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FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE PÚBLICA Subárea de Concentração Políticas Públicas e Saúde Departamento de Ciências Sociais Necessidades e demandas de informações: uma abordagem a partir da Vigilância Sanitária Maria José Castro d’Almeida Lins Rio de Janeiro - 2001

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  • FUNDAO OSWALDO CRUZ ESCOLA NACIONAL DE SADE PBLICA CURSO DE MESTRADO EM SADE PBLICA Subrea de Concentrao Polticas Pblicas e Sade Departamento de Cincias Sociais

    Necessidades e demandas de informaes: uma abordagem a partir da Vigilncia Sanitria

    Maria Jos Castro dAlmeida Lins

    Rio de Janeiro - 2001

  • FUNDAO OSWALDO CRUZ ESCOLA NACIONAL DE SADE PBLICA CURSO DE MESTRADO EM SADE PBLICA Subrea de Concentrao Polticas Pblicas e Sade Departamento de Cincias Sociais

    Necessidades e demandas de informaes: uma abordagem a partir da Vigilncia Sanitria

    Maria Jos Castro dAlmeida Lins

    Dissertao de Mestrado apresentada Escola Nacional de Sade Pblica ENSP/FIOCRUZ, como requisito parcial obteno do ttulo de mestre em

    Cincias, rea de Concentrao Sade Pblica, Subrea Polticas Pblicas e Sade.

    Orientadora: Prof Dr Ilara Hmmerli Sozzi de Moraes

    Rio de Janeiro - 2001

    2

  • Sou profundamente grata a todos os que contriburam para que este trabalho fosse realizado.

    3

  • Cuando el visionario Agustn Cueva (1991: 49) pronosticaba ya a comienzos de dcada que el proyecto neoliberal com su enorme proceso de concentracin y

    exclusin terminaria convirtiendo a la Amrica Latina en una realidad marcada por las figuras del delincuente y el mendigo, parece que hubiera presagiado la

    pandemia de violencia reactiva que se pronunciara en nuestras sociedades en la actualidade y la triste imagen de nuestras ciudades y caminos, convertidas ahora

    en un scenario dantesco donde pasea la pobreza su menesterosa splica y se perciben signos evidentes de la angustia de una masa abultada de desempleados

    y subempleados, que ni las estadsticas oficiales pueden ocultar, y cuyas urgencias no alcanzan a cubrir los exiguos subsidios focalizados que

    institucionaliz la caridad oficial, insuficiente y apaciguadora. (Breilh: 2000: 109)

    4

  • S U M R I O RESUMO INTRODUO ........................................................................................................ 7 Importncia da rea de estudo ................................................................... 13 Formulao do problema ........................................................................... 17 Organizao e metodologia da pesquisa ................................................... 22 Plano de apresentao .............................................................................. 24 I A INFORMAO .......................................................................................... 25

    1 Breve histria ....................................................................................... 25 2 A Informao e a sociedade do conhecimento..................................... 47 3 O trabalho com informao .................................................................. 62 4 A informao da informao ................................................................ 66 5 - Perspectivas ......................................................................................... 69

    II INFORMAO E SADE ............................................................................. 81 1 - Produo e disseminao da informao em sade pblica ................ 82

    2 - Panorama dos Sistemas de Informao em Sade ............................. 84 3 - Poltica de Informao em Sade ......................................................... 87 4 - Vigilncia da sade, vigilncia sanitria ................................................ 91 5 - Informao em sade na Secretaria de Estado de Sade RJ ......... 111

    III UM ESTUDO DE CASO NA VIGILNCIA SANITRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ...................................................................................................... 123

    1 - Metodologia do Estudo ............................................................................. 123 2 - Resultados e discusso ........................................................................... 137

    IV - CONSIDERAES FINAIS ......................................................................... 166 ABSTRACT BIBLIOGRAFIA ANEXOS

    5

  • RESUMO

    Este trabalho analisa o processo de definio de demandas informacionais na sade, da perspectiva da Cincia da Informao, enquanto conhecimento para se lidar com: i) o registro e a recuperao da informao; ii) desenvolver metodologias para a gerao, uso e disseminao de informaes; e iii) transformar o conhecimento cientfico em metalinguagens que permitam o acesso s informaes e seu uso. Seu objeto foi construdo no campo da transferncia e recuperao da informao, focalizando a informao da informao e o metaconhecimento como entendidos por Gmez (1996), onde a informao acerca da informao articula esta ao conhecimento. O estudo foi desenvolvido na Secretaria de Estado de Sade do Rio de Janeiro (SES/RJ), no espao de interseo entre a Coordenao Geral de Vigilncia Sanitria (VISA) e o Centro de Informaes em Sade (CISA). Procurou-se obter uma viso do cenrio informacional da SES/RJ e, mais especificamente, da VISA, averiguando como se processa a definio de demandas informacionais, assim como os aspectos de oferta e utilizao da informao, sistematizao das demandas informacionais, relevncia da informao para o gestor, conhecimento da informao disponibilizada em rede interna e externa, habilidade para lidar com as novas tecnologias da informao e, ainda, a indicao de crescimento de demandas de informao para apoiar a deciso. Os resultados destacam a persistncia de uma lgica fragmentadora permeando os sistemas de informao em sade disponveis, bem como os esforos para a superao da mesma. Permitem, tambm, confirmar a existncia de baixo uso de informaes na VISA como conseqncia dessa fragmentao e tambm de uma gama complexa de questes, dentre as quais se pode citar a falta de uma maior pertinncia destas informaes frente s necessidades dos gestores. Conclui-se pela falta de estruturao das informaes na VISA, o que determina o modo anrquico, no sistemtico, como se expressam as necessidades informacionais dos gestores. Estas necessidades, formando uma massa nebulosa, difusa, ambgua, exigem interveno metodolgica para definir os fluxos e o modo de definir as demandas informacionais.

    Palavras-chave:

    Informao Sade

    Vigilncia Sanitria

    Informao

    6

  • INTRODUO

    __________________________________________________________________

    O campo da cincia e do saber foi palco de grandes mudanas que tomaram

    corpo no decorrer da segunda metade do sculo 20. Estas mudanas foram

    interpretadas, a princpio, to somente como uma das formas de organizar o

    conhecimento (Lyotard, 1986). Mais recentemente percebeu-se que representam

    bem mais e acredita-se, mesmo, no surgimento de um novo paradigma, onde o

    conhecimento assume um carter interpretativo de maior subjetividade,

    contrapondo-se ao paradigma positivista que parece perder foras (Campos,

    1980).

    La sociedad de la Informacin es la Edad del Bit. De la misma forma que aquellos mundos [Idade da Pedra, Idade do Bronze, Idade do Ferro, Mundo Antigo, Idades Mdia, Moderna e Contempornea] cambiaran con el descubrimiento y utilizacin de nuevos materiales, el bronce o el hierro, que posibilitaban el desarrollo de cambios tecnolgicos, en la historia de nuestra especie ha aparecido un nuevo elemento: el bit, la digitalizacin, un elemento que est cambiando y lo har ms intensamente en el futuro nuestra organizacin social, nuestra forma de trabajo y, para algunos, tambin lo har en nuestra forma de pensar y percibir. (Romero, 1999:2)

    Vivemos uma poca de grandes transformaes em que novas estruturas esto emergindo no interior das instituies, entre instituies, nos pases e no mundo. Das estruturas rgidas e imutveis, est-se passando para estruturas flexveis e intercambiveis. A sociedade global est-se delineando cada vez mais propulsionada principalmente pela rede telemtica que multiplica e acelera a intercomunicao dos fatos no momento de seus acontecimentos. (Rosetto, 1997: 59)

    A economia industrial parece deslocar-se em direo a uma economia de

    informao. Acredita-se que a informao, em breve, se constituir numa fora

    que produzir mais riquezas do que foram capazes a terra e a industrializao, ou

    mesmo, o capital. A informao e as tecnologias da informao vm

    desempenhando papel fundamental tanto na definio quanto na execuo e

    aperfeioamento de estratgias no mundo dos negcios. Os tericos da

    7

  • sociedade ps-industrial, como D. Bell (1976), H.A. Simon (1983), citados por

    Lojkine (1995), preconizaram a passagem da era industrial, isto , de uma

    economia baseada na produo industrial, para a era da informao ou de uma

    economia fundada no tratamento da informao.

    Entretanto, muitos dos postulados contidos na perspectiva da sociedade ps-

    industrial no se confirmaram e o que se v, antes de tudo, que a informao

    no substitui a produo e, tambm, a indstria no foi substituda pelo setor de

    servios. Observa-se, de fato...

    (...) uma nova interpenetrao entre informao e produo e os pases economicamente mais competitivos, que no so os Estados Unidos ou a Frana, mas o Japo e a Alemanha, so os que melhor souberam, simultaneamente, organizar eficazmente a produo e tratar a informao, tanto na indstria como nos servios (Lojkine, 1995: 16).

    Lojkine (1995), avaliando o contedo dessas transformaes scio-tcnicas que

    tm recebido a denominao de especializao flexvel, v a revoluo

    tecnolgica que se inicia envolta em sombras. Diz, porm, que no se trata de

    uma segunda revoluo industrial, nem de uma revoluo cientfica e tcnica e

    nem mesmo de uma revoluo informtica, e que estas so designaes

    inadequadas, pois uma revoluo tecnolgica de conjunto no se reduz

    revoluo do instrumento de trabalho, ainda que esta seja essencial. Acredita que

    a transferncia de um novo tipo de funes cerebrais abstratas para as

    mquinas representa uma revoluo informacional, pois esta transferncia

    determina um deslocamento do trabalho humano da manipulao para o

    tratamento de smbolos abstratos, quer dizer, para o tratamento da informao.

    Neste sentido, a revoluo informacional nasce da oposio entre a revoluo da mquina-ferramenta, fundada na objetivao das funes manuais, e a revoluo da automao, baseada na objetivao de certas funes cerebrais desenvolvidas pelo maquinismo industrial. (Lojkine, 1995: 14)

    Para Lojkine, no entanto, a questo central saber quem so os sujeitos reais das

    aes no campo da informao. Lembra que a revoluo industrial, nascida no e

    8

  • com o capitalismo, distingue-se, desde ento, pela diviso de atividades, de

    funes e de homens e o que surge, hoje, nas sociedades so fortes

    potencialidades de superao dessas divises, a despeito das presses sempre

    dominantes (scio-econmicas, polticas, ideolgicas) para conserv-las.

