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Universidade Técnica de Lisboa Instituto Superior de Agronomia Flora e vegetação da Serra de Nogueira e do Parque Natural de Montesinho Doutoramento em engenharia agronómica Carlos Francisco Gonçalves Aguiar Lisboa 2000

Flora e vegetação da Serra de Nogueira e do Parque Natural ...bibdigital.rjb.csic.es/PDF/Aguiar_Fl-Nogeira-Montesinho.pdf · X. PARIETARIETEA 345 3.3.2. Vegetação casmocomofítica

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  • Universidade Tcnica de Lisboa Instituto Superior de Agronomia

    Flora e vegetao da Serra de Nogueira e do Parque Natural de Montesinho

    Doutoramento em engenharia agronmica

    Carlos Francisco Gonalves Aguiar

    Lisboa 2000

  • Universidade Tcnica de Lisboa Instituto Superior de Agronomia

    Flora e vegetao da Serra de Nogueira e do Parque Natural de Montesinho

    Doutoramento em engenharia agronmica

    Carlos Francisco Gonalves Aguiar

    Dissertao apresentada neste Instituto para a obteno do grau de doutor

    Lisboa 2000

  • Lisboa 2000 Flora e vegetao da Serra de Nogueira e do Parque Natural de Montesinho Carlos Aguiar

  • ndice

    PRLOGO I

    RESUMO V

    ABSTRACT VI

    INTRODUO 1

    I PARTE. CARACTERIZAO DA REA DE ESTUDO 5

    1. Localizao da rea de estudo 5

    2. Geologia 6

    3. Geomorfologia 11

    4. Solos 22

    5. Climatologia e bioclimatologia 30

    6. Ocupao e utilizao humana do territrio 41

    II PARTE. FLORA 45

    1. Herborizaes e outros trabalhos sobre a flora do Parque Natural de Montesinho e Serra de Nogueira no mbito do estudo da flora transmontana 45

    2. Endemismos e relquias serpentincolas das rochas UB de Trs-os-Montes 52

    3. Plantas cultivadas e sinantrpicas na rea do Parque Natural de Montesinho e Serra de Nogueira 58

    4. Catlogo da Flora Vascular do Parque Natural de Montesinho e Serra de Nogueira 67

    5. Comentrios adicionais ao catlogo da flora do Parque Natural de Montesinho e Serra de Nogueira 267

    5.1. Taxa citados na bibliografia e excludos do catlogo 267 5.2. Alguns nmeros respeitantes flora da Serra de Nogueira e Parque Natural de Montesinho 269 5.3. Plantas endmicas na rea do Parque Natural de Montesinho e Serra de Nogueira 270 5.4. Raridade e estatuto de ameaa IUCN 276

    III PARTE. VEGETAO 281

    1. Investigaes fitossociolgicas no NE de Portugal 281

    2. Mtodos e conceitos da fitossociologia integrada 281

    3. Vegetao do Parque Natural de Montesinho e da Serra de Nogueira 301 3.1. Vegetao aqutica de guas doces 304

    I. LEMNETEA 305 II. POTAMETEA 306

  • 3.2. Vegetao dulceaqucola anfbia, fontinal e de turfeiras 312 3.2.1. Vegetao anfbia efmera primocolonizadora 312

    III. BIDENTETEA TRIPARTITAE 312 IV. ISOETO-NANOJUNCETEA 313

    3.2.2. Vegetao anfbia lacustre, palustre, fontinal e de turfeiras 322 V. ISOETO-LITTORELLETEA 322 VI. MONTIO-CARDAMINETEA 324 VII. PHRAGMITO-MAGNOCARICETEA 329 VIII. SCHEUCHZERIO-CARICETEA FUSCAE 338

    3.3. Vegetao rupcola 341 3.3.1. Vegetao casmoftica 341

    IX. ASPLENIETEA TRICHOMANIS 341 X. PARIETARIETEA 345

    3.3.2. Vegetao casmocomoftica 348 XI. PHAGNALO-RUMICETEA INDURATI 348

    3.4. Vegetao antropozoognica, herbcea de orlas de bosques ou megafrbica 355 3.4.1. Vegetao antropozoognica 355

    XII. ARTEMISIETEA VULGARIS 355 XIII. PEGANO-SALSOLETEA 361 XIV. POLYGONO-POETEA ANNUAE 364 XV. STELLARIETEA MEDIAE 368

    3.4.2. Vegetao herbcea de orlas de bosques e vegetao megafrbica 393 XVI. GALIO-URTICETEA 393 XVII. ANTHRISCO CAUCALIDIS-GERANIETEA PURPUREI 401 XVIII. TRIFOLIO-GERANIETEA 404

    3.5. Vegetao herbcea siliccola, mediterrnica ocidental, tendencialmente orfila 411 XIX. FESTUCETEA INDIGESTAE 411

    3.6. Vegetao pratense 422 3.6.1. Arrelvados terofticos 422

    XX. HELIANTHEMETEA 422 3.6.2. Arrelvados vivazes mesoflicos ou xeroflicos 441

    XXI. POETEA BULBOSAE 441 XXII. STIPO GIGANTEAE-AGROSTIETEA CASTELLANAE 446

    3.6.3. Prados antropozoognicos dependentes de pastoreio e/ou corte 459 XXIII. MOLINIO-ARRHENATHERETEA 459 XXIV. NARDETEA 487

    3.7. Vegetao arbustiva subserial 492 3.7.1. Vegetao arbustiva subserial helifila de solos delgados 492

    XXV. CALLUNO -ULICETEA 492 XXVI. CISTO-LAVANDULETEA 500

    3.7.2. Vegetao arbustiva subserial de orlas de bosques 506 XXVII. CYTISETEA SCOPARIO-STRIATI 506 XXVIII. RHAMNO-PRUNETEA 521

    3.8. Vegetao potencial arbrea ou arbustiva 526 3.8.1. Bosques ripcolas primocolonizadores 526

    XXIX. SALICETEA PURPUREAE 526 3.8.2. Bosques e pr-bosques climatfilos ou edafoxerfilos 529

    XXX. QUERCETEA ILICIS 529 XXXI. QUERCO-FAGETEA 545

    3.9. Esquema sintaxonmico 571

    4. Sries de vegetao 581 4.1. Holco mollis-Querceto pyrenaicae Sigmetum 582 4.2. Physospermo cornubiensis-Querceto suberis Sigmetum 589 4.3. Genisto hystricis-Querceto rotundifoliae Sigmetum 591 4.4. Macrosrie edafo-higrfila de Fraxinus angustifolia do Populio albae Sigmion 595 4.5. Galio broteriani-Alneto glutinosae Sigmetum 596 4.6. Scrophulario scorodoniae-Alneto glutinosae Sigmetum 598 4.7. Macrosrie edafo-higrfila de Betula celtiberica e Salix atrocinerea do Betulio celtiberico-fontqueri Sigmion 598

  • 5. Outros complexos de vegetao 598 5.1. Complexos de vegetao pratense 599

    5.1.1. Complexos de vegetao pratense mesomediterrnicos superiores e supramediterrnicos inferiores sub-hmidos lusitano-durienses e orensano-sanabrienses 600 5.1.2. Complexos de vegetao pratense de transio 603

    6. Geossries 606 6.1. Geossries climatfilas 606

    6.1.1. Holco mollis-Querceto pyrenaicae Geosigmetum 606 6.1.2. Physospermo cornubiensis-Querceto suberis Geosigmetum 608

    6.2. Geossries ripcolas 609

    IV PARTE. BIOGEOGRAFIA 611

    1. Metodologia e conceitos fundamentais de biogeografia 611

    2. Estudos biogeogrficos sobre a Serra de Nogueira e o Parque Natural de Montesinho 612

    3. Tipologia biogeogrfica da rea de estudo 613 3.1. Sector Orensano-Sanabriense 617 3.2. Sector Lusitano-Duriense 619

    CONCLUSES 622

    BIBLIOGRAFIA 630

    ANEXOS 651

    Anexo I. Caracterizao genrica das unidades pedolgicas, classificao FAO/UNESCO, presentes na rea de trabalho. Transcrito de AGROCONSULTORES & COBA (1991) 652

    Anexo II. Unidades-solo co-dominantes e sub-dominantes presentes na rea de estudo. 654

    Anexo III. Sistema bioclimatolgico de Rivas-Martnez 655

    Anexo IV. Princiapis termos e conceitos da classificao das plantas sinantrpicas de KORNAS (1990) 658

    Anexo V. Tipologia fisionmica de BARKMAN (1988) restringida aos tipos fisonmicos de plantas aquticas citados no texto 659

  • 1

    Introduo

    Esta dissertao de doutoramento tem por ttulo e objecto a flora e a vegetao do Parque Natural de Montesinho (PNM) e da Serra de Nogueira: um territrio situado em Trs-os-Montes, no extremo NE de Portugal. Inicia-se com uma primeira parte de caracterizao fsica da rea de estudo. A complexidade dos solos, dos tipos litolgicos e das figuras do relevo regionais e a sua importncia na compreenso dos padres de distribuio espacial e de socializao das plantas vasculares, obrigaram a uma abordagem particularmente cuidadosa destes temas. No caso particular do solo, apesar de ser significativo o conhecimento acumulado sobre os solos transmontanos (cf. AGROCONSULTORES & COBA, 1991), no existem, contudo, estudos de biossequncias pedolgicas e no se conhece qualquer trabalho que ensaie estabelecer uma correlao entre solo e vegetao que ultrapasse a simples banalidade. Tendo em vista esta lacuna, julgamos necessrio efectuar uma tentativa, ainda que breve, de correlacionar os tipos de solo existentes na rea de estudo com a vegetao, sobretudo com a vegetao serial.

    O facto de actualmente ser possvel obter, por aplicao de ndices bioclimticos, boas correlaes clima distribuio espacial de taxa e sintaxa, permite a utilizao dos dados climticos como um importante auxiliar nos estudos de sintaxonomia, sinecologia e de sincorologia, sendo ainda de grande utilidade para o esboo de fronteiras biogeogrficas. A informao climatolgica relativa a Trs-os-Montes progrediu consideravelmente nos ltimos anos o que nos permitiu utilizar dados at h pouco tempo inditos com os quais se procurou complementar os dados fornecidos pela rede meteorolgica do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofsica. Ainda na primeira parte, para alm da aplicao do j clssico sistema bioclimatolgico de Rivas-Martnez (RIVAS-MARTNEZ & LOIDI, 1999a), procedeu-se sua comparao com o sistema de classificao (bio)climtica regional de GONALVES (1991), o sistema mais frequentemente utilizado em Trs-os-Montes.

    A segunda parte tem por objecto a flora da rea de estudo. A primeira dificuldade que se nos deparou no estudo da flora do NE de Portugal foi a enorme complexidade dos problemas taxonmicos levantados pelas plantas dos afloramentos de rochas ultrabsicas (cf. KRUCKERBERG, 1986). Tivemos, para isso, necessidade de estudar a forma como diferentes autores abordaram o problema e de aprofundar os nossos conhecimentos sobre o efeito dos serpentinitos nos fenmenos de diferenciao ecotpica e especiao, de modo a

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    encontrar bases para o estabelecimento de uma taxonomia consistente e homognea para estas plantas. Consequentemente, considerou-se oportuno rever a taxonomia de alguns dos taxa descritos para os habitates ultrabsicos transmontanos e reavaliar a sua utilizao na diferenciao de sintaxa.

    O levantamento da flora iniciou-se com uma reviso bibliogrfica, seguida da herborizao de toda a flora vascular indgena ou naturalizada da rea de trabalho. Para a recolha bibliogrfica tivemos que consultar a bibliografia dos primeiros botnicos que colheram plantas em Trs-os-Montes (vd. ROZEIRA, 1944). Algumas das descries da flora e da paisagem vegetal transmontanas efectuadas por esses exmios naturalistas surpreenderam-nos pela sua profundidade e qualidade, pelo que, a certa altura, consideramos que era do maior interesse elaborar uma breve histria das investigaes botnicas em Trs-os-Montes. Esta mereceria contudo um desenvolvimento de maior profundidade que no pudemos levar a cabo no mbito desta dissertao.

