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2ª Edição Florianópolis, 2011 Física Básica C-II Ivan Helmuth Bechtold Nilton da Silva Branco

Fisica Basica C-II 2edicao

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Livro de fisica basica 2 Edição.

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2ª Edição

Florianópolis, 2011

Física Básica C-IIIvan Helmuth BechtoldNilton da Silva Branco

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Governo FederalPresidente da República Dilma Vana Rousseff

Ministro da Educação Fernando Haddad

Secretário de Ensino a Distância Carlos Eduardo Bielschowsky

Coordenador da Universidade Aberta do Brasil Celso José da Costa

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Comissão EditorialMarcelo Henrique Romano Tragtenberg

Nelson Canzian da Silva

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Frederico Firmo de Souza Cruz

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Laboratório de Novas Tecnologias - LANTEC/CEDCoordenação PedagógicaCoordenação Geral: Andrea Lapa, Roseli Zen Cerny

Núcleo de Formação: Nilza Godoy Gomes

Núcleo de Pesquisa e Avaliação: Henrique César da Silva,

David Antonio da Costa

Núcleo de Criação e Desenvolvimento de MateriaisDesign GráficoCoordenação: Laura Martins Rodrigues, Thiago Rocha Oliveira

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Braga, Natal Anacleto Chicca Junior

Redesenho do Projeto Gráfico: Laura Martins Rodrigues,

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Tony Roberson de Mello Rodrigues

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Acadêmica do Curso de Licenciatura em Física na Modalidade à Distância.

Ficha Catalográfica B392f Bechtold, Ivan Helmuth Física básica C-II / Ivan Helmuth Bechtold, Nilton da Silva Branco. — 2. ed. — Florianópolis : UFSC/EAD/CED/CFM, 2011. 186 p. : il. Inclui bibliografia UFSC. Licenciatura em Física na Modalidade à Distância ISBN 978-85-8030-009-3 1. Física básica. 2. Fluidos. 3. Termodinâmica. I. Branco, Nilton da Silva. II. Título. CDU: 53 Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da UFSC

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Sumário

Apresentação ............................................................................. 9

1. Estática dos Fluidos ............................................................ 111.1 Propriedades dos fluidos ........................................................... 131.2 Pressão num fluido .................................................................... 151.3 Variação de pressão em um fluido em repouso ..................... 191.4 Aplicações .................................................................................... 24

1.4.1 Princípio de Pascal ............................................................. 241.4.2 Vasos comunicantes ........................................................... 271.4.3 Medidas de pressão ........................................................... 291.4.4 Empuxo: Princípio de Arquimedes ................................. 30

Resumo .............................................................................................. 35Exercícios ........................................................................................... 36Bibliografia básica ............................................................................ 38Bibliografia complementar comentada ......................................... 38

2. Dinâmica dos Fluidos ........................................................ 412.1 Introdução ................................................................................... 432.2 Conservação da massa: equação de continuidade ................ 452.3 Conservação da energia: equação de Bernoulli ..................... 492.4 Viscosidade ................................................................................. 56Resumo .............................................................................................. 60Questões ............................................................................................ 60Problemas ...........................................................................................61Bibliografia básica ............................................................................ 62Bibliografia complementar comentada ......................................... 62

3. Temperatura e Calor........................................................... 633.1 Introdução ................................................................................... 653.2 Temperatura ................................................................................ 66

3.2.1 Escalas de temperatura ..................................................... 673.3 Expansão térmica ....................................................................... 683.4 Calor ............................................................................................. 72

3.4.1 Capacidade térmica e calor específico ............................. 723.4.2 Transição de fase e calor latente ....................................... 77

3.5 Transferência de energia térmica ............................................. 793.5.1 Condutividade térmica ...................................................... 81

Resumo .............................................................................................. 85

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Questões ............................................................................................ 87Bibliografia básica ............................................................................ 89Bibliografia complementar comentada ......................................... 90

4. Primeira Lei da Termodinâmica ...................................... 914.1 Introdução ................................................................................... 934.2 Equivalente mecânico de caloria .............................................. 944.3 Trabalho adiabático .................................................................... 95

4.3.1 Análise gráfica .................................................................... 984.4 Transferência de calor .............................................................. 1004.5 Primeira lei da termodinâmica .............................................. 1004.6 Processos reversíveis ................................................................1014.7 Aplicação em processos termodinâmicos ............................. 104

4.7.1 Processo adiabático .......................................................... 1044.7.2 Processo isocórico ............................................................ 1044.7.3 Processo isobárico ............................................................ 1054.7.4 Processo isotérmico .......................................................... 1064.7.5 Processo cíclico ................................................................. 106

4.8 Gás ideal .................................................................................... 1094.8.1 Energia interna de um gás ideal .....................................1124.8.2 Capacidade térmica de um gás ideal .............................1134.8.3 Processo adiabático de um gás ideal ..............................116

Resumo ............................................................................................ 122Exercícios ......................................................................................... 123Bibliografia básica .......................................................................... 127Bibliografia complementar comentada ....................................... 127

5. Teoria Cinética dos Gases ............................................... 1295.1 Introdução ..................................................................................1315.2 Modelo de gás ideal ..................................................................1315.3 Pressão ...................................................................................... 1345.4 Temperatura: interpretação cinética ...................................... 1385.5 Fluido de Van der Waals ......................................................... 139Resumo ............................................................................................ 144Questões ...........................................................................................145Problemas .........................................................................................145Bibliografia básica ...........................................................................146

6. Segunda Lei da Termodinâmica e Entropia ................ 1476.1 Introdução ..................................................................................1496.2 Segunda Lei da Termodinâmica: enunciados de Clausius e Kelvin ............................................151

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6.3 Motor térmico e refrigerador .................................................. 1556.3.1 Motor térmico ................................................................... 1556.3.2 Refrigerador .......................................................................157

6.4 Equivalência dos enunciados de Kelvin e Clausius ............ 1586.4.1 O enunciado de Kelvin leva ao de Clausius ................. 1586.4.2 O enunciado de Clausius leva ao de Kelvin ................. 159

6.5 Ciclo de Carnot ..........................................................................1606.6 A escala termodinâmica de temperatura ............................. 1656.7 Exemplos de máquinas térmicas.............................................166

6.7.1 Refrigerador doméstico .....................................................1666.7.2 Bomba de calor ..................................................................1676.7.3 Ciclo Otto ............................................................................1676.7.4 Ciclo Diesel .........................................................................169

6.8 Teorema de Clausius ................................................................ 1716.9 Entropia ..................................................................................... 172

6.9.1 Entropia e processos reversíveis ..................................... 1726.9.2 Entropia e processos irreversíveis .................................. 1756.9.3 O princípio do aumento da entropia ..............................178

Resumo ............................................................................................ 183Questões .......................................................................................... 183Problemas ........................................................................................ 184Bibliografia básica .......................................................................... 186

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ApresentaçãoEste livro contempla de forma simples e direta os conteúdos per-tencentes às áreas de teoria dos fluidos e termodinâmica. Ao lon-go dos textos as discussões relacionam os fenômenos físicos a situações práticas, com o intuito de facilitar o entendimento por parte dos estudantes.

Iniciamos esta disciplina com o estudo da estática dos fluidos no Capítulo 1: nesse contexto consideramos fluidos em equilíbrio, onde propriedades como pressão e empuxo são discutidas em detalhes.

No Capítulo 2 veremos uma introdução à dinâmica dos fluidos, onde fluidos idealizados em movimentos simples serão estuda-dos. Apesar da simplicidade dos modelos tratados, as aplicações são várias, desde o escoamento de fluidos em encanamentos até a sustentação de aviões.

Dando seqüência ao conteúdo, iniciamos o estudo das proprieda-des térmicas da matéria no Capítulo 3, que discute os fenômenos relacionados com temperatura e calor e onde abordamos as es-calas térmicas, os efeitos de dilatação térmica e os processos de transferência de calor.

No Capítulo 4 é apresentada a primeira lei da termodinâmica, a qual é baseada nos conceitos de conservação de energia, sendo o calor e o trabalho as formas de energia transferidas entre os sis-temas considerados. Essa lei é aplicada a diversos processos ter-modinâmicos e é dada uma ênfase à importância dos processos reversíveis na determinação dos parâmetros citados acima. Nesse Capítulo também é introduzido o conceito de gás ideal, bem como as condições em que é observado.

No Capítulo 5 apresentamos a Teoria Cinética dos Gases, a qual se propõe a dar uma interpretação microscópica às leis termodinâ-micas estudadas nos Capítulos anteriores. Assim, estabelecemos a pressão e a temperatura como médias de grandezas microscó-picas. Veremos ainda um modelo de gás que vai além daquele de gás ideal, o chamado gás de Van der Waals.

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Finalmente, no Capítulo 6 será estudada a Segunda Lei da Termo-dinâmica, nos seus vários enunciados. Discutiremos máquinas térmicas (motores e refrigeradores), ciclos termodinâmicos - es-pecialmente o de Carnot, que permite a definição de uma escala termodinâmica de temperatura - e um conceito importante e de-licado em Termodinâmica, o de entropia.

Ivan Helmuth Bechtold Nilton da Silva Branco

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Capítulo 1Estática dos Fluidos

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Capítulo 1Estática dos Fluidos

Neste Capítulo, iremos estudar as propriedades de fluidos em equilíbrio. Vamos analisar conceitos básicos de densi-dade, pressão, empuxo e tensão superficial. Ao final des-te estudo você deverá ser capaz de: aplicar os conceitos de pressão, entender o Princípio de Pascal e o problema dos vasos comunicantes; definir densidade e explicar o empuxo sobre os corpos (por exemplo, sobre barcos e balões de ar quente) mediante o princípio de Arquimedes; resolver pro-blemas envolvendo variações de pressão e problemas com forças de empuxo sobre corpos flutuantes e imersos.

1.1 Propriedades dos fluidosUsualmente, costumamos classificar a matéria em sólidos, líquidos e gases. Um corpo sólido tem geralmente volume e forma bem de-finidos, que só se alteram (geralmente pouco) em resposta a forças externas. Uma das principais propriedades dos líquidos e gases é o escoamento, por isso ambos são denominados fluidos. Os líquidos têm volume bem definidos, mas não a forma, sendo que o volume amolda ao recipiente que o contém. Já os gases não apresentam nem forma nem volume bem definidos, expandindo até ocupar todo o volume do recipiente que os contém. Em alguns casos, a separação entre sólidos e fluidos não é bem definida; é o caso de fluidos como o vidro quente e o piche: eles escoam tão lentamente que se comportam como sólidos nos intervalos de tempo que trabalhamos com eles.

O plasma, caracterizado como um gás altamente ioniza-do, é frequentemente chamado de “o quarto estado da matéria”, em meio às três classes de estado já existentes

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(sólido, líquido e gasoso). Além disso, existem os materiais que se enquadram na chamada “matéria condensada mole”, os quais apresentam uma grande variedade de formas e cujas principais características são: elasticidade, interações fracas entre os elementos estruturais, grande variedade de graus internos de liberdade etc. Alguns exemplos são: ar-gila, sistemas granulares como a areia, polímeros como a borracha e o plástico, espuma, sistemas coloidais e micro-emulsões (maionese), membranas e outros materiais bioló-gicos, géis, cristais líquidos (para saber mais sobre matéria condensada mole, consulte o artigo da Revista Brasileira de Ensino de Física, que pode ser obtido no endereço: <http://www.sbfisica.org.br/rbef/Vol27/Num3/>) etc. Os estudos nessa área renderam o Prêmio Nobel de física de 1991 a Pierre-Gilles de Gennes.

Para uma definição mais precisa de sólidos e fluidos, é preciso classi-ficar os diferentes tipos de forças que atuam sobre eles. Essas forças são geralmente proporcionais à área de um elemento de superfície (que pode ser interna ou externa ao meio) sobre o qual estão sendo aplicadas. A força por unidade de área é definida como tensão: as tensões podem ser normais ou tangenciais às superfícies sobre as quais atuam, veja a Figura 1.1 abaixo:

m

T m

T

m

T1 T2

Cola

A B C

Figura 1.1 – (a) e (b) são exemplos de tensões normais sobre o teto e sobre o solo, respectivamente, e (c) é um exemplo de tensões tangenciais

sobre as superfícies laterais adjacentes ao corpo de massa m.

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Na Figura 1.1, (a) e (b) são exemplos de tensões normais. Em (a) um bloco de massa m puxa o fio que exerce uma tensão T

num elemen-to de superfície do teto, também chamada de tração. Em (b) o bloco está sobre o chão e exerce diretamente uma tensão T

sobre um ele-mento de superfície deste, chamada de pressão. Na Figura 1.1, em (c), o bloco está colado entre duas paredes e, como se pode notar, exerce as tensões 1T

e 2T

sobre as superfícies de cola que aparecem paralelas às paredes. Esse é um exemplo de tensões tangenciais, também chamadas de tensões de cisalhamento.

A diferença fundamental entre sólidos e fluidos está na forma com que estes respondem às tensões tangenciais sobre si. No caso de um sólido, a força externa pode deformar um pouco a sua estrutura, até que se atinja o equilíbrio com as tensões tangenciais internas e o corpo permaneça em repouso. Se a força externa não for muito grande e o sólido voltar à condição inicial depois dela ser retirada, a deformação é dita elástica. Essas deformações, em geral, são muito menores que as dimensões do corpo sólido.

Um fluido não consegue equilibrar uma força externa tangencial (por menor que seja), o resultado disso é o escoamento. Fisicamente esse fenômeno está relacionado com o deslizamento relativo entre as partí-culas constituintes do fluido. A resistência a esse deslizamento é cha-mada de viscosidade e será vista no Capítulo seguinte.

Lembrando de (c) na Figura 1.1, enquanto a cola estiver fluida ela es-coa ao longo das paredes devido à ação da gravidade; apenas depois de solidificada ela consegue equilibrar as forças tangenciais exerci-das pelo bloco.

1.2 Pressão num fluidoComumente vamos nos referir a elementos de volume num fluido

V x y z∆ = ∆ ∆ ∆ , onde suas dimensões , ,x y z∆ ∆ ∆ devem ser muito me-nores que as distâncias macroscópicas (ex.: a medida de uma caixa) e ao mesmo tempo muito maiores que as distâncias interatômicas. Essa proposição é necessária para que V∆ contenha um grande nú-mero de átomos e as flutuações nas propriedades do fluido sejam desprezíveis, resultando na condição de continuidade do fluido.

No caso de um pneu de automóvel ou bicicleta, a pressão interna do pneu está relacionada com as

colisões das moléculas de ar com a superfície interna

(mais detalhes no Capí-tulo 5), mas existe ainda a pressão atmosférica na

superfície externa do pneu (que é igual a 1 atm quando

próximo ao nível do mar). A pressão medida com

um calibrador equivale à diferença entre as pressões interna e externa, diferença essa que é compensada pela

elasticidade do material de que é feito o pneu.

Um fluido se comporta como um meio contínuo

porque, na escala macroscópica, suas

propriedades variam continuamente de um

ponto para outro.

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Vamos imaginar uma quantidade de fluido com massa m∆ fechada em um elemento de volume V∆ . Podemos então definir a densidade do fluido nessa região como:

0

limV

m dmV dV

r∆ →

∆ = = ∆ . (1.1)

onde o limite 0V∆ → nessa expressão significa que V∆ é um infinitésimo físico, portanto a densidade pode variar continuamente na escala macroscópica. A unidade de densidade no Sistema Inter-

nacional de medidas (SI) é 3

Kgm

. Na Tabela 1.1, apresentamos alguns

valores de densidades de algumas substâncias.

Substância Densidade

Hidrogênio a 0°C e 1atm 9,0 × 10-2

Ar: 0°C e 1atm100°C e 1atm0°C e 50atm

1,290,956,50

Isopor 1,0 × 102

Petróleo (valor médio) 8,0 × 102

Gelo 9,2 × 102

Água: 0°C e 1atm 100°C e 1atm 0°C e 50atm

1,000 × 103

0,958 × 103

1,002 × 103

Sangue 1,06 × 103

Glicerina 1,26 × 103

Alumínio 2,7 × 103

Ferro, Aço 7,8 × 103

Prata 1,05 × 104

Mercúrio 1,36 × 104

Ouro 1,93 × 104

Platina 2,14 × 104

Tabela 1.1 – Densidades de algumas substâncias

Um fluido está em equilíbrio quando o resultado da soma das for-ças que agem em cada porção do fluido é igual a zero. Essas forças podem ser divididas em volumétricas e superficiais. Um exemplo de forças volumétricas é a força gravitacional, a qual é de longo alcance e atua em todos os elementos do fluido, sendo dada por F mg∆ = ∆

,

Infinitésimo físicoUm elemento infinitesimal é definido como sendo muito pequeno, porém maior que zero.

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onde e representa a massa de um elemento de fluido. Te-mos então:

. (1.2)

onde g é a aceleração da gravidade.

Como discutimos anteriormente, os fluidos escoam quando submeti-dos a forças tangenciais à superfície, por isso a força superficial deve ser sempre perpendicular à superfície para um fluido em repouso.

A força superficial F∆

do fluido sobre um elemento de superfície S∆ é proporcional à área desse elemento. É conveniente então de-

finir a pressão P como o número que mede a força por unidade de área. Na Figura 1.2 a seguir, n̂ representa um vetor unitário normal a S∆ , onde convencionamos que n̂ aponta sempre para fora de uma superfície fechada. Dessa forma, podemos escrever:

ˆF P Sn∆ = ∆

. (1.3)

onde F∆

e n̂ têm a mesma direção e sentido, portanto a pressão pode ser escrita como:

FPS

∆=∆

. (1.4)

Tomando o limite onde o elemento de área tende a zero, obtemos a seguinte equação diferencial para P:

0limS

F dFPS dS∆ →

∆= =

∆. (1.5)

S∆

S

F∆n̂

Figura 1.2 – Representação esquemática de um elemento de superfície ∆S (parte de uma superfície S), indicando o sentido da força sobre S, bem como

o vetor unitário n̂ normal à superfície em ∆S.

As forças superficiais ocorrem em uma dada

porção do meio limitada por uma superfície.

Por exemplo: a força que a água exerce na superfície

interna de um copo.

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Em geral, a pressão pode variar de um ponto a outro da superfície, o que vem do fato dela depender diretamente da força aplicada no ponto em questão. Sendo A a área de uma superfície e F a força resultante sobre ela, a pressão pode ser escrita como:

FPA

= . (1.6)

É importante notar que a pressão é uma grandeza escalar, ou seja, não depende de . O que determina a direção da força é a orientação da superfície, ou seja, .

A unidade de pressão no SI é o Pascal, abreviatura Pa, sendo que 21Pa 1N/m= . Há outras unidades bastante comuns como: atmosfera

( 51atm 1,013 10 Pa= × ) e mmHg (1atm 760mmHg= ).

Exemplo 1. Calcule a massa e o peso do ar no interior de uma sala contendo 2,0m de altura e um piso com área de 3,0m 4,0m× . Quais seriam a massa e o peso do mesmo volume de água? Encon-tre ainda a força total sobre o piso dessa sala exercida de cima para baixo pela pressão do ar.

Solução: Na tabela 1.1, encontramos os valores da densidade da água e do ar (vamos considerar a densidade do ar igual a 31,2Kg/m na temperatura ambiente).

O volume da sala é 3(2,0m)(3,0m)(4,0m) 24mV = = , portanto a massa do ar pode ser obtida pela equação abaixo, partindo da equa-ção 1.1:

3 3(1, 2Kg/m )(24m ) 28,8Kgar arm V= = = .

O peso do ar é dado em Newtons:

(28,8Kg)(9,8N/Kg) 282,2Nar arw m g= = = .

A princípio é surpreendente que o peso de um volume tão gran-de de ar seja igual ao de uma criança de aproximadamente 30Kg , mas agora faça as mesmas contas considerando a água no lugar do ar e você vai encontrar que a massa do mesmo volume de água é

324 10 Kgáguam = × e consequentemente seu peso é 423,5 10 Náguaw = × .

Em homenagem ao cientista e filósofo francês Blaise Pascal (1623-1662).

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A pressão de 1atm (quando próximo ao nível do mar) sobre o piso de área 2(3,0m)(4,0m) 12mA = = produz uma força total de cima para baixo que é dada pela equação abaixo, a partir da equação 1.6:

5 2 2 5(1,013 10 N/m )(12m ) 12 10 NF PA= = × ≈ × .

Essa força é equivalente ao peso de aproximadamente 120 tonela-das de água. Assim, como o piso suporta um peso tão grande? A resposta é que existe uma força de mesma magnitude apontando de baixo pra cima sobre o piso, da mesma maneira como um livro fica parado sobre uma mesa: seu peso está atuando para baixo, mas existe uma força que atua de baixo para cima. E no caso de ser o piso de um apartamento no segundo andar? Aí precisamos lembrar que o apartamento de baixo também está preenchido de ar, e que esse ar produz uma força igual de baixo para cima no piso.

1.3 Variação de pressão em um fluido em repouso

Vamos considerar um pequeno elemento de um fluido, situado no interior deste e, além disso, supor que esse elemento tem forma de disco com pequena espessura e está situado a uma distância de re-ferência z, como mostra a Figura 1.3.

A

P’

z

z = 0

dzA

P

Figura 1.3

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A espessura do disco é dz e cada face tem uma área A . Partindo da equação 1.1, podemos escrever a massa desse elemento como:

dm dV Adz = = . (1.7)

As forças superficiais atuando no elemento de volume provêm do fluido que a este rodeia e são perpendiculares a sua superfície em todos os pontos. A resultante das forças nos eixos horizontais é nula, pois o elemento não tem aceleração ao longo desses eixos. As forças horizontais são devidas apenas às pressões do fluido e, por simetria, a pressão deve ser a mesma em todos os pontos do plano horizontal com altura z.

O elemento de fluido também não tem aceleração na direção ver-tical, logo a resultante das forças que agem nessa direção também é nula; entretanto as forças verticais não provêm unicamente das pressões nas faces do disco, mas existe também uma contribuição do seu peso. Sendo P a pressão na face inferior e P P dP′ = + a pres-são na face superior, a condição de equilíbrio é obtida observando que a força sobre a face superior mais o peso do elemento de fluido é igual à força sobre a face inferior do elemento, que é escrita a partir da equação 1.6:

( )PA P dP A dw= + + . (1.8)

onde dw Agdz= é o peso do elemento de volume, e aponta para baixo.

Desenvolvendo a equação 1.8, temos:

( )PA P dP A Agdz= + + ,

AdP A gdz= − ,

logo,

dP gdz

= − . (1.9)

A equação 1.9 mostra que a pressão no fluido varia com a altura em relação a um certo referencial. Essa variação de pressão equivale ao peso por unidade de volume do elemento de fluido compreendido

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entre os pontos onde ocorre a variação de pressão (lado direito da equação anterior).

Se 1P é a pressão na altura 1z e 2P é a pressão na altura 2z , acima de um nível de referência, a integração da equação 1.9 fornece:

2 2

1 1

P z

P z

dP gdz= −∫ ∫ou

. (1.10)

A equação 1.10 foi obtida considerando e g constantes de 1z a z2. Para líquidos, a densidade varia muito pouco, portanto, com boa aproximação, podemos tratar um líquido como incompressível na estática dos fluidos, ou seja, = constante. Em geral, as diferenças de nível não são muito grandes para que seja necessário considerar as variações de g, por isso a aproximação “g = constante” também é consistente.

A superfície livre de um líquido em contato com a atmosfera é uma superfície onde a pressão é constante, pois todos os seus pontos estão submetidos à pressão atmosférica 0P . Esse valor é o mesmo para todas as superfícies livres em líquidos na vizinhança numa mesma altitude. Assim, é conveniente definir essa superfície livre como sendo o nível natural de referência, e então podemos escrever

2 0P cte P= = . Consideremos 1z um nível arbitrário e que a pressão nessa altura é dada por P . Logo:

0 2 1( )P P g z z− = − − ,

mas 2 1z z− representa uma profundidade h abaixo da superfície li-vre, onde a pressão é P (veja a Figura 1.4), então temos que:

0P P gh= + . (1.11)

A equação 1.11 é conhecida como Lei de Stevin e diz que a pressão no interior de um fluido aumenta linearmente com a profundidade. Além disso, ela mostra claramente que a pressão é a mesma em to-dos os pontos de mesma profundidade. Uma consequência impor-

A densidade da água, por exemplo, aumenta

aproximadamente 0,5% quando a pressão varia de 1atm a 100atm em

temperatura ambiente.

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tante é que a pressão não depende do volume do fluido; a pressão da água a 1m abaixo da superfície de uma piscina é igual à pressão da água a 1m abaixo da superfície da Lagoa dos Patos (RS), conside-rando que ambas estão na mesma altitude e estão preenchidas com o mesmo líquido.

1P P=2z

1z

2 1z z h− =

Figura 1.4 – Líquido confinado num recipiente, onde a superfície superior está aberta para a atmosfera.

Um exemplo da aplicação da equação 1.11 ocorre na construção de represas ou barragens: a base é projetada mais larga que a parte su-perior e isso se deve ao fato que a pressão da água no fundo é maior que na superfície.

Para os gases, é bem menor que para os líquidos (ver tabela 1.1), por isso a diferença de pressão entre dois pontos nas proximidades da superfície da Terra é desprezível. No entanto, se o resultado de

2 1z z h− = for muito grande, poderá haver uma diferença de pressão entre as duas extremidades do objeto (o que não ocorrerá quando o h for muito pequeno): sabemos que a pressão do ar varia bastante quando subimos a grandes altitudes na atmosfera terrestre. Nesses casos, onde a densidade varia com a altitude, precisamos conhecer a função que relaciona com z , ( )z , antes de fazermos a integral que resultou na equação 1.10.

Exemplo 2. Achar a pressão a 10m de profundidade, abaixo da su-perfície de um lago, quando a pressão na superfície for de 1atm .

A pressão atmosférica está relacionada com o peso da coluna de ar acima da superfície da Terra. O peso de uma coluna de ar com área de 21cm é aproximadamente 10 N, resultando numa pressão de

51,013 10 Pa× .

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Solução: Para resolver esse problema, vamos utilizar a equação 1.11,

0p p gh= + .

Sendo: 5 20 1atm 1,013 10 N/mp = = × , 31000Kg/m= e

9,8 N/Kgg = , temos:

5 2 31,013 10 N/m (1000Kg/m )(9,8 N/Kg)(10m)p = × +

3 2199,3 10 N/m 1,97atmp = × = .

Ou seja, a 10m de profundidade, a pressão é quase o dobro da pres-são na superfície do lago, por isso é dito que cada 10m de diferença de profundidade na água corresponde a 1atm de pressão.

Exemplo 3. Uma represa retangular, de 50 m de largura, suporta uma massa de água com 20 m de profundidade (veja o esquema na Figura 1.5 abaixo). Calcule a força horizontal total que age sobre a represa.

H = 20 m

L = 50 m

dA = Ldh

Figura 1.5 – Represa retangular indicada no exemplo 3.

Solução: Pelo fato da pressão variar com a profundidade, não po-demos simplesmente multiplicar a pressão pela área da represa para encontrar a força exercida pela água. Para resolver o problema, é necessário integrar os elementos de força sobre os elementos de su-perfície em diferentes alturas dh , da base até o nível superior da água, ou seja, de 0h = até 20mh H= = . A pressão da água numa determinada profundidade h é dada pela equação 1.11, mas, nesse caso, não precisamos considerar a pressão atmosférica 0p , pois ela age nos dois lados da parede da represa. O elemento de força é então escrito como:

onde dA Ldh= , sendo que L é a largura da represa. A força é obtida através da integral:

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24

22

0 0 0

12 2

Hh H H

h

hF dF gLhdh gL gLH =

=

= = = =∫ ∫ .

Substituindo os valores, obtemos:

3 2 71 (1000Kg/m )(9,8 N/Kg)(50m)(20m) 9,8 10 N2

F = = × .

1.4 AplicaçõesA seguir serão estudadas as aplicações dos fundamentos apresenta-dos anteriormente.

1.4.1 Princípio de PascalPela Lei de Stevin (equação 1.11), a diferença de pressão entre dois pontos de um fluido em equilíbrio é constante, dependendo apenas do desnível entre estes pontos. Assim, se produzirmos uma diferen-ça de pressão num ponto de um fluido em equilíbrio, essa variação se transmitirá a todos os pontos. O resultado prático disso é que todos os pontos do fluido sofrem a mesma variação de pressão. Esse princípio foi enunciado por Pascal em seu “Tratado sobre o equilí-brio dos líquidos” e é conhecido como Princípio de Pascal.

Uma aplicação prática disso é o macaco hidráulico utilizado nas oficinas mecâ-nicas para levantar carros (ver esque-ma da Figura 1.6). A ideia básica é que, quando o pistão da esquerda é baixado pela aplicação de uma força f , o au-mento da pressão é transmitido para todos os pontos do fluido (em geral óleo), inclusive na outra extremidade onde existe um pistão com área A bem maior que a área a do primeiro. Como a pressão nos dois pistões é a mesma, pois estão no mesmo nível, a força para cima no pistão da direita F será maior que a força f .

d

a

AF D

f

Figura 1.6 – Esquema de um macaco hidráulico. Uma pequena força aplicada num pistão pequeno produz uma grande força

para movimentar um pistão grande.

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Para obtermos a relação entre as forças f e F , consideramos a igualdade da pressão no pistão da esquerda ( eP ) com a pressão no pistão da direita ( dP ), e dP P= , logo:

f Fa A=

então:AF fa

= . (1.12)

Ou seja, a força f é aumentada pela razão entre as áreas. Sendo d e D as distâncias de deslocamento dos pistões da esquerda e direita, respectivamente, e considerando o fluido incompressível, o volume deslocado pelo pistão da esquerda ( )eV ad= deve ser igual ao vo-lume deslocado pelo pistão da direita ( )dV AD= , então obtemos a seguinte relação entre as distâncias: ad AD= . Utilizando a equação 1.12, encontramos uma relação entre as forças e as distâncias nos dois pistões:

.fd FD= (1.13)

A equação 1.13 parece indicar que o trabalho realizado pela força externa no pistão da esquerda é igual ao trabalho realizado pelo fluido no pistão da direita. No entanto é importante lembrar que a equação 1.13 é obtida considerando a igualdade entre as pressões na equação 1.12, ou seja, isso é válido apenas quando ambos os pistões estão na mesma altura. Dessa forma, a equação 1.13 passa a ser uma boa aproximação para deslocamentos infinitesimais dos pistões.

Para deslocamentos maiores, que produzem uma diferença de altura entre o pistão da esquerda e o da direita, estando este último mais elevado, é necessário considerar também a pressão devido ao peso da coluna do fluido no pistão da di-reita, ou seja: . O resultado prático disso é que a força no pistão da esquerda tem que ser um pouco maior que a dada pela equação 1.12, pois precisa empurrar a colu-na do fluido, além disso essa força precisa ser maior com o aumento da altura . Nesse caso, vemos que a equação 1.13 não é satisfeita, ou seja, o trabalho devido ao deslocamento

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dos dois pistões não é o mesmo. Esse fato merece uma aten-ção especial, pois alguns livros de física básica não tratam desse problema.

Exemplo 4. O pistão grande de um macaco hidráulico tem 40 cm de diâmetro. Que força deve ser aplicada ao pistão pequeno, de 8 cm de diâmetro, para elevar uma massa (m = 1.800 Kg), que inclui a massa do carro mais a plataforma que o sustenta, a uma altura de 1,5 m?

Solução: Para visualizar a situação, observe a Figura 1.6. A fim de resolver o problema, vamos inicialmente utilizar a equação 1.12, que relaciona as forças nos dois pistões e as áreas destes. O objetivo é determinar a força f a ser exercida no pistão pequeno para elevar o carro no pistão grande, cuja força F mg= . Inicialmente, precisamos determinar as áreas dos pistões:

2(4cm)a = e 2(20cm)A =

Então:2

2

(4cm) (1.800Kg)(9,8 N/Kg) 705,6 N.(20cm)

af mgA

= = =

Uma força de 705,6 N equivale ao peso de uma pessoa de 72Kg .

Esse resultado é obtido considerando a igualdade das pressões entre os dois pistões durante todo o processo, o que na prática não ocorre porque o pistão da direita precisa subir para elevar o carro. Conside-rando que o pistão da esquerda permaneça no nível do solo e o da direita se eleve a uma altura 1,5mh = , sabemos que será necessária uma força f f′ > devido ao peso da coluna de fluido a ser eleva-da no pistão da direita. O valor de f ′ aumenta com o aumento da altura, sendo máximo na altura máxima 1,5mh = . Nessa situação, vamos calcular então o valor máximo dessa força, considerando que os pistões estão preenchidos com óleo cuja densidade volumétrica é aproximadamente 3820Kg/m . Nesse caso, a equação 1.12 se torna:

f F gha A

′= +

ou seja,

.af mg a ghA

′ = +

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Assim:

2 3705,6 N (0,04m) (820Kg/m )(9,8 N/Kg)(1,5m)705,6 N 60,6 N 766,2 N.

ff′ = +′ = + =

Nessa situação, a força máxima (a ser aplicada no pistão da esquer-da), para elevar o carro a uma altura de 1,5m do solo, precisa ser incrementada de 60,6 N , que equivale a um aumento de 8,6% em relação à situação de equilíbrio das pressões.

1.4.2 Vasos comunicantesA equação 1.11 dá a relação entre as pressões em dois pontos quais-quer de um fluido, independentemente da forma do recipiente que o contém. Portanto, se um recipiente é formado por diversos ramos que comunicam entre si e possuem as superfícies livres (ver exemplo (a) na Figura 1.7 a seguir), o líquido sobe à mesma altura h em todos os ramos. Note que, nesse caso, o fluido também tem a mesma pressão em quaisquer pontos dos diferentes ramos que estejam à mesma al-tura z. Esse é conhecido como o Princípio dos Vasos Comunicantes.

B

p0

h2 h1ρ1ρ2

p0

A

C C’hzA A

p0 p0 p0

Superfície deseparação

z

A B

Figura 1.7 – (a) Vasos comunicantes e (b) dois líquidos imiscíveis com densidades diferentes em um vaso com forma de U.

Agora, se compararmos os dois vasos externos no exemplo (a) da Fi-gura 1.7, à primeira vista, seríamos induzidos a pensar que a pressão do líquido é maior na base do vaso da esquerda que na base do vaso da direita (apesar de ambos possuírem a mesma área A). Essa intui-ção deve ao fato que, se os dois vasos fossem independentes e pesa-dos em separado, o vaso da esquerda acusaria um peso maior, pois existe um volume de água maior nesse vaso. Se isso fosse verdade, a

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altura da coluna de água deveria ser maior no vaso da direita, o que não é observado experimentalmente. Esse é conhecido como o pa-radoxo hidrostático. A explicação para essa situação resulta do fato que no vaso da esquerda a resultante das forças provenientes das pressões que atuam sobre as superfícies laterais têm uma compo-nente para baixo, a qual gera uma reação das paredes do vaso com uma componente para cima que tende a contrabalançar parte do peso do líquido. No caso do vaso da direita, as forças de reação pro-venientes das pressões das paredes verticais são horizontais, logo elas não têm componente vertical (observe as setas indicativas no exemplo (a) da Figura 1.7). O mesmo raciocínio é válido para o tubo do meio, com forma curvada, se a área da base for a mesma que a dos tubos laterais.