    Este autor adverte que a automatizao no tratamento da informao, como vista

    pelos tericos da sociedade ps-industrial, no altera a diviso social do trabalho -

    hierarquizada, dividida entre os que decidem e os que executam, reduzindo a

    informao ao nvel das mercadorias.

    A revoluo informacional...est em seus primrdios. Ela , primeiramente, uma revoluo tecnolgica de conjunto, que se segue revoluo industrial em vias de terminar. Mas muito mais que isto: constitui o anncio e a potencialidade de uma nova civilizao, ps-mercantil, emergente da ultrapassagem de uma diviso que ope os homens desde que existem as sociedades de classe: diviso entre os que produzem e os que dirigem a sociedade, diviso j dada entre os que rezavam, os escribas-sacerdotes administradores dos templos, e os que trabalhavam para eles. A diviso social entre os que tm o monoplio do pensamento e aqueles que so excludos deste exerccio est agora posta em questo ou, mais exatamente, seu questionamento torna-se hoje um problema social real na escala de toda a humanidade. (Lojkine, 1995: 11)

    Lojkine defende que a Novas Tecnologias da Informao permitem romper estas

    divises seculares e at mesmo milenares e isto tambm porque a gesto

    moderna j se deu conta que os comportamentos de manter a informao

    estratgica resguardada contra a tirania das pequenas decises s agravam os

    crculos viciosos, os bloqueios informacionais e organizacionais. (Lojkine, 1995:

    16)

    Conclui, entretanto, relativamente aos atores desta revoluo ps-mercantil que,

    de alguma forma, os atores somos todos ns quer tenhamos ou no conscincia

    disto. Os atores, pois, so os usurios das Novas Tecnologias da Informao que

    promovem novas cooperaes entre os setores de indstria e servios, da

    mesma forma como, no passado, o foram todos os usurios das mquinas-

    ferramenta. Estes, como ns, hoje, confrontaram-se com potencialidades

    9

  • contraditrias e, por isto mesmo, com opes que de maneira alguma podiam ser

    consideradas puramente tcnicas.

    Contudo, se se confere aos desafios atuais da revoluo informacional toda a sua significao cultural, poltica e tica, pode-se afirmar que o movimento social que deve realiz-la ainda pertence ao futuro. (Lojkine, 1995: 310)

    A par destas questes, maiores, tem-se que as transformaes que esto

    ocorrendo nas sociedades vm exigindo sejam adotadas modificaes

    importantes nas estruturas organizacionais, nos processos de produo e de

    trabalho. A gesto estratgica1 numa organizao define suas atividades meio e

    seus objetivos. Define a forma de operar essas atividades e a forma de tornar

    seus servios e produtos diferenciados, efetivos, competitivos. Isto vale para as

    empresas do mundo econmico como para organizaes de qualquer natureza. A

    informao e a tecnologia encontram-se na base desses processos.

    Toda organizao necessita mobilizar conhecimentos para desenvolver as

    atividades a que se destina. Para isto precisa apoiar-se em mecanismos e meios

    que permitam procurar e obter as informaes necessrias a seu desempenho. As

    fontes de informao vm crescendo progressivamente, assim como os meios de

    estocagem, em especial os de suporte magntico, favorecendo a obteno de

    informaes com rapidez e confiabilidade. Na prtica, entretanto, preciso que

    haja uma organizao especfica dessas informaes, assim como equipamentos

    e tcnicas capazes de dot-las de valor de uso2, potencializando a capacidade de

    governana dos gestores. E, antes disso, preciso que se trabalhe no sentido de

    identificar, no universo de necessidades de informao, as demandas importantes

    para o processo decisrio, tanto no mbito das organizaes privadas quanto

    pblicas.

    1 Administrao Estratgica uma atividade permanente e contnua que se desenvolve de modo ordenado, integrado, criativo e participativo, constituindo-se em um processo de aprendizado, em constante ajustamento com a cultura organizacional, visando a permitir que a empresa alcance os objetivos que possibilitaro a otimizao dos seus resultados no futuro, a despeito de mudanas aleatrias ou planejadas que venham a ocorrer no meio ambiente em que ela atua. (Leito, 1995) 2 (...) para as organizaes, importante no a quantidade de informao acumulada, mas possuir informao de valor, isto , informao avaliada e analisada, caracterizada por sua preciso, relevncia, confiabilidade, simplicidade e validade. (Prez, 1998: 5)

    10

  • Este trabalho trata da Informao no setor pblico e pretende buscar alguma

    contribuio para a rea da gesto da informao em sade3.

    A preocupao com a eficincia, eficcia e efetividade, o barateamento e a

    disseminao dos computadores de pequeno porte, as reformas de Estado e a

    prpria revoluo informacional colocaram aos governos a obrigatoriedade da

    modernizao, com base na ao informada, na gesto estratgica. Porm, a

    fragmentao que tem caracterizado o agir do Estado brasileiro, revelando-se na

    forma compartimentalizada como se organiza e como responde s demandas da

    sociedade, expressa-se fortemente em suas ferramentas de anlise, como o

    caso das informaes em sade (Moraes, 1994).

    A produo de saber no campo da sade tem tratado essas questes sob os mais

    diversos ngulos. As anlises contidas nesta dissertao representam mais um

    esforo no sentido da sistematizao do conhecimento disponibilizado para apoiar

    o processo decisrio com vistas a acrescentar qualidade gesto em sade.

    A fragmentao presente nos Sistemas de Informao em Sade espelha uma

    opo poltica4 voltada para impedir uma percepo globalizada das situaes e

    escamotear as contradies existentes na sociedade. Ela parte indivisvel da

    histria da organizao institucional das aes de sade e permanece como

    desafio no quadro da luta de afirmao e fortalecimento do Sistema nico de

    Sade - SUS5 (Moraes, 1994).

    A identificao e denncias de fracassos (...histrias de horror... - McGee &

    Prusak, 1994: XVI) ao se adotarem sistemas de informao, assim como o baixo

    3 Gesto da informao em sade - A utilizao da informao para fins estratgicos como vetor que possibilita: i) aumentar a sinergia dos esforos; ii) a capacidade para antecipar cenrios; iii) acompanhar a evoluo de problemas e solues associadas; iiii) reduzir as incertezas e; iiiii) permitir a formulao de um repertrio de manobras estratgicas ofensivas e defensivas. 4 A informao fundamentalmente poltica. Nem os meios, nem seu contedo, atuam num vazio histrico, mas, sim, representam e carregam sempre uma intencionalidade. (Premissa n 1 do Informe MacBride - UNESCO/ONU, citado por Piernes, 1990) 5 SUS Sistema nico de Sade, institudo pela Constituio Federal de 1988 Ttulo VIII, Captulo I, Seo II Artigos 196 a 200. Foi regulamentado pelas Leis 8.080/90 e 8.142/90.

    11

  • uso das informaes - quer nas empresas privadas, como nas organizaes

    pblicas, quer no primeiro mundo, como nos pases de economia dependente -,

    comeou a aparecer com freqncia nas pginas da produo acadmica. O

    usurio queixava-se: Continuamos a gastar rios de dinheiro, mas nunca

    conseguimos as informaes de que precisamos realmente.6 O enorme

    investimento realizado em tecnologia, por si s, logo mostrou-se pouco eficaz para

    resolver as necessidades de informaes das empresas. A tecnologia amplia as

    possibilidades destas no plano da informtica e mesmo da gesto, mas no

    oferece todas as solues.

    A tecnologia no impe limites s organizaes, cria alternativas, e o desafio passa a ser a escolha til (oposta escolha correta) entre elas [informaes]. (McGee & Prusak, 1994: XVII)

    At porque, contrariamente s pretenses comuns nos primrdios da aplicao do

    conceito de arquitetura da informao7, a maioria das informaes essenciais para

    uma organizao no pode ser embutida em sistemas. So informaes

    subjetivas ou de outra natureza que se encontram na memria da experincia dos

    trabalhadores e dos tomadores de deciso, que se encontram nas injunes das

    polticas e das mais diversas conjunturas. McGee & Prusak (1994: 129) acreditam

    que cerca de 90% das informaes de uma organizao esto fora dos sistemas

    automticos. Esta realidade no diferente nas organizaes pblicas.

    Observando o cotidiano dessas organizaes, pesquisadores, gestores e

    trabalhadores em geral verificaram que, tambm nelas, ou especialmente nelas,

    6 Depoimento feito a um dos autores de Gerenciamento estratgico da informao, McGee & Prusak, 1994: 109. 7 Arquitetura da informao Termo utilizado nas comunidades de sistemas de informaes, desde a dcada de 80, como metfora para indicar um modelo amplo de organizao para a gerao e movimentao de dados na tentativa de documentar sistematicamente todas as fontes de dados importantes numa organizao e as relaes entre esses dados, criando um mapa abrangente capaz de permitir a construo de um sistema o mais completo possvel. Entretanto, os resultados deste esforo muitas vezes ficaram aqum dos objetivos pretendidos pela presuno de que a maioria das informaes essenciais (ou mesmo todas) numa organizao pode ser estruturada e formatada para ser lida por computador, o que no ocorre. (McGee & Prusak, 1994: 129).

    12

  • constata-se fortemente a existncia de acmulo de informaes de um lado e

    baixa utilizao das mesmas de outro.

    Roberta Lamb descubri, en un estudio de campo, que los ejecutivos y el publico en general, no obstante tengan a su disposicin las condiciones para un acceso casi ilimitado a fuentes informacionales, com interfaces amigables, prefieren servicios facilitadores, seleccionados, com valor agregado, quiz por la conviccin de que la bsqueda de la informacin requiere tempo y esfuerzo, porque vivimos en un universo caracterizado por la abundancia de datos (information overload) y poca objetividad en trminos de informacin segmentada. (Miranda, 1996: 309)

    Assim, partindo da preocupao com o baixo uso da informao em sade no

    processo decisrio e, pela necessidade de averiguar e levantar formas de

    facilitao do seu uso pelos gestores, optou-se por analisar aspectos deste

    problema, desenvolvendo Estudo de Caso sobre demanda informacional na

    Coordenao Geral de Vigilncia Sanitria da Secretaria de Estado de Sade do

    Rio de Janeiro (VISA-SES/RJ).

    Importncia da rea de estudo

    Tm sido identificados em alguns estudos, como os de Moraes (1994, 1998 e

    1999), a existncia de baixo uso da informao no setor sade. Anlises no

    campo informacional apontam tambm a existncia de problemas, como: a

    multiplicao de bases de dados inadequadas e deficitrias; dificuldades tcnicas

    de compatibilidade e de conexo; baixa aceitao das novas tecnologias; falta de

    capacitao de pessoal para lidar com informtica; ausncia de investimento

    numa cultura informacional; e muitos outros.