    A identificao do material herborizado resultou da utilizao de chaves dicotmicas e descries disponveis na bibliografia e da comparao dos exemplares mais crticos com material de herbrio (vd. II parte). Em simultneo com a flora autctone e naturalizada, foram identificadas as plantas sinantrpicas e as principais plantas cultivadas, tanto ornamentais como agrcolas e florestais, da regio.

    Tendo em considerao que coligir informao relevante para a conservao da diversidade vegetal e para o planeamento e gesto de reas protegidas era tambm um dos objectivos desta dissertao, pareceu-nos insuficiente a elaborao de uma simples lista de flora, sem mais informao alm de alguns comentrios taxonmicos e nomenclaturais. Optamos por realizar, para cada taxon, uma avaliao da respectiva raridade s escalas local e nacional uma das muitas formas de medir a importncia para a conservao de um dado taxon bem como recolher alguns nomes vulgares, identificar os seus habitates e, por fim, caracteriz-los do ponto de vista fitossociolgico. Esta ltima componente particularmente importante porque a conservao da diversidade vegetal no pode ser considerada independente da conservao e do maneio do habitat das plantas (GIVEN, 1994).

    No estudo da vegetao efectuado na terceira parte adoptou-se a metodologia da escola de Zurique-Mompilher, complementada com as contribuies tericas e conceptuais recentemente aportadas pela fitossociologia paisagstica. Ao longo desta parte, por vezes em notas de rodap, foram sendo feitos alguns esclarecimentos tericos e conceptuais que justificamos, em sede prpria, pela necessidade de tomar opes conceptuais e metodolgicas que no so ainda consensuais entre os estudiosos ibricos da fitossociologia. Estes esclarecimentos no dispensaram contudo uma introduo terica

  • 3

    fitossociologia com a qual iniciamos o terceiro captulo, logo aps uma breve resenha histrica dos estudos fitossociolgicos realizados em Trs-os-Montes.

    O estudo da vegetao processou-se s trs escalas fundamentais da fitossociologia paisagstica: a fitocenose, a srie de vegetao e a geossrie de vegetao. escala da fitocenose, para cada comunidade vegetal identificada, foi descrita a sua estrutura, ecologia, distribuio na rea de estudo e em Trs-os-Montes e, quando tal se mostrou possvel, a corologia geral, a variabilidade florstica, o significado serial e os contactos catenais. Embora nos tenhamos mantido quase sempre fieis sintaxonomia dos catlogos de RIVAS-MARTNEZ, FERNNDEZ-GONZLEZ et al. (2000) e de RIVAS-MARTNEZ et al. (1999), como em sintaxonomia (e tambm na ideotaxonomia) os limites da variao florstica de cada sintaxon so estabelecidos por conveno i.e., existe um tipo nomenclatural em relao ao qual as divergncias florsticas admissveis para os indivduos de associao variam frequentemente de autor para autor foi muitas vezes necessrio discutir com alguma profundidade alguns aspectos da sintaxonomia dos sintaxa identificados. Para os sintaxa de categoria superior ou igual subaliana, foi feito um ensaio de enumerao dos taxa caractersticos.

    No estudo dos complexos de vegetao prestamos uma especial ateno aos complexos seriais de vegetao. Para identificarmos e classificarmos a vegetao e as sries de vegetao das reas mesomediterrnicas da rea de estudo, todas elas com pouca expresso e com um forte carcter fincola no Parque Natural de Montesinho, tivemos que nos embrenhar no estudo das fitocenoses e das sries de vegetao lusitano-durienses.

    Nos complexos de vegetao no seriais trabalhamos exclusivamente os complexos de vegetao pratense porque o seu estudo oferece algumas vantagens face a outros tipos de complexos de vegetao no correlacionados com a dinmica serial: tm padres de recorrncia espacial bastante claros; os factores ecolgicos que condicionam as catenas de vegetao so normalmente evidentes; e so tambm os complexos de vegetao com maior interesse aplicado porque envolvem comunidades vegetais com grande interesse agronmico.

    J havamos comeado a escrever esta dissertao quando efectuamos a maioria dos geossininventrios transcritos em III.6. De facto, a geossinfitossociologia exige um conhecimento muito profundo da vegetao serial de um dado territrio; exige uma conceptualizao clara de complexo de vegetao, microgeosigmetum, srie de vegetao, geossrie de vegetao e clissrie altitudinal; e ainda uma perfeita distino dos diferentes tipos de sries de vegetao sries climatfilas, edafoxerfilas e edafo-higrfilas e entre geossries climatfilas e ripcolas (cf. ALCARAZ, 1996 e RIVAS-MARTNEZ, 1996).

  • 4

    A informao recolhida nas partes I, II e III culminou com a caracterizao biogeogrfica da rea de estudo (IV parte). De acordo com as tendncias mais recentes da biogeografia ibrica (vd. GHU & RIVAS-MARTNEZ, 1981 e ALCARAZ, 1996) deu-se primazia corologia das sries e geossries de vegetao na delimitao dos diferentes territrios biogeogrficos transmontanos. S a posteriori se procurou identificar o cortejo florstico caracterstico ou diferencial de cada um dos territrios biogeogrficos previamente discriminados.

  • 5

    I Parte. Caracterizao da rea de Estudo

    1. Localizao da rea de estudo

    A rea de estudo situa-se no extremo NE de Portugal, na antiga regio administrativa de Trs-os-Montes (figura 1). Engloba a totalidade do Parque Natural de Montesinho (PNM) e a Serra de Nogueira, uma serra exterior ao PNM mas no seu directo prolongamento para S. Tem uma rea de cerca de 90.000 ha, dos quais 73.400 ha esto integrados no PNM. Desenvolve-se entre os paralelos 4144' S e 4159' N e os meridianos 630' e 710' W. No PNM ocupa a parte mais setentrional dos concelhos de Vinhas e Bragana; na Serra de Nogueira os extremos SE e SW destes dois concelhos, respectivamente.

    Figura 1. Localizao da rea de estudo na Pennsula Ibrica

  • 6

    No PNM, os limites da rea de estudo so a W, N e E a Espanha provncias de Orense e Zamora e a S as estradas nacionais 103 (Bragana-Vinhais) e 218 (Bragana-Quintanilha). A rea da Serra de Nogueira est contida nas cartas militares 1:25.000 24, 37 e 50. Grosso modo tem por fronteira uma linha imaginria que parte, a W, de Grandais e segue por Formil, lugar das Corrias, Sr. da Cabea, lugar de Ervedal, Castelo de Rebordos, Sortes, Lano, falda S da Sr. da Serra (Cumeeira), Celas, Zoio, falda W do Castro de Ouzilho, Romariz e termina na falda oeste do Monte de Cabres (figura 2).

    2. Geologia

    A litologia e os aspectos estruturais de Trs-os-Montes, particularmente dos concelhos de Bragana e Vinhais, so dos mais complexos de Portugal. Desde os anos 40 tm sido objecto de sucessivos estudos geolgicos de ndole diversa, dispersos por numerosas teses e outros tipos de publicaes cientficas, a maioria de grande hermetismo para o no gelogo. Resumidamente, a rea em estudo est situada na extremidade ocidental do Macio Hesprico ou Ibrico, um dos fragmentos do soco hercnico Europeu. Um dos aspectos mais importantes da geologia deste territrio a sua zonalidade quanto paleogeografia, estilo estrutural, magmatismo e metamorfismo. A esta zonalidade est subjacente a implantao de uma frente de mantos de carreamento que se ter iniciado durante a orogenia Varisca (ou Hercnica) no Devnico mdio (ca. 350 M.a.), resultante do choque de duas placas continentais placas de Gondwana e Armrica e do fecho de um oceano o oceano Varisco (cf. RIBEIRO, 1974 e MARQUES, 1989). Durante este perodo de tempo geolgico, a crosta ocenica primitiva do oceano Varisco e pores do contacto manto superior-placa continental alctone, foram deslocados de oeste para este, arrastando outros terrenos alctones de raiz mais prxima que os primeiros, sobre terrenos paleozicos.

    Existem diferentes classificaes para atender zonalidade geolgica de Trs-os-Montes, fundamentais na descrio e explanao da litologia regional. Na classificao mais recente, da autoria de RIBEIRO et al. (1987 cit. MARQUES, 1989), reconhecem-se trs terrenos tectonoestratigrficos: Ibrico, Ofioltico Setentrional e Alctone Continental (figura 3.). O Terreno Ibrico subdividido em Zona Centro-Ibrica, Zona com Afinidades1 Centro-Ibricas e Zona com Afinidades de Ossa Morena. Noutras classificaes (RIBEIRO, 1974 e IGLESIAS et al. 1983) estas zonas correspondem, respectivamente: aos domnios estruturais Autctone ou Douro Inferior; Parautctone ou Subdomnio Peritransmontano; e Alctone Inferior, Subdomnio Centrotransmontano ou ainda Complexo de Mantos Inferiores.

    1 Este termo indica a localizao da zona de razes.

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    Figura 2. Povoaes mais importantes da rea de estudo

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    A zona Centro-Ibrica (figuras 3 e 4), na rea de estudo, dominada por sedimentos ordovcicos e silricos (RIBEIRO, 1974 e MEIRELES et al., 1995), na maioria xistos, constituindo a unidade morfolgica correntemente denominada por "Trs-os-Montes xistento" (CABRAL, 1985). No NE de Trs-os-Montes, o Ordovcico centro-ibrico dispe-se em forma de arco entre Cisterna (Vinhais) e Travanca (Miranda do Douro). A sua litologia dominada por quartzitos (Arenigiano) alternados com xistos de diferentes tipos e extensas reas de xistos carbonosos (Landeiliano/Caradociano) (MEIRELES et al., 1995), localmente explorados no fabrico de lousas para telhados. Tambm existem mineralizaes intercaladas de ferro sedimentar. No Silrico existe um nvel de referncia litoestratigrfica de grs quartztico que divide duas formaes dominadas por xistos: infraquartztica e supraquartztica (cf. MEIRELES et al., 1995). A primeira formao constituda por xistos de gro fino (filitos) carbonosos com diferentes intercalaes e lentculas como por exemplo de calcrios dolomticos (na proximidade de Moimenta). Na formao supraquartztica esto presentes xistos de cores variadas.

    Figura 3. Classificao tectonoestratigrfica regional (adaptado de RIBEIRO, 1974)

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    Figura 4. Excerto da Carta Geolgica do NE de Trs-os-Montes. Escala 1:200.000 (adaptado de Direco Geral de Minas e Servios Geolgicos, 1974)

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    A Zona com Afinidades Centro-Ibrica est ausente da rea de estudo, contudo, como se depreende da sua denominao, litologicamente e cronologicamente muito prxima da Zona Centro-Ibrica. A Zona com Afinidades de Ossa Morena est representada na zona da Lomba, poro mais W do PNM, e no topo da Serra de Nogueira (Sr. da Serra). RIBEIRO (1974) identificou dois complexos na Zona com Afinidades de Ossa Morena: filado-quartzoso e vulcano-silicioso. Genericamente, no primeiro complexo dominam xistos siliciosos de gro fino que, consoante a poro de material filtico, vo dos quartzofildios aos fildios e grauvaques com diferentes graus de metamorfismo (metagrauvaques). No ltimo dos complexos, de petrologia de grande dificuldade para o no gelogo, surgem xistos verdes, xistos ricos em sericite e clorite, xistos borra de vinho, grauvaques, riolitos, afloramentos de metavulcanitos bsicos, etc.

