato interessante é que a partir dessa súmula ficou expresso que os recursos de competência daquele tribunal não estão abrangidos pelo jus  postulandi . Assim, o objetivo deste trabalho é tentar demonstrar os benefícios que poderão surgir com a limitação do exercício desse princípio consagrado ao trabalhador. 2 CONCEITO DE JUS POSTULANDI O art. 791 da CLT assim dispõe: “Os empregados e os empregadores poderão r eclamar  pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final”. A expressão “até o final” era interpretada por grandes doutrinadores como até o Tribunal Superior do Trabalho. Assim dissertou o professor Renato Saraiva: “Logo, em função do  jus postulandi , reclamante e reclamado poderão atuar sem a presença de advogados em todas as instâncias trabalhistas, mesmo nos Tribunais Regionais e no Tribunal Superior do Trabalho ” 2 Por sua vez, o art. 839, a, do mesmo diploma reza: “A reclamação poderá ser  apresentada : a) pelos empregados e empregadores, pessoalmente , ou por seus representantes, e  pelos sindicatos de classe”. À luz destes disposit ivos, pode-se concluir que  jus postulandi é a capacidade das partes de postularem, sem a presença de advogado, perante às instâncias judiciárias, e no caso da Justiça do Trabalho, somente podem os empregados e empregadores. 1 Pós-graduando em Direito do Tra balho e Proce ssual do Trabalho pela Univers idade de A nhang uera. Té cnico Judiciário do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região. 2 SARAI V A, Renato . “Curso de Dire ito Processual do T rabal ho”. São Pa ulo: Métod o, 2007, p. 200.

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A NOVA SÚMULA 425 DO TST. ENSAIO PARA O FIM DO JUS POSTULANDI?

Hugo Raphael da Costa Dias1

1 INTRODUÇÃO

 Nos dias atuais, cresce assustadoramente o número de processos trabalhistas, fato quesobrecarrega tanto o trabalho de magistrados quanto de servidores públicos. Um dos motivosdesse aumento está relacionado com um dos princípios consagrados do direito do trabalho: o

 jus  postulandi.

Ocorre que o trabalhador desinformado vem postulando pedido por pedido, ou seja,

numa reclamação requer apenas verbas rescisórias, em outra, horas extras ou outras parcelas.Isso conseqüentemente vai gerando o chamado efeito bola de neve, tumultuando a pauta dos

 juízes e enchendo as mesas dos servidores de processos para cumprirem expediente. Tal fatonão ocorreria se o empregado estivesse assistido por um advogado, que normalmente reunirianuma única reclamação todos os pedidos.

Recentemente, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 425, queestabelece os casos em que cabe o jus postulandi. Fato interessante é que a partir dessa súmulaficou expresso que os recursos de competência daquele tribunal não estão abrangidos pelo jus

 postulandi. Assim, o objetivo deste trabalho é tentar demonstrar os benefícios que poderãosurgir com a limitação do exercício desse princípio consagrado ao trabalhador.

2 CONCEITO DE JUS POSTULANDI 

O art. 791 da CLT assim dispõe: “Os empregados e os empregadores poderão reclamar  pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final”.

A expressão “até o final” era interpretada por grandes doutrinadores como até oTribunal Superior do Trabalho. Assim dissertou o professor Renato Saraiva:

“Logo, em função do  jus postulandi, reclamante e reclamado poderão

atuar sem a presença de advogados em todas as instâncias trabalhistas,mesmo nos Tribunais Regionais e no Tribunal Superior do Trabalho ”2

Por sua vez, o art. 839, a, do mesmo diploma reza: “A reclamação poderá ser apresentada: a) pelos empregados e empregadores, pessoalmente, ou por seus representantes, e

 pelos sindicatos de classe”.

À luz destes dispositivos, pode-se concluir que jus postulandi é a capacidade das partesde postularem, sem a presença de advogado, perante às instâncias judiciárias, e no caso daJustiça do Trabalho, somente podem os empregados e empregadores.

1 Pós-graduando em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Universidade de Anhanguera. TécnicoJudiciário do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região.

2 SARAIVA, Renato. “Curso de Direito Processual do Trabalho”. São Paulo: Método, 2007, p. 200.

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Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, ganhou força o entendimento deque o art. 791 da CLT não estaria mais em vigor, devido a incompatibilidade com o art. 133que prevê a indispensabilidade do advogado à administração da Justiça.

Porém, em 06/10/1994, julgando a ADI nº 1.127-8, O STF concedeu liminar no sentidode que a atuação de advogado não é imprescindível na Justiça do Trabalho, bem como nos

Juizados Especiais e na Justiça de Paz.

3 NOVA ORIENTAÇÃO COM A SÚMULA 425 DO TST

Em 30 de abril de 2010, o TST divulga a Súmula 425: “O  jus postulandi das partes,estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais doTrabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e osrecursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.”