Consideremos agora um tubo em forma de U que contém dois líqui-dos imiscíveis com densidades diferentes; por exemplo, um líquido mais denso no ramo da direita ( 1 ) e um menos denso no ramo da esquerda ( 2 ). A pressão pode ser diferente num mesmo nível dos dois ramos do tubo. Essa situação está ilustrada pelo exemplo (b) da Figura 1.7, onde se pode ver que a superfície do líquido é mais alta no ramo da esquerda que no da direita. A pressão em C e C′ é a mesma em ambos os lados, os quais estão à mesma altura z . No entanto, a pressão diminui menos de C para A que de C′ para B , porque a coluna do líquido do lado esquerdo pesa menos que a coluna do líquido do lado direito. Assim, a pressão no ponto A deve ser maior que no ponto B. Se P é a pressão em C e C′ , da equação 1.11 temos:

0 1 1 0 2 2P P gh P gh = + = + ,

de modo que:

1 2

2 1

hh

= . (1.14)

Através da expressão 1.14 acima, podemos determinar a relação entre as densidades de dois líquidos imiscíveis a partir da medida das altu-ras das colunas de cada líquido em relação à superfície de separação entre eles.

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1.4.3 Medidas de pressãoPodemos usar o fato de a diferença de pressão ser proporcional à profundidade de um líquido para medir pressões desconhecidas. Na Figura 1.8 a seguir, apresentamos um modelo simples de medidor de pressão, chamado de manômetro de tubo aberto. Nesse disposi-tivo, um lado fica aberto à pressão atmosférica 0P , enquanto a outra extremidade fica em contato com a pressão P a qual deseja medir (essa extremidade pode estar conectada a qualquer sistema, como exemplo estufas e cilindros de gás). A diferença 0P P− é chamada de pressão manométrica e, de acordo com a equação 1.11, é igual a gh , onde é a densidade do líquido no tubo. Dessa forma, conhecendo a pressão atmosférica e a densidade do líquido, podemos determi-nar a pressão absoluta P .

P

ρ

h1

h2

P0

h

Figura 1.8 – Manômetro de tubo aberto para a medição de uma pressão desconhecida.

Outro tipo comum de manômetro é o barômetro de mercúrio, uti-lizado pela primeira vez em meados do século XVII para medir a pressão atmosférica. Ele consiste de um longo tubo de vidro (apro-ximadamente 1m ), fechado em uma extremidade, previamente pre-enchido com mercúrio e posteriormente invertido em um recipiente contendo a mesma substância (ver Figura 1.9 ao lado). O líquido que está no tubo tende a descer, mas é impedido pela pressão atmosféri-ca atuando na superfície do líquido que está no recipiente, mantendo assim uma coluna de mercúrio dentro do tubo. O espaço que se for-ma acima da coluna contém apenas vapor de mercúrio, e sua pressão é muito pequena, podendo ser desprezada, de modo que a pressão nesse volume é considerada nula. Assim, o barômetro de mercúrio

Figura 1.9 – Barômetro de mercúrio, utilizado para medir a

pressão atmosférica P0.

P0 P0

h

P ≈ 0

A pressão manométrica é justamente aquela

pressão medida para o pneu de seu automóvel

no posto de gasolina.

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mede a pressão atmosférica diretamente a partir da altura da coluna de mercúrio. Ao nível do mar, a altura da coluna é de aproximada-mente 76 cm, sendo essa uma outra unidade de medida de pressão: 76 cmHg = 1 atm; no alto de uma montanha, essa altura pode dimi-nuir em até 8cm , indicando a diminuição da pressão externa.

1.4.4 Empuxo: Princípio de ArquimedesUma percepção familiar a todos nós é que um corpo imerso na água parece apresentar um peso menor que quando está no ar. Além dis-so, sabemos que um corpo flutua quando sua densidade é menor que a do líquido. Aparentemente, parece existir uma força que ajuda a sustentar os corpos dentro de um líquido; essa força realmente existe e é denominada de força de empuxo.

Vamos imaginar um corpo sólido cilíndrico, de área A na base e de altura h , totalmente imerso e em equilíbrio dentro de um recipiente contendo um fluido com densidade . A condição de equilíbrio re-quer que a somatória de todas as forças sobre esse corpo seja nula. Como ilustrado na Figura 1.10 a seguir, vemos por simetria que as forças sobre a superfície lateral do cilindro se cancelam, pois num mesmo eixo horizontal têm a mesma magnitude (que é o caso das pressões ,P P e ,P P′ ′ na figura), entretanto a pressão 2P exercida pelo fluido sobre a base inferior é maior que a pressão 1P sobre a base superior. Pela equação 1.11, temos:

2 1P P gh− = . (1.15)

Logo, a resultante das forças superficiais exercidas pelo fluido sobre o cilindro será a força de empuxo ˆ.E E z=

, que é dirigida para cima, onde:

2 1E P A P A ghA= − = . (1.16)

Como a altura multiplicada pela área dá o volume (hA V= ) e a den-sidade multiplicada pelo volume dá a massa ( V m = ), temos que o empuxo é dado por:

ˆ fluidoE mgz w= = −

. (1.17)

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Ou seja, o empuxo é igual ao peso da porção de fluido deslocada ( fluidow ), com o sinal invertido.

h

A

P′

1P

P′

P P

2P

Figura 1.10 – Pressões do líquido atuando sobre um cilindro sólido imerso num fluido.

Diante disso, como então o cilindro fica em equilíbrio no fluido se existe uma resultante sobre ele de baixo para cima? Precisamos lem-brar que, além do empuxo, atua sobre o sólido uma outra força vo-lumétrica que é a força peso ( w ), aplicada no centro de gravidade; é essa força que contrabalança o empuxo. No entanto, o equilíbrio só acontece se as densidades do sólido e do líquido forem as mesmas. Quando a densidade média do sólido for menor que a do fluido, ele não pode ficar totalmente submerso, pois E w>

. O sólido ficará então flutuando, com o empuxo, devido à porção submersa equili-brando o seu peso. Como exemplo podemos citar os “icebergs” que flutuam com apenas 11% do seu volume fora da água; isso ocorre porque a densidade do gelo é aproximadamente 90% da densida-de da água (ver Exemplo 6 no final desta Seção). Por outro lado, se E w<

, o sólido afunda.

Essa observação representa o Princípio de Arquimedes, que pode ser enunciado da seguinte forma: Um corpo total ou parcialmente imer-so em um fluido recebe do fluido uma força (o empuxo), que é igual e contrá-ria ao peso da porção de fluido deslocado e aplicado no centro de gravidade do mesmo.

É importante enfatizar que, nesse enunciado, o resultado não depen-de da forma do corpo imerso, o qual, para simplificar, inicialmente, consideramos como sendo um cilindro. O fato é que o empuxo atua

Esse princípio foi enunciado por Aquimedes no século

III a.C., quando, segundo a lenda, ele teria comprovado

a falsificação da coroa de ouro do rei Herão de

Siracusa, comparando o volume de água

transbordado pela coroa (quando imersa em um

recipiente cheio de água) e um pedaço de ouro de igual massa. Se a coroa

fosse mesmo de ouro, esse volume deveria ser o

mesmo do volume de água transbordado, pois, como

vimos, o volume deslocado depende da densidade do

material. Para o azar do rei, a coroa era falsa. Para mais detalhes, visite o endereço:

<http://nautilus.fis.uc.pt/softc/Read_c/gradiva1/

eureka.htm>.

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32

no centro de gravidade da porção de fluido deslocada pelo corpo, que é chamada de centro de empuxo. Nesse sentido, a geometria do casco de embarcações flutuantes torna importante para garantir a estabilidade de navegação, ou seja, é importante saber os pontos de apliacação dessas forças (peso e empuxo). O peso atua sempre no Centro de Gravidade (CG), que é fixo, enquanto o empuxo é aplicado no Centro de Empuxo (CE), que é variável e muda de acordo com a forma do volume do líquido deslocado, conforme a figura:

E��

G

CP��

E��

G

C

P��

A B

Figura 1.11 – O Peso sempre atua no Centro de Gravidade da embarcação, que não varia com a inclinação, porém isso altera o Centro de Empuxo, pois a forma da água deslocada varia.

A lei do empuxo também explica o funcionamento de um sub-marino. Ele possui vários compartimentos que são preenchidos com ar para flutuar na superfície da água, portanto E w>

; para afundar, bombeia água para o interior dos compartimentos até que E w<

; se a intenção é retornar à superfície, basta bombear a água para fora novamente. Note que, através desse processo, o coman-dante pode controlar perfeitamente a profundidade de navegação do submarino. Da mesma forma, você pode entender porque um balão com ar quente ou hidrogênio sobe.

Existem outros fenômenos que muitas vezes são confundidos com o empuxo: um clipe de alumínio (daqueles de prender papel) pode flutuar sobre a superfície da água, embora sua densidade seja quase 3 vezes maior que a da água; alguns insetos e até mesmo certos rép-teis conseguem caminhar sobre a superfície da água sem afundar.

Essas situações não são explicadas pelo empuxo, mas pelo fenôme-no da tensão superficial, no qual a superfície do líquido se comporta como uma membrana submetida a uma tensão. As moléculas de

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33

um líquido exercem forças de atração entre si, de modo que, se uma molécula for deslocada de sua posição, aparecerá uma força restau-radora que tende a recolocá-la na sua posição de origem. No caso do clipe, quando este é colocado sobre a superfície, as moléculas super-ficiais são ligeiramente deslocadas para baixo, e as moléculas adja-centes exercem uma força restauradora para cima, o que o sustenta.

Exemplo 5: Uma estatueta de ouro de 15,0Kg está sendo elevada de um navio submerso. Qual é a tensão no cabo de sustentação quando a estatueta está em repouso: a) completamente submersa e b) fora da água?

Solução:

Quando a estátua está submersa, ela sofre a ação de uma força a) de empuxo com módulo igual ao peso da água deslocada. Para encontrar essa força, inicialmente, precisamos calcular o volume da estatueta utilizando a densidade do ouro da tabela 1.1.

4 33 3

15,0Kg 7,8 10 m19,3 10 Kg/mouro

mV −= = = ××

.

Com esse valor, encontramos o peso da água do mar referente a esse volume deslocado (considere 3 31,03 10 Kg/mágua = × ):

água água águaw m g Vg= =

3 3 4 3(1,03 10 Kg/m )(7,8 10 m )(9,8 N/Kg) 7,8 N−= × × = .

Esse valor é igual ao módulo da força de empuxo E. Logo, para achar a tensão no cabo T quando a estátua está em repouso, uti-lizamos o princípio de que nessa condição a somatória de todas as forças que agem sobre ela é igual a zero, ou seja:

( ) 0F E T mg= + + − =∑ , logo:

(15,0Kg)(9,8 N/Kg) 7,8 NT mg E= − = −

147 N 7,8 N 139,2 NT = − = .

A estatueta submersa parece ter uma massa de 14,2Kg , cerca de 5% a menos que sua massa real.

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Refazendo as mesmas contas e utilizando a densidade do ar na b) temperatura ambiente como 31, 2Kg/mar = para determinar o empuxo do ar sobre a estatueta quando ela está fora da água, obtemos que:

39,1 10 N.ar arE Vg −= = ×

Como esse valor é muito menor que o valor do peso real da estatueta ( 147 Nmg = ), podemos considerar que a tensão no cabo é igual ao seu peso real. Veja na Figura 1.12 a seguir um dia-grama de forças sobre a estátua, referente aos itens (a) e (b) do exemplo 5:

Submersa Fora da água

W���

W���

E���

T���

T���

A B

Figura 1.12 – Figura citada no Exemplo 5.

Exemplo 6. Qual é a fração do volume total de um “iceberg” que fica fora da água?

Solução. Da tabela 1.1 temos que a densidade do gelo é igual a 2 39, 2 10 Kg/m× , enquanto a da água do mar é aproximadamente 3 31,03 10 Kg/m× . O peso do “iceberg” é dado por:

ice gelo icew V g= ,

onde iceV é o volume do “iceberg”. O peso da água do mar deslocada, de volume águaV , é igual ao empuxo E :

água águaE V g= ,

mas observe que iceE w= , porque o “iceberg” está em equilíbrio com o meio, então:

gelo ice água águaV g V g =

e

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35

3 3

3 3

0,92 10 Kg/m 0,89 89%1,03 10 Kg/m

água gelo

ice água

VV

×= = = =

×

.

Ou seja, o volume de água deslocada equivale a 89% do volume do “iceberg”, que representa a parte submersa, portanto apenas 11% do “iceberg” fica do lado de fora da água. Veja a seguinte representação conforme a Figura 1.13:

W���E��

Figura 1.13 – Figura citada no Exemplo 6.

ResumoA densidade de uma substância é dada pela razão entre a sua massa e o seu volume. Quando a massa m está uniformemente distribuída em um volume V , a densidade é dada por:

mV

= .

A pressão P de um fluido é a razão entre a força F exercida pelo fluido e a área A sobre a qual essa força está aplicada, logo:

FPA

= .

Num líquido como a água, que pode ser tratado como incompressí-vel, a pressão cresce linearmente com a profundidade. Tomando a superfície da água como nível de referência e submetida à pressão atmosférica 0P , a pressão P num ponto a uma profundidade h é dada por:

0P P gh= + .

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Pelo princípio de Pascal, a pressão aplicada a um fluido num vaso fechado se transmite sem alteração a todos os pontos do fluido e às paredes do vaso. Essa propriedade foi utilizada na elaboração de macacos e prensas hidráulicas.

O princípio de Arquimedes afirma que um corpo total ou parcial-mente imerso num fluido sofre uma força, o empuxo, que é igual em módulo e sentido oposto ao peso do fluido deslocado.

ˆ .fluidoE mgz w= = −

ExercíciosVocê compra uma peça retangular de metal com massa de 1) 0,0158 Kg e com dimensões 5,0 × 15,0 × 30,0 mm. O vendedor diz que o metal é ouro. Para verificar se é verdade, você deve calcular a densidade média da peça. Qual o valor obtido? Você foi enganado?

Resposta: 3 37,02 10 Kg/m = × ; Sim, o metal não é ouro.

Um balão de vidro de 60 ml está cheio de mercúrio a 0°C. 2) Quando a temperatura sobe para 80°C, 1,47 g de mercúrio são derramados para fora do frasco. Admitindo que o volume do frasco é constante, calcule a densidade do mercúrio a 80°C, sendo a sua densidade igual a 13.645 Kg/m3 na temperatura de 0°C.

Resposta: 313.620 Kg/m = .

O líquido no manômetro de tubo aberto indicado na Figura 1.8 3) é mercúrio, com h1 = 3,0 cm e h2 = 7,0 cm. Sendo assim:

a) Qual é a pressão absoluta no fundo do tubo em forma de U?

b) Qual é a pressão absoluta no tubo aberto a uma profundi-dade de 4,0 cm abaixo da superfície livre?

c) Qual é a pressão absoluta do gás no tanque da esquerda?

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Resposta:

a) 411,06 10 PaP = × ;

b) 410,66 10 PaP = × ;

c) 410,66 10 PaP = × .

Um tanque aberto cheio de água possui as seguintes dimen-4) sões: 2,0 × 1,0 × 0,5 m. Dessa forma:

a) Determine a pressão num ponto situado no fundo do tanque;

b) Calcule a força total exercida pela água sobre o fundo do tanque;

c) Calcule a pressão sobre as paredes laterais a uma profundi-dade h = 0,25 m;

d) Determine o módulo da força total resultante que atua so-bre a parede lateral do tanque, a qual possui largura de 1 m e profundidade de 0,5 m.

Resposta:

a) 410,62 10 PaP = × ;

b) 52,12 10 NF = × ;

c) 410,37 10 PaP = × ;

d) 1.225 NF = .

Muitas pessoas imaginam que, se fossem mergulhar com a 5) parte superior de um tubo snorkel flexível para fora da água, elas seriam capazes de respirar através dele enquanto estives-sem caminhando debaixo d’água, porém elas geralmente não consideram a pressão da água que se opõe à expansão do tórax e dos pulmões. Suponha que você pode respirar deitado no chão com um peso de 400 N sobre seu tórax que equivale a uma massa de 41 Kg. A que profundidade abaixo da superfí-cie livre da água você conseguiria respirar, admitindo que seu tórax tem uma área frontal de 0,009 m2?

Resposta: 4,5mh = .

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Um pedaço grande de cortiça pesa 0,285 N no ar. Quando mer-6) gulhado em água e acoplado a um dinamômetro preso no fun-do do tanque, a tensão na corda que impede a cortiça de subir para a superfície da água é de 0,855 N. Calcule a densidade da cortiça.

Resposta: 3250Kg/m = .

Um bloco de gelo flutua sobre um lago de água doce. Qual 7) deve ser o volume mínimo do bloco para que uma mulher de 45 Kg possa ficar em pé sobre o bloco sem que ela molhe seus pés?

Resposta: 2 356,25 10 mV −= × .

Bibliografia básicaNUSSENZVEIG, H. M. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. 2 v.

RESNICK, R.; HALLIDAY, D.; KRANE, K. S. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. 2 v.

SEARS, Z. Física II: termodinâmica e ondas. 10. ed. São Paulo: Addison Wesley, 2003.

TIPLER, P. A.; MOSCA, G. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. 1 v.

Bibliografia complementar comentadaNUSSENZVEIG, H. M. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. 2 v.

Para saber mais sobre propriedades dos fluidos, sugerimos a leitura da seção 1.1 Propriedade dos Fluidos.

RESNICK, R.; HALLIDAY, D.; KRANE, K. S. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. 2 v.

Uma leitura mais aprofundada sobre pressão nos fluidos pode ser encontrada nas seções 17.2 Pressão e Massa Específica e 17.3 Variação de Pressão em um Fluido em Repouso.

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TIPLER, P. A.; MOSCA, G. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. 1 v.

Você encontrará mais detalhes sobre empuxo na seção 13.3 Empuxo e Princípio de Arquimedes.

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Capítulo 2Dinâmica dos Fluidos

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Capítulo 2Dinâmica dos Fluidos

No final deste Capítulo, você deve ser capaz de tratar si-tuações simples de escoamento de fluidos sem turbulên-cia e sem viscosidade. Os conceitos físicos por trás dessas situações idealizadas já são conhecidos do leitor: leis de Newton, conservação de massa e conservação de ener-gia. Ao final do Capítulo, trataremos de escoamentos com viscosidade e, de forma qualitativa, de turbulência.

2.1 IntroduçãoNeste Capítulo iremos estudar a física de fluidos em movimento. Essa é uma das áreas mais interessantes da Física. Ela está por trás de vários fenômenos em nosso dia-a-dia, como ondas no mar, mo-vimentos na atmosfera (comportamento climático), escoamento da água tratada que recebemos em casa e até mesmo na dinâmica do tráfego de veículos em cidades.

Mas essa área pode ser de difícil tratamento matemático, devido às equações que descrevem os fenômenos nela observados. Assim, ire-mos iniciar nosso estudo com sistemas simples e aos poucos vamos introduzir efeitos mais realísticos.

Apesar de usarmos conceitos já vistos por você nas disciplinas an-teriores (conservação de massa e da energia por exemplo), no trata-mento de escoamento de fluidos, temos um procedimento diverso do utilizado anteriormente. Não seguiremos mais cada partícula (ou grupo de partículas) do fluido. Iremos agora nos concentrar em pontos dele, especificando a densidade ( , , , )x y z tρ ρ= , a veloci-dade ( , , , )v v x y z t=

das partículas e a pressão ( , , , )P P x y z t= em diferentes pontos ( , , )x y z e em diferentes instantes de tempo t .

Podemos classificar o escoamento de fluidos de acordo com as se-guintes características:

Na verdade, quase todos os estudos em Física Teórica

seguem este padrão: modelos simplificados são

estudados, a princípio, de tal forma que os

ingredientes fundamentais das situações reais estejam presentes nesses modelos

e que seu tratamento matemático seja possível. Posteriormente, modelos

mais complexos, que estejam mais próximos

do sistema real, são pesquisados.

Lembre-se que para falar de densidade não podemos nos

concentrar em um ponto. Na verdade, o que chama-

mos de ponto é uma região do fluido grande o suficien-te para termos muitas par-tículas, e assim ser possível definir densidade, e peque-na o suficiente para que as

grandezas físicas relevantes (velocidade, pressão, altura etc.) não variem considera-velmente dentro da região.

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Estacionário ou não-estacionário: no escoamento estacionário, a) as grandezas físicas não dependem do tempo, apesar de po-derem ainda depender da posição. Essa condição é satisfeita, por exemplo, em escoamentos a baixas velocidades. O escoa-mento pode ser não-estacionário e, nesse caso, as grandezas relevantes dependem do tempo. Um exemplo drástico desse tipo de escoamento é o que acontece em cachoeiras ou próxi-mo aos raios de uma roda de bicicleta a grandes velocidades: o comportamento do fluido é aparentemente aleatório e temos o fenômeno da turbulência;

Compressível ou incompressível: no caso da densidade do flui-b) do variar, diz-se que o escoamento é compressível (nesse caso, ele pode depender só da posição ( , , )x y z , só do tempo t ou de ambos). Se for constante, então o escoamento é incompres-sível e, nesse caso, não depende nem da posição nem do tempo;

Viscoso ou não-viscoso: uma aproximação comum nas disci-c) plinas de Física Básica A e B é a de desprezar o atrito. O análo-go ao atrito no caso de fluidos chama-se viscosidade e ela tem características bem diferentes daquelas do atrito entre corpos sólidos. Em muitas situações, como para óleos lubrificantes, a viscosidade é uma propriedade fundamental;

Rotacional ou irrotacional (ou não-rotacional): essa característi-d) ca pode ser melhor definida de um ponto de vista matemático, mas não iremos explorar esse caminho aqui. Fisicamente, um escoamento irrotacional é tal que uma pequena roda com pás, quando colocada a escoar junto com um fluido, deslocaria-se junto com ele sem girar sobre um eixo que passa pelo seu centro de massa. Uma analogia possível é a do movimento da Terra em torno do Sol: ele seria considerado rotacional, caso a Terra fosse um elemento de fluido, porque ela gira em torno de um eixo interno. Caso a Terra apenas se transladasse em torno do Sol, diríamos que seu movimento seria irrotacional. Nem sempre a noção intuitiva de um escoamento não-rotacional é correta. Assim, por exemplo, quando a água escoa pelo ralo de uma pia, o fluido gira, mas a roda descrita acima não giraria em torno de seu eixo, caracterizando assim um escoamento não-rotacional.

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Como discutido anteriormente, começaremos nosso estudo pela si-tuação mais simples e aos poucos discutiremos como a introdução de efeitos mais reais modificaria os resultados obtidos.

2.2 Conservação da massa: equação de continuidade

Vamos supor um escoamento estacionário, isto é, a velocidade v não depende do tempo. Imagine então um ponto P no fluido (veja Figura 2.1 a seguir): qualquer partícula que passe por esse ponto terá sempre a mesma velocidade e, portanto, seguirá sempre a mes-ma trajetória. Podemos então definir as linhas de corrente como sendo coincidentes com as trajetórias das partículas nos fluidos e a velocidade delas é sempre tangente às linhas em cada ponto (mas lembre-se que o módulo da velocidade pode variar). É consequên-cia direta dessa maneira de definir as linhas que, num escoamento estacionário, duas linhas de corrente nunca se cruzam (ou seja, uma situação como a desenhada em (b) na Figura 2.1 não é permitida).

P

QvP

vQ

R

A B

Figura 2.1 – (a) Representação de uma única linha de corrente, construída de tal forma que as partículas têm a trajetória especificada pela linha e, portanto, a velocidade em um dado

ponto seja tangente à linha naquele ponto. (b) Note que a situação desta parte da figura não é permitida (veja também discussão na Figura 2.2 a seguir).

Podemos definir ainda o que se chama de tubo de corrente: esse tubo imaginário, formado por linhas de corrente, limita a porção de fluido em seu interior, de tal forma que o fluido nunca atravessa o tubo, já que duas linhas de corrente não se cruzam (veja a Figura 2.2 a seguir). É como se, em um escoamento estacionário, houvesse real-mente um “cano”, formado pelas linhas de corrente, que separasse o fluido em porções interior e exterior ao tubo de corrente.

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Uma maneira de representar o módulo da velocidade numa região do fluido é através da densidade de linhas de corrente nessa região: quanto mais densa, maior a velocidade.

Figura 2.2 – Representação de um tubo de corrente: o fluido no interior (ou no exterior) desse tubo nunca cruzará sua fronteira, em um escoamento estacionário.

Vamos considerar agora um desses tubos de corrente, de tal forma que o fluido atravesse um elemento de área (com área 1A ) no ponto

1p de sua extremidade esquerda. Nesse ponto, o fluido tem densi-dade 1 (note que permitimos que o escoamento seja compressível) e velocidade 1v (de módulo 1v e direção perpendicular àquela defi-nida pela área 1A ). Assim, durante um intervalo de tempo t∆ , uma massa 1m∆ de fluido, dada por:

1 1 1 1 ,m A v t∆ = ∆ (2.1)

atravessa a área 1A (veja a Figura 2.3 a seguir).

Essa expressão vem do fato da massa ser igual ao produto da densidade pelo volume; deduza-a a partir dessa informação (veja o Capítulo 1 do livro). A grandeza 1m t∆ ∆ é o fluxo de massa para fora do volume hachureado, através da área 1A .

Durante esse mesmo intervalo de tempo t∆ , uma porção do fluido atravessa a área 2A , no ponto 2p ; se a velocidade nesse ponto for 2v , de módulo 2v , e a densidade do fluido for 2 , a massa de fluido atravessando a área 2A é:

2 2 2 2 .m A v t∆ = ∆ (2.2)

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Supondo que não haja fonte ou sorvedouro de massa entre 1p e 2p , a quantidade de massa que passa pela área 1A é a mesma que passa pela área 2A . Assim, temos:

1 1 1 2 2 2 ,A v A v = (2.3)

ou, de forma mais geral:constante,Av = (2.4)

ao longo de um tubo de corrente.

A1

A2

z2z1

v1

v2 ∆ t

ρ2

ρ1

p1

p2

∆t

Figura 2.3 – Representação de um tubo de corrente: a mesma quantidade de fluido que entra nesse tubo pela extremidade esquerda, em um intervalo de tempo t∆ , sai do tubo

na extremidade direita, no mesmo intervalo de tempo.

Se o fluido for incompressível, também é constante e então a equa-ção 2.4 se reduz a:

Av = constante. (2.5)

O produto Av nesse caso mede o volume de fluido que atravessa a seção transversal do tubo por unidade de tempo e é a chamada vazão do tubo.

Note, na equação 2.5, que a velocidade em um tubo é maior em par-tes onde sua seção reta é menor. Esse fenômeno é representado na Figura 2.4: a densidade de linhas na região de seção reta menor é maior que na região com seção reta maior.

Figura 2.4 – Representação do escoamento em um cano com seção reta variável. Note que a densidade de linhas é maior na região de seção reta menor, representando uma velocidade maior nessa região.

Você já deve ter usado esta propriedade: para aumentar

a velocidade de saída da água em uma mangueira,

diminuímos a área de saída no bico dela.

SorvedouroLugar no mar ou rio, onde há redemoinho; o que leva para o fundo o que nele cai.

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Você pode fazer uma experiência em casa ou no trabalho: abra uma torneira comum, deixando sair um fluxo nem muito pequeno nem muito grande de água, ou seja, um flu-xo estacionário. O que você percebe em relação à área do filete de água à medida que ela diminui a altura? Explique com o que discutimos nesta seção.

Exemplo 1. Um rio de 21m de largura e 4,5m de profundidade recebe a água de uma região de 2 9 28.500km 8,500 10 m= × de área, onde a precipitação pluviométrica média é de 48cm/ano . Suponha que um quarto desse volume de água volte à atmosfera por evapo-ração. Qual a velocidade média da água nesse rio?

Solução: Usaremos as unidades do Sistema Internacional de unida-des. Vamos supor que três quartos (3/4) do volume de água de chuva que cai na região seja drenado para o rio e por ele seja escoado para fora dela. Esse volume de água é dado por:

9 2 9 30, 48(m/ano) 8,500 10 m 4,1 10 m /ano.× × = ×

Três quartos desse volume anual têm o seguinte valor:

9 3 9 3(3/4) 4,1 10 m /ano 3,1 10 m /ano.× × = ×

É esse o valor que escoa pelo rio em um ano, ou seja, supondo um ano de 365 dias, em 1s temos uma vazão de:

9 33

7

3,1 10 (m /ano) 97 (m /s)3,1536 10 (s/ano)

×=

×.

Essa vazão é igual ao produto da área da seção reta do rio pela velo-cidade média de escoamento da água:

397m /sA v× = ,

Com 2(21m) (4,5m) 94mA = × = , temos que:

3

2

97 (m /s) 1,0(m/s)94(m )

v = = .

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2.3 Conservação da energia: equação de Bernoulli

Iremos mais uma vez aplicar um conceito já visto nas disciplinas anteriores, o da conservação de energia, a um fluido perfeito incom-pressível, no regime de escoamento estacionário e sem viscosida-de. Suponha um tubo de corrente muito fino, de tal maneira que as grandezas físicas relevantes não variem dentro de uma mesma seção reta desse tubo, o qual chamaremos de filete de corrente (veja para referência a Figura 2.3, na qual supomos que as seções retas

1A e 2A sejam pequenas o suficiente para que pressão, densidade e altura sejam aproximadamente constantes dentro da respectiva se-ção). As alturas dessas seções, em relação a um plano horizontal de referência, são respectivamente 1z e 2z , e o fluido flui da esquerda para a direita.

Lembramos a você, leitor, sobre a equação de conservação de energia, a qual diz que a variação de energia cinética de uma massa m∆ , en-tre dois pontos quaisquer, é dada pelo trabalho feito pela resultante de todas as forças que atuam nessa massa, no caminho entre esses pontos. Como estamos supondo que não há viscosidade, essas for-ças são conservativas e, especificamente em nosso caso, têm duas origens: 1) forças derivadas da diferença de pressão entre os pontos

1p e 2p , e 2) força da gravidade. Como por suposição as forças são conservativas, o trabalho por elas realizado não depende do cami-nho percorrido pela massa m∆ (esta é uma boa hora para você vol-tar ao material de disciplinas anteriores e recordar o porquê desse resultado). Vamos juntar as informações: a diferença T∆ de energia cinética entre os pontos 1p e 2p da Figura 2.3 é dada por:

2 22 2 1 1

1 1 .2 2

T m v m v∆ = ∆ − ∆ (2.6)

Como supomos não haver fontes ou sorvedouros de fluido entre os pontos, 1 2m m m∆ = ∆ ≡ ∆ , e então:

2 22 1

1 ( ).2

T m v v∆ = ∆ − (2.7)

No ponto 1p , a pressão é feita pela porção de fluido à esquerda da área hachurada na Figura 2.3 e, portanto, a força derivada dessa

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pressão está no mesmo sentido do movimento, de modo que o tra-balho é positivo e igual a 1 1 1 1 1F x P A v t∆ = ∆ , onde 1 1P A é a força atuan-do no ponto 1p e 1v t∆ é o deslocamento próximo a esse ponto. No ponto 2p , a força de pressão é contrária ao movimento, e é devido à porção de fluido à direita da área hachurada, atuando contrária ao deslocamento. Portanto, o trabalho devido a ela é negativo e igual a

2 2 2 ,P A v t− ∆ onde 2 2P A é a força atuando no ponto 2p e 2v t∆ é o des-locamento nesse ponto. Assim, o trabalho realizado pelas forças de pressão é representado por:

1 1 1 2 2 2 1 1 1 2 2 2( ) .P A v t P A v t P A v P A v t∆ − ∆ = − ∆ (2.8)

Essa equação pode ser reescrita usando as equações 2.1 e 2.2 e lem-brando que 1 2m m m∆ = ∆ ≡ ∆ . O trabalho realizado pela força de pres-são ( )pW é então:

1 2( ) ,pmW P P ∆

= −

(2.9)

onde é a densidade do fluido (como este é suposto incompressí-vel, a densidade é a mesma em qualquer ponto).

O trabalho devido à força da gravidade ( gW ) depende apenas da diferença de altura entre os pontos 1p e 2p e é dado por:

2 1( ),gW mg z z= −∆ − (2.10)

onde g é a aceleração da gravidade e 2z e 1z as alturas dos pontos

1p e 2p , respectivamente. Se 2z for maior que 1z , o trabalho feito pela força peso é negativo, como esperado, pois o peso tem sentido contrário ao deslocamento vertical de m∆ .

Como o trabalho total é a variação T∆ da energia cinética, ou seja,

p gT W W∆ = + , obtemos que:

2 22 1 1 2 2 1

1 ( ) ( ) ( ).2

mm v v P P mg z z∆∆ − = − −∆ −

Cancelando m∆ e multiplicando todos os termos pela densidade ,

2 22 1 1 2 2 1

1 ( ) ( ) ( ).2

v v P P g z z− = − − −

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Finalmente, escrevendo todas as grandezas relativas ao ponto 1p em um lado da equação e, do outro, as relativas ao ponto 2p , obtemos:

2 22 2 2 1 1 1

1 1 .2 2

v P gz v P gz+ + = + + (2.11)

Como os pontos 1p e 2p são quaisquer pontos de um filete, a igual-dade na equação 2.11 acima vale para qualquer ponto do filete e podemos então escrever:

21 ,2

v P gz C+ + = (2.12)

onde C é uma constante ao longo de todo o filete. Essa é a equa-ção de Bernoulli. A rigor, a constante C pode variar de filete a fi-lete, mas é comum encontrar aplicações nas quais C é o mesmo para todos os filetes. Se fazemos 0v = na equação 2.12 acima, re-obtemos o resultado conhecido da Hidrostática, onde P gz C+ = , estudado no Capítulo 1.

Note que a equação 2.12 pode ser interpretada como a soma de três termos associados a densidades de energia (energia por unidade de volume): o primeiro termo é a densidade de energia cinética, o terceiro termo a densidade de energia potencial e o segundo ter-mo uma densidade de energia associada à pressão. De fato, a força exercida pela pressão é o produto desta pela área, de modo que o trabalho feito por essa força (o qual é igual ao produto da força pelo deslocamento) é o produto da pressão pelo volume. Para encontrar a densidade de energia, dividimos a equação 2.2 pelo volume e en-contramos a própria pressão.

Vamos agora estudar algumas situações onde a equação de Ber-noulli é relevante.

Exemplo 2. Uma aplicação comum é a de um reservatório com uma grande superfície livre, na qual a pressão é a atmosférica (P0), con-forme esquematizado na Figura 2.5 a seguir. Suponha-se um es-coamento estacionário, com o fluido saindo por um orifício a uma determinada altura 1h , medida a partir da base do reservatório, de tal forma que o volume de líquido que sai pelo orifício é muito pe-

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queno, e a superfície livre do reservatório tem, para quaisquer fins práticos, altura constante (ou seja, a velocidade do fluido nessa su-perfície é zero). Podemos aplicar a equação de Bernoulli a um dos filetes representados na Figura 2.5 a seguir:

20 2 0 1

1 ,2

P gh P gh v+ = + +

O lado esquerdo se refere à superfície livre e o lado direito à parte externa B do furo. Assim:

2 12 ( ) 2 ,v g h h gh= − ≡ (2.13)

ou seja, o módulo da velocidade na saída do orifício é o mesmo que teria um corpo material que caísse de uma altura 2 1h h h≡ − sob ação exclusiva da força da gravidade.

BA

P0

P0

h2

h1

v0

h ≡ h2 −

h1

v

Figura 2.5 – Reservatório com superfície livre muito grande, de modo que o escoamento pelo orifício A não modifica consideravelmente a altura 2h dessa superfície.

Entre o ponto A e o ponto B , onde a pressão é a atmosférica ( 0P ), a seção reta do tubo de corrente sofre uma contração por um fator 0,6. Você pode justificar o porquê do fato da pressão em A ter de ser maior que 0p (use as equações de continuidade e de Bernoulli em seu argumento).

