94
5/28/2018 FundamentosdaTeologiadaSalvao-EdsonLopes-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/fundamentos-da-teologia-da-salvacao-edson-lopes E dson  L opes

Fundamentos da Teologia da Salvação- Edson Lopes

Embed Size (px)

Citation preview

  • E d s o n L o p e s

  • calvinistafiel

  • Copyright 2009 por Edson Pereira Lopes Publicado originalmente por Editora Mundo Cristo

    Editora responsvel: Silvia Justino Superviso editorial: Ester Tarrone Preparao: Ceclia Eller Reviso: Josemar de Souza Pinto Coordenao de produo: Lilian Melo Colaborao: Pamela Moura

    Os textos das referncias bblicas foram extrados da Nova Verso Internacional (NVI), da Sociedade Bblica Internacional, salvo indicao especfica.Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610, de 19/02/1998. expressamente proibida a reproduo total ou parcial deste livro, por quaisquer meios (eletrnicos, mecnicos, fotogrficos, gravao e outros), sem prvia autorizao, por escrito, da editora.

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Lopes, Edson Pereira

    Fundamentos da teologia da salvao: pode um cristo regenerado perder a salvao? / Edson Pereira Lopes So Paulo: Mundo Cristo, 2009. (Coleo teologia brasileira)

    ISBN 978-85-7325-592-8

    1. Salvao 2. Salvao Ensino bblico 3. Teologia I. Ttulo II. Srie.

    09-05571 CDD 234

    ndice para catlogo sistemtico:1. Salvao: Teologia dogmtica crist 234 Categoria: Teologia

    Publicado no Brasil com todos os direitos reservados por:Editora Mundo CristoRua Antnio Carlos Tacconi, 79, So Paulo, SP, Brasil, CEP 04810-020Telefone: (11) 2127-4147Home page: www.mundocristao.com.br

    1a edio: novembro de 2009 Ia reimpresso: 2011

  • S u m r i o

    Agradecimentos 7Pensando na doutrina 9Prefcio 11Introduo 13

    Captulo 1Correntes histricas da doutrina da salvao 15

    Captulo 2Fundamentos bblicos da crena de que o cristo regenerado no perde a salvao 47

    Captulo 3Consideraes finais e prticas da doutrina da salvao 79

    Bibliografia consultada 89Bibliografia de consulta sugerida 93Sobre o autor 95

  • A g r a d e c i m e n t o s

    MINHA AMADA ESPOSA NVEA COSTA DA SlLVA LOPES, grande incentivadora dos meus estudos e grande bno em meu ministrio pastoral e educacional.

    Aos meus filhos Tales Edson Costa Lopes e Taila Nvea Costa Lopes, bnos de Deus.

    Aos meus pais Luiz e Glria, meus primeiros educadores. Universidade Presbiteriana Mackenzie, por ter me proporcio

    nado o tempo necessrio para esta reflexo.Aos professores e alunos da Escola Superior de Teologia da Uni

    versidade Presbiteriana Mackenzie, razo de ser deste estudo.Ao rev. Marcos Nicolli Napoli, meu pastor do corao.Aos professores: revs. Sebastio Arruda, Hermisten Maia Perei

    ra da Costa e Joo Alves dos Santos, do Seminrio Presbiteriano, e rev. Jos Manoel da Conceio, que sempre me serviram de referncia na excelncia do ensino e da pesquisa.

    Ao tutor rev. Nei Arajo Bacellar (in memoriam).A Igreja Presbiteriana da Vila Esperana, que tenho o privilgio

    de pastorear.Aos presbteros Orlando Perciliano e Jos Mariano, que me fo

    ram muito teis no pastoreio da Igreja Presbiteriana de Parada XV de Novembro.

    Ao recm-organizado Presbitrio Leste de So Paulo.A Editora Mundo Cristo.A todos, meus sinceros agradecimentos.

  • P e n s a n d o n a d o u t r i n a

    LUTEROO decreto divino da predestinao imutvel e seguro; e sua execuo igualmente inaltervel, e h de levar-se a cabo com absoluta certeza. Se dependesse de ns mesmos, que somos to dbeis, mui poucos, ou melhor, nenhum se salvaria; Satans nos venceria a todos.

    BERKHOFE Deus quem persevera, no o homem... E porque Deus nunca aban- dona a sua obra que os crentes continuam de p at o fim.

    A. W. PINKSe a nossa escolha foi determinada desde a eternidade, perdurar por toda a eternidade.

    L. BOETTNERQuanto mais meditamos sobre estas verdades, mais sentimos que nossa perseverana na santidade e nossa segurana da salvao no depen- dem de nossa dbil natureza, mas do contnuo poder sustentador de Deus.

    D. JAMES KENNEDYA ddiva divina da vida eterna, sua graa e sua chamada para a salvao nunca so revertidas por Deus.

  • 10 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    D. DWIGHT PENTECOSTA obra do Pai, Filho e Esprito Santo a base da segurana do crente.

    JESUS CRISTOEu lhes dou a vida eterna, e elas jamais perecero; ningum as poder arrancar da minha mo.

  • O tema DESTE livro bastante atual e relevante. A salvao eterna de nossa alma, bem como a certeza dessa salvao so assuntos que cotidianamente percorrem os plpitos das igrejas evanglicas tradicionais e histricas, as salas das escolas dominicais e as discusses em grupo. Basta que se coloque o assunto em frum de discusso na Internet e logo surgem dezenas de opinies, favorveis e contrrias, muitas em tom acalorado, revelando o grau de envolvimento dos comentaristas.

    Os que so contra a ideia de que uma vez salvo, salvo para sempre no raro receiam que tal crena conduza, inevitavelmente, o cristo que assim se considera a negligenciar a graa, as atividades crists, a prtica espiritual. Argumentam que a expectativa diria de perder a salvao por desobedecer a Deus manter o cristo vigilante e ativo no servio divino. Em contrapartida, os que se contrapem ideia de que o verdadeiro cristo possa perder a salvao argumentam que viver na expectativa de perd-la rouba-lhe toda alegria, gozo e paz provenientes dessa certeza. E, naturalmente, as interpretaes que ambos os grupos faro dos textos bblicos refletiro tais receios e experincias pessoais.

    preciso, portanto, uma anlise mais isenta e focada nos textos bblicos, como a presente obra que o leitor tem em mos.

    Apesar de tratar-se de assunto bastante antigo como o prprio livro demonstra em seu primeiro captulo , ele sempre despertou o interesse de cristos de todas as pocas. E, portanto, sempre

  • 12 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    h espao para discuti-lo de novo, analis-lo luz de cada nova gerao, sem perder de vista o conhecimento adquirido pelas geraes anteriores. isso que o dr. Edson Lopes faz neste livro, de maneira didtica e clara, numa linguagem profunda mas de fcil leitura. Fundamentos da teologia da salvao uma contribuio para nossa gerao.

    Acredito que a relevncia do livro jaz no fato de que ele foi escrito numa poca em que as grandes doutrinas do cristianismo tm sido relegadas a plano secundrio. Isso se deve predominncia da teologia da prosperidade e do neopentecostalismo, cuja nfase equivocada nas necessidades materiais, fsicas e imediatas assola o brasileiro. Pouco ou nada se ouve falar nesses arraiais, onde prevalece a busca das bnos materiais, das grandes doutrinas da graa, da salvao completa e plena obtida por Cristo para o pecador perdido, e muito menos da obra do Esprito Santo na aplicao dessa salvao ao pecador o Esprito nesses crculos sinnimo apenas de curas, sinais, prodgios e dons extraordinrios.

    O presente livro, com a penetrao que a Editora Mundo Cristo tem no mercado brasileiro das mais diversas orientaes teolgicas, poder servir para instruir e orientar os que se encontram confusos quanto ao tema.

    So Paulo, setembro de 2009.

    Augustus Nicodemus Lopes Chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie

  • O grupo de pesquisa Religiosidade e Sade,1 composto por um psiquiatra, um educador, um psiclogo e uma estudante de psicologia, tem focado a discusso em se a religio influencia beneficamente a sade do cristo. O grupo surgiu da inquietao de um de seus membros, ao descobrir que isso nem sempre ocorre. Foram levantados vrios casos de fiis que sofrem com o estresse e, em fase mais avanada, com a depresso.

    Na prtica pastoral, encontram-se muitos cristos fiis ao Senhor que, por causa do estresse e da depresso, chegam a pensar se de fato so cristos verdadeiros. O cristo vive numa sociedade cujos valores familiares praticamente j no existem, e isso tem se refletido de modo negativo tambm em seu lar. No so raros os casos de verdadeiros cristos que enfrentam srias dificuldades nessa rea, sem mencionar questes conjugais, que geram angstia e sofrimento.

    No tocante ao trabalho, se algum se concentrar nas crises econmicas, polticas e sociais, certamente encontrar mais um motivo para angstias e sofrimentos. A relao de trabalho se reveste cada vez mais de intensos choques entre cultura, motivaes e novas tecnologias que, se por um lado facilitam a vida, por outro mostram que o ser humano perfeitamente descartvel em alguns

  • 14 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    setores.2 Isso sem mencionar as competies desleais que o cristo tem de enfrentar em muitas situaes.

    Nessa mesma perspectiva, se refletirmos criticamente na filosofia proposta para o sculo XXI, ficar claro que vivemos em um sculo em que a insensibilidade assola a sociedade, e o cristo no est imune a isso. Vemos poucos gestos de amor genuno, poucos lderes cristos compromissados com o evangelho de Cristo, pouco envolvimento de cristos no trabalho do Senhor e o enfraquecimento do cristianismo verdadeiro, apesar do fortalecimento das instituies religiosas.

    Imerso nessa sociedade, o cristo acaba absorvendo tais princpios, que resultam em angstia emocional, expressa nas mais diversas formas do sofrimento humano. Dentre as incertezas e dvidas que o assolam, destaca-se uma das temticas mais importantes para a vida crist: a salvao.

    No efetivo ministrio pastoral no cotidiano da igreja, encontramos indagaes como:

    Uma vez regenerado, o cristo pode perder a regenerao? O cristo regenerado pode perder a salvao?

    Diferentes respostas tm surgido no decorrer da histria crist. Este livro tem como objetivo mostrar que o cristo regenerado em Cristo, ainda que sofra as angstias e presses do presente sculo, pode estar certo de que nada do que ele faa ou sofra poder separ-lo do amor incondicional de Deus.

    2E. Fromm, A revoluo da esperana, p. 48-49.

  • C a p t u l o 1

    Correntes histricas da doutrina da salvao

    Ao estudar A histria DA Igreja crist no que concerne dvida quanto perda ou no da salvao, no podemos deixar de mencionar as principais correntes histrico-doutrinrias.

    A doutrina da salvao noPELAGIANISMO E NO SEMIPELAGIANISMO

    O pelagianismo assim denominado em referncia a Morgan Pel- gio (354-430), monge britnico, asceta e apoiador dos ideais monsticos.1 Pelgio chegou Itlia no final do sculo IV e, durante sua estada na capital romana, j no sculo V, estudou os escritos de Agostinho, especialmente a obra Do livre-arbtrio, e se ops doutrina do pecado original.2

    Pelgio, ento, associou a lassido moral dos bispos romanos doutrina do pecado original ensinada por Agostinho. Assim, tor- nou-se opositor a este ensino e comeou a defender a partir da a inexistncia do pecado original e a ensinar que o homem era capaz de conquistar um lugar no cu sem a interveno da graa de Deus.

    Pelgio discordou da seguinte afirmao agostiniana: D o que Tu ordenas e ordena o que Tu queres,3 pois compreendeu

    'R. C. Sproul, Sola gratia: a controvrsia sobre o livre-arbtrio na histria, p. 29.ZB. L. Shelley, Pelgio, pelagianismo, em: Enciclopdia histrico-teolgica da Igreja crist, p. 127.3Confisses, p. 221-222.