    Dentre as dificuldades a implicadas tem-se a fragmentao com que o Estado

    opera determinando uma atuao pontual e reativa que fortalece a tendncia

    formao de feudos tcnicos estanques (Moraes, 1994). Por extenso, a

    integralidade do contexto fica prejudicada e no se desenvolve a intersetorialidade

    necessria a um desempenho pleno com troca de experincias e informaes

    13

  • imprescindveis constituio de uma viso de conjunto e a uma atuao

    integrada no campo da informao em sade e da sade como um todo.

    Mas, freqentemente...

    (...) quando todas as explicaes triviais, tcnicas e materiais forem incapazes de encontrar qualquer luz, a cultura de informao8 chega, como uma fora renovadora, cercada de uma quantidade de confuso, rudo e poeira. E desaparece novamente, to repentinamente quanto apareceu. (Menou, 1996: 298)

    Menou (1996) procura mostrar que a influncia da cultura no ciclo da informao

    no se restringe a aspectos como lngua, a palavra escrita e falada, mas o

    resultado de interaes complexas e interpenetrantes.

    Este autor vem-se dedicando questo das relaes entre cultura, informao e

    educao de profissionais de informao nos pases em desenvolvimento e

    lamenta que as dificuldades nestas relaes, discutidas e identificadas h pelo

    menos um quarto de sculo, tenham alcanado to pouco progresso. Pois, de

    fato, as mudanas parecem ocorrer mais como conseqncia de

    desenvolvimentos tecnolgicos e foras econmicas que ambos provocam e dos

    quais se beneficiam. Cada vez mais, mquinas fazem imposies a seres

    humanos, j que a tendncia da revoluo informacional mecanizar os

    processos intelectuais (Menou, 1996: 303). Uma das conseqncias disto que a

    aplicao das modernas tecnologias provoca mais dificuldades, e mesmo falhas,

    do que facilidades e sucessos.

    preciso no apenas identificar as limitaes atuais, mas tambm encontrar

    caminhos exeqveis para super-las. Menou adverte que fundamental poder

    inventar o prprio caminho nos trabalhos de informao e realizar uma verdadeira

    apropriao da tecnologia, experimentando coletivamente o processo de

    transformao da realidade.

    8 Cultura de informao - , geralmente, definida como a habilidade dos indivduos ou grupos de fazer o melhor uso possvel da informao. Este, porm, um conceito reducionista que limita o papel da cultura ao estdio de consumo no ciclo da informao, pois a cultura permeia, tambm a criao da informao (Menou, 1996).

    14

  • A municipalizao da sade, descentralizando a gesto do setor e, portanto,

    passando a responsabilidade pela produo, gerenciamento e disseminao da

    informao em sade para o nvel local, colocou para os gestores uma maior

    necessidade de lidar com a informao e com suas tecnologias.

    Na impossibilidade de dar conta rapidamente destas e de tantas outras

    atribuies, servios de assessoria foram contratados para prover os gestores dos

    dados necessrios aos planos de gesto, relatrios e projetos, e principalmente

    preparao das planilhas de financiamentos. Poucos municpios se interessaram

    por desenvolver o trabalho com informao. Inclusive, insignificante a ateno

    que vem sendo dada atividade de produo e coleta de dados para os sistemas

    de bases nacionais.

    Nas secretarias estaduais de sade (SES), o advento da informao em bases

    modernas tambm no logrou introduzir grandes mudanas no sentido de

    incrementar a utilizao de informaes para apoiar o processo decisrio. Os

    centros de processamento de dados das SES, muitas vezes, apenas assumiram a

    tarefa de dar conta das exigncias do nvel federal de se utilizar o meio magntico

    para o repasse dos dados que devem alimentar os sistemas de informaes,

    assim como a tarefa de gerenciar burocraticamente a Rede Nacional de

    Informao em Sade (RNIS). As diretorias ou centros de informao, raramente

    tornaram-se realmente coordenadoras de uma poltica de informao em sade e

    uma referncia de apoio ao nvel central e aos municpios, mantendo o velho estilo

    de atuao. Deixam, assim, de exercer sua vocao integradora no interior das

    estruturas das SES, sem fora poltica para desempenhar suas atribuies, as

    quais se dispersam pelos mais que fragmentados setores dessas secretarias e

    das vigilncias epidemiolgicas e sanitrias. E tudo prossegue, mais ou menos

    como sempre foi, salvo poucas excees, para no negar a regra.

    Todavia, a informatizao foi-se ampliando, de modo que, grande parte das

    instituies de sade, secretarias estaduais e municipais, tem nmero cada vez

    maior de computadores. A poltica de informao do Ministrio da Sade,

    estimulando esta tendncia, instituiu a RNIS (Rede Nacional de Informaes em

    15

  • Sade), atravs da qual apoia o crescimento do parque de equipamentos de

    informtica.

    Por outro lado, as experincias de gesto foram-se sedimentando ao longo desses

    ltimos 10 anos de implementao da Reforma Sanitria, promovendo inovaes

    e trazendo contribuies importantes para o setor. Porm, a utilizao de

    informaes no processo decisrio, dadas as condies materiais, histricas,

    existentes no setor pblico de sade, ainda no logrou maiores progressos,

    exigindo um olhar atento para que haja uma melhor compreenso dos fenmenos

    a implicados.

    Assim, ainda em meio ao grande encantamento com as novas tecnologias da

    informao (NTI), comearam a surgir anlises chamando a ateno para a

    importncia das pessoas, de seu conhecimento e experincias, no contexto da

    gesto.

    Mais recentemente as pessoas onde, realmente, se encontra o conhecimento -

    passaram a ser valorizadas no contexto organizacional, pois uma perfeita

    arquitetura de informao, a tecnologia mais sofisticada e todas as reengenharias

    no resolveram, e no podero resolver, por si ss, todos os problemas no campo

    da informao ou de qualquer outro. As pessoas so o centro do processo e

    preciso comear perguntando-lhes sobre suas necessidades informacionais.

    Quais informaes lhes so teis, relevantes?

    Para Pearson (1973), necessidades so o maior determinante de uso e da o valor

    da informao. McGee & Prusak (1994) consideram a identificao de

    necessidades e requisitos de informao como a mais importante tarefa do

    processo de gerenciamento da informao. No raro, entre os que projetam os

    sistemas, considerar garantida, em breves anlises, a identificao das

    informaes a serem trabalhadas. Agem como se pudessem presumir, intuir ou

    adivinhar as necessidades daqueles a quem deveriam auxiliar, resultando na

    construo de sistemas ineficientes ou que no trazem os benefcios esperados

    (McGee & Prusak, 1994: 115).

    16

  • Necessidades so um universo amplo, difuso, mutvel. Necessidades que se

    transformam em demandas que podem ser operacionalizadas so necessidades

    pensadas, trabalhadas para que se chegue a uma orientao de contedo mais

    precisa. E ento, indo mais alm, preciso estabelecer um plano sistemtico, um

    modelo para adquirir a informao de sua fonte de origem. Sem esquecer que a

    informao precisa ser administrada diariamente, recebendo os mesmos cuidados

    que os demais recursos de uma organizao.

    O processo de definio de demandas informacionais ocupa espao relevante no

    escopo do gerenciamento da informao, de modo que um processo de

    sistematizao de demandas pouco cuidadoso pode resultar em esforos inteis.

    A informao, para ser realmente til e de valor para o usurio, precisa ser

    pertinente s necessidades deste. Necessidades que se devem transformar em

    demandas precisas.

    sobre este aspecto do gerenciamento da informao9 que se pretende observar

    e discutir, procurando obter algum conhecimento sobre a forma como se

    processam as demandas informacionais na VISA (VISA-SES/RJ).

    Formulao do problema

    Os estudos mostram, de forma recorrente, a existncia de subutilizao de

    informaes no processo decisrio em sade na realidade brasileira. Pode-se

    dizer, porm, que este fenmeno encontrado em todo o mundo, em todos os

    campos de gesto.

    O gestor de vigilncia sanitria atua em um campo que diz respeito a quase todos

    os aspectos da vida em sociedade, devendo funcionar como um termmetro

    extremamente sensvel de modo a poder antecipar aes capazes de interferir

    9 Gerenciamento da informao Para McGee & Prusak, o uso da informao como um recurso estratgico no qual o estabelecimento de processos e estruturas de suporte no se constitua em atividade que se preste a uma abordagem mecnica ou esquemtica, devendo envolver uma clara viso dos aspectos e atitudes humanas que circundam a informao e seu uso. (McGee & Prusak, 1994: 172)

    17

  • sobre: i) os fatores de riscos em processos de produo, transporte e

    comercializao de alimentos, produtos qumicos, farmacuticos, domissaneantes

    e cosmticos; ii) nas condies do meio ambiente e de ambientes de trabalho; iii)

    de servios de sade e assistenciais; e iiii) de circulao de pessoas, cargas e

    transportes.

    Trata-se de um universo amplo, onde a informao precisa e relevante

    disponibilizada em tempo timo e no melhor formato condio indispensvel

    para seu bom funcionamento. Esta realidade, por si s, coloca as vigilncias

    sanitrias como prioridades no desenvolvimento do aparato informacional e de

    informtica em sade. Porm, somente agora a gesto da informao comea a

    ser melhor compreendida e muitos estudos vm desvendando questes que no

    tinham sido valorizadas anteriormente. Dentre as questes que cercam o tema

    considerou-se relevante, neste estudo, lanar um olhar sobre o processo de

    formao de demandas10 de informaes, indagando-se a respeito da importncia

    da identificao de metodologias para a sua definio.

    Toda organizao necessita de modelo de gesto para funcionar adequadamente.

    A palavra gesto representa um conceito amplo, de modo que pode significar

    muitas coisas de acordo com a abrangncia do assunto considerado. Porm,

    desde que gesto, de um modo geral, pode ser definida como a forma como se

    estabelecem os relacionamentos entre as pessoas na busca de um objetivo

    comum, todos deveriam conhecer perfeitamente o modelo de gesto da

    organizao onde interage. A gesto diz respeito ao modo como se dirige, como

    se administra uma organizao, mas, mais que isto, diz respeito s pessoas, seu

    processo de trabalho, sua forma de comunicao (Rodriguez: 2001: 171).

    Rodriguez tambm define gesto como...

