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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇAO ESCOLAR FRACASSO ESCOLAR Por: Andréa da Silva Casadonte- Turma 38 1º semestre / 2003

FRACASSO ESCOLAR - avm.edu.br DA SILVA CASADONTE.pdf · Tem que se definir que escola deseja-se, que projeto de sociedade, redefinindo práticas ... reforço, programas de preparação

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇAO ESCOLAR

FRACASSO ESCOLAR

Por: Andréa da Silva Casadonte- Turma 38

1º semestre / 2003

Monografia orientada por:

Yasmin Maria Rodrigues Madeira da Costa

A Deus e aos meus pais que sempre me apoiaram com seu legado de coragem e fé na vida.

A todos que compartilham da utopia de um

mundo em que todos tenham o mesmo ponto de partida...

´A tarefa da educação é formar seres humanos para o presente, para qualquer presente, seres nos quais qualquer outro ser humano possa confiar e respeitar, seres capazes de pensar e

fazer tudo que requeira um ato de responsabilidade de acordo com sua consciência social.” Maturana

RESUMO

A repetência é a solução interna que o sistema escolar encontrou para lidar com o

problema da não-aprendizagem ou da má qualidade de tal aprendizagem. Dessa forma,

analisar as fontes e a natureza da repetência é analisar a própria missão da escola, incluindo a

série de variáveis e processos que incidem sobre a aprendizagem no meio escolar, sua

qualidade seus contextos e seus resultados.

Tem que se definir que escola deseja-se, que projeto de sociedade, redefinindo práticas

para a sociedade civil, rompendo com a fragmentação do ensino, investindo na formação do

professor, com condições apropriadas para uma educação continuada , a fim de conquistar-se

maior eficácia de oportunidades para os alunos na educação básica.

SUMÁRIO

1. Capítulo I- Introdução......................................................................................pág. 6

2. Capítulo II- O quê é fracasso escolar para você? ...........................................pág. 9

3. Capítulo III- A posição do poder público e seu papel em relação ao fracasso ....pág. 11

4. Capítulo IV- Atribuição do fracasso escolar........................................................pág. 15

5. Capítulo V- Superando as abordagens tradicionais do fracasso................... ........pág. 20

6. Capítulo VI- As estratégias adotadas pela escola para reverter a problemática do

fracasso e resultados obtidos.................................................................................pág. 24

7. Considerações finais ............................................................................................ pág. 26

CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO

Durante vários anos diversos Sistemas Educacionais consideraram a repetência como

uma solução interna para sanar o problema da não-aprendizagem ou de sua má qualidade.

Sendo assim, estudar as fontes e a natureza da repetência é levar em consideração o papel da

escola na sociedade, incidências que ocorrem durante o processo de aprendizagem, sua

qualidade, seus contextos e seus resultados.

A repetência no meio escolar afeta a grande maioria dos países, inclusive os ditos

industrializados. De acordo com as estatísticas de 1990, foram registrados 35,6 milhões de

repetentes no Ensino Fundamental e entre 10% e 20% dos meninos e das meninas no mundo

repetem alguma das séries iniciais do Ensino Fundamental. Constatou-se também que cerca

de 15% das crianças ficam à margem da escola e, embora entre 85% e 90% da população

infantil em idade escolar ingresse na escola, apenas 47% completa o Ensino Fundamental.

Diante destes fatos e evidente avanço da repetência, necessitamos dar maior atenção

ao problema, bem como ao registro, à documentação e à análise em torno do mesmo. É

preciso levantar questões junto aos agentes envolvidos no Sistema Educacional (professores,

supervisores, diretores), à família e a comunidade, como também, explorar experiências que

deram bons resultados nos países que mantêm baixos índices de repetência. É necessário,

também que a comunidade educacional deixe de encarar a repetência como algo “normal” ou

como um problema externo à escola.