    Os terrenos Ofioltico Setentrional (Complexo Ofioltico Intermdio ou Alctone Intermdio) e Continental Alctone (Complexo de Mantos Superiores ou Alctone Superior)2 correspondem respectivamente a fragmentos de crosta ocenica e continental, ao nvel da transio crosta-manto (RIBEIRO, 1974), fortemente metamorfizados. Esto distribudos em dois macios catazonais: Macio de Bragana-Vinhais e Macio de Morais. A quase totalidade do macio de Vinhais-Bragana est includo na rea de tese; o Macio de Morais situa-se mais a sul j nos concelhos de Macedo de Cavaleiros e Mogadouro (vd. figura 3). No Macio de Bragana esto identificadas dois sinformas Mofreita-Espinhosela-Baal e Vinhais-Vila Boa de Ouzilho dispostos paralelamente no sentido NW-SE e deslocados por dois acidentes tectnicos: a falha da Vilaria no sentido NNE-SSW e a falha de Bragana-Vinhais no sentido E-W.

    A petrologia dos Macios de Morais e Bragana muito complexa e a sua nomenclatura tem evoludo de forma assinalvel. A maioria das rochas dos dois macios, principalmente os grupos das bsicas e ultrabsicas, so tipos litolgicos raros em Portugal e mesmo por todo o mediterrneo europeu. A NE, no sinforma de Mofreita-Espinhosela-Baal, as rochas mais representadas so os gnaisses e os micaxistos, a que se juntam domnios significativos de migmatitos cidos (PORTUGAL-FERREIRA, 1997). As rochas bsicas anfibolitos e blastomilonitos3 so menos comuns e bordejam o sinforma. As rochas ultrabsicas rareiam, identificaram-se estreitas lentculas de serpentinitos4 em Espinhosela, Oleiros (Serro 3) e Donai. O sinforma a SW sinforma de Vinhais-Vila Boa de Ouzilho constitudo predominantemente por rochas bsicas e ultrabsicas. Da base para o topo esto presentes gnaisses e xistos verdes, blastomilonitos bsicos e extensos

    2 Alguns autores denominam, de forma genrica, estes dois terrenos no Macio de Vinhais-Bragana por complexo mfico-ultramfico ou complexo polimetamrfico. 3 Os blastomilonitos so rochas esmagadas por aces tectnicas, diz-se que tm uma textura blastomilontica. 4 Este termo vulgarmente usado na bibliografia no geolgica para designar a generalidade das rochas ultrabsicas. A bibliografia geolgica assinala para regio trs tipos de rochas ultrabsicas: peridotitos, serpentinitos e piroxenitos. Os serpentinitos so normalmente peridotitos submetidos a um processo de serpentinizao i.e. j alterados por aco dos agentes de meteorizao.

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    afloramentos de rochas ultrabsicas em Carrazedo, Ouzilho, Vila Boa de Ouzilho e Vila Verde. Entre os dois sinformas h um antiforma muito esmagado, incluvel na zona com afinidades Ossa Morena, com serpentinitos ricos em talco, flasergabros, anfibolitos e um pequeno afloramento de mrmores em Cova de Lua. Neste antiforma e contidos na rea de trabalho encontram-se os afloramentos ultrabsicos de Soeira (Penoicos), Castrelos (Monte Ladeiro) e Lagomar. No Macio de Bragana-Vinhais o Terreno Ofioltico Setentrional est includo no sinforma de Vinhais-Vila Boa de Ouzilho e constitui a denominada unidade de Soeira-Nogueira. composto por xistos verdes bsicos (dominante), anfibolitos metamorfizados, peridotitos (raros), flasergabros e talcoxistos (MARQUES, 1989).

    Na rea em estudo h ainda que assinalar a presena de granitos e de depsitos de superfcie. Nos Pinheiros, Moimenta e Serra de Montesinho encontram-se importantes afloramentos de granitos hercnicos calcoalcalinos de duas micas que se prolongam para N por Espanha. Os depsitos de superfcie tm expresso regional considervel e, na rea de estudo, localizam-se nas proximidades das aldeias de Aveleda, Baal, Sacoias e S. Julio de Palcios formao da Aveleda e foram atribudos ao final do Pliocnico incio do Pleistocnico (PEREIRA, 1999).

    3. Geomorfologia

    O relevo do nordeste de Trs-os-Montes caracteriza-se pela dominncia de planaltos extensos sulcados por vales profundos. A feio planltica uma caracterstica do relevo portugus, como refere BIROT (1950 cit. MEDEIROS, 1987) o relevo portugus decompe-se em fragmentos de planaltos mais ou menos extensos, mais ou menos elevados, mais ou menos recortados por vales. Quase todos os acidentes topogrficos so escarpas que separam planaltos de diferentes altitudes.

    Desde as convulses hercnicas, no territrio portugus, existiram vrios ciclos de aplanao e de rejuvenescimento do relevo de diferente importncia que esto na gnese daquelas superfcies planas e dos declives que as conectam. Terminada a Orogenia Hercnica, os relevos ento formados foram arrasados com intensidade durante o Carbnico e no incio do Prmico. No final do Paleozico existia uma extensa peneplancie5 a superfcie de eroso post-hercnica ou pr-trissica cujos acidentes (e.g. escarpas de falha, desligamentos, etc.) hoje mais no so do que limites litolgicos (BRUN-FERREIRA, 1981). No entanto, o sistema de falhas tradi-hercnicas importncia capital na definio das morfoestruturas originadas durante os surtos orognicos alpinos,

    5 Designao das superfcies de aplanamento mais extensas.

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    porque, na sua maior parte, resultaram de reactivaes repetidas de falhas pr-existentes (MARTN-SERRANO, 1994).

    A superfcie de eroso pr-trissica atravessou um largo perodo de estabilidade cortical mas, ainda assim, viu-se submetida a numerosos ciclos de arrasamento resultantes de pequenas deformaes (GUTIRREZ ELORZA, 1994). Durante o Paleocnico-Eocnico o mar retirou-se de grande parte da Pennsula e Ibrica e, mais tarde, na transio entre o Eocnico e o Oligocnico iniciaram-se as primeiras fases da orogenia Alpina durante as quais se individualizou a bacia endorreica do Douro (GUTIRREZ ELORZA, 1994), da qual Trs-os-Montes constitui uma regio perifrica a ocidente. Os consequentes rejuvenescimentos do relevo destes perodos conduziram a novos ciclos de aplanamento e formao de novas superfcies de eroso paleognicas. No Miocnico mdio produziram-se novas fases tectnicas alpinas s quais se sucedeu, novamente, um perodo de grande estabilidade que culminou na formao de uma grande superfcie de eroso no final do Miocnico, a superfcie de eroso, actualmente, com maior desenvolvimento na Pennsula Ibrica (GUTIRREZ ELORZA, 1994). No Pliocnico superior verificou-se uma enrgica fase tectnica com movimentos verticais que modificou fortemente a paisagem precedente e com ela se geram, muito provavelmente, grande parte dos macios montanhosos e serras da Pennsula Ibrica. tambm nesta altura que se rompe a bacia endorreica do rio Douro e se inicia a hierarquizao da rede fluvial quaternria (GUTIRREZ ELORZA, 1994).

    Sabe-se que a orogenia alpina teve tambm um efeito de rejuvenescimento do relevo no territrio portugus mas no teve um efeito to marcante como aconteceu noutros territrios ibricos, e.g. Pirinus e cordilheira Btica (cf. BRUN-FERREIRA, 1981). De qualquer modo a geodinmica alpina do macio Hesprico o motor geodinmico gerador de todos os relevos de ordem superior do NW peninsular (MARTN-SERRANO, 1994). Sendo a Serra de Montesinho a estribao sul do sistema montanhoso de Cabrera tem semelhana deste (cf. URETA et al., 1991) uma origem Alpina.

    Em Trs-os-Montes, aos ciclos de aplanao mais recentes esto associadas superfcies de eroso bem desenvolvidas e depsitos continentais correlativos (RIBEIRO & CABRAL, 1997). Segundo estes autores, a superfcie de eroso mais antiga no extremos NE de Portugal6 tem uma altitude superior a 700 m e os seus depsitos correlativos, atribudos ao Paleognico, esto conservados nas proximidades de Bragana e Morais. Numa carta geomorfolgica de Trs-os-Montes oriental escala 1:1.000.000 datada de 1966, publicada como indita e sem comentrios por DAVEAU (1987) (figura 5), o Prof. Antnio Ribeiro inclui nesta superfcie de eroso a meseta superior da figura 5 as zonas sumitais das duas maiores elevaes da rea de estudo: as Serras de Nogueira (1320 m na Sr. da Serra) e Montesinho (com 1492 m como maior cota no lado portugus da fronteira). A Serra da Cora (1272 m) includa na mesma superfcie de eroso por

    6 J TABORDA (1932) se refere a existncia de duas superfcies de eroso em Trs-os-Montes quando escreve ..., os planaltos testemunham obra de um antigo ciclo de eroso, as montanhas representam um ciclo de eroso anterior ainda.

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    CABRAL (1985). As superfcies de aplanamento conservam-se melhor nos granitos que nos xistos, por isso, no de surpreender a perfeio desta antiga peneplancie no topo da Serra de Montesinho.

    Figura 5. Carta geomorfolgica de RIBEIRO (1966) (adaptada de DAVEAU, 1987)

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    O ltimo importante perodo de aplanao ocorrido no NE de Portugal terminou no final do Pliocnico incio do Pleistocnico (cf. CABRAL, 1985). Deste perodo sobreviveu uma grande superfcie de eroso poligentica que deve a sua integridade e extenso ao facto de ter sido pouco sacrificada pelas convulses alpinas (MARTN-SERRANO, 1994) com uma altitude mdia de 700 a 800 m que morfograficamente corresponde ao prolongamento, em Portugal, da grande superfcie peneplanltica da Meseta Norte ou de Castela-a-Velha (CABRAL, 1985) (meseta inferior da figura 5). Entretanto, o aplanamento foi interrompido pela eroso associada rede de drenagem induzida por movimentos tectnicos verticais, no final do Pliocnico e durante o Pleistocnico (CABRAL, 1985), j referidos anteriormente.

    LAUTENSACH (1987b) defendeu que este surto orognico e/ou epirognico pliopleistocnico originou um levantamento generalizado de toda a peneplancie primitiva, com uma intensidade varivel porque existem diferenas significativas de altitude ao longo da poro portuguesa da Meseta Norte: no planalto de Miranda a mediana das altitudes ronda os 700 m enquanto que no planalto de Deilo, no PNM, atinge quase os 1000 m (figuras 6 e 8). Em Trs-os-Montes a peneplancie est mais bem conservada, a leste, no denominado planalto de Miranda (CABRAL, 1985). Como a elevao da meseta recente e o escavamento dos vales se processa da foz para as cabeceiras eroso linear progressiva , o Planalto de Miranda e a Meseta de Castela-a-Velha mantm quase inclume o seu carcter planltico. Em contrapartida, na maior parte do territrio transmontano, a peneplancie foi profundamente entalhada pelo rio Douro e respectivos afluentes. A eroso fluvial vertical, causada pela rede de drenagem, assim o processo geomorfolgico dominante em Trs-os-Montes e o rio Douro funciona, em ltima instncia, como nvel basal.

    A rea de estudo est totalmente includa na bacia hidrogrfica do Douro. As linhas de gua mais importantes esto orientadas de N para S e so de W para E os rios Mente, Rabaal, Tuela, Baceiro, Sabor, Igrejas, Onor e Mas. O rio Mente afluente do Rabaal, prximo de Mirandela conflui com o Tuela constituindo o rio Tua. Os rios Igrejas, Onor e Mas so afluentes do rio Sabor. Os rios Tua e Sabor so dois dos principais afluentes da margem direita do Douro (figura 6).

    Nas linhas de gua cujas cabeceiras se encontram na rea de estudo ou na sua proximidade, a parte superior dos vales relativamente larga e o declive pouco acentuado. A jusante verifica-se um progressivo encaixe dos cursos de gua mais importantes e respectivos tributrios, em vales progressivamente mais profundos. Os rios Mente, Rabaal, Tuela e Mas chegam rea de estudo, aps atravessarem a fronteira Luso-Espanhola, em vales j encaixados (DE na figura 7).