    A apresentao de forma estruturada e organizada de como ocorre a integrao entre os seus sistemas internos, formais e informais, que fazem

    10 Demanda - [Dev. de demandar.] S.f. 1. Ao de demandar. (...) 6. Econ. Procura. (...) Em demanda de. Em busca de; procura de: Vive em demanda de glria. (Dicionrio Luft, 1998)

    18

  • com que seja assegurado o atendimento s estratgias de negcio suportadas pelas pessoas dentro de uma Organizao formal de poder e sistemas. (Rodriguez, 2001: 172)

    Os modelos de gesto so definidos em funo das caractersticas e objetivos da

    organizao. A gesto da informao parte de um modelo de gesto e se

    relaciona ao aspecto organizao, o qual, por sua vez, se constitui, juntamente

    com a estratgia e os trabalhadores, na base de um modelo de gesto.

    A informao e as novas tecnologias tornaram possveis novas alternativas de

    estruturao organizacional permitindo sejam extrapoladas as capacidades e

    competncias de uma nica organizao e apontando para a possibilidade de

    rompimento da barreira representada pelas divises que caracterizam o

    capitalismo.

    Os conhecimentos que se desenvolveram no mundo dos negcios oferecem

    subsdios valiosos para as organizaes de natureza pblica. Porm, estas so

    portadoras de formas diferentes de gesto e organizao. Por atenderem

    necessidades complexas e variveis, seus servios no podem ser

    demasiadamente formalizados, necessitando de margens de autonomia maiores

    para atender s necessidades de gesto, assim como dos usurios. Mintzberg,

    1995 (citado por Kopf, 1999), denomina as organizaes pblicas de sade de

    organizaes profissionais e considera determinante o fato de que para

    funcionarem bem elas dependem, em primeiro lugar, de seus operadores. (Kopf,

    1999: 49).

    Conforme Ceclio (1993), o aumento da governabilidade no setor sade pressupe

    a incorporao dos seus trabalhadores na gesto efetiva dos servios, sendo

    questo de fundo para a gesto...

    ...a criao de um espao pblico, consensualmente definido e compartilhado, no qual as diferentes racionalidades portadas pelos diferentes grupos possam se consensuar e se disputar, referenciadas a um projeto poltico que tenha por objetivo uma sociedade radicalmente democrtica, tensa e ativamente construda. (Ceclio, 1993: 332)

    19

  • Ceclio (1997) enfatiza o assunto pela necessidade de se fazer frente a uma

    realidade bem conhecida que diz respeito ao fato da maioria das organizaes

    pblicas de sade trabalhar com sistemas de gesto de baixssima

    responsabilidade. Trata-se de uma realidade onde falta uma tradio de trabalho

    com base em declarao de compromisso com relao a determinadas tarefas e,

    tambm, onde h ausncia de cobranas efetivas sobre os compromissos

    assumidos. Completam o quadro, situaes onde as diretorias e as gerncias

    intermedirias tm agendas sempre lotadas com problemas emergenciais,

    aparentemente inadiveis, de modo que nunca sobra tempo para trabalhar com

    planejamento (Ceclio, 1977: 166).

    Transformaes significativas no mbito das organizaes do mundo do trabalho passam por mudanas no cotidiano de sua gesto que facultam uma maior expresso das orientaes dos sujeitos organizacionais em suas subjetividades, favorecendo aprendizados coletivos em uma coordenao da ao voltada para o entendimento. Entendimento, no no sentido legitimador das relaes de poder vigentes na sociedade e que se reproduzem nas organizaes, mas calcado no exerccio da crtica sobre as aes organizacionais, desenvolvendo as capacidades dos sujeitos que as integram. (Kopf, 1999: 55)

    Aqui cabe uma reflexo mais objetiva sobre a informao e a gesto cotidiana na

    sade. Merhy et al (1997) enfocam o tema sugerindo que o servio de sade seja

    visto no como um organismo, mas como uma certa arena onde operam

    distintos agentes institucionais com perspectivas de ao nem sempre comuns,

    todavia, no necessariamente contraditrias tambm, mas, simplesmente, uma

    arena (Merhy et al, 1997: 114). Neste caso, a gesto passaria a ser vista como

    uma propriedade de cada um dos agentes e de todos ao mesmo tempo. A gesto

    institucional teria que operar com o jogo de disputas dos muitos e distintos

    agentes, inclusive no modo como conformariam o espao institucional no jogo

    pblico e privado. A, a informao no teria lugar como um...

    ...simples medidor de funcionalidade cumprida ou no, mas teria que ser uma ferramenta que permitisse analisar permanentemente estes jogos do aparente funcional e no funcional, do pblico e do privado, balizando de que ponto tico-poltico pode-se julgar os sentidos a serem adquiridos pelo

    20

  • servio e a que interesses explicitamente vai se centrar. (Merhy et al., 1997: 115)

    A informao, portanto, , antes de tudo, poderosa ferramenta analisadora que

    permite interrogar os processos de trabalho e, tambm, revelar a maneira como os

    mesmos so geridos.

    Retomando a anlise de McGee & Prusak (1994), que incide sobre o setor

    privado, tem-se que estes autores verificaram a existncia de muitos fracassos

    empresariais de gerncia de informao devidos, principalmente, ao fato de que

    as organizaes no administram a rea de informao ou o fazem numa

    perspectiva secundria.

    Apenas quando a gerncia da informao conscienciosamente administrada e encarada como um aspecto natural da vida organizacional que surgiro organizaes verdadeiramente baseadas na informao. (McGee & Prusak, 1994: 153)

    McGee & Prusak (1994) entendem gerenciamento da informao, numa

    concepo ampla, como um processo onde conjuntos de atividades se conectam

    de modo lgico, cruzando limites funcionais sob a responsabilidade de um

    proprietrio responsvel (McGee & Prusak:, 1994: 108). Estes autores dizem,

    ainda, que o uso da informao como recurso estratgico implica no

    estabelecimento de processos e estruturas de suporte que se constituem em

    atividade que no se prestam a uma abordagem mecnica ou esquemtica,

    devendo envolver uma clara viso dos aspectos e atitudes humanas que

    circundam a informao e seu uso, em contextos de disputas de poder e saber

    (McGee & Prusak, 1994: 172).

    Dentro do processo de gerenciamento da informao impem-se as tarefas de

    identificao de necessidades e requisitos de informao. McGee & Prusak (1994)

    dizem que esta a mais importante tarefa dentro do processo.

    Ironicamente, os que projetam os sistemas freqentemente consideram garantida a identificao e agem como se pudessem presumir, intuir ou adivinhar a informao necessria a quem esto tentando auxiliar. Mesmo no

    21

  • caso de sistemas transacionais mais bsicos, onde se pode imaginar que as exigncias sejam simples e bvias, h opes que um profissional da informao criativo pode empregar para tornar os sistemas mais estratgicos e, portanto, de mais utilidade. (McGee & Prusak, 1994: 115)

    Assim, procurou-se obter algum conhecimento sobre o qu desejam os gestores

    da Coordenao de Vigilncia Sanitria da Secretaria de Estado de Sade do Rio

    de Janeiro - VISA; do qu precisam esses gestores para organizar seu trabalho,

    planejar, avaliar, tomar decises; como esto falando de suas necessidades

    informacionais; a quem; e de que maneira. Enfim, como vivenciam e

    sistematizam suas demandas informacionais.

    E, com vistas a um maior conhecimento da situao em torno do problema,

    buscaram-se respostas sobre a importncia dos bancos de dados existentes;

    sobre a capacitao do gestor para empreender busca de informaes utilizando

    internet e intranet; e manejar aplicativos11 que lhe permitam cruzar dados, etc.

    Procurou-se verificar, ainda: i) se o gestor dispe de equipamentos adequados e

    suficientes para isto; ii) se conta com apoio tcnico em informao e informtica; e

    iii) se uma metodologia de definio de demandas de informaes contribuiria

    para melhorar o ambiente informacional e oferecer-lhe informao til e relevante.

    Organizao e metodologia da pesquisa

    A preocupao com o baixo uso da informao em sade no processo decisrio

    determinou a escolha do objeto desta investigao: averiguar aspectos da gesto

    de informaes no intento de contribuir para trazer algum esclarecimento

    questo. Desta forma, optou-se por desenvolver Estudo de Caso sobre o processo

    de demanda informacional na VISA.

    11 Programas aplicativos So aqueles destinados a fazer com que o computador realize determinadas funes, como: escrever textos, fazer grficos, organizar e manipular tabelas, realizar clculos e operaes estatsticas, criar bancos de dados, organizar referncias bibliogrficas, fazer editorao, produzir imagens, movimentos, sons, etc. Permitem tambm conectar um computador a redes de computadores de uma mesma instituio ou a uma rede internacional, como a internet (Rey, 1997: 129).

    22

  • Considerou-se estudo de caso, o processo de demandas informacionais para o

    processo decisrio entre os gestores da VISA, a partir da investigao do modo: i)

    como estes gestores lidam com as informaes necessrias ao desempenho de

    suas atividades; ii) como se relacionam com os sistemas de informaes

    existentes; e iii) com os setores responsveis pela poltica de informao em

    sade na SES/RJ e no Ministrio da Sade (MS): Departamento de Informtica do

    Sistema nico de Sade (Datasus); Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    (Anvisa).

    A proposta investigar a forma como gestores da VISA demandam informaes

    para apoiar a deciso. Para isto, procurou-se conhecer tambm: i) a oferta de

    informaes existentes para o processo decisrio; ii) o volume, relevncia e

    pertinncia dessas informaes para os gestores; iii) facilidade de acesso; iiii)

    forma como as informaes esto disponibilizadas; iiiii) conhecimento das

    informaes disponibilizadas e das novas tecnologias da informao; iiiiii) e

    indicao do crescimento de demanda de informao entre eles. A percepo

    desses comportamentos na VISA foi analisada, tambm, da perspectiva dos

    gestores do CISA (Centro de Informaes em Sade da SES/RJ) e da empresa

    prestadora de servios de informtica SES/RJ, alm do Conselho Estadual de

    Sade (CES/RJ).

    Para tanto, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, orientadas por roteiro

    temtico, com gestores da VISA, do CISA, da prestadora de servios de

    informtica e do CES/RJ. Foram acompanhadas reunies de tcnicos da VISA e

    do CISA sobre a construo de relatrios gerenciais e de alerta; reunio do

    Comit Tcnico de Informao e Informtica em Sade da SES/RJ (CTIIS) e

    oficina de trabalho sobre Sistema de Informao em Vigilncia Sanitria.

    A discusso terica que norteou o trabalho fundamenta-se na literatura que trata

    da Cincia da Informao enquanto campo onde se articulam questes como

    sade, gesto e processo decisrio, sendo analisados alguns dos pressupostos

    identificados em pesquisas que enfocam o tema e na experincia cotidiana do

    trabalho em sade.