  • 16 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    que a criatura no necessita pedir permisso para fazer o que lhe foi ordenado. Em sua concepo, se Deus ordena que as pessoas creiam em Cristo, ento elas devem ter o poder de crer em Cristo sem ajuda da graa especial interior de Deus, da suas palavras: Se Deus ordena que os pecadores se arrependam, eles devem ter a habilidade de se inclinarem para obedecerem ao comando. A obedincia no precisa, de forma alguma, ser concedida.4

    A base fundamental dos princpios teolgicos pelagianos consis- te em que Deus, ao criar o homem, no o sujeitou, como as demais criaturas, lei da natureza, mas lhe deu o privilgio de cumprir a vontade divina por sua prpria escolha. Pelgio observa trs aspectos nas aes humanas: posse (poder), velle (querer) e esse (realizao), que se distribuem da seguinte forma: o poder vem exclusivamente de Deus, enquanto os outros dois pertencem ao homem.

    Pelgio defende a impossibilidade de o homem ter qualquer tendncia para o mal resultante da queda, conforme Gnesis 3. Em vez disso, acredita que o louvor ou a censura depende da ao humana.

    A interpretao de Pelgio da palavra graa est vinculada a sua crena de que, com a queda, a razo de Ado foi obscurecida, impedindo-o de compreender a revelao de Deus. Com isso, surgiu a necessidade de criar mecanismos como a lei de Moiss, o ensino e o exemplo de Cristo que consistem em graas externas fornecidas por Deus para que o homem reconhea o Criador. Vemos que, no ensino de Pelgio, a graa no uma ao interior, motivada pelo Esprito Santo, que conduz a vontade humana ao que bom, mas consiste unicamente em dons exteriores e faculdades naturais, tais como a natureza racional e o livre-arbtrio do homem, a revelao da lei de Deus nas Escrituras e o exemplo de Cristo.5

    Com a mesma perspectiva, Sproul assim entende o pensamento de Pelgio: [...] O livre-arbtrio, adequadamente exercido, pro

    4Sproul, Solagratia, p. 30.5A. Hoekema, Criados imagem de Deus, p. 174.

  • duz virtude, que o bem supremo e devidamente seguido pela recompensa. Por meio do seu prprio esforo, o homem pode alcan- ar tudo o que se requer dele na moralidade e na religio.6

    Hanarck7 observa que um dos principais fundamentos do pen- samento de Pelgio consiste no princpio de que a bondade e a justia so atributos que devem ser mais ressaltados em Deus, visto que para ele seria inconcebvel um Deus que carecesse da perfeio de tais atributos. Deus perfeitamente bom e criou o homem em igual condio, possuidor de livre-arbtrio, elemento que permitiu que Ado pecasse por sua prpria vontade. Ele no foi coagido por Deus ou por qualquer criatura a cometer o primeiro ato de pecado, e este no resultou na corrupo da sua natureza, nem causou a morte natural, uma vez que Pelgio acredita que Ado fora criado mortal.

    Podemos resumir8 os pressupostos teolgicos de Pelgio da seguinte maneira:

    1. Ado foi dotado de razo e livre-arbtrio. Com a razo, ele deveria ter domnio sobre todas as criaturas irracionais; com o livre-arbtrio, servir a Deus. A liberdade o bem supremo, a honra e a glria do homem, o bem natural que no pode ser perdido. a base nica da relao tica do homem com Deus. A liberdade consiste essencialmente no livre-arbtrio, ou seja, na possibilidade absoluta de escolher e praticar o bem ou o mal a cada momento. Pelgio firmou sua viso da natureza humana e do livre-arbtrio em sua doutrina da criao. Isso significa que ele acreditava que a natureza humana no apenas fora criada boa, mas incontestavelmente boa, ou seja, embora o comportamento da pessoa possa ser alterado ao cometer algum ato pecaminoso, o mesmo no ocorre com sua natureza ou substncia.

    "Sproul, Solagracia, p. 31.7History of the Dogma, p. 169-175.8Sproul, Sola gratia, p. 236.

    CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 17

  • 18 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    2. O pecado original no existe. A compreenso pelagiana do pecado parte do princpio de que a natureza do homem foi criada incontestavelmente boa. O homem, portanto, pode ser perfeito, e alguns tm sido, o que resulta na interpretao de que o pecado consiste num ato, e no em algo arraigado natureza humana, j que o homem capaz de voltar a agir corretamente, como antes de cometer o erro. As pessoas, portanto, nascem sem pecado. Cometem erros porque esto cercadas de maus exemplos. Por conseguinte e estritamente falando, segundo o ponto de vista pelagiano, no h pecadores, mas to somente atos pecaminosos isolados, frutos de maus exemplos.9

    3. Transmisso do pecado raa humana. Pelgio considerava que seria injustia de Deus transmitir ou imputar o pecado de um homem a outros, no vendo, portanto, conexo entre o pecado de Ado e seus descendentes. Acreditava que todos os homens so criados por Deus na mesma posio que Ado desfrutava antes da queda, o que eqivale a dizer que a criana concebida sem nenhum pecado. Para ele, s existem duas diferenas entre Ado e sua descendncia. Uma delas que ele foi criado adulto, e sua descendncia, infante. Assim, desde o incio, Ado teve uso total da razo, enquanto sua descendncia teve de desenvolv-la. A segunda diferena que Ado foi colocado no Paraso, onde no prevalecia o costume do mal, poupando-o dos maus exemplos, ao passo que sua descendncia nasce em uma sociedade e em um ambiente em que o costume do mal e, portanto, dos maus exemplos, prevalece.10

    4. O papel da graa de Deus. O pelagianismo defende que o homem nasce em condio neutra e sem pecado; o que o cor

    9L. Berkhof, Teologia sistemtica, p. 236.I0Sproul, Sola gratia, p. 35.

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 19

    rompe o mau exemplo e sua imitao, que resulta do hbi- to de pecar, o qual, por sua vez, obscurece o pensamento do ser humano, conduzindo-o aos maus hbitos. J a graa de Deus age como facilitadora, e no como elemento essencial, para que o homem encontre e pratique a justia e a bondade. Com esse pressuposto que Pelgio ensina a importncia da graa de Deus manifestada de diversas formas, seja por sua lei, seja pelo exemplo de Cristo, pela educao e iluminao. Tal graa nada produz, portanto, no interior do homem, mas define a bondade, apontando ao homem o caminho da justia.11

    Referindo-se a uma carta de Pelgio a Demtrio, Agostinho12 afirmou que o argumento total daquelas linhas demonstra que, para Pelgio, a assistncia de Deus, ou a graa de Deus, resume- se apenas instruo.

    Assim, como o pelagianismo defende o pressuposto de que a natureza do homem no foi corrompida pelo pecado que se trata apenas de uma questo de aes pecaminosas escolhidas pelo prprio homem e que ele capaz de fazer o bem mesmo sem a interveno divina, desde que seja despertado com os meios adequados , a salvao no resulta da graa divina como obra de Deus no homem, mas da vontade e capacidade deste em desej-la. Segundo Pelgio, portanto, a salvao depende apenas do homem.

    Em suma, as concepes teolgicas de Pelgio se fundamentam em discusses sobre o livre-arbtrio e o pecado original. Ele afirmava que a transgresso de Ado s fez mal a ele mesmo, e no a sua posteridade. O homem nasce na mesma condio em que Ado foi

    11A influncia desse pressuposto teolgico pode ser visto em Joo Ams Comenius (1592-1670), sistematizador da cincia da educao. Foi citado por Lopes em O conceito de teologia na Didtica magna de Comenius, p. 152, como pelagiano ou no mximo semipelagiano. Comenius considerou a educao um meio externo de Deus para curar a corrupo do gnero humano: a educao o remdio divino para a corrupo do gnero humano. Didtica magna, p. 11.12Agostinho, A graa, vol. 2, p. 7-8.

  • 20 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    criado, ou seja, sem pecado original. O resultado de tal ponto de vista que a vontade do homem livre, pois ele possui todo o poder de querer e fazer o bem, independentemente da graa salvfica interior e especial de Deus.

    Essa doutrina encontrou forte oposio na Igreja antiga e, de modo especial, em Agostinho, que se entregou por completo a combat-la. Foi tambm condenada pelo Snodo de Cartago (407 e 416 d.C.); pelo Concilio de Milevo, na Mumdia, em 416; pelos papas Inocncio e Zsimo; e pelo Concilio de feso (431). No obstante sua condenao, muitos cristos daqueles dias se mantiveram envolvidos com as ideias de Pelgio, o que resultou num cisma entre eles.

    De um lado, alguns perceberam que Pelgio pregava uma espcie de antropocentrismo incipiente, ao submeter a graa divina ao livre-arbtrio e boa escolha dos homens. Por outro lado, muitos no queriam aceitar a doutrina da eleio divina, ensinada por Agostinho. Assim, especialmente aps a morte do bispo, em 430d.C., originou-se na igreja uma doutrina intermediria denominada ' semipelagianismo, que admitia o pecado original e sua influncia sobre a natureza e a vontade do homem. Ensinava, contudo, que, se a boa natureza do homem fosse despertada e ajudada pela graa de Deus, seria possvel ao homem cooperar com Deus para vencer o pecado. Isso eqivale a dizer que, ao ser ajudado pelo homem, no Deus quem tem a palavra final na salvao do homem, mas o prprio homem.

    O semipelagianismo difere do pelagianismo por aceitar a doutrina do pecado original e se mostrar disposto a aceitar a predestinao divina, desde que fundamentada na prescincia de Deus, isto , ele prev de antemo quem vai aceitar sua graa e crer em Jesus.

    Com isso, as doutrinas pelagiana e semipelagiana respondem afirmativamente pergunta: Pode um cristo regenerado perder a salvao?. Nessas concepes doutrinrias, possvel ao cristo regenerado perder a salvao, haja vista que ela depende da fi

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 21

    delidade do homem que, quando muito, pode ter o auxlio da igreja , e no necessariamente da fidelidade de Deus.

    A DOUTRINA DA SALVAO NO AGOSTIN1ANISMOAgostinho, ou Aurelius Augustinus, nasceu em 13 de novembro de 354, na cidade de Tagaste, provncia romana da Numdia, hoje Souk-Ahras, Arglia. Foi o primeiro filho de Patrcio, conselheiro municipal e membro da classe mdia. Agostinho viveu em sua cidade natal at precisar se mudar para Madura e posteriormente para Cartago, a fim de continuar os estudos. Ali estudou as sete artes liberais gramtica, retrica, dialtica, geometria, msica, matemtica e astronomia e passou a viver com Melnea, com quem teve Adeodato.

    O prprio Agostinho13 narra sua converso, a qual se deu depois que ele encontrou uma criana que cantava repetidamente: toma e l. Aps esse evento, abriu a Bblia em Romanos 13:13-14, texto que marcou definitivamente sua converso. Em 25 de abril de 387, Agostinho foi batizado por Ambrsio e, logo depois, retornou a Tagaste. Pouco depois, mudou-se para Hipona a fim de fundar um mosteiro, onde viveu. Em 396, sucedeu o bispo Valrio, em Hipona. A partir de ento, Agostinho enfrentou vrias vicissitudes no ministrio pastoral.