Ora, o TST suprimiu a aplicação do jus postulandi em sua área de atuação. Se assim ofez, poderia ter estendido essa supressão para os Tribunais Regionais, ou até mesmo

extinguindo o instituto, pois é inegável que, hodiernamente, a jurisprudência possui forçanormativa.

Sobre a força normativa da jurisprudência Maurício Godinho Delgado esplana:

“(...) a segunda corrente, mais moderna, ponderando qu a  jurisprudência tem um indissimulável papel jurígeno (Criador doDireito). Em certos ramos – como o Direito do Trabalho – esse papelseria até mesmo determinante à compreensão da própria estrutura edinâmica do conjunto do ramo jurídico enfocado.

(…) Essas diretrizes jurisprudenciais – e dezenas de outras - , emboranão filiadas ao princípio estrito da reserva legal (se interpretandorigidamente esse princípio, é claro), têm inquestionável força jurídica(e jurígena)”3

 Nos casos em que Juízo reconhece a prescrição de ofício, extinguindo a reclamaçãotrabalhista com resolução do mérito, o reclamante leigo não teria condições técnicas derecorrer de tal decisão e tentar modificar o julgado.

Foi o que ocorreu no Juízo da 4ª Vara do Trabalho de Macapá:

“A Lei nº 11.280 de 16 de fevereiro de 2006 trouxe alterações noCódigo de Processo Civil e deu nova redação ao artigo 219, § 5º, paraautorizar o juiz a pronunciar de ofício a prescrição, revogandoexpressamente o artigo 194 do Código Civil de cunho eminentemente

 patrimonialista.

Entendo que o referido dispositivo aplica-se perfeitamente ao processodo trabalho, pelo permissivo do artigo 769 da CLT, haja vista que amatéria é omissa na legislação celetista e há compatibilidade entre osinstitutos. Além disso, a prescrição de ofício teve seu fundamento

maior na celeridade dos processos em geral, e inegável nascedouro na  jurisprudência trabalhista conforme Súmula nº 153 do Colendo

3 DELGADO, Maurício Godinho. “Curso de Direito do Trabalho”. São Paulo: LTR, 2009, p. 158-159.

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Tribunal Superior do Trabalho, ainda em vigor, que permite a argüiçãoda matéria prescricional em Primeiro ou Segundo graus na instânciaordinária, isto é, no processo de conhecimento: “PRESCRIÇÃO. Nãose conhece de prescrição não argüida na instância ordinária (ex-Prejulgado nº 27)”; assim, nada impede que, depois da decretação deofício pelo órgão de Primeiro Grau ocorra a argüição voluntária da

  parte interessada ao E. Tribunal Regional suprindo a omissão.”(Processo 01033-2009-205-08-00-1)

 Não é somente no casos de recursos em que o reclamante leigo entra numa situação dedificuldade, mas também nos casos de contra-razões de recurso. O jurista Leonardo Tadeu,tratando do tema, assim discorreu:

“Nos salta aos olhos as seguintes perguntas: Como um leigo,desprovido de toda a técnica jurídica, que anos a fio é estudada edebatida em uma faculdade; poderá redigir uma petição inicialobedecendo aos requisitos do art.282 do CPC?

Como poderá contra- arrazoar um recurso, obedecendo aos prazos processuais rigorosamente impostos pela lei e ainda enfrentar todo oritual da instrução probatória sem estar amparado por um profissionalcompetente e atento a todas as armadilhas processuais? Ressalta-seque em segundo grau, o reclamante ou reclamado, necessariamente,deverá por imposição legal constituir um advogado, se tiver a intençãode recorrer. Nos salta os olhos, então, um outro questionamento, se oinstituto do Jus postulandi é tão eficaz, qual será o motivo de nossoslegisladores exigir a habilitação de um advogado no segundo grau?Será que é devido a grande complexidade e a exigência de uma técnicamais apurada, que a esfera recursal exige? Temo que sim.”4

Já a cearense, Antônia Katiúscia Nogueira Lima, com polidez, assim se posicionou:

“Acreditamos, contudo, por motivos sólidos, que o instituto do jus postulandi, na área em comentário, somente deveria ser conferida aquem de direito: aos profissionais advogados legalmente habilitados.

Tal compreensão ocorre, entre outros motivos, pelo fato de não

conseguirmos visualizar que um leigo demande, com êxito, junto aosórgãos do Judiciário, essencialmente quando se trata das esferasrecursais.

Cremos que o instituto do jus postulandi dado à parte na seara laboraldeveria ser extinto, pois entendemos ter sido revogado pela CF/88 e,mais ainda, entendemos ter sido pertencente à época em que a Justiçado Trabalho não era ramo do Poder Judiciário, o que não é mais o caso.

Para a atuação na área trabalhista, agora ramo integrante do Poder Judiciário, faz-se necessário conhecimento técnico-profissional para

que se façam valer os direitos dos trabalhadores, a fim de ser aplicada a

4 TADEU, Leonardo. “JUS POSTULANDI NA JUSTIÇA DO TRABALHO - DIREITO OU AMEAÇA?”.Fonte: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=322  Acesso: 26/10/2011.