    23

  • Plano de apresentao do estudo

    O estudo encontra-se estruturado em trs partes: a primeira discute a Informao -

    desenvolvimento, bases tericas e conceituais, panorama e perspectivas; a

    segunda traz a questo da sade e da informao permitindo obter algum

    conhecimento sobre a atuao das reas onde a pesquisa foi desenvolvida a

    VISA e o CISA; a terceira trata do estudo de caso propriamente dito.

    No captulo I, A informao, discute-se a Informao e a Cincia da Informao,

    considerando em especial a informao sobre a informao, na perspectiva do

    objeto de anlise, isto , necessidades e demandas informacionais.

    O captulo II Informao e sade, traz uma discusso sobre a informao em

    sua articulao com a sade. Nesta parte, procurou-se desenvolver uma anlise

    sobre os conceitos de vigilncia da sade e vigilncia sanitria, seu significado em

    relao ao conceito ampliado de sade, de qualidade de vida e promoo da

    sade. Tratou-se, ainda, da importncia da informao para a vigilncia sanitria.

    O captulo III Um estudo de caso na Vigilncia Sanitria do estado do Rio de

    Janeiro, contm o estudo de caso realizado, sua metodologia, resultados e

    discusso.

    24

  • Captulo I

    A INFORMAO

    Do Livro Sumrio ao Livro Virtual

    __________________________________________________________________

    Os processos de mudana e crescimento encontram-se presentes na histria e se

    sucedero enquanto o ser humano existir e mantiver sua capacidade criativa.

    A Cincia da Informao resultado dos processos de criao e transformao no

    campo do conhecimento, fazendo parte desta histria, ao mesmo tempo em que

    recurso que lhe adiciona valor e dinamismo. A cincia da informao ou estudo da

    informao ou, ainda, informatologia, sinnimos usados por Sambaqui (1978: 52),

    surgiu como desdobramento da Documentao12, gerada da Bibliografia que, por

    sua vez, teve origem na Biblioteconomia.

    1 - Breve histria

    Desde a Antigidade, as sociedades praticavam o tratamento documentrio. No

    segundo milnio a.C., documentos mesopotmicos dispostos em tbuas de argila

    eram protegidos por envoltrios que continham informaes sobre seu contedo

    de modo a cumprir as funes dos resumos atuais. A Biblioteca de Alexandria

    utilizava sistema semelhante no trato dos seus papiros para facilitar o trabalho de

    busca dos estudiosos (Witty, 1973, citado em Kobashi, 1996: 5).

    Conforme Borko & Bernier (1975), a Documentao tornou-se sistema pblico de

    circulao de informaes a partir de 1665, na Frana, com a publicao, pela

    Academia Francesa de Cincias, de Le Journal des Savans que trazia resumos

    12 Documentao o processo de reunir, ordenar e disseminar documentos, bem como os resultados da atividade intelectual em todos os campos do conhecimento. (Souza, 1990: 146)

    25

  • da produo cientfica, artstica e filosfica da poca. Desde ento, muitas foram

    as iniciativas desta natureza que se multiplicaram e sofisticaram at as atuais

    bases de dados registradas em meio magntico e legveis por computador.

    Um longo caminho foi percorrido entre a idia de Tritheim e Gesner, em 1595, de

    um levantamento bibliogrfico universal, at as atuais bibliotecas informatizadas e

    os complexos centros de informao (Costa, 1990: 137). Os avanos

    extraordinrios que se verificaram neste percurso so devidos, fundamentalmente,

    natureza interdisciplinar deste campo do conhecimento e necessidade de

    criao de suportes fsicos para tornar prticas e geis as tcnicas concebidas.

    So testemunhos deste desenvolvimento: i) os j referidos invlucros dos livros

    sumrios e dos papiros, na Antigidade; ii) as fichas padronizadas contendo

    informaes dispostas segundo regras comuns para o tratamento analtico dos

    documentos, adotando-se um sistema de classificao nico da produo do

    conhecimento, em linguagem internacional (a chamada, hoje, Classificao

    Decimal Universal, CDU), depositadas em grandes bibliotecas; iii) e os modernos

    computadores.

    Porm, a preocupao terica com a organizao e a representao de

    informaes, com fins documentrios, recente, tendo passado a se manifestar

    de modo sistemtico a partir da dcada de 50. Contriburam para isto, os

    experimentos automticos de indexao, elaborao de resumos e recuperao

    de informaes.

    Durante a Segunda Guerra Mundial, houve grande incremento na produo

    cientfica como demonstrao do valor prtico da Cincia. Pesquisadores em

    diversas disciplinas organizaram servios especiais de informao, tanto para

    fazer circular os resultados dessa produo como para obter novas informaes

    cientficas e tcnicas.

    Terminada a guerra, surgiram novas disciplinas, como a Pesquisa Operacional, a

    Anlise de Sistemas, a Ciberntica e a Teoria dos Jogos, originando-se das

    26

  • necessidades que se apresentavam na busca de soluo dos problemas

    enfrentados (Costa, 1990: 138).

    O interesse pela coleta de dados e informaes para a atividade tcnica fez surgir,

    na dcada de 50, o ensino da Documentao como disciplina especfica, distinta

    da Biblioteconomia. A partir da dcada de 50, o uso sistemtico do computador

    contribuiu para grande desenvolvimento em todo o campo cientfico,

    representando, de certa forma, o cumprimento das promessas que inebriavam o

    mundo em fins do sculo XIX e incio do sculo XX, na certeza de uma marcha

    rpida e segura rumo a um futuro venturoso, tendo a eletricidade e a

    industrializao como motor (Costa & Schwarcz, 2000).

    Estados Unidos e Europa seguem caminhos diferentes no tratamento da

    Biblioteconomia e da Documentao. Os Estados Unidos priorizaram a prestao

    de servios, criando, para isto, centros de informao. Na Europa, apenas a

    Inglaterra acompanhou a tendncia estadunidense. Os demais pases mantiveram

    a tendncia erudita nos moldes da biblioteca clssica, com tradio na

    Antigidade.

    O termo Documentao acabou por ser substitudo por Informao. No incio da

    dcada de 60, na Frana e, depois, na Rssia, comeou-se a falar em Informtica

    (Informao + Automtica), com referncia Informao Cientfica.

    No Brasil, as discusses foram coordenadas pelo Instituto Brasileiro de Bibliografia

    e Documentao (IBBD), criado em 1954, sob os auspcios da Unesco, tendo

    frende Lydia de Queiroz Sambaquy. Em 1976, o IBBD passou a se chamar

    Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia - IBICT. O IBBD, depois

    IBICT, teve como objetivo, desde sua criao, a formao e o aperfeioamento de

    recursos humanos capacitados para o desenvolvimento das atividades na rea da

    informao cientfica e tecnolgica no Brasil (Costa, 1990: 139).

    Em 1962, o Georgia Institute of Technology (EUA) realizou um congresso para

    discutir a formao de tcnicos para o tratamento da informao. A foi

    27

  • apresentado o conceito de Cincia da Informao, o qual, mais abrangente que

    Informtica, inclua o aspecto qualitativo, isto , o da avaliao da informao:

    Cincia da Informao a disciplina que investiga as propriedades e o comportamento da informao, as foras que regem o seu fluxo e os mtodos naturais e/ou artificiais de process-la para se conseguir acessibilidade e uso timos. (Costa, 1990: 139)

    O Brasil, em 1984, atravs do IBICT, adotou conceito e terminologia

    estadunidenses, por meio do seu Curso de Mestrado em Cincia da Informao,

    em convnio com a Escola de Comunicao - ECO, da Universidade Federal do

    Rio de Janeiro - UFRJ (Costa, 1990: 139).

    Em 1985 foi realizado o I Congreso Iberoamericano de Informtica y

    Documentacin, em Medelln, Colmbia, onde especialistas procuravam

    compreender as possibilidades e os desafios que as novas tecnologias abriam

    para os servios e sistemas de informao. Miranda (1996: 308) relata que as

    discusses no Congresso giraram em torno do fato de que a informao no se

    esgota em seus processos de transferncia, de interdependncia e

    transnacionalidade de dados, mas alcana, tambm, a questo dos direitos

    individuais (privacidade, autoria) e aspectos sociais, ticos e polticos no marco

    das relaes econmicas. Tratou-se, tambm, do problema das sociedades

    autoritrias, na ocasio, ainda vigentes no continente latino-americano.

    Autores de destaque no cenrio internacional, como A. & H. Toffler (1995),

    Drucker (1989) e Senge (1990), chamavam a ateno com suas teses em favor do

    uso estratgico da informao e do conhecimento, tendo em vista melhores

    resultados nos processos de planejamento e desenvolvimento de instituies e

    negcios. Mas, principalmente, ressaltavam as possibilidades de ampliao das

    bases da democracia atravs de sistemas sempre mais criativos e participativos.

    J se fazia sentir, nas discusses, a desconfiana de que a simples expanso da

    infra-estrutura no seria suficiente para resolver os problemas do campo da

    informao e da prestao de servios de informao, segundo as demandas de

    28

  • um processo de desenvolvimento voltado para toda a sociedade, em bases mais

    justas e eqitativas.

    Interdisciplinaridade

    A cincia da informao , por sua natureza, de carter interdisciplinar, pois se

    originou de diversos campos do conhecimento, com os quais se relaciona. Dentre

    eles podem-se listar: Lgica, Matemtica, Anlise de Sistemas, Lingistica,

    Psicologia, Ciberntica, Comunicao, Administrao, Pesquisa Operacional,

    Artes Grficas, Engenharia, Tecnologia de Computadores e outros. Como no

    poderia deixar de ser, tem ligaes estreitas com a Biblioteconomia e a

    Documentao.

    Harmn (1971) afirma que o objetivo principal da cincia da informao diminuir

    as fronteiras do conhecimento e aumentar a abrangncia da compreenso

    humana. Para isto, que se desenvolve processo de produo, coleta,

    organizao, interpretao, armazenamento, recuperao, disseminao e uso da

    informao. Tendo-se originado da Documentao e da Recuperao da

    Informao, a cincia da informao incorporou muitos dos conceitos e objetivos

    daquelas, assim como da Comunicao e das Cincias do Comportamento, alm

    de outras disciplinas que concorreram para sua formao, tornando-se uma rea

    de investigao subjetiva, objetiva e prtica (Harmn, 1971, citado por Costa,

    1990: 139).