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    Figura 6. Altimetria e cursos de gua da rea de estudo (escala 1:250.000)

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    Nos xistos, litologia dominante na rea de estudo, os vales esto, embora tenuemente, meandrizados. Os xistos facilitam mais o escorrimento superficial e os processos erosivos do que os granitos porque so mais impermeveis gua (RIBEIRO, 1987), particularmente quando possuem uma folheao horizontal. Com facilidade os xistos partem-se e esfolheiam-se carregando de sedimentos os cursos de gua induzindo, relativamente ao granito, um envelhecimento mais precoce do relevo (RIBEIRO, 1987). Conforme se verifica na rea homognea da Lombada, nas bacias dos rios Igrejas e Onor, os xistos originaram uma rede hidrogrfica densa e catica, devido ao afundamento e amadurecimento do sistema hidrogrfico, por entre cabeos arredondados (modelado de disseco), relevo residual da peneplancie primitiva (DI na figura 7). Este fenmeno est generalizado por toda a Terra Quente transmontana xistenta.

    O padro da rede drenagem dominante na rea de estudo de tipo dendrtico apesar do controlo estrutural do encaixamento dos rios ser comum (FERNANDES, comunicao pessoal). Por exemplo, o controlo estrutural est presente nos afloramentos de rochas bsicas na proximidade do rio Tuela (PORTUGAL-FERREIRA, 1965), na regio de Cova de Lua (FERNANDES, 1992) e no vale do rio Sabor desde Frana at s proximidades de Bragana onde evidente o paralelismo entre o curso do rio Sabor e a falha da Vilaria. Nos granitos da Serra de Montesinho, na cabeceira dos rios Sabor e Andorinhas, constata-se uma acomodao da rede fluvial ao alinhamento geral do relevo, num padro de rede de drenagem paralela. Como a Serra de Montesinho um bloco tectnico basculado para S (CABRAL, 1985) as linhas de gua fluem de N para S.

    Os cursos de gua ao atravessarem cristas quartzticas estreitam e normalmente o declive do leito do rio maior (LAUTENSACH, 1987b). Este fenmeno observa-se no rio Rabaal, rio Onor e rio Mas. Os talvegues tambm apresentam um aumento brusco do declive no contacto entre rochas de diferente dureza como evidente nos troos superiores do rio Sabor e da rib. das Andorinhas, no contacto entre os granitos da Serra de Montesinho e os xistos silricos.

    A grande maioria das linhas de gua permanentes da rea de estudo so, por efeito do relevo, turbulentas. O escavamento e afundamento do leito assegura a concentrao linear das guas. S nos cursos de gua mais importantes como os rios Sabor e Tuela e na Lombada se verifica um predomnio da ablao lateral mas, como se referiu anteriormente, ainda com uma muito tnue meandrizao. A maior parte dos bancos de sedimentos, dos cursos de gua mais importantes, resultam de um processo de agradao porque os seus afluentes so de carcter torrencial e transportam ocasionalmente grande quantidades de sedimentos muito grosseiros. Este fenmeno origina, localizadamente, leitos de estio anastomosados e depsitos fluviais grosseiros por vezes com linhas de pedras e cascalho.

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    Nas superfcies de eroso da rea de estudo sobressaem quartzitos, de orientao hercnica NW-SE embora menos representados do que em outras reas da Terra-Quente transmontana. As cristas quartzticas encontram-se nos terrenos Centro-Ibrico ou com afinidades de Ossa Morena na Alta Lombada ou nos Pinheiros. As cristas quartzticas so um relevo de resistncia e por vezes configuram um horst; esto sujeitas a desprendimentos cclicos que originaram, nas maiores cristas, cascalheiras de quartzitos de pequena extenso7.

    No lugar de Lama Grande, no extremo norte Serra de Montesinho, existe uma superfcie cncava hoje ocupada com prados permanentes melhorados e, at poucos anos, cultivada com batata e centeio. A utilizao agrcola da Lama Grande recente e ainda persistem indcios de uma extensa turfeira, drenada artificialmente nos anos 40 para a produo de batata-semente. No existem estudos sedimentolgicos nesta rea mas a sua morfologia, por analogia com o que acontece na vizinha Serra de Cabrera, por exemplo com a turfeira de Sanguijuelas, evidncia que se trata de uma primitiva lagoa de origem periglaciar, resultante de um nicho de nivao, posteriormente colmatada. Esta hiptese sustentada por uma morfologia planltica favorvel ao processos periglaciares e pelos nveis de gelos perptuos recentemente publicados para regies prximas. Por exemplo, RAMIL-REGO et al. (1995) referem que na Serra do Gers, durante a ultima glaciao, o limite inferior das reas englaciadas teria variado entre os 700 e os 1000 m de altitude e que as neves perptuas se situariam a cotas superiores a 1100-1200 m.

    Existem dois acidentes tectnicos muito marcantes no complexo relevo da regio prxima a Bragana: a falha da Vilaria e a depresso tectnica de Bragana. A falha da Vilaria, tambm conhecida por falha Manteigas-Vilaria-Bragana, um acidente tardi-hercnico reactivado durante o Quaternrio (CABRAL, 1985). Corre ao longo do Vale do Sabor entre Frana e Bragana com uma ntida escarpa de falha associada, assinalada na carta de RIBEIRO (1966 in DAVEAU, 1987) (figura 5). Existe uma outra escarpa de falha associada mesma falha, mais a Sul e menos evidente, na encosta leste da Serra de Nogueira. CABRAL (1985) refere que a Serra de Nogueira um "demi-horst", associado falha da Vilaria, balanado para W e com uma direco NNE-SSW. A depresso de Bragana tem sido referida como uma bacia de desligamento, originada numa reactivao de acidentes hercnicos, com uma importante componente de movimentos horizontais (PEREIRA, 1999). A influncia da bacia de Bragana no relevo mais evidente na denominada Baixa Lombada e desde a chamada Veiga de Gostei, no sop da Serra de

    7 Na Terra-Quente existem cascalheiras de quartzitos bastante mais extensas como o caso das cascalheiras da Serra dos Passos, no concelho de Mirandela

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    Nogueira, at ao lugar de S. Jorge. Esta zona, coalescente com a rea de estudo, est em grande parte coberta por depsitos neognicos (formao de Bragana) (PEREIRA, 1999).

    Existem duas cartas geomorfolgicas que incluem a rea de estudo publicadas por BRUN-FERREIRA (1981) e por AGROCONSULTORES & COBA (1991). A escala destas cartas muito pequena e por isso, apenas permitem identificar as formas maiores do relevo. As formas mais conspcuas no relevo tm, ainda assim, grande utilidade na interpretao da paisagem e no cruzamento com informao proveniente dos estudos de vegetao. No "Esboo Geomorfolgico" de AGROCONSULTORES & COBA (1991) (figura 7) a mais informativa das duas cartas geomorfolgicas disponveis e no que respeita rea de estudo, sobressaem trs grandes superfcies planlticas de W para E: Pinheiros, Interflvio Tuela-Sabor e Alta Lombada. A compartimentar estas superfcies esto assinalados os vales do rio Rabaal, da rib. da Assureira, dos rios Tuela-Baceiro, dos rios Sabor-Igrejas-Onor e do rio Mas. A transio entre os vales e os planaltos faz-se atravs de encostas bastante declivosas. Na carta em discusso esto tambm realadas cristas de quartzitos na zona homognea da Cora, na Lastra, na falda S da Serra de Nogueira, nas encostas sobranceiras ao rio Mas e, sobretudo, no extremo W do PNM na zona da Lomba.

    Os conceitos de "meio em fase de pedognese" e "meio em fase de morfognese" seguidos na carta geomorfolgica de AGROCONSULTORES & COBA (1991) so de grande utilidade prtica na interpretao da paisagem vegetal regional. Nos meios em fase morfognese a eroso intensa e o efeito da topografia como factor pedogentico determinante. A pendente favorece o transporte das partculas do solo pelos factores de eroso, na rea de estudo: a gua e o rolamento das partculas de solo por aco da gravidade (reptao ou creeping)8. O equilbrio entre processos erosivos e pedogenticos verifica-se com solos delgados e poucos evoludos (leptossolos). Nos meios em fase de pedognese o equilbrio entre a exportao de partculas pela eroso e a pedognese favorvel a esta ltima. Os solos, desde que no perturbados por catstrofes ou pela aco erosiva do Homem (eroso acelerada), podem-se desenvolver na dependncia directa do clima (solos zonais). Estes dois conceitos podem, com as devidas precaues de escala, relacionar-se com os conceitos sinfitossociolgicos de srie de vegetao climatfila, edafo-higrfila e edafoxerfila. Os meios em pedognese so os bitopos das sries climatfilas ou, nos solos hidricamente compensados, edafo-higrfilas. Os meios em morfognese so predominantemente ocupados por sries edafoxerfilas. Regra geral, na proximidade de fronteiras biogeogrficas ou macrobioclimticas, sobretudo sob um

    8 Em condies particularmente propcias elevados declives e solo desnudado- podem suceder movimentos catastrficos do solo por solifluxo.

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    mesoclima mais favorvel (hmido), as sries predominantemente climatfilas podem estender-se aos meios em morfognese.

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    Figura 7. Carta geomorfolgica da rea de estudo (adaptado de AGROCONSULTORES & COBA, 1991)

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    Figura 8. Carta hipsomtrica da rea de estudo

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    Figura 9. reas geomorfologicamente homogneas da rea de estudo (adaptado de GONALVES, 1980)

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    As denominadas reas homogneas do PNM (GONALVES, 1980) Pinheiros, Lomba, Vinhais, Cora, Baceiro, Montesinho, Baixa-Lombada, Onor e Alta Lombada, s quais se poder adicionar ainda a Serra de Nogueira podem ser consideradas como reas homogneas do ponto de vista geomorfolgico (figura 9). Na carta hipsomtrica escala 1:500.000 (figura 8) e no esboo geomorfolgico de AGROCONSULTORES & COBA (1991) (figura 7), estas reas identificam-se com facilidade a partir de superfcies planlticas perfeitamente delimitadas por profundos vales fronteira. A sua homogeneidade geomorfolgica arrasta consigo uma homogeneidade climtica e de uso do territrio, por isso, aqueles termos so muito usados na bibliografia sobre a regio e ao longo deste texto.

    4. Solos

    A cartografia dos solos de Trs-os-Montes e Alto-Douro das mais actualizadas de Portugal: o consrcio AGROCONSULTORES & COBA publicou em 1991 a "Carta dos Solos, Carta do Uso Actual da Terra e Carta da Aptido da Terra do Nordeste de Portugal", escala 1:100.000, baseada na classificao da FAO/UNESCO (1987) da "Carta dos Solos do Mundo".

    As unidades cartogrficas i.e. as legendas dos polgonos da "Carta dos Solos do Nordeste de Portugal" indicam apenas os tipos de solos (unidades-solo) dominantes. Numa tabela anexa memria descritiva da carta esto assinaladas as unidades-solo codominantes e subdominantes, assim como a informao relativa s caractersticas qumicas e fsicas dos tipos de solos mais representados na regio9 e s condies de clima e fisiografia que condicionam cada unidade cartogrfica.

    As classes de solos com representao cartogrfica identificadas na rea de estudo (vd. descrio genrica no anexo I) e as respectivas unidades-solo de nvel taxonmico inferior mais comuns so:

    - leptossolos (l) - mbricos de xistos e rochas afins (lux) - mbricos de granitos e rochas afins (lug) - mbricos de rochas bsicas (lub) - dstricos rticos de xistos e rochas afins (ldox) - dstricos rticos de migmatitos e gnaisses blastomilonticos (ldom) - utricos rticos de rochas bsicas e metabsicas (leob) - utricos rticos de rochas ultrabsicas (leou)

    - fluvissolos (J) - dstricos rticos de aluvies (Jdoa)

    9 Infelizmente, no foram includos dados de perfis abertos em reas de rochas bsicas e ultrabsicas.

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    - cambissolos (B) - mbricos10 crmicos de depsitos de vertente em reas de xistos ou rochas

    afins, frequentemente com files de rochas quartzticas (Buxx2) - mbricos rticos de granitos e rochas afins (Buog1) - dstricos crmicos de migmatitos e gnaisses blastomilonticos (Bdxm1) - dstricos rticos de sedimentos detrticos no consolidados (Bdos1)

    - alissolos (U) - hplicos de sedimentos detrticos no consolidados (Uhs)

    - luvissolos - crmicos de rochas bsicas (Lxb)

    Esto ainda citados para a rea de estudo como codominantes ou subdominantes mais 29 unidades-solo, discriminadas no anexo II. Entre os solos citados no anexo II incluem-se mais 3 classes de solos: os antrossolos (T), os gleissolos (G), os regossolos (R) e os pararregossolos (R').