Neste sentido, os esforços feitos para resolver a repetência de um modo eficaz não

devem somente levar em conta a sua realidade estatística, mas também as percepções em

torno desta. Sabemos que a repetência está centrada nas séries iniciais, especificamente na

alfabetização. Um estudo realizado no México (1989) constatou que apenas 15% das crianças

que completam o Ensino Fundamental são capazes de ler e escrever com compreensão. A

repetência nas séries iniciais está intimamente ligada a problemas no ensino da leitura e da

escrita, embasada em compreensões atrasadas e estreitas com relação à aquisição da

linguagem. Mesmo depois de 20 anos de existência da teoria da Psicogênese da Língua

Escrita, sabemos que inúmeros professores a desconhecem ou simplesmente a ignoram.

Administrativa e financeiramente a repetência é considerada um desperdício de

recursos. Desta forma, algumas soluções superficiais foram adotadas, como: atividades de

reforço, programas de preparação na educação infantil, aumento das horas-aula e finalmente a

aprovação automática. Estas e outras medidas podem diminuir a repetência, mas não garantir

a aprendizagem. Vários países interromperam a aprovação automática ao constatarem um

crescente número de alunos que deixaram a escola sem obter níveis aceitáveis da aquisição da

leitura e da escrita.

Pensa-se que é de extrema importância que a sociedade, a comunidade escolar, e

principalmente os educadores estejam constantemente refletindo sobre a origem do fracasso

escolar e como saná-lo, acreditando que não só a falta de acesso à escola e a evasão escolar, a

repetência é um dos maiores problemas do sistema escolar, já que assume hoje um caráter de

solução de fatores da não-aprendizagem, o que leva, conseqüentemente ao fracasso. Desta

forma, analisar as fontes e a natureza do fracasso é analisar a própria missão da escola,

incluindo a série de variáveis de processo que incidam sobre a aprendizagem.

O presente estudo deteve-se em estudar o que contribui para o fracasso escolar, nas

séries iniciais do Ensino Fundamental, da rede pública. Para tal, investigou as ações

construídas na escola para minimizar o fracasso escolar, a fim de buscar estratégias

emancipatórias para a educação e desdobramentos para efetivar a cidadania, através da

identificação de suas principais causas e conseqüências e da análise das ações do poder

público para sanar o fracasso escolar, realizando uma pesquisa que levantou as razões do

fracasso na escola ao final do segundo ciclo do ensino fundamental, usando a Metodologia de

pesquisa bibliográfica, adotando as teorias de Gadotti e Romão, Pedro Demo, Paulo Freire,

Nilda Alves entre outros e da pesquisa qualitativa, dando ênfase ao trabalho de campo e a

pesquisa social; através do uso de entrevista para coletar dados, um roteiro de perguntas e

observação participante. Foram entrevistas semi-estruturadas com perguntas abertas e

fechadas, no qual o entrevistado expressou-se sobre o tema, sem respostas ou condições pré-

determinadas pelo pesquisador.

CAPÍTULO II – O QUÊ É FRACASSO ESCOLAR PARA VOCÊ?

A escola de excelência não é para todos, mas sim para os que nela passam sem

reprovação ou serão excluídos do processo, pois excelência supõe o sucesso, não sendo

permitido ter dificuldades sem se preocupar em encontrar soluções para o fracasso escolar.

A escola que defendemos está na rede pública, uma escola que propicie oportunidades,

tornando o fracasso em sucesso, com compromissos sociais, em busca de formar o cidadão

integral.

Neste estudo, utilizou-se a análise de conteúdos por tema que permite considerar as

diferentes opiniões dos entrevistados sobre o fracasso na escola, caracterizando apontamentos

que levantaram questões mais específicas do assunto.

É notável que a análise da concepção de fracasso escolar é bastante parecida entre a

maioria dos entrevistados. Estes consideram o fracasso escolar como a desistência da escola

por parte do aluno, porém uma professora em sua fala considera como fracasso escolar

‘quando vemos a criança sair da escola sem ter o mínimo de conhecimento: ler, escrever,

contar e outros. Afinal, são condições básicas necessárias para a sua vida.”