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 justiça no caso concreto.

Sabemos que o leigo não detém conhecimento jurídico para atuar  perante os órgãos do judiciário, ocorrendo que, na Justiça do Trabalho,estamos tratando de um crédito substancial, qual seja, o créditoalimentar, ocorrendo ainda que nesta área há, reconhecidamente, uma

relação entre desiguais, entre fraco e forte, quais sejam: empregado eempregador.

Assim sendo, entendemos fazer-se fundamentalmente necessária a presença do advogado.”5

A rigor, o referido instituto foi criado na “Era Vargas”, com o objetivo de incentivar ostrabalhadores à sindicalização. Entendo que, hodiernamente, devemos utilizar o método deinterpretação histórico, ou seja, buscar o contexto histórico em que a norma foi produzida.Logo, as condições sociais da década de 30 são totalmente diferentes da atualidade, o queimplicaria em desnecessidade do jus postulandi (uma vez que existe a Defensoria Pública).

Dessa forma, não haveria violação do direito ao acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, CF),  pois o reclamante poderia constituir um advogado particular ou por meio da DefensoriaPública.

Então por que não extinguir o jus postulandi? Por que o STF já se manifestou? A CorteSuperior firmou Jurisprudência em 1994, todavia, recentemente, há nova composição naquelacorte, não seria o caso de se fazer uma revisão?

A Súmula 425 dar sinais para esse entendimento, meio que tímido, porquanto suprimiude vez a idéia de aplicação do jus postulandi na esfera do Tribunal Superior do Trabalho.

Com efeito, assinala Patrick Maia Merísio:

“O acesso à Justiça não é princípio que se restrinja ao fenômeno  jurídico. Ele tem uma fundamentação muito mais ampla, nãomerecendo esta redução, e deve ser compreendido como acesso a umaordem jurídica justa (...)”6

 Nesse sentido, para um reclamante usufruir de uma ordem jurídica justa, deveria simestá representado por um advogado, pessoa capacitada para atuar na área do direito, o qual

assegurará de uma forma mais sólida os direitos daquele.Por fim, grandes benefícios poderiam surgir com a extinção do instituto do  jus

 postulandi: 1- reduziria o número de processos nas Varas do Trabalho e nos TribunaisRegionais; 2- o magistrado teria mais tempo e tranqüilidade ao prolatar uma sentençadiminuindo o número de embargos de declaração; 3- o empregado seria representado por um

 profissional preparado para postulação da causa, seja na audiência ou em caso de eventualrecurso; 4- evitaria a intimidação dos empregados perante o empregador acompanhado de seuadvogado.

5 LIMA, Antônia. “Considerações Acerca do Jus Postulandi: Enfoque na Seara Trabalhista”. Fonte:http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/5202/Consideracoes_Acerca_do_Jus_Postulandi_Enfoque_na_Seara_Trabalhista. Acesso: 26/10/2011.

6 MERÍSIO, Patrick Maia. “Noções Gerais de Direito e Formação Humanística”. São Paulo: Campus, 2010, p.73.

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4. CONCLUSÃO

A indispensabilidade do advogado à administração da Justiça está consagrada de formaexpressa na Constituição Federal (art. 133, CF). Logo, a melhor interpretação seria no sentidode que o jus postulandi, na área trabalhista , teria sido extinto em 1988.

Mesmo tendo o STF decidiu pela constitucionalidade dos artigos 791 e 839, “a”, daCLT, em 1994, entendo que tais preceitos são inconstitucionais, e como houve alteração nacomposição daquela corte, deveria haver uma revisão da jurisprudência.

Pelo exposto, o fim do  jus postulandi está ligado diretamente a uma razoável duraçãodo processo (art. 5º, LXXVIII, CF), uma vez que reduziria a quantidade de processos iniciados

 por má técnica, além de propiciar uma melhor forma de trabalho aos magistrados e servidores.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DELGADO, Maurício Godinho. “Curso de Direito do Trabalho”. São Paulo: LTR, 2009

MERÍSIO, Patrick Maia. “Noções Gerais de Direito e Formação Humanística”. São Paulo:Campus, 2010

LIMA, Antônia. “Considerações Acerca do Jus Postulandi: Enfoque na Seara Trabalhista”.Fonte:http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/5202/Consideracoes_Acerca_do_Jus_Postulandi_Enfoque_na_Seara_Trabalhista. Acesso: 26/10/2011.

SARAIVA, Renato. “Curso de Direito Processual do Trabalho”. São Paulo: Método, 2007.

TADEU, Leonardo. “JUS POSTULANDI NA JUSTIÇA DO TRABALHO - DIREITO OUAMEAÇA?”. Fonte: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=322 Acesso: 26/10/2011.