    Como prtica comum na cartografia de solos, AGROCONSULTORES & COBA (1991) utilizaram a litologia para segregar as unidades-solo de nvel taxonmico inferior. Deste modo, na organizao do material originrio AGROCONSULTORES & COBA (1991) agruparam as rochas metamrficas do Ofioltico Setentrional e do Continental Alctone em trs grandes grupos: migmatitos e gnaisses11 blastomilonticos, rochas bsicas e metabsicas e rochas ultrabsicas. Os restantes tipos de material originrio, todos eles de carcter cido excepo de alguns coluvies, foram organizados em: xistos ou rochas afins, granitos e rochas afins, aluvies, coluvies12 e sedimentos detrticos no consolidados (depsitos de superfcie no jargo das cincias geolgicas). Esta organizao aparentemente reflecte as correlaes entre o material originrio e as unidades taxonmicas de nvel mais elevado e, salvo uma excepo mais adiante referida, a influncia do material originrio na flora, na vegetao e na utilizao humana do territrio.

    O aspecto mais evidente da anlise do anexo II a grande diversidade de classes de solo na rea de estudo, por oposio a outras partes do territrio portugus. A diversidade climtica no chega para explicar esta diversidade pedotaxonmica porque a variao da precipitao e da temperatura mdia anual manifestamente insuficiente. A causa deste fenmeno reside, em nosso entender, em trs factores: 1) na complexa litologia regional no NE de Portugal existe uma verdadeira litosequncia de solos, 2) no relevo acidentado e 10 Na moderna classificao dos solos da FAO (1998) WRB-FAO desapareceram os cambissolos hmicos e em seu lugar surgiu uma nova classe de solos: os umbrissolos. 11 Os gnaisses ricos em hornblenda so considerados como rochas bsicas nas classificaes pedolgicas do material originrio (BUOL et al., 1991). A segregao dos gnaisses blastomilonticos por AGROCONSULTORES & COBA (1991) justifica-se pela pobreza destas rochas em hornblenda e piroxenas (cf. RIBEIRO, 1974: 47). Como se referiu, os migmatitos regionais so bsicos. 12 Nos coluvies so distinguidos os depsitos de encosta transportados por solifluxo e as deposies de base de encosta constitudas por materiais transportados por guas de escorrimento superficial e por reptao.

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    3) na utilizao humana do territrio. A diversidade pedolgica regional reflecte-se marcadamente na utilizao humana do territrio e, como mais adiante se tentar demonstrar, na flora e na paisagem vegetal. O estudo das relaes solo-planta ou, a maior escala, paisagem vegetal-solo esto fora do mbito desta tese, no entanto, conveniente abordar algumas das correlaes empricas encontradas entre alguns factores pedogenticos e as caractersticas dos solos e entre os solos e a utilizao humana do territrio para, neste captulo e nos captulos subsequentes, melhor se compreender a sinecologia da vegetao do territrio e a sua dinmica. Recorde-se que no conceito mais actual de associao se admite uma relao biunvoca entre as associaes vegetais e as condies ecolgicas do bitopo, das quais o solo um dos principais protagonistas.

    No caso das famlias de solos mais evoludos alissolos, luvissolos e cambissolos na rea de estudo, o material originrio maioritariamente composto por rochas bsicas, gnaisses blastomilonticos ou por sedimentos detrticos no consolidados. Os alissolos (Uhs) e os luvissolos (Lxb) duas famlias de solos morfologicamente semelhantes13 caracterizadas pela acumulao iluvial de argila no horizonte B (horizonte arglico, Bt14) diferenciaram-se respectivamente em depsitos de superfcie e em rochas bsicas, em fisiografias planas ou ligeiramente cncavas. A formao deste horizonte arglico com precipitaes que rodam os 1000 mm deve-se influncia do material originrio15: AGROCONSULTORES & COBA (1991) referem que a formao deste horizonte em Trs-os-Montes est normalmente correlacionado com precipitaes mais baixas das que se verificam na rea de estudo.

    A maioria dos cambissolos da rea de estudo esto associados aos afloramentos de gnaisses (Bdxm1) do sinforma de Mofreita-Espinhosela-Baal e s rochas bsicas (Buxb1 ou Bxb1). Os cambissolos de rochas bsicas coabitam com leptossolos16 de rochas bsicas (normalmente lebb ou lub) variando a importncia de cada uma destas unidade em funo da geomorfologia a mdia escala. Dificilmente cartografveis escala 1:100.000, mas de grande importncia regional, so os cambissolos desenvolvidos a partir de material coluvionar (Bdxx2, Buog2, Bxb3, Buxb2, Buox2 e Buxx2).

    Os cambissolos (B), mas tambm os regossolos (R) e os pararregossolos (R) (vd. mais adiante), so os bitopos dos giestais subseriais (Cytisetea scopario-striati) ou dos 13 Os luvissolos, ao contrrio dos alissolos, possuem um horizonte superficial com um grau de saturao elevado (superior a 50 %) e por isso a sua gnese favorecida pela elevada quantidade de bases presentes nos minerais primrios das rochas bsicas. 14 Nas legendas mais recentes da classificao dos solos (FAO/UNESCO, 1988 e FAO, 1998) o horizonte diagnstico arglico foi substitudo pelo horizonte rgico, conceptualmente prximo do primeiro. 15 Referimo-nos exclusivamente aos solos de gnese recente. 16 Na legenda da "Carta dos Solos do Mundo" da FAO/UNESCO (1988) o limite superior para a presena de rocha dura ou coerente dos leptossolos passou dos 50 cm seguidos por AGROCONSULTORES & COBA (1991) para 30 cm e, mais recentemente, para 25 cm no WRB (FAO, 1998). Com este novo conceito grande parte das reas da unidade cartogrfica de leptossolos utricos rticos de rochas bsicas e metabsicas (leob), tero que ser reclassificadas como cambissolos mbricos, na classificao de 1988, ou nos umbrissolos, na classificao de 1998. Uma observao atenta dos taludes das muitas estradas e caminhos que atravessam a Serra de Nogueira sustenta esta hiptese. Na nossa opinio, o conceito de umbrissolo melhora substancialmente as correlaes entre as unidades-solo e o coberto vegetal.

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    bosques climcicos climatfilos de Quercetalia roboris. A sua localizao espacial condiciona a distribuio da vegetao climcica e dos matos pr-florestais. no fundo dos vales e/ou, como demoradamente se defende nos pargrafos seguintes, sobre rochas bsicas ou gnaisses blastomilonticos que se encontram os solos mais adequados para aquelas formaes vegetais. A profundidade dos cambissolos trs consigo uma elevada aptido agrcola: so solos adequados produo cerealfera e s culturas perenes sobretudo do castanheiro; nos fundos de vale e com a disponibilidade de gua para rega so ocupados com lameiros ou com um grande nmero de plantas hortcolas e forrageiras. Os alissolos (Uhs) e os luvissolos (Lxb) esto tambm ocupados por culturas agrcolas. Nas reas de alissolos (Uhs), de grande significado na zona homognea da Baixa Lombada, mais precisamente no termo da aldeia de Baal, a existncia de um horizonte subsuperficial rico em argila iluvial (horizonte arglico, Bt) est na origem de evidentes problemas de drenagem interna. A maior disponibilidade de gua destes solos durante o Vero revelada pela abundncia de freixos (Fraxinus angustifolia) e prados permanentes sobre estes solos. muito provvel que no passado a maioria dos alissolos da regio e, consequentemente, a maioria dos depsitos de superfcie, fosse ocupada por bosques higrfilos de freixos e cerdeiros (Prunus avium). Os luvissolos so os solos zonais dos domnios nos domnios dos bosques pereniflios esclerofticos mesomediterrnicos de azinheira ou sobreiro.

    Na rea de estudo por demais evidente que os solos de rochas bsicas ou de gnaisses e blastomilonitos tm um efeito muito marcado na paisagem vegetal e nos sistemas de agricultura. Em comparao com solos derivados de outros substratos litolgicos, em condies geomorfolgicas e climticas semelhantes e.g. com os xistos da Lomba e da Alta-Lombada , os solos de rochas bsicas so muito mais profundos. A uma escala suficientemente pequena pode-se especular que os solos herdados das geraes que nos precederam, se encontram num equilbrio metaestvel entre a pedognese e a eroso do solo em sentido lato (FIGUEIREDO, 1997 comunicao pessoal). Esta hiptese, a ser verdadeira, implica uma outra: a gnese dos solos nas rochas bsicas mais rpida do que nos granitos e nos xistos cidos. Esta segunda hiptese muito plausvel: os minerais primrios ferromagnesianos, particularmente abundantes nas rochas bsicas, so muito susceptveis meteorizao qumica17 e as rochas dos dois sinformas da regio esto muito fragmentadas, por vezes milonitizadas, pela complexa tectnica regional.

    AGROCONSULTORES & COBA (1991) referem que a precipitao tem um efeito muito marcado nas propriedades dos solos em Trs-os-Montes: nas anlises qumicas do horizontes de alguns perfis abertos por aqueles autores verifica-se que para precipitaes inferiores a 800/1000 mm, a acumulao de matria orgnica diminui acentuadamente e o

    17 Esta susceptibilidade coloca-os no topo das conhecidas Sries de Goldish. Estas sries so uma hierarquizao da alterabilidade (sensibilidade meteorizao qumica) dos minerais primrios (cf. BASTOS MACEDO, 1988: 89-90)

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    teor de bases do complexo de troca superior. MARTINS (1992), no que respeita s bases de troca, precisa o limite da precipitao para solos derivados de granitos e refere que para valores inferiores a 800 mm se verifica um brusco aumento das bases de troca. AGROCONSULTORES & COBA (1991) grosso modo concordam com a fronteira dos 800 mm, mas referem que a reduo do teor de bases no complexo de troca, com o aumento da precipitao, cerceado nas rochas bsicas. O pH ao estar, normalmente, correlacionado com o teor de bases de troca tambm dever ter um comportamento semelhante18.

    A rochas bsicas tm tambm um efeito muito marcado na textura do solo. FIGUEIREDO (1990), influenciado por trabalhos anteriores de A. Martins, a este respeito reconhece em Trs-os-Montes o que designa por trs grandes domnios: o das texturas grosseiras com bastante areia, associado aos granitos; o das texturas medianas com elevado teor de limo, associado aos xistos; e o das texturas medianas a finas com maior teor de argila, associado s rochas bsicas e ultrabsicas. SILVA (1983), num dos raros estudos mineralgicos das argilas dos solos transmontanos, provou que as argilas 2:1 (montemorilonite e vermiculite) so mais abundantes nos solos derivados de rochas bsicas e ultrabsicas relativamente aos solos resultantes da alterao de outros tipos rochas-me19.

    Todas as hipteses referidas nos trs pargrafos anteriores so suportadas por BUOL et al. (1991). Segundo estes autores os solos derivados de rochas bsicas tem um pH relativamente elevado, so ricos em bases de troca, possuem texturas pesadas, so avermelhados pela abundncia de ferro livre e na presena de uma estao seca bem definida (clima mediterrnico) so ricos em montemorilonite. Estas propriedades implicam uma maior capacidade de troca catinica e capacidade de reteno da gua, uma significativa contraco e gretamento com a secura, e um fundo de fertilidade qumica superior ao que se verifica em solos derivados de outros substratos litolgicos.