    Todavia, segundo Costa (1990: 139), alguns autores, como Rees e Saracevic

    (1972), no comparam a cincia da informao Biblioteconomia,

    Documentao ou a qualquer outra disciplina. Para eles, a cincia da informao

    estuda os fenmenos da Comunicao, investigando tcnicas e mtodos que

    possibilitam uma melhor compreenso das propriedades, comportamentos e fluxo

    da informao. Envolveria...

    ...anlise de Sistemas, aspectos mesolgicos da informao e da Comunicao, dos meios de informao, da anlise Lingstica, da organizao do fluxo da informao e da interao homem-sistemas de

    29

  • informao.

    A Biblioteconomia e a Documentao, apenas, aplicariam os resultados das

    pesquisas realizadas pela cincia da informao, havendo uma troca de

    benefcios entre seus campos.

    Mostafa (1996) refere-se ao tema afirmando que a cincia da informao uma

    nova configurao temtica que...

    ...nasce no entremeio contraditrio entre as disciplinas sociais e tecnolgicas e no espao deixado por recortes j institudos pela biblioteconomia e demais cincias sociais. (Mostafa, 1996: 305)

    A cincia da informao se constituiu como disciplina no espao vazio deixado

    pela biblioteconomia quando esta fez o recorte de seu objeto. Mostafa (1996) diz

    que a biblioteconomia, em seu desenvolvimento, simplesmente no precisou

    ocupar este espao e que, ao precisar, j se deparou com uma caixa de

    ferramentas que estava sendo preparada...

    ...na forma de uma nova cincia que cuidaria das redes cognitivas de pesquisadores, dos canais de fluxo informacionais, procedimentos de busca e indexao impossveis de serem pensados sem processos automatizados. (Mostafa, 1996: 306)

    Esta autora prossegue, trazendo discusso o campo das comunicaes. Aponta

    a participao do mesmo em sua interseo com a biblioteconomia, na

    constituio da cincia da informao como disciplina. Das comunicaes, a

    cincia da informao absorveu a questo mesma do processo de comunicao,

    entendendo, de pronto, que a informao corre por um processo de comunicao

    que passa por canais.

    A cincia da informao passou a ser a cincia destes canais. (Mostafa,

    1996: 306)

    30

  • Objetivos da cincia da informao

    Para Barreto (1998: 8), os objetivos da cincia da informao se inscrevem em

    realidades distintas, circunscritas em trs mundos: i) o da realidade subjetiva

    espao das construes tericas, dos contedos de significao, da gerao,

    interpretao e assimilao da informao, etc; ii) da realidade dos objetos

    espao dos sistemas materiais e dos instrumentos; iii) e o mundo da realidade do

    ciberespao espao dos smbolos cibernticos, rea de comunicao entre os

    seres humanos e a computao, na qual seus dois mundos coincidem. Os

    objetivos da cincia da informao so operados a partir destes trs mundos e de

    suas interaes e se modificam de acordo com a velocidade em que ocorrem

    mudanas nas realidades que definem cada um destes mundos. Sua importncia

    relativa dentro de determinado perodo de tempo condicionada pela prioridade

    que a sociedade lhe atribui, de acordo com sua percepo do valor da eficcia dos

    diferentes meios e formatos da informao.

    Atualmente, o status tecnolgico, com seus avanos, que define os caminhos da

    cincia da informao. A estreita relao entre este campo e as tecnologias da

    informao e comunicao no permitem estabelecer definies e delimitaes

    permanentes. As tecnologias encontram-se em constante mudana, exigindo que

    os que convivem com seus conceitos e prticas estejam sempre voltados para o

    futuro.

    As mudanas que se delineiam para o futuro, segundo Barreto (1998), dizem

    respeito aos conceitos bsicos definidos a seguir:

    Hiperatividade: i) novas formas de interao, com a percepo sensorial

    participando mais ativamente no espao ciberntico; ii) aproximao dos

    ambientes cognitivos e artificias; iii) velocidades mil vezes maiores que as

    atuais no processo de interao com a informao.

    Hiperconectividade: i) o receptor poder ter a vivncia de espaos de fronteiras

    abertas em que a disponibilidade de informao se aproxime ao contnuo; ii) a

    31

  • convivncia nos espaos de informao trar consigo a emoo de que se

    parte do ambiente informacional, com condies para alterar este ambiente

    como se estivesse envolto nele.

    Contedo: no mbito da mensagem, o contedo se ajusta s condies

    individuais de assimilao do receptor tanto em sua forma como em suas

    linguagens de comunicao.

    Competncias: os geradores, os receptores, as organizaes e os profissionais

    deste campo necessitam desenvolver continuamente novas habilidades para o

    desempenho de suas atribuies em gesto, transferncia e recepo de

    informao.

    (Barreto, 1998: 8)

    Esta perspectiva faz prever para logo um novo modelo de acesso, transferncia e

    assimilao de informao: a realidade virtual, entendida como:

    ...una condicin de interaccin, en la que la informacin involucra e inclui al receptor, a travs de una mayor condicin de participacin de sua percepcin. (Barreto, 1998: 9)

    Neste sentido, os Estados Unidos da Amrica buscam assegurar a liderana em

    educao e pesquisa, disponibilizando novos servios e aplicaes em internet. O

    projeto mais importante em andamento o Internet-2, da University Corporation

    for Advanced Internet Development, de Washington, que permitir utilizar a

    informao com o emprego da realidade virtual, atravs da tecnologia da

    teleimerso. Esta consiste, basicamente, num instrumental para realidade virtual

    que proporciona a imerso atravs da projeo estereogrfica de imagens em trs

    quadros e um fundo, simultaneamente. Neste contexto, o som dirigido e

    personalizado para o objeto. Luvas especiais permitem obter sensaes tteis.

    Muitas pessoas podem participar ao mesmo tempo e, de forma interativa, explorar

    o contexto virtual. Imersos na cena, podem atuar e modificar o ambiente virtual.

    32

  • Estas conquistas tecnolgicas representam transformaes, a mdio prazo, para a

    cincia da informao.

    La realidad virtual e a teleimerso transformarn y reordenarn, ms de una vez, las certezas en el campo de la Ciencia de la Informacin. (Barreto, 1998: 9)

    Para alm da cincia da informao

    Em sua anlise, Mostafa levanta questes mais alm da cincia da informao.

    Discute que os ltimos 30 anos da nova cincia j permitem entrever espaos que

    ela no conseguiu tratar, por carregada que esteve, desde sempre, (...) do

    positivismo das cincias duras.

    ...analistas de cultura e economistas so quem analisam a teoria (problemtica) das trs fases da produo social - agricultura, indstria e fase informacional ou de servios. (Mostafa, 1996: 306)

    Estes temas, que no so exclusivos da cincia da informao, fomentariam

    presses, as quais, segundo Saracevic (1995), trariam mais cooperaes

    interdisciplinares. Mostafa (1996), entretanto, no entende a interdisciplinaridade

    como cooperao ou complementao, mas, principalmente, como uma relao

    de ruptura. Do contrrio, explica, esta cincia seria uma supercincia, capaz de

    absorver quaisquer presses. Viso, alis, que tem dificultado a definio do perfil

    epistemolgico da cincia da informao. como se ela estivesse no centro de

    todas as cincias, como uma cincia rgia (Mostafa, 1996: 306).

    O embate til para que se examine a dificuldade em se admitir os limites de uma

    cincia, mas, afirma Mostafa, sem limites, a cincia da informao ser sempre

    uma cincia emergente e, neste caso, questiona: quando vir o tempo de

    aprofundamento? Ao se constituir como cincia, a cincia da informao procedeu

    ao aprofundamento das contradies de um certo espao que estava l entre a

    biblioteconomia e as comunicaes e, ao se desenvolver, deixou ao largo

    problemas que vo originar novas configuraes. Alguns destes problemas,

    33

  • inclusive, se fazem sentir nos automatismos de todas as cincias novas que se

    articulam com inteligncia artificial (Mostafa, 1996: 306).

    Inteligncia artificial, cincia da informao, processamento automtico de dados, so reas espera de uma hermenutica que lhes d o sentido e a interpretao de suas mensagens. (Mostafa, 1996: 307)

    O espao ocupado por uma cincia no fica maior em funo das outras cincias

    com as quais guarda afinidades. No caso da cincia da informao, pode-se dizer

    que a biblioteconomia, a cincia da computao, as cincias cognitivas, a

    comunicao e outras no do conta das especificidades dos espaos do meio,

    sempre tensos.

    Trata-se de contradies que geram rupturas, gerando novos campos de atuao. O espao que a cincia da informao ocupou contraditrio no sentido em que contradiz (nega) as demarcaes anteriores: no mais biblioteconomia, tambm no mais comunicao; cincia da informao, a qual, se aprofunda algumas questes, tambm deixa outras em aberto; resolve (aprofunda) algumas contradies, mas tambm, gera outras, uma vez que toda demarcao limitante. (Mostafa, 1996: 307)

    Barreto (1998:3), discutindo o tema, refere que a primeira grande crise da cincia

    da informao, j quando do seu surgimento, caracterizou-se pelo enorme volume

    de informaes disponveis sem a devida correspondncia em termos de

    tecnologia para responder adequadamente s necessidades de controle desse

    volume de informao, de seu armazenamento, recuperao e disseminao.

    O autor diz que este impasse no foi resolvido, mas to somente atenuado e que

    a crise atual da cincia da informao de maior envergadura, pois, a despeito de

    transcorridos 50 anos, este campo do saber no logrou manter-se altura das

    mudanas radicais que se processaram e que seguem ocorrendo nos modelos

    relacionados s tecnologias para a informao (TI), as quais, por sua vez, so o

    resultado das transformaes ocorridas na microeletrnica, nas telecomunicaes

    e tecnologias associadas. Esta uma diferenciao de mrito para definir os

    objetivos, a investigao e o ensino no campo da cincia da informao. Na

    realidade, ambas premissas deveriam marchar unidas, mas a ansiedade

    34

  • tecnolgica imprime um posicionamento diferenciado entre as atividades prticas

    e as atividades tericas ao processar a questo. Desta forma, a sociedade tem

    sido mais afetada pelas transformaes da tecnologia que por seu contedo e os

    que convivem de perto com estas alteraes sofrem mais com as conseqncias

    sociais e fsicas de uma grande ansiedade tecnolgica, pois a tecnologia e o

    equipamento topo de linha j nascem ultrapassados (Barreto, 1998:6).