Sabe-se que grande parte das crianças que completa o Ensino Fundamental não são

capazes de ler e escrever com compreensão, sabendo-se que os maiores índices de evasão

estão centrados nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

Diante disto, o aluno não pode simplesmente passar pela escola e, assim, adquirir

escolaridade e não conhecimentos. É de extrema importância dar-se maior atenção a

problemática do fracasso, buscando levantar questões junto a todos envolvidos no processo

educacional como nos mostra a fala de uma professora onde: ´Acho que é o meu próprio

fracasso, pois se a criança não aprende é meu fracasso também. Eu ainda não descobri uma

forma ou um caminho para que ela pudesse se desenvolver melhor.”

Considerando-se a existência de vários fatores que colaboram para o fracasso escolar,

não se pode atribuir a razão do mesmo à somente um fator, sem deixar de considerar que o

professor que é comprometido com sua prática deve buscar constantemente meios que

possibilitem o melhor desenvolvimento do aluno, entretanto não será esta ação que garantirá a

redução dos índices da repetência; garantirá, provavelmente, uma melhor qualidade no

processo ensino-aprendizagem.

Diante destas colocações, se pode refletir sobre a concepção que as pessoas possuem

sobre o fracasso escolar, como também a necessidade de atribuí-lo a uma causa. Precisa-se

considerar, também a ausência de políticas públicas na resolução desta problemática. Não

basta somente estudar os fatores que causam o fracasso, se são oriundos por parte do

professor, alunos ou responsável, mas deve-se cobrar do poder público uma postura ativa em

relação ao fracasso realmente eficaz , não vinda de cima para baixo, como ocorreu com a

organização curricular em ciclos em alguns municípios ou a aprovação automática.

CAPÍTULO III – A POSIÇÃO DO PODER PÚBLICO E SEU PAPEL EM

RELAÇÃO AO FRACASSO

A reflexão sobre o fracasso na educação não pode se esgotar em contrapor nossa visão

e prática de qualidade à concepção neoliberal, caracterizada na própria posição do poder

público.

A exclusão da escola atinge a todos que a ela não têm acesso pela falta de vagas

gerada, via de regra, pela inexistência de políticas públicas adequadas às demandas sociais no

ensino fundamental.

A exclusão na escola está ligada à “baixa produtividade” da escola nas suas tarefas de

ensino-aprendizagem e concretiza-se nos mecanismos de seletividade intra-escolar

denominados de reprovação, repetência e “deserção” ou “evasão” escolar.

As ações governamentais, as práticas administrativas têm intrinsecamente uma

intencionalidade, não são desencadeadas por acaso. Ao contrário, são componentes de

projetos políticos que tendem a redefinir o sentido da escola para o pronto atendimento das

demandas do mercado. As pressões concentram-se na formação de um novo senso comum

sobre o papel da escola na economia globalizada. Trata-se de das respostas a dois grandes

problemas: a organização de um currículo hegemônico que expressa os interesses dominantes

da nova ordem e a constituição de um conjunto de medidas político-administrativo, coerentes

com a visão de Estado mínimo, centralizando na escola funções mais específicas, como vê-se

na fala de uma diretora de escola: “O poder público vive procurando alternativas, sempre

vindas de cima para baixo, de forma autoritária, sem ouvir o mais interessado: o professor.

São as várias reformas curriculares, o ensino por ciclos, promoção automática, etc.”

Embora o discurso seja de participação e autonomia, na prática configura-se a

descentralização das obrigações do poder público, repassando para a escola sua própria

sobrevivência, ao mesmo tempo, que mantém garantido o controle do currículo.

Trata-se da desconstituição da escola como espaço público onde a construção do

conhecimento produza valores e forme sujeitos históricos conscientes e atores de seu destino.

“O poder público se omite, não investe e “joga a peteca”para a escola.”

Nesse sentido, a escola, ao lado do direito e de outras instituições e atividades, é

importante instrumento do Poder Público para esse fim: criar e manter certo tipo de

civilização, de cidadão, difundindo certos costumes e hábitos, buscando um novo

conformismo, assim como fazendo desaparecer outros.