    Deve ser feita uma ressalva no contemplada na carta de solos em discusso. Constata-se que todos os tipos de xistos verdes foram englobados, na verso final da "Carta dos Solos do Nordeste de Portugal" de AGROCONSULTORES & COBA (1991), no denominado "material originrio rochas bsicas". No entanto, verifica-se que os xistos verdes da unidade de Soeira-Nogueira (Terreno Ofioltico Setentrional) e xistos verdes localizados na zona com afinidades Ossa Morena (Terreno Ibrico) tem um efeito muito distinto na paisagem vegetal. Os xistos-verdes de Soeira-Nogueira so rochas bsicas e originam solos profundos e frteis, com um coberto vegetal muito caracterstico, descrito

    18 A utilizao de um advrbio nesta assero deve-se ao facto de o pH ser uma medida absoluta da concentrao de hidrogenies. Assim sendo, a elevada capacidade de troca catinica dos solos derivados de rochas bsicas, teoricamente, pode permitir a presena simultnea de grandes quantidades de bases e de hidrogenies. 19 Na Terra-Quente (andar mesomediterrnico) existem inclusivamente solos derivados de rochas bsicas com propriedades vrticas (cf. carta n 7 de AGROCONSULTORES & COBA, 1991).

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    no prximo pargrafo. Os xistos verdes de Fresulfe-Gondesende e do topo da Serra de Nogueira esto cobertos por solos delgados leptossolos rticos de rochas bsicas (leob) e tm uma utilizao menos intensiva. As encostas mais declivosas, inclusivamente, foram j abandonadas ou nunca foram cultivadas, como acontece em alguns pontos da Serra de Nogueira, e tm uma utilizao florestal ou silvopastoril.

    A paisagem vegetal e a utilizao do solo nos afloramentos de rochas bsicas ou de gnaisses blastomilonticos algo surpreendente: nas reas mais planas observam-se culturas de cereais e batata, extensos soutos e castinais, sebes espinhosas (Rhamno-Prunetea spinosae) e bosquetes secundarizados de Quercus pyrenaica (Holco mollis-Quercetum pyrenaicae); nas encostas mais declivosas persistem alguns dos mais densos e extensos bosques de Q. pyrenaica de Portugal; a vegetao arbustiva helifila subserial pouco comum o mesmo sucedendo com as comunidades de plantas anuais de Helianthemetea. Como o sistema de agricultura e o povoamento em tudo semelhante da restante Terra Fria, o efeito do factor pedogentico litologia revela-se mais uma vez determinante.

    Os leptossolos so a classe de solos mais comum na rea de estudo, em Trs-os-Montes e em Portugal. O relevo movimentado da rea de estudo favorece a presena destes solos, mas a sua dominncia deve-se tambm eroso acelerada (de origem antrpica) de solos mais evoludos, particularmente de cambissolos. Muito j se escreveu sobre a importncia da agricultura principalmente da cerealicultura na eroso dos solos em Portugal. Hoje evidente que as polticas de proteco aos cereais iniciadas nos meados do sculo passado e intensificadas com a campanha do trigo dos anos 20 e 30, alargaram a cerealicultura a solos muito declivosos, com um impacto erosivo muito significativo20. As florestaes inadequadas e a pastorcia associada ao fogo tiveram tambm um impacto erosivo importante ao longo de toda a histria da utilizao humana dos solos transmontanos. Admite-se que nos relevos mais escarpados, dos vales mais encaixados, e sob relevos convexos com substratos rochosos particularmente duros e resistentes meteorizao, os leptossolos tm uma origem no antrpica. Nestas condies fisiogrficas a morfognese sobrepem-se pedognese: so os meios em fase de morfognese (vd. I.3). A exposio tem tambm um efeito marcado na distribuio dos leptossolos: as encostas viradas a sul so mais propcias esta classe de solos do que as encostas virada a norte (MARTINS, 1992).

    20 O Abade de Baal resumiu muito bem o impacto da campanha do trigo (ALVES, 1985: 427): Nos stios chamados Couto e Coutada de Aveleda, Cova de Lua, Donai, Frana, Labiados, Lagomar, rio de Onor, Sacoias, Soutelo da Gamoeda, Vale de Lamas e Varge [localidades situadas no interior do PNM] h restos de belssimas matas de carvalhos e sardes entremeado de pascigueiros, que o povo ignaro vai destruindo a ferro e fogo, sem ver que o cereal produzido no arroteamento brevemente estancar, arrastando rpida e absoluta esterilidade; ...os mesmo restos e conseqncias esterelizantes se encontram nos termos de Babe, Palcios, S. Julio, Baal, Carvas (Bragana), Rabal, Rica F (Bragana) e Vilar do Monte.

  • 29

    Os leptossolos mais comuns na rea de estudo so os mbricos21 de xistos (lux). Nas reas planlticas, sobretudo nas superfcies cncavas ou na base de declives suaves, esto mesclados com solos mais profundos j com um horizonte cmbico (Bt): cambissolos mbricos (Buox1 e Buox2). Nas cotas mais baixas estes solos so substitudos por solos mais pobres em matria orgnica respectivamente os leptossolos dstricos (ldox) e cambissolos dstricos (Bdxx1 e Bdxx2). Nas encostas mais declivosas os leptossolos, mbricos ou dstricos, alternam com solos esquelticos os leptossolos lticos (lsx). Na rea de estudo os afloramentos de granitos no so muito significativos. A morfologia dessas reas pouco movimentada mas ainda assim, no cmputo geral, os solos mais abundantes so os leptossolos mbricos (lug). Esta unidade-solo apresenta-se em mosaico com outras unidades de solum mais profundo como sejam os pararregossolos (R'ug)22 e os cambissolos mbricos (Buog1 e Buog2).

    Cabe agora analisar os leptossolos de rochas ultrabsicas na bibliografia referidos de forma simplificada como solos ultrabsicos , classificados por AGROCONSULTORES & COBA (1991) como leptossolos utricos rticos de rochas ultrabsicas (leou). O domnio quase absoluto dos leptossolos nos afloramentos de rochas ultrabsicas, em princpio, no se deve a causas antrpicas porque estes solos no tm utilidade agrcola e uma boa parte deles mantm o coberto vegetal primitivo (bosque de Q. rotundifolia). S em depresses ou rea muito planas se encontram pequenas bolsas de solos ultrabsicos mais profundos (luvissolos crmicos Lxu23). A explicao para aquele fenmeno reside no facto da gnese dos solos ultrabsicos ser um processo muito lento porque a maior parte dos produtos da meteorizao so solveis e rapidamente exportados para fora do perfil (PEDRO & BITAR, 1966). A reconhecida fitotoxidade dos solos ultrabsicos ao no permitir a instalao de vegetao com um elevado grau de cobertura facilita a eroso e dificulta ainda mais a evoluo destes solos (SEQUEIRA & PINTO DA SILVA, 1992). Em II.2. abordar-se-o, muito brevemente, as causas e os efeitos da fitotoxidade dos solos ultrabsicos e na III parte as particularidades da dinmica da sua vegetao, por agora apenas se exalta o efeito dramtico das rochas ultrabsicas na flora e vegetao. Estas rochas originam grandes descontinuidades na paisagem vegetal com os seus bosques de azinheiras ananicadas, matos ralos e rochas de cor anegrada. Algumas reas de solos ultrabsicos, num passado recente, chegaram a ser cultivadas com cereais; hoje est generalizado um aproveitamento silvo-pastoril muito extensivo.

    Os leptossolos tm a vindo a ser abandonados pela actividade agrcola e ocupados por matos subseriais. Em Trs-os-Montes evidente a correlao entre os matos de 21 Na bibliografia pedolgica e fitossociolgica mais antiga estes solos, particularmente se derivados de granitos, so conhecidos por "rankers". 22 A presena destes solos comum no Trs-os-Montes grantico devido ao fenmeno, generalizado, da arenitizao. 23 Esta unidade-solo coincidente com o conceito de solos vermelhos mediterrnicos utilizado por SEQUEIRA & PINTO DA SILVA (1992). AGROCONSULTORES & COBA (1991) assinalam ainda a presena de solos ultrabsicos com propriedades vrticas (cambissolos vrticos Bvu1), certamente em condies depressionrias de acumulao, no Macio de Bragana-Vinhais.

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    Calluno-Ulicetea e os leptossolos mbricos (lu) e os matos de Cisto-Lavanduletea e os leptossolos dstricos (ld) ou utricos (le). Nos meios em fase de morfognese, os leptossolos albergam por vezes restos de bosques primitivos de Quercus rotundifolia. A sua extenso depende da histria recente de utilizao humana destes solos, em particular se foram ou no devassados durante a campanha do trigo (1928 a 1938).

    Nos fundos dos vales da regio verifica-se a cumulao de coluvies que, consoante o grau de evoluo pedogentica, so identificados como regossolos (Rug, Rux e Rdx) ou cambissolos (Bdxx2, Buog2, Bxb3, Buxb2, Buox2 e Buxx2). Na proximidade das linhas de gua estes depsitos contactam com solos de origem aluvionar os fluvissolos (Jdoa). escala da Carta dos Solos de Trs-os-Montes escala 1:100.000 os fluvissolos esto subrepresentados. Raras so as linhas de gua permanentes que no tenham pequenas acumulaes de materiais fluviais cartografveis a escalas superiores ou iguais a 1:25.000. A fisiografia regional, com rios encaixados e de regime torrencial, no permite a existncia de grandes depsitos fluviais e promove a j referida mistura com material coluvionar. Os perfis abertos por TELES (1970), no seu estudo fitossociolgico dos lameiros do Norte de Portugal, demonstram a dominncia dos coluvies nos lameiros regionais. Como se depreende do que ficou dito, os depsitos aluvionares e os coluvies dos fundos dos vales, na regio genericamente designados por solos de baixa ou de veiga, so hoje utilizados para a produo de pasto e feno os lameiros ou na cultura de hortcolas e plantas forrageiras mais exigentes em solo como sejam a batata, o rbano e a beterraba. Primitivamente estariam cobertos por bosques edafo-higrfilos de Fraxinus angustifolia e Prunus avium (Populion albae) e, na margem das linhas de gua, por amiais (Osmundo-Alnion). Em mosaico com os solos de baixa existem pequenas manchas de solos hidromrficos (gleissolos, G) maioritariamente ocupados por juncais (Molinietalia caeruleae). Nesta classe esto tambm includos os solos, quase sempre submersos, que se desenvolvem em remansos de rios, canais, poos de rega, etc. e que esto colonizados com diversos tipos de comunidades de helfitos (Phragmito-Magnocaricetea). Estes solos tm uma camada superior de textura normalmente limosa, rica em matria orgnica fortemente reduzida: o saproplio.

    Com base na informao veiculada pela Carta de Solos do Nordeste de Portugal, sob as actuais condies macroclimticas e excluindo o efeito do material originrio, podem-se idealizar duas sequncias evolutivas (cronosequncia) simplificadas para os solos da rea de estudo24:

    24 De acordo com a moderna classificao dos solos da FAO (1998) WRB-FAO as cronosequncias anteriormente idealizadas, de forma ainda mais simplificada, so transcritas do seguinte modo:

    - andar supramediterrnico - leptossolos lticos leptossolos mbricos umbrissolos lpticos umbrissolos hplicos luvissolos;

    - andar mesomediterrnico - leptossolos lticos leptossolos dstricos ou utricos cambissolos dstricos, crmicos ou utricos luvissolos.

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    - andar supramediterrnico - leptossolos lticos leptossolos mbricos leptossolos cmbicos cambissolos mbricos luvissolos;

    - andar mesomediterrnico - leptossolos lticos leptossolos mbricos, dstricos ou utricos leptossolos cmbicos cambissolos dstricos, utricos ou crmicos alissolos ou luvissolos.

    Os alissolos ou luvissolos, os primeiros sobre depsitos de superfcie e os segundos nos restantes tipos de substratos, so, num horizonte temporal suficientemente grande, os solos zonais na rea de estudo. Somente em substratos muito cidos e permeveis, por exemplo em afloramentos quartzticos, nas reas mais chuvosas e frias de esperar a formao de podzis25. A predominncia dos cambissolos e a ausncia de luvissolos e podzis nos habitates regionais dos bosques climcicos de Quercus pyrenaica dever-se- a gnese recente (holocnica) da maioria dos solos da regio e, possivelmente, ao facto das floresta da regio ocuparem solos com uma longa histria de perturbao antrpica.