    Ele escreveu as seguinte obras: Contra os acadmicos, Solilquios, A vida feliz e. a ordem (386); A imortalidade da alma e A gramtica (387); A grandeza da alma (387-388); O livre'arbtrio (388-395); O mestre (389); A msica (389-391); A moral da Igreja Catlica e a moral dos maniques (388); As duas almas (391); Controvrsia contra Fortunato, O maniqueu (392); Sobre o Gnesis, Contra os maniqueus (386-391); A verdadeira religio (389); Questes diversas (389-396); A utilidade do crer (391); A f e o smbolo (393); Algumas cartas e sermes; Contra a epstola de Manique (397); Contra Fausto, o maniqueu

    13Agostinho, Confisses, p. 214-

  • 22 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    (398); A natureza do bem (399); O batismo (400); Contra a epstola de Petiliano (401); A unidade da Igreja (405); A doutrina crist (397); Confisses (398-399); Comentrio literal ao Gnesis (400-415); A Trindade (400-416); Os bens do matrimnio; A santa virgindade (401); Cartas, sermes e comentrios aos Salmos; Os mritos e a remisso dos pecados (411-412); O Esprito e a letra (412); A natureza e a graa (415); A correo dos donatistas (417); A graa de Cristo e o pecado original (418); A alma e sua origem (419); As npcias e a concupiscncia ( 419-420); O Enquirdio (421); dois volumes intitulados Contra Juliano (421 e 429-430); A graa e o livre-arbtrio e A correo e a graa (426); A predestinao dos santos e O dom da perseverana (428-429); A cidade de Deus (413-426); O Ciddado devido aos mortos (421) e as Retrataes (426-427).14

    Essas obras produzidas pelo bispo de Hipona foram intensas e profundas. Contudo, no se pode esquecer que seus escritos surgiram como resultado do seu exerccio pastoral prtico, cuja caracterstica mais evidente foi a defesa da f crist. Ao estud-las, notrio perceber que ele concedeu honra e glria a Deus, ao confessar que o fundamento da salvao estava somente nele e em sua soberana eleio por meio de Cristo.

    Para ele, o homem cado no tinha condies de se gloriar, porque Ado e todos os seus descendentes se corromperam aps a queda, de maneira que no homem no reside bem algum.15 Por causa das transgresses e erros, o homem , por natureza, escravo do pecado e filho da morte. E, sozinho, no pode mudar coisa alguma, a menos que seja regenerado ou nasa pelo Esprito Santo.16

    Agostinho foi quem primeiro ensinou a doutrina da perseverana dos santos, cuja base era a doutrina da predestinao. Segundo seu ponto de vista, os eleitos jamais poderiam se perder de modo

    14F. Ferreira, Agostinho de A a Z, p. 22-25.15Agostinho, A graa, p. 300.l6Idem, p. 114-

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 23

    definitivo. No obstante, o telogo reformado Berkhof17 argumenta que Agostinho achava possvel que alguns, mesmo depois de revestidos da nova vida e f verdadeira, poderiam cair completamente do estado de graa e, por fim, sofrer a condenao eterna. O problema dessa afirmao que Berkhof no fundamenta suas palavras em nenhuma obra de Agostinho. O que pode ser lido em seus escritos que ele jamais ensinou outra doutrina que no fosse a graa de Deus na vida do cristo como razo de sua perseverana.18

    Fica claro que Santo Agostinho declara que o homem eleito jamais pode perder a salvao. A resposta pergunta: Pode um cristo regenerado perder a salvao? explicitada em suas prprias palavras: Aqueles eleitos [...] foram predestinados [...] se eles se perdem, sinal de que Deus se engana; mas nenhum deles se perde, porque Deus no se engana.19

    O pensamento de Agostinho influenciou grande parte da Igreja e foi revisitado pelos movimentos reformados dos sculos XVI e XVII, os quais tambm responderam pergunta: Pode um cristo regenerado perder a salvao?. Passaremos a abordar esses pontos de vista.

    A DOUTRINA DA SALVAO NA REFORMA DO SCULO XVI E NOS MOVIMENTOS PROTESTANTES DO SCULO XVII

    O primeiro reformador a se posicionar acerca da possibilidade de perda da salvao foi Martinho Lutero, monge da ordem agostinia- na. Ele nasceu no dia 10 de novembro de 1483, em Eisleben. Seu pai era de origem camponesa, mas ganhou a vida administrando minas de cobre. Apesar de seus negcios no irem to bem, conseguiu prover boa educao para o filho. Em 1501, Lutero ingressou

    17Teobgia sistemtica, p. 549.lsPara aprofundamento, se Berkhof est correto ou no em afirmar que Agostinho teria ensinado que o cristo poderia perder a salvao ou no, necessrio ler o artigo: O dom da perseverana dos santos no pensamento de Santo Agostinho. Disponvel em: . Acesso em 28 de mai. de 2009.i9Ferreira, Agostinho de A a Z , p. 168.

  • na escola de Direito da Universidade de Erfurt. Todavia, desde ento, sua vocao era a rea religiosa.

    Depois de concluir o curso de Direito, Lutero optou pela vida religiosa e entrou para a Ordem dos Agostinianos em 1505, onde conquistou prestgio como intelectual. Em 1508, j era professor da Universidade de Wittenberg, no como titular, mas como contratado para lecionar durante um semestre. Anos mais tarde, viajou para Roma, sede da igreja papal, de onde voltou decepcionado com o ambiente de corrupo e avareza no qual vivia o clero.20

    Sua preocupao central na vida era a salvao de sua alma. Dentro do mosteiro, comeou a travar lutas agonizantes. Havia entrado ali procura da salvao, mas no encontrou a paz e a segurana de que estava no caminho de Deus. Mesmo levando uma vida exemplar de piedade, sua alma ardia com o sentimento de pecado e o pensamento constante de estar provocando a ira divina. Para livrar seu pai do purgatrio, subiu de joelhos a escada da Santa S, a escadaria que se diz ter sido trazida da casa de Pilatos. Em cada degrau, repetia o Pai-nosso. Ao chegar ao topo, veio-lhe mente a seguinte pergunta: Quem sabe se tudo isto verdade?. Mas tal inquietao logo passou.21

    Em 1511, foi transferido para Wittenberg, onde se tornou professor de Bblia. Ali recebeu o ttulo de doutor em Teologia. Com o intuito de aperfeioar seus ensinamentos, comeou a estudar as lnguas originais da Bblia (hebraico e grego). Segundo Cairns,22 de 1513 a 1515, Lutero lecionou sobre Salmos e, de 1515 a 1517, sobre Romanos, Glatas e Hebreus.

    Sua alma angustiada s encontraria paz interior entre os anos 1512 e 1517, ao estudar Romanos 1:17: O justo viver pela f. Esse texto despertou sua mente para entender que a salvao acontece pela graa e que somente pela f em Cristo possvel se tornar

    20R. Olson, Histria da teologia crist, p. 380.21R. Nicfiols, Histria da Igreja crist, p. 142.22Histria do cristianismo atravs dos sculos, p. 234.

    24 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 25

    justo diante de Deus. A partir da, as doutrinas da justificao pela f e da Sola Scriptura (somente as Escrituras), a ideia segundo a qual as Escrituras so a nica autoridade na qual o pecador pode procurar a salvao, passaram a ser os pontos principais de seu sistema teolgico. Contra essa verdade, a igreja papal apregoava que a salvao ocorreria pelas obras, mediante os sacramentos.

    No ano de 1517, apareceu em Wittenberg um homem chamado Tetzel, enviado pelo arcebispo Alberto de Mogncia, para vender indulgncias emitidas pelo papa. De toda parte, muitas pessoas vieram comprar essas indulgncias, pois elas ofereciam diminuio das penas do purgatrio. Essa multido pensava que, com a compra das indulgncias, conseguiria o perdo dos pecados. Tetzel ensi- nava que o arrependimento no era necessrio para quem com- prasse uma indulgncia, pois por si mesma ela era capaz de dar perdo completo de todos os pecados.23 To logo a moeda no cofre soa, uma alma do purgatrio voa!.24

    A notcia da venda das indulgncias chegou at Lutero, que objetou a elas e, em 31 de outubro de 1517, s vsperas do Dia de Todos os Santos, quando grande multido comparecia igreja do castelo,25 em Wittenberg, Lutero afixou as 95 teses que tratavam, particularmente, de mostrar que a igreja no podia oferecer per- do pelos pecados, tampouco alterar a situao no purgatrio e que somente Deus poderia faz-lo. As teses negavam que o papa e a igreja fossem mediadores entre o homem e Deus, no sendo dig- nos de perdoar, portanto, os pecados. A partir da, estava declarada a Reforma da igreja, ainda que Lutero s fosse excomungado em agosto de 1520, pelo papa Leo X. Seu intento inicial no era a diviso da igreja, mas reform-la em alguns pontos.

    Lutero fundamenta sua crena na Bblia sob a perspectiva agos- tiniana. Assim, ao proclamar a Reforma Protestante, rompeu com a

    2,Idem.24Olson, Histria da teologia crist, p. 387.25W. Walker, Histria da Igreja crist, p. 14.

  • 26 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    igreja papal. A principal doutrina que defendia, denominada de justificao pela f, era contrria a aceitar qualquer tipo de obras como meio de salvao. Por causa das influncias agostinianas, Lutero creu na doutrina da predestinao e respondeu questo: Pode um cristo regenerado perder a salvao? da seguinte maneira: Defendo que o decreto divino da predestinao imutvel e seguro; e sua execuo igualmente inaltervel, e h de levar-se a cabo com a absoluta certeza. Se dependesse de ns mesmos, que somos to dbeis, mui poucos, ou melhor, nenhum se salvaria, Satans nos venceria a todos.

    Ou seja, o luteranismo, originariamente, defendia que o cristo regenerado no poderia perder a salvao. Entretanto, por atribuir ao homem a funo de se manter fiel ou no a Deus, acredita hoje que possvel ao homem perder a salvao.26 A Frmula de Concrdia, elaborada em 1577, que retoma alguns artigos da Confisso de Augsburgo e aceita pelos luteranos como exposio correta das Sagradas Escrituras, afirma: Deve-se refutar e rejeitar zelosamente a falsa opinio de alguns segundo a qual no se pode perder [...] a salvao.27

    Vale ressaltar a afirmao conjunta das crenas da Igreja Catlica Romana e da Igreja Luterana: [...] Confessamos juntos que as pessoas crentes podem confiar na misericrdia e nas promisses de Deus [...]. Mas toda pessoa pode estar preocupada com sua salvao quando olha para suas prprias fraquezas e insuficincias.28 Na mesma declarao, ao tratar da Incapacidade e pecado humanos face justificao, a Igreja Luterana afirma: [...] Luteranos no negam que o ser humano possa rejeitar a atuao da graa [...].29 Por causa dessas afirmaes que se pode pontuar que a Igreja

    26Berkfiof, Teologia sistemtica, p. 549.27Hodge, Esboos de teologia, p. 762.Declarao Conjunta de Luteranos e Catlicos, 2008, p. 7. Disponvel em: < www.vatican.va/roman>. Acesso em 13 de ago. de 2008.29Idem, p. 4-

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 27

    Luterana, com o passar dos anos, afastou-se das ideias de Martinho Lutero acerca da doutrina da certeza da salvao e se apegou doutrina da graa universal ou expiao universal.30

    Dentro do movimento da Reforma, outras correntes tambm pontuam sua resposta pergunta: Pode um cristo regenerado perder a salvao?. Uma delas o arminianismo.

    A doutrina arminiana surgiu com o teolgo holands Jacob Hermann, que nasceu em 1560 e ficou conhecido pelo nome lati- nizado: Arminius. Ele foi designado para responder a Coomhert*1 e defender a posio supralapfica32 contra os ministros de Delft, os infralapsarianos.33 Em seus estudos, Arminius comeou a duvidar da doutrina da eleio incondicional e passou a atribuir ao homem o livre-arbtrio, ou seja, o homem tem soberana liberdade para aceitar ou recusar Cristo, ou seja, o homem controla a graa.