Exemplo 3. O medidor de Venturi é um dispositivo usado para medir a velocidade de escoamento de um fluido em uma tubula-ção. Considere a situação da Figura 2.6 a seguir, onde um fluido de densidade escoa por um tubo com seções retas de áreas A e a , de tal forma que A a> , e um tubo com um fluido de densidade em seu interior é acoplado ao encanamento.

Note que foi através desse procedimento que Torricelli, quando assistente de Galileu, enunciou a fórmula que leva seu nome.

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A ρ a

12

h

ρ

Figura 2.6 – Medidor de Venturi: equipamento usado para medir a velocidade de escoamento de um fluido em um encanamento. A densidade

do fluido no encanamento é e no tubo é .

Devido à equação de continuidade, temos que:

2 1,Av va

= (2.14)

onde 1v é a velocidade do fluido na parte da tubulação com seção reta A (ponto 1) e 2v é a velocidade na parte com seção reta a (pon-to 2 ). Desconsiderando a diferença de altura entre os pontos, pode-mos usar a equação de Bernoulli para escrever:

2 22 2 1 1

1 1 .2 2

P v P v+ = +

Aqui 2P é a pressão no ponto 2 e 1P a pressão no ponto 1. Usan-do a equação 2.14 e o fato da diferença de pressão ser dada por

1 2P P gh− = , onde h é a diferença entre as alturas do líquido de densidade nos dois lados do tubo, podemos mostrar (faça os cál-culos como exercício) que:

2 2

2( )

ghv aA a

=

−. (2.14.1)

Exemplo 4. Uma outra aplicação importante, usada na medição de velocidade de aviões (quando acoplada às extremidades das asas), é o chamado tubo de Pitot (este equipamento pode ter apresentado defeito no vôo da Air France que caiu, em 2009, quando ia do Rio de Janeiro para Paris). Nessa montagem (veja Figura 2.7 a seguir), uma abertura (ponto A) está em um ponto de acumulação, tal que a velo-cidade nesse ponto seja zero, ou seja, a pressão é a pressão estática,

A eP P= . Na outra abertura no tubo (ponto B), a pressão é a dinâmica

Usado para medir a velocidade de um fluido

em relação a um avião ou, de forma equivalente, a

velocidade de um avião se movendo em um fluido.

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e a velocidade do fluido é supostamente não perturbável pela pre-sença do aparato, o que é, formalmente, uma aproximação.

Tomando 0Av = e supondo como desprezível a diferença de altu-ra entre os pontos A e B , a equação de Bernoulli pode ser escrita como:

2 21 1 ,2 2e B e BP P v P P v= + ⇒ − =

onde é a densidade do fluido externo ao tubo.

B

hA

ρ0

ρ

B

Figura 2.7 – Esquema do tubo de Pitot, usado para medir a velocidade de um fluido em relação a um avião ou, de forma equivalente, a velocidade de um avião

em relação ao fluido. O ponto A é um ponto de acumulação, no qual o fluido encontra-se em repouso; no ponto B , por outro lado, supõe-se que

o fluido não tem sua velocidade modificada pelo aparato.

Podemos também relacionar a diferença entre as pressões eP e BP com a diferença de altura no tubo, 0 ,e BP P gh− = onde 0 é a den-sidade do fluido no interior do tubo. Assim:

2 00

1 2 .2

gh v v gh

= ⇒ =

Exemplo 5. Um procedimento feito com certa frequên-cia no passado, para remover combustível de um carro, está desenhado na Figura 2.8. O líquido do reservatório, de densidade , é aspirado através da mangueira ABC , para que saia pela abertura C .

Vamos calcular a velocidade de escoamento do fluido na abertura C da mangueira, em função das alturas 1h e 2h e da pressão 0P na superfície O do reservatório (se essa

h1

h2

A

ρ

O

C

B

Figura 2.8 – Um fluido de densidade é as-pirado por uma mangueira delgada e sai pela

sua abertura C . Esse esquema é utilizado (mas não é recomendado), por exemplo, para extrair combustível do tanque de um veículo.

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superfície estiver aberta, essa pressão é a atmosférica; vamos supor isso aqui). Suponha ainda que a superfície O tenha uma área muito maior que a da seção reta da mangueira, de modo que a velocidade com que a superfície O diminui sua altura, à medida que o fluido es-coa, seja desprezível. A pressão em C também é a atmosférica e pode-mos então aplicar a equação de Bernoulli ao longo de um filete (como indicado em cor azul escuro na Figura 2.8) para os pontos O e C :

20 2 0 2

1 2 ,2 c cp gh p v v gh + = + ⇒ = (2.15)

onde cv é a velocidade do fluido na abertura C e as alturas são sem-pre medidas em relação à abertura C .

Note que, se 2h tende a zero, a velocidade cv também vai a zero. Se o valor de 2h se torna negativo, ou seja, a superfície O fica abaixo da saída C , o fluido não escoa (pois o valor de 2

cv seria negativo).

Sabendo a velocidade em C , podemos usar a equação 2.15 de con-tinuidade (lembre-se que o fluido é suposto incompressível) para calcular as velocidades em A e em B . Como a área é a mesma ao longo de toda a mangueira:

22 .B A Cv v v gh= = =

Com a ajuda desse último resultado, podemos calcular a pressão PB no ponto B e a pressão PA no ponto A . Aplicando a equação de Bernoulli aos pontos A e C , obtemos:

2 22 0

1 1 ,2 2A A CP gh v P v+ + = +

onde supomos que a diferença de altura entre A e O seja desprezí-vel. Lembrando que as velocidades em A e em C são iguais, chega-mos ao seguinte resultado:

0 2.AP P gh= −

O mesmo procedimento pode ser aplicado aos pontos B e C :

2 21 2 0

1 1( ) .2 2B B CP g h h v P v+ + + = +

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Mais uma vez usando a igualdade entre as velocidades em B e em C , obtemos:

0 1 2( ).BP P g h h= − + (2.16)

Note que a pressão em B é menor que a pressão atmosférica. Se 1h for grande o suficiente, PB pode inclusive ir a zero. Dessa maneira, existe um valor máximo para 1h para que o fluido escoe pela man-gueira, dado pela condição de PB ser igual a zero:

01 2.ph h

h= −

2.4 ViscosidadeVamos discutir alguns aspectos simples de viscosidade. Essa é uma força de atrito entre camadas do fluido. Como toda força de atrito, ela é uma descrição fenomenológica dos efeitos de forças funda-mentais (como também o é na descrição do atrito entre superfícies sólidas, visto por você nas disciplinas anteriores).

Consideremos então uma porção de fluido entre duas placas planas paralelas, conforme mostrado na Figura 2.9 a seguir: é observado experimentalmente que, se a placa superior é puxada de modo a escorregar com velocidade constante v , lâminas inferiores do fluido são arrastadas, de tal forma que a lâmina imediatamente abaixo da placa tem a mesma velocidade desta e a lâmina em contato com a placa inferior está em repouso. Também é observado que a veloci-dade dessas placas diminui linearmente com a altura y e, eventu-almente, vai a zero em alguma altura (que definimos como 0y = ). Esse escoamento é chamado de laminar, pois o fluido se move em lâminas, as quais deslizam umas sobre as outras. A força por unida-de de área, chamada de tensão tangencial, necessária para arrastar a placa superior com velocidade constante é dada, em módulo, por:

(2.17)

onde A é a área da placa e o coeficiente de viscosidade, o qual é uma característica do fluido. Essa é a força que a lâmina de fluido imediatamente inferior à placa faz nesta e também a força que ela sofre da lâmina de fluido inferior. A unidade de no MKS é 2N.s / m .

Descrição fenomenológicaDescrição feita a partir de informações experimentais do sistema, buscando-se enunciar uma lei que des-creva aquele sistema em es-pecial e sistemas análogos a ele. Esse procedimento é al-ternativo ao usado em des-crições a partir de princípios fundamentais da Física.

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Uma unidade mais comum na prática é o centipoise (cp), dado por 1 cp 210−= poise = 3 210 N.s / m− .

dy

A

x

y

v

Figura 2.9 – Nesse processo, a placa superior é puxada com velocidade v e a placa inferior está em repouso. O fluido entre as placas é “arrastado” devido à viscosidade.

Quanto mais viscoso o líquido, maior será , e valores típicos des-se coeficiente para alguns fluidos são, em 2N.s / m : 0,11 = para o óleo lubrificante a 0 C° , 0,03h = para o óleo lubrificante a 20 C° ,

31 10 −= × para a água a 20 C° e 51,8 10 −= × para o ar a 20 C° .

Considere agora um escoamento viscoso ao longo de um cano ci-líndrico de raio a, de tal modo que a velocidade de escoamento não seja grande e este seja laminar. A porção do fluido em contato com o encanamento (r = a) está em repouso, e a velocidade aumenta no sen-tido do centro da tubulação. A força necessária para manter o esco-amento com velocidade constante vem de uma diferença de pressão entre as extremidades do encanamento (veja Figura 2.10 a seguir); para manter constante a velocidade de todas as lâminas, a força total sobre cada uma delas tem que ser nula. Sendo 1P e 2P as pressões nas extremidades esquerda e direita do tubo de comprimento l, res-pectivamente, a força por unidade de área na superfície externa de um tubo cilíndrico do raio r é dada por:

21 2 1 2( ) .

2 2P P r P PF r

A rl l− −

= =

(2.18)

a

P2

P1

Figura 2.10 – Escoamento viscoso em um cano de seção reta cilíndrica.

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Como essa é a força de viscosidade, a qual é dada pela equação 2.17, temos:

1 2 ,2

P PF dv rA dr l

−= − =

onde usamos a equação 2.18, e o sinal negativo vem do fato que a velocidade diminui à medida que r aumenta. Podemos isolar dv drna equação anterior, obtendo:

1 2( ) .2

P Pdv rdr l

−= −

Podemos resolver essa equação diferencial da seguinte forma: pas-sando a diferencial dr para o lado direito da equação e integrando ambos os lados, obtemos:

0' 1 2

( )

( ) ,2

a

v r r

P Pdv rdrl−

= −∫ ∫

onde usamos a condição de contorno da velocidade ser zero no con-tato com o cano, isto é, ( ) 0v a = . Obtemos então:

2 21 2( ) ( ).4

P Pv r a rl−

= −

Assim, o perfil de velocidades dentro da tubulação é parabólico, sen-do, como esperado, máximo para 0r = e mínimo, e igual a 0, para r a= .

A partir da equação anterior, podemos calcular a vazão total, isto é, o volume de fluido que escoa por unidade de tempo através da se-ção reta circular do cano. Como a velocidade varia com a distância ao eixo r do cano, devemos dividir o volume total do cilindro em pequenos volumes elementares, associados a uma porção compre-endida entre dois raios r e r dr+ (veja a Figura 2.11 a seguir), com dr pequeno o suficiente para que a velocidade seja aproximadamen-te constante entre r e r dr+ . A contribuição dessa porção para a vazão , ou seja, o volume escoado por unidade de tempo, é:

2 21 2( )( ) ( )2 ( ) .2

p pdVd v r dA v r rdr a r rdrdt l

= = = = −

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59

r

a

r + dr

Figura 2.11 – Divisão do cano representado na Figura 2.10 em pequenas porções cilíndricas, de raio r e espessura dr.

Essa, porém, é apenas a contribuição da porção cilíndrica entre os raios r e r dr+ ; para obtermos a vazão de todo o cano, temos que integrar desde 0r = até r a= :

2 21 2

0

( ) ( ) .2

ap pd a r rdrl

= = −∫ ∫

Essa integral pode ser resolvida da seguinte forma:

(a2 − r 2 )r dr

0

a

∫ =a2r 2

2−

r 4

4

0

a

=a4

2−

a4

4=

a4

4,

Assim o resultado final para a vazão é:

41 2( ) .

8a P P

l−

=

Essa é a lei de Hagen-Poiseuille, a qual diz que a vazão em um enca-namento é proporcional à queda de pressão por unidade de compri-mento e inversamente proporcional ao coeficiente de viscosidade. Ela diz também que a vazão é maior para tubos de raios maiores (manti-das constantes as outras características do escoamento e do fluido).

A definição de viscosidade, representada pela equação 2.17, é válida para fluidos chamados de newtonianos. Para estes, um gráfico entre a força por unidade de área ( F A ) e o gradiente da velocidade em uma direção perpendicular à área ( dv dy ) é uma reta que passa pela origem. Os fluidos que não seguem esse comportamento são chamados de fluidos não-newtonianos. Em alguns desses fluidos, a viscosidade depende do gradiente de velocidade, de modo que

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60

o fluido se comporta como um sólido se tentarmos, por exemplo, esticá-lo com movimentos bruscos, e se comporta como um líqui-do se o perturbarmos de forma mais suave. Em um fluido desse tipo, uma pessoa pode ser capaz de caminhar sobre ele, caso o faça com passos rápidos; por outro lado, se a pessoa parar em pé sobre o fluido, irá afundar, de forma parecida com o que aconteceria em um fluido newtoniano. Um fluido não-newtoniano pode ser feito em casa, adicionando-se maizena, aos poucos, a um copo de água e misturando. Se você tentar enfiar seu dedo rapidamente na mis-tura, sentirá uma forte reação contrária; o fluido se comporta como um sólido deformável. Por outro lado, se você lentamente tentar in-troduzir qualquer objeto no fluido, este se comportará como um líquido e a reação contrária será bem menor que no caso anterior.

ResumoFoi apresentado neste Capítulo um breve estudo dos fluidos em mo-vimento. Utilizando conceitos básicos como a conservação da massa e conservação de energia, foi deduzida a fórmula da continuidade para fluidos e a equação de Bernoulli. Essa última implica que, se um fluido estiver escoando em um estado de fluxo contínuo, então a pressão depende da velocidade do fluido. Quanto mais rápido o fluido estiver se movimentando, tanto menor será a pressão à mesma altura no fluido.

QuestõesPor que o jato de água em uma torneira, quando o escoamento 1) é estacionário, fica mais estreito à medida que a altura dimi-nui? Essa questão já foi levantada no texto anterior sobre visco-sidade. Talvez seja uma boa hora de voltar a pensar nela.

Um recipiente, com um fluido em seu interior, está em repouso 2) sobre uma mesa. Você caminha em relação à ela. Você usaria estática ou dinâmica dos fluidos para estudar o fluido no reci-piente? Por quê?

Esse interessante e divertido efeito pode ser visto no endereço <http://www.youtube.com> realizando-se uma busca com a expressão “non-newtonian fluid”.

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Em um escoamento estacionário, a velocidade em cada ponto do 3) fluido é constante. Como pode então a partícula ser acelerada?

Seria possível o grande Zico bater uma daquelas faltas de efei-4) to, que em geral terminavam com a bola dentro do gol do Flu-minense ou do Vasco, se o jogo se realizasse na Lua?

Explique qualitativamente como se dá o empuxo dinâmico 5) responsável pela sustentação de aviões.

Em 2002, durante uma ventania muito forte (semelhante aos 6) tornados, tão comuns em algumas regiões dos EUA), ocorrida no bairro Ribeirão da Ilha, em Florianópolis, o telhado de uma casa de alvenaria foi levantado e posteriormente caiu na rua, em frente à casa. Tente explicar como isso pôde acontecer, uti-lizando os conceitos estudados neste Capítulo.

Explique o funcionamento de um canudo para tomar líquidos.7)

ProblemasUma mangueira de jardim tem 1,9 cm de diâmetro interno e 1) está ligada a um irrigador que consiste de um recipiente ci-líndrico com 24 furos, cada um com 0,12 cm de diâmetro. Se a velocidade da água no interior da mangueira é de 1,05 m/s, com que velocidade ela sai dos orifícios do irrigador?

Um grande reservatório de paredes verticais e construído 2) sobre um terreno horizontal contém água até uma altura h . Suponha que um pequeno orifício seja feito em uma de suas paredes. A que distância máxima dessa parede o jato de água que sai do reservatório irá atingir o chão do terreno? Em que altura deve estar esse orifício, acima do terreno, para que essa distância seja atingida?

Explique qualitativamente por que, quando está ventando e 3) uma janela está aberta, as cortinas tendem a “sair” do aparta-mento, isto é, elas são puxadas para fora da janela. Suponha agora que a janela meça 4,26 m por 5,26 m, que o vento esteja soprando a 28,0 m/s fora do apartamento, em uma direção pa-ralela à janela, e que dentro do apartamento o ar esteja parado

Uma simulação interessante desse

fenômeno pode ser encontrada no endereço

<http://www.grc.nasa.gov/WWW/K-12/airplane/

foil2.html>

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62

(em média). Qual a força resultante sobre as cortinas citadas acima considerando que a densidade do ar = 1,3 Kg/m³?

Um avião tem uma massa total de 2000 Kg e a área total co-4) berta pelas duas asas é de 30 m2. A velocidade de escoamento acima das asas é 1,25 vezes maior que abaixo delas, quando o avião está decolando. A densidade da atmosfera é aproxima-damente 1,3 Kg/m³. Que velocidade mínima de escoamento acima das asas é necessária para que o avião decole? Proponha uma forma de o avião baixar de altura, no pouso, usando ape-nas a diferença de pressão nas asas.

Bibliografia básicaNUSSENZVEIG, H. M. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. 2 v.

SEARS, Z. Física II: termodinâmica e ondas. 10. ed. São Paulo: Addison Wesley, 2003.

RESNICK, R.; HALLIDAY, D. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. 2 v.

TIPLER, P. A.; MOSCA, G. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. 1 v.

Bibliografia complementar comentadaAGUIAR, C. E.; RUBINI, G. A aerodinâmica da bola de futebol. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 26, n. 4, p. 297-306, dez. 2004. Disponível em: <http://www.sbfisica.org.br/rbef/pdf/040701.pdf>. Acesso em: 18 jan. 2011.

Uma aplicação prática dos conceitos vistos neste Capítulo pode ser encontrada nesse artigo, o qual também pode ser localizado no endereço <http://www.fsc.ufsc.br/~canzian>, no link “Física do futebol”. Essa página foi construída pelo professor Nelson Canzian, do Departamento de Física da UFSC.

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Capítulo 3Temperatura e Calor

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Capítulo 3Temperatura e Calor

Ao final do Capítulo estaremos aptos a entender e dife-renciar os conceitos de temperatura e calor, bem como de-finir a Lei Zero da Termodinâmica; conhecer e relacionar matematicamente as escalas de temperatura e conceituar capacidade térmica e calor específico relacionando-os com processos de transferência de energia térmica.

3.1 IntroduçãoDaqui em diante (neste e nos próximos Capítulos) iremos estudar os fenômenos termodinâmicos, ou seja, os fenômenos relacionados com a temperatura, o calor e as trocas de calor. Entre outras coisas, será possível explicar processos cotidianos como a condução de calor em um ferro elétrico ou o fato dos cabos de madeira de uma panela evitarem que você queime a sua mão. Além disso, você entenderá o funcionamento de máquinas térmicas como uma geladeira, um aparelho de ar condicionado e um motor de automóvel.

Historicamente, a termodinâmica foi elaborada baseando-se em ob-servações empíricas. A descrição termodinâmica é sempre uma des-crição macroscópica (que se aplica a um número muito grande de par-tículas, considerando médias entre as grandezas envolvidas), o que é compatível com uma descrição estatística. Somente mais tarde, com a formulação da teoria cinética dos gases, precursora da teoria atômica da matéria, é que se procurou dar uma explicação microscópica (ao ní-vel atômico ou molecular) para alguns resultados da termodinâmica.

A termodinâmica clássica trata de sistemas em equilíbrio termodi-nâmico, ou seja, quando as variáveis macroscópicas que caracteri-zam o sistema não variam com o decorrer do tempo. No entanto, o fato de essas variáveis serem constantes no tempo não quer dizer que o sistema é estático do ponto de vista microscópico, ou seja, as partículas que formam o sistema estão em constante movimento e mudam constantemente de velocidade.

A partir da observação experimental.

As variáveis macroscópicas são, por exemplo: pressão,

volume e temperatura.

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Neste Capítulo iremos abordar os conceitos de temperatura, de calor e as propriedades térmicas da matéria, para nos Capítulos seguintes estudarmos as leis da termodinâmica, as quais acreditamos que re-gulam os fenômenos térmicos na natureza.

3.2 TemperaturaO conceito de temperatura está associado a uma propriedade comum de sistemas em equilíbrio térmico. No entanto, a sensação subjetiva de temperatura não fornece um método confiável de medição. Por exemplo: num dia frio, tocar um pedaço de metal e um pedaço de madeira, que estejam no mesmo ambiente, dá a falsa impressão de que o metal está mais frio. Como você explica esse fato? Mais adian-te isso ficará claro.

Desse problema trata a chamada Lei Zero da Termodinâminca (em alguns livros chamada de Anteprimeira Lei da Termodinâmica), que pode ser enunciada da seguinte forma:

Quando dois sistemas ( e ) estão em equilíbrio térmico com um terceiro (C), então e estão em equilíbrio térmico entre si (ver figura 3.1).

A B

C

Figura 3.1 – Ilustração da Lei Zero da Termodinâmica. Se A e B estão em equilíbrio térmico com C , então A e B estão em equilíbrio térmico entre si.

A Lei Zero a princípio parece óbvia, mas é preciso entender que ela só se aplica para sistemas em equilíbrio térmico, ou seja, quando a temperatura não varia com o decorrer do tempo. Essa lei trouxe grandes contribuições para a ciência: graças a ela é que podemos uti-lizar termômetros para medir a temperatura de corpos diferentes.

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3.2.1 Escalas de temperaturaA escala Celsius (°C) é a mais conhecida para nós, pois é a esca-la adotada nos termômetros que usamos aqui no Brasil. Em outros países outras escalas são mais comuns. A escala Celsius foi defi-nida como sendo 0°C o ponto de congelamento da água e 100°C o ponto de ebulição da água, ambos considerados próximos ao nível do mar. Dessa forma, um termômetro é calibrado a partir desses parâmetros, sendo dividido em 100 partes iguais, onde cada divisão equivale a 1°C. Com isso pode-se medir a temperatura desconheci-da de outros corpos.

A escala Fahrenheit (°F) é de uso corrente em países de cultura in-glesa e foi definida como sendo 32°F o ponto de congelamento da água e 212°F o ponto de ebulição da água, quando próximo ao nível do mar.Portanto, a diferença ente os pontos de congelamento e de ebulição é de 100° para a escala Celsius e de 180° para a escala Fahre-nheit. Com isso, pode-se estabelecer uma relação geral entre essas duas escalas de temperatura para realizar conversões entre elas:

(3.1)

em que TC é a temperatura em graus Celsius e TF a temperatura em graus Fahrenheit.

A escala Kelvin (K) é denominada de escala de temperatura absolu-ta, pois o ponto de 0 K, que é igual a -273,15°C, é a temperatura de pressão nula de qualquer gás. Esse valor é obtido através da extra-polação da curva de pressão em função da temperatura, medida por um termômetro a gás de volume constante; para atingir a pressão zero o gráfico intercepta o eixo da temperatura em -273,15°C, que é conhecido como Zero Absoluto. Como a variação de 1 K é igual a 1°C, a relação entre as duas escalas é dada por:

273,15KK CT T= + (3.2)

em que TK é a temperatura em Kelvin.

Assim, a temperatura de ebulição da água na escala Kelvin é 373,15 K. Para a maioria dos propósitos práticos pode-se arredondar para 273 K a temperatura de congelamento da água.

Sabemos que no alto de uma montanha a água entra

em ebulição abaixo de 100°C. Isso está relacionado com a pressão atmosférica,

que é menor no alto da montanha (como vimos no

Capítulo 1).

Para mais informações sobre o Zero Absoluto, verifique a bibliografia

comentada ao final deste Capítulo.

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Exemplo 1. Faça as seguintes conversões entre as escalas de tempera-tura: a) de 37°C para o equivalente em Fahrenheit; b) de 310 K para o equivalente em Celsius; e c) de 68°F para o equivalente em Kelvin.

Solução:

Para essa conversão vamos utilizar a equação 3.1, então:a)

ou seja,9 (37 ) 32 98,6 F5FT = ° + ° = ° .

Para essa conversão vamos utilizar a equação 3.2, então:b)

310K 273,15K,CT= +ou seja,

310K 273,15K 36,85 C.CT = - = °

Para essa conversão precisamos primeiro transformar os c) 68°F em Celsius pela equação 3.1 para depois transformar esse valor para Kelvin através da equação 3.2, então:

( )5 68 32 20 C,9CT = °- ° = °

portanto

273,15K 20 273,15K 293,15K.K CT T= + = °+ =

3.3 Expansão térmicaQuando a temperatura de um corpo aumenta, em geral observa-se uma expansão de suas dimensões. Isso ocorre devido ao aumen-to da energia interna do material, fazendo com que as moléculas ou átomos constituintes se afastem um pouco mais uns dos outros, em média. Consideremos uma barra comprida de comprimento L mantida à temperatura T : se sua temperatura for alterada ( T∆ ), ob-serva-se uma variação L∆ , no seu comprimento, proporcional a T∆ e ao comprimento original L:

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L L Ta∆ = ∆ (3.3)

Aqui a é o coeficiente de expansão linear e suas unidades são 1/°C ou 1/K . Esse coeficiente não varia sensivelmente com a pressão, mas pode variar com a temperatura, portanto a equação 3.3 fornece o valor médio de a num intervalo T∆ . O valor correto numa dada temperatura é obtido tomando-se o limite de a para 0T∆ → .

0

1limT

L L dLT L dT

a∆ →

∆= =

∆ (3.4)

No entanto, para fins práticos, podemos considerar a constante para valores de temperatura não muito próximos da temperatura de fu-são dos sólidos. Valores típicos de a para sólidos são da ordem de

510- por C° .

É importante destacar que em se tratando de sólidos aniso-trópicos, isto é, aqueles em que as propriedades variam de acordo com a direção a ser tomada, assume valores dife-rentes, dependendo da direção considerada.

Vamos considerar agora uma lâmina delgada (muito fina), com es-trutura isotrópica (igual em todas as direções) e lados 1L e 2L , cuja área A é dada por 1 2L L× . Nesse caso, uma variação na temperatura dT produzirá uma mudança na área dA dada por:

1 2 2 11 2

( )d L L dL dLdA L LdT dT dT dT

×= = + (3.5)

Logo, se dividirmos ambos os lados da igualdade por 1 2A L L= × , obtemos:

2 1

2 1

1 1 1 2dL dLdAA dT L dT L dT

a= + =

portanto

2A A Ta∆ = ∆ (3.6)

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70

Ou seja, o coeficiente de dilatação superficial é igual a duas vezes o coeficiente linear a . Analogamente, para o caso de um paralelepí-pedo teremos uma variação no volume V∆ , devida a uma variação de temperatura T∆ , que é dada por:

V V T∆ = ∆ (3.7)

onde 3 a= é definido como o coeficiente de dilatação volumétrico. Em geral, o valor de para líquidos (da ordem de 310- por C° ) é bem maior que para os sólidos (da ordem de 510- por C° ). A defini-ção de um coeficiente de dilatação volumétrico é conveniente no caso de líquidos e gases, os quais ocupam todo o ambiente em que estão confinados, onde se busca saber apenas a variação volumétrica.

Para a maioria dos materiais > 0, mas existe uma exceção para a água, onde 0< no intervalo de temperatura de 0 C° a 4 C° . Isso quer dizer que a água apresenta um volume mínimo a 4 C° e, portanto, a densidade da água é máxima nessa temperatura; diminuindo-se a temperatura abaixo desse valor, a água expande-se até congelar.

Uma consequência direta desse efeito é o fato da superfície de um lago (numa cidade de inverno rigoroso) congelar, sem que as águas mais profundas congelem. O gelo formado na superfície funcio-na como um isolante térmico, mantendo as águas mais profundas numa temperatura mais elevada, com densidade maior, permitindo que o gelo flutue. Perceba que isso é essencial para a manutenção da vida marinha abaixo da superfície congelada, pois se a água na superfície descesse para o fundo ao se congelar, o lago se congelaria como um todo. Esse comportamento da água deve-se às proprieda-des específicas das ligações de hidrogênio entre suas moléculas.

Exemplo 2. Uma ponte de aço tem comprimento de 1000m . Qual a expansão no seu comprimento quando a temperatura sobe de 0 C° para 30 C° ? Considere 6 111 10 Kaçoa - -= × .

Solução: Como a unidade do coeficiente linear é dada em 1K- , preci-samos determinar a variação da temperatura em Kelvin. Vimos que a variação de 1K 1 C= ° , ou seja, a variação de temperatura é a mesma em graus Celsius ou graus Kelvin (o mesmo não é válido para a escala Fahrenheit). Assim:

Isso explica o rompimento de canos cheios de água quando congelam em uma cidade muito fria no inverno. O mesmo acontece se você colocar uma garrafa cheia de água (tampada) para congelar no freezer.

É importante perceber que o coeficiente b não precisa estar vinculado à dilatação linear na direção dos três eixos cartesianos do espaço tridimensional, ele está relacionado com uma variação de volume. Por exemplo, no caso de líquidos e gases (que assumem a forma do recipiente que os contém), em geral interessa saber apenas a variação ∆V.

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30 C 0 C 30 C 30KT∆ = ° - ° = ° =

logo, 6 1(11 10 K )(1000m)(30K) 0,33mL L Ta - -∆ = ∆ = × = ,

ou seja, a ponte expande 33cm . É por isso que é necessário deixar folgas ao longo de uma ponte para que essa expansão seja possível, caso contrário a ponte poderia romper. Essa folga também é necessá-ria ao longo dos trilhos de trem, ou estes poderiam se curvar.

Exemplo 3. Um recipiente de vidro de 1 litro está cheio de álcool até a boca em temperatura de 10 C° . Se a temperatura for aumentada para 30 C° , qual a quantidade de álcool que transbordará do reci-piente? Dados: 6 19 10 Kvidroa - -= × e 3 11,1 10 Kálcool - -= × .

Solução: Para determinarmos a quantidade de álcool que transborda, precisamos calcular separadamente a variação no volume do vidro e a variação no volume do álcool. Para isso utilizaremos a equação 3.7, e depois subtrair os valores. Temos que a variação de temperatura é

20 C 20KT∆ = ° = . Além disso:

A variação do volume do vidro é dada por:a) 6 1

vidro vidro4

vidro

3 3(9 10 K )(1 litro)(20K)

5, 4 10 litros 0,54ml

V V TVa - -

-

∆ = ∆ = ×

∆ = × =

A variação do volume do álcool é dada por:b)

3 1

2

(1,1 10 K )(1 litro)(20K)

2,2 10 litros 22,0 mlálcool álcool

álcool

V V TV - -

-

∆ = ∆ = ×

∆ = × =

Assim, a quantidade que transborda será: c)

álcool vidro 22,0ml 0,54ml 21,46ml

V V VV

∆ = ∆ -∆ = -∆ =

Vale lembrar que existem materiais como o plástico e a bor-racha, que apresentam um efeito chamado entrópico, ou seja, eles contraem com o aumento da temperatura.

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3.4 CalorA primeira tentativa de definir “calor” foi dada por Lavoisier no sé-culo XVIII, com a hipótese do calórico, uma substância que escoaria entre os corpos, transferindo calor de um corpo para outro, sendo que a quantidade total de calórico era conservada. A hipótese ri-val foi dada por Francis Bacon e Thomas Hooke e enunciada por Newton, atribuindo o calor ao movimento de vibração das partícu-las dos corpos (ver sugestão de leitura no final deste Capítulo).

A definição mais correta para o calor, considerada atualmente, é que o calor é uma forma de energia, que é transferida de um corpo para outro em virtude de diferença de temperatura, portanto o calor é uma energia em transição. Nesse contexto, não faz sentido dizer que um corpo possui mais calor que outro; na verdade, os corpos podem possuir temperaturas diferentes, mas o calor (como veremos mais adiante) está sempre associado a um gradiente de temperatura.

3.4.1 Capacidade térmica e calor específicoQuando se adiciona energia térmica a uma substância, ou seja, quando é transferido calor para uma substância, a temperatura ge-ralmente se eleva1. Nesse caso, a quantidade de energia térmica Q∆ necessária para elevar a temperatura da substância em T∆ é pro-porcional à variação de temperatura T∆ e à sua massa m . Podemos escrever então:

Q mc T C T∆ = ∆ = ∆ (3.8)

onde C mc= é chamada de capacidade térmica2 e c é chamado de calor específico3. A unidade para a quantidade de calor é a caloria e foi definida inicialmente como a quantidade de energia térmica para elevar a temperatura de 1 grama de água de 14,5 C° até 15,5 C° . No Sistema Internacional de medidas 1cal 4,186J= .

Analogamente, pode-se então definir uma capacidade térmica mo-lar, /MC Mc C n= = , como sendo a capacidade térmica de 1mol da substância, onde M é a massa molecular. Nesse sentido, a capacida-de térmica de n moles é dada por n MC nC= .

1 Como veremos mais adiante, uma exceção ocorre nas transições de fase, onde a quantidade de calor absorvida é utilizada para alterar propriedades físicas da substância.

2 A capacidade térmica está relacionada com a capacidade que uma substância ou corpo tem de absorver calor e variar a temperatura. Vemos que quanto maior a massa de um corpo, maior é a sua capacidade térmica.

3 O calor específico é uma propriedade de cada substância e representa a medida da capacidade que uma substância tem de absorver calor.

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A massa molecular (em alguns livros chamada equi-vocadamente de peso molecular) é definida como a mas-sa por mol da substância e, portanto, a sua massa total é dada por . O valor de para todos os elementos existentes na natureza pode ser determinado utilizando-se a massa atômica (muitas vezes chamada de núme-ro de massa) de cada elemento da tabela periódica, que é expressa em gramas por mol. Por exemplo: para o Oxigê-nio 16,0g / molam ≈ e para o Hidrogênio 1,0g / molam ≈ , então uma molécula de água ( 2H O ) possui 18g / molM ≈ .

A capacidade térmica de um sistema com mais de uma substância, cujas massas são 1 2 3, , ,...m m m , nm , e seus respectivos calores especí-ficos 1 2 3, , ,...c c c , nc é dada pela soma da capacidade térmica de cada substância, ou seja:

1 1 2 2 3 3 ... n nC m c m c m c m c= + + + +

Nesse caso, a quantidade de energia térmica necessária para intro-duzir uma variação T∆ na temperatura do sistema é dada por:

1 1 2 2 3 3( ...) .Q m c m c m c T∆ = + + + ∆ (3.9)

O calor específico varia com a temperatura e com as condições em que a variação de temperatura ocorre: a pressão constante ou a volume constante. Por isso define-se o calor específico a pressão constante como Pc e o calor específico a volume constante como Vc . Para lí-quidos e sólidos a diferença entre Pc e Vc é pequena e pode ser desprezada, pois o volume varia muito pouco com a pressão. Em geral, o calor específico é determinado nas condições de pressão at-mosférica (que é constante), por isso a maioria dos valores de calor específico refere-se a Pc . Entretanto, para gases Pc e Vc são bas-tante diferentes, como veremos no Capítulo seguinte. Na tabela 3.1 a seguir apresentamos os valores de calor específico e capacidades térmicas molares de alguns sólidos e líquidos, juntamente com seu valor de massa molecular; esses valores foram obtidos em condições de pressão atmosférica (1atm ).

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Quando a variação da temperatura é grande, é preciso considerar a dependência de c com a temperatura: ( )c c T= . Assim, o correto seria integrar a equação 3.8 da temperatura inicial iT até a tempera-tura final fT :

(3.10)

Para pequenas variações de temperatura, porém, onde o calor espe-cífico não varia apreciavelmente, a equação 3.8 pode ser utilizada com boa aproximação. Nesse caso, o calor específico pode ser consi-derado como o valor médio entre iT e fT .