    Ao longo do sistema geomorfolgico: cimo de encosta, meia encosta, sop de encosta e vale dispem-se toposequncias de solos cuja diversidade pedotaxonmica est em larga medida dependente do clima, do grau de hemerobia e do balano entre a pedognese e a morfognese. Genericamente, em condies de baixa hemerobia, as toposequncias comeam nos meios sujeitos a intensa morfognese com uma sequncia de diversos subtipos de leptossolos, seguem-se os solos da classe dos cambissolos e/ou os luvissolos, e, finalmente, no sop das encostas inicia-se a sequncia dos solos de baixa. Sob a designao de solos de baixa, consoante o grau de evoluo pedogentica e em estreita dependncia com o macroclima e o tipo de material originrio, identificam-se desde regossolos a luvissolos, passando pelos cambissolos, todos eles derivados de coluvies e depsitos de encosta. A acumulao de materiais flvicos condiciona a formao de fluvissolos. A toposequncia em discusso termina na zonas depressionrias na proximidade do talvegue com solos hidromrficos: os gleissolos. Os solos produzido no sistema geomorfolgico: cimo de encosta, meia encosta, sop de encosta e vale albergam os geosigmeta climatfilos e ripcolas, estes ltimos na proximidade das linhas de gua (vd. III.2.). Em reas supratemperadas ou supramediterrnicas particularmente chuvosas e depressionrias, surgem catenas hidromrficas com histossolos e gleissolos que constituem o habitat dos microgeosigmeta de vegetao de turfas e vegetao higrfila.

    25 Foram detectados podzis na Terra Fria transmontana em substratos particularmente ricos em slica (e.g. quartzitos) ocupados com matos urzais produtores de matrias orgnicas cidas (cf. AGROCONSULTORES & COBA, 1991). A sua formao resulta de uma acelerao antrpica do processo pedogentico da podzolizao.

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    5. Climatologia e bioclimatologia

    O clima de Trs-os-Montes fortemente condicionado pelo cordo montanhoso que se desenvolve do Alto Minho (1545m) ao Alvo-Maro (1415m). A esta barreira geogrfica adicionam-se mais dois cordes montanhosos de menor altitude: o primeiro desce dos Maiores e prolonga-se pela Padrela-Falperra, Alto de Justes e Serra de S. Domingos; e o segundo constitudo pelos relevos de Montesinho, Cora e Nogueira e estende-se pela Serra de Bornes at ao planalto de Carrazeda, no extremo sul de Trs-os-Montes. As massas de ar carregadas de gua proveniente do mar (particularmente do quadrante NW) perante aqueles obstculos so progressivamente desidratadas e sob a aco do efeito de Fhen a continentalidade climtica acentua-se. Consequentemente, a variao da precipitao em Trs-os-Montes enorme: atinge mais de 2500 mm (ombroclima hiper-hmido) nas montanhas ocidentais, desce aos 1500 mm nas montanhas do interior norte e reduz-se a menos de 400 mm (ombroclima semi-rido) nos vales encaixados do Douro Superior. O efeito dos relevos de Montesinho, Cora e Nogueira particularmente sentido na rea de estudo: enquanto que as precipitaes no planalto de Oleiros-Espinhosela e na Serra de Montesinho rondam, respectivamente, os 1200 mm e os 1500 mm, a poucos quilmetros de distncia, na Baixa e Alta Lombada, a precipitao no ultrapassa os 600 a 800 mm (GONALVES, 2000). Para um pequeno territrio de pequenas montanhas, os valores das temperaturas absolutas em Trs-os-Montes tambm variam entre extremos bem acusados: podem verificar-se -16 C nos planaltos da Terra Fria de Bragana-Miranda e 46 C no Vale do Douro.

    A posio interior de Trs-os-Montes faz ainda com que esteja fechada s influncias martimas, no s pelo W como se referiu, mas tambm pelo N, atravs do sistema Galaico-Duriense (El Teleno, 2188 m) e pelos montes Cantbricos. De oriente, sofre a influncia do planalto Castelhano-Leons e, a S, a do planalto Beiro e do Macio Central, o prolongamento do sistema Central Ibrico (Almanor, 2592 m, Serra da Estrela, 1993 m) (GONALVES, 1990). Tendo como referncia o resto de Portugal, estas influncias reflectem-se num macroclima com caractersticas continentalizadas resumidas no refro popular em Trs-os-Montes existem nove meses de Inverno e trs de inferno conjugadas com um regime tipicamente mediterrnico com uma estao xrica estival, muito marcada (GONALVES, 1990).

    Genericamente, na rea de estudo, a temperatura do ar tem o seu mximo em Julho/Agosto; em Setembro/Outubro sofre uma primeira descida que se acentua em Novembro; entre Dezembro e Fevereiro ocorrem os valores mais baixos de temperatura,

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    em Maro e Abril as temperaturas so semelhantes s dos meses outonais; o ms de Maio um ms de transio para o Vero que se instala definitivamente em Junho (GONALVES, 2000). A temperatura mdia anual varia grosso modo entre os 8 C da Serra de Montesinho e os 12,5 C da Baixa Lombada; nas mesmas reas homogneas as temperaturas mdias das mnimas e mximas variam respectivamente entre os 5-7 C e os 14-17 C; a maior amplitude trmica absoluta anual verifica-se no vale do rio Sabor em Gimonde (Baixa Lombada) com - 16 C no Inverno e 42 C no Vero.

    A precipitao est concentrada no semestre Outubro-Maro e praticamente no chove em Julho e Agosto, tendo o bimestre Abril-Maio e o ms de Setembro um carcter de transio; a precipitao mdia anual reduz-se acentuadamente no sentido oeste-este, variando entre os 600 mm de Gimonde e os mais de 1500 mm da Serra de Montesinho. excepo dos vales mais trmicos, a neve um meteoro frequente que, por exemplo, ocorre entre 20 a 30 dias/ano na Terra Fria de Montanha.

    A evapotranspirao mdia anual est compreendida entre os 600 e os 700 mm. O nmero mdio de dias de geada tem um mnimo de 60 dias e ultrapassa os 80 dias nas cotas mais elevadas da Serra de Montesinho; as datas mdias da primeira e ltima geada ocorrem respectivamente na segunda quinzena de Outubro e primeira dezena de Maio; na Serra de Montesinho a data mdia das primeiras geadas verifica-se ainda no ms de Setembro.

    Tradicionalmente, Trs-os-Montes , de forma informal, dividido em dois grandes territrios homogneos do ponto de vista agrcola, geomorfolgico e macroclimtico: a Terra Quente e a Terra Fria. Entre a Terra Fria e a Terra Quente reconhecida uma Terra de Transio, denominada por Terra Temperada pelos autores mais antigos. Os conceitos de Terra Fria, Terra Quente e Terra de Transio encontram-se nos primeiros textos sobre a agricultura e a geografia regionais (cf. COUTINHO, 1877, 1882 e 1888 e MORAIS, 1932) e o seu uso est generalizado tanto na documentao tcnica como no discurso poltico e mesmo na organizao poltica e administrativa territorial.

    GONALVES (1985a, 1985b) objectivou os conceitos de Terra Quente, Terra Fria e Terra de Transio, com base na temperatura mdia anual, e definiu um conjunto de zonas climticamente homogneas, a partir da intercepo dos elementos climticos temperatura mdia e precipitao mdia anual (quadro 1). A repartio espacial das zonas climaticamente homogneas demostra a preocupao daquele autor em obter correlaes entre intervalos de temperatura e de precipitao e a utilizao agrcola do territrio. Neste sentido, a classificao climtica do Prof. Dionsio Gonalves tem uma

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    raiz bioclimatolgica26. A propositada simplicidade deste sistema facilita a sua utilizao prtica mas a sua aplicabilidade exclusivamente regional.

    26 A bioclimatologia a cincia que estuda as relaes entre o clima e os seres vivos e as respectivas comunidades (RIVAS-MARTNEZ, 1987a). Ao contrrio da climatologia tem uma preocupao expressa de correlacionar a distribuio dos organismos vivas e das suas comunidades com ndices (bioclimatolgicos) apropriados.

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    Figura 10. Zonas climaticamente homogneas na rea de estudo (AGROCONSULTORES & COBA, 1991) (escala 1:500.000)

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    Na verso do sistema bioclimtico regional do Prof. Dionsio Gonalves (existe uma verso mais recente publicada em GONALVES, 1991) adoptada por AGROCONSULTORES & COBA (1991) (quadro 1 e figura 10) a rea de estudo distribui-se pelas seguintes zonas climaticamente homogneas:

    - Terra Fria de Alta Montanha, no Planalto da Serra de Montesinho;

    - Terra Fria de Montanha, nas reas sumitais das Serras de Nogueira e Cora, no planalto dos Pinheiros e na parte mais meridional da Serra de Montesinho;

    - Terra Fria de Planalto, na maior parte do territrio e

    - Terra de Transio, na proximidade da fronteira sul da rea de estudo, no fundo dos vales dos rios Mente, Rabaal, Tuela, Sabor e afluentes directos e Mas.

    Quadro 1. - Classificao bioclimtica de Gonalves (AGROCONSULTORES & COBA, 1991)

    Tipo climtico Subtipo climtico Precipitao

    (mm) Temp. mdia

    anual (C) Altitude

    (m)

    Terra Fria de Alta Montanha A P 1200 T 9 1200/1300

    M1 P > 1200 Terra Fria de Montanha M2 1000 > P > 1200

    9 T > 10 900/1000 1200/1300

    F1 P > 1200

    F2 1000 > P > 1200

    F3 800 > P > 1000

    F4 600 > P > 800

    Terra Fria de Planalto

    F5 600 > P

    12,5 T > 10

    600/700 900/1000

    T1 P > 1200

    T2 1000 > P > 1200

    T3 800 > P > 1000

    T4 600 > P > 800

    Terra de Transio

    T5 600 > P

    14 T > 12,5

    400/500 600/700

    Q1 P > 1200

    Q2 1000 > P > 1200

    Q3 800 > P > 1000

    Terra Quente

    Q4 600 > P > 800

    T > 14

    < 400/500

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    Q5 600 > P

    Esto publicados numerosos ndices compsitos com diferentes elementos do clima (sobretudo temperatura e precipitao) e, inclusivamente, com alguns factores do clima como a altitude e latitude, correlacionados com a distribuio da flora da vegetao, a diferentes escalas (cf. FERNNDEZ-GONZLEZ, 1997). Para as escalas espaciais dos trs nveis de complexidade da fitossociologia integrada, o sistema bioclimtico de uso mais generalizado entre os fitossocilogos ibricos e o que melhores correlaes vegetao-ndices bioclimticos tem demonstrado o desenvolvido pelo Prof. Rivas-Martnez. A sua robustez tem inclusivamente sido demonstrada em trabalhos metodologicamente elaborados, desviantes da prtica fitossociolgica comum (e.g. BLASI et al., 1999).

    Rivas-Martnez props pela primeira vez o seu sistema bioclimtico, em 1981, para a Pennsula Ibrica (RIVAS-MARTNEZ, 1981a). Nas aproximaes mais recentes (RIVAS-MARTNEZ, 1995 e 1996) foi generalizado a todo o planeta. O sistema est explanado com algum pormenor no anexo III e ainda com mais pormenor em FERNNDEZ-GONZLEZ (1997), RIVAS-MARTNEZ (1994 e 1996) e RIVAS-MARTNEZ & LOIDI (1999a). Resumidamente, baseia-se no clculo de ndices bioclimticos de grande simplicidade e robustez que incorporam um pequeno nmero de elementos do clima. Os ndices mais importantes so:

    Io (ndice ombrotrmico) = 10 Pp/Tp, sendo Pp a soma da precipitao mdia em mm dos meses cuja temperatura mdia superior a 0 C e Tp a soma das temperaturas mensais superiores a 0 C em dcimas de grau centgrado;

    It (ndice de termicidade) = (T+M+m) 10, sendo T a temperatura mdia anual, M a temperatura mdia das mximas do ms mais frio e m a mdia das mnimas do ms mais frio, em graus centgrados.