    "Berkhof, Teologia sistemtica, p. 549.31Walker, Histria da Igreja crist, p. 13432A posio supralapsria definida por Hodge como a teoria das diversas provises do decreto divino nas suas relaes lgicas, que supe que o supremo fim a que Deus se props na salvao de uns e na condenao de outros foi a Sua prpria glria, e que, como meio de alcanar esse fim, decretou criar o homem e permitir que casse. Segundo o prprio Hodge, a ordem dos decretos seria ento: 1. dentre todos os homens, Deus

    primeiro decretou a salvao de uns e a condenao de outros, a fim de promover a sua prpria glria; 2. para alcanar esse fim, decretou criar os que j havia escolhido ou reprovado; 3. decretou permitir que cassem; 4- decretou preparar a salvao para os eleitos. Essa foi a teoria de Beza, sucessor de Calvino em Genebra, e de Gomaro, o grande oponente de Arminius. A. A. Hodge, Esboos de teologia, p. 313.33A posio infralapsria definida por Hodge como a teoria da predestinao, ou decreto da predestinao considerado como subsequente, no propsito divino, ao decreto que permitiu a queda do homem, representa este como objeto da eleio depois de criado e decado. Segundo ele, a ordem dos decretos a seguinte: 1. o decreto de criar o homem; 2. o de permitir que casse; 3. o de eleger certos homens dentre a raa inteira decada e com justia condenada para a vida eterna e de passar por alto os outros, deixando-os entregues s justas conseqncias dos seus pecados; 4. o decreto de preparar a salvao para os eleitos. Esta a teoria comum s igrejas reformadas, confirmada pelo Snodo de Dort e pela Assembleia de Westminster. A. A. Hodge, Esboos de teologia, p. 312.

  • 28 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    Com sua morte em 1609, seus discpulos, Joo Wtenbogaert e Simo Episcopius, sistematizaram a doutrina arminiana, chaman- do-a de Remonstrance,34 que defende cinco pontos fundamentais:

    1. O pecado e a vontade do homem. O homem nunca de tal modo corrompido pelo pecado que no possa crer salvaticia- mente no evangelho, uma vez que este lhe seja apresentado.35 Arminius acreditava que a queda do homem no foi total e sustentou que restou ao ser humano bem suficiente capaz de habilit-lo a querer aceitar Cristo como Salvador.

    2. Eleio condicional. O homem nunca de tal modo controlado por Deus que no possa rejeit-lo. Infere-se da que o ato de f por parte do homem a condio para que ele seja eleito e salvo eternamente.36

    3. Expiao universal. A eleio divina daqueles que sero salvos se alicera no fato da previso divina de que eles havero de crer, por sua prpria deliberao. Arminius sustentava a redeno universal, isto , a morte de Cristo oferece a Deus condio para que todos os homens se salvem.37

    4- A graa pode ser impedida. A morte de Cristo no garantiu a salvao para ningum, pois no garantiu o dom da f para ningum. Tal dom sequer existiria. O que ela fez foi criar a possibilidade de salvao para todo aquele que cr. Uma vez que Deus quer que todos os homens sejam salvos, ele envia seu Santo Esprito para atra-los a Cristo. Entretanto, por causa de seu livre-arbtrio, os seres humanos podem resistir graa de Deus e desejar no serem salvos.38

    34Protesto ou representao.35J. Packer, O antigo evangelho, p. 6.36Spencer, Os cinco pontos do calvinismo, p. 13.37Packer, O antigo evangelho, p. 6.38Spencer, Os cinco pontos do calvinismo, p. 14-

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 29

    5. O homem pode cair da graa. Depende inteiramente dos cren- tes manterem-se em um estado de graa, conservando sua f; aqueles que falham nesse ponto desviam-se e se perdem. Assim, depende de o homem permanecer no estado de graae, se ele no o desejar, poder se afastar de Deus. O resultado disso ser a perda da salvao.39

    Esses cinco pontos arminianos causaram conflitos no protestantismo da poca. Por isso, os Estados Gerais da Holanda convocaram um snodo nacional na cidade de Dort, que aconteceu entre 13/11/1618 e 9/5/1619, com a finalidade de prover um parecer conciliar acerca do assunto. O Snodo de Dort condenou o arminia- nismo e adotou os cnones de tom calvinista, os quais, juntamente com o Catecismo de Heidelberg e a Confisso belga tornaram-se a base doutrinai da Igreja Reformada Holandesa.

    Tendo em vista seu ensinos, em especial o ltimo ponto do Re- monstrance, Arminius, assim como seus discpulos, afirma ser possvel ao cristo perder a salvao.

    Embora condenado, o arminianismo, segundo Olson,40 floresceu em solo ingls no fim do sxulo XVI, e muitos lderes da igreja na Inglaterra o adotaram publicamente. Durante os sculos XVII e XVIII, uma era de racionalismo e de avivamento na Inglaterra e na Nova Inglaterra (hoje Estados Unidos da Amrica), os princpios arminianos foram disseminados no protestantismo norte-americano. Este, por meio de suas expedies missionrias ao Brasil, propagou o arminianismo em boa parte do protestantismo que nascia em terras brasileiras. De certa maneira, isso parece explicar, pelo menos em parte, a hegemonia da crena arminiana na maioria das igrejas protestantes ou evanglicas.

    39Idem.40Olson, Histria da teologia crist, p. 483.

  • Textos bblicos que parecem afirmar

    QUE O CRISTO REGENERADO PODE PERDER A SALVAO A grande maioria dos segmentos protestantes do Brasil do sculo XXI, por causa da forte influncia arminiana, defende que possvel a um cristo regenerado perder a salvao. Algumas dessas comunidades optaram pela postura arminiana, em detrimento da perspectiva calvinista, por causa de certas objees, fundamentadas, segundo esses grupos, em textos bblicos, os quais parecem se opor salvao ou segurana eterna do cristo regenerado.

    Hebreus 6:4-6Esse um texto muito difcil, classificado por Barclay41 como uma das passagens mais terrveis das Escrituras. Os arminianos fazem uso dele para defender sua crena de que o cristo regenerado pode perder a salvao. Ele diz o seguinte:

    Ora, para aqueles que uma vez foram iluminados, provaram o dom celestial, tornaram-se participantes do Esprito Santo, experimentaram a bondade da palavra de Deus e os poderes da era que h de vir e caram, impossvel que sejam reconduzidos ao arrependimento; pois para si mesmos esto crucificando de novo o Filho de Deus, sujeitando-o desonra pblica.

    No versculo 6, o escritor emprega a expresso impossvel, que est diretamente ligada continuao no mesmo versculo: que sejam reconduzidos ao arrependimento; pois para si mesmos esto crucificando de novo o Filho de Deus [...]. Observa-se que a dificuldade com essas afirmaes , por um lado, a queda dos iluminados e, por outro, a impossibilidade de renov-los para arrependimento. Bezerril42 entende que a primeira expresso

    41The Letter to the Hebrews, p. 55.42A queda dos iluminados de Hebreus 6:4-6, p. 1. Disponvel em: . Acesso em 22 de ago. de 2008.

    30 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 31

    parece se apresentar como um problema para os calvinistas, pois fala da queda dos que outrora foram iluminados; no entanto, a segunda sentena parece ser um problema para os arminianos, pois eles se deparam com a questo da impossibilidade de o homem por si mesmo se renovar para arrependimento.

    Agrava-se ainda mais o problema de compreenso do texto se forem consideradas as declaraes ditas, pelo escritor de Hebreus, acerca dos que caram: foram iluminados; provaram o dom celestial; tornaram-se participantes do Esprito Santo; provaram a boa palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro; mas, porque caram, impossvel que sejam reconduzidos ao arrependimento

    Num primeiro momento, a reflexo a ser feita com relao ao pecado que resultou nessa queda. Deve se tratar de um pecado grave (se que existe pecado que no seja grave), para resultar numa conseqncia to sria, mas pode-se afirmar que no se refere a qualquer tipo de pecado contra Deus.

    E fato que o termo caram,43 utilizado pelo escritor de Hebreus, pode se referir a ofensas comuns, conforme os textos bblicos de Mateus 6:14, Marcos 11:25 e Glatas 6:1. Mas tambm se refere ao estado de morte espiritual e condenao eterna, segundo os textos bblicos de Romanos 4:25, 5:15-18,20, 11:11; 2Corntios 5:19; Efsios 1:7, 2:1,5 e Colossenses 2:13. Infere-se da que aqueles homens no podiam ser novamente renovados para o arrependimento porque no cometeram uma ofensa comum a Deus, mas uma ofensa grave que resultava na condenao eterna. Essa grave ofensa pode ser percebida na frase final do versculo 6: [...] pois para si mesmos esto crucificando de novo o Filho de Deus, sujei- tando-o desonra pblica.

    Nesse contexto, vale ressaltar as palavras de Lutero44 quanto apostasia daqueles homens: Deve ser entendido que nesta passagem

    43No grego, parapesntas.44Lut/iers Works, p. 182.

  • 32 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    o apstolo est falando acerca daqueles que caram da f, eram os descrentes, os quais acreditavam que poderiam ser salvos sem Cristo, por sua prpria justia. Com a mesma perspectiva, Kistemaker45 pontua que aqueles homens caram porque no eram cristos re- generados, haja vista que negaram Jesus como Senhor e Salvador e deliberadamente se rebelaram contra Cristo.

    Para Hagner,46 quando o autor emprega o ttulo Filho de Deus, ele acentua a gravidade da ofensa. Em seu comentrio a respeito desse texto, o autor afirma que a apostasia um dos pecados mais graves, pecado para o qual no h remdio e do qual no h pos- sibilidade de retomo. Nenhum outro meio de salvao est disposio do apstata seno aquele que ele rejeitou.47

    Ainda que Hagner esteja correto em sua afirmao de que o autor de Hebreus intenciona acentuar a gravidade da ofensa ao empregar o ttulo Filho de Deus, relevante pontuar que no se trata de qualquer apostasia, mas de negar a obra da redeno realizada por Cristo e voltar ao judasmo e sua prtica sacrificial.

    Para melhor compreenso desse texto bblico, de uma perspectiva mais abrangente, preciso levar em conta o que est escrito em Mateus 12:31: Por esse motivo eu lhes digo: Todo pecado e blasfmia sero perdoados aos homens, mas a blasfmia contra o Esprito no ser perdoada. Pereira Filho,48 ao discutir a temtica em seu livro A blasfmia contra o Esprito Santo, explicita que esse pecado imperdovel porque est fundamentado no total desprezo e anulao da obra de salvao realizada por Cristo. Analisando os dois textos em conjunto, pode-se conceber que aqui se aplica a blasfmia contra o Esprito Santo,49 j que o problema principal quanto atitude daqueles homens que eles procuravam anular e buscar

    45Comentrio do Novo Testamento, p. 313-315.46Novo comentrio bblico contemporneo, p. 109.4'Idem.48p. 92-117.49Calvino, A epstola aos Hebreus, p. 151.

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 33

    um outro caminho que no fosse o sacrifcio de Jesus para expiao e justificao de seus pecados. Em outras palavras, alinham-se com os inimigos de Deus, que crucificaram Jesus e de modo figura- do cometem o mesmo pecado de novo.50 Todavia, deve-se deixar claro que tal coisa no acontece a qualquer um, exceto quele que peca contra o Esprito Santo [...],51

    pois, segundo o prprio Calvino,52 certamente Deus jamais exclui ou priva algum de sua graa, exceto aquele que se torna totalmente rprobo. Para tal pes- soa, nada deixado.