    Mdico e monstro, a tcnica, desde tempos remotos, desperta atrao e receio. O

    debate a respeito desta polarizao tem posto, no mundo inteiro, contingentes de

    intelectuais, de um lado e de outro, dando ensejo a Umberto Eco (1979) a

    design-los de apocalpticos e integrados. So chamados, tambm, de neoludistas

    os que se opem euforia tecnolgica -, e de tecno-utpicos os apaixonados

    promotores da cibercultura (Lemos, 1998: 46). A busca do consenso veio dos

    Estados Unidos, com a criao, em 1998, da corrente denominada de tecno-

    realismo:

    (...) uma espcie de movimento intelectual pelo bom senso e pela frieza nas observaes e anlises sobre a cultura tecnolgica contempornea. (Lemos, 1998: 46)

    Esta corrente, por sua vez, tem sido atacada em suas contradies, taxada de

    sentimentalista e utpica.

    O real problema da cibercultura est no tecno-surrealismo dos que acreditam em tudo e dos que no acreditam em nada. (Lemos, 1998: 52)

    A polmica tem razes antigas e profundas, mas no vem ao caso discuti-la aqui.

    Todavia, no h como, lanando um olhar sobre a modernidade, deixar de ver

    como se tem mostrado o lado perverso do desenvolvimento tecnolgico. A

    natureza e a vida social tornaram-se objeto de intervenes tecnocientficas

    freqentemente com conseqncias desastrosas desigualdades e toda sorte de

    problemas sociais, situao ambiental periclitante e guerras.

    Associa-se de forma radical o potencial inventivo humano ao potencial destrutivo da tcnica. (Lemos, 1998: 47)

    35

  • A discusso a respeito do lugar e significao dos saberes cientficos e

    tecnolgicos nas sociedades modernas, no que pese sua complexidade, central

    e imprescindvel. Elidi-la, abrir mo de fazer a histria, como exemplo, a

    estruturao de sistemas de informao por burocratas, implementados de modo

    vertical e autoritrio, que tem resultado em alienao, desperdcios e gestes

    pouco eficazes.

    A cincia e a tecnologia encontram-se no cerne do poder no mundo. Poder que as

    revestem com a aparncia enganosa da neutralidade e fazem com que sejam

    valorizadas como instncias absolutas e inquestionveis, quer seja na produo,

    como na cultura, na tica, na educao. Isto , transformam-se em religio,

    ideologia. Como resolver este problema? Grupos de debatedores acreditam que a

    apropriao social, isto , o controle social e democrtico sobre este poder, seria o

    caminho. Outros retrucam que a tcnica ser sempre fonte de poder e controle de

    poucos.

    A questo da tcnica , desde sempre, uma questo social e meras intervenes

    nela mesma no resolvero problemas crnicos da sociedade (Lemos, 1998: 50),

    pois, extremamente complexa, passa pela definio mesma do projeto de vida de

    um pas e, por extenso, da humanidade. O progresso da sociedade deve-se dar

    de modo integral, como condio bsica para a construo de uma vida melhor.

    H questes que so fundamentais para que isto ocorra, como a educao

    continuada e a transferncia da informao gerada pela atividade cientfica e

    tecnolgica voltadas para subsidiar atividades de gesto, planejamento, avaliao

    e tomada consciente de decises, assim como o controle social da poltica e ao

    pblicas.

    importante, ento, reivindicar a possibilidade do controle democrtico, atravs

    de entidades organizadas, sobre o modo como as instituies pretendem

    monitorar suas prticas e mesmo as condies de vida da populao (Moraes,

    1998).

    36

  • Bases Tericas e Conceituais

    Informao do latim informatio, ao de formar; do verbo informare, dar forma,

    esboar (Dantas, 1994: 36) uma maneira especfica de dar forma ao

    conhecimento.

    A palavra informao encontra-se definida em Luft (1998), da seguinte maneira:

    INFORMAO s.f.

    - de: Informao [conhecimento] de algo. Ter informao de um acontecimento, dos resultados de um concurso, de dados, de nomes, etc. Teve informao da viagem a tempo? (Aurlio)

    - (a ...) de; a: Informao [comunicado, participao] (a algum) de algo. No houve informao (ao pblico) da deciso do ministro. Faltou informao ao pblico, aos interessados.

    - de: A televiso deu, ontem, a informao oficial do caso. (Aurlio).

    - a: Servio de Informao aos Parlamentares SIP. Informao ao crucificado (obra de Carlos Heitor Cony, 1959).

    - sobre (e sinnimos): Informaes [dados, pormenores, elementos circunstanciais] sobre (ou acerca de, a propsito de, a respeito de...) algo ou algum.

    - sobre: Informaes sobre a zona cacaueira, gratuitas. (J. Amado, BTS, 340). Queria que o senhor me desse informaes sobre um inventrio. (Sabino, MV, 106). Literatura de informao sobre o mundo novo. (Amora, HLB, 18). Passei uma semana nesse jogo, colhendo informaes sobre a vida, a sade e a fortuna do velho Mendona. (Graciliano, SB, 77). Informao sobre esmeralda e prata. (Cassiano, PC, 142)

    - a propsito de: Uma informao a propsito disto ou daquilo. (Paulo Freire, C. 32)

    - a cerca de: Dar, receber informao acerca de algum ou de alguma coisa. (Domingos Vieira)

    - para: Informao [instruo, orientao] para (fazer) algo. Neste papel encontrar voc as informaes para a execuo do trabalho. (Aurlio)

    37

  • A teoria da informao tem seu marco inicial na publicao, em 1948, nos Estados

    Unidos, da Teoria Matemtica da Comunicao, de Shannon e Weaver. Esta

    teoria traz uma definio probabilstico-estatstica do conceito de quantidade da

    informao, levando o meio cientfico e tcnico a restringir a palavra informao

    sua dimenso sinttica.

    En efecto, si la sintaxis se abstrae de todo contenido semntico y centra su atencin slo en cmo se forman y transforman los signos, y se de manera semejante la Teoria Matemtica de la Informacin toma en cuenta nicamente las seales independientemente de todo significado, entonces es vlido interpretar dicha teora como una teora a nivel sintctico. (Rojas, 1996: 20)

    O sentido da palavra, excluindo, agora, o contedo semntico13 das afirmaes,

    passa a se referir a uma medida de trocas comunicativas, expressa

    exclusivamente de forma quantitativa. Esta separao permitiu que se fizesse livre

    uso da palavra, cada vez mais amplo e impreciso, levando a um nivelamento do

    contedo e do valor do que informado (Rozak (1988), apud Moraes, 1994: 33).

    Ela contribuiu, tambm, para que o aparato fsico ganhasse preponderncia sobre

    o contedo enredando-se com as condies que levaram ao desenvolvimento do

    complexo econmico que, por sua vez, ajudou a configurar a sociedade da

    informao. Neste processo, a informao, significando tudo e nada, revestida de

    neutralidade, pois se escuda em fatos incontestveis, segue escamoteando uma

    agenda poltica tecnocrtica que no deseja expor muito seus objetivos (Moraes,

    1994: 34).

    Mas, as informaes que indicam as desigualdades sociais, as mortes prematuras advindas da misria, dos riscos de trabalho, dos longos trajetos de casa para a fbrica, etc., no so transformadas em necessidades sociais em uma sociedade como a brasileira, em que a conquista de um conjunto de acciones sociales dirigidas a promover la transformacin de la calidad de vida de todos los sectores de la poblacin (OPS, 1987) ainda no saiu das pginas discursivas. (Moraes, 1994: 34)

    13 Semntica 1. (Ling.) Cincia das significaes dos elementos lingsticos. 2. Estudo da significao das palavras atravs do tempo e do espao. (Dicionrio Eletrnico Luft, 1998)

    38

  • Ademais, no obstante todo o desenvolvimento da sociedade da informao, que

    tambm a sociedade do conhecimento, e toda a exploso informacional, aquilo

    que os profissionais devem dizer uns aos outros no reflete esta realidade de

    progresso. Antes, pelo contrrio, a prtica mostra a indigncia em que se debatem

    as instituies de ensino, educao e sade nas suas necessidades

    informacionais. At mesmo grandes corporaes e organizaes estatais que

    investiram pesadamente em estruturas informacionais no lograram o xito

    projetado.

    Estudos mostram que a exploso da informao, embora vincule-se idia de que

    qualquer informao acessvel a qualquer pessoa, se traduz, principalmente, por

    acmulo de dados e papis que mais confundem do que esclarecem, desprovidos

    que so de valor de uso14, requerendo grandes esforos, perda de tempo e de

    trabalho criativo na garimpagem da informao til, da informao relevante.

    Moraes (1994: 35) lista algumas concluses destes estudos, a partir de Weis

    (1986), como, por exemplo, as de Lebedev (1975): 70 a 80% das publicaes no

    possuem aplicao prtica importante; e de Weis (1986): 50% dos dados

    especializados publicados nunca foram utilizados.

    Porm, a despeito destas dificuldades, os cientistas, desde logo, trataram de

    estudar outros aspectos da informao, ampliando a compreenso de sua

    complexidade. Com efeito, se o conceito ciberntico da informao elide em

    grande medida o qu h de substancial nas comunicaes, priorizando sua face

    quantitativa, introduz o conceito de quantidade de informao segundo o qual a

    magnitude desta inversamente proporcional ao grau de probabilidade do

    acontecimento comunicado. Isto , quanto mais provvel o acontecimento, tanto

    menos informao traz a comunicao sobre ele e vice-versa. Este conceito,

    portanto, trata a questo com base em outro conceito, o de probabilidade,

    aplicvel a situaes que carregam qualquer grau de indeterminao ou incerteza.

    Desta forma, se existe indefinio sobre um objeto qualquer e, em se obtendo

    14 Valor de uso (...) uma equao metafrica composta dos seguintes fatores: portiflio de produtos e servios, qualidade, custo e tempo de resposta. (Moresi, 2000: 14)

    39

  • novos dados sobre ele, logra-se uma maior compreenso deste objeto, pode-se

    dizer que a mensagem continha informao acerca do objeto. De modo contrrio,

    se um objeto conhecido com exatido, uma mensagem sobre ele no conter

    informao. Este raciocnio permite concluir que a quantidade de informao que

    uma mensagem contm sobre um objeto no corresponde ao estado do objeto

    mesmo, seno ao estado de nosso conhecimento acerca desse objeto e o estado

    de conhecimento constitui um reflexo da realidade em nossa conscincia. O

    estado de desconhecimento , portanto, do sujeito e no do objeto (Sardias,

    1999).