“(...) cada Estado é ético quando uma das suas funções mais importantes é a de elevar a

grande massa da população a um determinado nível cultural e moral, nível (ou tipo) que

corresponde às necessidades de desenvolvimento das forças produtivas e, portanto, aos

interesses das classes dominantes(...)”

(Gramsci, 1988:145)

O fracasso escolar reflete um dos fenômenos que caracteriza o descaso com a

construção de um projeto social mais amplo. Na verdade não se faz diagnósticos precisos, não

são ouvidos ou levados em consideração a opinião das pessoas que constituem o cotidiano

educacional, preocupados não só com o lado pedagógico, mas com o lado humano, social, que

engloba todo esse processo ensino-aprendizagem. O que vê-se é o poder público achar que

tal pacote ou medida, na área educacional satisfaça as necessidades da comunidade escolar.

Nesta concepção não cabem as idéias de solidariedade e igualdade. A padronização do

conhecimento, ministrada pela ordem do mercado, aumenta e consolida a exclusão dos setores

sociais em desvantagem.

Pode-se exemplificar aqui, uma parcela considerável da população que sofre com o

aumento do desemprego. Desta maneira, grande parte desta parcela se torna supérflua para a

produção e possivelmente até mesmo, como mercado. Cada vez mais a produção pode ser

deslocada para zonas de consideráveis mão-de-obra e baixos salários, e dirigida a setores

privilegiados na economia. Tais fatores denunciam diferenças econômicas e sociais e não

conseguem esconder o acentuado aumento da exclusão.

Nesse sentido Milton Santos (1999):

“A idéia de emulação é compulsoriamente substituída pela prática da competitividade, o individualismo como rega de ação exige o egoísmo como comportamento quase obrigatório e

a lei do interesse sem contrapartida moral supõe como corolário a fratura social e o esquecimento da solidariedade. O mundo do pragmatismo triunfante é o mesmo do “salve-se quem puder”, do “vale-tudo”, justificado pela busca apressada de resultados cada vez mais autocentrados, por meio de caminhos sempre mais estreitos, levando ao amesquinhamento

dos objetivos, por meio da pobreza das metas e da ausência de finalidades. O projeto educacional atualmente em marcha é tributário dessas lógicas diversas.”

Diante deste fato, várias famílias sofrem com o desemprego, o que leva parte dessa

camada social a procura de pontos alternativos de sustentação. Conseqüentemente, a estrutura

familiar necessária ao desenvolvimento psicológico e social do educando é rompida. Nesse

sentido, os valores estabelecem-se fundamentados em outros princípios, que muitas vezes, são

construídos num contexto de violência. “Com certeza o poder público é responsável por

vários fatores que levam ao fracasso, pois a escola precisa de condições de trabalho, a

família necessita de mais oportunidades para terem tempo de se dedicarem aos filhos.” ( fala

de uma diretora de escola)

Apesar da ideologia que prega a constituição do consenso e o pensamento único, o

Poder Público reforça o aprofundamento das desigualdades. Os direitos mais elementares da

cidadania são sonegados, portanto, trata-se de construir uma alternativa radicalmente

democrática, que redefina as relações do Poder Público com a sociedade.

CAPÍTULO IV– ATRIBUIÇÃO DO FRACASSO ESCOLAR

Segundo os relatos de educadores alfabetizadores, há uma inadequação da própria

escola em atender o perfil dos alunos de classes populares e o nosso sistema educacional não

respeita as diferenças individuais, sócio-política-econômica, no qual busca somente a

homogeneização do ensino, valorizando índices estatísticos finais sem se preocupar com a

revitalização das estruturas educacionais e os seus processos de recuperar um autoconceito

positivo de trabalho.

Vários estudiosos apontam essas particularidades na educação. Celso Vasconcellos

nos faz refletir sobre a finalidade da escola e sua crise de sentidos, pois há um sentimento

generalizado de “caos”, que se manifesta na falta dos educadores pesquisados. É importante

chamar a atenção para o papel do professor que antes sustentava sua autoridade no mito da

mobilidade social através da escola e hoje está perdido e não consegue articular um outro

sentido para a educação.