    Dessa perspectiva que sero estudadas as afirmaes que vi- ro a seguir. A primeira delas foram iluminados.53 Alguns con- sideram que essa expresso no se refere iluminao trazida pela verdadeira regenerao, mas apenas a um pequeno raio de luz do evangelho ou, como dizia Calvino,54 apenas uma degustao do dom celestial. Westcott55 e Kistemaker56 afirmam que Justino Mrtir, um dos primeiros pais da igreja, interpretou essa expresso como uma referncia ao batismo, pois, para ele, o pecado aps o batismo no receberia perdo.57 Kistemaker58 parece estar convic- to de que essas palavras esto diretamente ligadas ao batismo: Des- de o sculo II at hoje, escritores tm associado o verbo iluminados com o batismo.

    O mesmo Kistemaker59 afirma que essa interpretao se susten- ta por causa da expresso [...] uma vez; e porque no contexto mais amplo da passagem, o termo batismo de fato aparece em 6:2.

    50D. A. Hagner, Novo comentrio bblico contemporneo, p. 109.51Calvino, A epstola aos Hebreus, p. 151.52Idem.5No grego, phtisthentas.54A epstola aos Hebreus, p. 152.55The Epistle to the Hebrews, p. 148.56Comentrio do Novo Testamento, p. 225.57Barclay, The Letter to the Hebrews, p. 56.5SComentrio do Novo Testamento, p. 225.59ldem.

  • 34 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    Alm disso, segundo ele, muitas similaridades podem ser destacadas entre o batismo e a iluminao. Por exemplo, a prtica crist antiga de realizar os batismos na aurora utiliza o simbolismo da noite anterior de pecado e do sol nascente que ilumina o candidato batismal, que entra numa vida nova.60

    Tendo em mente a perspectiva de Kistemaker, necessrio atentar para o termo iluminados, usado no captulo 10, versculo 32: Lembrem-se dos primeiros dias, depois que vocs foram iluminados, quando suportaram muita luta e muito sofrimento. A palavra iluminados a mesma empregada no texto em estudo, e Kistemaker61 a interpreta com referncia aos que foram batizados e, a partir de ento, comearam a sofrer grandes lutas.

    Entretanto, alm dessas interpretaes concernentes ao termo iluminados, possvel entend-lo como uma referncia salvao. Em Joo 1:9, o evangelista aplica esse termo, segundo Bruce,62 da seguinte forma: A iluminao que o evangelista tem em mente principalmente espiritual, que dissipa as trevas do pecado e da descrena [...]. Outro texto que comprova que o termo iluminados se encontra diretamente ligado com a salvao Ef- sios 1:18: os olhos do corao de vocs sejam iluminados, a fim de que vocs conheam a esperana para a qual ele os chamou, as riquezas da gloriosa herana dele nos santos. Hendriksen,63 ao comentar o texto anterior, afirma: Com o fim de alcanar esta iluminao, o Esprito opera nos homens o novo nascimento [...]. Os olhos so esclarecidos (iluminados) quando o corao purificado.

    A partir dessas constataes, percebe-se que essa temtica no to simples quanto pode aparentar em primeira instncia, e en- car-la como uma revelao inicial ou uma degustao, como fez

    Idem.6lIdem, p. 419.aIntroduo e comentrio de Joo, p. 41- 63Comentrio do Novo Testamento: Efsios, p. 125.

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 35

    Calvino,64 parece no estar de acordo com as afirmaes do escritor de Hebreus, o qual pretendia demonstrar o alto grau de iluminao recebido por aqueles homens concernentes verdade crist, j que deles dito: [...] provaram o dom celestial. A referncia aqui no relativa a algo experimentado superficialmente, mas ao que de fato foi vivenciado. Eles tornaram-se participantes do Esprito Santo. Para Calvino,65 essa afirmao no deve ser entendida de outra forma, a no ser que os apstolos haviam imposto as mos sobre eles. Isso quer dizer que essas pessoas receberam o Esprito Santo, o que resultou possivelmente na operao de sinais e curas.

    Aqueles homens participaram ativamente da igreja e confessaram o senhorio de Jesus, pois essa era a condio bsica para participar da comunidade de f e usufruir da companhia dos cristos.66 E, por fim, [...] experimentaram a bondade da palavra de Deus e os poderes da era que h de vir, isto , tiveram os mesmos privilgios dos cristos: ouviram a palavra de Deus e participaram da ceia do Senhor. Entretanto, jamais chegaram ao arrependimento e regenerao. Com isso em mente, esse texto no serve para fundamentar o pensamento arminiano de que o cristo regenerado pode perder a salvao, haja vista que aqueles homens, ao voltarem para o judasmo e seus cerimoniais de sacrifcios, demonstraram que jamais tiveram um encontro salvfico com Jesus.

    Judas IscariotesMuitos no conseguem compreender como Judas, por ser um apstolo, caiu do estado de graa e se perdeu definitivamente. Concluem que, se ele caiu, o cristo regenerado tambm pode cair e de igual forma perder a salvao. Portanto, relevante destacar alguns textos das Escrituras quanto pessoa de Judas, para procurar

    MA epstola aos Hebreus, p. 150.65Idem, p. 148.66Westcott, The Epistle to the Hebrews, p. 149.

  • 36 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    saber se possvel identific-lo como o traidor e se ele era escolhido para a salvao eterna.

    Jesus declarou que um dos seus apstolos haveria de tra-lo. E o que pode ser lido em Joo 6:64: Contudo, h alguns de vocs que no creem. Pois Jesus sabia desde o princpio quais deles no criam e quem o iria trair. Em Joo 13:18, possvel ler: No estou me referindo a todos vocs; conheo os que escolhi. Mas isto acontece para que se cumpra a Escritura [...]. No captulo 17, versculo 12, encontram-se as seguintes palavras de Jesus: Enquanto estava com eles, eu os protegi e os guardei no nome que me deste. Nenhum deles se perdeu, a no ser aquele que estava destinado perdio, para que se cumprisse a Escritura.

    Nesses textos, algum pode objetar que o nome de Judas no mencionado e, portanto, poderia ser qualquer outro apstolo. Todavia, na comparao desses textos com outros textos bblicos, fica evidente que o nome desse traidor era Judas. Marcos 14:43-44 afirma: Enquanto ele ainda falava, apareceu Judas, um dos Doze [...]. O traidor havia combinado um sinal com eles: Aquele a quem eu saudar com um beijo, ele: prendam-no e levem-no em segurana [...]. Marcos 3:19 ainda mais expltico: e Judas Iscariotes, que o traiu. Em Mateus 26:47-49, o traidor chamado de Judas.

    Em Joo 13:2, pode-se ler: Estava sendo servido o jantar, e o Diabo j havia induzido Judas Iscariotes, filho de Simo, a trair Jesus. Com a mesma perspectiva, Lucas, em Atos 1:16, declara: [...] Irmos, era necessrio que se cumprisse a Escritura que o Esprito Santo predisse por boca de Davi, a respeito de Judas, que serviu de guia aos que prenderam Jesus.

    Por conseguinte, possvel afirmar que o traidor identificado como Judas Iscariotes, de quem o evangelista Mateus, no captulo 26, versculo 56, afirma: [...] para que se cumprissem as Escrituras [...]. Est claro que Judas Iscariotes traiu Jesus. Entretanto, no se pode concluir que Judas perdeu a salvao por causa da sua traio. Judas estava inserido no propsito eterno de Deus como aquele que seria um dos apstolos, denominado como tal, porm

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 37

    sem jamais fazer parte dos escolhidos de Deus. por essa razo que Jesus se refere a ele como filho da perdio e diz que seu propsito era que se cumprisse a Escritura, conforme Joo 17:12: [...] Nenhum deles se perdeu, a no ser aquele que estava destinado perdio, para que se cumprisse a Escritura.

    Isso significa que Judas pertencia ao colgio apostlico, mas no fazia parte dos escolhidos para a salvao eterna. Ele se perdeu para que as Escrituras se cumprissem. Portanto, desautorizar a doutrina de que o cristo regenerado no perde a salvao com base em Judas um equvoco bblico, haja vista que em nenhum momento se declara em qualquer parte das Escrituras que ele tivesse sido salvo e houvesse perdido a salvao. Pelo contrrio, Judas identificado como filho da perdio, ou seja, ele no perdeu a salvao, j que nunca a teve.

    Outro texto citado pelos cristos brasileiros que aderiram ao arminianismo em detrimento do calvinismo 2Pedro, que diz:

    Teria sido melhor que no tivessem conhecido o caminho da justia, do que, depois de o terem conhecido, voltarem as costas para o santo mandamento que lhes foi transmitido. Confirma-se neles que verdadeiro o provrbio: O co volta ao seu vmito e ainda: A porca lavada volta a revolver-se na lama.

    2Pedro 2:21-22

    Green,67 ao comentar esse texto, pontua, num primeiro momento, que esses homens no estavam dentro do mbito do santo mandamento que lhes fora dado, pois Pedro logo indica que no eram verdadeiros cristos. A porca no foi transformada, mas apenas lavada, como acontece quando algum selado exteriormente com o batismo, e no com a regenerao interior operada por obra do Esprito Santo.68 Assim, referindo-se ao texto, o autor declara: Este,

    67Segunda epstola de Pedro e Judas, p. 115.Hoekema, Criados imagem de Deus, p. 260.

  • 38 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    porm, pouco consolo para aqueles que dogmaticamente negariam a possibilidade de um cristo apostatar.69

    Com perspectiva semelhante de Green, Champlin,70 ao comentar esses versculos, informa que, na Antiguidade, os hbitos imundos do porco serviam para ilustrar os vcios morais e que Pedro, ao utilizar essa figura, tem em mente demonstrar que aqueles homens retornaram a seus pecados anteriores, com deleite e entusiasmo, embora, por algum tempo, tenham experimentado a crena crist.

    Com base nas interpretaes anteriores, nota-se que Green deixa mais dvidas do que Champlin sobre aqueles homens serem ou no cristos regenerados. Entretanto, no estudo desse texto, luz dos adgios utilizados, observa-se que o apstolo Pedro no tinha em mente indicar que eles eram cristos regenerados.

    Alm disso, o simples fato de o texto explicitar que aqueles homens conheceram o caminho da justia no implica que houve regenerao real. Trata-se, na verdade, do crente ou pessoa que, ao simpatizar com a vida crist, separa-se das impurezas do mundo por um curto espao de tempo. Todavia, logo volta a amar as coisas do mundo e, sendo vencido, torna-se pior do que o seu primeiro estado, conforme afirma o captulo 2, versculo 20. Assim, torna-se como o co que volta ao prprio vmito e a porca que, lavada, volta para o lamaal. Portanto, o texto no diz que o cristo regenerado pode perder a salvao, mas adverte quanto necessidade de o cristo regenerado estar vigilante contra os falsos mestres que se introduzem entre os cristos com heresias destruidoras, chegando a negar o Soberano que os resgatou [...] (2Pe 2:1).

    Glatas 5:4O texto bblico de Glatas 5:4 outro escolhido pelo protestantismo brasileiro na opo pela posio arminiana, em detrimento da

    69Idem.70O Novo Testamento interpretado verscub por versculo, p. 204.

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 39

    calvinista, pois ele afirma: Vocs, que procuram ser justificados pela Lei, separaram-se de Cristo; caram da graa. No se pode negar que Paulo escreve aos cristos da Galcia. Todavia, imprudente, luz desse texto, crer que o cristo pode perder a salvao, sobretudo fundamentado nas palavras caram da graa.