No próximo Capítulo veremos que a linha em indica que se trata de uma diferencial inexata.

Substância (J / Kg K)c (Kg / mol)M (J / mol K)MC

Alumínio 910 0,0270 24,6

Cobre 390 0,0636 24,8

Ouro 126 0,203 25,6

Chumbo 128 0,207 26,5

Prata 234 0,108 25,3

Álcool etílico 2.428 0,0461 111,9

Mercúrio 138 0,201 27,7

Sal (NaCl) 879 0,0585 51,4

Água 4.186 0,0180 75,4

Gelo (-10°C) 2.050 0,0180 36,9

Tabela 3.1 – Calores específicos e capacidades térmicas molares de algumas substâncias (a pressão constante de 1 atm).

Através da tabela 3.1 é interessante observar que as capacidades térmicas molares de todos os metais são praticamente as mesmas, apesar de terem calores específicos bem diferentes. Os calores es-pecíficos dos líquidos são bem maiores, especialmente o da água,

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que é consideravelmente maior que o das outras substâncias: é, por exemplo, aproximadamente 10 vezes maior que o do cobre. Assim, devido a sua grande capacidade térmica, a água é uma excelente substância para armazenar energia térmica. Além disso, o calor específico da água varia muito pouco num amplo intervalo de tem-peraturas; medidas precisas mostraram uma variação de aproxima-damente 1% no intervalo de 0 C° a 100 C° . Dessa forma, ela pode ser utilizada para determinar o valor do calor específico de uma substância desconhecida.

Sabendo-se a temperatura inicial de uma substância qualquer ST com massa Sm e calor específico Sc (desconhecido), se ela for mer-gulhada num recipiente termicamente isolado, de massa Rm e calor específico Rc e contendo uma massa de água Am cujo calor especí-fico é dado por Ac , ambos numa temperatura inicial conhecida iT , ocorre uma troca de calor entre a substância, a água e o recipiente contendo a água, até que o equilíbrio térmico seja atingido e todo o sistema assuma a mesma temperatura final fT . No caso de também ocorrerem transições de fase, é necessário considerar a quantidade de calor utilizada nesse processo.

Nessas condições, a quantidade de calor trocada pela substância é dada por:

( )s s s f sQ m c T T∆ = - , (3.11)

em que f ST T T∆ = - é a variação de temperatura da substância. A quantidade de calor trocada pelo recipiente e a água é dada por:

( ) ( )RA R R f i A A f iQ m c T T m c T T∆ = - + - , (3.12)

onde f iT T T∆ = - é a variação de temperatura do conjunto recipiente + água. Como o sistema substância + recipiente + água está termi-camente isolado, pela conservação de energia todo calor que sai da substância é absorvido pelo conjunto recipiente + água, e vice-versa. Portanto, a soma das equações 3.11 e 3.12 tem que ser igual a zero. Assim:

0,S RAQ Q∆ + ∆ =

ou seja,

( ) ( )( ) 0s s f s R R A A f im c T T m c m c T T- + + - = . (3.13)

Recipiente termicamente isoladoChamado de calorímetro, tem a propriedade de não permitir a troca de calor com o meio externo.

O fato é que grandes massas de água como

lagos e o oceano tendem a moderar as variações

de temperatura nas suas vizinhanças, ou seja, no inverno, quando a noite

cai, a água começa a liberar o calor absorvido do sol durante o dia, não deixando a temperatura

cair bruscamente. Já numa região desértica, onde

praticamente não existe água, durante o dia, com

sol as temperaturas chegam facilmente a 40°C, baixando

rapidamente para valores negativos com o pôr do sol.

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Através da equação 3.13, conhecendo-se as massas e medindo-se as temperaturas, pode-se determinar o calor específico de uma subs-tância desconhecida.

Como nesses cálculos utilizam-se variações de temperatura e essa variação é igual nas escalas Celsius e Kelvin, ambas as escalas podem ser utilizadas.

Reescrevendo a equação 3.8 na forma QT

C∆

∆ = , obtemos uma ex-

pressão para a variação da temperatura T∆ de um sistema com ca-pacidade térmica C pela transferência de uma quantidade de calor

Q∆ . Como C é proporcional à massa, vemos que 0T∆ → quando a massa for muito grande. Nesse caso limite, o sistema permite uma transferência de calor Q∆ sem que a temperatura se altere significa-tivamente. Tal sistema é chamado de reservatório térmico. Exemplos de reservatórios térmicos ideais são a atmosfera terrestre e o oceano, mas na prática pode-se considerar qualquer recipiente de tamanho adequado e contendo um fluido em equilíbrio térmico como sendo um reservatório térmico.

Exemplo 5. Um pedaço de chumbo com massa de 600g é aquecido a 100 C° e colocado num recipiente de alumínio de 200g contendo 500g de água, ambos a 17,3 C° . Sabendo-se que a temperatura final de equilíbrio é 20 C° , determine o calor específico do chumbo. Da-dos: 30,9 10 J / Kg KAlc = × e

2

3H O 4,18 10 J / Kg Kc = × .

Solução: Vemos que a variação de temperatura do recipiente com a água é 20 C 17,3 C 2,7 C 2,7KRAT∆ = ° - ° = ° = e do chumbo é

20 C 100 C 80 C 80KchT∆ = ° - ° = - ° = - . Lembre-se que, nas unidades dos calores específicos, a massa aparece em quilogramas (Kg), assim as massas do problema precisam ser transformadas para essa unida-de. Usando a equação 3.13 temos:

3

3

(0,6Kg)( 80) [(0,2Kg)(0,9 10 J / Kg K)

(0,5Kg)(4,18 10 J / Kg K)](2,7K) 0,chc- + ×

+ × =3

3

(0,6Kg)( 80) [(0,2Kg)(0,9 10 J / Kg K)

(0,5Kg)(4,18 10 J / Kg K)](2,7K) 0,chc- + ×

+ × =

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onde, isolando-se chc , obtemos:

3 3(0, 486 10 J 5,643 10 J) 128J / Kg K.48Kg Kchc × + ×

= =

3.4.2 Transição de fase e calor latenteComo dito anteriormente, quando se fornece uma quantidade de calor a uma substância, a pressão constante, usualmente se obser-va um aumento da sua temperatura. Entretanto, numa transição de fase uma substância pode absorver grandes quantidades de calor sem variar a temperatura. Nesse caso, a energia transferida à subs-tância é utilizada para alterar o seu estado físico. As transições de fase mais conhecidas são:

Fusão:a) do estado sólido para o líquido;

Vaporização: b) do estado líquido para o gasoso;

Sublimação: c) passagem direta do estado sólido para gasoso (ex: gelo seco (CO2 solidificado), naftalina etc.) e vice-versa;

Condensação: d) do estado gasoso para o líquido;

Solidificação:e) do estado líquido para o sólido.

No caso de uma substância pura como a água, as transições ocor-rem em uma dada temperatura, que, nas proximidades do nível do mar, são: 0 C° para a fusão e 100 C° para a vaporização.

Observou-se experimentalmente que a quantidade de calor necessá-ria para ocorrer uma transição é proporcional à massa m, e então de-finiu-se a constante de proporcionalidade como sendo o calor latente L . Para um processo de fusão existe o calor latente de fusão FL :

F FQ mL∆ = , (3.14)

Para um processo de vaporização existe o calor latente de vaporiza-ção VL :

v vQ mL∆ = , (3.15)

onde, para a água, a pressão de 1atm,

A transição de fase é identificada pela alteração

do estado físico da substância. Quando o gelo

derrete, por exemplo, ocorre a passagem do estado

sólido para o estado líquido da água.

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3 3333,5 10 J / Kg 79,7 10 cal / KgFL = × = × e

6 32, 26 10 J / Kg 540 10 cal / KgVL = × = × .

Percebe-se que o calor latente de vaporização é bem maior que o de fusão, isso indica que é necessária uma quantidade de calor maior para realizar a transição do estado líquido para o gasoso.

É importante destacar que o valor do calor latente para a solidificação é o mesmo que o valor para a fusão, a dife-rença é que para ocorrer a fusão uma quantidade de ca-lor tem que ser transferida para a substância, enquanto que para a solidificação essa mesma quantidade de calor deve ser removida. Portanto, convencionou-se que para a fusão e para a solidificação . O mes-mo raciocínio é válido para a vaporização e condensação.

Exemplo 6. Qual a quantidade de calor necessária para vaporizar 1,0Kg de gelo a 20 C- ° e mantido a uma pressão de 1atm?

Solução: Para encontrarmos a quantidade de calor necessária para vaporizar o gelo, precisamos inicialmente determinar a quantidade de calor gasta para levá-lo de 20 C- ° a 0 C° , depois aquela para fundi-lo nessa temperatura, em seguida a quantidade de calor para levá-lo de 0 C° a 100 C° e por fim aquela para vaporizá-lo a 100 C° . Assim, calcula-se a quantidade de calor gasta em cada um dos processos para somar todas as quantidades ao final.

Levar o gelo de a) 20 C- ° a 0 C° :

O calor específico do gelo é 32,05 10 J / Kg Kgeloc = × e temos que 0 ( 20) 20 C 20KT∆ = - - = ° = . Utilizando a equação 3.8:

3

3

(1,0Kg)(2,05 10 J / Kg K)(20K)

41 10 J.gelo gelo

gelo

Q mc T

Q

∆ = ∆ = ×

∆ = ×

Fundirb) o gelo a 0 C° (a temperatura permanece constante), para isso vamos utilizar a equação 3.14:

3 3(1,0Kg)(333,5 10 J / Kg) 333,5 10 JF FQ mL∆ = = × = ×

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Levar a água de c) 0 C° a 100 C° : o calor específico da água é

2

3H O 4,18 10 J / Kg Kc = × e temos que 100 C 100KT∆ = ° = . Uti-

lizando a equação 3.8:

2 2

2

3H O H O

3H O

(1,0Kg)(4,18 10 J / Kg K)(100K)

418 10 J.

Q mc T

Q

∆ = ∆ = ×

∆ = ×

Vaporizar a água a d) 100 C° (a temperatura permanece constante), para isso vamos utilizar a equação 3.15:

6 6(1,0 )(2,26 10 J / Kg) 2,26 10 J.V VQ mL Kg∆ = = × = ×

Dessa forma, a quantidade total de calor necessária para realizar esse processo é a soma das quantidades de calor de todas as etapas, logo:

2

33052,5 10 J.total gelo F H O V

total

Q Q Q Q Q

Q

∆ = ∆ + ∆ + ∆ + ∆

∆ = ×

3.5 Transferência de energia térmicaDe modo geral, sabemos que sempre que existir uma diferença de temperatura entre dois corpos ou dois meios, esse gradiente de tem-peratura faz com que haja um fluxo de energia térmica da tempera-tura maior para a menor. Existem três métodos pelos quais a energia térmica pode ser transferida: condução, convecção e radiação.

ConduçãoAtravés da condução, o calor é transferido pelas interações entre os átomos e moléculas que constituem o material, mas sem transferên-cia direta de matéria. A condução ocorre pela vibração e colisão das partículas constituintes. Lembrando que a vibração é maior onde a temperatura for mais elevada, na colisão parte da sua energia cinéti-ca é transferida para as partículas com vibração menor, que também passam a vibrar mais. O resultado é um processo em cadeia que se propaga para longe da região mais aquecida. No caso de um metal, o transporte também é feito pelos elétrons livres; no caso de um gás, apenas pelas colisões diretas entre as partículas.

Certamente você já queimou a mão ao tirar uma panela do fogo por-que o cabo estava quente, esse é um exemplo típico de condução de

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calor através do material do cabo. Para evitar isso, em geral os cabos são constituídos ou revestidos de materiais que não conduzem muito bem o calor (ex.: madeira, borracha); os metais são exemplos de bons condutores de calor. Agora você consegue responder à pergunta no início da seção 3.1; a sensação de que o metal é mais frio deve-se ao fato de que ele é melhor condutor de calor do que a madeira, assim ele absorve a energia térmica da sua mão com maior eficiência.

ConvecçãoA convecção é caracterizada pelo transporte de matéria no processo de transferência de calor, que ocorre pelo movimento coletivo das moléculas de um fluido (líquido ou gás). É um processo contínuo, ativado pela diferença de temperatura entre duas regiões do fluido, a qual altera a densidade do meio. Dessa forma ocorre um movi-mento do fluido no sentido de homogeneizar a densidade. Quan-do você coloca uma panela com água no fogo para ferver, durante um certo tempo é possível notar que a temperatura da superfície da água aumenta lentamente. Durante esse período a transferência de calor para a superfície ocorre pela condução através da vibração das moléculas. Obviamente, a temperatura no fundo da panela aumenta mais depressa, e quando a diferença entre a temperatura da água da superfície e a do fundo atinge um valor crítico, a água começa a se mover. A partir desse ponto, o processo de convecção é dominan-te na transferência de calor, fazendo com que rapidamente a água atinja o equilíbrio térmico. Portanto, a convecção é uma forma muito eficiente de transferir calor.

A convecção é um processo muito comum na natureza. As chama-das correntes de convecção podem ser observadas na atmosfera ter-restre e nos oceanos, em um copo com gelo percebe-se o movimento da água, num dia de verão o ar próximo ao asfalto parece trêmulo, ao abrir a porta de um freezer percebemos que o ar frio desce etc.

RadiaçãoImagine-se entrando em casa num dia frio de inverno em que você encontra a lareira acesa, de imediato você sente o calor na pele. No entanto, como o calor é transportado do fogo até a sua pele? Não pode ser por condução, pois o ar é um péssimo condutor de calor. Também não pode ser por convecção, pois o ar da sala está qua-

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se parado. Nesse exemplo você está experimentando a transmissão por radiação, onde a energia é transmitida através de ondas eletro-magnéticas. Essas ondas viajam do fogo até a sua pele, da mesma forma que a luz, onde então são absorvidas e convertidas em ener-gia interna. Todos os corpos do universo irradiam calor, e ao mesmo tempo que um corpo irradia também recebe energia irradiada por outros corpos.

A radiação é a única maneira de transmitir energia sem a necessidade de um meio para isso, ou seja, a radiação pode atravessar o espaço vazio, caso contrário não sentiríamos o calor do Sol aqui na Terra.

3.5.1 Condutividade térmicaVamos considerar dois reservatórios térmicos (sendo que um possui maior temperatura que o outro) ligados por uma barra condutora de calor, permitindo o fluxo contínuo de calor da temperatura maior ( 1T ) para a menor ( 2T ), como mostra o exemplo a na figura 3.2 a se-guir. Nesta, o exemplo (b) representa um segmento da barra condu-tora com área de seção reta A e comprimento x∆ , através do qual existe um gradiente de temperatura /T x∆ ∆ , onde T∆ é a diferença entre as temperaturas nas duas extremidades do segmento.

Fluxo de calorT1 T2

A

∆x

∆T

A B

Figura 3.2 – (a) Esquema de uma barra condutora de calor ligando dois reservatórios térmicos com temperaturas diferentes ( 1 2T T> ) e (b) detalhe de um segmento da barra condutora.

Sendo Q∆ a quantidade de calor conduzida num intervalo de tempo t∆ , então existe uma taxa de condução dada por /Q t I∆ ∆ = , que é de-

finida como a corrente térmica ( I ). Experimentalmente, verificou-se que a corrente térmica é proporcional à área da seção reta e ao gra-diente de temperatura, ou seja, . /I A T x∝ ∆ ∆ (o símbolo ∝ represen-ta proporcionalidade). Juntando as duas expressões para I , temos:

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Q TI kAt x

∆ ∆= =∆ ∆

. (3.16)

onde k é uma constante de proporcionalidade característica do meio condutor, definida como a condutividade térmica. A unidade de I é

J Ws= e a de k é / .W m K . Se isolarmos a variação de temperatura

na equação 3.16, encontramos:

xT I IkA∆

∆ = =ℜ , (3.17)

onde x

kA∆

ℜ = é a resistência térmica.

Vamos analisar agora como ocorre a condução térmica entre duas barras condutoras (com propriedades condutoras diferentes) ligadas entre si, como mostra a figura 3.3, onde 1T e 3T são as temperaturas nas duas extremidades externas e 2T é a temperatura na junção das barras ( 1 2 3T T T> > ); supomos que elas têm a mesma área transversal A, e 1k e 2k são as condutividades térmicas em cada barra.

T1

T2

L1 L2

k1T3

k2

Figura 3.3: Sistema constituído de duas barras condutoras diferentes, de comprimento 1L e 2L , unidas numa extremidade e submetidas a um

gradiente de temperatura, em que 1 2 3T T T> > .

Pela lei de conservação de energia, o fluxo térmico – e, consequente-mente, a corrente térmica – deve ser o mesmo através das duas barras. Pela equação 3.17 a variação de temperatura nas placas é dada por:

11 2 1

1

LT T Ik A

- = =ℜ

22 3 2

2

LT T Ik A

- = =ℜ

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Somando os lados da igualdade das duas equações resulta que:

1 3 1 2( ) eqT T I T I- = ℜ +ℜ →∆ =ℜ , (3.18)

onde 1 2eqℜ =ℜ +ℜ é a resistência equivalente para dois condutores ligados em série. Note que o resultado seria o mesmo se houvessem outros condutores a mais ligados da mesma forma, em que T∆ é a variação total de temperatura (nos dois extremos) e eqℜ a soma de todas as resistências.

Uma situação um pouco mais complexa é a determinação da quan-tidade de calor perdida numa sala em certo intervalo de tempo t∆ ; isso equivale a encontrar o fluxo de calor /Q t I∆ ∆ = . Nesse caso, precisamos encontrar a corrente térmica através do teto, das paredes laterais, portas e janelas. Como os materiais que constituem essas partes são diferentes, então a corrente térmica deve ser diferente em cada uma delas. Considerando que T∆ (que é a diferença entre a temperatura interna e externa da sala) é o mesmo em cada caminho, o fluxo total é dado pela soma das correntes térmicas em cada meio, ou seja, 1 2 3 ...totalI I I I= + + + + nI , e como T I∆ =ℜ temos:

1 2 3

1 2 3

...

1 1 1 1 1...

eq n

eq n

T T T T T∆ ∆ ∆ ∆ ∆= + + +

ℜ ℜ ℜ ℜ ℜ

= + + +ℜ ℜ ℜ ℜ ℜ

(3.19)

Nesse caso, eqℜ representa a resistência térmica equivalente através de condutores ligados em paralelo.

Mais adiante, na disciplina de Física III (que trata de fenô-menos elétricos), você verá que os conceitos abordados aqui são perfeitamente equivalentes ao caso elétrico. Aqui vimos que uma diferença de temperatura produz uma corrente térmica em um corpo que depende da sua resistência tér-mica pela relação T I∆ =ℜ . No caso elétrico, a corrente elé-trica é produzida por uma diferença de potencial elétrico ( ) que depende da resistência elétrica pela relação conhe-cida como Lei de Ohm, eletrV I∆ =ℜ . Note que as duas rela-ções são idênticas. O mesmo acontece com a relação para

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resistências elétricas equivalentes, em série e em paralelo. Lembramos que a corrente térmica está relacionada com o fluxo de calor num intervalo de tempo, enquanto a corrente elétrica relaciona-se com o fluxo de cargas elétricas num in-tervalo de tempo.

Certamente você já percebeu que num dia frio de inverno os pássa-ros enchem suas plumas, parecendo mais gordos; isso é um exem-plo de que os pássaros conhecem a condutividade dos materiais! O fato é que a condutividade térmica do ar é muito pequena, ou seja, o ar é um bom isolante térmico, então a camada de ar que preenche as plumas ajuda a evitar a fuga de calor do corpo. Pela mesma razão os casacos de lã e as cobertas de pena mantêm o nosso corpo aque-cido. Quem já andou de avião deve ter percebido que as janelas são duplas ou triplas, o motivo disso é confinar ar entre as lâminas de vidro para obter isolamento térmico. No entanto, se o espaçamento entre as lâminas for grande, a eficiência diminui por efeito de con-vecção. A distância otimizada de isolamento do ar é de 1cm a 2cm . Na tabela 3.2 estão apresentados valores de condutividade térmica de algumas substâncias.

Substância k (W/mK) Substância k (W/mK)

Alumínio 205,0 Vidro 0,8

Cobre 385,0 Gelo 1,6

Aço 50,2 Madeira 0,04 a 0,12

Concreto 0,8 Ar 0,024

Tabela 3.2 – Condutividade térmica de algumas substâncias.

Exemplo 7. Considere dois cubos metálicos (chumbo e prata) com 2,0cm de aresta, ligados em série, onde as extremidades externas estão entre dois reservatórios térmicos, um com 1 100 CT = ° (em con-tato com o chumbo) e o outro com 3 0 CT = ° (em contato com a prata), semelhante ao sistema da figura 3.3. Assim:

Encontre a corrente térmica total que atravessa os dois cubos; a)

Determine a temperatura b) T2 na interface entre os dois cubos. Dados: 353W / m Kchumbok = e 429W / m Kpratak = .

Quando um avião voa aproximadamente a 10.000 m de altitute a temperatura externa fica em torno de -40°C; se não houvesse isolamento térmico as pessoas congelariam dentro do avião.

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Solução:

Inicialmente precisamos encontrar a resistência total a) totalℜ . Como os dois cubos estão ligados em série, vamos utilizar a equação 3.18:

total ch prℜ =ℜ +ℜ . A área da seção reta é a mesma para os dois: 2 4 2(0,02m)(0,02m) 0,0004m 4 10 mA -= = = × ,

onde 0,02mx∆ = , portanto:

4 2

0,02m 0,142K / W(353W / mK)(4 10 m )ch

xkA -

∆ℜ = = =

×,

4 2

0,02m 0,117K / W(429W / mK)(4 10 m )pr

xkA -

∆ℜ = = =

×,

logo: (0,142 0,117)K / W 0,259K / W.totalℜ = + = Dessa forma a corrente total é dada por:

100K 386W.0,259K / Wtotal

total

TI ∆= = =ℜ

A temperatura na interface dos dois metais (b) T2) pode ser deter-minada com os dados existentes tanto para o chumbo como para a prata. Vamos calcular aqui a temperatura para o chumbo e fica a sugestão para você realizar o mesmo cálculo com os dados da prata, lembrando que a corrente que passa pelos dois é a mesma ( totalI ). Através da equação 3.18 temos:

1 2 ch totalT T I- =ℜ , vamos considerar 100 C 373K° = ,

2

2

373K (0,142K / W)(386W),373K 54,8K 318,2K 45,2 C.

TT

- == - = = °

ResumoO conceito de temperatura dos corpos é tratado pela Lei Zero da Termodinâmica: quando dois sistemas (A e B) estão em equilíbrio térmico com um terceiro (C), então A e B estão em equilíbrio térmico entre si (ver figura 3.1).

Para realizar conversões entre as escalas de temperatura Celsius ( CT ), Fahrenheit ( FT ) e Kelvin ( KT ) são utilizadas as seguintes equações:

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( )5 329C FT T= - ° e 273,15KK CT T= +

Com relação à dilatação dos materiais, vimos que ela depende das dimensões do material, da variação de temperatura e principalmen-te da sua estrutura química. No caso de uma dilatação linear temos que a variação no comprimento L é dada por:

L L Ta∆ = ∆ ,

onde a é o coeficiente de expansão linear. Se a dilatação for superficial, a variação da área da superfície é dada por:

2A A Ta∆ = ∆ ,

Se a dilatação for volumétrica, temos:

V V T∆ = ∆ ,

onde 3 a= é definido como o coeficiente de dilatação volumétrica.

O calor é uma energia de transição transmitida entre corpos sub-metidos a diferentes temperaturas. A capacidade térmica de uma substância (C mc= ) é definida como a capacidade que esta tem de absorver calor, onde c é o calor específico de cada substância. A quantidade de energia térmica Q∆ necessária para elevar a tempe-ratura de uma substância de T∆ é dada por:

Q mc T C T∆ = ∆ = ∆ .

Em situações onde ocorrem transições de fase, a quantidade de calor absorvida ou cedida pelo sistema é utilizada na sua totalidade para alterar o estado físico da substância, sem produzir uma variação da temperatura. Nesse caso:

Q mL∆ = ,

em que L é definido como calor latente, que pode ser de fusão ou vaporização.

Existem três formas pelas quais a energia térmica pode ser transfe-rida entre os corpos: condução, convecção e radiação.

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A condutividade térmica ( k ) é definida em termos de uma corrente térmica ( I ), que representa a taxa temporal de condução de calor:

/Q t I∆ ∆ = , onde:

Q TI kAT x

∆ ∆= =∆ ∆

.

Ao isolarmos a variação da temperatura, encontramos uma defini-ção para a resistência térmica (ℜ ):

xT I IkA∆

∆ = =ℜ ,

xkA∆

ℜ = .

Para situações em que existem vários condutores conectados em série, a resistência equivalente é dada por 1 2 3 ...eq nℜ =ℜ +ℜ +ℜ + ℜ , porém se eles estiverem conectados em paralelo a resistência equi-

valente se torna 1 2 3

1 1 1 1 1...eq n

= + + +ℜ ℜ ℜ ℜ ℜ

. Como será visto mais

adiante no curso, esses conceitos são idênticos aos de corrente e re-sistência elétrica.

QuestõesUm tanque subterrâneo com capacidade igual a 1) 1700 litros é pre-enchido com etanol a uma temperatura inicial de 19 C° . Quan-do o etanol se esfria até atingir a temperatura de 10 C° do solo (a qual está em equilíbrio com a do tanque), qual é o volume de etanol no interior do tanque? Suponha que o volume do tan-que permaneça constante e considere 3 0 1

tan (0,75 10 ) Ce ol - -= × .

Resposta: V = 1688,5 litros.

Um pedaço de gelo de 2) 200g e a 0 C° foi colocado em 500g de água a 20 C° . O sistema está em um calorímetro de capacidade térmica desprezível. Sendo assim:

Qual a temperatura final de equilíbrio do sistema? a)

Qual a quantidade de gelo que fundiu?b)

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Resposta:

0 CfT = °a) ;

m 125g=b) .

Um projétil de chumbo, inicialmente a 3) 30 C° , é lançado por uma arma e se funde ao colidir com um alvo. Admitindo-se que toda a energia cinética inicial se transforma em energia in-terna que eleva a temperatura do projétil até atingir a tempera-tura necessária para provocar a sua fusão, calcule a velocidade do projétil no impacto com o alvo. Considere: calor latente de fusão do chumbo como 324,7 10 J / KgL = × e ponto de fusão do chumbo como 600K .

Resposta: 354m/sv = .

Um pedaço de cobre de 4) 100 g a temperatura T é lançado num calorímetro de cobre com 150 g contendo 200 g de água. A tem-peratura inicial da água e do calorímetro é 16°C, e a tempera-tura final, depois de atingido o equilíbrio térmico, é de 38°C. Depois da experiência, pesando-se o calorímetro com a água, verificou-se que 1,2 g de água evaporaram. Determine a tem-peratura T. É necessário considerar que o calorímetro não está isolado e, portanto, que a quantidade de água evaporada não ficou no seu interior.

Resposta: T 625,7 C= ° .

Um cubo de alumínio e um cubo de cobre, ambos com ares-5) ta de 3,0 cm, estão dispostos entre dois reservatórios térmi-cos mantidos a 100°C e 20°C, conforme mostra a figura 3.4 a seguir. Considere: . 237W / m.Kalumk = e 401W / m.Kcobrek = . Sendo assim:

Encontre a corrente térmica conduzida por cada um dos a) cubos de um lado a outro;

Qual a corrente térmica total? b)

Qual é a resistência térmica equivalente?c)

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100°C 20°C

alumínio

cobre

Figura 3.4 – Figura referente ao exercício 5.

Resposta:

. 568,8WalumI =a) e 962,4WcobreI = ;

1531,2WtotalI =b) ;

352 10 K / Weq-ℜ = ×c) .

6) Uma panela com fundo de cobre contém 0,8 litro de água em ebulição, sendo que essa água seca em 10 minutos. Assumin-do que todo o calor passa pelo fundo plano de cobre com 15,0 cm de diâmetro e 3,0 mm de espessura, calcule a temperatura da face externa do fundo (em contato com o fogo) no instante em que a panela seca. Considere o calor latente de vaporização da água como 62, 26 10 J / KgVL = × .

Resposta: T 101,3 C= ° .

Bibliografia básicaNUSSENZVEIG, H. Moysés. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. v. 2.

SEARS, Zemansky. Física II: termodinâmica e ondas. 10 ed. São Paulo: Addison Wesley, 2003.

RESNICK, R.; HALLIDAY, D. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. v. 2.

TIPLER, Paul A.; MOSCA, Gene. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. v. 1.

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90

Bibliografia complementar comentadaTIPLER, Paul A.; MOSCA, Gene. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. v. 1.

Para mais detalhes sobre a obtenção da escala absoluta, sugere-se a leitura da seção 17.3 Termômetro a gás e escala de temperatura absoluta.

NUSSENZVEIG, H. Moysés. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. v. 2.

Uma leitura interessante sobre a natureza do calor pode ser encontrada na seção 8.1 A natureza do calor.

SEARS, Zemansky. Física II: termodinâmica e ondas. 10. ed. São Paulo: Editora Addison Wesley, 2003.

Mais detalhes sobre transições de fase, com vários exemplos resolvidos, podem ser encontrados na seção 15.7 Calorimetria e transições de fases. Uma discussão mais aprofundada sobre as fases da matéria pode ser encontrada na seção 16.7 Fases da matéria.

Para saber mais sobre os mecanismos de trocas de calor, com vários exemplos resolvidos, ver seção 15.8 Mecanismos de transferência de calor.

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Capítulo 4Primeira Lei da Termodinâmica

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Capítulo 4Primeira Lei da Termodinâmica

Ao final deste Capítulo você deverá compreender os con-ceitos relacionados à primeira lei da termodinâmica, assim como identificar e caracterizar os processos termodinâmi-cos. Também deverá interpretar e representar diagramas termodinâmicos e aplicar a definição de gases ideais na resolução de problemas e questões.

4.1 IntroduçãoA primeira lei da termodinâmica trata de um princípio fundamen-tal em física: a conservação de energia. No entanto, como os pro-cessos termodinâmicos, além do trabalho mecânico, também envol-vem trocas de calor, esse princípio foi ampliado e foi introduzido o conceito de energia interna de um sistema. A energia interna será representada pela letra U .

Essa lei de conservação de energia é considerada como o exemplo mais claro de descoberta simultânea, sendo anun-ciada por quatro cientistas europeus entre 1842 e 1847: Mayer, Joule, Colding e Helmholtz. Além desses, muitos outros, norteados pelos estudos de motores térmicos, con-tribuíram para que as ideias de conversão entre energia me-cânica e térmica fossem amadurecidas. O fato é que esses cientistas, aparentemente, sem terem conhecimento uns dos outros, apresentaram ideias com o mesmo eixo unificador centrado na conservação de energia. Para mais detalhes, ver sugestão de leitura no final deste Capítulo.

Da mesma forma como acontece para a energia potencial gravitacional de um corpo, a variação da energia interna ( )f iU U U∆ = − depende apenas dos estados inicial e final dessa energia. Como veremos neste Capítulo, a primeira lei da termodinâmica nos dá uma relação para en-

A energia interna de um sistema pode ser

entendida como a soma da energia cinética de

todas as partículas que constituem o sistema

somada com a sua energia potencial total, devido à interação entre elas.

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contrar ∆U a partir do calor transferido e do trabalho realizado. Com isso é possível definir um valor específico de U para um estado de re-ferência e dessa forma encontrar a energia em qualquer outro estado.

O estado termodinâmico de um fluido homogêneo (líquido ou gás) é descrito pela sua pressão ( )P , volume ( )V e temperatura ( )T , sendo que ele fica inteiramente determinado por um par dessas variáveis: ( )PV , ( )PT ou ( )VT , ficando assim determinada a temperatura, vo-lume e pressão, respectivamente.

Um sistema termodinâmico é caracterizado por ser capaz de reali-zar trocas de energia com sua vizinhança, ou seja, ele interage com o meio ambiente em sua volta. Isso pode ocorrer através de transfe-rência de calor ou realização de trabalho.

Neste Capítulo, iremos abordar a primeira lei da termodinâmica, dis-cutir alguns processos termodinâmicos a partir da primeira lei e apli-car isso em situações práticas. Esse estudo é importantíssimo para o entendimento de máquinas térmicas, como será visto mais adiante.

4.2 Equivalente mecânico de caloriaA relação entre energia mecânica e calor foi estabelecida por Joule em meados do século XIX, estudando o aquecimento da água quan-do a mesma era mexida por um agitador, como ilustrado na figura 4.1 a seguir. Ele utilizou um recipiente contendo água e constituído de paredes adiabáticas, e o movimento das pás era controlado pelo trabalho de subida e descida das massas conectadas ao eixo de giro, permitindo dessa forma calcular o trabalho realizado pelas pás.

m2

m1

Figura 4.1 – Esboço do esquema utilizado por Joule para determinar o equivalente mecânico de caloria. Consiste de um recipiente com paredes adiabáticas

contendo água, constituído de pás giratórias para agitar a água.

As paredes adiabáticas não permitem troca de calor com o meio externo, constituindo um sistema termicamente isolado.

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Joule verificou que o aumento da temperatura era proporcional ao trabalho realizado, sendo que eram necessários 4,186 Joules para au-mentar a temperatura de 1,0 grama de água de 14,5°C para 15,5°C , o que equivale a 1,0 caloria , então estabeleceu-se a relação:

1,0 cal 4,186 J.= (4.1)

Além disso, Joule mostrou por métodos diferentes que a mesma quantidade de trabalho era necessária para ter o mesmo efeito na temperatura. Um outro método foi utilizar uma resistência elétri-ca para aquecer a água (é isso que acontece num chuveiro elétrico). Nesse caso, o gerador de corrente que alimenta a resistência é que realiza o trabalho sobre o sistema.

No Sistema Internacional de medidas (SI) adota-se o Joule como uni-dade básica de energia, inclusive para o calor.

Vamos estudar agora algumas formas de transferência de energia entre um sistema e sua vizinhança, e como isso interfere na energia interna desse sistema.

4.3 Trabalho adiabáticoVamos considerar um gás em equilíbrio termodinâmico num reci-piente de paredes adiabáticas com um pistão móvel. Esse gás é des-crito pela sua pressão inicial ( )iP e seu volume inicial ( )iV . Quando é realizado um trabalho sobre o sistema, que pode ser através da colocação de um corpo de massa m sobre o pistão, o sistema tende para uma nova posição final de equilíbrio com fP e fV (ver figura 4.2 a seguir).

É importante lembrar que as leis da termodinâmica podem ser aplicadas apenas nas situações de equilíbrio termodi-nâmico, portanto os parâmetros do estado final podem ser considerados apenas após esse estado ter atingido o equilí-brio. Sabemos que isso não ocorre durante o deslocamento do pistão pela ação da força de contato do corpo com o pis-tão, onde ocorrem movimentos turbulentos no gás, portanto esses estados intermediários não são de equilíbrio.

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Mais adiante veremos que a condição de equilíbrio dos esta-dos intermediários é necessária para que se possa obter uma curva num diagrama , tornando o processo reversível.

Paredesadiabáticas

Pi , Vi

m

Pf , Vf

BA

Figura 4.2 – Ilustração de uma compressão adiabática de um gás através da colocação de um corpo de massa m sobre um pistão móvel:

(a) estado de equilíbrio inicial, antes de colocar a massa, descrito por iP e iV , e (b) estado de equilíbrio final, depois de colocada a massa, descrito por fP e fV .