Preocupados em recuperar o sentido da escola, Nilda Alves, Regina Leite Garcia,

Silvio Galo, entre outros, contribuem com suas teorias, tecendo algumas redes para superar-se

os desânimos, o resgate e o respeito à categoria do magistério e o desejo em participar da

construção de uma escola pública de qualidade e sem exclusão.

Temos problemas em adequar o sistema educacional e a escola, construindo um novo

jeito de ação que seja eficaz para a educação popular, seus desafios e o papel estratégico do

professor de educação básica, no sentido de “aprender a aprender”, resignando a educação

brasileira.

Teorizando sobre práticas pesquisadas no processo de alfabetização, há a necessidade

de readquirirmos outras habilidades e competências para que o professor modifique sua ação,

a fim de transformarmos o sistema educacional, junto com o conjunto de pessoas da sociedade

que lutam pelo bem comum. Tais práticas devem ser:

• Vislumbrar um professor engajado em transformar as estruturas, inclusive os valores das

pessoas, como bondade, solidariedade e visão crítica do seu fazer cotidiano;

• O professor que seja político e não apolítico, numa concepção sócio-interacionista da

educação, no papel de mediação e que não deixe adaptar-se as conveniências do sistema, que

é corporativista e omisso, excluindo classes mais desfavorecidas socialmente;

• Lutar pela valorização de seu fazer profissional, inclusive melhores condições de trabalho

pedagógico e salarial;

• Procurar espaço para uma educação continuada em serviço, mantendo-se atualizado sobre

as diferentes teorias estudadas na educação e nos acontecimentos do mundo moderno.

A tarefa é fácil. O professor que já desanimou e não consegue articular novo sentido

para a escola e o seu fazer, continua a reproduzir em sua sala de aula o fracasso escolar e as

desigualdades sociais.

De vítimas do sistema passa-se a ser agentes de transformação, acolhendo nosso aluno

e buscando uma educação para a cidadania, como fala o mestre Paulo Freire.

Neste estudo, os professores relataram a dificuldade em lidar com os alunos e sua

realidade social, na qual é violenta e desprovida de sentido. Não percebem a importância em

estudar e perguntam: “Professor, estudar para quê?”

Cabe ao professor apropriar-se de uma concepção da pedagogia que faça a leitura do

contexto histórico, onde o povo seja seu ator social, superando a dicotomia entre teoria e

prática; interferindo na realidade, levando a ação e reflexão, tal qual nos mostra a pedagogia

da autonomia de Paulo Freire.

Só com este novo olhar é que se pode dar conta de respeitar os alunos das classes

populares e suas diferenças individuais, não padronizando e trabalhando com a realidade do

aluno e não com a expectativa da escola tradicional, que sempre busca o aluno ideal,

descontextualizando de sua conjuntura cultural e social.

Na análise dos dados relatados, percebeu-se que os professores têm dificuldades em:

• Articular novos saberes e pensar numa educação não-disciplinar e insistem na visão

conteudista, sem perceberem que estão reproduzindo práticas que devia estar em desuso;

• Entender a interdisciplinaridade e seus limites;

• Pensar no conceito de transversalidade, desenvolvida por Félix Guattari no paradigma

rizomático, rompendo com a hierarquização do conhecimento;

• Romper a prática tradicional e cartilhada da alfabetização;

• Pesquisar as práticas que auxiliam o seu fazer imediato com as levantadas na psicogênese

da escrita por Emília Ferreiro;

• Mediar na intervenção da zona proximal, a partir dos estudos de Vygotsky, fazendo a

relação com a linguagem e o uso da palavra, tão evidenciados nas teorias de Bakhtin;

• Favorecer suas classes com o estudo do letramento, fundamentado por Magda Soares;

• Usar as referências teóricas que fundamenta as práticas mais atualizadas do fazer

pedagógico, nas diversas áreas do conhecimento e que são estratégias na alfabetização

popular.