    No estudo do texto de Glatas, percebe-se que a motivao principal para escrever essa epstola foi a deciso do Concilio de Jerusalm, descrita no captulo 15 de Atos. O debate consistia em saber se a salvao ocorria somente por meio da graa ou se, alm da graa, havia necessidade de seguir a lei de Moiss quanto circunciso. isso que se l em Atos 15:1: Alguns homens desceram da Judeia para Antioquia e passaram a ensinar aos irmos: Se vocs no forem circuncidados conforme o costume ensinado por Moiss, no podero ser salvos. O Concilio declarou: Cremos que somos salvos pela graa de nosso Senhor Jesus (At 15:11). Assim, negou aos considerados por eles como gentios a necessidade de praticarem a circunciso. Contudo, estes deveriam se abster das coisas sacrificadas a dolos, bem como do sangue, da carne de animais sufocados e das relaes sexuais ilcitas (At 15:29).

    Com essa perspectiva e visando a um grupo judaizante que se havia infiltrado naquela igreja, Paulo escreveu aos glatas, com a finalidade de ensinar que a salvao ocorre somente pela graa em Cristo. nesse contexto que se faz necessrio atentar s palavras de Pentecost:71

    O apstolo Paulo no se refere perda da salvao, mas sim ao abandono do princpio da graa pelo qual somos salvos e pelo qual vivemos. Os judeus salvos que tentavam viver pela lei estavam deixando o princpio da graa.

    A interpretao de Pentecost atende ao texto e ao contexto de toda a epstola aos Glatas, pois cair no possui o sentido de

    71A s doutrina, p. 111.

  • 40 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    perda da salvao, mas significa que eles estavam recebendo influncia de outro evangelho, o que resulta na admirao de Paulo, conforme expressa em 1:6-8: Admiro-me de que vocs estejam abandonando to rapidamente aquele que os chamou pela graa de Cristo, para seguirem outro evangelho [...] querendo perverter o evangelho de Cristo. Mas ainda que ns [...] pregue um evangelho diferente daquele que lhes pregamos, que seja amaldioado!. Hoekema72 comenta o seguinte a respeito desse texto: Paulo no est falando aqui sobre a possibilidade de que verdadeiros crentes percam a salvao, mas sobre um erro doutrinrio desastroso. Sendo assim, esse texto tambm no autoriza a crena de que possvel a um crente regenerado perder a salvao.

    Os protestantes brasileiros que adotam a postura arminiana tambm fundamentam sua crena de que o cristo regenerado pode perder a salvao em textos que demonstram a necessidade da perseverana diante da apostasia.

    ITimteo 4:1-3A primeira epstola a Timteo, captulo 4, versculos 1 a 3, afirma:

    O Esprito diz claramente que nos ltimos tempos alguns abandonaro a f e seguiro espritos enganadores e doutrinas de demnios. Tais ensinamentos vm de homens hipcritas e mentirosos, que tm a conscincia cauterizada e probem o casamento e o consumo de alimentos que Deus criou para serem recebidos com ao de graas pelos que creem e conhecem a verdade.

    Chama a ateno o trecho alguns abandonaro a f. A nfase de Paulo que esses apstatas nunca foram redimidos, nunca nasceram de novo, mas simplesmente tinham aparncia de piedade, a qual ao mesmo tempo negava o poder de Deus na vida deles e demonstrava em suas atitudes que no eram cristos regenerados.

    nCriados imagem de Deus, p. 255.

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 41

    Marcos 13:13 afirma: Todos odiaro vocs por minha causa; mas aquele que perseverar at o fim ser salvo, e em Hebreus 12:1-2 as seguintes palavras podem ser lidas:

    Portanto, tambm ns, uma vez que estamos rodeados por to grande nuvem de testemunhas, livremo-nos de tudo o que nos atrapalha e do pecado que nos envolve, e corramos com perseve- rana a corrida que nos proposta, tendo os olhos fitos em Jesus, autor e consumador da nossa f. Ele, pela alegria que lhe fora pro- posta, suportou a cruz, desprezando a vergonha, e assentou-se direita do trono de Deus.

    Os textos citados no dizem que o cristo regenerado pode perder a salvao. O foco est na necessidade de os cristos vigiarem. Eles mostram o perigo da negligncia a uma vida de orao, de f e da prpria Palavra de Deus. Portanto, tampouco esses textos podem fundamentar que o cristo regenerado perde a salvao. Eles sero conservados por causa da boa mo do Senhor.

    Por fim, relevante citar outro texto, que, conforme Pink,73 utilizado pelos arminianos na defesa de que o cristo regenerado pode perder a salvao. Trata-se de Joo 15:2,6. No versculo 2, podem ser lidas as palavras: Todo ramo que, estando em mim, no d fruto, ele corta; e todo que d fruto ele poda, para que d mais fruto ainda; e, no versculo 6, a afirmao : Se algum no permanecer em mim, ser como o ramo que jogado fora e seca. Tais ramos so apanhados, lanados ao fogo e queimados.

    Estudiosos como Bruce74 e Hendriksen75 associam o ramo cortado, seco, lanado no fogo e queimado diretamente a Judas. Esses autores fundamentam suas concepes em Joo 13:10-11, que afirma a respeito de Judas: Vocs esto limpos, mas nem todos.

    73Exposition ofthe Gospel ofjohn, p. 805.1Alntroduo e comentrio de Joo, p. 264-265.75Comentrio do Novo Testamento: Joo, p. 688.

  • 42 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    Pois ele sabia quem iria tra-lo, e por isso disse que nem todos esta- vam limpos.

    Num contexto geral, pode-se supor que Judas est entre estes ramos. Entretanto, no captulo 13, versculos 28 e 29, h referncia de que ele j tinha sado dentre os apstolos, de maneira que no ouviu as ltimas palavras de Jesus, narradas no captulo 13, a partir do versculo 31, e nos captulos 1417. Ele s aparece novamente em cena no captulo 18, com aqueles que haveriam de prender Jesus. Isso certamente no impediria Jesus de falar se referindo a ele. Mas, ainda que Judas esteja entre esses ramos, improvvel que Jesus tenha em mente diretamente a pessoa de Judas.

    Champlin,76 em sua interpretao arminiana, declara serem ramos infrutferos os cristos genunos que, por causa de sua falta de frutos, perdem a salvao. Pink77 enftico ao afirmar que esse texto no serve para fundamentar a crena arminiana relativa perda da salvao, pois, em sua concepo, Jesus tem como foco os onze discpulos. Assim, o autor conclui que essa passagem diz respeito aos crentes genunos, e no aos supostos discpulos que experimentam somente uma conexo externa e superficial com Jesus.

    Entretanto, por falta de frutos, podem sofrer disciplinas divinas. Wikenhauser,78 ao comentar esse versculo, afirma: Este texto ensina a severa disciplina que Deus impe a quem quer ser seu discpulo. Com a mesma perspectiva, Erdman79 ressalta que o verbo cortar possui o significado de disciplinar. Isso significa que esse corte pode ser o juzo de Deus na vida do crente, que pode implicar inclusive a morte fsica, mas jamais a perda da salvao.

    7O Novo Testamento interpretado verscub por verscub, p. 537. nExposition ofthe Gospel ofjohn, p. 805-806.78El evangelio segn San Juan, p. 425.790 evangelho de Joo, p. 117.

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 43

    A DOUTRINA DA SALVAO NO SNODO DE DORT

    Embora o princpio arminiano propagado seja amplamente aceito entre as comunidades evanglicas no Brasil, existe um grupo de igrejas que se denominam reformadas, tambm conhecidas como calvinistas, que respondem diferentemente das demais pergunta: Pode um cristo regenerado perder a salvao?.

    Antes de conhecer a resposta das igrejas reformadas ou calvi- nistas a essa indagao, necessrio refletir sobre a origem histrica dessas igrejas. Os princpios reformados ou calvinistas so assim denominados por se fundamentarem na compreenso dos textos bblicos com base nos pensamentos de Joo Calvino, por terem se mantido fiis aos cinco pontos do calvinismo prescritos pelo Snodo de Dort e por serem contrrios ao Remonstrance ou aos cinco pontos do arminianismo, j discutidos anteriormente.

    Joo Calvino, sistematizador da Reforma, no foi o criador do termo calvinismo. Este foi cunhado por seus seguidores no Snodo de Dort.

    Calvino nasceu em 1509, em Noyon, cidade renomada da regio da Picardia, no norte da Frana, e morreu em Genebra em 1564.80 Sua me se chamava Jeanne de Franc, e seu pai, Gerard Calvin. Este era um cidado respeitado, a quem era possvel reservar a renda de um beneficio eclesistico para a educao do filho, a partir dos seis anos de idade.81 Dois aspectos contriburam decisivamente para o preparo de Calvino:82 ter estudado na Universidade de Paris, onde se encontrou com Guilherme Cop,83 e ter conhecido as ideias protestantes por meio de seu primo Pierre Olivetan.84

    80T. Beza, A vida e a morte de Joo Calvino, p. 8.81Idem, p. 9.82F. Cambi, Histria da pedagogia, p. 252.83Mdico de Francisco I, foi um dos convertidos aos ideais reformados. Seu filho foi reitor da Universidade de Paris. cf. Biler, O pensamento econmico e social de Calvino, p. 115.84Primo de Calvino, converteu-se f reformada, influenciando posteriormente a deciso de Calvino.

  • 44 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    Ao encerrar os estudos humansticos, seu pai o enviou Univer- sidade de Orlans, para que ele pudesse seguir carreira jurdica. Depois de se transferir para a Universidade de Bourges, em 1529, deixou um comentrio sobre o De Clementia, de Sneca, em 1532, que marcou o pice da influncia humanstica sobre a sua vida.85

    Entre a concluso do comentrio e o fim do ano seguinte, 1533, Calvino se converteu e adotou as ideias da Reforma. Forado a abandonar a Frana em 1534 por colaborar com Nicholas Cop,86 reitor da Universidade de Paris, na elaborao de um documento recheado de humanismo e de reforma, seguiu para Basilia no in- cio de 1537.87

    Quando Guilherme Farei (1489-1565) estabeleceu os princpios reformados em Genebra, percebeu que necessitaria de algum administrativamente capacitado. Em 1536, Farei se encontrou com Calvino e solicitou sua ajuda. Calvino se recusou. Farei, por sua vez, o advertiu, dizendo que Deus o amaldioaria se no ficasse.88 Impelido pelo medo, Calvino resolveu ficar. Assim, ele e Farei trabalharam juntos at serem exilados em 1538.89

    Calvino foi ministro de ensino de Genebra em 1536,90 ano em que terminou sua obra As Institutas da religio crist, quando tinha 26 anos de idade. A princpio, desejava escrever apenas certos rudimentos para o rei da Frana, Francisco I, com a finalidade de defender os protestantes da Frana, que sofriam por sua f e solicitavam ao rei que compreendesse as ideias da Reforma.91 A esse respeito, Cairns afirma: Foi a perseguio aos protestantes franceses

    85Calvino, Breve instruccin, p. 6.86Fez um discurso que citava os escritos de Lutero, demonstrando ser a favor de uma reforma conforme os princpios reformados. Todavia, no se tratava de uma proposta de um cisma na igreja, mas da reforma de alguns princpios errneos que ela vinha apresentando. cf. Biler, O pensamento econmico e social de Calvino, p. 121-122.87Biler, O pensamento econmico e social de Calvino, p. 122.S8Beza, A vida e a morte de Joo Calvino, p. 18.89Idem.90Calvino, Breve instruccin, p. 6.91Idem, p. 13.