Na nova configuração de equilíbrio ( ,f fP V ), percebemos que o vo-lume foi reduzido e com isso a pressão interna deve ter aumentado. Diz-se que nesse processo foi realizado um trabalho adiabático so-bre o sistema, pois não houve troca de calor. Esse trabalho, por sua vez, produz um aumento da energia interna do sistema, que reflete num aumento da temperatura do gás, pelo fato de as paredes não permitirem fuga de calor (como no caso do experimento de Joule).

Da mesma forma, se o corpo de massa m fosse removido no exem-plo (b) da figura 4.2, o gás iria expandir-se até uma nova posição de equilíbrio, realizando trabalho sobre o pistão e resultando no seu movimento. Nesse caso, diria-se que o sistema realizou trabalho, causando uma diminuição da energia interna do gás. A partir des-sas considerações, podemos definir:

,i fU W →∆ = − (4.2)

ou seja, em um sistema termicamente isolado a variação da energia interna U∆ é igual ao trabalho realizado do estado inicial ao estado final ( i fW → ). O sinal negativo aparece por definição histórica do es-

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tudo de máquinas térmicas onde padronizou-se que o trabalho é po-sitivo ( 0W > ) quando o mesmo é realizado pelo sistema, e negativo ( 0W < ) quando é realizado sobre o sistema. Assim, como o trabalho realizado pelo sistema diminui a energia interna, coloca-se o sinal negativo na equação 4.2.

Essa padronização histórica está associada à ideia de traba-lho útil (que pode ser aproveitado) no estudo de máquinas térmicas. Por exemplo, numa máquina a vapor, como uma locomotiva, quando a água é transformada em vapor pela absorção de calor da caldeira o volume aumenta e, com isso, empurra o pistão realizando o trabalho necessário para mo-ver a alavanca que faz girar as rodas. Ou seja, a expansão do sistema gerou trabalho, e esse trabalho então foi consi-derado positivo. Mais adiante veremos que a mesma ideia é utilizada para definir como positiva uma quantidade de calor que é transferida a um sistema termodinâmico, pois essa energia transferida também pode ser convertida em trabalho útil.

A força que as moléculas do gás exercem sobre as paredes de um re-cipiente está relacionada com as colisões momentâneas das molécu-las com a parede. O trabalho na mecânica, por sua vez, está associa-do com um deslocamento durante a aplicação de uma força. Assim, o trabalho é identificado apenas quando ocorre um deslocamento da parede, que é observado no caso do pistão do exemplo anterior.

Considerando A como sendo a área do pistão, a força F sobre ele pode ser expressa por:

F PA= (4.3)

onde P é a pressão que o gás exerce sobre o pistão. Dessa forma, para um deslocamento infinitesimal dx, o trabalho relativo a essa força é:

,

mas Adx dV= , que representa uma pequena variação de volume, en-tão:

(4.4)

No próximo Capítulo, sobre a teoria cinética dos gases, veremos como a pressão é definida do ponto de vista

microscópico.

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A notação é utilizada para identificar que representa apenas uma quantidade infinitesimal de trabalho, não sen-do uma diferencial exata, ou seja, a partir da integração da equação 4.4 obtemos apenas uma quantidade de trabalho realizado entre o estado inicial e final, definido como na equação 4.5, mas jamais poderemos determinar quanto é o trabalho inicial ( ) ou o trabalho final ( ). Na verdade, assim como o calor, o trabalho não é uma propriedade do sistema. Como veremos mais adiante, isso está relacionado com o fato que o trabalho não é uma função de estado ter-modinâmico e, portanto, o trabalho realizado depende do tipo de processo (se adiabático, se isotérmico etc.).

Dessa forma, para uma variação finita de iV até fV , o trabalho é dado pela integral da equação 4.4 nestes limites:

( ) .f

i

V

i fV

W P V dV→ = ∫ (4.5)

Em geral, a pressão do sistema pode variar durante a variação do volume, portanto para calcular o trabalho a partir da equação 4.5 é necessário conhecer o caminho entre os estados iV e fV , ou seja, conhecer a função .

4.3.1 Análise gráficaVamos considerar um processo termodinâmico descrito num diagrama PV, que ocorre de um estado inicial (1) para um estado final (2). No gráfico da figura 4.3 a seguir estão ilustrados três caminhos em que o sistema pode evoluir de 1 para 2. Como a temperatura fica definida por cada ponto do par ( )PV do diagrama, cada caminho define como a temperatura varia ao longo do processo.

O caminho ao longo da curva b (1 2)b pode representar uma isoterma (onde a temperatura é constante); os cami-nhos 1 2a e 1 2c são compostos de trechos isocóricos (volu-me constante) e isobáricos (pressão constante). A partir do gráfico da figura 4.3, fica claro que o trabalho realizado nes-

Veremos mais adiante que essa função só pode ser obtida se o processo de compressão e expansão realizado pelo gás for reversível.

P

V

c

b

a 2

1P1

P2

V2V1

Figura 4.3 – Representação de um proces-so termodinâmico num diagrama PV, onde estão ilustrados três caminhos para ir do estado 1 para o estado 2.

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se processo depende do caminho apresentado no gráfico e é obtido pela equação 4.5, representando a área compreendida entre a curva

( )P P V= e o eixo V , de 1V até 2V . Por exemplo: a área hachurada na figura 4.3 representa o trabalho para ir de 1 até 2 pelo caminho 1 2b . Podemos ver que nos trechos 1c e 2a , onde a pressão é constante, da equação 4.5 temos:

1 1 2 1

2 2 2 1

( )( ),

c

a

W P V VW P V V

= −= −

Essas equações também representam as áreas abaixo das curvas para

1P e 2P constantes, entre 1V e 2V , respectivamente. Como 1 2P P> , ve-mos que 1 2c aW W→ →> , confirmando que o trabalho é diferente de acor-do com o caminho tomado por quem estiver analisando o processo. Nos trechos 1a e 2c o trabalho é nulo, pois o volume é constante.

No caso de um processo cíclico, onde o sistema volta ao estado ini-cial, o trabalho total é descrito pela área contida dentro da curva fechada, como mostra a figura 4.4 a seguir. Num processo cíclico, a variação total da energia interna é nula ( 0U∆ = ). Isso vem do fato de que a energia interna depende apenas dos estados inicial e fi-nal, e não do caminho descrito no gráfico, portanto o trabalho total (quando diferente de zero) está relacionado com uma quantidade de calor transferida no processo.

P

V

2

1P1

P2

V2V1

Figura 4.4 – Representação de um processo termodinâmico cíclico num diagrama PV. A área hachurada dentro da curva indica o trabalho total realizado nesse processo.

De acordo com a ilustração da figura 4.4, podemos ver que o traba-lho total será negativo se o ciclo ocorrer no sentido anti-horário, pois no trecho ( 2 1→ ) da parte superior do ciclo o trabalho é maior em módulo que no trecho (1 2→ ), porém negativo porque o volume di-

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minui. Se o ciclo ocorrer no sentido horário, o trabalho total será po-sitivo. Nesses processos é correto escrever a equação 4.5 na forma:

( ) ,cicloW P V dV= ∫ ( ) ,cicloW P V dV= ∫ (4.6)

onde o símbolo representa uma integral num circuito fechado.

4.4 Transferência de calorVamos considerar agora que a passagem do estado de equilíbrio inicial para o final de um recipiente contendo gás não ocorre pela realização de trabalho adiabático, mas pela transferência de calor. Nesse caso, uma das paredes do recipiente necessariamente precisa ser diatérmica (que permite a troca de calor) e estar em contato com um reservatório térmico. Assim, se não houver realização de traba-lho, a variação da energia interna depende apenas da quantidade de calor transferida:

.U Q∆ = (4.7)

Por definição, padronizou-se que a quantidade de calor é positiva ( 0Q > ) quando é fornecido calor ao sistema (aumentando a ener-gia interna) e negativa ( 0Q < ) quando é retirado calor do sistema. Como vimos anteriormente, isso se deve ao estudo com máquinas térmicas, onde uma quantidade de calor fornecida ao sistema pode ser convertida em trabalho útil.

4.5 Primeira lei da termodinâmicaNo caso mais geral, em que ocorrem transferência de calor e realiza-ção de trabalho, a variação da energia interna depende desses dois processos e é dada por:

.i fU Q W →∆ = − (4.8)

A equação 4.8 representa a forma analítica da primeira lei da termodi-nâmica, que atribui a variação da energia interna U∆ , a qual não pro-vém do trabalho realizado, ao calor transferido ao sistema ou retirado do sistema. A primeira lei pode ser enunciada da seguinte forma:

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“A variação da energia interna de um sistema termodinâ-mico é igual ao calor transferido menos o trabalho realizado entre o sistema e sua vizinhança”.

4.6 Processos reversíveisComo dito anteriormente, para determinar o trabalho através da equação 4.5 é necessário conhecer a função ( )P P V= . Isso só é pos-sível se o processo para levar o sistema do estado inicial ao estado final for reversível, nesse caso ele deve necessariamente ocorrer de forma quase estática. Para um processo ser quase estático, ele deve obedecer duas condições:

Ocorrer muito lentamente:1) essa condição é necessária para se ter uma sucessão infinitesimal de estados de equilíbrio termo-dinâmico, com P e V bem definidos.

O atrito entre as partes envolvidas no processo ser despre-2) zível: essa condição é necessária para não haver dissipação de energia por atrito.

Podemos imaginar uma situação prática desse panorama conside-rando o caso da figura 4.2 apresentada anteriormente, se substituir-mos o corpo de massa m por uma quantidade de areia de igual massa. Se colocarmos apenas um grão de areia, o sistema tende a buscar uma nova condição de equilíbrio, e após o equilíbrio ser atin-gido podemos determinar P e V . Após isso, colocamos outro grão de areia e assim por diante, lembrando que entre a colocação de um grão de areia e outro esperamos o sistema atingir o equilíbrio termodinâmico para termos P e V bem definidos. Se a cada grão colocado medirmos a pressão e o volume, conheceremos os pontos que ligam os estados inicial e final, e seremos capazes de desenhar a curva ( )P P V= . Esse procedimento permite determinar o caminho que leva do estado inicial ao estado final, tornando assim possível a utilização da equação 4.5 para cálculo do trabalho realizado.

Nos processos irreversíveis apenas os estados de equilíbrio inicial e final são conhecidos (como no exemplo da figura 4.2, quando o corpo de massa m é colocado sobre o pistão). Nesse caso, os estados inter-mediários são turbulentos e estão fora do equilíbrio termodinâmico.

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Então não é possível determinar as variáveis termodinâmicas P e V , o que não nos permite conhecer o caminho que leva do estado inicial ao estado final. Sabemos apenas que o trabalho realizado equivale à variação da energia interna, mas não podemos calculá-lo diretamen-te com a equação 4.5 porque a função ( )P P V= não é conhecida.

A transferência de calor num processo reversível obedece às mes-mas condições descritas anteriormente para os processos irrever-síveis, mas agora é a quantidade de calor que deve ser transferida lentamente, em que a transformação do estado inicial ao final deve passar por uma sucessão densa de estados de equilíbrio termodi-nâmico intermediários, permitindo a determinação das variáveis termodinâmicas durante o processo. Nesse caso, podemos utilizar a expressão estudada no Capítulo anterior para determinação da quantidade de calor:

(4.9)

onde integrando temos:

( ) ,f

i

T

T

Q C T dT= ∫ (4.10)

em que C mc= é a capacidade térmica. Lembramos que o calor es-pecífico c varia de acordo com o processo: Vc para volume constan-te e Pc para pressão constante, portanto a quantidade de calor trans-ferida Q (necessária para levar o sistema do estado inicial ao estado final) também depende do caminho do processo escolhido, sendo necessário conhecer a função ( )C C T= para fazer a integração. Da mesma forma como discutido para o trabalho infinitesimal , também representa apenas uma quantidade infinitesimal de calor transferida, não constituindo uma diferencial exata, ou seja, através da equação 4.10 não é possível determinar o calor inicial ou final de um sistema, apenas a quantidade de calor transferida.

É interessante notar que a energia interna de um deter-minado estado termodinâmico de equilíbrio não pode ser identificada nem com , nem com . É impossível dizer qual proporção de representa trabalho ou calor. Isso vem do fato que e não são funções de estado termodinâmico. Os termos calor e trabalho referem-se sempre a trocas ou fluxos de energia entre um sistema e sua vizinhança.

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A forma infinitesimal da primeira lei da termodinâmica para um número de moles fixo é dada por:

(4.11)

Exemplo 1. Um sistema termodinâmico é constituído de 3,0 Kg de água a 80°C . Mediante agitação da água, realiza-se 325 10 J× de tra-balho sobre o sistema e ao mesmo tempo removem-se 315 10 cal× de calor. Sendo assim, determine:

A variação da energia interna a) U∆ ;

A temperatura final do sistema.b)

Solução:

Inicialmente precisamos converter a unidade de calor para a) Joule através da relação apresentada na equação 4.1:

3 3(15 10 )(4,186 J) 62,8 10 J.Q = × = ×

Agora utilizamos a equação 4.8 para determinar • U∆ , lembrando da convenção de sinais: trabalho realizado sobre o sistema ( 0W < ) e calor retirado do sistema ( 0Q < ), então:

3 3 362,8 10 J 25 10 J 37,8 10 J.U Q W∆ = − = − × + × = − ×

Percebemos que a variação da energia interna é negativa, isso quer •dizer que foi removida mais energia em forma de calor que adicio-nada em forma de trabalho.

Para encontrar a temperatura final b) fT precisamos saber a variação de temperatura f iT T T∆ = − , visto que a temperatura inicial do sistema é conhecida ( 80 CiT = ° ). Para isso, utilizamos a equação 4.9, que relaciona uma quantidade de calor transferida com uma variação de temperatura: ,Q mc T∆ = ∆ sendo que o calor especí-fico da água é igual a 34,186 10 J/Kg C× ⋅° , então:

3

3

( 37,8 10 J) 3,0 C.(3,0Kg)(4,186 10 J/Kg C)

QTmc∆ − ×

∆ = = = − °× ⋅°

Como f iT T T= ∆ + , temos que:

3 80 C 77 C.fT C= − ° + ° = °

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4.7 Aplicação em processos termodinâmicos

Nesta Seção, vamos estudar alguns casos específicos de processos termodinâmicos que ocorrem em várias situações práticas. A iden-tificação do processo envolvido é o primeiro passo na resolução de problemas que envolvem a primeira lei da termodinâmica.

4.7.1 Processo adiabáticoNesse processo não existe troca de calor com o meio externo, ou seja, 0Q = . Isso usualmente é conseguido isolando-se termicamente o sistema num recipiente de paredes adiabáticas. Então a equação 4.8 fica assim redefinida:

.i fU W →∆ = − (4.12)

A variação da energia interna está relacionada apenas com a rea-lização de trabalho (nesse caso, chamado de trabalho adiabático). Como vimos na Seção 4.2, no caso de um gás confinado num reci-piente com paredes adiabáticas e um pistão móvel, quando é reali-zado trabalho sobre o sistema tem-se que 0U∆ > e a energia interna aumenta. Quando o sistema realiza trabalho, tem-se que 0U∆ < e a energia interna diminui. Geralmente esse processo resulta também na variação da temperatura.

Processos termodinâmicos suficientemente rápidos, em que não há tempo para ocorrer uma troca significativa de calor, também podem ser considerados adiabáticos. Por exemplo: a expansão de vapor numa máquina térmica, o aquecimento do ar quando bombeamos um pneu de bicicleta etc.

4.7.2 Processo isocóricoNesse processo o volume não varia. Em geral, isso significa que o sis-tema não realizou trabalho com a sua vizinhança, ou seja, 0i fW → = . Logo, pela primeira lei temos:

.U Q∆ = (4.13)

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Temos então que a variação da energia interna depende apenas da transferência de calor, sendo que U aumenta ( 0U∆ > ) quando é for-necido calor ao sistema e U diminui ( 0U∆ < ) quando é retirado calor do sistema. Um exemplo disso é o aquecimento de água em um recipiente cujo volume é mantido fixo.

É importante notar que a realização de trabalho não está vinculada apenas à variação de volume. É possível realizar trabalho num sis-tema por agitação, como foi demonstrado no experimento de Joule, na Seção 4.1 deste livro. Nesse exemplo, apesar de se tratar de um processo isocórico, temos que 0i fW → ≠ .

Uma outra situação interessante de análise é a expansão livre de um gás. A expansão livre de um gás é um experimento em que um recipiente contendo gás está ligado por uma válvula com outro reci-piente mantido a vácuo. Quando a válvula é aberta, o gás se expan-de livremente para o recipiente com vácuo e, como o ar não empurra nenhuma parede no seu movimento, o trabalho realizado pelo gás é nulo, apesar de variar o volume. Esse não é um processo isocórico, pois o volume do gás aumenta, entretanto o gás não realiza trabalho porque não empurra uma parede.

4.7.3 Processo isobáricoA pressão é mantida constante nesse processo. Nesse caso, em geral nenhuma das grandezas U∆ , Q e i fW → é nula, entretanto o cálculo do trabalho é simples, pois a pressão sai da integral na equação 4.5, resultando na relação:

( )i f f iW P V V→ = − . (4.14)

Isso ocorre, por exemplo, no processo de ebulição da água numa pa-nela aberta, onde a pressão atmosférica é constante ( 1,0atmatmP = ). Nesse exemplo, a variação da energia interna é dada por:

( ),V atm vapor águaU mL P V V∆ = − −

onde m é a massa de água e VL o calor latente de vaporização da água. Essa variação de energia interna é interpretada como a ener-gia necessária para romper as forças de atração das moléculas no

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estado líquido, na transição para o estado gasoso. Para assimilar es-ses princípios, sugerimos que você resolva o problema 2 da lista no final deste Capítulo.

4.7.4 Processo isotérmicoNesse processo a temperatura é que permanece constante. Para isso, é necessário que a transferência de energia ocorra muito lentamente, permitindo que o sistema permaneça em equilíbrio térmico. Num processo isotérmico, em geral U∆ , Q e i fW → não são nulos.

Um caso especial ocorre com um gás ideal, para o qual a energia interna depende apenas da temperatura, sem ser influenciada pelo volume e pela pressão. Dessa forma, 0U∆ = num processo isotérmi-co com um gás ideal, logo i fQ W →= . Ou seja, qualquer energia que entra no sistema em forma de calor sai novamente em virtude do trabalho realizado por ele.

4.7.5 Processo cíclicoNum processo cíclico o sistema volta sempre para o seu estado ini-cial. Como a variação da energia interna depende apenas dos esta-dos inicial e final, então 0U∆ = num ciclo completo, logo:

,i fQ W →= (4.15)

ou seja, a transferência de calor é igual ao trabalho realizado. Esse resul-tado se aplica no estudo de máquinas térmicas que operam em ciclos repetidos. Esse é o objeto de estudo da segunda lei da termodinâmica.

Uma outra situação bem particular, em que 0U∆ = , ocorre para um sistema isolado, que não permite nem troca de calor nem realização de trabalho, ou seja, 0i fQ W →= = , resultando que a energia interna de um sistema isolado permanece constante.

Exemplo 2. Um recipiente termicamente isolado, cheio de água, cai de uma altura h do solo. Considerando que a colisão seja perfeita-mente inelástica, onde toda a energia mecânica se transforma em energia interna da água, qual deve ser a altura para que a tempera-tura da água aumente em 1,0°C ?

Os gases ideais serão estudados na próxima Seção.

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Solução: A variação da energia mecânica quando um corpo cai de uma altura h é dada por mgh , em que g é a aceleração da gravidade e m a massa do corpo. Se a energia mecânica for totalmente conver-tida em energia interna e sendo o sistema termicamente isolado, essa queda acarretará num aumento de temperatura da água equivalente a uma transferência de energia térmica Q mc T= ∆ , então:

.mgh mc T= ∆

Para se obter um aumento de temperatura 1,0°C 1,0KT∆ = = , te-mos que a altura é:

3(4,18 10 J/Kg K)(1,0K) 426,5metros.9,8 N/Kg

c Thg∆ × ⋅

= = =

É interessante notar que a altura não depende da quantidade de água, ou seja, da massa m .

Exemplo 3. A partir do diagrama PV da figura 4.5 a seguir, preen-cha as lacunas da tabela 4.1.

b

c

a

P (N/m2)

V (m3)

2×105

1×105

5×10−3 10×10−3

Figura 4.5 – Figura indicada no exemplo 3.

Etapa

ab 800

bc

ca -100

abca

Tabela 4.1

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Solução: Nesta resolução utilizaremos a primeira lei da termodinâ-mica, conforme a equação 4.8. A sugestão é inicialmente acrescen-tar na tabela os valores das grandezas a partir do conhecimento dos processos termodinâmicos envolvidos em cada etapa, depois realizar os cálculos das etapas conhecidas. É importante sempre acrescentar os valores na tabela, porque ao final o trabalho resume-se a somar linhas e colunas.

É fácil perceber que, na etapa ca , o trabalho 0c aW → = porque se tra-ta de um processo isocórico. Isso quer dizer que 100Jca caQ U= ∆ = − . Além disso, sabemos que num ciclo completo a variação de energia interna é nula, portanto 0abcaU∆ = .

Para determinar o trabalho na etapa ab utilizamos a equação 4.14, pois se trata de um processo isobárico, então:

5 3( ) (1 10 ) (5 10 ) 500J ,a b a b aW P V V −→ = − = × × =

Lembre-se que esse valor representa a área debaixo da curva ab, en-tre aV e bV . Logo, pela primeira lei encontramos:

800J 500J 300J.ab ab a bU Q W →∆ = − = − =

Observando agora, para a última coluna da tabela, que

abca ab bc caU U U U∆ = ∆ + ∆ + ∆ , substituímos os valores conhecidos e obtemos que 200J.bcU∆ = −

O trabalho para o sistema ir de b para c pode ser calculado pela área debaixo da curva entre esses pontos. Percebe-se de antemão que este trabalho deve ser negativo porque o volume diminui, o que represen-ta que o trabalho é realizado sobre o sistema.

( ) ( )( ) 500J 250J 750J.2

c b b cb c b b c

P P V VW P V V→

− −= − + = − − = −

Assim, utilizando novamente a primeira lei podemos encontrar bcQ :

200J 750J 950J.bc bc b cQ U W →= ∆ + = − − = −

Bom, agora basta somar as colunas para encontrar os valores de:

250J,250J.

abca

abca

WQ

= −= −

Dessa maneira, podemos completar a tabela 4.1 com os seguintes valores:

Page 109: Fisica Basica C-II 2edicao

109

Etapa

ab 800 500 300

bc -950 -750 -200

ca -100 0 -100

abca -250 -250 0

Tabela 4.1

4.8 Gás idealAs condições físicas ou o estado termodinâmico de um dado ma-terial são descritos por sua pressão ( P ), seu volume (V ), sua tem-peratura (T ) e sua quantidade (relacionada à massa m ), sendo que, em geral, não podemos introduzir variações em nenhuma dessas grandezas sem afetar as outras. Existem casos em que a relação en-tre essas variáveis é bastante simples, o que torna possível explicitá-la em termos de uma equação matemática, chamada de equação de estado. Quando essa relação é complicada, usualmente utilizam-se gráficos ou tabelas numéricas para facilitar a visualização, mas de qualquer forma a relação entre as variáveis existe. A seguir vamos discutir a equação de estado de um gás ideal, que é muito utilizada para explicar o comportamento termodinâmico dos gases.

O conceito de gás ideal traz a ideia de que esses gases tendem a apresentar a mesma relação entre as variáveis P , V , T e m , em qualquer condição. Esse é um conceito idealizado, que na verdade não existe, mas experimentalmente observou-se que os gases reais seguem uma mesma relação nas seguintes condições:

Quando a densidade é baixa, ou seja, quando a dis-a) tância média entre as moléculas do gás é muito gran-de, nesse caso a energia potencial pode ser despre-zada, pois praticamente não existe interação entre as moléculas.

Quando a média do quadrado da velocidade das mo-b) léculas que constituem o gás é suficientemente alta. Isso ocorre quando a pressão é baixa e a temperatura elevada.

Page 110: Fisica Basica C-II 2edicao

110

O modelo de gás ideal que descreveremos aqui, portanto, é na ver-dade uma boa aproximação para o comportamento de gases reais sob as condições a e b apresentadas acima.

No caso dos gases, é geralmente mais fácil descrevê-los em termos do número de moles n ao invés da massa. Por definição, um mol de qualquer substância pura equivale à quantidade de substância tal que sua massa (em gramas) seja igual à massa molecular M. Nas Condições Normais de Temperatura e Pressão (CNTP), que corres-pondem a 273,15K 0 CT = = ° e 51,0atm 1,013 10 PaP = = × , a Lei de Avogadro leva ao resultado importante que 1,0mol de qualquer gás ocupa sempre o mesmo volume 22,415 litrosV = ; além dis-so, 1,0mol de qualquer substância tem sempre o mesmo número de moléculas, dado pelo chamado Número de Avogadro, ou seja,

230 6,023 10 moléculas/molN = × .

Através de experimentos com vários gases diferentes, que foram inseridos em cilindros onde era possível controlar P , V e T , man-tendo-se fixo o número de moles n para uma densidade suficiente-mente baixa de moléculas, observou-se que:

Quando a temperatura era mantida constante, a pressão va-a) riava inversamente com o volume . Daí tiramos que

.PV cte= ( cte quer dizer constante), conhecida como Lei de Boyle.

Quando a pressão era mantida constante, o volume varia-b) va diretamente com a temperatura ( )V T∝ . Daí tiramos que

/V T cte= , conhecida como Lei de Charles e Gay-Lussac.

Juntando-se as observações a e b anteriores podemos escrever uma única relação entre P , V e T , para o caso de n fixo:

,f fi i

i f

P VPVPV cteT T T

= → = (4.16)

Aqui os índices i e f referem-se aos estados inicial e final do gás. Como o volume ocupado por um gás, com P e T , é proporcional a sua massa (que está relacionada com o número de moles), então a constante cte na equação 4.16 deve ser proporcional a n , ou seja:

.PV nRT= (4.17)

A principal contribuição de Avogadro foi perceber que volumes iguais de todos os gases, nas mesmas condições de temperatura e pressão, contêm o mesmo número de moléculas.

Page 111: Fisica Basica C-II 2edicao

111

A princípio R é uma constante a ser determinada para cada gás, mas na condição de densidade baixa observou-se que ela tem o mesmo valor para todos os gases. Dessa maneira a equação 4.17 é chamada de equação de estado dos gases ideais, em que R é a constante uni-versal dos gases ideais, dada por 8,314 J/mol KR = ⋅ .

Na resolução de problemas através da equação 4.17 é neces-sário utilizar as unidades do Sistema Internacional de medi-das (SI), para o qual foi obtido o valor de 8,314 J/mol KR = ⋅ . No SI a temperatura é dada na escala Kelvin, o volume é dado em 3m (lembrando que 31,0m 1000 litros= ) e a pres-são é dada em Pascal, 21,0Pa 1,0 N/m= (lembrando que

51,0atm 1,013 10 Pa= × ).

Exemplo 4. Uma amostra de 100g de 2CO ocupa o volume de 55 litros a 1,0atm de pressão. Sendo assim:

Qual a temperatura da amostra? a)

Se o volume for aumentado para b) 80 litros e a temperatura for mantida constante, qual a nova pressão? Dados: a massa mole-cular do 2CO é 44g/molM ≈ .

Solução:

Inicialmente precisamos encontrar o número de moles a) n da amos-tra, que pode ser determinado a partir da massa m da amostra e da sua massa molecular M através da relação:

100g 2,27 moles.44g/mol

mnM

= = =

Agora podemos determinar a temperatura através da equa-ção 4.17, onde precisamos lembrar de transformar o volu-me em 3m ( 3 355 litros 55 10 m−= × ) e a pressão em Pascal ( 51,0atm 1,013 10 Pa= × ), portanto:

5 3 3(1,013 10 Pa) (55 10 m ) 295,2K 22 C.(2,27 moles) (8,314 J/mol K)

PVTnR

−× ×= = = ≈ °

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112

Para encontrar a nova pressão pelo aumento do volume de b) 55 litros para 80 litros com a temperatura permanecendo constante, po-demos usar a relação PV cte= :

(1,0atm) (55 litros) (80 litros)

0,688atm.i i f f f

f

P V P V PP

= = = ⋅

=

4.8.1 Energia interna de um gás idealVamos realizar aqui uma discussão qualitativa para chegar a con-clusões sobre a energia interna de um gás ideal. Para isso, conside-remos a expansão livre de um gás. Nesse processo o gás é mantido num recipiente com um determinado volume conectado por uma válvula a outro recipiente no qual foi produzido vácuo. Considere-mos ainda que esse sistema está isolado termicamente através de paredes adiabáticas. Quando a válvula é aberta, o gás se expande livremente, ocupando assim um volume maior, portanto percebe-se uma variação do volume e da pressão do gás. Como o gás não rea-liza trabalho porque não empurra nenhuma parede e como não há troca de calor com o meio externo, pela primeira lei da termodinâ-mica a variação da energia total do gás é nula ( 0U∆ = ). Se supuser-mos que a temperatura do gás se manteve constante nesse processo, é possível afirmar que a energia interna depende unicamente de T , e não tem dependência alguma com P e V . Mas isso é verdade?

É importante perceber que as considerações acima são válidas para qualquer gás, seja ele ideal ou não, pois se baseiam unicamente na pri-meira lei da termodinâmica. Medidas realizadas com o experimen-to de expansão livre de um gás trouxeram a resposta para a questão acima e comprovaram que, para gases reais, ocorre uma pequena diminuição da temperatura, apesar de a energia interna permanecer constante. Nesse caso, a energia interna depende também de P e V , entretanto a variação da temperatura cai para zero quando a den-sidade do gás for pequena, ou seja, para um gás ideal. Assim, para gases ideais, a energia interna depende unicamente da temperatura ( ( )U U T= ). A combinação dessa propriedade com a equação 4.17 de estado dos gases ideais constitui o modelo de um gás ideal.

No Capítulo seguinte, que trata da Teoria Cinética dos Gases, será apresentada uma dedução um pouco mais rigorosa.

Page 113: Fisica Basica C-II 2edicao

113

4.8.2 Capacidade térmica de um gás idealNo Capítulo anterior discutimos que as capacidades térmicas para gases podem ser bem diferentes, dependendo de como a variação de temperatura ocorre, a pressão constante ou a volume constante, o que está relacionado com os calores específicos Pc e Vc . Vamos dis-cutir essas diferenças através dos dois caminhos ( a e b ) pelos quais é possível passar da isoterma 1T para a isoterma 2T , onde 2 1T T> , como ilustrado na figura 4.6 a seguir. O caminho a representa um processo isocórico (V constante) enquanto o caminho b representa um processo isobárico (P constante).

As isotermas são obtidas considerando-se a temperatura

constante na equação 4.17, de onde obtemos que .

É fácil ver que as curvas e na figura 4.6 representam

temperaturas constantes, onde , e são obtidas quando

representamos a função num diagrama .

b

a

P

V V2

T1

V1

P1

P2

T2

Figura 4.6 – Representação esquemática de duas isotermas (T1 e T2) num diagrama PV, onde a passagem de T1 para T2 pode ocorrer por processo isocórico (a) ou isobárico (b).

Sendo MC Mc= a capacidade térmica molar de um gás ideal, temos que a quantidade de calor necessária para elevar a temperatura de n moles do gás de 1T para 2T é dada por:

(4.18)

Como depende do caminho pelo qual se faz a transferência de calor, o qual está relacionado com o fato das capacidades térmicas

Page 114: Fisica Basica C-II 2edicao

114

serem diferentes se o processo ocorre a volume constante ou a pres-são constante, então definimos:

(volume constante), e

(pressão constante).

Agora vamos aplicar a primeira lei da termodinâmica aos caminhos a e b da figura 4.6:

O caminho • a ocorre a volume constante, isso significa que não existe realização de trabalho, então pela primeira lei temos:

(4.19)

O caminho • b ocorre a pressão constante, percebemos então que além da transferência de calor existe também realização de trabalho, que é dado pela equação 4.4: , logo:

(4.20)

sendo que através da equação 4.14 de estado dos gases ide-ais obtemos: PdV nRdT= , pois a pressão é constante. Como discutido anteriormente, a variação da energia interna de um gás ideal depende apenas da variação da temperatura, por-tanto podemos igualar as equações (4.19) e (4.20), pois em am-bos os caminhos a variação de temperatura é a mesma, logo

a bdU dU= :

,MV MPnC dT nC dT nRdT= −

Dividindo ambos os lados por ndT , resulta que:

.MP MVC C R= + (4.21)

A equação 4.21 mostra que para gases ideais a capacidade térmica molar a pressão constante é sempre maior que a capacidade térmi-ca a volume constante. Isso vem do fato que no processo isobárico existe também realização de trabalho. Além disso, a diferença entre as duas capacidades térmicas é dada pela constante universal dos gases ideais ( R ).

Page 115: Fisica Basica C-II 2edicao

115

Na tabela 4.2 a seguir apresentamos os valores de MPC e MVC medi-dos para alguns gases à baixa densidade. De acordo com o modelo cinético teórico (o qual será visto em detalhes no próximo Capítulo)

temos que 32MVC R= , resultando que

52MPC R= e, por conseguinte,

que 5 1,673

MP

MV

CC

= = = . Esse modelo considera que as moléculas do

gás possuem apenas energia cinética de translação, o que é satis-feito muito bem para gases monoatômicos. Para gases constituídos de moléculas com mais de um átomo, outros efeitos precisam ser considerados, como a rotação e vibração das moléculas, resultando num aumento da energia interna do gás. Para gases diatômicos te-

mos que: 5 7 1,402 5MVC R = → = = , o que também concorda com os

valores medidos. Portanto, vemos que o modelo de gás ideal apre-senta boa concordância para gases monoatômicos e diatômicos, mas começa a falhar para gases mais complexos.

Tipo de gás Gás ( ) ( ) = R

( )

MonoatômicoHe 20,78 12,47 8,31 1,67

Ar 20,78 12,47 8,31 1,67

Diatômico

H2 28,74 20,42 8,32 1,40

N2 29,07 20,76 8,31 1,40

O2 29,17 20,85 8,31 1,40

Poliatômico

CO2 36,94 28,46 8,48 1,30

SO2 40,37 31,39 8,98 1,29

H2S 34,60 25,95 8,65 1,33

Tabela 4.2 – Valores experimentais de CMP e CMV para alguns gases com densidade pequena.

A constante adimensional MP

MV

CC

= é sempre maior que 1 para ga-

ses; essa grandeza desempenha um papel importante no processo adiabático de um gás ideal, o que será visto na seção 4.7.3 a seguir.

Vamos analisar uma expansão isotérmica de um gás ideal, por exem-plo: de 1V até 2V ao longo da curva 1T na figura 4.6 apresentada an-

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116

teriormente. Como a temperatura não varia ao longo da isoterma, a energia interna permanece constante ( 0U∆ = ), pois ( )U U T= , então pela primeira lei temos que i fQ W →= , ou seja, a quantidade de calor transferida é igual ao trabalho realizado, que é determinado por:

2 2

1 1

1 21 ,

V V

V V

W PdV nRT dVV→ = =∫ ∫

21 2 2 1

1

[ln ln ] ln .VW nRT V V nRTV→

= − =

(4.22)

Pela equação 4.22 vemos que, quando 2 1V V> , o logaritmo neperia-

no de 2

1

VV

é positivo, o que significa que o sistema realiza trabalho

( 1 2 0W → > ) e quando 2 1V V< o trabalho é negativo, como era de se

esperar.