Pensando em reverter o processo de fracasso escolar nas classes populares, propõe-se

que se resgatem práticas antigas, mas que são fundamentais na sala de aula tais como:

• O planejamento das aulas, numa temática contextualizada, de acordo com os centros de

interesse dos alunos;

• Valorizar a produção dos alunos, expondo na sala de aula seus trabalhos, estimulando a

auto-estima do grupo e um ambiente alfabetizador;

• Organizar as atividades em momentos de trabalho diversificado, em grupos e no coletivo,

além do individual.

As práticas sugeridas acima ajudam ao professor sistematizar, no dia-a-dia, o processo

do conhecimento.

Em entrevistas com as famílias, os pais de alunos mostraram-se preocupados com a

falta de tempo para apoiarem seus filhos ou a própria desestruturalização do grupo familiar,

tão afetado hoje pelo desemprego, causando dificuldades no processo educacional.

Argumenta-se que a família deixou para a escola toda a responsabilidade incluindo a

formação de valores morais e éticos. “Tem crianças que não tem apoio dos pais, uns porque

trabalham fora e não tem tempo e outros porque não se interessam mesmo.”

Escola e família devem unir-se abrindo possibilidades de parcerias, pois juntas podem

formular um projeto popular de desenvolvimento ou melhor, desenvolver seu projeto político

pedagógico atendendo a realidade da educação básica e implementando uma gestão escolar

democrática, tão necessária a nossa cidadania. “Trabalhamos com projetos, chamamos a

comunidade a participar de forma integral da escola. Pensamos sempre na escola como um

espaço de prazer.”

Há várias iniciativas pela participação da comunidade na educação escolar, desde

meados da década de 80, porém pouquíssimas escolas estão abertas a aceitação da população

na sua gestão.

Verificam-se resistências de foram dual na relação com a gestão democrática. De parte

dos pais, as evidências são que não há interesse em manter uma relação mais próxima com a

escola. Existem tentativas, como as do conselho escolar, com representação de professores,

funcionários, pais e alunos, na qual não avançam além das prestações de contas e fiscalização

das verbas e nem sempre são de caráter deliberativo.

CAPÍTULO V– SUPERANDO AS ABORDAGENS TRADICIONAIS DO

FRACASSO

A possibilidade da construção do sucesso, nas turmas de alfabetização, analisadas na

escola, efetivou-se a partir de uma modificação estrutural nas relações sociais e pedagógicas

vivenciadas no cotidiano escolar. Essa modificação está vinculada à perspectiva

epistemológica construtivista. Em sua gênese, encontra-se a reversão dos pressupostos

teórico-metodológicos definidores da ação desenvolvida na perspectiva da despatologização

do repetente, da sala de aula (re)significada, da construção da língua escrita e da proposta

metodológica do fracasso.

A superação dos mitos explicativos, que colocam no aluno ou na sua família as causas

para o insucesso escolar, apresentou-se como aspecto significativo nas situações investigadas.

Essa mudança substancial na forma de encarar o fracasso escolar, evidenciou-se no trato

cotidiano do processo educativo dos repetentes, na valorização de seus avanços cognitivos e

no resgate do prazer de aprender.

O fracasso na aprendizagem é compreendido como produção escolar mediada pelo

contexto político, social e econômico, no qual a instituição escolar está inserida. Nessa

perspectiva, estabeleceu-se um compromisso maior com os repetentes e multirrepetentes.

Sem mencionar os professores como vilões ou vítimas do processo, aponta-se a falta

de instrumentalização teórica dos professores e de inserção no contexto dos alunos como

impeditivos para realização de um trabalho de mais qualidade. O fato de a escola apresentar-

se como estranha ao modo de vida dos alunos, pelos seus rituais e regras, era também

apontado como motivador do fracasso escolar.

No caso dos alunos multirrepententes, com passagens pela classe especial, a idéia de

insuficiência pessoal como causa do fracasso era agravada. Na medida em que, no momento

de seu ingresso na escola, a criança não conseguia recortar, pintar ou desenhar adequadamente

o “a” ou tentar reproduzir determinados sinais, ela era encaminhada para a classe especial

onde era discriminada, apontada negativamente, e confinada ao treino psicomotor. Tanto é

assim que a classe especial é um assunto do qual as crianças, que por ela passaram, não

gostam de falar.