    Ic (ndice de continentalidade) = tw tc, sendo tw a temperatura mdia do ms mais quente e tc a temperatura mdia do ms mais frio, em graus centgrados.

    O Io e o It integram o efeito de trs grandes tipos de elementos do clima na explicao dos padres de distribuio das plantas vasculares e das respectivas comunidades: a quantidade de frio do ms mais frio, a quantidade de calor durante a estao do crescimento e a gua disponvel para as plantas durante a mesma estao. Genericamente, so os mesmos grandes tipos de elementos do clima que alguns autores mais recentemente tm vindo a valorizar (e.g. HUNTLEY et al., 1995 e HUNTLEY, 1998).

    Nas reas extratropicais fortemente ocenicas (Ic < 11) ou muito continentais (Ic > 18) as correlaes entre o It e os tipos vegetacionais ficam enfraquecidas pelo que o It tem de ser compensado atravs da adio de um factor de compensao. Deste modo:

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    Itc (ndice de termicidade compensado) = It + C.

    O sistema bioclimatolgico de Rivas-Martnez estrutura-se em trs nveis, aos quais correspondem escalas espaciais progressivamente mais pequenas: macrobioclima, bioclima e andar bioclimtico. Inicialmente, so definidos cinco macrobioclimas correlacionados com a latitude polar, boreal, temperado, mediterrnico e tropical , genericamente em funo da latitude e da temperatura mdia anual e dos ndices bioclimticos Itc, Ic, Iosc (ndices ombrotrmicos estivais compensveis) e Tp. Em Portugal e na rea de estudo esto representados os macrobioclimas temperado e mediterrnico, cuja discriminao se baseia na quantidade de gua disponvel para a plantas durante a estao quente, avaliada atravs dos ndices ombrotrmicos estivais compensveis Iosc (Ios2, Ios3 e Ios4):

    Ios2, Ios3 ou Ios4 = P(2, 3 ou 4 meses mais quentes) / T(2, 3 ou 4 meses mais quentes).

    Com base no ndice ombrotrmico (Io) e no ndice de continentalidade (Ic) os macrobioclimas temperado e mediterrnico dividem-se, respectivamente, em 4 e em 5 bioclimas. Na rea de estudo esto presentes os bioclimas mediterrnico pluviestacional-ocenico e o temperado ocenico, na sua verso submediterrnica.

    Por sua vez os espaos bioclimticos so subdivididos em andares bioclimticos cuja diagnose resulta da intercepo de um termoclima e de um ombroclima. No estudo do termoclima so usados o ndice de termicidade (It), o ndice de termicidade compensado (Itc) nos territrios de grande influncia continental ou ocenica, ou a temperatura positiva anual (Tp) no caso dos termotipos mais frios. Os tipos ombroclimticos definem-se com base no ndice ombrotrmico (Io). Nas reas de macrobioclima mediterrnico da rea de estudo reconheceram-se os termotipos mesomediterrnico e supramediterrnico e os ombrotipos sub-hmido e hmido. No Planalto da Serra de Montesinho identificou-se um andar supratemperado hiper-hmido.

    Nas primeiras verses do sistema bioclimtico de Rivas-Martnez, a maior preocupao deste autor no momento de determinar os valores de fronteira entre andares bioclimticos, na altura exclusivamente com o It, foi o de maximizar a aderncia entre os andares bioclimticos e o fenmeno universal da zonao altitudinal da vegetao. Esta zonao constituda por uma sequncia altitudinal de andares de vegetao27 a clisrie altitudinal cada um com comunidades vegetais de estrutura e composio florstica particular. Nas ltimas verses essa preocupao alargou-se delimitao de andares bioclimticos no exclusivamente correlacionados com a altitude: os andares devem agora ser genericamente entendidos como espaos bioclimticos.

    27 Segundo OZENDA (1985) um andar de vegetao um sistema de agrupamentos vegetais reunidos por uma afinidade num mesmo segmento altitudinal.

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    A caracterizao bioclimatolgica depende da quantidade e da qualidade da informao meteorolgica disponvel. O nordeste de Portugal onde se insere a rea de estudo, por iniciativa da rea de Climatologia da Escola Superior Agrria de Bragana (ESAB), dispe desde os anos 80 de uma densa cobertura de estaes meteorolgicas. Os dados climticos tm vindo a acumular-se mas, ainda assim, devem ser usados com precauo porque o nmero de anos de observao meteorolgica por enquanto insuficiente para atenuar as flutuaes macroclimticas de curto prazo, e produzir uma caracterizao bioclimatolgica uma escala temporal prxima da resilincia das comunidades vegetais dominantes na composio da paisagem vegetal.

    Quadro 2. Caracterizao das estaes meteorolgicas do utilizadas.

    Estao meteorolgica Coordenadas Altitude (m) Perodo

    Aerdromo de Bragana (ESAB) 4150'N 642'W 683 80/96

    Bragana (INMG) 4148'N 644' W 690 51/80

    Chaves (INMG) 4145'N 728'W 348 60/76

    Deilo (ESAB) 4151'N 635'W 890 78/96

    Figueira de Castelo Rodrigo (INMG) 4052'N 654'W 635 51/85

    Fontes Barrosas (ESAB) 4153'N 650'W 860 84/96

    Gimonde (ESAB) 4148'N 641'W 530 81/96

    Guarda (INMG) 4032N716W 1038 51/80

    Izeda (ESAB) 4134'N 643'W 600 84/96

    Miranda do Douro (INMG) 4131'N 617'W 639 51/80

    Mirandela (INMG) 4131'N 712'W 250 51/80

    Moimenta (ESAB) 4156'N 650'W 885 81/96

    Montesinho, Lama Grande (ESAB) 4158'N 647'W 1380 84/96

    Pedras Salgadas (INMG) 4133'N 736'W 613 51/76

    Pinela (ESAB) 4140'N 645'W 870 80/96

    Rgua (INMG) 4110'N 748'W 65 51/80

    St C. Rossas (ESAB) 4140'N 649'W 880 84/96

    Bragana, St Apolnia (ESAB) 4145'N 645'W 670 84/96

    Vila Flor (ESAB) 4118'N 78'W 550 84/96

    Vila Real (INMG) 4119'N 744'W 481 51/80

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    Vale da Vilaria (ESAB) 4115'N 705'W 125 84/96

    Legenda: ESAB Escola Superior Agrria de Bragana; INMG Instituto Nacional de Meteorologia e Geofsica. Em itlico estaes meteorolgicas localizadas na rea de estudo ou a menos de 5 km da sua fronteira.

    Quadro 3. Elementos do clima e ndices bioclimticos mais relevantes da rea de estudo

    Estao T Mi mi Tp P Ic It Itc Io Ios2 Diagnose bioclimtica

    Aeroporto de Bragana

    12,2 8,2 0,6 1462 654 16,9 201 201 4,5 0,6 Med. pluviestac.-ocenico

    supramed. sub-hmido

    Bragana 11,9 8,0 0,9 1433 741 16,2 208 208 5,2 0,7 Med. pluviestac.-ocenico supramed. sub-hmido

    Bragana, St Apolnia

    11,8 7,1 -0,7 1421 772 17,8 182 182 5,4 0,6 Med. pluviestac.-ocenico

    supramed. sub-hmido

    Chaves 12,5 10,2 1,1 1502 715 15,3 230 230 4,8 0,8 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. sub-hmido

    Deilo 12,2 7,5 1,3 1458 732 17 209 209 5,0 0,5 Med. pluviestac.-ocenico supramed. sub-hmido

    Figueira de Castelo Rodrigo

    12,3 8,8 0,6 1482 591 16,6 218 218 4,0 0,6 Med. pluviestac.-ocenico

    mesomed. sub-hmido

    Fontes Barrosas 11,3 7,9 0,3 1354 1049 16 195 195 7,8 0,8 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. hmido

    Gimonde 12,5 9,3 0,1 1494 602 17 218 218 4,0 0,5 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. sub-hmido

    Guarda 10,5 6,2 1,4 1255 936 15 181 181 7,5 O,6 Med. pluviestac.-ocenico supramed. hmido

    Izeda 13,2 9,9 0,7 1579 646 17,7 238 238 4,1 0,5 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. sub-hmido

    Miranda do Douro 12,0 7.8 0,7 1441 555 16,9 205 205 3,8 0,7 Med. pluviestac.-ocenico supramed. sub-hmido

    Mirandela 14,2 10,2 2 1707 520 17,5 264 264 3,0 0,4 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. seco

    Moimenta 10,7 7,1 -0,2 1288 1167 16 177 177 9,1 1,0 Med. pluviestac.-ocenico

    supramed. hmido

    Montesinho, Lama Grande

    8,1 2,4 -1,2 966 1541 15,8 93 93 15,9 2,0

    Ios3 = 2,5 Temp. ocenico

    submediterrnico supratemp. hiper-hmido

    Pedras Salgadas 12,5 9,5 2,4 1502 1042 14,3 244 244 6,9 0,7 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. sub-hmido

    Pinela 12,2 9,9 1,8 1462 758 14,4 239 239 5,2 0,6 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. sub-hmido

    Rgua 15,3 12,5 3,6 1834 950 14,9 314 314 5,2 0,5 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. sub-hmido

    St C. Rossas 11,7 6,8 0,8 1398 1108 16,8 193 193 7,9 1,1 Med. pluviestac.-ocenico

    supramed. hmido

    Vale da Vilaria 16,5 11,8 2,5 1977 245 19 308 313 1,2 0,2 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. semi-rido

    Vila Flor 13,8 8,5 1,8 1662 598 18 242 242 3,6 0,5 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. sub-hmido

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    Vila Real 13,4 9,8 3,1 1604 1128 14,9 263 263 7,0 0,7 Med. pluviestac.-ocenico mesomed. hmido

    No quadro 2. esto caracterizadas as estaes meteorolgicas da Rede Meteorolgica Nacional coordenada pelo Instituto Nacional de Meteorologia e Geofsica (INMG, 1997) e da rede mantida pela ESAB, utilizadas na caracterizao bioclimtica da rea de estudo. Foram apenas consideradas as estaes que se encontram em territrios carpetano-leoneses portugueses. No quadro 3. esto resumidos os elementos do clima e ndices bioclimticos mais relevantes da rea de estudo.

    Da anlise da informao bioclimatolgica do quadro 3 constata-se que praticamente toda a rea de estudo tem um macrobioclima de tipo mediterrnico. O topo da Serra de Montesinho , em princpio, temperado submediterrnico supratemperado hiper-hmido (Ios2 = 2,0 e Ios3 = 2,5, vd. tabela 3).

    Com o objectivo de precisar a altitude a que se processa a transio entre os andares meso e supramediterrnico e efectuou-se uma regresso linear entre a altitude e o Itc:

    Itc = 313 - 0,142.altitude (r2=0,81, b=0 para P

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    sobrevalorizar o andar mesomediterrnico28. Mais concretamente, conclumos que apenas os fundos e as meia-encostas dos vales mais profundos da rea de estudo, a cotas raramente superiores a 680 m, na proximidade da fronteira Sul do Parque Natural de Montesinho, so mesomediterrnicos; todo o restante territrio supramediterrnico. So eles os vales dos rios Mente, Rabaal, Tuela (at perto da ponte velha de Soeira), Sabor (at Rabal) (It = 218 em Gimonde), Igrejas, Onor e Frio e Mas e das ribeiras de Labiados e da Sapeira. Algumas encostas particularmente soalheiras da rib. da Assureira tambm sero mesomediterrnicas. Em nosso entender a denominada Terra de Transio da figura 10 representa fielmente as reas mesomediterrnicas na rea de estudo.

    Quanto ao ombroclima, a Baixa e Alta Lombada (vd. quadro 3., Io = 4,5 no Aeroporto e Io = 5,0 em Deilo) e os vales mais profundos que sulcam o Parque Natural de Montesinho so sub-hmidos. Os planaltos a oeste do rio Sabor e as Serras de Nogueir