4.8.3 Processo adiabático de um gás idealNum processo adiabático sabemos que não há troca de calor, por-tanto . Assim, a primeira lei nos dá que:

mas vimos pela equação 4.19 que a variação da energia interna de um gás ideal pode ser escrita como:

,MVdU nC dT= (4.23)

É importante lembrar que a energia interna depende apenas da temperatura, então a variação da energia interna depen-de unicamente da variação da temperatura em qualquer tipo de processo. Dessa forma, se a equação 4.19 for válida para um gás ideal em um determinado processo (nesse caso, iso-córico), ela será válida para um gás ideal em qualquer outro tipo de processo com o mesmo .

logo,

.MVnC dT PdV= − (4.24)

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117

Através da diferenciação da equação 4.14 de estado dos gases ideais, obtemos que:

,PdV VdP nRdT+ =

substituindo na equação 4.24:

,MVVdP PdV nRdT nC dT nRdT= − + = +

( ) .MV MPVdP n C R dT nC dT= + = (4.25)

Isolando-se dT na equação 4.24 e substituindo-a na equação 4.25, tem-se:

,MP

MV

CVdP PdV PdVC

= − = −

Podemos reescrever essa equação da seguinte forma:

.dP dVP V

= − (4.26)

Integrando-se ambos os lados da equação 4.26 entre os estados ini-ciais ( ,i iP V ) e os estados finais ( ,f fP V ), temos:

ln ln ln ,f f f

i i i

P V VP V V

= − =

logo, aplicando-se a operação exponencial em ambos os lados, ob-temos:

.f if f i i

i f

P V P V PVP V

= → =

(4.27)

A equação 4.27 nos diz que PV cte = numa transformação adiabáti-ca de um gás ideal. Uma consequência do fato que 1 > para gases ideais é que, num diagrama PV , as curvas adiabáticas são sempre mais inclinadas que as isotermas, portanto uma expansão adiabá-tica de um gás ideal é sempre acompanhada por uma redução da temperatura, por causa da diminuição da energia interna provocada pelo trabalho realizado pelo sistema. Já numa compressão adiabáti-ca observa-se um aumento da temperatura do gás, devido ao traba-lho realizado sobre ele, aumentando assim a sua energia interna.

Lembrando que, para temperatura constante,

a equação de estado dos gases ideais pode ser escrita

como , o que equivale a ter .

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118

Para obtermos uma relação entre a temperatura e o volume num processo adiabático de um gás ideal, basta substituirmos a pressão na equação 4.27, utilizando-se a equação de estado dos gases ideais:

nRTPV

= . Baseado nisso, faça as contas e mostre que:

1 1 1 .f f i iT V TV TV cte − − −= → = (4.28)

Vamos determinar agora o trabalho realizado por um gás num pro-cesso adiabático, para variar a temperatura de um estado inicial até um estado final. Como , temos que . Como pode-mos utilizar a equação 4.23 para dU , temos que:

Integrando essa equação temos: ( ),f i MV f iW nC T T→ = − − , ou seja,

( ).i f MV i fW nC T T→ = − . (4.29)

Dessa forma, sabendo-se o número de moles e as temperaturas ini-cial e final pode-se calcular o trabalho a partir da equação 4.29. Essa equação pode ser reescrita utilizando-se a equação de estado dos gases ideais, para torná-la dependente da pressão e do volume:

PVTnR

= , ou seja, i ii

PVTnR

= e f ff

P VT

nR= , logo:

( ),MVi f i i f f

CW PV P VR→ = −(PiVi - Pf Vf ),

Observe, porém, que 11

MVCR

=−

(essa expressão pode ser obtida

através da equação 4.21 e a relação MP

MV

CC

= , faça essa demonstração

como exercício). Dessa maneira:

( )1 .1i f i i f fW PV P V

→ = −−

(PiVi - Pf Vf ). (4.30)

Analisando-se as equações (4.29) e (4.30), vemos que se o proces-so adiabático for uma expansão a temperatura do gás diminui ( f i f f i iT T P V PV< → < ), resultando num trabalho positivo, que por sua vez diminui a energia interna do gás. No caso de uma compres-

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119

são ocorre o inverso e o trabalho é negativo. Vemos, portanto, que esses resultados condizem com as definições iniciais dos sinais do trabalho a partir da primeira lei da termodinâmica.

Exemplo 5. Um mol de gás Hélio, com 32MVC R= , inicialmente a

10atm e 0°C , sofre uma expansão adiabática reversível, como pri-meiro estágio num processo de liquefação do gás, até atingir a pres-são atmosférica. Vamos considerá-lo como sendo um gás ideal. A partir daí:

Calcule a temperatura final do gás. a)

Calcule o trabalho realizado na expansão.b)

Solução:

Nesse processo, todas as três variáveis termodinâmicas variam a) (P, V e T). Assim, para determinar a temperatura final precisa-mos inicialmente calcular os volumes inicial e final. Para isso, va-mos recorrer à equação de estado dos gases ideais (PV nRT= ) lembrando que 6 210atm 1,013 10 N/m= × e 0°C 273K= , logo:

3 36 2

(1mol) (8,31 J/mol K) (273K) 2,2 10 m 2,2litros.1,013 10 N/m

ii

i

nRTVP

−⋅= = = × =

×

Sendo 32MVC R= e usando a equação 4.21, obtemos que

52MPC R= e, portanto, que 5

3MP

MV

CC

= = . Dessa forma, podemos

utilizar a equação 4.27 para encontrar o volume final:

5 2 5/3 6 2 3 3 5/3(1,013 10 N/m ) (1,013 10 N/m )(2,2 10 m )f f i i fP V PV V −= → × = × ×3/5 3 3 3 3(10) (2,2 10 m ) 8,75 10 m 8,75 litros.fV − −= × = × =

Agora podemos utilizar novamente a equação de estado dos gases ideais para achar a temperatura do estado final,

5 2 3 30(1,013 10 / )(8,75 10 ) 107 166 .

(1 )(8,31 / . )f f

f

P V N m mT K CnR mol J mol K

−× ×= = = = −

Numa expansão adiabática temos que b) , ou seja, . Usando a equação 4.29 temos que:

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120

5 2 3 3(1,013 10 N/m )(8,75 10 m ) 107 K 166°C.(1mol) (8,31 J/mol K)

f ff

P VT

nR

−× ×= = = = −

2.069 .i fW J→ =

Exemplo 6. 1,0 litro de 2H , para o qual 75

= , à pressão de 1,0atm

e temperatura de 27°C , é comprimido adiabaticamente até o volu-me de 0,5 litro e depois resfriado a volume constante até voltar à pressão inicial. Finalmente, por expansão isobárica, volta ao estado inicial. Considere como sendo um gás ideal. A partir daí:

Represente o processo no plano a) PV , indicando (atm)P , (litro)V e (K)T para cada vértice do diagrama.

Calcule o trabalho total realizado.b)

Solução:

Inicialmente, precisamos identificar os vértices a) A , B e C do dia-grama a partir dos dados que já constam no problema. Assim:

Em • A : 1,0 litroAV = , 1,0 atmAP = e 27°C 300KAT = = ;

Em • B : 0,5 litroBV = , ?BP = e ?BT = ;

Em • C : 0,5 litroCV = , 1,0 atmCP = e ?CT = .

Além disso, é importante identificar os processos que levam os valo-res de um vértice para outro:

A B→• : compressão adiabática;

B C→• : resfriamento a volume constante (isocórico);

C A→• : expansão a pressão constante (isobárico).

Agora podemos começar a calcular os valores que faltam.

No processo A B→ usamos a equação 4.27 para encontrar BP :

3 3 7/5 5 2 3 3 7/5(0,5 10 m ) (1,013 10 N/m )(1,0 10 m )B B A A BP V P V P − −= → × = × ×

7/5 5 2 5 2(2) (1,013 10 N/m ) 2,67 10 N/m 2,64 atm.BP = × = × =

Para encontrar BT , podemos utilizar a equação 4.16:

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121

B B A A B BB A

B A A A

P V P V P VT TT T P V

= → =

(0,5 litro) (2,64 atm)(300K) 396K.(1,0 litro) (1,0 atm)BT = =

A única variável que ainda falta calcular é CT e, como o processo B C→ ocorre a volume constante, então podemos utilizar a seguin-te relação:

C B

C B

P PP cteT T T= → =

1,0 atm(396K) 150K.2,64 atm

CC B

B

PT TP

= = =

O diagrama PV desse processo está representado na figura 4.7:

B

C

1,0TC = 150 K

TA = 300 K

V (litros)

P (atm)

TB = 396 K

A

0,5

1,0

2,64

Figura 4.7 – Figura relativa ao exemplo 6.

O trabalho total é igual à soma dos trabalhos em cada uma das b) etapas: total A B B C C AW W W W→ → →= + + .

Na etapa A B→ , trata-se de um trabalho adiabático, portanto po-demos utilizar tanto a equação 4.29 como a equação 4.30. Vamos usar aqui a primeira opção e fica a sugestão para você conferir o resultado com a outra equação. Assim:

( )A B MV A BW nC T T→ = −

O número de moles pode ser determinado através da equação de es-

tado dos gases ideais, em que A A

A

P VnRT

= . Além disso, vimos que para

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122

7 55 2MVC R = → = . Logo:

5 2 3 35 5 (1,013 10 N/m )(1,0 10 m )( ) ( 96K) 81J.2 2 300K

A AA B A B

A

P VW T TT

× ×= − = − = −

O trabalho na etapa B C→ é nulo, 0B CW → = , porque o volume não varia.

Na etapa C A→ , a pressão é constante, então utilizamos simples-mente a equação:

5 2 3 3( ) (1,013 10 N/m )(0,5 10 m ) 50,6 J.C A A CW P V V −→ = − = × × =

Finalmente, o trabalho total é dado por:

81J 50,6 J 30,4 J.total A B C AW W W→ →= + = − + = −

Observe que o trabalho total é negativo, isso condiz com o fato de ser um processo cíclico no sentido anti-horário, como discutido an-teriormente.

ResumoA primeira lei da termodinâmica está relacionada com o princípio de conservação da energia interna de um sistema, e pode ser enun-ciada da seguinte forma: “A variação da energia interna de um sis-tema termodinâmico depende da realização de trabalho e da trans-ferência de calor entre o sistema e sua vizinhança”.

A expressão matemática que identifica a primeira lei é:

,i fU Q W →∆ = −

onde se adota a seguinte convenção de sinais:

0Q >• , quando for transferido calor ao sistema, contribuindo para o aumento de U ;

0Q <• , quando for retirado calor do sistema, contribuindo para a diminuição de U ;

0i fW → >• , quando o sistema realiza trabalho, contribuindo para a diminuição de U ;

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123

0i fW → <• , quando é realizado trabalho sobre o sistema, contri-buindo para o aumento de U .

O caminho percorrido pelo sistema entre um estado inicial e final só é conhecido se o processo termodinâmico for reversível, para isso, ele deve necessariamente ocorrer de forma quase estática. Essa con-dição é essencial para permitir o cálculo do trabalho realizado e o calor transferido em um sistema.

Processos termodinâmicos:

Adiabático: o sistema não troca calor com o ambiente, a) 0Q = ;

Isocórico: o volume permanece constante e, em geral, b) 0i fW → = ;

Isobárico: a pressão permanece constante;c)

Isotérmico: a temperatura permanece constante;d)

Cíclico: o sistema retorna ao estado inicial, e) 0cicloU∆ = .

A equação de estado dos gases ideais é dada por:

,PV nRT=

onde 8,314 J/mol KR = ⋅ é a constante universal dos gases ideais e n é o número de moles.

A energia interna de um gás ideal depende apenas da temperatura: ( )U U T= .

ExercíciosConsidere uma expansão isobárica de um gás com 1) 1 3,0 atmP = , de 1 1,0 litroV = até 2 3,0 litrosV = . Na sequência, considere o gás sendo resfriado a volume constante até 1 2,0atmP = . A variação da energia interna total é de 456J . Utilize a relação 1atm litro 101,3 J⋅ = . A partir daí:

Ilustre o diagrama a) PV destes processos.

Qual o calor transferido durante o processo total? b)

Resposta: b) 1064JQ = .

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124

2) Um litro de água, ao vaporizar-se a 100°C numa panela aber-ta, produz 31,671m de vapor d’água. O calor latente de va-porização da água é igual a 62, 26 10 J/Kg× . Lembre-se que

51,0atm 1,013 10 Pa= × . Sendo assim:

Determine o trabalho realizado no processo de vaporização.a)

Qual a variação da energia interna nesse processo? b)

Resposta: a) 51,69 10 JvaporW = × ;

b) 520,9 10 JU∆ = × .

De acordo com o diagrama da figura 4.7 a seguir, um flui-3) do pode passar do estado inicial ( i ) ao estado final ( f ) por dois caminhos: ( iaf ) e ( ibf ). A diferença de energia interna é

50Jf iU U U∆ = − = . O trabalho realizado pelo sistema ao ir de i f→ pelo caminho ibf é de 100J , e o trabalho realizado pelo sistema no ciclo completo ( iafbi ) é de 200J .

a

i b

P

V

Pf

Pi

Vi Vf

c

f

Figura 4.8 – Diagrama do Problema 3.

A partir desses dados, determine:

ibfQa) ;

a fW →b) ;

iafQc) ; e

se o sistema regressar de d) f i→ seguindo a diagonal pelo caminho fci , encontre fciW e fciQ .

Resposta: a) 150J ;

b) 300J ;

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125

c) 350J ; e

d) 200JfciW = − e 250JfciQ = − .

4) O diagrama PV da figura 4.8 a seguir indica uma série de pro-cessos termodinâmicos. No processo ab, 150J de calor são for-necidos ao sistema; no processo bd, 600J de calor são forne-cidos ao sistema e no processo ac a energia interna do sistema não variou. A partir desses dados, complete a tabela 4.3.

a

b d

P (Pa)

c

8,0.104

3,0.104

2,0.10−3 5,0.10−3 V (m−3)

Figura 4.9 – Diagrama do Problema 4.

Etapa Q(J) W(J)

ab

bd

abd

ac

cd

acd

Resposta:

Etapa Q(J) W(J)

ab 150 0 150

bd 600 240 360

abd 750 240 510

ac 90 90 0

cd 510 0 510

acd 600 90 510

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126

Um litro de nitrogênio gasoso a 5) 40°C e sob pressão de 3,0cmHg expande-se até atingir um volume de 2,0 litros sob pressão de 4,0cmHg . Considere o sistema como sendo um gás ideal e de-termine:

A quantidade de nitrogênio expressa em moles;a)

A temperatura final do sistema.b)

Resposta:

31,5 10 molesn −= ×a) ;

834,7 KfT =b) .

6) Um cilindro com um pistão submetido à pressão atmosférica contém 1,0 litro de ar a 27°C . Considere o ar como um gás ide-al com 20,8 J/mol KMVC = ⋅ e 1,40 = . Dessa maneira, calcule:

Qual a pressão e a temperatura final do ar se ele sofrer uma a)

compressão adiabática e seu volume for reduzido a 115

do volume inicial?

Qual é o trabalho realizado pelo ar nesse processo?b)

Resposta:

44atmfP =a) e 613°CfT = ;

494Ji fW → = −b) .

7) Considere que 0,1mol de um gás ideal com 32MVC R= descre-

ve o ciclo no plano PT, representado na figura 4.9 a seguir. Sen-do assim:

Determine a) P em atm e V em litros nos pontos A , B e C e desenhe o plano PV desse processo.

Calcule Q e W e b) U∆ para as etapas AB , BC , CA e ABCA .

B

A CPi

P (atm)

1,0

300 600 T (k)

Figura 4.10 – Diagrama do Problema 7.

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127

Resposta:

2,0atmA CP P= =a) , 1,0atmBP = e 1,23 litrosAV = , 2,46 litrosB CV V= = ;

Valores obtidos:b)

Etapa Q(J) W(J)AB 173 173 0

BC 374 0 374

CA -623 -249 -374

ABCA -76 -76 0

Bibliografia básicaNUSSENZVEIG, H. Moysés. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. v. 2.

SEARS, Zemansky. Física II: termodinâmica e ondas. 10. ed. São Paulo: Addison Wesley, 2003.

RESNICK, R.; HALLIDAY, D. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. v. 2.

TIPLER, Paul A.; MOSCA, Gene. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. v. 1.

Bibliografia complementar comentadaSEARS, Zemansky. Física II: termodinâmica e ondas. 10. ed. São Paulo: Addison Wesley, 2003.

Você pode obter mais detalhes sobre sistemas termodinâmicos na seção 17.2 Sistemas termodinâmicos.

KUHN, Thomas S. A tensão essencial. Lisboa: Edições 70, 1989.

Uma leitura bastante interessante sobre a descoberta da primeira lei da termodinâmica se encontra no capítulo 4 A conservação da energia, como exemplo de descoberta simultânea.

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128

RESNICK, R.; HALLIDAY, D. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. v. 2.

Existe uma discussão interessante sobre a relação entre calor e trabalho na primeira lei da termodinâmica, na seção 22.6 Calor e trabalho.

Para saber mais sobre gases ideais, sugerimos a leitura do Capítulo 23 “Teoria cinética dos gases I, seção 23.1 e 23.2”.

NUSSENZVEIG, H. Moysés. Curso de Física Básica. São Paulo: Editora Edgard Blücher LTDA, 1997. v. 2.

Para saber mais sobre processos reversíveis, sugerimos a leitura da seção 8.6 Processos reversíveis.

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Capítulo 5Teoria Cinética dos Gases

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Capítulo 5Teoria Cinética dos Gases

Ao final deste Capítulo você deve ser capaz de relacionar grandezas termodinâmicas, como pressão e temperatura, com médias de propriedades moleculares. Além disso, deve ser capaz de discutir a primeira aproximação mais sofisti-cada que o gás ideal, o chamado gás de Van der Waals.

5.1 IntroduçãoNos dois Capítulos anteriores, estudamos a Termodinâmica, que tem como objeto de estudo corpos macroscópicos, sem preocupação com aspectos ou detalhes microscópicos. Foi possível, então, estabe-lecer várias relações entre grandezas termodinâmicas, as quais de-vem ser respeitadas por quaisquer sistemas físicos macroscópicos. Neste Capítulo, iremos discutir a primeira tentativa de conectar as grandezas termodinâmicas, estudadas anteriormente, com médias obtidas em nível microscópico. Essa é a primeira estratégia para li-gar os mundos macroscópico e microscópico. Uma segunda teoria, a Mecânica Estatística, será vista apenas de forma introdutória, mais adiante no curso.

Iremos ver que a pressão está relacionada à média da velocidade ao quadrado das partículas e que a temperatura está ligada à energia cinética média de um gás ideal. Discutiremos, então, a energia inter-na de um gás ideal e, depois, estudaremos a primeira aproximação mais sofisticada que o gás ideal, o fluido de Van der Waals.

5.2 Modelo de gás idealIremos agora, pela primeira vez, recorrer a modelos microscópicos para estudar sistemas termodinâmicos. Como em todas as áreas da Física, a ideia inicial ao se modelar um sistema é reter os ingredien-tes físicos fundamentais deste, de tal forma que o modelo possa ser

Mecânica Estatística É uma teoria fundamental em Física e que procura prever o comportamento macroscópico de sistemas físicos a partir de métodos estatísticos aplicados aos constituintes microscópicos desses sistemas.

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matematicamente estudado e ainda descreva bem o que acontece na experiência.

Um gás em um determinado volume, mesmo que em equilíbrio, é um sistema bastante complexo. O estudo desse sistema através da Mecânica Newtoniana é impossível, do ponto de vista prático e ma-temático, e indesejável, do ponto de vista físico. Mesmo que soubés-semos todas as posições e velocidades das partículas em cada ins-tante, esses dados dariam pouquíssima (ou nenhuma) informação sobre o comportamento do sistema. No entanto, usaremos o fato do número de partículas do gás ser muito grande para relacionar gran-dezas macroscópicas com médias de grandezas microscópicas.

Exemplo 1. Considere aproximadamente um mol de um gás, ou seja, da ordem de 236 10× moléculas. Calcule o espaço, em gigabytes, necessário para guardar as posições e velocidades iniciais desse sistema em três dimensões. Quantos computadores seriam neces-sários para armazenar essas grandezas, para todas as moléculas? Faça suposições sobre o tamanho típico de discos rígidos modernos e calcule o número de computadores necessários por habitante da Terra. Comente.

Solução: Para cada partícula, há seis grandezas a serem guardadas, três componentes da posição e três componentes da velocidade. As-sim, o número total de grandezas a ser guardada é 23 246 6 10 10 ,× × onde o sinal significa que iremos nos preocupar apenas com or-dens de grandeza. Suponhamos agora que cada grandeza ocupe 4 bytes em um computador (esse é o espaço ocupado por um número real de precisão simples na linguagem Fortran). Assim, são neces-sários 24 244 10 10× bytes para armazenar essa informação. Vamos supor que cada computador tenha um disco rígido de 200 Gigabytes

9200 10= × bytes 1110 bytes. Assim, supondo que cada computa-

dor tenha um disco rígido apenas, são necessários 24 11 1310 /10 10= computadores. Supondo que a população da Terra seja da ordem de

1010 humanos, serão necessários 1.000 computadores por habitante da Terra apenas para guardar as posições e velocidades iniciais de um mol de um gás. Nossa estimativa está subestimada e ainda te-ríamos que usar mais computadores caso fosse necessário guardar grandezas ligadas à estrutura interna das moléculas. Assim, vemos que, tecnicamente, esse caminho é inviável. Por outro lado, as restri-

BytesEm se tratando de com-putadores, a informação é guardada em unidades fun-damentais chamadas bits, e cada bit assume o valor 0 ou 1. Um byte são 8 bits, ou seja, uma sequência de 8 ze-ros ou uns.

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ções de ordem matemática (resolver a segunda Lei de Newton para essas 236 10× moléculas é virtualmente irrealizável, pois as equações são acopladas, isto é, as grandezas para uma molécula dependem de grandezas de muitas outras) e física (que informação útil teríamos por saber a posição e velocidade de todas essas moléculas?) são ainda mais importantes.

Para simplificar esse panorama, vamos introduzir o modelo micros-cópico de gás ideal, consistente com o comportamento desse tipo de gás (discutido no Capítulo 4). Esse modelo está baseado nas seguin-tes hipóteses:

O gás é constituído de partículas. Estas podem ter estrutura 1) interna (serem, por exemplo, moléculas) ou não; essa carac-terística não será relevante em nosso tratamento (veja item 6 abaixo);

As moléculas seguem um movimento desordenado, colidindo 2) eventualmente umas com as outras e com as paredes do re-cipiente. Vamos supor que esse movimento seja bem descrito pela Mecânica Newtoniana;

Para que as médias descrevam bem o comportamento das par-3) tículas, vamos supor que o número destas seja muito grande (lembre-se que uma média só descreve apropriadamente o comportamento de um sistema quando o número de eventos tende a infinito);

O volume do recipiente é muito maior que o volume ocupado 4) por todas as partículas;

Devido ao item anterior, é razoável supor que as interações 5) entre as partículas não sejam relevantes, a não ser quando elas colidem umas com as outras. Em outras palavras, vamos supor que as interações moleculares tenham alcance da ordem do ta-manho molecular. Como as partículas, em média, estão muito afastadas umas das outras (veja item 4), as interações só serão relevantes quando elas colidirem;

As colisões têm duração desprezível e são, em média, elásticas. 6) Quando as partículas colidem, a energia cinética destas pode ser transformada em energia interna. Suponhamos, entretanto, que essa energia interna rapidamente se transforme de volta

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134

em energia cinética, de modo que esta se conserve, em média, ao longo do tempo. Em nossos cálculos, vamos usar a aproxi-mação de que cada colisão individualmente seja elástica. Essa suposição simplifica os cálculos e não modifica o resultado em relação à situação mais realista discutida anteriormente.

5.3 Pressão Vamos relacionar a pressão a grandezas médias microscópicas. Pres-são é força por unidade de área; por outro lado, força é variação de momento linear por unidade de tempo. Para simplificar nossos cál-culos, vamos supor um recipiente cúbico de lado L , que a força sofri-da por uma molécula ao colidir com uma parede tenha direção per-pendicular a esta e apenas inverta o valor do momento linear nessa direção. Assim, uma colisão com a parede em x L= (veja figura 5.1 a seguir) muda a componente x do momento linear da partícula, in-vertendo-o. Dessa forma, a variação do momento linear na direção x é dada por 2x x x xp mv mv mv∆ = − − = − , que é o momento final menos o momento inicial. Pela terceira Lei de Newton, a variação do momen-to linear da parede será então 2 xmv . Justifique essa afirmação.

x

z

y

L

L

Lv’

v

θθ

Figura 5.1 – Recipiente cúbico onde se encontra o gás. É mostrada apenas uma partícula e sua colisão com a parede em x = L. Depois dessa colisão a componente x da velocidade da partícula é invertida mas as componentes y e z se mantêm inaltera-das. Assim, 'v difere de v apenas na componente x, a qual muda de sinal na colisão.

É suposto que todas as colisões com as paredes tenham a característica de apenas inverter a componente da velocidade na direção perpendicular à parede.

Momento linear p é de-finido como o produto da massa m da partícu-la pela sua velocidade v: p = mv.

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Vamos agora calcular a transferência média de momento para a pare-de, devido às colisões de várias partículas. Nem todas as partículas que colidem com a parede têm a mesma velocidade; por praticidade, vamos supor que há partículas por unidade de volume com velo-cidade 1v , 2n partículas por unidade de volume com velocidade 2v , e assim por diante. O número total de partículas por unidade de vo-lume ( n ) é dado por 1 2 ... nn n n n= + + + . Em um intervalo de tempo dt , as partículas que colidirão com uma superfície S∆ (veja a figura 5.2 a seguir) na parede da direita, por exemplo, serão aquelas que estiverem em um cilindro de base S∆ e geratriz 1v dt

(isso porque apenas partículas com velocidade 1v que estejam dentro desse cilin-dro irão alcançar a parede na superfície S∆ após um intervalo de tempo dt . Assim, o número total de partículas com essa velocidade que colidem com a parede é dado pelo número de partículas por unidade de volume vezes o volume do cilindro apresentado pela figura 5.2, ou seja:

1 1 1 .xn n v Sdt∆ = ∆ (5.1)

Note que in∆ é o número de partículas, enquanto in representa densi-dade de partículas, ou seja, número de partículas por unidade de volume.

Cada uma dessas partículas transferirá um momento 2x xp mv∆ = para a parede. Assim, o momento total transferido por todas as par-tículas no cilindro em questão será de:

21 1 1 1 12 .x x xdp n p mn v Sdt= ∆ ∆ = ∆ (5.2)

A força feita por essas partículas é a transferência de momento por unidade de tempo:

211 1 12 .x

x xdpF mn v Sdt

∆ = = ∆ (5.3)

Dessa forma, a contribuição dessas partículas para a pressão 1P é dada por:

211 1 12 .x

xFP mn vS

∆= =

∆ (5.4)

Aqui cabe uma observação importante: ao fazermos os cálculos das equações 5.1, 5.2, 5.3 e 5.4, usamos apenas o módulo da velocidade, portanto entrarão em nossa conta partículas com velocidade orien-

Decidimos representardensidade de partículaspor n e reservar a letra para densidade de

massa.

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tada para a direita, que irão efetivamente colidir com a parede, e também partículas com velocidade orientada para a esquerda, as quais não irão colidir com a parede e não contribuirão para a pres-são. Supondo que o número de partículas que tenha velocidade xV para a direita seja o mesmo que o número de partículas que tenha velocidade xV− para a esquerda (ou seja, que a distribuição de velo-cidades seja isotrópica), tomamos como resultado final para 1P me-tade do valor expresso pela equação 5.4:

21 1 1 .xP mn v= (5.5)

v1x∆t

x∆s

∆t

1v��

1v

Figura 5.2 – Cilindro definido pela base S∆ e pela geratriz 1v t∆ . As partículas com velocidade 1v e que estiverem dentro desse cilindro colidirão

com a parede do recipiente em um intervalo de tempo t∆ .

Levando em consideração partículas com outras velocidades ( 2v , 3v etc.), a pressão total será:

2 ,i ixi

P m n v= ∑ (5.6)

onde in é o número de partículas por unidade de volume com ve-locidade iv e ixv a componente x dessa velocidade. O somatório é feito sobre todas as possíveis velocidades. Note que o valor médio de 2

xv , 2xv , é dado por:

22 2 2

2 1 1 2 2 3 3

1 2 3

.... ....

i ixx x x i

x

n vn v n v n vv

n n n n+ + +

= =+ + +

∑ (5.7)

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137

No entanto, o numerador do lado direito da equação 5.7 é exatamen-te igual ao somatório apresentado na equação 5.6. Assim, adotando

2 2i ix x

in v n v=∑ obtemos:

2 .xP nm v= (5.8)

A velocidade ao quadrado ( 2v ), porém, é dada por 2 2 2 2 ,x y zv v v v= + + e como a média de uma soma é a soma das médias, obtemos:

2 2 2 2 23x y z xv v v v v= + + = . Para a última igualdade nessa equa-

ção, supomos que todas as direções no recipiente sejam equivalen-

tes, ou seja, 2 2 2x y zv v v= = (desprezamos aqui efeitos gravitacio-

nais). Note que essa igualdade só é verdadeira em média! A equação

5.8 pode então ser reescrita como:

21 .3

P nm v= (5.9)

Como adiantado na introdução, relacionamos uma grandeza termo-dinâmica (a pressão P) à média da velocidade ao quadrado das par-tículas do gás, esta uma grandeza microscópica. Como n é o número de partículas por unidade de volume e m a massa de cada partícula, nm é a massa do gás por unidade de volume, ou seja, sua densidade . Escrevemos então:

2 21 1 2 ,

3 3 3Ct EMP v v

V V= = = (5.10)

onde tM é a massa total do gás, V seu volume e 2 2C tE M v= a sua energia cinética média total. Assim, a pressão de um gás é 2 3 da densidade de energia cinética média total de suas partículas.

Exemplo 2. Note que, a partir da equação 5.10, podemos calcular a

velocidade média quadrática ( 2rmsv v= ⟨ ⟩ ) das moléculas de um

gás a partir de valores medidos de sua pressão e densidade, atra-

vés de 2rmsv v= ⟨ ⟩ = . Para o oxigênio, nas condições nor-

mais de temperatura e pressão (CNTP), em que 273KT = , 1atmP = 5 21,01 10 N/m= × , sua densidade é 31, 43Kg/m = . A sua velocidade

média quadrática é então dada por 461m/s . A velocidade quadrática

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138

média de diferentes gases é da mesma ordem de grandeza da veloci-dade do som neles. Discuta com colegas o porquê desse resultado.

5.4 Temperatura: interpretação cinética

Vamos agora interpretar a temperatura em termos de grandezas mi-croscópicas. Multiplicando a equação 5.10 pelo volume V do gás, obtemos:

PV = 2 / 3V v⟨ ⟩ . (5.11)

No entanto, pela equação de estado do gás ideal temos que

BPV nRT Nk T= = , onde n é o número de moles, R a constante dos gases, N o número de partículas, Bk a constante de Boltzmann e T a temperatura. Além disso, Vr é a massa total do gás, e pode ser escrita como nM ou Nm , onde M é a massa molar do gás e m a massa de cada partícula. Aplicando essas considerações à equação 5.11, temos:

213BNk T Nm v= ⟨ ⟩ . (5.12)

A partir daí, podemos reescrever a equação 5.12 como:

21 32 2 Bm v k T⟨ ⟩ = . (5.13)

Essa expressão pode ainda ser reescrita como (faça os cálculos ne-cessários):

21 3

2 2M v RT⟨ ⟩ = . (5.14)

considerando-se B AR k N= , onde R é a constante dos gases e 23 16,02 10 molAN −= × como sendo o número de Avogadro.

Vemos então que a temperatura, uma grandeza termodinâmica, está associada à energia cinética média de uma molécula (ou, de forma equivalente, de um mol da substância), a qual é uma grandeza mi-croscópica.

O modelo microscópico de um gás ideal supõe que não haja interação entre as partículas, de modo que a energia interna do gás é apenas a soma das energias cinéticas de cada partícula. Como a energia cinética

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139

está ligada apenas à temperatura do gás (veja a equação 5.14), obtemos o resultado já conhecido de que a energia interna de um gás ideal de-pende apenas de sua temperatura. Acompanhe a tabela 5.1 a seguir.

GásEnergia cinética de translação

média por mol ( )

Hidrogênio 3.720

Hélio 3.750

Nitrogênio 3.740

Oxigênio 3.730

Dióxido de Carbono 3.730

Tabela 5.1 – Alguns gases, suas respectivas energias cinéticas de translação médias por mol a 300KT = .

Exemplo 3. Calcule a energia cinética de translação média de acordo com a Teoria Cinética dos Gases e compare com os dados da Tabela 5.1. Comente.

Solução: De acordo com a equação 5.14, essa energia média é dada, para o gás ideal, por:

3 8,31(J/mol K) 300(K) 3739,5 J/mol.2

T = ⋅ ⋅ ⋅ =

Comparando o resultado com os dados da Tabela 5.1, vemos que os valores da tabela estão bem próximos da previsão teórica da equa-ção. A maior discrepância é de 0,5% para o Hidrogênio. O desacordo pode ser entendido como uma medida de quanto o gás se desvia do comportamento ideal. Na próxima Seção, iremos um passo adiante da aproximação de gás ideal.

5.5 Fluido de Van der WaalsVamos agora estudar um modelo proposto pelo físico Johannes Di-derik Van der Waals em 1873 para estudar fluidos em circunstâncias tais que a equação de estado de gases ideais não os descrevia ade-quadamente. Para isso, partiremos desta equação de estado e intro-duziremos os efeitos de interação entre as partículas do fluido.

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Em nosso modelo de gás ideal, fizemos a suposição que as partícu-las do gás interagem apenas durante o curtíssimo espaço de tempo de uma colisão. Em situações gerais, essa aproximação não descreve bem o sistema. Assim, por exemplo, o modelo de gás ideal não prevê a transição de fase da água: esta passa de vapor a líquido, quando se abaixa a temperatura a 373,16K na pressão de 1atm . Na verdade, a aproximação de gás ideal não prevê transição de fase alguma.

Para construir um modelo mais realista, vamos levar em conta, pelo menos de forma aproximada, a interação entre as moléculas. Essa interação tem a energia potencial, entre duas moléculas, ( )U r , re-presentada por (a) na figura 5.3, onde r é a distância entre as partí-culas (talvez seja uma boa hora de relembrar o que foi visto em Fí-sica Básica B sobre energia potencial). A força entre essas moléculas é dada por ( ) /F r dU dr= − e está representada por (b) na figura 5.3. Podemos, simplificadamente, supor que os ingredientes básicos são uma forte repulsão ( 0)F > a curta distância 0( )r r< e uma atração ( 0)F < não tão forte a distância média 0(r r> ) mas não muito gran-de). A longas distâncias 0( )r r , a interação é desprezível.

r

V(r)

r0

r

F(r)

r0

A B

Figura 5.3 – (a) Energia potencial entre duas moléculas de um fluido, em função da distância entre as moléculas, representando uma forte repulsão de curto alcance e uma atração a

médio alcance; (b) Força derivada da energia potencial representada por (a) na figura 5.3.

Assim, nosso modelo irá incorporar essa repulsão a curtas distân-cias (a) e a atração a médias distâncias (b) da seguinte forma:

No modelo de gás ideal, o volume acessível ao gás é todo o a) volume do recipiente. Agora tratemos as moléculas como bolas de bilhar e, então, suponhamos que seus centros não podem se aproximar mais que o “diâmetro” da molécula. Assim, cada molécula cria em torno de si um volume excluído, dentro do

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141

qual nenhuma outra molécula consegue entrar. Veja a repre-sentação desta situação na figura 5.4 a seguir. Essa aproxima-ção é por isso chamada de aproximação de bola de bilhar ou apro-ximação de caroço duro.