Outro aspecto significativo que se reflete no insucesso escolar diz respeito à

assincronia entre o que a escola propõe e o que os alunos vivem no seu dia-a-dia fora da

escola.

Outros aspectos apontados como responsáveis pelo fracasso escolar referem-se a

questões extra-escolares, relacionadas à política governamental para a educação e a situação

sócio-econômica das famílias.

Em relação à política governamental destaca-se a idéia de que o Estado não garante, na

prática, o que prioriza no discurso para a área educacional. Inclui-se, nessa crítica, a falta de

recursos materiais para a escola, a ausências de políticas sistemáticas de formação de

professores e a política salarial para o magistério.

A inexistência de continuidade nas propostas trabalhadas no sistema educacional é

reiteradamente apontada em relação a má qualidade da qual resulta o insucesso: palestras,

cursos, seminários são promovidos sem que sejam amarrados entre si ou discutidos no

contexto das questões cotidianas da escola.

A relação do contexto social e econômico com o fracasso escolar é examinada em

várias perspectivas.

A diretora da escola pesquisada analisa a problemática familiar que se desencadeia a

partir dos problemas sócio-econômicos.

“Acho que tem um outro lado: a situação sócia- econômica do país interfere.Eu acho que não dá para subestimar isto aí, pois interfere na aprendizagem das crianças. De um lado, as pessoas não conseguem ter um salário que lhes permita viver uma ida

digna e, de outro, lado a inexistência deste salário e a inexistência de um padrão de vida geram uma série de problemas que terminam por interferir na forma como as crianças são criadas, no tipo de educação que recebem, na forma como vivem e no relacionamento dos pais com os filhos. (...) Para criar os filhos, as pessoas tem que

estar em casa em algum horário, é preciso ter uma vida regular, as crianças precisam ter uma referência...”

A visão contextualizada e desmistificada do fracasso escolar permite o

estabelecimento de expectativas positivas em relação aos alunos, independente de suas

experiências escolares pregressas. A crença na capacidade de aprender dos alunos expressa-se

nas falas e nas atitudes dos professores e da equipe pedagógica das escolas no dia a dia.

Em sala de aula, essas expectativas favoráveis manifestam-se em incentivos que

fortalecem a auto-estima e a autoconfiança dos alunos e representam um convite a novas

tentativas e ousadias. As situações observadas retratam essa assertiva.

No cotidiano, o resgate da autoconfiança e do prazer de aprender está ligado à forma

“des-patologizada” de olhar para o aluno. Sem a “piedade” que descompromete, sem o

autoritarismo que anula, o professor comprometido com a aprendizagem do aluno, é capaz de

ajudá-lo a resgatar-se, e a superar-se cognitivamente para avançar em direção ao saber que a

escola precisa socializar.

Essa visão “des-patologizada” do repetente, explicitada nas atitudes favoráveis e

pacientes em relação ao processo de aprendizagem do aluno, constitui-se como pilar central

nas experiências que investigamos.

CAPÍTULO VI– AS ESTRATÉGIAS ADOTADAS PELA ESCOLA PARA

REVERTER A PROBLEMÁTICA DO FRACASSO E RESULTADOS

OBTIDOS

Os pais percebem que na escola pesquisada existe um esforço em criar recursos na

busca de soluções para melhorar o desempenho de seus alunos, com atividades na Sala de

Leitura, Sala de Solicitação (recuperação paralela) e nas reuniões que visam a conscientização

e participação da comunidade escolar, porém não muda a realidade educacional.

Pais e professores não percebem empenho e interesse do poder público em investir

efetivamente em verbas para melhor distribuição de rendas, diminuindo, assim, a pobreza e a

evasão escolar.

Temos diversas ações e programas para tentar reverter o fracasso, como: projeto de

alfabetização de jovens e adultos, programas da educação juvenil, projeto de aceleração da

aprendizagem, mas que não dão conta da diversidade brasileira.