    A questo do conhecimento e da incerteza, portanto, so cruciais para a

    informao. Esta se encontra entre os conceitos e teorias como o princpio da

    incerteza, o conceito de entropia, a categoria da causalidade, a teoria da

    probabilidade, a informao de Shannon e a quntica - que se sustentam em

    fenmenos com incerteza, pois carecem de um estrito sentido fsico ao tempo em

    que adquirem um carter ontolgico, pois seu contedo depende mais da forma

    peculiar dos sujeitos perceberem o mundo do que do mundo em si (Sardias,

    1999: 33). E a forma como os sujeitos percebem o mundo e comunicam suas

    impresses, dando informao carter de fenmeno social, que interessa a este

    trabalho, deixando aos fsicos, como prope Sardias (1999):

    (...) la tarea de definir la naturaleza fsica independiente a su estado de conocimiento- de aquello que ellos cuantificaram y que optaron por llamar informacin. (Sardias, 1999, 33)

    Embora implique numa reduo do conceito, como reconhece Sardias, a

    definio de informao como informao social parece apropriada ao campo da

    comunicao humana, no caso, comunicao de conhecimentos. A informao foi

    chamada de social para que se estabelecesse a diferenciao com a informao

    biolgica que trata, dentre outros, dos processos psquicos da informao

    sensorial15. Esta, no ser humano, elaborada num processo ativo chamado de

    15 Informao sensorial - Reflexo direto das propriedades isoladas dos objetos e fenmenos do mundo material, assim como do estado interno do organismo, por meio da ao direta dos estmulos materiais nos receptores correspondentes. (Petrovski: 207, apud Sardias, 1999: 34)

    40

  • percepo16 que termina por gerar conhecimento concreto, sensvel, o qual, por

    sua vez, pode passar por um outro processo de abstrao, chamado

    representao:

    ...a imagem visualizvel-sensorial sintetizada dos objetos e fenmenos da realidade que se conserva e se reproduz na conscincia sem que os objetos e fenmenos mesmos influam diretamente sobre os rgos dos sentidos. (Petrovski: 372, apud Sardias, 1999: 34)

    Este conhecimento, ao ser codificado pela linguagem, d origem informao

    social...

    ...que s el suporte-cdigo de los conocimientos, que posibilitan la accin transformadora consciente del hombre, tanto de su entorno natural, como social, al orientar la conducta individual humana. (Sardias, 1999: 34)

    Aqui, introduz-se a noo de conscincia e a participao da linguagem na

    constituio do conhecimento e da representao no ser humano. Conscincia

    como forma superior de reflexo da realidade que se entrelaa indissociavelmente

    com a linguagem e de onde se produzem diferentes formas de pensamento como

    os conceitos, juzos e raciocnios, como resultado do processo de abstrao do

    pensamento. Em escala social, estas formas de pensamento constituem diferentes

    formas de conscincia social denominadas cincia, religio, arte, ideologia e

    outras que so o contedo da comunicao social que se estabelece nos

    processos de transmisso do pensamento.

    O que torna o pensamento e a sua transmisso possveis a forma de expresso

    de que dispe - a linguagem. Esta constitui o suporte-cdigo que objetiva o

    pensamento, garantindo-lhe o armazenamento, processamento, recuperao e

    transmisso, no espao e no tempo, no apenas no indivduo e por ele, mas por

    dispositivos ou sistemas artificiais criados por ele.

    Desta forma, a linguagem constitui o suporte-cdigo do pensamento que o

    contedo da comunicao social e a informao social como forma particular e 16 Percepo - Processo no qual se realiza o ordenamento e a associao das distintas sensaes em imagens integrais de coisas e fatos. (Petrovski: 223, apud Sardias, 1999: 34)

    41

  • especfica da comunicao social, constitui o suporte-cdigo dos conhecimentos

    (Vizcaya, 1997). Suporte-cdigo que vai garantir que este conhecimento seja

    armazenado, processado, recuperado e transmitido no espao e no tempo. Sua

    gerao, convm lembrar, d-se exclusivamente na conscincia humana.

    Pode-se ento concluir que a informao social para o conhecimento o que a

    linguagem para o pensamento sua forma de expresso (Vizcaya, 1997: 109).

    Informao e desenvolvimento

    A informao teve grande importncia no processo histrico das sociedades

    ocidentais tendo contribudo para sua atual conformao social e poltica. Tem

    sido conceituada como poder, conhecimento, comunicao e produto. Alm disso,

    vem sendo crescentemente valorizada como recurso e at mesmo como insumo

    bsico para a atividade produtiva, como o foi, no passado, a propriedade da terra,

    a mo-de-obra qualificada e a energia. neste sentido que vem sendo afirmada

    como elemento fundamental para o desenvolvimento, pois a informao oportuna

    se reverte em servios de alta qualidade, maior competitividade, tomada

    adequada de decises e, conseqentemente, em desenvolvimento (Almada,

    citado por Reyes, 1997: 78).

    A isto, acrescentam-se as vantagens...

    ...de ter um efeito multiplicador superior ao de outros recursos, de no se desgastar com o uso e de permitir sua transmisso ou duplicao quase instantaneamente. (Molino, citado por Reyes, 1997: 78)

    Deste modo, a informao torna-se um poderoso insumo para que governos e

    organizaes promovam mudanas importantes na busca de desenvolvimento

    num cenrio que combina exploso de informao, desenvolvimento acelerado da

    telemtica e processo de globalizao da economia. Esta importncia atribuda

    informao, que se constata com maior nfase nos pases mais ricos, devida,

    em parte, demanda crescente que acabou impondo uma compartimentao ou

    42

  • fragmentao do conhecimento em reas estanques que impedem a

    comunicao desse conhecimento. A informao veio desempenhar um papel

    mediador, permitindo a comunicao e a troca entre os saberes. Esta

    fragmentao, estendendo-se a aspectos do cotidiano, tornou a informao

    recurso cada vez mais indispensvel para atender s necessidades da vida diria.

    Portanto, parece haver consenso de que h informaes bsicas imprescindveis

    para que as sociedades modernas operem os fatos do cotidiano. Trata-se de

    conjunto de informaes visto de modo positivo unanimemente pelos governos,

    em qualquer regime, e pelas pessoas em geral, que...

    ...est fortemente atrelado a uma noo universal hegemnica do que se convencionou chamar desenvolvimento. (David, 1996: 97)

    Este saber bsico amplamente divulgado, em toda parte, quer pelos aparelhos

    estatais e organizaes sociais, quer pelos meios de comunicao de massa.

    Constitui-se, principalmente, de...

    ...normas e padres de comportamentos diversos que se vo modificando atravs dos tempos, to mais rapidamente quanto maior e variada a oferta de informao. (David, 1996: 97)

    A idia de desenvolvimento encontra-se no bojo da viso de mundo, legada,

    sobretudo, pelo Iluminismo que exacerba o valor do saber e volta-se para sua

    organizao e comunicao, expressadas pelo enciclopedismo. A idia de

    modernidade que se seguiu ampliou a concepo de desenvolvimento agregando

    conceitos como os de revoluo, progresso, emancipao e outros (Habermas

    (1990), apud David, 1996: 97). Portanto, o processo de desenvolvimento das

    culturas ocidentais modernas no representa a progresso natural da

    humanidade, mas , antes...

    ...uma decorrncia das profundas mudanas nas formas de pensar e produzir conhecimento, impostas pelas formas de produo ditadas pelo capitalismo. (David, 1996: 98)

    Este desenvolvimento vem agregar algumas de suas caractersticas ao processo

    43

  • informacional que, imbricando-se a ele, potencializa as concepes iluministas e

    as da modernidade. Desta forma, verifica-se uma valorizao crescente do

    conhecimento cientfico em detrimento do conhecimento no-cientfico ou popular

    que perde credibilidade para tratar sobre os fenmenos da realidade.

    Vincula-se informao, tambm, a noo de pblico destacada dos ideais

    liberais. Com a ampliao e diversificao dos campos do saber e das relaes

    sociais, a informao passa a ser percebida como forma de conhecimento. A

    modernizao da imprensa veio contribuir para ampliar esta concepo. Passa a

    se conformar a noo da informao como bem pblico.

    E esta noo da informao como bem pblico, como algo que pode e deve pertencer a todos, que determina outro atributo valorativo de vital importncia nas sociedades modernas, freqentemente apontado como pressuposto bsico dos governos que se dizem democrticos: a garantia de acesso universal informao, por parte de qualquer cidado. (David, 1996: 98)

    Esta concepo , sem dvida, um ganho importante e tem estado na base das

    lutas pela democratizao do acesso informao. Porm, a informao,

    enquanto elemento central na complexa configurao social, econmica e poltica

    do mundo moderno, no se torna bem pblico, de fato, por constar do iderio

    liberal. O controle da informao uma realidade cotidiana desde tempos

    remotos; e a ampliao e sofisticao dos meios de comunicao se inserem nos

    mesmos mecanismos de controle.

    Steinberger (1998: 36) discute a questo mostrando que, no universo dos meios

    de comunicao, os modos de configurar e organizar uma viso de mundo

    sustentada como consenso e legitimada como tendo origem na opinio pblica

    se efetivam atravs de diversas estratgias nos planos poltico, social, cognitivo.

    No plano poltico, a distribuio de poder regulamentada pelo critrio de acesso

    informao selecionada como relevante; no social, as diferenas sociais e o

    conceito de classe so reconfigurados a partir de novos critrios para o

    estabelecimento de identidades que se baseiam, sobretudo, no consumo; no

    cognitivo, estabelece-se um novo sistema de representaes que parece envolver

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  • os demais. Estes planos interagem numa relao dinmica pouco afeita a

    hierarquias e esquemas de causalidade rgidos.

    Entretanto, o fato de lidar com as representaes no permite supor que o plano

    cognitivo exera controle sobre os demais. Antes, pelo contrrio, j que a gnese

    das representaes se processa dentro de uma lgica operatria que se reporta

    ao princpio de sobrevivncia da vida material, condicionando a incluso do plano

    econmico neste processo de conformao de viso de mundo.

    A mediao social das representaes, de carter nitidamente controlador - papel

    que coube prioritariamente ao Estado -, , hoje, atribuda aos meios de

    comunicao. O poder dos meios de comunicao no se sustenta claramente em

    um centro poltico para onde reconverge sua fora, mas, ao contrrio, legitima-se

    pela aparncia de...

    ...livre circulao e disseminao, identificado apenas por uma vaga submisso aos preceitos do liberalismo econmico. (Steinberger, 1998: 37)

    Steinberger (1988) mostra a importncia de se pensar sobre o conceito de

    subdesenvolvimento no mbito informacional, especialmente nos pases sempre

    em desenvolvimento ou emergentes, porque, de fato, ele se define atravs de

    funes presentes nos processos de configurar, organizar e distribuir a

    informa