R

2R

Figura 5.4 – A molécula da esquerda cria um volume excluído ao seu redor, e a distância entre seu centro e o da molécula à direita não pode ser menor

que 2R, onde R é o “raio” da molécula.

Assim, na equação de estado do gás ideal, substituímos V por V bN− , onde b é uma constante dependente da geometria da molécula e N o número de moléculas do gás. Note: supomos que o volume excluído é proporcional ao número de molécu-las, o que é razoável. Assim, temos a equação:

P( ) ;Bp V bN Nk T− = (5.15)

Vamos incluir a atração a médias distâncias no cálculo da b) pressão. Como vimos na Seção 5.2, essa grandeza está ligada à taxa de transferência de momento linear para as paredes. O momento linear é proporcional à velocidade da partícula; assim, quanto maior essa velocidade, maior o momento a ser transferido à parede e maior a pressão. Quando as partículas se atraem, a médias distâncias, uma partícula que irá se chocar com a parede direita do recipiente (veja a figura 5.5 a seguir) será atraída, em média, para o lado esquerdo, visto que a maio-ria das outras moléculas estará à esquerda da partícula. Assim, a componente de sua velocidade perpendicular à parede será menor que no caso de não haver interação (a partícula é freada por essas interações) e seu momento será consequentemente menor. Logo, a transferência de momento será menor que no caso do gás ideal e a pressão será também diminuída.

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Essa diminuição está ligada à interação atrativa entre pares de moléculas e é proporcional ao quadrado da densidade de partí-culas 2( / )N V pela seguinte razão: a força sobre cada molécula que irá bater numa parede do recipiente é proporcional à den-sidade de partículas (quanto maior a densidade, maior a força que a partícula sentirá, nesse caso para a esquerda).

Assim, a variação de momento devida a uma partícula será pro-porcional a essa força, a qual é proporcional à densidade, mas a variação total de momento transferido à parede é propor-cional ao número de partículas que colidem com esta, e essa grandeza também é proporcional à densidade. Dessa forma, esses dois efeitos levam a uma dependência com a densidade ao quadrado. Isolando a pressão na equação 5.15, obtemos:

P ,( )

BNk TpV bN

=−

.

Essa seria a pressão caso não houvesse as interações atrativas. Como discutido até aqui, essas interações diminuem a pres-são, com uma contribuição proporcional a 2( / )N V . Chaman-do essa constante de proporcionalidade de a , temos então a equação:

P2

.( )

BNk T Np aV bN V

= − − (5.16)

Fv

Figura 5.5 – A molécula mais à direita é atraída pelas moléculas à sua esquerda e, devido a essa atração, deixa de colidir com a parede à direita ou colide com ela em

velocidade menor (em relação àquela com que colidiria caso não houvesse a atração). Em ambos os casos, a transferência de momento para a parede seria menor,

diminuindo, portanto, a pressão do gás.

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143

Usualmente, a equação 5.16 é escrita nesta forma:

2

2 ( ) BNP a V bN Nk TV

+ − =

(5.17)

ou, de forma equivalente:

2 ( ) BaP v b k Tv

+ − =

(5.18)

onde v é o volume por partícula.

As isotermas (T = constante) correspondentes a essa equação estão representadas na figura 5.6 a seguir. Para cT T< e P < Pc , há três so-luções para v. Isso é esperado, pois a equação de Van der Waals é de 3º grau em v. De fato, multiplicando a equação 5.18 por v², obtemos:

(5.19)

ou seja:

3 2( ) 0BPv k T bP v av ab− + + − = . (5.20)

À medida que T aumenta, as três soluções em v se aproximam e eventualmente se tornam uma só. Esse é o ponto crítico C: sua tempe-ratura é chamada de temperatura crítica (Tc) e sua pressão é chamada de pressão crítica (Pc). Para valores de P acima de Pc ou T acima de Tc, duas das soluções para v se tornam pares complexos conjugados e apenas uma, entre as três soluções matemáticas, tem sentido físico. Assim, para esses intervalos de P e T há apenas uma solução, como mostrado na figura 5.6 a seguir. Note que, para cT T , a curva é a P v× dada pela equação de estado do gás ideal, /BP k T v= .

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144

P

C

v

T >> Tc

vc

Pc

T > Tc

T < Tc

T = Tc

Figura 5.6 – Isotermas obtidas a partir da equação de Van der Waals. Para T < Tc e para cer-tos valores da pressão P há três soluções fisicamente aceitáveis para o volume v por partícu-

la. Exatamente em T = Tc, as três soluções possíveis se transformam em uma só, que é uma raiz tripla em v da equação de Van der Waals. Para T > Tc, há apenas uma solução

com sentido físico (as outras duas são um par complexo conjugado) e, para T >> Tc, a curva obtida é a de um gás ideal.

Sempre que diminuímos a pressão, para cT T< , o fluido sofre uma transição de fase dita de primeira ordem, passando de líquido a ga-soso. Essa transição desaparece para cT T> e, exatamente em cT T= , a transição tem um caráter especial que a difere daquela de primeira ordem.

ResumoNeste Capítulo introduzimos os primeiros modelos microscópicos para o estudo de fluidos: o modelo de gás ideal e o modelo de Van der Waals. O primeiro modelo descreve os gases como compostos de um número de partículas muito grande, ocupando um volume bem menor que o volume do recipiente e com interação desprezível entre as partículas. O segundo modelo leva em consideração alguns aspectos importantes dos gases quando estes não satisfazem a con-dição de gás ideal.

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QuestõesQuando se abre um frasco de perfume em um canto de uma 1) sala, o cheiro do perfume demora um certo tempo para chegar à outra extremidade. Como você explica esse fato, se as veloci-dades médias quadráticas nos gases são da ordem de centenas ou milhares de metros por segundo?

A velocidade de escape (2) ev ) de uma partícula na superfície de um planeta é a velocidade mínima que permite à partícu-la escapar da atração gravitacional desse planeta (releia essa parte da disciplina Física Básica B). Essa velocidade é dada por 2ev GM R= , onde G é a constante gravitacional, M é a massa e R o raio do planeta. Pesquise esses valores para a Terra e a Lua. Depois compare a velocidade de escape nesses dois planetas com a velocidade quadrática média (ver equação 5.9) para os gases mais comuns na atmosfera da Terra, para as temperaturas típicas na superfície da Terra e da Lua. Por que há atmosfera na Terra, mas não na Lua?

Um gás cujas moléculas possam ser supostas como 3) pontos geométricos perfeitos pode respeitar a lei de gás ideal?

Mostre que, quanto mais rarefeito o fluido de Van der Waals, 4) maior o volume molar. Mostre também que, para volumes mo-lares grandes, obtém-se a equação de estado de um gás ideal.

ProblemasSuponha a temperatura da atmosfera da Terra constante e 1) igual a T, e que a variação de pressão com a altura y, na atmos-fera da Terra, é dada por ( )

0Mgy RTP P e −= , onde 0P é a pressão na

superfície da Terra e M a massa molar do ar. A partir daí, mos-tre que o número de moléculas por unidade de volume ( Vn ) é dado por

0

( )Mgy RTP Pn n e −= , onde 0Vn é o número de moléculas

por unidade de volume na superfície da Terra.

A velocidade do som em gases diferentes e à mesma tempera-2) tura depende da massa molar dos gases. Mostre que

1 2 2 1v v M M= , onde 1M é a massa molar do gás 1 e 2M a

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massa molar do gás 2 (considere o mesmo para as velocidades

1v e 2v , respectivamente). Discuta como esse fato pode ser usa-do para separar gases com diferentes massas molares através de difusão.

Mostre que a equação de Van der Waals (ver equação 5.18) pode 3) ainda ser reescrita, usando o número de moles n ao invés do número de partículas N , desta maneira:

2

1 ( )P ã v b RTv

+ − =

onde 2( / )a a N n= e ( / )b b b n= , e v é o volume molar, /v V n≡ .

Bibliografia básicaNUSSENZVEIG, H. Moysés. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. v. 2.

RESNICK, R.; HALLIDAY, D.; KRANE, K. S. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. v. 2.

SEARS, Zemansky. Física II: termodinâmica e ondas. 10. ed. São Paulo: Addison Wesley, 2003.

TIPLER, Paul A.; MOSCA, Gene. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. v. 1.

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Capítulo 6Segunda Lei da Termodinâmica e Entropia

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Capítulo 6Segunda Lei da

Termodinâmica e Entropia

Após a leitura e o estudo desse Capítulo você poderá com-preender o funcionamento das maquinas térmicas, utilizar esse conceito na modelagem de motores e refrigeradores como máquinas térmicas idealizadas e, também, discutir o conceito de entropia, ligando-o aos enunciados da Se-gunda Lei da Termodinâmica e ao conceito de “seta do tempo”.

6.1 IntroduçãoComo vimos no Capítulo 4, a Primeira Lei da Termodinâmica refere-se também à conservação de energia, e qualquer processo físico tem que respeitar essa lei. Entretanto, vários processos não são observa-dos na natureza, apesar de obedecerem à Primeira Lei. Assim, podemos citar, por exemplo, os seguintes fenômenos:

Quando um bloco desliza com atrito sobre um plano inclina-a) do, ele pode eventualmente chegar ao repouso. Sua energia potencial se transforma em energia cinética, à medida que ele desce o plano, e esta se transforma em outros tipos de energia, devido ao atrito. Dentre esses tipos, o mais importante, em certas situações, é o calor. Assim, a Primeira Lei da Termodi-nâmica é obedecida e a energia potencial inicial transforma-se, no final do processo, em energia térmica (vamos despre-zar aqui outras formas possíveis nas quais a energia potencial pode se transformar, como, por exemplo, energia sonora e ele-tromagnética). No entanto, o que impede o calor gerado pelo atrito de ser devolvido ao bloco e este subir o plano inclinado e voltar à posição inicial? A Primeira Lei não proíbe esse pro-cesso de acontecer, mas nós certamente estranharíamos se o bloco subisse espontaneamente o plano. Dessa forma, é criada

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uma seta do tempo: o processo que ocorre na Natureza, espon-taneamente, é aquele no qual o bloco desce o plano inclinado, e não o inverso.

Um frasco de perfume aberto em um canto de uma sala irá b) permitir que as moléculas se espalhem pela sala e que, após algum tempo, uma pessoa no canto oposto ao do frasco sinta o odor do perfume. Entretanto, você não deve esperar que as moléculas de perfume se reorganizem e voltem para dentro do frasco espontaneamente. Da mesma forma, não acontece de o ar em um auditório, por exemplo, se concentrar esponta-neamente em um canto deste e matar a plateia sufocada. Por mais estranho que esses processos possam parecer, nada na Mecânica Clássica ou na Mecânica Quântica os proíbe. No caso do perfume, se, após as moléculas se difundirem pela sala, invertêssemos exatamente a velocidade de cada molécula (obviamente, essa é uma experiência imaginária), elas iriam retornar ao frasco, invertendo exatamente suas trajetórias ao saírem dele. Mais uma vez, esse comportamento não é obser-vado, apesar de permitido pelas leis físicas que já estudamos.

Assim, podemos classificar como reversíveis as leis físicas fundamen-tais vistas até agora: elas não distinguem o passado do futuro ou, em outras palavras, qualquer evento realizado de uma determina-da forma pode acontecer exatamente no sentido inverso no tempo. Como discutimos nos dois exemplos anteriores, porém, a natureza não se comporta dessa maneira. Um corpo deslizando com atrito em um plano inclinado, por exemplo, é um processo irreversível. A forma de compatibilizar as observações com a teoria está contida na Segunda Lei da Termodinâmica.

Como a maior parte da Termodinâmica, a introdução dessa lei este-ve associada a problemas práticos e à generalização de observações experimentais ligadas a máquinas térmicas. Assim, os enunciados de Clausius e Kelvin dessa lei estavam ligados ao comportamento dessas máquinas. Posteriormente, houve a introdução do conceito de entropia e, depois ainda, uma interpretação microscópica, a qual não iremos discutir neste texto, pois não é seu objetivo.

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6.2 Segunda Lei da Termodinâmica: enunciados de Clausius e Kelvin

O enunciado de Kelvin diz que não é possível a existência de um moto perpétuo, ou seja, de uma máquina que transforme totalmente calor em trabalho e retorne o sistema ao estado inicial. Mais formal-mente, o enunciado é formulado da seguinte maneira:

É impossível realizar um processo cujo único efeito seja remover calor de um reservatório térmico e produzir uma quantidade equivalente de trabalho.

A palavra em negrito no enunciado é importante: único significa que, após o processo termodinâmico, o sistema voltou a seu estado inicial e o calor que ele absorveu de uma dada fonte foi totalmente transformado em trabalho. Um processo no qual o sistema volte a seu estado inicial é dito cíclico. Note que pode haver uma transfor-mação na qual todo o calor absorvido seja transformado em traba-lho mas o sistema não retorna ao estado inicial, no qual se encontrava antes da transformação. Considere, por exemplo, um recipiente de paredes diatérmicas (permitem troca de calor) e uma tampa móvel, com uma certa quantidade de areia sobre essa tampa (veja a figura 6.1 a seguir). A temperatura da substância dentro do recipiente é a mesma da vizinhança. Se retirarmos bem devagar grãos do monte de areia que está sobre a tampa, esta irá se mover para cima, pois a pressão exercida pela tampa e pelo monte de areia irá diminuir. As-sim, a substância realizará trabalho, à medida que a tampa se move para cima. Como a temperatura permanecerá constante, e igual à da vizinhança, o sistema irá absorver calor dela. Se pudermos apro-ximar o gás no interior do recipiente por um sistema ideal, sua ener-gia não irá mudar (a energia de um gás ideal depende apenas de sua temperatura), de modo que a Primeira Lei da Termodinâmica será escrita como:

0U Q W Q W∆ = = ∆ −∆ ⇒ ∆ = ∆ .

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Assim, todo o calor absorvido foi utilizado para realizar trabalho. O processo não viola o enunciado de Kelvin porque o sistema não volta a seu estado inicial no final da transformação. Ao final do processo, a pressão do gás diminuiu e seu volume aumentou.

∆Q

∆W

Patm

PatmPatm

P > Patm

A B

Figura 6.1 – (a) gás suposto ideal, a pressão P e temperatura T, em contato térmico e mecânico com a atmosfera, com uma determinada quantidade de

areia sobre sua tampa; (b) quando parte dessa areia é retirada, bem devagar, o sistema absorve calor da atmosfera e realiza trabalho, elevando sua tampa.

Note que o enunciado de Kelvin proíbe que ocorra espontanea-mente o processo inverso de uma expansão livre, ou seja, uma compressão livre. Na expansão livre em um recipiente adiabático, não há troca de calor nem realização de trabalho e o volume do gás aumenta (de iV para fV , suponha) e sua pressão diminui, per-manecendo constante a temperatura (para um gás ideal). Assim, deveria ocorrer que 0Q W∆ = ∆ = descrito também para a suposta compressão espontânea, de modo que o volume iria de fV a iV (onde iV < fV ). Se após essa compressão colocássemos o reci-piente em contato com um reservatório térmico a pressão menor (e igual à pressão antes da compressão) e à mesma temperatura do sistema (como no parágrafo anterior), poderíamos fazer o sistema voltar à pressão original e sair do volume iV e voltar ao volume fV , com 0Q W∆ = ∆ ≠ . Assim, teríamos feito um ciclo no qual todo o calor absorvido teria se transformado em trabalho, o que é proibi-do pelo enunciado de Kelvin.

Neste Capítulo, iremos representar máquinas térmicas por diagra-mas. O diagrama de uma máquina térmica que receba calor e o transforme totalmente em trabalho está desenhado na figura 6.2.

Reservatório térmico é um sistema físico capaz de man-ter a temperatura constan-te, independente de realizar trocas de calor com outros sistemas. Um exemplo ra-zoável é nossa geladeira: ela deve manter constante a temperatura em seu interior, independente dos objetos que nela são colocados.

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Fonte quente

Q

W Motor miraculoso

Figura 6.2 – Diagrama representativo de um moto perpétuo ou motor miraculoso. O motor absorve uma quantidade de calor Q de um reservatório térmico (chamado de fonte quente) e o utiliza para realizar trabalho W , com W Q= e de tal forma que o motor volte a seu estado

inicial após o processo. Essa máquina é proibida pelo enunciado de Kelvin da segunda lei.

Um outro enunciado possível para a segunda lei é o de Clausius. Ele proíbe que a condução de calor se dê de um corpo mais frio para um mais quente sem outro processo envolvido. Explicitamente:

É impossível realizar um processo cujo único efeito seja trans-ferir calor de um corpo mais frio a um corpo mais quente.

De novo, a existência da palavra único é fundamental: ela implica que estamos falando de um ciclo. Caso a transformação termodinâmica não seja um ciclo, ela não é proibida pelo enunciado de Clausius. As-sim, por exemplo, suponha um recipiente de tampa móvel com um de-terminado gás e dois corpos: um frio, a temperatura 1T , e outro quente, a temperatura 2 1T T> . Esse gás pode absorver calor (Q) do corpo mais frio e realizar trabalho (W ) em uma expansão isotérmica, pois a temperatura é constante e igual a 1T (veja o exemplo a na figura 6.3 a seguir). Em seguida o gás é comprimido adiabaticamente até chegar à temperatura 2T , sendo realizado um trabalho 1W sobre ele (veja o exemplo b na figura 6.3). Em uma terceira etapa, o gás é colocado em contato com o corpo a temperatura 2T e comprimido isotermi-camente, sendo realizado um trabalho 2W sobre o gás e transferido calor Q para o corpo quente (ver exemplo c na figura 6.3). Nada im-pede que o trabalho total realizado sobre o gás seja nulo (note que, pela convenção, W é positivo mas 1W e 2W são negativos) e, nesse caso, foi retirado calor de um corpo mais quente e cedido a um cor-po mais frio. O processo não viola o enunciado de Clausius porque o gás não volta a seu estado inicial no final da transformação: sua temperatura aumentou de 1T para 2T . O diagrama dessa transfor-

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mação está representado na figura 6.4 a seguir e modela o compor-tamento de um refrigerador. O processo não viola o enunciado de Clausius porque o sistema não volta a seu estado inicial no final da transformação.

W

T1 Q

gás

A

W1

B

W2

QT2

gás

C

Figura 6.3 – Paredes duplas representam paredes adiabáticas neste desenho. (a) Expansão isotérmica, em contato com um corpo “frio” a temperatura 1T ;

(b) compressão adiabática até a temperatura chegar a 2T ;

(c) compressão isotérmica a temperatura 2T de modo a que o trabalho total seja nulo.

T1

T2

P

V

f

bi

a

∆Q = 0

Figura 6.4 – Diagrama PV de uma transformação na qual calor é retirado de um corpo mais frio (temperatura 1T ) e cedido a um corpo mais quente (temperatura 2T ).

O trecho ia corresponde à expansão isotérmica a temperatura T1, o trecho ab a uma compressão adiabática, levando a temperatura de T1 a T2, e o trecho bf a uma compressão isotérmica a temperatura T2. O diagrama é construído de modo que a área hachurada seja igual à

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área em cinza e o trabalho total seja zero (lembre-se que o trabalho é a área abaixo da curva ( )P P V= no diagrama PV). O estado final do gás, claramente, é diferente do inicial.

Na figura 6.5 a seguir representamos o esquema de um refrigerador miraculoso ou perfeito, o qual é proibido pelo enunciado de Clausius, operando entre uma fonte fria a temperatura 1T e uma fonte quente a temperatura 2T .

Refrigerador miraculoso

Q

Q

T2

T1<T2

Figura 6.5 – Esquema de um refrigerador miraculoso, no qual o único processo envolvido é a retirada de calor de uma fonte fria, a temperatura 1T ,

e sua cessão a uma fonte quente, a temperatura 2T .

6.3 Motor térmico e refrigerador6.3.1 Motor térmicoVamos exemplificar o funcionamento de um motor térmico. Esta máquina térmica tem que trabalhar em um ciclo, retirando ener-gia de um reservatório térmico (fonte quente) na forma de calor e a transformando em trabalho de forma cíclica. Segundo o enunciado de Kelvin, isso não é possível sem a presença de um segundo reser-vatório térmico (chamado de fonte fria), para onde parte do calor re-cebido é enviado. Considere então uma fonte quente a temperatura

2T e uma fonte fria a temperatura 1 2T T< .

O sistema retira um calor 2Q da fonte quente, realiza um trabalho W e cede um calor 1Q à fonte fria (a operação deste motor térmico é representada na figura 6.6 a seguir). Segundo a Primeira Lei da Termodinâmica:

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2 1 2 10 .U Q Q W W Q Q∆ = = − − ⇒ = − (6.1)

A primeira igualdade na equação 6.1 se justifica pelo fato do pro-cesso ser cíclico e o sistema voltar ao estado inicial. Como a energia interna é uma variável de estado, sua variação é nula num processo cíclico.

Q1

Q2

T2>T1

T1

W

Figura 6.6 – Esquema de um motor térmico, o qual retira calor 2Q de uma fonte quente a temperatura 2T , realiza um trabalho W e cede calor 1Q a uma fonte fria a temperatura 1T .

Note a convenção de sinal: agora e são positivos e o fato de ser um calor cedido é estabelecido pelo sinal de menos na equação 6.1. Essa convenção é diferente da usada em Ca-pítulos anteriores. Segundo a convenção anterior, a equação 6.1 seria escrita com negativo. Usaremos a nova convenção até segunda ordem.

Uma característica importante de motores é sua eficiência: o ideal é que a maior parte do calor absorvido seja transformada em trabalho (ou seja, para um dado investimento em energia, seja na forma de carvão, energia elétrica em geral etc., queremos que a maior quanti-dade possível seja transformada em trabalho útil, para operar uma máquina industrial, um automóvel, um navio, uma locomotiva etc.). Em outras palavras, deseja-se diminuir o máximo possível o calor

1Q cedido à fonte fria. A eficiência h é então definida como:

2

,WQ

h = (6.2)

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ou, em palavras, ela é o trabalho produzido sobre o calor absorvido. Usando a equação 6.1, podemos reescrever a equação 6.2 como:

2 1 1

2 2

1 .Q Q QQ Q

h−

= = − (6.3)

Assim, segundo o enunciado de Kelvin, qualquer motor térmico real tem eficiência 1h < , pois 1 0Q > .

6.3.2 RefrigeradorO objetivo de um refrigerador é resfriar objetos ou ambientes, e para isso ele retira calor de uma fonte fria e o cede a uma fonte quente. Esse é o funcionamento de uma geladeira, de um freezer ou de um ar condicionado, por exemplo. Já vimos que o ciclo não pode consistir apenas desses dois processos (enunciado de Clausius da segunda lei). Para que essas máquinas funcionem, é necessário que seja feito trabalho sobre o refrigerador. O funcionamento de um refrigerador é esquematizado na figura 6.7:

T1

Q1

WRefrigerador

Q2

T2

Figura 6.7 – Calor 1Q é retirado de uma fonte fria a temperatura 1T , trabalho W é feito sobre a máquina e calor 2Q é cedido a uma fonte quente.

A definição de eficiência usada para motores térmicos não é ade-quada para o refrigerador. Agora, queremos que este seja capaz de retirar a maior quantidade possível de calor da fonte fria ( 1Q ) sendo feito o menor trabalho (W ) possível sobre ele. Assim, o coeficiente de desempenho de um refrigerador é definido como:

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1 .QW

= (6.4)

Usando a Primeira Lei da Termodinâmica aplicada ao refrigerador,

1 2 2 10 .W Q Q W Q Q+ − = ⇒ = − Obtemos, então:

1

2 1

.QQ Q

=−

(6.5)

Veremos mais adiante como funciona um refrigerador comum resi-dencial.

Na seção 6.7.1 discutiremos em mais detalhes o funcionamento de um refrigerador doméstico, o qual é representado na figura 6.14.

6.4 Equivalência dos enunciados de Kelvin e Clausius

A princípio, não parece haver ligação entre os dois enunciados da Segunda Lei da Termodinâmica. Entretanto, veremos agora que eles são equivalentes, mostrando que o enunciado de Kelvin só pode ser verdade se o de Clausius também for verdadeiro, e vice-versa. Essa prova usa uma ferramenta bastante comum em Matemática: supo-mos que uma proposição seja verdadeira e então demonstramos que essa suposição leva a uma contradição ou a um absurdo, demons-trando assim que a proposição é falsa.

6.4.1 O enunciado de Kelvin leva ao de ClausiusVamos supor que o enunciado de Clausius seja falso, ou seja, que um refrigerador miraculoso seja possível. Um refrigerador miraculoso é aquele que realiza um processo cujo único efeito seja transferir ca-lor de um corpo mais frio a um corpo mais quente. Podemos então acoplá-lo a um motor real, como o da figura 6.6, de modo que o novo ciclo (ou a nova máquina) é representado na figura 6.8. Vamos cons-truir o refrigerador miraculoso de modo que ele receba calor 1Q da fonte fria e ceda calor 1Q à fonte quente. O motor real é como expli-cado anteriormente: ele retira calor 2Q de uma fonte quente, cede um

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calor 1Q a uma fonte fria e realiza um trabalho 2 1W Q Q= − . O efeito final desse acoplamento é que a nova máquina retira calor 2 1Q Q− da fonte quente e irá realizar trabalho 2 1W Q Q= − sendo, portanto, uma máquina que viola o enunciado de Kelvin. Assim, o enunciado de Kelvin não pode ser verdadeiro se o de Clausius não o for.

MotorRefrigeradormiraculoso

W

Q1

Q2

Q1

Q1

T1

T2>T1

WMotormiraculoso

T2>T1

Q2−Q1

T1

A B

Figura 6.8 – (a) Motor térmico (à direita da figura), o qual recebe calor 2Q de uma fonte quente, realiza trabalho W e cede calor 1Q a uma fonte fria. Esse motor é acoplado a um re-frigerador miraculoso (à esquerda da figura), o qual recebe calor 1Q da fonte fria e cede calor

1Q à fonte quente (b). A máquina resultante viola o enunciado de Kelvin, como discutido no texto, pois ela recebe calor 2 1Q Q− de uma fonte quente e realiza trabalho 2 1W Q Q= − .

6.4.2 O enunciado de Clausius leva ao de KelvinAgora vamos supor que o enunciado de Kelvin seja falso, ou seja, que um motor miraculoso seja permitido. Um motor miraculoso é aquele que realiza um processo cujo único efeito seja remover calor de um re-servatório térmico e produzir uma quantidade equivalente de traba-lho. Podemos então acoplá-lo a um refrigerador real, como o da figura 6.7, de modo que o novo ciclo (ou a nova máquina) é representado na figura 6.9 a seguir. Vamos construir o motor miraculoso de modo que ele receba calor 2 1Q Q− da fonte quente e realize trabalho 2 1W Q Q= − . Esse trabalho é então utilizado por um refrigerador, que retira calor Q1 da fonte fria e cede calor Q2 à fonte quente. Assim, o efeito desse acoplamento, motor miraculoso mais refrigerador real, é que a nova máquina retira calor Q1 de uma fonte fria e cede calor Q1 a uma fonte quente (veja a figura 6.9) sendo, portanto, uma máquina que viola o enunciado de Clausius. Então, o enunciado de Clausius não pode ser verdadeiro se o de Kelvin não o for.

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Motormiraculoso

Refrigerador

T1

T2>T1

Q2− Q1

Q1

Q2

W = Q2− Q1

Refrigeradormiraculoso

Q1

Q1

T2>T1

T1

A B

Figura 6.9 – (a) Motor miraculoso (à esquerda da figura), o qual retira calor 2 1Q Q− de uma fonte quente e realiza um trabalho 2 1W Q Q= − . Esse motor é acoplado a um refrigerador

real, de modo que o trabalho feito pelo motor é usado pelo refrigerador (à direita da figura), o qual retira calor 1Q de uma fonte fria e cede calor 2Q a uma fonte quente (b).

A máquina resultante viola o enunciado de Clausius, como discutido no texto, pois retira calor 1Q de uma fonte fria e cede calor 1Q a uma fonte quente.

6.5 Ciclo de CarnotPodemos, então, nos colocar a questão de qual seria a máquina que levaria ao maior rendimento possível, operando entre uma fonte quente e uma fonte fria. Para isso, devemos evitar máquinas com processos irreversíveis; a existência de atrito sempre transforma energia mecânica em calor, deixando de produzir trabalho útil. Ine-ficiência análoga também se dá quando ocorre transferência de ca-lor entre corpos a temperaturas diferentes.

Assim, essa máquina, operando entre duas fontes, deve trocar calor apenas a temperatura constante (transformação isotérmica), que é um processo reversível, ou então sofrer um processo no qual não seja trocado calor (transformação adiabática). Essa máquina é o cha-mado motor de Carnot (se o ciclo for percorrido no sentido inverso, temos o refrigerador de Carnot): ele consiste em uma expansão iso-térmica, com troca de calor 2Q com uma fonte quente a temperatura

2T , seguida de uma expansão adiabática, de tal modo que a tempe-ratura do sistema diminua e fique igual à da fonte fria ( 1T ). A tercei-ra transformação consiste de uma compressão isotérmica a tempe-ratura 1T e uma posterior compressão adiabática até a temperatura do sistema voltar a 2T . Na figura 6.10 a seguir representamos o ciclo de Carnot em um diagrama P V× e, posteriormente, na figura 6.11 representamos exemplos de como podem ser feitas as transforma-ções envolvidas no ciclo.

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161

Q2

Q1

T2

VcVbVdVa

T1

P

V

cd

b

a

W

Figura 6.10 – Ciclo de Carnot, o qual consiste de quatro transformações: uma expansão isotérmica de a até b a temperatura 2T ; uma expansão adiabática de b até c ,

diminuindo a temperatura do sistema de 2T a 1T ; uma compressão isotérmica de c até d a temperatura 1T ; e, finalmente, uma compressão adiabática de d até a , completando o ciclo.

T1 Q1

a b b c

d ac d

T2 Q2

Figura 6.11 – As quatro transformações do ciclo de Carnot. Linhas duplas representam pa-redes adiabáticas e linhas simples representam paredes diatérmicas. A tampa do recipiente é desenhada de forma tracejada na posição antes da transformação e com linha cheia na

posição depois da transformação.

Note que o trabalho realizado por esse ciclo é positivo (área colorida na figura 6.10). No entanto, como ele é reversível, pode ser feito no sentido contrário e, nesse caso, o trabalho seria negativo (trabalho

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162

seria feito sobre o sistema), um calor 1Q seria retirado da fonte fria e cedido um calor 2Q à fonte quente. Nesse caso, o ciclo de Carnot corresponderia a um refrigerador.

Um resultado importante é o Teorema de Carnot:

Nenhuma máquina térmica operando entre uma fonte a) quente e uma fonte fria pode ter rendimento superior ao de uma máquina de Carnot operando entre as mesmas fontes.

Todas as máquinas de Carnot que operem entre as mes-b) mas fontes têm o mesmo rendimento.

Vamos demonstrar o item a; o item b será demonstrado por você, leitor(a) (veja a questão 2 adiante). Imagine um motor térmico qual-quer (E) operando entre as mesmas temperaturas que um motor tér-mico de Carnot (C), mas com rendimento maior que este (veja figura 6.12 a seguir para uma esquematização dos motores), de modo que o trabalho realizado por E seja o mesmo que o trabalho realizado por C. Sendo 2Q o calor recebido por E da fonte quente, 1Q o calor cedido por E à fonte fria, 2Q o calor recebido por C da fonte quente e 1Q o calor cedido por C à fonte fria, temos, pela Primeira Lei da Termodinâmica:

2 1 2 1 1 1 2 2.W Q Q Q Q Q Q Q Q= − = − ⇒ − = −

(6.6)

O rendimento de uma máquina térmica é dado pela equação 6.3, ou seja:

22

; ,E CW W

QQh h= =

(6.7)

para as máquinas E e C, respectivamente. Pela hipótese, E Ch h> , e, então, usando a equação 6.7 temos que 2 2Q Q< , ou seja, 2 2 0Q Q− > . Assim, pela equação 6.6, temos que 1 1 0Q Q− > , ou seja, 1 1Q Q< .

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163

T2

T1

W

E

Motorsupereficiente

Q2~

Q1~

T2

T1

W

Motorde Carnot

Q2

Q1

Figura 6.12 – À esquerda, motor térmico operando com rendimento maior que a máquina de Carnot. À direita, motor de Carnot.

Como o ciclo de Carnot é reversível, podemos pensar que ele seja percorrido no sentido inverso, de tal modo que retire calor 1Q da fonte fria, um trabalho W seja realizado sobre o motor e seja cedido calor 2Q à fonte quente; esse é o refrigerador de Carnot. Podemos en-tão acoplar o motor E ao refrigerador de Carnot C (que é o motor de Carnot invertido), de tal modo que o trabalho realizado por E seja

o mesmo usado pelo ciclo invertido de Carnot. O es-quema está representado na figura 6.13 a seguir: note que o resultado líquido desse acoplamento é que foi retirado calor ( 1 1Q Q− ) da fonte fria e a mesma quan-tidade de calor, 2 2Q Q− (veja a equação 6.6) foi cedi-da à fonte quente, sem realização de trabalho. Isso, porém, viola o enunciado de Clausius da segunda lei e, assim, a existência de um motor com rendimento maior que o de Carnot é proibida.

O item b do Teorema de Carnot diz que qualquer motor de Carnot terá o mesmo rendimento e que esse rendimento independe da substância utilizada na máquina. Isso nos ajuda a calcular o rendimento do motor de Carnot, supondo que a substância seja um gás ideal.

Figura 6.13 – Motor supereficiente (com eficiência maior que a de um motor de Carnot operando entre as mesmas temperaturas) acoplado a um

refrigerador de Carnot, entre uma fonte quente a temperatura T1 e uma fonte fria a temperatura T2. O resultado final dessa situação é que é retirado

calor ( 1 1Q Q− ) da fonte fria e a mesma quantidade de calor é cedida à fonte quente, o que viola o

enunciado de Clausius da segunda lei.

Q2

Q1

~

~

Q2

Q1

T2

T1

Motorsupereficiente

Refrigeradorde CarnotW

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164

Exemplo 1. Calcule o rendimento de um motor de Carnot.

Solução: Como discutido no texto, vamos supor que a substância de trabalho do motor de Carnot seja um gás ideal. O rendimento é dado pela equação 6.2. Precisamos então calcular o trabalho total e o calor absorvido da fonte quente. O trabalho feito em uma transformação isotérmica a temperatura T é dado por ln( )iso f iW nRT V V= , onde n é o número de moles, R a constante dos gases, fV é o volume final e iV o volume inicial da transformação. O trabalho em uma

transformação adiabática é dado por , onde fT

é a temperatura final, iT a temperatura inicial da transformação e

MP MVC C = . Assim, o trabalho total será (confira na figura 6.10):

2 1 2 1

2 1 2 1

ln( / ) ( ) ( )1

( ) ln( ) ln( / ).1

b a d c

b a d c

nRW nRT V V T T nRT V V

nR T T nRT V V nRT V V

= + − + + +−

− = + +−

(6.8)

O calor 2Q é absorvido da fonte quente na transformação isotérmica ab (veja a figura 6.10). A variação da energia interna de um gás ideal é zero numa transformação isotérmica, pois essa energia depende só da temperatura. Assim, pela Primeira Lei da Termodinâmica:

2 2 20 ln( / ).ab ab b aU Q W Q W nRT V V∆ = = − ⇒ = =

(6.9)

A eficiência 2W Qh = é dada então por:

2 1

2

ln( / ) ln( / )ln( / )

b a d c

b a

nRT V V nRT V VnRT V V

h+

=

1 1

2 2

ln( / ) ln( / )1 1ln( / ) ln( / )

d c d c

b a a b

T V V T V VT V V T V V

+ = −

(6.10)

No entanto 1TV − é constante para uma transformação adiabática, de modo que:

1 12 1b cT V TV − −= (6.11)

e1 1

2 1 .a dT V TV − −= (6.12)

Page 165: Fisica Basica C-II 2edicao

165

Dividindo a equação 6.12 pela equação 6.11, obtemos d c a bV V V V= e, então, para um motor de Carnot:

1

2

1 .CTT

h = − (6.13)

É importante ressaltar que essa eficiência depende somente das tem-peraturas dos reservatórios quente ( 2T ) e frio ( 1T ).