  • CORRENTES HISTRICAS DA DOUTRINA DA SALVAO 45

    que levou Calvino a publicar a primeira edio das suas Institutas, em 1536; sua inteno era defender os cristos franceses como pes- soas leais e sugerir o fim da perseguio.92

    Nessa primeira edio, seu contedo estava delimitado aos ensi- nos dos Dez Mandamentos, do Credo apostlico, da f, da orao com modelo no Pai-nosso, dos dois sacramentos, dos perigos da doutrina romana acerca da ceia do Senhor e, finalmente, da liberdade crist do cidado.93 Essa obra passou por vrias edies, at a final, de 1559.94

    Em 1537, os amigos Guilherme Farei e Calvino conseguiram a apro- vao de um decreto que estabelecia que a ceia do Senhor fosse ceie- brada em ocasies preestabelecidas. Alm disso, um catecismo para crianas seria preparado, o canto congregacional seria adotado, e os membros professos, sob disciplina severa, seriam excomungados.95

    Em 1540, Calvino pastoreou refugiados franceses em Estrasburgo, onde dirigiu a Reforma e ensinou teologia. Nessa poca, casou-se com Idelette de Bure, viva de um pastor anabatista, convertido f refor- mada. Seu nico filho, Jacques, nascido em 20 de julho de 1547, no viveu mais que alguns dias, e, em 1549, Idelette tambm faleceu. Ainda na cidade de Estrasburgo, fez amizade com Melanchton,96 e, talvez por isso, o intento de Calvino, a partir de 1541, foi o de criar escolas ao lado dos templos calvinistas, conforme declara Biler:97

    Segue-se a ordem das escolas que diz respeito ao ministrio dos mestres. Prev as ordenanas, j em 1541, a criao de uma escola destinada formao dos pastores e magistrados; esta, entretanto, no aparecer seno em 1559.

    Calvino faleceu em maio de 1564, mas suas ideias influenciaram profundamente o protestantismo daqueles dias, e seus ensinos

    92Cairns, Histria do cristianismo atravs dos sculos, p. 257.93Cambi, Histria da pedagogia, p. 252.94Beza, A vida e a morte de Joo Calvino, p. 6895Cairns, Histria do cristianismo atravs dos sculos, p. 254.96Calvino, Breve instruccin, p. 7.97Calvino, O pensamento econmico e social de Calvino, p. 154-

  • 46 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    chegaram at as igrejas da atualidade. Sua maior influncia veio dos seus escritos, pois escreveu comentrios sobre 23 livros do Antigo Testamento e sobre todos os do Novo Testamento, com exceo do Apocalipse.98 Alm disso, produziu grande nmero de panfletos devocionais, doutrinrios e polmicos. Porm, acima de tudo, suas Institutas passaram por vrias edies e chegaram at os dias atuais, trazendo como contedo um profundo sistema doutrinrio fundamentado nas Escrituras.

    A teologia de Calvino passou a ser aceita como estrutura teolgica dos reformadores, e desde a formulao dos cinco pontos do calvinismo, no Snodo de Dort, eles passaram a ser denominados de reformados calvinistas, os quais, segundo Berkhof," parecem ser os nicos a responderem questo: Pode um cristo regenerado perder a salvao?, com a afirmao de que o eleito jamais pode cair do estado de graa e perder a salvao.

    Este captulo discorreu sobre as diferentes correntes histricas acerca. da doutrina da salvao, destacando as posies contrrias entre o arminianismo e o calvinismo com relao salvao e o regenerado. Depois dessas consideraes, permanecem as seguintes perguntas: O que as Escrituras Sagradas dizem com relao salvao do cristo regenerado? O que os documentos da histria da Igreja crist testemunham a respeito desta doutrina? O captulo seguinte se encarrega da busca por respostas a essas questes.

    Reviso e aproveitamento do captulo 1

    1. Qual a concepo de Pelgio quanto ao pecado original?2. Qual a concepo de Agostinho quanto ao pecado original?3. Como o semipelagianismo concebe a doutrina da salvao?4 Por que foi necessrio convocar o Snodo de Dort?5. Por que o arminianismo se propagou mais facilmente entre as

    igrejas evanglicas brasileiras do que o calvinismo?

    98Reid, Joo Calvino, p. 229.99Teologia sistemtica, p. 549.

  • C a p t u l o 2

    Fundamentos bblicos da crena de que o cristo regenerado no perde a salvao

    No captulo ANTERIOR, foram analisadas as diferentes correntes doutrinrias que respondem pergunta: Pode um cristo regenerado perder a salvao?. Neste captulo, o objetivo ser identificar o que as Escrituras Sagradas dizem a respeito dessa questo.

    Textos bblicos que confirmam que oCRISTO REGENERADO NO PERDE A SALVAO

    Jeremias 32:40Farei com eles uma aliana permanente: Jamais deixarei de fazer o bem a eles, e farei com que me temam de corao, para que jamais se desviem de mim.

    Spurgeon1 pregou sobre esse texto no Metropolitan Tabernacle, Londres, e o interpretou nos seguintes termos:

    1. Spurgeon afirma que a aliana eterna descrita no versculo 40 qualificada de eterna. Segundo ele, no captulo 31, essa aliana chamada de nova aliana em contraste com a aliana anterior estabelecida por Deus com Israel, quando o trouxe para fora do Egito.2 A aliana estava baseada nas obras. Com a quebra da aliana, Israel foi considerado infiel.

    'Perseverana na santidade.2Jeremias e Lamentaes, p. 115.

  • 48 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    Assim, Deus estabelece uma nova aliana eterna porque est firmada na pessoa e obra de Cristo. Jesus o prprio fiador desse concerto. Portanto, a aliana eterna, feita com o cris- to regenerado na pessoa de Cristo, que o representante legal de todo o seu povo. Isso leva certeza de que essa aliana no pode falhar, pois perfeita e recebida inteiramente pela graa de Deus, desde a primeira letra at sua palavra final.

    2. Spurgeon afirma que a aliana est baseada no Deus imutvel, ou seja, Deus o mesmo ontem e hoje, ele no muda no cumprimento de suas promessas. Para o autor, o mesmo motivo que levou Deus a comear o leva a continuar. Esse motivo no outro seno sua graa e misericrdia. A graa um favor imerecido, dispensado ao crente regenerado. Por essa razo, pode-se afirmar que Deus, ao fazer aliana eterna com o seu povo, garantiu que seus eleitos jamais poderiam perder a salvao.

    3. Spurgeon declara que seu povo h de perseverar na aliana at o fim porque ela foi provida de uma promessa absoluta oriunda do Deus onipotente, que no pode negar a sua prpria natureza: jamais se desviaro de mim. Para Spurgeon, a obra da regenerao no temporria, que reforma o homem apenas por algum tempo; mas uma obra eterna, por meio da qual o homem nasce para o cu. No novo nascimento, implantada uma vida que no poder morrer, porque uma semente viva e incorruptvel, que vive e permanece para sempre. A graa continuar operando no homem at lev-lo glria eterna, onde estar para sempre com Jesus.

    Joo 5:24Eu lhes asseguro: Quem ouve a minha palavra e cr naquele que me enviou, tem a vida eterna e no ser condenado, mas j passou da morte para a vida.

  • FUNDAMENTOS BBLICOS DA CRENA DE QUE O CRISTO REGENERADO NO.. 49

    Jesus declara enfaticamente nesse texto que aqueles que ouvem e guardam suas palavras e creem naquele que o enviou tm a vida eterna. Perceba que Jesus, ao utilizar o verbo ter, o coloca no presente do indicativo ativo.3 Isso significa afirmar que o cristo regnerado em Cristo tem a vida eterna4 no como realidade futura, mas como realidade presente. No momento em que algum cr, a vida eterna passa a ser, pela graa de Deus, sua herana. por isso que Cristo enfatiza: tem a vida eterna, no entra em juzo, mas passou da morte para a vida. Esse cristo, segundo as palavras de Jesus, j est salvo e livre da condenao da morte.

    Por conseguinte, entende-se, mediante as palavras de Jesus, que o cristo regenerado tem a vida eterna e perseverar at o fim no estado de graa, porque o prprio Cristo o suster, fazendo-o permanecer firme e fiel ao Senhor. Infere-se desse texto que esse cristo jamais poder perder a salvao eterna.

    Joo 6:37-39Todo aquele que o Pai me der vir a mim, e quem vier a mim eu jamais rejeitarei. Pois desci dos cus, no para fazer a minha vontade, mas para fazer a vontade daquele que me enviou. E esta a vontade daquele que me enviou: que eu no perca nenhum dos que ele me deu, mas os ressuscite no ltimo dia.

    Observa-se nesses versculos que o Pai d pessoas que lhe pertencem a Cristo, e estas jamais sero rejeitadas, porque no da vontade de Deus que nenhuma delas se perca. O termo perca diz respeito vida eterna. Esta nfase pode ser entendida no fato de que Cristo acolhe todos os que o Pai lhe d; e este acolher implica proteo at o fim. Da a expresso ltimo dia, que significa os eleitos so guardados e protegidos do momento de sua converso

    3No grego, exei.4No grego, zen ainion.

  • 50 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    at o fim. Por causa disso, pode-se declarar que o cristo regenerado tem a vida eterna e jamais a perder.

    Joo 6:47,54Asseguro-lhes que aquele que cr tem a vida eterna. Todo aquele que come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no ltimo dia.

    Inserido no mesmo contexto do versculo anterior, convm apenas notar que o tempo do verbo novamente o presente do indicativo ativo, ou seja, o cristo tem a vida eterna a partir do presente. Por essa razo, Bruce, ao comentar o texto em anlise, afirma: Apro- priar-se de Cristo pela f garante aos que so dele a vida na era vindoura, quando Ele os ressuscitar no ltimo dia; e, alm disso, faz com que a vida na era vindoura seja uma herana que j pode ser desfrutada aqui e agora.5

    Joo 10:28-29Eu lhes dou a vida eterna, e elas jamais perecero; ningum as poder arrancar da minha mo. Meu Pai, que as deu para mim, maior do que todos; ningum as pode arrancar da mo de meu Pai.

    Jesus, aps definir suas ovelhas (Jo 10:26-27), declara enfaticamente que elas podem ter certeza de que perseveraro at o fim e jamais perdero a salvao ou a vida eterna. Perceba no texto que a vida eterna doada gratuitamente por Cristo.6 No h mritos humanos diante dele para receb-la, mas os homens encontram graa na misericrdia de Cristo. Sendo assim, se Cristo o doador e ele imutvel, o cristo regenerado pode ter a certeza de que perseverar at o fim.

    5Introduo e comentrio de Joo, p. 144.O verbo empregado por Jesus didomi (somente eu lhes dou), que tem sua raiz em do, que por sua vez a raiz de doron (Ef 2:8-9), cuja traduo dom ou presente gratuito.

  • FUNDAMENTOS BBLICOS DA CRENA DE QUE O CRISTO REGENERADO NO.. 51

    Alm disso, o cristo regenerado pode ter a certeza da vida eterna com Cristo, porque ele confirma sua prpria afirmao ao dizer que o cristo pode perecer fisicamente, mas no eternamente.

    Por fim, Cristo declara: ningum as poder arrancar da minha mo. O pronome indefinido ningum enfatiza que nada pode arrebatar as ovelhas de Jesus da sua mo. Paulo afirma em Romanos 8:31-39 que nada pode separar o cristo do amor de Deus. Em Joo, Jesus afirma que este jamais lhe pode ser tirado. Ningum mais poderoso do que Jesus a ponto de conseguir arrancar qualquer de suas ovelhas da sua mo.

    Vale ressaltar que a expresso da minha mo7 indica que a ovelha de Jesus est protegida com ele. Alm disso, mo um simbolismo de poder. Assim, os ouvintes de Jesus entenderiam, por meio da palavra mo, que Cristo enfatizava seu imenso poder.