Precisa-se, na verdade, de políticas que atendam a concepção e princípios

pedagógicos de uma escola do campo, dos negros no sistema formal de ensino, pois no

imaginário do professor a criança negra tem maior possibilidade de fracasso, de uma

educação para os povos das florestas, visando o conhecimento e a língua dos índios e não-

índios, sendo respeitados num currículo próprio.

Necessita-se, também, enfatizar a luta por uma escola inclusiva para os portadores de

necessidades especiais de educação e a educação infantil e a creche, sendo priorizada

nacionalmente.

“Alguns nos dirão: “Ïsso é utopia!”

Para estes responderemos: “E o que é a utopia?”

Para nós: “A utopia é o que nos faz caminhar!”

(Paulo Freire)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando que a alfabetização nas classes populares, historicamente, traz no seu

bojo a realidade dual, na qual reflete diferenças sociais que permitem a perpetuação do

fracasso escolar, analisou-se a escola e suas funções, a partir de questionamentos que nos

fazem repensar uma escola que se acostumou a mandar e agora precisa dialogar e dar conta

das novas tecnologias e necessidades do mundo atual. Daí, reorganizar todo o cenário para

atender as demandas do mercado e romper com as amarras que são impostas ou por nós

mesmos e por instituições internacionais que se utilizam fachadas ditas democráticas, que

muitas vezes levam a comunidade escolar assumir-se como reprodutora do fracasso.

A produção da alfabetização se consolida nas trocas realizadas entre o educando e a

língua escrita, mediada pelas intervenções docentes e pelo grupo.

Nesse processo, o coletivo e o individual relacionam-se, desencadeiam a

aprendizagem e constituem um espaço pedagógico no qual a homogeneidade e a

uniformidade (próprias das práticas tradicionais) são substituídas pela heterogeneidade e pela

diversidade. Sendo assim, a avaliação deve desformalizar-se e instituir-se ao longo do ano

letivo, como prática diagnóstica e ser um instrumento reorganizador da proposta pedagógica.

O espaço pedagógico deve ser vivificado pelos significados sociais das temáticas,

através das quais a língua escrita possa ser aprendida.

O espaço institucional deve redinamizar-se pelo desejo da socialização do

conhecimento e pela crença de que todos são capazes de aprender, seja pela proposta

pedagógica ou no esforço dos docentes.

Na verdade, a escola deve voltar-se para a humanização, entendendo-se como espaço

constitutivo na formação do sujeito que aposta em relações sociais baseadas no bem comum,

enfim, numa ordem sem exclusão. Defende-se, portanto, uma escola que atua historicamente

como instrumento de transformação da realidade. Uma escola que valoriza os indivíduos

quanto seres pensantes, capazes de atuar coletivamente na sua história.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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• LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública : A pedagogia crítico-

social dos conteúdos, 3ª edição, São Paulo: Loyola, 1986.

• MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. A árvore do conhecimento.

Campinas Editorial PSY, 1995.

• MOLL, Jaqueline. Alfabetização possível: Reinventado o ensinar e aprender, Porto

Alegre: Mediação, 1996.

• PATTO, Maria Helena S. A criança da escola pública: diferente ou mal trabalhada?

In: Ciclo Básico, São Paulo, 1985.

• PATIO. Revista Pedagógica, Ano 3, nº 11, Porto Alegre: Artmel, 1999.

• PIAGET, Jean. O raciocínio da criança. Rio de Janeiro: Record, 1967.

• SANTOS, Milton. Os deficientes Cívicos. In: Folha de São Paulo, 24.1.1999.

• SOARES, Magda Becker. Linguagem e escola: uma perspectiva social, 3ª edição, São

Paulo: Ática, 1986.

• WEIZ, Telma. Como se aprende a ler e escrever ou prontidão, um problema mal

colocado. In: Ciclo Básico, São Paulo, 1985.

ANEXO 1

Questionário:

1) O que é Fracasso Escolar para você?

2) A que você atribui o Fracasso Escolar?

3) Na sua opinião, como o poder público se posiciona? E qual o seu papel em relação ao

fracasso?

4) Quais as estratégias que a escola adota para reverter a problemática do fracasso?

5) Que resultados têm obtido?