Note que, apesar dessa eficiência ter sido derivada para um gás ide-al como substância, devido ao item b do Teorema de Carnot, ela é válida para qualquer substância, líquida, gasosa ou mesmo mistura das duas.

6.6 A escala termodinâmica de temperatura

Comparando as equações 6.3 e 6.13 vemos que podemos fazer a relação:

1 1

2 2

.T QT Q

= (6.14)

Como essa relação não depende da substância, ela pode ser usada como definição de uma escala de temperatura, a qual não depende da substância termométrica (pois essa é uma característica da má-quina de Carnot). Essa escala é chamada de escala termodinâmica de temperatura ou escala Kelvin de temperatura.

Medindo-se o calor cedido e o absorvido em uma máquina de Car-not, é possível então saber a razão entre as temperaturas de corpos usados como fontes quente e fria. Para definir de modo único uma escala, foi então determinado que a temperatura do ponto triplo da água corresponde a 273,16T = K.

Define-se então a escala absoluta de temperatura como:

,tr

tr

TT QQ

= (6.15)

Ponto triplo da água Ponto onde essa substância coexiste em seus estados líquido, sólido e de vapor. Nesse ponto, a pressão tem valor Ptr = 4,58 mmHg, e a temperatura valor Ttr = 0,01°C = 273,16K.

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166

onde Q e trQ são os calores retirados ou cedidos a duas fontes em uma máquina de Carnot, uma na temperatura do ponto triplo da água e outra na temperatura que se quer medir.

Note que se pode medir temperaturas menores que a do ponto triplo da água ( trT ). Nesse caso, trQ seria o calor retirado da fonte quente (a água no ponto triplo) e Q o calor cedido à fonte fria, com a temperatura T que se quer medir. A menor temperatura possível de se obter, nessa escala, corresponde a 0Q → e, portanto, 0T → . O zero absoluto ( 0T = ), nessa escala, corresponde a 0Q = , isto é, um processo no qual, retirando-se calor de uma fonte quente e o trans-formando completamente em trabalho, a eficiência dessa máquina seria de 100% (h 1h = ). Isso, porém, contraria o enunciado de Kelvin da Segunda Lei da Termodinâmica. Esse e outros raciocínios leva-ram à formulação da Terceira Lei da Termodinâmica: não é possível, por qualquer número finito de processos, atingir a temperatura zero absoluto.

6.7 Exemplos de máquinas térmicasNesta Seção vamos estudar alguns exemplos de máquinas térmicas, discutindo o que acontece em máquinas reais e as idealizações na descrição delas.

6.7.1 Refrigerador domésticoO esquema básico de um refrigerador comum é mostrado na figura 6.14 a seguir. Uma substância refrigerante, na forma líquida, retira calor da fonte fria (no caso, o interior do refrigerador) e evapora. Esse processo é modelado pela retirada de calor da fonte fria a tem-peratura constante, em um diagrama P V× (ver o processo dc na figura 6.10: nosso refrigerador é modelado pelo ciclo dessa figura percorrido ao contrário). Após a passagem por uma válvula, ele é comprimido pelo compressor, aumentando sua pressão. Esse pro-cesso é suposto ser feito muito rapidamente, de modo que não haja tempo de haver troca de calor, ou seja, é adiabático. Ele é modelado pela transformação cb na figura 6.10. Com o aumento da pressão, a substância se liquefaz a uma temperatura maior e cede calor à fonte quente, de forma aproximadamente isotérmica. Essa transformação é aproximada pelo processo ba na figura 6.10. Finalmente, a subs-

As substâncias refrigerantes eram, usualmente, freons, que são gases a base de clorofluorcarbonos (CFC) e que contribuem para a diminuição da camada de ozônio. Atualmente outros gases são usados, como os hidrofluorcarbonetos (HFC), que não possuem cloro (o qual, junto com o bromo, é responsável pela destruição da camada de ozônio) mas ainda contribuem para o aquecimento global.

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167

tância passa por uma válvula, onde sofre uma transformação para baixar sua pressão, o qual é fundamental para que a substância eva-pore a uma temperatura menor (a da fonte fria). Essa última trans-formação é aproximada por uma expansão adiabática, o processo ad na figura 6.10.

Evaporador Condensador

Compressor

Interior dorefrigerador

Frio

Quente

Baixa pressão

Alta pressão

Válvula deexpansão

Figura 6.14 – Representação esquemática de um refrigerador doméstico. O interior do refrigerador é a fonte fria e o motor que realiza

trabalho sobre a substância é o compressor.

6.7.2 Bomba de calorUma variação da montagem anterior é a bomba de calor, usada para aquecer o interior de um cômodo ou edifício, resfriando o exterior. Ou seja, ele retira calor de uma fonte fria e cede a uma fonte quente, funcionando como um ar condicionado montado de fora para den-tro. As serpentinas que contêm o fluido que se evapora, retirando calor da fonte fria, se localizam no exterior, enquanto as que contêm o fluido que se condensam, cedendo calor à fonte quente, se encon-tram no interior.

6.7.3 Ciclo OttoEsse ciclo modela, aproximadamente, um motor a gasolina. Esse motor funciona conforme mostrado na figura 6.15. Inicialmente, o combustível é admitido no cilindro pela válvula de admissão, com

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168

a válvula de exaustão fechada (veja o exemplo a na figura 6.15); esse processo é representado no diagrama P V× pela reta horizontal, com a seta apontando para a direita (figura 6.16); (essa representação não é considerada parte do ciclo propriamente dito). Após essa fase, o pistão se move para cima, com as válvulas fechadas, comprimindo a gasolina (ver o exemplo b na figura 6.15); esse processo é suposto rápido, de modo que quase não haja troca de calor. Essa transfor-mação é representada no diagrama (veja a figura 6.16 a seguir) pelo trecho ab , uma transformação adiabática. Quando o pistão está na posição mais alta (ver o exemplo c na figura 6.15) e com as duas válvulas ainda fechadas, há a centelha da vela, a qual cede calor ao sistema, aproximadamente a volume constante; esse processo é re-presentado no diagrama PV pelo trecho bc (ver a figura 6.16).

Com a explosão o pistão se move para baixo, rapidamente e com as duas válvulas ainda fechadas (ver o exemplo d na figura 6.15). É realizado trabalho nesse processo, que é aproximado por uma ex-pansão adiabática (trecho cd na figura 6.16). Quando o pistão está na posição mais baixa, a válvula de exaustão é aberta e a pressão diminui a volume constante (ver exemplo e na figura 6.15 e trecho da na figura 6.16). Finalmente, a válvula de exaustão se abre e o gás é expulso do cilindro, pois o pistão se move para cima por inércia; esse processo é representado no diagrama P V× pela reta horizon-tal, com a seta apontando para a esquerda (essa representação tam-bém não é considerada parte do ciclo propriamente dito). Logo após, a válvula de exaustão se fecha e a válvula de admissão é aberta, permitindo a entrada de mais combustível.

Válvula deadmissão aberta

Válvula deexaustãofechada

Válvula deadmissão fechada

Válvula deexaustão

aberta

Eixo da manivela

Biela Pistão

Anéis do cilindro

Centelhada vela

As duas válvulas fechadas

A B C D E

Figura 6.15 – Figura do funcionamento de um motor a gasolina.

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169

W

P

V rV V

a

b

d

Q=0

Q=0

c

Figura 6.16 – Modelo idealizado de um motor a gasolina: ciclo Otto. Ele consiste de uma compressão adiabática (ab), seguida de aumento de pressão a volume constante (bc).

Após esse processo, a substância sofre uma expansão adiabática (cd), seguida de uma diminuição de pressão a volume constante (da).

6.7.4 Ciclo DieselO ciclo Diesel está representado na figura 6.17 a seguir: ele consiste de uma compressão adiabática (trecho ab da figura 6.17), forneci-mento de calor a pressão constante (trecho bc ), expansão adiabática (trecho cd ) e, finalmente, rejeição de calor a volume constante (tre-cho da ).

W

P

V

a

d

Q=0

Q=0

cb

Vb Vc Vd

Figura 6.17 – Ciclo idealizado de um motor a Diesel. São realizados quatro processos: uma compressão adiabática, um fornecimento de calor a pressão constante, uma expansão adia-bática (nesse processo é realizado trabalho útil) e uma rejeição de calor a volume constante.

O que acontece numa câmara de um motor a diesel é mostrado na figura 6.18:

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170

válvula deadmissão aberta

ambas as válvulas fechadas

Admissão Compressão Exaustão

válvula deexaustão aberta

exaustão

Combustão

injeção decombustível

ExpansãoA B C D E

Figura 6.18 – Figura do funcionamento de um motor a diesel.

Observe que no exemplo a da figura 6.18 o pistão se desloca para baixo, aspirando ar através da válvula da esquerda (válvula de aspiração); esse processo é representado no diagrama P V× pela reta horizontal que chega ao ponto a , com a seta apontando para a direita (essa re-presentação não é considerada parte do ciclo propriamente dito).

Na fase de compressão, o pistão se desloca para cima, com a vál-vula de aspiração fechada (ver exemplo b da figura 6.18). Com isso, o ar se comprime e sofre um aumento de temperatura. Essa trans-formação é modelada por uma compressão adiabática no diagrama PV . Depois, a pressão constante, o combustível é pulverizado para o interior da câmara, aumentando um pouco o volume desta; esse processo é modelado na figura 6.17 pelo trecho bc .

Devido à alta pressão e à alta temperatura do gás na câmara, o com-bustível incendeia-se espontaneamente (sem necessitar de uma fa-gulha, como no motor a gasolina), empurrando o pistão para baixo, rapidamente. Essa última transformação é modelada por uma ex-pansão adiabática na figura 6.17. Quando o pistão está quase no pon-to mais baixo, a válvula de descarga se abre e a pressão cai a volume constante; esse processo é modelado pelo trecho da na figura 6.17.

Finalmente, parte dos gases é expulsa quando o pistão sobe; esse processo é representado no diagrama P V× pela reta horizontal que sai do ponto a , com a seta apontando para a esquerda (essa representação também não é considerada parte do ciclo propria-mente dito).

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171

6.8 Teorema de ClausiusVamos agora enunciar um teorema fundamental na introdução de uma nova grandeza termodinâmica muito importante, a Entropia.

A equação 6.14 pode ser reescrita como:

2 1 2 1

2 1 2 1

0,Q Q Q QT T T T

= ⇒ − = (6.16)

onde 2Q é o calor absorvido da fonte quente, 1Q o calor cedido à fonte fria, 2T é a temperatura da fonte quente e 1T a temperatura da fonte fria. Vamos agora voltar à convenção original sobre o sinal do calor absorvido ou cedido. Assim, a equação 6.16 pode ser reescrita como:

2 1

2 1

0,Q QT T

+ = (6.17)

e agora 1Q é negativo. Essa equação é válida para um ciclo de Carnot e pode ainda ser escrita de uma maneira generalizada:

0,i

i i

QT

=∑ (6.18)

onde a soma é sobre todos os processos onde é absorvido ou cedido calor iQ a temperatura iT .

Essa equação pode ainda ser generalizada para qualquer processo reversível e para processos irreversíveis também. Nesses casos, ela é escrita na forma:

(6.19)

onde a integral é sobre um ciclo qualquer Γ (como exemplificado na figura 6.19 a seguir), o símbolo representa uma diferencial inexata e T é a temperatura nos pontos do ciclo (em geral, o processo é tal que a temperatura varia ao longo do ciclo). O sinal de igualdade vale para ciclos reversíveis (como o de Carnot) e a desigualdade para ciclos irreversíveis. Essa equação é central na discussão a seguir, e aconselhamos fortemente você entender sua dedução. Vamos agora examinar as consequências importantíssimas da equação (6.19).

Essa dedução pode ser encontrada nas páginas

218 a 221 da seção 10.6 do livro Física Básica 2 de

Moysés Nussenzveig.

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172

PC

V

Figura 6.19 – Ciclo Γ qualquer, para o qual vale a equação 6.19. Note que no exemplo dessa figura a temperatura varia de ponto a ponto

do ciclo. O ciclo pode ser dividido em transformações infinitesimais e é o calor absorvido ou cedido em cada uma dessas transformações.

6.9 Entropia

6.9.1 Entropia e processos reversíveisVimos que, para processos reversíveis,

(6.20)

para qualquer ciclo Γ reversível e onde define uma troca de ca-lor em um processo reversível (lembre-se que a quantidade de calor trocada depende do processo). Representando esse ciclo como na figura 6.20 a seguir, podemos reescrever a equação anterior como:

(6.21)

onde a primeira integral é feita do ponto i para o ponto f pelo ca-minho ( )I e a segunda integral feita do ponto f para o ponto i pelo caminho ( )II . Podemos inverter o caminho da segunda integral e, dessa forma, a equação anterior pode ser expressa na forma:

(6.22)

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173

V

f

(II )

(I )

i

P

Figura 6.20 – Ciclo termodinâmico: do estado inicial i o sistema vai, pelo caminho ( )I , até o estado f , retornando ao estado inicial pelo caminho ( )II .

Tanto ( )I quanto ( )II são caminhos quaisquer.

Como os caminhos reversíveis ( )I e ( )II são quaisquer, a equação 6.22 diz que a integral de independe do caminho para pro-cessos reversíveis; em outras palavras, a integral de depende apenas dos pontos inicial i e final f .

Você deve se lembrar de uma situação como essa na disci-plina de Física Básica B, onde a integral definia o trabalho de uma força e a independência dessa integral em relação ao caminho tornava possível a definição de uma grandeza chamada energia potencial. Essa energia pode ser definida para qualquer força conservativa, ou seja, para qualquer for-ça tal que o trabalho desta entre dois pontos não dependa do caminho entre eles.

Pode-se então definir uma função de estado, chamada de entropia, designada pela letra S , através de:

(6.23)

A unidade da entropia no SI é /J K (Joule sobre Kelvin). Para um fluido homogêneo, por exemplo, foi visto que apenas duas grande-zas (entre P, V e T) definem o estado termodinâmico do sistema e, portanto, como S depende apenas do estado, podemos escrever:

( , ) ou ( , ) ou ( , ).S S P T S S V T S S P V= = = (6.24)

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174

Para uma transformação infinitesimal:

(6.25)

Note que é uma diferencial inexata, enquanto dS é uma dife-rencial exata, ou seja, o fator 1/T é um fator integrante para a dife-rencial inexata . Você já deve ter visto este conceito nas discipli-nas de cálculo.

Vamos ver alguns exemplos de processos reversíveis e de como se comporta a entropia nestes casos:

Transformação adiabática reversível:a) nesse caso, , e en-tão 0.dS = Se a transformação não for infinitesimal, 0RQ∆ = e

0.S∆ = Assim, a entropia é constante ao longo de um processo adiabático, por isso essa transformação é chamada também de isentrópica. Conclui-se também que, ao longo de uma adiabáti-ca no diagrama PV, a entropia é constante.

Transição de fase:b) durante uma transição de fase (lembre-se, por exemplo, da fusão da água ou de sua evaporação), a tempe-ratura se mantém constante. Nesse caso, a variação de entropia é dada por ,RS Q T∆ = ∆ onde T é a temperatura de transição e RQ∆ a quantidade de calor transferida na transição. Como

RQ mL∆ = , onde m é a massa da substância que sofre a transi-ção e L seu calor latente, temos em uma transição de fase:

mLST

∆ = (6.26)

Entropia de um gás ideal:c) para uma transformação reversível, a Primeira Lei da Termodinâmica é escrita como:

.RdU dQ PdV TdS PdV= − = − (6.27)

Obtemos então:

.dU PdVdST T

= + (6.28)

Para 1 mol de gás ideal:

,MVdU C dT= (6.29)

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175

Considerando CMV constante e que:

,PV RT= (6.30)

podemos observar que:

.PdV VdP RdT+ = (6.31)

Para calcular dS através da equação 6.28, devemos determinar antes em função de quais grandezas termodinâmicas queremos escrever a variação da entropia (veja a equação 6.24).

Escolhendo V e T , temos:

,MVC RPdVds dTT PV

= + (6.32)

onde s é a entropia por mol, e usamos a equação 6.29 no primeiro termo e a equação 6.30 no segundo termo do lado direito da equação 6.32. Simplificando:

.MVC dVds dT RT V

= + (6.33)

Integrando:

ln ln .f f

i i

T Vff f

f i MV MVi ii T V

T VdT dVs s ds C R C RT V T V

− = = + = +

∫ ∫ ∫ (6.34)

Assim, a entropia molar de um gás ideal, em função de V e T , é dada por:

( , ) ln ln ,MVs V T C T R V A= + + (6.35)

onde A é uma constante.

6.9.2 Entropia e processos irreversíveisPara calcular a variação de entropia em um processo irreversível entre dois estados i e f , temos que imaginar um processo reversível que leve de i a f e calcular a variação de entropia através de:

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176

(6.36)

Como vimos, a entropia é uma função de estado e sua variação inde-pende do processo utilizado para ir do estado inicial ao final. Assim, qualquer processo reversível pode ser imaginado, para o cálculo da integral na equação 6.36, e o resultado será independente do pro-cesso (e, portanto, será o resultado para o processo irreversível es-tudado também). Há, entretanto, alguma diferença entre processos reversíveis e irreversíveis? Veremos que a diferença se manifesta na variação de entropia da vizinhança (a variação de entropia do siste-ma de interesse, como vimos, é a mesma). Vejamos dois exemplos:

Exemplo 2. Expansão livre: suponha que um gás sofra uma expan-são, do volume inicial iV para o volume final f iV V> , em um reci-piente isolado da vizinhança, ou seja, sem troca de calor ou trabalho realizado. Pela primeira lei:

0; 0; 0.U Q W∆ = ∆ = ∆ = (6.37)

Para um processo infinitesimal:

(6.38)

Note aqui a diferença entre o trabalho realizado para um processo reversível, 0dW PdV= > , e o trabalho realizado no processo irre-versível, . Essa diferença é esperada, pois o trabalho depende do processo termodinâmico.

Como o processo de interesse é irreversível, a equação 6.36 não pode ser usada nesse caso, mas podemos imaginar um processo reversí-vel e utilizar essa equação. Para isso, vamos supor que o gás seja ide-al e que a expansão seja feita a temperatura constante. Já calculamos a variação de entropia para um processo como esse (ver a equação 6.34) e obtemos:

ln .ff i

i

VS S nR

V

− =

(6.39)

Supondo uma transformação infinitesimal, , o que di-fere do resultado para a transformação irreversível, . Isso, po-

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177

rém, era esperado, pois a quantidade de calor trocada depende do processo.

Exemplo 3. Transferência de calor irreversível: dois corpos a tempe-raturas 1T e 2T diferentes (e supondo 2 1T T> ) são postos em contato térmico. Eventualmente, eles chegarão ao equilíbrio, em uma tem-peratura entre 1T e 2T . Como exercício, você pode calcular essa tem-peratura, supondo que as massas dos blocos sejam 1m e 2m e seus calores específicos 1c e 2c , respectivamente. No caso mais simples das massas e dos calores específicos serem iguais, a temperatura de equilíbrio ( fT ) será 1 2( ) 2fT T T= + . Use um argumento de simetria para justificar essa temperatura de equilíbrio. O processo descrito é irreversível, então não podemos calcular a variação de entropia usando a equação 6.36.

Vamos imaginar um processo reversível que leve do mesmo estado inicial ao mesmo estado final. Esse processo é o seguinte: o corpo a temperatura 1T é posto em contato térmico com reservatórios a tem-peraturas cada vez maiores, mas com essas temperaturas diferindo entre si de um infinitésimo, até chegar à temperatura fT . O mesmo vale para o corpo a temperatura 2T , só que nesse caso os reserva-tórios estão a temperaturas cada vez menores, até atingir fT . Cada um dos processos descritos neste parágrafo é reversível e podemos aplicar a equação 6.36 a eles. Assim:

(6.40)

onde T na primeira integral representa as temperaturas pelas quais passa o corpo a temperatura 1T e na segunda integral representa as temperaturas pelas quais passa o corpo a temperatura 2T . Como os processos são reversíveis, todas essas temperaturas estão bem defi-nidas, mas:

(6.41)

Usando essa expressão na equação 6.40 e já supondo o caso mais simples dos corpos a diferentes temperaturas terem a mesma massa e o mesmo calor específico, obtemos:

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178

1 2

2

1 2 1 2

ln ln ln .f fT T

f f f

T T

T T TdT dTS mc mc mcT T T T TT

∆ = + = + =

∫ ∫

Lembrando que 1 2( ) 2fT T T= + , podemos reescrever a expressão 6.42 como:

21 2

1 2

( )ln .4

T TS mcTT

+∆ =

(6.43)

Queremos agora mostrar que a variação S∆ é positiva. Para isso, precisamos mostrar que a expressão entre chaves na equação 6.43 é maior que 1. Mas:

2 2 2 2 2 21 2 1 1 2 2 1 1 2 2 1 2 1 2 1 2( ) 2 2 4 ( ) 4 ,T T T TT T T TT T TT T T TT+ = + + = − + + = − +

2 2 2 2 2 21 2 1 1 2 2 1 1 2 2 1 2 1 2 1 2( ) 2 2 4 ( ) 4 ,T T T TT T T TT T TT T T TT+ = + + = − + + = − +

Assim, a expressão entre chaves na equação 6.43 pode ser reescri-ta como:

2 21 2 1 2

1 2 1 2

( ) ( )1 .4 4

T T T TTT TT+ −

= + (6.45)

Essa expressão é claramente maior que 1 e, portanto, o logaritmo natural na equação 6.43 é maior que zero, ou seja, 0S∆ > .

6.9.3 O princípio do aumento da entropiaVamos demonstrar o conhecido resultado de que a entropia de um sistema termicamente isolado nunca decresce.

A equação 6.19 nos diz que, para um processo irreversível, a inte-gral em um ciclo de ð /Q T é não positiva. Não provaremos aqui esse resultado, mas, na verdade, é possível demonstrar que, para uma transformação irreversível Γ , a integral é negativa, ou seja, é possível descartar o sinal de igual:

(6.46)

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Assim, considere agora uma transformação irreversível de um esta-do i para um estado f e uma transformação reversível de f para i. As transformações são mostradas na figura 6.21: o processo irrever-sível I é representado por uma linha pontilhada porque seu cami-nho em um diagrama Pp V× pode não estar definido, pois os estados intermediários não são necessariamente de equilíbrio. A transfor-mação reversível R traz o sistema de volta ao estado inicial. Temos então um ciclo Γ irreversível e podemos usar:

(6.47)

onde invertemos o sentido no qual o processo reversível é realizado. Para esse processo, porém, temos que:

(6.48)

e então:

(6.49)

R

V

fI

i

P

Figura 6.21 – Ciclo irreversível, consistindo de um processo irreversível I (linha tracejada) e um processo reversível R (linha cheia).

Note que a variação de entropia se aplica a qualquer processo entre i e f , pois a entropia é uma função de estado. Temos então:

(6.50)

Se o sistema estiver isolado termicamente, , e obtemos:

0.S∆ > (6.51)

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Se o ciclo todo fosse reversível, poderíamos demonstrar, partindo da equação 6.19 com o sinal de igual, que:

0.S∆ = (6.52)

Assim, para um sistema isolado termicamente, temos:

0,S∆ ≥ (6.53)

onde o sinal de igual vale para um processo reversível e a desigual-dade para um processo irreversível.

Vamos agora introduzir termos convenientes para nossa discussão a seguir. Consideramos o sistema isolado, ou universo, como composto de um sistema físico de interesse, chamado apenas de sistema, e de sua vizinhança.

Pode-se então enunciar a Segunda Lei da Termodinâmica em ter-mos da variação da entropia de um sistema fechado, ou do universo, da seguinte forma:

Em qualquer processo termodinâmico que ocorra entre dois estados de equilíbrio, o resultado da soma da entropia do sistema com a entropia da vizinhança nunca diminui.

Note o conceito de vizinhança: essa é uma porção não pertencente ao sistema, mas que, junto com este, forma um sistema completo ter-micamente isolado, conforme o enunciado anterior. Vamos discutir dois exemplos:

Compressão espontânea: no exemplo 1 da Seção 6.9.2, vimos que a entropia aumenta de ln ( / )f iS nR V V∆ = quando um sistema isolado vai do volume iV para o volume f iV V> . Esse processo é comum e trata-se de uma expansão livre. No caso da compressão espontânea,

f iV V< e assim a entropia de um sistema fechado diminuiria, o que é proibido pela segunda lei. Essa é a razão de não termos tido notícia de uma audiência ter sufocado as pessoas porque todo o ar de uma sala se concentrasse em um canto desta.

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Condução de calor: no exemplo 3, calculamos a variação de entropia quando é retirado calor de um corpo mais quente e fornecido a um corpo mais frio, no momento em que este é posto em contato térmi-co com aquele. Vimos que essa variação é positiva, como manda a segunda lei. O processo contrário, isto é, quando é retirado calor de um dos corpos e cedido ao outro, até que ambos estivessem nas tem-peraturas 1T e 2T , nunca ocorre porque ele violaria a segunda lei.

Esses dois exemplos permitem a introdução da noção de uma “seta do tempo”, de um sentido para a ocorrência de fenômenos. Como discutimos anteriormente, a primeira lei não proíbe a compressão espontânea, mas a segunda lei, na forma de aumento da entropia, a proíbe.

Exemplo 4. Um bloco de gelo de massa 0,012gm = a temperatura inicial de 15gT = − é misturado à água em um calorímetro perfei-tamente isolado. A massa da água é de 0,056am = e sua tempe-ratura inicial de 23aT = . Calcule a temperatura final da mistura e mostre que todo o gelo se funde. Calcule a variação de entropia da mistura e discuta. Vamos desprezar o calor absorvido ou cedido pelo calorímetro.

Dados: calor específico do gelo: 2.220J / kg KgC = ; calor específico da água: 4.190J / kg KaC = ; calor latente de fusão: 333J / kg KL = .

Solução: Precisamos calcular a temperatura final da mistura. Vamos supor que todo o gelo tenha esquentado até a temperatura de 0 , tenha se transformado em água e esta tenha elevado sua temperatura até a temperatura final ( fT ). Caso essa hipótese esteja incorreta, nos-sas equações mostrarão alguma inconsistência. Assim, o gelo absorve calor para elevar sua temperatura até 0 (primeiro termo do lado direito da equação 6.54 a seguir), depois absorve calor para mudar de fase e se transformar em água (segundo termo do lado direito da equação 6.54) e, finalmente, essa quantidade de água devida ao gelo eleva sua temperatura até a temperatura final (terceiro termo do lado direito da equação 6.54). O calor absorvido por estes três processos é então calculado por:

0(0 ) ( 0 ).a g g g g g a fQ m c C T m L m c T C∆ = ° − + + − (6.54)

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O calor cedido se deve à quantidade de água inicialmente presente no calorímetro e é dado por:

( ).c a a f aQ m c T T∆ = − (6.55)

Como a mistura está isolada, 0.a cQ Q∆ + ∆ = Dessa equação pode-mos calcular fT , dado por 3,5fT = . Note que, nestas equações, utilizamos a temperatura em graus Celsius porque nas expressões ela sempre entra como diferenças de temperaturas. Daqui em diante, te-mos que utilizar as temperaturas em Kelvin (na dúvida, você estará seguro(a) se sempre utilizar as temperaturas em Kelvin).

Para calcular a variação de entropia do gelo, vamos reconhecer, mais uma vez, três processos:

Absorção de calor pelo gelo de forma irreversível. Já cal-a) culamos S∆ para esse caso (exemplo 3 anterior), obtendo

ln (273,15 / )g g g gS m c K T∆ = . Note que, como antecipado, esta-mos usando as temperaturas em Kelvin (K);

Aumento de entropia devido à transformação de fase do gelo. Esse b) cálculo foi efeito anteriormente (ver o item b da Seção 6.9.1) e obtivemos 273,15tf gS m L K∆ = ;

Essa porção de água eleva sua temperatura até c) 3,5 276,65fT C K= ° = . Esse cálculo é análogo ao feito no item a

acima e obtemos ln ( / 273,15 )ga g a fS m c T K∆ = .

Feitos esses cálculos para os valores do problema, obtemos:

16,7 J/K.gelo g tf gaS S S S∆ = ∆ + ∆ + ∆ = (6.56)

Para a variação da entropia da água inicialmente posta no calorí-metro, os cálculos são análogos ao item a anterior, obtendo-se

ln ( / ) 15,9 J/K.a a a f aS m c T T∆ = = −

Como vemos, a variação da entropia da água é negativa. Isso não viola o enunciado da segunda lei porque a água não é um sistema isolado. Se considerarmos o gelo sua vizinhança, de tal forma que gelo+água (sistema+vizinhança) estejam isolados, então a variação total de entropia é 16,7 J/K ( 15,9) J/K 0,8 J/Kt gelo aS S S∆ = ∆ + ∆ = + − = e, como esperado, essa variação é positiva.

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Vemos agora a diferença entre processos irreversíveis e reversíveis. Enquanto ambos produzem a mesma variação de entropia no sis-tema físico de interesse, a vizinhança tem uma variação diferen-te de entropia em cada caso. Para processos reversíveis, a entro-pia da vizinhança varia de modo a que a variação de entropia do sistema+vizinhança seja nula. Para processos irreversíveis, apesar da variação de entropia do sistema ser a mesma, a variação de en-tropia total é sempre positiva, ou seja, a variação de entropia da vi-zinhança é diferente da ocorrida num processo reversível.

Do ponto de vista prático, o aumento da entropia corresponde a um desperdício de energia, a qual não será transformada em trabalho. Esse é o caso, por exemplo, na condução de calor entre dois corpos a temperaturas diferentes: esses corpos poderiam ser utilizados como fontes quente e fria de uma máquina de Carnot e produzir trabalho. Posto em contato um com o outro, a temperatura de equi-libro é a mesma para ambos e o calor trocado não foi utilizado para realizar trabalho.

A interpretação microscópica da entropia é um assunto também fascinante mas fora do escopo deste texto.

ResumoIntroduzimos e discutimos diversos enunciados da Segunda Lei da Termodinâmica, estudamos modelos de máquinas térmicas e atra-vés da discussão do ciclo de Carnot chegamos a uma escala ter-modinâmica de temperatura. Finalmente, introduzimos o conceito termodinâmico de entropia e de “seta do tempo”.

QuestõesPor que o calor cedido à fonte fria não pode ser nulo em uma 1) máquina térmica (veja a figura 6)? Por que ele não pode ser também positivo, ou seja, por que o motor não pode também receber calor da fonte fria?

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Reveja o raciocínio usado para provar o item a do Teorema de 2) Carnot. Substitua a hipotética máquina de rendimento maior que a de Carnot por outro ciclo de Carnot e demonstre o item b do Teorema de Carnot.

Uma certa quantidade de energia mecânica pode ser totalmente 3) convertida em energia térmica? Dê um exemplo, se possível.

Considere uma caixa que tem um número muito pequeno de 4) moléculas, digamos três. Pode acontecer algumas vezes, por acaso, que todas essas moléculas se encontrem na metade es-querda da caixa e a metade direita esteja vazia? Isso seria a compressão livre, o oposto da expansão livre. Por que esse fe-nômeno não acontece com todo o ar de uma sala?

Quando juntamos cartas de um baralho em um maço ou empi-5) lhamos tijolos para construir uma casa, aumentamos a ordem do mundo físico. Isso viola a Segunda Lei da Termodinâmica?

No processo de surgimento de um ser vivo, desde as células 6) mais simples até os organismos mais complexos, uma forma de organização muito complexa é obtida. Nesse processo de ordenamento, a entropia diminui; isso significa que essa ten-dência à ordem viola a Segunda Lei da Termodinâmica?

ProblemasDemonstre que duas curvas adiabáticas não podem se cruzar. 1) Dica: suponha que esse cruzamento seja possível e complete o ciclo com uma isoterma. Mostre então que a Segunda Lei da Termodinâ-mica seria violada nesse caso.

Relembre as definições de rendimento 2) h de um motor e de co-eficiente de desempenho de um refrigerador. A partir daí:

Para um refrigerador de Carnot, calcule a) em função das temperaturas das fontes fria e quente, 1T e 2T , respectiva-mente. Discuta como esse coeficiente depende da tempera-tura externa;

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Compare o rendimento de um motor de Carnot com o de-b) sempenho de um refrigerador obtido do motor de Carnot pela reversão dos processos;

Em um refrigerador doméstico, o coeficiente c) de desem-penho é 40% do ideal e o motor fornece uma potência de 220 W. A temperatura do congelador é de 13− , suponha a temperatura ambiente de 27 . Qual a quantidade de calor removida do congelador, em 15 minutos de funcionamento do motor? Que quantidade de gelo ela permitiria formar, partindo da água a uma temperatura de 0 (o calor latente de fusão do gelo é de 80 )?

3) Um gás ideal monoatômico se expande lentamente até ocupar um volume igual ao dobro do seu volume inicial, realizando um trabalho igual a 300 J no processo. Esse processo pode ser isotérmico, adiabático ou isobárico. Sendo assim:

Desenhe em um diagrama a) PV os três processos acima.

Calcule o calor fornecido ao gás e a variação de sua energia b) interna para cada um dos três processos.

4) Numa máquina térmica o agente é um gás ideal de coeficiente adiabático . O gás sofre uma expansão adiabática na qual seu volume cresce r vezes, seguida de uma compressão isotérmica até seu volume inicial. Para fechar o ciclo, sua pressão é au-mentada a volume constante. Dessa forma:

Desenhe esse ciclo em um diagrama a) PV , explicitando to-das as informações disponíveis;

Calcule o rendimento em função de b) r e ;

Exprima o rendimento em função da razão entre as tempe-c) raturas extremas, 2 1T T ;

Calcule o rendimento para d) e 2r = . Compare esse rendimento com o de uma máquina de Carnot operando entre as mesmas fontes.

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Mostre que, para um fluido incompressível e com capaci-5) dade térmica C suposta constante, a entropia é dada por

ln( ) ,S C T A= + onde A é independente da temperatura.

Mostre que a entropia molar de um gás ideal, em função da pressão 6) P e da temperatura T , é dada por ( , ) ln ln ,MPs p T C T R P A= − + onde A é uma constante e p VC C R= + é a capacidade térmica a pressão constante.

Bibliografia básicaNUSSENZVEIG, H. Moysés. Curso de física básica. São Paulo: Edgard Blücher, 1997. v. 2.

RESNICK, R.; HALLIDAY, D.; KRANE, K. S. Física. Rio de Janeiro: LTC, 2006. v. 2.

SEARS, Zemansky. Física II: termodinâmica e ondas. 10. ed. São Paulo: Addison Wesley, 2003.

TIPLER, Paul A.; MOSCA, Gene. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. v. 1.