    Com base nessa declarao, portanto, as ovelhas de Jesus podem ter certeza de que sua perseverana est garantida at o fim, porque Cristo a prpria garantia de que a vida eterna com Deus est confirmada e consumada. Esse versculo claro em demonstrar que o cristo regenerado jamais perece e que nada pode separ-lo do poder e glria de Jesus. Por fim, para no deixar qualquer dvida quanto real promessa de Cristo, ele ainda profere as palavras do versculo 29, como se estivesse ratificando que a segurana de suas ovelhas definitiva, pois, alm dele, o Pai a certeza da vida eterna, haja vista que ele e o Pai so um (Jo 10:30).

    Por conseguinte, diante das declaraes de Jesus, s resta ao cristo ter plena certeza de que ele jamais perder a salvao, jamais cair do estado de graa, jamais deixar de perseverar. De outra forma, Cristo teria mentido, o que impossvel a sua prpria essncia divina.

    7No grego, aparece a preposio k (de dentro da mo). A figura utilizada por Jesus de uma mo com os dedos fechados para proteger o que est em seu interior.

  • 52 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    ljoo 5:11-13,20E este o testemunho: Deus nos deu a vida eterna, e essa vida est em seu Filho. Quem tem o Filho, tem a vida; quem no tem o Filho de Deus, no tem a vida. Escrevi-lhes estas coisas, a vocs que creem no nome do Filho de Deus, para que vocs saibam que tm a vida eterna. Sabemos tambm que o Filho de Deus veio e nos deu entendimento, para que conheamos aquele que o Verdadeiro. E ns estamos naquele que o Verdadeiro, em seu Filho Jesus Cristo. Este o verdadeiro Deus e a vida eterna.

    clara a nfase desses versculos. No versculo 11, percebe-se que o verbo ter no aparece como no evangelho de Joo, isto , no presente do indicativo ativo, mas utilizado em sua forma pretrita.8 Significa que Deus, o Pai, deu ao cristo regenerado, em definitivo, a vida eterna que est em seu Filho. Alm disso, o verbo utilizado dessa forma indica uma ao completa no passado, isto , a vida eterna, que, uma vez doada, no pode ser retirada.

    Nos versculos 12 e 20, Joo utiliza novamente o verbo ter no presente do indicativo ativo, de uma maneira enftica, a fim de explicitar que o cristo tem o Filho, e, se ele a vida eterna, aqueles que nele creem tm a mesma garantia. Com relao ao versculo 13, Joo procura convencer de forma definitiva que o fiel possuidor da vida eterna. Para isso, emprega o verbo ter9 no imperativo, expressando a ideia de ordem e splica: tm a vida eterna.

    Est explicitado que a vida eterna uma herana e possesso presente e que jamais pode ser perdida. Para quem discorda disso, Joo afirma em sua primeira epstola:

    Quem cr no Filho de Deus tem em si mesmo esse testemunho. Quem no cr em Deus o faz mentiroso, porque no cr no testemunho que Deus d acerca de seu Filho. E este o testemunho: Deus nos deu a vida eterna, e essa vida est em seu Filho.

    IJoo 5:10-11

    sO verbo ter aparece no pretrito edken, cuja traduo deu.90 verbo exete est no imperativo.

  • FUNDAMENTOS BBLICOS DA CRENA DE QUE O CRISTO REGENERADO NO.. 53

    Romanos 5:8-10Mas Deus demonstra seu amor por ns: Cristo morreu em nosso favor quando ainda ramos pecadores. Como agora fomos justificados por seu sangue, muito mais ainda, por meio dele, seremos salvos da ira de Deus! Se quando ramos inimigos de Deus fomos reconciliados com ele mediante a morte de seu Filho, quanto mais agora, tendo sido reconciliados, seremos salvos por sua vida!

    Paulo, nos versculos anteriores, declara que Cristo amou e morreu pelos que lhe pertencem, quando estes ainda estavam sob o domnio do pecado e do mundo. Essa declarao implica o princpio de que o homem, na condio de pecador, no podia apresentar boas obras diante de Deus ou mritos que lhe pudessem permitir reivindicar direitos salvao. O texto paulino claro em afirmar que Deus reconciliou o homem por um ato de amor e misericrdia, o que resulta na crena de que nada pode separ-lo do amor de Deus (Rm 8:31-39). Deus j conhecia as condies de misria e pecado em que o homem estava. Por isso, nem a ingratido nem a infidelidade do homem regenerado o motivaro a mudar e retirar sua graa salvfica, pois, segundo Boettner,10 Deus conhecia toda essa ingratido, antes de conferir Sua graa.

    A luz das palavras anteriores, surge a seguinte reflexo: se no fosse o propsito de Deus desde o princpio perdoar plenamente os pecados do cristo regenerado, segundo as palavras de Colossenses 2:14: e cancelou a escrita de dvida, que consistia em ordenanas, e que nos era contrria. Ele a removeu, pregando-a na cruz, para que teria chamado os que lhe pertencem a sua graa? Alm disso, pode-se indagar: que vida eterna essa que Deus d e depois retira? Para que salvar e depois deixar que o homem se perca? E contrrio natureza de Deus dar a bno da salvao e depois retir-la, porque, conforme visto, Deus imutvel, de forma que

    10La predestinacin, p. 158.

  • 54 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    nada no corao ou conduta do crente pode alterar seus propsitos divinos.

    Nesse sentido, o cristo regenerado pelo Esprito mais privilegiado que Ado. Deus fez com Ado um acordo ou pacto, que dependia nica e exclusivamente de o homem continuar no estado em que se encontrava. Ado no havia experimentado o pecado e no possua inclinao para o mal. No den, usufruiu do livre- arbtrio ou da capacidade de no pecar. Porm, mesmo sem essa inclinao, pecou. Assim, a questo que permanece : e quanto ao cristo que j foi concebido em pecado?

    No estudo da pessoa e obra de Cristo, notria a convico de que Jesus o representante legal dos salvos diante de Deus, o Pai. Isso significa que o cristo regenerado mais privilegiado do que Ado, pois, no caso de Ado, a salvao dependia dele e, mesmo sem inclinao para o pecado, ele caiu. Caso o cristo, que j concebido em pecado, no fosse assegurado pela suficincia da obra de Cristo, fcil imaginar que tragdia isso seria. Ado teve a oportunidade de demonstrar boas obras, mas nem mesmo ele conseguiu, da a necessidade do segundo Ado, Cristo, que satisfez todas as exigncias legais para garantir aos seus a salvao e as demais bnos eternas.

    Por conseguinte, percebe-se que o cristo regenerado no perde a salvao, pois esta no depende de sua obras e atitudes, mas da suficincia da obra de Cristo. Infere-se da que, quando algum salvo por Cristo, permanece nesse estado por toda a eternidade: uma vez salvo, sempre salvo.

    ICorntios 1:8Ele os manter firmes at o fim, de modo que vocs sero irrepreensveis no dia de nosso Senhor Jesus Cristo.

    O verbo manter,11 nesse versculo, cuja traduo corresponde a confirmar, fortalecer, garantir, o mesmo encontrado

    uNogrego, bebaiosei (confirmar).

  • FUNDAMENTOS BBLICOS DA CRENA DE QUE O CRISTO REGENERADO NO.. 55

    em ICorntios 1:6 e empregado muitas vezes com o significado de garantir legalmente. Paulo ressalta que a vida transformada dos corntios demonstrava a validade da mensagem que lhes fora pregada. Os efeitos da pregao eram a garantia de que lhes ensinara a verdade. No verssulo 8, o apstolo dos gentios ensina que Cristo os enriqueceu, deu-lhes graa e todas as boas ddivas e cuidar para que at a hora final no lhes falte nada.

    Paulo lembra que o prprio Cristo conservaria aqueles irmos irrepreensveis at o dia do Senhor. Portanto, deveriam ter firme a certeza de que permaneceriam nos caminhos da santidade at o dia do Senhor, no por suas prprias foras, mas porque Cristo assegurava essa certeza. Ora, se o cristo regenerado, semelhana dos corntios, permaneceria irrepreensvel, sustentado pelo poder de Jesus, isso significa que ele ser salvo da perdio eterna.

    Efsios 1:13,14Quando vocs ouviram e creram na palavra da verdade, o evangelho que os salvou, vocs foram selados em Cristo com o Esprito Santo da promessa, que a garantia da nossa herana at a redeno daqueles que pertencem a Deus, para o louvor da sua glria.

    Paulo afirma que o cristo, depois de ouvir a palavra da verdade e o evangelho da salvao e crer em Jesus, selado com o Esprito Santo da promessa. A palavra selo, na poca do Novo Testamento, era utilizada para garantir a genuinidade de cartas e objetos, para indicar que pertenciam a algum e proteg-los de violaes. Paulo, ao utilizar essa figura, tem a inteno de demonstrar que a presena do Esprito Santo no cristo o selo de que ele pertence a Deus e ser protegido contra dano ou violaes.

    O Esprito Santo a garantia de que o crente no se perder, pois ele o penhor,12 ou seja, um pagamento parcial, que dava a certeza ou garantia de que o pagamento total seria feito. Sendo

    12Nogrego: arrabon (penhor).

  • 56 FUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DA SALVAO

    assim, o Esprito Santo o selo da promessa de Deus de que o cristo regenerado receber sua herana completa. Ele a garan- tia de que o cristo jamais poder se perder, pois, caso isso aconte- cesse, perderia a herana garantida em Cristo por toda a eternidade.

    Filipenses 1:6Estou convencido de que aquele que comeou boa obra em vocs, vai complet-la at o dia de Cristo Jesus.

    O apstolo declara que Deus comeou a boa obra, ou seja, providenciou pregaes e trabalhos pastorais no meio deles, e, por isso, ocorreram inmeras converses. Essa boa obra, regenerao e converso, no ser frustrada, e os cristos no perdero a salvao. Pelo contrrio, sero preservados at o fim. Portanto, esse texto tambm afirma que o cristo tem a salvao e a vida eterna garantidas, uma vez que Deus quem inicia a obra da salvao e ele mesmo a completar.

    lPedro 1:3-5Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo! Conforme a sua grande misericrdia, ele nos regenerou para uma esperana viva, por meio da ressurreio de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herana que jamais poder perecer, macular-se ou perder o seu valor. Herana guardada nos cus para vocs que, mediante a f, so protegidos pelo poder de Deus at chegar a salvao prestes a ser revelada no ltimo tempo.

    Pedro profere, nesse texto, palavras de conforto acerca da eterna certeza da salvao. Afirma que o cristo possui herana incorruptvel, que est guardada no cu para ele. Alguns podem diante disso objetar: J que a herana est no cu, nunca a alcanaremos para desfrut-la. Porm, para descartar tal ideia, Pedro diz que o cristo protegido para alcanar a salvao. A palavra protegido a mesma empregada para indicar a proteo ou cuidado

  • FUNDAMENTOS BBLICOS DA CRENA DE QUE O CRISTO REGENERADO NO.. 57

    de uma cidade a cargo de soldados (2Co 11:32). Porm, o apstolo declara que o cristo no est guardado por soldados, mas por Deus, que o protege com seu poder. Essa proteo ou preservao no algo temporal, mas alcana o cu.

    Esse texto, como os demais, declara que o cristo regenerado jamais perder a salvao.

    Judas 24quele que poderoso para impedidos de cair e para apresen- t-los diante da sua glria sem mcula e com grande alegria.

    Essa doxologia faz lembrar, antes de tudo, o poder de Deus. Esse Deus onipotente quem impede os que lhe pertencem de cair. Com a palavra impedir, Judas enfatiza que mister vigiar e permanecer perto do Senhor (Jd 21), mas somente Deus pode guardar e fazer que os seus filhos andem seguros, sem quedas. Isso significa que Deus protege os seus de cair nos males morais e tambm no permitir que eles caiam do estado de graa ou que percam a salvao.

    Diante do expost